Tratado de Direito Privado, Tomo LIX - Direito das sucessões: Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação [59, 4ª ed.] 9788520344620

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Tratado de Direito Privado, Tomo LIX - Direito das sucessões: Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação [59, 4ª ed.]
 9788520344620

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42 M672 2012

Vol.59

TRMADODE DIREITO PRIVADO

TRATADO DE DIREITO PRIVADO

Diretor Responsável ANTONIO BELINELO

Diretora de Conteúdo Editorial GISELLE DE MELLO BRAGA TAPAI

Diretora de Operações Editoriais ORIENE PAVAN

Coordenadora Editorial DANIELLE CANOIDO DE OLIVEIRA

Analistas Documentais. Ariene Cristina Almeida do Nascimento, Bruna Shlindwein Zeni, Bruno Martins Costa, Cristiane Gonzalez Basile de Faria, Douglas Elmauer, Henderson Fíirst de Oliveira, Italo Façanha Costa, Iviê Adolfo de Macedo Loureiro Gomes, Mário Henrique Castanho Prado de Oliveira e Rodrigo Domiciano Oliveira. Editoração Eletrônica Coordenadora ROSEU CAMPOS DE CARVALHO

Equipe de Editoração: Adriana Medeiros Chaves Martins, Ana Paula Lopes Correa, Carolina do Prado Fatel, Gabriel Bratti Costa, Ladislau Francisco de Lima Neto, Luciana Pereira dos Santos, Luiz Fernando Romeu, Marcelo de Oliveira Silva e Vera Lúcia Cirino. Produção gráfica: Caio Henrique Andrade.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Miranda, Pontes de, 1892-1979 Direito das sucessões: sucessão testamentária, testamentos, oodicilo, revogação. / Pontes de Miranda; atualizado por Giselda Hironaka, Paulo Lôbo.-São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. - (coleção tratado de direito privado: parte especial; 59) ISBN

978-85-203-4462-0

1. Direito civil 2. Direito civil - Brasil I. Hironaka, Giselda. II. Lôbo, Paulo. III.TÍtulo. IV. Série. 12-08681

CDU-347 (81)

índices para catálogo sistemático: 1. Brasil : Direito civil 347 (81) 2. Brasil: Direito privado 347 (81)

^3J

Pontes de Mir TRATADO DE DIREITO PRIVADO PARTE ESPECIAL

TOMO LIX DIREITO DAS SUCESSÕES Sucessão testamentária. / Testamentos. Codicilo. Revogação

Atualizado por

Giselda Hironaka Paulo Lôbo

ÍWm anos

TRATADO DE DIREITO

PRIVADO

P O N T E S DE M I R A N D A PARTE

ESPECIAL

TOMO LIX DIREITO D A S S U C E S S Õ E S : Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação

GISELDA HIRONAKA PAULO LOBO Atmlizfldores

© Originais do Tratado de Direito Privado - 60 Tomos P O N T E S DE M I R A N D A © Desta Atualização [2012]: E D I T O R A R E V I S T A DOS T R I B U N A I S L T D A . ANTONIO BELINELO Diretor responsável Rua do Bosque, 820 - Barra Funda Tel. 11 3613-8400-Fax 11 3013-8450 CEP 01135-000 - São Paulo, SP, Brasil TODOS os DKEITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação tota] ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra cm qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos, do Código Penal), com pena de prisão e multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais). CENTRAL DE RELAAONAMENTO R T

(atendimento, em dias úteis, das 8 às 17 horas) Tel. 0800-702-2433 e-mail de atendimento ao consumidor: [email protected] Visite nosso site: www.rt.com.br Impresso no Brasil [07.2012] Profissional Fechamento desta edição [11.07.2012]

•ÍTURTO*^ UrrOSA AFILIADA ISBN 978-85-203-4452-0 ISBN da Coleção 978-85-203-4321-0

I AMNÉRIS E Ó FRANCIS,

amor e gratidão de seu marido e de seu pai.

ÍNDICE GERAL DO TOMO

APRESENTAÇÃO, 9

APRESENTAÇÃO DOS ATUALIZADORES, 1 1 PREFÁCIO À

EDIÇÃO, 1 3

SOBRE O AUTOR, 2 7 OBRAS PRINCIPAIS DO AUTOR, 3 1 SOBRE OS ATUALIZADORES, 3 5 PLANO GERAL DA COLEÇÃO, 3 7 TÁBUA SISTEMÁTICA DAS MATÉRIAS, 4 1 BIBLIOGRAHA DO TOMO LEX, 5 0 7 ÍNDICES

Alfabético dos Autores citados, 581 Cronológico da Legislação, 612 Cronológico da Jurisprudência, 693 Alfabético das Matérias, 723

LIX

A Editora Revista dos Tribunais - RT tem a honra de oferecer ao público leitor esta nova edição do Tratado de Direito Privado, de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, reconhecidamente um dos mais ilustres juristas brasileiros, senão o maior. Para nós, da Editora, a republicação desta obra tem importância única: ao se consubstanciar num marco científico e editorial, pela contribuição que há tantas décadas traz à ciência do Direito e, especificamente, ao Direito Privado. Essas fundamentais características se compõem com as comemorações do primeiro centenário desta Casa Editorial e com a evocação dos 120 anos de nascimento do grande tratadista. O respeito ao texto original, também publicado por esta Editora em 1983, foi um dos maiores cuidados que nos determinamos a tomar, desde a estrutura e organização do texto, passando por alguns recursos usados pelo Autor, até a ortografia da época, com exceção do trema nas semivogais. O Direito, porém, como todas as ciências, vem sofrendo grandes transformações nas últimas décadas. Por isso, com o intuito de inserir a obra no contexto presente, notas atualizadoras foram elaboradas por juristas convidados entre os mais renomados do País. Inseridas ao final de cada tópico (§), encontram-se devidamente destacadas do texto original, apresentando a seguinte disposição: Panorama Atual: § x: A - Legislação: indicação das alterações legislativas incidentes no instituto estudado § .x: B - Doutrina: observações sobre as tendências atuais na interpretação doutrinária do instituto estudado § C - Jurisprudência: anotações sobre o posicionamento atual dos Tribunais a respeito do instituto estudado

Neste século de existencia, a Editora Revista dos Tribunais se manteve líder e pioneira na promoção do conhecimento, procurando fornecer soluções especializadas e qualificadas aos constantes e novos problemas jurídicos da sociedade, à prática judiciária e à normatização. Nas páginas que publicou, encontra-se o Direito sendo estudado e divulgado ao longo de cinco Constituições republicanas, duas guerras mundiais e diversos regimes políticos e contextos internacionais. Mais recentemente, a revolução tecnológica, a era digital, e a globalização do conhecimento trouxeram desafios ainda mais complexos, e para acompanhar tudo isso, a Editora passou a compor, desde 2010, o grupo Thomson Reuters, incrementando substancialmente nossas condições de oferta de soluções ao mundo jurídico. Inovar, porém, não significa apenas "trazer novidades", mas também "renovar" e "restaurar". A obra de Pontes de Miranda permite tantas leituras, tamanha sua extensão e profundidade, que não se esgotam seu interesse e sua importância. E por isso, também - para inovar republicamos seu Tratado de Direito Privado. Não podemos deixar de registrar, ainda, nossos mais profundos agradecimentos à família Pontes de Miranda, pela participação que fez possível a realização de um sonho. EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS

APRESENTAÇÃO DOS ATUALIZADORES Talvez esta grande obra de Pontes de Miranda, conhecida na intimidade jurídica como "Tratado", seja mesmo a sua maior e mais importante obra. Quem não a conhece, no mundo jurídico? Eternamente citado, por docentes e profissionais do Direito, o Tratado de Direito Privado resiste - e sempre resistirá - à passagem do tempo e às mudanças da sociedade e das leis correspondentes. O raciocínio impecável do importante jurista brasileiro se estampa definitivamente nas letras jurídicas, levando-nos, a nós todos, a sempre consultar seus ensinamentos e suas reflexões, tão ricos. Por isso e por muito mais que isso, ficamos muitíssimo honrados com o convite da Editora Revista dos Tribunais para proceder à atualização dos seis últimos volumes do Tratado, correspondentes ao direito das sucessões. Para tanto, relemos uma vez mais, com extremo prazer e deleite intelectual, os capítulos e os parágrafos destes volumes, justamente para organizarmos a atualização pretendida pela Editora. A cada leitura, ficamos mais enriquecidos pela absorção do pensamento ponteano, como não podia deixar de ser. E, então, escrevemos as nossas notas, debaixo desta atmosfera de grandeza e de tanta inteligência. As notas de atualização desta obra ímpar de Pontes de Miranda, de acordo com os critérios de padronização e uniformidade adotados pela Editora, especialmente quanto ao irrestrito respeito à mtegridade do texto original, estão assim distribuídas - entre nós, os atualizadores - do tomo L K do Tratado de Direito Privado: Título ni Capítulo XX - Paulo Lôbo Capítulo XXI - Paulo Lôbo Capítulo XXn - Paulo Lôbo Capítulo XXni - Paulo Lôbo Capítulo XXIV - Giselda Hironaka Capítulo XXV - Giselda Hironaka

Capítulo XXVI - Giselda Hironaka Capítulo XXVII - Giselda Hironaka A divisão por capítulos atendeu a alguns critérios que combinamos, de sorte que cada um deles foi atualizado e assinado por um de nós, permitindo, então, uma identificação exata das notas de atualização. Foi assim que pretendemos trabalhar, e é assim que entregamos este quinto volume do direito sucessório (vol. LIX) à comunidade jurídica de nosso país. São Paulo, 25 de junho de 2012. Professor P A U L O

LÔBO

e Professora GISELDA

HIRONAKA

PREFÁCIO À

EDIÇÃO

1. Os sistemas jurídicos são sistemas lógicos, compostos de proposições que se referem a situações da vida, criadas pelos interêsses mais diversos. Essas proposições, regras jurídicas, prevêem (ou vêem) que tais situações ocorrem, e incidem sobre elas, como se as marcassem. Em verdade, para quem está no mundo em que elas operam, as regras jurídicas marcam, dizem o que se há de considerar jurídico e, por exclusão, o que se não há de considerar jurídico. Donde ser útil pensar-se em têrmos de topologia: o que entra e o que não entra no mundo jurídico. Mediante essas regras, consegue o homem diminuir, de muito, o arbitrário da vida social, a desordem dos interêsses, o tumultuario dos movimentos humanos à cata do que deseja, ou do que lhe satisfaz algum apetite. As proposições jurídicas não são diferentes das outras proposições: empregam-se conceitos, para que se possa assegurar que, ocorrendo a, se terá a'. Seria impossível chegar-se até aí, sem que aos conceitos jurídicos não correspondessem/afoí ãa vida, ainda quando esses fatos da vida sejam criados pelo pensamento humano. No fundo, a função social do direito é dar valores a interêsses, a bens da vida, e regular-lhes a distribuição entre os homens. Sofre o influxo de outros processos sociais mais estabilizadores do que êle, e é movido por processos sociais mais renovadores; de modo que desempenha, no campo da ação social, papel semelhante ao da ciência, no campo do pensamento. Êsse ponto é da maior importância. Para que se saiba qual a regra jurídica que incidiu, que incide, ou que incidirá, é preciso que se saiba o que é que se diz nela. Tal determinação do conteúdo da regra jurídica é função do intérprete, isto é, do juiz ou de alguém, jurista ou não, a que interêsse a regra jurídica. O jurista é apenas, nesse plano, o especialista em conhecimentos das regras jurídicas e da interpretação delas, se bem que, para chegar a essa especialização e ser fecunda, leal, exata, a sua função, precise de conhecer o passado do sistema jurídico e, pois, de cada regra jurídica, e o sistema jurídico do seu tempo, no momento em que pensa, ou pensa e fala ou escreve.

Diz-se que interpretar é, em grande parte, estender a regra jurídica a fatos não previstos por ela com o que se ultrapassa o conceito técnico de analogia. Estaria tal nüssão compreendida no poder do juiz e, pois, do intérprete. Diz-se mais: pode o juiz, pois que deve proferir a sententia quae rei gerendae aptior est, encher as lacunas, ainda se falta a regra jurídica que se pudesse estender, pela analogia, ou outro processo interpretativo, aos fatos não previstos. Ainda mais: se a regra jurídica não é acertada, há de buscar-se, contra legem, a regra jurídica acertada. Nota-se em tudo isso que se pretendem contrapor a investigação do sistema jurídico, em toda a sua riqueza, dogmática e histórica, e a letra da lei. Exatamente o que se há de procurar é a conciliação das três, no que é possível; portanto, o sentido - dogmática e historicamente - mais adequado às relações humanas, sem se dar ensejo ao arbítrio do juiz. A separação dos poderes, legislativo e judiciário, esteia-se em discriminação das funções sociais (política, direito); e a história do princípio, a sua revelação através de milênios, a sua defesa como princípio constitucional, apenas traduz a evolução social. O êrro do legislador pode ser de expressão: prevalece, então, o pensamento que se tentou exprimir, se êsse pensamento é captável no sistema jurídico; não se desce ao chamado espírito, ou à vontade do legislador, porque seria atravessar a linha distintiva do político e do jurídico; não se contraria o princípio de que a lei é para ser entendida pelo povo, no grau de cultura jurídica em que se acham os seus técnicos, e não para ser decifrada. Por outro lado, as circunstâncias sociais podem ter mudado: o envelhecimento da regra jurídica participa mais do julgamento do povo do que do decorrer do tempo; o problema toma-se mais de mecânica social do que de fontes e de interpretação das leis. 2. O sistema jurídico contém regras jurídicas; e essas se formulam com os conceitos jurídicos. Tem-se de estudar o fáctico, isto é, as relações humanas e os fatos, a que elas se referem, para se saber qual o suporte fáctico, isto é, aquilo sobre que elas incidem, apontado por elas. Aí é que se exerce a função esclarecedora, discriminativa, crítica, retocadora, da pesquisa jurídica. O conceito de suporte fáctico tem de ser guardado pelos que querem entender as leis e as operações de interpretação e de julgamento. A regra jurídica 'Todo homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil" (Código Civil, art. 1.°) é regra jurídica de suporte fáctico simplicíssimo: "Homem". Se há um ser humano, se nasceu e vive um homem, a regra jurídica do art. 1.° incide. Incide, portanto, sôbre cada homem. Cada ho-

mem pode invocá-la a seu favor; o juiz tem dever de aplicá-la. Porém nem todos os suportes fácticos são tão simples. "São incapazes relativamente, os maiores de dezesseis e menores de vinte e um anos" (art. 6.°, I). Suporte fáctico: ser humano, dezesseis anos feitos. "Cessando a confusão, para logo se restabelecer, com todos os acessórios, a obrigação anterior" (art. 1.052). Suporte fáctico: A devedor a B, A sucessor do direito de B, mas a sucessão é temporária, qualquer que seja a causa. É fácil compreender-se qual a importância que têm a exatidão e a precisão dos conceitos, a boa escolha e a nitidez deles, bem como o rigor na concepção e formulação das regras jurídicas e no raciocinar-se com elas. Seja como fôr, há sempre dúvidas, que exsurgem, a respeito de fatos, que se têm, ou não, de meter nas categorias, e da categoria em que, no caso afirmativo, se haveriam de colocar. Outras, ainda, a propósito dos próprios conceitos e das regras jurídicas, que têm de ser entendidas e interpretadas. A missão principal do jurista é dominar o assoberbante material legislativo e jurisprudencial, que constitui o ramo do direito, sobre que disserta, sem deixar de ver e de aprofundar o que provém dos outros ramos e como que perpassa por aquêle, a cada momento, e o traspassa, em vários sentidos. Mal dá êle por começada essa tarefa, impõe-se-Uie o estudo de cada uma das instituições jurídicas. Somente quando vai longe a sua investigação, horizontal e verticalmente, apanhando o sobredireito e o direito substancial, é que pode tratar a regra jurídica e o suporte fáctico, sobre que ela incide, avançando, então, através dos efeitos de tal entrada do suporte fáctico no mundo jurídico. O direito privado apanha as relações dos indivíduos entre si, e cria-as entre êles; mas a técnica legislativa tem de levar em conta que alguns dêsses indivíduos são Estados, Estados-membros, Municípios, pessoas jurídicas de direito público, que também podem ser sujeitos de direitos privados. Interpretar leis é lê-las, entender-lhes e criticar-lhes o texto e revelar-Ihes o conteúdo. Pode ela chocar-se com outras leis, ou consigo mesma. Tais choques têm de ser reduzidos, eliminados; nenhuma contradição há de conter a lei. O sistema jurídico, que é sistema lógico, há de ser entendido em tôda a sua pureza. ^ Se, por um lado, há tôda a razão em se repelir o método de interpretação conceptuaKstico (que se concentrava na consideração dos conceitos, esquecendo-lhe as regras jurídicas em seu todo e, até, o sistema jurídico), método que nunca foi o dos velhos juristas portuguêses nem o dos brasileiros, temos de nos livrar dos métodos que não atendem a que as regras

jurídicas se fazem com os conceitos e êsses tem a sua fixação histórica e hão de ser precisados. Principalmente, tem-se de levar em conta que a regra jurídica, a lei, viveu e vive láfora, - foi para ser ouvida e lida pelos que hão de observá-la e é para ser lida, hoje, por êles. Nem o que estava na psique dos que a criaram, nem o que está na psique dos que hoje a criam, têm outro valor além do que serve à explicitação do que é que foi ouvido e lido por aqueles a que foi dirigida, ou o é por aquêles a quem hoje se dirige. O elemento histórico, que se há de reverenciar, é mais exterior, social, do que interior e psicológico. Se assim se afasta a pesquisa da vontade do legislador, no passado e no presente, o subjetivismo e o voluntarismo que - há mais de trinta e dois anos - combatemos (nosso Subjektivismus und Voluntarismus im Recht, Archiv für Rechts und Wirtschaftsphilosophie, 16, 522-543), há de evitar-se passar-se a outro subjetivismo e a outro voluntarismo, - o da indagação da vontade da lei. Ratio legis não é voluntas legis; lei não quer; lei regra, lei enuncia. O sentido é o que está na lei, conforme o sistema jurídico, e não o que se atribui ao legislador ter querido, nem à lei querer agora. Nem o que E. R. B I E R L I N G (Juristische Prizipienlehre, IV, 230 e 256 s.), nem o que K . B I N D I N G (Handbuch, I, 465) e J . K O H L E R (Über die Interpretation der Gesetzen, Grünhuts Zeitschrift, 13, 1 s.) sustentavam. Interpretar é revelar as regras jurídicas que fazem parte do sistema jurídico, - pode ter sido escrita e pode não estar escrita, mas existir no sistema, pode estar escrita e facümente entender-se e apresentar certas dificuldades para ser entendida. Nas monocracias, os trabalhos preparatórios ficavam mais ocultos, raramente se publicavam com propósito de servir à interpretação, e quase sempre se perdiam, ao passo que a interpretação autêntica tinha todo o prestígio de lei, uma vez que não existia o princípio constitucional de irretroatividade da lei. Nas democracias, com o princípio da irretroatividade da lei, a interpretação autêntica ou é nova lei, ou não tem outro prestígio que o de seu valor intrínseco, se o tem; é interpretação como qualquer outra, sem qualquer peso a mais que lhe possa vir da procedência: o corpo legislativo somente pode, hoje, fazer lei para o faturo; não, para trás, ainda a pretexto de interpretar lei feita. O tribunal ou juiz que consultasse o Congresso Nacional cairia no ridículo, se bem que isso já tenha ocorrido na Europa. Seo legislador A ou os legisladores A, A' e A", quiseram a e todos os outros legisladores quiseram b, mas o que foi aprovado e publicado foi c, cé que é a regra jurídica. Bem assim, se todos quiseram a, e foi aprovado e publicado c. Os trabalhos preparatórios são, portanto, elemento de valor mínimo. O que foi publicado é a letra da lei, com as suas palavras e frases. Tem-se de interpretar, primeiro, gramatical-

mente, mas já aí as palavras podem revelar sentido que não coincide com o do dicionário vulgar (pode lá estar rescisão, e tratar-se de resolução; pode lá estar condição, e não ser de condido que se há de cogitar; pode falar-se de êrro, e só se dever entender o êrro de fato, e não o de direito). O sentido literal é o sentido literal da ciência do direito, tendo-se em vista que o próprio redator da lei ao redigi-la, exercia função da dimensão política, e não da dimensão jurídica, pode não ser jurista ou ser mau jurista, ou falso jurista, o que é pior. Demais, estava êle a redigir regra juri:dica, ou regras jurídicas, que se vão embutir no sistema jurídico e tal inserção não é sem conseqüências para o conteúdo das regras jurídicas, nem sem conseqüências para o sistema jurídico. Jurisprudência contra a lei é jurisprudência contra êsse resultado. Por isso, regra jurídica não escrita pode dilatar ou diminuir o conteúdo da regra jurídica nova. Daí, quando se lê a lei, em verdade se ter na mente o sistema jurídico, em que ela entra, e se ler na história, no texto e na exposição sistemática. Os êrros de expressão da lei são corrigidos facilmente porque o texto fica entre êsses dois componentes do material para a fixação do verdadeiro sentido. Na revelação de regra jurídica não escrita é que se nota maior liberdade do juiz. Nota-se; mas ¿há essa liberdade? Revelar a regra jurídica, se não está escrita, lendo-se na história e no sistema lógico, não é operação diferente de se ler na história, no texto e no sistema lógico. Não se cria a regra jurídica não escrita, como não se cria a regra jurídica escrita; ambas são reveladas, razão por que falar-se em lacuna do direito somente tem sentido se se critica o sistema jurídico, isto é, se se fala de iure condendo, ou se se alude a visão de primeiro exame, a algo que não se viu à primeira vista. Lacuna preenchida não é lacuna; lacuna que não é preenchível é lacuna de iure condendo. Analogia só se justifica se a ratio legis é a mesma (Ubi eadem ratio, idem ius); só se admite se, com ela, se revela, sem se substituir o juiz ao legislador: onde ela revela regra jurídica não-escrita, é analogia iuris, provém de explicitação do sistema jurídico e ainda é apenas reveladora, e não criadora. (A) Quando se revela por analogia legal, analogia legis, o que em verdade se faz é explicitar que a) a regra legal exprimiu, no texto, principio particular, e b) há principio mais geral em que êle se contém. (B) Quando se revela por analogia iuris, explicita-se regra jurídica que se há de ter como a), pois já existe, não escrita, no sistema jurídico. Fora de (A) e de (B), a chamada analogia é edicção de regra jurídica, contra o principio da separação dos poderes.

3. A atividade mais relevante da ciência do direito consiste, portanto, em apontar quais os têrmos, com que se compuseram e com que se hão de compor as proposições ou enunciados, a que s e dá o nome de regras jurídicas, e quais as regras jurídicas que, através dos tempos, foram adotadas e aplicadas. A sucessão histórica dessas regras obedece a leis sociológicas. Outra atividade, que não é menos inestimável do que aquela, está no interpretar o conteúdo das regras de cada momento e tirar delas certas normas ainda mais gerais, de modo a se ter em quase completa plenitude o sistema jurídico. Desde mais de dois milênios, porém principalmente nos últimos séculos, longo esforço de investigação, servido, aqui e ali, pela aparição de alguns espíritos geniais, conseguiu cristalizar a obra comum em enunciados sobre os próprios enunciados e sobre os têrmos, tornando cada vez "menos imperfeitas" a linguagem e a lógica do direito. A primeira necessidade da ciência jurídica passou a ser a mais rigorosa exatidão possível no delimitar os conceitos (E. I. BEKKER, System, IX). Os decênios passados puderam contemplar a obra imensa do século XIX, perceber o que não obtivera, até agora, "precisão"; e preparar-nos para a continuação criadora, que nunca seria possível sem a mole dos resultados anteriores e a depuração incessante de êrros. O valor do método etnológico assenta em que precisamos conhecer as instituições jurídicas em seu berço, mesmo em seus nascedouros, ou para distinguirmos dos outros processos sociais de adaptação o direito, ou para podermos escalonar, no tempo, as formas que o direito foi assumindo. Só assim poderemos datar o que apareceu no momento próprio e o que apareceu em momento impróprio (regressões, prematuridade legislativas). Com o método etnológico e o histórico-comparativo, podemos alcançar a discriminação das fases, na evolução social (método sociológico científico ou faseológico, que foi sempre o seguido em nossas obras, quer de sociologia, quer de dogmática jurídica). O valor dos estudos históricos para o conhecimento do direito vigente assenta em que não se pode conhecer o presente, sem se conhecer o passado, não se pode conhecer o que é, sem se conhecer o que foi. Não se poderia situar, no tempo, na evolução jurídica, cada enunciado do sistema lógico; nem se colheria o que estava na psique dos elaboradores da lei, porque estava no ambiente social (e continuou de estar), e se supôs incluso nos textos, ou entre os textos; nem se poderiam ñxar certos conceitos, nem se determinariam certas categorias, que têm os seus limites marcados

pelos fios históricos. Ainda onde o direito mudou muito, muito se há de inquirir do que não mudou. O direito muda muito onde em muito deixou de ser o que era. 4. A noção fundamental do direito é a de fato jurídico; depois, a de relação jurídica-, não a de direito subjetivo, que é já noção do plano dos efeitos; nem a de sujeito de direito, que é apenas têrmo da relação jurídica. Só há direitos subjetivos porque há sujeitos de direito; e só há sujeitos de direito porque há relações jurídicas. O grande trabalho da ciência jurídica tem sido o de examinar o que é que verdadeiramente se passa entre homens, quando se dizem credores, titulares ou sujeitos passivos de obrigações, autores e réus, proprietários, excipientes, etc. O esforço de dois milênios conseguiu precisar conceitos, dar forma sistemática à exposição, pôr êsses conhecimentos à disposição dos elaboradores de leis novas e aprimorar o senso crítico de algumas dezenas de gerações, até que, recentemente, se elevou a investigação ao nível da investigação das outras ciências, para maior precisão da linguagem e dos raciocínios. A subordinação dela à metodologia que resultou da lógica contemporânea, inclusive no que concerne à estrutura dos sistemas, é o último degrau a que se atingiu. Aliás, "ter direito" é, no falar diário, ambíguo, se não equívoco; Goethe tinha direito de escrever o que quisesse e, ainda naquele tempo, poderíamos ver no escrever o exercício de (direito de) liberdade de trabalho intelectual; A tem direito de se zangar com B, por B ter sido grosseiro, e vê-se bem que se está no mundo fáctico, a falar-se de direito, em sentido amplíssimo, que não é o sociológico, nem o técnico. Toda conveniência há em se evitar êsse sentido, extremamente largo, do falar comum; porém os juristas mesmos pecam em não verem que o direito abrange maior campo do que aquele que costumam, na rotina do ensino, da judicatura, ou da elaboração das leis, apontar ou pesquisar. Se A toma banho na praia, exerce direito de que êle não cogita, e é direito como os outros; se B vai ao cabeleireiro, com a filha, e diz que deseja as tranças do cabelo cortado, exerce direito. Onde quer que se distribuam bens da vida, inclusive os que se ligam à própria pessoa, aí está o sistema jurídico. Quem diz "aí está o sistema jurídico" diz há elementos fácticos sôbre os quais incidiu regra jurídica. Tal regra pode ser escrita, ou não escrita; em ambos os casos, faz parte do sistema jurídico, que é um cálculo lógico. A cada momento surgem problemas que somente podem ser resolvidos se se obedece a indicações e raciocínios exatos.

A incidência da regra jurídica é que toma jurídicos os bens da vida. Muitas vêzes, porém, a incognita é a regra jurídica; outras vezes, o conjunto de fatos, o suporte fáctico, em que a regra jurídica incide. Ali, responde-se às perguntas - "¿Há a regra jurídica e qual é?"; aqui, a duas outras "¿Quais os elementos que compõem o suporte fáctico; e qual a natureza de cada um dêles?" Tais questões são inconfundíveis com as da irradiação de efeitos dessa impressão da norma jurídica no suporte fáctico. Por onde se vê que não é de admitir-se, em ciência, que se comece a exposição, a falar-se dos efeitos, da eficácia (direitos, deveres ou dívidas; pretensões, obrigações; ações e exceções), antes de se descrever como os elementos do mundo fáctico penetram no mundo jurídico. O direito dos nossos tempos, depois de se haver o homem libertado do direito do clã e da tribo, bem como do privatismo oligárquico da Idade Média, é baseado em que cada um tem campo de autonomia em que pode rumar, como entenda, a sua vida. Supõe-se em cada uma aptidão biológica, social e psico-individual para alcançar fins autônomos, escolhendo os fins e, ainda, criando fins seus. A intervenção do Estado é excepcional, pôsto que, na elaboração das leis, se adotem - para os indivíduos e para o Estado - regras que não podem ser alteradas pela vontade de cada um. Algumas criam direitos; outras, deveres; outras, pretensões, obrigações e ações, ou só pretensões e obrigações. Outras criam direitos sem os subjetivar, de modo que o efeito, a que então se chama direito, é reflexo da norma jurídica que incidiu, sem ser, pois, o seu efeito adequado ou, sequer, anexo. Nem sempre o efeito reflexo cria direito sem subjetivação; o interesse é protegido sem a criação de direito subjetivo, ou, sequer, direito. Todavia, guardemo-nos de reduzir a essa categoria alguns fatos do mundo jurídico, que ofereceram dificuldades às gerações anteriores ao terem de os classificar {e.g., a lesão da propriedade, ou da pessoa); e mais ainda nos havemos de precatar contra discriminações concretas entre direito e interêsses protegidos que corresponderam a momentos já passados, a momentos em que eram verdadeiras (hoje não mais o são), tanto mais quanto tais discriminações podem ter resultado de deficiência do direito público de povos grandemente progredidos no direito privado. A afirmativa, por exemplo, de que não há no sistema jurídico regra que proíba, em geral, causar dano à pessoa ou ao patrimônio alheio {e.g., A. VON T Ü H R , Der Allgemeine Teil, I, 56) é falha: primeiro, desatende-se a que essa regra jurídica pode ser não-escrita e a que as regras jurídicas de sanções supõem a regra jurídica que se há de ter violado; segundo, não se vê que, noutro ramo do direito, que é o direito público, às vêzes no direito constitucional, a regra jurídica, que se supõe, vem, de ordinário, escrita.

5. Quando se trata de direito privado contemporâneo, poucos são os que se dão conta de que há mais de dois mil anos se vem elaborando toda a doutrina de que desfrutamos. Em verdade, foi como se, através desses milênios, estivesse o homem a descobrir o que seria melhor - ou é melhor - para regular as relações inter-humanas. "Descobrir" é o têrmo; pouco se criou: revelou-se, nos livros de doutrina, nas elaborações de regras jurídicas e nas crípticas, o que se presta a resolver os problemas do interêsse humano. Às vêzes por muitos séculos se procurou solução. No final, o direito, ainda o direito não-costumeiro, é a obra de milhares e milhares de inteligências. Daí ter-se de colher, aqui e ali, a verdade. Fácil é assim imaginar-se o que representa de esforço intelectual, de pesquisa, a Parte Geral do Direito Privado. 6. A respeito de conter, ou não, o Código Civil regras jurídicas de direito administrativo (portanto, heterotópicas), e de poder alguma regra de direito civil ser invocada como subsidiária do direito público, especialmente administrativo, tem havido graves confusões, provenientes de leitura apressadas de livros estrangeiros. No art. 1.°, diz-se que o Código Civil regula "os direitos e obrigações de ordem privada", de modo que é o fundo comum para o direito civil e o comercial; porém não para o direito público: para esse, a regra jurídica de direito privado somente pode ser invocada se é elemento do suporte fáctico de alguma regra jurídica publicística o fato jurídico privatístico, ou se - o que é causa das maiores confusões nos inexpertos - a regra jurídica privatística revela, no plano do direito privado, a existência de princípio geral de direito que também íe há de revelar no direito público. Exemplo de discussão imprecisa por ocasião dos acórdãos do Supremo Tribunal Federal, a 23 de junho de 1943, 5 de junho de 1944 e 5 de agosto de 1949 {R. dos T, 148,111 \ R. de D. A., H, 560; R. R, 129, 120). Em voto no acórdão da 2.^ Câmara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 23 de fevereiro de 1948 (R. dos T., 184, 351), procurou -se critério distintivo, dizendo-se que, em direito privado, se permite o que não é proibido, ao passo que, no direito público, só se pode fazer o que é permitido; mas isso é fácil dito, sem qualquer apoio em princípios, - tanto há regras jurídicas permissivas e proibitivas no direito privado quanto no público e o campo da liberdade, no direito público, é ainda mais vasto do que no direito privado. 7. A Parte Geral do Direito é um dos ramos do Direito. Todo sistema jurídico é sistema lógico. Cada ramo também o é. Não é contemplação.

nem doutrina teleológica. Há de formar sistema lógico; ou, melhor, há de ser apanhado do que é geral e comum no sistema lógico, ou geral e comum nos sistemas lógicos de que se trata. O sistema jurídico pode ser o do Estado A, ou um dos sistemas jurídicos (o direito civil, por exemplo) do Estado A; ou o dos Estados A, B, C, ou um dos sistemas dos Estados A, B, C. Ou se restrinja a definições, ou explicite princípios ou regras, ou é sistema lógico ou é parte de sistema. Embora seja possível pensar-se em Parte Geral do Direito em algum sistema hipotético (imaginário) X, ou X, Y, Z, a Parte Geral do Direito, ou do Direito Penal, ou do Direito Privado, ou a que fôr, é a de direito existente, ou de sistemas jurídicos existentes, ou de ramo do direito existente ou de ramo de sistemas jurídicos existentes. O seu programa não pode ser o de filosofia do direito, nem o de sociologia do direito; menos ainda o de história ou etnologia do direito; nem o dela pode suprir, ou eliminar os programas dessas disciplinas, nem o de qualquer delas, nem os de todas o suprem, ou eliminam. Alguns conceitos, é de notar-se, são sôbre os sistemas lógicos a que se dá a qualificação de jurídicos; por exigência prática, foram incluídos na Parte Geral do Direito, para se não recorrer a remissões. Outros são conceitos de que se precisa e, pois, subentendidos, o que os faz definições. A Parte Geral do Direito Privado tem, necessariamente, de trabalhar com, os conceitos que são comuns a todos os ramos do direito e a todos os ramos do direito privado; e com os conceitos que somente são comuns aos ramos do direito civü, ou ao direito comercial, ou a outro ramo. 8. A doutrina pandectista do século XIX deve-se a elaboração da Parte Geral do direito civil a ponto de se haver imposto, no século XX, às codificações mais autorizadas, exceto, o que é lamentar-se, à codificação italiana. As categorias jurídicas foram classificadas; os seus conteúdos discutidos e aclarados; e não há negar-se que, aos primeiros decênios do século corrente, a tal ponto havia chegado a sistematização, que os esforços, a partir desses anos, foram em profundidade e no sentido de classificação de toda a teoria geral do direito, em irradiações do que se conseguira na Parte Geral do dhreito civil. Exatamente por isso, a obra, que verse, no meio do século XX, matéria que se acrisolou com tantas investigações e controvérsias, exige-se pôr-se em dia com o que deixaram os últimos grandes civilistas das três primeiras décadas e o que as duas últimas conseguiram corrigir e aperfeiçoar. Seria, porém, incompleto o pôr-se em dia, se não se atendesse ao que se irradiava, em compensação fecunda, dos outros ramos

do direito. Daí a razão de se reputar da mais alta responsabilidade empreendimento tão complexo, a despeito de caber a matéria, nos códigos, em duas centenas de artigos (§§ 1-240 do Código Civil alemão; arts. l.°-179 do Código Civil brasileiro). 9. A divisão das matérias da Parte Geral aparece, nesta obra, pela primeira vez, em ordem lógico-científica. Primeiro, expusemos o que concerne ao plano da existência; depois, o que se refere ao plano da validade; finalmente, o que somente pertence ao plano da eficácia. O fato jurídico, primeiro, ê; se é, e somente se é, pode ser válido, nulo, anulável, rescindível, resolúvel, etc.; se é, e somente se é, pode irradiar efeitos, posto que haja fatos jurídicos que não os irradiam, ou ainda não os irradiam. No Plano I, a regra jurídica e o suporte fáctico sobre que ela incide são o de que de início nos incumbimos tratar; depois da incidência, que toma fato jurídico o suporte fáctico, versa-se o que define os fatos jurídicos e os classifica. A personalidade e a capacidade entram no estudo do suporte fáctico, porque de tais conceitos precisamos desde logo. No Plano n, o assunto já supõe a existência dos fatos jurídicos; mais precisamente, dos atos jurídicos (negócios jurídicos e atos jurídicos stricto sensu), fora os fatos jurídicos stricto sensu. São a validade, a nulidade e a anulabilidade o que mais longamente nos ocupa. No Plano IH, cogitamos da eficácia, que supõe existência e, de ordinário, pelo menos, não ser nulo o ato jurídico. Respectivamente, Tomos I-DI, IV e V-VI. A diferença entre o mundo fáctico e o mundo jurídico vê-se bem entre o passeio que alguém faz à casa do amigo e a entrega da carta com a oferta de contrato, entre o ato de cercar, interiormente, o terreno que lhe pertence e o de invadir o terreno do vizinho, entre a avulsão interior ao terreno de A e a avulsão entre o terreno de A e o de B. Duas pessoas que se divertem jogando cartas, sem parar qualquer valor (somente fichas de osso ou de matéria plástica, que voltam ao dono), mantêm-se no mundo fáctico; e duas que fizeram paradas de dinheiro, fizeram entrar no mundo jurídico, desde o momento em que acordaram em tal jogo, o negócio jurídico dos arts. 1.4771.479 do Código Civil. A diferença entre o plano da existência e o plano da eficácia percebe-se claramente quando se considera o fato jurídico e o direito, o dever, a pretensão, a obrigação, a ação e a exceção, que são efeitos, ou a condição e o têrmo, que só operam no plano da eficácia, e o distrato, a resolução sem ser por advento de condição ou têrmo, a própria resilição e a denúncia, que se passam no plano da existência. O distrato desfaz o ato

jurídico; a resolução resolve o ato jurídico, a resilição resile-o; a denuncia atinge o ato jurídico. A condição e o têrmo somente apanham efeitos. 10. A fonte mais extensa do direito civil brasileiro é o Código Civil, que teve a data de 1.° de janeiro de 1916 e entrou em vigor um ano depois. ''Este Código" disse o art. 1.°, "regula os direitos e obrigações de ordem privada concernentes às pessoas, aos bens e às suas relações". Em têrmos científicos, evitadas as elipses: o Código Civil regula os fatos de que resultam direitos e obrigações de ordem privada, quer de natureza pessoal, quer de natureza real. Como toda codificação, o Código Civil não foi exaustivo senão por algum tempo (= até a aparição de alguma regra jurídica derrogativa, ou a latere) e ainda assim não foi perfeita a sua exaustividade: somente onde se regulou alguma matéria foi, excluído o direito anterior (art. 1.807: "Ficam revogadas as Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes concernentes às matérias de direito civil reguladas neste Código"). No art. 1.806, estatuíra-se: "O Código Civil entrará em vigor no dia 1.° de janeiro de 1917". A fonte mais extensa do Código Comercial é o Código do Comércio (Lei n. 556, de 25 de junho de 1850). Os que não vivem atentos à história dos diferentes sistemas jurídicos dificilmente podem apreciar, com profundidade, a grande vantagem, que teve o Brasil, em receber o direito português e a doutrina jurídica dos séculos XV em diante, sem que direito estrangeiro fôsse imposto por invasores ou em imitações apressadas, como aconteceu a muitos dos povos hispano-americanos, em relação ao Código Civil francês. O Esboço de TEIXEIRA DE FREITAS, que nos teria dado o melhor Código Civil do século X I X , prestou-nos, não se transformando em Código Civil, o serviço de pôr-nos em dia com o que êle genialmente entrevia e permitiu-nos sorrir dos imitadores do Código Civil francês, enquanto Portugal, imitando-o, deixou que a sua história jurídica se fizesse mais nossa do que dêle. O Código Civil brasileiro é bem, como disse L . ENNECCERUS, a mais independente das codificações latino-americanas. Para quem observa, isentamente, o que se passou com o direito comercial, nota a artificialidade com que se quis arrancar do direito privado o todo suficiente para aparecer, como autônomo, ramo de direito privado que apenas consistia em algumas leis especiais e algumas regras jurídicas concernentes aos comerciantes. Algumas leis foram soldadas ao direito comercial sem se justificar tal soldagem deliberada e violenta.

11. A obra obedece a programa rigorosamente científico: a distinção entre mundo fáctico e mundo jurídico, que é o do sistema jurídico, vem à frente, e concorre imensamente para clarear os assuntos e para a solução de problemas delicados que perturbavam a ciencia européia; depois, a distinção entre o plano da existência, o plano da validade e o plano da eficácia, sem a qual em tantas confusões incorrem os juristas, baralhando "ser", "valer" e "ter efeito", como se fossem equivalentes "ser", "ser válido", "ser eficaz", ou "não ser", "não ser válido", "ser ineficaz". A ciência do direito, colhendo das regras jurídicas, da sistemática e da prática os conceitos, obedece às diferenças; os juristas, aqui e ali, perdem-nas de vista. Tudo aconselha a que se ordenem as matérias com toda a precisão conceptual. Já TEIXEIRA DE FREITAS percebera que a parte do direito concernente à eficácia ("dos efeitos civis", dizia êle) havia de ser todo um livro, após as causas, as pessoas, os bens e os fatos jurídicos. Somente depois se trataria - no plano do direito civil - dos direitos pessoais e dos direitos reais. O Código Comercial fundir-se-ia, uniücando-se o direito privado. Foi isso o que êle propôs em ofício de 20 de setembro de 1867, antes do Código suíço das Obrigações, - e a mediocridade circundante rejeitou. Há certo fio de coerência histórica e espiritual em realizarmos, já no plano da sistematização, com o material do direito vigente, complexo e de diferentes datas, versado lealmente, o que, no plano da técnica legislativa, fora o sonho do jurista brasileiro, há quase um século. Serve isso para mostrar, mais uma vez, que o Brasil tem um destino, que lhe traçaram o universalismo português e as circunstâncias jurídico-morais da sua história de mais de quatro séculos. É Ele, e não apenas nós (o civilista do século XIX e o autor desta obra), que planeja e executa. Somos apenas os instrumentos da sua avançada na dimensão do Tempo, a serviço da ordem jundica e da ciência, na América e no mundo. De nossa parte, outrem poderia levar a cabo esta obra, melhor e mais eficientemente; as circunstâncias trabalharam a nosso favor, de modo que cedo percebemos que sem elas não poderíamos, nem outrem qualquer poderia enfrentá-la. Também aí não se leve a conta de mérito excepcional do autor o que foi resultado, tão-só, da convergência, extremamente feliz, de múltiplos fatores, de ordem psíquica e de ordem material. Uma das circunstâncias foi a prática do direito, durante mais de quarenta anos; outra, a formação inicial, lógico-matemática; outra, a possibilidade de estar a par da ciência européia, especialmente alemã e austríaca, à custa de grandes sacrifícios. Porém não pesou menos o ter podido, materialmente,

realizar a obra, através de trinta anos de organização minudente e de disciplina estrita. A ciencia precisa, para ser verdadeiramente prática, não se limitar ao prático (R. VON J H E R I N G , Jahrbücher für die Dogmatik, I, 18: "Die Wissenschaft darf, um^wahrhaft praktisch zu sein, sich nicht auf das Praktische beschranken"). Êsse pensamento nos voltou à memoria, várias vêzes ao revermos as provas deste livro. A falta de precisão de conceitos e de enunciados é o maior mal na justiça, que é obrigada a aplicar o direito, e dos escritores de direito, que não são obrigados a aplicá-lo, pois deliberam êles-mesmos escrever. O direito que está à base da civilização ocidental só se revestirá do seu prestígio se lhe restituirmos a antiga pujança, acrescida do que a investigação científica haja revelado. Não pode ser justo, aplicando o direito, quem não no sabe. A ciência há de preceder ao fazer-se justiça e ao falar-se sobre direitos, pretensões, ações e exceções. Para honestamente se versar, hoje, o direito privado brasileiro, precisa-se de preparação de alguns decênios, quer pela necessidade de se meditarem milhares de obras, quer pela assoberbante jurisprudência que se amontoou. Por outro lado, não se pode impor ao público a exposição sistemática, sem críticas, do direito privado. Tem-se de apontar o que se diz e está errado; e chamar-se atenção para os que, com o seu gênio, descobriram, ou, com o valor das suas convicções, sustentaram a verdade. Rio de Janeiro, 15 de março de 1954. Rua Prudente de Morais, 1356.

SOBRE O AUTOR

FRANCISCO CAVALCANTI PONTES BE MIRANDA

Nasceu em Maceió, Estado de Alagoas, em 23 de abril de 1892. Faleceu no Rio de Janeiro, em 22 de dezembro de 1979. Foi um dos maiores juristas brasileiros. Também filósofo, matemático, sociólogo, deixou obras não só no campo do Direito, mas também da Filosofia, Sociologia, Matemática, Política e Literatura (poesia e prosa). Escreveu-as em português, francês, inglês, alemão e italiano. - Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, pela Faculdade de Recife, em 1911. - Membro do Instituto dos Advogados do Brasil, em 1918. - Membro Correspondente da Ordem dos Advogados de São Paulo, 16 de dezembro de 1919. - Conselheiro da Delegação Brasileira à V Conferência Internacional Americana, 1923. - Prêmio de Erudição da Academia Brasileira de Letras, 1924, pelo livro Introdução à Sociologia Geral. - Juiz de Órfíos, 1924. - Prêmio Único da Academia Brasileira de Letras, 1925, pelo livro A Sabedoria dos Instintos. - Prêmio Pedro Lessa, da Academia de Letras, 1925. - Professor Honoris Causa da Universidade Nacional do Rio de Janeiro, 1928. - Delegado do Brasil à V Conferência Internacional de Navegação Aérea, 1930. -Conf&XQnàstSi na Kaiser Wilhelm-Stiftung, em Berlim, 1931.

- Membro da Comissão de Reforma Universitária do Brasil, em 1931. - Membro da Comissão de Constituição, em 1932. - Chefe da Delegação do Brasil na Conferência Internacional de Navegação Aérea, em Haia, 1932. - Professor de Direito Internacional Privado na Académie de Droit International de la Haye, 1932. - Juiz dos Testamentos (Provedoria e Resíduos). - Desembargador do Tribunal de Apelação e Presidente das Câmaras de Apelação até 1939. - Ministro Plenipotenciário de P classe, em 1939. - Embaixador em comissão, 3 de novembro de 1939, sendo designado para Colômbia de 1940 a 1941. - Chefe da Delegação do Governo Brasileiro na XXVI Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, em Nova Iorque, 25 de setembro de 1941. - Representante do Brasil no Conselho Administrativo da Repartição Internacional do Trabalho, em Montreal, 29 de agosto de 1941; no posto de 15 de setembro de 1941 a março de 1943. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal do Recife, 1955. - Ordem do Tesouro Sagrado do Império do Japão, Primeiro Grau, 1958. - Medalha Comemorativa do Centenário do nascimento de Clóvis Beviláqua, 4 de outubro de 1959. - Prêmio Teixeira de Freitas, pelo Instituto dos Advogados Brasileiros, 1961. - Ordem do Mérito Jurídico Militar, pelo Superior Tribunal Militar, 1966. - Medalha Monumento Nacional ao Imigrante, Caxias do Sul, 1966. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal de São Paulo, 1966. - Comenda de Jurista Eminente, Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul, 1969.

- Professor Honorário da Faculdade de Direito de Caruaru, 26 de maio de 1969. - Grã-Cruz do Mérito da Única Ordem da República Federal da Alemanha, 1970. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul, 8 de agosto del970. - Professor Honoris Causa da Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 11 de agosto de 1970. • Titular Fundador da Legião de Honra do Marechal Rondon, 5 de maio de 1970. - Sumo Título de Mestre do Direito, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 19 de setembro de 1970. • Professor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 12 de agosto de 1971. • Prêmio Munis Freire de Pernambuco outorgado pela Associação dos Magistrados do Espírito Santo, 12 de agosto de 1974. • Prêmio Medalha Osvaldo Vergara outorgado pela OAB, Seção do Rio Grande do Sul, 6 de novembro de1974. - Professor Emérito da Faculdade de Direito de Olinda, 15 de maio de 1977. - Prêmio Medalha do Mérito Visconde de S. Leopoldo, Olinda, 15 de maio de 1977. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal de Alagoas, 1978. - Prêmio Medalha do Mérito Artur Ramos outorgado pelo Governador de Alagoas, março de 1978. - Imortal da Academia Brasileira de Letras, 8 de março de 1979. - Membro Benemérito do Diretório Acadêmico Rui Barbosa. - Membro Efetivo do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul. - Sócio Honorário do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. - Membro da Ordem dos Advogados do Brasil. - Membro da Academia Brasileira de Arte.

- Honra ao Mérito, Faculdade de Direito da Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. - Grau de Grã-Cruz (Ordem Albatroz) Museu de História, Sociedade Cultural Tradicionalista. - Membro - Membro - Membro - Membro

da Association of Symbolic Logic. da Academia Carioca de Letras. da Academia de Artes. da Academia Brasñeira de Letras Jurídicas.

- Membro da Academia Brasileira de Letras. - Cidadão Honorário de Minas Gerais.

OBRAS PRINCIPAIS DO AUTOR

JURÍDICAS

Sistema de Ciencia Positiva do Direito (1922), 2 Tomos; 2. ed., 1972, 4 Tomos. Os Fundamentos atuais do Direito Constitucional (1932). Tratado do Direito Internacional Privado, 2 Tomos (1935). Tratado das Ações, I-VH (1971-1978). Tratado de Direito Privado, Tomos I-LX, 3. ed. Comentários à Constituição da República dos E.U. do Brasil (1934), Tomos I e m . Comentários à Constituição de 10 de novembro de 1937, 1.° e 3." Tomos. Comentários à Constituição de 1946, 3. ed., Tomos I-Vm. Comentarios à Constituição de 1967, Tomos I-VI; 2. ed., com Emenda n. 1. La Conception du Droit internacional privé d'aprés la doctrine et la pratique au Brésil, Recueil des Cours de l'Académie de Droit Internacional de La Hoye, T. 39, 1932. La Création et la Personalité des personnes juridiques en Droit international privé, Mélanges Streit, Athènes, 1939. Nacionalidade e Naturalização no Direito brasileiro (1936).

A Margem do Direito (1912). História e Prática do Habeas Corpus (1916); 7. ed. (1972), 2 Tomos. Tratado de Direito de Família, 3. ed., 3 Tomos (1947). Da Promessa de Recompensa (1927). Das Obrigações por Atos Ilícitos, 2 Tomos (1927). Dos Títulos ao Portador (1921); 2. ed., 2 Tomos. Fontes e Evolução do Direito Civil Brasileiro, história, lacunas e incorreções do Código Civil (1928). Tratado dos Testamentos, 5 Tomos (1930).

Tratado do Direito Cambiário: I. Letra de Câmbio. II. Nota Promissória. III. Duplicam Mercantil. IV. Cheque, 1. ed., 4 Tomos (1954-1955). Tratado de Direito Predial (1953); 5 Tomos, 2. ed. Comentários ao Código de Processo Civil (1939), 2. ed., Tomos I-IX. Comentários ao Código de Processo Civil (de 1973), Tomos I-XVn. Embargos, Prejulgados e Revista no Direito processual brasileiro (1937). Tratado da Ação Rescisória (1973), 5. ed. História e Prática do Arresto ou Embargo (1937). Conceito e Importância da "unitas actus" (1939). Die Zivilgesètz der Gegetzwart, Band Hi, Brasilien (Einleitung von Dr. Pontes de Miranda), unter Mitwirkung von Dr. Pontes de Miranda u. Dr. Fritz Gericke, herausgegeben von Dr. Karl Heinscheimer (1928). Rechtsgefühl undBegriff des Rechts (1922). Begriff des Wertesundsoziale Anpassung (1922). Brasilien, Rechtsvergleichendes Handwõrterbuch, do Prof. Dr. Franz Schlegelberger, em colaboração (1929). Questões Forenses, S Tomos (1953). Princípio da relatividade gnosiológica e objetiva (1961). Dez anos de Pareceres, 1-10 (1974-1977).

D E FILOSOFIA

o Problema Fundamental do Conhecimento (1937), 2. ed. (1972). Garra, Mão e Dedo (1953). Vorstellung von Raune, Alti dei V Congresso Intemazionale di Filosofia (1924), Napoli, 1925.

SOCIOLÓGICAS

Introdução à Sociologia Geral (1926), 1," prêmio da Academia Brasileira de Letras. Á Moral do Futuro (Í913). Denujcracía, Liberdade, Igualdade, os três caminhos (1945).

Introdução à Política Científica (1924). Método de Análise Sociopsicológica (1925). O Novos Direitos do Homem (1933). Direito à Subsistência e Direito ao Trabalho (1935). Direito à Educação (1933). Anarquismo, Comunismo, Socialismo (1933). Los Principios y Leis de Simetria en la Sociologia General, Madrid, 1925.

LITERÁRIAS

Poèmes et chansons (1969). Obras Literárias (1960), 2 Tomos. A Sabedoria dos Instintos (1921), 1.° prêmio da Academia de Letras, 2. ed., 1924. A Sabedoria da Inteligência (1923). O Sábio e o Artista, edição de luxo (1929). Penetração, poemas, edição de luxo (1930). Inscrições da Estela Interior, poemas, edição de luxo (1930). Epiküre der Weisheit, München, 2. ed. (1973).

SOBRE OS ATUALIZADORES

GISELDA MARIA FERNANDES NOVAES HIRONAKA

Livre Docente e Doutora pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Professora Titular do Departamento de Direito Civil (DCV) da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Coordenadora Titular dos cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado da Faculdade Autônoma de São Paulo - FADISP. Consultora Pedagógica do Curso de Direito das Faculdades Alves Faria - ALFA em Goiânia (GO). Coordenadora Geral da área de Direito Civil da Escola Paulista de Direito - EPD, em São Paulo. Diretora nacional para a região sudeste do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Ex-Procuradora Federal. Advogada. Consultora jurídica, parecerista. Conferencista e palestrante em várias cidades brasileiras, e também no exterior. Autora de diversos artigos jurídicos, publicados em veículos da comunicação jurídica de vários Estados brasileiros, especialmente nas áreas do Direito Civil e do Direito Agrário.

PAULO LUIZ NETTO LOBO

Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Direito Privado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Advogado. Professor Emérito da Universidade Federal de Alagoas. Professor Visitante dos Cursos de Doutorado e Mestrado em Direito da Universidade Federal de Pernambuco. Foi Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, Procurador Geral do Estado de Alagoas, Conselheiro Federal da OAB, Presidente e Relator da Comissão do Conselho Federal da OAB que elaborou o projeto do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906, de 1994), Presidente do Instituto dos Advogados de Alagoas, Presidente da Associação Brasileira de Ensino do Direito. Membro Fundador do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM e do Instituto de Direito Privado. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros, da International Society of Family Law, do Instituto Brasñeiro de PoMca e Direito do Consumidor - Brasilcon, e do Instituto Luso-Brasileiro de Direito Comparado.

PLANO GEMAL DA COLEÇÃO PARTE GERAL

Tomo I - Introdução. Pessoas físicas e jurídicas. Tomo n - Bens. Fatos Jurídicos. Tomo i n - Negocios Jurídicos. Representação. Conteúdo. Forma. Prova. Tomo IV - Validade. Nulidade. Anulabilidade. Tomo V - Eficácia jurídica. Determinações inexas e anexas. Direitos. Pretensões. Ações. Tomo VI - Exceções. Direitos mutilados. Exercício dos direitos, pretensões, ações e exceções. Prescrição.

PARTE ESPECIAL

Tomo Vn - Direito de personalidade. Direito de família: direito matrimonial (Existência e validade do casamento). TomoVin - Dissolução da sociedade conjugal. Eficácia jurídica do casamento. Tomo IX - Direito de Famflia: Direito Parental. Direito Protetivo. Tomo X - Direito das Coisas: Posse. Tomo XI - Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da propriedade imobiliária. Tomo Xn - Direito das Coisas: Condomínio. Edifício de apartamentos. Compáscuo. Terras devolutas. Terras de silvícolas. Tomo Xm - Direito das Coisas: Loteamento. Direitos de vizinhança. Tomo XrV - Direito das Coisas: Pretensões e ações imobiliárias dominicais. Perda da propriedade imobiliária. Tomo XV - Propriedade mobiliária (bens corpóreos).

Tomo XVT - Direito das Coisas: Propriedade mobiliária (bens incorpóreos). Propriedade intelectual. Propriedade industrial. Tomo XVII - Direito das Coisas: Propriedade mobiliária (bens incorpóreos). Propriedade industrial (sinais distintivos). Tomo XVni - Direito das Coisas: Direitos reais limitados. Enfiteuse. Servidões. Tomo XDÍ - Direito das Coisas: Usufruto. Uso. Habitação. Renda sobre o imóvel. Tomo XX - Direito das Coisas: Direitos reais de garantia. Hipoteca. Penhor. Anticrese. Tomo XXI - Direito das Coisas: Penhor rural. Penhor industrial. Penhor mercantil. Anticrese. Cédulas rurais pignoratícias, hipotecárias e mistas. Transmissões em garantia. Tomo XXn - Direito das Obrigações: Obrigações e suas espécies. Fontes e espécies de obrigações. Tomo XXm - Direito das Obrigações: Auto-regramento da vontade e lei. Alteração das relações jurídicas obrigacionais. Transferência de créditos. Assunção de dívida alheia. Transferência da posição subjetiva nos negócios jurídicos. Tomo XXIV - Direito das Obrigações: Efeitos das dívidas e das obrigações. Juros. Extinção das dívidas e obrigações. Adimplemento. Arras. Liquidação. Depósito em consignação para adimplemento. Alienação para liberação. Adimplemento com sub-rogação. Imputação. Compensação. Tomo XXV - Direito das obrigações: Extinção das dívidas e obrigações. Dação em soluto. Confusão. Remissão de dívidas. Novação. Transação. Outros modos de extinção. Tomo XXVI - Direito das Obrigações: Conseqüências do inadimplemento. Exceções de contrato não adimplido, ou adimplido insatisfatòriamente, e de inseguridade. Enriquecimento injustificado. Estipulação a favor de terceiro. Eficácia protectiva de terceiro. Mudanças de circunstâncias. Compromisso. Tomo XXVn - Concurso de credores em geral. Privilégios. Concurso de credores civil. Tomo XXVm - Direito das Obrigações: Falência. Caracterização da falência e decretação da falência. Efeitos jurídicos da decretação da falência. Declaração de ineficiência relativa de atos do falido. Ação revocatoria falencial. Tomo XXIX - Direito das Obrigações: Administração da massa falencial. Restituições e vindicações. Verificação de créditos. Classificação de créditos. Inquérito judicial. Liquidação. Extinção das obrigações.

Tomo XXX - Direito das obrigações: Concordatas. Crimes falenciais. Liquidações administrativas voluntárias e coativas. Tomo XXXI - Direito das Obrigações: Negocios jurídicos unilaterais. Denuncia. Revogação. Reconhecimento. Promessas unilaterais. Traspasso bancário. Promessa de recompensa. Concurso. Tomo X X X n - Direito das Obrigações: Negócios juri'dicos unilaterais. Títulos ao portador. Tomo XXXm - Direito das Obrigações: Títulos ao portador (continuação). Títulos nominativos. Títulos endossáveis. Tomo XXXIV - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais. Direito cambiário. Letra de Câmbio. Tomo XXXV - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais. Direito cambiário. Letra de Câmbio. Nota promissória. Tomo XXXVI - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais Direito cambiariforme. Duplicata mercantil. Outros tímlos cambiariformes. Tomo XXXVn - Direito das Obrigações: Negócios Jurídicos unilaterais. Direito cambiariforme. Cheque. Direito extracambiário e extracambiariforme. Direito internacional cambiário e cambiariforme. Tomo XXXVin - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos bilaterais e negócios jurídicos plurilarerais. Pressupostos. Vícios de direito. Vícios do objeto. Evicção. Redibição. Espécies de negócios jurídicos bilaterais e de negócios jurídicos plurilaterals. Tomo XXXDC - Direito das Obrigações: Compra-e-venda. Troca. Contrato estimatório. Tomo XL - Direito das Obrigações; Locação de coisas. Locação de uso. Locação de uso e fruição. Tomo XLI - Direito das Obrigações: Locação de coisas. Renovação de contrato de locação. Fretamento. Tomo XLÜ - Direito das Obrigações: Mútuo. Mútuo a risco. Contrato de conta corrente. Abertura de crédito. Assinação e Acreditivo. Depósito. Tomo XLm - Direito das Obrigações: Mandato. Gestão de negócios alheios sem outorga. Mediação. Comissão. Corretagem. Tomo XLIV - Direito das Obrigações: Expedição. Contrato de agência. Representação de emprêsa. Fiança. Mandato de crédito. Constituição de renda. Promessa de dívida. Reconhecimento de dívida. Comunidade. Edição. Representação teatral, musical e de cinema. Empreitada.

Tomo XLV - Direito das Obrigações: Contrato de transporte. Contrato de parceria. Jôgo e aposta. Contrato de seguro. Seguros terrestres, marítimos, fluviais, lacustres e aeronáuticos. Tomo XLVI - Direito das Obrigações: Contrato de Seguro (continuação). Seguro de vida. Seguros de acidentes pessoais. Seguro de responsabilidade. Seguro de crédito. Seguros de riscos especiais e de universalidade. Seguros mutuos. Resseguro. Contrato de comodato. Contrato de doação. Contrato de hospedagem. Tomo XLVn - Direito das Obrigações: Contrato de locação de serviços. Contrato de trabalho. Tomo XLVm - Direito das Obrigações: Contrato coletivo do trabalho. Contratos especiais de trabalho. Preposição comercial. Ações. Acordos em dissídios coletivos e individuais. Contrato de trabalho rural. Tomo XLIX - Contrato de sociedade. Sociedades de pessoas. Tomo L - Direito das Obrigações: Sociedade por ações. Tomo LI - Direito das Obrigações: Sociedade por ações (continuação). Sociedade em comandita por ações, Controle das sociedades. Sociedades de investimento, de crédito e de financiamento. Tomo L n - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos bancários e de Bolsa. Corretagem de seguros. Transferência de propriedade mobiliária, em segurança. Subscrição, distribuição e colocação de títulos e valores mobiliários. Tomo L i n - Direito das Obrigações: Fatos ilícitos absolutos. Atos-fatos ilícitos absolutos. Atos ilícitos absolutos. Responsabilidade. Danos causados por animais. Coisas inanimadas e danos. Estado e servidores. Profissionais. Tomo LW - Direito das Obrigações: Responsabilidade das empresas de transporte. Exercício ilícito na Justiça. Danos à pessoa. Acidentes do trabalho. Pretensão e ação. Dever de exibição. Liquidação das obrigações. Cominação. Tomo LV - Direito das Sucessões: Sucessão em Geral. Sucessão legítima. Tomo LVI - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Testamento em geral. Disposições testamentárias em geral. Herança e legados. Tomo LVU - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Disposições testamentárias em geral. Herança e legados. Tomo LVm - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Disposições testamentárias em geral. Formas ordinárias do testamento. Tomo LIX - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. Tomo LX - Direito das Sucessões: Testamenteiro. Inventário e Partilha.

TÁBUA SISTEMÁTICA DAS MATÉRIAS TITULO III SUCESSÃO

TESTAMENTÁRIA

(continuação) CAPÍTULO X X TESTAMENTO

PÚBLICO

§ 5.864. ORIGEM E PRESSUPOSTOS FORMAIS 1. Dados históricos. 2. Requisitos formais do testamento público. 3. Testamentos brasileiros no estrangeiro. 4. Data nos testamentos públicos. 5, Feriados, domingos e horas da noite. 6. Lugar em que se lavrou o testamento público. 7. Fatos excepcionais quanto ao lugar. 8. Conhecimento do testador pelo oficial público e testemunhas. 9. Unidade do ato e de tempo. 10. Unidade de lugar e testamento público. 11. Identidade, capacidade, circunstâncias subjetivas do testador § 5.865. PARTICULARIDADES QUANTO À EXPRESSÃO DA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE

55

74

1. Testamento público e ditado. 2. Declaração e escrito. 3. Testamentos em respostas. 4. Solução concreta do problema. 5. Testamento público por sinais. 6. Língua estrangeira e testamento público § 5.866. REGRAS JURÍDICAS QUANTO ÀS TESTEMUNHAS

79

1. Testemunhas no testamento público. 2. Língua nacional e testemunhas. 3. Requisitos das testemunhas instrumentárias no testamento público § 5.867. LEITURA E ASSINATURA DO TESTAMENTO PÚBLICO

81

1. Leitura pelo oficial público. 2. Assinatura do ato público pelo testador. 3. Prova que faz o testamento público. 4. Essencial do eurema § 5.868. ANALFABETO E QUEM NÃO PODE ASSINAR 1. Quem não sabe ou não pode assinar. 2. Analfabeto no direito romano e no direito comum. 3. Analfabeto no direito alemão, no austríaco e no suíço. 4. Namreza do testamento no Código Civil, art. 1.633. 5. Leitura do testamento ao analfabeto. 6. Testador que não sabe ou

86

não pode assinar. 7. Testemunha no testamento previsto pelo Código Civil, art. 1.633. 8. Declaração de assinar a rôgo do testador § 5.869. FORMALIDADES E PORTE POR FÉ

93

1. Exigências formalísticas e menção exigida. 2. Especificação das formalidades. 3. Responsabilidade do oficial. 4. Ações dos lesados pela nulidade do testamento § 5.870. DECLARAÇÕES DE VIVA VOZ E EXAÇÃO DA LAVRATURA

98

1. Aptidão pela fala. 2. Incapacidade de falar, de ver e de ouvir. 3. Mudez, impossibilidade de falar e testamento. 4. Revisão da doutrina § 5.871. SURDO QUE SABE LER E SURDO QUE O NÃO SABE

103

1. Surdez e leitura do testamento. 2. Surdo que lê e surdo que não lê. 3. Assinatura do surdo. 4. Capacidade do ledor do testamento do surdo que não lê. 5. Se o ledor é oitavo figurante. 6. Se o ledor, que sabia a linguagem dos surdo, leu para si, e não para o surdo. 7. Surdo-cego e a forma de testamento § 5.872. TESTAMENTO PÚBLICO DO CEGO

106

1. Permissão especial da testamentifação. 2. Assinatura do cego e dispensabilidade § 5.873. CONSIDERAÇÕES FINAIS SÔBRE TESTAMENTO PÚBLICO

109

1. Precisões. 2. Direito canónico. 3. Essencialidade dos pressupostos. 4. Direito intertemporal. 5. Direito internacional privado. 6. Ordem pública e testamento público CAPÍTULO X X I TESTAMENTO

CERRADO

§ 5.874. REQUISITOS ESSENCIAIS

119

1. Regra jurídica especial. 2. Direito anterior. 3. Espécie de testamento notarial. 4. Leis estaduais anteriores à unidade do processo. 5. Solenidades distintas § 5.875. CÉDULA TESTAMENTÁRIA PARA O TESTAMENTO CERRADO .

126

1. Forma da cédula testamentária. 2. Capacidade para testar e outros requisitos. 3. Testamento escrito a rôgo. 4. Escrita do testamento por outrem. 5. Assinatura do testador. 6. Assinatura a rôgo. 7. Fôlha em que se escreve. 8. Oficial público e disposição testamentária. 9. Segredo e testamento cerrado § 5.876. ENTREGA AO OnCIAL PÚBLICO E AUTO DE APROVAÇÃO l. Perfeição do testamento cerrado. 2. Apresentação da cédula. 3. Testemunhas da apresentação. 4. Declaração do testador

138

§ 5.877. APROVAÇÃO DO TESTAMENTO CERRADO 1. Momento do auto de aprovação. 2. Leitura do auto pelo oficial público. 3. Assinaturas do auto de aprovação. 4. Diferença de tempo, feitura e aprovação. 5. Declaração de assinar a rôgo e expressões equivalentes. 6. Se a assinatura do testamento cerrado pode ser feita por outra pessoa, que não seja "uma das testemunhas". 7. Se o oficial público, ao mencionar as testemunhas, erra o nome de uma delas. 8. Cautelas voluntárias do oficial público. 9. É requisito essencial que o oficial público cerre e cosa, depois de concluído o instrumento de aprovação. 10. Se é nulo o testamento cerrado em cujo auto de aprovação não apôs o oficial público o seu sinal público. 11. "Unitas actus" da solenidade de aprovação. 12. O que deve conter o auto de aprovação do testamento cerrado. 13. Valor jurídico do auto de aprovação. 14. Cerrado e cosido, a quem se entrega o testamento § 5.878. TESTAMENTO ESCRITO PELO OFICIAL PÚBLICO E APROVAÇÃO 1. Texto legal. 2. Fonte. 3. ¿A lei permite que o oficial público escreva e assine, a rôgo do testador, ou somente que escreva? 4. Responsabilidade civil e criminal do oficial público que escreveu o testamento. 5. Cédula testamentária escrita por um oficial público e aprovada por outro § 5.879. LÍNGUA NACIONAL E LÍNGUA ESTRANGEIRA

146

164

166

1. Texto legal. 2. Língua estrangeira no direito romano. 3. Língua estrangeira e direito anterior. 4. Língua estrangeira e h'ngua secreta. 5. Necessidade de que o testador entenda a língua de que usa. 6. Diferença entre o testamento cerrado e o particular. 7. As declarações podem ser feitas em língua estrangeira, desde que oficial público e testemunhas a compreendam § 5.880. QUEM NÃO SABE OU NÃO PODE LER

169

1. Texto legal. 2. Fonte. 3. Fundamento. 4. Conseqüências da regra legal § 5.881. SURDO-MUDO

171

1. Testamentifação. 2. Direito anterior. 3. Entendimento da regra legal § 5.882. ENTREGA AO TESTADOR E NOTA NO LIVRO

172

1. Texto legal. 2. Fonte. 3. Fundamento da regra legal. 4. Conseqüências § 5.883. ABERTURA DO TESTAMENTO, REGISTO E ARQUIVO 1. Texto legal. 2. Velhos abusos dos séculos XII a XIV. 3. Do Código Visigótico ao Código Civil brasileiro. 4. Caso de testamento teratológico, porém não nulo. 5. Nulidade do testamento cerrado. 6. Responsabilidade do oficial público

174

§ 5.884. DIREITO INTERTEMPORAL E TESTAMENTO CERRADO 1. Duas fases. 2. Direito intertemporal e fase de imperfeição. 3. Direito intertemporal e aprovação. 4. Direito intertemporal, abertura, registo e arquivamento do testamento cerrado § 5.S85. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E TESTAMENTO CERRADO 1. Princípios. 2. Subespécies de testamentos cerrados judiciais ou notariais. 3. O que obedece à regra jundica "locus regit actum". 4. Qualificação de intrínseco. 5. Alcance da proibição do testamento secreto ou cerrado. 6. Abertura, registo e arquivamento do testamento cerrado nas relações de direito internacional privado

181

183

CAPÍTULO X X I I TESTAMENTO

PARTICULAR

§ 5.886. DADOS ffiSTÓRICOS SÔBRE O TESTAMENTO PARTICULAR E O TEXTO LEGAL

189

1. "Testamentum holographum". 2. Texto legal. 3. Direito anterior § 5.887. CONCEITO DE TESTAlVIENTO PARTICULAR

192

1. Negócio jurídico do testamento. 2. "Animus testamentum faciendi" § 5.888. TESTAMENTO PARTICULAR NO DIREITO BRASILEIRO

195

1. Holografia e assinatura. 2. Defeitos de atividade legislativa. 3. Direito estrangeiro § 5.889. PRECAUÇÃO DE ORDEM METODOLÓGICA

199

L Precisões. 2. Exigências da lei brasileira § 5.890. REQUISITOS SÓ EVENTUALMEIvíTE ESSENCIAIS

201

1. Técnica legislativa. 2. Data. 3. Unidade do ato, no testamento particular § 5.891. REQUISITO INTRÍNSECO DA APTIDÃO PARA FAZER TESTAMENTO PARTICULAR

209

1. Vedações. 2. Holografia § 5.892. REQUISITOS FORMAIS (ESSENCIAIS) DO TESTAMENTO PARTICULAR

210

1. Direito cogente e interpretação. 2. Primeiro requisito formal. 3. Holografia das disposições testamentárias. 4. Questões que surgem. 5. Testamento escrito com caracteres secretos. 6. Holografia da assinatura. 7. Requisito essencial da leitura às cinco testemunhas. 8. Assinaturas das testemunhas § 5.893. CUIDADOS OCASIONAIS 1. Expedientes úteis. 2. Reconhecimento da letra e das assinaturas. 3. Invólucro e testamento particular. 4. Tèm-se de afastar os inconve-

220

nientes das regras jurídicas. 5. Depósito do testamento particular. 6. Questão de ordem, estranha ao direito brasileiro. 7. Pluralidade de exemplares § 5.894. FORMALIDADES DA PUBLICAÇÃO 1. Exigência formal. 2. Texto legal. 3. Origens peninsulares da pubUcação. 4. Citação dos herdeiros legítimos. 5. Conseqüências substantivas da citação dos herdeiros legítimos. 6. Impugnações do testamento particular confirmado pelas testemunhas

224

§ 5.895. CUMPRA-SE DO TESTAMENTO HOLÓGRAFO 1. Texto legal. 2. Verificação judicial do testamento hológrafo. 3. Interpretação do texto legal

228

§ 5.896. FALTA DE TESTEMUNHAS 1. Texto legal. 2. Direito anterior. 3. Dados gerais para a solução das questões. 4. Natureza das duas regras jurídicas. 5. Solução das questões

230

§ 5.897. TESTAMENTO PARTICULAR E LÍNGUA

236

1. Texto legal. 2. Língua estrangeira e língua secreta § 5.898. DIREITO INTERTEMPORAL E TESTAMENTO PARTICULAR

237

1. Tempo e forma. 2. Forma e testador morto ou não na vigência da lei nova. 3. Pressupostos subjetivos e objetivos para o uso da forma hológrafa § 5.899. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E TESTAMENTO PARTICULAR 1. Forma extrínseca. 2. Aplicação da regra jurídica "locus regit acmm" aos testamentos particulares. 3. Apátrides. 4. Nacionalidade múltipla, se a lei pessoal é a "lex patriae". 5. Mudança de nacionalidade. 6. Vedação de ato do testamento particular. 7. Caso especial do menor brasileiro alhures. 8. Testamento particular do estrangeiro no Brasil. 9. Requisito da holografia e natureza jurídica da exigência. 10. Exigência formal da data. II. Questão relativa à dispensa de testemunhas. 12. Exigência de autenticidade e vigência da forma somente particular em Estado da "lex loci" CAPÍTULO X X I I I TESTEMUNHAS

TESTAMENTÁRIAS

§ 5.900. REGRAS JURÍDICAS SÔBRB TESTEMUNHAS TESTAMENTÁRIAS I. Texto legal. 2. Formas testamentárias e testemunhas no direito dos séculos passados. 3. Direito anterior e capacidade testemunhal. 4. Número das testemunhas e unidade do ato, no direito anterior

240

§ 5.901. FUNÇÃO E REQUISITOS DAS TESTEMUNHAS

252

1. Funções instrumentárias. 2. Conhecimento do testador pelas testemunhas instrumentárias. 3. Precaução metodológica para a interpretação do texto legal. 4. Incapacidade absoluta das testemunhas. 5. Instrumentariedade das testemunhas e testemunho probatorio. 6. Surdos e mudos, e surdos-mudos. 7. Analfabeto e incapacidade euremática. 8. Escreventes e empregados dos cartórios § 5.902. INCAPACIDADE RELATIVA ÀS LIGAÇÕES DE HERDEIROS E LEGATÁRIOS E PESSOAS A ÊLES LIGADAS

262

1. Ligações. 2. Parentes em linha reta, irmãos e cônjuge do herdeiro. 3. Herdeiros legítimos, herdeiros instituídos e legatários, testemunhas noutra cédula. 4. Herdeiro instituído, ainda que "ex certa re". 5. Legatário não pode ser testemunha em testamento. 6. Desquitado, herdeiro instituído ou legatário e cônjuge. 7. Testemunhas testamentárias: tutores e testamenteiros. 8. Noivados, amizade íntima, inimizade capital. 9. Testamento do pai da testemunha. 10. Pai, testemunha no testamento do filho § 5.903. NULIDADE DO TESTAMENTO POR INCAPACIDADE DA TESTEMUNHA E OUTROS FIGURANTES

270

1. Sanção de nulidade. 2. Nulidade por incapacidade de testemunha e "favor testamenti" § 5.904. ÊRRO DE FATO E ÊRRO DE DIREITO

272

1. Convocação e êrro. 2. Êrro de direito e capacidade. 3. De como se aprecia a incapacidade das testemunhas. 4. Capacidade putativa das testemunhas. 5. Êrro de direito quanto à capacidade das testemunhas. 6. Erro de fato quanto à capacidade das testemunhas § 5.905. DIREITO ESTRANGEIRO

276

1. Testemunhas testamentárias no direito francês. 2. Testemunhas testamentárias no direito austríaco. 3. Testemunhas testamentárias no direito italiano. 4. Testemunhas testamentárias no direito alemão. 5. Testemunhas testamentárias no direito suíço. 6. Códigos Civis americanos § 5.906. DIREITO INTERTEMPORAL E TESTEMUNHAS TESTAMENTÁRIAS 1. Testemunho e testamento. 2. Indistinção quanto a testemunhas dos atos públicos e dos atos particulares. 3. Fronteiras da máxima "tempus regit actum" e do pretenso princípio da retroatividade das leis processuais. 4. Testemunhas ou outros figurantes. 5. Natureza da regra jurídica de capacidade das testemunhas. 6. Sanções quanto às disposições testamentárias

285

§ 5 907. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E TESTEMUNHAS TESTAMENTÁRIAS

288

1. Capacidade e lei pessoal. 2. Fundamento da aplicação da máxima "locus regit actum". 3. Natureza da regra jurídica sobre capacidade das testemunhas. 4. Aplicação do princípio "locus regit actum". 5. Ato perfeito e "abundans cautela". 6. Sanção da lei da sucessão mais forte ou só em relação à lei do lugar. 7. Sanção da lei local mais forte que a da lei de sucessão CAPÍTULO X X I V CODICILO

§ 5.908. CONCEITO E ORIGEM DO CODICILO

293

1. Conceito inicial de codicilo. 2. Codicilo no direito romano. 3. Definição de codicilo. 4. Distinção entre codicilos e epístolas. 5. Codicilos no velho direito peninsular. 6. Direito contemporâneo a respeito de codicilo. 7. Visão panorânaica das três soluções contemporâneas. 8. Possibilidade da cláusula codicilar no direito brasileiro § 5.909. CODICILO E PRESSUPOSTOS FORMAIS E CONTENUTÍSTICOS.

301

1. Texto legal sobre codicilo. 2. Fonte da regra jurídica. 3. Direito anterior. 4. Requisitos formais dos codicilos. 5. Codicilo por forma pública. 6. Requisitos subjetivos e contenutísticos dos codicilos. 7. Disposição em codicilos. 8. Apreciação quantitativa das deixas codicilares. 9. Direitos de terceiros e codicilo. 10. Direito romano § 5.910. ESPÉCIES DE CODICILOS

307

1. Distinções. 2. Codicilos testamentários e codicilos abintestados. 3. Dependência e independência do codicilo testamentario. 4. Ficção codicilar e Código Civil. 5. Direito de terceiro. 6. Nomeação e substituição de testamenteiro § 5.911. REVOGAÇÃO DE CODICILO

311

1. Texto legal. 2. Distinções. 3. Ruptura dos codicilos § 5.912. CODICILO FECHADO

314

1. Texto legal. 2. Alcance da regra jurídica. 3. Codicilos noutros sistemas jurídicos § 5.913. CLÁUSULA CODICILAR 1. Conteúdo da cláusula. 2. Cláusula codicilar e conversão. 3. Cláusula codicilar e conservação. 4. Cláusula codicilar no direito romano. 5. Direito anterior e cláusula codicilar. 6. Natureza de cláusula codicilar (cláusula ou pressuposto). 7. Onde e como opera a cláusula codicilar. 8. Casos particulares relevantes

315

§ 5.914. DIREITO INÍTERTEMPORAL E CODICBLOS 1. Questões que surgem. 2. Lei anterior proibitiva e lei posterior permissiva. 3. Lei anterior permissiva e lei posterior proibitiva. 4. Cláusula codicilar e direito intertemporal

322

§ 5.915. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E CODICILOS 1. Posição do problema. 2. Formas extrínsecas do codicilo. 3. Formas intri^nsecas e efeitos dos codicilos. 4. Cláusula codicilar e direito internacional privado

323

CAPÍTULO X X V TESTAMENTOS

ESPECIAIS

§ 5.916. GENERALIDADES HISTÓRICAS

325

1. Dados históricos. 2. Direito romano e testamento procintual. 3. Direito romano: "testamentum militare" (preponderancia do fator poKtico). 4. Tempo de feitura. 5. Fundamentação do testamento militar. 6. Testamentos extraordinários no direito visigótico. 7. Testamento militar desde o século XV. 8. Testamento militar nas Ordenações Filipinas. 9. Testamento marítimo no direito português. 10. Critério contemporâneo § 5.917. OUTROS TESTAMENTOS ESPECIAIS

334

1. Considerações "de iure condendo". 2. Testamento "inter liberos". 3. Testamento rural. 4. 'Testamentum ad pias causas". 5. Testamento em tempo de peste. 6. Vista panorâmica dos testamentos especiais § 5.918. TESTAMENTOS ESPECDMS NO CÓDIGO CIVIL

337

1. Limitação. 2. Dispensas e exigências SEÇÃO i TESTAMENTO

MARÍTIMO

§ 5.919. TEXTO LEGAL E CONTEÚDO

339

1. Texto legal. 2. Legitimação subjetiva. 3. Escolha das testemunhas para o testamento marítimo. 4. Responsabilidade do oficial público extraordinário. 5. Navios de guerra ou mercantes. 6. Testamento em viagem aérea § 5.920. FEITURA E ENTREGA DO TESTAMENTO

342

L Texto legal. 2. Holografia e alografia § 5.921. CADUCIDADE DO TESTAMENTO MARÍTIMO

343

1. Texto legal. 2. Eficácia temporária dos testamentos especiais. 3. Efeitos da caducidade § 5.922. PÔRTO DE POSSÍVEL EMBARQUE 1. Texto legal. 2. Entendimento da regra jurídica

344

Seção II TESTAMENTO MILITAR § 5.923. TEXTO LEGAL E CONTEÚDO 1. Texto legal. 2. Criterio subjetivo e objetivo do texto legal. 3. Interpretação da lei. 4. Mulher do soldado que se acha nas tropas. 5. Caso especial das manobras militares. 6. Aviador militar e testamento. 7. Oficial do testamento público militar § 5.924. EXIGÊNCIA DA HOLOGRAFIA 1. Texto legal. 2. Exigência de nota. 3. ExpUcação da natureza da regra jurídica

351

§ 5.925. CADUCIDADE DO TESTAMENTO MILITAR

352

1. Texto legal. 2. Entendimento da regra jurídica § 5.926. TESTAMENTO MILITAR NUNCUPATT/O

354

1. Texto legal. 2. Pressupostos para a testamentifação nuncupativa. 3. Gases asfixiantes e outros meios de guerra. 4. Nuncupatividade e Marinha. 5. Caducidade do testamento nuncupative § 5.927. DIREITO ESTRANGEIRO

356

1. Testamento dos militares e marinheiros no direito inglês. 2. Testamentos especiais no direito argentino. 3. Testamento do nailitar no direito suíço. 4. Testamento militar no direito alemão. 5. Testamento marítimo no direito alemão § 5.928. DIREITO INTERTEMPORAL

359

1. Precisões. 2. Conservação e conversão em casos de testamentos "inter liberos" § 5.929. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

360

1. Testamentos extraordinários. 2. Testamento nuncupative. 3. Prazos suspensivos e resolutivos. 4. Estrangeiro em navio de guerra ou mercante do Brasil § 5.930. TESTAMENTO "IN FRAUDEM LEGIS"

362

1. Repa jurídica local e regra jurídica do momento. 2. Formas testamentárias e fraude à lei em direito intertemporal. 3. Fraude à lei em direito internacional privado CAPÍTULO X X V I "UNITAS ACTUS" NO T E S T A M E N T O NO CERRADO E NO

PÚBLICO,

PARTICULAR

§ 5.931. QUESTÕES QUE SURGIRAM 1. Testamentos e "unitas actus". 2. Dados históricos

365

§ 5.932. TESTAMENTO ABERTO 1. Testamento público. 2. Código Civil brasileiro. 3. Fatos e "unites actus". 4. Conclusão. 5. Voz do testador. 6. Assistência das testemunhas a todo o ato. 7. "Unitas loci". 8. Leitura co-presenciada. 9. Assinaturas. 10. Menção ou especificação. 11. Porte por fé

366

§ 5.933. TESTAMENTO CERRADO E "UNITAS ACTUS"

395

1. Conceito. 2. Partes temporais. 3. Direito romano. 4. "Unitas actus". 5. Ordenações Afonsinas. 6. Ordenações filipinas. 7. Espécies de testamentos. 8. Perfeição e entrega § 5.934. TESTAMENTO PARTICULAR E "UNITAS ACTUS"

404

1. Particularidade do testamento. 2. "Unitas actus" § 5.935. TESTAMENTOS ESPECDUS, CODICILOS E "UNITAS ACTUS"

409

1. Testamentos especiais do direito brasileiro. 2. Testamento militar. 3. Codicilo § 5.936. AUSÊNCIA E "UNITAS ACTUS"

411

1. Precisões. 2. Razões da saída. 3. 'Casos em exame CAPÍTULO X X V I I REVOGAÇÃO DOS

TESTAMENTOS

§ 5.937. PRECISÕES INICIAIS

417

1. Matérias em exame. 2. Vida dos testamentos. 3. Espécie de invalidação e ineficácia dos testamentos. 4. Distinções de grande importância técnica § 5.938. REGRAS JURÍDICAS SÔBRE REVOGAÇÃO DOS TESTAMENTOS

421

1. Texto legal. 2. Fonte. 3. Aplicação moderna do princípio. 4. Ato jurídico do testamento. 5. Perda de eficácia do testamento § 5.939. FORMA E REVOGAÇÃO

423

L Forma de revogação dos testamentos. 2. Revogação nos Códigos Civis de hoje. 3. Forma do testamento anterior e forma da revogação. 4. Origem das revogações por escritura em notas. 5. Revogação por escrimra púbüca, se é possível. 6. Escritura pública. 7. Escritura pública com o formalismo do testamento. 8. Escritura particular. 9. Revogação nua. 10. Revogação condicionada. IL C o d i c i l o s erevogações dos testamentos. 12. Revogabilidade da revogação. 13. Dificuldade § 5.940. REVOGAÇÃO TOTAL E REVOGAÇÃO PARCIAL 1. Texto legal. 2. Critério metodológico. 3. Revogação parcial. 4. Revogação parcial nos Códigos Civis de hoje. 5. Revogação pode só se referir

433

a pormenores. 6. Velhas questões de intuito revogatório. 7. Reexame global das questões de atos impedidos ou frustrados. 8. Aplicação dos princípios anteriormente invocados. 9. Extensão do ato ou cláusula revogatória. 10. Casos de destruição parcial do ato revogatório § 5.941. INFIRMAÇÃO OU SUBSISTÊNCIA 1. Texto legal. 2. Infirmação dos testamentos. 3. Três sistemas. 4. Contradição material e contradição intencional. 5. Caracterização da incompatibilidade das disposições. 6. Alcance da regra jurídica. 7. Testamento posterior sem objeto. 8. Testamentos da mesma data. 9. Atos "inter vivos" e testamentos anteriores

439

§ 5.942. SUCESSIVOS TESTAMENTOS

448

1. Sucessividade e revogação. 2. Posição do princípio § 5.943. CADUCIDADE E NULIDADE

449

1. Dois conceitos. 2. Texto legal. 3. Fonte. 4. Campo de aplicação da regra jurídica. 5. Revogação e infirmação. 6. Se a nulidade é formal, não se pode cogitar de conversão. 7. Nulidade do testamento e nulidade das disposições 8 5.944. ATACABILIDADE MATERIAL (DESTRUIÇÃO, DILACERAÇÃO, QUEIMA, CANCELAMENTO MATERIAL)

452

1. Ocorrências. 2. Texto legal. 3. Fonte. 4. Direito romano: civil e pretório. 5. Doutrina anterior ao Código Civil. 6. Códigos Civis do século XIX. 7. Infirmação e revogação, diversidade dos conceitos. 8. Atos que são disposições de última vontade. 9. Atacabiüdade material do ato testamentário. 10. Representação e instrumentalidade na espécie da regra jurídica. 11. Espécies de ataque ao instrumento testamentário. 12. Palavras cancelatórias e "animus revocandi". 13. Atos destrutivos já depois da morte do testador. 14. Testamento público e regra jurídica sobre abertura de testamento cerrado. 15. Testamento cerrado e a regra jurídica especial. 16. Testamento particular e regra jurídica sobre abertura de testamento cerrado. 17. Cancelações, riscos e borraduras capitais. 18. Em que consiste a presunção da lei quanto à abertura de testamento cerrado. 19. Ato destrutivo que não vale revogação. 20. Multiplicidade de exemplares do testamento. 21. Ônus da prova. 22. As alterações e as destruições parciais. 23. Rasuras, alterações e destruições parciais no testamento público. 24. Rasuras, alterações e destruições parciais no testamento cerrado. 25. Rasuras, alterações e destruições parciais no testamento particular § 5.945. NULIDADES DAS REVOGAÇÕES "IPSO FACTO" 1. Capacidade, vontade livre e sem defeitos. 2. Anulabilidade por defeito de vontade

474

§5.946. RUPTURA DOS TESTAMENTOS 1. "Ruptio". 2. Texto legal. 3. Direito romano. 4. Direito das Ordenações. 5. Códigos Civis próximos. 6. Códigos Civis de outros povos (Código CivU austríaco, Código Civil alemão. Código Civil suíço). 7. Posição sistemática dos textos legais. 8. Se as regras jurídicas são de presunção absoluta, ou se às vézes não incidem. 9. Distinção a respeito dos postumos. 10. Cláusula do testamento prevenindo a ruptura. 11. Questão preliminar: ¿o que ocorre com a premorte do superveniente ou aparecido constimi convalescença? 12. Persistência do testamento. 13. Pressupostos da regra jurídica. 14. Casos de legitimação, adoção e reconhecimento de filhos § 5.947. IGNORÂNCIA DE EXISTIREM OUTROS HERDEIROS NECESSÁRIOS 1. Texto legal. 2. Fonte. 3. Ambigüidade perigosa. 4. Se há persistência pela premorte, no caso das regras jurídicas. 5. Conseqüências das regras jurídicas. 6. Efeitos das disposições testamentárias que prevêem a superveniência ou a aparição § 5.948. SUPERVENIÊNCIA E APARIÇÃO SEM APLICABILIDADE DAS REGRAS JURÍDICAS

475

492

494

1. Herdeiros necessários. 2. Sucessão legítima e sucessão testamentária no testamento prevalecente. 3. Rôto o testamento em que o testador deserdou o único ou todos os herdeiros necessários, em têrmos váUdos, ¿a superveniência ou aparição de outrem faz caducar? 4. Disposição da metade e não-contemplação de herdeiros necessários ou deserdação sem menção de causa legal. 5. Elaboração. 6. Significação da regra jurídica § 5.949. DIREITO ANGLO-AMERICANO

497

1. Direito inglês. 2. Direito dos Estados Unidos da América § 5.950. DIREITO INTERTEMPORAL E DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO 1. Figuras jurídicas. 2. Revogabilidade inderrogável do ato. 3. Revogação tem de ser por testamento. 4. Revogação e direito intertemporal. 5. Revogação parcial e total. 6. Incompatibilidade entre testamentos. 7. Direito intertemporal sobre eficácia da revogação. 8. Qual a lei que deve reger as rasuras, emendas e entrelinhas dos testamentos. 9. Presunção de haver revogado. 10. Direito intertemporal e ruptura dos testamentos. 11. Direito internacional privado

500

TÍTULO I I I S U C E S S Ã O TESTAMENTÁRIA (continuação)

CAPÍTULO TESTAMENTO

XX PÚBLICO

§ 5.864. ORIGEM E PRESSUPOSTOS FORMAIS 1. DADOS HISTÓRICOS. - No Código visigótico não havia indícios do testamento apud acta. E no Breviário, IV, 1, cita-se a Nov. XXI de Valentiniano HI, const. I, sem que - a despeito da frase "licet municipalibus gestis indicia suprema componere", que all se lê - qualquer alusão se faça ao testamento apuã acta. Daí não pai'ecer que venha do testamentum apud acta conditum (L. 19, C., de testamentis: quem admodum testamenta ordinantur, 6,23) o testamento aberto, por tabelião, de que falaram a Lei de 21 de maio de 1349 e as Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 103. (A conclusão de HENRIQUE DA G A M A BARROS, História da Administração Pública em Portugal, m , nota 1, choca-se com a de outro lugar, 274, nota 1).

O testamento hológrafo, que está no direito brasileiro, não provém diretamente, mas entronca-se em 446 (Constituição de Valentiniano III, incluída no Breviário) e já se dispensava, em virtude da holografia, a intervenção de testemunhas. A razão disso está no texto: "multis enim casibus saepe continget, ut morientibus testium numerus et copia denegetur". Tais faltas de testemunhas não só ocorriam em se tratando de itinerum necessitas, mas devido a outras causas óbvias: solitudo villarum, navigatío. No período da Reconquista, testamento, em Portugal, era mais para o bem da alma do que para outro fim: o índice religioso invadia a ordem jurídico-econônaica. Morrer sem deixar bens à Igreja, ou para fins piedosos, causava terror aos moribundos. Tinham de despojar-se: iam os homens e as mulheres depor nos altares as escrituras das suas deixas. A Igreja conside-

rava válido tudo que aparecia e as formas mais frágeis abrigaram pretensas vontades últimas. Pela Lei de 21 de maio de 1349 sabe-se que eram três as formas do testamento: d) por escrito particular, com testemunhas, mas sem interferência do tabelião; b) verbais, quer dizer - que só constavam da declaração das testemunhas; c) feitos perante tabelião. Mas os juízes eclesiásticos, no seu propósito de favorecer as deixas, entendiam e mandavam que valessem escritos particulares, sem testemunhas, ou quando já fossem todas mortas. Foi a própria Lei de 1349 que verberou o abuso: "e o que pior he disserõ me que esses vigairos pobricam essas cédulas sem testemunhas seendo já essas testemunhas todas mortas que som escriptas nas cédulas que Ihis mostram, e que algüas vezes nom som escriptas algüas testemunhas era algüas cédulas... e mandam sem outro conhecimento que valham come testamentos" {Livro das Leis e Posturas, Tôrre do Tombo, foi. 156). Nas Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 103, havia: c) o testamento aberto, feito por tabelião, isto é, o testamento público do Código Civil: seis testemunhas, incluído o oficial (portanto, cinco); b) o testamento escrito ou só assinado pelo testador, ou escrito e assinado por outrem, que ou teria, nas costas, o instrumento público do tabelião, como os abertos (cinco testemunhas), ou teria de, após a morte, ser publicado, com audiência dos interessados (publicações que a Lei de 21 de maio de 1349 já exigira); c) o testamento oral, feito ao tempo da morte, com seis testemunhas. Nos lugares de diminuta população, bastavam três testemunhas. 2. REQUISITOS FORMAIS DO TESTAMENTO PÚBLICO. - Diz o Código Civil, art. 1.632: "São requisitos essenciais do testamento público: L Que seja escrito por oficial público em seu livro de notas, de acordo com o ditado ou as declarações do testador, em presença de cinco testemunhas, n. Que as testemunhas assistam a todo o ato. IH. Que, depois de escrito, seja lido pelo oficial, na presença do testador e das testemunhas, ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial. IV. Que, em seguida à leitura, seja o ato assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo oficial". Acrescenta: "As declarações do testador serão feitas na Kngua nacional". a) Competência territorial do oficial público. O primeiro requisito do testamento público é o da competência territorial do oficial público. Daí dever-se indicar o lugar em que o testamento foi feito: "na casa da rua A", "na fazenda 'Santa Rosa'", para que se saiba se o fêz, competentemente, o tabelião. No interior do Brasil, é de grande importância, porque, não

raro, a mesma fazenda pertence a dois municípios. Feito por oficial público incompetente pelo lugar, é nulo. Se não se trata de oficial público de testamentos, é inexistente. ¿Se não consta o lugar? De si só, a falta não faz nulo o ato. Não se há de presumir ter sido feito fora da jurisdição. Mas os juristas franceses, com os arts. 12 e 68 da Lei de 25 de outubro do ano XI, não raciocinaram assim: a menção do lugar é essencial. Duro formalismo, êsse, que toma essencial a menção, quando a essencialidade é da competência, e não da aparência dela. "Oficial público", diz a lei. O que é preciso é que se haja atribuído à pessoa função de fé pública. A lei pode considerar oficial público o tabelião ou o escrivão, ou substituto, que em lugar dêle fique sem limitações. Tem de haver a atribuição, por lei válida, e o exercício no momento (cf. 2." Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 30 de janeiro de 1952, A. J., 109, 327; 4.^ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 3 de abril de 1941, R. dos T., 131, 235). b) Ato pessoalíssimo do tabelião. Os tabeliães e os escreventes juramentados dos tabeliães podem lavrar, dentro do cartório, os atos, contratos e instrumentos quando por acúmulo de serviço, ou por outra causa, não possam ser lavrados pelos tabeliães. Os testamentos e codicños, êsses, bem como os instrumentos de aprovação dos testamentos cerrados, somente pelo tabelião o poderiam ser. Antes, o escrevente juramentado podia escrever o testamento sob as vistas do tabelião, que o assinaria. Mas cessou isso com o Decreto n. 4.824, de 22 de novembro de 1811, art. 78. Aliás, constituía isso regra geral do direito processual brasileiro, que o Código Civil de certo modo subentendeu. Se a lei de organização judiciária admite que os escreventes juramentados escrevam testamentos ou os aprovem, oficial público, no sentido da lei civil, são também êsses escreventes, e não só os tabeliães. Oficial público: qual seja, di-lo a lei do Estado-membro, em que se tiver de fazer o testamento. Nem é preciso que seja tabelião ou escrevente dêle. Se a competência cabe, por exemplo, ao escrivão de uma das varas, oficial público, é êsse. Mais: atendendo a grandes distâncias, pode a legislação estadual dar a atribuição de oficial púbHco dos testamentos a funcionários do Estado-membro na comarca, ou oficial do Município, que assim passa a ter função cartorária estadual. O que é necessário e suficiente é que seja, pela lei estadual, o oficial dos testamentos, e tenha, pelo direito público do Estado-membro, fé pública. Porque se trata de instrumento público ou auto público de aprovação, a que é necessário o poder de certificar.

Outrossim, para as declarações do art. 1.634, pois que as teria de portar por fé. (No passado, o escrevente juramentado podia escrever o testamento sob as vistas do tabelião, que o assinaria. Essa permissão cessou, com o Decreto n. 4.824, de 22 de novembro de 1811, art. 78). Em alguns Estados-membros, os escrivães de paz, nos distritos fora da sede das comarcas, exercem funções de tabelião: são, pois, tabeliães, e como tais lavram e aprovam testamentos. 3 . TESTAMENTOS BRASILEIROS NO ESTRANGEIRO. - Para a celebração de testamento de Brasileiro no estrangeiro, são oficiais públicos os agentes consulares (já assim, o Decreto-lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942, art. 18).

O art. 18 do Decreto-lei n. 4.657 tem hoje a seguinte redação (Lei n. 3.238, de 1.° de agosto de 1957). "Tratando-se de Brasileiros, são competentes as autoridades consulares brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de registo civil e de tabelionato, inclusive o registo de nascimento e de óbito dos filhos de Brasileiro ou Brasileira nascidos no país da sede do consulado". A respeito de tais testamentos consulares, há questão, que o próprio art. 18 e o art. 10 fizeram surgir. Nesse, foi dito que a lei do domicilio rege a sucessão por morte ou por ausência, portanto - a sucessão legítima ou testamentária, a ordem da vocação, os direitos dos herdeiros e a vaHdade intrínseca das disposições. Pergunta-se: ¿o estrangeiro, em tal caso, pode procurar o consulado brasileiro para testar por testamento público ou levar à aprovação do cônsul o testamento cerrado? A regra jurídica locus regit actum é facultativa: pode-se optar pela lei pessoal, ou por outra que deva reger o intrínseco. Ora, na espécie, ou êsse estrangeiro domiciliado no Brasil se acha na pátria dêle, ou se acha noutro Estado, que não seja a sua pátria, nem o Brasil. No último caso, a solução é fácil: o estrangeiro domiciliado no Brasil procura o consulado do Brasil, optando, de acordo com o direito internacional privado do Brasil, pela lei que rege, sem conflito internacional com o Estado terceiro, a sua sucessão. Seria absurdo que o cônsul brasileiro, invocando o art. 18, que só se refere a "Brasileiros", se recusasse a lavrar o testamento público, ou a aprovar o testamento cerrado que se lhe apresentou. Assume feição mais delicada o caso de se achar o testador no Estado a que pertence. D á - s e , evidentemente, o conflito quanto à lei pessoal: o Estado da pátria é que determina, provavelmente, que a lei nacional lhe reja a sucessão; e no entanto estatui a

lei brasileira que a sucessão dêsse estrangeiro obedeça, integralmente, à lei do Brasil. Se a regra jurídica do art. 18 fôsse obrigatória, e não facultativa, ainda assim seria permitido o ato: o testador estava no consulado, cuja lei invocava para reger o seu ato. Facultativa como é, desde que o Brasil impôs aos estrangeiros (art. 10) a lei do domicflio por estatuto da sucessão, seria incoerente se lhes não permitisse a opção pela forma extrínseca correspondente à lei que lhe impôs. Há conflito, mas diante do estrangeiro que cede à lei brasileira contra a lex patriae, não deve vacilar o cônsul.

Tudo que foi dito profundamente se comprova pela consideração de precisar talvez da lei brasileira o testador, para que as suas últimas vontades se adaptem ao estatuto de sucessão legitima e testamentária a que o direito internacional privado do Brasil imperativamente o sujeitou, principalmente no tocante a bens sitos no Brasil (Constituição de 1967, art. 150, § 33) Demos por exemplo: o testador é nacional de Estado cuja legislação lhe não permite impor a cláusula de inalienabilidade às legítimas, ou desconhece qualquer substituição, ou veda fideicomissos; o testamento feito perante o oficial público perderia qualquer valor, poderia, até, não poder ser feito, uma vez que a lex patriae não reconhece a excepcionalidade da regra jurídica brasileira. Portanto, o art. 18 deve ser interpretado em conjunção com o art. 1 0 do Decreto-lei n. 4 . 6 5 7 e com o art. 1 5 0 , § 33, da Constituição de 1967. 4. DATA NOS TESTAMENTOS PÚBLICOS. - A exigência de datar provém da lei dos oficiais públicos, e não do Código Civil. Por isso mesmo, a falta ou inexatidão pode motivar penas, e não nulidades. Mais: a data falsa, aliada à coação, dolo, ou êrro, que a contamina; de si mesma, nem a falta, nem a existência de uma data por outra, nem a própria inserção contra os fatos, pode, de si só, tomar nulo ou anulável o ato testamentário. Anulável por violência, dolo, ou êrro, - sim.

O testamento público é ato notarial, que faz fé pública a partir da sua data. Por isso, como todos os outros atos notariais, deve datar-se, com o dia, quiçá a hora, o mês e o ano. Mas daí dizer-se que são nulos, de pleno direito, os testamentos públicos, perfeitos, sem a data, ou com a data incompleta (JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALVES, Da Sucessão Testamentaria, Manual do Código Civil brasileiro, 19, 104), importaria criação de

nulidades onde a lei não as aponta. As nulidades do ato testamentário são as do Código Civil, e não outras. Em tempos mais próximos da dureza romana, lá estão, em Portugal,

testamentos sem data. Na Reconquista, por exemplo. O testamento por tabelião que se acha na coleção especial, caixa 84, da Torre do Tombo, e do século XIII, não tem data. Demais, o sistema do Código Civil não permite dúvidas. 5. FERIADOS, DOMINGOS E HORAS DA NOITE. - O Aviso n. 206, de 30 de agosto de 1852, estabeleceu que os atos de tabelião, sem dependência de juiz, não ficariam sujeitos às férias e a dias feriados. Apenas, nesses dias, não se abririam os respectivos cartórios (Resolução de 19 de agôsto de 1848) Podem ser praticados, portanto, em qualquer dia e a qualquer hora, ainda de noite (M. B. PIRES FERRÃO, Guia Prático e Formulário do Tabelião de Notas, 34) Assim, os testamentos públicos podem ser feitos: a) em dias úteis, nas horas de expediente, o que constitui o caso normal, dispensando a justificação da letra b), aplicável nos casos das letras c)tã)\ b) em domingos, chamado o oficial à casa do testador, ou no cartório (caso em que é de conveniência declarar o motivo de fazer-se em domingo, dentro ou fora do cartório); c) em dia feriado, nas circunstâncias da letra b)\d)tm domingos, feriados, ou dias úteis à noite, nas circunstâncias da letra b). Não há dúvida quanto à possibilidade de se fazer testamento ao anoitecer e pelas horas mortas da noite. Nem a isso obstava o formalístico direito romano: na L. 22, § 6, D., qui testamenta facerepossunt et quemadmodum testamenta fiant, 28,1, pois ULPIANO dizia: "Posse etnocte signari testamentum nulla dubitatio est". O que é preciso, e não se dispensa, é a identificabilidade do testador, questão de que trataremos. 6. LUGAR EM QUE SE LAVROU O TESTAMENTO PÚBLICO. - Os instrumentos públicos devem declarar o lugar (cidade, vila, distrito, freguesia, circunscrição, cartório, casa, sítio, local). Pode ser no campo, em circunstâncias extraordinárias. Mas questão surge quanto a ser, ou não, causa de nulidade dos testamentos a falta da menção do lugar em que se fêz. Os arts. 1.634 e 1.632 do Código Civil não cogitam disso, nem de se datar o ato. Subentende-se. Está certo. Mas nem tudo que se subentende pode, faltando, eivar de invalidade pleno iure a cédula. As nulidades formais são as do art. 1.634, e somente elas. Nada há que mais se deva subentender que a identidade do testador: tabelião e testemunhas devem conhecê-lo. Mas ¿seria acertado considerar nulo o testamento pelo só fato de lhe faltar a fórmula tabelioa: de mim

"conhecido e das testemunhas"? Provado que não era o mesmo, nenhum é o ato, porque é de outrem, e não de quem se diz que o fêz. O defeito é intrínseco, e não extrínseco: a nulidade não provém da forma, e sim do fundo. Provado que o testamento foi lavrado fora da circunscrição do tabelião, contra a lei, não houve testamento público, porque não havia, no ato, oficial com fé pública. Se consta um lugar, e foi feito noutro, - a questão é quaestiofacti: o juiz, que se vai pronunciar sôbre a nulidade, examina êsse ponto, que é de grande valor indiciário, e talvez o satisfaça na contenda das provas. Nulo, responde o oficial público, civil e criminalmente. 7 . FATOS EXCEPCIONAIS QUANTO AO LUGAR. - Pode ocorrer que o testador se ache em viagem, dentro da circunscrição do oficial público. Preliminarmente, afaste-se a discussão relativa a navios de alto-mar, de guerra ou mercantes, e a aeronaves mercantes ou de guerra, assunto de que se há de tratar a propósito do Código Civil, arts. 1.656-1.663. Quanto ao assunto de agora, duas são as espécies principais: a) Dentro da circunscrição do oficial público, em viagem com o testador ou chamado em meio do caminho, por aquele querer fazer, com urgência, o testamento, - vale o que se fizer, no trem, na aeronave, ou em barco ou vapor, escrito no livro de notas e com todas as formalidades do Código Civil, art. 1.632. No ato dir-se-á a razão de tal feitura, muitas vezes aconselhável se o declarante, doente, piorou, ou se, na própria viagem, foi vítima de desastre.

Para se exemplificar o que acima dissemos, pense-se no que foi prêso e tem de ser apresentado imediatamente dentro do lugar da competência do tabelião e êsse vai no avião com o hvro de notas e as testemunhas. b) Em caso de calamidade, ou de desastre, que obrigue toda a população a deslocar-se, inclusive as autoridades, vale o testamento feito pelo oficial público se as circunstâncias justificarem o êxodo. 8. CONHECIMENTO DO TESTADOR PELO OHCIAL PÚBLICO E TESTEMUNHAS. - O oficial público, as testemunhas e o leitor, na espécie do Có-

digo Civil, art. 1.636, devem conhecer o testador: é requisito intrínseco. Se, depois, se prova que qualquer dêles não no conhecia, pode ser nulo o testamento. A nulidade não é de ordem formal. Quer dizer: se o oficial deixou de declarar que o conhecia, ou que o conheciam as demais pessoas, só por isso

não se decreta a nulidade (contra, JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALVES, Da Sucessão testamentária, Manual do Código Civil brasileiro, 19, 105). Mas, provado, declara-se a nulidade, por se não ter - em verdade - número suficiente de testemunhas. Há responsabilidade do oficial público, porque êle, por sua lei, não cercou de todo o cuidado o testamento público. A diferença entre as nulidades de oid&m formal e as da ordem intrínseca não é sem interêsse: aquelas autorizam o juiz a pronunciá-las por ocasião do "cumpra-se", e essas, não. Porém o problema é mais árduo do que parece. ¿Que é que se entende por "a testemunha conheceu o testador"? ¿Ter-lhe sido apresentado na ocasião? Velha contenda, que merece reestudo. A própria exigência de conhecer, E. CHR. WESTPHAL (Theorie des rõmischen Rechts von Testamenten, § 153) não a tinha por essencial. J. C. PISTOR (Tractatiis iuris civilis de testatore testibus testamentaras incognito, 2 s.) distinguia: se o testador veio de fora para testar, ou se, viajante, aproveita o lugar em que se acha para pedir que lhe escrevam ou para escrever o testamento. Aqui, não é de mister que as testemunhas o conheçam. Pode ser que ninguém o conheça. No primeiro caso, não vale; no segundo, vale. LUDF. GFR. MADIHN {Principia iuris romani de successionibus seu de iure hereditario, § 70) queria que o conhecimento fôsse exigido a uma, pelo menos, das testemunhas. A. K. H . VON HARTITZSCH {Das Erbrecht nach rõmischen und heutigen Rechten, § 58), só aos testamentos escritos pelo testador dispensava que as testemunhas conhecessem o testador. Tudo isso, de iure condendo, seria razoável; mas falta a lei. Se houvesse possibilidade de se induzir regra jurídica que a todos os casos - ou a quase todos - acudisse, estaríamos diante de recomendável elaboração da lei pelo intérprete. Mas os fatos possíveis são tantos e tão variáveis, as circunstâncias que os modificam tão sutis e tantas, que aqui seria acertado o alvitre de J. C. PISTOR, ali, o de LUDF. GFR. MADIHN, acolá, o de A. K. H . VON HARTITZSCH, e, talvez, outros critérios de discrime. O testador que saiu do lugar em que mora - da comarca, digamos - e vai a outro testar por testamento público, valendo-se de testemunhas que o não conhecem e de oficial público que só então o vê, - êle mesmo por culpa sua se expôs a ser-lhe julgado nulo o testamento. Mas, daí a considerá-lo, a priori, nulo, grande diferença intervém. Para vermos como são muitas e múltiplas as circunstancias, que podem atuar, lembra-nos o caso do testador que tem motivos para desconfiar do oficial público do lugar e de quem üie vai ser testemunha, e procura

outro, fora do seu dorrücilio, pedindo talvez que lhe escreva tal explícita declaração, perfeitamente justificadora. As próprias testemunhas, se aceitaram ser, devem (e é de presumir-se) ter tido elementos paxa a identificação do testador: apresentação por pessoa não figurante, digna de confiança, apresentação de carteira de identidade, reconhecimento por informes de ordem familiar mais ou menos secretos, e tudo mais que - na realidade - serve, na vida, a identificar os recém-vindos. Tudo aconselha a deixar-se ao juiz a apreciação das circunstâncias, dos indícios, em vez de prendê-lo em malhas de injusto formalismo. A forma, essa, foi satisfeita. O que se discute é o requisito intrínseco do conhecimento do testador pelas partes figurantes, - oficial público, testemunhas e o leitor, de que fala o Código Civil, no art. 1.636. Como tal requisito depende, no seu fundamento, da questão de identidade, fora absurdo desprezar-se in limine a consideração de se achar evidentemente provada a identidade do testador, ainda quando tenha havido facilidade, por parte dos figurantes, no se persuadirem dela. Entender o contrário seria levar muito longe a indagação de fato puramente subjetivo, como é o de se convencer de que a pessoa com quem trata é a que está em seu pensamento. Muitas vêzes, simples dado basta a convencer-nos; outras, provas, ordinariamente bastantes, no caso não nos bastam. Compreende-se que, sabendo existir sósia do capitalista A, o oficial exija maiores provas de identidade que a simples confrontação com o retrato. Por outro lado, pode satisfazer-se, indo à casa de quem não conhece, a chamado, diante de filhos, parentes e amigos do morto, com a simples apresentação. O que acima de tudo importa é a identidade; o não-conhecimento, ou o conhecimento fácil só deve ter importância se deixa dúvidas quanto à identidade. Essa é a única regra jurídica geral, regra de julgar, que devemos induzir. Com ela, e no sentido dela, coexistem as aparentemente díspares opiniões que acima apontamos. Digamos mais: nela se subsumem. O conhecimento, apurado abstratamente, deixa de ser essencial, e também o deixa de ser como forma. Assim entendida, salva-se a opinião de E. CHR. WESTPHAL. Se o testador, sem justificativa, veio de fora para testar, e isto constitui indício contra a sua identidade, cria-se sitoação que justifica a solução de J. C. PISTOR: mas, está claro, probatoriamente, e não com o caráter de invaUdação, absoluto, que se lhe quis dar No caso do viajante, tanto seria fácil dispensar qualquer conhecimento por parte das testemunhas (J. C.

Tractatus inris civ. de testatore testibus testamentaras incognito, ubi simul differentia inter testamentum peregrinantis, et illius, quando quis in specie testandi causa, 2 s., incide nisto), como exigi-lo de modo absoluto, como opinavam nos séculos passados SAMUEL STRYK {Dissertatio de testamento in itinere confecto, t. 3 3 ) , GEOG. GF. THYME {Dissertatio de testamentis peregrinantium, § 3 ) e CHR. FRIED, VON GLÜCK {Ausführliche Erlauterung der Pandecten, 34, 306). PISTOR,

Em tôda essa materia, não há como deixar de invocar, se faltam provas pró e contra, ou se umas não destroem as outras, o elemento decididor do favor testamenti. O oficial público pode exigir provas de identidade do testador e das testemunhas, talvez determinado número de abonadores, segundo o seu estatuto. Se não pode ser feita imediatamente a prova, negar a feitura do testamento, talvez urgente, seria mais grave do que fazê-lo, ressalvando o oficial púbhco, quanto a isso, a sua responsabilidade. Há de declarar as circunstâncias, os sinais característicos do testador, ou das testemunhas, e a validade do testamento não pode deixar de depender da posterior justificação plena da identidade. 9. UNIDADE DO ATO E DE TEMPO. - O testamento público deve ser feito com as testemunhas, até afim, sempre presentes, simultaneamente, todas elas, o testador e o oficial. Ato seguido, sem interrupção; lidas, depois, todas as disposições constantes da escritura. Mas surgem problemas. Se as testemunhas assinaram o testamento e não viram o testador redigi-lo, nem, tão-pouco, ouviram as declarações de vontade do testador, houve violação da lei. Mas a prova disso, diante do texto do testamento público e a fé pública que se atribui ao oficial público, é dificil a prova mesmo testemunhal, feita por alguma ou algumas testemunhas - contra o ato público (cf. Turma do Supremo Tribunal Federal, 22 de setembro de 1950, A. J., 96, 318). "A leitura como dilucida PONTES DE MIRANDA (Tratados dos Testamentos, ü , 53) deve in conspectu testatoris e perante as testemunhas, simultaneamente" (2.=" Turma, 10 de janeiro de 1950, O D., 73,145). Se se prova que tal não aconteceu, há falta de elemento essencial, a despeito da dificuldade da prova. Se o testador entregou minuta preparada por outrem, mas declarou que aí estava a sua vontade, surge o problema que a 1." Turma do Supremo Tribunal Federal, a 27 de julho de 1942, teve de enfrentar. Se alguns Códi-

gos Civis, como o francês, exigem que seja ditado pelo testador, o Código Civil brasileiro, no art. 1.632,1, diz que o testamento público há de ser escrito por oficial público, em seu livro de notas, "de acordo com o ditado ou as declai-ações do testador". Daí estar na decisão unânime da 1." Turma do Supremo Tribunal Federal, a 27 de julho de 1942 (R. E, 92, 393): "Não é nulo o testamento feito mediante entrega pelo testador de minuta preparada por terceiro, mas, com a declaração, por êle feita, perante o notário e as testemunhas de que aquele é o seu testamento". O fundamento principal para tal conclusão está em que as testemunhas têm de assistir a todo o ato (art. 1.632, II) e, depois de escrito pelo oficial público, há de ser lido por esse, "na presença do testador e das testemunhas, ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial" (art. 1.632, m ) . Ainda concluiu a l.'' Turma, a 11 de junho de 1942 (R. dos T., 143, 330), que "as nulidades das declarações de última vontade só devem ser decretadas em face de evidentes provas de postergação da lei; simples defeitos de forma não podem valer para invalidar a vontade clara e expressa do testador". Havemos de entender, em se tratando de minuta, que basta a entrega ao oficial público. O testador tem de dizer que a minuta contém a sua declaração de vontade, o que se afirma quando o oficial público escreve o que consta da minuta e lê o que escreveu, na presença do testador e das testemunhas, ou o lê o próprio testador, se o prefere, na presença das testemunhas e do oficial público. Depois é que todos têm de assinar. Unanimemente, decidiu a Turma Julgadora do Supremo Tribunal Federal, a 3 de junho de 1938 (A. /., 67, 345), que a lei exige, como requisito essencial, que o testador dite ou declare a sua última vontade; não basta a entrega, por êle, de simples minuta, nem o assentimento final, ao ouvir a leitura feita pelo notário. PONTES DE MIRANDA {Tratado dos Testamentos, 11, n. 210) é explícito: "O notário não pode limitar-se a copiar a minuta ou projeto, salvo se o próprio testador o lê". Ou o lê, ou declara que todo o conteúdo é a sua declaração de vontade (cf. 4.=' Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 7 de setembro e 19 de setembro de 1938, 118, 214). Se, por parte de alguma ou de algumas das testemunhas houve rápidas ausências, enquanto se elaborava o instrumento público, e não se deixou de ouvir e ver o que se devia ouvir e ver, não há nulidade (cf. 1.^ Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás, a 9 de agosto de 1951, R. dos T, 202, 589). O fato de não constar do testamento que as testemunhas assistiram a todo o ato e de oficial público não declarar que tenha feito a leitura do

instrumento, pemite a qualquer interessado propor a ação de nulidade (cf. 2." Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 3 de outubro de 1949, R. F., 135,190). Se, em vez de cinco testemunhas, houve a presença e a assinatura de seis ou mais, não há causa de nulidade (2." Câmara Cível da Côrte de Apelação do Rio Grande do Sul, 15 de julho de 1936, R. dos T., 134, 611: "Tratar-se-ia de uma formalidade a mais, de abundância de cautela, e o princípio assente é o de não invalidar o que satisfaz mais do que a lei exigia, no dizer de PONTES DE MIRANDA"; 1.^ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 9 de dezembro de 1940,130, 666). Se foi feita prova testemunhal contra a observância das formalidades legais (e. g., assistência das testemunhas) e não houve contraprova suficiente, tem de ser decretada a nulidade (cf. 1.® Turma do Supremo Tribunal Federal, 14 de janeiro de 1946, O D., 41, 417). Ainda a respeito da presença das testemunhas, a 3.=* Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 13 de outubro de 1943 (R. dos T., 149, 174), acentuou: "... a ausência temporária de testemunhas, durante a escrita do testamento, não interrompe o ato, porque a presença das testemunhas só é exigida, pela lei, para que elas vejam, ouçam e compreendam o testador, certificando-se de que a escritura encerra a vontade dêle, objetivo que se atinge perfeitamente com a presença das testemunhas nos momentos da declaração da vontade, da leitura, aprovação e assinatura da escritura". Hoje, só o testamento público requere unitas actus. O testamento cerrado pode ser escrito, aos poucos, pelo testador, ou por outrem, - o momento decisivo é o da entrega pelo testador, em presença das testemunhas, ao oficial púbhco, que o vai aprovar, quando começa tôda uma série de formalidades incindíveis (Código Civil, art. 1.638, IV-XI). O testamento particular, escrito pelo testador, aos poucos, pode ser guardado por êle, ou escrito de uma só vez, e só depois lido às cinco testemunhas, que o assinam após o testador (art. 1.645, DI). Discute-se se é absoluto o conceito da unidade do ato no testamento público. Desde o testamento calatis comitiis que se exige a unidade do ato. No testamento per aes et libram a regra juri^dica tinha de ser enunciada. Ali, pertencia à própria forma: tratava-se de comício. Aqui, se não fôsse uno actu, duas operações, separadas, haveria: a ahenação entre vivos irrevogável e, depois, a disposição a causa de morte, sem fôrça civil.

No direito novo, foi expressa a exigência. Uno contextu actus testari oporteu dizia U L P I A N O ( L . 2 1 , § 3 , D . , de testamenta facere possunt

et

quemadmodum testamenta fiant, 28, 1), para caracterizar a continuidade do ato. Uno contextu. Quer dizer: a) reunião simultânea das testemunhas em presença do testador, in conspectu testatoris\ h) necessária a feitura e necessário o acabamento uno eodemque die et tempore' c) continuidade de ato propriamente dita, isto é, operações seguidas, sem interrupção, sem outros atos de permeio. Só se excluíam da imperatividade da unitas as breves interrupções devidas a necessidades corporais das testemunhas. Resta saber-se se, no düreito brasileiro, vale o testamento: a) se se escreveu aos poucos, com intervalos, talvez de horas, por estado ansiante do testador em perfeito juízo, ou dores fortes que lhe proíbam continuar; b) se se escreveu por mais de um dia, por serem minuciosas as disposições e tomarem mais do tempo permitido ao testador, ou por se tratar de texto longo; c) se foi assistido até um ponto por uma testemunha e daí em diante por outra, por morte daquela, ou por acidente. Se o oficial público não se ausentou e fícsjcwa presentes todos, não há discutir-se: vale, qualquer que seja o intervalo de espera. Cumpre saber-se se o mesmo se dá tendo dormido o testador, todos presentes. Em tese, é válido. O juiz há de apreciar as circunstâncias. É preciso atender-se a que esse ato ainda vai ser lido, inteiro, ao testador e às testemunhas, talvez pelo próprio testador, se o quiser, ao oficial púbhco e às testemunhas. No caso b), tem-se de mencionar a causa por que cessa e se encerra o testamento, como se estivesse pronto, dizendo o oficial público continuá-lo no dia seguinte: assinam testador, testemunhas e oficial púbhco. No outro dia, recomeça-se como se fôsse outro testamento, ainda que se digam em continuação as disposições de última vontade. Tal providência concihatória não ofende a unidade do ato: há mais de um testamento, se bem que ügados pela continuidade da voluntas testatoris. Quem podia revogar em parte, pode encerrar um e continuar outro, em outro dia. Mas há questão de certo melindre: morrendo o testador, ou não prosseguindo no testar, ¿vale o testamento iniciado ou perfeito? Qualquer solução in abstracto seria má. Devem-se examinar, concretamente, as especies. Pode bem ser que o testador tenha começado, e o disposto no primeiro testamento deva depender, claramente, do que disporia no segundo: o têr-

mo daquele pode dá-lo a entender, dizê-lo expressamente, ou resultar das disposições feitas. Pode ser que se trate de disposições completas, perfeitamente separáveis, porque autônomas e independentes do novo jacto de vontade. Exemplo: é válida declaração perfeitamente fundamentada, ou a clausulação de inalienabilidade a bens das legítimas (ou a todos os bens), se o testador, que deixou à outra cédula as disposições positivas, morrer antes de fazer o outro testamento. No caso c), se houve tempo de encerrar, a questão é igual à do caso b). Se não houve, o ato está prejudicado pelo acidente: se ainda não foram mencionadas, mencionam-se as testemunhas; se foram, o oficial público tomará sem efeito o que vinha escrevendo, ou, narrando o ocorrido, presente outra, que a substitua, volta ao começo do ato, reproduzindo tudo o que antes se escreveu se o testador, de viva voz, o repete. (Porque a reprodução do que já se escrevera, sem que o testador o repita para a nova e as mais testemunhas e o oficial ptíblico, de nada vale: faltou a reunião in conspectu testatoris, a feitura uno eodemque die et tempore, a continuidade do ato.) Da expressão - uno eodemque die et tempore - tirou GUST. L U Dov. THEOD. MAREZOLL (Über die bei der Testamentserrichtung zu beobachtende Einheit des Ortes, des Tages, der Zeit und des Rechtsactes, Zeitschrijifür Civilrecht und Prozess, IV, 54 s.), que, além de ser preciso o seguimento ininterrupto ou continuidade temporal (uno eodemque tempore), se havia de exigir o mesmo dia do calendário {eodem die): nêle haveria de começar e nêle acabar. Quer dizer: todos os testamentos teriam de terminar antes da meia-noite. Com êle, pela unidade do dia, A . F. J. THIBAUT {System des Pandektenrechts, II, S."" ed., § 8 2 9 ) , KARL AD. VON VANGEROW {Leitfaden für Pandekten-Vorlesungen, I I , § 444, 1 6 6 ) , e JoH. JAC. LANG (Lehrbuch des Justinianisch Rõmischen Rechts, § 4 1 2 , 4 0 8 ) . Expressamente, contra GUST. LUDOV. THEOD. MAREZOLL: W . SELL (1st zu Errichtung des testamentum privatum solenne ausser der Einheit der Handlung und der Zeit auch noch Einheit des Kalendertags enforderlich?, Jahrbücher für historische und dogmatische Bearheitung des rõmischen Rechts, I I I , 1 - 3 0 ) , G . F. PUCHTA {Pandekten, § 4 6 4 ) , J. J . BACHOFEN {Ausgewãhlte Lehren des rõmischen Civilrechts, 3 1 0 ) , E. FEIN, e m CHR. FRIED, VON GLÜCK, 4 5 , 1 3 ) e C . E R SINTENIS

(Das

praktische gemeine Civilrecht, III, § 169, 378). Na lei notarial de Maximifiano I, de 1512, também se falava em dia e tempo (§ 7, como na L. 21, C, de testamentis: quemadmodum

testamenta

ordinantur, 6, 23). Mas EDUARD FEIN ( 4 5 , 1 3 ) fez a análise devida, censu-

rando a literalice de GUST. LUDOV. THEOD. MAREZOLL. O que se queria era que se não diferisse para outro dia o acabamento da cédula: nihilque eius in diem alterum dijferatur. Não era imposição de não passar da meia-noite, nem tautologia . A expressão - uno eodemque die - podia e devia explicar-se pela proibição de diferir-se: suspender-se a feitura e deixar-se para outro dia. Ora, quem pela noite entrou e prosseguiu no ditar, até a madrugada, não descontinuou, não cessou, não diferiu. Diferre supõe salto de tempo. O imperador Teodósio tinha de dizer, como disse, die ac tempore, porque se difere se a outro dia, ou a outra hora do mesmo dia. Num e noutro caso, queria êle que se partisse o ato e, pois, fosse nulo. Salvo a exígua mora, isto é, lapso que não chega a quebrar a unidade de tempo. Para bem nos convencermos de que a unitas actus não pode ter a mesma essencialidade apriorística do uno contextu, basta ler-se o art. 1.632, que a isso se não refere. Donde a conseqüência necessária: concreta, e não abstratamente, é que se aprecia o requisito da unidade do ato. Aliás, êsse era o critério das Ordenações Filipinas, Livro IV. Título 80. O Assento de 10 de junho de 1817 somente exigiu que as testemunhas fossem presenciais de todo o ato, desde o princípio até o fim. Não houve, portanto, nenhuma inovação, ou qualquer recuo a velhos formalismos. Mas, conforme dissemos antes e está na jurisprudência de hoje, as testemunhas podem ter necessidade de ausência rápida, bem como o próprio oficial púbhco e o próprio testador. Êsse, doente, pode ter de parar por minutos ou horas o ditado, ou a própria escrita, ou a leitura. 10. UNIDADE DE LUGAR E TESTAMENTO PÚBLICO. - Logo aparece a questão: ¿pode oficial público, com o testador e as testemunhas, mudar de lugar quando está a tomar um testamento? Uno eodemque loco e eodem loco são dizeres encontrados nas L. 8, pr., C., quifacere testamentum possunt vel non possunt, 6, 22, e L. 12, C., de testamentis: quemadmodum testamenta ordinantur, 6, 23. É a unidade do lugar. Diante das considerações que antes se fizeram sobre os requisitos especiais do lugar, a única solução que se deve admitir é a de valer o testamento se, com a mudança de lugar, não se quebrou a unidade do ato. O mesmo é dizer-se: testador, oficial público, testemunhas, sempre presentes todos, uno actu, a tudo assistiram, e transportaram-se por fôrça

das circunstancias excepcionais (suficientes para isso), sem se interromper o seguimento da solenidade. Apreciará o juiz tais circunstancias e tal indiscontinuidade do ato de testar Exemplo: depois de ditar ou declarar algumas cláusulas, intervém o médico, e obriga, por julgar necessário, a transferência para a sala de operações, onde continuará, antes de operar-se, o testamento iniciado. Se consta da cédula, ou, se não consta, e tudo se passou realmente sem descontinuidade do ato, indo todos, sempre presentes, para o outro lugar, fôra sacrificar a injustificável apego às expressões unitas actus o testamento de quem se acha em circunstâncias tão extraordinárias. Fôra absurdo reputar válido o testamento in itinere confecto, e não no considerar aquêle em que a deslocação não foi mais que incidente passageiro. Para a maior segurança, deve o oficial público consignar tudo que ocorreu e claramente narrar os fatos que provam a ininterrupção do ato testamentário. 1 1 . IDENXROADE, CAPACIDADE, CIRCUNSTÂNCIAS SUBJETIVAS DO TES-

- O testamento público não exige maior capacidade que as outras formas testamentárias. Vale integralmente o que dissemos quando cogitamos do Código Civil, arts. 1.627 e 1.628. Quanto às situações subjetivas, que não tocam à capacidade, o art. 1.633 abre a porta ao que não sabe ler nem assinar, e os arts. 1.636 e 1.637 estabelecem o plus necessário às formas, se surdo ou cego o testador. TADOR.

Quanto à identidade, no testamento público, grave responsabilidade atinge o oficial público: com a fé pública, êle atesta, ainda implicitamente, que aquêle que testou era realmente quem se dizia. Situação idêntica, porém não quanto ao conteúdo (salvo o caso do art. 1.639), ocorre com o testamento cerrado (art. 1.638, IV eV). Às vêzes, devido a doença, ou pela gravidade, ou pelo contágio, fica a certa distância o testador, em penumbra. É essencial que o vejam e ouçam. Por isso mesmo, se, hoje, não podemos estabelecer regras jurídicas rígidas quanto aos testamentos feitos por trás de biombos (podem ser transparentes e permitirem ouvir-se a voz do testador), ou em camas rodeadas de cortinas, o juiz não pode deixar de suspeitar, se há outros indícios, dos testamentos em que o testador injustificadamente estava oculto, ou, se havia razões, não se estabeleceu o suficiente para se lhe certificar a identidade. O testamentum cortinatum, occultum, ou velatum, sempre foi suspeito ( L U D F . G H R . M A D I H N , Principia iuris romani de successionibus seu de iure hereditario, § 70).

R MÜLLER,

em nota a

G . A . STRUVE, W . A . LAUTERBACH, M . G .

WERNHER {Commentationes lectissimae ad Digesta, imprimis ad illustranda virorum Boehmeri, Heineccii et Ludovici compendia, § 22) e L. J. F.

cogitaram de tais testamentos, mas parece que a melhor lição deu S.L.B. DE CoccEius, seguido por J. U. VON CRAMER (Academ. ReHOPFNER

den über die gemeine und bürgerliche Rechtsliche, I, 602) e CHR FR. VON

(34, 208): se o testador não pode ver luz - e devemos generalizar: se há motivo suficiente para a parcial ocultação ou velamento - e as testemunhas podem identificá-lo, nenhuma razão há para se reputar nulo tal testamento. Tanto mais quanto as proximidades da morte ordinariamente se cercam de tais cautelas e velaturas. GLÜCK

Claro que, durante a noite, em quarto fechado e sem luz, tudo faciüta maquinações e imposturas. (Pode ocorrer, per exemplo, que o testador não seja o mesmo que se diz, ou alguém fale por êle, ou, ainda, se exerça violência, que a penumbra facilite). Alguns tratadistas fulminavam-no de nulidade (P. MÜLLER. nota a STRUVE, EX. 3 2 , th. 10, i, I I - I V ) , SAMUEL STRYK (De Cautelis testamentorum, c. 15, § 3 9 ) , W . A. LAUTERBACH (Collegium pandectarum theoretico-practicum, § 5 8 ) , C . M A N Z (Tractatus de testamento valido et invalido, 2 6 7 s.), L . J . F. HÕPFNER (Theoret. prakt. Kommentar über d. Heineccischen Institutionen nach deren neuesten Ausgabe, § 4 4 5 , 4 7 5 ) . Dêles discordava L . G . MADIHN {Principia iuris romani de successionibus seu de iure hereditario, § 70), para quem o testamentum noctu absque luminibus confectum apenas é suspeito de falsidade, suspeição que por prova contrária se deve destruir {quae per probationem contrarii elidi debet). Sozinho contra tudo isso, F. HAGEMANN (Etwas über die zur Nachtzeit, ohne Lichter, errichteten Testamente, und deren Gültigkeit, Archivfür die theoretische und praktische Rechtsgelehrsamkeit, I, n. VII, 198 s.). Para os nossos dias, a questão precisa ser posta em outros termos. Com a lição romana e a medieval, a noite não obsta a que se teste. Mas a exigência da luz não concerne à noite. Também, durante o dia, quartos fechados podem ser escuros. Exige-se a luz porque se exige a certeza sobre quem testa, de quem realmente parte a voz, e se têm de levar em consideração as mais circunstâncias de livre querer e identificação. Sena ridículo, hoje, descermos às sutilezas escusadas de antigos juristas, que impunham três luzes, sob pena de nulidade, como se o quantitativo, na espécie, pudesse ser o número de fontes luminosas, em vez do valor da própria luz.

Trata-se de praesumptio facti. Seria arbitrário elevá-lo sem o rito de indução, como alhures mostramos, à categoria de presunção legal. Ora, as presunções de fato longe estão de produzir a nulidade pleno iure dos atos jurídicos. Nulidade é sanção do direito. No processo das ações de nulidade, o juiz pesará tais presunções e com elas urdirá a trama da decisão. Qualquer regra a priori teria valor relativo e precário. A única que poderíamos formular é a seguinte: O que importa é a identidade, a procedência da voz, o livre querer visível do testador, e a pouquidade da luz, a má posição, o velamento, a interposição de aparelhos, talvez o encandeamento devido a excesso de luz, pouquidade da luz, a má posição, o velamento, a interposição indiciaria ou probatória, se deixa dúvida ou confirma dúvidas quanto à identidade, à procedência da voz, e ao livre querer do testador.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.864. A - Legislação Sobre os requisitos do testamento público, ver o art. 1.864 do CC/2002. § 5.864. B - Doutrina 1. o testamento público, certamente o mais utilizado no Brasil pela segurança que o cerca, sofreu importantes mitigações quanto aos seus requisitos essenciais, com o advento do Código Civil de 2002. Essas mitigações procuram atender às constantes orientações doutrinária e jurisprudencial que se formaram a partir da legislação anterior e às mudanças culturais e tecnológicas contemporâneas. Assim, houve redução do número de testemunhas de cinco para duas, que não mais precisam assistir a todos os atos, como exigia a lei anterior, mas apenas à leitura do instrumento feito pelo tabelião ou notário. Não há mais necessidade de o testamento ser escrito manualmente pelo tabelião, que poderá utilizar de meios mecânicos e até de formulários impressos, desde que todas as páginas sejam rubricadas pelo testador. As nulidades formais, previstas no art. 1.634 do CC/1916 não foram reproduzidas no Código atual. 2. O princípio da conservação dos negócios jurídicos (art. 184 do CC/2002) também é aplicável aos testamentos, de modo a que a nulidade insanável de uma de suas partes ou disposições não contamina as demais, que possam ser observadas e interpretadas de modo autônomo. 3.0 testador pode servir-se de notas, minutas ou apontamentos entregues ao tabelião, não sendo formalidade essencial que sejam ditadas ou lidas, o que reduz o papel tradicional da declaração oral. Na contemporaneidade, os testamentos

públicos mais complexos, que envolvem patrimónios diversificados, inclusive bens incorpóreos, são previamente elaborados por advogados especializados, que redigem as minutas entregues pelos testadores aos tabeliães. 4. A legislação anterior exigia que as declarações do testador fossem feitas em língua nacional, o que foi suprimido pela lei atual. Assim, pode o estrangeiro, que não saiba português, declarar oralmente as disposições testamentárias, traduzidas por intérprete que o acompanhar, ou declarar que a minuta traduzida em português que apresentar ao tabelião é a expressão de sua vontade livre. 5. O testamento público pode ser feito pelo tabelião de livre escolha do testador, não sendo exigível sua competência territorial pela legislação atual (Código Civil de 2002, Lei dos Registros Públicos de 1973 e Lei dos Serviços Notariais e de Registro de 1994). 6. A lei não exige a data ou o local onde foi redigido o testamento público, mas é praxe notarial fazê-lo. 7. Também não há exigência legal de o notário declarar na escritura do testamento que o notário conheça o testador. A explosão demográfica nas cidades brasileiras tornou inviável essa praxe. As testemunhas não precisam conhecer o testador, pois não são mais presenciais a todo o ato e tão somente para a leitura do texto elaborado pelo notário. 8. Essas mudanças deram força à doutrina que pugnava pelo desaparecimento da exigência de unidade do ato, ou unitas actus, pois a redação pode ocorrer em um dia e a leitura em outro, desde que, para esse fim, estejam presentes o testador e as testemunhas. A entrega da minuta ao notário não precisa de estar acompanhada de testemunhas. Pontes de Miranda já admitia a atenuação do princípio, no item 9 do § 5.864, quando houvesse o que denominou de providências conciliatórias, notadamente a menção no instrumento da causa da interrupção. Pela mesma razão, não é requisito essencial a mudança de lugar, se necessária for para a elaboração do testamento público. 9. O testador é livre para escolher o notário ou tabelião de notas, ainda que fora de seu domicílio ou do lugar onde estejam seus bens para a lavratura de seu testamento. Essa autonomia é assegurada pelo art. 8.° da Lei 8.935/1994, que também prevê o impedimento de o notário se deslocar fora da circunscrição de seu cartório para a lavratura do ato. Por sua vez, o Código Civil de 2002 admite que o testamento seja lavrado pelo substituto legal do tabelião. 10. Pode ser testador o maior de dezesseis anos, sendo impedidos os que, no ato de fazer as declarações de suas disposições testamentárias, não tenham o pleno discernimento para esses atos (art. 1.860 do CC/2002), ainda que não regularmente interditados.

§ 5.864. C - Jurisprudência Consolidou-se na jurisprudência do STF e do STJ que o formalismo do testamento não é absoluto (algumas decisões aludem a não sacramentai), não se

podendo cogitar de invalidação, sempre que a ausência de alguma formalidade não prejudique a consecução das finalidades lícitas das disposições deixadas pelo testador. Nesse sentido, o STJ decidiu pelo aproveitamento do testamento quando, não obstante a existência de certos vícios formais, a essência do ato se mantém íntegra, reconhecida pelo Tribunal estadual, soberano no exame da prova, a fidelidade da manifestação de vontade da testadora, sua capacidade mental e livre expressão (REsp 600.746/PR, j. 20.05.2010, rei. l\/lin. Aldir Passarinho Junior, DJe 15.06.2010). É certo, todavia, como decidiu o STJ, que a mitigação do rigor formal em prol da finalidade, no caso dos testamentos, deve ter especial atenção do julgador, tanto por não viver o testador no momento de esclarecer suas intenções, quanto pela suscetibilidade de fraudes na elaboração do instrumento e, consequentemente, na deturpação da vontade de quem dispõe dos bens para após a morte (STJ, REsp 147.959/SP, 4.®T, j. 14.12.2000, rei. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ19.03.2001, p. 111).

§ 5.865. P A R T I C U L A R I D A D E S Q U A N T O À E X P R E S S Ã O DA M A N I F E S T A Ç Ã O D E VONTADE

1. TESTAMENTO PÚBLICO E DITADO. - Têm de ser ditas, de viva voz, as disposições de última vontade (Código Civil, art. 1.632,1), quer ditando, quer declarando sem ser por ditado. Portanto: a) o mudo não pode testar na forma autêntica (artigo 1.635); b) o notário não pode restringir-se a copiar a minuta ou projeto, salvo, e. g., se o próprio testador lho lê. A Cassação de França, a 6 de novembro de 1890, já resolvera isso, que o Código Civñ brasileiro explicita: o ditado, isto é, a leitura pelo testador do que antes escreveu, ou alguém por êle escreveu. A declaração pode ser sobre a minuta. Por exemplo: "aqui está o que escrevi e contém as minhas disposições de última vontade"; "aqui está, batido a máquina, ou escrito por C, a minha vontade, e peço que as testemunhas e o senhor, oficial público, leiam, ou do conteúdo tomem conhecimento". É aconselhável, em tais casos, que o testador rubrique ou assine o que entregou, porém isso não é essencial. O Código Civil, no art. 1.632, I, não só se referiu ao "ditado" pelo testador, mas a isso e às "declarações do testador", sem serem ditadas, isto é, declarações que apenas aludem ao que é a sua vontade, inclusive ao papel ou a gravação do que êle tem como as suas disposições testamentarias.

2. DECLARAÇÃO E ESCRITO. - É costome, assaz louvável, lançarem os tabeliães as próprias palavras que o testador lhes disse, - palavras rudes, broncas, que revelam o grau de ignorância, ou de saber e de inteligência do declarante. Mas a doutrina é acorde em permitir-lhes que substituam um ou outro têrmo, de modo que diga melhor o que o próprio testador queria. Claro que tal fungibilidade de terminologia não pode ir a ponto de substituir ou alterar aquela vontade. Se foi, dá-se a nulidade; provada a invalidade, responde o oficial público aos herdeiros, legatários, ou beneficiados, de acordo com o que teria querido dizer o testador.

Melhor será o costume de lançar o que a viva voz do testador ditou. E só intervir o oficial público se, por ignorância, o declarante estiver a dispor nulamente, ou criando dificuldades de interpretação: então, há apenas esclarecimento, para que o testador melhor exprima o que quer. Convém que, na presença das testemunhas, o oficial público explique o que vai pôr, a fim de que o testador faça seu o que se sugere como expressão do seu querer. As entrelinhas não ressalvadas, mesmo em lugar substancial, disse o Tribunal de Apelação de Alagoas, a 14 de janeiro de 1941, R. dos T., 139, 272, "não viciam o testamento, nem o tomam suspeito, se destinadas a reforçar ou tomar mais claro o que já constava do contexto" Frise-se bem: se destinadas a reforçar ou tomar mais claro o queja constava do contexto. 3. TESTAMENTOS EM RESPOSTAS. - Muito se discutiu sôbre a validade dos testamentos ditados em resposta, isto é, ad interrogationem alterius. O direito contemporâneo não lhes nega valor, mas em verdade constitui circunstância a ser apreciada, em conjunto com outras, como indícios de coação, ou outros, que viciem a cédula. Um exemplo já vimos: o de instituir-se herdeiro a estranho, sem antecedentes de serviços, ou méritos afetivos, que justificassem a dádiva, e preterição de tôdas as pessoas, que os próprios herdeiros legítimos esperavam contempladas, devido a perguntas e insinuações. No direito anterior, as respostas simplistas {sbn, não), constituíam declarações insuficientes: devia o testamento ser ditado, ou declarado palavra por palavra. Ainda depois do Código Civil, há os que reputam inválido o testamento feito por perguntas e respostas (e.g., ITABAIANA DE OLIVEIRA, Elementos de Direito das Sucessões, 2." ed., 234). Mas a questão não está posta em bons termos: a) O testamento só é anulável se houve dolo ou coação, — isto é, se houve invasão da personalidade do testador, se não representa a vontade dêle. b) O simples perguntar e responder não pode, só

por si, tomar atacável a cédula. Exemplo: o testador declarou que desejava deixar a fortuna a alguns parentes e amigos; e o oficial público perguntou: "¿quais os parentes e amigos que deseja sejam contemplados?" - e o testador respondeu: "A, B e C" "Quanto deixará"? —, ao que respondeu: "cem mil cruzeiros novos"; "e a B?", "duzentos mil cruzeiros novos"; "e a C?", "cinqüenta mil cruzeiros novos, cabendo-lhe a testamentária". O oficial público pode perguntar se quer nomear alguém por testamenteiro. Não há inconveniente nisso, c) O oficial público, além das perguntas de quanto, pode fazer as que tendam a melhor compreensão do pensamento que vai escrever. O que é essencial é que lhe transcreva o pensamento e se proceda à leitiira. O testador, ouvindo-a, confere com o que pensou o que foi enunciado no texto das notas. 4. SOLUÇÃO CONCRETA DO PROBLEMA. - O princípio é o de dever ser livre, própria, sem interposição da personalidade de outrem, a declaração testamentária. Se o testador nada disse e já o oficial público começa a perguntar-lhe, interpõe-se entre o testador e o testamento, a respeito do que ainda não interessa. Nesse sentido, pode ser inválido o testamento ad interrogationem alterius. Não houve pedido de esclarecimento, mas precipitação, pré-declaração, sugestão, estraneidade do querer ainda a ser declarado. Só as circunstâncias é que podem ser decisivas. Vale, por exemplo, a cédula que o oficial público escreveu, por perguntas, se não houve, nelas, nem iniciativa do oficial público (isto é, matéria nova), nem indício de sugestão. Aqui, como em outros casos já mencionados, seria mau todo princípio a prion: só tem importância se se põe em dúvida a autonomia do testador. Aliás, outra não era a lição de S. L . B . DE COCCEIUS (IUS civile controversum, 9 e 7 ) e de G . C . SCHREIBER DE CRONSTERN (Dissertatio de testamento ad interrogationem alterius condito, §§ 14 e 15). Se o testador já declarou, a pergunta esclarecedora não lhe invade a personalidade. Se, ao ditar ou declarar, Uie esqueceu o nome do herdeiro, ou ocorreu lapsus linguae, todo o interrogatorio auxiliador não pode ser considerado como pertorbante da vontade própria. Os velhos escritores eram assaz rigorosos, e postulavam, duramente, a nuhdade, quando se tratava de um sim ou de um simples mover de cabeça (B. Bassiu, Dissertatio de testamento nuncupativo, th. 7; G. C. SCHREIBER DE CRONSTERN, Dissertatio de testamento ad interrogationem alterius condito, § 16). Porém isso deve apenas significar que tal testador esquecido, ou vítima de lapsus linguae, não deve satisfazer-se com o simples gesto. É inegável a presun-

ção de fato, contra o testamento, que de tudo isso deriva; e, se o oficial público, que com isso se satisfez e narrou, subscreve tal testamento, responde, civil e criminalmente, se o juiz o declarar nulo. Houve quem pretendesse distinguir a pergunta feita pelo oficial público e as perguntas feitas pelas testemunhas ou por estranhos. Mas, desde A . FÁBER (De Erwribus pragmaticorum et Interpretatione iuris, I I I , d. 6 9 , 1, 2), afastou-se qualquer distinção a tal respeito, pôsto que as perguntas feitas por estranho que é contemplado no testamento possa compor ato de dolo ou de violência. Cumpre advertir que pode haver veemente indício de coação consistente em aparecer o oficial público sem ter sido chamado pelo testador, ou começar o testamento aconselhando-o a fazer declarações e a dispor dos seus bens. ¿Como confiar em tal cédula? Assim, G . C. SCHREIBER DE CRONSTERN {Dissertatio de testamento ad interrogationem alterius condito, §§ 1 6 - 1 8 ) , e CHR. F R . VON GLÜCK ( 3 4 , 2 6 ) .

Quanto ao bater de cabeça, meramente explicativo, ainda contra êle não se deve afirmar exclusão absoluta e a priori. Rarissimamente pode valer, mas o não provável não é o impossível. Pelo absoluto a priori, JUST. CLAPROTH (Abhandlung von Testamenten, Codicillen, Vermachtnissen iind Fideicommissen, § 8, 60); se as circunstâncias não põem em dúvida a vontade do testador, CHR. HEINR. G . KOCHY {Commentatio de Testamento vi metuve extorto, § 4, 13). Um sim e uma aprovação gesticular, em circunstâncias especiaKssimas podem ser assaz expressivos. Mas, em se tratando dç escrito, que o testador leu, a aprovação gesticular, ou monossilábica {sim, não), não pode, de nenhum modo, referir-se à parte do escrito, porque seria então admitir o testamento público por cópia de minuta, a que se opõe o Código Civil, arts. 1.635 e 1.632,1. Assim, JusT. CLAPROTH {Abhandlung van Testamenten, Codicillen, Vermachtnissen und Fideicommissen, 60). Não se proíbe a entrega da minuta, mas é preciso que haja declaração de vontade de que se tenha o conteúdo como manifestação de vontade última do testador. A minuta pode ter sido escrita por advogado do testador (4.=* Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 3 de abril de 1941, R. dos T, 131, 235). Feita por alguma das pessoas instituídas herdeiros ou legatários, ou pelo único herdeiro ou legatário, o fato pode ser indício de coação do testador. Mas, aí, há quaestio facti. Se o testador, no interregno, perdeu a fala, já o testamento não pode continuar: o que se fêz está feito, desde que o testador possa assinar e esteja em juízo perfeito.

5. TESTAMENTO PÚBLICO POR SINAIS. - A lei exige sl palavra. Não seria testamento público o que se ditasse ao oficial público, por sinais, ainda que foraiassem linguagem inteligível e o oficial público a compreendesse. Assim, na Alemanha, fundado o direito nos Motive, V, 251 e 276, e assim no Brasil, pois a mudez exclui o uso da forma pública (art. 1.635). 6. L Í N G U A ESTRANGEIRA E TESTAMENTO PÚBLICO. - Testamento público tem de ser ditado e escrito em língua nacional. Não se admitem intérpretes. Também assim na França. Mas, lá, o ditado pode ser em língua estrangeira, que o notário compreenda: ouvirá, e lançará em francês, - expediente assaz perigoso, porque, lido, ao testador, na tradução, pode esse não perceber inexatidões e sutilezas da linguagem. No Brasil, se o estrangeiro pode exprimir-se em português, ainda que mesclado de dicções estrangeiras, como sói acontecer a espanhóis e italianos residentes no Brasil ou que aprenderam algo de essencial ao trato dos negócios, tem-se isso por Kngua nacional. O essencial não é a pureza da língua, mas a inteligibilidade pelo oficial público e pelas testemunhas, por mais defeituoso que seja o falar, ou, como ocorre aos povos nórdicos e ao francês, as irregularidades e discordâncias de pronúncia, de conjugação dos verbos e de formação dos gêneros e do plural.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.865. A - Legislação Sobre a manifestação de vontade nos testamentos públicos, conferir o art. 1.864,1, do CC/2002. § 5.865. B - Doutrina 1. A legislação atual admite que o notário restrinja-se a copiar a minuta do testamento que Itie foi entregue pelo testador, correspondente às suas declarações, elaborada por ele ou por advogado. A formalidade essencial passou a ser a leitura do texto lavrado, na presença do testador e das duas testemunhas. 2. Cabe ao notário a complementação das formalidades extrínsecas, não podendo modificar os termos da declaração oral ou expressada na minuta. 3. Se a minuta não foi feita diretamente pelo testador nem por advogado, mas sim por tierdeiro ou beneficiário de legado, essa circunstância deve ser anotada pelo tabelião.

4.0 estrangeiro pode declarar o testamento público em seu Idioma, desde que acompanhado por intérprete de sua confiança, uma vez que o texto será vertido no idioma nacional. A leitura feita pelo notário do testamento em português deverá ser traduzida pelo intérprete, concomitantemente. § 5.865. C - Jurisprudência O STJ resiste a decretar a invalidade de testamento público, em razão de observância ou não de requisitos legais, tanto por revolver questão de fato, que sua Súmula n. 7 veda, quanto por respeito à manifestação de vontade do testador de livremente dispor acerca de seus bens (nesse sentido, STJ, REsp 753.261/SP, 3.^ T.,j. 23.11.2010, rei. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 05.04.2011).

§ 5.866. R E G R A S J U R T O I C A S Q U A N T O À S T E S T E M U N H A S 1. TESTEMUNHAS NO TESTAMENTO PÚBLICO. - São cinco as testemunhas (Código Civil, art. 1.632,1). Se só intervieram quatro, é nulo o testamento público; e responde o oficial público. Se mais de cinco, o excesso não prejudica: por êsse fato, não pode dizer-se nulo o testamento; é salutar, em vez de causa de invalidade, a superabundância euremática (F. LAURENT, Principes de Droit Civil français, 13, n. 254).

2. LÍNGUA NACIONAL E TESTEMUNHAS. - As testemunhas no testamento público precisam compreender a língua nacional, pôsto que não no-lo diga a lei: o Código Civil só se refere, no art. 1.649, ao testamento particular. Mas a própria regra jurídica do art. 1.649 supõe outra, geral, que ela, permitindo a língua estrangeira, ressalva: a do entendimento do falar do testador pelas testemunhas. No testamento cerrado, sim; porque, nesse, a língua em que se escreveu pode ser diferente daquela com que se entregou o testamento e se pediu a aprovação: o ato de entrega e o pedido é que as testemunhas devem ver, ouvir e compreender. 3. REQUISITOS DAS TESTEMUNHAS INSTRUMENTARIAS NO TESTAMENTO PÚBLICO. - As testemunhas precisam saber a língua nacional, - única

em que se lavra o testamento público no Brasil e nos consulados. Hão de estar durante todo o ato, desde as primeiras palavras do testador até a assinatura pelo oficial público, ato terminativo da solenidade euremática.

Em todo O caso, já falamos das circunstâncias que podem fazer, temporàrianiente, ausentarem-se as testemunhas, ou algumas, ou alguma, ou o próprio testador, ou o oficiar público. Aí, a interrupção temporal pode não ser interrupção jurídica. Analfabetos podem testar por testamento público, porém não podem, nêle, ser testemunhas: é indispensável que saibam ler e assinar. Tentou-se ressalvar o caso do que sabe assinar, porém não sabe ler, cissiparidade que o Código Civil conserva. Mas, aqui, a leitura tem por ñm verificar-se se o pensamento foi, fielmente, lançado. ¿ 0 que não sabe ler como poderia verificar? Dir-se-á que o analfabeto testa por forma pública: mas o testador é um, e serviu a forma para êle, com a assinatura por uma das testemunhas, a seu rôgo. Se testemunhas, buscam-se outras. O próprio fato de assinar, por êle, uma das testemunhas, mostra que a lei supõe gente que leia, escreva e assine. Em verdade (redargüirão), a lei apenas exige que saiba assinar: são testemunhas de um. fato ou á& fatos, e não do ato escrito. A lei não exige que elas leiam o que assinam; basta que ouçam a leitura pelo oficial público. Mas, ¿se o testador não sabe ler e assinar? Então, assinará uma das testemunhas. ¿Também essa poderia ser ignorante da escrita? Aqui, seria absurdo: nem testador, nem testemunha conferiram o que lá estava escrito. A conferência, não é preciso ter havido; mas que pudesse haver. Testamento a rogo, com testemunhas que, todas, não sabem ler, ¿que valor teria se não o da simples palavra do oficial público? Aqui, como a outros respeitos, o juiz sobriamente apreciaria as conseqüências, dir-se-á. Mas os perigos são sérios. É de repelir-se que se admita a ausência de testemunha, em todo o tempo, ou durante a lavratura do testamento, como pareceu à Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 30 de dezembro de 1943 {R. E, 98,123). Pode sair do lugar em que se está a ler, ou a lavrar o testamento, ou a assinar; mas tem de haver a suspensão, até que a testemunha volte. Tão-pouco é de admitir-se que não possa haver suspensão, sem que se intrometa outro ato (cp. 3." Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 13 de outubro de 1943, R. dos T., 149, 174).

Panorama atual pelos Atuallzadores § 5.866. A - Legislação Sobre as testemunhas do testamento público, ver os incs. II e III e o parágrafo único do art. 1.864 do CC/2002. § 5.866. B - Doutrina Na legislação atual, o número das testemunhas foi reduzido de cinco para duas. Podem ser mais de duas, mas não pode ser apenas uma. As testemunhas são necessárias apenas para a leitura do texto lavrado pelo notário, sendo dispensadas para a declaração oral ou escrita (minuta ou anotações) do testador, ou para a lavratura. Não há ordem fixa para a assinatura das testemunhas, se antes ou após o notário, pois a regra existente na legislação anterior não foi reproduzida no Código Civil de 2002, o que levava a nulidades por extremada reverência ao formalismo. Não há mais impedimento legal para que parentes possam ser aceitos como testemunhas no testamento público, até porque sua função é de ouvir a leitura do texto lavrado e confirmar que tal procedimento foi obedecido, quando apõem suas assinaturas, sem interferência no conteúdo. § 5.866. C - Jurisprudência Antes do advento do Código Civil de 2002, o STJ interpretava de modo estrito a exigência de que as testemunhas assistissem a todo o ato. Em caso em que algumas testemunhas não presenciaram a manifestação de vontade do testador, assinando posteriormente o testamento, decidiu pela procedência da ação de nulidade do testamento público (STJ, REsp 294.691/PR, j. 13.03.2001, rei. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 07.05.2001, p. 140).

§ 5.867. L E I T U R A E A S S I N A T U R A D O T E S T A M E N T O P Ú B L I C O

1. LEITURA PELO OHCIAL PÚBLICO. - O oficial público lê o testamento "na presença do testador e das testemunhas", ou lê-lo-á o testador, se o quiser, "na presença destas e do oficial" (Código Civil, art. 1.632, III). Por isso mesmo não basta dizer o oficial público que leu ao testador e às testemunhas: é preciso que diga "na presença do testador e das testemunhas^ pois a leitura deve ser a todos, simultáneamente. Mas, se o oficial público, depois de usar de frase insuficiente, acrescenta qualquer outra que

fixe a simultaneidade da leitura, vale o testamento. Exemplos: "e a todos esses atos, inclusive a leitura, estiveram sempre presentes, e no mesmo ato, testador e testemunhas", e "deixa a B o predio tal", "deixa a B a metade do prédio tal". 2. ASSINATURA DO ATO PÚBLICO PELO TESTADOR. - Quem só sabe escrever o seu nome, e nada mais, pode testar por ato público e assiná-lo, ainda que não saiba ler (F. RITGEN, em G. PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, V, 495; cp. J. RAUSNITZ, Das Reichsgesetz über die Angelegenheiten der freiwiligen Gerichtsbarkeit, 569). Pode assinar com a mão, ou outro meio que não tire a individualidade do ato (J. RAUSNITZ, Das Reichsgesetz über die Angelegenheiten der freiwiligen Gerichtsbarkeit, 569). A exigência da escritura constitui, como já ficou dito, exigência de dermografia.

O cego, que sabe assinar, deve lançar no testamento a sua assinatura. Porque o art. 1.637 do Código Civil cogita de outras formalidades, e não se dispensa a forma que pode ser observada. Dispensar, só se deve, onde a necessidade evidentemente o obriga, ou se os princípios superiores prementemente o aconselham. O testamento público fica perfeito com as assinaturas do testador, das testemunhas e do oficial público. Se, durante êle, morre o testador, que começou a assinar, porém não acabou, não existe o testamento. Se falece o oficial público, cuja assinatura começou, cumpre ao juiz maior indagação. a) Se após isso, e sem se poder fazer nôvo testamento (por exemplo, invasão de cidade, guerra civil, fuga por motivo de calamidade pública), o juiz encontra-se diante de ato escrito por oficial público (art. 1.632,1) e assinado pelo testador e pelas testemunhas (art. 1.632, IV) e só o último a assinar, começando, morreu. Dadas as circunstâncias extraordinárias, que imaginamos, seria absurdo formalismo deixar-se de atender à vontade do testador: êle e as testemunhas assinaram, o oficial público começou a assinar. b) Ainda se esse morrer antes de assinar, e suposto se verifiquem as circunstâncias no caso b), o fato de ter dado ao testador e às testemunhas o livro de notas, para que o assinem o testador e as testemunhas, firma a presunção de que achou bom o texto e uma vez que escreveu as declarações do art. 1.634, portadas por fé, a assinatura - se não se fêz por morte inesperada, ou bala que inutilizasse as mãos ou os movimentos - não poderá ter a importância que o formalismo estrito exigiria. O formalismo só se justifica se puder ser compensado, no caso de nufidade, pela responsabilidade do oficial.

Se a assinatura do testador foi quase tôda e a morte impediu que se completasse com uma sílaba, uma letra, um traço (e o mesmo diremos da assinatura de uma das testemunhas), anda acertado o oficial público que, não obstante isso, portar por fé terem sido cumpridas as formalidades e acrescentar o relato da morte, ou do acidente. No caso de acidente não mortal, durante o ato testamentário, o oficial público pode narrá-lo e dizer que, por isso, passa o ato a ser assinado pela testemunha, de acordo com o art. 1 . 6 3 3 . Por precaução, o oficial público assim procede no caso de assinatura começada. Claro que se há de supor acidente que impede assinar. 3. PROVA QUE FAZ O TESTAMENTO PÚBLICO. - O testamento que está nas notas tem fôrça probatória formal. Ainda que o testador ou outrem rasgue o exemplar que o oficial público lhe deu, o que lá está escñto é o testamento, e só se revoga por outro testamento (público, cerrado, particular, ou, dadas as circunstâncias, especial). Quanto aos fatos de que o oficial público tem üoikid^propriis sensibus, visus et auditus, faz prova plena. Por isso não faz prova plena quanto à capacidade do testador, que podia parecer de perfeito juízo e não no ser.

4. ESSENCIAL DO EUREMA. — No ato do testamento público, o oficial público diz o nome do testador, nomeia o ato de que se trata (mas o nome não é essencial), começando pela fórmula do estilo. "Saibam quantos...", declarando ano, mês e dia. Estado, cidade, vila, cartório ou casa, ou lugar em que se achem (tudo isso pode ser essencial), o oficial público, o testador e as testemunhas (essencial), presença, nome, identidade, nacionalidade (não é essencial), capacidade do testador (não é formal), presença e assistência em todo o ato e contexto, bem como identidade das cinco testemunhas capazes (essencial), as declarações e cautelas (facultativas) de idade, estado, regime de bens, profissão, existência de filhos e quantos e quais, as declarações de vontade propriamente ditas (matéria variável e facultativa), declaração do tabelião de que foi rogado para a escritura do testamento e de serem as disposições escritas o que ouviu ao testador (comêço da especificação de que se falou), reprodução do nome das cinco testemunhas presentes desde o princípio até o fim, declaração de que foi lido perante o testador e as cinco testemunhas, declaração de que também o testador o leu (facultativo isso), ressalva de emendas, rasuras, entrelinhas, riscos, borrões, e tudo mais que possa causar dúvida, declaração de ter o

testador achado conforme, declaração do motivo de não ser assinado pelo testador e quanto a quem o vai fazer a rôgo. O oficial público porta por fé que tudo isso é verdade. Assina o testador (ou quem, por êle, deva assinar). Depois, as testemunhas. Finalmente, o oficial público. O Código Civil deu a ordem para as assinaturas (art. 1.632, IV: "em seguida à leitura, seja o ato assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo oficial"). Mas vemos na prática assinar em primeiro lugar o oficial, o que constitui irregularidade e alguns doutrinadores não repararam na ordem legal (TITO PRATES DA FONSECA, Sucessão Testamentária, 272 e 275). Alguns oficiais públicos assinam, dão ao testador e às testemunhas para assinar e reassinam por fim. Assim, pois, só é essencial: a) ser escrito pelo oficial público no livro de notas, ditado ou declarado pelo testador, na presença das testemunhas, que devem permanecer, juntas e com o testador, até inteira feitura da cédula, assistindo (se, por exemplo, uma desmaiou e volveu, assistiu todo o tempo como exige o art. 1.632,11); b) ser lido pelo oficial público, na presença do testador e das testemunhas (ou pelo testador, se o quiser, na presença dessas e do oficial, ou no caso do artigo 1.636, l.'' parte, ou pelo oficial público e a testemunha do art. 1.637, ou pela pessoa designada de acordo com o artigo 1.635); c) ser assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo oficial público; d) ter a afirmação de fé pública. Escrita, conjunta presença de todos durante todo o tempo, leitura, assinaturas, e o porte por fé. O negócio jurídico do testamento é formal, posto que se ofereçam algumas formas normais e outras ditas extraordinárias, por dependerem de pressupostos circunstanciais. Êsse formalismo foi concebido e mantido porque os legisladores entenderam e entendem que se deve cercar do máximo de garantia, não só a faculdade de testar, como a de não testar, e se deve afastar os riscos das falsidades. O problema mais delicado é o do testador que foi ao tabelião, ditou o seu testamento, assinou-o, assistiu assinarem-no as testemunhas e, no momento de ser assinado pelo oficial público, êsse, tendo começado de assinar, morreu. Em tal caso, com a circunstância, a mais, de não poder o testador fazer outro testamento (invasão da cidade, fuga por motivo de calamidade pública etc.), escrevemos: "dadas as circunstâncias extraordinárias, que imaginamos, seria absurdo formalismo deixar de atender à vontade do testador; êle e as testemunhas assinaram, o oficial começou a assinar". Não só, o que bem mostra não sermos hostis a limitação ao

rigor formal: se, portadas por fé as declarações do art. 1.634 do Código Civil, assinaram o testamento o testador e as testemunhas, porém morreu o oficial in acta ou algumas balas lhe inutilizaram as mãos, faltando, pois, a assinatura do fecho, ainda admitimos que (salvo impugnações) se cumprisse tal testamento, cuja certidão, pelo oficial sucessor, teria de narrar o fato. É o máximo em que se pode anuir para se encontrarem limites ao rigor formalístico dos testamentos, no tocante à exigência da assinatura do oficial público no fecho da cédula testamentária. A explicitade do Código Civil, art. 1.632, IV ("...em seguida à leitura seja o auto assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo oficial público") teve por fito afastar qualquer interpretação que reputasse bastante a menção do nome do oficial (eu, R, oficial..."), ou a assinatura antes das assinaturas do testador e das testemunhas. A 2." Turma do Supremo Tribunal Federal, a 10 de janeiro de 1950, O D., 73, 145, e a 2 de outubro de 1951 (A. J., 101, 121), achou que basta a referência ao cumprimento de todas as formalidades. Não é de mister a especificação. No mesmo sentido, já o Supremo Tribunal Federal, a 17 de novembro de 1930 (i?, dos T., 126, 714: "Não são sacramentais os têrmos pelos quais se traduz a formalidade, bastando, para a satisfação da exigência legal, que do contexto da escritura se infira, concludentemente, a sua observância"; a 2." Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 27 de janeiro de 1947,171,755: "...quanto à formalidade da leitura, o que também se tem decidido em juízo contencioso é que não é necessário que conste do testamento por palavras sacramentais: se se vê que tudo foi feito numa assentada e que se achavam em cartório reunidos o testador e as cinco testemunhas, o que se deve subentender, até prova em contrário, é que a leitura a todos foi feita na forma do estilo"; a Turma Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, a 16 de setembro de 1949, R. E, 133, 198; a 2.' Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 21 de outubro de 1947, R. dos T., Ill, ISl: "especificadas, no corpo do instrumento as solenidades legais, não é preciso reproduzi-las no fecho do auto, ao prestar por fé que todas foram satisfeitas"; a 1." Câmara Civil, a 20 de outubro de 1941, 137, 584: "Basta a simples menção de todas as formalidades no corpo da escritura para a validade do testamento, pois não é sacramental a exigência do art. 1.634 do Código Civil"; antes, a 2 de junho de 1938,116,124; a5." Câmara Civil, a 25 de setembro de 1935, 108, 123).

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.867. A - Legislação Sobre a formalidade da leitura do testamento público, ver o art. 1.864, 11, do CC/2002. § 5.867. B - Doutrina 1. A leitura do testamento pelo notário, na presença do testador e das duas testemunhas, é formalidade essencial, para assegurar que o escrito seja fiel à vontade do testador, que pode solicitar as retificações que desejar. As testemunhas são necessárias apenas para esse momento, dispensando-se o conhecimento delas pelo testador. 2. O testamento não precisa ser escrito manualmente pelo notário, que pode utilizar-se de meios mecânicos ou até mesmo de inserções em formulários impressos, desde que todas as folhas sejam, após a leitura, subscritas pelo testador. 3. As assinaturas integram a formalidade essencial do testamento. Se houver a declaração do testador, a lavratura do testamento, a leitura, mas não houver a assinatura do testador, por qualquer razão, inclusive em virtude de morte superveniente, o testamento é inexistente. 4. Nesse trecho. Pontes de Miranda registra antiga decisão do STF (RE 2.906/ MG, l.^'T, j. 17.11.1938, rei. Carvalho Mourão, 126/714), que permanece atual, sobre não serem sacramentais os termos pelos quais se traduz a formalidade do testamento público. O formalismo cede à finalidade do testamento. § 5.867. C - Jurisprudência Não há nulidade no testamento elaborado em cartório sem a presença do testador, com base em minuta previamente elaborada por ele, e posteriormente assinado em sua residência, porque, considerando que o testador tinha mais de 85 anos, sua saúde justifica a mitigação de formalidade, conforme já decidido pelo STF (STJ, REsp 753.261/SP, 3.®T., j. 23.11.2010, rei. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 05.04.2011).

§ 5.868. ANALFABETO E QUEM NÃO PODE ASSINAR

1. Q U E M NÃO SABE ou NÃO PODE ASSINAR. - Lê-se no Código Civil, art. 1.633: "Se o testador não souber, ou não puder assinar, o oficial assim O declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e a seu rôgo uma das

testemunhas instrumentárias". A declaração é do oficial público, para que se justifique a assinatura pela testemunha. No direito anterior, interpretado por TEIXEIRA DE FREITAS {Consolidação das Leis Civis, art. 1.054, § 4 ) e CARLOS DE CARVALHO {Nova Consolidação das Leis Civis, art. 1.760, d), era a testemunha que o declarava. Com a intervenção da Câmara dos Deputados {Trabalhos, VI, 495), preferiu-se outro sistema, de modo que é inexata a informação de CLÓVIS BEVILÁQUA (VI, 88), de que aí se manteve o direito anterior. 2. ANALFABETO NO DIREITO ROMANO E NO DIREITO COMUM. -

No

direito romano, é de crer-se que também se lesse o testamento ao que não sabia ler {testamentum iudice oblatum). Pela afirmativa, - H . VULTEIUS, J. H. BOEHMER, M . G . WERNHER; pela negativa, — JOA. SCHILTER, A U G . DE LEYSER e J. H . DE BERGER. G . L . WINKLER publicou dissertação em que apoiava a opinião de SCHILTER. A jurisprudência do direito comum dividia-se entre as duas soluções, a da essencialidade e a da não-essencialidade da leitura. De qualquer modo, a controvérsia persistia: ora se invocava a facilitação do falsum, que a dispensa trazia, ora se alegava, firmemente, que se não devia modificar a regra com fundamentos em tais considerações. Aliás, neste último caso, contra a regra interpretativa dos textos romanos (MAGLIANUS, De iuris interpretationis ratione, 32-51; H . CocK, De argumento ad analogiam, 16-20, que A. F. J. THIBAUT, Über Testamente der Schriftunkundigen, Archiv für die civilistische Praxis, VI, 31, trouxe à balha). Em verdade (digamos hoje) era mais questão de interpretação extensiva, revelação do conteúdo de regra jurídica, do que passagem de um caso a outro, ou analogia: o caso subsumia-se no princípio que mandava ler para o cego. A regra jurídica unius positio alterius est exclusio não podia ser invocada na espécie (J. G. VAN NES, De natura et vi argumenti a contrario petiti, 2 s., e H. CoCK, De argumento ad analogiam, 33-36) 3. ANALFABETO NO DIREITO ALEMÃO, NO AUSTRÍACO E NO SUÍÇO. - O

Código Civil alemão só permite ao analfabeto a forma pública. Ao testamento escrito pelo testador, § 2.231, 2, faz-se mister escrita própria e assinatura. Não se admitem sinais ou marcas, se bem que, ao lado da assinatura hológrafa, noutros atos se permitam as marcas feitas a mão, legalizadas perante o juiz, ou perante o notário (§ 126). No Código Civil austríaco, § 581, permitia-se o testamento do analfabeto perante três testemunhas, lido por uma delas, declarando estar de

acordo com o que dispôs. O que escreveu podia ser uma delas. Mas houve críticas e, por proposição de JOSEPH UNGER, corrigiu-se, a 1 de janeiro de 1917, de modo que, não sabendo ler o testador, não pode ser encarregado da leitui-a o que redigiu a cédula (Novela m , art. 56). direito suíço permitiu ao analfabeto o assinar de cruz (EUGÈNE CURTI-FORRER, Commentaire du Code Civil suisse, 3 9 5 ) . O que não se admite é a assinatura a rôgo. Se não lê, nem assina, o oficial público tem de ler em presença das testemunhas o que está escrito, declarando o testador se está ou não consoante a sua vontade (art. 502). O

4 . NATUREZA DO TESTAMENTO NO CÓDIGO CIVIL, ART. 1.633. - Na verdade, a cédula do art. 1.633 do Código Civil é testamentum nuncupativum, in scriptumm redactum. Tudo se confia ao oficial público e às testemunhas: nenhum sinal de si deixa o testador. Quer se trate de analfabeto, quer de não analfabeto, que não sabe ou não pode assinar. Daí os perigos, como perigoso é o art. 1.637, da mesma natureza. A leitura, que é requisito essencial ordinário (art. 1.632, m), cresce aqui de importância. É do caráter das coisas essenciais serem igualmente essenciais; porém indício contra a leitura de testamentos dos arts. 1.633 e 1.637 tem maior gravidade do que em relação a testamentos assinados. A essencialidade ad solennitatem não difere; mas cresce de ponto, adprobationem, a delicadeza da dúvida quanto a testamentos não assinados.

O analfabeto só tem de assinar se realmente pode assinar. O que precisa de mão de outrem não assina: não no faz sua mano, mas por mão de outrem. É também dispensado se nem sequer faz letras, mas traços que não são letras: seria assinatura per notas, ou per cruces, que o direito brasileiro não admite. Cp. R C. WIESEN (Dissertatio de subscriptione íestatoris analphabetí per cruces, 3 s.) e J. C. ROTH {Dissertatio de subscriptione testatoris per notas, 3 e 10 s.). Sempre que alguém assina, pelo testador, assina o próprio nome, e não o do testador. Assim no testamento público ou no cerrado. Mas, sem razão, não era assim tão claro para F. C . GESTERDING. J. CUJÁCIO, HUGO DONELO, B . BARDILI, SAMUEL STRYK, C . M A N Z e LUDF. GFR.

representaram a boa doutrina, que é também a do direito brasileiro. Quem assina a rôgo de outrem, assina o próprio nome. É testemunha especial (E. SALMASIUS, De subscribendis et signandis testamentis, 221) e gestor de ato alheio.

MADIHN

Surge uma questão: ¿pode assinar a rôgo do testador, em vez de testemunha instrumentaria, outra pessoa, como se dá na espécie do art. 1.636? No Código Civil, art. 1.633, satisfez-se a lei com o assinar, a rogo, uma das testemunhas. Com isso, dispensou-se o octavus subscriptor da L. 21, § l,C., de testamentis: quemadmodum testamenta ordinantur, 6,23, onde se dizia: "Quod si litteras testador ignoret vel subscribere nequeat, octavo subscriptore pro eo adhibito eadem servari decernimus". Dispensou. Portanto, resolvida está a questão, similar da que se discute quanto ao art. 1.637. Trata-se de fonnalidade a mais, de abundância de cautela, e o princípio assente é o de não invalidar o que satisfez mais do que a lei exigia. 5. LEITURA DO TESTAMENTO AO ANALFABETO. - A lei brasileira não exige que se leia duas vêzes, como ao cego, o testamento. Basta a leitura ordinária, pelo oficial público. Aliás, tal já era a velha lição (cp. M. D. GROLMANN, Commentatio de necessaria ultimaram voluntatum praelectione, c. II, § 9, m , § 2; J. M. SEUTER, Dissertatio de testamento analphabeti, §§11 s.). Porém, se isso foi resolvido e constitui simplificação, não se dispensou, em qualquer espécie que não seja a do art. 1.636, a formalidade da leitura pelo oficial público. Em todo o caso, se a pessoa não é surda, nem analfabeta, porém não pode assinar (art. 1.633), é permitida a alternativa do art. 1.632, III. Tal solução, resultante dos textos do Código Civil, confere com a opinião que nos davam os tratadistas (B. CARPZOV, lurisprudentiaforensis, I, n. 8; J. H. DE BERGER, Oeconomia iuris, 369; J. M. SEUTER, Dissertatio de testamento analphabeti, §§ 8-10). 6. TESTADOR QUE NÃO SABE OU NÃO PODE ASSINAR. - A lei não cogita só de quem não sabe ler: refere-se, também, ao que não sabe ou não pode assinar. Êsse, já se disse, pode ler, êle mesmo, o testamento, e dá-lo a uma testemunha, que a rôgo o assine. A questão que poderia surgir — a da indispensabilidade da leitura pelo oficial público — fica resolvida pela ordinariedade do art. 1.632, III, e a omissão da lei, contrariamente ao que se passa no art. 1.637. O cego, que pode e sabe assinar, também deve fazê-lo. Bem assim, o surdo. O art. 1.633 é regra jurídica de exceção para todos os casos em que o testador não saiba ou não possa assinar. 7 . TESTEMUNHA NO TESTAMENTO PREVISTO PELO CÓDIGO CIVIL, ART.

1.633. - Assim como a testemunha do Código Civil, art. 1.637, a do art.

1.633 precisa saber ler. A interpretação dominante que só exige às testemunhas instrumentárias saber assinar não pode ir até o ponto de permitir que uma delas, a escolhida para assinar pelo testador, não saiba ler. No artigo 1 . 6 3 7 , é isto exigência expressa. Também outrem há de ler, se o testador é surdo e não sabe ler (art. 1 . 6 3 6 ) . No art. 1 . 6 3 2 , HI, não se exige que o testador leia, mas deixa-se-lhe a faculdade. No caso de ser surdo, não sabendo ler, terá de assinar quem o leia (art. 1 . 6 3 6 ) . Em se tratando de cego, lê-lo-á o oficial público, porém isto não basta: terá de lê-lo uma das testemunhas, designadas pelo testador. Em nenhum caso, a lei permitiu que a conferência entre o lido e o escrito ficasse somente a cargo do oficial público. Deve-se, pois, afastar a possibilidade de testamento de analfabeto perante testemunhas analfabetas que assinam: somente poderiam testemunhar leitura, e a leitura por outrem pode não ter sido o igual do que se lançou nas notas. Aliás, tal era a boa doutrina. As outras testemunhas podem não ter prestado atenção ao que dizia o testador: foram rogadas, assistiram, assinaram. Mas a que assina vai dizer, pelo testador analfabeto ou cego, que aquele é o testamento que o testador quer: se cego o testador, terá o oficial público e uma das testemunhas de lê-lo, e isso garante, de algum modo, a identidade do texto; analfabeto, pode dar-se substituição de página, ou leitura diferente pelo oficial público. A lei era omissa no sistema jurídico romano (CHR. FR. VON GLÜCK, 3 4 , 5 3 ) . No art. 1.650, IV, do Código Civil, veda-se ao herdeiro instituído, seus ascendentes, descendentes, irmãos e cônjuge, ser testemunha no testamento. No art. 1.633, diz-se que, se o testador não sabe, ou não pode assinar, o oficial tem de declarar o que se passa, e uma das testemunhas instrumentárias assma, a rogo, por êle. Suscitou-se a questão de se outrem, em vez das testemunhas instrumentárias, pode assinar; e a solução foi no sentido do que escrevemos, conforme explícita citação. O que é preciso, evidentemente, é que tenha assistido a todo o ato. Não se precisa dizer que tal ocorreu, pois basta que resulte do texto e do que dêle se deduz. Na opinião de ITABAIANA DE OLIVEIRA {Direito das Sucessões, 2.^ ed., 236), a pessoa que assina a rôgo tem de ser uma das testemunhas. Mas fomos contra tal interpretação do art. 1.633. O relator do Recurso Extraordinário n. 9.913, a 3 de janeiro de 1950 {D. da J. de 25 de novembro de 1951), Ministro OROSIMBO NONATO, expôs: "Tenho como preferível o ensino de PONTES DE MIRANDA: "No Código Civil, art. 1.633, satisfez-se a lei com o assinar, a rogo, uma das testemunhas. Com isso, dispensou-se o octavus subscriptor da L. 21, § 1, C., 6,23, onde se dizia: "Quod si litteras testator

ignoret vel subscribere nequeat, octavo subscriptore pro eo adhibito eadem servar! decernimus". Dispensou. Portanto, resolvida está a questão, similar da que se discutirá sob o art. 1.637. Tratar-se-ia de formalidade a mais, de abundância de cautela, e o princípio assente é ode não invalidar o que satisfez mais do que a lei exigia" E acrescentou: "Assim, não vulnera o direito o considerar que pode assinar a rôgo do testador testemunha extranumerária e que a vedação do n. IV do art. 1.650 (que defende possa ser testemunha no testamento o herdeiro instituído ou ser parente propínquo ou cônjuge) diz respeito às testemunhas numerárias". Quanto à pessoa que há de assinar a rogo, o Código Civil, art. 1.633, exige que seja uma das testemunhas instrumentárías. Portanto, têm de ser satisfeitos os pressupostos para ser testemunha em testamento (absolutamente sem razão, a 2." Turma do Supremo Tribunal Federal, a 3 de janeiro de 1950, R. E, 132,119). O testamento pode ter mais de cinco testemunhas e qualquer delas pode, a rôgo do testador, assinar; porém de modo nenhum se há de admitir que possa assinar a rôgo quem não foi testemunha, ou não podia ser (certa, a 4." Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 3 de agosto de 1944, R. dos T., 152, 645; sem razão, a 3." Câmara Civil, a 1.° de março de 1943, 146, 128, e a 4." Câmara Civil, a 12 de setembro de 1940,133,158). Quem esteve presente, como se exige às testemunhas, testemunhou, e pode assinar a rogo, de modo que a jurisprudência que pretenda dispensar o testemunho, embora fora do número cinco das testemunhas, fere, frontalmente, o art. 1.633, verbis "uma das testemunhas instrumentarias". - De regra, a testemunha que assina pelo testador diz antes de assinar "a rôgo de F" ou "a rôgo do testador". Resta saber-se se a omissão disso causa nuhdade do testamento. Não, se no contexto da cédula se especificou o motivo de outrem assinar e foi dito quem o faria. Não é verdade que baste declarar que uma das testemunhas o assinará por não saber assinar o testador. Donde as seguintes conseqüências: a) Se o testador está no caso do Código Civil, art. 1.633, e o oficial público apenas diz que uma das testemunhas, por êsse motivo, por êle assinará, sem mencionar qual delas, e todas assinam sem a declaração "a rôgo", nulo é o testamento, e responde o oficial público, b) Se o oficial púbüco diz que uma das testemunhas assinará pelo testador, mencionando o nome dela, sem dizer por que motivo assina a rogo, dá-se o mesmo que no caso anterior: nulidade 8. DECLARAÇÃO DE ASSINAR A RÔGO DO TESTADOR.

do testamento, responsabilidade do oficial público. Salvo motivo notorio {e.g., "João cego"), c) Se o oficial público declara quem assina e o motivo por que o faz e tudo se observa, mas, por inadvertência, a declaração "a rogo" aparece junto a nome de outra testemunha (sem anteceder ou pospor-se ao nome da que devia assinar a rogo), há nulidade por defeito de forma e responsabilidade do oficial público, d) Se o oficial público diz que uma das testemunhas (sem individuá-la) assinará a rogo, por não saber assinar o testador, e uma delas, a primeira, a última, ou qualquer das outras, ao assinar, declara que o faz a rôgo do testador, procedendo à individualização que o oficial público omitira, ¿vale o testamento? Surgem questões. Não se pode dizer que o oficial público deixou de especificar as formalidades, mas uma vez que êle assina depois das testemunhas, tal posterioridade da firma não basta à individualização. Seria atribuir-se à assinatura do oficial público valor de dar fé pública ao que está antes dela, e dispensar, quanto à parte do conteúdo, o porte por fé em declaração expressa. Não se encontra discutida a questão, mas é de grande proveito distinguir-se: a) se o oficial, ao enumerar as testemunhas (art. 1.632,1), o que se faz no princípio da cédula, dá-lhes ordem que se observa em todo o contexto, e no fim, ao dizer quem assina pelo testador, declara que a primeira assinará a rôgo, e essa realmente é a primeira a assinar, seria demasiado formalismo querer-se pôr em dúvida a validade; b) se a assinatura, que aparece em primeiro lugar, não coincide com o nome da primeira enumerada, é nulo, e responde o oficial público. Aliter, se a declaração aparece junto a nome que coincida com o da primeira, porque então se há de entender que o oficial público se referia à primeira enumerada, e não à primeira que ia assinar. Não é idêntica a discordância anterior a essa, porque, aqui, o oficial público tinha a enumeração feita, de que usou e portou por fé, ao passo que, ali, havia enumeração, de que não usou, e a ordem das assinaturas, discordando da enumeração, desmente o texto, que êle portou por fé.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.868. A - Legislação Sobre o testamento de analfabeto ou de quem não pode assiná-lo, ver o art. 1.865 do CC/2002.

§ 5.868. B - Doutrina Tem-se a assinatura a rogo do testador em uma de duas hipóteses: quando for analfabeto ou quando alguma circunstância o impeça de assinar, como fratura do braço ou mão. Neniiuma das duas caracteriza incapacidade relativa (art. 4.° do CC/2002). Apenas uma das duas testemunhas pode assinar pelo testador, a seu pedido ou rogo, sendo vedado que terceiro o faça. O Código Civil de 2002 alude a testemunhas "instrumentárias", mas estas apenas se restringem à leitura do texto lavrado pelo notário. Na hipótese do analfabeto, a leitura do testamento assume relevância especial, pois a testemunha que ouviu a leitura é a mais qualificada para tal. Não há mais o impedimento, expressamente constante da lei anterior, de serem testemunhas e, portanto, assinantes do testamento, os ascendentes, descentes, cônjuge e irmãos do testador. § 5.868. C - Jurisprudência Dentro da tendência de máximo aproveitamento do testamento, evitando-se a nulidade, decidiu o STJ que a declaração do notário de que o testador não sabia ler, ainda que fosse capaz de "copiar" seu nome, não tornava nulo o testamento (STJ, REsp 6.648/SP, 3.®T, j. 19.03.1991, rei. Cláudio Santos, DJ 22.04.1991, p.4784).

§ 5.869. FORMALIDADES E PORTE POR FÉ

1. EXIGÊNCIAS FORMALÍSTICAS E MENÇÃO EXIGIDA. - Diz-se no Código Civil, art. 1.634: "O oficial público, especificando cada uma dessas formalidades, portará por fé, no testamento, haverem sido todas observadas". E seu parágrafo único: "Se faltar, ou não se mencionar alguma delas, será nulo o testamento, respondendo o oficial público civil e criminalmente". Tudo que no art. 1.632 se exigiu é insuprível e toma a cédula negócio jurídico formal: se alguma exigência não se satisfez, não vale o testamento. Pode o testamento exprimir a vontade do testador, mas, por defeito de forma, ser nulo. O fito da lei é proteger a vontade do testador; e não o testamento. Por isso, dá ação contra o oficial público, por faltar formalidade, ou não se mencionar alguma delas: a cédula nula representa a voiítade do testador somente para o efeito de dar aos contemplados a ação civil contra o oficial público. Assim, sempre que há testamento perante oficial público (isto é se esíá fora de dúvida que o oficial público funcionou) ou o testamento

vale e se cumpre, ou não vale, e o oficial público responde, civilmente, quanto aos prejuízos causados aos herdeiros instituídos, legatários e mais beneficiados. Pode dar-se que o testamento nulo seja revogação parcial ou total, diminua encargos, ou deixe de clausular legítima, e ainda nessa espécie responde o oficial público, pelos danos que se liquidarem. Há a alternativa, se houve nuüdade por infração de regra jurídica sobre forma: ou se cumpre; ou não se cumpre, e responde o oficial público. Admitido, pela lei, êsse critério compensatório, segundo o qual o fato de ter a vontade sido expressa, mas nulamente, por defeito de forma, implica a responsabilidade do oficial público, compreende-se que o juiz seja mais exigente no formalismo do testamento público do que, no tocante ao testamento cerrado, na parte de ato do testador, e no testamento particular. Nulo o particular, nenhuma responsabihdade simétrica e compensante se teria: quis, mas & forma inutilizou o querer. Dir-se-á o mesmo do testamento cerrado, na parte oculta ou exclusiva do testador. Na ação, se se propõe, para a. responsabilidade do oficial público, o próprio testamento diz o quanto ou serve de base para a fixação, quando dos seus têrmos não fôr expressa a quantidade em que consiste a herança, o legado ou o benefício. O oficial público responde como se fôra cumprido o testamento. Portanto, mais os frutos e rendimentos, os acidentes, as duplicações de ações ou aumentos por quotas dos fundos de reserva, menos as despesas, que teriam sido feitas, para a execução do testamento e para o inventário. O próprio testamenteiro, que tinha legado remuneratório, ou a que se fixava ou não se fixava prêmio, tem direito a reclamar do oficial público o que deixou de ganhar. Na ação contra o oficial público, deve ser citado o testamenteiro, porque, eventualmente, se houver dúvida quanto a verbas testamentárias, terá de pronunciar-se. Aliás, o testamenteiro terá de exercer na ação as suas eventuais funções. Se, pela legislação local, a ação corre fora do juízo de testamentos e surge discordância quanto à interpretação das cláusulas ou disposições testamentárias, o juiz não fica autorizado a interpretá-las. O oficial púbUco responde como se tivessem cumprido o testamento. E só o juízo dos testamentos pode decidir em assunto de vontade do testador: interpretada a verba no juízo de testamentos, junta-se a certidão aos autos do juízo

da ação de indenização. Ou êsse, a requerimento dos interessados, ou do Curador, que deve ser ouvido na ação civil, oficia àquele para que dê a interpretação. No juízo dos testamentos, há os mesmos recursos que existiriam se válido o testamento. 2. ESPECIFICAÇÃO DAS FORMALIDADES. - Não basta que o oficial público declare terem sido cumpridas, integralmente, todas as formalidades legais, isto è, as formalidades do Código Civil, arts. 1.532 e 1.533. É de mister mencioná-las uma por uma, de modo expresso, terminando pela declaração global. Há, pois, no art. 1.643 duas partes: uma, que é a da especificação das formalidades ou requisitos essenciais (nos casos ordinários, os do art. 1.532; sendo analfabeto o testador, aqueles e os do art. 1.633; se inteiramente' surdo, aquêles e o do artigo 1.636; sendo cego, aquêles e os do art. 1.637); outra, que consiste no portar por fé terem sido observadas tôdas as formalidades. Se o oficial público porta por fé, sem as especificar, é nulo o testamento e responde civil e criminalmente o oficial público. Se as especifica, esquecendo-se de portar por fé a observância, também nulo será, e tem de responder. Não escusa o oficial público o fato de constar do próprio testamento o requisito, se bem que o não mencione. Assim, se do texto escrito pelo oficial público, não consta que o testador assinou, mas está, efetivamente, assinado pelo testador, o testamento, nem vale êsse, nem se exime da responsabilidade o oficial público que deixou de mencionar. Se o oficial público não se refere a leitura do testamento, não pode ter cumpra-se (3." Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 7 de março de 1945, R. dos T., 159, 713; 5.^ Câmara Civil, 15 de fevereiro de 1940, 126, 559: "Não se deduz da declaração de que "foram cumpridas todas as formalidades legais" que o testamento em questão tivesse sido lido, sem expressa menção dessa circunstância, indispensável para a sua validade"). - Primeira leitura do art. 1 . 6 3 4 , parágrafo único, do Código Civil pode dar a entender que só é responsável o oficial público se algo falta ao texto, ou não se menciona alguma das formalidades ou requisitos essenciais, que acima se enumeraram. Se declarada a nulidade por haver discordância entre o que o oficial publico leu e o que consta da cédula, ou entre o que as pessoas dos arts. 1-636 e 1.637 leram e o que consta do livro, ou, ainda, firmada qualquer 3. RESPONSABILIDADE DO OFICIAL.

co-autoria ou cumplicidade do oficial público, responde ele civil e criminalmente. Tudo que êle portou por fé pública, se não coixesponde aos fatos, toma-o responsável nos dois juízos. Se os herdeiros legítimos acordarem na execução do testamento, nenhuma responsabilidade civil cabe ao oficial público. Porém o processo criminal pode ser instaurado. Se o testador fêz, depois, outro testamento, o ato anterior é nenhum, porém o simples fato de constar do livro de notas testamento sem formalidades devidas, de que poderiam ter resultado conseqüências lesivas, sujeita o oficial público às correições e às penas disciplinares. Resta saber se, em todos os casos de nulidade devida ao oficial público, podem os herdeiros legítimos cumprir o testamento. JOSÉ D I A S FERREIRA {Código Civil português anotado, IV, 295) nenhuma distinção fêz. Para êle, executado, sem oposição dos herdeiros legítimos, o testamento, sanada estaria a nulidade. Porém êle mesmo, referindo-se ao testador, escreveu que não poderia ratificar ou confirmar o testamento nulo. Dá-se aos herdeiros maior poder do que ao testador. De ato nulo querem-se conseqüências da importância jurídica das fundações, das substituições e dos fideicomissos. Não é possível que prevaleça tal critério apriorístico. Impõem-se as distinções: a) Se a nulidade formal é de tal natureza que deixe em dúvida a identidade do falecido testador, seria exigir do juiz cumprir ato talvez criminoso, no qual (dificilmente, é certo), podem ser interessados os próprios herdeiros legítimos, b) Se, na execução dos testamentos, ficam prejudicados terceiros que não sejam herdeiros legítimos (por exemplo, cláusula contratual de sociedade, em que há alternativa concernente à disposição de última vontade), sem a audiência deles não se poderia cumprir. Rigorosamente, a linha divisória entre o testamento nulo, cumprível por vontade dos herdeiros legítimos e, em geral, interessados na não-execução, e o testamento nulo, que tais interessados não podem cumprir, só ao juiz, apreciadas as circunstâncias, será dado decidir. Toca diretamente à dignidade da justiça, e qualquer regra abstrata teria de ceder diante da livre e direta verificação dos fatos. Pode bem ser que queiram encobrir um crime. Talvez, no ato mesmo dos herdeiros legítimos, um seja beneficiado e coaja os outros. Juridicamente, tal execução do nulo não é execução testamentária, mas ato jurídico dos interessados, por têrmo nos autos, com processo similar ao testamento, e toma o caráter inicial e a figura jurídica bordada pelos fatos:

OU será transação com os instituídos, ou desistência, ou renúncia, e terão de ser ressalvados os direitos dos credores. Só obriga aos que intervieram. Não se sanou a nulidade, porque era insanável: o que se tem diante dos olhos é ato de indenização. Um testamento nulo não deve, nem pode ratificar-se, ou confirmar-se por interessados. Quanto à confirmação tácita e à execução voluntária do testamento, só aparentemente o processo é testamentário. Mas, nessa aparência, nesse mandar que seja eficaz o que, para o direito, não vale, nesse trocar a inexistência de direito sucessório pela existência de ato entre vivos, que finja aquêle, em tudo se há de respeitar o fingido. Salvo se, na execução voluntária, os herdeiros legítimos (ou os contemplados no testamento anterior válido) incluíram restrições que não destoam da dignidade dos atos perante o juiz. 4 . AÇÕES DOS LESADOS PELA NULIDADE DO TESTAMENTO. - O s h e r -

deiros e legatários, os beneficiados pelo modus, o fiduciário, o nu-proprietário, ou o usufrutuário, desde logo devem receber as deixas. Nenhuma dúvida existe quanto à ação que podem exercer. Os fideicomissários, se bem que só depois recebam a propriedade, são herdeiros do decujo, e não do fiduciário. Podem exercer a ação, desde já, contra o oficial público, independentes do fiduciário. Ação, que lhes cabe, nasce do testamento, o não de quaisquer outras situações jurídicas. A mesma solução vale para os casos de extravio ou destruição dos testamentos, pela qual tenha alguém de responder. Os credores do herdeiro instituído podem ser autores contra o oficial público se o herdeiro não promove a ação (arg. ao art. 1.586).

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.869. B - Doutrina A regra do art. 1.634 do CC/1916, de exagerado formalismo, comentada por Pontes de Miranda nesse treclio, não foi reproduzida no Código Civil de 2002. Assim, é dispensável que o notário especifique as formalidades que foram observadas e as porte por fé. Em boa hora excluiu-se essa velharia tautológica.

§ 5.870. DECLARAÇÕES DE VIVA VOZ E EXAÇÃO DA LAVRATURA

1. APTIDÃO PELA FALA. - Diz o Código Civil, art. 1.635: "Considera-se habilitado a testar públicamente aquêle, que puder fazer de viva voz as suas declarações, e verificar, pela sua leitura, haverem sido fielmente exaradas". O Projeto primitivo, art. 1.806, dizia: "Todo aquêle que puder fazer as suas declarações de viva voz e verificar pela leitura que elas foram fielmente transladadas, está habilitado a testar públicamente". Rigorosamente, a fonte foi o Projeto primitivo. Mas o art. 1.635 do Código Civil compõe-se de uma parte útil, que vai da primeira palavra até a exigência de "fazer de viva voz as suas declarações", e outra inútil, que é o final, pois vai ser destruído, em parte, pelo art. 1.636. Em boa técnica, o que era preciso não se fêz: a regra jurídica prática, inteligente, sobre a mudez. O surdo teve o seu (art. 1.635). O cego (art. 1.637) e os surdos-mudos (art. 1.642) também o tiveram. O analfabeto, como espécie do que não sabe ou não pode assinar, foi contemplado no art. 1.633. Do mudo nada se disse. 2. INCAPACIDADE DE FALAR, DE VER E DE OUVIR. - Exige o Código Civil, no testamento público, que o testador dite ou declare o que quer (art. 1.632,1), ouça a leitora que lhe fará o oficial (art. 1.632, UI). Donde quatro dificuldades: a) a surdo-mudez, que impediria o uso do testamento plíblico: não pode ler alto, nem pode ouvir (opinião de CLÓVIS BEVILÁQUA, Código Civil comentado, VI, 90, que se chocou, de legeferenda, com o art. 1.636); b) a mudez, que permite ouvir e permitiria a entrega de minuta ao oficial público, sem qualquer inconveniente, mas o art. 1.635 toma assaz duvidosa a valia, por não poder fazer, "de viva voz", as declarações; c) a surdez, sem mudez, - caso em que lera de viva voz o que ditou e, se o não souber, designará quem o leia às testemunhas; d) cegueira, caso, que obriga a duas leituras, uma pelo oficial público, e outra por uma das testemunhas que o testador designe. O analfabeto pode ditar e ouvir o que ditou. Portanto, pode testar públicamente. O surdo-mudo só é incapaz de testar no mesmo caso em que o siirdo-mudo seria incapaz para qualquer outro ato jurídico: se não pode exprimir-se (Código Civil, arts. 5.°, m , e 1.627, IV). Portanto, o que pode exprimir-se, ainda que não fale, nem ouça, pode testar Mas o Código Civil, por defeito de técnica, deixou sem uso da forma o mudo não surdo que não sabe ler e o mudo cego. Conforme adiante se diz, a doutrina deve procurar solução para tais casos. Se é certo ser de ordem púbüca o direito das formas testamentárias, não é menos que as regras jurídicas sobre incapacidade

se inteipretam restritamente. E nem o mudo cego, nem o surdo analfabeto foram declarados incapazes no art. 1.627, que tratou das incapacidades de testamentifação. Ao mudo, a lei francesa permite testar com a forma secreta, se sabe escrever (art. 979): escrito, datado, assinado pelo testador, - exigências evidentemente exageradas. A lei alemã estatui longamente sobre o assunto. Aquêle que, segundo a convicção do juiz ou do notário, é mudo, ou de qualquer maneira não pode falar, somente pela entrega de um escrito pode fazer o seu testamento. Durante o processo, escreve no próprio protocolo, ou em folha separada que se lhe junte, a declaração de que o escrito contém as suas últimas vontades (§ 2.243, alínea 1.^). O protocolo dirá que a declaração é hológrafa e está convicto o juiz ou o notário de não poder falar o testador (§ 2.243, alínea 2.% No Código Civil alemão não há regra jurídica sôbre os surdos e o modo de testar. Duvidosa a capacidade, nos Motive (V, 275). Sem importância a omissão, porque, perante o juiz ou notário, basta entregar a minuta (§ 2.242, alínea 1.", parte). Em todo o caso, F. E N D E M A N N (Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, I H , § 35, C) e GEORG FROMMHOLD (Das Erbrecht, 3 ¿ ao § 2.229), negam ao surdo-mudo a forma pública, porque não pode ouvir a leitura do protocolo. Mas, era geral, a opinião é contrária (E. STROHAL, Das deutsche Erbrecht, § 21, nota 40; F. RITGEN, em G . PLANCK, Biirgerliches Gesetzbuch, V, 462; J. BÕHM, Das Erbrecht des BGB., 80; H. JASTROW, Formularbuch und Notariatsrecht, I, 173 e 178; GUSTAV MARKER, Die Nachlassbehandlung, 100; GERHARD EICHHORN, Das Testament, 123). E com razão. Quanto ao surdo-mudo, também nenhuma disposição especial. Ou êle sabe e pode escrever, e testa por testamento de mão própria, ou, embora surdo, pela entrega de minuta, como o mudo, § 2.243 (J. B Õ H M , Das Erbrecht des BGB., 80). GEORG FROMMHOLD {Das, Erbrecht, 3 bao § 2.229) repugnou tal extensão do testamento do mudo ao surdo. Mas a verdade é que pode saber ler a língua comum e então pode ler o que foi escrito no testamento púbhco: é a aceitação do protocolo, ¿Por que, então, lhe negar o testamento por ato púbHco? ( R . WILKE, Erbrecht, 2 ao § 2.243; A . JASTROW, Formularbuch und Notariatsrecht, I, 53, 180; R RITGEN, em G. PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, V, 462). ^ ¿Qual a solução, se o surdo-mudo aprendeu a hngua fónica especial? E o caso de admitir-lhe o testamento público, na Alemanha, com o auxflio, para o notário, de um professor; ou o testamento cerrado, no Brasil, se sabe

1er e escrever. Contra, F. ENDEMANN (Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, IH, § 35,270), porque, disse, continua surdo, e o mudo não testa por ato público. No direito anterior podia testar por linguagem de sinais (J. C. GENSLER, Das Testament einer taubgebomen und sprachlosen Person, Archivfür die civilistische Praxis, III, 345), o que hoje se nega. Mas, ¿se êle, mudo, usa sinais'e pode ouvir? Aí, há questão (cp. F. ENDEMANN, Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, IO, 270), que não é de somenos importância. A nossa opinião seria, no direito alemão, pela afirmativa. O direito suíço é mais prudente. O disponente indica a sua vontade. A indicação pode ser escrita, oral, por sinais (A. ESCHER, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, HL, 8 2 ; E U G È N E CURTI-FORRER, Commentaire du Code Civil suisse, 3 9 5 ) , quer escrita de cegos, quer de surdos-mudos. "Mitteilung" é expressão neutra: oral, ou gráficamente. Assaz liberal o formalismo suíço. Se o testador, respondendo, faz sinais inconfundíveis, como a aprovação de cabeça, ou monossilábica, vale a declaração perante o oficial público (P. T Ü O R , Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, IQ, 305), de modo que o mudo testa, por ato público, respondendo com gestos, ou dizeres escritos. No Código Civil alemão, o que não pode falar, nem por outra maneira exprimir-se, somente por escrito pode testar. No § 2.243 permite-se-lhe entregar ao juiz a declaração gráfica. É inadmissível testar por sinais, ou por intérpretes {Motive, V, 251; 276, cp., no direito anterior, E. MEISCHEIDER, Die letztwiligen Verfügungen nach dem BGB., 40, nota 10). Não se aplicam aos testamentos as regras jurídicas sôbre os intérpretes de surdos-mudos. Donde não poderem testar as pessoas que são menores e mudas (os menores só testam oralmente perante o juiz ou notário, § 2.238, alínea 2."), e os mudos que não sabem ler (§ 2.247) ou escrever (§ 2.243). É defeito técnico de que se livrou o Código Civil suíço. Aliás, as regras jurídicas de forma são interpretáveis, como antes deixamos assente, e a doutrina faz bem em preencher tão graves lacunas da lei escrita. - No direito brasileiro, o mudo não pode testar por ato público: o Código Civil, art. 1 . 6 3 6 , que abriu exceção em favor do surdo, riscando o segundo requisito do testamento em notas do tabelião, o ouvir a leitura, satisfazendo-se com o primeiro, declarações de viva voz, - não admitiu se riscasse, excepcionalmente, êsse, satisfazendo-se com aquêle. 3 . M U D E Z , IMPOSSIBILIDADE DE FALAR E TESTAMENTO.

A exceção do art. 1.636 é justificável sem a outra, menos perigosa: o mudo, que soubesse escrever, daria, escritas, as declarações, e ouviria a leitura. Se sabe escrever, testa hologràficamente, porquanto, se é certo que o testamento particular precisa ser lido às testemunhas, é o mesmo lerem-na todas as cinco, que vão assinar (art. 1.645, IH). Recorrerá, se quiser, ao testamento cerrado. Mas surgem questões: a) ¿Se o mudo, não surdo, não sabe escrever? Se pode exprimõr-se, outrem escreve, e êle ouve a leitura. ¿Como, porém, fazer o testamento? Público? Impede-o o art. 1.635. Cerrado? Teria êle de declarar ao oficial público ser o seu testamento e querer que o aprove (art. 1.638, V e VI). Por testamento particular, não no poderia. Portanto, temos de admitir que, exprimindo-se por gestos, quem pôde ditar, deve poder substituir as declarações verbais do art. 1.638, V e VI, bem mais simples, pelos seus sinais inteligíveis. ¿E a exigência de saber ler (artigo 1.641)? Temos de ver a vida em vez de ver somente textos. b) Se o mudo-cego sabe a escrita dos cegos, por ser mudo não poderia testar píiblicamente (não se expressa de viva voz), nem pelo cerrado (pode verificar o que outrem escreveu, entregar ao oficial público, mas há no assunto a regra jurídica despótica do art. 1.637), nem pelo hológrafo, em virtude da declaração do citado artigo. Que fazer? Ambos, o que se exprime sem saber ler e escrever, mas ouve, e o outro, que sabe escrever com a sua escrita, mas é mudo e cego, podem ser sãos de espírito, e exprimir o que querem. No estado atual do direito brasileiro, temos de atender às circunstâncias e admitir que os arts. 1.641 e 1.637 não se apliquem a casos tão excepcionais. O mudo, que não pode testar por testamento público, é o que, com a bôca e por palavras articuladas, não pode falar. Se articula, ainda que de modo forçado e exótico, se se faz entender por palavras, pode testar. O rigor da lei escrita vai ao extremo de negar o testamento público ao que, embora não seja mudo, se acha, ocasionalmente, impossibilitado de falar. Tal é o caso do que sofreu operação e o médico lhe proibiu que falasse. 4 . REVISÃO DA DOUTRINA. - Certamente temos de respeitar o direito formular do Código Civil, temos de levar em conta como requisito essencial tudo que êle diz sôbre mudos, surdos, surdos-mudos e cegos. Mas, dadas certas circunstâncias, e essas foram acima apontadas, não podemos levar as exigências de garantia ao extremo de vedar a alguém, maior de dezesseis anos, são de espírito, e que pode exprimir-se, a faculdade de dispor, testa-

mentàriamente, dos seus bens. O legislador não podia ter vedado a liberdade da expressão, e não devemos deixar que se opere, em proveito de mal-entendido formalismo, injustiça social que nos faria recuar aquém de Justiniano. Para isso, basta recorrermos à evolução de doutrina, à evolução da técnica que se processou através da história romana. A princípio, eram incapazes de testar os mudos e os surdos; com dupla razão, os surdos-mudos. Levava-se a ríspidos extremos a exigência át falar e de ouvir. No século VI, subiu-se um degrau: mas, ainda em tal direito, se distinguia o defeito de nascença e o defeito posterior ou acidental. ¿Será justo que no século XX haja quem possa exprimir-se e não possa testar? Se o art. 5.° do Código Civil reconhece surdos-mudos que se exprimem e se confirma, no artigo 1.627, IV, tal reconhecimento, ¿como deixar incapazes fora do art. 1.627? Tudo isso porque o direito de sucessões, mais estável que o direito das obrigações, não atendeu à possibilidade de declaração na escrita do cego ou dos surdos-mudos e, quanto ao mudo analfabeto, não lhe deixou forma nenhuma. Nem sequer ao mudo letrado, que perdeu as mãos. Se êle se exprime? Assim como a existência de mudo nato que aprendeu a ler, a escrever, e a de surdo nato, ou surdo-mudo de nascença, impuseram exceção à distinção do século VI, a excepcionalidade de hoje deve autorizar-nos a reconhecer a tais mutilados dos sentidos a única forma ou a mais razoável, de que êles, provada a excepcionalidade, podem socorrer-se. Qualquer outra solução seria volver ao dito de GAIO, que se choca com a letra expressa do art. 1.627: surdus etmutus testamentumfacere non possunt.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.870. B - Doutrina Esse "mal-entendido formalismo", aludido por Pontes de Miranda, foi excluído do Código Civil de 2002. Não há mais impedimento para que o mudo possa ser testador em testamento público, pois desapareceu a exigência de fazer suas declarações de "viva voz". O mudo pode ouvir a leitura do texto lavrado e comunicar-se pela ctiamada língua de sinais, se o notário a conhecer. O notário pode consultar-lhe por escrito se ouviu e compreendeu o texto lido, o que é suficiente para que possa assinar o testamento.

§ 5.871. SURDO QUE SABE LER E SURDO QUE O NÃO SABE

- Diz o Código Civil, art. 1.636: "O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e, se o não souber, designará quem o teia em seu lugar, presentes as testemunhas". O art. 1.636 proveio do antigo Código Civil português, art. 1.917: "Quem fôr inteiramente surdo, mas souber ler, deverá ler o seu testamento, e se não souber ler, designará a pessoa que o há de ler em seu lugar, sempre na presença das testemunhas". Assim o Código Civil da Espanha, art. 697, o mexicano, art. 3.772 (art. 3.503), o uruguaio, arts. 759 e 766, e o venezuelano, art. 849 (Si el testador no sabe o no puede leer, se necessitan dos testigos más de los requeridos en el articulo 840, y debe expresar su voluntad ante ellos de palabra). O extinto Código Civil italiano, art. 787, alíneas e 3.\ exigia: "Ove il testatore sia incapace anche di leggere, debono intervenire cinque testimoni. Si il testamento è ricevuto da due notai, bastano tre testimoni". No Código Civil italiano de 1942, depois de se dizer no art. 603, 2.^ alínea, 2. ^ parte, que: "Se il testatore non può sottoscrivere, o può farlo solo con grave difficoltà, deve dichiararne la causa, e il notaio deve menzionare questa dichiarazione prima della lettura dell atto", acrescenta-se, como alinea 3.®: "Per il testamento del muto, sordo o sordomuto si osservano le norme stabilite dalla legge notarile per gli atti pubblici di queste persone. Qualora il testatore sia incapace anche di leggere, devono intervenire quattro testimoni". Radical o Código Civil argentino, art. 3.651: por ato público não podem testar o surdo, o mudo e o surdo-mudo. 1. SURDEZ E LEITURA DO TESTAMENTO.

2 . SURDO QUE LÊ E SURDO QUE NÃO LÊ. - No Código Civil, art. 1 . 6 3 6 , prevêem-se dois casos: a) o do surdo que sabe ler, e satisfaz os dois requisitos áe falar e de ler (substituído o ouvir pela leitura feita por êle mesmo, facilitação que se impunha por valer tanto quanto ouvir, talvez mais, o ler o testador o que se escreveu, ditado ou declarado por êle); b)toào surdo que não lê, e indica quem por êle leia, - facilitação que importa verdadeira nuncupatividade, em ato de confiança no testador, impossibilitado, ex hypothesi, de ouvir a leitura, como de ler. 3 . ASSINATURA DO SURDO. - Se O surdo sabe ler e assinar, lê e assina o testamento. Se o surdo não sabe ler, nem assinar, alguém, que êle designe, presentes as testemunhas, lerá o seu testamento. Levantou-se a questão:

¿quem há de assinar por ele? ¿O leitor (of. art. 1.636 do Código Civil), ou uma das testemunhas instrumentárias de que fala o art. 1.633? Uma vez que o leitor figurou, deve assinar, mas assinar por si, como leitor que foi, a rogo do testador: quem assina pelo testador é a testemunha instrumentária com que o artigo 1.633 facilita aos que não sabem ou não podem assinar o requisito do art. 1.632, IV, a que se não reporta o art. 1.636. Ocorre o mesmo quanto ao cego. Se o surdo não sabe ler, mas sabe e pode assinar, não lhe é dispensada a assinatura: o art. 1.636 é exceção ou dispensa do requisito da leitura (art. 1.632, ni), e não da assinatura (art. 1.632, IV). Exceção ou dispensa do requisito da assinatura foi matéria do art. 1.633. (Tudo isso era diverso no direito romano onde êsse terceiro era subscriptor). 4 . CAPACIDADE DO LEDOR DO TESTAMENTO DO SURDO QUE NÃO LÊ. -

A lei não chama testemunha ao ledor do testamento, mas deve êle ter os requisitos exigidos às testemunhas; e não só os requisitos de atestação como também os de instrumento testamentario (art. 1.650). Por conseguinte, não podem ser encarregados da leitura: os menores de dezesseis anos, os loucos de todo o gênero, os surdos-mudos e os cegos, o herdeiro instituído, seus ascendentes e descendentes, kmãos e cônjuge, e os mais de que se fala sob o art. 1.650. 5 . S E O LEDOR É OITAVO FIGURANTE. - O art. 1 . 6 3 6 deriva do extinto Código Civil português, art. 1 . 9 1 7 . Mas, aqui e ali, a interpretação foi divergente. No direito português, entendia LOPES PRAÇA {Lições lito-

grafadas de Direito Civil, 281) que as testemunhas instrumentárias não

podem ser designadas para a leitura do testamento, - teria de intervir outra pessoa, que seria estranha às figurantes, e JOSÉ TAVARES (Sucessões, 6 1 5 ) achava dispensável a pessoa suplementar, incumbindo-se da leitura uma das testemunhas instrumentárias. No direito brasileiro, de um lado, CLÓVIS BEVILÁQUA (Código Civil comentado, V I , 9 1 ) , e do outro, JoÃo Luís ALVES (Código

Civil anotado,

X I , 1." ed., s o b o art. 1.149) e ITABAIANA

de Direito das Sucessões, 2 3 3 ) . Dizia CLÓVIS s.): "Deve ser mencionada no testamento a circunstância, a que se refere o artigo. Não é necessário que a pessoa designada para ler seja testemunha suplementar. Poderá ser uma das instrumentárias, que devem estar reunidas para ouvir a leitura. Confrontando-se êste artigo, com o 1 . 6 3 3 e com o 1 . 6 3 8 , verifica-se que o Código dispensa a intervenção de

DE OLIVEIRA

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BEVILÁQUA ( 9 0

mais de uma pessoa, no ato, sempre que o testador não pode executar por si uma das formalidades do testamento público, e a lei permite que outrem a execute em seu lugar". Diferente o que pensava ITABAIANA DE OLIVEIRA (233): "O Código Civil, neste art. 1.636, afastou-se do seu sistema, pois, sempre que o testador não pode executar, por si, uma das formalidades do testamento público, a lei determina que uma das testemunhas instrumentárias a execute em seu lugar. É o que se verifica nas hipóteses dos arts. 1.633 e 1.637. Entretanto, a pessoa designada para proceder à leitura do testamento do surdo não pode ser uma testemunha testamentária. Há de ser uma testemunha suplementar, que procederá à leitura na presença das instrumentárias". Como resolver? O Projeto revisto copiou-o do extinto Código Civil português: a lei estatui, retrogradamente, que seja outrem, designado, que o leia. Querer que possa ser uma das testemunhas, tratando-se, como se trata, de matéria formalística, fôra abertamente dispensar na lei. Ora, as contemporâneas tendências de interpretação das leis, que autorizam o juiz a formular a própria regra jurídica, evita tal intromissão quando se traia de resolver assunto de direito formalístico. 6. SE O LEDOR, QUE SABIA A LINGUAGEM DOS SURDO, LEU PARA SI, E

- A lei não exige que o leitor saiba a linguagem dos surdos e lhe traduza as declarações que fêz o testador, e foram escritas pelo oficial. A formalidade do art. 1.636 importa leitura pelo surdo que não sabe ler: o leitor designado como que representa o surdo, e tal leitor das notas pode não entender os sinais da linguagem especial. Mas, se o testador sabe tal linguagem e o leitor pode reproduzir o que está escrito, deve fazê-lo. Se o não faz, certo não acarretará isso nulidade, porém estabelece indício forte, praesumptio facti, na ação de invalidade em que se pretenda provar terem sido inexatas e dolosas ou fraudulentas as declarações escritas.

NÃO PARA O SURDO.

7. SuRDo-CEGo E A FORMA DE TESTAMENTO. - A tal disponente a lei não veda o testamento público: êle fala. Porém, por ser surdo, alguém, que não seja uma das testemunhas, nem o oficial público, tem de ser designado por êle, para ler o testamento. Talvez, no caso anterior (n. 6), transmitir-lhe o que está escrito (é possível, ex hypothesi, a linguagem do surdo-cego). Por ser cego o testador, tem de ser lido duas vêzes o testamento: uma, pelo oficial público, e outra, pela testemunha instramentária que fôr designada. Portanto, três leituras: a do oficial, indispensável, a especial da surdez (por

delegação a oitava pessoa) e a especial da cecidade, por uma das testemunhas instrumentárias. Em todo o caso, pode a doutrina atenuar a regra jurídica, pois não se trata do caso no n. 5. Se uma das testemunhas não leu, mas o, surdo cego designou estranho para a leitura, além da que deve fazer o oficial público, não se deve dar por nulo o testamento, porquanto a delegação de leitura é mais do que o pressuposto especial concernente à cegueira, que teria por fito ser verificado, auditivamente, pelo testador, o redigido pelo oficial público, e a verificação, pressuposta no art. 1.637, o cego-surdo não pode fazer.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.871. A - Legislação Sobre o testamento público do surdo, ver o art. 1.866 do CC/2002. § 5.871. B - Doutrina o Código Civil de 2002 cogita do testamento do surdo, que saiba ler ou não. A formalidade da leitura em voz alta pelo testador é substituída pela leitura direta do texto feita pelo testador. Se não souber lei, designará uma pessoa de sua confiança para ler em seu lugar. Se souber escrever, assinará pessoalmente o testamento; se não souber escrever, uma das duas testemunhas assinará, a rogo. Muda a função das testemunhas, que passa a ser a de confirmar a leitura feita pelo testador surdo. Se o surdo souber a língua de sinais poderá se comunicar dessa forma, preferentemente acompanhado de intérprete.

§ 5.872. TESTAMENTO PÚBLICO DO CEGO

1. PERMISSÃO ESPECIAL DA TESTAMENTIFAÇÃO. - Ao cego só se permite o testamento público, que lhe há de ser lido, em alta voz, duas vêzes, uma, pelo oficial, e a outra, por uma das testemunhas, designada pelo testador; fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento (Código Civil, art. 1.637). O art. 1.637 proveio do Projeto revisto, art. 1.973: "O cego só pode fazer testamento aberto, que será lido em voz alta, duas

vezes, uma pelo oficial pública, e outra por uma das testemunhas designada pelo testador, devendo esta circunstância ter menção especial no testamento". No Código Civil chileno, art. 1.019, inspirou-se o art. 1.637 do Código Civil brasileiro: "El ciego podrá solo testar nuncupativamente i ante escribano, o funcionario que haga veces de tal. Su testamento será leído en alta voz dos veces; la primera por el escribano o funcionario, i la segunda por uno de los testigos, elejido al efecto por el testador. Se hará mención especial de esta solemnidad en el testamento". Cf. Código Civil uruguaio, art. 760, e espanhol, art. 698 (por uno de los testigos ú otra persona que el testador designe). O cego podia testar por outras formas (Decreto n. 2.878, de 23 de junho de 1879). Aliás, se êle, porventura escreve, não se lhe pode negar a feitura de testamento cerrado ou de testamento particular. O direito brasileiro seguiu os códigos civis hispânicos. Era assente a capacidade de testar dos cegos ( S A M U E L STRYK, Disputado de testamentis corpore vitiatorum, § 3 ; F. H . M . KERSTEN, Dissertatto de visu privatis corumque iuribus, § 15). A discordancia, assim no antigo como no direito dos tempos modernos, era quanto z. forma que se lhe permitia (CHR. FR. VON GLÜCK, Ausfiihríiche Erlãuterung der Pandecten, 3 4 , 27). Salvo PETRUS FABER (Ad Ulpiani fragmenta, Tít. XX, § 1 3 , GERARD MEESMANN, NOVUS Thesaurus iuris civilis et canon., VE, 762), com a conclusão de que não vaha o testamento do cego por lhe ser impossível ver as testemunhas. Ora, o in conspectu testatoris não tinha tal sentido, mas o que mostrara J. C . KOCK iJProgr. de conspectu testatoris ad. L. 9, C, de testam., 9: "sub praesentia ipsius testatoris"). O direito justinianeu, a Ordenança de Maximiliano (1512), e as Ordenações de Portugal foram beber na Constituição de Justino a exigencia da forma oral pública, excluida a possibilidade da escrita ( H U G O D O N E L O , Commentarii de iure civili, IH, 328): porque o escrito, dizia-se, precisa ser lido às testemunhas, e o cego não no pode ler ( C H R . F R . VON G L Ü C K , 3 4 , 31). Seria, hoje, mau argumento. O que o testador lê é o que êle mesmo escreveu e o cego não pode fazê-lo. O que se pode invocar é que êle não poderia - salvo se as testemunhas usassem escrita de cegos - verificar se assinaram. A oitava testemunha, se faltava notário, o direito de hoje não na possui. O Código Civil só permite ao cego o testamento púbhco. O Código Civil exige que se leia duplamente: uma vez, pelo oficial público, que o escreveu, e outra, por uma das testemunhas. Predominou nao só a exigência da leitura (assaz discutida: por ela, D A N I E L N E T T E L -

Dissertatio de testamento nuncupativo in scripturam redacto, 20' M. G. W E R N H E R , Commentationes lectissimae ad Digesta, § 7; dispensando-a, C H R . F R . VON G L Ü C K , 3 4 , 3 5 ) , como também a de ser lido pelo oficial público e por uma das testemunhas. BLADT,

Tal formalidade é a que se dá no art. 1.636, relativo ao surdo, porque, no caso dêsse, a leitura não é ouvida: o ler é ato de confiança pessoal. O oitavo verifica pelo testador. Ao passo que o cego ouve. No art. 1.637, relativo ao cego, a lei diz que o lerá, como segunda leitura, uma das testemimhas. A questão está em se saber se o testador pode escolher oitava pessoa. Seria abundância de forma, de garantia, e isso non nocet. Aliás, os velhos dissertadores já o haviam decidido (M. D. GROLMANN, Commentatio de necessaria ultimarum volwitatum praelectione, c. II, § 6; J. G. K O E H N E N , Dissertatio deforma testamenti externa a coeco observanda, c. N , s. § 8 , n. I V ) . 2 . ASSINATURA DO CEGO E DISPENSABILIDADE. - Já se disse que o cego, que sabe e pode assinar, deve fazê-lo. O artigo 1.637 só dispensa o que não é possível observar-se., E a assinatura só se dispensa aos que não sabem ou não podem assinar. Resta uma questão: se o cego assina, ¿a testemunha, que leia o testamento (depois da leitura pelo oficial público), precisa por êle assinar? Não. O art. 1.737 exige a leitura pelo oficial público e pela testemunha designada. É exigência a mais. Quanto à assinatura, nada disse. Portanto, observar-se-á, integralmente, o art. 1.732, IV, se o cego sabe ou pode assinar. Se não sabe, ou não pode, recorre-se ao art. 1.733, que não se refere só aos analfabetos, mas, em geral, a todos os que não saibam ou não possam assinar.

Estendiam as exigências da lei de Justino aos testamentos privilegiados: além de J . J . WISSENBACH, J . PACIUS (Analys. Institut., ad § 4,1, Quibus non estpermiss. facere testam., 2 4 1 ) , J. U . VON CRAMER (Wetzlarische Beitrãge, 3 8 s.), J . F. RIVINUS {Dissertatio de testamento parentum inter líberos corum duobus testibus condito, respectu aliarum personarum invalido, § 22), e A. F. RIVINUS {Dissertatio de testamento parentum privilegiaria solenne prius conditum non infirmante, § § 1 5 - 1 7 ) . Mas, hoje, com o art. 1 . 6 6 3 , seria arbitraria tal conclusão: o que servia militarmente e se achava na situação do art. 1.637 pode testar, se cegou. A cegueira resultante da guerra ou - ainda se não resultante - de pessoas em combate, não obsta ao testamento especial.

Panorama atual pelos Atuaüzadores § 5.872. A - Legislação Sobre o testamento público do cego, ver o art. 1.867 do CC/2002. § 5.872. B - Doutrina Permanece a restrição do testamento público para o cego, que de outras modalidades não poderá se utilizar. Essa restrição não faz sentido se o cego pode ler 8 escrever na linguagem especial de Braille, sistema de escrita com pontos em relevo que as pessoas privadas da visão podem ler pelo tato e que lhes permite também escrever, cuja manifestação de vontade é indiscutível e expressa. No testamento público o cego dita suas declarações e ouve a leitura feita pelo testador, acompanhado pelas duas testemunhas. Se sabe assinar deve fazê-lo diretamente, sem necessidade de se valer de assinatura a rogo.

§ 5.873. C O N S R O E R A Ç Õ E S F I N A I S S Ô B R E T E S T A M E N T O P Ú B L I C O 1. PRECISÕES. - Algumas considerações devem ser feitas sobre o testamento público, além das que constitoem matéria da lei civil. Ou porque concernem ao direito judiciário das entidades intra-estatais, ou por suporem o conhecimento global dos dispositivos do Código Civil. Lendo-se os arts. 1.632-1.637, vê-se que êles contêm regras jurídicas que se ligam a direito judiciário e a dados especiais, relativos a circunstâncias subjetivas do testador: não saber ou não poder assinar, não poder ditar de viva voz, ser surdo, ser cego. Se algum Estado-membro exige que os livros sejam em determinado papel, ou que os testamentos cerrados o sejam, os livros, com a rubrica de quem os deva rubricar, ainda se em outro papel, são livros de notas; sendo cerrado o testamento, a lei estadual não lhe pode atingir a validade. Aliás, quando o imperador Maximiliano I, em 1512, exigiu o pergaminho dos testamentos notariais, impôs mais do que o bom senso permitiria. O destino da regra jurídica foi o que se viu: caiu em desuso. As leis são feitas para servir à vida, e não para desservi-la. Cf. B . BARDILI (Disputatio de subscriptione, 32-34).

O Código Civil brasileiro não acolheu o testamento judicial ou apud acta: só se referiu ao testamento lavrado pelo oficial público; portanto,

pelo oficial que tenha fé pública. Se alguma legislação estadual desse ao juiz de paz, explicitamente, tal função, teria criado - para os testamentos na pessoa do juiz, atribuição tabelionária. O direito federal seria o mesmo. 2. DIREITO CANÓNICO. - A tentativa de fazer recuar o testamento ao começo de ciclo social, à preponderância da religião, como pretendeu e logrou o direito canónico, teve contra si o surto dos próprios tempos, repondo o instituto na sua situação histórico-evolutiva. No direito canónico, eram só duas as testemunhas (c. 10, X, III, 26), vindo de Alexandre DI. O fim era facilitar os testamenta ad pias causas. A Igreja sempre pugnou pela liberdade de testar e pelas facilitações ao dispor intuitu mortis. Política econômica, tenaz e sutil, que veio até os nossos dias. Com os seus prós e os seus contras. - Toda a matéria dos arts. do Código Civil constitui solenidade essencial. Quer dizer: não pode ser dispensada. Se faltou, é nulo o testamento. Mas a distinção, que devemos fazer, não concerne a tal sentido. Tudo que é intrínseco e tudo que é extrínseco nos artigos citados interessa igualmente à segurança jurídica e, pois, não se pode dispensar, nem omitir. O discrime do intrínseco e do extrínseco, assaz importante em direito internacional privado e em direito intertemporal, merece feito, atendendo-se a especial qualificação do direito brasileiro. O fato de todas as referidas regras jurídicas se acharem dentro do capítulo intitulado "Das formas ordinárias do testamento" não prova que tudo seja extrínseco, nem que se lhes devam aplicar, indistintamente, os princípios de direito intertemporal e de direito internacional privado relativos às formas extrínsecas. 3 . ESSENCIALIDADE DOS PRESSUPOSTOS.

1.632-1.637

Assim, impõe-se a distinção: 1) É requisito essencial extrínseco: a) o ser ditado ou declarado; h) a assistência das testemunhas a todo o ato; c) a leitura pelo oficial público, na presença do testador e das testemunhas, ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial público; d) a assinatura pelo testador, pelas testemunhas e pelo oficial público; e) o número cinco de testemunhas;/) o serem feitas as declarações em língua nacional; g) a especificação das formalidades pelo oficial público e o portar por fé, no testamento, terem sido todas observadas; h) o terem de ser de viva voz as declarações. Tudo isso é essencial ao testamento que se faz no Brasil, sob pena de nulidade. Tudo isso, como se há de ver, constitui princípio de ordem pública, no plano internacional, isto é, obrigam a todos que se

achem no território brasileiro, quer sejam Brasileiros, quer não. Idem, no tocante a testamento público feito em consulado brasileiro, no estrangeiro. Também é extrínseco, também só deriva do testamento feito no Brasil, perante oficial público brasileiro, ou em território estrangeiro, que se ache sob govêmo de fato brasileiro, perante oficial público brasileiro, ou em consulado brasileiro, a responsabilidade a que se refere o art. 1.634, parágrafo único. 2) É requisito essencial intrínseco: á) a formalidade relativa ao surdo, que não saiba ou não possa escrever, pois só deve testar por forma pública (espécie); b) a formalidade relativa ao cego, que não pode usar de outra forma que não seja o testamento público; c) pela mesma razão, o que não sabe ou não pode assinar. Nos arts. 1.633, 1.636 e 1.637 existem, portanto, formalidades extrínsecas e formalidades intrínsecas: o que é extrínseco consiste no modo de testar por forma pública e isso pode variar conforme o país em que se achar o Brasileiro, ou pessoa domiciliada no Brasil, e o que é intrínseco é a exigência do testamento público. Quanto ao mudo, domiciliado no Brasil, que se acha no estrangeiro, pode testar pela entrega de escrito ao oficial. A exigência de viva voz é só extrínseca. 4. DIREITO INTERTEMPORAL. - Tudo que é extrínseco concerne ao ato, à forma em sentido estrito, - obedece, pois, à regra do direito transitório tempus regit actum. Se um testamento foi feito na vigência do Código Civil, de acordo com o que se estabelece na lei, e lei nova vem, que altera o extrínseco, nem o testador precisa inteirar-se da nova lei, nem sofre cem isso o testamento feito. Salvo - está visto - o despotismo de direito nôvo, que fôsse explícito em exigir aos testamentos já feitos, sob pena de nulidade, formalidades que não eram essenciais. Na maioria dos casos, tal direito nôvo não resistiria ao princípio constitucional contra leis retroativas. Quanto ao intrínseco dos arts. 1.633, 1.636 e 1.637, por se tratar de circunstâncias subjetivas, que tocam ao exercício das formas, rege-se, à semelhança do que se passa com a capacidade testamentária, pela lei do tempo da morte. Por onde se vê que a Seção H do Capítulo IH (arts. 1.632-1.637) não traz dificuldades de direito intertemporal. Tudo se rege pela lei do tempo em que se lavrou o ato testamentário ou pela lei da data da morte.

O art. 1.634, parágrafo único, não tem outra lei que a lei do ato: se lei nova extingue ou agrava ou atenua a responsabilidade civil do oficial público, não pode apanhar a que deriva de testamento feito antes da sua vigencia. Quanto à responsabilidade criminal, a lei nova não pode agravar. Tão-pouco se poderia aplicar pena a ato que já se não reputa crime. Mas, na espécie, fôra de mister revogar-se o art. 1.634, parágrafo único, do Código Civil, que se reporta a crime e entendeu frisar a responsabilidade criminal. Se, acaso, a lei antiga permitia a declaração per procuratorem, ou por entrega de escrito por outrem, e o testador morre, sob a lei nova, que o veda, não se cumpre o testamento: o testador podia ter atendido à lei do tempo da morte, e não atendeu. Não se trata de forma. Veremos conclusão simétrica em direito internacional privado. Não assim se não mais podia atender. 5. DIREITO INTERNACIONAL ERIVADO. - Todo o extrínseco dos arts. 1.632-1.637 do Código Civil obedece à lex loci. No território brasileiro ou sob jurisdição brasileira, o oficial público não pode obedecer a outras leis, nem se eximir da responsabilidade quando dispense ou omita as formalidades daquelas regras jurídicas. Por outro lado, se o testador, estrangeiro, não é domiciliado no Brasil, e o Estado do domicílio ou da nacionalidade, lhe veda, no estrangeiro, a forma pública, e lhe impõe a forma particular holográfica, nenhum interesse tem o Brasil em lhes permitir que viole a qualificação da lex domicilii, ou da lex patriae. Quanto ao analfabeto domiciliado no Brasil e quanto ao domiciliado cego, não podem testar senão perante a autoridade pública (notário, ou juiz, se a lei local tiver tal formaX ou perante o cônsul brasileiro. Igualmente, o completamente surdo, que não saiba ou não possa escrever: se pode escrever, pode testar hologràficamente, ou, sabendo ler e assinar, ainda alogràficamente, se o permite a lei local. Quanto ao mudo, se a lei do Estado em que está admite o testamento público pela entrega de escrito, vale, pois que o art. 1.635 somente contém exigência extrínseca. 6. ORDEM PÚBLICA E TESTAMENTO PÚBLICO. - Constitui matéria de ordem pública interna: a personalidade das declarações ou entrega do escrito ao oficial público, a leitura ao testador ou por êle (caso contrário, se-

ria negar ao testador a possibilidade da conferência), salvo se impossíveis a audiência e a leitura. Finalmente: somente quando exista impossibilidade material do exercício de outra forma pode-se admitir a nuncupatividade, e será pública {testamentum nuticupativum in scripturam redactum), ou, se o testador lê, por testamento publicamente aprovado (Código Civil, art. 1.638,1 e Hl). Aí, há ordem pública interna e internacional. Quer dizer: o domiciliado no Brasil, mesmo estrangeiro, se não é cego nem surdo que não saiba escrever, nem analfabeto, ou impossibilitado de escrever e assinar, não pode testar nuncupativamente, e - naqueles casos - teria de fazê-lo por forma oficial (pública ou cerrada). Por outro lado, o testamento de quem é domiciliado no Brasil, feito - fora do Brasil - nuncupativamente perante testemunhas e redator não oficial, ou ainda perante êsse, sem impossibilidade de uso das outras formas, vale para o Brasil, mesmo se não vale para a lex patriae. É nulo o testamento feito no Brasil por procurador, ainda que o admita o Estado estrangeiro. Mais: ainda quando o procurador somente entregue o escrito. Não era assim, nos séculos passados. Mas, hoje, é princípio de ordem pública a irrepresentabilidade para testar. Voluntas propria: caso contrário, seria de vontade alheia. E o rigor formular opõe-se a interpretação que ponha em dúvida a pessoalíssima declaração da última vontade. Fazendo-o por entrega de outrem, seria in fide privata, e não in fide publica. O juiz brasileiro deve mandar cumprir o testamento público, feito alhures, que se lançou após a entrega do projeto pelo próprio testador. Mas negará o "cumpra-se", por ser contra a ordem pública, a qualquer testamento que se fêz mediante entrega por outrem de escrito do testador ou de outrem, salvo se consta do texto que o testador ouviu, e depois da leitura, o confirmou, subscrevendo-o. A entrega precisa ser pessoal. Na pior das hipóteses, seguida de ato pessoal, que valha o mesmo que a entrega. É a maior concessão que se pode fazer. Nos próprios séculos anteriores, era forte a repulsa a tais atos do testador PER alios voluntatem suam apud acta declarante (B. C A R P Z O V , lurisprudenciaforensis, M , 3 , 2 3 ; F. C . HARPPRECHT, Dissertatio de testamento iudiciali, Dissertationes academ., § X I ; W . A . L A U T E R B A C H , Dissertatio de testamento iudiciali, § 1 4 ; J . H . DE B E R G E R , Oeconomia iuris, I , 3 5 8 ; J . H E U M A N N , De testatore per alios voluntatem suam apud acta declarante, Exercitationes iuris univ., I , § 5 ; W . A . SPIES, Dissertatio de testamento per procuratorem non ojferendo, passim; JUST. CLAPROTH, Theoretischepractische Rechtswissenschafi von freiwilligen Gerichtshandlungen, 186).

Quem seja oficial público, di-lo a lei do lugar (J. HEUMANN, De testatore per alios voluntatem suam apud acta declarante, Exercitationes iuris univ., I , § 2 ; J . A . KOPP, De testamentis Germanorum iudicialibus et sub dio conditis vulgo ungehat und ungestabt, § 1 2 ; H . C . SENCKENBERG, Disquisitio acad. de testamenti publici origine et solennitatibus extrinsecis, c. 4; J. F. LUDOVICI, Dissertatio de actuarii praesentia in actu testandi, § 18 s.). Seguirá êle o seu estatuto: pode ser singular, ou coletivo; pode ser juiz, tabelião, escrivão (cf. C. 1. W I E S E , Progr. quo testamentum coram satrapa et satrapiae scriba conditum iure statutario Moguntino validum esse demonstrat., c. II, §§ 1-3; L. G. M A D I H N , Principia iuris romani de successionibus seu de iure hereditario, § 86). A lei do Estado, em que se acha a pessoa domiciliada no Brasil, pode dispor que, longe dos lugares em que haja juiz ou notário (a autoridade ordinariamente competente), outra figura de oficial púbhco (e. g., o agente municipal, o delegado) exerça as funções. Vale tal testamento. É êle (extraordinàriamente, é certo) oficial público ( J . G . R R A U S , Dissertatio de testamentis controversis, praesertirn publicis, § 16). O testamento feito perante oficial público ou juiz, sem testemunhas, de acordo com a lei estrangeira, ¿pode ser cumprido no Brasil? Não, responderiam J. L. SCHMIDT {Õjfentl. Recktsprüche, §§ 5 e 6), SCHIERSCHMID {Dissertatio de testamento eorum solo iudice non conficiendo, § 13, dissertação especial que, em 1764, escreveu sobre o assunto), A. K. H. VON HARTITZSCH {Das Erbrecht nach rõmischen und heutigen Rechten, § 7 1 ) e CARL J U L . M E N O VALETT {Lehrbuch des praktischen Pandektenrechts, m , § 961). Invocaram o direito canónico (cap. 11, X, de probat., e 28, X, de test.), no qual si super testamentis quaestio agitetur, a só palavra do juiz não faria prova. Mas havia o argumento de não só o juiz figurar e tratar-se, na espécie, de fé judicial (J. C . BALSER, Libell. sing, deforma testamenti iudicialis externa, § 84), o outro, de não ser aplicável o direito canónico, e sim o direito romano (J. F . LUDOVICI, Dissertatio de actuarii praesentia in actu testandi, § 35), e valer o princípio: superfium est privatum testimonium, cum publica monumenta sufficiant (F. C . CONRADI {Dissertatio de testamento publico, quod fit apud acta, § 16; D . G . STRUBE, Rechtliche Bedenken, II, 172). A questão é delicadíssima. Tratando-se de oficial público, é indispensável o testemunho instrumental (duas testemunhas ou mais) Tratando-se de juiz, êle e o escrivão são imprescindíveis, ainda para aquêles que, como F. E. PuFENDORF {De iurisdictione germanica, I, c. IV. § 71) e C. I. WIESE

(Progr. quo testamentum coram satrapa et satrapiae scriba conditum iure statutario Moguntino validum esse demonstrai, c. II, § 3), ainda mais concediam. Resta saber se são de mister testemuniias. Os dois autores citados, mais E. C. WESTPHAL (Rechtsgutachten, H, n. 4 5 , 1 5 ) , julgaram desnecessárias: a fé judicial não precisa de atestantes. Outros iam além: o escrivão pode representar o juiz ( A U G . DE LEYSER, Meditationes ad Pandectas, V, 3 5 4 , 3 ; C . F. W A L C H , Introductio in controversias inris civilis, 2 9 4 s.; J . B . GBIGER U. CHR. FR. VON GLÜCK, Merkiwürd. Recht^ãlle undAbhandlungen, 1 , 1 9 2 ) . Alguns distinguiam se o testador entrega escrito ao juiz, ou se presta, oralmente, as declarações. No primeiro caso, pode estar só o juiz; no segundo, é de mister a presença do escrivão, porque quem escreve é êsse, e não o juiz. Mas, ¿se a lei do lugar permite que juiz escreva? Daí a distinção de C . F . W A L C H {Introductio in controversias inris civilis, 2 9 4 ) : juiz que pode e juiz que não pode escrever (L. G. M A D I H N , Principia iuris romani de successionibus seu de iure hereditario, § 8 5 ; e A . F . J . T H I B A U T , System des Pandektenrechts, 11, § 694). Outros achavam que o juiz sempre poderia ( A U G . DE LEYSER, Meditationes ad Pandectas, 6 0 7 ; W . A. L A U T E R B A C H , Collegium pandectarum, 11, § 4 9 ; J . H . B E R G E R , Oeconomia iuris, I , 3 6 0 ; J . G . KJRAUS, Dissertatio de testamentis controversis, praeserüm publicis, § 3 9 ) , como entendia a velha praxe, com B . C Â R P Z O V , J . H . B O E H M E R e J . U . VON CRAMER.

A lei do lugar é que decide sôbre quem deve funcionar como juiz ou oficial público: por escolha, designação, altematividade, distribuição por escala, etc. Tratando-se de juiz colegial ou de oficiais colegiais, dirá quanto ao número, a composição etc. (J. C . BALSER, Libell. sing, deforma testamenti iudicialis externa, § § 1 7 , 81 e 86; C . I. W I E S E , Progr. quo testamentum coram satrapa et satrapiae scriba conditum iure statutario Moguntino validum esse demonstrai., c. U , § 4 ; J . C . QUISTORP, Beitrãge zur Erlãuter. versch. Rechtsmaterien, 611 s.). Iguahnente, quanto à facultatividade concedida ao testador. Se falta o escrivão, pode o juiz nomear ad hoc (cp. W . H . P U C H T A , Handhuch des gerichtlichen Verfahrens, II, § 243). Conclusões: a) No testamento judicial, juiz e escrivão devem estar presentes. Se falta o juiz, outro juiz que, por lei, o substitua; se falta o escrivão, o que por lei, ainda ad hoc, o possa substimir b) Se nuncupative, por motivo de impossibilidade do exercício de outra forma testamentária, será preciso que, além de juiz e de escrivão, figure alguém que assine a rôgo ou ateste. É de ordem pública, para o Brasil, que - ainda perante o juiz - a declaração oral seja assinada ou

atestada, c) Mas escrito pelo testador (hológrafo), entregue ao juiz, se a lei permite, expressamente, que o juiz esteja só e tome perfeito o ato, não ofende à ordem pública, e pode ser cumprido no Brasil, d) No caso de se destruir o livro de notas ou o livro judicial, a restauração faz-se segundo as leis locais. A sentença precisa ser homologada para que se cumpra no Brasil. Em todos os casos, ¿ê nulo o testamento feito perante o notario, ou o juiz, onde se admitir o testamento judicial? Os velhos escritores separavam-se. Alguns juristas, como T. S. R E I N H A R D T , negavam a vahdade, pelo caráter "sagrado" do território. Queriam que os súditos seguissem a lei do lugar e obedecessem. Compreende-se a que conseqüências se chegaria: o cidadão de um Estado não sairia dêle para testar. A questão estava mais do que deslocada. Os outros preliminarmente assentaram: o testador pode sair do lugar onde mora e procurar o oficial público, perante quem teste, ou levar o testamento cerrado para que o aprove, ou escrever, fora, o seu testamento particular o pertencer a um Distrito, Província, Estado-membro, ou Estado, não prende o testador ( W . A. LAUTERBACH, Dissertatio de testamento iudiciali, 1 9 ; F . E. P U F E N D O R F , De iurisdictione germanica, § 7 1 ) . Se feito por oficial público fora da jurisdição (dentro do mesmo Estado), não em relação a testador residente ou domicihado noutro lugar, ou no mesmo, mas em relação ao lugar em que se acha o próprio oficial, é que tem sentido a questão. Trata-se de jurisdição voluntária, mas jurisdição, e como tal ineficaz extra territorium (L. G. M A D I H N , Miscellen aus alien Theilen der Rechtsgelahrtheit, 1 1 3 s.; C . J. M . VALETT, Lehrbuch des praktischen Pandektenrechts, 2 1 8 ; C H R . F R . VON G L Ü C K , 3 4 , 2 7 ) . O testador pode testar onde bem quer Ainda mais: ir ao estrangeiro testar. Mas há de escolher oficial (ou juiz, se a lei do lugar tem testamento público) territorialmente competente ( C D . U B E R e G . S . M A D H I N , Diatribe de validitate testamenti non rite oblati, § 19). Houve discussão, no caso de chamada à casa do testador, mas a competência territorial é indispensável. No caso de doença, ou outro motivo, o testador pode chamar o oficial público, - desprezado, assim, o velho aspecto do ofício e da justiça _/ZXAÁA (J. A . KOPP, De testamentis Germanorum iudicialibus et sub dio conditis vulgo ungehabt und ungestabt, § 10; H. C. SENCKENBERG, Disquisitio acad. de testamenti publici origine et solennitatibus extrinsecis, c. m , § 10; J . C. BALSER, Libell sing, deforma testamenti iudicialis externa, § 14). Hoje, ubi iudex, ibi iudicium. Se os atos judiciais podem ser praticados fora da sede do juízo, máxime os dos oficiais públicos, os atos estão dentro

das linhas de competência. A controvérsia cedo se apagou ( J . G . K R A U S , Dissertatio de testamentis controversis, praesertim publicis, § 27). Mas é preciso que o oficial diga porque se deslocou: a regra é praticarem-se os atos na sede; quando se praticam fora, faz-se preciso mencionar o motivo da exceção ( L . G . M A D I H N , Principia iuris romani de successionibus seu de iure hereditario, § 8 5 ; J U S T . C L A P R O T H , Theoretische-practische Rechtswissenschaft vonfreiwilligen Gerichtshandlungen, 195). Assim como o testamento pode ser feito, excepcionalmente, em casa do testador, chamado o oficial público, também, se não há tempo para fazê-lo no cartório, pode o testador ir à casa de residência do oficial público (F. K . A. T R Ü T Z S C H L E R , Anweisung zur Abfassung der Berichte, I I , 6, §§ 3 - 5 ; M . G . W E R N H E R , Commentationes lectissimae ad Digesta, § 1 6 ; W . H. PucHTA, Handbuch des gerichtlichen Verfahrens, 2. Th., § 243), ou de outrem, em que se ache o testador, ou o oficial público. Mais: se as circunstâncias o exigem, pode o testador, chamado o oficial público, ter de fazer o testamento público em praça, ou clube, ou rua, ou em lugar em que estejam a salvo de calamidade pública, ou se o testador está sendo perseguido, ou em lugar de segurança pública.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.873. B - Doutrina A redução das formalidades do testamento público, adotada pelo Código Civil de 2002, aponta para a mitigação de sua invalidade pelas razões correspondentes. As formalidades, notadamente as extrínsecas, não devem prevalecer em prejuízo das finalidades lícitas do testamento e da própria vontade do testador.

CAPÍTULO TESTAMENTO

XXI CERRADO

§ 5.874. REQUISITOS ESSENCIAIS 1. REGRA JURÍDICA ESPECIAL. - "São requisitos essenciais do testamento cerrado" (Código Civil, art. 1.638): "I. Que seja escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo. 11. Que seja assinado pelo testador, in. Que não sabendo, ou não podendo o testador assinar, seja assinado pela pessoa que lho escreveu. IV. Que o testador o entregue ao oficial em presença, quando menos, de cinco testemunhas. V. Que o oficial, perante as testemunhas, pergunte ao testador se aquele é o seu testamento, e quer que seja aprovado, quando o testador não se tenha antecipado em declará-lo. VI. Que para logo, em presença das testemunhas, o oficial exare o auto de aprovação, declarando nêle que o testador lhe entregou o testamento e o tinha por seu, bom, firme e valioso. VII. Que imediatamente depois da sua última palavra comece o instrumento de aprovação. VIII. Que, não sendo isto possível, por falta absoluta de espaço na última folha escrita, o oficial ponha nêle o seu sinal público e assim o declare no instrumento. IX. Que o instrumento ou auto de aprovação seja lido pelo oficial, assinando êle, as testemunhas e o testador, se souber e puder. X. Que, não sabendo, ou não podendo o testador assinar, assine por êle uma das testemunhas, declarando, ao pé da assinatura, que o faz a rogo do testador, por não saber ou não poder assinar. XI. Que o tabelião o cerre e cosa, depois de concluído o instrumento de aprovação". Diferente era o Projeto primitivo, art. 1.808: "São requisitos essenciais do testamento cerrado: 1.°. Que a carta testamentária faça com o seu instrumento de aprovação um todo de modo que não possa ser tirado o

conteúdo sem que se rompa o involucro; 2°. Que o próprio testador entregue o seu testamento, fechado e selado, ao tabelião, na presença de cinco testemunhas, ou que o faça fechar e selar pelo mesmo tabelião, à vista das testemunhas, declarando em voz inteligível ou de modo inequívoco que naquele papel se contém o seu testamento; 3.°. Que sob o dorso do papel ou do invólucro do testamento escreva o tabelião o instrumento de aprovação, do qual deve constar: d) A entrega do testamento e o pedido de aprovação; b) O número dos selos e a forma dos sinêtes; c) A presença das testemunhas nomeadas, desde o princípio da solenidade até o fim do ato; d) A menção de ter sido o instrumento de aprovação lido perante o testador e as testemunhas pelo tabelião; e) A menção da assinatura do testador, das testemunhas e do tabelião; 4.°. Que o auto de aprovação seja efetivamente assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião". Artigo 1.809: "Se o disponente não puder escrever, assinará por êle uma das testemunhas instrumentárias. declarando porque assim o fêz". O art. 1.638 do Código Civil provém do Projeto revisto, art. 1.974: "São requisitos essenciais do testamento cerrado: 1.°. Que seja escrito pelo testador ou por outra pessoa a seu rôgo; 2°. Que seja assinado pelo testador; 3.° Que não sabendo ou não podendo o testador assinar, seja assinado pela pessoa que lho escreveu; 4.°. Que o testador entregue ao oficial perante as testemunhas em número polo menos de cinco varões e maiores de quatorze anos; 5.° Que o oficial, perante as testemunhas, pergunte ao testador se é aquele o seu testamento, e se o há por bom, firme e vahoso, quando o testador não se tenha antecipado em declará-lo; 6.°. Que logo em presença das testemunhas, o oficial faça o instrumento de aprovação, declarando nêle que o testador lhe entregou o testamento e o houvera por seu, bom e firme; 1°. Que o instrumento de aprovação comece logo e imediatamente no fim do testamento; 8.°. Que não havendo lugar na última fôLha escrita do testamento para nêle começar o instrumento de aprovação, o oficial ponha no testamento seu sinal público, e assim o declare no instrumento; 9.°. Que o instrumento de aprovação seja lido pelo oficial, assinado pelo mesmo, pelas testemunhas, e pelo testador, se souber ou puder assinar; 10.°. Que não sabendo ou não podendo o testador assinar, assine por êle uma das testemunhas, declarando ao pé da assinatura que o faz a rôgo do testador, por não saber ou não poder assinar". Veio a emenda n. 1.594 do Senado (1902): "IV. Que o testador o entregue ao oficial em presença, quando menos, de cinco testemunhas. V. Diga-se: 'Que o oficial perante as testemunhas pergunte ao testador se aquêle é o seu testamen-

to e quer que seja aprovado, quando o testador não se tenha antecipado em declará-lo'. VI. Que para logo, em presença das testemunhas, o oficial exare o auto de aprovação... VIII... o oficial ponha o seu sinal público no testamento, e assim no instrumento o declare. IX. Que o instrumento ou auto de aprovação seja lido pelo oficial, assinando êle, as testemunhas e o testador, se souber, e puder". O testamento cerrado entrou na Espanha com a Lei das Sete Partidas, que a Lei de Toro atingira com complementos. Em Portugal, disse CARLOS M A X I M I L I A N O {Direito das Sucessões, I , 5." ed., 441) que chegou com as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80. Não é verdade. Lá está êle nas Ordenações Manuelinas e - mais - nas próprias Ordenações Afonsinas. Depois de falarem do costmne ("que foi e he d'antigamente em estes Regnos"), as Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 103, § 1, foram assaz claras: "O qual costume declaramos em esta guisa. Primeiramente mandamos, que aja lugar em todo testamento, assy aberto feito per TabeUiam, como no caso que tever estormento pruvico nas costas, e que as testemunhas em elle contheudas sejam todos barooes, e homeens que nom sejam servos, e que sejam maiores de quatorze amios, em tal guisa que com o TabeUiam, que fizer o testamento, ou instrumento nas costas delle, sejam seis". No § 5: "E se alguum quiser fazer codicillo, quer aberto feito per TabeUiam, quer çarrado com estormento nas costas, quer feito e assinado pelo testador, ou per alguma outra privada pessoa, deve-o fazer com quatro testemunhas, barooens ou moUieres, livres, e maiores de quatorze annos, em tal guisa que com o Tabelliom sejam cinquo testemunhas". E no § 6: "E quando o testamento, ou codicillo assy forem feitos, como dito he, mandamos que valham, assy como se tevessem sete, ou cinquo testemunhas, segundo a forma do Direito commuum". 2. DIREITO ANTERIOR. - As formalidades eram quase as mesmas que as de hoje: escrito pelo testador, ou por outra pessoa a seu rôgo; se não foi escrito pelo testador, mas êste sabia escrever, assinado por êle, sob pena de nulidade. As diferenças principais são as seguintes: a) escrito pelo testador o testamento, o direito anterior não exigia a assinatura da cédula; b) as expressões bom, firme e valioso eram sacramentais. (Mas havia divergências. PERDIGÃO M A L H E I R O , Consultas Jurídicas, 460-463, satisfazia-se com a manifestação da vontade de aprovação, por aquelas ou palavras equiva-

lentes; com ele, o Tribunal de Justiça de São Paulo, a 6 de junho de 1893. Contra, o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 26 de julho de 1876, adstrito às Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1°). Muito se discutia se era necessário que o testamento fôsse entregue cerrado e cosido (necessanedade do segredo). Nao, respondiam os Assentos de 8 de agosto de 1815 e de 10 de junho de 1817, e MANUEL DE ALAÍEROA E SOUSA: bastava ser dobrado. Cosido e cerrado - donde o nome - por tê-lo de cerrar e coser o oficial, e não o testador, a que se concedeu cerrasse e cosesse. Oficial vê, mas não lê. Contrária opinião: talvez pelo influxo dos Códigos Civis francês e italiano, - DUARTE DE AZEVEDO e MARTINHO GARCEZ.

As Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1.°, diziam: "será cerrado e cosido, e êle testador o entregará ao tabelião perante cinco testemunhas". No § 2.°: "no instrumento, que se fizer, de aprovação em outra folha, em que esteja envolto e cosido o testamento". Daí concluir FRANCISCO PINHEIRO (Tractatus de Testamentis, disp. 2, 3, n. 34): "deinde claudi et consul debet; sic consutum tradendum est a testatore tabellioni". Assim fechado havia de entregar-se. Ao oficial? Mas tinha-se de começar da última folha escrita, ¿Como consegui-lo, se estava cerrado e cosido? Reabrindo-o, dizia-se. Então, ¿para que apresentá-lo cerrado e cosido? A. J. GOUVEIA PINTO {Tratado regular e prático de Testamentos e Sucessões, nota 303) e a Relação do Rio de Janeiro, a 16 de dezembro de 1873, apoiavam tal solução. No direito anterior, não se exigia a leitura da aprovação (diferente, hoje, o Código Civil, art. 1.638, DC), porém os praxistas reputavam uma das solenidades, se bem que se pudesse provar, diziam, posteriormente. 3 . ESPÉCIE DE TESTAMENTO NOTARIAL. - O testamento cerrado ou secreto é a segunda forma dos testamentos notariais. No público, o oficial figura como instrumento da feitura, - escreve-o. No cerrado, apenas lhe dá o caráter de autenticidade exterior, que lhe advém de ser aprovado, fechado e cosido pelo tabelião. Todo testamento público é ato do oficial. No testamento cerrado, só o ato de aprovação, seguido do fechamento e da costura. Mas, por isto que é ato notarial a aprovação, só se impugna pela ação ordinária, como ocorreria às escrituras, aos testamentos públicos. A lei dos tabeliães - estadual, e não federal, - é, contudo, geral aos atos notariais, ao passo que o Código Civil, lei federal, é particular a certos atos notariais, como o testamento, em cujas formas, por tê-las como essenciais, sói intervir. Raciocínio, que - ainda quanto a leis elaboradas

pelo Congresso Federal (Distrito Federal, Territorios e Consulados) - tena a conseqüência de fazer revogada pela lei especial a lei geral, que às regras jurídicas se opuser. Tudo que, sôbre o testamento público e competência do oficial, se disse, ao se cogitar do art. 1.632, vale para o testamento cerrado. Aprovado fora do distrito, não foi aprovado legalmente. À diferença do testamento público, que tem de ser lavrado no livro do oficial público, pode o testamento cerrado, na parte tocante à cédula, ser de outra substância que o papel comum, e o próprio auto de aprovação, quando se tratar de matéria em que o oficial possa escrever: assim, não há vedação de aproveitar o espaço que lhe fique, ainda que tenha de usar tinta especial para o lavrar. Já aqui começam a ser aplicadas as considerações feitas no comêço. No estrangeiro, são competentes, para aprovar os testamentos de domiciliados no Brasil ou de pessoas cuja lei de sucessão tenha de ser a brasileira, os cônsules brasileiros. No que se refere ao local, ao dia e à hora, o testamento cerrado pode ser feito em qualquer parte. A aprovação é pelo oficial público a que o testador leva o testamento cerrado, e não necessariamente o oficial público do lugar em que foi feito, ou em que é domiciliado o testador. Não há a ligação que ocorre com o testamento público, porque, nesse, o ato é do tabelião, ao passo que, no testamento cerrado, o ato do oficial público é apenas aprovativo. Se, antes de o testador assinar, ou enquanto está a assinar, morre o testador, ou pelo estado em que está, deixa de completar a assinatura, o testamento cerrado não foi feito, não é testamento. 4 . LEIS ESTADUAIS ANTERIORES À UNIDADE DO PROCESSO. - N ã o p o -

diam nem podem as leis estaduais ferir ou derrogar o Código Civil na parte relativa a testamentos e suas formas. Feição especial tem a questão no caso das leis sôbre tabeliães e cônsules, votadas pelo Congresso Nacional. As leis estaduais não poderiam, de modo nenhum, ter tal efeito. A lei geral não revoga a especial, salvo se a ela se refere com explicitude. Por isso, na Itália, a lei notarial, posterior ao Código Civil, que foi de 1865, permitindo ao surdo-mudo o ato público, inclusive o testamento, não revogou o texto da lei civil, que só admitia o testamento secreto e o hológrafo. Mas, como efeito do art. 57 da lei notarial, pôde o surdo-mudo fazer contratos por ato público.

5 . SOLENIDADES DISTINTAS. - Pràticamente, o testamento cerrado compõe-se de duas solenidades distintas: a da cédula testamentaria, a que a lei impõe formalidades intrínsecas e extrínsecas, e a da aprovação pelo oficial público.

É de toda a conveniência separar, na exposição e nos comentários, \im e outro ato. No primeiro, há a escrita e a assinatura (art. 1.638,1-III), e sendo hológrafo o testamento, muito valem princípios relativos à feitura do testamento particular; alógrafo, os que se apontaram, no testamento público, sobre a alografia. No ato da aprovação, que é a segunda fase constitutiva do testamento cerrado, trata-se de ato público se bem que parcial, de conseqüências similares às do testamento público, de que é exemplo a responsabilidade criminal e civil do oficial público.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.874. A - Legislação Sobre os requisitos essenciais do testamento cerrado, ver o art. 1.868 do CC/2002; sobre o tabeüão de notas competente para o auto de aprovação, ver o art. 8.° da Lei 8.935/1994. § 5.874. B - Doutrina 1. Os resquícios do direito formular para a aprovação do testamento cerrado, presentes na legislação anterior, foram atenuados pelo Código Civil de 2002. Onze requisitos essenciais foram reduzidos a quatro formalidades: a) entrega do testamento cerrado ao notário pelo testador, acompanhado das testemunhas; b) declaração do testador; c) lavratura do auto de aprovação e leitura deste pelo notário; e d) assinaturas do notário, das testemunhas e do testador. 2.0 testamento cerrado sempre foi de reduzida utilização pela população brasileira, até porque, se não houver as formalidades de sua aprovação pelo notário, ele é considerado inexistente. A inexistência, e não apenas a ineficácia ou a invalidade, decorre de sua natureza de ato complexo, formado pela interdependência de sua escrita pelo testador e pelo auto de aprovação. Aquela sem este não traz o testamento ao mundo jurídico. O testamento cerrado apenas ingressa no mundo jurídico a partir da data do auto de aprovação notarial e não da data em que foi

escrito pelo testador. Enquanto não houver auto de aprovação não haverá ato jurídico perfeito. 3. A segurança do testamento cerrado é inferior ao do testamento público, pois seu conteúdo é naturalmente sigiloso, atendo-se o notário a lavrar o auto de aprovação, cujos dados são os únicos que retém. O objetivo do auto é apenas o de certificar a autenticidade do testamento cerrado, por ter sido apresentado (cerrado) pelo testador ao notário. Se o testamento vem a ser extraviado, o termo de aprovação não é suficiente para se extrair certidão de seu conteúdo, como se dá com o testamento público. 4. Nada impede que o testador elabore posteriormente outro testamento, inclusive sob a forma particular, que independe de termo de aprovação notarial, revogando-se, consequentemente, o testamento cerrado. 5. O Código Civil de 2002 reduziu de cinco para duas as testemunhas que acompanham o testador para a apresentação do testamento ao notário. 6. O testador é livre para escolher o notário ou tabelião de notas, ainda que fora de seu domicílio ou do lugar onde estejam seus bens ou do lugar onde escreveu o testamento cerrado. Essa autonomia é assegurada pelo art. 8.° da Lei 8.935/1994, sendo também previsto no art. 9.° da mesma lei o impedimento de o notário se deslocar fora da circunscrição de seu cartório para a lavratura do auto de aprovação. Por sua vez, o Código Civil de 2002 admite que o auto seja lavrado pelo substituto legai do tabelião. 7. Pode ser testador o maior de 16 anos, sendo impedidos os que, no ato de fazer o testamento, não tenham o pleno discernimento para esse ato (art. 1.860 do CC/2002), ainda que não regularmente Interditados. Há, Igualmente, vedação expressa para os cegos (art. 1.867), que são limitados ao testamento público, Mas, a finalidade dessa limitação é de proteção ao cego, o que é dispensável quando este possa ler e escrever valendo-se da linguagem especializada de Braille, caracterizada pelos pontos em relevo que as pessoas privadas da visão podem ler pelo tato e que lhes permite também escrever; nesta hipótese, o testamento cerrado deve ser considerado válido e eficaz, pois seu conteúdo poderá ser lido, após a morte do testador, por qualquer pessoa habilitada nessa linguagem. Apenas se considera cega, segundo as normas da Organização Mundial de Saúde, a pessoa que tem no melhor olho grau de acuidade visual inferior a 0,1. § 5.874. C - Jurisprudência "A nulidade do testamento cerrado, em razão de estrito cumprimento das formalidades, apenas em caráter excepcional tem sido admitido pelo STJ, que se orienta no sentido do prevalecimento da manifestação de vontade do testador. Nesse sentido afastou as alegações da Incapacidade física e mental da testadora; de captação de sua vontade; de quebra do sigilo do testamento, e da não simultaneidade das testemunhas ao ato de,assinatura do termo de encerramento" (STJ, REsp 1.001.674/SC, S.''T., j. 05.10.2010. rei. Paulo de Tarso Sanseverino DJe 15.10.2010).

§ 5.875. CÉDULA TESTAMENTÁRIA PARA O TESTAMENTO CERRADO

cédula para o testamento cerrado pode ser: escrita pelo testador e por ele assinada; escrita por outrem, a seu rôgo, e assinada por êle; escrita por outrem e assinada pela pessoa que, a seu rôgo, escreveu. O encarregado de escrever pode ser o próprio oficial público, que o vai aprovar. Porém há pontos que devem ser discutidos. 1. FORMA DA CÉDULA TESTAMENTÁRIA. - A

Quase sempre, somente com a abertura do testamento cerrado é que se vem a conhecer o que nêle se contém. Evita o testador que haja dissensões entre as pessoas que esperavam ser beneficiadas e ao mesmo tempo retira a possibilidade de reações dos que se tinham como merecedores da herança, ou de grande parte dela. É o caminho que se tem no direito brasileiro, no qual não há o testamento hológrafo sem a leitura às testemunhas, que apenas assinam. Se o testador não sabe escrever, ou não pode escrever, tem de ser escrito e assinado por outra pessoa, a rôgo do testador; mas pode dar-se que o testador possa assinar e não possa escrever, ou mesmo não queira escrever, e então a pessoa que o escreve a rôgo não o assina. A entrega ao oficial público é que há de ser feita pelo testador, e não por outrem. Todavia, se o testador não pode segurá-lo, por lhe faltarem mãos, ou, no momento, delas não pode usar, considera-se entrega pelo testador o fato, por exemplo, de estar em cofre o testamento e o testador dizer onde está a chave, como abrir o cofre, e ordenar que apanhe o que lá se acha. Não importa se o testamento foi escrito a rôgo, ou a rôgo escrito e assinado, ou se, quando o fêz, aiada podia o testador usar as mãos. No Código Civil não se estabeleceram requisitos estritos para a cédula do testamento cerrado. O testador pode inserir o que entende proveitoso ou necessário, a seu critério. Invocações e declarações religiosas, ou de outras convicções, podem ser insertas. Convém que se diga, de começo, de quem é o testamento, como "Eu, M., Brasileiro, solteiro, domiciliado em São Paulo", ou "Eu, N., Francês, domiciliado no Brasil, casado"; porém não é pressuposto necessário. Por vêzes, diz o testador qual o regime matrimonial de bens, quantos os descendentes ou outros herdeiros legítimos. Não há exigência de unidade do ato de escrita e assinatura da cédula testamentária. O testador pode levar dias, ou meses, ou anos, a redigir a

cédula testamentária, ou a ditar para alguém. A unidade de ato só é exigida para o auto de aprovação. 2. CAPACIDADE PARA TESTAR E OUTROS REQUISITOS. - Além dos requisitos de capacidade para testar (Código Civil, artigo 1.627), a lei exige ao que deseja fazer testamento cerrado que saiba e possa ler. Ao analfabeto falta esta exigência de validade intrínseca, este requisito para o exercício da forma senünuncupativa, que em verdade é o testamento cerrado do direito brasileiro. O art. 1.641 teve por fundamento evitar a nuncupatividade propriamente dita. Nos respectivos comentarios, mais espaçadamente trataremos o assunto. Não pode dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba ou não possa ler (art. 1 . 6 4 1 ) . Mas, de acordo com o art. 1 . 6 3 8 , M e X, dêle poderá usar o que, sabendo ler, contudo, não saiba escrever, curiosidade excepcionalíssima ( M A N U E L DE ALMEIDA E SOUSA, Coleção de dissertações jurídico-práticas em suplemento às Notas do livro terceiro das Instituições, 1 1 3 ) , com que CLÓVIS BEVILÁQUA procurou salvar a inabluível contradição entre o art. 1 . 6 3 8 , DI e X, e o art. 1 . 6 4 1 . Quem tem capacidade para ler e entender um testamento escrito por outrem dificilmente deixará de saber assinar. Poderá, certo, não poder; mas isto é outra coisa. Nada justifica a exceção legal, que parte pelo meio a ínfima cultura dos rudes: ler e assinar, ler só e não saber assinar. Do testamento cerrado também não pode valer-se o cego, porque não lê (diz-se). Não é bem isso: muitos cegos lêem a sua escrita; há, até, os que escrevem. A única dificuldade é de outra ordem: escrito por êle, ou por outrem, mas lido por êle, talvez não possa fiscalizar a aprovação, isto é, se, efetivamente foi o seu o que se aprovou. Não há impossibilidade nisto, máxime quando o cego escreveu e assinou. Não é, pois, porque não sabia ler que o cego só testa por testamento público, ler êle pode saber melhor do que muitos de olhos sãos. Nem há claros inconvenientes em que se redigisse com os caracteres especiais, fôsse lido às testemunhas por êle mesmo e o tabelião aprovasse. Do art. 1 . 6 4 1 , CLÓVIS BEVILÁQUA {Código Civil comentado, VI, 97) tirou que o cego não pode testar por testamento cerrado, "porque não pode ler"; mas não é por isto, e sim porque o proibiu, explicitamente, o art. 1.637: "ao cego, só se permite o testamento público". Aliás, noutro lugar, fizemos restrição a este "só". Quem não sabe ler não sabe escrever. Quem sabe escrever sabe ler. Se alguém sabe ler, mas está em situação física ou psíquica de não poder

ler, não pode fazer testamento cerrado, razão por que só teria a solução do testamento público. Quem não sabe, ou não pode ler, não pode testar por testamento particular, nem por testamento cerrado. Se o decujo escreveu e assinou o testamento cerrado, pôsto que, no momento da feitura, não pudesse ler o que escreveu, mas volta a poder ler e leva, à aprovação, vale o testamento cerrado. Se o decujo escreveu e assinou o testamento, que podia ler, e depois não mais o poderia ler e o leva à aprovação, seria nulo o testamento cerrado. É preciso que, no momento da entrega, possa o testador verificar se aquêle é o testamento cerrado que êle escreveu e assinou. Se, no intervalo entre a feitura do testamento cerrado e a entrega para a aprovação, o testador não podia ler, mas pode ler quando o entrega, o testamento cerrado vale. Se o testamento cerrado foi entregue para a aprovação, não basta que o testador declare que havia lido a cédula e a assinara: o que é indispensável é que o possa ler quando o entrega. Pode ser alegado e provado que o testador, no momento em que o levou ao oficial público, não podia ler. O testador pode simular que ainda o pode ler, ou fingir mesmo que o está lendo. Se o testador confiou a outrem a escrita e não leu o testamento cerrado, mas podia lê-lo, vale o testamento. No Código Civil alemão, que tem duas formas de testar: perante o juiz ou notário, e por declaração do testador, escrita e assinada de próprio punho, com indicação do lugar e dia (§ 2.231), logo se concluiu que o cego só poderia testar por testamento público, mas isto pelo pouco interesse prático da escrita dos cegos, porque, se o cego sabe ler e escrever a sua escrita, não pode ser tido na mesma linha que o analfabeto (cp. F. ENDEMANN, Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, I E , § § 3 5 , 3 7 e 3 9 ; R . W I L K E , Erbrecht, nota 1; G. FROMMHOLD, Erbrecht des BGB., nota 2). Ainda assim, vemos a A. WEISSLER (Das deutsche Nachlassverfahren, 151), pelo conhecimento da escrita dos cegos como circunstância sem qualquer consequência jurídica. No direito suíço, a escrita dos cegos é admitida (P. TÜOR, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, IH, 325). A lei permite a alternativa ao testador: escrever ou pedir que outrem escreva o seu testamento cerrado. O art. 1.638,1, admite que seja escrito por outra pessoa, a seu rogo. Por isto, é nulo, e.g., o testamento escrito por pessoa que não recebeu das mãos do testador o escrito para que copiasse.

CU que o recebeu, em nome déle, por intermédio de outrem. A lei supõe a pessoalidade do pedido. Outra pessoa, - mas é certo que poderá ser escrito por uma das futuras testemunhas. (O art. 1.639 permite que o seja pelo próprio oficial, que o vai aprovar). O auto de aprovação é outra solenidade. Assim, a Relação de Minas Gerais, a 5 de abril de 1922, porém com o só fundamento de não haver na lei proibição expressa. Se o testador deu apontamentos, convém que o redator ou o próprio testador ou os interessados os guardem. Mas não se vá ao extremo de criar o dever de guardar, sob pena de nulidade. Não está na lei. O testamento cerrado pode ser feito em qualquer material que receba escrita (papel almaço, acetinado, avergoado, celofane, papel ou pano gessado; pergaminho, fazenda, couro, ou outro material em que se possa escrever). Não é permitido escrever-se a máquina, nem imprimir-se. A escrita pode ser com a mão, ou com o pé, ou com a boca, ou com outro órgão {e. g., o resto do braço). O que importa é que seja escrita. A despeito de estar nos textos romanos a referência à manuscrição, à mão ("vel ipsius testatoris, vel cuiuslibet alterius manu conscriptam"), o que se há de entender é que só se exige que escreva o testador, ou alguém, por êle, a rogo. O Código Civil brasileiro apenas se refere a ser "escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rôgo". A 2." Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 4 de agosto de 1952 (R. dos T., 216, 239), confirmou sentença do Juiz de Avaré, que sustentou poder ser a máquina o testamento cerrado. Para isso, exibiu argumentos tirados de sistemas jurídicos diferentes, sem atender à letra da lei brasileira. A 1." Turma do Supremo Tribunal Federal, a 26 de junho de 1953 (A. J., 109, 68), não considerou requisito essencial o ser escrito a mão; porém temos de clarear o problema e dar-lhe soluções razoáveis: a) O testamento cerrado pode ser escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rôgo. Se admitíssemos que o testador ou a outra pessoa o escreva a máquina, teria de ser assinado pelo testador, porque somente pode assinar, a rôgo do testador, quem o escreveu. b) Não seria de admitir-se que, escrito a máquina, o assinasse pelo testador quem não o escreveu a mão, porque a lei exigiu a igualdade de grafia, para a identificação da pessoa rogada. Quase sempre o testador ou outra pessoa redige minuta. A minuta pode ser feita pelo próprio testador, ou por outra pessoa, e. g., advogado, e a cé-

dula testamentária, que nela se baseia, ser escrita e assinada pelo testador ou por outra pessoa, que não é a que fêz a minuta (5.® Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 3 de outubro de 1952, R. dos T., 206, 154). No testamento cerrado, há oportunidade, discreta, para a deserdação, ou perdão a indigno, clausulaçao de inalienabilidade ou de incomunicabilidade dos bens abintestato ou intestato, nomeação de tutor ou curador, reconhecimento de filhos, medidas sobre funerais, esmolas e recomendações mais ou menos veladas. Se o testador alude a outro testamento, tem de ser explícito no que deixa que continue e no que revoga. No caso de dúvida, a interpretação judicial há de partir da suposição de ter havido revogação. Não pode considerar parte do testamento cerrado, como de qualquer outro, o que consta de documento, ou de instruções postas em cofre, ou em mãos de outrem. 3 . TESTAMENTO ESCRITO A RÔGO. - O que escreve, a rogo, o testamento, deve ter as qualidades de testemunha: tudo que, sob o art. 1.650, se diz, é aplicável ao escritor da cédula ( C H R . FRIEDR. VON GLÜCK, Ausfiihrliche Erlãuterung der Pandecten, 34, 374). Ainda que seja o oficial público.

a quaestio Domitiana, por ser de DOMÍCIO ScHOTT dedicou-lhe preciosa monografia. É

LABEÃO

a

CELSO. A . F

perguntou; e CELSO respondeu ser ridículo duvidar (L. 27, D., qui testamenta facere possunt et quemadmodum testamenta fiant, 28, 1). Basta que assine pelo testador, para que se lhe exija poder ser testemunha testamentária (E. O T T O , Servius Sulpicius, 52; C. G. HÜBNER, Disputationes testamentariae, 6 8 - 7 4 ; F . ELAMMERER, Beitrãge zur Geschichte und Theorie des rõmischen Rechts, 2 0 8 - 2 2 7 ) . DOMÍCIO LABEÃO

Assim, ficam sujeitas ao art. 1.650 as pessoas referidas nos arts. 1.633, 1.636,1.637, 1.638,1, m e X, e 1.639. ¿Pode exercer a missão de escrever o testamento o herdeiro instituído, o legatário, o testamenteiro? Quanto aos dois primeiros, resolveu a lei (art. 1.719). Quanto ao último, nada se disse. Ao examinar a espécie, decidiram as Câmaras Reunidas da Corte de Apelação do Distrito Federal, pela negativa. 4. ESCRITA DO TESTAMENTO POR OUTREM. - A lei permite que o testador mande a outrem que lhe escreva o testamento: o Código Civil, art. 1.638,1, não exige circunstâncias subjetivas do testador; deixa ao seu arbí-

trio escrever ou dar a outrem que, a seu rogo, o escreva. Mas a assinatura do testador, este sabe e pode assinar, constitui formalidade essencial. Já no direito anterior, o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão n. 8.269, de 21 de junho de 1873, declarou nulo o testamento escrito por outrem, porém não assinado pelo testador que sabia e podia escrever. A distinção entre a escrita e a assinatura é relevante, porque o testador somente roga a outrem, que por êle assine, se não sabe assinar ou está na impossibilidade de assinar. No tocante à escrita, o testador pode, até, escrever o comêço, ou parte do meio, ou o final, e pedir a outrem que escreva o resto. Não se lhe veda, sequer, o acréscimo no que outrem concluiu. (Circunstâncias que convém êle declare ao oficial público quando lhe entrega a cédula testamentária para a aprovação, a fim de constar do auto). Quem escreveu o testamento, em vez do testador, é que pode assiná-lo a rôgo. O testamento pode ser escrito por outrem e assinado pelo testador, ou por essa pessoa que o escreveu; não por outra pessoa. O art. 1.638, IH, do Código Civil é explícito: "Que, não sabendo, ou não podendo o testador assinar, seja assinado pela pessoa que lho escreveu". O testador tem de não saber assinar, ou de não poder assinar, no momento em que o teria de fazer. Surgem questões. Por exemplo: a) o testador escreveu a cédula e, ao ter de assinar, não no pode, razão por que roga a outrem que assine; b) alguém, a quem o testador rogara, escreveu a cédula testamentária, e o rogado faleceu, tendo o testador ficado em estado de não poder assinar, como pretendia, - com isso, só há um caminho para o testador rogar a outrem, que escreva outra cédula testamentária e a assine. Se bem que a lei exija que assine, quem escreveu a rôgo, não há óbice a que assine a rôgo, por não poder assinar o testador, se a escrita foi do próprio testador. A expressão "a rôgo" é a mais usada, porém qualquer outra basta, se diz o mesmo (e. g., "a pedido do testador", "rogado pelo testador", "pelo testador"). (No sistema juri;dico brasileiro, após o Código Civil, a cédula testamentária tem de ser assinada, ou pelo testador, ou a seu rôgo. Não se dispensa, à diferença das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1.°, ao testamento cerrado escrito pelo testador a assinatura dêle, ou, se é o caso, por impossibilidade, a de outrem, a seu rôgo.) ^ Se a cédula testamentária não tem a assinamra do testador, ou de alguém a seu rôgo, não é cédula testamentária, não entrou no mundo jundi-

CO. Evite-se, aí, falar-se de nulidade. Se alguém assina a rôgo e não cabia a assinatura por outrem, então é nula a cédula. A assinatura do testador, ou de outrem, a seu rôgo, no auto de aprovação, nem juridiciza a cédula em que não havia assinatura; nem toma válida a cédula em que a assinatura a rôgo não era de admitir-se. Se quem escreveu a cédula testamentária a assinou, e após a assinou o testador, o excesso (assinatura supérflua da pessoa que escreveu a cédula) não tem relevância, porque houve a escrita e a assinatura do testador. Se o testador escreveu e assinou a cédula testamentária, ou alguém por êle a escreveu e assinou, ou só a escreveu, sendo assinada pelo testador, mas, por êrro, ou negligência, ou ignorância, testemunhas figuram como presentes e assinaram, essas assinaturas supérfluas não invalidam a cédula testamentária. O segrêdo não é pressuposto necessário do testamento cerrado. A assinatura do testador é uma só. Não é preciso que assine cada página, ou que rubrique. Quem escreveu e assina a rôgo só tem de lançar a assinatura no fim da cédula testamentária. Quanto à escrita pelo oficial público, ou o testador assina, ou é o próprio oficial público que o faz. Então, êle escreveu, êle assinou e êle aprova o testamento, que o testador lhe entregou para isso. A lei brasileira não distingue o escrever e o escrever e assinar, mas, para que o oficial público assine a cédula testamentária, é de mister que tenha estado impossibilitado de assiná-lo o testador. Foi essa a interpretação que demos aos artigos 1.639 e 1.638, VII e V m , do Código Civil {Tratado dos Testamentos, H, 153 s.) e prevaleceu na doutrina. Se o oficial público, que escreveu pelo testador, a seu rôgo, pode assinar, veremos adiante. 5 . ASSINATURA DO TESTADOR. - A assinatura há de ter os requisitos gerais das assinaturas: não bastam nomes desenhados, ou marcas: ou lança o testador o próprio nome, ou outra pessoa, para evitar falsidades, se o testador não pode assinar, terá de assinar a seu rôgo (FRANCISCO DE CALDAS PEREIRA DE CASTRO, Analyticus commentarius, sive ad Typxum instrumenti, Emptionis et Venditionis tractatus, 3 4 , n. 1 4 ; M A N U E L ALVARES PÊGAS, Commentaria in Ordinationes Regni Portugaliae, IV, 2 5 0 , n. 86; JOÃO R O DRIGUES CORDEIRO, Dubitationes luris in Foro frequentis, 3 , 3 5 ) . ¿Se o testador encerrou o testamento, escrito do seu próprio punho, e não no assinou? No direito das Ordenações Filipinas, estava claro que.

"sendo escrito por sua mão, abastará, ainda que não seja por êle assinado" (Livro IV, Título 80, § 1). Diferente a Ordenança francesa de 1735, art. 9, que o exigia ainda que escrito por êle mesmo. Mas FURGOLE {Traité des Testaments, c. 2, seção 3, n. 21) atenuava o rigor. O assunto pertence aos testamentos particulares, onde dêle se tratará, e com mais segurança se dispensará, atendido o que ali fôr dito, no testamento cerrado cuja aprovação tiver a assinatura do testador. 6. ASSINATURA A RÔGO. - Se o testador não sabe ou não pode escrever (mas lê), somente pode assinar a rôgo a pessoa que o escreveu. Já assim era no direito anterior. O Supremo Tribunal de Justiça, a 14 de outubro de 1853, decretou a nulidade de testamento que o infringiu. Aliás, nem cabia discutir-se diante da letra das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1. Constituiu decisão contra direito expresso o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 25 de julho de 1906, que julgou válido testamento cerrado, escrito por outrem, a rôgo do testador, e a rôgo assinado por pessoa que não era o redator do testamento {Gazeta Jurídica, 41, 258). Se o testador escreveu o testamento, precisa assiná-lo. Se o não faz, é nada. No direito anterior, as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1, não o exigiam. Hoje, o art. 1.638,1, considera-o requisito essencial. É bom de ver que nessa forma testamentária valem as conclusões sôbre espécie de assinatura que inserimos no início das matérias. Se o testador escreveu, quando podia, o seu testamento, e não o encerrou com a assinatura, por se achar, então, impossibilitado, ¿pode pedir a outrem que o assine? Entendamos que pode, mas deve, após o escrito, alguém, que vai assinar por êle, dizer o que se passou e sem interrupção do texto. Se outrem pode escrever, ¿por que lhe negar tal declaração como que ratificante do escrito do testador que não teve ensejo de assinar e ficou impossibilitado de fazê-lo? No testamento ceaado não pode haver espaço em branco, porém não há sanção de invalidade para o texto em que linhas ou lugares de linhas ficaram sem ser preenchidos. O ato de aprovação, sim, é que há de começar logo após a última palavra da cédula. Se falta lugar para se iniciar, tem o oficial púbhco de pôr o seu sinal público, para que não haja acréscimos ou mterpolaçoes. O que pode acontecer é que, no testamento, haja espaço, ou pequenos brancos, em que se poderia acrescentar, e convém que o testador o evite. Se, com a aprovação, se cerrou o testamento e, mais tarde, houve aumentos, é assunto para alegações e provas.

Quanto à cédula escrita só de um lado, tem o testador, ou quem escreveu por êle, a rogo, de inutilizar o verso, o que pode ser feito com traços suficientes para se mostrar que só se usou um lado do papel. 7. FÔLHA EM QUE SE ESCREVE. - O testamento pode ser escrito de irai lado só da fôlha, ou de ambos os lados (opistógrafo). Se escrito de um só lado, convém que o testador, ou alguém por ele, se outrem escreveu inutilize o lado em branco: se fica, pode o que escreveu intercalar outras disposições. Dir-se-á que não há tão grande perigo no testamento cerrado, porque, neste, o testador, que o levará à aprovação, o receberá das mãos do oficial, cerrado e cosido (art. 1.638, XI). Não é verdade, pela alografia e pelapossibñidade material de se abrir, criminosamente, o invólucro. Porém, no testamento particular, seria preciso imitar, na parte em branco, a letra do testador. A exigência da holografia toma difícil a falsificação ou falsidade. De qualquer modo, negado, no Brasil, o testamento particular alografado, diminui a importância da questão da opistografia. Pode ser - já o dissemos - em carta, volume, placa, ou o que quer que seja. 8. OFICIAL PÚBLICO E DISPOSIÇÃO TESTAMENTÁRIA. - Que as duas pessoas, disponente e oficial público, não se podem juntar na mesma, de si só se evidencia (F. RITGEN, em G . PLANCK, V, 4 4 7 ) . Também não pode ser herdeiro ou legatário do testador no testamento público, ou no cerrado (art. 1.719), ainda que o não tenha escrito e só aprovado. Nula seria a disposição. Se o oficial público escreveu pelo testador, deve satisfazer as exigências para ser testemunha. Então, ser-lhe-á aphcável o art. 1.650, IV, bem como o art. 1.719,1. Se, escrevendo-o, no testamento fôr contemplado, como legatário ou herdeiro, ascendente, descendente, irmão ou cônjuge dêle, nula é a disposição (art. 1.720). Não há ligação da competência do oficial público ao domicilio do testador, ou ao lugar da feimra da cédula testamentária. O ato da entrega para a aprovação é que importa, trate-se de notário, ou de cônsul, ou de qualquer outro oficial público. Dentro da circunscrição, pode êle atender no ofício, ou fora do oñ'cio, como, por exemplo, na residência do testador.

ou no hotel, ou no hospital. Não importa se em dia útil, ou em dia feriado, de dia ou de noite. A aprovação refere-se à cédula testamentária, escrita pelo testador, ou por outrem, ou pelo próprio oficial público. Quem não pode ser testemunha em testamento público, ou particular, também não o pode ser em auto de aprovação de testamento cerrado. Idem, se se trata de oficial público. Assim, os herdeiros instituídos, seus ascendentes e descendentes, irmãos ou cônjuge, ou os legatarios, não podem ser testemunhas, nem o oficial público in casu. A vedação há de existir no momento do auto de aprovação (e. g., o casamento posterior do oficial público com a herdeira, ou legatária, não é óbice; parentesco superveniente). O oficial público não pode outorgar ou delegar podêres a ajudante, escrevente, auxiliar, para a aprovação de testamentos cerrados, como não lhe é dado fazê-lo para a lavratura de testamentos públicos. Os auxiliares que forem nomeados oficiais públicos interinos, sim; idem, os que receberam, por lei, tal função. Se algum oficial público escreveu ou escreveu e assinou a cédula testamentaria, isso não obsta a que o testador a leve a outro oficial público para que a aprove. Aquêle oficial público apenas operou como qualquer outra pessoa que escrevesse ou escrevesse e assinasse a rôgo (cf. Tratado dos Testamentos, II, 155 s.). Mas, se não escreveu, arôgo do testador (art. 1.638.1,1.656 e 1.657), e apenas lavrou ou aprovou, é nula a disposição feita ao ascendente, descendente, irmão ou conjugo, porque se reputa interposta pessoa. A solução deve ser a mesma que se daria aos legatários: o art. 1.720 completamente os equipara. 9. SEGREDO E TESTAMENTO CERRADO. - Havendo o testamento público e o particular, o cerrado só se justifica como a forma velada, com a qual o testador, querendo, ocultará as suas últimas vontades. Se êle permitir, o oficial público poderá lê-lo e verificar se está com as formalidades requeridas às cédulas. Mas isto é a exceção. Nas duas outras formas ordinárias de testamento, o testador dispõe ou de viva voz (testamento púbhco) ou lendo o escrito (testamento particular, cuja leitura pelas testemunhas discutiremos no lugar próprio). No testamento cerrado, é o testador ou outrem, que o escreve: não precisa ser Hdo em voz alta pelo que

escreveu, - a exigência de saber e poder 1er o testador provê, exatamente, a esta verificabilidade do conteúdo por êle. Daí dizer-se que, no testamento cerrado, oficial público e testemunhas têm conhecimento implícito, e não explícito, do testamento. Outros, com certo equívoco, falam de nuncupação implícita, como se dissessem nuncupação relativa ao ato de entrega, e não ao conteúdo das disposições. Mas é preciso advertir na diversidade de legislações, passadas e presentes. Na Ordenança francesa de 1735, art. 9, no Código Civil francês, art. 976, no Código das Duas Sicflias, art. 902, no da Luisiana, art. 1.517, no da Sardenha, art. 751, e no da Holanda, art. 987, havia ou há a exigência de que o testador entregue fechado e selado {scellé), ou faça fechar e selar em sua presença. Também, o da Toscana, art. 307, o revogado italiano, art. 783, o do Chile, art. 1.023, e o de Venezuela, art. 845. O auto de aprovação lavra-se no sobrescrito. Expressivo, o Código Civil argentino, art. 3.666. A solução vitoriosa no Código Civil é a da não-necessariedade do segrêdo. Cerrado e cosido pelo testador, ou entregue aberto, e, até, escrito, a rogo, pelo próprio oficial público que o vai aprovar, tê-lo-á de cerrar e coser o oficial público (art. 1.638, XI). O direito brasileiro não impõe o segrêdo. A cédula testamentaria pode ser entregue fechada e lacrada, ou só fechada, ou só lacrada. Mas, se entregue fechada e lacrada, é preciso que do lado de fora fiquem as últimas palavras, ou fique a última palavra. No art. 1.638, VII, do Código Civil diz-se que "imediatamente depois da sua última palavra comece o auto de aprovação". Não sendo isto possível, ressalva o art. 1.630. VIH, "por falta absoluta de espaço na última fôlha escrita, o oficial ponha nêle o seu sinal público e assim o declare no instrumento". Portanto, o sinal público há de ser no lugar do fechamento ou do lacre, ou do fechamento e do lacre. Se não se dá tal interpretação ao art. 1.638, V n e VIII, o testamento cerrado nunca poderia ser entregue fechado, ou fechado e lacrado. Se o testador entrega a cédula aberta, o oficial púbhco só o há de ler e só o pode ler se o testador o sugere ou lho pede. Não-necessariedade não é o mesmo que inexistência de segrêdo: o testador tem direito ao segrêdo, não lho pede? negar o oficial púbüco, - se êle não lho concede, procedo mal o oficial público que, para o aprovar, exige lê-lo. Pode ser que o disponente só pelo segrêdo tenha escolhido tal forma testamentária, que evita ódios e discórdias entre herdeiros legítimos ou parentes e estranhos, esperançosos de heranças e legados.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.875. A - Legislação Sobre a forma e o conteúdo do testamento cerrado, conferir o caput e o parágrafo único do art. 1.868 e o art. 1.870 do CC/2002. Sobre a liberdade de escolha do notário para lavrar o auto de aprovação, conferir o art. 8.° da Lei 8.935/1994. § 5.875. B - D o u t r i n a 1. Não há exigências legais de formalidades para a escrita do testamento cerrado pelo testador, que é livre na forma ou no conteúdo. 2. Importante inovação trazida pelo Código Civil de 2002 foi a admissibilidade da escrita mecânica, que se expandiu no final do século XX com o advento do computador e da impressora portátil, que substituiu com vantagens a máquina de datilografia. Não mais há necessidade de ser o testamento cerrado manuscrito pelo testador, o qual apenas deve numerar e autenticar todas as folhas reproduzidas ou impressas, com sua assinatura ou rubrica. O uso do computador, todavia, leva ao risco da quebra do sigilo, desejado pelo testador, em face de intrusão perpetrada por terceiros aos arquivos nele contidos. 3. Apesar da finalidade de sigilo das disposições testamentárias, que por alguma razão o testador deseja preservar até sua morte, admite a lei que o testador possa valer-se de terceiro de sua confiança para redigir o testamento. A lei não exige que o testador saiba ler, nada impedindo que o analfabeto se utilize do testamento cerrado, desde que saiba assinar, uma vez que pode ouvir o que foi escrito por terceiro de sua confiança, além da autenticidade da origem do instrumento, que é atestado pelo auto de aprovação notarial. O Código Civil de 2002 manteve a expressão "ou por outra pessoa, a seu rogo", vinda do Código anterior, o que faz atual a interpretação de Pontes de Miranda de que deixa-se ao arbítrio do testador, pois deste não se exige circunstâncias subjetivas. 4. A assinatura do testador ao final do testamento, todavia, é requisito essencial (art. 1.868, caput, do CG/2002), ainda que tenha solicitado a outrem para fazê-lo, não sendo exigência legal que assine ou rubrique as páginas ou folhas anteriores. 5.0 notário ou seu substituto legal pode redigir o testamento cerrado a rogo do testador, mas, por dever de ofício, tem de manter o sigilo do conteúdo, não o reproduzindo em suas notas, exceto o auto de aprovação. § 5.875. C - Jurisprudência "Decidiu o STJ que, por mais elástica que possa ser a interpretação em matéria testamentária, de modo a fazer prevalecer a vontade do testador, não é possível admitir o testamento cerrado, datilografado por outra pessoa, no caso uma sobrinha, ausente a assinatura do testador, que é requisito essencial nos termos da lei" (STJ, REsp 163.617/RS, S.^T, ]. 07.10.1999, rei. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 24.04.2000, p.51).

§ 5.876. ENTREGA AO OFICIAL PÚBLICO E AUTO DE APROVAÇÃO 1. PERFEIÇÃO DO TESTAMENTO CERRADO. - Já dissemos que o testamento, desde que se fêz, é ato perfeito. Algumas conseqüências já foram tiradas de tal afirmação: outras exsurgem. Mas a cédula, de que tratamos, ainda não é testamento. Antes de ser aprovado o testamento cerrado, não passa êle de ato imperfeito, talvez de menor valor que um testamento hológrafo, que possa valer como codicüo e nos limites do valor dos codicilos. Quem morreu deixando tal cédula, morreu intestado. Se a cédula fôr hológrafa e contiver disposições permissíveis em codicüos, pode valer como tal; não, porém, como testamento.

2. APRESENTAÇÃO DA CÉDULA. - Quando o testador, na presença das cinco testemunhas, apresenta ao oficial público a cédula, que êle, ou outrem por êle, escreveu e assinou, procede a ato de nuncupação. Por isto se fala de nuncupação implícita: oficial público e testemunhas somente conhecem (ou melhor: somente precisam conhecer) exteriormente, e não no seu conteúdo, a cédula testamentária. Com o ato de entrega, começa outra fase, inconfundível, da elaboração do testamento cerrado: por isto mesmo, já o testador, após o gesto de declaração do art. 1.638, IV, não pode introduzir modificações ou cláusulas novas, que constem do auto e não da cédula. Se ocorre que lhe lembre alterar ou acrescentar, deve continuar na cédula e proceder, de nôvo, à entrega e declaração. É requisito essencial do testamento cerrado a entrega do testamento, pelo testador, em presença, pelo menos, de cinco testemunhas, ao oficial público que o há de aprovar. Trata-se de ato pessoalíssimo. E não só pessoalíssimo - ato que tem por fim deixar certo qual o testamento de que se trata. Pessoalíssimo, para que se identifique o testador; imediatamente relativo à determinado escrito, para que se identifique a cédula testamentária. O oficial público e as testemunhas têm de assistir a tudo que se passa após a entrega do testamento cerrado ao testador e até que todos assinem: o oficial público, as testemunhas e o testador. Há a responsabilidade do oficial público pelo defeito de forma, que êle poderia ver, pela má fé, pelo descuido, imperícia ou negligência. Quan-

do se trata de interpretação de regra jurídica, que havia de ser observada, e há discordâncias na doutrina, ou na jurisprudência, o oficial público só é responsável se prevaleceu alguma das interpretações e do acolhimento da outra, que foi posta de lado pela jurisprudência dominante, ou do mais alto grau judiciário, ou pela doutrina, houve danos a algum dos interessados. Um dos casos típicos da responsabilidade do oficial público, em se tratando de testamento cerrado, é o de ter atrasado tanto o recebimento para a aprovação, ou para o ato aprovativo, que o testador não pôde a tempo obter a aprovação. Se o oficial público deixa que assista à entrega ou ao ato aprovativo pessoa que o testador não queria que assistisse, responde êle pelos danos, inclusive morais. A assistência com o assentimento do testador é sem consequências de invalidade e de responsabilidade. Pode tratar-se, de advogado do testador, ou de jurista que êsse entendeu convidar para evitar erros de direito. Deve-se evitar a escrita de testamentos cerrados e a própria assinatura, ou entrega para a aprovação, em solenidades, festas, banquetes e cerimônias fúnebres. Não há, porém, aí a priori, causa de invalidade. Se algum herdeiro, ou legatário, está presente e declara que aceita, não há, aí, pacto sucessório, o que o sistema jurídico brasileiro não tem. Se não figurou como oficial público, ou testemunha, o elemento supérfluo da aceitação, mesmo se declarado pelo testador, ou pela pessoa que escreveu o testamento, não há invalidade da deixa, nem do testamento. O que pode acontecer é que se componha causa de anulabilidade, e. g., por dolo, êrro ou violência. A entrega da cédula testamentária é ao oficial público, perante as testemunhas, que hão de ser cinco. Isso não significa que não possa haver mais de cinco. Só o testador pode entregar. O ato é pessoalíssimo. Se não tem mãos, ou braço que possa substituir mão, ou pé, com que pratica atos de tradição, ou outra parte do corpo, que o permita e êle costume usar, é entrega a declaração do testador de que "ali, na mesa, está o testamento, quero que o apanhe o oficial público e que o aprove" Nesse caso e noutros semelhantes, o que se há de exigir é que haja a impossibilidade de pegar a cédula testamentária e de entregá-la, materialmente. O que o testador deve evitar é o intermediário. Se A pede a B que lhe ponha na bôca a cédula testamentária e chama o oficial público, diante das testemunhas, para que a apanhe, há entrega. Aí, não houve intermediariedade, porque o ato de pôr na bôca de A a cédula testamentária ainda nada tem com a tradição. A tradição pode ser brevi manu, como se A tinha feito sinal ao oficial público

para que retirasse da gaveta a cédula testamentaria, cu se ao oficial público havia entregue a cédula testamentária quem a rogo a escrevera, ou a escrevera e assinara, e o testador não poderia recebê-la e passá-la ao oficial público, sem ser por declaração de vontade que tenha eficácia de tradição, satisfeito o pressuposto de não poder o testador fazer a entrega com parte do corpo. As testemunhas têm de atender a que a lei exige a entrega ao oficial público, diante delas. A declaração oral de que o testamento entregue é do testador e êle quer que o oficial público o aprove é o quod plerumque fit. Mas o surdo-mudo e o mudo têm de escrever, na face externa da cédula testamentária, que o testamento entregue é dêle e quer que seja aprovado. O oficial público e as testemunhas têm de assistir a essa escrita, de modo que não bastaria ter escrito antes. Se o fizera, tem de fazê-lo de nôvo, e o auto de aprovação deve referir-se à duplicidade da declaração, com alusão ao motivo. Dá-se o mesmo se, antes da entrega, o testador houvera escrito parte da declaração, ainda se o tivesse feito somente diante do oficial público, ou somente diante das testemunhas, ou de algumas, ou de uma, ou somente diante do oficial público e de alguma ou algumas das cinco testemunhas. A lei não fala em ser assinada pelo testador a declaração feita pelo surdo-mudo ou pelo mudo; de jeito que não se pode reputar requisito essencial, aí, a assinatura do testador declarante. O testador não pode outorgar podêres a alguém para entrega da cédula testamentária ao oficial público. A pessoalidade do ato afasta qualquer delegabilidade. O testador tem de fazer e de ver a entrega. Assim é que se evitam pessoas interpostas, que poderiam substituir a cédula testamentária. Imaginemos que o testador houvesse escrito e assinado a cédula testamentária e depois, quando já não pudesse escrever e assinar, quisesse outras disposições. Alguém, interessado na irrevogação, em vez de apresentar a cédula escrita e assinada por outrem, a rôgo do testador, daria para a aprovação o que o testador havia escrito e assinado. O testador tem de dizer que o testamento é seu e que o tem por "bom, firme e valioso", isto é, válido e eficaz (com o auto de aprovação, entenda-se). Não precisa empregar as mesmas expressões, que aliás se afastam, com a imprecisão da praxe, da terminologia científica. O oficial público tem de lançar o que signifique considerar o testador que aquêle é o seu testamento, que atendeu às exigências legais (= é válido) e, com o auto de aprovação, terá a eficácia para o futuro e a eficácia revogatória, que é a de alcance dos testamentos anteriores ou do testamento anterior. Mesmo se o

testador não empregou as expressões que a lei râncidamente conservou (na esteira das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1.°), nada obsta a que o oficial público as lance. Quanto à substituibilidade das expressões "por seu, bom, firme e valioso", a jurisprudência é assente (2.® Turma do Supremo Tribunal Federal, 23 de novembro de 1948, R. dos T., 187, 960; 1/ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 28 de agosto de 1947, R. E, 118,186; Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 24 de novembro de 1933, R. dos T., 121, 229). Para a solução oposta citavam-se decisões antigas e o Assento de 17 de agosto de 1811, em que se dizia que o intérprete tinha de atender à letra da lei, "não devendo, nem podendo antepor-se, nem pospor-se, ou substituir por equipolência, as formas" das Ordenações Filipinas. Livro IV, Título 80, § 1. O Assento de 10 de junho de 1817 foi expressivo: "As palavras adotadas no Assento de 17 de agosto de 1811, que, declarando a Ordenação, Livro IV, Título 80, § 1.°, proíbem antepor, pospor, ou substituir por equipolência, as formas prescritas nessa Ordenação, nunca devem entender-se de uma observância supersticiosa da lei, que, olhando só para a letra, destrua sua verdadeira intenção; mas sim das formalidades substanciais do testamento, que se não podem, nem devem, confundir com a anteposição, posposição, ou substituição de palavras, que tenham a mesma significação". A lei cercou de precauções a identificação da cédula: além da entrega, presentes as testemunhas, e feita pelo próprio testador, exigiu que o oficial público, pergunte, perante as mesmas testemunhas, ao testador, se aquele é o seu testamento e quer que seja aprovado, quando o testador, de si mesmo, não se tenha antecipado em declará-lo (art. 1.638, V). Essencial é, portanto, a declaração do testador quanto a ser aquêle o seu testamento e ao seu desejo de que seja aprovado. No caso de mudez ou de surdo-mudez, o art. 1.643, que constitui substituto, permite que a declaração seja escrita na face externa do papel ou do envoltório. (Analogicamente, não, porque aqui não cabem analogias; mas pela revelação do conteúdo da própria regra, aplicar-se-á o art. 1.642 quando o testador, que não seja surdo-mudo nem mudo, não puder falar ou por acidente ocasional ou por prescrição médica após operação, ou pela impossibilidade material criada pelos aparelhos.) Uma vez que a tradição tem por ñm evitar a substituição do testamento e comprovar a sua identidade, não bastariam os gestos, não traslativos, do testador. Em 18 de junho de 1869, a Relação do Rio de Janeiro decidiu que a entrega por outrem, apontando o testador a cômoda em que estava o

testamento, não poderia ser suficiente. Em 22 de dezembro de 1900 e 13 de junho de 1901, julgou a de Minas Gerais ser essencial o recebimento das mãos do testador, em presença de todas as testemunhas, em situação de poder ver o testador e o ato, e de ouvir as perguntas ou declaração. Tudo isto é perfeitamente certo, mas há casos extraordinários, que convém meditar; a) O testador sem mãos: seria absurdo reduzir a tradição à entrega manual, quando as mãos, instrumento ordinário da tradição das cédulas, não existam. Será conveniente que o oficial declare a circunstância extraordinária e diga em que consistiu o meio identificador da cédula entregue. b) Testador com as mãos impedidas ou paralíticas: a situação equivale à do número anterior, - a solução tem de ser a mesma. Se fôsse a priori o princípio dos dois acórdãos da Relação de Minas Gerais, falhariam nesses dois casos. 3. TESTEMUNHAS DA APRESENTAÇÃO. - São cinco as testemunhas, número igualmente exigido aos outros testamentos. Porém, neste, não no são do testamento, mas da apresentação do testamento. Atestam a identidade da carta e as declarações do testador de que aquêle é o seu testamento e quer que seja aprovado. São testemunhas dêste ato, e não das disposições testamentárias propriamente ditas. Mas, como as dos testamentos púbHco e particular, são instnimentárias, e não acidentais. Se é certo, como, explicitamente, FRANCISCO DE CALDAS PEREIRA DE CASTRO e FRANCISCO PINHEIRO ensinavam, que não precisam, no velho sentido, ser rogados, nem por isso deixam de ser, hoje em dia, testemunhas convocadas, ainda que aproveitadas dentre as pessoas acidentalmente presentes. Devem estar ali, sem interrupção, como no testamento público, mas somente a partir do gesto do testador ao passar às mãos do oficial público a cédula testamentária, declarando-a sua e dizendo-a para ser aprovada, até a completa ultimação do ato, que é o cerrar e coser (art. 1.638, XI). As testemunhas são apenas da entrega ao oficial público para a aprovação e para os atos que são necessários até que se conclua o ato aprovativo, em que são elementos essenciais as suas assinaturas. Depois disso, é que o oficial público o cerra e cose. Se o testador o fechara, a formalidade de cerrar e coser, que é dever do oficial público, envolve novo envolvimento, pois que lá estão a cédula testamentária e o auto de aprovação, que oficial público, testemunhas e testador (ou alguém a rôgo) têm de assinar. O ato de aprovação, de que se lavra o auto, é uno, no espaço e no tempo, desde a entrega da cédula testamentária até a assinamra por todos

OS que têm de assinar, inexcetuàvelmente sete pessoas (oficial público, testemunhas e testador). A formalidade de cerramento e costura é formalidade essencial, porém não se diz, na lei, que as testemunhas tenham de assistir. Depois, há a entrega ao testador e o lançamento no livro do cartório, com o dia, mês e ano em que foi aprovado. A presença de algum herdeiro ou beneficiado, por outro meio, pelo testamento cerrado, pode ser indício de coação ou de induzimento. Não basta, por si, para que haja invalidade (Relação do Rio de Janeiro, 29 de abril de 1879). A propósito da presença das testemunhas decidiu a 2.^ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, a 25 de novembro de 1949 (R. J. B., 102, 168): "Na espécie, como acentuou a sentença apelada, alguns dêsses requisitos essenciais falecem nos autos. E certo que o tabelião fêz constar da cédula que tôdas as formalidades legais foram satisfeitas; mas a prova produzida, com depoimentos de testemunhas instrumentárias, mostra que nem tôdas aquelas formalidades foram observadas. É o que se há de reconhecer no caso vertente dos autos, mesmo quando se não deva alimentar a superstição dos formalismos obsoletos, que, no dizer de PONTES DE MIRANDA {Tratado dos Testamentos, N , 11), prejudicam em vez de servir à vida. Não vale argumentar com o conteúdo do testamento, que, pela sua licitude, pelo espírito caridoso que o teria inspirado, favorecendo uma aleijada, revelaria a vontade do testador, mas, por defeito de forma, venha a ser nula. É que, segundo é elementarmente sabido, as formas testamentárias são de ordem pública; e por isso adverte o mesmo PONTES DE MIRANDA (11, 14): No caso do testamento, sem a forma, é imperfeito e nulo o próprio ato. A falta da forma deixa não completo, é pois nulo o ato testamentário. Na espécie, duas das testemunhas instrumentárias declaram, firmemente, que não viram o tabelião receber qualquer papel do testador, ocorrendo que a primeira delas, Pedro Frazão da Silva, nem sequer entrou no quarto onde se achava o testador enfêrmo, quarto onde teria sido feito o testamento. Ora, a entrega do testamento ao oficial público ou notário, em presença, no mínimo de cinco testemunhas, é um dos requisitos essenciais do testamento cerrado, requisito que, in casu, não foi observado, motivo pelo qual, já por si, por êsse grave defeito de forma, o testamento é de ser considerado nulo (Ac. das Câmaras Reunidas do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, R. de D., 80, 352). São também requisitos essenciais: a) que o tabelião pergunte ao testador, perante as mesmas cinco testemunhas, se aquele é o seu testamento e quer que seja

aprovado (inciso V do art. 1.638); b) que a auto de aprovação seja lido pelo notario, assinando êle, as testemunhas e o testador (se este souber e puder), qual se vê do inciso IX do artigo mencionado. No entanto, na espécie, ao que resulta do depoimento do mesmo Frazão, de Antonio José Barbosa e de Gumercindo da Costa Queiroz, tais formalidades também não foram observadas, e tinham de ser observadas, eis que, - e evoque-se áinda uma vez o doutíssimo PONTES DE MIRANDA: "O que é requisito essencial está no art. 1.638. Fora disso, quaisquer nulidades não são absolutas e têm de ser apreciadas pelo juiz." (11,150)". 4 . DECLARAÇÃO DO TESTADOR. - Já dissemos que na entrega há gesto e há declaração, ordinariamente oral, excepcionalmente, no caso de mudez ou de não poder falar, escrita. As declarações ou são antecipadas, ou, iniciadas pelo gesto, em resposta às perguntas do oficial público. Se escritas, ou orais, podem ser, se oficial público e testemunhas compreenderem, em língua estrangeira (art. 1.640).

Não há nenhuma exigência sacramental: "êste é o meu testamento e quero que o aprove", ou qualquer outra frase que o valha. O Código Civil diz que, em presença das testemunhas, o oficial público exara o auto de aprovação, "declarando nêle que o testador lhe entregou o testamento e o tinha por seu, bom, firme e valioso" (art. 1 . 6 3 8 , V I ) . Mas isso, a despeito do que se lê em FERREIRA ALVES {Manual, 19, 1 1 4 s.) e ITAEAIANA DE OLIVEIRA {Elementos de Direito das Sucessões, 2 4 3 ) , não constitui expressão sacramental: bastam outras que equivalham. Aqui, a doutrina tecida em tômo das Ordenações Filipinas, derrubou o rigorismo de DOMINGOS ANTUNES PORTUGAL {Tractatus de Donationibus, m , c. 16, n. 4 7 ) , firmado em ANTÔNIO DA GAMA, ÁLVARO VALASCO e BENTO PINHEL, que exigia perguntas sacramentais. Cf. julgados de 1702, de 1 7 1 1 , de 1 8 0 2 e outros mais, citados por JOÃO RODRIGUES CORDEIRO {Dubitationes luris in Foro frequentes, d. 6, n. 4). Este ensinou: a) que o testador pode antecipar-se; b) mas & falta não é a mesma coisa que a inversão-. se o testador entregou, sem nada dizer, há nulidade. Coincidia com o que FURGOLE, comentando a Ordenança francesa, escreveu: basta que se prove de maneira inequívoca. Portanto, inversa ou não. Nunca a falta. Ao próprio mudo será exigido que escreva.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.876. A - Legislação Sobre a entrega do testamento cerrado ao notário e o auto de aprovação, conferir os arts. 1.868, I e 1.869 do CC/2002. §5.876. B - D o u t r i n a 1. O testador faz a entrega do testamento cerrado ao notario, acompanliado de duas testemunhas, declarando que aquele é seu testamento e quer que seja aprovado. As testemunlias podem ser mais de duas, mas não pode ser apenas urna. A iei atual não mais exige o formalismo de o notário perguntar ao testador se aquele é seu testamento e se deseja que seja aprovado, velharia tautológica que, consequentemente, não precisa ser consignada no auto de aprovação. 2. A entrega é pessoal, não podendo o testador ser representado por outra pessoa, para que se afaste o risco provável de o representante violar ou substituir o instrumento por outro. 3. A declaração do testador não necessita de ser oral, admitindo-se que o mudo possa fazê-lo por escrito ou mediante a linguagem de sinais, se for compreensível pelo notário. E não só para o mudo, mas igualmente para o surdo-mudo, para o qual basta que escreva na face externa do papel ou até mesmo no envoltório que aquele é seu testamento e que quer sua aprovação. 4.0 Código Civil de 2002 reduziu de cinco para duas testemunhas de apresentação, Para a lavratura do auto de aprovação exige a "a presença de duas testemunhas" e não "das" testemunhas de apresentação, o que abre o questionamento se podem ser distintas. A lei anterior aludia a "das" testemunhas, ou seja, as testemunhas de apresentação. Apesar da indeterminação da preposição, deve-se entender que as testemunhas são as mesmas, tanto para a apresentação do testamento, quanto para a lavratura do auto, quanto para a assinatura deste, em virtude da interdependência dessas etapas e de economia procedimental. Todavia, se o auto de aprovação for realizado em dia diferente do da apresentação, por motivo justificável, não há impedimento legal de sejam outras as testemunhas da lavratura, leitura e assinatura do auto. O Inc. IV do art. 1.868 do CC/2002 refere à assinatura do auto "pelas testemunhas", sem especificar quais. Pontes de Miranda tem entendimento mais restritivo, no sentido de ser uno o que denomina de ato de aprovação, no espaço e no tempo, desde a entrega do testamento até a assinatura de todos. § 5.876. C - Jurisprudência "O STJ decidiu que o fato de as testemunhas de apresentação terem assinado a cédula em cartório, após a assinatura da testadora, e não apenas o auto de aprovação, não invalida o testamento cerrado, se declararam em juízo que não conheciam seu conteúdo" (STJ, AgRg no Agin 570.748/SC, 3.^ T, j. 10.04.2007, rei. Castro Filho, DJ 04.06.2007, p. 340).

§ 5.877. APROVAÇÃO DO TESTAMENTO CERRADO 1. MOMENTO DO AUTO DE APROVAÇÃO. - Entregue o testamento, com declaração do testador, antecipada ou em resposta "para logo'" em presença das testemunhas, o oficial público exaia o auto de aprovação, "declarando nêle que o testador lhe entregou o testamento e o tinha por seu, bom, firme e valioso" (art. 1.638, VI). É reminiscência das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1. Pergunta-se: ¿ainda hoje são essenciais as palavras da fórmula que o testador tinha de dizer, - bom, firme e valioso^ Já dissemos que não.

Logo depois de receber a cédula testamentária, com a declaração oral, ou escrita, do testador de que aquêle é o seu testamento e quer que o aprove, o oficial público começa a lavrar o auto de aprovação. Êsse há de partir na linha que se segue àquela em que está a assinatura do testador, ou de quem assinou a seu rôgo. Se não há lugar para isso, mesmo se teria de ser na margem de baixo do papel, ou outro material em que se escreveu o testamento, o oficial público põe o sinal público junto à assinatura do testador, ou de quem a rôgo assinou a cédula testamentária, e inicia a feitura do auto de aprovação na página ou lauda ou folha imediata ou anexada. Se não apôs o sinal público, ou se não lançou o auto de aprovação em igual material, ou no papel próprio do cartório, aprovação não houve, salvo se, em virtude de circunstâncias extraordinárias, que têm de ser narradas no auto de aprovação (e. g., incêndio do cartório), nêle se declara que faltou material idêntico. O papel do cartório é o papel apropriado para a lavratura do auto de aprovação, se não há página seguinte, idêntica, à da cédula testamentária. Se há, aí é que se começa o auto de aprovação sem se exigir que seja o mesmo o papel da continuação, para a qual é adequado o papel do cartório. Não é preciso que se colem as páginas, nem que se preguem. Do auto de aprovação há de constar, necessàriamente, que, perante as testemunhas, por ocasião da entrega da cédula testamentária, o testador declarou que aquêle era o seu testamento, cuja aprovação quis. O que não é de exigir-se é o emprêgo das palavras que estão na lei. A referência a ter sido lido pelo oficial público também é pressuposto necessário do auto de aprovação. O auto de aprovação tem de dizer que foram observadas as formalidades essenciais. Não importa, porém, qual o lugar dêle em que pôs o oficial público a declaração. Nem a ordem em que se mencionaram.

No direito anterior, a Ordenação dizia: "e perante elas (as testemunhas) lhe perguntará o Tabelião, se é aquele o seu testamento e se há por bom, firme e valioso; e dizendo que sim, fará logo em presença das testemunhas o instrumento da aprovação nas costas do próprio testamento, declarando como o testador lhe entregou, e o houve por seu, bom e firme; no qual instrumento de aprovação assinarão todas as cinco testemunhas, e o testador, se souber, ou puder assinar". Hoje, a exigência constitui mera recordação da fonte: onde devia ser exigida a declaração, não no foi (Código Civil, art. 1.638, V). O oficial púbhco tem de declarar o que o testador lhe disse: bom, firme e valioso, ou outra frase que valha o mesmo. Não se poderia persistir na obsoleta interpretação do Assento de 10 de junho de 1817, que, no § 3, procurou explicar a Ordenação: "Com a declaração do testador de que é o seu testamento, que o há por bom, firme e valioso, ou, na falta desta declaração, com a resposta do testador ao tabelião dadas as perguntas declaradas no § 1.° da Ordenação citada". Tão-pouco, valeria hoje o que ensinaram J. H. CORREIA TELES, A. J. GOUVEIA PINTO, TEIXEIRA DE FREITAS e a jurisprudência. A escrita do auto de aprovação é precedida pela aposição do sinal na última folha escrita (art. 1.638, VHI), se não houver lugar para todo o auto, ou, pelo menos, para começá-lo. Daí as seguintes espécies: a) Se o testador quis apresentá-lo fechado, capeado pela última fôlha, permitindo ver onde acaba o seu escrito, - e deixou espaço, suficiente para todo o auto, lavrá-lo-á o oficial público, sem que isso dispense a intervenção autenticadora de cerrar e coser (art. 1.638, XI). b) Se o testador encheu toda a última fôlha com as suas declarações causa mortis e fechou o testamento, de modo que a envolvente, que tem de ser última, não dê margem para o auto, aporá o oficial público, nesta, o seu smal. (Tal solução, prática, afastada a dificuldade antiga de se conciliarem os §§ 1.° e 2° das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80. Mas alguns intérpretes teimavam em não ver.) Testamento cerrado, que acabou com a última fôlha tôda escrita, tem de levar o sinal público que o ligue, por êsse expediente, ao auto de aprovação, lavrado em outra fôüia. Se não no tem, nada o prende ao auto, e é nulo (J. A. CORREIA T^LES, Digesto português, § 253). A cédula testamentária do artigo 1.638, MH, sem a identificação e sem a atestação solene das declarações do testador, constitui negócio jurídico imperfeito. Testamento

cerrado sem aprovação, ou aprovação de testamento que não está no lugar, ainda não se perfez. Com a fôlha da aprovação, o oficial público envolvê-lo-á, cerraivio~o e cosendo-o. No ato de aprovação deve o oficial certificar a presença das testemunhas, para lhes atestar a identidade e idoneidade. As assinaturas são atos materiais. Mas o momento em que foram lançadas supõe serem posteriores à leitura do auto pelo oficial público, o que só êle poderá certificar. Se ocorre conñito entre o que diz o oficial público, no auto, e as testemunhas que o assinam, só se pode presumir válido o que diz o oficial público, porquanto as testemunhas, ex hypothesi, o assinaram. Tratar-se-á, então, de prova contra a fé do oficial. O juiz apreciará soberanamente. Surge o problema de, após a entrega da cédula testamentária, querer o testador que conste do testamento outra disposição, ou cláusula. Não se traga à balha o caso do Tribunal Supremo da Espanha, a 6 de julho de 1914, que considerou válido como testamento público o auto de aprovação que continha disposições novas, a despeito da nulidade da cédula testamentária. Temos de precisar o que é que se há de fazer se ao testador ocorre que quer alterar o testamento cerrado, que entregou, ou a cédula testamentária ainda aberta, se já iniciada a formalidade do ato de aprovação. O oficial público há de sugerir que se faça outro testamento público, pois estão presentes as testemunhas exigidas. A inserção no auto de aprovação exige que o oficial público, ao ter de satisfazer a exigência do lançamento no livro do cartório, não se restrinja à "nota do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado e entregue" (Código Civil, art. 1.643): tem de lançar o que o testador disse a mais e consta do auto de aprovação, que o oficial público, as testemunhas e o testador assinaram. JOSÉ HOMEM CORREIA TELES (Digesto português, m , art. 1.792, nova edição revista, 246 s.) escreveu: "Qualquer declaração de vontade que o testador faça no instrumento de aprovação, vale como testamento aberto" ANTÔNIO RIBEIRO DE L I Z TEIXEIRA (CUJSO de Direito Civil português, 11, 174) repete-o: "Pode o testador fazer qualquer declaração de vontade no instrumento ou auto de aprovação do testamento, a qual vale como testamento aberto, pois lhe é aplicável a disposição da Ordenação, Livro IV Título 80, pr.". Ora, as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, pr., falando do testamento aberto, exigiam que tal testamento, digamos púbüco, fôsse escrito nas Notas: "O qual testamento o Tabelião escreverá nas Notas, e será assinado pelas ditas testemunhas e pelo testedor...". Portanto, tmha de ser feito o lançamento no Livro de Notas do oficial público. Dá-se o mesmo, hoje, sob o Código Civil.

Durante a lavratura do auto de aprovação pode dar-se que alguém tenha de sair, por alguma necessidade, inclusive se tem de tomar remédio, ou injeção, ou ter de ser pôsto em lugar especial de tratamento o testador. Tudo pára, até que a pessoa volte ou possa estar presente, psiquicamente, à feitura do auto. Se o intervalo é longo, de modo que não possam as outras pessoas esperar, a solução é a de recomeçar-se, convindo que no texto já escrito em parte se narre o que ocorreu. Tudo que se lera tem de ser repetido, inclusive o ato de entrega e de declaração de vontade do testador. O oficial público não pode quebrar a unidade do ato, como se, a despeito da saída ou do desmaio, de uma das testemunhas, entende que deve continuar. Aí, há infração; em caso de decretação de nulidade, há responsabilidade do oficial público. Não há regra jurídica sôbre a duração das formalidades do auto de aprovação. A continuidade, a unidade, tal o que importa. A entrega da cédula testamentária pode ter sido às onze horas da noite e só ser assinado o auto de aprovação no dia seguinte, razão para se dizer a que horas se vai assinar. O auto de aprovação pode não se referir a intervalo que ocorreu, porque o que se supõe é que a unidade do ato de aprovação não se tenha quebrado. Nem seria recomendável qualquer referência a saída rápida de alguma testemunha, ou do testador, ou do próprio oficial público. A diferença de tinta ou de caneta pode resultar de insuficiência do que se estava usando (2.® Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 25 de novembro de 1949, R. J. B., 102, 170 s.: "A propósito cabe aqui, adequadamente, o que diz PONTES DE MIRANDA, no Tratado dos Testamentos, cuja transcrição faço, contra meus hábitos: "No ato de aprovação deve o oficial público certificar a presença das testemunhas para lhes atestar a identidade e idoneidade. As assinaturas são atos materiais, mas o momento em que foram lançadas supõe serem posteriores à leitura do auto pelo oficial público, o que só êste poderá certificar. Se ocorrer conñito entre o que diz o oficial público, no ato, e as testemunhas que o assinaram, só se pode presumir válido o que diz o oficial púbüco, porquanto as testemunhas, ex hypothesi, o assinaram. Tratar-se-á, então, de prova contra a fé do oficial púbhco. O juiz apreciará soberanamente". Afastada a hipótese de conluio criminoso do oficial público, a quem o acórdão abonou a probidade, e as testemunhas, entre as quais um médico conceituado no município, poder-se-ia repelir desde logo a invalidade do ato lavrado pelo tabelião, e em parte infirmado por aquêles que o assinaram. Se essas testemunhas o fizeram inconscientemente são inidôneas para destruir a fé do oficial púbüco; nenhuma confiança me-

recem suas declarações posteriores. Se compreenderam a responsabilidade que lhes tocava e prestaram-se à formalização de uma fraude, são partícipes do ato, e não podem agora inocentar-se com a própria torpeza. Mas os depoimentos cotejados e que serviram de base ao venerando acórdão não conduzem, com firmeza, à conclusão de que o oficial público tivesse certificado em falso, que essas testemunhas estivessem presentes e ouvissem tudo que se passou durante o ato probatório do testamento". 2 . LEITURA DO AUTO PELO OFICIAL PÚBLICO. - A leitura ao testador e às testemunhas é um dos requisitos essenciais do testamento cerrado e constituiria grave argumento contra a interpretação da ignorância da língua nacional por parte do testador (nunca das testemunhas) nos casos figurados conforme o Código Civil, art. 1.640, in fine.

No direito anterior, não eram expressas, a êsse respeito, as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, §§ 1 e 2, mas - sendo o testamento instrumento público e exigida a todos êles a leitura antes de subscreverem - entendiam ser solenidade essencial o requisito de se ler, assim o testamento público como o cerrado. Invocavam-se J. H. BOEHMER, M A N U E L ÁLVARES PÊGAS {Commentaria in Ordinationes Regni Portugalliae, IV, 46, n. 7) e JOÃO RODRIGUES CORDEIRO {Dubitationes luris in Foro frequentes, d. 9, n. 22, d. 47, n. 7, d. 47, n. 31). Mas havia grave incoerência de doutrina: solenidade essencial é solenidade que deve vir in ipso testamento, e os praxistas entendiam que podia ficar para prova posterior. Hoje, a solução tem de ser diferente: na aprovação, o oficial público deve declarar ter lido, porquanto o Código Civil, art. 1.638, IX, exige a leitura. A leitura do auto de aprovação do testamento cerrado há de ser feita pelo oficial público. Não pode êsse deixá-lo ao testador, nem a qualquer das testemunhas, nem a auxiliar seu. Somente no caso de surdez ou surdo-mudez do testador, é que se há de dispensar a leitura para o testador, que o escreveu todo e o assinou, e ao entregá-lo ao oficial público, ante as cinco testemunhas, na face externa do papel, ou do envoltório, já havia escrito que era o seu testamento e queria a aprovação. No auto de aprovação o oficial público há de mencionar que leu o testamento para as testemunhas e o testador estava (ou era) surdo ou surdo-mudo. 3. ASSINATURAS DO AUTO DE APROVAÇÃO. - A assinatura do oficial público é a primeira do auto de aprovação: trata-se de ato público. Seguem-se as testemunhas e o testador, que, pela lei, deve ser o último a assinar. Se êste não sabe ou não pode, assina por êle uma das testemunhas, declaran-

do, ao pé da assinatura, que o faz a rôgo do testador, por êsse não saber ou não poder assinar (art. 1.638, IX e X). Tal assinatura a rôgo nada tem com a assinatura, a rôgo, da cédula (art. 1.638, ni): a da cédula será necessariamente, se a rôgo, feita por quem escreveu o testamento; a do instrumento de aprovação, necessariamente, por uma das testemunhas. A ordem das assinaturas das testemunhas é sem relevância. A testemunha que assina pelo testador, tem de ser a pessoa que satisfaz as exigências para ser testemunha. É uma das testemunhas que constam do auto de aprovação. Podem elas ser cinco, ou mais, porque o Código Civil, no art. 1.638, IV, exigiu cinco testemunhas como mínimo (verbis "presença, quando menos, de cinco testemunhas"). A pessoa, que há de assinar pelo testador, não é uma pessoa a mais das testemunhas. Pode ser uma das cinco testemunhas, ou, por exemplo, uma das seis, ou uma das sete. Quem não foi testemunha não pode assinar pelo testador o auto de aprovação do testamento cerrado. Só uma das testemunhas pode fazê-lo. A causa do impedimento tem do constar do ato da aprovação. Ou dêle e do texto, "ao pé da assinatura da testemunha que assina a rôgo. Ou somente do texto "ao pé da assinatura". Apesar de o art. 1.638, X, do Código Civil, só se referir à declaração "ao pé da assinatura", tem-se de considerar bastante a declaração inserta no texto do auto de aprovação, dizendo qual a testemunha que a rôgo assina. Porém a essa testemunha não basta assinar; tem do referir-se ao rôgo do testador, porque por êle ela assina (cf. Assento do 10 de junho de 1817: "A intenção da lei é que se não falte nos requisitos dela; mas, uma vez que o tabelião porte por fé no instrumento que perante as testemunhas, ali presentes e declaradas, foram satisfeitos todos os requisitos da lei, especificados na mesma lei, especificando-os êle no mesmo instrumento, está observado o que a lei requer, e manda-se observar, a bem da liberdade de testar"). A testemunha que assina a rôgo do testador não precisa assinar duas vêzes. Por vêzes, apenas explicita que "assina por si o pelo testador, a seu rôgo". Cf. 4." Câmara Civil da Côrte de Apelação de São Paulo, 10 do março de 1937 (R. dos T., 110, 239): "Não se pode razoàvelmente exigir que as assinaturas constem do auto rigorosamente na ordem em que vêm elas mencionadas no texto. Uma vez que o instrumento está assinado por essas pessoas, satisfeita está a exigência legal". A testemunha que, a rôgo, assina pelo testador, não basta que assine: precisa declarar, ao pé da assinatura, que o faz a rôgo do testador e a razão

de o fazer. É requisito essencial (Código Civil, art. 1.638, X). Se o não declarou, é nulo o testamento (JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALVES, Consolidação das Leis relativas ao Juízo da Provedoria, 89). Mas a Relação do Rio de Janeiro, a 29 de outubro de 1869, decidiu que, escrito e assinado pelo oficial público, na impossibilidade de o fazer o testador, não é caso de nulidade se não repetiu no auto de aprovação a assinatura com a declaração a rôgo; porquanto, no próprio instrumento, tem de o dizer, narrando as circunstâncias, o próprio oficial. Está certa a decisão: dá-se identidade de escritor e assinante da cédula, oficial público narrante da solenidade, e particularidade da assinatura, de modo que a repetição seria exigência supérflua. Outro caso, porém não de identidade, sugeriram intérpretes de direito anterior (J. H. CORREIA TELES, Teoria da Interpretação das Leis, § 4, n. 19; TEIXEIRA DE FREITAS, Consolidação, art. 1.055, § 2, nota 2): o tabelião declarou que outrem assinou, a rôgo do testador, a cédula testamentária, mas o assinante, ao fazê-lo, não no declarou. Na espécie, o que se dá é efeito autentificante. No texto da nota 2 de TEIXEIRA DE FREITAS, a espécie estudada é a falta da assinatura, e não a da declaração a rôgo: neste caso, o auto de aprovação não pode ter a conseqüência de dispensar o requisito da assinatura - seria nulo o testamento. Questão delicada é a de se saber se, dito pelo oficial público o motivo por que não no assinou o testador e quem a seu rôgo vai fazê-lo e só assinando a testemunha o auto de aprovação, vale o testamento. Cumpre distinguir: a) Exemplo de TEIXEIRA DE FREITAS {Consolidação, artigo 1 . 0 5 5 , nota 19): a testemunha assina a rôgo, sem declarar porque o faz. Solução: vale o testamento: ela assinou a, declaração do oficial público e o seu dizer "a rôgo" inteiramente o reconhece. b) Exemplo da Relação de Ouro Preto, no acórdão de 12 de agosto de 1884: a testemunha assinou, mas nem sequer declarou que o fazia a rôgo. Solução: vale, decidiam J. H. CORREIA TELES (Digesto português, UI, art. 1 . 7 8 4 ) , que reputava equivalente dizê-lo o oficial público no instrumento ou dizê-lo a testemunha, MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA, na dissertação 4 em suplemento às Notas, e a Relação de Ouro Preto. c) Exemplo de ÁLVARO VALASCO, antifilipino: a omissão do auto e da testemunha. Vale dizer - as expressões da lei seriam enunciativas e não dispositivas. Bastaria, depois, que se provasse que o testador não podia assinar, e por tal causa não assinou {et ideo non signavit).

Antes de assentarmos opinião, consignemos que as Ordenações Filipinas e os Assentos deixavam dúvida, porque não exigiam especificação por parte do oficial, mas claramente a declaração pela testemunha, e agora o Código Civil, à diferença do que ocorre com o testamento público (art. 1.634), deixa de exigir a especificação ao testamento cerrado, e claramente exige a completa declaração pela testemunha-assinante. As questões perduram. O fato de ser a antecipada declaração do oficial público, que tem fé pública, de mais valia, e achar-se subscrita, confirmativamente, pela testemunha, repõe diante de nós a velha controvérsia. Eliminemos, desde logo, o caso c): a falta não é mínima, como pareceu a ÁLVARO VALASCO. Seria protrair a solenidades posteriores o que a lei quis in ipso testamento. A omissão feriria o princípio da essencialidade da forma, princípio criado pelo timor falsitatis. Somente os dois outros exemplos, de TEIXEIRA DE FREITAS e da Relação de Ouro Preto, deixam de pé as dúvidas. De omissão, em parte tão essencial, não cabe cogitar-se: mas de equivalência, sim. Temos de examinar os dois casos: o primeiro, em que a testemunha-assinante disse assinar a rôgo; o segundo, em que o não disse. Ex hypothesi, num o noutro caso, o oficial público fêz a declaração, que caberia às testemunhas. Nem nas Ordenações Manueünas, nem nas Ordenações Filipinas, nem no Código Civil, se deu ao oficial público a incumbência de dizer que, pelo motivo de não poder assinar o testador, outrem assinou. A testemunha é que o declara. Por isso mesmo, se o oficial se adianta em dizê-lo e a testemunha o subscreve, - actus factus eandem vim habet. A cautela foi observada pelo oficial público, que tem fé pública: há, na espécie, um plus, e a subscrição pela testemunha confirma o que acima o oficial público declarou. Assim, FRANCISCO DE CALDAS PEREIRA DE CASTRO (Analyticus Commentarius, sive ad Typum instrumenti, Emptionis et Venditionis Tractatus, c. 34, n. 2 2 ) , GABRIEL PEREIRA DE CASTRO {Decisiones Supremi Eminentissimique Senatus Portugalliae, dec. 8 1 , n. 3 , 3 7 0 ) , BATISTA FRAGOSO (Regiminis Reipublicae Christianae, IH, 1., 5, d. 8 , § 3 , n. 1 1 2 ) , obscuro A N T Ô N I O DE SOUSA DE MACEDO (Decisiones Supremi Senatus lustitiae Lusitaniae, d. 4 ) , MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA {Coleção de Dissertações jurídico-práticas em suplemento às notas ao livro terceiro das Instituições de PASCOAL JOSÉ DE M E L O FREIRE, 1 2 9 ) , contra ANTÔNIO DA GAMA {Decisiones Supremis Senatus Regni Lusitaniae, d. 4 6 ) . Foi excelente BATISTA FRAGOSO e ainda hoje não devemos buscar melhor Hção, - bem nova, bem

ao corrente dos bons métodos contemporâneos de interpretação (tirado o voluntarismo subjetivista, sinal do tempo): "Responsio est affirmativa, quia mens Legislatoris fuit, ut testamentorum fraudibus occurreretur; et magis occurritur, si Tabellio declaret pro testatore Titium subsignasse, quam ipse testis, qui id ex post facto efficere potest aut addere: Ideirco plenius intentioni Legislatoris satisfactum est per tabellionem quam per testem... Verosimile est Legislatorem, si in hoc casu fuisset interrogatus, responsurum sufficere Notarii declaratonem, per quam fraudes eliminantur". Valendo mais do que a da testemunha a declaração de oficial publico, e não havendo, como não há, falta de declaração, pois que a testemunha assina o que o oficial público escreveu, faz seu, confirmativamente, o que êle declarou, - fôra râncido formalismo sacrificar à exigência formal, duramente interpretada, a vontade do testador. Se há um favor tesíamenti, não há lugar mais próprio para êle intervir. Mas, em verdade, nem questão há deste favor: uma coisa é serem de ordem púbHca as formas testamentarias, e outra, poderem ser interpretados os artigos de lei que fixam os requisitos essenciais. O caso segundo da Relação de Ouro Prêto, se bem que, aparentemente, seja assaz distinto do primeiro, verdadeiramente não no é: se vale o argumento de declarar o oficial e a testemunha subscrever o que êle disse, declarando assinar pelo testador ("a rôgo"), vale também para o caso de tudo ter sido dito pelo oficial e nada pela testemunha-assinante: porque o a rôgo também aquêle o disse e a subscrição da testemunha ou vale para tudo, ou não vale; se vale para a parte em que se disseram os motivos da impossibilidade de assinar o testador e quem, por êle, assina, tem de valer para a expressão a rôgo, subentendida na primeira parte. Aqui, como no primeiro caso, o que se fêz foi interpretar o art. 1.638, VH e X, e não dispensar na lei. Certo, como já se disse, sem SL forma da aprovação, é imperfeito ainda o testamento ( M A N U E L FIGUEIRA DE NEGREIROS, Introductio ad ultimas voluntates, L. 2, c. 1, n. 4), mas a lei da forma pode-se e deve-se interpretar. Na espécie, fêz-se mais do que a lei pediu, e bastaria que fosse o mesmo: quando forma respicit certum effectum, per aequipollens potest ejfectualiter consegui. Seria retrocesso exigirmos hoje mais do que se exigiria nos séculos passados ao tempo das Ordenações Manuelinas e Filipinas. Após, os escritores que citamos, o prático de Lobão, com bons argumentos, solvia o problema da antecipação da formalidade, por parte do oficial. ¿Não conñain^as leis, perguntava MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA {Coleção de Dissertações

jurídico-práticas em suplemento às notas ao livro terceiro das Instituições de M E L O FREIRE, 1 3 0 ) , mais das escriturações dos tabeliães que das pessoas privadas? E acrescentava: "Isto não é equipolencia, tomada na própria acepção esta palavra; é, sim, uma maior e sobreequipolência, mais que uma equipolência". 4 . DIFERENÇA DE TEMPO, FEITURA E APROVAÇÃO. - A diferença de tempo entre a feitura da cédula testamentária e o ato de entrega para a aprovação, seguido dessa e das assinaturas, inclusive do testador, suscita a questão da capacidade do testador. Aliás, estende-se a outras espécies que não são as de incapacidade do testador, como as de nulidade de disposições. Se o testador não estava em perfeito juízo, ou não tinha idade para testar, quando fêz o testamento (escrito por êle, ou por outrem, não importa) e já podia testar ao entregar e assinar, vale o testamento cerrado que teve aprovação e as assinaturas. Se houve êrro, ou violência, no momento da escrita e de modo nenhum persistiu quando o testador entregou a cédula testamentária e assinou a aprovação, a causa de anulabilidade desapareceu. Pode ocorrer o mesmo, embora dificilmente, em caso de dolo. Se o testador dispôs a favor da concubina, mas, ao entregar a cédula testamentária, já dissolvida estava a sociedade conjugal, qualquer que fosse a causa da dissolução, a disposição vale.

Se o testador fêz testamento público, cerrado, ou particular, no intervalo, isto é, entre a feitura da cédula testamentária e o momento em que levou à aprovação, o testamento cerrado que foi aprovado depois revoga o intercalar. A data da cédula é sem relevância, se ó testador a pós-datou, em relação à data da entrega e da aprovação (cf. JOSÉ D I A S FERREIRA, Código Civil português anotado, IV, 302). O Código Civil não fala de data do auto de aprovação. Se bem que não se deva permitir a oficiais públicos lavrar autos, quaisquer que sejam, sem datar, para que êle e as testemunhas (ou êle e figurantes do negócio jurídico) assinem, a omissão do Código Civil deixa sem a sanção de nulidade a falta do oficial público, em se tratando de testamento. A datação é dever do oficial público, quer o testamento seja público, quer seja cerrado. 5 . DECLARAÇÃO DE ASSINAR A RÔGO E EXPRESSÕES EQUIVALENTES.

- O oficial público não precisa usar das expressões "a rôgo". Basta dizer o oficial público se o escreveu e vai assinar: por mim e pelo testador, ou

SÓ pelo testador, basta: porque nemo signal pro alio, nisi ad preces ipsius (GABRIEL PEREIRA DE CASTRO, Decisiones Supremi Eminentissimique Senatus Portugalliae, dec. 81, n. 2, 370). 6. S E A ASSINATURA DO TESTAMENTO CERRADO PODE SER FEITA POR

- No livro de FERREIRA ALVES (Consolidação das Leis relativas ao Juízo da Provedoria, 1,115), diz-se que "a lei só concedeu a uma das testemunhas do ato o poder de assinar pelo testador". Seria nulo o testamento assinado por outra pessoa. OUTRA PESSOA, QUE NÃO SEJA "UMA DAS TESTEMUNHAS".

Mas, pela exigência de uno contextu, o assinante será presente ao ato de aprovação. Será mais uma das testemunhas, a sexta, ou octavus figurante, com o testador e o oficial público. Não há nulidade (Relação do Rio de Janeiro, 21 de abril de 1874, Tribunal de Justiça de São Paulo, 3 de junho de 1899, JOÃO MONTEIRO, Aplicação de Direito, 51). ¿Quid iuris, se o oficial público não disse quem vai assinar, nem a testemunha-assinante o declarou? Se mais testemunhas do que a lei exige figurarem, melhor será, mais forte a prova instrumental (Relação do Rio de Janeiro, 3 de dezembro de 1 8 7 8 ) . É de mais ir além de cinco, dizia JOÃO MONTEIRO {Aplicação de Direito, 51); em mais de cinco, há sempre cinco. Se é testemunha, deve o oficial público dizê-lo no auto, máximo se extranumeraria (LAFAIETE RODRIGUES PEREIRA, O Direito, V. 571-588). Aqui, a questão não é de assinar, casos que foram discutidos: é de ser testemunha. Se não declarou porque assinou, nem no fêz o oficial público,/a/ía o requisito do art. 1.638, X. Se não se arrolou como testemunha, ¿como provar a validade? Assinatura prova que assinou, mas a presença deve constar do auto porque é uma das solenidades essenciais. Será nulo o testamento: a) Se o que assina a rôgo não se mencionou como testemunha, nem se pôs entre elas como tal. b) Se, assinando a rôgo, o mencionada só como testemunha, nem ela, nem o oficial público cogitou da declaração do art. 1.638, X. Se o oficial público faz as testemunhas assinarem em branco, para depois lançar o auto de aprovação, há irregularidade, que pode dar ensejo à decretação da nulidade. Idem, se o lavra e, mais tarde, convoca as testemunhas para que o assinem. Para que a invalidade seja decretada, é preciso que se produza prova suficiente do ocorrido.

7. S E O OFICIAL PÚBLICO, AO MENCIONAR AS TESTEMUNHAS, ERRA O NOME DE UMA DELAS.

- Cumpre distinguir os casos de êrro, pois nem todos

são iguais: a) Pode ser leve e não pôr em dúvida a identidade de quem testemunhou: Osvaldo por Oswald, Alberto por Alfredo Alberto, Júnior por Filho (há pessoas que usam os dois). b) Ou êrro que, devendo ter-se lido a aprovação, não se compreende que o deixasse passar a testemunha: Antônio Gama por Justino Ramos. Mas, se das circunstâncias e in ipso testamento se pode concluir sobre a identidade, não é nulo. Se não se pode concluir, é nulo, e responde o oficial público. 8. CAUTELAS VOLUNTÁRIAS DO OFICIAL PÚBLICO. - Muitos dizeres nos testamentos são benefícios, porém dispensáveis. Declarar que o testador estava doente, ou não, se em perfeito juízo e livre de coação. Mencionar o número de folhas do testamento e rubricá-las: o sinal far-se-á na última folha, e não em todas; a lei não exige que as rubrique, uma por uma, - a segurança está no fechar e coser, e não na rubrica das folhas. Fechar e coser é que é essencial. Constitui praxe dos cartórios, além de fechar e coser o testamento, lacrá-lo sôbre os pontos, ou alhures, e declarar o tabelião a côr do lacre, se tinha o seu carimbo, o número de pingos e os lugares em que se achavam. E de grande utilidade, ao lançar no seu livro a nota do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado, e entregue, registar o oficial público todos os atos de individuação das testemunhas (idade, naturalidade, profissão, domicflio e residência). Se o testador permitiu que o oficial público lesse o testamento, deve consignar as rasuras, emendas e ressalvas que houver, mas isto não quer dizer que a lei exija tal leitura, ou tal inspeção sem ler, por parte do oficial público. Chamamos auto de aprovação; os juristas franceses, de subscrição, palavra que melhor o diz. 9. É REQUISITO ESSENCIAL QUE O OFICIAL PÚBLICO CERRE E COSA, DE-

- Do art. 1.638, XI, tira-se que o oficial público (escapou ao legislador a expressão tabelião, que desde o art. 1.632 diligentemente evitara, lapso que não pode ter conseqüências) primeiro escreve o instrumento de aprovação, que êle assina

POIS DE CONCLUÍDO O INSTRUMENTO DE APROVAÇÃO.

com as testemunhas e o testador ou quem, por éste, escreveu o testamento. Somente após cerrará e coserá. Portanto, quando o testador lho entrega, pode estar cerrado e cosido e tê-lo de cerrar e coser de novo. A interpretação não pode peimitir que o testador entregue o testamento dentro de involucro, cosido, de modo que não permita começar o oficial público, "imediatamente depois da sua última palavra", o instrumento de aprovação, pois seria contravir ao art. 1.638, VII. Mas, ajustando-se os requisitos do art. 1.638, Vil e XI, chega-se à possibilidade intermediária da entrega de um testamento, cerrado e cosido, pelo testador, no qual se deixe, do lado de fora, a última palavra escrita e espaço suficiente para o instrumento da aprovação (art. 1.638, Vil), ou para o sinal público do oficial. O que é indispensável é estar do lado de fora a última palavra. Porque, quanto ao espaço, o art. 1.638, VIE, o dispensou: "não sendo isto possível, por falta absoluta de espaço na última folha escrita, o oficial ponha nêle o seu sinal púbHco e assim o declare no instrumento". O oficial público tem de fechar e coser o testamento. Costuma-se lacrar, além de fechar e coser, porque abrir e cortar a costura será fácil a terceiro. O lacre sôbre os pontos em que entram as linhas é de maior segurança. O carimbo, no lacre, autentica mais do que outro meio de cautela. Todavia, o lacre e o carimbo não são requisitos essenciais do fechamento. Falta saber se, cerrado e cosido pelo testador, precisa o oficial público novamente cosê-lo. Cumpre distinguir: a) Se o auto continuou após a última palavra, deve o oficial púbhco declarar que o recebeu em tais condições e reforçar o fechamento ou recosê-lo de modo a assegurar a autenticidade deste ato, porque o "cerrar e coser" ficou, por lei, ao oficial público. Se achar que bastam o fechamento e a costura, conforme lhe apresentaram, terá de dizê-lo no auto para que constitua uma como ratificação do fechamento e da costura pelo testador. b) Se não houve espaço para o auto de aprovação, e o oficial público tiver de escrevê-lo fora, pondo o sinal da última folha escrita (necessariamente exterior), tal auto de aprovação terá de envolver o testamento já cerrado e cosido pelo testador. Então, haverá dois fechamentos e duas costuras (e nisso não há nenhum inconveniente, pois que de tudo se dá conta no auto de aprovação): o fechar e cerrar do testador, visível a última palavra, com o sinal público, e o fechar e cerrar do oficial público aprovador. Se, no testamento cerrado, o testador diz que entregará ao oficial público já cosido, com os seus selos ou anéis, deixando, após a última pala-

vra, lugar para a aprovação, ou apenas deixando-a visível para que o oficial público aponha o seu sinal, e não forem encontrados os selos ou sinetes ou carimbos, a que se refere, isto por si não toma nulo o testamento. Podia ter-se esquecido. Mas é irrecusável que se trata de praesumptio facti contra a validade do ato. 1 0 . S E É NULO O TESTAMENTO CERRADO EM CUJO AUTO DE APROVA-

- Sòmcnte uma vez o Código Civil se referiu ao sinal público: no art. 1.638, para o caso de não haver espaço na última folha de papel escrita e em conseqüência disto ser impossível começar-se, nela, o auto de aprovação. Mas a questão é velha, por terem alguns, como FERREIRA ALVES (Consolidação das Leis relativas ao Juízo da Provedoria, 85), treslido o que, no seu tempo, decidira o senador OLIVEIRA, que mais esclareceu do que refutou a JoÃo RODRIGUES CORDEIRO {Duhitationes in Foro frequentes, 9, n. 21). Escrevia, com tôda a justeza, o velho julgador: "Note-se, que não requere sinal público, senão no caso de se pôr na folha apartada; de que resulta, que, se no instrumento da aprovação não fizer sinal público, mas raso, ou na nota, quando nela se fizer instrumento aberto, não será o testamento nulo, e assim o julguei". Qualquer que pudesse ter sido a melhor solução para o direito reinícola, o que é certo - hoje em dia - a opinião de OLIVEIRA é a que melhor se ajusta à letra e à interpretação do Código Civil: trata-se de requisito essencial, o sinal público, para o caso excepcional (achar-se tôda a última folha ocupada pela escrita do testador). Se ocorrer que a lei do tabelião lha exija a aposição do sinal no auto de aprovação, sem distinguir o caso ordinário e o extraordinário, tal providência legislativa, de direito estadual, não poderá ter o efeito de criar nulidades de testamento. Dela somente poderá resultar penalidade ao oficial público. ÇÃO NÃO APÔS O OFICIAL PÚBLICO O SEU SINAL PÚBLICO.

1 1 . "UNITAS ACTUS" DA SOLENIDADE DE APROVAÇÃO. - A l e i n ã o e x i -

ge a unidade de ato à escritura da cédula testamentária, que vai ser dada para a aprovação. Mas o instrumento de aprovação e tôdas as solenidades que o precedem e sucedem tem de ser uno contextu. Vale dizer: desde o gesto da entrega, presentes o oficial público, o testador e as testemunhas (Código Civil, art. 1 . 6 3 8 , IV), até o cerrar e coser do testamento (art. 1 . 6 3 8 , XI), tudo tem de fazer-se sem interrupção: continuidade e presencialidade desde o princípio até o ñm.

O uno contextu quer dizer sem interrupção para outra coisa ou atonon miscetur actus testamento alienas ( A N T Ô N I O DE SOUSA DE MACEDO Decisiones Supremi Senatus lustitiae Lusitaniae, d. 4, 5, 15). A existência de uno contextu só se refere à parte de autentificação, similar do testamento público e proceder solene. Quanto à cédula, não: pode ser feita num tempo, e noutro levar-se à aprovação; fazer-se aos poucos, conforme fôr entendendo o testador, como ocorre à estrutura do testamento particular. 1 2 . O Q U E D E V E C O N T E R O A U T O DE APROVAÇÃO DO TESTAMENTO

- O instrumento de aprovação deve consignar, por exigência do estatuto do oficial púbüco: CERRADO.

a) A data, isto é, o dia, o mês e o ano. b) O lugar em que foi feito. c) O nome do testador que entregou a cédula e o seu domicflio, cautela útil (porém não para o efeito que lhe atribui FERREIRA ALVES, Consolidação das Leis relativas ao Juízo da Provedoria, 1,118, "para se averiguar a competência do tabelião", pois não é o domicílio do testador que afirma, e sim o lugar em que se fêz o testamento, coisa diferentíssima). d) O nome das testemunhas, sendo aconselhável dizer-lhes, pelo menos, o domicílio. e) Reconhecimento do testador e das testemunhas ou abonação por duas pessoas, ato que pode fazer-se fora do testamento, no livro do cartório, dando o oficial público aos figurantes, em virtude disto, como reconhecidos. f) Leitura do auto pelo oficial público. g) Sinal e assinatura do oficial público; assinatura das testemunhas e do testador, se pode assinar. Se não puder, por êle assinará uma das testemunhas, com a declaração do artigo 1.638, X. Eventualmente, ressalva no fim do instrumento de aprovação e antes das assinaturas, de todas as emendas, entrelinhas, rasuras, etc. (Ordenações FiKpmas, Livro I, Título 78, § 4; Reg. n. 737, de 25 de novembro de 1850, art. 146). O que é requisito essencial está no art. 1.638. Fora disso, quaisquer invalidades não são absolutas e têm do ser apreciadas pelo juiz: exemplos temos no auto de aprovação a que faltou o nome da testemunha no texto da aprovação, mas esta subscreve o auto, ou troca de nome.

No auto de aprovação, tem o oficial público de dizer o lugar (cidade, ou vila, ou outra localidade, a rua, a casa ou número), e a data em que se lhe entregou a cédula testamentária, o nome do testador, o estado civil, a profissão, a nacionalidade, o domicílio e a residência. De ordinário, porém não imprescindivelmente, diz o oficial público que o testador se acha em perfeito juízo, em pleno estado de saúde (ou doente, com voz fraca, ou acamado, ou em cadeira de rodas). S e o oficial público afirmou que o estado mental ora normal, ou fêz qualquer outra alusão à saúde, pode ser feita prova contrária. São proposições usuais ou de estilo, que não fazem fé pública. Após os dados sôbre o testador, têm de vir os que concernem às testemunhas, para que haja a identificação. Se nem o oficial público nem as testemunhas conhecem o testador (o que pode ocorrer), duas outras pessoas têm de satisfazer as exigências de identificação, conforme a legislação especial. Depois de referir-se às pessoas presentes e à entrega, o oficial público, se o testamento foi entregue aberto, há de referir-se às laudas ou folhas da cédula testamentária; se cerrado pelo próprio testador, há de dizer qual o aspecto, o modo de fechamento e pôr o sinal público se não há lugar para iniciar o auto de aprovação, frisando que lhe fôra e como lhe fôra entregue fechado. Se a cédula testamentária foi apresentada aberta, o oficial público folheia-o, sem o ler (salvo se lho pede o testador), e deve dizer em que estado o encontrou (sem borrões ou com tais borrões, sem rasura ou com tais rasuras, riscos, emendas e rompimentos sem importância, que há de apontar). Entregue aberto o testamento, o oficial público rubrica as folhas. No auto de aprovação deve o oficial público dizer que a cédula testamentária já estava cosida e que vai ser fechada e cosida com a aprovação, ou que estava aberta e vai ser fechada e cosida. O oficial público tem de portar por fé a identidade do testador e declarar que as testemunhas o conhecem, ou que duas das testemunhas, ou duas pessoas identificantes o conhecem o assinaram a declaração (que pode ser no testamento, abaixo das assinaturas instrumentais, ou fora, conforme a praxe notarial). Se o oficial público não conhecia o testador, a declaração formal de duas pessoas é indispensável à função notarial e ao auto de aprovação; depois da identificação, não precisa a isso referir-se o oficial público, pois que passou a conhecer o testador, o que é de exigir ao ser-lhe entregue o testamento ou logo após.

Nem a rubrica das páginas da cédula testamentária, nem a indicação do número delas, ou das folhas, é pressuposto essencial, pôsto que de praxe notarial. Dá-se o mesmo com a própria referência a ter a cédula testamentária sido escrita e assinada pelo testador, ou por outrem escrita e por êle assinada, ou escrita e assinada a seu rôgo. 1 3 . VALOR JURÍDICO DO AUTO DE APROVAÇÃO. - Antes de aprovado, o testamento cerrado não constitui ato jurídico perfeito - ainda não é um testamento. De tal imperfeição decorre que, no próprio caso de cédula datada, a sua data não será a da cédula, mas a do auto de aprovação. A partir da entrega até a conclusão do auto é que se procede à autentificação do escrito: a êste ato, e não ao conteúdo da cédula, é que as testemunhas assistem, e atestam-no, e o oficial público certifica. Das declarações testamentárias, nem aquelas nem êste precisam ter conhecimento explícito.

14. C E R R A D O E cosroo, A Q U E M SE E N T R E G A O TESTAMENTO. - A lei diz com quem fica o testamento cerrado (Código Civil, art. 1.643), e devemos evitar que fique com o oficial público, como temos visto. Máxime se a rôgo escrita a cédula, e a rôgo assinado o auto de aprovação. A impressão que deixa é um pouco chocante quando o oficial público vai apresentá-lo. O testamento aprovado é entregue ao testador, que o guardará consigo, ou o confiará a quem entender, talvez ao futuro testamenteiro, o que é excelente prática, ou a estabelecimento bancário ou trustee, acautelando-o em caixa forte, e evitando criminosas inutilizações, que são freqüentes e raro verificáveis, tratando-se de testamentos cerrados. Principalmente se o testador não contemplou os herdeiros legítimos, não deve fiar deles a guarda dos instrumentos das suas últimas vontades. Quando não seja o intuito maldoso, o propósito de inutilizar, a curiosidade dêles, às vêzes contemplados, leva-os a forçar as linhas, arrebentar os lacres e os pontos. A guarda, ato de fidúcia, de conseqüências jurídicas, como o dever de apresentação, será estadado ao cogitarmos do artigo 1.756. Antes de entregar o testamento, o oficial lançará no seu livro o nome do testador, dia, mês e ano, aconselhàvelmente a própria hora em que se fêz a aprovação e o nome das testemunhas, com as características. Mas tal providência não consta do art. 1.638 do Código Civil: não constitui, portanto, causa de nulidade. Pelo fato de a mencionar o art. 1.643, da infração resulta poder ser punido, disciplinar ou criminalmente, o oficial público.

Panorama atuai pelos Atualizadores § 5.877. A - Legislação Para o procedimento de aprovação do testamento cerrado, ver os incs. Ill e IV do art. 1.868 e o art. 1.869 do CC/2002. § 5.877. B - Doutrina 1. Entre os requisitos meramente formulares ou formalismos inúteis, suprimidos pelo Código Civil de 2002, está a declaração do notário que "o testador llie entregou o testamento e o tinha por bom, firme e valioso", constante da legislação anterior. Igualmente suprimida é a necessidade da declaração do notário que leu o auto de aprovação para o testador e as testemunhas. 2. A lei atual apenas exige que o testador declare, sob sua fé, que o testador lhe entregou o testamento para ser aprovado na presença de duas testemunhas. Não há exigência de fórmulas ou outros requisitos, ou de reconhecimento pelo notário do testador e das testemunhas. A declaração do notário é feita logo após a última palavra do testamento, se houver espaço. Se o espaço da última folha for insuficiente, para o Início da aprovação, o notário aporá nela o seu sinal, elaborando o auto em separado e consignando essa circunstância. 3. O auto de aprovação completa o testamento, para que possa produzir seus efeitos na abertura da sucessão, razão porque também ficará encerrado dentro do envoltório, invólucro ou envelope do testamento. 4. A lei atual mantém a exigência de o notário "cerrar e coser" o instrumento aprovado, mas essas expressões não precisam ser interpretadas literalmente, pois o que interessa é que o envoltório esteja suficientemente lacrado pelo testador, dispensando-se a costura com pontos feitos com agulha e linha. Pontes de Miranda reconhece que é mais fácil abrir e cortar a costura do que romper o lacre. 5. Se o testador não puder assinar o auto de aprovação, uma das duas testemunhas o fará, a seu rogo. 6. O art. 1.874 do CC/2002 estabelece que, cumprida a aprovação, o testamento é devolvido ao testador, não podendo o notário retê-lo em seu cartório. Cabe-lhe apenas lançar em livro próprio nota do lugar, dia e mês da aprovação do testamento. § 5.877. C - Jurisprudência Para o STJ, inexistindo qualquer impugnação à manifestação da vontade, com a efetiva entrega do documento ao oficial, tudo confirmado na presença das testemunhas, a falta de assinatura do testador no auto de aprovação é irregularidade insuficiente para, na espécie, causar a invalidade do ato (STJ, REsp 223.799/SP, 4.^T.,). 13.11.1999, rei. Ruy Rosado de Aguiar, OJ 17.12.1999, p. 379).

§ 5.878. TESTAMENTO ESCRITO PELO OFICIAL PÚBLICO E APROVAÇÃO 1. TEXTO LEGAL. - Diz o Código Civil, art. 1 . 6 3 9 : "Se o oficial tiver escrito o testamento a rogo do testador, podê-lo-á, não obstante, aprovar". Já DO Projeto revisto, art. 1 . 9 7 5 : "Se o oficial tiver escrito o testamento a rogo do testador, podê-lo-á não obstante aprovar, como pessoa pública". Cf. Projeto de F E L Í C I O DOS S A N T O S , art. 1 . 6 2 1 .

2. F O N T E . - Cf. Assento de 23 de julho de 1811, interpretativo das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1: "E por pluralidade de votos foi assentado pelos Ministros, que não tinham nulidade alguma, proveniente desta causa, quaisquer testamentos escritos na forma da lei por qualquer Tabelião, e depois aprovados pelo mesmo; porque, não havendo Ordenação que o proíba, o que a lei não distingue, nós não devemos distinguir, e rogando nulidades nos atos, que os não têm. E para não vir mais em dúvida, se tomou êste Assento, que assinou o dito Senhor com os Desembargadores, que nêle votaram". Antes tinha dito: "Foi proposto, que havendo variedade de julgar sôbre os testamentos feitos na forma da Ordenação, Livro IV, Título 80, § 1, os quais, sendo escritos por algum Tabelião, se duvidava se êste podia ser o mesmo, que depois os aprovasse, escrevendo o ato legal da sua aprovação, ou se ficavam nulos, por ser a mesma pessoa praticando dois atos, um como pessoa pública, outro como particular". Portanto, da omissão das Ordenações tirou o Assento a regra, que o nôvo direito escrito consagrou. 3 . ¿ A L E I P E R M I T E Q U E O OFICIAL P Ú B L I C O ESCREVA E ASSINE, A

- Questão bem árdua que não vejo exposta no antigo e no direito de hoje. Aliás, o Assento, J. H. CORREIA TELES (Digesto português, III, n. 1.782), C O E L H O DA ROCHA {Instituições de Direito Civil português, § 679) e TEIXEIRA DE FREITAS {Consolidação, art. 1.059) e A. J G O U V E I A P I N T O {Tratado dos Testamentos e Sucessões, nota 196), só se referem à escrita. No direito anterior, como no de hoje, o auto de aprovação é assinado, se o testador não souber ou não puder, por uma das testemunhas (não se confunde com a assinamra da cédula que há de ser pelo testador, ou, se êle não souber, ou não puder, por quem lho escreveu).

RÔGO DO TESTADOR, O U S O M E N T E Q U E ESCREVA?

O art. 1.639 também só se refere à escrita, mas o artigo 1.638, HI, declara; "não sabendo, ou não podendo o testador assinar, seja assinado pela pessoa que lho escreveu". Daí a dúvida: a) Ou o oficial público somente pode escrever, quando o testador saiba assinar: será escrito pelo oficial público e assinado pelo testador. Solução esta que tem por si o sistema do Código Civil, pois no próprio testamento público, - escrito, por definição, pelo oficial público, - a assinatura a rôgo será de outrem (uma das testemunhas, art. 1.633). b) Ou o que não assina poderá encarregar o oficial público de escrever e assinar o testamento. O argumento a favor disto é o de serem equivalentes as formalidades dos arts. 1.633 e 1.638, X (assinatura no testamento público e assinatura no auto de aprovação do testamento cerrado por uma das testemunhas instrumentarias). Devemos entender que o oficial público pode escrever e assinar a cédula, mas - aqui as realidades obrigam a maiores cautelas - deve o oficial público deixar o espaço a que se refere o art. 1.638, VH e Vin, pois, se o não deixar, a fôlha ou folhas da cédula ficarão, escritas por êle e só com o seu sinal, sem as assinaturas das testemunhas instrumentárias. Seria facilitar a substituição do conteúdo. Difícilmente, na lide das provas, a fé pública do oficial público resistiria a tal circunstância de aparentemente proposital facilitação do embuste. Para obviar a isto, pode o oficial público, quando ocorrer a falta de lugar para o auto de aprovação, exigir que as testemunhas rubriquem as folhas. No direito anterior já a questão ficaria resolvida (Assento de 23 de julho de 1811; Consolidação, nota ao art. 1.059). 4 . RESPONSABILIDADE CIVIL E CRIMINAL DO O H C I A L PÚBLICO QUE ES-

o TESTAMENTO. - A responsabilidade ordinária do oficial público deriva da segunda fase de elaboração do testamento cerrado: o auto de aprovação. Mas, admitido como foi, pelo Código Civil, que êle escreva pelo testador, disto lhe advém posição especial, com a conseqüência de lhe agravar a culpa nas nulidades, ou inexatidões, que provierem da sua escrita, não obstante a exigência de poder ler quem testa pela forma fechada. Se é certo que êle escreve como pessoa particular, e não como oficial público, a cédula testamentária, que êle mesmo vai aprovar, não se deve concluir pela igual responsabilidade, pelo mesmo grau de culpa, entre o escritor privado e o oficial público chamado a tal função. A lei, dando-lhe fé pública,

CREVEU

conferiu-lhe valor de confiança, em que se pode ter louvado o testador, e é de presumir-se que fosse éste o móvel da escolha. 5 . C É D U L A T E S T A M E N T Á R I A ESCRITA POR U M OFICIAL P Ú B L I C O E

- A Ici permitiu que o próprio oficial público, que escreveu, aprove o testamento. Não disse que, tendo-o escrito, deva ser aprovado por êle e não por outrem. Quem escreve a pedido exerce função privada e como função privada pode ser exercida por tôdas as pessoas hábeis, capazes segundo a lei (assunto tratado noutro lugar), inclusive os oficiais públicos. Por isto mesmo, feita por um a cédula, assinada ou não pelo próprio testador, pode êste preferir que outro oficial público o aprove. APROVADA POR O U T R O .

Os antigos tempos cercavam de minudentes cautelas os testamentos. Hoje podemos perguntar: ¿pode o testador dar a aprovação em dois ofícios públicos - simultaneamente - o mesmo testamento? Nada lho obsta. iQuid iuris, se, aprovado por um, leva à outro oficial público para que ponha o seu sinal, reenvolva-o, cerre a nova carta, recosa e lacre? O testamento, com a primeira aprovação, ficou ato perfeito, mas abundans cautelas non nocet.

§ 5.879. L Í N G U A N A C I O N A L E L Í N G U A E S T R A N G E I R A 1. T E X T O LEGAL. - Diz o Código Civil, art. 1.640: "O testamento pode ser escrito, em língua nacional ou estrangeira, pelo próprio testador, ou por outrem, a seu rôgo. A assinatura será sempre do próprio testador, ou de quem lhe escreveu o testamento (art. 1.638, n. I)". No Projeto primitivo, art. 1.810: "As disposições testamentárias podem ser escritas, em língua vernácula ou exótica, pelo próprio testador ou por outrem a seu rôgo. A assinatura deve ser do punho do testador ou de quem escreveu o testamento". Cf. Projeto revisto, art. 1.976.

2. L Í N G U A ESTRANGEIRA NO DIREITO ROMANO. - Os romanos só admitiam a língua latina: tratava-se de negócio de direito civil. Mas vieram as concessões. Finalmente, tôdas as línguas que as testemunhas compreendessem {Novella Theodosii, 16, § 8).

3. LÍNGUA ESTRANGEIRA E DIREITO ANTERIOR. - A despeito do Decreto n. 863, de 17 de novembro de 1851, e da Resolução de 13 de agosto de 1781, com a lição de SAMUEL STRYK, permitia-se a língua estrangeira no testamento cerrado e no particular. F. DE P. LACERDA DE A L M E I D A {Sucessões, 209) ia ao extremo de permiti-la na aprovação, o que não se compreendia: o oficial público tem língua oficial. 4. LÍNGUA ESTRANGEIRA E LÍNGUA SECRETA. - A lei permite que o testamento cerrado (Código Civil, art. 1 . 6 4 0 ) e o particular (art. 1 . 6 4 9 ) sejam em língua estrangeira. Mas, quanto a êste, é preciso que as testemunhas a entendam. A escolha de língua estranha, desusada pelo testador, faz presumir-se a simples troça ou pilhéria ( A . ESCHER, 88). Não assim quando se trata de estrangeiro, pessoa mais afeiçoada a outro idioma, bilingüe, ou quando, em viagem, tenha empregado a língua do lugar. A vontade de ocultar o que escreve justifica o emprêgo de outra língua que a própria. De qualquer modo, a presunção, que é simples, e não legal, fâcihnente se elide com a exposição dos motivos de uso. Pode usar qualquer língua viva, ou morta ( F . R I T G E N , em G . P L A N C K , Bürgerliches Gesetzbuch, V , 4 3 8 ; W A L T H E R B R O C K , Das eingenhãndige Testament, 77 s.). Não são interditas as modernas línguas artificiais (P. T U O R , Das Erbrecht, Kommentar, III, 325), como o esperanto, o ido. Um bispo, um latinista, ou um esperantista, não se presume testarem por pilhéria. Em regra, as línguas secretas, só compreendidas pelo testador e os beneficiados, não podem valer (P. T U O R , Das Erbrecht, Kommentar, IH, 325). Mas, ainda nestes casos, podem as circunstâncias, apreciadas pelo juiz, justificar a eleição aparentemente absurda do sistema. Revelada a chave, diante da seriedade das exposições, não pode a justiça deixar de cumprir. 5 . NECESSIDADE DE QUE O TESTADOR E N T E N D A A LÍNGUA DE Q U E

USA. - Quer seja cerrado, quer particular, é preciso que o testador entenda a língua que escolheu, - entenda, e por ela possa exprimir-se (F. R I T G E N , V, 438). Quando particular, que a entendam as testemunhas (art. 1.649). Nenhuma importância têm nos testamentos os erros de ortografia, de sintaxe, de geografia ou de qualquer outro conhecimento. O que interessa é descobrir, sob o véu espesso, ou pregueado pela ignorância ou desatenção, a verdadeira vontade do testador. Somente quando não se entende, nem se

pode, por exemplo, descobrir o que o testador entendia pelo que nomeava poderá o juiz reputar ineficaz a disposição. 6 . D I F E R E N Ç A E N T R E O TESTAMENTO CERRADO E O PARTICULAR. - N o

testamento cerrado, o testador escreve ou manda que outro escreva, na língua que escolher, as suas disposições de última vontade: o que se lhe exige é que entenda a língua. Nem é preciso que a pessoa que escreve, ditado por êle, entenda o que está a escrever: o testador, sim, precisa saber e poder ler, e saber e poder ler a língua em que estão sendo escritas. No testamento particular, que o Código Civil só permite hológrafo, claro que o testador sabe e pode escrever a língua em que redigiu (sob o art. 1.649 discutir-se-á a questão da cópia de tradução, sendo deficiente o conhecimento, pelo testador, da língua em que êle escreve), mas, além disso, o art. 1.649 exige que as testemunhas a compreendam. Exigência, que se não entenderia no testamento cerrado, porque, nêle, não se testemunha o conteúdo da cédula, mas simplesmente a entrega, pelo testador, do testamento, que diz seu e quer que seja aprovado. Às considerações que aí ficam escapa uma questão: ¿o testador pode dizer em hngua estrangeira que "aquele é o seu testamento" (art. 1.638, V) e "quer que seja aprovado"? 7 . A s DECLARAÇÕES PODEM SER FEITAS EM LÍNGUA ESTRANGEIRA, DES-

onciAL PÚBLICO E T E S T E M U N H A S A COMPREENDAM. - Para desde logo restringirmos a questão, assentemos que são inadmissíveis intérpretes a êsse ato. Bom ou mau, é o sistema geral do direito testamentario brasileiro. Resolve-se o problema em saber se, conhecendo oficial público e testemunhas a língua em que se exprime o testador, é possível receber-se, na língua estrangeira, a declaração de ser aquele o seu testamento e querer que seja aprovado. A negativa jogaria muito longe o disco do rigorismo testamentário. Se isto se der, será prudente e de boa cautela que o oficial púbüco o consigne no auto de aprovação, para que não haja dúvida, nem omissão de um fato por sua natureza extraordinário. Feito isso, não poderíamos compreender que os juízes lhes negassem validade. ¿Se o testador não puder expressar-se em hngua que o oficial público e as testemunhas compreendam? No sistema brasileiro, só há um meio para tão dificil emergência: usar o disponente da declaração escrita, similar à do art. 1.642, declarando porque o faz. E o oficial púbüco dirá no auto DE Q U E

O que se passou, se as testemunhas conheciam a língua, quais os gestos ou monossílabos pelos quais se fêz compreender o testador. Não é nada de mais que assim se resolva, porquanto a lei permite interrogatório pelo oficial público e será possível resposta simples: sim, ou equivalente de línguas conhecidas. Exemplo: o Persa, que apresenta o testamento, gesticula diante das testemunhas, e compreendendo o essencial do que lho pergunta o oficial público, responde yes. Cabe ao juiz apreciar as circunstâncias.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.879. A - Legislação Sobre a possibilidade de o testamento cerrado ser escrito em língua estrangeira, ver o art. 1.871 do CC/2002. § 5.879. B - Doutrina No testamento cerrado, público é apenas o auto de aprovação. O testamento em si, por ser sido escrito de modo exclusivo e reservado pelo testador, é livre na forma e no conteúdo. A liberdade de forma Inclui o idioma em que foi escrito, pelo próprio testador ou por terceiro a seu rogo. Respeita-se, dessa forma, a liberdade de testar de quantos estrangeiros residam no Brasil e que tenham dificuldade de escrita em português, ou mesmo porque prefiram fazer seus testamentos em seus idiomas de origem. A escolha da língua estrangeira, no testamento cerrado, tem a vantagem da dispensa das testemunhas, que não precisam conhecê-la, porque apenas acompanham o testador para a entrega do instrumento ao notário, sem ciência do que nele se contém. O brasileiro também pode utilizar idioma estrangeiro, quando pretenda ampliar o segredo de suas disposições. Como não há mais necessidade de o notário perguntar ao testador se aquele é seu testamento e se deseja aprová-lo, o estrangeiro pode valer-se de seu idioma com ajuda de gestos ou sinais, para a entrega do testamento, desde que o notário o entenda.

§ 5.880. QUEM NÃO SABE OU NÃO PODE L E R 1. TEXTO LEGAL. - Diz o Código Civil, art. 1 . 6 4 1 : "Não poderá dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba, ou não possa ler". No Projeto revisto, art. 1 . 9 7 7 : "São inábeis para dispor de seus bens

em testamento cerrado os que não sabem ou não podem ler". No Projeto de C O E L H O R O D R I G U E S , art. 2 . 4 5 1 : "Aquêle que não pode ou não sabe ler, não pode fazer testamento cerrado". Veio o artigo alterar o sistema do Código: por isto foi proposta a supressão {Trabalhos, VI, 496 e 540). Com êle criou-se a figura singular do sabe e pode ler, mas não sabe assinar; com êle, permitiu-se ao analfabeto o testamento público, sem se lhe permitir o cerrado. 2. F O N T E . - Arg. à L. 21, C, ¿/E testamentis: quemadmodum testamenta ordinantur, 6, 23, e às Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, § 1.". Código Civil francês, artigo 978: "Ceux qui ne savent oü ne peuvent lire, ne pourront faire de dispositions dans la forme du testament mystique". A Novela 69, de Leão nunca teve autoridade em tal matéria no direito dos últimos séculos. 3. F U N D A M E N T O . - A razão do art. 1.641 está em que o testador deve, por si mesmo, poder verificar se o escrito, que êle apresenta, é, realmente, o seu testamento e se o conteúdo corresponde à expressão das suas últimas vontades. Aliás, a L. 21, C. de testamentis: quemadmodum testamentum ordinantur, 6, 23, emprega as expressões si litteras testator ignorei rei subscribere nequeat, que se pretendeu dissessem o mesmo que hoje se diz, na esteira do Código Civil francês, art. 978, do italiano revogado, art. 785, do espanhol, art. 708, e do português revogado, art. 1.923. Em verdade, hoje, a lei brasileira, mantendo o texto duvidoso (Ordenações Filipinas, Livro rV, Titulo 80, § 1; Código Civil, art. 1.638, IH: "não sabendo ou não podendo o testador assinar") e inserindo a exigência de saber e poder ler (art. 1.641), veio deixar êste extraordinário tipo do que sabe ler e não sabe assinar, que talvez não se encontre nos nossos sertões e centros urbanos. Raridade bem imprópria para um Código. Compreende-se que se cogitasse do que sabe ler e não pode assinar. Aquêle "não sabendo" do art. 1.638, HI, precisa riscar-se numa revisão da lei civil. infração do Código Civil, art. 1 . 6 4 1 , que tira ao disponente o uso de uma forma testamentária, tem por efeito a nulidade do testamento: a) Se cego, porque, não vendo, não pode ler. b) Se não pode ler, ou porque não saiba, ou porque esteja, acidentalmente, impedido disto, se bem que não seja cego. Ocorre tal circunstância 4 . CONSEQÜÊNCIAS DA REGRA LEGAL. - A

subjetiva, quando operado o testador, ou, por outro motivo (pancada, inchação) não possa ler.

§ 5.881. SURDO-MUDO 1. TESTAMENTIFAÇÃO. - Diz o Código Civil, art. 1 . 6 4 2 : "Pode fazer testamento cerrado o surdo-mudo, contanto que o escreva todo, e o assine de sua mão, e que, ao entregá-lo ao oficial público, ante as cinco testemunhas, escreva, na face externa do papel ou do envoltório, que aquele é o seu testamento, cuja aprovação lhe pede" No Projeto primitivo, artigo 1 . 8 1 1 : "O mudo, ou o surdo-mudo, que souber ler e escrever, pode fazer testamento cerrado, contanto que, ao apresentá-lo ao tabelião, perante as cinco testemunhas, escreva no dorso do papel ou do envólucro que aquele é o seu testamento, para o qual vem pedir a aprovação do oficial público". E no Projeto revisto, art. 1 . 9 7 8 : "Pode fazê-lo o surdo-mudo, contanto que seja todo escrito, assinado, e datado de sua mão, que ao apresentá-lo ao oficial público, perante as cinco testemunhas, escreva no dorso do papel ou do envólucro que aquêle é o seu testamento, para o qual vem pedir aprovação do oficial público".

Em verdade, tiramo-lo do revogado Código Civil português, art. 1.924: "O surdo-mudo pode fazer testamento cerrado, contanto que êste seja todo escrito, assinado, e datado de sua mão, e que, ao apresentá-lo ao tabelião perante cinco testemunhas, o testador escreva na presença de todos, sobre a face externa do testamento, que aquela é a sua última vontade, e que vai por êle escrita e assinada". Dizia o parágrafo único: "O tabelião declarará, no auto de aprovação, como o testador assim o escreveu, e se observará o mais que fica disposto no art. 1.922". 2 . DIREITO ANTERIOR. - A S Ordenações Filipinas, do Livro I V , Título 80, § 5, permitiam ao que se tomou surdo e mudo, sabendo escrever, que testasse do próprio punho. Estendia-se ao particular, hológrafo, e - por sugestão posterior da Ordenança francesa de 1735, art. 12 - ao cerrado, como o do Código Civil português atual e o brasileiro. 3 . ENTENDIMENTO DA REGRA LEGAL. - O dispositivo fala em surdo-mudo disponente que não pode satisfazer as exigências do Código Civil,

art. 1.638, V e IX: dizer que é seu e querer aprovado, e ouvir a leitura. Dispensa-lhe uma e outra coisa. Por isto mesmo, o surdo, que não é mudo pode testar, por testamento cerrado, pois que fala (art. 1.638, V) e lê (artigo 1.641), invocando a dispensa maior que aos surdos-mudos se concedeu. O mudo, que não é surdo, não diz o que lhe exige o art. 1.638, V. porém lê e ouve, e não seria razoável que se lhe vedasse a dispensa do art. 1.642 na parte de substituição da declaração oral pela escrita.

§ 5.882. ENTREGA AO TESTADOR E NOTA NO LIVRO 1. T E X T O L E G A L . - Diz o Código Civil, art. 1 . 6 4 3 : "Depois do aprovado e cerrado, será o testamento entregue ao testador, o oficial lançará, no seu livro, nota de lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado e entregue". No Projeto revisto, art. 1 . 9 7 9 : "Depois de aprovado e encerrado, será o testamento entregue ao testador, e o oficial lançará, no seu livro, nota de lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado e entregue".

- Código Civil português revogado, artigo 1 . 9 2 6 : "Aprovado e encerrado o testamento, será entregue ao testador, e lançará o tabelião nota no seu livro, do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado e entregue". Cp. espanhol, art. 7 1 0 ; mexicano, art. 3 . 5 2 0 (art. 3 . 7 8 9 ) ; e o guatemalense, art. 780. 2. FONTE.

3 . F U N D A M E N T O DA REGRA LEGAL. - A exigência da entrega tem importância de alto interêsse público, que é o da liberdade testamentaria. É preciso que o testador receba o ato perfeito, que é, com a aprovação, o testamento cerrado, para poder, arrependendo-se, revogá-lo pelo meio simples do artigo 1.749: abri-lo ou dilacerá-lo, ou mandar que outrem o abra ou dilacere. Se estava o disponente em situação difícil de testar, por exemplo, estando in extremis, não poderia recorrer aos meios escritos de revogação, e isto constituiria séria restrição ao princípio inderrogável da livre revogabilidade testamentária.

Quando o oficial público entrega ao testador o testamento fechado e cosido, exige-lhe, de regra, que assine o recibo, em papel à parte, ou em

livro do cartório. Não é essencial, de modo que o oficial púbÜco pode dar prova de tê-lo entregue, sem ter havido recibo, ou por ter-se perdido. 4. CONSEQÜÊNCIAS. - Além do queja antes se disse, convém caracterizar as duas providências do Código Civil, artigo 1.643, e distinguí-las: a) A entrega ao testador. Não significa ato de mão a mão, mas tradição por todos os meios que a lei admite. Se o oficial público, retirando-se, deixa na cabeceira do doente o testamento, dizendo que ai fica, ou sai, despedindo-se normalmente, apontando o documento, com o intuito de não molestar o testador moribundo, ludo isto vale entrega. Entrega é também abrir a gaveta da mesa em que se acha sentado o testador sem mão, ou de mãos impedidas, em gesto inequívoco de tradição, ou palavras que o valham. Se o testador adianta-se, ao ver coser-se o testamento, e diz: "faça o favor de dá-lo ao meu amigo A" pessoa que está presente, havendo razão de o fazer (por exemplo, falta das mãos, fortes sofrimentos, doença contagiosa), deu-se, juridicamente, a entrega. Tratando-se, como se trata, de entrega ao testador, não se deve confundir com o ato de fidúcia deste a outrem, principalmente ao testamenteiro. Lê-se em O R O S I M B O N O N A T O {Estudos sôbre Sucessão testamentária, I, 297): "A entrega ao testador pode ser levada a efeito por todos os meios admitidos em direito. Observa-o P O N T E S DE M I R A N D A , acrescentando não originar nulidade sua inocorrência. E o mesmo se passa com a ausência do lançamento a que alude o art. 1.643. A omissão poderá, entretanto, suscitar, conforme o caso, aplicação de pena disciplinar ou criminai ao oficial faltoso". b) Lançamento, no livro do oficial público, do lugar, dia, mês e ano (aconselhàvebnente, hora) em que o testamento foi aprovado e entregue. A falta disto não induz nulidade, mas não exime da responsabilidade criminal e disciplinar o oficial público que o omitir. Tão-pouco constitui nulidade ficar o testamento com o oficial público. A nota deve conter data relativa à aprovação e à entrega. Di-lo alei expressamente. Neste memorando inserto no livro oficial deve narrar-se o que se passou quanto ao fato da entrega, se, por acaso, não se fêz de mão do oficial público à mão do testador. Máxime se lhe disse entregar a outrem. Sempre que, em ação de nulidade de testamento, tiverem concorrido para a sentença que julgou procedente a ação, como indícios, fatos ou omissões, que não constituam por si causa de nulidade, mas de culpa do oficial público, poderá êle ser responsabilizado civil e criminalmente.

§ 5.883. ABERTURA DO TESTAMENTO, REGISTO E ARQUIVO

1. TEXTO LEGAL. - Diz o Código Civil, art. 1.644: "O testamento será aberto pelo juiz, que o fará registrar e arquivar no cartório a que tocar, ordenando que seja cumprido, se lhe nao achar vício extemo que o tome suspeito de nulidade, ou falsidade". No Projeto revisto, art. 1.981: "Éste testamento será aberto pelo juiz, que o mandará cumprir, se não encontrar vício extemo que o tome suspeito de falsidade, sendo registado na repartição competente e arquivado no respectivo cartório". Emenda do Senado Federal: "O testamento será aberto pelo juiz, que o fará registar e arquivar no cartório a que tocar, ordenando que seja cumprido, se lhe não achar vício extemo que o tome suspeito de nulidade ou falsidade". O auto de abertura do testamento cerrado é formalidade típica, porque a lei supõe cerrar-se o coser-se o testamento, ainda que antes já o testador o houvesse fechado, ou fechado e lacrado. Não se abre qualquer dos outros testamentos, exceto o testamento mihtar, que o testador, se escrito e assinado por êle, entendeu cerrar (Código Civil, art. 1.661). Para a abertura do testamento, o que se exige é que o levem ao juiz, e a lei não limitou a faculdade de apresentação para a abertura. Não se precisa da presença de qualquer outra pessoa, que o juiz e o escrivão, mesmo porque as testemunhas podem ser ignoradas, ou não mais viverem, ou estarem longe do juízo. Quem apresenta tem de estar presente à abertura. Se o testador falece, ou se é julgada a sucessão provisória, tem de ser aberto o testamento cerrado. A entrega para a abertura há de ser onde está o testamento cerrado, e não necessàriamente onde foi aprovado; pois o testador pode ter mudado de domicílio, ou de residência, ou apenas tê-lo guardado noutro lugar, ou tê-lo enviado a algum cofre que tenha noutra cidade, ou tê-lo confiado a alguém. A abertura onde se acha o testamento é recomendada para que se evite extravio, ou fraude, e para se saber o que se dispôs quanto aos funerais. A lei de organização judiciária é que diz qual o juiz competente, ou, onde não há juiz de vara especial, qual o que há de exercer tal função. Se o testamento cerrado é de pessoa não domiciliada no Brasil, deve o juiz remeter certidão à autoridade consular do Estado do domicílio, ou da nacionalidade do testador, conforme a lei pessoal. Em se tratando de falecido que era domiciliado noutro lugar do território brasileiro, tem-se de comunicar ao juízo competente do lugar do domicílio do falecido que foi aberto o testamento, com os informes que forem úteis.

O ato de abertura supõe todo cuidado no exame exterior do testamento cerrado, do estado em que se acha o testamento aberto. Tudo que seja de interesse (e. g., rasuras, entrelinhas, emendas, manchas) tem de constar do têmo de abertura. O juiz abre o testamento cerrado, com o escrivão do juízo, ou aquêle a que foi distribuído o processo, se há dois ou mais. Primeiro, lê o que foi lançado por fora do testamento, corta o lacre e as linhas de fechamento, examina por dentro o testamento cerrado, que abriu, diz quais as emendas, rasuras, entrelinhas e manchas que encontrou; e ordena ao escrivão que leia todo o manuscrito, em voz alta, estejam presentes pessoas interessadas ou apenas êle, juiz, o escrivão e o apresentante. O escrivão lavra o termo de abertura, no papel ou outro material do próprio testamento, logo após o auto de aprovação. No termo de abertura hão de estar as indicações principais e necessárias: lugar, dia, mês e ano da abertura; o nome do apresentante ou os nomes dos apresentantes, com informação sôbre ser ato do próprio apresentante, ou dos próprios apresentantes, ou por ordem de outrem, com nome de tal pessoa, ou das pessoas que ordenaram a apresentação; razão por que trouxe ou trouxeram o testamento; quais as relações do apresentante, ou dos apresentantes, de quem ordenou ou das pessoas que ordenaram a apresentação; em poder de quem se achava o testamento cerrado; a data e lugar do óbito, com os dados sôbre o falecido (nome, nacionalidade, naturalidade, filiação, estado civil, domicílio); estado do testamento cerrado, inclusive quanto ao número de pingos de lacre, borrões e quaisquer outros defeitos e correções. Se alguém abriu o testamento, em vez do juiz, ou houve êrro, ou dolo, ou simples inadvertência de terceiro, ou foi o próprio testador que o quis destmir. Não se pode considerar revogado o testamento cerrado que não foi aberto pelo testador, intencionalmente. Se foi outrem que o abriu, tem de ser feita, perante o juiz, que o teria de abrir, a justificação do que ocorreu, citados os interessados. Julgada a justificação, cabe o ato do cumpra-se (5.® Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 31 de julho de 1952, D. da J., 1952, 5462). Contra a denegação do cumpra-se há recurso. Nada obsta a que o interessado, diante do que aconteceu, proponha ação declaratória da abertura ilegal, portanto - da não-revogação do testamento. 2. VELHOS ABUSOS DOS SÉCULOS X n A XIV. - Desde o ñm do século a Igreja se esforçou por facilitar os testamentos e chamar a si a execução. Mas as publicações pelos pái'ocos eram abusivas. O Breviário (Codex

Theod-, IV, 4,4, interpret.) fazia-as apud curias vivos, cinco dias depois da morte do testador. Se os interessados estavam ausentes, a partir da vinda As fórmulas visigóticas atestam que tudo isto se praticou (K. Z E U M E R Formulae Merowing, et Karol, aevi. Monumenta Germaniac histórica inde ab anno Christi 500 usque ad annum 1500 edidit Societas aperiendis fontibus rerum Germanicarum medii aevi, 585 s.). No Código Visigótico, nem se fala em publicação na cúria, nem no registo. Publicavam-se perante o sacerdote na presença de testemunhas e antes de seis meses da morte. Publicado, entregava-se ao herdeiro de maior quinhão (ü, 14; V, 5, 10). Se tinha havido escrita a rôgo, ou fôra feito oralmente, era preciso que interviesse o juiz. Com a pena de excomunhão, foi a Igreja trazendo a si todas as publicações, inclusive as dos testamentos públicos, que não precisavam ser publicados. Mas a Lei de 21 de maio de 1349 repôs a jurisdição secular, em todos os casos, pela posse da jurisdição por parte da Coroa. Nas Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 103, § 2 (iguahnente, nas Ordenações Manuelinas, Livro IV, Título 76, § 3, e nas Ordenações Filipinas, Livro rv, Título 80, § 3), deviam ser publicados por autoridade de Justiça, chamados os interessados, se não tivessem nos cantos o instrumento público. Só o particular, hológrafo ou não, escrito ou oral, se publicava. Mas o prazo de publicação não se fixou. Nem leis posteriores o disseram. Onde há fé pública, dizia-se, não é preciso publicar-se, e o prazo pareceu injustificado. Por isso mesmo, no art. 1.643 do Código Civil só se exige ao testamento cerrado abertura, registo e arquivamento: publicado foi o ato (não o conteúdo da cédula) e dêle o oficial público lançou no livro nota do lugar, dia, mês e ano em que foi aprovado e entregue (art. 1.643). O testamento particular, êste se publica (art. 1.646). 3 . D o C Ó D I G O V I S I G Ó T I C O AO C Ó D I G O C I V I L BRASILEIRO. - O a r t .

1.644 do Código Civil vem firmar que o testamento cerrado será aberto pelo juiz, que o fará registar e arquivar no cartório a que tocar. Não era escusado dizê-lo. O Código Visigótico dava a publicação ao sacerdote perante testemunhas, salvo se a rôgo ou oral. Disto se aproveitaram os párocos para as publicações de todos os testamentos, ainda aquêles que não precisavam disto.

Como quer que seja, e a despeito da Lei de 21 de maio de 1349 (função que outrem usurpou é função desprestigiada), alguns escritores entenderam, bastando citar a PASCOAL JOSÉ DE M E L O F R E I R E (Institutiones iuris civilis lusitani, I, 5, § 52; Hl, 5, § 10), que a abertura podia ser pelo pároco ou por outra pessoa. No ato dos enterros, perante a irmandade, ou acompanhamento. Passavam os párocos a certidão da abertura. O que se fazer - a abertura pelo juiz, conforme M A N U E L DE A L M E I D A E S O U SA {Coleção de dissertações e tratados vários em suplemento às Segundas Linhas, 195), atestava ter visto. HENRIQUE DA G A M A BARROS {História da Administração pública em Portugal, III, 301) via na prática da abertura pelo sacerdote persistência da tradição visigótica. ¿E a abertura outra pessoal Disto não cogitou. Em M E L O F R E I R E {Institutiones iuris civilis lusitani, HE, tít. 5, § 10), lê-se: "a Parocho, vel quovis alio extraiudicialiter aperitur, quae apertura nullam publicationem, citationem, testiumve recognitionem requirit". Tanto quanto podemos seguir o fio do direito lusitano, a partir do Código visigótico, a permissão de outrem abrir vai entroncar-se no texto de Chindasvindo, no Código (11, 5, 14): "Scripta voluntas defuncti ante sex menses coram quolibet sacerdote, vel testibus publicetur". Se recorrermos à L. 12, encontraremos: "infra sex menses iuxta legem aliam sacerdoti pateant pubHcande". Portanto, tinha de abrir-se perante o pároco com a presença das testemunhas (cf. L. 10) e não perante as testemunhas. H E N R I Q U E DA G A M A BARROS {História da Administração pública em Portugal, 299), que viu no vel um et (coisa que já apontamos, hoje em dia, no Código Civil alemão e no brasileiro), podia ter concluído pela interpretação da alternativa em vez da copulativa, que seria a explicação certa. Se bem que só o art. 1.644 do Código Civil fale na verificação do vício externo, pelo juiz, e na pubhcação do testamento particular, todos os testamentos precisam do cumpra-se para que se executem. Ainda se público aberto. Mas o assunto, comum ao direito substantivo e ao adjetivo, melhor ficará no capítulo especial, que depois se insere sobre jurisdição e processo dos testamentos. 4 . CASO DE TESTAMENTO TERATOLÓGICO, PORÉM N Ã O N U L O . -

Ao

testamento cerrado, como ao hológrafo, o Código Civil exige que assistam, à entrega daquele e à leitura dêste, cinco testemunhas. O cerrado pode ser lido, ou não. Figure-se o caso do testamento escrito pelo testa-

dor e lido perante cinco testemunhas, assinado por êle e as testemunhas. Tem todos os requisitos de testamento particular (art. 1.645). Mas o testador, por confusão ou ignorância, leva-o ao oficial público, perante as mesmas ou outras testemunhas, e pede que o aprove. Supomos que tudo mais se passou legalmente. Vale como testamento hológrafo e como testamento cerrado, e dado que, por omissão ou defeito de formalidade, não valha como cerrado, valerá como particular. Porque, como particular, já estava perfeito. Tudo o mais que se seguiu foi supérfluo e não pode prejudicar o ato válido. Aqui, não se trata de conversão, como se daria em direito que possuísse a cláusula codicilar de valer, como codicilo, se, não valesse como testamento (P. S I M E O N , Lehrbuch des Bürgerlichen Rechtes, 1 8 6 ) , - mas de superposição de um ato nulo ou, quiçá, ineficaz, a outro eficaz. (Ahás, a cláusula codicilar não é bem conversão). Se admitirmos que o primeiro tem defeito, como testamento hológrafo, mas contém desde o início os requisitos essenciais do testamento cerrado, verificar-se-á a validade da forma do art. 1.638, ignorante ou confusamente associada à forma hológrafa. ¿Se um testador, em dúvida, incluiu a cláusula de conversão? Respeita-se, porque satisfez os requisitos essenciais. E como a regra locus regit actum é a que domina a forma, mas sem excluir a facultatividade da lei pessoal, pode ocorrer, no domínio do direito internacional privado, que se ressalve, na dúvida, a observância de uma lei. O que é preciso é que uma lei possa, no fôro, ser aplicada, e de acordo com ela valha o testamento. No Código Civil argentino, inspirado no da Luisiana, artigo 1.583, diz o art. 3.670: "El testamento cerrado que no pudiese valer como tal por falta de alguna de las solemnidades que debe tener, valdrá como testamento ológrafo, si estuviere todo él escrito y firmado por el testador". O maior argumento contra tal regra consiste em poder o testador ter querido que o testamento valesse como cerrado, e não como hológrafo. Se não vale como aquêle, não vale como éste. Seria levar demasiado longe o formalismo, querer-se que o testador possa fazer depender forma, que é secundaria, a sua vontade, que é principal. Não seria, sequer, séria, essa vontade de forma exclusiva; nem se havia de presumir. Aliás, o legislador romano, na L. 3, D., de testamento militis, 29, 1, acertadamente dissera: "...nec credendus est quisquam genus testandi eligere ad impugnanda sua

iudicia, sed magis utroque genere voluisse propter fortuitos casus" Cf. R. {Le Droit civil expliqué suivant Vordre des articles du Code, n. 1.654), V. MARCADÉ {Explication théorique et pratique du Code Napoléon, nota ao art. 976) e M A R C E L PLANIOL {Traité élémentaire de Droit Civil, III, 2.719, 671). Volver-se-á ao assunto a propósito do art. 1.645 e quando se tratar, espaçadamente, das figuras de conversão e de conservação. Aliás, no caso estudado, há mais do que conservação: há superposição. TROPLONG

5. NULIDADE DO TESTAMENTO CERRADO. - Se o testamento cerrado, quer na cédula testamentária, quer no auto de aprovação, não satisfaz algum dos pressupostos essenciais, há nulidade; salvo o respeito do princípio Una forma omissa, alteram non consumit, isto é, omitida uma forma, a outra não se desfaz. Pode ser que o testador tenha levado ao oficial público cédula testamentária em que (o que rarissimamente pode acontecer) foram satisfeitos os pressupostos necessários do testamento particular. Então, a nulidade do auto de aprovação não se estende ao negócio jurídico unilateral, que se tem de respeitar como testamento particular.

6. RESPONSABILIDADE DO OFICIAL P Ú B L I C O . - No testamento cerrado, se bem que não no diga, expressamente, o Código Civil, o oficial público responde, civilmente, pela inobservância da lei. Quanto à parte da aprovação, dar-se-á a responsabilidade civil como a respeito dos testamentos públicos. Assim, responde o oficial público se fôr nulo o testamento: a) escrito por êle, a rôgo do testador, e por êle aprovado (artigo 1.639), se o disponente não podia usar a forma cerrada, como acontece ao que não sabe ler (art. 1.641); è) se o surdo-mudo, que tinha de obedecer ao estatuído no art. 1.642, não no observou, e — não obstante — foi aprovado, salvo na parte que o oficial público ignorava (testamento entregue fechado e contendo outra letra em página anterior, que o oficial público não viu) e provadamente ignorou; c) se, escrito por outrem, não contiver a assinatura do testador ou de quem escreveu (artigo 1.640); d) se, no auto de aprovação, não sabendo, ou não podendo o testador assinar, não constar a formalidade do artigo 1.638, X, ou a pessoa que assinou não for uma das testemunhas; e) se a nulidade fôr derivada do próprio auto de aprovação, quer por falta de requisito, quer por se fazer/ora do lugar devido (art. 1.638, Vn e VIII).

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.883. A - Legislação Sobre a apresentação, abertura e registro do testamento cerrado, ver o art. 1.875 do CC/2002. § 5.883. B - Doutrina Como as demais espécies de testamento, o cerrado produz efeitos a partir da abertura da sucessão, se não tiver sido revogado antes pelo testador. O Código Civil de 2002 supriu uma lacuna existente na legislação anterior, ao deixar explícito que a apresentação do testamento cerrado, ao juiz competente, se fará "falecido o testador". A apresentação é obrigatória e imediata por quem tinha sido responsável por sua guarda, ou por quem o tenlia encontrado. Recebido o testamento, o juiz determinará sua abertura e o fará registrar no cartório a ele vinculado ou de acordo com a organização judiciária. A análise promovida pelo juiz é exclusivamente quanto às formalidades extrínsecas, notadamente quanto à existência do auto de aprovação notarial e se não há indícios de violação do lacre ou de falsificação, de tudo havendo alusão no termo de abertura. A abertura e o registro confirmam a eficácia do testamento desde a abertura da sucessão, por força da saisine. Para a apresentação do testamento ao juiz não há necessidade de testemunhas. A competência do juiz é dada pela organização judiciária estadual, mas deve levar em conta a regra matriz do último domicílio do testador, que é o da sua sucessão (art. 1.785 do CC/2002). § 5.883. C - Jurisprudência Decidiu o STJ que ao juiz é lícito investigar livremente os fatos (art. 1.107 do CPC), sendo igualmente lícita a exigência de certidões negativas, porque só se cumpre o testamento cerrado se lhe não achar vfcio externo que o torne suspeito de nulidade ou falsidade (STJ, REsp 95.861/RJ, S.^T, j. 04.03.1999, rei. IVlin. Nilson Naves, DJ21.06.1999, p. 149). Porém, entende-se cumpridas as formalidades legais extrínsecas, se o envelope entregue ao magistrado está cerrado, costurado e lacrado, sem vestígio algum de violação, ainda que não se tenha consignado na cédula testamentária nem no auto de aprovação o nome da pessoa que a datilografou a rogo do testador (STJ, REsp 228/MG, 4.^ T, j. 14.08.1989, rei. Min. Athos Carneiro, DJ 04.12.1989, p. 17.884).

§ 5.884. DIREITO INTERTEMPORAL E TESTAMENTO CERRADO



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§ 5.884. DIREITO INTERTEMPORAL E TESTAMENTO CERRADO

1. DUAS FASES. - A S duas fases de elaboração dos testamentos fechados e aprovados pelo oficial público, por se constituírem de atos sucessivos porém não suscetíveis de perfazer, sem a última formalidade, o ato jurídico do testamento, permitem questões que não se identificam com as surgidas a respeito do testamento público. 2 . DIREITO INTERTEMPORAL E FASE DE IMPERFEIÇÃO. - Os testamentos cerrados e os particulares têm fase de imperfeição: aquêles, antes de serem aprovados; êstes, antes de lidos e assinados. São, até o momento em que se aprovam, ou assinam, negotia imperfecta. ¿Qual a lei, em direito intertemporal, que os deve reger? Se, no meio tempo em que se escreveram, e se aprovaram ou assinaram, intervém mudança de lei, - ¿qual a que se incide, a do tempo do imperfeito ou a do tempo da perfeição, a antiga, sob que se iniciaram, ou a nova, sob que tais atos se completaram? O testador, antes da aprovação ou das assinaturas, não adquiriu direito à forma: não usou, legal e completamente, dela. Tem de tratar-se pro imperfecto, qualquer dos testamentos. A lei tem de ser a nova, a do tempo da perfeição, a do auto; ou do dia das assinaturas do testamento particular.

Quanto ao art. 1.641, que tem correspondentes nos direitos estrangeiros do testamento cerrado, discute-se qual a lei aplicável, se surge questão de direito intertemporal. Exemplos: a) lei do tempo A, que exige saber e poder ler, e lei do tempo B, que o não exige; b) lei do tempo A, que o não exige, e lei do tempo B, que o exige. Alguns consideram a disposição atinente à capacidade e por isto os testamentos feitos sob a lei permissiva, pelo que não sabe, ou não pode ler, não valeria sob a lei proibitiva do tempo da morte (V. VITALI, La Forma dei testamento italiano, 170; C A R L O FRANCESCO GABBA, Teoria de la Retroattività delle leggi, m , 348). Contra tal opinião, a Corte de Cassação de Roma, a 29 de abril de 1878. Trata-se realmente de requisito subjetivo, e não de regra de pura lei formal, porém a conclusão não se coaduna com o principio de reger-se tal exigência pela leí do ato testamentario. É caso semelhante ao do art. 1.637: a lei é a do dia da aprovação. Aprovado, é ato perfeito. 3. DIREITO INTERTEMPORAL E APROVAÇÃO. - Com a aprovação, o testamento cerrado se perfaz. Desde então só se aguarda a morte para os

efeitos. Fizesse-O o são de espírito que depois enlouqueceu, vale. Fizesse-o o que não podia escrever, se nova lei lhe negar o testamento cerrado, pelo exigir autógrafo, nem por isto deixará de valer o que se fêz no vigor da lei permissiva. Perfeito, somente deixará de valer, se, não a forma, mas o ato, em si, ficar ferido de morto, como ocorrerá no Estado, em que o legislador abolir a sucessão testamentária, ou negar a certas pessoas, não a capacidade testamentária ativa, mas a faculdade mesma de testar. Assim, rege-se pela lei do tempo em que se aprova: a) Tudo que concerne à fase imperfeita da cédula. b) A formalidade do art. 1.638: entrega ao oficial público, em presença das testemunhas. c) A exigência de começar, imediatamente depois da última palavra do escrito, o instrumento de aprovação. d) Se não houver espaço, a aposição do sinal público e a declaração disto no instrumento. e) A leitura pelo próprio oficial público e a assinatura dêle, das testemunhas e do testador, se puder (ou, se não puder, a precaução do art. 1.638, X). f) O cerrar e coser. g) A facultatividade de escrever o próprio oficial público aprovante a cédula testamentária (art. 1.639). h) A permissibilidade da língua nacional ou estrangeira na cédula (art. 1.640). i) A concessão e precaução do art. 1.642, relativas ao surdo-mudo e aplicáveis em caso de mudez e de surdez. j) A entrega ao próprio testador e o lançamento a que se refere o art. 1.643 (não é requisito essencial, mas faz parte do ato testamentário, e tempus regit actum). Do que acima se disse são conseqüências exemplificativas: se testamento foi feito antes do Código Civil, não cabe perguntar-se, nem discutir-se se, escrita pelo testador a cédula, precisava ser assinada pelo próprio. Mas, quanto às expressões bom, firme e valioso, persistiria a discussão: se sacramentais, ou se não sacramentais. A própria leitura não era expressamente exigida. Testamento feito na vigência do Código Civil, porém, pelo influxo do direito anterior, não lido, teria de obedecer à lei da feitura, ainda que o legislador, ao tempo da morte, tivesse revogado o Código Civil e reimplantado o texto das Ordenações Filipinas.

4 . DIREITO INTERTEMPORAL, ABERTURA, REGISTO E ARQUIVAMENTO

- Já O abrir, registar e arquivar não são partes integrantes do ato do testamento cerrado. Quando se fechou e coseu, entregue ao testador, perfez-se. Agora, o que importa é cumpri-lo. Diz o Código Civil, art. 1.644, que o abrirá o juiz. Se lei nova viesse, que restaurasse a abertura pelos párocos perante testemunhas, ou, até, segundo a corruptela da praxe que por longo tempo vigorou em Portugal e no Brasil, perante o pároco ou outras pessoas, deixaria de ser aplicável o Código Civil, se bem que feito na sua vigência o testamento. Aqui, nem a lei é a da forma {tempus regit actum), nem a do tempo da sucessão. Se, na ocasião da morte, ainda vigorava o Código Civil, porém a apresentação só se fêz, dias, meses ou anos após a morte, a lei será a vigente ao tempo em que se abrir, lei também do ato, lei do tempo do ato autônomo da abertura. DO TESTAMENTO CERRADO.

A abertura pode envolver, ou não, a faculdade judicial de apreciação das nulidades. As nulidades, que são as de ordem formal ou evidentes, são regidas pela lei temporal da capacidade ou pela da forma. Mas a possibilidade da apreciação, os limites dela, os podêres do juiz quanto ao cumprir ou não cumprir, tudo isto se rege pela lei do tempo da abertura, pela lei processual do momento em que se apresenta o testamento e o juiz o abre. iQuid iuris, se levado ao juízo, não há quem, na ocasião, o abra legalmente? Aqui, se a lei da apresentação dá um poder, e outro, maior ou menor, a lei da abertura, prevalece esta, por se tratar de competência judicial, tocante a interêsse público.

§ 5.885. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E TESTAMENTO CERRADO

- Os princípios que regem o direito internacional privado, no tocante a testamentos secretos ou cerrados, são diferentes, conforme se trata, ou não, de testamento feito pelo testador ou por outrem a seu rôgo, mas aprovado, necessariamente, por autoridade pública, seja juiz, ou seja 1. PRINCÍPIOS.

Se a legislação do lugar fala de testamento secreto ou cerrado sem a subscnção, ou aprovação de autoridade pública, a espécie não interessa à seção do direito testamentário brasileiro, que fala do testamento cerrado.

não constitui 2." espécie de testamento notarial ou judicial. Tôdas as questões, assim de direito internacional privado como de direito intertemporal, que por ventura suqam, dirimidas hão de ser pelos princípios relativos aos testamentos particulares nas relações de espaço e de tempo. Aqui, só nos interessa o testamento cerrado que constitui uma das espécies de testamento judicial ou notarial. 2 . SUBESPÉCFFIS DE TESTAMENTOS CERRADOS JUDICIAIS OU NOTARIAIS.

- Se O testamento fechado se faz desde a primeira palavra perante o oficial público, quer dizer - se a lei do lugar exige que a própria cédula seja escrita perante o tabelião, ou o juiz, ou êle mesmo, ou funcionário dêle o escreva (1." fase do testamento cerrado), não se trata da forma testamentaria dos arts. 1.638-1.644 do Código Civil brasileiro, nem similar dela: trata-se, evidentemente, de subespécie do testamento público propriamente dito e os princípios de direito internacional privado são, precisamente, os que regem aquele testamento, chamado por escritores dos séculos passados aberto público. O da referida hipótese é testamento público fechado. O que distingue a subespécie que ora versamos é a dualidade de fases, das quais a última assistida é oficiada por autoridade pública. A esta subespécie também se aplica a regra locus regit actum. A aprovação confere-lhe publicidade e seria violento vedar o legislador da lei pessoal o exercício de tal forma no estrangeiro. Se o fizer, dar-se-á o conñito de qualificação, porém o erro de política jurídica ressaltará quando o Estado terceiro tiver de pronunciar-se pela observância da lei proibitiva exterritorial ou da lei do lugar do ato. Provàvelmente, e com os melhores fundamentos, o Estado terceiro reconhecerá a validade do testamento que se fêz segundo a regra locus regit actum. 3 . O QUE OBEDECE À REGRA JURÍDICA "LOCUS REGIT ACTUM". - S e 0

testamento cerrado, aprovado por autoridade pública, deve ser escrito pelo próprio testador, ou se pode ser por outra pessoa, decide a lei do lugar. Também ela resolverá quanto a ser possível, ou não, a assinatura a rôgo, a presença das testemunhas, durante a primeira fase de elaboração, e o número delas. Quanto à fase da subscrição ou aprovação pela autoridade pública, tudo tem, necessariamente, de obedecer ao estatuto oficial público. Ele só tem uma lei, que é a sua. Aqui, prevalecem integralmente os princípios que regem, de ordem pública, os atos públicos, salvo se a própria lei lo-

cal dispensar ou agravar a formalidade segundo a lei pessoal. Mas, ainda aí, será a lei local, e não a pessoal, que em verdade a autoridade pública executa: será a lex loco no que manda aplicar a pessoal, - ex hypothesi, conteúdo dela. Cp. Código Civil francês, arts. 976 e 911\ italiano revogado, arts. 782 c 783; português revogado, arts. 1.920 e 1.922; espanhol, arts. 680, 706 e 707; argentino, art. 3.666; chileno, arts. 1.021 e 1.023; uruguaio, arts. 801803; venezuelano, artigos 389 e 845-847; bohviano, arts. 446-450; mexicano, artigos 3.486 e 3.506-3.514; peruano, arts. 667 e 668. As questões de direito internacional privado são as mesmas a que acima aludimos, e o Código Civil argentino, art. 3.666, que exige ser firmada pelo testador a cédula, não motiva questão de exceção à lex loci estrangeira nos testamentos feitos fora da Argentina. 4. QUALIFICAÇÃO DE INTRÍNSECO. - Existem, porém, circunstâncias subjetivas, que os países da lei pessoal podem reputar extraterritoriais, intrinsecando o extrínseco, ou consignando requisitos subjetivos, que digam de perto com as espécies testamentárias. Foi o caso, antes estudado, do cego (Código Civil, art. 1.637) e é, ainda, o do surdo-mudo (artigo 1.642) e do que não sabe ou não pode ler (art. 1.641). É matéria propícia a tais qualificações (e estas não precisam vir em lei expressa, porquanto não só o texto escrito é fonte de direito internacional privado). O Estado terceiro não deve ter o procedimento que teria no caso referido no n. 2, in fine: salvo princípio seu, nada louvável, por importar absolutismo inumano da locus regit actum, aplicará a lei pessoal, se interessada na sucessão. (Pode ser que não esteja, isto é, que o conflito não se dê, como se todos os bens se acham no Estado da lex loci, se não há herdeiros segundo a lei pessoal, e pois nenhum inconveniente existe em se reconhecer vahdade no país do lugar.) 5 . ALCANCE DA PROIBIÇÃO DO TESTAMENTO SECRETO OU CERRADO.

- Se a lei pessoal exige que o disponente só teste, no estrangeiro, por testamento púbhco, deve entender-se que se refere às duas espécies: o aberto pubhco e o púbüco fechado. Assim tem sido, com habitualidade, a praxe brasileira. Se a lei pessoal proíbe, expressamente, o segredo testamentario, não ha dúvida que pode fazê-lo, e o testador não deve, no estrangeiro, dentre as formas públicas possíveis, preferir a que a lei da sua pátria, ou a sua lei.

lhe proíbe. iQuid iuris, se, a despeito disto, o disponente empregar a forma secreta? Se esta forma fôr particular, nenhuma dúvida poderemos ter quanto ao conflito de qualificação e a solução será a de todos os conflitos insolúveis: cada um fica com a sua lei. O Estado terceiro propenderá para o Estado da lex loci: não havia razão de ordem subjetiva para a proibição do segredo. Se o testamento fôr fechado público, ao Estado da lei pessoal será aconselhável não levar o seu princípio ao ponto de ferir o princípio de validade dos atos públicos regidos pela lex loci. Trata-se, positivamente, de um êrro de política jurídica. Tôda a matéria dos arts. 1.638 e 1.639 do Código Civil constitui objeto da lei do lugar. Bem assim, a do art. 1.643, na parte concernente à nota que no seu livro deve tomar o oficial público. Mas, na questão processual da validade do testamento, e pelas razões que antes demos sobre a entrega, ou depósito de livre retirada pelo testador, constitui matéria de ordem pública. 6 . A B E R T U R A , REGISTO E A R Q U I V A M E N T O DO TESTAMENTO CERRADO

- Já Se disse tratar-se de ato autônomo, autonomia que nos deu, em direito intertemporal, as conseqüências apontadas no n. 1. Pelas mesmas razões, de si evidentes, a lei que rege o abrir, o fechar, o registar e arquivar dos testamentos é a do lugar em que eles são apresentados para tais fins. A lei da autoridade, que o abre, rege a possibilidade e os limites da apreciação sumaríssima das formalidades como autoriza, quanto aos vícios externos, o art. 1.644 do Código Civü.

NAS RELAÇÕES DE DIREITO I N T E R N A C I O N A L PRIVADO.

Registado o testamento, sòmente pode sair do cartório por ter sido proposta a ação de falsidade ou de invalidade e mediante despacho do juiz que atenda a requisição por outro para perícia, ou para isso, se tem competência para a ação. De qualquer modo, se o original é deslocado do cartório, tem de ficar traslado. Com o cumpra-se, hoje não mais se entrega o testamento ao interessado, ou a algum dos interessados. O que o interessado pode exigir é que se lhe dê certidão. O original é arquivado no cartório. Diz o Código de Processo Civil, art. 525: "Aberto e lido o testamento, lavrar-se-á o respectivo auto em seguida ao da aprovação, neste mencionando-se o estado em que se achava o instrumento", A abertura dá-se ao ser levado ao juiz o testamento. Se em domingo ou dia feriado, tem o juiz de providenciar para o comparecimento do es-

crivão, com os elementos necessários, ou para que êle e o escrivão se locomovam para o juízo. As medidas podem ser urgentes, como se relativas aos funerais. O testador pode deixar ordem, devidamente escrita, de só ser aberto o testamento após determinado acontecimento, ou em data marcada por êle, desde que não seja tardia para as providências da sucessão. Se o testamento cerrado é em língua estrangeira, tem o juiz de mandar que se traduza, para que depois se registe e se arquive com a tradução. Cumpre, porém, advertir-se que a legislação da lei pessoal - de iure condendo, desacertadamente - pode exigir que a abertura, o registo e o arquivamento, ou alguns dêsses atos sejam seguidos ou antecedidos de alguma formalidade consular ou de comunicação a embaixada ou legação. Convém que se observe o que foi estabelecido pela lei pessoal, para que não surjam dificuldades. Aí, pode não se tratar de respeito à lei pessoal competente-, mas sim de simples cautela, para se evitar aplicação no Estado da lei pessoal, ou mesmo em Estado terceiro, que venha ter repercussões danosas na aplicação da lei brasileira. As divergências entre as regras de direito internacional privado de muitos Estados, inclusive a respeito da lex loci, tomam de difícil solução alguns problemas de conflitos, que surgem. Por isso, ao ter de fazer testamento, ou ao ter de levar para o cumpra-se o testamento de outrem, há de ter atenção quem toma a providência, para que se evitem ocorrências que surgem nos juízes dos Estados de legislação discordante de outros, em que se fêz o testamento, ou da lei que se observou, ou do lugar em que se deu a aprovação, ou a abertura do testamento cerrado. Aliás, tudo isso pode ser a propósito de testamentos públicos ou de testamentos particulares, no tocante à feitura e à petição e despacho de cumpra-se, ou mesmo de exigências. De qualquer modo, o que mais importa é saber-se qual a lei pessoal e atender-se a uma, se há pluralidade de leis pessoais. O Estado da lex loci e o Estado do fôro tem de enfrentar e resolver tais problemas.

CAPÍTULO TESTAMENTO

XXII

PARTICULAR

§ 5.886. DADOS HISTÓSICOS SOBRE O TESTAMENTO PARTICULAR E O TEXTO LEGAL 1. "TESTAMENTUM H O L O G R A P H U M " . - Vulgarmente se diz que o testamento particular (Código Civil, arts. 1.645-1.649) vem-nos de Valentiniano, HI, no ano 446, mas, em verdade, como o do Breviário, só se referia a certos casos. Não era forma ordinaria. Deve dizer-se o mesmo do direito justinianeu, se bem que os escritores tenham como testamentum holographum o do Codex. Em todo o caso (e isto é de grande interesse para a história do direito luso-brasileiro), a Novela Valentiniana passou ao Breviarium Alaricianum, do ano 506, e já no ano 511 pensa-se ser testamento hológrafo o de Santa Perpétua. O Breviarium atuou na península e no sul da França, procedendo-se aí a certa evolução no sentido de tomar ordinário o que, originàriamente, fôra para casos particulares. Com isso retificamos os autores que o atribuem a criação à legislação francesa e, mais ainda, os que absurdamente o vêem no direito romano.

O que ocorreu no norte da França, onde êle veio a tomar-se costumeiro, não foi o influxo da recepção do direito romano: tal favorecimento consistia no testar, e não no testar hologràficamente, tanto assim que, na França, persistiam a variedade de usos, respeitada pela Ordenança de 1735, art. 19, e a tentativa de unificação, feita por M I C H E L DE M A R I L H A C , Ordenança de 1629, art. 126: os Parlamentos do Meio-dia recusaram registá-la ou só a registaram com a reserva da Novela 107 (testamento inter liberas). Houve o influxo romano do texto valentiniano, que os costumes fizeram evolver à forma ordinária, e depois o influxo contrário da legislação

justinianéia, exigindo fazer-se coram testibus, com certo desprêzo das práticas costumeiras. Mas, se era poder dos legisladores exigir tais seguranças instnimentárias, adiante veremos que igual direito não tinham os intérpretes em aplicar indistintamente as exigências comprobatórias relativas ao testamento nuncupativo. 2 . TEXTO LEGAL. - Lê-se no Código Civil, art. 1.645: "São requisitos essenciais do testamento particular: I. Que seja escrito e assinado pelo testador. n . Que nêle intervenham cinco testemunhas, além do testador. HI. Que seja lido perante as testemunhas, e, depois de lido, por elas assinado". Cf. Projeto primitivo, art. 1.812: "O testamento hológrafo deve ser todo escrito, datado e assinado pelo testador, em um só contexto, sem intervalo em branco, entrelinhas ou rasuras ou com ressalva das que tiver. Esta ressalva deve ser feita pelo próprio disponente antes de datar e assinar o instrumento"; art. 1.813: "O testador fará a leitura de seu testamento perante cinco testemunhas idôneas, antes de assiná-lo", Projeto revisto, art. 1.982: "São requisitos essenciais do testamento particular: 1.° Que seja feito pelo testador, ou por outra pessoa a seu rôgo; 2° Que intervenham cinco testemunhas, varões e maiores de 14 anos, além do testador ou do escritor, ou signatário do testamento; 3.° Que seja lido perante as testemunhas, e, depois de lido, por elas assinado". A emenda 1.601 do Senado Federal riscou o que pudesse permitir o testamento particular a rôgo.

O testamento hológrafo foi reconhecido na França pela Ordenança de 1629. Com o Código Civil francês, art. 970, o italiano revogado, arts. 774 e 775, e o espanhol, art. 688. Na Áustria, § 578, basta ser assinado, ainda que não contenha data. Portugal não no tinha, nem no tem. 3. DIREITO ANTERIOR. - No regime das Ordenações Filipinas, o testamento aberto e privado podia ser feito pelo testador, ou por outra pessoa a seu rôgo, eram cinco as testemunhas (varões e maiores de quatorze anos), tinha de ser lido perante elas e assinado em ato seguido. Depois da morte, procedia-se à publicação, ouvidas as testemunhas, com citação dos herdeiros legítimos, julgado e confirmado (Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80). Discutia-se quanto à confirmabilidade se não fôssem vivas tôdas as testemunhas. Se remontarmos ao velhíssimo direito português, encontraremos o testamento hológrafo no próprio Breviário, que insere a Constituição de Valentiniano lU, do ano 446, e já se dispensava, em virmde da holografia,

intervenção de testemunhas, se difícil havê-las. (Assim parece devemos entender o texto exemplificativo de casos de necessidade: itineram necessitas, solicitudo villarum, navigatio, pois multis enim casibus saepe continget, ut morientibus testium numerus et copia denegetur.) No regime da Lei de 21 de maio de 1349, há testemunhas. E tinha de ser publicado com audiência dos interessados. Nas Ordenações Afonsinas (Livro IV, Título 103, § 2), não vem o requisito da holografia, e tinha de publicar-se. Era o testamento de pessoa privada, "sem estormento público nas costas" (auto de aprovação). Em vez de Portugal continuar a evolução que se operava no sentido de tomar ordinário o que era extraordinário no Breviarium Alaricianum, evolução cujos traços se percebem, evidentes, em muitos atos, deixou-se levar pelo romanismo, que já então constituía retrocesso: aproveitou a aliás não generalizada publicação perante o sacerdote para introduzir os romanismos das inquirições de testemunhas.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.886. A - Legislação Sobre os requisitos essenciais à validade dos testamentos particulares, conferir o art. 1.876 do CC/2002. § 5.886. B - Doutrina Fruto tardio do direito romano, o testamento particular, em virtude das formalidades legais excessivas, teve pouca utilidade na população brasileira. O Código Civil de 2002 procurou atenuar o formalismo, objeto da crítica de Pontes de Miranda em várias passagens do capitulo dedicado ao testamento particular, podendo ser destacadas, como inovações: (a) a faculdade de ser escrito de próprio punho ou mediante processo mecânico; (b) a possibilidade de ser escrito, inclusive de modo mecânico, por outra pessoa ou por uma das testemunhas; (c) assinatura do testador exigível apenas ao final do texto manuscrito, datilografado ou impresso, juntamente com as testemunhas; (d) a redução de cinco para três testemunhas, que devem ouvir a leitura do testamento e assiná-lo; (e) a possibilidade de confirmação judicial do testamento, ainda que tenha sobrevivido ao testador apenas uma testemunha; (f) a admissibilidade de testamento particular informal, com dispensa das testemunhas e sem prazo de caducidade, quando houver circunstâncias excepcionais declaradas pelo testador na cédula. São alterações

substanciais, no sentido da mitigação das formalidades, o que poderá tornar o testamento particular mais atrativo, sem os riscos de sua ineficácia, amplificados na legislação anterior, principalmente quando faleciam as testemunhas antes de sua confirmação.

§ 5.887. CONCEITO DE TESTAMENTO PARTICULAR 1. NEGÓCIO JURÍDICO DO TESTAMENTO. - Se b e m que sujeito a com-

provação pelas testemunhas instrumentárias, o testamento particular não é um simples documento de prova, e sim a própria vontade do testador (WALTHER BROCK, Das eigenhãndige Testament, 73). Mas ¿dizer que é a própria vontade do testador importa afirmar que, ocorrendo certos defeitos, nada vale? As formalidades são essenciais à validade, - e querem WALTHER BROCK e A. ESCHER (Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, EI, 87), e outros que, sem elas, não haja testamento. Discordou ERICH DANZ (Kõnnen Testamente mit Formfehlem aufrechterhalten werden?, Deutsche Juristen-Zeitung, 14, 282). Mas o próprio A. ESCHER mandou não esquecer que são suscetíveis de interpretação as regras jurídicas de forma. Em verdade, a proposição - "das eigenhãndige Testament ist keine blosse Beweisurkunde, sondem der letzte Wille selbst" (Supremo Tribunal da Alemanha, Entsch., 12, 315) - contém verdade, mas verdade que não exclui a discussão e, pois, a revelação do que se entenda por escrita e assinatura (art. 1.645,1), testemunhas (art. 1.645, n), leitura perante elas e assinatura por elas (art. 1.645, III), material em que e com que se escreve etc. É impressionante ver-se, todos os anos, por simples defeitos de formas, declararem-se ineficazes, nenhuns, ou anularem-se testamentos, que todos, disse ERICH DANZ, inclusive os j u í z e s , s a b e m que exprimem e contêm a vontade do testador. Testamentos c u j a data não é a verdadeira, testamentos c o m data carimbada etc. Mas, no Brasil, tais exigências quanto à data seriam absurdas, e não, c o m o na Alemanha, diante do §

2.231, discutíveis. Basta pensar e m algo de grave: os bens do testador vão a pessoa diversa da que êle queria. É de maior relevância para a comunidade, para os interesses gerais, que a transmissão do patrimônio seja a que o testador queria (ERICH DANZ, Kõnnen Testamento mit Formfehlem aufrechterhaJ-

ten werden?, Deutsche Juristen-Zeitung, 14, 287). Só em último caso, deve o juiz sacrificar o interêsse da vontade, que merece favor, à exigência formal, cujo intuito somente poderia ser o de garantir a boa expressão da vontade e o seu respeito. Cumpre nunca nos esqueça diferença assaz importante entre os testamentos públicos, sejam abertos, sejam cerrados, e os testamentos particulares; naqueles, há culpa de um funcionário público que escreveu ou somente aprovou, e a nulidade matará o ato testamentário, deixando aos interessados a ação civil contra o culpado. No testamento particular, não. Quanto à técnica político-legislativa, tem-se dito que o testamento particular facilita: a) sugestão ou captação, porque não há intervalo entre a feitura e outra formalidade, como se dá com o testamento cerrado que depende de aprovação (verdade é que têm razões os que apontam o perigo se o sistema juri'dico dispensa testemunhas); b) destruição ou simples desaparição, sem que fique qualquer meio de provar que o testador o deixou; c) dá-se ensejo a que as pessoas façam, com facilidade e substituições rápidas, testamentos; d) o testamento particular é o que ocorre com a pressa emocional dos testadores, fazendo a causa de morte o que não raro é ato de amizade passageira, ou gratidão imediata, ou ódio, ou cólera. Em todo o caso, a facilidade com que se faz outro testamento particular apaga grande parte daqueles inconvenientes. Há conveniências, mas o tipo de testamento particular que está no Código Civil brasileiro tanto se caracteriza de dificuldades e limitações que pouco se pode mostrar das suas vantagens. 1. "ANIMUS TESTAMENTUM FACIENDI". - N o testamento público, ra-

ramente ocorre o êrro de nome, e do assunto já se tratou. No testamento cerrado, é de supor-se que no auto de aprovação o oficial público declare, em palavras explícitas, aprovar o testamento, e a lei exige a declaração do testador neste sentido. No testamento particular, certamente toma a questão aspecto próprio. Sendo possível, como é, o emprêgo de cartas, livros de família, e, segundo já vimos, diversos materiais, acihnente urdem as circunstâncias casos menos claros de testamentifação. Aqui, tem o juiz de examinar cuidadosamente a cédula, indagar das testemunhas, se a lex loci não se satisfaz com o documento hológrafo, ou somente assinado pelo testador, mas principalmente as circunstân-

cias e OS dados reveladores da vontade de testar. Em tese, não se confundem os testamentos e os outros atos jurídicos, quer pela forma em que se fazem, e as exigências instrumentárias, quer pela natureza das disposições contidas. Mas isto só em tese. Na prática, não são fáceis as questões sôbre o animus testamentum faciendi. Exemplo (Tribunal de Yvetot, 12 de maio de 1926): encontram-se por ocasião da morte, em casa da testadora, á) um projeto de testamento, b) um testamento regular, datado e assinado, cópia do anterior, c) documento, dentro de envelope, com a declaração "êste é meu testamento", contendo legados, mas sem data nem assinatura, ao passo que datado e com o nome da testadora, o invólucro. Resolveu o Tribunal que êste novo testamento, cuja data e nome estavam por fora, não podia revogar o anterior. Faltava-lhe a assinatura no texto. Havia o nome, porém sem um dos elementos constitutivos: a vontade expressa de aderir ao ato em que se apôs. ¿Seria aquêle, em verdade, o testamento a que o nome e a data se reportam? A questão seria menos interessante, no direito brasileiro; pelas obsoletas exigências com que se cerca o testamento hológrafo. Mas, na França, devolve-se a questão ao juiz do fato, que tem o direito de consultar as circunstâncias e apreciá-las soberanamente (Chambre de Requête, 7 de janeiro de 1924).

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.887. B - Doutrina O testamento particular - como as demais espécies de testamento - é negócio jurídico unilateral, de eficácia dependente de evento futuro e certo, que é a morte do testador. Os requisitos legais quanto à formalidade dizem respeito à sua validade. Se faltarem as testemunhas, o testamento será nulo. Se falecerem todas as testemunlias, o testamento será ineficaz, porque não pode ser confirmado. É válido e eficaz se assinado pelo testador e por três testemunhas, se sobreviver apenas uma delas que o confirmar e o juiz considerar que há provas suficientes de sua veracidade. Sempre que dúvidas houver quanto ao cumprimento das formalidades, o juiz deve decidir em favor do testamento, de modo a assegurar a eficácia das manifestações de vontade últimas do tesmdor. A relativização da forma é a tônica do modelo adotado pelo Código Civfl de 2002.

§ 5.888. T E S T A M E N T O P A R T I C U L A R N O D I R E I T O B R A S I L E I R O 1. HOLOGRAFIA E ASSINATURA. - A lei brasileira cercou de tais cautelas, ameaçou de vida tão precária o testamento particular, que em verdade quase o proibiu. Raro se vê. Exigiu-lhe holografia e assinatura autografa, exigiu-lhe cinco testemunhas, exigiu-lhe leitura perante elas e assinaturas por todas elas. Tudo isto era razoável e bastava. Mas o legislador, que tão liberal fora com o testamento cerrado, continuou em obstinado exigir, num como sonambulismo de perseguição: se morrerem três testemunhas, fica o dito pelo não dito, o testado pelo não testado (art. 1.648). ¡Lei absurda, lei inconseqüente, lei má, lei que devolveria a herança a pessoa de quem o testador não cogitou, porque num desastre morreram êle e três testemunhas! Mas volveremos a isso.

Entretanto, ainda não vimos a falsificação de um testamento particular, e já vimos falsos testamentos cerrados e falsos testamentos públicos. 2. DEFEITOS DE ATIVIDADE LEGISLATIVA. - O legislador brasileiro separou-se do seu tempo, ficou com o tempo local de códigos atrasados, e mal pensados, acorrentou-se a reminiscências confusas. Na raça ibérica, aquém do espanhol, do argentino. O Código Civil português não no tinha, não no tem: critério que se compreende, mais do que tê-lo e tomá-lo fonte de riscos.

Reminiscências confusas, disse; e é certo. O romanismo introduziu nas Ordenações aquela referência ao Direito. Cabia aos juristas do tempo distinguir o nuncupativo e o hológrafo, - naquele, a solenidade mais se exteriorizava com a prova de que por si mesma: e as testemunhas não podiam ser menos essenciais à prova que à solenidade. A prova, em verdade, mais era que a nuncupação: esta, sem aquela, não era nada. No caso do testamento escrito, o raciocínio não podia ser o mesmo. Perspicaz, PASCOAL JOSÉ DE M E L O F R E I R E {Institutiones iuris civilis lusitani, L. III, T. 5, § 10, nota) feriu o ponto: "Pro testamenti igitur validitate praesumendum, quamdiu contrarium evidenter non probatur, licet testes omnes mortui sind, itaque non possint subscriptiones suas recognoscere; namque in iure nunquam traditum est, testamentum irritum fieri ob defectum publicationis: uno quoque, vel alio teste mortuo, testamentum per duos, qui supersunt, probari, et recognosci potest: alia enim est ratio condendi, alia probandi testamenti". ^ Quando o escreveu, não o fêz sem lição de outros, que deve ter lido, alem dos que citou ( S A M U E L S T R Y K , USUS modemi pandectarum sped-

men, L. 29, T. 3, § 4; G. L. B O E H M E R , Ad lust T. qui testam, fac. poss., § 35). Era o mesmo que ensinavam G. A. STRUVE, A. FABER e outros. Nuncupative e hológrafo eram coisas diversas: diversas deviam ser as soluções. Antes de se descobrir o Brasil, já era erro, êrro contra a tradição do direito peninsular e êrro de interpretação das Ordenações. A verdade estava com o uso moderno, firmado por S A M U E L STRYK. A velharia inutilizadora que reponía no Código Civil desmente os fatos, fere a boa doutrina e cria aos jm'zes verdadeiros casos de consciência. O Código Civil espanhol, art. 691, manteve-se com o passado (índice de estabilidade, que ainda algema a Espanha em tantos assuntos), mas algo introduziu que atenua o afêrro: "Presentado el testamento ológrafo, y acreditado el fallecimiento del testador, el Juez lo abrirá si estuviere en pliego cerrado, rubricará con el actuario todas las hojas, y comprobará su identidad per medio de tres testigos que conozcam la letra y firma del testador y declaren que no abrigan duda racional de hallarse el testamento escrito y firmado de mano propia del mismo testador. A falta de testigos idóneos, ó si dudan los examinados, y siempre que el juez lo estime conveniente, podrá emplearse con dicho objeto el cotejo pericial de letras". Além disso, cumpre notar que o testamento hológrafo espanhol não tem testemunhas instrumentárias - "en papel de sello correspondiente al año de su otorgamiento", "escrito todo y firmado por el testador, con expression de afio, mes y dia en que se otorgue" (art. 688). As testemunhas a que alude o art. 691 não são instrumentárias. Nos nossos dias, a Novela I, art. 55, modificou o Código Civil austríaco, § 586, no sentido de caducidade do testamento, se faltar uma das três testemunhas, porém referiu-se ao testamento oral. O Juiz de Direito da 4.^ Vara de Órfãos e Sucessões do Estado da Guanabara, a 24 de janeiro de 1963, disse: "Os requisitos exigidos ao testamento hológrafo no direito brasileiro são de tal ordem, que PONTES DE M I R A N D A , a essa conta, não lhe poupa reproches enérgicos, quando dilucida: "A lei brasileira cercou de tais cautelas, ameaçou de vida tão precMa o testamento particular, que, em verdade, quase o proibiu. Raro se vê". "O legislador brasileiro divorciou-se do seu tempo, ficou com o tempo local dos Códigos atrasados (Tratado dos Testamentos, H, 107)". Tratava-se de testamento feito ña Itália, com observância da lei italiana e apresentado a juiz do lugar em que se dera a morte. 3. D I R E I T O ESTRANGEIRO. - No I Projeto alemão, excluía-se o testamento particular. Para isso, invocava a Comissão ser um dos atos mais

importantes, interessar profundamente à família e à sociedade. Donde a necessidade de formas rigorosas, de solenidades que ao mesmo tempo assegurem a eficácia dos testamentos verdadeiros e dificultem as falsificações. No caso de errar quanto à forma o disponente, estaria morto quando se descobrisse o erro. No testamento público, maior segurança haveria. Mas na II Comissão (a maioria contra) houve quem considerasse isto infantil. Trata-se de velho instituto, que sempre gozou do favor público, inspirado na lei romana de 446, mas trazido, através dos costumes (e das leis, dissemos nós) até os nossos dias. Lembrou-se o exemplo da Áustria (§§ 577 e 578), da França (arts. 969, 970 e 1.001), de Baden, da Itália, da Espanha. Afinal, o que a I Comissão excluía, na n se reputava como a mais própria forma moderna de testar {Protokolle, V, 326 s.). Entre os juristas, estava posta em causa a questão dos testamentos particulares, cujas virtudes foram discutidas e apontadas: presteza, pois que se faz mais rápido que os outros; comodidade, pelo fazer-se sem necessidade de se deslocar o disponente, ou de se chamar em casa autoridade pública (além disto, não se precisar, no direito alemão, de testemunhas);/amí/rarzáaáe e, até, intimidade, pelo caráter de vida particular com que se faz, e, finalmente, pouco custo. É bem a divisa do testamento privado nos povos que compreenderam a sua função nos tempos de hoje (EMIL JACOBY, Das eigenhãndige Testament im BGB., 13: "Schnelligkeit Bequemlichkeit, Ungeniertheit und Kostenlosigkeit kõnnen ais die Devise des eigenhãndigen Testaments hingestellt werden")- No Código Civil da Saxônia, §§ 2 . 1 0 0 - 2 . 1 1 5 , exigia-se a subscrição de testemunhas. Mas o Preussisches A. L. R., 1,13, § 66, dispensou-a. Também as excluiu o Código Civil francês, art. 970: "Le testament olographe ne sera point valable, s'il n'est écrit en entier, daté et signé de la main du testateur: il n'est assujetti à aucune autre forme". O testamento que os legisladores do Código Civil perseguiram, HEINRICH DERNBURG (Die Auslegung der Testamente, Deutsche Juristen-Zeitung, 11,4) também considerou fonte de inconvenientes, e EMIL STROHAL (Das deutsche Erbrecht, I, 90), censurou-o; mas os inconvenientes derivam das desconfianças dos juízes (GERHARDT EICHHORN, Zeitschrift des deutschen Notarvereins, 241 s.), das dúvidas sobre a letra, das exigências alemas do livro fundiário (Grundbuch).

A respeito, entendia ZIMMER (Das eigenhãndige Testament nach dem Bürgerlichen Gesetzbuch fiir das Deutsche Reich, Archivfür Bürgerliches Recht, 24, 28 s.) que testamentos não são atos que se devam tratar como os

das relações ordinarias da vida, como os negocios: exigem forma pública, seguranças. Mas contra isto, WALTHER BROCK (Das eigenhãndige Testament, 4 e 120 s.). E rigorismo, que se não compadece com os nossos tempos. No Código Civil suíço, arts. 498 e 505, o testamento particular é escrito pelo testador do comêço até o fim {von Anfangbis zu Ende), datado e assinado pelo testador. Os Cantões podem legislar sobre a entrega, aberto ou fechado, à autoridade encarregada de receber em depósito (art. 505, 2.® alínea). Entendeu-se (e bem) que os Cantões podiam, por isto, cobrar taxa. Mas ¿0 depósito tinha de ser, ou podia ser condição de validade? Zurique e outros decidiam deste modo. Não se trata de requisito formal, e sim de depósito facultativo (cf. A. ESCHER, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, IH, 91). Na formação do art. 505 houve propósito de simplificar e diminuir exigências formais ( H . OSER, Der Streit um das Privattestament im ZGB., 135 s.). A entrega não precisa sti pessoal: pode disto encarregar-se amigo, parente, o próprio herdeiro ou legatário (P. TÜOR, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, 330). Mas só em vida do testador.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.888. A - Legislação Sobre as formalidades, principalmente quanto às testemunhas, conferir o art. 1.878 do CC/2002. § 5.888. B - Doutrina Os pontos criticados por Pontes de Miranda, que configuram o que denominou "lei absurda, lei inconsequente, lei má", foram adequadamente enfrentados pelo Código Civil de 2002: (a) não se exige mais a exclusividade da holografia (escrito pela própria mão do autor); (b) as testemunhas foram reduzidas de cinco para três (poderia ter uniformizado com duas testemunhas, como exige para os demais documentos particulares); (c) principalmente, admitiu que o juiz possa confirmar o testamento se sobreviver uma testemunha que reconheça o testamento. § 5.888. C - Jurisprudência No sentido da mitigação das formalidades, e com fundamento de que o testamento deve ser interpretado com vistas às finalidades por ele colimadas,

O STJ decidiu que era válido e eficaz testamento digitado (não manuscrito) e subscrito por menos de cinco testemunhas, antes do advento do Código Civil de 2002, uma vez que três delas o confirmaram em audiência de instrução e julgamento (STJ, REsp 701.917/SP, 4.»T., j. 02.02.2010, rei. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 01,03.2010).

§ 5.889. P R E C A U Ç Ã O D E O R D E M M E T O D O L Ó G I C A

1. PRECISÕES. - A fim de bem distinguirmos o que constitui, no Código Civil, a Seção IV das formas testamentárias, separemos: a) Os requisitos formais essenciais: lei de forma (art. 1.645), de cuja observância resulta o ato perfeito do testamento, b) Os requisitos de forma, eventualmente essenciais, c) As formalidades processuais dos arts. 1.646-1.648. d) A permissão intrínseco-extrínseca do art. 1.649: por ser extrínseca, surte certos efeitos de direito internacional privado, e, por ser intrínseca, ocasionalmente terá outros. 2. EXIGÊNCIAS DA LEI BRASILEIRA. - Exige a lei brasileira como formalidade essencial: a) A holografia da cédula e a assinatura do testador: é isto o que diz o requisito de ser "escrito e assinado pelo testador". b) Intervenção de cinco testemunhas, a que o testador leia, ou mande ler (assunto de que se tratará), ou dê a ler a cada uma delas. c) Assinatura das cinco testemunhas. No art. 1.645, a redação não é boa; há três requisitos - holografia, leitura perante as cinco testemunhas e assinatura delas. Todos os três estão no art. 1.645,1 e HI, de modo que é supérfluo e pode trazer confusões o inciso II: se é preciso que se leia às cinco testemunhas e elas assinem, claro que cinco testemunhas intervêm. Antes de tratarmos dos requisitos essenciais, eliminemos as formalidades que o sistema jurídico brasileiro não considerou ad essentiam. O testador, escolhendo a forma do testamento particular, permitiu-se escrever com vagar, meditar quanto ao que vai lançar, retocar a minuta que começara a copiar, aguardar resolução definitiva quanto ao que escreveu e só então assinar. Mais: guardar o que escreveu e só mais tarde, dias, meses ou anos de espera, chamar as pessoas que quer como testemunhas. Essas

só têm de escutar a leitura e assinar. Se o testador falece, antes de assinarem as testemunhas, o testamento privado foi ato inacabado: não entrou no mundo jurídico, a despeito da assinatura do testador. Se o testador teme que desapareça o testamento particular, pode escrever dois ou mais instrumentos, iguais, com as assinaturas dêle e das testemunhas. Assim, pode guardar ou entregar a pessoa ou pessoas de sua confiança um ou dois ou mais exemplares, para que a desaparição de algum ou de alguns não lhe afaste a disposição de última vontade. Se todos desaparecem, o testador morre sem ter testado.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.889. A - Legislação Sobre as exigências de formalidades essenciais, conferir o art. 1.876 do CC/2002. § 5.889. B - Doutrina o testamento hoiógrafo (escrito de próprio punho peio testador), antes o único admissível, passou a ser espécie do gênero testamento particular, ao lado da escrita por meios mecânicos (datilografada, impressa). O número mínimo das testemunhas, que devem ouvir a leitura feita pelo testador e assinar o testamento, é três, podendo ser mais. É inválido o testamento se contar com menos de três testemunhas. Porém, como salienta Pontes de Miranda, não há quebra de validade se as testemunhas forem chamadas mais tarde pelo testador para escutar a leitura e assinar, pois não são necessárias para a escrita. As testemunhas também são necessárias para a eficácia do testamento, pois, após a morte do testador, devem reconhecer e confirmar a cédula testamentária. Apenas o testamento particular informal, quando houver circunstâncias excepcionais declaradas pelo testador na cédula testamentária, terá de ser escrito de próprio punho, com dispensa das testemunhas. A assinatura, em qualquer das espécies de testamento particular, há de ser do próprio punho do testador, pois o direito brasileiro ainda não admite, para os testamentos, a assinatura eletrônica. § 5.889. C - Jurisprudência o STJ firmou entendimento de privilegiar a manifestação de vontade última do testador, rejeitando a apreciação do cumprimento das formalidades como questões de fato, insuscetíveis de apreciação em recurso especial, inclusive em

relação aos testamentos realizados antes do advento do Código Civil de 2002. Nesse sentido, não conheceu de recurso contra decisão do tribunal recorrido, que afirmou estarem demonstradas a veracidade e autenticidade do testamento e a inexistência de vícios de consentimento, apesar do falecimento da maioria das testemunhas antes do falecimento da testadora (STJ, REsp 830.791/MG, j. 10.04.2007, rei. Min. Castro Filho, DJ 07.05.2007).

§ 5.890. R E Q U I S I T O S S Ó E V E N T U A L M E N T E E S S E N C I A I S

1. TÉCNICA LEGISLATIVA. - A técnica legislativa - e pois as leis de forma, que são um dos processos técnicos, um dos meios da realização da Justiça - não constituem ^zm em si, mas meios para a efetivação do justo nas relações humanas. Há fatos e expedientes que são essenciais: a observação das realidades, a experiência, o conhecimento psicológico e social dos homens mostraram ser indispensáveis, e a lei formal vem dizer até que ponto, e se devem, efetivamente, ser exigidos covão forma inderrogável, ou aã essentiam dos atos. Outros, ocasionalmente asseguradores ou garantidores, passam a segunda plana, e só eventualmente - no probatório - se apreciarão como de ocorrente essencialidade. 2. DATA. - Já dissemos o que concerne à data dos testamentos. Não é escusado relembrá-lo no caso particular. Os legisladores romanos não na exigiam nos testamentos privados (PH. E. HUSCHKE, lurisprudentia Anteiustinianae quae supersunt, 527; B. WINDSCHEID), Lehrbuch des Pandektenrechts, III, § 541). Nos mais velhos documentos legislativos de Portugal visigótico e da Reconquista, não na encontramos como requisito essencial. Há exemplos de testamentos públicos sem data. A fortiori, testamentos particulares. A data pode interessar, mas a essencialidade só decorre do Código Civil, art. 1.645, e a. data lá não está. ( A crítica de CLÓVIS BEVILÁQUA, Código Civil comentado, VI, 101, ao Código Civil é injusta). Podem ser dois, total e essencialmente contraditórios, e não se podendo apurar a data, não se imporem. Mas dir-se-ia o mesmo, se contivessem a data, e fôsse a mesma.

Se só se deixou um, e não há dúvida sobre a capacidade da lex tempus, nem sobrevierem filhos, ¿para que a data? Sobre a antedata e a pos-data inocentes, já se falou (Tomo LVII). O direito inglês supõe o lugar e a data, mas não há disposição especial sôbre o assunto, que, na falta, fuhnine de nulidade o testamento (MARTIN LIEBEGOTT, Nachlassbehandlung im englischen Recht, Archivfür Bürgerliches Recht, 38, 350). Na Alemanha, o I Projeto só admitia o testamento público, judicial ou notarial {Motive, V, 257 s.). Ainda a maioria da II Comissão se pronunciou contra o testamento privado, mas outro parecer foi o do Reichtag {Denkschrift, 429). Tanto o Código Civil francês, art. 970, quanto o Código Civil de Baden, art. 970, exigiram a data e o lugar. Seguiu-lhes o exemplo o Código Civil alemão. Mas ali, como em todos os lugares, em que se exige a data, tal essencialidade forçada traz controvérsias infindáveis. Por exemplo: a) Engano ou inexatidão na data não torna nulo o testamento particular (F. R I T G E N , em G . P L A N C K , Bürgerliches Gesetzbuch, 4 d ao § 2 . 2 3 1 ; E M I L STROMAL, Das deutsche Erbrecht,!, 1 0 9 s.; B . MATTHIASS, Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, U , 4 1 2 ; A . WEISSLER, Das deutsche Nachlassverfahren, 1 5 7 ; J . B Õ H M , Das Erbrecht des BGB., 8 0 ; HEINRICH T R Ã N K N E R , Die Form der Rechtsgeschãfte nach dem deutschen B G B . , Sãchsisches Archiv, V E , 3 5 4 ; H . O . L E H M A N N , em E N N E C C E R U S - L E H MANN, Das Bürgerliche Recht, 11, § 3 0 5 ; W I L H E L M FRANCKE, Blatter für Rechtspflege in Thüringen, 5 0 , 1 6 1 s.; H . PEISER, Handbuch des Testamentsrechts, 2 6 1 ; P A U L M E Y E R , Das Erbrecht des bürgerlichen Gesetzbuches, I. 1 6 1 ; G E R H A R D E I C H H O R N , Das Testament, 1 0 6 ) ; e há jurisprudência {Entscheidungen in A. der freiwilligen Gerichtsbarkeit, III, 70; M U G D A N , Die Rechtsprechung, IV, 4 2 4 ) . b) Data, para o Código Civil alemão, é a verdadeira e exata (G. Erbrecht des BGB., 2 1 6 ; GUSTAV MÃRCKER, Die Nachlassbehandlung, 8 9 s.; F . HERZFELDER, J. von Staudingers Kommentar, V, nota ao § 2 . 2 3 1 ; M A R T I N SCHERER, Erbrecht des BGB., 3 3 5 ; L . KUHLENBBCK, Von den Pandekten zum Bürgerlichen Gesetzbuch, Hl, 223; e o Reichsgericht). c) Deve inquiriur-se do propósito, ou não, da mentira da data, ou da sua inexatidão: nulo será, naquele caso; válido, neste (WALTHER BROCK, Das eigenhãndige Testament, 8 4 s.; E . MEISCHEIDER, Die letztwilligen Vetfügungen nach dem BGB., 3 1 s.; H A N S BORCHERDT, Das Erbrecht und die Nachlassbehandlung, 11, 475).

FROMMHOLD,

d) Ainda se não proposital, é preciso que outras circunstâncias tenham tomado exata a data que o não era ( H E I N R I C H D E R N B U R G , Das bürgerliche Recht, V, 75 s.; E D U A R D H O L D E R , Das eigenhândige Testament, Jherings Jahrbücher, 41, 3 0 3 s.; T H E O D O R K I P P , em B . W I N D S C H E I D , Lehrbuch des Pandektenrechts, HI, nota ao § 545). e) Mas, ainda no caso anterior, R I C H A R D WILBCE não admitia a nulidade, se inoperante a inexatidão. f) Finalmente, Z I M M E R (Das eigenhândige Testament nach dem Bürgerlichen Gesetzbuch für das Deutsche Reich, Archiv für Bürgerliches Recht, 24, 22) entendia que somente é nulo o testamento se é essencial ao testamento, in concreto, a aposição de data e do lugar. Este, evidentemente, estava de oUios abertos à realidade. A datação nada tem com a declaração de última vontade, por isso mesmo que esta vontade é última. Demais, se o Código Civil francês fala em "date" e o direito hádense em lugar, dia e ano, o Código Civil alemão satisfez-se em dizer Angabe do lugar e do dia, mas êste Angabe também é equívoco: tanto pode ser facultativo de datação real, quanto requisito formal exato. As circunstâncias é que podem fazer essencial a data. Esta, por si só, não é requisito formal. O legislador alemão foi além, no seu construir, do que lhe permitiam os dados contemporâneos de ciência. Por isto mesmo, a despeito do texto, as questões ficaram. Se dois ou mais testamentos não têm data, claro que se toma essencial a datação; mas a essencialidade não é formal. Por outro lado, pode ocorrer que um testamento seja feito em lugar que exija a data, e outro, em lugar que a dispense. A situação será bem difícil de resolver-se. Mais: inevitável o exame das circunstâncias, dos dados reabnente informativos do tempo da feitura. Não se confunda a questão da data com a outra, limítrofe, mas diferente, da data in fraudem legis: a data ainda longínqua, para evitar que o testador revogue o testamento, ou para evitar que, em viagem próxima, o disponente possa testar. Infelizmente, os autores, e entre êles W. GõsSLER {Zur Lehre van der Datierung des eigenhandigen Testaments, 10), baralharam fundamentos tão diversos, como sejam o requisito formal e a increpação de fraude à lei. A consideração de que a exigência da data afasta ou dificulta falsificações é bem fraco argumento: quem falsificou tôda a letra de um escrito falsificará a data e terá cuidado no escolhê-la. Ainda mais: quem vive em contacto com as realidades da vida sabe que os escritos falsos são sempre,

nesses pontos, impecáveis. Ilumina-os a má fé, ao passo que, ao testarem estão sempre descuidosos, inscientes do mal, os disponentes. No Código Civil suíço, art. 505, o legislador foi mais exigente: menção do lugar, ano, mês e dia da feitura (ed. alemã: Angabe von Ort, Jahr, Monat und Tag der Errichtung-, ed. francesa: mention du lieu, de l'année, du mois et dujour ou 1'acte a été dréssé\ ed. italiana: in cuifu scritto). Porém, ainda assim, a data do lugar e a data do tempo suscitam dúvidas no direito suíço. (Conforme dissemos, as leis de forma são suscetíveis de interpretação). Quanto à data do lugar, o Ortsdatum, não é a do lugar do domicílio, mas o da feitura. Se o testador está em viagem e não conhece o lugar em que se acha, bastam indicações (A. ESCHER, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch de A . EGGER, I H , 9 0 ) . Faz-se o que é possível, atendidas as circunstâncias. Quanto à data do dia, logo se assentou que vale o mesmo: ano novo de 1969, dia da festa federal, no dia de aniversário do meu casamento em 1970. Um tanto duvidosa, por exemplo, a referência ao "dia do noivado". Se houve êrro ou descuido do testador, uma vez que se possa retificar o engano, pela convicção dos fatos, não se reputa essencial a exatidão (P. TUOR, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch de M A X GMÜR, I H , 3 2 7 ) . De qualquer modo, presume-se ser verdadeira a data. Resta a questão da escolha. A praxe propende para a exigência da veracidade. Mas ¿veracidade de quê? ¿Do tempo em que escreveu o testamento? ¿Ou do tempo em que assinou? Se fêz e assinou, mas deixou em branco a data, ¿pode esta ser aposta depois, quando o testador quiser? Está visto que só o exame das circunstâncias pode resolver. Ê o caso de perguntarmos aos formalistas: ¿que essencialidade é esta, que depende de tantos dados e exige veracidade sem precisar de que veracidade se quer? O que acima dissemos é de grande importância para o direito brasileiro, que a cada momento está a cumprir testamentos de Alemães e de Suíços, cabendo ao juiz a apreciação das formalidades extrínsecas. Certamente, não se há de considerar não-escrito o que está nos dois Códigos Civis, mas entre as interpretações discordantes deve-se preferir a que mms se ajusta à concepção da lei pessoal, da lex loci e da lei do Brasil, que é a lex fori, atendidos os princípios. No dkeito italiano, anterior a 1942, o testamento hológrafo não precisava de testemunhas, tinha de ser a) escrito, todo, pelo testador; b) datado, isto é, indicar dia, mês e ano (admitidos, porém, pela doutrina, os

equipolentes); c) subscrito pelo testador, com o seu nome, ou, explicava-se, com o nome que o indivíduo usa (exemplo: pseudônimo por que é conhecido). Nada se disse sôbre o lugar. A Cassação de Roma {Giurisprudenza, 1917, 128) considerou a data disposição de vontade, de modo que, falsa, não prejudicaria o ato: o testador poderia querê-lo antedatado ou pós-datado. Disposição de vontade não é, e nisto erraram RAYMOND SALEILLES e vários tribunais. Nem é verdadeira a doutrina a. priori da essencialidade da data (tal doutrina causa graves injustiças), nem a de que a data seja disposição de vontade. A verdade está em que é requisito só eventualmente essencial. Portanto: a) fazê-lo requisito formal essencial seria expor a nulidades testamentos em que a indicação de tempo nenhuma importância teria, ou cuja data se pudesse provar; b) considerá-la disposição de vontade seria, para infirmar a contrária doutrina da essencialidade, recorrer a extremo liberalismo. No Código Civil italiano de 1942, diz o art. 602: "II testamento olografo deve essere scritto per intero, datato e sottoscritto di mano del testatore. La sottoscrizione deve essere posta alia fine delle disposizioni. Se anche non è fatta indicando nome e cognome, è tuttavia valida quando designa con certezza la persona dei testatore. La data deve contenere l'indicazione dei giomo, mese e anno. La prova delia non verità delia data è ammessa soltanto quando si tratta di giudicare delia capacita dei testatore, delia priorità di data tra piü testamenti o di altra questione da decidersi in base ai tempo dei testamento". Na Bélgica, apesar do Código Civil, e no Tribunal Superior prussiano, éste antes do Código Civil alemão, atenuou-se a francesia da data verí/aJezra essencial. Mais do que atenuar-se, abstraiu-se disto, em favor do testamento. Aliás, deve ser assaz duro para um juiz julgar nulo testamento sôbre o qual não pairam dúvidas e a data não tem importância, se foi lançada por descuido, bu por êrro. Seria demasiado algemar-se a palavras de lei: se a lei vai até tais extremos, é lei contra Direito. Mas, como vimos, leis de forma não são, como se diz, leis não interpretadas. A verdade está a gritar do todos os lados: trata-se de x&qaiúto formal, eventualmente essencial Tanto isso é certo que, no Brasil, que não exige a data, se há dois testamentos inconciliáveis e não se sabe a data dêles, a data constitui requisito essencial. As circunstâncias fizeram-no tal. Mas tds circunstâncias são raras, e o legislador não há de acorrentar a tais exigências ato que, por definição, é de última vontade.

Diante do texto do Código Civil alemão, os juristas e juízes têm entendido que o testador não pode aproveitar a designação do lugar ou da data, tipográficamente ou por perfuração, inscrita no papel. Não é hológrafó (KONRAD COSACK, Lehrbuch des Deutschen Bürgerlichen Rechts, I I , 7 1 1 EMIL JACOBY, Das eigenhãndige Testament im BGB., 2 5 ) . Desde que se exige data, quer-se caligráfica e não mecánicamente obtida. Compreende-se, perfeitamente, isto. Quanto à veracidade do lugar, - ¿que importa que se chame Pelotas ao que está perto de Pelotas e possivelmente não tinha noção bem precisa o testador? O Tribunal de Berlim, a 23 de dezembro de 1903, decidiu pela validade. Se disse "em minha Vila", é válido. Mas não nos parece justo considerar-se, a priori, nulo, se muitas vilas tem o testador, como se lê em EDUARD HOLDER (Das eigenhãndige Testament, Jherings Jahrbücher, 41, 308 s.) e A. WEISSLER {Das deutsche Nachlassverfahren, 156): é irrecusável que o juiz pode apreciar as circunstâncias. Exemplo: se há alguns anos de uma delas não sai o testador, ou se nenhuma importância tem isto. Quanto ao dia, se o testamento tem duas datas, - não em lugar distinto, porque seria, talvez, ato continuado, que o testador ia datando, - mas no final, a boa opinião é a de WILHELM MANTEY (Das Erfordemis richtiger Datierung eines holographischen Testaments, Gruchots Beitrage, 43, 652, nota 15), que considerou a data inexata como não escrita. Aplicação que fêz, sem dizer, do princípio de resguardar-se o útil, assaz salutar em todo o domínio jurídico. Aliás, os formalistas do direito alemão só o consideraram nulo se a multiplicidade implica falta de data certa (EMIL JACOBY, Das eigenhãndige, Testament im BGB., 27). As circunstâncias colaboram no julgamento de tal implicação. Para os sistemas em que se exige a data exata, surge questão: ¿quem tem o ônus da prova? Ora, em tais códigos, e em todos os sistemas jurídicos, o testamento particular não é documento de prova, mas ato perfeito, a própria vontade última do testador. Quem alega contra êle, que faça a prova (EMIL JACOBY, Das eigenhãndige Testament im BGB., 3 5 ) . Quanto à presunção de que a data é verdadeira, há mais de um século, na Corte de Cassação da França (1824), invocando-se o disponat testator et erit lex, chegou-se a dizer: "qu'en conséquence, la loi place momentanément le testateur dans la classe des fonctionnaires publics; d'oü il résulte qu'il imprime l'authenticité à la date qu'il donne à son testament; qu'au surplus, la force des choses conduirait seule à cette conséquence; qu'en effet, lorsqu'une personne a laissé plusieurs testaments, si leur date ne fai-

sait pas foi par elle-même, auquel de ces différents actes attribuerait-on I'authenticité?". No direito civil brasileiro, que não exige a data, se esta foi aposta, há de presumir-se verdadeira. Nem seria de aceitar-se presunção de fraude à lei. Se o testador, por exemplo, antedatou ou pós-datou para fraudar as regras jurídicas sobre capacidade, provado isto, não seria de admitir-se que permanecesse a eficácia presuntiva. O que é em fraude da lei cai por nulidade. Em têrmos gerais, será admitido à prova da falsidade do datar quem quer que nisso seja interessado: os herdeiros legítimos que foram citados para o processo de publicação, o próprio herdeiro instituído ou o legatário que, por exemplo, no caso de dois ou mais testamentos, um dos quais revoga parcialmente o outro, tiver interêsse em provar que a data de um foi aposta por mão de outrem. Pode ter ocorrido coação, não na feitura do testamento, e sim na aposição posterior de uma data, caso que constitui matéria de anulabilidade do elemento viciado e estranho ao que se dispôs em ato com forma suficiente de testamento. Mas mudou-se de questão. Tal caso é similar de outros, que poderiam ocorrer pelo êrro, ou pelo dolo. Pela data é que se sabe se o testamento, que se examina, revoga outro testamento. Sem datas, fica a investigações, às vêzes difíceis, a conclusão sobre os momentos em que foram concluídos. Tratando-se de testamentos particulares, quando foram assinados. É aconselhável, portanto, que se date o testamento particular, embora a lei não o repute requisito essencial. Passa-se o mesmo a respeito do lugar em que foi assinado. Se datado o testamento particular, exsurgem alguns problemas. Por exemplo, há uma data no alto da página e outra no fim, antes das assinaturas. Se aquela é anterior, o que se há de entender é que se iniciou nela e se assinou na última. Se a primeira é posterior à da assinatura, o que se pode supor é que o testador somente queria concluir o testamento na data que pôs acima, mas inesperadamente teve de concluí-lo mais cedo, ou não gastou o tempo que cria que gastaria. 3. UNIDADE DO ATO, NO TESTAMENTO PARTICULAR. - A lei brasileira

nao inseriu nos textos o princípio da unidade do ato. Livrou-se do romanismo formular. O que é essencial não deve exceder ao que está no Código Civil, art. 1.645. Demais, repugna à mentalidade de hoje tal exigência da unitas actus, nos documentos particulares. A leitura continua, por si, sujeita, de regra, à presença do testador e das testemunhas. Perante, diz o Código Civil.

Aliás, a tendência no direito dos nossos dias, é para dispensar testemunhas. (O Código Civil, neste ponto, ficou com o rigorismo obsoleto. E a leitura do ato, simultânea, às cinco testemunhas, frisa-lhe o afêrro às velhas leis, hostis aos atos testamentarios de caráter privado). Uma das conseqüências de não se exigir unitas actus, ainda no Código Civil alemão, que fala em designação de lugar e de data, é poder ser escrito aos poucos o testamento, datando-o de cada dia o testador (WALTHER BROCK, Das eigenhãndige Testament, 8 6 ; EMIL JACOBY, Das eigenhündige Testament im BGB., 28), sem contudo deixar desligadas as fôlhas escritas (ligação que se faz pelo sentido, ou pela repetição da última palavra, ou por outro meio). No direito brasileiro, que tem a leitura, o que é de mister é que seja lido às testemunhas (e interpretamos: ou elas leiam, cada uma por sua vez, perante as outras e o testador) e depois o assinem. Se se exigisse a unitas actus, assinatura e data tinham de ser do mesmo dia; mais - do mesmo momento. Isto não se dá no próprio direito alemão, que fala em data, nem no direito suíço, que chega a miudeá-la. ¿A data é a do momento em que o testador a escreve ou escreve e assina ou só assinai Os juristas alemães dizem que só não é boa a primeira hipótese. Se o testador escreveu e datou, deve, no dia de assinar, apor outra data (WILHELM MANTEY, Das Erfordemis richtiger Datierung des holographischen Testaments, Gruchots Beitrãge, 648; EMIL JACOBY, Das eigenhãndige Testament im BOB., 33). Mas revolta tanto apriorismo. ¿É possível cogitar de princípios rígidos em tal assunto, de importância só eventual? No meio de tudo isso, houve quem visse a verdade (ZIMMER, Das eigenhãndige Testament nach dem Bürgerlichen Geseízbuch fiir das Deutschen Reich, Archivfür Bürgerliches Recht, 24,17 s.). O testamento datado, assinado, fica completo, perfeito, quando (no direito alemão, já se vê), se juntam as três formalidades escrita, data e assinatura. Se o testador datou, assinou, e depois encheu as páginas, desde o momento em que o encheu está perfeito. Se o escreveu e assinou, deixando em branco a data, desde que lhe insira a designação de dia, mês e ano, ou só dia e mês, se já inserira o ano. ¿Como se dizer - no direito alemão - que não foi verdadeira a data? Volvamos ao direito brasileiro. Se o testador datar o testamento, ¿deve lê-lo, nesta data, às testemunhas? Se o não fizer? Não se pode decidir a priori contra tal testamento. O que é essencial é que as testemunhas o ten-

ham ouvido. Se, eventualmente, fôr essencial a data, decide-se de acordo com as circunstâncias.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.890. A - Legislação Os requisitos eventualmente essenciais, assim denominados por Pontes de Miranda, não estão previstos na legislação atual, notadamente no Código Civil de 2002. § 5.890. B - Doutrina í. Entre os requisitos essenciais para a.validade do testamento particular, a lei não inclui a data ou o lugar em que foi escrito o testamento. Sua ausência pode acarretar dúvida se o testador tiver deixado outro testamento, para que se saiba qual o posterior, que revoga o anterior. Mas essa circunstância é matéria de prova a ser apreciada em juízo, sem prejuízo da validade do testamento. 2. Tampouco é requisito essencial a unicidade do ato, podendo o testador redigir o testamento em uma data e convidar as testemunlias em outra data para leitura e assinatura. § 5.890. C - Jurisprudência Contra a tese da unidade do ato, para o STJ deve prevalecer o testamento particular, que as testemunhas ouviram ler e assinaram uma a uma, na presença do testador, mesmo sem que tivessem elas reunidas, todas, simultaneamente, para aquele fim (STJ, REsp 1.422/RS, j. 02.10.1990, rei. Min. Gueiros Leite, DJ04.03.1991).

§ 5.891. REQUISITO INTRÍNSECO DA APTIDÃO PARA FAZER TESTAMENTO PARTICULAR 1. VEDAÇÕES. - No Código Civil, os arts. 1 . 6 3 3 , 1 . 6 3 5 - 1 . 6 3 7 , 1 . 6 4 1 E 1.642 cogitam das aptidões para os testamentos públicos e cerrados. Só o art. 1.637 é concebido em teor excludente das outras formas testamentárias, mas há os casos do cego-surdo e do cego-mudo, que ficariam irresolvidos.

Não podem fazê-lo: a) o analfabeto; b) aquêle a quem a sua lei pessoal proíba; c) quem não pode escrever e assinar. A capacidade para testar há de existir quando o testador e as testemunhas assinam. Assim, o testamento hológrafo, que foi escrito pelo testador quando era incapaz e é por êle assinado quando se tomou capaz, é válido. A capacidade das testemunhas há de existir no momento em que se lê, perante elas, o testamento, e no momento em que assinam. A diferença, em relação ao testador, está em que não precisa êle ouvir leitura do testamento que escreveu, ao passo que é requisito essencial do testamento hológrafo a leitura perante as testemunhas. O mudo, o surdo-mudo, ou o que perdeu a fala, pode fazer testamento hológrafo. Incide o art. 1.645, IE, do Código Civil, que fala de ser lido o testamento particular "perante as testemunhas", sem dizer quem o há de ler. Pode lê-lo qualquer das testemunhas, ou por outra pessoa, como pode ser lido pelo próprio testador. 2. HOLOGRAFIA. - A holografia faz os limites à aptidão. Ficaria a leitura, mas o art. 1645, HI, precisa ser interpretado. De qualquer modo, os requisitos formais é que dão à lei as regras jurídicas de aptidão. A questão fica devolvida aos textos sobre requisitos formais, que devem ser interpretados.

§ 5.892, REQUISITOS FORMAIS (ESSENCIAIS) DO TESTAMENTO PARTICULAR 1. DIREITO COGENTE E INTERPRETAÇÃO. - São requisitos de lei de for-

ma, mas as leis de forma também se interpretam. lus cogens não quer dizer lei que se deva aplicar gramaticalmente, com tôdas as durezas da inadaptação às realidades, a que se vão aplicar, insensível o juiz aos princípios superiores de direito. Já vimos que as leis de forma, como tôdas as leis, inclusive as constitucionais, precisam que se lhes revelem o conteúdo e o alcance. Dizer que são imperativas não quer dizer que se devam adequar, desajeitadamente, aos fatos da vida, perturbando-a em vez de re^á-la, ou levando ao domínio do direito inflexibilidades injustas e despóticas, que lhe vêm do coeficiente político.

2. PRIMEIRO REQUISITO F O R M A L . - Primeiro requisito formal essencial: holografia. Entenda-se: holografia das disposições testamentárias e holografia da assinatura. Donde cindir-se o requisito. 3 . H O L O G R A F I A D A S DISPOSIÇÕES T E S T A M E N T Á R I A S . - Na parte de estudo geral das formas (Tomo LVIII), disse-se o que seja suficiente sobre a holografia. Não se trata de escrita necessariamente com a mão: é um requisito de dermografia, ainda nos países em que as leis empregam palavras como de próprio punho, da própria mão. Sabidos tais princípios gerais da holografia, só nos interessa o caso do testamento particular, e êste exige: a) que o testador não tenha colaborado com outro na feitura, isto é, que o tivesse escrito todo, e não parte: seria fora de propósito a invocação do non vitiatur utile per inutile, pois o testador tinha, na lei, uma exigência formal de feitura sozinho, isto é, sem que outrem escreva palavras ou frases; b) que exista ligação material ou intelectual - de papel, de sílabas ou de palavras, ou então, de sentido - entre as diferentes folhas do testamento. No direito brasileiro, todo o testamento hológrafo há de ser escrito pelo testador. Nenhuma palavra pode ser escrita por outrem. Isso não significa que alguém não possa ajudar o testador, que é ou está trêmulo, a manter-se em posição de poder escrever, ou o testador que enxerga mal a pôr a caneta no começo de cada linha, ou pôr diante dos olhos do testador o vidro suficiente para ver onde há de escrever. Se, em verdade, a despeito dos movimentos da mão do testador, não foi êle quem escreveu o testamento, dêle não é a escrita.

Freqüentemente, os testadores fazem, antes, minutas, ou pedem a outrem, que as faça, conforme o que exprimem, oralmente, ou através de dados escritos, de vontade testamentária. Nada obsta que copiem, exatamente ou com alterações, aquilo que lhes serve de base. Compreende-se que testadores mostrem, escritas a mão, ou a máquina, ou por mão de outrem, o que reputam ser a sua vontade, e peçam que alguém o corrija, ou esclareça, ou ponha em têrmos jurídicos adequados. Não importa qual a parte do corpo com que o testador costuma (ou somente pode escrever). O testamento tem de ser escrito e assinado pelo testador. A lei não foi além disso. Não disse, sequer, que a escrita e a assinatura têm de ser "do próprio punho", ou "a mão". A fortiori, não se referiu a qual das mãos. O canhoto usa a mão esquerda, ou pode usar as duas. O aleijado que aprendeu a escrever com o pé, pode escrever e assinar, com o pé, ou com os pés, o testamento particular. Quem escreve com o

braço, por faltar-lhe a mão, com aparelho que lhe sirva para mover a pena, pode testar hologràficamente. Quem usa a mão direita (ou a esquerda) há de evitar escrever com a outra mão se a grafia é diferente. O que importa é autenticidade da escrita e da assinatura, e para isso é necessário que não se criem suspeitas. O manuscrito é a regra; mas a escrita com outro órgão que a mão, se é o que o testador emprega, é elemento suficiente. Não assina qualquer máquina de escrever, chancela, carimbo, tipo de imprensa. Se o testamento não foi escrito pelo testador, não há ratificabilidade por ulterior declaração do testador no mesmo papel e com a assinatura dêle. A escrita pelo testador há de ser de todo o testamento particular, conforme os hábitos de grafia. Se o testador tem letra que parece de imprensa, com elementos diferenciais, de modo que essa é a sua letra, pode testar como sempre escreve, a despeito da excentricidade. Aí, o testador fêz seu o que em geral só se emprega em tipografia ou em máquina de escrever. Supõem-se, portanto, a facilidade, a exatidão e a indubitabilidade da perícia que adviesse. O testador não precisa dizer no testamento que foi por êle escrito e que o assina. Saiba, ou não, a língua portuguesa, pode êle empregar outra língua, desde que as testemunhas a compreendam, quando lhes seja lido o testamento. O alfabeto pode ser o latino, o gótico, o grego, o chinês, o hebraico, o japonês, o do cego (se o testador vê, porque cego não pode fazer testamento particular) e a estenografia, se é o que o testador usa. Os caracteres hão de ser inteligíveis, porém só a completa ininteligibilidade das disposições toma imprestável o testamento particular. O papel ou qualquer outro material {e.g., pergaminho, fazenda, madeira em que se possa escrever) há de ser conservável. Nada impede que o testamento particular seja escrito em caderno de notas, ou em diário do testador ou de outrem, em página ou páginas em branco de livro impresso ou livro dactilografado ou fotocopiado, ou como se fôsse carta, se está afastada a suspeita de se tratar de simples carta. À tinta só se exige a permanência {e.g., lápis-tinta). O que é recomendável é que não se empregue substância de fácil apagamento. Circunstâncias excepcionais, como a da prisão incomunicável do testador, podem justificar a escrita com carvão, com giz, ou outro ingrediente, em couro de tapête, ou na parede, ou na vidraça, ou na porta, onde as testemunhas

possam ver e o testador ou alguma das testemunhas ou outra pessoa possa ler e testador e testemunhas possam assinar. O testador escreve com a ortografia que entende (talvez a que consta da minuta feita por outrem, ou por outrem corrigida). Não importam os alinhamentos, nem as separações concernentes às disposições, nem os erros ortográficos, nem trocas de letras (às vêzes, devido ao estado nervoso do testador). Os números podem ser em algarismos, mesmo romanos, ou escritos por extenso. As corrigendas, acréscimos e cancelamentos somente precisam ser ressalvados se entrelinhados, ou superpostos; e antes da assinatura hão de estar todos. Se vêm após a assinatura do testador, tem esse de assinar de novo (cf. L. 11, § 3, C., de his quibus ut indignis aufeiuntur et aã senatua consultum silanianum, 6, 35: "nihil etenim actum esse credimus, dum aliquid addendum superest". Nada se tem como inserto no,ato se algo resta para se acrescentar. Se as testemunhas já haviam assinado, também elas têm de reassinar. Quaisquer acréscimos ou correções, se feitos em separado, têm de compor outro testamento particular, com todos os requisitos essenciais. Nada obsta a que se insiram em testamento cerrado, ou público. Se o testamento particular que se fizera é válido, e não no é o acréscimo, ou a correção, a invalidade não se estende. Dá-se o mesmo se inválido o testamento particular anterior e válido o que se acrescentou ou contém correção. Todavia, para que tenha eficácia o acréscimo ou correção, em testamento posterior, é preciso que o conteúdo possa ser a vontade do testador, a despeito da invalidade do texto a que se fêz o aditamento ou a correção. Para isso, um dos pressupostos é a independência do que é válido. O que mais acontece é o aumento ou a emenda ser ineficaz, por supor a eficácia do que recebeu o aditamento ou do que foi corrigido. A correção independente é substituição. Se a amplificação ou correção foi obra de outrem, com assentimento do testador, e ainda não houvera assinatura do testador e das testemunhas, todo o testamento particular é nulo. Se já havia as assinaturas e ao pós-escrito se acrescentaram novas assinaturas, nulo é êsse, e não o testamento particular. Também nulo seria o pós-escrito se foi feito à revelia do testador, mas, rigorosamente, aí, não existe aditamento ou correção. Nulidade só haveria se o testador e as testemunhas o assinassem, porque, à revelia ou não, faltaria a holografia. Se o testador ressalvou a intromissão da letra de terceiro, a ressalva é inoperante. Repila-se a opinião daqueles que sustentam ser nulo, então, todo o testamento particular se a intromissão foi após a assinatura pelo testador e pelas testemunhas.

Se, ao escrever o testamento particular, o testador usou papel em que já havia escritos, cu dactilografia, mas não há confusão resultante da proximidade, o que ele escreveu como testamento particular e foi por ele e pelas testemunhas assinado, é incólume a alegações de invalidade. A assinatura é no ñm da página, ou da última página, sem ser preciso rubrica. As testemunhas assinam depois da assinatura do testador. 4. QUESTÕES QUE SURGEM. - a) Se o testador escreveu todo o testamento, e depois, com a sua letra, acrescentou, entre linhas, valem se foram realmente suas, e se, neste aditamento, não houve incapacidade ou vício de vontade. (Se, na ocasião do acréscimo estava, por exemplo, fora do seu juízo perfeito, ou se houve coação, pode ser proposta a ação de invalidade só para esta parte, - utile per inutile non vitiatur). b) Se, escrito todo, os acrescentos foram de outrem: o ato estava perfeito, e tal intervenção, contra a vontade do testador, é inoperante. c) Se a parte escrita por outrem, com o consentimento do testador, ¿não é essencial? Há escritores que não distinguem, outros que se desinteressam, inteiramente, da questão, em tranqüilidade bem pouco científica e prenhe de injustiças. De um lado, vemos a F. ENDEMANN (Das Testament im Briefe, Deutsche Juristen-Zeitung, 21, 32 s., e Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, EI, § 37, 285), com a dureza de absoluta holografia, qualquer, e por mínima que seja a intervenção de outrem, G. FROMMHOLD (Erbrecht des BGB., nota. 2.^), WALTHER BROCK (Das eigenhündige Testament, 75 s.), GUSTAV MÃRKER {Die Nachlassbehandlung, 89). Porém, de outro lado KONRAD COSACK {Lehrbuch des Deutschen bürgerlichen Rechts, n, § 381, 711), que reclamava, para as espécies, o exame das circunstâncias, a R . WILKE {Erbrecht, nota 4 e), H. NEUMANN {Hanãsausgabe des BGB., nota 2 &) e F. RITGEN, em G . PLANCK {Bürgerliches Gesetzbuch,N,A3%). Exemplos: o testador escreveu o testamento e, depois, disse ao seu filho: escreva no fim o seguinte - "estive presente à feitura do testamento de meu pai. A", ou, sem o pai lhe dizer, ou dizendo-lho, "meu pai pediu que só apresentasse o testamento oito dias depois da morte dêle". Mais: com a letra de outrem, à margem, - "a casa a que papai se refere mudou de número, era 41 e hoje é 5, nota que escrevi à vista dêle". Claro que ao juiz ficara a apreciação da veracidade de tal mudança e de modo nenhum o escrito por

mão de outrem poderá - ainda quando consentido pelo testador - mudar o objeto da disposição de última vontade, restringi-lo ou aumentá-lo. A opinião de F. ENDEMANN, G . FROMMHOLD e de muitos outros escritores franceses e italianos é contra os princípios superiores de direito: não deve ser aceita. No Brasil, sempre que se tiver de decidir sobre isso, devem os juízes, quer quanto aos testamentos brasileiros, quer quanto aos estrangeiros, distinguir a intervenção que toca ao essencial e a intervenção que não pode escapar ao princípio do utile per inutile non vitiatur. Vejamos outros pontos que possivelmente interessam o testamento particular.

O teor do testamento constitui levíssima solennitas. O disponente tem liberdade de escolher, e daí a ingenuidade dos formulários. Nem se exige a subscrição de cada página, ou a rubrica em cima, se as junturas fazem sentido contínuo (WALTHER BROCK, Das eigenhãndige Testament, 3 8 ; A . WEISSLER, Das deutsche Nachlassverfahren, 158), ou o disponente as marca pelos meios usuais (por exemplo, repetição da última palavra da página anterior). Se ocorrer apresentar o testamento alguma coisa escrita a máquina, resolver-se-á como se fôsse escrito por mão de outrem. Não assim, se parte com os caracteres ordinários e parte em estenogramas, ou caracteres de outra Kngua, desde que se possa verificar a procedência holográfica. O que em tudo isto importa é a individualidade do testador, o traço característico, suscetível de revelar-se num ou noutro meio de escrita. 5. TESTAMENTO ESCRITO COM CARACTERES SECRETOS. - O testamento escrito em caracteres secretos vale ( E M I L JACOBY, Das eigenhãndige Testament im BGB., 40). Não só se satisfaz os requisitos, que apontamos, para a sua inteligibilidade (cp. J O H N E N , Die Wacht, Zeitschriftfür Stenographie, 300, 469). É preciso que fiquem os traços característicos da escrita do testador. A concessão da língua secreta ou dos alfabetos secretos não pode ir ao ponto de prejudicar o requisito essencial da dermografia, da personalidade do escrito, que deriva da exigência de ser hológrafo o testamento. Ocorre o mesmo, se usou de estenogramas. Escusado é dizer que as circunstâncias subjetivas ou objetivas devem afastar a pecha da não-seriedade. Quer se trate de caracteres, de línguas, quer de material escolhido pelo testador (WALTHER BROCK, Das eigenhãndige Testament, 7 7 ; EMIL STROHAL, Das deutsche Erbrecht, 1 0 4 ) .

Se O testador usou de abreviação, deixou, com isto, um certo trabalho à leitura do testamento, mas o ato vale, e não seria justo, pela ininteligibilidade de uma cláusula, invalidar o todo. Este assunto, aliás, mais pertence ao assunto do artigo 1.666, donde se anuncia o princípio de se considerar não-escrito o inútil separável. 6. HOLOGRAFIA DA ASSINATURA. - O essencial sobre isto já foi dito. Mas cumpre advertir que, no testamento hológrafo, a natureza das coisas recomenda menos rigor do que no testamento público ou no cerrado alógrafo, - nestes, o único indício extrínseco da individualidade do testador é a assinatura, ao passo que no testamento hológrafo houve frases inteiras, talvez folhas completas, com a escrita cursiva do testador. Naqueles, há a fé pública dos oficiais públicos, mas - na ação de nulidade, em que se discuta e se negue a própria assinatura do testador - esta ficará desacompanhada de outros indícios hologêneos para os exames periciais. Desta consideração resultam soluções como as que se vão citar e podem servir de exemplos, assaz significativos, à decisão dos juízes. No testamento em carta, que seja, realmente, testamento, ou sem ser em carta, a doutrina alemã considera suficiente o preñóme dos prúicipes e das autoridades católicas. No testamento de Massilon, a assinatura apenas continha iniciais e a cidade episcopal: "J.-B., évêque de Clermont". No processo, o juiz de primeira instância julgou pela validade; na apelação, as partes transigiram. O que é essencial é a assinatura que marque a personalidade. O caso de Massilon satisfazia tal exigência. Na França, a Côrte de Cassação (20 de abril de 1813 e 20 de maio de 1877) admitiu como assinatura do testamento hológrafo a aposição do nome, não no fim, porém em frase que começava com as palavras: "Feito por mim". Dadas certas circunstâncias, no próprio invólucro (Besançon, 20 de novembro de 1921). Se bem que a praxe seja a assinatura com todo o nome do testador, de modo que raramente se abrevia, com as letras iniciais, ou com omissões dos elementos do nome, e embora a lei fale de "assinado pelo testador" e "assinado" pelas testemunhas, basta que aquilo que se lançou identifique o testador. Se o testador se habituou a assinar com o pseudônimo, não há afastar-se que assine com êle. Se tem êle firma comercial, não pode assinar com a firma (CARL CROME, System des Deutschen Bürgerlichen Rechts, V, 63, nota 51; EMIL STROHAL, Das deutsche Er-

brecht, I, 3." ed., 167). Porém, se a firma é individual e idêntica ao nome que usa, nos contactos pessoais, pode lançar o nome, que provavelmente é identificante. Se, de ordinário, a assinatura do testador, nos negocios jurídicos entre vivos e na correspondência, é ilegível, mas verificável a autenticidade, não há razão para se vedar o uso em testamento particular. O nome, lançado no ato do testamento, como "eu, A. R, termino aqui o meu testamento", não é assinatura. Se, porém, no fim, o testador escreve "assim dispus e quero que se cumpra, A. E", entenda-se que assinou. Não atinge a assinatura a aposição da data após ela, uma vez que após venham as assinaturas das testemunhas. A data depois da assinatura das testemunhas é apenas indício de que aquela foi a data da feitura, sem se poder considerar indiscutivelmente datado tal testamento, a despeito de a letra ser do testador 7. REQUISITO ESSENCIAL DA LEITURA ÀS CINCO TESTEMUNHAS. - A

lei exige que o testamento particular seja conhecido, em seu texto, pelas testemunhas, porém não vai ao excesso de querer que se lembrem do que ouviram: por ocasião do processo para se publicar, satisfaz-se com a memória do fato da leitura (Código Civil, art. 1.647). No art. 1.645, IH, estatui-se que "seja lido perante as cinco testemunhas". Trata-se de forma solene, de requisito essencial; mas, conforme já se disse, as leis de forma precisam ser interpretadas. Se o legislador não exigiu expressamente que fôsse lido pelo testador, a leitura por êle não é de importância capital. Portanto, devemos assentar, pelo princípio de valer o equipolente quando actus factus eandem vim habet: a) A leitura poderá ser feita por uma das testemunhas, presentes as demais e o testador. O fim era reconhecerem elas tratar-se, realmente, de ato testamentário, e o mesmo ou melhor se consegue com a leitura por uma delas. Disse melhor, por ser possível testador gago, balbuciante; e poderíamos dizer, em vez de melhor, o único meio, se o testador é mudo, ou se não deve, por motivos razoáveis, ler. b) A leitura pode ser feita por outra pessoa, presentes tôdas as testeniunhas e o testador. Isto só poderia ferir o testamento se associado à coação ou dolo. Porém, nesse caso, seria a coação ou o dolo, ou, ainda, outra causa, que viciaria o ato testamentário.

O mudo pode fazer testamento hológmfo, dando-o a 1er às testemunhas: por não ser o quod plerumque fit, deve declará-lo no escrito. Se não disser? As testemunhas, inquiridas, deporão sôbre a leitura, e de como foi feita. Declará-lo, por se tratar de caso excepcional, é boa cautela. Assim, prepara-se a solução para o mudo-cego, que escreve, e para o qual o Código Civil, no art. 1.637, seria o mesmo que regra jurídica de incapacidade. Cerrado, não no poderia com a mesma força, porque não vi a cédula que entrega. A solução, pela falta técnica do art. 1.637, que devia prever o caso especial é - portanto - o testamento hológrafo. O testamento hológrafo alemão, o francês e o italiano não têm testemunhas. Mas, se acaso intervierem, não poderá isto causar-lhe nulidade, é abundans cautela. Os juristas alemães prevêem isso ( J . BÕHM, Das Erbrecht des BGB., 80; F. RITGEN, em G. PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, 439). Se não foi feita a leitura do testamento perante as testemunhas, faltou um dos requisitos essenciais (Código Civil, artigo 1.645, IH). A jurisprudência é assente {e.g., 1." Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Paraná, 4 de abril de 1938, R. dos T., 117, 710). Tal formalidade, uma vez que a lex loci é facultativa, o testamento de quem, pela lei pessoal, não precisa de tal solenidade, vale (4.^ Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, 16 de janeiro de 1941, 130, 655). 8. ASSINATURAS DAS TESTEMUNHAS. - Nenhuma particularidade ofe-

rece a assinatura das testemunhas: aqui, como a respeito da assinatura do testador, exige a lei a holografia. No testamento particular, que só se admite hológrafo, seria inconseqüente discutir-se se basta a assinatura e se pode tratar-se de testemunha analfabeta que assine, e depois reconheça a assinamra. Não deve só por isso dá-la por nenhuma o juiz e reputar nulo o testamento. Satisfez-se o que a lei queria: a assinatura. E tal testemunha terá de depor sôbre o que ouvia ou sôbre o fato da leitura. Se dúvida houver sôbre a holografia, não poderá ser crida, pois o depor só lhe foi exigido quanto à própria assinatura e à do testador. Demais, trata-se de testamento que em si mesmo contém outros meios de verificação: conferência e exame pericial da escrita. A testemunha, no direito brasileiro, não precisa dizer que assina como testemunha. Se assinou após a assinatura do testador, foi como testemunha que assinou.

P a n o r a m a atual p e l o s A t u a l l z a d o r e s § 5.892. A - Legislação Sobre os requisitos essenciais para validade do testamento particular, conferir os arts. 1.876, 1.879 e 1.880; sobre os requisitos para eficácia do testamento, conferir os arts. 1.877 e 1.878 do CC/2002. § 5.892. B - Doutrina 1. A holografia das disposições testamentárias (escritas de próprio punino pelo testador) não é mais requisito necessário, pois o testamento particular pode ser escrito de modo mecánico ou, ainda, redigido por terceiro, inclusive uma das testemunhas. Permanece a exigência da holografia da assinatura, pois o direito brasileiro ainda não admite o testamento particular mediante documento eletrônico, que importa assinatura eletrônica, cuja autenticidade também é certificada eletronicamente por entidades credenciadas (MedProv 2.200/2001). Pontes de Miranda, acertadamente, atenua o significado da exigência legal da assinatura, que não é necessariamente de próprio punho, pois o deficiente físico, sem mobilidade de braços e mãos, ou até mesmo desprovido destes, pode assinar com a boca ou com os pés. Com efeito, o art. 1.876 do CC/2002 apenas alude a que o documento deva "ser assinado pelo testador", sem exigir que o faça de próprio punho. 2. O testador tem liberdade para escolher o idioma que utilizará no testamento particular, ou mesclar idiomas, pouco importando que seja brasileiro ou estrangeiro. O requisito legal, para sua validade, é que as testemunhas compreendam o idioma escolhido, pois é indispensável que ouçam a leitura do texto escrito pelo testador. 3.0 requisito essencial é a leitura feita pelo testador às testemunhas. A função das testemunhas não é de gravar mentalmente o conteúdo, mas de reconhecer, perante o juiz, após a morte do testador, que aquele é de fato o testamento que ouviram e assinaram. A leitura pode ser feita pelo próprio testador ou por outra pessoa a seu pedido. 4. Uma das mais importantes inovações trazidas pelo Código Civil de 2002 foi a possibilidade de testamento particular informal, cuja principal vantagem é a dispensa das testemunhas. O documento ou a cédula testamentária é inteiramente livre de forma e conteúdo, bastando que seja escrito e assinado pelo testador. Para esse peculiar testamento, são requisitos essenciais: (a) a declaração feita na própria cédula, pelo testador, das circunstâncias excepcionais; (b) a escrita e a assinatura devem ser feitas de próprio punho pelo testador, não podendo se valer de meios mecânicos ou de terceiros. Extraordinárias são as circunstâncias que impeçam o testador de reunir três testemunhas, para leitura e assinatura do texto que escrever, ou de não poder dispor de meios mecânicos para redigi-lo naquele instante, havendo risco pela demora. A excepcionalidade do testamento particular informal é apreciada, caso a caso, se houver impugnação de eventuais

interessados. Diferentemente dos testamentos especiais (marítimo, aeronáutico e militar), previstos para situações-iimites, com risco de morte para o testador, o testamento particular informal não está sujeito a prazo de caducidade de noventa dias, se o evento previsto não ocorrer (morte do testador na viagem ou dentro desse prazo, ou do retorno do militar). Excepcional é o que é fora do comum, que ocorre além dos limites do estabelecido ou do que é normal, frequente ou corriqueiro. Nesse sentido, é excepcional a circunstância de o testador encontrar-se sob ameaça ou limitado em seus movimentos por interessados em sua herança. A abertura dada pelo Código Civil de 2002 ao testamento particular informal tornou praticamente inúteis ou dispensáveis os testamentos especiais, pois substitui estes com vantagens, sem necessidade de cumprimento de formalidades (testemunhas, declaração perante o comandante, registro em diário de bordo), e sem risco de caducidade.

§ 5.892. C - Jurisprudência Para o STJ, não há falar em nulidade do ato de testamento particular, apontando-se preterição de formalidade essencial (leitura do testamento perante as três testemunhas), quando as provas dos autos confirmam, de forma inequívoca, que o documento foi firmado pelo próprio testador, por livre e espontânea vontade, e por três testemunhas idôneas, não pairando qualquer dúvida quanto à capacidade mental do de cujus, no momento do ato. Para o Tribunal, o rigor formal deve ceder ante a necessidade de se atender à finalidade do ato, regularmente praticado pelo testador (STJ, REsp 828.616/MG, S.^T, j. 05.09.2006, rei. IVlin. Castro Filho, DJ 23.10.2006).

§ 5.893. CUIDADOS OCASIONAIS 1. EXPEDIENTES ÚTEIS. - H á e x p e d i e n t e s , q u e a lei n ã o exige, mas

seriam úteis, ou, por ventura, em certos casos, o seriam. 2. RECONHECIMENTO DA LETRA E DAS ASSINATURAS. - O testador, ou

alguém por êle, pode levar a tabelião o testamento particular, para que lhe reconheça a letra e as assinaturas. É da função dos tabeliães e a lei não podia impedir ato voluntário, abunãans, do testador, ou de outra pessoa, em nome dêle. Tratando-se, porém, de ato da importância do testamento, e de efeitos ou discussão talvez remotos, deve o tabelião ter a cautela de anotar nos seus livros o dia em que o fêz e a pessoa que lhe pediu.

Tal reconhecimento não atribui fé pública ao testamento, não no equipara ao testamento público, ou, sequer, ao cerrado com aprovação; dá-lhe apenas reforço para futuras provas, que em processo de anulação ou de nulidade ou de publicação possam ser precisas. 3. INVÓLUCRO E TESTAMENTO PARTICULAR. - Se O testamento particular fôr fechado pelo testador, depois de ter as formalidades do Código Civil, art. 1.645, levado ou não ao tabelião, o juiz abri-lo-á, porque não é de mister que as testemunhas assinem duas vezes dentro e fora: fora, é exigência do testamento cerrado (art. 1.638, IX). Nem o segrêdo é essencial ao testamento cerrado, e pois vale o que, subscrito dentro, o seja -por fora, satisfazendo ao art. 1.638. Nem o particular, por ser, de fato, cerrado (cosido e envolto), precisa que se aprove e tenha, de novo, as assinaturas das testemunhas. Mas ¿basta ao testamento particular a assinatura do invólucro? Temos contra J. R LUDOVICI (JDissertatio de involucro, vom Couvert, oder Umschlage bei Testamenten, 2 s.), a G . L . B O E H M E R (Testamenti signati et subscripti a testibus in involucro vis et auctorítas vindicata, 4 s.), que o reputava válido. C. U. G R U P E N (Observationes deforma conficiendi acta, 2 s.), distinguia os testamentos, em que sè devia assinar in ipsa scripture, e os que podiam ser assinados no invólucro: scriptura clausa involutaque, tabulae linteo involute et clausae. Se 0 invólucro é continuação do escrito {quaestio facti), - nenhuma dúvida pode haver. Mas, se há outra capa, algo de fora, algo que envolve, e não há assinaturas de testemunhas no texto, a questão é mais delicada. Se, no lado de fora, o testador declara - "êste é o meu testamento, que eu e as testemunhas assinamos" - e assina tendo elas assinado dentro, não devemos levar o formalismo a invalidar a cédula. C. M A N Z I U S {Tractatus de testamento valido vel invalido, IV, 1,111 s.), no seu tempo, nem distinguia se o testador assinava intus ou foris. Contra, C H R . FRIED, VON G L Ü C K {Kommentar, 34, 467). Se, no lado de fora, só assinam as testemunhas e o testador o encerrou, dentro, com a sua assinatura, - inquiridas na forma do art. 1.647, nada obsta a que se aprove. 4 . TÊM-SE DE AFASTAR OS INCONVENIENTES DAS REGRAS JURÍDICAS. -

Testamento particular merece maior simpatia, mais largo uso, do que lhe permite a vulgar interpretação da lei, quase vedativa. Para evitar efeitos

desastrosos, injustos, do art. 1.648, e satisfazer o testador que não deseja levá-lo à aprovação dos oficiais públicos, ou não nos tem perto, aconselhado será lê-lo o testador a mais de cinco testemunhas, oito, dez, quinze, quantas queiram e possam assinar. Não ocorrerá fatalmente faltarem tantas que não restem três. Para maior garantia (podem os interessados alegar que assinaram depois, sem consentimento do testador, ou após a morte dêle), deve, no próprio texto, mencioná-las. 5. DEPÓSITO DO TESTAMENTO PARTICULAR. - A lei brasileira n ã o tem

qualquer alusão a depósito do testamento hológrafo. No Código Civil alemão, há o § 2 . 2 4 8 , onde se dá, a pedido do testador, o depósito oficial {amtliche Verwahrung), podendo obter certificado (§ 2 . 2 4 6 , alínea 2."). A doutrina assentou, na interpretação do § 2.248: a) o pedido do testador não está sujeito à forma especial: pode ser por escrito, ainda sem reconhecimento da assinatura, ou, até, oral; b) pode ser pessoal, ou não, a entrega, admitindo-se a própria remessa pelo correio (Rechtsprechungen des OLG., 1 , 2 9 4 ) : c) a entrega pode ser - em certas circunstâncias (F. RITGEN, em G. PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, V. 469) - por terceiro, sem escrito de poderes passado pelo testador; d) a retirada do testamento pode ser feita em todo o tempo, mas somente pelo testador em pessoa. Ademais, cumpre advertir que o depósito é facultativo, e não tem o efeito revogatório, que, também para o testamento público, não tem a retirada a que se refere o § 2 . 2 5 6 , alínea 3.®. Se o testador não faz o depósito, fica com êle, ou com pessoa de sua confiança o testamento, e esta, por principio geral de direito, que nem precisava vir nas leis (§ 2.259), deve apresentá-lo após a morte do testador. 6. QUESTÃO DE ORDEM, ESTRANHA AO DIREITO BRASILEIRO. - N o s

requisitos do testamento hológrafo, não vem mencionado o de ser datado. No direito brasileiro, não tem importância a questão (ventilada na Itália e na França) da subscrição antes da data. Os italianos resolvem pela não-nulidade do testamento cuja data vem depois da assinatura. O critério da lei brasileira mais se ajusta às idéias de R. SALEILLES, que via nas datas dos testamentos hológrafos mais declarações de vontade do que outra coisa: com ela, o testador quis declarar que naquele dia se concretizou a sua vontade. Em todo o caso, pode ser necessário apurar-lhe a veracidade, para se decidir quanto à capacidade do testador ou a ruptura do testamento, quiçá anterioridade ou posterioridade em relação a outros, - e isto bem mostra que se tem de receber sob reservas o parecer do jurista francês. O que a lei

brasileira dispensa é a menção do momento de feitura. Mas os testamentos particulares, como todos atos jurídicos, têm um dia de feitura, verificável no seu contexto, ou em outros dados exteriores. 7 . P L U R A L I D A D E DE EXEMPLARES. - Já foi tratado o assunto da multiplicidade de exemplares. Aqui, só nos interessam casos especiais e com caráter de cuidado ocasional. Se o testador fêz muitos exemplares idênticos do testamento e os leu a duas ou mais séries de cinco testemunhas, assinando cada série um dos exemplares, qualquer dêles poderá ser apresentado para cumprir-se. Duas questões: Se morreram três testemunhas do testamento A e quatro do testamento B, ¿pode o juiz mandar cumprir um dêles? ¿Se morreram todas as de um e restam três do outro? A primeira questão é mais delicada que a segunda. Esta entra no caso ordinário do Código Civil, art. 1.648. A segunda terá de dirimir-se segundo as considerações, que faremos ao art. 1.648. Em todo o caso, se o testador sabia da morte das testemunhas, não se poderá somar as de um com as de outro testamento. iQuid iuris, se todas assistiram à mesma leitura e só no assinar as séries de cinco se partiram? Tal distinção não tem importância: há exigência de unitas actus quanto ao ser lido e ao assinar-se.

Quando um dos exemplares fôr diferente, deixa de haver a simples questão da multiplicidade idêntica: pertence ao art. 1.666, relativo à interpretação, ou ao art. 1.747, que regulou as revogações parciais dos testamentos.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.893. B - Doutrina 1. A legislação atual também não exige o reconhecimento da assinatura do testador e das testemunhas do testamento particular. Esta é exigência que a lei não faz. A conferência apenas se dará após a abertura da sucessão, em virtude da publicação do testamento e da citação dos herdeiros legítimos que podem impugnar as assinaturas. Para os documentos particulares em geral, Inclusive o testamento, não há mais obrigatoriedade, que a legislação anterior estipulava, nem de ser feito pelos próprios figurantes, nem da presença de duas testemunhas; é suficiente a assinatura, para a prova das obrigações convencionais de qualquer valor. Nesse sentido é que se deve entender a determinação da lei (art. 219 do CC/2002) de que as declarações constantes de documentos assinados

"presumem-se verdadeiras em relação aos signatários". Reputa-se verdadeiro o documento quando o tabelião reconhecer a assinatura do signatário (art. 369 do CPC), sendo essa presunção também relativa, pois o interessado pode provar erro ou dolo do tabelião. A fé pública do tabelião é relativa à assinatura, mas não ao testamento em si, pois a referida fé pública, como adverte Pontes de Miranda, não equipara o testamento particular ao testamento público. 2. Não há impedimento legal para que o testamento particular seja feito em várias vias, desde que sejam iguais no conteúdo e forma, com assinaturas em todas.

§ 5.894. FORMALIDADES DA PUBLICAÇÃO 1. EXIGÊNCIA FORMAL. - A n t e s da apreciação judicial, que o mandará

cumprir, aos testamentos falta força executória. São, desde que se fizeram, atos jurídicos perfeitos, mas uma coisa é a perfeição de um testamento e outra a eletiva eficácia de cumprir-se. No art. 1.644, o Código Civil fala, explícito, do exame externo do testamento cerrado. Nos artigos 1.6461.648, da publicação e cumprimento do particular. Também o público está sujeito à apresentação e a exame, assuntos de ordem processual, que noutro lugar serão tratados. Morto o testador, ou aberta a sucessão provisória, por ausência, tem de s&ipublicado o testamento particular. Há as citações dos herdeiros legítimos, do membro do Ministério Público, a quem caiba a função no Juízo dos Testamentos, e dos interessados no testamento, para se tomarem os depoimentos das testemunhas testamentárias. Apenas dizem que o testador testou, que o testamento foi lido perante elas, o que o testador escrevera, que o testador assinou e elas assinaram o que lhes fôra lido e que reconhecem as assinaturas. Têm de referir-se às disposições, porém tal elemento processual não é essencial à eficácia da publicação, a despeito do texto do art. 532 do Código de Processo Civil. A publicação ou redução a público do testamento particular somente pode ocorrer se ainda há três das testemunhas, que não morreram, nem estão em lugar não sabido. Se morreram três testemunhas, perdeu eficácia o testamento e deixa de ser. Se não se sabe onde se acham, tem de haver a investigação, até que se apure se existem ou não. Se das cinco testemunhas, três são contestes quanto à autenticidade, basta o que depuseram. Se somente três restam e uma, sem prova possível

da sua má fé, nega que lhes tenha sido lido o testamento, ou que tenham assinado, não há a publicação. 2 . TEXTO LEGAL. - Diz o art. 1 . 6 4 6 do Código Civil: "Morto o testador, pubhcar-se-á em juízo o testamento, com citação dos herdeiros legítimos"; Cf. Projeto primitivo, artigo 1 . 8 1 4 : "Depois da morte do testador será o testamento pubUcado em juízo, sendo ouvidas as testemunhas e os interessados"; Projeto revisto, art. 1 . 9 8 3 : "Por morte do testador, será o testamento publicado em juízo com citação dos herdeiros legítimos".

3. ORIGENS PENINSULARES DA PUBLICAÇÃO. - A Igreja, c o m intuito

de fiscalizar e favorecer as instituições de última vontade, aproveitou-se da disposição do Código Visigótico, que substituíra o Breviarium (publicação nas cúrias), disposição que mandava publicar perante o sacerdote na presença de testemunhas, e antes dos seis meses contados da morte. Note-se bem: o testamento que se abria judicialmente, para se lhe apurar a validade (como hoje está no Código Civil, artigos 1 . 6 4 6 - 1 . 6 4 8 ) , não era o hológrafo, ou o alógrafo subscrito pelo testador e pelas testemunhas instrumentárias, mas o subscrito a rôgo, o oral, os extraordinários. Para os testamentos hológrafos, dispunha-se que os herdeiros ou sucessores o apresentassem infra sex menses, ante sex menses, e a verificação que se dava ao juiz era a de confrontar a assinatura com as outras assinaturas acaso existentes do testador, ou audiência de testemunhas (não das testemunhas, porque o testamento podia não nas ter, e, se as tivesse, portanto instrumentárias, não precisava de tal verificação pelo juiz). Bispo e juiz davam-lhes a fôrça do cumpra-se (U, 5, 16). Por onde se vê que o direito visigótico não autorizava limitar a inquirição de certo número das testemunhas, menos ainda a de todas, pela razão muito simples de poder nem sequer tê-las havido. O texto da Lei de 21 de maio de 1349 não só autorizava a crer que se mquiriam outras testemunhas, ainda quando as houvesse instrumentárias, como, também, sem cogitar de nuhdade ou caducidade por morte ou falta de algumas das instrumentárias. Dava-se o mesmo no direito posterior. No texto das Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 103, § 2, não se cogitou de outra coisa que da verificação judicial, chamadas as partes a quem pertencer. Claro que a Lei de 1349 dizia que se ouvissem as testemunhas mstrumentárias, de preferência e assim devemos entender uma das suas acerbas censuras aos vigários e à Igreja de outrora. Porém nem ela nem as

Ordenações Afonsinas poderiam conter o absurdo do art. 1.648 do Código Civil brasileiro, inserto por inovações de CLÓVIS BEVILÁQUA, art. 1 . 8 1 6 (cp. Código Civil mexicano, arts. 3 . 5 4 5 e 3 . 5 4 6 ) . O que se pode alegar é o "segundo forma de Direito", que seria o romano. Mas: a) a Novela Valentiniana, III, 20, 2,1 (si holographa manu testamenta condantur, testes necessários non putamos) não passou ao direito de Justiniano; b) a formalidade que se queria concernia à nuncupatividade, de modo que só se referia ao testamento sem tabulae. Aliás, seria péssima interpretação entender-se aplicado ao feito pelo testador o que só se referia ao testamento nuncupativo. 4. CITAÇÃO DOS HERDEIROS LEGÍTIMOS. - O Código Civil manda que se citem os herdeiros legítimos. Convém seguir, no tempo, a regra ainda hoje inserta em lei. ¿Por que somente os herdeiros legítimos? Nas Ordenações Afonsinas (Livro IV, Título 103, § 2), mandava-se: "e em esse caso, a saber, quando for feito pelo testador, ou per alguma outra privada pessoa, sem teer estormento pruvico nas costas, deve tal testamento seer poblicado despois da morte do testador per autoridade de Justiça e chamadas as partes, a que perteençer, segundo forma de direito". Alusão ao direito romano. As Ordenações Manuelinas (Livro IV. Título 76, § 3) copiaram o texto. O mesmo fizeram as Ordenações Filipinas (Livro IV. Título 80, § 3). PASCOAL JOSÉ DE M E L O F R E I R E {Institutiones luris Civüis Lusitani, Livro m , Título 5, § 10), explicava: "citatis iis, quorum interest hereditatem ab intestato deferri". Se está em dúvida a revogação de anterior testamento, deve o juiz mandar citar os interessados do outro. E o cônjuge do testador, caso lhe conste haver póstumo. 5 . CONSEQÜÊNCIAS SUBSTANTIVAS DA CITAÇÃO DOS HERDEIROS LEGÍ-

indispensável a citação dos herdeiros legítimos. Daí as conseqüências imediatas do direito substantivado do Código Civil, art. 1.646. Uma delas é a de que êsses herdeiros podem impugnar, desde logo, o testamento. Não está na letra da lei, porém não se citam interessados para que fiquem inativos. Os arts. 1.646-1.648 como que preestabelecem, nas linhas gerais, o processo.

TIMOS. - É

6 . IMPUGNAÇÕES DO TESTAMENTO PARTICULAR CONFIIÍMADO PELAS TESTEMUNHAS.

- Os arts. 1.647 e 1.648 do Código Civil somente cogita-

ram do reconhecimento das assinaturas pelas testemunhas e do depoimento, pelo menos, sobre a leitura, mas outra questão, bem velha, continua. Se as testemunhas reconhecem as assinaturas e depõem segundo o Código Civil, artigo 1.647, porém os herdeiros citados declaram que a letra e a assinatura não são do testador, ou que só a letra, ou a assinatura, não no é, ¿que deve fazer o juiz: reputar assunto estranho à sua verificação de ordem superficial (cognição incompleta), ou, desde logo, admitir a prova? {Traité des Testaments, capítulo 2, seção 6), distinguia segundo os costumes, e êsses reputavam solene, ou não, o testamento hológrafo: onde eram solenes, como em Paris (Costume, art. 289), valiam como se fossem públicos, e não precisavam de tal reconhecimento de letra (em 6 de junho de 1744 remeteu-se a interessada às vias de direito). E FURGOLE errava: o Costume de Paris não autorizava isto (BOURJON, Droit commun, n, 203). Todavia não ficava excluída a possibilidade da questão onde, por lei, tal testamento fôsse solene. POTHIER (Traité des donations testamentaires, cap. I, art. 2, § 3) cortava cerce o problema: "II faut que le Testament olographe soit reconnu par les héritiers pour être écrit et signé de la main du testatem:, ou que, sur leur refiis de la reconnaítre, Técriture soit reconnue par des experts". FURGOLE

No direito brasileiro, a solução deve ser a da impugnabilidade, desde logo, do testamento; mas, no direito das Ordenações Filipinas, Livro TV, Título 80, § 2, que copiou as outras, mais acertado fora decidir com FURGOLE, porquanto, nelas, iguais entre si, está escrito "seja havido em lugar de tabelião" se bem que no fim se exigisse a publicação. (Tudo isso mostra, mais uma vez, as camadas heterogêneas do direito sucessório português, que, se em muitos pontos conseguiu a síntese, em quase todo o seu corpo deixou indeléveis os azulejos das fusões étnicas e culturais.) De qualquer modo, ao que alega incumbe a prova. Pode alegá-lo o órgão do Ministério Público, o Procurador da Fazenda, ou quem é herdeiro legítimo. Se ninguém alegou no prazo que a lei processual fixou, só a ação de nulidade pode ser proposta. ¿Se ninguém impugnou, mas parece ao juiz que se não trata de testamento escrito e assinado pelo testador? ¿Devemos admitir que o juiz, na sentença com que o há de mandar cumprir, possa converter em diligência o julgamento para os exames que se façam precisos? A praxe dos juízes brasileiros é ordenar-se, em qualquer tempo, nos processos de testamento ou de inventário, que se reconheçam os escritos que foram juntos. Mas, a conversão em diligência, poderia, eventualmente,

ser perigosa: não reconhecido o escrito, seria inútil a providência, ou o juiz levaria a negar o cumpra-se, sem o rito processual devido. Melhor será que se ordenem tais providências na fase das impugnações e das provas.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.894. A - Legislação Sobre as formalidades da publicação do testamento particular, ver o art. 1.877 do CC/2002. § 5.894. B - Doutrina Por não contar com a Interposição do notário, exigíveis para a validade dos testamentos público e cerrado, o testamento particular está sujeito a requisitos próprios de eficácia, a saber: (a) publicação em juízo do testamento; (b) citação dos herdeiros legítimos do testador; (c) depoimento em juízo das testemunhas, relativamente a terem ouvido a leitura daquele testamento, feita pelo testador ou por pessoa por este designada, e a reconhecerem a autenticidade de suas assinaturas e do testador; (d) confirmação pelo juiz. A publicação é feita nos meios de comunicação visual do órgão judiciário competente, sem necessidade de divulgação em meios de comunicação social. A citação dos herdeiros legítimos tem sido historicamente justificada, como faz Pontes de Miranda nesse trecho, porque podem impugnar o testamento. Com efeito, se a impugnação vem a ser acolhida os bens destinados a legatários ou a herdeiros testamentários permanecem sob a titularidade dos herdeiros legítimos. Para a eficácia do testamento, não basta a publicação ou a citação dos herdeiros, pois depende da sobrevivência ao testador de ao menos uma das testemunhas e do convencimento do juiz de que há provas suficientes para sua veracidade (o testamento é autêntico, correspondente ao que foi lido e as assinaturas são efetivamente do testador e das testemunhas). Ainda que tenha havido redução das formalidades, as que persistem são fatores de Inibição para a escolha dessa espécie de testamento, pois sua eficácia fica sujeita a concretização delas e à judiclalização da confirmação.

§ 5.895. CUMPRA-SE DO TESTAMENTO HOLÓGRAFO 1.

TEXTO LEGAL. - Diz o art. 1 . 6 4 7 do Código Civil: "Se as testemu-

nhas forem contestes sôbre o fato da disposição, ou, ao menos, sôbre a sua

leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como a do testador, será confirmado o testamento". Cf. Projeto primitivo, art. 1 . 8 1 5 : "Se as testemunhas forem acordes sobre a fatura do testamento e se reconhecerem as suas próprias assinamras assim como a do disponente, o juiz confirmará o testamento"; Projeto revisto, art. 1 . 9 8 4 : "Se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição, ou ao menos sôbre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas ou sinais, assim como a do testador, será confirmado o testamento". 2. VERIFICAÇÃO JUDICIAL DO TESTAMENTO HOLÓGRAFO. - A soleni-

dade da publicação, com citação dos herdeiros legítimos (Código Civil, art. 1.646), a que se reduzem, hoje, aquêles a quem interessa, - constitui formalidade essencial para se cumprirem os testamentos particulares. São momentos da publicação: citação dos herdeiros legítimos, leitura em juízo, citação das testemunhas, para que o reconheçam e as assinaturas que apuseram. Só assim adquirem fé; se as testemunhas vivas (três hão de o ser, para que atue, cf. art. 1 . 6 4 8 ) não foram contestes', i/ião se confirmará! No fundo, é o velho direito do nuncupative de que falou G. L. BOEHMER: solemnis apertura fit in testamentis mere privatis, auctoritate iudicis, ut hac ipsa publicam fidem accipiant. Fit haec publicatio: 1.° Coram Indice quocumque: 2° Praecedente aliquali cognotione: 3° Citatis testibus ut subscriptiones et sigilla sua recognoscant. Si sigilla a testibus viventibus non recognoscantur, tabulae fiunt suspectae, invalidaeque. Adiante, a propósito do art. 1 . 6 4 8 , versaremos o assunto, que não pode ter solução a priori, ou puramente gramatical. 3 . INTERPRETAÇÃO DO TEXTO LEGAL. - O Código Civil, art. 1 . 6 4 7 , deve ser entendido como suficiente, e não, a priori, como necessário. No fundo, o que êle diz e o que os princípios superiores de direitos permitem que nêle leiamos é bastar ao processo da publicação serem contestes pelo menos sôbre a leitura perante elas, e reconhecidas, por elas, as assinaturas próprias e a do testador.

Aliás, a lei não diz "só se confirmará", mas "será confirmado o testamento". Seria a lei contra o direito, lei injusta, talvez imoral (portanto, maplicável), se permitisse que a testemunha, subornada, ou que, por outro qualquer modo, depõe falsamente, constituísse elemento de invalidação de ato tão importante quanto o testamento.

§ 5.896. FALTA DE TESTEMUNHAS

- Diz o art. 1 . 6 4 8 do Código Civil: "Faltando até duas das testemunhas, por morte, ou ausencia em lugar não sabido, o testamento pode ser confirmado, se as três restantes forem contestes, nos termos do artigo antecedente". Cf. Projeto primitivo, art. 1 . 8 1 6 : "Faltando até duas das testemunhas por morte, ou ausência em lugar não sabido, o testamento poderá receber a confirmação judiciária, se as três restantes forem acordes segundo o preceituado no artigo antecedente"; Projeto revisto, art. 1 . 9 8 5 : "Faltando até duas das testemunhas, por morte ou ausência em lugar não sabido, o testamento pode ser confirmado, se as três restantes forem contestes, nos têrmos do artigo precedente". 1. TEXTO LEGAL.

2. DIREITO ANTERIOR. - Eram seis as testemunhas, admitia-se a assinatura a rôgo, hoje abolida no testamento particular; e fazia-se a pubhcação com a citação dos interessados, citatis illis quorum interest. No direito anterior, muito se discutia se, morta ou em lugar não sabido alguma testemunha, poderia valer o testamento com a confirmação das vivas, e reconhecimento das assinaturas dos defuntos. Se bem conhecemos a história das formas do testamento particular, certo se sabe que muito tinha do nuncupativo e muito dos outros. Compreende-se que alguns autores raciocinassem com as reminiscências da nuncupação e outros, de espírito mais aberto à vida, quisessem menos precária a condição da cédula hológrafa. Por isso, PASCOAL JOSÉ DE M E L O FREIRE (Institutiones Juris Civilis Lusitani, Livro III. Título V, § 10), estribado em S A M U E L STRYK {USUS moderni pandectarum specimen, L. 2 9 , III, § 4 ) , G . L . B O E H M E R ( § 3 5 ) e talvez G . A . S T R U V E {Syntagma, 3 4 , t. 4 2 ) , reputaram válido o testamento com as testemunhas restantes. Contra: M E L C H I O R F E B O {Decisiones Senatus Regni Lusitanae, d. 7 5 ) , D O M I N GOS A N T U N E S P O R T U G A L {Tractatus de Donationibus, L. 3 , c. 16, ns. 11 e 1 2 ) , JOÃO RODRIGUES CORDEIRO {Dubitationes luris in foro frequentes, d. 4 , n. 3 0 ) e M A N U E L DE A L M E I D A E SOUSA {Coleção de Dissertações Jurídico-práticas, 9 8 ) . Juristas franceses, depois de A N T Ô N I O GOMES {In Leges Tauri Commentaria, L. 3, n. 43), ressalvavam, sem razão, o caso de ser escrito pelo tabelião. Tal intervenção acidental não poderia atuar como exceção ao princípio. Hoje, o Código Civil admite que, das cinco testemunhas, duas faltem, - critério quantitativo que resolve sem optar por uma ou outra corrente doutrinária. Por isso mesmo, há questões antigas que ainda ficam.

• Se düas faltam e das três restantes urna leva o testamento ao juiz e morre antes de depor? Em têrmos mais gerais, ¿se, depois da morte do testador, e antes de depor, morre uma das testemunhas? ¿Se das cinco testemuníias, ou das três restantes, uma nega a assinatura ou alguma das cláusulas testamentárias? Invalidar por tais motivos o ato que é a própria vontade do testador, fôra devolver a outros, e não aos que êle queria, o patrimônio testado. Das questões referidas, não só a terceira merece tratar-se à parte. Na confirmação, é impossível negar-se ao juiz a apreciação das circunstâncias. Mas, por método, discutamos o geral antes de descermos aos casos especiais. 3. DADOS GERAIS PARA A SOLUÇÃO DAS QUESTÕES. - A despeito do tardio formalismo do Código Civil, arts. 1.647 e 1.648, é irrecusável que a lei não pôs no mesmo plano os requisitos instrumentais do art. 1.645 e os requisitos probatórios daquelas regras jurídicas. A primeira aquisição científica, que podemos invocar contra a equiparação dêles, consiste na perfeição do ato testamentario: o Código Civil não acolheu a teoria de C. F. A. KÕPPEN (Der obligatorische Vertrag unter AbwesÈnden, Jherings Jahrbiicher, 11, 153), nem a de E. R. BIERLING (Juristische Prínzipienlehren, n, 267), quer dizer, para o Código Civil, o testamento é perfeito desde que se/az, e não pela morte, nem pela publicação. Ainda instrumento particular, êle se consumou com a assinatura do testador e das testemunhas: lei nova não no atinge, incapacidade superveniente não no invalida. No Código Civil, art. 1.648, substitui-se o qualificativo pelo quantitativo (RUDOLF VON JHERING, Der Besitzwille, 147-150; Geist des rõmischen Rechts, 1, 53 s.; PONTES DE MIRANDA, Sistema, I, 484; H, 246-248). Mas 0 meio traiu o fim: a interpretação estrita, literal, tem o grave resultado de matar ato de extraordinária importância, como é o testamento, sem culpa e contra a vontade provada do testador. Então, o artifício, que tinha por fito proteger a testamentifação, passa a constituir injunção contrária à justiça. Nessa discordância entre o meio e o fim, a inércia do juiz pode ser indefensável, pode, mesmo, ser felonia à sua missão. Êle não é instrumento de imposição, mas instrumento do direito, e o conñito entre o texto imperfeito e as realidades que compõem a situação jurídica deve resolver-se segundo o du:eito, e não pela capitulação diante da letra injusta. 4. NATUREZA DAS DUAS REGRAS JURÍDICAS. - O s artigos 1.647 e 1.648

do Código Civil são de forma probatória. É dever do juiz reputá-los tais. Por outro lado, acreditava o legislador que o disponente, sabendo da morte,

da ausência, ou da incapacidade da testemunha, fizesse outro testamento. Era compreensível que supusesse isso. Mas essa suposição pode falhar: a) Três ou mais testemunhas, após a morte e antes da apresentação do testamento para publicar-se, morrem, enlouquecem, ausentam-se para lugar não sabido, ou surdo-emudecem, de modo a não poderem depor. b) Três ou mais testemunhas morrem, tomam-se incapazes, ou desaparecem, ainda em vida do testador, sem que êsse saiba. Pressupomos que se prove ter morrido êle na convicção de que nada disso ocorrera. c) Três ou mais testemunhas, peitadas pelos interessados no não-cumprimento do ato testamentário, depõem contra o próprio ato que firmaram. Muitas vêzes, o direito cede à sugestão moral, corrigindo o abuso do poder da legislação, do fenômeno político; aqui, se prevalecesse o falso testemunho, com a ajuda da lei de forma que o art. 1.648 consagra, teríamos a imoralidade (o que é absurdo) prevalecendo contra o direito no domínio deste. Ora, a perfectibilidade da adaptação social global está na crescente redução do conflito entre o texto e o que devia ser, entre o escrito na lei e a regra jurídica não descoberta pelo legislador na sua insuficiência de ciência e de técnica. Aos casos principais que apontamos acrescentaremos outro, pelo caráter especial que o extrema dos demais. d) Morte simultânea do testador e das testemunhas no mesmo navio, no mesmo trem, no mesmo avião, ou em lugares diversos. Em qualquer dos casos que sugerimos,/ezto a prova de que o testador não teve conhecimento do golpe no seu ato testamentário, impõe-se o cumprimento do testamento particular. O testemunho não é prova insuprível, e não deve, nem pode a lei, criar injunções contra a realidade das coisas. 5. SOLUÇÃO DAS QUESTÕES. - Ver-se-á que a delicadeza do problema constitui séria crítica ao sistema do Código Civil. Mas é frutífera a solução, por invocar os princípios superiores de direito. a) As testemunhas morrem ou faltam após a morte do testador. Se somente duas morreram, enlouqueceram, ficaram surdo-mudas, ou se ausentaram para lugar não sabido, o texto legal basta: o juiz pode mandar cumprir, satisfazendo-se com as afirmativas das três. iQuid iuris, se a morte, incapacidade ou ausência ocorre a três ou mais?

O testador não podia prever. Não será possível atribuir qualquer culpa ao testador e a solução negativa resolvería, duramente, contra a própria suposição dêste de ter morrido com testamento válido. Por outro lado, o próprio juiz pode estar plenamente convencido da verdade do escrito e da observância instrumental das formas solenes do art. 1.645. Ainda mais: pode ser apresentante o único interessado na nulidade, o herdeiro legítimo. Ou que todos os herdeiros legítimos reputem valioso, expressão exata e indiscutível da vontade do testador tudo aquilo que no escrito se insere. Seria ofensivo à verdade, à realidade perceptível das coisas, dar ao testemunho o caráter de prova insuprível. Também entre os romanos iure civili continuava válido o testamento cujo fio foi cortado, ou o linum que unia as tábuas. Nem por isso deixou o Pretor de introduzir a distinção: incisões feitas por terceiro, ou fortuitas, e incisões de própria vontade do testador (L. 1, § 9, D., de bonorum possessione secundum tabulas, 37, 11). Iguais atitudes tomou êle em certos casos de testamentos rwpíMWí & irritum. E ia além a L. 21, C., de testamentis: quemadmodum testamenta ordinantur, 6, 25, relativa a escrituras imperfeitas, caso, bem se vê, á& forma solene, e não d& forma probatória, pôsto que a solução fôsse por um favor: "Hcet imperfecta videatur scriptiura posterior, infirmato priore testamento secundam eius volmitatem non quasi testamentum, sed quasi voluntatem intestati valere sancimus". No caso da dita L. 21, § 5 a, fala-se em juramento de cinco testemunhas (em vez das sete instrumentárias), de modo que se tratava, não da intervenção no ato, mas de juramento das disposições, conforme explicaram os glosadores e GUSTAV LUDOV. THEOD. MAREZOLL.

Cumpre ainda advertir que o Código Civil não conhece prescrição ou prazo preclusive de testamento, nem, no capítulo da revogação, cogitou da invalidação dos testamentos pela falta de testemunhas instrumentárias. Ex hypothesi, nem se poderia cogitar disso: com as formalidades do art. 1.645, ficou perfeito o ato; corn a morte do testador, nenhuma idéia de revogação poderia invocar-se. É preciso não perdermos evolução que se operou entre GAIO e Justiniano: após êsse, e com êsse, a validade depende da persistência expressa da vontade do testador, ainda que da simples ruptura dos fios, se feita por êle. Neste caso, o imperador diria testamentum non valere. Ao passo que, em idênticas circunstâncias, GAIO digia: nihito tnmus iure civili valeat. b) Testemunhas mortas, incapacitadas, ou desaparecidas antes da morte do testador. Se bem que negotia peifecta os testamentos, no caso de um

aviso tão direto ao testador como é o do art. 1.648, não seria possível afastar à invalidação pela falta dos confirmantes instrumentais se dessa falta houve conhecimento o testador. Mas muda inteiramente de figura a questão se fica provado que o testador não conheceu tais fatos ou era de presumir que os não conhecesse. Decidir contra tal testamento que não oferece dúvidas, ou, se as havia, foram plenamente afastadas pelos meios probatórios admitidos em direito, seria sacrificar aquilo mesmo que as formas solenes quiseram plenamente assegurar. c) Testemunha que não confirma. Pode ocorrer que uma das testemunhas não confirme a assinatura ou as disposições. É velha a discussão, e dela deu conta P. MÜLLER, em nota a G . A . STRUVE {Syntagma iurisprudentiae, e. 34, t. 42): "Cum quis testis aperte suum sigillum negat, neque nunquam apposuisse dicit, tunc testamentum suspectum redditur. Cum qui simpliciter non agnoscit sigillum; tunc si sit alienum, redditur suspectum, idem est, cum praetenditur proprium, non tamen apparet forma ita ut non possit discerni. Cum apparet sigillum, tunc recognoscentis dubitatione exclusa, praesumitur testamentum validum et non suspectum; ita ut potius praesumatur pro sigillo quam pro negante". Ora, provado que a testemunha mente, que é sua, pelo exame pericial (Código Civil espanhol, art. 691), a assinatura que ela nega, e verdadeiros os fatos que procura inquinar de falsos, ¿como fazer dependente de criminoso proceder de outrem a eficácia de ato tão relevante como o testamento? Se nega, e não há prova contrária, nem circunstâncias apreciáveis, então, sim, não pode ser confirmado (MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA, Coleção das Dissertações, 100). Em todo o caso, deve o juiz mandar cumprir o testamento se, no caso de igualdade de elementos probatórios ou de inexistência dêles, três testemunhas das cinco, contra duas, o confirmarem, ou, ainda no caso do art. 1.648, se houver o depoimento respeitável de uma e as duas outras forem convencidas de falso. d) Morte simultânea do testador e das testemunhas. Vale o mesmo se falecidos, sem se poder averiguar quem morreu primeiro (Código Civil, art. 11). Tal disponente estava seguro do seu testamento. Não era de presumir-se, nem provável, que falecessem êle e as testemunhas na mesma vez. Infirmar o seu ato perfeito, com que êle contava, em reverência a texto escrito, obsoleto na sua técnica, fôra sancionar a injustiça. e) Solução global. Nos casos especiais que apontamos em b) e c), exemplificativos, se o juiz está convencido, deve mandar cumprir o testamento. Tudo deixa de aconselhar-lhe isso se o testador sabia da falta

das testemunhas. Então, se bem que devamos estar sempre vigilantes no respeito das vontades dos testadores, omnímodo testatorum voluntatibus prospicientes, tal zêlo perde a razão de ser, porque a vontade negativa também é vontade e o mesmo merece que a positiva. São meios probatórios, para a convicção do juiz, todos os que a lei admite (Código Civil, art. 136), inclusive o depoimento dos herdeiros legítimos não contemplados, a que não se pode, em sã consciência, negar forte valia. As distinções, a que se procedeu, são tanto mais necessárias quanto a dura aplicação, contra a vontade do testador, teria o gravíssimo efeito de deixar que operasse a regra do art. 1.748: ¡ficar em vigor o testamento anterior, que o particular revogou! Pense-se nas conseqüências da interpretação gramatical dos dois artigos, e notem-se os males que dela adviriam. Outro inconveniente que não é de somenos importância: se o testador, ou alguém por êle, mandou reconhecer as assinaturas, e há elementos probatórios, convincentes, do ato testamentário, como referência escrita da testemunha ao testamento a que assistira, ¿como refugar tudo isto e os princípios de direito para se ater a texto de injustificada velharia, que exporia o Código Civil a flagrantes contradições com os seus princípios?

Panorama atual pelos Atualizadores §5.896. A - L e g i s l a ç ã o Sobre as testemunhas do testamento particular e sua eventual falta, no momento da abertura da sucessão, ver o art. 1.878 do CC/2002. § 5.896. B - Doutrina O maior impedimento à disseminação do testamento particular, no Brasil, foi a exigência da legislação anterior de sobrevivência de ao menos três testemunhas, para sua confirmação perante o juiz. Por isso, o inconformismo de Pontes de Miranda, que qualificou essa exigência de lei má e Inconsequente, pois a eventual morte do testador e de três testemunhas, em um acidente, por exemplo, faria com que seus bens fossem destinados a quem ele não desejava beneficiar. O Código Civil de 2002 atendeu ao reclamo doutrinário da modificação, reduzindo o mínimo de testemunhas de cinco para três, além de admitir que o juiz possa confirmar o testamento se apenas sobreviver uma delas, mas se convencer da autenticidade do testamento e das assinaturas a ele apostas.

§ 5.897. TESTAMENTO PARTICULAR E LÍNGUA

1. TEXTO LEGAL. - Diz o art. 1.649 do Código Civil: "O testamento particular pode ser escrito em língua estrangeira, contanto que as testemunhas a compreendam". Cf. Projeto primitivo, art. 1.817: "O testamento hológrafo pode ser escrito em língua estrangeira, contanto que seja bem conhecida das testemunhas"; Projeto revisto, art. 1.986. A fonte foi o Código Civil espanhol, art. 688, alínea 3.^: "Los estranjeros podrán otorgar testamento ológrafo en su propio idioma" Cf. Código Civil argentino, art. 3.641: "El testamento ológrafo debe ser escrito precisamente con caracteres alfabéticos y puede escribirse en cualquier idioma". 2. LÍNGUA ESTRANGEIRA E LÍNGUA SECRETA. - A propósito do Código Civil, art. 1.640, antes já dissemos o que era preciso quanto à língua estrangeira ou secreta. Testamentos públicos fazem-se em língua do país. Testamentos cerrados entregam-se ao oficial público, em presença das testemunhas, - não terão de ser lidos. Portanto, podem ser escritos noutra língua, viva ou morta, natural ou artificial, ainda que não na compreendam testemunhas e oficial público. Testamentos particulares, êsses, têm de ser lidos perante as testemunhas. Depois de lidos, assinados por elas (Código Civil, art. 1.645, IH) e pelo testador (art. 1.645,1). De nada valeria a leitura, se as testemunhas não entendessem a Kngua em que foram lidas as disposições. Daí a exigência geral de compreenderem elas a língua em que o testador redigiu, hologràficamente, o escrito testamentário (art. 1.649). Noutros Códigos Civis, há o art. 688 do Código Civil espanhol (alínea 3.^: "Los estranjeros podrán otorgar testamento ológrafo en su propio idioma") e o art. 3.641 do Código Civil argentino ("puede escribirse en cualquier idioma"). No Código Civil alemão, o próprio testamento perante o juiz ou notario pode ser feito por quem não saiba a língua alemã e os §§ 2.244 e 2.245 regulam a função do intérprete. Não ocorre o mesmo no Brasil. A lei permite a língua estrangeira e já falamos da língua artificial. Não se distinguem língua viva e língua morta. É preciso que êle conheça, ou, pelo menos, possa verificar se os seus pensamentos foram precisamente concebidos na língua morta, estrangeira, ou artificial. É pressuposto de ordem subjetiva, intrínseca. Se não o exigirmos, pode o testador dizer o que não quis, no copiar o texto que lhe traduziram. Daí afirmarem alguns {e. g., WALTHER BROCK, 7 7 s.; F. RITGEN, em G PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, § 2 . 2 3 8 , nota 5 ; contra, H . JASTROW,

Formularbuch und Notariatsrecht, I, 176) que o disponente precisa poder conceber, na hngua empregada, ps seus pensamentos, ou conferir com o que pensou o que se traduziu (EMIL JACOBY, Das eigenhandige

Testament,

40).

Mas a nulidade, aí, não é formal, é de declaração. O juiz não pode decretá-la de ofício, salvo se do texto consta que o testador não sabia a língua e confiou em alguém, que traduzisse as suas últimas vontades. Ter-se-á tomado vício externo, porém não no era. Exemplo: "e termino o meu testamento, redigido em grego, que eu não sei; mas dei a nainuta a J., que o verteu para aquela língua e eu copiei". A diferença que resulta de se ter extrinsecado, mas não ser, ordinariamente, requisito formal, é de eventuais conseqüências práticas, e pô-mo-lo em relevo, tanto mais quanto a doutrina passa sobre o assunto das línguas estranhas sem ferir êste ponto, que é de importância.

§ 5.898. D I R E I T O I N T E R T E M P O R A L E T E S T A M E N T O P A R T I C U L A R

1. TEMPO E FORMA. - No tempo, as leis regem, quanto à forma, todos os atos que na sua vigência se perfizeram. Perfeito o ato, a lei posterior não o fere. 2. FORMA E TESTADOR MORTO OU NÃO NA VIGÊNCIA DA LEI NOVA. -

Se proibitiva do testamento particular, nem por isto a lei nova atinge o ato perfeito. É o que se tem decidido quanto à parte formal dos testamentos conjuntivos, que o Código Civil proíbe, e o que se julgaria se lei posterior ao Código Civil revogasse os arts. 1 . 6 4 5 - 1 . 6 4 9 . Tempus regit actum. Se o testador morreu antes da nova lei, com maioria de razão. A distinção é indiferente ao princípio de se reger a forma pela lei do tempo em que se fêz o testamento. A forma é a do tempo da efetiva feitura, e não a da lei correspondente à data irreal que se apôs (H. HABICHT, Die Einwirkung des BGB. aufzuvor entstandene Rechísverhãltnisse, 672). Se o testador observou as regras da lei nova, futura no momento da feitura do testamento, postergando as da lei antiga, vigente quando fêz, nulo e o testamento (EMIL JACOBY, Das eigenhandige

Testament,

63).

Em^tudo que toca a forma, o tempo que decide é o em que se fêz, e nao aquêle em que vai executar-se, ou aquêle em que se quer que a dispo-

sição se efetive (FRIEDRICH AFFOLTER, Das intertemporale Recht, 334). Exemplo: um alemão escreveu o seu testamento antes de janeiro de 1900, mas apôs a data posterior (2 de fevereiro, ou 5 de agosto de 1900) para se aproveitar da lei que ainda não entrara em vigor, - o testamento foi nulo. 3. PRESSUPOSTOS SUBJETIVOS E OBJETIVOS PARA O USO DA FORMA HO-

LÓGRAFA. - A lei do tcmpo da feitura efetiva, e não a da data antecipada, que o testador escreveu, é que lhe rege a aptidão para a forma hológrafa. Há possíveis questões de convalescença e de cassação legislativa. É do caráter das leis escritas referirem-se ao futuro, serem imposição aos atos que se vêem e não aquêles que já passaram. Esta atuação no presente é própria do Direito e por isto mesmo, no seu domínio, se aparam demasias dos textos impostos, sempre dosados do excesso arbitrário dos legisladores. No dizer que a lei não retroage, e dizê-lo por escrito, os órgãos políticos nada mais fazem do que reconhecer as fronteiras do processo social, jurídico, de adaptação, inconfundível com o processo poKtico, mais instável e mais violento do que aquele. Daí: a) os atos jurídicos, nulos, quanto à forma, conforme a lei do tempo em que se praticaram, em regra não convalescem com a superveniência da lei que exclua a nulidade; b) válidos segundo aquela lei, não os atinge a lei nova invalidante. Porém pode ocorrer: a) que a lei nova repute insuficiente a forma da feitura (de um testamento, por exemplo) e, a despeito da perfeição do ato, obrigue quem os fêz a satisfazer novas formalidades; b) que a lei nova repute suficiente o ato defeituoso que antes fôra praticado. Em ambos os casos, está visto, supõe-se texto expresso a respeito da necessariedade posterior ou da posterior invalidação. As duas proposições não podem ser tratadas em pé de igualdade, e já se disse o bastante sobre isso. Se o testador pode modificar o que fêz, isto é, se sabe e pode testar novamente, ou satisfazer a nova exigência do testamento particular, o Direito, a despeito da perfeição do ato, poderá admitir a investida do ato legislativo cassatório. Naturalmente, terá o juiz de examinar as circunstâncias e atender com mais largueza os próprios erros de direito. Se, porém, a lei nova procura cassar, indistintamente, valerá o mesmo que excluir capacidade de direito, e ofenderá princípios jurídicos superiores: não será aplicada.

No caso de sanatoria, proceder-se-á segundo o que ficou exposto: terá o efeito excepcional de avisar os que testaram nulamente de ir convalescer ou de ter convalescido, por fôrça de lei, os testamentos que fizeram.

Panorama atual pelos Atuaiizaaores §5.898. A - L e g i s l a ç ã o Sobre a regra básica de direito intertemporal, aplicáveis aos negócios jurídicos, conferir o art. 2.035 do CC/2002. § 5.898. B - Doutrina Ante a intensa controvérsia doutrinária e jurisprudencial, no Brasil, acerca da eficácia retroativa da lei nova nos negócios jurídicos concluídos sob a vigência da lei antiga, e considerando a garantia constitucional do ato jurídico perfeito, o Código Civil de 2002 estabeleceu delicada distinção, admitindo que a in-etroatividade diga respeito aos requisitos de validade do negócio jurídico, mas não aos fatores de eficácia. Assim, permanecem íntegros os requisitos essenciais de validade previstos pelo Código Civil de 1916 para o testamento particular escrito e assinado antes de 10 de janeiro de 2003 (advento do novo Código), notadamente o de ser escrito de próprio punho pelo testador e assinado por cinco testemunhas. ívlas, se a abertura da sucessão se deu após aquela data, a esse testamento se aplicam os fatores de eficácia do novo Código, bastando, para sua confirmação pelo juiz, que tenha sobrevivido apenas uma das testemunhas que o reconheça como autêntico e que o juiz se convença de sua veracidade. Para o novel testamento particular informal, os requisitos de validade e os fatores de eficácia são todos da nova lei. § 5.898. C - Jurisprudência Antes do Código Civil de 2002 o STJ tendia para a mitigação dos requisitos formais de validade, em favor das finalidades do testamento e da manifestação de vontade do testador. Em testamento particular digitado e não manuscrito, realizado antes do Código atual, mas objeto de julgamento após ele, houve assinatura de apenas quatro testemunhas sendo que três delas o confirmaram em audiência, o que pareceu bastante para o Tribunal o entender válido. O Tribunal, ante a situação de direito intertemporal, deu interpretação restritiva ao direito anterior sobre a validade do ato e o orientou segundo o direito novo. Argumentou-se que "o testamento, ato de disposição de última vontade, não pode ser invalidado sob alegativa de preterição de formalidade essencial, pois não pairam dúvidas que o documento foi firmado pela testadora de forma consciente e no uso pleno de sua capacidade mental" (STJ, REsp 701.917/SP, j. 02.02.2010, rei. Luis Felipe Salomão, DJe 01.03.2010).

§ 5.899. DIIÍEITO INTERNACIONAL PRIVADO E TESTAMENTO PARTICULAR

1. FORMA EXTRÍNSECA. - A forma extrínseca do testamento particular rege-se pela lei do lugar em que se faz. Mas cumpre advertir: a) que a regra jurídica locus regit actum é facultativa; b) que pode a lei pessoal proibir ao testador alguma espécie de testamento, ou mesmo só lhe admitir a forma pública. Há o problema da facultatividade da regra jurídica locus regit actum. Desde muito que se ensina (J. Nic. HERT, Dissertatio de collisione legum, Commentaria atque Opuscula, 182): "Si actus a solo agente dependeat, v.g., testamentum et hic sit exterus: vel si actus inter duos celebretur, v.g., pactum, et uterque paciscens sit exterus, et unius civitatis eives dubitandum non est actum a talibus secundum Leges patriae factum in patria valere". No Estado da lei pessoal do testador deve valer, e os outros povos, os povos-terceiros, diante do reconhecimento da facultatividade por parte da lei pessoal, têm de reconhecer a possibilidade de observar o testador a lei pessoal, em vez da lei do lugar. O reconhecimento por parte do Estado da lex loci é que depende do direito internacional privado dêste. Aqui, não é êle obrigado. J . Nic HERT tinha razão em dizer in patria valere, e nós a temos em achar que o Estado-terceiro há de preferir a facultatividade da lex personalis à obrigatoriedade do Estado do lugar. A jurisprudência brasileira é pela facultatividade: o testador italiano pode, por exemplo, testar pela forma hológrafa do seu país (Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de fevereiro de 1907). Com o que, aliás, segue a tradição da doutrina. 2 . APLICAÇÃO DA REGRA JURÍDICA "LOCUS REGIT ACTUM" AOS TES-

TAMENTOS PARTICULARES. - A regra é que o disponente escolhe a forma que lhe apraz entre as que a lex loci permite. A questão da facultatividade da regra jurídica locus regit actum intervém quando se trata de testamento sem intervenção de autoridades pííblicas. Se opta pela forma do direito local, deve observá-la em tudo. Pelo fato de preferi-la, ou de preferir a do seu país, não comete ato in fraudem legis (assim, A . NIEDNER, Einfühmngsgesetz, 2.=^ ed., ao art. 11; THEODOR NIEMEYER, Das Internationale Privatrecht des BGB., 114 s.). Por isto mesmo, a lex loci é que responde se - tendo optado por ela foram satisfeitos os requisitos essenciais e se a infração importa nulidade o u anulabilidade

(ERNST ZITELMANN, Das Internationale

Privatrecht,

II,

1 5 5 s.; A. NIEDNER, EinfUhrungsgesetz, 2." ed., sob o art. 11; EMIL JACOBY, Das eigenhãndige Testament, 55). Aliás, é de presumir-se que testou pela forma válida, se expressamente não declarou optar. Assim, cremos que fica elidida a questão quando o disponente no estrangeiro infrinja uma das exigências e a lei pessoal dê a sanção da nulidade e a local a da anulabilidade, ou vice-versa. A questão perdurou entre juristas alemães ( E M I L JACOBY, Dos eigenhãndige Testament, 5 5 ; THEODOR NIEMEYER, Das intemationale Privatrecht des BGB., 114), por não na terem afastado com a presunção a favor da escolha da forma válida ou menos atingida.

3. APÁTRIDES. - Tratemos dos sem pátria, que teriam a lei da nacionalidade como lei pessoal, e os de mais de uma nacionalidade. O sem pátria, sem lei pessoal do domicílio, testa bem, testando pela lei local, se domiciliado no Brasil; ou, se sujeito à lex successionis de outro país (exemplo, o Heimatlos que tem um filho brasileiro), optou pela forma da lei que seria a pessoal. Mas também pode escolher a forma da lei do domicílio, ou da residência se não tem domicílio. 4 . NACIONALIDADE MÚLTIPLA, SE A LEI PESSOAL É A "LEX PATRIAE".

- Se o disponente tem mais de uma nacionalidade, e as leis dos respectivos Estados não resolvem o conflito, pode testar pela lex loci, ou optar pela do Estado do domicflio, ou da residência, - salvo se a lei do seu domicílio é a brasileira, porque, então, somente pode testar pela lex loci ou pelas formas da lei do Brasil. A facultatividade é entre a lei pessoal e a do lugar; e o Estado da lei pessoal não pode permitir que opte por outra lei: utilitatis causa, surgiu a própria lex loci. Cp. THEODOR NIEMEYER ( D O S intemationale Privatrecht des BGB., ^2). 5. MUDANÇA DE NACIONALIDADE. - No caso de mudança de nacionalidade, vale o testamento feito conforme a lei da primeira. Não há, no Brasil, a dificuldade oriunda de regra escrita, que se pudesse prestar a interpretações discordantes, como no EinfUhrungsgesetz, art. 24, 3." alínea, em que é unilateral a regra jurídica. Aliás, cumpre, quanto àquele direito, prestar-se toda a atenção ao art. 25, quanto aos estrangeiros falecidos com domicilio na Alemanha (domicflio e residência, acrescenta CAESAR B A RAZETTI {Das intemationale Privatrecht, 98 e 109); só domicílio, entende A. NIEDNBR {EinfUhrungsgesetz, 67), regra jurídica que constitui matéria de dureito internacional privado alemão. Quanto ao direito internacional pnvado do Brasil, o princípio muda: certo, a sucessão e todo o intrínseco

se há de reger pela lei pessoal ao tempo da morte do testador que mudou de lei pessoal, mas a forma, esta se há de reger ou pela lei do lugar ou pela lei pessoal que se lhe conferia ao tempo da feitura. Ainda mais: se havia dúvidas quanto a essa, e a segunda constitui confirmação da que o testador se atribuía, devem os juízes, exceto se uma das leis pessoais atribuídas fôr a brasileira, considerar válido o testamento hológrafo que se fêz segundo a lei pessoal confirmada. 6. VEDAÇÃO DE ATO DO TESTAMENTO PARTICULAR. - Se a lei pessoal do testador só lhe dá o testamento público, não pode êle, fora do seu país, testar por escrito particular: toca, então, ao intrínseco (C. F R . EICHHORN, Einleitung in das deutsche Privatrecht, 110). Mas a recíproca não é verdadeira: se só se lhe dá a espécie particular, vale o que, no estrangeiro, se fizer pela forma pública (J. C. SIBBENKEES, Beitrãge zum teutschen Rechte, 1 2 0 ; K . F R . E I C H H O R N , Einleitung in das deutsche Privatrecht, 1 0 7 ; CHR. FRIED, VON G L Ü C K , Kommentar, 3 5 , 3 9 ) . Quer dizer: há muito que se formou êste princípio da valia inderrogável do ato público. Não é somente a lei do Estado do autor de um ato que lhe pode proibir uma forma; qualificando-a, pode fazê-lo, - no interêsse da família, dos nacionais, da fortuna localizada, - a lei da situação dos bens, a que rege a sucessão, etc. 7. CASO ESPECIAL DO M E N O R BRASILEIRO ALHURES. - Temos de cogitar do menor com domicflio brasileiro se está na Alemanha. Êste menor ou testa pela lei alemã, pública oral (Código Civil, § 2 . 2 3 8 , alínea 2.^), ou opta pela forma brasileira, hológrafa, ou cerrada com a aprovação do cônsul, ou pública, perante êste. Porém não pode dispensar as formalidades a mais da lei brasileira, empregando a mais fácil forma particular alemã: desta não lhe era dado usar. A altematividade da lei da forma cede onde a lei local considera o não-emprêgo da sua forma como de ordem pública. 8. TESTAMENTO PARTICULAR DO ESTRANGEIRO NO BRASIL. - N o B r a -

sil, o estrangeiro testa bem, se testa em forma pública, ou por testamento cerrado, com a aprovação do oficial público que lhe aponta a lei brasileira. É normal aplicação da regra jurídica locus regit actum. Na forma hológrafa, observando a lei brasileira, testa bem, salvo qualificação especial pela lei estrangeira.

Se o testador escolheu a forma hológrafa segundo a lei pessoal, testa bem. Seria absurdo ler-se como somente de aplicação facultativa a regra jurídica locus regit actum, se no estrangeiro o testador, e obrigatória, tratando-se de estrangeiro ou domiciliado no estrangeiro, se está no Brasil. A espécie é de instrumento particular e a regra jurídica locus regit actum não tem, e não deve ter, caráter obrigatório. Se o testador estrangeiro testou em país estrangeiro, não estando em jôgo a ordem pública do Brasil, o tribunal brasileiro tem de assumir atitude fria e objetiva. Pode ocorrer que o Estado da lei pessoal não conheça a alografia do testamento particular, e o testador tenha preferido a lei local, que lho permite. Não devemos, por isso, reputar válido o testamento alógrafo feito com as testemunhas em lugar que o admite, por testador cuja lex personalis lho interdiz, no interior ou no estrangeiro, ou só no estrangeiro (qualificação) a alografia particular. Mais: se, por exemplo, o cidadão holandês está na França e faz testamento hológrafo. Neste assunto é de concluir-se que valem: a) os testamentos públicos na forma autêntica local; b) se a lei pessoal não lho proíbe, o testamento quç o estrangeiro fêz na forma privada da lei local; c) o testamento feito na forma particular que a lei pessoal admite. No último caso, trata-se de aplicação da facultatividade da regra jurídica locus regit actum. • 9. REQUISITO DA HOLOGRAFIA E NATUREZA JURÍDICA DA EXIGÊNCIA.

- Quando a lei pessoal ou outra lei proibitiva exclui a nuncup atividade, a lex loci não deve frustrar a aplicação do direito vedativo. É inevitável, por vêzes, o conflito de qualificação. Solver-se-á pela lei de cada Estado, dentro dêle. Quanto ao Estado-terceiro, que não está em lide, se exclui a nuncupatividade, não deve dar ganho de causa ao país que a admite, - teria de ceder se o conflito fôsse consigo. Ex hypothesi, seria absurdo. A exigência do escrito - ainda quando o testador não saiba, ou não possa escrever - tem por fito evitar que surjam dúvidas graves quanto ao que declarou o testador, quanto à liberdade com que o fêz e à espontaneidade de suas disposições; Estão em jôgo interêsses do testador, da familia e do próprio país a que pertence. Por isto, a regra jurídica locus regit actum cessa de apücar-se quando intervém tal exclusão da nuncupatividade irxeduzida a escrito, ou insuficientemente reduzida. O testamento do brasileiro no estrangeiro, feito na forma hológrafa do Codigo Civil e com as formalidades da lei brasileira, porém sem as do lugar em que se fêz, vale. É uma das conseqüências do caráter fa-

cultativo da regra jurídica locus regit actum quando se trata de atos de caráter privado. Se quem tem a lei pessoal brasileira, estando no estrangeiro, testa pela forma particular hológrafa da lei do lugar, mas o testamento não se reveste das formalidades da lei brasileira, e só satisfaz a da holografia, - tal testamento vale. Trata-se, na espécie, de mera aplicação da lex loci, aliás facultativa. Se falta o requisito da holografia, não: mudou a própria espécie de testamento, tocou o critério-ceme, o critério-protetor que o legislador brasileiro houve por bem adotar na defesa dos testadores e da família: a exclusão da nuncupatividade inescrita, ou escrita em instrumento particular. Não se mudou deforma extrínseca, mas de espécie. Falta saber se é requisito intrínseco a holografia do todo o escrito ou só a da assinatura. No direito internacional privado, é a holografia da assinatura que se reputa requisito essencial. O que é de ordem intrínseca, o que o Estado-terceiro ou da lex fori, tem de reputar princípio superior de direito é a holografia da assinatura, Há povos de alta civilização que com isso se satisfazem. A holografia mínima é a da assinatura: o escrito por outrem e devidamente assinado poderá, para a lex fori, ser submetido a verificações comprobatorias, talvez a perícias, porém não à exclusão liminar com o fundamento de ofensa à ordem pública. Não ocorre o mesmo aos testamentos alógrafos e assinados a rôgo, que seriam disfarces do nuncupativo ou oral. Nuncupativo alogràficamente redigido, mas nuncupativo. Escapou ao que dissemos o testamento em que a lei brasileira não seja, de modo nenhum, interessada: o que a pessoa, com a lei pessoal do Estado A, fêz no Estado B, e em cuja sucessão não há cônjuge brasileiro, ou filho brasileiro, que obrigasse à lei do Brasil os requisitos intrínsecos. Aqui é que surge a questão da ordem pública. ¿ 0 Estado-terceiro deve negar cumprimento ao testamento todo alógrafo, se os dois Estados interessados o reconhecem? Se um só o nega, o da lei pessoal, o Brasil não pode dar ganho de causa ao Estado que o reconhece. Êste, que o cumpra no seu território. Se o nega o da lex loci, que o cumpra, no seu território, o Estado da lei pessoal. O Brasil comprometeria a sua própria legislação, se interviesse. Se todos reconhecem, e só o Estado-terceiro veda (caso do Brasil), então nem o extrínseco, nem o intrínseco, está sujeito ao exame imediato do Estado-terceiro.

10. EXIGÊNCIA FORMAL DA DATA. - N o direito de alguns povos, diante

dos textos legais que falam em data, há questões relativas à essencialidade de tal requisito. ¿Qual a atitude que deve assumir o juiz brasileiro quando tiver de se pronunciar sobre isso? A atitude do juiz do Estado-terceiro será - se também exigir a data verdadeira como requisito formal - a de acolher a solução que coincida com a lex fori. No Brasil, que não exige a data como requisito formal, terá de julgar com muita prudência o juiz a que se levar a questão da validade do testamento estrangeiro. Diante, por exemplo, das opiniões alemãs, somente deve negar validade ao testamento hológrafo alemão: a) se êle não teve data nenhuma (seria dispensar ao testador o conhecimento da sua lei); b) se a data aposta, inexata, fôr eventualmente essencial; c) se constituiu ato in fraudem legis. ¿Quid iuris, se testamento hológrafo de pessoa com a lei pessoal brasileira, feito na Alemanha? As soluções b) e c) são^perfeitamente aplicáveis. Mas a razão da solução a) desapareceu. Pode ter havido êrro de direito. Optou pela lei alemã, leu um livro que segue a essencialidade da data exata. Êrro que fácil se compreende pela omissão da data no texto da lei pessoal. Não se trata de reenvio, mas - observadas as circunstâncias - deve o juiz atender aos princípios sobre possibilidade do êrro de direito e mandar cumprir o testamento, se, no caso concreto, a data não fôr essencial. Não assim se fôr eventualmente essencial (e. g., dois sem se poder saber qual o primeiro). São questões de extrema delicadeza. As leis de forma, as regras jurídicas rígidas e pontiagudas, os gumes de espada dos princípios apriorísticos, semearam de injustiças e de desrespeito ao querer último as sociedades contemporâneas. Ora, no passado, havia as válvulas de valer como nuncupativo, de valer como codicilo, e outras semelhantes cláusulas explícitas ou impKcitas. Hoje, obturadas tais canalizações salutares, muito se sacrificaria com o exagerado formahsmo. Na própria ordem internacional, não é exótico falar-se em/avor íesíameníj. 11. QUESTÃO RELATIVA à DISPENSA DE TESTEMUNHAS. - Se O testador,

em país que tem a holografia intestemunhada, no próprio texto da ce'dula testamentaria declara que esta será assinada, por testemunhas, ¿vale o testamento a que não foram apostas as assinaturas? J. CmÁcio decidia que, a

despeito do testes non esse necessários do testamento hológrafo da Novela Valentiniana, quando o testador as anunciava no corpo do escrito, tinham de ser exigidas. Mas, pelo fato de não passar a Novela ao direito justinianeu, entendia MERLIN (Repertoire universel et raisonné de Jurisprudence, 17, 561) que errara J. CmÂcio; nem no antigo direito, nem sob o Código Civil, seria aceitável a conclusão invalidante. A jurisprudência esteve e está com o repertorista. Mas ¿poder-se-á afastar o exame das circunstâncias, quando estas sejam no sentido da imperfeição do ato? A questão tem importância para o direito brasileiro, porque se têm de cumprir testamentos hológrafos, intestemunhados, de pessoas não submetidas à lei brasileira. Se o testador disse, claramente, "testamento que somente valerá quando eu o ler às testemunhas A, B, C, D e E", o juiz da lex fori não pode deixar de atender a tal circunstância verdadeiramente decisiva: a feitura no Brasil. De tal cláusula só uma conclusão é possível tirar-se: o estranho que assim testou no Brasil, optou pela lei brasileira, o que lhe era permitido por ser facultativa a regra jurídica locus regit actum e tratar-se, na espécie, de caso em que a lex loci vem ao encontro da vontade do testador. Porém, pelo fato mesmo da facultatividade, ¿que é que se resolverá, quando o testador estava em país de testamento hológrafo intestemunhado, e é a sua lei pessoal a que exige as testemunhas? Se, ali, interpretamos o animus testamentum faciendi com a circunstância da lex loci, ¿será que a facultatividade da regra jurídica locus regit actum exclui a possibilidade de se interpretar com a lei pessoal? Ali, era a circunstância da estada, da residência, talvez do domicílio, que se invocava; porém aqui também seria de invocar-se a criação excepcional da regra jurídica, nascida utilitatis causa, e hoje reconhecida como facultativa. Com maioria de razão, em Estados cuja concepção de tal princípio seja a de bastar, na falta da lei do ato, a lei do lugar (como ocorre, por exemplo, no direito alemão). Mais difícil será se nem a lei local, nem a lei pessoal exigirem testemunhas. ¿A que direito, a que lei formal se podia supor referido o testamento? Mas o difícil não é o impossível. Nas relações internacionais, deve reconhecer-se mais larga aplicação ao error communis e ao êrro justificável de direito. 12. EXIGÊNCIA DE AUTENTICIDADE E VIGÊNCIA DA FORMA SOMENTE PARTICULAR EM ESTADO DA "LEX LOCI". - Alguns autores, para prover ao

caso de Estado que não tenha testamento público, e a lei do estrangeiro.

nêle domiciliado ou de passagem, diga só dever testar pela forma pública, recorrem, como A. P I L L E T (Traité pratique de Droit International Privé, II, 428), à definição mesma de ato autêntico ou público. Na Inglaterra, por exemplo, faz-se com o concurso de duas testemunhas. ¿Será ato autêntico no sentido do art. 999 do Código Civil francês? Respondem que sim. Mas, se nos aprofundarmos, veremos que, com o inmito de interpretar o art. 999, os julgados e os escritores franceses foram ao extremo de mudar a noção mesma do ato autêntico. Nada o justifica. A Inglaterra só tem o testamento particular. Tal o fato, e o art. 999 supõe que todos os Estados tenham o testamento púbUco, o que não se dá. Ora, não é a noção de ato autêntico que se deve torcer, amolgar, utilizar, para servir ao texto francês, - é o texto francês que se deve adaptar às realidades, interpretar-se. Assim, digamos: pressupôs o Código Civil francês, art. 999. que no Estado em que se ache o Francês haja aquela forma; se não há, satisfaz-se a regra jurídica com o uso da que fôr a mais segura, a de maior garantia, nos países esfrangeiros. Preferivelmente, a forma púbHca, aberta ou fechada, se houver. Na jurisprudência internacional, julgou bem, a 23 de janeiro de 1917, o Tribunal Superior de Lisboa. f As condições de pubHcidade, de autenticidade, julgam-se pela lei do lugar, - é a lei da forma do ato. As nulidades formais são as desta lei. Nem podia ser de outro modo. Se, no lugar, há a forma autêntica, tollitur quaestio. Se não há, teste o estrangeiro pela sua lei, se possível, ou, se outro meio não houver, pela forma que existir na lex loci.

CAPÍTULO TESTEMUNHAS

XXIII

TESTAMENTÁRIAS

§ 5.900. REGRAS JURÍDICAS SOBRE TESTEMUNHAS TESTAMENTÁRIAS

1. T E X T O L E G A L . - Diz o art. 1.650 do Código Civil: "Não podem ser testemunhas em testamentos: I. Os menores dezesseis anos. II. Os loucos de todo o gênero. IH. Os surdos-mudos e os cegos. IV. O herdeiro instituído, seus ascendentes e descendentes, irmãos e cônjuges. V. Os legatários". No Projeto primitivo, art. 1.818: "Não podem ser testemunhas do testamento ordinário: 1.° O herdeiro instituído e o legatário; 2.° Os ascendentes, descendentes, irmãos ou cônjuge do herdeiro ou do legatário; 3.° O escrevente ou empregado do tabehão que o escrever ou aprovar"; no Projeto revisto, artigo 1.990: "Não podem ser testemunhas em testamento: 1.° Os menores de 14 anos; 2.° Os loucos de todo o gênero; 3.° Os mudos e surdos, e os cegos; 4° O herdeiro instituído, seu cônjuge, os filhos que tiver sob pátrio poder, assim como os legatários; 5.° O pai, sob cujo poder estiver o herdeiro instimído; 6.° Os irmãos do herdeiro instituído, se todos estiverem sob o poder de seu pai; 7.° Os herdeiros e legatários, seus ascendentes e descendentes e afins na mesma linha, salvo no auto de aprovação do testamento cerrado". 2 . FORMAS TESTAMENTÁRIAS E T E S T E M U N H A S N O DIREITO DOS S É C U -

- No Código Visigótico, em que o influxo do direito romano foi maior do que nas outras leis dos nórdicos, ainda muito pouco se tratou do testar. Dos atos de última vontade, englobadamente com as escrituras, foi que cogitou o Livro H, Título 5. Ainda a doação com reserva de usuLOS PASSADOS.

fruto, revogável, por ser similitudo testamenti (Livro V, Título, 2, § 6) e era, talvez, a forma de que mais se usava. No fundo, a tradição resistia; não entendiam os Visigodos a essência de todas as romanices da instituição do herdeiro, dos codicilos e dos legados, e dos fideicomissos. Colheram, superficialmente, a forma, em que meteram os germes da sua evolução para o testamento. Mas, tão imperfeita, tão alheadamente se fêz, que se não cogitou do número das testemunhas. Na compilação de Recesvindo, havia três formas de testar: com assinatura do testador e subscrição pelas testemunhas; com firma do sinal dêle e das testemunhas; ou oralmente diante das testemunhas. Chegar-se-á, no direito visigótico, a admitir a alografia o subscrição por outrem, diante de testemunhas. Mas, se a impossibilidade cessava, precisava o testador ratificar. Havia o prazo de seis meses para as testemunhas confirmarem perante o juiz, nos dois casos que por último referimos. (As testemunhas tinham um trigésimo da herança ou parte da herança constituída em dinheiro). Os outros precisavam ser publicados, dentro de seis meses, pelos sacerdotes. No Breviarium, classiñcavam-se os testamentos em civil e pretoriano, o primeiro com cinco, e o segundo, com sete testemunhas. Mais uma, se o testador não sabia, ou não podia subscrever. Se per nuncupationem, sete. No século Xin, não era o testamento romano, nem as formas acima referidas que se observavam. Não nos esqueça que as Decretais de Gregório IX excluíam, a favor da Igreja, formalidades romanas. O mais freqüente era o testamento por tabelião. Havia particulares, na presença de testemunhas, às vêzes com o sêlo do mosteiro contemplado, outras, com o do Concelho. Em testamentos por tabelião da segunda metade do século XHI, há, às vêzes, só três testemunhas; outras, dez, quatro. Influência do que decretara o Papa Alexandre m , em 1170. No regime das Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 103, reconhecia-se o costume, não só antigo e geral como o judicial (em primeira e última instância) de valerem os que tivessem cinco testemunhas, ainda se algumas fossem mulheres, como valiam os de sete varões. {Afixação dêste número cinco fez-se definitiva para o sistema jurídico brasileiro, em todas as espécies de testamento do Código Civil). A boa política jurídica das Ordenações Afonsinas consistiu em cortar as dúvidas, refugando a exigência romana e fixando o número mais cômodo.

§ 5.900. REGRAS JURÍDICAS SÔBRE TESTEMUNHAS TESTAMENTARIAS



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3. DIREITO ANTERIOR E CAPACIDADE TESTEMUNHAL. - N ã o p o d i a m

ser testemunhas os menores de quatorze anos e as menores de doze (Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 85, pr.), os furiosos, surdos e mudos, e os pródigos. Mais: o herdeiro instituído, os filhos. Sob o pátrio poder, nem o pai, sob cujo pátrio poder estava o herdeiro, nem os irmãos do herdeiro, se todos sob o pátrio poder. Adiante veremos a mudança de conteúdo que se operou. Os pródigos, hoje, podem ser testemunhas, assim testamentárias como acidentais. 4. NtJMERO DAS TESTEMUNHAS E UNIDADE DO ATO, NO DIREITO ANTERIOR. - O número de testemunhas fôra sete, - por fundamento histórico; analogia com o testamento civil per aes et libram (ALB. DIETR. TREKELL, Tractatus de origine atque progressu testamentifact. praesen. apud Romanos, §§ 45-55, que considerou o antestatus sétima pessoa), e não pitagórico, pelo caráter sagrado do número sete, expressivo de perfeição, como pretenderam E. F. BERGMANN {Meditado de numero septenario testium in testamentis, § 17) e GEDICKE, em estudos sôbre a história da fé e o número sete. Também se exigia unitas actus. Eram rogadas as testemunhas, rogatio originária do ritus mancipationis per aes et libram ( E . OTTO, De lurisprudentia symbolica, 142).

No direito das Ordenações Filipinas, eram cinco as testemunhas do testamento público, aberto ou cerrado (Livro IV, Título 79, pr. e §§ 1 e 2), e seis no testamento "feito pelo testador, ou por outra pessoa privada" (§ 3) e no nuncupativo (§ 4). É de notar-se que o seis ainda simboliza 7: seis testemunhas mais o testador. Aliás, as cinco testemunhas do testamento público somadas ao testador e ao tabelião perfaziam o mesmo número.

Panorama atual pelos Atuallzadores § 5 . 9 0 0 . A - Legislação

O Código Civil de 2002 não reproduziu a regra do art. 1.651 do CC/1916, que estabelecia quem não poderia ser testemunha em testamentos. Consequentemente, incidem as regras comuns à prova testemunhal previstas nos arts. 227 a 229, constantes da Parte Geral do Código atual.

§ 5.900. B - Doutrina Não podem ser admitidos como testemunlias para os atos jurídicos em geral, inclusive nos testamentos, de acordo com a legislação vigente, os menores de 16 anos, os que não tiverem discernimento para a prática dos atos da vida civil, os cegos e surdos para os fatos que dependam dos sentidos que lhes faltam, o interessado no litígio, o amigo íntimo ou inimigo, os cônjuges, os ascendentes, os descendentes, os colaterais até o terceiro grau. Porém, a lei admite que para a prova dos fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o depoimento de qualquer dessas pessoas. Esta ressalva abre a possibilidade de não se rejeitar como testemunhas, em qualquer espécie de testamento (público, cerrado ou particular), os herdeiros ou legatários, que expressamente eram vetados no Código Civil de 1916, desde que, em caso de dúvida ou de impugnação da validade formal da cédula, contribuam para assegurar ou confirmar a manifestação de vontade genuína do testador e para se favorecer o testamento, em sua validade e eficácia ("favor testamenti").

§ 5.900. C - Jurisprudência Antes do início da vigência do Código Civil de 2002, o STJ já atenuava os impedimentos para certas pessoas serem testemunhas instrumentárias, existentes na legislação anterior. Entendeu, por exemplo, que a vedação do legatário impunha interpretação estrita, não atingindo sócio da entidade beneficiária da liberalidade (STJ, REsp 19.764/SP, S.^-T, j. 30.11.1992, rei. Min. Dias Trindade, DJ 08.02.1993).

§ 5.901. FUNÇÃO E REQUISITOS DAS TESTEMUNHAS 1. FUNÇÕES INSTRUMENTARIAS. - São instramentárias as testemu-

nhas, a que o art. 1.650 se refere. As testemunhas do testamento particular são instrumentárias. Figuram, e desde o comêço iam figurar no ato. Não bastariam ser acidentais. O testamento precisa ser-lhe Udo. Devem ver e ouvir o testador (W. A. LAUTERBACH, Collegium Pandectarum theoreticopracticum, § 58; E. CHR. WESTPHAL, Theorie des rômischen Rechts von

Testamenten, § 182). Não é o testador que deve vê-las e ouvi-las (sentido, que refutamos, do in conspectu testatoris, quando do testamento público): elas é que devem vê-lo e ouvi-lo. Vendo-o, identificam-no; ouvindo-o, podem, depois, confirmar o que ouviram. Por isso mesmo, tem-se de pôr por princípio que cegos não podem ser testemunhas.

Além das exigências formuladas pela lei, devem as testemunhas instrumentárias satisfazer as que lhes dão a possibilidade física e moral de cumprir, com pleno conhecimento, os seus deveres. Assim, no silêncio da lei, decidem os juristas alemães (Motive, V, 269; Protokolle, V, 535). 2 . CONHECIMENTO DO TESTADOR PELAS TESTEMUNHAS INSTRUMEN-

- As testemunhas devem conhecer o testador, ou, por qualquer modo, certificar-se da identidade a de que está em perfeito juízo e sem qualquer coação. As fórmulas tabelioas contêm dizeres como êste: testador, "de mim conhecido, e das testemunhas"; e isso basta. Aliás, a lei não exige ser portado por fé. E compreende-se: identidade é coisa que se pode apurar depois, se houver dúvida, e matéria de maior discussão. Se aceitaram ser testemunhas e assistiram e assinaram, identificam aquêle que testou com a pessoa nomeada como testador. TARIAS.

Pode ocorrer que, pelo depoimento posterior, de uma ou duas das testemunhas, não se trate do próprio. Mas isto é quaestio facti: ao juiz apreciá-la. O testamento lá QS\Á, perfeito; se não era o próprio, a assinatura é de outrem, e o oficial público portou por fé que era o próprio que assinava. Se a lei não exige do oficial público, que porte por fé conhecerem as testemunhas o testador, subentende-se que êle, oficial público, o conheça e, se não era o próprio, mentiu o oficial público: em tudo que êle certificou, afirmou, implicitamente, ser o próprio. Declarada a nulidade, por não ter sido o próprio, responde, criminalmente, o oficial público. As testemunhas devem ouvir e ver. Não basta que ouçam. Não basta que vejam. Hão de ter os sentidos. In conspectu testatoris: coram testatore, sub praesentia ipsius testatoris. O testador pode ser cego: as testemunhas, não. In conspectu testatoris não quer dizer que as veja o testador, porém que as testemunhas o vejam, que estejam todos presentes. J . C. K O C H tentou provar o contrário, porém sem êxito. O cego testa e já testava. Mas cegos não podiam ser testemunhas em testamentos. ¿Como reconhecer e identificar o testador? Restava a questão do testamento oral. Os doutos dos séculos passados muito a discutiam: H U G O D O N E L O , A. V I N N I U S , J O H A N N VOET, R . BACHOVIUS, WISSENBACH, A L B . D I E T R . TREKELL, S . L . B . COCCEIUS, J .

C.

{Progr. de conspectu testatoris ad. L. 9 C , de testam., 4 ) e C. F contra êles, EDUARD H E N R Y S O N e R I T T E R S H U S E N , depois, D . W MATTHIÃ {Dissertatio de testimonio coeci et surdi in testamento, cp. II), CA. LAURJCH (Dissertatio de coeco idoneo in testamentifactione teste, 2 s.) e G . K . L E H R {Ueher die Frage: ob ein Blinder bey Testamenten Zeuge seyn KOCH

WALCH;

konne, 3 s.). Havia os que reputavam válido o testamento oral feito perante testemunhas cegas e os que entravam em considerações de totalidade ou não. Podia ser que outrem fôsse quem declarava, imitando a voz do testador: experentia enim abunde docet alterius orationem ita ab alio exprimi posse, lit differentia vix ulla apparent (PETER M Ü L L E R ) . 3 . PRECAUÇÃO METODOLÓGICA PARA A INTERPRETAÇÃO DO TEXTO

- Se ajustarmos os arts. 1 . 6 5 0 , 1 . 7 1 9 e 1 . 7 2 0 do Código Civil, concluiremos que a lei civil não pôs no mesmo pé todas as nulidades que possam advir da incapacidade das testemunhas. Certo, as incapacidades do art. 1 . 6 5 0 , 1 - I I I , são absolutas, isto é, viciam o testamento, a cédula, em sua integridade de ato. Não se dá o mesmo quanto as do art. 1 . 6 5 0 , I V e V, porquanto, em relação a êstes, a lei providenciou quanto à sanção: no art. 1 . 7 2 0 , considerou nulas as disposições. Na parte geral do Código Civil, o sistema que se implantou foi o da nulidade parcial não invalidante da parte sã, se esta fôr separável (art. 153). Mais ainda: no art. 130, estatui-se que o ato valerá se a sanção fôr diferente. Quer dizer: se a lei fôsse omissa, a preterição do que se diz no art. 1.650 seria a nulidade (o que se dá em relação ao art. 1.650,1-IU), porém, havendo sanção diferente contra a preterição da forma exigida, esta, e não a nulidade, é a conseqüência da eiva ex hypothesi existente. LEGAL.

Por método, distingamos: a) nulidade absoluta, por incapacidade absoluta das testemunhas; h) nulidade da disposição, por aplicável a sanção do art. 1.720 e, em virtude do art. 130, somente ela. Isto posto, lancemos entre as regras jurídicas do artigo 1.650,1-III, e do art. 1 . 6 5 0 , IV eV, linha divisória que nos sirva de advertência na análise da lei. - Temos de cogitar dos menores de dezesseis anos, dos loucos e dos que, por defeito físico, não podem ser testemunhas instrumentarias. A imperfeição da lei vai ressaltar, reduzindo a bem pouco o seu valor como iniciativa da regra jurídica. É flagrante exemplo de regra jurídica escrita impensada. 4 . INCAPACIDADE ABSOLUTA DAS TESTEMUNHAS.

5 . INSTRUMENTARIEDADE DAS TESTEMUNHAS E TESTEMUNHO PROBA-

- No direito de hoje, devemos eliminar questiúnculas relativas à rogatio das testemunhas. Aliás, o que se pretendia dizer era o seguinte: há testemunhas que atestam (exemplo: os transeuntes testemunham o crime a

TÓRIO.

que, de passagem, assistiram) e testemunhas rogadas, testes rogati, que se convocam para figurar em certo ato, e testemunhar os fatos (testemunho de atestação) e as solenidades. Estas são parte á^ forma. Houve tempo em que foram partes do próprio ato jurídico; depois, vieram a ser instrumentárias, sem deixarem de pertencer ao todo solene do testamento. Por isto, têm de assistir desde todo o comêço do ato até final; não precisam ser chamadas, ou mandadas chamar. Hão de ser voluntárias, isto é, querer ou aceitar a participação na solenidade. Não seria testemunha instrumentária quem o não tivesse querido, pois precisa assistir e assinar. É neste sentido que se diz não poderem ser simplesmente testemunhas acidentais. Mas, se passava no momento, podia atender ao moribundo. As velhas fórmulas de redação já se não fazem, nem são de mister. Se ocorrer que alguma pessoa tenha assistido ao ato sem figurar no texto como testemunha, não pode do meio para o fim ser tida como tal, se bem que a tudo tenha assistido; nem substituir alguma que faleça no ato ou tenha de ausentar-se. Tal pessoa estranha e presente é testemunha daquela espécie, a que antes aludimos: acidental, voluntária ou não, que somente testemunham de atestação, e não de solenidade. Por isso mesmo, as exigências do Código Civil, art. 1.650, não concernem a estas. Se é certo que "os loucos de todo gênero" não podem ser testemunhas de atestação (art. 142) ou instrumentárias dos testamentos (art. 1.650, II), não se dá o mesmo com os cegos. Menores de dezesseis anos (arts. 142, IH, e 1.650,1) nem servem para uma nem para outra missão. Igualmente, os loucos (arts. 142,1, e 1.650, II). Indistintamente, os cegos não podem figurar nos testamentos como testemunhas instrumentárias (o caso do art. 1.663 será, ao seu tempo, discutido), pois assim o estabelece o art. 1.650, IH. Porém, na ação de nuhdade, podem ser dadas como testemunhas e ser inquiridas pessoas cegas que ouviram (e pessoas surdas ou que não sabem assinar, mas que viram e puderem depor, por escrito aquelas, oralmente estas). Resultado do artigo 142, E, que estatui não poderem ser admitidos como testemunhas "os cegos e os surdos, quando a ciência do fato, que se quer provar, dependa dos sentidos, que lhes faltam". Também há discordância entre o art. 1.650, IV e V, e o art. 142, por se não mencionarem, neste, como incapazes, o herdeiro instituído, seus ascendentes e descendentes, irmãos e cônjuge, e os legatários, e sim, em geral, o mteressado no objeto do litígio, bem como o ascendente e o descendente, ou o colateral, até o terceiro grau de alguma das partes, por consagüinidade

ou afinidade (art. 142, IV), e os cônjuges (artigo 142, V). Aliás, as incapacidades do art. 1.650, IV e V, são relativas. Por onde se vê que os herdeiros legítimos não contemplados no testamento podem ser testemunhas instmmentárias. Não no sendo, se ocorrer ação de nulidade, será interessado no objeto do litígio; portanto, inadmissível como testemunha de atestaçao (art. 142, IV). Nao só êle: o seu ascendente ou descendente, ou o colateral até o terceiro grau. por consangüinidade ou afinidade, bem como o cônjuge. Dar-se-á o mesmo quanto à pessoa que não é herdeiro legítimo, porém que, nulo o testamento, seria beneficiado por outro anterior. Ê interessado no objeto do litígio. Surge situação curiosa quando, tendo figurado, em testamento, como testemunha, um dos herdeiros legítimos, a questão versa sobre a capacidade do testador. Aí, a testemunha pode sustentar os fatos e solenidades a que assistiu, sem que haja discordância quanto ao possivelmente julgado em relação à capacidade, assunto técnico, que as testemunhas não podem atestar. Em todo o caso, na discussão disto, seria interessado no litígio, e nenhum, por força do art. 142, IV, o seu testemunho. De tal herdeiro só uma atestação fica: a que resulta da sua posição como testemunha testamentária. Dizer que o cego não pode ser testemunha instrumentaria dos testamentos não vale dizer que o seu testemunho seja nenhum. No art. 1.650, a exclusão é completa; porém no artigo 142, ü , não no é: o cego pode ser testemunha do que ouviu, como o surdo-mudo, que pode exprimir-se por sua linguagem (art. 5, IE), pode testemunhar o que viu (art. 142,11). No direito suíço, a lei não cogitou do cego. Mas é princípio geral de direito que são incapazes de testemunhar todos aquêles a que falta sentido que impossibilite a função testemunhante. Por isso, a doutrina inclui o cego. 6 . SURDOS E MUDOS, E STJUDOS-MUTIOS. - Neque furiosas, neque mutus, neque surdus, possunt in numero testium adhiberi. Tal o que está nas Institutas. A lei brasileira só exclui os surdos-mudos. No Projeto primitivo, art. 1.818, falava-se de mudos e surdos. No Projeto revisto, art. 1.990, de mudos e surdos. Sucederam a redação que se lhe deu na Câmara dos Deputados (Trabalhos, Vn, 203), onde ainda se lia mudos e surdos, e a da comissão de redação (Trabalhos, VIU, 241), onde, pela primeira vez, se substituiu por hífen a copulativa e. No Código Civil francês, no Código Civil italiano e no Código Civil alemão, tais questões ficaram às regras jurídicas gerais s o b r e testemunhas, CLÓVIS BEVILÁQUA (Código Civil comentado, VI, 105) entendia que eram

escusadas as regras jurídicas do art. 1.650,1-in, à vista do que fôra dito no art. 142. Mas a verdade é que as regras jurídicas não coincidem: no seu propósito de uniformidade, e de simetria, em vez de atender ao art. 142, a respeito dos surdos e dos mudos no testemunho testamentario, o Código Civil ajustou o art. 1.650 ao que se estatui no art. 5, referente à incapacidade absoluta. Mudos e surdos, talvez quisesse, por apego à errada tradição, dizer; e disse surdos-mudos. Interpretação superficial tiraria que mudos ou surdos não estão proibidos de figurar nos testamentos como testemunhas. Ora, quem proíbe ao cego, porque não vê, proíbe ao surdo, porque não ouve. Quanto ao mudo, não se deve, hoje, negar-lhe a capacidade de ser testemunha instrumentária: nos testamentos contemporâneos, a testemunha não tem de falar. Tem de ver e de ouvir. O mudo vê e ouve. Se o surdo-mudo, que pode exprimir-se, é capaz de exercer direito (art. 5, IH), porém não pode ser testemunha testamentária, não é porque seja suxdo-mudo, e sim porque é surdo. Por ser surdo, não pode testemunhar o que depende do ouvido. O legislador brasileiro foi assaz desalento, e o art. 1.650, HE, contém, evidentemente, uma das suas muitas incorreções. A questão da mudez não interessa, hoje, à capacidade para ser testemunha testamentária, mas sim ao exercício das formas de testar: constitui, pois, qualidade subjetiva do testador, e não das testemunhas. Nas Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 85, pr., lia-se: "nem pode ser testemunha o fiirioso, nem o mudo e surdo, nem o cego". Mas ANTÔNIO JOAQUIM DE GOUVEIA PINTO (Tratado regular e prático de Testamentos e Sucessões, 103), como o Repertório das Ordenações e Leis do Reino de Portugal (rV, 419), entendia tratar-se de furioso, surdo, mudo, cego, e não surdo-mudo. Assim, TEIXEIRA DE FREITAS {Consolidação, artigo 1.063, § 3, e Tratado de Testamentos e Sucessões, 112) distinguia duas classes: mudos e surdos, porque era o que se achava na lei. O velho êrro do direito lusitano, que equiparava a mudez da testemunha à mudez do testador, persiste, agravado pelo hífen, no Código Civil, art. 1.650, IH. A pessoa completamente surda pode ser testemunha no testamento particular. A lei cogitou de surdos-mudos e de cegos (art. 1.650, IH), e não de surdos. Se o surdo não sabe ler, tollitur quaestio: não pode conhecer o conteúdo do testamento público ou do particular, nem de ouvido, nem pela leitura; nem ouvir o que o oficial público pergunta, ou o que o testador

declara, ao entregar o testamento cerrado (art. 1.638, V), nem ler o que o testador teria de escrever no caso do art. 1.642. Se o surdo sabe ler, pode conhecer a redação do art. 1.632,1, porém não poderia atestar as declarações do testador. No testamento particular, se viu escrever, e leu, então não está êle inibido. É verdade que o art. 1.645, m , manda que seja lido perante as testemunhas. Porém seria excesso de apêgo à letra. No cerrado, teria de ouvir as declarações do testador ao entregar à aprovação e ouvir a leitura do auto. No direito escrito suíço, nada se disse quanto aos surdos. Quanto a êles e aos surdos-mudos, a doutrina entendeu, acertadamente, que não há incapacidade a priori: se pode, por algum modo, certificar-se da identidade do testador e da veracidade do testamento escrito, não lhe é vedado ser testemunha. ¿Quais são os incapazes, pelo Código Civil, art. 1.650, III, de figurar como testemunhas testamentárias? A lei, reduzida a iniciativa da regra jurídica, pelos seus defeitos, perdeu a respeitabilidade ordinária. ¿Qual o juiz que aceitaria testamentos cujas testemunhas fossem surdas? Nenhum. E a lei não os fêz incapazes. ¿Qual o juiz que reputaria nulo o testamento em que figurassem mudos como testemunhas, se êles pudessem, pela escrita, ou pela linguagem deles, prestar o testemunho do que ouviram ler? Nenhum. ¿Qual o juiz que julgaria nulo o testamento cujas testemunhas, surdas-mudas, leram o instrumento, que o testador escreveu à vista delas, ou o oficial público, uno actu, lavrou? Nenhum. Para os nossos dias, o art. 1.650 é defeituoso. Melhor fora não existisse. Aqui, os dados da vida prefixam, precisamente, a regra jurídica. Nem por falta de texto, que o proibisse, deixariam os cegos de ser incapazes. Melhor proceder teve o Código Civü alemão: que a doutrina formule a regra jurídica. Aqui, ou alhures, se é preciso ouvir, surdo não pode testemunhar; se é preciso ver - e isto é indispensável, pela exigência de identificação - cego não pode ser testemunha (F. ENDEMANN, Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, HI, 300). Quanto ao mudo, ¿por que excluí-lo? Mudo vê, mudo ouve: mudo, talvez, possa atestar (exigência probatória) e figurar, assinando (exigência instrumental). O surdo-mudo, a que a lei se refere, é o que não pode exprimir, nem ler: quem lê, lera; quem lê, e sabe escrever assina e pode depor, pois tudo viu, leu (vale o mesmo que ouvir, se testamento hológrafo). Pode, pois, ser

testemunha nos casos de holografia. Não precisa ouvir o que está escrito, se êle mesmo leu. Mas está excluído dos testamentos públicos e cerrados, por ser surdo. A lei civil, por inadvertência, omitiu os que não sabem ou não podem assinar. O art. 1.650,1-III, do Código Civü refere-se a menores de dezesseis anos, a loucos de todo o gênero e aos que, por defeito de vista ou de ouvido, não podem ser testemunhas. Mas não se referiu ao que não sabe assinar. Todavia, em virtude da letra da própria lei, só o que pode assinar figura, como testemunha, no testamento público (art. 1.632, IV), no cerrado (art. 1.638, IX) e no particular (art. 1.645, IH). Nos próprios testamentos especiais: marítimo (art. 1.657, § 2.°) e militar (art. 1.660). Somente no caso do art. 1.663. inteiramente excepcional, fôra de discutix-se a possibilidade. Mas o que não sabe ou não pode assinar não fica inibido de depor como testemunha de fatos (o art. 142 não os exclui, nem os poderia excluir). 7. ANALFABETO E INCAPACIDADE EUREMÁTICA. - A l é m d o s c a s o s

do Código Civil, art. 1.650, não podem ser testemunhas testamentárias os analfabetos: no testamento público, porque precisa ser assinado por elas (art. 1.632, IV); no cerrado e no particular, pelo mesmo motivo (arts. 1.638, IX, e 1.645, IH); bem assim no marítimo (art. 1.657). Só há um caso de testamento em que o analfabeto pode ser testemunha: o militar nuncupativo (art. 1.663). Resta uma questão: ¿se a testemunha (somos levados ao "cortar de cabelo em quatro", criado pelo Código Civil, artigos 1.638, m , e 1.641, em caso inverso) sabe assinar e não sabe ler. ¿Pode figurar no testamento cerrado? Seria admissível, porque é testemunha de/ato, e não de escrita (art. 1.638, IV-VI); mas, ainda neste caso, é preciso que se lhe leia o auto de aprovação (art. 1.638, IX). Não pode assinar a rôgo do testador: somente assina a rôgo quem sabe ler. De qualquer maneira, a testemunha que não sabe ler seria fraquíssima prova de leitura. Nos testamentos públicos, o oficial público não as deve admitir. Nos particulares, deve evitá-las o testador. Seria assaz precário o valor probante do seu testemunho sôbre as disposições. Mas aqui (tratando-se de testamento hológrafo), como em todos os outros casos, as circunstâncias têm de ser levadas em conta. Pode haver no lugar e em momento urgente quem não saiba ler e no entanto saiba assinar. No direito alemão exige-se, no processo verbal do testamento público, presença e assinatara das testemunhas (Código Civil alemão, § 2.242), mas

pode ser Ú: rogo (F. RITGEN, em G. PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, V, 460), ou pela marca de que trata o § 116 {Motive, V, 273 s.; A. WEISSLER', Das deutsche Nachlassverfahren, 146). No direito suíço, a lei, falando dos incapazes de testemunhar nos testamentos, incluiu os que não sabem ler nem escrever (art. 503). A despeito da redação, que parece afirmar que só sejam incapazes os que não sabem ler nem escrever (¡ficariam a salvo os que sabem ler e não sabem ou não podem escrever, e os que sabem escrever e não sabem ou não podem ler!) e da opinião de EUGÈNE CURTI-FORRER (Commentaire du Code Civil suisse, 398), a boa sustentação é a de P TUOR (Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, m , 317). 8. ESCREVENTES E EMPREGADOS DOS CARTÓRIOS. - P o d e m ser teste-

munhas, ainda que em testamentos públicos. Mas, em verdade, ficam diminuídas - pela função - no caso de surgir ação de nulidade. Fôra melhor tê-los excluído da capacidade de ser testemunhas. Os funcionários dos cartórios podem ser testemunhas nos testamentos que lá se lavrem, ou forem entregues para cerramento, ou para publicação. O art. 1.650 do Código Civil de modo nenhum os apanha (cf. 3." Câmara Civil da Côrte de Apelação de São Paulo, 11 de dezembro de 1936; 1." Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 21 de março de 1950, R.dosT., 105, 674, e 186, 763). Também os testamenteiros ou inventariantes podem ser testemunhas (3.=^ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 30 de outubro de 1946, R. dos T., 165, 680). Nos países, em que os empregados podem escrever, pelos oficiais, os testamentos, cria-se séria questão: se a estes empregados são aplicáveis disposições da natureza do Código Civil, arts. 1.719 e 1.720. Ter-se-á, então, de cindir o problema: exaçítgzáo-instrumento e QTOçr&gaào-substituto do oficial público. Dá-se isto, por exemplo, a respeito dos arts. 501 e 503 do Código Civil suíço {Protokolle, 602; A. ESCHER, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch, m , 86). No Código Civil alemão, §§ 2.234-2.237, as disposições apanham não só os escreventes Como também (§ 2.237,4) os que são empregados do juiz ou do notário instrumentante. (Instrumentante, aí, é o notario, e não o^empregado: o § 2.237,4, apanha quaisquer empregados, domésticos ou não).

P a n o r a m a atual p e l o s A t u a l i z a d o r e s §5.901. A - L e g i s l a ç ã o Inexistente na legislação atuai regra que disponha sobre as testemunhas instrumentárias do testamento, aplica-se a regra comum do art. 228 do CC/2002 sobre quem não pode ser testemunha presencial ou instrumentária, no que couber. § 5.901. B - D o u t r i n a 1. Diferentemente das testemunhas presenciais, ou de fatos percebidos, as testemunhas instrumentárias atuam voluntariamente na comprovação dos atos jurídicos, não tendo o dever de presenciar e assinar tais atos. As testemunhas instrumentárias, no entanto, têm o dever de servir como testemunhas processuais, se arroladas em juízo, para confirmarem o que viram ou assinaram. 2. Certas pessoas não podem ser testemunhas: menores de dezesseis anos, os enfermos mentais, os cegos e surdos quanto a fatos que dependam dos sentidos que lhes faltam, os amigos e inimigos, os cônjuges, companheiros e parentes até terceiro grau colateral. O Código Civil de 2002 não mais traz as hjpóteses em que é possível a admissão dessas pessoas como testemunhas, pois adota cláusula gerai nessa direção, segundo o convencimento do juiz; "Para a prova de fatos que só elas conheçam". O impedimento para essas pessoas serem testemunhas abre-se em importante exceção, ou mitigação em favor da verdada. Restou, pois, revogado o art. 405 do CPC, que restringia o alcance da admissibilidade às hipóteses nele previstas e classificava as testemunhas em incapazes, impedidas e suspeitas. 2. Não há impedimento de o cego ser testemunha Instrumental, se sabe assinar o nome, pois não lhe falta o sentido da audição, tendo em vista que a lei não exige a leitura pessoal do testamento público ou particular, mas que estes sejam lidos para audição das testemunhas. Quanto ao testamento cerrado, a testemunha é apenas de apresentação e para ouvir o auto de aprovação. 3. Igualmente, o mudo não está impedido de figurar como testemunha testamentária, pois pode ouvir e assinar. 4. Entre os impedidos estão os parentes colaterais até o terceiro grau. No parentesco consanguíneo ou socioafetivo (resultante de adoção, posse de estado de filiação e de inseminação artificial heteróloga), estão incluídos os tios e sobrinhos. Porém, o art. 228 do CC/2002 estende o impedimento para os colaterais "por consanguinidade, ou afinidade". A regra geral é de o parentesco colateral por afinidade se esgotar no segundo grau (cunhados), mas nada impede de a lei, contemplando os hábitos da população de estreita relação entre os parentes por afinidade, amplie esse específico parentesco para alcançar os tios e sobrinhos do cônjuge ou companheiro no âmbito da vedação de serem testemunhas.

§ 5.902. INCAPACIDADE RELATIVA ÀS LIGAÇÕES DE HERDEIROS E LEGATÁRIOS E PESSOAS A ÊLES LIGADAS

1. LIGAÇÕES. - O art. 130 do Código Civil é de sérias conseqüências na inteq)retação do art. 1 . 6 5 0 . Não se pode decretar a nulidade do ato quando, por preterição da formalidade exigida, deu a lei sanção diferente. O oficial público, diante do art. 1.650, não deve lacrar o ato com as testemunhas a que se refere o art. 1.650, IV e V. Mas, se lavrar, só por isto não será nulo o testamento: nula será a disposição (art. 1.720). Foi a sanção que a lei fixou. Demais, tal é o direito contemporâneo: o concurso da pessoa proibida só tem o efeito de tomar nula a liberalidade a que se liga. Cp. Código Civil alemão, § 2.235, alínea 2.^ As espécies do art. 1.650, IV e V, do Código Civil (Código Civil alemão, § 2.235) são essencialmente diferentes das que se mencionam no art. 1.650, I-DI (Código Civil alemão, § 2.237). Como teremos de ver, a enumeração do art. 1.650, IV e V, é incompleta (como o foi a do art. 1.650,1-III): o próprio Código Civil, arts. 1.720 e 1.719, se choca com o art. 1.650 No Código Civil, art. 1.650, IV e V. veda-se ao herdeiro instituído, seus ascendentes e descendentes, irmãos e cônjuge, bem como aos legatários, serem testemunhas no testamento. Discute-se se tais pessoas podem assinar, arôgo, o testamento, se não são testemunhas testamentárias, e sim extratestamentárias, isto é, pessoas presentes a mais. A resposta foi firmada em interpretação que déramos {Tratado dos Testamentos, 11, 253). Se quem assinou a rôgo não era uma das testemunhas instrumentárias, não há nulidade pelo fato de ser herdeira instituída, descendente ou ascendente, irmão ou cônjuge do herdeiro instituído. Acrescentemos: o legatário, que não é testemunha, pode assinar a rôgo. O art. 1.650, IV e V, só se refere a testemunhas instrumentárias (cf. Supremo Tribunal Federal, 3 de janeiro de 1950, D. da J. de 25 de novembro de 1951). ¿Os herdeiros instituídos a que se refere o art. 1.650, IV, são apenas os diretos? Herdeiros instituídos que não podem ser testemunhas são os plenos proprietários, os nus-proprietários e os usufrutuários. Resta saber se também os fideicomissários. No direito romano, se heres primus ou heres substitutus, universal ou ex parte, não havia questão (F. C. HARPPRECHT, Disputatio de testimonio testamentario heredi interdicto, §§ 10 e 13).

Mas os fideicomissários, como os legatários, eram excluídos da proibição (F. C. H A R P P R E C H T , Disputatio de testimonio testamentario legatariis permisso, 1 s.; E . VON LÕHR, Kurze Bemerkungen aus dem Gebiete des Erbrechts, Archiv für die civilistische Praxis, 11, 189-191). Nas Instimtas, %n,de testamentis ordinandis, 2, 10, escreveu-se: "Legatariis autem et fideicommissariis, quia non iuris successores sunt, et aliis personis eis coniunctis testimonium non denegamus, immo in quadam nostra constitutione et hoc specialiter concessimus, et multo magis his, qui in eorum potestate sunt, vel qui eos habent in potestate, huiusmodi licentiam damus". A constituição não está no Codex. Talvez falte (KARL WITTE, Leges restitutae des Justiniauischen Codex, 199). Mas, antes de Justiniano, já existia a exceção (L. 14, D., de rebus dubiis, 34, 5). Alguns velhos praxistas e comentadores distinguiam (e bem) o fideicomisso singular e o universal. Ss. fideicomissarius universalis, não podia ser testemunha no testamento. Se singularis, não lhe era vedado (A. FÁBER, De Erroribus pragmaticorum et Interpretatione iuris, d. 66, error 5; C. CANTIUNCULA, Paraphras. in tres prior. Institution, civil, libros, 347). Tal separação, que se vê em A. ViNius, H. HAHN, STRAUCH, BACHOVIUS e CHR. GIL. HAUBOLD, se simetriza com a distinção romana de herdeiro e legatário. Mas teve opositores fortes, e.g., F . C . ÍIARPPRECHT {Disputatio de testimonio testamentario fideicommissarii, t. 15-20), em dissertação especial. Também, em parte, com razão; porque, se a distinção era justa, aqueles entendiam que ofideicommissarius singularis não era iuris successor Em suma: mistura de conceitos romanos e modernos. Hoje, seja legado ou herança, o fideicomissário não pode ser testemunha. Mas, se o fideicomisso é legado, os parentes e cônjuges, se figurarem como testemunhas, não fazem nulo o testamento. Ainda sendo herança, se o beneficiado como fideicomissário é pessoa incerta, porque, então, seriam excluídos do testemunho todos os parentes das pessoas possíveis.

2. PARENTES EM LINHA RETA, IRMÃOS E CÔNJUGE DO HERDEIRO. - N a

proibição do Código Civil, art. 1.650, IV, operou-se mudança de conteúdo em relação ao direito romano. Nêle, o fundamento era o poder político-jurídico do paterfamilias, se testemunha, se pai da testemunha, ou se testemunha e herdeko estavam sob a patria potestas; hoje, o fundamento é econômico afetivo (ascendentes, descendentes, irmãos e cônjuges). Devido a tal diferença, temos:

a) No velho direito, o parentesco, só por si, não operava: não tomava incapaz a testemunha; a relação de pátrio poder, horizontal ou vertical sim. Cp. H . F . OTTO (Tractatus de testimonio fraterno testamentario contra communem doctonim opinionem, s. Ill), contra a opinião dominante. b) No direito de hoje, opera: o irmão do herdeiro, só por ser herdeiro é incapaz. Não se cogita de pátrio poder: o conteúdo é econômico afetivo. (Por isso mesmo, é lamentável ler-se em FERREIRA ALVES, Manual, 19, 136, que as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 85, § 1.°, foram a fonte do art. 1.650, IV.) 3. HERDEIROS LEGÍTIMOS, HERDEIROS INSTITUÍDOS E LEGATÁRIOS,

TESTEMUNHAS NOUTRA CÉDULA. - É velha a proibição de ser testemunha

o herdeiro inscrito. Qui testamento here instituitur, in eodem testamento testis esse non potest. Mas é permitido pelo Código Civü: a) Que os legítimos, não beneficiados testamentàriamente, sejam testemunhas, a) ainda que nos testamentos lhes gravem as legítimas, de acordo com o art. 1.723, porque a clausulação, por si só, não os tomaria suspeitos, b) ou se o testador - mantida a igualdade dos que recebem por lei - procede à distribuição, dentro das legítimas, de todos os seus bens (até a metade do monte), ou de alguns. b) Que a testemunha do testamento seja contemplada no outro testamento, em que não figure, ou em codicilo. No art. 1.650, V, não há incorreção, mas lacuna. No Hvro Fontes e Evolução (441), não argüimos de êrro o art. 1.650, V, mas de lacuna. Lacuna, porque se não previu a presença de descendentes, ou ascendentes, irmão ou cônjuge do legatario. Porém daí a aprovarmos a crítica de CLÓVIS BEVILÁQUA longa distância haveria: para êle {Código Civil comentado, VI, 105), se não pusermos os legatários no mesmo pé que os herdeiros, isto é, se não considerarmos incapazes de ser testemunhas instrumentárias a legatários, ascendentes, descendentes, irmãos e cônjuges, atribuiremos "à lei feia mácula de uma grosseira inconseqüência" Entendia que, ainda no silêncio da lei, são incapazes. Ora, ¿a sanção seria a nulidade? Mas ¿nulidade do testamento, por uma testemunha ser defeituosa em relação a um legado? Seria injustiça. Se o legado fôsse nulo, vá. Mas o testamento, não. Compreende-se que o torne nulo a mcapacidade do legatário testemunha: figura no texto. Mas nem

isso está na lei. O conteúdo é bem diferente. Basta que se leiam os artigos 1 719 e 1.720, onde a sanção, por haver herdeiro instituído ou legatário que é testemunha, não é a da nulidade do ato, mas, parcialmente, a da disposição. Ora, se a lei fixa sanção diferente da sanção de nulidade do ato, não se podem aplicar duas sanções, nem se há de preferir a sanção maior, não expressa na lei, à sanção menor claramente escrita no texto legal. No redigir-se o art. 1.650, V, houve lacuna, e não erro, - lacuna que o art. 1.720 enche: lá se diz que se reputam pessoas interpostas o pai, a mãe, os descendentes e o cônjuge do incapaz, o que quase eqüivale ao art. 1.650, IV (ascendentes, descendentes, irmãos e cônjuges). A diferença fica em avós, bisavós, etc, e irmãos. ¿É justo equiparar-se em tudo o legatário ao herdeiro? No direito romano, os legatários não eram excluídos da capacidade de ser testemunhas. Os herdeiros, sim. Os herdeiros e as mais pessoas a êle ligadas pela patria potestas: o pater, o de quem êle é pater, ou o com quem se acha em pátrio poder de outrem. A lei brasileira acrescentou os "legatários". Mas ¿invalidar o testamento - pelo só acidente de nêle figurar, por exemplo, o irmão de um legatário - é coisa que se compadeça com o favor testamentil Não. E ao direito contemporâneo repugnaria, como repugnaria aos antigos sistemas jurídicos. 4 . HERDEIRO INSTITUÍDO, AINDA Q U E " E X CERTA RE". - Em outras questões, que animavam as disposições dos séculos XVI e XVn, o Código Civil, art. 1 . 6 5 0 , V , veio resolver a da incapacidade da testemunha que é heres e re certa scriptus. Antes pela consideração de não ser co-herdeiro do monte, mas herdeiro de coisa certa, entendiam alguns, como P E T E R M U L L E R , em G . A. S T R U V E {Syntagma iurisprudentiae, ex. 3 2 , 6 5 7 ) e F . C. HARPPRECHT [Disputationes academicae, 1 , 1 5 4 8 s.), que - sendo como legatário, a legatário devia assimilar-se. ¿E o ius accrescendi de tôda a herança? ¿E as dúvidas da herança? Melhor opinião era dos que consideravam iuris successor ( H U G O D O N E L O , Commentarii de iure civili, VI, 3 9 0 ; J- VOLKMANN, Dissertatio de heredibus e re certa scriptis, § 1 5 ) .

Seja como fôr, o Código Civil elidiu, em parte, a questão. Mas só em parte. Porque há diferença quanto a parentes e cônjuges, no art. 1.650, IV e V, combinado com o art. 1.720.

O herdeiro ex re certa herdeiro é, e não legatário. Se tem ius accrescendi de toda a herança, nenhuma dúvida fica quanto a ser herdeiro, e observar-se-á o inciso IV, e não o V. 5. LEGATÁRIO NÃO PODE SER TESTEMUNHA EM TESTAMENTO. - C o m a

proibição do Código Civil, art. 1.650, V, vence a velha opinião de A. FÁBER {De Erroribus pragmaticorum et Interpretatione iuris, d. 66. error 3), que era só, combatida, nos séculos passados. No célebre tratado De Erroribus pragmaticorum, sustentava que, após a Novela I, c. 1, legatários não podiam ser testemunhas no testamento. Porque podiam ser iuris successores, no caso da Novela. O argumento contra A. FABBR era o seguinte: no caso de virem a ser, segundo a Novela, iuris successores, não no eram ex testamento, como os heredes scriptis e substituti, mas ex singiulari legis dispositione (F. C. HARPPRECHT, Disputationes

academicae,

I, 1479 s.; E. CHR. WESTPHAL,

Theorie des rõmischen Rechts van Testamenten, § 197). Com a proibição de ser testemunha o legatário, o Código Civil francês, art. 975, o espanhol, art. 682, o argentino, artigo 3.740, e o alemão, § 2.235. 6. DESQUITADO, HERDEIRO INSTITUÍDO OU LEGATÁRIO E CÔNJUGE. -

¿Pode o desquitado ser testemunha no testamento em que seja contemplado o outro cônjuge? O Código Civil, arts. 1.650, IV, 1.719,1, e 1.720, é omisso. Só se refere a cônjuge, sem distinguir. O Código Civil alemão, §§ 2.234-2.236, foi expHcito: cônjuge, "auch wenn die Ehe nicht mehr besteht" também se o casamento já não existir. O Código Civil suíço, art. 503, disse apenas "cônjuges". É, precisamente, o caso do Brasil. Ou, melhor, seria o mesmo se o sistema jurídico brasileiro tivesse o divórcio. Comentando o art. 503, os juristas suíços entendem que se trata do cônjuge enquanto exista o casamento: o divorciado e o cônjuge de casamento declarado nulo podem concorrer como oficial público ou como testemunha. Não temos, sobre isso, nenhuma dúvida. Também no Brasil, nulo o casamento, o cônjuge pode ser testemunha. Na ausência de lei, é de admitir-se: as concubinas e os amantes não são incapazes de testemunhar, instrumentàriamente, nos testamentos. Compreende-se o alcance do Código Civil alemão e louva-se. Tanto assim que, antes de declarar-se nulo o casamento, a fortiori de decretar-se a anulação se o casado serve de testemunha, vicia o ato, tomando-o nulo.

No caso de desquite, continua de haver cônjuge. Não há comunhão de bens, nem expectativa próxima de comunicação de bens herdados. Porém a faculdade de se restaurar tal regime, ou a sociedade conjugal, comunicadora de interêsses, quando não haja comunhão de bens, deve tomar relativamente incapaz o cônjuge. A presunção legal de interposta pessoa impõe-se ao juiz. Aliás, no caso de casamento declarado nulo, se não há, na espécie, presunção legal de interposição (art. 1.720), não fica excluída a possibilidade de ser anulada a disposição, por se tratar de interposta pessoa. Cresce de ponto tal presunção facti, quando do casamento nulo existem filhos. Conforme várias vêzes teremos de dizer, a 2." alínea do art. 1.720 estabelece a sanção legal, e a alínea l."* permite a anulação por interposição de pessoa, quando isso se prove, caso em que serão meios de prova as presunções de fato. Portanto, a diferença que divide os três Códigos Civis, alemão, suíço e brasileiro, está em que o primeiro elevou à categoria de praesumptio iuris et de iure o que, para os outros, constitui praesumptio facti. Noutros termos, o que faria anulável, faz, por força de lei, nulo. Pràticamente, no direito brasileiro se o beneficiado é cônjuge, e não foi anulado o casamento ao tempo em que o consorte figurou como testemunha, ou não foi decretada nulidade em tal tempo, ou, num e noutro caso, se foi proclamada a putatividade quanto a ambos ou quanto a um só, - basta que se peça, no juízo dos testamentos, a decretação da nulidade. Tal o efeito da sanção legal: Nos demais casos, ter-se-á de provar a interposição e dependerá de ação a decisão que invalide as disposições. As vêzes ocorre que desquitado brasileiro continua, pela lei brasileira, ligado a estrangeiro, que, por sua lei pessoal, se casou com outrem. Se fôr testemunha o cônjuge recasado no testamento em que se beneficie o desquitado Brasileiro, não deve o juiz considerar nula a disposição: desapareceu qualquer vestígio do fundamento econônúco-afetivo. Se a testemunha foi o Brasileiro desquitado e beneficiado o consorte estrangeiro recasado, impõe-se igual solução: não há a expectativa de ligação econômico-afetiva. Se bem que perdure (pelas amarras religioso-jurídicas do direito brasileiro, ponto inerte entre o mundo europeu e o americano), o vínculo conjugal. Mas sempre é possível a prova da interposição, quaisquer que sejam as pessoas escapas à presunção legal.

7 . TESTEMUNHAS TESTAMENTÁRIAS: TUTORES E TESTAMENTEIROS. -

¿Os testamenteiros e tutores podem ser testemunhas nos testamentos, se por outra causa (legado que não seja remuneratorio das funções de testamenteiro) não forem incapazes? Sim, responde FERREIRA ALVES {Manual do Código Civil Brasileiro, 19, 137). Quanto aos tutores, impõe-se a afirmativa. Quanto aos testamenteiros, há discordâncias, e a questão será discutida quando tratarmos da testamentária. Presunção legal de interposição, não há quanto a tutores ou testamenteiros; mas a interposição provada, esta se faz firme quanto a quaisquer pessoas. 8. NOIVADOS, AMIZADE ÍNTIMA, INIMIZADE CAPITAL. - O noivado não constitui impedimento às testemunhas, ainda em direito, como o alemão, que" consagra o instituto dos esponsais (F. R I T G E N , em G . PLANCK, Bürgerliches Gesetzbuch, V. 447). A amizade íntima e a inimizade capital não obstam a figurar como testemunha. Quiçá, defeito; não incapacidade. Trata-se de testemunha instrumentária e não probatória. 9. TESTAMENTO DO PAI DA Civil, art. 1 . 6 5 0 , deixou.

TESTEMUNHA.

- Há questões que o Código

Se, no testamento do pai, pode o filho menor de vinte e um anos e maior de dezesseis ser testemunha. Não se trata de testemunha acidental, mas instrumentária. Acidental, só para atestar, não poderia ser (art. 142, IV). Mas, quanto ao testemunho testamentário, não há, na lei, exclusão de ascendentes, descendentes, colaterais ou cônjuges dos testadores. Os parentes que se excluem são os dos herdeiros instituídos. Só êstes. Fica o argumento de se tratar de menor sob o pátrio poder do testador. Se no testamento fôr contemplado, a questão não se formula: na qualidade de herdeiro instituído, não pode ser testemunha instrumentária do testamento. Se o testador não dispõe a favor dêle, vale o testemunho: a lei ressalva a parte legítima, e o testador pode dispor livremente da outra. Só uma espécie é de molde a levantar discussão: se, no testamento, o pai deserda o filho testemunha. Dois aspectos: inexistência de pátrio poder ou exercício por outrem, que não o pai testador; exercício pelo pai.

Ali, há parentesco, aqui, parentesco e pátrio poder. Diz-se que aquele, só por si, não impede ( C . F . WALCH, Introductio in controversias iuris civilis, 268): pode o filho subscrever, confessar, concordar com a própria deserdação (L. 8, § 6, D., de bonorum possessione contra tabulas, 37,4). Assim, HUGO DOÍÍELO (Commentarii de iure civili, cp. 7, § 17), J. PACius (Analys. Institution. Tit. de testamentis ordinandis, § 9), E . BRONCHORST (ZuatucTípaüíüü, 2 9 2 ) e R . BACHOVIUS (Not.

et animadvers.

ad

TREUTLER, 540). A despeito de tais sustentadores, quem diz deserdação diz afirmativa de atos imorais (arts. 1.595-1.744). Tal testemunha probatória seria defeituosíssima. Testamentária (e aqui só esta é questão), participa de ato em que se lhe imputam torpezas. Nem a sua assinatura dispensa a prova do art. 1.743, nem fica posta de parte a incapacidade da testemunha por ocação. Se houver deserdação, e a testemunha fôr filho sob o pátrio poder, o seu testemunho não vale (J. J. WISSENBACH, Commentaria ad Instituí, lustin., 100). A torpeza, que se declara, foi reconhecida por pessoa subordinada ao interessado no ato. Tal testamento é, em si, ato nulo, por ilicitude: ofende aos bons costumes, ofende à dignidade humana, ofende à função, educativa e protetora, do pátrio poder. 10. PAI, TESTEMUNHA NO TESTAMENTO DO FELHO. - A l e i n ã o p r o í b e

que o filho teste e chame por testemunha o pai. Se êste é herdeiro instituído, ou alguém do Código Civil, artigo 1.650, IV, ou se é legatária a testemunha, nulo é o testamento. Mas, se o pai nenhum benefício para si tirou, não lhe é proibido ser testemunha no testamento do filho. Contra: RAEVARDUS, V. ZUICHEMUS {Comm. in Tit. Institutionum de tes-

tamentis ordinandis, ad § 9, L, 2, 10), J. PACIUS {Analys. Institution. Tit. de testamentis ordinandis, § 9), B. BRISSONIUS (Opus de Verborum, quae ad ius civile pertinent, significaüone, v. Domesticus). A favor: L. 20, § 2, D., qui testamentofacerepossuntetquemadmodum testamentafiant, 28,1, eA. ViNNnjs. Os outros juristas explicaram o texto como só referente ao testamento militar. A distinção do peculium castrense e dos outros bens não interessa, hoje, ao testamento. Não há nenhuma limitação quanto a objeto. O que dissemos sobre o testamento em que se deserda o filho vale para o em que se deserda o pai. A situação é a mesma.

P a n o r a m a atual p e l o s A t u a l i z a d o r e s § 5.902. B - Doutrina Não há mais, no direito brasileiro, atual, vedação de os herdeiros ou legatarios figurarem como testemunhas Instrumentárias em testamentos de qualquer espécie. Todavia, há a regra geral (art. 228 do CC/2002) do impedimento de testemunho (presencial ou Instrumentário) de cônjuges, ascendentes, descendentes e colaterais até o terceiro grau, que são herdeiros legítimos do testador e que podem ser por ele beneficiados como herdeiros testamentários ou legatários. Esse impedimento, todavia, cede ante o princípio de "favor testament!" ou da preservação da vontade inquestionável do testador, ou para a prova de fatos que só essas pessoas conheçam. Ante tais pressupostos, o juiz pode admitir a validade e a eficácia do testemunho de herdeiros e legatários parentes, ou cônjuges, ou companheiros, também em homenagem ao princípio da conservação dos negócios jurídicos, que orienta o julgador para restringir a invalidade do testamento, em razão de requisito formal, se dúvidas fundadas houver quanto à autenticidade da cédula. § 5.902. C - Jurisprudência Inclina-se a jurisprudência do STJ peio aproveitamento do testamento quando, não obstante a existência de certos vícios formais, a essência do ato se mantém íntegra, notadamente quanto a fidelidade da manifestação de vontade do testador, sua capacidade mental e livre expressão (STJ, REsp 600.746/PR, 4." T, j. 20.05.2010, rei. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe 15.06.2010).

§ 5.903. NULIDADE DO TESTAMENTO POR INCAPACIDADE DA TESTEMUNHA E OUTROS FIGURANTES 1 . SANÇÃO DE NULIDADE. - A lei só se referiu a testemunhas. Mas há pessoas que nos testamentos figuram, e são, nêles, como se fossem testemunhas. Em regra, não os reduz a lei a simples instrumentos. Dá-lhes atribuições cuja importância os eleva, pelo menos, à categoria de testemunhas instrumentárias.

Enumeração dos casos de nuüdade devida a figurantes. E nulo o testamento: a) Se figura como uma das cinco testemunhas pessoa menor de dezesseis anos: não há o número legal (arts. 1.632,1, 1.638, IV, e 1.645, H).

b) Se figura como subscritor, a rôgo, menor de dezesseis anos, tenha ou não figurado como redator do ato (subscritor, art. 1.637, redator e subscritor, art. 1.638,1-IH). c) Se figura como leitor do testamento do surdo pessoa menor de dezesseis anos (art. 1.636). Outrossim do testamento do cego (art. 1.637). d) Se fôr louca uma das cinco testemunhas (arts. 1.650, n , 1.632,1, 1.638, IV, e 1.645, II). Igualmente, qualquer das pessoas acima referidas, em b) e c). e) Se qualquer das pessoas referidas em a), b) e c); fôr cega (art. 1.650, IH). f) Se qualquer das testemunhas fôr completamente surda (somente por isso o surdo-mudo é incapaz). Mas, se no testamento particular, houve três que o confirmam, vale (artigo 1.647), bem como se, ainda sendo uma das restantes, se o surdo (ou o surdo-mudo) puder depor. Não é possível, sem absurdo, ainda quanto aos testamentos públicos e cerrados, negar ao juiz a apreciação das circunstâncias. Nunca se deve, porém, excluir em tais casos a responsabilidade do oficial público: nulo ò testamento, por defeito tão visível da testemunha, quer no testamento público, quer no cerrado, necessàriamente se estabelece a sua responsabilidade, ali por sua função em todo o ato; aqui, pela aprovação que deu à cédula testamentária. Tenhamos sempre aos olhos que o formalismo mais se justifica onde se pode salvar, pela indireta execução do testamento, à custa do oficial público, o interêsse dos contemplados. Com êste fundamento é que se conciliam rigorismo formular & favor testamenti. g) Se alguma das testemunhas deixou de assinar, ou se outrem assinou por ela. O testamento a rôgo só se permite, por necessidade irremovível, quanto ao testador, e não quanto às testemunhas. h) Se o testamento não é hológrafo e analfabeta a testemunha ou a pessoa mencionada em b) e c), nulo é o testamento público, pela impossibilidade da conferência do declarado com o redigido, ou o cerrado, pelo motivo da verificação da leitura do ato de aprovação. Nos testamentos hológrafos, mais liberal deve ser a interpretação: a testemunha depõe sobre o que lhe foi lido e reconhece a própria assinatura (artigo 1.647). A solução está sujeita a outros princípios, que são, na espécie, os de publicação em JUÍZO conforme regras jurídicas de caráter probatório que permitem atenuar o duro formalismo instrumental da forma pública. Demais, nulo o testamento particular, apagam-se quaisquer efeitos do ato testamentário. Nulo

O testamento cerrado ou público, responde o oficial público. Antes, quanto aos arts. 1.647 e 1.648, já tratamos de outros pontos. i) No caso de, aplicada a lei penal, ficar alguém privado de testemunhar, nulo é o seu testemunho. Nulo, portanto, o testamento. Mas a putatividade não pode ser desprezada. Pelas razões que já demos, não está privado de ser testemunha o mudo. 2. NULIDADE POR INCAPACIDADE DE TESTEMUNHA E "FAVOR TESTA-

MENTÍ". - Tudo que acima se disse seria simples e claro, se, em favor do testamento, não interviessem considerações de grande importância, para atenuar a rigidez dos principios de nulidade.

§ 5.904. ÊRRO DE FATO E ERRO DE DIREITO 1. CONVOCAÇÃO E ERRO. - No convocar as testemunhas, dois erros podem dar-se: o de direito e o de fato. 2. ERRO DE DIREITO E CAPACIDADE. - O êrro pode ser quanto à incapacidade das testemunhas, dos leitores e dos subscritores a rogo. Pode ocorrer que o testador ignore a lei que exclui do testemunho testamentário as pessoas que convocou e das funções dos arts. 1.637,1.638,1 e HI, e 1.636, as pessoas que não podem ser testemunhas. Tratando-se, como se trata, de êrro de direito, a ignorancia, em principio, não sana a nulidade do ato. Nemo ius ignorare consetur. Tem-se decidido que não merece indulgência, mas acertadamente se introduz caber ação contra o notário, cujo êrro de direito constitui grave perigo público, por parte dos herdeiros, ou legatários (R. SAVATIER, Sanction sur L'incapacité d'un témoin dans les testaments authentiques, Révue Trimestrielle de Droit Civil, 22, 810), e beneficiados. Contra isso, o que se alega é que o testador, e não o tabelião que escolhe as testemunhas. De qualquer modo, trata-se de culpa se éste oficial público conhecia o estado de fato. Pode ocorrer que tenham sido os herdeiros legítimos os causadores da escolha, com o fito na nulidade, que lhes aproveita. Serão responsáveis. O tribunal de Mauriac argumentou com a cobertura do ato dos herdeiros, pois o testador fêz sua a escolha. Mas é inaceitável a objeção. Se o testador

aceitou, ou quis as testemunhas que lhe sugeriram isso, prova que a manobra dolosa surtiu efeito. Cabe a ação de indenização contra os herdeiros. O princípio esbarra com os fatos, no testamento particular, ou, ainda nos demais, quando nem testador, nem oficial público í>o