Tratado de Direito Privado, Tomo LV - Direito das sucessões: Sucessão em geral. Sucessão legítima [55, 4ª ed.] 9788520343487

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Tratado de Direito Privado, Tomo LV - Direito das sucessões: Sucessão em geral. Sucessão legítima [55, 4ª ed.]
 9788520343487

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42 . V M672 2012

Vol.55

TRATADO DE DIREITO PRIVADO

TRATADO DE DIREITO PRIVADO

O/retor Responsável Amonio

BEUNB.0

Diretora de Conteúdo Editorial GISELLE OE M E U . 0 BRAGA TAPAI

Diretora de Operações Editorials ORIENE PAVAN

Analistas Documentais: Bethânia Mignolo dos Santos, Bruno Martins Costa, Cristiane Gonzalez Basile de Faria, Danielle Candido de Oliveira, Henderson Fiirst de Oliveira e ítalo Façanha Costa. Editoração Eletrônica Coordenadora ROSELI CAMPOS DE CARVALHO

Equipe de Editoração: Adriana Medeiros Chaves Martins, Ana Paula Lopes Corrêa, Carolina do Prado Fatel, Gabriel Bratti Costa, Ladislau Francisco de Uma Neto, Luciana Pereira dos Santos, Luiz Fernando Romeu, Marcelo de Oliveira Silva e Vera Lúcia Cirino. Produção grática:Caio Henrique Andrade.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Miranda, Pontes de, 1892-1979 Direito das sucessões : sucessão em geral : sucessão legítima / Pontes de Miranda ; atualizado por Giselda Maria Fernandes, Novaes Hironaka e Paulo Luiz Netto Lôbo. - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2012. - (coleção tratado de direito privado: parte especial; 55) ISBN 978-85-203-4348-7 1. Direito civil 2. Direito civil - Brasil I. Novaes Hironaka,Giselda Maria Fernandes. II. Lôbo, Paulo Luiz Netto. III. Título. IV. Série. 12-02509

CDU-347(81)

índices para catálogo sistemático: 1. Brasil: Direito civil 347 (81) 2. Brasil: Direito privado 347 (81)

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Pontes de Miranc

TRATADO DE DIREITO PRIVADO PARTE ESPECIAL

TOMO LV DIREITO DAS SUCESSÕES Sucessão em geral Sucessão legítima

Atualizado por

Giselda Hironaka Paulo Lôbo

EDITORA l í w 1 Q Q a n o s REVISTA D O S TRIBUNAIS

TRATADO D E DIREITO PRIVADO PONTES DE MIRANDA PARTE

ESPECIAL

T O M O LV DIREITO DAS SUCESSÕES: Sucessão em geral. Sucessão legítima

© Originais do Tratado de Direito Privado - 60 Tomos: PONTES DE M I R A N D A

© Desta Atualização [2012]: E D I T O R A REVISTA DOS TRIBUNAIS L T D A . ANTONIO BELINELO Diretor responsável Rua do Bosque, 820 - B a n a Funda Tel. 11 3 6 1 3 - 8 4 0 0 - F a x 11 3613-8450 CEP 01136-000 - São Paulo, SP, Brasil TODOS os DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos, microfilmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art 184 e parágrafos, do Código Penal), com pena de prisão e multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais). CENTRAL DE RELACIONAMENTO R T

(atendimento, em dias úteis, das 8 às 17 horas) Tel. 0800-702-2433 e-mail de atendimento ao consumidor: [email protected] Visite nosso site: www.rt.com.br Impresso no Brasil [03.2012] Profissional Fechamento desta edição [05.03.2012] •jrrowi,,

"TFgICKEgg.

ISBN 978-85-203-4348-7 ISBN da Coleção 978-85-203-4321-0

À AMNÉRIS e à FRANCIS,

amor e gratidão de seu marido e de seu pai.

ÍNDICE GERAL DO TOMO LV

APRESENTAÇÃO, 9 APRESENTAÇÃO DOS ATUALIZADORES,

11

PREFÁCIO À 1.A EDIÇÃO, 1 3 SOBRE O AUTOR, 2 7 OBRAS PRINCIPAIS DO AUTOR, 3 1 SOBRE OS ATUALIZADORES, 3 5 PLANO GERAL DA COLEÇÃO, 3 7 TÁBUA SISTEMÁTICA DAS MATÉRIAS, 4 1 BIBLIOGRAFIA DO TOMO LV, 4 3 3 ÍNDICES

Alfabético dos Autores citados, 449 Cronológico da Legislação, 455 Cronológico da Jurisprudência, 472 Alfabético das Matérias, 479

APRESENTAÇÃO

A Editora Revista dos Tribunais - RT tem a honra de oferecer ao público leitor esta nova edição do Tratado de Direito Privado, de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, reconhecidamente um dos mais ilustres juristas brasileiros, senão o maior. Para nós, da Editora, a republicação desta obra tem importância única: ao se consubstanciar num marco científico e editorial, pela contribuição que há tantas décadas traz à ciência do Direito e, especificamente, ao Direito Privado. Essas fundamentais características se compõem com as comemorações do primeiro centenário desta Casa Editorial e com a evocação dos 120 anos de nascimento do grande tratadista. O respeito ao texto original, também publicado por esta Editora em 1983, foi um dos maiores cuidados que nos determinamos a tomar, desde a estrutura e organização do texto, passando por alguns recursos usados pelo Autor, até a ortografia da época, com exceção do trema nas semivogais. O Direito, porém, como todas as ciências, vem sofrendo grandes transformações nas últimas décadas. Por isso, com o intuito de inserir a obra no contexto presente, notas atualizadoras foram elaboradas por juristas convidados entre os mais renomados do País. Inseridas ao final de cada tópico (§), encontram-se devidamente destacadas do texto original, apresentando a seguinte disposição:

Panorama Atual: § x: A - Legislação: indicação das alterações legislativas incidentes no instituto estudado § x: B - Doutrina: observações sobre as tendências atuais na interpretação doutrinária do instituto estudado § x: C ~ Jurisprudência: anotações sobre o posicionamento atual dos Tribunais a respeito do instituto estudado

Neste século de existência, a Editora Revista dos Tribunais se manteve líder e pioneira na promoção do conhecimento, procurando fornecer soluções especializadas e qualificadas aos constantes e novos problemas jurídicos da sociedade, à prática judiciária e à normatização. Nas páginas que publicou, encontra-se o Direito sendo estudado e divulgado ao longo de cinco Constituições republicanas, duas guerras mundiais e diversos regimes políticos e contextos internacionais. Mais recentemente, a revolução tecnológica, a era digital, e a globalização do conhecimento trouxeram desafios ainda mais complexos, e para acompanhar tudo isso, a Editora passou a compor, desde 2010, o grupo Thomson Reuters, incrementando substancialmente nossas condições de oferta de soluções ao mundo jurídico. Inovar, porém, não significa apenas "trazer novidades", mas também "renovar" e "restaurar". A obra de Pontes de Miranda permite tantas leituras, tamanha sua extensão e profundidade, que não se esgotam seu interesse e sua importância. E por isso, também - para inovar republicamos seu Tratado de Direito Privado. Não podemos deixar de registrar, ainda, nossos mais profundos agradecimentos à família Pontes de Miranda, pela participação que fez possível a realização de um sonho. EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS

APRESENTAÇÃO DOS ATUALIZABORES Talvez esta grande obra de Pontes de Miranda, conhecida na intimidade jurídica como "Tratado", seja mesmo a sua maior e mais importante obra. Quem não a conhece, no mundo jurídico? Eternamente citado, por docentes e profissionais do Direito, o Tratado de Direito Privado resiste - e sempre resistirá - à passagem do tempo e às mudanças da sociedade e das leis correspondentes. O raciocínio impecável do importante jurista brasileiro se estampa definitivamente nas letras jurídicas, levando-nos, a nós todos, a sempre consultar seus ensinamentos e suas reflexões, tão ricos. Por isso e por muito mais que isso, ficamos muitíssimo honrados com o convite da Editora Revista dos Tribunais para proceder à atualização dos seis últimos volumes do Tratado, correspondentes ao direito das sucessões. Para tanto, relemos uma vez mais, com extremo prazer e deleite intelectual, os capítulos e os parágrafos destes volumes, justamente para organizarmos a atualização pretendida pela Editora. A cada leitura, ficamos mais enriquecidos pela absorção do pensamento ponteano, como não podia deixar de ser. E, então, escrevemos as nossas notas, debaixo desta atmosfera de grandeza e de tanta inteligência. As notas de atualização desta obra ímpar de Pontes de Miranda, de acordo com os critérios de padronização e uniformidade adotados pela Editora, especialmente quanto ao irrestrito respeito à integridade do texto original, estão assim distribuídas - entre nós, os atualizadores - do Tomo LV do Tratado de Direito Privado: TÍTULO I

Capítulo I - P a u l o Lôbo Capítulo n - Paulo Lôbo Capítulo IH - Giselda Híronaka Capítulo IV - Giselda Hironaka Capítulo V - Paulo Lôbo Capítulo VI - Paulo Lôbo

TÍTULO I I

Capítulo I - Giselda Hironaka Capítulo II - Giselda Hironaka Capítulo m - Giselda Hironaka Capítulo IV - Giselda Hironaka Capítulo V - Paulo Lobo Capítulo VI - Paulo Lobo Capítulo VII - Paulo Lôbo Capítulo VIE - Paulo Lôbo A divisão por capítulos atendeu a alguns critérios que combinamos, de sorte que cada um deles foi atualizado por um de nós, permitindo, então, uma identificação exata das notas de atualização. Foi assim que pretendemos trabalhar, e é assim que entregamos este primeiro volume do direito sucessório (Tomo LV) à comunidade jurídica de nosso país. São Paulo, 05 de março de 2012. Professor PAULO

LÔBO

e Professora

GISELDA HIRONAKA.

PREFACIO À 1.a EDIÇÃO

l. Os sistemas jurídicos são sistemas lógicos, compostos de proposições que se referem a situações da vida, criadas pelos interesses mais diversos. Essas proposições, regras jurídicas, prevêem (ou vêem) que tais situações ocorrem, e incidem sobre elas, como se as marcassem. Em verdade, para quem está no mundo em que elas operam, as regras jurídicas marcam, dizem o que se há de considerar jurídico e, por exclusão, o que se não há de considerar jurídico. Donde ser útil pensar-se em têrmos de topologia: o que entra e o que não entra no mundo jurídico. Mediante essas regras, consegue o homem diminuir, de muito, o arbitrário da vida social, a desordem dos interesses, o tumultuário dos movimentos humanos à cata do que deseja, ou do que lhe satisfaz algum apetite. As proposições jurídicas não são diferentes das outras proposições: empregam-se conceitos, para que se possa assegurar que, ocorrendo a, se terá a'. Seria impossível chegar-se até aí, sem que aos conceitos jurídicos não correspondessem fatos da vida, ainda quando êsses fatos da vida sejam criados pelo pensamento humano. No fundo, a função social do direito é dar valores a interêsses, a bens da vida, e regular-lhes a distribuição entre os homens. Sofre o influxo de outros processos sociais mais estabilizadores do que êle, e é movido por processos sociais mais renovadores; de modo que desempenha, no campo da ação social, papel semelhante ao da ciência, no campo do pensamento. Esse ponto é da maior importância. Para que se saiba qual a regra jurídica que incidiu, que incide, ou que incidirá, é preciso que se saiba o que é que se diz nela. Tal determinação do conteúdo da regra jurídica é função do intérprete, isto é, do juiz ou de alguém, jurista ou não, a que interesse a regra jurídica. O jurista é apenas, nesse plano, o especialista em conhecimentos das regras jurídicas e da interpretação delas, se bem que, para chegar a essa especialização e ser fecunda, leal, exata, a sua função, precise de conhecer o passado do sistema jurídico e, pois, de cada regra jurídica, e o sistema jurídico do seu tempo, no momento em que pensa, ou pensa e fala ou escreve.

Diz-se que interpretar é, em grande parte, estender a regra jurídica a fatos não previstos por ela com o que se ultrapassa o conceito técnico de analogia. Estaria tal missão compreendida no poder do juiz e, pois, do intérprete. Diz-se mais: pode o juiz, pois que deve proferir a sententia quae rei gerendae aptior est, encher as lacunas, ainda se falta a regra jurídica que se pudesse estender, pela analogia, ou outro processo interpretativo, aos fatos não previstos. Ainda mais: se a regra jurídica não é acertada, há de buscar-se, contra legem, a regra jurídica acertada. Nota-se em tudo isso que se pretendem contrapor a investigação do sistema jurídico, em toda a sua riqueza, dogmática e histórica, e a letra da lei. Exatamente o que se há de procurar é a conciliação das três, no que é possível; portanto, o sentido - dogmática e historicamente - mais adequado às relações humanas, sem se dar ensejo ao arbítrio do juiz. A separação dos poderes, legislativo e judiciário, esteia-se em discriminação das funções sociais (política, direito); e a história do princípio, a sua revelação através de milênios, a sua defesa como princípio constitucional, apenas traduz a evolução social. O êrro do legislador pode ser de expressão: prevalece, então, o pensamento que se tentou exprimir, se êsse pensamento é captável no sistema jurídico; não se desce ao chamado espírito, ou à vontade do legislador, porque seria atravessar a linha distintiva do político e do jurídico; não se contraria o princípio de que a lei é para ser entendida pelo povo, no grau de cultura jurídica em que se acham os seus técnicos, e não para ser decifrada. Por outro lado, as circunstâncias sociais podem ter mudado: o envelhecimento da regra jurídica participa mais do julgamento do povo do que do decorrer do tempo; o problema torna-se mais de mecânica social do que de fontes e de interpretação das leis.

2. O sistema jurídico contém regras jurídicas; e essas se formulam com os conceitos jurídicos. Tem-se de estudar o fáctico, isto é, as relações humanas e os fatos, a que elas se referem, para se saber qual o suporte fáctico, isto é, aquilo sobre que elas incidem, apontado por elas. Aí é que se exerce a função esclarecedora, discriminativa, crítica, retocadora, da pesquisa jurídica. O conceito de suporte fáctico tem de ser guardado pelos que querem entender as leis e as operações de interpretação e de julgamento. A regra jurídica 'Todo homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil" (Código Civil, art. 1 é regra jurídica de suporte fáctico simplicíssimo: "Homem". Se há um ser humano, se nasceu e vive um homem, a regra jurídica do art. 1.° incide. Incide, portanto, sobre cada homem. Cada ho-

mem pode invocá-la a seu favor; o juiz tem dever de aplicá-la. Porém nem todos os suportes fácticos são tão simples. "São incapazes relativamente, os maiores de dezesseis e menores de vinte e um anos" (art. 6.°, I). Suporte fáctico: ser humano, dezesseis anos feitos. "Cessando a confusão, para logo se restabelecer, com todos os acessórios, a obrigação anterior" (art. 1.052). Suporte fáctico: A devedor a B, A sucessor do direito de B, mas a sucessão é temporária, qualquer que seja a causa. É fácil compreender-se qual a importância que têm a exatidão e a precisão dos conceitos, a boa escolha e a nitidez deles, bem como o rigor na concepção e formulação das regras jurídicas e no raciocinar-se com elas. Seja como fôr, há sempre dúvidas, que exsurgem, a respeito de fatos, que se têm, ou não, de meter nas categorias, e da categoria em que, no caso afirmativo, se haveriam de colocar. Outras, ainda, a propósito dos próprios conceitos e das regras jurídicas, que têm de ser entendidas e interpretadas. A missão principal do jurista é dominar o assoberbante material legislativo e jurisprudencial, que constitui o ramo do direito, sôbre que disserta, sem deixar de ver e de aprofundar o que provém dos outros ramos e como que perpassa por aquêle, a cada momento, e o traspassa, em vários sentidos. Mal dá êle por começada essa tarefa, impõe-se-lhe o estudo de cada uma das instituições jurídicas. Somente quando vai longe a sua investigação, horizontal e verticalmente, apanhando o sobredireito e o direito substancial, é que pode tratar a regra jurídica e o suporte fáctico, sôbre que ela incide, avançando, então, através dos efeitos de tal entrada do suporte fáctico no mundo jurídico. O direito privado apanha as relações dos indivíduos entre si, e cria-as entre êles; mas a técnica legislativa tem de levar em conta que alguns dêsses indivíduos são Estados, Estados-membros, Municípios, pessoas jurídicas de direito público, que também podem ser sujeitos de direitos privados. Interpretar leis é lê-las, entender-lhes e criticar-lhes o texto e revelar-lhes o conteúdo. Pode ela chocar-se com outras leis, ou consigo mesma. Tais choques têm de ser reduzidos, eliminados; nenhuma contradição há de conter a lei. O sistema jurídico, que é sistema lógico, há de ser entendido em tôda a sua pureza. Se, por um lado, há tôda a razão em se repelir o método de interpretação conceptualístico (que se concentrava na consideração dos conceitos, esquecendo-lhe as regras jurídicas em seu todo e, até, o sistema jurídico), método que nunca foi o dos velhos juristas portuguêses nem o dos brasileiros, temos de nos livrar dos métodos que não atendem a que as regras

jurídicas se fazem com os conceitos e êsses tem a sua fixação histórica e hão de ser precisados. Principalmente, tem-se de levar em conta que a regra jurídica, a lei, viveu e vive láfora, - foi para ser ouvida e lida pelos que hão de observá-la e é para ser lida, hoje, por êles. Nem o que estava na psique dos que a criaram, nem o que está na psique dos que hoje a criam, têm outro valor além do que serve à explicitação do que é que foi ouvido e lido por aqueles a que foi dirigida, ou o é por aquêles a quem hoje se dirige. O elemento histórico, que se há de reverenciar, é mais exterior, social, do que interior e psicológico. Se assim se afasta a pesquisa da vontade do legislador, no passado e no presente, o subjetivismo e o voluntarismo que - há mais de trinta e dois anos - combatemos (nosso Subjektivismus und Voluntarismus im Recht, Archiv für Rechts und Wirtschaftsphilosophie, 16, 5 2 2 - 5 4 3 ) , há de evitar-se passar-se a outro subjetivismo e a outro voluntarismo, - o da indagação da vontade da lei. Ratio legis não é voluntas legis; lei não quer; lei regra, lei enuncia. O sentido é o que está na lei, conforme o sistema jurídico, e não o que se atribui ao legislador ter querido, nem à lei querer agora. Nem o que E. R. BIERLING (Juristische Prizipienlehre, IV, 2 3 0 e 2 5 6 s.), nem o que K . BINDING (Handbuch, 1 , 4 6 5 ) e J. KOHLER (Über die Interpretation der Gesetzen, Grünhuts Zeitschrift, 13, 1 s.) sustentavam. Interpretar é revelar as regras jurídicas que fazem parte do sistema jurídico, - pode ter sido escrita e : pode não estar escrita, mas existir no sistema, pode estar escrita e facilmente entender-se e apresentar certas dificuldades para ser entendida. Nas monocracias, os trabalhos preparatórios ficavam mais ocultos, raramente se publicavam com propósito de servir à interpretação, e quase sempre se perdiam, ao passo que a interpretação autêntica tinha todo o prestígio de lei, uma vez que não existia o princípio constitucional de irretroatividade da lei. Nas democracias, com o princípio da irretroatividade da lei, a interpretação autêntica ou é nova lei, ou não tem outro prestígio que o de seu valor intrínseco, se o tem; é interpretação como qualquer outra, sem qualquer peso a mais que lhe possa vir da procedência: o corpo legislativo somente pode, hoje, fazer lei para o futuro; não, para trás, ainda a pretexto de interpretar lei feita. O tribunal ou juiz que consultasse o Congresso Nacional cairia no ridículo, se bem que isso já tenha ocorrido na Europa. Se o legislador A ou os legisladores A, A! e A", quiseram a e todos os outros legisladores quiseram b, mas o que foi aprovado e publicado foi c, cé que é a regra jurídica. Bem assim, se todos quiseram a, e foi aprovado e publicado c. Os trabalhos preparatórios são, portanto, elemento de valor mínimo. O que foi publicado é a letra da lei, com as suas palavras e frases. Tem-se de interpretar, primeiro, gramatical-

mente, mas já aí as palavras podem revelai- sentido que não coincide com o do dicionário vulgar (pode lá estar rescisão, e tratar-se de resolução; pode lá estar condição, e não ser de condido que se há de cogitar; pode falar-se de êrro, e só se dever entender o êrro de fato, e não o de direito). O sentido literal é o sentido literal da ciência do direito, tendo-se em vista que o próprio redator da lei ao redigi-la, exercia função da dimensão política, e não da dimensão jurídica, pode não ser jurista ou ser mau jurista, ou falso jurista, o que é pior. Demais, estava êle a redigir regra jurídica, ou regras jurídicas, que se vão embutir no sistema jurídico e tal inserção não é sem conseqüências para o conteúdo das regras jurídicas, nem sem conseqüências para o sistema jurídico. Jurisprudência contra a lei é jurisprudência contra êsse resultado. Por isso, regra jurídica não escrita pode dilatar ou diminuir o conteúdo da regra jurídica nova. Daí, quando se lê a lei, em verdade se ter na mente o sistema jurídico, em que ela entra, e se ler na história, no texto e na exposição sistemática. Os êrros de expressão da lei são corrigidos facilmente porque o texto fica entre êsses dois componentes do material para a fixação do verdadeiro sentido. Na revelação de regra jurídica não escrita é que se nota maior liberdade do juiz. Nota-se; mas ¿há essa liberdade? Revelar a regra jurídica, se não está escrita, lendo-se na história e no sistema lógico, não é operação diferente de se ler na história, no texto e no sistema lógico. Não se cria a regra jurídica não escrita, como não se cria a regra jurídica escrita; ambas são reveladas, razão por que falar-se em lacuna do direito somente tem sentido se se critica o sistema jurídico, isto é, se se fala de iure condendo, ou se se alude a visão de primeiro exame, a algo que não se viu à primeira vista. Lacuna preenchida não é lacuna; lacuna que não é preenchível é lacuna de iure condendo. Analogia só se justifica se a ratio legis é a mesma (Ubi eadem ratio, idem ius); só se admite se, com ela, se revela, sem se substituir o juiz ao legislador: onde ela revela regra jurídica não-escrita, é analogia iuris, provem de explicitação do sistema jurídico e ainda é apenas reveladora, e não criadora. (A) Quando se revela por analogia legal, analogia legis, o que em verdade se faz é explicitar que a) a regra legal exprimiu, no texto, princípio particular, e b) há princípio mais geral em que êle se contém. (B) Quando se revela por analogia iuris, explicita-se regra jurídica que se há de ter como a), pois já existe, não escrita, no sistema jurídico. Fora de (A) e de B ( )> a chamada analogia é edicção de regra jurídica, contra o princípio da separação dos poderes.

3. A atividade mais relevante da ciência do direito consiste, portanto, em apontar quais os termos, com que se compuseram e com que se hão de compor as proposições ou enunciados, a que se dá o nome de regras jurídicas, e quais as regras jurídicas que, através dos tempos, foram adotadas e aplicadas. A sucessão histórica dessas regras obedece a leis sociológicas. Outra atividade, que não é menos inestimável do que aquela, está no interpretar o conteúdo das regras de cada momento e tirar delas certas normas ainda mais gerais, de modo a se ter em quase completa plenitude o sistema jurídico. Desde mais de dois milênios, porém principalmente nos últimos séculos, longo esforço de investigação, servido, aqui e ah, pela aparição de alguns espíritos geniais, conseguiu cristalizar a obra comum em enunciados sôbre os próprios enunciados e sôbre os têrmos, tornando cada vez "menos imperfeitas" a linguagem e a lógica do direito. A primeira necessidade da ciência jurídica passou a ser a mais rigorosa exatidão possível no delimitar os conceitos (E. I . BEKKER, System, I X ) . Os decênios passados puderam contemplar a obra imensa do século XIX, perceber o que não obtivera, até agora, "precisão"; e preparar-nos para a continuação criadora, que nunca seria possível sem a mole dos resultados anteriores e a depuração incessante de erros. : O valor do método etnológico assenta em que precisamos conhecer as instituições jurídicas em seu bêrço, mesmo em seus nascedouros, ou para distinguirmos dos outros processos sociais de adaptação o direito, ou para podermos escalonar, no tempo, as formas que o direito foi assumindo. Só assim poderemos datar o que apareceu no momento próprio e o que apareceu em momento impróprio (regressões, prematuridade legislativas). Com o método etnológico e o histórico-comparativo, podemos alcançar a discriminação das fases, na evolução social (método sociológico científico ou faseológico, que foi sempre o seguido em nossas obras, quer de sociologia, quer de dogmática jurídica). O valor dos estudos históricos para o conhecimento do direito vigente assenta em que não se pode conhecer o presente, sem se conhecer o passado, não se pode conhecer o que é, sem se conhecer o que foi. Não se poderia situar, no tempo, na evolução jurídica, cada enunciado do sistema lógico; nem se colheria o que estava na psique dos elaboradores da lei, porque estava no ambiente social (e continuou de estar), e se supôs incluso nos textos, ou entre os textos; nem se poderiam fixar certos conceitos, nem se determinariam certas categorias, que têm os seus limites marcados

pelos fios históricos. A i n d a o n d e o direito m u d o u m u i t o , m u i t o s e h á de inquirir do que não mudou. O direito m u d a m u i t o o n d e e m m u i t o d e i x o u de ser o que era.

4. A noção fundamental do direito é a de fato jurídico; depois, a de relação jurídica-, não a de direito subjetivo, que é já noção do plano dos efeitos - nem a de sujeito de direito, que é apenas têrmo da relação jurídica. Só há direitos subjetivos porque há sujeitos de direito; e só há sujeitos de direito porque há relações jurídicas. O grande trabalho da ciência jurídica tem sido o de examinar o que é que verdadeiramente se passa entre homens, quando se dizem credores, titulares ou sujeitos passivos de obrigações, autores e réus, proprietários, excipientes, etc. O esforço de dois milênios conseguiu precisar conceitos, dar forma sistemática à exposição, pôr êsses conhecimentos à disposição dos elaboradores de leis novas e aprimorar o senso crítico de algumas dezenas de gerações, até que, recentemente, se elevou a investigação ao nível da investigação das outras ciências, para maior precisão da linguagem e dos raciocínios. A subordinação dela à metodologia que resultou da lógica contemporânea, inclusive no que concerne à estrutura dos sistemas, é o último degrau a que se atingiu. Aliás, "ter direito" é, no falar diário, ambíguo, se não equívoco; Goethe tinha direito de escrever o que quisesse e, ainda naquele tempo, poderíamos ver no escrever o exercício de (direito de) liberdade de trabalho intelectual; A tem direito de se zangar com B, por B ter sido grosseiro, e vê-se bem que se está no mundo fáctico, a falar-se de direito, em sentido amplíssimo, que não é o sociológico, nem o técnico. Toda conveniência há em se evitar êsse sentido, extremamente largo, do falar comum; porém os juristas mesmos pecam em não verem que o direito abrange maior campo do que aquele que costumam, na rotina do ensino, da judicatura, ou da elaboração das leis, apontar ou pesquisar. Se A toma banho na praia, exerce direito de que êle não cogita, e é direito como os outros; se B vai ao cabeleireiro, com a filha, e diz que deseja as tranças do cabelo cortado, exerce direito. Onde quer que se distribuam bens da vida, inclusive os que se ligam à própria pessoa, aí está o sistema jurídico. Quem diz "aí está o sistema jurídico" diz há elementos fácticos sôbre os quais incidiu regra jurídica. Tal regra pode ser escrita, ou não escrita; em ambos os casos, faz parte do sistema jurídico, que é um cálculo lógico. A cada momento surgem problemas que somente podem ser resolvidos se se obedece a indicações e raciocínios exatos.

A incidência da regra jurídica é que torna jurídicos os bens da vida. Muitas vêzes, porém, a incógnita é a regra jurídica; outras vêzes, o conjunto de fatos, o suporte fáctico, em que a regra jurídica incide. Ali, responde-se às perguntas - "¿Há a regra jurídica e qual é?"; aqui, a duas outras "¿Quais os elementos que compõem o suporte fáctico; e qual a natureza de cada um deles?" Tais questões são inconfundíveis com as da irradiação de efeitos dessa impressão da norma jurídica no suporte fáctico. Por onde se vê que não é de admitir-se, em ciência, que se comece a exposição, a falar-se dos efeitos, da eficácia (direitos, deveres ou dívidas; pretensões, obrigações; ações e exceções), antes de se descrever como os elementos do mundo fáctico penetram no mundo jurídico. O direito dos nossos tempos, depois de se haver o homem libertado do direito do clã e da tribo, bem como do privatismo oligárquico da Idade Média, é baseado em que cada um tem campo de autonomia em que pode rumar, como entenda, a sua vida. Supõe-se em cada uma aptidão biológica, social e psico-individual para alcançar fins autônomos, escolhendo os fins e, ainda, criando fins seus. A intervenção do Estado é excepcional, pôsto que, na elaboração das leis, se adotem - para os indivíduos e para o Estado - regras que não podem ser alteradas pela vontade de cada um. Algumas criam direitos; outras, deveres; outras, pretensões, obrigações e ações, ou só pretensões e obrigações. Outras criam direitos sem os subjetivar, de modo que o efeito, a que então se chama direito, é reflexo da norma jurídica que incidiu, sem ser, pois, o seu efeito adequado ou, sequer, anexo. Nem sempre o efeito reflexo cria direito sem subjetivação; o interêsse é protegido sem a criação de direito subjetivo, ou, sequer, direito. Todavia, guardemo-nos de reduzir a essa categoria alguns fatos do mundo jurídico, que ofereceram dificuldades às gerações anteriores ao terem de os classificar (e.g., a lesão da propriedade, ou da pessoa); e mais ainda nos havemos de precatai" contra discriminações concretas entre direito e interêsses protegidos que corresponderam a momentos já passados, a momentos em que eram verdadeiras (hoje não mais o são), tanto mais quanto tais discriminações podem ter resultado de deficiência do direito público de povos grandemente progredidos no direito privado. A afirmativa, por exemplo, de que não há no sistema jurídico regra que proíba, em geral, causar dano à pessoa ou ao patrimônio alheio (e.g., A. VON TUHR, Der Allgemeine Teil, I, 56) é falha: primeiro, desatende-se a que essa regra jurídica pode ser não-escrita e a que as regras jurídicas de sanções supõem a regra jurídica que se há de ter violado; segundo, não se vê que, noutro ramo do direito, que é o direito público, às vêzes no direito constitucional, a regra jurídica, que se supõe, vem, de ordinário, escrita.

5 Quando se trata de direito privado contemporâneo, poucos são os que se dão conta de que há mais de dois mil anos se vem elaborando toda a doutrina de que desfrutamos. Em verdade, foi como se, através desses milênios, estivesse o homem a descobrir o que seria melhor - ou é melhor - para regular as relações inter-humanas. "Descobrir" é o têrmo; pouco se criou: revelou-se, nos livros de doutrina, nas elaborações de regras jurídicas e nas críticas, o que se presta a resolver os problemas do interêsse humano. Às vêzes por muitos séculos se procurou solução. No final, o direito ainda o direito não-costumeiro, é a obra de milhares e milhares de inteligências. Daí ter-se de colher, aqui e ali, a verdade. Fácil é assim imaginar-se o que representa de esforço intelectual, de pesquisa, a Parte Geral do Direito Privado. 6. A respeito de conter, ou não, o Código Civil regras jurídicas de direito administrativo (portanto, heterotópicas), e de poder alguma regra de direito civil ser invocada como subsidiária do direito público, especialmente administrativo, tem havido graves confusões, provenientes de leitura apressadas de livros estrangeiros. No art. 1.°, diz-se que o Código Civil regula "os direitos e obrigações de ordem privada", de modo que é o fundo comum para o direito civil e o comercial; porém não para o direito público: para êsse, a regra jurídica de direito privado somente pode ser invocada se é elemento do suporte fáctico de alguma regra jurídica publicística o fato jurídico privatístico, ou se - o que é causa das maiores confusões nos inexpertos - a regra jurídica privatística revela, no plano do direito privado, a existência de princípio geral de direito que também se há de revelar no direito público. Exemplo de discussão imprecisa por ocasião dos acórdãos do Supremo Tribunal Federal, a 23 de junho de 1943, 5 de junho de 1944 e 5 de agosto de 1949 (R. dos T., 148, 777; R. de D. A., II, 560; R. F., 129, 120). Em voto no acórdão da 2.a Câmara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 23 de fevereiro de 1948 (R. dos T., 184, 351), procurou-se critério distintivo, dizendo-se que, em direito privado, se permite o que não é proibido, ao passo que, no direito público, só se pode fazer o que é permitido; mas isso é fácil dito, sem qualquer apoio em princípios, - tanto há regras jurídicas permissivas e proibitivas no direito privado quanto no público e o campo da liberdade, no direito público, é ainda mais vasto do que no direito privado. __ 7- A Parte Geral do Direito é um dos ramos do Direito. Todo sistema jurídico é sistema lógico. Cada ramo também o é. Não é contemplação,

nem doutrina teleológica. Há de formar sistema lógico; ou, melhor, há de ser apanhado do que é geral e comum no sistema lógico, ou geral e comum nos sistemas lógicos de que se trata. O sistema jurídico pode ser o do Estado A, ou um dos sistemas jurídicos (o direito civil, por exemplo) do Estado A; ou o dos Estados A, B, C, ou um dos sistemas dos Estados A, B, C. Ou se restrinja a definições, ou explicite princípios ou regras, ou é sistema lógico ou é parte de sistema. Embora seja possível pensar-se em Parte Geral do Direito em algum sistema hipotético (imaginário) X, ou X, Y, Z, a Parte Geral do Direito, ou do Direito Penal, ou do Direito Privado, ou a que fôr, é a de direito existente, ou de sistemas jurídicos existentes, ou de ramo do direito existente ou de ramo de sistemas jurídicos existentes. O seu programa não pode ser o de filosofia do direito, nem o de sociologia do direito; menos ainda o de história ou etnologia do direito; nem o dela pode suprir, ou eliminar os programas dessas disciplinas, nem o de qualquer delas, nem os de todas o suprem, ou eliminam. Alguns conceitos, é de notar-se, são sôbre os sistemas lógicos a que se dá a qualificação de jurídicos; por exigência prática, foram incluídos na Parte Geral do Direito, para se não recorrer a remissões. Outros são conceitos de que se precisa e, pois, subentendidos, o que os faz definições. A Parte Geral do Direito Privado tem, necessariamente, de trabalhar com, os conceitos que são comuns a todos os ramos do direito e a todos os ramos do direito privado; e com os conceitos que somente são comuns aos ramos do direito civil, ou ao direito comercial, ou a outro ramo. 8. À doutrina pandectista do século XIX deve-se a elaboração da Parte Geral do direito civil a ponto de se haver imposto, no século XX, às codificações mais autorizadas, exceto, o que é lamentar-se, à codificação italiana. As categorias jurídicas foram classificadas; os seus conteúdos discutidos e aclarados; e não há negar-se que, aos primeiros decênios do século corrente, a tal ponto havia chegado a sistematização, que os esforços, a partir desses anos, foram em profundidade e no sentido de classificação de toda a teoria geral do direito, em irradiações do que se conseguira na Parte Geral do direito civil. Exatamente por isso, a obra, que verse, no meio do século XX, matéria que se acrisolou com tantas investigações e controvérsias, exige-se pôr-se em dia com o que deixaram os últimos grandes civilistas das três primeiras décadas e o que as duas últimas conseguiram corrigir e aperfeiçoar. Seria, porém, incompleto o pôr-se em dia, se não se atendesse ao que se irradiava, em compensação fecunda, dos outros ramos

do direito. Daí a razão de se reputar da mais alta responsabilidade empreendimento tão complexo, a despeito de caber a matéria, nos códigos, em duas centenas de artigos (§§ 1-240 do Código Civil alemão; arts. l.°-179 do Código Civil brasileiro). 9 A divisão das matérias da Parte Geral aparece, nesta obra, pela primeira vez, em ordem lógico-científica. Primeiro, expusemos o que concerne ao plano da existência; depois, o que se refere ao plano da validade; finalmente, o que somente pertence ao plano da eficácia. O fato jurídico, primeiro, é; se é, e somente se é, pode ser válido, nulo, anulável, rescindível, resolúvel, etc.; se é, e somente se é, pode irradiar efeitos, posto que haja fatos jurídicos que não os irradiam, ou ainda não os irradiam. No Plano I, a regra jurídica e o suporte fáctico sôbre que ela incide são o de que de início nos incumbimos tratar; depois da incidência, que torna fato jurídico o suporte fáctico, versa-se o que define os fatos jurídicos e os classifica. A personalidade e a capacidade entram no estudo do suporte fáctico, porque de tais conceitos precisamos desde logo. No Plano II, o assunto já supõe a existência dos fatos jurídicos; mais precisamente, dos atos jurídicos (negócios jurídicos e atos jurídicos stricto sensu), fora os fatos jurídicos stricto sensu. São a validade, a nulidade e a anulabilidade o que mais longamente nos ocupa. No Plano III, cogitamos da eficácia, que supõe existência e, de ordinário, pelo menos, não ser nulo o ato jurídico. Respectivamente, Tomos I-IH, IV e V-VI. A diferença entre o mundo fáctico e o mundo jurídico vê-se bem entre o passeio que alguém faz à casa do amigo e a entrega da carta com a oferta de contrato, entre o ato de cercar, interiormente, o terreno que lhe pertence e o de invadir o terreno do vizinho, entre a avulsão interior ao terreno de A e a avulsão entre o terreno de A e o de B. Duas pessoas que se divertem jogando cartas, sem parar qualquer valor (somente fichas de osso ou de matéria plástica, que voltam ao dono), mantêm-se no mundo fáctico; e duas que fizeram paradas de dinheiro, fizeram entrar no mundo jurídico, desde o momento em que acordaram em tal jogo, o negócio jurídico dos arts. 1.4771.479 do Código Civil. A diferença entre o plano da existência e o plano da eficácia percebe-se claramente quando se considera o fato jurídico e o direito, o dever, a pretensão, a obrigação, a ação e a exceção, que são efeitos, ou a condição e o têrmo, que só operam no plano da eficácia, e o distrato, a resolução sem ser por advento de condição ou têrmo, a própria resilição e a denúncia, que se passam no plano da existência. O distrato desfaz o ato

jurídico; a resolução resolve o ato jurídico, a resilição resile-o; a denuncia atinge o ato jurídico. A condição e o têrmo somente apanham efeitos. 10. A fonte mais extensa do direito civil brasileiro é o Código Civil, que teve a data de 1.° de janeiro de 1916 e entrou em vigor um ano depois! "Este Código" disse o art. 1.°, "regula os direitos e obrigações de ordem privada concernentes às pessoas, aos bens e às suas relações". Em têrmos científicos, evitadas as elipses: o Código Civil regula os fatos de que resultam direitos e obrigações de ordem privada, quer de natureza pessoal, quer de natureza real. Como toda codificação, o Código Civil não foi exaustivo senão por algum tempo (= até a aparição de alguma regra jurídica derrogativa, ou a latere) e ainda assim não foi perfeita a sua exaustividade: somente onde se regulou alguma matéria foi, excluído o direito anterior (art. 1.807: "Ficam revogadas as Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes concernentes às matérias de direito civil reguladas neste Código"). No art. 1.806, estatuíra-se: "O Código Civil entrará em vigor no dia 1.° de janeiro de 1917". A fonte mais extensa do Código Comercial é o Código do Comércio (Lei n. 556, de 25 de junho de 1850). Os que não vivem atentos à história dos diferentes sistemas jurídicos dificilmente podem apreciar, com profundidade, a grande vantagem, que teve o Brasil, em receber o direito português e a doutrina jurídica dos séculos XV em diante, sem que direito estrangeiro fôsse imposto por invasores ou em imitações apressadas, como aconteceu a muitos dos povos hispano-americanos, em relação ao Código Civil francês. O Esboço de TEIXEIRA DE FREITAS, que nos teria dado o melhor Código Civil do século XIX, prestou-nos, não se transformando em Código Civil, o serviço de pôr-nos em dia com o que êle genialmente entrevia e permitiu-nos sorrir dos imitadores do Código Civil francês, enquanto Portugal, imitando-o, deixou que a sua história jurídica se fizesse mais nossa do que déle. O Código Civil brasileiro é bem, como disse L. ENNECCERUS, a mais independente das codificações latino-americanas. Para quem observa, isentamente, o que se passou com o direito comercial, nota a artificialidade com que se quis arrancar do direito privado o todo suficiente para aparecer, como autônomo, ramo de direito privado que apenas consistia em algumas leis especiais e algumas regras jurídicas concernentes aos comerciantes. Algumas leis foram soldadas ao direito comercial sem se justificar tal soldagem deliberada e violenta.

11 A obra obedece a programa rigorosamente científico: a distinção entre mundo fáctico

e mundo jurídico,

q u e é o d o sistema jurídico, v e m à

frente, e concorre imensamente para clarear os assuntos e para a solução de problemas delicados que perturbavam a ciência europeia; depois, a distinção entre o plano da existência,

o plano da validade

e o plano da

eficácia,

sem a qual em tantas confusões incorrem os juristas, baralhando "ser", "valer" e "ter efeito", como se fossem equivalentes "ser", "ser válido", "ser eficaz" ou "não ser", "não ser válido", "ser ineficaz". A ciência do direito, colhendo das regras jurídicas, da sistemática e da prática os conceitos, obedece às diferenças; os juristas, aqui e ali, perdem-nas de vista. Tudo aconselha a que se ordenem as matérias com toda a precisão conceptual. Já TEIXEIRA DE FREITAS percebera que a parte do direito concernente à eficácia ("dos efeitos civis", dizia êle) havia de ser todo um livro, após as causas, as pessoas, os bens e os fatos jurídicos. Somente depois se trataria - no plano do direito civil - dos direitos pessoais e dos direitos reais. O Código Comercial fundir-se-ia, unificando-se o direito privado. Foi isso o que êle propôs em ofício de 20 de setembro de 1867, antes do Código suíço das Obrigações, - e a mediocridade circundante rejeitou. Há certo fio de coerência histórica e espiritual em realizarmos, já no plano da sistematização, com o material do direito vigente, complexo e de diferentes datas, versado lealmente, o que, no plano da técnica legislativa, fôra o sonho do jurista brasileiro, há quase um século. Serve isso para mostrar, mais uma vez, que o Brasil tem um destino, que lhe traçaram o universalismo português e as circunstâncias jurídico-morais da sua história de mais de quatro séculos. É Ele, e não apenas nós (o civilista do século XIX e o autor desta obra), que planeja e executa. Somos apenas os instrumentos da sua avançada na dimensão do Tempo, a serviço da ordem jurídica e da ciência, na América e no mundo. De nossa parte, outrem poderia levar a cabo esta obra, melhor e mais eficientemente; as circunstâncias trabalharam a nosso favor, de modo que cedo percebemos que sem elas não poderíamos, nem outrem qualquer poderia enfrentá-la. Também aí não se leve a conta de mérito excepcional do autor o que foi resultado, tão-só, da convergência, extremamente feliz, de múltiplos fatores, de ordem psíquica e de ordem material. Uma das circunstâncias foi a prática do direito, durante mais de quarenta anos; outra, a formação inicial, lógico-matemática; outra, a possibilidade de estar a par da ciência européia, especialmente alemã e austríaca, à custa de grandes sacrifícios. Porém não pesou menos o ter podido, materialmente,

realizar a obra, através de trinta anos de organização minudente e de disciplina estrita. A ciência precisa, para ser verdadeiramente prática, não se limitar ao prático ( R . VON JHERING, Jahrbücher für die Dogmatik, I, 18: "Die Wissenschaft darf, um wahrhaft praktisch zu sein, sich nicht auf das Praktische beschrànken"). Êsse pensamento nos voltou à memória, várias vêzes ao revermos as provas deste livro. A falta de precisão de conceitos e de enunciados é o maior mal na justiça, que é obrigada a aplicar o direito, e dos escritores de direito, que não são obrigados a aplicá-lo, pois deliberam êles-mesmos escrever. O direito que está à base da civilização ocidental só se revestirá do seu prestígio se lhe restituirmos a antiga pujança, acrescida do que a investigação científica haja revelado. Não pode ser justo, aplicando o direito, quem não no sabe. A ciência há de preceder ao fazer-se justiça e ao falar-se sôbre direitos, pretensões, ações e exceções. Para honestamente se versar, hoje, o direito privado brasileiro, precisa-se de preparação de alguns decênios, quer pela necessidade de se meditarem milhares de obras, quer pela assoberbante jurisprudência que se amontoou. Por outro lado, não se pode impor ao público a exposição sistemática, sem críticas, do direito privado. Tem-se de apontar o que se diz e está errado; e chamar-se atenção para os que, com o seu gênio, descobriram, ou, com o valor das suas convicções, sustentaram a verdade. Rio de Janeiro, 15 de março de 1954. Rua Prudente de Morais, 1356.

SOBRE O AUTOR

FRANCISCO CAVALCANTI P O N T E S D E M I R A N D A

Nasceu em Maceió, Estado de Alagoas, em 23 de abril de 1892. Faleceu no Rio de Janeiro, em 22 de dezembro de 1979. Foi um dos maiores juristas brasileiros. Também filósofo, matemático, sociólogo, deixou obras não só no campo do Direito, mas também da Filosofia, Sociologia, Matemática, Política e Literatura (poesia e prosa). Escreveu-as em português, francês, inglês, alemão e italiano. - Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, pela Faculdade de Recife, em 1911. - Membro do Instituto dos Advogados do Brasil, em 1918. - Membro Correspondente da Ordem dos Advogados de São Paulo, 16 de dezembro de 1919. - Conselheiro da Delegação Brasileira à V Conferência Internacional Americana, 1923. - Prêmio de Erudição da Academia Brasileira de Letras, 1924, pelo livro Introdução à Sociologia Geral. - Juiz de Órfãos, 1924. - Prêmio Único da Academia Brasileira de Letras, 1925, pelo livro A Sabedoria dos Instintos. - Prêmio Pedro Lessa, da Academia de Letras, 1925. - Professor Honoris Causa da Universidade Nacional do Rio de Janeiro, 1928. - Delegado do Brasil à V Conferência Internacional de Navegação Aérea, 1930. - Conferencista na Keiser Wilhelm-Stiftung, em Berlim, 1931.

- Membro da Comissão de Reforma Universitaria do Brasil, em 1931. - Membro da Comissão de Constituição, em 1932. - Chefe da Delegação do Brasil na Conferencia Internacional de Navegação Aérea, em Haia, 1932. - Professor de Direito Internacional Privado na Académie de Droit International de la Hoye, 1932. - Juiz dos Testamentos (Provedoria e Residuos). - Desembargador do Tribunal de Apelação e Presidente das Câmaras de Apelação até 1939. Ministro Plenipotenciário de I a classe, em 1939. Embaixador em comissão, 3 de novembro de 1939, sendo designado para Bogotá de 1940 a 1941. Chefe da Delegação do Governo Brasileiro na XXVI Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, em Nova Iorque, 25 de setembro de 1941. Representante do Brasil no Conselho Administrativo da Repartição Internacional do Trabalho., em Montreal, 29 de agosto de 1941; no posto de 15 de setembro de 1941 a março de 1943. Professor Honoris Causa da Universidade Federal do Recife, 1955. Ordem do Tesouro Sagrado do Império do Japão, Primeiro Grau, 1958. - Medalha Comemorativa do Centenário do nascimento de Clóvis Beviláqua, 4 de outubro de 1959. - Prêmio Teixeira de Freitas, pelo Instituto dos Advogados Brasileiros, 1961. - Ordem do Mérito Jurídico Militar, pelo Superior Tribunal Militar, 1966. - Medalha Monumento Nacional ao Imigrante, Caxias do Sul, 1966. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal de São Paulo, 1966. - Comenda de Jurista Eminente, Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul, 1969.

- Professor Honorário da Faculdade de Direito de Caruaru, 26 de m a i o de 1969.

- Grã-Cruz do Mérito da Única Ordem da República Federal da Alemanha, 1970. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul, 8 de agosto del970. - Professor Honoris Causa da Pontifícia Universidade Católica do Rio

Grande do Sul, Porto Alegre, 11 de agosto de 1970. - Titular Fundador da Legião de Honra do Marechal Rondon, 5 de maio de 1970. - Sumo Título de Mestre do Direito, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 19 de setembro de 1970. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 12 de agosto de 1971. - Prêmio Munis Freire de Pernambuco outorgado pela Associação dos Magistrados do Espírito Santo, 12 de agosto de 1974. - Prêmio Medalha Osvaldo Vergara outorgado pela OAB, Seção do Rio Grande do Sul, 6 de novembro del974. - Professor Emérito da Faculdade de Direito de Olinda, 15 de maio de 1977. - Prêmio Medalha do Mérito Visconde de S. Leopoldo, Olinda, 15 de maio de 1977. - Professor Honoris Causa da Universidade Federal de Alagoas, 1978. - Prêmio Medalha do Mérito Artur Ramos outorgado pelo Governador de Alagoas, março de 1978. - Imortal da Academia Brasileira de Letras, 8 de março de 1979. - Membro Benemérito do Diretório Acadêmico Rui Barbosa. - Membro Efetivo do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul. - Sócio Honorário do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. - Membro da Ordem dos Advogados do Brasil. - Membro da Academia Brasileira de Arte.

Honra ao Mérito, Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Grau de Grã-Cruz (Ordem Albatroz) Museu de História, Sociedade Cultural Tradicionalista. Membro da Association of Symbolic Logic. Membro da Academia Carioca de Letras. Membro da Academia de Artes. Membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas. Membro da Academia Brasileira de Letras. Cidadão Honorário de Minas Gerais.

OBRAS PRINCIPAIS DO

AUTOR

JURÍDICAS

Sistema de Ciencia Positiva do Direito (1922), 2 Tomos; 2. ed., 1972, 4 Tomos. Os Fundamentos atuais do Direito Constitucional

(1932).

Tratado do Direito Internacional Privado, 2 Tomos (1935). Tratado das Ações, I-VIL (1971-1978). Tratado de Direito Privado, Tomos I-LX, 3. ed. Comentários à Constituição da República dos E.U. do Brasil (1934), Tomos I e El. Comentários à Constituição de 10 de novembro de 1937, 1.° e 3.° Tomos. Comentários à Constituição de 1946, 3. ed., Tomos I-VIH. Comentários à Constituição de 1967, Tomos I-VI; 2. ed., com Emenda n. 1. La Conception du Droit internacional privé d'aprés la doctrine et la pratique au Brésil, Recueil des Cours de 1'Académie de Droit Internacional de La Haye, T. 39, 1932. La Création et la Personalité des personnes juridiques Mélanges Streit, Athènes, 1939.

en Droit international

privé,

Nacionalidade e Naturalização no Direito brasileiro (1936). Â Margem do Direito (1912). História e Prática do Habeas Corpus (1916); 7. ed. (1972), 2 Tomos. Tratado de Direito de Família, 3. ed., 3 Tomos (1947). Da Promessa de Recompensa (1927). Das Obrigações por Atos Ilícitos, 2 Tomos (1927). Dos Títulos ao Portador (1921); 2. ed., 2 Tomos. Fontes e Evolução do Direito Civil Brasileiro, história, lacunas e incorreções do Código Civil (1928). Tratado dos Testamentos, 5 Tomos (1930).

Tratado do Direito Cambiário: I. Letra de Câmbio. II. Nota Promissória. Ill Duplicata Mercantil. TV. Cheque, 2. ed., 4 Tomos (1954-1955). Tratado de Direito Predial (1953); 5 Tomos, 2. ed. Comentários ao Código de Processo Civil (1939), 2. ed., Tomos I-DL Comentários ao Código de Processo Civil (de 1973), Tomos I-XVII. Embargos, Prejulgados e Revista no Direito processual brasileiro (1937). Tratado da Ação Rescisória (1973), 5. ed. História e Prática do Arresto ou Embargo (1937). Conceito e Importância da "unitas actus" (1939). Die Zivilgesetz der Gegenwart, Band HI, Brasilien (Einleitung von Dr. Pontes de Miranda), unter Mitwirkung von Dr. Pontes de Miranda u. Dr. Fritz Gericke, herausgegeben von Dr. Karl Heinscheimer (1928). Rechtsgefiihl und Begriff des Rechts (1922). Begriffdes Wertes und soziale Anpassung (1922). Brasilien, Rechtsvergleichendes Handwõrterbuch, do Prof. Dr. Franz Schlegelberger, em colaboração (1929). Questões Forenses, 8 Tomos (1953). Princípio da relatividade gnosiológica e objetiva (1961). Dez anos de Pareceres, 1-10 (1974-1977).

D E FILOSOFIA

O Problema Fundamental do Conhecimento (1937), 2. ed. (1972). Garra, Mão e Dedo (1953). Vorstellung von Raune, Alti del V Congresso Internazionale di Filosofia (1924), Napoli, 1925.

SOCIOLÓGICAS

Introdução à Sociologia Geral (1926), 1.° prêmio da Academia Brasileira de Letras. A Moral do Futuro (1913). Democracia, Liberdade, Igualdade, os três caminhos (1945).

Introdução à Política Científica (1924). Método de Análise Sociopsicológica (1925). O Novos Direitos do Homem (1933). Direito à Subsistência e Direito ao Trabalho (1935). Direito à Educação (1933). Anarquismo, Comunismo, Socialismo (1933). Los Principios y Leis de Simetria en la Sociologia General, Madrid, 1925.

LITERÁRIAS

Poèmes et chansons (1969). Obras Literárias (1960), 2 Tomos. A Sabedoria dos Instintos (1921), 1.° prêmio da Academia de Letras, 2. ed., 1924. A Sabedoria da Inteligência (1923). O Sábio e o Artista, edição de luxo (1929). Penetração, poemas, edição de luxo (1930). Inscrições da Estela Interior, poemas, edição de luxo (1930). Epikiire der Weisheit, München, 2. ed. (1973).

SOBRE OS ATUALIZ ADORES

GISELDA M A R I A FERNANDES NOVAES HIRONAKA

Livre Docente e Doutora pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Professora Titular do Departamento de Direito Civil (DCV) da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Coordenadora Titular dos cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado da Faculdade Autônoma de São Paulo - Fadisp. Consultora Pedagógica do Curso de Direito das Faculdades Alves Faria - Alfa em Goiânia (GO). Coordenadora Geral da área de Direito Civil da Escola Paulista de Direito - EPD, em São Paulo. Diretora nacional para a região sudeste do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Ex-Procuradora Federal. Advogada. Consultora jurídica, parecerista. Conferencista e palestrante em várias cidades brasileiras, e também no exterior. Autora de diversos artigos jurídicos, publicados em veículos da comunicação jurídica de vários Estados brasileiros, especialmente nas áreas do Direito Civil e do Direito Agrário.

PAULO LUIZ NETTO LÔBO

Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Direito Privado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Advogado. Professor Emérito da Universidade Federal de Alagoas. Professor Visitante dos Cursos de Doutorado e Mestrado em Direito da Universidade Federal de Pernambuco. Foi Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, Procurador Geral do Estado de Alagoas, Conselheiro Federal da OAB, Presidente e Relator da Comissão do Conselho Federal da OAB que elaborou o projeto do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906, de 1994), Presidente do Instituto dos Advogados de Alagoas, Presidente da Associação Brasileira de Ensino do Direito. Membro Fundador do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM e do Instituto de Direito Privado. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros, da International Society of Family Law, do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor - Brasilcon, e do Instituto Luso-Brasileiro de Direito Comparado.

PLANO GERAL DA COLEÇÃO PARTE G E R A L

Tomo I - Introdução. Pessoas físicas e jurídicas. Tomo II - Bens. Fatos Jurídicos. Tomo m - Negócios Jurídicos. Representação. Conteúdo. Forma. Prova. Tomo IV - Validade. Nulidade. Anulabilidade. Tomo V - Eficácia jurídica. Determinações inexas e anexas. Direitos. Pretensões. Ações. Tomo VI - Exceções. Direitos mutilados. Exercício dos direitos, pretensões, ações e exceções. Prescrição.

PARTE ESPECIAL

Tomo VII - Direito de personalidade. Direito de família: direito matrimonial (Existência e validade do casamento). Tomo VIH - Dissolução da sociedade conjugai. Eficácia jurídica do casamento. Tomo IX - Direito de Família: Direito Parental. Direito Protetivo. Tomo X - Direito das Coisas: Posse. Tomo XI - Direito das Coisas: Propriedade. Aquisição da propriedade imobiliária. Tomo XII - Direito das Coisas: Condomínio. Edifício de apartamentos. Compáscuo. Terras devolutas. Terras de silvícolas. Tomo X i n - Direito das Coisas: Loteamento. Direitos de vizinhança. Tomo XIV - Direito das Coisas: Pretensões e ações imobiliárias dominicais. Perda da propriedade imobiliária. Tomo XV - Propriedade mobiliária (bens corpóreos).

Tomo XVI - Direito das Coisas: Propriedade mobiliária (bens incorpóreos). Propriedade intelectual. Propriedade industrial. Tomo XVn - Direito das Coisas: Propriedade mobiliária (bens incorpóreos). Propriedade industrial (sinais distintivos). Tomo XVIII - Direito das Coisas: Direitos reais limitados. Enfiteuse. Servidões. Tomo XIX - Direito das Coisas: Usufruto. Uso. Habitação. Renda sobre o imóvel. Tomo XX - Direito das Coisas: Direitos reais de garantia. Hipoteca. Penhor. Anticrese. Tomo XXI - Direito das Coisas: Penhor rural. Penhor industrial. Penhor mercantil. Anticrese. Cédulas rurais pignoratícias, hipotecárias e mistas. Transmissões em garantia. Tomo XXH - Direito das Obrigações: Obrigações e suas espécies. Fontes e espécies de obrigações. Tomo XXm - Direito das Obrigações: Auto-regramento da vontade e lei. Alteração das relações jurídicas obrigacionais. Transferência de créditos. Assunção de dívida alheia. Transferência da posição subjetiva nos negócios jurídicos. Tomo XXIV - Direito das Obrigações: Efeitos das dividas e das obrigações. Juros. Extinção das dívidas e obrigações. Adimplemento. Arras. Liquidação. Depósito em consignação para adimplemento. Alienação para liberação. Adimplemento com sub-rogação. Imputação. Compensação. Tomo XXV - Direito das obrigações: Extinção das dívidas e obrigações. Dação em soluto. Confusão. Remissão de dívidas. Novação. Transação. Outros modos de extinção. Tomo XXVI - Direito das Obrigações: Consequências do inadimplemento. Exceções de contrato não adimplido, ou adimplido insatisfatòriamente, e de inseguridade. Enriquecimento injustificado. Estipulação a favor de terceiro. Eficácia protectiva de terceiro. Mudanças de circunstâncias. Compromisso. Tomo XXVn - Concurso de credores em geral. Privilégios. Concurso de credores civil. TomoXXVm - Direito das Obrigações: Falência. Caracterização dafalênciaedecretação da falência. Efeitos jurídicos da decretação da falência. Declaração de ineficiência relativa de atos do falido. Ação revocatoria falencial. Tomo XXIX - Direito das Obrigações: Administração da massa falencial. Restituições e vindicações. Verificação de créditos. Classificação de créditos. Inquérito judicial. Liquidação. Extinção das obrigações.

Tomo XXX - Direito das obrigações: Concordatas. Crimes falenciais. Liquidações administrativas voluntárias e coativas. Tomo XXXI - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais. Denúncia. Revogação. Reconhecimento. Promessas unilaterais. Traspasso bancário. Promessa de recompensa. Concurso. Tomo XXXn - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais. Títulos ao portador. Tomo XXXIII - Direito das Obrigações: Títulos ao portador (continuação). Títulos nominativos. Títulos endossáveis. Tomo XXXIV - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais. Direito cambiário. Letra de Câmbio. Tomo XXXV - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais. Direito cambiário. Letra de Câmbio. Nota promissória. Tomo XXXVI - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos unilaterais Direito cambiariforme. Duplicata mercantil. Outros títulos cambiariformes. Tomo XXXVH - Direito das Obrigações: Negócios Jurídicos unilaterais. Direito cambiariforme. Cheque. Direito extracambiário e extracambiariforme. Direito internacional cambiário e cambiariforme. Tomo XXXVin - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos bilaterais e negócios jurídicos plurilarerais. Pressupostos. Vícios de direito. Vícios do objeto. Evicção. Redibição. Espécies de negócios jurídicos bilaterais e de negócios jurídicos plurilaterals. Tomo XXXIX - Direito das Obrigações: Compra-e-venda. Troca. Contrato estimatório. Tomo XL - Direito das Obrigações: Locação de coisas. Locação de uso. Locação de uso e fruição. Tomo XLI - Direito das Obrigações: Locação de coisas. Renovação de contrato de locação. Fretamento. Tomo XLH - Direito das Obrigações: Mútuo. Mútuo arisco. Contrato de conta corrente. Abertura de crédito. Assinação e Acreditivo. Depósito. Tomo XLm - Direito das Obrigações: Mandato. Gestão de negócios alheios sem outorga. Mediação. Comissão. Corretagem. Tomo XLIV - Direito das Obrigações: Expedição. Contrato de agência. Representação de empresa. Fiança. Mandato de crédito. Constituição de renda. Promessa de dívida. Reconhecimento de dívida. Comunidade. Edição. Representação teatral, musical e de cinema. Empreitada.

Tomo XLV - Direito das Obrigações: Contrato de transporte. Contrato de parceria. Jôgo e aposta. Contrato de seguro. Seguros terrestres, marítimos, fluviais, lacustres e aeronáuticos. Tomo XLVI - Direito das Obrigações: Contrato de Seguro (continuação). Seguro de vida. Seguros de acidentes pessoais. Seguro de responsabilidade. Seguro de crédito. Seguros de riscos especiais e de universalidade. Seguros mutuos. Resseguro. Contrato de comodato. Contrato de doação. Contrato de hospedagem. Tomo XLVTI - Direito das Obrigações: Contrato de locação de serviços. Contrato de trabalho. Tomo XLVIH - Direito das Obrigações: Contrato coletivo do trabalho. Contratos especiais de trabalho. Preposição comercial. Ações. Acordos em dissídios coletivos e individuais. Contrato de trabalho rural. Tomo XLIX - Contrato de sociedade. Sociedades de pessoas. Tomo L - Direito das Obrigações: Sociedade por ações. Tomo LI - Direito das Obrigações: Sociedade por ações (continuação). Sociedade em comandita por ações, Controle das sociedades. Sociedades de investimento, de crédito e de financiamento. Tomo LII - Direito das Obrigações: Negócios jurídicos bancários e de Bolsa. Corretagem de seguros. Transferência de propriedade mobiliária, em segurança. Subscrição, distribuição e colocação de títulos e valores mobiliários. Tomo LEI - Direito das Obrigações: Fatos ilícitos absolutos. Atos-fatos ilícitos absolutos. Atos ilícitos absolutos. Responsabilidade. Danos causados por animais. Coisas inanimadas e danos. Estado e servidores. Profissionais. TomoLIV - Direito das Obrigações: Responsabilidade das emprêsas de transporte. Exercício ilícito na Justiça. Danos à pessoa. Acidentes do trabalho. Pretensão e ação. Dever de exibição. Liquidação das obrigações. Cominação. Tomo LV - Direito das Sucessões: Sucessão em Geral. Sucessão legítima. TomoLVI - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Testamento em geral. Disposições testamentárias em geral. Herança e legados. TomoLVn - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Disposições testamentárias em geral. Herança e legados. Tomo LVIII - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Disposições testamentárias em geral. Formas ordinárias do testamento. TomoLIX - Direito das Sucessões: Sucessão testamentária. Testamentos. Codicilo. Revogação. TomoLX - Direito das Sucessões: Testamenteiro. Inventário e Partilha.

TÁBUA SISTEMÁTICA DAS MATÉRIAS LIVRO V DIREITO DAS

SUCESSÕES

TÍTULO I SUCESSÃO EM

GERAL

CAPÍTULO I SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE EM GERAL, CONCEITO E NATUREZA

§ 5.584. CONCEITO E NATUREZA DA SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE...

53

1. Sucessão a causa de morte e sucessão entre vivos. 2. Sucessão a causa de morte a título universal e a título particular. 3. Dados históricos e fundamento da sucessão. 4. Fato jurídico da morte § 5.585. MOMENTO EM QUE TÊM DE EXISTIR OS PRESSUPOSTOS PARA A SUCESSÃO

58

1. Sucessibilidade. 2. Conclusões. 3. Existência do herdeiro no momento da morte. 4. Lugar em que se abre a sucessão CAPÍTULO II T R A N S M I S S Ã O DA

PROPRIEDADE

E DA P O S S E

§ 5.586. CONCEITO E NATUREZA DA TRANSMISSÃO DA PROPRIEDADE (LATO SENSO) EDA POSSE 1. Posição do problema no sistema jurídico brasileiro. 2. Direito romano

63

§ 5.587. SAISINA, NO DIREITO BRASILEIRO

65

1. Fontes do direito brasileiro. 2. Legitimação dos herdeiros quanto ao todo da herança. 3. Visão retrospectiva e contemporânea.

4. Herdeiros testamentários. 5. Herdeiro desconhecido e herdeiro ausente § 5.588. POSSE IMEDIATA ENQUANTO SE FAZEM O INVENTÁRIO E A PARTILHA

76

1. Posse imediata da herança. 2. Morte do marido se a mulher não estava vivendo com êle § 5.589. NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE

80

1. Cônjuge inventariante. 2. Herdeiro na posse e administração da herança. 3. Herdeiro mais idôneo. 4. Testamenteiro. 5. Inventariante dativo. 6. Legitimação à inventariança, feita abstração do interesse CAPÍTULO III A C E I T A Ç Ã O E R E N Ú N C I A DA H E R A N Ç A

§ 5.590. ATITUDE VOLITIVA DOS HERDEIROS

95

1. Precisões. 2. Transmissão da herança e aceitação. 3. Prazo judicial. 4. Transferência do direito de manifestar-se § 5.591. ACEITAÇÃO DA HERANÇA

103

1. Conceito e espécies. 2. Forma de adição. 3. Aceitação escrita. 4. Aceitação tácita. 5. Mulher casada, herdeira ou legatária. 6. Menores e curatelados. 7. Outorga de podêres para a adição e para a renúncia. 8. Existência e validade. 9. Pressupostos do direito do credor § 5.592. RENÚNCIA DA HERANÇA

114

1. Conceito e natureza. 2. Dados históricos. 3. Direito brasileiro. 4. Pressuposto formal da renúncia. 5. Poder para renunciar. 6. Cláusulas inválidas. 7. Existência e validade da renúncia § 5.593. NULIDADE E ANULABILIDADE, RETRATAÇÃO E REVOGAÇÃO ...

119

1. Aceitação e renúncia. 2. Aceitação válida e renúncia válida. 3. Retratação. 4. Aceitação e revogabilidade § 5.594. ATOS DO HERDEIRO ANTES DE ACEITAR OU DE RENUNCIAR...

123

1. Atos anteriores à manifestação de vontade do herdeiro. 2. Ação contra terceiro. 3. Atos anteriores à aceitação ou à renúncia. 4. Ação contra o herdeiro § 5.595. CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS DA RENÚNCIA E DA OMISSÃO.... 1. Sucessão legítima. 2. Falecimento do herdeiro antes de aceitar ou de renunciar a herança

126

§ 5.596. R E S P O N S A B I L I D A D E D O H E R D E I R O

130

1 Problema de técnica legislativa. 2. Reconhecimento de dívida do monte hereditário. 3. Imposto de transmissão a causa de morte CAPÍTULO IV HERANÇA JACENTE

§ 5.597. J U Í Z O D A S S U C E S S Õ E S

135

1. Leis federais e leis locais. 2. Medidas cautelares § 5.598. J A C Ê N C I A D A H E R A N Ç A

136

I. Conceituação através dos tempos. 2. Herança jacente e administração. 3. Arrecadação e provocação da arrecadação. 4. Causas de pré-exclusão da arrecadação. 5. Existência de procurador. 6. Suspensão da arrecadação. 7. Prazo para conclusão de inventário. 8. Regras jurídicas sobre alguns bens. 9. Habilitação de herdeiros. 10. Processo arrecadativo e eficácia das decisões. 11. Decujo estrangeiro § 5.599. VACÂNCIA DA HERANÇA

155

1. Conceituação. 2. Herança vacante. 3. Cumulação objetiva sucessiva de ações. 4. Sentença que proclama a vacância dos bens. 5. Ação de petição de herança e ação dos curadores. 6. Ação de cognição incompleta e ação de petição de herança. 7. Ações de credores e ações reais

CAPÍTULO V E X C L U S Ã O DA H E R A N Ç A

§ 5.600. HERDEIROS QUE SÃO EXCLUÍDOS

163

1. Noções preliminares. 2. Incapacidade e indignidade para suceder § 5.601. CAUSAS DE INDIGNIDADE

166

1. Precisões. 2. Direito romano. 3. Direito luso-brasileiro. 4. Enumeração exaustiva. 5. Declaração de vontade do decujo para preeliminar a exclusão da herança § 5.602. SENTENÇA DE EXCLUSÃO DA SUCESSÃO POR INDIGNIDADE E EFICÁCIA DO ATO EXCLUDENTE 1. Sentença de exclusão e sua classificação. 2. Nascimento da ação. 3. Pluralidade de fundamentos ou de ações

172

§ 5.603. EFICÁCIA DA SENTENÇA DE EXCLUSÃO, DIREITOS E DEVERES DO EXCLUÍDO 1. Fôrça desconstitutiva da sentença. 2. Frutos e rendimentos. 3. Atos de administração e alienações. 4. Indenização ao indigno excluído. 5. Administração e usufruto dos bens que, pela exclusão da sucessão, foram herdados pelo descendente CAPÍTULO V I PETIÇÃO DE HERANÇA

§5.604. CONCEITO E NATUREZA DA AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA... 1. "Hereditatis petitio". 2. Fusão de ações. 3. Ação de petição de herança e ação declaratória do direito hereditário. 4. Natureza da ação de petição de herança. 5. Prescrição da ação de petição de herança. 6. Coisa julgada e sentença na ação de prestação de herança. 7. Ações de restituição fora da ação de petição de herança

181

§ 5.605. LEGITIMAÇÃO ATIVA E PASSIVA

189

1. Legitimação ativa na ação de petição de herança. 2. Legitimação passiva § 5.606. ALEGAÇÕES E PROVAS 1. Prova e ônus da prova. 2. Bens objeto da ação de petição da herança

192

§ 5.607. EFICÁCIA SENTENCIAL...5

195

1. Eficácia da sentença na ação de petição de herança. 2. Restituição dos bens. 3. Boa fé do possuidor da herança. 4. Gastos do possuidor § 5.608. HERANÇA VACANTE E PETIÇÃO DE HERANÇA 1. Ação declaratória de petição de herança. 2. Precisão

199

§ 5.609. POSSE E USUCAPIÃO 1. Usucapião e petição de herança. 2. Posse de coisa singular. 3. Pretensões do herdeiro

200

TÍTULO II SUCESSÃO LEGÍTIMA CAPÍTULO I CONCEITO E NATUREZA DA C O M U N H Ã O A C A U S A DE M O R T E

§ 5.610. COMUNHÃO PRIMITIVA E COMUNHÃO ANTIGA 1. Comunhão primitiva. 2. Dois conceitos fundamentais: comunhão, devolução. 3. Comunhão "pro indiviso", comunhão "pro diviso" e

desmembramento da propriedade no direito das sucessões. 4. Comunhão "pro diviso" e os seus caracteres. 5. Comunhão e sociedade; caracteres distintivos § 5.611 ESPÉCIES DE COMUNHÃO 1 Classificação gradativa dos tipos de comunhão. 2. Efeitos da comunhão e seus possíveis incidentes

211

§ 5.612 COMUNHÃO DE HERDEIROS

213

1. Aparição da comunhão de herdeiros. 2. Comunhão de herdeiros. 3. Noção de devolução e direito das sucessões. 4. Direito espartano. 5. Direito romano § 5.613. SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE, PRESSUPOSTOS ESSENCIAIS E DIVISÃO

218

1. Pressupostos para que se dê a transmissão hereditária. 2. Divisão da herança como problema de política CAPÍTULO II C O N C E I T O E N A T U R E Z A DA A CAUSA DE

SUCESSÃO

MORTE

§ 5.614. CONCEITO DE SUCESSÃO

221

1. O que é suceder. 2. Conceito de sucessão. 3. Fundamento da sucessão a causa de morte. 4. Dados históricos. 5. Sucessão e espécies de sucessão § 5.615. PATRIMÔNIO E SUCESSÃO

226

1. Morte e patrimônio. 2. Patrimônio e transmissão. 3. Capacidade de direito de herdar § 5.616. ESPÉCIES DE SUCESSÃO E EFEITOS DA MORTE

229

1. Espécies de transmissões por extinção de pessoa. 2. Sucessão e direitos dos que sucedem. 3. Morte, elemento principal do suporte fáctico da herança. 4. Negócios jurídicos "mortis causa". 5. Momento em que se opera a sucessão a causa de morte. 6. Prova da morte. 7. Lugar em que se abre a sucessão a causa de morte. 8. Capacidade de ser parte e morte § 5.617. DERIVATIVIDADE DA SUCESSÃO HEREDITÁRIA 1. Natureza da sucessão a causa de morte. 2. Desaparição do vácuo entre a morte e a transmissão da herança. 3. Herdeiros legítimos necessários e não-necessários

239

CAPÍTULO III SUCESSÃO LEGÍTIMA NECESSÁRIA E SUCESSÃO LEGÍTIMA NÃO-NECESSÁR1A

§ 5.618. SUCESSÃO LEGÍTIMA

2 43

1. Elementos essenciais da sucessão. 2. Sucessão legítima e sucessão testamentária § 5.619. SUCESSÃO LEGÍTIMA NECESSÁRIA

248

1. Fundamentos e dados históricos. 2. Direito Romano. 3. Direito germânico. 4. Direito luso e luso-brasileiro § 5.620. QUOTA NECESSÁRIA

256

1. Fundamento da quota necessária. 2. Natureza dos direitos dos herdeiros necessários. 3. Filhos legítimos e filhos legitimados. 4. Filhos ilegítimos reconhecidos. 5. Filhos adotivos. 6. Ascendentes § 5.621. HERDEIROS LEGÍTIMOS NÃO-NECESSÁRIOS

269

1. Cônjuge. 2. Êrro de redação que se corrigiu. 3. Regras jurídicas de leis ordinárias. 4. Parentes colaterais § 5.622. DEVOLUÇÃO AO ESTADO

286

1. Dados históricos. 2. Ordem da sucessão. 3. Posse própria e posse imprópria. 4. Entidades estatais herdeiras legítimas § 5.623. ENTIDADES ESTATAIS SUCESSORAS LEGITIMÁRIAS

289

1. Atribuição conforme discriminação territorial. 2. Herança legítima pela entidade estatal e tributação CAPÍTULO IV DIREITO DE R E P R E S E N T A Ç Ã O

§ 5.624. CONCEITO E PRESSUPOSTOS

293

1. Conceito. 2. Pressupostos. 3. Renúncia pelo que teria herdado do substituído. 4. Indignidade em relação ao representado § 5.625. LINHA RETA DESCENDENTE 1. Substituição legitimária pelos descendentes. 2. Ascendentes e descendentes

307

§ 5.626. LINHA TRANSVERSAL I Limitação à substituição legitimaria na linha transversal. 2. Problemas que surgem § 5.627. PORÇÃO LEGÍTIMA 1 Sucessão substitutiva. 2. Divisão da porção entre os substitutos CAPÍTULO V DIREITO E S O B R E D I R E I T O DA S U C E S S Ã O

LEGÍTIMA

§ 5.628. DIREITO NO ESPAÇO E NO TEMPO

321

1. Precisões. 2. Sucessão legítima e direito intertemporal. 3. Sucessão legítima e direito internacional privado § 5.629. DIREITO INTERTEMPORAL DA SUCESSÃO LEGÍTIMA

325

1. Princípios. 2. Dia da morte do decujo e doações. 3. Aceitação e renúncia da herança. 4. Renúncia e lei do dia da morte do decujo. 5. Sucessão legítima e fiduciariedade. 6. Transmissão da herança, jacência e vacância § 5.630. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

333

1. Princípios. 2. Direito brasileiro CAPÍTULO V I DESERDAÇÃO

§ 5.631. CONCEITO E NATUREZA DA DESERDAÇÃO

335

1. Conceito. 2. Natureza da deserdação. 3. Testamento e deserdação. 4. Momento em que se deserda § 5.632. CAUSA DA DESERDAÇÃO 1. Causas suficientes. 2. Causas comuns à indignidade e à deserdação. 3. Deserdação pelo ascendente. 4. Deserdação pelo descendente. 5. Prova em juízo CAPÍTULO V I I COLAÇÃO

§ 5.633. NATUREZA E ORIGEM DA COLAÇÃO 1. Natureza da colação. 2. Direito romano. 3. Dever de conferência. 4. Terminologia equívoca. 5. Volta de valores ao patrimônio e colação

339

§ 5.634. REDUÇÃO E COLAÇÃO

358

1. Dois conceitos. 2. Ação de redução § 5.635. LEGITIMAÇÃO PASSIVA

360

1. Dever de colação e objeto da colação. 2. Herdeiro legítimo necessário descendente. 3. Sonegação e perda pelo herdeiro necessário descendente. 4. Pré-eliminação e eliminação do dever de colação. 5. Bens em colação. 6. Instituição testamentária dos herdeiros legítimos descendentes §5.636. LEGITIMAÇÃO ATIVA

368

1. Direito a exigir a colação. 2. Fundamento da legitimação ativa § 5.637. RENÚNCIA DA HERANÇA E COLAÇÃO

375

1. Regra jurídica especial. 2. Direito estrangeiro § 5.638. PROBLEMAS LIGADOS À DESCENDÊNCIA

377

1. Beneficiados que prefaleceram. 2. Liberalidades a descendentes do herdeiro. 3. Liberalidades anteriores à aquisição dos pressupostos da sucessibilidade legítima necessária. 4. Herdeiro legítimo necessário descendente, que também é herdeiro testamentário, ou legatário. 5. Pluralidade de beneficiados. 6. Liberalidades a cônjuge do herdeiro. 7. Liberalidades feitas pelos cônjuges. 8. Credores da herança § 5.639. CONCEITO E ESTRUTURA DA COLAÇÃO

382

1. Precisões conceptuais. 2. Opiniões superficiais e pretensa interpretação literal. 3. Eliminação de dados que confundem. 4. Colação e contabilidade § 5.640. BENS, ESPÉCIES, COLAÇÃO E VALÔRES

390

1. Precisões. 2. Bens cujos valores têm de ir à colação. 3. Bens que se têm de incluir no acervo (parte legítima + parte disponível). 4. Bens que não vão à colação § 5.641. VALOR COLACIONÁVEL 1. Precisões. 2. Princípio do valor na data da doação. 3. Perecimento, deterioração ou desvalorização. 4. Valorizações, benfeitorias acrescidas, ou outros aumentos ou prestações. 5. Quota disponível. 6. Colação e correção monetária

401

§ 5.642. COLAÇÃO E CLÁUSULAS 1 Cláusula de inserção em herança ou legado. 2. Natureza e eficácia da cláusula que afasta o adiantamento da legítima necessária do d e s c e n d e n t e . 3. Problema da irrevogabilidade e forma do ato. 4. Afastamento implícito do princípio do adiantamento. 5. Doação com cláusula de reversibilidade. 6. Doação com reserva de usufruto, uso, fruição ou habitação. 7. Instituição universal. 8. Partilha entre vivas e partilha em testamento. 9. Afastamento em testamento e forma exigida § 5.643. PERECIMENTO OU PERDA DO BEM DOADO

410

423

1. Perecimento ou perda anterior e perecimento ou perda posterior à morte do decujo. 2. Dificuldades eventuais CAPÍTULO V I I I CONCLUSÕES SOCIOLÓGICAS E JURÍDICAS

§ 5.644. SUCESSÃO EM GERAL

427

1. Épocas primitivas. 2. Direito romano. 3. Sucessão legítima § 5.645. PROBLEMAS QUE RESULTAM DA INCLUSÃO NUMA DAS DUAS METADES 1. Divisão e partilha. 2. Doação a descendente e inclusão na parte disponível. 3. Herança legítima não-necessária

430

LIVRO Y DIREITO DAS

SUCESSÕES

TÍTULO I SUCESSÃO EM GERAL

CAPÍTULO I

SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE E M GERAL, CONCEITO E NATUREZA

§ 5.584. CONCEITO E NATUREZA DA SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE 1. SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE E SUCESSÃO E N T R E VIVOS. - A s u -

cessão a causa de morte é tôda sucessão em que há o prefalecido e o sobrevivente, ou os sobreviventes, que recolhem a herança, senso lato, isto é, os herdeiros, os legatarios e outros beneficiados. Quando se fala de Direito das Sucessões, como se só existissem sucessões a causa de morte, emprega-se o têrmo em sentido limitativo, porque, em terminologia jurídica, há a sucessão a causa de morte e a sucessão entre vivos. Numa e na outra há a subentrada (sub, cedere). Há sucessores que não são a causa de morte. Nem se pode dizer que só haja sucessão universal se mortis causa. Nem cabe sublinhar-se que na sucessão entre vivos há quem perca e quem adquira, porque o alienante ou perdente está vivo. Há sucessão a causa de morte sem ser de universitas, como há sucessão de universitas entre vivos. Há opiniões que vêem na herança universitas iuris, porque os herdeiros respondem pelas dívidas (e. g., A N T Ô N I O Cicu, Natura giuridica delia vocazione nell'usufrutto di eredità, Foro Italiano, IV, 1 3 4 ; LODOVICO BARASSI, La Succesione legittima, 3 3 ) . Tão-pouco se há de dizer que só a sucessão a causa de morte seja successio in ius, ou successio in omne ius, ou successio per universitatem, de jeito que tôdas as sucessões entre vivos seriam successio in rem, ou successio in rerum singularum dominium. Sobre universalidades, empresas e fundo de emprêsa, cf. Tomo XV, §§ 1.797-1.832.

Herança, em sentido largo, compreende a herança, os legados e outros beneficios. Herança, em senso estrito, o que passa do morto a outra pessoa, ou outras pessoas, como patrimônio, ou parte de patrimônio. Então, hereditas nihil aliud est quam successio in universum ius quod defunctus habuit (L. 24, D., de verborum significatione, 50, 16). A sucessão a causa de morte nada tem com a personalidade do morto. Herdeiros sucedem nos bens, não na pessoa do decujo (cf. VITTORIO POLACCO, Delle Successioni, I, 5). O erro veio de textos romanos (L. 59, D., de diversis regulis iuris antiqui, 50, 17: "Heredem eiusdem potestatis iurisque esse, cuius fait defunctus, constat"; L. 1, § 13, D., quod legatorum, 43, 3; Nov. 48, pr.). Nem seria admissível que se falasse de representação do defunto pelos herdeiros: o decujo morreu; não é mais. No momento da morte o patrimônio transmite-se. A lei que rege a sucessão é a do momento em que morre o decujo (Código Civil, art. 1.577, onde não se há de ver apenas a lex nova sobre incapacidade). Se alguma lei permite a ação de reconhecimento após o desquite, e tal foi o que aconteceu com a Lei n. 883, de 21 de outubro de 1949, art. 1.°, in fine, a aplicação de tal regra jurídica de modo nenhum ofende o princípio da irretroeficácia das leis, porque é ineliminável o efeito declarativo da sentença. Ao tempo em que faleceu o genitor, a pessoa que propõe a ação já era filho e o genitor morreu desquitado ou divorciado Por isso temos de repelir o julgado da 2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 7 de junho de 1938 (R. dos T., 118, 266) e a 18 de junho de 1946, que considerou lei retroativa, portanto contra a Constituição, a lei que, após a morte do decujo, permite reconhecimento que antes não era permitido (cp. Tribunal de Apelação do Rio Grande do Norte, 28 de fevereiro de 1940). Frisaram, acertadamente, que a lei que regula a prova, se concerne a fato futuro, presente, ou passado, não é acoimável de retroativa se o fato, a que se aplica, foi anterior à morte do decujo, as Câmaras Reunidas do Tribunal de Apelação do Estado do Rio de Janeiro, a 12 de outubro de 1938 (R. dos T., 117, 296). Acertada é a solução a respeito de adoção que se fêz antes da lei que confere direitos hereditários a filho adotivo, se ao tempo da morte do decujo já os tinha (l, a Turma do Tribunal de Apelação do Pará, 5 de fevereiro de 1941, R. dos T. de A. do E. do R, III, 20). 2 . SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE A TÍTULO UNIVERSAL E A TÍTULO, PARTICULAR.

- A sucessão mortis causa pode ser a título universal, ou a

I 5.584. C O N C E I T O E N A T U R E Z A D A S U C E S S Ã O A C A U S A D E M O R T E



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título particular. A contraposição não deixa margem a que se atribuam os bens sem que alguém fique responsável pela satisfação das dívidas. O legatário, que é sucessor a título particular, não pode suceder em bem que seria atingido pelo pagamento dos débitos da massa hereditária. Se solve dívida da herança, tem ação contra o herdeiro, ou contra os herdeiros; mas, se, por exemplo, há o legado e é quase sem valor o todo do espólio, e o herdeiro e os herdeiros nada receberiam, por ser mais do que o valor do restante o passivo do decujo, tem-se de reduzir o legado, ou o legatário, para recebê-lo, há de prestar o que resta de dívida. 3. DADOS HISTÓRICOS E FUNDAMENTO DA SUCESSÃO. - De sucessão a causa de morte, nos primitivos, somente se poderia cogitar quanto às armas de sílex duro, que êles cortavam para a defesa contra os animais, quando se fêz carnívoro pela escassez das frutas. Quando desceu das árvores para se alojar perto das águas e em planaltos areentos, onde havia as matérias-primas de que necessitava, teve - após milênios - de construir vivendas e o pêlo já lhe não bastava para se proteger contra o frio. Compreende-se que os sobreviventes permanecessem na choupana e inumassem o falecido. Alguns objetos eram postos perto dêle. Enquanto não apareceu a propriedade individual, o conceito de sucessão a causa de morte não podia corresponder ao dos tempos de hoje. Os filhos já eram titulares do direito em comum. Telêmaco, ao falar dos bens de Ulisses, dizia que eram "bens seus", bem próprios, oíxov è|j.óv (Odisséia, XVI, 128). Está em PLUTARCO (Licurgo, 16) o que se passava no direito espartiata. Desde o nascimento, a compropriedade era adquirida pelo filho. Tal como na índia (Mitakchara, 41, 44 e 45). Nos poemas homéricos alude-se a partilha, seja entre mortais, seja entre deuses, mas tais poemas devem ser do tempo da propriedade individual (cf. P. G U I R A U D , La Propriétéfoncière en Grèce jusqu'á la conquête romaine, 55). Textos da Lei de Gortina (V. 28-34) mostram que em Creta ainda havia repulsa à partilha sucessoral, razão por que se estabeleceram medidas constrititivas (cf. W. RÕNNBERG, Das Erbrecht von Gortyna, 22 s.). Os parentes eram os que comiam na mesma mesa e se aqueciam perto do mesmo fôgo. As palavras gregas são expressivas (õpociuróouç, opoxárouç). O testamento apareceu tarde no direito ático até a legislação solônica no direito de Gortina e no direito germânico. As leis de Hamurabi regularam o direito sucessório (162-184).

Pelo que se sabe através dos papiros, a divisio parentum inter liberos foi freqüente no Egito, após tempos (VINCENZO ARANGIO-RUIZ, La Suecessione testamentaria secondo i papiri greco-egizii, 1 1 ; ERNST RABEL, Elterliche Teilung, Festschrift zur 49. Versammlung deutschen Philologen und Schulmanner in Basel im Jahre 1907, 512-538). Havia diferenças entre o instituto egípcio e o romano. Fingia-se, naquele, ter havido venda, com os dois títulos de transmissão (o da propriedade e o da posse) e com a transmissão imediata da propriedade, de modo que os genitores ficavam como administradores e usufrutuários. No direito greco-egipcio, os outorgados pagavam o imposto de transmissão. Quanto à sucessão legítima, o sistema de graus do direito romano e a distinção entre agnação e cognação, para a sucessão, não existiam. Ainda a sucessão era, em primeiro plano, da comunidade familiar. Fugindo ao antigo direito grego, com a preferência pelos parentes masculinos, fêz-se a pacificação. O primogênito tinha quota maior. morte é fato jurídico O ser humano deixou de ser pessoa. Houve a morte civil. Êle não existe mais. No direito romano, herdeiros somente havia quem os tinha com status libertatis, status civitatis, e era pessoa sui iuris (L. 11, D., de fideiussoribus et mandatoribus, 46,1; L. 4, C, communia de successinibus, 6, 59). 4 . FATO JURÍDICO DA MORTE. - A

Se algum efeito se irradiou no momento mesmo em que o decujo faleceu, tem-se de considerar adquirido o direito, ou a pretensão, ou a ação, ou a exceção. Momento mesmo da aquisição e da morte é momento que dificilmente se fixa. Daí ter-se de supor anterior à morte a irradiação da eficácia (Momentum mortis vitae tribuitur). A declaração de morte é medida que se toma mesmo se não se trata de sucessão. Dela teremos de cogitar, extensivamente, porque o sistema jurídico lhe atribui a eficácia do fato jurídico da morte. A morte só se refere às pessoas físicas. Não há morte das pessoas jurídicas: há extinção. Se ocorre a morte, ou se há a declaração de morte, há a transmissão automática aos herdeiros: "Aberta a sucessão" - entenda-se "morto o decujo" - "o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários" (Código Civil, art. 1.572). O legislador deveria ter dito: "Aberta a sucessão, a titularidade dos direitos, pretensões, ações e exceções, bem como a posse, que se compreendem na herança,

CONCEITO E NATUREZA DA SUCESSÃO A CAUSA DE MORTE



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desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários". Porque não só os direitos de propriedade, nem só, a fortiori, o domínio e a posse se transmitem, automáticamente; o que era transmissível transmitiu-se no momento da morte. transmitem-se,

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.584. A - Legislação A sucessão a causa de morte está assegurada na Constituição de 1988 no art. art. 5.°, XXX, como direito à herança, e no Código Civil de 2002, nos arts. 1.784 e ss., segundo a modalidade de saisine.

§ 5.584. B - Doutrina

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1. Segundo os dados de ciência atualmente irrefutáveis, tem sido entendido que para se apurar a morte da pessoa o órgão determinante é o cérebro, máxime considerando que procedimentos e equipamentos médico-hospitalares podem prolongar artificialmente a vitalidade de outros órgãos do corpo humano. Assim, a morte encefálica, constatada indiscutivelmente pela equipe médica, constitui o fim da pessoa, ainda que outros órgãos do corpo sejam mantidos artificialmente, pois não existe mais autonomia de vida pessoal. 2 . 0 direito brasileiro também admite a presunção definitiva da morte da pessoa desaparecida (art. 7.° do CC/2002); são eventos e circunstâncias com altíssimo grau de probabilidade da morte, nos quais o corpo não é encontrado; a data provável do falecimento deve ser preferencialmente a da ocorrência do fato ou da tragédia e não do encerramento das buscas, o que define o momento da abertura da sucessão. 3. A Lei 9.140/1995 reconhece como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas no período de 02.09.1961 a 15.08.1979, com imediata abertura da sucessão e da viuvez, sem necessidade do processo de ausência.

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§ 5.584. C - Jurisprudência]

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De acordo com o STJ, a herança é modalidade de aquisição da propriedade'

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imóvel, que se transfere aos herdeiros com a abertura da sucessão e não com o registro imobiliário, esclarecendo o efeito da saisine (STJ, REsp 48199/MG, 4 . a T „ j. 30.05.1994, rei. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ27.06.1994, p. 16990).

§ 5.585. MOMENTO EM QUE TÊM DE EXISTIR OS PRESSUPOSTOS PARA A SUCESSÃO

propósito da existência dos requisitos subjetivos para que alguém suceda, devemos repelir falar-se de incapacidade, porque, mesmo a respeito da exclusão, a palavra "incapacidade" é imprópria (cf. Código Civil, arts. 1.595-1.602). Houve incapacidades de adquirir sucessòriamente, ora fundadas em vínculos religiosos, ou de nacionalidade, ora em condenações criminais. A das ordens religiosas foi apagada, radicalmente, pela Constituição brasileira de 1891, art. 72, § 3.°, onde se disse: "Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para êsse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum". Cfr. Constituição de 1934, artigo 113, 4) e 5); Constituição de 1937, art. 122, 4; Constituição de 1946, art. 141, §§ 7.° e 8.°; Constituição de 1967, art. 150, §§ 5.° e 6.°. A sociedade, corporação, ou fundação, que não tem personalidade jurídica, não herda, porque não é pessoa, e só pessoas herdam, e não por serem incapazes. Aliás, no sistema jurídico brasileiro, pode haver disposição testamentária a favor de prole eventual de pessoa designada pelo testador (Código Civil, art. 1.718; cp. art. 1.169 e 4.°), como pode o testador criar mortis causa fundação ou outra pessoa jurídica, incumbindo alguém, herdeiro ou não, de transferir-lhe os bens (modus principal). Mais ainda: o beneficiado, no modus, pode ser animal, vegetal ou objeto. 1. SUCESSIBILEDADE. - A

Quando a lei pré-exclui alguém da sucessibilidade legítima, não há incapacidade. Quando se impede que, na constância da sociedade conjugai, o cônjuge reconheça o filho adulterino, com isso não se criou incapacidade. O caso que pode suscitar dúvidas é o da deixa a concubina do testador que ainda estava, ao morrer, em sociedade conjugal. O art. 1.719, III, do Código Civil estatui que não pode ser nomeada herdeira, ou legatária, a "concubina do testador casado". Teremos de revelar, oportunamente, o conteúdo dessa regra jurídica. Mas, pergunta-se, ¿o caso é de a) incapacidade da concubina, ou de b) proibição ao testador? Se b), a regra jurídica é de invalidade da disposição testamentária. Aliás, no art. 1.720, se fala de serem nulas as disposições, a despeito de se chamarem "incapazes" aos que seriam beneficiados nas espécies do art. 1.719,1-IV. Cp. arts. 247, IV, e 1.177. Quando os textos se referem a marido, entenda-se ao cônjuge, porque a doação feita pela mulher, mesmo se com a qual assentiu o marido, ao amante, é anulável por infração do art. 1.177, e assim se há de entender a deixa

testamentária que foi feita pela mulher ao amante (cf. Tomo n, § 133,1; IH, s 263 1 3- IV, § 394, 5; VI, §§ 708, 2; 710, 1; VH, § 765 10; VHI, §§ 851, 2- 852 í- 856, 6; 865 1; 941, 4; IX, § 969, 3; XXH, § 2.765, 2, 4; XXVI, §3.158, 5; XL, 4.435, 6; XLVI §§ 4.963, 2; 5.019, 7; 5.022, 1; 5.026, 3). Não há incapacidade, mas sim anulabilidade pelo motivo imoral. 2. CONCLUSÕES. - Uma vez que se permite a sucessão pela prole eventual de alguém, bem como pela entidade que, através de alguma pessoa, indicada pelo testador, vai ser criada e personificada, abre-se exceção ao princípio da contemporaneidade da morte com os pressupostos da sucessibilidade. Temos de ler diferentemente o art. 1.577. Nêle está dito: "A capacidade para suceder é a do tempo da abertura da sucessão, que se regulará conforme a lei então em vigor" Influência do Código Civil francês, art. 906, 2.a alínea, do Código Civil austríaco, art. 545, do Código Civil espanhol, art. 758, e de outros. Entendamo-lo tal como devia ser redigido: "Os pressupostos para se suceder são os exigidos pela lei ao tempo da abertura da sucessão, salvo exceção legal". A Brasileira, casada com estrangeiro, sob regime que não seja o da comunhão universal de bens, recebe, por morte do marido, o usufruto vitalício da quarta parte dos bens do marido, se há filhos brasileiros do casal, e de metade, se os não há (Decreto-lei n. 3.200, de 29 de abril de 1941, art. 17). Os Brasileiros, filhos do casal, sob regime que não seja o da comunhão universal de bens, recebem, por morte de qualquer dos cônjuges, metade dos bens do cônjuge sobrevivente, adquiridos na constância da sociedade conjugal (Decreto-lei n. 3.200, art. 18). Ê proibida a sucessão de estrangeiros em bens que sejam terrenos de marinha e acrescidos (Decreto-lei n. 3.439, de 17 de julho de 1941, art. 18, § 2.°). Em suma: capacidade de herdar qualquer pessoa tem. Quando algum sistema jurídico estabelece exigência (e. g., autorização estatal) para que alguma entidade possa suceder, ou afasta a atribuição de algum bem ou de alguns bens a pessoa, física ou jurídica, que, sem essa regra jurídica, herdaria, não retirou capacidade. O que se passa é que há interêsse do Estado em que se examine o caso, para se autorizar, ou não, que determinado bem ou determinados bens não fiquem, por exemplo, com estrangeiros. 3. EXISTÊNCIA DO HERDEIRO NO MOMENTO DA MORTE. - No momento da morte do decujo há de existir o herdeiro. Pode ter sido apenas concebi-

do. O nascituro herda. A pessoa jurídica também há de existir no momento da morte do decujo. Mas já apontamos exceções. A comunidade entre herdeiros é como a comunidade em mão comum do direito. Não importa se os herdeiros são legítimos, ou se são testamentários, ou legítimos e testamentários. Uma parte da herança pode ser das legítimas, ou da legítima, e outra, por disposição a causa de morte. Não há o princípio romano Nemo pro parte testatus, pro parte intestatus decedere potest (L. 7, D., de diversis regulis iuris antiqui, 50, 17; § 5,1, de heredibus instituendis, 2, 14). No direito romano, o testamento tinha de conter total disposição. Uma sucessão excluía a outra, e se o testador não esgotava o todo da herança, o remanescente ficava com os herdeiros testamentários. Todavia, na sucessão forçada ou necessária, podiam aparecer as duas espécies de herdeiros. Quanto ao máximo, houve discussões (e. g., CHRISTIAN FRIEDRICH MÜHLENBRUCH, em CHR. FREDR. VON GLÜCK, Ausfiihrliche Erlãuterung der Pandekten, 38, 145 s.; TH. SCHIRMER, Handbuch des Rõmischen Erbrechts, I, 52 s. nota 49; EDUARD HOLDER, Beitrãge zur Geschichte des Rõmischen Erbrechts, 153 s.; F. HOFMANN, Kritische Stiidien im rõmischen Recht, 106 s.; talvez procedesse de interpretação literal das X I I Tábuas, RUDOLF VON JHERING, Geist des rõmischen Rechts, I I , 482; A. BRINZ, Lehrbuch der Pandekten, 1.a ed., 771; II, 2.a, 75; A. SCHMIDT, Das formelle Recht der Notherben, l,nota3; ERNST RABEL, Die Erbrechtstheorie Bonfantes, Zeitschrift der SavignyStiftung fiir Rechtsgeschichte, 50, 306 s., sustentou que procede da jurisprudência da época republicana, que, com o seu método formal, criava regras jurídicas rígidas). Hoje, o que faz testamento pode só testar quanto a determinado bem, ou determinados bens, ou parte da herança, e beneficiar, como queira, estranhos ou sucessíveis, respeitando apenas a metade que há de caber aos herdeiros necessários, se os há, ou regras jurídicas especiais que protegem Brasileiros, filhos de estrangeiros, ou cônjuge, ou Brasileira casada com estrangeiro. A propósito de testamento, explicita-se que não adquire - evidentemente, porque não existe - quem não está concebido à data da morte do testador. Mas há a exceção, concernente a disposições testamentárias a favor de prole eventual de pessoa, por êle designada, ou de pessoas por êle designadas, uma vez que essa pessoa, ou essas pessoas já existiam ao tempo da abertura da sucessão (Código Civil, art. 1.718). Quem já foi concebido nascituro é; e herda, se "nasce com vida", conforme está no art. 4.° do Código Civil

4. LUGAR EM QUE SE ABRE A SUCESSÃO. - No art. 1.578 do Código Civil estatui-se: "A sucessão abre-se no lugar do ultimo domicilio do falecido". Do falecido, ou do desaparecido. Na Lei de Introdução ao Código Civil, o art. 10 foi explícito: "A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que era domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens". Lê-se no § 1.°: "A vocação para suceder em bens de estrangeiro situados no Brasil será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge brasileiro e dos filhos do casal, sempre que não lhes seja mais favorável a lei do domicílio". Ainda no § 2°: "A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder". No art. 10, a regra jurídica é de direito internacional privado e de direito interlocal. O § 1.° consta do artigo 150, § 33, da Constituição de 1967: "A sucessão de bens de estrangeiros situados no Brasil será regulada pela lei brasileira, em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que lhes não seja mais favorável a lei nacional do de cuius". Cf. Constituição de 1934, art. 134; Constituição de 1937, art. 152; Constituição de 1946, art. 165. O § 2.° é referente aos sistemas jurídicos que ainda tenham incapazes de suceder e pessoas atingidas por proibição. Teremos ensejo de tratar do direito intertemporal das sucessões a causa de morte. A sucessão legítima não apresenta os problemas que exsurgem da sucessão testamentária, porque o testamento é que tem os dois momentos de relevância: o da feitura e o da morte do decujo. O que mais importa é saber-se, de começo, qual a lei que rege a sucessão. Principalmente porque, se há herdeiros necessários, a lei é que há de fixar a quota legitimária, que não pode ser atingida pelas disposições testamentárias. Também ela permite, ou não, clausulações que atinjam a quota necessária. Porém, no próprio plano do direito testamentário, incidem regras jurídicas cogentes, dispositivas e interpretativas.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.585. A - Legislação CC/20026 °

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- 1-785 e 1.787 do

§ 5.585. B - Doutrina 1. A lei dos pressupostos e dos requisitos subjetivos é a vigente na abertura da sucessão; mas essa regra, de cunho infraconstitucional, não se aplica à Constituição Federal, notadamente quando esta apagou as discriminações entre os filhos de qualquer origem, com incidência imediata e evidente efeito retroativo, ainda que a sucessão tenha sido aberta antes de 1988. Quanto às organizações religiosas, não mais se lhe aplicam as exigências comuns para constituição e organização das associações civis, desde o advento da Lei 10.825/2003, salvo a existência de registro público, na data da abertura da sucessão. 2. A regra do último domicílio serve, igualmente, para se fixar a lei aplicável às sucessões abertas de estrangeiro domiciliado no Brasil ou de brasileiro ou estrangeiro domiciliado no exterior, conforme estabelece o art. 10 do Dec.-lei 4.657/1942 - Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, qualquer que seja a localização dos bens e direitos deixados. O domicílio do herdeiro é igualmente determinante da lei aplicável (se brasileira ou estrangeira) à legitimidade para suceder. A lei do domicílio determina quais são os sucessores do falecido e a ordem de vocação hereditária, os requisitos da legitimação para suceder, as hipóteses de exclusão ou de indignidade, a parte legítima e a parte disponível. Se o de cujus for estrangeiro, será aplicada a lei brasileira em benefício do cônjuge e dos filhos, se for mais favorável que a lei do país de nacionalidade daquele; se esta for mais favorável, a lei brasileira não prevalecerá. Esta é a regra do art. 5.°, XXXI, da CF. 3. O art. 1.787 do CC/2002 tomou o rumo certo quando substituiu a expressão capacidade por legitimação para suceder, atendendo à crítica da melhor doutrina, notadamente a de Pontes de Miranda. Não há, portanto, de : se falar em capacidade ou incapacidade para suceder. A regra do direito brasileiro é que somente podem ser dotados de legitimação para suceder hereditariamente as pessoas nascidas ou os já concebidos no momento da morte do autor da herança, mas é admitida, excepcionalmente, a legitimação de sujeitos de direitos potenciais, ou seja, titulares de direito sucessório, que ainda não foram concebidos no útero materno, ou fundações ainda não constituídas e registradas. 4. A entidade estatal herda desde o momento da abertura da sucessão, pois o patrimônio não pode restar sem sujeito e a vacância tem natureza declarativa e não constitutiva desse direito.

§ 5.585. C - Jurisprudência Contrariamente ao sustentado por Pontes de Miranda, o STJ tem entendido que a saisine não se aplica à entidade estatal, para a qual apenas haveria a transmissão do patrimônio do de cujus no momento da declaração da vacância (STJ, REsp 100290/SP, 4.a T., j. 14.05.2002, rei. Min. Barros Monteiro, DJ 26.08.2002). Essa orientação foi motivada pelo advento da Lei 8.049/1990, que transferiu o direito sucessório dos Estados-membros para os Municípios, Distrito Federal ou União, havendo vacância, tendo aqueles sustentado a aquisição nas sucessões abertas sob o império da legislação anterior.

CAPÍTULO II TRANSMISSÃO DA

PROPRIEDADE

DOS BENS E DA

POSSE

§ 5.586. CONCEITO E NATUREZA DA TRANSMISSÃO DA PROPRIEDADE (LATO SENSO) E DA POSSE 1. POSIÇÃO DO PROBLEMA NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO. - A d e s -

peito de algumas regras jurídicas em que a terminologia ainda se prende ao direito romano das sucessões, o que mais importa é saber-se o que se contém no art. 1.572 do Código Civil, que, por sinal, é enunciador do primeiro princípio do Livro IV, que se refere às sucessões. 2. DIREITO ROMANO. - No direito romano e no direito comum, havia lapso entre a dilação e a aquisição da herança. O sucessível ficava na posição jurídica de pessoa a quem se deferia a herança, a quem a herança era delata (delata hereditas). Daí em diante podia adir, aceitar (L. 151, D., de verborum significatione, 50, 16: "Delata hereditas intellegitur, quam quis possit adeundo consequi"). Não há nos textos a expressão "delatio hereditatis" Empregou-se para se falar de chamada à herança, quer haja, ou não haja, depois, a adição. Mas no direito comum atendia-se a que os sui heredis, sem prejuízo do beneficium abstinendi, se tornavam, desde logo, herdeiros. Se não havia suits heres, a herança jazia, era hereditas iacens, enquanto não ocorria a adição. Havia apenas a proteção do patrimônio como seria quanto a patrimônio de pessoa viva. Tudo isso passou. Antes da aceitação, todos os direitos - reais ou pessoais - estão transferidos, no momento da morte. A herança não jaz sem dono, de jeito que o conceito de herança jacente mudou. Quando, no

tempo em que se espera o nascimento do herdeiro concebido, ou de alguma decisão sôbre a legitimação ativa de alguém à herança, ou em que se aguarda a personificação de sociedade ou fundação, criada pelo decujo, ou outro ato que acaso seja necessário, a herança já é de alguém: apenas não se sabe se é o beneficiado pela lei, ou pelo testamento, ou se algum dos herdeiros legítimos, ou de outrem, que é herdeiro legítimo, ou de herdeiros testamentários. Não é a sucessão "que está em suspenso", expressão que repelimos e aparece em THEODOR K J P P - M A R T I N W O L F F (Lehrbuch, N , 3, § 8, VIH), mesmo se se há de admitir-se o instituto da hereditas iacens, tal como existia no direito romano (e. g„ GUSTAV SCHWARTZ, Kritisches über Rechtssubjekt und Rechtszweck, Archivfür Bürgerliches Recht, 35, 68 s.). Apenas se espera a manifestação de vontade do herdeiro: aceita, ou não aceita. A herança não está sem dono até que haja a aceitação, como pareceu a KONRAD H E L L W I G (Die Vertrãge aufLeistung an Dritte, 2 4 4 ) e a F. BERNHÕFT (ZurLehre von den Fiktionen, 2 4 4 s.). A propósito dos legados, o assunto é versado no Título m .

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.586. A - Legislação Sobre a natureza da transmissão sucessória, conferir o art. 1.784 do CC/2002.

§ 5.586. B - Doutrina 1. A essência da doutrina de Pontes de Miranda e do Código Civil de 2002, que a acolhe, é que a morte da pessoa não gera um vazio de titularidade sobre a herança que deixou. Os direitos subjetivos sobre a herança são de um sucessor, ou diversos sucessores, sejam eles determinado pela lei ou pelo próprio autor da herança, mediante testamento que antes fez. Não se admite que tais direitos restem sem sujeitos. 2. Atendendo à crítica de Pontes de Miranda, o Código Civil de 2002, suprimiu as expressões "o domínio e a posse", resultando simplesmente na transmissão automática da herança-conjugando direitos reais, posses, dívidas, créditos e outros direitos - ao herdeiro legítimo (incluindo o ente estatal) ou legatário.

§ 5.586. C - Jurisprudência Para o Superior Tribunal de Justiça, também a empresa individual engendra relações jurídicas transmissíveis aos herdeiros, particularmente o "fundo de comércio" (STJ, RMS 15.377/RN, 1 ,aT., j. 02.12.2003, rei. Min. Luiz Fux, R/16.02.2004, p. 203).

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§ 5.587. S A I S I N A , N O D I R E I T O B R A S I L E I R O

1. FONTES DO DIREITO BRASILEIRO. - Foi o Alvará de 9 de novembro ¿ e 1754, seguido do Assento de 16 de fevereiro de 1786, que introduziu no direito luso-brasileiro a transmissão automática dos direitos, que compõem o patrimônio da herança, aos sucessores, legítimos ou não, com toda a propriedade, a posse, os direitos reais e os pessoais. O que era propriedade e posse do decujo passa a ser propriedade e posse do sucessor a causa da morte, ou dos sucessores, em partes ideais, ou conforme a discriminação testamentária. Dá-se o mesmo com os créditos transferíveis e as dívidas, as pretensões, as obrigações e as ações. Alguns juristas pouco esclarecidos sôbre a teoria da posse, tal qual está no direito brasileiro, dizem que, enquanto se procede ao inventário e à partilha, a posse, no caso de comunhão de bens, incumbe ao cônjuge sobrevivente, e nos demais casos ao inventariante. Há, aí, grave confusão entre posse mediata e posse imediata, posse própria e posse imprópria. O cônjuge sobrevivente, na comunhão de bens, tem a posse própria, que lhe cabia (composse própria) e, com a morte do cônjuge, passa a ter a posse imprópria, imediata, sôbre a parte que era do falecido. Quanto ao inventariante, que é herdeiro, tem êle a posse própria e a imediata da parte ideal que lhe toca, ou dos bens que lhe foram deixados com discriminação, e a posse imprópria imediata de todos os bens que lhe foram entregues para inventário e partilha. Se o decujo não tinha posse imediata de algum ou de alguns bens, o cônjuge ou o inventariante herdeiro não passa a tê-la. Apenas se intercala entre os outros herdeiros e o possuidor imediato que como tal continua. No tocante ao que lhe cabe, como parte indivisa ou divisa, tem êle a posse própria e o possuidor imediato continua como possuidor imediato. Diz o Código Civil, art. 1.572: "Aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários". A regra jurídica há de ser lida como se lá estivesse escrito: Morto o decujo, qualquer titularidade de direito transmissível a causa de morte e a posse transmitem-se aos herdeiros, legítimos ou testamentários". Herdeiro não pede imissão de posse, porque posse êle tem. Pode exercer ação de esbulho, ou de turbação, ou qualquer ação possessória. Todavia, se o decujo precisava pedir imissão de posse, tem o herdeiro de pedida, porque o que se lhe transmitiu foi direito à posse, e não a posse. Se o decujo tinha ação a propor, ou se a propusera, o herdeiro insere-se na posição jurídica do falecido, no momento mesmo em que se dá a

morte. Se contra o decujo pendia ação, o herdeiro torna-se parte como o decujo o era. Se o herdeiro falece, mesmo antes de aceitar a herança, com os seus sucessores ocorre o que ocorrera com a pessoa de que herdara. Se algum co-herdeiro propõe ação contra possuidor ou tenedor de bens da herança, não tem importância qualquer alegação de só ser do demandante uma fração da herança, porque o herdeiro da parte tem legitimação para exercer qualquer ação no tocante ao todo da herança. Resta saber-se se, tendo o falecido discriminado bens que encheriam as partes ideais, persiste o princípio da legitimidade do herdeiro quanto ao todo. Temos de distinguir: a) a deixa de partes ideais que teriam de ser diminuídas se, quanto ao bem pôsto noutra parte ideal, adviesse a perda da ação, pelo herdeiro, como demandante, ou como demandado; e b) a deixa de partes ideais, que não sofreriam subtração em caso da perda por outro herdeiro, no que se refere a bem discriminado ou a bens discriminados na sua parte. Instituída herdeira qualquer entidade de direito privado ou público, desde que já personificada, a herança insere-se automaticamente no patrimônio da pessoa jurídica. O que pode ocorrer é que ela renuncie à herança; mas, aí, tudo se passa como a respeito de qualquer pessoa física. Na transmissão da propriedade e da posse, o que se transmite é o de que o decujo era titular, e também se transmitem as dívidas do decujo, as pretensões e ações contra êle, porque a herança compreende o ativo e o passivo. Aliás, não só a propriedade, em sentido exato e estreito, se transmite: transmitem-se todos os direitos, pretensões, ações e exceções, de que era titular o falecido, se transmissíveis. A referência a "domínio", no Código Civil, art. 1.572, foi infeliz. O que se transmite é o patrimônio, atendida a limitação nó tocante ao passivo (art. 1.587). Se o falecido havia, por exemplo, vendido algum bem, responde ao comprador o herdeiro, ou respondem os herdeiros. Se houve o negócio jurídico bilateral e o acordo de transmissão, o terceiro, que o obtivera, tem direito à transcrição da escritura pública, ou de outro instrumento suficiente, se do registo é que resulta a transmissão. Quem é titular do direito que lhe resulta do acordo de transmissão é legitimado a exigir do oficial do registo, ou da repartição, em que o registo haja de ser feito, que à transcrição ou outra formalidade legal se faça. Cf. 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 6 de novembro de 1952. Quanto ao imposto de transmissão da propriedade, a causa de morte, a invocação do art. 1.572 foi êrro da 1 ,a Turma, a 4 de julho de 1949 (R. de J. B., 92, 29). No direito financeiro, não há a saisina.

A posse, a que se refere o art. 1.572 do Código Civil, é qualquer posse, a imediata e a mediata, a própria e a imprópria (e. g., a do locatário, a do depositário), bem como qualquer direito à posse, ou à reaquisição da posse. Reduzir a alusão do art. 1.572 à posse "estado de fato" foi êrro em que incidiu a 1.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, a 19 de junho de 1941 (R. F., 88, 467). O cessionário do direito à posse, como o terceiro a que se fêz tradição da posse, pode opor embargos de terceiro (2.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 13 de novembro de 1945, R. dos T., 161, 237). 2. LEGITIMAÇÃO DOS HERDEIROS QUANTO AO TODO DA HERANÇA. -

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assunto é de grande relevância se os herdeiros são necessários, porque, aí, as partes ideais têm de ser iguais. O art. 1.580 do Código Civil fala de ser indivisível o direito dos herdeiros até que se ultime a partilha; isto é, até que seja julgada e transita em julgado a sentença. Mas há as duas espécies escapas à letra da lei: a de pré-existência de partilha amigável e a da individuação do bem ou dos bens inclusos na parte ideal. Estabelece o Código Civil, art. 1.580: "Sendo chamadas, simultaneamente, a uma herança, duas ou mais pessoas, será indivisível o seu direito, quanto à posse e ao domínio, até se ultimar a partilha". E no parágrafo único: "Qualquer dos co-herdeiros pode reclamar a universalidade da herança ao terceiro, que indevidamente a possua, não podendo este opor-lhe, em exceção, o caráter parcial do seu direito nos bens da sucessão". Quanto aos legados, veja-se o que dizemos a propósito do art. 1.690 do Código Civil, porque em tal caso o que importa é a cláusula testamentária. No direito romano, domínio e posse da herança não se transferiam aos herdeiros pelo simples fato da morte. No direito posterior, continuou o lapso, e no direito luso-brasileiro foi o Alvará de 9 de novembro de 1754, com a contribuição do Assento de 16 de fevereiro de 1786, que iniciou a nova época, em que se colocou o art. 1.572 do Código Civil. Os direitos que automáticamente se transmitem a causa de morte são todos os direitos que se incluem na herança. O que pode acontecer é que se protraia a entrega do bem, mas em tais espécies o herdeiro incumbido da prestação é proprietário e possuidor até que ocorra a transmissão. Enquanto se procede a inventário, a posse imediata fica com o cônjuge, ou com algum herdeiro, que a tenha, ou com o inventariante. Não se confunda com a posse própria dos herdeiros a posse imediata, que a respeito dos bens que não são herdados pelo possuidor, ou dos bens em propriedade

comum com o cônjuge sobrevivente, tem o herdeiro, ou o inventariante ou o cônjuge, de que falamos, ou talvez mesmo terceiro, como o locatário, ou o depositário. A posse que passa aos herdeiros, automaticamente, não é a título provisório, é posse própria, definitiva, que pode ser mediata (e. g., o decujo alugara o bem), ou apenas imediata (e. g., o decujo era arrendatário das terras). Se o bem era em comunhão matrimonial, a posse imediata continua com o cônjuge, sem que se pré-exclua a eventual composse com os herdeiros, como se esses a tinham ao tempo da abertura da sucessão, ou se a tomaram depois, por ser conveniente à defesa dos seus direitos. Alguns juristas têm falado de posse provisória pelo cônjuge sobrevivente, mas o que se atribui ao cônjuge sobrevivente, se o regime de bens era o da comunhão e, sendo mulher, convivia com o marido, ao tempo da morte dêsse, é a legitimação a ser nomeado inventariante. Se de alguns bens não tinha ela a posse, por serem incomunicáveis, adquire-a o cônjuge ao ser nomeado inventariante. Se esses bens estavam sob a posse de algum herdeiro, ou de alguns herdeiros, a posse que o cônjuge sobrevivente adquire com a nomeação para inventariante, é a posse imprópria mediata, e não a posse imediata. Se o bem era comum e com algum herdeiro estava a posse imediata, sem dever cessar à abertura da sucessão, o cônjuge sobrevivente continua com a posse própria mediata, que era a sua. (A teoria da saisina coletiva, que se prende, na Alemanha, a K. L. não teve acolhida, nem tem, nos outros povos: tocaria aos herdeiros chamados, e não a todos os parentes, coletivamente. Na sua forma mais atenuada, saisina coletiva dos parentes sucessíveis ou, em geral, dos sucessíveis dos parentes sucessíveis ou, em geral, dos sucessíveis, com a aquisição segundo o art. 1.572, tem sido assaz combatida; mas é curioso notar-se que os opositores a aceitam, adiante, nas aplicações práticas e até teóricas, e lhe dedicaram as mais precisas conseqüências lógico-jurídicas. Problema árduo, a maioria dos escritores evita feri-lo, com sacrifício da doutrina e, pois, das práticas da jurisprudência.) ZACHARIAE LINGENTHAL,

Os bens passam aos herdeiros instantaneamente. A situação dos sucessíveis da classe subseqüente, no lapso que vai da abertura da sucessão à renúncia ou à aceitação, não é destituída de sérios efeitos jurídicos. Primeiro, conforme veremos, tais sucessíveis já podem optar, e a prescrição contra eles começa a correr da morte do hereditando. Segundo, podem exercer as medidas conservatórias, como as de defesa da posse, de mter-

rupção da prescrição e de transcrição de títulos. Terceiro, podem pedir a partilha, tomar posse efetiva de bens, propor ações de nulidade ou anulação de testamento. Nesse ponto, é excelente a firmeza com que a jurisprudência francesa foi às conseqüências jurídicas, cabais, do exame científico da situação dos sucessíveis. A saisina é a investidura legal na herança. No direito brasileiro, compete a todos e quaisquer herdeiros - necessários, legítimos, ou testamentários. Todos e quaisquer têm a saisina: parentes, estranhos, Estado. Por onde se vê quão perigosa seria a consulta dos escritores franceses a respeito, sendo, como é, demasiado restrita, em todo caso essencialmente diferente da noção brasileira, a que está no Código Civil francês e nas leis francesas. Interessa à ordem pública, no sentido de que o sucedendo não pode tirar a saisina dos herdeiros, nem lhe modificar os efeitos, se bem que possa, dispondo dos bens, se não tem herdeiros necessários, instituir herdeiro ao estranho e dar pensões aos legítimos. (É interessante notar-se que os argumentos contra a teoria da saisina coletiva nem sempre são convincentes; o artigo 318 do Costume de Paris, que tanto se invoca, é contraditório. Demais, condenar teoria sem a substituir por outra, constitui atividade destrutiva.) A afirmativa da sucessividade da saisina bastaria a que se erigisse teoria; mas veremos que a noção é insuficiente. Diz-se que, se um herdeiro renuncia, a têm os co-herdeiros, ou, se todos recusam, vai aos sucessíveis da classe subseqüente. Aos que dão a primeira explicação podemos opor que outra coisa não pretendia a teoria da saisina coletiva e, se há a eficácia ex tune, a sucessividade não existe. Aos da segunda, que o renunciante se torna estranho ex tunc; portanto, não passou dêle aos outros: os outros já a tinham. Para recorrer a algo de mais firme, escritores aludem à ficção; mas tal proceder não resolve. A ficção, processo técnico, serviria, de tal maneira, à explicação de todas as situações jurídicas de difícil entendimento. Não se entendem? É árduo explicar? Há ficção. Ora, esse (processo simplista, sôbre ingênuo, nada traria de útil ou de dirimente. A ninguém persuade. Ressalta a petição de princípio. 3. VISÃO RETROSPECTIVA E CONTEMPORÂNEA. - Há quatro sistemas: a) O arcaico ou romano: o direito hereditário (excluído do caso do suits) só se adquire com a aditio ou aceitação, bem assim a posse, que se não transnfite zpso iure, mas com apreensão material, b) O extremo germânico: o do Código Civil francês, no qual os legítimos adquirem ipso iure (arts. 1.004,

1.006, 1.011 e 1.014), e adquirem domínio e posse (desde 1896, também os herdeiros naturais, isto é, filhos naturais e pais e mães naturais). Só eles têm saisina. Se não há herdeiros reservatários, também os legítimos universais, art. 1.006. c) O fusionado, isto é, germano e luso-brasileiro, pelo qual. a transmissão se opera ipso iure, quer se trate de herdeiros legítimos, quer de testamentários, quer quanto à propriedade, quer quanto à posse (saisina). d) O italiano, do Código Civil de 1865, no qual (duvidosamente, para alguns) ipso iure se transmitia a posse aos legítimos e aos testamentários, - não, porém, o domínio, que só a aceitação transferiria. Praticamente: o chamado à herança poderia exercer as ações possessórias, direito que, por lhe caber ex lege, não induz aceitação; e ato conservativo, que se poderia praticar no spatium deliberandi, sem constituir aceitação. art. 1 . 5 7 2 do Código Civil logo se nota que tratou em pé de igualdade herdeiros legítimos e herdeiros testamentários. A devolução, num e noutro caso, obedece ao mesmo princípio. Da unicidade de conteúdo do art. 1.572 tira-se que domínio e posse, ali e aqui, se sujeitam à mesma instantaneidade de transmissão. Mas a aceitação é igualmente indispensável: não há herdeiros que herdem sem querer; o que não o quiser não herda. 4 . HERDEIROS TESTAMENTÁRIOS. - AO

Saber quais os que devem herdar legitimamente é coisa fácil. Os textos são explícitos: provado o parentesco, tudo está resolvido. As dúvidas, de ordem doutrinária, são, praticamente, nenhumas. Mas, se a herança é ex testamento, pode a letra depender da interpretação. Donde embaraços. Maiores, se há herdeiros legítimos que impugnam, por nulidade ou anulabilidade, o testamento. Enquanto pende a ação de nulidade, ou de anulação, o tempo corre, e os herdeiros testamentários podem ser afastados com a res iudicata. No § 6,1, de legitima adgnatorum successione, 3, 2, decidia-se: Se o defunto não fez testamento, a proximidade determina-se pela época da morte ("Proximus autem, si quidem nullo testamento facto quisque decesserit, per hoc tempus requiritur, quo mortuus est is cuius de hereditate quaeritur"). Mas, se o fêz, é pela época em que se tornou certo que nenhum herdeiro, em virtude deste testamento, existe: pois é só então que se pode considerar que morrera intestado ("quod si facto testamento quisquam decesseri, per hoc tempus requiritur, quo certium esse coeperet nullum ex testamento heredem extaturum: tum enim proprie quisque intellegitur intestatus decessisse"). As vêzes só se decide muito tempo depois: ("quod quidem aliquando longo tempore declarator"), e no intervalo, acontece, não raro, que morre o mais próximo, de modo que se torna

mais próximo o que dantes não era ("in quo spatio temporis saepe accidit, ut proximiore mortuo proximus esse incipiat, qui moriente testatore non erat proximus"). Nem êsse é o bom princípio, nem o acolhe a lei brasileira. A sentença que declara a nulidade ou anula o testamento é de eficácia declaratória e desconstitutiva ex tune. Os efeitos são desde a morte do testador: o que era nulo, ou anulável, nulo ou anulado está, desde o dia da morte, pois a própria anulação pela coação, ou pelo dolo, opera desde todo o princípio: não há testamento; a ineficácia existia, não houve momento de eficácia que resista à fôrça cancelante da sentença anulatória. Ato unilateral, nem sequer se lhe pode aplicar a ressalva de interêsses dos aparentemente beneficiados, salvo os princípios gerais de in rem versio. Ainda nos casos de condição suspensiva, ou resolutiva, e renúncia, tudo se passa como se o hereditando ab origine tivesse morrido intestado. Se o único herdeiro renuncia, devolve-se ao que, sem êle, seria herdeiro no dia da morte do testador. Deixou B 100 apólices a A, sob a condição de doutorar-se aos 2b anos. A não consegue. A condição não foi satisfeita. Se os 25 anos se completaram no ano seguinte ao falecimento do decujo, ¿quem sucede a B? ¿Os que viviam ao tempo em que morreu, ou os que vivem ao tempo em que falha a condição? Havia opiniões que de modo especial liam, por exemplo, o art. 720 do Código Civil italiano de 1865 (dizia êle: "Non si fa luogo alia successione legittima se non quando manchi in tutto o in parte la testamentária"): a palavra "quando" teria dois sentidos: condição e tempo; isto é, "no caso em que", e "no momento em que". Todavia, CARLO FRANCESCO GABBA CTeoria delia Retroattività delle leggi, IH, 452 s.) distinguia: renúncia, caso em que se livrava do romanismo da aditio, e do influxo de R . SCHMID (Die Herrschaft der Gesetze nach ihre rãumlichen und zeitlichen Grenzen, 145), que chamava os herdeiros do dia em que se renunciava; e testamento tornado ou declarado ineficaz, ou condicionado, mas não implida a condição, casos em que a lei, para êle, seria a do dia da desconstituição do testamento ou da inadimplemento. Ora, nem cabe a doutrina geral, pretensamente literal, de C. LOSANA, nem as distinções de CARLO FRANCESCO GABBA, que nesse ponto se libertava de um romanismo para ali se acorrentar a outro. A lei é sempre a do dia da morte. Os herdeiros, os dêsse dia. Assim, PESCATORE (Filosofia e Dottrine Juridiche, I, 1 7 6 s.) e VITTORIO POLACCO (Delle Successions, E , 66-68). O Código Civil brasileiro repousa no mesmo princípio.

A equiparação dos testamentários aos legítimos é completa: com o testamento, os instituídos sucedem como, ex lege, os legítimos. Lon^e ficou o "solus Deus heredes facere potest, non homo", o "heredes gignuntur, non fiunt", que exprimia o princípio germânico, ainda representado no Código Civil francês, art. 724, por influência das Coutumes, no conceito de legatários universais e legatários a título singular. Lê-se no art. 724: "Les héritiers legitimes et les héritiers natureles sont saisis de plein droit des biens, droits et actions du défunt, sous 1'obligation d'aquitter toutes les charges de la succession", É a saisina iuris, pela qual propriedade e posse passam, ipso iure, aos herdeiros legítimos. Mas, apesar disso, há o romanismo da aceitação, que constitui algo de superposto, de colado, de preso por alfinetes, de heterogêneo. Para penetrar e compreender a função dessa janela aberta depois do corpo da casa,dêsse órgão que se enxertou onde não cabia (e a História é cheia disso, como de teratologías a Natureza), os intérpretes, e. g., E . ACOLLAS (Manuel de Droit Civil, n , 191 s.), levantaram a questão da suspensividade ou resolutividade da aceitação: isto é, ou o herdeiro recebe com a condição suspensiva de aceitar, ou resolutiva de renunciar. No anterior Código Civil português, art. 2.011, foram equiparados herdeiros legítimos e testamentários. E lá estava a aceitação cuidadosamente disciplinada. O Código Civil alemão fixa prazo à renúncia (§ 1.944, alínea 1.a). Bem assim, o suíço (arts. 567, 571,1. a parte). No Código Civil português de 1966, diz o art. 2.050: "1. O domínio e posse dos bens de herança adquirem-se pela aceitação, independentemente de sua apreensão material. 2. Os efeitos da aceitação retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão". No Código Civil italiano de 1865, o art. 825 somente falava de passagem da posse, e "senza bisogno di materiale apprensione". Não do domínio (VITTORIO POLLACCO, Delle Successioni, II, 8 9 ) . De modo que não era a saisina completa, como a tinha o Código Civil francês. Em todo caso, disso divergiam: os que falaram da aquisição sob condição resolutiva da renúncia, de modo que a aceitação só confirma (F. FILOMUSI-GUELFI, Delle Successioni, 5 4 s.) - e a respeito nos lembre o dito de CARLO FRANCESCO GABBA CTeoria delia Retroattività delle leggi, HL, 2 6 3 s.): "aceitação é renúncia à faculdade de renunciar"; os que invocavam a aceitação como condição suspensiva (potestativa) da aquisição, de modo que a relação não existe; os que viam na aceitação efeito retroativo, à semelhança do que ocorria no art. 933 do Código Civil italiano de 1865 (cf. Codex Fabrianus,

t 7, V ) . Para C. LOSANA, tal seria a verdadeira solução italiana. Cf. Código Civil português de 1966, art. 2.050. Mas ainda havia a solução de outros: a investidura é de modo presuntivo; a vontade do herdeiro confirma ou desfaz a presunção (e. g., G. P. CHIRONI, Istituzioni di Diritto Civile italiano, II, 405 s.). Mero artifício, impróprio de quem a êle recorreu. Além de artificiosa (F. FILOMUSI-GUELFI, Delle Successioni, 94 s.), inconcludente (VITTORIO POLLACCO, Delle Sucessioni, II, 102), porque, dizia o próprio G . P. CHIRONI, "a transmissão somente da posse corresponde exatamente ao transmitir-se a qualidade hereditária só presuntivamente". Posteriormente, falou de "subinvestidura" do legatário, construção a que SOLAZZI chamou "discretamente feudal" e que VITTORIO POLLACCO apostrofou: "concludiamo col lamentare che tanta industria di sottilissimo ingegno conduca talvolta ad abbuiare il Diritto positivo piuttosto che chiarirlo". VII

Em virtude do desenvolvimento, que aí fica, restringiu-se o assunto, delimitando-se o campo em que se tem de pôr o problema de interpretação do direito brasileiro: a) Nada tem êle, no que concerne à transmissão causa mortis, com o direito romano: o art. 1.572 do Código Civil claramente estatui transmitirem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários, o "domínio" e a "posse" (entenda-se a propriedade ou outra titularidade e a posse). b) Como o direito francês, que, nesse ponto, é o mais germânico, temos a saisina; porém não a restrição aos herdeiros legítimos e aos legatários universais, no caso do Código Civil francês, art. 1.006. A imissão de posse é proposta contra o que se diz herdeiro ou legatário com posse, sem no ser; ou contra o que se diz possuidor sem ter posse. Por isso mesmo não serve para se tirar a posse de outrem. Contra titulo possidentem non datur interdictum adipiscendae. Seria absurdo usá-la para se retirar a posse ao que está a usucapir ( M A N U E L M E N D E S DE CASTRO, Practica Lusitana, II, 243): "... contra titulo possidentem non datur hoc interdictum, sed contra eum, qui possidet pro possessore, vel pro haerede ... sic non competit contra eum, qui rem usucaptam habet iusto errore, qui error iustuspro titulo habetur ad usucapionem...". A posse passa aos herdeiros legítimos e testamentários. Se só os há legítimos, fácil é saber-se quais são. Se pende algum processo de habilitação, ou de investigação de paternidade ou maternidade, de que aquela dependa,' só a sentença fará certo o direito e com ela é que se pede a imissão de

posse, se bem que o herdeiro assim reconhecido tenha sido proprietário e possuidor desde a abertura da sucessão. Se só existem herdeiros testamentários, imitem-se na posse todos os que a houveram do decujo por fôrça do testamento que se mandou cumprir. Daí a importância do "cumpra-se". O que é, segundo o testamento, herdeiro, ou legatário com posse, tem direito à imissão enquanto não passa em julgado a sentença que declara a nulidade ou anula o testamento. Após esse trânsito, os que são herdeiros legítimos, ou testamentários segundo outro testamento, é que podem propor o remédio adipiscendae. Se há terceiros legítimos e testamentários, cada um tem o direito à imissão segundo o seu título. Uma vez que o testamento dá a posse, desde logo, a algum legatário, cabe-lhe o remédio adipiscendae, à semelhança do que ocorre com os beneficiados, em atos entre vivos, com a cláusula constituti. "Desde o dia da morte do testador, pertence ao legatário a coisa legada, com os frutos que produzir" (Código Civil, art. 1.692). Pode dar-se que haja condição ou têrmo para i aquisição (o que não se confunde com a condição ou têrmo para a execução do legado). Se o legado foi de crédito, transmite-se a titularidade desde a morte do testador. Os artigos 1.690 e 1.692 abrangem todos os legados, salvo se há têrmo ou condição para a aquisição. As transmissões pela saisina independem de formalidades registarias. Vamos a exemplo. O art. 27, a), do Decreto-lei 1.2.627, de 26 de setembro de 1940, estabelece que a transferência das ações nominativas se opera, por têrmo lavrado no livro de "Transferência das Ações Nominativas", datado e assinado pelo cedente e pelo cessionário, ou seus legítimos representantes". Acrescenta-se no § 1.°: "A transferência das ações nominativas, em virtude de transmissão por sucessão universal ou legado, de arrematação, adjudicação ou outro ato judicial, somente se fará mediante averbação no livro de 'Registro de Ações Nominativas', em face de documento hábil, que ficará em poder da sociedade". Cf. Tomo I, § 5.287, 4. Tem-se de atender a que a transmissão da propriedade das ações nominativas ou é entre vivos ou é a causa de morte. Entre vivos, transmissão somente há após o têrmo no livro de "Transferências das Ações Nominativas", tal como acontece com os bens imóveis e com os bens móveis para cuja transmissão da propriedade a lei exige o registo. Sempre que a propriedade se transmite pela saisina, as regras jurídicas sobre o registo, referentes à transferência (ato formal de transferência), não são atributivas do direito de propriedade. Esse já existe. A eficácia é só in-

terna e para determinados efeitos, como se o herdeiro sucedeu na propriedade de ações nominativas que precisam do registo na sociedade por ações, ou se sucedem na propriedade de bem imóvel, cujo registo se haja de fazer. No intervalo, o herdeiro é dono, em virtude do art. 1.572 do Código Civil: falta a formalidade, que é indispensável para determinados efeitos. Se algum bem imóvel ou móvel, para cuja transmissão de propriedade se exige registo, é atribuído a credor da herança, a transmissão da propriedade somente se dá com o registo. Diferente é o que se passa sempre que há transmissão legal da propriedade, como acontece com os herdeiros e os legatários que se acham na situação do art. 1.692 do Código Civil, inclusive em se tratando de títulos nominativos. Se alguma lei exige autorização para que se considere apto ao exercício do direito o sucessível, tal pressuposto - e. g., autorização - apenas se há de ter como elemento para a adição. 5 . HERDEIRO DESCONHECIDO E HERDEIRO AUSENTE. - Nem o fato de se desconhecer quem é o herdeiro, nem o de estar ausente o sucessível implica ficar a herança sem transmissão. Só há herança se alguém herda, porque isso resulta do princípio da saisina. Se o desconhecido não se apresenta, ou se o que se cria ausente não existia, ou renunciou, há quem seja herdeiro, inclusive, se faltam os sucessíveis parentes, cônjuge e sucessíveis testamentários, a entidade estatal, o Fisco.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.587. A - Legislação Sobre a posse, objeto de transmissão hereditária, conferir os arts. 1.206 e 1.207 do CC/2002; sobre a saisine, os arts. 1.784 (herdeiros) e 1.923 (legatários) do CC/2002. ¡

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§ 5.587. B - Doutrina

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1 . 0 Código Civil de 2002 manteve a tradição de nosso direito, desde 1754 da transmissão automática da herança (saisine), presumindo a aceitação do herdeiro ou legatario, mas admitindo que estes possam rejeitá-la, mediante renúncia com efeito retroativo. Parte da doutrina brasileira, sob efeito da tradição romana, e sem a devida atençao às peculiaridades da saisine ampla que nosso direito adotou

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reproduz o modelo restrito de outros direitos, como o português aludido por Pontes de Miranda. Mas, no direito brasileiro, a saisine opera automaticamente sem chamamento, dilação e devolução, pois a transmissão não depende da vontade do sucessível: morto o autor da herança esta se transmite imediatamente ao herdeiro ou legatário. Não se pode cogitar de devolução, pois esta supõe a existência de tempo (dilação) em que a herança não foi ainda transmitida aos sucessores, "devolvendo-se" a estes quando aceitam. A saisine é o mecanismo jurídico de Investidura automática e legal na titularidade da herança, dos que o ordenamento considera sucessores, na ordem estabelecida. No direito brasileiro é conferida a quaisquer herdeiros necessários, legítimos ou testamentários e a todos que estejam legitimados a receber a herança, sejam parentes, legatários e o ente estatal. 2. A saisine, contudo, não opera automaticamente com relação à posse dos bens deixados, pois os legatários, conquanto já investidos na titularidade dos respectivo direitos reais, têm que reclamá-la aos herdeiros legítimos, se houver. A transmissão da posse é legal e automática apenas para os herdeiros legítimos. 3. Na transmissão da herança de bens móveis ou imóveis o título e o modo de aquisição se confundem na abertura da sucessão: não são, portanto, dois momentos distintos, o que significa dizer que não se fazem necessários nem o registro público nem a tradição da coisa, cujas eficácias são meramente declarativas, diferentemente da eficácia constitutiva que ostentam na transmissão entre vivos.

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§ 5.587. C - Jurisprudência De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, a saisine legitima os herdeiros a ajuizarem diretamente ação de indenização por danos causados ao de cujus (STJ, REsp 623.511/RJ, 1.a T„ j. 19.05.2005, rei. Min. Luiz Fux, DJ 06.06.2005, p. 186).

§ 5.588. POSSE IMEDIATA ENQUANTO SE FAZEM O INVENTÁRIO E A PARTILHA 1. POSSE IMEDIATA DA HERANÇA. - No direito brasileiro, se há entre os cônjuges comunhão de bens, ainda que se não trate da comunhão universal de bens, cabe ao sobrevivo continuar, até o julgamento da partilha, na posse da herança - entenda-se na posse imediata de todos os bens e na posse imediata e na posse própria, composse, dos bens comuns. Diz o art. 1.579 do Código Civil: "Ao cônjuge sobrevivente, no casamento celebrado sob o regime da comunhão de bens, cabe continuar, até a partilha, na posse da herança, com o cargo de cabeça de casal". Cabeça de casal é o chefe da família. Quando morria alguém, inclusive o Rei, ficava a mulher na cabeça do

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casal. DUARTE NUNES DE LEÃO (Crônicas d'El-Rei, Dom Afonso I , 3 1 ) escreveu: "ficou a Rainha em posse, e cabeça do Reino, como Senhora e proprietária que era dêle". Também se dizia cabeça de casal o casal principal da herdade. Falava-se do "casal encabeçado" e carta de Afonso DI, datada de 1265, foi expressiva, no determinar a tomada das terras, que foram vendidas ou deixadas, a infratores de tributos. Cf. Ordenações Afonsinas, Livro n , Título 64, § 3: "E o Serviçal, e Mordomo seja huü na quintaa, e mais nom; e o que morar na cabeça de seu casal, que ora teem cada huü povoado, ou o já foi, que lavrar as suas herdades próprias, e outras nom, em quanto as assy teverem, e lavrarem sem outra malícia, e engano; e se em outras herdades lavrarem, paguem, e peitem como os outros, e servam ipor ellas outro tanto tempo do anno, quanto montar pera lavrar essas outras herdades; e se assy nom fezerem manda El Rey que nom ajam privilégios". Casal é o que tem casa em comum. Casa-se para ir para a mesma casa. 2 . M O R T E DO MARIDO SE A MULHER NÃO ESTAVA VIVENDO COM Ê L E .

- Se a mulher não mais vivia com o marido, isto é, não mais tinha a convivência conjugal, há regra jurídica especial para o caso de premorrer o marido. A regra jurídica do art. 1.579, § 1.°, do Código Civil não tem exatidão terminológica e dá margem a dúvidas e a equívocos. Primeiramente, atendamos a que há diferença entre o que estabeleceu a legislação de 1916 e o que antes estava assente. Nas Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 95, pr., apenas se repetiu o que as Ordenações Afonsinas receberam dos costumes. Todavia, houve ressalva quanto à separação. Segundo as Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 12, pr., "costume foi em estes Regnos de longamente usado, e julgado, que honde o casamento he feito antre o marido, e a mulher per Carta de Mectade, ou em tal lugar, que per usança se partam os beês de per meo aa morte sem aver hy tal Carta, morto o marido, a molher fica em posse, e Cabeça de Casal, e de sua maão devem receber os herdeiros, e legatários do marido partiçom de todos os beês, que per morte do dito marido ficarom, e bem assy os leguados". Se alguma pessoa, herdeira ou não, retirava a posse, sem consentimento da viúva, podia dizer-se "esbulhada", e a restituição devia logo ser feita. Nada tinha o costume quanto aos bens particulares, porque esses escapavam ao poder do cabeça de casal. Nas Ordenações Manuelinas, Livro IV, Título 7, pr., explicitou-se o principio dispositivo de ser de comunhão universal o regime matrimonial de bens: "Todos os casamentos que forem feitos em Nossos Reynos, e Se-

nhorios, se entendem seer feitos por carta de metade, salvo quando antre as partes outra coisa foi acordado e contractado, porque entonce se guardará o que antre elles for concertado". No Título 7, § 1: "E morto o marido a molher fica em posse e cabeça de casal, se com elle ao tempo de sua morte vivia em casa theuda e mantheuda como marido e molher, e de sua mão receberam os herdeiros do marido partiçam de todos os bens que per morte do dito marido ficaram, e bem assi os leguatarios os leguados, em tanto que se alguüs dos herdeiros, ou leguatarios, ou qualquer outro filhar posse dalgüa cousa da dita herança depois da morte do dito marido sem consentimento da dita molher, ella se pode chamar esbulhada, e ser-lhe-á restituída". Adiante: "o marido por morte da molher continua a posse velha, que antes tinha", razão para que "ficasse ella em posse e cabeça de casal". As Ordenações Filipinas, Livro IV. Título 95, pr., estatuíam: "Morto o marido, a mulher fica em posse e cabeça de casal, se com êle ao tempo de sua morte vivia cm casa teúda e manteúda, como marido e mulher; e de sua mão receberão os herdeiros do marido partilha de todos os bens, que por morte do marido ficarem, e os legatários os legados: Em tanto que se alguns herdeiros, ou legatários, ou qualquer outra pessoa tomar posse de alguma coisa da herança depois da morte do marido, sem consentimento da mulher, ela se pode chamar esbulhada, e ser-lhe-á restituída". Se houve decretação da nulidade ou de anulação de casamento, casamento não houve, por ter eficácia ex tune a sentença. Se houve desquite, ou divórcio (e. g., se um dos cônjuges era estrangeiro e a sentença foi de divórcio), não mais há comunhão matrimonial de bens, mesmo antes da sentença. Se não houve desquite, nem divórcio, e a mulher vivia separada, de fato, do marido, residindo fora do lar, não mais é:abeça de casal. Se o marido estava internado, por doença, ou prêso, ou ausente, ou desaparecido, ou tinha outra residência, ou mesmo outro domicílio, que não coincide com a residência ou com a residência e o domicílio comuns, tem a mulher a posse imediata e a função de cabeça de casal, a parir da morte do marido. Temos de atender a que a mulher somente não tem a posse imediata e não é cabeça de casal, com a morte do marido, sefàcticamente on juridicamente se separou dêle. Surgem alguns problemas. Se foi pedida a separação de corpos, para desquite por adultério do marido, ou por tentativa de morte, sevícia ou injúria grave, ou abandono do lar conjugal durante dois anos contínuos (Código Civil, art. 317, II-IV), seria injusto que se retirassem à mulher, pelo fato do pedido, ou pela decretação da separação de corpos, a posse mediata

§ 5 588. P O S S E IMEDIATA E N Q U A N T O S E F A Z E M O I N V E N T Á R I O E A P A R T I L H A



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dos bens comuns e as funções de cabeça de casal. Abrix-se-ia porta a que o marido provocasse a separação para que, morrendo, o art. 1.579 não fôsse invocado, e sim a regra jurídica do art. 1.579, § 1.°. Por outro lado, vive com o marido a mulher que está internada por doença, ou ausente para viagem ou negócios normais, ou que fugiu diante de ameaças do marido e se escondeu. Se os cônjuges não vivem em comum, mesmo notoriamente, mas a mulher é que está encarregada da administração dos bens, por estar o marido fora do lugar em que são situados, ou em que há as operações da empresa, a mulher continua na posse imediata e com as funções de cabeça de casal, porque, na verdade, ela as tinha.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.588. A - Legislação Sobre a eficácia do casamento, conferir os arts. 1.565 a 1.570 do CC/2002.

§ 5.588. B - Doutrina 1. Com o advento da Constituição Federal de 1988, a chefia da sociedade conjugal e a função de cabeça de casal, atribuídas originariamente ao marido, foram extintas por incompatibilidade com o princípio da igualdade entre os cônjuges, cujos direitos e deveres passaram a ser exercidos igualmente pelo homem e pela mulher (art. 226, § 5.°, da CF). 2. Por seu turno, o art. 1.567 do CC/2002 estabelece que a direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sem precedência de um sobre a outra, como foi o modelo anterior do art. 1.579 do CC/1916, objeto da análise de Pontes de Miranda, para fins da posse imediata e da inventariança.

§ 5.588. C - Jurisprudência

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Dado o caráter de transmissão automática do patrimônio, pela saisine, antiga decisão do Supremo Tribunal Federal, de relataria do Min. Nelson Hungria, já esclarecia que os herdeiros o recebem pro indiviso, nenhum deles podendo exercer atos possessórios que excluam a posse dos outros (Agin 15.181/SP, 1.a T., j. 10.12.1951, rei. Min. Nelson Hungria). É também do STF (RE 7.586/PB, 2. a T., j. 28.07.1950, rei. Min. Orozimbo Nonato) o entendimento de ser possível a pretensão reivindicatória do herdeiro, antes do inventário, em virtude da saisine, pois esta já lhe transmitiu automaticamente a posse e o domínio.

§ 5.589. NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE 1. CÔNJUGE INVENTARIANTE. - O inventariante há de ser o cônjuge sobrevivente se o regime matrimonial de bens é o da comunhão. A função de inventariante é mais ampla do que a de cabeça de casal, porque o cônjuge tem a posse imediata dos próprios bens particulares do cônjuge falecido e tem de suscitar o inventário e a partilha.

Pode dar-se que - a despeito de ser de comunhão o regime matrimonial de bens - não haja bens comuns, como ocorre se o marido ou a mulher herdou bens inalienáveis, e não, portanto, comunicáveis, e nenhum bem se comunicou, o cônjuge não é o inventariante, com invocação do art. 1.579. Se a morte do marido ocorre, pendente a ação de desquite, após a separação de corpos pedida pela mulher, autora da ação, não está excluída da posse imediata e das funções de cabeça de casal a mulher, pois não se lhe pode atribuir culpa em não estar convivendo com o marido (conforme sustentamos, a 2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 17 de fevereiro de 1947, R. dos T., 173, 353). Outrossim, se a mulher está na posse imediata e na administração dos bens comuns, por ter o marido abandonado o lar, ou estar preso, ou desaparecido. Se a mulher ou o marido morre antes da homologação do desquite, o sobrevivente meeiro é o inventariante (8.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 27 de janeiro de 1947, R. F., 114,406). S e o decujo, a despeito de não viver com a mulher meeira, a nomeia inventariante, passa ela à frente de quaisquer herdeiros e do testamenteiro (nossos Comentários ao Código de Processo Civil, VII, 2.a ed., 29). Se o regime matrimonial não era o de comunhão de bens e não há herdeiros necessários, pode o testador nomear inventariante a mulher. Se o casamento fôra com separação de bens e o cônjuge sobrevivente herda, pode pedir a nomeação com o fundamento de que é herdeiro e estava na administração dos bens, ou por ser o herdeiro mais idôneo. Se não há testamenteiro, o cônjuge sobrevivente, que não é herdeiro, nem era casado sob o regime matrimonial da comunhão de bens, pode ser nomeado pelo juiz. A decisão da 2.a Câmara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 25 de julho de 1947, que disse ser "princípio consagrado em lei que, embora instituída herdeira, não pode, viúva, que foi casada com separação de bens, ser inventariante", errou, imperdoàvelmente. Tais afirmações levianas desprestigiam a justiça.

A posse dos bens dos cônjuges, se há comunhão de bens, composse. Trata-se de posse própria, quer seja mediata ou mediata a posse, quer seja posse integral. Dizer-se, como se fêz em voto junto ao acórdão da 2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 21 de outubro de 1949 (A. J., 94, 236; O D., 1, 173). que a mulher "continua na posse de uma parte, e assume a posse da outra, presumindo-se que tenha conhecimento dos negócios, pela convivência com o marido", é de repelir-se. Quanto à eficácia do art. 1.579, § 1.°, do Código Civil, seria acertado, de iure condendo, que se apurasse a culpa; mas, de iure condito, não foi a lei até aí. Se a mulher era casada com estrangeiro, sob o regime da separação de bens, e é herdeira de usufruto vitalício, deve ser nomeada inventariante, de modo que se afasta nomeação do testamenteiro (4.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 25 de fevereiro de 1944, R. ¥., 99, 420) ou a de algum herdeiro. Quem alega que não estava a mulher convivendo com o marido ("vivendo com", sem que se exija a referência a relações sexuais), tem o ônus da prova (5.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 23 de setembro de 1947, O D., 50, 211). Se a mulher não vivia com o marido, mas é herdeira, na qualidade de herdeira é que se trata e pode ser nomeada inventariante (5.a Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, 16 de novembro de 1934, R. dos T., 94, 501). A fortiori, se, embora casada sob o regime da separação de bens, é herdeira (3.a Câmara Civil, 2 de junho de 1949, 181, 781). Se a mulher viúva não satisfaz os requisitos para ser inventariante, como cabeça de casal, mas é herdeira, pode, na qualidade de herdeira, se os pressupostos existem, ser nomeada. Outrossim, se não há herdeiro que possa ser nomeado, nada obsta a que o juiz a nomeie inventariante, por ser mãe de algum herdeiro, ou de alguns herdeiros, mesmo se desquitada (sem razão, a 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 27 de junho de 1950, R. dos T., 188, 832). A simples existência de alvará de separação de corpos, se a mulher e o marido continuam no mesmo lar, não impede a nomeação de inventariante (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 17 de fevereiro de 1948,/?. dosT., 173,353). 2. HERDEIRO NA POSSE E ADMINISTRAÇÃO DA HERANÇA. - O herdeiro que se acha na posse e administração dos bens, uma vez que não há cônju-

ge que tenha de ser inventariante, ou não possa ser nomeado, é legitimado à inventaiiança (Código Civil, art. 1.579, § 2.°: "Na falta de cônjuge sobrevivente, a nomeação de inventariante recairá no co-herdeiro que se achar na posse corporal e na administração dos bens. Entre os co-herdeiros, a preferência se graduará pela idoneidade". Herdeiro na "posse" e "administração" dos bens é o herdeiro que, sendo administrador dos bens, tem a posse imediata. Porque a posse mediata, dita indireta, essa se transmitiu a todos os herdeiros, sem distinção. Não se trata do herdeiro que somente residia com o decujo. Isso não basta. Nem o que esteja na guarda ocasional dos bens: guarda as coisas indivisas, como qualquer condômino; ou papéis, valores, como servidor da posse comum, ou outra figura. Trata-se de administrador. Mas a administração pode ter começado antes ou depois da abertura da sucessão. O direito de administrar transmite-se a todos os herdeiros, de modo que é preciso que se prove ter existido a administração em vida do decujo, ou ter-se estabelecido, à semelhança da gestão de negócio, ou outra figura, pelo interêsse de proteger a herança, sob o regime da separação de bens (3.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio de Janeiro, 27 de fevereiro de 1941, L J„ 57, 373). A 5.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação o Distrito Federal, a 27 de fevereiro de 1941 {R. F., SS, 43b), entendeu que o herdeiro procurador do decujo não pode ser inventariante. A 1.a Câmara Cível doTribunal de Justiça de Minas Gerais, a 1.° de junho de 1950 (R. F., 133, 175), excluiu da legitimação à inventaiiança o herdeiro que tenha de restar contas. Mas exatamente quem "administra os bens" dêles tem "posse" prefere aos outros herdeiros. O argumento e ser pessoa que tem de prestar contas é improcedente. ¿Há quem administre bens alheios, fora dos pais usufrutuários, em ter de prestar contas? No direito anterior, disputava-se quanto a vir primeiro o testamenteiro, ou vir primeiro o herdeiro. O argumento a favor daquela solução era a existência de textos legais como o as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 96, pr., e do Decreto n. 422, de 27 de junho de 1845, art. 1.°, § 2.°, por ilação m tanto forçada (cf. TEIXEIRA DE FREITAS, Consolidação das leis Civis, art. 1.142; CARLOS DE CARVALHO, Nova Consolidado, art. 1.840). A favor da segunda o de terem os herdeiros, saisina (Código Civil, art. 1.572); mas com isso se confundiam a posse recebida do decujo, por lei, com a posse imediata, que algum ou alguns dos herdeiros podem não ter (e. g„ HERMENEGILDO DE BARROS, Manual, 18,120 s.). A posse imediata e a administração são elementos distintivos, que servem »ara se preferir um herdeiro a outro, embora todos tenham a posse mediata (cf. Tomo X, §§ 1.967,4, 1.092, 2, e 1.093, 1).

O Código Civil, art. 1.579, §§ 2.° e 3.°, foi claríssimo: o herdeiro prefere ao testamenteiro; entre herdeiros, prefere-se o que tem a posse e a administração, a que se refere o artigo 1.579, § 2.°, ou o mais idôneo. O testador pode, se não há cônjuge ou herdeiro necessário, atribuir a posse e a administração ao testamenteiro, preterindo os herdeiros legítimos não necessários e os testamentários. Se o testador nomeou testamenteiro e lhe deu posse e administração dos bens, havendo cônjuge meeiro ou herdeiro necessário, vale a cláusula de nomeação e é nula a de atribuição da posse e administração ao testamenteiro que cônjuge não é nem herdeiro. Se há herdeiros necessários e a posse e a administração tocavam e tocam a herdeiro testamentário, prefere esse, porque o Código de Processo Civil, art. 469, II e Hl, não distinguiu. Pode ocorrer que tenham a posse e a administração dois ou mais herdeiros, e outros, não. Dentre os que as têm escolhe o juiz, pela maior idoneidade (analogia com o artigo 469, IH). O Código de Processo Civil, art. 469, II, de modo nenhum se referiu a grau de parentesco; nem, tão-pouco, no art. 469, III. No art. 469, II, o elemento diferenciador, em que se estriba a preferencia, é o de estar o herdeiro na posse e administração dos bens; no art. 469, IH, a maior idoneidade. Assim, é preciso ler-se com cuidado o acórdão da 5.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 28 de novembro de 1950 (D. da J. de 7 de agosto de 1952), em que se diz ter preferência a irmã, que está na posse e administração dos bens do decujo em relação à sobrinha. Se fôsse a sobrinha que estivesse na posse e administração dos bens, preferiria à irmã do decujo. A posse e a administração podem já pertencer, antes da morte do decujo, ao herdeiro, ou podem ter sido atribuídas por êle. Uma das cláusulas com que usualmente se dá ao herdeiro a posse e administração é aquela em que o testador diz "nomeio inventariante o herdeiro A". Se o herdeiro já as tinha e o testador as dá a outrem, pode tal ato do testador conter infração de relação jurídica entre êle e o herdeiro (que era e é, por exemplo, locatário dos bens), mas o efeito para a nomeação de inventariante persiste. O herdeiro testamentário é tratado, pela lei, como o legítimo, e, no art. 469, II e III (aliter, no art. 469, IV, do Código de Processo Civil), como os herdeiros legítimos, inclusive necessários. Por isso mesmo feriu a lei a decisão da 6.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 1.° de outubro de 1946 (R. F., 112, 152), ao preferir-lhe o in-

ventariante judicial, por ser diminuta a parte do herdeiro testamentario na herança e haver dissídio entre os interessados (dois argumentos estranhos ao sistema jurídico). Não pode pretender a inventariança o cessionário do herdeiro, nem o do cônjuge sobrevivente, porque se está em juízo familiae erciscundae, e a qualidade hereditária é intransferível (5.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 4 de abril de 1941, R. F., 88,173). A 3.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 8 de agosto de 1941, reputou incompatibilizado, para o cargo de inventariante, o herdeiro cujo advogado tem interêsses contrários ao espólio (R. F., 89, 479). Também isso não está na lei, nem é, de iure condendo, justo. Os herdeiros necessários somente por serem necessários não têm preferência em relação aos outros herdeiros. Podem não ter a posse e a administração dos bens (art. 469, D), nem idoneidade, ou podem ser menos idôneos que os outros (art. 469,1). Por isso, foi lapso da 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, a 14 de outubro de 1947 (R. dos T., da Baia, 39, 335), referir-se a herdeiros necessários. O Código Civil, no art. 1.579, § 2.°, dá preferência ao herdeiro que se acha na posse imediata - dita, ali, "posse corporal" - ou mesmo mediata, e na administração dos bens. Cf. Código de Processo Civil, art. 469, II. Não se distinguem os herdeiros, sejam legítimos e testamentários, ou só legítimos, ou só testamentários. Se nenhum dos herdeiros tinha a posse e a administração, o que importa é a idoneidade, isto é, a conveniência e a aptidão para o exercício do cargo (6.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 1.° de setembro de 1933; 2.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Estado do Rio de Janeiro, 22 de agosto de 1939, A.J., 52, 46). Se o herdeiro tem de prestar contas à herança, sem ser em virtude da posse e administração do espólio antes da morte decujo, não deve ser nomeado inventariante (1.a Câmara Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 1.° de junho de 1950, em generalidade demasiada, R. F., 133, 175). Se o herdeiro cedeu a herança, não mais pode ser nomeado inventariante (1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 21 de outubro de 1947, /., 29, 693). Idem, o herdeiro que está em lugar ignorado (1.a Câmara Cível, 4 de janeiro de 1944, R. dos T., 170, 744). A lei não distingue, para a nomeação de inventariante, herdeiros necessários e herdeiros legítimos não necessários ou testamentários (sem ra-

zão, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 12 de janeiro de 1944, R dosT., 170, 742).

Se há duas ou mais pessoas que sucedem ao decujo, é indivisível o direito à posse e à propriedade, ou, mais largamente, à titularidade de direitos, pretensões e ações. Terceiros não podem opor a parcialidade do direito de cada herdeiro. Trata-se de universalidade (Código Civil, art. 57). O direito à sucessão aberta é considerado direito sôbre bem imóvel (art. 44). Temos, pois, que a herança é bem imóvel e indivisível até que se ultime a partilha (arts. 53 e 1.580). Por isso, segundo a regra jurídica do art. 1.139, o herdeiro há de ser considerado condômino, ou, melhor, comuneiro, e o outro herdeiro ou os outros herdeiros têm o direito de preferência: qualquer dêles, que venha, ou alguns dêles, ou todos os outros, que venham saber da alienação da quota, ou de parte da quota, podem, com o depósito do preço, haver a parte que foi alienada a estranho, que requerem no prazo de seis meses (cf. artigos 623, III, do Código Civil, e art. 410 do Código de Processo Civil). O direito de preferência só se extingue com o trânsito em julgado da sentença sôbre a partilha, ou com a assinatura da partilha amigável feita por escritura pública, ou por instrumento particular, com o têrmo de ratificação e a homologação pelo juiz. Dá-se o mesmo a respeito de bens compreendidos em sobrepartilha. O direito de preferência do herdeiro ou dos herdeiros foi reconhecido pela 2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 21 de janeiro de 1951 (R. F., 137, 73). Herdeiros menores não podem ser nomeados inventariantes (3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de dezembro de 1946, R. dos T., 167, 168). Isso não afasta que o juiz possa dar o suplemento de idade antes da nomeação e após a morte do decujo. O tutor ou o curador somente pode ser nomeado inventariante como inventariante dativo. Se é tutor ou curador e herdeiro, na qualidade de herdeiro pode ser nomeado. A distinção entre o poder de nomear inventariante, que em o juiz, e o de poder o testador nomear testamenteiro, com posse e administração da herança, é relevante, porque o testador só tem um óbice à nomeação de testamenteiro com posse administração dos bens: haver cônjuge, ou herdeiro necessário. Se há herdeiros não-necessários, o juiz não tem a escolha de inventariante dativo (cf. 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de dezembro de 1946, R. dos T., 66, 126). Se o inventário é dos bens dos dois cônjuges, um dos quais deixou herdeiro necessário e outro não, a nomeação pode ser de qualquer dos herdeiros (sem razão, a 2.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São

Paulo, 9 de outubro de 1939, R. dos T., 125,106). Se o herdeiro necessário reputa inconveniente, o que lhe cabe é pedir a separação dos processos. 3. HERDEIRO MAIS IDÔNEO. - "Mais idôneo" ("preferência pela idoneidade"), significa o que tem maiores indicações para o cargo de inventariante, - morais, econômicas, de trato dos negócios que concernem à administração de herança, ou forenses, ou de confiança, ou simplesmente de estima ou respeito dos outros herdeiros. A escolha do mais idôneo não é de puro arbítrio; no escolher, o juiz decide, julga. Cumpre advertir-se que a regra jurídica, sob a aparência de um só caso, contém dois: se algum dos herdeiros está na posse material dos bens sem ter a administração presumindo-se tolos idôneos, antes de se indagar da idoneidade, como é a regra - e pede a abertura do inventário, dentro do prazo, esse leve ser nomeado, se não fôr provado que é menos idôneo. As preferências em virtude de sexo são de direito estrito; só se leva em conta a esse quando a lei o permite, ou impõe. Em conseqüência dêsse princípio, o sexo não é elemento para se apurar a idoneidade. Regra tradicional do nosso direito é a de só se escolher pela verificação da idoneidade maior se os herdeiros, em sua totalidade (não maioria, nem sequer todos menos o escolhido e mais um, ou menos um que não seja o escolhido), não elegeram inventariante (ALBERTO CARLOS DE MENESES, Prática dos Inventários, 3.a ed., I, 17; não assim, JOSÉ PEREIRA DE CARVALHO, Primeiras Linhas, 2.a ed., 32, nota 59). O ser mais velho o herdeiro também não basta. A falta de herdeiro, que possa ser inventariante, é que permite nomear-se inventariante o testamenteiro, ou, se também falta testamenteiro, que se nomeie, nomear-se pessoa estranha. Se não há herdeiro, tollitur quaestio. Se há herdeiro, mas é incapaz, nomeia-se o testamenteiro, ou chama-se à inventariança pessoa estranha. Pergunta-se: se o herdeiro é pessoa domiciliada no estrangeiro, ¿pode ser nomeado? O inventariante é autor, na ação de inventário e partilha, e pode ser-lhe exigida caução às custas (Código de Processo Civil, artigo 67), inclusive se, domiciliado no Brasil, se ausentar; salvo se tem bens imóveis que assegurem o pagamento das custas. Quanto a dinheiros e valores do espólio, pode o juiz ordenar o depósito. Escusado é advertir-se que o juiz pode apreciar a idoneidade e, portanto, dela exigir provas. Todavia, não há, no sistema jurídico brasileiro, regra jurídica que estabeleça incapacidade do estrangeiro ou do Brasileiro, domiciliado no estrangeiro, para ser nomeado inventariante, quer se trate de pessoa que caiba na regra jurídica do art. 469,1, do Código de Processo Civil, quer na do art. 469,1, quer na do art. 469, HI, quer na do art. 469, IV. A nomeação

de pessoa estranha, que seja domiciliada no estrangeiro, ou fora da jurisdição do juiz do inventário e partilha, apenas é desaconselhável. Daí serem sem razão a argumentação e a conclusão da 5.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 7 de novembro de 1950 (D. da /., de 23 de agosto de 1951). Bem andou a mesma 5.a Câmara Cível, a 13 de fevereiro de 1951, dizendo: "... embora pudesse ter estabelecido a restrição, o legislador não a formula, e onde a lei não distingue não é lícito fazê-lo o intérprete. A ordem de transferências do art. 469 do Código de Processo Civil deve, em qualquer caso, ser observada". - Se não há cônjuge, ou não tem legitimação, nem há, ou não tem legitimação o herdeiro, cabe a inventariança ao testamenteiro, se o testador lhe concedeu a posse e administração dos bens de herança. Sôbre a posse do testamenteiro, nosso Tratado dos Testamentos, V, 184-208. Não basta que o testador haja ordenado a entrega imediata (portanto, posse e administração) de parte dos bens da herança. O art. 469, III, do Código de Processo Civil, também e aplica se o testador distribuiu tôda a herança em legados (Código Civil, art. 1.769). 4 . TESTAMENTEIRO.

Se há cônjuge meeiro ou herdeiro necessário, somente na falta acidental dêles pode ter validade a cláusula de posse e administração do testamenteiro. A falta (incapacidade para ser inventariante, ou certeza de que não aceitará a inventariança) tem de ser antes da morte; porque, no dia da morte, e o cônjuge meeiro pode ser inventariante, ou se o pode ser o herdeiro, a cláusula testamentária é nula. Deve-se entender que a cláusula "nomeio-o testamenteiro e inventariante" implica "nomeio-o testamenteiro e dou-lhe a posse e administração da herança" (2.a Turma do Supremo tribunal Federal, 27 de junho de 1950, A. /., 96, 387). 5. INVENTARIANTE DATIVO. - A escolha do inventariante, dito, por isso, inventariante dativo, obedece ao critério das nomeações; não há ficção (vontade do decujo, ou dos herdeiros), nem presunção de ter sido o preferido, ainda que recaia em legatário, ou em testamenteiro sem a posse e a administração da herança. Não é, além disso, igual aos atos do juiz nas nomeações do art. 1.579, §§ 1.°, 2.° e 3.°, cuja discutibilidade é fora de toda dúvida. Esses são atos de resolução: o juiz, aí, julga. O que há de comum entre todos esses atos é serem atos constitutivos (formadores) judiciais, com maior, ou menor elemento declarativo. A questão está em se saber até

que ponto elemento declarativo permite a impugnabilidade. Ponhamos de parte a alegação de ter o juiz pulado um dos incisos do art. 469 do Código de Processo Civil (Código Civil, art. 1.579, § 1.°, 2.° e 3.°), porque, aí^a sentença é injusta (iníqua sententia), por igual, em qualquer dos casos. Examinemos apenas . injustiça "interna" (e. g., convivência ou não-convivência com o marido, não ter o herdeiro a administração, não ser o mais idôneo, não ter o testamenteiro a posse e a administração da herança, não ser idônea a pessoa estranha escolhida). Não há qualquer diferença entre as apreciações do juiz, nem entre as apreciações eventuais e a impugnabilidade dêsses diferentes atos do juiz, pois a única distinção está na origem delas (partes, juiz). (a) Tôda nomeação de cônjuge sobrevivente só se dá se o regime é o da comunhão de bens; portanto, não há a indicação legal se o regime é o da separação legal, ou se o regime é o da separação de bens convencional, ou o dotal. "Comunhão". Entende-se "comunhão universal", ou "parcial". Se o cônjuge está desquitado, comunhão não há, porque não há sociedade conjugal, e não seria possível pensar-se em nomeação com fundamento no regime matrimonial. A regra jurídica assimétrica do art. 1.579, § 1.° (marido, estivesse, ou não, vivendo com a mulher; mulher somente se estava vivendo com o marido), proveio das Ordenações Filipinas. Deve-se interpretar que a nomeação tem de ser excluída "se não estava vivendo com o marido, sem reger os bens" (Código Civil, artigo 251), porque, se a mulher está na direção e administração do casal, cessa a ratio legis. Também não se pode afastar da inventariança a mulher, se ela propusera ação de desquite ou de anulação, ou reconvenção, e apenas a separação preventiva fora decretada. Convivência, na regra jurídica do artigo 1.579, § 1.° (cuja assimetria, de legeferenda, é condenada), está por "habitação no mesmo lar", e não por "existência de relações sexuais entre os cônjuges". Seo cônjuge não tem legitimação ativa para inventariante, como cônjuge, mas satisfaz o requisito da lei (herdeiro ou legatário, ou cessionário daquele ou dêsse), ou o requisito para testamenteiro, ou do Código de Processo Civil, art. 468, TV (credor do herdeiro, munido de sentença executória ou de título de crédito certo e líquido), pode requerer o inventário e, se satisfaz algum dos requisitos do art. 469, II-V. pode ser nomeado inventariante (no mesmo sentido, a 2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 17 de outubro de 1950, D. da J., de 5 de agosto de 1952). (b) Não sendo o caso de se nomear cônjuge, um, dois, ou mais de dois herdeiros podem achar-se na posse e administração dos bens do decujo. Se

somente um se acha em tal posição, tem de ser nomeado; mas, nomeando-o ou deixando de nomeá-lo, o juiz emite comunicação de conhecimento ou enunciado de fato (julgamento): "A está na posse e administração dos bens do decujo" ou "A não está na posse e administração dos bens do decujo"; e a verdade ou falsidade dêsse julgamento pode ser discutida no agravo de instrumento (Código de Processo Civil, art. 842, VE). Se há dois ou mais nas situações do art. 469, II, só a maior idoneidade pode decidir. E aí novamente emite o juiz comunicação de conhecimento ou nunciado de fato, com a possibilidade do recurso do Código e Processo Civil, art. 842, VII. (c) Se nenhum dos herdeiros está na posse e administração dos bens do decujo e há dois ou mais, qualquer nomeação contém o enunciado explícito ou implícito de que o nomeado é o mais idôneo. Também nesse caso a verdade ou falsidade da comunicação de conhecimento é discutível no agravo. (d) Se o testamenteiro não tem, pelo testamento, a posse e administração da herança, porém não há cônjuge nem herdeiro, êle é que deve ser nomeado. Há os seguintes enunciados de fato: não há cônjuge; não há herdeiro; o testamenteiro está em situação de exercer o cargo. Lê-se no Código Civil, art. 1.579, § 3.°: "Na falta de cônjuge ou de herdeiros, será inventariante o testamenteiro". Temos, após o Código de Processo Civil, de atender às regras jurídicas que se introduziram. Se o testamenteiro tem, pelo testamento, a posse e administração dos bens do decujo, pois que não há cônjuge sobrevivente, nem herdeiro necessário (isto é, podiam ser-lhe concedidas a posse e a administração), deve ser nomeado. Os enunciados, em escala de questões prejudiciais, são, pois, os seguintes: a) o testador não tinha (ou não deixou) cônjuge ou herdeiro necessário; b) o testador concedera ao testamenteiro a posse e administração dos bens da herança; c) o testamenteiro está em situação de exercer o cargo. Tôdas as comunicações judiciais acima apontadas são discutíveis no agravo de instrumento. O agravo não tem efeito suspensivo. (e)A nomeação de pessoa idônea somente se dá se no ligar não há o inventariante judicial. Portanto, os enunciados são os seguintes: a) não há qualquer das pessoas mencionadas no Código Civil, art. 1.579, §§ 1.°, 2.° e 3°, eno Código de Processo Civil, art. 469,1-IV); b) não há inventariante judicial, ou há, porém é impedido; c) o nomeado é pessoa idônea. Todos esses enunciados podem ser discutidos no recurso de agravo.

A 1.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 21 de outubro de 1941 (R. F., 90, 464), entendeu que o juiz pode nomear inventariante além do caso do Código de Processo Civil, art. 469, V, se há grave divergencia entre os herdeiros com risco de entorpecer a marcha do processo de inventário. Isso não está na lei. É preciso que se tenha removido o que exercia. 6 . LEGITIMAÇÃO À INVENTARIANÇA, FEITA ABSTRAÇÃO DO INTERESSE.

- Cada uma das pessoas indicadas pelas leis somente é inventariante, na falta da pessoa ou das pessoas referidas nas leis. Faltam, ou por não existirem, ou não estarem legitimadas, ou por serem incapazes. Qualquer delas tem pretensão a postular, - pode, assim, pleitear a nomeação, e impugnar, antes de ser nomeada; o testamenteiro tem a pretensão de defender a sua posição e atacar a do que o substituir. A ordem legal tem de ser respeitada e a enumeração é exaustiva (1.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 4 de agosto de 1941, R. dos T., 133, 140; 2.a Câmara Civil, 12 de setembro de 1944,152,135). Não se introduza a exigência do interesse de exercer o cargo, que seria contra os princípios. A lei somente cogita, para a nomeação de inventariante, de legitimação, e qualquer alusão a interesse específico seria absurda. Quanto ao cessionário da pretensão ou da ação (= cessionário, que não é do direito, como o cessionário da pretensão reivindicatória), pode requerer o inventário; porém não tem pretensão a ser nomeado inventariante, porque não é legitimado a isso o próprio cessionário do direito (sem razão, a 4.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 10 de agosto de 1951, D. da J., de 29 de abril de 1954; certas, a 3.a Câmara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 10 de dezembro de 1951, e a 3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 25 de setembro de 1952, R. dos T., 206, 339). É pessoa estranha, como o próprio cessionário do direito, e somente pode ser inventariante dativo. A 4.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 11 de setembro de 1952 (.R. dos T., 205, 261), decidiu que, se há cessionário de herdeiro, ou de herdeiros, contra cuja idoneidade nada se articula e se revelou diligente no ativar o andamento do inventário, não se justifica a nomeação de pessoa estranha. Tem-se de pôr isso em têrmos de técnica jurídica: se há cessionário ou cessionários de algum ou de alguns herdeiros, o cônjuge meeiro ou o herdeiro prefere a êle ou a eles; se há cessionário ou cessionários de todos os herdeiros e há testamenteiro, o testamenteiro prefere; se

há cessionário ou cessionários de todos os herdeiros, o que se pode dizer é que tal situação o recomenda ou os recomenda para a inventariança dativa. Não há pretensão do cessionário à inventariança. O credor do herdeiro pode suscitar a abertura do inventário e, provàvelmente, obtém penhora no rosto dos autos. Se, na ação executiva contra o herdeiro, o credor arremata a quota do herdeiro, a posição dele é de cessionário que tem interêsse em requerer a partilha e nela figurar. A incompatibilidade entre os herdeiros não justifica, de si só, nomear-se pessoa estranha para o cargo de inventariante (sem razão, a 6.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 28 de janeiro de 1947, R. F., 115, 131, a 7.a Câmara Cível, a 17 de maio de 1947, 114, 134, e a Câmara do Tribunal de Justiça de Sergipe, a 30 de setembro de 1952, D. da J. de Sergipe, a 18 de outubro, e o Procurador-Geral da República, a 19 de novembro, D. da J., de 2 de fevereiro de 1952). Com razão, a 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 17 de outubro de 1950 (R. F., 136, 131: "... a ordem legal tem de ser respeitada e a enumeração é exaustiva", vêde PONTES DE MIRANDA, Comentários, HI, I, 25). E, rigorosamente, a divergência entre herdeiros não abre ensejo ao juiz de nomear inventariante, além do caso do artigo 469, V. Somente quando não possa o juiz encontrar inventariante dentro no quadro legal e na ordem que a lei estabelece, possível será a convocação de estranho"). Se sobrevêm discórdia entre os interessados no andamento do processo, não pode o juiz nomear outro inventariante sem remover o que se achava exercendo o múnus. Discórdia não é causa de destituição, nem basta para a nomeação de pessoa estranha. É ilegal nomear o juiz o advogado do cônjuge meeiro, ou do herdeiro, ou do testamenteiro, em vez de nomear quem pela ordem legal havia de ser nomeado. Para que se nomeasse pessoa estranha seria preciso que já se pudesse invocar a regra jurídica especial, isto é, que não houvesse qualquer legitimado das classes mencionadas na lei. Se há uma ou algumas pessoas, que possam ser nomeadas, só a renúncia ou as renúncias podem abrir o branco para a nomeação de estranho (cf. 2.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, 24 de setembro de 1947, R. dos T. da Bahia, 39, 201). Sem razão, a 5.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 28 de maio de 1948 (R. dos T. 175, 305), destituiu viúva meeira, por ter idade avançada (mas estava no cargo, nomeada), e nomeou pessoa estranha, "por haver inimizade entre herdeiros" (não é causa de exclusão da legitimação à inventariança).

Pergunta-se: ¿O cônjuge meeiro ou o herdeiro que está na posse e administração da herança, mas é incapaz, pode ser nomeado inventariante? A resposta é negativa. ¿Em vêz dele, pode ser nomeado o representante legal, ou a pessoa que a êle teria de assistir? Responderam afirmativamente a 6.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 4 de outubro de 1946 (A. J., 81, 61), e a 7.a Câmara Cível, a 19 de agosto de 1947 (O D., 50, 274), mas sem razão. Seria difícil conceber-se que o herdeiro, sendo pessoa incapaz, tivesse a posse e a administração; de jeito que incidisse regra jurídica relativa a êle; outro herdeiro ou as teria, ou estaria em igual situação e seria mais idôneo. A nomeação do representante legal, ou da pessoa que teria de assistir, somente caberia como nomeação de inventariante dativo. O que se pode alegar é a recomendabilidade de tal estranho dentre os estranhos, pela função que exerce. Cresce de ponto a recomendação se os outros herdeiros o indicam ou se o indica o testamenteiro, que teria de ser nomeado (cf. 5.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 22 de outubro de 1946, R. F., 110, 123). A nomeação para inventariante, a que alude o art. 1.579, com os §§ 1.°, 2.° e 3.°, do Código Civil, é a nomeação que tem de ser feita pelo juiz. O testamenteiro só há de ser nomeado, se falta cônjuge, com os pressupostos legais para isso, ou algum herdeiro. Nada tem isso com a atribuição ao testamenteiro pelo testador: o testador somente pode fazê-la se lhe dá "a posse e a administração da herança por não haver cônjuge ou herdeiro necessário" (Código de Processo Civil, artigo 469, IV, 2.a parte, onde há regra jurídica que não consta do art. 1.579 e §§ 1.°, 2.° e 3.° do Código Civil). Confuso, e in casu injusto, o acórdão do Supremo Tribunal Federal, a 27 de junho de 1950 (A. /., 96, 387). O testador tem de reputar, ou não, necessária a nomeação, por êle, de testamenteiro. Pode nomear um, dois ou mais testamenteiros, conjuntos ou separados, e atribuir a todos, ou a alguns, ou a um a posse e administração dos bens da herança (se não há herdeiro necessário). As funções podem ser distintas, inclusive quanto a bens sob a posse e a administração. Se o testamenteiro é nomeado inventariante, por ser testamenteiro, com a posse e a administração da herança, porque não há cônjuge legitimado à inventariança, nem herdeiro necessário, é como testamenteiro que o nomeia o juiz. Se não ocorre um dos pressupostos legais para que se prefira o testamenteiro a terceiro, trata-se o testamenteiro como pessoa estranha. Há apenas coincidência em ser testamenteiro e inventariante. Daí poder haver, em qualquer das espécies, duas remunerações, uma, de inventariante, e ou-

tra de testamenteiro, salvo se o testador previu a unidade da remuneração (cf' 2.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 22 de maio de 1939, R. dos T., 120, 167). Não se pode dizer que não haja arbítrio do juiz na nomeação do inventariante, como fêz a 3.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 14 de junho de 1938 (R. dos T., 114, 667). Somente não há arbítrio se há cônjuge, ou herdeiro legitimado à nomeação, ou se há testamenteiro com a posse e a administração da herança, ou nomeado pelo testador, se não há cônjuge nem herdeiro necessário. Fora daí, a nomeação é pelo juiz, a seu líbito, apenas com a exigência da idoneidade. Discute-se se pode a situação entre os herdeiros e o inventariante, ou a pessoa que havia de ser nomeada inventariante, ser tal que se justifique não se nomear quem está com os pressupostos para isso. Referem-se com causas para essa atitude omissiva haver dissídio que impeça a marcha do inventário, ou a extrema necessidade (3.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 19 de novembro de 1937, R. dos T., 112, 596). E perigosa essa atitude do juiz. Mais acertado é que nomeie o inventariante, conforme a lei, e - diante de alegações e provas - o destitua.

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.589. A - Legislação Sobre a nomeação do inventariante, conferir o art. 990 do CPC; sua dispensa no inventário extrajudicial está normatizada na Lei 11.441/2007.

§ 5.589. B - Doutrina 1. Uma das diretrizes do Código Civil de 2002 foi a supressão das normas de processo ou procedimentos, restringindo-se ao direito material, remetendo aquelas à correspondente legislação processual. Assim é que o Código Civil dedica apenas um artigo (art. 1.991) ao inventariante, apenas para atribuir-lhe a administração da herança, desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, sem definir, como fazia o Código Civil anterior, quem pode ser o inventariante e quais suas atribuições. 2. As considerações de Pontes de Miranda no § 5.589, principalmente em face do que dispunha o revogado art. 1.579 do CC/1916, ficaram prejudicadas por essas razões, além do art. 990 do CPC de 1973 ter regulado de maneira diferente a ordem preferencial para nomeação do inventariante pelo juiz. 3. Por outro ângulo, a norma revogava discriminava a mulher,

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quando ela fosse o cônjuge sobrevivente, o que também a incompatibilizou com a Constituição de 1 9 8 8 . 4 . 0 inventário e a partilha por escritura pública, se todos os herdeiros forem capazes e concordes, torna desnecessário o inventariante

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§ 5.589. C - Jurisprudência i

De acordo com o SuperiorTribunal de Justiça, a universalidade consubstanciada na herança tem representação expressamente atribuída ao inventariante, que é parte legítima para a ação proposta pelo herdeiro (STJ, REsp 1.080.614/SP, 3.a

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T„ j. 01.09.2009, rei. Min. Nancy Andrighi, DJe 21.09.2009).

CAPÍTULO III ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA

HERANÇA

§ 5.590. ATITUDE VOLITIVA DOS HERDEIROS 1. PRECISÕES. - No momento em que ocorreu a morte do decujo, a herança transferiu-se aos herdeiros, automaticamente. Tem-se de conceituar o que se passa em síntese que atenda ao elemento germânico da saisina e às reminiscências da aditio e da repudiatio. A expressão "renúncia" que hoje se emprega, não é má, porque se supõe direito nascido, a que a declaração unilateral de vontade põe fora. A adição, a aceitação, também é declaração unilateral de vontade. Não se pode deixar de ver que a própria terminologia romana, ao tempo, portanto, em que não havia a saisina, vacilava. Na L. 24, § 2, D., de minoribus viginti quinqué annis, 4, 4, em texto interpolado, empregou-se "repudiaverit hereditatem", e na L. 1, § 4, D., ut in possessionem, legatorum vel fideicommissorum servandorum causa esse liceat, 36, 4, "si certum sit repudiatam vel omissam hereditatem". No sistema jurídico brasileiro, a expressão "renúncia" atende ao que se passa, porque houve a transmissão; apenas, aí, a renúncia tem eficácia ex tunc.

Para que se possa abrir herança, é preciso que tenha morrido o decujo. Não há adição prévia ou anterior à abertura da sucessão. Nem vale promessa de adição. Se há ou houve a morte, a promessa vale e é adição, e não promessa do negócio jurídico unilateral. O "praetermittere" e o "omittere" não ficariam bem; e o "repudiare" seria equívoco. Há o spatium deliberandi, que é aquele a que corresponde o têrmo judicial. Lê-se no Código Civil, art. 1.581: "A aceitação da herança pode ser expressa ou tácita; a renúncia, porém, deverá constar, expressamente, de escritura pública, ou têrmo judicial".

Frisemos que foi absurda a opinião de ERNST STAMPE (Unsere Rechtsund Begrijfsbildung, 55 s.; Besprechung, Juristische Wochenschrift, 51, 22), para quem a aceitação da herança seria aceitação de oferta, e a renúncia, rejeição. Não há qualquer relação jurídica entre o decujo e o herdeiro quer legítimo, quer testamentário, ou o legatário, mesmo porque o decujo não mais existe. Além disso, seria relação jurídica contratual, o que se teria de repelir (cf. Tomo XII, § 2.687, 2). A herança transmite-se aos herdeiros e legatários, mas a renúncia tem eficácia negativa ex tunc: quem renuncia nunca foi herdeiro ou legatário. Tem-se de considerar o beneficiado como se não existisse, de modo que, morto A, com a renúncia pelo filho único, B, herdeiro legítimo, não se afasta a transmissão da herança a C, ou a C e D, netos do decujo e filhos de B. Mais: se A tinha outros filhos e todos renunciaram, os filhos do renunciante vêm à sucessão, "por direito próprio e por cabeça" (Código Civil, art. 1.588). No direito romano, a aceitação, a adição, era pressuposto necessário para que se dêsse a transmissão da herança. No direito brasileiro, a adição pode ser tácita e, se o decujo, A, deixou a B e, na sua falta, a C, e morre B após A, o que se há de entender é que B adiu à herança, a despeito de ter morrido sem expressar a sua vontade ou mesmo na ignorância da deixa. Os sucessores de B podem adir, ou renunciar à herança, porque se lhe transmitiram todos os direitos, deveres e ônus do herdeiro falecido. Pode dar-se, porém, que o testador haja instituído herdeiro a B, com fideicomisso, ou sob condição suspensiva, que se não verificou. Aberta a sucessão, passados vinte dias, qualquer interessado pode pedir que o juiz fixe prazo, não superior a trinta dias, para que o beneficiado declare se recusa ou não a herança ou o legado. Se nada expressou, tem-se como adita a herança. >

2 . TRANSMISSÃO DA HERANÇA E ACEITAÇÃO. - A transmissão da herança, automática, como é, faz nascer o direito de aceitar ou de renunciar. Se o sucessível aceita, não mais pode renunciar; igualmente, se deixou expirar o prazo judicial para a manifestação unilateral de vontade sem renúncia. A expiração do prazo (o advento do têrmo judicial) é aceitação.

O juiz, ao fixar o têrmo para a manifestação unilateral de vontade do herdeiro, cuja omissão aceitação é, tem de atender às circunstâncias. Não pode ser curto, nem maior do que se fixa na lei, porque há de ter tempo o herdeiro para verificar se convém, ou não, aceitar, e o limite atende a que se

inicia com o conhecimento. O herdeiro pode estar fora do país, ou servindo em guerra, ou em missão especial, ou estar desaparecido, ou ausente, e em tôdas essas espécies tem de haver notificação, inclusive através de carta precatória. É preciso que a renúncia parta de quem pode renunciar. Se o testador deixou os bens para se constituir sociedade ou fundação, ou a sociedade ou função, para que possa satisfazer exigências de personificação, o presidente, ou a diretoria, não pode renunciar à herança, porque seria permitir-lhe destruir a fundação (ERNST ZITELMANN, Allgemeiner Teil, 7 2 ) . prazo judicial somente pode começar do momento em que o herdeiro tem conhecimento exato da chamada a manifestar-se, com os dados sôbre a causa. Por isso, é preciso que o herdeiro legítimo conheça a falta de outras pessoas, que o pré-excluiriam. Se é herdeiro legítimo necessário, ou simplesmente legítimo, ou herdeiro testamentário, o prazo só se inicia para a vocação que a essa posição judiciária lhe corresponde. Se foi chamado qual herdeiro, legítimo, e não testamentário, mas herdeiro legítimo não é, o prazo não correu para que êle aceitasse ou renunciasse a herança testamentária. 3. PRAZO JUDICIAL. - O

Se o herdeiro é absolutamente incapaz, alguém o tem de representar. Se relativamente incapaz, há de ter tido conhecimento o herdeiro, e não só o titular do pátrio poder, o tutor ou o curador. Se o herdeiro, capaz ou incapaz, tem representante sem poder suficiente para aceitar ou renunciar a herança, o prazo só se conta a partir do conhecimento pelo herdeiro (JULIUS BINDER, Die Rechtsstellung des Erben, I, 1 2 1 s.; sem razão, E M I L a STROHAL, Das deutsche Erbrecht, II, 3. ed., II, § 6 1 , nota 16-a). No sistema jurídico brasileiro, acertadamente, o prazo há de ser marcado pelo juiz competente. Da data da notificação é que se inicia o curso. Se não havia os informes exatos (e. g., falou-se da sucessão de A, e se trata da morte de A'; a notificação referiu-se à sucessão testamentária, e o herdeiro legítimo não foi contemplado no testamento), o prazo não corre. Vinte dias depois de aberta a sucessão, há a legitimação de qualquer interessado à notificação do herdeiro para que, dentro de prazo razoável, nao maior de trinta dias, declare se aceita, ou não, a herança. Se expira o prazo judicial, sem a manifestação, entende-se aceita a herança (Código Civil, art. 1.584). Se algum herdeiro legítimo também o é testamentário, mesmo com valor maior, com ou sem restrições ou encargos, pode êle aceitar uma herança e renunciar a outra.

Se alguma lei especial exige que o beneficiado tenha autorização do Estado, o prazo somente pode ser contado da data em que teve êle conhecimento do ato estatal autorizativo. Não, porém, porque, com a exigencia da autorização, a transmissão só se dê com a outorga, de jeito que, com essa, haja eficácia ex tunc (ao momento da abertura da sucessão): a eficácia negativa, ex tunc, seria a da recusa da autorização. No direito alemão, há disputa a respeito disso, mas a opinião contrária à eficácia só retroativa negativa, para a' denegação da autorização, não é acertada (sem razão, por exemplo, G. PLANCK, Lehrbuch, V, 73 s.). O prazo judicial somente começa para o nascituro com o nascimento. Se o herdeiro é incapaz e lhe falta representante legal, só se inicia o prazo judicial no dia em que assume a tutoria ou a curadoria a pessoa que o há de representar. Se pende questão de reconhecimento pelo genitor, só a partir da data em que se decida, com res iudicata, se ao genitor caberia a representação. No intervalo, pode haver tutor ou curador. Se está em férias a Justiça, ou, por outra causa, sem funcionamento, interrompe-se o prazo preclusivo. Igualmente, se se alega e prova ter havido fôrça maior. Se foi proposta a ação de nulidade ou de anulação do testamento, ou mesmo a ação declaratória de inexistência, e o contemplado entende que é herdeiro legítimo, o prazo judicial para que êle se manifeste a respeito da herança testamentária só se inicia com o trânsito em julgado da sentença que decidiu ser improcedente a ação proposta. Se há ação de nulidade ou de anulação de testamento proposta por outrem contra o herdeiro testamentário, a contestação por êsse há de ser interpretada como aceitação. - Se o herdeiro, legítimo ou testamentário, falece antes de manifestar-se pela aceitação ou pela renúncia, a herança passa aos herdeiros do herdeiro e com ela o direito de manifestar-se. A respeito, lê-se no art. 1.585: "Falecendo o herdeiro, antes de declarar se aceita a herança, o direito de aceitar passa-lhe aos herdeiros, a menos que se trate de instituição adstrita a uma condição suspensiva, ainda não verificada". A exposição do conteúdo do art. 1.585, devido a sua insuficiente redação, é de grande relevância. O herdeiro do herdeiro pode aceitar ou renunciar a primeira herança; mas, se renuncia a primeira, aceitou, implicitamente, a segunda. Pode aceitar ambas as heranças, porém não renunciar a herança do herdeiro e aceitar a primeira. O art. 1.585 fala de herança ou 4 . TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE MANIFESTAR-SE.

legado ("instituição") sujeita a condição suspensiva, ainda não verificada. Se não se impliu a condição suspensiva, ao herdeiro não se transmitiu a herança. A lei não se referiu ao decurso do prazo judicial, exceto quanto ao máximo. Ora, há duas situações inconfundíveis: a) a do herdeiro do herdeiro, se êsse morreu antes de se iniciai- o prazo judicial; b) a do herdeiro do herdeiro, se, quando êsse morreu, já fora notificado. Na espécie a), o herdeiro do herdeiro tem de ser notificado. Na espécie b), o prazo judicial foi substituído pelo prazo judicial para se manifestar o herdeiro do herdeiro quanto à segunda sucessão (cf. W . E. KNITSCHKY, Erbschaft und Erbtheil, Archivfür die civilistische Praxis 91, 191). Os que admitem que o prazo continue a correr contra o herdeiro do herdeiro teriam de considerar aceita a primeira herança por ter expirado o prazo, mas pode o herdeiro do herdeiro, que o ignoraria, propor ação por invalidade fundada no êrro. Um pouco de artifício. Tanto a aceitação como a renúncia supõem que esteja aberta a sucessão, porém não que se tenha aberto inventário, ou que esteja a correr prazo para a manifestação. Quem sabe que o ascendente, ou descendente, ou o cônjuge, ou o parente colateral, ou o testador faleceu e sabe que é herdeiro, ou legatário, pode aceitar ou renunciar a herança. A própria pessoa chamada em lugar posterior pode manifestar a vontade de aceitar ou renunciar. Não se invoque contra isso a regra jurídica do Código Civil, art. 1.583, porque de modo nenhum, nas duas espécies, se aceitou ou se renunciou sob condição: aceitou-se ou renunciou-se o direito eventual. Para que alguém aceite ou renuncie herança, é preciso que o faça sem ser sob condição, ou a têrmo. Também não se pode aceitar ou renunciar somente parte da herança. Diz-se no Código Civil, no art. 1.583: "Não se pode aceitar ou renunciar a herança, em parte, sob condição, ou a têrmo; mas o herdeiro, a quem se testaram legados, pode aceitá-los, renunciando a herança, ou, aceitando-a, repudiá-los". As regras jurídicas aí contidas têm de ser expostas com especial distinção. A herança transmitiu-se no dia da morte do decujo, e a atitude do herdeiro é de aceitação, ou de renúncia, de "sim" ou "não", no tocante à vontade do herdeiro. A aceitação da herança "se o filho do decujo não está vivo" ou a renúncia "se é verdade que o decujo se desquitara e a mulher tem pendente ação rescisória da sentença" é manifestação de vontade repelida pelo art. 1.583, 1.a parte. Quem aceita ou renuncia herança supõe que haja abertura de sucessão e que tenha de aceitar ou renunciar. Se quem aceitou ou renunciou diz

que não está certo da morte, ou de ter lugar na sucessão legítima ou testamentária, aceitou ou renunciou; porque os dois pressupostos são apenas condiciones iuris. A aceitação, ou a renúncia, se cabia, foi pura. Por isso temos de refusar a opinião de THEODOR K I P P ( L . ENNECCERUS, Lehrbuch, II, 3, 160), porque toda a razão estava com G. PLANCK (Kommentar, V, 8 0 ) , com P. M E Y E R (Das Erbrecht des BGB., 5 1 7 , nota 23), F. ENDEMANN (Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, II, 2, 7 8 5 ) e F . H E R Z F E L D E R (J. V. Staudingers Kommentar, V, 1019). Se a pessoa aceitou ou renunciou herança, frisando que não tem certeza de que o decujo haja morrido, é válida a aceitação ou a renúncia, porque se supôs a morte. Se a morte não ocorreu, nada exprimiu o que se manifestou, porque vocação não houve. Com a morte do decujo após o ato de aceitação ou de renúncia, que se lançou no vácuo, o manifestante - se é herdeiro, ou legatário - pode aceitar, ou renunciar. A renúncia a benefício de terceiro determinado não se tem como renúncia condicionada. O que o renunciante inseriu foi supérfluo, porque êle renunciou e não fêz depender do fato de vir a ser chamado, em vez déle, o terceiro. Se, porém, êle fêz a eficácia da sua renúncia subordinada à vocação do terceiro, então o art. 1 . 5 8 3 , 1.a parte, incide. Aí, com razão, THEODOR K I P P ( L . ENNECCERUS, Lehrbuch, n, 3, 1 6 0 ) , F R A N Z LEONHARD (.Erbrecht, 2. A ed., 4 2 ) e JULIUS B I N D E R (Die Rechtsstellung des Erben, I, 1 2 8 ) ; sem razão, G . P L A N C K (Kommentar, V, 8 0 ) . Se o genitor renuncia a herança e em seu lugar é sucessível o filho, nem por isso deixa de ser exigida a prévia autorização do juiz (cf. Código Civil, art. 386). Não se há de atender a solução diferente de outros sistemas jurídicos. Se houve renúncia antes de ser dada a autorização judicial, tem de ser repetida a declaração de renúncia, porque é pressuposto necessário a previedade da autorização. Se alguém nasceu e faleceu a mãe antes que o pai o reconhecesse, ou se ainda não foi nomeado tutor ou curador que assuma o cargo, não há prazo judicial para que o absolutamente incapaz ou o relativamente incapaz se manifeste. Só após o trânsito em julgado da decisão de reconhecimento, ou de nomeação de tutor, ou de curador, pode o juiz marcar o prazo. Idem, se o caso é de adoção de quem não tem pai, nem mãe, nem tutor, nem curador. A aceitação da herança e a renúncia referem-se ao espólio, portanto - são declarações de significação patrimonial. Mas seria contra o instituto mesmo da herança, seja de origem legal, seja testamentária, que se abstra-

ísse do elemento pessoal, inclusive no que concerne à honra e às conseqüências que teria, por exemplo, a renúncia, se, com ela, os bens iriam a quem não os merecia receber. Em caso de concurso de credores, ou de devedores, a deliberação é segundo os princípios. No direito brasileiro, há o art. 1.586 do Código Civil, onde se diz: "Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando a herança, poderão eles, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunciante. Nesse caso, e depois de pagas as dívidas do renunciante, o remanescente será devolvido aos outros herdeiros". Noutros sistemas jurídicos parte-se de princípio que colima com a regra jurídica acima transcrita: entende-se que se apóia em pensamento prático não ser influenciada pelos credores a manifestação de vontade do herdeiro. Mas havia e há, de lege ferenda, opiniões opostas, como foi a de K O N R A D H E L L W I G (Erbschafsausschlagung und Glãubigerhaftung, Festschrift der Berliner juristischen Fakultãtfiir F. VON M A R T I T Z , 1 5 7 s.). Quanto ao têrmo, nem o têrmo suspensivo nem o resolutivo podem constar da aceitação, ou da renúncia. Se foi incerto, não vale a aceitação, nem a renúncia. Se ainda é tempo para outra manifestação da vontade, pode ser repetida sem o elemento invalidante. O herdeiro que aceita a fração da herança que lhe cabia, on que somente renuncia a fração, não aceitou válidamente, ou não renunciou válidamente. O herdeiro tanto o pode ser de toda a herança como de parte, unitariamente, como se só há um herdeiro legítimo ou testamentário, ou há dois ou mais herdeiros legítimos, ou o testador deixou a B um quarto da herança e a C três quartos. Não é de admitir-se que o herdeiro do todo só aceite a metade, ou, por exemplo, o herdeiro da fração só aceite metade ou dois terços do que lhe cabe. Se, porém, à mesma pessoa foram atribuídas duas ou mais frações hereditárias, tem-se de indagar se a causa de herdar é a mesma, ou se há duas ou mais causas. Se a causa é a mesma, a aceitação de uma porção apanha a todas as vocações; bem assim, a renúncia. O art. 1.588 do Código Civil e assaz relevante. A mesmidade da causa pode ser de herdeiro pelo mesmo testamento, ou por dois ou mais testamentos. Quem herda como bisneto por ser neto de A e ser filho de A', premortos, e como bisneto por ser neto de B e filho de B', premortos, por serem A' e B' primos que se casaram, não herda pela mesma causa. Também há pluralidade de causas se a mulher herda como casada com o premorto e como colateral, o que pode acontecer

(cf. Decreto-lei n. 3 . 2 0 0 , de 19 de abril de 1 9 4 1 , art. 1.°, com aredação que lhe deu o Decreto-lei n. 5 . 1 8 7 , de 13 de janeiro de 1 9 4 3 , art. 1.°; e Lei n. 883, de 21 de outubro de 1949, art. 3°). A questão foi discutida: com razão, por exemplo, JULIUS BINDER (Die Rechtsstellung des Erben, I, 1 1 1 s.), F. HERZFELDER (J. v. Staudingers Kommentar, V, 1 0 2 1 ) , FRANZ LEONHARD (Erbrecht, 2. A ed., 4 6 ) , THEODOR K I P P (L. ENNECCERUS, Lehrbuch, I I , 3, 1 6 1 ) , P. MEYER (Das Erbrecht des BGB., 5 1 8 ) e F. ENDEMANN (Lehrbuch, H I , 2, 7 8 7 ) ; contra, HANS HELLWIG (Beruht die gesetzliche Berufung zur mehreren Erbteilen auf "dem selben Grunde", Archiv für die civilistische Praxis, 1 0 2 , 4 3 9 ) , G . PLANCK (Kommentar, V, 8 8 ) , EMIL STROHAL (Das deutsche Erbrecht, I I , § 6 1 , 6 ) , O T T O N I E S E (Bedeutung und Tragweite des § 2 0 0 7 des BGB., Archiv für Bürgerliches Recht, 3 0 , 1 9 8 s.) e W . E . KNITSCHKY (Erbschaft und Erbtheil, Archiv für die civilistische Praxis, 9 1 , 3 0 2 s.), H U G O KRESS (Die Erbengemeinschaft nach dem BGB., 1 9 4 ) , J . A B Õ H M (Das Erbrecht des BGB., 2. ed., 2 5 6 ) , R. PELARGUS (Das Erbrecht des BGB., 1 3 1 ) , GUSTAV MARKER (Die Nachlassbehandlung, Das Erbrecht, Familienrecht undVormundschaftsrecht, 17.A ed., 233). Se um herdeiro foi afastado depois da abertura da sucessão, há aumento da porção que cabia ao que restou, ou aos que restaram. No direito brasileiro, a porção é uma só, aporque apenas houve suposição de que o outro herdeiro não fosse afastado. O herdeiro, legítimo ou testamentário, a quem se deixou legado, ou a que se deixaram legados, pode aceitar o legado, ou os legados, renunciando a herança, ou, aceitando-a, repudiá-los. Se um herdeiro morreu deixando dois ou mais herdeiros, o filho ou os filhos do herdeiro morto após a abertura da sucessão, há a herança pelo filho, ou pelos filhos, e isso nada tem com as regras jurídicas do art. 1.583. Se o testador deixou ao mesmo herdeiro porções distintas e permitiu que venha a renunciar uma, ou algumas, e aceitar uma ou algumas, o tratamento da espécie há de ser em analogia com o que se estatui quanto à herança e legados (artigo 1.583, 2.a parte). Se o herdeiro morreu deixando dois ou mais herdeiros, qualquer deles pode aceitar ou renunciar o que lhe toca. Se o herdeiro morto não aceitara, nem renunciara, qualquer dos seus herdeiros pode renunciar a porção que lhe corresponda na herança do decujo. Se renuncia, a porção é deferida aos herdeiros do decujo, e não aos restantes herdeiros do herdeiro (JULIUS BINDER, Die Rechtsstellung des Erben, I, 1 3 6 s; sem razão, PAUL OERTMANN, Civilistische Rundschau, Archiv für Bürgerliches Rechts, 14, 3 6 6 ) .

Se o herdeiro seria herdeiro legítimo não-necessário e é herdeiro testamentario, pode renunciar a porção testamentária e aceitar a legítima, porque a sucessão legítima não-necessária somente ocorre se não há herdeiro testamentário. O herdeiro que ignora as causas pelas quais é chamado, ou que podem existir, pode aceitar ou repudiar para quaisquer que sejam as causas. Não há, aí, condição.

§ 5.591. A C E I T A Ç Ã O D A H E R A N Ç A

1. CONCEITO E ESPÉCIES. - A aceitação é a manifestação de vontade que faz definitiva a posição jurídica do sucessível. Uma vez que se lhe permite renunciar, aceita se o diz, ou se não renuncia. Pode a aceitação ser expressa ou tácita. Se há atos do herdeiro que só se poderiam atribuir a herdeiro, a aceitação é tácita. No art. 1.581, § 1.°, diz o Código Civil: "É expressa a aceitação quando se faz por declaração escrita; tácita, quando resulta de atos compatíveis somente com o caráter de herdeiros". A terminologia do art. 1.581 e do § 1.° não é perfeita: as manifestações de vontade podem ser expressas sem serem escritas. O § 1.° limitou o conteúdo da expressão. No § 2.° há limite à tacitude: "Não exprimem aceitação da herança os atos oficiosos, como o funeral do finado, os meramente conservatórios ou os de administração e guarda interina". No art. 1.582: "Não importa igualmente aceitação a cessão gratuita, pura e simples, da herança, aos demais co-herdeiros". 2. FORMA DA ADIÇÃO. - Estatui o Código Civil, artigo 1.581: "A aceitação da herança pode ser expressa ou tácita; a renúncia, porém, deverá constar, expressamente, de escritura pública, ou têrmo judicial". No § 1.°: "É expressa a aceitação, quando se faz por declaração escrita; tácita, quando resulta de atos compatíveis somente com o caráter de herdeiros". No § 2.°: "Não exprimem aceitação da herança os atos oficiosos, como o funeral do finado, os meramente conservatórios, ou os de administração e guarda interna". Os menores absolutamente incapazes e os adultos absolutamente incapazes são representados pelos pais, tutores ou curadores, conforme os princípios gerais. Todavia, há atos que os representantes não podem

praticar sem autorização do juiz. Um déles é a renúncia a herança ou legado. Para a adição, basta a declaração do pai, tutor ou curador, ou a adição tácita. Quanto aos relativamente incapazes, os pais, tutores ou curadores têm de assistir. Mas, se houve adição tácita, ou expressa, pelo relativamente incapaz, tácito pode ser o assentimento. O Código Civil fala de aceitação expressa ou tácita; com isso inclui na tacitude a chamada presunção. S e o herdeiro ou legatário foi intimado a manifestar-se, e não se manifestou, entende-se que aceitou, porque assim estatui o art. 1.584 do Código Civil. Não há presunção. A espécie é semelhante à do art. 1.084, a propósito de aceitação de oferta de contrato. Há resposta com o silêncio, conforme dissertamos no Tomo XXXVIII, § 4.188, 3, e não presunção. 3 . ACEITAÇÃO ESCRITA. - A aceitação escrita pode ser em virtude de declaração em escritura pública, ou em requerimento no juízo de inventário e partilha, ou em telegrama, com as formalidades que se exigem no art. 9.° do Código de Processo Civil, por analogia.

4. ACEITAÇÃO TÁCITA. - Tácita é qualquer aceitação que não é expressa. Mas a terminologia do Código Civil deixou inclusa nas aceitações tácitas as aceitações expressas sem terem sido feitas por escrito. Se o sucessível assume a posse imediata dos bens e a administração, recebe a sua quota em créditos ou em algum crédito, paga dívidas da herança, outorga poderes a alguém para que seja advogado na ação de inventário e partilha, ou em ação de reivindicação, ou de posse, ou de reivindicação de posse, quanto a bens do espólio, aceitou a herança. No artigo 1.581, § 2.°, está explícito que se não reputa aceitação (o verbo "exprimem" é impróprio, porque aceitação que se "exprime" é "aceitação expressa", e o art. 1.581, § 2.°, afasta casos que seriam de aceitação tácita): os atos oficiosos, como o funeral do defunto, os anúncios e invitações para solenidades religiosas e profissionais, pagamentos de despesas dos empregados domésticos, do edifício de apartamentos e reparos urgentes em casa ou na eletricidade, o recebimento dos alugueres que deposita na conta do falecido, a locação de vigia para a casa ou qualquer bem da herança. Se o sucessível entrega ao locador o edifício ou apartamento ou quarto de que era locatário o decujo, com isso não manifestou vontade de aceitar a herança. Tão-pouco, se continua, no lugar do falecido, com o trabalho do escritório,

ou da fábrica, ou a exploração de plantações ou criações. Não no é, sequer, a renda necessária para pagamento de dívidas urgentes, porque o faz em posição de gestor de negócios alheios sem outorga. Se é de interpretar-se o comportamento do herdeiro, tal como os costumes o concebem, como de manifestação de vontade de ficar com a herança {pro herede gestio, como se sói dizer), há aceitação. A recepção não é exigida à aceitação; à renúncia, sim, para a sua eficácia. Cf. quanto à aceitação, H. TITZE (Missverstándnis, Handwõrterbuch der Rechtswissenschaft, IV. 86); sem razão JULIUS B I N D E R (Die Rechtsstellung des Erben, 1 , 4 0 2 s.; também, F R A N Z LEONHARD, Erbrecht, 2. A ed., 3 5 s.), que apenas considera suficiente a declaração perante tabelião. Ao juiz compete apreciar se o herdeiro ou legatário aceitou (G. P L A N C K , Kommentar, V, 66), mas pode existir quaestio iuris, e não só quaestio facti, como se se trata de interpretação do art. 1.582 do Código Civil. Escreveu CARLOS MAXIMILIANO (Direito das Sucessões, I, 7 0 ) que se presume sempre a aceitação tácita. Sem razão. O que se compõe tácitamente, como se comporia expressamente, não é presumido, não depende de presunção. Se os fatos mostram que se manifestou vontade, inclusive a de adição, sem que expressa fôsse tal manifestação, houve tácita manifestação de vontade, não a manifestação presumida de vontade. Se o beneficiado toma a posse dos bens, os administra ou os aliena ou grava de direito real, tacitamente manifestou a sua vontade de adir à herança, salvo se o fêz com invocação de outra causa (e. g., dizendo-se esbulhado pelo decujo). Se o beneficiado demole a casa, ou os muros, sem que haja ameaça de ruína e lhe coubesse tal dever, tácitamente adiu. Se, sem ser representante do decujo, ou ter de tomar medidas, cobra ou recebe créditos do decujo, tácitamente adiu. Se reclama abertura de inventário e partilha, ou se propõe a ação de inventário e partilha, ou outra qualquer ação que não tinha de ser proposta por êle, ou se paga dívidas da herança, sem revelar que o faz como gestor de negócios alheios com outorga ou sem outorga, tácitamente adiu a herança. Se constitui procurador para representá-lo no inventário, ou em qualquer ações do herdeiro ou dos herdeiros ou contra êle ou eles, ou se doa ou lega algum bem da herança, ou se paga salários ou retribuições que os herdeiros teriam de pagar, tácitamente adiu. Não se cogita, em todos êsses casos, de presumibilidade, mas sim de tacitude. Cf. Tomos I, § 25; II, § 222, 2; m , § 249, 2. Nas manifestações tácitas de vontade há conclusão exfactis-, e não se confunde com as vontades praesumtae.

Não há manifestação tácita da vontade de adir, por exemplo, se o beneficiado toma providências quanto ao funeral, ou quanto a atos religiosos, ou a medidas urgentes a respeito dos bens sem o propósito de assumir função de herdeiro, ou de dono do legado, ou de solver dívidas do decujo somente para evitar medidas cautelares ou executivas, ou se procede à colheita e vende os frutos que não podem aguardar a abertura do inventário e a entrega da posse, continua na fazenda, granja, chácara, ou estabelecimento industrial, comercial ou bancário, porque era a sua função, ou, pelas circunstâncias, lhe incumbe substituir o decujo, como se herdeiro ou legatário não fôsse. Mesmo a alienação urgente de bens da herança para pagamento imediato de dívidas, ou evitar deterioração, se lhe cabia tal atividade se herdeiro ou legatário não fôsse ( P A U L KÕHNE-RICHARD FEIST, Die Nachlassbehandlung, I, 18.a ed., 392), não induz adição tácita. A adição, expressa ou tácita, é irrevogável. Daí poder ser discutido se a renúncia foi tardia, ou se os atos que se pretende tenham sido de adição expressa ou tácita já ocorreram após a renúncia, que também é irrevogável. Há aceitação se o sucessível cede, a título oneroso, se doa com encargo a alguém co-sucessível a parte que lhe coube, ou se hipotecou ou empenhou a parte, ou a mencionou como bem a ser penhorado, se como incluída em patrimônio ou em-declaração de imposto de renda, ou outra declaração para efeitos fiscais ou de garantia, ou de seguro, ou se atende a qualquer medida judicial ou ação contra o espólio, como se herdeiro fôsse, ou se contestou ou interpôs recurso sem dizer que renunciara. O simples fato da propositura de ação por parte do sucessível, no que concerne ao patrimônio do decujo, pode não conter aceitação tácita (cf. HANS REICHEL, Aktiv- und Passivprozesse der vorlãufigen Erben, Festgabe der Juristenfakultãt Jenafür AUGUST T H O N , 1 1 7 s.). Diz o Código Civil, art. 1.584: "O interessado em que o herdeiro declare se aceita, ou não, a herança, poderá, vinte dias depois de aberta a sucessão, requerer ao juiz prazo razoável, não maior de trinta dias, para, dentro nele, se pronunciar o herdeiro, sob pena de se haver a herança por aceita". Na espécie, o herdeiro ou legatário é notificado; se não atende com a manifestação de vontade que se deseja, o seu silêncio é manifestação tácita de vontade. Se expirou o prazo judicial, houve a aceitação. Discutiu-se a classificação da expiração do prazo preclusivo para a renúncia (se não renunciou, aceitou), mas houve confusões que temos de afastar. Para alguns, trata-se de fato objetivo (objektive Tatsache), e não de negócio jurídico, nem,

sequer, de ato jurídico stricto sensu (G. PLANCK, Kommentar, V, 67, 6 a; a FRANZ LEONHARD, Erbrecht, 2. ed., 36; THEODOR KIPP, em L . ENNECCERUS, Lehrbuch, II, 3, 167 s.; /. v. Staudingers, Kommentar, V, 1013; contra, F. ENDEMANN, Lehrbuch, I I I , 2, 783; JULIUS BINDER, Die Rechtsstellung des Erben, I, 78 s.; PETER KLEIN, Die Rechtshandlungen im engeren Sinne, 32 e 41). 0 que se há de considerar, precipuamente, é o ato de aceitação, a que se não pode negar ser declaração unilateral de vontade e, pois, na especie, negocio jurídico unilateral. O prazo judicial é apenas notificação ao herdeiro, e nada tem com a expressa declaração de vontade do herdeiro; apenas se fixou para que se conclua, ao término do prazo judicial, pela aceitação tácita, se não houve outra, expressa ou tácita no transcurso. Trata-se de fato, mas fato que entra como elemento do suporte fáctico da aceitação tácita, se ela ocorre. Se no intervalo houve a renúncia, o prazo judicial apenas foi elemento para que o herdeiro se manifestasse pró ou contra a aceitação, e a expiração não mais importa. Por outro lado, se houve a aceitação expressa, pode não ter tal conseqüência a notificação. Se houve violência, dolo ou êrro, ou outra causa de nulidade ou de anulação, a aceitação expressa e a tácita são sujeitas aos mesmos princípios. A aceitação, como a renúncia, não pode ter cláusula de condição, ou de têrmo, seja resolutivo, seja suspensivo. A inexidade é absolutamente afastada. Se há alguma cláusula inexa, tem-se como não-escrita. O fato de poder o interessado requerer ao juiz que notifique o sucessor para declarar se aceita, ou não, a herança, não significa que se presuma a adição. S e o notificado não se manifesta, tem-se por aceita tácitamente, pelo silêncio, a herança, porque assim se estabelece na lei. Se o sucessor diz que aceita sob condição, ou a têrmo, o que se há de entender é que não se manifestou, quer pela adição, quer pela renúncia. Em todo o caso, é possível que atos posteriores ou atos anteriores já haviam composto a adição tácita. 5. M U L H E R CASADA, HERDEIRA OU LEGATÁRIA. - O artigo 2 4 2 , I V , do Código Civil suscita problema grave. Lá se diz que a mulher não pode, sem autorização do marido, "aceitar ou repudiar herança, ou legado" (alias, "renunciar"). Se a mulher é herdeira, necessária ou não, precisa ela da autorização do marido, ou do suprimento judicial? Notificada por algum co-herdeiro, ou outro interessado, tem prazo judicial, não maior de trinta dias, para manifestar-se. A notificação tem de ser a ela e ao marido. Se nas vésperas da expiração do prazo judicial o marido, notificado, ou não, se

manifesta contra a vontade da mulher (e. g., ela quer aceitar, e êle nega a autorização, tem ela de pedir suprimento judicial). Não houve atendimento ao prazo, ou não há tempo para êle. Qual a solução? Fôrça maior interveio, de modo que o pedido de suprimento, a tempo, interrompe o prazo preclusivo. Depois da decisão do juiz, favorável ao pedido (e raramente haveria fundamento para que o juiz o negasse, principalmente em sistema jurídico em que não há responsabilidade ultra vires hereditatis, ou se está em causa legítima necessária), a aceitação está ultimada com a coisa julgada. Não se precisa de nova notificação. A mulher manifestou a sua vontade, ato a que faltava a autorização do marido, mas a decisão judicial a supriu. Se a mulher quer renunciar e o marido não lhe dá a autorização, tudo se passa como acima expusemos. A decisão judicial integra a manifestação de vontade da mulher renunciante. Se houve a notificação e nem a mulher nem o marido se manifestaram dentro do prazo, aceita foi a herança, ou aceito foi o legado. 6. M E N O R E S E CURATELADOS. - Se o herdeiro é menor, tem de ser representado ou assistido em juízo, se houve a notificação. Comentadores do Código Civil inadvertidamente, dizem que o pai, o tutor ou o curador, que representa, pode pelo absolutamente incapaz aceitar ou renunciar a herança. Quem assiste não aceita, nem renuncia; apenas assiste ao relativamente incapaz que quer aceitar, ou renunciar. O próprio titular do pátrio poder não pode alienar bens imóveis, nem, portanto, renunciar a herança, salvo se alega que é necessário fazê-lo e pede a prévia autorização do juiz (Código Civil, art. 386). Se há colisão de interesses entre o filho e o genitor (e. g., com a renúncia à herança, os bens iriam ao genitor, cônjuge do falecido), tem de ser dado curador especial (artigo 387). Por outro lado, seria absurdo que o filho, chamado à herança, por exclusão do pai, êsse pudesse representá-lo, ou assisti-lo na aceitação ou na renúncia. Quanto ao tutor e aos curadores, cumpre observar-se que somente podem aceitar heranças, ou legados, com autorização do juiz (arts. 427, EI, e 453). O texto do art. 427, IH, só alude a "aceitar por êle" - pelo tutelado ou pelo curatelado - "herança, legados, ou doações com ou sem encargos" de modo que somente duas interpretações lhe poderiam ser dadas: a) a de que não haveria permissão legal para renúncia da herança em que o herdeiro ou legatário fôsse sujeito a tutela ou curatela; b) a de que, só excepcionalmente, em circunstâncias nocivas ao interesse patrimonial ou moral do incapaz, poderia o juiz autorizar a renúncia. A interpretação literal é a); a segunda supõe situações

difíceis de ocorrer, como a de que, aceitando a herança testamentária, o sucessível herdaria bens discriminados, ao passo que, renunciando, a quota da legítima estaria livre da discriminação. Mas verdade é que o herdeiro pode renunciar o que há de ser incluído na quota legitimária, uma vez que lhe não diminua o valor. Há ainda o problema que exsurge da regra jurídica do art. 1.170, na qual se diz que às pessoas que não puderem contratar é facultado, no entanto, aceitar doações puras (Tomos XLVI, § 5.016, 1, 2; IX, §1.021, 2, 5).

O titular do pátrio poder não precisa de autorização do juiz para aceitar herança, em nome do filho absolutamente incapaz, nem para assisti-lo no ato de aceitação, se relativamente incapaz. O art. 1.590 do Código Civil somente se referiu às causas para a "retratação" da renúncia. Nada disse sôbre causas para retratação da aceitação; apenas a limitou a favor dos credores ou do credor, como ocorre com o ato retratativo da renúncia (art. 1 . 5 9 0 , 2. A parte: " A aceitação pode retratar-se, se não resultar prejuízo a credores, sendo lícito a estes, no caso contrário, reclamar a providência referida no art. 1 . 5 8 6 " ) . Isso não afasta a nulidade ou a anulabilidade, tal como se alguém forçou o contemplado em testamento a aceitar a herança para moralmente prejudicar o sucessível ou se o aceitante errou quanto ao objeto da herança ou ao seu valor ( F R A N Z LEONHARD, Erbrecht, 2. A ed. 5 0 ; P. M E Y E R , Das Erbrecht des BGB., 5 2 1 ) . Se o testador disse que deixaria o legado tal para o caso de não ser herdeiro o legatário (e. g., havia ação de invalidade do reconhecimento), a aceitação do legado eventual não implica renúncia à herança. 7 . OUTORGA DE PODERES PARA A ADIÇÃO E PARA A RENÚNCIA. -

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adição e a renúncia podem ser feitas por procuração. Compreende-se que se exijam, para essa, poderes especiais (cf. EMIL STROHAL, Das deutsche Erbrecht, Hl, 3.a ed., 17). Quanto à adição, o art. 1.295 do Código Civil não nos dá base suficiente, porque adir herança não é administrar, porém somente em caso de restrição dos poderes que pré-excluísse o exame da situação hereditária seria de admitir-se que o procurador para atos em geral não os tivesse para adir a herança. 8. EXISTÊNCIA E VALIDADE. - A aceitação da herança, a adição, pode ser inexistente, nula ou anulável. A aceitação feita pela pessoa que não é beneficiada legítima ou testamentàriamente não existe. A aceitação pela pessoa que é beneficiada, mas cometeria ato ilícito absoluto se aceitasse,

é nula. Por exemplo: disse A, no testamento, que seria seu herdeiro B, seu filho, embora a mãe de B e o pai de B fossem casados e constasse B do registo de nascimentos como filho legítimo do pai e da mãe. A adição pelo absolutamente incapaz é nula; mas pode ocorrer que o titular do pátrio poder, o tutor ou o curador haja, depois, representado o absolutamente incapaz e a adição tenha sido expressa ou tácita. Quanto à anulabilidade, a matéria foi, quase toda, atribuída à retratabilidade (êrro, dolo, violência). Ficam de fora a incapacidade relativa do agente, a simulação e a fraude aos credores. O assentimento, em caso de relativamente incapazes, no tocante à aceitação, é, praticamente, sem relevância. Quanto à simulação, se a aceitação foi antedatada, para que se reputasse intempestiva a renúncia, há anulabilidade da adição. Alega-se e prova-se a antedata. A fraude contra credores não pode ser objeto de discussão, porque quem adita recebe, e não figura em negócio jurídico oneroso. - Estabelece o Código Civil, no art. 1.586: "Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando a herança, poderão eles, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunciante. Nesse caso, e depois de pagas as dívidas do renunciante, o remanescente será devolvido aos outros herdeiros". 9 . PRESSUPOSTOS DO DIREITO DO CREDOR.

A regra jurídica é especial e afasta a invocabilidade da anulabilidade por fraude contra credores, mesmo porque só se exige o eventus damni. Os dois pressupostos necessários, conforme a regra jurídica especial, são apenas a anterioridade dos créditos, em relação à renúncia, e a insuficiência dos bens do devedor para a solução das suas dívidas. Não é preciso, sequer, que os bens da herança, que se renuncia, bastem para a solução das dívidas. O inventário sempre foi segurança para os credores. A pretensão dêles ao beneficium separationis firmava-se em serem satisfeitas as dívidas, de maneira precípua, antes de se confundirem com os bens próprios dos herdeiros os haveres do decujo. A lei exige que os credores do herdeiro estejam munidos de "sentença executória" ou de título certo e líquido; não se referiu aos credores do decujo, porque êsses podem intentar a ação contra os herdeiros, se não há inventário, inclusive executar títulos ou sentenças (arg. ao Código de Processo Civil, art. 898). A êles não se requere que tenham a "sentença executória" ou o título líquido e certo. Aos credores do herdeiro, sim... ¿Que é, porém, sentença executória? A lei fala de "sentença exeqüível" (arts. 882 e 886); e ou são elas executivas, ou são sentenças de condenação, ou sentenças de mandamento, quando, além do imperativo do

mandado, importem execução no sentido lato (e. g., embargo, certas ações de caducidade ou amortizações etc.). Algumas sentenças declarativas e as constitutivas podem ter efeitos de condenação ou executivos. São sempre "executórias" na parte das custas e despesas, ainda nos casos dos arts. 63 e 59, parágrafo único. O Código de Processo Civil, ao falar de título certo e líquido, atendeu à maioria dos casos de ação executiva, não abrangendo, porém, todos os casos da ação do art. 298. O credor da herança não é legitimado só por ser credor, a requerer a abertura do inventário (6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 18 de fevereiro de 1952, R. dos T., 200, 441). Tem êle pretensão contra a herança toda; portanto nenhum interêsse em inventário tendente à partilha. Se os bens não bastam para pagamento das dívidas, há o concurso de credores, para o qual se procede, ou já se procedeu à descrição e avaliação de bens, ou houve a situação falencial de que trata o Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, arts. l.°-6.°, e ao síndico cabe a arrecadação dos bens. O representante da massa, na falência do herdeiro (não do legatário), ou na liquidação coativa, ou no concurso civil de credores, é legitimado a requerer a abertura do inventário. Também o representante na falência, liquidação coativa ou concurso civil de credores do cônjuge sobrevivente, ainda que o regime matrimonial de bens não tivesse sido o da comunhão. No direito brasileiro, o credor tem a pretensão à adição, a despeito de ter havido a renúncia pelo sucessor. Tem de ser exercida, satisfeitos os pressupostos e produzidas as provas, com o remédio jurídico processual da autorização judicial. O credor pede ao juiz tal autorização. Tem base jurídica exigir-se o rito ordinário, pois é indispensável a citação do renunciante, para a contestação e os demais atos processuais. O renunciante pode alegar e provar que não há insolvabilidade, que o demandante não é credor do que diz, que as dívidas foram posteriores à renúncia. Se o renunciante paga a dívida, ou as dívidas, cessa a demanda. A lei criou direito, pretensão e ação para o credor se se compõem os requisitos que ela aponta como necessários. Não se trata de inserção do credor na situação jurídica do devedor insolvente e renunciante. Apenas se sub-roga ao renunciante, no que toca ao devedor, razão por que, no inventario e partilha, se legitima a todos os atos que o devedor renunciante tinha de praticar ou poderia praticar. Desde o momento em que se paga de todo o crédito, cessa a legitimação do credor para atos que concernem ao patrimonio ou à parte do patrimônio que seria do renunciante se renúncia não tivesse havido. Não se trata de "anulação" a favor do credor, o que é erro-

nía de alguns juristas (e. g., CARLOS MAXIMILIANO, Direito das Sucessões, I, 86). Tôdas as renuncias a herança ficam expostas a essa eventual ineficacizição por ter algum credor, ou por terem alguns credores, satisfeitos os pressupostos, exercido o direito de se sub-rogar nos direitos do renunciante, até a importância do que êsse lhe devia antes da renúncia. No fundo, a ação do credor é constitutiva negativa, quanto à renúncia pelo devedor, e tem carga de eficácia condenatória, sem que isso altere o rito processual do inventário e da partilha. Não há o que se passa, quanto à liquidação, nas ações executivas de títulos extrajudiciais e nas ações executivas da sentença. Digamos: a sentença favorável ao credor é desconstitutiva da eficácia da renúncia (*****), até o valor do crédito; o juiz declara a existência do direito, da pretensão e da ação (***); condena o devedor (****); e manda que se atenda ao credor, em sub-rogação pessoal (**). A executividade é ínfima (*), porque houve a sub-rogação pessoal. É de relevância saber-se qual a carga de declaratividade para se afirmar a eficácia da coisa julgada material que tem a sentença favorável ao credor. Acima falamos da força da sentença favorável ao credor e consideramos constitutiva negativa a ação do credor. Tal eficácia negativa preponderante ataca a renúncia, negócio jurídico unilateral do sucessor. Há o lado positivo, que é o da sub-rogação„pessoal do credor no valor do que seria do devedor, até se perfazer o quanto devido. Mas a sub-rogação penal provém da desconstituição da eficácia da renúncia, que só se passa para que possa haver a sub-rogação pessoal. No direito anterior ao Código Civil, a ação que se propunha era a ação revocatoria ou ação Pauliana, mas havia, para a justificativa, a exigência de prova da má intenção (cf. J . H . CORREIA TELES, Doutrina das Ações, § 54, n. 169), o que hoje seria estranho à letra da lei. Alguns sistemas jurídicos, como o alemão, não têm o direito do credor à constituição da eficácia da renúncia. A desconstituição é até o quanto da dívida, ou das dívidas, seja um só o credor, ou sejam dois ou mais os credores. No que excede à soma devida, a eficácia da renúncia não é atingida. O resto vai aos outros sucessores, conforme os princípios, em virtude da permanência abdicativa. Se algum credor venceu em ação condenatória contra o sucessor renunciante, tem de propor a ação desconstitutiva negativa e o litígio muda de carga de eficácia: a sentença na ação do credor para se sub-rogar pessoalmente ao devedor renunciante continua constitutiva negativa de eficácia e tem de atender à condenatoriedade e à declaratividade da sentença

transita em julgado. Entenda-se: o juiz não pode recusar o reconhecimento, o respeito, da sentença que se proferia na ação condenatoria. O que cresce é o elemento executivo, que passa a ser de ***, como está na sentença proferida na ação condenatoria.

Panorama atual pelos Atualizadores I |

§ 5.591. A - Legislação O atual Código Civil cuida da aceitação e da renúncia da herança entre os arts. 1.804 a 1.813.

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§5.591. B-Doutrina

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1. Não foram tantas as alterações legislativas e doutrinárias neste tema. 2. O art. 1.804 do CC/2002 (dispositivo de abertura do Capítulo IV) não tem correspondência no Código Civil de 1916, mas, no entanto, o dispositivo atual e seu parágrafo único não inovam, relativamente à Lei Civil anterior, pois a doutrina já havia chegado a esta mesma conclusão. A nova Lei Civil condiciona a transmissão abstrata do acervo à aceitação pelo sucessor mortis causa. Se este não quiser a herança, deverá a ela renunciar. Não renunciando, determina o Código Civil que a transmissão se completou e os bens foram definitivamente transferidos para a propriedade de herdeiro ou sucessor. 3. Na Lei anterior, a aceitação poderia ser condicional (benefício de inventário), só produzindo eficácia se o ativo da herança fosse maior que o passivo. Feita a partilha, cada herdeiro só responde na proporção do quinhão da herança que lhe coube, ou seja, o herdeiro responderá pelas dívidas do falecido até o montante de bens ou valores recebidos. 4. Por outro lado, se o herdeiro falecer antes de aceitar a herança, este direito de aceitar transfere-se aos herdeiros do herdeiro falecido, desde que estes manifestem-se positivamente acerca da aceitação da herança relativa à sucessão do herdeiro falecido (art. 1.809 do CC/2002). Nestes casos, os herdeiros do herdeiro falecido poderão aceitar ou renunciar à primeira herança (parágrafo único). Este parágrafo único também é construção apenas da Lei Civil de 2002. 5. Quanto à irrevogabilidade da aceitação ou da renúncia, contida no art. 1.812 do CC/2002, o tema recebeu novo tratamento, diversamente do que constava do Código anterior (possibilidade de reparação daqueles atos unilaterais). Nesse sentido, andou melhor o Código Civil ora em vigor.

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§ 5.591. C - Jurisprudência No julgamento do RE 110.756-1, datado de setembro de 1986, antes, portanto, da edição do atual Código Civil e do advento de seu art. 1.804, o Ministro do

STF, Carlos Madeira, seguiu o entendimento de Pontes de Miranda quanto aos efeitos ex tunc da renúncia de herança (STF, RE 110.756-1, 2.a T., j. 19.09.1986 rei. Carlos Madeira, DJU 24.10.1986, RT 614/253). Quanto ao momento do pedido de aceitação da herança, o STJ entendeu, no REsp 754.468, que este pedido deve ser feito até o momento imediatamente anterior ao da homologação da partilha de bens (STJ, REsp 754.468, 4.a T., j. 27.10.2009, v.u., Min. Luis Felipe Salomão, DJe 16.11.2009, RT893/205).

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§ 5.592. R E N Ú N C I A D A H E R A N Ç A

direito do herdeiro nasceu no momento mesmo em que ocorreu a morte do decujo. Renuncia quem não quer a herança, ou o legado. Para que se dê a renúncia, é preciso que se satisfaçam os pressupostos subjetivos e o de forma da manifestação de vontade. Não só se lhe exige que seja expressa: há de ser por escrito. 1. C O N C E I T O E N A T U R E Z A . - O

Renúncia somente há se já foi aberta a sucessão (= se já faleceu o decujo). Não há renúncia prévia ou anterior à morte do decujo. Nem vale promessa de renúncia. No direito brasileiro, nenhuma ligação há entre o momento em que há de ser feita a renúncia e o em que se abre o inventário. Só se renuncia seja se abriu a sucessão, porque só à data da morte do decujo - digamos melhor, no instante em que morre o decujo - é que nasce o direito do herdeiro, ou o direito do legatário. 2. D A D O S HISTÓRICOS. - O pacto sucessório é vedado no direito brasileiro (Tomo V m , § 917, 2; XLVI, § 5.015). No direito romano, a L. 16, D . , de suis et legitimis heredibus, 38, 16, tirou-se de P A P I N I A N O que um pai pôs no instrumento dotal que a filha recebera o dote para que nada mais esperasse da herança do pai, mas isso não atingiu o direito de sucessão, porque a convocação privada não têm a autoridade das leis: "Pater instrumento dotali comprehendit filiam ita dotem accepisse, ne quid aliud ex hereditate patris speraret: eam scripturum ius successionis non mutasse constitit: privatorum enim cautiones legum auctoritate non censeri". Em constituição do praefectus praetor J U L I A N O , o princípio ainda se afirma CL. 35, § L C, de inoffidoso testamento, 3, 28): "Illud etiam sancimus, ut, si quis a patre certas res vel pecunias accepisset et pactus fuisset, quatenus de inofficiosi querella adversus testamentum paternum minimae ab

eo moveretur, et post obitum patris filius cognito paterno testamento non aonoverit eius iudicium, sed oppugnandum putaverit, vetere iurgio expioso huiusmodi pacto filium minime gravan secundum Papiniani responsum, in quo definivit meritis filios ad paterna obsequia provocandos quam pactionibus adstringendos". Se um filho recebeu do pai bens ou quantias e pactou que de modo nenhum se moveria contra o testamento paterno, com a querela de inojficioso testamento, mas, com a morte, não aceitou a deixa, insurgindo-se contra o testamento paterno, só se excluía a sua posição se tivesse acordado com os outros herdeiros. Na Lex Salica, Cap. LX, no Sachsenspiegel, I, art. 52, § 1, e no direito posterior, o pacto sucessório infiltrou-se (cf. G. BESELER, Die Lehre von den Erbvertrãgen, I I , 2, 222 s.; H. B R U N N E R , Deutsche Rechtsgeschichte, I, 92; RICHARD SCHRODER, Deutsche Rechtsgeschichte, 2 7 7 ; sobre documentos JOHN JACOB M O S E R , Teutsches Staatsrecht, 15, 508; K A R L KOPP, Der Erbverzicht im deutschen Recht, 30 s). É de observar-se que se falava no direito alemão (e ainda hoje se fala) de renuncia, de Verzicht, têrmo improprio porque não há renuntiatio do direito que ainda não nasceu. Quanto à repudiação, no direito romano, atenda-se a que, no comêço, os herdeiros eram sui heredes e necessários: sui, porque herdaram de patrimônio que, no plano familial, já era seu, e necessários porque seria contraditório expeli-los. No direito ático, os herdeiros filhos continuavam o genitor e a isso, pelo culto, eram obrigados. Herdeiros necessários, como eram, também não podiam aceitar nem renunciar. A ligação era dos dois lados, da parte do genitor, que não os podia eliminar, e da parte dos filhos. O filho que não pagava as dívidas perante o Estado sofria atimia até a completa satisfação. Era a pena que se aplicava aos traidores, por ser a desgraça pública, a retirada dos direitos públicos. Posteriormente, houve a repudiabilidade, exceto para descendentes e filhos adotivos. O direito de repudiar, TTÍÇ KÀ,TIQOVO|J.Í aQ . àcpiotaaôiiL, só seria exercível antes de haver aceitação, que também podia ser tácita. Seria de discutir-se se o direito grego tinha a saisina para os descendentes e os filhos adotivos entre vivos. Podiam eles entrar na posse dos bens por meio de uma èppáxsuaiç. Mas ipso facto (ISAIOS, I I I , § 59), à diferença do que ocorria com o credor com garantia de hipoteca, se o devedor não adimplia a dívida. Assimilava-se o titular do direito de hipoteca ao her es suus (PAUL VINOGRADOFF, Outlines of Historical Jurisprudence, II, 219).

3. DIREITO BRASILEIRO. - O ato de renuncia à herança é declaração unilateral de vontade, com exigência de recepção se a forma foi a de escritura pública, ou se por têrmo judicial, porque há, nas duas espécies, a eficácia erga omnes; mas a receptividade é ineliminável. Onde quer que o herdeiro haja declarado, em escritura pública, renunciar a herança, qualquer interessado tem direito à certidão. O têrmo judicial há de ser perante o juiz competente, que é o do lugar da abertura da sucessão. Porém, se o herdeiro ou legatário está ausente, o juiz competente segundo a lei local pode ordenar que se tome por têrmo a manifestação de vontade e o herdeiro renunciante, ou o legatário renunciante, ou qualquer interessado, está habilitado a exigir a certidão para que seja atendida a situação jurídica criada pela renúncia. Se a declaração de renúncia foi feita perante juízo competente, que é aquêle juiz do lugar em que se abriu, ou em que se há de abrir, ou um daqueles do lugar em que se pode abrir o inventário, o que pode acontecer é a ineficácia, de modo que expire o prazo judicial antes da ciência pelo juízo competente e pelos interessados. A entrega da escritura pública, ou do têrmo nos autos, feito alhures, eficaciza o instrumento que se lavrara em lugar impróprio. Assim, se o herdeiro ou legatário foi notificado, conforme o art. 1.584, com a fixação do prazo, e teve de viajar sem tempo para obter a escritura pública, ou o ato processual do têrmo nos autos, pode alhures declarar que renuncia, se por escritura pública, ou por têrmo nos autos, uma vez que antes de expirar o prazo judicial junte ao processo o documento. Se não se apresenta a tempo o ato renunciativo, o herdeiro ou legatário é tido como aceitante da herança ou do legado. A sucessão a causa de morte dá-se no momento mesmo da morte do decujo. Todos os direitos, deveres, pretensões, obrigações e ações, bem como as exceções e os ônus, passam ao sucessor, ou aos sucessores. Renúncia é negócio jurídico unilateral, abdicativo. Quem renuncia, perde. O negócio jurídico da renúncia é abstrato. A manifestação de vontade, em se tratando de sucessão a causa de morte, há de ser expresso. E irrevogável. Em vez de se falar de repúdio de herança, fala-se de renúncia da herança (Tomo m , § 279, 1, 2, 6). Seo sucessível cede, gratuitamente, aos outros herdeiros, ou ao outro herdeiro, a herança, entende-se que não aceitou, salvo se houve aceitação escrita ou tácita. É assim que se há de interpretar o art. 1.582: se aceitara, cedeu e há a incidência das próprias regras jurídicas fiscais; se não aceitara, a cessão gratuita não importa aceitação. Não se disse que a cessão gratuita a todos os herdeiros é renúncia. Se há condição, ou ônus ou encargo, o

cedente aceitou e cede com exigências. Idem, se, na cessão, se referiu a quotas diferentes para os outorgados, isto é, quotas que não seriam as que eles teriam se renúncia tivesse havido. Houve renúncia, e doação. Já no direito romano, na L. 6, D., de diversis regulis iuris antiqui, 50, 17, se dizia, tirado de ULPIANO, que não quer ser herdeiro quem quis transferir a outro a herança: "Non vult heres esse, qui ad alium transfere voluit hereditatem". 4. PRESSUPOSTO FORMAL DA RENÚNCIA. - A renúncia tem de ser expressa. Não há renúncia tácita, nem, sequer, pelo silêncio. Tem de ser por escritura pública, ou por têrmo nos autos. Não se admite o instrumento particular. As regras jurídicas a respeito são expressivas de que a renúncia da herança é rara. Por mais expressivas e verídicas que sejam as manifestações de vontade para a renúncia da herança sem serem em escritura pública, ou por têrmo nos autos, não se tem, no direito brasileiro, como renunciada a herança. Dir-se-á que surge o problema do testador que ofende a pessoa beneficiada, com o ato de deixar-lhe herança, ou que notoriamente era seu inimigo, e não há tempo ou situação para que a pessoa beneficiada renuncie. Temos exemplo, que não foi a juízo, mas por si só mostra a importância da regra jurídica limitativa da prova. Deixou A a C a herança, ou parte da herança, e C, que fora notificada ao subir ao aeroplano, em virtude de desastre ficou internada em hospital e não pôde providenciar para que no prazo se remetesse a resposta renunciativa. De qualquer modo, tem-se de entender que C aceitou, o que lhe causa constrangimento e confissão de relações íntimas com A. O que C pode fazer, dentro do sistema jurídico brasileiro, é doar a herança a alguma instituição de caridade, ou a pessoa da família do testador, com esclarecimentos sôbre o que ocorreu para que se tivesse como aceita a herança. A renúncia pode ser em escritura pública, ou em têrmo judicial. Não basta declaração feita no ato da deliberação da partilha (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 18 de maio de 1948, R. F., 122, 131). Renúncia é ato de declaração unilateral de vontade, abstrato; de modo que se não pode ver no ato renunciativo de doação (2.a Turma, 8 de abril de 1947, 114, 78). Renúncia a favor de determinada pessoa, ou de determinadas pessoas, não existe; o ato seria de cessão de herança, ou de doação (6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 27 de março de 1953, R. dos T., 212, 346). Apesar de ter aceito a herança, ¿pode o herdeiro renunciá-la? Há jurisprudência no sentido afirmativo (2.a Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, 18 de novembro de 1947, R. dos T., 172, 732; também 41, 468;

80,92; e 63, 194). Entendeu-se (3.A Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 19 de novembro de 1952) que a renúncia posterior à aceitação implica dupla imposição causa mortis, porque, com a aceitação se definitivara a transmissão. Pensou-se na saisina, mas os juízes e procuradores não atenderam a que, em direito tributário a causa de morte, não há a saisina. Quanto ao juízo competente para perante êle se fazer a renúncia da herança, ou é o do inventário e partilha, ou qualquer juízo para o qual haja sido citada na qualidade de herdeiro a pessoa que quer renunciar. A escritura pública pode ser lavrada no foro do inventário e partilha, ou em qualquer outro. Enquanto não se notifica o beneficiado, com prazo, a sua vontade de renúncia pode ser declarada. Apenas, se houve a notificação, ou êle responde com a renúncia, ou junta aos autos, dentro do prazo, a escritura pública que assinara, ou se refere ao têrmo nos autos que fora concluído. Se o não faz, a qualquer momento em que se invoque a renúncia pelo silêncio pode ser alegado, em objeção, que renunciara por escritura pública, ou por têrmo nos autos, antes da notificação. Manifestação de vontade renunciativa, após a notificação, é ineficaz, se a ela não se fêz menção dentro do prazo. 5. PODER PARA RENUNCIAR. - No caso de outorga de poder para renunciar, tem de a outorga ser junto à escritura pública. Ou aos autos antes do têrmo. 6. CLÁUSULAS INVÁLIDAS. - A aceitação pode ser alegada contra terceiro, porém não vale a cláusula negocial de vir a aceitar (cf. G . PLANCK, Kommentar, Y, 6 5 ; discordam F R A N Z LEONHARD, Erbrecht, 2.A ed., 3 4 s., e JULIUS B I N D E R , Die Rechtsstellung des Erben, I, 1 0 3 ) . Nem a cláusula de vir a renunciar. 7 . EXISTÊNCIA E VALIDADE DA RENÚNCIA. - A renúncia da herança pode ser inexistente (e. g., quem renunciou não foi o sucessor, nem procurador dêle). Pode ser nula (e. g., quem renunciou estava louco, ou era menor absolutamente incapaz). Pode ser anulável (e. g., quem renunciou não teve assistência do titular do pátrio poder, do tutor ou do curador).

O êrro, o dolo e a coação foram apontados como elementos suficientes para a retratação. Preferiu-se o têrmo "retratação" ao têrmo "anulação'. A incapacidade absoluta faz nula a renúncia. A incapacidade relativa dá causa a anulabilidade, pois que faltou o assentimento do titular do pátrio poder, do tutor ou do curador.

§ 5.593. N U L I D A D E E A N U L A B I L I D A D E ,

RETRATAÇÃO E REVOGAÇÃO



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Panorama atual pelos Atualizadores § 5.592. A - Legislação Sobre o assunto tratado no § 5.592, verificar, principalmente, os arts.1.807 a 1.813 do CC/2002.

§ 5.592. B - Doutrina 1. A renúncia, diferentemente da aceitação, só pode ser feita de modo expresso. No Código Civil anterior, seria possível acontecer que aquele que renunciasse a herança poderia se livrar de dívida (do falecido) que ele, sucessor, não contraíra, uma vez que, aceitando o acervo hereditário, responderia pelo passivo até as forças da herança. 2. A regra geral, tanto no antigo quanto no novo Código Civil, determina que a herança se apresenta, por determinação legal, como um bem único e indivisível, permanecendo assim até a final partilha. Por isso, o herdeiro não poderá renunciar apenas parcialmente à herança; deverá aceitá-la por Inteiro ou renunciar a ela in totum (art.1.808, caput, do CC/2002). 3. Os dois parágrafos deste dispositivo, no entanto, abrem exceções: se o herdeiro for também legatário, poderá aceitar a herança e renunciar ao legado, ou vice-versa; ou, se o herdeiro for contemplado com mais de um quinhão (por títulos diversos), na mesma sucessão, poderá escolher qual(als) dos quinhões deseja aceitar, renunciando ao demais. Esta última hipótese (§ 2.°), não tinha correspondente no Código Civil anterior.

§ 5.592. C - Jurisprudência A 7.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no julgamento do Ag 1.0024.04.288515-2/001, declarou inválida renúncia parcial à herança (rei. Des. Heloisa Combat, em 27.02.2007).

§ 5.593. NULIDADE E ANULABILIDADE, RETRATAÇÃO E R E V O G A Ç Ã O

1. ACEITAÇÃO E RENÚNCIA. - A aceitação e a renúncia têm de observar os princípios gerais sôbre validade. Tais princípios são, precipuamente, os do Código Civil, arts. 82, 84, 86-101,130-132,145-147,152,153 e 158. Trata-se de negócios jurídicos entre vivos. Há dois pontos que merecem referência especial: no art. 1.590 fala-se de "retratação"; no art. 1.170, a

propósito de doação pura, abstrai-se da capacidade para a aceitação (ali, aceitação elemento de negocio jurídico bilateral). A expressão "retratação" é impropria. A propósito da arrematação, que, com o auto da arrematação, fica "perfeita e acabada", o Código de Processo Civil insere o princípio da irretratabilidade da arrematação. Retratação está, aí, no sentido de desfazimento, de puxar para traz, de tirar o que foi dito, de retrahere, em vez de distratar e de contratar e até mesmo se abstrair. Quem se retrata nem só retira a voz, nem anula. Quem injuriou, ou caluniou, pode retratar-se; não basta retirar a voz, que seria revogar: tem de afirmar que foi falsa a comunicação de conhecimento. O renunciante da herança impugna ou pede a decretação da anulabilidade por ter sido a renúncia proveniente de violência, ou de êrro, ou de dolo, ouvidos os interessados. A espécie não é de retratação, expressão que se inseriu no art. 1.590 do Código Civil, inclusive para se pôr o princípio do desfazimento voluntário da aceitação, pura revogabilidade da aceitação. Retratar-se é corrigir-se. Retratar algum êrro é manifestar que errou e retira os efeitos. Na L. 10, D., de administratione rerum ac civitatespertinentium, 50, 8, diz-se que a retractatio errores calculi era admitida mesmo após dez ou vinte anos ("Calculi erroris retractatio etiam post decennii aut vicennii témpora admittitur". Na L. 1. § 1, D., ne de statu defunctorumpost quiquenium quaeratur, 40,15, o "retractandus" estava no sentido de rediscutir-se. Na L. 1, § 3, C, de revocandis donationibus, 8, 55, falou-se de "retractatio" (in diem vitae suae non retractavit), em lugar de revocatio, o que referimos no Tomo VI, § 707, 1, impropriedade que aparece com outras (L. 10, § 1: "evertere donationem"; L. 5: ("rescindere"). Ora, a verdade está em que há plus na retratação em relação à revogação: não basta a retirada da voz. Discutimos tudo isso e muitos outros textos romanos no Tomo XXXVIII, § 4.244, 2. Se houve, na renúncia, violência, dolo ou êrro, o Código Civil, art. 1.590, 1.a parte, permite a retratação, "ouvidos os interessados". Isso não põe de parte os princípios sôbre invalidade (violência, dolo, ou êrro). Ficaram dois caminhos: o da retratação e o da propositura da ação de anulação. Quanto à aceitação, ela é retratável como o é a renúncia, salvo se ofende a credores-, mas é também revogável, salvo se ofende a credores (cf. Tomo IV, §§ 383, 5 e 452, 1). 2. ACEITAÇÃO VÁLIDA E RENÚNCIA VÁLIDA. - A aceitação tem de existir e de ser válida. Dá-se o mesmo com a renúncia. Os princípios sôbre nulidade e anulabilidade incidem. Após a decretação da nulidade ou da

§ 5.593. NULIDADE E ANULABILIDADE, RETRATAÇÃO E REVOGAÇÃO



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invalidade, tem-se de atender a que os atos que o renunciante praticara, como lhe tocavam na qualidade de herdeiro, são atingidos, no passado pela eficácia ex tunc da sentença trânsita em julgado. Responde como simples gestor de negócios alheios sem outorga. Nenhum deles pode ser ratificado sem ser pelo herdeiro ou pelos herdeiros que aceitaram, mas segundo os princípios de direito das obrigações. Se advém retratação da renúncia, volve-se à situação inicial: trata-se de pro herede gestio. A anulação também é possível se o êrro é sôbre qualidades da herança, ou de bens nela contidos, pois, embora a herança não seja bem em sentido restrito, bem ela o é e o art. 87 do Código Civil refere-se a "objeto principal da declaração", ou "alguma das qualidades a êle essenciais". O que é preciso é que no uso do tráfico se tenham como essenciais. Não se pode excluir o credor da herança. Se o herdeiro renuncia porque eram demasiado grandes os gravames ou o modus, mas, depois, em decisão judicial foram consideradas nulas as disposições testamentárias restringentes, o herdeiro renunciante pode propor a ação de anulação pelo êrro. Idem, se foi chamado como simples herdeiro testamentário e era legítimo, ou vice-versa. Se foi fixado o prazo judicial e expirou, tem-se a omissão do herdeiro como aceitação; de modo que as causas de nulidade e de anulação são as mesmas para as outras espécies de aceitação. Se o herdeiro deixou transcorrer o prazo judicial, por não ter conhecido os exatos têrmos da notificação, êrro houve. (HEEGER, Die Anfechtung der Versãumung der Ausschlagungsfrist wegen Irrtums, 1 2 ; contra, em parte, K A R L A U G U S T H A U SER, Die Anfechtung der Versãumung der Erbausschlagungsfrist, Jherings Jahrbücher, 65, 271 &.). No direito alemão, houve, aí, críticas às expressões "Anfechtung" impugnação, e "angefochten" porque só se trata de êrro (ADOLF JACOBSON, Die Anfechtung stillschweigender Willenserklárungen wegen Irrtums, Jherings Jahrbücher, 56, 377). No direito brasileiro, só se falou de retratação da renúncia se proveniente de violência, êrro ou dolo. Quanto à aceitação, quer expressa, quer tácita, inclusive pela expiração do prazo judicial, o art. 1 . 5 9 0 , 2. A parte, fê-la retratável, salvo se há prejuízos para credores. A renúncia, conforme expusemos no Tomo I, § 35, 1, é retratável, porque o sistema jurídico brasileiro fêz descer a espécie ao plano da ^existência. A aceitação também o é nas mesmas espécies em que o é a renúncia. Não podemos ler o art. 1.590, 2.a parte, como se lá estivesse dito: a aceitação é sempre retratável. Seria absurdo. Só se retrata se há elemento

que permita a retratação, que é mais em relação à revogação. Todavia, para evitarmos interpretação que ponha em reprovável situação a regra jurídica, o que temos de entender é que há a anulabilidade, a retratabilidade, por violência, êrro, ou dolo, e a revogabilidade, mas sempre com ressalva legal dos direitos e interêsses dos credores. - Uma vez que já se fixou o conceito de retratação, cumpre-nos agora examinar o que se diz no Código Civil, art. 1.590: "É retratável a renúncia, quando proveniente de violência, êrro ou dolo, ouvidos os interessados. A aceitação pode retratar-se, se não resultar prejuízo a credores, sendo lícito a estes, no caso contrário, reclamar a providência referida no art. 1.586". O fundamento para a retratação da renúncia é o de ter havido violência, êrro ou dolo. Tais fundamentos também dão causa à anulabilidade. No tocante à aceitação, a retratação também há de ter o mesmo fundamento, mas há a revogabilidade, que é simples retirada da voz. 3 . RETRATAÇÃO.

¿Como há de ser feita a retratação da renúncia da herança e como há de ser feita a retratação da aceitação da herançal Ponhamos fora da questão a ação de anulabilidade da renúncia ou da aceitação e a revogação da aceitação. A retratação da renúncia somente se há compor tal como foi feita a renúncia (por escritura pública, ou por têrmo judicial). Se adveio incapacidade do manifestante da retratação, só a partir da investidura do representante ou do assistente se pode pensar em ato retratativo. Se o titular do direito de retratação faleceu, só com a aceitação da herança de tal titular se inicia o direito de retratação. O simples inventariante ou testamenteiro nada pode fazer: não podem renunciar, nem aceitar herança; portanto, não podem retratar. Quanto à eficácia, a retratação da renúncia implica aceitação; a retratação da aceitação, a renúncia. Um dos erros mais relevantes é o êrro quanto à pessoa do decujo, ou entre duas heranças ( O T T O WENDT, Unterlassungen und Versãumnisse im biirgerlichen Recht, Archiv für die civilistische Praxis, 92, 264). O êrro quanto ao prazo judicial pode dar ensejo à retratação da renúncia (J. BREIT, Die Versãumung d e r Auschlagungsfrist und ihre Anfechtung wegen Irrtums, Zeitschrift des deutschen Notarvereins, V, 141 s.). 4 . ACEITAÇÃO E REVOGABILIDADE. - No direito brasileiro, admitiu-se a revogabilidade da aceitação, salvo se ofende a direitos e interêsse de credores. De iure condendo, não recomendável, pôsto que haja a limitaçao da responsabilidade.

§ 5.594. ATOS DO HERDEIRO ANTES DE ACEITAR OU DE RENUNCIAR

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Panorama atual pelos Atualizadores

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§ 5.593. A - Legislação Especialmente os arts. 1.812 e 1.813, ambos do CC/2002, tratam da matéria deste parágrafo.

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§ 5.593. B - Doutrina

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1. Tendo em vista a reformulação, por completo, do antigo art. 1.590 (que tratava da retratabilidade, anulabilidade ou nulidade da renúncia e da aceitação), já não fala mais, a Lei atual, sobre estes destinos dos atos. A expressão "retratabilidade" já era considerada, por Pontes de Miranda, como imprópria. O art. 1.812 do CC/2002, diz, taxativamente, que "São irrevogáveis os atos de aceitação ou de renúncia da herança". 2. Hoje, apenas sob o entendimento da regra geral que rege eventual comprometimento do plano da validade (e seus requisitos) para qualquer tipo de negócio jurídico (entre eles o testamento, negócio jurídico unilateral que é), é que cogitará da eventualidade de retrocesso nos atos de aceitação ou renúncia à herança. Mas já não se permite, a bem da estabilidade das relações jurídicas, e tendo sido tomada a deliberação, que volte atrás o sucessor (aceitante ou renunciante), modificando novamente a vocação hereditária estabilizada com a sua aceitação, ou reformulada com sua renúncia. 3. Por outra parte, e no que respeita à hipótese de serem carreados prejuízos para ao credores do herdeiro renunciante, o dispositivo legal atual (art. 1.813, caput) que determina a chance de estes credores poderem aceitar à herança, em nome do renunciante, permanece com a mesma dicção do dispositivo da anterior Lei Civil de 1916. A nova Lei acrescentou, apenas um parágrafo (§ 1,°) que determina prazo para a habilitação dos credores.

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§ 5.593. C - Jurisprudência

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No julgamento da Ap 990.10.208873-1, entendeu-se que a única hipótese de admissão de retratação da renúncia de herança, por força do art. 1.812 do CC/2002, seria em razão de vício do consentimento quando de sua realização (TJSP, 3.a Câm. de Direito Privado, Des. rei. Donegá Morandini, 26.10.2010).

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§ 5.594. ATOS DO HERDEIRO ANTES DE ACEITAR OU DE RENUNCIAR 1. ATOS ANTERIORES À MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO HERDEIRO.

Os atos que a pessoa pode praticar, antes de aceitar ou de renunciar a

herança, ou são atos de quem se põe na qualidade de simples gestor de negócios alheios sem outorga, ou pro herede gestor, ou de quem abstrai da abertura da sucessão, inclusive de deveres de possuidor da herança, ou de quem, com eles, manifesta que aceita. Os últimos afastam a questão do tratamento jurídico dos atos anteriores à aceitação ou à renúncia, porque, ex hypothesi, houve aceitação. - Se O herdeiro exerce alguma ação contra terceiro, não tem o ônus de provar que aceitou a herança. Se o terceiro entende que houve renúncia, cabe-lhe alegar e provar que isso aconteceu a ( F R A N Z LEONHARD, Erbrecht, 2. ed., 36). Quem tem de propor, ou quem propõe ação contra o herdeiro, ou quem quer continuar a ação que se lhe adjudiquem, ou se ponham em praça, bens que eram do decujo, tem de alegar e provar que o herdeiro aceitou a herança (G. PLANCK, Kommentar, V, 70). Há de dizer quando aceitou. Se houve prazo judicial e o terceiro afirma que expirou o prazo judicial sem ter havido renúncia, ao herdeiro toca o ônus de alegar e provar que renunciou. 2 . A Ç Ã O CONTRA TERCEIRO.

3 . ATOS ANTERIORES À ACEITAÇÃO OU À RENÚNCIA. - Se, antes de renunciar, o herdeiro cuida dos negócios da herança, fica vinculado, perante o herdeiro que aceita, ou os herdeiros que aceitam, com os direitos e os deveres do gestor de negócios alheios sem mandato. Não tinha êle dever de pro herede gestio. Fêz-se gestor. Se os negócios alheios são conexos com os do gestor, de modo que não possam gerir separadamente, tem-se como sócio (Código Civil, art. 1.345), mas aquêle, em cujo benefício interveio o gestor, só é obrigado na razão das vantagens que lhe advieram (art. 1.345, parágrafo único). Para a propositura de ações ou de medidas jurídicas, é legitimado ativo o herdeiro que ainda não aceitou. Quanto à disposição de direitos, só é permissível se seria danoso para a herança não se alienar o direito, a pretensão ou a ação (e. g., apodreceria a mercadoria, morreria o gado, não se evitaria, sem o direito obtido com o ato dispositivo, saldar a dívida da herança e evitar, por exemplo, falência, pedido de concordata, ou outra atitude semelhante de elemento do ativo hereditário). Se o herdeiro, que teve a pro herede gestio, renuncia, nenhuma legitimação tem que a de gestor de negócios alheios sem outorga, e nenhuma legitimação ativa pode ser a de herdeiro.

4. AÇÃO CONTRA O HERDEIRO. - Antes da aceitação da herança nenhuma ação pode ser proposta contra o herdeiro, no tocante à sucessão, de

§ 5.594. ATOS D O H E R D E I R O A N T E S D E A C E I T A R OU D E R E N U N C I A R



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modo que o herdeiro pode alegar a falta de legitimação passiva, o que não é exceção. A aceitação é pressuposto para a ação, uma vez que se trata de dívida da herança ou de qualquer direito sobre bens da herança. Aliter, se a dívida ou situação passiva é do herdeiro e ao mesmo tempo da herança. Se ainda não foi aceita a herança, nem há cônjuge sobrevivente, com o cargo de cabeça do casal, ou se a ação não é restrita à atividade do inventariante, tem de ser feita a notificação, para que o herdeiro declare se aceita, ou não, a herança, sob pena de ser tida a herança como aceita. O credor, ou outro titular de direito, pretensão ou ação contra a herança, tem o ônus de alegar e provar que houve aceitação expressa ou tácita, inclusive por expiração do prazo judicial, com a qual se tem por aceita a herança. Na terminologia alemã, diz-se, por isso, prazo para a renúncia, Ausschlcigungsfrist. O herdeiro que fora citado ou interpelado, sem ter aceito a herança, sendo a ação com eficácia para os outros herdeiros, de jeito nenhum pode ratificar a falta da aceitação tempestiva, nem renunciar a proteção à exigência da aceitação. Todavia, a entrada e a permanência no processo podem compor a aceitação tácita. Não pode êle prosseguir, passivamente, no feito, sob reserva de seu direito à renúncia, porque está em causa pressuposto legal para a tutela jurídica, que a vontade das partes, sem ser com manifestação de vontade de eficácia imediata, não pode suprir (KONRAD HELLWIG, Lehrbruch des deutschen Zivilprozessrechts, 1,165). Igualmente, em se tratando de execução forçada. A exigência, no tocante à tutela jurídica processual, nada tem com a eficácia dos fatos jurídicos que sejam concernentes ao ativo e ao passivo da herança. Se juros ou penas independiam de interpolação ou qualquer outro ato de ordem receptícia, tudo se passa automaticamente. Se os juros somente correriam com o ato judicial, ou comunicação extrajudicial, então a recepção pelo herdeiro que ainda não aceitou tem tôdas as conseqüências para êle, se vem êle a aceitar a herança, expressa ou tácitamente (F. HERZFELDER. Hindern die aufschiebenden Einreden aus §§ 2 0 1 4 , 2 0 1 5 B G B . den Verzug des Erben? Deutsche Juristen-Zeitung, 1 0 , 6 2 ; GUSTAV M Ü L LER, com o mesmo título, Deutsche Juristen-Zeitung, 10, 687 s.). Quanto as exceções dilatórias, partamos da afirmativa de que o prazo para a abertura do inventário é de um mês a contar da abertura da sucessão, devendo ultimar-se nos três meses subseqüentes, "prazo este que o juiz poderá dilatar, a requerimento do inventariante, por motivo justo" (Código Civil, art. 1-770; Código de Processo Civil, arts. 1 3 5 e 4 6 7 ) . O herdeiro, que aceitou a herança, tem a seu favor os três meses, ou mais, para que possa obter os dados da herança; mas, se foi, antes disso, ultimado o inventário, a exceção

dilatória desaparece. Se é possuidor da herança, de má fé, responde como se tivesse aceito a herança, ou se tivesse sido litispendente em ação proposta contra a herança.

§ 5.595. CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS DA RENUNCIA E DA OMISSÃO

1. SUCESSÃO LEGÍTIMA. - Se a pessoa chamada à herança é herdeira, que definitivamente renuncia, herdeira não mais é, nem foi (eficácia ex tunc da renúncia). A legislação tem de dizer o que se passa com a legítima que se renunciou e com a parte da herança testamentária, que à pessoa definitivamente se retirou, pelo ato renunciativo. Daí a regra jurídica do artigo 1.589 do Código Civil: "Na sucessão legítima, aparte do renunciante acresce à das outros herdeiros da mesma classe, e, sendo êle o único desta, devolve-se aos da subseqüente". Quanto à sucessão testamentária, se um dos herdeiros nomeados morre antes do testador, ou renuncia a herança, ou dela é excluído, ou se não se verifica a condição sob a qual foi instituído, o seu quanto acresce (Código Civil, art. 1.712), ou a quota do herdeiro testamentário é dos herdeiros legítimos (art. 1.713). Há pormenores de que só se há cogitar ao se tratar da sucessão testamentária. Renunciada a herança, nenhum descendente pode representar o renunciante. Diz o Código Civil, art. 1.588: "Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, êle fôr o único legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem à herança, poderão os filhos vir à sucessão, por direito próprio e por cabeça". Quem renunciou deixou de ser herdeiro, ex tunc. Não se compara com quem seria herdeiro se não tivesse falecido antes do decujo. Se era êle o único herdeiro legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciaram, o filho herda, ou os filhos herdam por direito próprio e por cabeça. Não há, aí, exceção ao princípio da irrepresentabilidade do renunciante. Ha, apenas, explicitação do que se passa, no plano da sucessão legítima. Daí a impropriedade da expressão "porém", que aparece no art. 1.588, 2.a parte. 2 . FALECIMENTO DO HERDEIRO ANTES DE ACEITAR OU DE RENUNCIAR A HERANÇA.

- A herança de A a B pode não ter sido aceita ou renunciada

§ 5.595. C O N S E Q Ü Ê N C I A S I U R Í D I C A S D A R E N Ú N C I A E D A O M I S S Ã O



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e, dentro do prazo, ou a tempo de deliberar, ter falecido B. O herdeiro de B, C, pode aceitar a herança de B e aceitar ou renunciar a herança de A. A renuncia da herança de B implica que o descendente renuncia aquela sôbre que B não se manifestara. O art. 1.585 do Código Civil estatui: "Falecendo o herdeiro, antes de declarar se aceita a herança, o direito de aceitar passa-lhe aos herdeiros, a menos que se trate de instituição adstrita a uma condição suspensiva, ainda não verificada". O que está em causa é a transmissão do ius deliberandi. Não a do direito próprio do herdeiro do herdeiro. O direito de aceitar ou de renunciar é transmissível. Se há dois ou mais herdeiros do herdeiro, cada um delibera conforme o seu quinhão na herança do herdeiro. No direito romano, negava-se a transmissão do direito de aceitar a herança se o chamado morria antes de aceitar (L. 1, § 5, C, de caducis tollendis, 6, 51: "hereditatem etenim, nisi fuerit adita, transmitti nec veteres concedebant nec nos patimur"). Não tardaram atenuações ao princípio da pessoalidade do ius delationis: a da transmissio iure sanguinis ou transmissio theodosiana (ano 450), segundo a qual, se o descendente, instituído herdeiro, faleceu antes da abertura do testamento, se transmitia o ius delationis aos seus herdeiros e descendentes (L. 1, C, de his qui ante apertas tabulas hereditates transmittunt, 6, 52); a transmissio iustinianea ou transmissio ex iure deliberandi (ano 529), conforme a. qual, se alguém, chamado à herança, faleceu antes do decurso de um ano contado da notícia da delação, sem ter aceito ou renunciado, tal direito se transmitia aos seus herdeiros, e deveria ser exercido no resto do período (L. 19, § 1, C, de iure deliberandi et de adeunda vel adquirenda hereditate, 6, 30). Com o advento do princípio da saisina (princípio da aquisição ipso iure), tinha-se de assentar o princípio da transmissibilidade do ius deliberandi. Todavia - enquanto há o artigo 781 do Código Civil francês e havia os arts. 939-941 do Código Civil italiano de 1865 e há o art. 1.585 do Código Civil brasileiro - o novo Código Civil italiano, art. 479, alínea 3.a, estatui, explicitamente: "La rinunzia all'ereditá propria del transmitiente include rinunzia alia eredità che ai medesimo è devoluta". Com isso, atendeu-se a que há diferença entre o ius repraesentationis e a transmissão do ius deliberandi, que já supõe estar na herança do herdeiro falecido o que proviera do decujo. O ius adeundae hereditatis já fazia e faz parte do patrimônio de quem morreu antes de aceitar ou renunciar. Assim, a regra jurídica do art. 1.585 do Código Civil supõe que, segundo dos princípios, a solução é a de a renúncia por C da herança de B,

que morreu após A, de quem fora herdeiro e não aceitara nem renunciara a herança, implicar renúncia ao que proviera da morte de A. O art. 1.585 nada tem com o ius repraesentationis: apenas cogita do ius adeundi. O que alguém herdou e ainda não aceitou já está em seu patrimônio, posto que não definitivamente. Se falece o titular, o ius deliberandi é que se transmite, mas inserto na herança. A argumentação a favor da opinião que aqui acolhemos consiste em dois pontos: a comunhão dos herdeiros do herdeiro estabeleceu-se e a atribuição ao herdeiro, que morreu depois não pode ser repelida em parte (a renúncia, para a primeira herança, há de ser do todo, e a renúncia parcial é apenas para regular a situação dos herdeiros do herdeiro); o aumento a favor dos herdeiros da primeira herança somente se justificaria se todos os herdeiros do herdeiro renunciassem. Somente todos os herdeiros do herdeiro poderiam renunciar, sem quebra dos princípios, a primeira herança. Contra isso, argui-se que, se C renuncia a porção da herança de A, em que foi sucessor do ius deliberandi de B, a eficácia da renúncia é parcial e dentro do âmbito da herança de A, não da herança de B. O problema não foi de fácil solução, i ~ e havia discussões intensas, No art. 1.625 explícito está que o renunciante à herança de alguém pode representá-la na sucessão de outrem. Nada tem isso com a regra jurídica do art. 1.585, onde está em causa a transmissão do ius adeundae hereditatis, e não o direito próprio do representante (ius repraesentationis). Para que se dê a aquisição da primeira herança pelo herdeiro do herdeiro, é pressuposto necessário que êsse adquira, definitivamente, a segunda herança. Não transcorre o prazo para a aceitação ou a renúncia da primeira herança antes de transcorrer o prazo para a aceitação da herança do herdeiro, salvo se o prazo contra o herdeiro da primeira herança já se havia iniciado. Com isso, o direito de hoje acolhe a solução romana, de que antes falamos. Todavia, se o herdeiro do herdeiro não se manifestou explicitamente sôbre a primeira herança, mas foi tida por aceita por êle a herança, pode exercer a impugnação por êrro, uma vez que não conhecia a iniciação do prazo. Se algum ou alguns herdeiros do herdeiro renunciam a renúncia é do que corresponde ao seu quinhão, ou aos seus quinhões, na herança do herdeiro do herdeiro, e o que lhe teria sido atribuído vai, não àquela pessoa ou àquelas pessoas que herdariam do primeiro falecido (herdeiro do herdeiro, ou outros herdeiros do herdeiro), mas à pessoa ou àquelas pessoas que aceitaram as suas partes (FR. LEONHARD, Erbrecht, 2. A ed., 4 8 s.; P. M E Y E R , Das Erbrecht des BGB., 5 2 5 ; W I L H E L M ERNST

§ 5.595. C O N S E Q Ü Ê N C I A S J U R Í D I C A S DA R E N Ú N C I A E D A O M I S S Ã O



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und Erbtheil, Archiv für die civilistische Praxis, 91, Civilitische Rundschau, Archiv für Bürgerliches Recht, 1 4 , 3 6 6 , e 1 5 , 4 4 3 ; contra, M A X H A C H E N B U R G , Vortrãge, 6 5 6 ; J U LIUS B I N D E R , Die Rechtsstellung des Erben, I , 1 3 6 ) . Conforme o direito justinianeu, a responsabilidade pelas dívidas da herança era, para o herdeiro, ilimitada. Respondia per se. Na L. 22, C, de iure deliberandi et de adeunda vel adquirenda hereditate, 6, 30, há minucioso trato do assunto. Já antes, o Pretor havia introduzido o chamado beneficium separationis, que, no caso de concursos de credores, ou fora de concurso, protegia os credores do patrimônio da herança. Assim, satisfaziam-se os créditos do monte hereditário, sem se atenderem créditos contra o herdeiro (cf. L. 1., D., de separationibus, 42, 6), salvo se já se haviam liquidado tôdas as dívidas da herança. KNITSCHKY, E r b s c h a f t

2 9 2 ; P A U L OERTMANN,

Panorama atual pelos Atualizadores § 5.595. A - Legislação Principalmente os arts 1.810 e 1.811 do CC/2002 cuidam da matéria deste parágrafo.

§ 5.595. B - Doutrina | I j i |

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1. Ainda vale e vigora famosa reflexão de Pontes de Miranda, segundo a qual: "se a pessoa chamada à herança é herdeira, que definitivamente renuncia, herdeira não mais é, nem foi (eficácia ex tunc da renúncia). 2. Da mesma maneira, permanecem inalteráveis os antigos arts. 1.588 e 1.589 do CC/1916, e que são correspondentes, hoje, aos arts. 1.811 e 1.810, respectivamente. 3. O primeiro dispositivo regulamenta o chamado direito de acrescer, segundo o qual, dada a efetivação da renúncia pela forma solene e legal, o quinhão estipulado por lei ou por testamento, ou os legados instituídos - quer dizer, todos os que passam a compor o acervo objeto da renúncia - serão devolvidos ao monte-mór, e não aos herdeiros do renunciante, pois não há direito de representação, nesses casos (art. 1.811, CC/2002). 4. A renúncia do momento atual é apenas a abdicativa (verdadeira e autêntica renúncia do quinhão hereditário), isto é, aquela por meio da qual o herdeiro apenas manifesta sua renúncia, sem indicar destinatário específico para o quinhão objeto da renúncia, mas devolvendo-o para o monte partível, com exclusiva incidência do imposto causa mortis. Se houver indicação de um favorecido em substituição, não se terá a renúncia propriamente dita, mas sim

uma cessão da herança, que poderá ser gratuita ou onerosa. Se assim for, dois atos jurídicos terão sido levados a cabo pelo sucessor e dois impostos de transmissão incidirão na hipótese: o imposto causa mortis e também o imposto inter vivos. 5. Os arts. 1.589 e 1.588 do CC/1916 não sofreram alterações e é a mesma a dicção dos atuais arts. 1.810 e 1.811. Assim, "Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce à dos outros herdeiros da mesma classe e, sendo ele o único desta, devolve-se aos subsequentes" (art. 1.810 do CC/2002) e também, "Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, ele fôr o único legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem à herança, poderão os filhos vir à sucessão, por direito próprio, e por cabeça" (art. 1.811 do CC/2002). Diferentemente do que acontece em outros momentos da Legislação Civil, nos quais o legislador preservou os direitos dos filhos do indigno e dos filhos do herdeiro pré-morto, aqui a lei não deliberou a favor do direito de representação. Entendeu o legislador que, se o sucessor escolheu renunciar, o fez de modo pensado e ponderado. Seus filhos não podem representá-lo porque, na verdade, o renunciante "nunca existiu". 6. No entanto, o art. 1.856 do CC/2002 que ora vige (correspondente ao art. 1.625 do CC/1916), excepciona, de alguma forma, essa impossibilidade de representação, ao determinar que, "O renunciante à herança de uma pessoa poderá representá-la na sucessão de outra", eis que cada sucessão é uma, e o que altera uma delas (a renúncia) não produz a mesma consequência em outra sucessão.

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§ 5.595. C - Jurisprudência Em julgado datado de junho de 2005, a 3. a Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios entendeu que a renúncia translativa é espécie de negócio jurídico de alienação (Agln 2005.002002785-3, j. 20.06.2005, rei. Des. Mário Zam Belmiro Rosa).

§ 5.596. RESPONSABILIDADE DO HERDEIRO

1. PROBLEMA DE TÉCNICA LEGISLATIVA. - A responsabilidade dos herdeiros, ou do herdeiro, pelas dívidas e outros deveres, obrigações e ações da herança, e mesmo quanto a exceções, sempre foi assunto de relevância para o Direito das Sucessões. Se há um só herdeiro, o problema é mais simples, porém ainda assim há dificuldades. O inventário havia de ser com toda a minuciosidade. Se expirado o prazo, incidiam as antigas leis que estabeleciam a responsabilidade ilimitada do herdeiro que aceitava. O prazo para a abertura do inventário era de

um mês; para acabamento, de mais dois meses. Se o herdeiro se achava ausente do lugar onde estava situada a maior parte da herança, o prazo era de um ano, a contar da morte do decujo. (De passagem observemos que, na L. 22, § 14, C, de iure deliberandi et de adeunda vel adquirenda hereditate, 6, 30, está a referência a antiqua iura e nostrae legis benefidum, o que põe em relevo o passo além para se evitar a responsabilidade ilimitada.) No direito comum, os credores somente podiam propor ação que apanhasse os bens da herança, à diferença do direito justianeu, que deixava aos credores irem contra os bens do herdeiro, dentro dos limites do valor da herança. A herança é patrimônio, as dívidas e outros interêsses contra ela pesam sôbre êle. a) Há dívidas e outros deveres que já se tinham irradiado até o momento da morte do decujo. b) Há as dívidas e outros deveres que somente se produziram depois da morte e antes da aceitação. Numas e noutras incluídas estão as dívidas fiscais. Se em virtude de lei ou de negócio jurídico há garantia real ou pessoal, que se não extinguiu, ela recaía no tocante aos créditos que depois nascessem, salvo se a morte era têrmo resolutivo. Há também as conseqüências dos deveres de omissão (cf. G U S T A V B O E H M E R , Erbfolge und Erbenhajtung, 25 s. e 98 s.). Estatui o Código Civil, no art. 1.587: "O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se existir inventário, que a escuse, demonstrando o valor dos bens herdados". O que se transmite é o patrimônio - portanto, o ativo e o passivo. Com a aceitação, a transmissão, que dela dependia para a sua definitividade, faz-se sem outra saída para o herdeiro que a da retratação ou a da revogação, mas respeitados os direitos, pretensões, ações e exceções dos credores. Se há desrespeito - qualquer que seja a causa da situação jurídica ofensiva (renúncia desconstitutiva por invalidade da aceitação, ou retratação da aceitação, ou pela revogação) - podem alguns dos credores, ou mesmo um só dos credores prejudicados, ou o único prejudicado, ou todos, requerer ao juiz autorização para aceitá-la, "em nome do renunciante". Enquanto não se pagam tôdas as dívidas, o valor do ativo é o de cada momento em que se exige o adimplemento. Somente não é responsável o herdeiro que aceitou se a dívida não é transmissível.

Cumpre que se não confundam com as dívidas da herança o que, na qualidade de herdeiro, incumbe a êsse prestar como parte ou como despesas da herança (porções de legítimas, frações a que tem direito o cônjuge, legados e modos, os gastos de enterro, incineração, embalsamação e transporte para o lugar em que o decujo quis ser pôsto, se não é excessiva a quantia relativamente à herança). O herdeiro não é vinculado ao pagamento das despesas da conservação da sepultura, salvo cláusula testamentária. O cabeça de casal, inventariante, não pode ser demandado in solidum, por dívidas da herança indivisa e à revelia dos herdeiros interessados (Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 23 de agosto de 1934, R. dos T., 121, 237). Aliter, a respeito das dívidas do casal; mas os herdeiros são litisconsortes. Ao inventariante dativo falta a qualidade de herdeiro ou de cônjuge, de modo que não representa a herança (4.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 17 de abril de 1940, R. dos T., 126, 190). Em virtude do art. 1.587 do Código Civil, há separatio bonorum entre o patrimônio da herança e o patrimônio do herdeiro, ou os patrimônios dos herdeiros, e qualquer herdeiro pode repelir pretensão ou agressão contra o seu patrimônio. Por isso, se; ainda não há inventário, com aprovação do cálculo, tem o ônus de alegar e provar o excesso. 2 . RECONHECIMENTO DE DÍVIDA DO MONTE HEREDITÁRIO. - Se algum herdeiro, sem poderes outorgados por lei ou pelos outros herdeiros, reconhece dívida da herança, tal reconhecimento de dívida pode ser impugnado pelos outros herdeiros, mas o herdeiro reconhecente fica vinculado no tocante à fração que lhe cabe na herança.

Isso não afasta a apreciação judicial da existência da dívida da herança e da sua exigibilidade. 3. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO A CAUSA DE MORTE. - O imposto de transmissão causa mortis é dever de obrigação pessoal do herdeiro, ou legatário, ou quem adquiriu, em virtude de cláusula testamentária, o bem. O tributo que se paga para se cumprir obrigação derivada de modus é dever e obrigação de quem recebe a herança, ou o legado, com o modus.

Panorama atual pelos Atualizadores §5.596. A-Legislação Sobre o assunto, conferir principalmente art. 1.792 do CC/2002.

§ 5.596. B - Doutrina A dicção do art. 1.587 do CC/1916 manteve-se praticamente a mesma, no Código atual (art. 1.792) e se refere ao sistema doutrinário antes existente denominado sistema de aceitação a benefício de inventário, a significar que o herdeiro aceitaria condicionalmente a herança, desde que o ativo fosse maior que o passivo deixado pelo falecido, para que não fosse sacrificado o seu patrimônio pessoal, pagando as dívidas do morto. Esta cláusula condicional foi elevada ao status de norma legal, determinando a Lei Civil que o herdeiro não responde pelas dívidas do autor da herança, senão até o limite do ativo, isto é, até as forças da herança.

§ 5.596. C - Jurisprudência A 1.a Turma do STJ, aplicando o art. 1.792 do CC/2002, entendeu que os herdeiros de administrador de empresas para os quais foi redirecionada execução fiscal podem ser responsabilizados pela dívida nos limites da herança (STJ, REsp 877359/PR, j. 18.03.2008, rei. Min. Denise Arruda).

CAPÍTULO

IV

HERANÇA JACENTE

§ 5.597. JUÍZO DAS SUCESSÕES

- Deveres e direitos do Estado resultam de leis federais ou de leis locais. As leis locais é que têm de determinar quais os juízos que conhecem das ações concernentes à sucessão legítima e à testamentária, bem como ao inventário, à partilha e às medidas necessárias à proteção da herança., Até que haja a aceitação, por um, ou todos os herdeiros, o Estado - através do juízo competente - tem de cuidar da segurança dos bens da sucessão; outrossim, se não é sem dúvida ter êle aceito a herança, ou se é desconhecido. Findo o prazo de um mês, a contar da abertura da sucessão, sem que haja requerido a abertura do inventário, ou por tê-lo requerido algum interessado, o juiz tem o dever de ordenar, em portaria, que se inicie o inventário. Há dever do Estado, que não se pode afastar, nem a omissão dos juízes foge aos atos de funcionários públicos de que podem resultar responsabilidades das entidades estatais. O direito brasileiro tem a transmissão ipso iure da herança aos herdeiros, com saisina (le mort saisit le vij), combinando princípio romano e princípio germânico. Não se têm bona hereditaria vacua sine domino, como se diz na L. 1, pr., D., de successorio edicto, 38, 9, quando o Edicto estabeleceu que não permanecessem muito tempo sem dono. Tem-se a automaticidade da transmissão. Apesar disso, há o dever do Estado de cuidar da herança (cf. Sachsenspiegel, I, 28 e 22, § 1) e o prazo a contar da morte (C. G. HOMEYER, Der Dreissigste, 87-270; R. VON SYDOW, Darstellung des Erbrechts nach den Grundsãtze des Sachsenspriegels, 54 s.; H . SIEGEL, Das deutsche Erbrecht nach den Rechtsquellen des Mittelalters, 53). 1. LEIS FEDERAIS E LEIS LOCAIS.

2. MEDIDAS CAUTELARES. - A obrigação consiste em guarda com as formalidades necessárias, e. g., o sêlo nas portas ou no cadeado ou fechadura do cofre (cf. B. W. LEIST, Die bonorum possessio, II, 465 s.; C. G. HOMEYER, Die Dreissigste, 231 s.; L. 2 e L . 6, C., de usuris, 4, 32). A função acauteladora do Estado começa pela arrecadação e relação geral dos bens, com descrição e individuação, e o traslado dos títulos. Vai até à remoção do inventariante, ao seqüestro da herança, às colações, à verificação dos legitimados à herança e à partilha. Quando há incerteza quanto aos herdeiros, ausência, incapazes, bens situados no estrangeiro, ou herdeiros ou legatários de outra nacionalidade ou domiciliados noutro Estado, cresce a responsabilidade dos juízes de herança. O exame das aceitações e das renúncias é de toda a relevância. Não se podem enumerar, exaustivamente, todos os deveres e poderes dos juízos (cf. EMIL MOSER, Die staatliche Nachlassfiirsorge, 68 s.). O que o inventariante e os tutores e curadores, inclusive dos herdeiros nascituros, bem como da prole eventual de determinada pessoa, ou pessoas, fazem, fica sob a apreciação do juízo, e não importa a diferença entre herdeiro inventariante e inventariante testamenteiro ou pessoa estranha (cf. W I L H E L M ESSLINGER, Der Erbschein nach dem BGB., 36 s.).

§ 5.598. JACÊNCIA DA HERANÇA

1. CONCEITUAÇÃO ATRAVÉS DOS TEMPOS. - Com a aparição da sucessão legal, ou sucessão legitima, pelos membros da família (sui heredes), houve passo além ou inicial na evolução do direito das sucessões. Com o falecimento do chefe da família, o poder, que êle exercia sozinho, sobre quem quer que fosse da casa, dividiu-se entre os descendentes, que assim se fizeram chefes de outras famílias. Com isso, transmitiam-se direitos e deveres, inclusive de culto. Depois, a sucessão faz-se somente patrimonial e aparecem os heredes extranei, a começar pelos parentes agnados colaterais. Se o decujo não tinha descendentes, ia a herança aos mais próximos agnados e, na falta dêles, aos gentiles. Então, a casa desfazia-se, extinto o poder doméstico. O herdeiro pertencia a outra situação local, com outro culto. O herdeiro estranho não adquirira a herança automaticamente, como o siais heres, mas sim com o ato com que adia a herança. Enquanto o adire

hereditatem não ocorria, os bens não eram de ninguém, eram nullius; e a h e r a n ç a jazia. Qualquer pessoa podia tomar posse da herança, da hereditas iacens. Daí a usucapió pro herede. O testamento romano é antiquíssimo, testamento comicial, com que se permitía a quem não tinha sui heredes transferir a outrem a casa, o culto familiar, de modo que se pré-excluíam agnados e gentis; o testamento per aes et libram, que era ato de alienação fiduciaria entre vivos, através do familiae emptor, pessoa de confiança que, por ocasião da morte do testador, transferia a herança às pessoas indicadas por êle; o testamento, ao tempo da permissão da instituição de herdeiro universal, apenas atendia exigências para pré-excluir da herança os sui heredes. O princípio da herança jacente persistiu. Quanto ao chamamento do herdeiro à herança, se não se encontravam herdeiros, o Edictum cui heres non extabit, já na época republicana, permitiu que o magistrado desse posse dos bens vacantes (bona vacantia) aos credores, para que se satisfizessem os créditos. No ano 18 antes de Cristo atribuiu-se a herança vacante ao Erário público, - inicialmente ao Tesouro republicano (cf. O . H I R S C H F E L D , Die Kaiserliche Verwaltungsbeamte bis Diokletian, 2.a ed., 116). O Estado passou a ser sucessor universal heredis loco, com a responsabilidade pelas dívidas. Depois, o Pretor determinou que, no caso de passivo superior ao ativo, a herança fôsse entregue aos credores, de modo que somente fossem ao Tesouro público as heranças com excedente ativo (L. 1, § 1, D., de iurefisci, 49, 14). No Código Civil, o art. 1.591 fala de "herança jacente", no art. 1.593, de "bens vacantes"; e no art. 1.594, de "vacância da herança". Se, após as diligências legais, herdeiros não aparecem, há a declaração de vacância. Decorridos cinco anos da abertura da sucessão, os bens arrecadados integram-se no patrimônio do Estado, conforme a discriminação que se faz no art. 1.594. No direito comum estavam separadas, de ordinário e conceptualmente, a aquisição da herança e a delação. A delação chamava os herdeiros, que tinham de adir para adquirir a herança. Só os sui heredes tinham a herança, automàticamante; sem que se lhe retirasse o beneficium abstinendi. No caso de abstenção por algum, passava ao juiz o poder de fixar-lhes prazo para aceitar ou renunciar (L. 7, pr., e L. 8, D., de iure deliberandi, 28, 8; L. 19, C., de iure deliberandi et de adeunda vel adquirenda hereditate, 6, 30).

No direito brasileiro, o herdeiro legítimo e o herdeiro testamentario adquirem a herança automáticamente, mas podem renunciá-la. Compreende-se que, no direito romano e no comum, se não existia suus heres, ficava sem dono, jazia, a herança, até que ocorresse adição. Durante o intervalo a hereditas iacens era protegida. Apesar da automaticidade da aquisição, no direito brasileiro e noutros sistemas jurídicos, há quem considere em suspenso o direito de sucessão, ou a sucessão mesma. Ora, quando se abre a sucessão, isto é, no instante imediato à morte do decujo, e se tem de aguardar o nascimento do herdeiro, ou de um dos herdeiros, a incerteza sôbre isso é subjetiva: se nasce com vida, herdou; se não nasce vivo, não herdou, porque, juridicamente, não existe, nem existiu. Se se aguarda a decisão sôbre a legitimidade de um filho, ou na ação de investigação da paternidade ou maternidade, mesmo ilegítima, a dúvida é subjetiva: se é filho legítimo, herdou como tal; se ilegítimo e lhe cabe herança, como filho ilegítimo êle herdou. Se a sentença, transita em julgado, é desfavorável, não herdou. Se depende de aprovação alguma fundação, ou outra entidade, que o decujo criou, o ato favorável mostra que ela herdou. A suspensão, de que se fala, é no plano subjetivo, porque o homem não sabe tudo do futuro. No caso de prole de alguma pessoa, ou de duas pessoas, a herança transferiu-se à prole, porque a lei o permitiu. Se tal prole não advém, o êrro foi de quem a esperava. O ponto mais delicado é o de haver alegação e prova de que a mulher não poderia nunca conceber, ou de que do varão nenhum filho se poderia cogitar. Há, aí, o ensejo para ação declaratória com repercussão na suposição da legitimação ativa da prole insurgível. É êrro dizer-se que a herança está sem dono até que nasça o concebido, ou que se dê a decisão na ação de filiação legítima ou ilegítima, ou o ato aprovativo da fundação ou de outra entidade (e. g.. T H . KIPP, em L . ENNECCERUS, I I , 3, § 1, V M , e nota 3 8 ) . GUSTAV SCHWARTZ (Kritisches über Rechtssubjekt und Rechtszweck, Archiv für Bürgerliches Recht, 35, 68 s.) admitia, no direito alemão de hoje, a hereditas iacens, tal como seria no direito comum; mas temos de repelir os seus argumentos, no direito brasileiro e em todos os sistemas jurídicos com a saisina. 2. HERANÇA JACENTE E ADMINISTRAÇÃO. - Se há cônjuge, que seja cabeça de casal, ou herdeiro descendente ou ascendente, ou mesmo colateral sucessível, notoriamente conhecido, e não renunciara a herança, a herança fica sob a guarda, conservação e administração do cônjuge, ou do herdeiro que foi nomeado inventariante (Código Civil, art. 1.579 e §§ 1.° e 2.°).

Chama-se jacente a herança que não está sob essa guarda, conservação e administração, nem sob a guarda, conservação e administração de herdeiro testamentário, nomeado inventariante, ou de testamenteiro ou outra pessoa que seja inventariante, se houve testamento. Lê-se no Código Civil, art. 1.591: "Não havendo testamento, a herança é jacente, e ficará sob a guarda, conservação e administração de um curador: I. Se o falecido não deixar cônjuge, nem herdeiro descendente ou ascendente, nem colateral sucessível, notoriamente conhecido. II. Se os herdeiros, descendentes ou ascendentes, renunciaram a herança, e não houver cônjuge, ou colateral sucessível, notoriamente conhecido". Acrescenta o Código Civil, no art. 1.592: "Havendo testamento, observar-se-á o disposto no artigo antecedente: I. Se o falecido não deixar cônjuge, ou herdeiros descendentes ou ascendentes. II. Se o herdeiro nomeado não existir, ou não aceitar a herança. EI. Se, em qualquer dos casos previstos nos dois números antecedentes, não houver colateral sucessível, notoriamente conhecido. IV. Se, verificada alguma das hipóteses dos três números anteriores, não houver testamenteiro nomeado, o nomeado não existir, ou não aceitar a testamentaria". As medidas que se tomam quando não aparecem herdeiros, são medidas que atendem a que os haja e estejam ausentes. A ausência é fáctica, mas há a possibilidade de ser elemento de suporte fáctico de alguma regra jurídica, por haver interêsse da pessoa em estar fora do lugar no momento e interêsse que tenha de ser protegido onde ela, no momento, não se acha (cf. S. GÕSSMANN, Die Lehre von den Curatelen der Abwesenden, § 2). Porém é possível que as medidas sejam a propósito do próprio decujo, ou já estejam tomadas, antes da morte dêsse, a respeito de alguma pessoa que se tinha como sucessor. Tais providências processuais são as de direito de família, de que cogitam os arts. 463-484 do Código Civil, pôsto que a atribuição de definitividade já faz sucessão a causa de morte, em sentido próprio, o que se passa com os herdeiros ou com a entidade estatal com direito legitimário. Quanto aos credores do ausente, podem eles exercer a pretensão à tutela jurídica e apenas, no processo, se exigem os editais. Por onde se vê que há tratos diferentes do fato da ausência. Há a proteção dos interêsses do ausente e a proteção dos interêsses alheios, em caso de ausência. Por outro lado, há a ausência presumida, a ausência declarada e a prova da morte ou a declaração de morte, por ter havido preclusão do prazo para se afastar a presunção ( C . E . RIESENFELD, Verschollenheit und Todeserklürung nach

gemeinem und preussischem Recht, 47). Cumpre observar-se que de modo nenhum a declaração de morte, a despeito da eficácia sucessoral definitiva pré-exclui a possibilidade de vir a pessoa, que foi declarada morta, aparecer, com a repercussão jurídica no mundo do direito. A competência para as medidas de cura, em caso de ausência, é do juiz do Estado que as ordena, e não a da lex rei sitae (F. BÕHM, Die rüumliche Herrschaft der Rechtsnormen, 78). Quanto aos bens, a declaração de morte não tem eficácia fora do lugar em que foi feita, nem a respeito dos bens que estão alhures, especialmente onde a pessoa, tida como morta, tem domicílio ou residência (C. E. RIESENFELD, Verschollenheit und Todeserklãrung nach gemeinem und preussischen Recht, 104 s.; HEINRICH HOFMANN, Der Erbfolge in das Vermõgenfür tot erkãrter Personen, 49). "Bens de defuntos" arrecadáveis são os bens de quem morreu sem alguém aparecer como sucessor. A falta da aparição é restrita aos herdeiros parentais e testamentários, uma vez que se não pode pensar em não-aparição do Estado. A definição é, pois, a de bens a que se ignoram herdeiros, ou não existem herdeiros, parentais ou testamentários. Um é herdeiro certo, se não existem outros: o Estado. - A arrecadação é de ofício; portanto, se alguém pede a arrecadação, sem ter qualidade, a comunicação de vontade é eficaz como elemento informativo. 3 . ARRECADAÇÃO E PROVOCAÇÃO DA ARRECADAÇÃO.

O pedido do órgão do Ministério Público é ato de autor na ação de arrecadação de bens do falecido, de modo que êle é parte no processo. Não fiscaliza apenas. Parte é, também, a Fazenda Pública, a que o seu representante serve, postulacionalmente. Na função de ofício, o juiz inicia e procede em segunda função, que não é a de juiz, segundo a explicação, já conhecida, da iniciativa processual do próprio juiz. Duas funções estatais numa só pessoa. Intervindo o representante da Fazenda Pública no processo de arrecadação, se por êle não foi promovido, a sua função é a de parte, e não só a de fiscal. Porque, arrecadando-se os bens, se supõe que o interêsse do Estado seja precípuo, uma vez que lhe vão os bens. A presença do representante da Fazenda Municipal, que aí se explica como de outra natureza, é, de ordinário, como sendo a Fazenda interessada na destinação do imposto, ou como opoente dentro do processo (e. g., se alega que os bens são do seu domínio), ou fora dêle (embargos de terceiro, oposição de terceiro). A ação de arrecadação de bens, na sua primeira fase, começa como constituição da curadoria dos bens arrecadados; é, portanto, ação com

adiantamento da constituição. A verificação de existirem, ou não, herdeiros e sucessores é questão prejudicial, sôbre a qual não se profere, desde logo, decisão de cognição completa, a despeito do procedimento edital. Depois de passar em julgado a sentença de devolução, é somente por meio de ação "direta" que se pleiteia a entrega dos bens ou o pagamento. A segunda fase do processo é a que, entregues os bens ao curador, para o que bastou a cognição superficial, se inicia com a publicação dos editais e vai até à entrega dos bens aos herdeiros e sucessores, ou donos (terceiros), ou ao Estado. Tal entrega é feita em virtude de sentença, que pode ser de cognição completa (e. g-, aos terceiros), ou não (devolução à Fazenda). A sentença de declaração de vacância e devolução dos bens à Fazenda Pública tem fôrça de coisa julgada formal, porém não de coisa julgada material. Nem se pode considerar, sequer, incluída na classe das sentenças a que se refere o art. 289, II, do Código de Processo Civil. Se do certificado de óbito não consta ter o falecido deixado cônjuge, ou herdeiro notoriamente conhecido, nem testamento, ou se o testamenteiro, que figura no testamento está ausente, tem o oficial do registo civil de comunicá-lo, imediatamente, ao juiz. Aí, o dever é do oficial do registo, e desde o momento da comunicação começa o dever do juiz quanto à arrecadação dos bens, com ciência do Ministério Público e da Fazenda Pública, através de órgão ou de representante, conforme a legislação estadual. Há prazo para a arrecadação, que é o de vinte e quatro horas. Aí, o dever é da entidade estatal e é do juiz, razão por que pode haver ação de indenização contra a entidade estatal, com invocabilidade da Constituição de 1967, art. 105 e parágrafo único. A arrecadação é medida urgente, que deve ser tomada o mais rápido possível, coincidir com o lugar da abertura da sucessão e onde têm de ser encontrados os objetos de uso pessoal do morto. Se o decujo faleceu no estrangeiro, o foro é o da situação dos bens, ou o do último domicilio no Brasil. Impunha-se foro do óbito; depois, tinham de vir êsses. Não basta a presença do procurador do testamenteiro para que não se arrecade a herança, porque o cargo é personalíssimo (Decreto n. 2 . 4 3 3 , de 15 de junho de 1 8 5 9 , art. 3.°, interpretado, exprofesso, por A G O S T I N H O a MARQUES PERDIGÃO M A L H E I R O , Manual do Procurador dos Feitos, 2. ed., I, 136, nota 594). O Código de Processo Civil, art. 554, é explícito: "não se ache presente". Cp. art. 562, verbis "quando houver testamento e o testamenteiro se apresentar em juízo reclamando os bens". Aliter, se pelo juiz foi feita a nomeação do testamenteiro.

A comunicação do oficial do registo civil é comunicação de conhecimento e do seu ato de inscrição. Responde pelos danos provenientes da omissão, êrro ou dolo, segundo os principios comuns. Os cônsules brasileiros têm o mesmo dever de comunicar, se falecem, onde eles se locallizam, pessoas de que se tenha de fazer inventário no Brasil. Porque aos bens delas são aplicáveis as regras jurídicas sôbre herança jacente (Aviso n. 112, de 11 de outubro de 1845). O juiz é que manda arrolar os bens, descrevê-los em auto circunstanciado, e os confia à guarda de depositário idôneo, até que seja nomeado o curador. A presença do juiz é indispensável, salvo se, por afluência de serviço, ou pela distância, não pode assistir à arrecadação dos bens, e requisita a arrecadação e o arrolamento pelo delegado de polícia do distrito, o que há de ser com o testemunho de duas pessoas quanto ao aixolamento e à aposição dos selos (obsignação pelo delegado). Só o juiz pode abri-los ou despregá-los. Se a arrecadação e o arrolamento não se ultimam no mesmo dia, tem o juiz de apor os selos nos bens, quaisquer que sejam, e nos documentos. À medida que se vai procedendo ao arrolamento, abrem-se os selos, o que se há de mencionar nos autos, com todos os informes a respeito. Os selos são tiras de papel ou de pano, em que possam ficar a assinatura do juiz e os lacres, ou se as circunstâncias o recomendarem, fios de metal que circundem os invólucros e cujas pontas se prendam entre si, com o sêlo de chumbo ou de lacre sôbre elas e a assinatura do juiz no sêlo, ou em papel sob o sêlo. A única exigência formal é a da verificabilidade da abertura, no intervalo das vinte e quatro horas, ou nas subseqüentes, se não se tiver concluído a arrecadação. Sempre que se encontrem violações, ou se suspeite disso, têm de ser abertos os selos; e exige-se que se mencione no auto o estado dos selos ao serem abertos os invólucros, ainda que achados incólumes. O processo da arrecadação, que começa pela permissão (e pelo dever) de ser determinado de ofício, é o tipo do processo inquisitivo. O juiz tem tôda a liberdade em inquirir, procurar provas, inclusive lendo os papéis do morto, para lhes descobrir os herdeiros e os bens, ou o testamento, o codicilo ou simples instruções da classe das velhas cartas de consciência. No caso de arrecadação e arrolamento pelo delegado, não se dispensa a presença do escrivão. O auto é lacrado por êle, e assinado pelo delegado, por êle e pelas testemunhas. Os informes e indagações hão de ser pelo

delegado, que tem os mesmos deveres do juiz. Tem, como juiz instracional, de proceder à arrecadação nas vinte e quatro horas, como o juiz, contadas do óbito, ou do momento em que se lhe requisitou a diligência judicialiforme. A função do delegado restringe-se à medida cautelar de arrecadação e arrolamento, com a obsignação delegada. Não pode atender a quem se diga herdeiro. Essa função só a tem o juiz e é indelegável, pois que é êle responsável, como o escrivão, pelo atendimento de falso herdeiro (cf. C. CHORINSKY, Das Notariat und die Verlassenschaftsabhandlung in Òsterreich, 27 s.). Feitos a arrecadação e o arrolamento, os bens são entregues ao curador. Publicam-se quatro vêzes os editais, cada trinta dias, com o prazo de seis meses para que se apresentem os herdeiros para a habilitação. A Fazenda Pública apenas aguarda que a herança lhe seja entregue, após a presunção de não existirem herdeiros. O que se tem por fito, com os editais, é a preparação dessa presunção legal. Exemplo frisante de presunção legal constituída. Os editais têm de ser publicados quatro vêzes (e. g., a primeira, no primeiro dia dos seis meses, a segunda, no trigésimo segundo dia, a terceira, no sexagésimo terceiro, e a quarta, no nonagésimo quarto). Para ser útil a última publicação, a lei deixou mais de dois meses ao último edital. A citação edital é provocatio ad agendum; portanto, não se pense em integração da relação jurídica processual que a promoção da arrecadação e do arrolamento suscitou. Não se chama à relação jurídica processual, chama-se a propor a ação de habilitação. O curador é o curador oficial (dito judicial), se o há; ou de nomeação do juiz. Esse tem de prestar compromisso, como o tutor e o curador de incapazes. Cf. Ordenações Filipinas, Livro I, Título 90. Oficial, ou não, é o representante da herança em juízo ou fora dêle (Decreto n. 160, de 9 de maio de 1842, art. 24, § 1.°: "Aos curadores ou administradores dados às heranças jacentes e bens de ausentes compete: 1.°. A arrecadação e administração das heranças e bens dos ausentes de que forem encarregados, representando pelas mesmas heranças e bens em juízo, e fora dêle, demandando e sendo demandado pelo que lhes disser respeito"). Ainda que tenha sido aberto inventário, pode a Fazenda Pública alegar que é caso de arrecadação da herança como herança jacente. Ela é parte (e não litisconsorte, como disse o Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 15 de julho de 1941, D. da J., de 18 de junho de 1942): litisconsorte é parte, quase sempre; porém nem tôda parte é litisconsorte.

4. CAUSAS DE PRÉ-EXCLUSÃO DA ARRECADAÇÃO. - Não se procede à arrecadação: 1) se algum herdeiro está habilitado, inclusive o cônjuge; 2) se o decujo faleceu testado e o testamenteiro reclama os bens. Se, a despeito disso, se fêz, e algum dos herdeiros, ou o testamenteiro, reclama, a arrecadação cessa, considerando-se (à) nula se havia, à sua data, habilitação de herdeiros ou abertura regular de inventário, com o "têrmo dos herdeiros" pelo inventariante, ou (b) prejudicada em seu seguimento (atuação de circunstâncias novas), se a abertura regular do inventário ou a habilitação se deu depois. Não aludimos ao cônjuge sobrevivente, porque, se não estava desquitado e não há outros herdeiros anteriores, herdeiro é. No caso de ter sido excluído, ou de estar desquitado, o seu interêsse em bens comuns que existam não impede a arrecadação. A conversão pode operar-se por simples ratificação do inventariante, ou do inventariante e dos herdeiros, julgada pelo juiz, ou a êle requerida e feita, em virtude do seu despacho, por têrmo lavrado nos autos. A regra jurídica de não se proceder à arrecadação se há cônjuge "sobrevivente", ou herdeiro, legítimo ou testamentário, não incide, porque, na arrecadação de bens de ausente, se supõe que o cônjuge queira ser o curador (cp. Código Civil, art. 466) e não há, ainda, herdeiros: há parentes e o testamento só se abre no momento previsto no art. 471 do Código Civil (Código de Processo Civil, art. 587). Não há pensar-se em saisina (1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 22 de junho de 1948, R. dos T., 175, 716), salvo se vem a ser certa a morte do ausente, porque, então, à data da morte incidiu o art. 1.572 do Código Civil. Antes, a posse, que tem o cônjuge ou o suposto herdeiro é recebida do juízo, e não em virtude do art. 1.572. Se decorreu o prazo (Código Civil, art. 481), entende-se que incidiu o art. 1.572. Idem, na espécie do art. 590, III, do Código de Processo Civil. 5. EXISTÊNCIA DE PROCURADOR. - Se ocorre que não se habilitaram herdeiros, nem foi aberto, regularmente, o inventário, nem o testamenteiro se apresentou, mas o falecido tinha procurador e êsse sabe existir herdeiro, ou testamento, com razão para ser crido, não se procede à arrecadação, ou, se começada, suspende-se. Não há qualquer pretensão de direito material, ou de direito processual, por parte do procurador, que fôra, a ser depositário judicial. A lei pesou, apenas, o interêsse da herança, aceitando que se confie na pessoa em que o falecido confiava. O que faz suspender-se ou não se efetuar a arrecadação é a comunicação de conhecimento, que se

contém na afirmação d e existir h e r d e i r o o u t e s t a m e n t o ; n ã o , o ter h a v i d o procuração do f a l e c i d o . P o r isso m e s m o , i n v e r o s s í m i l a c o m u n i c a ç ã o , a regra jurídica pré-excludente é inaplicável.

Se o falecido deixou procurador, não se faz a arrecadação, ou se suspende, se fôra feita, se tal procurador declara haver cônjuge sobrevivente, ou herdeiro, legítimo ou testamentário. Assina o procurador o têrmo de depositário judicial dos bens em seu poder, ou sob sua administração. O defunto pode ter deixado outros bens. Uma vez que é a notícia de herdeiros, ou de testamento, que impede ou faz suspender-se a arrecadação, quaisquer bens, e não só aquêles, ficam depositados com o ex-procurador. Ainda se há testamento, se não há herdeiros, nem legatários, nem testamenteiro que se apresente, arrecadam-se os bens. 6. SUSPENSÃO DA ARRECADAÇÃO. - Se há declaração do procurador quanto a existir cônjuge sobrevivente, ou herdeiro, e se fizera a arrecadação, tem de ser suspensa; não cessa, somente cessa quando se apresentarem herdeiros habilitados. Enquanto existe o depósito judicial, ou (a) se habilitam herdeiros, ou se encontra ou é apresentado o testamento nos primeiros trinta dias; ou (b) os herdeiros indicados pelo ex-procurador não se revelam nos trinta dias para a abertura de inventário, nem se confirmou a notícia do testamento, e sim depois; ou (c) as informações do ex-procurador não se confirmaram, ou nenhum herdeiro se habilitou, ou não se encontrou o testamento. Nos casos (a), abre-se o inventário, a requerimento de qualquer interessado. Nos casos (b), o juiz ordena a abertura do inventário e nomeia o inventariante, se não foi pedida. Nos casos (c), a arrecadação prossegue. Se há confirmação das comunicações feitas pelo ex-procurador, o juiz tem de ordenar a abertura do inventário, atingido o prazo legal para ser pedida pelos interessados, ou a arrecadação. Não há terceira alternativa. Por isso mesmo, prescindiu a lei processual de hoje de fixar prazo (alguns dos antigos Códigos estaduais fixavam, ora em sessenta, ora em noventa dias). 7. PRAZO PARA CONCLUSÃO DE INVENTÁRIO. - O prazo para se concluir o inventário é de noventa dias, contados da arrecadação. A venda dos moveis é de necessidade, exceto: a) se guarnecem imóveis que estejam alugados; b) se são destinados a guarnecer algum imóvel, a que valorizem, ou se, não os guarnecendo e sendo vendidos, a venda constitui prejuízo; c) se constituem legado a legatário não aparecido e a conservação dêles não

onera a herança contra disposição do testamento ou do codicilo. O mesmo raciocínio faça-se quanto aos semoventes, principalmente se são parte integrante de estabelecimento agrícola ou industrial (cf. Aviso n. 423, de 23 de dezembro de 1856, e Decreto n. 2.433, de 1859, art. 38). De regra, a venda é à vista; mas desde o Decreto n. 510, de 13 de março de 1847, e Decreto n. 2.433, art. 63, permite-se o prazo, tal como se faz com os contratos com a Fazenda Pública. O Decreto-lei n. 6.609 foi explicitamente revogado pelo art. 4.° do Decreto-lei n. 8.207, de 22 de novembro de 1945, que redigira diferentemente os arts. 1.594 e 1.612 do Código Civil, mas a redação que dera ao art. 1.612 foi, por sua vez, revogada pelo Decreto-lei n. 9.461, de 15 de julho de 1946, que disse (art. 1.°) passar a vigorar o art. 1.612 com a seguinte redação: "Se não houver cônjuge sobrevivente, ou êle incorrer na incapacidade do art. 1.611, serão chamados a suceder os colaterais até o quarto grau". Essa regra apanhou os casos de sucessão aberta se os bens ainda não haviam sido incorporados ao patrimônio da Fazenda, em virtude de decisão judicial trânsita em julgado (art. 2.°). 8. REGRAS JURÍDICAS ESPECIAIS SÔBRE ALGUNS BENS. - Os títulos da dívida pública e os de direito privado somente são vendidos se o juiz entende, apreciando as circunstâncias, que é conveniente a venda. Não há arbítrio puro, pôsto que se trate, aí, de regra jurídica de arbítrio; ao contrário da regra da 1.a parte do art. 565 do Código de Processo Civil, verbis "mandará vender" que é, sem dúvida, regra jurídica completa. Se não há com que se continuar a fazer a entrada para as ações das sociedades, com risco de prejuízo, vendem-se (AGOSTINHO MARQUES PERDIGÃO MALHEIRO, Manual do Procurador dos Feitos, I, 142, nota 616). As regras jurídicas do Código de Processo Civil, artigo 565 e seu parágrafo, supõem que não haja qualquer habilitação pendente. Se algum habilitando o requere, o juiz tem de apreciar as razões que apresenta para se não vender algum bem (cf. art. 567, § 3.°, referente a bens de raiz). Implicitamente foi proibida a guarda de dinheiro, pedras preciosas, ações e títulos de crédito pelo curador, ainda que seja o oficial. A providência estende-se aos papéis particulares do morto, ou que com êle se achavam, que se hão de depositar lacrados e com o sêlo. A queima dos papéis ou objetos que contenham segredos deve ser feita pelo juiz, presente o curador e escrivão, não desde logo, mas quando se der a entrega à Fazenda Pública (Código de Processo Civil. arts. 573 e 566, parágrafo único).

O juiz autoriza as cobranças. O curador, autorizado a cobrar, pode procurar o devedor, ou propor a ação de cobrança. Também para a ação declaratoria, é necessária a autorização do juiz. Bem assim, para as ações constitutivas negativas (e. g., de nulidade quanto a infração de marca de indústria e comércio). Os bens móveis, com valor de afeição, e. g., retratos de família, coleções de medalhas e livros raros, quadros e obras de arte, só se podem vender após a devolução da herança à Fazenda Pública. Bens móveis, com valor de afeição, são aquêles que não têm preço, fixo ou aproximado, de mercado. Supõe-se não ser corrente o valor. Somente hão de ser vendidos quando não mais estiver em curso o prazo de cinco anos para que herdeiros, descendentes, ou ascendentes, ou testamentários, se habilitem. Nada obsta a que, no dia da expropriação, se faça a venda, se a Fazenda Pública o requer. Os bens imóveis não se vendem, durante a curadoria; podem ser arrendados, com autorização do juiz. Todavia, quando de fácil deterioração, ou em ruína, ou ameaça de ruína, ou se indispensável a alienação para pagamento de dívidas, legalmente computadas, pode o juiz autorizar a venda dos bens imóveis avaliados. A venda não pode ser por preço inferior à avaliação. A regra jurídica do Código de Processo Civil, art. 567, § 1.°, que permite a venda particular nas espécies apontadas, choca-se com os princípios de direito administrativo (bens da Fazenda Pública, que talvez sejam), pois que se trata de bens de patrimônio de incerta persona, de bens judicialmente depositados. O que vale é que a venda particular, ou não, nunca será por preço inferior à avaliação. A sábia legislação administrativa do tempo do Império, que anuiu na venda em praça a prazo, se não houvesse outro jeito (Decreto n. 510, de 13 de março de 1847; Decreto n. 2.433, de 15 de junho de 1859. art. 63), sempre repeliu a venda particular, sem exceção (Ofício do Ministro da Fazenda, de 10 de março de 1858; AGOSTINHO M A R Q U E S DE PERDIGÃO M A L H E I R O , Manual do Procurador dos Feitos, I, 143, nota 620). No art. 567, § 3.°, o Código de Processo Civil veda as vendas de bens da herança enquanto pende ação de habilitação de herdeiros, ação em apartado ao processo da herança jacente. Com isso se reconhece o interêsse dos herdeiros (ou legatários quanto ao objeto legado) durante a fase de cognição da situação jurídica. A 4.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 30 de dezembro de 1947 (A. J., 87, 283), deixou de aplicar o art. 507, § 3.°, em caso de livros cuja guarda e conservação exigiam

despesas (art. 567, § 1°), porque o art. 567, § 3.°, só se refere, disse, a bens de raiz. Pôsto que o art. 567 fale de bens de raiz, os §§ 1.°, 2° e 3.° concernem aos bens hereditários em geral. O êrro da 4.a Câmara Cível ressalta. 9. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. - As diligências que se atribuem ao juízo das sucessões têm por fito a provocação dos herdeiros a que se habilitem. A habilitação dos herdeiros processa-se conforme o Código de Processo Civil, arts. 746-753. A habilitação em caso de jacência é desconstitutiva do estado que se estabeleceu judicialmente. O processo da habilitação pode ser dispensado se ocorre alguma das espécies que a lei prevê. A habilitação de herdeiros, não incidente, é dispensada se a), havendo cônjuge, ainda que não seja herdeiro casado com o regime da comunhão de bens, e, sendo mulher, se estava convivendo com o marido ao tempo da morte, foi nomeado inventariante e comunicou o nome dos herdeiros; se b) o herdeiro legítimo, inclusive o cônjuge (e exceto a Fazenda Pública, que não inventaria), achando-se ou não na posse e administração dos bens, é nomeado inventariante e comunica,o nome dos herdeiros; se c), havendo testamento, o testamenteiro ou algum herdeiro, provando a sua identidade, se não é notória, comunica o nome dos herdeiros; se d), havendo testamento e sendo dativo o inventariante, esse comunica o nome dos herdeiros; se é), não tendo ocorrido qualquer dos casos acima, o herdeiro pede a inclusão do seu nome na relação de herdeiros, alegando a notoriedade da sua qualidade de herdeiro, caso em que são ouvidos o órgão do Ministério Público e o representante da Fazenda Pública e esses "concordam" isto é, não negam a afirmação de ser notória a qualidade (nesse caso, se a negam, tem-se de proceder à habilitação de herdeiros); se f ) , em vez de alegar a notoriedade da sua qualidade, o herdeiro necessário apresenta certidão de idade (ou certidões) ou prova equivalente, ou o cônjuge sobrevivente herdeiro apresenta a certidão de casamento; se g), em vez de alegar a notoriedade da sua qualidade, ou a certidão (ou certidões) a que se refere a espécie/», o herdeiro pede a sua inclusão, com a certidão da sentença que lhe declarou a qualidade de herdeiro; se h), em vez de alegar a notoriedade, ou proceder na forma da espécie/) ou da g), o cônjuge pede a sua inclusão, com a certidão de sentença que declarou a existência do seu casamento (tanto aqui quanto na espécie anterior, a natureza ou efeito declarativo da sentença basta, não precisa tratar-se de sentença declaratória); se i), oferecidos artigos de habilitação, ou simplesmente pedido de inclusão, o inventariante concorda em retificar a relação de herdeiros e se procede à retificação. Tal

o direito, que é lógico e suscetível da construção que fizemos. Nas espécies ei) até d), a dispensa é fundada na força probatória material da comunicação do inventariante; bem assim na espécie i). Na espécie