Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito [1 ed.]
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DA ESTRUTURA

À FUNCÃO J

NOVOS ESTUDOS OE TEORIA DO DIREITO

Prefácio à edição brasileira de Mario Losano, e apresenração de Celso Lafer

G:>pyrlghtO 2007 Edl1ora Manole Ltda., por meio de contrato com Andrea Bobbio. Logotipo: c.opyrightC Cen1ro de Esrudos Norbeno Bobbio

Tltulodo original: Dalla smmura alla{Ulµione: m"11!i nudi di reori4 tUI dirino TradUfd.tx Daniela Beccaccia Versiani TradUfdo do prtftkio d edifào brasileint. Marcela Varejão Revisdo tknica Orlando Seixas Bechara Renata Nagamlne Projeto grd{iur. Depanamento Editorial da Editora Manole EditolUfdo elerr6nica know·How Edi1orial LtdL CÃpa:. Eduardo Benolini Imagem da topa. Arcadas da hüia - iStoekpho10.com

Dados lmernacionais de catalogaçào na Publlcaçto (CIP) (Gamara Brasileira do livro. SP. Brasil) Bobbio, Norbeno Da 5Cl'UIUl'a à função : l\OYOS eslUdos de teoria do direito I Norberto Bobbio ; ndução de Daniela Beecaccia VeBiani ; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara. Renata Nagamine. - Buueri, SP : Manole. 2007. Titulo original: DaJla s1runura alia funzione. ISBN 85·204 ·2556·9 1. Dirtilo • Filosofia 1. Titulo. CL.lU·340. 12

06·8347 lodices para catálogo sistemá1ico:

!. Direito: Fik>sofia340.12 2. Filosofia do Oirei1034.0.J2

Todos os di reitos reservados. Nenhuma pane deste livro poderá ser reproduzida. por qualquer processo, sem a pennisslo expres.sa dos editores. ~proibida a reproduiôAO por xerox. Edição brasileira - 2007 l• reimpressão - 2008 Editora Manole LI.da. Av. Ceei, 672- Tamborl 06460· 120- Ban.aeri - SP - Brasil Tel.: (l IJ 4.196·6000 - fax: (l IJ 4196-6021 www.manole.com.br [email protected]

Impresso no Brasil Prinred i" Bnuil

SUMÁRIO

Sobre o autor Nota à edição brasileira ... .. . ... . .. • Prefâcio ... .......... . .... . . . .

Prefácio à edição brasileira .•.

• VII . . ... IX

. .. ••• .... XJ • .. XJX

Apresentação à edição brasileira

...... LI

1. A função promocional do direico

. .. .. . 1

2. As sanções posilivas . .. , .. , . . 3. Direito e ciências sociais .

. • 23 . .... 33

4. Em d ireção a uma teoria funcionaJisca do direito ... .. . .... .. .. 53 5. A análise funcional do direito: tendências e problemas . . .. .. . 81

6. Do uso das grandes dicotomias na teoria do direito .......... l 15 7. A grande dicotetmia .. . ...... .... . .. ... ... .... .. . .. ....... 139 8. Teoria e ideologia na dou1rina de Santi Romano . 9. Estrutura e função na teoria do direito de Kelsen 10. TuWoAscareW .

.. 159 181 . .. 211

(odice onomástico

.. 273

Indice remissivo .

. .. 279

---~

SOBRE O AUTOR

Norberto Bobbio na:;celi'em Turim, em 1909. Graduou-se em Direito (1931) e em Filosofia (1933) pela Universidade de Turim, instiruição da qual foi professor de Filosofia do Direito (1948-1972) e de

filosofia Política (1972-1979). Lecionou também nas universidades de

Cameri.no, Siena e Pádua. Em 1984, como reconhecimento da excelência de seu magistério e de sua vida pública, tomou-se professor emérito da Universidade de Turim e foi nomeado senador vitalfcio da Itália pelo presidente Sandro Pertini. Faleceu em 9 de janeiro de 2004,

deixando um legado intelectual de aproximadamente 5.000 titulas, emre livros e ensaios, parte dos quais foi traduzida para o alemão, espanhol, francês, inglês, iugoslavo e português. São algumas de suas obras publicadas no Brasil: Teoria do ordenamento juridico, Teoria da

norma jurldica, O positivismo jurldico: lições de filosofia do direito, Diciondrio de polfcic:a, com Nicola Mateucd e Gianfranco Pasquino, e Teoria geral da politica: a filosofia polftica e as lições dos clássicos, organizado por Michelangelo Bovero.

...... 1

PREFÁCIO

Reúno nesle volume a maioria dos escri1os de teoria do direito

elaborados depois da última coletãnea análoga (Studi per uma teoria genera~ dei diritto, Giappichelli, Turim, 1970). São ensaios esparsos e dispersos. de tem.Stica dfspar, sobre temas teóricos e também sobre pessoas. Não são redutíveis a wna única inspiração nem são passíveis de ser reescritos em uma unidade sistemática. No entanto, quase

todos são atravessados ou locados por um tema dominame, o da função ~promocionaJ" do direito - peço desculpas pela palavra rude, mas não encomrei uma melhor - , que dá título ao primeiro ensaio e ..por conseguime, à coletãnea como um iodo. Vinculam-se direramente a esse tema os dois primeiros ensaios, A função promocional do direito e As sanções positivas. mas quase todos os ouuos a ele se reíerem tangenclalmenre, a ele acenam ou nele resvalam. Trata-se de um tema cuja apreensão e discussão considero fundamentais para adequar a teoria geral do direito às transformações da sociedade contemporânea e ao crescimento do Es1ado social, ou administrativo, ou de bem-estar, ou de justiça, ou de capi1alismo monopolista, como se

queira, de modo mais ou menos benevolente, denominar, segundo os diferentes pontos de vista. Essa adequação se tomou necessária a quem deseje compreender e descrever com exatidão a passagem do Estado ''garantista~ para o Estado "dirigista" e, conseqüentemente, as metamorfoses do direito como instrumento de ·controle social", no sentido estrito da palavra, em instrumento de "direção social": em suma. para suplantar a disparidade entre a teoria geral do direito 1al qual é e a mesma teoria tal como deveria ser, em um universo social em constante movimento. Entendo por "função promocional" a ação que o direito desenvolve pelo instrumento das "sanções positivas", isto é, por mecanismos genericamente compreendidos pelo nome de ~incenti· vos~. os quais visam não a impedir atos socialmente indesejáveis, fim precípuo das penas, multas, indeniz.ações, reparações, restituições, ressarcimentos, etc., mas, sim, a "promover" a realização de atos socialmente desejáveis. Essa função não é nova. Mas é nova a extensão que ela teve e continua a 1er no Estado contemporâneo: uma eKtensão em continua ampliação, a ponto de fazer parecer comple· tamente inadequada, e, de qualquer modo, lacunosa, uma 1eoria do direito que continue a considerar o orden·a mento juridico do ponto de vista da sua função tradicional puramente protetora (dos interes· ses considerados essenciais por aqueles que fazem as leis) e repressi· va (das ações que a eles se opõem). A perccpção dessa mudança obrigou-me a voltar o olhar para um problema que fora um tanto quanto negligenciado pela teoria tradicional, qual seja. o problema da função do direilo, ao qual se dedicam o terceiro, o quarto e o quin10 ensaios, e, em parte, também o ensaio sobre Kelsen. O predomínio da teoria pura do direico no campo dos estudos jurfdicos teve por efeito que os estudos de ceoria geraJ do direito foram orien1ados, por um longo período, mais em direção à análise da estrutura dos ordenamentos juridicos do que à análise da sua função. É desnecessário mencionar as imponames contribuições dadas, nos últimos anos, para a ampliação e o aprofun-

XII

damenm da análise estrutural. de cujo ventre fecundo nasceu direta· mente uma disciplina -:-ova e fascinante, a lógica deõntica. Contudo. o direito não é um sistema fechado e independente, ainda que nada nos impeça de assim considerá-lo quando nos pomos do ponto de vista das estruturas formais. Em relação ao sistema social considerado em seu todo, em codas as suas articulações e inter-relações, o direito é um subsistema que se posiciona ao lado dos outros subsistemas, tais como o econõmico, o cultural e o político. e em parte se sobrepõe e contrapõe a eles. Ora. aquilo que o distingue dos outros subsistemas, junto aos quais constitui o sistema social em seu todo, é a função. Tanto é verdade que uma análise do sistema social em seu todo não pode prescindir da análise funcional de cada uma de suas panes. Naturalmente, a orientação da teoria do direito em direção à análise funcional, a qual eu denominei úma "teoria funcionalista do direilo~. como wn acréscimo, e não em oposição, à teoria estruturalista dominante, não pôde ocorrer sem umét conuibuição direta da sociologia. A passagem da teorià estrutural para a teoria funcional é também a passagem de uma teoria formal (ou pura!) para uma teoria sociológica (impura?). Digo isto porque na maioria dos artigos aqui reunidos - e este é um outro traço comum a eles - percebe-se que a sociologia do direito bate à porta. Os dois artigos sobre as "grandes " são um exercício de ars combinatoria; wna operação pela qual sempre tive um certo gosto e que sempre considerei estimulante. São, em parte, a continuação e o desenvolvimento do artigo sobre normas primárias e normas secundárias que encerrava a cole1ânea precedeme (na obra citada acima. p.175-97). Mas são, também, uma tentativa de entender como ope· ram as categorias fundamentais pelas quais procuramos apreender e dominar uma determinada esfera da experiência e emender quais relações há enue as ca1egorias fundamentais das diversas esferas de experiência que fazem referência umas às outras (sociedade, direito, economia. moral. e1c.}.

XIII

Dos três artigos sobre juristas, o que se refere a Kelsen está ligado aos principais temas da função positiva do direito e da análise funcional do sistema jurídico, que caracterizam a presente compilação. Os outros dois, ao contrário, escritos para ocasiões celebra1ivas (mesmo que eu me iluda em acreditar que não tenham sido celebrantes), são estranhos à principal temática do livro. O anigo sobre Tullio Ascarelli - inserido aqui porque acé agora passou despercebido, sepultado tal como es1;t em um daqueles cemitérios monumentais que são os estudos em homenagem. e também porque conlém as primeiras referências a uma teoria funcionalista do direito - é o mais antigo desta coletânea (foi escrito em 1964); o anigo sobre Santi Romano. em parte inédito, é o mais recente (1975). Segue abaixo o elenco dos escrito.s reunidos neste volume, com a advertência de que. ao reeditá-los, neles lntroduzi algumas ligeiras correções e a eles acrescentei algumas notas de a1ualização: 1 Su.lla funzione promoziono.le dei diritto !Sobre a função promocional do direito), in "Rivista trimestrale dl dirino e procedura civi.le~.

XXIII, 1969, p.l.312-29 (este artigo foi publicado tam-

bém em lingua inglesa, sob o titulo •The promotion of action

in the modem State", na miscelãnla Law, Reason and Justice.

Essays in Legal Philosophy. edited by Graham Hughes, New York University Press, New York. 1969, p.189-206) (reimpresso posteriormente in AA.W.. La teoria funzionale dei diritto e conflitosociale, Milão, Unicopli, 1979, p.135-53; publicado tam· bém em espanhol, com o tflulo .. La función promocional dei derecho", in Alfonso RuizMiguel (org.), Contribución a la teoria delderecho, Valencia, Fernando Torres, 1980, p.367-81; e para o servo·croata, com o título •promocionalna funkcija prava", in

1 A nlr rlemo. tnut (Qlcht'le, forom 1acscem1d». ptlos rcvisoru. indicaçõn das nimpKU6es t 1111duçk$1taliuf.las posltriormtnte /i. ediçâodt 1976de VallaS1t1111urua/Jafu11.ti011e. publietdl em lln· gua i1alian1tm !!ln" 1'34. Tam~mfon.m induldasnfertncias • t!Ui1fnci1 dt traduço)c.'$ pVaa linxua portuKUn.a du obn.sci1adas ptlo autor em nous de rodapi. tN.R.I

XIV

Nale teme. XXXJI, n.7-8, L988, p.1.905-17, e in Nikola Viskovié, Eseji iz teorije pratia. Splh, Logos, 1988, p.93-1031. Sulk sanzioni posilive [Sobre as sanções positivas), in Studl dedicaci ad Antonio Raselli. Giuffré, Milão, 1971, vol. 1. p.22949 (deste artigo. foram reproduzidas, no presente volume, apenas as páginas novas relativas ao artigo precedente) [uaduzido e publicado posteriormente em espanhol com o titulo ~Las sanciones positivas'', in Alfonso RuizMiguel {org.). Contribuci6n a la teoria dei derecho, Valencia, Fernando Torres, 1980. p.383-90). II diritro 10 direirot. in le scienu umane in ltalia, oggi, 11 Mulino, Bolonha, 1971, p.259-77 {republicado nesta coletânea sob o útulo Diriuo e sc~nze sociali [Direito e ciências sociais))

!traduzido e publicado posteriormente em espanhol com o titulo MDerecho y ciencias sociale_s", in Alfonso Ruiz Miguel (org.), Contribuci6n a la ieorla dei derecho, Valencia, Fernando Torres, 1980, p.225-381.

Verso una teoria funz.ionalistica dei dirirto fEm direção a uma teoria funcionalista do direicoJ, escrito originalmente para os estudos em memória do filósofo do direito argentino Ambrosio Gioja (ainda inédito) [publicado em Ungua espanhola com o título "Hacia una teoria funcional dei derecho", in AA.VV., Derecho, filosofia y lenguaje: homenaje a Ambrosio L Gioja, BuenosAires,Astrea, 1976, p.9-30]. Jncorno all'analisi funzionate del diritto IEm torno da andlise funcional do direilol, in "Sociologia dei dlritto", li, 1975, p.l-25 {aqui reimpresso sob o titulo L'analisi funzionate dei diritto: tendenu e problemi IA análise funcional do direito: tendtncias e problemas!) luaduzido e publlcado posterlormen1e em espanhol com o título "EI análisis funcional dei

XV

derecho: 1endencias y problemas", in AJfonso Ruiz Miguel (org.), ContTibución a la teoria ckl dtrecho, Valencia, Fernando Torres.

1980, p.263-87; e para o servo-croata, com o Htulo "O funkcionaJnoj analizi prava~. in Nikola Viskovié, Zbornik z.a teoriju prava li, 1982, p.193-216, e posteriormente ln Nikola Viskovié, Eseji teorije prava. Spli1, Logos, 1988, p.75-92].

Dell'uso delle grandi dicotomie nella teoria dei diritto !Do uso das grandes na reorla do direito), in "Rivista íntemazionale di filosofia dei diritto", XLVII, 1970, p.187-204;



2 2

(também em Szudi in onore di Giuseppe Grosso, GiappicheW, Twim, 1971. vol. (Y, p.615-35).

li 5

la grande dicotomia \A grande dicotomia], in Studi in memoria

di Cario Esposito, Cedam, Pádua, 1974, p.2.187-200. Teoria e ideologia ne1'a dottrina di Santi Romano 1Teoria e ideologia na doutrina de Sami Romano], escrito arigina1-

mente para o Congresso U dottrine giuridiche di oggi e l'insegnamento di Santi Romano, promovido pela ISAP. em 25 e 26 de outubro de 1975, publicado in "Amministrare. Rassegna internaz.ionale di pubblica amministrazione", 1, 1975, p.447-66; e, em seguida, em uma nova versão, que é aqui incluída. destinada aos estudos em ho menagem ao filósofo do direito em lingua espanhola Luís Recasêns Siches (ainda inédito) [reimpresso in Paolo Biscaretti di Ruffia (org.), Le dottrine giuridiche di oggi e l'insegnamento di Santi Romann, Milão, Giuffre. 1977, p.2543; traduzida e publicado posteriormente em espanhol com o título "Teoria e ideologia en la doctrina de Santi Romano", in Alfonso Ruiz Miguel (org.), Contribuci6n a la teoria dei derecho. Valencia. Fernanda Torres, 1980. p.155-701. Hans Kelsen, in "Rivista internazionale di filosofia dei diritto". L. 1973, p.426-49 (aqui publicado sob o título Strutcura efunzione

XVI

nella Ieoria dei diritto di Kelsen [E.Urulura e funçiJo na teoria do direito de Kelsen)) (posteriormente republicado in Norberto

Bobblo, Dirino e 'pocere. Saggt su Kelsen, Nápoles, Edizioni Scientifiche Italiane, 1992, p.65-87; traduzido e publicado 1ambém em espanhol, com o titulo "Estructura y hmcíón en la teoria dei derecho de Kelsen", in Alfonso Ruiz Miguel (org.J, Conrribuc:ión a la 1eoria del derecho, Valencía, Fernando Torres, 1980, p.241-61; e para o servo-croala, com o titulo "Struktura i hmkcija u Kelsenovoj prava", in Dometi, XXI. n.1·3. 1988, p.61-73, e, posteriormente, com o título ''Struktura l funkcija u Kelsenovoj 1eoriji prava" in Nikola Viskovié, Eseji teorije prava, Split, Logos, 1988, p.105-211.

L'irinerario di Tullio Ascarelli !O itin_erário de Tullio AscareJIJl, Ascarell~ Giuffré, Milão, 1969,

in Sludi in memoria di Tullio

vol. 1, p.LXXXIX-CXL; e antes, ainda que apenas parcialmente, publicado sob o titulo TulUoAscareli~ in "Belfago1", XIX. 1964, p.411-34; p.546-65.

XVII

PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA

Maria G. Lo sano• O pensamento de Norberto Bobbio, do positivismo jurídico à função do d ireita2

1. Bobbio e o positivismo juridic4:1de Hans Kelsen. Para compreender como o livro Dalla strutrura alia funzione,

ora apresentado com satisfação ao leit~r brasileiro, encontra inserimento na vasta obra de Norbetto Bobbio (1909-2004), é necessário seguir a evolução do seu pensamento sobre os temas da filosofia do direito e, em panicular, sua relação crit ica com o positivismo jurídico, até alcançar a função promocional do direito, objeto deste volume. O interesse de Bobbio pelo positMsmo jurldico inicia-se em 1949,, continua nos anos Sessenta e Setenta e se encerra nos anos I ~afio(;. l,,lmno 4; Profe$$or C.tedl1itlco ~ filosofia do OlreilO C de lnform,hk;a f\lrJdÍCI NI Uni~r1ill dei Pi..nom" Orlentale "Aml!deo Avopdro". Ali!Uandria, h'1ia: Doutor honorb U.UA.

peta llniversld.de de Hannover, Alelftll\M: l'rtinioAlexander-von-Humboldt. Bonn. Alem1nhl. 2 A 1r-duçlo desce prefacio foi reall7.lld1 por Mucela VaM/lo. Profe.sson Adjuntll da Unlvel'$kiride Feêltnl d a Paralblo e da Uni'lfl'$libde Federal de Pernambuco: Dou1on ptl1 F&e0l1à di Giurisprude11Z1 e Pós-dou!on pela fal;olt.11 di Scienz:e Poliliche, amb&s d& Un~nil.11 degli Srudi

di Millno.h6li1. 6-11 na qwd íaur iniei• as obru d1 nu1.uridade l ~·e Bobbio: "Se eu 1ivesH que hat escolheria o ano de 1949, noqualpubliqud 1M1/t&llauma 1naliseeumcomen1ario à Teoria1u1mW UI llfriao de fr.nçesco r.un1\11nl" {naqvôe 111ip. Bobbio defo:ndtll o porhivilmo kelwfti&oo. como wrt ..Ut0 • lflUltJ: Norbeno llobblo. PrdloflO A Ili tdid6n l!pOlio/Q. em Conrri•"'ióri D lo ~ tt.ltlntdio. Ediçlo a CllJO de AlfonllO Ruiz Migu.tl. Ftm111do Torres. Valencia, 1980. p.10. Uma pttdr.& reco nsuuç.10 do pensamento teórko-jwidlco dt Bobblo esia con!id& m1 aptesenll(.110 àquele volume: Alfonso Ru~ Miptl, Bobbõo y ri pol/li"is""' jwrldio:l/14/iallO, p.IS·S& e. soblTl. de .. p.J IJ. Sobre o~ dcs.cnvah-'imcntM pn••~•ia=. cf. Ca!la ra,.lli. ,,,. Jiltw>[i;i Rn/11~111,,..,;~ iu •!íf' Kfl~n e Tre\"~ mediadn por Dtl \'i:cchlo. esta Hu~trmJo de1alhadam~nte em ~brio G. tosano. lúrn110 T"'"· WC"iologo Í"' il Vtt.-l1io " il .'liurMIO Moml11. r.m1 il '«PSI•> lb/iogmfln di Htnt1m Treve1. Unlcopll, Mllano. 19911. V111 -210p.

8 C.omu rol •·~to n.a nota 4. u grupo dus cs1ui.llosos qoe sob 1·üriH formas 1ém 8obhlo como rf'íerên· eia ,; ind ic:w:lo com num•,. di\-.:nos: com o nome df' ·scuol• dl Tolino· é tlcsign ado aquele R"'P" rnr s...a acepçll11 m~b11111:ns.a. S11b1eas11rl~nsd~ "Scuola dll"o1ino· publique! Un strolodifilv1JJ•fi" tkl Jfriflo n Torino: 1872· 1972. ··Teoria puliliea·. XX\: 1999. 11.:l·l, p... 71 -517; 1ambfm: U" sii;:lo fiutle/1/erttl10t11 Túrin; /872· 1972. "An~ rlo de 1'i10 r:.OrMli.111, INJrico ftMM1' dtl dlrillO.

Sul;içtà Ed~1ii;. prin cipalmtnle sob o aspecto formal. No primeiro cu1so rstudamos 1 norma juridiCll. i~olulamtntr considtnda; nH!t novo bbio. l'rólogQulai'diclónC11Jthin. Aouhii, &1/>hir1 •K'lln rnlwro 1/f' lir•t:'"' ·''"'ll''"ln. e út Cd"" l,>fo1. Hol lbin iu U1Usi lf'. cn~1>1>•r11m·•~ 1amblim .. m •·eniw iialiAllll "" vulu111" dc \'alcniiua 1-.rmi (a cur.i úi). /.'/~'"

  • biu, li µosiliviimul(mritiicu. t..:1.iuni de filusufii dt:l di1ilw ri~~ohe da ,._cltu Morr.i An no ólCCira ed;,,·f•o. ~ahu lllgum""l°"""'cu11 ... ~õo.-. ío1rn3i~-· i p.XI .

    XXIX

    se inverteram'' 31 : o positivismo foi abandonado por mui1os, que encontraram no direito natural - antes esquecido - o bálsamo para as angústias que aqueles anos dfficeis deixavam paro uás. Como exemplo desce estado de ânimo, Bobbio relembrava freqüememente (não nesse seu preíácio. mas nas suas aulas que eu escutava quando es1udante) o radicaJ repensamemo de Gustav Ratlbruch. positivista que passou ao jusnaturalismo depois da guerra. Em tal contexto. Bobbio introduz uma distinção que também não será possfvel aqui desenvolver, mas que é fundamcntaJ para compreender os tantos mal-entendidos sobre os quais se fundamen· taram as polêmicas por \'e:tes ásperas do pós-guerra. O positivismo podia assumir um valor liberal quando induzia a respeitar as normas democráticas no momento no qual o poder ditatorial as colocava em perigo; mas, depois da consolidação deste poder, o positivismo assumia um valor autorilário porque impunha a aplit:ação das normas di1atoriais sem colocar-se in1errogações éticas. AnaJogamente, ao jusnaturalismo conservador se podia contrapor um jusnaturalismo progressista, este último relembrado muitas vezes por Kelsen. O positivismo jurídico nos seduz como cientistas neu1rais; ao invés, o jusnaturalismo nos permite afirmar nossos valores morai~ "Existe portanto - conclui Bobbio - um limite entre positivismo e jusnaturalismo que corta pela metade a pessoa de cada um e com relação ao qual nos vemos na condição de positivistas ou jusnaturalistas, não segundo as épocas ou as ocasiões. mas até mesmo segundo a pane que representamos na sociedade".32 Um exemplo de relativismo dos valores que decerto teria agradado Kelsen. Vez que de Bobbio me separam trinta anos exatos, não pude experimentar a laceração do jurista sobre a qual ele faJava. Dela tinha uma idéia livresca e vaga. Creio tê-la compreendido melhor quando me ocupei do direilo alternativo na América do Sul e, em concreto, do "Movimenlo dos Sem Terra" no Brasil. De fato, os juíz.es brasileiros llBohhio,ôJ mm1lrtt1lllstn1> t po.1irit·ismogiu1/tliro, cil .. p. IO s 3ZMrohhio,(;f1~.adnr) - Hu1s i;,r~n . \Jmhcrt" Campagnolo. VirPilo imermicionQ/ e CJ1n10 sabe""'" (~un un tl'll~n im!d•to d" llaM Kl'l>en e um cn~iu de :>eno tlobtliu. lradução de Mar,ela V;uc1;óu. Mu!insl'o'ltes.Sào :'auln.?002.X\'·20~p

    ~i; Uobhh Ciu1n111ru·a~is"'JÍli1•i.111Wf1U.túlico. d1 .• 2~1p.

    il7 .'>aquele me,cnoo ~dado. eu aat.ara de po.1blicar a 1rnduçio il:'lli.:lllil da st11unda edição cb 0011r/11n l""t1rkldiri11occm 19till. em l"arb. sob a infldncia de aobhlo. lalei v~rnu \'le'l.es S'Jh1t 1al prolJlema com n lúgko C~'I('' Kalinuwski. que illlilllr.ara clltlcamen1e a comunicaçào de Bobbio no c•.ll'llfl:SSO de Got1done tcomo llobblo ll'Wfd:! em Otríttoe /JO/trr. cit.. P,41, nota). ~mer.1e ll et anoslÍ\"puis publiqul'iosresuhadosíinaJsdaquelesericon11o~ queoM1Jo puisien1ein!em»npera

    b1usc.arneme: Matio e;. L.osanc. Sul/a pt.sttWlth un Unguo11iioora d#Scrimooora pre&crlllioo ntlfn dumiflll pura 'oriM t rmlta in KeWn. Comunitll.Milil/lo, 1981,p. \17 .!i l.

    XXXVI

    realidade e normatividade. entre mundo do ser e mundo do dever ser, entre os quais - afirmava Kelsen - não devia e>Ustir nenhuma relação. Naqueles anos. o tema neokantiano das relações entre ser e dever ser estava no centro do debate filosófico-jurídico, tanto que a ele íoi dedicado o congresso da "lnternationale Verelnigung tor Rechts- und Sozialphilosophie" (IVR), de setembro de I 967, em Gardone Riviera, no qual Bobbio apresentou urna comunicação sobre ser e dever ser em Kelsen. Em março de 1967, "nós, turine· ses· havfamo-nos preparado para aquele congresso organizando um encontro sobre o mesmo cema.''11 O congresso em Gardone foi também a oca~iãn de memoráveis encontros pe!õ.Soais, destinados a durar decênios e a fazer circular o pensamento de Bobbio: eu conheci Miguel Reale; Elias Díaz encontrou Bobbio pela primeira vez.. 49 Todavia. independentemente destas ocasiões de encontro e de confronto. o positivismo kelseniano há muilo já estava no centro dos estudos individuais de muitos de nós e assinalara tanto o início das nossas carreiras acadêmicas, quanto~ nossas primeiras construções teóricas. De fato, os anos Sessenta foram para Bobbio os anos do apro· fundamento da teoria pura do direito e, em especial, da naturc1.a sistemática desta teoria. Nesta análise. foram envolvidos também os alunos mais próximos, cujos trabalhos podem ser vistos como aprofundamentos de aspectos individuais das sete acepções do posilivismo jurídico elencadas ameriormeme: é suficiente citar o volume de Amedeo G. Conte sobre a completude dos ordenamentos juridicos {1962), o estudo de Giorgio Lazzaro sobre a interpretação

    411:-.:o encontroturin~. doqualparricipavam o.. ..n1iuj!J"qu~ nu nw~ u:m/fnciu llll o:ori.a ju1fdiu SOYitilc1uOl1..110 seja compfftndido no maii Jmbi1n dll ºcifocia dll di1l'rw.1,so.:lol0f"f""l/~J1/oell/'1lflllluraa/1"fu'1i!.iu"~· "';!.,p. ll 7 79 Duhbiu. /.JJfun~io"' pronuv:.i. ln "Rivis!adi íilosoíl8". LVII. l9íi6. p. l4l · 5S. As p&apnl d1adas l!!lfll'I. ru p«rlvamf'n1e nas páginas 149. 154. 1!;1

    Dando seguimento à profunda transformação que em todos os lugues deu origem ao Welfare Stare, os órgãos públicos perseguem os novos fins propostos à ação do Estado mediante novas técnicas de conrrole social, distintas daquelas tradicionais. "Não é possível" analisa Carrió - ~que o aparato conceitual, elaborado pela teoria geral do direito, persista e atravesse inalterado mudanças tão radicais~.

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    Tomando essa observação como ponto de partida, proponho-me a examinar um dos aspectos mais relevantes - e ainda pouco estudado na própria sede da teoria geral do direito - das novas técnicas de controle social, as quais caracterizam a ação do Estado social dos nossos 1empos e a diíerenciam p1ofundamente da ação do Estado liberal clássico: o emprego cada vez mais difundido das técnicas de encorajamento em acréscimo, ou em. substituição, às técnicas tradicionais de desencorajamento. indubitável que essa inovação coloca em crise algumas das mais conhecidas teorias tradicionais do direito, que

    e.

    se originam de uma imagem extremamente simplificada do direito. Refiro-me, em panicular. à teoria que considera o direito exclusiva· mente do ponto de vista da sua funç~o protetora e àquela que o considera exclusivamente do ponto de vista da sua função repressiva.

    t

    desnecessário acrescentar que. com freqilência, as duas teorias encontram-se sobrepostas: o direito desenvolve a função de proreçdo em relação aos atos licitas (que podem ser tanro atos permilidos quan10 obrigatórios) mediante a repressaa dos aios illcilos. Um exemplo clássico da primeira teoria é a que tem por predece!>Sor Christianus Thomasius, segundo o qual o direito se caracteriza por conquistar o próprio objetivo (que é essencialmente protetor) por meio da emanação de comandos negativos (proibições). A segunda teoria, comum a toda a corrente do positivismo jurídico, de Austin a

    Jhering e Kelsen, é aquela segundo a qual o direito atinge o próprioobJe· tivo (que é essencialmente repressivo) por meio da organizaç.ão de sanções negativas (o direito como aparato coativo, ou ZwangsordnunKJ.

    2 . Como se sab·e. Thomasius considerou o direito como um t cmjunto de nonnas negativas (que, afinal, se re.5umiam substancial~nte no preceito neminem Jaedere), a fim de oferecer um critério atmples e claro que servisse para distinguir as normas jurfdlcas de nutras normas. como as da moral individual e as da moral social. 2 Como todas as 1eorias reducionistas (e a teoria thomasiana é ,mrticulannente simplista), a teoria que vê no direito um conjunto de normas de um só tipo (neste caso, as negativas) é manifestamente falsa. Contudo, é por demais manifestamente falsa para não estimular 1 observação do que havia por irás dela. O que ela escondia era a idéia dr que se deveria atribuir ao direito, exatamente para diferenciá-lo da moral, uma função eminentemente ~protetora. O surgimento do direito como conjunto de normas negativas assinalava a passagem do estado de nauueza para o estado civil, Isto é, de um estado continuamente ameaçado pela guerµ univêrsal para um estado de paz. A rinalidade do direito, dizia Thomasius, era evitar o mal maior para a humanidade - a guerra - e garantir o bem menor - a paz. Ora, para garantir a paz. bastam nonnas que impeçam os diversos membros do corpo social de fazer mal uns aos outtos, isto é, bastam precisamente as normas negativas. Thomaslus cometeu o erro de apresentar como uma teoria do direito, como uma determinação filosófica da essência do direito, o que era, na realidade, um ideal poltôco- como dirfamos hoje. uma ideologia. Ele descreveu não o que o direito é, mas o que deveria ser para conesponder ao ideal de um f.stado que tem por objetivo não apenas tomar os próprios súditos mais felizes. mas garantir-lhes a liberdade reciproca. Prova disso é que 11 1eoria de Thomasius, como se sabe, foi refutada por Leibniz, segundo o quaJ o direito não pode se eximir de comandar, além de proibir.1 ~ Como se .sabe-, Ch1 i~cianub Tilumuiu> apreuniou como fundamcnto Uo iwru1r1, de muJo a difc1fl!cié·lo do IKme de coruidenr a força em rtl4ç.&o 10 dirci10 no anigo u ... " ndfaru. IW. l. • •11w Mt11üs1·.xux. 1965. p.l21·4 1. PubliC11do 11m~m na •1tiVii11 di dirino civilt-. ' ' ': 411. ' '· •go.a. no volume Sr..d i ~· " ""' lfOl"io ft'"'r"llle 41 dirirro. Gi•ppicht:bi. Tu1im. 1970.

    Xn.

    , .. ; .111

    adverte, logo em seguida, que "elas têm uma importância secundária no interior desses sistemas, que funcionam como ordenamentoscoercilivos",7 nos quais se vê claramente que o conceito de ordenamento coercitivo implica o de sanção negativa. Para Carnelutti, embora "não exista nenhum motivo para reservar ao castigo o caráter da sanção'', o valor prático da recompensa no direito "é tão limitado a ponto de explicar, quando não justificar, o hábito teórico de, negligenciando-a completamente, simplesmente reduzir a sanção a um mal infligido a quem praticou o mal".8 Essa imagem do direito também é predomi· nante na Uteratura não jurídica. Felix Oppenheim, após ter ilustrado a técnica do desencorajamento, observa que o melhor exemplo desse tipo de controle social é a legislação, porque "é a técnica social usada com maior freqüência por aqueles que exercem o poder de governo para influenciar o comportam"ento dos governados".9 O sociólogo J. P. Gibbs observa que "legal sanctions {at least in Anglo-American System) are exclusively negacive, and this is perhaps of significance in evaluating the role of law in social arder°'. 10 Desse ponto de vista. ainda hoje é extremamente instrutiva a obra de Rudolf (vonJ Jhering, Der Zweck im Recht, que é, como se sabe, um tratado sobre as alavancas que determinam o movimento social, em sentido lato: um tratado, como aquele já clássico de Bentharn, sobre as penas e as recompensas. Jhering nio desconhece, em absolum. a imponância das recompensas como alavancas do movimento sociaJ, mas, como historiador do direito romano que era, contrapõe a

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    H. l>.!UL'.1ndonar a imagem tradicional dO direito como ordenamento ptu1ctor-repressivo. Ao lado desta, uma nova imagem toma forma: 1 do ordenamenro jurfdico co mo ordenamento com função promotlmml.15 Consideremos qualquer uma ~ constituições dos Estados 1K1s-liberais, como a arua1 consâruição italiana. Nas constituições liberais clássicas, a principal função do Estado parece ser a de rut.elar (ou garantir). Nas constituiçõe~ pós-liberais, ao lado da função de 1u1cla ou garantia, aparece, cada vez com maior freqüência, a função de promover. Segundo a constiruição italiana, a República "promove •s condições que tomam efetivo" o direito ao trabalho (art. 4°, pará111:rafo 1°); "promoveasautonomias locais" (an. 5°); "promove o desenvolvimento da cultura" (art. 9°, parágrafo 1°); "promove e fa110rea os • cordas e as organizações internacionais voltados a afirmar e regular os direitos do trabalho~ (art. 35, parágrafo 3°); "promove e favorece a ampliação" da cooperação (art. 45, parágrafo 1°). Além disso, "facilita. i.:om medidas econômicas e outras providências, a formação da famflia" (an. 31, parágrafo 1°); "dispõe de medidas em favor das zonas de montanha" (art. 44, parágrafo 2°); "encoraja e rutela a poupança" (art. 47, parágrafo 1°J; "favorece o acesso da poupança popular à propriedade, e

    f. .g-

    l f

    ou compelindo à sua execução. São medidas diretas as várias formas de vigilãncia (que pode ser passiva ou ativa) e o recurso ao uso da força (que pode ser impedi1iva ou consuiliva). Distinguem-se das medidas dire1as as operações do segundo e do cerceiro tipos, porque visam atingir o objetivo {lanto aquele próprio da função repressiva quanto aquele próprio da função promocionaJ) não agindo diretamente sobre o componamento não desejado ou desejado, mas buscando influenciar por meios psiquicos o agente do quaJ se deseja ou não um decerminado comportamento. Podem ser denominadas medidas indireras. São indiretas porque o comportamento não desejado é, concudo, sempre possivel, mas deve tornar-se mais difkil ou mais íácil, ou então, uma vez reaJizado, produz certas conseqüências, desagradáveis ou agradáveis, segundo o caso. Em um ordenamento repressivo, o desencorajamento é a técnica tfpica por meio da qual se realizam as medidas indiretas. Em um ordenamento promocional, a técnica tlpica das medidas indiretas é o encorajamento. A esta altura, podemos definir "desencorajamento~ como a operação pela qual A procura influenciar o componamen10 não desejado (não impona se comissivo ou omissivoJ de B. ou obstaculizando-o ou atribuindo-lhe conseqüências desagradáveis. Simetricamente, podemos definir "encorajamento" como a operação pela qual A procura influenciar o comportamento desejado (não importa se comissivo ou omissivo) de 8, ou facilitando-o ou atribuindo-lhe conseqüências agradáveis. ; Gostaria de destacar que esta definição de desencorajamento e de encorajamenco, uma vez que encena ambas as formas típicas de medidas indiretas - tanto a obstaculização e a íacilicação quanto a punição e a premiação - , é mais ampla do que aquela usualmente oíerecida, a qual encerra apenas a terceira forma, ou seja, a sanção propriameme dita, nas duas species da sanção negaciva (pena) e da sanção positiva (prêmio). Penso que a consideração exclusiva da terceira íorma dependa do fato de os juristas, por considerarem somente

    16

    1 tknica do desencorajamento, serem levados a ver nesta expressão.

    •ae foi, por longo tempo, a mais difundida e eficaz nos ordenamen· lnll jurldicos cradicionais, precisamente a sanção negaciva. Quando ..sumimos também o ponto de V:isca da técnica do encorajamento. f lmposslvel deixar de notar que ela age mediante dois expedientes dls1intos. isto é, seja pela resposta favorável ao comportamento já rea· llz;ido, no que consiste precisamente a sanção positiva, seja pelo ravon·dmemo do componamenco quando ainda está para ser reaJizado. t) destaque dado ao expediente da íacilitação serve para salientar, por rnmraste, o expediente da obs1aculização, que habituaJmente passa despercebido: pode-se desencorajar um comportamento não desejado tamo ameaçando com uma petUA (expediente da sanção), sempre c1ue o comportamento vier a se realizar: quanto tomando o próprio comportamento mais penoso. Com particular atenção às técni~!lS de encorajamento, note· se a diferença entre as duas operações: a sanção propriamente dita, sob forma de recompensa. vem depois. com o comportamento já realiza· do: a facifüação precede ou acompanha o comportamento que se pretende encorajar. Em outras paJavras. pode-se encorajar intervindo sobre as conseqi.lências do comportamento ou sobre as modal ida· des, sobre as formas, sobre as condições do próprio comportamento. Para oferecer um exemplo retirado da vida comum, temos: se desejo que meu filho faça uma tradução diflcil do latim. posso prometer-lhe. se ele a fizer. irmos ao cinema, ou então posso pennitir que utilize uma tradução bilingüe. Já há algum tempo. os juristas têm ressaltado que uma das características mais evidentes do sistema juridico de um Estado assis· tenciaJ é o aumento das chamadas leis de incentivo ou leis-incenti· vo,17 O elemento novo das leis de incentivo, aquele que permite o agrupamento dessas leis em uma única categoria, é exatamente o

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    l" g. o.

    ~:

    17 Pm 10flos, cin.>G. C.1'•~'"''· .~ui l"tj(im,co.nlru~ionulrd~/,/'1,gi di inun1ivnúonr:ed1' /ndiriun. in t961.n.1. p.t·20

    "A1omop~t10lics sociais, constitufdo por um conjuntp de sistemas normativos, 1•111re os quais o mais significativo, e também mais estudado, por obra dirl!ta de um grupo profissional de especialistas, e precisamente o sis11•111a jurfdico. i:. surpreendente qinstatar quantos conceitos-base da 1t·oria geraJ da sociedade, tais como status, papel, expectativa, esfera 1fo permissividade e de obrigatoriedade, sanção (positiva e negativa), Instituição, institucionalização, etc. (são conceitos-base. como qual11uer um pode ver, extraídos do sistema parsoniano), são também rnnceitos·base da teoria geral do direito; isso. cabe enfatizar, porque s;io conceitos fundamentais para descrever um sistema normativo. No entanto, é igualmente surpreendente o quão pouco os sociólogos lenham se dado conta do trabalho feito pelos juristas em tomo dos mesmos conceitos. Portanto, não há razão para que, no momento em que o jurista se aproxima do sociólogo, com uma nova e grande curiosidade, este continue considerando o estudo do direito estranho ao seu próprio interesse, seja no nfvel mais alto - a elaboração de uma teoria geral da sociedade - seja nos níveis mais baixos- a reconstruf.iãOde cada um dos institutos. Penso que uma das tarefas da sociolo· ~ia do direito. que ora está se desenvolvendo na Itália. sobretudo por obra de Renato Treves e da sua Escola, seja também contribuir para um melhor conhecimento recíproco entre sociólogos e juristas.

    4

    EM DIREÇÃO A UMA TEORIA FUNCIONALISTA DO DIREITO

    ·;V v.AR10 - l. Predomlnlodas 1eorias esuu1unUs1as sobre as 1eortas funcionallstas na 1eorta geral do dJreho - 2. Es1rurura e fu.nçao na 1eoria do direl10 de Ketsen - l . 11 1eorla kelseoiana do direito oomo ordenamento coauvo - 4. As sançOes posltlvas na obn de Kelsen - s. Razões his1órtcas da ampliaçaio das sanções positivas no Estado con1emporãneo - 6. Os ln~ntivos e os prtmlos como duas formas da a1Mdade promocional do

    Estado - 7. Acrescente lmpolU.nda da açao ptomoclonaJ do Eslado coloca em crise a teoria kelseniana do direilo como Otdenammto coattvo18. Aação promocional do Estado incide sobre o modo de entender o direi·

    to não do pon10 de visla esuurural. mas do ponlo de viSta fundcmal.

    1. Se aplicarmos à teoria do direito a distinção entre abordagem tstruturalista e abordagem funcionalista, da qual os ciemistas sociais fazem grande uso para diíerenciar e classificar as suas teorias, não resta dúvida de que, no estudo do direito em geral (de que se ocupa a teoria geral do direito), nesses últimos cinquenta anos, a primeira abordagem prevaleceu sobre a segunda. 1 Sem fazer concessões a rótulos, sempre perigosos por mais úteis que sejam, acredito ser possível afinnar com cena tranqüilidade que, no seu desenvolvimento posterior à guinada kelseniana, a teoria do direito tenha obedecido muito mais a sugestões estrllluralistas do que funcionalistas. Em poucas palavras, aqueles que se dedicaram à teoria geral do direito se preocuparam muim mais em saber "como o direito é feito" do que .. para que o direito serve". A conseqüência disso foi que a análise estrutural foi levada muito mais a fundo 1 A insuficlfnc:la da abordapm funclonafü11 nas teorias mais a Nal$ do dl~ilo i ~alçada por 8. Ll ~. Wh111 h ltwlr 8t)ond SduiWlklJM, /li U robanivtvlll jurldlq~. Actn" dM rongrft mondiol dt phllo$Dph"' d" droll n d# plil/Glophit S«"ial Bruulloç, 30 de .,.:mo - l df Sftmlbro de 1971. Nau'"'laau. t..ov.nio. 1971. p.73·1D. Mu nlo fiel dar o por que o autor cknomlllil a abordagem uadl · clOfllil#Nlfornuck-'$eholaniei$m'.



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    tk1 que a análise funcional. 1h•rht~rt L A. Han, autor da obra de teo· ria do direito que ah:;iuçou us maiores consensos aquém e além do Oceano Atlântico nos últimos anos, parte de uma anáJise das carências funcionais dos ordenamentos primitivos para culminar em uma determinação do conceito de direito - o ordenamemo jurldico é um composlo de normas primárias e secundárias-, no qual o estruluralismo celebra os seus próprios triunfos. ~ verdade que, em Han, análise funcional e análise esrrurural estão estreitamente ligadas: o ordenamento jurfdico é assim construído, isto é, tem aquela determinada estrutura, porque, apenas enquanto assim construído, elimina as carências funcionais dos ordenamentos primitivos. A estrutura

    específica do ordenamento jurfdlco desempenha uma função espe-

    ô

    cífica, que é assegurar ceneza, mobilidade e eficácia ao sistema normativo. Entretanto, permanece o fato de que aquilo que caracleriza os ordenamentos normativos que de hábito denominamos jurldicos é precisamente o modo pelo qual são "estruturados". Na obra de Kelsen, não só anã.lise funcional e estrutural estão declaradamente separadas, como esta separação é a base teórica sobre a qual ele funda a exclusão da primeira em ravor da segunda. Como todos sabem, para o fundador da teoria pura do direito, uma teoria cientifica do direito não deve se ocupar da função do direito, mas tão-somente dos seus elementos estruturais. A análise funcional é confiada aos sociólogos e, talvez, aos fiJósofos. O movimento em d ireção ao estudo da estrutura do ordenamento jwidico foi favoreddo por uma rígida divisão do trabalho entre juristas (que observam o direito a partir de seu interior) e sociólogos (que o observam a partir do seu exterior). A distinção haniana entre ponto de vista externo e interno, que dá tanto pano para a manga aos seus intérpretes, pode ser considerada como uma justificação daquela divisão do trabalho entre sociólogos e juristas, que em Kelsen, ao contrário, fundava-se sobre o dualismo entre esfera do ser e do dever ser, entre leis naturais e normas jurfdicas, entre relação de causalidade e de imputação. Que a teoria pura do direito se ocupe da estrutura, e não da função do

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    direito, é algo que Kelsen declara explicitamente em inúmeras ocatlões. Em polêmica com os teóricos soviéticos do direito, os quais, deRnindo o direito em função dos interesses da classe dominante, conferem-lhe uma definição funcional , Kelsen reitera energicamenlt! seu ponto de vista: Estti doutrina (a dou1rina pura dodirvitoJndo considera(... ) o objeti110 que é perseguido e alcançado pelo ortkllOtMnto jurldico, mas Ido· somenreoordenamemo jW'úlicoem si mesmo:econsü:Ura esteordellOmento na auronomia normatim pr6pria da sua es1ru1ura. e n40 em relação o este uu objeri/IO. 2

    De resto, qualquer pessoa que tenha certa familiaridade com as obras de Kelsen sabe que nelas não h~ lugar (ou não deveria haver) para as definições teleológicas dos conceitos-chave da teoria do direi10. e que seu esforço para 6nalmeme oferecer aos juristas uma teoria cientifica do direito consiste pre.cisamerite em fornecer definições formais desses conceitos, começando pelo conceito de norma jurídica e 1erminando com o de ordenamento jwfdico. Hoje podemos olhar com uma cena intolerância para o furor antiteleológico de Kelsen e dos kelsenianos. Contudo, não devemos esquecer que a busca do objetivo ou dos objetivos do direito era a brecha pela qual as mais conuastantes ideologias entravam na teoria do direito. Circunscrever a tarefa de uma teoria do direito à análise estrutural era um modo de salvaguardar a pesquisa teórica da intrusão dos juízos de valor e de evi1ar a confusão entre o direito posi1ivo- o único obje10 possivel de uma 1eoria cientifica do direi10 - e o direito ideal. Entre as intenções de Kelsen estava a condition sine qua non para a fundação de uma teoria científica do direito. ..Como ciência" - cabe enfatizar, •como ciência~ - "a doutrina pura do direi10... escreve Kelsen , "vê· se obrigada a tão-somente compreender o direito positivo na sua essência e a eniendê-lo mediante uma 2 Rt fo e Rtth1S~l1 rr. Ein~inmg 111 d~ mh11w~11$lio/l/i(ht Probltn1'!1i/f. F. Ow~icke, Viena. 1934. p.33 IT~rio puro do ditriro, tnd. pon. fcrnandna.I, considerando apenas a primeira como objeto de uma teoria pura do direito. A segunda não pode conceber uma aná1íse funcional distinta da estrutural pelo simples fato de que confunde a estrutura com a função, sustentando que o direito tem uma função na qualidade de uma estrutura das relações sociais. É verdade que Kelsen, com a intenção de construir a 1eoria pura, jamais se ocupou, execro marginalmente, dos problemas relativos ao aspecto funcional do direito. Mas isso não significa que com eles não tenha se preocupado de modo algum. Do ponto de visra funcional, como se sabe, o direito é, para Kelsen, ''uma técnica especifica da organização social": sua especificidade consiste no uso dos meios lRJU.t.p.17.

    56

    c~vos

    para induzir .os membros do grupo social a fazer ou a não r... ala uma coisa. o direito é um Mordenamen10 coativo". Aquilo que bGlrlllwaa lodos os ordenamentos sociais. que habitualmente qualiflUllliOI juridicos. é a presença de uma organiução, mais ou menos c:eatlralJzada, para obter dos associados detenninados comportamentee, recorrendo, em úJtima instância, à força. Na terminologia pró-

    piia dos sociólogos, a qual, aliás, Kelsen não utiliza, o direito é uma dai turmas possíveis de controle social, especificamente, é a que se rt.da no uso da força. O que distingue essa teoria funcional do direito de outras é

    legislador. mediante o rMÇdo conrra o wu oposto por meio de "mato coativo imposlo por d'JdOS au:uais:.25

    A atividade direta pode ser remetida à atividade económica dM 1•11rticulares, com a única diferença de que os destinatários dos 0. 1.t ftm.:lonl socilif/r/H dirif•o. ln -Quadttni di $0C:I01opi-. l001. 1973. p.103· 21: V.Auioa1. 11w1orlalfímtti01Jo/io'1t• lt>Studomlmrogral'ado.ap~11tJo noVUI COng~mun· di;ol ~ SOC"lolofia. wdlado cm Toron10. rm 111»'0 de 197.&).

    º"

    !> ~. lum•u;"· RttlusrozlolOfi~. "™'ohh, ltcinbek bei Hambu~ 19?2, voU. 2 iSociolorfa dodi"ilo. uMI. pon. Gt1$11\'0 15.iyer, Riu de lane!l1). Tempo B~$11elro, 191LSI.

    B2

    EllpUlsa o velho, porque ·sabe que o novo logo se 1ornará velho e o fflho voltará a ser novo, lembra que o mo1ivo da con1enda en1ão não •a 1;1mo o con1ras1e entre es1ru1uralismo e funcionalismo, mas entre •onismo e pluralismo. Por 1eoria sociológica do direito entendia-se, naquela época, uma teoria que via no direito uma produção da sociedade em coMi; as suas formas, e não apenas uma produção do Estado, e que, •i;im. tinha uma incidência direta sobre o problema das fontes. li.•oria sociológica do direito era sinónimo, ao menos na Itália (mas 1ombêm na França, se pensannos na teoria da instituição de Renard, nn teoria do direito social de Gurvitch, que posteriormente, viria • tomar-se um dos maiores represent"mes do renascimento da iw1t:iologia jurídica), de teoria da pluralidade dos ordenamentos juridicos. Enquanto o alvo das teorias sociológicas do direito é. hoje, o forma lismo, o alvo das teorias socjológicas de ontem era o estadismo. Jliscoricamente, o pluralismo juridico. do qual Gwvilch foi o mais fervoroso defensor, fõra uma das tanras manifesrações da falsa crença, t:omum tanto aos liberais radicais quanto aos socialistas libenários, de que o desenvolvimento da sociedade indus1rial teria por efeito uma diminuição das funções do Estado, um ripo de reabsorção do Estado pela sociedade civil. O que aconteceu foi exatamente o con1rário. Para quem queira considerar o direho como fenômeno social, o problema do pluralismo perdeu grande pane de seu interesse. Com o enorme aumento das funções do Estado na passagem do Estado liberal para o Estado social, o problema fundamental para uma teoria sociológica do direito, isto é, para uma teoria que considere o direito como um subsistema do sistema social geraJ, é o de verificar se, para· !elamente. não foram aumentadas e mudadas as funções do direiro, e, emenda-se, do di1ei10 estatal, o que explica o imprevisto surgimento e a rápida difusão da perspeetiva funcionalista. Para além de seu débito para com o desenvolvimen10 da antropologia e da sociologia do direi10, a perspectiva íuncionalista do direi· to deve uma parte da sua atual fortuna ao peso cada vez maior do

    1 . ~

    l

    marxismo. dos vários marxismos, nas ciências sociais. Não confundo mux.ismo com funcionalismo:' simplesmente chamo a atenção para o fato de que aquilo que Marx e Engels acrescenraram à definiçàn tradicional do direito como ordenamento coativo foi a determinação da sua função, o domínio de classe. Entre as teorias gerais do direito hoje correntes, as que mais insistem na "função social" do direito são as teorias soviéticas e as dos juristas dos países socialistas. Na sua Théorie tk l'état et du droit, que pode ser considerada wna das maio-

    res summaeda concepção marxista do direito e do Estado atualmente

    1

    d

    disponíveis em uma lfngua mais acessível, Radomir LukiC' inicia a exposição da parte geral com um capítulo intitulado ~La fonction

    social de l'état et du droit", em que se lê que o direito. como ordenamento do monopólio da força, encontra o seu caráter especifico no rato de que desempenha a função social de proteger expressamen1e o interesse da classe dominante por meio da manmenção forçada de um certo modo de produção.7 A diferença entre a definição do direito de Kelsen e a de Lukié salta aos olhos: também para Kelsen o direito é ordenamento coativo, mas é nada mais que ordenamemo coatiVo. Qual é a ..função social" desse ordenamento coativo não lhe interessa, porque, para alêm do objetivo genérico da paz ou da ordem ou, nas relações internacionais, da segurança coletiva, por meio deste particular instrumento que é o direito, por esta ~técnica da organízação social", os mais diversosobje-

    ~NeuemrsmoH'fltido."rB.U. llA.lloo;.Wlwfislllw?iJr>vt1thcho"'ntitism.inUraUo du Conpft mondõal ck phllotoph~ du droit et de philasophlcsorialc. BNR!u. 1971.

    publicados como fuciculodopeliodo~rço·junlio de 1971.de"LoSiqutetaiuolyK". N~m. t.o-.'llnio. 1971. p.77·83: •1t h t"Yldenc 1ha1. .....,.W\"er lts liml1a1loN. the Man:is11CCOUnl ofle.,.•it nOI miml)' formal. lt addlftSftl!sclfveryspKlflcally 10 que11ionsofsocial function. !ohowin1what l1w doe'sforusandwhGthdoescow"!p.IDI. 111. Lv~-w:. Tltf'o.Vthl'ltt1lf"ldudf'tllr. mid. fr.nc. dl.' M. Cjidua, DallDJ"., PB.ris, 1974: "L;i fo...:1lon de n:uit l!I. du drol1 tsl d'avoir un r61f da/Is le 50ei~1t. d'agjr au sein dt 11 wdttf. üirnmc l'Erai •volr plusi"1rt .::!loru. scuk ceroapondni • ll'ur fonai11n. celle qul ktw ~ tt 1.. drol1 -ntil.'llt ti sp«tAqut. Cf par quoi lb li.' di1nn1wr11 dft 1u1ra phlnomhcs soc:la\o" IP.891. Equali~ fwl~7" ... l'E111 ttledrcri1omcomont fonctlon k maln1len du modl.'depn1Clu(1ton quil f1)n~;enr 6 le CW. difi&e8nte inl~ ti donl Us .on1 ln ctt11ion1" Cp.99l. E danecnMrio ~rqueuma du mau conhttidasobrudr reoria,...rxilia do dirc.i111 sc intih.1lo Lllfv~c

    ptti""'

    riroluVonarioMldlrirro.

    84

    ttros podem ser perseguidos e conquistados. Para Kelsen, o direito é 1m1 instrumento especifico que não tem uma função espectfica. no •mido de que a sua especificidade consiste não na função, mas em •r um instrumento disponível para as mais diferentes funções.' Ao rmurário, para LukiC'. e. em geral. para os juristas marxistas- parti· tularmente para aquela numerosa, quando não compacta, fileira de ltiristas marxistas que são os juristas soviéticos-, a especificidade do dlrei10 está não em ser um ordenamento coativo, mas na função espe· clfica que esse ordenamento tem e que só ele pode ter, uma vez que •omence o ordenamento da força monopolizada, na qual consiste o tnstrumemo "direi10~. está em condições de assegurar à classe domi· nante o seu domfnio. 2. Tenho razão em considerar que o escasso interesse pelo pro· blema da função social do direito na teoria geral do direico dominan· te ué os nossos dias seja assocfado, preci$illlente, ao destaque que os grandes teóricos do direito, de Jhering a Kelsen. deram ao direito como instrumenco especifico, cuja especificidade não deriva dos fins a que serve. mas do modo pelo qual os fins. quaisquer que sejam. são perseguidos e alcançados. t de conhecimento geral que uma das afir· mações recorrentes de Kelsen - a ponto de se tornar tfpica - é que a doutrina pura do direito não considera o objetil!O peneguido e alcançado pelo ordenamento juridico. mOJ considera, apellQj e tdo·.somentt, o ordenamento jurúJ.i· co;ecomideranteordenamentonaautonomiadasMOestrun..ra,endo em relaçdoue:steuu objeiiw.9

    Kelsen podia fazer essa afirmação porque considerava ter encontrado o elemento caracterlstico do direito na estrutura do 8 ~~· me com mais vapr -

    1ema no anlgo dlado Em dillo(dO o ullUI 1«1'1a {lultkma/ISlO da d/""10. ~1to-me. O)ntudo.~t1'01ri1orw...Wm .ofl'IN.io$0M t:cism. llftt• ~ovoluint.

    Küst.". R#IM R~luslthrr. EinlttllWIJ lntl~ rPdmo~licM PrDblnniuik. f. l)eutl~. \/lena. .,34. p_ll. Tnd. li., Utlfa-nlltl1doilri1ra pur4tk/41rlno. ElnaucU. Turim. l!SZ. p.72 IT#Vlia pum dl>tll""ro. uad. po". Fernando de Mit11nda. Sào Paulo, Sanlva. 1!139J.

    !I H.

    85

    ordenamento jurídico como sistema dinâmico, e não precisava do objetivo para a sua definição. ~ menos conhecido o fato de que, noe mesmos anos, um outro apaixonado, mas desafortunado, autor dl "science juridique pure··, Emest Roguin, afinnava com tenacidade mais ou menos as mesmas coisas.'º Recuando ainda mais, também Jhering, não obstance o titulo de sua grande obra, Lo scopo dei diritto, concentrava toda a atenção não no fim, mas no instrumento, isto f, na coação e na organização desta. Dian1e da pergunta sobre qual seria a finalidade do direito, dava uma resposta genérica, ou seja, que o direito servia para garantir "as condições de existência da socieda· de~. 11 as quais eram, afinal. tudo e nada, compreendendo não apenas as condições da existência física, mas "também todos aqueles ouuos bens e prazeres que... atribuem à vida o seu verdadeiro valor". 12 Que uma resposta tão genérica e. ademais. previsivel não pudesse ofe. recer qualquer ajuda à determinação da nota espedfica do direito.

    parece-nos totalmente evidente. Esse foi sempre o componamento dos teóricos do Estado diante do problema da definição do Estado: eles jamais admitiram os fUlS que o Estado persegue entre os assim denominados elementos constitutivos do Estado. Para caracterizar essa organização máxima da convivência humana, são suficientes. para eles, algumas características materiais e formais. Basta recordar Max Weber. Depois de ter definido o Estado pelo "meio" que emprega para obter os próprios fins. o uso da força, afirma: NiJo é possiwl definir um grupo polltico - e tampouco um Emulo - indicando o objetillO do seu agir de grupo. NiJo hd nenhum abfetillO que grupos politicos ntW tenham alguma vez proposto paro si. do ~Sfor· ço para prover o sustento d pro1eçiJo da arte: e não há nenhum que 10 Oetlvc.o.me em v:hlos OISJ'C'("tmda tnr1a FRI de. ltoguln. lndu.il\vwb~o ant11drvloghmo. em um anlgo, U11 dl11wr11Jco10 NOrini d,/ dlrl110: ÜN'fl Rojpoder estatal mediante a formação do Estado-aparato (o poder trHal-racional de Max Weber). Este fenõmeno induzia a concentrar 1 Ulenção nos problemas da complexa organização do instrumento. mais do que nos problemas de 'ordem axiológica ou sociológica, t'nnsiderados, uns, perturbadores (e, talvez, também irrelevantes), muros. irrelevantes (e, talvez. também perturbadores). Não devemos esquecer que, da consideração do Estado moderno como grande organização, nasceu a teoria do direito como conjunto ordenado ou mganizado de normas, a teoria do direito como ordenamento, que se n:enconna, embora sob diversas camadas, mas facilmente reconheci· veis, tanto em Max Weber quanto em Kelsen.14 Parece-me que uma das razões do desinteresse dos teóricos do direito pelo problema da função estava exatamente na sua presumida irrelevància. À consideração de que o direito se caracteriza por ser um instrumento específico que deveria servir ao desenvolvimen10 de mu.ilas funções, acrescentava-se não só a consideração de que as mesmas funções se desenvolviam em diferentes sociedades, como ~ncnte

    l:i M. ~l:K'. & 0 11omta t nxit1il. l'.dlzioni di f".omunuà. ~i~o. 1961. w1J. 1. p.5.1 ·4 il:C011"'"M t M&11-01. op. t11.. p.528. no11 10.

    2l J~ticeHolmeJOfl /twJm,.m:iJ.i11 LAwnnrlmriolao Fip/ortJ111ry~organiUdo porW. M. Ev,.,~.

    Fitt Pres, :-!ewYurl. 1962; louliü · ~ na p.101, ~um Hus 1c:sp«ti"'1.S ..ommt'1io•).

    organismo e o do sis1ema. não são, de modo algum, incompativeis, e. com freqüência, um é utilizado para incerpretar o outro); b) os indivf· duos, que são partes componentes dessa tocalidade, interagem entre si e com o todo. Quem se põe o problema da função do direito, faz referência a quaJ dos dois pólos? Põe-se o prol;ilema de qual é a fun· ção do direito em relação à sociedade como totaJidade ou em rela· ção aos indlvfduos que dela fazem parte? Provavelmente, em relação a ambos, o que é perfeitamente lícito. O que não é lícito e cria confu· são é que os dois problemas não sejam claramente diferenciados. Se eu digo, como diz o príncipe dos funcionaliscas. que a principal fun· ção do direito é a integração social,31 coloco·me do pomo de vista da sociedade e me ponho um problema determinado, que é o da fun· ção do direim em relação à sociedade no seu conjunto. Se eu digo. como dizem geralmente os antropólogos, que a função do direito é tornar passivei a sa1isfação de algumas necessidades fundamentais do homem, como a nutrição, o sexo e ouuas necessidades de ordem cultural e assim por dian1e, nas sociedades mais evoluidas, colocome do ponto de vista do individuo e me ponho um ourro problema determinado, que é o da função do direito em relação aos indivíduos singularmente considerados.

    Já foi corretamente sublinhada a diferença entre a função do direito em relação ao sistema (as sysremfunktionale Bestimmungen

    des Rechts, de Helmut Schelslcyl e a função antropológica do direi· to.32 Mas não é necessário incomodar sociólogos e antropólogos para colocar em destaque essa distinção. Quando Kelsen, que não era sociólogo nem antropólogo. afuma que o direito é uma técnica de organização social cuja função é 1omar passivei a paz social. li Pata uma int~iiu e um dtSenvohirnc:ruo da 1eoria ~niana do direito. ver H. C. D~mtMH~--. i..>w.ar 11111 inugra rfw mech11111Um. in W. M. EvM, op. ci1., p.73-90. Sobre sociologia do direi lo de 1endheia ntnuural-Nndona.llsta. em panieular$0b~ l'alwns. •·u A- Glf..\AJm 11ir /('l.,.,..,..,,,flrlm1JirenU't'OJt.JH.>1,0...;)I, Ra:l!Us&ia/otit. ciL. vol. I. p.105 !.'«iolop> do dlmm ciLI.

    112

    Como efeito da cpmplexidade do fenómeno jurídico. es1á ()Dircndo nas teorias funcionais aquilo que já ocorreu com as teo· cill estruturais. que. quando eram demasiado espCdficas, deixavam

    làn de suas fronteiras alguns pedaços do território (por exemplo. •direito internacional); quando queriam abraçar todos os campos cnadicionaJmente ocupados pelo direito, ou dos quais se ocuparam hls1oricamente os juristas, acabavam sendo demasiado genéricas. Nno gos1aria, a esta altura, que alguém acredhasse ser possfvel sair do impasse unindo as caracteristicas estruturais e as funcionais por meio de wna pretensiosa análise estrururaJ.funcional. Entre estrutu· rn Ido direito) e função (do direito) não há correspondência biunlvo· ca. porque a mesma estrutura. por exemplo, o direito considerado como combinação de nonnas prim.trias e secundárias, pode ter as mais diversas funções, assim como a mesma função, por exemplo, aquela, comumente atribufda ao direi10. de tomar possfvel a coesão e a integração do grupo, pode realizar.se mediante diversas estruturas normativas. (0 que não quer dizer que a esuutura e a função sejam independentes: modificações da função podem incidir sobre modifi· cações estruturais. e vice-versa). Enfim, se quisermos deduzir uma consideração final, tal seria que a análise estrutural, atenta às modi· ficações da estrutura, e a análise funcional, atenta às modincações da função, devem ser continuamente alimentadas e avançar lado a lado, sem que a primeira. como ocorreu no passado, eclipse a segun· da, e sem que a segunda eclipse a primeira como poderia ocorrer em uma inversão das perspectivas a que os hábitos. as modas. o prazer do novo pelo novo, são paniculannente favoráveis.

    113

    6

    DO USO DAS GRANDES DICOTOMIAS NA TEORIA DO DIREITO ~UMA~!() - 1. Normas de conduta e nonnas de organização - 2. Adis· flnç.ão entre nonnas de condura e de organização nlo coincide com a dlsdnção entre normas posilivas e negarivas nem com a disdnçio ent"' normas absira1as e concretas -3. A distinção entre normas de conduta e de orgartlz.açio com base em sua dlsrinta função - 4. Comparação enu~ as normas de conduta e de organlzaçio, de um lado. e as normas primirias e secundá rias. dt o urro - 5. A distinção entre normas de condu1a e de organiução colocada em relaçlo à dlstinç1o entre 1toria do dimto como relação e ieoria do direito como insli,tuiçlo - 6. As "grandes dico· tomias- e a sua imponlnda slstemitlca - "7. A grande dicotomia enl.rt normas de conduta e de organização comparada às grandes dico1omias dos jusnaruralisw e dos sociólogos positivistas- 8•••• e â grande dico1omia de Dwtheim encre solidariedade mednicl e otglnlca - 9. Da distinção entre sariÇ6e:S repressivas e sanÇ&s mtiNdvas à distinção enue sanções negallvaseposldvas.

    1. Proponho-me chamar a atenção dos estudiosos de teoria geral do direito e dos juristas para dois artigos recentes do economista Friedrich A. Hayek, publicados no Idioma italiano em revistas não jurídicas. 1 Nesses dois artigos, o autor usa uma contraposição. bem conhecida pelos juristas, entre dois tipos de normas, para descrever e diferenciar dois tipos de ordenamenco estatal. Os dois 1ipos de normas são as normas de conduta e as normas de organiza;ão. A tese de Hayek

    1 Esses doisanippsll60:f.A. H.rrM primor~ 1111 não tenha tido, inclusive no passado, além da função de repress.'\n, também a função de promoção. Contudo, o primeiro tipo de funç:\u sempre foi tão predominante que a maior parte das teorias do dircilu não registraram, nas suas definições do direito, a função de promo· ção. AJiás, com freqüência, a distinção entre as duas funções serviu de critério para distinguir o direito de outros sistemas de commh• social. é exemplo desse ponto de vista a grande obra de Rudolí 1vonl Jhering. ~r Zweck im Recht, que sai em busca das quatro alavancas que detenninam o movimento social. Dessas quatro alavancas, duas - o prémio e a pena - movem os impulsos inferiores e duas - o sen· timento de dever e o amor - movem os impulsos superiores. Nessa dicotomia, o direito ocupa um lugar bem especifico: ele recobre o campo em que age a alavanca da coação, o que equivale a dizer que a sua função é essencialmente repressiva. é imponante notar que a esfera em que opera a alavanca da recdmpensa coincide, em grande parte, com a esfera das relações de rrqca, as quais constituem, para Tõnnies, o tecido da Gesellschaft contraposta à Gemeinschaft, ainda que o mesmo Tõnnies mantenha presente a diferença entre a sua categoria e a de Jhering.21 A diferença entre função repressiva e função promocional de um sistema normativo pode ser brevemente resumida nos seguin· tes termos: com a primeira, o sistema tende a impedir que se verifi· quem componamentos não desejados; com a segunda, tende a provocar componamentos desejados. Enne os componamentos desejados e os não desejados está a vasta esfera dos componamemos indiferentes, como deixar ou não deixar testamento, connair ou não contrair mairimOnio, panicipar ou não panicipar de um concurso, nos quais

    21 f. TO:

    i

    i

    2. Na teoria do direito, a distinção que se apresenta, mais mar· cadamente do que qualquer outra, com o caráter de "grande dicoto· mia~ é a distinção entre direito privado e direito público. ~ supérfluo acrescentar que a distinção, que ainda encabeça a maioria dos nossos iratados, enue direito subjetivo e direito objetivo, não é uma grande didirPi·

    i' ~i~ado.

    145

    de normas de condu1a per1ence, por cena, o direi10 penaJ, que Ut• dicionalmente é considerado público; aos conjuntos de normas tlt organização penence, por ceno, o direito empresariaJ (das gramlft empresas), que se insere no direito privado. 3. Também no que se refere ao que denominei de Muso historio· gráfico" dos dois termos de uma grande dicotomia, a distinção enu" direito privado e direito público se sai bem na prova. Em uma vis;lu histórica do direito, direito privado e direito público comparecem. com freqüência, não mais como as duas partes do sistema juridku, mas como os dois momentos da evolução do direito, como duas fases do direito considerado em seu processo. Podeóamos fazer observa· ções interessantes sobre o modo de adaptar uma dicotomia à divisão de um processo histórico em períodos, de servir-se dos resultados do processo de criação de dicotomias para estabelecer uma periodi· zação. As grandes dicotomias sociológicas oferecem ampla matéria para wn estudo desse tipo. Contudo, para pennanecer no campo da teoria do direito. observemos a passagem da grande dicotomia que aqui nos interessa para critério de periodização ou como indicador de uma tendência de desenvolvimento: o que acontece quando se fala de tendência à privatização e, inversamente, à publicização, ou até mesmo de um momento predominantemente privatista e de um momento predominantemente publicista do direito. No século passado. à medida que a contraposição en1re sociedade civil e Estado ganhava espaço e se evidenciava a prioridade da primeira em relação ao segundo, afirmando-se a idéia do progressivo deperecimento do Eslado, preconizou-se o advento do momento privatista do direito (é neste sentido que se deve interpretar. do ponto de vista da teoria geral do direito, a tese da passagem da sociedade de status para a de contractus). Em seguida, houve uma inversão de tendência: já no início desle século, obras sobre o inexorável decUnio das instituições tradicionais do direito privado chamavam a a1enção para o fenómeno contrário. islo é, para a progressiva publici-

    146

    _.,do sistema jurídico..Menospre?.ada como um mal, ou exal1ada GIMllO um bem, essa tendência foi reconhecida de modo unânime ~o uma das características do direi10 contemporâneo. Que tal ltndência tenha sido vista no primado das relações de subordinação 11.1lue as de coordenação, ou das normas de organização sobre as de conduta, ou do momento da heteronomia sobre o da autonomia, ou da vontade coletiva sobre a soma das vontades individuais, e assim por diante, não tem grande imponância em relação à opinião cont:orde sobre o cará1er do processo, que distinguiria a evolução do direito na passagem do Estado liberal para o social, do Estado tutor da ordem pública para o Estado curador e promotor do bem-estar público. É inegável que tenham sido usadas outras dico1omias para assinalar as grandes etapas da evolução-do direito, por exemplo, aquela entre normas negativas e nonnas positivas, entre normas de condUla e normas de organização, enne normas abstratas e ordens concretas. Enuetanto, para lhes dar maior credibilidade. essas dicotomias foram freqüentememe reenviadas, quase que assimiladas. à grande dicommia direito privado·direlto público (nisto mostraram seu caráter de dicotomias secundárias). ou então não se saíram bem na prova de uma verificação histórica, ainda que superficial, enquamo a concraposição emre 1endência à privatização e tendência à publicizaçào não perdeu nada da sua relevância histórica e do seu prestígio conceituai. Como vimos, o uso axiológico dos termos das grandes dicotomias está estreitamente ligado ao uso hisloriográfico, no sentido de que, com freqüência, a distinção em periodos caminha pari passu com uma teoria do progresso ou do re1rocesso histórico. ou. em outras palavras, a periodização é 1ambém indicativa de uma certa processualidade (em uma direção positiva ou em uma direção nega1iva). Quem se recorda, mesmo que apenas de algum fragmento, da literatura sobre a publicização do direito sabe que as valorações do fenômeno, isto é, se ela está na direção do progresso histórico ou na direção do re1rocesso, são \'ariadas e discordantes. Pensemos

    147

    nus dnis c ..sus-limitc da longa tradição liberal-liberista,8 que vai de Spencer a Hayek e que vê na vantagem do direito público sobre.• o direito privado uma das manifestações mais inquietantes do des· potismo moderno;' ou a tradição marxista-comunista, da qual se podem encontrar exemplares genuínos nos primeiros e mais vigo· rosos teóricos do direito soviético, que identifica (ou troca) direito privado com direito burguês, e, portanto, vê também uma superação do direito privado na superação do direito burguês a que tende o novo Estado. 10 As valorações, numa e noutra tendência, são opostas: o que é um bem para uma, e, ponamo, fndice de progresso, é um mal para a outra, e. ponanto, índice de regresso. Mesmo que não consideremos que uma forma de direito esteja destinada a suplantar a outra (a suplantação do direito público por pane do direito privado e a suplantação do privado por parte do direito público são apenas o limite ideal do processo) e continuemos a afinnar que direito privado e direito público estão destinados a conviver no mesmo sistema, uma coisa é dizer que o direito público tem a função de salvaguardar o direito privado, de assegurar-lhe a eficácia, outra coisa é dizer que o direito público tende a eliminar, a reduzir o direito privado até fazê-lo desaparecer. Uma vez que nos damos conta do uso Wológico da grande dicotomia, torna-se mais clara e mais plausível a observação repetidamente fei1a por Kelsen acerca do caráter ideológico da distinção entre direito privado e público.11 O que tem caráter 8 O adjelivo /iMta!t {libt1aO deriva do s11bs1•n1Wo /ibtrallsmo (llberalismoJ, que dtnoi. liberali$· mo polflico. e o Mli-!IW> /iHrís&olliMrista) deriv• cio ' ubst1ntivo liNrismll (liberi$l'llOl.que dtno1• libenlismo ec:onõmko. PUl.I 9 SObrf u1ye1:, ver osdois •nlp Tllc'prillC'lplnofo lit.fal 1«/ol onm. ln "li l'Oll!lç0". XXXI, 1!166. p.60l- l8:e 0tdimvntn1Dgluri4fcot ordlno.-n10.Wffo.in"llPolitlco". lOClll.l968,p.693. 72l.

    IOPlnleulWJnen1ein1-ie,•"*'prop6sl10.ifo11nip1UP.l.SniU-•.to/uM.iot1•''"°'u.:10,.o, 1a drl dlrlllo•rhlla 1111ro. orpnbado pur U. Q,1TOnl. Eln.udl. l\rrlm. 196purt1deldirino.ci1., p.314 ITeorÍt,lpurt1dodirtilo, ci1.. p.312J.

    149

    grande dicotomia um uso hisloriog:ráfico, ou que é mau direito, segun· do insinua quem dele fat um uso axiológico. Na linguagem juridic1. um dos modos mais comuns de eliminar da esfera do direito tudo o que se considera que não deva pertencer a ela é adjudicá-lo à esfera do fato. Para quem entende ..direito~ como um conjunto de nonnas. isln é, de proposições expressas ou não-expressas que permitem qualificar comportamentos humanos como licitas ou ilícitos, passa a pertencer à esfera do fato qualquer evento não qualificado nem qualificável por

    aquelas normas. Assim. o processo de universalização de uma das duas panes da grande dicotomia ocorre, habitualmente, por meio da redução da outra pane a mero fato. Em uma concepção priva.tista do

    direito, as relações de direi10 público sào expulsas da esfera jwidica como relações de poder ou de força que, como tais, subtraem-se à.s

    regras válidas para as relações de direito privado. Em uma concepção publicista, as relações de direito privado são expulsas como relações de mera conveniência ou de oportunidade, como relações sociais genéricas não protegidas pelo sistema normativo estatal. Na primeira concepção, o direito público é impelido para a esfera do extra-jurídico. Na segunda, o direito privado é relegado à esfera do pré-jwidico. Em um e outro caso, o verdadeiro direito é um só. A ciência do direito foi dominada durante séculos pela concepção privatista do direito, para a qual somente os institutos uadlcionais do direito privado são direito em sentido próprio. Um dos momentos culminantes dessa concepção foi a doutrina do contrato social. O contratuallsmo. como bem observou Hegel ao criticar a sua legilimidade, 13 pode ser considerado a conseqüência extrema da tendência predominante de pensar todo o direito, e, ponan(Q, também o d ireito público, por uma das categorias fundamentais do direi10 privado,

    I] ~t •u• obta dt ju,"entudt. O~rdir,.ois.M'n.ul>tt/tlitlttn &halldlunrStltUnda N4tutrtthU. td. ~.\1l.p...OS(U.d.l!. Scrlt1idiftJ044ff,ackldirltto.organi111dapor,,,_Negti.lACtne.U..ri. l962.

    p.1 101. Plni ulltrit>rn pormcnoR"'. rr~•o o lricor 10 mtu aMllO /#rp/ tllflWIUlturo/il'"o. in "lfo1>todi filo1oOíla". Xl.Vll. L !l66. 11.:U17·91"1 ~toj...n11uRlivno".inbmdost!ObrrH'S'fl · dlrr/10. J«~adrr/1~/. f.uadc~ 2 . ...t. nnd. rior1. h iilSfrgio Henr1q~ e Carlos NtlMln Courinha. Slo Paulo. BrlsiliniK· Unesp. l!r.l:"o. p.?.Vi~•\

    150

    como a tentativa suprema, permitam-me a expressão, de privatizar o l!ltado. A medida que se afumam, em lugar disso, as teorias estatalis18s e imperatlvistas, para as quais o direito é comando do soberano. Dto é, daquele que detém o monopólio da força em uma determinada 10Ciedade, o direito privado passa a ser considerado direito apenas como direito público, o que equivale dizer que todo o direito é público. e a distinção entre direho privado e direito público é tão-somente uma distinção cómoda que. na realidade, nada distingue. O que as juristas continuam denominando de direito privado não seria outra coisa senão um ramo do direito público. Em vez de privatizar o Estado, publiciz.a-se o individuo. Em vez de observar o Estado do

    >

    1

    ponto de vista da autonomia dos indivtdu.o s. observa-se o individuo do ponto de vista da autoridade do Estado'. Um exemplo ainda mais apropriado da influência que a predomináncia da imagem privatista ou da iJJ:lagem publicista do direito exerceu na teoria do direito é o co"iitraste entre teoria do direito como relação e teoria do direito como instituição. Como se sabe, a teoria institucional nasceu, tanto na França quanto na Itália, de jwistas provenientes do campo do direito público, para os quais o direito se apresentava, mais do que como c.onjunto de regras para o estabelecimento de relações de convivência, como conjunto de regras para a coordenação de ações convergentes voltadas para a reaJlzação de um fim, isto é, como instrumento de organização com vistas a um objecivo comum. 14 A teoria do direito como relação entre dois sujeitos predominou enquanto a teoria geral do direito foi moldada pelo direi•o privado. A teoria do Estado como pessoa jurídica, que permitira a aplicação do conceito de relação jurídica à relação entre indivfduos e Estado, foi uma tentativa de construir a dogmática do direito público à imagem e semelhança da dogmática do direito privado. Quando os publicistas, cada vez mais insatisfeitos com o antigo jogo, entraram no campo de batalha, a imagem do direito como relação l 4 fa.&uriau.kl .. p.ISS...9".

    instiruclonaJista podia enconuar um auditório bem disposto. mas. n• autores aos quais o estudioso inglês se referia ainda eram Hauriuu " Renard, estranhamente não Gurvitch e, menos estranhamente. m\n Romano. 7 Mesmo levando devidamente em conta a tradicional igno · rância da douuina juridica francesa e inglesa em relação à doutriuu italiana, é preciso reconhecer que não devia ser tão natural para um estrangeiro sair em busca de uma teoria antiestatalista na Itália, nulo anos de fascismo imperante. Não obstante o prestigio de que sempn• gozou Romano como jurista, a sua teoria geral do direito. exatamen· te porque era percebida em seu aspecto predominante de teoria do pluralismo. não podia ser aprovada por um regime consagrado ao culto do Estado. t sintomático o fato de que, em 1940. quando foram publicados os quatro volumes dos estudos em sua honra, Giuseppe Bonai. à época minisuo da educação nacional do governo fascista,

    preíaciou·os com algumas páginas nas quais sustentava que a crise do Estado da qual partira a doutrina pluralista agora já escava supe· rada pelo fascismo e que, de qualquer modo, os exemplos de Estado pluralista dos quais se servira Romano :.. a sociedade medieval e a sociedade européia dos primeiros anos do século- nada tinham a ver com o Estado corporativo, que "representa o oposto das situações. para as quais não se pode falar de plura.lidade".8 O ex-sindicalista revolucionário que se tomara teórico do Estado fascista, Sergio Panunzio, já havia afirmado com muita clareza alguns anos antes que, se era verdade que a teoria do pluralismo era um episódio ligado ao nascimento do sindicalismo, agora já era um episódio superado, uma vez que o sindicalismo puro se uansformara 7w. hm lt.'ill.las poHl.lc..-: ··•.. se/ili destjM I que o homem 'popular' nlo se 1ome homem ·vu1g1r": que 'o homem quillqucr' n.io se compone como homem ú.bio e prc"nda com.andar.~ mesnu• quando de\·eriil obedea:r: que. cm suma. o mr.nqOllo e bonachlo 'homem da escn.d.1' nio assum~ ocnmponamentodoemepico1o"homemda pnça", dete rminando a fáeil de:R"teraçiodad""ocr:• eia em odocf'llcla· lp.2.15), O fra~mcnto u aza d u a de julho de 194S. li bp...ci..Jmirntir nu 1.1ue cuoccmc aus lilW.olot.. Romano n preocupa cm e$1abele(ei uma ddi1Ui· 11çào preel$lli;le fron1tiras.deiundnclaro queaquilnque dizemo~ fllósofo1 M"1hrendlrri1opnd1· •t\'letimponan1~.masnln1r1Uqualq11crinteie..stp&I bnovv,. e um11 pll-411 de tu~inci• o;.6unie1 (que 1N.i5

    ude do qUI! C\ln). porG. TNUI J 0001. n.)S,S, Hlt-mbrode l'7S.p.38.s.lnll t1oidentrdoln1t-1aK"a.u.ipdo noti.o 1ema. AC:OIKl.lta!;todo \lloc:ulo mt~ 1 rooSOn !lw es1a na Jlmplts tníast de que at~sociai,que inttressam diret1mtn1e aodirei1o públiro nil'l!õf'tuurem nas que1tmpor l'lrili olndl\1duo. de um lado. o Uu1doe ascomunldades 1..rti1orlals rnenures. de ouiro. Cllmu seria 1gtalmenitc:on1rilirioaolnllfevl!UnteeMgUrop~ histcllieodequeanouaciviliuçioderl·

    "'1U

    JIM.Cll'ldir dalu úJ1lmas. da mesma ro11na p&i«f C:JiCMtlil dtmtnlar e íundunmt.al ltvtit

    mi consid~1"

    tarnbtm u orpnluçÕf'I

    SOrrnl'ti k und Wl.iologie dr~ ruht~·.

    Dunckcrundllumblot. llcrli m,1970. !'i R. WM.n•, lkr ~11wdrti~ Stand der ,,.;,,~,. 1n·1w1.-1,,,., ito • fl«hl~lheor~·. 1, 1970, p.69·9S.

    183

    No entanto, de Kelsen em diante, e, sobretudo, por meio de Kelst•n. os problemas da jurisprudência 1eórlca adentraram o cfrculo d;u• discussões gerais sobre me1odologia, ética e meta-ética, lógica e. tlr modo mais geraJ, filosofia da ciência . Um exemplo convincente e siM nificativo: no amplo compêndio de problemas de lógica e filosofia d11 ciência, dirigido por Jean Piaget para a ~Encyclopécüe de la Pléiade·, nu breve parágrafo em que é introduzido o problema da ciência jurídica. o único ponto de referência é o sistema Kelseniano, a propósito do qual se diz:" ... o direito constitui, em si mesmo, um sistema de nor· mas, cujas aniculações e construtividade foram trazidas à luz com grande profundidade por H. Kelsen". 6 O que faz da teoria pura do direito um momento decisivo da

    jurisprudência teórica, e, ponanto, uma e1apa obrigatória dos es1udos de teoria do direito, inclusive para os reticentes, são alguns traços fun· damentais, seja quanto ao método, seja quanto à perspectiva sobre o

    próprio objeto. seja quanto à implantação 1eórica geral da disciplina. os quais a teoria pura do direito tem em comum com as teorias gerais que se desenvolviam, aproximadamente nos mesmos anos, em outros campos das ciências humanas. Atiterarura kelseniana, embora vastissima, jamais se deteve com a devida atenção neste ponto, isto é, no fato de que a empreitada cientUlca de Kelsen desenvolve-se em

    consonância com as grandes empreitadas cientificas de seu tempo no campo das ciências sociais e com elas panilha algumas características fundamentais. Os habituais confrontos entre a teoria de Kelsen e outras teorias do direito, infelizmente, não vão muito além de corretos, mas estéreis, exercícios acadêm.icos, sem conseqüências relevan tes para uma melhor compreensão do sistema kelseniano. O confronto mais interessante e mais esclarecedor é aquele que o próprio Kelsen 6 J. Pv.GlT, Uslhw problttncs /Nlntlpaw Mnptsttm~da scitrtUS dt/'llummt. ln tortqut t l ro11Miuo11ttxi1111i/jqut,vol.XX11da•EncydopfditdcbPlfiadC'". f'lris.19&7. p.1.1171"0sdois principais problemas da tpislemotogi;I das citnci» humanas·. in l.ágico t tot1htdmtn10 citm{/K;o. 2 vols.. nad . pon. Souza Dias, Pono. CMlizaç.lo, 1980· 1981 ). Sobre a relação Pie~1 · Ktl6m.dr.G. CE.UJJU[~. lncidmzo tkll'tpiJtc1110fcfcil:I gnericll suita rtoria Mi /oMlimt mi dtl dirlffO. in W.M •• kon Pfqtl tM scitnuwcioli. 1-1 .'luova halia, fl~n. 2. cd .. Slo P1uk>. Manln.• Fontes. 2000). Kt~n disc111c a afirma1iva ót Rohcnn ~iclwls. segun!Jo o qual n faKitmo. nasu1ttndCncia•ntiparlunen111,•polano · sceml'ar..1u.eaniíu1a,considtr1ndoq~ap01111rade

    l'ar..11• na considtiaçào do p11lamcnto co~spondia il ~um lihrnl Cp.t6-7). O jub.o dr Mlchtls fundavil·SCtos kelsenianos metodologicamente mais imponantes, o Prefácio à segunda edição de Haupcprobleme (1923), termina com este augúrio: Talvez eu pos.s.a 1er esperanças de qiu oS nossos t$/Otf0$ no sentido de aprofundar filosoficamente os problemas da dou1rina do direito e do Es1ado, ligando.os aos problemas ondlogos das ou1ros cilncias e libe· rondo, assim, o nossa cilncio do seu isolonuuuo insano, itl$trindo-a. como membro digno, no sistema das cilrlcias, encontrem uma com to comprttns4o tambclm junto aos adwrsdrios. 11

    Também em Kelsen, o projeto de elevar a ciência do direito ao patamar das outras ciências. perseguindo o ideal cientifico da "obje· tividade" e da "exatidão", é acompanhado por uma concepção irra· cionalista dos va1ores, tão radical quanto a de Pareto e a de Weber. Se quer ser bem-sucedido em seu intento de construir uma teoria universalmente válida, o cientista deve manter os juiz.os de valor sob

    lfi mu. p.ICIV (l raduç:ioo i1aliaM p.I XJ.

    171tm1p/probltml', çít.. pJOUll.

    vigilância tanto quanto lhe for possível. precisamente porque os valores representam a esfera do irracional. Onde quer que o cientista deixe que se insinuem as próprias preferências, expressas em juizos de valor, a empreitada científica está destinada ao fracasso, pela simples razão de que os juízos de valor não são passíveis de ser sub· metidos aos controles constitutivos do universo cientifico. Em ouuas palaVTas, a empreitada científica só é possível quando procwa ser avalorativa. NaturaJmente, para não se deixar influenciar pelas pró· prias preferências élico-polllicas, o cientista deve renunciar à preten· são de oferecer receitas para a ação. A tarefa da ciência é descrever, e não prescrever. Qualquer um que tenha alguma familiaridade com as obras de JCelsen sabe muito bem a irnponàncla que tem, em sua concepção da ética do cientista, o comp~omisso de nada prescrever: Kelsen leva esse compromisso tão longe a ponto de estendê-lo da teo· ria geral do direito, na qual parece mais óbvio, ao rrabalho dos juristas. que deveriam limitar-se a propor as várias interpretações possíveis de uma norma ou de um complexo de normas, já que qualquer escolha, implicando uma valoração, seria cientificamente insustentável. 11 O valor por excelência a que o direito está relacionado é o valor da justiça. Como todo valor (ou, mais precisamente, como todo valor último ou final), a justiça não é passivei de ser submetida a qual· quer fonna de conuole empirico ou racional. Uma das afirmações recorrentes em Ioda a obra kelseniana é que a justiça é um ideal irra· cional. HJustiça" - escreve ele em Reine Rechtslehre, no significado que IM i próprio e q ue a diferenrii1 do direito, expressa {.. .) um valor aluoluto. O seu conteüdo mio pode ser determinodo pela doutrina pu_ra do direito. Ali1:, ele rufo 1 de modo algum determind11el pelo conhec1mer1to nuioruJI.

    E mais adiante: LI ~ali~'ªkktlrawd1m R«ltlSbtfriff. FnM Oru!icke. UpU. cvten1, 1923,p.l23.

    quecon~moscomo um sisum1u. ,;·impossível apreendera narureza do direito limiumdo a mnsa ai.ençâo à regra singulor isoladanunte. ÀS relo· ções que ligo.mas normas pdrticulaTN de um ordenamnito jurldicoentrv 5i sdo, rwen1anro. t!Slem:iaü à natureza do direito. Somemecom base em uma e/ora compreensão destas relações que constiluem o ordenamemo jurldico' poutvel enurnkr plenamenre a naturao do direito.)()

    Nunca foi dado o devido destaque à novidade deste uso de "sistema" na teoria do direito. Na linguagem dos juristas. há um significado tradicional para essa palavra, segundo o qual •sistema" não signtn-

    ca nada mais que o conjunto das divisões da matéria jurídica para uso didático, mais do que ciendfico (o chamado sistema extemo).31 Quanto ao sistema incemo, a única concepção do ordenamenro como sistema que surgiu entre os juristas do sécuJo pa~do foi a de ordenamento juridico como sistema funcional. Com Kelsen, ou seja. com a teoria di· nâmica do ordenamento jurídico, aparece, pela primeira vez na teoria do direito, a represen1ação do ordenamento juridico como wn sis1ema que possui uma cena estrutura e que é caracterizado precisamen1e por possuir esta. e não aquela estrurura. O tenno ·esrrurura" é usado pelo próprio Kelsen em algumas passagens cruciais da sua teoria: "Como ciência" - a doutrina pura do direito - "considera-se obrigada apenas a compreender o direilo positivo na sua essência e a entend~-lo mediante uma análise da sua estrutura (Scruktur)~. 32 E, mais adiante, a análise estrutural é claramente colocada em contraposição à análise funcional dodireico: Esta dourrina /a dourrina pura do direito/ ndo considera, de faro, o objetivoqueé~neguidoealcançadopormdodoordenarMntojurídi·

    co, mas considera a~nas o ordenamento jurldico mesmo: e considera

    30c;ru.p.3(11:11duçiol!aliana.p.ll.

    31 Sobreas.,...l'IOÇll)esdtns.m.~cfr. G. L.vzNio.t'ir1~f4rtm#Rt.tldtfla ltgr. ~pkhell. 1\lrim. 1965, apecialmcntt o gp. I; para 111N hbtófil dl iMil de W1mw. com p11rtlcularMmçlot.ciimc:lrijurldk.leit0dim10.dr. M. llloM.-o.~rsm.m1101Wldlrlrro.vol. 1. Collippkhdll.1\lrtm. !969. TamWmdewnldvl~~~o1emanomMioPrr1111 ...,._Ili r.oriaStnnairdrl dlrlno. in Sn.dJ ln nwwforlodl EnricoCui«ilanli. Ndua. 1975. p.I~ nR!ILl . §9.

    199

    estt orde1111n11mta na autonomia própria do uu conteúdo de untidu (Sinngehalr), e ndo relatiuomente a este seu objctivo.l.1

    Foi corretamente observado que "não basta simplesmenlt• . 14 fazer uso do termo 'estrutura' para nos tornarmos estruturaJistasM contudo, é inegável que a tendência de Kelsen a considerar o direito como um universo esuuturado responde à mesma exigência da qual partiram as pesquisas estruturais em lingtHstica e antropologia. Kelsen dedica-se a reftetir sobre qual é a estrutura especifica do sistema jurídico em relação a outros sistemas normativos, sobre· tudo quando enfrenta diretamente, em um ensaio de 1928, o clássico problema da relação entre direito natural e direito positivo. Para distinguir o sistema do direito natural do sistema do direito positivo, Kelsen inuoduz a distinção entre sistema normativo estático, cuja1t regras estão interligadas pelo conteúdo, e sistema normativo dinàmi· co, cujas regras estão interligadas pelo modo como são produzidas. O ordenamento jurídico é um sistema d.inàmico.15 Em um sistema estático, diz-se que uma norma pertence ao sistema quando é dedutível do conteúdo do postulado ético que está em sua base; em wn sistema dinâmico, diz-se que uma norma pertence ao sistema quando é produzida de acordo com o modo previsto na norma que institui o poder soberano (a chamada norma fundamental). Não obstante as criticas assinaladas, e não obstante os acrésci· mos e aperfeiçoamentos que sofreu e que ainda podem ter lugar,36 lJ1111/.1.tl4."-R.Tlo~mdluSi~fpot"un.ortunz"[estn.11W11)(1raduç:ioll.lbN.~l!IS2.p.4QJ.

    011'Miu1ori1allilnodaHg11ndirdlçlo.M. l.oM110,tnduz a tlpic:i1explnlio.lotrbcnlanaSru.fi'nboiu («>1· muMlM'ormd~ loonmuçloemsr-us! pot"mu/TlllDrardllae' les!rurun hiatiquiol. ~tan· dolllgunsuechosnosquaisopróp1klKn!en111i11otennoSlnltfurcomrftrrtnc1.aa:atamrntrllmnMru· çto em gnus [Qgrot/~ do ordmamemojuricllco (l.AdomiM f"'ID •ldirino. ci1.. p.XCOO. INAI Vtr KT no capitulo ·Em dirwçto • WN teoria Í\lncionalis11 do dini10·. l4M.l.n!iANo,op.cit.p.XOX l1' H. IW~rN, DW phlloiopli~lvn Cn.oiul~ br Naturrrliulmrr 11..d dn R«liapmirivtr"'"' (1929).queel1od1 uaduç.ao l1a.ll1n.a nu11~•CTLS. p.407 !"Ado..nrin&dodlftltO ru1ufldeo pMitMlmo juTldleo". in Tf'l'lri4~"'/dodiITiiotdoEsrado.1rad. pon. Luls Carlos Bo'lft, 3. td.. sao Paulo. Mllllns Fonlts. 2000[. CCl'. l.llmbfm ML2.. t t4.b.

    36 Altm do 1ntgo de lt Waltrr. )a c11.. d r. 8. Ao.11dmacon1idençlo: J. IW:. JhtC()nttp1of1:1 l..g.l$)$1#m. Cl:arendon Pm.s.Oxford. 1970; e C. E. N.CHOU~llON e E. 8tJl.(,"11";11>. Nonnotl~ JY$rtnu. Spril'lger. Vltna, 1971.

    3a R. A. MrtAU. HtuU Kdun, cit., p.J6.

    De qualquer maneira. é certo que a instiruição de leis con!tl tucionais hierarquicamente superiores às leis ordinárias, isto é, àqur las normas do sistema que eram tradicionalmente consideradas ... normas últimas, permitia. ao introduzir um grau ulterior no sis1e11w normativo, ver também os demais graus com maior nitidez do qur ocorrera até então. Não por acaso, Hart, um teórico do direito qur consuói a sua teoria com base na constituição inglesa, à qual fol111 o grau superior das normas constirucionais, detem-se na distinç;ln entre normas primárias e secundárias e re8ete, sem aprofundá·ln, sobre o principio da estrutura hierárquica do ordenamento (dess.· pomo de vista. a teoria de Han constitui um passo atrás em relação à teoria de Kelsen) . Com maior razão, a teoria dinâmica do ordena· mento juridico dificilmente poderia ter nascido da reflexão sobre u constituição de um Estado absoluto ou de uma sociedade primitiva. Contudo, isso não impede que a representação do ordenamen10 jurfdico como sis1ema hierárquico com muitos graus sirva para compreender melhor 1ambém os ordenamentos ma.is simples, isto é, pa· ra emender que também estes têm uma estrutura e constituem um sistema, não sendo, pois, um amontoado de normas. CA anatomia do homem, diria Marx, serve para compreender melhor a anatomia do macaco). O que, pelo contrário, até agora não foi observado - ao menos não que eu saiba - é que a teoria k.elseniana sobre a estrutura imerna de um sistema jurldico pode ser proveitosameme comparada com a contemporânea teoria weberiana do processo de racionalização (formal) do poder estual, da qual deriva aquele tipo de Estado adminis1rativo ou burocrá1ico cuja legitimidade é dada pela forma de poder que Weber, com razão, chama de ''legal", em virtude do nexo que ele estabelece enne racionalização e legalização. A construção em graus do ordenamento juridico bem pode ser considerada a representação mais adequada daquele Estado racional e legal - racionaJ porque regulado pelo direito em todos os níveis - cuja formação constitui, segundo Weber, a tendência do grande Estado moderno (capitaJisla

    e não capitalista). Uma vez mais, isso não significa que Kelsen, não obstante a sua pretensão de elaborar uma teoria geral do direito válida para todos os sistemas juridicos de todos os tempos, na realidade teorize uma forma histórica de Estado. Significa que uma teorização acabada do sis1ema juridico como sistema norma1ivo complexo não poderia nascer senão de uma contínua reflexão sobre a formação do Estado moderno, no qual a racionahzação dos processos de produção juridica toma mêlls evidente a estruruca piramidal do ordenamento, ou seja, permite perceber com maior perspidcia que aquele ordenamento normativo a que damos o nome de ordenamento juridico é um universo estruturado de um certo modo. O que aqui importa destacar é que, quando Kelsen descreve a progressiva juridificação do Estado modemó, capaz de levar à famosa ou ramigerada redução do Estado a ordenamento jurídico. revela o mesmo processo que Weber percebe na formação do poder legal, que acompanha o desenvoMmento do Estado no mesmo periodo histórico. O Estado é o próprio ordenamento jurídico (Kelsen). porque o poder é completamente legalizado (Weber) . O que distingue o Estado como ordenamento juridico de outros ordenamentos jurldicos. como os ordenamentos das sociedades pré-estatais ou o ordenamento internacional, é um certo grau de organização, ou seja, a existência de órgãos "que trabalham segundo as regras da divisão do trabalho para a produção e aplicação das normas de que ele é constitufdo". 39 Quando Kelsen especifica que a presença dessa organização para a produção e aplicação do direito comporta a conseqüência de que a relação definida como poder es1atal diferencia-se das demais relações de poder pelo fa10 de ser ela mesma regulada por nonnas juridicas, parece descrever aquela forma de poder legftimo que é, precisamente, o poder legal, cuja principal caracterfs1ica é ter aparatos especializados, como o aparato judiciário e o administrativo (Kelsen

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    39 RRL2. S~I .•.

    203

    ainda acrescentaria o aparato legislativo), os quais agem nos limites de regras gerais e absuatas postas pelo sistema. Não há dúvida de que a descrição kelseniana encontra-se em um nivel superior de abstração em relação à weberiana. mas Kelsen propõe-se a elaborar uma teoria geral do Estado, enquanto Weber descreve um tipo ideal de Estado, que não é o único tipo historicamen· te existente. Não diferente de Weber, Kelsen se dá conta da enorme importância dos grandes apa.ratos administtativos para a fonnação do Estado moderno. Contudo, enquanto Weber identifica a burocrati· zação da maioria das atividades do Estado como a especificidade do poder legal. Kelsen distingue nela uma fase daquele processo de pro· gressiva centraliz.ação das atividades de produção e aplicação do direi· to. na qual acredita consistir a característica do ordenamento juódico estatal (processo que ele denomina de passagem do Gericht:sstaat para o Verwaltungsstaa().fCI Pode-se também acrescentar que, para além dessa convergência entre a concepção teórica de Kelsen e a descrição weberiana do processo a que tende o Estado moderno, era claro para ambos que o pomo de vista do jurista é diferente do ponto de vista do sociólogo. O que Weber diz sobre o direito, como sociólogo, ou seja, que um ordenamento jurídico passa a existir quando se forma, em um detenninado grupo social, um aparato coercitivo, pode ser literalmen1e subscrito por Kelsen. No entanto. Weber poderia subscrever a tese kelseniana segundo a qual, para entender o que é o direito, é necessário observar não as regras, mas o seu conjunto, isto é, o ordenamento como wn todo.41 4. O significado histórico da obra kelseniana está ligado à análise estrutural do direico como ordenamento normativo especí·

    40 HRl J. ~ 411.t·. ~ RHl . 2.§ 41. li. 41 Orna rri~1~nci1 a Kel~cn. mas apenas t m re~Sn 10 Wrrirrloliv&mw. encon11a-~ no ensaio sobrt o ~n,..mtmo jurídico - bcri.ano de K. [l.."11. •1.1.u Wrbrr ot.. R«h~philoloph '"'" lli'Chwmiol~. in Maz Wrl•~ í'.Nm:hrniMch•ifl drr 1..du,if· Ma.iimili111U· U11ive" ilii1 MlincM " 1964. Duncker & Humbloc. Uerlim. 1'66. p.67·83. z um /00. Wi......,rhlv , ,.;,..,,

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    fico, cuja especificidade consiste, precisamente, não nos conteúdos normativos, mas no modo pelo qual as normas estão unidas umas às outtas no sis1ema. Esse tipo de análise constitui, também, o limite da 1eoria pura do direito. Está claro que o desenvolvimento da análise estrutural ocorreu em preju(zo da análise funcional: em comparação com o destaque dado por Kelsen aos problemas estrucurais do direito, é extremamente restrito o espaço que ele reservou aos problemas relativos à função do direito. I! significativo que precisamente o uecho já citado, no qual afirma que a teoria pura estuda o direico na sua estrutura, pertença a um contexto cujo objetivo é negar que essa teoria deva ocupar-se dos fins do ordenamento juridico. A razão pela qual Kelsen não se preo~upou com o fim do ordenamento jurídico está no fato de ele ter do direito, entendido como forma de controle social, uma concepção meramente instrumental, que, é necessário repetir. está perf~itamenre de acordo com o relati· vismo ético e o irracionalismo dos valores. Uma das afirmações recorrentes em toda a obra hlseniana é que o direito não é um fim, mas um meio. Como meio, pode ser usado para atingir os mais diversos fins, como ensina a história do direito. Entretanto, exatamente por· que serve para atingir os mais diversos fins, uma análise que parta dos fins, ou, pior, do fim (como a dos jusnaturalistas), jamais permiti· rá que se apreenda a essência do direi10. Para Kelsen, o direito é uma "técnica de organização social": a sua especificidade consiste no uso dos meios coercitivos para induzir os membros de um grupo social a fazer ou a não íazer algo. O direito é um "mecanismo coativo". O que é comum a todos os ordenamentos sociais que denominamos de jwi· dicos é a presença de uma organização mais ou menos centralizada para obter, recorrendo, em última instância, à rorça, a execução de certas obrigações de fazer ou a observância de certas obrigações de não fazer. Desse pomo de vista, entende-se porque o direiro pode ter os mais diversos objetivos: de acordo com as circunstâncias, possui 1odos os objetivos a que um grupo social atribui tanra imponãncia a ponto de considerar que devam ser alcançados recorrendo até

    1.

    mesmo à força. Para usar a terminologia dos sociólogos, que, alit!i, Kelsen não emprega, o direito é wna das possíveis formas de conrroh: social, mais especificamente, é a fonna de controle que se vale do usu da força organizada. Considerado o direito como meio, e não comi> fim, e definido como específica técn ica social, a análise funcional du direito logo se exauriu. A função do direito é permitir a consecução daqueles fins sociais que não podem ser alcançados por outras for· mas (mais brandas, menos constritivas) de controle social. Quais sãu esses fins varia de uma sociedade para outra: é um problema hiscóri· co, não um problema que possa inceressar à teoria do direito. O problema funcional não é de todo evitado. Todavia, nada mostra mais o quanto Kelsen desejava evitar comprometer-se demais com o problema do fim do direito do que a correção, -não leve~. 4 ~ íeita na segunda edição de Reine Rechrslehre, nos dois parágrafos da General theory oflaw and Sta te, em que deixara escapar a afirma· ção de que o direito tem, sim, um objetivo, o qual é a paz social: "o direito" - afirmara ele-Né indubilavelmence um ordenamento para a promoção da paz''.43 Uma frase desse tipo dá margem a uma discus· são teleológica: de fato, como o rganização da força monopolizada, o direito limita o uso indiscriminado da força~definindo-se a paz "como a condição em que a força não é usada~. deve-se concluir que o direito "assegwa a p az da comunidade"." A correção "não leve" que ele introd uz n esse t recho da última obra consiste em refutar a paz como fim do direito e em colocar em seu lugar um conceito bem m ais genérico e menos comprometedor, como é o de "segurança coletiva~, mani· festamente derivado do direito internacional: como organização da força monopolizada, o direito asseguraria não tanlo a paz quanto a segurança coletiva, que não é, ela mesma, a paz, mas "visa à paz~.•s Nes.te sentido, pareceria que a pa.z não seria o fim do direito. mas 42 RJtL Z. p.40(1~duçtoh1lian1, p.S I ).

    O c ns, p.21 flraduçioitaliana. 11.21). 44c;TLS,p.21 (1raduçloltaliana, p.21). 45RRL2.p.391mr.duçJioi•ali1n1. p.SO).

    uma espécie de idea1·1imite a que o direito tende. logo em seguida, com efei10, Kelsen apressa-se em especificar que, nos ordenamentos juddicos primitivos, fundados no principio da au1orutela (e o direito internaciona1 é um deles), ~não se pode falar seriamente de uma pacificação, ainda que apenas relativa. da comunidade jurfdica".46 Dai a conclusão: "Não se pode com razão considerar que o estado de direito seja, necessariamente, um estado de paz e que assegurar a paz seja uma funçao essencia1 do direito".47 Ou seja. o direi lo tem um fim , mas é um fim minimo, intermediário, um fim que tem valor instrumenta1, porque serve de condição preliminar para atingir outros fins. O direito não cem um fim último (como a justiça, o bem comum, o interesse coletivo). O seu fim não é sequer o fim hobbesiano da paz, que já é manifestamente um fim intermediário. No rétrocesso da busca desse fim minimo. da paz à segU1ança coletiva, Kelsen revela, em suma, a caçada impiedosa que empreende contra qualquer tentativa de determinar, para empregar expressão deiherinS. a "6na1idade do direito... Kelsen se dá conta perfeitamente de que, do ponto de vista da análise funcionaJ , as suas afirmativas nada fazem aJém de reproduzir. mesmo que de maneira ainda mais drástica e ideologicamente sempre mais esterilizada, um dos fundamentos do positivismo juridico. Introduzindo o debate sobre a coação, na primeira edição de Reine Rechrslehre, tem o cuidado de advenir que "'neste ponto, a doutrina pura do direito continua a cradição da teoria positivista do direito do século XIX".48 Sob este aspecto, que é precisamente o aspecto funcional, parece não ter nada de particularmeme importante a dizer. Os problemas aos quais o positivismo juridico não respondera eram aqueles relativos à estrutura desse mecanismo coativo em que consiste o direito. Por isso. posto de lado o problema da função, volta sua a1enção essenciaJmente para a análise estrucural. Mas isto faz

    46RRL2. p.39(uaduçiohaliana. p.>OJ. 47 RRL 2. p.40 (tn1duçloitalia"a.p.Sll

    .a RRL 1. ~12

    207

    com que, enquanto nesta ana.Jise a sua contribuição é fundamental e não mais contestada - a não ser por jusnaturalistas tardios (que, aliás, estão desaparecendo) , os juristas soviéticos, devido a precon· ceitos ideológicos dillceis de morrer. e aJguns dentre os mais radicais reaJlstas norte-americanos, devido a uma espécie de fobia contra qualquer tipo de teoria geral -, a anáJise funcional permanece, na teoria kelsenlana, mais ou menos estancada no ponto em que ele a encontrara, exatamente no momento em que, com rapidez. a socie· dade se ttansformava nos paises industrialmente mais desenvolvidos (transformação que faria aparecer uma diferente função do direito, a qual os jwistas do século passado sequer puderam prever). Não se pode, por certo, censurar Kelsen por não ter percebido um processo em curso, que. de resto, foi pouco observado inclusive por aqueles que vieram depois dele. Contudo. se tivéssemos de fazer um balan· ço, seria inevitável constatar o quanto a velha teoria do direito como ordenamento coativo, acolhida in roro pelo fundador da teoria pura do direito, é hoje inadequada. Como tive a oportunidade de afirmar alhures. Kelsen nunca teve dúvidas de que a técnica de controle social própria do direito consistisse na ameaça e na aplicação d~ sanções negativas, isto é, das sanções que infligem um mal àqueles que praticaram ações socialmente indesejáveis. Todas as vezes que repete a sua definição do direito como ordenamento coativo, tem o cuidado de especificar que o direito é tal porque está em condições de provocar o mal. ainda que sob a fonna de privação de bens ao violador das normas. Ordenamento coativo e ordenamento baseado em sanções negativas são, na sua linguagem. sinónimos. Hoje, no entanto, a constatação de que a função do direito deixou de ser exclusivamente protetivo-repressiva, desde que o Estado deixou de ser indiferente ao desenvolvimento económico, impõe-se cada vez mais ao observador sem pré-conceitos. O instrumento juridico clássico do desenvolvimento económico, em uma sociedade na qual o Estado não intervém no processo econOmico, foi o negócio juridico, a que o direito, precisamente como 208

    ordenamento coativo, limita-se a garantir a eficácia. Mas a partir do momento em que o Estado assume a tarefa não apenas de controlar o desenvolvimento econõmico, mas também de dirigi-lo, o instrumento idóneo para essa função não é mais a norma reforçada por uma sanção negativa contra aqueles que a uansgridem, mas a diretiva econõmtca. que, freqüentemente, é reforçada por uma sanção positiva em favor daqueles que a ela se confonnam, como ocorre, por exemplo, nas denominadas leis de incentivo, que começam a ser estudadas com atenção pelos juristas. Daf a função do direito não ser mais apenas protetivo-reptessiva, mas também, e com freqüência cada vez maior, promocional. Nos dias de hoje, uma análise funcional do direito que queira levar em consideração as mudanças ocorridas naquela "especifica técnica de organização social" que é o direito não pode deixar de integrar a sua função promocional ao estudo da sua tradicional função protetivo-repressiva.A meu ver, essa integração é necessária se o que se deseja é elaborar um rTiodelo teórico representativo do direito como sistema coativo. Trata-se de passar da concepçâo do direito como forma de controle social para a concepção do direito como forma de controle e direçiJo social. Isso posto, é preciso acrescentar, ainda, que as mudanças ocorridas na função do direito não anulam a validade da análise estrulural 1al como foi elaborada por Kelsen. O que ele disse acerca da estrutura do ordenamento juridico permanece perfeitamente de pé, mesmo depois dos desenvolvimentos mais recentes da análise funcional. A construção do direito como sistema normarivo dinâmico não é minimamente abalada pelas revelações que dizem respei10 ao fim do direito. Para ela, uma norma é jurídica sempre que tenha sido produrida nas formas previstas, isto é, em conformidade com outras normas do ordenamento, em particular aquelas que regulam a produção das normas do sistema. Que uma norma vlse reprimir ou promover um detenninado comportamento não tem, em relação à estrutura do ordenamento. qualquer relevãncia. Afüfis, a especificidade do ordenamento jurldico em relação a outros ordena mentos sociais continua,

    209

    uma vez mais, confiada à especificidade da sua estrutwa, e não à su• função, que, qualquer que seja, realiza-se na fonna que é própria • um ordenamento dinâmico. A guinada que a teoria pura do direito representou para o desenvolvimemo da jurisprudência teórica é, em suma, uma daquelas guinadas para aJém das quais é passivei avançar,

    mas não é Ucico reuoceder. Prova disto é que a maior obra de juris· prudencia teórica depois de Kelsen, a de Han, prosseguiu no mesmo caminho, buscando na estrutura específica do ordenamento juridico, caracterizada pela "união de nonnas primárias e de nonnas secundá· rias", a determinação do "conceito do direito".

    210

    1o

    TULLIO ASCARELLI

    SU'v1 Ílf?10- l. Re0ex6t'$inrrodut6riase conclusivassobn: • U.himaobra2. O irm:resse predominan1e pelo problema da in1etpre11çlo e da comparaçto juridk.e primeiro$ escriios menores - 3. /\ panicipaçlo na lula anliía.scista por meio da colaboraçlo nas revistas "SNdi politici" e "Quano smo" - 4. Breve resenha dos escrilos jurídicos entre os aoos de 1926 e 1946 - 5. Os escrhos de ceoria gftal depob de 1946 e a critica ao positivismo jwidico - 6. Cdlica à uadicional 1eoria das íontrs. em uma visão antiformalista das rela~s enue din:i10 e sociedade, entre direito e economia - 7. O problema da intetpn:ta~o - 8. Em particular, crllica ao

    "º'

    logicbmoe lpfOximaçãodaescola da -notívelle rhttorique~. de ~relman poUtica e in1eres.ses culturais ap6s o retorno do exílio a1t a sua mone - 10. Julzo abrangen1e sobre a obra e a pel'$0nalidade de Tullio

    - 9. Ação

    Ascan:Ui .

    1. O último escrito de TuWo AscareUi ances de sua mone, ocorrida prematuramente em 20 de novembro de 1959, foi a ampla introdução

    a uma edição de textos raros de Hobbes e de Leibniz.1 O livro foi publicado postumamence, com organização e notas de Giorgio Bernini e Domenico Maffei, e apresentação do discípulo Michele Gianoua Era o primeiro volume de wna coleção de "Testi per la storia dei pensiero giuridico", que, idealizada há tempos. fora objeto de reOexões e revisões constantes nos últimos anos. Nosso interesse comum pelo pensamento jurkl.ico de Hobbes e, sobretudo, pelo Dialogo sul dirino comune. a cuja publicação nos apliávamos contemporaneamente sem que um soubesse do outro, deu ori1Tii. HOll•'·'· A Dlalop

    17 Jn"flivfqaJcl Jiti!tnc1i . li1alfipis 111tUltl1M~,...GobeUi(l>n1C"n ll: "~ con«l.eahbtó1iio\klpós·g._1r.ocomolut1da•

    claf.Ses médiu ennu1 u dtmais. AIJ c1>nu1rin. t unia 11111 tnfl\"ckuu!s t1Wtlia.c umas nackl,..lisia.-. m111a.s >0eial1>1.s...". k.dll&S tç'Vl>lOdu•çana5 deA$carellicnde~adas1Gobtnl:

    com cabtçalho do Minis1dio das Hnanças. llll'fdo

    l,llNIÜZI dtman;ode 1924 (tmpllptl d8' ptlll6a dt çom a qual

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    aumw.

    As.Q~lienvlaap1óp1i;i1ua de 5u~ri~oa"l..aRiwhu.iontliberale•: O\llnldelldtl11Modtl92S

    231

    continuou mantendo contato com o entourage gobeuiano. Co1111.1 :;.• sabe, Gobeni constituira, em julho de 1924, durante a primeira crir." que explodiu depois do delito Maneoui, os Gruppi di Rivol11;;u1111• Liberale (Grupos de Revolução Liberall. Em uma carta de Umbcn., Morra a Gobetti, datada de 25 de outubro de 1924, em que é no1it'i:1 da, com detalhes, uma reunião do Grupo Romano de Rivoluziunr Liberale, relata-se a presença. entre os demais (üebmann, Ncl·1:hi, Nicoletti, Ascoli, Sotgiu. Plncherle. Bosl), deTullio Ascarelli, que 1~s 1:1 va entre os quinze que permaneceram até o fim da tumultuada n~ u nião, depois da secessão de sete dos presentes, que discordavam tlu teor da ordem do dia. 19 Eu não saberia dizer se Ascarelli colaborara com revistas poli ticas nos dois anos subseqilentes. durante os quais cultivou com par· 1icular fervor os estudos juridicos. Por certo. continuou man1end11 vivas relações com os centros do antüascismo mililante, como o llo · rentinoMNon mollaren INâodesistirl. Retomou, com renovado ardor. a atividade de escrilor polftico nas colunas de

    ~Quarto

    statoH (Quar111

    Estado!. revista fundada em Milão por Cario Rosselli e Piero Nenni. publicada em 30 nOmeros. de 27 de março a 30 de outubro de 1926.'uo Colaborou nela com seis artigos (dois histórico-crf1icos. assinado:com o próprio nome, os outros quatro programáticos. politicamen1 011•1'ÜJCtJ. ?1 de julho de 1'26. 8"iN!do C:uH ~I flllAAl\#I; li ua/OJT dt:I

    º'

    ao socialismo. que nos anigos de 1923 pan•n:1 1111r:11111 • u1~ · 1.1~:111 ,_. ,·ui · tural, agora se torna aceitação real do movimentu. 011, m;1b 111rd~a · mente, do partido que ressurgiria das cinzas do velho partido, ;i..:ura cm dissolução. e criaria a nova democracia italiana. Ascarelli partilha o ponto de vista dos neófilos e dos renovadores, que poderia ser expresso pela proposição: o socialismo está morto, viva o socialismo. O fascismo fragmencou a história da Itália em duas partes que jamais poderão ser reunidas. O fascismo arrastará, na sua ruína. toda a Jtãlia de ontem. da qual fora uma continuação. A renovação ocorreri\ com a democracia e o socialismo, ou, melhor dizendo, com o socialismo, que será a única condição para a instauração daquela democracia que, na Itália, jamais existiu. Entre uma luta com fins ime· t.liatos. que deve necessariamente descer ã compromissos mais ou menos realistas com a classe burguesa. e uma luta a longo prazo, que aceita o fascismo como fato consumado~ põe o pmblema da reno· vação radical com maior intransigência, Ascarelli propõe a segunda alternativa. Contudo, para renovar o país, antes de tudo, o socialismo deveri\ renovar a si mesmo. De que modo? Fascismo e socialismo represen1am não duas politicas diferentes, mas duas civilizações diferentes: o socialismo só será uma nova civilização quando souber expressar uma nova ética, uma ética superior, e propuser um novo ideal de homem. Qual seria essa nova ética, Ascarelli não sabia e não queria definir com detalhes demasiado precisos. Aliás. reconhecia que a edgência da nova clvllização surgia Mmals em sentido negativo, por oposição à atual, do que em sentido positlvo".42 Não nos ponhamos agora a discutir se essa êníase no aspec· to ético do socialismo seria um passo adiante ou. infelizmente, um passo para Irás, como já foi obse.vadoa rcspei10 da batalha combali· da por ·Quarto statoN bem em meio ao fascismo triunfante. Poderia l«ialimro. 7 de l~o Wot1ne1udolngi,lt>:>:romr0. um sistema por vir, um todo móvel e semovente no 1empo, uma espécie de corrente de rio que se avoluma ao longo do caminho, mas que é sempre o mesmo rio. Neste processo, a interpretação ê como o afluente que contribui para o crescimento da massa de água: mas. uma vez conHuido na corrente, dela não mais se distingue. A interpretação cumpre a própria função mantendo a conlinuidade do sistema. A discussão de Ascarelli sobre a interpretação movimenta-se sempre entre dois pólos, o da criatividade e o da conlinuidade. Infelizmente, esse conceito de continuidade, não obstanle o papel importante que assume na teoria, jamais foi desenvolvido anaJiticamen1e. Entende-se para que serve (para evitar o fácil abandono às correntes do direito Livre, is10 é, da criação contínua); mas não se enlende bem como deva ser compreendido. Continuidade 79 A. G. t:o~n. "Ordinamen10 glv1in•~llillfll ~' int(rp111t~çau. v, G. T•»tX lll. ''""ffir:~ncy uf 1ht /~/ mmn a11d 1,,,,,.11y 11/ tlit imtr1ir.1tr, in T11r Jsrari .trndl'lny 11/ 5':ff>1ICl'l 1111d llumnnirirs. Procmlings.1. n.::I. Jcru,..1Cm. 1~6J. p.l·Z2 (U l.l'l\U).

    Não há correme mecodológica amiga ou moderna ou reccmfssima que fuja à sua pontaria geralmente ccneira. Critica Hart e Tammelo, Coing e Klug. Em relação a cada um deles, indica afinidades e diferença. Sua crilica apresenta-se. cominuameme, ao menos em tr~ frentes opostas entre si: a frente do conceitualismo tradicional, cuja con1inuidade reconhece em recentes tentativas de redirecionar o raciocinio juridico aos esquemas da lógica formal (Magni. KJug.'1 81 e em algumas íormulações neopositivistas (faz referência, inclusive, a alguns dos meus estudos); 82 a frente do realismo sociológico, em que insere 1amhém a teoria da na1ureza dos raios como fonte do direito: e a frente do direito livre ou da criatividade desregulada, de que a confiança no juí:1..o de eqüidade é expressão tfpica e recorrente. Levando em consideração esses três alvos polêmicoS, a pars des"uensdo pen samemo de Ascarelli pode ser resumida nestas três afirmações: l) a interpretação não é lógica, e. portanlo, a chamada ciência juddica nada 1em a ver com as ciências formais; 2) a interpretação não é uma pesquisa factual, e, ponanto. a ciência jurfdica nada tem a ver com as ciências empíricas: 3) a imerpretação não é mera intuição pessoal. expressão de emoções ou sentimentos. Aliás, a interpretação não ser lógica no senlido estrico da palavra não significa que seja uma atividade irracional, pois obedece a regras que servem para garantir certos resultados, mesmo que não sejam regras lógicas: AscareUi aceita o rigor. mas refuta a rigorização. A imerpretação não se resumir a uma pesquisa factual não exdui que a pesquisa sobre a natureza dos fatos seja preliminarmente necessária: apesar de condenar o sociologismo, Ascarelli reconhece a importante contribuição que a sociologia 111 Para a crhica aos cMutlos de ~M;:-< 1, cfr. o prPrãcio ao~ .'iludi di dirillo cmnpaniro. cit. p.XXlX· XXXI, 001121 ; 1os de Kt1J(~ ViJ1iu1e 1111'10do/Of/c!1t t ro11trwti di "'11utiuio11i. cit •. p.'1 73 em dia ore OhSl'rv.içciu Mihrc o uso da l~tica com referência a 1. TA."MWJ, in li prohltmu wrlimiMl'I! dti 1i1oll d1"ettdo"IOt ln /ogiCtl 11i1m"dica (1956t, ln l'roblrmi 1iu ridit~ cil., 1. p. 100, cm nnK'ifn,;a• r •nuu conhfl'imen10·. (~.T. l

    que 1ivéssemos bem claro cm nossas mentes que esca nada poderia ter de diference do trabalho criativo da interpretação, e, ponanto, linha função prática. e não teorética.11!1 Seguindo suas próprias incli · nações e convicções UI rimas, Ascarelli leria preferido falar de sabedo· ria ao invés de ciência. 90 Por trás das discussões abstraias em torno da ciemificidade da jurisprudência, creio que Ascarelli intuía o desejo dos juristas de escapar das próprias responsabilidades éticas e políticas. Quando, ao contrário, repetia a tese da função prá1ica da ciência do direito. que. afinal, era o mesmo que a reconhecida natureza criativa da interpre· taçào, conclamava o jurista ao dever de tomar consciência do próprio lugar na sociedade. Uma de suas máximas preferidas era a de que as técnicas imerpretativas nunca são neuuas. Com as suas valorações, o jwista estava a serviço de fins políticos- estivesse ou não consciente disso. Ascarelli não era neutro e linha sobre os ouuos colegas a van· 1agem de estar consciente disso. Mesmo nos primeiros anos, como vimos, participara da batalha polirica dos grupos juvenis antifascis· tas. Mas engajamento polftico e estudos jurídicos, como freqüentc· men1e ocorre cnue os jovens devido à não alcançada harmonia enue as aspirações e a realidade, avançaram por caminhos diíeren1es. sem quase nunca se encontrarem. Em seguida, veio o longo parên1esc do fascismo, denno do qual o tecnicismo fora a defesa contra a política, que se tornara campo minado. Someme nos anos pus1eriores à liber· tação, ocorreu a completa conciliação entre política e ciência na obra de Ascarclli. Até mesmo por isso, os anos sobre os quais estamos dis· correndo foram os mais fecundos. No Brasil, passara por um período de grande atividade cien· llfica e prálica e de intensa preparação para o esperado retorno. Da estadia no Brasil. i;empre guardou uma grata recordação. E. para

    89 Al(;llmu 'tsK sob~ a ci"'1ld3 jurldk~ fo1am nposlu po1 A4arelli NOttM gilmdiaJ t rtaltiJ wâalt>. cit , p.88·9. nota 20. 90No1m11grurilltc11erml1«s1Ktt•k. cit~ P.ll2

    M'l

    uma nota do ~nsalo

    tornar público o 1es1emunho dessa gratidão, escreveu. com a versatilidade que lhe era peculiar, uma monografia completa, em que expôs história e sistema político. economia e direito, problemas cul1urais, sociais e religiosos da cerra que o hospedara. O livro foi publicado com o despretensioso título Sguardo sul Brasile, em uma cole1ânea, "Paesi srranieri". que ele idealizara com um amigo do tempo de antifascismo juvenil. Riccardo Bauer. Conrudo. a empreitada não reve sucesso, e o pequeno volume foi pouco lido, estando agora quase esquecido.91 Em novembro de 1946, vohou pela primeira vez à hália. para reassumir a cátedra em Bolonha. As suas impressões sobre a sociedade itaJiana que vinha se formando de modo 1Urbulen10 em meio à desordem da derrma, das lacerações da guerra civil. da agitação frené1ica da libenaçãu, eram conrradi1órias. Admirava o fmpelU generoso da Resistência, mas dela contestava o rápido apagar-se num

    q11alunquismo92 sem horizontes e na conílitan1e divisão dos partidos em racções. Não escondia de si mesmo o periodo do neofascismo, "alimentado pela burguesia proletari.,.ada e ferozmente inimiga da república". Sobre a situação politica, expressou um juizo que era uma profecia: o governo era de esquerda (ainda não ocorrera o afas1amen10 dos comunis1as e socialistas do governo). mas a economia caminhava à direita, criando novo aumento de concentração da riqueza. 93 Comparando a França e a Itália, julgou a primeira mais es1ável. a segunda mais inventiva (mas menos sólida). Seja como for, preferia o ímpeto ativista de Milão à euforia de poucos, acompanhada pela

    91 .~s1u1rrlo Jrt/ 8"1$i/r. Giuffré, Milão. 19-19 -,tprtJfUlrigrtmle li~iJlll. li, 11.:.!S. 24 tk junho de !95-1: C.ius1/:it1 m1";:/iou" li. n.SI. ?3ckdtumbrnde 1950: !/m(t)/J)llll,ObOO. Ylll. o.n. l5 dede.o:c1nbro fl~ 11156.

    100 .~aias doi 1toi1 conitll'SMI~ lof"J.m publk.O.. n. co~~ da eclilora Laio:r1.a "Lihri f.ltl •~mpo": U. louncwum i "'""º/JO/i, ~º"' "'hª"it~to• lnitoduçjode lõ. Scalfori. tl;iri. 195S \; comoniaçâo

    f.k: i\Scarelli..:má nas p. IU'.i·3!>J:

    266

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    a~ani~.açioc imrOll~ç.aa

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    ção de dois esboços de projetos de lei, dos quais Ascarelli foi um dos principais autores. USulle intese industriali e commerciali in tema di società" e ~sulla produzione e utilizzazione dei combustibili nucleari", depois apresentados à Câmara dos Oepu1ados pelos honorâveis La Malfa, Lombardi e Villabruna. 101 A primeira comunicação ofereceu a Ascarelli uma boa oporfunidade para apresentar, como propostas de reforma legislativa, observações e cricicas que há anos vinha dirigindo à disciplina normativa das sociedades por ações, partindo, sobretudo, de duas considerações: em relação àqueles aos quais cabia. em última instãncia, o poder de decisão, o poder aumentara enormemente com o crescimento da grande empresa, mas não aumentara proporcionalmente o risco econõmico: em relação aos acioilis1as pequenos e isolados, a pro1eção legislativa era insuficiente e, o mais importante, ineficaz. Eram necessárias, por um lado. mai~res e melhores medidas de controle dos mais fortes. e por outro, intervenções mais enérgicas para a tutela dos mais fracos. A direita econômica, nós acrescentamos, sempre pronta a erigir-se como severa guardiã dos direitos das minorias em sede pollcica (onde é mais íraca), torna-se igualmente reivindicadora indignada do poder das maiorias em sedeeconõmica (onde é mais forieJ. Quanto à crítica an1imonopoli!=ita, lamentando que a nossa legislação fosse agora a única a ignorar o problema, propôs a introdução de normas impeditivas de qualquer pacto encre a concorrência reciproca, especificando e delimi1ando o campo que deveria ser ampliado às intenções indiretas (que são também as mais freqüentes).

    lla1i, l!l:'..7 (a cor"'micaç.io ~ Asci11dli C$•6 nas p.IOS·Jfl) , f. inacndit.ivfl, mas ao longo de todo o volume d;u atz não 1111>1rt«' a d11a do tongu.'5."'l. A• duu cnmunicaçõcs de ASom:lll polkm $