Teoria Geral do Estado e do Direito
 9723218437, 9789723218435

Table of contents :
IMG_1.pdf
IMG_2.pdf
IMG_3.pdf
IMG_4.pdf
IMG_5.pdf
IMG_6.pdf
IMG_7.pdf

Citation preview

JU§I' I'UN'I'U§ Agregado e Doutor em Ciências Políticu Mcstre em Ciências JurÍdico-PolÍticas Profcssor da Universidade Aberta e da Academia Militar

TEORIA GERAL

DO E,STADO E DO DIREITO 3.^ EDIÇÃO REVISTA E ACTUALIZADA

@-wolters Kluwer

@

co*raruEditora

6:rrI

Título;

Tooria Geral do Estado e do Direiro

Auton José Fontes 3.'Ediglo: Setembro2010 Bditor:

Wolters Kluwer portugal sob a marca Coimbra Editora Edifício Coimbra Editora Ladeira da paula, n.o l0

Anraúol

-

304F,-574 Coimbra

www.wkp.pt www.coimbraeditora.pt [email protected]

os dhcias pr'WdwsKtuwerFortugal IC_oimbÍa Edittra. !1senaús -túy Ncm a onlidodc nem Nne desra obra púe ,* rpã**to-íà*^,raa, wr nenhum meio elcctnÍnico ou mecânia, grawção tnSnética ou qualquer armazenamento de informação'" ,irt"n, a, rccuperaçiio sem aworização por escrito da wolterc Kluwer portugal.

t*h;d"i;;ó;;,

ISBN 978-972-32-1843-5

ISBN 98-972-32-1689-9 )cpósito L,egal n." 314

_

3.. edição 2." edição)

il7l2TtT

lxccuçío gráfica: Coimbra Editora, S.A.

INTRODUÇAO Sumório:Introdução à temática. Conceitos operativos.

O estudo da Teoria Geral do Estado é importante para o jurista, em lorô1, e para o estudante preocupado com as questões de Ciência Polílca e de Direito Constitucional, em particular, pois prepara-o e ajuda-o a rompreender e a interpretar melhor determinados institutos de Direito (l) e factos do nosso quotidiano e da nossa vida em comunidade. 'olÍtico )osta forma verificamos que a Ciência Política lida com conceitos que ntcressam ao Direito Constitucional e vice-versa. A Ciência Política lida com conceitos que interessam ao Direito lonstitucional e vice-versa. O Estado surge como uma comunidade humana politicamente orgatizada e estabelecida num território. O poder político tende a consolilar-se em todas as agremiações humanas. O ser humano tem nattúeza locial e, por regra, organiza-se politicamente, mesmo que seja através de brmas arcaicas de que a tribo nómada é um dos exemplos. O territó'io também individualiza o Estado porque demarca e delimita fronteiras , espaços de influência. A Geografia molda e cria modelos, verifi:ando-se certas repercussões desta na Ciência Política. Não podemos esquecer igualmente o texto da Consútuição enquanto liploma normativo, que regula o , entendeu-se que os cstudantes necessitariam de uma abordagem às questões relativas à temática nas suas várias perspectivas e vertentes. Independentemente da licenciatura frequentada é neces-

slÍrio que o estudante do ensino superior conheça as principais instituições estaduais, já que, por muito que se anuncie a crise do Estâdo, ele continua a ser uma referência inultrapassável na vida interna, nas relações internacionais e bem assim na da pópria União Europeia. Também por estas razões o estudo de uma Teoria Geral do Estado é

relevante e indispensável. O Estado continua a ser hoje um importante e cadavez mais valorizado pilar das relações intemacionais e do póprio Direito intemo e internacional público. Poucos são os movimentos independentistas que não desejam obter o reconhecimento de uma parcela de território como Estado soberano, o quer que hoje este conceito e essa realidade signifiquem. Neste capítulo todos os conteúdos programáücos convergem para uma visão holística do Estado numa variada perspectiva que não dispensa a análise e o estudo, no caso português, do normativo constitucional qu'e fundamenta a organização do Estado poÍtuguês. No final do estudo deste capítulo os estudântes ficam habilitados com vários conceitos primários e conhecedores dos «fundamentais>> do Estado, designadamente os seu§ vários corpus, atribuições e competências dos difercntes órgãos e estruturas não só políticas mas também jurisdicionais e administrativas. Começa, pois, aqui a construção de uma verdadeira Teoria Geral do Estado já que este capítulo comporta, entre outras temáticas, uma análise das várias funções e dos vários órgãos de soberania, ou seja, comporta uma veÍtente organizacional, com a definição e a caracterização de estruturas subjectivas e orgânicas a quem está afecta a satisfação das imposições constitucionais, como sejam os diferentes órgãos de soberania e a Administração Priblica portuguesa; e com uma vertente substantiva intimamente relacionada com a actividade política e jurídica daquelas diferentes estruturas.

Podemos encontrar diferentes sentidos para a expressão , que não é, como sabemos, uma expressão de sentido unívoco. Desde @

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

cafirmar que estes conceitos não esgotam a realidade humana do Estado. 'or conseguinte, o elemento humano é o Povo, mas, demograficamente, r conceito de população abarca também os estrangeiros e os apátridas, rara além dos nacionais de alguns Estados, ao abrigo do princípio da gualdade de direitos, exceptuando os políticos. Em conclusão, podemos rfirmar que o Povo surge como o elemento humano do conceito de istado e como urn conjunto orgânico ligado àquele por vínculos muito :specíficos de nacionalidade de acordo com os critérios fixados pelos

legí

imos órgãos do Estado. Importa referir que existem situações de pesioas que não estão ligadas a qualquer Estado, pelo que, juridicamente, ,ão consideradas apátridas.

O poder político como elemento estruturante do Estado reúne a rctividade que consagra, disciplina e ordena juridicamente a organiza;ão política da colectividade, com a consagração de instituições jurílioo-políticas. O poder político pode traduzir-se desde logo em mani'estações de poder constituinte e de exercícios de poder constituído, mais adiante estudaremos. 1ue Por outro lado, o conceito de Nação é um conceito político-cultual intemporal constituído pelos que morreram, pelos que vivem e pelos 'indouros, que hão-de nascer. Os conceitos de Nação e de Estado nem empre são coincidentes. O caso português é paradigmático, já que istado e Nação são conceitos concordantes. No que diz respeito ao conceito de Soberania, ela reside na Nação ru, para a tradicional esquerda, no Povo, por exemplo como resulta da IRP de 1976 (dizer que reside no Povo é atribuir a um sector dos anti,os Estados-Gerais: Povo, Nobreza e Clero). Contudo, importa salienil que, tendo em conta que o conceito de Povo pode não ser culturalrente homogéneo, o conceito de Soberania pode abranger parte de uma Iação. Aliás, após a Revolução Francesa a soberania popular deixa a xpressão: , usando antes: , definindo a «(...) extensão e o limite das águas territoriais, a zoÍta económica exclusiva e os direitos de Portugal aos fundos mariúos contíguos.»>, não podendo o Estado alienar «(...) qualquer parte do território português ou dos direitos de soberania que sobre ele exerce, sem prejuízo da rectificação de fronteiras».

1.1. AS DIFERENTES FORMAS DE ESTADO Na tradicional classificação dos diferentes tipos de Estado encontramos uma que distingue entre Esreoos uNrrÁruos e EstRoos coMposros. Esta distinção clássica radica no número de centros de impulsão política, portanto, num critério numérico de distribuição do poder político.

Assim, os Esrepos uNttÁnlos, que traduzem a ideia de convergência do poder político, atribuem as funções e a realização das atribuições estaduais a órgãos nacionais, sendo o Estado dotado de uma única Constituição e as grandes instituições, como as forças armadas, as forças policiais e o sistema prisional, entre outras, são comuns a todo o país. Em conclusão, apenas possuem um centro relevante de impulso político, ao contrário dos Esre.oos coMposros, que sáo Estados formados por Estados e não por meras unidades territoriais regionais, que dispõem de viários centros políticos. Por outro lado, os Esrepos uNtrÁmos podem também ser analisados e diferenciados consoante o grau de centralização do poder, que pode ter três níveis: de centralização absoluta do poder, de descentralizaçío e de desconcentração políticas. Desta forma, surgem as modalidades de Esreoos trynÁruos sIMpLEs e de Esraoos uNrrÁruos coMPLExos. Nos Esrapos urrrÁmos sIMpLEs existe uma total centralizaçío da titularidade e do exercício do poder político, não havendo, por Íegra, manifestações de desconcentração político-administrativa. @ Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

l.

O Estado

27

Nos Esrapos cENTRALzADoS não há qualquer divisão de competêndias nem autonomia em relação a qualquer tipo de colectividade ou de estrutura social ou política. No que diz respeito aos Esreoos uunÁRtos coMpI-Exos importa referir que se consagram várias entidades descentralizadas com diferentes graus de autonomia político-administrativa ou meramente administrativa, mas a Constituição continua a ser única para todo o Estado, não dispondo aquelas entidades de qualquer poder constituinte próprio. Os Esreoos DESCENTRALIzADoS são aqueles em que se prevê a existência de colectividades ou estruturas com características próprias, às quais vai ser conferido um poder de se autogovernarem, podendo este poder manifestar-se quer num poder administrativo quer num poder que traduza uma competência legislativa própria, o que significa que podem existir colectividades às quais são confiados poderes políticos específicos ou peculiares que abrangem uma competência legislativa. Essa competência é exercida por órgãos próprios em regra eleitos. Exemplo deste tipo de Estados são os unitários regionais, aqueles que têm estruturas políticas com governos próprios e em relação aos quais as assembleias eleitas têm competência legislativa (e). Portugal é um exemplo típico de um Esreoo uNrrÁRIo oBsCENTRALIzADo E IARCIALMENTE REGIoNALrzeoo, já que constitucionalmente se delimitam as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira como entidades regionais com órgãos de governo próprio, um dos quais eleito directamente - a Assembleia Legislativa; um órgão não eleito o Governo Regional; e um órgão que representa a República o Representante da República na Região Autónoma (10), daí ser um

-

Esrloo

uNrrÁRro.

Uma segunda característica dos Esreoos DEScENTRALTzADoS é a de que os seus actos e principalmente os das colectividades e estruturas descentralizadas estão sujeitos a um poder tutelar exercido pelos órgãos centrais do Estado, poder esse com maior ou menor amplitude consoante o âmbito da descentralizaçáo.

(e) Que é o exemplo paradigmático de um poder inovador, que constitui, modifica ou extingue relações jurídicas. (r0) Esta Íigura corresponde ao antigo Ministro da República. @ Wolters Kluwer PoÍtugal I Coimbra Editora

Parte

I-

Teoria Geral do Estado

Um terceiro tipo de Esrnoos uNrrÁRlos são os DEScoNCENTRADoS, que se traduzem fundamentalmente numa repartição das competências entre os órgãos administrativos centrais e os serviços ou departamentos da Administração Rública aos quais são cometidas algumas atribuições, o que significa que neste tipo de Estados há níveis diferentes de carâ.ct€r administrativo e os serviços estão sujeitos a um poder hienárquico, ou seja, os órgãos administrativos centrais continuam e mantêm poderes organizatórios em relação a esses serviços aos quais foram atribuídas competências específicas.

Portugal é, como vimos, um Esraoo ulrtTÁRro DEScENTRALIzADo E DESCoNCENTRADo E rARCTALMENTE REcIoNALrzADo, aliás, de acordo com o previsto no artigo 6." da CRP, que diz o seguinte: Artigo 6." (Estado unitário)

1. O Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da administração pública. 2. Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos e de órgãos de governo próprio. No que diz respeito aos Esrapos CoMposros são aqueles em que há uma pluralidade de centros de impulsão política. Tal como sucede com os Esreoos uNrrÁRlos, existem diferentes tipos de Esreoos couposros, sendo, tradicionalmente, a UNtÃo PessoAL e a Ut{rÃo REAL e, contemporaneamente, a FeornaçÃo e a CoNnennuçÃo os melhores exemplos que podem ser apresentados. Quanto à UtttÃo kssoat- significa que dois ou mais Estados têm, por vezes acidentalmente, o mesmo soberano, ou seja, o mesmo chefe de Estado.

Alguns autores não consideram a UtuÃo hssoet- como uma verdadeira fama de Estado conposto, pois não resulta da vontade daqueles Estados mas antes da aplicação da legislação interna sobre designação sucessória de cada Estado que faz coincidir na mesma pessoa a chefia do Estado. A Umeo REAI- é também, de alguma forma, uma união pessoal, pois existe uma identidade governativa, com órgãos comuns, e perdendo os @

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

l.

O Estado

29

Estados isolados para a União a capacidade internacional de que dis-

punham. Um exemplo foi a União entre Portugal e Brasil no anterior Ultramar e antes da independência da colónia brasileira. Estas situações ocorreriam em virtude da aplicação de legislação interna dos Estados, designadamente das leis da sucessão. Na actualidade, o principal tipo de Esraoo coMposro é o Esraoo FEDERAL, que resulta de um pacto entre diferentes Esreoos rnmÁruos fundadores que renunciam a uma parte da sua soberania e que a em benefício do novo Estado, o que significa que aqueles Esreoos urqrÁnIos se transformam em Esrapos FEDERADoS. Esta transformação implica uma delimitação das atribuições do Esrepo FEDERAL que possui em regra competências ao nível das relações externas, da defesa nacional e, necessariamente, do orçamento e das receitas inerentes àquelas competências. No entanto, em paralelo, os Esrenos FEDERADoS continuam a manter uma estrutura política própria, uma Constituição política, uma organização do poder e uma estrutura jurídica próprias. Por outro lado, o Esrloo FEDERAL está sujeito a dois grandes princípios estruturantes:

I

I

I

- Ao princípio da participação dos Esraoos FEDERADoS, o que faz surgir um órgão que os representa, fazendo emergir um tipo de bicameralismo, ou seja, um parlamento com duas câmaras, que é o bicameralismo federal, em que existe, para além de uma câmara que representa os cidadãos, uma câmara representativa dos Esrepos rBpBRADos (11); e

Ao princípio da autonomia, que consiste na atribuição a cada um dos Esrnoos FEDERADoS de poderes organizatórios próprios para construção da sua própria ordem jurídica que não deve entrar em conflito com o âmbito das atribuições do ordenamento jurídico federal, sendo que as duas ordens (a federal e a federada) devem ser autónomas, porque abarcam poderes políticos diferenciados, complementares e não conflituantes. Normalmente, os poderes do Esreoo FEDERAL são delimitados rigorosamente na Constituição do respectivo Estado ou no pacto constitutivo

-

(rr) Exemplo é o Senado dos EUA, a câmara alta do Congresso, que elege 2 Senadores por cada Estado, ou seja, um total de 100 Senadores. @ Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editore

Parte

da

I-

Teoria Geral do Estado

Fbrnaçeo.

Nos dias de hoje, os EUA são um exemplo de Esreoo por 50 Esreoos FEDERADoS (12). No que respeita às coxrupenAçÕEs, estas são formadas por Estados

FEDEnAL oomposto

sú€rmos que determinam a prossecução de certas atribúções em comum oün ürEos Estados sem colocarem em causa a sua independência e a sua soberania. É, segundo alguns autores, uma forma de concertação permaDente de Estados mais do que uma verdadeira forma alternativa de Estado- Por regra, as confederações, que são associações de Estados, mde cada um conserva a sua soberania, mas onde se comprometem a realJ?an, em comum, um conjunto de atribuições, são classicamente dirigdas por estruturas colectivas. Os laços existentes entre os Esreoos coNFEDERADos são menos intensos do que os que existem entre os Estaoos FEDERADOS.

12. as TRADICTONAIS FUNÇOES DO

ESTADO

O conceito de função do Estado pode ser analisado como tarefa ou como actividade. Enquanto tarefa encontramos a sua consagração constitucional no disposto no artigo 9.'da CRP, que se refere às principais tarefas do Estado Português:

Artigo 9.' (Tarefas fundamentais do Estado) São tarefas fundamentais do Estado:

Garantir a independência nacional e criar as condições políticas, económicas, sociais e culturais que a promovam; b\ Garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático; c) Defender a democracia política, assegurar e incentivar a participa-

a)

@ d)

democútica dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais;

Promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estmturas económicas e sociais;

(12) Inicialmente eram 13 os Esreoos @

FEDERADoS que deram

Woltêrs Kluwer Porhrgal I Coimbra Editora

origem à FEDERAÇÃo.

1. O Estado

31

Proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os reclusos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território; Í) Assegurar o ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa; s) Promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional, tendo em conta, designadamente, o carácter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira; h) Promover a igualdade entre homens e mulheres. e)

Enquanto actividade, as funções do Estado podem definir-se como um conjunto de actos destinados à prossecução de um fim comum ou semelhante. Existem muitos autores que se dedicaram ao estudo das funções do Estado. Destacamos Mon'rnseutpu, que elaborou sobre as doutrinas da separação de poderes e sobre a emergência dos poderes legislativo, judicial e executivo, ou seja, dividido o poder político 1ta) do Estado cada um destes poderes agiria por si próprio, limitando-se e limitando os restantes, e os três deveriam funcionar coordenados. Assim, em Portugal, o poder judicial vem limitar o poder legislativo, já que, sempre que este viola a Lei Fundamental, o TC poderá declarar inconstitucional a norma em causa, aprovada por aquele poder, ao mesmo tempo que é o poder legislativo que aprova as noÍrnas reguladoras da actividade dos Tribunais e as que estes aplicam. Importa referir que os poderes legislativo, executivo e judicial são poderes constituídos, devendo obedecer ao poder constituinte (14), que os cria e os delimita. O conceito de Estado de Direito, que é multidimensional, apela à existência de uma autolimitação da actuação do Estado pelo Direito existente e, igualmente, pela divisão e separação de poderes. Aquela máxima significa que ninguém, nem o Estado, se pode considerar acima do Direito. Os Estados têm tradicionalmente funções próprias e muito peculiares que se podem distribuir em três grandes grupos: as funções políticas, as funções administrativas e as funções jurisdicionais.

(13) Em sentido amplo.

(ra) Este poder consubstancia-se na faculdade de aprovar as nonnas que definem e estruturam todo o poder político e que se encontram nas Constituições dos Estados. @

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

Parte

I-

Teoria Geral do Estado

No caso português, vários publicistas êm dedicado estudos à repartição das funções do Estado. Salientamos Jonce MnANoR, que propõe a seguinte distinção: política em sentido amplo (ls); - Função Função administrativa; e - Função jurisdicional. Aos órgãos que exercem a função política compete definir o interesse público primário ou originário e encontrar os meios próprios para o satisfazer e realizar. A função política abarca não só a função legislativa mas também a função govemativa em sentido estrito. Esta abarca os actos dos órgãos governativos respeitantes quer à condução da política geral do país pelo Govemo quer à condução da política regional pelos govemos das Regiões

Autónomas dos Açores e da Madeira.

A função legislativa é a que se

consubstancia na aprovação de actos legislativos, logo em actos inovadores, que tanto podem ser actos constitutivos, modificativos ou extintivos de situações jurídicas. Esta função do Estado, em sentido amplo, concretiza-se hoje, antes de mais, na aprovação de Leis Constitucionais, que visam alterar a Lei Fundamental, paradigma de todo o orde-

namento jurídico, sob pena da decorrência de vícios de desconformidade específicos que são os das inconstitucionalidades e que impedem a ügência vrflida da norma violadora. Esta função traduz-se igualmente na aprovação ordinrária de um conjunto de actos legislativos e que em Portugal, nos ternos do n.o 1 do artigo 112.'da CRP, são: as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais, que são aprovados, respectivamente, pela Assembleia da República, pelo Governo da República e pelas Assembleias kgislativas das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Vejamos o n." I do artigo referido:

Artigo 112.' (Actos normativos)

l.

São actos legislativos as leis, os decretos-leis e os decretos legis-

lativos regionais.

(...)

(t5)

Que inclui a função legislaüva e a função govemativa ou política stricto sensu.

@

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

l - O Estado

.,J

A função administrativa visa a satisfação regular e contínua

das

necessidades colectivas e pode traduzir-se, igualmente, no exercício de

competências de natureza e conteúdo normativo. Estes actos normativos aprovados pelas estruturas da Administração Pública designam-se, genericamente, como regulamentos e podem ser de diversa natuÍeza. Assim, encontramos decretos regulamentares, portarias e, entre outros, despachos normativos. Esta função traduz-se ainda, e sobretudo, em actos de conteúdo individual e concreto que são, igualmente, como os regúamentos, actos unilaterais, conhecidos como actos administrativos, que disciplinam juridicamente situações individuais em casos concretos. O exercício das funções administrativas pode ainda manifestar-se através de actos bilaterais gue assumem a natureza de

contratos administrativos (16). Em conclusão, podemos afirmar que esta função se traduz, através do seu exercício e desempenho, na satisfação das necessidades colectivas, regular e continuadamente, que são, genericamente, a segurança, a cultura e o bem-estar. A sua noção pode induzir-se do disposto no artigo 266." da CRP:

AÍigo (

266."

Princípios fundamentais )

1. A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. 2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.

(t6) Vide JosÉ MaNUEL SÉnvulo Connrn, in lzgalidade e autonomia contratual nos contratos administrativos, Colecção Teses, Livraria Almedina, Coimbra, 1997; Mann loÃo oo RosÁnto EsronNwHo, in Requiem pelo contrato Administrativo, Livraria Almedina, Coimbra, 1990; Manrl JoÂo po RosÁRIo EsronNnuo, in Princípio da Legalidade e Contratos da Administraçdo,Separata do Boletim do Ministério da Justiça, n.o 368, Lisboa, 1987. O Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

Parte

I-

Teoria Geral do Estado

Por fim, os cultores do Estado apresentam a função jurisdicional cujo exercício se traduz nas sentenças e acórdãos dos tribunais comuns ou de outros tribunais constitucionalmente previstos no artigo 209.0 da CRP: Artigo 209." (Cate gorias de tribunais

)

1. Além do Tribunal Constitucional, existem as seguintes categorias de tribunais: a)

O Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais judiciais de primeira e de segunda instância;

b)

O Supremo Tribunal Administrativo e os demais tribunais administrativos e fiscais;

c) O Tribunal de Contas.

2. Podem existir

tribunais marítimos, tribunais arbitrais e julgados

de paz.

3. A lei determina

os cÍlsos e as formas em que os tribunais previstos

nos números anteriores se podem constituir, separada ou conjuntamente, em tribunais de conflitos. 4. Sem prejuízo do disposto quanto aos tribunais militares, é proibida a existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas categorias de crimes.

Esta função traduz-se também, nalguns casos, na atribuição aos tribunais ou a um tribunal especíÍico de competência própria para verificar da conformidade de qualquer acto normativo com as Constituições e, quando se cria um tribunal com essa competência específica, surgem os Tribunais Constitucionais. Em Portugal o nosso Tribunal Constitucional tem consagração a partir do artigo 221.'da CRP:

A*igo 221." (DeJinição)

O Tribunal Constitucional é o tribunal ao qual compete especificamente administrar a justiça em matérias de natureza juídico-constitucional. @

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

l.

35

O Estado

função jurisdicional recebe uma definição expressa no artigo 202!, n." 2, da CRP, como um exercício de procura da justa composição dos litígios e da aplicação de forma passiva (17) e imparcial do Direito.

A

Vejamos o que diz o referido artigo constitucional: Artigo 202.' (

Funçdo jurí sdicional)

1. Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo. 2. Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados. 3. No exercício das suas funções os tribunais têm direito à coadjuvação das outras autoridades. 4. A lei poderá institucionalizar instrumentos e formas de composição não jurisdicional de conflitos.

13. A CHEFIA DE ESTADO Todos os Estados têm, em regra, um órgão supremo que genericamente pode ser considerado como o chefe de Estado com designações e competências que variam de Estado para Estado.

Em primeiro lugar, convém referir que a chefia de Estado pode ser colegial ou singular. Como exemplos de chefias colegiais poderemos encontrar exemplos históricos como os triunviratos, os consulados e os directórios; como exemplos de chefias individuais podemos apresentar actualmente os Presidentes da República e os Monarcas. Por outro lado, nos regimes republicanos, a chefia de Estado está, em regra, entregue a um Presidente e, nos regimes monárquicos, a chefia de Estado é confiada, entre outros, a Imperadores, a Reis, a Príncipes ou a Grão-Duques. O caso português e o caso espanhol são disto

(17) Porque, como veremos mais adiante, os Tribunais. para intervirem, necessitam de um impulso processual externo, que partirá dos particulares ou do Ministério Público. (0 Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

Parte

I-

Teoria Geral do Esndo

exemplos: em Portugal, a chefia de Estado assume a designação de Presidente da República; na Espanha monárquica o chefe de Estado é o Rei. knporta referir que estes variados tipos de chefia do Estado não determinam a natureza democrática dos Estados. Esta questão coloca-se, sobretudo e primeiramente, quanto às formas de designação dos titulares dos diferentes órgãos políticos, à existência ou não de separação de poderes e à consagração e à efectivação de amplos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Por isso, podemos afirmar que existem Estados não democnáticos com chefias de Estado presidenciais ou regimes moniírquicos que garantem o regime democrático, da mesma forma que o contfiírio também sucede. Portugal é uma república democnática com um chefe de Estado - o hesidente da República designado por sufrágio universal e secreto, e a Espanha, igualmente democrática, dispõe de um monarca como chefe de Estado designado, em primeira liúa (18), pelo anterior ditador. Importa ainda referir que nalguns Estados o chefe de Estado acumula as funções com as de chefe de Governo. Por exemplo, nos sistemas de govemo presidencialistas como no caso dos EUA, o Presidente é simultaneamente chefe de Estado e chefe do Executivo.

I.4. OS SISTEMAS

DESIGNATÓNTOS

Um dos principais pressupostos de qualquer sistema político democnítico prende-se com a delimitação das formas de designação dos governantes e dos demais titulares de cargos públicos. São vários os métodos que podemos utilizar para escolher os titulares dos diferentes cargos, designadamente do Estado, das Regiões Autónomas, dos órgãos das autarquias locais e das restantes estruturas da Administração Príblica. Existem, genericamente, sete formas de designação comummente aceites nas sociedades democráticas ocidentais (t9): - Eleição; Herança;

-

(t8) Que obteve a aprovação das Cortes. (le) A par de outras como sejam o Golpe

de Estado, a Insurreição ou Pronun-

ciamento e a Revolução. @ Wolters Kluwer PoÍtugal I Coimbra Editora

l.

O Estado

- Cooptação; - Nomeação; - Inerência; - Sorteio; e - Concurso. Vejamos cada

uma destas formas designatórias. A rmtçÃo traduz-se por excelência no exercício de um direito de participação política que o Liberalismo consagrou e que é o direito de sufrágio. Este traduz um acto de escolha através de um voto. Tem algumas características consoante a natureza de cada regime político, a estrutura de cada forma e sistema de governo e o âmbito de cada sistema político-constitucional. Daí que o sufrágio possa ter, hoje em dia, viírias características : nas democracias representativas ocidentais ligadas ao Estado de Direito democrático, o sufrágio tende a ser universal, ou seja, este é o sufrágio geral que abarca o conjunto dos cidadãos que preenchem os requisitos delimitados para a capacidade eleitoral activa e também passiva, isto é, que são susceptíveis de exercer o direito de voto e de ser eleitos, respectivamente. Entre nós, estabeleceram-se algumas restrições no que respeita i capacidade eleitoral passiva, já que a Lei Eleitoral para a AR considera inelegíveis (20), entre outros: os magistrados judiciais ou do Ministério Público em efectividade de funções, os diplomatas de carreira, e os elementos militares ou militarizados enquanto em serviço activo. Daí que o processo de participação política que hoje em dia se sedimenta no sufnígio universal tenha começado por ser restrito (21), como no primeiro período do Liberalismo, em que era censitdrio, para passaÍ a ser um sufrágio capacitiírio, em que somente votavam e só eram eleitos certos cidadãos, designadamente, homens. Após a 2." Guerra Mundial começa a

(2o) Vide o disposto no artigo 5." da Iri Eleitoral para a Assembleia da República e que consta da tri n.o l4l79,de 16 de Maio, actualizada com as alterações introduzidas pela Lri Orgânica n.o 2l?-OOl, de 25 de Agosto, (2t) No sufrágio restrito o direito de votar só é conferido a cidadãos com determinados requisitos. Aqui a capacidade eleitoral é definida pela positiva, pois apenas a possuem determinadas pessoas favorecidas, ou pela posse de determinados bens, como a terra, ou possuidores de determinados rendimentos ou habilitações literiírias, @ Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

Parte

I-

Teoria Geral do Estado

consagrÍu-se num grande número de democracias representativas o sufnágio universal. Ern Portugal, a universalidade do sufrágio somente foi alcançada com a Revolução de 25 de Abril de 1974 e foi, apenas, a partir desta datã que as mulheres puderam votar. O sufrágio é igual, ou seja, a delimitação do exercício do sufrágio poÍ parte de um cidadão implica uma opção que não vai ter limites no proaesso de conversão de votos em mandatos. Ora, nalguns sistemas

constitucionais e ordenamentos jurídicos estabelecem-se mecanismos limitaüvos desta conversão, naquilo a que se designa genericamente cnmo ckiusulas barreiras, isto é, a exigência da obtenção de um certo núneÍo de votos ou de uma ceÍta percentagem para que se efective e concrúzo a conversão de votos em mandatos. Por exemplo, no sistema jurídioo-político alemão consagra-se a exigência da obtenção de uma peroentagem mínima de 5vo para que se concretize a referida conversão. Em Portugal, nos termos do disposto no artigo 49." da CRP, o súágio é livre, o que implica desde logo a liberdade de votar. Isto significa que se consagra o sufnágio facultativo e, porranto, os cidadãos qrenas têm um dever cívico de exercer o direito de voto, enquanto que noutÍos sistemas (22) o sufrrágio é obrigatório, ou seja, o eleitor é obrigado a votar sob pena de ser sancionado caso o não faça. Vejamos o disposto no referido artigo: Artigo 49." (Direito de sufrágio) I

-

Têm direito de sufrágio todos os cidadãos maiores de dezoito

anos, ressalvadas as incapacidades previstas na lei geral. 2. O exercício do direito de sufrágio é pessoal e constitui um dever

cíüco.

Por outro lado, o sufrágio é secreto, proibindo-se, desta forma, qualquer sinalização do voto, e é também pessoal, ou seja, deve ser exercido pessoalnrente e só excepcionalmente é que um cidadão pode ser

(22) Como acontece na Bélgica. @

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

1. O Estado

acompanhado por outro eleitor no acto eleitoral. Com base no princípio republicano, podemos ainda afirmar que o sufrágio é periódico, o que implica que os titulares de cargos políticos têm mandatos com uma duração prefixada. A duração dos mandatos resulta da CRP ou da lei e só pode ser alterada nos casos constitucional ou legalmente previstos. Em Pornrgal, os mandatos dos principais órgãos políticos e administrativos têm a seguinte duração: o do Presidente da República tem a duração de 5 anos, nos termos do disposto no artigo 128.", n.o l, da CRP; a legislatura da Assembleia da República tem a duração de 4 sessões legislativas, de acordo com o disposto no artigo 171.o, n." 1, da CRP; as eleições para as Assembleias Legislativas ocoÍrem, regularmente, de 4 em 4 anos; e o mandaüo dos órgãos das autarquias locais e\ é de 4 anos. O sufnágio periódico pressupõe a insusceptibilidade de inversão das eleições, já que, porventura, se um órgão for dissolvido, no próprio acto de dissolução deve ser consagrado o momento de realizaçáo das novas eleições, que têm de realizar-se nos 60 dias subsequentes, nos termos do disposto no artigo 113.", n.o 6, da CRP, não podendo haver assim, em regra, alteração ao quadro eleitoral pré-determinado. Ainda segundo a generalidade dos autores, a eleição pode ser individual, recaindo o sufrágio na escolha singular de determinados cidadãos em concreto, ou ser por lista, incidindo o voto dos eleitores sobre um elenco de pessoas preparado, em regra, pelos directórios dos partidos políticos. No caso português o sufrágio é individual para o cargo de Presidente da República e por lista para eleição dos Deputados à AR. Vejamos o disposto nos artigos 126.", n." 1, e 151.o, r.o l, da CRP:

Artigo 126." (Sistema eleitoral)

1. Será eleito Presidente da República o candidato que obtiver mais de metade dos votos validamente expressos, não se considerando como tal os votos em branco. (...)

(23) Os órgãos das autarquias locais eleitos são: a assembleia municipal, a câmara municipal, o presidente da câmara municipal e a assembleia de freguesia. @ Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

Parte

I-

Teoria Geral do Estado

Artigo 15l.' (Candidaturas)

l.

As candidaturas são apresentadâs, nos termos da lei, pelos partidos políticos, isoladamente ou em coligação, podendo as listas integrar cidadãos não inscritos nos respectivos partidos.

(...) Sem que possa confundir-se com a classificação anterior, o sufnágio

pode ser uninominal

ol plurinominal.

Diz-se uninominal quando está

em disputa, numa determinada circunscrição eleitoral, apenas um mandato; diz-se plurinominal sempre que, num mesmo círculo eleitoral, estão em

disputa viírios mandatos. Ora, o sufrágio por listas é sempre plurinominal, mas o sufrágio individual pode ser uninominal ou plurinominal. Reparemos: o sufnágio por lisns é sempre plurinomirwl (o sufrágio por lista, implica um elenco de pessoas que disputam viírios mandatos por isso é plurinominal; veja-se o exemplo da eleição da AR), mas o sufrágio individunl (quando o sufrágio recai na escolha singular de determinados cidadãos em concreto) pode ser aplicado a circunscriç&s uninominnis (quando está em disputa apenas um mandato) ou plurinomr'nais (sempre que, num mesmo círculo eleitoral, estão em disputa vários mandatos, por exemplo, vários nomes individualmente considerados para viírios mandatos em disputa, em vez de ser apresentada apenas uma lista partidrária.

Por fim, o sufrágio pode ser directo ou indirecto. O sufrágio é directo se o regime jurídico eleitoral possibilita a eleição dos titulares sem intermediação, como sucede, no caso português, com a eleição do chefe de Estado. O sufnágio é indirecto (24) quando os eleitores apenas designem indivíduos que, após eleitos, procedem à eleição dos titulares dos órgãos governativos, cujo exemplo é a designação do Presidente dos EUA. Os cidadãos norte americanos elegem os grandes eleitores e sáo esses que, posteriormente, elegem o novo Presidente dos EUA. A eleição consiste, desta forma, nas escolha e designação feitas através do voto de um universo de pessoas, a que chamamos colégio elei-

(24) Como veremos mais adiante, a 1.'Plataforma de Acordo Constitucional, assinada após a Revolução de25 de Abril de 1974, estipulava que a eleição do futuro Presidente da República havia de fazer-se de forma indirecta. @ Wolteís Kluwer Portugal I Coimbra Editora

l.

4t

O Estado

toral.

Cada uma dessas pessoas designa-se eleitor e para exercer o direito de voto carece de preencher um conjunto de requisitos constitucional e legalmente previstos e de dispor de capacidade eleitoral activa. Somente podem ser eleitos os cidadãos que dispuserem de capacidade eleitoral passiva, ou seja, de legitimidade para ser eleito. No exercício do direito de voto, o eleitor pode tomar várias atitudes, a primeira das quais é votar, escolhendo, desta forma, quem deseja que ocupe o cargo em disputa. Em segundo lugar, atendendo a que o sufrágio é facultativo, o eleitor pode abster-se de votar, não exercendo o seu direito de voto. Ainda podemos considerar as situações de voto branco, em que o eleitor participa no acto eleitoral, mas nada assinala no boletim de voto, e as situa@s de voto nulo, quando o eleitor coloca a cfltz fora do lugar adequado ou assinala de qualquer outra forma o seu voto (neste caso os votos, nulos, não contam para o apuramento da maioria). Através da rmnaNÇe, o exercício de funções ocorre por via de [ansmissão hereditrária e é a forma usual na monarqúa de designação do chefe de Estado, permitindo, segundo os seus cultores, a independência dos

governantes e a educação ao longo dos anos para o exercício de cargos públicos, evitando-se, desta forma, as lutas de poder. Contudo, importa referir que o exercício do poder fica restringido apenas a uma famflia, emergindo o risco evidente de colocar o exercício de funções públicas em pessoas sem qualidade ou vocação para tal exercício. A coorraçÃo é um sistema usualmente conhecido como a eleição dos eleitos e pode ser simultânea ou sucessiva. Diz-se slrraur-rÂNBe quando os membros que já têm assento num determinado órgão colegial podem designar algum ou alguns dos seus pares para as vagas que faltam preencher. Por exemplo, no caso português, 3 dos 13 juízes do Tribunal Constitucional são cooptados pelos 10 juízes eleitos pelo Parlamento. Estes são paÍes e os cooptados vão ter as mesmas funções das dos membros do colégio eleitoral. Diz-se sucEsslvA quando o titular do órgão designa o seu sucessor. No que diz respeito à NonaeeçÃo traduz um sistema de designade um titular de um órgão por órgão diferente. A nomeação é o acto ção unilateral de provimento num cargo, em regra público, cuja eficácia depende da aceitação do nomeado. A nomeação pode ocoÍrer através de um órgão singular ou através de um órgão colegial. Por exemplo, no @ Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

42

Parte

I-

Teoria Geral do Esndo

caso português o Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da Repú-

blica, através de um decreto presidencial. A nrenÊNctA (25) é a forma de designar um titular de um cargo pelo facto de ele desempenhar outro cargo. Por exemplo, no caso porurguês o hesidente da República é, por inerência, Comandante Supremo das Forças Armadas. No caso do sonruo utiliza-se o elemento aleatório para a designação de um titular de um cargo. Por fim, o coNCURso implica a escolha de um determinado titular em virtude da realização e utilização de um procedimento concursal. É o que sucede nos nossos dias para a designação de titulares de cargos dirigentes da Administração Pública, ao abrigo do disposto na Lei a." 2l2OO4, de 15 de Janeiro, alterada pela Lei n." 5112005, de 30 de Agosto.

15. O§ SISTEMAS

ELEITORAIS

No âmbito dos sistemas designatórios de titulares do poder político e no que diz respeito à eleição, foi necessiírio encontrar meios ou fórmulas de converter os votos em mandatos. Os sistemas eleitorais são as formas utilizadas para a conversão desses votos em mandatos. Genericamente, há dois grandes tipos de sistemas eleitorais: maioritários; e - Sistemas proporcionais. Sistemas No que diz respeito aos sIsrEMAs ueronrrÁnros, eles pretendem essencialmente garantir a estabilidade política e podem ser de dois tipos: de maioria relativa, a uma volta ou à pluralidade de - Sistemas votos em que o mandato é atribúdo ao candidato que obtiver o maior

-

(2s) Há quem distinga entre inerência de exercício e inerência sucessiva: o Presidente da República é substituído, nas suÍrs ausências, pelo Presidente do Parlamento, nos termos do disposto no artigo l32.o,n.o I, da CRP trata-se de um exemplo de inerência de exercício; como exemplo de inerência sucessiva podemos atender ao disposto no artigo 142.",alíneaJ), da CRP, já que os antigos Presidentes da República são conselheiros de Estado, em viÍude de terem exercido as funções de chefe de

-

Estado.

@

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

1. O Estado

43

número de votos e está directamente relacionado com um tipo de circunscrição eleitoral onde apenas estií em disputa um mandato, sendo o mesmo atribuído ao candidato que obtiver o melhor resultado eleitoral; - Sistemas de maioria absoluta ou a duas voltas - aqui o mandato é atribuído ao candidato que obtiver no primeiro escrutínio a maioria absoluta dos sufrágios e se, porventura, nenhum candidato obtiver esse resultado realiza-se uma segunda volta onde se confrontam apenas os dois candidatos que obtiveram os melhores resultados e então, necessariamente, o mandato em disputa é atribuído ao que tiver maior número de sufrágios nessa segunda volta. No que respeita aos sIsrEMAs pRopoRcroNAls, estes pretendem garantir, por excelência, a expressão das várias correntes preponderantes da comunidade, daí que a opção ente os viários sistemas eleitorais seja uma opção política exüemamente relacionada com a tadiSo ou a implementação do sisúema e susceptível de ser alterada a cada momento, se bem que nalguns cÍrsos nas ConstituiçOes se estableçam maiorias específicas para alteração do sistema eleitoral. O sistema proporcional é aquele em que se tenta garan-

tir a expressão das conentes políticas dominantes, afashndo-se o sistema que privilegia um vencedor único, ou a regra segundo aqtnlwiltrur tal , páLg. 61. @

Woltêrs Kluwer Portugal I Coimbra Editora

4. Os partilos políticos

191

Em conclusão e no que respeita à natureza jurídica dos partidos políticos a generalidade da doutrina concorda que os partidos políticos desempenham, ao abrigo do seu papel eleitoral, funções de natureza constitucional, logo facilmente caracteizáveis como públicas. Quanto a isto não surgem dúvidas ou querelas doutrinárias, existindo um consenso nesta matéria. De igual forma, não podemos negar que os partidos políticos no nosso ordenamento jurídico-constitucional são entidades privadas. Desta forma podemos afirmar, com base nestas premissas, que os partidos são uma manifestação do exercício privado de funções

públicas constitucionais.

42. A FUNÇÃO ELETTORAL DOS PARTTDOS

POLÍTTCOS

O estudo da função eleitoral dos partidos políticos exige necessariamente uma análise rigorosa de todo um regime disperso por noÍmas constitucionais (tse; e por vários diplomas legais, já que no nosso ordenamento jurídico não existe um Código de Direito Eleitoral (184) que reúna toda a legislação nesta matéria. O quadro jurídico que regula o Direito Eleitoral português integra, para além de normas constitucionais, uma série de legislação ordiniária, que está dispersa por muitos diplomas e que necessita de uma interpretação correcta e exaustiva para uma melhor compreensão da função eleitoral dos partidos políticos.

ltar) A CRP, aprovada em 2 de Abril de 1976 pela Assembleia Constituinte e que entrou em vigor em 25 de Abril de 1976, desde logo consagrou os grandes princípios definidores de Direito Eleitoral português. (184) De salientar que foi, pela primeira vez, nomeada pelo X Govemo Constitucional (por despacho de 3 de Março de 1986 do Ministro da Administração Intema, publicado no Didrio da República,Il Série, n.'71, de 26 de Março de 1986) uma comissão de juristas independentes presidida pelo Prof. Doutor Joncr MInaNpa, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, incumbida de proceder à elaboração de um projecto de Código Eleitoral que codificasse toda a legislação nesta matéria. Esta comissão apresentou o seu trabalho em relatório apresentado ao Govemo sob a forma de um projecto de Código Eleitoral, publicado no Boletim do Ministério da Justiça,n."'364, de 1987. Com base neste estudo, foi presente a Conselho de Ministros em 20 de Dezembro de 1990 uma ante-proposta de lei de Código Eleitoral para ser apresentada à Assembleia da República. Esta ante-proposta não chegou, no entanto, a ser aprovada. @

Wolters Kluwer Portugal I Coimbra Editora

Parte

192

I-

Teoria Geral do Estado

Assim, exigir-se-á uma aniílise cuidada de toda a legislação eleitoral vigente, nomeadamente da que visa regular a eleição dos órgãos colegiais (185): - Assembleia da República; - Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira; Legislativa da Região Autónoma dos Açores; - Assembleia autarquias Órgãos das locais; e - Parlamento Europeu. Não existe um estudo dourinal sistemático sobre esta função especÍfica dos partidos políticos, embora muitos autores se tenham debruçado já sobre esta figura em geral, quer em termos de Ciência Política quer em termos de Direito Constitucional ou Político (186). Por conseguinte, existiu em Portugal, como facilmente podemos verificar, um défice de trabalhos de investigação sobre questões eleitorais, tornando a tarefa mais difícil, mas ao mesmo tempo mais aliciante. Parece assim interessante fazer esta análise sistemática e, tanto quanto possível, exaustiva do Direito eleitoral português (187), que nos pode levar para além de um estudo meramente descritivo de regime jurídico à compreensão de uma matéria que tem sido algo controvertida na Doutrina de uma entidade que é por - a natureza político-jurídica do si só um dos elementos estruturantes regime democrático em que vivemos: os paÍtidos políticos. Surge-nos de imediato, muitas vezes em regime de monopólio, o poder de apresentação de candidaturas como o principal papel ou função eleitoral dos partidos políticos. Contudo, um estudo mais aprofundado de toda a legislação e de todo o processo eleitoral demonstra-nos que as suas intervenção e participação se estendem muito para além da apresentação de listas partidrárias de candidaturas aos órgãos políticos elec-

tivos. Tanto assim é que somos

levados a concluir, nos termos da Constitúção e da lei, que a função eleitoral dos partidos políticos írssume

(185) Eleições onde é, directa e imediatamente, patente a intervenção dos partidos

políticos. (186) Na expressão de Anulxoo M. MAReuEs GuEDEs, in Ciência Política,ll Teoria Geral do Estado, 1982, pág.3. ltez; Direito que teve, segundo JoRcr MnlNoe, de ser todo erguido desde a base, rn O Direito,Ill Volume, lD2, Sobre a Comissão Nacional de Eleições, pl9.3».

@

Wolters Kluwer Portugal I Goimbra Editora

4. As partidos políticos

193

relevância em todo o Direito Eleitoral muito para além do poder de apresentação de listas de candidatos. JoncB Mnexo.l autonomiza a função eleitoral como tarefa dos partidos políticos, que se traduziria por excelência, entre outros (188), nos actos de promoção do recenseamento, propaganda das candidaturas e dos candidatos e fiscalização do escrutínio. O partido político é assim, em nosso entender, uma das mais importantes (189), se não a mais importante, entidade com funções eleitorais. Independentemente do que atrás é referido, a nossa Constituição não deixa de consagrar (190) que a participação directa e activa dos cidadãos na vida política constitui condição e instrumento fundamental de consolidação do sistema democrático, ao mesmo tempo que consagra uma ampla reserva de participação exclusiva para os partidos políticos legalmente constitúdos. Como exemplo, o n." 2 do artigo 10.'da Lei Fundamental prevê que «Os partidos políticos concorrem para a organização e para a expressão da vontade popular (...)>>, termos em que se consagra uma espécie de