Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas [3 ed.] 0800557688, 9788502156265

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Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas [3 ed.]
 0800557688, 9788502156265

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Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas

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OBRAS DO AUTOR

Código de Processo Penal anotado, Saraiva. Código Penal anotado, Saraiva. Comentários ao Código Penal (2 v.), Saraiva. Crimes deporte de arma de fogo e assemelhados', anotações à parte criminal da Lei n. 9.437, de 20 de fevereiro de 1997, Saraiva. Crimes de trânsito, Saraiva. Decisões anotadas do Supremo Tribunal Federal em matéria criminal, Saraiva. Direito penal, 1o volume, Saraiva. Direito penal, 2o volume, Saraiva. Direito penal, 3o volume, Saraiva. Direito penal, 4o volume, Saraiva. Imputação objetiva, Saraiva. Lei Antitóxicos anotada, Saraiva. Lei das Contravenções Penais anotada, Saraiva. Lei dos Juizados Especiais Criminais anotada, Saraiva. Novas questões criminais, Saraiva. Novíssimas questões criminais, Saraiva. O novo sistema penal, Saraiva. Penas alternativas, Saraiva. Prescrição penal, Saraiva. Questões criminais, Saraiva. Temas de direito criminal, 1a série, Saraiva. Teoria do domínio do fato no concurso de pessoas, Saraiva.

DAMÁSIO E. DE JESUS

Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas 3a edição 2a tiragem 2009

Editora

B S araiv a

y—

Edi tora

Saraiva Av. Marquês de Sõo Vicente, 1697 - CEP 01139-904 Borra Fundo - Sõo Poulo-SP Vendos: (11) 3613-3344 (tel.) / (11) 3611-3268 (fox) SAC: (11) 3613-3210 (Grande SP) / 0800557688 (outras locolidodes) E m É [email protected] — Acesse: www.soraivcijur.cori.bf FILIAIS

ISBN 978-85-02-15626-5 Dados Internacionais de Cotologoçõo no Publicação (CIP) (Cômoro Brasileira do Livro, SP, Brasil) Jesus, Domásio E. de, 1935Teoria do domínio do foto no concurso de pessoos / Domósio E. de Jesus. — 3. ed. — Sõo Poulo: Saraivo, 2002. Bibliografia.

a m a z o n a s / r o n d ô n iv r o r a i m a / a c r e

Ruo Costa Azevedo, 56 - Centro Fone: (92) 3633-4227 - Fax: (92) 3633-4782 - Monous BAHIA/SERGIPE Ruo Agripino Dóreo, 23 - Brotos Fone: (7 1 )3 3 8 1 -5 8 5 4 / 3 3 8 1 -5 8 9 5 Fox: (71) 3381-0959 -S o to d o r BAURU (SÃO PAULO) Ruo Monsenhor Cloro, 2-55/2-57 - Centro Fone: (14) 3234-5643 - Fax: (14) 3234-7401 - Bouru CEARÃ/PIAUt/MARANHÃO Av. Fíomeno Gomes, 670 - Jocorecongo Fone: (85) 3 2 38 -2 32 3/3 23 8-138 4 Fox: (85) 3238-1331 -Fortoiezo

1. Concurso de pessoos (Direito penol) 2. Direito penol 3. Foto juridico 4. Nexo cousol I. Título. Editado tombém como livro impresso em 2002. L_

índice para cotólogo sistemático: 1. Concurso de pessoos: Teoria do domínio do foto: Direito penol 343.237

DISTRITO FEDERAL SIG 0 0 3 BI. B - lojo 97 - Setor Induslriol Grófko Fone: (61 )3 3 4 4 -2 9 2 0 / 3 3 4 4 -2 9 5 1 Fox: (61) 3344-1709 -B ro sS o GOIÁSAOCAHTIHS Av. Independendo, 5330 - Setor Aeroporto Fone: (6 2 )3 2 2 5 -2 8 8 2 / 3 2 1 2 -2 8 0 6 Fox: (62) 3224-3016-GoiÔnio MATO GROSSO DO SUL/MATO GROSSO Ruo 14 de Juf», 3 1 4 8 -Centro Fone: (67) 3382-3682 - Fax: (67) 3382-0112 - Canpo Grande MINAS GERAIS Ruo Além Poroíbo, 449 - Logoinho Fone: (31) 3429-8300 - Fax: (31) 3 4 2 9 -8 3 1 0 - Belo Horizonte PARÁ/AMAPÁ Travesso Apinogés, 186 - Botisto Compos Fone: (9 1 )3 2 2 2 -9 0 3 4 / 3 2 2 4 -9 0 3 8 Fox: (91) 32 41 -0 49 9-Belém PARANÁ/SANIA CATARINA Ruo Conselheiro lounndo, 2895 - Prodo Vefio Fone/Fax: (41) 3332-4894 -C u ritto PERNAMBUCO/PARAÍBA/R. G. DO NORTE/ALAGOAS Ruo Corredor do Bispo, 185 - Boo Visto Fone: (81) 3421-4246 - Fax: (81) 3 4 2 1 - 4 5 1 0 - Recife RIBEIRÃO PRETO (SÃO PAULO) Av. Francisco Junqueira, 1255 - Centro Fone: (16) 3610-5843 - Fax: (16) 3 6 1 0 8 2 8 4 - Ribeirão Preto RIO DE JANEIRO/ESPÍRITO SANTO Ruo Visconde de Santo Isabel, 113 o 119 - Vlo Isobel Fone: (21) 2577-9494 - Fax: (21) 2 5 7 7 8 8 6 7 / 2577-9565 Rio de Joneiro RIO GRANDE DO SU L

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Nenhumo porte desta publicoçõo poderó ser reproduzido por qualquer m e» ou formo sem o prévio outorízoçõo do Editora Soroivo. A violoçõo dos direiras outorois é crime esfobetecido no Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penol

ABREVIATURAS

art(s). cap. CF cit. CP Ed. ed. loc. cit. n. op. cit.

— — — — — — — — — —

P-



PJ — RBCDP— RF RJTJSP — RT s.

— —

artigo(s) capítulo Constituição Federal citado Código Penal Editora edição locus citatus (local citado) número(s) opus citatus (obra citada) página(s) Paraná Judiciário Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal Revista Forense Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo Revista dos Tribunais seguintes

VI

trad. v. v. g. v.

ABREVIATURAS

— — — —

tradução vide verbi gratia (por exemplo) volume

SUMÁRIO

Abreviaturas.................................................................

V

Nota do a u to r .................................................................

IX

1. Concurso de pessoas e relação de causalidade .... 1.1. Os requisitos do crime e o nexo de causalidade .. 1.2. O declínio do prestígio da exigência do nexo causal ................................................................ 1.3. Responsabilidade penal e relação causal: nossa posição...............................................................

1 1 1 4

2. Concurso de pessoas ............................................... 6 2.1. Autoria individual, autoria coletiva e partici­ pação .................................................................. 6 2.2. O nexo de causalidade como requisito da au­ toria e da participação...................................... 6 2.3. Nossa nova posição a respeito da exigência da relação de causalidade material na partici­ pação................................................................... 10 3. Teorias sobre as formas de realização da conduta típica: autoria e participação.................................. 13 3.1. As teorias mais importantes sobre o conceito de autor.............................................................. 13

v in

SUMÁRIO

3.1.1. Teoria extensiva...................................... 3.1.2. Teoria restritiva...................................... 3.2. Posição do Código Penal brasileiro...............

14 15 16

4. Teoria do domínio do f a to ....................................... 4.1. Introdução......................................................... 4.2. Espécies de autoria em face do domínio do fato . 4.2.1. Autoria propriamente d ita ..................... 4.2.2. Autoria intelectual................................. 4.2.3. Autoria m ediata...................................... 4.2.4. C o-autoria.............................................. 4.3. Formas de co-autoria ....................................... 4.3.1. Co-autoria d ire ta .................................... 4.3.2. Co-autoria parcial ou funcional ........... 4.4. Co-autoria e co-autor sob outras form as

17 17 18 19 19 19 21 22 22 22 25

5. Participação..............................................................

25

6. Extensão da teoria do domínio do fato .................

27

7. O Código Penal brasileiro e a teoria do domínio do f a to ............................................................................ 27 Bibliografia nacional consultada pelo a u to r

29

Bibliografia estrangeira consultada pelo a u to r

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NOTA DO AUTOR

Adotávamos a exigência do nexo de causalidade como requisito da participação no tema do concurso de pessoas. Assim, v. g., no induzimento, entendíamos que o indutor só respondia pelo crime se causal sua conduta. Caso con­ trário, o fato seria considerado atípico. Com o passar dos anos, depois de muito estudo e medi­ tação, as idéias amadurecem, os conceitos vão se sedimen­ tando, e o autor se descobre submetendo a revisão crítica as suas próprias posições. Nílton Bonder, em O segredo judaico de resolução de problemas, lembra que, de acordo com a tradição cabalística “a realidade existe em camadas, como uma cebola”*. Com efeito, em face de um tema tor­ mentoso como o da causalidade material, o desfazimento uma a uma de suas camadas, pelo estudo de seu conteúdo, aplicação a casos concretos e a outros institutos, permite o surgimento e a visão de encobertos meandros jurídicos, tomando, às vezes, incorretos e inadequados velhos e pa­ cíficos conceitos, exigindo a formulação de outros princí­ pios e a tomada de novas posições. Isso aconteceu conosco na questão da relação de causalidade objetiva como condi­

* São Paulo: Imago, 1995, p. 12.

X

NOTA DO AUTOR

ção da participação. Há tempos estamos avaliando a se­ guinte hipótese: imagine um roubo praticado por diversos sujeitos. Uns subjugam as vítimas; outros subtraem valores; outros transportam o grupo, e um deles atua como sen­ tinela ou “olheiro”. Aplicando-se o pressuposto da exigên­ cia da causaüdade da participação, se esta fosse causal — necessária, indispensável — , o vigia seria considerado partícipe e, portanto, responsável também pelo assalto; caso contrário, o evento não lhe seria atribuído. Nesta última hipótese, para a teoria tradicional, incidindo o art. 13, caput, do Código Penal, não seria partícipe do roubo por ausên­ cia do nexo de causalidade. Essa orientação, que sempre defendemos, hoje não é aceitável. Passamos a entender que o sentinela responde pelo crime de roubo nos dois casos, ainda que não causal seu comportamento. Na distinção entre autoria e participação, éramos par­ tidários da teoria restritiva, na modalidade objetivo-formal, considerando executor somente quem realiza concretamente o verbo típico. Diante disso, estávamos obrigados a con­ siderar mero partícipe o sujeito que, num homicídio, segu­ rasse a vítima a fim de ser esfaqueada ou, num roubo, fos­ se o chefe da quadrilha. Essa orientação, hoje, não nos parece correta: os sujeitos, nos dois casos, devem ser tidos como co-autores. Por isso, estamos também adotando a “teoria do domínio do fato”, considerando que atende mais adequadamente a solução de várias questões que envol­ vem um dos mais fascinantes institutos do Direito Penal, o concurso de pessoas. Procuramos ser o mais didático possível, dividindo os assuntos em itens, de forma a permitir melhor compreen­ são da matéria. Nosso trabalho não esgota o assunto. Não tivemos essa pretensão. Na bibliografia serão encontrados artigos, livros e

NOTA DO AUTOR

XI

monografias de grande extensão e profundidade, abordando todos os aspectos do concurso pessoal. Aqui, em pequena exposição singela, quisemos apenas deixar firmado nosso novo posicionamento a respeito de dois pontos: 1Q) passamos a adotar a teoria do domínio do fato com todas as suas conseqüências; 22) estamos desprezando o nexo de causalidade objeti­ va na participação, mantendo-o na autoria direta material. Esperamos que nosso novo posicionamento provoque debates e questionamentos, adesões e críticas, formas de seguir no rumo do aperfeiçoamento da ciência penal. Não se trata de simples “mudança de idéias”. É amadu­ recimento, avanço. Um passo a mais na busca de um Di­ reito Penal garantidor.

São Paulo, junho de 1999 Damásio E. de Jesus

TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO NO CONCURSO DE PESSOAS

1. Concurso de pessoas e relação de causalidade 1.1. Os requisitos do crime e o nexo de causalidade Conceituamos crime, sob o aspecto formal, como fato típico e antijurídico. O fato típico, nos crimes materiais de ação, compõe-se, para efeito didático, de conduta dolosa ou culposa, resultado, nexo de causalidade e tipicidade. Assim, na hipótese de o sujeito, agindo dolosamente, des­ fechar tiros de revólver na vítima, matando-a, encontrare­ mos a conduta dolosa (disparo), o resultado (morte), a re­ lação causal entre a ação e o evento e a tipicidade (art. 121, caput, do CP). Dessa maneira, o fato material, formado de comportamento, evento e relação causal, aliado à tipicidade, integra, para efeito de compreensão, o fato típico. E este, acrescido da ilicitude, conduz à existência de crime.

1.2. O declínio do prestígio da exigência do nexo causal Nos últimos tempos, alguns autores vêm recomendan­ do a eliminação da relação de causalidade como elemento do fato típico, que passaria a conter, como requisitos do cri­

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me material e de ação, somente o comportamento doloso ou culposo, o resultado e a tipicidade. Com o advento do Di­ reito Penal da Culpabilidade — ensinam — toma-se desne­ cessária a verificação da relação entre a conduta e o resulta­ do, uma vez que só pode sofrer o juízo de censurabilidade (culpabilidade) quem concretiza o fato típico, dentro do qual se encontra o evento, conseqüência da ação. Desse modo, o juiz, na fase da verificação da culpabilidade, necessariamente passa pela averiguação da prática do fato típico, em que se acham o comportamento e o resultado. Se não estão conec­ tados ao agente, este deve ser absolvido. Não é nova a idéia de excluir-se o nexo causal material dos códigos penais. A Comissão Redatora do Código Penal Tipo para a América Latina, em sua segunda reu­ nião, realizada no México (sessão de 20 de outubro de 1965), recomendou a não-inclusão de dispositivo a respei­ to do nexo de causalidade objetiva. Naquela oportunidade, Heleno Cláudio Fragoso, Relator da Comissão brasileira, anotou que “a matéria da causalidade provoca gravíssimas discrepâncias doutrinárias e jurisprudenciais, conduzindo a situações de grande confusão na aplicação da lei penal”1. Em outro trabalho, afirmou que a matéria da relação de causalidade é um “daqueles conceitos que devem ser dei­ xados à elaboração doutrinária, como o conceito de culpa­ bilidade. Esse é o caminho que vão seguindo todos os có­ digos e projetos mais recentes”2. No dizer de Bustos Ramirez, no estágio atual da teoria do deüto, “o dogma da cau1. Código Penal Tipo para Latinoamérica, México: Academia Mexicana de Ciências Penales, 1967, p. 70. 2. “A reforma da legislação penal - 1”, RBCDP, Rio de Janeiro, 2:59, 1963.

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salidade não serve para nada e fica reduzido a um ‘puro dogma’, vazio completamente de conteúdo”3. No mesmo sentido: Alberto Silva Franco4. De acordo com os doutrinadores, o tema do nexo causal, relevante para a teoria naturalística da ação, à medida que esta foi perdendo terreno na doutrina, diminuiu de importância, substituído pelo prin­ cípio de que não há pena sem culpabilidade. Para outros, a questão é de tipicidade, de amoldar-se ou não o fato mate­ rial ao modelo legal, de modo a poder ser atribuído ao su­ jeito, tema que supera, por inclusão, o nexo causal, poden­ do por isso ser excluído. Percebendo a função diminuta da relação causal, José Frederico Marques, em trabalho espe­ cífico sobre o assunto, notou que, se a causalidade tivesse importância absorvente, “a tipicidade estaria reduzida a um papel subalterno, quando não inócuo”5. Além disso, a pre­ sença do nexo causal é apenas início da responsabilidade penal, tanto que no próprio tipo se inclui o dolo, delimitador subjetivo da imputação do resultado. Entre nós, acatado na Reforma Penal de 1984 o princípio da culpabilidade e, por isso, extinto todo resquício de responsabilidade penal ob­ jetiva, como se depreende do art. 19 do Código Penal, se­ gundo o qual o resultado só pode ser imputado a título de dolo ou culpa, alguns doutrinadores afirmam que não há mais necessidade de socorrer-se da relação causal objeti­ va. Como dizia Heleno Cláudio Fragoso em 1963, “excluí­ da a responsabilidade objetiva, já não há por que cuidarse, com tanta precisão, de estabelecer clara solução 3. Manual de derecho penal espanol, Madri, 1:174, 1984. 4. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 131. 5. “Co-autoria”, RF, 173:507.

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legislativa para o dificílimo problema de causalidade. A questão não tem, sob outro aspecto, a magnitude que se imaginava: a causalidade somente surge nos crimes mate­ riais, apresentando dúvidas em número muito restrito de casos”6. Por isso, Welzel observava que somente em pou­ cos delitos, como homicídio, lesões corporais e incêndio, o tema da causalidade oferece maiores interesses7. A Comissão Revisora do Anteprojeto de Código Penal de 1969, de Nélson Hungria, atendendo às objeções que apa­ receram na época, suprimiu as disposições referentes ao imputatio facti. O Código Penal de 1969, porém, de acordo com o que informou a Exposição de Motivos, decidiu “man­ ter, com pequenas correções, o que se refere à relação de cau­ salidade, considerando que se trata de regra que jamais trouxe qualquer dificuldade na aplicação da lei penal, sendo de fácil compreensão pelos juizes. Suprimir esse dispositivo seria ensejar a reabertura de largo debate que ainda hoje divide a doutrina, entre as teorias fundamentais sobre o nexo causal, o que haveria de conduzir a incertezas e dificuldades na aplica­ ção da lei” (n. 8). A Reforma Penal de 1984 seguiu essa orien­ tação, mantendo a disciplina do nexo de causalidade no art. 13 do Código Penal. Por isso incidiu na crítica da doutrina8.

1.3. Responsabilidade penal e relação causal: nossa posição Realmente, acatada a responsabilidade pessoal e subje­ tiva, que tem como centro a culpabilidade, só pode ser conde6. “A reforma da legislação penal - 1”, cit., 2:59. 7. Derecho penal alemán\ parte geral, 11. ed., Jurídica de Chile, 1970, p. 66. 8. Franco, op. e loc. cits.

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nado, v. g., por homicídio doloso quem “matou alguém”, o que pressupõe o nexo de causalidade. Ausente este, não se pode considerar que o sujeito “matou alguém”. De ver-se, contudo, que, adotada irrestritamente a teoria de que o Di­ reito Penal da Culpabilidade leva ao desprezo do nexo cau­ sal, por ser supérfluo, quando ausente este, opera-se a absol­ vição do agente por falta de censurabilidade, pressupondose, então, que cometeu um fato típico e antijurídico. Ora, se alguém, por exemplo, é acusado da prática de um crime de homicídio e comprova-se que a morte não adveio de sua conduta, não se pode dizer que realizou um fato típico, ten­ do em vista que o resultado não foi causado pela ação. Absolvê-lo por ausência de culpabilidade é reconhecer que praticou um crime, quando, na verdade, nem fato típico pode ser-lhe imputado. Não se identificam os efeitos da ausência de fato típico e de culpabilidade. Na primeira hipótese, o fato não ingressa no campo do Direito Penal, ficando impe­ didos o inquérito policial e a ação penal; no segundo, como há o cometimento de um delito, procede-se à persecução criminal, beneficiando-se o acusado pela absolvição somente no momento da análise do mérito da pretensão punitiva. Além disso, em muitos casos, como de causas antecedentes, concomitantes e supervenientes, absolutamente independen­ tes da conduta do sujeito, a exclusão do nexo de causalida­ de, afastando o fato típico e não a culpabiüdade, constitui exigência de um Direito Penal garantidor. É certo que, inexistindo nexo objetivo entre a conduta e o resultado, o fato é atípico, pelo que se prescindiria da exigência da cau­ salidade, substituída pela tipicidade. Nos crimes materiais e de ação, entretanto, a presença da regra de que o resultado só é imputável a quem lhe deu causa constitui uma garantia na solução dos casos que envolvem a autoria direta e material.

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Daí por que não concordamos com a tese da desnecessi­ dade do nexo causal como elemento do fato típico nos casos de autoria direta e material, reconhecendo a conveniência de sua subsistência e a manutenção do art. 13 do Código Penal, que disciplina o tema.

2. Concurso de pessoas 2.1. Autoria individual, autoria coletiva e participação Em regra, os crimes são cometidos somente por um sujeito, hipóteses que podemos chamar de “autoria indivi­ dual”. O delito, entretanto, às vezes resulta da conduta de mais de uma pessoa, sendo que algumas têm participação meramente acessória na realização do fato, não podendo por isso ser denominadas “autoras”, recebendo o nome de “partícipes”. Se, em relação ao autor material direto, como vimos, convém incidir o requisito do nexo de causaüdade, de questionar sua exigência no tocante ao partícipe, o que passaremos a analisar.

2.2.0 nexo de causalidade como requisito da autoria e da participação No Brasil, o concurso de pessoas, seja co-autoria, seja participação, sempre esteve sujeito ao requisito do nexo de causalidade9. Assim, a Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 já dizia que o antigo art. 25, que tratava do

9. Nilo Batista, Concurso de agentes, Rio de Janeiro: Liber Juris, 1979, v. 7.

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concurso de agentes, era “mero corolário” do art. 11, que disciplinava o nexo causal objetivo (n. 22). Em face disso, cuidando da participação, nossos penalistas, em sua quase-unanimidade, seguindo a orientação da doutrina estran­ geira, especialmente a italiana, e aplicando a teoria exten­ siva, sempre exigiram sua relevância causal. Como dizia José Frederico Marques, “sem um comportamento relevan­ te, sob o aspecto causal, não se pode falar em participação. Não há participação no crime, relevante para o Direito Pe­ nal, sem ato exterior que se inclua na cadeia causal” 10. No mesmo sentido, Heleno Cláudio Fragoso sentenciava: “se falta contribuição causal inexiste participação”11. Da mes­ ma forma: Bento de Faria, Nélson Hungria, Roberto Lyra, Costa e Silva, Magalhães Noronha, Baliseu Garcia, Salga­ do Martins e Aníbal Bruno; modernamente, Evandro Lins e Silva, Celso Delmanto, Luiz Vicente Cem icchiaro, Mirabete e Cezar Bitencourt. Doutrina italiana da necessi­ dade causal da participação seguida pelos autores brasilei­ ros: Guamieri, Ranieri, Frosali, Pedrazzi, Bettiol, Cavallo, Pisapia e Morelli12. Vide sobre essa tradicional exigência na doutrina italiana: Giovanni Fiandaca e Enzo Musco13. Isso significa que a doutrina, no Brasil, orienta-se no senti­ do de que é aplicável às formas de concurso de pessoas o art. 13, caput, do Código Penal, que adotou os princípios

10. Tratado de direito penal, Campinas: Bookseller, n. 7,1:407, 1997. Verbete: “relevância causal das condutas”. 11. Lições de direito penal: a nova parte geral, Rio de Janeiro: Forense, n. 249, 1985, p. 268-9. 12. Relação de Antonio Pagliaro, in Principi di diritto penale, Milão: Giuffrè, 1993, nota 13, p. 540. 13. Diritto penale; parte generale, Roma: Zanichelli, 1995, p. 448.

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da equivalência dos antecedentes e da consideração da causa segundo o sistema da eliminação hipotética. A conduta do partícipe, de acordo com essa orientação, só é típica quando, sem ela, o delito não teria ocorrido. A jurisprudência não se aparta da doutrina, inserindo a causalidade material como con­ dição da participação14. Esse entendimento, entretanto, não convém que seja acatado, como procuraremos demonstrar. Suponha-se um assalto cometido por diversos sujeitos. Um deles atua como sentinela. Apücando-se o pressuposto da exigência da causalidade da conduta, se esta fosse causal, seria considerado partícipe e, portanto, responsável também pelo roubo; caso contrário, o evento não lhe seria imputado. Em outros termos, de acordo com a teoria da eliminação hipotética da eventual conduta relevante, para ser apreciada como indispensável ou não a contribuição, devemos excluíla da cadeia causal: se, eliminada, o assalto não se consu­ masse, seria causal, havendo responsabilidade pelo resulta­ do; se, retirada, ainda assim houvesse roubo, não se mostra­ ria causal, não se lhe podendo atribuir o evento. Admita-se que a participação do vigia tenha somente apressado a fuga dos meliantes. Excluída, haveria delito da mesma forma, somente retardada a retirada do local. Para a teoria tradicional, incidindo o art. 13, caput, do Có­ digo Penal, não seria partícipe do roubo por ausência do nexo de causalidade. Tal solução não se sustenta. No caso, o sentinela deve responder pelo assalto, indispensável ou não sua conduta, desprezando-se o requisito da relação causal. No sentido do texto: Paulo de Souza Mendes, “Crítica à idéia de ‘diminuição do risco’ de Roxin”, RBCP, 14. RT, 375:287,432:319,487:312,524:346 e 676:325; RJTJSP, 10:411 e 22:493.

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São Paulo, 74:106, nota 15, abr.-jun. 1996. Como dizia Novoa Monreal, “é possível prestar ajuda à realização de um delito mediante uma conduta que não seja indispensá­ vel para o resultado típico. Pode perfeitamente acontecer que alguém somente favoreça uma atuação do autor: por exemplo, acelerando a produção do resultado punível, que, sem essa ajuda, de todo modo, teria chegado a ocorrer, ou então facilitando uma atuação do autor, que, sem essa aju­ da, sempre se teria produzido. Com isso está cooperando na atuação do delinqüente principal, porém mediante atos secundários, que não são decisivos para a produção do de­ lito, mas que simplesmente tornam mais rápido e fácil o resultado típico. Temos que entender, em conseqüência, que a relação causal não é requisito indispensável para a atua­ ção do auxiliar ou cúmplice” 15. Imagine-se uma hipótese de homicídio. Sabendo que “A” pretende matar a vítima “B”, o armeiro “C”, também seu inimigo, incentiva-o à prática do delito e melhora a mira de sua arma de fogo, aderindo objetiva e subjetivamente ao fato. “A” mata “B”. De acordo com a prova, ainda que a mira não fosse melhorada e ausente a instigação, “C”, com firme propósito, executaria a vítima. Aplicando-se a exigên­ cia causal, “C” não seria partícipe, não respondendo pelo crime. Essa conclusão não é convincente, restringindo in­ devidamente a área do concurso de pessoas16. Nós, já em 1971, não obstante inserindo também a rele­ vância causal como requisito do concurso de pessoas, dizía­ mos que a doutrina estava “exagerando na questão da in-

15. “Algumas considerações sobre o concurso de pessoas no fato punível”, RBCDP, Rio de Janeiro, 16:11,1967. 16. Fiandaca e Musco, op. cit., p. 448.

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fluência do tema da causalidade no problema da co-delinqüência”17. Alertávamos sobre isso nas primeiras edições de nosso Direito Penal18 e nos Comentários ao Código Penal19, crítica que permanece até hoje20. Já tínhamos percebido que a aplicação irrestrita da causaüdade na participação condu­ zia a soluções incorretas. Nesse sentido, analisando especi­ ficamente a participação, Esther de Figueiredo Ferraz afir­ mava que esse modo de encarar o concurso de pessoas “con­ vidava a um comodismo funesto em conseqüências”21. E, fulminando o dogma causal, Nilo Batista criticava a sua con­ figuração como base conceituai do concurso de pessoas22.

2.3. Nossa nova posição a respeito da exigência da rela­ ção de causalidade material na participação Estamos abandonando a relevância causal como re­ quisito da participação. Nesse sentido: Hippel, Engisch, Mayer, Sauer, Merkel, Wessels, Weber, Camelutti, Grispigni, Padovani, Pagliaro e Novoa Monreal23. 17. Damásio E. de Jesus, Da co-delinqüência em fa ce do novo Código Penal, “Prêmio Costa e Silva de 1971”, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976, p. 9. 18. Damásio E. de Jesus, Direito penal, São Paulo: Saraiva, 1:366, 1978. 19. Damásio E. de Jesus, Comentários ao Código Penal, 2. ed., São Paulo: Saraiva, 11:519, 1986. 20. Damásio E. de Jesus, Direito penal, 22. ed., São Paulo: Sa­ raiva, n. 5,1:406, 1999. 21. A co-delinqüência no direito penal brasileiro, São Paulo, Bushatsky, 1976, p. 12. 22. Op. cit., v. 8, p. 30 e s. e 149. 23. V. discussão sobre o tema in Jescheck, Tratado de derecho

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Como entende Nilo Batista, “a causalidade não pode constituir um critério central para a imputação do fato em caso de concursos de agentes”; assim, “nem a instigação nem a cumplicidade devem ser necessariamente causais”24. Nesse sentido, considerando que “a participação se insere na cadeia causal, mas não é indispensável”: Paulo José da Costa Júnior25. No mesmo sentido, dispensando a causali­ dade na cumplicidade (auxílio material): Pierangelli26 e Wagner Brússolo Pacheco27. Na verdade, o princípio do nexo causal só pode servir à consideração do fato cometido pelo autor material. Mas não se presta às outras formas do concurso de pessoas, que devem ser regidas pelo dogma da tipicidade. A participa­ ção não precisa ser causal. Tanto é que, entre nós, a contri­ buição de somenos importância conduz à redução da pena (art. 29, § Ia, do CP). Se é de “somenos” importância, que significa de valor inferior, reles, vil28, não pode ser causal, necessária. Se fosse “necessária”, por ser causal, não seria de “somenos” importância. Nesse sentido: Antonio Pagliaro29. De observar que em nenhum lugar os arts. 29 a 31 do penal-, parte general, trad. Mir Puig e Munoz Conde, Barcelona: Bosch, 11:964e s., 1981; Pagliaro, op. cit., p. 541. 24. Op. cit., VIII: 149 e XXX: 154. 25. Curso de direito penai, parte geral, São Paulo: Saraiva, 1:113, 1991. 26. “O concurso de pessoas e o novo Código Penal”, RT, 680:304, b\ Escritos jurídico-penais, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 68. 27. “Concurso de pessoas: notas e comentários”, RT, 720:387. 28. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo dicionário Au­ rélio da língua portuguesa, 2. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p. 1610. 29. Op. cit., p. 542.

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Código Penal, que disciplinam o concurso de pessoas, men­ cionam o nexo causal como requisito do instituto. Ao con­ trário, o art. 29, caput, e § 22 recomendam a exigência do dolo na delimitação do resultado e a consideração da cul­ pabilidade como critério informador da responsabilidade penal. Note-se que a participação apresenta natureza aces­ sória: configura um comportamento que se agrega a uma conduta principal de autoria. Esta, sim, deve revestir-se do atributo do nexo de causalidade. Além disso, se a contri­ buição paralela necessitasse do requisito da causalidade entre a conduta e o resultado naturalístico, não poderia ha­ ver participação nos delitos de mera conduta e na omissão imprópria30. Em suma, para nós, alterando posição anterior, o partícipe responde pelo fato ainda que sua contribuição não seja causal. Se causal, como veremos, detendo o do­ mínio do fato, não é considerado partícipe, e sim co-autor. A participação está ligada à tipicidade e à conduta e não ao nexo de causalidade. Cuida-se de uma hipótese de adequação típica de subordinação mediata, por extensão ou ampliação. Na adequação típica de subordinação direta, como sabemos, o fato amolda-se ao modelo legal de forma imediata, sem a interfe­ rência de outro dispositivo. Exemplo: “A” mata “B”, agindo dolosamente. O fato enquadra-se na figura do crime de homicí­ dio (art. 121, caput, do CP), não havendo necessidade de outra norma. Na adequação típica de subordinação mediata (amplia­ da ou por extensão), o fato não se enquadra imediatamente na norma penal incriminadora, exigindo-se para isso o concurso de outro dispositivo. E o que acontece na participação por induzimento, instigação e auxílio (cumplicidade), uma vez que a conduta do partícipe não se ajusta de forma imediata ao tipo, 30. Idem, p. 541

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exigindo o emprego de outra disposição para o perfeito enquadramento: “quem, de qualquer modo, concoire para o crime incide nas penas a este cominadas” (art 29, caput, do CP). Assim, na participação existe ampliação espacial e pessoal do tipo, pois a descrição delitiva, com o concurso da regra do art 29, não abrange somente o comportamento que se amolda imediatamente em seu núcleo, estendendo-se também às con­ dutas que, de qualquer modo, concorrem para a realização do crime. Vê-se que nas formas de contribuição moral e material, fora da autoria, há extensão do tipo incriminador, de maneira que a concorrência acede à ação do executor material. Esta, sim, não prescinde do nexo com o resultado. A lei, para efeito de responsabilidade penal, equipara a con­ duta do partícipe à do autor material. Dessa forma, a causalida­ de, na participação, apresenta natureza normativa e não objeti­ va. E a norma do art 29, caput, que determina: responde pelo crime não só o executor físico, que produz o resultado, mas também o partícipe, que acede sua conduta à ação principal. Em suma, nos crimes materiais exige-se nexo de cau­ salidade entre a ação e o resultado. Logo, o art. 13, caput, só é aplicável ao autor direto (quem matou, lesionou etc.), tendo em vista que a relação ali disciplinada é objetiva, material, entre a conduta e o resultado. Já o art. 29, caput, regula a extensão punitiva ao comportamento do partícipe, é de ordem normativa e não material.

3. Teorias sobre as formas de realização da conduta típi­ ca: autoria e participação 3.1. As teorias mais importantes sobre o conceito de autor Existem várias teorias sobre o conceito de autor, que envolve o de partícipe:

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Ia) teoria extensiva; 2a) teoria restritiva, subdividida em: a) teoria objetivo-formal; b) teoria objetivo-material; 3a) teoria do domínio do fato (de origem restritiva).

3.1.1. Teoria extensiva Com fundamento na doutrina causal da equivalência das condições, conceitua autor como todo aquele que, de qualquer forma, produz o resultado. É uma doutrina cau­ sal. Adotando um critério objetivo, não distingue autor de partícipe. Assim, no homicídio, são autores mandante e executor. Autor não é só quem concretiza o comportamen­ to típico, como também aquele que, mediante as formas de participação, realiza conduta sem a qual o resultado não teria ocorrido. Reconhece, entretanto, haver diferença, no plano subjetivo, entre quem concretiza o núcleo do tipo e quem contribui para o delito por induzimento, instigação ou auxílio, preconizando, neste caso, tratamento punitivo mais suave. A pena abstrata, do ponto de vista objetivo, é a mesma para todos. Subjetivamente, contudo, quem não realiza a conduta típica deve receber pena menor. Daí socorrer-se esta doutrina da “teoria subjetiva da participação”, para a qual autor é quem age com dolo de autor (animus auctoris) e deseja o fato como próprio; partícipe, quem re­ aliza o comportamento com dolo de partícipe (animus socii) e quer o fato como alheio31. Assim, tendo contribuído para 31. Günter Stratewerth, Derecho penal, parte general, trad. Gladys Romero, Madri: Edersa, 1982, p. 231; Cezar Roberto Bitencourt, Manual de direito penal, parte geral, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 431-2.

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o resultado mediante qualquer conduta, a consideração do sujeito como autor ou partícipe depende da direção e con­ teúdo de sua vontade32. Daí também denominar-se “teoria subjetiva causal”. A teoria extensiva de autor, com seu complemento subjetivo de participação, foi refutada pela doutrina, uma vez que permitiria, segundo a vontade do sujeito, ser con­ siderado autor quando, não tendo realizado a conduta tí­ pica, quisesse o fato como próprio, e partícipe se, efeti­ vando o comportamento do núcleo do tipo, desejasse o crime como alheio.

3.1.2. Teoria restritiva Autor é quem realiza a conduta típica expressa no ver­ bo. E o executor material do fato33: quem mata, ofende, sub­ trai, constrange etc. Esta teoria, em sua conceituação origi­ nal, justamente por não poder ser aplicada a comportamen­ tos que deveriam ser considerados de autor, é completada por uma teoria objetiva de participação, com duas facetas: Ia) Teoria objetivo-formal: distingue autoria de partici­ pação, considerada esta na hipótese de o sujeito realizar uma ação ou omissão que não se enquadra no verbo cen­ tral, concorrendo para o crime mediante induzimento, ins­ tigação ou auxílio. A conduta do partícipe, em princípio, é atípica, uma vez que não se amolda ao núcleo da figura penal, tomando-se típica em face de norma de ampliação temporal (art. 29, caput, do CP). Aparecem nítidas e dis-

32. Jescheck, op. cit., n. IV, 11:894. 33. Franco, op. cit., p. 344.

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tintas as imagens do autor (ou executor) e do partícipe. Se “A” empresta a arma para “B” matar a vítima “C”, “A ” é partícipe e “B”, autor ou executor. Era a doutrina que adotá­ vamos, sem o socorro à teoria do domínio do fato. 2a) Teoria objetivo-material: distingue autor de partí­ cipe pela maior contribuição do primeiro na causação do resultado. A teoria restritiva recebeu críticas, tendo em vista que, não obstante reconhecer a diferença entre autor e partícipe, não resolve a questão da denominada “autoria mediata” ou “autoria de escritório”, em que o sujeito serve-se de outra pessoa, como instrumento executório, para a prática deli­ tuosa34. Além disso, sob o aspecto da teoria objetivo-formal, em um delito de estupro, se um sujeito aponta a arma e outro mantém conjunção carnal com a vítima, o primeiro seria autor e o segundo, partícipe, uma vez que o verbo típico é “constranger” (art. 213 do CP); o chefe de uma quadrilha de assaltantes que não participasse materialmente dos roubos seria considerado mero partícipe. Nesses ca­ sos, o senso comum que informa o princípio da natureza das coisas indica o estuprador e o chefe da quadrilha como verdadeiros autores e não simples partícipes.

3.2. Posição do Código Penal brasileiro Nosso Código Penal adotou a teoria restritiva, já que os arts. 29 e 62 fazem distinção entre autor e partícipe. Assim, o art. 62, IV, agrava a pena em relação ao agente que “execu­ 34. Munoz Conde e Mercedes García Aran, Derecho penal, parte general, Valencia: Tirant lo Blanch, 1996, p. 450.

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ta o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa” (destaques nossos). Quem executa o crime é autor; quem induz, instiga ou auxilia considera-se partícipe. Isso, entretanto, não resolve certos problemas, como o da autoria mediata, em que o sujeito se vale de outrem para cometer o delito. Daí a necessidade de a doutrina socorrerse da teoria do domínio do fato, que, aliada à restritiva, dá adequação apropriada aos casos concretos.

4. Teoria do domínio do fato 4.1. Introdução Welzel, em 1939, ao mesmo tempo em que criou o finalismo, introduziu no concurso de pessoas a “teoria do domínio do fato”, partindo da tese restritiva e empregando um critério objetivo-subjetivo: autor é quem tem o controle final do fato, domina finalisticamente o decurso do crime e decide sobre sua prática, interrupção e circunstâncias (“se”, “quando”, “onde”, “como” etc.). É uma teoria que se assen­ ta em princípios relacionados à conduta e não ao resultado. Agindo no exercício desse controle, distingue-se do partícipe, que não tem o domínio do fato, apenas cooperando, indu­ zindo, incitando etc.35. Constitui tese restritiva, aplicando critério objetivo-sub­ jetivo. Não é inteiramente objetiva nem subjetiva. É mista. Por isso é denominada “objetivo-subjetiva”. Além disso, exige apreciação caso a caso em face da descrição do crime. 35. Batista, op. cit., p. 77; Teresa Pizarro Beleza, Direito penal, Lisboa: AAFDL, 11:394, 1997.

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Apresentando a finalidade como fundamento, como na teoria finalista da ação, é amplamente adotada pela doutri­ na: Welzel, Stratenwerth, Maurach, Wessels, Roxin, Schrõder, Jescheck, Gallas, Blei, Zaffaroni, Munoz Conde, Córdoba Roda, Rodríguez Devesa, Mir Puig, Bacigalupo, Enrique Cury e Bockelman; no Brasil: Manoel Pedro Pimentel, Alberto Silva Franco, Nilo Batista, Luiz Régis Prado, Cezar Bitencourt, Pierangelli e Luiz Flávio Gomes. E a teoria que passamos a adotar. Em outras palavras, nossa posição adere à teoria do domínio do fato, que é uma tese que complementaadoutrinarestritivaformal-objetiva,aplicandocritério misto (objetivo-subj etivo). De notar, pois, que a teoria do do­ mínio do fato não exclui a restritiva. E um complemento. Unemse para dar solução adequada às questões que se apresentam en­ volvendo autores materiais e intelectuais de crimes, chefes de quadrilha, sentinelas, aprendizes, motoristas, auxiliadores, indutores, incentivadores etc. Sob rigor científico, é mais um re­ quisito da autoria que uma teoria do concurso de pessoas35 A. A

4.2. Espécies de autoria em face do domínio do fato Na teoria do domínio do fato, a autoria abrange: l 2) autoria propriamente dita (autoria direta individual e imediata); 22) autoria intelectual; 32) autoria mediata; e 42) co-autoria (reunião de autorias). 35-A. No mesmo sentido, adotando nosso entendimento: José Francisco Cagliari, Concurso de pessoas — Os conceitos de autoria e participação e a teoria do domínio do fato, in Teoria da imputação objetiva e teoria do domínio do fato, Caderno Jurídico, São Paulo: Escola Superior do Ministério Público, 7:167, abr. 2001.

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4.2.1. Autoria propriamente dita Na autoria propriamente dita (autoria direta individual e imediata), o autor ou executor realiza materialmente a conduta típica (executor material individual), age sozinho, não havendo indutor, instigador ou auxiliar. Ele tem o do­ mínio da conduta.

4.2.2. Autoria intelectual Na autoria intelectual o sujeito planeja a ação delituosa, constituindo o crime produto de sua criatividade. É o caso do chefe de quadrilha que, sem efetuar comportamento tí­ pico, planeja e decide a ação conjunta36. A Constituição da Repúbüca refere-se ao autor intelectual quando, determi­ nando a inafiançabiüdade dos crimes hediondos e asseme­ lhados, emprega a expressão “mandante”37. O Código Pe­ nal agrava a pena do autor intelectual, referindo-se ao su­ jeito que “promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes” (art. 6 2 ,1).

4.2.3. Autoria mediata Na autoria mediata, uma pessoa, o “sujeito de trás”, serve-se de outrem para praticar o fato38, podendo a ele 36. Enrique Cury, Derecho penal, parte general, Santiago do Chile, 11:245, 1985; Franco, op. cit., p. 345; Fragoso, op. cit., n. 243, p. 264. 37. Luiz Vicente Cemicchiaro e Paulo José da Costa Júnior, Direito penal na Constituição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990, n. 4.1 e 4.2, p. 173-4. 38. Jescheck, op. cit., p. 898-9; Germano Marques da Silva, Direi­ to penal português', parte geral, Lisboa: Editorial Verbo, 11:285, 1998.

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ser atribuída a “propriedade” do crime39. Ele possui o domínio da vontade do executor, chamado de “instrumen­ to”. Exemplos: o hipnotizador sugere ao hipnotizado a prática de um delito; o sujeito constrange alguém, medi­ ante grave ameaça, a assinar documento falso. Nesses casos, não há participação, uma vez que o autor mediato tem o domínio do comportamento e da vontade de seu executor material. E autor. A autoria mediata inclui as seguintes hipóteses: a) ausência de capacidade penal do instrumento por menoridade penal, embriaguez ou doença mental (art. 62, m, do CP); b) coação moral irresistível ou obediência hierárquica (art. 22 do CP); c) erro de tipo escusável determinado por terceiro, em que o instrumento age sem dolo (art. 20, § 22, do CP); d) erro de proibição invencível (art. 21, caput, do CP). No primeiro caso (a), o autor mediato determina a um inimputável por menoridade ou doença mental a prática de um crime. No segundo (b), incidem sobre o “instrumento” coação moral irresistível ou ordem de superior hierárquico (art. 22 do CP). Na terceira hipótese (c), o autor mediato conduz o instrumento humano a incidir em erro de tipo invencível. Exemplos: o sujeito, mediante comunicação fal­ sa de crime, provoca erro da autoridade policial, que efe­ tua a prisão de um inocente; o caçador induz o companhei­ ro a atirar naquilo que aponta como animal, sabendo que na verdade é uma pessoa. Nesses casos, o innocent agent, 39. Santiago Mir Puig, Derecho penal, parte general, 3. ed., Barcelona: PPU, 1995, p. 396. Vide sobre o tema: Carolina Bolea Bardon, Autoria mediata en derecho penal, Valência: Tirant lo Blanch, 2000.

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como é denominado o instrumento pelos autores de língua inglesa, é induzido a realizar uma conduta que supõe pe­ nalmente irrelevante, quando, na verdade, é criminalmente punida40. Por fim, no erro de proibição (d) o instrumento incide em erro sobre a ilicitude da conduta. Nesse tema, dá-se o nome de “instrumento” ao “executor imediato”, que concretiza materialmente o crime sem dolo ou sem culpabilidade, não possuindo o domínio final do fato. De observar que a expressão “instrumento” é reservada à pes­ soa humana e não a animais ou coisas41. Vide sobre a auto­ ria mediata: Emilio Moreno y Bravo42, Estebam Juan Pérez Alonso43 e Nilo Batista44.

4.2.4. Co-autoria Na co-autoria (reunião de autorias), que constitui for­ ma de autoria, o co-autor realiza o verbo típico ou concre­ tiza parte da descrição do crime, ainda que, no último caso, não seja típica a conduta perante o verbo, desde que esteja abarcada pela vontade comum de cometimento do fato. É a prática com unitária do crim e, segundo Johannes Wessels45. Cada um dos integrantes possui o domínio da 40. Gianville Williams, “Principals and acessories”, in Crimi­ nal law, general part, 2. ed., Londres, 1953, p. 350, § 120. 41. José María Luzón Cuesta, Compendio de derecho penal, parte general, Madri: Dykinson, 1998, p. 209. 42. Autoria en la doctrina dei Tribunal Supremo, Madri: Dykinson, 1997, p. 73 e s. 43. La coautoría y la complicidad (necesaria) en derecho pe­ nal, Granada: Editorial Cornares, 1998, p. 172 e s. 44. Op. cit., p. 103. 45. Direito penal, parte geral, trad. Juarez Tavares, Porto Ale­ gre: Sérgio A. Fabris, Editor, 11:117, n. 1, 1976.

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realização do fato conjuntamente com outro ou outros au­ tores, com os quais tem plano comum de distribuição de atividades46, e quer realizar como próprio o fato comum com a cooperação dos outros47. Há divisão de tarefas, de maneira que o crime constitui conseqüência das condutas repartidas, produto final da vontade comum. E nenhum deles é simples instrumento dos outros. Não é necessário, portanto, que haja hierarquia ou subordinação de uma von­ tade a outra48.

4.3. Formas de co-autoria A co-autoria pode ser: l 2) direta; e 22) parcial ou funcional.

4.3.1. Co-autoria direta Na co-autoria direta todos os sujeitos realizam a con­ duta típica. Exemplo: diversas pessoas agridem a vítima produzindo-lhe lesões corporais.

4.3.2. Co-autoria parcial ou funcional Há divisão de tarefas executórias do delito. Trata-se do chamado “domínio funcional do fato”, assim denomi­

46. Juan Bustos Ramirez, op. cit., p. 331. 47. Luiz Carlos Perez, Tratado de derecho penal, Bogotá: Ed. Ternis, 11:15, 1967. 48. Enrique Bacigalupo, Princípios de derecho penai, parte ge­ neral, 3. ed., Madri, 1994, p. 228.

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nado porque alude à repartição de atividades (funções) en­ tre os sujeitos49. Os atos executórios do iter criminis são distribuídos entre os diversos autores, de modo que cada um é responsável por uma parte do fato, desde a execução até o momento consumativo. As colaborações são diferen­ tes, constituindo partes e dados de união da ação coletiva, de forma que a ausência de uma faria frustrar o delito. É por isso que cada um mantém o domínio funcional do fato50. Exemplos: no roubo, são divididas as ações de apoderamento do dinheiro, constrangimento dos sujeitos passivos mediante ameaça, vigilância e direção do veículo; no ho­ micídio, um sujeito segura a vítima e outro a esfaqueia51; no estupro, um a ameaça com emprego de arma e outro mantém com ela conjunção carnal. Na co-autoria (parcial ou funcional), como ficou con­ signado, parte da doutrina exige que a contribuição seja cau­ sal, isto é, que a conduta de cada um dos autores seja de tal modo necessária que, sem ela, o crime não seria cometido. Nessas hipóteses, ensina Munoz Conde, só pode haver co-autoria se, a par do acordo, a conduta constitui uma parte essencial da concreta realização do delito52. Caso contrário, há participação. Assim, no exemplo do sentinela (“campana”) 49. Gomez Benitez, ‘Teoria jurídica dei delito”, in Derecho penal, parte general, Madri, 1992, p. 128; Moreno y Bravo, op. cit., p. 57. 50. Manoel Pedro Pimentel, “A teoria do crime na reforma pe­ nal”, RT, 591:293; Pacheco, op. cit., p. 383. 51. Exemplo de Eugenio Raúl Zaffaroni e Pierangelli, Manual de direito penal brasileiro; parte geral, São Paulo: Revista dos Tribu­ nais, 1997, p. 675. No mesmo sentido: Teresa Pizarro Beleza, op. cit., p. 402; André Luiz Callegari, “Concurso de pessoas — Teorias e reflexos no Código Penal”, Revista Ibero-Americana de Ciências Penais, Porto Alegre: Centro de Estudos Ibero-Americano de Ciên­ cias Penais, 0:26, maio-ago. 2000. 52. Op. cit., p. 455.

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do crime de roubo, será co-autor ou partícipe, segundo a sua contribuição causal. Se, caso estivesse ausente, não se con­ sumaria o assalto, é co-autor; se a sua ação apenas permitiu fuga mais rápida, deve ser considerado partícipe53. Esse critério, entretanto, com base na teoria da rele­ vância causal, não pode ser acatado pela nossa posição, como vimos, uma vez que só aceitamos o dogma da causa­ lidade na autoria direta. No caso do vigia, como também nas hipóteses do motorista, do “aprendiz assistente” e do “informante”, sua consideração como co-autor ou partícipe depende da presença do domínio final do fato e não do requisito da causalidade material. No sentido parcial desse entendimento, afirmando que na cumplicidade não é ne­ cessário que a intervenção seja causal: Pierangelli54. A contribuição do sentinela, v. g., é penalmente rele­ vante, ainda que não causal, desde que tenha facilitado “ou tomado mais expedita a execução do fato”, mesmo “que pudesse ser dispensada pelo autor”55. É também co-autor o motorista que aguarda os assaltantes nas proximidades do estabelecimento bancário ou que transporta a vítima de seqüestro (co-autoria fracionada)56. No sentido de que é partícipe não só quem realiza conduta que tomou possível a prática delituosa, como também quem facilita o cometi­ mento do crime: Fiandaca e Musco57. Assim, ainda que não causal, a contribuição do partícipe é criminalmente relevante se facilitou ou reforçou a conse53. Zaffaroni, Teoria dei delito, Buenos Aires: Ediar, 1973, p. 648; Zaffaroni e Pierangelli, op. cit., p. 675. 54. “O concurso de pessoas e o novo Código Penal”, cit., p. 304, b. 55. Idem, p. 304-5. 56. André Luiz Callegari, “Concurso de pessoas — Teorias e reflexos no Código Penal”, cit., 0:27, n. 2.2.3. 57. Op. cit., p. 451.

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cução do objetivo final, características que se aproximam da teoria italiana da “causalità agevolatrice o di riforzo”58.

4.4. Co-autoria e co-autor sob outras formas A co-autoria ainda pode ser: l 2) simples: dois executores da conduta típica, por exemplo; 22) complexa: um executor e outro co-autor intelectual ou funcional, por exemplo. O co-autor pode ser: l2) direto ou material: ele é um dos sujeitos que executa o verbo do tipo. A Constituição Federal refere-se ao autor di­ reto quando, determinando a inafiançabilidade dos crimes hediondos e assemelhados, emprega a expressão “executor”59; 22) intelectual: na repartição de tarefas, é autor da idéia delituosa (caso do mandante, que detém o domínio do fato) ou se lhe incumbe organizar o plano criminoso. No sentido de que o mandato é forma de determinação: Alberto Silva Franco60; 3*)funcional: cabe-lhe, na missão criminosa, executar parte do comportamento típico.

5. Participação Partícipe, na doutrina do domínio do fato, é quem efetiva um comportamento que não se ajusta ao verbo do tipo e não tem poder de decisão sobre a execução ou consumação do crime. 58. V. o tema in Fiandaca e Musco, op. cit., p. 448-9. 59. Cemicchiaro e Costa Júnior, op. cit, n. 4.1 e 4.2, p. 173-4. 60. Op. cit., n. 1.03, a2, p. 348.

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São, pois, características da participação: Ia) a conduta não se amolda ao núcleo da figura típica (o verbo); 2a) o partícipe não tem nenhum poder diretivo sobre o crime, isto é, não possui o domínio finalista do fato. Nesse sentido: Alberto Silva Franco61, Manoel Pedro Pimentel62, Pierangelli63, Nilo Batista64, Luiz Régis Prado65 e Wagner Brússolo Pacheco66. Contribui, por intermédio de conduta acessória, para a concretização do com portam ento típico, m ediante induzimento (determinação), instigação ou auxílio material (a chamada cumplicidade). No sentido da sinonímia, na dou­ trina brasileira, entre auxílio e cumplicidade: Heleno Cláu­ dio Fragoso67 e Wagner Brússolo Pacheco68. Distinguem-se autor, co-autor e partícipe. O autor de­ tém o domínio do fato; o co-autor, o domínio funcional do fato, tendo influência sobre o “se” e o “como” do crime; o partícipe só possui o domínio da vontade da própria condu­ ta, tratando-se de um “colaborador”, uma figura lateral, não tendo o domínio finalista do crime. O delito não lhe perten­ ce: ele colabora no crime alheio. Nesse sentido: Manoel Pedro 61. Op. cit., n. 1.01, p. 345. 62. Op. cit., p. 293. 63. “O concurso de pessoas e o novo Código Penal”, cit., p. 311. 64. Op. cit., p. 77. 65. Curso de direito penal brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 267. 66. Op. cit., p. 387. 67. Heleno Cláudio Fragoso e Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, Rio de Janeiro: Forense, v. 1, t. 2, 1978, p. 635 e 637. 68. Op. cit., p. 387.

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Pimentel69; Luiz Régis Prado e Cezar Roberto Bitencourt70; Pierangelli71. 0 mandante é autor intelectual e não partícipe, uma vez que detém o domínio do fato. No sentido de que o mandante é autor intelectual: Luiz Carlos Perez72. 0 indutor ou determinador, o instigador e o auxiliador são meros partícipes, desde que, não dominando subjetivamente o fato, restrinjam sua contribuição ao simples induzimento, encorajamento ou auxílio secundário.

6. Extensão da teoria do domínio do fato Só é aplicável aos crimes dolosos, sejam materiais, sejam formais ou de mera conduta73. Nos culposos, inexiste distinção entre autoria e participação: é autor todo aquele que, mediante qualquer conduta, produz um resultado típi­ co deixando de observar o cuidado objetivo necessário.

7 .0 Código Penal brasileiro e a teoria do domínio do fato O Código Penal, na reforma de 1984, adotou a tese fi­ nalista, como pode ser demonstrado pela introdução do dolo na estrutura da conduta e na conceituação do erro de tipo e de proibição. Por coerência lógica, admitimos, como faz 69. Op. cit., p. 293. 70. Código Penal anotado, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, n. 3, p. 244. 71. “O concurso de pessoas e o novo Código Penal”, cit., p. 311. 72. Op. cit., p. 23. 73. José Ulises Hemández Plasencia, La autoria mediata en derecho penal, Granada: Editorial Cornares, 1996, p. 79, mencionando crimes materiais e de mera conduta.

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DAMÁSIO E. DE JESUS

Alberto Silva Franco, que nosso estatuto penal também aco­ lheu a teoria do domínio do fato74. No sentido de que o Có­ digo Penal vigente adota a teoria do domínio do fato: Manoel Pedro Pimentel75; Nilo Batista76; Pierangelli77; Luiz Régis Prado e Cezar Roberto Bitencourt78; Wagner Brússolo Pacheco79. Note-se que o art. 6 2 ,1, do Código Penal determina a agravação da pena daquele que “promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agen­ tes”, referindo-se, obviamente, ao sujeito que possui o do­ mínio do fato. No mesmo sentido: Nilo Batista80.

74. 75. 76. 77. 78. 79. 80.

Op. cit., p. 345. Op. cit., p. 294. Op. cit., p. 56. “O concurso de pessoas e o novo Código Penal”, cit., p. 297. Op. cit., n. 2 e 3, p. 243-4. Op. cit., p. 381. Op. cit., p. 80.

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