O Manto de Penélope [1ª ed.]
 85-359-0263-5

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JoÃo PINTO FURTADO

O manto História, mito e

de Penélope

memória da Inconfídência

Mineira de 1788-9

WNASRAS

©

Copyright

2002 by João Pinto Furtado

Capa Ettorc Bottiní

sobrc Tiradentes (Mantenha a liberdade quae sera tamen), obra de Wesley Duke Lee (l979, técnica mista) pertencente ao acervo do Museu dc Arte de São Paulo Assís Chateaubríand, fotografada por Luiz

Hossaka

Índice remissivo

Caren Inoue Prepamção Cláudía Cantarín Revisão

Ana Maria Barbosa Alexandra Costa da Fonseca

Dados Intcrnacíonaís dc Catalogação na Publicaçã o Câmara Brasíleira do Lívro. sP, Brasil

((:u')

Para

Furmd0, Ioão Pínto

O mamo

de Pcnólope

:

hístóría,

lnconñdência Mincim de l788~9 São Paulo

:

/

Companhía das Letras

mim

João

e

Pimo

memóría da Furlado.

-

Ian 85~359-0263-5 Brasil

1.

-

História

_ Inconñdência Mineira, 1789

Título.

02-3264

cnn-981.0321

Índice para calálogo sístemáticoz l.

lnconñdêncía Míneira

:

Brasil

:

Históría

98 l .032l

[2002]

Todos os

direítos desta edição reservados à EDITORA SCHWARCZ LTDA.

Rua Bandeira 04532-002 Tclcfone

Fax

(11)

Paulista 702

_ São Paulo -

(11)

cj.

32

sP

3167-0801

3167-0814

www.companhiadasletras.com.br

quq continua conosca

Para Fernanda, sempre, a mulher que eu am0. Para Iosé Geraldo, Célia e Maíca, que tornaram tudo posszveL

2002.

Bibliograñn

I.

Elisa,

Sumário

Agradecimentos

............................................................................................

Primeiras palavras l.

Monumentos

........................................................................................

11

............................................................................................

31

Inconñdências sobre os inconñdentes Diálogo

2.

com

..............................................

48

Fontes, registro e publicação

63

Fragmentos

...............................................................................................

.........................................................

Transição econômicaz demograña e posses

......................................

As condições materiais de existência da Inconñdência

Testemunhos

Nação

....................

76 81

87

1oo

............................................................................................

e região nas vozes

inconñdentes

República e representação política 4.

40

a historiograña

Lavras, ñnanças, ofícios e roças

3.

9

Interpretações

.............................

....................................................

...............................................................

Insurrecionismo, rebeldia e acomodação

Adminístração, justiça e poder na perspectiva luso-brasileira

........

193

......................................................

203

.............................................................................................

215

Reformismo Outras palavras

e sedição nas

Minas

.......................................................

................................................

Agradecimentos

Relação de gráñcos, quadros e tabelas Abreviaturas

.......................................................

..........................................

.......................................................

......................................................

Referências bibliográñcas

Créditos das ílustrações Índice remissivo

....................................................... ...........

.......................................................

..........

........................

................................................... . ......................

.................

311

313

Este livro é

uma versão

revista e

ampliada de

|vndída junto à Universidade de São Paulo, '|'nrnou-se possível graças

tese

de

doutcl>ra,m'ent0

no programa de

ao concurso, direto ou ind1reto, de

uma sér1:

::C1:S: .

u ms

c instituíções

que temo não conseguir enumerar.e,

dcsculpo por alguma eventual omissão.

d_el“

HlStorTa

e p.ortant,0, des.

/pme

JIÍICHF

No plano instltuaonaL e

píeãlscgnsmo Pessoa innar o apoio da Coordenadoria de Aperfeiçoamentlo de ~ ode bOISa Hupcrior (Capes), órgão do governo federal que atraves da Clonãelssao deserk «lu Programa de Incentivo à Capacitação Docente (P1CD) v1a1.)1 12(?u Departamento de História da UírlllverSIdãÊ e, Feden vnlvimento dos estudos. x

O

_

ImClO d 0 ml dc Ouro Preto concedeu-me a liberação de encargos didathOS ,nO 0 ¡›mccsso de qualíñcação, pelo que sou extremamente grato. Tarflbem DePaÃQ l.uncnto de História da Universidade Federal de

Minas Gerals,

cor.n

gínd

gcncmsidadm acolheu o projeto e concedeu todo o apoio à sua c0.nthultt: Seà Os amigos Fábio Faversani, Marco Aurélio Santana e Rodrlgo a u sw Mntta, colegas de jornada acadêmíca desde muito cedc?, ofereceâam estímulo à contlflmdade 0 tr::alho podero ¡mrlc permanente e

foram um

so

mterlocutores e refe: Pinto Venâncio e Tarcísio Rodrigues Botelho são alggns aspecâ0§› rôncia intelectual de longa data, tendo contribuído, quanto a. Flguexr edo Ro r1indicações técnicas e bibliográñcas preciosas. André

chuto

mm

p1ciou-me o acesso a obras de

tes

no

dífícíl

trabalho, e a elas agradeço

com

fontes íconográñcas e

A

obtenção.

O

historíador Márcio Jardím,

Primeiras palavras

carínho. Maralíz V. Christo índicou-me

tem sído ínterlocutora freqüente. Carla María Junho Anastasía devo os melhores

agradecimentos. Foi presença decisiva na deñníção de mínha carreira acadêmica e indicou, ainda, documentos e textos médítos que foram de grande ímportância na reflexão empreendida. Além dela, as professoras doutoras Laura de Cecílía Helena de Mello e Souza; Salles Olíveíra e Leila

Mezan

Algranti, membros examínadora, fízeram da banca precíosas sugestões e indicações bibliográñcas e docu~ mentaís que muito ajudaram na consolídação e no

amadurecímento do text0. Luís Carlos Víllalta, presença constante nas notas de rodapé, maís que uma referência é muíto biblíográñca. Amígo de todas as horas, foí~o assíduo interlocutor mais acadêmíco do trabalh0, desde 0

do projeta Informações acadêmicas,

em suma,

momento da montagem

referêncías

documentais

'

'

O certo é quejá não há homens; porem que havza de arma r uma meada

e bíbliográñcas,

ínconfídêncías de toda espécie foram sua melhor Contríbuição Iongo dos últimos ao anos. Por outro lado, o processo de

tal)

orientação revelou~se

que

em

deZ, V in i e

Ou Cem an0$,

ha V'la de dese mbaTa Ça1.

YlaO SC

.

.

.

.

.

F ra se atribuída a Ioaquim Iosé da Sllva XaVIer por Vlcente Vlelr a À

.

.

.

da Mota Autos de devassa da Inconfídenaa Mmezra (5.407)

-

l

~

~

-

z

]f

1

_

-] 1

]

]

sã0, sob todos aspectos, dignos

foi

de admíração. Finalmente, Fernanda Borges de Moraes, a assídua ínterlocutora,

quem 0 trabalho é dedicado, além de permanente testemunha das agruras e

avan-

.

.

Spl

.

.

.

.

.

r \

,

S

11

haviam concorrido com extrema excitação àquele que seria espetáculos do absolutismo português no Brasíl viram-se,

um

dos últimos

após o corpo pen-

der da forca, tomados por certa melancolia, como porâneo, frei Penaforte, autor dos Últimos

bem

retratou

momentos dos

1789 pelo fmde que cada

um

05 assistiu

seguiu seu caminho

mento de culpa

de confíssão.2 Após o cumprimento do ritual

como que tomado por uma mistura de

e arrependimento. Naturalmente, tudo isso

efn outros locais, por exemplo glosas

que

se rejubílavam pelo

ñdelidade à raínha

como

“d.

d.

Maria

um contem~

inconfidentes de

em

não impedíu que

Vila Rica, acontecessem festas civís e reli-

malogro da conspíração 1,

sentij

que

e pela reafírmação

se tornaria conhecida,

da

posteriormente

,

Maria, a louca”.3

sentencíar que Tiradentes deveria ter seu corpo decapitado e partido em quartos, depoís de morte “natural para sempre”4 na forca, a Coroa procurava reañrmar simbolicamente a autoridade sobre o corpo do vassalo. Anti-

O

o que era premente

avançavam a passos

estar

assegurando a

em um contexto em que o céleres e a França, a

si

próprio alguma sobrevida

Iluminismo

e as ídéias liberais,

maior das monarquías

absolutistas

danEu.ropa, já havía

ob)et1vos

sucumbido ao poder da burguesia em ascensã0. Porém os visados pelas medidas repressivas da monarquia ibérica em

1;92 consolidaram: além de não conter o movimento de redeñnição política que se daria poucas décadas maís tarde, a partir de 1808 a Coroa parece ter conseguido, em Hagrante paradoxo, apenas dar ínício a um processo que

não

mnis sobre esse

momento

histórico fundamental da História

na criação de

um

mito, o do herói abnegado e perseverante, movido por grande ídealismo e destínado aínda que em um período posteríor e através de sua apropriação pelo ímaginário nacional a ínterferir

_

-

decisíva-

mente nos rumos da História do Brasil. É na confluência temporal entre a ascensão dos novos valores pregados pela burguesia emergente e a decadência dos antígos, aos quais a Casa Real

portuguesa ainda se apegava aguerridamente, que se situam os principais ma.s e protagonistas deste livro. Seja

mals reformadora,

como

tomando partido de uma

o caso de alguns dos inconñdentes, persp'ectiva maís conservadora e “regressista”, no caso de outros, tagonlstas ainda

foi

podem nos revelar, em suas contradições e

seus depoimentos e ações,

do

dizer algo

bem

Brasil,

mmo sobre seus desdobramentos. Nesse sentido, 0 lívro parte do princípio de quc é preciso,

em relação ao tema da Inconñdência Mineira de

1788-9,

ir

além

aparências e vísões consagradas e retomar outras possibilidades de expli-

mlus

u|ção,

no presente sugerídas pelos novos conhecímentos disponíveís

e pelas

novas abordagens historiográñcas.

Temos de considerar o movimento em

múltiplos aspectos e tentar refletir

sobre seu alcance e sobre a natureza de suas

upropriações políticas; tentar identiñcar por que, añnaL os problemas

seus

relati-

vos à representação política, às liberdades individuais e à cidadania são tão

ra,

o que é recorrente na História do

Assim como Penélope

manter e reavivar seus votos nupciais

também

ñdência Mineira

Brasil.

fazia, desfazia e refazia

com

de

tentar

da Incon-

parece refazer e reinterpretan a cada geração e a

cm busca de certo reavivamento da idéia de liberdade. Paradoxalmente, todavia, o mesmo “manto” que, por fora, revela uma forma, um desenho ou bor-

em

dado, encobre

seu interior aspectos do “conteúdo”

cle,

de

alguns dos quais serão aqui reexaminados

em

que

se

esconde sobre

sua historicidade e a partir

um diálogo com as tendêncías maís recentes da historiograña sobre o mo-

vímento, sobre Minas Gerais e sobre a América portuguesa no fmal do século XVIIL6

Em suma, este livro procura examinar os processos de construção,

desconstrução e reconstrução permanentes da historiograña sobre o tema da

Inconñdência Mineíra, os quais parecem retomar de tempos

em tempos

o

legado simbólíco de seus agentes: a permanente promessa, supostamente não

cumprida, de

um regime de governo representativo de fato.

te-

uma

nossos pro-

ambigüidades

manto para

perguntas de cada conjuntura, as linhas gerais do levante, sempre

partir das

O drama que teve seu desenlace em 21

perspectiva seja

seu

Ulísses,5 a historiograña

se

resultaria

podem nos

partícularmente afeitos e vinculados ao discurso sobre a Inconñdêncía Minei-

Ao

go Regíme português julgou

mcnte, se de novo inquiridos, nossos “atores políticos”

em

apogeu e

de

uma capítania que sempre foi

abril

de 1792 esteve ligado ao

cercada pelos maiores cuida-

dos e vigilância por parte da Coroa portuguesa, a ponto de a historiograña ter

añrmado que

te,

“a imposição

em

suas formas materíaís de exístência e em ;eus costumes, aspectos novos sobre o objeto de que aqui nos ocupamos. Certa-

crise

de

foi



nessa capítania das Minas Gerais que se deu, efetívamen-

do Estado no

Brasil”.7

Marcada desde

a origem pela ativida-

de mineradora que, embora não sendo atividade econômica

exclusiva, foi

12 13

um

Um ambiente assim constituído com certeza não era dos mais p g

e ordeíros

do ponto de

vista político.

ñm

meíros governadores, ao gu~

In

/

l

-

5

l

z

chuvosa e

a

fria região

A julgar

pelas palavras de

um

dos pri~

das duas primeiras décadas do século XVUI, a

centra 1 da terra mineíra “evaporava tumultos”, “exalava

' -

-

quand o não “vomitava

motins”, “tocava desaforos”,

insolências”.l°

Aínda c0n-

siderando o s depoimentos coevos, poder- se-ía inferir que o cenário domilg S

nante nas Minás e ra de

um

permanente confr onto dos novos habitantes

desejosos de enriquecer ra pidamente

S

controla r o território, prontas a se

Coroa

lhes

con feria. Nunca

partir

g

utili Zar

as autoridades de signadas para

dos instrumentos de poder que a

demais relembr ar que

em pouco tempo

guesa teve que se adap tar z

é

portanto, tentando fugir da ação limi-

- com

tadora (e arrecadadora) do Esta do g

I

e,

à

nova

também

a Coroa portu-

situação, o

de permanente tentativ a de reforço da autoridade

criação e à estruturação das primeira s instituições e

que

se

deu a

do estímulo

r ea1,

comunidades a dministra-

tivas

urbanas,

bem como

cientes.“ Exemplar, nesse aspecto, são as várias tentati vas e articulações

do quinto sobre o ouro. B em ao

sen tido de maximízar a arrecadaçâo )

)

z ›]

-

'

l

l

1

l

-

n

direito ao quinto so bre o

q

,

XC

da arrecadaçã o sempre foram objeto das três

ti

séc ulo XV111,

aplic ados alternadamente.

7

formalme nte questionadu

te a

ma is

o controlc

acres polêmicas.

pos os principais métodos adotados para a arrecadação

do quinto ao longo do

g

foi

pelos moradores das Minas, por outr o, as formas de sua aferição e

Foram de

p

ouro nunca

\

S

espírito

um Minas fosse rcmcnição, previa~se q ue um quinto de todo o ouro extraído nas legititido à Casa Real portug uesa como imposto devido. Se, por um lado, a midade do

(

no

“direito real” praticamente incontestado. P

da época, o quinto era

l

(

,

à

da articulação de redes de poder e instrumentos de controle cada vez mais soñsticados, embora, às vezes, completamente ineñ-

S

)

-

simple s separação de

tendo sid0, na maior parte do períod0,

Em pri meiro lugar, destaca-se a cobrança median~

” 20% do peso total e a “aposição do

seío real a

todo

o ouro que passav a nas famigeradas casas de fundição. Tal sistema tinha por pressuposto a expressa p roibição, em toda a capitania, da circulação de ouro cm pó ou em moedas, os quaís seriam conñscados se encontrados em podcr “capitação”, estimativa de algu ém. Outro sistema se utilízav a do método da que supunha um valor ñxo a ser pago pelo p roprietário de cada escravo (por

cabeça, daí o termo “ca pitação”), e partia uurífera

e,

do pressu posto de que

a

produção

por conseqüência, a arrecadação eram diretam ente proporcionais

14 15

ao numero de escravos empregados na ativídade mineradora. Por ñm fez-se de outro us.0 método por estímatíva, em que os moradores da regiãcl assum1am, atr.avés das câmaras munícipais e numa espécie de contrato de rísco o compromlsso de remeter pelo menos cem arrobas de ouro anuais (0 e ui\;alÊnte a 1500 quilos) à Coroa portuguesa. Nesse caso, o que excedesse aq uantldade estipulada ñcaria em poder dos míneiros. Por outro lado se nqão se :rrecadlasse 0 montante estimado pela Coroa, as câmaras se comérometiam o Volume prev15t0 através de cobrança adícionaL a decríãnnfaàtar famigerada

Os

três

métodos revelaram

cos e suscetíveis de despertar

ser,

cada

um a seu tempo, muíto problemáti-

enorme gama de

conflitos.

O

funcionamento

das casas de fundíção, na prática, além de escorchante e mais im er~ meaveÉ à sonegação, contribuía para ímobílizar a círculação de bens pr0pdutosle rlquezas na medida em que vedava as operações mais elementarés que se faz¡am, numa economía em fase de ímplantação e que passava por rá ídas transformações, a partir do ouro em pó. O método da “capitação” 'olr) seu turng re've%ou-se profundamente injusto porque, quando aplicado Lão estaPeleaa dlstmções, por exemplo, entre aqueles que possuíam lavras nãais lucratlvas e os menos aquinhoados pela sorte, ou mesmo entre os escravos que se ocÍlpavam das atividades agrícolas e os empregados na mineração. Por ñm 0 plerllo

rrlletodo

da estimatíva,

dICÊ da derrama acelto pela

com o compromisso de promover

quando não se atingissem as cem Coroa em 1751, a partir de demanda

173fl, revelava-se

o lançamento

arrobas,

perí:$-

mesmo tendo

sido

dos moradores das Mínas

em

incapaz de responder às flutuações típicas de uma economía multo marcada pelo “risco”, com eventuais quedas abruptas de produ ão como de fato ocorreu a partír da segunda metade do século. Foí esse mét(ç)do, que gelrou um “déf1cit” crescente e cumulatívo na arrecadação e, indiretamenteíserla um dos principaís elementos de instabilidade entre os moradores das Mmas e as autoridades nas últimas décadas do século XVIII, o que se expressava sobretudo no temor ínspirado pelo lançamento da derrama.'2 Estíma-se qu.e, em 1789, se lançada a derrama sobre os débitos pendentes, as câmaras terlam que arrecadar algo em torno de 528 arrobas de ouro ou se' )a› cerca de 7920 quílos, quase oíto toneladas. ,

Por toda a mtensa problemática envolvida nesses números e métodos podemos añrmar que a tentativa de “ímposição do Estado” sem,

não

se

deu

vibrante reação dos “p0vos” e das “gentes” da capitaniam

e,

de

fato,

consolidou plenamente ao longo do período

em

dcsde as primeiras décadas do século

foram palco de uma

XVIII,

questão. As

nunca

Mínas

se

Gerais,

de

série

motins, conñitos e conspirações que se espraíam até o ñnal desse século e são

que conformam os antecedentes

os elementos

que será abordado neste

livro.

e o

“pano de fund0” do tema

Exemplar desse contexto

é

o conjunto de esca-

ramuças e chacinas que se tornou conhecído como a Guerra dos Emboabas contrapôs, já na primeira década do século

dos primeiros indícios e “fontes”

XVIII,

e

os paulistas, descobridores

do ouro, aos recém-chegados imigrantes

portugueses, que se aliaram a alguns dos migrantes internos, sobretudo baianos,

uns e outros desejosos de controlar algum quinhão do lucrativo merca-

do emergente no

com

forças

interior

do BrasiL Liderados por Manoel Nunes Viana,

e

numericamente muito superiores, os portugueses conseguiram

cxpulsar os paulistas, o que se deveu, além dos feitos militares propriamente ditos, a

uma

que pesem todas dos

em

com

ardilosa traição conjugada as tentativas

Nunes Víana

ñscais e tributárias,

Em

de contenção do poder privado dos potenta~

armas, a Coroa portuguesa,

ndmitir a força de

hábil articulação política.“

ñndo o

confronto, tem que se resignar e

e seu séquito.

mas também

Embora com motivações mais

nessa linha de confronto aberto, ígual des-

lnque merece a Rebelião de Vila Rica (1720), na qual, liderada pelos portuguescs Pascoal

da

Silva

Guimarães

e Felipe

dos Santos,

uma pequena multidão

de

"mineiros” se insurgiu contra a instalação das casas de fundição, o método de urrecadar impostos supostamente mais efíciente que se lão

do conde de Assumar. Amotinados

as autoridades locais e logo

em

em Vila

propunha sob a

Rica, os rebeldes

ges-

dominaram

seguída dírigíram-se à Vila do Carmo, onde

pretendiam admoestar o governador de

modo

a

que revertesse sua decisão.

lim visível inferioridade, Assumar se diz disposto a negociar e aceita a suspensão da

medida

e das punições.

Tão logo

se

desmobilizam

as forças rebeldes, o

governador se articula para perseguir e punir os principaís rcsulta a

líderes,

do que

morte de Felipe dos Santos. Ainda na linha do confronto aberto com

us autoridades,

enquadra-se o caso dos Motins do Sertão (1736), onde,

rados por potentados

do Prado

e

em

lide-

armas como Manoel Rodrigues Soares, Domingos

Pedro Cardoso, os amotinados do noroeste da capitania protesta-

ram, entre outros motivos, contra o sistema de “capitação” proposto pela

monarquia portuguesa para melhorar a arrecadação dos

direitos tributários

16 17

reais.l5

Após uma

de percalços e derrotas de ambos os lados, o movimene acabou por se desest ruturar sem conseguir maiores ava nços na revogação do sis tema da capitação. Por out ro lado, seus principais líde res não foram mais importunados pelo govern ado r, reconhecend0-se, de par te a parte, as respectiv as jurisdiçõest Observ e-se, a propósito, como todos esses movimentos, entre outros menos con hecidos, conñrmam o potencial contestad or da população mineir a desde os primórdios da ocupação. Ainda é digno de nota 0 fato de em dois dele s o motivo central do confronto ser a questão ñscal e tributária, evidenciando ~se melhor, nesses casos, a contra posição entre “povo” e autori dades. to foi

série

perdendo algo de seu ímpeto original

débitos a cummados esp ecialmente ade quada a esse

edemido Tomás Antônio Gon zaga, ouvidorlda comarca de Víla Ríca, e 0 eloqüente alferes Ioaquí m ]osé, 0 movimento parece ter ganho maior visi

lidade

no batizado de

bi-

um ñlho

do poeta Alvarenga Peixoto em 8 de outubro de 1788, quand0, pela primei ra vez, em meio a “bravatas etílicas” e imp rec

quc

aberto a dat a efetiva de deñagraçã0, pois )ulgava-se, por aquela oca31a0,

uma

na das principai s instruções trazidas pelo novo governador sen

m

conñdente

se ria,

portant0, deñagrado a part ir da decretação da derrama e por .

mcio da senha “H0je

é

o dia do batizado”, a

ser d1v ulgada entre

rc

de Andrada e por Tiradentes.

Aos diversos participantes estariam destinadas algumas ciaisz

a

implemen tação

(,›fcnsiva mílitar

caberla

substantiva perda de pat rimônio familiar.

ade

O jovem

ñlho de

Alvarenga tampouco pod eria conceber que seu bat izado ensejaria a criaçã o da senha com a qual seria deflagrado 0 levante; não obstante, ela nunca foi pronunciada.

d e divulgação

efetiva das estratéglas

m

dau a Inácio José de Alvareng a Peixoto, a padre Rolim e a

a historiograña

que estíveram presentes a esse batizado vários inconñdentes da Comarc a do Rio das Mortes, tendo sid vez, traçadas,

vanteÊO político

De

em

o

público e

com grande

início acordou-se

excitação,

que era preciso

que estimulasse a revolta pop ular surgente que desde o iníc io caract

um

ali,

e reacendesse o velho espírito in-

erízara as Minas.

Sendo a cobrança dos

C arlos

Correia de

em

consórcio

com Franasco Antônio

de Oliveira Lopes, cabena,

res-

pcctivamente, a articulação da defesa contm as forças que proviessem de São Claud10 Paulo, da Bahia e d o Rio de ]aneiro; a Tomás Antônio Gonzaga, a

Manuel da Costa

e

ao côneg 0 Luís Vieira da Silva fôra atribuída a elaboraçao

corpo constitucional provis ório; 0 velho coronel Domingos de Abreu Vieira e Ios é Aires Gomes seriam os res ponsáveis por vultosa contnbm ção fmanceira para a compra de pólvora e armas; a Iosé Álvares Maciel caberla dc

um

l

.

>

Havia ainda os que,

como

e parte

da elaboração

1egislativa.

Luís Vaz de Toledo Pisa, Vicente Vieira da

Mota

e

~

auxiliares, e

que gravitavam

eram ñgu ras de menor grandeza, com funçoes

em

torno de par entes ou patrões mais dec151va-

mente ligados à trama. Outros, como os Resende Co sta, pai e ñlho, o padre Manuel Rodrigues da Costa, Salvador de Carvalho do Am aral Gurgel, Domingos Vidal de Barbosa Lage, Ioão da Costa Rodrigues, Antônio d e Oliveira particx~ Lopes, Ioão Dias da Mota e ]osé de Oliveira Lopes, não tinham maior .

pação na trama, embora dela tivessem conheamento valores

em

vígor,

com

e,

portanto, à luz dos

ela t ivessem consentid0. _

pela primeira

algumas das linhas do lefato de ínequívoco ape lo

condução da

.

Toledo,

l

Añrma

e a

a Tiradentes e a Francisco de Paula Freire de Andra-

Vitorían 0 Gonçalves Veloso,

uma

tarefas preferen-

.

jovem João Damasceno não podia imaginar que na sua festa de ba~ tizado estariam sendo traçados os caminhos que o levariam à orfand

paterna e a

todos os sedi-

Freiciosos por intermédio de e missários designados por Fra ncisco de Paula

coordenar o processo de produção de armas

zaga, o

rdw

üvu ao lançamento da derrama, o que deveria se dar ainda no prlimeiro §e0d0, naquela data, que 0 movxmento mmcstre de 1789. Acertou-se, grosso

ações contra 0 governador, alguns aspectos da tra ma foram trazidos à 1uz.” Batizado pelo padre Tol edo e tendo

como padrinho Tomás Antôní o Gon-

delxar l~

cm

'7

Esse tipo de problemática não nos parece inteiramente distante do hori~ zonte de alguns dos protag onistas da Inconñdência Mineira, movimento que entre 1788 e 1789 articu lou alguns dos homens mais eminentes da capita nia de Minas Geraist Emb ora o apelo “separatísta” pud esse caracterizar um horizonte relativamente novo de mobilização, a evocação da questão ñsc aL expressa pela iminente decretação da derrama, era forte indício de u'm com ponente tradicional no leva nte. Articulando hom ens tão diferentes como o emp

ñm, optou-se por

Inspirados pelo exemplo do s “americanos ingleses” e premldos pe 1 o pro cesso de t ransformação

do

econômica que

se

arrastava havia décadas, redefmin-

relações pess oais e de poder, nossos prota gonistas

começaram

perigosa e publicament e, algumas impressões sobre a conjuntura

víviam,

bem como

a trocar,

em

que

sobre o fut uro da Améríca portuguesa. F oram realizadas

18

19

pelo

menos cinco reuniões importantes no ano de

va a última, que ocorreu

ram

em

1788, sendo a mais decisi-

26 de dezembro. Nela, supostamente se deñni-

as principais propostas e linhas de ação para os primeiros

tempos que

se

Iurmc argumentaremos oportunamente, ao considerar o imaginário

políti-

m do século XVIII não podemos perder de vista que, assím como, nas palauma

Saínt-]ust, “a felicidade era

vms de

idéia

nova na Europa”, a noção de

seguiriam ao levante, o qual deveria ser deflagrado nos primeiros meses de 1789. Conforme já anunciamos, a suposta cobrança imediata de débítos pen-

.nncricanos ingleses que já possuíam forte tradição de orgamzação comun1-

dentes junto ao ñsco desde a década de 1750

l.'iria.

alardeado e largamente explorado na campanha de convencimento empreendida por Tiradentes. Pode-se dizer, poís, que o lançamento da derrama foi tão desejado pelos inconñdentes quanto temido pelos principais contratadores de impostos, que foi fato

seriam inevitavelmente chamados a quítar seus débitos pendentes.2' A importância da derrama como principal elemento gerador de descontentamento era tão prímordial que foí percebida com facilídade pelas autoridades da capitania, que não só a suspenderam, como jamais voltaram a mencionar 0

tema após

a desestruturação

dade

mesmo

ao

do

levante,

em

demonstração de grande

habíli-

tempo, de grande realismo quanto à percepção da conjuntura vívida pela capítania ao se aproximar 0 ñm do século XVIII. É impórtane,

te destacar, nesse caso,

que

a

suspensão se deu antes

mesmo da

to,

que

no entanto, não nos impede de

se deflagrasse a revolta.

citar e avaliar

Seu abortamen-

algumas das principais pr0-

postas aventadas.

Um

dos pressupostos básicos dos sediciosos

americana.

Dentre 0 extenso programa de transformações proposto pelos inconñdentes, alguns pontos sempre foram objeto de destaque na historiograña e no ima~ ginário político. Naquele contexto, os acontecímentos que resultaram na for-

mação dos Estados Unidos da América

setentríonal

eram relativamente bem

conhecidos e ensejavam acalorados debates. Isso

fez com que boa parte da historiograña de referência22 sobre o tema procurasse ídentiñcar o conteúdo e o sentido do movimento mineiro com o que almejaram Jefferson, Franklin,

seria,

e

Adams nos

portanto,

20

um

como

transplantar,

sem mediação, os

principais aspectos

I

Estados Unidos.

A idéia de criação

de

do

Amé-

portuguesa. Logo, a idéia de república ensejada por alguns dos inf30nf1-

icn

tlcntcsn de

Minas Gerais bebia muito mais da inspiração de Montesquleu do

quc da de John Locke, referência teórica indiscutível para os américaímés ~do Nnrte.

Como

decorrência dessa inspiração teórica, e da força das mstltulçoes

municipais na tradição portuguesa, os limites políticos e geográñcos dairepúhlica pretendida Iilica a

eram bem mais

opção pela mudança da

restritos

capital para

do que

já se

São Ioão del

añrlmouj o.que JusRe1, pr1nc1pa.l sede

dn Comarca do Rio das Mortes e eixo de crescimento econômico con31derávcl

no último quartel do século XVIIL Outras propostas de grande envergadura junto à historiografia e ao 1ma-

¡I_inário

nacional diziam respeito a

umizando o favorecimento da rriação de

uma

um

suposto projeto industrializante, pre-

indústria têxtil e metalúrgica,

bem como

uma

república

dos primeiros pontos de ação dos inconñdentes. Con-

à

universidade, ao estabelecimento de novaslregirasid~e regula-

çuo econômica, à eliminação de parte da carga tributária, à 1nst1tu1çao de sistcma de correios e comunicação mais ágil

e,

um

por ñm, à permissão de que

quaisquer indivíduos pudessem usar cetim, o que era vedado a

era, ainda por inspiração dos acontecimentos da América inglesa, de que seria preciso redeñnir o conteúdo e o sentido das relações entre Portugal e sua extensão

Hamilton

havia

.

adiante, e

fazer para

Não

um ensaio e uma intenção,lmesmo para gs

msaio de organização que se empreendia no Norte para o contexto da

denúncia de

Ioaquim Silvério dos Reis, isto é, tão logo o visconde de Barbacena se apercebeu de seu potencial de geração de ínstabílidade na capitania. Suspensa dera rama, o movimento perdeu fôlego, como melhor discutiremos muito pouco caberia

nvpública representativa era ainda

es.c/ravos e

uma mmade de pmjetos e propostas de ação ora mais gerais, ora mais pontuals, o que em cada Iibertos

segundo o costume da época. Enñm, tratava-se de

atendia às identidades daqueles que as

mso

que nos interessa nesse ponto

inícial

propunham. Mas sobretudo no

de reñexão, é preciso destacar que ñcou

ucordado na última reunião, a mais decisíva, de 26 de dezembro de l788, que não

se tocaria

Iizar

de imediato no problema da escravidão, sob pena de desestabi-

todo o sistema social na capitania, convicção partilhada decisivamente

pclo nosso alferes, 0 à

que

se constitui

em

notável exemplo dos limites relativos

natureza da rebelião proposta.

Não

obstante a versão da História dominante no senso

consagrado

dade

e

como

comum

o maior herói de nossa nacionalidade, protomártir

da democracia, o

alferes

Joaquim

Iosé,

o tenha Fla liber.-

na verdade, esteve mals próx121

mo das crenças e instituições do Antigo Regime português, algumas das quais Valorizava e pretendía restaurar,

añrmava,

moda

à

do que da então popular doutrina liberal que

de John Locke, a centralidade do trabalho

livre

como

valor

socioeconômicas, o que parece oferecer notável exemplo para a abordagem

em

dc alguns aspectos do problema.27 Apesar de ter nascido

vamente

estáveis

do ponto de

vista

condições

relati~

socioeconômic0, Ioaquim Iosé ñcou órfão

instítuidor de práticas políticas e sociais. Contraditória e anacronícamente,

por volta dos dez ou onze anos, passando a ser criado por familiares. Enquan-

no entanto, Tiradentes passou

lo se

à História

como o

do

principal paladino

em sua

ralismo e da democracia no Brasil.“ Recuando no tempo e retomando historicidade alguns aspectos da natureza,

do sentido

libe~

do alcance das fontes

e

que nos informam sobre o movimento, bem como examinando como

se

deu

processava o inventário dos bens da família, aos quais provavelmente

não teve

nenhum

acesso,

mais tarde seriam responsáveis pelo ofício de prático conseqüência, pela alcunha de Tiradentes.

Embora

sua apropriação e exame pela historiograña ao longo dos séculos, acreditamos

sc notabilizaria pela intensa e diversiñcada

poder melhor compreender alguns aspectos do evento.

iniciou sua vida adulta e proñssional lnrgos

conhecimentos sobre a terra

ofício de tropeiro,

Descoberto por volta de 1692, dades de Mariana (MG), o ouro era

margens do

às

_

rio Piranga, nas proximi-

à época e hoje

- objeto de cobiça que

estimulava as mais rebuscadas fantasias. Provavelmente terá sido inspirado pela febre do ouro que 0

nosso protagonista,

como

jovem

reinol

homem branco

se dizia à época), resolveu

e

Domingos da

sem impureza

Silva Santos, bai de

religiosa (cristão-velho,

migrar da península ibérica para os domí-

na fazenda do PombaL de proprieda-

de da família, na Vila de São Ioão del Rei. Diferentemente do que

maram

já afir-

muitos, sobretudo na tentativa de argumentar que Tiradentes

foí

0

único condenado à morte porque era 0 mais pobre, sua família não era de

poucas posses ou de baixa condição econômica.

gundo

no inventárío da

se Verifica

mineração

e

uma

sede

com

A

fazenda do Pombal,

se-

família, tinha várias “datas” (lotes)

de

dois pavimentos; abrigava

em

sua rotina de tra-

isso,

do levante

e,

Gerais, entre o ñnal da década de 30 e o início da década

de 40 do século XVIIL

No

plano da realidade, esse processo de “prosperidade”

não duraria indeñnidamente, embora tenha gerado co.26

fértil

imaginário políti-

Sua história de Vída passa por constantes e permanentes redeñnições 22

rendido

O

prestígio sociaL

ou mesmo para negros

nasci-

é possíofíci0;

0 mais importante propagandis~

dos principais possíveis motivos de sua

última refer.ência às atividades de comércio ambulan-

'l'iradentes entre 1764, tc,

um

como

existem dados muito precisos sobre os ofícios e as atividades de

e 1775,

quando

ingressa na tropa paga de cavalaria e inicia sua carreira

militar e burocrática, já

no posto de

alferes,

no qual permaneceria

até sua pri-

são e posterior execução. Sobre seus colegas de conspiração, porém, existem fartas evidências e

dados que comprovam sua plena inserção no sistema de

poder implantado nas Minas. Inácio Iosé de Alvarenga Peixoto, entre 1776 l780, antes de ser desalojado

esse posto, foi objeto

Minas

não conferia amplo

fosse ofício para libertos

aquí sim, temos

nomía mineira de capitania de

teria

expandido seu círculo de conhecidos.

e

lan provavelmente o teria qualiñcado

em

Tíradentes nasceu, por assim dizer, no auge da produção aurífera na

que lhe

José

a familiaridade adquirida acerca dos caminhos de Minas, à

balho cerca de 35 escravos, volume não desprezível para os padrões da ecoentão.

tropeiro, o

Joaquim

qual seriam acrescidos os conhecimentos obtidos no exercícío do ofício mili-

Não

1746,25

agrícola,

regíão que

sem nenhuma condição econômica. De qualquer maneira,

mais do que

sendo Ioaquím Iosé 0 quarto a nascer. Nosso Tiradentes

em

numa

que Joaquim Iosé tenha alcançado alguma prosperidade com 0

cxecução.

provavelmente terá nascido

nascido

vel

casou

e teve sete ñlhos,

em “odontologia” e, em

livres

Antônia da Encarnação Xavier, descendente de

se

conhecimentos que

dos

la

com quem

tio

produção

como

ao olhar setecentista,

ainda que tampouco

nios americanos da casa real portuguesa. Aqui chegand0, conheceu a jovem paulistas,

com um

0 jovem adquiria

Portugal, foi ouvidor da

extorsã0”.2“

de

do posto por rearticulações

e

políticas ocorridas

Comarca do Rio das Mortes. Enquanto ocupou

uma

série

de denúncias de “abuso de autoridade e

Cláudio Manuel da Costa, que se dedicava no

momento de

sua

prisão às suas fazendas, à mineração e à intermediação ñnanceira, tinha sido

importante ñgura do poder público

em

pesavam suspeitas de “enriquecimento trabando”.

várias gestões anteriores. Sobre ele

ilícito” e

participação

em “rede de c0n-

O padre Carlos Correia de Toledo, um dos mais atuantes na trama, 23

era solidamente estabelecido na

fazendas de produção agrícola diversiñcada e lavras. Tal Vieira da Silva, foi acusado de se utilizar religiosa para

do cargo

de suas

Luís

da posição na hierarquia

e

aumentar seu patrimônio. Sobre 0 segundo pesava, além da

monia, a suspeita de envolvímento sexual,

uma

como 0 cônego

ñéis.

Com

com

si-

posterior favorecimento, de

respeito a Tiradentes, existem evidêncías de

ñns da década de 1780, além das atividades da tropa

que

em

regular, era proprietário

al-

serão aprofundadas nos capítulos subseqüentes: ha-

vendo tão diferentes ídentidades

e interesses

em

jogo, é possível crer

unídade absoluta do movimento míneiro de l788-9? Não

vel imaginar a existência de dissensões e conñitos

em

sería possí-

que pudessem corroer

internamente a própria trama sediciosa? Seria a repressão empreendida pelo absolutismo real o único fator explicativo de seu fracasso? Não deveria o

problema da

falta

um

de

propósito

buído aos diversos inconfidentes,

comum,

ter sido

inequívoco, capaz de ser

mais

bem examinado

toriograña? Tentemos reexaminar, nesse sentido, a tessitura do

atri-

pela his-

manto de

Além

das diversas formas de ínserção individual dos inconñdentes

cenário econômico das Minas, havia,

como bem

que procuraremos aprofundar adiante,

político, aos

conflitos de interesses

da derrama estiveram na base

inicial

políticas entre os diversos envolvidos, é preciso considerar

marca do Rio das Mortes se

não há

e

da Comarca de Vila

das articulações

com muíta

Rica.32 Fica

atenção

no

ar a pergunta:

perclara identidade de propósitos índividuais, seriam então nossos

sonagens movidos apenas pelo mais genuíno espírito

liberal e representativo?

A verdade é que a questão é muito complexa. A região das Minas tornoufoco de agitação social e pose, sobretudo no ñnal do século XVIII, um grande lítica.

Nesse contexto disseminavam-se idéias que iam desde demandas mais

localizadas quanto à opressão causada pelo ñsco até a

nária liberal”, passando

também

propaganda “revolucio-

pela pregação autonomista. Tais ideais fer-

massa populacional heterogêneaz atingiam algumas parcelas dos setores menos favorecidos e encontravam guarita em meio Considerando as às elites, embora entre estas com um signiñcado especial.

mentavam em meio

a

uma

uma

idéia

mais Clara das diferentes inserções dos

em bem

ainda se

insiste.3°

de sua montagem, a “região mineradoraÍ podemos supor que, no XVIII,

em

social

iní-

ñm do

situação agravada pela miséria, era a própria sobrevivência da

que estava

em

questão.

No

bojo dessa crise

ameaça, no que dizia respeito aos membros da

também

elite local, a

se

pôs sob

manutenção do

controle sobre a massa populacional livre e escrava, fundamental à continui-

da trama segundo suas posições econômícas, geo-

dade do processo produtivo. Nesse sentido, oligarcas e poderosos mineradoem questão sua res exasperavam~se com tal possibilidade, que poderia colocar

dominantes. Observe-se, de

XX;

que caracterizou, desde o

que procura

se tenta estabelecer

tampouco são

metade do seculo

cío

a conhecida instabilídade social e política

ordem

líderes e agentes políticos:

século XIX;

como

da Comarca do Rio das Mortes, principal área de ex-

retratar os principais atores

de existente quando

que contrapu-

especial Vila Rica, a circulação e a fermentação de idéias de ruptura,

século

inconñdentes mineiros na trama de 1788-9, veja-se o Quadro

24

Mesmo supondo verdadeira a premissa de que os interes-

scs materiais e a recusa

Rica, tradicional núcleo

pansão econômica.29 Para

políticas e funcíonais

no

sugeríu Kenneth Maxwell e

nham, grosso mod0, os habitantes da Comarca de Vila

c1a,

ução dos envolvídos.

sobejas evidêncías quanto à crise econômica que se abateu sobre as Minas,

Penélope.

ra

“grupó de interesse” no sentido que a ciência política contemporânea consamóveís de grou, o que torna extremamente delicado o exame dos possíveis

Codinâmicas econômicas que conformavam e contrapunham os espaços da

gumas índagações que

do poder

um

indiciados3' esteve longe de representar

acusado de “abuso de autoridade” e de exorbitar de suas funções de Luís da Cunha Meneses.

Todas essas ínformações, ainda que relativamente esparsas, sugerem

uma

que o conjunto de agentes

o fato de que havia divergências e conflitos crescentes entre os agentes e as

já tinha sido

mando

runça,

Também

de empreendimentos agrícolas que garantiam parte de seu sustent0.

a

exame do quadro nos permite añrmar, com alguma margem de segu-

O

Comarca do Rio das Mortes, onde possuía

início, a

1,

extrema diñculda-

alguma identidade entre os principais

não são todos

como já se añrmou no todos mineradores falidos, como foi dito na primeíintelectuais,

tampouco são todos burocratas, como, com freqüên-

própria sobrevivêncía, e que levaria as tensões decorrentes da instabilidade escravos social e política das Minas a tocar necessariamente no problema dos e

demais excluídos da população. Não

é fortuito,

segundo entendemos, o

fato

Mide que alguns dos principais expoentes do movimento da Inconñdência neira fossem senhores de escravos e mineradores.

Também

não

é fortuito

25

que

_

QUADRO

~

1 RES UMo DAs PRINCIPAIS ATIVIDADES ECONÔMICAS, GRAUS ACADÊMIco S ' O FICIos E/0U PROFISSOES Dos INCONFIDENTES MINEIRos DE 1788-933 ,

TíTULcy

COMARCA

TROFISSÃO

DE RESID.

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