É possível assobiar e chupar cana ao mesmo tempo? Sobre defender o socialismo revolucionário e ao mesmo tempo a burguesia.

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Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema Universitário de Bibliotecas (SIBI/UFBA), com os dados fornecidos pelo autor Menezes, Jean Paulo Pereira de. É possível assobiar e chupar cana ao mesmo tempo? Sobre defender o socialismo revolucionário e ao mesmo tempo a burguesia. / Jean Paulo Pereira de Menezes, Supervisão e revisão de Cléia Montezano . -- Paranaíba MS, 2018. 22 f. Livro eletrônico (Ciência Política) , Editorial Práxis, 2018. 1. História Política. 2. Crítica ao reformismo. II. , Supervisão e revisão de Cléia Montezano. I. , . II. Título.

É POSSÍVEL ASSOBIAR E CHUPAR CANA AO MESMO TEMPO?

SOBRE DEFENDER O SOCIALISMO REVOLUCIONÁRIO E AO MESMO TEMPO A BURGUESIA. Jean Paulo Pereira de Menezes 1. “As direções oportunistas vêm, durante décadas, aliando-se com a burguesia para defender o capitalismo e o Estado burguês. Elas levam o proletariado brasileiro a sucessivas derrotas e retrocessos em sua luta. Se estas direções reformistas, que não vão além do capitalismo, não forem combatidas todos os dias, não é possível construir uma alternativa de direção revolucionária para a classe operária” (FONTANA, 2018, p. 107).

Sou professor de História e Ciências Sociais há 21 anos. Não escrevo isso para evocar um discurso de autoridade, mas para dizer que parto de relações concretas, reais, sobre o que é ser professor e pesquisador nesta sociedade que vivemos, apenas isso. Lecionei desde o primeiro ano do ensino fundamental até a pós-graduação, em instituições públicas e privadas e pude ver os diversos chão de escolas e o quanto este trabalho é massacrado pelo Estado e o capital. Já vi professores saindo aos prantos da sala de aula, alunos sendo retirados de sala, pais revoltados com nota de alunos, salário não sendo pago, alunos com fome, professores desesperados! Há muitos professores com mais experiências para relatar, mas estas são algumas da minhas, socialmente construída. Na graduação, pude estudar que esse modo de viver é assim porque desejam que seja assim. Mas entender mesmo o que estudava foi principalmente com a militância. Não há naturalidade nas relações sociais. Há intenções, projetos políticos, classes, culturas, opressões e exploração. Saber que tudo isso existia eu já sabia bem antes. Nem sempre fui professor, era metalúrgico, operário de chão de fábrica e o que vivíamos todos os dias no trabalho não nos convencia de que as coisas (relações de trabalho) iriam mudar por vontade do patrão.

1 Membro da Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional (LIT-CI), militante de seção brasileira (PSTU). Graduado em História, mestre em História e doutor em Ciências Sociais.

Muito diferente do que muitos intelectuais made in CAPES 2 cogitam, os operários conseguem pensar para além do imediato, a questão é que não tínhamos muito tempo para nos dedicarmos à Filosofia, à Política, à História e outra áreas do conhecimento. Eramos obrigados, como toda a classe operária, a dedicarmos o nosso tempo com exclusividade para os interesses do capital. Portanto, não é uma questão meramente de não conseguir entender as relações sociais para além da imediaticidade, mas da existência de uma determinação da sociedade burguesa que pré-estabelece quem é que vai estudar e explicar o presente e aqueles que no presente ficarão cortando chapas de ferro com o maçarico, apertando porcas, fazendo peças de cobre ou ainda preenchendo formulários sobre a produção. Queremos dizer com isso que há determinações na sociedade burguesa sobre quem é que vai produzir conhecimento e explicar a vida e aqueles que vão (ou deveriam) aceitar essa explicação.

Mas também existirão aqueles não aceitarão este conhecimento produzido,

pacificamente. E é neste grupo que nos encontramos! O fato é que muitos de nós jamais aceitamos esta determinação violenta sob nossas vidas, sobre nossa busca por mudar a realidade de exploração. Resistimos e a resistência se organiza de diversas formas na história. Quando falamos resistência, esta palavra ainda carece de explicações, pois apenas a palavra, definida como aquilo ou aquele que resiste a algo ou alguma coisa, é uma abstração que mais pode confundir do que esclarecer muita coisa. A resistência que nos referimos é aquela que se organiza em partidos internacionais para lutar contra a burguesia (também

2 Expressão que aprendi com Giseli Costa Sifroni, militante da LIT-CI e pesquisadora na Universidade de São Paulo, para se referir a um conjunto muito expressivo de alunos e pesquisadores que vivem para preencher formulários da CAPES, onde o currículo de atividades tem centralidade na constituição da vida destas pessoas, mais do que a própria atividade intelectual. São intelectuais no sentido mais empobrecido do termo, ligados a uma lógica reprodutivista quantitativa e abestada que procura dar importância numérica para aquilo que os números jamais conseguirão representar: o conhecimento. O intelectual made in CAPES é uma espécie de idiota, escravo das agências de fomento, que se sujeitam a lógica da fábrica para produzir um tipo de conhecimento fenomênico e que ignora absolutamente a luta de classes. Já escrevemos dois pequenos textos sobre esta questão em outro momento, “A fábrica para além da fábrica” (http:// www.carosamigos.com.br/index.php/artigos-e-debates/5941-a-fabrica-para-alem-da-fabrica); e também, “A burocratização do trabalho docente, ou, da cafetinagem acadêmica” (http://carosamigos.com.br/index.php/ colunistas/216-jean-de-menezes/11615-a-burocratizacao-do-trabalho-docente-ou-da-cafetinagemacadêmica).

internacional). Trata-se de uma resistência que defende o Socialismo Revolucionário e não qualquer outra coisa na moda eleitoreira do nosso tempo presente3 . Defender um programa socialista revolucionário não é algo meramente abstrato, como apenas defender a resistência em abstrato! O programa que referimos-nos possui fundamentação histórica, concreta, real. Desde 1848 o programa revolucionário se apresenta como uma forma concreta de entender e transformar a realidade de exploração da classe trabalhadora. Nos referimos ao Manifesto do Partido Comunista, escrito por Karl Heinrich Marx e Friedrich Engels, como Programa da Liga dos Comunistas na Inglaterra. Um programa pode ser expresso em um papel organizado em livro, mas se se esgotasse nesta forma física, seria também apenas um conjunto de palavras, frases e parágrafos escritos por alguém. É verdade que o programa pode ser escrito, mas neste caso o texto não pode ser uma mera abstração. No caso de 1848, o programa do Partido Comunista é a síntese da realidade pensada, ou seja, é uma teoria do mundo real, concreto. O programa publicizado pela Liga dos Comunistas não era um conto de fadas, mas um retrato da mais dura realidade em que viviam milhares de operários na sociedade burguesa. O programa é uma análise histórica das condições de vida da classe trabalhadora no tempo e espaço. O programa revolucionário tratava daquilo que em nada se associava a utopias ou delírios. Tratava da sociedade de carne e osso que existia diante de qualquer sentido empírico daqueles que viviam na Inglaterra vitoriana. O programa não falava de sujeitos imaginários, mas de toda uma classe explorada historicamente e que poderia ser evidenciada (ainda hoje) em qualquer cidade da Inglaterra e Europa continental. Tratava-se da classe operária que vivia miseravelmente, com os poucos xelins em Manchester a míseros copeques de São Petersburgo. Ninguém com o mínimo de honestidade intelectual conseguiria afirmar que a realidade era linda e maravilhosa (claro, os defensores da Belle Époque e mesmo a Victorian age, pensam diferente de nós) e que o conteúdo do Manifesto do Partido Comunista era um devaneio de um grupo de revolucionários que resistiam aos progressos do mundo capitalista.

3 Não confundir com uma pseudo resistência pacifista que tem como estratégia os processos eleitorais burgueses. Esta resistência não resiste a nada! Não resistem ao projeto neoreformista, as alianças com os donos de empresas... trata-se apenas de defender os interesses de uma certa classe média (middle-classes), de mentalidade pequeno burguesa. São reformadores do sistema capitalistas, perfumadores daquilo que não tem perfume. Defendem a manutenção da ordem burguesa, sem tocar em um fio de cabelo do capitalismo. Não resistem as migalhas que caem da mesa do banquete da classe burguesa e se deliciam com as sobras de comida que o capital lança ao chão.

O programa é algo vivo e radical porque pretende ir até a raiz daquela imediaticidade. O programa socialista revolucionário parte da realidade imediata e desenvolve o desvelamento das relações sociais mistificadas, naturalizadas. Esta perspectiva estuda, investiga e se organiza para transformar o tempo presente. Não há espaço para o elogio do presente na perspectiva socialista revolucionária. Defende-se a organização da classe trabalhadora mundialmente, o fim da propriedade privada, o fim do assalariamento, a tomada do Estado pelo proletariado, ou seja: a ditadura revolucionária do proletariado (que significa tomar pelas mãos o poder do Estado e colocá-lo para funcionar de acordo com os interesses do proletariado e sua posterior destruição). Diante do nosso tempo presente4 (2018) é fundamental saber identificar o programa político daqueles que se colocam como resistência5! Primeiro: resistência em relação a quê? É preciso ter isso muito claro, pois resistir nem sempre é um caso de rebeldia, muito menos ainda de defender os interesses da classe trabalhadora. Sob a palavra vazia de “resistência” se esconde muita coisa antagônica aos interesses da classe trabalhadora. Por isso reivindicamos o debate programático, para além do personalismo (que em muitos casos encarnam seus programas políticos neoliberais -chamado de modo eufêmico de neodesenvolvimentismo6 -, como é o caso de Lula).

4 Sobre o conceito de tempo presente que trabalhamos ver in biblioteca: MENEZES, J.P.P. . M543e. Um estudo sobre o conceito de história e tempo presente em. Marx através da crítica da economia política de 1859 / Jean Paulo. Pereira de Menezes. – Marília, 2015. 272 f. ; 30 cm. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Campus de Marília - SP. 5 Não nos esqueçamos que até mesmo um chuveiro tem “resistência”!A questão é: a quem aquece a água que passa por sua resistência? Se a sua resistência funciona como aquecedora dos interesses da burguesia, o banho da classe trabalhadora continua gelado! 6 O neodesenvolvimentismo é um eufemismo para social-liberalismo, que sustentamos aqui ser o correspondente ao neoliberalismo. Esta perspectiva, de acordo com FONTANA (2018) “[...] não passou de um rótulo para, nos limites do neoliberalismo, apoiar, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e isenções de impostos bilionários, industrias nacionais de baixa tecnologia como a Friboi e as empreiteiras, para tornarem-se monopolistas e multinacionais. [...] Essa política não representou nenhuma emancipação com relação ao imperialismo nem confronto com o capital financeiro. Os bancos lucraram cinco vezes mais nos mandatos de Lula do que nos de FHC segundo dados do Banco Central. [...] O neodesenvolvimentismo também não difere do neoliberalismo quanto as políticas sociais: defende a igualdade de oportunidades e os programas compensatórios de transferência de renda do Banco Mundial, enquanto aplica e permite a privatização, por meio de concessões, Parcerias Público-Privadas (PPP) e gestão privada de serviços públicos [...]”, além de apostas na superação dos problemas sociais pela via do mercado.

Desde 1848, quando da apresentação de um programa revolucionário pelos comunistas, passando pela criação da Associação Internacional dos Trabalhadores (A.I.T.) em 1864, pelos congressos da Internacional, pelo programa de Gotha e pela constituição da Social Democracia Alemã em 1863, temos a construção do que poderíamos chamar de tradição marxista e na constituição desta tradição o programa socialista revolucionário passou por diversos ataques, muitas vezes sendo reduzido a pó, no caso alemão, reduzido a milhares de mortos da classe trabalhadora nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial, defendendo os interesses da burguesia imperialista. A defesa do programa socialista revolucionário é uma luta travada nos últimos séculos na sociedade de classes onde o reformismo e o neoreformismo se fazem presentes defendendo a ordem da burguesia e suas formas de dominação. O imperialismo se utiliza da reação democrática para impor derrotas à classe trabalhadora mundial. Por reação democrática se entende a ação da burguesia através de suas representações políticas que têm por objetivo aniquilar qualquer perspectiva revolucionária diante da crise do capital. Em momentos de crise orgânica o capital deve se recompor (composição orgânica do capital), e para que isso aconteça o imperialismo deve impor planos de austeridades a toda classe trabalhadora, como por exemplo: aniquilação de direitos trabalhistas, reformas previdenciárias, confiscos de poupanças, demissões em massa, guerras, etc. Para evitar a construção de uma proposta revolucionária que se coloque radicalmente contra os planos de austeridades, a burguesia se utiliza da democracia para fortalecer seus objetivos de retomada de crescimento da taxa de lucros, internacionalmente. Neste caso, mostra-se a importância dos regimes republicano-democráticos e sua importância particular para dominação de classe. A democracia permite a instrumentalização das crises de governo, safando a burguesia da insurreição da classe trabalhadora, pois joga no sentido de apresentar massivamente à população (as classes) a necessidade binária da troca de um governo ruim, por um que seja competente diante da crise. Para este segundo se promete o paraíso que tiraria a classe da crise e elevaria a qualidade de vida. Na verdade, não é isso que acontece... bem se sabe! Assim mesmo o que observamos é a instrumentalização do jogo democrático da burguesia e para isso as organizações reformistas são de fundamental importância para que a

recomposição orgânica tenha sucesso. Explicamos: ao passo que as organizações reformistas e neoreformistas (partidos políticos, centrais sindicais e movimentos sociais) optam por fazerem o jogo da democracia dos ricos, comprometem-se a seguirem as regras determinadas pelo Estado democrático, por exemplo, a luta por via das eleições. Ao fazer isso, priorizam a luta por conquistas eleitorais e por assim, a representação no parlamento, sob as regras positivas do direito estabelecido, não questionando seus fundamentos e aceitando o jogo eleitoral. O que temos com isso, principalmente em um republicanismo de coalizão, é a manutenção dos interesses da ordem burguesa diante da crise, uma vez que é esta que direciona os resultados que chamamos de vazios das eleições. Cria-se uma falsa expectativa para a classe que recebe os planos de austeridades do capital (por isso vazia), levando à classe a desmoralização política e desarmando a mesma para a luta e construção de um projeto revolucionário (é o caso do Podemos7 na Espanha e do Syriza8 na Grécia e também do PT9 e Psol10 no Brasil). No jogo democrático o impeachment é um instrumento clássico da burguesia para gerenciar suas crises políticas e embora apresente este recurso como democráticoconstitucional, trata-se de uma forma de trocar os gestores dos negócios do capital no Estado, uma vez que este dispositivo fica a cargo dos parlamentares em última instância, e, nestas condições, vence quem tiver maioria no parlamento, mantendo ou não um atual governo. Francis Fukuyama, em seu livro “O Fim da história e o Último Homem” (The End of History ande the Last Man) dá a seguinte mensagem: “Vencemos! A democracia teria vencido qualquer outra perspectiva política (URSS) e desta forma se teria chegado ao ‘fim da história'”. Tratava-se de defender e aperfeiçoar a democracia como valor universal, como a forma de governo que melhor desenvolveu a humanidade e, portanto, dever-se-ia procurar aperfeiçoá-la. Evidentemente, esta proposta atende perfeitamente os interesses da burguesia e não da classe trabalhadora. Assim, diante das crises do capital, da reestruturação produtiva, dos planos de austeridades, seria necessário votar! Votar seria a saída civilizada e 7 Partido fundado em 2014 na Espanha, apresentando-se como sendo de esquerda e alternativo aos partidos tradicionais como o PP (Partido Popular) e o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol). 8 Sigla de Synaspismós Rizospastikís Aristerás (Coligação da Esquerda Radical), fundada em 2004, via coalizão iniciada por dissidências do Partido Comunista Grego e setores da esquerda, composto por 13 tendências políticas que levou o nome de Alexis Tsipras (que recebeu a maioria dos votos do povo grego e posteriormente se mostrou subserviente ao imperialismo) contra a Nova Democracia e PASOK, que representavam os interesses da Troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional). 9 Partido dos Trabalhadores, fundado em 1980. 10 Partido Socialismo e Liberdade, fundado em 2004.

democrática para o enfrentamento das crises e aperfeiçoamento da história. É preciso dizer que Fukuyama escreve seu livro em 1992 a pedido do próprio governo dos Estados Unidos, onde se configurava como um dos assessores de Ronald Reagan e Margaret Thatcher. A crença, na verdade, ideologia, de que a democracia é o melhor dos sistemas existentes representa a defesa do dispositivo da burguesia imperialista para efetivar a recomposição orgânica do capital. E é neste sentido que as organizações reformistas levam a classe trabalhadora para o lago dos crocodilos. Não há mudança significativa da vida no modo de produção capitalista que seja por via das eleições. O jogo democrático serve ao capital, não à classe trabalhadora. As eleições da burguesia não são capazes de atender as necessidades dos trabalhadores diante da crise. Motivo: ela não existe para este fim. Quanto mais a classe trabalhadora é seduzida pela proposta política reformista, mas ela se distancia da possibilidade de construção de algo que realmente mude a vida, a saber, a revolução socialista, uma estratégia que as organizações reformistas possuem terror de pronunciar, exatamente porque sua política não é mudar estruturalmente absolutamente nada, apenas reformar o que já existe. Em outras palavras, não se trata de construir o novo (embora digam isso em suas peças publicitárias), mas de reparar alguns elementos do velho, sem mudar por completo (como se faz com uma casa deteriorada pela ação do tempo, pintando, arrumando algumas trincas da parede, trocando uma telha... mas que por fim, esta lá a casa como era antes, apenas com algumas reformas que não a muda a partir dos seus alicerces, dos seus fundamentos) o que já está dado, e neste caso: a democracia burguesa como arma política da classe dominante. A burguesia, ao se utilizar da democracia como arma política, seduz as organizações claramente reformistas ou com tendências reformistas, triturando-as até que não lhes restem nada de perspectiva revolucionária, quando houver (raramente há). Não tenhamos a ilusão de que o imperialismo se utiliza apenas da reação democrática para encaminhar sua estratégia de dominação. As armas ainda são características clássicas dos dispositivos da burguesia imperar (imperium), desde que seja necessário (vide suas ações na África e oriente médio, em países onde a tática de dominação pela democracia ainda não é possível de ser colocada em prática). Nestes casos, a burguesia imperialista segue colocando em prática formas de imperar que remontam o período que Marx chamou em “O Capital” de “A assim chamada acumulação primitiva”. Segundo o próprio Marx: Na história real, como se sabe, o papel principal é desempenhado pela conquista, a subjugação, o assassínio para roubar, em suma, a violência. Já

na economia política, tão branda, imperou sempre o idílio. Direito e “trabalho” foram, desde tempos imemoriais, os únicos meios de enriquecimento, excetuando-se sempre, é claro, “este ano”. Na realidade, os métodos da acumulação primitiva podem ser qualquer coisa, menos idílicos (MARX, 2013, p. 960).

Diante desta perspectiva, a agitação e a propaganda de um programa revolucionário se fazem absolutamente necessárias diante do tempo presente (o nosso). Qualquer tipo de concessão dada à burguesia e às organizações reformistas (que se deliciam com as migalhas da mesa do banquete do capital) colabora para o distanciamento da ação revolucionária por parte da classe trabalhadora. “Centrear-se” com as organizações revolucionárias é capitular diante de uma situação pré-revolucionária onde cabe as organizações revolucionárias apresentarem o seu programa, não fazendo coro com a crença ideológica de que as eleições da burguesia seja a solução para a saída da crise capitalista mundial. O reformismo joga plenamente no fortalecimento da luta de classes, a favor da burguesia, pois afugenta a construção de um projeto revolucionário que destrua a burguesia e eleve o proletariado ao poder. No Brasil, o reformismo lutou contra as ditaduras e isso não é irrelevante. Todavia, as organizações reformistas não travaram o enfrentamento com a democracia burguesa, ao contrário, lutaram contra a ditadura (de 1937 e 1964) a favor da democracia política da burguesia e pós 1985 se sentiram vitoriosos. Entretanto, diante de um programa revolucionário, a saber, que defenda o fim das classes, do sistema de assalariamento, da propriedade privada dos meios de produzir a vida, não podemos falar de vitória. Há uma vitória de um programa político reformista sob um regime ditatorial militarempresarial. Neste caso, uma vitória do programa burguês, não o socialista revolucionário. Esta característica é importante para considerarmos, no campo da política, como as organizações reformistas fortaleceram o seu “canto da sereia” nas últimas décadas (no Brasil) e gozando de cadeira cativa na plateia do imperialismo. Lutou-se (os reformistas) com a ditadura, não contra a democracia da burguesia, por isso, a adesão a tese de que se havia chegado ao fim da história... Tratava-se, agora, de aperfeiçoar a democracia como o melhor dos sistemas possíveis. “Centrear-se” diante desta questão não é mera capitulação é ser derrotado pelo reformismo. Assim a tarefa dos revolucionários é sempre a mais difícil: organizar a classe trabalhadora para fazer a revolução e atacar a burguesia e seus aliados por todos os ângulos. É necessário combater a ideia de que o mal menor é a melhor solução. Os

revolucionários nunca foram revolucionários da história por que tinham o discurso mais agradável e o mais fácil de ser implantado, mas sim, por terem firme a capacidade de construção do programa revolucionário radical. É importante considerar que o programa socialista revolucionário é radical. Quer tomar as cosias pela sua raiz e não pelas pontas dos fios do cabelo. Defende a organização da classe visando à revolução social. Não se contenta com reformas, pois a sua estratégia é a revolução socialista, não é a manutenção da ordem e o regime burguês. Estes elementos são da maior importância para fazer uma analise da atual conjuntura. Diferente dos programas reformistas (clássicos e novos) os socialistas revolucionários não gritam volta Lula! Mas, Greve Geral, Rebelião Social, por conselho de trabalhadores! Os socialistas revolucionários não esperam da burguesia a mudança de rumo da sua vida; não depositam nenhuma esperança de que a burguesia vai atender as necessidades da classe trabalhadora cada vez mais empobrecida, ao passo que mais trabalha para o patrão. A classe trabalhadora possui uma demanda que jamais será atendida pela burguesia e seus governos em seus regimes. E não afirmamos isso contando apenas com uma questão moral (de que os porcos capitalistas querem nos sugar a cada dia - o que não é mentira), pois a forma de funcionamento da sociedade capitalista está para além da moral. Queremos dizer com isso que as contradições da sociedade burguesa são irreparáveis, como afirmamos no início este artigo. A classe trabalhadora necessita de casas para morar com dignidade. Necessita de trabalho associado e não alienado! É imperioso que seja proprietária daquilo que produz e não escrava do salário que recebe pela venda da força de trabalho. Precisa de saúde que atenda as necessidades humanas; de educação pública e de qualidade; de acesso ao conhecimento historicamente acumulado para continuar a produzir conhecimento e humanizar-se. Jamais a burguesia promoverá a demanda por habitação, pois a especulação imobiliária é um grande setor da economia capitalista. Não permitirá também outro trabalho que não seja o alienado aos interesses da capital, pois isso seria sua ruína; jamais promoverá saúde publica de qualidade, pois isso arruinaria os negócios privados dos planos de saúde e demais empresas particulares em relação à vida e morte da humanidade; não promoverá uma educação de qualidade para os filhos da classe trabalhadora porque tampouco deseja

abandonar os tubarões da educação privada que lucram rios de riquezas às custas do Estado regido pela burguesia (de FHC - 1995 até Temer - 2018). Todos estes setores fundamentais para a vida da classe trabalhadora estão sob o domínio dos interesses privados, onde o capital mostra a sua centralidade, não os interesses da classe trabalhadora que dele necessita. Por isso, temos como palavra de ordem: Fora todos eles! As mudanças que necessita a classe trabalhadora só podem ser realizadas pela própria classe trabalhadora, rompendo com o regime de governo da burguesia! As eleições burguesas jamais mudaram substancialmente a vida da classe trabalhadora11. A história do Brasil não nos deixa errar diante dos fatos. É necessário atacarmos o reformismo todos os dias, pois ai reside um grande aliado da burguesia e não da classe trabalhadora. Os reformistas ajudam a compor o que o professor da Universidade de São Paulo e militante trotskysta argentino, Osvaldo Coggiola, já chamou de governo violino, ou seja: “apoia na esquerda, mas quem toca é a direita12!”,(muito provavelmente se referindo a José Sarney). O reformismo é uma desgraça em relação à construção de uma direção revolucionária. Um entrave para a revolução social. Desde o século XIX, o reformismo já se coloca como colaborador dos interesses burgueses, seja com análises de caracterizações equivocadas, seja por posicionamentos conscientes da colaboração de classes. E é na própria tradição marxista que encontramos o abandono de um programa socialista revolucionário a favor de um programa centrista, reformista e que entregou a classe trabalhadora à morte, seja durante e depois das guerras mundiais!13

11 Desde o século XVI existiam eleições locais na América Portuguesa. No período imperial também há registros de eleições indiretas, mas é no período republicano que as eleições são enfatizadas devido o caráter do regime político adotado com a República. Como afirmamos, nenhuma destas eleições provocaram mudanças substanciais na vida da classe trabalhadora. Jamais superaram a relação entre senhor e escravo e/ ou entre a burguesia e trabalhadores. Acreditar nas eleições como caminho para uma vida plena, como afirmam os reformistas, é a mais pura utopia em seu sentido vulgar. 12 Para ter acesso a uma breve aula sobre os limites destas classificações políticas de direita e esquerda e entender que se colocar no tempo presente como “sendo de esquerda” não nos diz muita coisa, acessar: https://youtu.be/KNAwlz5Vis8. 13 Jamais associar o PT a perspectiva socialista revolucionária, pois nunca estiveram neste campo. Esta organização nasceu e se fez da frente popular e assim governou. Nunca a direção deste partido defendeu o socialismo revolucionário, muito ao contrário, sempre se posicionou contra um programa socialista revolucionário e é assim até hoje.

Em 1875, na cidade de Gotha (Alemanha, ver imagem)

acontecera

uma

importante

proposta

programática encabeçada por Ferdinand Lassalle, de fusão14 de duas organizações da classe trabalhadora e com um programa político rebaixado em relação aos princípios do socialismo revolucionário defendidos por Marx e Engels. Lassalle defendia que era papel do Estado defender os interesses da classe trabalhadora, ignorando o caráter de classe da origem do Estado15 já apresentada no programa de 1848 pela Liga dos Comunistas. Nas palavras do próprio Lassalle em carta aberta ao Comitê Central pela convocação de um congresso geral do operários alemães em Leipzig, apresentada por Michael Löwy: O Estado tem a obrigação de assumir a grande causa da associação livre e individual da classe operária [...]. Em primeiro lugar, é tarefa, destinação do Estado, facilitar, assegurar os grandes progressos da civilização humana. Essa é sua função, é com esse objetivo que ele existe. É para isso que ele sempre serviu, que deve sempre servir (Löwy, 2012, p. 12).

O reformismo, naquela época liderado por Lassalle, ignora absolutamente o caráter de classe do Estado, dirigindo a classe trabalhadora para um confiança utópica em relação ao Estado regido pela classe dominante e a sua utilização como forma de dominação da classe 14 A história política atual está repleta de fusões entre aqueles que disputam o “campeonato” para ver quem é mais reformista, embora se autoproclamem como revolucionários da resistência. Neste caso do nosso tempo presente refiro-me aos neoreformistas, diferentemente dos reformistas clássicos do século XIX, não possuem influencia de massas entre os trabalhadores; atuam e são majoritariamente constituídos pela pequena burguesia. No Brasil, é o caso emblemático do Psol que tenta com todas as suas forças (que inclui as forças do apoio burguês) ser o substituto do PT, nos dando demonstrações até mesmo bizarras quando do comício de 2018 de fronte o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC onde Lula como se fosse o papaizinho de Boulos, lhe dá conselhos “fraternais”, endossando a figura do novo filho de trinta e poucos anos na vida política nacional. 15 Este erro, de ignorar os fundamentos do Estado, ainda é reproduzido pela esquerda reformista e mesmo por parte das organizações que formalmente ainda chamam para si o socialismo revolucionário, como é o caso do PCB e PCO para citar apenas duas. Nesta mesma linha encontramos intelectuais autonomistas ou mesmo simpatizantes de organizações que se situam no campo abstrato que chamamos de esquerda, sejam eles neoreformistas ou socialistas revolucionários de salão. No caso destes intelectuais simpatizantes de esquerda a ignorância da origem do Estado chega a ser assustadora, pois tratam como se o fosse natural, a-histórico e absolutamente normal o regime democrático-liberal de governar, aceitando as suas regras e crendo na defesa da democracia por parte dos poderes do Estado burguês. Chega a ser infantil! Para ficarmos em apenas um exemplo: lutam contra um suposto golpe desferido contra a ex-presidenta Dilma. Se isso não for ignorar os fundamentos e a origem de classe do Estado e o seu funcionamento, francamente, não sei nem mais o que dissertar (para não ofender inocentes úteis)

trabalhadora. Princípio elementar da Internacional Comunista e radicalmente distante do pensamento de Marx e Engels. Este é apenas um dos momentos emblemático em que o reformismo (neste caso o reformismo clássico) se propõe a dirigir a classe trabalhadora com um programa (que seria o Programa de Gotha) rebaixado em relações aos princípios desenvolvidos a partir de uma análise e caracterização científica realizadas durante décadas a partir da realidade mais concreta da luta de classes. O reformismo programático de Lassalle representa o retorno à metafísica da política já criticado profundamente por Marx em 1845 quando da polemização necessária com Pierre Joseph Phroudhon. A proposta reformista faz retroceder as conquistas programáticas, no mínimo em 30 anos, além de alimentar as disputas com os anarquistas de Mikhail Bakunin que via nesse reformismo uma forma de atacar Marx e toda a Internacional. Marx pensava radicalmente diferente de Lassalle e fez a devida crítica à proposta do documento ao Congresso de Gotha, não deixando dúvidas sobre o seu posicionamento acerca do reformismo, não autorizando nenhuma associação do seu pensamento revolucionário com o posicionamento de um programa socialista desbotado como se propunha durante a fusão de partidos na Alemanha. Assim mesmo, diante do oportunismo dos reformistas, até hoje, o pensamento de Marx é reivindicado por muitas organizações neoreformistas, francamente traidoras dos interesses da classe trabalhadora, defendendo o Estado e o regime burguês de dominação, defendendo as eleições da burguesia como se estas fossem, por si só, mudar a vida dos trabalhadores e atender as suas demandas. Marx jamais acreditou nestas teses, por isso combatia os reformistas do seu tempo. Seus estudos sobre a economia política não permitiam investir tempo com alegorias e idealismos. O concreto gritava (e ainda grita), não ficava em silêncio no mundo das ideias reformistas que apenas amaciava a polarização da luta de classes entre burguesia e proletariado (assim como o faz o neoreformismo em nossos dias). Mas a história do reformismo que se vendia de socialista revolucionário não se iniciou em Gotha, tampouco, terminou nesta cidade. A Alemanha sediou o maior partido comunista do século XIX e se sua história é marcada pela participação massiva da classe operária, é também marcada pelo reformismo que matou milhares destas vidas. E, por ironia da história, um de seus maiores representantes é Karl Kautsky, militante que esteve comprometido em atacar a vulgarização do pensamento

revolucionário de Marx ao lado de Engels no final do século XIX após a morte de Karl Marx. Muitos dirão que o reformismo é um fantasma que ronda a construção do Programa Revolucionário: isso não é verdade. Fantasmas não existem! O que é real são os reformadores, aqueles que por múltiplas variáveis abandonam e colocam em descrédito o programa socialista revolucionário. Não podemos atribuir à metafisica a existência do reformismo. É preciso localizá-lo na história, pois este é o seu lugar, não em um mundo para além do nosso, na alegoria ou na fantasia, pois se trata de um fenômeno que tem seus fundamentos e que coloca a classe para marchar fora da perspectiva revolucionária. Faz a classe apenas caminhar pelas estradas dos interesses da classe burguesa, vendendo (ai sim uma utopia) de que é possível atingir o socialismo através de leis, do respeito cidadão ao regime burguês de dominação democrática, que é possível destruir o capitalismo ao passo que enchermos o Estado de leis socialistas, com sua destruição pacífica: isso nunca aconteceu! Lênin em “A revolução proletária e o renegado Kautsky”, de 1918, demonstra como Marx é transformado em um liberal pelos dirigentes da Social-Democracia alemã, especificamente sobre a capitulação de Kautsky ao meramente definir o conceito de ditadura do proletariado: A ditadura revolucionária do proletariado é um poder conquistado e mantido pela violência do proletariado sobre a burguesia, um poder que não está amarrado por nenhumas leis. E esta simples verdade, verdade clara como a luz do dia para qualquer operário consciente (um representante da massa e não da camada superior da canalha filistina subornada pelos capitalistas, como são os sociais-imperialistas de todos os países), esta verdade evidente para qualquer representante dos explorados que lutam pela sua libertação, esta verdade indiscutível para qualquer marxista, é preciso «conquista-la pela guerra» ao doutíssimo senhor Kautsky! Como explicar isto? Pelo espírito de servilismo de que estão penetrados os chefes da II Internacional, transformados em desprezíveis sicofantas ao serviço da burguesia (LÊNIN, 2018, p. 07).

Neste caso, Kautsky deturpa o conceito de ditadura revolucionária do proletariado para adequar ao seu marxismo vulgarizado o pensamento revolucionário de Marx. Era preciso agir desta forma para colaborar com a burguesia alemã e participar do jogo imperialista deixando claro que o pacifismo legislativo diante da democracia liberal era o objetivo dos comunistas alemães. Como diz ainda Lênin: Resumindo: Kautsky deturpou da forma mais inaudita o conceito de ditadura do proletariado, transformando Marx num vulgar liberal, isto é,

desceu ele próprio ao nível do liberal que lança frases vulgares acerca da «democracia pura», escondendo e esbatendo o conteúdo de classe da democracia burguesa , esquivando-se acima de tudo à violência revolucionária por parte da classe oprimida. Quando Kautsky «interpretou» o conceito de «ditadura revolucionária do proletariado» de modo a fazer desaparecer a violência revolucionária por parte da classe oprimida contra os opressores, de facto bate o recorde mundial da deformação liberal de Marx. O renegado Bernstein não é mais do que um fedelho em comparação com o renegado Kautsky (LÊNIN, 2018, p. 11).

Os reformistas de ontem e de hoje, “fazem das tripas coração” para deixar claro a burguesia que são ordeiros, pacifistas e que respeitam as instituições do Estado criado pela burguesia. Do século XIX ao XXI os reformistas são capazes de ignorar o acúmulo de séculos de lutas, de lições históricas sobre a construção da luta revolucionária para aplacar o medo da burguesia em momentos de crise. Com todas as letras se desviam dos fundamentos do Estado como instrumento de dominação. Aceitam a democracia liberal sem maiores problemas e divulgam para a classe trabalhadora que a saída para os problemas diante da crise são as eleições. Mais uma vez, ignoram frontalmente a origem do Estado, respeitam o seu regime e caluniam as organizações que não recuaram em seu programa socialista revolucionário. Todavia, muitas destas organizações pequeno burguesas insistem em se apresentarem nomenclaturalmente como socialistas, provocando confusão em parte dos trabalhadores e alegria entre os senhores! León Trotsky, ao se referir ao pai16 da capitulação, do socialismo revolucionário ao reformismo, escreve: “O governo do Estado moderno nada mais é do que um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa”. Nesta fórmula sucinta, que os dirigentes social-democratas depreciavam como um paradoxo jornalístico, encontra-se, na verdade, a única teoria científica sobre o Estado. A democracia idealizada pela burguesia não é, como pensavam Bernstein e Kautsky, uma casca vazia que se pode, tranqüilamente, encher com qualquer conteúdo. A democracia burguesa só pode servir à burguesia. O governo de “Frente Popular” dirigido por Blum ou Chautemps, Caballero ou Negrin é tão somente “um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa”. Quando este comitê se sai mal em seus negócios, a burguesia expulsa-o do poder a pontapés (TROTSKY, 2003, p. 61). 16 É importante notar que Kautsky não é o único dirigente da Social Democracia Alemã que estava a vulgarizar Marx. Mesmo com diferenças pontuais, ao seu lado, na direção desta capitulação esta Eduard Berstein, que também defendia a ideia de que o capitalismo que Marx havia estudado já não era mais o mesmo de “O Capital”, pois supostamente, o capitalismo atual permitiria, com sucessivas transformações democráticas, paulatinamente, através da democracia parlamentar, a transformação em socialismo, sem a necessidade de uma revolução social. Era totalmente contrário a ditadura revolucionária do proletariado.

Hoje, podemos reafirmar que a história se apresenta de duas formas, primeiro como tragédia, depois como farsa! Em nosso tempo presente, organizações que formalmente defendem em seus programas o socialismo revolucionário se colocam como para-choque do programa “neodesenvolvimentista” do PT e do neoreformismo do Psol. Lutam pela democracia liberal, não apenas pelas liberdades democráticas. Abandonam a perspectiva revolucionária quando a classe trabalhadora mais necessita desta para se organizar e agir diante da crise capitalista. Primeiro como tragédia, pois os reformistas clássicos possuíam representação na classe operária. Segundo, como farsa, pois os capituladores do socialismo revolucionário não possuem influência de massas na classe operária e os neoreformistas se lambuzam com a pequena burguesia. Farsas que desviam a classe trabalhadora da construção da revolução social. Apresentam-se como dirigentes da classe, mas estão sob direção da burguesia e acirram a crise de direção revolucionária da classe trabalhadora. Confundem os trabalhadores propositalmente e ensinam a defesa das instituições do Estado (Émile Durkheim ficaria muito orgulhoso!). É prudente aprendermos com as lições históricas. Ignorá-las é jogar-se no precipício. Ainda, sobre ser para-choque da burguesia em nosso tempo presente e realizar o jogo que o capital gosta, além de propor um “governo violino”, Boulos (candidato à presidência pelo Psol) em entrevista ao programa da Fundação Padre Anchieta, em 7 de maio deste ano (2018), apresentou-nos de modo simplista o programa político que defende e certamente não há nele absolutamente nada de socialista revolucionário! Ao invés de propor a revogação imediata dos planos de austeridades, o que propõe é a manutenção do jogo democrático da burguesia: “(...) a nossa primeira medida no dia primeiro de janeiro de 2019 vai ser propor um plebiscito para que o povo brasileiro possa decidir se quer manter ou revogar as medidas tomadas pelo Michel Temer porque isso foi feito sem passar pelo crivo do voto popular (...)” (BOULOS, 2018a). Embora seu partido se coloque como socialista e defenda formalmente a superação do capitalismo. Defender o socialismo e agraciar a burguesia não é algo novo ha história, como buscamos demonstrar até aqui. Os neoreformistas querem “assobia e chupar cana ao mesmo tempo”! Insistem em dizer que isso é possível, mas sabemos que não o é. Não é factível defender o socialismo e a humanização da classe trabalhadora e ao mesmo tempo defender a burguesia, pois a relação

de constituição da vida entre estas duas classes não é pacifista, harmônica e proporcional. Mas a figura pública do neoreformismo psolista insiste: “(...) as experiências históricas todas elas todas elas são complexas, experiências de revoluções socialistas onde os governos socialistas que aconteceram no mundo, tiveram avanços sociais importantes, em índices como educação, saúde, basta ver a saúde cubana, o analfabetismo que é zerado em vários países que tiveram experiência, ou mesmo desenvolvimento econômico produtivo desses países. Agora nós não queremos construir a nossa experiência seguindo cartilha de nenhuma outra. O Brasil é um país próprio, nós queremos sim, construir socialismo no sentido mais específico da palavra... socialismo é defender a igualdade de oportunidades, defender que todos sejam tratados iguais na sociedade, socialismo é defender a democracia ampla, não é uma democracia que se limita apertar um botão a cada quatro anos, mas defende que as pessoas possam decidir de maneira permanente sobre as questões políticas nacionais, sobre os grandes temas de um país, isso é o que a gente acredita, é isso que nós defendemos enquanto socialismo enquanto democracia” (...) (BOULOS, 2018b).

Um socialismo que propõe a manutenção da democracia? Que sentido “específico da palavra” tem esse socialismo? Igualdade de oportunidades na sociedade capitalista? Um espetáculo de retórica, pois propaga um socialismo no capitalismo, igualdade na sociedade de mercado, oportunidade na terra da mais-valia? E o psolista Guilherme Boulos não para por ai: “(...) eu não tô aqui para demonizar empresário, empresário, né... acho se empresário serve o país, excelente, é importante que o faça, aliás as micro, médias e pequenas empresas no país, são as maiores geradoras de emprego e precisam sim de estímulo do Estado, de crédito, tudo mais, inclusive baixando o juros, você colocou uma questão essencial, o Brasil não pode ficar refém, nem os empresários e nem o povo brasileiro, nós não podemos ficar reféns de juros exorbitantes (...)” (BOULOS, 2018c).

“Assobiar e chupar cana”, defender que estas duas ações é possível, significa defender a conciliação de duas classes historicamente antagônicas. Isso o PT já fez em seus governos desde 2002 e os resultados todos sabemos. O Psol, como partido reformista, revisionista decadente do socialismo, segue o mesmo caminho do PT, efetivando o jogo da reação democrática da burguesia em épocas de crise e as consequências para a classe trabalhadora continuarão sendo gravíssimas! Todavia, uma das farsas dos neoreformistas, detidamente a apresentada pelo Psol em nosso tempo presente, é que se coloca formalmente contra a conciliação de classes e de forma

quase retumbante se diz ser programaticamente contra “assobiar e chupar cana” ao mesmo tempo. Vejamos como é apresentada esta questão em seu programa socialista “com liberdade”: 3) Rechaçar a conciliação de classes e apoiar as lutas dos trabalhadores. Nossa base programática não pode deixar de se pautar num principio: o resgate da independência política dos trabalhadores e excluídos. Não estamos formando um novo partido para estimular a conciliação de classes. Nossas alianças para construir um projeto alternativo têm que ser as que busquem soldar a unidade entre todos os setores do povo trabalhador – todos os trabalhadores, os que estão desempregados, com os movimentos populares, com os trabalhadores do campo, sem-terra, pequenos agricultores, com as classes médias urbanas, nas profissões liberais, na academia, nos setores formadores de opinião, cada vez mais dilapidadas pelo capital financeiro, como vimos recentemente no caso argentino. São estas alianças que vão permitir a construção da auto-organização independente e do poder alternativo popular, para além dos limites da ordem capitalista. Por isso, nosso partido rejeita os governos comuns com a classe dominante (PSOL, 2018).

O programa de fundação, neste caso, sustentado até esta data, não passa de uma abstração, no sentido de serem palavras vazias. Queremos dizer com isso que o reformismo trabalha no plano abstrato da realidade no que se refere ao Programa. Que embora programaticamente se coloque como defensor da independência de classe, e de supostamente serem contra a conciliação de classes, no plano da realidade concreta esta defesa não passa de uma abstração como empregado por Marx na “Introdução de 1857": Es scheint das richtige zu sein, mit dem Realen und Konkreten, der wirklichen Voraussetzung zu beginnen, also z.B. in der Ökonomie mit der Bevölkerung, die die Grundlage und das Subjekt des ganzen gesellschaftlichen Produktionsakts ist. Indes zeigt sich dies bei näherer Betrachtung [als] falsch. Die Bevölkerung ist eine Abstraktion, wenn ich z.B. die Klassen, aus denen sie besteht, weglasse. Diese Klassen sind wieder ein leeres Wort, wenn ich die Elemente nicht kenne, auf denen sie beruhn, z.B. Lohnarbeit, Kapital etc (MARX, ). 17

É absolutamente abstrato, para não dizer irreal, pois este ponto do programa não passa pela menor crítica que se estabeleça no tempo presente, considerando que o Psol como 17 A tradução aqui é de Fausto Castilho: “É que parece correto começar pelo real e pelo concreto, pela pressuposição efetivamente real e, assim, em economia, por exemplo, pela população: fundamento e sujeito do ato todo da produção social (die rundlage und das Subjekt des ganzen gesellschaftlichen Produktionsakts ). A uma consideração mais precisa, contudo, isto se revela falso. A população, por exemplo, se omito as classes que a constituem, é uma mera abstração. Estas últimas, por sua vez, são uma expressão vazia se não conheço os elementos sobre que repousam, a saber, o trabalho assalariado, o capital etc.” (CASTILHO, 2010, p. 109).

representante do neoreformismo é incapaz de efetivar o que supostamente defende em seu programa político que leva a palavra socialista com um vermelho completamente desbotado pela água sanitária da burguesia que diz combater. A prova mais cabal desta afirmação é a prática desta organização de aceitar, sem nenhum problema, o financiamento de empresas, ou seja, dinheiro da própria burguesia para defenderem este programa abstrato durante o jogo democrático que já nos referimos anteriormente. É preciso reafirmar a esquerda revolucionária e certamente o Psol passa longe de ser revolucionário, pois sua práxis é radicalmente utilitarista e atende os interesses da burguesia. Como sustentar o financiamento de campanha e ao mesmo tempo um programa realmente revolucionário? Quem nos responde é Luciana Genro, na ocasião ao entrevistador da TV Gaúcha: Entrevistador: “A senhora disse que é preciso taxar a riqueza das cinco mil famílias mais ricas obviamente do Brasil, no entanto em 2008, quando a senhora foi candidato a prefeita de Porto Alegre a senhora recebeu cem mil reais da multinacional gaúcha Gerdau, que inclusive todos sabem, apoio à ditadura militar na década de 60, também recebeu recursos e ta recebendo da companhia Zaffari que também é uma das famílias mais ricas do Brasil... onde é que esta a distância entre a coerência do que se fala e do que se pratica?” Entrevistada: “Acho que é ao contrário da Dilma, por exemplo, que recebe dinheiro dos bancos das empreiteiras e efetivamente governa a favor desse segmento são tantos na política econômica como colocando essas empreiteiras para fazer obras na Petrobras e superfaturamento e propinas como a gente tá vendo, o fato da Gerdau ter contribuído com a minha campanha em 2008, aliás, eles contribuíram com cem mil reais para todos os candidatos, só demonstra que eu apesar de ter recebido esse dinheiro não tem absolutamente nenhum compromisso com essas empresas, assim como também não tenho com o Zaffari que é a única empresa que doa para o Psol, então o Psol por estatuto tem uma definição de não receber dinheiro dos bancos das empreiteiras que das multinacionais que são as empresas que em geral os segmentos empresariais que mais estabelecem essa relação promíscua com os partidos e os governos [...]18.

Se não fossem suficientes as contradições da própria resposta ao entrevistador e conivência com a ditadura militar empresarial, como defender a convivência pacífica entre empresários e a classe trabalhadora que é vilipendiada todos os dias pelo empresariado? Como aceitar o jogo da reação democrática e construir a revolução socialista? Parece-nos que esta prática é dizer que consegue “assobiar e chupar cana” ao mesmo tempo! É o típico caso 18 Entrevista disponível in: . Acesso em 19 de Maio de 2018.

de defender um programa socialista absolutamente vazio, abstrato e ao mesmo tempo a burguesia no tempo presente. Reafirmamos: o reformismo deve ser combatido com todas as nossas forças, pois estas organizações (não apenas no Brasil), não representam um programa político à parte dos interesses da burguesia, pois são a expressão literal do programa político burguês que necessita da perspectiva reformista para dar um ar de legitimidade àquilo que apresentamos aqui como reação democrática. Principalmente nos momentos de crise do capital, onde a taxa de lucro deve ser retomada a todo preço. Preço que evidentemente querem fazer a classe trabalhadora pagar. Diante disso, ao invés de construir e fortalecer a perspectiva socialista revolucionária, os reformistas apenas fazem confundir ainda mais a classe trabalhadora e desviar as tarefas de armar a classe proletária como sujeito revolucionário do nosso tempo presente. Se a burguesia nos ataca frontalmente, o reformismo nos ataca pelas costas. Nossa resposta, para ambos, continua sendo aquela dada de frente: colocar a classe para marchar e instaurar a ditadura revolucionária do proletariado. E isso não se faz em conciliação com empresários, nem através das eleições. Faz-se com lutas organizadas, unindo os trabalhadores, não as esquerdas, neste caso os neoreformistas. Estes, do século XIX até o XXI, devem ser atacados com todas as nossas forças. Com a palavra, aqueles que dizem “assobiar e chupar cana” ao mesmo tempo!

Referências: BOULOS, Guilherme. Entrevista Programa Roda Viva. Fundação Padre Anchieta, 2018. Disponível in:. Acesso em: 21 de Maio de 2018. CASTILHO, Fausto. Tradução. O método da Economia Política. Karl Marx. Revista Crítica Marxista, número 30, Campinas, 2010. FONTANA, Mariúcha (Org). Projeto de teses programáticas (da seção brasileira da LITCI): O Brasil precisa de uma revolução socialista. São Paulo: Sundermann, 2018. FUKUYAMA, Francis. O fim da história e o último homem. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. MARX, Karl. O Capital: Crítica da economia política. Livro I: O processo de produção do capital. Trad. Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013. LÊNIN, Vladimir (1918). A revolução proletária e o renegado Kautsky. Disponível in:. Acesso em: 03 de Maio de 2018. LÖWY, Michael. Prefácio a edição brasileira. In: Crítica ao programa de Gotha/Karl Marx, tradução de Rubens Enderle - São Paulo: Boitempo, 2012. PSOL. Programa. Programa aprovado no Encontro Nacional de fundação [...]. Disponível in:. Acesso em 09 de Maio de 2018. TROTSKY, Leon. Posfácio, 90 anos do manifesto comunista. In: Manifesto do Partido Comunista. Editora José Luis e Rosa Sundermann; SP, 2003.