Ancestralidade afro-brasileira: o culto de babá egum

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Ancestralidade Afro-Brasileira

OUTROS TÍTULOS A Discriminação do Negro no Livro Didático Ana Célia da Silva

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.A.família de Santo nos Candomblé.r Jejê Nagôs da Bahia Vivaldo da Costa Lima Agadá: Dinâmica da Civilizaç/Jo Africano-Brasileira Marco Aurélio Luz (co-edição com a SECNEB) Caçadores de Alma .Ordep Serra Candomblé da Jlahia - Repre.sslJo e Rui.ri nela JólioBraga

Comida e Presente em Tempo de Pauag~m Pedro Agostinho

Dois Estudos Afro-Brasileiros Ordep Serra Encontro de NaçlJes de Candomblé Vários Autores Galegos no Paraíso Racial Jefcrson Bacelar (co-edição com a Editora !ao.amá) Notícias da Bahia - 1850 Pierre Vcrgcr

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IDUFIA Editora da Universidade federal da Bahia Rua Barão de Geremoabo stn Campus de Ondina 40170-290 Salvador Bahia

TeVfax, (711263 6160 / 6164 [email protected] www.edufba.ufba.br Uvrarla 1

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Uvrarlil3 Livraria Afro-Oriental - Terreiro de Jesus 17

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Mestre em Ciências Humanas em 1975 pela UFBA 'e doutor em antropologia pela Université Nationale de Zaire (i'977), onde defendeu tese sobre as práticas divinatórias afrobrasileiras, Júlio Braga realizou pós-doutorado na Université des Sciences Humaines de Strasbourg, França, e foi visiting scholar do Institut of Afriqan Studies da Universidade de Boston, Estados Unidos. Leitor brasileiro junto à Embaixada do Brasil na Costa do Marfim, pesquisou religiões tradicionais em vários países da África Ocidental, Entre outros trabalhos', publicou: Contos afro-

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Ancestralidade Afro-Brasilçira

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JULIO BRAGA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Reitor Luiz Felippe Perret Serpa Vice-Reitora Maria Gleide Santos Barreto

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EDUFBA Diretor Gustavo Aryocara de Oliveira Falcón Conselho Editorial Ubiratan Castro de Araújo (Presidente) Gustavo Aryocara de Oliveira Falcón Antonia Torreão Herrera Lúcia Fernandes Lobato Manoel Barral Neto Marco Aurélio Andrade de Filgueiras Gomes

Ancestralidade Afro-Brasileira O

culto de babá egu1n 2ª EDIÇÃO

CEAO Diretor J eferson Bacelar Vice-Diretor Afonso Florence

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para a língua portuguesa cedidos ao Centro de Estudos Af'1·0· ri ntais da Universidade Federal da Bahia e Edições Ianamá.

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l•'oi f ifo o depósito legal.

F otografias: Capa - Artur Ikissima Págs. 83, 85, 87 e 89 - Pierre Verger Pág. 91 - Suky Miller Pág. 93 - Katarina Real ]

Capa: Aloísio Moura Filho

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Braga, Júlio Ancestralidade afro-brasileira; o culto de babá egum / Júlio Braga/ 2. ed. - Salvador: EDUFBA/Ianamá, 1995. 142 p., il. 1. Antropologia. 2. Religião afro-brasileira. 3. Etnografia religiosa. 1. título. CDD 572 291 291.21 291.3

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EDUFBA - EDITORA DA UNNERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Rua Barão de Geremoabo, Campus Universitário da Federação - Ondina Fone: (071) 245-9564 - Fax: (071) 235-8991 - CEP 40170-290 - Salvador

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EDIÇÕES IANAMÁ Av. Cardeal da Silva, 82 - Federação Fone: (071) 245-8235 - Fax: (071) 235-7545-CEP 40220-141 - Salvador

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Este livro é para Olga de Afoqueto Vivaldo da Costa Lima Cleusa Millet

SUMÁRIO

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Júlio Braga, por Pierre V erger .................................. . 11 Introdução ............................................................ . 13 O culto de egum em Ponta de Areia ..................... . 23 Organização sócio-econômica do culto de babá egum .......................................... . 49 v-~ Ancestralidade em Ponta de Areia: o exercício da autoridade ...................................... . 65 Ancestralidade afro-brasileira ............................... . 95 . A dinâmica da ancestralidade afro-brasileira ........ . 115 Glossário ................................................................ . 127 Bibliografia ..............................................·............ .. . 133

Agradecimentos

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Desejo expressar os agradecimentos mais sinceros a todos quantos, de uma maneira ou de outra, tornaram possível a publicação deste livro. Inicialmente, meus agradecimentos aos irmãos dos can,-domblés da Bahia, com quem aprendi a exercitar as fórmulas delicadas cuidadosamente utilizadas para não falar das coisas proibidas. Cecília Sardenberg compartilhou comigo o processo de elaboração deste trabalho, em Boston. O meu reconhecimento e carinho. Barbara Kempf muito me ajudou na versão para o francês do texto inicial, apresentado à Université des Sciences Humaines, de Strasbourg, que deu origem a este livro. Consuelo Pondé teve a gentileza de fazer a leitura prévia do texto integral e realizou competente revisão. Ao amigo e companheiro permanente, Gustavo Falcón, que na qualidade de editor do Centro de Estudos Afro-Orientais da UFBA soube superar as dificuldades técnicas. Ao amigo e companheiro J eferson Bacelar, com quem discuti algumas formulações teóricas. A Ivanildes e Mirian pela eficiência com que digitaram os origznazs. Meus agradecimentos especiais à equipe do Centro de Estudos Afro-Orientais, minha casa de trabalho.



Júlio Braga

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Uma irnportante parte dos estudos e trabalhos do Doutor Júlio Braga consiste, do ponto de vista iorubá, ern uma pesquisa de suas origens rnísticas nesta etnia africana. Ele se tern integrado há rnuito ternpo, nos rneios onde se .,,pratica o culto dos orixás nagôs aclimatados no Brasil. Suas pesquisas conduzirarn-no a viver urn certo ternpo nos lugares de origern dos deuses e deusas africanos na Nigéria e no Benirn (o antigo Daorné). Sua vida parece ter sido dorninada pelo fato de ter corno entidade protetora Oya-Yansã (Santa Bárbara), voluntariosa, dorninadora, guerreira, hornenageda pela expressão "ajirnudá" (apanha a espada no rnornento que desperta). Eu tive o privilégio de guiar os prirneiros passos de Júlio Braga na Nigéria e de facilitar suas entrevistas corn rneus confrades babalaôs que lhe contararn nurnerosas lendas sobre o seu orixá protetor. Posso testernunhar do respeito que ele dernomtrava, na África, ao seu "Otá ado Oya" (seixo do Rio Níger) de sua iniciação, o qual transportou carinhosarnente para o Brasil nurn vidro cheio de água do rnesrno rio, para preservar o seu axé. Acontece que Iansã é o único orixá capaz de dorninar os eguns (almas dos antepassados) e que os lugares onde se pratica o culto destas entidades são situados sobretudo na Ilha de Itaparica.



ANCEST RALIDADE AFRO-BRASILEIRA

INTRODUÇÃO

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,l. Braga estabeleceu um de Satá por puro acas~ q.ue Ju w . do culto-de babá .H'US domicílios nas proximidades dos terreiros t:gum? . convivência com o pessoal de Ponta Quer seja ou n~o, sua esses interessantes ensaios sobre de Areia o conduziu a escrever a el representado pela prea vida dos pesca~ores do luga: e ~ volta dos babás eguns sença da ~om~nida6~e or;:;~~a d~s moradores desta região na organizaçao s. cw-ec da Ilha de Jtapanca.

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PIERRE FATUMBI VERGER

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La nwrt est vécue comme rupture: celle qui a rompu avec la vie, celle des deuileurs rejétés pour un temps de la société. Il

y a, sans dnute, des mptures heureuses bien que dnuloureuses co111111e celle de la naissance. Il en est aussi de reposantes quand on s'abandonne au bien que certains soient hantés par la crainte de ne passe réveiller. D'autres sont penibles mais l'espoir deretour console de la peinequand on sequitte pour un long voyage. Loms-V1NCENT THOMAS, LE CADAVRE

Apesar da vasta bibliografia relativa à presença das culturas africanas no Brasil, incluindo-se alguns trabalhos que já se tornaram clássicos, quer pelo pioneirismo, quer pela profundidade com que os temas foram abor·-dados, esses estudos se ressentem ainda de pesquisas orientadas para estudos monográficos, capazes de fornecer novos elementos etnográficos indispensáveis à compreensão, acaso mais abrangente, da contribuição do negro à cultura nacional e ao conheómento mais profundo do substrato sócio-cultural que elabora e define sua identidade cultural, no contexto da sociedade brasileira. Essa identidade cultural, sempre entendida como identidade étnica e servindo aos interesses políticos de defesa do patrimônio e espaços sociais do negro, emana de maneira evidente de sua própria.realidade histórica e sociológica, na mesma dimensão em que é conhecida e posta a serviço de seus interesses mais fundamentais. Contudo_, essa identidade do negro se projeta não como mecanismo simplista de. busca e exaltação desenfreada das diferenças que reforçam os preconceitos sociais de toda natureza e de todos os matizes. Antes aponta para um processo permanente de luta pela conquista e valorização de sua especificidade, no âmbito da

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INTRODUÇÃO

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AN CESTRALIDADE AFRO-BRASILEIRA

\l ifo · Lad a cultura nacional. Esta é a t~refa qu~ vêm 11111 t•a \i zando diferentes instituições cultur.ais : mo.vimen1 tos < r anizados na Bahia, visando a valorizaça? c.onstante os componentes sócio-culturais afro-brasi~eiros que odulam e expressam a cultura baiana naquilo que ela p ossui de mais original. . . . . Entretanto, é necessário que essa especificidade cultural negro-baiana seja interpr~tada, não c~mo algo estranho ou exótico, circunstância que se ;e~ificou, de certa maneira, em alguns estudos antropologicos demasiadamente comparativistas, nos quais dispens~u=se pouca atenção à avaliação e análise do pro~esso dinamico de mudança e reinterpretação a que .estiveram per?1anentemente submetidas as culturas africanas no Brasil. Certo é que a tentativa de compreender. e analisa~ a cultura negra no contexto brasil~i~o e, mais do que isto, n~.sua projeção sócio-antropologica atual, encontra, fre~uen­ temente, certa resistência por parte dos que teu~a1!1 em ver degeneração ou deformação onde parece existir reelaboração permanente dessas mesmas culturas, em nova ordem sócio-cultural mais ampla. A perspectiva de compreender a at':1al ?inâmica cultura afro-brasileira não pode prescindir de av.ahação constante da importância dos padrões culturais de origem, que a motivaram, posto ~ue e:er.ce~, no campo das representações simbólicas,. influ.encia ainda mmto marcante na elaboração da identidade cultural do negro. . _ É certo que os candomblés da Bahia estao estruturalmente comprometidos com diversos e complexos valores religiosos africanos. Cont~do, exa~e mais acurado do seu ajustamento à nova realidade soCial revela ~eca­ nismos de surgimento de uma estrutura que preserva elementos de origem, reelaborados de acordo com novo



sistema de crença que motiva e anima essas comunidades r~ligiosas afro-brasileiras. Essa perspectiva analítica permite afirmar que elementos constitutivos da estrutura dos cult?s africanos foram abandonados pois que se tornaram ineficazes ou não se ajustaram ao sistema surgido no Brasil. P.e~m~ne.ceram somente aqueles segme.n~os c01;iponenc1ais indispensáveis ao novo sistema rehgios?. E o caso, por exemplo, da noção também rede.fimda de odu (caminho, destino), elemento central do s~stem~ divinatório com o opelê Ifá (rosário de Ifá) dos 1oru~as, reencontrada no jogo de búzios de que se valem pais e mães-de-santo nos candomblés da Bahia. Por essa razão é que os candomblés sintetizam dife_3 entes. val_?res, c.ultur~i~, ao formarem uma complexa orgamzaçao socio-reh.g10sa, que não encontra paralelo em nenhuma das sociedades tradicionais africanas envolvi~as p~lo t~áfico de es.cravos para o Brasil. De certa maneira, tem sido decepcionantes os resultados das viagens realizadas por pais e mães-de-santo a diferentes países .da Áfric~, .ªº se darem conta de que não existe um orgams~o rehgi?so, como o candomblé, cuja estrutura se aproxn~~ ou sirva de modelo às suas próprias casas de c;,ulto às divindades de origem africana e afro-brasileira. E que o candomb~é ~onstitui, em essência, uma criação do negro no Brasil, integrando atualmente um sistema ~ais ,amplo..de. religiosidade popular. Nesse sentido, já nao e uma c01sa de negro", como se dizia, depreciativamente'. ~~ medida em que ocorre ampla penetração dessa rehgia