A Passagem do Três ao Um
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A passagem do três ao um

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Leopoldo Waizbort

A passagemdo três ao um crítica literária,

sociologia, $tologia

SBD-FFLCH-USP

11 11 11

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/''

COSACNAIFY

b.+

Parte l

11

DESIGUAISPOREMCOMBINADOS

Lt)

Continuação de um e complemento de outro

\l

"Epor que não pode ser bruiLeiía a formct do Realismo europeu?

Parte n 87

SENSODAS COALESCÊNCIASE SENTIMENTO DA REALIDADE

112

Excurso dúplice: a corutruçãoda identidade disciplinar e aquela tesedo ano \ gSa

i43

Recurso sobre uma dúvida, que se atretcl aa anterior

i98 Excursofara de Lugar 226

Observação interpost'i sobre o desalinho de Macho'do de .4ssb

Parte ni Z65

EXTRAPROGRAMA: FILOLOGIA E SOCIOLOGIA

321 Bibliografia DEDALUS - Acervo - FFLCH

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2 0 9 0 0 1 7 2 3 4 9

335 Nota 337 Sobreo autor 34i índice onomástico

O que me carnal,a um prazer especí$co, era a descobertados pontos comum a vários seres.SÓ ao vbLumbrá-Los, meu espírito

até então sonolento, mesmo

sob a aparente vil,acidade dm palavras cuja animação, na conversa,mmcarava para outrem um completo torpor espiritual mm o que nessesmomentosperseguia

Lançava-sede súbito à caça,

por exemplo, a identidade em diversos

Lugarese época diversa do Salão Herdurin

situava-se a certa profundidade,

para além da aparência,em lona um poucomais recuada.

Proust

Parte l DESIGUAISPOREMCOMBINADOS

r' a

Iniciemos em tempo e lugar distantes, uma ode a uma amantc esquiva: "Had we but world enough and time...". Pleno de sentido, o verso que

Erich Auerbach tomou como epígrafe em MzmeiÚ. -D'zrgeife//feM:rX:Lichkeit in der abertdlãndischen l.iteratur

\Mimesis. .4 realidade exposta na

//[er'zrzzraoc;densa/]não recebeu grande atenção de seus leitores. No

poemade Andrew Marvell, um dos metafísicosinglesesdo séculoxvll, o verso possuium sentido bastanteclaro, tempo e espaçosão finitos e não os temos ao nosso dispor; portanto, minha querida, é melhor nos apressarmos e colhermos todos os prazeres que esta vida pode nos dar, antes que tudo pereça e sejamos roídos pelos vermes. Despercebido é o

sentido que o verso possui em Auerbach, considerando-se que o livro

foi escritopor um filólogo judeu-alemãoem exílio involuntário na Turquia, durante a Segunda Guerra Mundial, carente de tempo e condições de pesquisa favoráveis. Fossem outras as condições, o livro não seria o que se apresenta agora e dessaforma.' Isso sugere algo significativo na

estrutura profunda e superficial do livro. Quando o Fondo de Cultura resolveu, logo após a edição original,

traduzir a obra, Auerbachescreveuum novo capítulo sobre o romance de Cervantes. a fim de torna-la mais encantadora ao leitor castelhano. A inserção de um capítulo em meio ao livro indica a complexa relação de

todo e parte que o articula. Posteriormente, já ao final da décadade i95o, Auerbach comentou a estrutura de J141mesü e os lapsos que Ihe pareciam i. O fato de Auerbachtransformar o "lhos/d" e " Zzme", com maiúsculas,em "wor/H" e üme", com minúsculas, indica o sentido mais concreto, imediato e próximo que pretende para os termos, despojando-os de qualquer sentido transcendente possível. Cf. A. Marvell To his Coy Mistress", in Helen Gardner (org.), ZBe .44efap/Çsica/Pneu. Harmondsworth

Penguin,ig86,p.z5o. 11

r verdade,indica uma pluralidade de "realismos", cadaqual com sua

especialmente significativos na obra, oferecendo mais alguns estudos que contemplassem certas lacunas.: Isso sugere que a empreitada auer-

peculiaridade específica. Interessa-me menos esmiuçar esseverdadeiro

problema e achadodo que indicar um registro analítico, no qual pretendo adentrar. Pois se as investigações de Auerbach mapeiam uma

bachiana possui uma dimensão (que denominarei aqui, para uso restrito)

aberta", a permitir investigações suplementares,que indiquem formal

ampla gama de feições do "realismo", de modo a dissolver uma defini-

ou modalidades outras da realidade exposta na obra de arte literária. Ou seja, podemos entender ]Mzmesücomo um conjunto de fragmentos, fina-

mente articulados entre si

pois a trama narrativa do livro é complexa

e resulta em uma articulação única de análise singular, síntese histórica e

totalização narrativa --, que indicam uma série variada e muito rica de modos de exposição da realidade na literatura, que não se esgota no

L

i'

ção monolítica em uma série de configurações e modalidades próprias a

períodos e obras literárias específicas, abre-se então a possibilidade de se pensar outras configurações "realistas" particulares na perspectiva geral que o livro arma.

Com isso em vista, vou pontuar o problema em dois livros, publi-

elenco apresentado seja em i946, seja em 1949 (edição mexicana), seja em i958.' Há uma concepção geral que dá enquadramento e unidade ao pensamento ali exposto, mas que permite ainda outros desdobramentos,

cados quase simultaneamente: Machado de .Jssú.' ap/r.2m/de e o zrap4/a (1974), de Raymundo Faoro, e Ho enredar m óalalm (/). For«'za /frei'í ria e processosocial nos inícios do romance brmiteiro (i gllÕ, de RobeTto

que apenas as limitações de tempo e lugar impuseram ao seu autor (essas

Schwarz na desconfiançade que a faísca produzida pelo confronto

limitações são ressaltadaspelo fato de Auerbach firmar laconicamente,

ilumine algo significativo.

na abertura, o período de redação: "Maio de i94z a abril de i945".'

Um dos aspectosmais intrigantes da fortuna do livro é precisa-

Há uma mesma questãoque é o fulcro dos dois estudose fornece o

mente o fato de que ele se acha aberto para outros modos de exposição da realidade, de sorte que podemos ler novos esforços (sejam do próprio

fio condutor inicial: qual o "realismo" de Machado de Assis? O que equivale indagar como a literatura de Machado expõe a realidade, se

autor, sejam de outros) no interior dessaconcepçãogeral. Como se sabe,

e como a "retrata",

"espelha",

"ilumina",

"apresenta";

qual a relação

na

que se estabeleceentre "realidade" e "obra literária". Compreender a

z. CE.t.úch P-uetbach , Linratursprach und Publikttmin der !ateinischenSpâtarttikeund im

peculiaridade do realismo machadiano é explicar o nó dessasleituras sociológicas; donde inclusive o caminho inverso, que é reivindicar para as ciências sociais o conceito ou noção, incorporando dessemodo um

Auerbach tece uma complexa e matizada concepção de "realismo";

]l/írfe/a/rer.

Berna: Francke, i958(citado

a seguir com o título reduzido

de Z.;rerarurspracÃe

ad Ptzó#Éüm).É o próprio Auerbach quem fa]a das ]acunas do ]ivro em ]Hzmesú.Z)arfa sfeZ2fe M:r&#cÃÉeli (i:

ed.

í946),

;lz der aóend7à/zclhcÃen Ziferafzzr.

p. 5i8;

}'Zer

CZnrerxücÃü'zge/z

{ur

g? ed., Tübingen/Basel:

GefcÃ;cale

der.#a,zÍãsiscÁen

Francke, Bz'/du,zg.

i994 Berna=

elemento que apenasa repartição disciplinar pretendeu, em alguma vertente, situar para além daquelas "ciências". Pois se a institucionalização e a especialização permitiram que as obras fossem classificadas

3. A conste]ação de ]141mei&comporta, ainda, escudos avulsos, alguns deles, como o impor-

em outras categorias, trata-se apenas de um critério possível, dentre outros, que vale ser considerado em sua história e contingência.s Mas, como dizia, fala-se de "realismo", e pareceprudente começar

tante ensaio sobre Baudelaire, reunidos em E. Auerbach, Geaamme/ze4zHuàre {ür rama/zís

por considerar duas noções de realismo, extraídas dos nomeados esforços

Francke, i95i) p- 7; Ez'íerafzzrspracÁe zzlzdPuó/iAum, op. cit., pp. zz e z4; "Epilegomena zu i141meiü", in RomanúcÀe XarxcÃurzgea,v. 65, n? i-z, i953} pp- i-i8.

cACaPãiZoZaF;e. Berna/Munique: Francke, ig67, e em }4er C/nre zcÁzz/zgen ur GescÁlcA e der.#an ókiscÁe/z Bz'/du/tg,op. cit. Sobre a forma "aberta", veja-se a analogia apontada por Auerbach entre o "escritor moderno" e o "filólogo moderno", isto é, ele mesmo; Auerbach,

5. Ver W Lepenies, "Einleitung. Studien zur kognitiven, sozialen und historischen Identitãt

]141mel&, OP.cit., PP. 5o9-io. 4 Na segunda edição do livro, de i959, portanto após a morte de Auerbach, o indicativo

der Soziologie",in W Lepenies(org.), GeicÀ/cÀ e der Saído/aFle. Frankfurt: Suhrkamp,ig8i

assumiu a seguinte redação, cujo caráter menos lacónico atenua o efeito de dramaticidade,

Ka/zr;ngen{.Munique: W Fink, i998 (Poetik und Hermeneutik, i7); assimcomo Niklas

problematicidade e profundidade que emerge da redaçãooriginal: "Escrito entre maio de

Luhmann,

i94z e abril de i945". Cf. Auerbach,J141meiis, op. cit., p- 4.

dernlg. Stanford: Stanford University Press, i998, pp. 44-6z.

\2 Desiguais porém combinados

v- i, pp. i-xxxv. Sobre história e contingência, cf. G. v. Grãvenitz e O. Marquard (orgs.): "Contingency

as Modem

Society's

Defining

Attribute",

in Oósen'azz'om o/z .44o.

i3

r Segundo Reinado e dos inícios da República. Sem adentrar na discus-

de análise de Machado de Assis, talvez variando mesmo a noção ao

sãoacercada relaçãoentre sociologia e história, diria que sua análise é informada por uma modalidade de sociologia histórica, conjugação

longo deste estudo. Nos dois casos em pauta, há uma especificidade da

obra de Machado, que faz sua grandeza e que poderia ser considerada na concepção auerbachiana uma outra configuração histórica do "rea

de evento e conceito sociológico. O leitor percebe isso com facilidade, pois há extensaspassagensdo livro em que Machado fica de lado para

lismo", possuidora de especificidadeprópria. Faoro e Schwarz, cada um a seu modo, dialogam com Auerbach, oferecendo, com tempo e labor próprios, seus "suplementos". Comecemos pelo de Faoro:

conceito sociológico. A prova dá-se passo a passo,de modo que sua reprodução não vale a pena, pois seria muito empobrecida, mas pode

Discernir o pev$t dcl hora tTameUnte nos caracteres, des'pendam,atrás do pa-

pel teatral, as funções sociais e espirituais

dar lugar à informação e à análise histórica; esta sempre informada pelo a

esteo caminho tentado, para

reconqtlistar, no Machado de Assimimpresso, não o homem e a época, mas o homem e a época que se criaram na tinta e não na vida real'

ser dada /rznzzceno fulcro do argumento: "A mudança de uma estrutura. A velha sociedade de estamentos cede lugar, dia a dia, à sociedade de

classes".Entretanto e isto é tão ou mais importante do que o que precede --, "a classe em ascensão coexiste com o estamento; muitas vezes,

a classeperde sua autonomia e desvia-se de seu destino para mergulhar no estamento político, que orienta e comanda o Segundo Reinado".9

A tinta e a vida real, res.fczaee res#aclae,dois momentos que se quer separar e compreender: a realidade que se cria na literatura é o primeiro ponto que assinalo e remeto de imediato à matriz auerbachiana. O título mesmo do livro de Auerbach afirma: como "filólogo", interessa-lhe a realidade

Em meio a isso, a posição e a situação de Machado de Assis: "Perdido na mudança, no fogo cruzado de concepções divergentes do mundo, sem conseguir armar a teia da sociedade e identificar-lhe os fios, o

que se apresenta na forma de literatura;' disso decorre a tarefa, que é mos-

própria transição".'' E aqui chegamos, pelas costas, ao segundo ponto,

trar como a literatura expõe uma realidade, vale dizer, a constitui como

já indicado. Uma obra literária às voltas com uma situaçãode compli-

tal (/za obra). O problema de Faoro é precisamente este: a realidade que a obra de Machado expõe e, expondo, torna real. A figura do sociólogo é a

cada transformação.

encarregadado discernimento, desvendamentoe outros correlatos, pois

uma história do Segundo Reinado e inícios da República com a ficção

há uma falha entre a realidade tal como ela é o que signiníca, para Faoro, como a história e a sociologia a constituem e o modo como ela aparece em Machado: o ficcionista "estiliza os fatos e os homens".'

machadiana, de sorte que um serve ao outro, a história dando raiz à ficção, a ficção ilustrando e lustrando a história daí a estilização. Donde

Dois pontos, então.Pr/mo,a realidadetal como ela é: Faoro entende Machado de Assis interpondo à sua obra uma interpretação do

autor estiliza os fatos e os homens, na armadura de um esquemada

Talvez a força do livro radique no andamento em paralelo de

também uma fraqueza do livro, uma certa perda de autonomia da obra,

que só se deixa ler sob o cenário da história que a acompanhamzz/lo &perro (deveria dizer /medíaramen e?). Isso se mostra em uma alter-

nância que os leitores podem perceber: ora Faoro informa por meio da história pense-se por exemplo na discussão do Encilhamento (capí6. Raymundo Faoro, .44acÀado de.4ssü.'apzrám;dee a rrapéÍío.4: ed., Rio de Janeiro: Globo,

tulo 3)

2001,P.l3. 7- É preciso destacara cuidadosa formulação de Auerbach: "dargei e//re mzrÉ/ícÀÉe;l","rea-

ao primeiro plano, ilustrando a análise histórica. Seja dito, em favor de Faoro, que é a história que nos permite bem compreender o que se

e a obra de Machado aparece mais distante; ora esta é chamada

lidade exposta/apresentada", e não "apresentação da realidade". O estatuto que se atribui à realidade é diferente conforme a versão. Veja-se o texto, muito lúcido e no calor da hora,

narra, no sentido de que o autor crê que o bom entendimento da obra

de Kãte Hamburger, "Zwei Formen LiteratursoziologischerBetrachtung. Zu Erich Auer bachs]b41mesü und Georg Lukács GoelÀezzrzd se;rieZe;r", Oróú Zlf erarzzm,t. vn, fasc. i-z, i949,PP.i44-45. 8. Faoro, .44acÃado de .4sF&.'ap/rámíde e o aapáÍ;o, op. cit., pp. i4 e 54i-47.

l4 Desiguais porém combinados

g. Faoro, .44acÃado de ,4siü.' ap;rámz'de e o zrapé ia, op. cit., pp. i5 e i4

io.Id.,ibid.,p. i4.

literária exige o conhecer da história. A ficção nutre-se da realidade histórica; uma vez nutrida, pode dela se afastar, na direção da mencionada estilização.

Ora, se Faoro pede escreversuasociologia histórica do Segundo Reinado í/zzifra/zdo-acom Machado de Assis, é sinal de que Machado foi capaz, em registro próprio, de re ralo-/a, vale dizer expor a rea#dade.

Trata-se aqui, portanto, de uma realização rea/úla, que caberia qualificar. Poderíamos dizer, provocativamente, que Faoro possui sua história já pronta de antemão.'' Machado de Assis a ilustra, mas o sentido dessa ilustração não é nem simples nem banal: há muito que escapaa Machado,

seu intérprete Ihe contrapõe, a flm de indicar seuslimites, vale dizer,

Há, pois, um realismo específico que opera na análise de Faoro e a faz

vibrar; mas no âmago desserealismo pulsa o moralismo; e o inverso também é verdadeiro e necessário: na alma dessemoralismo vive o realismo. E é justamente nesseponto que ele deve ao 6ilóiogo judeu-alemão, assim como está obrigado na embocadura geral do estudo. É preciso,

pois, indicar como um determinado "tipo de realismo"'s constituiu-se precisamentenessaarticulação de realismo e moralismo, e exatamente

esteponto central, pivâ sobreo qual gira a interpretaçãode Faoro, foi posto a descoberto por Auerbach. Pois, para pensar e compreender Machado, Faoro precisou dar conta desta dupla face

por um lado realista,

por outro moralista:

suaexala posição.E tudo aquilo que encontrano escritor, que Ihe permite comprovar, enriquecer e lustrar sua análise,é trazido à tona. Assim como "a política dava lustro ao nome humilde",:: Machado de Assis dá

lustro à história de Faoro. A armaçãointerpretativa deste repousa na articulação de dois vetores, ambos já clássicos na exegesemachadiana: o rea/úmo e o mora/ümo.i3 Difícil trata-los em separado:

Tambémpertence a essaforça de uma visão sintética do mundo uma consciên-

ci(t crítica sólida, mas não obstanteelástica e perspectivista, queatribui aos fenómenos,sem uma moralizaçãoabstrata, o seu valor moíaLpecuLiare mutilado com precisão, na verdade deixando-o brilhar dospróprios fenómenos. [.-]

O me;o ei í/&ríco[...]

empregado #o;./á na .4/zf&u;Jade

mzz;lo pre ada

e denominado então "ironia"= taLforma discursiva indiretamertte iminuante, E/e]o

política

romanciçra]

/zão aprc,va oi

a/orai ;mcrífos no czzme da carreira

mostra-o, ao contrário, apenm um feixe de decepções,de amarga

ji'ustrações..4 ficção não remetea realidade nem a reproduz.no esp'lho; 'la

mediada, tem como pressuposto um sistema complexo e múltiplo de possibiLid(ües de valor%ão e também uma comciência perspectivista, que com o acontecimento in.slnua ao mesmo tempo sua con.seqiiêncta."

a critica, a combate, a denigre. O escritoré, filia SchiLter, o vingaílor da realidade -- nunca a palavra esteve mais adequ(lamente empregada do que

Este passo de Auerbach condensa muito: o estatuto do realismo em

no caso. O escritor não pode mentir; sua mentira terá a formct de fuga ou de

pauta, sua relação com o moralismo e o estatuto dessemoralismo, e

retóúca va:lm. Sea realidade éji'ustração, não se deve ofato ao escritor, mw

à própria íeaticlade, em si cinzenta e destituída de força de fucínio. Esta a

> interpor um excurso sobre a questão.Seja dito apenas,para não fazer mistério, que Schiller

verdadeira perspectiva: esta a $1osoFada ÍI'ustração O ministério oil o título

não disse ser o escritor o "vingador da realidade", mas o "vingador da natureza". Quem

de marquês, com o qual sonhavam Rufião e 7irgília,

transformou a expressãoem "vingador da realidade" foi, salvo engano, Georg Lukács. Que Faoro tenha citado a expressãoem sua forma adulterada indica, creio, que o fez por meio de Lukács. E isso nos leva a um outro autor que está levemente por detrás de sua análise:

.z/go desr]rzzi2/o de vazar aüfé/z lco[...].

são mera apa'êncta,

'*

masque por razõesde espaçoe de centralidade deixei de lado. Ver Friedrich Schiller, "über ii. Inclusive em sentido literal: Raymundo Faoro, Osdonosdopoder. Ãormafãa doparranara pa#tfco ór ;Zebra.31ed., Rio de Janeiro: Globo, zoom. lz. Faoro, .44acÀado de ,4sxü.' a pirâmide

e o rrap(qü,

OP- cit., P. iZ6.

i3. Embora signifique parte importante da discussãodos au coresde que trato, este estudo deixa de lado os diálogos que estabelecemcom a fortuna crítica e a tradição de interpr'ta ção da obra de Machado de Assimpara concentrar-sena questão de fundo proposta.

i4. Faoro,it4acÁado de .4siís.'a pirâmidee a rrapéÍfa,op- cit., p- iz8; ver tambémp. 536 A referência a Schiller é especial por uma razão cifrada, que deixo de lado para não ter de >

naive und sentimentalische Dichtung",

in Sãmr#cÃe Mêr4e. g? ed., Munique: C. Hanser,

i997>v. 5, p. 7iz; Georg Lukács, "Aktualitãt und Flucht", in ScÁícÉsabH'ande. .Befaage{zi eíriernele/zdezucAen /2eo/agfe.Berlim: Aufbau, i948, p. 11i; Georg Lukács,"Maré und das ProblemdesideologischenVerfalls", in /HerÉe. Proa/emedesãea#fmm /. Neuwied/Berlim: Luchterhand, i971, p- z78.

l 5. Ver Ulrich Schulz-Buschhaus, "Typen desRealismusund Typen der Gattungsmischung Eine Postille zu Erich Auerbachs 'Mimesis"', SpracÀÉzzmf, 20) ig87, pp. 5t-67 i6. Auerbach, ]16meiü, op. cit., pp. zí i-iz.

i7 \6 Desiguaisporém

como

aços

o meio estilístico mobilizado o mais das vezes.E sintetiza a figura do

traço do Machado moralista presente no episódio.'8 Por sua vez, Miécio

escritor, na consciência a um tempo crítica e perspectlvlsta -- por exem-

Táxi, em O mzzndo de Machado

plo, é a ela que se deve a célebre caracterização do cunhado Cotrim (no

rentes meios de transporte que aparecem na obra do ficcionista.'' Sem negar ambas asinterpretações, Faoro as potencia: mostra-nos como os meios de transporte estão ligados a uma complexa e fascinante topografia social, que vai decantando passo a passo: carruagens, coches,tílburis, landaus, cupês,caos,cabriolés, bondes e símiles indicam momentos

capítulo cxxm

das .A4emórím pósfzzm«s de -Bró Cüó«,), dentre tantas

outras aparições que assombram. Isso somente para sublinhar que esse passo de Auerbach é uma chave de leitura privilegiada para a obra de Machado de Assim-- que não cabe esmiuçar aqui, já que meu problema é de segunda ordem. O que, decerto, não me abstém do ânus da prova com relação à importância do moralismo, na visão de Faoro:

de ..4:iü, arrolou

extensivamente

os dife-

históricos específicos e possuem proprietários e usuários determinados,

que não seconfundem jamais na teia dos mecanismos de prestígio e de

hierarquia social: Machado, preso aos preconceitosde moralista, ainda alheio à formação de historiador do século xíx, concebeu w estruturas sociais como moviam por

Do cachoao bonde

sentimentose papões individuais. No jogo dm forças sociais, o concursodas

Reinado, que se expressa e caracteriza. Pelo cacTOse conheceo homem: sÍmboLode opulência, da mediania e da pobreza. .4 carruagem faça supor as

circumtâmia

exteriores tem inegáveLpeso, mm o que decide é a libra do ho-

é toda a sociedade do Império, sobretudo a do Segunda

mem, rompendo caminhos à cinta de sua ambição. \..À .4 visão do moralbta

cocheira, o exército de criados e escravos, tudo articulado para o lu)ço os-

pune a ambição, esmagaa paixão quearde secretamentena alma, ao tisná-

terttatório das rum e praças. O bonde, no outro extremo, é a sociedade demo-

La com a ilustração.

17

crática que se expande e cresce

socieclacle mat-educada,

que cospe no chão

exala alto. O carro escondee dissimula cabedais; o carro ostentae põe a nu o homem, com sem vícios e sua pobreza. Eles se digladiam nm ruas, com

A figura do moralista amolda o realismo machadiano,assimcomo o realismo dá forma ao moralista pois não setrata do moralista que julga segundo um panteão de valores dados de antemão, senãoque os deixa aflorar no próprio desenrolar da ação,situação ou problema. E isso que Auerbach tinha em vista, quando distinguia a moralização abstrata, de

Como fantasmas,as coisasvivem e falam pelos homens, que se vêem

um lado, de um valor moral que tinge os fenómenos no acontecerda

condenados a meros objetos, nesta como que lembrança do fetichismo

própria situação,de outro. Isso em favor tanto do Machadorealista

da mercadoria por Faoro.:' Por detrás deste mundo dos coches, cupês, tílburis e companhia pulsa toda a trama viva da sociedade, vista sob as

como moralista -- e sem deixar passar despercebida a singular maestria

do romancista no simplesmente deixar aflorar... Tomemos um único exemplo, que faculta avaliar o diálogo de Faoro com a tradição e, no mesmo movimento, aquilatar a enorme força de sua análise. Eugênio Games, em O enigma de Cap/ u, dedicou um parágrafo à velha bege de D. Glória, que encantava Bentinho e de que sua mãe

não se desfaziapor lembrança do marido. Segundo Eugênio Gomes,

impulsos próprios, honra e prestígio derivados du parelha

num painel

autêntico do quevale ccLdçlhomem n.oconceito de OUtTO homem u

lentes do moralismo: aqui, os homens valem pelo que aparentam ser e valer. Comparar Faoro com Gomes (Táti é simples e competentemente

descritivo) é instrutivo para aquilatar a distância que vai de uma interpretação impressionista a uma leitura sociológica: Eugênio Gomes utiliza a sebe para marcar a necessidadede distinção e prestígio, tingida contudo pelo inusitado de um tipo de carruagem já antigo e difícil de se

Bentinho aprecia a sege como objeto de prestígio, como símbolo de status.

Ver-se na begeera um afago em sua vaidade, donde Games indica o

i8. Eugênio Games, O enzg«2a de Capíru.Emana de inzerpre/ardo.Rio de Janeiro: José Olympio, ig67, pp. l3o-3í.

i7. Faoro,J4acÀadode.4siü.' aplrámide e a apé;a, op. cit., pp. i8 e iz5. A questãodo mo-

ig. Miécio Táti, O mzzndode .4/achado de 2siü. Rio de Janeiro: São José, ig6i, pp. 67-75.

ralismo é constante, pelo menos desde Sílvio Romero, na literatura sobre Machado de Assim,

zo. Faoro,it/achadode,4ssü.'apirámidee o irapáÍ;o,op. cit., PP.6j-66.

de sorte que me abstenhode indica-la em detalhe.

n. Id., ibid., pp. 53-54;ver também pp. 93, l94 e 5z6.

1% Desigttcüporém

combinados

i9

todos esseselementos, insere-os em um registro mais amplo e signifi-

idéia de m/meia é o que nasce desse embate: precisamente o realismo peculiar de Machado, que não é a realidade tal qual a história e a sociologia, boas irmãs que são,mas sim uma iluminação dessarealidade: não

cativo, porque extrapola a dimensão simplesmente pessoal envolta na

o espelho que simplesmente reflete, mas a lâmpada que deforma.:'

ver trafegando àquela época, e que dá destaque. Para Bentinho, circular de sege era um modo de se fazer visto e falado. Já Faoro, sem dispensar

bege:ela não é mais, sem deixar de sê-lo, apenasum meio para Benti-

Faoro procura, então, alcançara diferença de narrativa histórico-

nho, mas sim depositária e reveladora de toda uma complexa hierarquia

sociológica e narrativa ficcional. Em ambas,detecta a significação cultu-

social, em processo ao longo do século. É comparando a antiga bege da rua de Mata Cavalos com os outros tipos de carruagens que se pode

ral que se estabelece na relação de sujeito e objeto; seguindo bem de per-

entender precisamente o que é uma sege. E só então se compreende a

atribui sentido ao real, selano historiador, sejano ficcionista: "0 valor

velha sege de D. Glória como cifra de posição social e prestígio.

cultural relevante estápresente na configuração seletiva do historiador como na obra literária".:' Isso significa que ambos refletem e iluminam, por conta de sua perspectiva própria. Desta feita, a questão passaa ser

Entretanto, é preciso adentrar o modo como Faoro incorpora a análisede Auerbach com relação ao problema da realidade exposta. Em

to o Max Weber da mhsemcÀa@sZe,6re, entende que é uma valoração que

literárias:, de modo a conectar domínios diferentes, mas não incomuni-

qual a perspectiva que está operando. Ê precisamente aqui que se insere a compreensão do realismo específico de Machado de Assis, que incorpora

cáveis. Compreender essemecanismo é compreender o que explica e dá

seumoralismo particular. Se há um realismo próprio ao ficcionista, é

substância à sua empreitada analítica (histórico-sociológica

Carece entender, então, como Faoro compreende essasduas mar-

porque este trabalha o real, destacando e enlaçando: "A conexão entre a realidade e o valor configura o sentido da realidade, gerando o ponto de vista que a torna perceptível, relevante".28 Quanto a isso, não há propria-

gens, unidas pela ponte que aproxima e separa. A história revela uma

mente diferença entre os procedimentos do historiador e do ficcionista,

realidade, que não se confunde com a ficção.:' A corta altura, ele afirma: "Até aqui a ficção, sistematizadae reconstruída em simetria com

estando a divergência naqueles valores que informam a seleção operada.

seu entendimento, m;meia seria a "ponte" entre a realidade e a obra

ou, caso se

queira, no campo dos estudos literários).

um mundo que dela emerge,interiormente harmónico. Uma pausapara a verdade do sistema político, tecido de documentos e números".z' Há

O confronto entre a visão de Machado de .4ssis e a realidade, ou mais carreta

uma "verdade" que só se alcança pela história e pela sociologia, m



não

mente, a realidade tat comoa percebeo historiador, indica muita discrepan' de defaZÃe.[...] Ozzrrw, mlz;l

oz'naç, penam

fncongrzzé/zc; entre a

reza./;cfâo. Trata o autor, então, de abandonar esta última e cercar-se

perspectiva do escritor e o painel reconstruído do pesado. Zs diferença de

dos "documentos

pormenoresnão mostram, mesmose arrolado, minudentemente,a peculia

e números",

de modo que a verdade apareça.:s Uma

vez visível, a ficção é chamadanovamente, destafeita para o confronto.

ridade do quadrocontraído por Machado de .4ssis sobreo SegundoReinado.

Confronta-se a realidade social-histórica e a ficção e a substânciada

Os traços isolados, m indicações particulares,

as observações de intimidade e

zz.Id.,ibid.,p. sz6. z3. "Machado de Assimaproxima-se da realidade sempre que lembra o fato anedótico, oca-

z6. Outra inspiração de Faoro, a exegese de Abrams da teoria da crítica literária do Roman-

sional, pitoresco. Dela se afastaao tocar o travejamento estrutural, um tanto embaciado, na suaarquiteEura,aos olhos do historiador moralista." Faoro, .A4acÁadp de 4siú.' agir.ímzde e

Londres: Oxford University Press, i97i (ll ed. i953), em cujo prefácio se lê: " 7%erl /e oÍ th bookidenti#es [wo camion and antithetic metaphorsof mina, one coar-fine the mina [o

o aapéÍio, OP.cit., P. i54.

u reflector of externas objecto, the atheí to Q radiant projector wich tnakes Q corttíibution lo the

tismo; M.H. Abrams, Z%e]141rrora d IÃevamp. Romanlíf Z%eo7 and IAe CHríca/ Zradílío/z

z4. Id., ibid., p. i43; ver também pp. z34-35.

oÕec l percei ei". Vela-se Faoro, .44acAado de Jaiíç.' apzrám;de e o rrapéÍ;a,op. cit., PP.í43

z5. Ao ver a realidade verdadeira, Faoro é tributário de uma concepçãode miazeiü-verdade,

52395z7 e 52g.

algo que existe independentemente de um sistema de codificações que o codifica. Ver Nelson

Goodmann, /É%zWS af morZ2/maÉlrzg. Indianápolis: Hackett, i995.

1.0 Desiguais porém combinados

z7. Faoro, .A4acÃado de ,4siü.' apírám;de e o irapáÍío, op. cit., p. 5z8. z8. Id., ibid., p. 528. Há uma pitadinha de Schütz no passo?

21

profundidade são de rara autenticidade. Decorrem, todavia, de um centro de

C)$ccionbta, do qual nào se dbtancia o cronista, viveu cercade cinqüerttü

JiLnagem e de seleção vatorativa que acerltua e destaca o Íenâmeno singular

anos de história, dentro do SegundoReinado. Retratou e elaborou uma se

empreluílo da organizaçãosocial, da estatura política e dm coordenada su-

cieclade, decantada, FLtrada, comtruída a partir da conduta de personagem.s,

pra individuais. A hbtória

Eram.sformados em homem, escravose capitalista,

acção

condicionamento do destino da personagem de

obedeceà atividade comciente do homem ou queé redutíl,el à com-

banqueiros e poeta

bacharéis e deputados,

Opadrão teórico, colhido nos moratistm e nos sociólogos

ciência. \.. À No fundo, todos os males da sociedade e todos os remédios es-

determinista do século xix, sublima-se como produto da investigação crítica,

tariam no coração do homem, só eLerespomáveLpetosacontecimentos. Nesse

pressupostodo ordenamento da realidade. \..l\ O romancista não se preocupa

poço de contradições, o destino humano e o destino dm nações têm sua mola

com entidadessociais ou econâmicm, mm com situações coaaetm, signt#-

íntimct e última de decisões.TcLLconcepçãodo homem e da históíi(t é que

cativas na medida em que os valores dominantes Lhesconferem cor, sentido

explica os extra'pios, as in#detidades sociais, a proyeçãono cenário dospe que-

e consistência, prqetaclos da estrutura global. \.. À Há, em todos os gestos e

ntesmotivos para explicar grandes acontecimentos. Fora da perspectiva psi-

alas d© personagens, motivando-m

cológica, penetrada de moralismo, há no grande mundo, de cuja comtrução

ostensiva, forjada com o material da ordem sacia!, globalmente comideradct.

global, em retrovisão, decorre outra imagem do homem, mesmo a pequena imagem oculta e íntima que m virtudes e os vigias mmcaraml''

Á longa meditação dafato Literário, impregnado de realismo, dá a perspectiva,

ou determinarão-m,

a mola, secreta ou

singular entre os escritores brmileiros do seü tempo, do compromisso do ato corri o seu meia. \..À Com os.Êos da vida e da tradição, do pemamento e da

A diferença que faz diferença diz respeito, portanto, àquelas conexões

experiência, pinta um qu(dro acabado da sociedade brmiLeira?'

de sentido que informam as narrativas em pauta, e aqui é possível per-

ceber os limites da ficção machadiana, pois ela, no entender de Faoro, gira sobre um pivâ que não é a estrutura social, global, mas um ponto de vista particularista, nomeadamente "singular", isto é, como se viu em

passo]á citado, o movimento das estruturas sociais é sempre atribuído aos sentimentos, paixões e desejos dos indivíduos. Já o movimento do exegeta opera em seleção diferente e alcança, ao que parece, a "verdade" (no passo mencionado, do sistema político).

O sociólogo, Faoro, tem em vista a estrutura global que foge ao escritor íluminense e vendo o que o outro não vê, é capaz de assinalar, em sua cartografia sociológica, a posição real da obra machadiana. Eis o traço

fundamental da interpretação de Faoro, que vê o que Machado não vê.'i Mas estou acelerando o andamento do argumento, e parece prudente assentar melhor a trilha, antes de derrapar por afoiteza. Voltemos

Nesseponto antevemostraços daquela outra vertente, que informará

então, tendo passadopela lição weberiana, ao modo como Faoro formula sua incorporação da m;mesa auerbachiana. O que deve ser compreen-

fortemente a análise de Roberto Schwarz, qual seja, a de que a perspectiva da totalidade assegura a percepção da verdade. No caso de Faoro, é isso que justifica, no final das contas, um livro sobre Machado de Assis, já que a realidade que este expõe não é "real", na acepção de "verdadeira'

dido, vale ressaltar, como uma possível contribuição ao problema de Auerbach, tão parcimonioso na formulação conceptualexplícita da questão, escolhendo deixa-la ir se desdobrando nas próprias análises.Assim, o problema daquela antiga ponte, filtrado pelas conexões de valores,

em sentido enfático, mas "estilizada". A sociologia da obra explica a

que indicam sentido, desemboca na concepção de m;meia de Faoro:

estilização, por um lado, e, por outro, mostra o que é o real. Este depende

da estrutura social como um todo e em movimento, estrutura que nunca

.4 arte deforma a realidade, na mimesis dietética, não raro intencionalmente,

aparece tal e qual em Machado; aparece sempre desviada, até mesmo

por obra de sucoestmturcl especÍ$ca. Na crictção artÍsticct con$gura-se umcl

adulterada, pelas motivações pessoais donde se comprova a indissociabilidade do moralismo. Vale a pena citar extensamente:

categoriaprópria de história, recolhida da imagem quebradae recomtruída, 3o.Id.,ibid.,pp.383-84.

z9.Id.,ibid.,p.i8o-8r L ]. Desiguais porém combinados

3i. Isso semostra reitaradamente no curso do livro; a título de exemplo, Faoro, .4/achadode .4ssís.'a/irem/de e a [rapéÍ;o, op. cit., pp. i20> z5z, )22>35i e 38g.

z3

rla realidade,

tom dessarealidade exposta; também neste ponto Faoro segue Auerbach:

processode tra mutação --, superandoas velam distinções entre forma e

um "realista moderno [Auerbachrefere-seao século xix] imita um

conteúdo, abrange o estilo e a própria realidade social ]:

ambiente contemporâneo qualquer, cotidiano, com sua infra-estrutura

mediante simetria e desenhopróprios. Oprocesso deformativo

social, sem estilização".'s Ora, Faoro entende que em Machado de A adjetivação insere algo novo, pois trata-se de uma m;mesasd/cz/álica. O sentido dessadialética é possibilitar a "transmutação", de sorte que a realidade da obra de arte não é menor, nem pior, do que a realidade

Assis há estilização, e o mesmo movimento que o afasta do moderno realismo europeu marca a seguir a peculiaridade do seu realismo, que,

informada pela estrutura social entendidaem sua totalidade -- aquela

realismo de um autor como Thackeray, que, "embora desenvolvaseu

que o sociólogo-historiador Faoro havia confrontado com a ficção. Duplo desvelamento, da natureza da obra machadianae do exegeta que a

fundo da época napoleónica

enfrenta. E, com essa explicação -- é verdade que rápida --, Faoro pode

m;de e o üapéÍ;o entenderia, a essa altura, que Machado liga sua acção

reenlaçar o enquadramento auerbachiano, em dupla chave. Em primeiro

à época do Segundo Reinado e inícios da República... Note-se que permanecemossempre na mencionada e sublinhada simbiose de realismo e moralismo, que de fato indica algo como uma posição intermediária

lugar, a ficção machadiana é uma exposição da realidade, de sorte a contemplar uma das lacunas possíveis que mencionei de início. Em segundo

lugar, a categoria de estilo, a categoriaoperante em Auerbach, pois é o estilo que "expõe a realidade";; (o estilo como que formata o modo

nos termos de Auerbach, ao mesmo tempo estaria nas proximidades do

romance de modo mais moralista do que histórico, liga-o ao pano de e pós-napoleónica"."

O leitor de .dp/rá-

entreo realismoda Antiguidade e o realismomoderno:

como a realidade é exposta). Há, portanto, umã relação importante en-

Para a literatura realista antiga, a sociedadenão existe comoum problema

tre estilo e m;mesas;o estilo "pauta", "ordena" a forma, a modalidade da

ftistórico, quandomuito comoum problema morar, e de mais a mais o mora-

m/meia.34Então, embora Faoro abstenha-seao longo do livro de discu-

lismo di{ mais respeito aos indivíduos do que à sociedade. .4 critica dos vícios

tir a forma da narrativa machadiana (e ele lança mão de contos, roman-

e excrescência \.. Àformuta

cese crónicas, além de teatro e poesia), ele está a indicar que isso precisa

quea crítica da sociedadenunca conduza um desvelarrtentodm força que Ãcí az' /zão open

um #mlre

de Jazz reaXçma,

mm

de maneira

ser pensado sob a categoria do estilo, pois, como se viu, a obra literária

'z movem.

possui "estrutura específica", que outros poderiam preferir denominar

sobretudo, um limite de sua comciência histórica. Pois precisamente nm Tela

"forma". Talvez haja aqui alguma estripulia do analista, pois, como o

iões econ6micm e espirituais da vida cotidiana revelam-se u forças que estão na óa.sec/oi nzzolme/z os A roncos [...].37

livro é amplamente sustentado por citações de Machado, o estilo está dentro do livro de Faoro, como matéria bruta que seus leitores vão ab-

[.-]

o problema de modo individualista,

ramóém,

e

sorvendo ao longo da leitura, e com isso ele se abstém da tarefa de uma análise "estilística" (tarefa do filólogo, diga-se de passagem). Ademais,

São precisamente a essasformulações de Auerbach que Faoro remete

como o estilo estaria compreendido sob a égide daquela dialética men-

preender o verdadeiro estatuto dado ao realismo machadiano; de lambuza, aquilatamos o montante da dívida de Faoro para com Mzmeiü

cionada, ele é tratado o tempo todo, sem o ser.

seus leitores;*, e delas precisamos nos aproximar se quisermos com

Reencontramos aqui um ponto assinalado ao início, a estilização

Se a realidade é exposta mediante o estilo, a idéia de estilização dá o 3z- Faoro, -44acÁadode .4siü.' apirámz'de e o rrapéÍlo, OP-cit.) p. 5zg; ver também p. 5z6.

33. Auerbach, J141meiü,op- cit., pp. 6z, 3z-33, passam. 34-Embora Auerbach seja,como sempre, discreto (uma dimensão de seu serenoÃzzml/h),há uma grande proximidade entre o "Z)arsre//u/zgrwe&e"e o "Sr;/", que o ]eitor de ]14zmeiiç entende.

z4 Desigtlak porém combinados

35-Auerbach,]l#meiü,op.cit., p. 34 36. Id., ibid., p. 36. No registro da influência, valiosa mas algo insuficiente para o presente andamento, E. Games tentou aproximar Machado de Assis de Thackeray; cf. E. Games, "Machado de Assim influências inglesas", in .Epe/%c}contra expe/Ão.São Paulo: Progresso, i949,PP.59-65.

37.Auerbach,]141meiü, op. cit., pp. 35e 37 38. Faoro, .44acÀado de .4sfü.' apfrámlde e o apé la, op. cit., p. 53o)nota io.

Vejamos então como Faoro reescreve aquela análise e argumentação de

Auerbach, transposta para o casoMachado de Assis: Substitui Machado a simetria sociológica,jú incorporadapor Stendhal, Ballac

e Zona,a umacon.strução. É a estililaçãodasociedade reduçãoda rea-

Voltaire, apresentando a sociedade como véu global"': --, sem que isso

signifique, claro está, literatura menor. Indica tão-somente a natureza

própria do realismo em questão.Uma vez destrinchado,o realismo machadianopermite compreender sua posição no universo da literatura. nacional e mundial.

lidade exterior à vontadehumana, comforma e modelosart$cialmente

Tanto quanto sou capaz de perceber, Faoro imputa o caráter

.Êxodos.\..4 O que Lhefaltava, e isto o enquadrana Linlm dos moratistm,

específico do realismo machadiano à própria situação social do autor. A transição da sociedade estamental para a sociedade de classes,"tran-

era a compreemão da realidade social, como totalid(üe, nascida dm relações

exteriores e impregnada na vida interior. \- À .4 estililação partia, po' con' sequência, de fatos e realidades sociais, apor(üos na obsewação das coisa e na conduta dos homem. O qtcea distingue da construçãosocial, decorrente de uma compreemão gtobat, é a predominância dox sentimentos e dm virtudes 'La ação cotetiva. Persbte nela

diga-se ainda uma vel.

o moralismo, miti-

gado embora com a sociedade sentida e percebida como resistência à vontade do ftomem, o homem ingenuamente vestido de rei da criação."

Esta é a situação do realismo de Machado, que não se confunde absolutamente com o que Auerbach atribuía ao realismo antigo, pois vivem

aqui indivíduos que só ganham carne e osso no âmbito da literatura europeia (e ocidental). Trata-se, como se insistiu mais acima, de uma consciência crítica e perspectivista. E, como também mencionei anteriormente, é no teor dessaconsciência que Faoro e Schwarz vão divergir; isso implica um conceito de realismo que entre eles setransforma e, conseqüentemente, a possibilidade de se continuar admitindo um moralismo, ou não, em Machado. Este é o passoque nos conduz ao livro de Roberto Schwarz.

Tentemos então resumir o argumento. Faoro expõe claramente o problema do realismo machadiano e o resolve em uma fórmula auerbachiana, a do realismo tingido de moralismo. É evidente que essa solu-

ção não é prerrogativa exclusiva de Auerbach, masé a ele que Faoro se refere. Sendo moralista

"moralista

decepcionado""

--, a sociedade

não aparece em seu movimento real na ficção machadiana, donde uma êcie de déficit de realidade "no mesmo século, Stendhal e Balzac sobretudo, já haviam ultrapassado o moralismo historicizante de um

siçãode uma ordem solidária para outra, a contratual", o "desaparecimento de uma estrutura social",'2 tudo isso atinge a ficção, tinge-a com ascores do moralismo, no sentido de que o moralista, ligado aos morei, tem em uma situação de mudança o momento do estranhamento, quiçá choque dos comportamentos, e com isso se surpreende, se distancia,

seamargura, se diverte, se decepciona,conforme o caso.Machadode Assis decepciona-se.

Imagino que Faoro tinha, na formulação do problema do moralismo em Machado, os olhos postos em um problema bem mais amplo, que investigara em Os donosdopoder. O moralista tem nos costumes a medida

com a qual contemplao mundo. Entretanto, "os costumesse movem sobrea força das paixõese dos sentimentos.Pisando nesseterrcno fluido, não aceita o constrangimento da conduta por obra das relaçõessociais, das instituições e as organizações".'3 Ora, a sociedade brasileira, na intepretação oferecida em Os donosdopoder, caracteriza-se precisamente por

assentar-semais nas paixões e sentimentos do que naqueles constrangimentos. Veja-se o seguinte passo que, embora tratando de outro contexto e época, ilumina o problema do moralismo machadiano: Longe estará o direito racional, racional no seu conteúdoe não meramerlte como forma, calcuLávet nos seus efeitos, pre'Risível nm comequêncim tios contratos por eLedisciplinados. Ete só msentará em pressupostosalheios ao

EstctdopatTimonictl, numa realidade política quesepara a sociedadeda OTganilação do poder, com o predomínio e a incotumidade dm liberdades.Pro vavetmente\- À somenteondeuma comunidade, um grupo, uma clmsepede subsistir sem a interferência dopríncipe se consolidou o direito como categoria

4l-ld.,ibid.,p.54o39 Id., ibid., pp. 545-46;ver tambémpp. izo, 537e 54o-

4o.Id.,ibid.,p.54i

4z- Id., ibid., pp. 54o-4i)543)i4, passam

43.Id., üid., P.537. 27

z6 Desiguakporém

combinados

inviolável ao arbítrio do Estado. Fora daí, numa estrutura de predomínio absoluto das interferâmiaó estatais, a realidade jurídica será sempre uma som

bra do poderpolítico, altaneiro, incontrmtávet, ameaçador.As atividades !conâmicas,

o$ interesses, os contratos não se íedulem,

dentro desse contexto

social, ao ganho, ao !acto e às vantagem materiais. Tudo sesubordina à gló rza, a honra, ao zrzcren7ze/zro dos va/orai gueo esfanzzenro corpo/=ÍÍca[...].

Em .A4acÀado de .Hsiü.' a pirâmide e o lrapé ía, o mesmo ponto encontra expressão: a ]á mencionada transição implica "o desaparecimento de uma estrutura social que modela os valores sociais por critérios de

honra e prestígio".'s Machado,vivendo o momento da transição da so-

O autor dirá que não podia alterar a realidade dos fatos; mm esta resposta é

de poeta, é de artista? Se a missão do romancista fosse copiar os fatos, tais qtlais eles se dão na úda, a arte era uma coisa inútil; a memória substituiria

a ;magínafão[...]. O/Dera dana a demüsão e o cronüt.z romana a dírefãa claParnmo. Demais, o aütorpodia, sem alterar osfatos, falar obra de artista, fr;ar

em

e de reter;r

[...].5'

Essaliberdade na figuração do real talvez indique a adjetivação da mi-

meiú, pois, não sendo,é. Como quer que seja, continua valendo aqui a "verdade estética", a "verossimilhança

comunicativa".''

passemos ao seguinte; mas, em vez de fazê-lo em um passo, façamo-lo

ciedade estamental para a sociedade de classes, contemplava o mundo

em um desvio,para facilitar um pouco as coisas.

com olhos criados e educadosno regime do estamento; os costumes que poderiam medir o curso das coisasencontravam-se, justamente, em momento de ajuste, quiçá tensão, ocasionalmente até confronto." Apesar de tudo, o estamento perman'ce, ajusta-se mas p'rm?n'ce.

Continuação de um e complemento de outro

tensão entre as idéias e o modo como elas existem na prática oferece, nesseamplo contexto, uma base para o moralismo. Machado parece ter seguido essasugestão.Os seusleitores podem lembrar-se, certamente, de mais de um passo em que se faz a apologia da glória ou, seu negativo, o temor da obscuridade, mal maior."

Algo ainda sobre a m;mesa. O tema da m;mesas,em Faorol provém direta e abertamente de Auerbach.'8 Entretanto, seu teor dialético, duas vezessublinhado por Faoro," não aparece ao menos com essaadletivação

em Auerbach. De onde provém? A m;mesiçtransfigura a realidade,

mas estanão deixa de ser a realidade da obra de arte (Faoro apura a verdade na arte e na realidade). A fantasia que altera os fatos em favor da realidadeda obra é o que permite fa]ar na verdade da obra artística (]á se

Isso posto,

Quando Roberto Schwarz publicou .Jo vencedor óaf'zim (/), em t977, o título continha esse "(i)",

justificado na "Explicação ao leitor", na

qual se esclarecia ser o livro somente a metade do estudo pretendido so-

bre Machado de Assis, a que se deveria seguir, posteriormente, a outra

metade.Ao final do volume, vinha um "(confznzza)",em itálico, de sorte que ao iniciar e ao terminar o autor reiterava o caráterincompleto do trabalho.s: Incompleto, porém compreensível e pleno de sentido em suas metades separadas. A segunda metade foi publicada em i99o, mas,

ao contrário do esperado, não ganhou o título Ho vencedor«; óalafm (/v),

e sim, como sesabe,título de reverberação benjaminiana, [/m «zeizrena per êer;a do cap;la/úmo...44acÃadade .Jssis. No prefácio à segunda metade, o autor adverte a seusleitores que o livro em mãos é a continuação

viu, mais atrás,que a obra literária configura uma categoriaprópria de história). Faoro cita Machado, em crítica a livro do sr. dr. Macedo:

44. Faoro, Osdonosdopoder, op. cit., p. 87; passagensequivalentes encontram-se em .4/achada de .4siís.' apírámíde e o rapéÍío, OP.cit.> pp. 77 e z94. 45. Faoro, .4/arando de 4siü.' apfrámfde e o napéÍio, OP' cit., P- 543'

46. O que lembra a interpretação de ]aiá Carola po' R. Schwarz, a que chegarei em breve. 47. Faoro refresca a lembrança: J4acÃadode .4siis.' apzrámzdee o rrapáÍü, OP'cit.) PP. 54i'4Z48. Ver Faoro, A/achado de .4sxü.' apirâmide e o rrapéÍfo, OP' cit., P. 5Z6.

49.Id.,ibid.,pp.5z6

e 5zg.

5o. Machadode Assis, Obra coaap/era.Rio de Janeiro: Aguilar, lg86, v. 3, p- 844; cf. Faoro, i14acÀado dé Jasü.' apírámz'dee o napeÍ;o, op. cit., PP. 53l-3z. 51.Faoro, J4acÃadode 2siü.' aplrám;de e o aapéÍ;a, op. cit., p. 53z. 5z. Roberto Schwarz, .4o enredar ai óafaím(/).

Forma &rerána eprocesio soc;a/ /zol llzzZzaida

rama/zceórmlZeiro.São Paulo: Duas Cidades, i977) pp. g e x6i. No curso deste estudo, citarei sempre segundo a 5: ed.; .4o e/zcedora.sóalat«s. Forma /lrerána eprocesxoSacia/rios znúzai

da rama/zceór ;/giro. São Paulo: Duas Cidades/34, 2000. O livro foi apresentado originalmente, em i976, como tesede doutorado em Estudos Latino-Americanos na Universidade de Paras m, com o título Forme /ilréraíre e procedi

iocia/ aüx dZóün d z rama/z óráz/íen.

z9 z8 Desiguakporém combinados

do livro de 1977e que, embora escritos de modo a serem metades autó-

um pressuposto do posterior, embora a autonomia de ambos não seja posta em dúvida.S' Nesse aspecto, há algo de próximo, embora não

nomas, continuam sendo metades que formam um todo." O caso de Raymundo Faoro é bem diferente. Machado de .J:iü.' a

coincidente, no modo como os quatro livros dos dois autores se rela

p;rám;de e o rrap4;o está visceralmente ligado ao estudo sobre a "forma-

cionam. Isso mereceria um exame mais detido, entretanto vou indicar

ção do patronato político brasileiro", que Faoro publicou em i958, inti-

apenasum ponto. Trata-se de uma citação de Trotsky, na verdade de

tulado Os do/zoidopoder. Na verdade, o livro de i958 foi completamente

reescrito para a segunda edição,de i973, de sorte que os dois livros

uma idéia, que aparece tanto em [/m mei re naper#àr;a do cap;nazismo. ]üacÃado de .dsiis quanto em Os donos do poder; como se pode sem

foram compostos mais ou menos simultaneamente e, de certo modo,

muito esforço adivinhar, a "lei do desenvolvimento desigual e com

completam-se.Embora Faoro afirme, sob os auspíciosde Montaigne,

binado" do capitalismo.s' Leia-se inicialmente a matriz, saída da pena

a ideia do livro de i958 não se altera na sua reedição, a leitura das duas versões não deixa muitas dúvidas sobre a extensão das modifica-

do grande revolucionário:

ções. Mas Os donos dopoder, em suas duas variantes, termina com uma Imagem machadianas' e estava aí indicado o próximo passo: '4p;rám;de e o zrapé{/odesdobra esseMachado que ficara apenas latente, entrevisto.

>

83o e 833 . Para uma amostra do enorme poder de fogo de Faoro, vela-se apenas a primeira

dasreferências: "As classes,nas suasconexões com o domínio, o comando e a política, ga

O núcleo que une os dois livros é a compreensãoda dimensão estamen-

nham ascendênciacom a sociedadeburguesa, com a Revolução Industrial. Num período

tal da sociedadebrasileira, no casode Machado,como vimos, em meio

pré-capitalista

de capitalismo comercial ou de capitalismo politicamente orientado --, elas

seacomodame subordinam ao quadro diretor, de caráter estamental. Suaspretensõesde se apropriar dasdecisões do Estado ou do seu mecanismo se perdem na mediação de outras categorias,fortes para a açãoimediata somente com o predomínio da sociedadeindustrial.

à passagem complicada para a sociedade de classes.

É n'Os do/zoi dopoder que encontramos amplo uso e fundamentação de categorias que serão basilares no estudo sobre Machado de Assis: classe, estamento, capitalismo politicamente orientado, estado

As formas sociais e jurídicas assumem caráter constitutivo na estrutura global, estabilizando

patrimonial-burocrático, patrimonialismo. Ademais, o problema da transição complexa, como se viu capital para compreender Machado, é amplamente discutido.ssNesse sentido, o livro anterior é mesmo

classescaracteriza o período colonial, com o prolongamento até os dias recentes,semque o industrialismo anualrompesseo quadro; industrialismo, na verdade, estatalmenteevocado, incentivado e fomentado. Numa sociedadedessasorte pré-capitalisticamente sobrevivente,

as manifestações económicas, freando o domínio das classes. Essa posição subalterna das

apesar de suas contínuas modernizações, a emancipação das classes nunca ocorreu. Ao con-

trário, a ascensãosocial se desvia, no topo da pirâmide, num processo desorientador, com

S3.Roberto Schwarz,[/m melae 'zapereÉena do capa'ra/içmo..4/achadode 4slü. 3: ed., São Paulo: Duas Cidades, i998 (ll ed. i99o), p. iz. Com a publicaçãodesselivro, Schwarzpa'

o ingresso no esEamento.A ambição do rico comerciante, do opulento proprietário não serápossuir mais bens, senão o afidalgamento, com o engaste na camada do estado-maior

receter julgado mais apropriado tirar o "(i)" do título de .4o vencedorm óarafm, assim como

de domínio político". Noto somente que essaúltima frase não vale apenaspara Agostinho Santos.aliásbarão de Santos.

a mencionada "Explicação ao leitor" e o "(conrllzua)". No meu entender, isso tem sua razão

de ser; não obstante a continuidade, há alguns deslocamentos significativos entre as duas

56. Uma nota acerca do título do livro sobre Machado de Assim: 4plrámz'de e o zrapéÍio.

obras-metades. É por isso, por conta do sentido dessesdeslocamentos, que pede estudo 54. As referências são: Raymundo Faoro, Or donos do poder. Formarão do pazronafo po/z?íca

Uma das epígrafes do livro fala das pirâmides do Evito, algo que é imutável, masmuda; e outra do trapézio na cabeçade Brás, no qual sedependurou a idéia fixa, algo que não muda, mantém-se, balançando. Ora, a chave está dada em Os dana do poder: as pirâmides do

óran/eira. Porto Alegre: Globo, i958. A segunda edição, como mesmo título e editora, é de

Egito são a sociedade,que esperapor sua salvação; a idéia fixa dependurada no trapézio é

i973. A edição por mim utilizada é a 31; Rio de Janeiro: Globo, zoom. A imagem machadiana

o estanlento, balançando sem cair nos seis séculos de história. Cf. Faoro, Os do/zosdopader,

mencionadaaparecesemprena última página: na i: ed., na p. z7:; na 31,na p' 838.As outras referências a Machado de Assis em Os donosdo/odor situam-se nas pp- zz7) z54} 45i) 753 e

op cit., p. 8z8. Referências explícitas a Os donos dopoder em it4acAadode ,4siis.' apírámzde e

793 (nesta,oferece suasolução para o enigma de Capitu--)

57. Cf. Schwarz, CZmmeírre /zapereÉanado cáfila/ifmo.' .44acÀadade .4ssú, op. cit. p. 38, e

próprio, que a segunda metade é deixada de lado neste estudo.

o zrapé;o, op. cit., pp. z5q z94) 3z6 e 521.

55. Faoro, Of do/zoadopoder, OP cit., PP.z37, 5l5, 567, 573)579 (diretamente significativa >

para o caso Machado de Assis, tratando-se do Encilhamento), 59i, 6o5, 676, 8zo, 8Z3-Z4

3o Desiguais porém combinados

Faoro, Os donosdopoder, op. cit., í: ed. p. z66, 31ed. p. 8zi. Ambos fazendo referência, em rodapé, ao capítulo inicial d'.4 Àüfóna da Rel,o/ufão R ia, de Leon Trotsky.

Um país atrmado assimila m conquista materiais e ideológicas dos países

o caráter contraditório dos empréstimos, que emperra o desenvolvi

(diantados. \- X O desenvolvimento de uma nação historicamente atrasada

mento segundo o modelo dos mais adiantados.

cortdu{, necessariamente, a uma combinação original da= diversas fases do

process histórico. .4 órbita descrita toma, em seu conjunto, um caráter Irre-

De Dom Jogo l Q Getúlio yargu, numa viagem de seis séculos,temaestou

gular, complexo, combinado. A possibilidade de superar os degrau intermediários não é, está claro, absoluta; realmente, está Limitada pelas capacida-

$os mais profundos, à travessia do oceano Largo. O capitalismo politicamente

des econâmicm e Guturais do país. Um país atrmado$'eqüentemente rebaixo

orientado

m realizações que toma de empréstimo ao exterior para adapta-las à sua

cla conquista e da colonização moldou a realidade estatal, sobrevivendo, e

própria cultura primitiva.

O próprio processode msimiLação apres'nta, neste

cmo, um caráter contraditório. \.. \ .4s Lebda História nada têm em comum com os sistemaspedantescos. A desigualdade do ritmo, que é a Lei mais ge-

turapoLítico-socialresbtiu a toda m tramÍormaçõesfundamentais,aos desao capitalismo político, ou o pré-capitalismo --, centro dct aventura,

incorporando na sobrevivênciao capitalismo moderno, de {ncloLeindustrial, racional na técnica efundado

rLa [iberdcüe

c]o indivíduo

\. . À. .4 crítica Liberal

e marxistct, ao ctdmitirem CLrealidade histórica do Estado patümonial, com

ral do processos histórico, evidencia-se com maior vigor e complexidade nos

sua alma no capitalismo politicamente orientado, partem do pressupostoda

destinos dospaíses atrasados. Sob o chicote das necessid(files externas, a vida

traí.sitoriedade do fenómeno, quercomoresíduo anacrónico,quer comojüe

retardatário vê-se na contingência de avançar aos saltos. Desta Lei universal

de transição. .4mbm, rta verdade, comparam a estátua imperfeita a um tipo

da desigualdade dos ritmos decorreoutra lei qüe,porÍaLta de denominação

ideal \...\. O ponto de referênciaé o capitalismo moderno, tat comodecai

apropriada, chamaremos de Lei do desenvolvimento combinado, que signifca ctprmcimação das diversas etapa, combinação da jtues diferenciada,

amál-

gama dmformm arcaicas com m mais moderam. Sem essalei, tomada, bem

Lado por Ajam

Smith, Mare

e beber,

tratados os estilos divergentes como se

fossem desvios, atalhos sombreados, revivescêncim deformadoras, vestígios evanescentes.Sobre um mundo acabado, completo, ou em via de atingir sua

entendido, em todo o seu codunto material, é impossívelcompreendera his-

perfeição Última e próxima, a 'pista mergulha no passado, para TecomtituÍ-lo,

tória da Rússia, como em geral a de todos os países chamados à civitiXação

conferindo-Lheum sentido retrospectivo, numa concepçãolinear da história.

em segtinxla, terceira ou décima linha?'

O passado tem, entretanto, sum próprias pautam, seu curso, embora não caprichoso, obra dos homem e de circunstâncias não homogéneas. \..l\ A reali-

Embora recortado do contexto, o passo é bastanteclaro e evidente o

dade histórica brmiteira demonstrou \. . À a persistêmia secular da estrutura

seu nexo com a situação brasileira, donde aliás sua fortuna dentre nós.

patrimonial, resistindo galhardamente, invioLaveLmertte,à repetição, em

Faoro privilegia,s' como se sabe, o peso da herança, do morto sobre

fase progressiva, da experiência capitalista. .4dotou do capitalismo a técnica,

o vivo, "Ze moraiaü; Zevef".óoAssim, não surpreende que sua reto-

as máquina, M empresas,sem aceitar-lhe a alma Gulosa de trammigrar.

mada, crítica, do modo de desenvolvimento combinado tenha em vista

[...] H uaz corpo re/zovador empa

;vo e criador

ie agregam,

em con í é7zc;a

relutante, naçõesmoderniladoras, em cortante adaptação, mm dentro de proyeçõesde seuprópriopmsado, de sua história, lançada em outro rumo. \..]\ 58. Leon Trotsky, .4 Àürórfa da Hera/ufãa Rasa. zt ed., Rio de Janeiro: Paze Terra, i977,

Enquanto o sistema feudal separa-se do capitalismo, enrijecendo-se antes de

v.i)PP. z4 z5.

partir-se, opatrimonialismoseamolda às tradições, às mudança, em cará-

59. Há, precisamente nesseponto, uma mudança na interpretação de Faoro nas duas versõesde O: do/zoidopoder. Embora o prefácio da z: edição afirme que a tesecentral do livro

terllexiveLmente estabilizador do modelo ncterno \. . À.6~

permanece, e isso é verdade, há mudanças consideráveisentre as duas versões. Destaco apenasque, no que tange ao passo,contexto e utilização de Trotsky, parece haver mudanças nas duas versões. Como me interessa o livro sobre Machado de Assis, vou manter-me

estritamente na versão que Ihe é contemporânea. 6o. Kar] Marx, Z) Kapira/. ](nf;t derpo#riscÁe/z Õ4o/zom;e. Berlim: Dietz, ig66, v- i(MEW, 2)), p- i5 (prefácio à il ed.).

3z Desiguais porém combinados

6i. Faoro, Osdp/zosdopoder,op. cit., pp. 8rg e 8zi-z4; ver tambémp. io7. Trotsky é citada em meio ao trecho que transcrevi e foi deixado de lado para evitar a repetição do passo já citado.

33

Faoro, digamos, lê Trotsky com o viés da conservação e atribuindo-lhe

o direcionamento teleológico da forma maisdesenvolvida. Entende-o como subordinando a persistência ao modelo acabado e, por isso, rou-

lação do argumento trotskiano em Faoro, que depende do peso especíGícoque se atribui aos termos da expressão;pesos que encontram outra

medidaem sualeitura por Roberto Schwarz.Aqui, o sistemaglobal do

caso,já que interessamarcar a "peculiaridade histórica brasileira"':, um certo tipo de capitalismo",'3 que não se deixa confundir com o capita-

capitalismo reproduz-se de modo igualmente desigual e combinado, de sorte que -- para marcar a diferença com o desenvolvimento de Faoro tornamo-nos modernos, de certo modo tão modernos quanto os outros

lismo central e modelar que Trotsky tinha sob os olhos. Não obstante,

(porque inscritos em um mesmo e único movimento), só que peculiar-

há uma coexistência complexa, dado que a ordem global articula o conjunto das relações que se estabelecementre as diferentes e divergentes

mente modernos. Precisamente esseaspecto é o núcleo da referência de Schwarz. Seu argumento é suficientemente complexo e matizado para

bando-lhe sua existência, seu estatuto próprio, precisamente o nosso

partes.A lógica global realiza-sesobretudono tráfico negreiro, que insere o Brasi] na ordem mundial, pois é o comércio que articula a "totalidade da ordem económica", tanto nacional como internacionalmente."

A lógica particularista realiza-seno tipo próprio de capitalismo que persiste, que Faoro, seguindo célebre denominação weberiana, nomeia "capitalismo politicamente orientado".'s Note-se o cerne da divergência

com Trotsky: o capitalismo político sobrevive e ;rzco7orao capitalismo

moderno, mas não se torna moderno nem por via própria, nem por saltos.A modernizaçãoé travada," persisteo capitalismo antigo, que apenasincorpora o moderno, isto é, modela-o sob o seu molde próprio ("a túnica rígida do passado inexaurível, pesado, sufocante", que excita

os leitores de Os donosdapoder); capitalismo político que coabita com o capitalismo moderno dos paísescentrais. Entendemos assim a remode

ser exposto aqui com brevidade, sendo mais prático afere-lo na fonte:" Assim, cl lig%ão da país à ordem revotucionada do capital e du Liberdades

civis não só mudava os modos atrmados de produzir, como os con#rmava e promovia na pratica, fundando neles uma evolução com pressupostosmodernos, o que naturalmente mostravcl o progresso por um flanco inesperado. L.i\

Contudo Luta comiderar a n.ovadivisão internctciortal do trabalho, em queàs ex-coLânim coube o papel de comumidores de manu$aturados e fornecedores de produtos tropicais, para entender queo desenvolvimento moderno do atrmo

só emprimeira imtância era üma aberraçãobrmiLeira Qoulatino-americamà. O fundamento efetivo estava no que a tradição marxista idertti$ca como o desenvolvimento desigual e combincLdodo capitalismo', signa a eqüanimidade sociológica particular

expressão que de-

a esse modo de produção, o qual

reatila sua finalidade económica,o Lucro,sqa atravésda ruína deforram anteriores de opressão,sqa através da reprodução e do agravamento delas. 6z. Faoro, Os donosdapoder, op. cit., p. 834; com relação a Machado de Assis, formula-se

Contrariamenteao quem apaíêncim de atrmo falem supor, a causa última

a questão da peculiaridade de seu modo de apresentar a realidade; um trecho citado anteriormente falava da "peculiaridade do quadro construído por Machado de Assimsobre o

cla absurda formação social brmiLeira está nos avanços do capital e na ordem

Segundo Reinado

63. "Aristocracia burocrática, estamentalno seucontexto, tocadapelos cabedaisde um certo tipo de capitalismo, pré-industrial, político nas suasconexões." Faoro, i14acÁado de .4siiç. a pirâmide e a rrapéÍfa, OP cit., p. z3; ver ainda pp. 4o'4i e zgz' Tema e problema, evidente-

nossa ctmse dominante sãoparte tão legítima quanto o decoro vitoriano. isso posto, digamos que a Br

ilse abrict ao comércio dm nações e virtualmente à

totctlidade da cutturcl contemporâneamediante a expamãa de modalidades soc;aú gz/eie ei a am orçando a execrafão do mu/zdoc; falado.[...]

mente, recorrentes em Os donos dopoder. 64. Cf. Faoro, .4/achado de ,4siü.' aplrám;de

planetária criada por eles, de .cuja atucttidctde m condutas disparcLtadu de

e o rapéÍ;o, OP. cit., p. n5'

No que diz respeita

ao comércio do tráfico negreiro, Faoro pareceantecipar, no início dos anos i97o) algo das análises de Fernando Navais e Luiz Felipe de Alencastro, autores que informarão, logo

Éh

resun7}0, o país colutttuÍra-se numa formação sln gane is, com questões prática e ideológico-morais própria, de imema relevância, nas quais a atuaLidcLdemundial

e3çpunha alguns de seus segredos e se podia píobLematiTaí

depois, alguns desenvolvimentos de Roberto Schwarz. 65. Conferir o uso da expressão no índice analítico de Max Weber, Wzr cÃaÓz zzndGele//scÁaÚí.51ed. rev., Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), ig8o, p. go'' 66. Além d 'Os donosdopoder, o problema é tratado por Faoro em Eküre ümpemamenropo/ír;fo ór z/giro?São Paulo; Atiça, i994, especialmenteparte n: "A modernização nacional'

34 Desiguais porém combinados

67. Excelente desenvolvimento do ponto em Paulo E. Arantes, Senrlmeno da día/ár;cana oçperiência intelectual bímiíeira. Diabética e dualidade segundo Antonio Cândida e Rabeíto ScÀwaq. São Paulo: Paz e Terra, t99z> pp. 46-lo7, sobretudo a segunda parte.

35

a comprovar o nexo que une as duas obras. Mas temos uma formulação

juvelmente atado ao desenvolvimento do capitalismo -- embora, para Faoro, trata-se de divergir. Donde se pode concluir deixando de lado o confronto das diferenças, que certamente vale a pena -- que, para se compreender adequadamenteMachado, é preciso atinar com essenexo maisamplo; não só o Rio de Janeiro do Império, a paisagemfluminense, maso amplo nexo económico, político e cultural de que essasituação

bem definida da lógica de desenvolvimento do capital -- vale dizer, do modo de existência e reprodução da sociedadecomo um todo --, cujos

pensávelpara o conhecimento de Machado de Assis.

por sua ve{. E claro quenãose tratou aqui de escreveruma história da Brmit, mm de ucpoí com brevidade o travejamento contraditório da ncperiência que serialigurada e investigada pela Literatura de um grande autor'*

Não estamoslonge do capítulo inicial de .4o e/zcedor m óa arm, de modo

local era parte constituinte. Nessaaltura, a sociologia mostrou-seindis-

segredos se revelam, ao menos em parte, nesse outro lado seu; e, para 11

tanto, nada mais indicativo do que a obra de Machado de Assis. Caberia conjecturar se o desenvolvimento desigual e combinado poderia ser

'E por que não pode ser brasileira a forma do Realismo europeu?""

pensado livremente nos domínios do realismo; se aquilo que alguns não

hesitariam em condenar como regressivo no realismo europeu não significa aqui a possibilidade de revelar o segredodo modo das relaçõessociais; se o que passava por inverdade no realismo europeu não mostrava

A passagem para o livro de i977 está dada pelo seu subtítulo: "forma

literária e processo social nos inícios do romance brasileiro". Como recorda o leitor, Faoro abstém-sede discutir a forma da narrativa macha-

seuteor de verdade por aqui. Como quer que seja,o nexo que pretendo assinalaragora é esseponto de encontro dos dois autores, sem que isso

diana, lançando mão indistintamente, de acordo com a necessidade, em

signifique, claro está, convergência de interpretação. Mas para ambos a

de Schwarz, nesse aspecto,é diametralmente oposta, cuidando atentamente do problema da forma (embora isso não signifique, sem mais, gênero). Com isso, adentramos diretamente no âmago do problema, a

ponderação correta da obra de Machado se faz por meio de um nexo de relações muito amplo, implicando avaliação do processo de desenvolvimento do mundo moderno e da peculiaridade da formação nacional.'P

Aqui asdiferenças, tanto como nos livros sobre Machado de Assis, são grandes e significativas, marcando posições Não obstante, há um

sua análise, de poesia, conto, romance, crónica, crítica. A empreitada

cópula do subtítulo, e é preciso ir a Georg Lukács para buscar as formulações que informam as análises de Roberto Schwarz:

traço comum que vale salientar: ambos vêem a necessidade de compreen'

.4 tomada de posição teoricamente correia com relação à forma do romance

der o processo social brasileiro em seu nexo mundial, nexo este indisso-

pressupõe uma tomada de posição teoricamente carreta com retaçãa ao desenvolvimento cheio de contradições da sociedade capitalista?'

68. Schwarz, C/mmesre rzapereHena da cáFIla/úmo.'A4acÀado de.dsiíç, OP'cit., PP-37'4oForam deixadasde lado as notas de rodapé do autor. No "Prefácio", pp. iz'i3, lemos um passo similar: "]-.] audaciosa conclusão de que as marcas clássicas do atraso brasileiro não

deviam ser consideradas como arcaísmoresidual, e sim como parte integrante da reprodução da sociedade moderna, ou se)a, como indicativo de uma forma perversa de progresso Para o historiador da cultura e o crítico de arte em paísescomo o nosso, antiga colónia, a

Note-se, com o perdão da reiteração: a compreensão da forma exige a compreensão do processo social. No romance do século xix, isto significa necessariamentea compreensão da relação entre forma romanesca e desenvolvimento do capitalismo. Ora, se temos, como indica o problema

do desenvolvimento desigual porém combinado, um certo capitalismo,

tesetem potencial de estímulo e desprovincianização notáveis, pois permite inscrever na atualidade internacional, em forma polêmica, muito daquilo que parecia nos afastar dela e nos confinar na irrelevância". Faoro discute o "atraso brasileiro" em .44acÀadode .4ai&. a pfr.ímlde e a rrapéÍzo, OP-cit., pp. n3 e 433, sendo o gemarecorrente em Osdonos dopoder.

7o- Schwarz, .4o vencedor m óaz'zfas, op. cit., p. 5i

6g. Veja-se,para confronto com Osdo/zosdopader,o rico e pequeno artigo de Fernando No vais, "Passagenspara o Novo Mundo", ÀrovosEfrzzdoi,n? g, ig84, pp. z'8, no qual Schwarz reconhecefonte de inspiração e basehistórica.

7t. Georg

36 Desiguais porém combinado\

Lukács,

"Der

Roman"

(i934),

in F. Benseler

Z,zrerarzirlÀeon e z//zd.LíferalziTa/ír;É i934-t94o. Frankfurt:

(org.),

.A/osAaüer ScÀnÚen. Zzzr

Sendler, ig81, p. zo. A seleção dos

escritos de Lukács citados limita-se àqueles referidos por Schwarz em do l,enredar

óafalw.

37

singular(porém inscrito em um nexo global),': está posta a questão acerca de certo romance, também ele singular(porém inscrito em um nexo global), e de certo realismo, particular(porém inscrito em um nexo global). Pela

Eis o que interessa;passando a pressupostosociológico uma parte dw con-

via de argumentação lukacsiana, é preciso compreender a especificidade do desenvolvimento do capitalismo no Brasil, sem o que é impossível com-

t/8 reZafõei iocfaú derermz/zac/a.f[...].7S

preender a forma do romance. No caso de Lukács, isso foi pensado muito

mais no contexto das peculiaridadesdo desenvolvimento do capitalismo na Europa (França, Inglaterra, Itália, Alemanha, Rússia), mas a questão permanece de pé e formulada potencialmente para outros casos;Schwarz

tomou para si a tarefa e desdobrou-a em .4o enredarm óararm. A idéia trotskiana do "desenvolvimento desigual e combinado" é, digamos, como que potenciada: pode-se dizer que a forma do romance também passapelos dois momentos, da desigualdade o processo do romance brasileiro não

dições históricas originais reaparece, com sua mesma lógica, mm agora no plano da acção e como resultado formal. Nesse sentido, forma são o abstrato

Quem objetar que há aqui tanto Antonio Candido quanto Lukács não deixa de ter razão, mas o caminho tem sua sutileza. Em seu estudo sobre o modo como seu "mestre-açu" resolve o problema da relação de literatura e sociedade, desde o início o tema está posto no programa (lukacsiano) que reaparece no subtítulo de Ho vencedor óalaf«ç: "Dialética de forma literária e processo social"." Nesse estudo, Schwarz re

fume o núcleo forte do argumento ao formular o que se deve entender por "forma" (à diferença do que ocorria em Faoro):

se confundecom o processodo romanceeuropeu,a forma machadiana não se confunde, sem mais, com a forma do romance europeu, nem

.assim, ajunção de romance e sociedade se fa{ através da forma. Esta é en

o processo de formação do romance brasileiro segue o ritmo e as etapas

rendida comoumprincípio mediador queorganiza emprofundidade os dados

do processo europeu -- e da combinação

da acção e os dcl realidade, sendo parte dos dois planos. Sem descartar o

o desenvolvimento da forma

upecto inventivo, queexiste, há aqui uma presençada realidade em sentido

romance precisa ser considerado em sua totalidade, a forma machadiana se fm forma em diálogo com a forma da matriz e com a história das formas na

forte \.. À. Noutra palavras, antesde intuída e objetivadapelo romancista,

Europa e levando-as em consideração, sendo nesse processo forma local de

a forma que o crítico estuda foi produTtda pelo processo social, mesmo que

um processo global. Esseúltimo ponto é atestado,facilmente, pela crítica literária de Machado, como, por exemplo, na já citada sobre um romance de Macedo, naquela acercado "instinto de nacionalidade", na crítica a Oprúzza .Bmí2;oe outras mais. Assim, torna-se essencial estudar a posição relativa

ninguém saiba dera. Trata-se de uma teoria enfática do realismo literário e

no sistema solar do capitalismo (das mercadorias e das idéias), pois que a forma romance que se tem em vista pressupõe as contradições específicas dessasociedade, que ele "retrata"." Esta é uma das razões do célebre ca pítulo inicial de .4o e/zcedor óafazme, de quebra, mostra como a análise torna-se sociológica e, como em toda sociologia que se preza, histórica.

da rectlidade social enquantoformada:'

O social tornado forma, "forma que se compreende em termos do mo vimento da sociedadeglobal",': o romance tornado forma. Note-se que falamos de totalidade e mediação, processo social e obra literária: uma sú eie, o processo /za obra. Se este é o programa, sempre discreto, de

Antonio Candido, ele não deixa de ser informado também pela leitura atenta de Lukács, que é o aspecto que interessa por ora destacar." Não

Portanto, estamos nos encalços de Lukács quando Schwarz firma posição pelos "pressupostos sociológicos das formas".74Vale então ver de

perto como a lição lukacsianavem formulada no sociólogo brasileiro:

75.Id.,ibid. 76. Roberto Schwarz, "Pressupostos,salvo engano,de 'Dialética da malandragem'", in vários autores, Efóofo de/gzzra. Homenagem a .4nron;o Ca/adido. São Paulo: Duas Cidades,

lz. Conota-seem P. hrantes, Sentimentoda diabéticana experiênciaintelectualbrasileira,

i979)P-t33.

op- cit., pp. 49 e adlacências,que indica a companhia da reflexão de Roberto nesseaspecto' Já seviu a relevância do problema para Faoro.

77.Id.,ibid.,p. i4i. 78.Id.,ibid., p. l4z.

73. Cf. Lukács, "Der Roman", op. cit., p. z6.

79-"Ah, eu confessototalmente a minha dívida para com Lukács. No meu entender, ele é o maior

74 Schwarz,Ho vencedorm óafafm, op. cit., P. 51.

crítico do romance até o advento da literatura moderna. O meu Machadode Assis depende >

3S Desiguaisporém

como n(dos

39

sua centralidade, a relação de escravidão não ocupa o centro da discussão

apenasno ]á citado "Der Roman", mas em toda uma série.deestudos, em grande parte da década de i93o, Lukács formula o problema da dia-

ideológica no Brasil do século xlx,8z o salto de Rodhos do argumento

béticade forma e processosocial. Assim, o capítulo inicial de Schwarz

de Schwarz é que, sendo a vida ideológica lastreada nos latifundiários e homens livres, e sendo a relação destes com aqueles ordenada pelo/apor, esteúltimo torna-se o mecanismo que rege a vida ideológica:

sobre "as idéias fora de lugar" é pressuposto para a análise da forma Vejamos um passo importante:

Ofavoí é a nossa mediação gume universal

Áo longo de sua reproduçãosocial, incamavelmente o BrmiLpõe e repõe idéias :uropéias, sempre em seRENoimpróprio. E nesta quaLidcde que elu serãoma-

os escàtores tenham bweado metea sua interpretação do Brmit, involuntaria-

EéTiae problema para a Literatura. \-l\ Oía, a gravitação cotidiana du idéias : das perspectivas prática

é a matéria imediata e natural da literatura

e sendo mais simpático do que o

nelcoescravista, a outra relação que a colónia n.osLegara,é compreemível que mente düfarçando a violência, que sempre reinou na esfera da produção $'

\- À.

Portanto, é o ponto de partida também do romance, quanto mak do rotnance

realista.Assim, o queestivemosdescrevendo é a feição exala com quea Histó-

A mediação lastreia formas concretas de vida, o processo social, destinos

ria mttndiat, na forma estruturada e cifrada de seus result(üos Locais, semp'e

individuais, armando-se dessa complexa maneira o que será a matéria

repostos,pensapara dentro da escrita, em queagora in#uipeta via interna \- X. Noutra palavra,

de$nimos tim campo vasto e fteterogêneo,mm estruturado, >

]ue é resultado histórico, e pode ser origem artística. \-l\ a matéria do artbta mostra msim não ser informe: é historicamente formada, e íegistra de algum

segundo trata dos precedentes,a importação do romance como forma e sua figuração por Alentar; o terceiro por fim, trata de Machado, o verdadeiro objeto anunciado, a forma que se quer entender. Com frequência, Lukács inicia suas obras com um capítulo sobre as condições históricas e

modo o processosocial a que deve a sua existência. Ao forma-La, por sua ve{,

sociaisdo surgimento do fenómeno em pauta, ou com as peculiaridades de um desenvolvimento

o escritor sobrepõe uma forma a outícl forma, e é da felicidade desta operaçã',

ou de uma situação,para aseguir encaminhar o desenvolvimento de seu tema eproblema. Isso foi

desta relação com a matéria pré-formada

em queimprevisível dormita a His-

tória -- que vão dependerprofurüidade, força, complexidade dos resuLtados*'

elucidadopelo próprio Schwarzem seu texto sobre Arranjo Cândida, já mencionado, onde selê:

'Nestescasos,o crítico tem de mmarzzz} o processosocial em teoria, tendo em mente engendrar a generalidade capaz de unificar o universo romanesco estudado, generalidade que antes dele

O passo é complexo e precisa ser escondido. Em primeiro lugar, note-se que se trata de passo conclusivo do mencionado capítulo inicial, capítulo este que, pela sua posição e pelo que se diz no trecho citado, é a base sobre a qual assentaa interpretação que Ihe sucede daí ter:lhe dito pres:uposto,

embora sejaum pressupostoposto-*' Tendo discutido que, não obstante

o romancistahavia percebidoe transformado em princípio de construção artística." Schwarz, "Pressupostos, salvo engano, de 'Dialética da Malandragem"',

da vida ideológica."R. Schwarz,.4avencedor óa/aia, op.cit., p. i5. Lembroafirmação anterior. acerca de Faoro, da tensão existente entre as idéias e o modo como elas existem na prática como fundamento do moralismo. Sobre o debateideológico das elites, ver Faoro, zt4acÁado de ,4siü.' apírám;de

>

op. cit., p. i4o.

8z. "Sendo embora a relação produtiva fundamental, a escravidão não era o nexo efetivo

e o frapáÍ;Ó, OP. cit., pp. i79,

i87 e ig6.

inteiramente de Lukács. Não há a menor dúvida, porque a referênciaao romance realista da

83. Schwarz, 4o vencedorm óararm, op- cit., pp. i6-i7

Cabe notar que a idéia do favor,

séculoxix é toda fundadanele.Aliás, eu o cito abundantemente,não escondoessainfluência de

calibrado pelo arbítrio, como mediaçãouniversal na sociedadebrasileira e suaâguraçãa

maneira nenhuma." Roberto Schwarz em entrevista a Gildo Marçal Brandão e O. C. Louzada

literária, isto é, a "adequação perfeita entre realidade social e representaçãoliterária", foi

Filho em E/zco/zoi coma Cívz/ilaçãoBrmí/eira, n' l 5, i979, p- ioi- Posteriormente,uma outra

tema de trabalho semanalda sociologia brasileira no limiar dos anos i97o: Mana Sylvia

entrevista esmiuçou em detalhe o ponto: "Entrevista com Roberto Schwarz" por Eva L. Corre-

C. Franco Moreira, "Realidade social e representaçãoliterária: um exemplo brasileira

dor em Zíferarurae Sociedade, n?6, zoom-zoom, pp. i4-37. Ainda sobre isso algo no prefácio de

(A Vontade Santa)", in O moderno e iz

Schwarz, [/m meirre rzapereÉzna do cáfila/Esmo.'it4acÀadode .4ssú, op' cit., P. Í3'

i97o, p. í38. O texto indica, de modo primoroso, até onde chegamosem uma análise"si-

8o. Schwarz, .4a encedor

milar" a de Schwarz, que no entanto seabstém de chegar aos problemas da forma literária.

Óalarm, OP.cit., PP. 29-3i.

8i. Uma nota sobre a organização de .4a e/zcedor m óarafm. Mesmo em sua forma, o livro par'ce seguir uma inspiração lukacsiana. Composto de três capítulos, o primeiro destaca os pressupos' tos históricos e ideológicos, armando a situação para a interpretação literária que vem a seguir; o >

4a Desiguais porém combinados

/ fere/zfm. Tese de livre-docência, Fn.cu-usp

Como não poderia deixar de ser, também Faoro percebeo problema da "reciprocidade dos favores", reconhece sua generalidade, mas não o torna estrutural nos termos de Schwarz. Ver Faoro, .44acÀada de .4isis.' ap;rámide e o napéÍ;a, op. cit., p. i6i.

41

para a elaboração literária do romance de Machado de Assim.Dá corpo, ainda, à forma, que por ela se pauta, por meio dela se figura. E a isso atrelada a idéia do romance realista, ainda, a essaaltura da argumentação,

não mais do que lembrada, para ser depois rigorosamente construída. Compreendendo o processo mundial do capitalismo, Schwarz pode

entender o qüiproquó das idéias -- o que, na Europa, era ideologia e correspondia à aparência socialmente necessária, era justificação, aqui

não corresponde à aparência alguma e nada poderia justificar como forma própria e necessáriade participação no todo, de sorte que o romance, tematizando o local em suaforma "qüiproquosada" (e vejo aqui

o ZIJln.scÃ/ag marxistas'),alcançao todo. Se o resultado histórico pode ser origem artística precisamenteo que vai ocorrer, no entender de Schwarz --, vemos aqui ainda o pressupostode que a obra de arte é, na

sua raiz, histórica (razão pela qual o grande Realismo europeu passa, inicialmente, pela forma do romance histórico, no entender de Lukács). O problema que então se formula é precisamente a indagação acerca do

modo como essaraiz histórica lastreia e estápresentena obra literária. Este o programa de .4o encedorm óalarm.

Note-se, entretanto, que tratamos de formas, sempre históricas. A situação dependente do país colonizado engendra uma forma, a par'

tir da qual o romancistatrabalha, isto é, cria suaforma literária. Assim como o desenvolvimentohistórico europeu engendrauma forma própria para o romance realista, o mesmoprecisaser pensadopara o que ocorre na periferia: por isso a questão se torna perceber como e em que consiste a forma própria do romance machadiano,e em que medida

essaforma retrabalha a forma primeira, o que está"pré-formado". Se não elabora uma forma própria, perde-se o nexo do "desenvolvimento desigual e combinado" e da situação histórica particular.*'

Advirto que, em todo essedesenvolvimento,estamosacompa' nhando Lukács bem de perto. Assim, pode-se ler em um texto escrito

quarentaanos antes (Schwarzpoderia muito legitimamente dizer: " 'ziç fora'.7earsi;/za"): o "ponto de vista metodológico decisivo é a inves

visão de mundo que dele brota, e a forma artística".:' Passo propositadamente co]hido em Z)er ÃÜ orúcÃe Roman [0 romance Àisrór/co], obra citada em .4o ve/zcedor óaf'zim e que se põe como problema exatamente a dialética de forma e processo social. Donde o próximo passo: só em teoria dá-se o confronta d feto entre üma forma Literária e uma estrutura sacia!, jú que esta, por ser ao mesmo tempo impalpável e real, não compareceem pessoa entre m dua capa de um livro. Ofato de experiência, propriamente Literário, é outro, e é a eLeque a boa teoria deve chegaráestá no

acordoou desacordoentre a forma e a matéria a quese aplica, matéria que esta sim é rrtarcada eformada pela sociedade real, de mla lógica pensa a ser

a representante,mais ou menosincómoda, no Xnteüoí da literatura x]

Aliás, acordo e desacordo entre forma e matéria é o tema constante do Lukács citado, pois investigar o romance histórico significa empreender um extenso estudo acerca do modo como a matéria histórica aparece (e desaparece) no romance europeu do século xix. Exige ras-

trear o desenvolvimentoda forma desdeseusantecedentes no século xvm, passandopela "forma clássicado romancehistórico" em Scotte Púchkin e chegando em Balzac, que a suprime, conservando-a, ao fazer

do romance a história do presente. Isso só para lembrar que a forma estánessarelação complicada "dialética" é a adjetivação que alguns usam com a matéria, que em última instância é histórica, no sentido de que é resultante do movimento da sociedade como um todo. Acordo ou desacordo significa: se o romance a forma é verdadeira ou falsa, se consegue expor, artisticamente, a realidade em sua complexidade (o

que significa: em suasdeterminações sociais) ou se a falsifica.

Por essarazão. "nossa matéria encontra densidadesuficiente só

quandoinclui, no próprio plano dos conteúdos,a falênciada forma européia, sem a qual não estamos completos".88 Assim, à matéria que não pode ser a européia já se viu que nossa mediação é o favor, e não o dinheiro, tal como no capitalismo da matriz somamos a impossibilidade

tigação da interação entre o desenvolvimento económico e social, e a 86. Georg Lukács, Z)er ÁüforúcÁe Ramal(i937),

84. Cf. respectivamente Karl Marx, Z)m Xapfra/, OP' cit., p. 86,e Ruy Fausto, i14arr.' ZóBlcae

.roja/ca. São Paulo: Brasiliense, ig83, t. i, cap' I' 85. Cf. Schwarz, Ha enredar m Óazarm,OP' cit., P. 36.

in Meras. Proa/eme des Rea/ü«'z«i ///. Neu

wied/Berlim: Luchterhand, ig65, p. ig; ver também i)p. zi) i6o, 343, 4o8, 4zz, 4z6, passim 87. Schwarz,,4a pe/zcedor óafaim, op cit., P. 56, itálico por minha conta, para ressaltar como o externo setorna interno.

SS.td.,ibid.,p.74. 43

41 Desiguais porém combinados

de sua forma, que se constitui em "interação" com sua realidade, e a

busca de forma própria. Noutros termos, pata commtií um romance verdadeiro é preciso que sua matéricc

sda verdadeira. Isto é, para nossocmo de país dependente,quesda uma síntese zm queligure com regularidade a marca de nossaposição diminuída no sistema

nmcente do Imperialismo. Porforça da imitação, da fidelidade ao "cunho rtacio nal",

as ideologias dofavor e liberalestão reunidas em permctnência, formando um

quebra-cabeças qw ao ser armado \..:\ irá dar uma$gura nova e não-diminuída diminuição burguua,

da

cujo ciclo ainda hde nos interessa, pois não se encerrouF'

nova, lógica que passaa imperar, embora sem jamais anular por completo a anterior...) Que esseprocesso cumula em contradição, é evidente e amplamente exposto por Machado, como, por exemplo, neste trecho de.4 mâo e a /zzva,tomado por Schwarz como epígrafe a um subcapítulo do [ivro: "um bom cá]cu]o, [...] todo fi]ho do coração...".PZ

Assim, superadoum primeiro momento de entusiasmoliberal, Machado sustenta suas tramas romanescas em tópicos da "ideologia

antiliberal".'; Quando se tem em mente que o capítulo primeiro do livro de Schwarz dava notícia precisamente dos desencontros da ideo-

logia liberal por estasbandas,já há por aí algo a se esperardessareviravolta machadiana. Vejamos a passagem a respeito:

Até mesmo no âmbito terminológico Roberto Schwarz trai a filiação lukacsiana: esse"com regularidade" é a " Gele mãsizkX:e;r"de Lukács;

Retomando nossoJio, digamos que a ucctmão da referência Liberal evitava o

o "figurar"

é o "ceifa/te/z". O conteúdo do passo é uma paráfrase da

descentramentodm ideologia, de que tanto fcLLamos,mm ao preço de cortar

citação de Lukács com que iniciamos. Matéria verdadeira, posição no

as ligações com o murro contetnporâneo. Para avaliar m ambiguidades desse

sistema, quebra-cabeça dizem respeito ao desenvolvimento contraditó-

percurso,tome-se a militância anui-realista de Machado cleAsse, em cqas

rio da sociedadecapitalista. Até esseponto, Schwarz estáabordando os inícios do romance, o problema de sua importação, armando o quadro

palavra o Realismo "é a negaçàa mesma do princípio dct arte". São ecosdcl

no qual vai adentrar Machado de Assis. E note-se, de passagem, a confluência (que não diminui a diferença) para o diagnóstico de Faoro, no

plebe, materialbmo, gíria, sqeira e socialismo eram parte de um mesmo e deestáve contínuo. ,4 norma éantimoderna em toda a !unha..4 recua da matéria

que diz respeito à persistência, nos termos.de um, ciclo, nos de outro."

baba leva à píocurçt do assunto elevado, querditar expurgado dw $rtalidades prática da vida contemporâma. \- À No entanto, havia da parte de Machado

Isso posto, passemos ao que há a dizer acerca de Machado.

Na parte em que fala das "generalidades"acercado romance machadiano da primeira fase, Roberto Schwarz sublinha e desdobra o conformismo marcante dos primeiros romances, já resultado de desilusão do jovem Machado de Assis com o ideário liberal. Isso leva o romancista a comungar com elementos fortes do pensamento da reação, em sua defesa da família, da tradição, da honra e da dignidade. No caso de Machado, essaconversão dá-se pela via do paternalismo ou, como diz o

título do próprio Schwarz, "0 paternalismo e a sua racionalização nos primeiros romances de Machado de Assis".P: (Vale destacar a formula

dois Irzafâo da Revue des Deux Mandes, para a goza/Rea/Zçmo, democrac;a,

uma intenção realista nesteanta-realismocomervador, se o comideramosexpressão de experiência e ceticismo

o que não era na Euíopa, onde represen'

tava tlm recuo intelectual em jtLcedo cabimento das idéim [iberab no Brmit. Destinado a esfumar os antagonismosdo regime burguês, o anta-realismo não ospostulava, e nospoupava da ilusão de sermos a trança... Mesmo a exclusão do msunto bai)co, em espéciem miséria modernas, ocmionadm pelo Capital, era para nós a exclusão de um santo com tropismosjlívoLos. Enquanto quea eleição de msurLtosdecoíosos paternalismo antes quedinheiro Levavapara

maisperto dct vüa popular quea diaLéticado dito Capital?'

ção: o paternalismo, nessaaltura histórica,Já á objeto de racionalização no romance machadiano, donde se percebe o processo em curso, no qual

Estajá é uma solução que Schwarz oferece para o realismo de Machado de

o paternalismo será crescentementeracionalizado por conta da outra, e

Assis, para aquele cerro rea/bmo. Em primeiro lugar, sua feição lukacsiana,

89. id., bid., P. 75.

9z.Id.,ibid.,p. 95 93.Id.,ibid., P. 85

go Neste, decerto, tributário de Caio Prado Jr. e CensoFurtado. gi. Schwarz, .4o ve/zcedorm óalafm, OP.cit.) cap. 3) pp' 8l-z3i.

44 Desiguais porém combinados

94 Id., ibid., pp. 86-87. Deixei de lado duas notas de pé de página do texto original

45

que é seu âmago. Nesse aspecto, o critério está dado pela "vida popular o que legitima e dá lastro ao realismo de Machado (nos termos citados: "intenção realista do anta-realismo") é o fato de este apresentar elementos

da vida popular, tal como Lukács discutiu extensamenteem vários de seus escritos. Tendo Schwarz tomado o critério da vida popular, pede avaliar sesuafiguração no romancerealiza-sede modo maisverdadeiro por meio da regra dos velhos tempos o decoro -- ou dos novos o dinheiro. Ou seja,o paternalismo é mais importante aqui do que o dinheiro, porque por seu meio podemos chegar ao âmago do elemento realista do romance, a

Note entãoo leitor que Schwarztoma como critério de julgamento o parâmetro lukacsiano a presençae figuração da vida popular--, donde a possibilidade de aquilatar o que há de realismo no anel-realismo de Machado de Assim.Ou seja: embora crítico de certo realismo, Machado

figura um outro realismo,marcandoassimuma especificidade.Mas esseoutro realismo responde, a seu modo, ao critério supremo do realismo que Lukács detectara na matriz. Assim, o critério que na Europa serealizava sob signo progressista, realiza-se na periferia sob bandeira

tradicionalista. Um qüiproquó, uma figura da dialética. Movimento

figuração da vida popular. Por meio do dinheiro, ao contrário, isso não se

este que, ademais, é o núcleo do argumento.

realizaria de modo tão definido, pois a sociedade não se regulava apenas pelas maneiras do capital e, nessedomínio, o dinheiro definia menos inten-

O recuo liberal é amplamentetrabalhado por Lukács, sobretudo tendo sob os olhos a literatura posterior a i848. Dentre as variadas implica-

samente do que as relações pessoais de dependência.

ções do massacre de junho, uma delas é a metamorfose no entendimento

Tomemos Z)er ÀürorücÃeRoman, ao qual me limitarei por economia (tratando-se, decerto, de uma obra importante para Schwarz). Nele,

da história: se antes ela era compreendida como um processo contraditó-

o elementopopular, a "vida popular" (" HoZXs/eóe/z") é o critério de verdade da forma sob a qual se discute o realismo, a saber, o romance histórico. Scott, Balzac, Puchkin, Gógol, Manzoni, Tolstói, Cooper são autores que, precisamente, figuram a vida do povo em suas obras. Não obstante, o critério de verdade estádado pelo caráter concreto, histórico

rio e o desenvolvimento considerado prenhe de contradições, após i848 a reviravolta burguesa passaa compreender a história expurgadada contradição. É isso que Schwarz tem em vista ao falar do esfumaçamento dos

antagonismos,objetivo da nova ideologia burguesa. Ora, tais antagonismos são resultantes da contradição entre capital e trabalho, contradição estaque não vale no regime local, escravista. Este é o raciocínio do autor.

do romance, e Scott é exemplar ao figurar "as grandes transformações da história como transformações da vida popular. [...] A vida realmente

Mascom sua nota específica:por tudo isso, o anti-realismo é a realiza-

viva da realidadehistórica de Walter Scotté a vida do próprio povo".9s

e retomandoa mençãoanterior à teoria enfáticado realismo,fica agora

Em contraposição a isso, nos romantismos de variada lavra, assimcomo

claro como não setrata de uma doutrinação formalista do estilo, masda figuração do desenvolvimento social em sua dinâmica própria.

em geral no romance pós-i848, não há "vida do povo", a não ser como ele-

mento acessório, não central; quando aparece, nada mais é do que ilustração ou abstração.

ção do realismo, entendido como figuração da vida popular. Além disso,

Não seria exagero também entender, e ainda estamos nos domínios

daqueles primeiros romances, que essemodo de figuração é a concretização de certo instinto de nacionalidade, em que se capacita a falar do que é especificamente nosso, inscrevendo-o no mesmo movimento em

95 Lukács, Z)er ÁiçforíscÁe Rom'zn,op- cit., pp. 59, 67 e 4o7. Saliente-se que "vida popular'

âmbito geral. Que o tradicionalista apareçacomo não-tradicionalista,

para Lukács, e consequentementepara Schwarz, não se refere absolutamente apenas aos de baixo", mas à totalidade. Esse momento é essencial.Vale citar: "0 caráter popular da

que o não-moderno apareçacomo não-não-moderno (isto é, como um

arte de Scott não consiste, portanto, em que ele figure exclusivamente a vida das classes oprimidas e espoliadas.Isso seria uma concepção restrita do caráter popular. Como todo grande poeta, Walter Scott objetiva figurar o conjunto da vida nacional em sua complicada

moderno próprio), são formas dialéticas da interversão, como ensi-

nou Ruy Fausto,ou entãoum qüiproquó similar ao mencionadopor Adorno," leitura da predileção do crítico em pauta. De tudo isso se

interação entre 'em cima' e 'em baixo'. A fendénc;amu;ro erzérgícaaa car(íierpapü/ar manifesta-se nele por reconhecer no 'em baixo' a base material e o fundamento da explicação literária da âguração do que ocorre 'em cima'." Lukács, Z)er ÃüloriçcÀenomaa, op cit., p 59; ver também pp. z54, 346 e 36o. Como se vê, o caminho da totalidade.

46 Desiguais porém combinadas

g6. Cf. Theodor WI.Adorno, "tlber den Fetischcharakter in der Musik und die Regression des Hõrens"

(r938),

in Z)isaorzarzÍen.' B/«szÉ irz '/er veda/lefen

}He/f. 6: ed., Gõttingen:

Vanden

hoeck&:Ruprecht,ig8z,p. 20 47

Entretanto, a esta altura Schwarz está dialogando também com Erich Auerbache, embora "sem alardede método ou terminologia",

depreende que Machado percebe ascondições de possibilidade de uma

certa figuração realista em seusromances,extraindo da dupla.delimi-

revelando uma "inspiração essencial" sua.'o: Pois há preocupação de

tação - representada, por um lado, pelo romance de Alencar" e, por

mostrar como se trata menos de um realismo e mais de uma série ampla,

outro, pelo romance europeu ' um espaçopróprio, um modo próprio

no limite infindável, de realismos específicos, entendidos como modos

de figuração realista.

Com a figuração de um realismoespecífico,adentramosem outro tópico lukacsiano, embora agora não mais exclusivo. Em Lukács o problema é desenvolvido, sobretudo, visando a Tolstói, por conta pre' cisamente da "peculiaridade do desenvolvimento russo".98 Embora

esseaspecto não apareça em primeiro plano, ele é substancialmente

constitutivo da teoria do Realismo. Ocorre, por exemplo, quando Lukács percebe diferentes "tipos de realismo" ao mostrar a diferença do romance de Rabelais frente ao de Defoe, e ao indicar o "romance í/z i alzznascend/" em contraposição ao romance mais moderno; usa

portanto a expressão"tipo de realismo" para demarcar um tipo den-

tre outros possíveis.P9 Como não poderiadeixar de ser, isso tem um encial com a relação de forma literária e processo social, de sorte que diferentes etapas do desenvolvimento do capitalismo impli

a'

de exposição da realidade na obra literária, à qual o resultado da análise de Schwarz acrescenta mais uma possibilidade."; Dito em outra chave: ao mostrar como Machado de Assis expõe a realidade, Schwarz oferece

mais um capítulo a Mzmeih. Isso é sugerido por Schwarz de maneira

levemente cifrada, ao retomar o problema da separaçãoe mescla de estilos, o oilúzaroque serve de parâmetro para Auerbach.'" Como sevê no passo citado, estamos a falar de "matéria baixa" e "assunto elevado",

"assunto baixo" e "assuntos decorosos". Vale uma amostra do problema na voz de Auerbach: a vida política, económicae social entrou na literatura, em toda a sua exten.são e com todos os seus problema,

somente a partir

de Stendhal e BaL-

{ac; e trata-se da vida contemporâneae atuat, comiderada não na forma

cam diferentespossibilidadesde figuração do romance;'" tudo isto

generaLiladora e estática dos moratistm, mm como um conjunto de rena

pensado, no caso de Schwarz, sob a perspectiva do desenvolvimento

menos apresentados com sum callsm profundas, sua interdependência, seu dinamismo; comprova-se, outrossim, qtce quaisquer pessoas, sem distinção

desigual e combinado:'' -- e com tudo isso estamostão-somente no

de posição social, podem desempenhar um papel trágico, e que não é preciso

programa enunciado no subtítulo.

um meio nobre, real ou heróicopara cena de uma anão trágica. Foram portanto eles que reatilaram pela primeira ve{ na trança (pode-semesmoditar,

97. Que, como se sabe,o sociólogo examina no segundo capítulo do livro em pauta; "A importação do romance e suascontradições em Alencar", in Schwarz, .4o encedorw óarafm, OP.ctt.,PP-33-79-

com alguém restrições, na Europaà a mistura dos génerosna sua forma mo deína. Esscl mistura, chamada comumente de realismo, me parece a forma

mais importante e CLmais e$cal. da litercLturamoderna; acompanhctndode

g8. Lukács, l)er À& oriçci%e Rama/z,op cit., p. z56.Este é um ponto muito importante; falta-me fôlego e competência para desenvolvê-lo. Remeto às formulações fundamentais de

Auerbach,.A4ímeiü,op. cit., pp. 483-87,esp p. 486, que precisariam ser confrontadas e relacionadas com os problemas postospor Trotsky, Lukács e Schwarz. 99. Lukács, "Der Roman", op. cit., p. 35' ioo. Cf. a contraposição Inglaterra/França em Lukács, "Der Roman", op' cit., p. 38; também as especificidades dos desenvolvimentos francês e alemão, cf. Lukács, Z)er ÀürorúcÀerz Roman, op- cit., pp. 394 95 e 4ii.

ioi. Lukács, "Der Roman", op. cit., p. 4o, aproxima-se da questão ao tratar do caso russo. Obviamente, seria impensável para o húngaro refugiado em Moscou nos anos i93o qual quer referência, por velada que fosse, a Trotsky, para não falar das divergências com relação

a uma "teoria literária trotskista". Ricardo Musse disse-meque aqui a referência em pauta para Lukács, é antes Lênin, em sua obra de igo5, P"grama

48 Desiguais porém combinados

agr'íno da iocia/ democracz'a.

ioz. Assim Schwarz sobre o marxismo de Antonio Candido(Schwarz, "Pressupostos,salvo engano, de 'Dialética da malandragem"', op. cit., p. l33), o que, creio, vale para si mesmo com relação a Auerbach. Este é citado apenasuma vez em 4o enredar

óaiafm(op. cit

p- zo3> rodapé), mas há também referências não nominais(p. 86, }á citada; ver também pp- i45-46). Não obstante, ele é muito importante para o andamento de Schwarz, embora em plano diferente que Lukács. io3. Que não setrata de uma possibilidade güaZgzzer, o leitor vai percebendo passoa passo; necessitandoinclusive do passoque leva à metade de i99o, por ora fora de consideração. io4. Cf. Auerbach, Zirerafzzr=pracÃe and Püó/IÉzzm,op cit., p. 20: "/íaupfawazÍ" é o termo utilizado por Auerbach, ao qual voltarei.

49

perto w r($idm tramformações de rlossa vida, abrangendo cada vel. mais a totc.lidcLdeda vida dos homem sobre Q Terrcl, permite LhesteT uma visão de

por meio da desmontageme remontagem de Schwarz, pois a regra européianão vale, sem mais,por aqui. O primeiro, por seu turno, ofe

coq/zznroda rea#dade concreta ,za gua/ vive«z [...]."5

rece enquadramento decisivo para o resultado da remontagem, o que vale dizer, marca seu lugar no mundo.

Não vou recolher por agora tudo o que o passo oferece; fiquemos ape-

O passoem pauta é, como se vê, especialmentesugestivopor

nas com a questão que vinha destacandoem Schwarz.Ele não se contenta nem um pouco com o enquadramentolukacsiano do problema

adensar três aspectos: a incorporação criativa da análise de Lukács, de

do realismo, senãoque o incorpora por dentro e pelo avesso(isto é, mostrando como temos a vida popular figurada em uma situação inversa) e o soma à formulação auerbachiana,no sentido de que, se o realismo europeu do século xix estáa enterrar a regra da separação

Auerbach e do romance de Machado. Continuemos, agora pelo núcleo da interpretação de Schwarz, o romance de 1878: Em \ãxâ Gato\a, desde m primeiras página,

o leitor percebe a reatic]ade

mak aburLdante, menos esquemática e aindcl msim melhor uni$cctda. Como

de estilos, nosso realismo opera ainda evitando o baixo e elegendo os assuntos decorosos; não obstante, está precisamente a romper com a

era de esperar,a apreciaçãorealista dm relaçõessociais épropícia também

tal regra, à medida que figura a vida popular, nos termos de Lukács,

associara uma atitude conÍormista, insegura a propriedade e a latitude na

ou a totalidade da vida dos homens, nos termos de Auerbach. Trata-se de uma reviravolta notável (sem dúvida do romancista, mas possivelmente também do crítico; talvez haja aqui novamente um movimento

incorporação da empina. Se nos romances anteriores a estreiteza do ponto cle

dialético). Não obstante, o passo de Auerbach sugere a diferença do

a circulação mais desafogada erLtreos espaçosdo romance e da realid(üeJ"

realismo de Stendhal e Balzac frente ao de Machado de Assis

ao realismo Literário, e se não insegura o ângulo crítico r(üicat, pois pode se

vota acabavapor distanciar o paternalismo literário do quesepraticava efetivamente, agora Machado está numa posição que os aproxima, e quepermite

algo que

já vimos na pena de Faoro e a que ainda voltarei.

O que aparecia como assunto baixo no romance europeu, e a que ele não podia se furtar, sob pena de sacrificar seu teor de verdade (o que Lukács pretende demonstrar laboriosamente na discussão do romance europeu pós-i848), depende do que Lukács denominada

seu "desenvolvimento histórico-social", e que Schwarz indica pelas "misérias modernas" oriundas do capitalismo. Assim, temos o enquadramento de um tipo específico de realismo, segundo Auerbach, ou do Realismo, segundo Lukács. Este último só pode fazer sentido para nós

A ênfaseno paternalismo, em /a;á Gar(/a, é de caráter realista, pois se fala cada vez mais e melhor "do que se praticava efetivamente" e a questão do realismo é "ver e dizer as coisas como são", "transpor a

ordem social".'" É assimque a caracterizaçãodos traços e atributos do romance realista, por Lukács, é retomada na caracterização do romance de Machado de Assis. mostrando como elementos centrais da configuração da forma romance aparecem estruturando e dando forma

a esseromance machadiano.i08

Não obstante, o livro é de um "realismo limitado",'" que é um modo de formular o problema seguinte: quais são os limites desserealismo e o que significam?

ío5. Erich Auerbach, 4n aduçãoaosesrzzdai /i'reránai. SãoPaulo: Cultrix, i97o) p. z43. Embora não citado por Schwarz, o livro resume o problema desenvolvido em detalhe em J14zmeiü, este sim citado em ,4o encedora.sóararm. Para o mesmo desenvolvimento, embora

Retomando a referência à Guerra do Paraguai em /a;á Gare;a, Schwarz prossegue:

de modo mais elaborado, ver Auerbach, ]141mefü,op. cit., pp. 34-35;cap. x8, pp. 4zz-59, esp. pp. 43i, 44i) 447, 448, 458 e 5i5. Nora-se claramente, além do problema que estou discu-

io6. Schwarz,,4o vencedorm óazafw, op- cit., p. l52.

tindo, como estamosinteiramente no âmbito da discussãode Faoro, conforme assinalei

io7. Id., ibid., p. l58, que transpõe quaseliteralmente Lukács, Z)er ÀiçrorücÁenomaa, op. cit P.4z7.

anteriormente. Valeria a pena uma análise mais detalhada do entendimento de Stendhal por Auerbach, que talvez permita em alguns aspectosaproximações com Machado de Assis, margeando Faoro e Schwarz.

SODesiguaisporémcombinados

io8. Schwarz, ,4a vencedor

io9-ld.,ibid., p. i56.

óarazm, op cit., PP. l 54-55.

Resta queMachado torna'pclcomemuráveba literatura cle.acção,a vida comi digna e um episódio decisivo da história nacional, o que é um feito muito apreciável, e representauma adaptação verdadeiramente criteúosa de um dos grattdes lugares-comum do realismo literário à realidade br iLeiraJ"

Esta trinca, mesmo que lugar-comum, provém diretamente das análises de Lukács, que a demonstra e explora exaustivamente, na chave anunciada pelo subtímlo de Schwarz, em Z)er ÀüioriscÀe.Roman. Mais ainda;

no subsolo, Schwarz vai montando uma argumentação.que Ihe permite convergir para Lukács, para então também marcar diferenças. .Marcar

diferenças é responder ao sentido do "realismo limitado '

de resto,

algo que também está presente em Lukács, a seu modo., r' o limite é precisamente"o clima privado e paternalista do livro".''z Trata-se, por assim dizer, de uma privatização, que impede desdobrar por inteiro o realismo, o qual supoe a "totalidade dos obJetos': exposta pelo filtro da "vida do povo" A privatização, como Lukács demonstrou, já caracteriza um desenvolvimento do romance europeu pós-i848 -- nos seus

termos. "decadente" --, quando a historicidade concreta da ação é sacrificada em favor do seu caráter privado. No caso da interpretação de Za;á Garcia, há uma "dissolução" do elemento histórico concreto (no caso, cumprindo um elemento da caracterização lukacsiana do romance

histórico, o episódio de crise da vida nacional), que na "forma clássica

estavasituado. Não é, portanto, propriamente um limite nem do escritor nem de sua obra, mas de sua situação histórica concreta, e, assim sendo, de ambos. A comparação feita com George Sand demonstra-o com clareza.''s Como resultado, temos uma complementação da discus-

sãofeita por Lukács de fato, um dos objetivos do livro de Schwarz--, indicandocomo em uma outra situaçãohistórica os "mesmos" problemas encontram forma literária própria. Donde se vê que .4o I'enredar

m óazarmnão é apenasum livro sobre Machado de Assis, assim como

tambémnão é apenasum livro sobre o Brasil, senãoque é também a contribuição local à compreensãodos problemas da forma literária e de sua relação com a realidade (ou, formulando em outra rubrica, "rea-

lismo e realidade"). De quebra, uma intromissão poderosa no debate sobre o(s) realismo(s), além de contribuição a uma estética marxista.

Voltemos por um instante à comparação com o romance de George Sand, -Le,44argzzis de }'7/gemer.Neste, por conta de um grau mais avançado de consciência histórica (mais avançado comparando França e Brasil), as figuras da fábula -- fábula que seria semelhante

à de ]a/á Gare;a historicizam-se, isto é, deixam para trás de si o caráter puramente privado dos acontecimentos da vida, enquanto no romance de Machado de Assis não há uma historicização semelhante,

permanecemosno registro do privado. Como Schwarzrepete e reitera, não se trata de insuficiência do romancista, masda sociedade.

do romancehistórico"''' seria precisamenteo chão sobre o qual se fun-

A expressão utilizada

damentaa forma romanescaespecífica,em "motivos privados".''' Em diálogo refinado com Lukács, Roberto Schwarz trata de com-

distância imensa entre a vida popular e a História

preender a diferença da situação histórica e social que está.na base do

romance machadiano, de maneira a mostrar que, no fundo, o limite do realismo de Machado deve-se à situação histórica concreta na qual

é "falta

de dimensão

histórica":

"Entretanto,

a

falta de dimensão histórica tem fundamento histórico ela mesma,na que fazem as nossas

elites".''' Vida popular é a expressãode Lukács eJ(í sepercebecom facilidade que essafalta de dimensão histórica, a ser creditada ao processosocial, há de tornar-se ela própria forma literária. Quando isso ocorrer de modo acabado, Machado terá atingido sua maturidade e já

l io. Idem, ibidem. Como a questão da Guerra do Paraguai é discutida recorrentemente na

navegaremos nas águas dos romances da segunda fase.''' Note-se que a "vida cotidiana", destacada recorrentemente por Lukács e retomada

literatura sobre M achado de Assis, temos aqui um bom caso para aquilatar o comportamento

por Schwarz no passocitado, não se confunde com o privado, muito

de Schwarz frente a essatradição, com a qual dialoga constantemente. Se apenas indico o ponto, é porque o foco deste estudo é outro. ii. Penso, para dar um exemplo, na sua compreensão de Prosper Mérimée em Z)er ÀüloH,ch,eRoman,. iiz. Schwarz,

.40 7,encedor m óalazm, OP- cit., P. i5 5'

l i3. Este é o título do primeiro capítulo de Z)er ÀisrorücÀeRama/z,OP'cit.>PP.Z3''o5l i4. Schwarz,.4o encedoraf óalafm, OP.cit., P. t56.

SZDesiguais porém combinados

ii5.Id.,ibid.,p.l57. ii6. Id., ibid., p. i58, rodapé. Esse ponto também é enfática e recorrentemente destacado por Faoro, Os donosdapoder, op. cit., p. 835

il7. Isso é indicado no último parágrafo de .4o ve/zcedora.sóalafm e faz a transição, assim puxa Um mestrenclperiferiçl do capita isco: À4achado de .{ssi$.

ao contrário (basta lembrar a discussão acerca do drama e sua "roma-

nização" no século xix).''; Há, pois, uma espéciede materialismo no procedimento de Machado de Assim que é enfrentar as relações sociais reais (donde seu realismo),

que não são as do individualismo burguês europeu, mas as da família e do favor: "Trata-se de uma posição refletida, em que se reivindica a realidade das relações sociais contra os sentimentos 'literários' vindos da Europa. Com o perdão do anacronismo, uma espéciede quinau da

realidade na cultura alienada, quinau ambivalente, em que estão juntos o ataqueà ilusão e a aquiescênciaà desigualdadesocial" :'' Há aqui, segundo Schwarz, a descoberta de "uma lógica real, naturalmente sem

o in.soLúveLprobLema ideológico dos bene$ciados da ordem brasileira, quena queretempo como Roleprocuravam Bolar dm vantagem combinadas do atraso social e do progresso mctterial. Retomando nossojio, concebe-se quc a pe queria

história de Guiomar reúne muito vesti adamente os elementos de totalidade necessários a uma representação probtematilada

da vida do país \.. À)zl

Como sevê, Schwarz adota o ponto de vista da reprodução do sistema económico mundial; como conseqüência, o processo social (do subtítulo) é pensado nessa dimensão, na qual opera a mencionada lógica do

desenvolvimentodesigual e combinado (donde as "vantagens combinadas" do passo). Isso significa que a totalidade aqui é mais complexa,

reproduzir a realidadeinteira".':' E isto em duplo sentido:por um.lado,

pois exige a visada do desenvolvimento como um todo (daí a referência

o romance sempre opera uma seleção,dado que a realidade é infinita;'a por outro, há o que ficou de fora: tudo o que foge ao núcleo da família

trelaçamentos com a sociologia do desenvolvimento e da dependência:

a Celso Furtado em uma importante nota de rodapé':;), donde os en-

e do favor. A descobertado favor como mediaçãosignifica perceber

trata-sede uma modernização truncada, prejudicada e complexa,':' que

nexos concretos entre as camadas e posições sociais em jogo, coeficiente,

Machado de Assis, em registro próprio, vai pontuando. Guarde-se o problema da totalidade, que vou abordar logo à frente. Então, resultando de

portanto, de verdade histórica, que, por sua.vez,é verdade da forma romance. Assim, a compreensão'desse complexo é a compreensão dos

nexos que dão fundamento ao movimento da sociedade:lastreia formas

tudo isso, a tal "representação problematizada da vida do país", que é outro modo de dizer "exposição histórica da realidade",':s realismo.

concretas de vida. Ora, o passo seguinte -- a ser testado no romance da

segunda fase -- é o alcance da totalidade, via forma literária. Mas para tanto há obstáculos e dificuldades consideráveis:

Quando é acertada, a assimilação de contradições sociais no esqueletoro manesco cria um contexto mais exigente, de que a racionalidade do processo social é um elemento

Como se sabe, a hegemoniacultural cla Europa não se Limitava às idéi©.

elemento que Ihe infunde a especiaLseriedade, parti

calar ao romancerealista. Incomistêncim pensam, nessecmo, a ser questões

Mais que elm, íepouava nos objetos de comuna, que importávamos, e que a

sua maneira também são veículos de ideologia, mab dWceb de criticar aliás, z impossíveis de descartar, por ser'm parte do fulo económico normal \.. À. Sem desçam.se,a reprodução do sbtema económico internacional prendia os )Lhos e desejos da elite bíasiLeircl a coisa e idéias sem qualquer continuidcüe

com m nossa rel%õessocüis de bue, que.Fiavam relativamente emuclecida,

ízz. Schwarz,.4o vencedor Óafarm,op. cit., pp. io6-o7. Como não possoexplorar, comparece com Faoro, -44acÃadode .4siíç.' aplrámz'de e o irapé{/o, OP cit., PP. 25o'51.

iz3. Schwarz,.4o vencedorm óararm,OP-cit., PP- lo6-o7. Aqui é lugar para um ponto pouco desenvolvido das análisesde Lukács. Trata-se da ideia de que o desenvolvimento do capi talismã oferecenovas perspectivasde figuração da realidade, no sentido de uma "ampliação

do campode figuração"; disso se poderia sacarque o capitalismo como sistemamundial

sem coroamento na civilização material e ideológica. Incongruência de efei-

inscreve o exótico e distante em um nexo histórico comum. Por outra via, uma possbili

tos enormes, di$ceb de medir, que eía um fato cotidiano de nossa vida, um

dade similar à explorada por Schwarz. Ver Lukács, Z)er Ãüro/úcAeRoman, op. cit., p- 4z3:

símbolo apropriado de nossaposição rLadivisão internacional do trabalho, e

embora muito rápido e parcial.

lz4 Este, como já se viu, é um tema também faoriano por excelência. Especificamentesoil8. Cf. Lukács, Z)er ÃüforücÃeRonda, op. cit., cap. z' l ig- Schwarz, .4o verzcedor m óararm, OP'cit., P- 98.

izo.Id.,ibid.,p. ioo. izi. Cf. Lukács, Z)er Àíso/úcÀenomaa, OP.cit.) pp' iog e 37o'

\4 Desigual

porém combinados

bre o problema da dependência,ver Faoro, Os do oi dopoder, op. cit., pp. 457'58. rz5. Note-se a terminologia: "dargef e/7fenÀüron faca mzr#/i cÃAe;r"(Lukács, Z)er ÁüzoríçcÁe Roman, op cit., p. z56) é a mesma expressão de Auerbach, apenas enfatizando o "histórico' que de resto está pressuposto e posto em Auerbach-

ie Lógica Literária tanto quanto social, e nesta qualidade mesclada elas vêm a ser intoleráveis. .4 irritação deixada pelos romancesda primeira fue machadiana é ligada a esta espéciemais substanciosa de incoruistência, e assinala,

além do defeito, a comtituição de um realismobrasileiro."'

As inconsistênciassociais, que são devidas ao mencionado desenvolvimento

desigual e combinado do capitalismo, migram para dentro da obra literária. São aquela matéria pré-formada, com a qual a forma ajusta suascontas. Por vezes melhor, por vezespior. E note-se que, aqui, trata-se de "realismo com erre minúsculo, pois não mais o "Realismo" tal como formado em sua diabéticaeuropéia, como forma geral, mas sim um realismo específico, tingido por nossarealidade que, sendo periférica, exige remodelação. A questãoé muito instrutiva. Lukács fiava do Realismo(que Schwarz

com maiúscula) europeu e seu modelo servia inclusive alémmar, em Cooper. O problema do choque das civilizações indígena e européia, na América do Norte, pede ganhar forma em um realismo tal

al o europeu (na forma "romance histórico") -- o que não significa deixar de apontar suasdificuldades e falhas. Schwarz nos diz que as coisassão diferentes por aqui. Nosso realismo exige repensar desdebaixo, desde a realidade social, desde as relações sociais em sua totalidade, de

modo que a forma (literária) possase constituir a partir dessaforma. Exemplo disso Schwarz identifica no Machado de .4 mâo e a /üva, aquilo que denomina um "realismo cínico" (a adletivação é sempre valiosa, pois marca a especificidade), porque avança na reproflução da realidade,

maspermanece ideologicamente atrelado ao paternalismo.':' Todavia. é sobretudo em sua aná]ise de ]a/á Garcia que Schwarz

decantao papel das relações entre estrutura social e paternalismo. Há aqui um passo,creio, especialmenteimportante:

Embora o fulcro do argumento, que é o recuo,já esteja dado, vale

continuar a citação,pois reitera e clarifica o argumento (observo ape nas que esserecuo da sociedade contemporânea é coetâneo do já citado

"corte das ligações com o mundo contemporâneo"): Por mais rigorosa que seja a análise das relaçõespaternalista, a exclusão cla esferado dinheiro autónomo tem um efeito ideatilador, e dá aoscontitos deste Livro uma dignidade antiga, que os outros, maisperseguidos pelo dinheiro, não

tâm. Poí outro Lado,a idealizaçãonão pareceforçada, e talvez sepossaditar que comeste simplesmente num modo um pouco velho de encarar a sociedade

contemporânea, nos termos queforam próprios à sua fme anterior, quando a presença do dinheiro e da mercadoria no relacionamento pessoal ainda seria menor,

um modo de ver que decerto continuava muito generaLilczdoe acatado,

emborajú não viessea propósito, e represa"tese uma renúncia intelectual.'u

Essemovimento de recuo é essencial,porque significa renunciar a compreender a sociedade contemporânea em sua historicidade de raiz, em

favor de uma sociedadeque já não é mais. Aqui estamosno cernede uma interpretação lukacsiana central, a passagem de Walter Scott a Balzac, um movimento que vale a pena caracterizar com a célebre .dz{/Ãeózzng. Balzac, como é sabido, reconheceu em Scott um predecessor importante, embora criticasse o fato deste, em seusromances, permanecer preso ao passadoe de figurar de modo pouco elaborado as paixões. Resolvendo essasduas deficiências do romance histórico clássico, Balzac dava o passo decisivo

para seu próprio modo de exposição da realidade: "A passagemda figuração da Ã;szór;apanada para a figuração do preienfe e g anjo Ãü[óna".izp Em Balzac, a "concentração temporal" garante "a unidade de iz8.Id.,ibid.,pp.l65-66. izg. Lukács, Z)er ÀúiorücÀe Rampa, op- cit., p. 99. Exatamente o mesmo ponto é desen

.assim, o dinheiro neste romance não tem existência autónoma e aparece atleta

e "naturalmente" vinculado aopoderpaternaListct, do qual é um apêndice não

volvido por Auerbach em .4/zmeiü, embora então a discussão não sela orientada pelo ro

contraditório. Uma soluçãoquetem a relativa verdde quejá vimos, e quedo

mancehistórico(o que, em última instância, embora significativo, não é decisivo, pois o romancehistórico é uma forma, histórica, de realismo). De qualquer modo, segundo Auer-

ponto de vista da urti$caçãotiteráda é vantqosa,

bach, em Balzac temos "o presente como história"

soc/idade co/zemporáne'z]-.].

126.Schwarz, 2o enredar m óalafm,OPcit.,PP.iol'oz. iz7.Id.,ibid.,p. to8.

mm ao p'eço de recuarda

" Gegenwari aü GeicÃ;cale", literalmente

igual à formulação de Lukács --, "o presente como algo que acontece a partir da história" e a "ligação orgânica entre homem e história". O ponto bem vale uma discussãodetalhada, que deixo para outro momento. Como quer que seja, o problema está posto no duplo registro dos dois autores, e cbm ambos sedialoga. Para o passocitado, ver Auerbach, .44zmei&, op. cit., p. 447. O tema e problema, de fato, encontram-se já formulados no "Prefácio" à >

57 \6 Desiguais porém combinados

concepção de sociedade e de história".'"

Isso o recuo machadiano torna

impossível. Embora o romance de Machado não seja romance histórico,

de Machado na contemplação da "sociedade contemporânea" e do "seu mundo": por um lado, entende o domínio dos interesses e do dinheiro

a ele ainda falta enraizamento no tempo presente para figurar o presente

naburopa e suaaclimataçãopor aqui; por outro, percebeo predomínio

como história, e a explicação para tanto é que não há, por conta do re-

da relação paternalista no seu mundo.';' O que faz é mostrar como essa tensãose resolve, ou melhor: seajeita. Eis sua compreensão da empina, da vida cotidiana, e portanto teor de verdade de seu realismo. Vejamos agora como se dá a questão do aspecto dramático, tal

cuo, a tal unidade de concepção de sociedade e história

o recuo a dis-

socia.A esseelemento que, repito, é fundamental -- soma-seainda um outro. "Balzac salientou o elemento dramático como uma característica Ora, se Balzacoperou a virada da história passadapara o presente como história, conclui-se daí que perceber o presente como história implica

como o formulou Lukács com relação ao romance de Balzac, relacionado que estava à passagempara a figuração do presente como história. Será que "o aspectoformal onipresente e mais importante

incorporar a fundo o elementodramático no romance.Tal "penetração

do livro" -- o fato de que "os conflitos que a fisionomia moral das

do elemento dramático no romance moderno" precisa ser compreendida em toda a sua amplitude e conseqüência.:': Abordemos o problema por partes. Inicialmente, esseembate com plexo de temporalidades, verdadeiro a/zacronismoem sentido forte (ato

personagens faz esperar não desabrocham e as várias acomodações

distintiva do novo tipo de romance,emoposiçãoaostipos anteriores."'"

de pâr algo fora do tempo correspondente), é desdobrado por Schwarz na

idéia do "obséquio impessoal", entendido, como não poderia deixar

ligadas à complementaridade real dos interesses não se comentam nem se explicitam"';s não é decorrente de uma espéciede não-dramatização dos conflitos, não-dramatização esta decorrente daquele

"recuo"? Como vimos no argumento lukacsiano acercade Balzac,há um nexo muito forte entre "presente como história" e "dramatização

de ser, como contradição. Esta figura, o obséquio impessoal, depende do

dos conflitos no interior da forma romance. Ora, se Machado sus-

recuo, sem o que ela seria impossível:

pende um conflito mais-do-que-anunciado e adora a "acomodação", estásubtraindo a ênfase no elemento dramático, ao mesmo tempo que

soaLidadesuprimia u desvantagemmorais da dependência,mm não o seu

recuarado contemporâneo.Os dois movimentos estão íntima e indissoluvelmenteligados. Assim, guardadas as devidas proporções e os contornos específicos,o movimento que Lukács percebeem Balzac

funxlamento, ao mesmo tempo querepresentava a aprop'cação, sem quebrade

no processo de desenvolvimento do romance está presente, em nega-

do ponto de'pista ideológico era uma $na solução, pois conciliava os interesses dos dependentes,dosproprietários, e a imputação moderna. De fato, a impes-

contexto, do espírito do tempo: aperfeiçoava-se o obséquio, que se msimiLava

f/vo. em Machado de Assis. Um movimento em sentido inverso foi

quanto possível, pela via de sua estililação, à troca e ao sen'lço tmpessoats, e

o que possibilitou a Machado figurar a sociedade como contradição,

) dependente se concebia como um funcionário do buxo de lavores.*"

embora o custo tenha sido justamente perder a possibilidade de figu-

rar o presentecomo história em toda a sua concretude (e totalidade) Uma solução romanesca para o problema, que, contudo, não deixa de ser

e de poder desdobrar plenamente a dramatização do conflito

contradição. São "acomodações modernizantes" que tentam resolver o anacronismo e que sãopossibilitadas pelo recuo. Há, pois, uma reflexão

conquistas já consumadas por Balzac.

ambas

i34. Faoro também aborda o tema: ]14acÃado de .4ssü.'a pirâmide e o rrapéÍío,op. cit., p. z5; Comédz a Àumarza; ver Honoré

de Balzac, ,4 comédia duma/za. 4? ed

r955)v.i pp. g-22,esppp.i3 i4. i3o- Lukács, Z)er ÁüiorücÁe Roman, op. cit., P. ioo'

i3t.Id.,ibid., p. i49. i3z.Id.,ibid. [33 Schwarz,.4o vencedor óalazm,op. cit., pp. i74 e i73'

\% Desiguakporém

combinados

Rio de Janeiro: Globo,

sobre o dinheiro em geral passam,p. ex. pp. íz6, 228, z47 e z5i . Poderia recuo ser compreen

dido sob a perspectiva do "anacronismo necessário" de que fala Lukács, citando Hegel? Há formulaçõespertinentes a esserespeito em Z)er ÃÜ o/úcÀeRompa, op. cit., p. zo4. Theodor W Adorno também indicou o problema, ao detectar um elemento de "atraso histórico" em

'Balzac-Lektüre",in Moira {urZlferalur. Frankfurt: Suhrkamp,ig8r, p. í46. i35.Schwarz,.4ovencedor óalafa, op. cit., p. i76. 59

Não obstante, há elementos fundamentais em Balzac e que encontram correspondência em Machado, como o "tipo' e o modo de configuração do "processo real", indicado por Schwarz.'" E como não pode ria deixar de ser, o problema da "vida do povo" , que desembocana luta

de classes,surge em meio ao reczzo. Assim, a forma própria daquele conformismo" que caracterizaria o Machado da primeira fase ganha

contorno específicoem]aiá Garcia:suafigura é o "imobilismo", le fato, é melhor queliguem todosem seu Lugar e conheçama sua concliçãoNãoporque a diferençasocialse)ajwta ou porquea tr(Maçãoajusti$que, mu porque os mediadores do movimento

o obséquio, bem como o desejo de subir

- são aitüa mais degradantes. Este o lado con.servidordestas$gurm, cqa consciênciada situação é aguda, sem quese tramforme em comciência de clmse. Mais exatamente, pela generalidade e pela recusa da solução pessoal

a análise é de clube, sim. Entretanto a sua dimemão coletiva não tem seqüência, e sem resultados são vistos na ótica do decoro e da dignidade cla pessoa, o que os recupera para a esfera do paternalismos)'

Teríamos encontrado aqui, então, aquele limite do realismo do primeiro Machado? Porque a dimensão coletiva da consciência é travada? Note

se que o argumento, se carreto, é bem lukacsiano... Mas Schwarz não pára por aqui, senãovai extrair mais: Digamos que, para sefoímuLarem, problema e con#ita se alimentavam de tina vaga apropriação do igualitarismo burguês, ao penso que sua evolução real", isto é, a evolução que Lhesimprime o enredo, corre nos trilhos da depen-

dência pessoal, chás alternativa

gamosao ponto alcançado por Balzac, ou seja, romance do presente como história. Ademais, a fantasia exala indica que o escritor, embora figure com liberdade a realidade na obra, é capaz de exprimir um nexo histórico decisivo e, assim, retratar um movimento fundamental da sociedade."'

Como se vê, o travamento mencionado torna-se forma. Tal processosocialtornado forma é realista, modo como a literatura expõe a realidade; assim, a forma literária de Machado de Assis é também o realismo de Machado de Assis, que variará de acordo com a mudança da forma. Portanto, o realismo machadiano é diferenciado: ao longo da análise dos quatro romances da primeira fase, em 2o ve/zcedorm ó.zfa/w (expressão, note-se, que é osf/Halo de um romance posterior...), vamos tateando a constituição de um realismo próprio que desemboca no realismo de /a;ó Gare;a -- que, mofa gene, é onde desagua o livro e o ápice de sua argumentação e construção teórica --; ambos apontam, claro está, para o foco situado além do livro, para as Memór;após mm.14i O realismo posterior está a um passo desse realismo -- como indica o parágrafo 6ínal de Ho e/zcedor óararm, um passo em sentido bem definido (e que será retomado por inteiro na continuação do livro).'': Esse passo possui uma direção que foi assinalada, a seu modo, por

Lukács. O que é comum a todos os grandes realistas,figuradores da realidade, independentemente de local e época, é seu "enraizamento nos

grandesproblemas de seu tempo e a figuração impiedosa da substância verdadeira da realidade"."; Donde se pode tirar o sentido da passagem

são outím. Daí a descontinuidade e perda

le ten.sãoque sinatamos, uma desarmonia queno entanto é eta mesmo uma

forma, a tr'inscrição formal de relaçõesreais, no cmo a palmar'rate fl'mtração das mpirações de independência da clmse dependente.Na perspectiva de nossoestudo, estaforma deve ser saudada como o primeiro feito comiderável

do romancebrmiteiro \- À. Umaforma muito melhordo quenova, original rlo sentidofafte da palavra, em que a originalidade a ser a premissa da fantwia

Ora, como a expressão"fantasia exala" provém do texto de Adorno sobre... Balzac,'" o encaminhamento que venho destacando não é totalmente amalucàdo: Schwarz está dizendo que, quando essafantasia se torna exata, che-

do processo nacional vem

romanesca, que vai se tornanxio excita.* ''

i39. Theodor W. Adorno, "Balzac-Lektüre", op- cit.} p. i39' Em seu texto sobre Balzac, Roberto Schwarz cita esse texto de Adorno e acrescenta: "Devo muito ao espírito deste ensaio, dívida que

não cabeem citações". Roberto Schwarz, "Dinheiro, memória, beleza(O/a/ (hnoz)", in .4xereza

eo desço/!ácida. z?ed., Rio de Janeiro: Paze Terra, ig8i(l? ed. ig65), p. i6g. i4o. Esta também é uma lição lukacsiana, cf. Z)er Àüfo/ücÀeRompa, op. cit., p. ex- p. 335. i4x' Aqui um sintomático paralelo com o mestre-açuAcê, que em suahistória literária ajusta o foco em uma figura que estápara além dos limites propostos para o escudo.Ver Schwarz. 4a enredarm óafafas, op. cit., p. 4i, rodapé, a que ainda voltarei.

i4z. Inclusive na repetiçãopraticamenteliteral da formulação, como se pode ver em R [36. Id., ibid., p. i58, também rodapé.

i37.Id.,ibid.,pp.i85-86. i38.Id.,ibid.,pp.igo

e i97.

Schwarz, C/mmeifre na/er canado cáfila/Erma...44acÃadp de ,4iiú, op. cit., p. n3. \43. Geotg \;laKâw,Bdqac ulü &íjiclnqãsische Reaíismm, tn Werke.Problemades Realbmus !u, ap cit., p. 443. No mesmo sentido e com a mesmaadjetivação, ver Auerbach, i141mei&,op. cit., p. 434

6i (Sa Desiguais porém combinados

para a segunda fase machadiana, precisamente na "figuração impiedosa (novamente a adjetivação);

o /mp;idoso é o elemento que se torna lace-

rante nas Memór/após/zzmm, ao passo que nos romances da primeira fase impera a 'zcomodafâo.

O trecho é especialmente revelador no que diz respeito a Auerbach, pois

asoutras linhas indicadas sempre foram reconhecidas pelo próprio Roberto."' Seria ingenuidade supor, ou entender, que o "procedimento expositivo" indique apenas uma dimensão formal de seu trabalho; ao

Tudo isso conduz para além dos meus limites neste estudo, de sorte

contrário, a "Z)ars e// z/zg"é um momento mesmo daquilo que se pre-

que procede contabilizar. O problema do "realismo", que é o problema

tende dar conta, de modo que exposição, análise e desdobramento con-

dos autores com que dialoga, encontrauma respostaprõpna, que permite aquilatar o diálogo: no tocante a Auerbach, Schwarz oferece, tal como Faoro, um certo realismo, que em seucolorido próprio oferece um capítulo nacional (mas não só'44)ao Mlmeiü ampliado. Com relação a Georg Lukács, a questão é um pouco mais complicada: respon' de à ampla discussão dos "problemas do realismo" (título dos escritos

reunidos de Lukács sobre o realismo), mapeando e topografando um

realismo que não é levado em conta pelo húngaro, mas que se alinha à sua teoria do realismo, à medida que mostra como a forma histórica do romance realista é dependente de um desenvolvimento histórico e social e que, portanto, das especificidadesdessedesenvolvimento pode'

ceptualimbriquem-se em uma única coisa. Análise de texto e explanação

histórica não são diferentes, mas apenas momentos de um mesmo procedimento de análise ou, dito por outras palavras, uma outra face da compreensãohistórica e social de forma. É isso, ademais,que unifica as linhas indicadas, que se constelam sem contradições embora com ênfases,terminologias e desenvolvimentos variados. Não há razão alguma paracontestar a compreensãoretrospectiva do candidato-memorialista, masvale pontuar e, ocasionalmente, insistir em um ou outro ponto. Mas há mais. Schwarz elabora a fundo a questão da forma literária (que não é tematizada nessestermos no livro de Faoro), na exala medida em que mostra

no caso de ]a;á Gare/a

como a forma é resultado da

se esperar especificidades do realismo (basta lembrar o que se diz acer-

percepçãoe formalização do processo social: o "paternalismo está, enním,

ca de Manzoni e dos russos em Lukács; os russos, ademais, por razões

transformado em princípio formal".t'8 Vinca fundamental do processo social brasileiro, lógica das relações sociais, é convertido pelo escritor

óbvias, especialmente importantes para Schwarz''s). Esse nexo possa bilita um rapidíssimo desvio pelo "percurso" de Roberto Schwarz, tal como indicado em seu .Menor;a/ para concurso de professor titular na Unicamp,

onde se lê que .4o vencedor m óa az

em forma literária (forma sobre o pré-formado), um realismoprofundo, de origem, mais do que mero espelhamento dos "acontecimentos da

vida". E tanto mais cifrado, necessitadodo sociólogo que o revela.i"

:

Já vimos como Lukács formula o problema da forma. Segundo

quanto a idéim e técnica \..l\ se inspira em linhas diversas, que enumera em

Schwarz, "a forma, em literatura, faz as vezes de realidade"';' (donde

seguida. aàA visão do romance bruiteiío desenvolvida por'4n'onio Cândida bÜ Os estudos marxista

de um círculo que se reuniu em São PauLo em jin.s

dos anos tg\a e começo de \ g6o, tratando de entender o "atímo"

do país

:omo parte da atttatidade do capitalismo mundial. cÜ.4 interpretação histó rico-sociológicadmformas, praticada por GeoígLukács, WaLtcrBenjamin e Theodoí W. .4dorno. d) Oprocedimento expositivo de Erich .4ueíbach, combinando análise de texto e expLanaçãohistórica)"

i44. Ver Schwarz, .4o rerzcedar óararm, OP.cit., p ig6, rodapé

i45. Desde seu primeiro livro Roberto dedica atençãoe inteligência aos russos;ver R. Schwarz,

4 fere;a e o deicon@ada, OP. cit.

i46. Schwarz,Ã4emona/para concurso de professor titular na Unicamp, texto datilografado, i99oJPP.3-4.

6z Desiguais porém combinados

i47. Assim, sobre a importância de Antonio Cândida, basta lembrar o que lá indiquei ante [iormente a partir do texto "Pressupostos, salvo engano, de 'Dialética da n]alandragem"'

assimcomo toda a primeira parte de seulivro Següénc;mórmí/e;rm.E/na;oi. São Paulo: Companhia das Letras, r999, pp. g-58; com relação ao círculo de estudos marxistas, tanto

o "Prefácio" de ZJ»zmesas/zaper#àrz a da cap/ta/ümo.. .44acAado deJiiü, op. cit., pp. iz-i3 comoo texto "Um seminário de Marx", in Següénci ór ;Zeírm,op. cit., pp. 86-io5; Lukács Benjamine Adorno também são reconhecidos no "Prefácio", indicado. Apenas Auerbach não é explicitado ao longo de suaobra. i48. Schwarz,,4o vencedor óarafw, op. cit., P. i97. r49. Sobre o pontos vale a pena ver Bento Prado Jr., "A sereia desmistificada", in ,4©z/memafaf.São Paulo: Max Limonad, tg85, pp. zz7-47. i5o. Schwarz,.4o enredarm óaiazm,op. cit., p. ig8. E ainda: "Relações de verossimilhança entrea forma literária e o processosocial"(idem); zo3; zo8: o narrador "assimila e transforma

63

>

se evidencia decisivamente o nexo auerbachiano -- realidade exposta

/z.zliteratura -- e o encaminhamentoque Schwarz dá para a questão). E para que a forma faça as vezes de realidade é preciso que esteja inves-

tida de uma "força generalizante",'s' que é precisamente seu modo de dizer o que dizia Lukács acerca da capacidade de universalização, que é condição do realismo. Em primeiro lugar, a universalidade é concreta

zada nos tipos e na galeria dos tipos, donde vale citar a formulação de Lukács a que Schwarz remete seus leitores:

desde Hegel, é que a epopéia implica totalidade (retomar e reconstruir essetema e problema seria muito custoso para mim e nos levaria longe demais). Vejamos apenas como Lukács equaciona a questão, pois, creio, o caminho de Schwarz é o mesmo: 4 tragédia e a grande épicapretendem amam a $guração dcltotalidade do processoda vida. É claro quebso, nos dois caos, sópode ser uma comeqüên ciçtda estmturçcartística, da comentração formcLLna reprodução artística dos traços essenciaisda realidade objetivo)S'

Á categoria centrar e o critério cta concepçãorealista de !iteratura= o tipo, com relação ao carácter e situação, é urna síntese peculiar que conjuga organtca

mente o universal e o individual)::

Assim, o realismo de Machado de Assimlança mão da figuração dos tipos como procedimento de universalizaçãolvale dizer de fiWração do processo social no interior do romance, vale dizer forma. Com isso,

equacionamostambém abstraçãoe concretude: os tipos históricos sociais são encarnados, concretizados nas figuras singulares, tudo conver-

gindo para a exposiçãoda realidade. Lembro, a propósito, o significado da "vida popular", que articula em si essesentido de totalidade. Em segundo lugar, e ligado a isso, é característicado próprio gênero romance a figuração da totalidade, herdeiro que é da epopéia . donde chegamos

à célebre formulação de Hegel do romance como "moderna epopeia

burguesa", retomada por Lukács e Schwarz.'S;A questão,formulada

>

em regra subjetiva

e portanto em elemento formal

o momento de arbitrário que é parte

de seu assunto, para infligi-lo ao leitor". Note-se que aqui Schwarz insere o problema do

Aqui tocamos o (já mencionado) problema da infinitude da totalidade da vida, que exige uma espécie de redlzfâo, diabética, aos seus traços essenciais.issO nome dessaredução é forma literária, o modo como ela se realiza chama-se mediação a figura da dialética que permite que a universalidade alcançada não seja abstrata, uma má universalidade.'s' Mediação é o nexo que articula forma literária e forma social ("realidade exposta

/zaobra literária"). A totalidade, como sevê, resolve-se na forma literária, donde o programa do subtítulo, que de fato esconde, sob a cópula, o problema da totalidade. Com isso, embora sem enfrentar diretamente o problema, dá para entender a afirmação que nos interessa e da qual parti,

de que a forma faz as vezesde realidade. Em Machado de Assis, temos figurada uma universalidade concreta, porque mediada, porque resolve por dentro as "determinações históricas" da vida cotidiana de suasfiguras.Resultado muito curioso e peculiar: a "relação com o presente" não é abstrata, não obstante o "recuo" realizado. Por aí se vê o lugar em que se doca a discussão do romance machadiano em Schwarz. Há ainda um outro aspecto no qual se desdobra essaquestão. Tendo em mente os desenvolvimentos de Lukács. a última frase de .,4ovencedor

narrador. o mais das vezes deixado de lado por Lukács, indicando uma sensibilidade diversa,

oriunda, decerto, da leitura de Benjamin e Adorno(mas também Auerbach e os críticos

m óa/arm dá o que pensar.'s' Lembremo-nos de suasanálises do romance

anglo-saxões), para não falar de seu mestre-açu-

i51.Schwarz, .dorerzcedor m Óafarm, OP'cit.,P.i98. i5z. Lukács,.BaZÍac dderfaqüícÁe Rea/&mm,OP'cit., p. 4)6; ver tambémpp. 46g-7i(quando fda em "galeria" de tipos), passam;Schwarz remete ao texto em .4o ve/zcedoras óarazas,op' cit., p. i58, rodapé; ver também pp. 6z} 48-49, lo7} i78 e t86. No mesmo sentido, Lukács, Z)erÁüroríscÁeRoman, op. cit., pp. 4z e 4oo; "Der Roman", op' cit.) pp. z6-3i, 36-37 e 55. l53 . Georg Wilhelm' Friedrich

Hegel, Har/eiü7zgeníióer ,4;roer;l, in WerÉe. Frankfurt:

Suhrkamp, ig86, v. i5, P. 39Z; Lukács, "Der Roman", op' cit.) p. ig, passim; Lukács, Der

ÁíszoríscÀe Ramal, op. cit., PP.io8-og, i5z e i67; Schwarz, 4o enredarm óararm, OP cit.) p. zo3, inclusive rodapé. Ver ainda: Theodor W. Adorno, "Standort des Erzãhlersim >

64 Desiguais porém combinados

> zeitgenõssischen

Roman",

in .Nbren {zzr .[íleralar,

op

cit., pp. 4n48,

cf. Schwarz,

.4o perzce-

dor óarafm,op.cit., p. 94 i54 Lukács, Z)er Ãúio/úcÃe Rompa, op- cit., p. iog; ver também pp. 38o e 4o6 q5. Italicizo redução para antecipar urna fórmula que reaparecerá posteriormente.

rS6.Ver Lukács,Z)erÁíçroríçcÃe Rama/z,op. cit., p. 262, que traz inclusive citação de Hegel a res peito(proveniente

do S 65 da E/WÉZJpdÓe derpÃ;ZoinpÁíscÀen mhse«.cÃaÚen z/n G,«ndbse).

i57.Aqui vai ela, para quem não estiver com o livro à mão; "Digamos que Machado tentara analisaro arbitrário paternalista na perspectiva dos dependentes, a fim de livra-los dele, o >

65

do período pós-1848e do período imperialista, aí incluído .o romance humanista antifascista. A crítica a esteúltimo é que, não obstante sua diferença frente ao romance da decadência burguesa (Naturalismo e

No essencialtodavia a imposição da forma descontínua e do metro da conti-

nuidade impedia o ciclo pctternalista de completar o seu movimenta e a sua $gura. Este era um movimento real, a quenaturalmente nãofaltava sentido, um sentido quepara a parte fraca não é glorioso. Na relação entre vicese de-

formalismos vários), ele não vê a partir de baixo e suas ações estão centradas nas esferas superiores da sociedade. Falta-lhes vida popular coti-

pendentes, diversamente do exemplo clássico, a classe totalizante é a primeira.

diana. há uma "excentricidade social dos destinos humanos".'s8 Dife-

SÓdepois de virar cl cuaca Machado alargaria

o coÚunto desseprocessos'''

rentementede ambos,Púchkin e Thomas Mann, em situaçõesmuito diferentes, também realizam obras que transcorrem em camadas superiores; no entanto, os destinos são universais -- de modo mais imediato

em Púchkin, de modo mais medrado em Mann. Ou sela, se de cima ou de baixo, não é propriamente a questão (donde também a crítica de

Lukács ao romance da oposição plebeia); a questão é se, tanto de cima como de baixo, há a visada da totalidade e da mediação. A questão é tão matizada quanto provocativa, pois Schwarz indica

dois momentos do problema, nos primeiros romances e nos seguintes, de sorte que as Memór;após zzmmde .Brú Cuóm -- assim termina ,4o vencedorm óa alm marcam uma virada na obra. No âmbito dos

primeiros, o problema resolve-sedo seguintemodo: por conta de pro-

As conseqüências do passo são terríveis, justamente porque, como se

viu (inclusive na interpretação de Faoro), permanecem anuais.Mas no âmbito do diálogo crítico com Lukács temos totalização porque a mediação universal em pauta (o favor) ordena as relações entre os perso-

nagens,de sorte que se resolve, de modo próprio, o problema da totalidade no romance no qual não figuram os escravos. O resultado não é similar nem ao romance da oposição plebéia pós-1848, nem ao romance

burguês decadente, nem ao romance do período imperialista, para falarmos como Lukács. E (guardando sempre as proporções) similar a

Púchkin exemplo máximo do romance histórico -- e a Thomas Mann -- exemplo honrado de romance burguês crítico.

cedimento de acomodação e desdramatização, há um estancamento

Conseqüentemente,a forma literária não se reduz nem equivale

do movimento no romance (Schwarz demonstra-o sobretudo em Zai'í

a pontos de vista específicos de classes determinadas, ao contrário: a forma é o modo como classesdiferentes, com pontos de vista diferentes,

Gare;a), estancamento que abre uma vertente analítica importante. Por

um lado, a forma incorpora a descontinuidade,por outro, o.proces:lo social é indicado em sua incompletude retomando e retrabalhando de certo modo as idéias de Paulo Emílio Sales Gomes acerca dos ciclos

do cinema nacional, descontínuos.'sPA partir de tudo isso, pode-se ler o passo seguinte:

confluem em uma situação histórica concreta. Dessa maneira, a forma não é soma das partes, mas totalidade que se faz no movimento das partes em tensão e conflito, muitas vezes em contradição.i61 Também nesse

aspectoé possívelindicar a passagemrumo à obra madura,na qual, segundo Schwarz,'': investiga-se com maior desenvoltura o "movimento destas relações" a saber, dos diferentes pontos de vista, das diferentes posições sociais --, vale dizer, variedade dos arranjos, função

dasfiguras, o que, pelo que precede, afeta a fundo a forma. > que o levara a exclui-lo do bom tom. Mais tarde, pelo contrário, ele o assumiriainteiramente[-.] para Ihe acompanhar e estudar o movimento, e trazê-lo ao primeiro plano,,em lugar de o ocultar. É claro que esta nova posição é compreensível somente se o arbitrário

Mas, voltando à questão da introdução do elemento dramático no romance pelas mãos de Balzac, que ficou dependurada mais atrás: ]a/.í

não for sentido como humilhação. De fato, Machado completava a sua ascensão social. Em

seusromances maduros o arbitrário será encaradocom a intimidade humorística de quem se confessapraticante, e já não tem o que temer. O ponto de vista passou a ser o de cima. Schwarz, .4o verzcedar m óafarm, OP.cit., P Z3'' i58. Lukács, Z)er ÁürorücÁe Roman, OP.Cit., P. 347 .59 Cf. Paulo Emílio Safes Games, Clrnma.. aa/elóna rzo iuódeie/zva/vime/zro. São Paulo:

Paz e Terra, i996, especialmenteo capítulo anal, que dá título ao volume.

66 Desiguais porém combinados

i6o.Schwarz,,4ol,encedor óararm,op. cit., p. nz.

i6i. Cf. Schwarz,.4a e?zcedorparar«.f, op. cit., p. igo, Jácitado("uma déiarmo,zz a 7ue/zo epzrarzro é e/a mesmoüma#orma"), e p. 211.Cf. ainda Lukács, Z)er ÁísroríscÁe Ronca, op. cit. PP.4o6 e 38o.

i6Z.Cf. Schwarz,.4ol,erzcedor a.sóafalm,op. cit., pp. igi-gz-

67

Gare;aé caracterizado por Schwarz como anti-dramático,''; possibilitando entender que a ausênciade dramatização, levada às suasconseqüên-

cias, indica algo como a posição relativa do realismo de Machado de Assis frente ao "grande realismo europeu". Embora não se trate de elaborar uma tipologia dos realismos, a comparação é instrutiva, como se

Isso posto, vale uma interpolação que retoma e amarra com mais um nó um problema já formulado. Trata-se de Thackeray, que recebe uma análise muito sugestiva por Lukács em -Der ÁzszorücÃe.Roman, especialmente quando temos em mente o presente andamento.

Thackeray,escrevendopor volta de i848 (HanzryXa;r é de i848,

vê e como se verá novamentemais à frente. De todo modo, mais uma

Z%e/?ZfroO' of /Zenly Exmond, Exg., seu romance histórico, é de i85z),

vez, especificidade da forma e do realismo. Imediatamente ligado a isso está o déficit de desdobramento realista clássico de /a;á Gare/a:

filia-se ao realismo do século xvni inglês,''s procurando continuidade

menoscom a tradição do romance histórico que Ihe é mais imediata (Scott), do que se referindo diretamente aos romancistas daquele século.

por decoroMachado não traria ao primeiro plano nem tratava nuamenteo movimento das fortuna e dm cLmsessociais. Preferia trata-laó como ele-

Essetraço parece ser sugestivo para se pensar Machado de Assis. De

mento da imaginação individual, o que anula o movimento objetivo da so-

Machado;'" de outro, porque assinala uma via diversa, que não a apre-

ciedade, mm metodila a comiseraçãode sua existência e e$cácia rLOplano rência históricas, faltam em laia Garcia os grandes ritmos da traí.sformação

sentadae defendida por Lukács como a "grande" tradição realista, uma via em que encontramosuma figuração realista que se desviado romancehistórico (na sua "forma clássica"), mas não obstante apre-

social, ctÜo contorrLOsó o movimento da propriedade e dm clmses desenltaJU

sentaresultados: no Brasil e na Inglaterra... Isso não significa, absolu-

simbólico. Em comeqüência,a despeitodo propósito panorâmico e dm refe-

um lado, porque instala um nexo com autores significativos para

tamente, que Machado não tenha lido e digerido seus predecessores, a

Resultado que poderia ser lido como similar à compreensão de Ma-

chado como moralista, embora não seja esseo aporte de Schwarz.

começarpor Alencar (como muito bem o mostra Schwarz). Mas temos também nisso um traço próprio: em vez de atrelar seu romance (e seu

Como quer que seja,nomeia-se aqui o que se deixa de realizar em com-

realismo) unicamente às formas nacionais que o precedem imediata-

paração com o realismo de Balzac e Stendhal (para retomar os autores nomeados por Faoro nesseponto de sua discussão). Se o movimento da

mente, teve também referências outras. No caso de Thackeray, essa referência era-lhe, ainda, nacional; no caso de Machado (firmando o pé em uma compreensão muito acurada de certo "instinto de naciona-

sociedade como um todo não aparece em suasdeterminações coletivas e permanece adstrito ao individual, é porque ainda está ligada àquele "recuo" operado por Machado, pois o ritmo de que se fala aqui implica o

presente como história, nos termos de Lukács-Balzac (e Auerbach) .

No entremeio disso tudo, não se pode deixar escaparque, como seviu mais acima, trata-se do "primeiro feito considerável do romance brasileiro", o que significa que o romance torna-se, precisamente, bra-

sileiro. Marco do romancebrasileiro, revela o específicoda sociedade

lidade"), nutriu-se de tradição romanescavária, dentre outras coisas dos ingleses do século xvin. A semelhança de resultados, guardadas

asproproções e complexa especificidade, é a assinalada anteriormente (Auerbach e Faoro). Vejamos então como Lukács entende Thackeray. Nos realistas do século xvnl [zma /a/ aproximação

à historicidade

óro oü /zazüraZmenle de szzm fendén.

nacional figurado criativamente na forma romance. O que, pelo que já

elas realista de crítica à sociedcLde.Ela é um dos muitos pulos rumo àquela

foi dito, significa tambémuma descobertacognitiva da realidade,pela

concepção 'ectlistcl da história,

via da força cognitiva da ficção.

seu apogeu em Scott ou Püchkin. Em Thackeray essa etnmaê.a do estilo

dcl vida social, dct vüa do povo, que alcança

i65. Lukács, Z)er /íísiorúcÁeRompa, op. cit., p. z44-

i63. id., ibid., pp. zoz, zo6, zo7, zog e n4. Exemplosda desdramatização:"ausênciade

i66. A pesquisa sobre Machado de Assim, desde sempre, pelo menos desde Sílvio Romero

conflito";

vem apontado suas ligações com a literatura inglesa do século xvm, sobretudo Swift e Sterne

"culminação

que na verdade é um deslize'

i64.Id.,ibid.,p.zi7. 6% Desiguais porém combinadas

Ver o já mencionado E. Games; em 4o vencedor para/m, op. cit., p. zo3-

69

Ideológico comptetamertte outros de uma desilusãop'afunda, amarga, quese

sociais, mas ainda deixam algo de fora e aqui as diferenças tomam rumos próprios. Apenas não deixemos de observar que Schwarz, mais

3xternalila pela sátira, decepçãodo tipo de política, da relaçãoentre a vida

à frente, retoma o problema da desilusão para indicar a via que leva aos

política e a vida social cleseupróprio tempo''''

romancesda maturidade: "A Machado, já agora só faltava a desilusão da desilusão:desiludir-se também do conservantismo paternalista".t'9

e da estrutura dos romancesdo século xrni origina-se de um fundamento

Thackeray não se atrela à linhagem do romance histórico clássico e por

Este momento intermediário, da desilusão ainda-não-desiludida, é a

issopermanece,para voltarmos ao termo de Raymundo Faoro e Erich Auerbach. morcz/hz.z. A "forma clássica" do romance histórico implica

embocadurana qual a leitura moralista ganha pé e com ele reencontramos o argumento que víramos, via Auerbach, em Faoro: um realismo para o

não o moralismo, mas a compreensãodo caráter histórico e concreto

qual a sociedade não aparece como problema propriamente histórico, mas

da vida popular, e por isso, por causa do povo, alcança a totalidade, o

como problema moral; no qual a crítica da sociedade permanece adstrita

movimento da sociedade como um todo -- que permanece vedada ao

aosindivíduos, masnão às forças históricas que direcionam seu movi-

moralismo. Aqui, estilo e estrutura são forma literária que remete a um

mento. (No entendimento de Auerbach, os limites desse realismo são os

processo social que não é a totalidade, mas uma compreensão particular e restrita, individualista, cuja experiência de base é a desilusão. Como

limites da consciência histórica, e isso possui conteúdo e lastro epocais, o

o romance de Scott }á havia deixado para trás essetipo de experiência

mento de Schwarz, segundo o qual os limites de Machado de Assis não são limites nem do escritor nem da obra, mas da sociedade.) Se Auerbach e Faoro destacavam a consciência crítica que aflorava nesse realismo particular, Lukács não fica atrás: Thackeray é um "realista crítico".:'o Embora sua não-filiação à via clássicado romance histórico impeça a exposição do movimento da sociedadeem sua totalidade, não deixa contudo de figurar um tipo próprio de realismo. A argumentação de Lukács é previsível no

como fundamento da forma literária, há em Thackeray um rec o -- para

resgatar propositadamente aquele termo importante.

A seu tempo, Roberto Schwarz decifrou fenómeno análogo em Machadode Assis: uma juventude liberal desiludida redunda nos romances da primeira fase, de modo que estes são o resultado de uma

desilusão.Na décadade i85o, Machado havia adoradoidéias Liberaise assimiladaa retórica do progresso

e da @zza/ande. [segue-seuma prova com a citação de um texto de i859] ,4 limão nãodurou, e !ogoMachadoiria mudardeconvicção\- À. Mais tarde, Inundo vem a escrever sem p'imeiros romances, estes se alimentam da ideo-

que, a seu modo, pareceantecipar, embora de modo mais tosco, o argu-

seu próximo passo,o que falta ao inglês: "Thackeray não vê o povo"; "com isso, ele suprime a objetividade histórica".''' Esta é a razão da supremacia de Walter Scott: "Oferece uma pintura mais ampla e o#er/va das forças históricas", enquanto Thackeray oferece uma pintura subJetiva'':

o que significa, esquematizando em

logia antiliberal. Pata Machado, portanto, jú não se tratava aqui de uma

traçosgrossos:um realismopleno/universal veremum realismofraco/

posição inicial e iríefletida, mas do resultado da experiência, com a parte de

particular (que não vai até o$undo, que não figura a totalidade). Este é o

realismo

se não de verdade

que acompanha as desilusões ~'s

resultadofinal, no realismo crítico de Thackeray, para Lukács: "0 dilema na apresentação dos acontecimentos históricos reduz-se, para ele, na

Note-se que o ponto de chegada é exatamente o mesmo indicado por Lukács: um realismo que é resultado de desilusão; e um realismo que, se não é regressivo (nem na Inglaterra nem no Brasil), também não é progressivo. Ambos desvelam aspectosimportantes das contradições

escolhaentre a glorificação patética da vida pública ou o retratar realista dos costumes da vida privada".'';

O encaminhamento machadiano

i69.Id.,ibid.,P.87. i7o Lukács, Z)er Àís o/íçc#eRompa, op. cit., p. z44

i7i.Id.,ibid., p. z47. i67. Lukács, Z)er ÁüforücÀe Roman, OP.cit., PP Z44'45i68. Schwarz, 2a

enredar w óarafm, OP.cit., PP. 84-85

lo Desiguais porém combinados

r7z.Id.,ibid.,pp.

z47 e z48.

i73.Id.,ibid., p. z45. 71

está próximo disso -- embora, é claro, não esteJamo.sfalando, no caso de Machado, de romance histórico. Deixando de lado o povo, Thackeray "suprime a objetividade histórica, e quanto mais forçosamente ele fundamenta psicologicamente as açõessingulares de seuspersonagens,

quanto mais sutilmente ele conduz sua psicologia privada, tanto mais

resumindo tudo: o subjetivismo, que é um particularismo e portanto antiuniversalismo -- são elas mesmashistóricas, em verdade não sendo falhas nem do romance nem do romancista, mas da própria sociedade. Eis o argumento de Roberto Schwarz.

Quando Machado de Assis passada desilusão para a desilusão-da-

sintonia com a versão de Faoro:'s e em significativas aproximações com

desilusão, resolve-se o problema, no entender de Schwarz -- resolve-se em sentido literal: uma solução possível, histórica, concreta. A argumentação de Faoro, lembremos, pára nesse primeiro momento: falávamos

a interpretação

entãodo "moralismo decepcionado", que era a forma como o realismo

casualmente aparece tudo, visto de uma perspectiva histórica".t" Tudo isso, que é muito semelhante ao que faz Machado de Assis -- em perfeita de Schwarz

--, é devido

ao mencionado

reczzo.

Não estou falando que Machado é um Thackeray dos trópicos; digo que há um movimento similar em ambos (que jamais poderia ser igual, dada a posição relativa de Inglaterra e Brasil no sistema

do capital), que resulta em um realismo específico (portanto forma literária e processo social), que tem raiz em uma experiência de decepçãoe que, não obstante, é crítico e dessemodo mostra traços determinantes da vida social, daqui e de lá."' Entretanto, a ambos falta um movimento de universalizaçãomais amplo, problema este que Schwarz vai encarar na análise de Memóriaspóslzzmasde .Broa Czzóas, em seu livro de i99o, e que vimos sugerido, logo acima, no final de .,4o enredar ai óalafas.

No entendimento de Lukács, o resultado final no romancista inglês é o subjetivismo e a correlata "deformação da história, seu rebaixamento ao nível do privado e pequeno".'" Se o argumento faz sentido,

pode-se então dizer que Schwarz está, também, oferecendo uma crítica à análise lukacsiana, ao mostrar a densidade da "imagem" da sociedade

que aparece em Machado de Assis. Seu alcanceultrapassa Lukács em um aspecto central e preciso: o que Lukács não vê é que as "falhas"

seconfigurava em Machado;1'8no confronto com os grandes realistas europeus, ele permanecia deficitário. Já no entender de Schwarz, a forma se resolve de outra maneira, mas a seu modo pois trata-se de um

realismo próprio -- resolvia o problema da realidade exposta em seu movimento global. Assim, se antes afirmei que Faoro vê o que Machado não vê, vemos agora que Schwarz vê o que Machado vê.

Há mais. Em Thackeray, ensina-nos Lukács, trata-se de uma "virada para trás", visada para trás: ele vem depois de Scott e olha para o realismo do século xvm, ignorando a via do "romance histórico clás-

sico". Essa"RücÉwendu/zg"tem sabor nostálgico, embora desenganado, resultadoque é da "decepção" e resultado que dá na "sátira". Não seria essamesma nostalgia que Roberto Schwarz atribui à compreensão de Machado de Assis por Raymundo Faoro? Faoro concebea prosa machctdianacomo um imema mar de situações, anedota.s e fOTmulaÇÕes, cuJO depoimento histórico-sociológico

procura colher,

posta de parte m fTonteiTU entre obras e entre géneros. O procedimento tem

seupreço, pois marginatila o signi$cado das formas, tácito e decisivo.Por

outro lado, fcLcultaa liberdctdede circulação quepermitiu ao crítico refutar de uma vel.por todas Q opinião comum, segundo ÇLquaLMmhado teria

i74. Id., ibid., p. z47, uma vez que "casual" é acessório,supéáuo, o contrário de "necessária i75. E, sea análise de Thackeray por Lukács está em sintonia com a de Machado de Assis

pouco interessepelas coisa n«zonais, em especialpeLçlpolítica. Movendo-se

por Faoro, talvez ha)a aí indício para aquela adJetivação"dialética" da mímeiü

rLOcontínuo dos usuntos, o Livro evidencia, além da qualidade, CLenorme

i76. Caso semelhante é formulado do seguinte modo por Schwarz, ao comentar a existência

quantidade du obsewaçõesfeita pelo romancista. Evidencia- lhes também, digamos, o ânimo hütórico diferencial: u grandes mudança se lêem nos

de traços similares em Machado de Assime George band: "Assim, no plano muito abstrato em que é possível a transposição de situações européias para o Brasil [--], a semelhança dos esquemase da têmpera psicológica é um fato".('4o re/zcedorm óararas, op' cit., P. Z3o rodapé). Mas, fuso, o casoé apenassemelhante,pois, no que estamosvendo em Thackeray a semelhança é de certo processo histórico da forma, na sua relação com presente e p;ss;do;

consequentemente,da historicidade própria de formas literárias específicas. i77. Lukács, Z)er ÀÜ o ücÀenaman, op- cit.) P.Z48.

lz Desiguais porém combinados

i78. Um crítico literário, influenciado pela leitura dos livros de Faoro e Schwarz,lançou mão da 6rmula "deapnpe rea/üm": John Gledson, Z%eZ)ecepfz l,e Rea/üm aÍ J#acÀadode .4siü, na sua versão nacional

com o título .44acÀado de ,üsis.' ;mpoirura

e rea/úmo.

São Paulo:

Companhia das Letras, i99i.

73

pormenores. O que talvelse possa discutir é a perspectiva geral do email, que

fa{ da obramachadianaum painel da traí.sifão da sociedadeestamentalà

patriarcal para a sociedade burguesa, da monarquia para a república, épocacaracterizada pela "ascensão histórica de uma nova classediri-

autêntico, e ao avanço da ordem burguesa, que ele não entendia e a que teria

gente"-i;' De fato, poder-se-ia dizer que Faoro vai diretamente contra a interpretação de Astrojildo, pois a considera por demais simplificada,':: algo bastanteevidente para os leitores dos dois livros de

horror. .4 ser carreta a Leiturade Faoro, o sentido do romancede Machado

Faoro (o amplo e brilhante retrato da sociedade do Segundo Reinado,

seria elegíaco)'9

que Faoro oferece por meio de Machado de Assim,foi injustiçado

de cLmses,da ordem solidária à contratual. .4 penumbra melancólica da .acção seria devida ao recuo inapeLável do mundo antigo, qüe o escritorjuLgava

pelo enfoque deste estudo).

Estaa tomadade posiçãode Schwarzem seulivro de i99o -- embora .4p/r.ím;de e o [rap4.;a tenha sido publicado antes de .do enfadar m óaiara,

Em segundolugar, o termo "recuo", que aparecenovamentena

penade Schwarz.Ora, não fora ele mesmoquem destacarao recuo

não há referências ao primeiro neste último, de sorte que só na metade

no romance da primeira fase e indicara como tal recuo era essencial na

final é que se mostra o entendimento de Schwarz acercade Faoro.t:'

figuração do realismo em pauta? Se essapergunta faz sentido, o argu-

Observemos inicialmente dois pontos-

Em primeiro lugar, por conta de argumento apontado anteriormente, uma correia avaliação do estatuto da [rani4âo exige a sondagem con)unta de Oxdonosdopoder, pois a dinâmica desse proc'sso é bem mais complexa do que a simples passagemde um a outro, da sociedade estamental à sociedade de classes (um passo ]á citado de

Faoro tematiza o ponto). Isso seria simplificar e mesmo deformar o argumento de Faoro; na verdade, estaé a tesede Astrojildo Pereira que, em "Romancista do Segundo Reinado", afirmara que Machado

de Assis estavaem meio a uma época de transição, da sociedade

mento e desenvolvimento de Faoro, embora muito diferentes do de Schwarz, apresentam aspectos de aproximação, sobretudo no, digamos,

'resultado", o realismo específico de Machado -- embora os caminhos adorados sejam bem diferentes, o que exigiria apenas (o que não é pou-

co) que se concedesseque resultados similares atingidos por caminhos diferentes valem uma aproximação... Já no que diz respeito ao segundo livro de Schwarz e às indicações acerca dos romances da segunda fase em ..4ovencedor

óar'zzm, tudo muda de figura.

Isso posto, chegamos ao "elegíaco" como sentido geral do romance machadiano, se carreta a leitura de Faoro. O termo refere-se, creio, ao estudo de Schiller Sopre apoes;a ;/zgénz'a e sen ;menta/ (de i795):

i79- Schwarz, C/mreine naperefàna do cap;ra/ümo.'zl/grAÚdode .4ssú, OP' cit.} p- zí% rodapé-

i8o. Como mencionei, ,4o vencedorm óazarmé a versão em português da tesede doutorado de Schwarz na Universidade de Paras(i976); o texto foi composto na primeira metade dos anos i97o; embora publicado em i977, foi escrito alguns anos antes. O capítulo sobre "As idéias fora do lugar", por exemplo, ]á havia sido publicado entre nós, em i973, em E'rlzdoi Ceórap,n? 3. Na verdade, Roberto Schwarz já tomara posição frente ao livro de Faoro em i979, em prefácio a uma edição estrangeira de Qü;nc Boroa: "]-.] há pouco se publicou um [ongo livro socio]ógico [o ]ivro de Faoro] sobre as transformações do Brasil entre o Império e a República, inteiramente baseado no valor documentário destasnotações [dos elementoslocais]. A evidência que seimpõe é que Machadonão só não era desatento,como era o mais atento de nossos escritores. Todavia, impressionado pela massae pela precisão dos detalhes sociaisque encontrou, o autor do mencionado estudo os tomou como ;rlÊormafão, deixando em segundo piano a ironia que sempre os acompanha[...]. Em conseqüência, o livro documenta cabalmente a amplitude e a fidelidade do trabalho de cronista de Machado [-.]". R. Schwarz, "Duas notas sobre Machadode Assis" (i979), in Que Aormiâo?. São Paulo: Companhia dasLetras, lg87, p. i68.

]4 Desiguaisporém

combinados

Se o poeta opõe Q natureza à arte e o ideal à realidade, de nado que CL apre-

sentaçãodosprimeiros predomina e a satbfação com eles se torne sensação dominante, denomina o elegíaco. Essegénero também contém, como a sátira,

dum ctçLsses. Ou CLnatureza e o ideal são um objeto de trktela, quandose apresentcl Qruela como perdida e este como inatingível;

ou ambos são um ob-

jeto de alegria, na meada em que são representados como reais. Oprimeiro

i8i. Astrojildo

Pereira, "Romancista do Segundo Reinado" (i939), in .44acÀadade ,4siís

E/ miaie aponzamenfos avuZçai. Nova ed., Belo Horizonte: Oficina delivros, i99i, pp. l i-36 esp.pp. i5 e zi. Também Lúcia Miguel Pereira, em J?blóría da #rerafüra órmí/eira.'prosade .Écfão de l 87o a igzo- São Paulo/ Belo Horizonte: Edusp/Itatiaia, ig88 (i? ed. i95o), p. 75 passou pela mesma formulação. i8z. Cf. Faoro, -44acÃadode .4siís.' ap;rámfde e a zrapéÍia, op. cit., passam,com referência na

p.547,rodapé.

75

cmo resulta na elegia em signi$cado mab restrito, o outro no idílio em signi-

Issoindica a crítica de Schwarz ao modo como Faoro vê Machadode

$cado mais amplo)SÕ

Assim,mas não propriamente ao modo como Faoro vê a realidade, visto (pe Faoro vê o que Machado não vê. Não obstante e isto dá enorme lastro à interpretação de Faoro, pois mostra como ela se preocupa em acompanharas nuances de seu objeto --, há um momento em que Ma-

Evidentemente, não se trata de idílio, mas do elegíaco em sentido enfático. Ora, isso implica uma relação específica com a realidade; teríamos, de fato, uma leitura de Machado de Assis na qual o modo como a realidade é exposta remonta a uma perda e a sensaçãoresultante é a

chado supera a posição moralista: quando trata dos escravos. Há então,

tristeza, mais precisamente,talvez, um misto de decepção,nostalgia,

na visão do escritor, projetadct sobre o píablema senil, um processonovo na to

tristeza e resignação.is4Noutros termos, o realismo, se tingido do elemento elegíaco, assumeum sabor muito próprio, e certamente restrito,

nada de comciência da realidade. .4o seu cuidado antigo de descobrirna ação

pois a realidade não é exposta em sua plenitude, com o con)unto de suas

pação de ver, no acontecimento público, m Talões, não mais de ordem moral,

determinações históricas e concretas,como diria Lukács. Trocando em

mm onu/z(/m da organl afâo aoc;a/.[.-]

miúdos, Schwarz define o teor do realismo que Faoro detecta em Machado de Assis e sua própria análise procura mostrar que, de fato, o

Machado de .4ssb, não mostra, no fundo dm ações, o incomciente, os interes-

realismo machadiano é outro -- digamos, de modo semelhante à sua superaçãoda argumentação lukacsiana com relação a Thackeray. Com isso em mente, vale a pena conferir qual a resposta de Schwarz às interpretações que terminam no moralismo:

caril. de Cleópatrade seu louvado Pascal, para discernir uma ordem subter-

o móvel íntimo, que des$gura o fato exterior \..À, sobrepõe-se agora a preocu-

.d denzZncía, o deim

caramenro, em

sesde cause e a Longadistorção do tecido hbtórico. Hai além, na verdade, do rânea, que ete supõeorganizada segundoforçm obscuras, empenhada em se

alhear dclpresunçãohumana.Ete sabe quetudo o quese vê, na superfícieda sociedade, não pensa de falsidade e misti$cação Ignora, ou arena pressente, emancipando-se,

sem audácia,

dos moralista,

que m relações entre os homo

Daí o encanto para modernos desta maneira rLarrativa, em que os 4bsolutos

obedecema outros imperativos, talvez.falsose vãos, comoos ostemivos.En-

que ainda hoje nos vampirilam a energia e o moral aparecem reLativilados,

$m, na questão servil, o escritor não quer ser enganado pelos di.scursos e peru

referidos que estão ao fundo movediço e humano

dos arranjos pessoais. Para conceberenÕma distância ideológica tramposta

açõesfakamente generosa.ELe, gume solitariamente, vê, atrás da liberdade, o fundamentoda liberdade, usentado saLTea autonomia económica.Percebe

nesta mudança de regbno, digamos que eLa corta ou dá circuito, como um

quea libertação do escravopode ser arena.sum bom negóciopara o brancoe

repetimos que itmório

comutador, nada metrosque ao fetichismo próprio à civilização do Capital; fetichismo queisola e absolutila oschamados"valores" tarte, Moral, Ciência, .amor, Propried(de etc., e sobretudo o próprio valor econâmicoÜ, e que ao

o caminho da miséria para o preto. '4 Liberdade \..À também eta escondea sewidão. Cénicocom respeito à abolição e às alforriu, obra de M«haja

a escravidão existe, na

de .4ssis, independente dos sentimentos.' B''

separa-tos do coÜunto da vida social tanto os torna irracionais em substância,

quanto depositários, para o indivíduo, de toda a racionalidade disponíve!:

Há, pois, um passo em direção ao conhecimento da realidade tal como

uma espécie de fisco in.saciávet, a quem devemos e pagamos comcienciosa-

o conhecimentodo sociólogo e do historiador, a preocupaçãoem des-

m,en,te a, e)ci,sten,ci,q,.*''

vendar aquela realidade que só a história e a sociologia, anteriormente,

pareciam oferecer, passo que afasta Machado do moralismo. Ultrapassandoo limiar daquela visada da realidade que, presa às paixões e i83. Friedrich Schiller, "über naive und sentimentalischeDichrung", op. cit.) P- 7z8.

i84. Isso ganha força sobretudo no subcapítulointitulado "Uma camada social que se

sentimentos, faz delas derivar os acontecimentos da vida, despidos de qualquer nexo mais amplo, convertendo os destinos pessoais em simples

apaga: fim de um mundo", in Faoro, Ã4acÁadode .4siü.' a plrámz'de e o aapéÍlo, OP' cit.:

PP.383-9i. i85. Schwarz, .4o enredarw Óarafm,OP.cit., p. 59, dispensando comentários.

IG Desiguais porém combinados

i86.Faoro,]4acÃadade.4ssü.'ap;rámídee o rrapéÍio,op. cit., pp. 36i-6z

77

conseqüências das intermitências e inconseqüências da interioridade,

sociais, às ctmses

transforma-se nesseponto e aspectoo realismo machadiano,procu-

que passou e o que não chegou)sx

o humaur é aperta o expediente entre dois momentos, o

rando e revolvendo outras terras. Agora, ao que parece, os problemas não são mais formulados de maneira individualista, para retomarmos

Nesseponto, mas somente agora, talvez se possa dizer que Machado de

uma antiga formulação de Auerbach; um véu que encobria é levado

Assis é, em sentido próprio, elegíaco.i89

pelos ventos. Mas o que resta, o que aparece?

i

Restaainda a questão da forma. Se voltarmos ao passo em que se

do hi.storiador e do sociólogo. Mu a essênciaé a mesma, composta de fatali-

fala da "m;meia dialética", veremos que o estilo aparececomo resultadodo processode exposiçãoliterária da realidadena literatura Ao mesmo tempo, a realidade exposta é resultado do estilo (donde

dade, sem quea mM do homem lega a história, entidade estranha, devoradora,

uma figuração possível da fórmula "o texto como resultado"). Esse

imponente. EsseFuso

movimento seria dialético? Sem responder, prossigo. Falei na oca

Na visuatilação doproblema social, bemverdade,a naturezasetrammuta em sociedade; há um grande progressona perspectiva do moralista, agora Tirinho

da natureza à história

somente podia ser in.spirado

por quem vivesse a tragédia do escravo, a ele próximo pelo sangue, impotente para intewir no seu destino. Há, na sutil mudança de ângulo, o cal(do protesto

das lamentações inúteis, refugiada no conformismo, que se exprimem na descrição minuciosa do soflimenlo do escral,o,desum falam alegrias, onde o leitor menosgenerosopoderá vislumbrar algum retalho de sadbmo. Reside aí, nesse sentimento de impotência e na imputável avalanche que desabasobreo homem, o sen.setrágico da existência, que impregna a arte de Machado de .4ssis.~sn

Há pouco a dizer aqui; a medida exatadestetraço realista outro é difícil de medir: a percepção das forças históricas, que contudo aparecem como forças obscuras. O estudioso do século xix bem sabe que emerge aqui um fenómeno que não Ihe é estranho. No caso de Machado de Assim,

piãoda estripulia do intérprete para se furtar da forma. Agora cabe dizer: o estilo é o equivalente funcional, em Faoro (que se reporta a Auerbach), àquilo que em Schwarz significa a forma. É a dimensão analítica, concreta, na qual o processo social se cruza com a fatura literária. "0 estilo reflete e acentua o contexto social" -- e Já se viu por que, no casode Machado,é diHcil falar em "processo", no lugar de "contexto"; também já se viu o nome dessa diferença. "0 estilo tem, nessaoperação, seu papel expressivo, ao refinar ou barbarizar a forma, eixo do movimento integral de aproximação à realidade".'" Não se trata absolutamente

de elidir a distância considerável

e o peso

muito diferente da forma nos dois intérpretes, mas apenasindicar que o problema não é simplesmente deixado de lado por Faoro e

visto por Faoro, sociólogo, há uma explicação: a situação histórica concreta do escritor que, vimos desdeo início, estápreso e perdido em meio a uma situação de complexa transição. Ê esseenraizamento concreto na história que Ihe permite solucionar seu realismo próprio, como se aca-

aqui a especificidade de cada um com relação às matrizes que revolvo

bou de ver vário, criando uma figura própria não só do realismo, mas

estilo, aparece em .dp;rámíde e o [rapéi./o.

ébem definida. Prova do que digo é a contribuição de Faoro ao problema do humorismo machadiano, quando lança mão do estudo do narrador;iP:contraprova de que, a seu modo, a forma, travestida em

também do moralista, em um nexo muito particular de vínculo à tradição e resposta aõ tempo presente. Uma vez discernido o teor complexo

do moralismo machadiano,Faoro o formula pelaÚltima vez:

r88.Id.,ibid., p. 4i6. i8g. Há uma nota do Stendhal analisadopor Auerbach que reverbera em Machadode Assis: mas uma nota de som próprio e difícil de definir (ao menos para mim). O "mal-estar" e uma

O moTctListü, com sum lei.s, seus saltos e suu cabTioLa, não ercl mais possível,

como verdade e como sonho. O munxiopertence às imtituições, às estrtiturm

espéciede "resistência" com relação ao seu tempo cf. Auerbach, .44zmzei&, op. cit., pp. 4z8 e 434 aparecemtransmutados em Machado, e isso talvez ]á possaser percebido na leitura de Augusto Meyer, um dos interlocutores de Faoro. igo. Faoro, .44acÁadode ,4siü.' a/z'rámlde e o trepei;o, op cit., p. 53o.

i87.Id.,ibid.,pp.364-65 1%Desigual

pa ém combinados

i9i.Id.,ibid.,p.

438.

79

Para concluir, preciso recuperar o problema da estilização, que

Contudo, o problema da estilização é sua medida exala, pois não

já apareceu na discussão do livro de Faoro Retenho agora duas ocor-

pode haver estilização em excesso,'" sob pena de se perder o nexo com a realidade -- quando a estilização é "artificial". Ê nesse sentido que

rências da estilização em ,4o ve/zcedor m óalarm. Quando se discutiu anteriormente o obséquio impessoal, mencionou-se a estilização: "aper-

a "estilização"

feiçoava-se o obséquio pela via de sua estilização". Estilização significa,

superfície, em cores vivas, as fraquezas de sua concepção geral da vida

aqui, uma melamo@'ie da natureza mesma do obséquio, rumo a uma acomodação. Uma situação de alta tensão potencial se resolve por essa

metamorfose; como a acomodaçãoé traço geral do romance da primeira fase, a estilização torna-se um comporte,zfe (med/afãs) fundamental (estrutural) da#orma de expor;ç:ãoda rea//Jade. Em outra passagem, Schwarz volta a falar em estilização, e o sentido é o mesmo.'" O sentido de estilização em Faoro já foi melhor indicado, mas reto-

memos. Também aqui se trata de uma metamorfose, e também aqui se trata de um componente fundante do modo de exposição da realidade. Mas note-se que divirto propositalmente nos termos, agora modo, antes

forma, pois como ]á indiquei e Schwarz destacou em suatomada de posição frente ao livro de Faoro, não se trata, neste, de investigar a fundo a forma literária (no sentido de Schwarz e Lukács) e, menos ainda, a formação da forma. Isso posto, temos elementos para aquilatar melhor a proximidade

e a distância de ambos os sociólogos nesse ponto, ponto

aliás capital para a argumentação dos dois e, se meu andamento estiver correto, centro de suasinterpretações. Centro porque, em diálogo com Auerbach, estão preocupados em compreender como se apresentaa realidade na literatura, e a estilização é a mediação ou o modo como isso se concretiza -- um a converte em estilo, o outro, em forma. Em Lukács, estili49ção também é uma metamorfose e torna-se essencial no romance moderno, embora não deixe de ser um elemento proble mático da épica moderna. Seu caráter problemático está ligado à exposição

da totalidade, pois a estilização, em Lukács, parece estar relacionada a uma espécie de "representação", por meio da qual se realiza a passagem do par

ticular para o universal (o problema vale o estudo, mas não aqui).'9'

vai aparecer

na análise

de Thackeray,

pois ela "traz

à

social".'PS No Machado de Assis de Raymundo Faoro, igualmente, a estilizaçãoimpede a visada da realidade da sociedade, enquanto movimento do todo. Se essaaproximação faz sentido, é preciso reconhecer a extração lukacsiana do problema da estilização em Faoro, donde se conclui que, à diretriz auerbachiana, soma-se esta outra, ambas coexistindo em paralelo ao curso da intepretação e encontrando-se, como boasparalelas que são, no resultado final, na mímeiis dialética.i'ó Essa adjetivação, ]á ressaltada, pode ser agora melhor compreendida: com

Merleau-Ponta. Faoro reivindicada, ao que parece, uma autonomia relativa para a obra de arte, cuja justificativa é nada mais, nada menos do que a lei do desenvolvimento desigual do capitalismo.'" Ressalte-se,

i94. Id., ibid., pp. i5% 288 e 343.

i95.Id.,ibid., p. 249. ig6. Faoro cita o célebre texto de Lukács, simultâneo a Z)er ÁÚ oriçcAeRama/z,"Narrar ou descrever?"(i936), in J4acAadode .4siü.' aplrámíde e o lrapéÍlo, op- cit., p. 533,embora para uma argumentação distinta. Cf. Georg Lukács, "Erzãhlen oder Beschreiben?Zur Diskussion über Naturalismus und Formalismus", in .ScÀícÉxaZçwende. .Bez'nãlge {zze;roerneizendeün-

cÃe/z 22eoZag;e, op. cit., pp. li 5-79.E, pois, em um texto como esseque vamos encontraras formulaçõesque servem de parâmetro para o Juízodo déficit realista de Machado de Assim. P. ex.: "0 conhecimento real das forças motoras do desenvolvimento social, o espelhamento

poético amplo, carreto, profundo e imparcial de sua amação precisa aparecer na vida humana na forma do movimento [-.]". Lukács, "Erzãhlen oder Beschreiben?", op. cit., p. i33. Como seviu, falta essemovimento do todo e permanecemos nos domínios do moralismo. i97. Ver Maurice Merlau-PonW) Z,exave/zfzzres de /a dzaZecz;gue. Paria: Gallimard, i955, pp. gz-94,

onde estãoem discussãoos escritosde Lukács sobre literatura dos anos i93o. Merleau-Ponty não é mencionado em .44acÃadode ,4çiú.' a/írámzde e o aap4ü, mas em Osdonosdopoder(op. cit., pp. 897 e 822). Dois pontos a destacar,portanto: em primeiro lugar, Merleau-Ponty é citado em Or do/zosdopoder como elemento de crítica ao marxismo e justamente por ocasiãoda discus-

igz "Esta presençaob)etiva e regular do arbítrio subletivo no processo social está transcri [a nos conflitos que analisamos.E talvez sepossadizer que mais tarde, quando reduziria a vida social ao movimento caprichoso da vontade, Machado estilizada em veia também pesei mista, mas agora cómica, esta mesmaexperiência." Schwarz,.4o I'e/zcedorm parara, OP'cit.) p- i3i . Já mencionei a extração lukacsiana do "regular" i93- Lukács, Z)er ÃürorÍscÁeRoman, OP.cit.> PP. 56} 57, iz4 e iz5-

sãoda lei do desenvolvimentocombinado, em passocitado anteriormente. Donde a crítica de Faoro poderia ser rotulada sob inspiração do filósofo francês, ou seja, em uma conjugação iaí

ge/ze/üde Marx e Wd)er. Em segundolugar, temos aqui um reforço e reiteraçãodo nexo entre osdois livros, pois Faoro fundamentadaa adjetivaçãode m;meia como diabéticaem um desen-

volvimento transposto,pressuposto e cifrado indicadono outro livro. O trilho da WüsemcÃaÚb;erre sobre o qual corre a intepretação de Machado de Assis por Faoro já foi destacado.

8i 8a Desiguais porém combinados

então, que a solução de Schwarz vai em outra direção, pois a estilização

é mediaçãona forma literária, o social tornado forma.

assim,a última afirmação de Antonio Candido vale tanto para sua própria "crítica" como também para a de Faoro, que nomeia "sociológica"

Faoro. Antonio Candido, contrastivamente, demarcou do seguinte

Então, como seria possível formular a divergência? Ê que a realidade de que fala Antonio Candido radica na estrutura profunda da

modo sua posição crítica e a de Raymundo Faoro:

obra, enquanto a de Faoro, na superfície. Há portanto um reconheci-

Essa diferença nos conduz ao comentário de um outro leitor de

mento duplo da m;mesa, mas uma ênfase distinta no seu processo, por Eu acho que a crítica sociológicaé perfeitamente legítima e há obra muito

assimdizer. Em um, a "m/meia dialética" opera a estilização e cabe

disse isso e a Independência foi msim, a Independência foi afim e eLedose

ao crítico revelar o teor da estilização, aquilo que a lastreia. No caso, o moralismo. No outro, veremos depois. Voltemos então a Auerbach e Schwarz, para ressaltar algo do nexo queos une.PPO ponto é o que Auerbach denominou, em Mlmexis, ".9zi/-

aquilo. Éperfeitamente legítimo e muito esclarecedor.Não é isso queetl pí''

m&c'ízz/zg", "mistura de estilos". Não é o casode reconstituir o proble-

tendo falei,

foi sempre falar uma certa coisa e depois eü a vi muito bem formulada no

ma nos escritos de Auerbach, mas vale retomar o passo, citado anteriormente, de Zn rodzzfâoaos eirados Z;rerár/oi, em que aparece a questão(na

Lukács. O mab importante, e bso é um método diabético e não um método da

passagem,por problema de formulação, fala-se em "mistura de gêne-

sociologia académica, é ver comoé queo social na Literatura não é propriamente o social, é alguma coisa diferente, é aquela coisa que o Forsteí di{ em

ros", mas trata-se de fato de "mistura de estilos"). O realismo moderno, um resultado histórico (Auerbach refere-se ao realismo desde Balzac e

Aspectos do romance, o homo fictus é mülra d Hera/zfe do homo sapiens.

Stendhal, como já se viu), realiza-se na mistura de estilos, na dissolução

...l\ o homem queestá dentro da ficção podeparei'r demais com a vida real,

da regra da separação de estilos e na possibilidade de livre exposição dos assuntosem vários níveis, e isso resulta na possibilidade de exposiçãoda realidade como totalidade em movimento.:"

Importantes de crítica sociológica. Eu ataria, por 'templo, no Brmil, o tino le Raymundo Faoro sobreMctchado de Assim, um livro exemplar. Eu tenho

lí a sociedade,eu tenho a obra aqui e vou estudar a relaçãoentre eLa.s.Ele

isso eu chamo de paratelbmo crítico. Porque a minha ambição

mm eLejú é outra coisa, eLefoi uctraído da vida real e p'sto num sistema interno de relações. .4quito qüe era ucLerno passa a ser interno. Por isso é que

o romance é, ao mesmo tempo, tãoparecido e tão diferente da vida real.tql

Essapossibilidade, Schwarz rapidamente a apanhou. Na análise de

HeZeaa,mas sugerindo certa generalidade da questão, Schwarz aponta É conhecido o esforço de Antonio Candido em transpor a barreira da

a "diversidade estilística" que caracteriza a prosa machadiana,não

crítica sociológica" em favor da, pura e simplesmente,"crítica". Por agora, interessa-nos tanto a percepção de Antonio Candido do problema

i99. É possíve]atestar desdepeãomenos o início dos anos íg6o uma ]eitura de ]Uzmaxispor

auerbachiano da realidade exposta na literatura, tributária de uma con-

Roberto Schwarz. Ver R. Schwarz, .4 gere;a e o deican#ada, op. cit., pp. l7l-72. O assunto,

cepção, diz ele, dialética, na qu;l a realidade na obra é específica, própria da obra. e não se confunde com a realidade dada do "mundo"; como o

como não poderia deixar de ser, era o realismo. Embora esseprimeiro livro de Schwarz esteja

modo pelo qual Faoro é lido, nessaespéciede paralelismo de ficção e rea

que o problema do realismo aflora com toda a força. Nesse sentido, oferecem uma espécie de

lidade, em meio ao qual se situa a mimeiíç. O ponto é bastante sutil, pois Faoro reconhece a m/mesa, vale dizer, reconhece a transfiguração, uma

diferença-- para a qual dá inclusive nome: "estilização"

que se esta

fora da presente discussão, é permitido lembrar que ele congrega uma série de estudos em

propedêuticaà discussãodo realismo na literatura brasileira, isto é, a .4o ve/zcedor óafafm (e suacontinuação). Embora para além dos limites deste estudo, convém lembrar que o ponto de chegada da análise das .44emórfmpósfüm

de .Brú Caem por Schwarz é nada menos do

queuma "mímesehistórica"(portanto, uma resposta a um impasseno trabalho deAuerbach).

beleceentre uma e outra e que é constituinte da obra literária. Ora, se é

Ver R. Schwarz, C/m mei re naper#àrz a dp caWira/&mo...44acÀado de Hsaís, op cit., pp. zz5-z7.

ig8. "Entrevista com Antonio Candido", in Jnvesa'rações, v. 7) set. i997} pp- zo'zi; ver tam

zoo. Veja-se os precedentesde Shakespearee Cervantes em Auerbach, ]Hzmeaü,op. cit., PP 3oí ss., 336 e 338. Em Balzac temos, no entendimento de Auerbach, uma literatura na qual "são válidos todos os gêneros estilísticos e todos os níveis" e cujo escapo é o todo,

bém Antonio Candido, "Duas vezes 'A passagemdo dois ao três"' (i974/76), in V. Danças (org.), Zexros de ;lzren'então. São Paulo: Duas Cidades/34, zoo:, PP' 5''53'

8z Desigttabparém

combinados

'umaapresentaçãototal da sociedadefrancesa no século xlx". id., ibid., pp. 444-4S

83

deixando de sublinhar que se trata de "prosa realista": já aqui os leitores

Parte n

de Auerbach percebem com quem se estádialogando... Schwarz vai,

SENSODAS COALESCENCIASE SENTIMENTO DA REALIDADE

então. destacando a variedade estilística da prosa, rumo à seguinte conclusão: "0 que pensar desta diversidade?". Ela é "demonstração de força

e recurso literários", o que significa, pelo que precede, processo social medrado na forma literária. Resultado: realismo peculiar de Machado de

Assis, pensado nos termos de Auerbach. Daí ao Machado da segunda fase há apenas um passo, que Schwarz não resiste indicar: Levadamais Longee tratada em veia }tumoíística, algo como um desní/et de Pme a frwe, esta mesma diversidade ideológica e retórica será um Ingrediente essencial da prosa machacliana ulterior, em que a freqüentação alexandrino

e mercurial de todos os estilos acaba sendo o nosso único estilo

autêntico, um achadoLiterário em que a salada intelectual do país encontra seu regbtro imortal. .4 coexistêmiçtindiscriminada de maneira, toda igualmente prelado,

desde que tratadas competentemente, é tina fatalidade de

czz/lzlrasdepenc/entes gonzoa /zosia]-.].zol

Vale destacar, então, como Schwarz opera leves deslocamentos nas for-

mulaçõesde Auerbach. Em primeiro lugar, trabalha no registro estilístico do filólogo moderno, examinando a composição de frase a frase. Em segundo, a diversidade é o modo de retomar a "Sz;ZmíscÃzz/zg", mar-

cando que a possibilidade de um estilo autêntico, isto é, a peculiaridade

do realismo de Machado, deriva do processosocial; esta é a maneira como a leitura e a inspiração auerbachianasão reconvertidas no pro' blema da forma. Por fim, e como outra face do precedente, a especial cidade é relacionada ao processo do desenvolvimento como um todo (desigual e combinado), donde chegamos às "culturas dependentes" O que veio a significar

uma outra via de desenvolvimento,pois

chegamos

à mistura de estilos por desvio próprio."'

Certa vez se disse que a vida da dialética pulsa na unificação pro dutiva de momentos antagónicos. Contudo, para poder apanha-la de jeito é necessário ainda mais um passo 20i. Schwarz, 4o vencedoras óarazw, OP.cit., PP. í45'47 para o passo e as expressões que a precedem.

zoz. De modo muito sutil, Schwarzoferecesoluçãoparaum problemaradicado no âmago da empreitada auerbachiana, o problema das "forças históricas'

84 Desiguaisparém combin(dos

Coube ao último dos orientandos de Antonio Candido formular a per junta e obter a resposta que repõem o ponto de partida deste estudo: face vários mãos,durante una muy recordada visita que eLprofesoí .4ntonio Cândida ciTOCLMédico, Lepíegunté que si él votvierçt cl nacev quién queTrÍa ser. Imagino que podría elegia a un héroe socialista, o a un grau deportista Uquees et sacão de machos intetectualesÜ, o, tal ve{, penso, te gmtaría ser un Herdaguer, porque Zntonio Candido tiene también la JacuLtad de imitar CLtodo el mundo y lo hctcemuyserio, como los grandes humaristm. En $n,

capas que querría ser un cantante italiano, porque, con su vo{ roncay url tanto agónica, canta estupendamente en vários dialectos italianos, y tiene un oído püvilegiado. Es un conversadoramenísimo, divertido. Cuando habla de

aLgúnpeTson qe, lo paneQactuar, lo imita, habla comoél, imita su voR.ysus ctdemanesmás peculiares. Es como si en el incenso registro de su memorict Losseres queduen grabctdospor dualidades que tLenen que ver con la vida, son

seresvivos queestar ahí. No tos describe,sino que, cuando Lospresente, los hme actuar, siempre con esetoque de grada quees un don muyespeciat. Me respondió=" Yo eligiría ser ETich .4uerbcLch". Su respuestame sorprendió, porque en reaLidad Lomás obvio era que élpen.suta en uno de sus héroesLiterários, y Lomás imsperado a nuestra imaginación suite ser [o más obvio. Para contextuatilar su respuesta me conto que él, dejwen, conoció a un tío de ÁueTbmh, ya anciarto, quese había ido vivia atBrmil. Elpreguntó pov el grau crítico, a quien (úmiraba macho. ".4h, Erich...", le repandió êste.

SÍ, esmi sobrino." E aitadio: "Erich es un playboy. Es rico, tierLeun canvertible rojo, yse la pua conqubtando mucttachm" }

i. Jorge R. de la Serna, "EI método crítico de Antonio Cândida", in J. R. de la Serna (org.)

2]blóda e /z'ferafzzra. /fome/vagem a .4lzzo/zío Caadz'do. Campinas/São Paulo: Unicamp/Fun daçãoMemorial da América Latina, zoo3, pp. 397-g8.

87

É muito difícil ponderar a medida exala dessarevelação, não de todo inesperada para um leitor atento da obra de Antonio Candido. Se Erich Auerbach é revelado no primeiro momento, a anedota que vem a seguir dissimula a

da z: edição" da tese sobre Sílvio Romero, de lg61, o autor afirma que

confissão, como a dizer que gostaria de ser Auerbach apenaspara namorar as belas meninas no seu convertível vermelho. Assim, um movimento no qual algo de uma subjetividade se revela mas, sentindo que se expõe, desvia; e o desvio só revela mais ainda: que se trata, de fato, de algo precioso.

Farmaf'2oe em alguns dos textos que seriam logo adiante reunidos em

A questão é procurar um caminho possível. Um bom ponto de apoio pode ser encontrado nos termos do próprio autor, em um texto sobreo cururu publicado na Re üfa de 4/zrropoZog;a, em i956:

o estudo vale sua republicação por "marcar o ponto de partida das po

sjçõescríticas a que cheguei";' essasestão concretizadas sobretudo na Literatura

e sociedade e Tese e antíteses

Então, se quisermos compreender como, nos anos i94o, o autor encaminha seu problema, vale o seguinte passo do prefácio à primeira edição da tese, firmado em maio de i945: Do ponto de vista da estrutura, o presentetrabalho comportctdok aspectos: dbcussão do probLemctcrítico em SÍlvio, ou aspectopuramente metodológico, e

roam m velas que não temos dados seguíospara conhecer m raízes de um traço

estudo da função cultural queexerceu, ou mpecto propriamente histórico. Pen-

de cultura, cabe a aventura intelectual da suposição, corltanto quefundamen-

samos queos dois mpectos se completam, e que a sua junção permite falar

tada em documentos idóneos e desenvolvida segundo os princípios lógicos da

em naó.zZZo de história

disciplina

riem.zobra estética e o iegu/zdo nzzm.zobra de!!ociologj!

a que se liga o estudo. Assim, estaremos perto da verossimi]hança,

literária,

pois gaze,separador

o pr;me;ro ;/apor ar;a

(/a co/zÀec;/ze/zzo' .

que é uma forma modesta e por velas Putuosa da verdade :

Os leitores sabemque a tese cumpre o programa anunciado, ressalvando-se

Talvez seja estauma boa direção a seguir, de modo a não injustiçar o autor e suasidéias e, ao mesmo tempo, revolver com alguma maleabi. lidade aspectos menos salientes de um percurso intelectual, que foi se delineando desde a década de i94o. Pois data dessa época a conhecida

apenasque o primeiro tópico, uma "leitura interna" da obra de Sílvio Romero,alcançadesenvolvimento muito maior do que o segundo, que acabou comprimido sobretudo no capítulo Hínal e aqui há de ser lembrado que a tese,como quase sempre é o caso, foi escrita sob pressãodo prazo-'

tesede livre-docência, apresentadaem i945 e intitulada /nrrodafâoaa párodo crú;co de .çz'7v;o Romeno.' Esse estudo é a fundamentação para que Antonio Cândida possa definir mais claramente a tarefa e o desafio da

história literária que tem em mira por volta de i945 e que acabaráresultando na Formarão da Z;lerazzraór ;Ze;ra,livro publicado em 1959,mas redigido, em duas tiradas, entre i945-5i e i95j-57. Atente-se para a continuidade das datas: a Formarão da alar.z zzraórm;Ze;ra começa a ser escrita imediatamente após a conclusão da tese de livre-docência. No "Prefácio

4. Antonio Candido, O mé odo cn'ricode Sáb;o Romeno, op. cit., p. i3-

Í. Cf. Antonio Cândida, O párodocrú;code Sz'Zp;o Romeno,op. cit., pp. i3-i5. Afora isso, o autor já havia publicado .B/zkadaZ eira(São Paulo: Martins, i945), /lcFâo eco/tÜiâo(Rio

de

Janeiro:J. Olympio, i956) e O oóaemador#rercírío(São Paulo: Conselho Estadualde Cultura. [959), além de sua atividade como crítico de rodapé, na FoZ%a da .44anÃãe no Z)iárz'ode Sâa Puü/o (i943-47) e na revista Cama (i94i-44).

6.Antonio Cândida, O máfodocruzcode Sz7p;o Romeno, op. cit., p io) grifos meus. 7. "]-.] Escolhi um assunto que conhecia bem, que era Sílvio Romero, e preparei todo o material para escrever a tese, que íoi redigida em quarenta dias. Quando terminei de escrevê.

z. Antonio Cândida, "Possíveis raízes indígenas de uma dança popular", Relúra dé 2rznapoá)Wa,v. 4,

n' i, i956, p. 1,a que sesoma a formulação feliz de Gilda de Mello e Souza:"suprindo o que efta com

la, àstrês horas da madrugada, desmaieiesfalfado. [-.] Apresentei a tese, me inscrevi e fiz o concurso." Entrevista de Antonio Cândida ao Idesp(ig87), apud Heloisa Pontes, Z)eitlrzoi

aimaginação". Cf. G. Mello e Souza,Ererrúúx dé ZelMra.São Paulo; Duas Cidades, ig8o, p. ztg. Nos

múfos. Os cn'r;cosdo G/upo Cama em Sâo Pa Zo(l94o-68). São Paulo: Companhia das Letras,

termos de QKparce;rosdo .f?ó Boü o: "obter coincidênciasque assegurama validade da reconsdtui-

i998, p. 26). Cf. também "Entrevista com Antonio Cândida", Rel,üra .BrmzZe;ra de Clénc;

$o" . }-$todxa Caltüàn,

semmeüKdé ]Ma. g? ed., São Paulo; Duas Cidades/34, zoom(tesede igS4, 1?ed. ig64), p. z3.

Social, v. i6, n' 47, out. zoom,p. ZJ; Antonio Cândida, "Mário e o concurso" (i993), in Recortei.São Paulo: Companhia das Letras, i993, p. 244; e Walnice N. Galvão, "A militância

3. Republicada,em 3?ed., como Antonio Candido, O métodoc/ú;fo de S17viaRomeno.São

não-partidária", in F. Aguiar(org.),

Paulo: Edusp, ig88.

Humanitas/Fundação Perdeu Abraço, i999) pp. i8o-8i para o desenrolar do concurso.

Qs parceiros {ío Rio Boún.

Esmo

8 % Seno dw coalescêticias e sentimento da realidade

sobre o ca@ira pat !kta e a trm$ormação

os

Hnron/o Canal'da.'pe ame ro e mi# ánc;a. São Paulo:

89

O resultado foi o equacionamento de uma análise interna, via reconstrução dos postulados da crítica romeriana, acrescido de um capítulo âínal de sociologia do conhecimento, que compreende o pensamento enraizado nas

Aqui estamosno cerne do programa delineado e assentadoao final do .nsaio de abertura de -L;rerarzzrae ioc;idade, nada menos que o pro'

condições históricas especínícasde sua existência. Esseduplo movimento, na

ção" desselivro, datado de novembro de i97z,it e que, em meu enten-

tesede i945, anuncia um procedimento crítico que vai perpassar toda a tra-

der, encontra sua realização máxima na obra que ombreia a Formarão,

jetória de Antonio Candido, ganhando formulações variadas, mas acenando sempre para essasdimensões interna e externa e o nexo que as articula.' No prefácio à segunda edição da tese,em ig61, o autor defende os mimos pontos de vista que reaparecerãoem Zfreraü'ra e ioc/edMe(ig65) e que reúne textos escritos ao longo dos anos i95o e início da década de ig6o. De sorte que alguns de seustrechos parecemprovir do livro publicado em ig65 (e dedicado ao casalMana Amélia e Sérgio Buarque de Holanda), não fosseo tom algo polêmico, estanho em geral ao autor. Tal como no seguinte trecho:

grama do próprio autor,'' reiterado ao final do "Prefácio à terceira edi-

isto é, O dzicz'rsoe a c/Jade(t993)

em cujo prefácio reencontramos

aquela mesma idéia da "crítica integradora".': Como se vê, um arco amplo, da década de t94o à de i99o. Mas adianto o desenvolvimento. Em O máodo c/ú;fo de.SZh;aRomeno,

Antonio Candido sublinhava certa "visão filosófica, necessáriaao ver-

dadeirohistoriador literário":'; digamos que, matutando sobrea história literária, tateando o que um dia viria a ser a Formação da # erafzzr'z órwí/e/ra,Antonio Candido deparou-se com um problema, que não era

Poí tudo isto, a reimpressãodo presentelivro talvez.sirva para mostrara glórict

apenasaquele equacionamento de análise imanente da obra e sua posição histórica; pois a isso se acrescia uma ideia que possibilitasse a súfeie, e de

e a miséria dos dogmatismos e bater ver aosjo'vem Qen.sesobretudo rios meus

que deriva o modo de concepção, formulação, apresentação e escrita do

alunosb de qüemodo as visõesparciais do processocrítico e da rtaturela da obra

temae problema. Disso resulta que se trata, no livro publicado ao final da décadade i95o, não de uma "história da literatura brasileira", masda

Literária têm a sua função histórica e seurisco teórico. Sílvio achincalhara o que Lheparecesse"esteticbmo"; muitos doscríticos atuais repet'm Çdebocal o recurso a qualquer "falai ucterno". Em ambosos casos,posiçõesparciais, apresentada com a mesma imodéstia, deformando a inteligêmia plena do fenómeno literáúo, quese qwr integralmente apreeTüMa.Neste tido, gume no início de uma carreira,

"formação da literatura brasileira em seusmomentos decisivos" pois não me parece exagero dar alguma atenção ao título e subtítulo.'' Há uma iúleie operante na Formarão, mas não se pretende a compZerizde; é possível umponro de vã a que, trabalhando um conjunto de momentos, configura

procurei, com as limitações pessoais e os poucos.recursos do momento, sugerir uma

crítica integrativa, auperaPzdo oi reiguü;os de na lira/içmo, gelea;lida ioóreü-

> .44amen/oi decísivoi.8?ed., Belo Horizonte: Itatiaia, i997 (ITed. i959), v. i, p. x6. De acordo

viam, e mostrando as limitações do ponto de vista sociológico,então em grande

comdepoimento em 26 jun. zoom,na Fn.cu-usp, a passagemde uma crítica "sociológica: parauma crítica "integrativa" estaria indicada em seu primeiro rodapé como crítico titular do Z);.ína de São raiz/o, "Notas de crítica literária começando"(x945), republicado em

voga e ao quaLeupróprio aderira ams entes, ao começar a ncrever:' 8. Destarte, em um texto de i97z, Antonio Candido destacou o procedimento de interpretação

da obra literária do seguinte modo: "Há no estudo da obra literária um momento analítico, se

Zex/oidezhferve/zfão, op. cit.,pp. 37-44. io. Antonio Candido, "Crítica e sociologia (tentativa de esclarecimento)"

quiserem de cunho científico, que precisa deixar em suspensoproblemas relativos ao autor, ao valor, à atuação psíquica e social, a fim de reforçar uma concentração necessáriana obra coma

ii. Antonio Candido,Z,/rerafurae Saciedade, op. cit., P. 2

objeto de conhecimento; e há um momento crítico, que indaga sobre a validade da obra e sua função como síntesee proleção da experiênciahumana". Antonio Candido, "A literatura e

i993),P. 9.

a formação do homem" (i97z), in V. Dantas (org.), Zexíoxde znrerrenfão,São Paulo: Duas Cidades/34, zoom p. 8o.

g. Antonio Cândida, O métodom?icodeS#vfoRomena,op' cit.) pp. í4''5, grifo meu. O mesmo argumento aparece no "Prefácio da zl edição" da Formarão da #feraízzraaras;/eira, datado

de novembro de tg6z, no qual Antonio Cândida destacao nexo de continuidade entre a Formarãoe a tesesobre Sílvio Romero. Ver Antonio Cândida, Formaçãoda /irerarura orai;/éfra.>

ga Sensodas coatescêncime sentimento da realidade

(ig6i-65) in Zíze-

rararae iocíedade.SãoPaulo: T.A. Queiroz/Publifolha, lodo, pp. l 5-i6 (ll ed. lg65). iz. Antonio Cândida, O dücarxa e a cz'Jade.z? ed., São Paulo: Duas Cidades, i998(IT ed i3. Antonio Candido, O métodoc/ú;co de SZ7vlaRomena,op. cit., p. 2g.

i4. Em entrevista,Antonio Cândida afirmou: "Aliás, o livro deveria ter sido intitulado: Arcãdia e romantismo

momentos decisivos l\a formação do sistema !iteráúo brasileiro" . }aüo-

nio Cândida, em entrevistas cedidasa Luiz Carlos Jackson em o6 jun. 1996 e 3o set. i996 e publicadas em L. C. Jackson, .4 rracã âo esgzzecida.Os parceiros do Rio Bonito ea ioc/o/ag;a de ,4rzanjo Cândida. São Paulo/Belo Horizonte: Fapesp/UFMC, zoom, p. l75.

9t

um lodo pois são momentos decZs/vos --, que contudo não tem a pretensão

Não seria exagerado supor, portanto, um diálogo intelectual entre os ami-

da complerude. Esse ponto me parece importante e exige reflexão.:s

gosno final da décadade t94o, quando Sérgio lê e comenta alguns livros novosque vêm do exterior (ou que obteve em viagem à Europa em i949).

Vou desdobrar essaquestão em mais de um movimento. Inicialmente. vale a aventura da suposição de que isso está relacionado, em uma coalescência ou confluência muito instigante, com a filologia românica alemã de

Reníro-me especificamente a duas obras, lidas, meditadas e incorporadas

Ernst Robert Curtius e Erich Auerbach, autoresque Antonio Candido vem

por Sérgio em seus rodapés de crítica literária da época: EaropãücÃe .[;feíatur und lateinischesMittetalter \Literatura europeia e Idade Média latinas,

a conhecer na década de i94o (ou, o mais tardar, no início da década de

deErnst Robert Curtius, publicado em i948 e já referido por Sérgioem

í95o), talvez por intermédio de Sérgio Buarque de Holanda.

\ 949:qe Mimesis. DaTgesteLLte WirkLichkeit irt der abertdtândischenLiteratur,

Relembremos: no "Prefácio da i: edição" da Formarão da # eralzzra ór ;Ze;ía, Antonio

Candido afirma que

esteLivrojoipreparado e redigido entre \94S e \95t. Uma velpronto, ou gume, e

publicadoem i946 e que, em um rodapé no Z)/(ír;ode /zorü/mde 24 de julho de i949, Sérgio qualifica como "uma das obras capitais da crítica e da história literária dos nossosdias".:o No ano seguinte, ele dedica um rodapéexclusivamente ao livro de Auerbach, sendo, pelo que sei, a pri-

submetido à Leitura dos mem amigos Décio de .41meida Prado, Sérvio Buarque

meira resenha de Mzmesü no Brasil.z' Além disso, o livro aparece citado

de HoLanda e, parcialmente, outros, foi, apesar de bem recebido por etn, posto

nos C2wÚzz/o.f de #/erazzzracoZon/a/,escritos pela mesma época.z Já o livro de Curdus se tornaria uma referência fundamental para Sérgio, como sepode depreenderclaramente de p'hâo doparaZso,sua grande obra da

de [(üo algum.sanos e retomado em \ gS\, para uma revisão terminada em tgS(i, quanto ao primeiro volume, e xgS'7, quanto ao segundos'

décadade i95o Ou seja, os trabalhos no que se tornaria mais tarde a Formarão sucedem

sendotambém importante para os p(5stumosCLzpiüZoi de

üeramra coZonzaZ, escritos na maior parte, ao que parece, nos anos iPSo.u

imediatamente à conclusão da tese sobre Sílvio Romero e se estendem até i95l; a interrupção

de i95i a i955 é devida, grosso modo, à conchíião

da tese

de doutorado do autor em sociologia, defendida no Gínalde t954 e publicada, dez anos depois, com o título Os parca;ros do R/o .Bonito. Uma vez

ig. Sérgio Buarque de Holanda, "Descobrindo a infância", Z);áüo de

ü'c;m(Rio de Janeiro), i6

out. i949, citado de acordo com a republicação em O eiplHfo e a Zona..Ekflzdai de c/úlca /zlerán'a

A. Arnoni Prado(org.). SãoPaulo: CompanhiadasLetras, i996, v. z, p. i55.

concluído o doutorado, Antonio Candido retorna à Ãormafão,com vistas

zo. Sérgio Buarque de Holanda, "Simbolismo e realismo", Z)l frio de nolüim(Rio

à .. . . Ê..l:...a.

z4 ]ul. 1949, citado de acordo com a republicação em O explHzoe a ferra, op. cit., v. z, p- 127.

17

a DUa. XlllallZda.\.avB

Em depoimento recente,Antonio Candido relatou que conheceu Sérgio Buarque de Holanda em i943) mas seuscontatos tornaram-se mais

de Janeiro),

zi. Sérgio Buarque de Holanda, "Mimesis", Z)íána Carzoca,z6 nov. i95o, citado de acordo com a republicação em O esW/nroe a /eaa, op. cit., v. z, pp. z8g-93. Ver também "0 romance

burguês",Z)i.íno Canoca,z3 ago i953, citado de acordo com a republicação em O expzHzo e

fortes a partir de i944-45 (Sérgio muda-separa São Paulo em i946)."

a /eaa, op. cit., v. z, pp. 579-83.Posteriormente à conclusão desseestudo, tomei conhecimen-

l 5. O tema e problema é antigo e deita raízesna filosofia do romantismo e idealismo alemão,

to da resenhade ]141meiúpor Otto Mana Caípeaux, "Origens do realismo", publicada em Orar/za/ de i3 ]un. i948 e republicada em O. M. Carpeaux>E/falai reaaldai i946-i97i. Rio

onde osespecialistase eruditos poderão encontrar amplase matizadasformulações a respeito. Desde então, espraiou-se.

deJaneiro: Universidade/TopBooks, zoom,pp 3ii-i5 Mzmes& em "Poesia

na Bíblia",

publicado

no suplemento

Além disso, Carpeaux )á menciona Letras

e Artes do jornal

,4 J14anÁã

i6. Antonio Candido,Formaçãoda /z'erafüraórmzZelra, op cit., v. i, p. io. i7- Sobrea cronologia,ver também"EntrevistacomAntonio Candido",Relê/a .Br iZeírade Czélzcím .çacíaü,v. i6, n' 47, out. 2001,p. z6; ÃormafãodaZzrerara órm/Zezru, op. cit., v. 1, p. n;

zz.Cf. SérgioBuarquede Holanda,CkzpztüZoi deazerarzíra co/cHIa/,org. e intr. Antonio Cân-

Os parcei os do Rb Baniu, op. çxt.} p. \l; ÀiemorüÍpara

z3. Embora não se)acitado com frequência, ,Lãa do parado seria inconcebível semo en-

o Commso de P{($bssor Titdar de Teoria

emlz out. i947 e republicado em .E)na;oi rezznidasi946-i97i, op. cit., pp. zl 5-ig dida. São Paulo; Brasiliense, i99i, p. 3n-

Z,iierána e.Lírera ra Comparsa do candidato Antonio Candido de Mello e Souza(s.l.[São Paulo],

foque dos ropol, tal como concebido e desenvolvido por Curtius. Donde noto que dez anos

texto datilografado, s.d.[i974], apresentadoà FTLcn-usp), p. l.

i8. Antonio Cândida, depoimento em o6 jul. zoomna "Homenagem a Sérgio Buarque de

depois,em terras bem distantes,o livro de Curtius recebeu um tratamento magistral, na continuidade do estudo de um dos seuszopoz(cf. Sérgio Buarque de Holanda, P,Lâo doparado.

Holanda", Centro Universitário ManaAntonia, SãoPaulo.

A4oízosedé/zzcoi no desfoón mentoe coZoni' afâo do Braça/.São Paulo: Brasiliense/Publifolha,

)2 Senlsodas coaÍescênctas e sentimen o da realidade

93

>

Não é descabido supor, portanto, que Antonio Candido, ao escrever

Uma história narrativa e enttmerativa oferece apeou um conhecimentodos

a Formaçãoda //rara zzraór ;/e;ra,no final dos anosi94o) ou no curso dos anos t95o, tenha tido contato com a filologia românica de Curtius e Auerbach(sejapor meio de Sérgio,sejapor um acasode livraria ou

fenosde modo similar a um catalogo. ELa deixa a matéíicl permanecer em sua

outra contingência qualquer). Independentemente do caminho, importa

todosque"dissolvem" a matéria e tornam visíveis m sum estruturasls

confguração cuual. Entretanto, a con.sideração histórica deve abl'ir sua porta

e adentraí nessamatéricl. Deve formar métodos analíticos, isto é, a queresmé

que essa confluência é significativa para lastrear a concepção de história literária presente na Formarão e, por mais fantasiosa que seja, tem poder

Esteé o modo como Curtius compreende a possibilidade da história

explicativo e, com isso, verdade. Curtius e Auerbach, embora em mui-

literária como "totalidade" ("Gan Ãe;f"); o que Antonio Cândida rea

to divergentes, convergem precisamente no intuito de escrever história

lixa nos "momentos decisivos" é )ustamente esse "tornar perceptível as estruturas" e o mecanismo conceitual de que lança mão é a idéia de "sis temaliterário" que, já tendo sido discutido tantas vezes, deixo de lado

literária, mas rompendo com a noção de completude; por meio de um conjunto de momentos, articulados a cada vez de modo próprio, suashistórias buscam e oferecem uma totalidade, mas não a completude. E dessa maneira oferecem uma totalidade "aberta", que permite sempre novos :complementos"

nesteestudo,não sem reconhecersua importância.zóFundamental é

e "suplementos

No caso de Curtius, novos zopofe seusdesdobramentose figurações; no caso de Auerbach, as "lacunas" a que fez menção ao final de

7b41meiis e no início dos outros dois livros que publicou posteriormente. Como ]á pontuei anteriormente algo do problema referindo-me a Auer bach, vejamos destavez uma formulação de Curtius no capítulo inicial de Europãische Literatur und LateinischesMittelaLter Qomesmo tesuXtada, neste

ponto especePco,:' pode ser obtido por meio deama discussão do proble

z5.Ernst Robert Curtius, .Eizropd&cÀe Zfrera ur u d ZaelrzücÁei 4z'rre/a/rer. 31ed., Berna/Mu nique:Francke, ig6i (ll ed. i948), p. z3. Um leitor inteligente de Auerbach formulou a questãonos seguintestermos: "Para o nossocontexto é importante firmar que J16meiú apesar de todos os reparos que se Ihe possafazer em pontos específicos permanece sendo até agoraa única tentativa convincentede uma história literária que não é orientada pela língua nacional;uma história literária que põe no lugar da seriaçãousual de datas,nomes, escolas e títulos a unidade da interrogação do problema. Uma história literária, ademais, que por essas razõespode sepermitir evidenciar de modo textual, fundado e refletido a unidade dos fenómenos;ânalmente, uma história literária que contemplava seu contraste não mais em isolamentofrente à história geral, mas sim como parte dela, especialmentecomo parte da

ma em Auerbach, mas de modo mais demorado e complexo):

históriasocial". Hans-Jõrg Neuschãfer, "Sermo humilis. Oder: was wir mit Erich Auerbach vertriebenhaben", in Hans Helmut Christmann, Frank-Rutger Hausmann eManfred Briegel >

lodo(i: ed. i959). Também Zenzalz'v de mira/aF;ae .4 ccpnfnóiz4ãa na/ía/zapara ajormafâa do Brmí/ atestam a leitura e a recepçãode Curtius.

Qalgs3,Deutsche ulü õsterreicÍu Romanisten ak Het$algtedes Natianako$aíismm. 'Tq3kÀngen:

z4. Em momento algum pretendo aplainar as diferenças substanciais entre os dois filólogos-roma-

umahistória literária ordenada cronologicamente; a matéria é ordenada segundo os proble-

Stauffenburg,ig8g, p. gr. ResenhandoCurtius, Auerbach aârmou; "0 livro não é algo como

nisras;para tanto, bastaremontar à resenhade Z]leramra ezzrapéz'a e/jade ]l/e'dza ;anlzapor Auer-

mas [-.]."

bach, republicada

iMzríe/a/rer(iPSo), op. cit., p. 333- Sobre Curtius e a totalidade ver Dirk Hoeges, Koarro erre

em Gesamme/fe 4zÓãr e {wr rama/ziscÁe/z PÁiZoZ9W'e.Berna/Munique:

Francke,

Erich

Auerbach,

resenha de E. R. Curtius,

.EbropãúcÀe Zlleralar

zz/zd/a e;rlücÀei

ig67, pp. 33o-38, assim como sua diferenciação diante de Curtius, explícita em "Epijegomena zu

am 4óym/zd'Errar RoóerrCuram und.Kar/.44an/zÀeím. Frankfurt; Fischer, i994, cap. 3.

]Mzmeia", RammíscÁeFarxcÁ gen, v. 65, n': l-z, i953, e em "Philologie der Welditeratur"(i95z)l

z6.Talvez sepossadizer algo semelhantecom relação aos C2píhZoi de Zzera ura co/a/zza/deSérvio

tambémrepublicadoem Geiamme/ce 4z#dqe ur rama/zÚcÁen PÁf/a/arie,op' cit., PP-3o:':o;

Buarque,ao menos tal como Antonio Candido os compreende: "Nesse trabalho, fica patente o já

implícita

referido sensodas coalescências,que dissolve as divisões de períodos e restaura o movimento da

em }?er ZJn er= cÁmge/z Wr GacÁzcÃre derfmÍõ'sücÀen

B;/2&mg. Berna:

Francke, í95b

?p. 1-w , e em Literatursprmhe tLndPublikum in der lateinischn Spiitmtike und im Mittelabeí. Bet-

tradição, fmendo ver o jogo indissolúvel da semelhança e da diferença como peculiar ao processo

na: Francke, i958, pp. g-z4; assim como a resenhade .44zmeiüpor Curtius, "Die Lebre von den

históricodasliteraturas, como instrumento medianteo qual o crítico deverácaracterizarcada

drei Sti[en in A[tertum und Mitte]a]ter(zu Auerbachs ]Mzmoais)", in

autor, no que possui de próprio e comum"("Introdução",

om ücÁeFaísca Feri,v. 64,

i95z, pp- 57-7o. Como se sabe, a tensão aflorou publicamente em um seminário de Princeton; cf.

in Sérgio Buarque de Holanda, Capí-

ízlãude #feramra caZanzaZ! op- cit., p. 23). Em meu entender, tal âormulaçao inscreve-se no progra-

Robert Fitzgerald, E/i/argíng Áe CBmge.-Z%ePnwero/zgemi'Fiar:úzZ,z'terão'Cnriciçmi949':95i'

made-tzteramra ezzrapéía eJiáde ]1déZaZalzm(o livro é citado por Sérvio Buarque; ver CapúzzZai

Boston: Northeastern University Press, ig85.

deZzreraMra coZanfd.op- cit., pp. 3i5 e 3ig). Antonio Cândida, na mesmapágina, mencionao >

94 Senso dm coatucênciu

e sentimento cla realidade

95

sublinhar que nessasobras se abole a perspectiva classificatória dos manuais e das histórias literárias, em favor de uma outra história literária,

acentuada"2'), contrabalança-a com autores ingleses, italianos, norte. americanose alemães.:;Todavia, no que diz respeito aos problemas da

or/enfadapor zzmproóZema, a partir do qual seestrutura. Nessecontexto, podemos ver como Antonio Candido, embora formado sobretudo na tradição francesa ("minha formação francesa muito

"hjstória literária", creio que conclui sobretudo com os alemães.Sobre isso,cabeum depoimento de alguém muito próximo ao autor, Décio de Almeida Prado, um daqueles leitores, Junto com Sérgío Buarque de Holanda, da primeira versão da Ãormafâo:

>

sistemade tópicos" detectadoe operado por Sérvio na análiseda literatura colonial, em plena consonânciacom a pesquisade Curdus. Uma vez levantadaessaquestão,e na impossibilidade de desdobra-laadequadamente,cabeindicar ao menosalguma diretriz, dada a discussãosobre o estatuto da história na tópica de Curtius e seu sentido em Sérvio Buarque. Embora fde em ÁúloúcÃe 7bp;É","com a pesquisade iopoi Curtius pretendeindicar em última instância cons-

Á cultura germânica, de resto,parecia j;].sciná-Lo, não medos, entre M estran Beiras, do que a francesa, cl inglesa e a italiana.

Foi eLe que me pTopâs ter

aulas de alemão, em companhia de Ruy Coelho e Lítio Xavier \.. À. .4ntonio Cândida era o que maisfaltava e o único que aprendeu alguma coisa \.. 4 zs

tantes da literatura, essencialidades idênticas a si mesmas"(Oito Põggeler, "Dichtungstheorie und Topos6orschung", in Max L. Baeumer(org.), 7ZpaqÉorscÁung. Darmstadt: WissenschaHiche

> de Durão e o tópico do /acm amoenm, estudado por Curtius". Ver, respectivamente,An-

Buchgesellschaft,i973, p. izz), de sorte que essatópica histórica se caracterizaria por um' '-historicidade de raiz, contradição que os críticos de Curtius já realçaram com nitidez(ver H ans-Ulrich

tonio Cândida, "Entre pastores" (igS8), in Brigada /@ezra e oa roi esta'los.z: ed. aum., São

Gumbrecht,

Paulo: Atiça,

Hom Zeóe/z zz/zdSleróen der gro$se/z oma/züfen. Munique: C. Hanser, zoom, e Peter

Jehn, "Ernst Robert Curtius: Topos6orschung als RestauradonÍstatt eles Vorwortsl", in P. Jehn (org.),

7Zpo ÉorscÁzzngEhe Z)oÉlmerzlaZlon. Frankhrt:

Athenãum,

i97z, pp' vn'Lxiv).

O mesmo

já não deveria ser dito, creio, com relação a Sérgto Buarque de Holanda, donde se coloca a ques-

Paulo: Unesp, i99z> pp. izg-35) p. ex. p. i33) e Antonio Candido, .Aravazade aüZa.8?ed., São lodo,

p. 33; o topos foi indicado

por E. R. Curtius

em .EurapàúcÁe -Lzrerafzrr

u d /afeüücÃei]141rn/a/rer, op. cit., pp. 459 e 94) e Antonio Cândida, "Os ultramarinos' (i99z), in //Hn'osficarás. 31ed. rev. e ampl., SãoPaulo;Duas Cidades, t99i) pp. zzz-z3, zz5z6 e "Literatura

de dois gumes"

(ig66),

in J ed cafâopeZa noz' e & ozznoi e

aios. 3: ed., São

tão do seu entendimento e(re)formulação da tópica de Curdus. Tanto em }'bâo doparaúo coma

Paulo:Anca, lodo, pp i77-78; AnLonio Candido, " Estrutura literária e função histórica

nos Capúuhs, o problema seria perceber um processo eminentemente histórico, que se deixada

(ig6i), in -Lz'reraüzrae iocndade, op. cit., pp. i6o-6i, remetendo a E. R. Curtius, ElzropdÜcÁe üteíattir ttnd !ate bckes Uitteíatter, OQ.(R., cap- ia.

compreender por meio das figurações e transformações dos lopaf. No que tange aos C@z /m de #feraâ«racoZonfa/,dado o caráter inacabado e póstumo do livro, parece'me difícil ir além das afirmações da introdução de Antonio Cândida, reproduzidas acima. No que diz respeito a anão. daparado, Luiz Costa Lama indicou a proximidade e a diferença diante de Curtius, precisamente na concepção de história(cf.

L. C. Lima, "Sério

Buarque de Holanda:

,bâo do parado", Re-

z7-Antonio Cândida, "Entrevista com Antonio Candido", ]nveilzkações, v. 7, set. í997, p. íz. z8.Sobreo contrabalançoda influência francesa ver Antonio Cândida, "Um verão, em Berlim"(ig8z), in Recaríes,op. cit., p. zz7. Sobrea importância dasinHuênciasfrancesasna cultura brasileira,ver Antonio Cândida, "0 francês: instrumento de desenvolvimento". in Antonio

l,úfa usp, n? 53,mar.-maio zoom,pp. 43-53),assentandoo assuntosobre basesseguras.Por fim,

Calçado

cabe destacar que Dirk Hoeges, em seu instigante livro sobre Curtius e Mannheim, afirmou que

Hemus, i977) pp g'i7- Em várias entrevistas, Antonio Candido relata a importância da presen ça francesa,mas sempre contrabalançada por outras, em seu mundo de cultura. Decerto vem

Europãkche liuraur

und lateinischesMittelalur

ê a tesQostx a Ideologia und Utopia. \- X O con-

et aiii,

O #altcês

imtrümentd:

a experiênúa

na Universidade

de São Pavio.

Sào PauXo=

ceito de lapasde Curdus éabsorvido em sua função no quadro de suacontraposição a Mannheiin,

daí sua imunidade a surtos e modas, que Ihe garantiu uma sobriedade e densidade intelectual

nem mais nem menos. SÓquem não conhece essecontexto pode procurar em Curtius um conceito

ímpares,subtraindo-se às mais variadas ideologias francesas que circularam e colonizaram por

de íopai sustentável 61ologicamente"(D. Hoeges, Kanaaverseam .4Ógm'd.. E/n.sf Raóen Gado

aquiao longo de sua trajetória crítica. Cf. p. ex. Antonio Cândida em entrevista a Décio de

md .Kar/.A42zmÁeíoz, op cit., pp. z33 e z4z) Se assim é, abre-se um flanco a pesquisar, qual seja,

Almeida Prado in ManOiaMartins e Paulo Roberto Abrantes(orgs.), 3 Hrzfo/zzba & ilaó;m. Rio

pensar quem é esseSérgio Buarque, revisor da tópica de Curtius 'zd mum Áiíronw

deJaneiro:ResumeDumará, i993, p. 97-Uma meravista d 'olhos na biblioteca deAntonio Cân-

há aqui nada

menos do que uma solução brasileira para um impasseda mologia românica européia(sem fHu

dida, parcialmente depositada na Biblioteca da Fn.cn-usp, assim como na biblioteca de seu pai,

na questãoda possibilidade de aproximação com os desenvolvimentos mannheimianos) E )áque

depositadana Unicamp, permite facilmente aquilatar a variedade de suasleituras e idiomas.

entrei no assunto,uma última observação:também Antonio Cândida deu atenção,semp'e que ne-

Z9' Décio de Almeida Prado, "0 Clima de uma época", in F. Aguçar (org.), .4Pzronza Can

cessário,às questõesda tópica, como sepode ver claramente em suas referências ao paposda "aérea mec&ocnlm"na poesia arcádica e à tópica como um procedimento literário ítmdamental para vin-

dada.'pemame/zro e ml#ránfza, op. cit., p. 35 O ponto marca uma diferença significativa não apenasdiante de Sílvio Romero, influenciado pelos alemãesem via indireta, como destacou

cular "os poetasde Minas, de maneira orgânica, ao universo cultural do Ocidente europeu"' Ou,

o próprio Antonio Cândida em O méfadocn2lcade Sz7vz'a Romeno,op- cit., p. 3t, mas tam

ainda, ao estudar o Caramz'm,afirmar que "convém estabeleceralgumas correlaçõesente atécnica >

bém em seu próprio ambiente intelectual, como destacou, em tom de anedota, Bento Prado >

g6 SerLsodu coalescência e sentimento da realidade

97

No mesmo passo, Décio destaca o interesse de Antonio Cândida pelo romantismo alemão, que, como se sabe, está na raiz da filologia romã- l

nica alemã. Já se disse que parte da originalidade de Raqei do..Brm;/ é tributário das leituras germânicas de Sérgio Buarque de Holanda.seAlgo similar, czzm

gra/zoiaaf, sepoderia arriscar dizer com relação à Formaçãoda #leraüra ór ;/eira, e o mesmo Sérgio Buarque de Holanda não seria aqui a figura

a monografia de Curtius sobre Joyce, publicada em igzg. E, se levarmos emconta as instigantes formulações do próprio Antonio Candido, ao suge rk o estudo da biblioteca como elemento da formação do espírito "estu.

dar a formação de uma cultura pessoalpor meio da biblioteca" --, não seria totalmente descabida a suposição do diálogo entre Sérgio e o autor da Formarão.Aliás, a circulação de livros e idéias, que indico, nada mais é do que o programa formulado por Antonio Candido, "o aproveitamento

de menor importância, como entusiastade Curtius e Auerbach, leitor dos

possíveldascoleçõesindividuais para investigar nossahistória mental".3z

rascunhos da Formação e interlocutor privilegiado de Antonio Cândida. O

Uma outra face dessamesma questão pode ser vislumbrada nas revistas

resultado é que algo da nílologia românica alemã, mesmo que apenaso

colecionadaspelo crítico, tal como relatou em entrevista, pois no rol das

espírito e não a letra, viu-se dentro da historiografia literária brasileira. Há elementos concretos que podem basear essahipótese, tais como a

revistaspor ele assinadas pontuam a Parfüan .Rev;ewe a KenWO/z .Rev;ew, quepublicaram, entre i95o e 1952, alguns capítulos de Mzmeiiç (anunciando a publicação da tradução integral do livro em i953)."

leitura e o impacto de Curtius e Auerbach em Sérgio Buarque de Holanda; o fato deste ter lido e opinado sobre a primeira versão da Formarão; ter escrito em seusrodapés de crítica literária acercade Curtius e Auerbach e,

Afirmando a presença e "influência";'

da filologia românica alemã

na história literária de Antonio Candido, compreendo que sua própria

por fim, ter intercambiadoliteraturae referênciascom Antonio Cândida a ponto de, quando abandona sua atividade como crítico regular de literatura, ter presenteado o amigo com parte de sua biblioteca sobre o assunto." Vale lembrar, então, que, na doação que Antonio Candido está fazendo de

3z. Antonio Cândida, "0 recado dos livros" (ig8g), in Redor el, op. cit., pp. n8 e zn res-

pectivamente.Observo que, independentementedo modo como se deu o conhecimento dosalemãespor parte de Antonio Cândida, há uma aproximação signiâcativa: não sugiro

sua biblioteca pessoal para a Biblioteca da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, podemos encontrar

uma dependência, um uso hierarquicamente subordinativo, mas uma aproximação densa e

livros que vieram da Alemanha com Sérglo Buarque -- como, por exemplo,

viu-se forçado a recorrer à literatura e surrupiou-lhe

substantiva, não necessariamente causal. Um sociólogo de nomeada, tateando algo similar, a expressão maÁ/vemandacÁaÓ.

33' Ver Antonio Cândida, "Os vários mundos de um humanista" (entrevista), Cz'éncz a .f?#e,

v.i6,n?gr,]un.1993,p.38. > Jr., referindo-se a um comentário de Cruz Costa, em "Cruz Costa e a história das idéias no Brasil". in R. Moraes, R. Antunes.e V. B. Ferrante (orgs.), /nze/@êncíaórml/e;ra. Sãa

}4' Para evitar mal-entendidoscom essetermo, um rodapé sobre o assunto; aqui valem as

Paulo: Brasiliense, lg86, p. ít3. Segundo me disse Líbia Chiappini(em conversa, oz jan

(SãoPaulo: Humanitas, zoom,pp. g6 ss.;texto de r99o). A questão aparece inúmeras vezes na obrado crítico. Já desde o início da Ãarmafão da /zreraluraór«sz'Zebra, seu autor manifestou uma

zoom),Antonio Candido dizia a seusalunos que foi estudar alemão nos anos l94o pa'a ler Auerbach; a mesma história me foi recontada por Heloisa Pontes, ano e meio depois, quan-

formulações acerca desse problema por Antonio Candido no final de O rama/zzíçmorzo Brmz/

compreensãoexcepcionalmente madura e matizada da questão da inHuência, compreendendo

do disse que Antonio Cândida [he fadou que [eu ]141n'zeiü junto com a professora de alemão,

a multiplicidade de direções e intensidades do fenómeno, assim como as artnadilhas do que é

e depois releu-o na tradução norte-americana. Como a edição norte-americana é de i953

evidentee do que, embora presente, não se revela. Ademais, pode "ser de tal modo incorporada

(.4/imeiís. 7Ae Represenraffo/z af Rea/fZy ilz IHesrern Zfrerarure. Princeton:

Princeton

Univer-

sity Press, i953),'isso indica que ele deve ter lido it/ímes&, em alemão, antes dessa data. 3o. Indico apenas o próprio Antonio Cândida, "Sérgio em Berlim e depois" (ig8z), in }'anãs ea(irai, op- cit., pp. 3z3-35, e "Raízes do Brasil"(ig67),

e Terra, ig8o, pp. i34-5Z.

àestrutura que adquire um significado orgânico e perde o caráter de empréstimo"(cf. Ãor«lafãa

daZzíeramra órmz'leira,op. cit., v. i, pp. 36-37). Ta] incorporação foi, anosdepois, retomadana

in Terei;na erc. Rio de Janeiro; Paz

.

3i. Ver Antonio Candido, "Sérgio em Berlim e depois"} op. cit., e "Um verão, em Berlim (lg8z), in Recortes,op. cit.) PP.zz7'3i' Quem informa da doação de Sérgio é o prõpno

estudosobre os primeiros baudelairianos, quando destacou "uma certa deformação, como as

que em toda inHuêncialiterária tornam o objeto cultural ajustado às necessidades e característicasdo grupo que o recebee aproveita"(Antonio Cândida, "Os primeiros baudelairianos [i973], in Z educação pe/a noz're ê ozzrros e

amai, op- cit., pp. z4-z5). O decisivo

é essa idéia de

uma deformação, que implica adaptação às necessidadesem pauta; não se reproduz nem se co-

Antonio Candido(na "Introdução" a Sérvio Buarquede Holanda, Ck2púu/as de#ferarüra

pia, masdeforma-se para um caso concreto específico, com suas necessidadespróprias. Isso fm

co/on;a/,op. cit., P. lo).

da influência não algo mecânico, mas algo elaborado intelectualmente, dzgenda

g% Servo du coaLescêrtcia e sentimento da realidade

99

obra está inscrita naquela "dialética do localismo e do cosmopolitismo" )

exatamenteo mesmo que Curtius pretende indicar em seu estudo. Ora,

que constitui como que "uma lei de evolução de nossa vida espiritual".3s

nãoestou afirmando que Antonio Candido conhecia essetexto de Curtius

Para evidenciar, pela última vez, o problema em foco, um modo

trução da noção é decerto divergente.s9 Apenas destaco que encontramos

à publicação de .Eu/opàücÃeZ;zerafEzrzzadZaleüiçcÃesMlf eZaZ/er,intitulado

precisamenteuma resposta à pergunta "como escrever história literária?"

Retórica antiga e literatura comparada".x Nessetexto, Curtius lança mão

O problema vale a reflexão." O fato é que Antonio Candido escreve uma história da literatura nacional abdicando da completude, exatamenteaquilo que a filologia românica alemã tinha acabado de realizar.

da idéia de "sistema literário" ("Z/lera zzrsWT/em"), em um sentido que, se não se confunde com o sentido que Ihe dá Antonio Candido, não deixa de

).

i.L !.L

d tomou de]e a idéia de sistema literário, inclusive porque o modo de cons-

e possibilidade de escrever história literária, destaco um outro texto de Ernst Robert Curtius, escrito em i949, portanto imediatamente posterior

possuir um traço essencial em comum: sistema literário implica, para Curtius, a capacidade de uma literatura nacional interpretar-se a si mesma.Esse mesmo aspecto estaria contido na concepção de sistema de Antonio Cândida, decerto por outros caminhos, naturalmente tendo em vista o sistema

em ambos os autores uma saída similar para um problema similar, que é

contudo para além do ânabito das literaturas nacionais. Nesse aspecto, a

novidade do crítico brasileiro é realizar, nos limites da história literária nacional, a conquista que havia se realizado em uma história literária que deixara para trás os limites das literaturas

nacionais.

consolidado, e não propriamente seusmomentos decisivos de formação.

Tendo isso em vista, quero indicar uma contraprova e uma outra

Mas, ao lermos seu "resumo para principiantes" sobre a literatura brasileira, percebemos bem que o "sistema literário consolidado", título do terceiro e último capítulo do resumo,3' pode ser compreendido de modo similar

dimensãodo problema, agora de maneira ainda mais esquemática.Em primeiro lugar, nossashistórias literárias escritasaté a Âormafâopartilhavamda concepçãoda totalidade que é completude. Isso vale para todas

(mas não igual) à idéia homónima de Curtius basta ver o casoexemplar de Machado de Assis, que segundo Antonio Candido "teve noção exata

ashistórias de nossaliteratura (Sílvio Romero, José Veríssimo, Ronald de

do processo literário brasileiro" e representa "um certificado de maioridade da literatura brasileira através da consciência crítica".38 Esse traço é

to de histórias de outras literaturas nacionais, que Antonio Candido utili-

Carvalho,SoaresAmora etc.), assimcomo vale também para um conjunzouna feitura da Formar.2o.Uma olhadela nas histórias literárias citadas na Formação da Literatura bruiLeircl e em O método cHtico de Sílvio Romero

permite aquilatar bem o ponto: são histórias que começam com o início 35. Antonio Cândida, "Literatura e cultura de ígoo a í945 (panorama para estrangeiros)" (i95o), in Z,írerarlzra e sociedade, op. cit., p. ioi. Note-se que, tratando-se de um texto si-

multâneo à Formação,repete esseoi írzafoda crítica de Antonio Cândida. Ver Formaçãoda aferafzzra órwfZa/ra, op. cit. passam, p. ex- v. i, p. z3.

36. Ernst Robert Curtius, "Antike Rhetorik und vergleichende Literaturwissenschaft" (i949)) in Geiamme/fe.4z!#=dlÍe ür romanücÃen PÁz/o/ayze.Berna: Francke, ig6q pp. 5'zz' O texto foi

deuma determinada literatura nacional e terminam no presente; quando literaturas do passado (como a grega), terminam com o "Glm" da civilizaçãoem questão (o que seria o equivalente funcional da literatura nacional). Escreverhistória literária implica essaconcepção específica de totalidade que vai do começo ao fim (quando muito, o Gim é o presente). Em face

publicado originalmente no número inaugural de Comparar;ve.Z,frerarure(v.i, n? 1, Winter i949), que continha ainda uma resenhade i14zmesú por Ulrich Leo e a resenhapor Auerbach de .L;nglzünci aad-LlferaO' /Jbro7, de Leo Spitzer. 37. Antonio

Cândida, /nfclafâo .i /f erarura óraf/eira(resuma para pn/zcÜ'z'abres).31 ed., São

> nãosó a produção dos textos literários, mas como, ao lado da criação dos textos literários.

Paulo: Humanitas, i999(texto de íg87).

osbrasileiros pensavam no significado histórico dessaelaboração. Pensandonisso, eles pen cavamo seupaís". Antonio Candido, em entrevista a L. C. Jackson, op. cit., p. t7i-

38. Antonio Candido, /nzcfafâo à /i'ferarura órml/eira, op cit., p. 55-Chamo a atenção para a

39' Valeria aqui o mesmo que o autor indicou em outro contexto? "Eu cheguei à conclusão

fato de que essaidéia já estálatente na tesede i945, nas mençõesfeitas a Machado de Assim

parecidapor uma via puramenteempírica,como é de meu feitio-." Antonio Cândida.em

(cf. Antonio Candido, O mé odo crúico de S#i,zo nomeia, op- cit., pp- z8 e 34-35 e, evidente-

mente, na Ãormafâc,da /z'reraruraór«;l/eira). O problema encontra formulação tambémem entrevistas do autor, como, por exemplo, na seguinte passagem,acerca da Formarão: "Ê de certa maneira um capítulo da formação do pensamentobrasileiro no terreno da literarur% >

\ oo Seno dw coaíescêncim e sentimento da realidade

entrevistascedidasa Luiz Carlos Jackson, op. cit., p- i6i. 4o. Cf. Hans Robert Jauss,"Literaturgeschichte als Provokation der Literaturwissenchaft" in Z;íerarizrgeicÀfcÁze a6 Prava4afz a/z. Frankfurt:

Suhrkamp,

i974) pp i44-zo7

quem seja

permitido anotar, teria ganho muito seconhecessea Xormafâo da #rera ura oral/eira.

101

disso, a Formarão da // era zzraórmiZe;raé completamente diferente. Esta-

Em segundo lugar, há a dimensão institucional. Por um lado, crí-

mos aqui, nos termos citados de Curtius, na diferença entre as histórias

tica e história literária procuram seu lugar, que não está dado nem pela

literárias que são como catálogos e as que adentram na matéria e desvelam

suasestruturas.'' Isso foi muito bem percebido por Roberto Schwarz,ao

estéticanem pela sociologia, mas na sua integração; donde a idéia, desde O párodo crú;co de .S/h/o Romeno, da mencionada "crítica integrativa

afirmar que "a formação da literatura brasileira é identificada como uma

O programa teórico'5 é também programa institucional, com o intuito

estrutura histórica", indicando o rumo de uma concepçãode totalidade/

depoder definir o lugar do crítico

unidade presente: "0 essencialé descrever sua articulação interna, ou seja, a complementaridade funcional dos momentos e a regra de seu movimento, além do sistema de paradoxos e de ilusões que Ihe corresponde" ': Vale lembrar como o próprio autor tinha tudo isso em mente, pois no "Prefácio da i? edição" da Ãormafâo (nírmado em agosto de t957) relatou a encomenda inicial "uma história da literatura brasileira, das origens aos nossos dias"

que é professor universitário

e de

seu pensamento. Não por acaso a tese de 1945 foi republicada, em ig63, como o primeiro "Boletim de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da usp, área sob a responsa-

bilidade do professor Antonio Candido desde ig61." Há, nesteponto, um paralelo instrutivo com a situação de Gustave Lanson,um historiador da literatura que marcou Antonio Candido." Na França,

e o resultado tardio, "obra de natureza diversa".'s Essadife-

rença de plano e realização teve como conseqüência« redimensionar e solu-

desde o desaparecimento de Talhe e Renal, a crítica renunciou a con.struir uma

cionar problemas armados em mais de um século de esforços no campo da

filosofa geral e pareciafechar-senos domínios da literatura e da arte. Por isso:

história literária, não só brasileira. A feição mais espetacular da formação está distante das histórias tidas até então: Antonio Cândida estuda seus predeces-

mínios, seja para tirar u comeqüén.daspotíticm e sociais de sum idéim, seja

sores, testa as suas interpretações,

para expor a metafLica implícita: o quetornava temível a origemsubjetiva de

racionaliza os seus procedimentos,

gume todos os que a praticavam ultrap

mas é

saram, certo dh,

os Limites dessesdo

certo que a modificação que no seu livro desloca todo o resto é a concepção

se«sjulgamentos.Por outro L.üo, outros criaram uma nova dbciplina, a Hütó

da zozaZldade gaze/zâoá co/npZemde. Noutras palavras, Antonio Cândida cultivava ao mesmo tempo uma tradição estreita, na qual a experiência histórica local havia se sedimentado, sem prejuízo de cultivar possibilidades mais

rü da LitercLtura,que reclamava para si o espírito cient$co e almejava a objeti

amplas, bem como o sentimento atualista, que comandava a combinação.

cidade; eta viria a dominar rapidamente na Universidade \-l\4s

45.De modo muito próprio e original, Antonio Candido respondiaa um desafioformulado por Georg Lukács em leio: "A sínteseda história literária em uma unidade nova e orgânica

4i. Comentandoum escrito de Sérgio Buarquede Holanda, Antonio Candido chamaa atenção para uma maneira mais tradicional de conceber e escrever história literária, em contraste com uma maneira mais"independente". Tal distinção é feita no espírito do passa citado de Curtius (cf. Antonio Candido, "Introdução" a Sérvio Buarque de Holanda, Capa: rü/ai de aferaiura co/ama/, op. cit., pp. i3-i4 e l6). 4z. Roberto Schwarz, "Os sete fôlegos de um livro", in Segiiélzcí óra.siZelras. São Paulo: Companhia das Letras, i999, p. 5o. Roberto formulou o mesmo problema em termos bas-

é uma unificação de sociologia e estética. A estética procura apenas o que há de constante naquelesfenómenos que cuidamos denominar literários; a sociologia apenasa descriçãode suastransformações e suascausas.A história literária vê-se defronte à tarefa paradoxal de uniâcar essesdois aspectos:ela deve procurar o que há de constante no que setransforma e rastrearno que se transforma o que é constante. Portanto, sua tarefa é encontrar as possi bilidades de desenvolvimento, caminhos e tendências das formas esboçadasem abstrações estéticase, ao mesmo tempo, encontrar, na teia densa das obras literárias singulares(e seus

tante próximos aosde Curtius: a Formaçãoda arerarlzraór«si/e;ra "trouxe a uma disciplina comparativamente atrasadae enumerativa como a história das literaturas nacionais a preo'

efeitos), asconstantes,asregularidades e aquilo que retorna". Georg Lukács, "Zur Theorie

cupação com a unidade substancial e articulação interna do objeto, que asciências sociais mais elaboradasentão cultivavam". R. Schwarz,"Antonio Candido(um verbete)", Re ü a

46. Cf. Antonio Candido, O múodo crú/code Sz'Zvü./?onera,op. cit., p. 8

usp,n?i7,i993,p-i78.

derLiteraturgeschichte",Zext + J(na't, v. 39/4o, i973, p. z4. 47 Cf. Antonio Cândida, "A literatura e a universidade(n)", Z)zánbde SâoPnüZa,20 Jun. x946 citado de acordo com a republicação em Z;terafura e sociedade,n? 5, logo) p- 241.

43.Antonio Candido,Formarãoda /írerarüraór ;/eira,OP.cit.) v. i, P' 'z'

4g. Gus\axe Lanson, Hiscoire de !a !ittérature $altçaise. Remaniée e! compíétéetour h période

44 No que segue, até o final do parágrafo, parafraseio, torcendo os protagonistas, R. Schwarz,

i85o-r95o/ar E 7}e#iazz.Paras:Hachette, ig68 (ll ed. 1894, mas o passocitado é de autoria

"Sobre a Formarãoda /íreraruraórafí/eira", in Següénc; ór z'/eira,op cit., PP-z''::-

de

l 02 Sen.se dm coalescência.s e sentimento da realidade

Tuffrau),

p.

1 1 86.

io3

sobretudo a Nouvelle Sorbonne. Por isso, encontramos em Lanson UU

trabalho em história literária que se vê incessantementecobrado eu sua cientificidade. A história de Lanson não é ciência, mas faz o possível para responder às exigênciasdesta. Ela não é ciência (segundo os critérios de seumeio e momento histórico) por um motivo central: a fundamentaçãoda história literária na França, na pena de Lanson, reivindica um amálgama de julgamento estético e espírito científico. A preservação do juízo de valor estético é fundamental para Lanson, e é

seu rodapé inaugural como crítico titular da Ão/3a da ManÁâ, Antonio Cândida recusa a transformação da crítica em ciências'). Mas ele difere deLanson no estatuto que vai dar à história literária. Este escreve a sua /?hlo;re de Za #rzárarzzre fanfaàe almeJando a completude e totalidade, mesmo que ao custo de toda uma vida de estudos.szJá Antonio Candido renuncia à completude: sua história detém-se nos "momentos decisi-

vos", que é justamenteo ponto de encontro com aquelaconcepçãode

A tarefa e

história literária da filologia românica alemã. O movimento aqui indicado apresenta uma similaridade interessante

o desafio da história literária são unir essasduas pontas. Para esseandamento, cabe reter de Lanson a ideia de uma história

com o que podemos divisar na tese sobre Sílvio Romero: é que este estaria em uma posição similar à que se atribui, na passagem acima, a Taine e

literária como disciplina autónomae que pretendeincorporar o espírito científico,'9 ao mesmo tempo que preserva e garante o espaço para o

Renan;Antonio Candido mostra-nos, ao longo de sua tese,como Sílvio Romerotrabalha com um conceito de crítica extremamente amplo, que

juízo estético na análise da obra literárias' -- programa similar ao que

estáaquém e além de uma crítica propriamente literária.ss Assim como

encontramos na "Introdução"

a tarefa de Lanson foi definir a história literária, a de Antonio Candido

este o flanco que é atacado por seus opositores cientificistas.

da Formarão da areralura ór«ç;Ze;ra(desde

foi tornar a crítica especificamenteliterária. Assim como Lanson fun-l 49. No ambiente francês, à diferença do além-Rena, a distinção entre asciências da natureza e do espírito não se desenvolvetão fortemente. Antonio Cândida, por seu lado, incorpora o avanço na discussãoque é o debatealemão; na tese de 1945cita Croce e Rickert (Antonio Candido, O método crúíco de S#v;a Romeno, op. cit., p. g6). Mesmo Sílvio Romero, a seu

tempo, recusaria o cientificismo estrito na análise da cultura. A influência alemã seriaespe-

dou a história literária na universidade, respondendo às exigências do

conhecimentocom o reconhecimentodo "espírito científico", Antonio Candido implantará na universidade sua cadeira de teoria literária, e ambosnão pouparam esforços para sedimentar seusrespectivos proletos. A institucionalização universitária dos estudos literários cátedras,

cialmente significativa para Antonio Cândida, no sentido de contrabalançar (ma 'zo/zrrc7po, como veremos adiante) a idéia cientificista de um conhecimento da sociedade: uma ciência da sociedade,a sociologia. Na Alemanha, já desdeantes, masdefinitivamente com Dildley, temos a refutação do cientificismo; "0 objetivo de Dilthey estava na refutação científica

Si.Antonio Cândida,"Ouverture", in Zenoi de;n ewenfâo,op- cit., p. z4.

da ideologia cientificista; queria evitar os erros da doutrina européia da sociedadesem

I'histoire littéraire" (igio), in H. Peyre (org.), Eísaú de mérÃode,de cn'rz'gue e d'Zúrolre

sucumbir ao perigo, semprepresente na Alemanha, de buscar refúgio no intimismo. Paraa

#rréraire.Paras:Hachette,ig65, pp. 5í-5z.A completude foi um ponto muito importante

5z. Gustave

Lanson,

.f?hralre

de /a /íírérarure

./?a/ZÍaüe,

op. cit., p. b

e "La

méthode

de

experiência interior, o estado do espírito e os sentimentos não eram decisivos, massim os

paraLanson; deve-se a ele a incorporação definitiva da literatura da Idade Média nas histó-

farol comprováveis da consciência: era necessário partir deles para desenvolver as ciências humanas e as letras como sistema autónomo". wolf Lepenies, .4s rrés clz/ ürm. São Paulo:

rias literárias francesas e o esforço de compor o corpo do que se veio a compreender como

Edusp, i996, p. z35.A /nrrod fâa à cfé/zcl do explHro,de Dilthey, é de 1883.As diferenças dos estudos literários na Fiança e na Alemanha, e as variadas conseqüências disso, sãa tratadas por Joseph Jurt em "Für eine vergleichende Sozialgeschichte der Literaturstudien.

Romanistik in Deutschland, étudeslittéraires in Frankreich", texto datilografado, zoo4 5o. "Nem o objeto nem os meios do conhecimento literário são,rigorosamente falando, cien típicos./Em literatura, assim como na arte, não podemosperder de vista as obras, infinita e

história da literatura francesa. Desnecessáriolembrar em que medida isso estavaligado à construçãoda idéia de "nação". Naturalmente, essatradição afommada foi formadora de Anronio Cândida: "Nos anos i93o li muito os críticos franceses,fiquei fascinadopor Albert Thibaudet [-.]. A história ]iterária tipo Lanson me marcou bastante [-.]". Antonio Cândida, Os vários mundos de um humanista" (entrevista), op. cit., p. 38. Em sua passagempelo Colégio Universitário (i937-38), preparatório para a universidade, Antonio Cândida leu a

indefinidamente receptivas, e das quais ninguém jamais pode afirmar ter esgotado o conteúdo

históriada literatura francesade Lanson; cf. "Entrevista com Antonio Cândida". Revira Brafz'/ez ra deGé c;w Saclaü,op- cit., p. ii-

ou fixado a fórmula. Isso equivale a dizer que a literatura não é objeto de um saber; ela é exer-

í3. "Quando falamos em crítica romeriana, portanto, devemos compreendê-la como atividade

cício, gosto, prazer. Nós não iaóemoi da literatura, nÓsnão a apõe/zdemoi:nós a praticamos, a

de análisee sistematização da cultura, apresentada, nos seus melhores exemplares, sob o ponto

cultivamos, a amamos." Lanson, //ulazre de /a /ífrérarzzre.#anfa&e,op' cit.) PP.vn'wn.

devista histórico." Antonio Cândida, O métodomhbo de SzbzaRomeno,op- cit., p. io9

\o4 Senãodw coalescência e sentimento da realidade

io5

da literatura brasileira, soóa direfão deJ?v.z,o.[lm. .Delapodeórolar zzm

alunos, assistentes,boletins, cursos, livros, bibliotecas, financiamentos,

verde Cita rumo para os estudos de Literatura brmiLeira, concebidçl ao mesmo

congressos, revistas etc., os mais variados .meios de legitimação intelectual disciplinar, acadêmica e institucionais' em meio a um processo de diferenciação das disciplinas -- exige definir qual é o lugar dos estudos

tempo como trabalho erudito e comtrução dcl semibiLUade. Desse modo, o ponto de vistcl "universitário"

literários, o que vale dizer quais são seus objetos, quais são seusmétodos, se se trata de ciência, ou não, e assim por diante. É preciso dar uma identidade ao domínio de conhecimento que pretende se legitimar como tal, e isso exige o programa

de um modo de conhecimento

será apresentado ao Bruil

por um punhada

de críticos não- universitários, excetuado$ dois ou três colaboradores. Espe remos que este esforço realmente gigantesco seja compreendüo pelos poderes responsáveis pela educação, para que eles proporcionem às universidades os

elementosnecessários para retoma-la e renova to sempre?'

que seja espe.cínico,

a 6im de não se confundir com outros. Desse modo, a crítica literária não

l pode ser nem estética nem sociologia, mas uma integração a conjugar ambas, figurada no estudo das obras literárias.

Setudo isso tem sentido,vale citar extensamenteum rodapéde i946, em que todos essesproblemaspulsam, prospectivamente,no Jovemcrítico. O rodapé tem o título, em tudo significativo, "A literatu. ra e a universidade", e mostra como Antonio Candido, imediatamente após a tese sobre Sílvio Romero, estámatutando o problema da crítica e da história literária: No Brasil, há um certoimpmseno movimentocrítico, e não tenhodúvida ie que a Universidade está chamada a trabalhar no sentido de resolvo-to. CÚícoi

>ei«.ü

' le«ó-/oi

de pr]«'e;ra

arde«-L-..].

.4 [rad4ão

eru'#ra,

ma-

tado, perdeu-se ao nmcer, abafada pelo mwimento do Recite, e CL Jilosólica pouco progrediu depois dele. É impressionante como, entre nós, a crtttca nao contrüuiu,

depois de Sílvio Romeno, com nenhuma obra sólida, amplamente

lrquitetada, para a compreemãode nossacultura. Nos melhorescaos, temos

óri«zo.arr'koi gae ão " encaix-do periodic'«erre e« /ívroi[...]. Nada, porém, de um esforço Largo e amadurecido de revisão de valores, de verdadeira.FLoso$a da crítica. A nossa esp'rança, à vota do mau funcionamento

Dado o malogro da história coletiva de Álvaro Lins, coube precisamente ao jovem professor universitário, ainda sem cadeira em sua área de predileção, escrever a obra que responderia ao desafio do "esforço largo e amadurecido de revisão de valores". Não há dúvida de que o diagnóstico dado na citação indica a tarefa que o jovem crítico tomou para si, pensar e escrevera Formarão da # era zzraór ;Ze;ra.Além disso, não é extravagân. cia afirmar que a publicação da Formação tenha oferecido ampla e pode-

rosajustificativa para a nomeaçãode Antonio Candido no momento de criação do "Curso de Teoria Geral da Literatura" e sua posterior institucionalização em cadeira e denominação como "Teoria Literária e Literatura Comparada", na virada da década de i95o para a de ig6o.s'

Voltando ao problema da "crítica integrativa", vale lembrar a crí rica feita por Afrânio Coutinho, na época da publicação, à Formarão da a/er.zzzraór ;Ze;ra:o livro de Antonio Candido seria uma história late

riria fundada sobre um conceito histórico-sociológico de literatura, e

não estético.Ela estaria a meio caminho entre Sílvio Romero e as exi gênciasda teoria da literatura do momento atual (ig6o), pois tratavase,no entender de Coutinho, de escrever uma história literária fundada sobreum conceito estético de literatura, dada a autonomia do estético.

las nossasjovens universidades, está agora presa à monumental 'khst6v\a Í5.Antonio Candido, "A literatura e a universidade(n)",

tÜ!)hll::: i:: :

op. cit., p. z4z- Formulação muito geme

Ihante Já se encontra em um rodapé de setembro de i944, "Noras de crítica literária

54- Sobre esse aspecto, pode-se conferir Antonio Candido, "Literatura comparada' (i,

.))

Ti=i="::'==i:':s:.;'=:=

para o Concursode Prc:4essor 71tu/ar, op' cit.) PP z''zz. Sobre o processo de passagemda =1tica de rodapé para a crítica feita a partir da universidade, ver Antonio Candido, "A literatura

brasileira em i97z } 'érre em revira, z: ed., n' i, São Paulo: Kairós, tg8l} p- n) assim coma Flora Süssekind, "Rodapés, tratados e ensaios.A formação da crítica brasileira moderna"l

in ;?zpáisco/abas. Rio de Janeiro;urna, i993, pp' :3'33\aG Seno dw coalescênciu e sentimento da realidade

carta a Luas

Mastins",republicado em Antonio Cândida, 7tzzos dé ürewe%ã),'op. cit., pp. z56-57.A confiança deAntonio Cândida nos estudos superiores, perceptível no passo citado, encontra lugar também no que diz respeitoàs ciênciasmodais,como sepode aquilatar em Antonio Cândida, "A sociologia no Brasil", in E/Kicápédz;a Z)e/za-Z,aromie. Rio de Janeiro: Delta, i959, v- 5} p. zzz7i6. Ver Antonio

Candido,

"Os

vários

mundos

de um humanista"(entrevista),

Cz'éncza /=raye:

OPcit., p. 37; também a carta de Antonio Cândida a Jogo Alexandre Barbosa, de í4 jan. i963, publicada em .44agma,n? z, i995> pp. 3i-35

io7

Autonomia estaque era relegadapor Antonio Candido, ao embaralhá-

situadana confluência de "estética" e "sociologia do conhecimento", e

la com o social e com o histórico.s' Entretanto, justamente isso, no seu entender, seria a tarefa e o desafio da "crítica integrativa": "um método

o mesmo vale para a Formarão, quando se fala de juízo histórico e gosto. O resultado é essa "crítica" que é "apenas crítica"

que seja histórico e estético ao mesmo tempo"'" Como menciona no início da Formação,o lastro social e histórico é um mecanismo regulador

Essapassagem, em tudo significativa, ganha imensamente se pensadaSm con)unto com .d moda no iáczzZo xzx, tese de doutorado de ©ilda

do juízo estético, funcionando como uma espécie de grade de referência,

Rochade.IMello.i'Sõii2là (na qual Sérgio Buarque de Holanda também desempenhou seu papel na rubrica "bibliografia

parâmetro frente ao qual ele se situa e que dá sua cor específica. >

Í'

Um campo do conhecimento

em processo de especialização

e

autonomização,como a teoria, crítica e história literárias, na busca de seu lugar

e reconhecimento

res, procura

conquistar

no interior

do quadro

esse reconhecimento

das ciências e sabe-

distanciando-se

das for-

mas que Ihe possam ser concorrentes. No caso de Antonio Candido, o elemento de diferença, a ser aferido no seu ajuste de contas com Sílvio

Romero, é a introdução e a defesado juízo de gosto na crítica, como contraparte e contrabalanço da visada científica, que pautava o crítico sergipano; a passagemde uma "crítica sociológica" para uma "crítica"

o externose torna //zrernoe a crítica deixa de ser sociológica, para ser

a

61 traponto do outro, isto é, um completa o outro. Antonio Candido quer el estabelecerautonomia frente a uma interpretação sociológica e faz uma

defesado juízo estético sobre a obra, objetivando, como resultado,a "críticaintegradora". Gilda, por seulado, começasuatesecom um capítulo em que a moda é vista como fenómeno puramente estético; na buscade uma análiseque leve em consideração também os aspectossociais, passade uma perspectiva puramente estética para sua complementação com uma perspectiva sociológica."

Nessemovimento encontramos os rastros do professor Roger Bas-

apenas crítica".SP Se voltarmos àquela primeira passagem extra(da da

tide e suas incursões na "sgglglgglê.Ê!!ética".

tesede i945, veremos que a história literária, no entender do autor, está

sentido que possamos ler, na tese de i95o, um trecho que foi suprimido na sua posterior edição em livro, 37 anos após a defesa da tese. No texto

57.Cf. Afrânio Coutinho, Corzce;ro de/ínrafüra órml/eira(email). Rio de Janeiro: Livraria

antigo, a jovem autora quer "agradecer a orientação valiosa do prof.

Acadêmica, ig6o.

Reger Bastide, a quem devemos o interesse pelos estudos de eifél;ca soc;o/ce/ca";entretanto Gilda, ainda antes da defesa da tese, corrigiu à mão a passagem,deixando-a assim: "agradecer a orientação valiosa do prof. Roger Bastide, a quem devemos o interesse pelos estudos de

58. Antonio Candido, Formaçãoda /iterafura órm;/eira, op' cit., v. 1, p' l6; cf. entrevista a

L.C. Jackson,op.cit., p. iz8. n-s 59.Antonio Candido,"Crítica e sociologia(tentativade esclarecimento)",op. cit., p- 8 (ver ''

alemã"), escrita sob

lal a orientação de(Roger'Bastidê)edefendida em l95o, pois um é o con-

também Antonio Cândida, O método crz'n'cade Síh'zoRamero, op- cit., PP. xo6-iz, páginas que

merecemcomentário em detalhe). Tocamos aqui em um aspecto que aguarda um trabalho específico,a saber, a idéia, em tudo interessada,de "crítica". Se as palavras possuemuma semânticaque é intrinsecamente histórica, como acredito, não há como não se reportar ao peso específicoque essetermo ganha nos integrantes do grupo de C/íma. "Crítica" é menos um conceito do que um escudo estratégico, que é manipulado para Justificar e legitimar um determinado e interessado "ponto de vista" (esta também uma expressãointeressada),com o intuito de forjar e garantir uma posição no campo intelectual(sobretudo em suasdimen iões institucionais, cognitivas e disciplinares). Nessadireção, pode-se ler o livro de Heloisa Pontes, Z)efnrzosmüroJ, op. cit., passam(p. ex. p- 62), que oferece amplos materiais para avaliar o estrato de "interesse" da palavra "crítica" (sem contudo suprir a necessidadedo estudo que indiquei). Também Pauta E. Arantes, em "Providências de um crítico literária na periferia do capitalismo"(in P. E. Arantes e O. B. F. Arantes, Serzffdodajormafâa. São Paulo: Paz e Terra, i997, pp. 34 ss.), oferece materiais para a discussão.Sela dito que esse estudo de Amantesaborda, com a maestria costumeira, muito do que aqui se tenta esboçar.

\o% Seno dw coaiescência.s e sentimento da realidade

É revelador e prenhe de

SocüZog/a.Ekzéf;ca".'' Essa habilidade entre sociologia estética e estética 6o. Gilda de Mejjo e Souza, O expzHzoclm roupa. .4 nada no sécü/adele/zol,e.São Paulo: Companhia das Letras, ig87, pp. 26-51, e Gilda Rocha de Mello e Souza,.4 moda no iácaZo x/x. São Paulo, tesede doutorado apresentada à Primeira Cadeira de Sociologia da Faculdadede Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, t95o, p. io56i. Gilda Rocha de Mello e Souza,.4 moda noiécuZox/x, op. cit., p. 6, itálico meu. Na publicação da tese na Re ü a da ]l/

ezzPau/isca (nova série, v. S, i95i, pp- 7-93), o trabalho apareceu

com o seguinte título; "A moda no século xix. Ensaio de sociologia estética". Antonio Can

dido, em seusegundo ano na Faculdade de Filosofa, Ciências e Letras (i94o), freqüentou o curso de Sociologia Estética de Reger Bastide". Cf. Antonio Candido, "Prefácio" a Reger

,,7 Bastide,Poe

do Brmz/. z: ed., São Paulo: Edusp, i997, p iz; "Entrevista com Antonio

Candido",Revira BrmzZe;ra de Clérzcz'Social, op cit., pp. io e í4. Em maisde umaocasião Antonio Cândida reconheceua inHuência de Bastide em seu trabalho e no de seuscolegas >

lo9

Ãormafãoe que encontrará teorização no início de -L;rerarzzr'z e ioc;idade. Note-se ainda o percurso de Antonio Candido, que vai de O méfoda ú;co de S#v;o .Romeno,passando pela primeira redação da Formação,

sociológica, muito sintomática, estápresente também em Bastideóze foi um outro modo de formular algo que vai na direção da mencionada

j"crítica integrativa". Isso estádito pelo próprio Antonio Cândida,ao a obra de Bastide, também ele "excelente crítico literário"';

depois pelos Parco;roi do .Rlo .Bon/zo(livro instigado, mas não só, pelos estudos de Sérgio Buarque de Holanda) e chegando à redação final da

(a

l que não Ihe impede de pontuar as diferenças)-

Formaçãoda literatura brmileira.

Um movimento aproximadamenteinverso ao indicado no início da tese de Gilda estava em curso em Antonio Candido: uma análise

O momento dos Parca;roi tem uma grande importância, porque a pretendida análise do cururu mostraria uma forma artística ainda

que não se pautasse exclusivamente pela sociologia, mas resolvesse a

não autonomizada, em uma situação rural e rústica. Como não há de

dupla dimensão autonomia da obra e sociedade ihreie operante na

fato autonomia artística nessaforma cultural caipira, a análisepropriamente sociológica torna-se indispensável, a fim de situar claramente o fenómeno em domínio cultural próprio.« A autonomização das formas

> do grupo de C/ima; ver Antonio Candido,Formaçãoda /frerarlzraórmf/eira,op' cit., v. i, p (repetido no v. z, p. 349); "Prefácio" a RegerBasdde,Poefai daBr í/, op' cit., p. i5) e

artísticas,visualizada no estudo sobre a persistência e a mudança das

Machadode Assimde outro modo" (i99o), in Recortes,op. cit., pp. :o5'og, em cuja pagina inicial se lê: "Este ensaio [de Bastide, sobre Machado de Assis, lw], somado a outros do

formas de vida e do mundo caipira, é contempladaem outra situação

mesmoautor, bem como ao seuensino e ao seuconvívio, teve muita influênciaem mim,

nos estudos da Formarão da //lera zzraórm/Zebra,em que se pode perce-

coisa que custei a perceber. Quando o reli há tempos, depois de muitos anos, senti que foi uma dasfontes de várias idéias que estãona baseda minha concepçãode literatura brasileira

ber como se concretiza o processo de autonomização.'s Nesse sentido, o estudo sobre "A literatura na evolução de uma comunidade"" é exem-

Os pontos de vista de Bastideseincrustaram de tal modo na minha mente que perdi a noção

plar, pois mostra claramente como se dá esseprocesso de definição e

do quanto Ihe devo". No a4emona/para o Ca,zcarso de PrcÓziior 7z'fu/arde Zeona Zirerár;a e

consolidação,teorizado mais detidamente em "Estímulos da criação literária", que fazia parte do pretendido estudo sobre o cururu e que

Z,;terarzzraComparada, op. cit., p. i, Antonio Cândida assinala os cursos de Bastide "Arte e

sociedade" e "Barroco brasileiro", assim como afirma que Bastide, junto com Maugüé,foi um dos "professores que marcaram". Em entrevista: "Sofá influência muito grande do professor Reger Bastide, não apenasem sociologia, masem literatura, porque sempre esc'eveu

só foi publicado cerca de dez anos depois, em Zirerarzzra e ioc/idade. Portanto, um problema que aparece com certa recorrência em alguns

sobreliteramra, era muito bom crítico e nósconversávamos a respeito". Antonio Cândida,

estudos enfeixados no livro de ig65 é decorrente das pesquisas com

em entrevista a L. C. Jackson, op. cit., p. l 57; em outra entrevista, afirmou: "Sou discípulo

o caipira paulista, que a certa altura chega mesmo a ser nomeado.ó' Quandonão é nomeado,como é o casoem "Estímulos da criação literária", fala-se contudo do "homem rústico", apontando para aquela

de Jean Maugüé e de Bastide". Antonio Cândida, "Entrevista com Antonio Cândida", in

/n eilÜafõea,op.cit.,P.33-

..

. .,

"

w> 6z. Isso serádesenvolvido ern artigo próximo sobre a "sociologia estética/estéticasociológica' nos escritos de Gilda de Melão e Souza.Ver, de Roger Bastide, Px;c á/üe da ca/imé e n

mesmasituação.

dai de

socüã)W'aeirélzcaór l/eira. Curitiba: Guaíra, i94'; "Carta sobre a crítica sociologia", O Effadü de S. Pardo, z5 nov. i944, republicado em Ceder/zoscreu, n' 10, i977, Pp' :3''7; "A propósito da

64. Cf. Antonio Cândida, Or/arca/rax do R;o Bo/z;ro,op. cit., p. ii, e "Estímulos da criação literária", in Zifera üra e aocíedade,OP.cit., pp. 37-63.

poesia como método sociológico", O Z:fiado de S. raiz/o, 8 e zz fev. 1946, republicado em C2zder-

J c xu, OP.cit., pp. 75'8z;e .érree soczeclade, trad. Gilda de Melãoe Souza.SãoPaulo: Martins, i945. Para uma avaliação mais ampla e matizada, ver Fernanda Peixoto, Z)íáZoyasórmíZefras.Exma anó/üe da obrade nager Bmzzde.São Paulo: Edusp, zooo-

'>

63.Antonio Cândida,"Os vários mundosdeum humanista"(entrevista),op. cit., P-34;cf. ain. da Anionio

Candido,

"Reger

Bastide e a literatura

(ig87) e "Machado de Assis de outro modo"(i99o),

brasileira"(r978))

"Acerca

de André

Gide

todos eles em necorfes,op' .cit, resp'ctlv'

mente, pp. 99-io4, l ro'i3 e io5-og, além do }á mencionado "Prefácio" a Pneu da Brml/, OP'cit

Ver também "Entrevista com Antonio Cândida", Raúla Br í/e;ra de Cíértcí Soc;aú,OP'CÍt. pp. í4-i 5)e Antonio Candido, entrevistapublicadaem eram/gorro/@ãa,n' i, i974, P' i5'

61. Devo a Samuel Titan Jr., em palestra na FFLCH-USP(zoom),uma exposição magistral do movimento indicado nesseparágrafo. Como notou um estudioso d'Osparceírai do R;a Bo/tiro, "a distância temática que separaa Formarão e Orparce;roi deve ser, portanto, relê tivizada. Embora sejam livros muito distintos, aproximam-se pela preocupação em com preender o processo histórico e os fundamentos da nação brasileira, apesar de tratarem de

dimensõesdiferentes da realidade e da história". Luiz C. Jackson, .4 aadzfâo eiguec;da,op cít.,PP.73-74. 66.Texto de i954, publicado em ig65 em Z/zerafüra eioc/idade, op. cit., pp. iz7-5i67.Antonio Candido, "A literatura e a vida social", in Ziferarüra esocledada,op. cit., p. 3o.

l ll wa Seno dm coatescênciase sentimento da realidade

tjcaà e processo social e então não faria mais sentido a investida de remar- \

O resultado do processo é que a redação definitiva da Formafãa da //lêíalzzía óraai/e;ra, depois da propedêutica da O método crú;co de

caçãode .4ntonio Candido. .assim, é possível compre'feder sua imistência

S/Zv/oRomeno, do doutorado e dos diálogos variados com Sérgio Buar-

-'perceptível sobretudo em entrevista -- em destacar tal posição como não

que de Ho]anda, Gi]da de Mello e Souza e Roger Bastide, implica ]á uma análise e compreensão dos nexos de literatura e sociedade, que será teorizado, embora com a parcimónia característica do crítico, em

proprmmente sociológica e deslocando a sociologia para a posição de "ponto

Literatura e sociedadei*

sentido a separação entre o que.4ntonio Candidofal. e a sociologia.

de veta", a ser incorporado na posição crítica do crítico?' Uma ve{ quese \ desmisti$ca essaconcepçãooperante e altamente estratégica, deixa de ter \ Contudo, cabe notar que essa concepção cienti$cista

.l

e restrita de sociolo-

gia tenha talvelorigem em seustempos de estudante, sqa nos manilals e com-

Excurso dúplice: a construção da identidade disciplinar e aquela tese do

pêndiosde cqa Leitura se impregnou, seja na doutrinação de Pau! .4rbousse-

ano 1950

Bastide na usp, poisjáfoi

destacado como esseprofessorftancês professava

uma concepçãopositi'pista de sociologia:~ Não obstante, nada deve obliterar

Á questãoda "crítica integradora" e a atttonomilação do "crítico" Pente ~ "sociologia"

remetem a um movimento estratégico e signi$cativo para se

compreender a posição de 4ntonio Cândida -- de certo modo, no sentido de Impor uma de$nição de sua posição de macio favorável ao que ete é e pretende será' Embora aponto'palhct o estudo, indicaremsomente o que, em meu entendimento, é o xis do problema. 3tosso nada,

aqui se vê em que medida Zntonio Cândida opera uma

=on.cepçãocienti$cista de sociologia, lama sociologia da cultura que deixaria

n Í7o. Recorrente nasentrevistas, essaposição está firmada do modo mais enfático na entrevis{ l taa Luiz Carlos Jackson, de 3o set. i996, op. cit., esp. pp. l 55-57, que vale também para o que

i l segueà respeito dos dois Bastide. Pergunto-me até que ponto ao relegar a sociologia a um . l > l l Fl

ponto de vista, Antonio Cândida não opera uma sutil desclassificaçãoda sociologia (similar, mu/al& mzzra/zdü,ao que Bourdieu destacacom relação à sociologia diante da âíosofia nos seusanosde aprendizado). Uma espéciede arte persuasivaopera do seguinte modo: não que asociologia não seja importante e legitima (ela é), mas não para o que eu faço; não obstante

ie fora o juízo estético sobre a obra, como se fosse possível compreender o

: l suainadequação,se utilizada na dose certa e por alguém esclarecido, ela pode contribuir,

social na obra desvinculado de sua própria forma -- posição, naturalmente,

i Lmodestamente, para o objetivo visado; portanto, converta-a em ponto de vista. ' 7i. "]-.] a formação 'positivista' que tive na Faculdade(não no sentido estrito de Augusto

;ontrária à queo crítico reivindica para si' Essa concepçãocienti$cista e restrita de sociologia é estratégica para que .4ntonio Cartdido possa deslocar l si mesmo da sociologia para sua posição como "crítico".

Se se comidermse

üma sociologia menos cienti$cista e mais, digamos, "cliaLética", tornar-se-

Comte,masno da tradiçãouniversitária francesade cientificismo na Filosofia)[-.]."Antonio Cândida, entrevista publicada em Trens/gorro/afãs, op. cit , p. io; tanabéma entrevista 'Os vários mundos de um humanista", op- cit., p. 34, onde se fala da "orientação 'positiva'

la claro que a sociologia estaria imcrita na relação de forma titeráTia Çartís-

francesavigente na Faculdadede Filosofia". Em outra entrevista: "]-.] na minha geração nós estávamosainda muito próximos do positivismo científico.[-.] Fui formado dentro da

68. Por entre todos essesmomentosvive, é claro, a vida de Antonio Cândida, que o so-

escolasociológica francesa,Durkheim, que vem de Auguste Comte". "Entrevista com Antonio Cândida", in /nveifzgaÉõei,op. cit., resp. pp. iz e ig; "Naquele tempo, na Faculdades-.],

ciólogo sempre vê sob prisma próprio. Se as condições familiares permitiram a Antonio Cândida uma formação absolutamente privilegiada e em vários aspec:osúnica as disposiçõesda criança e do jovem não encontram obstáculos, só facilidades e a sociabilidade universitária converteu tudo em plataforma crítica, sobre a qual se erige a obra: o próprio professor relatou como suasexperiênciasinfantis de leitura e de "antologia" estão na base mais funda e sólida de sua atividade intelectual madura, que foi encontrando e forjando lugar por entre os constrangimentos pessoaise institucionais. Tudo isso vale, por si só,um estudo à parte. Ver a título de parâmetro, Pierre Bourdieu, .44edzrafõespmfa/ía/zas. Rio de

Janeiro:Bertrand,200i, pp.200-01. 6g. Parafraseio Pierre Bourdieu, .44edi'rafõeipmca/íarzar, OP'cit.) P. i93'

\x 2 Seno dm coalescêncim e sentimento da fealdade

predominava a visão institucional dos franceses, Durkheim e seguidores". Antonio Cândida, entrevista a L.C. Jackson, op. cit., p. i43. E sobre Paul Arbousse-Bastide: "Quando éramosalunos, foi decisiva em nós a influência dasaulas admiráveis em que Paul ArbousseBastide estabe]eceu a distinção entre método, processo e técnica". Antonio Candido, ];%fei-

ra/zÃerrza/ides. SãoPaulo: FundaçãoPerdeuAbramo, 200i, p- i4- Ver também"Entrevista de Antonio Cândida com Michel Launay em 3o de agosto de í978", Z,zhÀa'/:dkua, n? 7, abr.

i99o>pp. 3-4; "Entrevista com Antonio Candido", Revira Brmz'/eirade Cz'é/zc;Sac;aú,opcit., pp. l3-i4; na p. iz> indica suasleituras sociológicas no tempo do Colégio Universitário, que não deixam dúvida sobre o viés cientiâcista que marcou sua formação sociológica. To davia, de acordo com o a4emona//ara o Concursodé Pr(?$eiior Zz' ü/ar de Zeona .[;fer.ín a â >

ii3

P )

o elementoestratégico quesublinhei, pois ojovem ..4rttonioCandido era bem

podeTicl perfeitamente

reais próximo do outro professor Bólide,

compreendermos o que Autoria

para o qual, nas suas aventura

. Portanto,

para

Cctrtdido entende por cHtica e históüü, e qual

sociotógicm, sociologia e arte podiam em muito se entrelaçar Çemborapor

Ma posição e situação nos dotnírtios dcl cultura, é tão necessária a compíeen-

/eles Reger Bastide marcmse posição com relação à primalza da socioLogidb .4demais, não se pode esquecer de quepor longos anos .4ntonio Candido ateou

;ão do queele entendepor literatura, Crítica e histól'icl literária comodo que :le entendepor sociologia e demais campos em competição. Seu trabctlho só

como insistente de Ferrando de .41evedo,pautado, no quedil. respeitoà con-

ê, ou deixa de ser, sociologia $'ente a uma certa sociologia, o quevale ditar

cepção de ciência, pelo mais estrito cienti$cismo durkheimiano.';

lue os domínios

só ganham

identidade

contrastivamente,

mediante

pToces-'..

No momento-chave de diferenciação das tarefa e disciplinas, uma de

sosde auto-identi$cações e autodiferenciações mútttm. -- Talhe l por ser um

:qm faces é a concorrência entre grupos intelectuais Qvetho tema mannheimianoÕ, a situação mesma da sociologia é vaiada de ten.iões, "a hesitação

hibridismo terminológica, não raro se esquecede que a sociologia pretende nada mais, mm também nctda menos, do quefalar da sociedade. -

entre uma orientaçãocienti$cista, pronta a imitar m ciênciasnaturais, e tina atitude hermenêutica, que aproxima a di.scipLina da literatura"?'

.4

sociologia quevai se imptantartdo na usB na qual.4ntonio Cândida seforma e pensa a aduar, tende muito mais, não há dúvida possível, à orientação cienti$cista do que a qualquer outra e dbso origina-se sua como'eemão

Çrestritivaà da sociologia. Em face disso, o trabalho de Ántonio Cândida

toma distância e vai migrando para Fora da sociologia Çdaí,por ncemplo, szzaazzlo-co/npreemão re rospecr;vade Os parceiros do Rio Bonito como

Esscl concepçãorestritivcl de sociologia tem raízes antiga,

quese CLtua-

Lilaram QeatualilalnÕ de modos e com ênj'mes muito variegcdas. Em regra, tTatct-sede um movimento de defesa contra a pretensão de objeàvidade, taREmveresreclamada pela sociologia, em corridcl des'vairadclpela rcLcionctlidade cientí$ca. Frente a isso, que implica a anulação do sentimento e do ]uÍqo de gosto, é evidente que a críticcl pretendidcl de .4ntonio Cândida só poderia asstLmira negação, sem negar contudo a oportunidade comoponto

um Livro mais antropológico que sociológico's). Con,siderada "atitude her-

de vistct. Mas, assim como almelou CLcienti$cidcüe, desde o mesmo momento m tendência anil-sistemáticas e suqetivm, digamos, emaísticas, coto-

menêutica",

niqarcLmCL sociologia, de sorte queela espraiou-seem planos'variados, como

a "crítica",

na qual a sociologia é apenm um 'ponto de vista",

uma multiplicidade >

vir CLser considercLdct "sociologia"

Z,írera zzraCo/aparada, op. cit., p. i) Arbousse-Bastide não foi um daqueles "professores que

marcaram". Segundo uma antiga aluna de Antonio Candido, nas décadasde i95o e xg6o predominava "o prometo de estabelecer as ciências sociais como disciplinas científicas autó-

nomas, desdenhando-setudo o que as aproximasse de 'impressionismo'. Havia o esforço decidido de transforma-las em saber positivo, desprezando-seseusaspectoshumanísticos' (Mana Sylvia de Carvalho Franco, it/emorza/apresentadoà FTLcn-usp, ig88) citado através de L. C. Jackson, H [radífâo eaguec;da,op. cit., p. 77). Nessecontexto, não é de espantarque

de possibiLidcLdes.Que .Antonio Cândida, dentre todas',

tenhctescolhido a versão cienti$cista, é sintomático: pois só diante dela ete rêde difererlciar-se e garantir, msim, seu lugar. --X Heloiscl Pontes, em seu estudo sobre o grupo de CXtma, mostrou como

ssclquestãonão somente estava presente, como possuía certa generalidade.Sem pretender demonstra-Lo por externo, indicou-o em alguns pontos=have, como no que diR. respeito CLLourival

Goles

MachcLdo:' Mm,

como

nãopoderia dei)car de ser, é na diferenciação frente à "sociologia" de Fto-

Antonio Cândida afirme e reitere que o que faz não é sociologia, assim como os sociólogos não consideram sociologia aquilo que ele faz.

restan Fernandes que a questão aparece por inteiro. Em um de seus textos

7z- Ver "Entrevista com Antonio Cândida", Re úfa .Brmz/eirade Cféncz' Socía&,op' cita

cantribtlição para a sociologia foi em primeiro !ugarfalê-ta

P-i4

Faseinicictl, em que elct ercl sobretudo ponto de vista geralpara

cobreFlorestal, Hntonio Canclido a$rma: "Na Universidade, a sua grande passar de uma encarar a

73 E é bem sintomático que no retrato do dr. Ferrando esseaspecto não seja jamais mencionado. Cf. Antonio Cândida, "Doutor Fernando"(i994), in Zexlai de ínrerve/zfâo,OP.cit., pp z97-3og. Mas em entrevista: "Arbousse e Fernando de Azevedo eram durkheimianos; Roger Bastideera mais eclédco [-.]". Antonio Candido, em entrevista a L. C. Jackson, op'

76. Cf. H. Pontes, Z)eilz zoi múzoi, op- cit., pp. z8-zg. O mesmo poderia ser dito, creio eu

ctt., P. i57.

le ultramar. Estudos sobre a formação da culmra filosófica uspiana(.Uma experiência nos anos

74- IWolf Lepenies, .4s és cu/rürar, op- cit., p. ii, cf. também p. i7

6o). São Paulo: Paz e Terra, i994, passam,p. ex- p. i88, onde discute a separação de filosofia

75. Cf. Antonio Cândida,entrevistaa L. C. Jackson,op. cit., p. t4z'

e literatura, por conta do que chamariade uma mentalidade classificatória

w 4 Sen.sedm coaLescêncim e sentimento da realidade

com relação à filosofia uspiana, repetida por Paulo E. Arantes em [/m {/?arramerzlo.Fa?zcí=

sociedade e ser aplicada em vários setores, para sua efetiva de$nição coma

acadêmico, foi coisa que a partir de certa altura passei a não levar em

di«sciplinaespecífica"?l É em meio a essapassagem que.4ntonio Cândida

conta. E minha formação compósita ajudou isso. Quando eu era jovem, havia na Faculdade de Filosofia certa mania

vai instrumentatilar

o que sqa a "sociologia".

Assim, comentando esse

momento inicial da Faculdade de Filosofa da usp, em que "faltava"

UMct

lógico, o específico económico, o específico antropológico, com o medo

mundo e ingrediente para outros interesses (.Literatura, no meu casou":* M«

de minha tese (que se arrastou por muitos anos). Eu informeme disse

quem disse que a sociologia, msim concebida, como "instrumento de vbão

que estavacom medo de ela não ser realmente sociológica. Ele retrucou

de mundo",

correspondente de não ser científico. Mas Roger Bastide não pensava assim. Lembro que certa vez me perguntou como ia indo a elaboração

logia estamos falando. Heloisa, comentando o mesmo penso, a$rmcl= "De

prontamente:"0 importante não é que sejaou não sociológica, masque seja boa".'' Creio que posso caracterizar minha carreira como um afãs.

fato, a sociologia era concebida por eles \o pessoal do grupo de CX\maq mais

tamento cada vez maior do "específico", em busca de um modo aberto

como um instmmento de vbão de murro do quecomotrabalho sistemáticode

e integrativo, que passapor cima das divisões acadêmicas para chegar a

pesquisa e análise da realidade":9 Mas quem, sertão a mentalidade cienti$-

um "ponto de vista" coerente. Isso porque talvez eu seja um ensaísta,na

cista, dose que a sociologia precisa ser ta! "trabalho

medida em que gosto de jogar com os sentidos possíveis e de relativizar

não ésociotogiai

Seria preciso firmar

com clareza de qual socio-

sistemático de pesquiscl

e análise da realidade" ? .4 Leitura dos materiais disponíveis sugere a ambiguidade queperpassa o proQ

de "especificidade", cuja origem era durkheimiana: o específico socio-

diferenciação estrita, a$rmou: "Mas não havia a organização cientí$ca do traba11t.o,rLaquetafme iniciar em que m coisasse imtaLavam. Por isso, ercl usual quemtLitos vissemna sociologia sobretudoum in.strumentode visão do

blema. Nas entrevista rememorativas -- em quese há de comiderar a irmão autobiográ$ca--,8' .4ntonio Cândida vctLoriTasua capacidadede trafegarpor entre m disciplina, embora no momento de criação da cadeira de Teoria

asconclusões, embora procure dar cunho sistemático àsanálises.8: Um aspectomuito revelador essa mcessidcde de "negação" da sociologia como quilo queo críüofal. apareceem uma anotação margindde .4ntonio Cândida ao en.saiode Theodor W. .4dorno sobre lírica e socidcde. Eis apmsagem do tacto:

Literária e l.iteratura Comparadaa comtituição da identidade disciplinar

a inEeq)retação social da lírica, como ademais de todas as obras de arte, não

de'pa ter sido essencial

pode ter em vistas de modo não medrado, a assim chamada posição social, ou a situação social dos interesses da obra, ou mesmo de seus autores. Ela

e portanto o Professor não poderia ser, ou parecerser,

de modo algum, sociólogo.

precisa antes descobrir como o todo de uma sociedade, como uma unidade

Pensandona minha vida intelectual na idade avançadaem que estou,

em si mesma plena de contradições, aparece na obra de arte [...].*'

penso que ela se orientou instintivamente, mas depois conscientemente,

no sentido de elaborar um "ponto de vista" para olhar e tentar compreender a realidade. Sobretudo por meio da literatura, mas com apoio nas

8i. Nota do autor: em outra entrevista, relatando a mesma história, Antonio Cândida agre

ciências sociais e na arte. Quanto a ser ou não canónico sob o aspecto

minadoresme deram dez, ele deu nove, ou nove e meio, não me lembro, alegando que era

gou o seguinte comentário: "Apesar disso, quando defendi a tese, enquanto todos os exa

maisantropológicado que sociológica-. Um espírito curioso". "Entrevista com Antonio Cândida", Revista praz'/eira de Cz'é/zclm Soaaiç, op. cit, p. l477 Antonio

Cândida, /iZorei a/z Perna/ides, OP.cit., P. 28.

8z. Antonio Candido, "Os vários mundos de um humanista" (entrevista) , op. cit., p. 35

78.Id.,ibid.,pp.iz-i3.

Também Heloisa Pontes constatou a ilusão retrospectiva que modela os depoimentos de

79. Cf. H. Pontes, Z)eifírzoimüroi, op cit., p. i75- A posição de Antonio Candido também

Antonio Cândida.Ver H. Pontes,Z)earznoimü/oi, op- cit., p. ex. pp. i75-76 e l77-8o ("a tentativado autorIAntonio Cândida,Lw] de estabeleceruma continuidadeno interior de

pode ser aferida com nitidez em seuverbete "A sociologia no Brasil", op. cit., p. zzz7 8o. O próprio Antonio Candido, em aula-depoimento na FTLcn-usp, em z6 jun. zoom)chamou a atenção para o tanto de construção da coerência a que estãosujeitos os depoimentos, textos e entrevistas rememorativos.

suaprodução", p. r79) etc.

83.TheodorW Adorno, "Rede über Lyrik und Gesellschaft"(i957), in i\zoren {zzrZ; erarur.

Frankfurt:Suhrkamp,ig8í, p. 5i

e Z

\ \6 Seno dw coalescêmim

e sentimento da realidade

ii7

.4ntonio Cândida anotou, na margem de seu exemplar:

Não a 'sociologia'

estética-- dimemão esta que a sociologia "cienti$cista"

debcaria clefora xs

da lit. ou cla arte" *' Ora, .Adorno estáfaLando,em seu texto, da necessi-

Creioqueo próprio Antonio Cândida pressentict CLquestão.Junto a uma outra

dade da mediação comoprocedimento imanente procedimento ao qual vol-

pesagem de .adorno -- 'aquela uni'persalidade do conteúdo líüco é contudo essencialmente social. SÓ compreende ctquilo que o poema dil, quem per-

tarei logo à Pentes, na mesma medida em quese contrapõea interpretações

mec'i/z;cm,e Jn on;o Ca/zd/docoar/ü/, interessadamente, gazeisto /zâoé sociologia -- e é o positivista que está preocupado com o que é e o que não é--, pois se o fosse todo o seu trabalho poderia ser sociologia, e não, como

e manifestado na Linguagem, najorma,

que são ao mesmo tempo a presettça

do cotetivo e o veículo pctrct eLe" ?~

pretende, "critica Isso é refaTÇado, ademais,

cebena sucosolidão a vo3.da humanidade" --lq' .4ntonio Canxlidoobservou:

" Uma concepção do 'social' como 'total' Çhumanoà, Rugido do 'irai'piduaL'

poT uma obsev'fiação no cabeçctlho dct mesmcl

página clo exemplar de .4ntonio Candido, onde se Lê: "Chamar

a atenção pa

Essemesmo nexo de questõesemergiu, logo atrás, na correçãomanmcrita de Gitda Rocha de Melão e Soula em sua tesefeita sob orientação de

de bom crítico no entenderde ..4ntortioCandido, é antes de mais nadcte

RegerBmticle. É a impregnação cienti$cista que e;age o preciosbmo, que nãopermite o destila de uma sociologia estética a uma estética sociológica

sobretudosaci6Xoga. assim, há uma diferença entre cl crítica do crítico e

Qouseria o contrário?). Se o próprio Rogar Bmtide exigia de sua orientando

a crítica do sociólogo, quese estenderia, numa continuidade submersa, na diferença entre Bastide e Candido. Mw é preciso notar que aquilo que, no tacto de Adorno, não aparece acÜudicadoa nenhuma disciplina especí$ca seja a sociologia, seja a teoria ou crítica literária; .Adorno rtomeictgeneri-

e do candidato uma precisão disciplinar -- falando uma corrigir o tacto e do

camente a teoria estética --, foi de fato muita

o avanço sobre RBmtide" xs Quando convém lembTctí que Bmtide, apesar

vales implicado

no que have-

outro tirando a nota má9cima --, o que ditar cie sum próprias ambigüidcdes?

Já ji{ menção CLO fato de que .4ntonio Candido fTeqüentou o curso de sociologia estética de Bastide; curso este que foi tradulzdo pela aluna efutura

ria de ser uma sociologia da arte % De qualquermodo, o que importa nesse

usistente Gitcla e publicado em l gA\. Na dedicatória (.impressasa Sérvio Mittiet, Lê-se="1.ivro de estética sociológica"?l Em outro exemplar desse

ponto é antes que não importa propriamente o nome da disciplina, mm o

mesmo!ivro, em tina dedicatória manuscrita de Bmtide a uma antiga aluna,

como proceder a anáLbe da obra de artes

lê-se: "sociologia estética"?' Na verdade, esse livro repete algo jú presen-

Se, pelo queprecede, com relação à mediação de forma literária e processosocial, podemos aceitar que a "forma"

é social?ü então a "sociologia",

ao analisar a obra, necessariamenteprecisaria atentar para a dimensão

te em z/m ozz/ro# r;rzÃode i94í. Ehz Psicanálise do cafuné e estudos de sociologia estética brasileira, comodzi:opr(Pno f#zzZo,já e rara a de zíma "sociologia estética"; mm quatnão é a surpresa do leitor quando, logo no início, o autor emenda: "Cabendo-me um cllrso de estética sociológica"9'

precisa-

menteo curso de sociologia estética mencionado por .4ntonio Cartdido. 84. Marginália no exemplar de Antonio Cândida da obra de T. WI.Adorno, M} a de /ilerarzzra.Barcelona: Anel, s. d., p. 55. Exemplar da biblioteca de Antonio Candido, depositado na Biblioteca da pn.cn-usp.

8g.Cf. Antonio Cândida, "Estímulos da criação literária", op. cit., p. 46.

85. Id., bid.

9o.T. W Adorno, "Redeüber Lyrik und Gesellschaft",op. cit., p. 5o-

86. Para que não haja dúvidas a esse respeito, basta ver os escritos de Adorno; do modo mais

gi Marginália no exemplar de Antonio Candido da obra de T. W Adorno, Moemde /!fera

explícito, EbzZe;l g úz díe 41 iÉxop'oZgyie.Frankfurt: Suhrkamp, i975; "Thesen zur Kunstso-

furo OP.clt., P. 54

ziologie", in Geiamme/feScÃà@en. Frankfun: Suhrkamp, i977, v. io} t. i, pp. 367-74

9z. Reger Basdde, ,urze e ioc;idade, op. cit. O editor Marfins, note-se, é o mesmo que por

87. Note o leitor que não estou advogando, no pólo oposto, uma posição privilegiada paraa sociologia"; noto apenas que a preocupação disciplinar não é inocente e é, ela mesma,um

essamesma época encomenda a Antonio Candido o que virá a ser a Formarão da aferafzzra praz/eira. A dedicatória impressa a Sérgio Milliet é importante, pois ao que consta é ele o

fato social que pede explicação. 88. Ta] como o próprio Antonio Candido reconheceu: "]-.] haja vista Adorno, com a sua

"crítico" com quem Bastide dialoga nos textos, importantes para essecontexto, "Carta sobre

concepção da forma como a verdadeira manifestaçãodo social na obra [-.]". Antonio Cân-

93.R. Bastide,,4rfe e sociedade,op. cit., exemplar na Biblioteca da FFLCn-uSP. 94.Reger Basdde,Pxz'faria/üedo c(!Óun/e eirlzdoi de xoczoZgW'a esféfzcaór i/eira, op. cit., p. 7

dida, "Duas vezes'A passagemdo dois ao três"', in Zexroxdeinfen'Cação, op. cit., p. 54' n 8 Seno dm coalescêmim e sentimento dct realidade

acrítica sociológica" e "A propósito da poesia como método sociológico", já citados.

ii9

Nesse catedrático de sociologia, prenhe de apartes inesperados e atitudes inu.citadas,

"espírito

menos sistemático

e mais inquieto";''

percebe-se

üma habilidade -- não me parece adequctdo denomina-La demão --, na qual

)(.sÜlivro(.sÕtanto pode(JnÕser compreendido(.sb -- nota gene, pelo próprio autor como de sociologia ou como de estética. Substantivação e Mjetivação revelam-se parcaindicar um domínio da re$exão que não cabe proprümente nem lá nem cá, a sugerir quehá um interregno de indifererLciaçãono processo de diferenciação e especialização, e nesse !ipso se imere o trabalho ora apresentado. Ou, então, que se trata de substituir os sistema cLmsi$:atórios operantes, usualmente operantes, por algum outro. Como quer que

sela, no cona'oito dasformuLações,não se trata depreciosismo, mm de umcl lmbigüidade e habilidade queo autor reivindica para sua posição e quemuito Ihe serve e muito nos serve: a ete, para situar-se mais à vontade frente ao seu objeto e aos sem leitores; a nós, para compreendermos o seu, digamos,

estilo de pemamento e trabalho?' Gilda de Melão e Souqa, em seu estudo, de gatil. rememorativo -- o

zno era l glz --, sobrea "estéticapobre" deBmtide e a estética,por contraposição, "rica" de Maugüé e Lévi-Strams, a então professora de estética, remanescente" de um "período arcaico e talvez artesanal da nossahistória" , em sua "aula terminal" na Faculdade quea formou, não mais precisouse

entanto, conveniente indagar se se trata realmente, nessa outra aparição, de

habilidadeou de ambigüidcde ou se, diferentemente, temos agora um outro mentido pata aquela correçãomanuscrita; pois nata-sc precisamentede uma coííeção,no sentido de que uma formulação mais inadequada é substituída poTouwamais adequada. O quepodemosentender disso? Creio quehá um

acentodistinto nessanova aparição da !agilidade: na aluna não sepermite clvacilação, o trabalho precisa ser um trabalho de sociologia

e o mesmo

valerá, poucos anos depois, para cl tese de .4ntonio Cândida. Tratando-se de umcl tese de sociologia, não pode haver dúvücl quanto

à suapertença à clüciplina. 'ainda mais se comiderarmos que a disciplina encontra-se em processo de formação,

cle delineamento

de identidade

cog-

nitiva, histórica e imtitucionalpor essa banclm. Esse momento especí$co indica, agorasim, uma temãoprópria= pois há a necessidadede delimitação, o quesigni$ca diferenciação, e o trabalho apresentadoprecisa contribuir, de algum modo, paTcttanto. Nào obstante, vive-se um momento em que essa diferenciação é incipiente e que permite essa inde$nição, melhor dizendo: uma circulação espontânea por um domínio cÜas Ponteiam não estão claramente de$nidm.

De quctlquermodo, CLÚltima palavra é, digamos, imtitucionat: sendo a teseapresentadaà cadeira de sociologia, eta reivindica para si o campo

Intimidar ao dizer queencontraem Bmtide mctisuma "estética" do que

da sociologia estética. (.Que, diga-se de pesagem, jújora

üma "sociologia" -- embora de teorpróprio e Lábioerltre m dum disciplina?' Donde se vê quea deFnição disciplinar é muito mais interessada, dependen-

u sktematiXações de Durkheim e Maus?q') Em depoimentoretrospectivo,

te de momento e situação, do quepropriamente fundada no método e objeto

esqueça de queestáfalendo uma tesede sociologia"?' Entretanto, seria o cmo de indagar se a força produtiva da tesenão

das dbcipLinas, comosuporia uma mentatidacle cientilicista.

msinalado desde

Giba destacou o alerta sempre repetido pelo orientador: "A Senhora não se

Mm nem sempre foi permitido a Gilda essa Liberdade de movimen-

repomaria precisamente nesse balançar entre a sociologia estética e a estéti-

to. Em sua tese reencontramos a mesma labitidade do Mestre. Seria, no

casociológica. Se não seria o ir e vir de uma à outra, seguindo a liberdade anunciadapelo orientador, que teriapossibilitado afeitura dessaobra ímpar gueéA moda no século xix.

95-Antonio Candido, "A sociologia no Brasil", op. cit., p- zzz5' "Reger Bastide dava uma visão aberta da sociologia, sem escola, sem teoria obrigatória, estimulando o desenvolvimento da sensibilidade para a realidade social. As aulas dele eram muito interessantes.Pri-

Por outro lctdo, esseproblema que circumcrevo, sem pretendeTpropTiamentesolucionar sua sutiljiligrana, ra de Gildcl de Melão e Souqa. "Minha

encontrou concretude na própria carreimulher, por exemplo, só davcl cursos

meiro expunha o tema, depois mostrava asdiferentes opiniões a respeito, abrindo um leque que fechava na conclusão.Não era dogmático."(Será que outros eram?) Antonio Cândida, em entrevista a L. C. Jackson, op. cit., p. t57 g6. Tal como demonstrado por Fernanda Peixoto em Z)láZogoiórml/eiras. t/ma an(í/íseda obra de RogerB

ride,ap- dxu

97. Cito Gilda de Mello e Souza,"A estéticarica e a estéticapobre dos professores franceses"

(i97z), in .Ekercúfofde/eifara,op. cit., pp. g-34, esp'pp' g e 3z'34' \ zo Sen.sedm coatescênaw e sentimento da realidade

g8.Ver, a título apenasindicativo, Marcel Mauss, Oeuvrei. Paria: Minuit, ig6g, v. 3, p- i93; tambémp. 444, com referência a Charles Lalo, autor muito importante para asdiscussões empreendidaspor Reger Bastide. 99.Depoimento de Gilda de Mello e Souzana rFLCn-USP,zg ]un. zoom.

121

de sociologia estética, depoispensoupara o Departamento de Filosofa" )w

ÉcLaro quepuLsclCLqui tambémum outroproblema, ligctdoà dimen-

:om a partida de$nitiva de Bmtide e suco substituiçãopor Florestal Fer-

são sincrónica já indicada. .4 tese de Gilda, apresentada em \gSa, foi

üandes, Gitda tramferiu-se para a disciplina de Estética do curso de Filo-

'sendo matutara

sofa -- ondepede então, nào sem con.strições, praticar algo como üma "esté-

\94S e x9St",

e escritct nos arcos anteriores. .4ntonio

Candido,

Em paralelo,

seta marido

desde

i94'3,

isto é, "entre escrea,ia sua

Formação da literatura brasileira gaze,apreienrada em iezz.fnome/zzoi

[lca sociológica" )»~ Na sua diferenciaçãofíerLte a Florestal o fato de "eu [er uma wsão artística das coisa" e Florestal uma visão "científica" --,lül

decisivos, espraia-se sobretudo pelo século xix. De sorte que encontramos

.«d. jú e"á dito. ..aliás, o próprio Ftorestan jú o tinha dito, na curta resenha que escre-

de todos. Ese nossa prosa de acção do século xix, na tese de \ g\o, é tra-

veu, em \ gSZ, da tese da colegct: embora o tom geral seja muito positivo,

tada com admirável saberanict e a autora recorta carinhosamente a pro-

rlo momento de marcar suas diferenças Ftorestan "Lamenta" "a explo-

dução de .41ertcar, Machado

ração abusiva da Liberdade de expressão (a qual não se coaduna com a

sãoas referências ao vestuário no livro cio professor. Mm elas estão !á, à

natureza de um email sociológicos e clfalta de fundamentação empírica

esperado leitor curioso, que vá à cata das velas em que .4ntonio Cândida, no livro publicado em 'l gSC),menciona a modal. De sorte queumcl dimen-

de algumas dm explanações mais sugestiva

para Florestal

e importantes".

Na verdade,

a questão se resume ao emprego das "técnicas de investi-

osdois professores estudando o mesmo período; o saldo é do conhecimento

são até agorcl não $rmctda

e do autor d'À moles\nha,

ncl fortuna

menos evidentes

dm duas obra pode ser nomeadas

gação adequadas", com o que se evidenciam m "vantagens da aborda-

uma parceria codugal.

gem sociológica do fenómeno".'n3 Como destacou Heloisa Pontes, essa restriçõesde Florestal "parecem dizer mais sobre o modelo de excelência

indicado em outro livro,~" temos no grupo da revista Clama um momento

do trabalho

muito particular

cientí$co

que o resenhista

tinha

em mente (.e se empenham,a

Á verdadeira dizer«ão disso não há de ser men.osprelada:comojáfoi no que di{ respeito à orgartilação

clãs relações de género e à

zm praticara do quesobre a natureza substantiva das alegadas Pagilida-

divisãosexual do trabctlho. GiLda, desdea épocade estudante, vaifoÜando

desdo ensaiode GiLda"."'

lugarpróprio e, com msombroscl acuidade, descreve o destino daB mulheres

É essa con.cepçãoprópria e estritct do que deve ser o trabalho em socio-

logia

na tese de 'l g\o, como se estivesse espelhando Selas mais íntimos

dilema:

da qual emergemos célebres"pctdrõesde rigor científico" JÜ' que

'rlarca ameiposição "cientí$ca", Pente à qual o cmaLMetLo e Soara, cada

Por isso, quando da segunda metade do século xix em diante começou

Km a seu tempo e modo, toma distância. Contudo, m di$culdades, para

a interessar-se pelas procissões, encontrou-se diante de um impasse. A carreira, privativa do homem e compreendida, como vimos, em termos de austeridade do tra)e, obrigava-a a desinteressar-se do adorno e a re-

GiLda, são muito maiores)"

nunciar ao comportamento narcísico, como as governantes já o tinham

ioo. Antonio Cândida, entrevista cedida a Luiz Carlos Jackson, op. cit., p- l63. ioi. Sobre as dificuldades de Gilda de Mello e Souza, ver H. Pontes, Z)eifí/zoi müzoi, OP'

cit.,PP.i87-9o.

feito e como o vão fazer as ize#agelrei. Mas não se desiste impunemente de velhos hábitos que anos de vida bloqueada desenvolveram como uma

ioz. Depoimento de Gi]da de Me]]o e Souzana PFI.cm-usp,zg ]un. zoom.

segunda natureza. E lançando-se no áspero mundo dos homens, a mu-

io3. FlorestanFernandes,resenhade Gilda Rochade Melãoe Souza,"A moda no século

lher viu-se dilaceradaentre dois pólos, vivendo simultaneamenteem

xix. Ensaio de sociologia estética", in .4nÁemóí,ano m, v. ix, n' z5, dez. i95z, p' "4o'

dois mundos, com duas ordens diversas de valores. Para viver dentro da

io4. Heloisa Pontes, "Modas e modos: uma leitura enviesadode O espzlào'd

profissão adaptou-se à mentalidade masculina da eficiência e do despojamento, copiando os hábitos do grupo dominante, a sua maneira de vestir,

roupas', Ca-

dernos .f)agzz,n? zz, zoo4) p. l8.

io5. Antonio Candido, "Informação sobre a sociologia em SãoPaulo", in vários autores E/uafaipazz#srw. São Paulo: Anhambi, i958, p. 5i8; cf. tb. Antonio Cândida, "A sociologia no Brasil", op cit.) P 2229

desgostando-se com tudo aquilo que, por ser característico de seu sexo,

io6. Sobre Gilda e sua tese, veja-se a exploração multifacetada de Heloisa Pontes, "Modas

e modos; uma leitura enviesadade O espz'nzo d

roupa", OP-cit.

xzz Sentsodas coaíescêntclas e sentimento da realidade

io7. Heloisa Pontes, Z)einnox müroi, op. cit

123

surgia como símbolo de inferioridade: o brilho dos vestidos, a graça dos

movimentos, o ondulado do corpo E, se na profissão era sempreolhada

.o interpretar

o mctis-que-célebre

coucomo o uniforme épro'pejar

"0

espelho",

de identidade

.4ntonio

Cândida desta

e sem ele o .Alferes é nadd~~

um pouco como um amador, dentro de seu grupo, onde os valores ainda

.:donde sepoderia deduzir quesem o uniforme o crítico não seria crítico... O

se relacionavam com a arte de seduzir, representavaum verdadeiro fracasso. Não é de espantar que essedilaceramento tenha levado a mulher

n.ocoentre a formtcLaçào em Tese e anútese e a análise no "Esquema de Machado de .Assim" é tanto mais $agrante quanto neste último o conto de

ao estado de insegurança e dúvida que perdura até hoje. Pois perdeu

Machado de Assim é compreendido como "uma espécie de aLegoTictmoderna

seu elemento mais poderoso de afirmação e ainda não adquiriu aquela confiança em si que séculos de trabalho implantaram no homem. Mas

àasdivisões da personalidcLdee da relatividctde do ser" , precbamente o $o

é possível que ainda encontre um divisor comum entre valores de seu

searmar comocrítico de literatura Habilitou mecanismosnada despre;;leis naprópria constituição psíquica. Frente a isso, o cienti$cismo com quese precboucircumcrever a sociologia é apenm uma racionatilação, isto é, algo referenteàs camarim mais super$ciais da alma.

grupo e os valores do grupo masculino, e aprenda a inscrever no novo curso de sua vida aqueles elementos que se gravaram na sua individualidade e fazem como que parte de seu ser. E que, combinando a graça com

temático que amarra 'Tese e al\tkese)\l

Por asse vê como a necessicl(üe de

a eGíciência,encontre para si um novo equilíbrio, tão harmonioso como o estilo de vida da mulher do século xlx.l08

Para retornar ao tema do excurso, uma pesagem de'tese e antítese. Nesse Livro, publicado pouco após a nomeação de .4ntortio Cândida para a cadeira

de Teoria Literária e Literaturcl Comparada, o crítico aparece utüeondxzado: "envergando

uniforme adequado, o crítico. ..".l09 Que ete precise do

tlniforme para poder aparecer como crítico remete a um processode identidade do eu, a um hab\MS portanto, imcrito em uma espéciede "dietética entre m disposições e m posições")~Ü Em "Esquema de Machado

Tudo isso resulta em um trabalho extremamente sofisticado que, con tudo, jamais lança mão de cores fortes, um autêntico termo Além;#' lis que exige dos leitores, continuamente, vígil atenção. Tal como no se. guinte passo,dos mais importantes, extraído da ironicamente dispensa vel "Introdução"

da Ãormafâo da Zz'/er.zrura ór ;Ze/ra:

de .4ssis", rii. Cf. Antonio Cândida, "Esquema de Machado de Assis" (ig68), in p'ánoi eafrzfaa,op cit., pp. z7'z8) onde se fala do "símbolo social do uniforme" para dizer "quem sou eu?"

io8. Gilda de Metia e Souza,O expzHra d roupa, op- cit., pp. io6-o7; Gilda Rochade Mello e Souza, .4 moda na iécuZox/x, op. cit., pp. 59-6o. É notável observar, à margem, que Antonio Candido, em "A sociologia no Brasil", embora inventarie os trabalhos de sociologia, deixe de lado a tesede Gilda, na rubrica "sociologias especiais"(op. cit., p. 2232). O mesmo já não ocorre em artigo mais restrito; cf. Antonio Cândida, "Informação sobre a sociologia em São Paulo", op. cit., p. 5zo

Bourdieu também destaca o uniforme em .A4edzlafõei/anca/z amar, op cit., pp. l 87 ss., e a

partir daí sua discussãosobre o Ãaól

no cap- iv-

iiz. Antonio Candido, "Esquema de Machado de Assis", op. cit., p- zg, e Zésee a/zlzteie,op cit., "Prefácio". A proximidade de Zeie e anri2eiecom o "Esquema..." também é atestada pelaaproximação com Conrad ("Esquema-.", pp. 3l-32). Que essaocorrência sintomática

douniforme não é simplesmentetola, atestao próprio crítico, que lançamão de procedi

iog. Antonio Candido, Zeie e a/zlúeie.z: ed. rev., São Paulo: Nacional, i97b "Prefácio'

mento similar na análise de Oswald de Andrade. Cf. Antonio

(sem paginação).

mentalsobre Oswald de Andrade" (i97o), in p'Zn'oselcnroi, op. cit., pp. 8z-83.

iio. P. Bourdieu, .A4edífafõei peca/ia/zm, OP.cit., p. igz e ainda pp. zg8'99, onde se lê:

ii3. "Ora, sempre me comportem no campo dos estudos literários como antes no de sociólo-

[.-] a apropriação da função pelo impetrante também constitui apropriação do impetrante

ga, preferindo também a linguagem corrente e usando com parcimónia os termos técnicos

Cândida, "Digressão senti

pela função: o titular toma possede sua função apenasna medida em que aceita sedeixar

indispensáveis." Antonio Cândida, "Os vários mundos de um humanista" (entrevista), op.

possuir por ela em seu corpo a que sevê obrigado pelo rito de investidura o qual, ao impor a adoção de uma vestimenta em geral, um uniforme --, de uma linguagem, igualmente

cit., p. 38. Provém daí o distanciamento do crítico frente ao "luxo especulativo" (cf. Antonio Candido, "Crítica e sociologia (tentativa de esclarecimento)", op. cit., p. l4). Sobre o termoÀümz/hcomo atitude, ver H. J. Neuschãfer, "Sermo humilis. Oder: was wir mit Erich

padronizada e estilizada, como um uniforme, e de uma Ãexú corporal adequada, pret'nde envolvê-lo, de modo durável, com uma maneira de ser impessoal e a manifestar por ess'

Auerbachvertrieben haben", op' cit., p. 94, que pode ser aproximada à formulação do pró-

gü«sí-anonimato que ele aceita o sacrifício, por vezesexorbitante, da pessoaprivada'

prio Antonio Cândida acercade Bastide, no "Prefácio" a Pnerm do Brmi/, op. cit., p. i4-

L2.4 Seno dm coatescâncimesentimento da realidade

125

meiros românticos e dos críticos estrangeirosque, antes deles, locatilarctm m

O arco que parte dos árcadesconclui em Machado de Assis, confi..rando o movimento de formação da literatura brasileira. Tal arco é

fme arcádica o início da nossaverdadeira Literatura, graça à manifntação de

construído pela perspectiva do narrador dos anos 5o do século xx, que

O leitorperceberá queme coloqueideliberadamenterlo ângulo dos nossospri-

tema, notadamente o Indianismo, que dominarão a produção oitocentistct. Es-

sósepõe na perspectiva dos primeiros românticos para poder ganhar um

sescríticos conceberam a Literatura do Bruit

DO/z" depara;da. Uma vez obtido, o foco trai por completo essaposição,

como ocpressão da realidade local e,

ao mesmo tempo, elementopositivo na contusão nacional. Achei interessante estudar o sentido e a validade hi.stórica dessavelha concepçãocheia de e quívocos, ]ue forma

o ponto de parida

de toda a nossa crítica,

revendo-a na perspectiva

Inirando o livro em narração para um ponto propositadamente além dos

limites propostos, isto é, para o momento de consolidação do processo deformação.A história literária é narrada prospectivamente, focalizada

atüal. Sob esseaspecto, poder-se-ia dileí queo pies'rate Livro con.stitui qadap-

em um ponto que está para além dos limites do período de formação; há

Lando o título do conhecido estudo de Bendaà uma "hbtória dos br

portantouma teleologia, cujo estatuto é preciso compr'ender: ela está

lÍCitos no

seudesejode ter uma Literatura". É um critério válido para quemdota orientação Àiçzónca, se úe/ à arl;cu/afõei e à dirzámica dm oórm /zo reazpot-.].''+

Não é necessáriagrande astúcia para perceber o complexo movimento que se revela nessepasso,embora seja pr'cimo algum esforço p;r; com-

preendê-lo em todos os seusdesdobramentos.Trata-se do problema da textura e densidadedo tempo histórico que arma a história que se quer contar. Em i959, o autor coloca-seintencionalmente na posição dos primeiros românticos, marcandoum primeiro lapso histórico que modelada sua narrativa. Dessa posição, o narrador está em condições de compr:ender

a fase

inscrita na perspectiva do narrador, mas não no processo histórico. Mas

note-sea sofisticação:essateleologia inscrita na perspectiva do narrador limita-seao processode formação e não diz respeito à história como um todo -- e com isso articula-se à totalidade que não é completude. Mas, se por um lado, ela é narrada prospectivamente,

também o é,

aomesmotempo, retrospectivamente, pois que o narrador de i959 está, por outro lado, muito além do momento de Machado de Assis. Notese, portanto, que há um deslocamento ardiloso do narrador, que estan-

do apósa consolidaçãodo sistema literário pretende retroagir para o momento de formação, como estratagema para ganhar um ponto de par-

tida. Uma vez obtido, o foco narrativo é mirado para além do período,

arcádica, imediatamente precedente, em uma determinação que Ihe é especialmente valiosa, a saber, como ponto de partida de um movimenta

que suanarrativa vai querer apanhar.Contudo, a posição do narrador não se confunde absolutamente (conforme parece querer iludir) com a posição dos primeiros românticos, pois a narrativa que se emprestatem como ponto focal Machado de Assis, um acontecimento literário poste dor aos primeiros românticos e cujo aparecimento exigiu uma rotação na perspectiva de compreensão da história literária nacional.' '5

>/irerarzzra ór l/eira, que de fato acabavade ser encerradapor Machadode Assis. Com a cortesiaque todos Ihe conhecemos,Antonio Candido se afastou e cedeu lugar à personagemcentral de seugrande livro". Antonio Calçado,"'Formação da literatura brasileira': um

monólogointerior", in M. A. D'lncao e E. F. Scarabâtolo(orgs.), De'zaodaferra, denroda p;da.&lsafai ioóre ,4nio/zloCa/zdído.São Paulo: Companhia das Letras/Instituto Moreira

Salles,i99z, pp l4z e iSZ. Ou entãoRoberto Schwarz; "Embora não faça parte da fase 'formativa' de que trata o livro, e estejamencionado só umas poucas vezes,Machado é uma dasfiguras centrais, o seu ponto de fuga [--]", in .4o vencedorm óafarai (/). Xormza#íerána e pracesao Sacia/nos Iriúfai da rama/zceórmz/eira. São Paulo; Duas Cidades, 1977, p. 4i, rodapé

ii4 Antonio Cândida,Formaçãoda /fferaruraórml/eira,op' cit.} v. i, p' z5' O leitor deveter em mente essapassagemnos desenvolvimentos que seguem.

ii5. Lúcia Miguel Pereira,/?:çrónada/iterarura órm;/ez'ra.' prosade/cfâo São Paulo/Belo Horizonte: Edusp/Itatiaia,

de i87o a i9Zo'

ig88, pp. 54'5S' Sobre Machado de Assis como

ponto focal da Formarão da/íferafz'ra órwzZefra:"A Formaçãotem seu herói oculto, ou semioculto, preservado com astúcia e maestria. As qualidades desseherói são amealhadas,entesouradas,e se distribuem, ao longo da narração, com p;'cimânia, para que o herói surja, quando surgir, em sua comp]eEae indiscutível glória.[-]

\ z6 Seno dm coatescêmi

e sentimento da realidade

o autor encerra a Ãarmaçãó'/a >

Ver ainda Antonio Candido, Formarão da alerafzzraórmf/eira, op. cit., v. z, pp. io% io4-o5 i93 e ig8-99; /nlc;ardo d /iferarlzraóraffZezra,op. cit., pp. 5z-55. Vale notar que, seMachado deAssisé o ponto de mira da Farmafão, é também uma presençacapital no livro sobre O ozéfada c/bico de Sz7vlaRomeno,como a contraparte equilibrada e madura da crítica literária àépocade Sílvio: Machado aparececomo o grande crítico literário: "rato, gosto, finura e argúcia",informam sua crítica e sãoum ponto de vista fundamental para a análise de Antonio Cândida(ver O métodocrúfco de Sz'avioRamero, op. cit., pp. 28 e 34-35). Esse Machado crítico

reaparecerá ao anal da Ãormafão.Voltarei ao ponto.

127

como é possível apresentar essaestrutura histórica em processo, uma vez que, como se viu, "a formação da literatura brasileira é identificada como uma estrutura histórica" e o desa6lo é compreender seu processo. Ademais, a idéia da literatura brasileira como expressão da realida

mas aquém do narrador migrante por entre os tempos e as perspectivas

O resultado é o adensamentodo tempo histórico e uma narrativa his tórica que nada tem de ingênua, pois constrói no mesmo movimento a perspectiva do narrador e o processo que ele quer narrar.'" O leitor, se desejar,pode ligar com flexinhas os "momentos" abaixo: Árcades

i'? Românticos

Machado de Assis

de local e como elemento da construção nacional, mencionadano passo citado, deve ser compreendida, tendo-se em mente a tomada de posição de Machado de Assim em i873, sem o que a Ãormafâo da #/erarzzraórm;/e;ra perderia um de seus nexos de articulação e estruturação fundamen. tais. Mas, de fato, ela opera um anacronismo complexo, pondo diferentes

Antonio Cândida

Desse esquema poder-se-ia tirar, se fosse o caso, uma representação

temposhistóricos em confronto com o intuito de, do confronto, extrair a

gráfica (como sempr', imperfeita) do problema da totalidade que não

"complementaridade funcional dos momentos e a regra de seu movimen-

êcompletude.

. .

..

.

...

to, além do sistemade paradoxos e de ilusões que Ihe corresponde", se

' Naturalmente, Antonio Candido não pretendenegar toda essamovi-

me é permitido repetir a compreensão acurada de Roberto Schwarz.

mentação pois trata-se de testar a validade, a partir da ' perspetfiva atum , de uma ideia antiga. O entrelaçamento entre a perspectiva anuale a antiga

Retomamos pois àquele domínio, já destacado,de uma história literária que é totalidade, sem pretender contudo a completude. É opor-

.stá amarrado precisamente em Machado de.Assim,Guio senso de maturi

tuno então buscar a aproximação com Erich Auerbach, já que mais atrás

jade(e, portanto, indicativo da consolidação da literatura brasileim) reside, dentre outros aspectos,na solução do problema que articulava o ponto de

armei-me apenas em Curtius. Como se sabe, o intuito de Auerbach -- em consonância com o de Antonio Candido -- é "escrever história";''9

vista dos primeiros românticos, adensadono mencionado Indianismo, que

masessaintenção é desdobrada visando não só "esclarecer em geral a

como se sabe será superado por certo "sentimento íntimo...(e este justa-

mente o marco da maturidade).'" Quer dizer, o que pois.ibilita a Antonio

Candido pretender voltar à posição dos primeiros romãnttcos e precisa-

> ceramuma opção universalizante,traduzida na linguagem civilizada do Ocidente, em terra

mente o fato de que entre a sua posição e eles há Machado, e portanto o

semibárbara como era o Brasil daquele tempo na quase totalidade./A

o[har do narrador da história ]á percebeu o nexo do movimento históri-

e a bem dizer até nossos dias, esse fato foi encarado frequentemente como desvio do 'espírita

co que quer apresentar, revelado na dinâmica dos "momen.ns decis:vos'

nacional', como atraso no processode auto-identificação,que teria requerido de preferência

de Arcádia e Romantismo.':' A questãoem pautamportanto, diz respeitoa

um mergulho profundo nas particularidades do pitoresco e da cor local. Mas na verdade ele re.

partir dos românticos

presentava a incorporação das normas cultas, necessáriaspara nossa configuração como povo Decisivo, no caso, não era o fato em si do artiãcio, que pertence a toda arte, mas o vínculo

íi6. Antonio Cândida está apontando para isso quando afirma ser a Formação "um livro

que ele estabelecia em relação às culturas-matrizes. Do mesmo modo ateou, noutro plano, a

de crítica, mas escrito do ponto de vista histórico". Formarão da /ibera ura órm;/eira, op' cit.,

vitória da língua pomiguesa sobre a língua geral, nos lugares em que essapredominava. Se não fosseassim não seríamos o que somos./A essa luz a literatura dos árcades ganha o seu pleno

v. i, p' Z4;l:=ratambómssiS Obracomo/efa. Rio de Janeiro:Nova Aguilar, ig86, v. 3, p' 8o4;

significado histórico de tradução dagzze/e]oca] nafue/e universal, que permitiria elaborar bem

a inflaçãode pitoresco e particularismo, promovida dali a pouco pela moda romântica, num movimento dialético oportuno. Foi sobretudo por obra do eixo universalizante dos clássicos (no caso brasileiro, ligado de maneira decisiva à civilização urbana de Minas) que se desenvol-

veuem condiçõesfavoráveis a dialética da nossaliteratura no correr do decisivo século xix 'Quando ela atingiu um ponto de maturidade, com Machado de Assim,foi possível ver que o local e o universal, o transitório e o permanente,o particular e o geral estavamdevidamente tecidosna suacarne,como na de qualquer literatura que vale alguma coisa >

ri9- Auerbach, Zz'rerarurspracAeü d PuÓ#ÉEzm,op- cit., p. 20

129 \ z8 Senso dm coaLescênciw e sentimento da rectlidade

peculiaridade dos fenómenos? mas sim as condiçõ.es de seu apalreclmen-

to e a direção de suaatuação".':' A tarefa dessehistoriador é dar conta tanto do movimento das peculiaridades (e, portanto, também das similitudes), como precisa estar sobretudo atento para o processo mesmo, o

transcurso histórico.

Lido no registro limitado do passoque discutimos,trata-se não enas do "aparecimento"

da ídéia que permite escrever a história que

sepretende 'o ponto de vista dos primeiros românticos, o Indlan smo --, mas também da direção de seus efeitos e atuações: que se concretizam

na consolidaçãodo sistemae na superaçãodo Indianismopelo "sentimento íntimo". Lido contudo no âmbito de uma formulação mais geral, o esforço analítico de Auerbach é muito similar ao que Antonio Cândida veio a desenvolver, quase simultaneamente, no Brasil. A essaaltura vale uma interpolação. A problematização do "como escrever história literária? " na Formação da /ífera zzraórm;/e;ra -- que aproximei da solução dos romanistas alemães-- é também tematizada, por um caminho bastante diverso, mas também instrutivo, por Luiz Costa Lama, que retoma uma formulação de Tynianov e Jakobson dos anos lg20:

cueirosromânticos, assim como de Machado de Assis, para o narrador da Formarão? 'zzCosta Lama percebeu bem a questão e a partir dos rus sos elabora seu entendimento da Formação: O princípio da "signifcação

hierárquica"(.clm

obr(uÜ tinha Q imediata van.

tarem de msinaLarqueo exercícioda crítica e a feitura da históriaLiterária supõemnecessariamente a atualilação de valores e não a apreemàode deter minações causal. Tinha ainda a de uttrapusar

a linearidade cronológica dm

hbtórim do século passado, pela combincLção, no presente, de um passado quepermanece vivo e de um futuro que se prqeta. Fossepor in8uância ou por coincidência com a corLcepçãohusserliana do tempo, "retemão" do pensado e 'protemão" do futuro retiravam o tempo clo determinismo mecanicista eforço-

samentelinear dw história tradicionais. Deste modo o tempopodia serloto como instante tridimensional

em que se reatila o investimento diferenciado de

valores. Pensado efuturo se despoyavam do caráter de fatalidade para se tornarem objeto dc escolha; de escolha menos individual

que socialmente motivctda.

Pesado e futuro não são, do ponto de vista do sistema, o quese estende,respectivamente, ctntcse depois, mas o que, no Grites,os agentes culturais sentem como presente e, no depois, como pro)eção antecipadoTa. Nesta sintaniu,

são

os agentes tão condicionados por seu presente quanto dele condicionadores.'zs

,4 história do sistema é, de suaparte, um sistema. O sincronismo pu'o mostra agora ser uma ilusão= cada sistema sincí6nico contém seu mass(do e seufuturo, ' gue ião e/ámen oi ImeparáveZs do iisfema [...]. .4 noção de iiç ema sifzcMnico

literário não coincide com a noção ingénua de época, pois que é comtituüo não só por obras de arte p'óximm no tempo mas também por obra atraídas ao sistema e provenientes de [iteraturm estíangeirm ou de época anteriores.

Por um lado, Costa Lima compreende a mesmainovação que venho destacando;embora por outra via, trata-se da totalidade que não é completude.Por outro, quando destacao problema da significação hie rárquica

que é o que Antonio Candido alocaria na rubrica do juízo de

gosto ,':' da história literária que se funda na atualização de valores, e

Não bastacatalogar osfenómenosexistentesdando-Lhesdireitos iguais; o que importa é sua signifcação hierárquicaparcauma certa época.'

izz. Não se deve cair no erro de uma leitura apressadado "sistema" dos russos:não há sincronismoestrito que trava o andamento da história nem a história é o preenchimento (ou não) de possibilidades dadas ou latentes do sistema.

Na perspectiva adotada por Antonio Candido, .não seria .justamente

rz3. Costa Lama, "Concepção de história literária na 'Formação"', op cit., p. i55

importante a significação hierárquica dos arcadespar? os ;pnllleiros

iz4. "]-.] pois o intuito não 6oi a erudição,masa interpretação,visandoo juízo crítico,

românticos? E não se trataria ainda da significação hierárquica dos pri

fundado sobretudo no gosto.[-.] a crítica viva usa largamente a intuição, aceitando e pro

curandoexprimir as sugestõestrazidaspela leitura. Delas sairá afinal o juízo, que não é )ulgamento puro e simples, mas avaliação,

reconhecimento e definição de valor." Antonio

Cândida,Xarmafâoda /z'lerafz'ra ór í/eira, op. cit., v. i, pp. io e 3i; ver tambémp. 3o.Agua aqui,no juízo de gosto, umje rzexaú gz'a;percebido desde os primórdios da crítica moderna,

a serreconhecidoem Sainte-Beuve,aliásbem lido por nossocrítico. Cf. Antonio Candido, aula-depoimentona FTLcn-usp, z6 jun. zoom)quando destacou a Hgura do crítico francês > (orgs.),

Dentro do [exro, lenHO da vida, OP. cit., P. i5 5'

l 3a Seno das coajescênciasesentimento da realidade

l3i

não em um causalismo cronológico, estáa sublinhar a posição do narrador. no movimento indicado por Antonio Candido na abertura da obra e que destaques anteriormente.

Costa Lima percebe, dessa maneira um

sincrónica".':' De fato, se compreendemos a natureza complexa dessa articulaçãode sincronia e diacronia, tocamos o âmago da obra. Em segundo lugar, alguma lição benjaminiana ajuda-nos a melhor

movimento essencial da Formação, a assunção da construção narrativa

comprender os movimentos de um leitor e narrador.':' Prz/no, a questão

dessa história que compreende o presente, o passado e o futuro, como

da "perspectiva anual", de que fala Antonio Cândida, foi apontada por Walter Benjamin como "a marca da dialética histórica: a fonte de com-

E:Ül11i::'hz

:

:lWW#

para firmar uma expressãoimportante para Auerbach, merece renexão.

Isso pode ser observado pelo menos em dois aspectos'Em pri.l

:'i"g;;, .ü' i.«b"- q-' ' '"'T'f;', """"'::i'l? T';l!:f:Tregno que é precisamente compr"ndido

como o.penoso.de formação

preensãoda história radica no presente do historiador".':: Ora, o presentedo historiador é, em larga medida, aquele "impasse" descrito em "A literatura e a universidade (n)", impasse este que definiu de cima à baixo a tarefa do crítico. A outra face desse mesmo impasse, também já a apontei: a "crítica integrativa". Estas são as tarefas históricas com

da literatura brasileira, abre-sevoluntariamente para o passadoe para

asquais o critico tenta acertar as contas na Formarão e que pautam seu

o futuro, para aquilo que Antonio Candido denomina respectivamente v' ' erioresaoprocessodeconfiguraçãodo "manifestaçõesliterárias",an . .... . ."

lidade complexa e adensada,de uma crítica que se dirige tanto ao seu

"resumo

sistema, e "sistema literário consolidado".

Nesse sentido, o

ilã21Êli ::=!=.=:'==:==m;lf zlH: literárias ' , "A configuração do sistema literário" e "0 sistema literário

andamento.O historiador dialético habita, dessemodo, essatemporapróprio tempo presente como ao tempo passado que ele pretende fazer

viver, narrando-o. Secando,uma vez legitimada, pelo critério benjaminiano,a adjetivação "dialética", é cabível adentrar na tarefa formulada por Benjamin:

consolidado" ':5 Ademais, é evidente a articulação de sincronia e dia-

:::::u:===1'= :: F?:l;lXl;'

com a seqüência temporal dos eventos.ou das obras e seu encadeamento -- mas com a pertinência dos traços de um determinado sistema. Isso se reflete na minha tese sociológica Osparceiros do R;o .Bon;to (i954) e em Formação da /frera zzraórm//eira, publicado em 1959' N.este, nota-se o desejo de ver um sentido diacrónico combinado ao respeito pela visão

iz6. Antonio Cândida, entrevista publicada em eram/gorro/afâo, op. cit., p. ioiz7. Parafraseioum antigo aluno de Antonio Candido, que bem percebeu o rico e matizada diálogoque pauta a obra do professor: "A verdade é que ele jamais foi um mero aplicador dequalquer esquemateórico alheio e, embora perfeitamente informado sobre o que sefazia fora, jamais cedeu a qualquer moda, como se viu nos anos fortes da difusão avassaladora dos

estruturalismos,nos quais manteve firme a posiçãoandformalista que Jádemonstrará, aliás, diantede correntes anteriores. Ao contrário, se destacou precisamente por mostrar como, emnossopaís,de cultura dependente, a qualidade autêntica seachado lado dos produtos au-

como uma espéciede patriarca da crítica literária moderna. Ver ainda Antonio Candido, "Um impressionismo válido"(i958), in Zexrai de ilzren'elzfão,OP cit.) p- 47, e "A literatura

tónomos que souberam incorporar sugestões à substância própria, em geral acumulada por

um processode lenta assimilaçãoda tradição local, em sínteseprudente e lúcida com respeito àstendênciasvindas de fora, como no exemplo famoso de Machado de Assis. No seucaso pessoal,não se pode deixar de verificar como as inúmeras sugestõesou contadosmarcantes quefoi recebendoao ]ongo da vida acabaram por seintegrar à sua ]inha própria de reflexão, mantidacom notável independênciae articulação ao longo dos anos e profundamente enraizadana herança que recebeu de nossa tradição crítica, sem se fechar às novidades, mas

considerando-as sobluz crítica". Davi Arrigucci Jr., "Movimentos de um leitor", in M. A. D'lncao e E. F. Scarabâtolo(orgs.), Z)erzrroda ferra, defino da ],z'da,op. cit., p. ig6. iZ8. Walter Benjamin, Geiamme/fe ScÀrt/}en, org. R. Tiedemann e H. Schweppenhãuser.

literárias, formação literária e o sistemaliterário já consolidado

Frankhrt: Suhrkamp, i99i) v. n 3, p. í359; também v. m, p- zga

i33 1 3z Senso dw codescêncim e sentimento da realidade

lu obra de arte\ integram, pctra aquele que dela se ocupa enquanto historiador diabético, tanto suapré-história como sua pós-história -- uma pós-hÜtÓTia

ervaigucLLaressaintromissão a um nexo causctl.ELa é, antes, um nexo

em virtude da qual também a sua pré'história é compreendida como em mu-

súbito e discreto podem ter sido perdidos há sécuLosb''~

dança cortante.

diabético e os fios que o curso histórico atual apanha novamente de modo

Elw emanam-Lhe como sua função uLtrapwsa sem criadores

3 pode deüarpara

trás suas intenções; como a recepçãopelos s'u corttempa"'

râneos é uma parte constituinte do efeito que a obra de arte tem hde sobre nós mesmos, e como esseefeito baseia-se não somente no corttato com a obra, ma L29

sim com a história que a permitiu perdurar até nossosdias.

É evidente o nexo que tal formulação estabelececom a passagemda Xarmafão que discuto. A idéia dos "momentos decisivos" (pensados como

A essaaltura, convém voltar à mencionada questão das peculiaridades e similitudes, de fundamental importância tanto para Auerbach como paraAntonio Candido, indicando como o problema se coloca para ambos.Entendo que há aqui uma espéciede diabética de aproximação e afastamento,que é ousaria dizer -- a lei narrativa tanto de Mzmeizlç

momentos decisivos de uma estrutura histórica em processo) abre-se

como da Formarão da arar.zzzzra ór IZe/ra. Sem a demonstrar Irzexze/zio.

para aquilo que Benjamin entende como pré-história e pós-história, re-

vou apenas indicar o ponto, de sorte que se possa, caso se queira, ir em

cebendo-as no presente do historiador -- que é um presente complexo,

buscada completude. A dialética de aproximação e afastamento, simi-

dado que, como tentei indicar, ele se situa em meio a um adensamento

litude e peculiaridade, é um procedimento acima de tudo comparatista. Os leitores de Mzmesú percebem já desde o início (isto é, doponzo de

do tempo histórico. Se vale pensar esquematicamente,é só voltar aa ma que deixei sempreencher e perceber que a ideia se formula para cada um dos momentos, e parece que Antonio Candido estava bem ciente disso.';' O movimento revelado na passagem que comento é

o modo como o crítico procura respondera essaexigência.

pari;da) como o andamento da narrativa é eminentemente contrastivo, pautado por similitudes que são destacadas somente para, logo em seguida, serem sutilmente diferenciadas. O movimento de aproximação e diferenciação é a lógica narrativa do livro e, quando Auerbach aponta

um elementodeterminado em um texto qualquer, o leitor só precisa, Cmo se queira considerar a história comoum tacto, então vale para ela o

atento, esperar pelo contraste que esse mesmo elemento ganhará no

lue um autor recentedisseacercado texto Literário: o pesado sedimentou-

transcursoda análise.Em um registro muito maislimitado em tempo e espaço,mas nem por isso menos válido e interessante, pode-sedi-

rteLa imagens

qtce se poderia

comparar

àquelas

que foram .Fendas em um

$lme foto-sensível. "Apenas o futuro dispõe de reveladoresfortes o suf-

zerque a Formarão da #ferarzzraórm;/e;ra, em sua articulação dos "mo-

ciente para permitir que a imagem apareça com tactos os detalhes \-À O método histórico é um método filológico, que tem por base o Livro da

mentosdecisivos" de Arcadismo e Romantismo, opera essadialética da similitude e diferença. Esse movimento central é duro (e ao mesmo

vida. "Leí o quejamais$oi escrito", disseHofmannsthal. O Leitorno qml

tempofácil) de demonstrar, pois desdobra-se na totalidade da obra. O

se há de pensar aqui é o verdadeiro historiador. \.. X Cumprir esta tarefa

próprio autor chamou a atençãopara o problema e para a dificuldade

permanece reservado a uma historiografa cqo objeto não é formado por um novelo clefactuatidades, mas sim por um grupo contado de lias, que

daapresentaçãoresumida,';z e é mediante essemovimento analítico que

apresenta a intromissão de um pensado na textura do presente. ÇSeriaum

izg- Idem, v. n.z, p- 467; ver em geral pp. 467-6g; tb. v. v.l, PP' 587-88. í3o. Por meio das rubricas "plumlização do horizonte temporal" e "convergência de tem

r3i.'Rr.Benjamin,Gesamme/ze ScÁ/{Óren, op. cit., v. i.3, p- iz38, v. n.z, p. 479i3z.Antonio Candido afirma a "solidariedadeestreita" entre Romantismoe Arcadismo. . separados" pela "atitude estética" e "próximos" da /írerafura ór ÍZelra, op' cit., v. i, pp. i6-l7

pela "vocação histórica". Ver Formafâa

E ainda: "sugerir uma certa labilidade que

pos', Flora Süssekindentreviu algo dessaquestão,emborasob outra pe'sp.:ctiva Cf. F Süssekind,"Relógios e ritmos. Emtorno de um comentáriodeAntonio Cândida", in '4 va{

permitisseao leitor sentir, por exemplo, que a separação evidente, do ponto de vista estético,

e a iene. Rio de Janeiro/Belo Horizonte: SenteLetras/UFMG, i998> PP-7t'io3'

suaunidade profunda"

1'54 Seno das coalescêncime sentimento da fealdade

entreasfasesneoclássicae romântica, é contrabalançada, do ponto de vista histórico, pela (idem, p. 36); "a formação da nossa literatura só adquire sentido >

i35

J

se descortina a "peculiaridade" e a "atuação", "complementaridade

trabalho de historiador literário, como se estivessefalando da Forma

funcional dos momentos e a regra de seu movimento". Onde sempre se

fão da # erarzzraaras/Ze/ra: "incrível

tratou de enfatizar a ruptura, Antonio Candido mostra-nos que há continuidade; mas, uma vez indicada a continuidade, é possível aquilatar a diferença (este o movimento crítico por excelência) '" Daí inclusive a

dição, intuição construtiva". Sem menosprezar as primeiras, destaco sobretudo a última, na qual está o fundamental: escolher perspectiva

necessidade de esses dois livros serem lidos por inteiro, pois só assim

se pode percebere adentrar na lógica narrativa dessashistórias, semo que de fato não se os compreende sabe-seque muitas vezes ambos os livros são lidos em seus capítulos, levando à má compreensão ou, no

J

capacidade de trabalho, rara eru-

püviLegicLdas parte o histoTiadot, como sào os pontos de

junção, ou seja, os momentosonde a realidade parece girar no ei)coe o signi$cctdo dos fatos é submetido a um movimento quepode desnortear quem obsena, mu pode também favorecer os golpes certeiros de vi.stalln

mínimo, à incapacidade de real dimensionamento da empreitada."'

Atestam o labor na arquitetura da Formaçãorodapés como "Crí-

tica de poeta" e "Dia longo", de i946. O leitor encontra, a título de exemplo, no primeiro de]esa crítica à ]preienfafâo da poli;a óras;/e;,a. de Manuel Bandeira, e pode ponderar quanto daquelesele-

Não há dúvida de que foi um golpe certeiro, e desnorteou. A essaaltura, aflora algo que foi, anteriormente, relegado a um rodapé e que preciso agora recuperar, a saber, o entendimento de Antonio Can dadoacercados escritos póstumos de Sérgio Buarque de Holanda:

mentos foram levados em consideração na fatura da Formarão.i3SA

percepçãoda "estrutura histórica" da nossaliteratura e da lógica de seu movimento é resultante daquelecrítico que se despoJa"da

Nessetrabalho, liga patente oiá referido seno dm coalescências, quedissolve

visão formal dos compêndios e dos críticos" e mergulha "na bruma sem procurar divida-la, mas tão-somente perceber as formas que a oam".'" Essemergulho, além disso, afina sua sensibilidade para as continuidades, que dão lastro à formação da tradição e à acumu

indbsolúvel da semelhança e da diferença como peculiar ao processo histórico

m divisões deperbdos e restaurao movimento da tradição, falando verojogo dm literatura, comoimtrttmento mediante o qual o crítico deverácaractere Tar cada autor, no que possui de próprio e comumy*

caçãocrítica. Tudo isso converge, ademais, para aquilo que detectou

em um historiador amigo e que se aplica tal e qual ao seu próprio

i37. Antonio Cândida, "Apresentação",in Richard M. Morse, O expeZZo de Próspera.São Paulo:Companhia dasLetras, lg88, pp. io e l í. Essaformulação de Antonio Candido com

> vista na inteireza dos dois movimentos solidários: o neoclássico,de integração; o romântico,

dediferenciação"(idem, v. z, p. z8g). i33. Um outro aspecto desseprocedimento é que ele faculta uma espéciede controle nas construções apoxfenon de continuidades. Cf. Antonio Cândida, Formaçãoda /flerarura óra-

ode com o que Auerbach denominava "2mazi", e que discutiremadiante. i38. Antonio Cândida, "Introdução", in Sérvio Buarque de Holanda, CapzhZosde /zferamra calo/zíaZ,op. cit., p. z3. Nessa concepção da relação de autor e processo histórico pode-se re

conheceruma vez mais o historiador dialético de Walter Benjamin: "Ele faz a épocasaltar da 'continuidade histórica' coisificada, assim como a vida saltar da época e, assim, a obra saltar da

s;/eira, op. cit., v. i, P. l84.

Tanto Roberto Schwarz como Líbia Chiappini já destacaram,cada um a seumodo, essemovimento estrutural da Formarão da /irerafzzraórml/eira, de sorte que a eles remeto

obra de uma vida. Contudo, o resultado dessa construção é que a obra de uma vida é retida e su peradana obra, a época é retida e superada na obra de uma vida eo transcurso histórico é retido

os leitores interessadosem uma prova mais detalhadado argumento. Cf. R. Schwarz, "Os

esuperado/zaépoca". Benjamin, Gexamme/ze ScÀrÓren, op. cit., v. n-z, p- 468. Quero crer que

sete fôlegos de um livro", op. cit., e L. Chiappini) "Formação da literatura brasileira ou a história de um desejo") in ZlnÀa d:água, n' 7) abr. i99o, pp' 'o'z3, que aborda de modo

temos aqui não sÓuma formulação pessoal,mas um tema amplamente referido e problematiza

instigante o problema também na sua contraposição de "vantagens" e "desvantagens Cf. Antonio Cândida, "Crítica de poeta"(i946), republicado em Z;rerarz'ra eSociedade,

n' 6, zoom-o%PP.3o3'o7. Antonio Candi(Ío, "Dia longo"(i946),

.

. ,

republicado em Zireratz'ra e Sociedade,n? 6,

op' cit., p. iii(voltarei

Kanaoverfe

am .4ógr

d. Er

r Roóer

Curam

u/zd .Kar/ .442znnÁezh:

a isso em "Extraprograma"). Nos termos da Ãormaça, podemos ler: "É

necessário um movimento amplo econstanteentreo geral e o particular", "quando seatenta,ao mesmotempo,para o significado histórico do conjunto e o caráter singular dosautores". Antonio Candido,Xarmafãoda Xrera ra órm;Zona,op. cit., v. i, p. 3o. Por fim: aquele "na", sempre destacadopor Benjamin, exprime "mediação". Voltarei ao ponto-

zoom-oz,P.3o8.

\ 36 Seno das coaLescêncim e sentimento da reaLid

do na época; cf. D. Hoeges,

e

i37

Pelo que precede, temos nessepasso a mais sensata(sensatezligada ao

Além de lembrar como essepassoestápróximo do historiador dialético

sereno ,tzz«ziZb) e perspicaz

de que falava Walter Benjamin, atento à pré e pós-história, seria preciso

aproximação

à Xor«cação da //fera

zzra órm;Ze;ru

(mas que trai, na mesma medida, o leitor atento de Mzmesik).'" A súrese, manifesta no "senso das coalescências", é a tarefa e o desafio da história

literária, de que o "crítico" é artíÊce.'40Ela implica o reconhecimento da

esmiuçar um pouco a idéia de tradição. O primeiro aspecto a destacar é a relação disso com a assunção deliberada do ângulo dos primeiros românticos. Antonio Candido increve-se a si mesmo (o "crítico") em um pro-

tradição", estabelecida pelo historiador em função de seu ponto de vista e do seu ângulo de visada. Mas a tradição é movimento, cuja lógica é o dito

cessohistórico do qual é parte, embora o observe. Com isso, reconhece

"jogo indissolúvel" de semelhançae diferença, cuja consideração.implica.e possibilita -- e somente ela reconhecer o "processo histórico ' de uma determinada literatura (nacional) como específico,marca da "originalidade"

sição.O acumulado é mobilizado no trabalho do crítico, em suatentativa

É no interior desseprocesso histórico que o crítico encontra os elementos da caracterização dos autores e das obras, que serão sempre ponderados

parte. Para tanto, lança mão do recurso que indiquei anteriormente, ao

segundo o duplo parâmetro da similitude e particularidade..Há, pois, uma

uma tradição, invenção esta que é retomada pelo critico, ao mesmo tempo

espéciede interação, na qual o processo histórico depende das obras e dos autores e na qual estesdependem daquele. A exigência de síntesecom que

que precisa

um processo de acumulação intelectual, a partir do qual buscara sua pode síntese,tal qual no caso Machado de Assim.Portanto, Antonio Candido supõe uma tradição ]á existente, que exige sua ponderação, mas da qual é falar do adensamento histórico. Os românticos, a seu tempo, inventaram ser superada

(no sentido

benjaminiano,

indicado:

"aüWewaÁrt

"

Em um livro de crítica, mas escrito do ponto de a,isto histórico, como este,

e "aze#geÃoóen '). Essa tarefa dúplice é realizada, em parte, por conta dos movimentos do crítico, já que sua posição conjuga, na temporalidade adensada,o processo de formação com a perspectiva do sistema já formado. Por conta disso, a tradição precisou ser concebida como um processo e uma construção, interessada (daí, inclusive, a "literatura empenhada"), ponto de articulação da estrutura histórica que se quer compreender, marcada

n obras não podem apctreceíem si, na CLUtOnOmia que manifestam, quando abstraímos u circumtâncim enumeradas; aparecem,porjorça da perspectiva

por continuidades e diferenciações; daí seu caráter, digamos, "materialista", para firmar a adjetivaçãoque um de seusleitores Ihe atribuiu.:': A

escolhida, integrando em um dado momento um sistema articulado e, ao in-

tradição é uma construção histórica que se mostra a cada vez em sua face

sedefronta o crítico deve, precisamente,dar conta dessemovimento, no que a idéia de tradição vem a auxilia-lo. Não por acaso,portanto, o movimento da tradição foi também destacado na Formação:

fluir sobre a elaboração de outras, formarão, no tempo, uma tradição."' i4z' Cf. R. Schwarz, "Sobre a Forazafâo da /llerarura órmz'/e;ra", in Se7#éncz'

op' cit., p. zo' Ver aindaAntonio Cândida,"Notas de crítica literária i39. A essaaltura, na décadade i99o, Antonio Candido )á tinha expostocom clarezaseu

órmz'/ezraí

a/7oic#a /zo.Brmz/:

(i94S), in Zex os de z'nren'enfio, op. cit., p. z63 Em rodapé anterior, destaques a presença

Hteresse incomum com relação a Auerbach. Voltarei ao assuntomais à frente.

dessaquestãoem Sérgio Buarque. Uma aluna suaformulou o ponto do seguintemodo:

í4o. No mesmo sentido, em rodapé nos anos i94o, Antonio Cândida afirmou que é "pró-

'Há um fulcro inspirador comum a todos os seustrabalhos, que é a reconstimição das ten iões entre as tradições e a mudança histórica, sucessivamente retomadas em suasobras

prio do historiador" o "sentimento dos conjuntos". Antonio Cândida, "Crítica de poet' (i946), republicado em Zflerarizra esociedade,n? 6, 200i-oz, P' 3o5'

sob ângulos de abordagens diferentes". Mana Odila Dias, "Sérgio Buarque de Holanda

i4i. Antonio Candido,Formação da /írerafzzra traí/eira, op' cit., v. i, p z4)ver tambémp. zg;

historiador", in Anronio Candido(org.),

em "Letras e idéias no período colonial(Exposição didática)", in -Z'íferaíüíae Sac;idade,OP

Fundação Perdeu Abramo, í998, p rí. Se assinala, é porque isso talvez possa vir a ajudar a

cit., p. 84, encontramos formulação quaseliteralmente idêntica. E, em entrevista: "Quando uma obra se articula com outras obras e cria uma tradição forma-se o sistema, e aí iã esta-

O nexo "persistência e mudança" poderia servir para indicar esseprocesso (ver Xormafãa

mos no terreno da história ]iterária.[-.]

da /frerafura óra;/ez ra, op' cit., v. i, p. i84) e é centra! em Orparfez'ras do Rz'o Banzro,op- cit

Na Farmafâo, que é um livro de história literári%

vejo não apenas a obra, mas o significado histórico da obra tomada em relação àsoutras obras". Antonio Cândida, entrevista a L. C. Jackson,op. cit., PP.: z8-zg- Note-se, presentes o movimento de aproximar e afastar, o ca/nparaf; ümo-

\ 38 Serra du coaLescênciae sentimento da realidade

compreender

com mais acurácia

Sérg;o Bazar?uede J7o/fiada e o Brml/. São Paulo

o sentido

da tradição

na Formarão

da/rrerarlzra

órmz'/ez'ra.

cujo título de publicação, tal como anunciado inicialmente, seria Periüréncza e muda/zfa. E lido aoÓre a crime /zoxme;oi de z'da do ca@z rapou/üra.

Sobre esses títulos e variações,

ver a

entrevista a Luiz C. Jackson, op. cit., p. l42.

i39

de constructo, como mobilização de uma atividade crítica específica, que cabe ao crítico reconhecer. O reconhecimento dessatessitura especíGíca da

nacional na forma de uma "crítica viva"

tradição é aquilo que Benjamin também tinha em vista ao falar do irromper da continuidade histórica (ademais, como sabem os leitores da Formação,

falta de massacrítica e ver-se forçado a assumir o traje de crítico, no

a "verificação crítica da tradição" é uma dimensão fundamental do processoformativo'';). Não se trata de uma continuidade morta. O historia-

mental da tradição, como trabalho sucessivo e continuado das gerações,

dor dialético, o crítico, a reconhece como viva, pulsante, força que modela

não somente literatura -- um processo de üdependZnc/a, que vale dizer

dimensões da obra e é por ela modelada. Ao fazê-lo, encontra critério para a avaliação da obra, mas também do transcurso histórico, que no caso é o

maturidade.i47Maturação, portanto, resultante de acumulação, ciclo

processo formativo da literatura brasileira. No mesmo golpe, refere-se ao presente, no qual o crítico está enraizado.'"

os haveres de uns e outros que se enriquece o pecúlio comum", isso

O enraizamento do crítico no presentemodela-se segundo o reconhecimento da tradição, pois o trabalho de Antonio Cândida recupera,

para retomar a rubrica dada

na Formação--, cujo vértice foi Machado de Assis. Este, ao diagnosticar célebre "Instinto de nacionalidade" (1873), destacara o papel fundado qual resultaria a "fisionomia própria ao pensamento nacional", e

que Antonio Candido entenderá completo com Machado. Se é "com

vale tanto para Machado como para Candido. Note-se, portanto, que o momento de acabamentodo ciclo formativo coincide com o momento de autoconsciência na crítica. Se para Machado de Assis falta a críti-

passoa passo,o lugar do crítico e historiador literário, dialogando, corrigindo e acumulando,tal como, no âmbito da literatura propriamente

ca, como dimensão auto-reflexiva da literatura nacional, para Antonio Candido o dignóstico machadiano da falta já é, ele mesmo, a dimensão

dita. Machado de Assis

auto-reflexiva.i48

"na verdade ele foi, sob vários aspectos, con-

tinuador genial, não figura isolada e literariamente sem genealogia no

Brasil".''s Há um paralelo entre as posiçõesque ambos ocupam, que

E por essa razão

que a /brmafão

da azerarzzra óra.sz'Ze/ra

termina com a citação do "Instinto de nacionalidade", a que Antonio Candido emenda:

se revela, por exemplo, através das aparições de Machado na Forma-

ção,que delineiam uma fisionomia do historiador dialético.'" Reforça

Estro palavras exprimem o ponto de maturidade da cHticcl romêLntica;a com

essaimpressão o paralelismo com a tomada de consciência da literatura

ciêncict real que o Romantismo ctdquiriu do seu signi$cado hi.stórica. Elu

são

Cede quctdm, portanto, para encerrar este Livro, onde se procurou justamente lescTever o processo por meio do quctl os brmiLeiros tomaram consciência dçt i43. R. Schwarz, "Os sete fôlegos de um livro", op. cit., p. 47' i44. O referir a tradição ao presente provém, segundo Roberto Schwarz, da lição de Mário

deAndrade (do ano igz5). Ver Schwarz,"Os setefôlegosde um livro", op cit., p- 48. Benjamin, em i93i, formulou tarefa similar: "Pois não setrata, decerto, de apresentar asobras literárias em conexão com sua época, mas sim de, na época na qual elas surgiram, trazer à tona a época que asreconhece ou seja,a nossa.Com isso, a literatura torna-se um oganon da história e estaé a tarefa da história literária e não converter a literatura em matéria da

história." W. Benjamin, Gesamme/ e ScÃrlÓzen, op. cit., v. m) p. zgo' i45- Antonio Candido, Ãormafü da Zz'reraMra órafZé;ru,op- cit., v. z, p' i93} ver também pp. io4'35'

sua exi.stência espiritual e social atrcwés da literatura, combinando de modo va/za oi

azares anzverian

coãz a rea/zc/a(/e foca/ [...].14p

Creio perceber uma dupla dimensão nessamaturidade, que remete ao esqueminha que deixei para ser completado. Ela realiza-se, em meio àquela

temporalidade complexa (e, note-se, não em dois momentos diferentes), em Machado de Assimcrítico e em Antonio Candido, que realiza aquela crítica que Machado diagnosticara faltante. Portanto, os dois ocupam

i46. Ver Antonio Cândida,Ãormafâada /írerafuraaras;/e;ra,op. cit.) v. z, PP' iob io4-o51

i93 e ig8-99. P. E. Arantes, em"Providênciasde um crítico literário na periferiado capitalismo", op. cit., pp. zg-3o) apontou com precisão esseparalelismo. Valeria, então,em

i47 Machado de Assis, "Instinto de nacionalidade", in Obra compZera,op. cit., v. 3, p- 8ol

dupla face, a caracterização de Roberto Schwarz: alcançámos "uma síntese superior, que

Acrescente-sea isso o comentário de Antonio Candido acerca de Gonçalves de Magalhães

[-.] recupera os momentos ruins e bons e os transforma em acertos máximos". R. Schwarz,

naFormarãoda #rerafüraórmiZeira,op. cit., v. z, p. z95.

[/m mestrenaper!cenado cáfila/ümo.'A/achadode.4siü, OP.cit., p. zz4; ver tb. p- n8 e, do

i48. Ver Machado de Assim,"Instinto de nacionalidade", op. cit., p. 8o4, passoque é citado

mesmo autor, acentuando o caráter duplo, crítico e cumulativo, "Nacional por subtração",

por Antonio Candido em O método crúlco de S#i,z o Romeno,op. cit., p. z8.

in blue Àorm-sâo.P,op. cit.} PP. Z9 48.

i49 Antonio Cândida,Formarãoda Zz'reparara órmí/e;ra,op. cit., v. z, p. 3z7-

\4a Senso dm coatescência e sentimento da realidade

i41

uma mesma posição, a da auto-reflexão. Isso é evidenciado por um detalhe de escrita, significativo, na Formação.Uma vista d'olhos no livro

expectativa hegeliana da eternização do presente, mas adentra em nova

fase,que recebeo nome de "sistema consolidado

revela que o capítulo final, "A consciência literária", assenta-sesobre a

idéia de que a crítica é "de certo modo a consciênciada literatura" ,'5' passando portanto a investiga-la e culminando no passo citado logo acima,

Excursosobre uma dúvida. que se atreva ao anterior

com que finaliza a obra, vale dizer a história do processo formativo. O

vértice desseprocesso recebeo epíteto de "crítica viva", que é exata-

Não tenha clareza com relação às comeqilências Q sacar desse mo'pimento e

mente a mesma expressão com que Antonio Candido, no início do livro, define seu próprio trabalho.'s' Portanto, do mesmo modo como há uma

creio que isso se de'pe clo caráterpouco

circularidade que ata o ponto de partida e o ponto de chegadado livro, a

fiação, mas a do enLaçamento, do congregar. Será que, umcl veX.comoLidcLdo

"crítica viva" está nos dois momentos, que se amalgamam no âmbito da

o sistema, ete pensa a operar segundo a lógica da diferenciação?.4 questão

elaboTctdo dct noção de sktema ope

Tarte. Pelo medos rlo processo de formação, sua lógica não é a da diferem

é oportuna, caso se queira compreender a posição do autor que escreve a

estrutura em processo "'

Notemos que ao final da Formaçãoa crítica é pensada como inte-

Formação da literatura brasileira. Poú. como se vzzza'zpmsagem em gue

rior ao processo da literatura ou, em outros termos, a crítica é a dimen.

,4ntonio Cândida matutava acerca do !ivro ainda não escrito, como uma saí-

são de autoconsciência da literatura e, de modo hegeliano, quando ela chega, mostra o acabamento do processo formativo. O fato é prenhe

dado impmse, o Crítico supunha queo processode difererLciaçàobale dizer

de sentido, pois o modelo do "sistema literário", como triangulação

tratar dctsociologict nacional em um verbete de encictopédi(t -- embora a esse

de autores (e obras), público e tradição, não implicaria necessariamen

texto não possa ser atribuído o mesmo peso que a um tacto como CL'Eotma-

te a crítica como coruja de Minerva

embora ela sejacertamenteum

elemento significativo no sistema "configurado".

Entretanto, uma

!specialilaçãoÜ disciplinar ofereceria solução para a crítica, msim como, ao

lâd'~ --, detectou o momento de maturidade como autonomização por conta

deumprocessode diferenciação. Se a lógica da diferenciação entra-sistémica

vez em "interação dinâmica",'s; o sistemanão segueabsolutamentea > pp' 34, 3i' A idéia da "interação dinâmica" ponteia recorrentemente em sextosda época; ap'nas' título de exemplo, ver "0 escritor e o público" (i955) e "Letras e idéias no período

i5o.Id.,ibid., p. z85. l 5i. Antonio Candido, Formaçãoda /íferarzzra órmf/eira, OP-cit., v. i, P 3b v' z, PP' 3'7'Z7. O

colonial (exposição didática)"

mesmoocorre na "Entrevista comAntonio Cândida", in ]nveil@afõei,op. cit., p. il.

mentepp 68 e 84. Não obstante

] 5z. Ousaria ainda acrescentar, por minha conta e risco, que essa adjetivação sugestiva reaparece, não sem razão, na própria formulação da relação de forma literária e processo social,

tema" --, é o casode deixar claro que, rigorosamente falando, o sistematriangulapro./urorei (autores), receptores(público) e um iü/e«.a de na«s«:üsão(tradição), conforme se vê em

como quando o crítico afirma que "a ligação entre a literatura e a sociedadeé percebida de maneira viva quando tentamos descobrir como as sugestõese influências do meio se

Antonio Candido, Formarão da #rerarüraóraçl/ez'ra,op. cit., v. i, p z3- Foi em /nzc;afãs.i Zz ferarizraÓrmz/eiraonde Antonio Candido formulou com maior acuidade o ponto: "Entendo

incorporam à estrutura da obra

ciais, para se tornarem a substância do ato criador". Antonio Candido, "Literatura de dois

aqui por súrema a articulação dos elementos que constituem a atividade literária regular: auloreiformando um conjunto virtual e veículos que permitem o seu relacionamento, deíi.

gumes", op. cit., p. i63-64. Problema, contudo, que é deixado de lado neste estuda i53. Antonio Cândida, Formarão da /z'lerarizraór ;/e;ra, op' cit., v. i, p' :6, remetendo a

nindo urna 'vida literária'; pzíó/zcai, restritos ou amplos, capazesde ler ou ouvir as obras, permitindo com isso que elas circulem e atraem;lrad#âo, que é o reconhecimento de obras e

Thomas

autorespr'cedentes, funcionando como exemplo ou Justificativa daquilo que sequer fazer, mesmoque sela para rejeitar". Obra citada, pp. í4-i5. Note-se, apenaspara fim de clareza que a triangulação autor obra - público congrega "os três elementos fundamentais da co-

C. Pollock,

de modo tão visceral que deixam de ser propriamente so-

7%e .Azarüre aÍ Z,iferarlzre. /n Re/alzon

o Sclence, Za/zguage and /fuma/z

Experzence. Princeton: Princeton University Press, l94b e ao próprio Antonio Cândida, Arte e sociedade", Bo/eam de Psz'co/agia,ano io, n' 35'36, i958, pp. z6-43, texto que foi, posteriormente, republicado em Ziferarara e ioc;idade com o título "A literatura e a vida social", no qual, ao final, cita-se novamente o mesmo Pollock, com o fim de definir a "série interativa: obra-autor-público". Antonio Cândida, "A literatura e a vida social", op. cit.}>

\ AI

Senso d©

coaLescênciu

e sentimento

da realidade

(ig6i),

ambos em Z,zferarura e ioczedade, op. cit., respectiva-

ainda mais quando não pretendo discutir a idéia de "sis.

municação humana" ("A literatura e a vida social", op. cit., p. zz), mas por si só não permite

falar em sistemaliterário, que exige a tradição/sistema de transmissão. i54.Antonio Candido, "A sociologia no Brasil", op. cit., p. zzz7-

i43

pensa a operar (pois ela não vale na etapa formativa, ao contrários, crítica a história [iterárim autonomizar-se-icemfrente à Literatura e a pesagem da

crítica para a universidademarcaria essemomento)55Isso explicaria, por Km lado, o fato de que tanto Maca(do de .4ssis como .4ntonio Candido, num

;efta sentUo, ocupam o mesmolugar, comomomento de auto-re$eJcào.Por

nutro,explica queesselugar é outro,pois, sellm é o lugar da completudedct etapa formativa,

o outro é o Lugar da autonomia(anãoda crítica e da história

literária Pente à titercttura. Esse movimento de autonomizaçãose fal. sob a

cheia de equívocos", da qual contudo não abre mão). Essadescontinuidadeaponta para o presente do historiador, que sabe reconhecer que, não obstante a formação do sistema literário, a sociedade como um todo -- e Daqual aquelesistema existe -- não concluiu aquele prometomoderno.157 Há um descompassoentre a maioridade da literatura nacional e a maioridade nacional propriamente dita -- Antonio Candido destacaa "formação nacional" como elemento relevante na /brmafâoiS8--, que ressalta,mostrando ao mesmotempo a atualidade e a inatualidade do prometoromântico.

tocamos novamente no cmo-modelo Lamon. Mas, tanto Lá como (qui, não se

Disse, mais atrás, que a compreensão da natureza da articulação dediacronia e sincronia leva-nos ao âmago da formação (tanto do livro como do problema). Anoto então que há uma correspondência (estru

trata de tramformar a crítica Literária nem a história Literária em ciência, e

rural?) entre a descontinuidade diacrónica, enfatizada por Paulo Emílio

Isso é um problema. Daí, talvez, a necessidade do uniforme.

fales Games ao tratar do cinema nacional, e a descontinuidade sincrâ

égide da especialização -- que no cma em pauta é decorrente da universidade --,

com a necessidadede responderàs ucigênciu de cienti$cidade, com o que

Uniforme de múltiplas funções,sela dito, pois, além de envergadopelo professoruniversitário epelo CTÍtiCO, esped$caesteÚltimo. Certafeita, $alctndo dos críticos, .4ntonio Canllido separou os "cr(tacospro$ssionais" dos "artista

nucaque a formação da literatura brasileira sofre na suarelaçãocom o restante da sociedade, cultura, política e economia nacionais.'s9

É instrutivo relembrar um dos modos como Antonio Candido tra

diferenciação e especialização.E anos depois,fatcLndode Sérvio Miltiet -- uma

balhou feições específicasdessasdescontinuidades. No resumo históri co da literatura brasileira, enfatizando a relação da formação da libera

$gura anterior a esseprocesso --, vinculou o "crítico literário" , categoria na qual

Lurabrasileira com a formação da sociedadebrasileira, afirmou:

;dadores", praticantes ocasioTI.aisda crítica, tocando a cerne do processo de

se incluía, creio, ao processode especiali=(ação dbciplinar

certamente um dos

aspectosvotos e antevistos no texto sobrea literatura e a universidadeJU

Á sociedade cotoniat brasileira não foi, portanto qcomo teria preferido quefosse

certa imaginação romântica nacionalistas, um prolongamento dm ctttturu locais, mais ou menosdestruíam. Foi tramposição du !eb, dos costumes,do aqui lamento espiritual das metrópoles.''!partir dessadiferença de ritmos de vida e

Ao lado dessas especulações, há um aspecto ainda pendente da citação

de modalidades culturaisformou-se a sociedadebrmiteira, queviveu desdecedo

que discuto. Embora retome o ângulo dos primeiros românticos, Antonio Candido não tem dúvidas quanto à conclusãoda etapaformativa da

a di$ciLsimaçãode contactoerLtreÍormm primitivas e formas avançada, l,ida

literatura brasileira, a consolidação do sistema. Assim, o empenho forma

fora para transformar-se à medida quedeformava uma sociedadenovas'"

tivo daqueles não tem mais razão de ser, mas mesmo assim é valorizado pelo crítico -- embora não sem distanciamento irónico("velha concepção

rude e vida requintada. .assim, a literatura não "nuceu" aqui; veio pronta de

i57. Aqui reencontramos aquele "tornamo-nos modernos, mas peculiarmente modernos",

queassinaleianteriormentena leitura deTrotsky por Roberto Schwarz. i55. Em rodapé sobre a crítica de Álvaro Lins, Antonio Cândida afirmou que "a crítica é

um gêneroliterário como os outros", incluindo-a portanto no registro do "movimenta literário". Antonio Candido,"Sobre um crítico" (i946), republicado em Rematedea4a/es,

númeroespecial,i999, p. i8. l 56. Cf. Antonio Candido, "Crítica de poeta"(i946), republicado em Zflerarzzrae socfedde, n? 6, zoom-o% pp

3o3-o4 e "0

ato crítico"

(i978),

in 4 eduçafãope/a

/zo;re & Olzfros emaios,

i58. Antonio

Candido, Formarão da /í/eralzzra ór

z'/eira, op. cit., v. 1, p i6; ver ainda pp. n7

e z8i, v. 2, pp. i2} zo, 43-44)99) iol e 326. i59' Essemesmoproblema, manifesto em outra dimensão,foi alentado,no que precede, com relação à interpretação de Machado de Assis por Roberto Schwarz, quando o mesmo PauloEmílio foi trazido à baila. i6o. Antonio Candido, /níc;ardo .i aferafüfa órm-í/e;ra, op cit., p. iz. O leitor sente a aâni-

dadecom Faoro?

OP. cit.,P. lz6.

\ 44 Seno dm coaLescêncim e sentimento da realidade

i45

Há uma percepção de diferentes ritmos de desenvolvimento coetâneos,

material para reflexão, meio século transcorrido

donde uma consciência matizada da tessitura histórica presente. Assim

quela estética da recepção a7'z#l /a Zezrretecida pela idéia de sistema

parte decerto da-

como essaformação social marcadapor uma simultaneidade do que

literário.''; Essa atualidade da obra em múltiplas temporalidades indica

não é simultâneo, há também uma assincronia que se manifestará no próprio processo da literatura brasileira. Roberto Schwarz destacou

a-acuidadedo foco e a perspicácia crítica da volta àquele ângulo antigo, o que poderia certamente ser caracterizado, para utilizar uma expres-

com acuidade aspectos centrais desse descompasso:

sãodo próprio Antonio Candido,como "um sentimentode oportunidadehistórica"."' A articulação com o caráter empenhado,o desejo

tou, e é certo que algo do dé$cit se Eram.emitiue se trctn.emite à esfera literária,

de "construção do país livre",''s revelou-se anualem vários momentos históricos, oferecendo uma espécie de ancoragem àquela noção de tra-

onde afasta de organicidade, sefoi superctdaem certosentido, em outro conti-

dição-- impedindo-a de transformar-se em uma continuidade homo-

rlua viva. Esta posição distanciada, mm não por completo, que defato exbte rlo livro em relação ao movimento da formação, representa um modo real e

gêna,uma massaamorfa -- e lastro ao adensamento histórico operado

apropriado de comciência histórica. O Livro que soube perceber o percurso efe-

de espírito",

tivo da Literatura nacional con.statavaum movimento quese completou e nem

aproveitou-se dela.

em outro âmbito, a$ormação do país independente e integrado não se comple-

pelo crítico, em seu movimento. Daí ele afirmar que essa"disposição

Não demomtrava também que aó

foi "do maior proveito":"

até ele

Note-se então que o "ponto de partida" de que falava Antonio

por isso tran.sformouo Brwil. O sistema Literário integradofuncionaria como üma antecipação de integrações futura?

"historicamente",

Candido não deve ser compreendido como um "início", como um come-

elites podiam ir Longe, sem necessidadede se falarem acompanhar pelo res-

ço ontológico (donde se vê a resposta que cabe às críticas que rejeitam

tante dopaís? Serão ritmos desiguais, quenaLgtlm momento convergirãopara

a Formarãoda /crer.zrzzra órm//e/rapor deixar de lado o que vem antes

formar um uníssono? São discrepâncias que falem duvidar da hipótese e até

da necessidade segundo o prisma

da convergência? Quais os resultados a

tirar dessascomteLaçõesde resultados, quesintetizam a experiência nacional e armam equações decisiva para o mundo corttemporaneo?''*

dosárcades), mas apenascomo um ponto a partir do qual o historiador começaa desenrolar o novelo narrativo de suahistória,'" golpe de vista certeiro, ponto que revela a perspectiva adotada e que, sebem escolhido e moldado, deve servir de modo ótimo para a forma narrativa (que, não

custa dizê-lo, é forma de conhecimento) que se almeja. Esse ponto de

Embora concorde com todas as questões formuladas por Roberto, não

é certo que o crítico, nos anos i95o, estivessecontando com todas e[asao escrever a Formação.''zMas isso não altera nada, ]á que não se trata de rastrear intenções, mais ou menos ocultas, de autores, e sim de compreender textos que, sabemos há muito, possuem vida própria

i63. Confira-se o feito, afora a Formação,do modo mais explícito em "0 escritor e o público", op. cit., p. ex. p. 68: "A literatura é pois um sistemavivo de obras, agindo umas sobre as outrase sobre os leitores; e só vive na medida em que estesa vivem, decifrando-a, aceitando-a, deformando-a. A obra não é produto âxo, unívoco ante qualquer público; nem esteé

Com o resultado adicional de mostrar que a atualidade da obra não

passivo,homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito. São dois termos que atuam

se restringe ao seu momento de publicação, mas continua oferecendo

um sobre o outro, e aos quais se junta o autor, termo inicial desseprocesso de circulação literária, para configurar a realidade da literatura aquandono tempo i64. Antonio Candido, tomada de posição republicada em Zenai de irzfen'enfio, op. cit.,

i6i. Roberto Schwarz, "Os sete fôlegos de um livro", op. cit., pp. 53 e 56. Aqui, Roberta desenvolve um argumento rápido de Antonio Cândida em "Poesia, documento e história", in Brl#ada /ígeíra e o ziroi eicHlof, OP.cit.> 199% pp' 45 e 47.

r6z. E, sem querer forçar a interpretação, é sintomático notar que, quando inquirido acerca dessasformulações de Roberto Schwarz, Antonio Cândida tenha, após um repique inicial, desviado a conversa, como aliás confessoude imediato. Cf. Antonio Candido, entrevista a

L. C. Jackson,op. cit., pp. i74-75

! A6 Senso dm coaLescêncim e sentimento da reatidacle

P. io5 í65.Antonio Candido, Ãormqâo da Zzrerara ór /Ze;ra,op. cit., v. i, p. z6; ver também pp. i7-i8.

i66.Id.,ibid.,p. 26 i67. O próprio Antonio Candido explicita ta! posição: "Já que é preciso um começo, tomei como ponto de partida.-", in Xormafâo da #ferafzzraór ÍZe;ra,op. cit., v. 1, p z5. Sobre o tema, ver Edward W Said, Begirznãugs. Znfenríanand .44erÀod.Nova ed., Nova York: Columbia University Press, ig85, com referência ao problema em Auerbach nas pp. 68 ss.

i47

abdicada completude. Daí a importância daquele procedimento que destaques,lógica de aproximaçãoe diferenciação, que dá lugar e des-

partida é, nada mais, nada menos, o que Auerbach denomina ".dmarÍ" e que procurou explicitar em algumas passagensde sua.obra tardia.'a

dobra o que é "caracteristicamente singular". O leitor nota, sem grande

O .4/zsal{é elemento estruturante da prática filológica(vale dizer:

cognitiva e expressiva)de Auerbach, ao mesmo tempo que propiciou uma de suas raras manifestações metodológicas explícitas. O termo é de

diHcil versão, comportando várias dimensõesde significado, que um alu-

no, Holdheim, procurou detalhar.Ele funcionacomo um ponto de partida, de alavancagem da análise histórica, e nessesentido o termo possui as nuances de crescimento, expansão, desdobramento, irradiação, de sorte que através dele a investigação pode contemplar um desenvolvimento que

esforço,como a For«'afãs da //lera üra ór«.,í/e;ra(e o mesmo vale para 7Üzmesü)pode ser entendida segundo essaformulação. Um de seusleitoresdestacou essaembocadura, embora vindo de um ângulo diverso: Na preceito formativa segundo o qual se deve começar colhendo um problema na sua feição Local, está claramente pressuposto a convicção de que se pode

alcançarCLreal universalidade do problema em questão%ar kso mesmosem-

articula uma dimensão particular à totalidade, operando portanto uma

pre determincLdahmediante o aprofundamento das sugestõesLocais,quesão

síntese. No caso limite, "the whole is potentially contained in the part"1'9

parte dct evolução mundial do conjunto)n'

-- o que significaria, no caso em pauta, que a estrutura histórica pode ser compreendida a partir de seus "momentos decisivos

Auerbach afirma que o .4niaf{ precisa possuir uma força de irra fiação excepcional, de sorte que se possa,a partir dele, desdobrar toda a história.'"

Mais ainda, o "método" de Auerbach

formulado simultaneamente à

Ãormafão estána mais fina sintonia com o método do crítico brasileiro, tanto nos objetivos visados como na maneira de conduzir a pesquisa: "Escolher questões singulares de tal modo, desdobra-las e

combina-las, que elas amuamcomo problemas-chave e abrem a totalidade. [...] A totalidade seria então moldada de modo a aduar como uma

Se é impossível reunir todos os singulares em uma síntese, salve{ seja possív'l :Regar à síntese mediante o desdobramento do que é caracteristicamente sin-

gular. Esse método con.seteem encontrar A.nsãme ou problema-chave, nos

quais vate a pena se especializar,pois delessai um caminho queLevaao co nhecimento de nacos tab, que a tul. que deles irradia como que ilumina toda

unidade dialética [...]".''3

Esteé o método do conhecimento "filológico" que Auerbach almeja e desenvolveuem seusescritos. Note-se essainclinação para a questão específica, que vai sendo desdobrada infinitamente, até revelar-se como uma via de acesso privilegiada ao todo, percebido como "unidade

uma paisagem históricay*

Em primeiro lugar, a desconfiançafrente às totalizaçoesdas histórias "catalográficas", que começam no início e terminam no fim, e a proposta

de um outro caminhopara a pesquisahistórica, que é a totalidade que

dialética", isto é, em processo.Assim como Antonio Candido forja-se como "crítico", Auerbach entendia-se "filólogo", e ambos exigem, com isso, concepções bem precisas e particulares do que sejam o "crítico" e

o "filólogo". Naturalmente, há de se perguntar como o "filólogo" trabalha o texto. "Não me achego ao tcxto sem pressuposições; dirijo uma i68. Ver Auerbach, .L;lera

rspracÀe zznd Pzzó/í/tüm, OP. cit., pp- g'z4; éter [/nferszzcÀüngen

{ur Geschichte dera'anlõsischen

BiLdurtg, op. ç

. ) pp. l-u

; Introdução aos estudos !iterários.

Sâo

questãoa ele, e essaquestão,e não o texto, é o .dmar{ principal", diz

Auerbach.'" O filólogo, portanto, formula questões,indaga, inquire,

Paulo; Cultrix, i97o, pp. 38-4z;"Philologie der Weltliteratur", in Geiamme/íe4ie#sãte {ur romanischen Philologie,

ay- dt

i69. W Wolfgang Holdheim, "The Hermeneutic Signiâcanceof Auerbach's.4mazÍ") in ]Uew.L;reraO'/!:sfo7, v. xw, n?3, primavera ig85, p. 6z7 i7o.

Cf.

Auerbach,

"Philologie

der

Weltliteratur",

op'

cit.,p-

3o9'

..

. ..

-

.7i . Auerbach, .LíreraturspracÁeünd Pizó/ítüm, OP' cit.) p ig; o mesmo em "philologie Weltliteratur",

op- cit., P. 3o8.

\4S Senso dm coaLuscênciu e sentimento da realidade

.

der

i7z. P. E. Arantes, "Providências de um crítico literário na periferia do capitalismo", op. cít., P. 37 i73. Auerbach, .[;reraf /=pracÃezzndPüó/!'&um, op. cit., p. io.

i74. Id., ibid., p. 20. Na mesma direção ia a tradição francesa da explicação de texto importante para Auerbach e também muito bem conhecida do crítico brasileiro

tão

como se >

i49

O investigadorprecisaestar despertopara aquilo que o objeto pede e oferece, "Die Dinge selbst sollen zur Sprache kommen",'77mani-

interpela seu material. Para tanto, a sensibilidadee a intuição do pesquisadortornam-se essenciais,'7s tal como assinalouo crítico:

festando o desafio daquilo que, anos depois, Antonio Candido viria PeísorLaLmente, pleno

a denominar "uma crítica de vertentes, seguindo o pendor natural do

que elpunto cle partida del crítico dele ser La sistema-

objeto".'" Daí essaapologia da liberdade, nomeada "imaginação crítica",'7Puma aventura na qual se reconhece os direitos da fantasia, enquanto base do juízo crítico.i"

tilación de su intuiciones, nacidas de aria lectura perceptiva, erl una espécie de aventuícl mental que depende de Lçlcultura y de La sensibiLidad de cçLdçl uno. Con#eso que incluso en mü trabajos más sistemáticos, siempre procuré mantener esa tibertad de impresión, que empena la opinión del crítico y des-

Tal crítica poderia ser compreendida como uma retomada dialédca da exp#ca /o de [exre, pois se, por um lado, "a exp#car;on de rea'fe,

pierta la resonancia det Leitor."''

quando bem conduzida, preserva simultaneamente a integridade esté>

tica [...] e as vinculações históricas", a análise de texto advogadapor Antonio Candido visa ressaltar "ao mesmo tempo a sua integridade

vê na seguinte formulação de Lanson: "L'idée de la question demande souvent autant de génie que I'idée de la réponse"- G. Lanson, "La méthode de I'histoire littéraire", op' cit.) p. 54.A Znzrodizfão czoses idos/irercínoi, de Auerbach, era um sextobem conhecido de Antonia

específicade construção literária e a sua natureza de incorporador da realidade social e cultural de um dado momento".'*' Se digo dialética,

Cândida, pelo menos desdeseu início como professor de literatura, como se vê pela suautilização no curso de ig63 (repetido

em ig64 [cf. Antonio

Cândida,

a/emana/para

o Carzcürua

de Prc$Eisor Zz'lü/ar, op. cit., p. l 5]), posteriormente publicado: Antonio Cândida, O Cale/do > i943), republicado

a/za/zllco do/Dama.SãoPaulo, FTLCn-USP, reimpresãode l 993. Antonio Candido utiliza a il ed. alemã de i949 (embora o texto seja em francês): /nlrodüff;o/z a

em Zz'rerarzzra e soez'idade, n' 5, lodo, p. i6g. Em aula-depoimento

na rrLCH-

usp, em z6 jun. zoo3>recolhi asseguintesformulaçõesa respeito: "Eu acho que a coisafunda-

érudeadepÁÍ/oZogfe

romano.Frankfurt: V. Klostermann, 1949.Há aqui um nexo que vale a menção e que se enlaçacom algo ]á destacado.O estudodo poema,tal como formulado por Antonio Cân-

mental da crítica é a intuição"; "a crítica literária é, em grande parte, estabelecercorrelações

dida nessecurso e apostila, baseia-senos dois momentos complementares de comentário

a profissãodo sociólogo, Pierre Bourdieu vindicou a intuição como procedimento sociológi

e interpretação

os três elementos fundamentais do crítico são: "intuição, conhecimento, teoria". Defendendo

co,"talvez,no final dascontas,o usocientificode uma experiênciasocial"(P. Bourdieu,Ezh

(cf. O eizüdo a,za/ú;co do poe«za, passam, p- ex' p. l 5). Esse modelo recobre

se zb/oyúcÃerJAZZ: erx zcÁ.Frankfurt: Suhrkamp, zoo% p- 74.). Concordo plenamente, não sem

sem falhas aquele outro proposto por Walter Benjamin em seu escudodas MaÃ/verwmücÀaÚen,em que falava dos momentos de comentário e crítica, com seusteores objetivo e de

contudo reconhecer a dificuldade na reconstituição e figuração de uma tal experiência, algo que não é o escopo deste estudo e que ele apenaspretende sugerir.

verdade, respectivamente (W. Benjamin, Geaamme/teScÃ/{Óze/z, op' cit., v. i.l, PP- iz5'z6)Ambos, por suavez, convergem com a teoria do .4mar{ auerbachiano.Essa afinidade eletiva concreta dos três críticos realiza virtualmente o enlacebarrado pela contingência histórica,

i77. "As próprias coisas devem ser levadas a falar." Auerbach, "Philologie der Weltlitera-

tur", op cit., p. 3og;cf. ainda]147meaú, op. cit., p. 5i7; }qer [ZnzerxücÃzzngen zzrGeicÀ]cà e der

que teria permitido que, por meio da intermediação de Auerbach, Antonio Cândida fosse aluno de Benjamin. Ver a carta de Erich Auerbach a Walter Benjamin, de z3 set. i935, pu' blicada em K. Barck, "5 Briefe Erich Auerbachs an Walter Benjamin in Paras", ZezncÁr#l

/a/z ó'aücÁen BI/azzng,op- cit., p. 7: "A peculiaridade absoluta de uma obra significativa explica-sepor si mesma. É certo que precisamos aprender suas formas de expressão,quando

jür German&iiÉ, ano g) n? 6, dez. lg88, p. 68g.

adquiridos em quantidade suâciente, as próprias obras manifestam a sua essência:

i75. Cf. Auerbach, "Philologie der Weltliteramr", op. cit., p. 3o6.

r78.Antonio Cândida, O cXfczzr=o e a c;Jade,op. cit., p. l3.

i76. Anronio Candido, "Prefácio", in Eírmenda.7Zz'óeracíóri. México: Sigla xxi, zoom,apud J. R.

i79. Antonio Cândida, "Tensões críticas do modernismo"(zoom), in M. M. Nascimento

elasnão pertencem a nossa língua e ao nosso tempo, mas assim que essesconhecimentos sãa

de la Serna, "EI método crítico de Antonio Cândida", op. cit., p. 399, ao que se soma a seguinte

(org.),Jorrza/deresen4m.ieú anal. SãoPaulo: Discurso, zoom,v. z, p- i67r

diretriz de Antonio Cândida: "Ler infatigavelmente o texto analisadoé a regra de ouro da

i8o. "A fantasia, hoje agregadaà competência do inconsciente e proscrita no conhecimento

analista, como sempre preconizou a velha exp/iraízon de [exzedos franceses.A multiplicação das leituras suscita intuições, que são o combustível nesteofício". Antonio Candido, .Aravazade aula,

como rudimento puerilmente incapaz de )uízo, institui sozinha aquela relação entre objetos em que se origina necessariamente todo juízo: fosse ela excluída, ao mesmo tempo o juízo, o

op. cit., p. 6; ver também p. 77 e ainda Antonio Candido, Xormafão da /írerafura órmí/eira, OP'cit.l

próprio ato do conhecimento, seria exorcizado." T. W Adorno, .44znímamara#a. Frankfurt:

pp- 3i e 37. Já em seu primeiro rodapé na Ão/Aada ]UmÁã, no início de i943, lemos: "Quero

Suhrkamp, ig8o, p. í37 (Geiamme/reScÀr:»ze/z, v. 4).

referir-me à penetração. Sem ela, sem estacapacidade, elementar para o crítico, de mergulhar

r81. Antonio Cândida, "Duas vezes 'A passagem do dois ao três"', op. cit. pp. 58 e 6í res

na obra e intuir os seus va]ores próprios, não há crítica." Antonio Cândida, "Ouverrure"(7

l Sa Sensod..s coaLescêrtciue sentimerLtoda realidade

]an.

>

pectivamente. Vale a menção a essetexto de caráter "didático" para lembrar que, para o >

Paulo Arantes demonstrou como no nascimento da cultura silo é porque, por um lado, atenta para os 'elementos mediadores espe:íGi-

cos", enquanto,por outro, não perde Jamaisde vista a síntesetotalizadora. '': Como resultado, "o estudioso é obrigado a considerar forma e

conteúdo como momentos diabéticosde uma compreensão total" .''s Aqui transborda um nexo histórico local. Juntar a "vocação para

o concreto"::' com a explicaçãode texto, a precedênciada obra: essa dupla face da crítica de Antonio Candido é a.herança de meanMaugué - a aceitarmos seu retrato por Paulo Arantes.i8s Some-se a isso a obser-

vância obstinada do princípio da acumulação e chegamos àsprinct?ais linhas de força da obra de Antonio Candido. Não obstante as facilidades biográficas, reveladas nas entrevistas,.é.sobretudo a experiência da

universidade que propicia a Antonio Candido lastro e combustível para alçar vâo, sendo portanto o elemento de enlace geracional: "me par'c'

fora de dúvida que a minha geraçãoé uma geraçãocrítica '" o que significa: que toma para si a solução de "impasses", um dos quais já nossoconhecido.

sófica uspiana (assim sua denominação, em letra e espírito simmelia na), na figura do professor Maugüé, concluía a atenção a mais detida e.sutil pelo momento

"a filosofia vive no presente. Não é corajosa-

mentefilósofo senãoaqueleque cedo ou tarde expressao seupensa mento acerca das questões atuais" ':' --, pela experiência da vida (que se converte em "filosofia vivida", segundo Maugüé), com o estudo do texto, onde repousa o passado ("se o presente não se situar exatamente

em relaçãoao passado,será como um navio que perdeu a rota"), feito segundoa técnica da explicaçãode texto ("leitura, lenta, contínua e meditada"). Aqui, as duas faces potenciam-se mutuamente: o texto dando lastro à compreensão e ao enraizamento no presente, e este iluminando a tradição que repousa na letra adormecida (o nome que Maugüé dá para isso é "tacto histórico"). O resultado é o desenvolvimento do "senso crítico", "única justificação dos estudos filosóficos"

Donde o argumento do filósofo uspiano: os verdadeiros herdeiros

dacultura filosófica professadapor Maugüé não foram os filósofos pro fissionais, mas seusalunos críticos de Cama (o que, em sua pena, signi

>

çrídco, a análise literária é a "atividade central do ensino. Ela se manifesta sobretudo nos cursos, em grande parte dos quais a Teoria é canalizadapara o estudo dos textos [-.]". An-

tonio bandido, 7Uemona/parao Concurso dePr(:Êesaor rifa/ar, op' cit.) p. 5' Com isso,fica assinaladaa importância fundamental do professor, tanto mais quando Antonio Cândida aârma reiteradamente que seustextos são,em grande parte, oriundos das aulas que minis-

trou ao longo dos anos. "0 docentede literatura é um crítico literário, o crítico oral-. A oralidade é uma forma de crítica, muito viva." Antonio Candido, em aula-depoimento na rFI.cn-usp> em 26 jun. 2003.

i8z. Antonio Cândida, "Duas vezes'A passagemdo dois ao três"', op' Cit.,pp. 6z e 6o. Em Zeie e anráeie, op. cit., p. 56, encontramos a seguinte formulação: "Realização) em literatura, quer dizer complexidade dirigida pelo sensoartístico, revelando, portanto, a pr's'nça de elementos contraditórios, que a intuição formal e a concepção do mundo unificam na síntesesuperior da obra i83. Antonio Candido, "Duas vezes'A passagemdo dois ao três"', op' cit.) p' 56. A questão atrela-secom osinícios da atividade de crítica literária de Antonio Cândida, à medida que a que ele entendia, então,como "crítica funcional" pretendia articular a obra de arte literária com a sociedadee/ou cultura. Ver Antonio Cândida, "Notas de crítica literária começan'

do" (i945), in Zexroide;rzen'unção,OP'cit., PP'38-39 i84. Antonio Cândida, "Notas de crítica literária -- a.P/aioPa no Brml/",

GlcaAntonio Candido e Gilda de Mello e Souza).';* A visada é simples i87. Jean Maugüé, "0 ensino da filosofia. Suas diretrizes", 2nüáno da ZacüZ2adede Fz'/oi(#a,

Cz'é/zc;m eZe r

i934-i935. SãoPaulo, usp, l937>p. z8. O mesmo texto vale para asmenções

a seguir(pp. z8-33). i88. Em seua4emona/paraCanczzrxo dePrc8easor Zz'mZm, op. cit., p. i, Antonio Cândidadestacou Maugüé, em conjunto com Reger Bastide, como um dos "professores que marcaram" e de quem assistiu cursos sobre Hegel, Schopenhauer, Nietzsche, Freud e Max Scheler, durante todos os três anos de duração do seu bacharelado e licenciatura em ciências sociais e políticas

na usp(r939-i94t). "Maugüé era um mestreextraordinário, brilhante e inspirador, capazde tornar atraente o pensamento filosófico mais abstruso, inclusive graças às correlações que sabia

fazer com domínios diversos,estimulando a nossareflexão a partir dasfitas que víamos, dos romances que líamos, dos acontecimentos e idéias políticas da hora.[-.]

Todos nós apreciáva-

mos o trânsito constante de Maugüé entre as idéias e a sociedade, sob estímulo de um marxismo

bastanteliberto, raro naquela altura. A influência que recebemosdele foi decisiva.Inclusive porque a sua abertura conârmou em muitos de nós uma vocação de crítica e ensaísmo que nos Goilevando a deixar de lado filosofa e sociologia, para nos aninharmos na literatura e nas artes.

Antonio Candido, "0 companheiroAzis Simão"(i99i), in Recortes,op. cit., p. i88; cf. também op- cit., P. Z59'

i85. Paulo E. Arantes, "Certidão de nascimento") in [Jm deparramenro.#a/icesde a/tramar, OP. cit.,PP. 6i-87-

i86. Antonio Candido, "Plataforma da nova geração" (i943), in Zexrosde znren'então,OP'

Antonio Candido, "Clima", in gerei;rzaezc.,op. cit., pp. i6z-63- Em entrevista: "]-.] foi o professorque inâuenciouo meu grupo maisprofundamente. Com ele eu senti queâlosoâa e sociologia podiam servir como visão de mundo, não apenascomo especialidadeuniversitária. Foi a maior inHuência que recebi". Antonio Cândida, em entrevista a L. C. Jackson, op. cit., p. i58.

cit.,P. z4o.

i53 \ \l Seno das coalescênciw e sentimento da realidade

na sua penetração, que reconheço acertada, embora ajunte um ou Outro

acréscimo. Na genealogia uspiana de Arantes, Antonio Candido procede diretamente de Maugüé, no que diz respeito à "concepção de vida e trabalho intelectual". Daí que sobretudo o Brasil fosse o tema de refle-

xão: segundo Maugüé, "o Brasil [...] terá interesseem se meditar a si

mesmo,no ponto da trajetória que já percorreu";t:' segundoArantes, "a palavra de ordem vens/e concretexprimia antes de tudo um convite, renovado pela aclimatação bem planelada de novas técnicas intelectuais,

a passara limpo o e armo dos seusmaiores, a prosa explicativa, hoje clássica,daquelesque a partir do influxo modernista e da reviravolta de i93o começaram a pâr no lugar algumas peçasdo tabuleiro nacional".i'o

O trabalho sobre Sílvio Romero, o enfrentamento dos impassesda crítica e tudo o que disso resultou advém dessedesafio. Algo que aparece,a seu modo, na rememoração de uma antiga aluna de Antonio Candido: Como as companheiros de sua geração, Ántonio Candido tinhcl cl "paixão do concreto". Longe dw dbcussões teórica e abstrçttm, o seu trabalho mais

apa;xonanre era a an(í/he concrerczdoi ex/os/frei(írzoi, noi]sic] guaú se mesctctvam QsemibiLidade e a intuição, o rigor dcl analise e Q Liberdade de

interpretação quepossibilitavam os grandes saltos da imaginação criadora. Eu ficava fmcinada pela sua maneira de Ler o texto e perceber,nas coisa aparentementesimples, a realidade mais complexa; ü veresnum simples relance eLeiluminava todo o processo de composição do romance, como ncl cena em que o "mestre de-cerimónia.s" é surpreendido de cueccle solidéu na

l 8g. Jean Maugüé, "0 ensino da filosofia. Suasdiretrizes", op' cit., p. 3z' Já seu colega Roger Bastide lamentava a falta de estudo da realidade brasileira: "No campo teórico, manifestam-

se[...] preocupaçõescom os problemas de método e definição, apoiados na exposição de doutrinas

o que levava Reger Bastide a lamentar em 1939, na ReviveZnrer/zafz orla/e de .9o-

faÓefa, nm Memórias de um sargento de milícias. .4/i, nagzze/a cena,JáeitaNCLem germe "a diabética dcl ordem e da desordem", que iria furLdamentar seu email sobre CL"Diabética da malandragem";

outras Tetas, um parágrafo

fzo&)gle, que os sociólogos brasileiros não se dirigissem mais decididamente à consideração

do romance, uma imagem, uma not%ão de estilo eram su$cientespara ele

da realidadepresente. Era todavia uma atividade necessária,que se de um lado revelava a

perceberos movimentosfundamentais do romance, como no capítulo "afogo

caráter incipiente da matéria, entre nós, signiâcava, de outro, o estabelecimento de certas

no campa", um dos meti.sbem comtruÍdos do Tomance,no quctlCLação e os

disciplinas mentais que se revelariam fecundas dentro em pouco"' Antonio Cândida, "Informação sobre a sociologia em São Paulo", op. cit., p 5í5- Florestan Fernandes,também

sentimentos dm personagem.s se arredam, podendo-se percebe n

aluno de Maugüé, tomou o mesmo problema mediante enfoque um pouco distinto, enfatizando sua dimensão propriamente política; ver Florestan Fernandes em "A geraçãoperdi-

tios com o fogo no campo)9'

müLhm do

texto o despertar do sentimento amoroso de Lui#nha por Leopardo, extasia

da", in 4 aocia/agiano Brmf/. z: ed., Petrópolis: Vozes, ig8o, pp. zi3'5z, esp' pp' z:7 e zz5-

visto retrospectivamente pelo professor francês: "et puisque j'avais appris pendant des an-

O que essaantiga aluna descreve nada mais é senão aquilo que Auerbach, fazendo valer uma tradição escolar francesa na filologia, enten-

nées à [ire à travers ]es phi]osophes mon pays et mon époque, ]e me fixais d 'apprendre aux

dia como "explicação de texto" e que cria ser um método indispensável

ígo. P. Arantes, "Certidão de nascimento", op. cit., p. 85>na qual também cita o programa,

brésilienspar les mêmestruchements,à lide leur époqueet leur propre pays". O próprio Antonio Candido, por seulado, formulada com um acento algo distinto: "Se, na Universidade de São Paulo, aprendemos com Jean Maugüé a considerar a filosofia uma atitude vital,

inseparável da existência e dos problemas da vida, foi com Cruz Costa que aprendemos a dar um passoa mais e sentir a necessidadede filosofar ioóre o Brasil". Antonio Candido, "Notas de crítica literária

a/7ai(?Áa no Brmi/",

op. cit., p. z6z. E ainda: "]-.]

o Professor

parao trato com a obra literária

no que coincide, como vimos, com

Antonio Candido. É preciso notar, não obstante, que essaatenção detida,

esselabor continuado em cima do texto, a preocupaçãotanto com os detalhesaparentementeínfimos como com o andamento geral da obra,

tudo isso é o arcabouço geral, do qual a interpretação emerge.Assim,

Cruz Costainsistia semparar na necessidadede aplicar a reflexão ao Brasil, mesmoque para isso fossepreciso sair da filosofia(ou da sociologia) estritamente concebida. Daí termos sido confirmados na vocação de críticos". Antonio Cândida, entrevista publicada em

eram/gorro/afia, op. cit., p. i4. Em tempo; Roberto Schwarztambém indicou um movimento em paralelo entre os desenvolvimentos nos estudos literários e na filosofia, falando deum grupo universitário evariado de leitores de Maré, enfeixados no princípio filosófico da leitura estrutural: "0 aprendizado da leitura cerrada e metódica atendia às necessidades

universitárias de iniciação e diferenciação.Tanto que estava em curso um movimento>

L SA Sen.sedw coalucêncim e sentimento da realidade

> paralelo nos estudosliterários, onde também seensinava a ler 'de outra maneira', diferente da comum"(Roberto

Schwarz, "Um seminário de Marx", in Següé/zc; Órm;Ze;rm, op. cit.

p. gl). E quem estavaensinando isso era o professor Antonio Candido; quem estavaapren dendo,salvo erro, era o mesmo Roberto Schwarz. igi. Teresa de Jesus P. Vara, "Esboço de figurino",

pemame/zzo e mi#fóncia, op. cit., p. z33.

in F. Aguiar(org.),

.4nionlo Ca/zdfda.

se há "grandes saltos da imaginação criadora", é porque lastreados por

enorme labor sedimentado e por uma empatia profunda do crítico com seu objeto.'9: Daí a importância, variadas vezes destacada, da intuição.

Esta se torna, portanto, um atributo imprescindível e fundamental

necessidadede que a análise cresça a partir do desdobramento do .dmal{, como se fosse "uma parte dele mesmo"."'

A sensibilidade do filólogo educa-se na confluência da história e

dasobras "aprende-se pouco a pouco a encontrar nas próprias for-

(e não metódica:94). É necessário aquele "exprl de .Przeise" de que falava

mas históricas as categorias ordenadoras de que se necessita, sempre elásticas e provisórias".P* IJma vez que o .dmaz{ é trabalhado, desdo-

Pascal, o sujeito expondo-se ao material e acompanhando seu movimento,

bra-se, incorporando gradativa mas definitivamente novos materiais,

e, nesse movimento, fundando o ato da interpretação, baseado no Juízo.i9s

enter-relacionando-os e permitindo a síntese, o movimento da totalida-

Os movimentos do intérprete devem moldar-sepelo esforçoem deixar

de. Não há dúvida, então, de que o trabalho do crítico/filólogo

falar o objeto, e não coagi-lo a modelos e conceitos já dados de antemão --

demente responsável pelo andamento, em função de todas as escolhas

do filólogo/crítico,

pois "a descoberta do .4maz{ é intuição"

e "pessoal"'P'

"a tentação de dominar a multiplicidade do material mediante a introdução hipostasiante de conceitos ordenadores leva ao embaçamento do objeto, à discussão de falsos problemas e, por fim, a lugar nenhum",'" donde a

é gran-

que vai fazendo, desde o ponto de partida, e das ênfases que vai dan-

do ao longo da investigação. Nesse sentido e a essa altura, creio que se pode dizer que o .dniari. da Formarão está dado naquela passagem acerca dos primeiros românticos, quando se falava da perspectiva do crítico e da intenção do livro em se constituir como "uma história dos

igz. Eis o trecho que se aproxima, com reverbaraçõessugestivas, da questão; "]-.] cerca

brasileiros no seu desejo de ter uma literatura", uma perspectiva que o

confiança na intuição, que permite voar além do saber acumulado e estabelecera 'empatia', a identificação simpática e indefinível com o objeto de estudo --, seja texto, personagem ou

crítico recolhena própria história e testa sua validade, desdobrando-a. Mas, ao fazê-lo, vai reconfigurando-a gradual e continuamente, e o

cultura. Os alemães,que criaram a modernaerudição universitária, sobretudo atravésda

resultado é a Formarão.

Filologia, valorizaram também essesestudos arrojados, que fundem asparticularidades e

transfiguram as contradiçõesdo real por meio da 'visão'. O entendimento que resultaé global e sepretende exemplar. Para atingi-lo, o autor, por mais minuciosamente informada

e documentadoque esteja,não hesitaem dar saltosqualitativos quasemortais, como os

Isso tudo concluí também para os desenvolvimentos que Luiz Costa Lima indicou a partir de Tynianov e Jakobson, já que temos em

Antonio Candido e na Formarãoda Z;era/zzraaras;/e;ramuito menos

de Spitzer quando extrapola a partir do traço de estilo, ou os de Simmel, quando define

determinaçõescausaisdo que uma história orientada por valores; aque-

tipos sociais ambíguos: a pobre, o estrangeiro, o nobre. O conhecimento obtido assim é ao mesmo tempo afastado do dado empírico e incrivelmente revelador, porque permite ver num nível onde a 'compreensão' é forma quasemisteriosa de penetrar no objeto estudado"

las, quando aparecem, estão subordinados a esta.

Antonio Cândida, "Sérvio em Berlim e depois", op. cit., pp. 3z8-zg. Cf. ainda Antonio Cândida,"Duas vezes'A passagemdo dois aotrês'", op cit., p. 59i93- Auerbach, "Phi]o]ogie der We]t]iteramr", op. cit., p. 3o6. No depoimento ]á mencionado, por ocasiãoda "Homenagem a Sérgio Buarque de Holanda" (6 ]ul- zoom),Antonia

Os valores que orientam a Ãormafão da ZI/erarzzraórm/Zezraestão apresentados em seu pórtico: uma "história dos brasileiros no seu desejo de ter

uma literatura", "uma literatura empenhada".iP' Este é o .4maz{, dado pelo "ângulo" assumido pelo crítico e a partir do qual ele concebe e tece o livro. Ademais, seo .4maz{ é o desejo dos brasileiros em ter uma literatura, então

Candido afirmou que o fundamento do juízo crítico é a intuição- Ao comentar a crítica

faz todo sentidoque o ponto focal da estrutura narrativa do livro seja

literária de Sérvio Buarque e sua capacidadeincomum de acerto crítico, Antonio Cândida

precisamente o Machado de Assis do "Instinto de nacionalidade".z'o E se

detectava uma intuição crítica apurada.

i94 Auerbach, Zirerarur=pracÁeiz/zdPuó/zÉzzm, OP-cit., P- i9i95. Idem, p. l 5; Antonio Candido, Farmafão da /írerarzzraórm;/eira, op' cit.) v. í, Pp' 37, 3: e io; ver ainda Carlos Drummond de Andrade, "Esboço de figura", in vários autores, Efóafa de#gura. 17ome/vagem a '4rzío/zzo Candz'da.São Paulo: Duas Cidades, i979, p' z3' ig6. Auerbach, "Philologie der Weltliteratur", op. cit., p. 3o6; ver também p. 3og' Na sua independência frente a modas, escolas e tendênciasAntonio Candido aproxima-se soberanamente dessasformulações de Auerbach. Por exemplo na Xar7zzafãa da /freramía órmf/eira, op cit., P. i5'

\ $6 Sen.se dm coaLescêncim e sentintento cla realidade

í97. Auerbach, "Philologie der Weltliteratur", op. cit., p. 3ogig8. Auerbach, Z.íferalu/lpracÁea dPüó/ÍAum, op. cit., p. l5. 'i99. Antonio Cândida, Formarão da #ferarzzraór IZe;ra, op. cit., v. i, p- z5-z8. Ver também Antonio Cândida, "Estímulos da criação literária", op. cit., p. 4z200. No texto de Machado, lê-se: "Reconhecido o instinto de nacionalidade que se manifesta nas obras destes últimos tempos conviria examinar se possuímos todas as condições e >

i57

assim é, contemplamos também aquelas outras dimensões destacadas ante-

Para melhor dimensionar o ponto e marcar o feito, vale citar um aluno de Auerbach, escrevendo dez anos após a publicação da Forma-

riormente, relativas ao sensodas coalescênciase o que dele se derivou.

Tocamos, assim, um outro ponto nevrálgico da empreitada de

çãoda literatura brmiLeira:

Antonio Candido, que indica sua posição absolutamente peculiar. Trata-se do fato de que Antonio Candido escreveuma história de uma literatura nacional, e ainda mais "empenhada", segundo a "concepção" da

Deve-se imistir contudo que a história Literária comparada sópode ser corda

incompletude que só havia sido concretizada em um âmbito que deixara

seria plenamente preenchido se a história literária nacional se munisse de seu

para trás as literaturas nacionais -- os dois grandes livros de Auerbach

procedimento e de seus conhecimentos. .4o que parece, esseobjetivo perna

e Curtius referiam-se, respectivamente, ao "Ocidente" e à "Europa"} e

tece a uma distância inalcançável:':

a superação do ponto de vista e ataque das literaturas nacionais nessas duas obras é uma de suas realizações mais assombrosas. Para essesdois

lida satisfatoriamente emfunção da história literária nacional. Seu sentido

filólogos-romanistas, escreverhistória literária significou romper com

Surpreendentemente, aquilo que na Alemanha de lg68 era relegado àscalendasgregas já havia sido realizado, no Brasil, há dez anos. Quis

a história literária nacional, superando o impasse em que se situava esse

o destino que os desafios e impassesda história e teoria literárias

domínio do conhecimento.Ernst Robert Curtius destacavaa tradição

européias encontrassem solução no trópico escaldante, e o autocentramento dos pesquisadores do Atlântico Norte impediu-lhes então, como parece ocorrer ainda hoje, de reconhecer essacontribuição singular.:'3 Sem insistir no ponto, que me levaria a outras bandas, vale

supranacional (pois pré-nacional) que está por detrás das literaturas

nacionais;Erich Auerbachcomo que ignora o registro dashistóriasliterárias nacionais, como atesta, por exemplo, o tratamento lancinante que dá à "Chanson de Alexis", considerada ponto inicial da literatura francesae discutida em Mzmeiü ignorando-se totalmente esseaspecto. Anto-

nio Candido conclui para ambos na concepçãoda totalidade que não é completude, mas a enfoca no âmbito da história literária nacional diferença capital frente a Curtius e Auerbach.

uma

Reformulando o problemados limites da história da literatura nacional

pois serompesse esseslimites o crítico poderia correr o risco

lembrar o trabalho de Jaussde ig67, que tomava as exigências e os > comparada", e não "Teoria geral da literatura": "Dedo: A cadeira de teoria literária em SãoPaulo foi criada para você? Cândida: Foi. Mas não era cadeira. Era curso, e eu fiquei até quasea aposentadoria como professor colaborador em nível de titular". E ainda: "Dedo:E como você conseguiu voltar para São Paulo depois de dois anos e meio? Candido: Eu conversei com Jogo Cruz Costa, com Fernando de Azevedo e com o Souza Lama e

elesdefenderama criaçãoda disciplina de Teoria Geral da Literatura da usp, o que aca-

de perder de vista os nexos históricos concretos da literatura brasileira --,

bou acontecendo.Era o correlato em letras de uma cadeira da faculdade de direito, a de

Antonio Candido lança mão de (ou coincide com, já que não se trata de afirmar dependência e prioridade) procedimentos gestados no âmbito

Teoria Geral do Estado. Quando voltei para a usp pedi para mudar o nome para Teoria Literária e Literatura Comparada". Antonio Candido em entrevista a Dedo de Almeida

de uma história literária supranacional e eminentemente comparatística.

Prado, in Marília Marfins e Paulo Roberto Abrantes(orgs.), 3 dnron;ai & l Joó;m, op. cit. pp. l i3 e l i4 respectivamente; cf. também a mencionada carta de Antonio Cândida a Jogo

Ao fazê-lo, rompe os limites entre literatura comparadae história literária nacional. Esse feito é, sem favor, sensacional. Sensacional porque

resolve o impasse em que ashistórias literárias nacionais haviam caído desde suas grandes realizações no século xix e início do século xx.:"' > motivos históricos de uma nacionalidadeliterária [-.]. Meu principal ob]eto é atestaro fato anual; ora, o fato é o instinto

de que falei, a gera/ doida de criar uma /íferarz'ra maü Iridependepz-

le". Machado de Assis, "Instinto de nacionalidade", op. cit., p. 8oz, itálico por minha conta.

zoi. Que Antonio Cândida estavamuito conscientede tudo isso, comprova'o o fato de que insistiu para que "sua" cadeira na usp fossedenominada "Teoria literária e literatura >

\ S8 Sen.se das coalescênci

e sentimento da realidade

Alexandre Barbosa, de i4 jan. ig63, op. cit. Sobre o apoio decisivo de Cruz Costa para a

criaçãoda cadeirade Antonio Cândida, ver, deste, "Lucidez de Cruz Costa" (ig8g), in

Recorrer, op-cit., p. i6g. zoz. Werner Krauss, Grzzndpraó/eme der.Líferarlzm'üaemcÀ({#!. Hamburgo: Rowohlt, ig68, p n7. Há que lembrar, contudo, que Krauss, na República Democrática Alemã, tenderia a enfa tizar o "nacional". Por seulado, em igS6, lan Watt considerava a história literária um "beco -semsaída"; cf. 1. Watt, ,4 mcemâodo rama/zce. São Paulo: Companhia dasLetras, i99o, p. li zo3.A título de exemplo,uma formulação vinda da poderosa Yale: "Perhaps üe only true li terary history we cave, Eriçh Auerbach's .44zheiü]-.]". Geofrrey H. Hartman, Chdcism Ir rÃe

FHz'azar/zns. Z%eSfudgaf Zzteralzzre ZodaW. New Haven: Yale University Press,ig8o, p. z35.

i59

desafiosda história literária como provocação à teoria literária -- Uma

aplicar um ponto de vista integrativo, presewando a autonomia relativa da

formulação que estána basemesmadas preocupaçõesde Antonio

obra, mas Levandoem conta os elementos da personalidade e da socied(üe; e,

Candido. documentada desde a tese sobre Sílvio Romero. Assim, as

ainda, mostrando a diabética da independência e da dependência do texto em

provocações formuladas por Jauss, "fundir a tradicional estética da produção e da representação em uma estética da recepção e dos efei-

relação cloutros textos, no tempo e no wpaçolm

tos", de sorte que "a historicidade da literatura não se baseia em um

Seesserelato retrospectivo insere enfaticamente a Formarão naquela

nexo de 'fatos literários' estabelecidopos $eifum, mas sim na expe-

perspectiva que vem da tesesobre Sílvio Romero e que ganha fórmula em Z;ferafzzrae aoc;idade, ao mesmo tempo marca e especifica a pers-

riência passadada obra literária por seu leitor",:" nada mais é do que

o movimento do pesquisador que se ilumina no passo da Formafâa que discutimos -- "0 leitor perceberá..." -- e que se concretiza na

obra como um todo (a noção de "sistema", como se sabe,antecipa a problematização da questão dos receptores)- Tal confronto da For-

pectiva comparatista.Não por acaso,Krauss e Jaussrimam por serem ambosromanistas, conscientesde que as literaturas nacionais edificamse sobreo solo comum da literatura européia e das tradições clássicae judaico-cristã. Antonio Candido, por sua vez, é consciente de que a lite-

parece) como desafio vale também por iluminar pelo avesso o tópico

ratura brasileira é galho de arbusto, donde a necessidade de que o juízo crítico compreenda o movimento de aproximação e distanciamento, por

da "tradição europeia e descobertasdo Brasil",:'s como a dizer, em uma interversão dialética, que a esseproblema, percorrido conscien-

meio do qual vai se definindo a literatura nacional. Para perceberesse movimento, é fundamental o viés comparatista, a ponto de o crítico

ciosamente ao longo da Formaçãoda /ffera ura órm;/e/ra, corresponde igualmente a questão da tradição brasileira e descoberta da Europa (e

enfatizar que "estudar literatura brasileira é, em grande parte, estudar

maçãocom o que europeus e norte-americanos viam (e ainda vêem,

América do Norte).:" O próprio Antonio Candido,em seuMemoria/, formulou

a seu modo algo dessas questões:

/Uo /z'vro Formação da literatura brasileira (momentos decisivos) i75o\%%a,elaborado de \946 a \ç)S7 e publicado em \gSg, aparece o intuito de

zo4 H. R. Jauss,"Literaturgeschichteals Provokation der Literaturwissenchaft", op' cit.) P. i71 (it tese); ver também p- g-

zo5.Cf. Antonio Candido,Formaçãoda /í erarlzraórw;/eira, op' cit., v. i, P' Z7' zo6. Um programa que se cumpre igualmente, seja-mepermitido anotar sem contudo comprovar>na obra de Sérvio Buarque de Holanda. Desnecessáriolembrar que estamosno cerne dos problemas tratados, mais atrás, em "Desiguais porém combinados". Posteriormente,ao final de seu estudo sobre as .A4emónaide lzmlarga,z o de mz/ü;af, Antonio Cândida, sem alarde algum, destacada um desdobramento dessetipo de enfoque, quando contrapõe o romance(vale dizer: sociedade) brasileiro ao norte-americano. Ver Antonio Cândida, O dücür=oe a cidade,op' cit., pp. 5o-5i, com o comentário, a essaaltura lá bem conhecido do leitor, de Roberto Schwarz,

literatura comparada".z08

Essaperspectiva comparatista está na base da possibilidade de constituição da história literária que é totalidade, mas abdica da com-

pletude.É evidente que o encadeamentodado pela cronologia funcionou, em toda a historiografia literária que almeJaa totalidade pela via da completude, como um caminho seguro. A renúncia da cronologia (e da disposição catalográfica) implica dificuldade extrema de totalização,exigindo solução inventiva. Esta foi dada pelo comparativismo, de sorte que a estrutura narrativa da Ãormafão da /í era zra ór ;Ze/ra, como disse, repousa no movimento de similitudes e diferenças, que é um movimento comparativo. Aproximações e afastamentos, semelhan-

çase dessemelhanças,continuidades e descontinuidades formulam-se

nos momentos decisivos,Arcádia e Romantismo, seja no âmbito da comparaçãointerna (entre momentos, autores, obras, gêneros etc.),

sejanos domínios da comparaçãoexterna, donde a diabéticado universal e local, integração e diferenciação, localismo e cosmopolitismo, "tradição européia e descobertas do Brasil" em ambas as dimensões,

Pressupostos,salvo engano, de 'Dialética da malandragem"', op' cit., p. i49' Beirando essepro' blema, em uma margem na qual não posso desembarcar,Gilda de Melão e Souzasobre ]ldmma: ma: ver o seu O zup;e o aZazZde. São Paulo; Duas Cidades, i979> pp' 7)'75, que remete signiÊcau-

zo7.Antonio Cândida,.A4emona/para o Concurso dePrc:#esior 77mZar,op. cit., p. 3

vamente a ,4a e/zcedar«f óalarm. O problema encontrará a seguir formulação empenhadaem R.

zo8.Antonio Cândidaem aula-depoimento na rrLCH-usp,em z6 jun. zoo3>que repete

Schwarz,[Xmmestrerzaper{6ena docáfila/&mo..4/achado de.4ssis,OP'cit., pp. 'z3 e :3-

Antonio Cândida, "Literaru ra comparada", op. cit., pp. n l ss.

\ 6o Senso dw coa escêmim

e sentimento da realidade

i6i

o sensodos contrários e dasnuançase diferenças atua como potência

de questõesleva-nos a um problema que é tematizado constantemente

motriz do procedimento comparativista."' Observo, então, que, à diferença dos romanistas alemães, a idéia de nação permanece estruturando a história literária de Antonio Can-

na Ãormafâo da # crat zra órmzZe;rae na obra de Antonio Cândida como

dido e essa"persistência", por assimdizer (comparadaà "Rama/zia"de Curtius e à " We/ //zer.zfzzr" de Auerbach), é índice histórico específico

produtiva e necessáriade leitura da obra. Interessa aqui apenasassina-

(e, talvez, a contradição motriz das contradições de que falava Schwarz),

procura "uma nova morada nesta parte do mundo".:'' À diferença das

que dá concret:ude ao processo da estrutura histórica que se quer com. preender e que ganha ancoragem naquele movimento complexo do crí.

literaturas européias visadas pelos romanistas alemães, cujos processos

rico, já que não se trata de uma ideia externa, mas de um ponto de vista e um valor intrínseco ao problema (objeto) que se quer compreender (tal como ocorre nos casos específicos de Auerbach e Curtius) Esseâmbito

matizados, à época, por conta de sua falência -- a guerra, a barbárie e a destruição --, o caso brasileiro implicava, para Antonio Candido, o

um todo e que conclui para a célebre e já referida dialética de localismo ecosmopolitismo, reiterada no passo anterior -- sendo uma perspectiva lar que, na Ãormafâo, isso ganha forma no "espírito do Ocidente" que

de formação nacional já tinham se realizado e encontravam-se proble-

reconhecimento do anacronismo das diversas camadas do tempo histórico, por conta do qual a literatura se formou sem que a nação como

tal seforme, marcando um descompassorico em conseqüênciaspara os zog. Seja lembrado, em rodapé, que à época da publicação da Ãor«Raçãoda /íreraFlzraórarf/exmaesseproblema foi não só percebido, mas elaborado por Otto Mana Carpeaux que, em "Problemas de história literária brasileira" (artigo publicado em jornal e republicada em Z,íwoi /zamesa,que é de ig6o), formula, a partir da leitura da Formarão, embora a seu modo, todo esseproblema que discuto. Por um lado, Carpeaux foi ao âmago, tal como o compreendia: "História da literatura brasileira.- A meditação por assim dizer fenomenológica dessestrês termos daria o resultado seguinte, que parece óbvio, mas não é: essahistória não pode ser só literária nem só brasileira, masproduto de um compromisso. Coma história literária, tem de inspirar-se em conceitos de crítica e estética. Mas como história

destinos da nação.

SeJausstem razão ao afirmar que a história literária, desdeo séculoxix, testemunha um declínio constante, e a isso se soma o fato de que, em seusbons tempos, história literária sempre foi his-

tória literária nacional, as obras de Curtius, Auerbach e Antonio Candido levantam algumas indagações. Para começar, os romanistas conceberam uma (ou, se o leitor preferir, duas) certa(s) maneira(s)

de escreverhistória literária para além dos limites das literaturas

e como história brasileira não pode dispensar os elementos históricos, etnológicos, socio-

nacionais e, com isso, deslocaram as bases tradicionais de concepção

lógicos, ideológicos. A tarefa seria esta: extrair, daquela história, o que é especificamente

e julgamento do que há de ser (ou pode ser) história literária (em outro jargão, mais impróprio, alguém diria: estabelecem um novo

literário e que é especificamentebrasileiro; e manter os dois fatores, ou antes: asduasséries de fatores em constante equilíbrio". Por outro lado, percebeu com acurácia o movimento estruturador da Farmafão, que precisadar conta do "nacional" e do "universal", mediante critérios novos, comparativos", que lançam mão do princípio da "analogia-diferença". Ver

C)ttoMana Carpeaux,"Problemasde histórialiterária brasileira", in auaíal reünídoi.Rio de Janeiro: UniverCidade/Topbooks, x999,v- i, pp- 845-48. Quem, então, for ao artigo de Antonio Cândida sobre Carpeaux (Antonio Cândida, "Dia]ética apaixonada" [1979], in

paradigma). Nesse sentido, renovam e revitalizam a história literária,

abrindo um novo leque de possibilidades e um amplo arco de ques-

tões.Em segundo lugar, Antonio Candido escrevea Formar.7oda #fer.zlzzra óraiz/e/ra em pleno século xx, e o faz colocando a questão sobrenovasbases,o que significa abrir um campo virgem de possi-

Recorrem, op- cit., PP. 8g-95), poderá aquilatar a proximidade das histórias literárias de ambos uma nacional, uma universal --, vista por um deles.Se enxergobem, ambos marcaram

bilidades e questões. Os três, cada um à sua maneira, transformam a história literária, mas o trabalho do brasileiro possui seu destaque e

um ponto de encontro naquele programa enunciadoao início por Ernst Robert Curdus

relevânciapróprios, por fazê-lo no âmbito de uma literatura nacional. Essapeculiaridade é intrinsecamente histórica e sua razão preci-

(embora, a meu juízo, a história de Carpeaux não se compare à de Antonio Candido). Por fim: na Puguenaóló/zagrada .ú;ca da arerat«,a órm;/eira(que cito na 31ed. rev- e aum, a

-sana ser buscada nessedomínio.

última revista pelo autor: Rio de Janeiro: Letras e Artes, ig64) p. 25),a Formaçãoé a última dashistórias arroladas no capítulo "Histórias da literatura brasileira", e Carpeaux comenta: Renova totalmente os métodos e amplia os horizontes: obra importandssima". Nenhuma das outras histórias arroladas recebequalificação similar.

\6z Seno dm coalescêncim e sentimento da realidade

zro.Antonio Cândida,Formarãoda #feraruraórm;/e;ra,op. cit., v. i, p. io

i63

As literaturas européias,já formadas-- lembro o texto de Curtius que falava em "sistema literário"

desde pelo menos o século xix,

encontraram seu parâmetro de identidade sobretudo na língua nacional. O devir da língua oferecia, aos historiadores das literaturas nacionais

do séculoxix, uma chave construtiva privilegiada, que organizavaos materiais e assentavaas basesda história literária. Por conta disso, foi possível (ou ao menos pretendeu-se que fosse).escrever história literária nacional prescindindo da formação nacional:' ' -- basta lembrar os casos

sentido preciso de que faz com que seja possível compreender as peculia cidadese o elemento universal,::' além de permitir compreender o nexo de "tradição européia e descobertasdo Brasil":'s (daí falar o crítico em "dialé. tida"). A primeira e a segunda respostasestãoinextricavelmente articuladas (idem). Uma particularidade definidora, o caráter empenhado da literatura brasileira, é chave para compreender o processo da estrutura, articulando história literária e história da nação(que é, a julgarmos procedente a idéia do desenvolvimento desigual e combinado, também história mundial):

clássicosde unificação nacional tardia, Itália e Alemanha, que possuíam história da literatura nacional antes da existência da nação, na forma do

Quem escoe've,contribui e se in.screvenum processohistórico de elaboração rLa-

moderno Estado nacional unificado. O que, é claro, não vale para o Bra-

cional. \.. À .4 literatura do Brasit, como a dos outros países latino-americanos,

sil, a começar pelalíngua, que recebemose compartilhamos; precisamos identificar uma literatura brasileira apesarde utilizarmos a língua que veio de Portugal. Assim, o critério da língua viu-se necessitadode subor-

é marcada por essecompromisso com a üda nacional no seu coÜunto, circun.stância que mexi.stenu literatura dos países de velha cultura. Nelas, os víncu

dinar-se a algum outro, ]á que apenas ele não seria capaz de demarcar a

ao conjunto da produçõescuttur.zis; mas não a comciência, ou a intenção, de

literatura brasileira.z'z Certamente, o queperceberam "nossos primeiros românticos e os críticos estrangeiros que, antes deles, localizaram na

estarfalendo um poucoda nação aDIa ler literatura. \..l\ Quatro grandestema presidem à formação da literatura brmileira como sistema entre t75o e \88a,

Losneste sentido são os que prendem necessariamente as produções do espírito

fase arcádica o início de nossa verdadeira literatura, graças à manifes-

em correlação íntima com a elaboraçãode uma con.sciênciarLacionat: o conheci-

tação de temas". Eis aí: é o tema que veio a fecundar como critério de

mento da realidade local; CLvatoTiTaçãodu populaçõesaborígenes; o desejo de

identidade, e esta é a diferença crucial diante das literaturas européias.

contribuir para o progressodo país; a incorporaçãoaospadrõeseuropeu:~'

Quando Antonio Candido volta ao ângulo dos primeiros românticos, é para retomar essaposição, que julga adequada, talvez até mesmo indis

O caráter empenhado aponta, pois, para o cumprimento de uma certa

pensável. Mas adequada para quê? E mais: como adequada?

função pela literatura,

como um elemento de consciência nacional,z17

Primeira resposta:adequadapara compreender a literatura brasilei ra como uma estrutura em processo.:'3 Segunda resposta: adequada no

zii. Georg Gervinus, p. ex., publica sua Z)fe (kscAícÀfederpoeú(Áen .Nbdorza//zreramrder Z)euEs-

2i4' Ou, como apontou com perspicáciaLigia Chiappini, o desdobramentono registro das"vantagens" e "desvantagens"; cf. L. Chiappini, "Formação da literatura brasileira ou ahistória de um desejo", op. cit.

cÀenentre i835-4z. Sobre o signi6cado dessa escrita da história, tributária de Schlegel(Hegel), ver Luiz Costa Lama, ;14zheaú.'deia#o ac}pemame/zra.Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,

nS. Cf. Antonio Cândida, Formarão da /íferarüra órm;Zez ra, op. cit., v. i, pp. io, z7) passam;

lodo, p ig; o mesmo autor traduziu o texto-basede Friedrich Schlegelsobre a questão,"Intro-

n6. Antonio Cândida,Formarãoda /i eraruraórmz'Ze;ra, op. cit., v. i, pp- í7-i8 e 66-67; cf.

dução à história da literatura europeia"(i8o3-o4), Hrzíma, ano i, n? i, 2001, pp' 'z9'49'

também"Literatura e cultura de igoo a í94S (panorama para estrangeiros)", op. cit., p. in n7. Em texto de ig66, Antonio Candido retomou a contraposição e composição de Arca

ziz. "A literatura portuguesa,a francesa ou a italiana foram se constituindo lentamente, ao mesmo tempo que se formavam os respectivos idiomas. Língua, sociedadee literatura parecem nessescasos configurar um p'acesso contínuo, afinando-se mutuamente e alcançando aos poucos a maturidade. Não é o casodas literaturas ocidentais do Novo Mundo. Antonio Cândida, /níc;afâo â #ferafzzraórm;/e;ra, op. cit., P. il

v- z, pp. 78, 3z6, passim.

dia e Romantismo: "No entanto (como procurei mostrar num livro sobre o assunto) esta ruptura estéticaentre os dois períodos não significa ruptura histórica, pois o Romantismo continuou orientado pela mesma tendência, isto é, o duplo processo de integração e dize renciação,de incorporação do geral (no caso, a mentalidade e as normas da Europa) para

Cf. W. Benjamin, Gesamme/te ScÁreÓzerz, op. cit., v. m, p. z84:"]-.] em seupróprio desenvol-

obter a expressãodo particular, isto é, os aspectosnovos que iam surgindo no processo de amadurecimentodo País. Esta circunstância dá continuidade e unidade à nossaliteraUra.

vimento [...] a história literária é um momento da história geral'

como elemento de formação da consciência nacional, do século xw, ou pelo menos do >

n3. O que significa ter em mente que a história literária é um momento da história nacional

\G4 Seno dw coalescêmim e seguimento da realidade

i65

ao mesmo tempo que se adensa na "interação dinâmica" entre autores obras e público. Tudo isso converge para um ponto, que já foi apontado uma dezena de vezes, a saber, a tarefa do historiador da literatura brasi-

leira, que tomou para si o desafio da junção de crítica e história.:': Sob certa perspectiva, a crítica de Antonio Candido poderia ser considerada

uma espécie de desenvolvimento cabal da "crítica nacionalista", tal como a detectou na crítica literária das duas últimas décadasdo século xix, na qual repontava, Junto com o Machado de Assis romancista, a momento de autoconsciência literária -- autoconsciência em dupla face,

excessode cientificismo e a falta de Juízo estético.::' Mas o problema con tinua sendo o mesmo, a ponto de, na Ãormafão, julgar válido o teste da perspectiva dos antigos, destacando o caráter empenhado e interessado

da literatura nacional, sendo,por exemplo, capazde identificar quanto o Arcadismo foi um momento decisivo de nossaformação literária. Mas, se ela mantém acesaessachama romântica não por acasovive mos ainda o "longo pós-romantismo"::' --, o caráter próprio de "naciona lismo" que a de6lne é bastante diferenciado. Basta, inicialmente, lembrar aquelaslinhas do prefácio à Formação, em que modula a importância das

tanto de realizaçãopropriamente literária no Machado maduro como

letras nacionais, valorizando-as mas distanciando-se de uma apologia

de consciência crítica no próprio Machado e em Sílvio Romero, logo secundadopor Araripe e Veríssimo.'''

acrítica. Por outro lado, o "espírito crítico" que move a obra de Antonio bandido sempre lançou mão, por essarazão mesma, dos contrastes com

A origem romântica dessacrítica, localizada em Sílvio Romero, Araripe Jr. e José Veríssimo, é exatamente aquele ponto de vista dos pri-

meiros românticos, também aditado pelo autor da Formação.Assim, se

aquelescríticos, desenvolvendoa seutempo o ponto de vista romântico da relação entre literatura e construçãoda nação,formulam o pro' blema da "construção de uma consciência literária", será essemesmo o problema de Antonio Candido, com o cuidado de assinalar criticamente os predecessores e corrigir o que considerava sua principal limitação, o

outras literaturas, donde o importante viés comparatista de seusvários escritos, que se realiza basicamente em duas frentes. A primeira delas, a mais evidente e que vem desde os rodapés dos anos i94o, é precisamente a aproximação das diversas literaturas, e isso conclui com a maior força para obras como nele e a/zzúeiee O í!:sczzr=oe a cidade.ZZZ A segunda delas

zzo. Valecitar: "Em crítica literária, a fase l 88o-igoo, por suastrês principais figuras Síjvio Romero, Araripe Júnior e José Veríssimo

havia desenvolvido e apurado a tendência prin-

cipal do nossopensamento crítico, isto é, o que se poderia chamar a cn?zca/zaclo,za/hra,de

>

século xvn, até o século xix. A essaaltura, tanto a literatura quanto a consciência das clas-

origemromântica. Como em todos ospaísesempenhadosentão na independênciapolítica, o Romantismofoi no Brasil um vigoroso esforço de afirmação nacional; tanto mais quanto se tratava aqui, também, da construção de uma consciência literária". Antonio Cândida, "LI.

sesdominantes (a que ela correspondia) já podem ser consideradas maduras e consolidadas,

teraturae cultura de igoo a i945 (panorama para estrangeiros)", op. cit., p. io6, ver também

como a sociedade, porque eram capazesde formular seusproblemas e tentar resolvê-los".

p io7) e Antonio

Antonio Candido, "Literatura dedois gumes", op. cit., p. i79. Note-secomo,no passo,há

rificismo e falta de juízo de gosto remetem, evidentemente, à tesesobre Sílvio Romeno,além

Cândida,

/n;c;afâo

.i /z'reralura órmz'/ez ra, op- cit., pp. 55-56. Excesso de cien

a afirmação de uma espéciede paralelismo de literatura e sociedade,como a dizer que o

de facultar o contraponto com Lanson (contemporâneo francês de Sílvio), como vimos.

acabamentodo processo formativo da literatura encontra correspondência no acabamento da formação nacional, o que não é o caso,como já seviu. Isso reforça um ponto já indicada

zzi. Cf. Antonio Cândida, nele e a/zrúeie,op- cit., "Prefácio", sem paginação; "Esquema de Machadode Assim", op cit., p. i7; O (#fczzrsoe a cidade, op. cit., pp. i56 e i68; também

em rodapé, a dificuldade de Antonio Cândida na formulação mais precisa desseproblema. zi8. Talvez sem o saber,Antonio Candido tomava e cumpria o programa benjaminiano; cf.

o resumo "0 Romantismo, nossocontemporâneo (Resumo da aula inaugural de Antonio

W. Benjamin, Geiamme/re ScÁrlPea, op- cit., v. lu, p- z8g Vale notar que essa junção, Benja-

Candido no Departamento de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro)", de autoria de Claudio Bojunga, publicado nolarna/ da Bra;/, de íg mar. tg88.

min a reconhecia como um legado da filologia, negado por seuscontemporâneos,e que vla

zzz. Na rubrica "Aplicações na perspectiva comparatista" de seu .44emzona/para o Cancurfo

ser preciso atualizar. A filologia aparecia a ele como depositária dessapossibilidade, que é

dePrc$eiícpr ZzrüZar(op.cit., p. 4), Antonio Cândidaescreveu:"No âmbito de uma literatu-

a possibilidade da história literária no presente (i93i). E foram preces'mente os filólogos romanistas que a realizaram, nosanos da guerra, e aqui também semostra a confluência de Antonio Cândida com eles e com a tarefa delineada por W Benjamin.

ra comparada livre, preocupada menos com a influência verificável do que com a ocorrên-

zig. O percurso que vai culminar no Machado crítico é, como se sabe, preocupaçãodo capítulo final da Formação.

\ 66 Sen.se dm coaÍescêncim e sentimento da eülidade

cia de temas e processosnos diferentes espaçosculturais, essespontos de vista aparecem no livro mexee anfúeie (ig64), voltado sobretudo para o problema da divisão romântica da personalidadee seu sentido histórico-social na literatura". Naquela altura, O dZfcursoe a ac/adeainda não havia sido publicado.

i67

é que há no próprio modo de trabalhar a literatura brasileira uma persctiva comparatista, que se faz, grossomodo,no procedimento, já bem assinalado, (ie inicialmente aproximar o que se apresenta como diferente,

para só depois marcar as diferenças, assim como na mencionada "dialética da independência e dependência do texto em relação a outros textos". O ganho em matiz e penetração desseproc'dimento de afastamento e apro ximação é vultoso e ]az na base do método crítico de Antonio Candido.

dente,procurando uma nova morada nesta parte do mundo"::' e que orienta a Ãormafâo. Não por acaso, ao final, o processo formativo se completa com o escritor que é o mais nacional, porque universal. O andamento é muito sugestivo, pois demonstra mesmo o que se

entendepor#ormafão. No resumo sobre nosso romantismo. um fruto tardio da Formarão, lemos:

Voltemos por alguns instantes ao ponto de vista dos primeiros românticos: Antonio Candido detectou a presençamatricial da teoria

Um elemento importante ms anos de 1%la e \$3o foi o desejo de autonomia Literária, tornado mais vivo depor da Independência. Então, o Romantkmo

das "duas literaturas" de Schlegelzz3 no nossoprimeiro romantismo, justamente aquele ponto de vista que resolveu adorar e testar novamente

apa'ec'u aos poucos como caminho favorável à expressãoprópria da nação

Se a matriz discernia a presença de duas literaturas em uma espécie de

pa'ticularismo, eportanto a identidade, emoposiçãoà Metrópole, identi#cada

tensão, cabia aos românticos

com a tradição clássica. .4ssim surgiu algo novo: a noção de que no Brasil

"promover

o triunfo da literatura

nal".zz4 naturalmente às custas da valorização (e possibilidade

nacio-

recém-fundada,pois fnrrLeciaconcepções e modelosquepermitiam a$rmar o

de coexis-

havia uma produção literária com característica próprias, que agora seria de-

tência) dos elementos supranacionais. Tal "triunfo" remete ao caráter

finida e descrita comojmti$cativa da reivindicação de autonomia espiritual?zn

empenhado

da nossa literatura,

"programa

nativista

' em ]Vireró;, a ser-

viço do "desejode autonomia", agoraliterária. Com isso,funda-sea crí-

Fala-se aqui acerca do pondo depara;da da crítica romântica; o trecho

tica literária no Brasil, ponto de partida da radífâo que se mostrará ama-

final da Formarão da /fferarzzraóraiz'/e;rafala de seupon o de chegada

durecida, em faces distintas, seja em Sílvio Romero, seja em Machado de

Após citar o "Instinto de nacionalidade", Antonio Candido afirma:

Assis.z:' Ora, vale notar que Antonio Candido, adotando o ponto de vis-

ta dos primeiros românticos, não se fia por inteiro, desdeo prefácio da Formarão, no exclusivismo nacional

donde inclusive a ironia presente

asco --, de sorte a relativizar o empenho e interesse com o elemen-

EstaspaLawas \deMachado de.4ssisem "lmtinto de nacionalidade' l exprimem o ponto de mamrid(de da crítica romântica; a consciên.cü real que o Romantkmo

adquiriu do seusiga $cado histórico.Elw sãocedequadra,portanto, para encerrar

to matricial que fora diminuído (quando não anulado) pelo "programa

este livro, onde se procurou ]ustamertte descrever o processo poT meio do qual os

nativista", agora em variados matizes possíveis. Ou seja, há latente um

brasileiros tomaram comciência da sua nútênch

interesse supranacional, que pretende inscrever a literatura brasileira no

literatura, combinando de modo a,áda os valores universais com a realid.:de local

quadro dasliteraturas do Ocidente -- mesmo que "galho secundário" de "arbusto de segunda ordem", trata-se de reconhecer "o espírito do Oci

espiritual e sacia através da

e, destamaneira, ganhandoo direito de exprimir o seu sonho, Qsua dor, o seu júbilo, a sua modesta visão das cobra e ü semelhante m

Do particularismo inicial, "programa nativista", uma longa viagem, um zz3. Cf. Antonio Candido, O rama/zrúma no Brmi/, op' cit., PP.Z7'zg; Fo'maçãoda õlerarzzraóraf/eira, op. cit., v. z, "Raízesda crítica romântica", pp' z85ss.Nesselivro, Antonio

processo formativo conduziu a um universalismo particularista (se me

Cândida refere-se sobretudo a August Wilhelm, ao passoque em O romarzlümorzaorai/ a Friedrich Schlegel. Este, de fato, foi o mentor da idéia, mas coube ao irmão divulga-la e encontrar recepção,sobretudo por intermédio de Madamede Staêl.

zz6.Antonio Cândida,Xarmafâoda /ííerar#raórmlZezra, op. cit., v. i, pp g-io} e sobretudo

zz4. Antonio Candido, O romarzfümc} /zoBrml/, op' cit., p. zg; o crítico refere-se aoscrÍtIcoS

o belo e importante subcapítulo "Presença do Ocidente", pp. 66-6g.

de .ZV7re ró;.

Zz7.Antonio Cândida, O romanfúmono Brmi/, op. cit., p. zo; ver também p. zz. Zz8.Antonio Cândida, Formarão da /lrerarlzraór l/ez'ra,op. cit., v. z, p. 3z7 (com o perdão pelarepetição do passo).

zz5. Cf. Antonio Cândida, O romanfümo no Brml/, OP cit.) PP. z6) zg) 3z e 34; Formafãa da /ffera ura órmí/eira, op. cit., v. z, cap. 8.

\ 68 Sen.se das coalescêncim e sentimento da realidade

i69

permitem a adletivação::9). A posição do autor da Formação, rastreando esseprocesso, embora adote o ponto de partida, computa o resultado do

nto de chegada e isso Ihe permite compreender o processo formativo

Lura. Tatvel.tenhclhavido aíalguma in$uência de Lukács, que li em F(üu çõesitaliana

no começodo decénio de 'L95a. Mm posso diqeTque não estava

comcientedela quandopela primeira veq.formulei em público aquela pTeocu

como estrutura histórica viva, segundo sualei de movimento, aquilo

pagão' Foi no ii Congressode Crítica e História Literária, rectlilado em .4ssis

que, simultaneamente à Formação,recebeu o nome de "dialética do localismo e do cosmopolitismo".:" O distanciamento presente naquele

em \ g6'' Como nãoficou bem registrada nos .anais, publquei umclformula

passoinicial reverbera no passofinal, pois o ponto de vista dos primeiros românticos é englobado no processo que o suprimee comeria -- e o que faz o narrador da Formarão da // era zzraórm/Ze/raé precisamente isso: conserva, porque acabasuprimindo-o. No entremeio, contudo, co-

fâo correia e maü conzpZefano Zzvro Literatura

e sociedade, de ig6S.23'

Também na espécie de prestação de contas que é o Memoria/para o Co/zc rxo de Prc?#esior ZzrzzZar,na rubrica

"Definições

teóricas",

encon

éramosformulação similar, que vale reproduzir:

lhe a possibilidade de expor a estrutura histórica em processo.

De todo modo, aqui já margeamosos limites do texto em pauta e certa trilha permite chegar aos desdobramentosmais imediatos da Formação

da /írera

zzra aras//e;ra,

que

ganham

corpo

em -Z'lferafzzra

e

O esforço básico tem sido, desde que as posições teórica e a prática adquiriram

:ertclmaturidade, reconhecertrês momentos válidos lla atividade CTÍtÜa:enfoque Lo texto em suco autommia

relativa;

consüeraçào

dos elementos de personcLli-

soc;idade,livro que reúne textos dos anos t95o e início dos anos ig6o (portanto, em grande parte coetâneosà Formarão). Em um esquema

dade e sociedade; tentativcl de estudar estes, não como enquadramento ou causa,

apresentado em entrevista, Antonio Candido destacou retrospectivamente três momentos principais de sua trajetória crítica:

inclinaçãocrescente pelo último, queparecepermitir o tratamentoespecíficodo

mu como comtituintes da estnltura. O candidato tem pensado pelos trás, com texto, enquanto sistema que se pode abordar em si mesmo, permitindo ao mesmo tempo manter o interessepelos aspectospessoal e social.s, quandofor o cuo.

uma terceira Jtue, mais recente, onde a preocupação teórica se subordina m

Este esforçose esbaçctna tese de concurso bç)AS), que escolheumsunto

!stmturação, isto é, o processopor meio do qua! o que era condicionantese

teórico e procu'ou superar certo prctgmatismo sociológico inicictl, poTmeio de pontos de vista críticos de T. S. Etiot. Mais recentemente, o lil,ro L\tetamta

torna elemento interno pertinente. .4 preocupaçãonão é mais tanto o condicio-

e sodedade (x g(55) apresentaformulações de maior esforçointegrativo?;:

Interessepela estmturação.Não pela estatura propriamente dita; mm pela

namento quanto o próprio sistema. Não o sistema isolado, tomado em si, mas rla medida em que é uma fórmula através da qual o externo se torna interm =) interesse pela funcionalidade diferente

dos estmturalistm,

Leva ao interesse pela estrutura, pois o que se indaga

num sentido

é como a estatura

se esHr!t-

É Justamenteno texto de abertura de Z; erarz'rae ioczedadeque Erich Auerbachaparececom toda a força, nomeado no contexto o mais sig

nificativo. Desdeo início dos anosig6o, Auerbach torna-seuma re gerênciaconstante (embora nem sempre nomeada) e um interlocutor

zzg. Cf. Antonio Cândida, "0 homem dos avessos",in nelee a/zrúese, op' cit., PP ':9'39; Literatura

e subdesenvolvimento"(l97o),

in .4 edlzcafãope/a

no;le & o zzrox emaiai,

op' cit.l

z3i' Antonio Candido, entrevista publicada em eram/gorazZafâo, op. cit., pp. ro-ii; cf. ain

p- i6z; "Literatura de dois gumes", op' cit.) pp '76 ss.; "A nova narrativa" (i979)) in J educação pe/a noi e & ozznosema;ai, op- cit.) pp zo3 e zo7'o8; "Notas de crítica literária

daAntonio Cândida, itdemona/parao Concursode Prc:#esrorZzruZar,op. cit., p. 4. Também é perceptível a presençade Lukács no texto "A personagem do romance", de ig6i.

Sagarana" e "No Gra'zdeJarrão"(i956), republicados em Zexroi de ;rzlen'erzfão,OP'c:t.,

z3z. Antonio Cândida, .44emona/parao Co/zcarfodé Prc:#esiorZz' ü/ar, op. cit., p. 3. Sobre a

pp. l 83-gz; "Jagunçosmineiros de Claudio a GuimarãesRosa" (ig66), in }'áàai eicnlai,

referência a T. S. Eliot, sobre a qual não posso me estender, ver P. Amantes. "Providências

OP.cit.,PP.x6z ss. z3o. Antonio Cândida, "Literatura e cultura de igoo a :945 (panorama p;ra estrangeiros)

deum crítico literário na periferia do capitalismo", op. cit., PP.z7-3o. Em favor do argu

0195o),op. cit., p. ioi; no qual se fala, no mesmo sentido, da "dialética do universal e do particular" (p. iog, passim)

estáa confissão com que iniciamos, tanto mais forte quando se sabe que Eliot é um poeta dapredileção do crítico.

\ 7a Seno dm coalescêncime sentimento da realid(üe

mentode Arantes, ao qual portanto me alinho, qual seja, de que Eliot não é de fato central

i7i

dos mais importantes. Seu lugar é então reconhecido; ao final do texto

a que Antonio Candido fez referência, logo após mencionar Lukács,:;s Auerbach e seu-M/mesaaparecem como modelo de crítica: Num piam menosexplícito e mais sutil, mencionemosa tentativa de Erich .4uerbach, fundindo os processosestilísticos com os métodos histórico-socjo-

texto que conclui mencionando Auerbach, Já foi tomada como tarefa.z;s

É de se notar, com isso, que desdeo início da década de ig6o Auerbach passaa ser uma referência explícita, e nessemesmo momento Antonio bandido passaa utiliza-lo em seuscursos, o que equivale a dizer, desde a üú;o de sua atividade como professor de literatura, na recém-criada

cadeirade Teoria Literária e Literatura Comparada,tal como foi in-

lichkeit in der abendlãndischen Literatur). Fo; a propôs;rode [e/oral;a

cjusive assinalado em depoimento de antigos alunos.23óEssemomento inicial da atividade de Antonio Candido na área de teoria literária. um

semelhantes que alto Macia Carpeaux aludiu a um método sintético, a que chamou de "estilístico-sociológico", na Introdução da sua magnÍ$ca Hh\6.

de cujos registros está dado por seu texto decisivo em .dperxonagemde .peão,:3'permite avaliar a medida da relevância dada ao romanista-filó-

ria da literatura ocidental. Za/método,cq/oapedê4oamenfo ier.í decedo

logo nos seus próprios estudos.

/ lcospara ínveirzgaroi#arai da /flerazura(Mimesis. Dargestellte Wirk-

uma d© tarejh desta segunda metade do século, no vamp' dos estudos literários, permitirá Levaro ponto de vista sintético à intimidade da interpretação,

desfazendoa dicotomia tradicional entre favoresexievnas e inielnos, que ainda serre anualmentepata suprir a carênciade critérios adequados.Veremos então, provavelmente, que os elementos de ordem social serãoJiltrados através de uma cornepçãoestética e tratados ao nível da falara, para ente7tdet a singuLaridcule e a autonomia da obra ls'

Z3S.O próprio crítico, no "Prefácio à terceira edição" de Zz'rerarüra e Sociedade,op. cit., p. 2 sublinha o fato de que os estudos apresentados nessa obra são a plataforma dos estudos que

vemelaborando e que serão posteriormente publicados em livro. Por outro lado, como, em meu entendimento, a discussãoacerca do método crítico de Antonio Cândida, no que diz respeito à relação dos fatores internos e externos

vale dizer, Forma literária e processa

social--, já foi cumprida de modo ódmo tanto pelo próprio crítico (seja enHdca e progra maticamente em Zzzerarürae iocz'idade, seja in concretoem sua obra como um todo) como

em um autor tão refletido e ponderadocomo Antonio Candido,a po-

por Roberto Schwarz em "Pressupostos, salvo engano, de 'Diabética da malandragem'" (op.

sição atribuída nessecontexto a Auerbach não pode ser subestimada.E não é mistério algum que aqui sediscorre antesde mais nada acercado

cit.), abstenho-me de desenvolver a questão. z36. Em depoimento, Telê Ancona Lopez relembra o início dos anos íg6o: "Além do /zew-

programa crítico do próprio Antonio Candido, e a compreen?ãode seu método crítico", uma de cujas exposições programáticas é dada nesse

m'rzcism,Antonio Cândida nos trouxe o encantamento de uma primeira leitura de Auerba ch, que ainda não estava traduzido em pormguês. Deveria ser encomendado ao Findo de Cultura, México." Tela Ancona Lopez, "Ser aluna de Antonio Cândida", in M. A. D'lncaa e E. F. Scarabâtolo(orgs.),

Z)entra do [exlo, de,irra da vida, op- cit., pp. 43-44. Cerca de uma

décadamais tarde, Antonio Cândida continuava a ler Auerbach com seusalunos, como a z33. Embora na entrevista Antonio Cândida fale da leitura dastraduções italianas, no texto íaz-se menção a Z)er Àís arücÃe Rama,z, citado em alemão(ver Antonio Cândida, "Crítica e

sociologia(tentativa deesclarecimento)",op. cit., p. l4). Na partedabiblioteca deAntonia Cândida já doadaà Biblioteca da rrLcn-usB encontra-se uma edição alemã de Z)er ÃísloríscÀeRamal, de i955, com marca a lápis "i957"; talvez a data de aquisição ou leitura. Além deste.vários outros livros de Lukács em edições alemãsda mesma época e com a mesma

indicar um trato e reflexão continuados acerca de ]16mexü. Ver João Luiz Lafetá, "Memorial acadêmico", in -Lzrerarzzra e iocfedade, n' 3, i998, p. 95.

z37-Cf. Antonio Cândida, "A personagem do romance", in A. Cândida, A. Rosenfeld, D. Almeida Prado e P. E. Sales Games, .4personagem de.Acção. São Pauta: Perspectiva, íg68

pp' 5i-8o (emboraAuerbach não seja mencionado no texto, entendo que sua presença subterrâneaé decisiva). O livro reproduz o segundo boletim da área de Teoria Literária

indicaçãode data: "1957". Lukács, em traduçãoitaliana, é mencionado na Formação'ía

e Literatura Comparadada pn.cn da usp, áreasob a responsabilidadedo prof. Antonia

/ílerafizra órwi/e;ra, OP- cit., v. z, p 359. Em "Duas vezes 'A passagem do dois ao três'", OP'

Cândida, publicado inicialmente em ig63/64 (o primeiro boletim, como disse, foi a repu-

cit., p. 53,Antonio Cândida explicitou a relação de Lukács com o problema da estruturaçãol vale dizer, com seu método crítico. Voltarei ao ponto-

ra/zos azufos,OP.cit., p. zoi), traia-se "do primeiro curso que Antonio Cândida ministrou,

z34. Antonio Candido, "Crítica e sociologia(tentativa

de esclarecimento)", .OP..cn., p' '5'

Sobre Carpeaux e o "método estilístico-sociológico', ver Antonio Cândida, "Dialética

apaixonada",op.cit.,PP.9z'93' \ lz Sen.sedm coaLucênciw e sentimento da realidade

blicação,em ig63, da tesesobreSílvio Romero). Como nosinforma Heloisa Pontes(Z)eiem ig6i, como professor de literatura" na usp; ver também o "Prefácio", assinado pelo responsável, no livro em pauta p 6, assim como o a4emor;a/para o Co/zczzrso de Prc!$eJJar

HtuZar,op. cit., p. ic-

i73

À época da publicação de -Mlmesü, uma atenta e sábia resenhista,

aproximando Auerbach e Lukács, destacouexatamente o mesmo aspec-

to que aparecenesta citação de Antonio Candido. Em se tratando de

pois evidencia o quanto de ambiente e contexto, situação e interesse modula essasadjetivações, ]á que Antonio Candido, no seu meio e momento.

desdobra-separa dizer que não se trata de "método sociológico", mas de "crítica".:"

compreender a "especificidade da obra de Auerbach", afirmou:

Em segundo lugar, oferece a passagem para a questão do

"realismo". A realidade não está fora da obra, mas nela mesma; não é O método sociológico procede em geral segundo pontos de vista relativos ao conteúdo e ao material. \..À Erich 4uerbach comprovou como um método sociológico, que parta não dos pressupostossociológicos das obra Literárias, mas sim destra obras mesmas, é possível e fmti$ca de maneira imuspeita. [...] .4 /zovfdade da método de .dz'eróacà co

isle /zo Bafo de gaze o desen-

volvimento estilístico da /f erafura elzropé;aá ;ndlcado em ama cafegoda especz@camenfe sociológica, a rea/idade da ida ioc;a/ Àüma/za. O saózíh/o

externa, mas interna. Isso afeta desde a base a discussão e compreensão

do teor "documentário" da obra e seusmatizes particulares. Veremos maisadiante como isso repercute e vibra em Antonio Candido. Por ora. apenas destaco um movimento curioso: como se acabou de ver no passo citado de -L;fer z ara e Sociedade,Auerbach aparece como um autor que

consegueequacionar o problema da "crítica integrativa", o problema tomado como desafio e programa naquele primeiro texto de Z/ erarzzra

do tido nãofala em "representação da realidade", mm sim em "realidade

e ioc;idade -- a articulação de externo e interno na obra de arte literária.

ncposta na literatura ocidentctt", com o que o problema da realidade já é

A leitura de Kãte Hamburger é modelar ao mostrar como o externo é

desllgnado como lzm elemento estético-estilístico meramente como sua "matéria ."'

dm oór

/í er.ídm, e /zão

interno, isto é, formula, a seu modo, o problema da mediação e o situa no

fulcro do estudo da obra literária. Uma vez apontado o caráter modelar de 7Uzmesúno que diz respei-

A letra é clara, precisa, e dispensacomentário; vai ao cerne da questão e diz praticamente tudo, além de lastrear afirmações e encadeamentos anteriores deste estudo. Não obstante, quero destacar dois pontos Em

primeiro lugar, lembremo-nosde que, emum outro contexto o interesse foi precisamente adjetivar como sociológico o.tipo de análise da obra

to à "crítica integrativa", alguns estudos-chave posteriores de Antonio

Candido vão retomar Mzmeiú também sob uma perspectiva específica, na qual essa questão primeira continua plenamente atuante, embora modelada em um nexo específico de questões, a saber, a questão dos

"realismos" e, através deles, o nexo "realidade e realismo". Será no

de arte literária realizada por Erich Auerbach.:;' O ponto tem sua graça, > e C. Müller-Daehn. Munique:W. Fink, ig67, pp i8z-zog; Fritz Schalk, "Einleitung", in z38. Kãte Hamburger, "Zwei Formen Literatursoziologischer Betrachtung. Zu Erich Auer-

Auerbach, Geiamme/re,4ze#aózÍe zzrrama/zúcÁenPói/oZog;e,op. cit., PP.7-í8; Paul Zumthor,

bachs ]14fmes&und Georg Lukács GoerÁeu drezne Zeír", in OTÓÚZ;f erarum, t. wl, fasc. i-z,

Erich Auerbach ou I'éloge de la philologie", in Zzrrérarzzre, n' 5, i97z, pp. io7-i6; Ulrich

i949,PP.i43 44.

Schulz-Buschhaus, "Auerbachs Methode", in Richard Baum, Klaus Bõckle, Franz Josef

z39. Alguma literatura, desde a década de i93o, destacou o trabalho de Auerbach no regis-

Hausmann

e Franz

LebsanfE(orgs.),

Zz rzgzza er Zradz'rzo.

GeicÁ;cÁ/e

der SpracÃP«içaemcÁa!#r

tro de uma sociologia da literamra. Seu opúsculo Z)m.#a/zÍõ'siçcÀe Pzzó/iAzzm desi7.Jaá'Auri-

u/zdderneüere/z PÁz'/o/aglea. Tübingen: G. Narr, i994, pp. i93-6o7. Emborajá tenhamen-

dern [oplíó/ico.Éa,zcés do iécu/a xr//l (Munique: M. Hueber, i933), posteriormente remo-

cionado o ponto, relembro a polêmica entre Curtius e Mannheim, quando, nos anos i93a

delado e republicado em }'ier C/nferxucÁu/zgen ür GeicÃicÁre der.#mÍó'sücAenB;ZaUng, OP' cit., pp. iz'5o, com o título "La cour et la ville", dava, desdeentão,largo ensejoao rótulo.

tratava-sede delimitar sociologia e análise da obra literária. Auerbach, por seu lado, entendia-se/7Z/ago,mas em uma concepção(também ela) muito própria de filologia. Ver o Extraprograma mais à frente.

Ver apenas a titulo indicativo e sem p'etensão de completude: Werner Kraus$ "t)ber die Trãger

/zc/f

íscÃe

24o. O próprio Antonio Cândida, em outro contexto, margeou a questão: "A distinção

{ó3ücÁeZfrerarür fm Zefla/íer des.dóso/utismm.Org. P. Jehle. Berlim/Nova York:

entre os limites da crítica é uma questão [-.] mais cultura] do que específica, isto é, depende

der

klassischen

Gesinnung

im

i7.

W. de Gruyter, i997, pp. 33o'43 e 6ií-iz; in K/eírze ScÁreÓzen. Org. F. Dirlmeier.

Jahrhundert"

(i937),

in

SpanücÀe,

ira/fe

Otto Regenbogen, "J141mesü. Eine Rezension"

Munique: C. H. Beck, ig6i, PP. 6oo-i7; Gerhard

maisda solicitação que Ihe faz o ambiente do que da própria namreza do trabalho crítico AnEonio Cândida, "Notas de crítica literária

problema de jurisdição",

Xo/Za da .l#anÁâ. ii

Hess. "J14Zmes&. Zu Erich Auerbachs Geschichte des abendlãndischen Realismus"(i958),

lu]. i943, apud Flora Süssekind, "Rodapés, tratados e ensaios.A formação da crítica brasi-

in GeieZZscÃ(!Ót, Zllerarür, MhaemcÁa#r. Geiamme/reScÀn@en i938-ig66. Org. H. R. Jauss>

leiramoderna",op.cit., p. ig

t'74

Sen.se d©

coaLncêncim

e sentimento

da realidade

i75

interior dessadiscussão que Antonio Candido pautará alguns de seus mais importantes textos escritos desdeentão, em uma modulação muito

própria, mastributária e em diálogo criativo com a formulação auerbachiana. Não só em sua contribuição ao estudo do personagem de ficção,

como também em vários momentos de sua obra, a presença submersa de Auerbach é decisiva.

Longe de querer demonstrar, pretendo apenas sugerir. Por exem-

plo, se voltarmos a um texto publicadoem i957 no SuplementoLiterário d'O Eirado de S. PaüZo,intitulado "A compreensão da realidade" e logo depois republicado em O oósemador /crer'ído, veremos que

nio Candido revela a leitura dos estudos de Lukács sobre o realismo. Realismo e realidade -- assimo título de um pequeno ensaio sobre Proust (e muito mais) dos anos ig8o -- já se relacionavam nos aportes

críticos dos anos i95o, indicando um tema que vai se tornando cada vez mais significativo e decisivo para Antonio Candido. Sobretudo no

o problema da realidade,o modo de.e.xposiçãoda realidade, surge como o problema crítico por excelênciaz'l e está inscrito, como

o demonstrou a citação de Kãte Hamburger, no problema teórico da relação das dimensões interna e externa -- o que nos permite aGírmar que o desafio do programa crítico de Antonio Candido.será.enfrentado

sobretudo no terreno do romance e segundo a embocadura "realismo e realidade" . No texto de 1957, uma análise dos romances de José Lins do Rego, a discussão é pautada, logo de início, pelos "ângulos .principais" ' que balizam a "compr"nsão da realidade", obJetivismo e subJetivismo, nas suas variadas combinações.24z Com o curso do tempo essa polariza-

ção vai ganhar cada vez maior nuance em sua obra crítica. Não me parece, portanto,

exagero

afirmar

que em Tese e anzífeie

nome, como no caso do estudo sobre Gracialiano Ramos; por vezes

transmutado, como no estudo sobre Guimarães Rosa; mas sempre presente. Se a articulação do livro é uma série de variações acerca do

"atilhaçamento do ser", este núcleo mesmo é decorrente do problema

do realismo, já que

como indica o autor

desdeo Romantismo (e

vivemos no "longo pós-romantismo") os diferentes modos de exposiçãoda realidade vêm a exigir, com maior ou menor ímpeto, conforme o caso, a tematização e problematização desse indivíduo múltiplo.:" Valeria o esforço de ler Zeie e anfúeie para destacar, passo a passo, a presençados problemas dos realismos.

Seria até mesmo possível forçar uma leitura desselivro em diálogo com Auerbach, no preciso sentido de que, em suplemento a uma aproximação à realidade cotidiana -- este o traço realista destacado

por Auerbach--, Antonio Candido procura destacarum outro traço essencialdo realismo e da exposiçãoda realidadena literatura, que vemdo séculoxix e penetracom toda a força na literatura do século xx, a saber,o desdobramento da personalidade. Se é cabível essa aproximação, vale destacar que Zeie e anfúeie começa com o estudo de Dumas, contemporâneo de Balzac e Stendhal dois autores que sãoinclusive mencionados no estudo --, e, a partir dele, desdobra-se em um "naturalista"

(Eça, equivalendo,

digamos, na estrutura do

livro de Auerbach, aos Goncourt). O que vem a seguir, Conrad, o centro de gravitação do livro, já indica algo daquele "realismo" que serádiscutido por Auerbach nos autores do século xx com que encerra 7142meiú. O estudo de Graciliano Ramos, na seqüência, pontua uma

forma realista "tradicional" (segundo o modelo do grande realismo do século xix) que, não obstante, não foge à experimentação.z" Enfim,

palpita, subterrânea e continuamente, o problema dos realismos, em ca(Ía um dos autores estudados. Por vezes aflora com o seu próprio

z43.Cf. Antonio Cândida,Zeie e anrúeie,op. cit., "Prefácio:

z44.Cf. Antonio Cândida,"Os bichosdo subterrâneo"(i959),contido tanto em Zeiee Z4i. A questão aparece recorrentemente nos cursos de Antonio Candijo, desde o [ J-po de Assis, passando por alguns momentos-chave, como nos cursos "CompreensT do.

#ili:l;l ::

:ia

:í :ã

z4z.(:f. Antonio Cândida, "A compreensãoda realidade", in Brigada /Üelra e oüaosacnrm)

a4zúeie,op. cit., pp. ili-iz,

como em .FIcÇão e co/!/ífsâo(z?ed. aum., Rio de Janeiro: 34

i99z). Neste último, no ensaio "No aparecimento de Caetés" (ig84), lemos: "0 realismo de Graciliano Ramos é exato na sugestão da vida e dos fatos; mas a sua capacidade de ser verdadeiro e convincente decorre da dimensão estética, caracterizada como a 'rara condensação'da escrita, ou a 'densidade do descritivo'. Portanto, trata-se de uma fotografia extre mamenteseletiva e transfiguradora, que seresolve na capacidadede representar os aspectos significativos que constituem a 'força íntima' dos fatos, isto é, os aspectosque funcionam porque se tornaram mateúal artisticamente estilizado"(Op.

cit., p. g6)

OP-cit., PP.i5i'57-

l77 \ 7G Seno dm coaLescêncim e sentimento da realidade

desaguamos

em Guimarães

Rosa, com seu grande realismo

szzlge/zero,

no qual explode o contraponto, entendido como presençasimultânea, de realismo e magia o ponto, ademais, que liga esseestudo a um trabalho da mesma época, o estudo sobre o personagem no romance em Ápersonagemde acção:"' Ou, ainda, para indicar mais um caso em uma lista comprida e ]á

entrar na décadade i97o, o ideal, diagnosticadoem LamaBarreto, da representação direta da realidade", uma aproximação peculiar de res

única alunas'8e o resultado final desse esforço será publicado em O discurso e a cidade.

O longo interregno de mais de três décadasfoi o tempo de concepção e maturação de um livro que se pauta pelo diálogo o mais criativo com o filólogo alemão, em uma série de capítulos sobre autores e contextosvariados, que se orientam, desde o início, pelo problema dos

realismos,pelos diferentes e divergentes modos como "a realidadeé exposta na obra literária"("dargeire/7re Wz rX:/fcÃX:e;t ;rz der Z;referi'r"),

#acfaee rei./:crie, documento e ficção, convertida em forma literária,

para lembrar o importante

vale dizer. nos termos do autor, "realização literária plena".24ó Muito de tudo isso concluiu, e do modo mais decisivo, para O d&-

czzrTOe a c/Jade, intituladas

subtítulo de Mzmeiiç.249

O xis da questão concentra-se nas duas primeiras partes de O dürespectivamente

"0

discurso

e a cidade" e

cz'rsoe a c/Jade (i993), livro que é um diálogo soberano com M;mean.

Olhando retrospectivamente, é possível recolher uma série de indícios

Z48.Teresa de JesusP. Vara, "Esboço de figurino", op. cit., p. z33. Trata-se do curso "0 ro-

do diálogo com Auerbach, passando sempre pela idéia de que a tarefa da crítica é "demonstrar efetivamente [...] de que maneira a realidade social

de Filosofa, Ciências e Letras de Assim.De acordo com depoimento recente de Antonio

manceromântico brasileiro: M. A. Almeida e Alencar", ministrado em ig6o na Faculdade

ou psicológica se transforma em estrutura literária":" -- com o que, seja

Candido(rpLcn-usp, z6 jun. 200)), a primeira versãode "Diabéticada malandragem"foi dadaem curso no ano tg65, quando ele era professor em Paras;tratava-sedo curso "Le

enas lembrado, atamos com a discussão precedente dos intérpretes de Machado de Assis.

M.emoriatpara o Concurso de Professor Titular, op. dt.}

Creio, portanto, que o diálogo de Antonio Candido com Erich Auerbach vem de longe e desdobra-se ao longo do tempo. Ao que parece, é no momento da publicação da Formação da /íferalzzra órmf-

/e/ra, quando o autor realiza o retiro estratégico em Assis, que se ini coamas pesquisasque resultarão naquele livro só publicado muitos anos depois, no início da década de l99o Em Assis, Antonio Candi

do inicia a leitura das.Memór;mde zzmiargenfode m;/ú/ai comuma

romain urbaine dana la littérature brésilienne: M. A. de Almeida". Cf. Antonio Cândida, p. l \.

Z49.Não se deve deixar de relevar a importância que Antonio

Cândida dá a O d&carso e a

cidadeno conjunto de sua obra: é o livro que guardou para dedicar às olhas. Com relação àposiçãoque o autor atribui a O d&czzrxo e a cz'Jade,vale a seguinte resposta em entrevista: "A 'Dialética da malandragem' faz parte dos meus artigos posteriores, de maturidade. Creio que desdemuito cedo há sinais nos meus escritos da preocupação de mostrar como os dados da personalidade e os da sociedade se transformam numa realidade estética autónoma.

Maso primeiro artigo em que consegui mostrar isso claramente foi publicado na Revüfa d2Zezrm,da Faculdadede Filosofia de Assis, em ig61. Chamava-se 'Estrutura e função do Caramzzra' e está no meu livro Z; erazzzrcz e soc;idade, com o nome de 'Estrutura literária e âinçãohistórica'. A formulação do meu ponto de vista está em 'Diabética da malandragem'.

z45- Ver Antonio Cândida, pesee anrúese, op- cit., pp. izz, :z5, i35 e l39, aproximando-se de

Antonio Cândida, "A personagem do romance", op. cit., pp. 77 e adlacências. z46. Cf. Antonio Candido, "Os olhos, a barca e o espelho" (i976), in '4 ed cafãope/a lza;!e & ozzaosemaias,op. cit., PP.4i-4z, 44, 47 e 5o O mesmo problema, em outra conâguraçãq

aparecenos eruditos ensaiosde Antonio Candido, "0 patriarca" (ig6g) e "Timidez do romance" (i97z), publicados no mesmo volume, pp. 76-78, 93 e g8-99- Estes dois textos têm importância decisiva para um trabalho que procur' reconstruir a noção de mfmeiisem Antonio Candido, trabalho importante e ainda por ser feito, tanto mais porque o critico opera, como indicaremmais à frente, embora de modo muito rápido, uma noção dupla que possibilita mal-entendido.

z47.Antonio Cândida,entrevistaa L. C. Jackson,op' cit., p. iz7, que reproduzAnlonio Cândida, Z.fleralura e Sociedade,op. cit., p- i) e O d&cürsoe a cz'Jade,op cit., P. 9'

\ l8 Sensod

coalescênciu esentimento da realidade

Nelefaço um esquema,indicando que a obra é como uma estátua de Jante,com duas caras; elaolha sempre para fora e para dentro, volta-se para o seu meio condicionante e é uma realidadeautónoma ao mesmo tempo. Em seguida, 6z outros ensaios,que estãoreunidos com 'Dialética da malandragem' no livro O düczzrTOe a cidade. Quer dizer que depois de muitos tacteios e tendo já quarenta anos, consegui na medida das minhas forças realizar um tipo de análise correspondente à concepção que expus da 'redução estrutural'. Isso começa

com o artigo sobre o Caramum. Depois vieram 'Dialética da malandragem' e os artigos sobre.L:daiommoír, de Émile Zola, /.44a/avag#a, de Giovanni Verga, e O corara, de Aluísio

Azevedo.Com eles realizei, bem ou mal, a aspiração que tinha desde moço: mostrar como pode-selevar em conta a dimensão da sociedadesem fazer crítica sociológica, mostrando efedvamente(não apenas postulando teoricamente) a sublimação dos dados sociais e psico-

lógicosem estrutura estética". Antonio Cândida, entrevista a L. C. Jackson, op- cit., p. ízg

i79

Quatro esperas". As duas partes possuemuma unidade própria e sig-

dialético" entre eles.zs'A força de conhecimento advém então desse logo diabético; o crítico continua nos limites da mencionada "crítica de

nificativa, marcadapor um nexode complementaridade-- "2oi cara

vertentes", que segueo pendor do objeto

de zonaconcePc;Ó/z":'o' que é preciso destacar e compreender. Convém

lembrar que a parte inicial foi concluídano início dos anos i97o, mas aguardou cerca de duas décadas pela publicação.em livro.:s: Com efeito,

essaparte aguardava pela segunda, só publicada em i99o 25zA importância do fato, ao apontar para a complementaridade essencial entre as duas partes, pede esclarecimento. A chave.para sua ponderação adeada encontra-se naquele célebre "senso dos contrastes", atrelado a ;um senso agudo das estruturas", que Antonio Cândida destacou em

seu prefácio a um livro de Sérgio Buarque de Holanda.:s' Como se sabe. Antonio Candido inscreve Rales da .Brm// no pensamento social

da América Latina por compartilharessetraço, que propiciada uma percepçãoaguçadade sua história e sociedade.Destarte, o que o crítico diz acerca do livro de seu amigo valeria, mzza ú mzzrandís,para o seu próprio, a saber: explorando os contrastes e as oposições (tanto no

aquilo que Adorno deu-se

ao trabalho de teorizar como " Horrang des OÓ/eX:rs","precedência do

objeto"; noutras palavras, um modo de "pensar simultaneamente os diversos !ados de um problema".:ss

O outro aspectoque convém sublinhar de saída é o caráter supra nacional dos autores e das obras estudados, potencializando o caráter

comparatísticoque articula os diferentes capítulos das duas partes e adensando-ossobremaneira, em uma teia de relações que se tece inicialmente no interior do livro, compondo instigante arquitetura para, a seguir, espraiar-se por outros livros e textos de Antonio Candido.

Z$4.Antonio Cândida, "Raízes do Brasil", op. cit., resp.pp. l5i e i4o; na p. x5i Antonio Cândida fala da "meditação livre de tipo dialético"; a versão citada, que excluiu o "livre: encontra-sena versão publicada como prefácio a Raqei do Br //] que traz como título "0

interior das partes como entre a primeira e a segundaparte de O dis-

signiâcado de Raqex do .Brml/", in Sérgio Buarque de Holanda, 7?aqui do .Brm;/. z6? ed.:

c zrxoe a c/Jade), Antonio Cândida aprofunda a discussão do problema

SãoPaulo: CompanhiadasLetras, i99i> p. zo. Em outro texto da mesmaépoca,lemos

dos realismos, e percebemoscomo seupensamentovai se desdobran

o seguinte com relação ao ângulo do crítico: "A atitude adotada pode ser definida como

do nesse movimento. O "método repousa sobre um jogo de oposições

sentimento dos contrários, isto é: procura ver em cada tendência a componente oposta, de

e contrastes, que impede o dogmatismo e abre campo para.a medita ção de tipo dialético"; no que diz respeito aos realismos, "o esclare

Cândida, "Literatura de dois gumes", op cit., p. i64. Em entrevista, o crítico aârmou: "A

cimento não decorre da opção [...] por um deles [...], mas pelo logo

modo a apreender a realidadeda maneira mais dinâmica, que é sempre dialética". Antonio primeira obsessãoé explicar o aparente pelo oculto, e a segunda é raciocinar em função dos contrários.Tudo o que eu escrevo, pode-se notar mais visível ou menos visível, é sempre feito em função dos contrários, é um processo diabético,é e não é, pode e não pode, era e

z5o. Antonio Candido, "Prefácio", in EmaWai.y camenfaríai. Campinas/São Paulo: Uni-

camp/FondodeCulturaEconómicadeMéxico,í995)P'9' .. . ..

..- '.

25i. O fato de o título do livro repetir o título da primeira parte já indica a centralidade da parte inicial, a mais ampla e mais elaborada do conjunta

ZSZ.Já foi dito que a publicaçãodas"Quatro esperas', em i99o, poderia ser vista como uma espéciede comentário ao resultado das eleiçõesde ig8g. Cf. Flora Süssekind, "A memória como método", in H vo{ e a iene. Rio de Janeiro/Belo Horizonte: SenteLetras/UFMG,

nãoera. A partir daí procuro tirar minhas diretrizes.[-.] para poder interpretar o concreto do texto, o concreto do fato literário histórico, eu procurei sempre raciocinar como é que o oculto explica o aparente, como é que os contrários têm que ser levados em conta. AÍ está umapresençaconstante do método dialético". Antonio Cândida, "Entrevista com Antonio Cândida", in /n eil@afõei, op. cit., p. t7.

z55.Antonio Candido, gerei/naerc.,op. cit., p. i34. A menção a Theodor Adorno referese a Megaüve Z);aZetr;É. 3: ed., Frankfurt:

Suhrkamp, ig8z, pp. i84 ss, e ]rlÀefíscÀe Z%eo.

ne. Frankfurt; Suhrkamp, i973, p. 383-84. A proximidade de Antonio Cândida e Theodor i998,P.

254.

.,

..

J

zz3 Antonio Cândida, "Raízesdo Brasil", op. cit., PP.i3S'5z; cit. pp. i.39e '5'.' Noto, de passagem que o uso, sempre significativo, do termo "senso" por Antonio Cândida guarda proximidade com o uso, por Machado de Assis, do termo "instinto" no mencionado :'Instinto de nacionalidade". No romancista, seria impossível ignorar o peso que o termo, aquela época, carregava em tributo às descobertase desenvolvimentos das ciências, donde a necessidade de sua transmutação, para o crítico do século posterior, em "senso". O mesmo já não ocorre com "sentimento",

Adorno pode ser aquilatada por meio do passocitado na nota anterior, na qual se fala do 'sentimento dos contrários". Sobre a primazia do objeto e a crítica de vertentes, o seguinte

passo,tomado de entrevista: "Cada texto tem suarealidade própria e é preciso analisa lo de acordocom a sua identidade. Não tem sentido nenhum investigar a realidade num poema que é totalmente desligado dela. O que importa nessecaso é analisar a sua organização interna e os recursos expressivos que o caracterizam". Antonio Cândida, entrevista a L. C

Jackson,op.cit.,p.t7o.

que corre livre na pena dos dois.

i8i \ 8o Se.tso dw coaLescênciu e sentimento da realidade

O livro inicia-se com o célebre estudo acerca das Memór;ai de zzmz s'zqenro de m;Zlb;aç. Como sempre, regra de seu procedimento,

Antonio

como um nexo sedento de novos desdobramentos realistas -- ao menos

oara seusleitores criativos.

Candido retoma o processo cumulativo de conhecimento e debate acer-

'

ca do objeto e, ao comentar a análise do livro por Darcy Damasceno,

jüterpretação da obra, buscando aplainar o terreno e recolher materiais

que Ihe nega o traço realista, porque não documentário, diverge:

paraa análise,leva-o a Mário de Andrade, que "estava certo ao dizer

.4 única dúvida seria referenteao realismo, e talvez nem esta, se Darcy Damasceno estiver se referindo especi$camente ao conceito muar dw classi$ca-

ções Literárias, que wsim designam o que ocorreu na segunda metade do sé

cozax7x, engzz'z/zro o meu intuito é caracterizar uma modalidade bastante Ê)ecus\at, que se manifesta no Livro de MlanuelÁntânio

de .4[meida IK

Desta feita, desde a abertura do ensaio inicial do livro estamos no âm-

bito dos problemas do realismo ou, dito com maior precisão,dos problemas dos realismos, e o crítico já vai demarcando as águas do conceito

"usual« de realismo, sugerindo e apontando para um conceito "inusual",

O passo seguinte, ainda no registro do debate com a tradição de

quenas Memór;m não há realismo em sentido moderno; o que nelas se achaé algo mais vasto e intemporal, próprio da comicidade popularesca".258 Mário fala aqui de realismo em sentido "usual", como movimento literário, e Antonio Candido está preocupado em indicar que não se trata mesmo desse realismo, mas de um realismo de teor outro. Ora,

é o próprio Auerbach quem chama a atençãopara o nexo do elemento "popular" com os realismos, à medida que significa, muitas vezes, exposiçãoda realidade cotidiana. Assim, ao destacar os laços com a tradição popular, com "modelos populares",:s' Antonio Candido como querepete um percurso que Auerbach realiza em outro contexto, quando sublinha o elemento popular como traço e teor realista no teatro

ampliado, e que vai desenvolver ao longo de suasanálises. Essecon-

medieval. Nesse caso, evidencia-se um realismo em contexto e sentido,

ceito inusual é tomado de Erich Auerbach, não no sentido restritivo de

digamos, "pré-moderno", uma figuração possível e "inusual" do realismo. Note-se ainda que estamos, dessamaneira, sempre a expandir o conceito de realismo, como uma noção que se concretiza de modo vário

uma utilização, mas no imaginativo da "assimilação criadora" e "inven-

ção";zs7um conceito que, assim como vimos com respeito a /brmafâa da #feralzzr.zórwí/e/ra, abole a perspectiva classificatória dos manuais. Relendo o passo: se se fala do romance como realista no sentido

ao longo da literatura universal. Observe-se ainda que a "comicidade popularesca" como traço realistapoderia ser aproximada ao realismo rabelaisiano, tal como indicado por Auerbach, que também lança mão dessemesmo elemento, embora

usual, não há dúvida de que a ele não se aplica a categoria. Mas, se realismo é um conceito ampliado, a indicar diversos modos de exposição da realidade na obra de arte literária, então faz todo o sentido falar no realismo das.Memór;m, e é justamente estc o caso.Mas,

vindo de outra direção. O ponto de chegadaobviamente não é o mes-

então, é preciso configurar e compreender uma modalidade específica de realismo, que se realizaria no livro de Manuel Antânio. Está, pois,

em divergência, aproximações e afastamentos, é apenas porque é exatamente esta a trama e o andamento que tornam possível uma obra como

traçado o programa da análise almejada pelo crítico, desenvolvendo, sob o tópico dos problemas dos realismos, um realismo característico,

mo, mas há essestraços em comum. Se destaco pontos em comum e

]Mzmeiü,e que também lastreiam o andamento do crítico brasileiro. Isso posto, pode-se adentrar propriamente no curso da análise:

concretizado no romance em pauta. Note-se ainda que o intuito de caracterização de uma modalidade peculiar de realismo enquadra-se

no programa auerbachiano, que se apresentacomo lacunas e aberto,

Poderíamos,então,dizer quea integridade dm 'bó.em6üasé feita pela w sociação íntima entre um plano voluntário Çarepresentação dos costumes e

cena do Rios e um plano talvez na maiorpaíte invoLurttáúo(traçossetni-

z56. Antonio Cândida, O decurso e a cidade, op. cit., p. zq grifo meu. z57. Cf. respectivamente Antonio n' lo-i3,

Candido, "0 saber e o ato", Zügzza e Zíferalura, ano io

l g8 i- 84, p. l i8, e O romanrümo

no Brm;/,

OP' cit., pp. g6 ss. Ver ainda Formação da

/ireralzzra órmi/eira,op. cit., v. i, PP.36-37. \ Sz Seno dm coalescânci

e sentimento da realidade

z58. Antonio

Candido,

O c#çczzrxo e a cidade, op. cit., p. z6

z59.Id.,ibid., p. z7

i83

folclóricos, manifestados sobTetudano teor dos alas e clm peripéci(uÜ. Cano ingrediente, um realismo espontarl'o e corriqueiro, mas baseado na intuição da dinâmica social do Br it rla primeira metade do século xix. E nisto reside provavelmente o segredo da suaforça e da sua prol'ção rLOtempo'"'

Documentáriorestrito,pois, queignora m camarim dirigentes, de um Lado,M

A articulação é cristalina: realismo, que é categoria da crítica, lastreia-se no processo social; é a percepção, mesmo que intuitiva, das forças histó-

ricas ou, ao menos, do movimento da história, que âncora o realismo.:''

Essenexo entre o realismo, que é um resultadoliterário, em outros termos forma, e o processosocial é o fulcro da análise, decantadacom argúcia e certeza por Roberto Schwarz em "Pressupostos, salvo engano, da 'Dialética da malandragem'". Além disso, é o pivâ sobre o qual gira o con)unto dos estudos que discuto.

Há apenasque destacar que, se Roberto demonstrou os pressupostos alinhados na tradição marxista, ao fazê-lo deixou na sombra o diálogo capital com Auerbach, que também estápreocupado..como que a vertente marxista circunscreve na rubrica "processo social" (tal como

vimos, formulado tanto pelo próprio Antonio Candido como por Kãte Hamburger). Isso aparece, em Auerbach, na rubrica das "forças sociais e históricas". Disto resulta que a crítica de Antonio Candido, em meu

entender, está ajustando as contas com essasduas vertentes, Lukács e

Auerbach, e se Roberto já indicou com perfeição o acerto com o pri meiro, resta o com o segundo. Mas cabe dizer que ambos são uma única e mesma coisa e que esse é um dos grandes trunfos do crítico, senão o maior deles.zó:

Pondo em questão o fato de as -Memór;mser um romance docu mentário, dada uma série de limitações a que o livro se vê circunscrito Z6o.Id., ibid., PP.z8-zg. O livro foi tratado, claro está,na Formafãada /f era ura óraf;/eira OP' cit., v. z, PP. i95-99. Sem dúvida alguma, a análise em O d&mrxo e a cidade constitui avanço notável, mas há alguns traços da análise na Formação que permanecem na "Dialética da malan-

dragem".Ver tambémAntonio Cândida,Orama/zrlsmo /zo.Brmz/,op' çit., PP-6i-6Z. . O procedimento por assim dizer "técnico" do romancista foi a "estilização")

. seu teor realista tem uma de suas especificidades no seu "campo res trato", nunca alcançando "o conjunto da sociedade":'; --, a discussão de Antonio Candido chega à seguinte formulação:

camada bá.siga, de outro. Mas talher. o problema deva ser proposto noutros termos, sem quererver a acção como duplicação --, atitude $'eqüente na crítica

naturaListctquetem imperadoa maior parte dos comentáriossobrem Mem6 üas, e que tinha do realismo umcl concepção que se quali$caria de mec&nicct.

Este o intróito da formulação que de fato nos interessa; ele aparece

aqui, entretanto, porque reforça o ambiente no qual ela aparecerá,a saber,a problematização do conceito de realismo, rompendo com sua

caracterização"usual" e pensando-o de modo ampliado, vale dizer, de acordo com a postulação auerbachiana, de variadas modulações. O passocitado continua: Na verdade, o que interessa à análise literária ésaber, neste cuo, qual Qfun

ÇãaocercUclpela realidadesacia hktoricamente localiTadctpara constituir CL estrutura da obra --, isto é, um fenómeno que se poderia chamar de formato qação ou redução estrutural dos dados externos'u

Trata-se de uma espécie de realismo interior e estrutural, íntimo, se me

for permitida a expressão,à diferença do realismo "usual", externo. A formação da forma dá-se por mediação da sociedade na forma literá-

ria, e nessesentido fala-seem "formalização" e "redução estrutural" Uma vez concebido em termos de forma literária. sentido "inusual". o

realismodependeda formação da forma, da articulação interna feliz doselementosconstitutivos: "quando o autor os organiza de modo integrado,o resultadoé satisfatório e nós podemossentir a realidade",:'s o que não ocorre quando há "desintegração dos elementos constitutivos". Daí que o realismo de que falamos depende da organização das

através

da qual obteve "generalidade", chegando inclusive aos "tipos'. A relação de "realismo' e "generalidade" já foi enfocada nas páginas precedentes; no texto em pauta, ver p' ex' Anto-

nio Candido. O descartae a c;Jade, op. cit., pp. 5z e i38. z6z. Seria possível perceber um "sentimento dos contrários" amante no crítico, que lastreia a incorpomção crítica e criativa de Lukács e Auerbach e da qual resulta seu modo de análise.

z63.Cf. Antonio Cândida, O cXfcürTO ea cidade,op cit., p. z5; ver tambémp. 3i. z64.Id., ibid., p. 3z-33. O trecho remete à passagemjá citada do final do primeiro ensaiode Z;rerarzzraeioc;idade, assimcomo à observação de K. Hamburger. z65.Antonio Cândida, O d&carxoe a cidade, op. cit., p. 33; cf. Formarão da /lzerafzzraórasl /e;ra,op. cit., v. z, pp. 74-75>97-g8, í6i e z7o.

O leitor pode ir julgando se há preponderância de algum deles

\ %4 Seno d-.s coalescêncim e sentimento

da realidade

r85

diferentes dimensões da narrativa e ganha substância nessa articulação (exatamente o motim operandode Auerbach em Mlmeiís). Se ela é falha,

falta de fato teor realista, e o que podemos encontrar é teor documentário

e então ate mesmo um realismo "usual".zóó Daí a conclusão: Sendo msim, éprováve! que a impressãode realidade comunicada pelo tino

H

Uma vez deslocadaa questão de um romance que é simplesmente documento, Antonio Candido formula seu entendimento do que seria

o "romance representativo", fulcro de sua interpretação, e que é pre casoretomar. Inicialmente, o crítico destacadois diferentes "estratos universalizadores" -- operadores da generalidade -- que informam o romance,um mais amplo e outro mais restrito:

não venha essencialmentedos informes, aliás relativamente limitados, sobre a sociedade carioca do tempo do Rei Melro. Decorre de uma visão mab

profunda, emboraimtintiva, da função, ou "destino" das pessoa nessase piedade; tanto assim que o real adquire plena força quando aparte integrante do ato e componente d

situações. Manuetantânio,

ap'sar da sua singeleza,

tem uma coisa em comum com os grandes realista: a capacidade de intuir,

além dosfragmentos descritos,certosprincípios comtitutivos da sociedade--,

Nm \Ãem6üas, o segundo estrato é constituído pela diabética dcl ordem e da desordem, que manifesta concretamente m relações humanas no plctno do livro, do quatforma o sistema de referência. O seu caráter deprincípio estou rural, que gera o esqueletode sustentação, é devida à formalização estética de circumtânciu de caráter sociaLprofundamente signi$cativm como modos de existênch; e que por isso contribuem para atingir essencialmente os leitores.

Estcl a$rmativa sõ pode seí esclarecida peLctdescrição do sistema de

elemento oculto qtleage como totatil(üor dos aspectospare'ats."'

relações dospersonagen.s, que mostra: Çx) a comtrução, na sociedade descrita

Esta é a fatura realista. Assim, esseselementos ocultos que formam a estrutura da sociedade operam também na estrutura da obra literária:

são a força interna que dá forma à forma literária, isto é, que a trans-

forma em um todo articulado e prenhede sentido.Essa"totalização dos aspectosparciais" é precisamentea ope'ação na qual intervém a diabética. Para tanto, estamossempre na dependência do que Antonia Candido denominou "visão mais profunda", a capacidade de penetração que desvela o movimento

das "forças históricas"? para. falar como

Auerbach; por isso a aproximação aos "grandes realistas" -- fazendo aqui coincidir os sentidos usual e inusual do termo. Se lembrarmos por um instantea análisedos grandesrealistas-- Balzac,Stendhal . por Auerbach, veremos que seus realismos dependem precisamente dessa "visão", da capacidade de percepção do movimento das forças históri cas e de sua configuração na obra literária.

pelo livro, de umcl ordem comunicando se com umcl desordem quea cerca de todos as Lados; ÇabCLsua correspondêncictprofunda, muito mais do que

documentárLa,a certos mpectos assumidospela relação entre a ordem e Q desordem ncl sociedade brmiLeira da primeira

metade do século HxlGÜ

Eis o fulcro: o teor realista das Memódm de zzmsargentode ml&Z; é dado pela "formalização estética", cujo resultado é a "correspondência profunda" de estrutura social e forma literária, uma paráfrase da formulação

lukacsianada relaçãoentre forma literária e desenvolvimento social, que apareceaqui pela primeira vez e cuja fortuna na sociologia e crítica literária brasileiras, embora restrita, fez fortuna. A expressão a que lança mão o crítico não remete explicitamente à matriz marxista, que falaria com mais facilidade em "reflexo", "mediação", "determinação", "espelhamento",

"desdobramento", conforme o caso daí o esforço de Roberto Schwarz, em seus "Pressupostos", em tornar mais palpável e evidente a matriz. Ê o mesmoRoberto quem destaca o que fica por detrás da análise:

Z66. "A força de convicção do livro depende pois essencialmentede certos pressupostos da natura, que ordenam a camada super6cial dos dados. Estes precisam ser encarados coma

trata-se de lev o romance sobrefundo real e de estudar a realidade sobre

elementos de composição, não como informes propo'clonados pelo autor, pois n'ste caso estaríamosreduzindo o romance a uma série de quadros descritivos dos costumesdo tem-

fundo de romance, rlo plano duformm mais que dos conteúdos, e isto criati-me«te. Q«e' ditar, «ão -««é; dmfo-mm de p«ceia., q«e ;ãoj««.m.«"

po." Antonio Cândida, O dücurKOe a cidade, op. cit.) P. 34'

,

: ...

Z67. id., ibid., p 35. Sublinho que encontramos aqui o equivalente não apenas .funcional, mas inclusive literal, de formulações que Roberto Schwarz alinhou em seu estudo sobre o texto em discussão e pelas quais já passamos.

\ %6 Seno dm coalescências e sentimenu

da realidade

z68.Id.,ibid.,p.36 i87

] que a emancipação da forma e sua imantação pela história contemporânea -- puseram de lado, mas através da sondagem mab ousada possível da criência estética e dos conhecimentoshavidos: Ler uma na outra, a litera-

i ++"

tura e a realidade, até encontraro termo de mediação.Entretanto, Já vimos lue "encontrar" não é a palavra cena, pois não dispomosde mesmomodo

de um romarlcee da realidade, nem a maneira de estuda-Losé igual. No plantoda literatura, pela naturezad© coisas,CL forma ainda a mais secreta, jncomciente ou intelectuatilada, tem de ser íeiterávet (."encontráveL" ) para

a imaginação} semo quedeixa de existir. Ao paó'o.queno plano da realidade, o qual para quem escrevese compõe de vida prática, conhecimentos e biblio-

y

gra$a eLapode não existir de modo literariamente dbponível, embota estqa traída. Nestes casos, o crítico tem de consttxüt o proa'sso social em teoria, Lendoem mente engendrar a generalidade capas.de urti$car o uni'persaromarlescoestudado, generalidade que antes dele o romancista havia percebido e tramformado em pl'hcípio de comtrução artística. Este trabalho, se responde i$nura de seu objeto, produz. um conhecimentorlovo. Trata-se, noutra pala'

vrm, de chegara uma estrutura cleestruturas, ou melhor, a uma estrutura composta de duu outrm= a forma da obra, articulada ao processo social, que

tem de estarcomtruído de Irado a viabiLilaí e tornar inteligível a coerênciae . força otganiladora da primeira, a qual é o ponto de parida da re$exão. Quanto ao método, note-se que no vaivém entre acção e realidade a prioridade da forma literária é absoluta."''

Afora a inspiração adorniana do texto de Roberto, formula, se aqui a arti' culação,altamenteprodutivae -v' ''r"'' . ovadora, .da síntese ,. ..Lukács-Auerbach, ., . ..:.i...

Edil á

==:::'=:ln'il:: l çl

lismo em Lukács e soluciona-se a dificuldade na teorização do problema

dasforças históricas em Auerbach. Este, aliás, é um tema que aflora nas notasde leitura de Antonio Candido: )unto a uma mençãoao Mzmeià de Auerbach em livro de Hatzfeld, anotou: "Auerbach como encontro do P-v estrutural (e atemporal) com o condicional (e histórico)".:'o

A denominadadialética da ordem e da desordem é o "princípio estrutural" que se realiza na obra literária (ficção) e na realidade,cada vez a seu modo próprio, mas sempre redutível, via análise, à essa forma geradora. As -Memónm permitiram a Antonio Candido perceber e

formular essadialética, que se realiza como princípio estruturante do romancee que se realiza enquanto forma da realidade na sociedade brasileira, naquela situação histórica. Ora, sendo lógica estruturantc das relações sociais, é mecanismo totalizante, que por sua vez reverte, no âmbito da forma literária, como possibilidade de organização

dosvariados elementos se se quiser, sínteseda forma ("formalização estética"). O ponto de vista da totalidade está ancorado nessaestrutura profunda e por assim dizer geradora, que se desdobra em ficção e realidade,donde a possibilidade da "correspondência profunda" entre uma

e outra (ou algo como uma reversão infinita, para se falar em outro jargão). Com isso chegamosao realismo, em sentido "inusual" Antonio Cândida sintetiza todo o andamento e problema na seguinte

formulação: nõo é a representaçãodos d(üos concretosparticulares queprodu\ na acção o sensoda realidade; rnm sim a sugestão de uma certa generalidade, que olhcl para os dois L(úos e dá comistêncict tanto aos dados particulares do real

quanto aos dados particulares do mundo fictício. \.. À pois o sentimento da realidcüe ncl acção pressupõe o dado real mm não depende dele. Depende de

princípios mediadores, geralmente ocultos, queestruturam a obra e graça CLÃS quais se tornam coerentes u dum séries, CLreal e a fictícia ln~

z7o.Anotação marginal de Antonio Candido em seu exemplar de Helmut Hatzfeld, .Bló/io graça crí:ica de !a nue'/a estilística aplicada a {as !i eralur

românica. b&adü: G Caos, xgSS}

p- 47(no item signiâcativamente intitulado "Importância de la explicación de texto para la crítica y la historia literária"). O exemplar da biblioteca de Antonio Cândida, depositado na Biblioteca da PFLcn-(JSP,traz manuscrita a data "5.v.58 z7i. Antonio Cândida, O clifcurxo e a c;Jade, op. cit., pp. 45-46. O "sentimento da realidade

encontra-setambém em Antonio Cândida, "A personagem do romance", op. cit., pp. 78 e 8o. Nesse importante texto, o mesmo problema foi aventada, com ênfase nos aspectos>

i89 l8$ Seno dm coaLescêncime sentimento da realidade

vés do particular e do particular medianteo universal ("raciocinar em

Destarte, a mediação rzoreal e /zofictício é uma dimensão estrutural que

função dos contrários"). O resultado é o conceito adensado de realismo.

se faz presente, organizando e estruturando? na.estrutura da sociedade

e na estrutura da obra literária. A m;mes;shabita um espaço51ntrereJ Éaczaee rei#crae - e talvez nesse sentido se possa entender a afirmação

'de Faoro a respeito da "m;melü dialética" como "ponte"' Explicando Antonio Candido azzxe/t#a/zzs, Roberto Schwarz destacou a estrutura J

profunda ( estrutura de estruturas").que seria propnam'll.J diabética, r'v-use realiza na obra e na sociedade -- daí

exemplares os detalhes da realidade presente".2'2

mediação

Dessa maneira, a solução realista das .44emór;mé a formulação de uma modalidade específica de realismo, que ganha inclusive nome,

possibilitadoradesíntese,que . ''..-i.+-r

O viés auerbachiano da interpretação mostra-se ainda no pendor comparativo, que apareceao final do ensaio. Sobretudo na comparação com Alencar, estilo e realidade são postos em relação. Em Alencar, o "estilo de classe" leva a uma perda do "senso da realidade", enquanto o estilo "coloquial" de Manuel Antânio "torna amplos, significativos e

.

. : .;J.-.;J.J.';.:

da sociedade /za obra. Como mzmes;s nao é ide .tidade

tação,v-' ia pum e simples), mas produção da diferença...

(Imi-

lesa' nos

termos de Candido), tanto a realidadecomo a obra literária guardam especificidades próprias e irredutíveis, embora sejam ambas redutíveis ao princípio estrutural. Se assim é, vemos como Antomo C=.-.\ o ofe. rege solução notável aos impasses(teóricos, mas não analíticos) a que chegara Auerbach.

'"'Disto

.

.

.

..

..

"fábula realista": "Vislumbramos através das situações sociais concretas

uma espéciede mundo arquetípico da lenda, onde o realismo é contrabalançado por elementos brandamente fabulosos".27; Um capítulo a mais no panorama dos realismos inaugurado por Auerbach. Mas só

vemos e sentimos tudo isso, nós outros, devido à lição de "anatomia espectral",27' lição de Asmodeu.

posto, Antonio Candido não poupa referências ao "realismo",

:==.=:' === .=:.=H:i::'=:=:=n,:=: :;1gamos a uma concepção profunda de realismo, que conjuga o universal e o particular -- conjugação que se faz por meio da diabética Que se.. a

liE:ÊÂE't:.?=':=i,='= == : =1:, relação que lembra a formulação adorniana da crítica do universal atra

Uma vez que Antonio Cândida firma a especiatcidade de certo realismo, historicamente situado, e assim dirige-se a uma compreensão dos problemas dos realismos de embocadura auerbachiana, mas ao mesmo tempo

não abre mão da compreensão dialética da relação de processo social

e forma literária, surge a necessidadede aplainar a arestacom a compreensãolukacsiana, que normaliza, como se sabe, um realismo como o Realismo.z's A isso vem o segundo ensaio de "0 discurso e a cidade",

272.Antonio Candido, O (#çczzrTO e a c;dada,op. cit., p. 5z.

>

z73.Id., ibid., p. 54. No rodapé"Conversa dada", de zz ago. i946 e republicado em .[írerarura e sociedade, n? 6, 2001-0z, p. 3l5, Antonio

Candido destaca o romance de Manuel

Antânio como "precursor do realismo", mas em O rama/zümo no Brml/(op. cit., p. 6z) afasta-sedessaidéia; na Formaçãoda /írerazzzra ór ;Ze;ra,firma o "ponderado realismo" de

ManuelAntânio(op. cit., v. z, p. í95). z74.Antonio Candido, O c/hczzrTO e czc/dado,op. cit., p. 54. z75.Já na Formaçãoda areralzzraór IZelraAntonio Candido detectou o dogmatismo lukacsiano(op. cit., v. z, p. 97), assim como em Z;rerarzzrae iocíedade(op. cit., pp. 6 e l4). Sobre o caráternormativo mais tênue em Auerbach, ver Gerhard Hess. "J141meiü.Zu Erich Auer. 'bachs Geschichte des abendlândischen Realismus", op. cit., pp. zo6-o7, e Ulrich SchulzBuschhaus, "Auerbachs Methode", op. cit., pp. 593-94; este último, ainda aproximando e

afastandoo crítico húngaro do romanista alemão(pp. 594-95 e 599), aproximação estaque era o mote da também já citada resenha de Kãte Hamburger.

correntes". OP. cit., PP.74'75 e 77

i9i lç)o Seno dm coalescêrtcias e sentimen o da realidade

"A degradação do espaço", no qual se analisa -Z,'Hssommo;r.Nesse con-

texto, opera o conhecido estudo de Lukács, "Erzãhlen oder Beschreiben? Zur Diskussion über Naturalismus und Formalismus" ["Narrar ou

'aB lt+'b'

escritor. Aqui, portanto, rllLm paradmco aparente, o simbolismo provém do 'nrzzzlonatura/Kra[...].280

descrever? Para a discussão sobre o naturalismo e o formalismo"lz7ó que

Há transfiguração mesmo no realismo pretensamente o mais "estrito", e

busca. dentre outras coisas,indicar e fundamentar os limites do "rea-

issose concretiza na forma literária, enquanto dimensão da obra na qual semanifesta aquela estrutura profunda. É disso que brotam Gíguraçõesli-

lismo" de Zola. Entretanto, Antonio Candido assumedeliberadamente

t»'

a "perspectiva dos ambientes e das coisas",277que é o modo no qual se desdobra a "descrição" repreendida por Lukács. Daí a intencionalidade oculta («z« non lroppo) do ensaio, uma contraposição às formulações do

crítico húngaro, que aflora explicitamente uma ou outra vez: se para Lukács a questão estava posta nos termos da exclusão, "narrar ozzdescrever". Antonio Candido mostra-nos como "descrever á narrar".278 Desse modo, a continuidade da discussão dos problemas dos rea-

lismos será desdobradaem exemplo consagradodo realismo "usual"

teráriascomo a escadado cortiço em -L:Hiiommo;r,que Antonio Cândida analisa(com o mencionado pendor comparatista, e vale reler os ensaiosde "0 discurso e a cidade" apenaspara aferir a enorme quantidade de referênciascomparativas feitas), procurando mostrar como ela é ao mesmo tempo "um dado realista do espaço das habitações coletivas e um dado simbólico da narração".zst Naturalmente, visa-se aqui Georg Lukács, que em "Narrar ou descrever?" reprova a utilização do símbolo na literatura realista. Se no romance de Zola descrever é narrar, no de Verga falta a des-

(potencia[izado, pois "natura]ista"), Zola, e ]a de início a perspectiva do crítico é divergir: "Apesar do intuito c;e/zlg;co,ele comunica o senso da realidade menos pelo discurso referencial do que pela interação des-

crição. Encontramos na análise de /.44aZaPOF#a um outro realismo, que se

te níve] com o metafórico [...]".:" Ou sela,desmistificandoo realismo como mero retrato da realidade,pois mesmoem Zonaa obra figura o

pretação,Antonio Candido destacacomparativamente o modo como o

real a seu modo, inclusive szzóipec;e metafórica.

meridionalforjam por dentro formas literárias específicas.Não é mero

diferenciado que seviu em Zola. Aflora aqui de modo mais claro os ftlndamentos sociais que pautam as análises: desde o início, abrindo a interdesenvolvimento do capitalismo na metrópole francesa e o atraso na Itália acasoque o tr'atamento do espaçosela tão diverso nos dois romances ana-

de sua obra, como de qualquer outra com certo teor de imaginação verda-

lisadospor Antonio Candido, que se preocupa em sublinhar a diferença.

deiramente criadora, se desprendeum signiFc(do que tram$gura objetos e

A análise de -L:dxaommo/rjá o tematizava desde o título, "A degradação do

personagens=e que, nada tendo a ver com qualquer noção idealista de trem cenciência, decorre da própria orgartilação dos elementos manipulados pelo

espaço" Notemos, então, que no romance de Zola trata-se de um espaço diferenciado, seja fisicamente, seja nas suas funções, e o romance é lido através do percurso por diferentes espaços e por suastransformações, isto é, a variação nas suas funções. Daí a importância da descrição, que

z76. Cf. Georg Lukács, "Erzâhlen oder Beschreiben? Zur Diskussion über Naruralismus und Formalismus". in ScÀícha&we/üe. Belnàjge u ezrzerrzelzepz deuncÁe/z/deoZogfe.Berlim: Aufbau,

r948,pp. l i5-79. Como já sedisse,o texto é parte de um amplo conjunto de escritosdo período moscovita do crítico húngaro, que formam, embora lançando mão da redundância, sistema. z77. Antonio Cândida, O discurso e a cidade, op- cit., P. 84-

Z78.Id., ibid., p. 7z; ver também pp- 76 e 8g. O que lança luz retrospectiva sobre o papelda descrição nas .44emónmde um iargenro de mz/iZlm(cf. O dücurKOe a cidade,op. cit., PP' 33' 39 etc ). Note-se como a transposição da argumentaçãode Antonio Cândida com relaçãoa Sérvio Buarque, indicada mais atrás, funciona à perfeiçãonesseponto: não setrata de optar, como faz Lukács, por um realismo, masda capacidadede estabelecero )ogo dialédco entre realismos particulares.

z79. Id., ibid., p. 61. Guarde-se a idéia do "discurso referencial", que retornarâ mais adiante.

z8o.id., ibid., p. 66. Cf. Ãarmafâoda afora zra Órmz'/e;ra, op. cit., v. z, p. g8. Pode-selem brar do que já se disse anteriormente acerca da "transâguração". Ver também Antonio bandido, "0 direito à literatura"(ig88), in }Un oi escn'ioi,op. cit., p. 24)z8i. Antonio Candido, O (/üczirio e a cidade, op. cit., p. 6g; ver também p. ioi- A possibili dadede um realismo que lançamão do simbolismo é objeto do texto de Brecht "Amplitude

evariedadedo modo de escreverrealista"(i938), EflzzdosH mfadai, v. iz, n' 34, set./dez -i998, pp. z67-76. O texto foi escrito como contraposição àscríticas, por Lukács, do símbolo no realismo e remete a um amplo e rico debate da época. Auerbach tratou da questão em seu estudo sobre Baudelaire: "Baudelaires .1;7ezzr= dlz ma/ und das Erhabene"(i95i),

in Ge

ramme/fe.4zeÓ=dzÍe ar romaníscÀenPÃi;o;og/e, op- cit., pp. z78 e z8g-

i93 L gz Sen.se d

coalescância.s e sentimento da reaLüade

mostra-nos, na análise de -L'.4siommo;r, como são de fato capitais na nar-

i

possibilita inc[usive a afirmação reparadora do Juízo lukacsiano, "narrar é descrever", pois a variedade dos espaçose a.mudança das suas funções

rativa, pois remetem e simbolizam elementos da estrutura profunda da

precisam ser caracterizadas.:82Ademais, o simbolismo que permel: a narr;uva aguacomo elemento dissolvente do determinismo materialista. Em

lizados, e não há, portanto, por que se deter na sua descrição. A narrativa

contraposição a tudo isso, na análise do romance de Verga prevalece a mdíferenciação do espaço,de sorte que temos um "espaço único multi-

r

funcional",zi3 que engloba família/casa, aldeia e mar. Consequentemente,

os procedimentos descritivos perdem em importância:

$

)s pormenores são tratados

deixa a descrição de lado e corre por entre essespormenores, tomando-os como dados, estando ali. É estasua presença naturalizada que remete para o "significado

social", como se exprime na "casa", cujo sentido, antes "fa-

mília" do que construçãoe materialidade,em tudo difere do cortiço no romance de Zola. Daí a novidade desseselementos, que são decisivos, sem

++,.'

]

obra. Agora, em /Ma/avoFZ;a, surgem de outro modo. Aparecem natura-

como se a sua ncistância nos fosse tão famili«

anta é pata o rLaíí(üoí, tendopor bso a realidadeólwia das coça natural. .4 indeterminação e a parcimónia dos traços descritivos contribuem para

contudo serem descritos nem comentados.28õ Aqui percebemos um dos impulsos das análises reunidas em "0 discurso e a cidade", a preocupação em diferenciar o que é visto como indiferente, no caso o "Naturalismo".n'

Há também a preocupação com a relação de estilo elevado e coti-

absolver os ambientes no seusigni$ccdo social.'"

diano:Verga rompe com o estilo elevado e mergulha no cotidiano. O

.+

Sãopormenores similares que irritavam o crítico húngaro, que os considerava supérfluos, não determinados pela necessidade.:8sJá nosso crítico

z8z. "A ação se torna quase descrição, na medida em que os atos são manipulações; a narrativa parece uma concatenaçãode coisase o enredo sedissolve no ambiente, que vem a -a" "' r"'"'

'

s de objetos e dos ates executados em função deles.

primeiroplanoatravésdasconstelaçõe .

. , .

Jn--«nr'ín--,.

mesmojá ocorrera em Zela, cuja "revolução estilística" em .[:4xio«z«-o/r

foi trazer a fala do povo para a linguagem literária, configurando verdadeira "invenção da linguagem".28* Aqui Antonio Candido desdobra

aspectodas análisesde Auerbach, a conquista do cotidiano na linguagem, assimcomo a relaçãode linguagem literária e público. O leitor percebe então, retrospectivamente, como vão se enlaçando os estu-

dossobre Manuel Antânio de Almeida, Êmile Zola e Giovanni Verga, estandoclaro que diferenças nacionais, de contexto, históricas e sociais,

implicam significação diferenciada da linguagem coloquial nos três romances.28' A "linguagem

nova de fundo popular",

esmiuçada agora

em Verga, vale também, guardadassempre asproporções devidas (que sãoproporções históricas e sociais), para o brasileiro e o francês. Se me é permitido desdobrar um pouco essecomplexo de problemastrabalhados por Antonio Candido na análise de /Ma/al.'og/ía, cabe

z86.Antonio Cândida, O decurso e a cz'Jade,op. cit., p. g8

z87.Id., ibid., pp. io5-o6 e il-iz; na página t47, fala da "complexidadede matizesdo Naturalismo". Na versão em espanhol Antonio Cândida optou por transformar "0 discurso forte entre esselivro de ig64 e o de i993, que aguarda um escudodetalhado. z83. Antonio Cândida, O disclzrsoe a cidade, op. cit., P. 97'

$l$Plui HB u:yl::ip

e a cidade"

em "Tríptico

naturalista",

excluindo

o estudo

das -44emónas de zzm sagenlo

de

mz/ü;m. Cf. Antonio Candido, E/naWoi.7 comeman oi, op- cit., pp. g-io e i3 ss A preocupa

çãoem diferenciar é uma figuração do mencionado "pensar simultaneamente os diversos ladosde um problema z88.Antonio Cândida, O dhclzrsoe a cidade,op. cit., pp. gi-gz e io5

z89.Id.,ibid.,p.io6-o7. i95

194 Se"se daa coalescêncime sentimento da realidade

notar que o tema e o problema da penetraçãoda.linguagem falada e ular na língua escrita e culta é um tópico central em Mzmeaü. Verga

e Zola possuíamdomínio e maestrialingüística para escreverem um

n a

tal como Auerbach indicou no coteJOda "Chanson de Alexis" com sua possível conte latina: é apenas na língua vulgar que "as pessoasganham envergadura e vida humana":'s, sendo portanto elemento de crucial teor

estilo culto, se necessário. Mas sua novidade é que incorporam essacapa-

realista. Um meio privilegiado que aí opera é precisamente o dzsczzrsa

cidade que Auerbach demonstrou brilhantemente na análise de Gregário de Touro: para alcançar o mundo, o sensível, ele foi capaz.de submeter a

difere,que aparece como uma dimensão daquela mesma conquista, possibilitando que pela "primeira vez" tenha sido possível uma "erupção" da

linguagem ao mundo.:9' Ponto central do argumento de Auerbach, coU

"essênciaverdadeira" do ser.:9'

relação a Gregário, é que, nele, pela primeira vez, a língua vulgar molda

Segundo Antonio Candido, o intuito principal do ensaio sobre

a língua literária, a fala popular molda o latim. Embora a língua vul-

/Ma/avog#a é "analisar a convergência do elemento lingüístico e do

gar não apareça como língua literárias escrita -- o que sõ aparece'â mais

tarde. na análise da "Chanson de Roland" --, ela ]á está, em Gregário, anunciando-se por detrás e no entremeio do latim. O resultado dissoé

que se ganhaem realismo,isto é, em "realidade cotidiana", em sensibilidade e problematicidade.:''

Por sua vez, o que Antonio Candido mostra

elementosocial"z" algo que, depois de firmado, se espraia retrospectivamente para os outros dois romances estudadospreviamente. Isto é evidente, bastando lembrar que a degradação do espaço e do humano emZ:4alommo;r é simultaneamente degradação da linguagem.

Aquela convergência é de fato a dimensão social e moral:': que

em Zela e sobretudo em Verga é um momento avançado desseprocesso,

entranha na linguagem literária (o que vale também para Z:dxiommo/r) e

de que um resultado é o vértice realista do século xix.

que,no casode /MaZavogZ;a,permite a convergência final no provérbio,

Seguindo esseencadeamento,quando se fala da conquista da linguagempopular em Zola, é pertinente relembrar um desenvolvimentode Auerbach no segundo capítulo de Mlmesü. Auerbach mostra-nos como

espéciede síntese que se expressa no próprio título do ensaio, "0 mundoprovérbio".zw Donde se aquilata a grandeza do escritor: na cunhagem de

a linguagem literária anterior ao séculoxix, mesmo quando retratao cotidiano e os estratossociais maisbaixos, não é a linguagem do povo.

revive recorrentemente na pena do escritor,"' à diferença da linguagem

Se é, então o registro é satírico ou de comédia, mas jamais sério, profundo e problemático.ZP:Gregório, contudo, possui uma disposição para "retratar

vivamente

a realidade viva".ZP3 Ele adequa sua linguagem

ao que

uma linguagem literária que é depositária dessa dimensão social e que

z95.Id.,ibid.,p. lt5 z96.Id., ibid. z97.Antonio Candido, O cüçcurxoe a c;Jade, op. cit., p. io8; ver também p. izi.

pretende narrar: uma "linguagem que dá conta da realidade cotidiana",ZP'

zg8. id., ibid., p. io8. Antonio

e é essamesma intenção que culminará em um autor como Verga, com

de Graciliano Ramos. Ver Antonio Cândida, /lcfão e cor!#íião; o problema também per-

sua linguagem-provérbio.

Este realiza um trabalho homólogo à conquis-

ta literária que foi a passagem da língua latina para as línguas vulgares,

Cândida explorou também esse problema em suas análises

passanele e anrúeie. Veja-se, por fim, o que se diz em ]141meiü acerca do "modelo moral"

Auerbach,op. cit., p. ti3. z99.Antonio Cândida, O c#fczzx=o e a cidade,op. cit., pp. 95 e izi 3oo. Para situar o trabalho de Antonio Cândida no contexto da compreensão de /a4a/al,ag/za,

zgo. Antonio Candido destacou isto, mlz alú mzírand&, com relação à estréia de Clarice Lis

pector: " Os vocábulos são obrigados a perder o seusentido corrente para se amoldaremàs necessidadesde uma expressãomuito sutil e muito tensa,dç tal modo que a língua adquire o mesmo caráter dramático que o entrecho". Antonio Cândida, "Uma tentativa de renova

ção"(i944),in BTÜada /beiraeoü oi escnloJ, OP'c:t., P :oo'

z9i-Cf. Auerbach, ]141mesü, OP'cit.,P.94' Z9Z.Id., ibid., cap.z.

z93-ld.,ibid.,p.94. z94 Id.,ibid.

\ g6 Seno dm coalescênciw e sentimento da realidade

remetoa Alberto Asor Rosa,"/.44a/aPag#a di Giovanni Verga", in A. A. Rosa(org.),Zerferarzzra zfa/cana.Ze opere.Turim: Einaudi, i995, v. 3, pp. 733-877. Especialmenteo item v(pp. 834-7z)oferece pontos de contato muito instigantes com o que se tenta desenvolver na análise

deAntonio Cândida. Ademais,para seaquilatar o trabalho do nossocrítico é preciso retornar adois estudosclássicossobre / Ada/a og#a; G. Devoto, "I piam del racconto in due capitoli dei 'Malavoglia"', in .BoZellzrio de/ Ce/irra di' Smdz'.FTZo/OFicf eZügu&üc/ Szcz/fama v. u, i954, pp z7i-74) assim como a resposta de Leo Spitzer, "L'oríginalità della narrazione nei 'Malavoglia

(igj6), in Ron'zanúcAe Zinrar zrKrz/die/z i936-i956. Tübingen: M. Niemeyer, i959, pp. 6z4-44. Note-seque não estou afirmando que Antonio Candido conhecesseos dois trabalhos, mas que >

i97

literária autonomizada, que prescrevee elimina o coloquial, que almeJaa "estilo epigráfico"."'

f'

ã

Estamos então variando um tema auerbachiano,

L'on volt certains animaux farouches, des males et des femelles, répandus

par la campagne,noirs, livides et tout brülés de soleil, attachésà la berre

o problema da mistura de estilos ou, dito com maior precisão, a quebra

qu'ils fouillent et qu'ils remuent avec une opiniâtreté invincible; ils ont

da regra da separação de estilos. Ou seja, Verga está operando, em registro

commeune voix articulée, et quand ils selêvent sur leurs pieds, ils montrent

específico, o processo que Auerbach indica em Mzmexís. Sua especifica. dade é assinalada por Antonio Candido, à medida que destaca o proble.

une face humaine, et en effect ils sono des hommes; ils se retirent la nuit dana

ma do italiano culto, do regionalismo e do dialeto;;': Verga busca uma

autres hommes la peine de gemer, de labourer et de recueillir pour vivre, et

solução que é adequação da linguagem à coisa, e o resultado é o "estilo

méritent ainsi de ne pas manquer de ce pain qu'ils ont semé.ns

des taniêres oü ils vivent de pain noir, d'eau et de racine; ils épargnent aux

rústico", em continuidadeflagrantecom a "sociedaderústica".;"

4

.i {

Note-se então que o problema dos "níveis elementares de Sobrevivência" e da "sociedade rústica", recorrente e estruturante na análise

A análise de .Auerbach tem uma $nalidade bem precisct: na COnfTOntaçào de

de /Ma/a OF#a,é o mesmotema que Antonio Candido desenvolvera

período CLáSSiCOfTanCês, sob o reinado de Luas xil'. O núcleo dopTobLemü é a Telctçãode tipi$ccLção e individualização. Não obstante estarmos em um

em Os parceiros do Rio Bonito?'~

1..aBntNêíe com MoLiêTe, oferece um estudo saLTem forrou

de realismo no

século moralista e tipi$cador, Moliàre accntucl o individual

saLTe o tipo e,

lessemovimento, "compreende CL realidade de modo muito mak individual

Excursofora delugar

É re/e an e oó:er ar e entendergazea gzkra@ede Os parceiros do Rio

c muito menos tipi$cado do que a maioriçl dos moralista

de seu século"l'''

- emborca o faÇCL para dar lugar à comicidade. De fato, a "atitude moralista écomum a ambos, mas o teatro deMoliàTe exige o "elemento concreto-vivo" ,

Bodxto, um Fuso msombroso de La Bruyàre, é ncatamente o mesmo queé citado e analisado por Auerbach em b/!Àmeüs. Hou retoma-to e apontar seu

:nquanto a prosa mordi.stct satisfaTse com o "abstrato-típico",

de sorte que

sentido nas dum obras, e talvez. mab além:

l individual e CLoutrct,o típico. Isto posto, '4uerbachformula a próxima

los dois autores temos duas forma dct atitude moralista, uma privilegiando questão que Ihe interessct, cl saber: como o "povo"

é visto pelos escritores?

Como ete aparece nessa Literaturct?nn >

se encontram todos em rico entrelaçamentode discussão,o que permite tanto melhor compreender como avaliar a contribuição de Antonio Candido. Se por um instante refletirmos em

conjunto sobre o ponto, veremos que Antonio Candido mobiliza em suaanáliseos elementos presentes nessesestudos, mas deles se diferencia por articula-los a uma dimensão social que, neles, embora subjacente, não é foco de problematização. Exatamente esta diferença é a distân-

Em um primeiro momento, Áuerbctch nos mostra como, para Moliêre, BoiLeau e Lcl Bruyêre, o povo só apctrece como "personcLgem ridículos". .4 Liferençclentre eles é que, no primeiro, hâ também um "marquês ridículo" de modo queo ridículo nào épTerrogativct do po'vo --, enquanto os outros dois

cia que Auerbach preocupou-se em demarcar frente a Spitzer na introdução de Zlreralar=pracée

) cemuram por essamistura: atribuir o ridículo Qnível baixos a um persona-

nd Püó/ÍÉzzm, isto é, a preocupaçãoem superaro enfoqueestilístico rumo à dimensão social.

gemde posiçãoe nh'et elevado.Comi.sso,Moliêre atinge "os Limitesdo que

Cf. Auerbach,Z;fera ür=pracÁe zzd Puó/iÉlzm, op.cit., pp. zo'n. Lembro,por fim, queHelmut HatzEe\d. na sua Bibliogra$a crÍticcl de La nueva estilística aplicclda a [© [iteraturm românica, aP.

cit., p. 6o7 livro que, como indiquei, foi lido por Antonio Candido e repousaem suabiblioteca, depositada na Biblioteca da rPLCH-USP ) aborda o mencionado estudo de G. Devoto, destacando a importância que nele é dada ao-. provérbio.

3oi. Antonio Cândida, O diçcürxoe .zcidade, op. cit., p- lo6.

3of. La Bruyàre, Zei Caracrêreiou /esmoezzrs de ceszêc/ein Oea rei compêíes. Ed. J. Benda

Paria:Galimard, ig88, p. 333 ("De L'Homme", n' 128).Citado por Antonio Cândida,Os parceirosdo R;a .Bo/zzra, op cit., p. g, e Erich Auerbach, Mzmesís,op. cit., pp. 348-49(há

3oz.Id.,ibid.,pp.io6-o7.

diferenças textuais entre as versões, mas sem grande prejuízo de sentido).

3o3. id., ibid., pp. io8 e in.

3o6.Auerbach,]141mei&, op- cit., p. 345

3o4- Texto no qual não vou adentrar. Vela-se a discussãoacerca dessetrabalho de Antonio Cândida em L. C. Jackson, H nacZ+âoesgüeada,op. cit., que inclusive indica bibliograâa a respeito-

l 9% Senso dm coalescêncim e sentimento da realidade

3o7. Id., ibid., p. 347. O tema foi tratado por Auerbach anteriormente em Z)mean ó'aúcÁe Publikurn des \ 1. JahrhurLderts . op. dt.

i99

!ra então possível")uv Entretanto, emboraMoLiàre fuja à tipi$cação, que é a tendência corrente a seü tempo, não se encontra nele uma "apresentação real da vida das camada populares", donde a conclusão de .4uerbach:

D

Não há qualquer sombra da política, de crítica social ou económica,ou investigação dos fundamentos políticos, sociais e económicos da vida;

;-4

sua critica dos costumes é puramente moralista, isto é, ela considera a es-

(J

dbcmsão do livro, ..4ntortio Cartdido optou porfaler uma citação d'À- \geologia alemã, na goza/o ier Ãzzmano,za/ como na epzkra$e,á vazo como zzm ln\mal 1~:Há portanto um encadeamento entre o início e o jim, La Bruyêre e M.ar2c, e a pesagem de um a outro signi$ca a percepção mais acuradct do caráteT histórico dm formas de vida, dm forram de domínio e ncptorcLÇãodo

duração e validade geral e fustiga as extravagâncias que existem em seu

serhumano; digamos, a pesagem de umcl compreensãomoralista para uma

interior como algo digno de gozação."'

compreemão materialista.

O caipira, na situação de crise em função da assimilação e/ou aco. Éno interior desse contexto de interpretação

"Ü'H'R--.

fo#na/ d'Os parceiros do Rio Bonito, em gaze27arade amarrar foda a

trutura existente da sociedade como dada, pressupõe a sua legitimidade,

a.. {

cia humctncl,como quetentando compemar aquilo que, ncl descrição de Lcu Bmyàre, aparecia comonaturalizado. Mas só bem mais à frente, no Homem

que aparece o penso tomado como

notação à civilização urbana, encontra-se no limiar iminente de "sÜeição lconâmiccltotal"Õ~' em contexto de mudança, com a alteração de pctdrões

epígrafe nos Patcekos e também analbado por Áuerbach.La Bruyàre, "que ascrevejáno $ml do séculoxl'n, quandoo brilha do grande reijá não se irradia de maneira tão ctarct", estácon.sciente "desta limitação da arte literárü" ,

sociais, o caipim é arrmtado a uma condição de "miséria",

]uaLseja: de que a crítica não pode apenm !imitar-se aos costumes, sem toca

análise levada à cabo n'Os patce]ros, emfavor cla reforma agrária:

a estrutura da vida da sociedade.Daí a descriçãopungente e perturbadora

"da mais revol-

tante iniquidade" "' É frente a essasituação, diagnosticada através da que .4ntonio Candido toma posição

dos trabalhadores do campo, algo que seria impossível em BoiLeau e Moliàre,

porque eles estariam dando, mediante um tratamento excesswamenteconcreto e sério, mais peso a um objeto cotidiano e contemporâneo do que Ihs

podemos ver que a situação do parceiro rural

transitória e instável

exprime, de um lado, a miséria do trabalhador sem terra própria para

seria esteticamente direito" ]'' . l.a Bruyàre, contudo, percebe que é preciso ir

lavrar, e sem condições para dirigir o próprio destino; de outro, a inca

até os problemas sociais, mm é preciso trata-Los ainda no registro da genera-

pacidadeeconómica,técnicaou administrativa do latifundiário. É um

lidade moralista, pob um tratamento mab direto é impossível tanto estética

casotípico em que o latiMndio não se Justifica pela utilidade pública

como politicamente."

(pois a sua produtividade é mínima) nem privada (pois não proporciona

'

Digamos que Lct Bruyàre está a um Fuso de perceber a dimemão his-

ao proprietário senãopequenaparcela do que poderia render). De outro

tórica intHnseca à situação de vida mberávet e indigna dos homem.s,mas LaLpercepção permanece engessada por uma compreensão restrita, eLa mes-

3íz. Ver o passocitado por Candido em Karl Marx e Friedrich Engels, Z)z'edeuncÁe/2ea/agz'e.

ma histórica, do queseria o movimento histórico como um todo Qemsentido

(Marx/Engels, Werke, v. 3). Berlim: Dietz, ig6z, p. 5o- Sobre seucontadocom a obra de

similar, mm rtào igual, ao quejá vimos com relação ao que mLLitosjuLgam

Marx, Antonio Cândida relatou: "LÍ muita coisa de Marx na mocidade, mas no livro [Or

ser o moralismo cleMachado de .4ssisÜ.

parcefroi do Rzo Bo/ziro] o que está mais presente é a /2eo/OFz'aa/emâ, que me impressionou

No início d'Os patce\tos, isto é, na seqüêrtciada epígrafe, .4ntonio Candido estabeleceuma discmsão, pautada pelo Marx d'À. \deoXogxaaXe [í\ã, do caráter intrimecamente material e hktórico das forram de ucistên

profundamente devido ao relevo que dá aos meios de vida como favor de sociabilidade, e ao trabalho como fator de humanização,de possibilidade do homem se definir em face da natureza".Antonio Candido, em entrevista a L. C. Jackson, op- cit., p. i4o. Em outra entrevista, afirmou que, das obras de Marx, "a que me influenciou mais foi a Jaez/ayz'aa/emã, que

li primeiro numa tradução inglesa incompleta no começo dos anos 4o". Antonio Candido.

3o8.Auerbach, 7141meiis, op-cit.,P-348. 3o9.Id.,ibid. 3io.Id.,p.349. 3ii.Id.,ibid. 200 Sen.sadas coalwcê i

e sentimento da realidade

'Marxismo e militância" (entrevista), Praga, n? i, t996, p. i6; cf. ainda o depoimento de Antonio Candido a E. Bucci e E. Sader, Zeona & Z)eóare, n? z, ig88, p. 35.

3i3- Antonio Cândida, OKparcez'roi da RzoBo/z;lo,op. cit., p. z78; ver também p. z77

3i4.Id.,ibid.,pp.z79-8o. 201

lado, priva da posse da terra os seuscultivadores, que graças a ela poderiam adquirir estabilidade.''s

l:m virtude de toda essa.socorrências, não é mero acaBOque o tcmcl

real'zrefamm roda#orfaepzzngé#cía em O discurso e a cidade..a üfer predaçãode Chssamma\

enfatiza a redução do humano à condição ani

Esta última frase é a reformulação,por '4rttonio Candido, comoponto de

natesca e a "degradação do espaço" apresenta-se como um processa de

chegada, do penso de La Bruyàre tomado como epígrafe. Isto posto, só Ihe

Lesada Tuna ao animal, como que antecipando um temcl forte na análise

falta apontar a dimensãointrimecamente humaniladora envolvida nesse

I'O cal«ça, no Último ensaio da primeira parte do livro. Neste, desdo-

processo, que libertaria os homem de sua condição animaLesca. E nesse con-

brando um dito de époccl "para português, negro e burro, três pês: pão

tacto que lança mão da ideia do padre Lebres dos "bem incompressíveis",

paíct comer,pano paíct vestir, pau para trabalhar" --, .Antonio Cctndido

]ue "não são apenm os que se reputam essenciais à estrita sobrevivência do

escandiu o tirana até o $m:

indivíduo, mas todos aqueles que permitem ao homem tornar-se verdadeif

ramente humano" }~' Tornar-se verdadeiramente humanos é isto que precüa

Conseqüência:o que é próprio do homem se estendeao animal e permite,

ser garantido ao caipira paulista em meio à situação de mudança e crise; não se trata de garantir sua existência apenas económica, mm sua extstên-

por simetria, que o que é próprio do animal se estenda ao homem. Pão para

cict humanas sua cultura, seu modo de vida, a "realização de sua persona-

o homem e também para o burro; pano para o homem e também para o burro; pau para o burro e também para o homem. Conclusão: não se trata

lidade". E daí o sentido do trechod'À- \&eoXoglnalemã com o qual conclui

de uma equiparação graciosa do animal ao homem(à maneira das fábulas),

Os parceiros do Rio Bonito, ondeSeja/a da reZafãoco/zzradZróna e/zfreo :amuo e a cidade, relação cata que resulta na at\\mala\za($o dos campos'ses 7 e dos citadinos?*

mas, ao contrário, de uma feroz equiparação do homem ao animal, entendendo-se (e aí estáa chave) que não é o homem na integridade de seu ser, maso homem = trabalhador. O dito não envolve, portanto, confusão onto-

Posteriormente, em um tacto de \ g6%,.4ntonio Cândida voltou ao proble-

lógica, massociológica, e visa ocultamente a deânir uma relaçãode trabalho

maformulado naqueletrechode La Bruyàre, agora por meio de Machado de

(ligada a certo tipo de acumulação de riqueza), na qual o homem pode ser confundido com o bicho e tratado de acordo com estaconfusão.n9

.4ssb. Desato, ao destacar o quecomideía a vertente maisforte da obra macha digna, a "relação devoradora de homem a }lomem", mosuou como Machado

algo próximo às idéias cie aLierLação e rei$caçãodo ser humano, entendidas

Dessclmarteircl, percebemosum arco complexo, da tese de \ gSa.,publicada em ig64, ao rea'lo ioóre O cortiço, eicr; o em i973 epzzóZz fado em O dis-

:omo exploração e falta de liberdade: " \..l\ o homem, ü'ansformado.em imtru mento do homem, caipraticamente no nível do animal violentado" 3*$

de xç)Sgà. ''acompanhando-o,

cle .4ssis, em vários escritos (."um dos demõniosfamiliares

de sua obra"

), expõe

curso e a cidade, vüze anui depor(focando em "0 dzreíroâ #reralz'ra"I Erich Auerbach. .41ém do mctis, tocamos em

uma dimemão quefoi deixctdctde Ladoneste estudo, mas que comtitui gerente muito importante dct obrcl de Ántonio Cândida: "sobretudo em tempo ;amo o nosso, o crítico sópode enriquecer a sua obrcl se tomar con.sciêncictdos 3t5.Id.,ibid., p. z8i. 3i6. Id., ibid., p. z8z. A mesmareferênciaao Pe.Lebrese aos"bens incompressíveis"apa receránovamente,anos depois,no texto "0 direito à literatura", op' cit., p. z4o (no qual ocupa um lugar estrutural), que retoma e desdobra um texto anterior: "A literatura e a for mação do homem" (i97z), op. cit. Sobre o Pe. Lebret, ver Antonio Candido, depoimento a E. Bucci e E. Sader, Zeona & Z)eóaze,op. cit., p. 4z.

3i7 Cf. Antonio Cândida,O: parceirasdo Ría .Bon;ro, op' cita p. z83,e o passoindicado

problema

socicii.s e organizar

agzzz em zzma co/t/zgarafâo

o seu pemcLmento em relação CLeles")in mzz;fopeiioa/,

algo da7zzeZetermo

Pulsa

humilis.3zi

3ig' Antonio Candido,O cá&clzrxo e a cz'Jade, op. cit., p. izg; ver tambémpp. 6o, 76, go, 93, iz8,i34 e i43-45. 3zo.Antonio Candido, "Sobre um crítico", op. cit., p. zz- A não-observânciadessadiretriz levaria, segundo nosso autor, a um "desfibramento progressivo da crítica literária". Id., ibid., p. z3.

acima de Marx e Engels em Z);e deüncÃe/2eaZagz'e. Ressalto apenas que, apontando esse nexo na tesede i954, não pretendo reduzi-la a ele.

3zi. "E pertencem ao termo ÁzzmlXf,tal como o procuro formular aqui, [-.] além disso a

3i8. Antonio Cândida, "EsquemadeMachadodeAssis", op' cit., PP.34'36.

proximidade humana e de caráter imediato entre eu e você [-.]. Faz parte de]e, ademais,>

202 Sen.sedm coa escêncime sentimento da realidade

zo3

Voltando. Falava da sociedade rústica em /MaZavog/fa e de sua relação

(donde se percebe tanto o nexo importante de linguagem literária e exposi ção da realidade, problema de Auerbach, como a questão do regionalismo literário, significativa para as literaturas brasileira e italiana).;:'

com uma linguagem rústica; um enlace de mundo e língua que resulta

A elaboraçãodessavoz narrativa própria e inovadora concretiza-se

em um "estilo rústico" em continuidade com a "sociedaderústica". A

na superaçãoda "dicotomia autor-personagem", donde advém o teor rea lista. Ora, a compreensão de uma âguração realista específica, caracteriza dapor meio de sua especificidade e alocada em meio à história da literatura é tal e qual o programa de Auerbach, de sorte que estamos, com Antonio Candido, em meio a uma variação do arcabouço de Mzmesú.

tarefa, como vimos, é mostrar como o social torna-se interno: Esta fusão do indivíduo na família, da família no grupo, do grupo na meio

$sico, fato da precariedade cleum génerode vida queperpetua a tradição, porque se processa nos níveis elementares da sobrem,ivência, cria a hornogemi-

dade que, veremosdaqui a pouco, é sobretudoeleito de estilo e propriedade {'

> de uma voz narrativa que se resolve em uma posição peculiar para representar o mundo. Ademais, é precisamente o estilo indireto livre que desempenha papel importante em Verga,

especl3icada estrutura Literárias"'

assim como em Machado de Assim,embora naquele, segundo Antonio Candido, em sua

Em outras palavras, o segredo aqui é que há um romancista que desvelaa estrutura social profunda(mesmo que sem o saber) e a converte em forma literária: "homogeneidade". E com isto chegamos ao cerne do problema: Á vo{ inventada por rergcl \.. À gera uma posição pecuLi'z' para r'presentar o

forma "expandida". Há aqui, creio, uma discussãosubterrâneacom a mesmaquestãona literatura brasileira, nomeadamenteo romance do século xrx. Joaquim Mafioso Câmara Jr., em l94i, publicou um belo estudo, "0 discurso indireto livre em Machado de Assis no qual demonstrou a recorrência e a importância estética do procedimento. Sem pretender reconstituir o texto e seu argumento, sublinho dois pontos. Por um lado, Mattoso Câmara destacacomo o discurso indireto livre torna-se um procedimento recorrente e importante

mundo. ELa aproxima o narrador do personagem,graça à intimidade facul-

par' o romancedo século xix

tada por uma espéciede exten.sãodo estilo itdireto livre, cqa virtudes, na

importância

prá fca/irei(ída,

Por outro lado, pergunta pelasfontes de Machado na sugestãodo uso do discurso indireto livre. Anos depois, Eugênio Games retomou essasegunda questão e mostrou como, antes

aparecem gera/me/zre intercaladas

en re

ozófrm moda-

lidades, mm aqui são por msim dizer permanentes ÇcomoZela Jilera em CÀ.ssommo\t, creio quepela primeira ve{ na história da Literaturas.Doía homogeneidade, que supera a dicotomia autor-personagem, própria da maio

processo no qual Zola desempenhaum papel de suma

e como o procedimento encontra amplo uso na obra de Machado de Assis.

de mais nada, é em .4/e«zonasde um iargenro de mz'/zZlmque encontramos amplo uso do dis-

curso indireto livre, de sorte que haveria uma linha de continuidade entre Manuel Antânio

ri.z dos regionalismos, e smcita um poderoso gemo de realidade, dentro do

de Almeida e Machadode Assim(Antonio Cândida, em Formaçãoda arerarEzra óra.s;/eira,opcit., v. z, pp. lg8-99, como já indiquei, destacaessa"continuidade"). Com isso, há uma ar-

arti$cio linguístico adorado con.scientemente."'

ticulação, subjacente ao texto de Antonio Candido

que sem dúvida conhecia os textos de

Mattoso Câmara e Eugênio Games --, entre as a4emónas, Zela, Verga e Machado, embora

A grande realização de Verga foi a "criação de uma vo{ narrafíva"3:' que, solvendo o problema de língua regional e língua nacional literárias?marca a singularidade de sua exposição da realidade, vale dizer, de seu realismo'"

esteúltimo não seja na ocasiãoabordado por Antonio Candido. Como venho tentando indicar a importância e o sentido dos nexos entre os três ensaios até agora discutidos de '0 discurso e a cidade", temos aqui um círculo que os congrega e que tem como ponto de diga, no âmbito da literatura brasileira, Machado de Assim.Ver Joaquim Mattoso Câmara Jr., "0 discurso indireto livre em Machado de Assis", in E

a consciência imediata e a expressão constante da comunidade: nós todos aqui e agora.'

a/oi macÀadzanos.z? ed.. Rio de

Janeiro/Brasília: Livro Técnico/ÍNL, i977) pp. z5-4i) e Eugênio Games, "0 estilo indireto

Auerbach, .LírerafurspracÁe zznd Puó/itzzm, OP. cit.)PP.46-47

livre", in /UacÃado de,4siú. Rio deJaneiro: SãoJosé,i958, pp. iri-i5-

3zz. Antonio Cândida, O decurso e a c;Jade,OP.cit., PP.'oo'oi; ver também p- 99

3z6. Não é acaso,portanto, a aproximação feita a um romance dó José Lins do Rego no estudo sobre Verga: Antonio Cândida, O düczzrsoe a cidade, op. cit., p. íí5. Ver, portanto,

3z3.Id.,ibid.,p.lo9. 3z4.Id., ibid., PP.ío9-ii, cf. p. io5-

.,

3z5. Note-se, de passagem, que o problema das .A4emónmpófrzzm«sde aras Cüóm também

pode, em alguma medida, ser formulado nessestermos, pois também trata-se da criação >

zo4 Sen.sedm caaLescêncime sentimento da realidade

os estudos sobre Zé Lins: Antonio Cândida, "Um romancista da decadência", in Brigada Zzgezra e oízrroiescalas,op cit., pp. 6i-67; "A compreensãoda realidade", op. cit., pp. l 5i-57 Ainda retomarei ao regionalismo.

zo5

Mas, se, por um lado, Antonio Candido explora a relaçãode linguagemliterária e exposiçãoda realidadespor outro, a questãodo narrador remete diretamente ao texto de Adorno, que Antonio Cândida leu (o mais tardar) no final dos anos ig6o com seus alunos3:' -- e

os textos que discutimos parecemter sido concebidose escritosnessa década e publicados no início dos anos i97o' Nas anotações marginais

mento, anoto que o ensaio sobre Zysiommo/r

é, em certo sentido, mais

"simples", pois a estrutura profunda é revelada através do "tema estrutu rador" (na falta de melhor expressão), o "espaço" e suas metamorfoses

e variações Talvez de maneira intencional o capítulo sobre Zola seja o mais descritivo, aquele no qual o crítico reconta com mais detalhes o

de Antonio Candido em seu exemplar do texto de Adorno "La posi-

entrecho do romance. Não obstante, é com Zola que chegamos à men.

ción del narrador en la novela contemporânea", ao que parece tendo

cionada "revolução estilística", cujos traços principais convém destacar.

em vista um seminário sobre o texto com seus alunos, o professor ano-

Na ocasião, Antonio Candido citou um passo de Anatole France, que detectava a utilização, soberana, do discurso indireto livre (embora sem

tou: "Ressaltar aqui o problema do realismo, que é central, discutido do {

própria da sociedadebrasileira da época do velho Rei.330 Nesseanda-

ângulo da 'forma' e não da equivalência ao real. Do realismo à realida. de".3:* Destarte, no diálogo com Adorno, o problema da fatura realista

é tratado através da posição do narrador, mas o modo de análisede Antonio Candido conjuga criativamente linguagem literária, estilo e

nomeá-lo) em Zola. Este soubera incorporar elementos da linguagem do povo no romance, alterando a posição do narrador em uma mistura

especíGíca de discurso indireto e direto, que culmina no uso do discurso

indireto livre emum monólogointerior de Gervaise.Além disso,há uma utilização muito diferenciada do dialeto (elemento que, em Verga, como apontei, remete ao problema do regionalismo literário), que acenada

posição do narrador: .4 criação da vol. narrativa de$ne o ângulo, ou enfoque do mrrcdor, condicionando

superHcie do tcxto para elementos da estrutura profunda do romance.

=eHOt+o de estilo. No rommce estenão se reduz.a um modo determinado de usar

Como resultado, as dimensões simbólicas da narrativa se fundem na di-

l thgua, pais manifesm simuLtmeamenteaposiçãodo narrador, formando ambos

mensãolinguística.3'' Entendo que o ensaio sobre /Ma/avoF#a avança maisum passo,quando a estrutura profunda se revela no nexo que seestabeleceentre posição do narrador, estilo e linguagem literária, aspectos

filma reaLüade dupla. 4 língua dá vida ao enfoque, o enfoque dirige o estilo?n

Lembro agora que também na interpretação das JMemór;afde zzmsargena de m//ú;m a questão do narrador ganhou destaque, pois foi uma deter

minada posição do narrador que permitiu chegar a uma visada muita

por assim dizer "técnicos" da fatura romanesca. Desse modo: Em \ MaXaxog\\a o ângulo é o de um narrador neutro e inde$nido, situado na terceira pessoa, quefala como falariam os personagem rüticos cuja vida

'Losconta. QucLndo procuramosdeterminar qual é o traço queos une organi 3Z7. T. W

Adorno,

"Standort

des Erzãhlers

im zeitgenõssichen

Roman",

in Arorerz {m /]'-

cclmente, emontramos o estilo indireto homogenei\apor, nome que, à falta de

[erarizr,op. cit., pp. 4i-47- Em seu memorial acadêmicode ig8o, João Luiz Lafetá afirma Antonio Cândida, em sua disciplina "Literatura e sociedade", ministrada em i973) leu e discutiu com os alunos o Adorno de ]Uorm de /írerarurae Prúmm. Ver João Luiz Lafetá, il/emorla/ académico,OP.cit., p. 95, assim como Antonio Candido, .Ademana/parao Concuria de PrcZ#essor Zulu/ar, op. cit., p. i7. Nada impede supor, contudo, que a leitura e reflexão acerca do texto de Adorno por Antonio Cândida date de anos anteriores.

3z8. Marginália no exemplar de Antonio Candido da obra de T. W. Adorno, Abra de /fterarura, op. cit., p. 45; exemplar da biblioteca de Antonio Candido, depositado na Biblioteca da

33o. "Ora, o livro de Manuel Antânio é contado na terceira pessoapor um narrador (ângu lo primário) que não seidentifica e varia com desenvoltura o ângulo secundário --, trazendo. o de Leonardo Pai a Leonardo Filho, deste ao Compadre ou à Comadre, depois à Cigana e assim por diante, de maneira que estabeleçauma visão dinâmica da matéria narrada.:

Antonio Candido, O düczzrxo e a cidade,op. cit., pp. zi-zz. Já destaquei anteriormentea .importânciadeLubbock; em i97i Antonio Cândidaministrou um curso intitulado "Teoria

FTLcn-usp. O problema e a fórmula reaparecerão no estudo decisivo de ig83, "Realidade e

dos gêneros narrativos:

realismo(via MarcelProust)", in Redorel, op- cit., aoqual aindachegarei. 3zg. Antonio Candido, O d&czzrioe a c;Jade, op- cit., p- i'o' Essa mesma concepção guiava

dePrc$zssor71ru/ar,op' cit., p i7' Como indica seu exemplar da obra de Lubbock(deposi todo na Biblioteca da rFLCn-usp), Antonio Candido leu-o inúmeras vezes

a inteQretação de Conrad oferecida em pesee a/zdele; cf. op- cit., P- 9''

33i. Antonio Cândida, O düclzrioe a cz'Jade,op. cit., resp. pp. gi-gz; 59)gz; e 59-6o.

zoG Seno d

coalescêncime sentimento da realidade

o foco narrativo";

cf. Antonio

Candido,

J4emona/para

o Co/zczzrfa

zo7

melhor, podeser mudo pctradesignar a tortatidadeobtida pela generalil%ão

dm virudes medi(üoru do indiretoLivre. Entretanto, a sua e$ciência é grande porque ele está ligado a certas traçosquefuncionam comoamattação, no sentidoarquitetânico,pois defato

amattam a narrativa à linguagem, emfunçãodo mundopopular, fechado e recorrente. Sãa e/es.' o lugar-comum,

a repetição e a provérbio

--, com

força e atuação progressivas. ... À .assim, podemos estabelecer no plano da análise Literária uma cer

ta convergência entre a estatura social e a Linguagem, quefoi precisamente ) quefel. Verga no plano da criação, \usar\carão em profunxiid(üe a átomo geneilação do estilos"L

O estilo indireto livre, mesmoque não formalmente,atua de modo generalizado, donde Antonio Candido falar em "estilo indireto homogeneizador": mesmo quando não rigorosamente na forma de estilo in-

direto livre, ele tem como resultado artístico os atributos do indireto livre. Isto se deve ao fato de que uma das características marcantes do

indireto livre é a aproximação extremaque propicia entre narrador e personagem,;;' exatamente o ponto que Antonio Candido destacaem

seuargumento,vindo do problemada posição.do narrador. No caso

Ora, sevoltarmos por um instante apenas ao estudo de Mattoso Câmara Jr. que acabeide citar, veremos que ele o conclui a6írmando que, não obstante a importância do discurso indireto livre em Machado de Assis, neste

"falta o intento de uma valorizaçãosistemáticado processocomo meio de criar a simbiose entre personagem e narrador",;'s simbiose esta que éprec/lama/zfeo que Antonio Candido demonstra em sua análise de Verga. O passo subseqüente na argumentação é o nexo que se estabelece entre essenarrador/estilo/discurso e a estrutura do romance, disposi-

ção e organização de suaspartes e elementos, ponto no qual Antonio Candido põe em paralelo a convergência das duas séries mencionadas no passo acima, "estrutura social" e "linguagem",

antecipando o esque-

magráfico com que conclui a análise.s;' A "homogeneização" de que se fala é enfatizada na "continuidade

estilística"entre os estilos indireto, direto e indireto livre, pois Antonio Candido entende que "o narrador procura uma posição equivalente à

do personagem",;3'numa narrativa que funde com arte as três modalidades sem quebras. Assim, o argumento de Antonio Candido é que a

voz narrativa firmada por Verga permite que o narrador, seja no esti-

lo indireto, seio no indireto livre, fale tal como as personagens,que ademaisjá falam no discurso direto

daí a homogeneidade.;;; Como

ecífico de / .A4a/aog/ia, isso resulta no "estilo rústico", em que o

narrador fala tal como aspersonagensrústicas,por um lado, e no qual se plasma a sociedade rústica, por out.ro."'

33z.Id.,ibid., pp. iio-il. 333- [.-] o discurso indireto ]ivre [-.] estabelece um elo psíquico entre o narrador ea

personagem que fala: em vez daquele apres'ntar o personagem no palco da narração coma uma fibra dramática, que fala por si(discurso direto) ou de lança-lo aos bastidores par' nos informar objetivamente sobre o que ele disse (discurso indireto estrito), o narrador associa-seao seu personagem, transpoe-se para )unto dele e fala em uníssono com ele. Ê assim um processo lingüístico a que o indivíduo pode recorrer, como a muitos outros, para imprimir a própria emoção nas palavras alheias que comunica. Já no discurso direto temos

enasa possbilidade de transmitir o estado emocional do personagem, de quem o narrador se desliga à maneira de um diretor de cena em face dos seus atores." J. Mattoso Câmara

Jr., "0 discurso indireto livre em Machadode Assim",op. cit., PP.3o'3i

334 Na biblioteca de Antonio Cândida encontra-seo texto de Pier Paolo Pasolini, "lntervento sul discurso Libero Indiretto", no qual se lê; "Certo ê che ogni volta che si ha il Libero Indireto, questo implica una coscíe a socio/agirá,chiara o no, nela'autore. Che mi sembra, del Libero Indirecto, la caratteristica fondamentale e cortante".(in Pasolini, Enfim'na >

ZQ%Sem. dm coaLescêncim e sentimento da reatidacle

> ereüco.Milho: Garzanti, l97z; exemplar da biblioteca de Antonio Cândida, depositado na Biblioteca da FTLcn-usp.) Como sesabe,os textos sobre Zola e Verga foram escritosantes da publicação dessevolume de Pasolini, que traz manuscrito "6/g/7z", provavelmente data de aquisição; não obstante, creio válido assinalar a proximidade muito instigante entre

asformulações de Pasolini e os desenvolvimentos de Antonio Candido. 335.J. Mattoso Câmara Jr., "0 discurso indireto livre em Machado de Assim" , op. cit., p- 4o

336.Cf. Antonio Cândida,O dúczzrioe a cidade,op. cit., p. i2i.

337.Id.,ibid.,p.liz. 338."Em certos momentos de maestria suprema o enfoque desliza do narrador para o per

sonagem,cuja primeira pessoase incrusta na terceira do narrador, arrastando-nospara uma percepção de tal maneira ÀomayeneÜada que as modalidades do discurso se fundem e não há mais distância entre personagem e narrador." Antonio Cândida, O decurso e a

idade, op. cit., p. il3 Tal homogeneidadeestásituadano pólo oposto a uma "dualidade estilística", "espécie de estilo esquizofrênico" que Antonio Candido detectou ao tratar de

um texto regionalistade Coelho Neto. Na ocasião,contrapôs a Coelho Neto outro regionalista, limões Lopes Neto, que cria um enfoque narrativo próprio, nessesentido mais próximo ao que sediz de Verga, embora com especiâcidadeprópria. Ver Antonio Cândida, 'A literatura e a formação do homem", op- cit., pp. 88-gz. Posteriormente, em seuresumo >

209

já enfatizei, tudo isso ganha sentido, na análise do crítico, porque este demonstra a confluência da homogeneidade do discurso com a homo-

Além do mais,a essafusão dos estilos/discursos soma-sea "fusão dos elementos

geneidade da vida apresentada no romance. O resultado é um realismo

ao mesmo tempo muito poderoso e peculiar.';'

a observaçãoreveLctclmaneira sutilpor que a expressão vai serão modi$cada imp'rceptivclmente, promovendo Q dominância da maneira popular. 'efusão

ias elementos, não apctrentecl olho nu, é o processonormal de Verga, na >

para principiantes, formulou de tal modo que a aproximação à análise de Verga é inegável:

comtru çãode sua escrita peculiar''n

o autor gaúcho "superou o afastamento entre narrador culto e homem rústico, usando um personagem fixo, ao qual [-.] delega a mediação narrativa, exercida através de uma prosa construída na confluência da fala popular com a estilizaçãoerudita". Antonio Cândida, Znffzafão â /crer.zrzzra órmí/e;ra, op. cit., p. 67. Portanto, a questão do regionalismo no romance italiano, do Verismo, tematizada em /J4a/avos/ía(O d&curfo e a cidade,op. cit., pp. io6-o7), {

enlaça-se com o problema do regionalismo na literatura brasileira, problema tratado por Antonio Cândida em outros textos Ver Antonio Cândida, Formarão da #fera ura órmf/eira, op. cit., v. z, cap. vn, "A corte e a província", pp. z63-8z; "Poesia, documento e história", op. cit., pp. 45-6o; "Um romancista da decadência", op. cit., pp 6i-67; "A compreensãoda

realidade", op. cit, pp. i5i-S7; Iniciarão .i /i erafuraórm;/e;ra,op. cít., PP.46, 49, 66-67, 77, 83 e 93; "Literatura e cultura de ígoo a i945", op. cit.; "Literatura e subdesenvolvimento' op. cit., pp. l58 ss.; "A revolução de 3o e a cultura", in .4 edücafâope/a/zoife& ou roi emafai, op. cit., p. l 87; O romarzlümo no .Brmi/, op. cit., pp. 79 ss. ; Fz'cfâa e cor!»são, op. cit.; assim como os textos e referências a João Guimarães Rosa(p. ex. em nele e anlúeie, p'Hdoi eicdías,

Tal fusão dos elementos é incorporação de formas da fala do povo, ditos,

frases feitas, lugares-comuns, repetições e, condensando e potencializando tudo isso, o provérbio. Através deste, por fim, faz-se a junção com a sociedaderústica, já que ele cristaliza em si, como "modo de falar fixado", "símbolos da sociedade fixada", "exprimindo a fixidez do discurso e do mundo".;'' O caráter cíclico e fechado da sociedade tradicional encontra realidade literária e lingüística, estética e expressiva, no

próprio texto, nas formas de repetição que culminam no provérbio, e daío título "0 mundo-provérbio" cumprindo o programa enunciado, de mostrar o externo como interno, processo social e forma literária. Note-se ainda que tal fusão dos elementos sedimenta-se na linguagem,

Zex oi de llz erre/zfão); tudo isso, claro está, sem a pretensão de esgotar o tópico.

na "escrita peculiar" de Verga, que, por sua vez, resulta na capacidade

339-Seja-mepermitido um excurso em forma de rodapé. Antonio Candido retomou muito dessaanálise que vimos, redirecionando-a para uma figura da nossaliteratura contempo-

de expor a realidade, naquele "senso da realidade" de que falava o crí-

rânea, Jogo Antânio: "Prolongando a tradição estilística que remonta a Êmile Zela, Joga Antõnio inventou uma espéciede uniformização da escrita, de tal maneira que tanto o narrador quanto os personagens,ou seja, canto os momentos de estilo indireto quanto os de estilo direto, parecembrotar juntos da mesma fonte. Aqui não há, com efeito, um narrador culto que reserva para si o privilégio da linguagem de outra esferaatravés da imitação de sualinguagem irregular, que serve para manter a distância. Longe disso, narrador e perso-

tico, e que, sendo peculiar, define certo realismo.

Dessamaneira, Antonio Candido marca distância frente à concep-

ção naturalista da "transposição direta da realidade" na obra literária como, aliás, a análise de Zola já havia deixado claro:

nagem se fundem, nos seus contos, pela unificação do estilo, que forma um lençol homo-

Mas nós sabemos que, embota fIXa do mundo, a obra é um mundo e que convém antes de tudo pesquisar neta mesma M latões que a sustêm como tcLL..4

gêneoe com isso define o mundo próprio a que aludi. Não se trata, portanto, de mais um

sucnazão é CLdisposiçãodos núcleosde signi$cado, formando uma combinct.

autor que usa como pitoresco, como coisa exterior a si próprio, a fala peculiar dos incultos. Trata-se de um narrador culto que usa a sua cultura para diminuir as distâncias, irmanando a sua voz à dos marginais que povoam a noite cheia de angústia e transgressão,numa

enunciado exemplar. Este procura indicar a fórmula segundo a qual a reali-

cidade documentariamente real, e que no entanto ganha uma segunda natureza no reino da

ção snXgenes\s, quese for determinada pela análise pode ser tradu=iida num dade do mundo ou do espírito foi rcordenctda, traí.sformada, des$gurada ou até posta de Lado,para dar nmcimento ao outro mundols':

transfiguração criadora" (Antonio Cândida, "Na noite enxovalhada", in A4a/aguera, P2rzif e.fraca/laço, de Jogo Antânio. São Paulo: Cosac Naify, zoo4, 4: edição, pp. 5-i z). Essa natura

ficcional foi qualificada pelo crítico, em outros textos, como um "realismo feroz", uma das tendênciasda "nova narrativa"(Antonio Candido, "A nova narrativa", op. cit., pp. zlo'zi;

34o. Antonio Cândida, O dúczlrso e a c Jade, op cit., p. l i3-

cf. também, do mesmo, "A literatura brasileira em i97z", op. cit., pp. z3-z4). Dessemodo,

34Z id., ibid., pp. lz3-z4) nasquais tambémse encontra uma crítica da idéia de mímesú

mais uma modalidade de realismo para a galeria dos realismos peculiares.

como transposição direta da realidade.

21 Q Seno dw coalescêncim esentimento da realidade

34i.Id.,ibid.,pp.

i2i e ii5

211

A realidade que aparece na obra de arte é reordenação, transformação, desfiguração ou abandono de uma realidade primeira. Cabe lembrar,

o procedimentoda "montagem", configurado na literatura de modo

nessecontexto, que ]á no início dos anoslg6o Antonio Candido afir-

invenção, arte: a íiormula, cujo resultado é a produção de diferença, um

mara, seguindo Auerbach, que m;meia é poiesis, isto é, que mlmeiü é

inundo que é precisamentenovo.

produção de diferença.3'sE perceber essemovimento, marcar essadi-

Na análise d '0 corluko,tal programa deixa-se desenvolver de modo muito sugestivo, pois, se por um lado o romancista permanece próximo ao

ferença, torna-se uma das tarefas do crítico, já que Antonio Cândida

quer "rastrear na obra o mundo como material, para surpreenderno processo vivo da montagem a singularidade da fórmula segundo a qual

é transformado no mundo novo"."' Vale destacar aqui os termos-chave: processo,montagem, fórmula

específico. Esse "configurar" é o processo literário mesmo, criação e

escapo da transposição direta, ao mesmo tempo O corrzla é inspirado em Z:dssommo;r,embora cheio de peculiaridades. A relação dessesdois romances torna-se tanto mais importante quando se considera que um capítulo anterior tratou de -[2siommo;r e o fio condutor da aná]ise, a degradação,

O que denominei realidade primeira oferece o material que é, mediante

reapareceem O corara. Entretanto, à diferença da sociedade europeia, mais diferenciada, que levou Zela a tratar em partes os domínios resultantes

343- Como se vê pela seguinte, importante formulação: o crítico precisa "ter consciência da

relação arbitrária e deformante que o trabalho artístico estabelececom a realidade, mesmo

do processo de diferenciação social -- processo este que a época de Zola tcve enorme prazer e cuidado em perceber, classificar e ordenar, sendo

quando pretende observa-la e transpâ'la rigorosamente, pois a mimese é sempreuma forma de pozese".Antonio Cândida, "Crítica e sociologia (tentativa de esclarecimento)", op.

portanto sua própria empreitada romanesca um momento significativo desseprocesso--, no Brasil do século xix, Aluísio Azevedo pede juntar

cit., p. l3 Também em "Estímulos da criação literária", op. cit., p- 55, pode-se depreender

("montagem") no romance uma variedade muito ampla de elementos, que o processode diferenciação, muito menos avançado do que na França, não

posiçãosemelhante.Auerbach armava o ponto, ao final de ]Hzmeiú(op. cit., p. 5: 5): mlmesú como "interpretação da realidade mediante a exposição ou 'imitação' literária". Sobretudo Luiz Costa Lama tem enfatizado, em variados textos, a idéia de mímexú como produção de

diferença. Cf. p. ex. L. C. Lama,]Uzhesú.-deia#o aopemamenro,op' cit. 344. Antonio Candido, O discursoe a cidade, op' cit., p' :z4' Em sentido similu, uma formulação antológica(e bem auerbachiana) no estudo sobre Clarice Lispector: "A descoberta do cotidiana é uma aventura sempre possível, e o seu milagre uma transfiguração que abre caminhos para mundos novos". Antonio Cândida, "Uma tentativa de renovação", op. cit., p. 99' Clarice, ainda

outra vez, deu ensejoa uma formulação similar: "]-.] Clarice mostravaque a realidadesocial ou pessoal(que fornece o tema) e o instrumento verbal(que institui a linguagem) se justi6cam

antesde mais nada pelo fato de produzirem uma realidadeprópria, com a suainteligibilidade especí6ca.Não setrata mais de ver o texto como algo que se esgotaao conduzir a esteou àquele aspecto do mundo edo ser; mas de Ihe pedir que crie para nós o mundo, ou um mundo, que existe e agua na medida em que é discurso literário.[-.] a força própria da ficção provém, antes de tudo, da convenção que permite elaborar os 'mundos imaginários'." Antonio Candido, "A nova narrativa", op. cit., pp. zo6 e zo7. Essa criação do novo, dependente da fantasia e da coerência na formalização da obra, aparece recorrenLementena obra de Antonio Candido; apen;s atitula de exemplo, ver "Crítica e socióloga(tentativa

de esclarecimento)", op. cit., p. i3; "Estímulos

tinha isolado. Há, nessesentido preciso, uma figuração do célebre mote vebleniano das "vantagens do atraso": "A originalidade do romance de

Aluísio estánessacoexistênciaíntima do explorado e do explorador, tornada logicamente possível pela própria natureza elementar da acumulação em um país que economicamente ainda era semicolonial".s4s

Coexistência esta que não pede mais ser figurada no romance de Zola, onde cada um dos variados domínios da sociedade exigiu seu tratamento em separado e donde se tira a conseqüência que o romancista precisa, ao cabo, empreender um amplo ciclo romanesco, se tcm a pretensão de uma totalização com respeito à sociedade. Já no romance

brasileiro, isso se converte na capacidade de figuração de uma multiplicidade maior de tipos, na figuração de um con)unto muito mais amplo de traços do processo social, de sorte que a possibilidade de apresentaçãodo mundo social como uma totalidade está muito mais acessívelao romancista brasileiro do que ao francês."ó

da criação literária", op. cit.) p. 47; "0 direito àliteratura", op- cit.) pp. z46} z48 e z5o;]Uavazade azz/a,op- cit., pp. }o e 3i, onde se lê: "No nível profundo, a análisede um poema é frequentemente a pesquisade suas tensões,isto é, dos elementos ou signiâcados contraditórios que se opõem, e poderiam até desorganizar o discurso; mas na verdade criam as condições para oqanizá-lo, por meio de uma uni6cação diabética.[.-] o poema repousa sobre um movimento dialético, que as integradas tensões, Lw] e supera, construindo aunidade de expressão'

z\ 2 Seno dw coalescêncime sentimento da realidade

345.Antonio Cândida, O dücarxo e a cidade, op. cit., p. iz6. Nessa formulação reencontra moso problema aventada anteriormente, da formação e consolidação do sistemaliterário, em um nexo mais amplo, no qual a nação não completa seuprocesso formativo. 346. Vale trazer à memória, esquematicamente, algumas das formulações de Auerbach acerca >

com sua atmosfera saudosistanão quer ver a emergência da ordem

de maior dificuldade na percepção e síntese do movimento da sociedade como um todo -- porque mais mediada --, consegue não obstante

social competitiva, o Aluísio Azevedo de Antonio Candido está precisamenteenfocando esseproblema:

6ígurar o caráter histórico de modo mais cabal do que o brasileiro, este em uma situação na qual as vantagens do atraso pareceriam em princí-

Em contraposição ao Machado de Assim de Raymundo Faoro, que

pio privilegiar. Prova dessacontradição é dada pela própria argumenÉ visível que a carreira de Jogo Romãs tem para o 'omancista um catáter

taçãode Antonio Candido, que destacao fato de Aluísio Azevedo não

cleparadigma \..l\. .aliás, .4Luísiofoi, salvo erro meu, o primeiro dosnos-

de Macedo, .4Lencar otl Machado de Assim, nos quais o dinheiro aparece com

avançar na percepção e crítica da luta de classes, mas permanecer agarrado à chave xenófoba frente a Portugal.:': Já o romance francês, apesar da maior complexidade, expunha a luta de classes seja no Balzac de Lukács, seja no Balzac, Stendhal e Zola de Auerbach. Por fim, ressalto,

frequência, mm adquiridopoí heía7tça,dote ou outrafoíma fortuita. Pesando,

a descriçãocomo procedimento literário fundamental...

sos romancistas a descrever minuciosamente o mecanismo de formação da riqueza individual. Bula comparar o seu Livro com m indicações sumária

determinando, é certo, mm como um dadojápronto no entrecho.N'O co Üqa

"Alegoriado Brasil" é como Antonio Candido vai entendero

eLese torna implicitamente objeto central da narrativa, cujo ritmo acabase

romancede Aluísio, o que implica a tomada radical de posição com

custando ao ritmo da sua acumulação, tomadapela primeira ve{ no Brmil

relação à natureza do realismo em pauta:

como eixo da composição Fcciorta!'q]

O leitor d'O cotüçolica duvidando se ete é um romancenaturalista verda-

Não avanço sem anotar que Aluísio escreve à época de Machado de Assim,pois O corl4o é de i8go. Ele "descreve" o presente, não há recuo,

deiro, que não descia ir além dcl realidade observável, ou se é nutrido por

e caberia, portanto, indagar se, como os grandes realistas franceses, ele

cotidiana contêm implicitamente um outro plano de signi$cado. Lukács di-

retrata o "presente como história". E será precisamente aí que veremos

ria que isso se dá por causa daquilo e que o mal do NaturctLI.smofoi não

a diferença: embora fale do presente e não recue

umcl espécie de realismo alegórico, segundo o quctl as descrições da vidcl

e, além do mais,

espelhar" de modo carreto CLrecLtidade, mu usá-lct para chegar CL uma visão

devido à mencionada menor diferenciação social, dispõe de maior facilidade de totalização --, Aluísio Azevedo não remonta à totalidade tal

Não creio quemsim seja e registro queCLalegoria não ocorreno Naturalismo

como os franceses,por assim dizer, em ponto grande, mas o faz em

em geral. Nós não cl encontramos,por exemplo, na obra de Verga nem nos

ponto pequeno, no âmbito do cortiço e sua vizinhança imediata. Donde uma espéciede contradição, que vale notar: o romancista francês, em uma situação de maior diferenciação e complexidade social e portanto

romances naturalistas de Eça de Queiras; mas a encontramos sem dúvida

rei$cada e reformadora, quea substitui de maneira indevida e é a alegoria.

nos de lota,

cabeça-de-turco de Lukâcs,

que a partir deles procedeu a uma

extrapolação. TatveX.por in$uência de Zela nós a encontramos tctmbém nas de 4tuísio, sendo em ambos os caos, Qmeu ver, elemento de forçct e não de

traqueia. \..À Talvelaforça do livro venhaemparte dessacontaminaçãodo > do romance de Zo]a em ]l/ímesü: "Zela levou a sério a mistura de estilos e deixou para trás o rea-

plano real e do plano ategÓTicolq9

lismo meramente estético da geração que o precedeu. Ele é um dos poucos escritores do século que criou sua obra a partir dos grandes problemas da época; nesse sentido apenas Balzac Ihe é comparável, mas este escreveu em uma época em que muito ainda não havia se desenvolvido ou ainda não era reconhecíve], ta] como Zo]a o reconheceu.[-.] assim como em Balzac, entretanto

348.Cf. Antonio Candido, O d&çzzrso e a c/Jade,op. cit., p. í3i

de modo mais metódico e exato, ele pretende compreender a totalidade da vida da época". Com isso, o romance atinge "o núcleo do problema social da época, a luta entre capital industrial e

.çit., p. 58. Em outro texto, afirmou o seguinte com relação ao naturalismo: "0 Naturalismo éa forma de realismo em que os sentimentos e a conduta dos personagens sãorelacionados

classetrabalhadora". Auerbach, J141meiü,op. cit.) resp. pp. 476, 478 e 476.

com os fatores do meio, da herança, dos instintos, que os condicionam segundo um deter-

347.Antonio Cândida, O düczzruo ea c;Jade,op. cit., pp. i3o'3i. Versõesanterioresdessainterp'e' tição de O coraraforam republicadascomo "Duas vezes'A passagemdo dois ao três"', op' cit.

minismo mais ou menos rígido. A ficção brasileira renovadora obedeceu em grande parte a

n 4 Seno d

coaLescêrtcim e sentimentoda realidade

349.Id., ibid., pp. l36-37. Ver também Antonio Cândida, Zníc;afâoâ #rerafura órm;/eira, op.

esterumo, influenciadapor Emílio Zola e EçadeQueirós". Antonio Cândida,"A literatura >

Resultado dessa contaminação é a força -- poderia dizer: força de verossimilhança? -- do realismo d' O cor lfo, e precisamente a rica forma de realidade exposta ("dargeire//fe m:rX:#cÃÉeif") que nele se concretiza, que não sendo transposição direta, é transfiguração? e que lança mão da

alegoria como procedimento de intensificação do "sentimento da realidade". Donde a potência realista do romance. Nos termos de Antonio

Candido,há "um jogo de mediações,que modificam a relaçãoentre ficção e realidade, porque [...] os fatos.narrados tendem a ganhar um segundo sentido, de cunho alegórico"."' O motivo das vantagens do atraso também se faz presente na afirmação da "complexidade de matizes do Naturalismo", já que há, na

fatura brasileira, "um avanço curioso em relação aos modelos europeus",'si nomeadamentea liberdade das descriçõesdos aspectosliga-

{

dos ao sexo. Mais do que simples descrição, os elementos relativos ao

ratista,que perpassa,estruturante, o livro. Ela se desdobra,por outro lado, na comparação entre Zola e Aluísio, já que há uma proximidade e uma diferenciação entre ambos;;s' desdobra-se também na comparação entre Verga e Zela, latente, despontando no que se diz acerca da "revo-

juçãoestilística". Como se assumeque os três últimos autores inscrevem-se no âmbito do naturalismo, o nexo das três análises6ínaisde "0 discurso e a cidade" é evidente; e o nexo da primeira delas já foi sendo,

aospoucos,indicado. Disso tudo. sacaAntonio Cândida a conclusão de "0 discurso e a cidade": uma vez tendo analisado um processo que atravessao século

xix, figurando-o em momentos e locais variados, no centro e na periferia, é preciso compreender as diferenças entre as diversas exposições

literárias da(s) realidade(s);ss(paráfrase, como se vê, do subtítulo de Auerbach), no preciso sentido de que há diferentes modalidades da

sexo chegam mesmo a figurar uma "função narrativa e estilística' própria a' O corizfo,;': que é estruturante da relação.de rea#aclae e resfcrae,

mobiliza a alegoria e resulta em um tipo específico de realismo. O final do ensaio, que aparece sob a rubrica "força e fraqueza das mediações",

oferece uma rápida enter-relação de aspectose problemas que foram sendo decantados ao longo de "0 discurso e a cidade". Assim, se no estudo das Memór;m de zm sargentode m;/ú;

a análise permitira falar

354.No casoespecíficoda contraposição Zola-Azevedo, que lastreia o último capítulo dessa parte do livro de Antonio Cândida, a conclusão é a que segue: "0 fato de ser brasileiro levou Aluísio a interpor uma camada mediadora de sentido entre o fato particular(cortiço) e o significado humano geral(pobreza, exploração). Em Z,2ssommoíra história de Gervaise nos conduz diretamente à experiência mental da pobreza, sendo o cortiço e o bairro ingre dientes graças aos quais ela é particularizada e determinada. Mas, no livro de Aluísio, entre

em uma "diabética da ordem e da desordem", no d'O cor o chega-se

a representaçãoconcreta particular(cortiço) e a nossapercepção da pobreza se interpõe o Brasil como intermediário. Essanecessidadede representar o paíspor acréscimo,que não se

ao "jogo do espontâneo e do dirigido".'s' Esta é a perspectiva compa'

impunha a Zela em relação à França, diminui o alcancegeral do romance de Aluísio, masaumenta o seu signiâcado especíâco". Antonio Candido, O diçcurxa e a cidade, op. cit., p. i5z.

>

durante o Império", in Sérgio Buarque de Holanda(org.),

O BrmÍ/ manar?zinco ' reaçõese

[ramaçõei.SãoPaulo: Difel, ig67, t. n, v. 3, p' 353 Antonio Candido, O discursoe a c;Jade, op. cit., p- l5'; ver também "Duas vezes 'A

passagemdo dois ao três"', op' cit., PP.75'76. 35i.Id., ibid., p. i47 Lembro que, dosmodeloseuropeus,dois sãotratadosem O dücursa e a c;Jade(Zela e Verga), enquanto o terceiro, Eça, foi tema de estudo em Zeaee a/zrüese e, mais recentemente,em Antonio Cândida, "Ironia e latência", in Beatriz Berrini(org.), Ela de Qüelra{.- .4 i/mire cma de Ramíres, cemanos. São Paulo, Educ, zooo e, do mesmo, "Eça.de Queiras, passado e presente", in Benjamin Abdala Jr.(org.), Ecos do Br«,l/. Zfa de Quelrú. /efrur

ór f/elr

eporrzzgzieim. São Paulo: Senai, zoom.

35z.Antonio Cândida, O díscizrsae a cidade, op. cit., P- i48. 353. "Jogo", aqui, equivale a "dialética" e nesse mesmo sentido reapar'ce em outras ocasiões; cf., por exemplo, Antonio Cândida, o d&çursa e a cidade, op. cit.) p. i75, com relação a nTO

Buzzati: "0 segundo movimento do livro é o jogo da esperançae da morte, que vão assumir realidade concreta'

355.Cf. Antonio Candido, O dücurxoe a cidade,op. cit., pp. l5l-l52. Paulo E. Arantes vinculou expressamente os estudos de Antonio Candido sobre as i14emórzas,assim como o sobre O corara, a Auerbach: "Consultando a experiência local, cujo dinamismo especíâco

passavaa reconstituir com recursos analíticos próprios]-.] o críticoIAntonio Candido, Lw] davainício, ao que parece, a uma série de estudos sobre a evolução da representaçãoliterá ria da realidade no Brasil, começando a análise pelas A/emónm de zzmiargenfo de mi/úiw e O mrrzfo. Sua intervenção consistia basicamente numa espécie de redução estrutural

como

lembraRoberto Schwarz em que ficava evidente que o esqueleto de sustentaçãodaqueles romancesvinha ser a formalização estética de aspectoscaracterísticos da sociedadebrasa leira. Mas sobretudo mostrava que tais aspectosnão eram da ordem da combinação fortuita de circunstânciasavulsas,porém cristalizavam resultados reiterados de um processo social complexo.Algo organizado portanto. Assim sendo, o vínculo mimético que se exprimia na composição unificava de fato duas estruturas, uma literária e outra histórica vínculo material que no entanto só a análise da organização interna da obra podia revelar". P. E Arantes, C/m c&parf'zme/zro.#a/z(és de zó/tramar, op- cit., pp. z3i-3z.

zi7 z\6 Seno dw coalescêncim e sentimento da realüade

realidade exposta na obra de arte literária, que cabe ao crítico indicar,

com o que se constitui o amplo arco dos vários e peculiares realismos.

preciso responder, então, a esse realismo outro, no qual as referências ao real são mais tênues, problematizadas em outra chave. Se a relação

Recapitulando

os quatro ensaios da primeira parte d ' O d&czzrxo"ea cida-

de ficção e realidade já está no centro do problema dos realismos.tal

de, anoto que os quatro romancesestudadosoferecem quatro diferen-

como formulado nos estudos da primeira parte, na segunda parte ela será formulada novamente em outros textos, procurando explorar uma outra

tes e peculiares "tipos de realismo" (para falarmos nos termos de um sistematizador de Auerbach:'s' a "fábula realista" das Memór/ai de zzm

{

fronteira, mais inóspita.

sargen o de m//ú/a, o "realismo simbólico" de .Z:yisommo;r, o "realismo rústico" (neste caso, a expressão é minha) de /MaZavog//a e o "rea-

Essa terra incógnita que Antonio Candido desbrava nas "Quatro esperas" é uma respostaa uma questão formulada por Auerbach

lismo alegórico" d'O cora o.

nasentrelinhas de Mime.fü, e que deixou sem solução.3s:Dito de modo

E nessa altura, concluindo-se a primeira parte do livro, cabe reler

abrupto: se o problema de Auerbach era, como reza o seu título. a "dar-

a epígrafe tomada de .[e c;ffâ ;/z iç/ó///: "Ninguém sabe melhor do que tu, sábio Kublai, que nunca se deve confundir a cidade com o discurso

gei e//fe Wzr#/zc,6Ée;r",o que pensar das realidades imaginadas, dos

que a descreve. No entanto, há uma relação entre ambos". O discurso e a cidade é a realidade e a exposição literária da realidade; a tarefa do crí-

tico é, tal como propôs Auerbach, investigar a m;mesas: a relaçãoentre ambas, e tal como o sábio, não confundir a cidade com o discurso acerca

da cidade. Resulta disto, por um lado, uma compreensão,no fundo, da m;meia como produção da diferença e, por outro, da variedade de realismos possíveis, que remontam a um fundamento histórico e social,de modo a reelaborar e levar adiante o problema que Auerbach havia indicado sob a rubrica das "forças históricas'

Como indiquei mais atrás, os quatro ensaiosque constituem a primeira parte d' O (!hczzrsoe a c;Jadeforam todos concluídos no início da

mundos de sonho, dos mundos imaginários?

"Quatro esperas",a segundaparte d'O düczzrxoe a c;dado,é um contraponto (em sentido musical) à primeira parte. Composta em quatro passos,oferece análises de textos de Constantino Cavafis. Franz Kafka, Dino Buzzati e Julien Gracq, embora todas elas, especialmente as duas primeiras, sejam bem mais rápidas e menos elaboradas do que

asquatro análisesda primeira parte. Os quatro passosvão do poema, passandopela narrativa curta, ao romance, com um nexo temático sempre presente: a espera, que assume a cada vez a forma de uma espécie de distensão do tempo rumo a um fim. Tal espera, tênue, dissolvente, é contrabalançada sempre por um espaço definido, no qual ela ocorre.

A primeira das quatro esperas,"Na cidade", trata do poema de

década de i97o, mas só foram reunidos em i993, pois estavam à espera

Cavafis "À espera dos bárbaros". O poema é compreendido por Anto-

da segunda parte, "Quatro esperas", que traz como epígrafe um conhe-

nio Cândida como uma espéciede introdução ao tema das esperas,que

cido mote de Verde: "Copiar a realidade pode ser uma coisa boa; mas irz e/zar a rea/zdadeé melhor, muito melhor".3s'A verdade é que os quatro romances investigados na primeira parte estavam circunscritos ao registro da "cópia da realidade", embora com matiz, intensidade e teor

serádesdobrado quatro vezes em quatro autores diversos. Não obstante

variados

justamente

o traço que aflora com toda a força nas análises.

São configurações "realistas" em sentido mais restrito, a que se contrapõe a "invenção da realidade" (para continuar nos termos de Verde): é 356. Cf. Ulrich Schulz-Buschhaus, "Typen des Realismus und Typen der Gattungsmischung

a concisão da análise

não se poderia falar em exp#caf/on de rexfe, tal

:ama ocotte em O estudoanctlíticodopoemcle em Na sala de aula, yal exemplo --, sublinho o ponto de chegada, a percepção da "imparcialidade irónica da voz narrativa", que aguade modo "corrosivo", uma vez que "não explica nem comenta nada. Apenas constrói a informação pelo método dramático, expresso numa espécie de coral impessoalizado".;sP Esta achega ao poema marca, intencionalmente, uma série de diferençascom relação aos quatro estudos anteriores, a começar por se tratar

Eine Postille zu Erich Auerbachsa/zmeiü", op. cit.) pp. 5i'67. Contudo, prefiro falar

em "modalidades" ou então, como um resenhista, "formas do realismo"

cf. Gerhard Hess,

]147meiis.Zu Erich Auerbachs Geschichte des abendlãndischenRealismus", op. cit., P. zo6.

357.Antonio Cândida,O d&czzrso e a c;Jade,op. cit., p. l53' zl g Seno d

coaíescêncim e sentimento da realid z ie

358.t)o modo mais explícito, creio, em ]141mesis, op. cit., p. 498. 359-Antonio Cândida, O düczzrxo e a a'Jade, op. cit., resp. pp t6i e i6o

ng

Na terceira espera,"Na fortaleza", encontramosa primeira análi-

de poesia e não mais de prosa. Escapa t;mbém dos limites temporais e

se mais detida desta segunda parte: percorrendo O desertodoi 7Zrzaroi, Antonio Candido destaca a falta de "intuito realista", do mesmo modo

espaciais discutidos até então, realizando a passagem para o século xx - :'Quatro esperas", assim como "0 discurso e a cidade", percorre crQ..

como ocorria em Kafka e Cavafis. Trata-se de "um romance desligado da história e da sociedade"; mais ainda, trata-se de "um romance do

nologicamente o seu século, através.da eleição de quatro momentos -) ' jádecantando-anoregistrod

problemático (o poema . .. , . .. e.-contraditório . . :. ,.,...''' :....

serfora do tempo e do espaço""; A ambigüidade é uma força motriz sua,operante em vários níveis, e resulta em uma espéciede "dissolu-

exprimeum "dilaceramentocontraditório", diz Antonio Cândida'a). Para esseestudo, é importante notar que se destaca uma voz narrativa

ção da identidade" que, não obstante, não implica perda do "sentimento de realidade Essa espécie de esvaecimento do realismo aparece também na análise do romance de Julien Gracq -- a quarta e última espera, "Na

específica, que atua por entre o poem? e dá seu tom peculiar. Este se caracteriza pelo distanciamento que não comenta nem explica, apenas expõe (daí a "imparcialidade irónica", duplo sinal de distanciamento). Pelo que foi dito com relação ao estatuto desta primeira esperano inte{

marinha" --, no qual se quer "sugerir a realidade a partir do mistério,

rior do conjunto, não há mais a dizer da análise -- ap'nas sublinhar como,

comose tudo fossealegoriaou símbolo".;" Já se viu que alegoria e símbolo à diferença da interpretação lukacsiana são elemen-

não obstante a passagempara a poesia, a questão do narrador, que já

vimos central nas análisesda parte precedente,continua presente,no mesmosentido que nos casosanteriores:dicerni-la e marcar suaespe-

tos que podem coabitar com o realismo e, como também potencia-lo, ao mesmo tempo em que marcam uma especificidade sua possível e, mais, histórica e concreta. Agora, entretanto, tais elementos surgem como solventes do teor realista. A solução de Antonio Cândi-

ciGícidade. O teor da obra é interpretado, em grande parte, em função

dessa"voz narrativa A segunda espera, "Na muralha", dá continuidade ao que precede e avança. A cada página, o problema do narrador continua onipresenle, e também a forma do fragmento, atuante seja no tema -- a muralha frag..ntada

da que a toma de um trabalho sobre o romance de Gracq3's é caracterizar a narrativa de O /zrora/das S;ires como uma "oscilação entre realismo e surrealismo";" (uma forma de ambigüidade, traço

--, seja na forma kaOdana (o fragmento já aparecia na forma

presente em todas as análises precedentes do livro). Com o perdão

do poema de Cavafis), como, por fim, nos ângulos de visada descorti-

da reiteração, notemos que há uma potencialização dos elementos que Antonio Candido preocupou-se em destacar como constituintes

nados por Antonio Candido - 'o narrador, o leitor, o "Alto comando" A narrativa de Kaíka descreve "um método de construir por pedaços",

possíveis do realismo "forte"

de sorte que o tema e enredo é realizado pela própria forma da narra-

do século xix; só que agora confronta-

mo-nos com uma literatura que está mais para além ou acima do real

çao3ói(talvez esse método de construção também pudesse ser referido ao próprio livro de Antonio Candido)- O fragmento é tanto forma nar-

do que junto a ele. Pergunta: isso significa que abandonamosos territórios da mencionada "diferença entre a representaçãoliterária da

rativa com valor próprio -- afim com o absurdo.eirracional do mundo -- como tema da narrativa: a muralha como coleção de fragmentos e,

portanto,ruina."'

> segundaem Kaíka e Gracq e na terceira parte na epígrafe e na "Garra ma/121ma".E, desde essaplataforma expandida, expande-seretrospectivamente ao livro-irmão, nele e anlúele, na âgura do autor-marinheiro Conrad

36o.Id.,ibid.,p.i56.

363.Antonio Cândida, O decursoe a cidade,op. cit., p. i85.

364.id.,ibid.,p. i89. 365.Antonio Cândida, O dücurfo e a cidade,op. cit., pp. i8g-go e l97, cita Mana Teresa

,'1

de.Frestas,/7c/;o/zef surráa me dam Le Rivage des Syrtes dele!/ien Grau?.Dissertação de mostrado, usp, 1974.

366.Antonio Cândida, O d&cürsoe a c/Jade,op. cit., pp. i8g go. 221

2.2Q Seno du coalescência e sentimento da realidcüe

realidade"? Ou ainda: como equacionar realismo e realidade (para

ir firmando uma fórmula lapidar)? Isso encontra soluçãona formulação auerbachiana das modalidades (plurais) da exposição da reali-

dadena obra. No caso da análise do romance de Gracq, Antonio Candido nos

adverte que "a coerência do livro deve ser procurada mais nas metáforas do que nos enunciados fugidios ou nas alusõesvagas".3ó7Pois o lista ("sentimento da realidade"), como se viu, depende mais da

coerência do que propriamente do caráter documentário -- e a análise do romance de Gracq expõe o primado da coerência (forma literária)

de modo preciso.3ó8 Não obstantetodo o "surreal" do livro, não obsf

afastamento do cânone realista, "o ser está ligado aos outros,

ao meio, à história".s69Há, portanto, elemento de realidade nessaliteratura. embora de teor diferente no seu modo de figuração e exposição. Isso se deve ao fato de que, no entender do crítico, os "significados do

livro" revelam-se por meio de um "sistema metafórico"."o A realidade exposta sefaz mediante metáfora, donde sevê como estapassaa ser um continente que pertence ao amplo mapa dos realismos.

É de se supor que muitos leitores de -M/meiassempre se pergun taram como conceber o fantástico, a literatura surrealista, o rea/ malta í//oso. ou manifestações literárias similares, na perspectiva ampla e aberta de Auerbach."' Não tenho dúvidas de que o próprio Auerbach

farejava a questão, e peço licença para lembrar por um momento

alguns desenvolvimentos no capítulo sexto de -M/me.çü.Trata-se da análise do romance de cavalaria medieval, e o capítulo sucede à análi-

seda CÃa on de gene no capítulo quinto. No entender de Auerbach, o romance cortês é uma espéciede inversão da CAanion de geife, já que estanão estava presa ao estamento, sendo inclusive "popular", embo-

ra mantendo um estilo elevado. O romance cortês, por seu lado, é estámental, mas não mantém a diferença de estilos. O núcleo do argu-

mentoé o destaqueda "atmosferade conto de fada" do "realismo do romance cortês", que Ihe subtrai "o fundamento político-real"3': . à diferença da Cóanionde feira, que preenche uma "função históri co-política".3'3 Como resultado, não há o "concreto": o cavaleiro da CÃamonde RoZandpossui "uma função no mundo real"; já no roman

ce cortês o "efÀoi feudal" perdeu sua "função política" e "tornou-se absoluto": "não possui nenhuma outra finalidade a não ser a auto realização"3" (enquanto a CÃanxonde geire possuía sua "realidade"

e

'concretude" social e política;'s). Auerbach conclui o argumento com a seguinte e para nós importante afirmativa: "uma tal idealiza ção conduz para muito além da imitação do real" (".NbcÃaÃmzz/zg dei MzrÉ#cÃen")na literaturas'ó e no entanto não deixa de ser "dargei. tettte WiTkiic%keit?'

Os mesmosleitores recordam-seentão que o capítulo em pau ta termina com uma explicaçãopara o lugar de destaquedo tema do amor na poesia européia: o amor torna-se o tema central e objeto do estilo elevado e em Dante já estará claramente definidor" (em uma

linhagem que se estenderáaté os românticos e Baudelaire, este sub 367.Id.,ibid.,p.

t96.

368. Essa mesma questão }á fora meditada muitos anos antes e em obra muito diversa: discutindo romancesde Jorre Amado em seusrodapésliterários, no ano i947, Antonio Cândi-

vertendo as hierarquiass78).Entre o romance cortês e Dente, os poetas provençais e o estilo novo italiano, que operam precisamente um apro fundamento da "sublimação" do amor e, com isso, "afastam-se da rea-

da criticou com veemência a pretensa "honestidade" docurnentária do romancista, ao passo

que o louvou quando lança mão "da força que tem a inteligência ordenadorado artista sobre o material bruto da evidência documentária e o impulso irresistível da inspiração

Antonio Cândida, "Poesia,documentoe história", op. cit., p- 6o-

373.Id.,ibid.,p.ii9.

36g. Antonio Candido, O dücürso e a cidade, OP cit., P. zoo' 37o id', ibid , P. i99-

374.Id.,ibid., p. i3o. 375-Id., ibid.; ver também cap. 5. O processo exprime-se inclusive em termos próprios e

ealizado, o único texto que toma a questão como tema é Manha J- Nan-

dorQ, "La literatura fantástica y la representación de la realidad", in David Rias(org.),

37z.Auerbach, .44z'meia,op. cit., p. izg; cf. tb. p. i34.

Zeorla

de Z(#a/]rónca. Madre: Arco/Libras, zoom PP' z43'6t(publicado originalmente na Revista Ca/zademe de Esüzcãos/l?EWámcoJ, v. wb i99i). Mas Antonio Cândida, em "A personagem do

romance", op. cit., PP.77'78, ]á indicava o "realismo mágico" de Grandesertão.-vereda coma

especíâcos:a idéia de "vassalagem" é substituída pela de "corleúie 376. Auerbach, J14;mesa,op. cit., p. i33. Ver também Antonio Cândida, "0 patriarca", op cit., P.78 )77. huerbach, ]16meiú, op. cit., pp. i37-38. 378. Cf. Auerbach, "Baudelaire .fVeür=dü ma/ und dasErhabene", op cit.

um modo de realismo, que "garante o sentimento de realidade". O ano era, salvo engano, ig6i

223 zzz Sem. dw coaLescência e sentimentoda fealdade

lidade concreta do mundo""P (problema bastante similar foi abordado por Auerbach com relação ao século xvn francês). Portanto, a literatu-

pesee a [úeie ,;;' há realidade e o engenho da narrativa é "transfor-

ra opera de modo muito variado a "imitação da realidade", indo, por

A força analítica singular que se desenvolve nos dois romances estudadosao final de "Quatro esperas" pode ser indicada do modo seguinte:o problema da realidade nessasobras nebulosasfoi variado duas vezes. Na primeira delas, em Buzzati, ele é ancorado na realidade do mundo interior, uma solução em certo sentido convencional, dada a infinita e incansável exploração dos mundos interiores,

meio da "idealização", a recantos cuja "realidade" parece bem longín-

qua -- e qualquer semelhança com as "Quatro esperas", creio, não é desprovida de sentido. Nesses desenvolvimentos há uma articulação que Auerbach não desenvolve, mas que está, latente, a permitir uma abertura para fenómenos que a literatura do século xx soube explorar.

É isso que sentiu Antonio Candido, quando tentou contrapor a "0 discurso e a cidade" às "Quatro esperas". Em um outro texto dos

anosi97o, o crítico formulou uma possibilidadeamplamenteexplora{

da pela literatura do século xx, e na mesma direção em que Auerbach,

no capítulo final de Mzmeiís: Um modo de ampliar o campo dos signi$c(üos e, depois dele, a visão do mundo, é a injeção de imóLito e irreal rlo neJcocorrerlte da realidade. Foi msim que o romance contemporâneo superou m Ponteiros do realismo e, paradoxalmente,

pâcle ampliar

m da realidade,

dando-lhes o toque da tían.scen-

dância que quebram restrições do concretoparticular '*'

mar o possível em realidade concreta".S8'

como parte da realidade, desde o romantismo (daí uma certa proximidade com rede e anrúeie). Já em Gracq, não se trata mais apenas da realidade de um mundo interior, quando diz de Amo que "o ser estáligado aosoutros, ao meio, à história".38sHá portanto uma espéciede difusão de uma certa realidade, sondada inicialmente no mundo exterior e que se espraia para além. Trata-se, creio, de algo realmente novo, no sentido de que a análise tcnta apalpar esseselementossupra-individuais e concretos que configuram uma realidade, propiciam um sentimentode realidade(lastreadona fatura artística: "coerência"), e não dizem necessariamenterespeito aos mundos interiores.386 No texto, Antonio Cândida chama a atenção para a maior complexidade do livro de Gracq, comparado ao de Buzzati. Essadiz

De fato, há menos uma cesura do que um contínuo, que a literatura vai explorando continuamente; daí a fórmula feliz da relação de realismo

e realidade, como antídoto às formulações dogmáticas do Realismo. Antonio Candido destaca a "contaminação dos níveis (real e irreal)",;'' avançando em uma frente que Auerbach apenas sugerira.

Isso sedeixa entender, nos estudos de "Quatro esperas", quando

Antonio Candido afirma que o romancede Gracq conjuga "verossimilhançaficcional" com "visão transfiguradora", de sorte que as narrativas são resultadosdessesdois vetores.ss:Embora não se possa falar de "enquadramento

realista"

como no Conrad presente em

379. Auerbach, ]16meiis, op. cit., P. i38.

383.Cf. Antonio Cândida,O cüfazrxo e a cz'Jade, op. cit., p. ígo e mexe e arzz?eie,op. cit. pp- 57'93: aqui o estudo de Conrad apresenta uma instigante proximidade com os de Gracq

eBuzzati em O decursoe a c;Jade:com Gracq o clima geral do romance lido pelo crítico; e com Buzzati o significado da morte do protagonista ao anal, tal qual em Conrad.

384.Antonio Cândida,O desci'rxo e a cidade,op. cit., p. igo; vela-seo que sediz de Conrad em Zeie e anláeie, op. cit., pp. 8S-86. 385.Anronio Candido, O disclzrsoe a cz'Jade,op. cit., p. zoo- Vale notar que o que se realiza em .Le Xi age dei Slyrex é o que fica para sempre imóvel em /.44aZavog#a. No estudo deste

último, Antonio Cândida destacou a sociedadecomo uma espéciede personagem, imóvel estáticae bloqueando toda mudança; no estudo do primeiro, percebeu a sociedadeque, estagnadahá trezentosanos, movimenta-se e anseiapor mudança, mesmo que estasignifique a suaruina.

38o.Antonio Cândida,"Poesiae ficçãona autobiografia",op' cit., p- 65

386. Creio que o casomais explorado pelo romance do século xx, nessesentido, foi recor-

38i. Id., ibid., p. 66. Há uma presençaindireta de Auerbach nessetexto de Antonio Cândida,

rentemente pautado pelo problema do tempo, remetendo a uma experiência subjetiva da temporalidade. Aqui, com muita discrição, Antonio Cândida ilumina uma outra vertente

pois, ao analisar Boirempo, retoma a análise de Merquior da "mescla estilística" em Drummond, inspirada em Auerbach(apresentada em 4 rzíffa da «7zheie,e retomada em nérfa

para além dos limites, digamos, "pós-tradicionais".

A questão é muito difícil de formular e

e unwerso em Z)rummontÍ).

desenvolver, pois que, como sevê na análise oferecida de .[e Rz age dei SWrrer,tudo é nebu-

38z. Antonio Cândida, O dücizrso e a cidade, op cit., p- i9o'

loso, elíptico, metafórico, real e surreal, inconclusivo, flutuante e, não obstante, Ãürórzco.

zl 4 Senso das coaLescênciw e sentimento da realidade

respeito àquela espécie de inovação do teor realista, rompendo uma

para se revelar. Na sua obra, a oportunidade não interessa:interessa a

fronteira inexplorada e virgem, um outro e novo mundo. As duas

qualidade permanente.3:'

análises mais detidas de "Quatro esperas" demarcam, assim,~possi bilidades várias de realidade exposta na literatura, até mesmo em um

É importante destacarcomo o crítico aproxima e distancia Machado dos

domínio aparentemente,ao primeiro olhar, surreal.'*'

realbtm e nüturctlistm, pois tenho sempre em vista que, no problemcl e na con..stelaçãode " O discurso e Q cidade" , trcLta-se de compreender essemesmo

movimentos há similitudes, mm há di$erençm Qofulcro clo procedimento de

Obsewação interposta sobre o desalinho de Machado de Assim

análise de .4uerbcLchb,e importct sempre destacar o matar.peculiar de cada obTCL e autor tratados. Nào é o aceno, portanto, quefaR.com que, neste rodapé

Hou retomar, embora em pensos largos, um percurso de interpretação de Machado de .4ssis em .4ntonio Candido, escondido em três momentos: um rodapé f t

de l 947, a Formação da literatura

brasileira

e o 'Zkgzzema de Machado de

,4ssis", de \ g6$ este último, observo, retativamertte coetâneo aos estudos de "0 discurso e a cidade". Começo com um rodapé de l gAn:

inicial, MachcLdo de Assim seja comtelado com Zona e .Aluísio

estttdosposteriores de "0 discurso e a cidade" "0 discurso e a cidade"

prende de certo modo ao pessimismo naturalista. Mas que pessimismo

objetos dos

que$coufora

de

dentro de 'Tese e alttitese.

Neste, Lemoso seguinte: O pessimismo

Machado é dos negadores mais completos que se conhece. Por aí se

porque jú havia Fiado

e Eça

desses dois livros

[0/nmo

.BaiZ71oe O cama do padre

.4maro] é um quinhão do naturalismo literário, presente tanto em Zela quanto no precursor Flaubert, em Aluísio Azevedo e Eça de Queiras.

diferente de Aluísio, Zola, Flaubert ou Eça de Queirósl Não provém,

Tomados entre a contradição violenta da civilização capitalista do século

com efeito, de tristeza ante a desarmonia de um mundo (uma sociedade)

xix,

que poderia ser harmonioso; provém da constatação de uma desarmonia irremediáve[, metafísica e não socia]. [...] Os naturalistas e realistas do

cesso vertiginoso

entre a burguesia ascendente,criadora de novos estilos, e o pro de proletarização

os romancistas

realistas e naturalis.

tas padecem do sentimento agudo das desarmonias.;'9

século xix (Balzac e Stendhal incluídos) eram excessivamente sociológicos, na medida em que todos eles estudaram o homem como fruto de

Não há dúvidcl queo principctl, aqui, está no "sentimento agudo dm pesar

um choque entre a consciência e a existência social

moniw".

uma desarmonia de

natureza temporal, em suma. Machado transcende essacondição por as sim dizer histórica; não estabelececondições segundo as quais o homem é assim ou assado: toma-o como fata] e eternamente assim [...]. Para

Guardamos a ucpressão, para ver mais à frente se serve também

a Machado de .,4ssiç. Opmio iegzzz nfe á dadope/a Formação da literatura

ele, pois, as condições sociais não criam o filistino de Flaubert nem os

388. Antonio Candido, "Duas notas"(1947), republicado em Zíferafzzrae Sociedade,n' 6: zoom-o%pp. 3r8 e 3lg

libidinosos de Aluísio ou os taradosde Zola; apenasdão esteou aquele

38g- Antonio

colorido a qualidades eternamente humanas, à espera de oportunidade

sente"(op. cit., p. lg), Antonio Cândida marcou a proximidade de Zela e Eça.No campo

Candido, nele e anlúese, op. cit., p. 35. Em "Eça de Queirós, passado e pre-

dessesentrelaçamentos e aproximações, não deixo de notar a presença forte do Conrad trabalhado em nele e a/zfúesee do Kafka de O d&clzrxoe a cz'Jadeno " Esquemade Machada 387. Claro que o olhar de Antonio Candido jamais é o primeiro olhar: a explicação de texto não secansade lançar novos olhares e o crítico reitera constantemente a necessidade da "leitura atenta", chegando mesmo a comentar como as descobertasanalíticas vêm com a leitura repetida. Cf. Antonio Cândida, O düclzrsoe a cidade, op. cit., PP- '79, iga

de Assim". Ademais, o more mesmo de nele e arz/z?eie,a divisão do ser, aparecerecorren-

[ementeno "Esquemade Machadode Assis". Por âm, vale lembrar que Graciliano Ramos(autor presenteem Zeie e anláeie) foi caracterizado,em outro momento,no interior

e Olzfroi escr;ros,OP cit., pp. zn-zz. O mesmo, diga-se de passagem, dizia e praticava o

dessaconstelação: nele Antonio Candido enxerga "a imparcialidade construída de certos pessimistasante a natureza humana; um realismo desencantado que sucedeu, em vários escritores, ao pessimismo vigoroso e algo romântico dos primeiros naturalistas" . Antonio

filólogo alemão.

Candido, "Ficção e confissão" (lgj S),in Ficção e co/!Ásião, op cit., p. zi-

e i95; tambémAntonio Cândida, "Ungaretti em SãoPaulo" (ig6o), in Brigada /lgeira

zz6 Sen.sed

coalescêncime sentimento da realidade

227

btagtXeha, para a qualjá destaquesa importância de Machado. Em certo

comefeito, lança mão desseprocedimento, e issodeslocaa análise do ro manco machadiano parcao âmbito da posição do narTCLdor,que nào é tema

momento desse livro, lemos:

tjlada sela no rodapé de l gA'7,sqa no livro de t959. Mas é um osünaio Entretanto, as sendas poéticas do indianismo e a humanidade sincera

muito importante em "0 discurso e a ciclacle", e também em "Esquema de

mas superâcíal do regionalismo não eram elementos suficientes para a maturidade do nosso romance. Faltavam-lhe para isso aquelas "pes-

Machado de .4ssb". Se btofalsentido,

quisas psicológicas", que segundo Lúcia Miguel Pereira constituem o

diria quepor detrás de "0 discurso

c a cidade" pul.sa o "Esquemcl de Machado de .Assim", como uma espécie de

nota dissonante,porque di$cil de clmsi$car. Por conta disso, l,alanos como

brasão de Machado de Assis e Raul Pompéia. Elas consistem, principal-

se tentct entender um pouco de Machado de Ássis na quere "Esquema".

Em

mente, em recusar o valor aparente do comport;mento e das idéias, em

primeiro lugar, a dissonância é apontada pelo próprio .4ntonio Candido:

não aceita-los segundo a norma que lhes traçam o costume, ou os seus desvios mais freqüentes. Há na pesquisapsicológica uma certa malícia e

Eça de Queirós, bem ajustado ao espírito do naturalismo; Machado de

uma certa dor, que levam o romancista a esquadrinhar a composição dos

Assim, enigmático e bifronte, olhando para o passado e para o futuro, es

atou e pensamentos; a reconstituir as maneiras possíveis por que teriam

condendo um mundo estranho e original sob a neutralidade aparente de

variado, levando-os, muitas vezes, a conseqüênciasinaceitáveis para

suashistórias que todos podiam ler.:P'

a visão normal. Esta experimentação com o personagem ê que o torna

tão vivo e tão próximo da nossavida profunda, na qual vai provocar o

E depois

estremecimento de atou virtuais, de pensamentos sufocados, de toda uma

fermentação obscura e vagamente pressentida. Na medida em que atua

Não é nos apaixonados naturalistas do seu tempo, teóricos da objetividade,

dessemodo, o romance tem para nós uma função insubstituível, auxi-

que encontramos o distanciamento estético que reforça a vibração da rea-

liando-nos a vislumbrar em nós mesmos, e nos outros homens, certos

lidade, mas sim na sua técnica de espectador.":

abismos sobre os quais a engenharia da vida de relação constrói as suas

Essctsduas Linhase meia condemcLm um tanto: em primeiro lugar, o Tea-

pontes frágeis e questionáveis.

Uma literatura só pode ser considerada madura quando experimenta a vertigem de tais abismos. Na brasileira, experimentou-a inten lamente Machado de Assim,dando-lhe, por essaforma, razão de ser num

de .4ssis", .4ntonio Candido dedica dum página,

O que quero sublinhar, a partir desse penso, é que aqui encontramos uma espécie de encaixe, no âmbito da "experimentação com o personagem )

=omo que se disse anteriormente acerca do decurso indireto livre, e mesmo Mattoso Câmara Jr., que utitileipara caracteriTá-lo, formulava-o 'J\s-à-vxs .4quele penso (. 'o discurso indireto livre

psquico entre o narrador e o pera'nadem quefala..."

ser algo morto ou estáticos, em segundo, o procedimento técnico, narrativo,

de quelança mão. Com essasdum faces, chegamosaospontos c]eencontro com os estudos de "0 discurso e cccidade". Em "Esquema de MctchcLdo

plano supranacional.3P'

Machado.

tismo intenso, forte e presente Ç"vibração da reatidcde"= ela vibra, longe de

muito condensada, a

aíticuLctrposiçãodo narrador e estilo em Machado e assim como, no estudo de yeTga, chegou ao "estilo homogéneo/rústico", em Machctdo chegct à "imparcialidade

estilística",

que é resultado

formct

sulxgenes\s?9' TatestiLo é compreendidopor.4ntonio

de um narTCLdoT

Cândida como "matriz

\: À estabelece um eto

) tinha o objetivo de

39i. Antonio Candido, "Esquema de Machadode Assis", op. cit., p. 20.

caracterizaro indireto livre, mm ao mesmotemp' c'm ' intuito de eviden-

39z.Id.,ibid.,p.z7.

cia..lo no autor$umineme. .4 ncperimentaçãode quefala .4ntonio Cândida,

393. Ver Antonio Cândida, "Esquema de Machado de Assis", op. cit., pp. z6-z7. Avançar na compreensão dessenarrador izzígenerü foi a tarefa que Roberto Schwarz tomou para si, Í)rimeiramente nas .4áemónmpószm de .Brú Cuów e a seguir no Z)om Cmmtzrro.Cf

39o. Antonio Candido, Formarão da /fierarzzraórm;/eira, op' cit., v. z, P' t93'

zz S Seno dm coaiescêncime senàmentoda fealdade

R. Schwarz, ZZmmeifre na per Éar;ada capifa#fmo.' ,A4acÀada de .4iiü, op. cit., e "A poesia >

zz9

formal" da obra de McLchado?~ vale diqeTcomoaquela estruturctpTofundcl quefoi detectada nos estudosde "0 discurso e a cidade". .além disso, em um outro texto usinaLa a posição de McLchado como continuador sui genes\s" de Macedo e .41encar,mm só destaca a continui-

discretamente um estranho fio social na tela do seu relativismo. Pela sua

dade para, na sequência, de$nir a diferença, no estro e no cXkiax?" ) reagi.smo peculiar de McLchadode .4ssi.s um velho tema deste estudo afora nessecontexto. .4ntonio Cândida dedica-se a elencar, rlo texto,

Esse"interessemais Largo", indicctuma generalidade quetem a 'ver comcl

algum caos da "originalidade" da obra deMachado de .4ssise entãoapon-

com uma compreemão iguctlmente profunda dm estrutur(n social.s", estou

ta, dentre ozzzroimpef os a reZafâo entre res factae e res fictae -- "reZafão entre o fato real e o fato imaginado", "a fantmia funciona como realida-

turm estro quepossuemuma "imartên.cia poderosa" em sucoobra?" -- contra.

de" ?9' Sem reconstituir o percursodo crítico, cito a amarração do argu{

mento.- TÉ' cone/uzhos gazeneste romance [Dom

Casmurros,

situctções da sua obrcl, o TeaLpode seTo que parece real" ]m os estudos de " QuarTO esperas". É que Machado,

como nozzfrm Ectqui tocamos

obra toda há um sensoprofundo, nadadocumentário, do irarm, do duelo dos salões, do movimento das camadas, da potência do dinheiro.;"

preocupaçãoem dar conta da "organização dm relações", e o resultado é que "o senso mctchadiano dos signos da aLmct se articula

em muitos caos

piamente, portanto, à queLctoutra Leitura de MacttcLdo como moraListcl.

Entretanto -- e disto resulta CL di$culdade em de$nir univoccLmente

suco

posição--, uma outrclface sucoaproxima-o também daqueles outros tipos de autismo, ctbardados e discutidos nm " Quatro espera",

a de:

coma 'pomos, "olhando

para o passadoe para o futuro", ocupaumaposiçãomuito própria, única, digamos quesituada entre "0 discurso e a cidade" e " Quatro espera"?9*

um escritor poderoso e atormentado, que recobria os seuslivros com a cutícula do respeito humano e das boas maneiras para poder, debaixo

Isso posto, vale veri$car que o mpecto preferido por .4ntonio Candido

dela, desmascarar, investigar, experimentar, descobrir o mundo da alma,

em Machado é um tema queo aproxima enfaticamente, de um modo muito próprio, dos reatistm e naturalista:

rir da sociedade, expor algumas das componentes mais esquisitasda personalidade. Na razão inversa da sua prosa elegante e discreta, do seu tom humorístico e ao mesmo tempo acadêmico, avultam para o leitor atento

Essa devoração geral e surda tende a transformar o homem em instru-

as mais desmedidas surpresas. A sua atualidade vem do encanto quase

mento do homem, e sob esseaspectoa obra de Machado searticula, muito mais do que poderia parecer à primeira vista, com os conceitos de aliena-

intemporal do seu estilo e desseuniverso oculto que sugere os abismos

ção e decorrente reificação da personalidade, dominantes no pensamento

prezados pela literatura do século xx. [...] A sua técnica consiste essencialmente em sugerir as coisas mais tremendas da maneira mais cândida

e na crítica marxista de nossos dias e já ilustrados pela obra dos grandes realistas, homens tão diferentes dele quanto Balzac e Zola. [...] há na

(como os ironistas do século xvm); ou em estabelecer um contraste en-

sua obra um interessemaislargo, proveniente do fato de haver incluído

sugerir, sob aparênciado contrário, que o ato excepcional é normal, e

tre a normalidade social dos fatos e a sua anormalidade essencial; ou em

anormal seria o ato corriqueiro. AÍ está o motivo da sua modernidade. > envenenadade Z)om C mzzrro",in R. Schwarz, Z)zzmmenir . São Paulo: Companhia das

Letras,1997)pp-7-4i. 394.Antonio Candido,"EsquemadeMachadode Assis", op- cit., p. z7 395. Cf. Antonio Candido, ]a/clarão à /i eralara órm;/eira, op- cit., p. 54. O procedimento, como salientem,é estruturante da forma narrativa, e portanto gnoseológica, da Ãormafõoda !iteratura brail,eha.

apesar do seu arcaísmo de superfície [...]

[o] sentimento profundo da re]atividade tota] dos ates, da impossibilidade de os conceituar adequadamente,dá lugar ao sentimento do absurdo, do ato sem origem e do Juízo sem fundamento, que é a mola da obra de Kafka [...] e percorre discretamente a de Machado de Assim."'

396. Antonio Candido, "Esquema de Machado de Assim",op. cit., pp. 3o e 3z

397.Id.,ibid., p. 3i. 398. Tanto mais na medida em que é um escritor da ambiguidade que, como se viu, é um

399'+ntonio Cândida,"EsquemadeMachadode Assis", op. cit., pp. 34-35e 37

traço signiâcativo dos textos analisadosem "Quatro esperas"-Cf. Antonio Candido, ini-

4oo.Id.,ibid.,pp.37-38

ciação.i #lerarzzraÓr í/e;ra, op. cit., p. 54-

4oi.Id.ibid.,pp.

z'bo Sensod

coaíescêncime sentimento da realidade

20-21,27 e 33

z3i

O passoé signi$cativo à medida quetende a caracterizarMachado de Assim ncuqueLa cha've desdobrada

em "(quatro

esperas",~':

de um seno

da rectLidadeque independe do carâter propriamente documentário ou, se sepreferir, documenta tanto mais profundamente quanto é capas de se despir

ío traço documentário super$cial: wsim como m obras de Cava:jb, Ralha,

Bu=[4atie Gracq, esseMachado explora "o sentimento de va]zo quecorrói os grupos e os seres

:"

dependesse dessavia contraditória","' a recorrente lição de Asmodeu.

o "sensodoscontrários". Daí termos,por um lado, a prosopopéia,a metamorfose, transfigurações congêneres, na poesia e na prosa, convergindo em um realismo izz;generü, já que "não incompatível com a fidelidade ao real",'o' muito ao contrário. Como revela o caso Antonil.

destacadopor Antonio Candido, uma certa transfiguração dá enorme teor de realidade à descriçãoe compreensãoda matéria visada. Por outro lado, coexistindo com esserealismo transfigurador -- que lança mão de um estilo elevado para um assuntobaixo, poderíamos dizer, forçando um pouco a mão e o argumento -- há um outro: a "representação

Nesse contexto de discussão, gostaria de lembrar que, em um Outra {

texto importante, sob o epíteto "transfiguração da realidade e senso do concreto", Antonio Candido apontou diferentes registros de realismo como impulsionadores da nossa literatura nacional. Assim, "a

imaginaçãoliterária transfigurou a realidadeda terra e, ao mesmo tempo, submeteu-a a uma descrição objetiva, como se o conhecimento 4oz- Quem leu com atenção O c/hcür=oe a cidadenotou que Machado de Assis apareceno livro, como elemento de comparação, não frente aos romances do século xix, mas aosdo século xx; portanto, não em "0 discurso e a cidade", mas sim em "Quatro esperas". Cf.

Antonio Cândida, O düfurso e a c;Jade,op. cit., p. i8z. O mesmoaflora no resumo:"r-.] seustemas foram incrivelmente precursores, obrigando a crítica atual, para explica-lo, a evocar autores que vieram depois, como Pirandello, Proust, Kafka, sem falar de seu contemporâneo Dostoievski".

Antonio Candido, ]nic;afâo .i #ferafzzraórm-i/e;ra, op. cit., p. 54.

E também em outro texto: "]-.] romances e contos que confirmam a sua maestria e a sua posição de ignorado precursor de algumas tendências da acção contemporânea, como o sensodo absurdo e da gratuidade dos ates, a pluralidade do espírito, a indeterminação do objeto narrador-.]". Antonio Candido, "A literatura durante o Império", op. cit., p. 354. Em pesee arzlúeie,Antonio Cândida aproximou Conrad de Dostoievski, exatamentede um

direta da realidade [...], que contribuíram para estabe]ecer em nossa ]iteratura um realismo que se tornou arma de conhecimento objetivo da

sociedadee do espírito", indo desembocarsobretudono romance. desdea décadade i84o.'o'

Se esteestudoprocura indicar como o trabalho de Antonio Candido faz-se em uma interlocução constante com Auerbach. não mediante a citação e referência explícita, mas sim na formulação mesmade um problema para a teoria e história literárias, uma outra questãoé ver como Antonio Candido resolve a seu modo o problema que Erich Auerbach também tenta resolver: o caráter social

e histórico da obra literária. A solução de Auerbach está fundada em seu radical "relativismo histórico";'07 a de Antonio Candido é a relação de "interno" e "externo", explorada desde a tese de livre-

docência e teorizada sobretudo em Zfferarura e ioczedade.embora continuamente presente em todo o caminho do crítico.408Em O dúczzrso e a c/Jade, sobretudo na primeira parte, isso se resolve, nos termos das análises das obras, na revelação de suas "estruturas pro-

fundas", na "redução estrutural", pois é nessadimensão que radica

modo que os aproxima do que diz de Machado: "A força e a novidade de sua obralConrad, i.v] residem na circunstância de que a referida divisão ou pluralidadela pluralidade con-

traditória da alma, vista em Dostoievski, i.v] aparececomo norma, não desvio"(op. cit.,

4o4-Antonio Cândida, "Literatu ra de dois gumes", op. cit., p. i6g.

p 79). Em "A personagem do romance", discorrendo acerca da profundidade e dos mistérios do ser, Antonio Candido aârmou: "Escritores como Baude]aire, Nerva],])ostoievski,

4o5.Id.,ibid.,p.l7o. 4o6.Id.,ibid.,pp. l7l-72.

Emily Brontê(aos

4o7. A expressão aparece em ZzferafzzrxpracÁe zzadPuó/zlum, OP-cit., p. i4, mas é signifi-

quais se liga por alguns aspectos, isolado na segregação do seu meio

cultural acanhado, o nosso Machado de Assis), que preparam o caminho para escritores como Proust, Joyce, Kafka, Pirandello, Gide"(op. cit., p. 57, cf. tb. p. 73). Por âm, âca o

cativa para toda a sua obra. Já indiquei, mais atrás, como Antonio Cândida, em anotação, compreendia a solução de Auerbach

registro de que tudo isto já estáantecipado em rodapé de i946, "0 nossoromance antesde igzo(ul)", republicado em Z;leralura e iocíedade,n' 5, lodo) pp. 221-23 4o3. Antonio Candido, O decursoe a c;Jade,op. cit., p. iz

4o8. Assim, por exemplo: "Justamente pelo fato de manter relações com a realidade social, a liEeraruraincorpora assuascontradições à estrutura e ao significado das obras". Antonia Candido, "Literatura de dois gumes", op-cit., p. i67.

z'b2. Seno d

coaíescênciwe sentimento da realidade

23)

uma historicidade que, a seu modo próprio e irredutível, determina e media a obra literária. "Fora do esquadro", a terceira e última parte de O clbczzrioe a c;da.

\.

lido influência no primeiro Gonçalves de Magalhães,''3enquantoa poesia pantagruélica, firmando o pé na "negatividade",

decanta "um

de, embora apresente laços bem mais tênues com o nexo que articu-

traço romântico importante".4t' No final das contas, o capítulo sobre

la as duas partes iniciais, revolve em obras e momentos variados um conjunto de aspectosque searticula, com certa sutileza, na estrutura do livro como um todo (donde se vê que o livro, de fato, é um livro).m

essapoesia "menor" dos bacharéis conclui com os estudos reunidos

No primeiro capítulo,"Carta marítima", Antonio Cândida ana-

f

Caldas é vista como precursora do romantismo, tendo mesmo exer

lisa uma obra menos conhecida, mas não menor, de Souza Caldas. A Carta dirigida a meu Comigo Jogo de Deus Pitas Ferreiro, em queIhe descrevo.zm//zÁav/agempor mar ará Génova,de t79o, ganha importância, para a presente argumentação, no termo da aventada mistura de tom, análoga à mistura de estilos de que fala o romanista alemão. A Garra «zan'r/ma,como prefere chama-la o crítico, joga alacremente com o tom mais elevado e mais baixo, misturando-os e resultando dessa mistura,

entremeadana mistura dos próprios gêneros composiçãomista que é em prosa e verso.''' De fato, essa "epístola mesclada" mescla muita

coisa: "observação e fantasia", prosa e verso, tom elevado e prosaico, seriedade e sátira (seriedade e brincadeira), "combinação do elemento ideológico com o elemento fàbulativo", fatos e idéias.4':

Que o tema da mistura dos gêneros não é desprovido de impor-

em Zeie e a/zfúeie,pois no fundo do absurdo há o movimento, típica mente romântico

ig64

e mesmo pós-romântico,

a lembrarmos o livro de

de "desmascaramento do ser".''5

Em segundo lugar, se a "epístola mesclada" misturou, como se viu, tantas coisas, ainda não é contudo propriamente "subversão do dis-

curso", tal como ocorre no a/t#gan .''' Assim, no romantismo o a/t#gzzd "se irmana ao gosto pelo absurdo e à confiança no fragmento, ao uso do contraste e do grotesco, à mistura de gêneros e à quebra das hierarquias

literárias, parecendo afirmar a liberdade de experimentação, que pode levar a uma espéciede negaçãodo discurso"'n como se vê, bem guardadasasproporções, algo que se aproxima da Car/a de Souza Caldas.'':

Se,com isso, torna-se perceptível o nexo que articula os dois pri melros estudosde "Fora do esquadro", é tanto mais importante destacar como essesprocedimentos românticos também antecipamexperimentações futuras do século xx, tal como o surrealismo donde se revela o nexo com os estudos de "Quatro esperas". Tal aproximação

tância na investigação de Antonio Candido, indica-o sua recorrência no estudo seguinte, "A poesia pantagruélica", quando se afirma que o

é ainda mais significativa se atinarmos para a recorrência da amózkü;-

'z/!#gzzr;romântico explora as mesmas "mistura de gêneros" e "quebra

#roraz'dm S;r ea,mas presente também no poema de Cavafis e na narrativa de Kaíka. Agora, vemos a "ambigüidade extrema" que perpassa

das hierarquias literárias".'':

O estudo do a/t/zgzzr;na "poesia panta-

Jade, destacada sobretudo nos estudos sobre O deierro doi rárfaroi e O

gruélica" dos acadêmicos paulistanos encaixa-se com a Garra marúlma

sobretudo em dois aspectos.O primeiro delesé que a carta de Souza

4i3 Cf. Antonio Cândida, O cüfczzrxa e a cidade,op. cit., pp. 22í-zz. Na Formaçãoda Zzleraazraór z/e;ra,op. cit., v. i, p. 3ig, e v z, pp í3, 49, 5i e 78, Antonio Candido apontou a inHuência de Souza Caldas sobre os românticos.

4og Se a primeira parte tratava, meio a meio, de autores nacionais e estrangeiros, e a segunda

4t4' Antonio Cândida, O dúcürsoe a cz'Jade, op. cit., p. zzi. Cf. Antonio Cândida,Ãarmafão

exclusivamente de autores estrangeiros, coube à parte final tratar apenasde autores brasileiros.

da viera ara órmz'/eira, op. cit., v. z, pp. i56-58, i94.

4lo. Cf. Antonio Candido, O dísczzrfo e a cidade,op. cit., pp. zo8-og. Sobre a relaçãopro-

4i5. Cf. Antonio Cândida, O düczzr=oe a cidade, op. cit., pp. z4z-43) e também Zeie earzlúeie,

sa/verso e o modo como isso aparece em .A/ímeiú, ver Gerhard Hess, "JI/zmesú. Zu Erich

op. cit., "Prefácio

Auerbachs Geschichte des abendlãndischen Realismus", op. cit, pp. igz-93.

4i6. Antonio Candido, O düczzrxoe a cz'Jade,op. cit., p. zz8. 4i7. id., ibid., p. zzg; cf. Antonio Cândida, "A literatura na evolução de uma comunidade'

4il. Cf. Antonio Candido, O cüscurxo e a c;Jade,op. cit., resp.pp. 210}21b 208-og>n5 e zi i. Antonio Candido tratou da " Garrama/ú;ma" na Farmafãoda /í erafuraórmi/eira,OP' cit., v. 1, p. i88; assim como a menciona em "Letras e idéias no período colonial (exposição

didática)",op.cit.,pp.97-g8. 4iz- Antonio Cândida, O düczzrxoe a c;Jade,op. cit., p. 229.

2 b4 Senso dw coaLescêmim e sentimento da realidade

OP. clt.,P i4i 4i8. Noto, em acréscimopara além do livro em pauta, que em Znícíafâoâ /iieralara órm//eira: op. cit., pp. 38-39,Antonio Cândida destacou a importância do an@gzzn como um elemento de continuidade de Arcádia e Romantismo.

235

a poesia pantagruélica de Bernardo Guimarães,':Pmarcando uma con-

vem sublinhada desde o título e que se realiza através do z/nó#fo,como se

tinuidade entre o Romantismo e o "longo pós-romantismo" que vem até nós. É o próprio Antonio Candido quem o assinala,quando diz:

mdo estivesse fora do lugar.'zz

"Esta atitude radicalmente romântica liberou a poesia e abriu caminho }

para a exacerbaçãoda elipse, o gosto pelo implícito e o oculto, tão presente na literatura do nosso tempo",':' ou seja, exatamente aquilo que foi mostrado e analisado, sempre nas suasformas particulares, nas

"Quatro esperas" donde se reforça o nexo entre O disczzrso e a c;Jade e Tesee antítese:" Com tudo isso em mente, não é descabidaa aproximação com a poesia e a prosa (esta mesma um casoizz/generiçde mescla de poesia e prosa) de Murilo Mendes, estudadaspelo crítico em Ma vazade aula e em .,4educafâopeZa no; e 6' outrase a;ax. No primeiro, Antonio Candido analisa um poema de i94t (simultâneo ao livro de Buzzad, de i94o), cuja ambigüidade

4ig. Antonio Cândida, O d&cz/rso e a cidade,op. cit., pp. 2)7 e 24l; tb. Zn;clarãoâ /ílerafara órm;/eira, op. cit., p. 46. O soneto "Eu vi dos pólos o gigante alado", discutido em O (/bczzrsoe a c;Jade, reaparece na Formarão da /frerafüra ór ;/eira, op. cit., v. z, p. i57) e em "A literatura na evolução de uma comunidade", op. cit., p. i37

Uma vez descobertaa continuidade das análises e problemas, o fio da meada, desenrola-lo leva longe. Como não quero ir até o fim, lembro apenasque o problema romântico encontra expressãoprivilegiada no xonAo, espaço por excelência de criação de outro mundo,

sonho presentetanto na poesia de Murilo como na de Alvares de Azevedo, onde ocupa, a Julgar acertada a interpretação que Ihe dá Antonio Candido, lugar similar ao que se analisa na poesiapantagruélica de Bernardo Guimarães.Nesta, a análiseevidencia o desrecalque,':3 enquanto a análise do "sonho fantástico" de Alvares de

Azevedo

tão fantástico como os duendes e bruxas de Bernardo --

mostra-o como "preso ao inconsciente".424 O poemade Murilo, ademais, receberá o epíteto "pastoral fantástica", situada nos domínios do surrealismo.':s Não obstante respondendo ao desafio que Auer-

bach deixara em suspenso,como disse --, sentimos a realidade, mais precisamente "uma espécie de realidade irreal, mas atuante"; "uma

fascinante realidade além da realidade, e ao mesmo tempo aderente a ela".4zóAqui também, tal como vimos na discussão sobre o romance

420. Antonio Cândida, O dhczzr=oe a cidade, op. cit., pp. z38-39; assim como este passo so-

bre Gracq: " O # ora/ dm .9íriesé um tipo raro de narrativa, onde o indivíduo e a sociedade se desvendam reciprocamente como dois lados da realidade, segundo uma técnica aparen-

temente a mais inadequada possível para sugerir mecanismospolíticos, pois nela reinam

4zz. A expressãoe o termo aparecemno estudo da poesia pantagruélica(cf. Antonio Candido, O cüfcuno e a cidade,op. cit., pp. z38 e 242), mas valem tal e qual para Murilo Mendes.

a alusão, a elipse, a metáfora, gerando um universo de subentendidos e informações tão

-- Não por acaso,portanto, o insólito é destacado tanto em sua poesia como em sua prosa

fragmentárias quanto obscuras.Parece que o intuito é fazer de Amo alguém coextensivo ao país e sugerir a realidade a partir do mistério, como setudo fossealegoria ou símbolo; coma

poética; cf. Antonio Cândida, .Aravazade aüZa,op. cit., pp. 83, 87, gz etc., e Antonio Candido, "Poesia e ficção na autobiografia", op. cit., pp. 57-6o.

se aspessoas,cenas,lugares estivessemmeio dissolvidos num halo magnético do tipo que

4z3. Cf. Antonio Cândida, O cXçczzrsa e a cidade, op- cit., por exemplo, pp. z39 e z43

o Surrealismocultivou"(idem, p- i8g).

4z4.Cf. Antonio Candido,]\?2z ia/a deaula, op- cit., p. 44; ver tambémpp. 38-53;o sonhojá

4zi . Importante lembrar, neste contexto, o artigo "0 romantismo, nosso contemporânea (Resumo da aula inaugural de Antonio Cândida no Departamento de Letras da PontiHcia Universidade Católica do Rio de Janeiro)", de Claudio Bojunga, op. cit. No artigo-resumo,

havia sido destacado na Ãormafâo da/irerafizra ór z'/ez'ra,op- cit., v. z, pp. i6i-6z; cf. também

vamos pontear uma série de temas e problemas que já apareceram neste estudo e que se

O rama/zzümo/zoBrm;/, op. cit., p. 99. A continuidade com o estudo do .44ac.írz a e d',4 nobre rzacavernaé flagrante e deixo-a de lado para não dar a impressão de que almeJOo sistema. Noto apenasque nele pulsam os problemas da mescla dos gêneros e do sonho. Cf. Antonio

entrelaçamno mencionado curso de Antonio Cândida. Assim, encontramos a afirmaçãode

Candido,

que ainda vivemos no período romântico, e um dos traços seusde maior destaquena atualidade é sua negatividade, uma de cujas manifestaçõesé a poesiaanfigúrica, a ser discutida no curso. Sua conclusão seria uma discussãoampla da negatividade(romântica) vista na

pp. io-z2. Ademais, o simbolismo, detectado na poesia pantagruélica, aproxima-se do simbolismo visto em Zola, Aluísio e Gracq, assim como em Alvares de Azevedo.

"A educação pela noite"

(ig8i),

in .4 edrzcafâope/a

noite & o zeros e

aios, op- cit.,

4z5.Cf. Antonio Cândida,.Araxa/ade azzZa, op. cit., pp. 8i-95. Na p. 88, Antonio Cândida

literatura contemporânea, precisamente nos quatro textos que formarão, logo a seguir, as Quatro esperas". Ou seja, o resumo oferece uma articulação por assim dizer epocal para o

aproxima Murilo Mendes de Alvares de Azevedo sob o signo do sonho, validado e valorado

conjunto dos estudos reunidos em O dücurxa e a cidade

4z6. RespectivamenteAntonio Candido, J\zavazade azz/a,op. cit., p. 84, e Znlcíafâoà #reraizzraórm;Ze;ra,op. cit., p. 8i.

com as exceções de Souza Caldas

e Manuel Antânio de Almeida, que são, não obstante e precisamente, precursores.

2 36 Seno dw coaíescêncim e sentimen o da realidade

pelo Romantismo.

237

de Gracq, o sentimento da realidade é tributário da coerénc;a,a des-

queimporta num atopositivo defutura. .4 obra-feita Ligao mundodafantasia

peito do insólito

«ardem ao mundo real, mostrando que sào solidários e interdependentesi':

e do surreal.4z7

O problema da realidadeexpostana obra literária ganha pois

j

t

q

l

nova figuração, em exemplo extremado e fulgurante de m/mean como

Uma solução,portanto, para o dilema da m/meia; não há propriamente

po;Cais,"pois o discurso pantagruélico precisa ter certo poder de con-

.zrealidade na obra literária, e portanto um único realismo, compacto,

vicção pelo avesso, como se estivéssemos recebendo uma mensagem que a seu modo faz sentido, embora não possamos defina-lo nos termos correntes" .428Portanto, a discussão do a/t/:gizrí indica como a literatura

estável e normativo, mas uma abundância de realismos, muito variados,

cria realidades para muito além de uma realidade primeira.4:9 Podemos

Antonio Candido, aceitaramo desafio da leitura rica de Erich Auer-

então ler a mencionada "subversão do discurso" sob o viés das epígrafes acerca da relação do discurso com a cidade e da cópia com a inven-

bach."'

.;. ,l, ..,l;,l,,IP A importância do sonho é realçada,por fim, no último estudo de O disczzrsoe .z c;Jade, "0 poeta itinerante",

resultado da longa ges-

que cobrem um espectro móvel que, indicado inicialmente em Mzmeiíç,

soube manter-se aberto e provocativo para todos aqueles que, como Nesse sentido, vale notar a precisão

e não o pedantismo

da

enunciaçãode Auerbach, que assinala a diferença que faz diferença: "dargei e/7e MzrX://cÃÉezf" indica-nos que não se trata de uma realidade dada de antemão,que a literatura estariaa expor, massim de uma realidade que é expostan'z literatura. Donde noto que o "sentimento da

tação da análise da "Louvação da tarde", de Mário de Andrade. Aqui

realidade", de que tantas vezes fala o crítico brasileiro, é uma espécie de

são destacadosos laços de fatura com o romantismo,430reiterando também em "Fora do esquadro" essenexo importante.43'A análise do poema é uma "descrição crítica" na qual Antonio Candido destaca o problema da realidade na obra de arte literária, compreendendo

equivalente da "dargei e// e MzrX:Z;c,6,te/f" do filólogo judeu-alemão. De fato, dizer o que é a realidade "em si" não é o problema da literatura nem do crítico. Salvo para o crítico materialista, preso ao critério enfático de verdade, donde secompreende a posição de Georg Lukács.

a relação (seria o caso de adjetivar?) de sonho, imaginação, fantasia, realidade, cotidiano. Tudo conclui para o passo seguinte, espécie de conclusão da análise:

43z. Antonio Candido, O d&carxoe a c;dada,op. cit., p. z77. Embora o texto sobre a "Louvação da tarde" só tenha sido publicado em i99o> desde muitos anos Antonio Cândida trabalhava no poema, como se depreende da menção a ele em O esrlzdoaria/ztzcodapoema, op. cit., p. 6: "de

Louvação da tarde" mostra como o sonho-devaneiopromove aluga provbótia do rea! e como nasce dele o sonho con.stmção, que é o processo de que resulta a

obra literária. Esta é soneto,porque deril,a da fantmia; mm é realidade, pot-

Mário analisamos durante meses,em ig6z, o poema 'Louvação da tarde "' (ver também p. z6) edepois, comentando essecurso em entrevista: "]-.] um curso de análise do poema 'Louvação

da tarde' de Mário de Andrade, que acaboutendo muitas conseqüências"(Antonio Candido, "A grande revolução cultural do Brasil" [entrevista], Z). O. Zezmra, ano zo, n? i-z, 200z, p 25).

4z7. Cf. Antonio Candido,2Uaia/a deazz/a,op. cit., p. 85-

O poema,ademais,já aparecerana "Lembrançade Mário de Andrade" (i946), in Brigada Zzgeíra e auras esmrol,op cit., p. zi3; Xormafàoda /zrera/uraóra.sz'/eira, op- cit., v. z, p. 35;e

4z8. Antonio Candido, O disczzrioe a cz'Jade,op. cit., p. z3b que também valeria, creio, para

referido como uma possibilidadede análiseem "Estímulos da criação literária", op. cit., p. 53-

o poema surrealista de Murilo. Esse poder de convicção pelo avessoé, creio, exatamentea

JoaquimAlves de Aguiar, em aula na FPLcn-uspem io Jul. zoom,demonstrou com maestriaa

mesmo movimento que Auerbach destacou em sua análise dos poemas de Baudelaire, cf Baudelaires F7nzrsdü ma/ und dasErhabene", op cit.

433. Se fosse o caso de aproximar o passo citado sobre Mário de Andrade aos desenvolvimen

4zg. Cf. p. ex. Antonio Candido, O discursoe a cidade, OP.cit., p. zz6. O ponto aparece embora muito rapidamente, também no terceiro estudo de "Fora do esquadro", intitulada "Pomo do mal". Cf. Antonio Candido, O cíhcurxoe a cidade, op. cit., p. z56. O mesmo poema

paralelismo entre os estudos anais de Zeie eaaü'lesae O (Xfcürxoe a cidade

tos de Auerbach em ]l#meiü, caberia pensa-lo em relação com o que sediz acercado romance

do século xx, sobretudo a análisede Zo /ÁeZ,zkÁTÁome. Sobre a leitura rica de Auerbach, ver Gerhard Hess, "71#mesü.Zu Erich Auerbachs Geschichte des abendlãndischenRealismus

já tinha sido tratado em "Os primeiros baudelairianos", op- cit., pp. 36-37-

op.cit., pp' l 8ze i87) e Ulrich Schulz-Buschhaus, "AuerbachsMethode", op.cit., p. 59S.Para

43o. Antonio Cândida, O dücarsoe a cidade,op. cit., pp. z6o ss.

usar.uma expressãodo próprio Antonio Candido, diria que há uma "concarenaçãolatente'

43í Como apontou Joaquim Alves de Aguiar(aula, FTLCn-USP,io jul. 200)), encontramos em

entre os seus estudos nas duas primeiras partes de O dLcürao e a cidade(mas não só) e Auer-

"Fora do esquadro" um "roteiro da poesia romântica brasileira, contada pelos seus avessos'

bach. A expressão aparece em Antonio Cândida, O cl2çcursoe a cz'Jade,op. cit., p- igo-

2 38 Sen.sa dw coaLescêmim e sentimento da realidade

z39

Mas então, como compreender que Antonio Candido fale, nos estudos que revela em traço a própria estrutura da sociedade? A pergunta vale a

não viciar o trabalho concreto da análise. Nele podemos ler que "de fato, a ambição do crítico é mostrar como o recado do escritor se cons. trai a partir do mundo, mas gera um mundo novo, cujas leis fazem sen

resposta,porque aponta para a determinação do lugar do crítico, entre

tir melhor a realidade originária".4só Q.ue Antonio

a sociologia e a crítica e história literária, marcando seu espaço crítico na definição de uma certa crítica que, muita vez -- mas não sempre -- é

existência e pertinência dessa "realidade originária",

em mesma medida sociologia, conhecimento da sociedade. E aqui se evidencia, de uma vez por todas, em que medida a acumulação crítica leva adiante; no caso, um passo adiante de Lukács e

foi a possibilidade de uma determinada adjetivação. Oportuna, então, a entrada em cena de Georg Lukács. Em página

Auerbach. Como demostrado no comentário de Roberto Schwarz ao estudo das Memór;m de zzmsargo/zo de m//ú;a, o método crítico de

[ProóZem do reaZismo]de Lukács, há uma anotação importante e reve ladora dos caminhos do crítico que, em depoimento recente, afirmou: "grande parte do que a gente escreve é reminiscência inconsciente do que leu".4s7Vale então se imiscuir pelas leituras de Antonio Candido e

da primeira parte de O düczzrxoe a c;dado,daquela estrutura profunda

)

]

' L.L {

Antonio Candido alcança o resultado daquela estrutura profunda, que

se mostra tanto na forma como na sociedade.Aqui, há um "materialismo" muito próprio, que não é o de Lukács, pois permite ao crítico

Candido mantenha a indica a vertente

materialistasobrea qual funda sua crítica; e o que se procurou indicar

de rosto do exemplar

de Antonio

Candido

de ProóZeme des Rea/&mzzs

aferir, nos limites do possível e do razoável, em que medida pulsa em

brasileiro por-se à salvo das determinações normativas estritas em que o húngaro firmava o pé (outros diriam: atolava). No mesmo movimen-

suacrítica viva uma verve lukacsiana. Reproduzo por inteiro a anotaçãode Antonio Candido no livro de Lukács, apenastraduzindo as

to, oferece resposta ao que, em Auerbach, é visado o tempo inteiro no

citações(copiadas em alemão):

registro das "forças sociais e históricas"; o filólogo está semprepreo' cupado com o nexo amplo, da totalidade (basta lembrar sua diferenciação intencional diante de Spitzer), mas todo o seu trabalho termina em

Comentar.'

(aemzlzáno,

4'. a?zo,

2'. iem.

l g68)

duas frentes: na análise brilhante das obras e no reconhecimento de um

Disto resulta que toda obra de arte precisa mostrar um nexo acabctdo,con.

nexo histórico e social, que embora seja nomeado, evidenciado e destrinchado em sua dimensão profunda, não encontra formulação teórica e programática como em Antonio Candido."'

alusivo em si mesmo, completo, e na verdade um nuca de tal tipo queseu

A esta altura, uma vez transcorrido o percurso e esboçada a arqui-

mo z/nenzoe azia es/rulzzr.ziâo imediatamente

ep/dentes.

i4

que foi dei-

;Desse modo, toda obra de arte signi$cativa cria um 'mundo próprio'. Personagem.s,situações, condução da anão etc. possuem uma qualidcLdeparticular,

xado propositalmente de lado para não dirigir de antemão a leitura e

completamente diversa dcl realidade cotidialta e quenào écomum a nenhuma

tetura d' O dúczzrsoe a cidade,';S posso voltar ao "Prefácio",

outra obra de arte. 434.Va]e o depoimento de ex-a]una; "De acordo com o crítico [Antonio Cândida, lw], Auerbach leva às últimas consequências o método de Spitzer, até chegar a uma metodologia pessoal que realiza a desejada fusão entre o ponto de vista estético e o ponto de vista histórico, entre o enfoque linguístico e o sociológico". Teresa Vara, entrevista em .44agma,n? 7) zool} p. 27'

435. A arquitetânica rigorosa e imaginativa de O discursae a cidade valeria um estudo à parte. O encadeamentodas três partes, assim como dos estudos que compõem cada uma delas, assim como os laços subterrâneos que enlaçam estudos de diferentes partes e, por fim,

os ricos entrelaçamentos subentendidoscom o restanteda obra de Antonio Cândida: tudo isso é presentee passível de rastreamento e análise. Paraalém do que indiquei, Joaquim Alves de Aguiar desenvolveu o ponto em aula na FFLCn-USP em io ]ul. zoom;Flora Süssekind também destacou-o em "A memória como método", op. cit., pp. z49-54-

z4o Seno dm coaíescêmim e sentimento da realidade

436. Antonio Cândida, O dú(urso e a cz'Jade,op- cit., pp. g-io; cf. também aspp. iz3-z4, citadasmais acima, e também p. z38,quando, falando da poesia pantagruélica, formula; "]-.] já convencidos de que não há lógica normal no poema, começamosa aceitar o delírio verbal e a perceber que estamoso universo de um discurso que obedece a regras completamente diversas. As leis do mundo foram subvertidas e nós assistimos à criação de outro, com as suasleis próprias. Mundo nascido da imaginação livre, que leva ao máximo os processosda poesias-.]". Poderia estar falando da poesiade Muri]o, não? 437.Antonio Cândida, aula-depoimento na FFLCU-USP, em z6 jun. 200).

241

(.44m.' D acabamento aparente da obra de arte, sua incomparabitidcLde ctparente com

CLrealidade baseia se precisamente nafundamento do espelhamento artístico da realidade.

A partir disso, é possível aquilatar a proximidade e o distancia mento de Antonio Candido em relação a Lukács. A incorporação da idéia de que a obra de arte cria um outro mundo é contrabalançada

pelo afastamentocom relação à doutrina do reflexo, substituída pela sofisticada dialética que Roberto Schwarz indicou em seu texto sobre

Antonio Candido e que reproduzi mais acima."' O resultado dessa determinam objetivamente o Pigmento de vida que eta con$gura, em um nexo

incorporaçãoe invençãoé que se trata de fato da criação de outro mundo, mas esseoutro mundo criado permite sentir a realidade de

cornetoe bem pToporcionctdo..4 obra de arte precisa espelhar essasdetermil\açõek

modo mais enfático e vivo -- o leitor pode lembrar-se da passagemno

de tat modo que essefragmento de vHa seja conzpreemívele sentido em si e a

começo do ensaio sobre O corzzfo:"Mas nós sabemos que, embora filha do mundo, a obra é um mundo" e, confrontando-a com as transcritas de

.4 obra de arte precba espelhar tocam u determinações essenciais e oqetivm que !

l L

l

partir de si mesmo, de mamira a aparecer como uma totalidade da vida.

i6-i7 438 }

Lukács, tem material ótimo para avaliar todo o problema. E sublinho que tudo isto se soma à discussão anterior acerca da exp#caríon de [exze,

J

O comentário do professor não consta, apenaso encadeamentodo material primário. Mas por meio da leitura do texto e da seleção e montagem

das passagensé possível aferir muito do que vem de Lukács, e de que maneira Antonio Candido incorpora e deforma. A autonomia da obra, destacadano primeiro trecho, possibilita a apreensãoimediata (o grifo é de Lukács) de um nexo, de um entrelaçamento de aspectos, vistos como estrutura e processo; tal apreensão imediata é tributária da qualidade da

fatura artística. O resultado,a obra propriamente dita, é um "mundo novo", "outro mundo", absolutamentepróprio à obra literária e que não se reduz ou confunde com a realidadeprimeira, do mundo em que vivemos, da "realidade cotidiana". Mas. então. a adversativa de Antonio Candido e Lukács: a autonomia é decorrente do espelhamento, do reflexo artístico da realidade. Daí a conclusão,muito importante para a teoria do romance, como já se viu anteriormente na discussãode Roberto Schwarz: como a realidade é infinita e só é espelhada em parte na obra, é

preciso que a parte apareça como totalidade, e esseé o âmago do argumento, pois disto depende o teor e sucesso da própria obra de arte.439

da qual Antonio Candido não abre mão. Fato é que ele, em versão preliminar do ensaio sobre O corrzfo,aproximou-se de certo modo da análise lukacsiana que permite perceber a dimensão social na obra, na sua própria estrutura, no "plano profundo".

É nessa ocasião em

que dá mais espaço a formulações propriamente teóricas a respeito, que podem aqui funcionar como se fossem o comentário vivo do professor

em seu seminário sobre Lukács: eram Qconstatar, no domínio das relações erLtre literaturct e sociedade, que:

t.\] há um vínculo entre CLprodução do texto e a sociedade a quepertence l autor; ÇzÕeste vínculo corLsistebmicamente na possibitidcLde de expri nir os traços desta sociedade batendo do tecto tina Tepresentctçãoespecial La realidade exterior; Ç\b CLO pensarem de "fato"

a "usunto",

os traços da

realidade exteTio se OTganiTamnum sistemcl diferente, compossibilidades combinatórias mais limitada, quedenota a sucodependênciaem relação à rectLidade;Ç4bhá portanto uma defarmaçàocriadora, devida à ten.sãoerLtre o desejode reprodultr e o desejode inventará QS)esta deformaçãodepende m parte da discrepância entre o intuito do autor e a CLtuaçào de foíçw por

438. Anotação e cópia de Antonio Cândida em seu exemplarde Georg Lukács, ProóZeme dei Rea/:smm. Berlim: Aufbau, i955) página de rosto. Exemplar depositado na Biblioteca da FFLcuIJSP.Todos os trechos citados provêm do parágrafo "m. O espelhamento artístico da realidade" do texto "Kunst und objektive Wâhrheit"("Arte

msim dites mai.sfortes do queeLe, que motivam a comtituição de um subsolo debaixo da camada aparente de signifccLdo; qa) tais forem determinantes se

p'andem sobretudo às estrutura mentais dos grupos e classessocial.sQ que

e verdade objetiva"), que faz parte do conjun

to dos escritos de Lukács nos anos i93o Os números após ascitações referem-se à paginação. 439. Antonio Candido, ainda nos anos i94o, discutiu tudo isso em uma série de rodapés acerca de Jorge Amado, a que já âz menção: "Poesia, documento e história", op. cit., pp. 45'6o.

z4z Seno dm coalescêncim e setitimenEO da realidade

44o. OÍpróprio Antonio Cândida marcou posição com relação à teoria do reHexo,que vai desdeb positivismo até uma certa vertente dialética. Ver Antonio Cândida, "Duas vezes'A passagemdo dois ao três"', op. cit., pp. SÍ ss-

243

o autor pertence, e quese caracterizampor um certomodo de ver o mundo:

LamentepoTnão terem compromissodocumentário, mm obedeceremsobíettdo

l7) o elemento individualpuxa

a expressão estética para um lado, enquanto

LfarLtasia --, paradoxo inerente à titeraturcl. Conclui-se que CLcapctcidçtde que

o elemento social puxa eventualmente para outro o signi$cctda profun(b, di-

)s textos possuem de convencerdepende mais da sua organização própria que

versi$cando o texto verticalmente e dando-Lhe uma profundidade que obriga

la referência ao mundo e3çterior,pois estesó ganha vHa na obra literária sejor

a complementar a análise estética pela análise ideológica; (8 ) na medidct em

devidamente reordenado pelcl futura.

que a superfície aparente do texto é a sua organilaçãoformat,

a sua camada

estéticapropriamente dita, elclcomandao trabalho analítico sobrea camada )

]

. L.L

í11:')

Os textos analbcldos aqui, tanto os rea

utu como os não-realistas, suscitam no Leitor uma impressão de verdadeporque antes de serem ou não verossímeis são articuladas de maneira coerenteu'

profunda, que sóse con#gura através dela, mm que possua vela esclarece, de

torna-viagem. \.. À de tal modo queo estudiosoé obrigado a comiderarforma

O que significa, por outras palavras, que são forma literária. constructo

e co/z ez2do como momenfoi día#tz coi de uma co/npree ão

e artifício, autónoma e, não obstante, ligada à sociedade. Para explicar a natureza dessa ligação, só saberia indicar o termo "mediação", um acu

ora/[...].q'

Creio que a síntese final de Antonio Candido é dependente, pois, desse

convívio dúplice com essavertente "marxista" e com o "método estilís-

rado "senso das mediações"."3 Daí uma certa primazia da organização do texto, cuja coerência é o índice de verdade; por causa disto, então, a

tico-sociológico", fundado na ex7#car/onde zexre.Destarte, e voltando,

necessidade da leitura atenta. Não por acaso, nas anotações marginais

o resumoprogramáticoapresentado no "Prefácio"de O düczzrso ea c/Jadeexplicita todo o movimento e evidenciao "meu" argumento: Os [exros gazeabordo nesta pane;ra parra (Memórias de um sargento de

milícias, L'Assommoir, l Malavoglia, O cortiço) sãoemgrau maiorozz

ao texto de Adorno, "Discurso sobre lírica y sociedad", ao que parece mais uma vez tendo em vista um seminário sobre o texto com seusalu. nos, Antonio Candido anotou: "Ressaltar aqui o problema da atitude metodológica: busca do social pela análise imanente".4'4 Creio que o problema da análise imanente leva-nos ao fulcro, que é compreender o

menor tributários de uma concepçãorealista, de ve{ queprocuram reprodultr a realidade. Com este $m inventam enredos inseridas em sociedades existentes, reconttecÍveis por indícios que o leitor é cagar. de conferir com os da

44z Antonio Cândida,O disczzrxo e a cz'dada, op' cit., pp. io-il, a que sesomao seguinte

realid(de histoücamente comprovada. Por isso eles seriam mais verdadeiros

passosobre "Quatro esperas","um ensaioúnico em quatro capítulos": "Alimentadospor

do que os dct segunda parte qopoema "Esperarldo os bárbctros", Qnarrativa

premonições não observações,essestextos [analisados,Lw] se des]igam da realidadedoca mentiria e a dissolvem por meio de uma fantasia livre, criando mundos arbitrários. semloca

A construção da muralha da China, oi rama/zceiO deserto dos tártaros e O litoral das Sortes), gz'edele/am transfigurar a rea/!Jade, deicre e/zdo comportamentos envoltos num certo Rata irreal, em paragem.sinde$nidas.

Mm se evitarmos o ponto de vista cLass$catóriodos manuais obsewaremos algumas aparentes contradições, sinais de que o problema é mais com-

lização histórica nem geográfica precisa, nos quais se infiltram entretanto dramas e angústias de civilizações que conhecemos, no passado e no presente. [-.] Mas, repito, tanto nos textos

assentadosno documento eventual, quanto osque o transfiguram para criar contextos inexistentessãocapazesde comunicar o sentimento da vida e da verdade,porque sãoliterariamente eficazes" (idem, p. i:). Talvez se possa, nesse contexto, compreender a epígrafe anteposta ao

plexo Primeiro, veremos qtle os romames naturatistm podem desLilarpara as

Prefácio", um verso de Montale que poderia servir de mote à tarefa crítica. Ademais, toda

imagem tram$guradorm e o símbolo, apesar dm iate%ões deprograma, como

essamesma discussão fora realizada por Antonio Candido em "A personagem do romance

procuro mostrar sobretudo rios emaios sobre Zela e .4tuísio Alevedo. Procuro

op' cit. que, como disse, remete ao primeiro curso de Antonio Cândida como professor de literatura na usp. O ano era ig6i

mostrar em seguida que os textos da segunda parte são capa les, tanto quanto os

outros, de trammitir um profundo sentimento da vicia; e queaté se poderia arriscar um juízo de aparente imoerência, dizendo quepenetram bem no realjus-

443. Tomo a expressão de Antonio Candido, "Dialética apaixonada", op. cit., p. 93. O caráter de construção da obra literária foi enfatizado por Antonio Cândida em "0 direito à literatura", op. cit., pp. z45-46. 444. Marginália no exemplar de Antonio Candido da obra de T. W Adorno, Àrozasde /zre Falara,op' cit., p. 53' Exemplar da biblioteca de Antonio Cândida, depositado na Biblioteca

44i. Antonio Cândida,"Duas vezes'A passagemdo dois ao três' OP.cit., PP. J5-56. z44 Seno dm coalescêmi

e sen:inerte

da reaÍidçtde

da FPLCm

z45

mencionado "paradoxo inerente à literatura". Pois é dele que se extrai a assertiva de que o sentimento de realidade depende da coerência da

obra, vale dizer, forma literária, que, por seulado, desdeo início fora concebida como desafio da "crítica integrativa'

Vale então retomar a formulação dos anos i94o para o mesmo

[

Disto resulta ainda uma espéciede reabilitação da dimensão essencial

dapozeiú: o que emergedo trabalho crítico é a compreensãode que a$a/zzm/a,inextricavelmentepresentee operante, configura a diverti dadedos realismos."' Por essarazão,veio a exigir aquelaadletivação cuidadosa: a fantasia exata.

(

problema,

J )

ainda no "Prefácio"

de O dúczzrso e a (/Jade

donde se vê

a suaposiçãoextraordinária no interior da obra do crítico. O passo

Há ainda um outro ensaio capital de Antonio Candido, imprescin dível para o andamento desta interpretação, por ser lapidado com arte

parece repetir o já visto, mas, a esta altura do caminho, deve fazer alguma diferença:

maior -- o que, seja dito de passagem,repõe a velha discussãoacerca

Os e aios dapdmeira parte deste livro tentam analisar ctlgum duos da que

chamei de "redução estrutural" , isto é, o processopor cqa intermédio CL reali-

MarcelProust)", ]á é revelador.Em primeiro lugar, sejalembradaa intimidade do crítico com a obra de Proust, construída em décadasde

dade do mundo e do ser se tom.a, na narrativct $ccionat, componente dc uma

convívio amoroso (durante muitos anos, lia Proust todos os dias). Isto

estrutura literária, permitindo qtceesta seja estudada em si mesma, como

Ihe possibilita uma soberaniavaliosa no trato analítico, pois há uma

algo autónomo. O meu propósito éfaler uma crítica integradora, capas de

questão teórica decisiva que é pensada através de um caso modelar, mas

mostrar (não apenas enunciar teoricamente, como é Itábitoà de que maneira

o tratamento é bastante imbricado, donde certa dificuldade em resolver a dimensão teórica despojada do caso analítico em pauta. Mas, nesta altura da argumentação, é possível dimensionar com discernimento o

.L

l t

')

)

/')

a narrativa se con.stituia partir de materiais não literários, manipulados a Fm de se tornarem aspectosde uma organização estética regida pela suu próprias leis, não M da natureza, da sociedade ou do será"

"Redução estrutural" é fórmula do crítico para "mediação", e "crítica integrativa" para "análiseimanente". Assim, almejasolver o problema da relação de interno e externo, do que está dentro do texto, mas for. mula o que está fora. Trata-se da tarefa crítica, o caminho para a com. preensão do paradoxo mencionado. E daí o destaque, sempre recorrente, à coerénc;a,como dimensão, na própria futura, isto é, no próprio texto, na qual essenexo se resolve que a vertente dialética do século xx fixou na idéia de forma literária, não sem dificuldades e tropeços."6

do ensaio como obra de arte --, difícil de abordar e desdobrar pela sua alta concisão e perfeita construção. O título, "Realidade e realismo (via

problema formulado no par "realidade e realismo". Este é o fulcro, que será pensado e desdobrado através de Marcel Proust, um caso exemplar

por ser extremado: situando-se nos limites do problema, sendo mesmo

> um reszz/lado, só pode ganharpelo conhecimentoda realidadeque serviu de baseà sua realidade própria". Veja-se ainda a discussão acerca da autonomia da obra na p. 33. Sobre

a coerência,ver ainda Antonio Candido,.[z'rerafzzra e iaczidade, op. cit., p. z; "Estrutura literária e funçãohistórica", op' cit., pp. r 53e i6í-6z. No importante texto "A personagem do romance", lemos: "No fim de contas, a construção estrutural é o maior responsávelpela

forçae eficáciade um romance" (op. cit., p. 55;ver tambémpp. 74-75passam).A questão da coerência remete à apropriação, por Antonio Cândida, das conquistas do J\bw CHrzcüm

norte-americano,que ele estudavadesdeos anos i94o, conforme relatou em aula-depor 44S Antonio Cândida, O díçcürsoe a cidade,op. cit., p. g; cf. entrevista a L. C. Jackson,op. cit., PP. lz6-z7. 446. Desde a Zormafâo da # erarzzraórmlZeíra, Antonio Candido firmou sua crítica na noção

de coerência da obra, e esseconceito ganhou, na ocasião,estatuto de fundamento. Ver o

subcapítulo"Conceitos" na "Introdução" da obra citada, v. i, p- 37- Ele aparec%então, como elemento regulador e aglutinador, vale dizer, formador, que cabe à crítica aferir. As-

mento na rri.cn-usP,

em z6 jun. zoo3

447' "De fato, judo pode acontecerna vida, mas no romance não, porque ele é estruturado segundo uma certa coerência e se o autor não obedecera esta a obra fica inverossímil. O escritor toma os dados da realidade, submete-os à fantasia e produz algo que, apesar de muita

parecido com a realidade, é outra coisa. O que me interessa não é tanto a relação do texto com a sociedade,é a transformação da sociedadeem texto, devida ao processo de 'redução

sim, forma-se a forma, e voltamos à ideia do texto como resultado. A respeito, ver a p. 34

esEruqral'."Antonio Cândida,em entrevista a L. C. Jackson,op. cit., p. i7o; ver também

da mesma "Introdução": "]-.] a compreensão da obra não prescinde a consideração dos

Antonio Cândida, "Crítica e sociologia (tentativa de esclarecimento)", op. cit., p. i3; "A literatura e a formação do homem", op. cit., p. 8i.

elementosinicialmente não literários. O texto não os anula, ao transâgurá-lose, sendo>

ZA(S Seno d

coalescêncim e sentimento da realidade

247

um excesso,permite vislumbrar o que encerra de característico e pun-

l realidctde se encontre mCLiSem elementos que tra

gente, em todo o seu matiz e nuança; irradia e totaliza."8

Fatos e coisa descrita do que neles mesmos. Eo realismo, estritctmente conde

O ensaiopossui uma alma, um centro de gravitação e força que

l [

o estrutura e Ihe dá sentido: é uma citação de Mzmesú. A estrutura do

texto é relativamentesimples:de início, dois parágrafossobrevoam sinteticamente o problema e a argumentação; há então uma espécie de introdução, que prepara a formulação de Auerbach, seguidapela citação de uma passagemde Mzmeiü. A seguir, um parágrafo de pará-

frase e modulação do tema e problema, e então tudo é localizado no caso Proust, a "via" para pensar a questão (o primeiro parágrafo Sobre {

Proust é uma transição entre a paráfrase e o exemplo, podendo pertencer a qualquer um dos dois momentos do ensaio). Mas, como o problema é pensado através de um caminho, o centro de gravitação, não obstante sua centralidade, faz-se também na modulação exemplar, e disto resulta uma das dificuldades na interpretação do texto.

Os dois primeiros parágrafosdo ensaioformam um bloco compacto, que introduz e antecipa o desenvolvimento:

pendem a aparênci(t dos

Lido como representaçãomimética do mundo, pode não ser o melhor condutor da realidadeun

Verdade, literatura, ficção, verossimilhança e realidade: eis a constela.

çãodo problema. A tarefa: compreender os limites e as confluências. as formas de existência articulada desseselementos. O caminho: a relação de particularidade e generalidade. Se falamos da verdade na literatura.

falamos de verossimilhança e coerência, e seus modos são os equilíbrios de particularidade e generalidade(equilíbrios que constituem a

dimensãoproprJ;menteartística).Toda formulação na qual um dos se desprende do outro acaba, ao fim, em fracasso: é preciso uma

generalidade que mantenha o concreto da particularidade, assimcomo a especificidade que respire a universalidade. É a obra concreta que se faz em meio a esse equilíbrio e desequilíbrio, do qual depende o "sen-

ento da realidade ; e o que a garante é, precisamente,aquela sua formalização estética". Lançando mão sela da descrição, seja da narra-

.4 broca da verdade rla literatura Qverd(üe convencionar dalicçãoõ se norteia fre qüentemertte pelo esforço de con.struir uma vbão coerente e verossímil, que

ção, pois narrar e descrever se complementam enquanto procedimentos composicionais no trabalho do material. Então, se "realismo" é o termo

seja butartte geratpara ir além da particularidade e mutante concretçlpara não se descarnar em abstração. Por isso, é decisiva a maneira pela quatsão

que se convenciona reservar para circunscrever esse nexo de sentido. cabereconhecer sua polissemia latente.

tratados os elementos particulares,

Ou melhor, o trato com a idéia de realismo vai mostrando uma espéciede sedimentação em camadas,cujo registro de superfícieé o caráter documentário, relativo a uma (pretensa?) "representação objetiva", atrelada,em suaobjetividade, ao instantâneo,ao que é (e não

ção ou uma narrativa,

os pormenores que integram umcl descri-

seja da vida interior, sda do quadro onde vivemos.

C)ra, este tipo de enfoque tem uma das suas modalidades principais

rlo realismo, quepara algum é o único e para outros um dos muitos caminhospossíveis. Se considerarmos realismo as modalidades moderam, quese

necessariamenteao que foi, ao que será, ou mesmo ao que poderia ter

=Lejiniramno século xix e vieram até nós, veremos queeLm tendem a umcl

sido e ao que pode ser). É espraiando-sefrente a uma temporalidade mais complexa, portanto, que o "realismo" mergulha em camadasse-

$deLidade documentárict quepriviLegicl a representaçãoobletiva do momento presente da naTTativa. No entctnto, mesmo dentro do rectlismo, os textos de reatar alcance procuram algo mais gerctl, que pode ser a ra=;ãooculta sob a

aparência dos fatos narrados ou dw coisa descrita, e pode sera Leidestes fatos nclseqiLênciado tempo Isso leva a uma conclusãoparcLdo)cat:quetalvez.

448. Flora Süssekindpercebeubem um nexoque liga essepequenotexto sobreProustcom O dücizrKO e a cidade,livro que se abre e se fecha com mençõesa Marcel Proust. Ver F. Süssekind, "A memória como método", op. cit., p. 249; cf. Antonio Cândida, O dbczzrxo e a c;Jade,op. cit., pp. i4 e 277.

z4R Seno

d«s caaiescêncim

e sentimento

da realiza

e

dimentares mais profundas, possibilitando formas de simultaneidade e não-simultaneidade, tal como a analogia da rocha sedimentar possibilita ao geólogo o olhar sincrânico do processo diacrónico, da estrutura e do processo. Portanto, ao realismo usual se acrescenta a possibilidade de um outro realismo, inusual, que se funda na mesma relação de particularidade e universalidade, todavia não mais pensada necessariamente sob

449' Antonio Cândida, "Realidade e realismo (via Marcel Proust)", op. cit., p. iZ5

z49

[

(

}

J

P

l l

L. ')

)

/')

o signo da objetividade (pois agora contingente, ou imaginária); por-

paraa sociedadee a existênciarústicas,que me permitiram falar num

tanto, em um outro modo da relação de particularidade e generalidade.

"realismo rústico"; e para além da superfície de O corf4o, vislumbra-se a

Essemodo é o processo,a suaexistênciano tempo. Incorporando a dimensãotemporal, a transformaçãodos elementosao longo do tempo,

diabética do espontâneo e do dirigido, que dá pulso e teor ao "realismo

embora se possaperder ao primeiro olhar, no âmbito da "fidelidade do. cumentária", ganha-se ao segundo,no "sentimento da realidade"l'Disto sacaAntonio Candido sua conclusão: o problema da realidade na Obra

pelo crítico visava avançar da superfície rumo à "estrutura profunda", que confere generalidade ao dado particular. Na seqüência do ensaio sobre Proust, Antonio Candido discute

literária não depende, no fundo, da aparência, das camadas superficiais da obra e do que ela apresenta, mas da profundidade; profundidade esta

o sentido do pormenor e do detalhe no realismo. Em primeiro lugar,

que se revela e que se abre na confluência de estrutura e processo.É

de" e exerce assim uma "função referencial"'s' --, e a seguir é parte de um nexo de sentido, elemento da "coerência" da obra, exercendo uma

por essarazão que reiterou, mais de uma vez, que o seu problema é o da "redução estrutural", através da qual seria possível equilibrar esses aspectos diferentes. E disto também a segunda formulação da conclusão. que não se deve conceber "realismo" como "representação mimética do

mundo". O que dá lugar a uma explicação: representaçãomimética do mundo entendida como "imitação", "cópia". Entretanto, já vimos que para Antonio Candido, m;meia épo;eiú, donde se conclui que m;mesa é produção da diferença, o que significa, no caso, que há como que uma

utilização também "usual" de mimeiü, que não dá conta da "realidade"

alegórico" do livro. Nos quatro casos,a "redução estrutural" operada

é um elementode verossimilhança "reforça a aparênciade realida-

"função estrutural". É na confluência dessasduas funções que o particular (o detalhe, o pormenor, o objeto, a descrição) ganha direito de existência,pois isso significa que ele passaa desempenhar funções que operam uma certa generalidade: "Portanto, a especificação do pormenor é um dos fatores que constitui o discurso ficcional, estabelecendo nexos sucessivosque vão ancorando a particularidade dos elementos na generalidade

do

significado[.

. .] " .'5 '

Ao mesmotempo em que sintetiza o precedente,formula o proble-

e uma concepção "inusual", que enfatizando a diferença abre o campo

ma do fazer-se do discurso ficcional, vale dizer. da forma da verdade

do processo, da dimensão temporal na qual a estrutura existe e na qual

na literatura, vale dizer, do "sentimento da realidade" propiciado pela

ela se transforma. isto é. difere de si mesma.

obra de ficção. Contudo, falta algo -- e aqui Antonio Candido prepara

Portanto, Antonio Candido está sugerindo ao leitor a passagem da noção "usual" de realismo para a "inusual", e da noção "usual" de m;meia como imitação para a "inusual" de m/mesa como produção da H;+b-."-. 'Y"'

a citação de Auerbach: "Mas a visão realista só se completa graças ao registro das alterações trazidas ao pormenor pelo tempo, que pode ir de algumas horas até um século

e ao introduzir

a duração introduz

a história no cerne da representaçãoda realidade".'s: De fato, se, por

Isto posto, vale ressaltaro que já vimos nas discussõesprecedentes: que o "grande" realismo sempre lançou mão de uma generalidade através do particular, donde críticos como Lukács enfatizarem o "tipo"; essealgo mais geral é o que Antonio Candido explorou nas quatro análises de "0 discurso e a cidade"-, ao mostrar como a estrutura profunda

das obras testemunhae concretiza essageneralidade.Digamos: para além da superfície das Memór;m de zmlarga/zrode m;/ú;a, vislumbramos a operante dialética da malandragem e chegamos a uma "fábula

realista"; para além da superfície de 22siommo;r, vislumbramos a

45o. Antonio Candido, "Realidade e realismo (via Marcel Proust)", op. cit., p. lz6. 45i. Id., ibid.; o mesmo ponto em Antonio Cândida, "A personagem do romance", op cit., p. 79. Ademais, "apesar do esforço do Naturalismo e, a seguir, de escritores como Proust e Joyce, no sentido de reforçar o sentimento da realidade por meio da abundância de pormenores,nunca sechegou nem sechegaráa registrar o dia-a-dia completo de um personagem, o que equivaleria a anular a arte, dissolvendo-a na vida. A elipse é inerente ao ato de narrar, pois graças a ela é possível dar destaque aos fatos necessários à lógica do enredo". Antonio

Cândida, "Ironia e latência", op. cit., pp. z3-z4 45z Antonio Cândida, "Realidade e realismo (via Marcel Proust)", op. cit., p. 126. Vale

degradação do espaço em suas múltiplas, simbólicas e concretas dimensões, chegando a um "realismo simbólico"; para além da super6cie de /

notar que Antonio Candido adota a versão usual de "dargeire/?fe MzrÉ#cÀÁelr"como "re-

Maça og/ía,vislumbramos o nexo estrutural da fala rústica confluindo

çõesbrasileira ("representação da realidade"), mexicana ("representación de la realidad") >

2 Sa Seno dm coaLescêncim e sentimentoáa realidade

presentação da realidade", e não "realidade exposta/apresentada",

no que segue as tradu-

um lado, repetimos, formulando de outro modo, o nexo de estrutura e

Se lembrarmos que "imitação" da realidade é "exposição literária" da realidade,'s' vemos que a exposição da realidade tem como condição aincorporação da temporalidade, do transformar-se ao longo do tempo, ou seja,.do(s) processo(s) no(s) qual(ais) a(s) estrutura(s) ;xiste(m). Aliás, o segredo da interpretação de Dante por Auerbach radica

processo, por outro, Antonio Candido como que parafraseia Auerbach.

que emerge então com toda a força, pois condensae amálgama tudo o que precede e sucede no ensaio: .4 imitação da realidade é a imitação da experiênciasemoriat da vida na terra, uma de cÜas característica principais é sem dúvida possuir uma his)

J

na questão da individualização das figuras: uma individualização J

que

se precisa adjetivar como diabética,pois os indivíduos estão imbrica-

tória, mudar, desenvolver-se; seja qucLLforcl Liberdade que se der à arte dct

dos em uma vida concreta e terrena, mas divina.4sóEsta é a "inversão

Imitado, o artista não tem o direito, na sua obra, de privar a realidade dessa

característica de Dante: os personagens da Z)zvúzaComédia "desdobram

=aracterüttca, que pertence d sua própria essêmta:"

à nossafrente um mundo da vida histórica e terrena, dos feitos, esfor-

L

ços, sentimentos e paixões terrenas, que não poderiam ser oferecidas. O passoé extraído do capítulo sobre Dance em Mzmeiiç, e os leitores do t

em tal riqueza e força, no próprio cenário terreno".4s7 Dance povoa o

livro sabem aquilatar sua posição-chavena arquitetânica da obra e

mundo divino com um mundo tão humano, como o mundo terreno não

do problema. Como não cabeaqui reconstituir essaposição,lembro apenasque o passoé a reformulação, por Auerbach, do entendimento de Hegel acercade Dante nas Z;iões de eifél/ca, que por sua vez re-

pode ser; ele expande "a humanidade terrena no além«.4s8Assim. o rea-

toma asconquistas da interpretação de Schelling.'s' Como se trata, em Mzmeiü, de esmiuçar e variar (no sentido musical) o problema dos realismos, o traço absolutamente decisivo do realismo dantesco é atribuir historicidade enfática ao que é figurado. Essaconquista realista a per-

lismo dantesco permite e realiza "uma experiência da vida imediata e mais forte do que tudo";'59 nos termos de Antonio Candido, algo como

andonar o realismo (éín sentido restrito e "usual") para mergulhar profundamente na realidade.

Se Dance apresenta a individualidade humana em toda a sua complexidade,multiplicidade e riqueza, é porque "seu estilo elevado

cepção da sociedade humana em seu movimento -- liga-o diretamente

consiste precisamente na ordenação dos elementos caracteristicamente

ao grande realismo do século xix. Portanto, Antonio Candido toma

individuais, ocasionalmente terríveis, horríveis, grotescos e cotidianos

]ltna

{ArmBll..;,...

ulxlH EviLlllulc \uv

J.

ABBnrhanl'

\.tl z LUL /ctçxl

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a L/aJ IL\P l/alce \,/LjillL#al \i l/itJ'

em uma dignidade do Juízodivino que supera toda a sublimidade ter-

blema geral da relação de realidade e realismo, pensado no caso através

rena"."' Daí aparecer em uma espécie de ligação imediata e complexa

de Proust, mas que os seus leitores reconhecem difuso e presente ao longo desua obra.

com Baudelaire, que dá ao baixo o estatuto do sublime.4ói

> e norte-americana("representation of reality"). Já assinalei, inclusive mediante a citação

Note-se que há uma confluência capital com o argumento de Antonio Candido: Dance "imita o cotidiano" sem limites; o que toma como sublime, ele o faz por meio do modo como ordena e dá forma,"z

de Kãte Hamburger, a diferença crucial frente a uma versão correra. 453 Auerbach citado por Antonio Candido em "Realidade e realismo(via Marcel Proust)", op. cit., p. iz6. Antonio Candido cita a edição brasileira de ]141meiü,corrigindo a tradução. Aqui vai uma versão que seguemais de perto o original: "Imitação da realidade é imitação

45S.Cf. Auerbach, .4/imeiis, op cit., p. 5i5

4S6.Cf. Auerbach,]16mexü,op- cit., pp. l 89-9o.

da experiência sensívelda vida terrena, vida da qual uma das característicasmaisessenciais

457. Auerbach, 71#mei&, op- cit., p. i9Z.

parece ser sua historicidade, o seu transformar-se e desenvolver-se; por mais liberdade que

458. id., bid.

seconceda ao poeta imitativo na conâguração, essapeculiaridade, que é suaprópria essência, não pode ser subtraída à realidade". Auerbach, ]l#mesiç, op. cit., p. í83.

4$9. Id., ibid., p. r93.

454. Cf.

Erich

Auerbach,

"Entdeckung

Dantes

in der Romantik"

(lgzg),

in GesammeZle

4le#Tdl e ur romanücÃen PÀiZoZog;e, op. cit., pp. i76-83; Erich Auerbach,Z)antea6 Z)lcÁrer der;rc/ücÀe/zMê/f. z?ed., Berlim/Nova York; W: de Gruyter, 200i.

2 SZ Sen.se dw coatescêmim

e sentimento

da realidade

46o.Id.,ibid.,p.i86,cf.p.

z64.

46i. Cf. Auerbach, A/zmeiú, op- cit., p. i38; "Baudelaires /iburs dzr ma/ und das Erhabene OP. clt.

46z. Cf. Auerbach, a4zmeJÚ,OP.cit., P. i77.

z53

o que vale dizer: por.conta daquela unidade e estrutura do todo", que aparece,

na pena de Antonio

Candido,

sob a rubrica

indica que só quando esta aguaaquela se realiza de fato no registro da obra de arte. Assim o argumento:

da coeréncz'z.

Assim, sistematizando o sentido do passo,fala-se de um realismo esp'cífico e através dele se define um traço realista decisivo, situado, desde então, para além das especificidades dos variados realismos. Desse modo.

,4tiás, CLobrctde Proust delineia umclteoria quepressupõenestao trcltamento simultâneo

válido para o.contexto amplo no qual se move o ensaiode Antonio Can. dado,que mobiliza o ganho para uso próprio. Uso este que é, na seqüência de Auerbach, procurar definir a relação de realidade e realismo ("Nin.

guém sabe melhor do que tu, sábio Kublai, que nunca se deve confundir

i

da estrutura

e do processo,

ou,

nos termos

dct presente

são, do pormenor integrcLdo em con$gurações expressiva,

di.scus-

e sua alteração

LOtempo como Lei do signi$cctdo.Resulta um parctdoxo aparente, pois eLe descreve CLmudança incessante dos seres, reLctçõese cais al, mm erLcontra o signi$cctdo nas permanências

no luxo

tempo

que essa mudançct revetct

a cidade com o discurso que a descreve. No entanto, há uma relação entre ambos"4ós),deHlnição esta que se faz através de caso modelar, tal como se

\...À; ver m coisa rLOtempo é vê-tm de modos dil,ursos, em 'patim etapa; portanto, é atingir um maior grau de generalidade, quede$ne clpermanêncict

realiza, a cada passo em Mzhe.fú. Portanto, uma concepção "usual;' de rea-

QeLativaÕda estruturcl sob o processo que a comtitui.

lismo está descarnadaem favor de uma concepção "inusual", situada para além do teor meramente documentário e que possibilita, só ela, o =lsenti. mento da realidade". Nos termos do ensaio em questão, "o resultado é uma visão construída que pode não ser realista no sentido das correntes literárias, mas é real no sentido mais alto, como acontece na obra de Proust".«

singular ganha ceítcl generalidade acima do tempo que o gerou e do qual

A partir daí, está dada a via através da qual se faz o caminho de

volta, mostrando como, na narrativa proustiana, resolve-sea relação entre o discurso e a cidade -- pois a cada vez, como se aprende com Auerbach e, agora, com Antonio Candido, a relação é uma.

Assim, o problema da verossimilhança ganha resposta no grau de

De tcLlforma que o cuo

emerge. Estrutura e processo, estático e dinâmico se unem na síntese de uma visão !ntegrattva

ü

Em primeiro lugar, note-se que o "pormenor integrado em configuraçõesexpressivas"é o que Auerbach evidenciou em Dante e que se realiza de modo acabado nos "realismos" que brotam a partir do século xix. Ele próprio, em suas análises no célebre capítulo final de Mzmelà, trabalhou na mesma direção, e sua interpretação de Proust é bastante si-

convencimento extraordinário da narrativa proustiana, que embora

milar à de Antonio Candido."' Ambos estãoem perfeita sintonia, cada um tratando dos seus autores,compartilhando uma visão integrativa

crie" a realidade (dada a presença atuante dada/zl za, que transfigura

comum e confluindo para a obra de Proust.

"inventar a realidade é melhor, muito melhor"), convencemais do que aquelasnarrativas que buscamo sentimento da realidade exclusi-

Em meio a tudo isso, o problema da totalização é central e, portanto, a sínteseocupa lugar de destaqueno passo citado, pois o que lastreia o sentimento da realidade é muito menos a mera soma dos detalhese pormenores do que a unificação estrutural que os eleva a

vamente mediante a "função referencial"'ós. Como se vê, o ponto de vista do crítico privilegia a "função estrutural"; semabrir mão da ouça,

algo absolutamente novo: a realidade aa obra. A coerénczaé, digamos, 463 Pouco antes de Italo Calvino, Thomas Mann havia formulado, a seu modo, o proble-

ma: "Quando faço de uma coisa uma oração que tem a ver estacoisa com a oração?"

466.Antonio Cândida, "Realidade e realismo (via Marcel Proust)", op. cit., pp. iz5 e iz8

Cito apenas porque o caso é dado por Anatol Rosenfeld em "Literatura e personagem

sublinhoque tal interpretação é praticatnente uma paráfrase da interpretação de Dance por

seutexto no volume conjunto com Antonio Candido, ,aperTO'zage«? de/cfâo, op cit., p. zo, rodapé

Auerbach em ,44zmeiú.Aproximando Pedro Nave de Proust, Antonio Cândida também tocou

e

no mesmo ponto, cf. "Poesia e ficção na autobiograâa", op- cit., p. 63: "Como em Proust, a fuga 464. Antonio Cândida, "Realidade e realismo (via Marcel Proust)", op. cit., P. iZ5.

Elotempo é compensadapela permanência das estruturas e a recorrência dos detalhes [-.]"

465.Relembroum passocitado anteriormente,com relaçãoa Zela: "Apesardo intuito cl'e/z-

467. Cf. Auerbach, 71/zmelü,op. cit., PP. 5o3-o4; cf. também Auerbach, "Marcel Proust:

rz#co,ele comunica o sensoda realidade menos pelo discurso referencial do que pela interaçãodeste nível com o metafórico [-.]."

Z S4 Seno dm coatescânc e sentimento da realidade

Der Roman der verlorenen

Zeit" (igz5), in Geiamme/ e 4ze#aàlÍe zir ramanücÀe/z Pál'/oZogfe:

OP.cit.,PP. z96-3oo.

z55

índice da rola/fÍafão. Como venho destacandoa continuidade entre os diversos textos de Antonio Candido, vale citar nesta altura seu texto

abandona, por assim dizer, a "função referencial" em favor da "função

sobre "A personagem do romance", do curso de lg6i (coetâneo, por

denciando como os sentidos que vão emergindo das memórias do poeta,

tanto, daquele texto de -Z,lzera/urae xoczedadeno qual apresentava o seu

por conta de certa "auto-referência", constroem seu sentido em função

programa crítico através de Auerbach) :

da estrutura, que no caso é o modo como as palavras são encadeadas e

estrutural". Antonio Candido mostra isto com muita propriedade, evi-

semantizadas.Portanto, Antonio Candido, lendo Murilo Mandes, firAssim, a verossimiLhançct proprictmente dita

que depende em princípio dcl

possibilidade de compavaío mundo do romancecom o mundo real (acção }

]

f':') ''7)

\g;üaXa vidas acaba depertdertdoda organização estética do material, que apenm gTaÇma eLctse torna ptenamertte verossímil. Conclui-se, no plano eTí-

a

ma os pés na "função estrutural", como a dimensão por excelência da

construção do sentido (daí ter falado, em passo supracitado, da "Ze/ do significado"). Assim, se em Proust assinalou como, através da mudan-

Lico, queo wpecto mais importante pata o estudodo romanceé o queresuttct

ça, revela-sea permanência,em Murilo a transfiguração por meio da recordação e a imaginação funcionam como reveladoras do mundo,

da análise da sua composição, não dclsua comparação com o mundo. Mesmo

pois reconstroem, em palavra e texto, os sentidos que haviam sido des-

que Q matéria nctrradcl sela cópia $el da realidade, eLa só parecerá tal na medida em quefor organizada numa estrutura coerente"'

feitos no rumo do insólito.

Dada a importância desseprocedimento totalizante, é evidente como

Nesse sentido, os três pequenos estudos sobre Murilo Mendes (que

formam sistema'7t)apontam para o mesmo lugar em que Antonio Candido situa João Guimarães Rosa:

todo o supérfluo,na narrativa (assimcomo no drama, no poemaou nos gêneros misturados), perde direito de existência, sendo tarefa do escritor o "descarte do acessório".469

Se, agora, voltarmos por um instante para o início de "Realidade e realismo (via Proust)", caberia perguntar o seguinte: não descarna o

discurso, ocasionalmente, em abstração?Antonio Candido também a formulou e respondeu-a novamente através de um autor de sua maior

tornou-se o maior $ccionistct dct língua portuguesa em nosso tempo, mos trarão como é possível superar o recttbmo para intemi$car o senso do Tecto; como é possível entrar pelo faxLt&tico e comunicar o mais Legítimo sentimento

do verdade;ro[...].47z B

A prosa poética de Murilo Mendes em ,4 /Jade do serrote é pensada

O caso de Murilo, por ser uma prosa que é poesia (vale também para Guimarães Rosa),"; potencializa a cada palavra a relação da semelhança e dessemelhança com o mundo real: Murilo vai desfazendo os nexos

no mesmo registro operado no ensaio sobre Proust: uma escrita que

usuais que ligam o discurso ao mundo, mas constrói um mundo com os

predileção,

Murilo

Mendes.470

nexos que estabelece entre as palavras: 468. Antonio Cândida, "A personagem do romance", op. cit., p. 75. O leitor talvez se lem. bre de trecho citado anteriormente, em que se falava: "não é a representaçãodos dados concretos particulares que produz na acção o senso da realidade; mas sim a sugestãode uma certa generalidade.-' 46g. Antonio Cândida, "Realidade e rea]ismo (via Marce] Proust)", op. cit., p. l z6, como se

viu, cumprindo uma exigência lukacsiana.

47i' Refiro-mea Antonio Cândida,"0 mundodesfeitoe refeito" (i99z), in Recortes, op cit. pp. 3o-34; ao capítulo sobre Muri]o Mendes em ]Ua la/a de azz/a,op. cit., pp. 8i-95, e aa parágrafo dedicado a Murilo em "Poesia e ficção na autobiografia", op- cit., pp. 57-6r. Já citei anteriormente o passosobre Murilo na Znzc;ardo.i #ierafura óraiiZeir.z.

47o- Ademais, Murilo Mendes ocupa um papel importante na arquitetânica das correlações dasobras de Antonio Candido: é que, como epígrafe(tomada de "As ruínas de Selinunte")

47z-Antonio Cândida, "A nova narrativa", op. cit., p. zo7, que se liga a discussãode Gui

do estudo sobre Conrad em nele e anrl2eie,que é o centro de gravidade do ]ivro, ele reitera essaligação importante entre os ]ivros de ig64 e 1993,talvez osdois livros mais importantes

473- Bastaouvir a gravação de trecho de Gra/zdeferrão.-Fere(/mpor Antonio Cândida em

de Antonio Candido. Ora, o dístico em epígrafe e título em nele e a rúeie anuncia claramente o tema desdobrado nas "Quatro esperas" em O d&czzrTO e a cidade.

2 S6 Seno d

coalescêncim e senlimenta da fealdade

marães Rosa em "A personagem do romance", op. cit., pp. 77-78. João Guimarães

Rosa,

7 epúódz oi de Grande Jarrão.. verei

Z)al,í .4rrzkzzcc/7r., Joiá716ndZzh. cn, sem indicações(Coleção

/zm vo ei de ,4/zionlo Candzcía.

Ler e Ouvir,

l)-

z57

C)mando da experiência raciortaLiladafoi desfeito, redu$do a impressõe.

) msunto perde a soberanLcte parece produto da escrita, tornando caduca m

fugidia

.iscussõessobre os critérios ncLciortaListu tradicionais. Com efeito, eLeparece

incompleta, nascidas da percepção embrionária do menino pequeno.

Mas a seguirfoi

[1. D'

refeito, pela palavra, tratada como se sobre eta, não sobre q

realid(üe, repommse o signi$cado profundo. \..l\ Um discurso como este ga-

Liler que a presençamimética dct terra e do homem deve ser dissolvida na autonomia relativa do di.scursoparcachegar à categoria de universalidade'nb

rante e m mesmo tempo perturba o rlexo com o mundo. M©, milagrosamenu,

a perturbação torna o nexo mais signifcativo, porque ao destacctro discurso dá maior expressividade CLO mundoKn~

Sem dúvida alguma, um acontecimento notável na história da literatura brasileira; tanto mais quando se faz em uma espécie de superposição do

A essaaltura, não há dúvida que estamosno centro de uma teoria da

discurso com a cidade. Por outras palavras, temos uma mzmeiü que é puramentepozeiiç, alguma coisa como uma fantasia exala.

m/meia, e que portanto os esforços de Antonio Candido alinham-se à empreitada de Auerbach. Ele desenvolve o mesmo nexo de problemas, oferecendo uma contribuição muito própria e valiosa. Já reiterei como.

A mesmafantasia exala oferece oportunidade para amarrar um tema

para o crítico, m;meiZçépo;esü. Ele desfibrou esseproblema em Jogo Guimarães Rosa; em uma bela página de seu resumo, com relaçãoa Grande ier ão.- percam. afirma:

invenção,a situaçãode maturidadena qual aquilo que foi tomado de outrem é reconfigurado criativamente em uma outra situação e uso Em um fragmento republicado recentemente,ao que parece do final

serpenteante ao longo deste estudo, o problema da influência e da

dos anos íg6o, Antonio Candido ofereceu indicações sugestivas para uma linguagem art$cia] e perfeita, ondem diversa camada da Línguase

pensar a questão, com uma dimensão auto-reflexiva latente que gosta-

combinam segundo um critério rigoroso de invenção, de maneira a produ+r

ria de explorar.47v

um texto 07üenão sesabese a realidade s cita o discltrso, ou se o decurso titui uma realidade q15

O argumento é simples; afirmando que igzz talvez seja a única ruptura de pesona literatura brasileira, Antonio Candido procura mos

i

arar como nossa literatura adentra em um "estado decisivo", caracteri-

Vemos aqui, em um texto contemporâneo a O düczzrTO e a c;Jade,os mesmostemas e problemas, donde se percebe com clareza como a constelação comporta muito mais do que simplesmente aquilo que se

zado pelo fato de que, desde então, a produção literária pode sustentarse basicamente referindo-se a si mesma (anoto de passagem a similitude

encontra entre as duas capas do livro. Assim como Mzmeiú se abre para suaslacunas, o livro do crítico brasileiro, variando o problema

com o argumento de Ernst Robert Curtius quando falava em «Z.r. arzzrSWTrem"); seprocura referências exteriores, elas são de tal modo reconfiguradas que adquirem nova cidadania: "A partir de lg22, encontramos

da realidade expostana obra literária, abre-separa um sem-fim de

cadavez mais escritoresque não apenasfiltram com originalidade as

possibilidades. Ademais, se, por um lado, estamos no âmago da questão de realis-

mo e realidade, estamostambém. com GuimarãesRosa.no fulcro de um acontecimentona história literária brasileira, que, com ele, atinge uma realizaçãode certo modo paralela a de Machado de Assis e seu "instinto de nacionalidade". Embora trate do sertão e do jagunço,

476. Idem, ibidem. Cf. também Antonio Cândida, "Jagunços mineiros de Cláudio a Gui marãesRosa", op. cit., PP. i68 ss., onde reencontramos o mencionado "universalismo par ticularista

477.Anronio Candidq parte do artigo "Movimento geral da literatura brasileira", repu blicado em Antonio Cândida, Zexzaade z)z/eme/zfão, op' cit., pp. íi7-zo; a seguir seguirei de peito os desenvolvimentos dessaspáginas, modelando-o para a questão em foco; as "citações não indicadas provem desse texto (a mesma idéia já estava presente no rodapé

Poetasmenoresde hoje

in", de zi maio i944, republicado em Z,z'rerarurae ioczidade. n? 6

i-oz, P' z95)- A questão da "influência", além da referência já indicada, pode ser bem 474. Antonio Candido, "0 mundo desfeito e refeito", op. cit., pp. 3z-33 475.Antonío Cândida, /níclafão à #feralura órmzZezra, op. cit., p. 94.

z S%Seno dm coalescênciw e sentimento da realidade

aquilatadano estudo de Antonio Cândida acercad ' "Os primeiros baudelairianos", op. cit. PP' z3-z$, z6 e 3z.Além disso, tratou do tema na entrevista a L. C. Jackson, op. cit., p. i73.

z59

influências externas, mas se formam, nas coisas essenciais, a partir de antecessores brasileiros".

avaliar quanto de Auerbach andarácirculando na crítica e história lide.

Esta a tese central, que o crítico desdobra a

riria de Antonio Cândida.

seguir em alguns casos significativos, percorrendo criadores-chave do

n:

para os mais antigos era sempre importante nos referirmos a influências externas que, mesmo se filtradas e remodeladas, permaneciam indispensáveis para um entendimento adequado de suas obras.

,K.

bastante sabida a importância que o crítico dá ao processo de

modernismo para cá. O percurso vai mostrando como, cada vez mais. essesautores baseiam-se na tradição de nossa literatura e como podemos compreender suascriações referindo-nos a essatradição; enquanto

Esse processo de maturação e de auto-referência, vê-se, nada mais é do que a verdadeira consolidação do sistema literário, que fora anunciada por Machado de Assis por volta da virada para a década de

i88o e, como se viu, era o ponto de fuga da Formarão da # eralzzraóras;/eira. Por conta desseprocesso,há uma transformação significativa no modo como os autores mais recentes podem relacionar-se com as correntes e tradições que, a partir de fora, repercutem de algum modo por aqui:

ação intelectual, e mais de um leitor já sublinhou o quanto seus textos dialogam com a tradição de interpretação dos seus objetos, aderindo juízos, ponderando conclusões, deslocando ênfases, mas sempre a

incorporando de algum modo o que o precede, como a abrir caminho respeitosamas decididamente, para o que pretende formular. Isto vale. é claro, não apenaspara a linhagem ilustre dos críticos e historiadores brasileiros, com a qual teve o cuidado de iniciar-se na vida acadêmica na ocasiãoda tesesobre Sílvio Romero; vale também para os inúmeros autores estrangeiros que sempr: cultivou e que orientam desde sempre

sua atividade crítica."8 Mas foi precisamenteuma fantasia exala que Ihe permitiu, no convívio com todos, filtrar e constituir sua craveira. Nesse sentido, todo este estudo alinha-se com aquela formulação ante-

rior de uma "literatura comparada livre", "preocupada menos com a influência verificável do que com a ocorrência de temas e processos nos

diferentes espaçosculturais" Como são mais autónomos ejá encontram na c«LouraLocal uma continuidade ponderável de experiência

e soluções fecundas, podem tratar

fontes estran-

geira sem a Ítucinação paralisadora de outrora e explora-las com maior penetração,tramformando-as em substânciaprópria com uma eficácia que, no puscLdo, ercl excepcional, mesmo nos altos talentos.

É essamesmaidéia que, mencionada anteriormente, recebera o nome de invenção". O resultado é que o contado e a incorporação de referências

estrangeiras passapor uma digestão tão poderosa, que fica difícil reconhecer origens, empréstimos e remodelagens e distinguir entre o que veio de lá ou foi restado aqui. Na verdade, essamesmaquestãotorna-se quaseobsoleta, pois reformulação, empréstimo ou influência, sehouver, contam na forma do resultado.

Certa feita, ao prefaciar a reedição de uma obra de Roger Bastide Antonio Candido referiu-se a "uma acuidade de escrita que procurava unir precisão e fantasia","' como a desvelar um aspecto de sua própria prosa. A experiência de leitura de seus vários escritos oferece a seus leitores a chance de averiguar, pela última vez, sua proximidade a Erich Auerbach. Vamos deles já destacaram a prosa límpida e perfeitamente ajustada, de caimento preciso, que adentra os domínios da prosa artística como que a provocar aquela velha disputa, se o ensaio é, ou não arte. Auerbach, a seu tempo, ponderou enfaticamente a proximidade de trabalho crítico, como dependente de uma intuição individual, e obra de arte, conjugando labor e liberdade.

É evidente que esseraciocínio, elaborado por Antonio Cândida para caracterizar o processo daquela estrutura histórica já destacada,

478. Creio que da obra crítica de Antonio Cândida também se pode dizer que cumpre, a seumodo,

possui um traço auto-referenteque exige que se o volte para a pró-

de primeira ordem, inHuenciada, não por modelos estrangeiros imediatos, mas por exemplos

pria obra do crítico, cujas reformulações, empréstimos e influências são variadas, mas sempre de tal forma digeridas, que resultaram em algo

nacionais anteriores. isso signiâca o estabelecimentodo que se poderia chamar um pouco meca-

muito próprio. Parafraseandoele próprio, e mirando o casomais destacado neste estudo, só com boa lente e um micrótomo afiado poderemos z6o Sensodm coalescêncim e sentimento da reaiMade

um estágio fundamental na sup'r'ção da dependência", a saber, "a capacidadede produzir obras

nicamenteda causalidadeinterna, que torna inclusive mais fecundos os empréstimos tomados às outras culturas". Antonio Cândida, "Literatura e subdesenvolvimento", op. cit., p. i53-

479-Antonio Cândida, "Prefácio" a Reger Bastide, Roera do .Braíz/,op. cit., p. rz; cf. também

p' t3' Ver aindaAntonio Cândida,"A literatura e a formaçãodo homem", op. cit., p. 8i

z6i

Jq.

Talvez tenha sido por essarazão que situei esteestudo intendo.

Parte ni

nalmente em uma paragem similar ao "limiar fantástico" de que falava Antonio Candido ao tratar de Buzzati, "zona um pouco mais recuada". testando assim a possibilidade daquele teor de realidade, daquele senti.

EXTRAPROGRAMA: FILOLOGIA E SOCIOLOGIA

mento de realidade que brota para além da "simples" imitação do real e [.

no qual percebemos com toda a força em que medida m/meia époleiü. J

/

z6z Seno dm coatescêKcime sentimento da realidade

a

il.t.' Erich Samuel [lsrael] Auerbach (i8gz-i957) iniciou-se nos estudos literários com uma tese de doutorado sobre a novela nos inícios da Renascença !ur Technik

deT FTührenaissctrtceno'veLle

in Italien

urtd Frankreich

\Sobre Q téc-

/lira da /zoveZanoi üú/oi da Re/z ce/zfana /ráZza e /zaXranfa], defendida e publicada em lg21 Na "Introdução" Auerbach delineia um programa crítico-analítico que compreende a obra de arte literária imersa em sua condição histórica e social. Assim a formulação indicativa, embora algo genérica, com que abre o estudo: Podemosdizer de toda obra de arte que eLaé determinada essenci(temente por rês falares: pela época de suei origem, pelo Local e pela peculiaridctde de seu

voador.Isso vale em maior medida para cl na'peLcl, pois enquantona tragédia 'u ncl grande epopeia é um povo quefala, para com isso questionar deus ou o destino \.. À, na novela o sujeito ésempre a sociedade, e com isso o objeto opor exceancz

a agzzeZa jorna dé mzzndana#dade gaze denomüamoi cuZrara.[...]

;eu pressuposto é um círculo de seres humanos circunscrito atente a um extc'ior, que obteve uma determinada posição na vida terrena e tem interesse em

:onhecê-la e comiderá-La criticamente. Assim, CL novela está sempre em meio zo tempo e em meio ao lugar; eta é um pedaço de história \...À.

É de notar que há, por detrás da aparência simplificada da equação dos

três favores,uma reflexão que procura contrabalançar objetividade e subjetividade, exterioridade e dimensão interna na obra. Não se trata com efeito, de atribuir todo o peso da obra à subjetividade criadora de f. E. Auerbach, Zur Zecérz;éder /HÁrepzaúxa/zcenope/Ze úz/íaZze/zü/zd/}a/z&eicú. zt ed. rev.. Heidel berg: C. Winter, i97í(i:

ed. ]g21), p. i; cf. Auerbach, ]níroduç@ aai eirzdoi /z' er.í/üa. São Paulo:

Cultrix, i97o, P-3i.

26j

um gênio ou personalidade,nem por outro lado de defini-la em um pa

passa a ser compreender as suas transformações, que serão atribuídas

ralelogramo cujas forças seriam meio e momento. Compreender a Obra

por Auerbach a diferentes situaçõeshistóricas.s O desenvolvimento

significa ser capaz de captar essatensão de forças que se configura entre

E':

cidade da forma que se busca compreender, a novela. O estudo procura investigar as origens dessaforma um problema que põe em questão um outro, presente subterraneamente e nunca nomeado, a saber, a relação de p'+

, L:t.p

da novela é compreendido como um processo de transformação social

uma subjetividade e a objetividade do mundo na qual ela existe e que em alguma medida também a modela. E a isso se acrescentaa especini

novela e romance --, que é caracterizada logo de início em diferenciação às formas da tragédia e epopéia. De fato, a própria definição

da novela ]á

é realizada através de um procedimento de historicização, pois ela é vista

como uma forma literária que tem como pressupostouma situaçãohistórica específica. Daí o passo seguinte, que circunscreve o problema: a forma interna e ncterna da novela é uma criação nova e, para dizer rapidamente, uma criação nova da Renmcença. Tornar-se con.scientede sua própria pessoa;ver-se em uma existência terrena, que exige ser alcançada e dominada: esta é a mpir%ão decisiva da Renuce?tça.Dela origina-se a sociedade cultivada" e, ao mesmo tempo, CL novela:

A novela é compreendida como um produto histórico, originada de uma situação histórica e social muito particular, que se condensa na sua forma.

A novela como forma dá notícia de uma forma social específica; Auerbach toma como pressuposto a análise de Jacob Burckhardt (autor cuja

importância para sua obra não pode ser subestimada) em .d czzZrzzra da Ren ce/zfana /rá/ia, na qual define um tipo próprio de sociabilidade em pequenos grupos, exatamente aquilo que encontrará expressão na novela de Boccaccio ("0 enquadramento do Z)ecamerãodeve ser compreendido

atravésdo conceito de forma social";). Essa situação possibilitou a cristalização do gênero, ou seja, a

transformação de narrativas curtas, que existiam anteriormente, na forma novela.' Uma vez consolidada na obra de Boccaccio,o problema

-- as mudanças da sociedade e das formas de sociabilidade renascentistas

trazem consigo transformações na novela. A tese desenvolve um duplo andamento: por um lado as transforJ

maçõesda forma novela na Itália, apóso .Decamerão, por outro, seu desenvolvimento na França, uma vez que ambos se enter-relacionam. pois Importantes realizações da novela francesa são influenciadas pela novela italiana. Ao final do processo examinado, no século xv, a forma novela perde o ímpeto de seu apogeu na Itália, pois seu lastro social se

transforma,' sendo que, no que diz respeito à França, seus desenvolvimentos desernbocarãoem Philippe de Commynes e François Rabelais, já para além da forma novela propriamente dita. Grosso modo, a tese compõe-se de três capítulos: o primeiro é filo-

lógico-sociológico, o segundoeminentementesociológico e o terceiro eminentemente filológico. O primeiro é filológico-sociológico porque toma uma categoria da análise literária, o enquadramento da narrativa. e a modela a partir de uma situação históricos-social; o enquadramento na novela, desenvolve-se de modo completamente diferente, ao longo do tempo e do espaço,por conta de fatores histórico-sociais. Assim. na

novela italiana, e sobretudo no -Decamerâo, seu objeto maior, o enquadramento deriva do processo social, nomeadamente a formação de uma forma de sociabilidade específica em um grupo caracterizado pela distinção, pelo nascimento nobre e que procura diversão elegante«O que dá lastro a essaforma artística é "a força da forma social" 7 decorrente de uma situação histórica na qual os possíveis elementos de amálgama

Í. "0 que há de comum nestes,assimcomo em meus outros trabalhos, é o esforço em chegar a uma tipologia histórica, na qual o intento não é tanto esclarecer em geral a pecu liaridade dos fenómenos, mas sim as condições de seu originar-se e a direção de seusefei tos." Erich

z. Id., ibid., p. z; "sociedadecultivada" é expressãoque provêm deJ. Burckhardt.

3.Id., bid., PP.7-84. "Narrativas curtas sempre existiram; uma sociedade com normas vinculantes não existia

Auerbach,

Hzer C/nrerxzzcázzngen{ur Ceifa;Gare der.#a/zÍÓ'súcÁen .Bz'Z2u/zg.Berna;

Francke, igií, p' 7' A Formarão da árerallzraóraiz/eira estámuito próxima dessatipologia histórica, pois a investigação do processo de formação da ]iteratura brasileira é concebida como compreensãode um originar-se e de seusefeitos, e nessemovimento analítico resol. ve-se, claro está, o problema da peculiaridade dos fenómenos.

até o início do século xlv." Auerbach. ZzzrHera í# der.FPÜÁre/zaúsanceno e//e znlfaZz'e/z and

Fran,trezcÁ, op.cit., p. 2 66 Exuaprograma:

$!oíogia e sociologia

6. Cf. Auerbach, Zur ZécÁ/zll der /;líüre/zaíssa/za/za e/Zezrz/ía/zen u/zdFrmlrezcÁ, op. cit., p. 66.

7.Id.,ibid.,p. 7

z67

coletivo, tais como a família, a religião, o Estadoetc. encontravam-se

n:

r:

K

parativismo contrastivo aguados dois lados: destacando a caracterís rica de que se partiu e evidenciando a diferença do outro texto. Esse

enfraquecidos. Já na França o processo transcorreu de modo diverso. Se a Itália caracterizou-se por uma passagembrusca da Idade Média para a Renascença,e isso significou (pois Auerbach seguea interpreta-

. é desenvolvido incessantemente,resultando em uma trama analítica

ção da Renascença italiana por Burckhardt) a criação da sociabilidade

(e narrativa) densa, pois os diversos passos analíticos vão se acumu

como uma espéciede jogo, na França a transição nada teve de abrupto, transcorrendo gradualmente e deixando resquícios medievais; esseprocessogradual faz-se sob o signo da nação e é disto que deriva o enquadramento da novela francesa, que seprende ao ambiente doméstico, ao

movimento de análise denominado "consideração histórico-formal"8

i

lando e se sobrepondo, de sorte que, ao final, emerge uma construção interpretativa um resultado que, ocasionalmente, chega até mesmo

a uma tipologia.9 Os exemplossão inúmeros e reconstitui-los signifi cada reconstituir todo o livro e toda a argumentação.Lembro, apenas

interior. Desenvolvendo a distinção de enquadramento de sociabilidade

ilustrativamente, como Boccaccio é comparado ao MoveZ#rzo, aos fran

e enquadramento doméstico e fazendo-os caracterizar a novela italiana

meses,aos epígonos italianos, aproximado

de Cavalcanti e Dante. Nesse

e francesa, respectivamente (com a exceção das Cear Nou e//ei Houve/-

amplo e variado movimento, delineia-se um quadro de nexos e irradia-

Zei,italianizadas), Auerbach âncora sua análisenos fundamentos sociais.

ções, aproximações e afastamentos, similitudes

em desenvolvimentos históricos e sociais específicos, que repercutem e modelam a forma literária.

o trabalho de análise, tal como o compreende Auerbach, e isso perpassa

O segundo capítulo é eminentemente sociológico porque discute a posição da mulher e os equilíbrios e desequilíbrios de poder nas relaçõesentre os sexos. Tal discussãoé de fato a apresentação,no material literário, de um processo histórico-social, pautado na sua transformação no tempo (período que vai de Boccaccio ao século xv) e espaço (Itália e França). Destarte, a mulher, que em Boccaccio é quem fala e domina, deixa de sê-lo na novelística italiana posterior, assim como na francesa. A posição da mulher surge como elemento revelador e estruturante da

livro, e funciona ademaiscomo um elemento articulador da trama nar-

forma da novela, e as transformações e nuances dessaposição indicam o processo de transformação histórica da forma literária. O passo subseqüente, nas conclusões do segundo capítulo, é relacio-

nar as duas vertentes: o enquadramento social corresponde ao "triunfo

e diferenciações. Este é

e caracterizao conjunto de seusescritos,da teseinicial até seu último rativa dos textos.io O tNAe\:ixo üe Zur Technik der FrilhrenaissancenoveLLe in ItaLien znd FranJ:rezcà é alcançado nessa espécie de simbiose de filologia

e

8. id., bid., P.65. g' "0 ponto de partida escolhido para a obtenção de uma tipologia da 'novela dos inícios da Renascença' em contraposição a Boccaccio estão os epígonos italianos e as QuzrzÍe JoWes de .A/arl age

já era aqui essencialmente

sociológico."

Fritz

Schalk,

"Vorwort",

in E

Auerbach,Zur Hera/zz'É der FMÃrenaísianfenove//e zlz/jazz'e/z und FranArez cÁ,op. cit., p. vi. O procedimento de Auerbach é recorrenEemenLecumulativo (cf. Auerbach, "Figurative Text rllustrating Certain Passages of Dance 's Commedla" (i946) in Geianzme/fe 4iç$=dre {ur ro

das mulheres", ao passo que o enfraquecimento daquele enquadramen-

manúcÀenPÁz/o/agia.Berna/Munique: Francke, ig67, p. ioi)

to narrativo corresponde ao enfraquecimento do predomínio feminino, processo que culmina na novela francesa,caracterizada pelo enquadramento no ambiente doméstico e pelo papel subordinado da mulher. O terceiro e último capítulo trata da composição das novelas, evi-

série de casos,ocorrências e variações,em um comparativismo minucioso e estruturado, de

denciando comparativamente as transformaçõestemáticas e narrativas nas principais obras do período. O procedimento comparatista é

ele vai acumulando uma

sorte que a uma certa altura emerge uma construção analítica. Isto se soma ao procedimen to, já indicado, do ",4marÍ'

ro. Do modo mais cabalem ,l/zmeair, onde sepode notar como esseprocedimento por assim dizer micrológico se converte em estrutura totalizadora. Mas, como disse, é característico de toda a obra e assumefeições várias. De qualquer maneira, traça-sede "contrapor, com a finalidade de perceber com mais precisão o que é similar e o que é diferente". Auerbach:

estruturante na análise e característico em Auerbach. Cada passoda

Literatursprache und PubLikum in deí lateinbchen Spatantike urLdim MitteLaLter. Betna-. V\an-

investigação e do argumento é lastreado na comparação:define-se uma determinada característica de uma determinada obra; a seguir, contra-

Língua et Trcüitio. Geschicltteder Sprachwissemcluzftundder neüeren PhiLoLogien.'T\b\ gen'. G.

põe-se-lheoutra, mostrando em que aspectosse diferenciam. O comZ6%Extraprograma: jiloíogia e sociologia

cke, ig$8, p. í6g; cf. U. Schulz-Buschhaus,"Auerbachs Methode", in Richard Baum et al Narr, r994, pp. 6oi-6oz, 6o4.

z69

sociologia: mostrar como a novela sofre uma transformação que é essencialmentesocial e histórica. No âmbito do enquadramento narrativo: do grupo de sociabilidade (Itália, Boccaccio) para o ambiente

escopo e os limites da empreitada de Auerbach seria preciso remontar à situação do campo intelectual alemão no período, às pretensões da nova ciência sociologia e às tradições da Já madura filologia. Em meio a isto

doméstico (França). No âmbito das figuras-suporte: da mulher como

Auerbach toma posição, procurando forjar um lugar para seu trabalho

dominante (Boccaccio) para o homem como dominador (epígonos

e pensamento, que fustiga a sociologia e a filologia.

italianos, França).

Segundoo autor, trata-sede uma "consideraçãohistórico-formal" ) cuja tarefa é analisar o desenvolvimento de uma forma literária ao lon. go do tempo e do espaço.Tal procedimento demarca a "peculiaridade" das diversas formas da novela no período e região em pauta no escudo; em outros termos, o nexo entre forma literária -- a novela e a sociedade na qual ela é composta.: ' Não é preciso expor em maior detalhe as análises e andamentos de Auerbach -- trata-se apenas de pontuar o problema.': No caso, como a análise faz-se, tal como Fritz Schalk destacou no prefácio que escreveu

O leitor não deve sentir-se frustrado se não avanço na questão J

decisiva apontada anteriormente, a situação do campo intelectual, sem

a qual não temos perspectivacorrera para compreender o trabalho de )tuetbach Ç'Lesdéformations du tente êtant d'autant pausprobabtes que lrzg/zorance da conrexied'orzkzrzee.çrp/ grande":') é que isto exige um estudo à parte.'s O que pretendo oferecer aqui é apenas a face interna desseproblema e, mesmo assim, em passosrápidos. Daí o percurso por alguns textos decisivos de Auerbach; e após sua tese de doutoramento. sua tese de habilitação,

.Dan/e aZi .Ozcalar der zrcghcÀen /HeZr [Z)a/z/e como

roera do mzzndo[erreno]surge como uma estação significativa, embora

para a reedição da tese, "nos limites de literatura e sociologia, esforçan-

o problema em pauta não ganhe destaque explícito no livro, sobretudo

do-se para alargar um mediante o outro".::

porque, no entender de Auerbach, Dance é um dos poucos escritores cuja leitura pode ser feita com um mínimo de informação e conheci-

Essafórmula de Schalk é em tudo sugestiva,pois buscadefinir o lugar no qual Auerbachprocura se posicionar,e essemovimento

mento exterior à obra. Não obstante,um dos tópicos abordadosno

implica uma visada na situação dos estudos literários e da sociologia no

livro

Entreguerras na Alemanha. Dito de outro modo, para compreender o

poesiagestadaem um círculo restrito -- sociologicamente concebido:

ii . Auerbach,

Zur

ZecÁnz'É der FrüÁre/zaüianceno

e//e zn /la/zen zznd /ra/ztrezcÁ,

op. cit., pp.

65-66

iz. A relação da tese de igzi com a obra restante de Auerbach é forte e significativa: Dante é uma âgura central, embora apareçaapenas ocasionalmente,pois é condição para o surgimento da novela italiana(cf. Auerbach, Zür ZecÀ ÍÉder/MÃrenaúsaaanope#e l,z/la/z'enund

é a discussão

acerca

do grupo

social

que âncora

o doZce iz;/ /zozzvo.

CL poesicl de Dente ganhou in.spiração inicial nào em um grande e amplo rtovtmento, mcLS sim rLacultura formcLLde um círculo diminuto, querecebeucomcientementea tradição provençal e ercl mesmomais intensamente esotérico e exclusivo do que eta. Pois como GuinileLLI, o fundador, não encontrouosfundamentos sociológicos queosprovençais possuíam, e como,

FranAreícÀ,op- cit., p. 3), exatamente o mesmo Dante que será esmiuçado na tese habilitação

de [gzg e, posteriormente, em uma série de artigos e no cap. vui de ]147mexíç. Ademais, a tesede igzí apresentaum núcleo que seráretomado e desdobrado em dois outros capítulos

i4. P. Bourdieu, "Les conditions socialesde la circulation internationale des idées", in Jurei

de it/lmesü, dedicados a Boccaccio e Antoine de la Sale (A/zmesü,op. cit., caps. ix e x),

iS. Veja-se,a título indicativo; D. Hoeges,Konlraper=eam 2óFmnd. Er r RoóerrClzrrz

assim como indica a passageme continuidade do problema, tal como âgurado em Rabelais, que também será tratado no livro de í946 (cap. xi). Dessemodo, pode-seler a tese de lgn com os olhos nos quatro capítulos do livro posterior. Da mesma maneira, todo o processo

unc/Kar/ Jda/z/zÁe;m.Frankfurt; Fischer, i994; W Ben)amin, "Literaturgeschichte

analisado na teseé apresentado,de forma sintética, embora por outro lado situado em um quadro histórico mais amplo, em Znzradlzcz/on azr éízzdeide pÃ/ZoZogz'e romano. Frankfurt: v. Klostermann, i949(r? ed. turca de i944, trad. bus. /a rodafâo aoi eslüdoi #reránar. São Paulo: Cultrix, i97o).

i3. Fritz Schalk,"Vorwort", op. cit., p. ix. L 7a Extíapfogíamü: $!otagia e socialagia

de Za ./?ec4ercÃe en .S'czente.ç SoczaZei, no i45, 2002, P. 7.

und Late

raturwissenschaft", in Gelam«ze/re.9cÃ/#;e/z.R. Tiedemann e H. Schweppenhãuser(orgs.) Frankfurt: Suhrkamp, v. rn, pp' z83-go; JosephJurt, "La romanistique allemande sous le troisiême Reich: attendstes, résistants, émigrés", in ,4crei de /a RecÁerfÁeen Scz'Cacei Saca'a-

/es,n' 86/87, i99i) PP.ízJ-z8; Kurt Flasch,"Nachwort", in Auerbach, Z)arie aü Z)IcÁrer derz'rdúcÁen IHe/r.zt ed., Berlim/Nova York: W. de Gruyter, zoom,pp. zz6-z7; Wolfgang Bialas e Gérard Raujet(orgs.). Z)ze//Z zorúmmdeÓar/ezrzder IHezmares Repuó/tÉ. Frankfurt:

P.Lang, i996.

271

por outro lado, deles sefe { herdeiro, na medida em qüe sua poesia époesia

latim, mas sim, escrevendo em língua vulgar, todos aqueles que alme-

artística e expressãode uma forma de vida seLetcl,CLriStOCrátiCCt, hostil à

]am uma cultura nobre. Essenovo público, segundoAuerbach, tornarse-áo "suporte da nova cultura européia".i' Há, pois, um nexo enfático

expressãoordinária a pátria

imaginária

então ete pâs no lugar dcl Píovença cavaLheiresccl do cor gebtRe

e esse traço absolutamente

entre formação de um novo público e transformação da língua literária,

espirj-

uma espéciede "democratização" da cultura, se me é permitido o ter-

Euat, essaformação, qüeera um eixos religioso mm não a igreja universal, uma pátria comum mas não um domínio na terra, foi a primeira consciência artística autónoma da nova Europa e a única coisa que Ligava entre si

mo, dependente da nobi]itação ]iterária das línguas vulgares.

uma atmosfera perfeitamente entorpecida e venturosa de uma aliança se-

Ainda mais decisiva, entretanto,é a questão que dá título e ensejo ao livro, a tesepropriamente dita que Auerbach expõe e defende. Embora de modo quasevelado, ela supõe um fundamento históricosociológico, visto que a poesia de Dance depende do individualismo

cretcl daqueles que sabictm e CLmavam)'

renascentista,que lastreia, efetivamente, a teseapresentada: o fato des-

os companÀe;roido "dolce sul nuovo". .E isto /zkoade modo /ãajorre oi mais destacadosdentre eles em uma sensibilidade comum quese originou

a

te ser um poeta do mundo terreno (repetida nos variados estudosde )

Embora Auerbach não avance no ponto, estáindicado o nexo entre poesia e forma social, em diversas dimensões: na formação de um círculo social de eleitos; na sua relação de distanciamento frente ao restante da

Auerbach sobre Dante, inclusive no já citado capítulo de Mzmeiü). É o que vemos, ao tomarmos momentos do livro em que o autor enuncia sua tese:

sociedade; no processo histórico da passagem da poesia provençal para

o do/ceif;/ nzzovo,caracterizado por uma espéciede repúdio ao mundo concreto da vida terrena, no sentido de que a ausência de um lastro

m alma do Além dantesconão são de modo algum mortos, antesos verda-

social concreto, à diferença do que ocorria com a poesia provençal

de sua essênciaatmos$rica da vida terrena anterior. Contudo, mostram esses

(baseadaem formas sociais concretas de cavalheirismo), é em mesma medida um fato social decisivo, pois indica uma situação social na qual essadiferenciação exclusivista é possível e, portanto, uma situação histórica de diferenciação e estruturação social mais complexa. É isso que

dados em uma tal compLetude,sincronia, presenççte atualiclade, quejamais

deiramente vivos, que com efeito somem os dados concretos de sua história e

teriam alcançctdo em seu tempo na terra e que certamente nunca teriam re

rezadoa um ex7ecrador.[.-] oi come gaeaparecemna Comédiajá/eram subtraídos da épocctterrena e de seu destino tramcorrida. Dente escolheu

possibilita a criação da pátria imaginária do corgerir;Ze,que não se sus-

um cenário absolutamente particular para sua exposição \...À, que [he abriu

tentaria, podeZsesupor, em uma situação de menor diferenciação. Nada

possibilidades de expressãoabsolutamentenovas \..l\: todo o mundo histó-

disso é explorado extensivamente por Auerbach, mas tudo isso está nas

rico-terreno \...\, de tat modo queele não roubou dm $guras singulares, em

entrelinhas dotexto.

seu destino anal escatológtco, seu caráter terreno, nem mesmo o enfraqueceu,

Por outro lado, vendo o mesmoproblema, Auerbach identifica a questão do público da poesia dantesca, definindo uma categoria socio-

mas sim o contrário, na medida em queeLefixou a intemi$cação extrema de sucosubstância hbtÓTicct e terrena e a identificou com o destinojinal)S

lógica como constituinte da análiseliterária -- um tema e problema que nunca mais abandonará (basta lembrar que o capítulo final de seu últi-

mo livro intitula-se "0 público do Ocidentee sualíngua"). No caso em pauta, a obra de Dance apela, acena e "cria" um público que se torna uma categoria social-histórica central para a análise de Auerbach.

E o público que Dante tem em vista não são os //frei'zzzl que entendem

r6. E. Auerbach, Z)a re aü Z);cÃ/erder irdücÃen JHe/t, op. cit.> pp. 35-36(il ed. igzg).

z 7z Extraprograma: $!oíogia e sociologia

i7. Id., ibid., p. g6. Esse mesmo tema e problema aparecerá de modo decisivo no último livro de Auerbach, Z,írera/ü/xpracÁe zz/zd Puó/iÉum znder /afazriÚcÁenSpdfanlz'Ae zz/zdím .l/file/a/fer, op. cit., cap. 4; o destino dessacultura européia, dependente de seu suporte social, será temaúzadopor Auerbach naspp. g-io e 2jg dessemesmo livro, assim como em "Philologie der Welditeratur", in Gexamme/re4il6xã/{e zzrromaaücÁerzPÀÍ/p/ayz'e,op. cit. i8. Auerbach, Z)erre aü Z)icÁrerder ;rd&cAelz}He#,op. cit., pp. i68 e ío8; para outras formulações, cumulativas, da tese, ver pp. 79) 83-84, 110, il3-ii4> i43) i66, í74, i86 e zii. A tese é totalmente tributária da compreensãode Dance por Hegel, coisa que o próprio Auerbach >

z73

Interessa aqui menos discutir a tese de Auerbach do que evidenciar

de sorte que, em função do objeto em pauta, o problema ganha maior ou menor ênfase.Isso transpareceno comentário da tese de doutorado. no qual a forma novela é compreendida como eminentemente histórica.

como a dimensão social e histórica Ihe é intrínseca e basilar, apesar de o livro não adentrar por uma análisepropriamente histórica ou sociológica. Não obstante, é essacompreensão de Dante como poeta do mundo terreno que significa "poeta do mundo histórico" que abre a senda para a formulação da natureza da m;mean operante na literatura

que investiga, e que se desdobrara em amplo arco em Mzmesü, quinze anos depois. Pois é o terreno, concreto, real, histórico que lastreia e dá tessitura ao problema do rea/limo, tal como Auerbach o compreende, e que aparecena tesede igzg: "o homem conhecido, que vive, vinculado à história; o indivíduo existente em sua unidade e completude, em pou-

)

rização da análise é contrabalançada pela própria tese a ser defendida a

O esforço,então,concentrou-sena demarcaçãodesseteor histórico sazgenerú," que poderíamosbem qualificar como z/crer;or. Portanto. as duas tesesdemarcam como que extremos no modo como a histó- ; ria adentra na obra de arte literária, conformando-a como obra. forma

e "visão". Talvez a tarefa fosse, dentro do possível, fazer colidir tais

O leitor da tesenão tem dúvidas com relação à força e persuasão do argumento, embora isso não signifique que o problema da m;mesa

extremos, quiçá uma possibilidade de leitura de Mzmesü.

seja resolvido,

atuar como -Pr; ardoienrde filologia em Marburg e ministrou sua aula i

m/meia e realismo são categorias centrais

e decisivas, mas só encontram desdobramentos em seusensaios e livros posteriores. Essas anotações baseadas nas duas teses de Auerbach permitem

observar que a formulação de Schalk encontra respaldo nessasobras, embora de modos diferenciados. A dimensão sociológica e histórica é uma presençabem mais forte na tesede doutorado do que na de habilitação; contudo, nessaúltima, o problema do realismo aparececom mais vigor, lastreado inclusive por uma preocupação conceitual e histórica

com o conceito de m/meia, e tudo issoganhará muita importância em 7141mesiç e nos estudos que o preparam. Creio que seria possível afirmar

que Auerbach, desdeo final da Guerra, quando sevolta para os estudos literários, tem plena compreensão do papel da história na análise da

(

que detecta uma historicidade profunda e peculiar na obra de Dance.

cas palavras: a imitação de sua natureza histórica".'P

ao contrário:

S

Já com relaçãoa Dante, a análisehistórica fica em segundo plano, em função da naturezamesmada obra. Em contrapartida, a falta de histo-

mesmo ano em que publicou sua tese sobre Dance, começou a'7

inaugural "A descoberta de Dance no romantismo", Auerbach escre-

veu um ensaionotável sobreMontaigne, "Der Schriftsteller Montaigne" l $ l3bàr ["O escritor Montaigne"], no qua] a categoria de público desempenha l = um papel estratégico e determinante, categoria eminentemente socio- l . lógica que seria recorrentemente retomada em outros textos seus (nos seis anos em que permaneceu como docente universitário na Alema-

nha, de rgzg a i935

a partir de i93o como professor titular --, Auer-

bach dedicou-se sobretudo ao estudo da literatura francesa). No caso de Montaigne, seu argumento é que se trata, de fato, da criação de um público que até então não existia para os -alma;ox.E a categoria de públi-

X

co encontra em Montaigne também suacontraface, o escritor, Ãomme de Zerzrea, figuração histórica do intelectual.

obra literária e busca formular /rzconcretoo problema nas suasanálises, 0

Montaigne não encontrouo público dos Essa\sjá formado e não podia imagi> reconheceu em sua aula inaugural como professor de filologia em Marburg, em igzg; cf. Auerbach,

"Entdeckung

Dantes in der Romantik",

in Geiamme/fe

4z #=ãr e {zzr rama/zücÁe/z

nar queele existisse.ELe não escreveunem para a corte, nem parcaa povo; nem pa'ct os católicos, nem para osprotestantes; riem para os humanista, nem para

seusestudos sobre Dance e buscou fundamentação para sua tese na interpretação âgural, que expôs no importante texto de i939, "Figura"(in

Geiamme/ e 4ze#=dz e ur romanúcÁerz

PÃzZoZogfe, op. cit., pp. 5S-gz). A partir daí, desdobra a questão da interpretação figural em uma ampla série de estudos sobre Dente. ig. Auerbach, Z)ante aZçZ)zcÀferderIr(üçcÀenW2Zr,op. cit., p. n3.

Z 74 Ex raprograma:

$íalogia

e sociologia

\

k-

4

PÀzZo/arie,op. cit., pp. i8o-8i. A análise de Hegel encontra-se em Hor/esz/zgenüóer2 Àez;l.

Frankfurt: Suhrkamp, ig86, v. i5, pp. 4o6-o7. Após a tesede igzg, Auerbach prosseguiu

t

zo. Para dar um exemplo e citar um texto da época de composição de Mzmeiü, no qual Auerbach discute a aparição de SãoFrancisco na Camádz a: assinalando as razões e o modo como Dante lança mão da alegoria (o que significa demarcar asdiferenças do seuuso com parativamenEeà literatura que o precede), Auerbach afirma: "Dance puxa a alegoria para o elemento atual, ele a liga intimamente com o histórico". Auerbach, "Franz von Assisi in der

/ÚÓ'moda e"(i945), in GeiammeZre 4z€6sãf e {izrrama/zücÁen PÁzZoZpyz'e, op. cit., p. 4i

275

q

+. 8

qualquercoletividade e3cistente. Ete escreveupara uma cotetividade quenão

A constituição dessascategoriassociais e, sublinho, categorias

parecia existir, para os homem vivos em geral, que, comoleigos, possuíam posteriormente, foi nomeadopúblico culto. .4té então havia como cotetividade

que implicam um complexo processo, histórico e social, de identidade, pois fundam-se na relação de mútua interdependência escritor/público, relação que configura um espaço social específico, que recebe a deno-

apenm Q cristctndctde, se se abstrai a profissão, o estamento e o estado. Mon-

minação, por Auerbach, de "comunidade de leigos" -- é percebida cla-

alguma formação e queriam p'estar contas de sua exbtência;para

o grupo que,

cária, carente de nuance e desenvolvimento. Contudo, 75 anos atrás

ramente como um desafio intelectual e, ao final do ensaio, ele aponta uma direção para o encaminhamento do problema: essenovo tipo historiciza-se na figura do Ãon/zéfeÃomme, que reaparece em seu estudo subsequente, Dm fTan4õsbche Publikum des 'i'7. Jahrhunderts \Opúbtico .Prancésdo iáf Zoxp'7z],publicado em i933 No texto sobre Montaigne,l Auerbach já antecipava:

representava algo novo, e situado naquela posição que Auerbach tenta forjar para si e seu trabalho, entre a sociologia e a filologia. É

A pessoade Montaigne eraaproprictdapara cüaí um novo tipo humano;em

no interior dessaproblematização que a independência de Montaigne exige também categorização, pois aquele que, escrevendo, cria um pú-

realiza toda m forram e comidera m coisa a partir de si. Entretanto, o

.s }

honnête homme tios séculosxl'n e xrlnfoi rapidamente Levadopor outras in$uênci a outras diíeções; no final dm contas eLese tornou mais atino,




'}

Ç '< %'

l!

construo-lamediantepesquisa"(op. cit., p. $4; a idéia é recorrente nos escritosde Auerbach).


PP-599 ss

a Beatriz

na Comédia. Cf. Auerbach,

"Figurative

Text lllustrating

Certain

Passagem

of Dance's Cammedza" (t946), op. cit., p. loi ou, mais polêmico, seu estudo "Passio als

Leidenschaft", op. cit. 57. Cf. Auerbach,

"Giambattista

Vico

und die Idee der Philologie"(i936),

in GesammeZre

2z€6=àfÍe ur romanúcÀen PÃiZoZog;e,op. cit., pp. z33-4i; a idéia aparece em variados ensaios

sobre Vice.

58. Cf. Karl Mannheim, Mbíemao;a/ogle,org. K. Wolff. Berlim/Neuwied: Luchterhand, ig64 Rettiknxd \..axbe, Kar

M.annheim und die Klbe des }iistorismtts.

Historismm

ais

wü e ia íaZogúcÀer ParspeArívümm. Gõttingen: Vandenhoeck& Ruprecht, 2004;D. Hoeges,Kontroverseam Àbgmnd: E

t Raber! Curtia undKar11Han hein, ap. çü.

z9z Ex raprograma $!oíogia e sociologia

6o. Auerbach tratou desseponto em todos os seusescritos sobre Vice; ver como exemplo Auerbach, "Sprachliche Beitrãge zur Erklãrung der .fcze/zÍa.Azouva von G. B. Viço" (i937), in Gesamme/ e 4ie$=dre {ur romaniscÁen Pó;;o/onze, op. cit., pp. z5i-53; também Zz'rerartzrspra-

cÀezzndpuó#&izm,OP.cit., PP.9o-9i. 6i. Auerbach, "Vice and aesüetic historism"(i948),

in Geiamme/fe 41#=ãrie ar romanü-

cÀenPáí/oá)yz'e, op.cit., p. z69. 6z. Auerbach,-L;ferarlzrKpracÁe tzndPzzóZz'&um, op. cit., p. i4; cf. adzmean,op. cit., p. 5i3. O ponto possui uma interessante reverberação,pouco destacada nos comentários: é que se enlaçacom um traço constitutivo do pensamento de Montaigne, o conhecer-se a si mesmo,

29)

>

i.i. A diferençado "historismoperspectivista"no contextoda filologia pode ser em parte aquilatadano confronto com uma figura

do texto, Auerbach discorre sobre o seu "historismo perspectivista"

importante do campo de conhecimentos na época de formação de Auer-

haveria compreensão e interesse possível pela obra: ele é o enlace de obra e leitor, semo que ambos não se encontram.

Sem esse enlace originário (para utilizar a expressão de Gundolf),

bach: Friedrich Gundolf. Em uma carta do período anterior à Guerra, a Georg Misch, Gundolf afirmava:

/

2. O entendimentode Vico da filologia, que é retomado por Auer bach, atribui-lhe, mediante um alargamento e extensão, a totalidade da

.)

)nde o Sr. a$rma que o acessoCLDente somentepode ser comeguido pulando-se pela Idctde Média, eu diria queo caminho até QIdade Média pas-

)

J

i

vida social: "assim a filologia expande-seem tal medida, que passaa

SCLria sobretudo por Dente. Uma obrct de arte é um centro fechado em si, cluto-

compreender todas as humanidades históricas [...] ela torna-se quase idêntica ao termo alemão Geistesgeschichte".ÓS Como apontei anterior

su$ciente, Q partir do qual os cctminhos conduzem unicamente às peíiferiw

mente, essapretensão da filologia, que é o horizonte que orienta a obra

histórica. Esse cerLtro,tonal,ia, é ncpeüment(üo apenm originariamente, hbtÓTico, i.sto é, cl relação, jamais pode dar-nos a chave parca o humano, isto é,

de Auerbach, é um centro de discussãoe polêmica durante o período de Wéimar e a tomada de posição de Auerbach implica, embora de modo implícito, uma posição frente à pretensão universalizante da sociologia.

para a substância: somente na medida em que o histórico também é humano,

Daí a afirmativa de Schalk com que iniciamos.

.')

com o próprio coração, como uma vivência humana que se tornou forma, e o )

')

não

rLOsentido de que é ainda }toie vivenciável, é que temos CLLguma forma de acesso a ete. . ©

z.i. Com isso, também no estatuto que se atribui à filologia encon-

O texto ganha relevo especialpara nós, quando se tem em vista que

tramos uma base segura para entranhar a obra e o pensamento de Auerbach em seu contexto. No período de Weimar, os filólogos romanistas e não somente Auerbach, ele estava em meio a uma onda buscaram

Auerbach, com toda a ênfase no caráter histórico, não perde jamais de

redefinir o estatuto de sua disciplina e alocá-la no coração das Geú-

vista a idéia de uma espéciede empatia do leitor pela obra, o que de-

reiwüle cÃaÚfen. Isso se deixa ver claramente na seguinte formulação

pende inteiramente da sua apropriação de Vico: "// mo/zdode/Ze/zai.;on;"

de Victor Klemperer e Eugen Lerch

só pode ser compreendido pelos homens, porque eles o realizaram;

importante periódico /aÀrózzcÃ/ür PéiZoZog;e --, ambos alunos de Karl Vossler e colegas/concorrentes de Auerbach," que cito para evidenciar o contexto disciplinar e cognitivo no qual Auerbach agua:

mesmo as formas mais primitivas e primevas do pensamento e da ação humanas podem ser encontradas, ou redescobertas, no interior das po-

na abertura programática do

tencialidades (Vico diz modz#caÍ;o/z;,modificações) da nossamente humana, de sorte que somos capazes de as compreender".« Na seqüência

O conceito de "$Lologia"

é T je duplamente suspeitos por um Lado ele cheira

a um pedantismo de professor de ginásio, e de outro cheira àquela ciência da > que Auerbach destaca recorrentemte nos seusdois textos sobre Monraigne. Com relação a Vico, Auerbach afirmou; "Aquele reencontrar da história em nosso próprio espírito é conhecimento de si; trata-se do embrião de uma teoria da compreensão histórica a partir

> europeu'ocidental, não apresentatanto uma apropriação artística e uma representaçãopoé tida da realidade; antes,provém do enredamento do ser humano na realidade cotidiana da

da compreensãode si mesmo". Auerbach, "Vico und der Volksgeist" (lg) 5), in Gesamme/e

vida, no qual conhecimento e participação estão indissoluvelmente arados". Walter Busch e Gerhart Pickerodt, "Vorwort", in Buscae Pickerodt (ares.), IHaÁrneÁmen .[esenZ)eüien

Hze#=dzÍe ur romarzúcÀe/zPÁz'/o/oyfe, op- cit., p. z49-

63. Carta F. Gundolf a G. Misch, rz nov. igio) in F. Gundolf, Bn'l:Êe..Nêzze Xa/ge. Amsterdã;

EncÃ,4ueróachZ.elrüre derit4oder/ze,op. cit., p. io-

C. Peregrini, ig65, p 7z, apudW. Lepenies,.4r rréscz/fura. SãoPaulo: Edusp,i996, p. 3zo

65.Auerbach,"Vico and aesthetichistorism", op. cit., p. z64.

Ver Auerbach, /nnod fâo aoi eizlzdoi/z'rerán'os, op- cit., pp. 3z-3364. Auerbach, "Vice's contribution to lirerary criticism", in Geiamme/e 4z#sãre ur roma-

66. Kjemperer concorreu, e perdeu, com Auerbach pelo menos em duas situaçõesdecisivas

,zÜcAe/zPAzZo/ogz'e, op. cit., p. zig; fizera a/=pracÁeiznd Plzó/l#um, op. cit., p. 10. A questão

burg e na nomeação como professor em lstambul. Lerch é o autor do texto sobre '.pwsio' que contesta o texto inicial de Auerbach sobre o assunto, ao qual Auerbach por sua vez replicou em "Passio als Leidenschaft", op. cit.

possibilita o seguinte comentário: "A 'verdade hermenêutica' da ampla investigação histórico-cultural de Auerbach, que sepõe à prova nos grandes documentos escritosda tradição >

z94 Extrapfograma

$

!agia e sociobgia

para as carreiras e destinos de ambos: na nomeação como professor catedrático em Mar-

z95

Literatura e da linguagem positivista, que desato vate como um fundamento

Entreguerras, Auerbach pretendia resolver, dentro do possível, os dilemas

Lndispensável, mas de modo algum como um objetivo. Nós queremos com-

do historismo, tal como formulados ao longo do século xix e sistematiza

preender o termo nctquele sentido grctndioso e espiritual que possuí(t dentre

dos e problematizados no início do século xx.ÓPCom efeito, torna-se maná

oi Ãumanúrm, gua/zdoe/eira/zd;am /za "philologia sacra et profana " a

testo que Auerbach toma para si o desafio da "crise do historismo" (para citar um título da época), que marca profundamente o período de Wêimar

totalidade dos conteúdos espiritual

do pusadoGn

e de que aspolêmicasenvolvendo a sociologia do conhecimento sãouma

Como se vê, formula-se uma dupla tarefa: a atualizaçãoda disciplina,

i

das frentes. A posição de Auerbach, portanto, é de uma solução aos proble-

ou seja, sua atualização ao tempo presente, liberando-se das amarras

}

J

masdo historismo no seu próprio interior, potenciando-o.

(sobretudo metodológicas) da tradição disciplinar, sem contudo abdi-

3 i. Vale observar que o envolvimento de Auerbach com Vico é

car dessatradição, e a sua Orzóeirímmzzng,vale dizer, a atribuição de sua

também amplamente referido ao contexto no qual agua:a) sua tradução e apresentaçãoda Czé/zc;a /cova,no meio dos anos 20, tinha por objetivo colocar Vico em circulação nesseambiente de "crise", como uma inter-

centralidade no conjunto das Geü eiwisie«scÃaÚen.

3. Contudo, a filologia auerbachiana não é uma simples figuração

.')

]

'}

da GeürexgeacÃ/cale, precisamente por contade Vico e do diálogoimplí-

conhecimento histórico precisa estar atento aos critérios, concepçõese

venção e conta'ibuição relevante, ou quem sabeaté mesmo decisiva, para a clarificação e superação dos problemas do historismo; ademais, o próprio Auerbach reconhece a dívida para com seu professor Ernst Troeltsch(que acabarade falecer): "Devo especialmenteum agradecimento em memória

categorias do próprio momento histórico que pretende compreender, para

de Troeltsch, de quem partiu o vivo estímulo para que eu me ocupasse

não Ihe impor categoriasexógenas,por outro, o intérprete tambémestá

de Vice";'o b) em seus textos sobre Vico nos anos 3o, além do exposto, há

cito com a sociologia do conhecimento,pois ela incorpora uma resposta ao problema do historismo e do relativismo histórico. Se, por um lado, o

atado a uma historicidade particular, sua situação concreta de vida. Donde Auerbach falar em um "relativismo radical", "pois o relativismo histórico é de dupla face: refere-se tanto ao que se compreende como àquele que compreende", ou seja, refere-se tanto ao objeto como ao sujeito do conhecimento.ó8Com isso, de maneira similar à sociologia do conhecimento do

>

4uerbachs Beitrag {ur Theorie und Methodologie der l-iteraturgeschichle. Kbnl gsteln'. Fotum

Academicum, i979, pp.79-S3. 6g. Os marcos, para Auerbach, estão dados sobretudo por seuprofessor Ernst Troeltsch em Z)er .flrLraríçmmund iez'rieProa/eme,publicado em igz% e por Friedrich Meinecke em Z);e EnnzeÃu/zg dei /;rh o/úmüs, de i936. Sobre o histerismo, ver Friedrich Jaeger e Jõrn Rüsen

GeicÁz caledei .fínroriçmm.Eirze.Elbt/bÃrzzng. Munique: C. H. Beck, i99z; AnneteeWittkau 67. VectorKlemperer e EugenLerch, "Vorwort", /aÁróucÁjür PÁzZoZag;e, n' i, igz5, p- iv-

]?:s/arúmm. Zzzr GeicÁzcÁfe des.Begr{0; zznddei Praz/e/m. z: ed., Gõttingen: Vandenhoeck

Trata-se da abertura programática do periódico. Cito através de J. Jurt, "Für eine verglei-

& Ruprecht, i994, que mapeiam a discussãoe a bibliografia; além disso, como um importante texto do contexto, K. Mannheim, "Historismus" (igz4), in WLse se zaá)yle.Berlim/

chende Sozialgeschichte der LiteratursNdien.

Romanistik in Deutschland, étude littéraires

in Frankreich". Texto datilografado, zoo4.

Neuwied;Luchterhand,ig64, pp.z46-3o7.

68. Auerbach, Zíreralu/=pracÁe dPuó#lum, op. cit., pp. i4-i5. E por essarazão que firmou

7o Auerbach, "Vorrede des tlbersetzers", in Giambattista Vice, Z)zeJUeuemhsemcÃaPr.Ber-

o período de composição de .44zmeiüna abertura do livro (que citei ao iniciar) e, em texto

posterior, reiterou que "7141meiú é, de modo absolutamenteconsciente,um livro escrito

linm/Leipzig: W de Gruyter, s.d. [igz5], p. 39. Vale notar que a so]ução auerbachianapara o problema e a crise do histerismo situa-seno interior do escapode Troeltsch, para quem os

por um determinado homem, em uma determinada situação, no começo dos anos i94o' Auerbach, "Epilegomena zu 7141mefis", op- cit., p. i8. Esse enraizamento em seu próprio

problemas do histerismo deveriam encontrar solução em uma nova concepção da compreensãohistórica, na qual sesuperassemsuascontradições e aporias (sobretudo: seu relativis-

tempo é muito significativo em Auerbach (voltarei a ele no final); ver Mzmea&,op. cit., pp.

mo); mas a solução deveria permanecer dentro dos quadros do historismo. Corno o contexto

5i4 e 5t8; }1er [/nreriucÀü/zgerz{zzr GeicÁicÁreder./}an ókücÁe/z.B;/du/zg, op. cit., pp. ro-ii;

é aqui de extremaimportância, ressalto que o importante estudo de Mannheim sobre o histe-

Philologie der Welditeratur", op. cit., p. 3o3 Em tempo:os problemasrelativosa sujeito

rismo ("Historismus", de igz4) foi escrito sob o impacto de duas obras recém-publicadas:o

e objeto no conhecimento histórico foram amplamente discutidos por Ernst Troeltsch em

Der Histori.smas tLndseim Problema, de 'TraeXtsch (.\ gza], e GeschichtetcndKLmsenbewustsein.

Z)er /7urorúmm zz/zdxezheProa/eme(Tübingen: J. C. B. Mohr, lg22); no que diz respeito

de Lukács (igz3). Cf. Michel LõW, "Karl Mannheim und der Historisrnus", in W Bialas e

a Auerbach, ver Klaus Gronau, Zz'rerarúcÁeXorm zzadgele/&cÁa#r/lcÁe Ebzrwfc&/u/zg. En cÁ >

G. Raulet(orgs.),Z)ze/fulo/úm

l 96 Extraprograma: $!oíogia e socioiogh

deóarze zader Irei maresRepüó/iÉ,op. cit., pp. i7i-83.

z97

também um outro elemento que ganha sentido em função do contexto: seu esforço em separar Vico de Herder e da linhagem que parte deste último

4 . O resultado do duplo histerismo ou relativismo seria a possibilidade de compreensão de um dado momento ou período histórico, "the

(o romantismo, Hegel, a filologia românica) deve ser compreendido como um afastamento crítico da tradição do HoZXxgeiçf e símiles, que, àquela altura, já tinha dado provas suGlcientesde sua periculosidade nessesentido e contexto, Vico foi especialmente útil para se contrapor às tendências que

/

)

enfatizavam o nacional.'t Este aspectoé mais nuançadodo que a minha )

J #

i

ou pe:sar humano, tal compreensão é a chave para a compreensão do todo: ' a compreensão de um desses aspectos da configuração humana

vante. Sejaapenaslembrado que Auerbach, em suahistória literária, referenciou-se na idéia de Ocidente como um domínio supra-nacional, que secontrapunha intencionalmente à idéia de literatura nacional, tal como

[arte, .direito, po]ítica, economia, literatura etc.] em um estágio deter-

)

r)

isto é, limites, cognitivos. Tal potenciaçãoevidencia-sena idéia de que, se é possível compreenderhistoricamente algum aspectodo agir

formulação deixa ver, mas, de qualquer maneira, é presente e muito rele-

a história literária e a filologia a concretizavam até então, como sublinhei

')

specific skateof human mind at a given time"," uma espéciede potenciação da idéia do Ze/rgeàf, pois consciente de seus condicionamentos.

minado de desenvolvimento fornece, ao mesmo tempo, a chave para todas as outras configurações do mesmo estágio".'s 5. Essa última afirmação a respeito da relação de particularidade

anteriormente. O mesmo vale para seu pungente texto dos anos 5o, "Phi-

e totalidade atinge, ao mesmo tempo, o programa e o método auerba-

lologie der Weltliteratur" ["Filologia da literatura universal"], no qual o

chiano, que preciso citar ü exzenio:

que era "ocidental"

já se expande para o "universal/mundial";':

c) por Gím,

nos Estados Unidos, do Gtnaldos anos i94o até sua morte em i957) Auer-

Àquela quctlidade humanct geral, comum às obra mai.s pedeitm de períodos

bach vindicou Vico em um contexto no qual dominavao Mew Cnr/cúm,

ares

obras essa que podem fornecer, só elas, tais categoria

\catego-

com sua reconhecida desconfiança, para não dizer mais, de interpretações históricas e sociológicas. Auerbach, nesseambiente, foi mesmo alvo de iro-

somente pode seT compreendida em suas forma

nia, por professar

Lm processo diabético na história; suei essência abstrata não pode ser expressa

"ÃÚ aeczzZar reZzg/on (Zf i%ãzoHcisw" .7s

iu válida para ojuÍyo hktórico, e não categoTiu abstrcttu e a-hi.stóricasÜ--, pctrticuLares, ou melhor, como

em termos de signi$ccLdounívoco. O hbtorictdor ird aprender Q extrair do próprio material w categoria

71 Ver Auerbach,Z,IrerarzzrlpracÀe und Pzzó#Éüm, op. cit., p. g; "Vico und perder", in Gefamme/re .4zeHTãfe zzrrama/zúcÁen PÀ/Za/agíe, op. cit., pp. 224-2S; "Vice und der Volksgeist'

ou conceitos que necessite parCLdescrever e ccl-

acteriXar os difererLtesfe71âmenos.Tak conceitos não são ctbsolutos; eles são elásticos e prol,isórios, mutáveis em co4unto com a história em movimento.

op. cit.; "Vico and aesthetichistorism", op. cit., p. z73; "Philologie der Weltliteratur", op. cit. Cf. WI.Bialase G. Raulet(orgs.), Z)íeJ?ü o/úm deóarfellz der }Heímarer Repz/ó/ÍÉ, op

cit., passam, p ex-pp.33ss.

74. Auerbach, "Viço and aesthetichistorism", op. cit., p. 26o.

7z. Cf. Auerbach,"Philologie der Weltliteratur", op. cit. A recusaem formular a discussão

75. Auerbach, Zz'lerarürspracÁezz/zdPuó&' zzm,OP' cit.> p. ii; o mesmo em 716meiú, op

histórica no registro das especificidadesnacionais e a ênfaseno aspectosupra-nacional em Auerbach(presente em seu esforço em diferenciar Vice de Herder e da linhagem que sai desseúltimo) era um elemento presente em Troeltsch, que no imediato pós-guerra enfati-

Z)ergüz'(: Travaux du Séminaire de Philologie Romane, lsranbul üniversitesi), n? l

zavao caráter não científico daquelassínteseshistóricas que formulavam uma diferenciação entre uma(suposta) cultura "alemã" e a cultura européia-ocidental, e que em geral não

essaalara, não há como se furtar a uma obra capital da época e contexto, /]hrórza e com. cz'énfz a de c/mle, onde se lê: "]-.] a essência do método dialético consiste no facto de em

encontrou ressonância, em um ambiente marcado pelos ressentimentose debates acalora-

todos os momentos correctamente apreendidos pela dialética estar integralmente contida

dos acerca das condições do armistício de Versalhes. Cf. F. Jaeger e J. Rüsen, GeicÁfcÀiedei

a totalidade, e de a partir de qualquer momento sepoder desenvolver todo o método. [-.] cada momento contém a possibilidade de a partir dele se desenvolver roda a riqueza do

Historismm. Fine Eit$ihru?lg, op. dt. , p gS. 73. René Wellek, "Auerbach and Vice", in-Lerrere i a#ane, ano 3o, n? 4, out.-dez. i978, p. 466.

cit., p- 4iz;

"ÍJber

die ernste

Nachahmung

des Alltàglichen",

in Romano/#;

Semz/zero'

r937, pp' z76-77 (a questãoreapareceem variados momentos da obra de Auerbach). A

a Antonio Candido. Já nos anos igzo foi usual caracterizar o histerismo como "religião'

conteúdo da tonalidade." Georg Lukács, .f?hlórza e comcl'éncz'a de c/wie. Porto; Escorpião, i974, pp' : 8g-go. Em outro trabalho, procurei sugerir como essaperspectiva lukacsiana é uma derivação da lição de seu professor Georg Simmel; cf. L. Waizbort, ,4r a enfzzr de

Wellek, também ele um europeu daquele tempo, o retoma no seuperíodo norte americano.

Georg Szmme/. São Paulo: 34, 2000.

Como indiquei, logo depois ocorreu exatamenteo mesmo na crítica de Afrânio Coutinho

Z 98 Extraprogíama: $!elogia e sociologia

299

Mas eles serão sujcientes para nos possibilitar descobrir o quê os diferentes fenómenos significam

posição frente a um outro grande marco: é supreendente o modo como. na apropriação de Vico, emerge a relação com o campo de problemas do marxismo, relação esta que, em virtude do recato e compostura de

n.o interior de seu próprio período, e o quê eles signi$cam

no interior dos três mitênios de vida Literária humana de que temos conhecimento; e, $natmente, o quê eles signi$cam para nós, ctqui e agoraJ'

Auerbach, jamais ganha referências ou menções explícitas.'8

Nesse sentido, embora de modo ainda mais esquemático, assinalo que: a) a leitura de Vico realizada por Auerbach toma como núcleo vivo do pensamento viquiano a idéia de que os homens fazem a história. de

)

Este é o resultado do histerismo auerbachiano,um historismo que teve

)

o cuidado de furtar-se tanto dos acentosnacionais como de qualquer lógica superior do transcurso histórico nem Escola Histórica, nem J

filosofia hegeliana." Com essapeculiaridade,ele inclusive marcou

i

que a história é um fazer humano;" b) a historicidade da natureza humaC

na é firmada enfaticamente;" c) há uma compreensão do problema das ;forças históricas" que perpassa toda sua obra e que permanece um desa-

:

76. Auerbach, "Viço and aesthetic historism", op. cit., p. z63; cf. .L;rerarurxpracÃe zzadPuÓ#tu'n, OP.cit., P. t5.

fio para seusleitores;;' d) novamente seguindo a via viquiana, busca

77. Onde sepode sentir suaproximidade a Burckhardt, a quem raramente faz menção. Suas

concreta"), embora através de uma totalidade que não é completude8z

firmar o ponto de vista da totalidade (diria mesmo, de uma "totalidade

observações sobre o historiador são muito reveladoras do seu próprio trabalho: "Não acei-

tou nem as concepçõesmísticas e idealistasdos românticos, nem a filosofia de Hegel, nem os métodos psicológicos e sociológicos dos positivistas. Suavasta erudição, que abrangia a História geral, a história da literatura e da arte dasvárias épocasda Antiguidade e da Renascença,a precisão e a riqueza de sua imaginação combinadora, e a clareza do seujulgamento permitiram-lhe escrever livros de uma síntese poderosa e exata à qual ele próprio deu o nome de história da cultura

a-u/ rgescÀicÁfe".Auerbach, ]n radzzfãoaoi eirados /z'rer'iras, op. cit.,

pp. 34-3$. Se tenho razão em aproximar Auerbach de Burckhardt, seja-me permitida uma interpelação acercado sentido da história e da tarefa do historiador; "A continuidade, como eleIBurckhardt] a entende, é mais do que o mero prosseguir, e é menos do que o desenvolvimento progressivo. É menos do que progressiva porque não tem subjacenteo princípio complacente de que todo o processo da história tem como meta e concretização o objetivo de

conduzir à nossaactual mediocridade. De acordo com Burckhardt, a mente e a alma do homem há muito que se completaram. E a continuidade é mais do que o mero prosseguir, porque implica um esforço conscientede relembrar e renovar o nossolegado, em vez de aceitar com impassividade o amálgamade costumes.A continuidade histórica conscienteconstitui tradição e liberta-nos em relação a ela. Os únicos povos que renunciaram a esseprivilégio

78. Um interessanteexemplodisso pode ser encontradoem um texto do seuúltimo pería do, "Dance 's Adresses to the Reader", dedicado ao já mencionado Rudolf Bultmann. um antigo amigo dos tempos de Marburg. Ao final dessetexto, o último que escreveuem uma longa e poderosa série de estudos sobre Dante, há a seguinte passagem, na qual joga com o marxismo: "0 re ; a/ cristão do ánpenzímRamanum é a primeira concepção da unidade política na Terra, e a interpretação cristã da vida humana como queda e redenção está na raiz de toda a compreensão diabética da história". (Auerbach, "Dance's Adresses to the

Render"]i954], in Geiamme/re4ze#xãrÍe {zzrromanúcÁen Pól/oá2yz'e, op- cit., P. i55). Muitos já destacaramo messianismoem Mam, a começar por um amigo de Auerbach, Ernst Bloch A união política do globo, nas mãos dos proletários unidos de todo o mundo, seria portanto um desenvolvimento mais tardio do mesmo aspectopercebido em Dance, assim como o declínio do capitalismo e a redenção com o advento do comunismo encontram raízes em uma tradição européia mais ampla do que deixa supor a leitura usual dos marxistas mais dogmáticos o que, aliás, Bloco semprese esforçou em evidenciar. Cf. também Auerbach. Z,z'feraur=pracÁe ünd Puó#&zzm, OP. cit., PP. Z58-S9.

da consciênciahistórica foram osbárbaros primitivos e civilizados. A continuidade espiritual, constituída pela consciência histórica, é 'uma das principais preocupaçõesda existência do homem', em vimide de constituir a única prova do 'significado da duração da nossaexistên

79' P. ex. Auerbach,"SprachlicheBeitrãgezur Erklãrung der .SçíenÍa.Nbzzva von G. B.

cia'. Por isso, deve ser nosso desejo urgente que a percepção dessa continuidade se mantenha

8o. Auerbach, Z.írerarurxpracÁe zz/zdPuó##zzm,OP.cit., p. iz; "Vico and aesthetichistorism OP-cit.}P. z74

viva nas nossas mentes". (Karl Lõwith, O sen /da da Á&lóna. Lisboa: 7o, l99i, pp. 34-35). É exatamente nesse mesmo sentido que Auerbach justifica, para si e para seus leitores, sua existência como âlólogo e

sim, isso é surpreendente!

como ser humano. Ver il#meiis, op. cit.,

p. 5i8; -LírerafürxpracÁe zzd Pzzó#Éüm,op. cit., pp. g-z4 e z$g; }'Zer CZnfersücÀu/zgerz {ar GeicÁícÀfeder.#arzÍüücAe/z.BIcHa/zg,op- cit., pp. 7-lt. K. Gronau, em sua monograma(Zízerarúc#e Forra und geseikcitaftliche EnmickÍung- Erick Áuerbachs Beiral

{ur Tkeoíie { lü À ethodeíogie

derZfzerarurgeicAlcÃre, op. cit.), aproximou convincentementeAuerbach e Burckhardt.

\QQ ExKaprograma:

$Lologicl e sociologia

Viço", OP cit., PP.z5i-5z. O mesmo enfatizava Georg Lukács em .f?üzón'ae comclé cla de c/mle, OP.cit, pp. iz7 e i64.

8i. P. ex. Auerbach, "Vice und perder", op- cit., pp. zz3 e z3z; "Uber Pascaispolitische Theorie", in Geiamme/re ,4z€6=dlÍeur ramanücÁen Pói/oZoFfe,op. cit., p. zo6; "Vico and the aesthedc historism", op' cit., p. z67; ]14Zmeiú,op. cit., passam.; Znrrodufâo aox es zrdai crer.ínoJ, op. cit., pp. 3z e z3i-3z; Z)

.#a/zÍãfücÁe PuóZz'Ézzm des r7.JaÁTÃu/zdern, op. cit., p. 5t-

8z. Auerbach, "Vice and aesthetic historism", op. cit., P. z74; Zz' eralzz/=pracÁeu/zc/Paó/z'Éizm,

OP.cit.} PP.9-22.

3oi

Suateoria do .dmazi.procura suprir essaidéia, quando a partir do singu

exigência benjaminiana parece referir-se, por seu turno, àquela outra

lar, mediante sua força de irradiação, abre-se a via da síntese que expõe

obra clássica do ano igz3, definidora de posições nos debates acerca do

"o movimento do todo".8s

teor histórico das criações humanas, na qual se lê:

Um comentador preso às diretrizes ideológicas da antiga Repú blica Democrática da Alemanha (RDA)reconheceua "clara renúncia

OTCL e o fato não podict escapctraos historiadores realmente importantes do

)

)

de Auerbach do historismo 'clássico'" -- que se converte, no andamen-

to que seguimos,em seu historismo potenciado, "relativismo radical". Na ocasião,firmava uma defesado filólogo, como ponto máximo da historiografia literária burguesa,a quem só faltou dar mais atenção"à mediação dialética entre base e superestrutura".84

séculoxix, por exemplo, a RLegl, Ditthey, Dvorák

i

CLessa ia dct história

reside precisamente na modi$cação dm {olmas estmmtais por intermédio dm quais se opera CLCOnfTOntaçãa do homem com o meio e que determinam

CLobjetividade da sucovida interior e exterior. Isso só é possível, objetivo e rectlmente Q só pode, por conseguinte, ser Cede quctdamente compreendidos se

Essaobservação vale por evidenciar que, até sob os critérios da antiga RnA, há a percepção do materialismo das análises de Auerbach; já em meu entender, e provocativamente, trata-se de um verdadeiro "historiador '')

CLindiviductlidcLde,a unicidctdede uma época, de umclformação etc., residir na OTiginalid(üe brutct dessa formas estruturais e sefor possível detecta- La e

mostra ta neta e por eLasU

dialético", "materialista histórico", para utilizar formulação conhecida:

Não é fácil ponderar com segurançaem que medida isso estápresente Ele fala época saltar da "continuidade hktÓTicct" coisi$cada, usam como cl

em Auerbach, educado nesseshistoriadores mencionados por Lukács

vida saltar dct época e, wsim, a obrcl sctLtarda obícl de uma vida. Contudo,

(sobretudo Dvorák Ihe foi importante). Embora Auerbach tenha sido

) resultado dessacon,stTUÇão é cinea obTCL de uma vida é retida e superada

sempre bastante reservado e económico com relação a formulações

[aufbewahrt

mais genéricas e desconfiasse de conceitos abrangentes,8' em seu texto

und aufgehoben]

na obra, a apor.z á refz'da e superada na obra

de uma vida e o tramcuíso histórico é retido e superado na época s'

capital de 1937,"über die ernste Nachahmung des Alltãglichen" ["So-

bre a imitação séria do cotidiano"],*: há um passobastanterevelador e Tanto quanto sou capaz de entender a obra de Auerbach, ela cumpre, a seu próprio modo, essaexigência de seu amigo Benjamin. Todavia, essa

enfático a respeito: Deve-se supor queuma tra formação na execuçãoartística irritativa e nos

83. Auerbach, "Philologie der Weltliteratur",

84. Ulrich Knoke, "Erich Auerbach

seus objetos está conectada a uma traí.sformação da visão de si humana e,

op- cit., p. 3ío-

eine erkenntnis-und methodenkritischeBetra-

chtung", in Zz'/z' ZezncÁnÚ/ürZz'ferarlzr'i4/úsemcÁ({#z zz/zdZzriguú iÉ, ano 5,fase. i7, i97S, pp-

gz, gi e 8z. E ainda; "De fato Auerbach, como muito raros teóricos da literatura de seu tem po, levou em consideração em suasanálises asforças produtivas e as relaçõesde produção em épocasdeterminadas; ele tentou compreender a realidadehumana como uma totalidade

86. Lukács, .f?:çrónae comczérzcz a de cZaie, op. cit. p. t73; ver também pp. l 8g-go. Tais "formas estruturais" de que fala Lukács remetem, creio, àquela "redução estrutural" de que falava Antonio Cândida, e o texto e esforço de Roberto Schwarz sobre o método de Antonio Candido, sua clarificação daquelas duas séries

realidade e literatura --, [em o intuito de explicitar essenexo.

que se transforma, com componentes ideológicos e materiais. Contudo, deu mais peso à

87. Cf. Auerbach, "Epilegomena zu Jt4z'mel&",op. cit., PP. i5-i7; p'z'er[;nrersucÁtz/zge/z {izr

coesão e à coerência dessasépocas do que às suas contradições internas" (idem, p. gl).

GeschichLe der$anlbsischen Bildung, ap. c ., pp- g- \o Literatursprache undPttbLikum , ap. cXt«

85. W. Benjamin, "Eduard Fuchs, der Sammler und der Historiker"(i937),

in GeiammeZre

SfÁngien,op. cit., v. n-z, p. 468. Posteriormente Benjamin retomou essamesma formulação de seuestudo sobre Eduard Fuchs em uma de suas"Teses sobre o conceito de história". nomeadamenteaquela na qual faz a crítica do-. historismo. Cf. Benjamin, Geiamme/remer4e, op. cit., v. l.z, pp. 7oz-o3. No que diz respeito a Auerbach, ver "Baudelaires /bzzrx du ma/

und dasErhabene",op. cit., p. z87; "Philologie der Weltliterarur", op. cit., p. 3o5;J4zmesü, OP-cit., p. 412;Z;lera ürlWracÀe zzdPüó/z'lum, op. cit., pp. g-z4-

302. Extraprograma: $!alDEia e sociologia

p' 47; "Vice's contribution to literary criticism", op. cit., p. z63; "Philologie der Weltliteratur",op. cit.,p.3o6. 88. Essetexto, publicado na Turquia logo após a chegada de Auerbach, e provavelmente escrito antes de suaemigração, enuncia claramente o programa de .4Zz meia. Portanto, é pura

mitologia afirmar que ]141meiúé "resultado" do isolamentoem lstambul, que de fato foi providencial para permitir a Auerbach a concisão sintética que torna o livro o que é. Mas a concepção,não deve haver dúvidas, já estavagestada no período de Marburg.

3o3

além disso, a uma tramformação correspondentedo próprio ser humano e de

/za#orma, sempre sintética e necessária".P3Por conseguinte, através da

sua estrutura soclalw

forma literária o filólogo tem a via de acessopara a totalidade.

Donde ter falado, mais acima, em "totalidade concreta", uma expressão

A essaaltura, é desnecessárioinsistir no nexo que se estabelececom as questões da forma literária tratadas anteriormente. Se voltarmos à re-

hegeliana retomada por Marx, que não era estranha ao teórico húngaro )

)

4

e que me parece exprimir com pertinência aquilo que Auerbach tinha em vista. Ê certo que Auerbach deixa aos sociólogos e historiadores o

senhade Mzmeiú por Kãte Hamburger, tocamoso fulcro do problema. i

Na ocasião, procurei enfatizar a similitude da formulação de Auerbach

estudo daquelas formas estruturais," mas toma como tarefa a compreen-

e Antonio Candido. É preciso, agora, retomar a questãodo subtítulo de

são das formas culturais referidas a essasformas, no que a construção da época, segundo a formulação benjaminiana, encontraria fundamen-

.44zmeiü e do problema que ele encerra. Auerbach fala em "dargeireZZze

to.9' Trata-se menos, fiel ao seu espírito, de indicar uma fundamentação,

WzrX:/ic,4'te;l"na obra de arte literária; não se trata de ".DarxreZZzzng der WzrÉZzc,6,te/r", isto é, apresentaçãoou exposição da realidade (ou, como

do que de clarificar algo que vive nas suasanálisesconcretas,como bem sabemos seusleitores: o século xvn francês.a Itália de Dante. o

os tradutores normalmente preferem, "representação da realidade"),

século xix na França, e até mesmo o século xx "mundializado"':

as

fases de Benjamin). Com efeito, a questão é que não estamos falando

grandes épocas estudadaspor Auerbach -- almejam precisamente essa compreensãohistórica, que ele procura desenvolver. Outxoss\m, o trabalho Biológico deve dar conta, sinteticamente,da fofa/idade Ãíszór/ca.Para tanto, o filólogo lança mão da obra literária, na qual há uma "sedimentação da situação da época" que é "mediada

da realidade-em-si, mas da realidade tal como a obra literária a expõe;

mas de uma realidade exposta n'z obra (para continuarmos com as ên-

e como a obra literária é uma forma própria como foi recorrentemente enfatizado ao longo deste estudo o modo como a exposição ocorre é constituinte, essencialmenteconstituinte, daquilo que aparece

como e é a realidade (na obra literária)

ou, por outras palavras, do

sentimento da realidade. 8g. Auerbach, "über die ernste Nachahmung desAlltãglichen", op- cit., p. z76, uma página decisiva a que remeto o leitor. go. Assim, p. ex., no estudo sobre o público do século xvn francês, a certa alara reclama da falta de pesquisados historiadores sobre o problema da estratificação social do período. Cf. Auerbach, Z)m.#a/zÍÕ'aücÁe P ó/zÃumdes l7. /aÃTÃzz/zderfr, op cit., p. 35)assim como p. i3) citada mais acima; ver tb. "über die ernsLe Nachahmung des Alltãglichen",

gi. A relação entre asformas estruturais e as formas culturais

op- cit., p. z76.

no jargão lukacsiano forma

Citando aquela resenha, assinalei que ali estava em jogo uma for-

mulação do problema da mediação da sociedade na obra, ao mesmo tempo em que atribuí a essaquestão uma centralidade decisiva no estudo da obra literária. Como também frisei, trata-se do mesmo programa que Antonio Candido formulada sob a rubrica da "crítica integrativa"

E, avançando nessadireção, diria que há uma espéciede materialismo

literária e processosocial tinha sido sistematicamentediscutida por Karl Mannheim em um texto de igzi-zz, publicado nolaÀróucÁjür KümgeicÀlcÀre,periódico soba responsabilidade

no modo de Auerbach, na "conversão" ("mediação", que se exprime naqueles"na" em destaque) do processo social em forma literária.P'

de Max Dvorák, que não seria exageradosupor que Auerbach conhecesse.Ver Mannheim,

Não quero com isso forçar Auerbach a uma posição que não é sua. Pro-

Beitrãge zur Theorie der Weltanschauungs-lnterpretation",

curaríamosem vão um momentoteórico em sua obra, no qual aparecesseum conceito de forma literária tal como indicado em Antonio

in }PhxemiaÍ;a/agia, op' cit., pp.

gt-i54> texto no qual Mannheim discute, dentre outros autores,Troeltsch, Lukács e Dvorák: Auerbach, em seu livro sobre Dance, cita o conhecido estudo de Dvorák, "ldealismus und Naturalismus in der gotischen Skulptur und Malerei"(igi8),

e julgo que o trabalho de Dvo-

rák foi bastante relavante para Auerbach, embora não haja menção a isso na !iteratura.

93 Auerbach, "über die ernste Nachahmung desAlltãglichen", op. cit., pp. z76-77, grifos

gz. Auerbach, "Philologie der Weltliteratur", op. cit., pp. 3oi-oz; p'zer tZnferx cÃzz/zge zzr

meus

Geschichtederjtanlàsiscken Bildttng, oç. çli., p- %;l.iteratursprachealta PubÍikt&m,op. (5t ) çp. g-io e z59; 7141mesü, op- cit., p. 5i4; carta de Erich Auerbach a Walter Benjamin, de o3 jan.

94' Essa fórmula, reconhecidamente lukacsiana, não por acaso foi tomada como título na

i937, in K. Barck, "5 Briefe Erich Auerbachs an Walter Benjamin in Paras", ZelncÃr Hr ür

schaftliche Enmicklurtg. Erich .4uerbach Beitrag Tur Theorie und MethodoLogic der Literatuí-

Germanúl;É) ano g} n' 6, ig88, p. 6gz.

geicúüÃze, op. cit.

3o4 Extraprograma:

$íoíogia e sociologia

única monografia publicada sobre Auerbach: Klaus Gronau, Zz'ferarÚc4eXorm EZ/zd gele//.

3o5

Cândida, Roberto Schwarz ou Georg Lukács (não obstante suasdife-

portanto dos sujeitoshistóricos concretosde um determinado tempo e

renças) mas encontramos uma aproximação sugestiva, cujo lastro é o andamento das pr(5prias análises.E isso nos conduz ao cerne de seus

espaço.Mais do que indivíduos singulares, Auerbach tem em vista uma

época,um momento histórico determinado. Em Auerbach, as épocas aparecemcomo totalidades históricas, cujos traços fundamentais ele procura indicar; a obra literária é, para o filólogo, a via de acessoao

esforços de formulação, ao problema das "forças históricas' A expressão aparece em Mzmesiç e em alguns outros textos e indica

um problema que perpassatoda a obra, à esperade estudo aprofundado.

Trata-se de compreender o modo como Auerbach concebeas "forças sociais e históricas", pressuposto para a compreensãodo teor histórico

e social da obra literária e, portanto, um ponto de ancoragempara a avaliaçãodaquele problema formulado por Fritz Schalk,dos limites de literatura e sociologia e dos esforçosdo filólogo. Ademais, a questão

conhecimento dessasépocas pois, como vimos logo acima, na obra há a

uma sedimentação da época e a época é mediada na obra.9'

Do que sepode concluir que na literatura antiga sedimenta-setoda uma época histórica, que o filólogo aborda através da obra; esta é uma

forma própria, forma na qual a épocaencontra-semediada. Essemovi-

das "forças históricas" está na base da compreensão alargada de "realismo" e de seu conceito em Auerbach.

mento é o que permite a articulação entre limite do realismo e limite da consciência histórica. Este seria, creio, o primeiro passo do argumento. O segundo refere-se ao problema das forças históricas. Anteriormente,

Para tornar um pouco mais clara essaquestão, vejamos uma passagem decisiva do capítulo de Mzmzeiüque trata de Petrânio, Tácito e

mencionei que o .é/aapraniar{de Auerbach em Mzmes&é a questão da

dos Evangelhos:

nessapassagemsobre a literatura antiga. Isso é revelador do procedi-

separação e mistura de estilos,"

o critério

distintivo

que aparece agora

mento de análise do filólogo: indagando como a literatura antiga Tocamos CLqui, ine'pitaveLmente, em uma questão furLdamental e bmtante di-

$cil. Se a literatura ürttiga não pretendia expor a vida cotidiana de moda sério, problemático e em seu contexto hbtórico, mm somenteem um estilo

no

caso, Petrânio, logo a seguir Tácito e depois, contrastivamente, os Evangelhos sinópticos figura a vida cotidiana e, constatando que

íadicc. aínão somente um limite de seu recLLkmo, mas também, e sobretudo.

suaspossibilidades de figuração circunscrevem-se ao domínio do estilo baixo (ocasionalmente, quando muito, médio), no qual não há problematicidade, seriedade, tragicidade, dramaticidade, Auerbach conclui

um Limite de sua comciênciaItistórica. Pois precisamerLte nu relaçõesespiri-

pela limitação da consciênciahistórica: a incapacidadede perceber o

tuais e econ6micm da vida cotidiana revelam-se uforças que estão na bme dos movimentos históricos. Estes, sejam referidos às guerra ou à diplomacia

um devir histórico

)u à comtituiÇão interna do estctdo,são apenm o resultado ou a resultado

dade de figuração, na modalidade de realismo que desenvolve.P8

baixo, de modo cómico ou quando muito idílico, despido de história e estático,

último das traí.sformações na profundidade

domínio da vida cotidiana como algo vivo, em movimento, em meio a

o que reverte, conseqüentemente,na sua capaci-

cotHiana qs g6. Auerbach, Zz'ferazzrspracÁe {zndPuó#Ézzm,op. cit., p. zo: "Se aceitarmos o pressuposto

Destaco alguns pontos importantes: há um realismo nessaliteratura an-

tiga (Auerbachestavadiscutindo Petrânio), masé um realismolimitado, ou seja,um tipo específico de realismo. O que define sua limitação e especificidade é que o caráter propriamente histórico dos acontecimentos narrados, ou daquilo que é descrito, é deixado de lado, pois não é perce-

bido enquanto tal. Nessesentido, Auerbach afirma que o limite do rea-

viquiano da unidade das épocas,então todo texto deve oferecer a perspectiva que possibilita a síntese.Empreguei freqüentemenEeo método, especialmente em .4dzmelú[-.]." Ver .14zmesa, OP.cit., pp. 4iz, Si8, assim como os estudos sobre Vico, p. ex- "Vice and aesthetic

historism", op. cit., p. z74. Embora nào enfrente a questão, parece-me que Auerbach vai na mesma direção que Adorno; "0 artista que produz a obra de arte não é absolutamente o sujeito psicológico, mas sim um sujeito social." Adorno citado em Max Horkheimer, Ge-

samme/leScÁreÓzen. Frankfurt; Fischer, ig85, v. iz, p. 555

lismo em questão é devido ao caráter limitado da consciência histórica,

97. Cf. Auerbach, -L;fera/lz/=pracÁe zz/zd Puó/IÉum,op cit., p. zo-

95' Auerbach, .44zmeiú,op. cit., p. 37; ver também pp. 34-35-

g8. Essaênfase no domínio da vida cotidiana, da cotidianeidade, está na origem da concepçãomesmado problema tratado em itdzmes&,tal como Auerbach revelou retrospectivamente em "Epilegomena zu J4zmeia" (op. cit., p. i4) e que teve sua formulação inicial em seu

3a6 Extraprograrna: filologia e sociologia

3o7

>

É oportuno destacar, embora lateralmente, que para Auerbach a

dade dessa vida cotidiana, Zoomdas forças históricas e sociais em ato.

narrativa histórica é um dramcz:assimele compreendiao seu próprio

trabalho como filólogo e sua escrita da história.PPA atribuição de dramaticidade e problematicidade àquilo que é narrado, pelo que se viu, implica uma consciênciahistórica aprofundada o que Auerbach atribui a um movimento que vem desde o romantismo e que) em termos gerais, denomina historismo, ao qual se alinha, na sua formulaçãode um "historismo perspectivistaradical", alémde frisar

)

mais de uma vez como sua disciplina, a filologia, é um dos resultados desse movimento histórico.ioo

Por conseguinte, percepção e compreensão dos movimentos históricos depende da capacidade de perceber o domínio da vida cotidiana

como dramático, sério e problemático. O filólogo toma conhecimento das forças históricas na percepção e compreensão das relações económicas e espirituais que serevelam na v/da cor/d/ana:nas formas concretas de vida dos homens.

e compreensãodaquilo que ocorre nessedomínio. Quando a vida cotidiana é tratada no registro satírico, grotesco ou cómico (estilo baixo), há

uma limitação na compreensãodo movimento das forças históricas. Se, ao contrário, a esfera da vida cotidiana é reconhecida em sua dramatici-

i

dade e problematicidade, há percepção e compreensão do movimento e do aduar das forças históricas. Então, tudo é movimento e drama.

Ademais, é preciso enfatizar que justamente a tradição judaicocristã -- à diferença da tradição clássica enobreceu a esfera da vida cotidiana. Como Auerbach nos ensina, a relevância da profundidade cotidiana é um produto da visão de mundo judaico-cristã. Sobretudo o cristianismo atribuiu ao cotidiano uma dignidade nova e, conseqüentemente,os objetos da vida cotidiana e popular pude ram ser vistos e considerados sublimes e dignos. A história de Jesus

lam vivem nas relaçõesespirituaise económicasque perfazem o domí-

possibilitou "une synthêseentre le humble et le sublime" e o resultado disso foi que "trop de réalisme, trop de vie concrête" pede ser exposto '': Precisamente essa"vie concrête" indica o lugar no qual

nio da vida cotidiana.''' O devir histórico estáenraizadona profundi-

atuam as relações económicas e espirituais.

As forças que estão na base dos movimentos históricos e os mode-

>

C)utrossim, a consciência histórica refere-se à capacidade de percepção

texto "Romantik

und Realismus",

.AreizelaÃróücÁerjü'r

mLfem(Áa#r

zz/zd/uge dólZ2u/zg, ana

9, í933, pp- i43-53. Esse destaque dado ao mundo da vida foi destacado por H. U. Gumbrecht ( Ham Zeóen zz/zdSleróen der groire/z Rama/zís en, op. cit.) e merece estudo mais detido; ver

Hans Blumenberg, Zeóe eii u d We/cell. Frankfurt: Suhrkamp, zoom,parte i99'

Cf.

Auerbach,

Z.írerarurspracÁe

znd PüóZzÉüm,

op.

cit.,

pp.

io

e zz;

}'z er t;nrerx

zc&zz/zgen

{zzr GeicÃífÁreder./}anÍósíscÃen.BIZ2ung,op. cit., pp. 7-ii; H. Kuhn, "Literaturgeschichte

als

Algo análogodeixa-seformular com relação à questãodos "realismos": haverá diferentes modalidadesde realismo em função da capacidadede reconhecimentodaquilo que ocorre na profundidade da vida cotidiana. Um determinado tipo ou modalidade de realismo depende sempre dos limites da consciência histórica, que dizem respeito à capacidade de percepção das forças históricas, e esta depende

da história como um todo imanente de sentido. Ela seoriginou em vários lugares, mas prin-

finalmente, por assimdizer, do grau de reconhecimento da dramaticidadee problematicidadedo domínio da vida cotidiana. Quanto maior o reconhecimento, maior a consciência histórica, e correspondente-

cipalmente na Inglaterra e na Alemanha; na Alemanha ela vivenciou o seu apogeu-Sugerida

mente mais profundo, sério e problemático o realismo.'o' Na verdade,

Geschichtsphilosophie", op. cit., pp. zz6-z7. íoo. "Somente em oposição a essamentalidade hostil à história é que surgiu a idéia moderna

desde os anos i76o por Johann Georg Hamann, organizada metodicamente primeiro por Herder, ela atingiu suaexpressãofilosófica perfeita nas obras de Hegel e os fundamentos de suaprática nos intelectuais românticos. A disciplina que represento,a filologia românica, é

lar derírdücÁen me#, op' cit., PP. r8-33; Zírera/zzrxpracÁe zndPuó/z'Ézzm, op. cit., cap. i) 44z-

cit., p- zz3, assim como ]141mei&,op. cit., p. 4iz; Zireraru/lpracóe und Puó/I'Ézim,op. cit., p. g;

mesn, op. cit.) cap. z>esp' pp 43-5z e 73-74 Aqui encontramos uma passagempara o tema

"Philologie der Weltliteratur", op. cit.; "Epijegomena zu J14z melÜ", op. cit., p. i7; /nrrodufãa

l

l

i02. Cf. Auerbach, "Sacrae Scripturae Sermo Humilis", op cit., PP.63-64; Da/zreaà Z)!ca-

um ramo menor da árvore do histerismo romântico [...]."Auerbach, "Vice und perder", op.

aoseirlzdoi #reránas, op. cit., pp. z3o-3z; "Romantik und Realísmus", op. cit.) pp- i46-47.

e problema da S l/ne/z/zzzng e S IZmücÁü/zg(separaçãode estilos e mescla estilística), que operam como fios condutores ("HaüpEa«.;arÍ") em 7Mzmeiú.

ior. Em Z)m.#an õ'siscAePlzó/I'& m des i7../aÁTÀundern, op- cit., p. 35, Auerbach critica os

io3' A oposição entre a tragédia francesa clássica e o grande realismo francês de Stendhal

economistaspolíticos que falam de "relações de produção", uma idéia genérica que não é capazde explicar "como oshomens vivem'

Balzac e Flaubert oferece exemplo lancinante: de uma "metafísica" a uma "física" das pai-

3a% Extraprogíama= $íologia e sociologia

xões.Cf. Auerbach,.4/lmex&,caps xv e xvm; "Passioals Leidenschaft", op. cit. e "Racine >

3o9

deve-se ter em vista que o problema de Auerbach não era, em Mzmeiü,

um problema especialmente candente é tornar clara cl relação dcl "inova-estrutural" real, ecanâmico-social do clesenvoLvimerttomoderno com suco"su

escrever uma história do realismo, mas sim, em função do /7aupram'zr? adotado, indicar "a medida e o tipo de seriedade, problematicidade ou

perestrutura" ideológica, çient$co-ético-religiosa; uma problematizaçãoque

tragicidade" presenteem diversasobras de diferentesépocas.'o'Tudo

ctdquiíiu uma signi$cctçãopráticcl e teórica absolutamenteextraoídinári(t por

isso apenas de modo indicativo, pois a questão requer maior estudo.

conta clo dogma histórico-$1osó$co da Democracict Social. Trata-se sempre da

Nesse contexto, o discurso sobre as relações espirituais e económi-

casprecisa ser compreendido como diferença e crítica frente ao materialismo

histórico,

tal como

se pode

ler em .[;rer.zfzzrxpracÃe

zz/zdPzzó#X:zzm.ios

E preciso ter em vista que, aqui, tocamos um ponto recorrente e polêmico

nas GeüreswiçsenicÃa#en ao final do séculoxix e iníciosdo séculoxx. Trata-se de uma contraposição ao postulado marxista da determinação

pela infra-estrutura económica e da defesade uma via de mão dupla entre as determinações ideais e materiais.'" Ao mesmo tempo, trata-se de diferença e crítica frente àsinterpretações puramente idealistas -- no caso de Auerbach, expressamente manifesta na sua diferenciação frente

a Leo Spitzer.'" Essa problematização já era perceptível no professor e mentor de Auerbach, Ernst Troeltsch; cito uma passagemna qual aflora com clareza modelar:

questão: em que medida os elementos ideaisjá

i

estão contidos naqueles outros,

e em quemedida os elementosreais encorltram-se nestes.E com toda probabilidade é isso que ocorre, de modo particular, com todo obieta particular)"

Essaproblematização aparece também na obra e no contexto de Auerbach: ele mantém-se seguramente distante do "dogma"

crença no pro-

gresso,precedência absoluta da infra-estrutura económica

e procura,

em seusobjetos literários, investigar as relações das dimensões materiais e ideais. Por exemplo: ao discutir a Renascença, Auerbach destaca a sua

"base económica",'" que desempenhaum papel fundamental na sua argumentação (mesmo que o destaque não seja sempre correspondente à importância), pois está relacionada com o processo de formação e desen-

volvimento de um público, como se viu uma categoria basilar em seus estudos (a ponto de ser, por conta disso, considerado por alguns como sociólogo da literatura' :'). Leia-se então estepasso: "Os metais preciosos > und die Leidenschaften",

op- cit.; Z)m ./?a/zÍõkÜcÁe Pzzó/z'Ézm dei i7. /a'brÁurzderzi,

op. cit.,

/nlradufâa aoi eifzzdoa/llercínai, op. cit., pp. i88-zo8. A distância do cotidiano foi indicada por Auerbach também em Baudelaire; ver "Baudelaires /bizrs da ma/ und das Erhabene' (l95i),

OP. cit.,PP. z75-9o

io4. Cf. Auerbach,.4/zmeiü,op.cit., pp. 5i7-i 8 e 3z6(no capítulosobreCervantes,portanto de vedação posterior).

to6. Tratei do problema em .4s averzrürmde GeorgSfmme/, op. cit.; ver tb. Georg Simmel, PÁ;/aiopÁ;edei Ge/dei.Frankfut; Suhrkamp, ig8g, p. i3io7- Contrapondo-se a Spitzer, Auerbach afirmou que seu colega estava sempre preocupado com "formas individuais", enquanto ele mesmo estavapreocupado com algo mais universal, que Ihe permitisse "escrever história". Ao mesmo tempo, o universal era contra balançado pela mais diligente atenção ao particular (como seviu com relação à exp/zcafzan de erre). Ver Auerbach, Zzrera/urspracÁe znd Püó/tÉum, op. cit., p. zo; Hzer UnrerslzcÁunge'z

{ur Geschichtederjranlõsischen Bildung, op. cit., p. lo; Introdução aos estudosLiterários, op. dt' ,

pp- 38-4z. O problema foi bem indicado por U. Schulz-Buschhaus,"Auerbachs Methode' OP.cit.,pp.596-97,6oi-oz e 6o4.

$íologia

à virada do século não há apenas uma explicação motivacional nem institucional; nem apenas uma explicação referida àinfra-estrutura nem apenasreferida à superestrutura; há asduas coisas, e na verdade em um quadro conceptualque se situa para além das alternativas de materialismo e

ro5. Cf. Auerbach, op. cit., p. zi. É preciso ter em mente que setrata aqui do mamismo da n. International o que, por outro lado, torna a posição de Auerbach passívelde aproximação com a de Walter Benjamin em "über den Begrifí der Geschichte" (esp. tesesxm e xvn).

\O Extraprograma:

ro8. E. Troeltsch, "Die Kulturbedeutung desCalvinismus", op. cit., p. i8g. Um conhecidopesquisador da obra de Weberformulou o problema do seguinte modo: "Para o Wêber posterior

e sociologia

idealismo"(W. Schluchter,Re/zgz'an K/zdZeóe/nÓÜ'Ám/zg. Frankfurt: Suhrkamp, i99i, v- i, p- 72). Seria preciso indagar em que medida Auerbach desenvolve uma posição similar, conforme se pode depreenderde uma passagemcomo a seguinte: "A contribuição do positivismo IAuerbach nomeia Taine, lw] para os estudos históricos e as Letras é deveras importante e preciosa; ele nos ensinou a manter os pés sobre a terra ao explicar as ações e obras do Homem,

e se é verdade

que os fatos materiais não bastam sempre e inteiramente para explicar os fenómenos literários, é absurdo querer explicar estes sem levar em consideração aqueles". Auerbach, /nnodaçã aos esrzzdai/z erórlai, op- cit., pp. 33-34; cf. Mz'meiíç,op. cit., p. 368. Ver um exemplo em Auerbach,

Zz'ferazrxpracÁe zz/zZPüÓ/z'tzzm, op. cit., pp. zo8-o9. íog' Auerbach, ]n/radEzfãaaoi esazdai/z'er.ínai, op. cit., p. i55; veja-se por exemplo a importância atribuída às cidades italianas em i14zmexa, op- cit., pp. i35 e zog, e em Zírerar z/KpracÁe

u/zdpuó#&zzm,op. cit., pp. zz4-z$ iio. Ver Auerbach, /nfradufãa aoi eir idas /i eránai, op. cit., p. 37, além dos comentários de F. >

3ii

que entram na Europa aceleram o progresso do capitalismo 6lnanceiro e,

no realismo antigo, as força sociais que estão rla bme das relações que são

provocando crisesterríveis, dão a uma camadabem mais ampla do que

expostas a cada ve\não são cLari$cctdm. Isso só poderia ocorrer nos quadros

anteriormente a possibilidade de se enriquecer; será a classe 'média', a burguesia moderna, que irá constituir o público de que falamos [...]".i'' Não

daquilo queéséTioe problemático; mu, comom personagem.s não abandonctm

obstanteo tom didático, a ser debitado na conta do manual escrito para

çãojeitoscl ou um isolamento grotesco e TepreemÍvet. O indivíduo exposto de

seusalunos na Turquüa, vê-se claramente como as forças históricas não se restringem e referem a indivíduos singulares, senão que há uma força social que permeia o desenrolar da história, imprimindo nele sua marca. Ora, como Auerbach também menciona, "a formação do público instruído na Europa e a lenta extensão de seu poderio, lenta masininterrupta a partir da

o rernfórla

do cóm;co,

süa relação

modo realista, em Última i a

com

a universalidade

é ozz zzma aaãzplcz

tância, nunca tem TalãoPente à sociedade,e

estcl aparece como dada, algo que não carece de esclarecimentos quanto à sua origem e aos sem efeitos, como uma imtituição

invadavetmente

estática

no jimdo dos respectivosacontecimentos. Também isso tramformou-se muito

nos temposmaia recentes.Para a literatura realista antigct, Q sociedadenão

Renascença[...] é um dos fenómenos mais interessantese dos mais impor-

exbte Gamoum problema histórico, quando muito como um problema mo-

tantesda civilização moderna".'': Assim, sepor um lado o autor "cria" o

ral, e de mais CLmctiso moralismo dil mais respeito aos indivíduos do que

público (como vimos com relaçãoa Dante e Montaigne), e por outro a for-

à sociedade..4 crítica dos vícios e nccrescêncim\- ÀformuLa o problema de

mação da linguagem literária imbrica e enlaça ambos, por outro lado ainda, esseprocesso está imerso em condições históricas e sociais concretas, que o

modo individualista,

Gllólogo nunca perde de vista.''; Portanto, quando a expressão "corças históricas e sociais" aparece em Auerbach, ela é indicativa de todo um nexo

de sorte que a crítica da sociedade nunca conduz a um

desvetamento das forças que a movem.' ~'

Em Mzmeiiç, Auerbach investiga um amplo espectro de modalidades

de questões, que apenas o contexto mais amplo pode indicar e esclarecer; tudo isto também informa a citada resenhade Krauss.

de realismo, isto é, como procurei sugerir, conteúdos diferenciados da consciência histórica, que se referem a diferentes épocas históricas. Do

A questão das "forças históricas" aparece como uma fundamenta-

realismo antigo ao do século xix de Balzac, Stendhal e Zola, somos con-

ção do realismo: a modalidade de realismoé "determinada" pelo teor

frontados com uma pluralidade de realismos

da consciência histórica, por assim dizer a capacidade de compreensão

rosamente, diferentes modos e intensidades de tragicidade, problematicidade e seriedade --; todos eles expõem uma realidade, mas o fazem de modo diferenciado. Como, em Mzmeiü, o .H;zapr'zm'zz{ estádado pela

do movimento histórico profundo, vale dizer, do movimento das forças históricas. Em diferentes concepções e compreensões do movimento das forças históricas condensam-se diferentes realismos de conteúdos variados. Auerbach faz a seguinte distinção: > Schalk, "Einleitung",

in Auerbach, Gesamme/[e 4ie#=àrÍe ur ramanúcÁe/zPÁl;o/Onze,op. cit.,

pp. ii-i3, i7 e H.R. Jauss, "Literaturgeschichte als Provokation der Literaturwissenschaft", in Z;regar rgeicÁ;calea6 Pravo4alz'an.Frankfurt: Suhrkamp, i974, p. i8o. ili. Auerbach, /nrradufão aoi eifzzdai/z ercínai, op. cit., p. i56.

riz.Id.,ibid.,p.i55.

ou, falando mais rigo-

doutrina da separação dos níveis de estilo e sua contraposição na mescla estilística, toda a análise, a cada passo, é referida a essa embocadura. A

oposição, no passocitado, entre o realismo moderno e o realismo antigo é também uma contraposição entre formas diversas de consciência hist(trica. Aquilo que permanece encoberto no realismo antigo, a saber, a percepção do movimento das forças sociais e históricas que se dá no domínio da vida cotidiana, e por isso esta é considerada em toda a sua se-

íl3- Werner Krauss, em parecer sobre Auerbach, com vistas à sua nomeaçãocomo ca-

riedade e tragicidade --, no realismo moderno é não só percebido, como

tedrático na Universidade de Berlim, em i949, aârmava: "Seus trabalhos sobre a novela

até mesmo tematizado: o romance moderno tomou para si a problematização do próprio movimento das forças históricas, explicitou como seu

italiana, sobre Dante, sobre o público francês no século xvli revelam, além do mais, uma tendência acentuadaao aprofundamento sociológico e a uma orientação metodológica pela história literária comparada." Krauss, parecer de zo mar. i949, in K. Barck (org.), "Eine

unverõfíentlichte Korrespondenz.Erich Auerbach/Werner Krauss", in Beínãlge{zzrRoma-

l i4. Auerbach, ]141mesü,op. cit., p. 3S;ver também pp. 36-37, 43) 46-47, 3og) 348, 35z, 4oz-o3

rzúcÀe/z PÃiZoZogie, v. xxvu, n' 1, tg88, p. i86.

4i% 4i4, 43i-3% 447>48o etc.

3\ 2. Extrapfograma:

l

$!elogia

e sociologia

3i3

problema a relação com a universalidade

e daí a enorme importância

menos CLnteúormerttedespercebüos ou negligenciados. Esse desenvolvimento,

de Balzac e Zela para Auerbach,''s e é disso que resulta o tom diferen. dado do capítulo final de Mzmeiü, propriamente elegíaco.

favorecida por alguém tendência da $Loso$a moderna, acarretava uma

De todo modo, o problema do realismo é relativo às diferentes moda-

objetivo e una, e pulava-se CLcompTeendê-lacada veq.mais comoumclfun-

lidades que a literatura desenvolve para figurar o real. Auerbach foi acusado de pouco rigor conceptual,:'' mas talvez isso tenha sido uma incompreensão de seu próprio escopo analítico: "quando Auerbach falava em realismo não

desintegração da carLcepçãoda íectLiclade;deixavct-se de comiderá-La como ção dcl comciêmia, de sorte que à noção de uma realidcLdeobjetivo, comum a todos, se substituíam realidades diferentes segundo a comcLência dos in-

i

divíduos ou grupos que a contemplavam, os quais mudavam, por sucovel.,

supunha uma categoria sempre idêntica a si mesma,mas[.-] uma categoria meta-histórica, definida como a representaçãodo homem em suá ambiência

emfunção de seu humor ou de sua situação, modi$cartdo-se, assim, na sua maneira de 'perosfenómenosdct realidade. À realidade una e indivisível se

temporal e de acordo com suascoordenadas temporais".' ''

substituíam, pois, diferentes camada da realidade, vale dites, um perspec-

z'z'pz.s/zzo co/z.çcze/zz'e 1... 1. ' 'ó

Por outras palavras: é uma aguçada compreensãohistórica e social das obrasliterárias que permite a Auerbach, emMzmeiü, decantaruma série de modalidades singulares de realismo e, com isso, "escrever história".

Todavia, o próprio curso da história veio problematizar ainda mais essaquestão,quando se tem em vista a literatura do século xx,

no enfrentamentodo filólogo com a literatura de seupróprio tempo. Trata-se de

am desenvolvimentoassai interessantedo Realismo. O subjetivismo se in trodu#u, como é muito natural (.ejá na tradição stendhatiarLaà na arte rea

Lista;produltu obra quedavam, da vida humana, imagem muito pessoais, por Nevesestranhas; elm coNtaCTavam e agrupavam os homens e os fcttos

de maneira insólita e imprevista, davam deles uma análise sociológica ou psicológica de acordo com um ponto de vista particular, iluminavam Íenâ-

As conseqüências das realidades múltiplas

um tema da fenomenologia husserliana,fortemente presenteem seu ambienteintelec tual

levam-nos ao cerne do problema da realidade na obra da arte,

que tangenciei variadas vezes ao longo deste estudo.''' Como veremos logo a seguir, o próprio trabalho de Auerbach não permanece imune a essemovimento indicado no texto, de sorte que a noção de realidade presente em seu programa "realidade exposta na literatura" é decomposta (ele dizia: "desintegrado"), de uma realidade

objetiva em realidades como função da consciência (que, não sendo absolutizada nem essencializada,é múltipla); passamosde uma realidade una e objetiva às realidades múltiplas. É precisamente essa

passagemque indica a tarefa do filólogo: se anteriormente a "realidade objetiva" era "comum a todos", isso se perde um diagnóstico de Auerbach sobre seu próprio tempo e agora as realidades

ii5. Já vimos como Auerbach, em total conHuênciacom Lukács, percebia em Balzac "o presente

são particulares, não possuem generalidade. Cabe então ao filólogo

como história". Agora podemosaditar o sentido que Auerbach acrescentaa essaaârmação:

construir um nexo de sentido que recupere alguma generalidade ao que é pura particularização isto é, "escrever história". Isso é tornar viva a experiência cristalizada nas obras, que sendo humanas não nos são estranhas, mas precisam ser vivificadas pelos leitores

:seus homens e atmosferas são sempre representados como fenómenos que brotam das forças

e eventoshistóricos". Auerbach, ]16mei&, op. cit., p. 447. O mesmohavia sido formulado no sexto anterior, "über die ernste Nachahmung des Alltãglichen", op. cir., pp. z88-8g.

ii6. Auerbach exprimiu-se assim em "Epilegomena zu ,A/zmeSEs": "Falou-se muito que minha conceptualizaçãonão seria inequívoca e que os termos que utilizo para as categorias classificatórias careceriam de uma deânição mais clara. De fato, não defino essestermos e não os emprego com coerência. Esse método é proposital. Busco o rigor na análise do par-

ticular e do concreto" (op. cit., p. l 5); "Philologie der Weltliteratur", op. cit., p. 3o6; algo similar em 71,dbnesü', op. cit., p. 5l7. il7. L. C. Lima, "Auerbach: história e metaistória", in .çocledadee {üçc zrTO.Ácc;ona/. Rio de

Janeiro; Guanabara, ig86, p. 4i8.

3 \ 4 Extraprograma;

$!ologh

e sociologia

(um antigo tema do romantismo alemão). Trata-se de um comparii8. Auerbach, /nrrodufâo aoi eirzzdoa # er írz'as,op. cit., p. z44, o mesmo problema, formula. do com mais vagar, apareceno capítu]o âna] de ]141mesú, op. cit.

ríg' Vela-sesobre o problema Hans Blumenberg, "Wirklichkeitsbegriff und Móglichkeit des Romana", in HarÁerúcÁelznd merapAoroZogücÀe .çcÁreÓlen. Frankfurt: Suhrkamp, zoom PP.47-73

3i5

tilhar de experiências que Auerbach explicita ao final de MzmeJ;s e

percebido por Kãte Hamburger e Antonio Candido. Isso significaria

nos seus livros subseqüentes.i:o

que as variações do realismo correspondem a transformações na ima-

Por outro lado Auerbach, com sua dissoluçãoda categoriamono-

gem do homem e a transformações da sociedade, "história da conquista

lítica de "realismo" e sua multiplicação em vários realismos específicos,

literária da realidademoderna",':' que o historiador dialético procura

realiza um daqueles agrupamentos insólitos e imprevistos. A desinte-

expor e compreender. Há, por fim, uma última questão: como seria a escrita da história pelo filólogo judeu-alemão? Em uma conhecida e reveladora passagem

gração da concepçãode realidade de que fala Auerbach é funcional para que .44zmeiútrate da realidade expostana literatura: é a obra de

i

do capítulo final de Mzmeiiç, Auerbach aproxima o filólogo moderno,

arte literária que configura, em si, a realidade que o filólogo, analisando e interpretando, apresenta (nesse ponto, uma apresentação de segunda

isto é, ele mesmo, do escritor moderno, objeto de sua atenção. Auerbach

ordem: Auerbach fala em uma "história do modo como o real é apreen-

demonstracomo o escritor moderno renuncia a um transcurso temporal

dido literariamente"::'). Trata-se de entender que não há mais uma

totalizada; donde se poderia concluir que também o filólogo não pode

realidade verdadeira dada de antemão, mas sim que a obra cria uma

pretender essatotalização. A conseqüência disso seria a fragmentação e,

realidade tal como ela é /za obra. A passagem que Auerbach destaca, de

/z'z.#agme/z/Grão, a vú.io do rodo: "0

uma consciência una e objetiva para o modo como uma consciência vê

tude do escritor com relaçãoà realidade do mundo que ele apresenta".':s

e vendo constitui seu objeto, essapassagem é engrenada com o historismo, no sentido da capacidade da percepção desse relativismo, lastreado

uma exposição ou apresentação) da "dargei e/7e WzrÃ#c,6Xe/["na lite-

historicamente. É por essarazão que Auerbach enfatiza a continuidade,

ratura, depreendemosque o todo dependedo filólogo, isto é, do modo

na menção ao subjetivismo de Stendhal; e, como se sublinha em Mzme-

como ele seposiciona com relação à realidade do mundo que apresenta.

sü) o grande realismo do século xix é dependente do historismo.i::

Ora, sabemosque essemodo de relacionamento,por assim dizer, é a

No que diz respeito à estrutura narrrativa de Mzmesü, a noção de

realismooperaria segundoum princípio retórico de similaridade:tz'a cada vez, é de um realismo que se fala, mas há uma similaridade entre

cadafiguração sua, o que permite que se fale sempreem realismo,

uma questão da ati-

Se entendermos que o livro Mzmeiü é uma -Darxze/7u/zg (isto é,

.4mc'6azzzz/zg, a capacidade -- e atitude

do sujeito de perceber os nexos

significativos que fazem do todo um todo.':' O todo é uma construção do filólogo, que cuida da unidade e sentido do todo em pauta no livro e, portanto, do nexo histórico que seencontra nele presente.

ComentandoProust, Auerbachafirma que sua narrativa exi-

embora a cada vez seja um realismo particular. As conseqüências disso

para a relação de obra literária e sociedade e história são amplas, pois

todo é portanto

ge uma participação atava do leitor, no sentido de que há muito que

fica sugeridoque é na mediaçãode obra e sociedadeque se funda a modalidade específica de realismo, que responderia, creio, ao desafio

124.Auerbach, ]141mexú, op- cit., p. 3i6.

iz5.Id.,ibid.,p.497. izo. "A história interior dos últimos milênios, que a âlologia, enquanto disciplina histórica,

iz6. Segundo Auerbach, o universal é dado por uma '4mcÁazzzz/zg de um transcurso históri

trata, é a história da humanidade levada a sua auto-expressão.Ela contém os documentos

co: não é uma teoria do destino da humanidade, não há lei ou leis que ordenam o transcurso histórico, mas é possível uma visada do sujeito que compreende o todo, isto é, realiza a

das poderosas e aventurosas investidas dos seres humanos na busca da consciência de sua

situaçãoe na atualização daspossibilidades que lhes sãodadas]-.]. O que somos,tornamonos na nossahistória; só podemos viver e nos desenvolver nela. A tarefa do filólogo universal de nossaépoca é mostrar isso de tal modo que isso penetre e se torne inesquecível." Auerbach, "Philologie der Weltliteratur", op. cit., p. 3o3 in. Auerbach, ]141meiú,op- cit., p. i3o.

síntese que dá sentido à história("Sz ri7zgeóungdex .çzlzn/Dica", na expressão saborosa de

Theodor Leasing). Auerbach repudia as"leis" e as"categorias de ordenação" asleis "são demasiadosimples para dominar o todo dos acontecimentos" e não obstante o universal o todo permanece como tarefa do filólogo cuja "intenção é escrever história". Se não há leis e elas não são possíveis, a totalização, a síntese, é tarefa da .4mcÁaülz'zg,capacidade subjeti

izz. Cf. i141mesü,op. cit., pp. 4iz-i3; /azradufâo aoaeiladoi #fercínai, op cit., pp. 23o-32.

va de compreensão que define o "relativismo radical" e "compreensivo" de Auerbach. Ver

iz3. Cf. T. Bahti, "Viço, Auerbachand Literary History", in /)%íZoZogzca/ Qaarfer/g,v. 6o,

Literatursp'ache undPublikum, ap. clt., py. zl e 22 ; c{. Vier Untersmhüngen {ut Geschichteder

primavera lg8i, n' z, p. z48.

f

3t6 Extraprograma:

$íologia e socioiagia

ósücÃenBz/2lz/zg,op. cit., p. 8.

3i7

permanece à espera de que o leitor complete o que foi apenas esboçado ou então deixado de lado. O mesmo vale para a obra do filólogo, pois embora sealmeje a síntese,não há completude.':' Completude que,

= os nativas, que cotüuTem a minhct investigação, e pov caretados quais eLa foi escritct, seriam completamente soterrados sob CLmusa de dadas materiais,

ademais, não seria nem possível, nem desejável. O texto parece ser de

que há muito são conhecidos e podem ser obtidos nos manuais. Em contrapo-

minha convicção, é um modo equivocado de CLdquirire utilizar conhecimentos.

capital importância para a compreensãoda empresaauerbachiana(e

tção a isso, parece'me produtivo e facto'pel o método de deixar-me condu\ir

não só dela):

por algum motivos queforam sendotrabalhadosgTaducLlmente e seminten-

i Proust apresenta diu

e momentos singulares de épocas variada,

mas as mu-

danças exteriores do destino, que atingem nesseínterim as personagen.sdo

ção e testa-Los em umcl quantidade de textos que, no curso de minhct ativi-

dctdefilológica, se me tornaram vivos e conjiderLtes.Pois estouconvencido que CL queresmotivos fundamentais da hi.stóüa da exposição da reaLidctde,se

romance, são menciortadm apenm ocasionalmente, ou retrospectivamente, ou

os w corretamente, precisctm se deixar compro'Par em qualquer texto reaLbta.

'rlesmo antecipadamente,

apara

sem que o $m da narrativcl

repouse nela;fTe

qüen-

voltar então aos escritores modernos

que preferem o esgotctmento de

LementeeLu precisam ser comptementadm pelo Leitor \.. \. Nesta modijicaçào de ênfue ncpvime-se algo como um deslocamento de con$ança: anibui-se menor signiFcação aos grandes pontos de mudança externos, atribui-se-Lhes

um processo cotidiano qualquer no interior clepoucos dias e horta à apresentação cronológica e completa de um transcurso totctl exterior --, tctmbém eles

menor capacidade em dar o decisivo acerca do objeto. Em contraposiçãoa isto,

é impossívela real compLetudeno interior de um tramcurso total exterior e,

a con$ança é dada a um pinças e destcLcar qualquer do tramcuíso da vida; em

nisso, fazer brilhar o que há de essencicLL.TçLmbém eles têm receio de atribuir

qualquermomento poderia estclrcondão e poderia seí apresentado o conteúdo

à vid.t,

totctLdo destino. Tem-se mais con$ança nm sínteses que são obtida

ao seu objeto,

uma ordem

que eLa mesma

não oferece)ZR

mediante

o esgotamentode um acontecimentocotidiano, do queem um tratamento total ordenctdo cronologicamente,

tde modo mai.s ou menos comcientebsão condu+dos petct comiseração de que

que persegue o objeto do começo até o $m,

O filólogo, portanto, não atribui uma ordem externa que não se encon tra no próprio fenómeno, senão que procura desenrolar uma série de

esforça-se por não omitir o que há de essencial no âmbito exterior e destaca

motivos em uma série de casos.Um resenhistaafirmou, com proprie

enfaticamente as grandes mudança do destino, msim como m articulações

dade, que Auerbach escreveu um único livro, "um fragmento composto

do acontecido. Pode se comparar esseprocedimento dos escritoresmodeT-

de fragmentos", no qual todos os seus escritos se reúnem; e o próprio

'los com o de ctLgunsfilólogos modernos, queentendemque sepode ganhar

autor afirmou, em seu último escrito, que ele

mais e em mpectas mais decisivos acercçlde Shakespeare, Racine, Goethe e Phêdre ou Faust, do gae arar /r de Zl+õeigazezrcz/amiúzemáfz ca e cro/zoZo-

estavaà procura de seu objeto::P.O resultado não pode ser, assim, uma história entendida como uma história de um objeto específico, em sua origem, devir e finalidade, mas uma história fragmentada, seletiva, mi

gicamente de su

e obTm;pode-se mesmo tomar como exemplo disso

crológica, cuja totalidade é vista ;rznzzceno singular, cuja totalidade

a presenteinvestigação.Jamab teria podido escreveralgo comouma hbtória

depende da capacidade de síntese do autor e do leitor, já que há uma simbiose entre eles, sem a qual não seria possível falar em totalidade

sum épocasa partir de uma interpretação de cttgumm pesagem de 'E3.am\et, vLd

clorealismo europeu; teria me afogado na matéria, teria sido preciso adestrar am discmsões sem jim acerca dos limites das diversa épocas, acerca da ordeactção dos escritores singulares

nessas época,

e sobretudo acerca da de$nição

do conceito de realismo. Além disso estaria forçado, por contclda completude, l me ocupar de fenómenos que me são conhecidos apenas supev$cialmente,

o fragmento -- ainda

o que explica as significativas interlocuções com os leitores ao final de Mz mexa e da "Introdução" de -L;fera a XWracÃe zzndPzzó#Ézzm.A totali-

dade de sentido é a síntese que o sujeito pode vir a realizar com os materiais que são apresentados,mas ela não é dada, posta, por Auerbach:

de sorte que precisaria adquirir ad hoc conhecimentos sobre eles, o que, na

iz8.Id.,ibid.,pp.5o9-io. iz7. Cf. Auerbach, Mz meia, op. cit., p. 5og-

3\ % ExFaprograma:

$!olaria

e sociologia

izg' Cf. H. Kuhn, "Literaturgeschichte als Geschichtsphilosophie", op. cit., p. zz3; Auerbach Zzrerafzz/Kpracée zndPizóZz'Éum, op. cit., p. z4-

3i9

ele oferece as condições para sua posição. Daí que a ,4nicÀazzzzrzg, que oferece a síntese, tem o sujeito como suporte, seja ele o autor, seja ele o le ot: " chaqtte homme porte [aforme entiàre de t'humaine conditiod

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A escrita da história está conectada a transformações na imagem do homem e a transformações da sociedade;Auerbach sintetizada isso na sua própria compreensão da história: seu "relativismo radical", que supõe um entranhamento radical do homem em seu tempo e, ao mes-

mo tempo, um estranhamento radical. Uma experiência humana que estána raiz de sua compreensão histórica e que ele, quando se viu forçado a formula-la, soube apenas citar um monge do século xn: "delica. do é aquele para quem a pátria é doce; forte é aquele que em qualquer

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