Uma Cidade em Camadas: ensaio sobre o romance Eles eram muitos Cavalos, de Luiz Ruffato 9788599279106

Desde a sua publicação, o romance Eles eram muitos cavalos tem despertado um grande interesse junto ao público e à críti

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Uma Cidade em Camadas: ensaio sobre o romance Eles eram muitos Cavalos, de Luiz Ruffato
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Nelson H. Vieira | 13']

MÓBILES URBANOS: eles eram muitos...

Renato Cordeiro Gomes*

Quando a fragmentação e o caos parecerem avassaladores, [é necessário] defrontar-se com o desmedido das metrópoles como uma nova experiência das escalas, da distância e do tempo, para, através das novas paisagens construídas pelas intervenções na própria cidade, redescobrir a cidade. Nelson Brissac Peixoto

No início de 2003, realizou-se, no Centro de Arquitetura e Urbanismo, no Rio de Janeiro, a exposição Paisagens da Mobilidade, que reuniu vinte e quatro projetos de renomados arquitetos franceses, cuja proposta era acompanhar, apresentando alternativas, o dinamismo das cidades contemporâneas. Em declaração ao Jornal do Brasil (02/01/03), a curador da exposição, Francis Lambert, afirmou que a proposta procurava revelar: "uma arquitetura que cria o deslocamento é o desenraizamento. Falar da mobilidade significa interrogar sobre as mudanças da cidade e da sociedade contemporâneas, refletir sobre as múltiplas velocidades que marcam o ritmo de nossa vida moderna". São paisagens móveis, pertencentes à mobilidade que se intensifica nos fluxos comunicacionais, apontando a cidade tanto como resposta ao acelerado avanço da revolução tecno-científica, cujo impacto altera hábitos' e costumes, ritmo e intensidade dos transportes,

* Renato Cordeiro Gomes, doutor em Letras (PUC-Rio), pesquisador do CNPq, professor dos Departamentos de Comunicação Social e de Letras da PLJC-Rio; coordenador-adjunto da Cátedra Padre António Vieira de Estudos Portugueses; autor de Todas as cidades, a cidade: literatura e experiência urbana (Rocco, 1994), João do Rio: vielas do vício, ruas da graça (Relume/Dumará, 1996), João do Rio por Renato Cordeiro Gomes (Agir, 2005), O papel do intelectual hoje (org. Izabel Margato; ed. LTFMG, 2004); Literatura/politica/cullura - 1004-2004 (org. Izabel Margato; ed. UGMG, 2005) e de inúmeros ensaios publicados em volumes coletivos e revistas especializadas nacionais e estrangeiras.

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comunicação e trabalho, da mesma forma como hoje é outra a resposta ao avanço da tecnologia eletrónica e digital, por sua vez modificada em um modo contínuo. A cidade é obrigada a se redefinir. Há uma "requalificação" da cidade contemporânea, que pode também ser desenhada a partir de valores virtuais, ou seja, de uma gama de atividades que deixam de ser realizadas apenas no plano material, que significa a adaptação à inserção do ser humano no meio virtual, como sublinhou José Luiz Favaro, curador da exposição "Morar na metrópole": o olhar de quinze arquitetos, na Bienal de Arquitetura, de São Paulo, em 2003.

Essas alusões servem para confirmar o interesse pelas cidades nesta última década. Algumas hipóteses para tal interesse vêm sendo levantadas por estudiosos das mais diversas áreas do conhecimento. Uns, como Néstor Garcia Canclini, acreditam que as cidades voltam a pensar em si mesmas, devido à crise dos grandes paradigmas ideológicos que leva os estudiosos a buscar unidades de análise mais próximas, unidades que, como a cidade, são dotadas de densidade histórica (1997, p. 141 e 148). Esse aspecto está ligado diretamente aos paradoxos da globalização, ou seja, à intensificação da interdependência transnacional e das interações globais, que faz com que as relações sociais pareçam mais desterritorializadas, ao lado do desabochar de identidades regionais e locais alicerçadas em uma revitalização do direito às raízes (SANTOS, 1996, p. 17-22). Em outras palavras, ante a globalização, dá-se a afirmação do local identificado à cidade, a realidade mais próxima. A desterritorialização gera, assim, fortes tendências para a reterritorialização (essa tensão/contradiçãoéfartamenteconstatável na literatura contemporânea e em produtos da cultura midiática), representadas por movimentos sociais que afirmam o local, engendrando diferenças e formas locais de arraigamento, assegura Canclini (1997, p.48). Nesse mesmo sentido, verifica-se que uma reestru tu ração supranacional das políticas culturais necessita combinar-se com uma nova visão das culturas étnicas e regionais, que não desapareceram no processo de globalização. s Relacionada a esses fenômenos sociopolíticos e culturais, prolifera uma nova literatura eminentemente urbana, que, dentro da diversidade de temas e de procedimentos de linguagem característicos da multiplicidade da produção contemporânea, ao invés de apropriação de fontes populares e míticas, para empreender a releitura da história e das identidades nacionais, explora a violência nas cidades e o narcotráfico, a vida precária e suja, às vezes à deriva, para também apresentar a crítica social de uma comunidade que caminha para a anomia, ao -lado de certas tendências que exploram asubjetividade marcada pelo solidão, pelo isolamento, de homens e mulheres que vivem fechados no seu cotidiano muitas vezes cinzento. A diversidade atrela-se assim a paisagens da mobilidade. Eppur si tiiuovc: "a cidade é uma sucessão de imagens que se depositam umas sobre as outras, como colónias de fungo. O imaginário, como esse conjunto de imagens, dita o espaço", como revpla Eugênio Bucci (2002). Renato Cordeiro Gomes | 133

Essa literatura de um mundo desencantado parece corroer as certezas do projeto moderno enfeixadas na utopia. Ao tematizar e dramatizar um universo pós-utópico, explora o reino da distopia, um mundo de que parece não haver saída (guarda o sentido etimológico do termo relacionado à patologia: localização anómala de um órgão), um mundo que abdicou das certezas, da verdade. A distopia instalada no mundo urbano. Cabe então indagar quais estratégias discursivas podem ainda dar conta da representação da cidade contemporânea desse mundo desencantado, atravessada pelo multiculturalismo, pela fragmentação, pelas simultaneidades temporais e espaciais (essa obsessão modernista e das vanguardas do século XX). Como narrar a experiência urbana, hoje, em uma cidade polifônica? Como lembra Garcia Canclini: "Em nossas metrópoles- dominadas pela desconexão, atomização e falta de sentido podem existir histórias?" (1995, p. 133). Desaparece a cidade encorpada e facilmente identificável que se lia nas narrativas de cunho realista-documental do modernismo? A cidade tõrna-se então toda e qualquer: todas as cidades, a cidade? Ela desaparece e deixa, no entanto, suas marcas, emblematicamente anunciada no conto "Cenários", , de Sérgio SanfAnna, do livro O concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro, de 1982, em que, em uma espécie de refrão "Não, não é bem isto", aponta para a corrosão e a crise da representação, que entretanto exigirá novas (ou melhor, outras) soluções como revela certa literatura dos anos 2000.

Essa ficção tem por certo que "narrar é saber que já não é possível a experiência da ordem que o flâneur esperava estabelecer ao passear pela metrópole do início do século XX. Agora a cidade é como um videoclipe: montagem efervescente de imagens descontínuas (...). Tudo é denso e fragmentário. Como nos vídeos, a cidade se fez de imagens saqueadas de todas as partes, em qualquer ordem, que trazem as marcas das visões efémeras" (CANCLINI, 1995, p. 131 e 133). A ficção dramatiza a descontinuidade da vida urbana e engendra um discurso que busca modos de conectar as múltiplas narrativas que atravessam a cidade, que é "um palco de uma guerra dejelatos", para usar a formulação de Michel de Certeau (2003, p.201). Há determinadas propostas que procuram soluções para os impasses da crise da representação, a exemplo da de Ricardo Piglia em Tres propuestas para el próximo milénio (y cinco dificultades), de 2001. Propõe o desloctimento e a distância, que implicam uma noção de verdade que escapa à evidência imediata, e supõe primeiro desmontar as construções do poder e suas forças fictícias e por outro lado resgatar as verdades fragmentárias, as alegorias e os relatos sociais. Se o deslocamento, como estratégia discursiva e política (o que seria falar fora dos centros hegemónicos, falar a partir da margem, do subúrbio de Buenos Aires? - formula Piglia), for a primeira das propostas, a que se liga a segunda: a noção de limite, ou seja, a impossibilidade de expressar diretamente a verdade, isto define os limites da literatura. Há um ponto 134 | Uma cidade em camadas

extremo ao que parece impossível de acercar-se, como se a linguagem tivesse uma margem, como se fosse um território com uma fronteira, depois da qual está o deserto infinito e o silêncio. Como narrar o horror? Como transmitir a experiência do horror e não só informar sobre ele?

Daí o deslocamento que significa dar a palavra ao outro '(a outra cidade e a cidade dos outros), o que implica a mudança na enunciação cujo sujeito é condensador da experiência e relata uma cena que êondensa e cristaliza uma rede múltipla de sentidos, que está muito além da simples informação. Isto teria a ver com a língua técnica, demagógica, publicitária que a sociedade impôs. Tudo que éstá fora dessa rede, dessa grade, fica fora da razão e do entendimento: quem não diz o que todo.s dizem é incompreensível e está fora de sua época - lembra Piglia (2001, p. 37). Há uma ordem do dia mundial que define os temas e os modos de dizer: os mass media repetem e modulam as versões oficiais, as construções monolíticas da realidade. A literatura seria o antídoto dessa peste da linguagem (como ressalta Calvino, em a "Exatidão", 1991). Piglia fala então no paradoxo da língua privada da literatura que é o rastro mais vivo da linguagem social. A intervenção política do escritor define-se, antes de mais nada, na confrontação com os usos oficiais da linguagem.

Essas observações glosadas de Ricardo Piglia ajudam a perceber como a realidade inelutável é testada pelos limites da linguagem em narrativas como a ficção de EEMC. A prosa de escritores como Luiz Ruffato, entre tantos outros, a exemplo de Marçal Aquino, Bernardo Carvalho, Nelson de Oliveira ou Amílcar Barbosa Bettega, atrela-se ao real, não porque tenta se colar ao mundo extra textual e seus mecanismos de representação bruta da realidade, sem mediação, mas porque se distancia desse "Uso oficial da linguagem, deslocase, afirma-se enquanto ficção, que põe em dúvida os limites entre a própria ficção e a realidade (LEVY & SCHOLLHAMMER, 2002, p. 23). Distancia-se da realidade para, paradoxalmente, a ela se remeter e para dela nos aproximar. Tenta-se recuperar a representação, ante uma impossibilidade (representar o irrepresentável, o indizível), não para criar a ilusão da realidade, ou o efeito do real, mas, como afirma Vera Follain de Figueiredo, fazer emergir o seu caráter de representação de uma representação, pondo em causa a possibilidade do conhecimento objetivo do real (2003, p. 14). Se, por um lado, cònstata-se o "deserto do real" (a imagem é do filme Matrix, 1999, dos irmãos Wachowski) que certa literatura e produtos da cultura midiática propõem, preenchendo de ficção/de virtual esse deserto do real, por outro, volta-se à crua realidade inelutável. O romance de Ruffato, cujo título é tomado de um verso do Romanceiro da Inconfidência (1953), de Cecília Meireles, sem optar por uma sequência fechada, traça um mosaico de 69 fragmentos numerados, que, valendo-se de

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uma linguagem estilhaçada, busca representar o caos urbano e humano de uma cidade como São Paulo. Sem buscar exemplaridade edificante, o romance ("chamo de romance para simplificar" - diz o autor) revela, antes, os aspectos distópicos de um espaço urbano desencantado. O conjunto aparentemente desconexo, captado por um olhar múltiplo e distanciado, semelhante à maneira brechtiana (torna o familiar em não-familiar, para criticamente, conhecê-lo melhor, compreendendo-o de novo modo) quer provar que não há dimensão profunda para além dos dados sensíveis. Além da violência e do medo, o que une os personagens e liga todas as histórias, todos os recortes, é o espaço - a cidade de São Paulo - atrelado à dimensão temporal, que dá coerência ao livro. Os fragmentos urbanos, espécies de móbiles, flagram, em um dia (este tempo denso e complexo acaba funcionando como um fio condutor), uma variedade de gente, antes peças de um ambiente que propriamente personagens: peças que se movem em uma paisagem também móvel.' Utilizando formas narrativas diversificadas, o romance constrói seres isolados em sua solidão e frustração, ao plasmar subjetividades esfaceladas. Este tipo de estruturação associa tais subjetividades ao estilhaça mento, às paisagens da mobilidade, afastando-se de um relato jornalístico, ao mesmo tempo em que "corrói a confiança nas estruturas sequenciais" (FIGUEIREDO, 2003, p.14) que constituíssem uma unidade fechada capaz de representar de forma documental a realidade supostamente dada como "verdade". O que resta é a cidade, que o relato constrói: uma realidade urbana feita de uma multiplicidade de relações mais ou menos precárias; cidade do caos, da violência e do medo, tão bem representada no diálogo final de frases curtase medrosas de um casal trancado em sua casa, enquanto ruídos estranhos e cotidianos sugerem a violência que arrebenta lá fora.

É essa opção de não se colar à realidade extratextual que corrói o aspecto tautológico da linguagem e revela o seu caráter ficcional atado aos registros múltiplos e artificiosos do discurso. É o artifício da linguagem, portanto, que possibilita revelar a inelutável realidade urbana de um Brasil contemporâneo, sublinhando a própria crise da representação. Pode-se dizer que é a própria narrativa, ou a própria cidade que se narra coip sua pluralidade de vozes. A voz de um suposto narrador panóptico ausenta-se, mas é representado pelo Autor (o nome que assina) que está à escuta. Não está atento apenas a uma voz, mas escuta a polifonia que a cidade de São Paulo oferece em um dia qualquer. Creio ser válido para Ruffato o que diz o romancista espanhol Juan Goytisolo: "Sou um anima) urbano e, na-' cidade, estou à escuta das vozes que me rodeiam". Tal polifonia exige uma heteroglossia, uma multiplicidade de discursos, cada qual com seu andamerito, sejj ritmo, seus artifícios de estilo. Cada fragmento (não são propriamente capítulos, ou episódios, ou cenas; a noção de capítulo enquanto elemento da estrutura tradicional da narrativa é posta em questão, como já havia sido feito pelas vanguardas modernistas) possui

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seu regime discursivo, que não se conjuga a um encadeamento linear, causal, em torno de um conflito central, que evolui. Os 69 fragmentos, que começam com o "cabeçalho" indicando a data (São Paulo, 9 de maio de 2000. Terça-feira), seguindo-se da previsão metereológica e da hagiologia (o santo do dia), vão registrando pedaços de histórias, peça dramatúrgiça em diálogo, descrições enumera ti vas, reprodução de recados de uma secretaria eletrónica (estilhaços de uma narrativa), oração de Santo Expedito, lista de anúncios classificados de jornais à procura de parceiros (mini-narrativas, fifinal), anúncios de oferecimento de serviços, carta, lista de livros (Fragmento 24 "Estante", que lembra o poema "Biblioteca Nacional", de Oswald de Andrade), o salmo 38, conto curto com início, meio e fim, espécie de poema em prosa etc. "Cada fragmento exigiu uma arquitetura narrativa diferente, desde a clássica até discursos aparentemente sem lógica" - revela Ruffato. São empregados recursos gráficos variados, deixando a nu os artifícios da linguagem que constroem "paisagens urbanas com figuras", "caos urbano e humano que se acotovela, se ama, se detesta, ou simplesmente, na maior parte das vezes, se ignora, no segundo maior conglomerado urbano do planeta" como expressou o jornalista José Nêumanne (Estado de S. Paulo, 06/01/2002). Os personagens, atores sociais, são "sobreviventes" (título de um livro de contos do autor). Os relatos prendem-se aos dramas miúdos, sem heroísmo, a subjetividades esfaceladas, experimentadas em um espaço fraturado, também esfacelado. Seres comuns e brutais constituem figuras de uma anti-épica, anónimos como os cavalos da Inconfidência poetizados por Cecília Meireles, que motivou o título do livro e citada em epígrafe: "Eles eram muitos cavalos,/mas ninguém mais sabe os seus nomes,/sua pelagem, sua origem". O título enigmático assim alude aos cavalos que não deixaram nome, como os personagens que o autor/narrador busca fixar, em seus estereótipos, chapados, sem profundidade, que vivem o caos urbano da megalópole paulista. Por meio da narrativa, Ruffato - como declara em entrevista - interessa-se pela concretização das idéias de um país, de uma nação, como fez Cecília Meirelles no Romanceiro. "Quis como'ela mostrar a importância, via cavalos, de dar voz a quem não tem vez. Os cavalos da Inconfidência estiveram lá, olharam, participaram de tudo e, mesmo assim, não tiveram vez. Os cavalos como os homens participam de corridas inócuas, que ninguém ganha, que não se chega a lugar nenhum. Quis mostrar a história de quem não pôde fazer nada: todos somos responsáveis pelo que está aí".

A escolha de seres que não têm vez nem voz ajusta-se perfeitamente ' à opção por um narrador não-autoritário, que não procura falar pelos • personagens, mas deixa que eles falem, nas suas pluralidades de enunciação, ao mesmo tempo que estiliza essas falas, interferindo na construção de uma linguagem, de um estilo (óu de estilos). Assume com tais procedimentos o caráter artificial (de arte, de artifício) da literatura, sem se preocupar em mimetizar, fotografando a linguagem, quando também evita representar

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diretamente a realidade: há a mediação dessa linguagem. Por isso não há um registro uno, permitindo a linguagem abrir-se ao experimentalismo, que, sem ser novidade, pois já fora ponto da pauta modernista, das vanguardas e. da literatura dos anos de 1960 e 1970, já não é mais programático, mas opção. Daí o uso de uma série de recursos gráficos, de diagramação, do uso de negrito, de espaços em branco. \

Entretanto, ao contrário das narrativas experimentais vanguardislas, o livro de Ruffato não é hermético e comporta um leitor médio, aquele que é visado por boa parte na literatura contemporânea, que quer ser lida por um número maior de leitores, atendendo, de certa forma, à demanda do mercado. r Esse tipo de linguagem e de postura narrativa abre espaço para deslocar da visão direta da "realidade" considerada "verdadeira" pelo senso comum. Isto permite evitar a linguagem jornalística (lembre-se que Ruffato também foi jornalista) e adotar procedimentos que levam ao deslocamento, ao distanciamento, ou seja, permite ver a realidade pela mediação de outros personagens, de outras cenas, para poder representar o que escapa à representação.

A ousadia formal permite descartar o naturalismo e a linguagem jornalística: evita a literatura meramente documental, essa outra tendência da literatura e do cinema brasileiros desta virada de século. A literatura exige mais a descrição do que'reforçar os estereótipos. "Talvez fosse possível que as histórias que narro no meu romance estivessem mesmo no jornal, mas a linguagem é diferente. Ao contrário do jornalismo, o que interessa não é o luem, mas o quê. A aproximação com o jornalismo está presente, sim, na pntativa de mostrar o que acontece no dia-a-dia. Mais do que isso, acho que '.EMC reúne o que ficaria de fora do jornal, o sangue do jornal, aquilo que ninguém daria muito valor: o sangue humano, não o sangue da desgraça, mas as experiências corriqueiras das pessoas" - declarou Ruffato em uma entrevista na PUC-Rio, em junho de 2003. A linguagem estilhaçada é a única que permitiu ao autor "espelhar o caos de uma’cidade como São Paulo" - assegura Ruffato. E continua: "É como se alguém pegasse um carro e andasse pela cidade sem parar e contasse as histórias que encontrou". As histórias são, afinal, móbiles, não só enquanto peças de um todo que se movimentam, mas enquanto paisagens da mobilidade. São "vistas parciais da cidade" (ver fragmento 45 do romance), a indicar que se abriu mão de abarcar a totalidade da cidade, por sua vez impossível de ser realizada: "são paulo relâmpagos / (são paulo é o lá fora? é o aqui dentro?) / de pé a paisagem que murcha / a velha rente à janela" (EEMC, p. 94).

Ao leitor, cabe escolher nessa estrutura aberta a ordem que quer dar aos 69 fragmentos, combináveis em variações infinitas como a cidade de São

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Paulo. O olhar móvel do leitor procede por deslocamentos e cola-se ao sujeito da enunciação - o narrador que é um condensador de experiências múltiplas e variadas e que assume uma apessoalidade, para pôr em questão a suposta objetividade e a neutralidade do discurso jornalístico. Talvez a maneira mais radical de figurar esse narrador seja a do cão vadio que relata uma chacina em um bar de periferia.

E essa opção de não se colar à realidade extratextual que corrói o aspecto tautológico da linguagem e revela o seu caráter ficcional atado aos registros múltiplos e artificiosos do discurso. E o artifício da linguagem, portanto, que possibilita revelar a crueldade da inelutável realidade urbana de um Brasil contemporâneo, sublinhando a própria crise da representação. Não é difícil perceber, como estamos demonstrando, que EEMC trabalha uma realidade distópica, o mundo desencantado, gasto, esfacelado, em que ' os sujeitos se esfacelam: é o mundo dos ratos que se entredevoram (cf. o fragmento 9 "Ratos", p. 20). Mas é o distanciamento crítico, que permite vislumbrar aí resíduos utópicos. Como diz Ruffato, "o livro, diferente das notícias que lemos, é otimista, à medida que apresenta uma saída, uma crítica à mimese, que só reproduz, sem nada propor. A literatura cria um mundo com a pretensão de mudá-lo, como no meu caso. Literatura com base na realidade, como também certo jornalismo, depende de uma realidade que é discutível, que existe e pode ser ao mesmo tempo reinventada. Para mim, a realidade [em termos absolutos de verdade] não existe; ela é recriada com uma linguagem própria [com o artifício da linguagem] e tento estabelecer com o leitor que ele lê algo compartilhado, que lê algo diferente daquilo que foi escrito, porque reinventamos tudo segundo nossos universos de significações".

É neste sentido que Ruffato persegue os resíduos de humanismo, do que resta de humano nesses seres brutalizados e anónimos, em que, apesar de tudo, é ainda possível sonhar. "É uma literatura que, longe de ser mimética, que acha possível descrever a realidade, quando, no máximo, chegamos a outra realidade, quando escrevemos sobre ela mesma. Acabo criando tipos ao mesmo tempo em que reforço estereótipos. A diferença é que busco injetar o humanismo e ver como as personagens me veriam, e não como eu as veria. O que me interessa são os porquês, o que as pessoas passam através de suas realidades" - palavras de Ruffato. Tentar recuperar esses resíduos utópicos em um mundo de sobreviventes não é pouco. E nisto está o valor ético e político que se alia ao estético, para que não se perca essa dimensão éticopolítica, "que se esvazia quando o lugar da discussão fica perdido, quando passa a existir um muro entre a produção e a sociedade. Uma literatura ética deve abrir o debate, suscitar questionamentos, produzir algo incómodo. Continuo achando que; mais do que atingir a todos [seria, antes de tudo, uma • questão mercadológica], devo ser o indutor da discussão na qual acredito".

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PAINEL DA CONDIÇÃO HUMANA Sônia Maria van Dijck Lima*

Esquecidas as preocupações com os gêneros literários, aceita-se o convite de Luiz Ruffato para percorrer os desvãos da metrópole, com olhos e ouvidos atentos, cruzando com criaturas que nunca mais serão vistas, porque integram a multidão.

Nada do charme do traje preto da figura que Baudelaire contemplou em "À une passante". Em Ruffato, as criaturas mostram-se em suas angústias e em suas buscas ditadas pela esperança e limitadas pela desilusão ou pelo medo. Retratos de corpo e alma, na paisagem da cidade grande.

Flâneur, o autor estabelece o palco de suas andanças na abertura do livro, em linguagem que se quer objetiva, mas que não se esquece do imaginário cristão, que paira sobre a cidade tentacular. Cúmplice, o leitor acompanhará o andarilho Ruffato durante as próximas horas desse dia 9 de maio de 2000; marcado pela violência, pelo oportunismo, péla corrupção, pelo sonho, pelo medo, pela coragem. Devo dizer que não é a primeira vez que São Paulo e a vida que pulsa em suas entranhas se mudam para a Literatura. Só para ficar com um exemplo clássico (e de minha paixão), lembro Paulicéia desvairada, de-Mário de Andrade. Ali, em 22 poemas, temos a costureirinha, o enfatuamento burguês, a normalista, o Tietê, o imigrante, o pregão da rua, a Casa Kosmos (lembrando "impermeáveis em liquidação"), a paisagem cinza como "um tristemente longo", com os plátanos do Largo do Arouche. O poeta foi um tupi, tangendo um alaúde (em um dos versos da Paulicéia). Ruffato é o imigrante: tupi a seu modo e sem alaúde.

* Sônia Maria van Dijck Lima nasceu na Bahia (Brasil), é diplomada em Letras e em Pedagogia e doutora em Letras. Foi professora da Universidade Federal de Sergipe e da Universidade Federal da Paraíba (na qual se aposentou). Como professora visitante e professora convidada lecionou na Universidade Federal da Bahia, na Universidade Estadual de Londrina e na Université Paris X-Nanterre. É crítica literária e pesquisadora de arquivos, com trabalhos publicados no Brasil e no exterior. É poeta e contista bissexta.

Sônia Maria van Dijck Uma | 14]

Mário, tão voyeur quanto Ruffato. Ambos, flâneurs, cm uma paisagem interiorizada, depois de recolhida pelo olhar privilegiado de autores que querem decifrar seus enigmas.

E não importa se um era nativo e o outro chegou das Gerais. A Paulicéia é o objeto de contemplação - comoção - de ambos. Se a cidade é arlequinal para Mário, podemos encontrar nos fragmentos de Ruffato a construção de sua natureza "cinza e ouro", que se expressa em repulsa e paixão de quem a contempla, tal como fez Mário, seu grande amante. Afinal, "São Paulo é um palco de bailados russos. / Sarabandam a tísica, a ambição, as invejas, os crimes / e também as apoteoses de ilusão... (Mário de Andrade).

Ruffato alinha 69 quadros (numerados de 1 a 69) ou instantes da cidade grande ou, simplesmente, textçs - cabe ao leitor o interesse em classificar os fragmentos que constituem o livro. Nas últimas páginas, acrescenta uma nota de silêncio (página em preto - frente e verso) e o diálogo dos assustados moradores, no meio da noite. Livro construído pela diversidade de linguagens, encerra-se com o silêncio: "- Porque... porque ainda pode ter alguém lá... E aí? Melhor dormir... Vai... vira pro canto... vira pro canto e dorme... Amanhã... amanhã a gente vê... Amanhã a gente fica sabendo... Dorme... vai...)" (EEMC, p. 150).

Amanhã. Mais um dia. Não estaremos lá, pois o livro acaba aí.

Esse 9 de maio de 2000 é um dia como outro qualquer, mas que àe torna especial porque foi destacado como situação sensível e exemplar. Dramas da banalidade do cotidiano. Fragmentos da vida, visitados com olhos de ver e captados por ouvidos atentos. Nada que o leitor não conheça, pelo menos de ouvir falar ou porque leu em algum jornal.

Marginalidade, anonimato, desimportância... Os que vivem e os que morrem e os que são mortos; os que chegam e os que partem. Quase sempre sem nome, como a vovó pernambucana que vai visitar o filho e conhecer a nora e os netos, trazendo bagagem de expectativa acerca da vida do filho e a bexiga cheia, porque o banheiro do ônibus estava fedido depois de tanta estrada a caminho do desconhecido. José Geraldo não tem nome de família; é apenas mais um que quer se dar bem na vida e vai encontrar o amigo nos Estados Unidos, como exemplo de quem escapa da vidinha apertada e medíocre, de muita batalha e pouco ganho. A costureirinha está reencarnada na moça de "dezessete anos, proprietária já de indesejáveis estrias nas coxas, nos peitos, celulite na bunda, também! Uma sede beduína por refrigerantes!" (p. 79), que trabalha em uma fábrica de confecçãoda periferia e, sem entender nada do que estava acontecendo, enquanto devpra o cachorro-quente do almoço, leva uma bala de um assaltante tão lascado na vida quanto ela. 142 | Uma cidade em camadas

Os tempos mudaram. A Paulicéia de Ruffato tem pouco lirismo no último ano do século XX.

Na diversidade de linguagens, não há uma voz narrativa que organize os fatos que aconteceram ou poderiam ter acontecido. Ou seja, nào há um narrador nem caberia um "eu" lírico que lhe desse unidade na Paulicéia de Ruffato. Pode ocorrer como no fragmento 41. Um motorista de táxi começa perguntando "O doutor tem algum itinerário de preferência?" (p. 84), e inicia um diálogo com o passageiro, comentando os conhecidos congestionamentos da megalópole. Na conversa entre taxista e cliente, apenas temos a fala do primeiro. O motorista vai desfiando histórias da família, sonhos, derrotas, alegrias, confidências masculinas, satisfação em ter criado e educado os filhos. Um monte de miudezas, cuja grande importância pode ser encontrada no tempo da vida de um retirante que se torna motorista de táxi, passou bons e maus momentos, criou os filhos e, agora, conduz um passageiro pelos caminhos da cidade em que se sente vencedor. O doutor deve ser um bom ouvinte, pois, no tempo da viagem, criou-se tal cumplicidade que, ao chegar ao destino, o motorista sente-se à vontade para completar: "Mas, só pra concluir, esse menino, meu neto, o João Paulo, ganhou outro dia uma olimpíada de matemática, o senhor acredita? Olha, vou deixar um cartão pro senhor, esse aqui é o número do celular, se precisar, é só chamar: Claudionor, a seu dispor. Muito obrigado e bòa viagem. Até a volta!" (p. 90) O silêncio do passageiro lembra o diálogo de Riobaldo. Mas, aqui, sabese, sim, que há um pacto: com a cidade grande e em nome da sobrevivência. Nunca saberemos o destino do taxista, tragado pelas ruas, becos, avenidàs e descaminhos da perifefia. Deve continuar em seu ofício travestido em muitos outros condutores de interlocutores ocasionais. O passageiro vai muito bem, multiplicado na multidão anónima.

Sem pedir licença, o autor vai entrando na intimidade das criaturas e escancara ao leitor o interior da vida da classe média, como na manhã fria de pão velho com margarina, enquanto o marido está lendo Foucault, comprado no sebo, e a mulher saturada da vida apertada nos limites do orçamento doméstico "já não reconhece/ quem é esse homem quem?" (p. 28). Mas também entra com a professora na escola destruída pelo vandalismo de elementos da própria comunidade, que arrasaram a hortinha da merenda escolar. Solidão e desespero capta o narrador na atitude desolada da professora. Reiteradamente, Ruffato entrega o discurso à personagem, tornando mais contundente o quadro de solidão e desespero. E o que acontece quando o leitor o acompanha ao quarto de motel, no qual uma prostituta é violentada por uns indivíduos bêbados; sem saída, ela se refugia nã lembrança antiga de um cliente gentil e endinheirado, que lhe dera tratamento especial e até a levara’ a um restaurante chique; impotente, traduz seu desprezo pela escória que a agride na certeza de que naquele restaurante "esses putos nunca entraram, nunca entraram nem nunca vão entrar, nunca vão entrar..." (p. 123) - pois é: Sônia Maria van Dijck Lima | ] 43

as pessoas precisam manter sua integridade, mesmo que impedidas de reagir, ainda que recorrendo a um argumento ingénuo diante das circunstâncias... E ela nem sabe que viveu a história daquela outra prostituta do filme, sem, contudo, ter chegado ao final feliz.

Aos que ainda têm fé è esperança, a cidade oferece o discurso do pregador solitário, que fala da salvação eterna; simpatias, umà oração a Santo Expedito, ou a Igreja do Evangelho Quadrangular. Para outro tipo de fé e de esperança, pode-se percorrer, com a ponta do dedo, tanto as listas de empregos oferecidos como os anúncios de serviços sexuais, até com garantia de discrição e de sexo seguro nos tempos que correm... Quem preferir pode parar diante da estante e escolher um livro, entre os vários citados por Ruffato, e deixar lá fora os gritos e o ranger de dentes; se puder, sirva-se do cardápio requintado, que convida o leitor ao banquete da indiferença. O leitor pode escolher qual o fragmento do painel construído por Ruffato que deseja contemplar. Crianças mordidas por ratos, o velório daquele jesuscristinho de 17 anos que se envolveu com más companhias, o menino abusado sexualmente, mulheres solitárias, outras abandonadas, uma que aguarda o toque do telefone que lhe pode abrir as portas para o sucesso e a casada desiludida e mais aquela que morreu de AIDS, contaminada pelo marido, ou a outra descabelada que vaga à procura do filho desaparecido. Homens que procuram emprego, outros que roubam fraldas no supermercado, aquele que afana a carteira cheia de grana de uma advogada, porque queria comprar um presente para a mãe, o pai que esconde do filho que entrou para a roda do crime. Quem poderá julgar o médico que abandona a sala de cirurgia ao reconhecer o assaltante que invadira sua casa, espalhando pânico e desespero? Peças de um tabuleiro. Mas, se o leitor, por exemplo, escolher o fragmento 32 "Uma copa" e for virando as páginas até chegar ao de número 33 "A vida antes da morte" ou se fizer o caminho contrário, notará que um texto sugere o outro, independentemente da ordem de leitura. No 32, ao som do motor da geladeira Cônsul, os olhos passeiam pelos inúnheros detalhes de um apartamento classe média baixa, impregnado do cheiro de família, de fé, lembranças, intimidade. Para saber o quanto de sordidez e desesperança pode caber em um apartamento assim, basta que se entre na residência do fragmento vizinho. Se a leitura se fizer no sentido contrário, deixando a família para trás e entrando no apartamento vazio, verá que a violência não está dita nas fotos de família nem na poltrona de napa marrom; os objetos não gritam, não ameaçam, não agridem, e servem para preencher o espaço, como marcas de passos de gente, sem interferir nas relações pessoajs, que, da vida familiar, ganham as ruas com a mesma crueldade. A certa altura, pergunta o autor: "(são paulo é o lá fora? é o aqui dentro?)" (p. 94). Na verdade, São Paulo é a menina que se prostitui, é o índio bêbado, é o pai que sonha com um futuro melhor para o filho, é a garota morta 144 | Uma cidade em camadas

pelo assaltante de bairro, tão miserável quanto sua vítima... é o corrupto engravatado, é o tarado e o que busca a salvação, é a fome, o frio e o jantar, é o desempregado, é a mulher desolada, é o filho que recebe saudades trazidas na carta, é a roda de amigos. São Paulo é o lá fora de sua multidão; é o aqui dentro de cada medo, esperança, desespero, mesquinharia. São Paulo é véspera do Dia das Mães. São Paulo é o pacto de silêncio assustado do casal que sabe haver alguém ferido lá fora, mas que prefere dormir, porque "amanhã a gente fica sabendo" - nada se pode fazer por alguém atingido pela violência urbana, altas horas da noite - questão de preservação da vida... Pois é. Quem olha São Paulo como quem visita um apartamento sem habitantes, não vê suas lágrimas, sonhos, alegrias, desesperos, tristezas e solidão. O verdadeiro voyeur quer ver as pessoas andando, angustiadas a caminho da entrevista do emprego, ternas, violentas, indiferentes, assustadas, cultivando habilidades como cantar hinos e ler trechos da Bíblia na igreja ou saber a localização das cidades anunciadas nos letreiros dos ôrúbus que correm na BR sem qualquer utilidade prática, além de levar os pais ao sonho de melhor futuro para os filhos. Os olhos do caminhante enchem-se de realidade. Ao leitor, Ruffato oferece um naturalismo que não teme mergulhar no submundo: a cidade grande para além do movimento de veículos, luzes, extensão territorial; para além das estatísticas do número de habitantes e dos indicadores de seu desenvolvimento. A cidade é feita por gente que nasce, cresce, tem ou não emprego e até pode apodrecer antes de morrer e sempre tenta manter a cabeça fora das engrenagens da avassaladora vida urbana, até a hora de voltar ao pó e contar com a generosidade de uma amiga que lhe faça uma maquiagem bonita, para descansar em paz, ou com o vizinho que tem um livro sobre a eternidade, cuja notícia pode dar alento aos tempos que ainda restam no inferno dos vivos.

A São Paulo de Ruffato não-se limita ao lugar comum da "selva de pedra". É humanidade, contemplada cuidadosamente pelo olhar desse autor que se mistura à multidão para traçar o mosaico da condição humana, algumas vezes deixando que o leitor perceba sua comunhão com as dores e as alegrias da gente miúda, que não se sabe bem de onde vem ou para onde vai; mas está aí, de corpo e alma, fazendo o significado da cidade.

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ELES ERAM TANTOS CORAÇÕES, CORPOS, CONSCIÊNCIAS Vera Lúcia de Oliveira E esta outra gente quem é, solta e miúda, que veio com a terra, embora não registada na escritura, almas mortas, ou ainda vivas? José Saramago

Luiz Ruffato, mineiro de Cataguases, estréia como poeta, em 1984, com o livro Cotidiano do medo. O título desse primeiro livro é indicativo de um clima que o Brasil estava vivendo, e que Ruffato, como os autores da sua geração, assimilou no corpo e na consciência ferida, tendo crescido à sombra da ditadura. O autor publicou outros dois livros de contos, que lhe valeram prémios e reconhecimentos, mas o grande salto de qualidade se dá com a publicação de EEMC, em 2001, obra que marca uma guinada em sua produção, à qual seguem outros romances que compõem a trilogia "Inferno Provisório", em que narra a história de imigrantes italianos e seus descendentes no interior de Minas Gerais.

Pela importância da obra, pela ruptura ficcional em relação ao próprio percurso do autor, ocupar-me-ei aqui do livro EEMC, obra inquietante, enigmática já no título, que toma emprestado um verso de Cecília Meireles, do Romanceiro da Inconfidência. Nela, o leitor defronta-se com uma escritura fragmentada, em que os estilhaços das várias histórias estão aparentemente desconexos. Trata-se de polifonia, mais do que sinfonia, vozes abafadas, choros e gemidos indistintos, tanto que a grande cidade de São Paulo, tão bem representada nestas páginas em que são descritas tantas vidas anónimas, não percebe e não sabe distinguir um protagonista do outro. São, no entanto, tais personagens, protagonistas apenas por um instante, como se estivéssemos diante de um confuso palco, com tantos atores secundários, em quê um ou outro são, momentaneamente, focados pela luz da ribalta, ou seja, pelo • Vera Lúcia de Oliveira atualmente é professora na Università del Salento (Itália), onde ensina Literaturas Portuguesa e Brasileira. Formou-se em Letras no Brasil, e em Línguas e Literaturas Estrangeiras na Itália, país em que obteve também o doutorado, em 1997. É autora de trabalhos sobre poetas contemporâneos, publicados em revistas brasileiras e estrangeiras. Além da produção ensaísta, recebeu diversos prémios nacionais e internacionais pela produção poética, entre os quais o Prémio de Poesia da Academia Brasileira de Letras, em 2005.

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olhar agudo e perspicaz do autor, que expõem o corpo frágil, a indigência, a nudez, o medo, ou simplesmente-a inconsciência de quem recita uma parte, sem saber exataménte qual. Esses "cavalos", nos -quais nos vemos de alguma forma refletidos, carregam ou arrastam com fadiga o peso da megalópole industrial, para que ela esteja sempre em movimento, para que respire e resfolegue, transpire e expulse os que não conseguem resistir à sua velocidade de máquina, perenemente em curso de moagem e trituração. Contos breves, poemas em prosa, romance desarticulado: não é fácil definir essa obra marcada por uma força coesiva potente, com elementos comuns a todos esses gêneros. Em EEMC, a argamassa que liga os fragmentos parece ser a percepção da vida como peso, angústia, travessia de uma espécie de purgatório (inferno para muitos), sem alguma certeza de redenção final. A metonímia é freqiientemente privilegiada nas narrativas, pois favorece a percepção de seres e coisas em segmentos e partes, contribuindo para a sensação de fragmentação geral. Tantos autores enquadraram e descreveram a cidade de São Paulo, mas Ruffato o faz com um olhar ao mesmo tempo participante e estranhado, de alguém que vê de cima e tem a perspectiva do conjunto, sem perder de vista a composição e a articulação minuciosa das partes, sem deixar de lado as minúsculas tesselas do mosaico. Ao autor interessam, justamente, essas tesselas, e delas ele retira a linfa com a qual compõe toda a sua obra. Para isto, contribui sem dúvida a própria experiência pessoal, de menino crescido em uma pequena cidade de interior, em contato com mazelas de pequenas vidas, que são grandes só para quem as vive. A estas vidas ele retorna nos romances sucessivos, construindo um pungente quadro da realidade social brasileira. I

A obra compõe-se de rigorosas e cruéis instantâneas do dia-a-dia de São Paulo, elaboradas a partir de materiais heterogéneos, como diálogos, monólogos, anúncios publicitários, cartas, bilhetes, orações, flashes da realidade colhida nas várias dimensões: sonora, visual, tátil, olfativa, enfim sinestésica. E, nessa enumeração caótica de momentos, fatos e personagens, o que marca é também a aceleração dos eventos, a velocidade dos. carros, a pressa dos passantes, o torvelinho das imagens que se entrechocam. Afirma uma das personagens recém-chegada à cidade, assustada pelo caos urbano: "Meu Deus, prq que tanta correria?"1. O ritmo vertiginoso do texto evidencia, com nitidez, uma adequação da realidade representada à sua forma de representação, onde o real forja o seu registro linguístico e literário. Como, de.outro modo, narrar o movimento veloz e alucinante da cidade e os tantos segmentos e cenas desarmônicas e alienadas que a compõem? Tal questão foi afrontada já pelos autores • modernistas em suas obras, nos primeiros decénios do século XX. Ruffato dialoga com livros como Memórias'sentimentais de ]oào Miramar (1924) e PauBrasil (1925), de Oswald de Andrade, Brás, Bexiga e Barra Funda (1927), de Alcântara Machado, e até mesmo Macunaíma (1928), de Mário de Andrade, Vera Lúcia de Oliveira | 147

considerados pontas de lanças da vanguarda brasileira. Oswald de Andrade já havia optado pela desarticulação da estrutura da poesia e da prosa convencionais, em busca da síntese, do equilíbrio, da invenção e da surpresa que indicou como os verdadeiros objetivos a serem atingidos para a criação de uma linguagem literária eficaz e inovadora. Pelo processo de justaposição de materiais vários e heterogéneos, o poeta modernista incorporou o hibridismo e a multiplicidade que caracterizavam o Brasil daqueles anos. Rompendo com a sintaxe tradicional, ele buscou novos meios expressivos, congeniais à complexidade dos novos tempos.

É inequívoco o diálogo intertextual que Ruffato estabelece com o autor de Pau-Brasil, pois também Oswald de Andrade incorporou, nesse livro que é - a seu modo - um retrato não só de São Paulo, mas também do Brasil, registros linguísticos desiguais, neologismos, pastiche de materiais retirados dos mais diferentes setores, dos títulos de jornais aos fragmentos de cartas, dos anúncios publicitários aos elencos de livros, das anotações rápidas de sentimentos e reflexões pessoais aos flashes da cidade, no seu vaivém contínuo. Ao contrário de Oswald, no entanto, que privilegia, em sua leitura crítica do mundo paulistano, o humor, a sátira e a paródia, no caso de Ruffato, às inovações formais -o autor associa um agudo e concreto sentimento de participação social, de pietas por todos esses seres infelizes, que compõe p retrato talvez mais pungente e doloroso, jamais elaborado, da capital paulista. Em alguns fragmentos, como o de número 9, temos seres humanos e animais, crianças e ratos, disputando o mesmo mísero e degradado espaço: "E lêndeas explodem nos pixains encipoados das crianças e ratazanas procriam ho estômago do barraco e percevejos e pulgas entrelaçam-se aos fiapos dos cobertores e baratas guerreiam nas gretas" (EEMC, p. 22). Note-se que todos, nivelados pela miséria, estão sendo, do, mesmo modo, digeridos pelo "estômago do barraco", em que tentam, possivelmente, dormir e sobreviver.

Cada fragmento tem um número e um título. O autor usa variações tipográficas como pistas para o leitor se orientar, distinguir entre um solilóquio, por exemplo, e os rumores que o interrompem, que se cruzam com diálogos e descrições. Na verdade, tem-se a impressão de que é a própria cidade que se narra, de forma nãp-linear, como é a nossa percepçào do real, em que todas os estímulos e sensações nos investem contemporaneamente e somos nós, posteriormente, que lhes damos coesão lógica. A aparente ausência de um narrador, no entanto, não nos deve enganar. Ele está presente também no tipo de enfoque, no qual, se não há um ponto* de vista unívoco, os momentos focalizados são cruciais e de forte impacto na vida dos personagens, e tudo é apreendido de forma caótica pelos cincos sentidos. Tal procedimento narrativo'acompanha também, muitas vezes, o processo de racionalização - vivido pelos protagonistas -, ou a tentativa de racionalizar, destrinchar, assimilar até as coisas mais indigestas, a humilhação,

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as dores e necessidades corporais, as obsessões, os esconjuros dessas figuras que perambulam pela cidade. Alguns relatos sào em primeira pessoa, vozes e bocas que expõem a violência de que sào vítimas, cqiyi um tom ora rebelde ora resignado. E, mesmo nas narrativas em terceira pessoa, os dramas urbanos são empaticamente captados, reconstituídos pelo narrador com toda a carga emotiva que os caracterizam. Os momentos focados são, muitas vezes, aqueles em que os personagens se deparam com o imponderável, uma porta que se abre para o sonho, a própria vida ou a morte expondo-se por inteira, um instante de revelação, de auto-consciência, ditados talvez pela expectativa de algo novo que virá, de algo de antigo que retoma, de algo que, juntando-se ao peso de uma vida infeliz, faz desabar paredes de paciência e resignação. No fragmento 10, temos uma mulher que, depois de ter vivido uma situação de violência e de risco, na noite anterior, dessas tantas que paradoxalmente se tornaram quase normais na vida dos paulistanos, sente que vem à tona todo o descontentamento, a inconformidade por um dia-a-dia com um marido que ela questiona, como questiona o sentido de sua vida, das escolhas feitas, do tempo que passa, das dificuldades, da luta.

Ao narrador não interessa tanto seguir ou revelar ao leitor como esta «história terminará, é - ou parece ser - como tantas outras, de gente que labuta, que tem sonhos frustrados, que perde a paciência e se revolta, para, depois ter de retomar a sofrida rotina de resignação: interessa-lhe, muito mais, seguir o movimento vertical e singular da consciência e da alma, na aparente horizontalidade de tudo. Cada pessoa encontrada, na fila, no elevador, no semáforo, no ônibus, no banco, na escola, andando pela rua, é singular no seu sentir e pensar, é um nervo que vibra, é uma ferida que punge, um olho aberto para o mundo, um corpo exposto ao tempo e a tudo o que o maltrata. E isso vale tanto para os seres humanos quanto para os animais. No fragmento 11, que tem como título "Chacina n. 41", por exemplo, o narrador apossa-sê da perspectiva de um animalzinho assustado, testemunha da violência contra mendigos, bêbados e meninos de rua, assassinados enquanto dormiam, de madrugada. E da mesma forma em que os homens se questionam, o faz também o cão: "Por que fora agredido (...) Por que fora agredido?" (p. 28), como se precisasse, ele, vira-latas sem dono e sem casa, de respostas sobre o imanente e o transcendente de sua existência.

No universo das ruas, essas sim anónimas, para compensar a indiferença e brutalidade de muitos seres humanos, a natureza vibra de sentimentos, humaniza-se: as plantinhas arrancadas de um jardim de escola de favela expõem "os pequenos cadáveres verdes", à curiosidade das crianças que "mendigam explicações" (p. 30). E quando a humilhação é demais, quando o processo de degradação, ou de marginalização, vivido pelo personagem, chegou ao limite, a linguagem revela-o, sutil e agudamente, como no fragmento 17, "A espera", em que são Vera Lúcia de Oliveira | 149

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as coisas do mundo que agem, sào elas que levam, de um lado para o outro, o protagonista, e não o contrário: "o café com leite engole" (p. 38), "a calça de moletom cinza arrasta o chinelo raider pela cerâmica vermelha até o quarto", "o elástico preto prende os cabelos", "e Edifício Itália funda-se nos seus ombros"(p.39). Esse mesmo processo de alienação, que cancela a identidade e a personalidade dos indivíduos, evidencia-se tanto de fora para dentro, quando é imposto, quanto de dentro para fora, quando é assumido pelos personagens como algo de inevitável, que é necessário aceitar para poder viver ou sobreviver. Nos dois casos, as coisas parecem adquirir sensibilidade, poder de ação e decisão, enquanto que o ser humano desaparece, ou então existe apenas quando associado aos objetos: "o ténis branco sorri" (p. 48), "rodinho e balde em garras subnutridas disputam párabrisas" (p. 60), "grossa pulseira de ouro reconhece no visor o número que chama" (p. 61), "o relógio Breitlig abafa a voz" (ide, ibidem) etc. De acordo com essa lógica mercantil e desumanizadora, que regula as relações sociais e afetivas no mundo de hoje, os objetos são indicados em detalhes, com letras maiusculas, e descritos minuciosamente: "poltrona número 3 da linha Garanhuns-São Paulo" (p. 16), "restos de uma sopa Knorr galinha-capiria" (p. 38), "Amarfanha o terno Armani cinza-chumbo do pai" (p. 59), "pistolas Glock austríaca e Jericó israelense" (p. 62), "O motor da geladeira Cônsul Contest 28 branco-gelo" (p. 65) etc. Em contrapartida, raramente ficamos sabendo os nomes dos personagens, que desaparecem nas descrições sumárias e generalizantes: "o bugre apareceu noboteco" (p. 31), "O segurança, negro agigantado" (p. 54), "o negro franzino, ossudo" (p. 54), "Pardo, idade indefinida" (p. 56), "O velho contínuo, amarelo o branco dos olhos" (p. 64), "aquela mulher que se arrasta espantalha por ruavenidas do morumbi" (p. 70) etc.

Muitas vezes, o narrador cria uma problemática e reveladora ambiguidade, em que os objetos parecem canibalizar o ser humano: "uma velha se oferece buquê de rosas encarnadas" (p. 60), "a jornada de bovinos e suínos cortes no açougue do tio" (p. 62), "Os olhos amarelos procuraram refúgio nas mãos que estufavam um pedaço da flanela do pijama de riscas finas azuis e brancas fedendo a suor" (p. 70), "As meias finas brancas buscaram os sapatos brancos, a televisão desmaiada" (p. 110), "pijamas amontoados correndo" (p. 127) etc. A fala, a linguagem, parece ter desertado esses seres carentes. Raros são os que se exprimem, e o fazem de forma tímida, entrecortada, sabendo, talvez, que não serão ouvidos. Acorrentados à condição de últimos, esmagados sob o peso da pirâmide económica e social do país, de que representam a base, esses seres desventurados parecem ter abdicado também da linguagem verbal como possibilidade de exprimir desconcertos, revoltas, medos, angústias. São outros os códigos que utilizam, como um certo gesto descomposto, uma postura estranha do corpo, um olhar de viés, um gemido ou mesmo um grito: "aquela mulher que arrasta (...) cabelos assim espetados (...) pernas braços f^Q | Uma cidade em camadas

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assim machucados unhas pretas vestido esfrangalhado (...) lábios murchos olhar esgotado mãos que. pendulam arrítmicas pernas desaprumadas" (p. 70). Não que não tenham tentado, com insistência e obstinação, comunicar o que sentem, como se pode ver no fragmento 34, " Aquela mulher", em que reconstruímos, por meio de códigos não verbais, o terrível abatimento de uma mãe que busca desesperadamente a própria filha, pedindo e implorando rastros e pistas sobre o seu paradeiro: "suplicando respostas exigindo febril irritada chorosa perguntas variantes insensas" (p. 70). O narrador não é neutro, não se esconde atrás desses vultos anónimos. A própria escolha do quê narrar, e de como fazê-lo, nos revela, a cada instante, z que ele incorpora o humano ao desumano, antes, convida o leitor a fazê-lo. Não nos dá o quebra-cabeças montado, mas fornece indícios de que isto pode ser feito, com muita paciência e sensibilidade, embora sempre faltaráalgo nesse quadro porque os sinais deixados não são suficientes para que conheçamos, em detalhes, cada personagem. E isso também é indicativo de uma dificuldade real, hoje, de aprofundar relacionamentos, de conhecer as pessoas em toda sua inteireza e complexidade.

No fragmento 8, por exemplo, temos indícios que nos ajudam a recuperar a figura de um rapaz, filho de pais separados, figura que vamos compondo por meio das imagens que nos chegam da própria mãe que está, ela também, tentando reconstituir um percurso de vida, seguindo, em flashback, o menino e o adolescente nos tantos momentos passados juntos. E, nesta descompressão do tempo, ela esforça-se para pôr ordem nos acontecimentos que levaram à perda do único e adorado filho de dezessete anos, "um jesuscristinho", agora sendo velado, sem que possamos saber, na verdade, o que provocou a morte. A mesma angustiosa dúvida paralisa a mãe diante do corpo morto: "meu deus por que que ele foi fazer isso meu deus por quê" (p. 20), em que o pronome "ele" tanto pode indicar o filho como qualquer outro personagem, o pai do rapaz, um amigo, um colega de farras, ou mesmo um desconhecido, que causou a tragédia. A linguagem também não é neutra, não estamos diante de uma descrição impassível de situações e personagens. São palavras emocionadas as que usa • Luiz Ruffato, sobretudo quando se refere a esses pequenos seres infelizes: "um jesuscristinho ali assim deitado nem parece uma criança" (p. 18), "o coraçãozinho às corcovas" (p. 28), "acompanhava o madaleno a via-sacra do seu dono" (p. 28), "um comichão na pálpebra superior esquerda e a solidão e o desespero." (p. 30), "De pena, Idalina procurou-a, coitada, largada, sozinha" (p. 76), "e tudo tem a cor cansada / e os corpos mais cansados / mais cansados / e batata das minhas pernas dói minha cabeça dói e" (p. 96), "alma ' esfrangalhada que se esbatia sentada no sofá" (p. 142), "olhos me olhando, me pedindo" (143), etc. Observe-se, a tal propósito, que o próprio título da obra é grafado em minúsculo pelo autor, como a indicar que o despojamento, a que são submetidos os seres, contamina o cerne da própria linguagem.

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Ruffato usa termos retirados do cotidiano, usa um vocabulário corriqueiro, incorporando calões e gírias das periferias, além de neologismos, ao modo de Guimarães Rosa (formados por processo de sufixação e aglutinação), e termos regionais e arcaicos, típico dos personagens oriundos de muitas regiões do Brasil: "reliento", "asselvajado" (p. 15), "bocona jacaroa", "arvrinhas" (p. 16), "azul-frienta" (p. 17), "em-antes", "danisca" (p. 22), "sealembrar", "os peemes desembarcaram", "em-dentro" (p. 31), "bonachonamente" (p. 32), "Brabeza despasseia" (p. 41), "doença indescoberta" (p. 42), "acordou zumbizado" (p. 43), "destamanho" (56), "malemolente" (p. 57), "pingapingar da torneira" (p. 63), "beijafloram" (p. 68), "bestando" (p.88), "atoíce" (p. 93), "pipocado" (p. 99), "babaquara" (p. 100), "minas peladas" (102) etc.

A linguagem denuncia também elementos de generalização e alienação, em que a realidade complexa do mundo é segmentada em grandes blocos anódinos, que desqualificam o indivíduo e justificam os estereótipos discriminantes: "Além do quê, os lígures... os lígures são todos ladrões... todos ladrões"! (p. 82), "A peàozada tem que receber em dia...", "O que vai ter de baiano na rua...", "É... pra ficar nos faróis assaltando a gente....", "É... nós, da classe média, estamos acuados..." (p. 113), etc. A própria epígrafe' escolhida para abrir o volume, os versos de Cecília Meireles, retirados de uma obra tão singular como o Romanceiro da Inconfidência - "Eles eram muitos cavalos / mas ninguém mais sabe os seus nomes / sua pelagem, sua origem"2 -, estabelece um paralelismo entres esses "cavalos" da inconfidência, animais que suportaram o peso da história, mas que, paradoxalmente, não ficaram na história, e os personagens anónimos do livro, dos quais também ninguém se ocupa, que se perdem e se confundem, que se anulam e que o autor tenta "salvar" do cancelamento da memória e da história coletiva, resgatando identidades, ou fragmentos de identidades, fragmentos de carne e de corpos feridos, estilhaços de consciência lacerada. E poderíamos citar, porque pertinentes, outros versos desse mesmo poema de Cecília Meireles: "Aqui, além, pelo mundo, / ossos, nomes, letras, poeira... / Onde os rostos? Onde as almas? (...) rastro nenhum, pelo chão."3

Outra correspondência com o Romanceiro é o caráter múltiplo das duas obras, os cruzamentos temporais e espaciais de planos, o fio narrativo unitário que, não obstante a heterogeneidade e a pluralidade de figuras e vozes, compõem um retrato panorâmico de um momento importante e dramático da história brasileira, sem perder de vista sentimentos, ambições, sonhos, fraquezas, malogros de cada um dos protagonistas e figurantes destes eventos. Poderíamos supor que o Romanceiro da Inconfidência possa ter servido, de base de inspiração, para que o autor compusesse um outro retrato do Brasil, em que, apesar do tempo passado, a história ainda continua a cancelar, das suas páginas, sempre os mesmos humilhados e ofendidos. Outro elemento que se deve destacar é a contraposição "mundo rural versus grande cidade", onde a nostalgia do passado, ou a mitificação desse 152 | Uma cidade em camadas

tempo perdido, caracteriza o sentimento de infelicidade de muitos dos personagens. E também aqui se instaura uma analogia com Cecília Meireles: assim como os "cavalos" da inconfidência eram antes livres, "donos dos ares e das ervas, / com tranquilos olhos macios"4, em um tempo e espaço de vida rural e agreste, os "cavalos" de hoje, arrancados, muitos deles, abruptamente, do seu mundo de sertanejos, vaqueiros, lavradores, e impelidos com violência para as engrenagens do processo de industrialização brasileiro, feito sem nenhum critério nem respeitos pelos direitos humanos, também perdem a " identidade, também "jazem por aí, caídos"5. De fato, boa parte dos habitantes de São Paulo é oriunda de outras regiões, gente muitas vezes que não tinha outra profissão senão a de lavrador e que, por isso, dificilmente conseguirá assimilar ou ser assimilado pela cidade, vivendo um estranhamento doloroso de quem não tem mais lugar no mundo. De tal situação, são emblemáticos vários fragmentos, como o "Minuano", em que a personagem, desesperada, tenta reconstruir momentos de sua vida com a família, momentos da infância, tempos de rústica e difícil vida rural, da qual só agora ela percebe a intensidade e a beleza, quando a compara com o vazio do seu momento presente: "e era plena em sua felicidade a felicidade que temos aos sete anos e que ela agora com o som do microsystem ligado no último volume no décimo-terceiro andar de um edifício em cerqueira césar jogada no chão quase bêbada desesperadamente reconhece mas meu deus como deixara escapar aquela felicidade em que momento da vida ela tinha se esfarelado em sua mãos em que lugar fora esquecida quando meu deus quando" (EEMC, p. 104).

Note-se, a tal propósito, que muitos desses fragmentos de histórias terminam com interrogações, para as quais os personagens ainda buscam respostas, demonstrando que não se alienaram completamente, que não desistiram de tentar atar os fios soltos da própria história. Luiz Ruffato flagra e fixa, com sua câmera fotográfica de autor participante, todos esses painéis e todos esses seres, convoca-os à nossa presença e consciência de leitores, quer que vivam e pulsem diante dos nossos olhos, com suas palavras sussurradas, seus gemidos para dentro, o grito desesperado de ajuda. O seu enfoque, como dissemos, não é neutro, solicita nossa emoção, nossa compaixão e até nossa solidariedade. Afirma o autor em entrevista ao Leia Livro: "Minha intenção é oferecer uma contribuição literária para a reflexão sobre a nossa História". Podemos dizer que ele o conseguiu plenamente, já que o livro EEMC foi apontado, por leitores e intelectuais, como um dos que mais marcaram o panorama literário nacional nas últimas décadas. E não sem razão. Notas 1 RUFFATO, Luiz. Eles eram muitos cavalos. 3.ed. São Paulo: Boitempo, 2005, p. 16.

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Todas as citações da obra presentes no texto serão feitas desta edição. 2 MEIRELES, C. "Romanceiro da Inconfidência". In: Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985, p. 545.

3 Idem, ibidem, p. 406.

4 Idem, ibidem, p. 544.




Ruffato e Emediato; Ruffato e Ivan Ângelo, Ruffato e Loyola Brandão; Ruffato e as revistas Escrita, Ficção, José... Diálogo com a geração 70 que Ruffato diz ser opção de Fernando Bonassi em Subúrbio (Ruffato, 2006, O 'Globo) mas que também é a dele. Eles falavam de direitos para o produtor literário e buscavam a via da profissionalização, em alguns casos, como meio de legitimação66; ele falava do mesmo e decidiu apostar pelo ofício. Aqueles anos de 1970 em que ele entra no campo literário (e que retrata em momentos do Inferno Provisório) e estes anos de 1990 (e 2000) em que ocupa uma posição central, em um dos centros que convivem com outros (nas habituais dinâmicas sistémicas) em que os prestigiados são justamente João Gilberto

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Noll, Rubem Fonseca, Nélida Pinon, Antônio Torres, Loyola Brandão, Sérgio SanfAnna... E, como círculos que convivem no campo literário, uns produtores ocupam posições que simbolicamente atraem outros produtores (é o casQ, por exemplo, de Ruffato como organizador das coletâneas de autoria feminina). De modo que a trajetória literária do autor de Cataguases mostra, nestes momentos, um produtor literário que adota tomadas de posição menos autónomas do que em outros momentos dessa trajetória; adotando, em determinados momentos, posições heterônomas. Como marca da posição que ocupa atualmente no campo literário brasileiro, destacamos o fato de o autor tentar transmitir idéia de coerência na sua trajetória, de círculo em que estão as peças que ele considera que devem estar, no olhar de uma visão retrospectiva com orientação clara: "Toda a minha obra, acredito, dialoga, porque a minha intenção é de organizar uma obra aberta, em que as partes se intercomuniquem, com a participação efetiva do leitor. Então, EEMC é. uma face do Inferno Provisório. Não houvesse aquele livro, que me possibilitou o rompimento formal com as estruturas do romance tradicional, muito provavelmente não teria coragem de encetar a escritura do Inferno Provisório, que retoma e radicaliza certos procedimentos. Portanto, EEMC é uma experiência reflexiva sobre a precariedade. E Inferno Provisório é uma reflexão sobre o intercambiamento das histórias com a História" (SANDRINI, 2006, p. 55). Ao analista e ao leitor crítico de trajetórias ficam leituras "sem intenções"... e."EEMC".

Notas 1 Agradeço a Marguerite Itamar Harrison.o convite para participar deste livro e, de modo especial, a amizade e colaboração de Luiz Ruffato. 2 Neste sentido, o livro de Flávio Carneiro No país do presente (2005) ou as antologias do próprio Nelson de Oliveira sobre a Geração 90 (2001 e 2003) são importantes; como também alguns trabalhos que já aparecem no meio acadêmico. Sobre a crítica literária nos últimos anos e alguns apontamentos relativos a palavras de Nelson de Oliveira, ver. "A demissão da crítica", de Paulo Franchetti. 3 Aceitando a proposta de Even-Zõhar (1990) para os macro-fatores que funcionam em um sistema literário. ' 4 Este conceito complexo refere-se ao "système de dispositions qui, étant le produit d'une trajectoire sociale et d'une position à 1'intérieur du champ littéraire (etc.), trouvent dans cette position une occasion plus ou moins favorable de s'actualiser" (BOURDIEU, 1991, p. 6). 5 Um bom exemplo é a 'ficha' que, sobre o autor, apresenta a edição de seu último livro, Vista parcial da noite (Inferno Provisório.V. III, São Paulo, Record, 2006). Nessa lista de referências de livros da sua autoria e de prémios, o primeiro deles é Histórias de remorsos e rancores. 178 | Uma cidade em camadas

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6 De fato, não foi possível localizar a editora em que foi publicado; e foi o próprio Ruffato quem, muito gentilmente e por meio do correio eletrónico (janeiro, 2007), indicou-me que saiu numa edição da Roseta Edições, de Juiz de Fora: "um nome de fantasia para uma editora que não existia". Ruffato, jornalista de profissão, estreou na literatura como poeta, com o livro de poemas O homem que tece (1979)".

8 "Ele começou como muitos outros escritores, com livros de poesia: Cotidiano do medo e O homem que tece" (Roberti/Silva). 9 Ver Bourdieu (1985). 10 No sentido em que a entende ítamar Even-Zohar (1990, p. 37).

11 Foi também o próprio Ruffato quem, muito gentilmente e por meio do correio eletrónico (janeiro, 2007), indicou-me que saiu em uma edição da Mandi Edições, de Alfenas, MG: "um nome de fantasia para uma editora que não existia". 12 Com o risco de cairmos na "ilusão biográfica" de que "nos adverte" Bourdieu (1994). 13

Claudinei Vieira - E a tua literatura no meio disso? Você começou com poesia.

Luiz Ruffato -, mas não era uma coisa profissional. Eu acho que minha estréia mesmo no crime foi Histórias de remorsos e rancores. Antes, não existia um projeto, aquilo faz parte de uma preparação para algo que depois viria a acontecer. Fiquei uns dez anos sem escrever absolutamente nada, sem publicar nem poemas, nem meus contos lá em Minas, saindo numa antologia no Rio Grande do Sul chamada Novos contistas Mineiros, de que participei, mas até ali não tinha muita consciência do que eu queria, inclusive acho que não tinha nenhuma consciência do que significava literatura para mim." (http:www.desconcertos.com.br). 11 Como sabemos, na tradição literária brasileira - e não só - o ofício de escritor e de jornalista conviveram na biografia de uma boa parte dos produtores literários, como estudou de modo exaustivo a editora do,caderno Ideias - do jornal do Brasil - Cristiane Costa, em sua Tese de Doutorado Escritores jornalistas no Brasil - 1904-2004, defendida em 2004 na UFRJ. Nos últimos anos tínhamos -em opinião de C. Costa - "uma nova safra de jornalistas escritores com orientações e preocupações distintas dos seus predecessores, com ênfase para Bernardo Carvalho, Marçal Aquino e Luiz Ruffato" (LIMA, 2004). 15 http://www.tudolorota.com.br; http://www.vermelho.org.br; etc. 16 Ver Hollanda/Matos, 2006.

17 Versões parecidas do processo em duas entrevistas: 1) (Histórias de remorsos c rancores . )"Era tido como um livro de contos, o que eu não queria. Mas mandei umas trinta cópias para trinta editoras e 90% delas nem responderam. Quem acabou publicando o livro foi a Boitempo" (Hollanda/Ma tos, 2006). 2) "Mas, até publicá-lo (Histórias de remorsos e rancores) foram diversas tentativas. 'Eu não iria bancar. Só lançaria se tivesse uma editora', diz. E, enviou o pedido para vinte. 'Quinze nem sequer me deram resposta e as outras cinco disseram não', conta. Como é persistente, antes de viajar para’Europa, decidiu enviar a proposta para mais vinte editoras. Três delas se interessaram e Ruffato pôde escolher" (ZOCHE, 2005). 18 O poeta gaúcho Fabrício Carpinejar confirma também que, "ao contrário do que atualmente se acredita, é possível viver da literatura" (BORGES, 2006). Carmen Villarlno Pardo | 179

19 "Foi programático mesmo, e comecei a estudar maneiras, os procedimentos técnicos para isso" (www.tudolorota.com.br). Refere-se à ausência do operário e do trabalhador em geral nos textos literários brasileiros.

20 Em palavras do seu colega Marçal Aquino, também em posições próximas de alguns dos centros do sistema literário brasileiro hoje, "Pessoalmente, acompanho com atenção a trajetória de vários autores contemporâneos. Entre eles, um destaque é Luiz Ruffato, escritor da.minha geração com um claro projeto literário e, mais que isso, com profundas marcas de-humanismo naquilo que escreve. No momento ele está envolvido com uma realização arrojada: um conjunto de cinco livros intitulado Inferno Provisório (...)". (http://maldemontano.wordpress.com).

21 "O livro (Histórias de remorsos e rancores) foi bem vendido e a editora teve interesse em publicar o segundo, intitulado como (os sobreviventes)" (ZOCHE, 2005).

22 "Eles eram muitos cavalos, mais que um livro, é uma experiência a não perder" (CRISTÓVÃO, http://www.novacullura.de). 23 Para o contista Estevão Azevedo: "romance?!?" (www.geocities.com). 24 Citamos, como exemplo de algumas resenhas, as seguintes: Flávio Aguiar, "O malestar da linguagem", Zero Hora 2, Março, 2002, Cultura, 7. Cecília Costa, "Ousado, realista e sonhador" O Globo 24, Dezembro, 2001., Segundo caderno, 1-2. Regina Dalcastagnè, "Um dia, em São Paulo", Correio Braziliense 7, Outubro, 2001, Pensar, 10; Beatriz Resende, "São Paulo, SP", Babel Livros 3, Outubro, 2001. Flávio Carneiro, "A palavra como arma". In: Carneiro, 2005, p. 69-72. * \ ' 25 Das ligações com o hipertexto e o zapping televisivo fala Ana Cláudia Viegas; da ligação entre texto literário e crítica social: Carneiro (2005); e, da cidade, em diferentes aspectos: dos "flashes" da megalópole (e...), Harrison (2005); da cidade como parte e como tudo, Sônia van' Dijck (2001); dq São Paulo de EEMC e outras cidades, Dalcastagnè (2001, 2003); Santos (2003) etc. 26 Cartas e mapas encontrarão os leitores, com certeza, neste livro... e, sobretudo, em . EEMC. 27 E, agora, pronta uma quarta; e, em breve, uma tradução para o alemão.

28 Onde participou, em Setembro de 2004, no lançamento da edição italiana, Come tanti cavalli, tradução de Patrizia di Malta e Bevivino A. Torreguitart Ruiz. Em palavras de P. di Malta, tradutora e divulgadora da literatura brasileira no Brasil nos últimos anos (organizadora também da antologia de narrativa erótica brasileira Sex'n Bossa), Ruffato é: "Autore radicale, innovatore e sperimentatore poço conosciuto in Itália anche a causa di certa stampa e negozianti. Che non prestano attenziione a chi non há grandi gruppi editoriali alie spalle" (http://musibrasil.net./articolo.php?id=1218&pr int=l. Último acesso: 16/01/07. 29 Participou, entre outros, do "International Literaturfestival Berlin", em setembro de 2006. 30 Ruffato e Adriana Lisboa foram os representantes brasileiros no Encontro de Escritores que se organizou durante a celebração, do VIII Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas na Universidade de Santiago de Compostela (18-23 Julho

7005). 31 Participou, como convidado, do Encontro Literário "Correntes d'Escritasz na povoa do Varzim, em fevereiro de 2006. A imprensa e os programas de televisão especializados ofereceram também entrevistas com o autor.

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Das resenhas publicadas na imprensa selecionamos a de José Mário Silva, no Suplemento 6*', do Diário de Notícias (31/03/06) e o seu "Aviso aos incautos": "Este livro é um labirinto. E um tour dc force. E um jogo de espelhos. E um caleidoscópio partido. E um trompe íoeil. Pode entrar-se nele no início, a meio ou no fim. É indiferente. O resultado será sempre o mesmo porque deste inferno não há saída. O romance imita a cidade: é megalómano, triturador, ávido, gargantuesco. É um buraco negro que devora a paisagem, cada vez mais depressa. Um palimpsesto interminável".

32 Ver http://www.fabricasaopaulo.coml.br/articles.php?id=118&PHPSESSID=51 94676e8daa3. Último acesso: 09/01/07; e também: http://wwvvl.folha.uol.com.br/ folha/ilustrada/ult90u31959.shtml. Ver Harrison (2005). 13 Ver Mello (2006). Como dado de interesse, citamos o fato de o professor Jefferson Agostini Mello, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, escolheu como leitura obrigada para os/as alunos/as da disciplina "Arte, Literatura e Cultura no Brasil" (da sua Escola na USP) o Inferno Provisório, de Luiz Ruffato, no tema: "Pós-modernismo periférico". Não é o único; mas é uma amostra da legitimação que lhe concede o espaço acadêmico. 34 Ver, entre outros, http://www.bravoonline.com.br/noticias.php?id=2135 (Luís A. Fischer, "Memória remota da pobreza"); http://www.revista.agulha.nom.b r/lruffato5.html (Cláudia Nina, "As fronteiras existenciais de Ruffato"; http:// www.paralelos.org/out03/000684.html (Ronize Aline; "Luiz Ruffato e seu inferno provisório"); http: / / www.desconcertos.com.br/ index.php?option=com_content &task=view&id=81&it (Claudinei Vieira e Fransueldes de Abreu, entrev.); http:// www.speculum.art.br; http//www.tudolorota.com.br/entrevistas3.htm etc.

35 Sempre com a prudência de não cairmos nos "perigos" da "ilusão biográfica"... 36 Sem esquecer também a presença de imigrantes - italianos e nordestinos-.

37 Autor naturalista que - além da tentativa de se constituir em escritor profissional também tinha - e disto poucas vezes se fala - o projeto de retratar uma comédie huinaine à brasileira em vários volumes: "o romancista não soube levar a efeito um vasto plano narrativo que viria a constituir-sè na comédia humana do Segundo Reinado, sob o título geral de Brasileiros Antigos e Modernos. A série ficou no primeiro volume, justamente O Cortiço" (BOSI, A. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1994, p. 191). 38 A jornalista e escritora Ronize Aline lembra, em uma entrevista (www.paralelos.org), que "em entrevista ao caderno Cultura do Estado de Sao Paulo do dia 06/03/2005, Fàbrício Carpinejar citou EEMC ao lado do Lorde, de João Gilberto Noll, como livros publicados nos últimos dez anos que mereceriam a honraria de clássicos".

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39 Ver Santos (http:// rascunho.ondarpc.com.br) 40 Mas, como sabemos, encontramos neles (na experimentaçãq habitual do autor) versos também no discurso "aparentemente em prosa"; como se observa em EEMC (textos 7,10, 45, 47...). < 41 "É possível que, ao deparar com o novo livro do escritor mineiro Luiz Ruffato, a * coletânea de poemas 'As máscaras singulares', lançada pela Boitempo, o leitor espere encontrar algo radicalmente inovador - similar, nesse aspecto, ao romance EEMC, livro anterior do autor" (MARQUES, 2002).

42 Já participou com contos em outras antologias: Novos Contistas Mineiros (Porto

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Alegre, Mercado Aberto, 1988), 27 Contos pelo Telefone (Sào Paulo, DBA, 2000), Geração 90 - Manuscritos de Computador (São Paulo, Boi tempo, 2001) e Os Apóstolos - Doze Revelações (Sào Paulo, Nova Alexandria, 2001, organização de Márcia Denser).

n http://www.desconcertos.com.br/index2.php?option=com_content&task=view&i d=92&. Entrevista a Marcelino Freire. Último acesso. 09/01/07.

44 Organizador, também, da coletânea de minicontos, Os cem melhores contos do século, na coleção Cinco Minutinhos dà Ateliê Editorial, 2004. 45 Ver, como amostra, a Dissertação de Mestrado de Adriano Davanço Quadrado (2006), Inferno pós-moderno. Marcas da contcmporaneidade em Hotel Hell e outras obras da Geração 90. É este próprio pesquisador quem indica que o termo "Geraçao 90" começou a aparecer na imprensa em 2000: A primeira matéria da Folha de S. Paulo que faz menção ao termo é de 18.11.2000. Sob o título "Coletânea é amostra significativa da ficção atual", o jornalista Bernardo Ajzenberg citava os escritores Marçal Aquino, João Carrascoza, José Roberto Torero e Marcelo Coelho como membros da "geração 90", naquele momento grafada assim, em minúsculas (QUADRADO, 2006, p. 45). 46 Como amostra, as entrevistas organizadas em 2003 para o iGLer: "Foi a antologia organizada por Nelson de Oliveira que motivou nossas conversas com os novos autores da literatura brasileira para uma série de entrevistas realizadas em 2003 para o iGLer. O próprio nome do livro já é instigante: 'Geração 90: manuscritos de computador'" [Claudinei Vieira]. http://www.desconcertos.com.br/index2.php?option=com_ content&do_pdf=l&id=88. Último acesso: 14/12/06). 4 Para o professor, escritor e crítico literário Flávio Carneiro (www.flaviocarneiro.com) perante a pergunta: [ -Você acredita que essa é uma geração de 'transgressores', como a chamou Nelson de Oliveira?]:

- FC - Pelo que já li na imprensa, nem o próprio Nelson acredita nisso. Foi uma estratégia de marketing, uma tentativa de colocar no mercado autores que ele considera de valor e que estavam sem espaço. Conceitualmente falando, não acredito na idéia de geração, e acho inclusive que ela é nociva para a ficção que se faz hoje, justamente porque "geração" sugere certa marca de grupo, certa uniformidade, e a grande riqueza da ficção atual é não ser uniforme, ser múltipla. 4S Jorge Rocha, em resenha da antologia Geração 90: os transgressores, explica: "A organização desta coletânea já seria suficiente para fazer com que Nelson de Oliveira ostentasse esta alcunha. Mas a idéia de enquadrá-la em uma geração específica e adjetivá-la criou uma certa polêmica no chamado meio literário - o qúe não deixa de ser um marketing e tanto; ainda bem. São inúmeras as pendengas em relação aos termos 'geração 90' e 'transgressores' que podem, em certos momentos, desviar o foco da qualidade dos textos reunidos para uma discussão de fundo - e daí, para a masturbação filosófica, é um pulo" (Rocha, www.paralelos.org). < 49 E não é o único, http:// www.desconcertos.com.br/index2php?option=com_conten t&task=view&id=92&...

50 Marcelino Freire indica como "responsável" pela etiqueta a ítalo Moriconi: "Quando a gente estava na Primavera dos Livros (evento que congrega várias editoras de pequeno porte), eu, Nelson e Mirisola, o Morriconi falou que nós formávamos uma 'máfia paulista' e aí a gente até pensou em dar o nome da revista 'Máfia' (...)." http: www.desconcertos.com.br/index2.php?option=com_content&task=view&id=92&... 51 ZZE por uma razão que até não saberia te explicar, porque existe um pessoal que

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faz parte dessa tal Geração 90, e mais algumas pessoas que não estão lá. Isto é, a gente se conhece, bate papo e tudo acaba criando um vínculo ex trai i terá rio" (http: // www.desconcertos.com.br/ index.php?option=com_content&task=view&id=81& It....)

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52 Se acreditarmos nas palavras de Ruffato: "Eu tenho uns contatos com o exterior, toda vez que alguém vem aqui, sempre convido o pessoal para a gente se encontrar. No ano passado., foram três encontros, (...). Sabe, encontros para tentar estabelecer alguns vínculos de crescimento..." http://www.desconcertos.com.br/ index.php?option=com_content&task=view&id=81&It...

53 Um dos produtores literários com destaque no sistema literário brasileiro já na década de 1970 e que ocupa ainda hoje posições centrais no mesmo. 54 Como amostra pode servir o sucesso do volume organizado por ítalo Moriconi, Os cem melhores contos brasileiros do século, São Paulo: Objetiva, 2000. Mas se revisarmos as dinâmicas sistémicas da década de 1960 no Brasil encontramos várias referências ao sucesso de estratégias comerciais parecidas (VILLARINO, 2004b).

Ver também: Carneiro, 2005, p. 31-32; Oliveira, 2001, p. 9-12; http://maldemontano.vv ordpress.com/tag/entrevistas/ (entrevista Marçal Aquino, 2006). 55 Ver Cristina Zarur "+30 mulheres, organizadas por Luiz Ruffato", O Globo On Line. http://www.verdcstrigos.org/sitenovo/site/resenha_ver.asp?id=298. Último acesso: 28/12/06.

56 Como amostra, esta manchete do Jornal do Brasil, de novembro de 1978: "Antologias um negócio que dá certo. Principal mente quando o tema é mulher", Beatriz Bonfim 57 Critério que, entre outros, diferencia estas coletâneas da organizada por Li Helena Vianna e Márcia Lígia Guidin, Contos de escritoras brasileiras, São Paulo: Mar’ Fontéç, 2003; em que prevalece a ideia de selecionar contos de autoria feminina história da literatura brasileira.

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58 " Há

muito não se via aparecer tanta gente jovem escrevendo ao mesmo tempo e com um comportamento tão saudável. Mas, para ser sincero, voltei, ontem, 10 de julho de 2004, do Festival de Paraty, com a sensação de que se está escrevendo demais. É preciso que essa 'quantidade' se transforme numa exigência cada vez maior de qualidade" (RESENDE, 2005). Pode parecer que se trata de sensações 'pessoais', mas há outros que partilham a opinião de Sérgio Sant'Anna e trata-se de um produtor já consolidado no sistema literário brasileiro... S9 Ver http://germinaliteratura.com.br/pcruzadas_no_ago2006.htm. (Entrevista Nelson de Oliveira) e http://www. foresti.locaweb.com.br. Como exemplo de texto previamente publicado em blog está a novela Hotel Hell, de Joca Reiners Terron, posteriormente publicado na coleção "Tumba do Cânone" da editora Livros do Mal.

60http://maldemontano.wordpress.com/tag/entrevistas (entrevista Marçal Aquino); http://revista vaga lume, com/destaque/entrevista_jose.castello_imp.htm(José Castello). 61 O responsável pela parte relativa a encontros de escritores foi Flávio Carneiro, http://www.agenciariff.com.br/diario/default.asp?mes=4&ano=2006&menu= Journal. Último acesso: 09/01/07; www.copadacultura.gov.br/page/imprensa_ dètail.asp?cod=33. Último acesso: 09/01/07.

62 Festa Literária, organizada por escritores ligados ao "Projeto Identidade", http:

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//clareira.nase)va.cQm/2006/08/cobertura-flap2006-sp/print. Último acesso: 09/ 01/07. M Ruffato, Quiroga e Ondjaki coincidem - pela primeira vez os três, e une-os agora uma boa relação de amizade - em Santiago de Compostela, em julho de 2005, no decurso do VIII Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas (organizado por Rodríguez/Torres/Villarino). E coincidem de novo no Encontro das "Correntçs d'Escritas", em 2006.

w Editora que abriu o próprio Emediato após ter abandonado a profissão de jornalista em inícios da década de 1990 e de ter-se dedicado a fazer consultoria política.http://g eracaobooks.locaweb.com.br/releases/impresso.php?id=28.Último acesso: 08/01/07. 65 Do tipo de Zero, de Loyola Brandão, e, em certo modo, de EEMC no trabalho de fontes que Ruffato faz com as notícias de jornal. 66 Ver Barbieri (2003) e Villarino (2004a).

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Editora Horizonte

/ Cartas a Victor Hugo, de Louise Michel Cartas da juventude, da vida adulta e da maturidade, enviadas da grande educadora c revolucionária francesa Louise Michel, para aquele que ela considerava o maior escritor da França, seu grande mestre Victor Hugo. Por meio das cartas da juventude entendemos muitas das atitudes de Louise Michel na vida adulta. Foi educada pela "avó", proprietária de castelo, onde sua mãe trabalhava como empregada. Senhora Demahis fez questão de incluir na educação de Louise Michel liberdade para correr nos campos e aprender, em contato com a natureza, as ciências naturais; e para falar e escrever com perfeição o francês: leitura de grandes romancistas da época. Louise Michel, ao ingressar no magistéiro, aperfeiçoou os métodos de sua avó e os aplicou em centenas de alunos, formando um exército de cidadãos, que souberam buscar a igualdade, liberdade e fraternidade.

Kace Chopin

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L Conheça também os livros da coleção Mulheres e Letras. Cosiuia, de Grazia Deledda, é a biografia romanceada dessa que foi uma das poucas mulheres a vencer o Prémio Nobel de Literatura em 200 anos. Culpados, de Kate Chopin, um romance envolvente que trata do divórcio, do alcoolismo, enfim, tenta responder a célebre questão de Freud "Que querem as mulheres?".

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Redes da criação: construção da obra de arte, de Cecilia Almeida Salles, aborda com linguagem objetiva e fluente Redes da taça os processos que envolvem a criação da obra de arte. Bem Construção da ! fundamentado e rico em exemplos, que tomam por base obra de os cadernos, anotações, gráficos, desenhos de criação de arte diversos artistas, como Daniel Senise, Louise Bourgeois, Ignácio de Loyola Brandão, Bill Viola, John Cage, entre -/ outros, este livro contribui determinantemente para os estudos sobre os processos de criação, oferecendo instrumentos para um crítica de processos. Com um roteiro eficiente, Cecília Salles perfaz os caminhos para o estudo e entendimento da obra de arte, iniciando pela abordagem da criação como rede em que verificamos que toda obra é flexível e recebe influências diversas. Em seguida entendemos as questões culturais, quando discute como a rua entra nos escritóriós, bem como os mecanismos individuais, quando fala de olhares, lembranças, e modos de fazer. Em seguida discute as tramas do pensamento, tanto no diálogo entre as linguagens utilizadas pelos artistas, por exemplo, escrita que gera pintura, como as interações cognitivas em que se tenta chegar o mais próximo possível dos procedimentos que geraram as obras. Indispensável para estudantes e críticos e uma obra confiável para os interessados no tema.

Romance de estréia no Brasil, Periferias, de Carlos Quiroga, fala de diferentes tempos e geografias que se convergem para um património comum: a Língua Portuguesa. Na primeira parte do livro nos deparamos com a promessa de um romance histórico, numa viagem para o ano de 1499, mas este evolui para os nossos dias e para além, para uma américa futurista', com a promessa de o Brasil manauara ser í) ponto de sobrevivência de nossa língua. Instigante e fluente Periferias é dividido em três tempos e geografias: 1499, trata das aventuras de um negro de Manicongo, levado para Lisboa. Salto para 1999, 500 anos depois, um estudante galego faz a rota Santiago de Compostela - Lisboa. E mais 100 anos, numa américa futura, uma brasileira nascida nos Estados Unidos-vai a Lisbóa em busca de um objeto, que na superfície é uma flauta e na profundidade suas origens, sua própria língua. Segundo Luiz Ruffato face ao mundo globalizado em que se pressupõe acesso igualitário às economias e culturas mundiais, lidamos com um impasse que diz respeito ao domínio do capital e do poder sobre as economias e culturas ditas minoritárias. Como o caso da Galiza, berço histórico da língua portuguesa, sufocada pela ditadura de Franco, em que a população se viu impedida de falar a sua própria língua. Neste sentido, Carlos Quiroga tem feito um. grande trabalho em favor da causa galega, impondo reflexões sobre identidade e cultura.

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