Tratado de direito comercial brasileiro - Vol. 4 - Das sociedades comerciais [4, 6ª ed.]

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TRATADO DE

COMfRCIAl

DIRflTO

ORASllEIRO

POR

,

JOSE XAVIER CARVALHO DE MENDONÇA ADVOGADO 6. ª EDIÇÃO POSTA EM DIA POR ROBERTO CARVALHO DE :MENDONÇA C"··•."

*

VOLUME IV LIVRO

II

Dos comerciantes e seus auxiliares PARTE III

Das sociedades comerciais (Conclusão)

1ltnania ']'leitas Bastas s/a. SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO Largo da Carioca

R.. IS de Novembro, 62/66

1959

Todos os exemplares são numerados.

M

-

--

2692

LIVRO SEGUNDO Dos comerciantes e seus auxiliares

PARTE III

Das sociedades comerciais (Continuação)

TfTULO IV

Das sociedades anônimas (Continuação)

CAPfTULO IV

Dos órgãos da sociedade anônima (A VIDA SOCIAL)

Sumário: 1116. Os órgãos sociais. - 1117. Os podêres substanciais de cada um dêsses órgãos não podem ser suprimidos nem modificados pelos estatutos. - 1118. Razão de ordem.

1.116 .

Os órgãos dasi sociedade anônimas são:

a)

a assembléia geral dos acionistas (Poder Legisla-

b)

a administração (Poder Executivo); e o Conselho Fiscal.

tivo);

e)

J. X.

CARVALHO DE MENDONÇA

VIDARI chama-os massimi organi aniministrativi ( 1) . Esses três órgãos constituem a mola do mecanismo das sociedades anônimas: a administração suprema e legislativa, aliás sem o caráter de continuidade, confiada à assembléia geral; a administração executiva permanente, para os negócios correntes, a cargo dos administradores; a fiscalização, entregue ao conselho fiscal, que serve de traço de união entre a assembléia geral e os administradores, com poderes de verificar as contas dêstes e de convocar aquela em casos especiais . Temos, assim, nessas sociedades, um órgão de vontade, outro de execução e outro de fiscalização. Algumas sociedades costumam estabelecer nos estatutos um conselho geral, reunião dos administradores e fiscais, e ainda um conselho deliberativo ou simplesmente consultivo, composto de certo número de acionistas, para deliberar ou ser ouvido sôbre determinados negócios. A assembléia geral é que dispõe da maior soma de poderes, sem falar no papel que representa na constituição da sociedade: toma contas anuais aos administradores, nomeiaos e destitui-os, designa os membros do Conselho Fiscal, autoriza os atos para os quais os administradores não têm poderes, e exerce a grande faculdade de modificar os estatutos ou contrato social. Ela, na expressão frisante do Código Federal Suíço das Obrigações, é o "poder supremo da sociedade anônima" (art . 643) (2) . Os poderes substanciais, confiados por lei a cad::i um dos três órgãos acima enumerados, não podem ser suprimidos nem reduzidos pelos estatutos. A lei os distribuiu com 1.117 -

Corso di diritto commerciale, 5.ª ed.., vol. 2. 0 , n. 1. 260. VIV ANTE considera órgãos extraordinários da sociedade a minoria e os acionistas singulares, com a missão de remediarem a obra deficiente dos órgãos normais e repô-los no caminho legal ( Trattato di diritto commerciale, 3.ª ,ed., vol. 2.º, n. 492) . (1)

(2) "L'assemblea generale ê non solamente l'organo piu naturale e fEdele delle società per azioni ed anonime, ma ê anche il solo autorizzato ad esprimere direttamente la voluntà di questi enti collettivi e ad esercitare il supremo potere sociale" (Relazione MANCINI al Senato Italiano) .

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caráter imperativo. Não se poderia, por exemplo, confiar ao Conselho Fiscal a aprovação das contas, nem à diretoria a fiscalização de si própria ou a faculdade de modificar os estatutos. 1.118 - Nas seções dêste capítulo, trataremos demoradamente de cada um dêsses órgãos.

SEÇÃO I Da assembléia geral Sumário: 1119. A assembléia geral. 1120. Limites dos seu:; poderes. 1121. Os seus poderes são intransferíveis. 1122. Manifestação da sociedade por meio da assembléia. ·1123. Legitimação dos acionistas para compô-la. 1124. Quem não pode compor a assembléia. 1125. Lugar d;i reunião da assembléia.

1.119 - A assembléia geral é a reuniao dos acionistas regularmente convocados para discutirem e deliberarem sôbre os negócios sociais. Ela é o poder administrativo por e?'c:_elência; resolve todos êsses negócios, toma quaisque~ dec1soes, delibera, aprova ou ratifica todos os atos que mteressam à sociedade; modifica e altera os estatutos ou contrato social (1). (Veja-se n. 931 do 3.º vol. dêste Tratado).

_A assembléia geral funciona também durante a liquidaçao da sociedade ( 2) e ainda depois de declarada a sua falência (3) . 1.120 - A assembléia geral não tem, porém, poderes absolutos. O círculo da sua ação acha-se traçado na lei e nos· estatutos ou contrato social (n. 931 do 3. 0 vol.). Dec. n. 434, art. 128; Dec. n. 8.821, art. 63. (*) (2) Dec. n. 434, arts. 157, 159, n. 3, 162, 163 e 164; Decreto n. 8.821, arts. 86, 89, 92, 93 e 94. (**) (3) Lei n. 2.024, de 17 de dezembro de 1908, art. 103, pará(1)

grafo 2.º. ( * * *)

Decreto-lei n. 2 . 627, de 26 de setembro de 1940, art. 87. Decreto-lei n. 2. 627, arts. 139, parágrafo único, 141, parágrafo único e 148. (***) Decreto-lei n. 7.661, de 21-6-945, art. 179, III, e art. 105, "f", do citado Decreto-lei n. 2.627. ( *)

( * *)

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J. X. CARVALHO DE MENDONÇA

Não lhe é permitido no exercício do seu poder jurídico: a) mudar ou transformar o objeto essencial da sociedade, isto é, a característica da atividade da sociedade (n. 886 do 3. 0 vol.) (1); b) modificar e alterar os estatutos ou contrato social, se os estatutos ou contrato social proibirem (n. 931 do 3. 0 vol.) (2); e) limitar ou anular os direitos conferidos por lei aos acionistas, quer individualmente, quer como parte componente da sociedade, nem ofender direitos adquiridos de um ou mais acionistas, ainda a pretexto de modificar estatutos; d) suprimir obrigações assumidas e ofender direitos e interêsses de terceiros, salvo com expresso consentimento dêstes. Outrossim, a assembléia não tem, em princípio, o poder de deliberar sôbre doações ou atos de liberalidade, os quais são incompatíveis com o objeto a que se propõem as sociedades anônimas . Não queremos dizer que sejam proibidos aquêles atos que, embora tenham a aparência de liberalidade, são antes remuneratórios, manifestações de eqüidade, ou atos de interêsse ou de utilidade da sociedade, usuais no comércio, como gratificações aos administradores ou empregados, etc. (3). 1.121 - Os poderes da assembléia geral são intransferíveis. Esta não os pode delegar àe modo geral aos administradores, se bem que lhe seja permitido autorizar êsses administradores a tratarem de determinado negócio (4) .

(1-2) Dec. n. 434, art. 128, 2.ª alínea; Dec. n. 8.821, art. 63, 2.ª alínea. ( •) O Congresso Internacional das Sociedades por Ações, realizado em Paris, no ano de 1900, adotou a seguinte resolução: "14e On ne doit pas accorder aux assemblées générales d'actionnaires le pouvoir illimité de modifier les statuts à la majorité". (3) As sociedades anônimas, especialmente as mais abastadas, são solicitadas a contribuírem para obras de caridade, por subscrições abertas por ocasião de festas de regozijo nacional, de grandes calamidades, etc. Essas contribuições módicas são admitidas geralmente. Os administradores não as negam e a assembléia geral as aprova. (4) DELOISON, Des sociétés commerciales, vol. 2.0 , n. 442. ( *) V. Decreto-lei n. 2. 627, de 26 de setembro de 1940, artigos 72, 78 e 150.

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Seria radicalmente nula, por exemplo, a delegação investindo a diretoria de poderes para refarmar ou modificar os estatutos. A lei traçou o exercício da atividade jurídica de cada um dos órgãos da sociedade, e perturbá-lo seria destruir o sistema. 1.122 - A vontade da sociedade manifesta-se exteriormente pelo voto dos acionistas reunidos em assembléia, devidamente convocada, voto obrigatório aos ausentes, abstinentes ou dissidentes·, se dentro da lei e dos esta tu tos . O meio prático dessa manifestação é o voto da maioria (1) . Exigir a unanimidade seria expor a sociedade à inação, seria cair no absurdo de atribuir a um só acionista a qualidade de representante ou árbitro da vontade social (n. 1.143, infra).

Adotando-se o critério da maioria, sistema seguido em tôdas as corporações como necessidade lógica, não se sacrificam direitos nem interêsses individuais dos sócios. Achase em causa o interêsse exclusivo da pessoa jurídica, sociedade, abstraindo de considerações de ordem individual (2). A assembléia não representa a totalização das vontades individuais dos acionistas; é o órgão mais autorizado da vontade social. Os acionistas cooperam aí não como contratantes, porém, com a vontade individual para produzirem uma só vontade, a da sociedade (3). Tem-se dito, com razão, que a sociedade anônima vive sob o regime parlamentar, sujeita à lei das maiorias. As deliberações da assembléia geral, tomadas nos limites da lei e dos estatutos, não se pode, portanto, subtrair a minoria. Os acionistas com as ações adquiridas subseqüentemente às deliberações acham-se, também, a estas subordinados. 1.123 - O reconhecimento ou legitimação dos acionistas, que devem tomar parte nas assembléias gerais, é a primeira condição para o legal funcionamento destas . (1) "Id quod maioris partis probaberit adsensus, solemnis firmet auctoritas" (L. 5, Cod. 10. 63) .

(2) CELÉRIER, Et~tde sur les sociétés anonymes, n. 92. (3) VIVANTE, Trattato di diritto commerciale, 3.ª ed., vol. 2.0 , n. 493 bis.

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Faz-se essa legitimação: Quanto aos portadores das ações nominativas, à vista da inscrição no registro da sociedade (1) . Para êsse fim, os administradores organizam previamente a lista dos acionistas, deixando-a à disposição da mesa da assembléia. Êsse é um dos motivos por que de ordinário os estatutos mandam suspender as transferências das ações durante alguns dias antes da reunião; a)

b) Quanto aos possuidores das ações ao portador e das transferíveis por endôsso, mediante a exibição dos títulos

perante a mesa da assembléia, podendo os estatutos ou contrato social autorizar o seu depósito na caixa da sociedade, pelo menos três dias antes da reunião (2). Recebendo os títulos, a administração da sociedade entrega ao portador uma cautela ou senha, que serve para a admissão à assembléia. Na prática, substitui-se êste depósito na caixa da sociedade pela declaração de banqueiros, de confiança dos administradores da sociedade, que tenham em depósito as ações ao portador, acompanhada da obrigação de conservá-las em seu poder até a reunião da assembléia (***). 1.124 -

Não podem fazer parte da assembléia geral:

O portador de uma fração de ação ( n. 1 . 048 do 3. volume). a)

0

Somente frações, reunidas em número, que dêem valor equivalente ao da ação, podem autorizar a representação nas assembléias gerais (n. 1. 048, cit.) . b)

O condômino de uma ação (n . 1. 049 do 3. 0 vol. ) .

Os condôminos devem designar um só dêles para figurar como proprietário da ação perante a sociedade (número 1. 049, cit.) . Dec. n. 434, art. 22; Lei n. 3.150, art. 7.0 , § 3.0 ; Decreto n. 8.821, art. 18; Dec. n. 164, art. 7. 0 , § 3.0 . (*) (2) Dec. n. 434, art. 136; Dec. n. 8.821, art. 69, parágrafo único. ( *"') ( *) Decreto-lei n. 2. 627, de 26 de setembro de 1940, art. 56, I. ( **) Decreto-lei n. 2. 627, art. 91, 2.ª alínea. (**"') Veja-se o n. 1.543. (1)

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e) O acionista suspenso do exercício dos direitos nos têrmos do art. 32, 2.ª alínea, do Dec. n. 434, de 4 de julho de 1891 (ns. 1. 049 e 1. 077 do 3. 0 vol.) ( *) . O acionista, cujas ações tenham sido dadas em penho;, !'lãa fica privado de formar a assembléia geral e votar (numero 1.100 do 3. 0 vol.). 1.125 - As assembléias gerais reúnem-se no lugar designado para sede social, salvo se se determinar outro nos estatutos ou contrato social, o que aliás não é curial. A reunião em outro lugar traria nulidade à deliberação porventura tomada (1). ARTIGO I Da assembléia geral ordinária e extraordinária Sumário: 1126. A assembléia geral ordinária e extraordinária. 1127. Funções da ordinária. 1128. Funções da extraordinária.

1 .126 -

traordinária .

A assembléia geral pode ser ordinária ou ex-

Estas duas expressões, conquanto não tenham sentido jurídico, foram adotadas para clareza; a lei aceitou-as (***)~ Não contemplamos aqui a assembléia constituinte, composta dos subscritores, com o objetivo de verificar e certificar o cumprimento das condições legais para constituição da sociedade e deliberar sôbre os atos referentes a essa constituição. A respeito dessa assembléia, que aliás nenhuma re(1) Nas ações ao portador e nas transferíveis por endôsso, é essencial a declaração do dia e lugar da reunião anual da assembléia geral ordinária (Dec. n. 434, art. 36, n. 4) . ( * *) Decreto-lei n. 2. 627, art. 85. O Decreto-lei n. 2. 627, de 26 de setembro de 1940, nãa admite ações transferíveis por endôsso (art. 23) . Os dizeres das nominativas e ao portador estão indicados no art. 20. ( * *.,..) Citado Decreto-lei n. 2. 627, art. 97. ( *)

( * *)

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lação tem com a sociedade, pois esta é o resultado da deliberação ali tomada pelos subscritores, já dissemos em os ns. 967 e segs. do 3. 0 vol. Para a modificação dos estatutos não se convoca a assembléia constituinte, a qual funciona uma só vez, porém, a assembléia geral extraordinária (n. 931 do 3 o volume). Difere a assembléia ordinária da extraordinária não sàmen te pela época certa em que se reúne a primeira, como pelo objeto das suas deliberações. A uma e outra devem assistir os administradores e fiscais, ainda que não sejam acionistas, para fornecerem as explicações necessárias. 1.127 - A assembléia geral ordinária é a que, por disposição de lei, se reúne anualmente na época fixada nos estatutos, a fim de tomar as deliberações relativas às exigências normais da vida da sociedade e tem por fim especial a leitura do parecer dos fiscais, o exame,· a discussão e a deliberação sôbre o inventário, balanço e contas dos administradores durante o exercício social findo ( 1) e a nomeação dos fiscais e seus suplentes (2).

Esta assembléia, periódica e regulamentar, pode ter ainda funções eventuais e intermitentes, designadas nos estatutos ou contrato social, como a nomeação dos administradores1, a fixação da retribuição dêstes e dos fiscais, etc. A assembléia extraordinária é a convocada anormal e eventualmente para tomar quaisquer deliberações sôbre negócios e interêsses sociais em casos graves e urgentes ou as resoluções que não cabem à assembléia geral ordinária, notadamente as relativas às modificações ou alterações dos 1. 128 -

princ. e art. 15, (2) Dec. n.

Dec. n. 434, art. 143, princ. e § 1.0 ; Lei n. 3.150, art. 15 § 1.º; Dec. n. 2.821, art. 73, 1.ª e 2.ª alíneas; Dec. n. 164' princ. e § 1.0 • ( •) ' Dec. n. 434, art. 1~8, § 1.0 ; Lei n. 3.150, art. 14, princ.; 8.821, art. 54, 2.ª almea; Dec. n. 164, art. 14, princ. (**)

( •) ( • •)

Art. 98 do Decreto-lei n. 2. 627, de 26 de setembro de 1940 Art. 124, do citado De~reto-lei n. 2. 627. ·

(1)

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estatutos (1), à dissolução antecipada (2), à fusão (3), à emissão de empréstimos por obrigações ao portador ( 4), etc. ARTIGO II

Da convocação da assembléia geral Sumário: 1129. Quem convoca a assembléia geral ordinária. 1130. E a extraordinária. 1131. Processo da convocação. Anúncio. 1132. Motivação. 1133. Segunda e terceira convocação. 1133-A. Reunião da totalidade dos acionistas, sem convocação.

A assembléia geral ordinária é convocada pelos administradores, na sede social, designando-se o lugar, dia e hora da reunião. Não é conveniente que os estatutos sociais fixem dia certo para essa reunião; é melhor estabelecerem um prazo máximo depois do levantamento do balanço geral para que ela se realize (5) . Se os administradores retardam a convocação por mais de três meses além da época designada nos estatutos ou contrato social, qualquer acionista tem o direito de exigir-lhes que cumpram aquêle dever (6) . Se continuam inertes, o acionista pode êle próprio convocar a assembléia, declarando essa circunstância nos anúncios públicos (7) (*****). 1.129 -

(1) Dec. n. 434, art. 128, 2.ª alínea; Dec. n. 8.821, art. 63, 2.ª alínea. (Veja-se o n. 931 do 3.0 vol.) . ( •) (2) Dec. n. 434, arts. 148 e 149; Lei n. 3.150, art. 17; Decreto n. 8.821, arts. 77 e 78; Dec. n. 164, art. 17. (**) (3) Dec. n. 434, art. 213; Dec. n. 8.821, art. 165. (***) (4) Lei n. 177-A, de 15 de setembro de 1893, art. 1.0 , § 5.0 • (****) (5) Os estatutos da Companhia Docas de Santos dispõem no art. 7.0 : "Haverá, anualmente, no mês de abril, uma assembléia geral ordinária para os fins do art. 15, § 1.0, do citado Dec. n. 164. O ano social coincidirá com o ano civil. (6-7) Dec. n. 434, arts. 139 e 140; Dec. n. 164, art. 15, § 9.0 , n. 2. Êste artigo modificou o art. 15, § 9.0 , n. 2, da Lei n. 3 .150. (Veja-se o n. 1.113 do 3.0 volume).

( •)

Art. 104, do Decreto-lei n. 2 . 627, de 26-9-940. Art. 137, e, do citado Decreto-lei n. 2. 627. Art. 105, e, do citado Decreto-lei n. 2. 627. ( • • • •) V. também o art. 105, e, do citado Decreto-lei n. 2. 627. ( *"' ** •) Hoje por mais de dois meses. (Art. 89, b, do citado Decreto-lei n. 2. 627) . ( *"') ( * **)

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1.130 -

A

assembléia geral extraordinária pode ser con-

vocada: a) pelos administradores; b) pelosi fiscais, ainda que não acionistas; ou c) pelos acionistas em certo grupo ( 1) . Os administradores têm por dever convocar essa assen1bléia: a) Espontâneamente, se, em bem dos interêsses sociais, houver mister de deliberação sôbre assunto excedente da sua alçada. b) A pedido de acionista em número não inferior a sete, representando pelo menos um quinto do capital social (2) (*). Êste pedido deve ser fundamentado e os administradores não o atenderão se o motivo alegado pelos peticionários versar sôbre matéria, atos e contas já apreciados e julgados em assembléia geral (3). Os fiscais têm o direito de convocar a assembléia geral Extraordinária em qualquer tempo, se ocorrerem motivos graves e urgentes (4) . Os acionistas em número não menor de sete, representando pelo menos um quinto do capital social, podem, também, convocar a assembléia geral extraordinária, s e os administradores, indeferindo sem razão o seu requerimento ou 1

(1) A assembléia geral pode convocar-se a si própria? Não há dúvida que sim em face do art. 128 do Dec. n. 434. ( * *) O caso, não obstante raro, pode muito bem se dar. A assembléia delibera ou resolve certas providências ou medidas em benefício da sociedade; pode designar desde logo o dia, a hora e o lugar da subseqüente assembléia para conhecer o modo pelo qual foram executadas aquelas providências ou medidas, e autorizar o presidente da reunião a fazer a convocação pela imprensa. (2-3) Dec. n. 434, art. 137; Dec. n. 164, art. 15, § 9.0 , l.ª e 2.ª alíneas. (4) Dec. n. 434, arts. 120 e 121, combinados; Lei n. 3 .150, art. 14, § 3.0 ; Dec. n. 8.821, art. 56; Dec. n. 164, art. 14, § 3.0 . (***) Esta medida varia conforme os Códigos. O Cód. alemão exige um vigésimo de acionistas (arts. 254 e 325, n. 2) ; o suíço, um décimo (art. 645); a lei belga (art. 60, alínea 2) e o Cód. italiano (art. 159), um quinto. ( *) Um quinto do capital, qualquer que seja o número de acionistas (Decreto-lei n. 2. 627, de 26 de setembro de 1940, art. 89, b). (**) Citado Decreto-lei n. 2.627, art. 87. ("* *) Citado Decreto-lei n. 2. 627, art. 127, V.

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deixando de deferi-lo, não procederem à convocação no prazo de oito dias, contados da apresentação do requerimento (1). 1.131 - Processos da convocação - A convocação da assembléia geral faz-se por meio de anúncios nos jornais da sede social, e, se os não houver, nos do lugar mais próximo, com intervalo razoável (2) . A assembléia ordinária é anunciada quinze dias antes (3) pela imprensa, com indicação do lugar e hora da reunião (4) . Os estatutos não podem restringir êsse prazo, estabelecido no interêsse dos acionistas. A lei não determinou prazo para o anúncio da convocação da assembléia extraordinária; deixou a tarefa aos estatutos. Como quer que seja, o prazo deve ser bastante para os acionistas poderem atender ao convite e informarse da matéria da ordem do dia. Seria irregular a convocação da assembléia com preterição dessa regra de tão fácil justificativa. Não há inconveniente em que sejam convocadas simultâneamente a assembléia ordinária e a extraordinária, funcionando esta logo após o encerramento daquela. E' até meio fácil para poupar tempo aos acionistas. 1.132 - A convocação das assembléias gerais será sempre motivada ( 5), isto é, deverá conter a ordem do dia, que O Dec. n. 434, art. 138; Dec. n. 164, art. 15, § 9.0 , n. 1. (*) O Congresso Internacional das Sociedades por Ações, realizado em Paris, em junho de 1900, adotou a resolução seguinte: "lle. (1)

Resol. La convocation d'une assemblée générale peut être exigée par des actionnaires possédant un certain nombre d'actions, représentant une partie notable du capital social à déterminer par la loi non obstant toute stipulation contraire des statuts". (2) Dec. n. 434, art. 134; Dec. n. 8.821, art. 68; Decreto n. 164, art. 15, §§ 1.0 , 5.0 e 9. 0 • (**) (3) O Dec. n. 434, art. 143, diz: "anunciada pela imprensa quinze dias"; a Lei n. 3.150, art. 15, princ.: "anunciada quinze dias antes pela imprensa"; o Dec. n. 8.821: "anunciada pela imprensa quinze dias"; o Dec. n. 164, art. 15, § l.º, "anunciando-se quinze dias antes, sempre pela imprensa". ( * * *) ( 4) Dec. n. 434, art. 143, princ.; Lei n. 3 .150, art. 15, princ.; Dec. n. 8.821, art. 73, princ.; Dec. n. 164, art. 15, princ. (** . . ) (5) Dec. n. 434, art. 134; Dec. n. 8.821, art. 68; Dec. n. 164, art. 15, § 5. 0 • (****"') ( *) Um quinto, qualquer que seja o número de acionistas (citado Decreto-lei n. 2. 627, de 1940, art. 89, d) . (**) Citado Decreto-lei n. 2.627, art. 88, in principio. (***) Hoje, oito dias (citado Decreto-lei n. 2.627, art. 88, parágrafo 1.º) . ( * * * *) Citado Decreto-lei n. 2. 627, art. 88, in principio. ( * * * ~, *) Citado Decreto-lei n. 2. 627, art. 88, in principio. 2

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J. X.

CARVALHO DE MENDONÇA

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é a menção, mais ou menos resumida, das matérias que vão ser submetidas à discussão e deliberação dos acionistas, Justifica-se a exigência pela necessidade de dar tempo para o estudo e reflexão sôbre essas matérias, evitando surprêsas e permitindo aos acionistas formar juízo seguro.

Quando se fala de convocação da assembléia geral das sociedades anônimas, vêm logo ao pensamento duas idéias distintas, o apêlo, o convite para a reunião, e a informação, a notícia do objeto dêsse apêlo ou convite. Sôbre matéria não contemplada na ordem do dia pode-se discutir, nunca, porém, deliberar, por se presumir que os acionistas não tiveram suficiente conhecimento do assunto (1). A especialização da ordem do dia faz parte do sistema de publicidade no qual vivem as sociedades anônimas. Seriam inadmissíveis avisos redigidos em têrmos duvidosos, genéricos, ou incompletos, como se se convocasse a assembléia para resolver sôbre negócios sociais, sôbre modi(1) O Cód. Comercial argentino, art. 349: "Es nula toda d~li­ beración sobre materias extrafías á las de la convocatoria"; Cod. Comercial italiano, art. 155: "Qualunque deliberazione presa sopra un oggetto non indicato nell'ordine dei giorno ê nulla". - Convocados os acionistas de uma sociedade anônima para em assembléia deliberarem sôbre o levantamento de um empréstimo, esta assembléia autorizou a diretoria a contrair o empréstimo com garantia hipotecária dos bens sociais. Os estatutos da sociedade não autorizavam a diretoria a hipotecar bens sociais. Em parecer de 31 de julho de 1898, opinou o Conselheiro LAFAYETTE que era nula a hipoteca contraída em virtude dessa autorização por se ter infringido o art. 134 do Dec. n. 434. A faculdade de contrair dívidas, diz êste jurisconsulto, é diferente e distinta da faculdade de hipotecar: pela primeira, o indivíduo toma uma obrigação, uma responsabilidade; pela segunda, aliena um direito real sôbre o imóvel (a hipoteca é um princípio de alienação) . Daí vem que o poder para contrair dívidas não abrange a hipoteca. A assembléia geral convocada para levantamento de empréstimos delibera acêrca de assunto para o qual não foi convocada autorizando a diretoria a constituir hinoteca dos bens sociais. Esta deliberação é nula, porque falta o reqÜisito ou condição legal para que a assembléia geral possa deliberar a respeito, e a nulidade da autorizacão acarreta virtual e necessàriamente a nulidade da hipoteca (Do )ornal do Comércio de 28 de agôsto de 1898) . A opinião do preclaro jurisconulto não será porventura rigororn? Convocada a assembléia para deliberar sôbre um empréstimo, cabe-lhe estabelecer as condições e garantias para êsse ato. Nesse sentido opinaram: o Conselheiro SILVA COSTA, em pal"ecer de 4 de agôsto de 1898: "Desde que nos avisos de convocação

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ficação dos estatutos, etc. Isso não importa dizer que se

divulguem em um simples aviso de convocação fatos íntimos da sociedade, concorrendo, assim, para o seu descrédito. Podem os avisos ser lacônicos sem incorrerem na censura legal. Está subentendido que a assembléia tem a faculdade de adotar a fórmula que melhor lhe pareça para resolver sôbre a matéria levada ao seu conhecimento (n. 1.148, infra). E'-lhe defeso sàmente decidir sôbre assunto que, direta ou indiretamente, explícita ou implicitamente, principal ou acessàriamente, não se compreenda na ordem do dia ( 1) . Admite-se, entretanto, que no silêncio da ordem do dia, a assembléia delibere sôbre a responsabilidade e destituição dos administradores, sôbre a retribuição dos administradores e fiscais, se não estiver estabelecida nos estatutos. Pondera VIV ANTE quanto à destituição dos administradores: "não é possível admitir que a assembléia deixe a administração social até a convocação de nova assembléia com quem se mostrou indigno da sua confiança, nem que lhe abandone nas mã0ts o estabelecimento social correndo o risco de desaparecerem os atos que o condenam" (2). Não falta quem admita, também, no caso de urgência, a deliberação sôbre matéria não compreendida na ordem ã.o dia, para salvaguarda dos interêsses sociais. Faz-se mister, porém, que o caráter de urgência seja real, evidente e que a deliberação não possa ser adiada sem grave prejuízo. s~ inseriu a autorização à diretoria para levantamento de empréstimo nesta praça, estava anunciado quanto bastava para que a as-

sembléia geral pudesse vàlidamente deliberar sôbre o empréstimo com garantia hipotecária", e o Dr. SOUSA RIBEIRO, em parecer da mesma data: "O art. 134 do Dec. n. 434 não nrescreve fórmulas de anúncio e os acionistas chamados a deliberar sôbre o levantamento de empréstimos, sabem desde logo que terão de pronunciar sôbre suas modalidades e garantias, e podem a tempo colhêr informacões. E auando lhes não baste o estudo prévio d.o assunto nem os esclareÇa a discussão. podem ainda na assembléia propor o adiamento da sessão, parH que se proceda no intervalo às investigações convenientes" (Dec. citado, argumento dos arts. 128 e 143, § 2.0 ) . (1) O fim especial da assembléia geral anual acha-se explicado no art. 143, § 1.0 , do Dec. n. 434. Não há inconveniente em que esta assembléia resolva sôbre negócios administrativos da sociedade, que tenham relação direta com a ação dos administradores. (2) Trattato di diritto commerciale, 3.ª ed., vol. 2. 0 , n. 499; HOLBACH, L'assemblée générale des sociétés anonymes, pág. 107.

:o

J.

X.

CARVALHO DE MENDONÇA

A assembléia que verifica essa urgência, vota-a preliminarn1en te, e a sua declaração não cria, mas simplesmente reconhece um estado de fato. Aconselha-se aos administradores publicarem novos anúncios em aditamento aos de conYocação já correntes na imprensa, avisando o caso de urgência que surgiu ( 1) . 1 .133 - Sôbre a segunda e terceira convocação, na falta de quorum para a primeira reunião, diremos em o nú1nero 1.139, infra. 1.133-A - A convocação da assembléia geral, nos têrmos explicados, é essencial para a validade da deliberação. Há, entretanto, o caso em que essa convocação pode ser suprida, qual se comparecem, sem protesto, todos os acionistas, demonstrando êles, destarte, que conheceram em tempo útil a ordem do dia. Faz-se a convocação no interêsse exclusivo dos acionistas e não no de terceiros. Êstes não podem intervir nas deliberações, nem levantar oposição ao que em assembléia se deliberar. A sua garantia está na publicação da deliberação e no remédio judicial que a lei lhes assegura. Essa tese tem sido recebida sem relutância; pode-se dizer pacífica.

(1)

HOLBACH,

L'assemblée générale des sociétés anonymes,

pág. 110: "Si la déclaration (d'urgence) n'était faite que pour éviter la publicité de l'ordre du jour, alars qu'elle s'impose, ou dans un but doleux quelconque, elle serait vaine, et la décision, votée malgré le silence de l'ordre du jour, nulle. La déclaration d'urgence vaut jusqu'à preuve contraire, parce qu'elle entre dans les attributions de l'assemblée".

TRATADO DE DIREITO COMERCIAL BRASILEIRO

21

ARTIGO III Da constituição legal da assembléia geral. Novas convocações. Sumário: 1134. Quorum para a constituição da assembléia. 1135. Continuação. 1136. Continuação. 1137. Procuradores. 1138. Representantes. 1139. Nova convocação na falta do quorum legal. 1140. Deve ser mantida nas subseqüentes convocações a mesma ordem do dia.

1.134 - Em o n. 1.123, supra, dissemos sôbre o reconhecimento ou legitimação dos acionistas para a composição da assembléia geral. Para que a assembléia funcione e delibere, exercendo o seu poder jurídico, a lei exige a presença de um número mínimo de acionistas, representando determinada fração do capital social. Êste mínimo (número legal, quorum), brando ou forte, conforme o objeto da assembléia, é necessário para não deixar os destinos da sociedade à mercê das pequenas minorias. Não se confundam quorum e maioria. O quorum diz respeito ao número de acionistas, necessário para compor legalmente a assembléia (composição da assembléia) (1); a maioria refere-se ao modo de ser colhida a deliberação dos acionistas presentes à assembléia (quorum), por outra, significa a proporção dos votos que, estando presente o quorum, tem de resolver sôbre a medida proposta (ns. 1.122, supra, 1.143 e 1.144 infra).

O uso tem admitido o livro de presença ou a fôlha de onde assinam os acionistas que comparecem pessoalmente ou por seus representantes ou procuradores presença,

(1) CLARK, Private cor1)orations, pág. 469: "By1 the term quorum is meant the number of rnernbers of a corporation, board, comrnittee, etc., who must be present in arder to take action".

J.

X.

CARVALHO DE MENDONÇA

(*).Logo após a última assinatura. o secretário da assembléia lavra o têrmo de encerramento, que é assinado por tôda a mesa. Isso se impõe para autenticidade do ato. O livro ou a f ôlha de presença mostra os nomes e o número dos acionistas comparecentes e o total das ações representadas na assembléia (2) . 1n. 1.153 infra)

(1)

1 .135 - Exigem-se: A. - A presença de acionistas que, no m1n1mo, repre-

sentem dois terços do capital social, para a constituição das assembléias gerais, que tiverem de deliberar sôbre: a) a modificação ou alteração nos estatutos ou contrato social (3); e b) a concordata na falência da sociedade (4) . B. - A presença de acionistas cujo número corresponda a mais de três quartos dêles, representando, pelo menos, metade do capital social, para a constituição da assembléia que tiver de deliberar sôbre a emissão de empréstimo em cbrigações ao portador (debêntures) (5) (***) (Veja-se número 1. 282, infra) . C. - A presença de acionistas que representem, pelo menos, um quarto do capital social, para a constituição da assembléia que tiver de deliberar sôbre matéria não expressamente declarada nas letras A e B, supra (6) (****) . JÇA

estas se achem cotadas na bôlsa acima ou abaixo do valor non1inal. Justifica-se, em teoria, a caução em ações, para interessar o administrador no bom andamento da sociedade. Mas· a lei tolera a caução em ações de terceiros! E' uma garantia precária, senão ilusória! Se vem a falência da sociedade. . . que valem estas ações? Se os negócios sociais foren1 maus, levando a sociedade ao descalabro, como garantir com os seus títulos depreciados os erros: ou crimes dos administradores? Tem-se sugerido a caução em títulos do Estado, ou, ao menos, em parte dêles. 1.176 - A caução constitui-se por têrmo lavrado no livro do registro das ações ( 1) .

Se as ações forem ao portador ou transferíveis por endôsso, serão depositadas na caixa da sociedade ou em poder de pessoa designada pela assembléia geral (2). Esta pessoa é, de ordinário, um banco. A caução pode ser prestada pelo próprio administrador ou por qualquer acionista em favor dêste (3), o que de ordinário acontece se aquêle não é acionista ou se não possui número suficiente de ações. 1.177 -

1.178 - O administrador que, dentro do prazo de trinta dias, não prestar a caução, entende-se que não aceitou a nomeação (4) . Dec. n. 434, art. 105, § 1.0 ; Lei n. 3.150, art. 10, § 2.ª alínea; Dec. n. 8.821, art. 47, § 2.0 , 1.ª alínea; Dec. n. art. 10, § 3. 0 , 2.ª alínea. ( •) (2) Dec. n. 434, art. 105, § 2.0 ; Lei n. 3.150, art. 10, § 2.ª alínea; Dec. n. 8.821. art. 47, § 2.0 , 2.ª alínea; Dec. n. art. 10, § 3.0 , 2.ª alínea. (3) Dec. n. 434, art. 105t, § 3.0 ;§Lei n. 3.150, art. 10, § 3.ª alínea; Dec. n. 8.821, ar · 47, 3.0 ; Dec. n. 164 art. § 3.0 , 3.ª alínea. ' (4) Dec. n. 434, art. 107; Dec. n. 8.821, art. 49. (*"') (1)

3.º, 164, 3.º, 164, 3.º, 10,

( •) Citado Decreto-lei n. 2. 627, art. 28, in principio, e artigo 56, I, /. ( .. ) Citado Decreto-lei n. 2.627, art. 117, § 1.0.

TRATADO DE OI REITO COMERCIAL BRASILEIRO

47

Quid se tomou posse do cargo independentemente de caução? Os atos dos administradores não são nulos, nem êstes ficam isentos das responsabilidades legais ou contratuais.

1.179 - Os administradores prestam a caução antes de entrar em exercício (n. 1.174, supra) . Lavra-se esta caucão no livro de registo a cargo ou na posse dos administradores (n. 1.176, supra) . Se os detentores dos livros e mais papéis não consentem na caução, como podem os administradores entrar na posse ou no exercício do cargo? Parece-nos que o meio é os administradores requererem ao juiz que os admita a prestar provisàriamente a caução em juízo, até que, normalizada a situação, se lavre o têrmo definitivo no respectivo livro. Certo é que, pelo fato de os detentores dos livros e papéis criarem obstáculos à prestação da caução, não podem os legítimos administradores: ser privados do seu cargo. 1 . 180 - A caução de que falamos apresenta todos os caracteres da constituição do penhor, e a sociedade, os acionistas ou terceiros podem requerer a venda judicial das ações caucionadas no caso de responsabilidade dos administradores por faltas, culpas ou delitos (1) . A sociedade, os acionistas ou terceiros têm os direitos dos credores pignoratícios, pelo que gozam sôbre o produto daquela venda a preferência para seu pagamento. As ações caucionadas tornam-se inalienáveis, ou melhor, incessíveis até a prestação das contas (n. 1.181, infra). Por mais privilegiados que sejam os credores pessoais dos administradores, êles não podem penhorar as ações caucionadas, sem estar liquidada a responsabilidade dêstes por faltas·, culpas ou delitos na gestão da sociedade. 1 .181 - A lei não diz quando se extingue a caução, sendo permitida a restituição das ações.

(1)

Dec. n. 434, art. 106; (•) Dec. n. 8.821, art. 48.

(•) o posição.

Decreto-lei n. 2. 627, de 26-9-940, não repetiu esta dis-

4S

J. X.

CARVALHO DE MENDONÇA

Cabe aos estatutos prever o caso, não devendo ser libertas as ações até antes pelo menos de a assembléia geral ordinária aprovar as contas e dar quitus aos antigos administradores. Na falta de disposição estatutária é o que se tem observado. Se a assembléia aprova as contas, considera-se que tenha tudo corrido regularmente e não há motivo para se manter o vínculo da caução com fundamento em possível &ção (1). Isso não significa, porém, a extinção absoluta da responsabilidade dos administradores ( *) . 1.182 - Remuneração - O cargo de administrador pode ser estipendiado ou gratuito (2) . A gratuidade quase se não compreende aqui. Além de oferecer o serviço remunerado melhores garantias, ninguém aplica atividade e diligência em negócios alheios nem assume responsabilidade sem estipêndio. Os estatutos ou contrato social devem regular os ven-

cimentos (3), mas êstes estatutos ou contrato podem conferir, por sua vez, à assembléia geral a atribuição de marcálos (vejam-se ns. 1.127 e 1.132, supra), atendendo aos serviços dos administradores e aos 1ucros sociais (4) . 1

(1) MOR!, La società anonima, vol. 1.0, n. 186; PIC, Des sociétés commerciales, vol. 2.0 , n. 1.112. (2) Dec. n. 434, art. 98, princ.; Lei n. 3.150, art. 9.0 , l.ª parte; Dec. n. 8.821, art. 42, princ.; Dec. n. 164, art. 9.0, l.ª parte. (3) Dec. n. 434, art. 100; Lei n. 3.150, art. 10; Dec. n. 8.821, art. 44; Dec. n. 164, art. 10, l.ª alínea. (**)

(4) Pode a assembléia geral reduzir os ordenados que os estatutos fixarem para os administradores, ainda que não reúna as condições necessárias para a reforma dos estatutos? Se os vencimentos dos administradores são marcados nos estatutos parece que para a sua redução como para o aumento é indispensável que se cumpra o disposto no art. 131 do Dec. n. 434. A Relação do Estado do Rio, depois de grande tibieza, julgou, em acórdão de 8 de outubro de 1895, que era válida a resolução da assembléia extraordinária, reduzindo os ordenados, ainda que sem a presença de dois terços dos acionistas, máxime se os diretores a isso aquiesceram em virtude do estado pouco lisonjeiro da sociedade (coleção dos acórdãos rdêste Tribunal no anexo E do Relatório do seu presidente, de junho de 1896, págs. 178-185). ( •) Hoje o Decreto-lei n. 2. 627, de 26 de setembro de 1940 dispõe, expressamente, a respeito - Art. 117, § 2.0. (••) Citado Decreto-lei n. 2.627, art. 116, § 1.0, b.

TRATADO DE DIREITO COMERCIAL BRASILEIRO

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1.183 - A remuneração pode ter a forma de estipêndio ou consistir em determinada participação nos lucros líquidos da sociedade, depois de deduzida a parte destinada ao fundo de reserva, se porventura instituído (1). E' ilegal a cláusula estatutária concedendo aos administradores vantagens sôbre a renda bruta (2) .

Se fantasiam aquêles lucros por meio de balanços menos verdadeiros, para colherem vantagens pessoais mais do que as devidas, os administradores, além das p1mas em que possam incorrer, estão obrigados a restituir à sociedade ou à massa falida o que indevidamente receberam. 1.183 bis -

A ação para haver a remuneração não pres-

creve em um ano, pois, não sendo os administradores da (1)

Dec. n. 434, arts. 98 e 100; Lei n. 3.150, arts. 9. 0 e 10,

princ.; Dec. n. 8.821, arts. 42, 2.ª alínea, e 44; Dec. n. 164, artigos 9. 0 , l.ª parte, e 10, ~rinc. ( *)

(2) Nesse sentido manifestaram-se o VISCONDE DE OURO PRÊTO, ANDRADE FIGUEIRA, CLóVIS BEVILÃQUA, GUMERCINDO RIBAS, BRASÍLIO MACHADO e DUARTE DE AZEVEDO, em pareceres no ano de 1908, que se encontram nos Relatórios da Inspetoria de Seguros sôbre os estatutos da Comp. de Seguros de Vida SulAmérica, Imprensa Nacional, 1908, págs. 51-57 e 99-100. ANDRADE FIGUEIRA disse: "A intercalação das palavras salvo disposição em contrário dos estatutos no art. 98 do Dec. n. 434, vem a autorizar

porcentagens sôbre a receita bruta, uma vez que sejam autorizadas pelos estatutos; mas essa intercalação foi manifestamente um êrro de transplantação das fontes legais consolidadas e ali citadas, a saber, a Lei n. 3 .150, de 1882, e o Dec. n. 164, de 1890, ambas as quais prescrevem que tais porcentagens só possam ser deduzidas dos lucros líquidos ou se trate de fixá-las em disposições dos estatutos orgânicos da sociedade (art. 10, § 4.0 , de ambos os atos) ou se estabeleçam por deliberação da assembléia geral depois de constituída a sociedade" (art. 3. 0 , § 3.0 , de ambos os atos) . DUARTE DE AZEVEDO escreveu: "as Leis de 4 de novembro de 1882 e de 17 de janeiro de 1890, e os Decs. de 30 de dezembro de 1882 e de 4 de julho de 1891, não permitem que a porcentagem devida aos administradores seja deduzida dos lucros brutos da companhia: são expressos em mandá-la deduzir dos lucros líquidos. A questão única sôbre êste ponto é saber se para tal dedução computa-se ou não nos lucros líquidos a parte destinada ao fundo de reserva, que não será compreendida, salvo disposição contrária dos estatutos". (Vejam-se, também, no citado opúsculo os lúcidos relatórios do Dr. VERGNE DE ABREU, inspetor de seguros e ofício dêste ao Ministro da Fazenda, em 16 de fevereiro de 1913, no Diário Oficial de 10 de março de 1923, pág. 7. 225) . (*)

Citado Decreto-lei n. 2.627, art. 134.

J. X. CARVALHO DE MENDONÇA

50

sociedade anônima prepostos, não se lhes aplica o art. 448 do Cód. Comercial (1) . 1.184 - Direito Fiscal - Sôbre as gratificações que assim se atribuem aos acionistas não se paga o impôsto de dividendo. Estatui o art. 2. 0 do Dec. n. 2.757, de 23 de dezembro de 1897, que êste impôsto compreende as quantias pagas a título de bonificação ou outro por que se distribuem os lucros: "esta disposição regulamentar, porém, de modo algum, pode ser entendida senão como se referindo aos lucros distribuídos pelos acionistas e tão-sàmente sôbre êsses lucros é que foi criado o impôsto e ao poder que regulamenta a lei não é dado alterá-la ou modificá-la, mormente em matéria de impostos" (2) . 1.185 - Cessação do ofício - Não se explicaram minuciosamente na lei as diversas causas da cessação do ofício de administrador, por outra, os casos de vaga do lugar de administrador . Cumpre aos estatutos ou contrato social preencher a lacuna. Podem-se, aplicando por analogia as regras do mandato, estabelecer os seguintes casos em que acaba o ofício de administrador: 1.º)

o decurso do tempo da nomeação (n. 1. 169, supra);

2. 0 ) a revogação ou destituição (3); 3. 0 )

a renúncia (4);

(1) Acórdão das Câmaras Reunidas, de 7 de outubro de 1915. na Revista Jurídica, do Rio, vol. 1.º, pág. 502. (2) Acórdão do Supremo Tribunal Federal, de 7 de novembro de 1906, n'O Direito, vol. 103, pág. 540. A Lei n. 2.919, de 31 de dezembro de 1914, no art. 1.º, n. 33, está de acôrdo com essa solução, estabelecendo o impôsto sôbre o dividendo e outros produtos das ações. (3) Cód. Comercial, art. 157, n. 1; Dec. 434, art. 100; Lei n. 3.150, art. 10; Dec. n. 8.821, arts. 41, § 1.0 , e 44; Dec. n. 164, art. 10, princ. (*) (4) Cód. Comercial, art. 157, n. 2.

("') Decreto-lei n. 2.627, de 26 de setembro de 1940, arts. 87, parágrafo único, a, e 116.

TRATADO DE DIREITO COMERCIAL BRASILEIRO

4. 0 )

a morte (1);

5. 0 )

a inabilitação moral (2);

6. 0 )

a falência do administrador (3).

51

Cessa, ainda, o ofício de administrador com a dissolução da sociedade anônima (4) . A falência da sociedade não produz, porém, a ces.~ação do ofício dos administradores. A sociedade anônima, desde que ao tempo da abertura da falência não se ache em liquidação, pode oferecer concordata pelo órgão dos seus adIninisll sa sentença publicada na Revista de Direito, vol. 11, pág. 309. (VeJase CLóVIS BEVILÃQUA, Teoria Geral do Direito Civil, pág. 199) · O Cód. Comercial argentino teve a cautela de dispor, no artigo 285: "Las sociedades legalmente costituídas en país extranjero, que no tuvieren asiento, sucursal ó cualquier especie rde representación social en la República, podrán, sin embargo, praticar en esta los respectivos actos de comercio que no sean contrarias á ley nacional". Combinam-se aqui, diz SEGOVIA, êstes dois princípios de direito internacional privado: 1.0 , a existência e capacidade das sociedades, como das pessoas jurídicas a que são equiparadas, regemse pela lei do país onde tenham sido fundadas e reconhecidas como tais; 2.º, para o exercício de atos compreendidos no objeto da sua instituiçào, essas sociedades e pessoas jurídicas devem conformarse às prescrições estabelecidas no Estado, 1:º qual prete~dem realizá-los (Explicación y crítica del nuevo codigo de comercio, volume 1.º, nota 1.014).

TRATADO DE DIREITO COMERCIAL BRASILEIRO

277

A lei não proíbe que qualquer sociedade estrangeira não autorizada para funcionar na República tenha mandatário nesta, nem lhe veda acionar ou ser acionada perante os tribunais brasileiros ( 1) . Para se fixarem, porém, em território brasileiro, formando aí estabelecimento principal ou sucursal ou fi1. 511 -

(1) Sôbre a capacida·de ativa e passiva para demandar, opinaram negando-a, ANDRADE FIGUEIRA e LAFAYETTE, em pareceres na Revista Forense, de Minas, vol. 8. 0 , pág. 120, sendo que LAFAYETTE com restrições. Entendeu êste que as sociedades comerciais estrangeiras de responsabilidade ilimitada conservam em qualquer país a sua personalidade jurídica e em conseqüência podem aí praticEtx vàlidamente atos jmídicos de tôda a natureza e estar em juízo ativa e passivamente. Não assim as sociedades anônimas estrangeiras sem autorização, porque não gozam de personalidade jurídica em país que não é o da sua nacionalidade. Em sentença de 14 de dezembro de 1867 (onze votos vencedores e cinco vencidos), o Supremo Tribunal de Justiça julgou que a sociedade anônima estrangeira, ainda que não autorizada para funcionar no Brasil, podia acionar o seu mandatário: "não se pode ampliar a disposição de lei e do regulamento a um agente ou mandatário que qualquer casa comercial pode estabelecer onde lhe convier, conforme o seu interêsse" (CANDIDO MENDES, Arestas, página 693) . - O Banco Industrial do Pôrto, sociedade anônima não autorizada a funcionar no Brasil, acionou um comerciante no Rio de Janeiro para que pagasse certa quantia que lhe ficou devendo na qualidade de seu agente nessa cidade. O juiz do comércio, Dr. MACEDO SOARES, em sentença de 1. 0 de outubro de 1888, julgou que "a obrigação não se elidia pelo fato de não ter a agência funcionado com autorização do Govêrno; porquanto a obrigação de prestar contas vem do mandato conferido e aceito e dos atos em virtude dêle praticados. A legalidade ou ilegalidade da existência e funcionamento dos ~ancos ~~ agências bancárias sem autorização legal não anula, nao modifica por forma alguma as respectivas transações nem as relações do banco com a sua agência. E' questão de direito fiscal e não de direito civil ou C'omercial (Dec. n. 2.711), art. 1.0 ; Lei n. 1.083, de 1860, art. 2.º § l.º e Dec. n. 575, de 1849, art. 10) . Demais, não pode 0 réu invocar em seu favor o próprio delito ou infração da lei que a êle, mais que ao autor, ,cu:11pria observar'.'. A Relação do Rio, em acordaos de 19 de Julho e 22 de novembro de 1889, confirmou unânimemente essa sentença. Interposta revista para o Supremo Tribunal de Justiça, êste, em sentença de 26 de abril de 1890, a concedeu, sob o fundamento seguinte: "Determina a lei que nenhuma sociedade anônima estrangeira possa funcionar no Brasil sem prévia autorização do Govêrno; entretanto, a decisão da Relação a O f~damento dêsse ~irei to não está na exigibilidade das d1v1das ~m virtude da declaraçao da falência, exigibilidade que prevalece so.mente com relação falido (Lei n. 2. 024, de 17 de dezembro ae 1908, art. 26, prmc.) . Ela não se refere aos créditos do falido