Sítios de pesca lacustre em Rio Grande, RS, Brasil [1º ed.]

Publication in book of the recognized thesis of the archaeologist Pedro Ignacio Schmitz, presented in 1976.

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Sítios de pesca lacustre em Rio Grande, RS, Brasil [1º ed.]

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ISBN 978-85-60967-40-7

9 788 560 967407

O Arqueólogo Pedro Ignácio Schmitz, possui Graduação em Filosofia pela Faculdade de Filosofia Cristo Rei (1954), Graduação em Geografia e História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1958), Graduação em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Filosofia e Teologia de Cristo Rei (1963). Livre-Docente em Antropologia, Doutor em Geografia e História - PUCRS, Porto Alegre, 1976. Foi professor titular na UFRGS de 1958 a 1985 (Aposentado). E desde 1966 até o momento (2011) é coordenador do Instituto Anchietano de Pesquisas – IAP, na UNISINOS, Universidade onde também é professor. Possui uma vasta produção científica, cujo resultado pode-se consultar em uma sólida e ampla produção bibliográfica, divulgada em periódicos nacionais e internacionais. É Editor da Revista PESQUISAS desde 1962, e membro do corpo editorial de diversas revistas. Consultor, representante, frente a diversos órgãos governamentais, como: CAPES, CNPq e IPHAN. Desenvolveu e desenvolve pesquisas em diversos estados brasileiros, como: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás, e no Pantanal do Mato Grosso do Sul. Como resultado e reconhecimento de sua atuação profissional, já foi condecorado com diversos prêmios, medalhas e homenagens. Consolidando-se como um dos pioneiros da arqueologia brasileira.

Este livro reproduz o trabalho produzido por Pedro Ignácio Schmitz em 1976, para obtenção do grau de Livre-docente, pela Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS

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O Arqueólogo Pedro Ignácio Schmitz, possui Graduação em Filosofia pela Faculdade de Filosofia Cristo Rei (1954), Graduação em Geografia e História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1958), Graduação em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Filosofia e Teologia de Cristo Rei (1963). Livre-Docente em Antropologia, Doutor em Geografia e História - PUCRS, Porto Alegre, 1976. Foi professor titular na UFRGS de 1958 a 1985 (Aposentado). E desde 1966 até o momento (2011) é coordenador do Instituto Anchietano de Pesquisas – IAP, na UNISINOS, Universidade onde também é professor. Possui uma vasta produção científica, cujo resultado pode-se consultar em uma sólida e ampla produção bibliográfica, divulgada em periódicos nacionais e internacionais. É Editor da Revista PESQUISAS desde 1962, e membro do corpo editorial de diversas revistas. Consultor, representante, frente a diversos órgãos governamentais, como: CAPES, CNPq e IPHAN. Desenvolveu e desenvolve pesquisas em diversos estados brasileiros, como: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás, e no Pantanal do Mato Grosso do Sul. Como resultado e reconhecimento de sua atuação profissional, já foi condecorado com diversos prêmios, medalhas e homenagens. Consolidando-se como um dos pioneiros da arqueologia brasileira.

Este livro reproduz o trabalho produzido por Pedro Ignácio Schmitz em 1976, para obtenção do grau de Livre-docente, pela Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS

Pedro Ignácio Schmitz

Erechim RS 2011

Todos os direitos reservados pela SAB-Sociedade de Arqueologia Brasileira. Proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma e por qualquer meio mecânico ou eletrônico, inclusive através de fotocópias e de gravações, sem a expressa permissão do autor.

Preparação de originais e Revisão técnica: Tânia Tomázia do Nascimento Editoração: Darcy Rudimar Varella Elen Luci da Gama Capa:

José Alfredo Abrão Gabi Cavion

Organizadores: Rossano Lopes Bastos Erika M. Robrahn-González

S335s Schmitz, Pedro Ignácio Sítios de pesca lacustre em Rio Grande, RS, Brasil / Pedro Ignácio Schmitz. – Erechim, RS : Habilis, 2011. 280 p. ; 14 x 21 cm. - (Clássicos da Arqueologia ) ISBN 978-85-60967-40-7 1. Arqueologia 2. Pesca lacustre 3. Rio Grande do Sul – Rio Grande I. Título II. Série C.D.U.: 902.034 (816.5) Catalogação na fonte: bibliotecária Sandra Milbrath CRB 10/1278

IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL

Apresentação Quatro anos após o primeiro volume da série “Clássicos” da arqueologia brasileira, que visa publicizar trabalhos de excelência e relevância, publicados nos últimos cinquenta anos na arqueologia brasileira, vimos através de um congresso conjunto – XVI Congresso da Sociedade Brasileira de Arqueologia e XVI Congresso Mundial da UISPP – apresentar, o segundo volume da série. Ressaltamos que os critérios de seleção dos trabalhos ora apresentados, pautaram-se na excelência, inovação e persistência das obras escolhidas. Enquanto secretário geral do XVI Congresso Mundial da UISPP é uma honra apresentar os autores que abrilhantaram o segundo volume da série: Pedro Ignácio Schmitz, Tom Oliver Miller Junior e José Luiz de Morais. Arqueólogos que dedicaram suas vidas para a arqueologia, e contribuíram para delimitar e marcar os cânones da arqueologia nacional. E embora a arqueologia brasileira, hoje, passe por grandes transformações, com a inserção de métodos, teorias e novas áreas de atuação, advindas com a modernidade, quaisquer trabalho atual estará ligado à matriz arqueológica começada pelos precursores. Visando divulgar para as gerações presentes e futuras as obras: “Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil” de Pedro Ignácio Schmitz, “Duas Fases Paleoindígenas da Bacia de Rio Claro, E. S. Paulo: um Estudo em Metodologia” de Tom Oliver Miller Junior, e “Perspectivas Geoambientais da Arqueologia do Paranapanema Paulista” de José Luiz de Morais, esperamos contribuir com o fácil acesso e democratização do conhecimento, através da publicação do trabalho de pesquisadores que colaboraram para o reconhecimento da arqueologia brasileira em cenário nacional e mundial. Rossano Lopes Bastos Secretário Geral do XVI Congresso Mundial da UISPP

Prefácio A arqueologia brasileira é, cronologicamente, bastante recente se comparada a outros países latino-americanos, norte-americanos ou europeus. Podemos considerar que as pesquisas com um rigor mais científico tenham efetivamente se iniciado na segunda metade da década de 1950 ou, como muitos entendem, a partir da implementação do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA), em meados da década de 1960. Mesmo assim, são cerca de 50 anos, o que não é muito para que ocorra de forma completa a sua “perda da inocência”. No entanto, mesmo que ainda na adolescência, certamente já contamos com diferentes gerações de arqueólogos, tanto no tempo como na perspectiva das abordagens dadas às pesquisas. Podemos então, também falar hoje com mais reverência, sobre os “pioneiros” de nossa arqueologia. E pioneiro foi Pedro Ignácio Schmitz, tendo publicado seu primeiro trabalho acadêmico na área no ano de 1957 e que ainda hoje produz, de forma incessante e prolífica, peças fundamentais do conhecimento arqueológico nacional, à frente do Instituto Anchietano de Pesquisas, em São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Pioneiro também foi em sua atuação política à frente da Sociedade de Arqueologia Brasileira, sendo um de seus fundadores e primeiro presidente. Em uma coleção que pretende (re)publicar obras hoje “clássicas” da arqueologia nacional, esse autor não poderia faltar. A obra que ora chega até nós representa a síntese de pesquisas arqueológicas desenvolvidas no município gaúcho de Rio Grande, junto à outros arqueólogos também pioneiros, entre o final da década de 1960 e o início dos anos 1970 e foi defendida como requisito parcial para a obtenção de seu título de Livre Docência, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, no ano de 1976.

Nela, o autor faz um detalhado estudo dos assentamentos préhistóricos localizados na margem sudoeste da Laguna dos Patos, enfocando especialmente as estratégias de ocupação do espaço e de obtenção de recursos alimentares desenvolvidas, inicialmente, por grupos pescadores, caçadores e coletores e, posteriormente, horticultores, assentando bases mais sólidas para uma arqueologia das regiões costeiras do sul do Brasil. Se, por um lado, os enfoques teóricos, metodológicos e as técnicas de análise de vestígios arqueológicos tem mudado ao longo desses 50 anos, saber apreciar e valorizar trabalhos que buscaram, no seu devido tempo e lugar, criar uma arqueologia brasileira até então praticamente inexistente e que fundamenta o que conhecemos hoje é, certamente, não apenas desejável, mas necessário. São Leopoldo, agosto de 2011 Jairo Henrique Rogge

SUMÁRIO I - INTRODUÇÃO ................................................................

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II – AMBIENTE ................................................................... 1. Dados Gerais .............................................................. 2. Geologia e Fisiografia ................................................ 3. Ecologia .....................................................................

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III. HISTÓRIA DA PESQUISA E DA CULTURA ........... A. História de Pesquisa ..................................................

63 65

1. Pesquisas na Região do Rio Camaquã (a): ....................

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2. Pesquisas no Município de Rio Grande (b): .................

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3. Pesquisas no Município de Santa Vitória (c): ...............

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4. Pesquisas no Departamento de Treinta y Tres (d): ........

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5. Pesquisas nas Nascentes do Rio Negro (e): ..................

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6. Outras Pesquisas Realizadas na Serra do Sudeste (f): ..

71

B. As culturas e sua História .........................................

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1. A Cultura dos Aterros: ...................................................

72

2. Os Tupiguarani ..............................................................

74

3. Os sítios de Contato: .....................................................

74

4. A Colonização Portuguesa e o Contato com os Índios: .

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IV. OS SÍTIOS ESTUDADOS ............................................. A. Características dos Sítios ........................................... B. Cronologia dos Sítios ................................................. C. Descrição dos Sítios ...................................................

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V. CULTURA MATERIAL: CERÂMICA ......................... A. A Cerâmica de Tradição Vieira ................................. B. A Cerâmica de Tradição Tupiguarani ........................

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VI. CULTURA MATERIAL: LÍTICO ............................... VII. CULTURA MATERIAL: OSSOS E CONCHAS TRABALHADOS ..................

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VIII. RESTOS DE ALIMENTOS NOS SÍTIOS ...............

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IX. CARACTERIZAÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS.

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BIBLIOGRAFIA CITADA NO TEXTO ............................

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ANEXOS ...............................................................................

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I INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo caracterizar os sítios arqueológicos da margem ocidental da parte inferior da Lagoa dos Patos, na área compreendida entre as cidades de Pelotas e Rio Grande, no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. O estudo desses sítios começou na primeira aproximação à Arqueologia do Rio Grande do Sul, quando se instalou o Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas, em 1965, e vem por ele profundamente influenciado, tanto nos objetivos, como na metodologia e nas técnicas. Os objetivos eram fortemente marcados pela História, acentuando seqüências culturais, difusão de elementos, distribuição espacial, migrações, com o estabelecimento de tipos de valor históricoespacial e fases e tradições tecnológicas, mas sem descuidar os elementos de ajustamento ecológico. Em geral, o núcleo metodológico do procedimento arqueológico estava acomodado às premissas antropológicas de que a cultura ou as culturas mudam através do tempo e de que o comportamento cultural e social está de alguma forma registrado nos objetos materiais. Como arqueólogos, lidamos com esse comportamento através do suporte desses objetos, chegando a conclusões sobre o tempo, o lugar e a mudança e construindo essas conclusões com o auxílio de conceitos tais como difusão, evolução e ajustamento ecológico trazidos da Antropologia e de outras disciplinas. (Willey 1968:210). Para o estabelecimento de seqüências culturais, baseamo-nos fortemente nas técnicas desenvolvidas por Ford (1962) e Meggers e Evans (1970), buscando amostras controladas, quer através de cortes estratigráficos em níveis artificiais, quer através da coleta sistemática de superfície, de materiais que se prestassem para ordenação por semelhança de freqüências de características ou tipos. Mas, por outro lado, procuramos intensamente elementos do padrão de abastecimento, que caracterizassem o estabelecimento 11

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com relação a estação, recursos explorados, tecnologia utilizada, bem como as mudanças provocadas por evolução interna, exigência do ambiente e interferência de outros grupos. Os dados mais importantes, que buscamos, se referem aos seguintes itens: a) caracterização dos sítios: forma, tamanho, espessura dos estratos, implantação no ambiente ao tempo da ocupação, restos de alimentos, artefatos, estruturas; b) cronologia dos sítios e dos diversos estratos: posição sobre os terraços lacustres, estratigrafia, datação do carvão das fogueiras pelo processo do carbono 14, seriação da cerâmica dos cortes e das coletas de superfície, utilização de material intrusivo datado; c) padrão de abastecimento: alimentos usados, proporção entre os alimentos, mudança na alimentação durante o tempo, época do ano em que estão disponíveis, técnica usada na sua apropriação e transformação, e artefatos relacionados com apropriação e transformação, recursos complementares a serem conseguidos em outros estabelecimentos; d) identificação cultural, contatos com outros grupos culturais, modificações conseqüentes. O trabalho é basicamente descritivo, local, não tendo intenções de comparação dentro de um horizonte maior. Trata-se de uma primeira aproximação a uma região e, em parte, dos primeiros ensaios de interpretação. Há deficiências no conhecimento da região, onde numerosas expedições foram realizadas, sem que os materiais pudessem até hoje ser todos analisados. Há dificuldades de uma comparação sistemática com regiões próximas, porque muito pouca coisa está publicada. De qualquer maneira, buscamos caracterizar com suficientes pormenores os sítios da margem da Lagoa. Trata-se de uma pequena série de estabelecimentos de pesca lacustre ocupados durante períodos quentes do ano e que parecem pertencer a uma mesma tradição de caçadores. 12

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Na mesma região existem numerosos outros sítios de caçadores, em processo de estudo, cuja relação com os primeiros ainda desconhecemos e cujos dados são referidos apenas enquanto podem esclarecer problemas dos sítios de pesca. Ao lado desses estabelecimentos de caçadores, existem sítios de horticultores, que são estudados apenas na medida em que se relacionam com os caçadores e seus estabelecimentos. Para evitar mal-entendidos com relação aos termos usados, explicamos rapidamente os conceitos mais importantes. Os sítios arqueológicos, cujo estudo fazemos, são chamados pelos moradores locais, devido a sua forma, de cerritos, nome também aplicado a elevações naturais semelhantes. Sítio arqueológico é um local onde se encontram restos arqueológicos. Geralmente se supõe que o local esteja coberto de restos com certa continuidade e que os restos tenham pertencido a uma determinada forma de assentamento, que pode ser tanto um pequeno acampamento como uma grande cidade. (Willey & Phillips 1958:18). O terno assentamento ou estabelecimento é bem amplo e é usado para designar qualquer lugar ocupado por um ou mais indivíduos, por uma ou mais noites, para qualquer finalidade, que cai dentro do ciclo ordinário, esperado e previsível de atividade da sociedade em apreço. (Chang 1962:29). No trabalho falamos de estabelecimentos de pesca, entendendo por isso sítios nos quais predominam os restos provenientes da pesca (principalmente peixes e crustáceos), provavelmente de exploração estacional, embora também existam, nos mesmos, restos de caça e de colheita. Não se exclui que o mesmo grupo que pesca em determinada época do ano, tenha outras espécies de assentamento, que se caracterizam principalmente pela caça, colheita ou ritual. Aos grupos que pescam na margem da Lagoa denominamos caçadores, entendendo por esse termo grupos que sobrevivem à base da caça, da pesca e da colheita; a parcela maior da alimentação não precisa provir da caça, mas pode ser conseguida com a pesca ou a 13

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colheita de plantas nativas. (Lee & Devore 1973:4). Em oposição a caçadores, temos agricultores ou grupos ainda mais desenvolvidos. Para a consecução de amostras da cultura material e da alimentação dos grupos, realizamos cortes nos sítios. Os cortes podem ser experimentais, geralmente pequenos e rápidos, destinados a um mero reconhecimento dos estratos, da sua espessura e do substrato no qual assentam; ou estratigráficos, buscando caracterizar os estratos. Em nossos trabalhos cortamos os estratos geralmente em níveis artificialmente estabelecidos e iguais para o mesmo corte, a fim de possuirmos unidades comparáveis no estudo do material; quando se trata de estratos cerâmicos e buscamos material para seriação, cuidamos de conseguir amostras significativas com um número mínimo de unidades; da mesma forma procedemos nas coletas superficiais destinadas á seriação. Tanto na consecução das amostras, como no seu tratamento e classificação, seguimos os critérios e usamos os conceitos estabelecidos por Meggers e Evans 1970:22 ss). Na classificação, de acordo com a natureza e quantidade de material, usamos umas vezes um método analítico, destacando modos de sentido histórico-distribucional ou descritivo morfológico, outras vezes empregamos um método tipológico, destacando tipos descritivos morfológicos. “Modo é qualquer padrão, conceito ou costume que governa o comportamento dos artesãos de uma comunidade, que eles transmitem de geração em geração e podem espalhar-se de comunidade em comunidade sobre distancias consideráveis. Esses modos vão refletir-se nos artefatos como atributos, que se conformam com os padrões da comunidade, que exprimem os seus conceitos, ou que revelam as suas maneiras costumeiras de fazer ou produzir os artefatos. A classificação analítica enfoca esses atributos e através deles, tenta chegar aos padrões, conceitos e aos próprios costumes. De fato, tenta compreender tais modos nos artefatos.” (Rouse 1960:313). “O ponto importante é que o autor esteja interessado em estabelecer modos independentes e não em estudar a maneira como esses modos estão combinados nos artefatos.” (Rouse 1960:314). “Os modos podem ser de duas espécies: (1) conceitos de material, forma e decoração com os quais se conformam os artesãos, (2) 14

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procedimentos costumeiros seguidos na feitura e uso dos artefatos.” (Rouse 1960:315). No trabalho empregamos tanto a primeira como a segunda espécie de modos. Por outro lado, “um tipo pode ser definido como um complexo de modos, que é diagnóstico de uma certa classe de artefatos e que serve para diferenciar essa classe de todas as outras classes.” (Rouse 1960:315 s). “Tipos históricos são formados para estabelecer diferenças de tempo e espaço; tipos descritivos, para exprimir diferenças na natureza dos artefatos.” (Rouse 1960:318). Segundo Steward (1954:54 ss), os tipos podem ser morfológicos; históricos, funcionais ou culturais. No trabalho usamos tipos descritivos no sentido de Rouse, morfológicos no sentido de Steward. Na seriação do material arqueológico por semelhança da freqüência dos modos ou tipos, tendo em vista a datação relativa do mesmo e sua distribuição espacial, utilizamos a técnica desenvolvida por Ford (1962) e aperfeiçoada por Meggers e Evans (1970), mas para o mesmo assunto também consultamos Rowe (1961:324 ss). As datas necessárias para fixar a cronologia relativa foram feitas pelo processo do Carbono 14 no Radiation Biology Laboratory, Radiocarbon Laboratory da Smithsonian Institution, Washington, D.C., por intermediação do Dr. Clifford Evans.

Colocando os estratos no tempo, podemos distinguir um período pré-cerâmico, entendendo por isso, um período em que o grupo não usava cerâmica naqueles sítios; esse período se estende de aproximadamente 500 a.C. ao princípio de nossa era. E um período cerâmico, isto é, um em que o grupo usava cerâmica naqueles sítios; esse período se estende de aproximadamente princípios de nossa era até ao século XVIII. Tomando em consideração a tecnologia desenvolvida nos sítios, podemos dividi-los em tradições e fases arqueológicas. 15

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Por tecnologia entendemos “a soma total das técnicas possuídas pelos membros de uma sociedade, isto é, a totalidade de seus modos de comportar-se com respeito à obtenção de matériasprimas do meio-ambiente e ao tratamento destes para fabricação de instrumentos, recipientes, alimentos, vestidos, albergues, meios de transporte e muitas outras exigências materiais.” (Beals & Hoijer 1968:293). Tradição arqueológica “é uma continuidade (primeiramente) temporal, representada por configurações continuadas de tecnologias individuais ou outros sistemas de formas relacionadas.” (willey & Pillips 1958:37) Fase “é uma unidade arqueológica, que possui traços suficientemente característicos para distingui-la de todas as outras unidades concebidas do mesmo modo, quer da mesma, quer de outras culturas ou civilizações (ou tradições), limitada especialmente à ordem de grandeza de uma localidade ou região e cronologicamente limitada a um espaço de tempo relativamente breve.” (Willey & Phillips 1958:22) Se agora aplicarmos esses conceitos aos sítios em estudo, a parte pré-cerâmica pertence à tradição Itaipu. A tradição foi estabelecida em reunião do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas, em Washington, para reunir fases pré-cerâmicas de grupos caçadores, com as seguintes características gerais: aterros ou sítios sobre dunas, na proximidade de praias ou mangues, rios, banhados, geralmente ao nível da água, excepcionalmente sobre colinas; com forma circular, oval ou elíptica; com tamanhos que variam de 3 x 3 a 50 x 200 m, espessura dos estratos entre 0,30 e 1,20 m; contendo restos de alimentos compostos de peixes, crustáceos, moluscos, aves, mamíferos, frutas; instrumentos líticos sob a forma de lâminas de machados polidas, picoteadas ou lascadas, almofarizes, moedores, pedras-com-covinhas picoteadas ou polidas, batedores de seixo, talhadores, pesos de rede, pontas, pontas de flecha, raspadores, lascas, pedras de funda; material de osso sob a forma de pontas, agulhas, contas, pendentes; material feito de conchas. - As fases incluídas na tradição 16

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estendem-se desde o Espírito Santo até o Uruguai, abrangendo principalmente sítios litorâneos, mas também outros mais para o interior, que apresentam as mesmas características fundamentais. Não se devem confundir com sambaquis, nos quais predominam as conchas como restos de alimentos. - A tradição foi subdividida em três subtradições, sendo uma no centro do Brasil, denominada Apicum, e duas no sul do Brasil, denominadas Lagoa e Piraçã; provavelmente há outras fases que, com o tempo, deverão ser incluídas. A subtradição Lagoa compreende as fases pré-cerâmicas ao longo das grandes lagoas do Rio Grande do Sul; a subtradição Piraçã sítios de aterros no centro do Rio Grande do Sul. - O précerâmico dos sítios estudados por nos, pertencente à subtradição Lagoa, denomina-se fase Lagoa. Os estratos com cerâmica típica dos caçadores Iocais pertencem à tradição Vieira. A tradição foi estabelecida por Brochado et al. (1969:12), para reunir fases cerâmicas de grupos caçadores, encontradas no Sul do Rio Grande do Sul e Norte do Uruguai, com as seguintes características gerais: aterros ou sítios sobre dunas ou barrancas perto de corpos de água (lagoas, rios, arroios), geralmente ao nível da água, excepcionalmente sobre colinas; com forma circular ou alongada; com tamanhos que variam de 10 a 80 m de diâmetro, espessura dos estratos entre 0,30 e 3,00 m; contendo restos de alimentos compostos de peixes, crustáceos, moluscos, aves, mamíferos, frutas; artefatos líticos sob a forma de pedras-com-covinhas polidas, polidores com depressões alongadas ou circulares, pedras com faces polidas, lascas retocadas ou não, pontas-de-flecha, batedores; artefatos de asso sob a forma de pontas, pendentes; material feito de conchas; a cerâmica com antiplástico mineral, com vasilhames simples, rasos, pequenos, geralmente sem decoração, às vezes com a superfície externa coberta por suaves impressões da polpa do dedo, roletada, com impressão de cestaria, ou com engobo branco na base. A tradição Vieira ocupa uma área que abrange o Sul do Rio Grande do Sul e Norte do Uruguai. - Foi subdividida em subtradição Vieira, que fica mais para o Este, e subtradição Ibirapuitã, para o Oeste. - As datas mais antigas estão no Este. Ela parece sobrepor-se imedia17

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tamente à tradição Itaipu. - A subtradição Vieira esta representada nos sítios por duas fases cerâmicas, a mais antiga com cerâmica incipiente, denominada Torotama (desde o começo de nossa era até aproximadamente século III), a mais nova, com cerâmica já estabelecida, denominada fase Vieira (de aproximadamente século III ao século XVIII). Para subtradição Vieira, ver Schmitz e Basile Becker (1970) e Schmitz e Brochado (1972:4 ss); para a fase Ibirapuitã, ver Miller (1969:16 s). Em alguns sítios existem estratos com restos característicos da tradição Tupiguarani. A tradição foi estabelecida por Brochado et al. (1969:18 ss) para reunir fases cerâmicas de grupos horticultores, com as seguintes características gerais: sítios superficiais resultantes de aldeias com certa permanência, ocupando elevações de pouca altura, em áreas de vegetação florestal. Apesar de as fases componentes da tradição divergirem na presença, freqüência relativa e combinação de traços, todas mostram a mesma cultura geral. Sepultamentos secundários em urnas foram praticados no próprio sítio-habitação ou em sua proximidade. Artefatos líticos, de ocorrência quase universal, compreendem lascas, talhadores, abrasadores e grandes bifaces polidos. O tembetá é o ornamento característico e são comuns os cachimbos. As técnicas diagnósticas de decoração cerâmica compreendem a pintura sobre engobo branco, o corrugado, o escovado, e o ungulado. Engobo vermelho, acanalado, borda entalhada, incisão, ponteado e serrungulado são também outras técnicas de ampla dispersão. Há grande variedade de formas de vasilhames, comportando desde tigelas arredondadas ate grandes urnas funerárias de ombros angulares. As tigelas são por vezes quadradas ou elípticas, outras vezes circulares. - Apesar de este complexo cultural básico ser compartilhado por todos os membros da tradição Tupiguarani, varia notadamente a popularidade absoluta e relativa das varias técnicas de decoração de cerâmica. Tais subtradições resultaram caracterizadas, respectivamente, pela dominância das técnicas pintada, corrugada e escovada. - A subtradição Pintada tem suas datas mais antigas entre Paraná e São Paulo, pelo século V d. C., e sua dispersão mais importante 18

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

em direção ao norte do Brasil. A subtradição Corrugada tem suas datas mais antigas no Alto Jacuí, Rio Grande do Sul, no século V d.C., e sua dispersão para o norte até São Paulo e para o sul até Buenos Aires. A subtradição Escovada é posterior à Conquista, está mal definida e encontra-se em pontos dispersos. Nos sítios por nós estudados está representada a subtradição Corrugada com a fase Camaquã, que deve ter chegado à área ao redor do século XI d.C. Para a caracterização da tradição Tupiguarani, suas subtradições, migrações e ecologia, veja-se Brochado (1973 a, 1973 b). Além desta introdução, o trabalho apresenta os seguintes capítulos: primeiro, uma visão do ambiente no qual estão implantados os sítios; um histórico da pesquisa na região e das culturas que nela foi possível definir; uma caracterização pormenorizada dos sítios que formam o núcleo desta dissertação; depois, o estudo da cultura material (cerâmica, lítico, ossos e conchas trabalhados) e dos restos de alimentos; por fim, uma caracterização dos estabelecimentos.

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II AMBIENTE

O local de nossas pesquisas situa-se na Planície Costeira do Rio Grande do Sul. Para a sua compreensão, há necessidade de que nos detenhamos um pouco na descrição da área, na qual os sítios estão implantados, na sua posição geográfica, formação geológica e ecologia. A descrição mais extensa e abrangente se destina a fornecer um panorama, no qual se possa compreender a ocupação do homem pré-histórico.

1 Dados Gerais A área de nossas pesquisas situa-se na margem ocidental da Lagoa dos Patos, em terrenos baixos entre as cidades de Pelotas e Rio Grande, abrangendo as seguintes localidades: Capão Seco, Barra Falsa, Povo Novo, Arraial e Quitéria. Está dentro do Município de Rio Grande. Latitude aproximada: entre 31o 30’ e 32o 15’ sul. Longitude aproximada: entre 52o e 52o 40’ oeste de Greenwich. Os terrenos são formados por sedimentos pleistocênicos e holocênicos. A paisagem apresenta grande uniformidade e as altitudes não ultrapassam os 15 metros, que correspondem a ondulações constituídas de dunas fixadas. No oeste se vê claramente a Serra do Sudeste, que dista apenas algumas dezenas de km. A localidade é formada de uma “ilha” de terreno mais elevado, com menos de 10m de altitude média, cercada por terrenos baixos descobertos com a retirada da antiga lagoa; hoje a leste se encontra a Lagoa dos Patos, a oeste e norte o Canal de São Gonçalo, desaguadouro da Lagoa Mirim, que é ladeado por extensos terrenos baixos, pantanosos; para o sul grandes extensões de areia com lagoas paralelas ao Oceano. Em outros tempos a “ilha” estava cercada de 23

Pedro Ignácio Schmitz

água, que lentamente se foi retirando, deixando o canal, as lagoas (dentro da área está a do Peixe), e extensos banhados. Os terrenos baixos estão sujeitos a prolongadas alagações durante o inverno, quando a Lagoa dos Patos sobe com a descarga dos rios do Planalto Rio-Grandense e o Canal de São Gonçalo se espraia com a carga da Lagoa Mirim e de seus próprios tributários.

Figura 1 - Gráfico do clima, estação de Santa Maria.

A precipitação anual é ao redor de 1.250 mm, distribuída principalmente pelo outono e inverno. O clima, na classificação de Gaussen, é 7a: Mesaxérico (temperado) - eumesaxérico (temperado quente) - com a temperatura 24

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

do mês mais frio entre 10 e 15°C. A denominação no Brasil é subtropical - O valor do índice xerotérmico é igual a zero - o número de meses secos é igual a zero. O gráfico (Fig.1) correspondente a Santa Maria, RS, é característico para a região. (Galvão 1966:II-9). “O clima 7a aparece na Campanha Gaucha”, sob a forma de clima oceânico temperado quente, cuja origem esta ligada à existência de um relevo arrasado que não oferece obstáculos às constantes e freqüentes penetrações dos ventos úmidos do litoral, que invadem toda a campanha, sendo responsáveis pelo regime de chuvas bem distribuídas. “A influência da continentalidade nesta região é praticamente nula, como indica a aproximação dos índices do continentalidade calculados segundo Gorzynski, para as estações de Uruguaiana (31) no extremo oeste, e Porto Alegre (29) no litoral. “A existência da vegetação campestre na Campanha, invulgar dentro do clima 7a, que é típico de florestas, parece estar ligada ao fator solo. Alguns autores consideram esta vegetação como prolongamento dos pampas argentinos e em desacordo com as condições mesológicas atuais; sua origem estaria ligada à existência de um clima mais seco no passado e sua permanência seria função dos solos mais lixiviados e impróprios ao desenvolvimento de uma vegetação mais exuberante.” (Galvão 1966:II-9). Com relação aos ventos, observa-se que: “1) durante todas as estações do ano o vento predominantemente foi o Nordeste; 2) durante o outono e o inverno o Minuano é mais importante que durante a primavera e o verão; 3) durante o inverno o Carpinteiro da Costa é mais importante; 4) durante todas as estações do ano as direções predominantes dos ventos são nordeste, leste, sul e oeste.” (Delaney 1965:64).

2 Geologia e Fisiografia Para o estudo da Geologia, valemo-nos principalmente de Delaney (1965) e de Carraro et al. (1974). 25

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“As feições geológicas da Planície Costeira são: (1) rochas antigas; (2) Pleistoceno; e (3) Holoceno. (...) O contato superficial entre as rochas pré-quaternárias e os sedimentos mais jovens (Quaternário) forma o limite interno da Planície Costeira. Um conhecimento destas rochas mais antigas é essencial para a compreensão do conjunto geológico, uma vez que tiveram papel importante no fornecimento do material detrítico incorporado aos sedimentos do Quaternário. As rochas mais antigas são as cristalinas do PréCambriano, fazendo parte do escudo rio-grandense. São granitos, sedimentos granitizados, xisto e gnaisses, aflorando num cinto arqueado de Pelotas a Itapoã. Mais ao norte estão falhadas ao longo da margem leste da Coxilha das Lombas, onde são encontrados raros afloramentos.” (Delaney 1965:72). “Examinando o mapa geológico, vê-se que o limite interno da Planície Costeira é formado sempre por rochas distribuídas do Pré-Cambriano ao Jurássico, enquanto os sedimentos aflorantes são de idade pleistocênica a holocênica. As rochas cristalinas da área costumam ser colocadas no Pré-Cambriano (...). A maior parte destas rochas tem sido falhadas e dobradas desde sua formação pertencendo, estruturalmente, ao extremo sul do escudo brasileiro, o qual ocupa grande porção do leste da América do Sul, estendendose da Bacia Amazônica ao Rio do Prata. “No Rio Grande do Sul, um longo período de tempo separou as rochas pré-cambrianas da primeira deposição de sedimentos gondwânicos (...). Os sedimentos gondwânicos foram depositados, discordantemente, sobre as antigas rochas cristalinas, em ambientes tão variados como glacial, de planície de maré, pantanoso, de lagos continentais e desérticos. “Os sedimentos gondwânicos estão capeados por espessos derrames basálticos tidos como os mais extensos do mundo (...), compreendendo no mínimo 13 e alcançando espessura máxima de 1 km. (...) A idade dos derrames de lava está compreendida entre o Jurássico e Cretáceo. Após o resfriamento das lavas, seguiu-se um período de intensa erosão e movimentos estruturais. (...) Durante o intervalo de tempo que separou o Triássico Superior do Cretáceo Médio, devem ter ocorrido falhamentos em grande escala, pois neste 26

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tempo definitivamente foram separados o Gondwana da América do Sul e da África do Sul. “Depois deste período de intensa atividade estrutural ocorreu um, relativamente longo, de erosão ou não deposição que se estendeu do Cretáceo Superior ao Terciário Médio. Durante o Terciário o oceano transgrediu a área a oeste da atual Lagoa dos Patos, indo de Tapes pelo menos até a Lagoa Mirim. (...) As rochas depositadas eram areias contendo uma micro e macrofauna de invertebrados, indicando ambiente de águas rasas e quentes. A idade destas provavelmente é Oligoceno Superior ou Mioceno Inferior. Após a deposição do Terciário Médio, seguiram-se processos erosivos cuja exata duração é desconhecida; contudo, parece ter abrangido todo o Terciário Superior. “A Historia do Pleistoceno da Planície Costeira é bastante complexa, pois contém três formações geológicas, dois paleoclimas, falhamentos e envolve diversos níveis do mar (...). A mais antiga unidade de rocha do grupo Patos acredita-se ter sido depositada pelo Atlântico Sul, quando o mesmo possuía um nível mais elevado. Esta formação denomina-se Itapoã (...). “Apos a deposição desta unidade, ocorreu o sistema de falhamento Coxilha das Lombas, elevando-se o bloco oeste e abatendo a porção leste da Planície Costeira. (...) “Durante este tempo o nível do mar era mais alto que o atual; no entanto é difícil estimar-se quanto, uma vez que as evidências geológicas e fisiográficas são muito raras. “Durante a formação da laterita Serra de Tapes prevaleceu um clima quente, úmido, com períodos úmidos e secos, acreditando-se que o mesmo corresponda a uma porção de uma idade interglacial pleistocênica; no entanto, não é sabido qual. “A Formação seguinte é denominada Graxaim, composta principalmente por litologias arcósicas. Os fósseis mais importantes são mamíferos dos gêneros Toxodon, Haplomastodon, Macraucheria, Equus, Odocoilerini, Paleolama e Glyptodon, sendo todos do Pleistoceno (...) e de grande semelhança com a fauna pampeana. A presença destes animais sugere um ambiente de estepe frio, inter27

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pretação que conduz ao seguinte panorama durante o Pleistoceno glacial na América do Sul: (1) a glaciação continental ficou restrita ao Sul, e, provavelmente, não se estendeu mais para o norte que o Rio Gallegos, Argentina; (2) a glaciação montanhosa ficou restrita aos Andes e, provavelmente, estendeu-se para o norte ate a Colômbia; (3) na borda das geleiras continentais da província de Buenos Aires, Argentina e, através do Uruguai, até o sul do Estado do Rio Grande do Sul, existiram pampas de loess; (4) ao norte dos pampas de loess e ao sul do escarpamento da Formação Serra Geral, existiu, provavelmente, uma estepe fria abaixo do atual nível do mar. “Antes do fim do Pleistoceno variações eustáticas causaram um maior abaixamento do nível dos oceanos, pois, em várias partes do mundo, são conhecidos quatro ou cinco deles com conseqüentes variações no nível base dos rios. No Rio Grande do Sul é desconhecido quantas mudanças eustáticas ocorreram, porque atividades estruturais modificaram a posição topográfica de formações mais antigas. (...) “Após o nível do mar ter alcançado seu ponto mais baixo, começou gradualmente a subir à medida que as geleiras eram fundidas, iniciando então os rios aluviar e preencher lentamente seus vales. A linha de praia, na porção central da Planície Costeira, era provavelmente uma costa de tipo “ria”. Os longos espigões provavelmente eram paredes de vales orientados em direção sudeste, permitindo a deposição de 100 m de sedimentos em algumas porções destes (Graxaim). “A medida que se elevava o nível do mar, todos os cursos de água menores eram afogados no seu próprio aluvião. Esta elevação deve ter sido de 6-7 m acima do atual (...). “No tempo em que o nível do mar estava aproximadamente entre 6 e 7 m. mais alto, ocorreu a erosão no que presentemente é o banco oeste da Lagoa dos Patos, formando escarpas na Graxaim, evidenciadas nos dias atuais. “Durante este tempo os rios tinham somente pequena capacidade de transporte, sendo suas cargas constituídas principalmente por areia de granulação fina e silte. Assim, a Formação Chuí foi 28

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depositada no sentido do mergulho e em sua posição regressiva em relação à Formação Graxaim. “Assim a formação Chuí foi depositada como um “long shore bar” e a água ficou retida entre esta barreira e a escarpa de Graxaim formando, mais tarde, as grandes lagunas dos Patos e Mirim.

Figura 2 – Mapa com localização dos sítios arqueológicos.

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Figura 3 – Posição dos sítios em relação aos terraços.

“Gradualmente o nível do mar baixou, durante o último tempo glacial. Nesta ocasião, uma grande parte da Planície Costeira era exposta e muitos animais, do tipo pampeano, habitavam esta área. Provavelmente o clima era bem mais seco e mais frio, porque naquele tempo a Formação Chuí foi calichificada. “Mais tarde, o nível do mar subiu até alcançar a condição atual, possibilitando o aumento da costa até a presente feição. No caso do Recente, este acréscimo de costa e a abundância de areia foram consideráveis, fazendo com que fosse transportada pelo vento, formando grandes campos de dunas, línguas e dunas isoladas. A flutuação do nível do mar teve um efeito profundo sobre os cursos de água da Planície Costeira. Assim, durante os estágios mais elevados 30

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os rios aluviaram e formavam terraços e nos mais baixos erodiam e escavavam seus vales, fazendo com que, na atualidade, todos os cursos de água tenham dois terraços.” (Delaney 1965:92-98). Os solos respondem em grandes linhas a essas formações: “No geral existem três grandes grupos de solos na Planície Costeira: planossolo, podsol húmico-férrico e aluviões. Freqüentemente os planossolos estão desenvolvidos em antigas formações pleistocênicas (Itapoã e Graxaim); podsol húmicoférrico no Pleistoceno mais jovem (Chuí) e aluviões no Recente,” (Delaney 1965:65). No anexo mapa dos terraços, organizado pela Profª Moanilda Godolphim, sobre fotografia aérea tirada de satélite, localizamos, com a exatidão possível, os sítios de nosso trabalho. (Fig. 2). Dentro de nossa área de estudo, entre o Canal de São Gonçalo e a cidade de Rio Grande, medimos a altura de diversas formações e as bordas dos terraços. (Fig. 3). Constatamos uma “ilha” de terreno mais elevado entre o Canal de São Gonçalo e a Lagoa dos Patos. Os terrenos dessa formação são chamados por Delaney (1965: Mapa Geológico da Área de Rio Grande) Formação Chuí; por Carraro et al. (1974: Mapa Geológico do Estado do Rio Grande do Sul) Formação Itapoã. Nós denominamos a barranca deste terreno alto de barranco do Pleistoceno, a não ser que expressamente digamos outra coisa. Entre a ilha de terreno alto e o Canal de São Gonçalo existe um terreno mais baixo, denominado por Delaney de Recente. Para Carraro et al. é Formação Chuí. Nós o denominamos Holoceno. Os terrenos baixos entre a “ilha” de terra alta e a Lagoa dos Patos são incluídos por Delaney no Recente. Para Carraro et al. são aluviões. Nós os denominamos Holoceno. O alto do barranco do Pleistoceno, medido nos fundos do RSRG-21, apresenta 7,80 m sobre o nível do terreno circundante. No fundo dos sítios RS-RG-08 e 14 está 7,78 m sobre o nível da Lagoa; junto ao sítio RS-RG-04 mede 5,77m sobre o nível da Lagoa. Em todos os três casos o terreno no alto do barranco é aproximadamente plano. Junto aos sítios RS-RG-03 e 50 existe um alto cordão de 31

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dunas, substituindo o barranco. Junto ao primeiro desses sítios a altura sobre o nível da Lagoa chega a 14 m. Na região abrangida entre a ilha Torotama e a ilha Leonídio existe junto ao barranco do Pleistoceno um escalão mais baixo, medindo aproximadamente 150 cm sobre o nível da Lagoa. Aparece junto aos sítios RS-RG-08, RS-RG-14, RS-RG-28 e RS-RG-10. Nos terrenos baixos que dão para o Canal de São Gonçalo, denominados por Carraro et al. de Formação Chuí, conseguimos identificar dois terraços, que denominamos A e B. Nos terrenos baixos entre a ilha Torotama e a ilha do Leonídio os mesmos terraços não são tão claros, talvez porque nunca o tenham sido, ou porque o cultivo intenso de chácaras, com profunda movimentação das terras os tenha destruído. O terraço A por nós medido está entre 40 e 60 cm sobre o nível da água da Lagoa no verão (medição entre 25 e 31 de janeiro de 1976); o terraço B está a uns 90 cm sobre o mesmo nível da água. Numa tentativa de datar a formação da borda dos terraços, usamos as datas de C14 conseguidas para os sítios estabelecidos sobre os respectivos terraços. Aceitando o pressuposto, que pelas nossas análises parece válido, de que os acampamentos de pesca de que resultaram os sítios arqueológicos estudados, foram feitos no verão, sobre a borda da Lagoa, o início do sítio marcaria o nível da Lagoa. Tomando um índice de crescimento médio dos estratos arqueológicos, de 75 anos para 10 cm, podemos estabelecer o início aproximado daqueles que foram datados em qualquer uma das suas camadas. O índice é meramente aproximativo e foi calculado sobre a média das datas e a evolução dos aterros.

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Figura 4 – Nível do mar, seg. Fairbridge e comparação dos terraços.

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Observando, então, as datas (Fig. 4), constatamos o seguinte: O sítio RS-RG-01 (cerrito 5), de G. Naue, cuja datação me foi feita pela Smithsonian Institution, deve ter começado ao redor de A. D. 1600. Os estratos arqueológicos estão exatamente sobre a borda do terraço A. A borda do terraço já existia, ou estava em formação, quando o sítio aí foi estabelecido. O sítio RS-RG-01 (cerrito 1), de G. Naue, deve ter começado em A.D. 800. O sítio RS-RG-48 deve ter começado ao redor de A.D. 600. Ambos estão sobre a borda do terraço B. A borda desse terraço deve ter existido, ou estava em formação, quando o sítio foi aí estabelecido. O sítio RS-RG-01 (cerrito 4), de G. Neue, deve ter começado antes de 200 a.C. O sítio RS-RG-49 e o RS-RG-21, ambos devem ter começado antes de 500 a.C. Estão sobre o terraço B, mas afastados da borda, indicando que nessa época ainda não deve ter existido e que os sítios foram estabelecidos sobre a planície de inundação da Lagoa, em outras palavras, sobre o terraço ainda não recortado. Do mesmo modo, os sítios RS-RG-14, 08, 10, 03 (1), que pela combinação das datações e da seriação da cerâmica são posteriores a A.D. 600, parecem colocados sobre o que seria o terraço A. Como tentativa, embora sem esperar resultados seguros, justapusemos as curvas de oscilação do mar, seg. Fairbridge, com os terraços por nós encontrados e a estimativa de datação dos sítios sobre os mesmos (Fig. 4). Observamos o seguinte: A borda do terraço A parece ocupada desde A.D. 1.600; a do B desde A.D. 600. Os sítios sobre os terraços têm idades correspondentemente mais antigas. Inicialmente pensamos que as bordas poderiam ter surgido nas datas da ocupação. Porém, comparando as alturas das bordas com as das transgressões marinhas propostas, notamos que as datas da ocupação respondem a períodos de nível médio do mar, que são precedidos por períodos de transgressões com a altura aproximada dos terraços. Dessa maneira a borda de 40-60 cm poderia ter surgido ao redor de A.D. 1.200 e ser ocupada ao redor de A.D. 1.600; a de 90 cm poderia ter surgido entre 500 a.C. e A.D. e sido ocupada a partir de A.D. 600. (A diferença está indicada na figura pela linha 34

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diagonal). As ocupações registradas sobre as bordas responderiam então às normalizações após regressões? As ocupações sobre os terraços responderiam à época das transgressões? Os sítios formados na época das regressões teriam sido demolidos ou enterrados pela nova ascensão? Existe alguma lógica nisso. As perguntas ficam para serem respondidas em campo. Com relação à posição e paisagem dos sítios no momento da sua ocupação, essas considerações são importantes, principalmente para os que dão para o Canal de São Gonçalo: o mesmo canal era na época um largo braço da Lagoa e os sítios estavam diretamente sobre a sua borda, quando hoje estão muito afastados e separados da mesma por extensos banhados. Os sítios que dão para o Saco do Silveira e o Saco do Arraial teriam então uma paisagem semelhante à que têm agora.

3 Ecologia a) A Lagoa dos Patos, sua ecologia, seus recursos: A Lagoa dos Patos surgiu, porque a Formação Chuí se depositou como um “long shore bar”, retendo a água entre sua barreira e a escarpa da Formação Graxaim (Delaney 1965:98). Como ela não recebe apenas a água doce dos rios da vertente oriental, mas deixa penetrar, em certas épocas, devido ao seu baixo nível, as águas salgadas do Oceano, oferece um ambiente variado para a vida aquática, o que leva grupos humanos a se fixarem na sua margem, nos setores mais favoráveis. Uma visão da Lagoa e das suas partes nos auxilia a compreender a razão dessas opções. “A Lagoa dos Patos é a maior das massas d’água represadas na planície costeira do Rio Grande do Sul e de toda a costa brasileira. Situa-se numa faixa alongada entre as ladeiras orientais do Escudo sul-rio-grandense e a grande restinga que se estende ao longo da costa atual. Possui área aproximada de 11.000 km2, estendendo-se por 250 km de NNE para SSE, com um máximo de largura de 60 km, na altura de São Lourenço, bordo norte, a aproximadamente 30° 30’ S e limite sul a 32° S. Área central da Lagoa a 51° 30’ w. 35

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“Apesar de sua extensão, não mostra profundidades muito grandes, em sua maioria variando entre seis e oito metros, excetuados os canais artificialmente abertos, para facilitar a navegação, em torno de 10 metros. Ao que se sabe, a topografia do fundo é muito constante, com pequenas inclinações. “Do ponto de vista geográfico-ecológico, podem-se diferenciar duas zonas distintas na Lagoa dos Patos: a primeira, situada ao sul e compreendendo o trecho entre os Molhes (Canal de Acesso) e o Farol da Porteira no estreitamento da Ilha da Feitoria. Esta zona é bastante menor que a segunda, sendo as profundidades relativamente pequenas e cujo açoriamento por sedimentos trazidos pelos arroios, bem como dos resultantes da floculação de argilas nas “zonas de conflito”, é contínuo. Nesta zona encontra-mos, ainda, os baixios denominados localmente de “sacos”. São na realidade, enseadas rasas do litoral lagunar, circunscritos ao setor interior de esporões recurvados (recurved spit), cuja colmatagem por sedimentos, constituídos primordialmente de argilas e areia fina, é rápida e progressiva, sendo conhecidas modificações apreciáveis em período histórico, como, por exemplo, a ligação da Ilha da Torotama com a margem. A profundidade nos sacos é pequena, variando entre 0,5 e 3 m, podendo as zonas das bordas permanecer esporadicamente exondadas, formando zonas de um marsh límnico (freshwater marsh). Ainda nesta zona encontramos uma série de ilhas, destacando-se, pelo tamanho, as seguintes: Marinheiros, Pólvora, Cavalos, Leonídio, Torotama, Ovos e Feitoria. “A segunda zona corresponde à Lagoa propriamente dita, situada entre o Farol da Porteira e o Guaíba. Nesta zona, as larguras tornam-se muito maiores, os sacos têm maior amplitude, mostrando esporões assimétricos e arqueados de espaço a espaço; do lado ocidental são muito comuns planícies aluviais de nível de base, sobretudo correlacionadas com os depósitos do Baixo Camaquã. “Ecologicamente, ambas as zonas também se diferenciam fundamentalmente em relação às condições físico-químicas das águas e da fauna, principalmente desta última. (...) “As condições físico-químicas, no limite entre as duas zonas, são um tanto flutuantes, devido a fatores estacionais. Não são 36

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observadas variações apreciáveis no nível d’água. A maré praticamente não tem influência, havendo um equilíbrio entre a descarga d’água pelo canal e o afluxo dos rios, mesmo durante o inverno. O fator vento, importante para a entrada d’água salgada na Lagoa, é o responsável pelas constantes variações de salinidade na zona Sul.” (Closs 1962:15-17). A área de nosso estudo localiza-se na primeira destas zonas, na margem ocidental, em frente aos “sacos” rasos e às grandes ilhas. “O fator salinidade permite (...) separar inicialmente a Lagoa dos Patos em duas grandes zonas: A Lagoa propriamente dita, onde a salinidade se situa em torno de 0% ou apresenta salinidade de baixo valor, na zona entre os faróis da Porteira e do Bojuru (1-3%); A zona sul da Lagoa, na qual a salinidade varia tanto na superfície como no fundo entre extremos muito grandes (0-29%). “A primeira corresponderia às zonas oligohalina e límnica (doce) da classificação de Redeke. Na segunda zona, os limites extremos são muito grandes, mas as médias de salinidade das águas de fundo, (...) apresentam limites que se deixam enquadrar dentro da classificação das águas mixohalinas. O canal de acesso, desde os molhes até a altura de São José do Norte, mostra salinidade em média entre 30 e 15%, correspondendo à zona polihalina. O resto da zona sul da Lagoa, entre São José do Norte e o Farol da Porteira, tem valores médios de salinidade menores que os da zona anterior, entre 8 e 13%, ao sul da ilha dos Marinheiros, e entre 3 e 11%, nos sacos mais ao norte, valores correspondentes à zona mesohalina de Redeke.” (Closs 1962:70). Closs (1962:81) subdivide a Lagoa em seis zonas ecológicas, que nos interessam extraordinariamente: “1. zona pré-marinha Canal de acesso desde o início dos Molhes até a 4ª Secção Nova. 2. zona submarinha Canal de acesso desde a 4ª Secção Nova até a altura de São José do Norte; Porto Novo; Saco da Mangueira. 37

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3. zona pré-mixohalina Porto Velho Sul da Ilha dos Marinheiros até a Ilha do Leonídio. 4. zona mixohalina propriamente dita Sacos do Mendanha, Laranjal, Ambu, Rincão, Arraial, etc. Norte da Ilha dos Marinheiros até o Farol da Porteira. 5. zona pré-límnica Desde o Farol da Porteira até a altura do Farol de Bojuru e São Lourenço. 6. zona límnica (doce) Do limite anterior até o Guaíba.”

Merece destaque especial a zona mixohalina propriamente dita (4.) e a especificação de suas características, porque nessa estão os sítios estudados. “Salinidade: valores de salinidade decrescem em direção ao Farol da Porteira. Até a altura do Farol do Diamante, a salinidade equivale à do Porto Velho. Entre o São Gonçalo e o Farol da Porteira valores correspondentes à metade dos de Rio Grande. Diferenças entre a salinidade da superfície e de fundo relativamente pequenas nos baixios. Maiores valores correspondem à zona dos canais, sendo baixa a salinidade na maioria das amostras tomadas nos baixios. Salinidades correspondem à zona mesohalina de Redeke. Em nossas amostras, obtivemos para os Sacos valores entre 3 e 9% enquanto que, para os canais, entre 8 e 28%. “Temperatura da água: entre 14 e 28°. “Profundidade: predominam nesta zona os baixios, com 0,5 a 2 metros, e somente nos canais artificialmente abertos encontramos profundidades entre 10 e 6 metros, esta última a mais comum. “Alimento: nos extensos baixios, as diatomáceas constituem, mais uma vez, boa parte de alimento. Matéria orgânica em putrefação em apreciável quantidade. “Sedimento: predominam areia fina e muito fina, seguindose areia média, silte e argila em pequenas porcentagens.” (Closs 1962:86-87). 38

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Nas águas oligohalinas numerosas espécies de animais e plantas de água doce se desenvolvem em grande número, muitas vezes com maior riqueza que na própria água doce. As águas mesohalinas são consideradas como águas mixohalinas s. str., sendo sua principal característica a presença de espécies, que faltam totalmente nos dois outros ambientes (oligohalinas e polihalinas) ou se desenvolvem somente nos termos de valores de Salinidade. As águas polihalinas são as que mais se aproximam do ambiente marinho, encontrando-se nelas, portanto, elevado número de espécies marinhas adaptadas. (Closs 1962:75). O meio mixohalino representa, em todo o mundo, um dos melhores pontos para a pesca, confluindo para aí os peixes em sucessivas migrações tróficas ou reprodutivas, reunindo grandes massas de animais da mesma espécie, mas de um número restrito de espécies, o que permite um estudo taxonômico rápido (Closs 1962:74), e um conhecimento prático dos seus hábitos, facilitando a captura de animais da mesma espécie, com o que se pode satisfazer a necessidade cotidiana e a previsão do futuro. Parece haver, portanto, uma razão bem forte de que é neste ponto que se concentram os sítios de pesca do homem pré-histórico entre os quais selecionamos os sítios para o nosso estudo. O pouco desnível existente na planície de inundação da Lagoa, bem como nos terraços A e B, parece indicar que a margem da Lagoa era em outros tempos tão rasa como hoje, oferecendo um ambiente semelhante ao que conhecemos agora. A Lagoa funciona realmente como um reduto, que recebe anualmente, nas diferentes estações do ano, migrações de peixes e crustáceos marinhos, que vêm para se alimentar e crescer (migração trófica) ou para se reproduzir (migração reprodutiva), transformando a cidade de Rio Grande, que está perto do desaguadouro da Lagoa, num dos maiores centros de pesca marinha e lacustre do Brasil. Os Recursos da Água

Para termos uma idéia do peixe que existe hoje na Lagoa, frente aos sítios estudados, fizemos um levantamento em sete famílias de 39

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proprietários de campos ou chacareiros, duas das quais de pescadores profissionais, procurando saber que peixes pescam ou conhecem e que crustáceos recolhem. Os moradores deram nomes populares; os nomes científicos que os acompanham foram tirados da lista organizada por Barcellos (1962), mas, como os nomes populares variam de um lugar para outro não nos podemos responsabilizar pela sua correspondência completa. Peixes do Mar:

Bagre - palavra genérica para designar os peixes marinhos da família Siluridae. Burriquete - miragaia nova. Scianidae: Pogonias chromis L. Corvina - Scianidae: Micropogon opercularis. Enchova - Pomatomidae: Chelodipterus saltator L. Linguado - Pleuronectidae: Paralichtys orbignyana (Velenciene), Paralichtys patagoniensis (Jourdan e Gross). Miragaia - ou Burriquete Papa-terra Scianidae: Menticirrhus martinicensis (Cuvier) Peixe-rei - Atherinidae: Odonthestes ihering (Ribeiro). Tainha - Mugilidae: Mugil brasiliensis (Agassis). Viola - Rbinobatidae Rhinobatus horkelli (Müller e Henke) Dos peixes marinhos mais estudados, fornecemos adiante algumas informações complementares. Peixes de Água Doce:

Jundiá - Rhamdia sp. Enguia - Synbranchus marmoratus Lambari - Astyanax spp. Pampa (ou cará) 40

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Pintado Traíra - Hoplias malabaricus Tainha-de-água-doce. Crustáceos:

Siri-azul - Calinectes sapidus Siri-deareia - Occipoda arenaria Camarão - Penaeus paulensis Craca - Balanus. Do siri-azul e do camarão fornecemos adiante mais alguns dados. Mariscos de Água Doce:

Bivalvos. Bagre:

Há três espécies de bagres mais encontradiços pelos pescadores, Tachysurus barbus, Tachysurus agassisi e Tachysurus genidens, mas o mais comum é o que antigamente denominavam Bagre-ariaçu nas colônias de pescadores gaúchos. Seu nome científico é “Tachysurus barbus”. O Ariaçu é o maior de todos, pois chega a ultrapassar um metro de comprimento e pesar mais de 30 quilos. No Rio Grande do Sul as três espécies, T. barbus, T. agassisi, T. genidens, estão reunidas nos dados estatísticos de pesca sob a denominação única de bagre. Na Lagoa dos Patos chega a constituir a segunda espécie pescada por ordem de importância. Em l967 o Rio Grande do Sul pescou 7.140 toneladas. OS bagres preferem o ambiente lacustre como área de desova. Chegam em agosto ou Setembro, mas em outubro ou novembro oferecem as maiores capturas. Ao ingressarem na Lagoa, estão gordos e com os ovários bem desenvolvidos. Após cerca de três 41

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meses, retornam ao mar, na arreada, muito magros e desovados. (Dados de Fernandes Teixeira 1970:18-19). Corvina:

Micropogon opercularis (Barcellos 1962:11) Micropogon furnerii (lnst. Ocean. USP, Boletim sobre Exploração de Recursos Renováveis, do Grupo de Pesquisa Sobre a Pesca Marítima). O biologista Boaventura N. Barcellos classificou a nossa corvina como “Micropogon opercularis”, ao passo que o Instituto Oceanográfico, da Universidade de São Paulo, no seu boletim sobre a “Exploração de Recursos Renováveis”, do Grupo de Pesquisas sobre a Pesca Marítima, diz que a nossa corvina é cientificamente conhecida como “Micropogon furnerii”. A “corvina negra” dos argentinos (Pogonias chromis L.), no Rio Grande do Sul, toma o nome de “Burriquete”, quando jovem, e “Miragaia”, adulta. A corvina é peixe de carne de delicioso paladar, apesar de ter, às vezes, as suas vísceras infestadas por um platelminto. A corvina mede uns 30 cm, em média, mas os barcos trazem exemplares desde 16 a 70 cm. Uma corvina com 30 cm pesa 240 a 300 gramas, ao passo que no dobro de comprimento, ou seja, uns 60 cm pode atingir 2.200 gramas. No Rio Grande do Sul, a corvina penetra na barra do Rio Grande em setembro - outubro, para reprodução na Lagoa dos Patos, e volta ao mar, arreada, nos meses de dezembro - janeiro. Ao chegar à Lagoa está gorda, com ovários desenvolvidos, enquanto que se acha magra na arreada, na volta ao mar. Em ambas as ocasiões, pescam-se grandes quantidades de corvina na parte sul da Lagoa dos Patos e canais do porto de Rio Grande, atingindo até 50% da pesca total lacustre. Uma das colheitas maiores nessa área foi obtida em 1959, com 14.000 toneladas. Esse peixe entra na Lagoa dos Patos para reprodução, e von Ihering observou a pesca da corvina na desembocadura do Rio Camaquã e, de vez em quando, até em plena água doce do Rio 42

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Guaíba, defronte de Porto Alegre. (Dados de Fernandes Teixeira 1970:15-16). Miragaia:

Pogonias chromis L. No Rio Grande do Sul é chamada “Burriquete”, quando jovem, “Miragaia” quando adulta. Os argentinos a denominam “Corvina negra”. No Uruguai o exemplar leva o nome de “Criollita”. (Fernandes Teixeira 1970:15). A miragaia jovem, “Burriquete”, ocorre no litoral sulino de julho a novembro. A miragaia adulta procura a Lagoa dos Patos desde Setembro, sendo outubro e novembro os meses de maior pesca. (Fernandes Teixeira 1970:34 s). Tainha:

Mugil brasiliensis-Agassis Mugil platanus. É peixe de escamas, de forma alongada, semicilíndrica, com longo intestino, de acordo com sua alimentação onívora, e estomago musculoso, como a moela das aves; os dentes são miúdos e a primeira nadadeira dorsal é dotada de espinhos fortes; a coloração é prateada, sendo a do dorso cinza escuro. (Demócrito Silva. A Tainha). O peso da tainha de corrida, “Mugil brasiliensis Agassis”, vai de um e meio a dois quilos e o comprimento é de 40-50 cm. (Demócrito Silva. A Tainha). Alguns exemplares chegam a atingir mais de um metro de comprimento e 6-7 quilos de peso, mas, em média, uma boa tainha tem meio metro e pesa dois quilos, (Fernandes Teixeira 1970:20). Outra espécie, a que ocorre na Lagoa Mirim, sem a mesma impor43

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tância econômica, chega a pesar oito quilos e medir 80-90 cm de comprimento. (Demócrito Silva, A Tainha). A tainha é uma das maiores riquezas das Lagoas dos Patos e Mirim. Ali ela cresce e se multiplica, saindo, uma vez por ano, pela barra do Rio Grande, em grandes cardumes, para desovar no Oceano Atlântico. (Fernandes Teixeira 1970:19-20). A tainha do Rio Grande do Sul é um dos peixes de maior valor econômico. Sua pesca em Rio Grande e São José do Norte principalmente, é algo de extraordinário, tendo atingido, em 1965, o volume de quase 4.000 toneladas. Além de produzir o “caviar” brasileiro, a tainha é considerada um dos melhores peixes para congelar, salgar, enlatar, prensar, (Fernandes Teixeira 1970:20). “Na primavera, a tainha entra pelo Canal de Rio Grande, vinda do Sul, em numerosos cardumes relativamente pequenos, em geral magra, dirigindo-se para a Lagoa dos Patos e penetrando nos rios, a fim de alimentar-se e preparar-se para a desova. Nessa ocasião, nas imediações da barra, faz-se sua pesca em pequena escala, porque, além do mais, tem pouco valor comercial, magra e sem ovos. “De abril a junho, dependendo das condições do tempo, a tainha que se espalhara pela Lagoa dos Patos e atingira o Guaíba, ou mais acima, achando-se gorda e com os ovários repletos de óvulos em estado de serem fecundados, reúne-se em grandes mantos ou cardumes de machos e fêmeas, e dirige-se para o Oceano, através da barra do Rio Grande, tomando a direção norte, para então reproduzir-se. “Anualmente, nos fins de abril ou começos de maio, - narra um repórter do jornal “O Estado de São Paulo” - um espetáculo impressionante pode ser observado na barra da Lagoa dos Patos. É a corrida da tainha. Uma quantidade incalculável desses peixes, que então atingiram o devido grau de maturidade, demanda o Oceano,em cardumes extraordinariamente volumosos, buscando regiões propícias para a desova. “Durante os dias que precedem a corrida, nota-se na parte sul da Lagoa um movimento incomum. Tainhas irrequietas saltam 44

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constantemente para fora da água e aos poucos se vão agrupando em cardumes tanto mais completos quanto mais próximo o momento de arremeterem na direção do Atlântico. (...) A corrida da tainha dura cerca de 48 horas. Logo após o rebojo, isto é, a mudança dos ventos que passam a soprar do quadrante sul, ela se inicia discretamente, para, ao cabo de algumas horas, ficar o canal da barra tomado por completo pelos peixes, que então podem ser capturados com espantosa facilidade pelos pescadores das praias. Ali eles se colocam em filas - pois as praias são pouco extensas para comportar o grande número de profissionais - e um grupo cada vez mais numeroso lança a rede de arrastão, trazendo-a abarrotada de tainhas. Botes e canoas, em número jamais visto, cruzam ininterruptamente o canal, transportando o pescado para os trapiches das indústrias, onde são vendidas as tainhas por preço que diminui à medida que se avoluma a pesca. Nas plataformas dos canais de atracação é impressionante a quantidade de tainhas que ali são continuamente descarregadas, cobrindo todo o espaço livre e crescendo em montanhas que durante dois dias desafiam a disposição dos carregadores e a eficiência dos transportes. A migração da tainha varia de ano para ano, mas sempre está entre os meses de abril, maio e junho.” (Fernandes Teixeira 1970:20). Castanha:

ou “Pargo branco”: Umbrina spp. É um peixe da costa do Uruguai e Argentina, que penetra nas águas brasileiras do sul. (Fernandes Teixeira 1970:26). Pescado no verão na costa do Rio Grande do Sul. Siri-azul:

Callinectes sapidus “Conhecido com o nome de siri-puã, é um dos maiores siris do nosso litoral, podendo atingir até 17 cm de envergadura. As fêmeas são sempre menores que os machos. Vivem em praias lodosas desde 45

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a parte rasa até as águas profundas, mas penetram em riachos que desembocam no mar, e parece ser a espécie mais abundante em água salobra. As fêmeas, na época da eclosão dos ovos, voltam para o mar onde as larvas se vão desenvolver. Alimentam-se principalmente de animais mortos, mas também podem comer plantas. São muito usados na alimentação e podem ser “pescados” facilmente com um samburá e um pedaço de carne em início de putrefação”. (Narchi 1973:91). Referências populares dos pescadores, em relação à presença do siri-azul na Lagoa dos Patos, dão conta de sua abundância, através de expressões como “azula de siri” ou “preteia de siri”. (Schorr 1975:20). O siri-azul entra na Lagoa, quando começa o calor, em migração trófica, e as fêmeas vão desovar no mar quando começa o frio. Camarão:

Penaeus paulensis No Rio Grande do Sul - observação de Barcellos o camarão, popularmente conhecido como “Rosa” (Penaeus paulensis), tem tecidos finos e delicado paladar, sendo capturado em águas da Lagoa dos Patos, entre os paralelos 31° 30’ e 32° l0’ de latitude sul. Suas safras alcançam em alguns anos 4.000 toneladas. Em águas interiores são apanhados pelo arrastão de costa e, nos canais, com as redes de saco, que dão bom rendimento. Sua abundância é, provavelmente, prejudicada pelas chuvas excessivas na bacia hidrográfica, dado que as formas pós-larvárias desse crustáceo precisam de relativa salinidade na época em que, vindos do mar, procuram as águas salobras da Lagoa dos Patos onde se desenvolvem. No meio lacustre as corvinas, miragaias e bagres, encontram no camarão seu principal alimento. Atualmente a exploração atinge as formas maduras, quando procuram migrar para o mar. (Fernandes Teixeira 1970:7).

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Calendário da Migração e da Pesca: Épocas 1. janeiro a março: 2. março a junho: 3. julho a novembro: 4. julho a novembro:

5. agosto a setembro: 6. agosto a dezembro: 7. Setembro a dezembro:

Espécies (S. Catarina e Rio Grande): Camarão. No Rio Grande do Sul, principalmente em março, mas depende da salinidade das águas da Lagoa dos Patos onde o camarão entra para desovar. Tainha: Maior captura se dá quando a tainha deixa a Lagoa rumo ao Oceano, quando então, se pescam as maiores quantidades nas águas interiores. Burriquete. Nome genérico dado à Miragaia jovem, no litoral sulino. Pescadinha. No Atlântico Sul, a pescadinha oferece o máximo de pesca nos meses de junho a agosto. Os cardumes mais densos são encontrados durante o verão, na latitude 32° S, e durante o inverno entre 28° S e 29° S. O mesmo acontece com a Savelha. Bagre. No Rio Grande do Sul, aparece em quantidade desde agosto, não obstante sua maior abundância verificar-se em outubro e novembro, quando penetra na Lagoa dos Patos para a desova. Corvina. Encontrada em maior quantidade na parte Sul da Lagoa dos Patos desde agosto, sendo novembro dezembro os meses de maior pesca. Miragaia. Procura a Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, desde setembro, sendo outubro e novembro os meses de maior pesca. (Dados de Fernandes Teixeira 1970: 34-45).

b) A Terra firme, sua ecologia, seus recursos: A Vegetação

A vegetação está entre, e é uma combinação de, elementos dos campos limpos (formações não-florestais, herbáceas, não inundadas) que vêm do Sul; floresta subtropical (formações florestais, estacionais, latifoliadas, subcaducifólias, subtropicais), que entra por cima da Serra do Sudeste; e pequenas influências de floresta de restinga 47

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(formações florestais, estacionais, latifoliadas, tropicais, esclerófilas litorâneas), que desce ao longo do litoral. (Lima 1966: II- 11). Para termos uma idéia da fitogeografia da região, usamos Rambo (1956), que melhor compreendeu e descreveu os fenômenos presentes. Apresenta um perfil da região, começando no Oceano e deixando-os no alto da Serra do Sudeste. “Uma fotografia aérea dum setor do litoral apresenta as seguintes zonas paralelas: o oceano, a zona da ressaca, a zona das areias movediças, a zona das dunas vegetadas, a zona dos olhos de água, a zona do campo, a zona dos lagos internos, e a zona das serras. As primeiras quatro zonas se sucedem rigorosamente paralelas e nitidamente separadas; nas quatro últimas, o paralelismo é menos pronunciado, perturbado por numerosas endentações e irregularidades.” (Rambo 1956:19). Omitimos algumas das zonas por não nos interessarem diretamente. “e) Na zona das dunas vegetadas domina a matinha litorânea. A luta contínua contra as condições desfavoráveis do substrato e do ambiente atmosférico permite a existência das famílias decididamente xerófilas, entre as quais sobressaem, em massa e número de espécies, as mirtáceas; dessas famílias a seleção natural escolheu os tipos mais resistentes; e estes, por sua vez, só conseguem manter a posição num esforço supremo de adaptação. “Assim, o tipo dos arbustos litorâneos ê o do camboim: raízes profundas, dispostas como escoras para impedir que o vento, varrendo a areia, possa derrubar o vegetal; galhos numerosos, contorcidos, tenazes, emaranhados; folhas coriáceas, pequenas, brilhantes; copas arredondadas, densas, confundidas com os vizinhos em sociedade vegetal fechada; enfim, um máximo de acomodação ecológica. “Estas matinhas geralmente ocupam dunas só na crista e no flanco à sombra do vento; mesmo assim as da crista estão sujeitas a terem as raízes completamente descobertas, e as do flanco a serem enterradas na areia, razão por que às vezes um renque inteiro de dunas apresenta a matinha seca e morta, resistindo só os raros exemplares da figueira (Ficus subtriplinervia) que crescem de permeio.” (Rambo 1956:21). 48

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“f) Na zona dos olhos de água (na qual incluímos a das lagoas marginais) a vegetação difere completamente das dunas. Estes ajuntamentos de água, provenientes em parte das chuvas estagnadas nas depressões do terreno, em parte de bacias enchidas pelo transvasamento dos arroios, em parte de alargamentos dos próprios cursos de água, produzem um melhoramento considerável das condições ecológicas, e isso por dois motivos: pela própria presença de água doce em abundância, e pela acumulação duma camada variável de húmus fertilizante. “Desta maneira, as poças de água estagnada são centros de intensa vegetação. Um denso tapete de algas verdes, filamentosas, reveste o leito, flutuando ao sabor das minúsculas ondas; na zona marginal, as gramas, os juncos, as ciperáceas, as verbenáceas e leguminosas rasteiras adquirem um viço descomunal; núcleos minúsculos de matinha arbustiva e algum exemplar contorcido de corticeira (Erythrina cristagalli) marcam as primeiras tentativas para formar sociedades silváticas. “As lagoas maiores de água perene reeditam este espetáculo em formato maior e mais rico. Na parte central, sempre de pouca profundidade, existem unicamente as algas filamentosas, que, vistas de avião, aviventam o aspecto monótono das águas, com os mais variados desenhos matizados de verde e azul escuro; na zona marginal brejosa pulula a vegetação palustre, em espécies comuns a todos os lugares semelhantes na parte meridional do Estado: são, em parte, tipos inteiramente flutuantes, sem raízes terrestres, como os aguapés (Eichhornia crassipes, pontederiácea) com os pecíolos foliares inchados em flutuadores, e belas inflorescências azuis, Salvinia auriculata e Azolla filiculoides, dois pteridófitos flutuantes, e espécies de Wolffiella e Lemna, lemnáceas; em parte espécies de rizoma enterrado no limo subaquático e folhas flutuantes na superfície, como Eichhornia azurea, Pontederia cordata, Regnellidium diphyllum; em parte espécies de rizoma submerso e folhas estendidas ao ar, como o chapéu de couro (Echinodorus grandiflorus); em parte, enfim, espécies radicadas na margem limosa, mandando os seus estolões à superfície da água, como Heteranthera e várias gramíneas. - Na própria margem, úmida desdobra-se uma rica 49

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flora palustre, como as Utriculárias insetívoras de flores amarelas ou azuis, várias espécies de Jussieua de grandes flores amarelas, caducas; gramíneas, ciperáceas, juncáceas e outras. - Na zona mais seca, encontram-se espécies rasteiras como Lycopodium inundatum, Ranunculus, verbenáceas e leguminosas rastejantes, bem como a Drosera brevifolia, a mais típica das nossas plantas insetívoras. Nas encostas secas das lagoas prevalece, conforme as circunstâncias locais, a vegetação das dunas, do campo seco ou das matinhas litorâneas, podendo estas últimas assumir a forma de capões mirtáceos, entremeados de jerivás, cristas de galo e figueiras. “Pertencem ainda a esta última categoria as matinhas ciliares ou de anteparo, estreitas faixas de vegetação arbustiva ao longo dos cursos de água.” (Rambo 1956:21-23). “g) Na zona do campo, a vegetação acha um solo bastante duro e seco. Somente em maior distância da praia se encontram essas planícies, caracterizadas por sua cor cinzenta-verde, e quase tão planas como um soalho, como campo visual aberto sobre dezenas de quilômetros. Formam um pasto muito freqüentado, mas seco e magro, de subsolo mais ou menos firme e seco, e com uma coberta vegetal rala e baixa, formada em sua grande massa de gramíneas e ciperáceas, deixando transparecer, por toda a parte, a areia. Encontram-se ali, entre outras, as leucostachyus, Cenchrus tribuloides, Paspalum; ciperáceas como Fimbirstylis complanata, e Kyllinga pungens; umbelíferas, como Hydrocotyle umbellata e Centella asiática, rasteiras, e Eryngium nudicaule formando rosetas no chão; enfim, verbenáceas e outras famílias com representantes rasteiros e subarbustivos. “Na orla das lagoas, em terreno seco, as sociedades arbustivas das mirtáceas, melastomatáceas e compostas lenhosas chegam a constituir verdadeiros capões, cuja copa baixa é sobrepujada por jerivás e figueiras; em terreno pantanoso, desenvolvem-se matas brejosas de mirtáceas, numerosos exemplares de crista de galo, touceiras de gravatá (Bromélia fastuosa), jerivás e majestosas figueiras; na beira seca dos capões e das matas brejosas, estende-se um véu pouco denso de vassoura vermelha (Dodonaea viscosa), e compostas arbustivas; mais adiante, já em campo aberto, apresentam-se, afora 50

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de exemplares isolados de figueiras e jerivás, espécimens de louro (Cordia trichotoma) e cedro (Cedrela fissilis), primeiros representantes da flora silvática da serra. No extremo Sul, nos arredores de Santa Vitória do Palmar, como em Palmares e Osório, milhares de butiás se acham espalhados pelo campo litorâneo, excelentemente protegidos contra a seca pelas folhas rígidas e enceradas.” (Rambo 1956:25-24). “h) Na zona das grandes lagoas internas, repetem-se, em escala proporcional, os fenômenos ecológicos das lagunas costeiras. Nas partes centrais, com uma profundidade oscilando entre 5 e 7 metros, não existem os penachos de algas flutuantes; os aguapés acumulam-se em quantidades prodigiosas nos sacos e nos remansos; a vegetação juncácea da margem forma superfícies extensíssimas de verde azulado, que muitas vezes passam, sem transição sensível, à margem brejosa, onde gramíneas, ciperáceas e espécies altas de Eryngium cobrem, por vezes, quilômetros e quilômetros quadrados de planície; a mata brejosa, à exceção de seu volume mais avantajado, é do caráter antes descrito. “Na Lagoa dos Patos, a Serra do Mar, como formação geológica, se conserva a pouca distância da margem continental, mas só num único ponto, em Itapoã, nela chega a tocar diretamente. Assim, a vegetação da margem ocidental, afora das espécies campestres, palustres e silváticas da faixa litorânea, ostenta um contingente considerável de tipos oriundos da Serra do Sudeste, que se condensam, em verdadeiros matos na desembocadura do Camaquã.” (Rambo 1956:24). A zona das serras já está fora de nossa área direta de pesquisa, mas completa o quadro, oferecendo alternativas de abastecimento para as estações menos abastecidas da planície e recursos que faltam naquela. “Nos arredores de Pelotas a Serra Buena reduz a paisagem a uma estreita faixa irregular, que para o lado do São Gonçalo depressa toma o caráter do litoral marítimo, e que para o lado oeste rapidamente esbarra nas paisagens do interior. A terra dos campos secos, mistura de areia do litoral e pedregulho da serra, é magra, abrigando uma vegetação de dimensões reduzidas e duma pobreza 51

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comparável à dos campos secos do litoral. Ao longo dos arroios, desenvolvem-se formações de anteparos mais ricas do que ao sul de Piratini, e os ilhotes e espigões de granito ora se acham revestidos de campo seco entremeados de matacões, como o do Capão do Leão, ora ostentam matas de meia altura, entre as quais sobressaem figueiras de belo porte. Nas partes pantanosas predominam os juncais, de mistura com uma espécie de parque palustre constituído de arbustos espinhosos de maricá (Mimosa sepiaria) e exemplares contorcidos de crista de galo. A constante alternação de pastos secos, plainos magros de areia e areião, cordões de galeria, pântanos com aguapés, juncais, mata palustre, cercas, os quadros de eucalipto e outras modificações provenientes da mão do homem fazem com que esta paisagem seja a menos bem definida de toda esta zona.” (Rambo 1956:84). “As formações edáficas sobre o granito podem dividir-se em 11 tipos, como segue: “a) campo limpo, entremeado de muitos blocos de granito descobertos ou semienterrados, com uma vegetação rasteira de gramíneas, verbenáceas e compostas, não passando de meio metro de altura; é a formação das coxilhas, dos morros arredondados e dos picos mais elevados da serra. “b) campo sujo, coberto de carquejas (Baccharis) e touceiras de capim alto; desenvolve-se de preferência em porções muito planas de terreno ou nas depressões, onde o solo é mais profundo e a umidade mais abundante. “c) Vassourais, formados de arbustos de um a três metros, prevalecendo a vassoura vermelha (Dodonaea viscosa), e as espécies arbustivas das vassouras comuns (Baccharis); crescem em geral abaixo da metade dos flancos, avançando em muitos pontos mais acima, onde se misturam com o campo sujo. “d) Matinhas arbustivas ou subarborescentes, contendo, como componentes principais, arbustos duros e contorcidos da família das mirtáceas, cipós espinhosos de salsaparilha (Smilax), bignoniáceas e outras; esta formação constitui o limite superior da vegetação silvática fechada. 52

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“e) Mato arborescente ou alto, contendo espinilhos (Fagara), chalchal (Allophylus edulis), açoita-cavalo (Lühea divaricata), cocão (Erythroxylum), canelas (Nectandra), coração-de-negro (Maytenus cassiniformis), salgueiro (Salix humboldtiana), figueira (Ficus subtriplinervia), cedro (Cedrela fissilis), canjerana (Cabralea oblongifoliola), ipê (Tecoma); a vegetação dos cipós, aliás bastante raros nestes matos, com espécies pertencentes às famílias das bignoniáceas, liliáceas, malpighiáceas, passifloráceas; as árvores maiores estão cobertas de epífitos, barbade-pau (Tillandasia usneoides), orquidáceas, piperáceas. “f) Matos de parque, formados por exemplares de aroeira comum (Lithraea brasiliensis), da aroeira salsa (Schinus molle), da caapororoca (Rapanea umbellata), colocados a distância um do outro, sem se tocarem, tendo as copas perfeitamente redondas; esta formação, vista de avião, oferece o aspecto de grãos de pimenta semeados pelo campo. “g) Capões, isto é, matos menores mais ou menos redondos, fechados, nitidamente destacados, dependendo em volume e composição da natureza local do solo; esta modalidade de mato assinala quase sempre as nascentes de água nos recôncavos das coxilhas. “h) Matos de galeria ou de anteparo, que acompanham os cursos de água, começando subarbustivos nas fontes, desenvolvendo-se em matinhas na encosta seca e rochosa, e terminando em matos de regular extensão e altura, de acordo com o volume da água e dos terrenos de aluvião. “i) Mata virgem, assemelhando-se, em viço e composição, às matas subtropicais do planalto; na vertente nordeste do Morro de Sant’Ana, no município de Porto Alegre, no lado da Serra do Herval, dirigido contra a Lagoa dos Patos, nos arredores de Caçapava, ao longo dos rios Camaquã e Piratini, bem como de seus braços mais volumosos; enfim, em todos os pontos da Serra do Sudeste, onde as condições edáficas o permitem, encontram-se estas matas, correspondentes ao clima do Rio Grande do Sul. “j) A capoeira resulta da destruição da vegetação silvática seja para obter solo de lavoura, seja apenas para explorar a lenha; aban53

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donadas a si, reconstituem-se novamente em matos, embora com muitos elementos sistemáticos diferentes da formação primitiva. “k) Os palmares, enfim, compostos de butiazeiros (Butiá), como sociedade de interesse fisionômico, limitam-se à Serra do Herval, especialmente ao seu flanco leste e norte, onde, nas proximidades de Tapes e de Encruzilhada, ocorrem exemplares sem conta, semeados pelos campos,” (Rambo 1956:72-74). A vegetação, no setor restrito por nós pesquisado, tem aspectos dos descritos por Rambo para as zonas dos olhos de água, mas principalmente para as lagoas de água perene, a do campo e a da zona das grandes lagoas internas. Os recursos vegetais estão indicados a seguir. Nas áreas um pouco mais afastadas, principalmente na Serra, encontram-se alternativas estacionais ou complementares. Podem ser matérias-primas ou alimentos. Frutos abundantes se encontram nos palmares, caça nos campos e em diversas formações arbustivas, as áreas cobertas por formações arbóreas ou arborescentes geralmente têm solos convenientes para o cultivo. Recursos Vegetais

Em duas expedições com uma semana de duração cada uma, realizadas em dezembro de 1975 e janeiro - fevereiro de 1976, procurou-se avaliar a possibilidade de consecução de alimentos vegetais e outros recursos úteis para o homem primitivo na área restrita dos sítios. A lista que segue indica os elementos mais importantes, encontrados no local, que foram indicados pelos moradores e/ou por nós observados. Figueiras bravas, principalmente Ficus subtriplinervia Mart. As figueiras encontram-se nos capões de mato de toda a planície e se destacam pelas suas grandes copas. Desde dezembro até o fim de fevereiro amadurecem as frutinhas, comestíveis, das diversas espécies. Um frutinho pode ter de 7 a 8 mm de diâmetro. As copas 54

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arredondadas cobrem-se completamente de frutos, devendo dar aproximadamente 100 frutinhas por palmo quadrado. As copas têm de 20 a 30 m de diâmetro e existem áreas em que formam um dossel completamente fechado. Os frutinhos são doces e fáceis de apanhar, porque os ramos de algumas espécies são bastante horizontais, permitindo uma escalada fácil e uma derrubada sem utilização de muitos recursos. O frutinho pode ser comido ao natural, como pode ser secado ou talvez misturado ao peixe seco ou preparado de outra maneira. Bosques com algumas figueiras podem dar toneladas de alimentos. Em toda a região das lagoas as figueiras são muito abundantes. Devido à diferença de tempo na maturação dos frutinhos, eles cobrem desde dezembro até fim de fevereiro. Tunas: Opuntia vulgaris: (Foto 1 e 2). Comuns na periferia dos bosques ou capões de mato, nas partes mais secas e por todos os campos do interior. Precisam de sol e não se desenvolvem debaixo das arvores fechadas. Nas secções foliares, que têm 20 a 25 m de comprimento, se encontram até 16 frutos, do tamanho de um figo. Um tufo normal tem algumas dezenas de frutos, os maiores, alguns milhares. Em diversas áreas de sítios, podem-se colher toneladas de frutos. Dão em janeiro, fevereiro e parte de março. A parte comestível tem uns 2 cm de diâmetro. O espinho que o cerca pode ser facilmente removido, deixando o fruto um tempo sobre brasas. Um grupo, morando na região, poderia facilmente alimentar-se com eles durante dois meses: janeiro e fevereiro. O próprio indígena poderia ser responsável em parte pela sua propagação. Jerivá: Arecastrum romanzoffianum. Nas áreas mais úmidas dos bosques ou capões os jerivazeiros são muito abundantes, chegando a formar ocasionalmente verdadeiros matos nos banhados. Cada pé costuma produzir um a dois cachos anuais, com mais de uma centena de frutos, com aproximadamente 15 mm de comprimento e 10 mm de diâmetro. Do fruto pode-se aproveitar a polpa e a amêndoa que está dentro do coco. É possível recolher toneladas de coquinhos em determinadas regiões. Os frutos estão maduros em dezembro e janeiro. 55

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Cacto de árvore (foto 1), chamado localmente mandacuru: Cereus sp. Aparece bastante, porem em menor quantidade que a tuna e dá menos frutos. Amadurece a partir de fevereiro. O fruto é semelhante ao da tuna. Mamão silvestre: Carica quercifolia. Parece ser natural da área de mata. Aparece de preferência sobre os sítios ou encostado neles e perto de casas provavelmente transportado e plantado pelo homem primitivo e atual. Produz uma frutinha amarela quando madura, de uns 3 cm de comprimento e que se assemelha a um mamão. Não muito abundante. Amadurece entre fins de janeiro e fins de fevereiro. Butiá: Butia capitata (Mart.) Beccari. Popularmente é conhecido como butiá-dapraia ou butiá-azedo. Não encontramos butiazeiros no local, a não ser os plantados perto das casas. Os frutos amadurecem de dezembro a março. Mas na Serra do Sudeste e perto da Lagoa Mirim formam agrupamentos fechados que se estendem por muitos quilômetros. Taleira ou cereja do mato: Celtis sellowiana Miq. Arbusto com ramos flexuosos, formando tufos, ou entrelaçando-se com ramos de árvores, é muito abundante na borda ensolarada dos capões. Produz um frutinho, amarelo quando maduro, de 6 a 7 mm de diâmetro. Amadurece entre janeiro e fevereiro. Amora negra: Morus nigra. Pequena quantidade. Araçá: Psidium variabile. Arbusto que dá frutos, que são miniaturas de goiabas (10-15 mm de diâmetro). Os frutos amadurecem em fevereiro. Existe em pequena quantidade. Angélica: Randia armata (Sw.) DC. Árvore que produz um fruto amarelo quando maduro, com 2 a 3 cm de diâmetro. Não muito abundante. Amadurece a partir de fevereiro. Tarumã: Vitex megapotamicus (Spreng) Mold. Árvore que produz abundantes frutos com aproximadamente 1 cm de diâmetro,quase pretos quando maduros. Árvore não muito numerosa no local. Fevereiro? 56

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Chal-chal: Allophylus edulis. Árvore que produz grande quantidade de cachos com pequenos frutos (± 5 mm), alaranjados. Árvore não muito abundante no local. Fevereiro? Marmelo do mato ou fruta do macaco. Ananás: Ananas nativus. Gravatá: Eryngium sp. Muito abundante dentro e ao redor dos capões de mato. Produz um cacho de frutos alongados com 5 a 7 cm de comprimento e 2 a 3 cm de diâmetro. Amadurece por fevereiro – março. Maracujá silvestre: Passiflora sp. Gravatá manso, que é muito abundante, produz uma batatinha comestível. Materiais para a fabricação de esteiras, cestos, redes e outros trançados podem ser conseguidos das palmáceas, bromeliáceas, juncáceas e outras plantas abundantes na região. As mesmas poderiam ser usadas na construção de choupanas e abrigos. Fibras têxteis podem ser conseguidas, além disso, da planta chamada Cardamomo ou Lírio do vale. Muitas outras plantas poderiam e deveriam ser usadas pela população, mas nos são desconhecidas. Os animais Terrestres e Voláteis

Também foi feito um levantamento dos animais caçados ou ao menos conhecidos pelos moradores locais. É possível que animais existentes tenham sido omitidos porque os moradores não estão familiarizados com eles. Ao lado dos nomes vulgares indicados pelos moradores foram colocados os nomes científicos que provavelmente lhes correspondem, usando-se para os mamíferos a lista organizada por Voss (1973) e Silva e Voss (1975), e para as aves a lista organizada por Camargo (1962). Como os nomes populares variam, de lugar para lugar, é possível que haja erros na correspondência concreta indicada. 57

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Mamíferos indicados como existentes pelas sete famílias: Capivara (capincho) - Hydrochaeris hydrochaeris (Linnaeus). Furão - Galictis vittata brasiliensis (Thunberg). Gambá - Didelphis sp. Gato-do-mato - Felis Wiedi Guaraxaim - Dusicyon gymnocercus gymnocercus (Fischer). Lebre Lepus europaeus europaeus Pallas. Lontra - Lutra platensis (Waterhouse) Mão - pelada - Procyon cancrivorus nigripes (Mivart). Ouriço - Coendu spinosus (F. Cuvier). Preá - Cavia pamparum Thomas. Ratão- do -banhado - Myocastor coypos bonaerensis (Commerson). Tatu bola Tatu mulita - Dasypus hybridus (Desmarest) Tatu peludo - Euphractus sexcinctus flavimanus (Desmarest) Tatu - de - rabo - mole - Cabassous totouay (Desmarest) Toninha - Stenodelphis blainvillii (Gervais) Tucotuco Ctenomys brasiliensis (Blainville) Veado campeiro - Ozotoceros bezoarticus bezoarticus (Linnaeus) Zorrilho - Conepatus chinga suffocans (llliger) Pela mera enumeração se reconhece que os animais não são nem muito variados, nem abundantes. Uma parte deles está ligada ao ambiente aquático, à Lagoa e aos banhados, outra à terra seca. Todos estão ali o ano inteiro, nenhum é estacional. Aves indicadas como existentes pelas sete famílias: Carão - Aramus scolopaceus carau (Vieillot) Caturrita - Myiopsitta monachus monachus (Boddaert) Colheiro - Ajaja ajaja (Linnaeus) 58

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Flamingo, em determinadas épocas secas Frangos d’água - fam. Rallidae e Jacanidae Gaivota - Larus maculipennis (Lichtenstein) Garça - branca - Casmerodius albus egretta (Gmelin) Gavião Jacu João Grande - Eucenura maguari Juriti - Leptoptila verreauxi chlorauchenia (Giglioni e Salvadori) Maçarico - Tringa flavipes (Gmelin) Marrecão - Metopiana peposaca (Vieillot) Marrecos - provavelmente Dendrocigna viduata, D. autumnalis, D. bicolor Narceja - Capella paraguaiae paraguaiae (Vleillot) Pato capororoca - Coscoroba coscoroba (Molina) Pato arminho Perdiz, perdigão Rhynchotus rufescens rufescens (Temminck) Pomba - Columba cayennensis sylvestris (Vieillot) Pica - pau Quero - quero - Belonopterus chilensis lampronotus (Wagler) Saracura - Artygonaz sanguinolentus sanguinolentus (Swainson) Tahã, tarrã ou tagã Chauna torquata (Oken) A maior parte dessas aves estão ligadas aos banhados e às lagoas. As marrecas e patos são os que interessam mais diretamente, porque são abundantes e com bastante carne. Costumam nidificar de janeiro a março, ou mesmo até maio, pondo uma média de 3 ovos por fêmea. Em junho os filhotes costumam estar adultos, em setembro o bando regressa a seus pontos de origem, embora muitos não migrem. Além de caçar o animal adulto em qualquer época, durante a nidificação se podem recolher os ovos ou agarrar os animais com certa facilidade em cima dos ninhos. – As aves não diretamente ligadas à água costumam ser pequenas e pouco numerosas. 59

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Répteis: Lagarto - Tupinambis tequixim Jacaré - Caiman sp. Tartarugas - Platemys sp. Anfíbios:

Rã Sapos. c) A Distribuição dos principais recursos pelo ano: No quadro anexo tentamos registrar os principais recursos estacionais atuais, que foi possível levantar, no local dos sítios, com vistas ao estudo das migrações do grupo. Infelizmente eles se restringem aos peixes, a algumas aves e aos frutos. Não estão incluídos recursos presentes durante o ano todo, nem outros hipotéticos como a possibilidade de cultivos. Com uma rápida olhada ao quadro, onde estão reunidos os principais recursos da margem da Lagoa, se vê que a maior parte das migrações dos peixes se dá na primavera; o camarão e o siri, os ovos das aves, as próprias aves e os frutos estão presentes no verão. Dessa maneira a primavera e o verão oferecem recursos abundantes, o outono poucos e o inverno parece mais desprovido de alimentos na margem da Lagoa. Se incluirmos recursos distribuídos por locais um pouco mais afastados, teremos o butiá em vários pontos durante o fim do verão e começo do outono; terrenos próprios para o cultivo na serra e na “ilha” pleistocênica entre o Canal de São Gonçalo e a Lagoa, durante as estações mais quentes; a caça de veados, capivaras e outros animais em setores pantanosos ou de campos durante o ano inteiro. Com isso estão disponíveis em abundância tanto proteínas como carboidratos e outros elementos necessários ao sustento do homem. Acreditamos que para o abastecimento seriam importantes recursos uniformes e concentrados numa mesma localidade. Dessa 60

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forma um grupo caçador e/ou horticultor se poderia manter muito bem, realizando uma exploração sucessiva e racional dos elementos espalhados por diversos lugares da região. Os campos abertos permitem um deslocamento rápido entre as diversas localidades. Isso seria possível para um grupo meramente caçador e coletor, explorando as localidades sucessivamente, em ciclo anual; mas seria ainda mais fácil se o grupo conservasse alimentos de períodos e lugares mais ricos para períodos e lugares mais pobres, ou se suplementasse a caça e a coleta com algum cultivo. A conservação de alimentos e o cultivo possibilitariam ao grupo ou uma sedentariedade maior, ou uma restrição do território de exploração, ou ainda uma maior abundância e segurança. De qualquer maneira seria difícil imaginar que o grupo ficasse acampado à beira da Lagoa sem dominar os diferentes lugares do interior, principalmente enquanto não tivesse cultivo e tecnologia de conservação de alimentos, que lhe garantissem as estações pobres na margem da Lagoa. Durante os 2.000 anos a que se refere o nosso trabalho, provavelmente houve modificações no ambiente, como nas margens da Lagoa, com um maior desenvolvimento da vegetação e talvez mudanças na fauna. Certamente houve modificações no território disponível para exploração com o deslocamento de grupos indígenas. Houve modificações na tecnologia provocadas por contatos com grupos mais desenvolvidos. Todos esses são fatores que influem no maior ou menor aproveitamento por um grupo dos recursos realmente existentes na região e no seu maior ou menor deslocamento através da região.

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Pedro Ignácio Schmitz

Setembro

Outubro

Novembro

Dezembro

Corvina

X

X

X

X

X

X

X

X

X

?

?

?

X

X

?

X

Tainha

X

X

X

X

Julho

X

X

Junho

X

X

Maio

X

X

Abril

?

Março

?

Fevereiro

Bagre

Camarão

Janeiro

Agosto

Tabela 1 – Distribuição dos principais recursos animais e vegetais pelo ano.

Miragaia Castanha Pescadinha Siri-azul X Ovos de X aves Figuinhos X

X

X

X

X

Tunas

X

X

Jerivá

X

Cereus sp.

X ?

X

X

X

X

X X

X

Taleira

X

X

Mamão

X

X

Butiá

X

X

Araçá

X

Angélica

X

Tarumã

?

Gravatá

X

Chal-chal

X

X

X

X

62

III HISTÓRIA DA PESQUISA E DA CULTURA

A. História de Pesquisa A área das lagoas do Sudeste do Rio Grande do Sul e regiões vizinhas foi pesquisada arqueologicamente desde 1966, por investigadores ligados ao Instituto Anchietano de Pesquisas e à Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O objetivo era estabelecer um quadro histórico das culturas e a adaptação dos grupos humanos ao seu meio. Foram usados para isso os métodos convencionais do Programa Nacional de Pesquisa Arqueológica, sob a orientação dos arqueólogos americanos Betty J. Meggers e Clitford Evans. Os projetos foram financiados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Conselho Nacional de Pesquisas, a Smithsonian Institution e as prefeituras locais. Participaram dos trabalhos os seguintes arqueólogos (em ordem alfabética): Ítala Irene Basile Becker, José Proenza Brochado, Fernando La Salvia, Pedro Augusto Mentz Ribeiro, Guilherme Naue, Pedro Ignácio Schmitz, Maria Helena Abrahão Schorr. Os trabalhos de campo em grande parte foram realizados em grupo e relatórios prévios sobre alguns projetos foram publicados. A maior parte do material, entretanto, continua inédito, inclusive não analisado, aguardando ser completado em novas expedições. Além dos relatórios prévios, existe uma monografia sobre os restos de alimentos, provenientes dos cortes, elaborada por Maria Helena Abrahão Schorr, sob a orientação de Pedro Ignácio Schmitz. Os dados que seguem têm o objetivo de mostrar o que se realizou na área e os resultados gerais alcançados, para servirem de moldura ao nosso trabalho, que detalha pormenores de uma localidade restrita, em Rio Grande, incompreensível fora da moldura da região. Há um outro objetivo na apresentação dos resultados de uma região maior: se estudarmos o padrão de assentamento do grupo e as migrações dentro da área sob seu domínio, uma visão puramente local é absolutamente insuficiente, porque possibilidades variadas estão distribuídas pela região que abrange as terras baixas junto às 65

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lagoas, a Serra do Sudeste com a floresta subtropical e os campos que se estendem em direção ao ocidente. Ver localização dos pontos pesquisados no mapa do Rio Grande do Sul, no capítulo II.(Fig. 2) 1 Pesquisas na Região do Rio Camaquã (a):

A localidade pesquisada situa-se na margem esquerda do Rio Camaquã, próxima à desembocadura na Lagoa dos Patos, abrangendo o Banhado do Colégio e parte da Serra adjacente. Latitude aproximada entre 30° 10’ e 31° 10’ sul; longitude aproximada entre 51° 30’ e 52° oeste de Greenwich. A cobertura vegetal no Banhado do Colégio é predominantemente de campos; na Serra é floresta subtropical. Foram realizadas as seguintes expedições: Em janeiro de 1968 P. I. Schmitz, P. A. Mentz Ribeiro, G. Naue, I. I Basile Becker visitaram 29 sítios com 62 aterros no Banhado do Colégio, fazendo coletas superficiais e três cortes estratigráficos; 19 sítios Tupiguarani na Serra do Sudeste, fazendo coletas superficiais. Breve relatório publicado por Schmitz et al.(1974). No verão de 1970 J. Proenza Brochado visitou 18 sítios com 34 aterros no Banhado do Colégio, a metade dos quais haviam sido visitados em 1968. Breve relatório foi publicado por Brochado (1974). Em janeiro de 1971 P. I. Schmitz, J. Proenza Brochado, I. I. Basile Becker, G. Naue fizeram 12 cortes estratigráficos e algumas coletas suplementares de superfície em sítios visitados em 1968 e 1970. O material ainda não foi analisado. Os resultados conseguidos foram os seguintes: No Banhado do Colégio existem sítios sob a forma de aterros e de dunas ocupadas. Os aterros podem ser pré-cerâmicos (fase Patos), contendo pontas de projétil pedunculadas, ou material ainda pouco definido, por escasso. Outra parte dos aterros, assim como as dunas ocupadas, contém cerâmica de tradição Vieira, ao que parece tardia. 66

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Um dos sítios (erodido) tem cerâmica Tupiguarani, cerâmica Vieira e pontas líticas penduculadas. A situação dos sítios do Banhado do Colégio e o desenvolvimento da cultura não estão claros: não há datações radiocarbônicas e a análise do material está incompleta. Os restos de alimentos não se conservaram, mas as pontas parecem indicar que se trata de sítios de caça. Na Serra do Sudeste, acompanhando a mancha de floresta tropical, que avança para o Sul há sítios de tradição Tupiguarani, subtradição Corrugada, fase Camaquã, cuja ocupação deve corresponder a uns séculos antes do Descobrimento e deve ter durado até pelo século XVIII. 2 Pesquisas no Município de Rio Grande (b):

A localidade pesquisada situa-se entre o Oceano Atlântico, a margem ocidental da Lagoa dos Patos e o Canal de São Gonçalo, desaguadouro da Lagoa Mirim e de alguns rios. São terras baixas de formação quaternária. Latitude aproximada entre 31° 45’ e 32° 30’ sul; longitude aproximada entre 52° e 52° 40’ oeste de Greenwich. A cobertura vegetal é de campos e pequenas formações florestais. Foram realizadas as seguintes expedições: Em fevereiro de 1966 J. Proenza Brochado e P. I. Schmitz estudaram 10 sítios, entre aterros, dunas ocupadas e sítios Tupiguarani. Foi feito um corte no RS-RG-49. Uma nota prévia foi dada a conhecer por Schmitz e Brochado (1966). A partir de 1968 G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco de Rio Grande, estudaram ou visitaram 40 sítios, entre aterros, dunas ocupadas e sítios Tupiguarani, inclusive alguns já visitados em 1966. Resultados foram publicados por Schmitz (coordenador 1967) e Naue et al. (1968). Em janeiro de 1969 P. I. Schmitz, G. Naue, F. La Salvia, W. Valente, I. I. Basile Becker e M. H. Abrahão Schorr fizeram dois cortes no RS-RG-20 e analisaram o material guardado no Colégio 67

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São Francisco e em outras coleções. Resultados foram publicados por Naue et al. (1971). Em janeiro e fevereiro de 1970 P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker, G. Naue, M. H. Abrahão Schorr realizaram sete cortes estratigráficos, nos sítios RS-RG-49, 48, 04, 08, 21, e coletas superficiais em diversos sítios. Em março de 1972 P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker, G. Naue fizeram cortes nos sítios RS-RG-50, 28 e coletas superficiais em outros. Entre abril e maio de 1972 G. Naue realizou cortes estratigráficos no RS-RG-01 (cerritos 1,4,5,6) e no RS-RG-02 (01), além de coletas sistemáticas. Posteriormente foram realizadas novas expedições a Barra Falsa, para estudo ecológico, e à região do Taim para localização de sítios e estudo ecológico por G. Naue e M. H. Abrahão Schorr. Em dezembro de 1975, P. I. Schmitz buscou suplementos para a ecologia no Taim. Em janeiro de 1976 P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker, G. Naue, M. H. Abrahão Schorr fizeram observações sobre a geomorfologia da margem ocidental da Lagoa dos Patos. Os resultados conseguidos foram os que seguem: Existem aterros pré-cerâmicos, predominantemente de pesca, a partir de mais ou menos 500 a.C - ± A.D.: fase Lagoa; cômoros, com cerâmica de tradição Vieira, predominantemente de pesca, ou predominantemente de caça: fase Torotama (± A.D. – A.D.200) e fase Vieira (A.D. 200 - A.D. 1750); na parte final da fase Vieira temos a presença de muitos elementos cerâmicos Tupiguarani. Por outro lado, temos sítios Tupiguarani (fase Camaquã) sobre os terrenos mais elevados, de formação pleistocênica, e sobre o topo de aterros, desde aproximadamente A.D. 1.000. Ainda sobre terrenos mais elevados, localizam-se sítios rasos, hoje erodidos, nos quais estão associadas cerâmica de tradição Vieira, cerâmica de tradição Tupiguarani, uma indústria lítica variada, 68

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geralmente com abundância de pontas pedunculadas e material de tradição européia. A esta fase, que deve ter começado em inícios do século XVIII, denominamos Bojuru. Estudos sobre os restos ósseos foram publicados por Schorr e Schmitz (1973 e 1975) e por Schorr (1975). 3 Pesquisas no Município de Santa Vitória (c):

A área pesquisada Situa-se entre a Lagoa Mirim e o Oceano. São terras baixas de formação quaternária. Latitude aproximada entre 32° 45’ e 33° 20’ Sul; longitude aproximada entre 52° 30’ e 53° 20’ oeste de Greenwich. A cobertura vegetal e predominantemente de campos. Foram realizadas as seguintes expedições: Em janeiro de 1967 P. I. Schmitz, G. Naue, F. La Salvia, I. I. Basile Becker visitaram 46 sítios, com 138 aterros, fazendo 5 cortes estratigráficos e numerosas coletas superficiais. Pequena nota foi publicada por Schmitz (coordenador 1967). Em janeiro de 1971 P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker e G. Naue fizeram três cortes estratigráficos e, como a chuva impediu a continuação do trabalho de campo, estudaram o material de duas grandes coleções particulares. Em janeiro de 1972 P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker e G. Naue realizaram 13 cortes estratigráficos. Os resultados conseguidos foram os seguintes: A quase totalidade dos sítios são aterros, havendo ao lado deles material erodido ao longo da margem da Lagoa Mirim ou na do arroio Chuí e do Atlântico. Nos aterros há uma fase pré-cerâmica não muito bem definida, seguida por uma fase com cerâmica de tradição Vieira. Os restos de alimentos são predominantemente de caça, mas em alguns dos mais altos os estratos inferiores contêm pequena quantidade de ossos de peixes. 69

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O material da beira da Lagoa Mirim é uma mistura de cerâmica de tradição Vieira com cerâmica de tradição Tupiguarani e pontas líticas pedunculadas com todo um acompanhamento de lascas. A situação não está clara, porque o material ainda é insuficiente e não foi analisado. 4 Pesquisas no Departamento de Treinta y Tres (d):

A área pesquisada abrange os terrenos baixos na margem ocidental da Lagoa Mirim e os terrenos elevados que seguem para o interior. Latitude aproximada entre 32° 45’ e 33° 25’ sul; longitude aproximada entre 53° 30’ e 54°30’ oeste de Greenwich, A cobertura vegetal é predominantemente de campos, mas também existem formações arbóreas. Até 1969 uma equipe local (O. Prieto, A. Alvarez, G. Arbenoiz, J. A. de los Santos, A. Vesidi) tinha estudado aproximadamente 350 sítios de aterros no Departamento e algumas dunas ocupadas ao longo da Lagoa Mirim. Em 1969 P. I. Schmitz e I. I. Basile Becker estiveram algum tempo com a equipe uruguaia, visitando os sítios e estudando o material no Gabinete. Um relatório prévio foi publicado por Prieto et al. (1970). Posteriormente, o trabalho continuou mais lentamente, mas não houve divulgação. Os resultados conseguidos foram os seguintes: Os aterros, que se encontram tanto nas áreas baixas como sobre o alto de cerros, apresentam cerâmica de tradição Vieira. Se existem aterros pré-cerâmicos, não ficou claro. O material lítico é semelhante ao dos aterros de Santa Vitória. Os restos de alimentos são predominantemente de caça. As dunas ocupadas apresentam cerâmica de tradição Vieira e alguma de tradição Tupiguarani. O material da beira da Lagoa Mirim é uma mistura de cerâmica de tradição Vieira com cerâmica de tradição Tupiguarani e pontas líticas pedunculadas com todo um acompanhamento de lascas, como no Município de Santa Vitória do Palmar, na outra margem da lagoa. A situação também aqui não está nada clara. 70

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5 Pesquisas nas Nascentes do Rio Negro (e):

A região pesquisada abrange áreas marginais ao Rio Negro nas suas nascentes e alto curso. A altitude varia de 120 a 160 m.s.n.m. e estamos a grande distância do Oceano e das grandes lagoas. Latitude aproximada entre 31° 30’ e 32° sul; longitude aproximada entre 54° e 54° 45’ oeste de Greenwich. A cobertura vegetal é de campos e matas de galeria. Em janeiro de 1967 F. La Salvia visitou sete sítios de aterros nas nascentes do Rio Negro, no Município de Bagé, com um total de 30 cômoros, mais dois sítios abertos que não são aterros. Uma notícia foi publicada por Schmitz (coordenador 1967). Os dois tipos de sítios apresentam cerâmica de tradição Vieira e pontas de projétil de pedra. Os restos de alimentos são predominantemente de caça. Não há informação sobre sítios pré-cerâmicos e sítios Tupiguarani. A pesquisa está apenas iniciada. No lado uruguaio, Departamento de Rivera, até 1967 Osmar Santos havia registrado mais de 100 aterros na margem direita do Rio Negro. (Santos 1965 e 1967). Os aterros têm cerâmica de tradição Vieira, pontas líticas pedunculadas e os restos de alimentos são predominantemente de caça. Também aqui não há informação sobre sítios pré-cerâmicos ou presença Tupiguarani. A pesquisa no Alto Rio Negro está continuando, mas não houve divulgação dos resultados. 6 Outras Pesquisas Realizadas na Serra do Sudeste (f):

A área pesquisada encontra-se ao sul do Rio Camaquã, abrangendo lugares antes no domínio da floresta subtropical, nos municípios de Piratini e Canguçu. Latitude aproximada entre 30° 50’ e 31° 40’ Sul; longitude aproximada entre 52° 20’ e 53° l5’ oeste de Greenwich. 71

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Em 1969 e 1970 J. Proenza Brochado realizou pesquisas nessa área com os seguintes resultados: Oito sítios (seis cerâmicos, dois sem cerâmica) da fase Piratini, na mata de galeria. O material poderia ser Vieira tardio aculturado com Tupiguarani, ou simplesmente Tupiguarani atípico. 16 sítios cerâmicos da fase Canguçu: Tupiguarani, subtradição Corrugada, ocupação recente, provavelmente posterior ao Descobrimento. Seis Sítios cerâmicos da fase Faxinal, provavelmente neobrasileiro dos séculos XVIII e XIX. O relatório foi publicado por Brochado (1974).

B. As culturas e sua História 1 A Cultura dos Aterros:

Aterros, barrancos ou dunas ocupadas perto dos corpos de água (lagoas, rios, arroios), ocasionalmente também sobre elevações. De forma circular ou alongada. Isolados (Rio Grande), formando agrupamentos (Camaquã, Santa Vitória do Palmar, Treinta y Tres, Bagé, Rivera). Predominantemente de pesca (Rio Grande, na margem ocidental da Lagoa dos Patos), predominantemente de caça (Rio Grande, ao longo do Canal de São Gonçalo e nas outras áreas estudadas menos Piratini e Canguçu). Inicialmente sem cerâmica (fase Patos em Camaquã, fase Lagoa em Rio Grande, pré-cerâmico de Santa Vitória do Palmar, possivelmente também em outras das áreas estudadas): em Rio Grande de ± 500 a.C. até A.D.. Depois com cerâmica de tradição Vieira: primeiro fase Torotama (A.D. - A.D. 200), conhecida por enquanto só de Rio Grande; depois fase Vieira (A.D. 200 - 1.750 em Rio Grande), conhecida de Camaquã, Rio Grande, Santa Vitória do Palmar, Treinta y Tres e Nascentes do Rio Negro. A cerâmica forma uma tradição própria, denominada Vieira por Schmitz e Brochado (1966): possui mais semelhanças com as 72

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tradições cerâmicas platinas do que com as do Planalto Brasileiro. São recipientes simples, rasos, pequenos, com antiplástico mineral, geralmente sem decoração, às vezes com a superfície externa coberta por suaves impressões da polpa do dedo (digitado), roletada ou ponteada; nos períodos iniciais, a base do recipiente pode estar coberta por um engobo branco, como certas cerâmicas do Rio do Prata; no final do período a parede externa pode estar coberta por impressões de cestaria. A tradição cerâmica Vieira ocupa uma área cujos limites parecem encontrar-se, no sul em Rocha e no médiol Rio Negro; no oeste no médio Ibicuí; no norte no Rio Jacuí. Suas datas mais antigas estão localizadas em Rio Grande, na área de nossa pesquisa, donde a cerâmica parece ter-se espalhado e onde podemos acompanhar o seu desenvolvimento por mais de 1.700 anos. O material lítico constitui-se de pedras com covinhas polidas, polidores com depressões alongadas ou aproximadamente circulares, pedras com faces polidas que podem servir como moedores, lascas retocadas ou não. Pontas de projétil de pedra aparecem em Camaquã, nas nascentes do Rio Negro e em Treinta y Tres. O modo de vida do grupo parece ser de caçadores, havendo sítios em que predominam os restos de caça e outros em que predominam os da pesca. Os de pesca são certamente estacionais, os de caça provavelmente também. Certamente a coleta exerce também um papel importante, embora seja difícil descobrir os seus restos com os métodos usados até agora. Depois do contato com os horticultores Tupiguarani (ao redor de A.D, 1.000), certamente assumiram, juntamente com os elementos de cerâmica daquele grupo, também alguns dos seus cultígenos. Os sítios da fase Piratini, cujo significado ate agora estão mal esclarecido, poderiam eventualmente ser tais sítios de cultivo. Como fecha o ciclo anual de abastecimento e a migração estacional, não ficou claro, apesar dos estudos. Os sítios descritos em nosso trabalho são de primavera e verão, acentuando a pesca e provavelmente a coleta, numa localidade rica tanto numa como na outra. Sobre a cultura dos aterros Schmitz e Basile Becker publicaram uma síntese anteriormente (1970).

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2 Os Tupiguarani:

Os sítios são constituídos por manchas de sedimentos escuros, formando agrupamentos em terrenos altos, na Serra do Sudeste, ou sobre os depósitos pleistocênicos, eventualmente sobre os aterros de tradição Vieira nas margens da Lagoa dos Patos. Ocupam terras de mato e inferimos que são horticultores. Dentro da colonização geral do Tupiguarani, a região do Sudeste do Rio Grande do Sul já está na periferia: ali temos os últimos avanços da floresta subtropical para dentro dos campos, que não parecem ambiente propício para o Tupiguarani e por isso são ocupados por caçadores que constroem aterros. Todos os sítios são da subtradição corrugada. A fase mais antiga é a Camaquã, que encontramos ao longo da Lagoa e na Serra em Camaquã. A única data para o Tupiguarani da região e 890 ± 40 a.P., ou A.D. 1.060 para um sítio antigo da fase Camaquã em Rio Grande, dentro da área de nossa pesquisa. A fase Camaquã pode ter continuado até depois do Descobrimento. A fase Canguçu encontra-se na Serra mais para o sul: podem ser contemporâneos e/ou posteriores ao Descobrimento. A fase Faxinal, que só tem alguns elementos possivelmente Tupiguarani, provavelmente é do século XVIII e XIX e se encontra mais para o Sul, onde a mata praticamente já terminou. O Tupiguarani e os construtores de aterros viveram lado a lado; os últimos aceitaram cerâmica e provavelmente outros elementos dos primeiros; o intercâmbio não parece ter funcionado intensamente no sentido contrário. Com a entrada do Tupiguarani, a área dos construtores de aterros ficou reduzida, mas não está claro se isso pode ter interferido no seu padrão de assentamento e como isso se poderia ter verificado. A influência do Tupiguarani, manifestada na cerâmica, foi veiculada, chegando espacialmente muito mais longe do que as aldeias do grupo horticultor, atingindo áreas de campo, onde o seu sistema de cultivo já parece impossível. 3 Os sítios de Contato:

Os sítios apresentam-se como áreas erodidas entre dunas, geralmente sobre a Formação Chuí (segundo denominação de Carraro 74

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et al. 1974), onde se encontra, além de material europeu variado, cerâmica de tradição Vieira, geralmente também cerâmica de tradição Tupiguarani e implementos líticos variados: pedras com facetas polidas convexas, bolas de boleadeira, pedras com covinhas, lascas abundantes, fragmentos de implementes, batedores, alisadores de arenito ou cerâmica, machados, talhadores, lascas retocadas, pedras de chispa, pequenos bifaces amidalóides, furadores, raspadores, lascas com pontas simples ou com pontas entre entalhes, pontas de projétil pedunculadas. Se existem estratos, os mesmos são muito delgados e parecem indicar uma ocupação curta, apesar da quantidade do material. Esse tipo de sítio, cuja formação ainda desconhecemos, existe tanto no município de Rio Grande, como de Santa Vitoria do PaImar e Treinta y Tres. Às vezes parece faltar um dos elementos, mas isso pode ser explicado pelo fato de que quase todas as coletas foram feitas por amadores. Supomos que esse tipo de sítio corresponde aos Minuano históricos, mas não está nada claro como se associaram os elementos. Cerâmica de tradição Vieira e de tradição Tupiguarani se encontram no mesmo sítio desde muito tempo, mas não está esclarecido como se acrescentaram as pontas pedunculadas e a rica indústria lítica ao tempo do contato com o português. Ao tempo da colonização portuguesa existem na área, além dos Minuano, outros grupos indígenas, mas a probabilidade de que os sítios sejam de algum desses outros grupos parece menor. De qualquer maneira damos, a seguir, uma rápida visão da colonização portuguesa e dos seus contatos com os grupos indígenas. 4 A Colonização Portuguesa e o Contato com os Índios:

Desde o começo do século XVII e talvez já desde fins do século XVI, moradores do atual estado de São Paulo preiam índios no litoral do Rio Grande do Sul e provavelmente penetram pela Lagoa dos Patos para subir o Rio Jacuí com os seus batelães. Que influência exerceriam na vida dos caçadores indígenas da margem da Lagoa ou dos índios horticultores da Serra do Sudeste não consta 75

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em nenhum documento. O contato permanente com os primeiros começa mais tarde. A fundação de Rio Grande está ligada diretamente com a criação da Colônia do Sacramento, em 1680, junto ao Rio da Prata, até onde o português queria estender o seu domínio. Em 1684, funda-se Laguna, em território atualmente brasileiro, como posto intermediário entre a Colônia do Sacramento e a área de população portuguesa mais densa, que se situava ao redor de São Paulo e Rio de Janeiro. Mas da Laguna até a Colônia do Sacramento se estendia uma grande área de terra, cujo interior (a Serra do Sudeste e os campos que a seguem) os jesuítas espanhóis das reduções haviam ocupado, estabelecendo ali as estâncias para o abastecimento dos índios cristianizados. A parte não ocupada pelas estâncias missioneiras estava em poder dos Minuano e Charrua, nômades, inimigos das reduções e dos espanhóis e que se tornariam amigos dos portugueses. Em 1715 o governador do Rio de Janeiro, capitão Francisco de Távora, ordenou a Francisco de Brito Peixoto, capitão-mor da vila de Laguna e seu povoador, que fizesse examinar as campanhas do sul até a Colônia do Sacramento, sem propósito de fixação, e pesquisar se algum daqueles sítios se achava ocupado por estrangeiros. Expediu ele a esta diligência cinco homens brancos com alguns escravos, os quais, depois de tudo explorarem até a aldeia dos índios Charrua de São Domingos Soriano, ao voltar com a notícia de que se conservaram desimpedidos aqueles sítios, foram atacados, aprisionados e despojados de armas e roupa por um troço considerável de índios, de cujo cativeiro, passados tempos, conseguiram escapar. Em 1725 parte de Laguna a segunda expedição chefiada por João de Magalhães, genro de Francisco de Brito Peixoto, rumo ao Prata, descendo pela orla marítima, ao Flanco da Serra Geral. Nessa investida disseminou João de Magalhães os seus companheiros de aventura pela faixa litorânea, com o propósito de concretizar o fato decisivo da posse. João de Magalhães levantou arranchamento ao norte da barra de Rio Grande, no lugar onde hoje está São José do Norte. Construiu canoas, com que transpôs o canal e entrou em relações amistosas com os índios Minuano e Charrua, que dominavam a vasta campanha. 76

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Em 1726 Cristovão Pereira estabeleceu um caminho entre Laguna e a Colônia do Sacramento, que foi continuado de 1728 a 1730 por Souza Faria em direção a São Paulo. Com isso estava esboçado o celebre “caminho do sul”, ou ainda o “caminho do gado”, “caminho das tropas”, por onde circulariam as correntes povoadoras de maior projeção para o Brasil Meridional e pelo qual se levariam as tropas de muares do pampa gaúcho e uruguaio até as regiões auríferas de São Paulo e Minas. (Alguns sítios arqueológicos, onde encontramos material indígena misturado com o europeu, encontram-se ao lado desses velhos caminhos, que passavam entre as lagoas e o mar). Cristóvão Pereira travara relações de amizade com os índios Minuano, que dominavam a bacia da Lagoa Mirim, e deles recebia quantidade considerável de gado para abater. Mais tarde ainda eram esses silvícolas os fornecedores de cavalhadas que transportavam para as feiras do Norte. Foi ainda ele quem levou à pia batismal dezenas de Minuano, que receberam o batismo no Presídio de Rio Grande, em 1738 (Porto, 1943 I:358). Ainda conseguiu Cristóvão Pereira que os Minuano se fossem situar nas proximidades de São Miguel, ao sul do arroio Chuí, para acorrer à defesa dessa fortificação. Tinham, ao mesmo tempo, a incumbência de correr gado e cavalhadas pelo Pampa, os quais eram comprados pelos portugueses. (Porto 1943 I:386). Na faixa de terras do Albardão, entre a Lagoa Mirim e o Oceano, bem como ao longo do caminho do gado, formaram-se, com o correr do tempo, diversos estabelecimentos para a criação. Começado o povoamento dessas paragens pelo estabelecimento de estâncias e postos militares, o governador do Rio de Janeiro, Gomes Freire de Andrade, resolveu ocupá-las militarmente. Coube essa tarefa ao brigadeiro José da Silva Pais, que, transpondo a barra do Rio Grande, desembarcou com a sua força de 200 homens, a 19 de fevereiro de 1737. Em dezembro do mesmo ano o capitão João de Távora, que se presume ser cunhado de Cristóvão Pereira e companheiro no desbravamento e consolidação do Presídio de Rio Grande, trouxe de Laguna duas dezenas de homens, entre índios e brancos, destinados a trabalhar nas obras de fortificação da barra. Mais tarde foi a Santos, trazendo de São Paulo perto de 200 índios casados das aldeias del-rei. Este é o segundo grupo de 77

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índios que encontramos e nos podem interessar no trabalho. (Naue et al. 1971:92-93). O terceiro grupo de Índios são os Tape ou Guarani das reduções, que cuidavam do gado nas estâncias jesuíticas não muito longe da área ocupada pelos portugueses e desde as primeiras entradas hostilizavam os novos ocupantes. (Porto 1943 I:367). Esses são os três grupos indígenas encontrados pelos portugueses. Não temos razões seguras, mas apenas uma hipótese de que os sítios de contato seriam dos Minuano. Há pouca probabilidade de que os sítios sejam dos índios das aldeias del-rei, que não teriam cerâmica Vieira e já deveriam estar fortemente europeizados. É praticamente impossível que sejam dos Tape ou Guarani, que também não tinham cerâmica Vieira e entrariam na área apenas esporadicamente para atacar os portugueses. Um melhor conhecimento da evolução da cultura local pode, entretanto, mudar esta colocação.

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IV OS SÍTIOS ESTUDADOS

A. Características dos Sítios Os sítios estudados são pequenos cômoros, acumulados pelo homem, constituídos de sedimentos arenosos, escuros, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal, em menor quantidade de origem vegetal, localizados sobre os terraços holocênicos da margem ocidental da Lagoa dos Patos, na parte mais próxima à sua barra. Excepcionalmente se encontram os mesmos sítios sobre o barranco do Pleistoceno. Os sítios sobressaem do terreno circundante, razão por que são localmente conhecidos como “cerritos”, e servem de abrigo para o gado no período de inverno. A maior parte é construída diretamente sobre areia clara, mas nos que dão para o Canal de São Gonçalo geralmente encontramos subjacente uma camada argilosa, ou areno-argilosa. A área varia de 800 m2 a 11.000 m2. A altura atual vai de 30 a 125 cm. Devido à intensa destruição dos mesmos pela fábrica de adubos Caruccio, de Pelotas, que durante 20 anos extraiu restos orgânicos dos mesmos, a forma e a altura atuais não são sempre a forma e altura originais. Também contribuem para isso intensamente os trabalhos agrícolas nos sítios que dão para o Saco do Arraial, onde as chácaras ocupam todos os terraços holocênicos, como também na outra área, onde se escolhe a terra mais alta e fértil para realizar pequenas plantações. A forma é arredondada ou elíptica, e a parte central mais alta que as bordas. A vegetação, devido à maior fertilidade, caracteriza-se por ervas altas de terras perturbadas. Os estratos dos sítios estudados não são muito diferenciados ou estruturados, encontrando-se níveis ou lentes de ossos, soltos ou 81

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conglomerados, lugares de fogueiras, mas sem marcação de pedras, excepcionalmente covas ou sepultamentos. Quando os sedimentos por baixo dos estratos arqueológicos são claros, podem-se observar evidências de estacas, com um diâmetro de 7 a 8 cm. Como os cortes são relativamente pequenos e a remoção foi feita em níveis artificiais, não se puderam observar associações, notando-se apenas que a cerâmica aparece mais abundante nos lugares das fogueiras. Em nenhuma das covas foram encontrados restos humanos suficientes para estabelecer uma forma de sepultamento. Os restos culturais aparecem em todos os estratos, não se notando camadas naturais estéreis ou acúmulos humanos sem material arqueológico. Se o cômoro não parece ter surgido meramente pelo abandono de restos de alimentos e elementos culturais, não está claro se os sedimentos agregados (geralmente areia) são resultado da ação humana ou natural. Os elementos culturais mais numerosos nos sítios são cacos de cerâmica. Os implementos líticos, ósseos e conchíferos são raros. Os restos de alimentos mais abundantes são os de origem animal, predominando absolutamente o peixe, seguindo os crustáceos, moluscos, mamíferos e aves. Por essa razão denominamos os sítios de lugares de pesca. Os restos de alimentos vegetais são mais raros, constituindo-se praticamente de coquinhos calcinados, inteiros ou quebrados. Nos sítios que possuem estratos conservados, foi possível fazer cortes estratigráficos, com o que se conseguiram amostras mais significativas. Nos sítios muito revolvidos, fizeram-se coletas superficiais, conseguindo-se amostras muito menos ricas para os nossos objetivos. Os sítios mais antigos têm uma parte pré-cerâmica, sobre a qual existem estratos cerâmicos. Não encontramos, nessa seqüência, nenhum sítio totalmente pré-cerâmico. Nos mais recentes existe além da cerâmica de tradição Vieira, também cerâmica de tradição Tupiguarani. 82

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B. Cronologia dos Sítios O tempo coberto pelos sítios estudados é de aproximadamente 2.000 anos, começando em meados do primeiro milênio a.C. e estendendo-se provavelmente até a ocupação portuguesa da área, no século XVIII. Quatro dos sítios por nós estudados têm datação de Carbono 14. Para maior segurança, usamos também as 4 datas conseguidas para o conjunto de sítios do RS-RG-01, escavados por Naue (s.d.) e datados por nosso intermédio, e a data para o sítio RS-RG-02 (Tupiguarani) conseguida na mesma oportunidade. 1. Período Pré-cerâmico

Há 4 datas para o período pré-cerâmico: 2.435 ± 85 a.P. ou 485 a.C. (SI-1006) para o nível de 30-40 cm do corte I do sítio RS-RG-21, que está sobre o terraço B, mas afastado da sua borda. 2.160 ± 80 a.P. ou 210 a.C. (SI-1194) para o nível de 40-50 cm do corte I do RS-RG-01 (04), que está sobre o terraço B, mas afastado da sua borda. 2.000 ± 120 a.P. ou 50 a.C. (SI-1193) para o nível de 30-40 cm do corte I do RS-RG-01 (04), que está sobre o terraço B, mas afastado da sua borda. 2.020 ± 50 a.P. ou 70 a.C. (SI-1008) para o nível de 40-60 cm do corte I do RS-RG-49, que está sobre o terraço B, mas afastado da borda. Embora haja 2 fragmentos de cerâmica no nível, preferimos pensar que a cerâmica pode estar ali por fatores mecânicos, uma vez que ao aparece com certa abundancia até 40 cm de profundidade. Dessa forma, podemos estabelecer para o período pré-cerâmico os limites de aproximadamente 500 a.C. até A.D. A fase é Lagoa, subtradição Lagoa, tradição Itaipu. Pertencem a essa fase três dos sítios por nós estudados, na sua parte inferior: RS-RG-21, RS-RG-50, RS-RG-49. Do RS-RG-01, estudado por Naue, o Cerrito 04, totalmente pré-cerâmico. 83

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Caracteriza-se a fase pela ausência da cerâmica, sendo os demais elementos comuns às fases cerâmicas. 2. Período Cerâmico

Esse período é dividido em 2 fases: fase Torotama e fase Vieira. Fase Torotama: Não temos datas de C14 para essa fase. Os estratos que lhe correspondem, estão imediatamente sobre os da fase pré-cerâmica Lagoa, da qual se distingue por ter uma cerâmica incipiente, mas abundante. Pela seriação dos elementos cerâmicos, ela parece imediatamente anterior à parte inicial da fase Vieira, com a qual forma uma certa continuidade. Assim, a fase Torotama parece o elo de ligação entre a fase pré-cerâmica Lagoa e a fase Vieira, com cerâmica já estabelecida. Tentativamente, colocamos o seu início ao redor de A.D. e o seu final no século III d.C. Os estratos, que correspondem à fase Torotama, são os 20 cm superficiais do RS-RG-21, que está sobre o terraço B, mas afastado da sua borda, e os 40 cm superficiais do RS-RG-50, que está sobre o terraço B, mas afastado da Borda. Nem no RS-RG-01, escavado por Naue, nem nas outras localidades por nós estudadas, apareceram novos estratos correspondentes à fase Torotama. Fase Vieira: Há 4 datas para a fase Vieira: 1335 ± 45 a.P. ou A.D. 595 (SI-1007) para o nível de 80-100 cm do corte A3 do RS-RG-48, sobre a borda do terraço B. 1080 ± 90 a.P. ou A.D. 870 (SI-1192) para o nível de 40 - 50 cm do corte I do RS-RG-01 (01), que está sobre a borda do terraço B. 845 ± 75 a.P. ou A.D. 1105 (SI-1005) para o nível de 20-40 cm do corte I do RS-RG-04, sobre o barranco do Pleistoceno. 200 ± 80 a.P. ou A.D. 1750 (SI-1191) para o nível de 10-20 cm do corte I do RS-RG-01 (05), sobre a borda do terraço A. Pela 84

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seriação da cerâmica e a posição no terraço este sítio é imediatamente posterior ao RS-RG-08, o mais recente de nossa seqüência. Tentativamente, colocamos o começo da fase Vieira ao redor de inícios do século III e o seu fim depois da ocupação portuguesa de Rio Grande, na primeira metade do século XVIII. Pertencem a ela os seguintes sítios da nossa seqüência: os 40 cm superficiais do RS-RG-49, o RS-RG-20, RS-RG-48, s/n (perto do RS-RG-20), RS-RG-10, RS-RG-14, RS-RG-28, RS-RG-04, RSRG-08, RS-RG-03 (01 e 2/5). Do RS-RG-01, escavado por Naue, os cerritos 01, 06, 05. Para de alguma forma diferenciar as várias partes de uma fase muito longa, podemos distinguir o Vieira inicial, correspondente aos estratos superficiais do sítio RS-RG-49 e aos sítios RS-RG-20, RS-RG-48, que tentativamente colocamos entre o século III e IX; o Vieira final, já em contato com o Tupiguarani e correspondente à parte superficial dos sítios RS-RG-04 (?), RS-RG-08, RS-RG-14, RS-RG-28, RS-RG-10, RS-RG-03 (01 e 2/5), que tentativamente colocamos entre o século XIII e XVIII; do Vieira médio são os estratos ou sítios restantes. A fase Vieira distingue-se da fase Torotama, mais por características da cerâmica do que por qualquer outra coisa; no Vieira final, podem-se notar localizações sobre o barranco do Pleistoceno (RS-RG-04), RS-RG-03 (2/5), RS-RG-28 (?), que poderiam indicar o peso da aculturação na escolha dos lugares de acampamento. Fora da nossa série temos ainda os sítios Tupiguarani da fase Camaquã, sobre o barranco do Pleistoceno a apenas algumas centenas de metros. O RS-RG-02 (01), escavado por Naue (s.d.), deu 890 ± 40 a.P, ou A.D. 1060 (51-1190). Essa proximidade, já num período antigo, pode explicar a intensidade do contato com o grupo Vieira e a reocupação de sítios de tradição Vieira por grupos de tradição Tupiguarani. Também fora de nossa série estão os sítios de contato com os europeus, no século XVIII, e que denominamos fase Bojuru (Schmitz e Brochado 1972:6). 85

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C. Descrição dos Sítios Sítio Arqueológico RS-RG-50 1. Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Oscar Mendes, Barra Falsa, Município de Rio Grande, RS. Dista da Lagoa aproximadamente 750 m. Está sobre o terraço B, distando de sua borda 300 m. O barranco do Pleistoceno dista aproximadamente um quilômetro, estando o espaço intermédio ocupado por campos baixos, com pequenos Capões de mato. Mede 135 X 83,50 m. Os estratos têm espessura de 100 cm, elevando-se o todo bastante sobre o terreno circundante. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica superficial. A área do sítio é cultivada desde muito tempo, encontrando-se sobre o mesmo, além da chácara, plantações de árvores frutíferas e eucaliptos. Num dos extremos está a morada do proprietário. A vegetação dos arredores são gramíneas de campos úmidos e grupos de árvores formando capões. Apesar de o sítio estar sendo cultivado desde muito tempo (uns 50 anos), apenas os 14 cm superficiais estão revolvidos. No lugar do corte, entretanto, puderam notar-se diversas tocas de tatu. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em começos de 1966, P. I. Schmitz e J. Proenza Brochado visitaram o sítio e preencheram a ficha do IPHAN. A pequena coleta superficial feita na data se encontra no Museu Rio-Grandense de História Natural, Porto Alegre. 86

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Em princípios de 1969 foi feita nova visita por P. I. Schmitz, F. La Salvia, G. Naue, M. H. Abrahão Schorr e I. I. Basile Becker, fazendo-se outra coleta superficial, que ficou com G. Naue. Corte Estratigráfico: De 10 a 13/3/72, P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker e G. Naue realizaram um corte estratigráfico, no centro do sítio. Corte 2 X 2 m. Remoção do depósito em níveis artificiais de 20 cm de espessura. Todo o material foi peneirado com malha de 3 mm. Os buracos de tatu são responsáveis pela mistura de material do estrato: os restos de alimentos não servem para estudo quantitativo; a cerâmica nos lugares não perturbados chega até o nível II, ao passo que nos perturbados chegam cacos até quase a base. O estrato parece uniforme. A descrição é feita de acordo com os níveis artificiais da escavação. 0 - 20 cm: Os primeiros 14 cm foram revolvidos pelo cultivo e se apresentam soltos, marromavermelhados. No resto do nível o depósito se apresenta arenoso, com húmus, marrom-escuro, solto. Cerâmica de tradição Vieira (fase Torotama), restos de alimentos. 20 - 40 cm: Depósito arenoso, escuro, mais úmido, solto. Cerâmica, algumas lascas, restos de alimentos, principalmente ossos de peixes, poucos coquinhos calcinados. 40 - 60 cm: Depósito arenoso igual, mais úmido. Pouca cerâmica em áreas perturbadas, restos de alimentos aumentam muito. Duas lentes (tamanho 15 X 25 cm), compostos quase exclusivamente de otólitos de peixes, alguns ossos calcinados. 60 - 80 cm: Depósito arenoso igual, úmido, quase preto, um caco de cerâmica em cova de tatu, restos de alimentes: peixes, pequenos roedores, 87

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coquinhos calcinados inteiros ou quebrados. Continuam as lentes com otólitos. 80 - 100 cm: 80-90 cm: depósito arenoso igual com intrusões de areia clara nas covas de tatu. Caco de cerâmica em área perturbada, restos de alimentos em menor quantidade. 90-100 cm: depósito mais claro, só com algumas manchas escuras. Aos 100 cm areia clara, limpa, fofa. Sobre a mesma se reconhecem 17 evidências de estacas, que se aprofundam 20 cm. 100 - 160 cm: Depósito arenoso claro, sem material arqueológico e sem perturbações. Coletas superficiais: Em 13/3/72 foi feita uma coleta sistemática em toda a superfície do sítio. Outra só na superfície do lugar delimitado para o corte. Em janeiro de 1976 foi feita outra coleta sistemática em parte da superfície. 3. Identificação Cultural e Datação:

A parte pré-cerâmica, níveis III a VI, pertence à fase Lagoa; a parte cerâmica, níveis I e II, pertence à fase Torotama, tradição Vieira. Os poucos cacos Tupiguarani devem ser de reocupação Tupiguarani. Não há data de C14. Pela seriação, a parte superficial cai no setor mais antigo do período cerâmico. A parte pré-cerâmica, tomandose em consideração a distância da borda do terraço, provavelmente corresponde às ocupações mais antigas da área.

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Figura 5 – RS-RG-50 - Croqui do sítio.

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Figura 6 – Perfil do corte I e planta baixa. 90

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Sítio Arqueológico RS-RG-49 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Oscar Mendes, Barra Falsa, Município de Rio Grande, RS. Dista da Lagoa aproximadamente 550 m. Está sobre o terraço B, distando 100 m da sua borda. O sítio RS-RG-50 está a 200 m em direção ao barranco do Pleistoceno. Mede 90 x 120 m. O ponto mais alto (onde foram acumulados restos pela fábrica de adubos) está 200 cm sobre a base. Os estratos têm, no lugar do corte estratigráfico II, 120 cm de espessura e o sítio se destaca perfeitamente dos terrenos planos adjacentes. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal, elementos culturais, principalmente cerâmica na parte de superfície. Sobre o sítio existem gramíneas de campo limpo, ao passo que ao redor do mesmo cresceu um anel de árvores, com infra-estrutura de gravatá. Os demais dados como no RS-RG-50. O sítio foi grandemente danificado pela fabrica de adubos Caruccio, de Pelotas, que o explorou durante anos, retirando materiais ósseos e outros restos orgânicos. Na escavação desses materiais apareceram vários esqueletos, segundo informações do proprietário. Até alguns anos atrás, um irmão deste, que morava nos arredores, utilizou o cômoro, devido à sua fertilidade e altura, para fazer suas chácaras. O local apresenta uma profunda e larga escavação na parte central, onde também se encontram os montículos formados pela areia resultante da peneiração dos restos orgânicos, mas na periferia e no local de acesso dos caminhões existem áreas intatas, onde foram realizados cortes. 2. Trabalhos Realizados:

Corte Estratigráfico I: Em 21/2/66, P. I. Schmitz e J. Proenza Brochado fizeram um 91

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corte estratigráfico de 1,5 X 1,5 m à beira da área demolida pela fábrica de adubos. O material encontra-se no Museu Rio-Grandense de História Natural e não foi aqui incluído. Inicialmente foi cortada uma fina camada superficial, numa espessura de 5 cm, para retirar o capim. A remoção do depósito foi feita em níveis artificiais de 15 cm de espessura. 05 - 20 cm: Depósito arenoso, cinzento, solto, revolvido pelo cultivo. Cacos de cerâmica de tradição Vieira (fase Vieira), restos de alimentos de origem animal, principalmente peixes. 20 - 35 cm: Depósito semelhante, mais escuro, mais solto. Poucos cacos de cerâmica, muitos restos de alimentos de origem animal e coquinhos calcinados; carvão. 35 - 50 cm: Depósito semelhante. Pouca cerâmica, restos de alimentos de origem animal e coquinhos. Uma amostra de carvão recolhida na superfície do nível, onde se encontrava uma lente de coquinhos calcinados por cima de um estrato de ossos amarelados, proporcionou a data de 2020 ± 50 a.P. ou 70 a.C. (SI-1008). 50 65 cm: Depósito semelhante. Uma pedra sem evidências de modificação ou uso, muitos restos animais. 65 - 80 cm: Igual ao anterior. 80 - 145 cm: Continuam os estratos arqueológicos, mas sem cerâmica ou pedras. 145 cm em diante: Areia clara, sem material arqueológico e sem perturbações. 92

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Corte Estratigráfico II: Entre 5/2 e 11/2/70, P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker, G. Naue e M. H. Abrahão Schorr realizaram outro corte estratigráfico no lugar de acesso dos caminhões. Esse corte dista aproximadamente 20 m do anterior. Corte 2 X 1,5 m. Remoção dos estratos em níveis artificiais de 20 cm. Todo o material foi peneirado, usando se uma malha de 3 mm. O estrato é bastante uniforme, razão por que é descrito segundo os níveis artificiais de escavação. 0 - 20 cm: Os primeiros 10 cm são constituídos por leivas. 10 - 20 cm: depósito arenoso, com húmus, marrom-escuro, solto. Cerâmica, lascas, restos de alimentos de origem animal. A cerâmica diminui para o fim do nível. 20 - 40 cm: Depósito arenoso, marrom-escuro, um pouco mais compacto. Raríssima cerâmica, aparecendo principalmente no início do nível; restos de alimentos de origem animal soltos ou em conglomerados, grande quantidade de coquinhos calcinados. 40 - 60 cm: Deposito igual. Sem cerâmica. Muitos conglomerados de ossos. 60 - 80 cm: Depósito igual. Dois cacos de cerâmica, possivelmente provenientes de camadas superiores. Ossos trabalhados. Grande quantidade de ossos (soltos ou conglomerados) e coquinhos calcinados. O estrato se torna mais arenoso e mais claro. 80 - 100 cm: Depósito mais claro, com presença de lentes de areia bem limpa. Abundantes ossos e coquinhos calcinados. 93

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100 - 120 cm: Depósito arenoso, de cor amarelada, bastante úmido, entremeado de finos estratos com material arqueológico: ossos e coquinhos. Daí para baixo areia mais clara, sem material arqueológico. Coletas Sistemáticas Entre 5/2 e 11/2/70, foi realizada uma coleta sistemática de superfície, que deu pouco material, devido à grama que cobre tudo.

3. Identificação Cultural e Datação A parte pré-cerâmica, níveis III a VI (corte II), pertence à fase Lagoa; a parte cerâmica, níveis I e II, pertence à fase Vieira inicial, tradição Vieira. Os cacos Tupiguarani devem provir de reocupação do sítio. Amostra de carvão do nível 35-50 (corte I) deu a data de 2020 ± 50 a. P. ou 70 a.C. (SI-1008). Representa, provavelmente, o fim do período pré-cerâmico e o início do cerâmico. Pela seriação, a cerâmica é a mais antiga da fase Vieira.

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Figura 7 – RS-RG-49 – Croqui do sítio.

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Figura 8- RS-RG-49 – Perfil do corte II 96

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Sítio Arqueológico s/n (RS-RG-49) S /n (junto ao RS-RG-49)

Na mesma propriedade que o RS-RG-49 e distando do mesmo aproximadamente 300 m, encontra-se um sítio sem número e não estudado. Dista da Lagoa 250 m. Está sobre o terraço B, distando apenas uns 10 m da sua borda. Trata-se de um sítio grande, com 165 cm de altura sobre o terraço, totalmente rodeado e coberto de vegetação arbórea. O ambiente é o mesmo do RS-RG-50 e 49. Na Superfície foi encontrada cerâmica, mas nenhum corte foi realizado.

Sítio Arqueológico RS-RG-21 1. Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Oscar Abreu, Rincão Bravo, Município de Rio Grande, RS. Dista aproximadamente 200 m do banhado que dá na Lagoa do Peixe. Está sobre o terraço B, distando da sua borda cerca de 100 m. O barranco do Pleistoceno, que tem perto de 8 m de altura, dista um quilômetro, estando o espaço intermédio coberto por campos baixos e úmidos e junto ao Pleistoceno, inclusive por uma área pantanosa. Tem um diâmetro de aproximadamente 90 m, com bordas mal definidas. Eleva-se apenas sobre o terreno circundante, tendo os estratos uma espessura de 45 cm. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica superficial. A área é cultivada desde muito tempo. A vegetação dos arredores são gramíneas de campos limpos e nos trechos mais úmidos há 97

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vegetações características. A vegetação mais alta é toda plantada: bambu, eucalipto, árvores frutíferas e de sombra. Na periferia está a morada do proprietário. Apesar de o sítio estar sendo cultivado desde muitos anos, o revolvimento da terra não parece ter atingido mais de 10 cm, encontrando-se por baixo estratos intocados. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em 9/3/68, G. Naue visitou o sítio com companheiros do Colégio São Francisco, de Rio Grande, tendo preenchido nessa data a ficha de identificação para o IPHAN, registrando como material recolhido pedras lascadas e cerâmica Tupiguarani. Posteriormente, a pedido do proprietário, escavou uma urna Tupiguarani, na qual havia ossos de infante (Naue, inf. Pessoal). Corte Estratigráfico Em 12/2/70, P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker e G. Naue realizaram um rápido corte estratigráfico, a uns 5 m do lugar onde Naue havia escavado a urna Tupiguarani. Tinha o corte por objeto verificar os estratos arqueológicos e identificar os componentes culturais, uma vez que na superfície havia cerâmica Tupiguarani, mas o aspecto geral do sítio era de pesca. Corte 2 X 1,5 m perto do centro do sítio. Remoção do depósito em níveis artificiais de 10 cm de espessura. Revisão com colher de pedreiro e parte do material peneirado com malha de 10 e de 3 mm. O estrato parece uniforme. A descrição é feita de acordo com os níveis artificiais da escavação. 0 - 10 cm: Depósito arenoso com húmus, de coloração pardo-escura, bastante solto, revolvido pelo arado. Restos de plantas cultivadas. Cacos de cerâmica Tupiguarani e Vieira (fase Torotama), restos de alimentos, que não foram recolhidos. 98

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10 - 20 cm: Depósito arenoso de coloração parda, tendendo a marrom, mais consistente. Cacos de cerâmica Tupiguarani e Vieira (fase Torotama), uma pedra-com-covinhas, duas pontas de osso, restos de alimentos: peixes, crustáceos, moluscos, mamíferos, aves, muitos coquinhos calcinados. Conglomerados de ossos em lugares de fogueiras. 20 - 30 cm: Depósito igual ao anterior. Duas pedras-com-covinhas. Sem cerâmica. Os coquinhos, abundantes, geralmente quebrados. Mais conglomerados no lugar das fogueiras. 30 - 40 cm: Depósito mais escuro e úmido, formado quase só de restos de alimentos. Mais conglomerados. Em direção à base clareando. 40 - 50 cm: Depósito inicialmente escuro, depois amarelado, arenoso com alguma argila, onde se notam algumas intrusões escuras. Coletas Superficiais: Em 12/2/70 foi feita em todo o sítio uma coleta superficial, que ficou com G. Naue. Em 28/1/76 foi feita, em todo o sítio, outra coleta superficial que ficou com P. I. Schmitz. 3. Identificação Cultural e Datação:

A parte pré-cerâmica, níveis III e IV, pertence à fase Lagoa; na parte cerâmica, níveis I e II, estão misturados elementos de tradição Tupiguarani com elementos de tradição Vieira (fase Torotama), certamente por mistura mecânica. O sítio pré-cerâmico deve ter evoluído para cerâmica primitiva; muito mais tarde foi reocupado por grupo de tradição Tupiguarani. 99

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Amostra de carvão do nível 30-40 cm foi datada por C14 em 2.435 ± 85 a.P., ou 485 a.C. (SI-1006).

Figura 9 – RS-RG-21- Croqui do sítio. 100

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Figura 10 – RS-RG-21 – Perfil do corte I. 101

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Sítio Arqueológico RS-RG-20 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Anibal Rocha, Barra Falsa, Município de Rio Grande, RS. Dista do banhado, que dá na Lagoa do Peixe, 70 m. Está sobre o terraço B. O barranco do Pleistoceno dista uns 2 km. Está na proximidade de outro sítio s/n (junto ao RS-RG-20), que está a uns 500 m. (Foto 3) Tem um diâmetro de 33 m, 125 cm de altura, destacando-se bem no ambiente. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica, que se encontra em toda a espessura das camadas. Sobre o sítio crescem ervas típicas de áreas perturbadas e mais férteis ao passo que ao redor há gramíneas baixas de campos limpos e nas áreas úmidas vegetação característica dos banhados. O sítio estava intato. 2. Trabalhos Realizados:

Primeira visita: Em 21/6/66, P. I. Schmitz e J. Proenza Brochado preencheram a ficha do IPHAN e coletaram pequena amostra, que ficou no Museu Rio-Grandense de Historia Natural. Corte Estratigráfico: De 22 a 24/1/69, P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker, G. Naue, M. H. Abrahão Schorr e F. La Salvia fizeram um corte estratigráfico de 2 X 2 m no topo do sítio. O depósito foi removido em níveis artificiais de 20 cm de espessura e parcialmente revisado com colher de pedreiro, parcialmente peneirado com peneira de 10 e 3 mm de malha. 102

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Um outro corte de 2 X 2 m foi começado, mas teve de ser interrompido devido às chuvas. O estrato apresenta-se bastante uniforme, como o dos outros sítios da área. Descrevemos os níveis artificiais. 0 - 20 cm: Depósito arenoso, com húmus, marrom, compactado. Cerâmica, algumas lascas, restos de alimentos de origem animal. 20 - 40 cm: Depósito igual, pouco compactado. Cerâmica, pequenos seixos, ossos soltos e conglomerados. Carvão. 40 - 60 cm: Depósito igual. 60 - 80 cm: Depósito igual. Um fragmento de lâmina de machado. 80 - 100 cm: Depósito igual. Um osso trabalhado. Ao final do nível apareceram restos de um esqueleto de infante, parecendo ser dois pedaços de fêmures ossos da perna e do pé em cova em posição que parecia de enterro primário. O resto do esqueleto estava dentro da parede e não foi escavado, nem levantado. 100 - 120 cm: Depósito arenoso, marrom, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal; não há conglomerados. Carvão. 120 - 140 cm: Estratos de ossos até 137 cm. Depois um horizonte de argila de uns 10 cm de espessura. A seguir, areia clara. Nos níveis até 100 cm de profundidade, existem conglomerados de ossos bem típicos em círculos: contém ossos calcinados. Sobre os círculos ou ao redor desses costumam aparecer os restos de alimentos. A partir dos 100 cm, existem estratos de ossos soltos. 103

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3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é totalmente cerâmico, pertencendo à fase Vieira inicial. Pela seriação da cerâmica está localizado entre o RS-RG-49 e o RS-RG-48.

Figura 11 – RS-RG-20 – Croqui do sítio. 104

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Sítio arqueológico s/n (junto a RS-RG-20) 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Aníbal Rocha, Barra Falsa, Município de Rio Grande, RS. Dista aproximadamente 1,5 km do banhado, que acompanha o Canal de São Gonçalo: do Canal uns 6 km, mais ou menos a mesma coisa da Lagoa dos Patos. Está sobre o terraço B, na sua borda. Dista uns 500 m do RS-RG-20. Mede aproximadamente 60 X 40 m. Os estratos têm 30 cm de espessura e o sítio quase não se distingue do resto do terraço. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, argilo-arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica. A área do sítio é cultivada desde muito tempo. Ao redor são campos limpos e só mais adiante, onde a borda do terraço é mais saliente, existem árvores nativas. O sítio está sendo cultivado desde muito tempo e a parte superficial está revolvida; em profundidade existe pequena parcela de estratos intocados. 2. Trabalhos Realizados:

Em janeiro de 1976, foi feito o levantamento do sítio e uma amostra de superfície numa área de 44 X 14 m. 3. Identificação Cultural e Datação:

Sítio totalmente cerâmico, da fase Vieira, período médio.

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Figura 12 - S/n (RS-RG-20) – Croqui do sítio.

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Sítio Arqueológico RS-RG-48 1. Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Oscar Mendes, Barra Falsa, Município de Rio Grande, RS. Dista do Banhado que acompanha o canal de São Gonçalo uns 1.500 m; do canal uns 4.500 m; da Lagoa dos Patos uns 3.000 m. Está sobre o terraço B, praticamente na borda do mesmo. O barranco do Pleistoceno distará uns 3.500 m. (Foto 4) Mede 32 X 26 m. Os estratos têm uma espessura de 100 cm e o sítio se destaca perfeitamente dos arredores. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, areno-argilosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, sendo totalmente cerâmico. Sobre o sítio existem plantas típicas de terrenos revolvidos e mais férteis e ao redor estão campos úmidos cobertos de gramíneas, havendo bosques sobre o terraço; a área inferior ao terraço (terraço A) não tem vegetação arbórea ou arbustiva. Sobre o sítio havia uma construção em tempo que escapa à memória do proprietário atual e cujos restos marcam um horizonte bem claro no perfil dos cortes, com a presença de restos de tijolos, vidro, pregos, cerâmica de tradição européia, botões, etc. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em 21/2/66, P. I. Schmitz e J. Proenza Brochado estiveram no local e preencheram a ficha do IPHAN. A pequena coleta feita na oportunidade ficou no Museu Rio-Grandense de História Natural. Cortes Estratigráficos: De 28/1/70 a 5/2/70, P. I. Schmitz, G. Naue, I. I. Basile Becker, M. H. Abrahão Schorr fizeram três cortes estratigráficos para coleta sistemática de material. 107

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Para os cortes, delimitou-se uma faixa de 1,5 m. de largura, em direção aproximadamente Norte-Sul, demarcando-se nela setores de 2 m, marcados do ponto mais alto para a periferia com as siglas A1 a A5. Os níveis têm como referência sempre o ponto zero, no alto do sítio. A remoção do material foi feita em níveis artificiais de 20 cm de espessura, sendo o material todo peneirado numa malha de 3 mm. O estrato é consideravelmente homogêneo no mesmo corte e comparando os três cortes. Por essa razão, apresentamos aqui apenas a descrição do corte A1, nos seus níveis artificiais. Corte A1: 0 - 20 cm: Depósito areno-argiloso, com húmus, pardo-escuro, tendendo a marrom-escuro, mais ou menos solto e apresentando pequenos torrões. Cacos de cerâmica e vidro, poucos restos de alimentos de origem animal. Aproximadamente aos 20 cm de profundidade o depósito apresenta-se compactado, acusando o chão da casa, com regular quantidade de cacos de tijolos, cerâmica de tradição européia, ossos de peixes e de pequenos mamíferos. 20 - 40 cm: Nos primeiros 5 cm o depósito continua compactado, com restos de tijolos, cerâmica e outros indícios de ocupação européia. Os demais 15 cm são de um depósito amarelado, mais solto, com cerâmica de tradição Vieira, restos de alimentos de origem animal, alguns carvões. Um dente perfurado. 40 - 60 cm: Depósito igual, como na parte inferior do anterior. Cerâmica, ossos soltos e conglomerados, grânulos de carvão que aumentam em profundidade. Uma rodela de concha perfurada. 60 - 80 cm: Depósito igual, mais solto. Cerâmica, uma pedra sem sinal de modificação ou uso, lasca de quartzo. Grande quantidade de carvão e coquinhos. 108

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80 - 100 cm: Depósito mais claro. Umas lasca de quartzo. Ossos soltos e conglomerados. Uma ponta helicoidal, um dente perfurado. 100 - 120 cm: Argila pardoacinzentada com bolsões contendo material arqueológico. A 115 cm a consistência se torna maior e a coloração mais amarelada. O piso original é bem irregular e aparece ao menos uma evidência de estaca. Daí para baixo o depósito é igual, sem material arqueológico ou indícios de perturbações. 3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é totalmente cerâmico, pertencendo à fase Vieira, período inicial. A amostra de carvão recolhida no setor A3, na profundidade de 80 - 100 cm, forneceu uma data de 1.335 ± 45 a.P., ou A. D. 595 (SI-1007).

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Figura 13 – RS-RG-48 – Croqui do sítio.

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Figura 14 – RS-RG-48 – Perfil dos cortes A1, A3, A5. 111

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Sítio Arqueológico RS-RG-04 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Pedro Ferreira, Quitéria, Município de Rio Grande, RS. Dista da Lagoa dos Patos uns 250 m. Está sobre um barranco do pleistoceno, com altura de uns 5,50 m. Os terraços do Holoceno, se alguma vez existiram, foram nivelados pelo cultivo e estariam muito apertados contra o barranco. A área baixa, onde se encontram hoje as chácaras, provavelmente é de formação posterior ao sítio. A extensão do sítio é difícil de delimitar, devido à vegetação arbórea que cobre o local, calculando-se que possa ser de 30 x 100 m. Os estratos têm uma espessura de uns 40 cm, mas não sobressaem de nenhum modo dos arredores. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica. Sobre os estratos existem um bosque, plantações de árvores frutíferas, chácaras. A vegetação dos arredores é a mesma, havendo árvores sobre a borda do barranco; a área baixa está coberta de chácaras ou vegetação típica de áreas alagadiças. Na superfície, misturado com o material pré-histórico, encontram-se restos de ocupações brancas variadas. Os estratos foram em grande parte destruídos pela fábrica de adubos de Pelotas, que retirou muito material. Nessa oportunidade teriam sido encontrados esqueletos humanos. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em 4/3/67, G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco, de Rio Grande estiveram no sítio, preenchendo a ficha de registro do IPHAN e realizando uma coleta superficial, que ficou com Naue. 112

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Corte Estratigráfico: Em 6/2/70, P, I. Schmitz, G. Naue, I. I. Basile Becker, M. H. Abrahão Schorr fizeram um corte estratigráfico, em área intata debaixo das árvores. Corte de 2 x 1,5 m. Os estratos foram removidos em níveis artificiais de 20 cm de espessura. 0 - 20 cm: Depósito arenoso, com húmus, de coloração marrom-escura, solto. Os primeiros 8-10 cm se compõem principalmente de húmus, folhas e raízes. A partir daí aparecem cerâmica e restos de alimentos. 20 - 40 cm: Depósito igual. Coquinhos calcinados, um lugar de fogueira, onde se recolheu carvão para datação. 40 - 60 cm: Aos 40 cm o depósito se torna quase areia pura, amarelada, com alguns ossos e cerâmica. Ossos trabalhados. Aparecem bolsões com carvão, sobre o fundo arenoso alguns sinais de estaca. 60 - 80 cm: Areia amarelada, onde apenas existem bolsões de terra escura com carvão, que se aprofundam até 70 ou 75 cm. A cerâmica costuma aparecer junto às concentrações de ossos. Coleta Sistemática: Em cima do sítio e ao redor dele foi feita uma coleta sistemática, aparecendo cerâmica de tradição Vieira, cerâmica de tradição Tupiguarani e cerâmica de tradição européia. 3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é totalmente cerâmico, pertencendo à fase Vieira, período médio a final. O material Tupiguarani da superfície pode ser atribuído a reocupação, ou contato. 113

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Amostra de carvão recolhida a 30 cm de profundidade deu uma data de 845 ± 74 a. P., ou A. D. 1105 (SI-1105).

Figura 15 – RS-RG-04 – Croqui do sítio. 114

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Sítio Arqueológico RS-RG-08 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de José dos Santos Figueiredo, Arraial de Fora, Município de Rio Grande, RS. Dista 230 m da Lagoa dos Patos. Os terraços do Holoceno foram destruídos pelas chácaras, mas a altura sobre a água sugere que esteja localizado sobre o terraço A, na proximidade da borda do terraço B. O barranco do Pleistoceno, com quase 8 m sobre o nível da Lagoa, dista apenas 400 m. O sítio RS-RG-14 está a uns 200 m e um pouco mais longe da Lagoa. Mede 53 X 50 m, apresentando uma espessura atual de 50 cm, mal se distinguindo hoje dos terrenos circunjacentes. Sobre o local existem chácaras, em direção ao barranco do Pleistoceno arbustos e árvores nativas, além de outras plantadas; em direção à Lagoa, nas áreas alagadiças, vegetações características. O sítio hoje é apenas uma sombra, não se tendo muita segurança sobre os dados conseguidos, porque, além da remoção produzida pelas chácaras, que escavam profundamente o solo, a fábrica de adubos Caruccio, de Pelotas, retirou dali 20 caminhões de restos ósseos, peneirando antes disso o material. É possível que apesar disso o material tenha validade e tenhamos atingido pontos não escavados. A seriação dos restos de alimentos, entretanto, mostrou tendências erráticas. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em 14/10/67, G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco de Rio Grande, visitaram o sítio e preencheram a ficha do IPHAN, fazendo coleta superficial. Corte Estratigráfico: 115

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De 6/2 a 9/2/70, P. I. Schmitz, G. Naue, I. I. Basile Becker, fizeram um corte estratigráfico no ponto mais alto do sítio, medido 3 X 1,5 m. O material foi removido em níveis artificiais de 10 cm e peneirado numa malha de 3 mm. 0 - 10 cm: Depósito arenoso, com húmus, marrom-escuro, solto. Cerâmica, um pequeno disco de concha perfurado, restos de alimentos de origem animal. Terra revolvida pelo cultivo. 10 - 20 cm: Depósito igual, mais escuro e consistente. Cerâmica junto às concentrações de ossos ou debaixo delas e nas fogueiras. Um coquinho calcinado. 20 - 30 cm: Depósito igual, mais escuro. Menos cerâmica, menos ossos. 30 - 40 cm: Depósito igual, bem escuro, algum carvão. Cerâmica. Ao final do nível aparecem conglomerados de ossos sobre um depósito arenoso bem claro. Duas evidências de estacas (7 e 8 cm de diâmetro) preenchidas com ossos e ligadas aos horizontes de ossos. 40 - 50 cm: Depósito arenoso mais claro que o do nível anterior; em profundidade cor amarelada, com menos restos de alimentos. Pouca cerâmica. Um coquinho, carvão. Coleta Superficial: Foi feita coleta superficial em todo o sítio. 3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é todo cerâmico, pertencendo à fase Vieira, período final. O material Tupiguarani deve provir de contato. 116

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Figura 16 – RS-RG-08 e 14 – Croqui dos sítios. 117

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Figura 17 – RS-RG-08 – Perfil do corte I. 118

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Sítio arqueológico RS-RG-14 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de José dos Santos Figueiredo, Arraial de Fora, Município de Rio Grande, RS. Dista uns 300 m da Lagoa dos Patos. Os terraços do Holoceno foram destruídos pelas chácaras, mas a altura sobre a água sugere que esteja localizado entre o terraço A e B. Dista do Barranco do Pleistoceno menos de 400 m. O sítio RS-RG-08 está a uns 200 m e um pouco mais perto da Lagoa. Ver croqui do RS-RG-08. Mede 40 x 30 m, apresentando uma espessura atual de uns 30 cm, mal se distinguindo do terreno circundante. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica. Sobre o local existem chácaras e, em direção ao barranco do Pleistoceno, arbustos e árvores nativos, além de outros plantados; em direção à Lagoa, nas áreas alagadiças, vegetação característica. O sítio hoje está totalmente destruído pelos profundos sulcos das chácaras, sendo revolvido e cultivado desde muito tempo. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em 14/10/67, G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco, de Rio Grande, estiveram no sítio, preenchendo a ficha de registro do IPHAN e fazendo coleta superficial, que está em seu poder. 3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é totalmente cerâmico, pertencendo à fase Vieira, período médio a final. O material Tupiguarani deve provir de contato. 119

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Sítio Arqueológico RS-RG-28 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Carlos Costa Amaral, Arraial de Fora, Município de Rio Grande, RS. À margem do Arroio Arraial, numa pequena barranca, 160 cm sobre o nível da Lagoa. O barranco parece ser um terraço mais antigo do Holoceno. Na base das camadas aparece um estrato de conchichas de deposição aquática. Até a Lagoa são aproximadamente 700 m de terra baixa. Não foi possível delimitar com exatidão o sítio devido à vegetação. Deve ter aproximadamente 40 x 50 m. A espessura das camadas e de 60 cm. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, fortemente arenosos, com restos de alimentos de origem animal e vegetal e elementos culturais, principalmente cerâmica. Sobre o local estão construções da morada do proprietário, com árvores e horta; ao longo do arroio há vegetação arbórea alta; em direção à Lagoa, nas áreas afastadas do arroio, vegetação característica. Os estratos estão sendo destruídos progressivamente pela ocupação atual. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco, de Rio Grande, estiveram no sítio, preenchendo a ficha do IPHAN. Corte Estratigráfico: Em 12/5/72, P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker e G. Naue realizaram um corte estratigráfico, num dos pontos mais altos, em lugar preservado perto do renque de eucaliptos. 120

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Corte 1,5 X 1,5 m. O material foi removido em níveis artificiais de 20 cm de espessura e peneirado com malha de 3 mm. 0 - 20 cm: Depósito arenoso, pardo, solto. Cerâmica, restos de alimento de origem animal, abundância de coquinhos calcinados. Na profundidade de 10 a 20 cm, dois fogões bem marcados. 20 - 40 cm: Depósito igual escurecendo em profundidade, onde se torna negro, com muito carvão. Cerâmica, uma pedra-com-covinha, muitos coquinhos. 40 - 60 cm: Depósito igual, inicialmente escuro, clareando em profundidade. Muitos coquinhos. 60 - 80 cm: Areia clara, com alguns bolsões contendo material arqueológico. Sobre a base clara aparecem nitidamente seis vestígios de estacas. 3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é totalmente cerâmico, da fase Vieira, período médio a final. O material Tupiguarani deve provir de contato.

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Figura 18 – RS-RG-28 – Croqui do sítio.

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Figura 19 – RS-RG-28 – Perfil do corte I e planta baixa. 123

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Sítio Arqueológico RS-RG-03 1.Caracterização Geral:

Núcleos 2/5 Localizados na propriedade de Lacides Antunes Gonçalves, Quitéria, Rio Grande, RS. Distam da Lagoa mais ou menos 500 m, encontrando-se no alto de uma duna em erosão. Os estratos, cuja espessura parece ser de uns 20 cm, estão a quase 14 m sobre o nível da água. Numa área de uns 60 m de diâmetro, nas áreas varridas pelo vento aparece a cerâmica; nas bordas se vêem restos dos estratos arqueológicos. A configuração e tamanho das manchas variam de acordo com o movimento das dunas. Os estratos são escuros, arenosos, com muita cerâmica, algumas lascas, alguns restos de alimentos de origem animal e muito carvão. No local não existe vegetação, mas sufocados pelas dunas se vêem árvores e arbustos, que cresciam ao longo do declive e no topo das dunas. Núcleo 1: Localizado na propriedade de Mariana Antunes Maciel, Quitéria, Rio Grande, RS. Dista da Lagoa aproximadamente 250 m. Não é possível indicar sobre qual dos terraços, porque as chácaras e as dunas obliteraram os mesmos completamente, mas é possível que esteja entre o A e B. Mede uns 40 X 50 m. O sítio foi quase completamente destruído pela fábrica de adubos Caruccio, de Pelotas, e os trabalhos do cultivo. O local praticamente não se distingue hoje do terreno circundante. Está coberto por plantações; na borda das dunas e sobre as mesmas existem árvores e arbustos; nos locais alagadiços, vegetação característica de beira de lagoa. Sobre o sítio existe um galpão. 124

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2. Trabalhos Realizados:

1. Primeiras Visitas: Em 4/3/67, G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco, de Rio Grande, preencheu a ficha do IPHAN e fez uma coleta, que está em seu poder. Coletas Sistemáticas: Em 13/3/72 foram feitas coletas sistemáticas nos setores 2 a 5, por P. I. Schmitz, I. I. Basile Becker, G. Naue, M. H. Abrahão Schorr. Em janeiro de 1976 foi feita coleta de superfície novamente nos setores 2 a 5 e também no 1, pelos mesmos pesquisadores, numa área aparentemente não perturbada. 3. Identificação Cultural e Datação:

Os setores 2/5 são da fase Vieira, período médio a final. O setor 1 é da fase Vieira, período médio a final. O material Tupiguarani deve provir de contato.

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Figura 20 – RS-RG-03 – Croqui do sítio.

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Sítio Arqueológico RS-RG-10 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Pedro Barros, Arraial de Fora, Município de Rio Grande, RS. Dista 550 m da Lagoa dos Patos, localizando-se na transição entre o terraço A e B que ali não apresenta borda marcada, devido ao trabalho das chácaras. Está a 300 m de um sítio sem número (s/n junto a RS-RG-10), que se encontra abaixo do terraço A. Mede 50 X 80 m aproximadamente, tendo os estratos uma espessura de uns 50 cm, e sobressaindo suavemente do terreno circundante. O sítio caracteriza-se por estratos escuros, arenosos, com grande quantidade de restos de alimentos de origem animal e elementos culturais, principalmente cerâmica. A área é cultivada desde muito tempo. A vegetação dos arredores é formada de gramíneas de campos limpos e, sobre os terraços de formações arbóreas ou arbustivas esparsas. Nos locais mais úmidos, vegetação característica. Ao lado do sítio existem casas e galpões. Segundo informações dos filhos do proprietário, por ocasião da drenagem do local e do tratamento do solo, apareceram numerosos restos de esqueletos humanos, fragmentos dos quais ainda se encontram no meio das chácaras. 2. Trabalhos Realizados:

Primeiras Visitas: Em 8/7/67, G. Naue e companheiros do Colégio São Francisco, de Rio Grande, visitaram o local e preencheram a ficha do IPHAN. Corte Experimental: 127

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Em 13/3/72, P. I. Schmitz, G. Naue e I. I. Basile Becker fizeram o levantamento do sítio e realizaram pequeno corte experimental perto do topo, com 80 X 90 cm de lado e 50 cm de profundidade. 0 - 20 cm: Depósito arenoso, marrom, pouco compactado. Até 12 cm de profundidade é revolvido pelo cultivo. Cerâmica, restos de alimentos de origem animal. 20 - 40 cm: Depósito igual, mais escuro e mais úmido e compacto. Cerâmica, um lito, restos de alimentos. 40 - 50 cm: Depósito marromescuro, clareando em profundidade. Pouca cerâmica, poucos restos de alimentos. Aos 50 cm, mais argiloso, amarelado, sem restos arqueológicos. Coleta Sistemática: Em 15/3/72 também foi feita uma coleta sistemática em toda a superfície livre. 3. Identificação Cultural e Datação:

O sítio é totalmente cerâmico e pertence à fase Vieira, período médio a final. O material Tupiguarani deve provir de contato.

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Figura 21 - RS-RG-03 – Croqui do sítio. 129

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Sítio Arqueológico s/n (junto ao RS-RG-10) 1.Caracterização Geral:

Localizado na propriedade de Pedro Barros, Arraial de Fora, município de Rio Grande, RS. Dista 250 m da Lagoa, encontrando-se na sua área de alagação hibernal. Está antes da borda do terraço A, encontrando-se sobre o nível da água apenas 21 cm. Tem aproximadamente 10 m de diâmetro, 35 cm de altura e destaca-se claramente na superfície plana. Na superfície, além de grama baixa, existem pequenas árvores. Ao redor, na área de alagação, vegetação típica da borda da Lagoa. O sítio parece intato. 2. Trabalho Realizado:

Além da medição, nenhum trabalho foi realizado, nem material recolhido. 3.Identificação Cultural e Datação:

O sítio provavelmente é o mais recente de toda a seqüência, devido à sua posição.

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V CULTURA MATERIAL: CERÂMICA

Como se disse no capítulo IV, na seqüência dos sítios de pesca por nós estudados, podemos distinguir um período pré-cerâmico e um período cerâmico. O pré-cerâmico chama-se fase Lagoa, subtradição Lagoa, tradição Itaipu. O cerâmico abrange duas tradições: a Vieira, subtradição Vieira, com a fase Torotama, mais antiga, e a fase Vieira, mais recente; a cerâmica tanto de uma como de outra fase costuma ser abundante nos estratos; por outro lado, temos a tradição Tupiguarani, subtradição Corrugada, fase Camaquã, que aparece na superfície dos sítios de pesca, quer por contato, quer por reocupação. Os sítios Tupiguarani puros, sobre o barranco do Pleistoceno, foram estudados por Naue (s.d.). Na superfície de diversos sítios aparece ainda cerâmica de tradição européia ou neobrasileira, que às vezes é difícil de separar da cerâmica de tradição Vieira, por ter alguns elementos comuns, como antiplástico e às vezes também forma. A cerâmica Vieira recebeu seu nome de Schmitz e Brochado (1966); fase Torotama e fase Lagoa foram estabelecidas por Schmitz e Brochado (1972:4 ss); a fase Camaquã foi criada por Brochado (1974:36 ss) e sua extensão para Rio Grande feita por Naue (s.d.). Os nomes das tradições e subtradições, como são usados aqui, foram estabelecidos em diversas reuniões do Programa Nacional de P. Arqueológica, orientado pelos Drs. Clifford Evans e Betty J. Meggers, do qual participavam arqueólogos de diversos estados brasileiros, como se disse na Introdução. No estudo da cerâmica estávamos interessados principalmente em encontrar indicadores cronológicos, que marcassem com firmeza o desenvolvimento dos sítios da região, mas paralelamente também buscamos outros indicadores, como de funcionalidade e de aculturação. Para isso nos parecia mais útil o estudo de modos isolados do que de tipos tradicionais fechados; estudamos separadamente as características da pasta, do tratamento da superfície, da forma e outras; para formar tipos tradicionais, basta reunir os modos discretos. 133

Pedro Ignácio Schmitz

A. A Cerâmica de Tradição Vieira Na análise das duas fases da tradição cerâmica Vieira (fase Torotama e fase Vieira), usamos os mesmos critérios, uma vez que uma parece ser a continuação da outra, a fim de as podermos comparar melhor. No estudo da pasta, com que é feita a cerâmica, observamos o antiplástico, que parece ser intencional e, portanto, facilmente sujeito a modificações no tempo: descobrimos com isso que o antiplástico de areia fina e o de areião apresentam tendências bem marcadas. No estudo do tratamento da superfície procuramos indicadores semelhantes, que aparecem sob as seguintes modalidades: superfície alisada, digitada, ponteada, roletada, escovada, com impressão de cestaria, engobada. No estudo das formas, que parecem bastante uniformes, procuramos medidores bastante objetivos: separamos o contorno em simples e infletido; para separar formas mais ou menos restringidas, medimos, nas formas com contorno simples, o ângulo que a borda forma com a linha da boca; nas formas com contorno infletido, o ângulo da parede antes do ponto de inflexão com a linha da boca. Todas as formas foram reconstituídas a partir de fragmentos de bordas e bases. Para a descrição usamos as denominações e a organização de Shepard (1961:224 ss). Através de quadros e gráficos, procuramos relacionar os diversos modos entre si e com os sítios ou níveis donde provêm. No caso de trabalhar com proporções, buscamos formar amostras de aproximadamente 100 exemplares, para as porcentagens serem representativas e válidas. Para isso às vezes somamos amostras, ou, quando não era possível, trabalhamos somente com as amostras suficientemente representativas. Nas descrições mantemos, tanto quanto possível, a organização usada na descrição tradicional dos tipos.

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Descrição das Pastas da Fase Torotama a) Pasta com Areia

I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelada e/ou modelada. A maior parte dos cacos são irregulares e apresentam tantas depressões e irregularidades no corpo e na borda, que parecem ser modelados por um grupo que tem pouca experiência ceramista. Em algumas bordas o rolete que fecha a borda não está completamente obliterado. 2. Impurezas da argila: restos vegetais carbonizados em pequeno tamanho e grande quantidade, espículas de esponja de água doce em pequena quantidade e pequenas dimensões (menores que 1 mm). 3. Antiplástico: grãos arredondados, bastante uniformes, de areia fina (menos de 1 mm), tendo o quartzo coloração leitosa ou transparente; hematita bem triturada, fragmentos isolados de quartzo nas colorações rosada, leitosa e transparente, com mais de 4 mm, de feldspato caulinizado, atingindo excepcionalmente 6 mm, lamínulas de mica muscovita menores que 1 mm, concreções ferruginosas de 0,5 a 5 mm. O antiplástico de areia fina é muito denso, os demais elementos aparecem casualmente. 4. Textura: compacta e uniforme. Devido à carbonização de restos vegetais, aparecem pequenos espaços vazios. Fratura irregular, suave ao tato. 5. Cor do núcleo: predominantemente negro e cinza, em alguns cacos amarelado ou esbranquiçado, devido a uma oxidação mais efetiva. 6. Cozimento: oxidante, com manchas de cocção. Cozimento pobre. A superfície externa é mais bem oxidada, atingindo de 0,5 a 8 mm. Nos cacos mal oxidados o núcleo atinge a superfície interna, cuja oxidação não passa de 1 mm. A pasta é pouco fundida. 7. Dureza (E. Mohs): 3. 135

Pedro Ignácio Schmitz

II. Elementos da Superfície: 1. Cor da superfície: na maior parte dos fragmentos é igual em ambas as superfícies; quando diferente, a parede externa é mais clara que a interna. Cores predominantes: amarelada, cinza e marrom claro, esbranquiçado. A cor amarelada distingue facilmente esta cerâmica da cerâmica da fase Vieira. 2. Tratamento da superfície interna: irregularmente alisada, aparecendo estrias e depressões provenientes da produção por modelagem e um alisamento que parece feito com palha. 3. Tratamento da superfície externa: veja descrição mais adiante. III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos mais adiante. b) Pasta com Areião

Provavelmente uma grande parte dos cacos provêm da quebra de recipientes modernos, usados pelos moradores atuais, que apresentam características de pasta e forma semelhantes à cerâmica indígena e, por isso, estando na superfície, são difíceis de separar. I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelada. Existem alguns fragmentos, onde o rolete aparece na borda, utilizado que foi como rolete de acabamento, mas geralmente o negativo e o positivo dos roletes pouco aparecem. 2. Impurezas da argila: restos vegetais carbonizados arredondados, atingindo ate 0,5 mm, ou mais alongados e maiores até 4 mm. 3. Antiplástico: abundantes fragmentos de quartzo rosado, leitoso ou transparente em diversos tamanhos, sendo mais abundantes os de 1 mm, mas aparecendo muito também os maiores. Vêm acompanhados de concreções ferruginosas até 3 mm, hematita bem triturada, alcançando no máximo 1 mm, e feldspato caulinizado entre 1 e 2 mm. 136

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O antiplástico é denso. 4. Textura: compacta e uniforme. Fraturas irregulares, mas em alguns casos acompanham o sentido dos roletes; fratura áspera ao tato. 5. Cor do núcleo: cinza escuro e claro; alaranjado e esbranquiçado nos fragmentos bem oxidados. 6. Cozimento: oxidante, com manchas de cocção. Regular. Nos cacos bem queimados, quando a oxidação não atinge toda a espessura da parede, alcança de 1 a 4 mm na superfície externa. A superfície interna muitas vezes não se distingue do núcleo ou está oxidada entre menos de 1 e 2 mm. A pasta está parcialmente fundida. 7. Dureza (E. MohS): 3. II. Elementos da Superfície: 1. Cor da parede: geralmente igual na superfície interna e externa; quando diferente, a externa costuma ser mais clara. A cor varia de cinza, marrom claro, alaranjado a esbranquiçado. 2. Tratamento da superfície interna: alisamento irregular, devido aos grãos de quartzo que impedem um bom alisamento. 3. Tratamento da superfície externa: veja descrição mais adiante. III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos mais adiante.

Descrição das Pastas da Fase Vieira a) Pasta com Areia

I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelada. São visíveis os negativos e positivos dos roletes. 137

Pedro Ignácio Schmitz

2. Impurezas da argila: esporádicas espículas que parecem de esponja até 0,5 mm, restos vegetais carbonizados, alongados ou arredondados. 3. Antiplástico: grãos pequenos e arredondados de quartzo e em alguns casos de hematita até 1 mm. Escassos feldspatos caulinizados até 2 mm, concreções ferruginosas até 1 mm, pequenas ágatas. O antiplástico é muito denso. 4. Textura: compacta e uniforme. Fratura regular, geralmente acompanhando os roletes e suave ao tato. 5. Cor do núcleo: negro, cinza claro e escuro, marrom. 6. Cozimento: oxidante, com manchas de cocção. Regular. Os cacos totalmente oxidados não são muitos. Nos cacos não totalmente oxidados a espessura modificada na superfície interna alcança 1 mm, a externa costuma ser mais espessa. A pasta está parcialmente fundida. 7. Dureza (E. Mohs): 3. II. Elementos da Superfície: 1.Cor das superfícies: a superfície interna em geral é mais clara que a externa. A cor costuma variar do negro, cinza claro e escuro, que são dominantes, ao marrom claro, tendendo para amarelado. 2. Tratamento da superfície interna: geralmente bem alisada. 3. Tratamento da superfície externa: veja descrição mais adiante. III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos mais adiante. b) Pasta com Areião

I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelada. Nas fraturas são visíveis os negativos e positivos dos roletes; além disso, há bastantes cacos onde 138

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a junção dos roletes é mal soldada. Os roletes não são superpostos um sobre o outro, mas transversalmente, de modo que formam uma parede dupla (veja última borda da forma 4a, Fig. 24). Geralmente o rolete da borda está um pouco saliente externa ou internamente. OS roletes têm uma largura entre 1 e 2 cm, sendo a espessura muito menor. 2. Impurezas da argila: esporádicas espículas que parecem de esponja até 1 mm, restos vegetais alongados, carbonizados ou não, até 5 mm. 3. Antiplástico: fragmentos angulosos de quartzo predominantemente de 1 ou 2 mm, mas também maiores entre 5 e 10 mm. Aparecem nas cores leitosa, rosada e transparente. Hematita e concreções ferruginosas também abundantes. Escassos feldspatos caulizados até 4 mm, ágatas, algumas lamínulas de mica. O antiplástico é muito denso. Na medida em que passa o tempo em direção ao presente, os grãos de quartzo aumentam em quantidade e tamanho. 4. Textura: compacta, uniforme. Fratura irregular, áspera. 5. Cor do núcleo: predominam as cores negro, cinza e avermelhado. Em alguns fragmentos a cor é esbranquiçada. 6. Cozimento: oxidante, com manchas de cocção. Regular, sendo bastante freqüentes os fragmentos totalmente oxidados, possuindo núcleos vermelhos ou esbranquiçados. Freqüentemente a superfície interna se identifica com o núcleo ou tem uma espessura oxidada de 1 mm. A parte oxidada na parede externa varia de 1 a 5 mm. A pasta está parcialmente fundida. 7. Dureza (E. Mohs): 3 e 3,5. II. Elementos da Superfície: 1. Cor da parede: na maior parte das vezes a cor da parede interna é igual à da externa, mas nem sempre. As cores estão entre negro, cinza, avermelhado, amarelado, esbranquiçado. 2. Tratamento da superfície interna: geralmente bem alisada. 139

Pedro Ignácio Schmitz

Na superfície externa são bastante freqüentes roletes expostos, por causa de um alisamento mais superficial, e estrias irregulares provocadas pelo arrastamento dos fragmentos de antiplástico. 3. Tratamento da superfície externa: veja descrição, mais adiante. III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos, mais adiante.

Descrição das Formas da Fase Torotama a) Com contorno simples (Fig. 22):

Forma 1a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 157-180°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado. Forma 2a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 135-157°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada ou aplanada, borda direta ou restringida, lábio arredondado ou aplanado. Forma 3a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 113135°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada ou levemente aplanada, borda direta ou com pequeno reforço interno, lábio arredondado ou aplanado. Forma 4a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 90-113°, contorno simples, um ou 2 pontos terminais, um ponto de tangência vertical, corpo ovalóide ou levemente irregular, base aplanada ou arredondada, borda direta ou com pequeno reforço interno, lábio arredondado ou aplanado. Forma 5a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 67-90°, contorno simples, um ou dois pontos terminais, corpo em secção de cone ou ovalóide, base aplanada ou arredondada, borda direta, lábio arredondado, aplanado ou apontado. 140

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Forma 6a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 45-67°, contorno simples, um ou dois pontos terminais, corpo em calota de ovóide ou secção de conóide, base aplanada ou arredondada, borda direta ou levemente restringida, lábio arredondado, aplanado ou apontado.

Figura 22 – Formas dos vasilhames da fase Torotama.

141

Pedro Ignácio Schmitz

Figura 23 – Formas dos vasilhames da fase Torotama.

Forma 7a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 23-45°, contorno simples, um ponto terminal, corpo 142

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em calota de ovóide ou esferóide, base arredondada, borda direta ou levemente apontada, lábio arredondado, aplanado ou apontado. Forma 8a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 0-23°, contorno simples, um ponto terminal, corpo em calota de ovóide ou esferóide, base arredondada, borda direta, reforçada interna ou apontada, lábio arredondado ou apontado. b) Com Contorno Infletido (Fig. 23):

Formas 1b, 2b não existem. Forma 3b: Vasilhame restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 113135°, contorno infletido, um ponto terminal, um ou dois pontos de tangência vertical, 1 ponto de inflexão, secção de elipsóide ou esfera, base arredondada, borda direta ou com leve reforço externo, lábio arredondado. Forma 4b: Vasilhame restringido, ângulo da parede com a linha da boca 90-113°, contorno infletido, um ou dois pontos terminais, um ou dois pontos de tangência vertical, 1 ponto de inflexão, corpo elipsóide ou esferóide, base aplanada ou arredondada, borda direta ou restringida, lábio arredondado, aplanado ou apontado. Forma 5b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede com a linha da borda 67-90°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, secção de ovóide ou esferóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Forma 6b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede com a linha da boca 45-67°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, calota de ovóide, base arredondada, borda direta, ou levemente reforçada, lábio arredondado ou aplanado. Forma 7b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede com a linha da boca 23-45°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, calota de ovóide ou esferóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Forma 8b não existe. 143

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Descrição das Formas da Fase Vieira a) Com contorno simples (Fig. 24):

Forma 1a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 157-180°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Forma 2a: vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 135-157°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta ou com pequeno reforço interno, lábio arredondado ou aplanado, Forma 3a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 113-135°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta ou com pequeno reforço interno, lábio arredondado ou aplanado. Forma 4a: Vasilhame restringido, ângulo da borda com a linha da boca 90-113°, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, corpo ovóide ou esferóide, base arredondada, borda direta ou com suave reforço interno, lábio arredondado ou aplanado. Forma 5a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 67-90°, contorno simples, um ponto terminal, corpo secção de elipsóide ou ovóide, base arredondada, borda direta ou com pequeno reforço interno, lábio arredondado ou aplanado. Forma 6a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 45-67°, contorno simples, um ponto terminal, corpo calota de esfera, base arredondada, borda direta ou levemente restringida, lábio arredondado ou aplanado. Forma 7a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 23-45°, contorno simples, um ponto terminal, corpo calota de esfera, base arredondada, borda direta ou levemente restringida, lábio arredondado ou aplanado. Forma 8a: Vasilhame não restringido, ângulo da borda com a linha da boca 0-23°, contorno simples, um ponto terminal, corpo 144

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calota de esfera, base arredondada, borda direta, restringida ou com reforço interno, lábio arredondado ou aplanado.

Figura 24 – Formas dos vasilhames da fase Vieira.

145

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Figura 25 – Formas dos vasilhames da fase Vieira.

b) Com contorno infletido (Fig. 25):

Forma 1b não existe. 146

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Forma 2b: Vasilhame restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 135-157°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, um ou dois pontos de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Forma 3b: Vasilhame restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 113135°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, 1 ou 2 pontos de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Forma 4b: Vasilhame restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 90-113°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, 2 ou 1 ponto de tangência vertical, corpo elipsóide, base arredondada, borda direta ou reforçada externa, lábio arredondado ou aplanado. Forma 5b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede antes da inflexão, com a linha da boca 67-90°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, corpo em calota de ovóide, base arredondada, borda direta, reforçada ou restringida, lábio aplanado ou arredondado. Forma 6b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 45-67°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, corpo em calota de ovóide, base arredondada, borda direta, reforçada ou restringida, lábio arredondado, aplanado ou apontado. Forma 7b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 23-45°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, corpo em calota de ovóide, base arredondada, borda direta, reforçada ou restringida, lábio arredondado ou aplanado. Forma 8b: Vasilhame não restringido, ângulo da parede antes da inflexão com a linha da boca 0-23°, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, corpo em calota de ovóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado. 147

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Nota: Com certa freqüência aparecem furos, geralmente biconvexos e feitos depois da cocção; algumas vezes parece que antes da cocção, os quais poderiam servir para suspensão do vasilhame ou para outras finalidades.

Tratamento da superfície externa ou decoração da fase Torotama e da fase Vieira 1. Alisado externo: O alisamento é apenas regular. Nos cacos com pasta areião é freqüente o arrastamento de fragmentos de quartzo produzindo estrias irregulares. A superfície nunca é bem lisa, mas grosseira, como se tivesse sido alisada com a pasta já muito seca. Nos cacos com pasta areia da fase Vieira, o alisamento é regular, mas há bastantes arestas, marcando o limite do alisado nas suas várias passagens. Algumas impressões de palha produzidas ao apoiar a peça em fabricação. Nos cacos com pasta areia da fase Torotama, o alisamento é mais grosseiro, confundindo-se com as depressões produzidas pela polpa do dedo na manufatura. Também há grande quantidade de impressões de palha, produzidas quer no movimento de alisar, quer por ter sido pousado o vasilhame sobre ela. 2. Digitado externo: O digitado é produzido por uma leve pressão da polpa do dedo sobre a massa, provavelmente para melhor juntar os roletes, deixando faixas de depressões às vezes mal perceptíveis, paralelas à borda e cobrindo a peça inteira. Raramente aparece junto à depressão produzida pela polpa do dedo também a impressão suave da borda da unha. Às vezes também o digitado vem com um sulco raso do fechamento de um rolete sobre o outro. O digitado nada tem a ver com o corrugado Tupiguarani, porque aparece antes da chegada deste grupo ao local e é produzido por pressão perpendicular, e 148

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não lateral sobre a parede. Para fazer uma separação cuidadosa do digitado, é preciso trabalhar com luz rasante, devido a pouca profundidade das depressões. 3. Roletado externo: Os roletes não foram alisados na superfície externa. Não se confunde com o fechamento incompleto dos roletes externos em superfícies alisadas, que é muito freqüente, ao passo que do roletado temos um único fragmento. 4. Ponteado externo: Dois fragmentos em que existe uma linha de pontos, num caso oblíquo à borda, no outro sem orientação conhecida. Os pontos no primeiro caso apresentam no fundo uma pequena aresta em espiral, sugerindo que tenham sido impressos por movimento rotativo. (Fig. 24, forma 5a). 5. Ungulado interno: Um único fragmento em que existe uma faixa de ungulações junto à borda, no lado interno de um vasilhame. Altura das ungulações 10 mm, profundidade 1 mm. (Fig. 24, forma 6a), 6. Escavado externo: Na fase Torotama aparece um fragmento de borda com um escovado perpendicular à borda; as estrias são profundas e irregulares, 7. Impressão de cestaria: Impressões regulares formando faixas paralelas à borda e cobrindo todo o vasilhame, com exceção, geralmente de uma faixa estreita junto ao lábio. Sobre as técnicas da cestaria, veja mais adiante. (Fotos 5 e 6). 8. Engobado externo: Nas bases grossas de vasilhames feitos com pasta de areia da fase Torotama aparece um engobado claro, que se dilui na parede do vasilhame. Pode atingir 1 mm de espessura. É semelhante a um engobado que aparece em tradições cerâmicas do Rio Paraná (Schmitz et al. 1972:5 s). 149

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Além dos tratamentos descritos, aparecem ainda embora não como tratamento de superfície, mas impressões acidentais, as impressões de esteiras. São impressões regulares em linhas paralelas, de pontos, acompanhados de impressões alongadas perpendiculares às linhas de pontos; aparecem em cacos alisados ou digitados, no corpo do vasilhame, nunca perto da borda. As impressões que aparecem são em geral os negativos da fibra que une os feixes do leito da esteira; os feixes do leito, com poucas exceções, estão apenas indicados.

A. Freqüência dos Diferentes Modos nos Sítios na Fase Torotama e na Fase Vieira Com o objetivo de estabelecer firmemente a cronologia da seqüência dos sítios de pesca, seriamos as diferentes características, que apresentam mudança e parecem indicadora da passagem do tempo. As características são as seguintes: a pasta, o tratamento da superfície, as formas individuais, o contorno dos vasilhames, as aberturas da boca, a espessura das paredes. Outras características, que também testamos, não apresentam tendências definidas, como, p. ex., a contagem dos vasilhames restringidos contra os não-restringidos. À base do quadro de distribuição dos modos pelos sítios e seus respectivos níveis, organizamos um gráfico de seriação por semelhança, segundo o método de Ford (1962) e Meggers e Evans (1970), procurando incorporar na seriação todas as amostras dos cortes e da superfície, tomando como ponto de partida as tendências apresentadas nos níveis dos cortes, complementadas com as datações de C14 e a posição dos sítios nos diferentes terraços. As amostras não são iguais, porque às vezes removemos os estratos dos níveis artificiais de 10 cm, às vezes em níveis artificiais de 20 cm; além disso, estamos usando amostras de superfície, onde podem estar reunidos elementos correspondentes a diversos níveis artificiais. Outro fator de erro, difícil de remover, é que na superfície do sítio, 150

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em qualquer momento, se podem justapor ou misturar elementos díspares, que na análise se podem disfarçar completamente. Por tudo isso, atribuímos à seqüência conseguida apenas um valor de aproximação, que parece maior na parte baixa e média da seriação, onde trabalhamos com mais cortes, e menor na parte alta, onde as amostras de superfície são mais numerosas. Acreditamos que, mesmo assim, e combinando a seriação de diversos modos, tenhamos conseguido resultados de bastante confiança, se tomarmos a proximidade indicada num sentido um pouco mais lato. Nas seriações trabalhamos sempre com a fase Torotama e a fase Vieira juntas, por formarem um todo contínuo, separado artificialmente.

151

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

97,05 2,95

1579 48 1627 1550 6 0 0 0 1 0 70 1627 0 2

152

4,30

0,06

95,27 0,37

% 177 6 183 158 2 0 0 0 0 0 23 183 0 0



12,57

86,34 1,09

96,72 3,28

%

C. I (0 - 20)

Col. Sup.



RS-RG-50

RS-RG-50 S

39 7 46 41 3 0 0 0 0 0 2 46 0 0



4,35

89,13 6,52

84,78 15,22

%

C. I (20 - 40)

RS-RG-50

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios

Tabela 2 – Distribuição da cerâmica Vieira pelos sítios.

6 0 6 6 0 0 0 0 0 0 0 6 0 0



100

100

%

C. I (40 - 60)

RS-RG-50

3 0 3 3 0 0 0 0 0 0 0 3 0 0



100

100

%

C. I (60 - 80)

RS-RG-50

Pedro Ignácio Schmitz

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

48 7 55 50 3 0 0 0 0 0 2 55 0 0

153

3,64

90,91 5,45

87,27 12,73

% 39 4 43 43 0 0 0 0 0 0 0 43 0 97



100

90,70 9,30

%

Col. Sup.

C. I. (20 - 80)



RS-RG-21

RS-RG-50 S

7 0 7 7 0 0 0 0 0 0 0 7 0 4



100

100

%

C. I (0 - 10)

RS-RG-21

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 1

4 1 5 3 1 0 0 0 0 0 1 5 0 6



20

60 20

80 20

%

C. I (10 - 20)

RS-RG-21

50 5 55 53 1 0 0 0 0 0 1 55 0 107



1,82

96,36 1,82

90,91 9,09

%

TOTAL

RS-RG-21

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AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

100

% 28,57 71,43

Nº 132 145 277 274 3 0 0 0 0 0 0 277 3 2

154

1,08

98,92 1,08

% 47,65 52,35

C. II (0 - 20)

Col. Sup.

Nº 6 15 21 21 0 0 0 0 0 0 0 21 0 2

RS-RG-49

RS-RG-49 Nº 6 8 14 14 0 0 0 0 0 0 0 14 0 0 100

% 42,86 57,14

C. II (20 - 40)

RS-RG-49

RS-RG-49 Nº 2 1 3 3 0 0 0 0 0 0 0 3 0 0 100

% 66,67 33,33

C. II (60 - 80)

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 2

Nº 3 28 31 31 0 0 0 0 0 0 0 31 0 0

100

% 9,68 90,32

Col. Sup.

RS-RG-20

Pedro Ignácio Schmitz

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras Nº 53 98 151 151 0 0 0 0 0 0 0 151 0 0

Nº 111 305 416 407 9 0 0 0 0 0 0 416 2 0

155

0,48

97,84 2,16

100

% 35,10 64,90

C. A (20 - 40)

C. A (0 - 20) % 26,68 73,32

RS-RG-20

RS-RG-20 Nº 33 80 113 112 1 0 0 0 0 0 0 113 3 0 2,65

99,12 0,88

% 29,20 70,80

C. A (40 - 60)

RS-RG-20

RS-RG-20 Nº 19 20 39 39 0 0 0 0 0 0 0 39 1 0 2,56

100

% 48,72 51,28

C. A (60 - 80)

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 3

Nº 8 14 22 22 0 0 0 0 0 0 0 22 0 0

100

% 36,36 63,64

C. A (80 - 100)

RS-RG-20

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

1 3 4 4 0 0 0 0 0 0 0 4 0 0

100

25 75

RS-RG-20 C. A (100 120) Nº % 1 1 2 2 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 100

50 50

% 29 38 67 67 0 0 0 0 0 0 0 67 1 0



1,49

100

43,28 56,72

%

C. A (60 - 140)

C. A (120 - 140) Nº

RS-RG-20 S

RS-RG-20

87 325 412 406 6 0 0 0 0 0 0 412 1 0



156

0,24

98,54 1,46

21,12 78,88

%

C. B (0 - 20)

RS-RG-20

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 4

57 220 277 270 7 0 0 0 0 0 0 277 0 0



97,47 2,53

20,58 79,42

%

C. B (20 - 40)

RS-RG-20

Pedro Ignácio Schmitz

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

1 10 11 11 0 0 0 0 0 0 0 11 0 0 100

9,09 90,91

% 1 6 7 7 0 0 0 0 0 0 0 7 0 0



100

14,29 85,71

%

Col. Sup.

C. B. (40 - 60)



RS-RG-48

RS-RG-20

16 72 88 83 4 0 0 0 0 1 0 88 0 0



157

1,14

94,32 4,55

18,18 81,82

%

C. A1 (0 - 20)

RS-RG-48

46 495 541 506 35 0 0 0 0 0 0 541 9 0



1,66

93,53 6,47

8,50 91,50

%

C. A1 (20 - 40)

RS-RG-48

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 5

27 292 319 306 13 0 0 0 0 0 0 319 5 0



1,57

95,92 4,08

8,46 91,54

%

C. A1 (40 - 60)

RS-RG-48

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

16 169 185 180 5 0 0 0 0 0 0 185 4 0

158

2,16

97,30 2,70

8,65 91,35

3 75 75 78 0 0 0 0 0 0 0 78 0 0





100

3,85 96,15

%

C. A1 (80-100)

C. A1 (60 - 80) %

RS-RG-48

RS-RG-48

0 9 9 9 0 0 0 0 0 0 0 9 0 0 100

100

RS-RG-48 C. A1 (100 120) Nº %

RS-RG-48 S

RS-RG-48

3 84 87 87 0 0 0 0 0 0 0 87 0 0



100

3,45 96,55

%

34 392 426 416 10 0 0 0 0 0 0 426 1 0



0,23

97,65 2,35

7,98 92,02

%

C. A1 (80 - 120) C. A3 (20 - 40)

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 6

Pedro Ignácio Schmitz

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

18 303 321 316 5 0 0 0 0 0 0 321 0 0

98,44 1,56

5,61 94,39

% 7 89 96 96 0 0 0 0 0 0 0 96 0 0



100

7,29 92,71

%

C. A3 (80 - 100)

C. A3 (60 - 80)



RS-RG-48

RS-RG-48

33 276 309 286 23 0 0 0 0 0 0 309 1 0



159

0,32

92,56 7,44

10,68 89,32

%

C. A5 (60 - 80)

RS-RG-48

95 745 840 777 62 0 0 1 0 0 0 840 4 0



0,48

0,12

92,5 7,38

11,31 88,69

%

C. A5 (80 - 100)

RS-RG-48

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 7

8 117 125 123 2 0 0 0 0 0 0 125 0 0



98,4 1,6

6,4 93,6

%

C. A5 (100 - 120)

RS-RG-48

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

84 1380 1464 1330 133 0 1 0 0 0 0 1464 1 0

160

0,07

0,07

90,85 9,08

5,74 94,26

% 4 180 184 135 49 0 0 0 0 0 0 184 4 7



2,17

73,37 26,63

2,17 97,83

%

Col. Sup.

Col. Sup.



RS-RG-04

S/N (RS-RG-20)

3 108 111 89 22 0 0 0 0 0 0 111 3 0



2,70

80,18 19,82

2,70 97,30

%

C. I (0 - 20)

RS-RG-04

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 8

0 79 79 55 24 0 0 0 0 0 0 79 0 0



69,62 30,38

100

%

C. I (20 - 40)

RS-RG-04

0 29 29 19 10 0 0 0 0 0 0 29 0 0



65,52 34,48

100

%

C. I (40 - 60)

RS-RG-04

Pedro Ignácio Schmitz

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

0 108 108 74 34 0 0 0 0 0 0 108 0 0 68,52 31,48

100

% 62 1078 1140 946 166 28 0 0 0 0 0 1140 28 94



161

2,46

82,98 14,56 2,46

5,44 94,56

%

Col. Sup.

C. I (20 - 60)



RS-RG-08

RS-RG-04 S

11 178 189 161 26 2 0 0 0 0 0 189 10 10



5,29

85,19 13,76 1,06

5,82 94,18

%

C. I (0 - 10)

RS-RG-08

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 9

10 128 138 112 25 1 0 0 0 0 0 138 2 0



1,45

81,16 18,12 0,72

7,25 92,75

%

C. I (10 - 20)

RS-RG-08

2 59 61 48 13 0 0 0 0 0 0 61 0 0



78,69 21,31

3,28 96,72

%

C. I (20 - 30)

RS-RG-08

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

1 57 58 44 14 0 0 0 0 0 0 58 0 0

75,85 24,14

1,72 98,28

0 17 17 16 1 0 0 0 0 0 0 17 0 0





94,12 5,88

100

%

C. I (40 - 50)

C. I (30 - 40) %

RS-RG-08

RS-RG-08

1 74 75 60 15 0 0 0 0 0 0 75 0 0



80 30

1,33 98,67

%

C. I (30 - 50)

RS-RG-08 S

34 218 252 226 26 0 0 0 0 0 0 252 2 8



162

0,79

89,68 10,32

13,49 86,51

%

Col. Sup.

RS-RG-14

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 10

28 343 371 243 127 1 0 0 0 0 0 371 13 8



3,50

65,50 34,23 0,27

7,55 92,45

%

Col. Sup.

RS-RG-03 (01)

Pedro Ignácio Schmitz

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

9 49 58 48 10 0 0 0 0 0 0 58 0 0

82,76 17,24

15,52 84,48

% 0 65 65 41 24 0 0 0 0 0 0 65 3 0



163

4,62

63,08 36,92

100

%

C. I (0 - 20)

Col. Sup.



RS-RG-28

RS-RG-28

0 16 16 13 3 0 0 0 0 0 0 16 0 0



81,25 18,75

100

%

C. I (20 - 40)

RS-RG-28

0 1 1 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0



100

100

%

C. I (40 - 60)

RS-RG-28

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 11

0 82 82 55 27 0 0 0 0 0 0 82 3 0



3,66

67,07 32,93

100

%

C. I (0 - 60)

RS-RG-28 S

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

AREIA AREIÃO TOTAL ALISADO DIGITADO IMP. CESTARIA ROLETADO PONTEADO ESCOVADO UNGULADO ENGOBADO TOTAL IMP. ESTEIRA TUPIGUARANI

Modos

Amostras

70 1017 1087 987 100 0 0 0 0 0 0 1087 1 40

164

0,09

90,80 9,20

6,44 93,56

4 23 27 24 3 0 0 0 0 0 0 27 0 0





88,89 11,11

14,81 85,19

%

C. I (0 - 20)

Col. Sup. %

RS-RG-10

RS-RG-10

5 16 21 20 1 0 0 0 0 0 0 21 0 0 95,24 4,76

23,81 76,19

0 4 4 4 0 0 0 0 0 0 0 4 0 0 100

100

9 43 52 48 4 0 0 0 0 0 0 52 0 0 93,31 7,69

17,31 82,69

RS-RG-10 RS-RG-10 S C. I (40 C. I (20 - 40) C. I (0 - 60) 60) Nº % Nº % Nº %

RS-RG-10

2. Distribuição da Cerâmica Vieira pelos Sítios - cont. 12

128 3691 3819 3508 276 35 0 0 0 0 0 3819 58 753



1,52

91,86 7,23 0,92

3,35 96,65

%

Col. Sup.

RS-RG-03 (2/5)

Pedro Ignácio Schmitz

Figura 26 – Tradição Vieira: Seriação da cerâmica da fase Vieira e da fase Torotama.

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

165



2,05

2,45

1,97

3

4

7

RS-RG-10 S/n (RSRG-20) RS-RG-48

166





5,56

1

3,23

9

2,86

TOTAL

1

24

9,68

4,35 1 0,62

4b

5b

6b

7b

3 16,67 4

4 12,90 1

22,22

3,23

6 3,73 22 13,66 22 13,66 11 6,83 1 0,62

3b

2 6,45 3 9,68

2b

4

3

8,57 10,00

2

1 5,00

2,86

8,59

15 9,20

3

7,50

3

4 11,43 4

9 5,52

5

3,07 11

3 2,05 17 11,64 13

1 2,86 1 2,86

296

3 30,00 2

234 20,00

6,45

3

1

156 10,00

9,68

42

49

50

76

42 12,14 46 13,29 48 13,87 75 21,68

186

3,23 12

66

4

66 19,08 4 1,16

122

1

11

1 10,00

128

6

21

6 1,73 20 5,78

60

2 6,45 2 6,45

6

126

9,22 16 7,77 39 18,93 32 15,53 35 16,99 6 2,91 1 0,49 5 2,43 12 5,83 10

13 41,94 5 16,13 2

3 30,00

3

7



39 10,96 72 20,22 59 16,57 37 10,39 26 7,30 4 1,12 4 1,12 22 6,18 31 8,71 24

2

RS-RG-50 1 0,29 21 6,07

11,11

3,23

6,21

6,85 23 15,75 35 23,97 16 10,96 13 8,90

42

RS-RG-21

17,14

7,50 11 27,50

4 11,43 6

17,50 3

TOTAL

FASE TOROTAMA

2

1

36 22,09 23 14,11 36 22,09 14

10

7

1

RS-RG-49

6,45

22,22

29,03



5 12,5 1 2,5 5 3,07 5 3,07

8b

163

146

40

35

308

18

31

161

TOTAL

6

1,73

4,85

35

4

7

4 1,16 7 2,02

84

1 3,23

7 3,40 8 3,88 1

356

346

10

1495

31

206

6,74 17 4,78 13 3,65 1 0,28 356

6,75

8,90 12 8,22 1 0,68

7,50

11,43 3 8,57 1 2,86

35 11,36 55 17,86 63 20,45 34 11,04 19 6,17 1 0,32 1 0,32 9 2,92 27 8,77 34 11,04 23 7,47 5 1,62

4 22,22 4

19,35 1

6

19

2



3. Formas por Sítios (Soma das Amostras)

19 11,80 28 17,39 32 19,88 10



RS-RG-20 2 0,97 14 6,80

2,5

1

0,65

2

6 17,14

3,23

1

RS-RG-14

1,24

2



RS-RG-08 RS-RG-03 (1) RS-RG-28 RS-RG-03 (2/5) RS-RG-04

FASE VIEIRA

SÍTIOS

FORMAS

Tabela 3 – Cerâmica Vieira: Formas por sítios (soma das amostras).

Pedro Ignácio Schmitz

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

1. Seriação da Pasta e do Tratamento da Superfície (quadro 2, Fig.26)

Tomando, pois, a fase Torotama e a fase Vieira como uma unidade, observamos que a pasta com areia decresce desde um máximo de 97,05% até abaixo de 5%; a pasta com areião cresce na proporção inversa. - Se tomarmos as duas fases isoladamente, notamos que a pasta com areia representa entre 97,05% e 87,27% na fase Torotama; na fase Vieira decresce rapidamente de 47,65% até abaixo de 5%. Tomando a fase Torotama e a fase Vieira como uma unidade, observamos que no tratamento da superfície o alisado predomina sempre, mantendo porcentagens desde 65,50% até 100% do total. O digitado, presente desde o começo em pequena porcentagem, cresce até 34,23%, decrescendo novamente. O engobado só existe na parte baixa da seriação, correspondendo exclusivamente à fase Torotama. O penteado, o roletado e o ungulado interno só estão presentes uma vez cada um, no meio da fase Vieira. O escovado está presente uma vez na fase Torotama. A impressão de cestaria aparece na parte final da fase Vieira, quando há contato com o Tupiguarani. Finalmente a impressão de esteira, que não consideramos como tratamento de superfície, mas como impressão acidental, aparece em pequena proporção desde o começo da fase Vieira, crescendo na sua parte final. Caracterizando a fase Torotama e os diferentes momentos da fase Vieira, temos os seguintes elementos indicadores: Torotama tem predomínio absoluto da pasta com areia, presença de engobe, ausência da impressão de esteira. Vieira inicial tem pasta com areia abundante, em declínio; pouco digitado. Vieira médio, pouca pasta com areia, digitado em crescimento. Vieira final, pouca pasta com areia, digitado bem representado, impressão de cestaria, presença de cerâmica Tupiguarani. 2. Seriação das Formas (Quadro 3, Fig. 27)

Utilizando apenas as amostras representativas e omitindo as excessivamente pequenas, observamos as seguintes tendências: as 167

Pedro Ignácio Schmitz

formas de contorno simples, mais abertas e mais fechadas (1a, 2a, 6a, 7a, 8a) decrescem; as formas com paredes próximas à posição vertical (4a, 5a) crescem, mas no fim têm pequeno decréscimo; a forma 3a não mostra uma tendência definida.

Figura 27 – Cerâmica Vieira: Formas por sítios das fases Vieira e Torotama. 168

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Tabela 4 – Cerâmica Vieira: Contorno dos vasilhames por sítios. 4. Contorno dos Vasilhames por Sítios CONTORNOS SÍTIOS

CONTORNO SIMPLES

CONTORNO INFLETIDO

FASE VIEIRA Nº

%



%



RS-RG-08

99

61,49

62

38,51

161

RS-RG-3 (01)

21

67,74

10

32,26

31

RS-RG-28

11

61,11

7

38,89

18

RS-RG-03 (2/5)

209

67,86

99

32,14

308

RS-RG-04

21

60,00

14

40,00

35

RS-RG-14

28

70,00

12

30,00

40

RS-RG-10

100

68,49

46

31,51

146

S/n (RS-RG-20)

128

78,53

35

21,47

163

RS-RG-48

244

68,54

112

31,46

356

RS-RG-20

163

79,13

43

20,87

206

RS-RG-49

26

83,87

5

16,13

31

TOTAL

1050

445

1495

FASE TOROTAMA RS-RG-21

9

90,00

1

10,00

10

RS-RG-50

303

87,57

43

12,43

346

TOTAL

312

44

169

356

Figura 28 – Cerâmica Vieira: Contorno dos vasilhames por sítios.

Pedro Ignácio Schmitz

170

171

TOTAL

48-52cm

130

0,77

27

15

1

277

0,36

1,81 1

1

27

3,70

3,70

3

36

8,33

0,55

% 1

Nº 5,56

% 5

27 14,92 4 22,22 104

1



1

5

7,38

%

42-46cm

2,31 1 3,70

22



3

%

10 7,58



24 18,46 6 22,22 3 20,00 32 11,55 6 22,22 9 25,00 22 16,30 14 10,61 45 15,10 19 10,50

1,48

0,74

%

1

10

135

0,74

7,41

3

132

2,27

2

14

298

0,67

4,70

2

2

5

181

1,10

1,10

2,76

18

1276

3

7

45

180

32 23,70 35 26,52 69 23,15 32 17,68 3 16,67 289

2

1



30-34cm

11,11

2,78

2,78

%

36-40cm

1

1



25 19,23 6 22,22 6 40,00 68 24,55 9 33,33 4

3,70

%

24-28cm

1



39 30,00 8 29,63 4 26,67 87 31,41 4 14,81 11 30,56 42 31,11 46 34,85 91 30,54 49 27,07 6 33,33 387

7,94

0,36

%

FASE TOROTAMA

4

2



0,98

%

90 29,32

3



90

3

TOTAL

6

1

9

25

307

0,33

2,93

8,14

66,67 73 23,78

313

1

9

25

77

33,33 106 34,53 108

%

TORS-RG-21 RS-RG-50 TAL

18-22cm



RSRG-49

25 19,23 4 14,81 2 13,33 61 22,02 5 18,52 7 19,44 25 18,52 24 18,18 55 18,46 44 24,31 4 22,22 256

%

S/n (RSRS-RG-48 RS-RG-20 RG-20)

12-16cm



RS-RG-14 RS-RG-10

22

%

RSRG-04

13 10,00 2 7,41



RS-RG-03 (2/5)

6-10cm

%

RSRG-28

1



RSRG-08

0-4 cm

ABERTURAS

RSRG-03 (01)

SÍTIOS FASE VIEIRA

5. Aberturas dos Vasilhames por Sítios

§§

Tabela 5 – Cerâmica Vieira: Abertura dos vasilhames por sítios.

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Figura 29 – Cerâmica Vieira: Aberturas por sítios

Pedro Ignácio Schmitz

172

173

12,5

1 100,00 21

3

AREIA

TOTAL

1

40

87,5

2

TOTAL

AREIÃO

186

42

50,00



1

%

%

8,06

3a

19



%

8,12

4a

%

46 15,54



5a

21



%



7a

24

42

2

296

4,76

49

3

6,12

50

3

6,00

95,24 46 93,88 47 94,00

234

76

1

75

156

%



1,32 66

1

%

75,00

25,00

1,52 4

100,00

FASE TOROTAMA

12

98,68 65 98,48 4

122

8a

FASE VIEIRA

13,46 20 16,39 3

6a

%

Nº 10,00

%

3b

8



% 6,25

4b

7



% 5,56

5b

11

128

6

21

3

14,29

6 100,00 18 85,71

60

6

6

126

100,00

9 81,82 54 90,00 120 93,75 119 94,44

2 18,18 6



2b

6. ANTIPLÁSTICOS POR FORMAS

30 71,43 171 91,94 215 91,88 250 84,46 135 84,54 102 83,61 9

12 28,57 15

AREIÃO



%

50,00

1

2a



1a

AREIA

ANTIPLÁSTICO

FORMAS

Tabela 6 – Cerâmica Vieira: Antiplástico por formas.

% 4,76

3



% 8,57

7b

167

Nº % TOTAL

8b

4

1

3

84

25,00

75,00

7

7

35

100

1

356

17

339

1495

80 95,24 32 91,43 1 100 1328

4



6b

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Pedro Ignácio Schmitz

As formas de contorno infletido mais abertas e mais fechadas (2b, 3b, 6b, 7b, 8b) crescem inicialmente, para decrescerem novamente; as formas próximas à posição vertical (4b, 5b) crescem. De um modo geral se nota uma redução, no tempo, das formas mais abertas e mais fechadas, havendo uma tendência a uniformização, expressa na produção de formas com paredes próximas à posição vertical. O crescimento inicial das formas de contorno infletido mais abertas e mais fechadas está relacionado com um crescimento generalizado das formas infletidas, como se vê no gráfico seguinte. 3. Seriação do Contorno (Quadro 4, Fig. 28)

Utilizando novamente só as amostras com suficientes elementos, observamos uma tendência clara de decréscimo do contorno simples, em oposição ao crescimento do contorno infletido, que cresce na proporção inversa. 4. Seriação da Abertura dos Vasilhames (Quadro 5, Fig. 29)

Tomando ainda uma vez só as amostras com suficientes elementos, notamos as seguintes tendências gerais: as aberturas menores (6-16 cm) tendem a decrescer, as aberturas maiores (18-40 cm) tendem a crescer, embora apresentem novamente pequena redução na parte final. As aberturas muito pequenas (0-4 cm) e muito grandes (42-52 cm) estão pouco representadas e não apresentam tendência clara. As medidas foram feitas de 2 em 2 cm. Além de uma uniformização das formas, nota-se, portanto, um aumento das mesmas, quase no começo da seriação, que apresenta depois certa estabilidade. Nos quadros, cuja análise segue, procuramos ver as relações que existem entre os diversos modos. 1. Quadro do Antiplástico por Formas (Quadro 6) A proporção do antiplástico nas formas está em relação com a distribuição do antiplástico, das formas e do contorno no tempo: 174

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

na fase Torotama temos mais areia, porque e mais antiga; as formas mais abertas e mais fechadas têm mais areia, porque são proporcionalmente mais antigas; as formas infletidas têm menos areia, porque são proporcionalmente mais novas. A constatação básica parece ser de que não existe uma relação entre forma e pasta, o que indica falta de especialização na cerâmica, fazendo-se qualquer vasilhame com qualquer pasta.

Tabela 7 – Cerâmica Vieira: contorno dos vasilhames por antiplásticos. 7. Contorno dos Vasilhames por Antiplástico ANTIPLÁSTICO

CONTORNO SIMPLES

CONTORNO INFLETIDO

FASE VIEIRA X



%



%

TOTAL

AREIA

137

13,05

30

6,73

167

AREIÃO

913

86,95

415

93,27

1328

TOTAL

1050

445

1495

FASE TOROTAMA AREIA

299

95,83

40

AREIÃO

13

4,17

4

TOTAL

312

44

175

90,91 9,09

339 17 356

176

%

2a

POTEADO

TOTAL

ENGOBADO

IMP. CESTARIA

1

24

1 100 24 100

42

ALISADO

UNGULADO

%



4a

%

42

42

186

3

100

1,61

49

49

234

100

5 11,90 21 11,29 32 13,68

2

DIGITADO



3a



5a

%



6a

%



%



%

8a

FASE VIEIRA

7a



%

2b

8. Decoração Presente por Formas

Nº %

3b



4b

%



5b

%



%

6b



%

7b

Nº %

8b

TOTAL

50

50

296

1

1

42

100

0,34

0,34

14,19

76

76

156

1

1

9

100

0,64

0,64

5,77

12

8,33

66

66

100

4

4

100

FASE TOROTAMA

122

16 13,11 1

11

128

1,56

6

21

2

9,52

6 100 19 90,48

60

2

6

6

126

1

100

0,79

4

4

84

100

7

7

35

100

2 18,18 6 10 24 18,75 26 20,63 13 15,48 6 17,14

1

356

2

354

1495

8

203

2 100 37 88,10 162 87,10 202 86,32 252 85,14 145 92,95 106 86,89 11 91,67 9 81,82 54 90 102 79,69 99 78,57 71 84,52 29 82,86 1 100 1282

Nº % Nº

1a

TOTAL

ENGOBADO

IMP. CESTARIA

ESCOVADO

UNGULADO

PONTEADO

DIGITADO

ALISADO

DECORAÇÃO

FORMAS

Tabela 8 – Cerâmica Vieira: Decoração presente por formas.

Pedro Ignácio Schmitz

%

% 3,72

% 13

2



% 1

0,82

8,33 21 17,21

1,28

177

4,17

2

5

23

0,85

2,14

9,83

1

2

19 0,34

0,68

6,42

21,43

9

234

18,37

5

296

1

6

12,24

6

4

24

42

49

50

5

16,67

4,08

6,12

1

7

2

3

ñ.det.

4 16,67

9,52

42-46

36-40

4

10,00

2,00

12,00

8,00

76

9

6 1

2

66

11,84 3

7,89

2

24-28

8,33

3 12,50 10 23,81 12 24,49 14 28,00 21 27,63 8

30-34

4,92

0,82

1,64

%



1

1

8,33

8,33

2

1

3

6 50,00 3

4 33,33 2

8a

4,55

1,52

3,03

12,12

4

1 25,00

1 25,00

1 25,00

122 12 11 FASE TOROTAMA 1 25,00

6

1

2

10,00 23 30,26 32 48,48

156

5,77

3,21

4,92

1 100,00 9 37,50 12 28,57 17 34,69 15 30,00 17 22,37 20 30,30

9

186

9

5

52 17,57 24 15,38 6

18-22

12-16

1

5 20,83

42

0-4

2

0,54

2,15

6,99

6 14,29 47 25,27 43 18,38 30 10,14

6-10

ñ.det.

48-52

1

4

36-40

42-46

6 14,29 13

30-34

8 19,05 52 27,96 70 29,91 72 24,32 36 23,08 38 31,15

11



7a FASE VIEIRA Nº % Nº

1 50,00 8 19,05 28 15,05 45 19,23 66 22,30 37 23,72 19 15,57

3,85

%

6a

3

Nº 5,00

%

3b

3

Nº 2,34

%

4b

7

Nº 5,56

%

5b

8

Nº 9,52

%

6b % Nº

0,78

2,34

1

3

0,79

2,38

1

2

1,19

2,38

7,14

1

3

128

126

5,71

1 14,29

35

1 25,00 1 14,29

84

2,86

8,57

9,52

6

21

6

4

7

1 14,29

2 33,33 2 50,00 1 14,29

7 33,33 1 16,67

1 16,67 3 14,29

1 16,67 2

3 50,00 6 28,57 3 50,00 1 25,00 3 42,86

1 16,67 3 14,29

60

18,18 19 31,67 27 21,09 20 15,87 10 11,90 2

1

3

6 10,00 17 13,28 22 17,46 6

9 15,00 20 15,63 27 21,43 21 25,00 5 14,29

27,27 13 21,67 31 24,22 27 21,43 23 27,38 11 31,43 9,09

%

8b

1

5 14,29 1 100,00



7b

27,27 10 16,67 26 20,31 19 15,08 13 15,48 8 22,85

18,18

%

2b

9. Aberturas Dos Vasilhames Por Formas

18-22

9



5a

24-28

5,91

0,54

4a

1 50,00 7 16,67 29 15,59 37 15,81 43 14,53 30 19,23 28 22,95

1



3a

12-16

2,38

6 14,29 11



6-10

%

2a

1



1a

0-4

ABERTURAS

FORMAS

Tabela 9 – Cerâmica Vieira: Aberturas dos vasilhames por formas.

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Pedro Ignácio Schmitz

Figura 30 – Cerâmica Vieira: Aberturas dos vasilhames por formas.

178

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Tabela 10 – Cerâmica Vieira: Espessura das paredes por formas (em mm.). 10. Espessura das Paredes por Formas (Em Mm.) FORMAS

1a

2a

3a

4a

5a

6a

ESPESSURAS MÁXIMA

8a 2b 3b

4b

5b 6b 7b 8b

FASE VIEIRA 8

MÉDIA MÍNIMA

7a

7,5

12,5 9,5

9

9

9

9

8,5 11 9,5 10,5 10 8,5 9,5

6,5

7

7,5

7

7,5

8

8

6,5

5

5,5

6

4,5

4,5

4,5

6,5 7

8

4 4,5 5,5

8,5 7,5 7,5 5

5

5,5 4,5

FASE TOROTAMA MÁXIMA MÉDIA MÍNIMA

12

15 10,5 16 12,5

12

13

13

11

11 12 13

12,5 10 8,5

9

11

9

7,5

8

10

10

10

7

8

8,5

7

8

8

7

5,5

8

6

6

7

5

7

2. Quadro do Contorno dos Vasilhames por Antiplástico (Quadro 7) As mesmas razões apontadas para o quadro 1 se repetem aqui, mostrando que a maior porcentagem de areia no contorno simples se deve ao crescimento posterior do contorno infletido, que é paralelo ao crescimento do areião. 3.Quadro da Decoração Presente por Formas (Quadro 8) As mesmas razões apontadas para o quadro 6 novamente se repetem aqui, mostrando que o crescimento de certas formas e decorações através do tempo são os responsáveis pela diferença das porcentagens aqui anotadas. 4. Gráfico das Aberturas da Boca dos Vasilhames por Formas (Quadro 9, Fig. 30). As formas da fase Torotama apresentam aberturas em média um pouco menores que as da fase Vieira. As formas mais abertas e mais fechadas mostram geralmente bocas menores nas duas fases, o que parece estar relacionado com a evolução das formas no tempo. As aberturas em números absolutos vão de 4 a 52 cm, mas a maior freqüência está entre 6 e 34 cm, isto é, as bocas são médias, sendo muito úteis para uso familiar e para grupo que migra. 179

Pedro Ignácio Schmitz

5. Quadro da Espessura das Paredes (Quadro 10) A espessura das paredes na fase Torotama oscila entre 5 e 15 mm, concentrando-se a maior parte entre 8 e 11 mm. A espessura das paredes na fase Vieira é menor, oscilando entre 4 e 12,5 mm; concentra-se a maior parte entre 6,5 e 7,5 mm, notando-se acentuada uniformidade. Não se observam diferenças consideráveis de uma forma para outra, o que vem confirmar novamente a falta de especialização da cerâmica. Se fazemos um balanço das seriações, notamos modificações através do tempo, nos seguintes modos: a pasta com areião aumenta em detrimento da pasta com areia; a espessura das paredes diminui; no tratamento da superfície, desaparece o engobo da base, o digitado cresce, aparece e cresce a impressão acidental de esteira, aparece a impressão de cestaria; com relação às formas, as mais abertas e mais fechadas diminuem em benefício das que têm paredes mais verticais, as de contorno infletido crescem em detrimento das de contorno simples, a abertura da boca cresce. Procuramos indicar o sentido de algumas dessas mudanças: o aumento do areião permite fazer uma parede mais fina, mais resistente e mais condutora por causa do quartzo, aumentando a eficiência do vasilhame. O aumento da boca dos vasilhames, com a diminuição das formas mais abertas e mais fechadas, dá maior capacidade. Isso parece mostrar um maior domínio na fabricação de cerâmica. O aumento do digitado pode estar em relação com o aumento do tamanho e da densidade dos fragmentos de antiplástico, tornando mais difícil o alisamento. O aparecimento da impressão de cestaria, no momento em que o grupo Vieira entra em contato regular com o Tupiguarani, poderia ser a vontade de produzir decorações semelhantes às dos seus vizinhos. Não sabemos explicar o crescimento das formas infletidas, em detrimento das formas de contorno simples. 180

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Se fazemos um balanço dos quadros nos quais relacionamos diversos modos entre si, observamos que não parecem existir ligações fixas entre forma e antiplástico, forma e decoração, forma e abertura da boca. Em outras palavras, não parecem existir formas especializadas ou exclusivas. Isso parece ser um indicador de um grupo não-especializado. Dados Sobre a Impressão de Esteira A impressão de esteira aparece freqüentemente, estando presente em todos os sítios da fase Vieira. Não está presente na fase Torotama. Durante aproximadamente 1.500 anos não oferece maior variação, embora aumente no final da fase Vieira, razão por que não utilizamos a impressão de esteira na seriação; não parece ter sido percebida como elemento decorativo, mas simplesmente como acidente de produção. Pela disposição das impressões no corpo do vasilhame, (perto da base, mas nunca na borda), pela debilidade da impressão e por encontrar-se sobreposta ao acabamento normal do vasilhame (alisamento grosseiro ou digitado) parece ser acidental, surgindo em decorrência de se apoiar o vasilhame durante o alisamento interno, em posição inclinada, sobre uma esteira. Por essa razão, também a impressão da esteira pode aparecer dupla ou múltipla, justaposta ou cruzada, de acordo com o movimento do vasilhame. As impressões que aparecem nos cacos, o mais das vezes, são as saliências da fibra que une os feixes do leito da esteira. Muitas vezes se notam fracamente esses feixes. Em alguns cacos se vê a trama inteira da esteira. Os feixes paralelos do leito da esteira são de fibra desfiada ou batida na maioria das vezes, medindo os feixes entre 3 a 5 mm de largura ou espessura. Nas impressões não se distingue a matéria-prima usada, que pode ser junco, junquilho, taboa, ou mesmo gravatá, tanto para os feixes do leito quanto para a fibra de amarração. Quanto à técnica podemos distinguir as esteiras simples das duplas: nas simples (Fig. 31: a - e) o leito é formado por feixes paralelos amarrados a distâncias que variam geralmente de menos 1 a 1,5 cm. Os feixes parecem amarrados paralelos e não em forma 181

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Figura 31 – Cerâmica Vieira: Impressões de esteira e cestaria.

182

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de gaze. A amarração deve ser feita com duas fibras que se trançam (i). Nas esteiras duplas (f - g) temos um leito duplo, correndo um conjunto de feixes numa direção e outros perpendicularmente aos mesmos. Com isso também existe uma amarração dupla, que se cruza perpendicularmente. Em alguns casos (h) se vê que um leito simples parece ter uma amarração dupla, como no caso da esteira dupla, ou ao menos um reforço transversal. No quadro da cerâmica (Quadro 2) indicamos a presença de cacos com impressão de esteira, mas não os incluímos no cômputo como modos, considerando-se para todos os efeitos o tratamento subjacente da superfície para a tipologia. Fora da seriação, indicamos que porcentagem do total dos cacos apresenta impressões de esteira (Fig. 26). Dados sobre a Impressão de Cestaria A impressão de cestaria aparece sê na fase Vieira e somente a partir do momento em que nos sítios também existe bastante cerâmica Tupiguarani, isto é, depois do primeiro milênio d. C. A impressão de cestaria não é elemento da tradição Tupiguarani e pode ser explicada como uma inovação acompanhando o contato. A razão parece ser a vontade do ceramista Vieira de produzir uma decoração mais complexa que a usada anteriormente, não reproduzindo a cerâmica do outro, mas criando uma própria. A impressão de cestaria encontra-se sobreposta à característica da cerâmica Vieira, razão por que só podemos atribuí-la a este grupo. Se está ligada à introdução de uma cestaria nova, de origem Tupiguarani, ou veiculada por eles, ou se meramente é usada uma cestaria preexistente no grupo Vieira para decorar a cerâmica, não pode ser elucidado por falta de elementos. É preciso lembrar que a tradição Taquara, que é contemporânea da Vieira, usa em grande abundância a impressão de cestaria na sua cerâmica, mas não se vê nenhuma conexão entre o surgimento dessa técnica de decoração na cerâmica Vieira e a existência já durante quase um milênio de semelhante técnica no planalto do Rio Grande do Sul. O exame das impressões de cestaria (Fig. 31) permite distinguir várias técnicas de fabricação de cestos, que procuramos ilustrar a 183

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seguir. Às vezes a impressão não permite inferir com exatidão, ou de nenhum modo, a técnica usada. Às vezes também, o que parece impressão de cestaria, poderia ser a impressão com uma espátula, imitando a impressão do cesto. Como os cacos são relativamente pouco numerosos, há pouca probabilidade de que tenhamos esgotado as técnicas de cestaria e os motivos decorativos buscados. Em coleções particulares vimos outros motivos, mas não houve possibilidade de acrescentá-los aqui. (Foto 7) Os cestos são relativamente pequenos, mantendo o mesmo tamanho que a cerâmica Vieira tradicional. Esta afirmação não exclui a existência de quaisquer outros cestos, com outro tamanho e outra técnica de fabricação. A impressão de cestaria costuma cobrir toda a face externa do vasilhame, com exceção de estreita faixa beirando o lábio. Se o vasilhame foi realmente moldado dentro do cesto ou foi imprensado nele depois de moldado, não fica claro; às vezes as impressões são tão fracas e os interstícios tão alisados que a segunda alternativa parece possível. 1. Cestaria em espiral: enrolada simples: “Sobre uma base de fibras enroladas em círculo, outras fibras giram em sentido transversal, sustentando a distâncias irregulares o maço de fibras que formam um disco. A ligação é obtida amarrando os feixes um ao outro.” (Diversos, Textiles 1966:80). Os feixes horizontais podem ser chatos (como se fossem feixes de folhas de taboa) (f, g), achatados (a, b, c), angulosos ou arredondados (h). A tira de amarração, fina, pode ser angulosa, arredondada, amarrada com (b) ou sem torção, fina ou grossa (d, e, i, J). O fecho ou arremate do cesto na parte superior, onde são absorvidas as fibras restantes e se dá consistência para que o trabalho não se desmancha, aparece de três maneiras nas poucas bordas existentes: o enrolamento continua sem modificação (k); ou a tira, além de amarrar o feixe inteiro, é passada também pelo meio dele (1), ou se faz um fecho mais complicado (m), que só pela impressão é difícil de elucidar. Tamanho dos cestos impressos: 10 - 28 cm. 184

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2. Cestaria em espiral: bifurcada com costura. É enrolada como a anterior, mas uma das tiras é bifurcada ou dupla, sendo costurada com a outra, que pode ser simples ou também dupla ou bifurcada. (Diversos, Textiles 1966:80). No caso concreto, com apenas dois pequenos cacos a técnica não fica muito clara, razão por que representamos alternativas: a) vista do lado interno; b) e c) alternativas para a face externa. 3. Técnica não definida 1: Pode ser enrolada simples, cestaria com armadura vertical, ou mesmo esteira. 4. Técnica não definida 2: Temos apenas um fragmento pequeno e a impressão pode ser de alguma cestaria, como também de um carimbo. 5. Técnica não definida 3: Há diversos fragmentos, mas com as impressões não se chegou a captar a técnica de produção. 6. Cestaria com armadura vertical. Existe apenas um caco de borda. As fibras trançadas, tanto as verticais como as horizontais, são finas, parecendo junquilho. As tiras horizontais, de espessuras diferentes, sucedem-se em seqüências fixas, produzindo barras sucessivas. Tamanho do cesto impresso: 32 cm.

B. A Cerâmica de Tradição Tupiguarani Em quase todos os sítios do projeto aparece, na superfície, cerâmica de tradição Tupiguarani. Em alguns é abundante, em outros são apenas alguns cacos. É da fase Camaquã (Naue s.d.:12 ss), da subtradição Corrugada. No quadro pode-se ver a sua distribuição por sítios e níveis de escavação. Na análise do material separamos três tipos de pastas: a pasta preparada com cacos moídos, por ser o antiplástico Tupiguarani 185

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mais diagnóstico; a pasta com areião, por ser o antiplástico da cerâmica Vieira no momento do contato com o Tupiguarani; os demais fragmentos como pasta com areia. Paralelamente analisamos a decoração ou tratamento de superfície e as formas, segundo modelo tradicional. Querendo compor um tipo clássico, basta juntar os diferentes modos por nós separados. 1. Descrição da Cerâmica

As Pastas: a) Pasta com Areia

I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelada. Os negativos e positivos dos roletes aparecem bem; ao lado deles parece que algumas vezes se usou o modelado à mão, principalmente no RS-RG-03. Diâmetro dos roletes de 0,2 a 0,8 cm. 2. Impurezas da argila: restos de vegetais carbonizados de 2 a 6 mm, raramente pequenos fragmentos de conchas (2 mm) e ossos (3 mm). 3. Antiplástico: areia rolada fina, hematita de 1 a 2 mm, feldspato de 2 a 5 mm, concreções ferruginosas de 2 a 6 mm, fragmentos angulosos de quartzo até 4 mm, rarissimamente lamínulas de mica, menores de 1 mm. O antiplástico é muito denso. 4. Textura: compacta, muito poucas bolhas de ar. Fratura ao longo dos roletes, produzindo cacos pequenos e irregulares. 5. Cor do núcleo: predomina o negro e o cinza; mais raramente aparece o amarelado e o vermelho em cacos totalmente oxidados. 6. Cozimento: oxidante. Regular. Aparecem manchas de cocção. Nos cacos não completamente oxidados, a espessura modificada vai de 1 a 5 mm. A pasta apresenta-se parcialmente fundida. 7. Dureza (E. Mohs): 3 e 3,5. 186

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II. Elementos da Superfície: 1. Cor da Superfície: interna e externa: geralmente igual, variando do amareloescuro ao cinza e ao negro. 2. Superfície interna: alisamento, geralmente bom. 3. Superfície externa: veja descrição mais adiante. III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos mais adiante. b) Pasta com Caco Moído

I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelada. Os negativos e positivos dos roletes aparecem muito. Diâmetro dos roletes 0,5 a 1,8 cm. Algumas bases parecem modeladas à mão. 2. Impurezas da argila: restos vegetais alongados, carbonizados, de 2 a 6 mm, fragmentos de conchas de 2 a 4 mm, minúsculos ossinhos de 2 mm. 3. Antiplástico: caco moído com tamanhos de 1 a 5 mm, fragmentos angulosos de quartzo de 2 a 5 mm, de cor transparente, leitosa ou rosada, hematita de 1 a 2 mm, abundantes concreções ferruginosas de 1 a 6 mm, areia. O antiplástico é muito denso no sítio RS-RG-03, nos outros é médio. 4. Textura: compacta, com algumas bolhas de ar e fissuras na união dos roletes. A fratura, regular, geralmente acompanha os roletes e é áspera ao tato. 5. Cor do núcleo: geralmente cinza-escuro, mas com variações que vão até o amarelo-alaranjado. 6. Cozimento: oxidante. Regular, havendo cacos totalmente oxidados. Nos cacos não totalmente oxidados, a espessura da camada oxidada varia de 1 a 4 mm. A pasta apresenta-se parcialmente fundida. 7. Dureza (E. Mohs): 3. II. Elementos da Superfície: 187

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1. Cor da superfície interna e externa: geralmente igual, variando do amarelo-escuro ao cinza e ao negro. 2. Superfície interna: alisamento geralmente bom. 3. Superfície externa: veja descrição mais adiante. III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos mais adiante. c) Pasta com Areião

I. Elementos da Pasta: 1. Manufatura: acordelado. Os negativos e positivos dos roletes estão bem visíveis. Diâmetro dos roletes: 0,7 a 1,2 cm. 2. Impurezas da argila: ossinhos até 12 mm. 3. Antiplástico: abundantes fragmentos angulosos de quartzo geralmente de 1 a 2 mm, às vezes 10 mm, e feldspato de 2 a 4 mm, hematita de 1 a 4 mm, concreções ferruginosas de 1 a 5 mm. O antiplástico é muito denso no RS-RG-03 e regular nos demais sítios. 4. Textura: compacta, sendo raras as bolhas de ar, mas não uniforme devido ao tamanho e à distribuição do antiplástico. A fratura, regular, geralmente acompanha os roletes e é áspera. 5. Cor do núcleo: a maior parte cinza-escura, mas também existem cacos esbranquiçados, alaranjados e vermelhos quando totalmente oxidados. 6. Cozimento: oxidante. Regular. Nos cacos não totalmente oxidados, a espessura da camada transformada varia de 2 a 9 mm. A pasta apresenta-se parcialmente fundida. 7. Dureza (E. Mohs): 4 e 4,5. II. Elementos da Superfície: 1. Cor da superfície interna e externa: geralmente igual, variando do amarelo-escuro ao cinza e ao negro. 2. Superfície interna: alisamento geralmente bom. 3. Superfície externa: veja descrição mais adiante. 188

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III. Formas: Veja descrição, quadros e gráficos mais adiante. Tratamento das Superfícies ou Decoração:

Quando não se indica outra coisa, a superfície interna é alisada, como se disse ao descrever as pastas. 1. Alisado externo: A parede externa em geral foi regularmente alisada. A espessura das paredes dos vasilhames varia de 0,4 a 1,5 cm. 2. Pintado externo e/ou interno: A pintura externa geralmente é bicolor, vermelho ou marrom sobre engobe claro. Vai do lábio ao ombro e se distribui em motivos paralelos à borda. A pintura interna pode ser vermelha ou bicolor, cobrindo provavelmente toda a superfície interna. A espessura média das paredes dos vasilhames é de 1 cm. 3. Corrugado externo: Corrugações alinhadas paralelas à borda do vasilhame, cobrindo-o do lábio à base. As corrugações são produzidas: pressionando os roletes, na medida em que são colocados, contra o imediatamente anterior. A polpa do dedo deixa depressões rítmicas acompanhadas pelas saliências da massa deslocada por cada uma das pressões do dedo. As corrugações variam de 1 cm de altura por 0,5 cm de largura e 1,5 cm de altura por 0,7 cm de largura. A profundidade é média ou pequena e se encaixa no chamado corrugado B e C. O acabamento é regular, às vezes tão uniforme que sugere uma impressão de cesto. A espessura média das paredes dos vasilhames é de 1 cm. 4. Corrugado-ungulado externo: Corrugações alinhadas paralelas à borda, como no caso anterior, mas com o acréscimo de impressões da borda da unha, que podem ser casuais e acompanhar a impressão da polpa ou intencionais e 189

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ser sobrepostas às corrugações. As corrugações variam de 1,8 cm de altura por 0,8 cm de largura a 0,8 cm de altura por 0,4 cm de largura. A profundidade é a correspondente ao corrugado-ungulado B e C. O acabamento pode ser regular ou ruim. A espessura das paredes dos vasilhames vai de 0,6 a 1,3 cm. 5.Ungulado externo: Faixas regulares ou irregulares de impressões da borda da unha geralmente paralelas à borda e feitas sobre uma superfície anteriormente alisada. As impressões, que são geralmente perpendiculares a borda, podem medir de 0,4 a 0,7 cm de comprimento. A espessura média das paredes dos vasilhames é de 0,7 cm. 6. Escovado externo: A parede apresenta estrias aproximadamente paralelas mas dispostas irregularmente, estreitas e de pouca profundidade. A espessura das paredes dos vasilhames é de aproximadamente 0,5 e 1 cm. As decorações são tipicamente Tupiguarani, não se observando modificações notáveis; o corrugado regular, parecendo impressão de cestaria, talvez pudesse ser apontado como uma pequena acomodação surgida no momento do contato, quando também na cerâmica de tradição Vieira aparece impressão de cestaria, antes desconhecida. As Formas (F1g. 32)

As formas são descritas de acordo com a classificação de Shepard (1961:224 ss). Forma 1: Vasilhame não restringido, contorno simples, um ponto terminal, secção de elipsóide ou esfera, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 8 a 50 cm. Para a distribuição por antiplástico, decoração e sítio, ver quadros. 190

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Forma 2: Vasilhame restringido, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, secção de ovóide, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 4 a 38 cm. Forma 3: Vasilhame restringido, contorno simples, um ponto terminal, um ponto de tangência vertical, secção de elipsóide ou esfera, base arredondada, borda com pequeno reforço externo na sua parte superior, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 12 a 36 cm. Forma 4: Vasilhame não restringido, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, secção de elipsóide, base arredondada, borda direta ou levemente restringida, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 10 - 42 cm, predominando de 14 a 24 cm. Forma 5: Vasilhame independentemente restringido, contorno infletido, um ponto terminal, um ponto de inflexão, 2 pontos de tangência vertical, corpo esférico, base arredondada, borda direta, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 12 a 40 cm, predominando de 12 a 26 cm. Forma 6: Vasilhame independentemente restringido, contorno complexo, um ponto terminal, 2 pontos angulares, o corpo elíptico, sobre ele um estreitamento cilíndrico, base arredondada, borda geralmente direta, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 10 a 44 cm. Forma 7: Vasilhame dependentemente restringido, contorno composto, um ponto terminal, 1 ponto angular, a parte inferior em calota de esfera, a superior conóide, base arredondada, borda direta, levemente restringida ou com pequeno reforço interno. Abertura da boca de 24 a 36 cm. Forma 8: Vasilhame independentemente restringido, contorno complexo, um ponto terminal, um ponto de inflexão, 2 pontos de tangência vertical, um ponto angular, corpo ovalóide, gargalo co191

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nóide, secção superior conóide, base arredondada, borda direta ou restringida, lábio arredondado ou apontado. Abertura da boca 8 a 26 cm.

Figura 32 – Formas dos vasilhames da cerâmica Tupiguarani. 192

193

100%

NÃO CLASSIF.

70

1

97

ESCOVADO

TOTAL

2

1

1,03

1,03

4

45 46,39 2 50%

2

UNGULADO

CORRUGUNGUL.

2 50%

31

31 ,96

19 19,59

4

1 25%

CORRUGADO

PINTADO

SIMPLES

2

TOTAL

97

6

6,19

13 13,40

ANTIP. AREIÃO

100%

2

ANTIP. CACO M.

78 80,41 3 75%

RSRG-21 C.I (0-10)

ANTIP. AREIA

Modos

Sítios RS-RG-50 RS-RG-21 S Col. Col. Sup. Sup.

6

6

6

1

5

100%

16,67

83,23

70

107

1

1

53

33

19

107

8

13

86

2

0,93

0,93

49,53

2

30,84 2 100%

17,76

7,48

12,15

80,37 2 100%

2

2

2

2

100%

100%

7

4

1

2

7

1

4

2

57,14

14,29

28,57

14,29

57,14

28,57

94

8

8,51

23 24,47

19 20,21

16 17,02

28 29,79

94

15 15,96

16 17,02

63 67,02

10

7

3

10

1

9

70

30

10

90 1

8

2

6

8

7

12,5

25

75

87,5

8

1

1

6

8

5

2

1

12,5

12,5

75

62,5

25

12,5

9

8

1

9

4

1

4

1

5

13

40

7

40

88,99 22

11,11

44,44

11,11

44,44 32

55

12,5

32,5

17,5

2,5

80

RS-RG-21 RS-RG-03 RS-RG-21 RS-RG-49 RS-RG-49 RS-RG-04 RS-RG-08 RS-RG-08 RS-RG-14 RS-RG-28 RS-RG-10 S Col. Sup. (01) Col. Col. Sup. Col. Sup. C.I (10-20) Col. Sup. C. II (0-20) Col. Sup. Col. Sup. C.I (0-10) Col. Sup. C. I Sup.

11. Distribuição de Cerâmica Tupiguarani por Sítios e Níveis de Escavação

Tabela 11 – Distribuição da cerâmica Tupiguarani por sítios e níveis de escavação.

9,56

8,37

753

53

7,04

225 29,88

175 23,24

63

237 31,47

753

138 18,33

543 72,11

72

RS-RG-3 (2/5) Col. Sup.

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Forma 9: Vasilhame independentemente restringido, contorno complexo, um ponto terminal, 3 pontos angulares, a parte inferior em secção de ovóide, as 3 seguintes conóides (?), base arredondada, borda direta ou levemente restringida, lábio arredondado. Abertura da boca de 16 a 30 cm. Forma 10: Vasilhame independentemente restringido, contorno complexo, um ponto terminal, 2 pontos angulares, a parte inferior ovóide, as duas seguintes conóides, base arredondada, borda geralmente um pouco reforçada, lábio arredondado ou aplanado. Abertura da boca de 16 a 32 cm. As formas são tipicamente Tupiguarani, não se notando aculturações. Não se encontraram formas bem grandes, como existem em certas fases Tupiguarani, mas no RS-RG-21 aparece o sepultamento de um infante em urna. 2. Análise dos Quadros

Observando o quadro da distribuição da cerâmica Tupiguarani por sítios e níveis de escavação, notamos, na distribuição das pastas pelos sítios uma diferença marcada nas porcentagens. O RS-RG-03 tem predominância de pasta com antiplástico de cacos, RS-RG-21, RS-RG-10 e RS-RG-08 têm predominância de areia, os sítios com poucos cacos têm predominância de areião (RS-RG-14, RS-RG-03 cerrito 1), ou areia (RS-RG-49), ou um equilíbrio entre areia e areião (RS-RG-28), nunca predominância de caco moído. A distribuição da decoração por sítios nada nos esclarece, por serem poucos os sítios com amostragem suficiente.

194

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Tabela 12 – Cerâmica Tupiguarani: Presença da pasta pelas diversas decorações. 12. Presença da Pasta pelas Diversas Decorações Areia

Pasta Decoração



Areião %



Caco Moído

%



Total

%

Alisado

88

31.32

3

1.07

190

67.62

281

Pintado

24

24.24

25

25.25

50

50.51

99

Corrugado

52

20.39

40

15.69

163

63.92

255

Corrugado-ungulado

98

28.16

89

25.57

161

46.26

348

Ungulado

8

12.70

34

53.97

21

33.33

63

1

50.00

2

191

18.23

586

55.92

1.048

Escovado Total

1

50.00

271

25.86

Observando o quadro acima notamos que a pasta mais abundante é a temperada com cacos moídos, perfazendo um total de 55,92%; segue a de areia com 25,86%, ficando 18,23% para a pasta com areião. As decorações, com exceção do escovado, que só tem 2 cacos, aparecem nas três pastas, com proporções geralmente semelhantes; as exceções são explicáveis em termos de amostragem (unguladoareião: um vasilhame com muitos cacos), ou de separação (alisadoareião: é difícil de separar do alisadoareião da tradição Vieira). Tabela 13 – Cerâmica Tupiguarani: Distribuição das formas por sítios. 13. Distribuição das Formas por Sítios Formas

1

2

RS-RG-03 (2/3) - C. Sup.

13

12 2 11

RS-RG-08 - C. Sup.

4

2

Sítios

3

1

4

5

13 3 4 4 2

3

RS-RG-03 (1) - C. Sup.

1

RS-RG-28 - C. Sup.

2

RS-RG-21 - Total

13

4

Total

32

18 3 16

6 7 8 9 10 TOTAL 5

69

1 1

12

1

2 2

2

195

2

2 2

16 7 7 4 2

1

26

6

111

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RS-RG-03 e RS-RG-21 têm a maior parte das formas, ao passo que os demais sítios só têm parte delas, o que se pode explicar em termos de número de cacos presentes no sítio. Tabela 14 – Cerâmica Tupiguarani: Presença da pasta nas diversas formas. 14. Presença da Pasta nas Diversas Formas Formas 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Areia 19+ 6 1 4 2 1 1

Areião 4 2

1 35

3 22

1 5 4 3

Caco Moído 9 10 2 11 9 2 3 4 2 2 54

Total 32 18 3 16 16 7 7 4 2 6 111

+ É provável que parte das bordas sejam de cerâmica Vieira. Não foi possível isolar completamente o Tupiguarani.

Não se nota, no quadro, uma exclusividade de certa forma para determinada pasta. As diferenças existentes na relação forma pasta são difíceis de avaliar, devido ao pequeno número de cacos. A relação decoração-forma e bem caracteristicamente Tupiguarani. Se o Vieira e o Tupiguarani vivem lado a lado na mesma localidade, de aproximadamente A.D. 1000 até o começo do século XVII ou ainda mais tarde, quais os indícios de aculturação observados na cerâmica? Que representa o fato de que numerosos sítios possuem, ao lado da cerâmica Vieira, também cerâmica Tupiguarani?

196

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Tabela 15 – Cerâmica Tupiguarani: Presença da decoração pelas formas. 15. Presença da Decoração pelas Formas Formas

Alisado

1 2

Corrugado

14+

2

10

6

6

4

4

3

1

4

3

2

4

2

5

1

7

2 1

9 10

Ungulado Escovado Total 32 1

1

6 8

Corrug. Ungul.

Pintado

3 9

16

5

8

2

16

3

3

1

7

1

4

1

4

1

1

7

2 1

5

26

18

18

2 6 28

34

5

111

+ É provável que parte das bordas sejam de cerâmica Vieira. Não foi possível isolar completamente o Tupiguarani.

RS-RG-21 tem uma parte pré-cerâmica, datada em 485 a.C., possui cerâmica incipiente claramente da fase Torotama, que deve ser dos primeiros séculos de nossa era, e tem abundante cerâmica Tupiguarani, que só pode ser do segundo milênio d.C. Com certeza quase absoluta, o Tupiguarani é uma reocupação totalmente desligada das ocupações Vieira anteriores. Os poucos cacos de RS-RG-49 e RS-RG-50 também devem ser atribuídos à passagem Tupiguarani posterior à ocupação Vieira: os sítios como tais são muito anteriores ao Tupiguarani e os cacos estão na superfície. Não se pode aceitar que a cerâmica Tupiguarani de RS-RG-08, 14,3(1), 28, 10, 3(2/5) venha de reocupação do sítio pelos horticultores Tupiguarani porque também os demais sítios da mesma época e área, estudados por Naue (s.d.) e os estudados por nos em outros locais têm material Tupiguarani. Existe ainda uma outra razão: nesses sítios a presença do Tupiguarani é acompanhada pelo aparecimento da impressão de cestaria, que não existia antes na cerâmica de tradição Vieira e que parece uma resultante do contato. O Tupi197

Pedro Ignácio Schmitz

guarani representa, com exceção do RS-RG-03, uma porcentagem muito pequena e se encontra na superfície. Essa presença da cerâmica Tupiguarani nos sítios Vieira se explica melhor em termos de contato regular do grupo Vieira com o Tupiguarani, cujos sítios distam apenas algumas centenas de metros. O fato de que a cerâmica Tupiguarani não aparece em profundidade sugere que a intensificação do contato se deu em período recente. O mesmo insinua a falta de uma aculturação comprovada: o único elemento que poderia indicar aculturação na cerâmica Tupiguarani é o antiplástico de areião, mas este aparece também em sítios da fase Camaquã na Serra de Camaquã e pode representar uma convergência. No RS-RG-03 a situação de contato parece mais avançada e se deve postular para o sítio uma convivência dos dois grupos na mesma aldeia: as cerâmicas das duas tradições são bem características, há um certo zoneamento do material, a localização sobre uma duna alta e a natureza dos estratos mais parecem Tupiguarani, mas a cerâmica mais abundante é a Vieira. Isso indicaria um estado avançado de acomodação mútua de um grupo horticultor e outro caçador, reunidos numa aldeia, que por um lado está em terreno alto que se presta ao cultivo, e por outro esta na proximidade da Lagoa e facilita a pesca. Por que razão o Tupiguarani teria reocupado sítios Vieira não é muito claro e os motivos podem ser muito variados: são pontos altos em áreas baixas na proximidade da Lagoa, têm terra fértil para o estabelecimento de pequenas chácaras, estão talvez na tradição como lugares de morada ou sepultamento.

198

VI CULTURA MATERIAL: LÍTICO

O material lítico das fases Vieira e Torotama é escasso e pouco diversificado nos sítios por nós estudados. Em trabalho anterior (Naue et al. 1971:91 ss), onde analisamos de forma genérica todo o material lítico da área de Rio Grande, reunindo coletas sistemáticas e achados fortuitos, havia maior abundância e variedade de implementes. Uma grande parte dos materiais aqui estudados provém da superfície e foi coletada pelos proprietários dos campos nas chácaras feitas sobre os aterros. Uma parte foi recolhida por nós em superfície e o resto vem dos cortes. A matéria-prima apresenta certa diversificação, aparecendo quartzo e quartzito, granito, diabásio, basalto e xisto. Quartzo e quartzito formam 82% do total, diabásio 10%, granito 6%, basalto e xisto cada um 1%. A diversidade provém em parte do fato de se utilizarem seixos, que devem ter sido trazidos dos rios e arroios, que descem da Serra do Sudeste: na proximidade dos sítios não existem rochas nem cascalhos. A escassez de matéria-prima pode explicar o fato de que a maior parte das lascas são corticais e provém da inutilização de implementos. A pouca diversidade dos implementos poderia ter alguma relação com uma especialização de atividade, mas provavelmente era complementada por implementos de material perecível. Devido ao pequeno numero de peças que não permitem um panorama, estabelecemos tipos bem gerais, morfológicos. Pedras - com - covinhas Pequenas pedras, de formas irregulares, tendo como material inicial seixos ou blocos, que foram amoldados, apresentando agora faces polidas ou alisadas, planas, levemente convexas ou côncavas, os lados alisados ou ao natural (fraturados ou com córtex). No meio de algumas superfícies polidas encontram-se pequenas depressões 201

Pedro Ignácio Schmitz

ou covinhas rasas, aproximadamente circulares e igualmente polidas; quando em faces opostas, ocupam posição simétrica. Tamanho das peças: de 10,5 X 9 cm até 4,5 X 3,5 cm; espessura de 4,8 a 2,9 cm. Tamanho das covinhas: diâmetro de 2,5 a 1,2 cm, profundidade de 3 a 1 mm. Matéria-prima: quartzos e quartzitos, granito, diabásio. Utilização: moer, suporte para esmagar sementes. (Foto 7:2-3). Pedras com Faces Polidas Pequenas pedras com as características da categoria anterior, da qual se distinguem porque não têm a covinha. Em algumas, uma das faces e aproximadamente plana e bem polida, ao passo que a outra é convexa. Tamanho das peças: de 8,5 X 4 cm 4,2 x 3,7 cm; espessura de 5,4 a 1,7 cm. Matériaprima: quartzo e quartzito, granito, diabásio. Utilização: moer, esmagar, alisar ou polir. (Foto 7:5) Percutores Pequenas pedras, de formas irregulares, tendo como material inicial seixos, cujas arestas e saliências apresentam sinais de percussão. Tamanho das peças: de 7,6 X 4,5 em a 5,7 X 4,2 cm; espessura de 6,7 a 3,2 cm. Matéria-prima: quartzo e quartzito, granito. Utilização: esmagar, quebrar. Polidores Pedras chatas ou pequenas lajotas, excepcionalmente pedras grossas, amoldadas, e em cujas faces se produziram uma ou mais superfícies côncavas. Essas concavidades são rasas e geralmente cobrem a maior parte da face. Como as peças estão muito fragme202

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

tadas na sua maior parte, não se podem fazer subdivisões como fizemos em trabalho anterior (Naue et al. 1971:91 ss). Tamanho das peças: de 14 X 10 cm a 9 X 7,2 cm; espessura 8,5 cm a 1,2 cm. Profundidade das depressões: de 8 a 1 mm. Matéria-prima: quartzo e quartzito, diabásio, granito. Utilização: moer, alisar ou polir. (Foto 7:1) Lâminas de machado a) Lâmina larga, de formato geral retangulóide, entalhe lateral para prender cabo, faces côncavas com covinhas centrais. Total mente alisada, a extremidade do talão picoteada, gume grosso (60 a 80 graus) e gasto. As covinhas são polidas. Uma peça inteira e um fragmento de gume. Tamanho da peça inteira: 11,5 X 9,4 cm; entalhe lateral 2,2 cm de largura por 0,2 cm de profundidade. Covinhas: 1,2 cm de diâmetro X 0,3 cm de profundidade. Matéria-prima: diabásio. Utilização: cortar com o gume, esmagar com o talão. Do grupo construtor dos aterros. (Foto 8:1) b) Lâmina grossa, trapezoidal, lados e faces convexas. Totalmente polida. Gume grosso (60 graus) e gasto. Tamanho da peça: 10,7 X 5,3 X 3,8 cm. Matéria-prima: basalto Utilização: cortar. Do grupo Tupiguarani. (Foto 8:2) Alisadores Pedra de granulação grossa (arenito), ovalóide, totalmente alisada, as bordas em bisel duplo obtuso (ângulo de 90o). 203

Pedro Ignácio Schmitz

Tamanho da peça: 4,6 X 3,5 X 1,5 cm. Utilização: alisar, amoldar. (Foto 7:4) Plaqueta de arenito, alongada, com uma das bordas laterais alisada numa das faces. Tamanho da peça: 6 X 4 X 0,7 cm. Utilização: alisar, amoldar. Fragmentos de implementos Pequenos fragmentos, geralmente com restos de córtex na face externa, irregulares na face interna. A face externa com sinais de percussão ou alisamento. Não se pode identificar as categorias de implementos de que provêm. Tamanho dos fragmentos: de 7 X 6 cm a 2 X 2 cm; espessura de 3,8 até 0,5 cm. Matéria-prima: quartzo e quartzito, diabásio, granito. Lascas As lascas pequenas não apresentam forma ou orientação fixa. A maior parte são lascas primárias e têm o plano de percussão e a face externa cortical, ou ao menos semicortical. A parte do córtex geralmente apresenta sinais de percussão. AS lascas parecem provir da quebra de instrumentos. O bulbo costuma ser bem visível. Algumas bordas eram bem cortantes. Tamanho das peças: de 4,5 X 3,5 cm a 1,4 X 1,2 cm; espessura de 1,2 a 0,5 cm. Matéria-prima: quartzo e quartzito, diabásio, basalto, xisto. Utilização: para cortar, raspar, retalhar. (Foto 9 ). Há duas lascas grandes, trapezoidais, grossas, a face externa marcada por aresta forte, assimétrica, o bordo grosso, oposto a um lado formando dorso largo. Tamanho das peças: 5,3 X 4,6 X 2,6 cm; 4,9 X 4,1 X 2,3 cm. 204

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Matéria-prima: quartzo. Utilização: para cortar, raspar, retalhar. Furadores Pequenos pedaços de pedra lascada, de forma grosseiramente triangular ou losangular, grossos, com uma ou duas extremidades em ponta grossa e estreita, geralmente sem retoques e com as arestas bem vivas. Tamanho de algumas peças: 4,5 X 3,4 X 1,5 cm; 5,5 X 2,6 X 1 cm; 3,1 X 1,4 X 1,5 cm. Matéria-prima: quartzo ou quartzito, granito. Utilização: furar. Núcleo Pedra com numerosas cicatrizes paralelas, partindo de uma superfície de percussão plana. Tamanho da peça: 3,5 X 4,3 X 3,5 cm. Matéria-prima: quartzo. Pedras quebradas Pequenos pedaços angulares e irregulares de pedra, quebrados, sem bulbos de percussão, geralmente sem córtex. Tamanhos: de 9,5 x 7,5 cm a 2 X 1 cm. Matéria-prima: quartzo ou quartzito, granito, diabásio, xisto. Pequenos seixos rolados, sem nenhuma modificação, desde 5 X 2,5 X 2,5 cm até 1,3 X 1,2 X 0,7 cm. Matéria-prima: quartzo ou quartzito, diabásio, xisto. No quadro anexo (quadro 16), pode-se ver a distribuição por sítios e níveis. De um modo geral, os diferentes tipos se encontram nos sítios das diferentes posições cronológicas. Nos sítios mais antigos pa205

Pedro Ignácio Schmitz

rece haver mais implementos do que nos mais novos. Em alguns dos mais novos (s/n RS-RG-20, RS-RG-14, RS-RG-03 (1)) não se recolheu nenhum material lítico, nas coletas de superfície realizadas em chácaras em que removeram a terra profundamente e que são cultivadas desde muito tempo. Os implementos definidos se relacionam com funções de esmagar, moer, alisar, polir. Instrumentos grandes de cortar, relacionados com trabalho de madeira ou abate de árvores, estão representados por três lâminas de machado, das quais uma provavelmente é de procedência Tupiguarani. As poucas lascas e furadores podem ter uma utilização múltipla nas atividades econômicas. Os dois alisadores têm funções pouco definidas.

206

207

14 6

4

LASCAS

FURADORES

1

1

1

1 5

1 33 3 1 2 3

3

1 1

1

1 1

1

1

1 1

1

1

1 4 1 2 3 3 16 14 1 1 4 3 1 1

51 12 8

1

TOTAL

1

3

4

1

2

7 2

1

5

4

15 2

1 1

1

1 2 2

PEDRAS QUEBRAD.

1

9

2

1

1

1

2

1

1

1

NÚCLEO

1

8

FRAGM. IMPLEM.

6 1

1

MACHADO b

ALISADORES

1

3

2

MACHADO a

4

CI4

1

2

CI2

1

CII1

POLIDORES

5

CI1

1

1

CII3 CI1 CI2 CI3 CI4 CI6 CII1 1

4

PEDRAS C/FACES POL.

1 2 2

SUP. CI1 CI2 CI3 SUP.

3

CII2 SUP. A3 5 A5 4 A5 5 A5 6 CI1

PERCUTORES

1

SUP.

PEDRAS-COM-C0VINHAS

SUP. 4

2

1

1

1

1

CI2

04 RS-RG-08 RS-RG-28 10 03 (2/5)

1

1

CI4

RS-RG-48

2

1

1

CI1

RS-RG-20

1

1

CI2

16. Distribuição de Material por Sítios e Níveis

2

1

1

CI2

RS-RG-21 RS-RG-49

4

1

1

1

1

SUP.

RS-RG-50

Tabela 16 – Distribuição do material lítico por sítios e níveis.

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208

VII CULTURA MATERIAL: OSSOS E CONCHAS TRABALHADOS

No meio de centenas de milhares de ossos quebrados, que foram manuseados no estudo dos alimentos, muito poucos implementos apareceram. Ossos em que se vê a manipulação pelo homem são muitos. Certos ossos longos de peixes estão quebrados em pequenos segmentos, mas não sabemos se intencional ou acidentalmente. Esporões dentados de peixes podem ter sido usados como pontas, praticamente sem modificação. Ossos longos de mamíferos foram seccionados junto da epífise, ou seccionados e quebrados ou só quebrados; a diáfise foi rachada, formando estilhas alongadas e estreitas ou mais largas e losangulares, ou de formas irregulares. Algumas estilhas apresentam sinais de seccionamento. São comuns os ossos longos de aves seccionados na proximidade da epífise, mas a maior distância que os dos mamíferos. (Foto 11:1) Os instrumentos de osso identificáveis são os seguintes: a) Pontas em forma de naveta: Osso longo de mamífero, usado de maneira que uma das faces é a superfície externa do osso; a outra apresenta vestígios do canal medular; as duas extremidades em ponta. A peça toda perfeitamente alisada. Utilização como ponta de projétil ou corpo de anzol composto. (Foto 11:3) 1. (RS-RG-49, c.II, n.4): 83 mm comp.; 9,5 mm larg.; 6 mm espes. Inteira. 2. (RS-RG-49, c.II, n.4): 91 mm comp.; 10 mm larg.; 6,5 mm espes. Inteira. 3. (RS-RG-21, c.I, n.2): 165 + ? mm comp.; 12 mm larg.; 5,5 mm espes. Com uma das extremidades quebrada. 4. (RS-RG-21, c.I, n.2): 46,5 + ? mm comp.; 12 mm larg.; max.; 5,5 mm espes. max. Fragmento de ponta. 5. (RS-RG-04, c.I, n.5): 63 + ? mm comp.; 9 mm Iarg. max.; 5 mm espes. max. Fragmento de ponta. 211

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b) Pontas em bisel a: Ossos longos de aves (4) ou mamíferos (1), seccionados perto da epífise e apontados em bisel simples na outra extremidade. As pontas são perfeitamente acabadas. Utilização como ponta de projétil. (Foto 11:1) 1. (RS-RG-48, c.A5,n.5): 75 + ? mm comp.; 13 mm larg. máx.; 11,5 mm espes. máx. junto da extrem. proximal. Quebrada, faltando pequena parte distal. 2. (RS-RG-48, c.A5,n.6): 52 + ? mm comp.; 14 mm larg. máx.; 11 mm espes. máx. junto da extrem. proximal. Quebrada, faltando pequena parte distal. 3. (RS-RG-20, c.I,n.5): 56 + ? mm comp.; 14,5 mm larg. máx.; 10,5 mm espes. máx. junto da extrem. proximal. Quebrada, faltando pequena parte distal. 4. (RS-RG-04, c.I,n.3): 69 + ? mm comp.; 15 mm larg. máx. atual; 11 mm espes. máx. junto da fratura. Quebrada na extrem. proximal. Osso de mamífero. 5. (RS-RG-04, c.I,n.3): 79 mm comp.; 15 mm larg. máx.; 10,5mm espes. máx. junto da extrem. proximal. Inteira. c) Ponta em bisel b: Osso longo de ave com epífise conservada na extremidade proximal, apontado em bisel junto da extremidade distal. Ponta quebrada. Utilização como sovela ou furador. (Foto 11:5). 1. (RS-RG-48, c.A5,n.5): 73 + ? mm comp.; 8 mm junto à epífise; 5,5 mm espes. Max. junto à epífise. d) Fragmento de implemento: osso de peixe, com a extremidade proximal seccionada; a 4 mm dessa 2 sulcos periféricos com 1 mm de larg. e espes. e distantes um do outro 1 mm. Extremidade distal faltando completamente. Utilização: corpo de anzol composto? (Foto 11:4) 1. (RS-RG-20, c.II,n.2): 72 + ? mm comp.; 10,5 mm larg. máx.; 4,5 mm espes. máx. e) Ponta helicoidal: Estilha de osso longo de ave, apontado numa extremidade e adaptado na outra (assimétrica e torcida). Sobre a face externa do osso dois entalhes pequenos e finos. Utilização possivelmente como parte de um anzol composto (a farpa). 212

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O corpo do anzol poderia ser uma peça como d). (Foto 11:2) 1. (RS-RG-48, c.A3,n.5): 46 mm comp.; 9 mm larg. máx.; 4 mm espes. máx. Inteira. a) Ossos manipulados de outra forma: Ossos curvos, de peixe, com incisões. Utilização: possivelmente incisões para facilitar a fratura e produzir pequenos segmentos iguais. (Foto 11:6) 1. (RS-RG-04, c.I,n.3): 64 mm comp.; 13 mm larg. máx.; 7 mm espes. máx. No lado convexo do osso incisões estreitas e rasas, ± 5 mm comp. No lado côncavo 28 incisões semelhantes. Uma das extremidades está quebrada, tendo-se usado as incisões nas duas faces para realizar a fratura. 2. (RS-RG-04, c.I,n.3): 37 mm comp.; 9 mm larg. máx.; 4,5 mm espes. máx. 6 incisões periféricas, estreitas e rasas. As duas extremidades estão quebradas, usando-se as incisões como ponto de fratura. Dentes perfurados como elemento decorativo: a) Dentes longos, perfurados na raiz. Utilização: como pingente ou peça de colar. (Foto 10: 2 ) 1. (RS-RG-48, c.A1, n.2): Dente de felino perfurado na raiz. 25 mm comp.; 6 mm larg. máx.; 3,5 mm espes. máx. Perfuração bicônica na raiz a 5 mm da extrem. proximal. 2. (RS-RG-48, c.A3,n.5): Dente de mamífero perfurado na raiz: 26 + ? mm comp. (ponta quebrada); 6,5 mm larg. máx.; 5 mm espes. máx. Perfuração bicônica a 5 mm da extrem. proximal. Pequenas rodelas de concha bivalva perfuradas como elemento decorativo. (Foto 10:3 ) 1. (RS-RG-48, c.A5,n.6): 19,5 x 19,5 x 1 mm. Perfuração excêntrica; 2,5 mm diam. 2. (RS-RG-48, c.A1,n.3): 8,8 x 8,8 x 1 mm. Perfuração central, 2 mm diam. 3. (RS-RG-08, c.I. n. 1): 19,5 x 18,5 x 1 mm. Perfuração um pouco excêntrica, 3 mm diam. 213

Pedro Ignácio Schmitz

Pele distribuição no quadro se vê que o material se encontra espalhado pelos diversos sítios, sem mostrar uma tendência. Só com escavações maiores se poderia ter uma visão melhor de sua distribuição no tempo. A função dos implementos recuperados parece estar relacionada com a apanha de animais: pontas em forma de naveta, pontas em bisel a, ponta helicoidal; a de outros com o preparo de materiais, como furador: ponta em bisel b. Outros materiais ainda se destinavam a enfeitar as pessoas, além de outras funções que poderiam ter: dentes perfurados, rodelas de conchas. Os artefatos que aparecem provavelmente não dão uma idéia sequer incompleta da implementação óssea do grupo. Só para mencionar: não aparecem as diáfises seccionadas dos ossos longos de aves, que são abundantes em vários sítios. Tabela 17 – Distribuição dos ossos e conchas trabalhados por sítios

RS-RG-49, C. II, n. 4 RS-RG-21, C. I, n. 2 RS-RG-20, C.I,n. 5 RS-RG-20, C.II, n. 2 RS-RG-48, C. A1, n.2 RS-RG-48, C. A1, n.3 RS-RG-48, C. A3, n.5 RS-RG-48, C. A5, n.5 RS-RG-48, C. A5, n.6 RS-RG-04, C. I, n.3 RS-RG-08, C. I, n. 1

Rodela concha

Dentes perf.

Ossos peixe incis.

Ponta helicoidal

1

Fragm. Implem.

2 2 1

pontas-bisel b

Pontas-bisel a

Sítio, corte, nível

Pontas-naveta

17. Distribuição dos Ossos e Conchas Trabalhados por Sítios

1 1 1 1

1

1 1 2

1

1 1 2 1 214

VIII RESTOS DE ALIMENTOS NOS SÍTIOS

1. Sítios Selecionados para o Estudo da Alimentação Embora tenhamos recolhido os restos de todos os sítios, em que foram realizados cortes, somente analisamos os restos de alguns, visto serem os materiais extraordinariamente abundantes e consideravelmente uniformes. Como amostras foram escolhidos os sítios RS-RG-21, RS-RG-49, RS-RG-20, RS-RG-48, RS-RG-08. Com isso estavam representados o período pré-cerâmico (fase Lagoa) e o período cerâmico: fase Torotama (cerâmica inicial), Fase Vieira (cerâmica definitiva). Outros aterros, escavados por Naue e analisados do mesmo modo, deram resultados parecidos. (Schorr 1975).

2. Técnicas de Campo A quantidade e qualidade de restos que temos para analisar, estão na dependência de dois fatores: restos que realmente existiam nos estratos e técnicas usadas na sua recuperação. As técnicas usadas foram no princípio um pouco primitivas, porque inicialmente não se pensou num estudo quantitativo dos restos de alimentos. Posteriormente se melhoraram as técnicas, mas estamos conscientes de que os resultados conseguidos são aproximações. Para resultados ainda mais seguros, há necessidade de uma melhora nas técnicas, o que devera ocorrer com novas pesquisas. Em alguns sítios o depósito foi revisado com auxílio de uma colher de pedreiro, com muito cuidado porque chovia e a terra, não podia ser peneirada. Muitos restos, inclusive médios, podem ter escapado: RS-RG-20, RS-RG-21. Na maior parte dos sítios o depósito foi peneirado com malha de 3 mm. Restos muito pequenos e frágeis podem ter escapado: RS-RG-49, RS-RG-48, RS-RG-08. 217

Pedro Ignácio Schmitz

Alguns restos, p. ex., o camarão, podem não aparecer, devido à técnica usada. Com ossos de peixes muito pequenos, isso também pode ter acontecido. Por essa razão algumas comparações de um sítio para outro são apenas aproximadas, mas as comparações dentro do mesmo sítio têm bastante validade, por se ter usado a mesma técnica básica. Nas novas investigações pensamos trazer para casa amostras inteiras de sedimentos para um tratamento exaustivo em laboratório. Apesar da técnica, de cujas deficiências estivemos bem conscientes na análise do material, algumas tendências aparecem claramente.

3. Técnicas de Laboratório O material foi primeiro todo limpo com jatos de água em temperatura ambiente. Depois foi separado mecanicamente por categorias de animais e vegetais. Os animais foram separados em crustáceos, peixes, moluscos, mamíferos, aves. Os restos humanos foram colocados à parte. Do mesmo modo foram separados os restos vegetais. Para comparação do volume de restos alimentícios de cada categoria nos diversos níveis dos cortes, foi feita contagem e pesagem dos elementos presentes. Os resultados foram transformados em tabelas e gráficos, nos quais se tem uma idéia aproximada do volume de restos (entre os recuperados) que corresponde a cada uma das categorias e à proporção dos restos no que seria o universo recuperado por nível. Embora os restos recuperados não representem a alimentação real, visto que uma grande parte dos elementos não pode ser resgatada, como estamos usando sempre os mesmos elementos, provavelmente nos indicam modificações e constâncias na alimentação. Para identificar o gênero ou espécie dos restos de cada uma das categorias, a maior parte dos ossos tem pouca utilidade. Somente alguns indicadores podiam ser usados. A identificação é muito 218

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importante, para saber: 1º que tipos de animais eram predados; 2º em que ambiente estaria colocado o sítio; 3º em que época do ano se fazia a predação e, com isso, em que época do ano a população vivia na beira da lagoa.

4. Restos que Aparecem e que não Aparecem Crustáceos: aparecem pinças ou guelas, artículos de patas e extremidades laterais de carapaças. As pinças variam de 1 a 4 cm. Espécies: “Siriazul” (Callinectes sapidus), “Siri-da-areia” (Occipoda arenaria), cracas (fam. Balânidas). - Não aparece o camarão. Peixes aparecem vértebras, raios de nadadeiras, esporões, ossos da cabeça, placas, dentes, mandíbulas, ossos cranianos, otólitos. Espécies: corvinas, bagres, castanhas, miragaias, pescadinhas, raros seláquios. - Não aparecem os peixes de água doce. Também não a enchova, o linguado, o papa-terra, o peixe-rei, a tainha, a viola. Moluscos: aparecem valvas. - Estão muito quebradas para serem classificadas. Predominam, entretanto, os bivalvos. Os restos dos bivalvos variam de 3 a 4 cm; os dos univalvos, de 2 a 6 mm, não devem ter servido para a alimentação. Mamíferos: aparecem ossos longos, mandíbulas, dentes, vértebras. – Espécies: ratãodo-banhado, preá, veado, tatu, herbívoros não identificados, carnívoros não identificados. Aves: aparecem vértebras, ossos longos dos membros locomotores. - As espécies não puderam ser identificadas. Anfíbios: não foram encontrados. Répteis: aparecem placas e ossos. – Espécies: quelônios, lagartos. - Não aparece o jacaré. Vegetais: aparecem Coquinhos. - Predominam os dos gênero Arecastrum, alguns da espécie romanzoffianum, além de duas outras espécies ainda não identificadas. (Dados segundo Schorr 1975:16s)

219

Pedro Ignácio Schmitz

5. A Comparação dos Materiais Para compreendermos o comportamento dos restos de alimentos, organizamo-los em quadros e gráficos, para o que usamos os elementos reunidos por Schorr 1975: tabelas PP. 46 v, 57 v, 66 v, 76 v, 95 v. Através desses dados procuramos documentar e esclarecer os seguintes pontos: a) restos que predominam no sítio, observando os elementos que vêm da água (crustáceos, peixes, moluscos) e os que vêm da terra (mamíferos, aves), para saber se o sítio e predominantemente de pesca ou de caça; b) a proporção dos restos por categorias, nos níveis sucessivos, já primeiro por peça, depois por peso, a fim de observar se há modificações no regime alimentar; c) o peso médio dos restos individuais, por categorias, nos níveis sucessivos, para averiguar se existe permanência, diminuição ou aumento de peso, que poderia indicar suficiente reposição, diminuição ou aumento dos recursos; d) o momento em que a categoria chega ao seu máximo de porcentagem no sítio, para verificar em que posição temporal, com relação às outras categorias, este clímax se encontra; e) o momento em que se acumulou o maior número de restos por nível. Ainda não sabemos o que isso pode representar.

220

Figura 33 – Restos de alimentos: Gráfico de RS-RG-21, 49, 20.

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

221

Categorias CRUSTÁCEOS PEIXES MOLUSCOS PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS) Níveis Nº % Nº % Nº % 0-20 12 1,19 960 94,86 4 0,40 20-40 320 0,35 90.408 99,24 96 0,11 40-60 385 0,21 184.942 99,46 104 0,06 60-80 1.240 0,54 227.534 98,95 570 0,25 80-100 30 0,50 5.703 94,99 70 1,17 100-120 4 6,35 58 92,06 1 1,59 TOTAL 1.991 509.605 845 PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS) 0-20 6 0,70 813 94,21 2 0,23 20-40 178 0,77 22.492 97,74 75 0,33 40-60 170 0,74 22.476 98,17 130 0,57 60-80 898 3,42 24.950 94,89 230 0,87 80-100 24 0,49 4.629 94,22 90 1,83 100-120 4 6,67 55 91,67 1 1,67 TOTAL 1.280 75.415 528 PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS 0-20 0,50 0,85 0,50 20-40 0,56 0,25 0,78 40-60 0,44 0,12 1,25 60-80 0,72 0,11 0,40 80-100 0,80 0,81 1,29 100-120 1,00 0,95 1,00

18. RS-RG-49

222

1,25 1,54 0,43 0,27 1,17 -

34 100 15 6 70 225

Nº 27 65 35 22 60 209 3,94 0,43 0,07 0,02 1,42

% 2,67 0,07 0,02 0,01 1,00

MAMÍFEROS

Tabela 18 – Restos de alimentos: RS-RG-49.

0,89 0,79 0,22 0,35 0,71 -

8 168 105 210 100 591

Nº 9 214 476 577 141 1.417

AVES

0,93 0,73 0,46 0,80 2,04

% 0,89 0,23 0,25 0,25 2.35

863 23.013 22.896 26.294 4.913 60 78.039

Nº 1.012 91.103 185.942 229.943 6.004 63 514.067

TOTAIS

1,11 29,49 29,34 33,69 6,30 0,08

% 0,20 17,72 36,17 44,73 1,17 0,01

Pedro Ignácio Schmitz

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Comentário ao Quadro e Gráfico do RS-RG-49

a) A pesca predomina absolutamente: Os ossos de peixe têm porcentagem altíssima. A caça quase não aparece. b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Desprezando O nível superior que tem pouco material: crustáceos decrescem; peixes tendem a crescer; moluscos tendem a diminuir; mamíferos não apresentam tendência; aves têm certa estabilidade. Tendências pouco claras. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Desprezando o nível superior que tem pouco material: crustáceos decrescem; peixes crescem; moluscos tendem a decrescer; mamíferos não apresentam tendência; aves não apresentam tendência. Tendências pouco claras. c) Peso Médio por Peça: crustáceos irregular; peixes irregular; moluscos irregular; mamíferos irregular; aves irregular. d) Seqüências dos Clímax em Peso por Categoria: 1º crustáceos: nível de 100-120 cm. 2º moluscos, aves: nível de 60-80 cm. 3º peixes: nível de 40-60 cm. 4º mamíferos: nível de O-20 cm. e) O material e mais abundante no nível de 60-8O cm, diminuindo em direção ao topo; é pouco abundante nos dois níveis inferiores, por causa das infiltrações de areia.

223

CRUSTÁCEOS

PEIXES

Nº 38 4 34 27 103



300 900 3.675 25 4.900

%

9,55 0,44 0,89 16,98

75,38 98,25 96,33 15,72

% 29 23 38 90

224

40 6 20 32 98

7,37 0,68 0,55 15,09

0-10 10-20 20-30 30-40 40-50

1,05 1,50 0,59 1,19

1,40 0,96 0,97 2,48

420 860 3.560 62 4.902

PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS

0-10 10-20 20-30 30-40 40-50 TOTAL 77,35 97,73 97,40 29,25

1,38 1,09 0,84

40 25 32 97

PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS)

Níveis 0-10 10-20 20-30 30-40 40-50 TOTAL



0,68 15,09

7,37

0,60 23,90

7,29

%

MOLUSCOS

PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS)

Categorias

4,60 1,25 1,47 4,55

23 10 25 50 108

Nº 5 8 17 11 41

4,24 1,14 0,68 23,58

1,25 0,87 0,45 6,92

%

MAMÍFEROS

Tabela 19 – Restos de alimentos: RS-RG-21. 19. RS-RG-21

0,77 1,00 0,38 0,62

20 4 25 36 85

Nº 26 4 66 58 154

AVES

3,68 0,45 0,68 16,98

6,53 0,44 1,73 36,48

%

543 880 3.655 212 5.290

Nº 398 916 3.815 159 5.288

TOTAIS

10,26 16,64 69,09 4,01

7,53 17,32 72,14 3,01

%

Pedro Ignácio Schmitz

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Comentário ao Quadro e Gráfico do RS-RG-21

a) Os restos de pesca predominam absolutamente: Os ossos de peixe têm a porcentagem mais alta. Os restos de caça têm pouca representação. b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Desprezando o nível mais alto, que provavelmente foi perturbado pelo Tupiguarani, como mostra a presença da cerâmica: crustáceos decrescem; peixes crescem; moluscos decrescem; mamíferos decrescem; aves decrescem. Tendências bastante regulares. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Desprezando o nível mais alto: crustáceos decrescem; peixes crescem; moluscos decrescem; mamíferos decrescem; aves decrescem. Tendências bastante regulares e iguais às anteriores. c) Peso Médio por Peça: crustáceos irregulares; peixes decrescem; moluscos irregular; mamíferos decrescem; aves irregular. d) Seqüências dos Clímax em Peso por Categoria: 1º crustáceos, moluscos, mamíferos, aves: nível de 40-50 cm. 2º peixes: nível de 20-30 cm. e) A maior quantidade de restos se encontra no nível de 30-40 cm, diminuindo nos níveis superiores. O nível de 40-50 cm é quase estéril.

225

Nº 10 35 61 58 51 430 974 1619

9 23 20 59 45 399 1264 1819

0,90 0,66 0,33 1,02 0,88 0,93 1,30

0-20 20-40 40-60 60-80 80-100 100-120 120-140 TOTAL

0-20 20-40 40-60 60-80 80-100 100-120 120-140

4,84 10,41 4,68 8,49 4,75 12,89 51,57

% 4,72 9,64 12,3 9,81 4,43 7,28 49,92

CRUSTÁCEOS

Níveis 0-20 20-40 40-60 60-80 80-100 100-120 120-140 TOTAL

Categorias

PEIXES MOLUSCOS MAMÍFEROS AVES PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS) Nº % Nº % Nº % Nº % 125 58,96 8 3,77 24 45 45 21,23 85 23,42 5 1,38 21 217 217 59,78 281 56,88 11 2,23 21 120 120 24,28 443 74,96 21 3,55 13 56 56 9,48 1012 87,92 58 5,04 17 13 13 1,13 4691 78,97 805 13,55 5 9 9 0,15 790 40,49 179 9,17 2 6 6 0,31 7427 1087 103 466 466 PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS) 96 51,61 6 3,23 27,95 23 23 12,37 117 52,94 7 3,17 9,95 52 52 23,53 299 70,02 15 3,51 8,90 55 55 12,88 544 78,27 43 6,19 2,30 33 33 4,75 772 81,43 90 9,49 3,69 6 6 0,63 2252 72,74 423 13,66 0,45 8 8 0,26 958 39,09 218 8,89 0,08 9 9 0,37 5938 802 186 186 PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS 0,77 0,75 0,51 0,51 1,38 1,40 0,24 0,24 1,06 1,36 0,46 0,46 1,23 2,05 0,59 0,59 0,76 1,55 0,46 0,46 0,48 0,53 0,89 0,89 1,21 1,22 1,50 1,50

20. RS-RG-20

Tabela 20 – Restos de alimentos: RS-RG-20.

186 221 427 695 948 3.096 2.451 8.024

Nº 212 363 494 591 1.151 5.940 1.951 10.702

TOTAIS

2,32 2,75 5,32 8,66 11,81 38,58 30,55

% 1,98 3,39 4,62 5,52 10,75 55,50 18,23 Pedro Ignácio Schmitz

226

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Comentário ao Quadro e Gráfico do RS-RG-20

a) A pesca predomina no todo: Os ossos de peixe fazem a maior porcentagem, mas outras categorias também estão bem representadas, principalmente os crustáceos no nível mais baixo. Os restos de caça estão altamente representados nos níveis superiores, ressaltando-se a presença das aves. b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Desprezando o nível mais alto: crustáceos decrescem, crescem um pouco e decrescem novamente; peixes crescem e decrescem; moluscos crescem e decrescem; mamíferos crescem; aves crescem. Tendências marcadas. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Desprezando o nível mais alto: crustáceos tendem a decrescer; peixes crescem e decrescem; moluscos crescem e decrescem; mamíferos crescem; aves crescem. c) Peso Médio por Peça: crustáceos irregular; peixes irregular; moluscos irregular; mamíferos irregular; aves irregular. d) Seqüência dos Clímax em Peso por Categoria: 1º crustáceos: nível de 120-140 cm. 2º moluscos: nível de 100-120 cm. 3º peixes: nível de 80-100 cm. 4º aves: nível de 20-40 cm. 5º mamíferos: nível de 0-20 cm. e) Os restos são mais abundantes nos níveis inferiores, decrescendo em direção ao topo.

227

Figura 34 – Restos de alimentos: Gráfico de RS-RG-48 A1, A3, A5, RS-RG-08.

Pedro Ignácio Schmitz

228

Nº 3 12 100 25 140

229

27 370 690 280 1.367

1,74 23,84 42,02 30,20

40 760 722 667 460 2.649

0-20 20-40 40-60 60-80 80-100

0,31 0,36 0,49 0,33

1,29 0,55 0,61 0,56 0,48

PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS

0-20 20-40 40-60 60-80 80-100 TOTAL

34,78 48,97 46,52 40,62 49,62

2,33 5,00 0,40 0,92

7 60 40 23 130 0,45 3,87 2,44 2,48

0,13 0,41 2,89 1,17

%

1,86 1,43 1,08 0,65 0,61

67 608 260 120 80 1.135

Nº 36 425 241 185 132 1.019 58,26 39,18 16,75 7,31 8,63

% 46,75 18,22 8,15 5,34 6,16

21. RS-RG-48 A1 MOLUSCOS MAMÍFEROS

PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS)

Categorias CRUSTÁCEOS PEIXES PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS) Níveis Nº % Nº % 0-20 31 40,26 20-40 88 3,77 1.376 59,01 40-60 1.036 35,04 1.184 40,04 60-80 1.408 40,62 1.295 37,36 80-100 848 39,55 964 44,96 TOTAL 3.380 4.850

Tabela 21 – Restos de alimentos: RS-RG-48 A1.

0,80 0,34 0,29 0,26 0,48

8 150 140 125 84 507

Nº 10 440 484 478 175 1.587 6,96 9,66 9,02 7,61 9,06

% 12,99 18,87 16,37 13,79 8,16

AVES

115 1.552 1.552 1.642 9 27 5.788

Nº 77 2.332 2.957 3.466 2.144 10.976

1,99 26,81 26,81 28,37 16,02

% 0,70 21,25 26,25 31,58 19,53

TOTAIS

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Pedro Ignácio Schmitz

Comentário ao quadro e Gráfico do RS-RG-48 A1

a) A pesca predomina fortemente no começo: Os ossos de peixe fazem a maior porcentagem, mas outras categorias também estão bem representadas, principalmente os crustáceos nos níveis inferiores. A caça aparece com boa porcentagem nos níveis superiores; a porcentagem dos mamíferos no nível de 0-20 cm provavelmente se deve à ocupação branca posterior. b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Crustáceos crescem e decrescem; peixes crescem e decrescem; moluscos crescem e decrescem; mamíferos crescem; aves tendem a crescer. Tendências regulares. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Crustáceos crescem e decrescem; peixes crescem e decrescem; moluscos crescem e decrescem; mamíferos crescem; aves crescem e decrescem; Tendências regulares e iguais. c) Peso Médio por Peça: crustáceos crescem e decrescem; peixes crescem; moluscos crescem e decrescem; mamíferos crescem; aves crescem. d) Seqüência dos Clímax em Peso, por Categoria: 1º peixes: nível de 80-1OO cm. 2º crustáceos: nível de 60-80 cm. 3º moluscos: nível de 40-60 cm. 4º aves: nível de 20-40 cm. 5º mamíferos: nível de 0-20 cm. e) Os restos estão distribuídos com certo equilíbrio pelos níveis.

230

47,19

33,49

45,23

19.188

6.135

29.023

968

5.500

60-80

80-100

TOTAL

40-60

60-80

231

PEIXES

MOLUSCOS

22. RS-RG-48 A3 MAMÍFEROS

29,81

51,04

77,09

%

315

70

220

25



0,75

0,54

0,13

%

555

29

297

229



0,31

0,73

1,20

%

920

300

200

420



0,51

0,49

0,26

0,29

0,21

40-60

60-80

80-100

1.325

0,48

18.867

1.270

7.738

80-100

10.071

7.471

23

325

105

197

0,25 3,74

1,20 529

18

263

2,48

1,50

0,90

0,92

0,62

0,89

1,08

PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS

47,19

61,33

83,85

0,64

1,60

2,78

1,95 0,30

%

3,21

2,38

2,24

3,22

0,49

2,20

AVES

0,48

680

90

390

200

PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS)

38.243

2.775

20.752

14.716



PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS)

TOTAL

10,86

65,90

19,38

3.700

40-60

%



CRUSTÁCEOS

Níveis

Categorias

Tabela 22 – Restos de alimentos: RS-RG-48 A3.

28.139

2.808

16.421

8.910

69.056

9.309

40.657

19.090



%

9,98

58,36

31,66

13,48

58,88

27,64

TOTAIS

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Pedro Ignácio Schmitz

Comentário ao Quadro e Gráfico do RS-RG-48 A3

a) Os restos da pesca predominam absolutamente: Os ossos de peixe fazem a maior porcentagem, mas os crustáceos também estão bem representados. A caça apresenta porcentagens baixas. b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Crustáceos decrescem; peixes crescem; moluscos decrescem; mamíferos crescem; aves irregular. Tendências marcadas. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Crustáceos decrescem; peixes crescem; moluscos decrescem; mamíferos crescem; aves decrescem. Tendências marcadas e iguais. c) Peso Médio por Peça: crustáceos irregular; peixes crescem; moluscos decrescem; mamíferos crescem; aves irregular. d) Seqüências dos Clímax em Peso por Categoria: 1º crustáceos, moluscos, aves: nível de 80-100 cm. 2º peixes, mamíferos: nível de 40-60 cm. e) Os restos estão mais densos de 80-100 cm.

232

CRUSTÁCEOS

PEIXES

233

136

328

0,38

0,25

0,37

100-120

TOTAL

60-80

80-100

100-120

105

TOTAL

40

50

100-120

152

40

80-100

60-80

15

60-80

80-100



Níveis

34,61

2,93

2,03

15,87

1,33

1,24

%

59,05

72,12

61,03

%

23. RS-RG-48 A5

20

5

15

-



1,59

0,50

%

MOLUSCOS

900

57

506

337



18,10

16,77

27,94

%

MAMÍFEROS

415

17

280

118



0,96

0,51

0,49

5.933

194

4.229

1.510

-

13

3

10 0,76

0,19 427

24

211

192

1,67

1,50

-

2,38

2,40

1,76

PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS

49,36

81,45

76,77 6,11

4,06

9,76

0,47

0,47

0,52

851

36

590

225

PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS)

3.098

186

2.176

736



PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS)

Categorias

Tabela 23 – Restos de alimentos: RS-RG-48 A5

5,40

9,28

9,78

%

9,16

11,36

11,44

AVES

7.552

393

5.192

1.967

4.538

315

3.017

1.206



%

5,19

68,75

26,05

6,94

66,48

26,58

TOTAIS

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Pedro Ignácio Schmitz

Comentário ao Quadro e Gráfico do RS-RG-48 A5

a) A pesca predomina absolutamente: Os ossos de peixe fazem a maior porcentagem. A caça está bem representada. b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Crustáceos decrescem; peixes crescem e decrescem; moluscos decrescem; mamíferos decrescem e crescem; aves crescem. Tendências marcadas. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Crustáceos decrescem; peixes crescem e decrescem; moluscos decrescem; mamíferos descressem e crescem; aves crescem. Tendências marcadas e iguais. c) Peso Médio por Peça: crustáceos irregular; peixes decrescem; moluscos decrescem; mamífero crescem e decrescem; aves decrescem. d) Seqüências dos Clímax em Peso por Categorias: 1º crustáceos, moluscos: nível de 100-120 cm. 2º peixes: nível de 80-100 cm. 3º mamíferos, aves: nível de 60-80 cm. e) Os restos estão mais densos no nível de 80-100 cm.

234

Nº 600 1.040 138 140 270 2.188

300 922 73 70 150 1.515

0,50 0,89 0,53 0,50 0,56

0-10 10-20 20-30 30-40 40-50 TOTAL

0-10 10-20 20-30 30-40 40-50

19,87 45,94 8,31 5,89 32,33

% 39,79 50,51 23,47 16,30 48,56

CRUSTÁCEOS

Níveis 0-10 10-20 20-30 30-40 40-50 TOTAL

Categorias

MOLUSCOS

MAMÍFEROS

0,40 0,90 0,57 0,59 1,51

% 0,80 1,80 2,21 1,51 2,88

AVES

Nº % Nº % Nº % Nº 833 55,24 48 3,18 15 0,99 12 896 43,52 65 3,16 21 1,02 37 409 69,56 13 2,21 15 2,55 13 680 79,16 20 2,33 6 0,70 13 239 42,99 25 4,50 6 1,08 16 3.057 171 63 91 PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PESO: GRAMAS) 1.161 76,89 22 1,46 21 1,39 6 952 47,43 52 2,59 63 3,14 18 764 87,02 6 0,68 30 3,42 5 1.080 90,83 23 1,93 9 0,76 7 285 61,42 14 3,02 8 1,72 7 4.242 117 131 43 PESO MÉDIO DAS PEÇAS EM GRAMAS 1,39 0,46 1,40 0,50 1,06 0,80 3,00 0,49 1,87 0,46 2,00 0,38 1,59 1,15 1,50 0,54 1,19 0,56 1,33 0,44

PROPORÇÃO DAS CATEGORIAS POR NÍVEIS (EM PEÇAS)

PEIXES

24. RS-RG-08

235

1.510 2.007 878 1.189 464 6.048

Nº 1.508 2.059 588 859 556 5.570

24,97 33,18 14,52 19,66 7,67

% 27,07 36,97 10,56 15,42 9,98

TOTAIS

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Pedro Ignácio Schmitz

Comentário ao quadro e Gráfico do RS-RG-08

a) Os restos da pesca predominam absolutamente: Os ossos de peixe fazem a maior porcentagem; os crustáceos estão bem representados. A caça tem porcentagem muito baixa. Excluindo o nível mais baixo que destoa mais freqüentemente, temos algumas tendências indicadas: b) Proporção das Categorias por Níveis: Peças. Crustáceos crescem e decrescem; peixes decrescem; moluscos crescem; mamíferos crescem e decrescem; aves crescem e decrescem. Tendências regulares. Proporção das Categorias por Níveis: Peso. Crustáceos crescem e decrescem; peixes decrescem; moluscos crescem e decrescem; mamíferos crescem e decrescem; aves crescem e decrescem. Tendências pouco marcadas, aproximadamente iguais. c) Peso Médio por Peça: crustáceos permanência; peixes irregular; moluscos irregular; mamíferos crescem e decrescem; aves permanência. d) Seqüência dos Clímax em Peso por Categoria, excluindo o nível mais baixo: 1º peixes: nível de 30-40 cm. 2º mamíferos: nível de 20-30 cm. 3º crustáceos, moluscos, aves: nível de 10-20 cm. e) O material cresce em direção aos níveis superiores.

236

x

x

x

x

x

x

20

0

237

Ratão-do-banh.

x

x

x

Univalvos

x

x

Bivalvos

Mamíferos

x

x

x

x

1

31

27

17

Moluscos

x

2

15

8

14

Miragaia

Selaquios

Dentes

Miragaia

Ossos

Miragaia

5

3

Bagre

5

Castanha

Corvina

Otólitos

x

x

x

x

x

x

3

10

2

2 736

174

x

x

x

x

60

40

x

x

80

60

RS-RG-49

6

52

x

x

x

22

x

x

x

x

x

100

x

x

x

x

7

100

0

1459

490

x

x

x

x

x

x

136

x

x

x

x

x

x

1

x

100 120 20

80

1778 3732 122 4200

588

50

x

x

x

x

40

20

x

x

x

x

50

40

Peixes

x

x

x

40

30

x

x

x

x

30

20

RS-RG-21

Craca

x

x

x

Crustáceos

Siri Azul

Siri-de-areia

20

I. Animais

10

x

x

x

x

21

2

4

x

x

40

20

x

x

x

x

x

1

44

29

9

x

x

60

40

80

0

x

x

x

x

x

x

x

x

x

x

x

x

33

28

2

x

x

x

x

x

x

x

80 100 20

60

RS-RG-48

x

x

x

2

30

23

9

x

x

40

20

x

x

x

x

x

2

4

1

x

x

60

40

x

x

9

2

x

x

80

60

100

x

x

x

x

x

1

10

x

x

x

x

x

6

13

125

7

x

x

x

100 120

80

RS-RG-20

Tabela 25 – Restos de animais e vegetais identificáveis por níveis nos cortes.

x

x

x

x

x

x

4

18

141

8

x

x

140

120

x

x

x

x

x

11

136

15

175

x

x

10

0

x

x

x

x

x

2

67

2

70

x

x

20

x

x

9

7

x

x

9

x

x

x

x

x

2

x

x

11 11

8

16

x

x

30 40 50

20 30 40

RS-RG-8 10

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

x

x

x

x

238

Coquinhos

II . Vegetais

Outros Ossos

Dentes

Humanos

Quelônios (placas)

x

x

x

1

x

3

xxx

1

xxx

4

xxx xx

x

x

x

1

x

4

x

x

Lagartos (mandib.)

x x

x

x

x

x

Répteis

x

x

Aves

x

Carn. ñ ident.

x

x

x

x

1

x

x

x

x

x

1

x

x

x

x

x

RS-RG-48 x

x

x

2

x

x

x

x

x

x

Herb. ñ identi.

x

x

RS-RG-49

x

x

x x

x

x

x

x

x

x

x

RS-RG-20

25. Restos de Animais e Vegetais Identificáveis por Níveis nos Cortes - Cont. 1

Veado

Tatu (placas)

Préa

RS-RG-21

x

x

x

x

x

x

x

x

x

x

x

x

RS-RG-8

x

x Pedro Ignácio Schmitz

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

Comentário ao Quadro dos Restos de Animais e Vegetais identificáveis por Níveis nos Cortes

No quadro reunimos dados sobre a presença de restos identificados nos níveis dos sítios. Devido à natureza dos restos recuperados nos cortes, a maior parte deles não é identificável em termos de gênero e espécie. Os que puderam ser determinados foram colocados na tabela, marcando-se geralmente só a presença; às vezes a quantidade (otólitos de peixes, dentes humanos), ou a maior ou menor intensidade (coquinhos). Dados de Schorr 1975:43-111; as tabelas de Schorr às vezes têm números levemente diferentes. Os crustáceos mais abundantes são o siri-azul, que é marinho; o siri-de-areia aparece em quantidades pequenas; a craca só marca presença em alguns casos. Os peixes identificados são de determinadas espécies de origem marinha, que entram na Lagoa para procriar ou para se alimentarem durante a primavera: corvinas, bagres, castanhas, miragaias os raros seláquios provavelmente seriam pescados no mar. Os otólitos mais numerosos são os da castanha e do bagre. A tainha, que está na Lagoa em enorme quantidade de março a junho, não aparece; o mesmo acontece com o camarão, que está presente de janeiro a março. A falta de restos de tainha parece indicar que os sítios não eram ocupados no outono e inverno. A falta de restos de camarão talvez se explique mais facilmente pelo tamanho da malha usada na recuperação do material. Notável também é a completa ausência de peixes de água doce; sua explicação poderia ser a salinidade das águas diante dos sítios na primavera e verão; no inverno, quando são menos salgadas e os peixes de água doce poderiam descer, os sítios parecem não estar ocupados. Não temos dados para supor que houvesse uma seleção do peixe a ser pescado. Os moluscos são geralmente bivalvos; não foram determinados em termos de procedência e hábitos. Os univalvos costumam ser raros e tão pequenos que dificilmente serviriam para a alimentação. 239

Pedro Ignácio Schmitz

Os mamíferos, cujos restos aparecem em maior número, são pequenos e vivem nas imediações dos acampamentos: em maior quantidade o ratãodobanhado, que existe em todos os sítios, menos no RS-RG-08, mas é mais abundante na parte superior do RS-RG-49, no RS-RG-20 e mais ainda no RS-RG-48. O ratão-do-banhado vive no mesmo ambiente de pesca, na borda da Lagoa e principalmente nos banhados. O seu aumento pode ser considerado um índice do crescimento do banhado, que substitui a Lagoa ao longo do Canal de São Gonçalo. No final do RS-RG-49 o braço da Lagoa, onde hoje está o Canal de São Gonçalo, ainda deve ter sido grande; o banhado, pequeno, mas em crescimento; o RS-RG-20 se estabeleceu mais perto do braço da Lagoa, mas também empantanou. O mesmo aconteceu com o RS-RG-48, que é o último da série na região. Depois o banhado impediu o acesso ao braço da água e os sítios vão mudarse para junto do corpo principal da Lagoa. - Em quantidades menores, aparecem a preá, em todos os sítios, hoje abundantíssima em qualquer tufo de vegetação. Em quantidade ainda menor aparece o tatu, também em todos os sítios menos no RS-RG-21; o tatu é hoje o responsável pela mistura dos estratos de numerosos sítios. – Os herbívoros, maiores, entre os quais devem estar veados e capivaras, que se podem criar tanto nos campos como nos banhados, aparecem com poucos restos, embora em todos os sítios. Restos de veados às vezes puderam ser identificados. - Carnívoros só foram reconhecidos no RS-RG-49 e RS-RG-08, provavelmente por serem caçados raramente e não servirem para, a alimentação. Os restos das aves não puderam ser identificados em termos de gênero e espécie, proveniência ou hábito, o que é realmente lamentável, por nos privar de informações muito necessárias. Dos répteis aparecem placas de quelônios e mandíbulas de lagartos, ambos gêneros hoje abundantes na região. A maior deficiência se registra com relação aos restos vegetais, o que se deve às técnicas utilizadas, que não previam a sua recuperação sistemática, devido aos objetivos iniciais da pesquisa e à própria perecibilidade dos frutos. Dos restos vegetais só recuperamos coquinhos, alguns determinados como Butia capitata; a maior parte deve ser Arecastrum romanzoffianum, mas não houve um estudo 240

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

pormenorizado dos mesmos, devido à insuficiência dos restos. No sítio RS-RG-49 em vários níveis foram recolhidos vários Kgr., ao passo que no RS-RG-20 não foram registrados e no RS-RG-48 e no RS-RG-08 existem em pequena quantidade. Observações Gerais: Se observarmos a proporção dos restos de animais nos diversos sítios da amostra, notamos que sempre predominam os elementos retirados da água (peixes, crustáceos, moluscos), dando aos sítios uma - feição tipicamente de pesca; só nos sítios RS-RG-20 e RSRG-48, sem prejudicar a feição pescadora, a caça tem um certo desenvolvimento, principalmente de animais pequenos, de procriação rápida, que se multiplicam com o crescimento do banhado, que começa a cercar esses sítios. Entre os animais retirados da água o peixe sempre tem predominância: os crustáceos aparecem com abundância nos três sítios totalmente cerâmicos (RS-RG-20, RS-RG-48, RS-RG-08), ao passo que nos pré-cerâmicos aparecem muito menos. Isso poderia estar em relação com a introdução e uso da cerâmica, mas não está claro. Os moluscos são sempre poucos, porque quase não existem na Lagoa. Entre os animais de caça, as aves costumam ser mais abundantes que os mamíferos e atingem o clímax mais cedo; com certeza predominam as aves aquáticas que são abundantes na região; os mamíferos, que nunca existem em grande proporção, costumam aumentar para o final do sítio, e isso mais marcadamente quando o banhado cresce ao redor do mesmo e oferece mais possibilidades de captura na proximidade. Na seqüência dos clímax por categorias de alimentos, precedem geralmente os máximos dos restos da pesca, seguindo só depois os da caça, que em quase todos os sítios cresce em direção ao final da ocupação, com o afastamento da água e/ou empantamento. Com relação ao peso médio das peças, não foi possível notar aumento ou diminuição nos restos de alimentos. É explicável, uma vez que se trata de recursos permanentemente renováveis de animais adultos não sujeitos a esgotamento: os da água porque vêm novas migrações, os de terra porque se multiplicam rapidamente. 241

Pedro Ignácio Schmitz

O total dos restos recuperados por nível costuma ser maior nos níveis inferiores, havendo só a exceção do RS-RG-08. Não temos uma razão plausível para isso. Todas as nossas comparações são feitas apenas com os restos presentes e recuperados. Não fazemos ilações para a quantidade de alimentos representados, para o que necessitaríamos cortes maiores e outras técnicas.

242

IX CARACTERIZAÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS

Os sítios estudados localizam-se na parte inferior da Lagoa dos Patos, nos terraços holocênicos ou excepcionalmente nos terrenos pleistocênicos, da margem ocidental, em áreas onde se nota um gradiente acentuado de vegetação, que vai desde a vegetação aquática, passando por juncais e campos, até chegar a formações arbustivas e de capões de mato bastante fechados. Ecologicamente, a região apresenta uma combinação de elementos dos campos, da floresta subtropical e do litoral, dandolhe variedade e riqueza, mas parece predominar suavemente o aspecto dos campos meridionais sobre o dos matos setentrionais. Com isso, recursos alimentares abundantes, de espécies uniformes e densamente representadas, tanto no reino animal como no vegetal, se tornam acessíveis principalmente durante a primavera e o verão. Na primavera se dão grandes migrações de peixes; no verão existem crustáceos, aves, ovos e frutos. O outono e o inverno apresentam poucos recursos, além das inundações e do frio. Se os terraços holocênicos eram pouco propícios para o cultivo, os terrenos mais altos, em cima do barranco do Pleistoceno, ofereciam terras com boas condições. Os sítios caracterizam-se como assentamentos de pesca, sendo apanhados predominantemente peixes e crustáceos marinhos, que entram na parte mixohalina da Lagoa para fins de alimentação ou procriação, durante os períodos quentes do ano. Paralelamente se caçam aves, mamíferos e outros animais, porém em proporção muito inferior. Colhem-se frutos. No período final, provavelmente se cultivam algumas plantas. Na realidade os assentamentos são de atividade múltipla, no sentido em que Wilmsen (1968:28-29) usou o termo, em oposição a localizações de atividade limitada. Como o período abrangido pelos sítios é muito longo, mais de 2.000 anos, há necessidade de que marquemos primeiro os principais períodos de desenvolvimento. 245

Pedro Ignácio Schmitz

O grupo se estabelece no local quando o primeiro terraço já é bastante largo e permite o crescimento de árvores junto ao barranco do Pleistoceno. Na medida em que se desloca a costa da Lagoa, os sítios acompanham-na, encontrando-se mais concentrados sobre as bordas dos terraços, onde aparentemente as águas estacionaram mais tempo. Também é possível que outros sítios tenham sido destruídos nas últimas transgressões lacustres. A parte mais antiga da seqüência é pré-cerâmica: fase Lagoa, subtradição Lagoa, tradição Itaipu. Caracterizam-se os sítios, que estão na Barra Falsa, como assentamentos de pesca sobre o terraço B, afastados da borda e bastante amplos. Aproximadamente de 500 a. C. a princípios de nossa era. Os demais sítios são cerâmicos de tradição Vieira, mas as características gerais continuam as mesmas. A parte mais antiga é denominada fase Torotama. A cerâmica aparece na parte superficial de dois sítios da fase Lagoa e apresenta um ar de primitividade nas formas pequenas, paredes grossas, mal acabadas e mal cozidas, com impressões de palha na superfície e restos de palha na pasta. Devido ao fato de que esta fase está definida praticamente só por cerâmica, que se deve considerar superficial, não se podem avaliar possíveis modificações no sistema de abastecimento ou no padrão de assentamento. A cerâmica tem semelhanças com as da área do Rio da Prata, e nenhuma com a cerâmica de tradição Taquara do Planalto do Rio Grande do Sul, que também é antiga. Também ecologicamente a região das Lagoas e do Planalto são muito diferentes. Como tentativa colocamos a fase Torotama entre o começo de nossa era e o século III. Os demais sítios pertencem à fase Vieira, que se estende até o século XVIII, quando o português coloniza a região. Os sítios da fase Vieira inicial, na Barra Falsa, estão sobre a borda do terraço B. A cerâmica já é bem elaborada. Datação por tentativa: do século III ao IX. Os sítios da fase Vieira média estão localizados em frente ao Saco do Arraial, sobre o terraço A ou sobre terrenos pleistocênico. A ocupação de terrenos pleistocênicos, aptos para o cultivo, poderia 246

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

indicar mudanças no abastecimento por influência do Tupiguarani. Do século IX ao XIII. A fase Vieira final, em frente ao Seco do Arraial, sobre o terraço A ou terrenos pleistocênicos, encontra-se geralmente na parte superficial dos sítios da fase Vieira média e caracteriza-se pela presença de certa quantidade de cerâmica Tupiguarani. Em nenhum dos sítios de nossa pesquisa aparece material europeu do início da colonização portuguesa, razão por que supomos que são todos anteriores a essa conquista. Os sítios das fases Lagoa, Torotama e Vieira inicial parecem ter sido estabelecidos na borda da água da Lagoa, sobre os terraços holocênicos, na Barra falsa, onde o barranco do Pleistoceno dista ao menos 1 km. Os sítios da fase Vieira média e final estão frente ao Saco do Arraial, podendo estar na borda da água sobre o terraço holocênico próximo ao barranco do Pleistoceno, ou sobre os próprios terrenos pleistocênicos, mais altos, mas sempre na proximidade da água da Lagoa. A colocação no terreno pleistocênico, que se presta para o cultivo, pode não ser casual e coincide aproximadamente com a chegada do Tupiguarani, trazendo tão técnicas de cultivo, ao redor do século XI. Os sítios são ocupados durante períodos bastante longos, provavelmente alguns séculos: são abandonados na medida em que a Lagoa se afasta muito do local. A progressiva modificação da paisagem, ao redor do acampamento manifesta-se pelo aumento, em cada um dos sítios, primeiro da caça de aves, e depois da caça de pequenos mamíferos, que se multiplicam nas áreas pantanosas da fase Vieira inicial, a mais atingida pelo empantanamento, tornando-a finalmente imprestável para novos assentamentos. A complementação da pesca, caça e colheita de plantas nativas com cultivos, ao tempo em que entram em contato com o Tupiguarani, pode ser outro fator do abandono da área da Barra Falsa, onde o barranco do Pleistoceno está mais afastado, para se dirigirem para áreas onde o Pleistoceno está mais próximo da água e se podem combinar mais facilmente atividades de pesca, colheita e cultivo. 247

Pedro Ignácio Schmitz

A área é muito rica e permitiria a concentração estacional de vários grupos. Como na margem da Lagoa existem numerosos sítios, não sabemos quantos grupos estariam estabelecidos na região. Basta dizer que uma seqüência semelhante à que nós conseguimos, juntando os sítios da Barra Falsa com os do Saco do Arraial, foi conseguida por Naue, num ponto intermédio, no Banhado do Silveira, frente à Ilha de Torotama. O tamanho dos sítios sugere assentamentos com poucas choupanas. A ocupação por períodos longos criaria um acúmulo de restos que se destaca suavemente na paisagem como pequeno cômoro. Não está claro se a grande quantidade de areia, misturada com os restos, é intencional, para levantar mais o cômoro, ou acidental. Não temos certeza, mas supomos que o mesmo padrão de assentamento terá continuado, mesmo onde o contato com o Tupiguarani foi mais intenso. As choças do grupo, tomando por base os vestígios de estacas, seriam pequenas. Durante todo o período abrangido pela fase Vieira, como mostram as impressões na cerâmica, o grupo produz esteiras, com que deveria forrar o chão para descansar e trabalhar. Não temos testemunhos do mesmo fato para as fases Torotama e Lagoa. Para a fase Vieira final, quando estão em contato com o Tupiguarani, conhecemos deles pequenos cestos, feitos com diversas técnicas e que deixaram impressões na cerâmica. A matéria-prima para as choupanas, as esteiras e os cestos é abundante e acessível na beira da Lagoa, onde existem grande quantidade de juncos e outros materiais produtores de fibras. Quando buscamos estabelecer os padrões tecnológicos, relacionando os restos de alimentos recuperados, as possibilidades oferecidas pelo ambiente e os utensílios e instrumentos escavados, os dados são muito insuficientes, porque os artefatos são poucos e maus indicadores. Entre os artefatos líticos, temos pedras-com-covinhas, pedras com facetas polidas, polidores e percutores, que podem estar rela248

Sítios de Pesca Lacustre em Rio Grande, RS, Brasil

cionados com o esmagamento de cocos, a trituração de alimentos, o preparo de couros; lascas e furadores toscos, que podem ter utilidade múltipla; escassos machados, que serviriam para trabalhar madeira num local onde a mesma é pouca e talvez pouco significativa. Entre os objetos ósseos, destacamos as pontas em naveta, que podem tanto ser pontas de projétil, como partes de anzol composto; as pontas em bisel a) certamente são pontas de projétil; a ponta helicoidal provavelmente é a farpa de um anzol composto; o fragmento de implemento pode ser o corpo de um anzol composto; a ponta em bisel b) pode ser uma sovela. Com isso teríamos a possibilidade de algumas pontas de projétil, de algum anzol composto, de uma sovela. A utilidade dos outros objetos ósseos não é clara. Provavelmente usaram numerosas pontas mais simples de osso, como parecem indicar os abundantes ossos seccionados, mas infelizmente não foi possível encontrá-las. Os dentes perfurados e as rodelas de conchas são manifestamente objetos de adorno, podendo ter também outra conotação. O elemento mais abundante é a cerâmica. Ela é utilitária e intensamente usada no fogo; simples e uniforme. A falta de especialização nas formas pode ser explicada tanto pela simplicidade da cultura a que pertence, como pela função específica a que se destinaria. Certamente a sua ligação inicial não é com cultivos, mas com a preparação do peixe: o peixe esboroa-se todo ao assar e, por isso, a panela é de grande utilidade. Os recipientes baixos e largos, de paredes finas e antiplástico grosseiro, de quartzo, prestam-se admiravelmente, porque oferecem grande superfície para a disposição do alimento a preparar e permitem que o calor chegue facilmente aos alimentos. A evolução da cerâmica Vieira de formas mais rasas, menores e mais diversificadas para formas um pouco mais profundas, um pouco maiores e mais uniformes, mostra, além de um maior domínio da técnica, um maior ajustamento na exploração dos recursos uniformes do ambiente. A sua não especialização responde ao fato de pertencer a um grupo caçador, a pouca modificação no tempo indica uma cultura 249

Pedro Ignácio Schmitz

estável e o pequeno tamanho provavelmente está relacionado com a forma de organização social. Quando chega o cultivo, a cerâmica Vieira permanece igual, mas ao lado dela existe, com maior ou menor intensidade, a cerâmica de tradição Tupiguarani, também inalterada, preenchendo talvez parcial ou totalmente as novas funções e necessidades. Se os artefatos presentes nos dão poucos dados sobre as técnicas, somando-os com as ausências, outros elementos da técnica podem ser postulados. Quando examinamos os restos presentes, podemos levantar hipóteses sobre as técnicas utilizadas ou utilizáveis. A maior quantidade de restos é de peixes marinhos, de tamanho médio e existentes em grande quantidade na Lagoa, onde entram em densos cardumes. A falta de anzóis induz-nos a crer que na pesca devem ter usado a rede. O baixo nível das águas, em grandes extensões da Lagoa, permitiria colocar redes sem auxílio de canoas. A colocação de redes necessitaria da colaboração de várias pessoas, de preferência homens. Talvez paralelamente se usasse também algum tipo de anzol ou projétil para pegar peixes grandes, como a miragaia, que é pescada hoje com a utilização de um anzol especial. Os crustáceos capturam-se facilmente usando um cesto com engodo e naturalmente também se prendem nas redes. Os moluscos são recolhidos geralmente com a mão. A caça de aves vem em segundo lugar. Quando aninhadas, geralmente em bandos, as aves aquáticas de arribação são fáceis de pegar com laços ou com a mão. Ao mesmo tempo se podem recolher grandes quantidades de ovos dos ninhos agrupados e colocados a pouca altura do chão. Uma outra caça abundante ê a de animais pequenos: ratões-dobanhado, preás, tatus; para a caça de todos eles o expediente mais fácil é a armadilha, o laço, a mão, não o projétil. Os herbívoros maiores mais facilmente se caçam com projeteis, porque são mais isolados e menos freqüentes, menos fixos a um determinado local. 250

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Dessa maneira, a falta de mais evidências de armas pode ser explicada pela utilização predominantemente de outros expedientes, como redes, laços, armadilhas, cestos ou a captura com a própria mão. Para a colheita de frutas também se necessitariam apenas cestos ou sacos, que não deixam vestígios, porque feitos com materiais perecíveis como fibras ou couro. Entre os objetos relacionados com a transformação de alimentos ou matéria-prima, o principal é a cerâmica, ligada ao preparo de alimentos; os outros objetos, antes mencionados, dificilmente manifestam a sua utilização. No tocante ao abastecimento, e muito importante caracterizar as estações em que os sítios da beira da Lagoa eram ocupados. No capítulo sobre o ambiente, procuramos mostrar quais os recursos disponíveis e em que épocas do ano. Examinando agora os restos, podemos ver quais são os realmente utilizados e quais os que poderiam ser utilizados. Para as fases Lagoa, Torotama e Vieira inicial, quando na região não está o Tupiguarani, os peixes presentes são os da primavera e começo do verão; ausentes os do outono e inverno. Os crustáceos presentes são todos do período quente, primavera e verão. Os coquinhos de jerivá são do começo do verão. De modo que, pela presença dos peixes, crustáceos e coquinhos, temos provas de que o assentamento e ocupado na primavera e começo de verão e não ocupado durante o período de outono e inverno; no inverno se dá a subida da Lagoa, que dificultaria a permanência no sítio, e mais o frio que é muito intenso na beira da água. Para o meio do verão não temos por enquanto provas conclusivas, mas sugestões muito fortes: esse período apresenta recursos abundantíssimos em crustáceos, aves, ovos e variedade de frutas. Dificilmente um outro local dentro da região apresentaria a mesma riqueza na mesma época. Dessa maneira podemos postular que os sítios estão ocupados com certeza durante a primavera e começo do verão, com grande probabilidade durante o meio do verão; abandonados, durante o outono e inverno. 251

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Onde estaria o grupo durante o período mais frio? Recursos abundantes e uniformes, que ocorrem no fim do verão e começo do outono, são os butiás, de que existem matos densos em vários pontos da Serra do Sudeste, principalmente Encruzilhada e Tapes e junto da Lagoa Mirim; por outro lado, existe caça abundante de cervídeos e capivaras em diversos locais da região, onde o grupo poderia sobreviver. Durante a fase Vieira média o Tupiguarani, vindo de áreas florestadas mais ao norte, chegaria ao Sudeste, ocupando os terrenos pleistocênicos junto da Lagoa e as áreas de floresta subtropical da Serra do Sudeste. Os mesmos recursos continuam existindo nas mesmas estações. Nos sítios as mesmas presenças e ausências são constatadas. A presença do Tupiguarani nas áreas de floresta da Serra do Sudeste e nos terrenos pleistocênicos junto da Lagoa, a presença de cerâmica Tupiguarani nos sítios Vieira e a presença da cerâmica Vieira nos sítios Tupiguarani (Naue s.d.:14), a escolha para assentamento pelos Vieira de terrenos pleistocênicos, em vez de ocupação exclusiva de terraços holocênicos, e a convivência na mesma aldeia de Vieira e Tupiguarani parecem razões suficientes para admitir que o grupo da cerâmica Vieira adotou cultivos, que aprendeu do Tupiguarani. Esses cultivos podem ser feitos nos terrenos pleistocênicos junto da Lagoa, ou em pontos da Serra não utilizados pelo Tupiguarani. A floresta da Serra parece nunca ter sido utilizada pelo Vieira. A fase Piratini (Brochado 1974:34 ss), localizada em pequenos vales estreitos, cobertos com vegetação de galeria, já na periferia da floresta, poderia ser um local de cultivo do grupo Vieira na Serra. Com a ocupação da mata da Serra pelo Tupiguarani, o acesso aos butiazais da região provavelmente também teria sido cortado; talvez também áreas de caça tenham sido atingidas pela nova ocupação. Tudo isso nos leva a crer que o grupo Vieira teria de fazer um replanejamento do seu ciclo de abastecimento anual dentro de uma área mais reduzida, mas com novas possibilidades trazidas com a introdução da agricultura. A introdução da agricultura teria também outras conseqüências: os cultivos teriam de ser feitos na beira da Lagoa, porque a época 252

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do plantio coincide com o período da pesca; o local teriam de ser os terrenos pleistocênicos; os produtos maduros no fim do verão e outono provavelmente reteriam os habitantes no local e possivelmente impediriam a colheita do butiá, caso o mesmo ainda estivesse acessível; com isso aumentaria a sedentariedade e diminuiriam as possibilidades de realizar caçadas em pontos mais afastados. Se permanecem na margem da Lagoa, o melhor local para se estabelecer não é a beira da água, sujeita a inundações e pouco apta para o cultivo, mas o barranco ou, ao menos, o topo dos cômoros da fase Vieira média. Se o ritmo de vida, com a introdução do cultivo, se assemelha ao do Tupiguarani, o intercâmbio e mesmo a convivência se tornam interessantes. Tudo isso parece estar marcado nos sítios da fase Vieira final. Há, entretanto, um problema sem solução: os ossos dos peixes do outono e do inverno deveriam aparecer como indicadores. Os ossos da pescadinha, que migra no inverno, aparecem de fato em sítios recentes (RS-RG-01, cerritos 01 e 05) (Schorr 1975:109), mas os ossos da tainha, que está presente no outono, não foram constatados. Infelizmente não temos a análise de alimentos de nenhum sítio sobre o barranco do Pleistoceno, para verificá-lo. Com a pergunta sobre o ciclo anual surge também a interrogação se faziam reservas nos períodos mais abastecidos para cobrir períodos menos favoráveis. É sabido que o número de pessoas que podem viver numa região não é proporcional à quantidade de alimentos na época da fartura, mas à do tempo de possibilidades mínimas; estas podem ser melhoradas através de reservas. Não temos nenhuma, prova de que estocassem alimentos. Entretanto nos fazem pensar no problema a grande abundância, na margem da Lagoa, durante o período quente, tanto de alimentos protéicos, como de carboidratados, e a progressiva uniformização e aumento da cerâmica. Num período anterior à agricultura, a preservação tanto de alimentos protéicos como de carboidratados seria importante. Com o cultivo, os alimentos carboidratados seriam consideravelmente aumentados no outono, mas os protéicos seriam provavelmente reduzidos, devido à maior competição pelas áreas de caça e à redução do tempo disponível para a mesma. 253

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Outros elementos do abastecimento também devem ser considerados: materiais para construção, para tecelagem e trançados eram abundantes na beira da Lagoa, como ossos de diversos tipos e de variados animais, bem como penas e couros. Mas as pedras para a fabricação de artefatos devem ser buscadas em outra parte: a matéria-prima dos instrumentos líticos indica que se trata de seixos rolados, sendo os elementos predominantemente da Serra do Sudeste alguns possivelmente do Planalto Rio-Grandense. Também o areião, serve de antiplástico, tem sua origem na Serra. Com relação à sucessão dos alimentos no tempo e nos diferentes cerritos, a pesca parece ter sido sempre a tarefa principal. Os crustáceos apresentam uma contribuição considerável durante o período cerâmico, sendo menor no pré-cerâmico: pode haver uma relação com a cerâmica, pois o vasilhame de barro-cozido permite um cozimento mais fácil. A caça de aves cresce nos sítios, quando o banhado existe ou aumenta ao longo dos assentamentos, e isso progressivamente; depois também aumenta progressivamente nos mesmos sítios a caça de animais terrestres que dependem de idêntico ambiente. Isso sugere que a caça não é feita a grande distância, mas ao redor do acampamento. O ratão-do-banhado e a preá se multiplicam muito rapidamente e podem produzir maior quantidade de alimento por área do que os grandes herbívoros. Com isso também se explica a pequena participação dos herbívoros maiores na alimentação do grupo: provavelmente eles são poucos, isolados e distraem muita mão-de-obra que é necessária para a pesca, tanto no momento da captura como da transformação. É sabido que certos alimentos, e imagino entre eles o peixe, requerem muito mais esforço de transformação e estocagem do que de captura. Assim, os limites da exploração de um território nos tempos de abundância podem ser expressos mais pela capacidade da população de estocar alimentos que pela capacidade de apropriar dos mesmos. (Suttles 1968:64). Talvez a caça, tanto dos animais terrestres como dos voláteis, preenchesse o meio de verão, quando há menor quantidade de peixes migratórios na Lagoa e, portanto, menos ocupação para os homens. A caça é importante não só pelo alimento que proporciona, mas também como fornecedora de uma grande quantidade de ossos, 254

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necessários para a produção de instrumentos, e de penas e couros necessários para outros misteres. Os coquinhos só aparecem abundantemente nos sítios próximos do barranco do Pleistoceno, porque é ali que eles crescem: ou a população não iria longe para colhêlos, ou quando as árvores estivessem longe não levariam os frutos para o acampamento. Podemos imaginar que as crianças estariam mais ocupadas, como se dá na maior parte dos grupos, com a colheita e o consumo de frutas; talvez também as mulheres; as possibilidades são muitas e, como para qualquer outro caçador, constituiriam elemento importante na alimentação. (Lee & Devore 1973:7). Se o grupo precisa juntar os recursos de diversos nichos espalhados por uma região maior, que área ocupa esse território de abastecimento? Os grupos caçadores apresentam certa fluidez de organização, isto é, as famílias se agregam e separam com certa liberdade e assim circulam por um amplo território, ora num bando, ora no outro, o que tem certas vantagens adaptativas. (Lee & Devore 1973:8). Com isso se torna muito difícil demarcar o território, que corresponderia às famílias que pescam na beira da Lagoa. A cerâmica poderia ser tomada como indicador da sua área de circulação, se não formos muito exigentes na identificação das famílias. A cerâmica de tradição Vieira, subtradição Vieira, ocupa uma área que abrange o ambiente das grandes lagoas, os campos limpos e sujos, que se estendem de Camaquã até o Sul de Rocha, do Atlântico até o Alto Rio Negro e as nascentes dos afluentes meridionais do Ibicuí, dando um diâmetro de uns 300 km. Dentro dessa área ainda não conseguimos estabelecer fases contemporâneas que marcariam de certa maneira grupos paralelos com alguma estabilidade territorial. No dia em que isso for possível, provavelmente estaremos mais próximos da resposta buscada. Uma das zonas mais ricas em determinada época do ano certamente é a parte interior da Lagoa dos Patos, onde se deveriam concentrar então grupos de famílias para a pesca, a caça e a colheita de plantas nativas. Mas também existem outras áreas com grande densidade de sítios, neste caso de caça, em terrenos alagadiços. Não 255

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temos nenhuma pesquisa até agora sobre os locais onde abunda o butiá. Infelizmente ainda não foi possível estudar como os diversos nichos se relacionam entre si; provavelmente nas localidades mais abastecidas as populações se agrupam e adensam em certas épocas do ano, ao passo que se dispersam e rarefazem em outras menos abastecidas. Os sítios de pesca estudados encontram-se dentro de uma área de transição, de ecologia variada, bastante marcada pelos campos, embora cheguem até lá elementos da floresta subtropical e da vegetação da restinga. Nela grupos humanos podem sobreviver bastante bem, combinando racionalmente a caça, a pesca e a colheita de plantas nativas, às quais em tempos recentes se acrescentariam as cultivadas. Dessa forma se cria na região uma adaptação características ao do homem ao meio, a qual não vai repetir-se com os mesmos pormenores em nenhum outro lugar. As comparações que podemos fazer com grupos de outras regiões são, portanto, parciais, ressaltando aspectos da tecnologia ou da organização social. Caçadores, combinando caça, pesca e colheita de plantas nativas e com rudimentos de cultivo em algum momento da sua história existem em abundância em toda parte, representando um estágio da evolução da cultura. Nas áreas próximas à localidade por nós estudada, são abundantes, tanto no litoral brasileiro, como na bacia do Prata. Muitos elementos da tecnologia são semelhantes, quer porque exploram recursos equivalentes ou ao menos parecidos, quer porque compartem a mesma experiência, permitindo a criação de tradições tecnológicas; outros elementos, pelas mesmas razões, são diferentes, levando à multiplicação das tradições e à divisão das mesmas em subtradições e fases. No início do trabalho já indicamos a posição do período précerâmico que pertence à subtradição Lagoa, da tradição Itaipu, ao lado da subtradição Apicum, e da subtradição Piraçã. Embora a subtradição Piraçã ainda não tenha sido publicada, pelas informações orais dos pesquisadores, sabemos que a Subtradição Lagoa deve ter mais elementos em comum com ela do que com a subtradição Apicum. 256

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Quando a cerâmica aparece entre os caçadores da área, notamse mais facilmente as configurações culturais que realmente as devem ter identificado. Nesse momento os caçadores por nós estudados se configuram como uma tradição local independente, sob a denominação de tradição Vieira, que apresenta uma subtradição no Este (subtradição Vieira) e outra no Oeste (subtradição Ibirapuitã). A partir desse ponto se destacam dos caçadores do litoral brasileiro, onde preexiste a tradição Itaipu, porque as tradições cerâmicas são bastante diferentes. Entre os numerosos trabalhos sobre caçadores do litoral, excluídos os coletores de mariscos, indicamos apenas alguns, selecionados entre os sintéticos e os analítico: Beck (1970, 1974), Beck et al. (1969, 1970, 1970), Rohr (1959, 1966) para Santa Catarina; Rauth (1963) para o Paraná, Perota(1971, 1974) para o Espírito Santo. Na bacia do Rio da Prata, são numerosos caçadores com adaptações semelhantes às de Rio Grande e explorando ambientes parecidos. Dentro a abundante bibliografia, destacamos novamente alguns trabalhos, selecionados entre os sintéticos e os analíticos: Torres (1911), Lothrop (1932), Krapovicas (1957), Cigliano, Schmitz e Caggiano (1971), Serrano (1972), Boretto et al. (1973, 1975), Schmitz et al. (s.d.). A cerâmica Vieira é mais parecida com a dos grupos que vivem sobre o Rio Uruguai do que com as do Rio Paraná; e é bastante diferente da cerâmica do planalto e litoral brasileiros. Com isso chegamos à conclusão de que, como no ambiente, também na cultura, os grupos de Rio Grande devem ser afiliados às tradições platinas e não às brasileiras. Com a chegada do horticultor de tradição Tupiguarani, que acompanha um nicho de floresta subtropical, temos a penetração na área de elementos setentrionais, brasileiros ou amazônicos, com uma adaptação ecológica muito diferente. Em termos de mera classificação, a situação do contato entre os grupos Vieira e Tupiguarani pode ser caracterizada como tipo Al de Lathrap (1956:9 ss): Retenção da identidade cultural com pequena troca de elementos. “Numa área de cultura mais ou menos homogênea, cultura A, aparece uma cultura diferente, cultura B, 257

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como uma ou mais unidades- sítio. Posteriormente as duas culturas permanecem identificáveis por um longo período de tempo, mas alguns poucos tipos de artefatos e características de organização de cada cultura são encontrados em sítios da outra.” O Tupiguarani, que chega ao redor do século XI, ocupa não as áreas florestadas da Serra do Sudeste, mas também os terrenos elevados na beira da Lagoa, a poucas centenas de metros dos sítios de pesca do grupo Vieira e o próprio topo dos cômoros deixados por este. No contato entre os dois grupos, os horticultores parecem ter sofrido pouca influência, ao passo que os caçadores receberam maior quantidade de elementos da outra cultura, como fizemos constar em parágrafos anteriores. Essa influência não se manifesta apenas nos sítios próximos à área efetivamente ocupada pelo Tupiguarani, mas a grande distância encontrando-se cerâmica Tupiguarani em cômoros que distam 100 ou mais km das aldeias dos horticultores. No período anterior à ocupação portuguesa, percebe-se um contato intenso entre os dois grupos, que chegam ao ponto de conviver na mesma aldeia. Se o grupo Vieira chega até a Conquista, e é conhecido como Minuano pelos portugueses, podemos afirmar que sofreu modificações ainda mais profundas com a introdução da tecnologia do conquistador, principalmente o cavalo e o gado. Como, porém, a ligação entre os elementos arqueológicos e os históricos não é segura, pretiro não me ocupar desse ponto. Com isso chegamos ao final da caracterização dos estabelecimentos, com os dados que temos à disposição, através de inferências a partir do material arqueológico. Essas inferências, ora mais seguras, ora menos como se pode ver perfeitamente pela maneira como foram apresentadas, podem ainda ser complementadas, para iluminar melhor o quadro, com algumas características gerais do modo de vida dos caçadores reunidos na introdução aos textos do simpósio sobre o Homem Caçador: “Fazemos duas suposições básicas a respeito de caçadores e coletores: 1) eles vivem em pequenos grupos e 2) eles se movem muito. Cada grupo local está associado com um espaço geográfico, mas esses grupos não funcionam como 258

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sistemas sociais fechados. Provavelmente, desde o começo houve comunicação entre grupos, incluindo visitas recíprocas e alianças matrimoniais; de modo que a sociedade caçadora básica consistia em uma série de bandos locais, que eram parte de uma comunidade lingüística e procriadora maior. O sistema econômico está baseado em diversas características nucleares, incluindo uma base residencial ou campo, uma divisão de trabalho - com homens caçando e mulheres colhendo - e, mais importante, um padrão de partilha dos recursos alimentares colhidos. “Essas poucas características, amplamente definidas, proporcionam uma linha de base organizacional da pequena sociedade da qual podem ser derivados desenvolvimentos posteriores. Visualizamos mos um sistema social com as seguintes características. Primeiro, se indivíduos e grupos têm de movimentar-se para conseguir alimentos, há uma implicação importante: O montante de propriedade pessoal tem de ser mantido num nível muito baixo. (...) Segundo, a natureza do suprimento alimentar mantém pequenos os grupos viventes, geralmente abaixo de cinqüenta pessoas. Grandes concentrações de pessoas esgotariam rapidamente os recursos imediatos e os membros seriam forçados a dispersar-se em unidades menores de abastecimento. É provável, como observou Mauss, que diversos bandos se encontrariam numa base estacional, resultando numa divisão do ano em períodos “públicos” o “privados”. Por causa do pequeno tamanho dos grupos vivos e da grande variação do tamanho da família, os bandos crescem e diminuem em número de membros. É provavelmente necessário redistribuir continuamente a população entre os bandos com o objetivo de manter as unidades de colheita de alimentos num nível efetivo. “Terceiro, os grupos locais como grupos, não mantém ordinariamente direitos exclusivos sobre os recursos. Variações no suprimento de comida de região para região e de ano para ano criam uma situação fluida, que pode ser melhor controlada por organizações flexíveis, que permitem à população mover-se de uma área para outra. Os padrões de visita criam obrigações intergrupais, de modo que os hóspedes numa estação se tornam os hospedeiros na outra. Pensamos que acesso recíproco aos recursos figuraria com impor259

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tância igual ao intercâmbio de esposas como meio de comunicação entre os grupos. (...) “Quarto, superávit alimentar não seria uma característica proeminente da pequena sociedade. Se os estoques de alimento disponíveis são mínimos, um esforço praticamente constante tem de ser realizado durante todo o ano. Se cada um sabe onde está o alimento, na realidade o próprio ambiente é o armazém; e desde que cada um conhece os movimentos de todos os outros, não há preocupação de que os recursos alimentares vão falhar ou vão ser explorados por outros. “Quinto, visitas freqüentes entre as áreas de recursos vão evitar que qualquer um dos grupos se apegue demasiadamente a uma única área. Sítios rituais estão comumente associados a grupos específicos, mas a subsistência da população não deponde destes sítios. Além disso, a falta de empecilhos sob a forma de propriedade pessoal ou coletiva permite um grau considerável de liberdade de movimentos. Indivíduos e grupos podem mudar de residência sem abandonar interesses vitais em terras ou bens, e, quando a discussão surge, a solução é dividir o grupo para evitar conflito sério.” (Lee & Devore 1973:11-12).

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272

ANEXOS

Pedro Ignácio Schmitz

1 - Vegetação característica sobre o terreno pleistocênico vendo-se cactáceas.

2 - Opuntia vulgaris com frutos imaturos.

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3 - Vista do sítio RS-RG-20.

4 - Vista do sítio RS-RG-48.

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5 - Cerâmica Vieira com impressão de cestaria, dos sítios.

6 - Cerâmica Vieira com impressão de cestaria, da coleção G. Naue. 276

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7 - Material lítico: 1 - polidor; 2 – 3 pedra-com-covinha; 4 – alisador; 5 – pedra com facetas polidas.

8. Material lítico, lâminas de machado: 1 - tipo b; 2 – tipo a. 277

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9 - Material lítico: lascas.

10 - Material de osso e concha: 1 - ossos seccionados; 2 – dentes perfurados; 3 – rodelas de concha. 278

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11 - Implementos de osso: 1 – Pontas em bisel a; 2 – ponta helicoidal; 3 – pontas em naveta; 4 – fragmento de implemento; 5 – ponta em bisel b; 6 – ossos de peixe com incisões.

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ISBN 978-85-60967-40-7

9 788 560 967407

O Arqueólogo Pedro Ignácio Schmitz, possui Graduação em Filosofia pela Faculdade de Filosofia Cristo Rei (1954), Graduação em Geografia e História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1958), Graduação em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Filosofia e Teologia de Cristo Rei (1963). Livre-Docente em Antropologia, Doutor em Geografia e História - PUCRS, Porto Alegre, 1976. Foi professor titular na UFRGS de 1958 a 1985 (Aposentado). E desde 1966 até o momento (2011) é coordenador do Instituto Anchietano de Pesquisas – IAP, na UNISINOS, Universidade onde também é professor. Possui uma vasta produção científica, cujo resultado pode-se consultar em uma sólida e ampla produção bibliográfica, divulgada em periódicos nacionais e internacionais. É Editor da Revista PESQUISAS desde 1962, e membro do corpo editorial de diversas revistas. Consultor, representante, frente a diversos órgãos governamentais, como: CAPES, CNPq e IPHAN. Desenvolveu e desenvolve pesquisas em diversos estados brasileiros, como: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás, e no Pantanal do Mato Grosso do Sul. Como resultado e reconhecimento de sua atuação profissional, já foi condecorado com diversos prêmios, medalhas e homenagens. Consolidando-se como um dos pioneiros da arqueologia brasileira.

Este livro reproduz o trabalho produzido por Pedro Ignácio Schmitz em 1976, para obtenção do grau de Livre-docente, pela Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS

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