Repensando a Pesquisa Participante [3 ed.]
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Carlos Rodrigues Brandão (org.)

Repensando a pesqtllsa participante

editora brasiliense

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parte desta publicação potle ser g.ravada,

armazenada em sistemas eletrônico.s. .loÍrtcopiada, reproduzida por meios mecanicos ou outt'os cluoisquer sern autori:ação previct da editoru.

CaTtu: Joào Baptista da Costa

.\guiar

Revisão.' Jose W. S. Moraes Nobuka Rachi

3" edição, I 98 7

3" reimpressão, 2008

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) tCàmara Brasileira do Livro SP Brasil) Repensando a pesquisa participante / Carlos Rodrigues Brandão (org.).-- São Paulo: Brasiliense, 1999.

Vários autores da 3. ed. de ISBN 85-11-0t0tt-7

1987.

I. Ciências sociais - Trabalho de campo 2. Observação participante 3. Pesquisa social Brasil L Brandão, Carlos Rodrigues , 1940.

99-5210

cDD-300-72081

Índices para catálogo sistemático:

I. Brasil: Pesquisa participante: Pesquisa social: Ciências

ocultas

30A.12081

editora e livraria brasiliense Rua Mourato Coelho, I I I - Pinheiros CEP 05417-010 - São Paulo - SP www. e dit o rab ra s ili e n s e. c om. b r

Índice Participar-pesquisar carlos Rodrigues Brandão.. Pesquisa participante: Propostas e projetos Marcela Gaj ardo

15

Pesquisa participante: Propostas e reflexões metodológicas

Gry Le Boterf .

\otas para o debate

.

51

sobre pesquisa-ação

Elementos metodológicos da pesquisa

-

Michel Thioilent .

participante

.

Demo

104

Causa popular, ciência popular: Uma metodologia do conhecimento científico através da ação Victor D. Bonilla. - e Augus to Libreros. Gonzalo Castillo. Orlando Fals B orda Pesquisa participante em um contexto de economia campoVera Gianotten e Ton de Wit E

m busca de uma

Manuel Alberto

-\

82

pedro

metodologia

1

l5g

de ação institucional

Argumedo

l g9

participação da pesquisa no trabalho

RodriguesBrandão..

I3

popular ......

carros 223

P articip ar-p esquis ar i Ciência sem conhecimento e a ruína da alma. Rabelais, Pantagruel, VIII

Ja que cada um dos autores desta segunda coletânea sobre o assunto vai de algum modo discutir teorias e práticas de modalidades de pesquisa participante, quero reservar para estas poucas páginas de introduÇão uma questão que, por ser possivelmente menos científica e menos política, em aparência, não tem sido abordada em publico até aqui. Ela parece fazer parte daquilo que, sendo sentido por todos, não deve ser falado entre ninguém, muito menos em um livro.

F

§

r

Há segredos que se ocultam de teorias; assuntos do humano que há no oficio do pesquisador e que somente o pensar sobre a práttca pessoal revela. Durante anos aprendemos que boa parte de uma metodologia científica adequada serve para proteger o sujeito de si próprio, de sua propria pessoa, ou seja: de sua subjetividade. Que entre quem pesquisa e quem é pesquisado não exista senão uma proximidade policiada entre o metodo (o sujeito dissolvido em ciência) e o objeto (o outro sujeito dissolvido em dado). Fora do domínio de qualquer interesse que não o da propria ciência, tudo se resolve com boa teoria no princípio, uma objetiva neutralidade no nreio e uma rigorosa articulaçáo de ambas as coisas com os dados obtidos, no final. Mais tarde, tempos coletivos de militàncra que, €ffi sucessi\ os momentos, tornaram humanos e próximos os "objetos de pesquisa" . trouxeram experiências e crenças que , actedito, temos compartido.

8

cARLos R'DRIG,ES BRANDÃo ro.g'.) .

,

com variações, vários e diferentes cientistas sociais. Uma delas: só conhece em profundidade alguma coisa

se

da vid a da sociedade ou da

cultura, quando através de um envolvimento em alguns casos, pessoal entre o pesquisador - outra: não é p.opiiamente e aquilo, ou aquele, 9ue ele investiga. um método objetivo de trabalho científico que determiru opriori u qruli'6;;;, relação entre os pólos da pesquisa, mas, ao contrário; com freqüência e a intenção premeditada, ou a evidência real izada de uma reum comprometimento

lação pessoal

e/ou política estabelecida, ou a estabelecer, que sugere a escolha dos modos concretos de realização do trabalho de pensar a

pesquisa' uma última: em boa medida, a logica, a técni ca e a estrategia de uma pesquisa de campo dependem tanto de pressupostos teóricos quanto da maneira coÍno o pesquisador se çoloca na pesquisa e através dela e, a partir d,aí, constitui simbolicamente o outro que investiga.

Uma das difuculdades fundamentais em uma atividade científica cujo "outro lado" é constituído também por pessoas, sujeitos sociais quase sempre diferentes do pesquisador (índios, negros, camponeses, "populações marginal izadas;, operários, migrant..) é a de como ttatar, pessoal e metodologicamente, uma relação antecedente de alteridade que se estabelecã e que, na maioria dos casos? e aprópriacondição da pesquisa. Algumas relações de proximidade entre a prática catequ etica do passado, a do profestoi d. hoje e a do pesquisador de campo, ajudam a compreender, ora por opor um ao outro , ora por aproximá-los, a questão dificil da construção do outro que antecede e dirige o exercício d,a prática. A missão do pregador catequista que um dia aportou da Europa no país era a de fazet d,o outro um ,,como eu,,, desde que subalterno' Através de idéias inculcadas, de hábitos mudados e de ritos de mudança impostos, destruir aquilo que separa na vida, na consciência e na cultura , o outro de mi* desde Que, ao ingressar , em meu mundo, a proximidade adquirida pelo ouÍro não venha a abolir a diferença entre nos. o índio cristiànizad,o e o negro batizado, como resultado de um trabalho violento e seguro de re-significação da cultura (a morad,a dos símbolso) e da identid ade (a motada dos significados culturais da diferen para ser finalmente ça), um cristão como eu, desde que ainda índio ou negro, ou seja, desde que nunca um outro eu. um ser agora humano, porque cristão, mas ainda índio ou negro e, portanto, um subalterno legítimo a quem a

proximidade adquirida

à custa de perdas forçaãas permita

ate

REPE}ISANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

chamá-lo de "irmão", mas um

g

próximo sobre quem a nova diferença estabelecida autottza submeter, reduztr ou escrav izar. Nos livros de His tétria do Brasil uma construção equivalente do outro subalterno apârece de modo exemp lar. os sujeitos nomidados, através de cujas falas e flui o fio aa rristória, são os senhores 1eões do poder ou os seus emissários. são também, aqui e ali, um reduzido repertório de sujeitos popula índios, negros e brancos pobres, quando não "mestiços" que se destac am, seja por cumprirem exemplarmente as ordens do senhor, seja por se rebelarem, também exemplarmente, a elas: Henrique Dias e um cas o; zumbi, um outro. Nomes, datas e bio-sraf-ias são um direito legítimo de senhores e mediadores, os primeiros. pero que fazem, os últimos, pelo que criam' os "outros" aparecem como geníes. como povos ..nativos,, sem nomes porque, imersos plenamente em uma cultura, de que são a face pitoresca, estão totalmente fora da história, de que são sujeitos plenamente

subjugados. Nos livros de..História pátria,, as inúmeras nações indígenas são "índios", na melhor hipótese, ..tupis- e "tapuias"' Enquanto os da minha geração tiveram de decorar todos os nomes dos famigerados donatáiios de capitanias hereditárias até hoje as crianças das escolas não sabem de que po\ os. ' de que nações, vieram os nossos ,.negros escravos,,. Assim, à margem da historia e presentes no "lir-ro de Historia,, por serem coletivamente a sua face de silêncio. índios. negros. mestiços e brancos pobres são, ali, de pleno direito, os sujeitos da cultura' Excluídos social e pessoalmente do oficio de participar do fazet a história; vazios da iàentidade e, não raro, do próprio nome da classe da "gente" de que são, são puros ,.tipos culturais,,, segundo a logic a da cultura escolar que, há muitos anos, povoa o país de eternos cangaceiros, mulatas, cabrochas, vaqueiros do

Nordeste, gaúchos, capoeiras, seringueiros e cantadores de cordel. ora' também pafa o pesquisador social, a existência do diferente é a condição da prática. Esta afirmação,

QUe apenas parcialmente se aplica ao historiador e ao cientista político, possui uma validade crescente no caso do sociólogo e,-para o antropólogo, é o proprio começo do seu credo. Assim, ;rq;;nto as histórias de suas próprias ciências são um repertório erudito de nomes, escolas e referências de relações entre uns e outras: segundo as suas idéias, segundo as suas "contribuições", numa análise onde sempre o resultado coletivo da "escola" é um somatorio de trabalhos nominados de sujeitos plenamente pessoais, quando de novo o outro ..popular,, aparece' a sua pessoa some no dado, ou se dissolve

num discurso

l0

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

1org.;

QUe, de tanto pretender ser o da "classe" ou da "categoria,,, ameaça não conter a fala nem o imaginário de ninguém. Não é que o outro "popular" não partic ipe da pesquisa, ele nao participa ,.qu.,

pes quis ado.

ao

,r,

Para serem constituídos como a substância das ciências sociais: "grupos sociais", "culturas". "mor-imentos,,,,,proc.rroil r- ü;;;,, ou "movimentos" populares, são igualmente reduzidos, seja a um anonimato de seus sujeitos (aquilo mesmo que a ciência recusa com

horror quando fala de si própria), seja a um anonimato de suas próprias identidades sociais. Não custa refletir a respeito d,a boa

intenção que levava cientistas sociais a ocultarem cuidadosamente o nome da comunidade onde faziam os seus "estudos de comunidade"' Não custa pensar a razão pela qual, durante muito tempo, uma das características universalmente mais aceitas para definir o que é "cultura popular" era justamente o seu anonimato. Ou seja, 3ntre outras coisas- o que a distingue da nossa é que, enquanto o eruüiIr-r da cultura e a necessidade da identidade pessoal do autor, t. '{ue torne iegitima a popular é que nela ele não exista, ou porque toi esquecido no tempo. ou porque, não tendo atores de história, o

po\ o não deve ter tambem autores de sua

própria cultura. Não custa

avaliar uma insistência do uso do questionário gue, mais do que tornar as coisas faceis e objetivas, estabelece, também no momento da pesquisa, uma máxima desigualdade na relação entre um lado e o outro' Entre ele e o catecismo há, uma curiosa semelh ança: um possui todas as perguntas e, o outro, todas as respostas. Entre os primeiros homens que constituíram os ,,tempos modernos" de nossas ciências, a pesquisa do outro mais simples, mais distante, menos matreiro e resistente servia a explicar-nos, ou'a explicar totalidades: "o homem", " a religião,,, ,,os estágios da humanidade" (onde irredutivelmente as formas primitivas eram

sempre as do ooúro e, as exemplares, as d,o nós).A Hist oria e épica e, por isso, não só o senhor cabe nela como deve ser, mesmo quando inimigo, o sujeito dos solos mais importantes Ín-oior,^^;;*ros, sujeitos de mundo sem classes, ou sujeitos das de baixo em nosso mundo, faziam momentos breves de um coral escondido, mesmo quando

entoavam o hino do aliado. Mas a Sociologia e a Antropologia perguntam sobre relações que, cotidianas, podem ser ate cômicas. Então é melhor perguntar sobre nós atravás do outro. Nada mais simples: tomar para cad,a instituição ou fenômeno cultural a sua "forma mais simples" e pesquisar como funcio na ali,- depois, complicar a conclusão e tornar nobre a retórica, para explicar como

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

1l

aquilo funciona "em geral, ou, em "nossa'f sociedade. A aus traria era ótima para isto. ,

- I tr' -'

"Foi dito muitas

v:z'es que a sociedade -J,jl ocidental era aúnica a ter produzido etnografosj qu. ..riJiu ,ru grandeza

outras superioridades, e, à farta de qr. estes lhe contestem, a unicaque a inclinar-se perante .iu, os obriga ;;, yez gue , sem era, não existiriam. Poderia também' do ..r,,o modo, pr.i.naer-se o contrário; ocidente prod uziu etnógrafos, se o e

po.qre

um remorso muito poderoso deveria atormentá-lo' oúigundo-o u .o, frontar a sua imagem com a de sociedades diferentes' na esperança d. que elas refletirão idênticas taras ou ajud arão a explicar como e que as suas se desenvolveram seu seio" (craude Levi-Strauss, no Tristei Tropicos,pp. 3

g4_3g5).

Houve avanços importantes. Hoje em dia existe uma preensão ampla de que comainda que o objetivo , d,a ciência sociar seja produzir explicações tão universais qrunto possíver, na verdade a pesquisa do outro em primeiro lugar

serve para expli cá-ro. Malinowski desembarcou sozinho nas irhas de Trobriand, euando apenas um método que não era ia ser reinventado ari; era uma atitude. \ào mais reconstruir a explicação da sociedade e da curtura do ,,ourro,. através de fragmentos de relatos de e missionários. viver com o outro no seu Ir.-on'iajantes mundo, aprender a sua Iín gua: r ir er sua vida; pensar através de sua rógica; sentir com ere.

"Logo depois que me instalei em omarak ana (Ilhas Trobriand). mecei' de certa forma, a cotomar parte na vida da alde ia, abuscar quais os acontecimentos importantes ou festivos , a adquirir um pessoal no diz-que -diz interesse e no desenrolar dos acontecimentos quena aldeia; a acordar da pecada manhã para um dia que se me apresentava mais ou menos como se apresen ta parao nativo... Durante o meu passeio matinal aldeia, podia observar os íntimos detarhes -pela '"orinha, da vida famiriar, a higi.r. ,u âs refeições; podia ver os preparativos para o dia de trabalho, u, p.rroas saindo paraatender aos seus interesses, ou grupos de algumas tarefas manuraúreiras. homens e mulheres ocupados em Disputas, piuaur, cenas familiares, dramaiicos, mas sempre signi_

;::i,T:,:il:#;;§ jffi::r::"T,.'

deres

rVÍais

tardel no

correr.:H,ro;Í:

i,ff;Í:T}:níi:

seria facilmente acessível; não hãvia quutffi possibilidade escapasse à minha observação,, de que (Bronisraw úarinowski, ,,objetivo, desta Pesquisa" y;:::; Desvendando Máscaras,so_

iof"u"'

-

t2

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO 1org.;

E tudo isto por quê? Porque em todos os mundos sociais todas tal maneira :c erplicam atraves da posição que ocupam e'da função que exercem Ilt-) interior da r ida social total. que somente uma apreensão pessoal : d:rrt-rr;ir de tu..Jo ptrssibilita a e\plicaÇão científica daquela sociedade. P,-1r::-.. i3:::em. r) primeirr- tltr de logica do pesquisador deve as instituiçÔes da vida estão interligadas de tal sorte e de

ser nào

o seu - § de sua ciencia. mas o da propria cultura

que

investiga, tal como a expressarn os proprios sujeitos que a vivem. Estava inventada a observação participante. Este mergulho por inteiro no mundo do olttro não impediu que uma ciência sociologicamente renovada se desobrigasse das questões efetivamente sociais das condições de vida dos outros. Assim, uma Antropologia, cujo método era enfim participante, nem por isso tornou-se ela propria politicamente participat1a, a partir do que começou a descobrir.

Pesquisando e escrevendo na mesma Inglaterra de onde o polonês Malinowski saíra para Trobri and, o alemão Marx invertia a questão. Não é necess énio gue q pesquisador se faça operário ou como ele, para conhecê-lo. É necessário que o cientista e sua ciência sejam, primeiro, um momento de compromisso e partic ipação com o trabalho histórico e os projetos de luta do outro, a quem, mais do que conhec er pata explicar, a pesquisa pretende compreender para servir.

A pattir

daí uma nova coerência de trabalho científico

se

instala e permite que, a serviço do metodo que a constitui, diferentes técnicas sej am viáveis: o relato de outros observadores, ffiesmo

quando não cientistas, a leitura de documentos,

a apycação de questionários (Marx mesmo fez uffi, mas às avessas), a observação da vida e do trabalho. Estava invent ad,a aparticipação da pesquisa. Quando o outro se transforma em uma convivência, a relação obriga a que o pesquisador participe de sua vida, de sua cultura. Quando o outro me transforma em um compromisso, a relação obriga a que o pesquisador participe de sua história. Antes da relação pessoal da convivência e da relação pessoalmente política do

compromisso, era facil e barato mandar que "auxiliares de pesquisa" aplicassem centenas de questionários apressados entre outros QUe, escolhidos através de amostragens ao acaso "antes", seriam reduzidos a porcentagens sem sujeitos "depois". Isto é bastante mais difícil quando o pesquisador convive com pessoas reais vés delas, com culturas, grupos sociais e classes populares.

e, atra-

euando

comparte com elas momentos redutores da distância do outro no interior do seu cotidiano. Então a observação participante, a entre-

.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

vista livre e a'i historia de vida se impõem. o pesquisador descobre com espanto que â ntraneira espontânea de ,- entrevistado sobre qualquer assunt farar a"'i-àt ãie, de sua pessoa. natural de uma pessoa amaneira eue explicar alguma coisa diante ào gravador, é através de sua "história a'. ,iãa", ou através de um fragmento de relações entre a sua vida e aquilo a qu. ..sponde.

Em boa medida

descobre que métodos e técnicas de

fr':riffiiil§,o*:H.Quais

.ritoffi::i':da m

àu. se armacom cuidado ; i;'.,tigador submete à sua

são

a vonrade

redefinição

o

a atteridade rem acontecido,

entre

, ;,';, ffJ I :j,:,:?, :1, : ;,H, {, companheiro de um compromisso ; "o cuj a traj.rorii'';;;, " balho político e luta popular, zid,aem tra_ obriga o p.rõuisador a repensar não só a posição de sua pesquisa, mas também a de sua própria A relação de participação da práticacientífica no truuurno pessoa. das classes popula", político d.,

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afiaü;rquisador a ver e compreender

classes' seus sujeitos e seus mundoi

:

tais

, tanto através de suas pessoas nominadas' quanto a partir de um trabarho social e porítico cre classe Que' constituindo a razão d,a pratica., constitui igualmente a razão da pesquisa' Está invent ad,a a pes,quiro parÍic iparÍe. Nâo porque como querem tantos, tantas ,.r., urna fraçâo diente

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t

de sujeitos populares

E)

pa

,ri,pa subarternamente

do pesquisador' mas porque uma pesquisa coletiva camente

ã,

si

obe_

da pesquisa

participa organide momentos do trabalhà de classe, quando ela precisa reconhecer no conhecimento se da ciência.

Este segundo volume de documentos delsobre pesquisas particomplicado

cipantes é

q*

o primeiro. Aqui estão reunidos escritos de T.tlt diferentes pessoas, do Biasir, da América Laünae Europa' como acredito da que pesquisa participante

:ffi.T:::lJTlih,1Í,1,,'-'!'?;;á,,ni.o '1

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: ;'*:',,::ffii? rrópria' escolhi documentos "';T Deixei regidos pela diferença. 'assem aqui pessoas que que fadefendã* pontos de vista diversos, a partir Jt' teorias às vezes opostas. Permiti

'dade de uma proposta e, ao

qr. variasse o grau de radicaescolh...^.*fio. de pesquisas parti-

':pantes' não quis recorrerjustamente a casos ,,exemplares,,,

mas

t4

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

1org.;

selecionei algumas experiências possíveis. Reconheço que faz falta na coletânea um tipo de documento, o da crítica cient ífica e da cnttca política das diferentes propostas de pesquisa participante . Jâ

que, ou por falta de textos ou por falta de coragem, não o incluí entre os que são apresentados aqui. deixo a unt o utro a sugestão de

que isto seja t-eito em um prorimo livro. se possír.el. breve. Este é o momento. leitor. para anunciar em julho de Ig84 a realizaçào, e ffi São Paulo. de um 3." Seminário Latino-americano de

Pesquisa Participante. Muito mais do que no caso dos dois primeiros em Cartagena, na Colômbia, o outro em Pátzcuãro, no México aquele será o momento de reunirmos, finalmente, à euforia dos primeiros tempos da "experiênc ia" , uma crítica séria e serena de sua prâtica. Carlos Rodrigues Brandão

lesq uisa participante : Propostas e projetos*

Marcela Gajardo** Introdução

[Im estilo supõe a ideiade Atrai' enquanto tal, diversas totalidade e possibilidade histórica. manifestações que ocorrem mesmo campo de atividade. em um Este é, penru.or, o caso que visuali das práticas

zam parti cipação, irrestigação momentos de um mesmo processo.

o germe de um ou mais estilos

e ação educativas como Pensamos que neras se encontra

alternativos de trabarho junto setores populares' Pensamos a ainda que estes se inscrevem perspectiva mais ampra, em uma quar ,.-lu, a de contribuir, por

iüil:;;*'nicaçãà

meio da proot conhecimentos, para a criação de uma nova

Muitos são os esforços desenvolvidos em torno dessa idéia. Grande é a experiência acumulada . várias as vertentes e propostas que confluem para dar corpo a um estiro de trabarho que vê na apropriação coletiva do nu produção coretiva de , 'ub., conheci(.) Este artigo para Research Reviá' sustenta -se integrarmente em um traba rho prepara do oia,Àà|,*yi"'ãrrro cado primeiramente sob o titulo "Éíoücion, ryyecl,do rDRc, canadá. pubri_ situacíón, q.tuar y perspectivas

',',i,,r"'ll?,1,""nJ

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FLA

cso,

M . A . em associada da Facultao pesqu isadora _sociorogia . rrab alha atuatme't" Lãtinoamericana de ciencias sociares (FLAcso).

t"'ã rericano de coopeta.ion

edu."çãà rurar no rnstituto chire .em rn teraAgricrttur, 1ilcei , escritorio do Brasir.

especialista

prrc

ra

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

t6

1org.;

mentos a possibilidade de efetivar o direito que os diversos grupos

movimentos sociais têm sobre

e

a produção,, o poder e a cultura.

Quais são essas prâticas e como se têm desenvolvido, quais as teorias subj acentes a elas? Qua is são suas estratégias metodologicas e suas

projeçÔes? Eis o que tentaremos abordar neste artigo. Para estes f-tns. entendemos que nào eriste uma unica maneira de definir estas atiridades. Elas sào. sobretudo. processos onde coexistem raízes distintas, teorias diversas e estratégias metodologicas nem sempre condizentes com os postulados gerais.

Muitas dessas práticas aparecem indistintamente como método de ação e mecanismo de aprendizagem coletiva. Para alguns, isto culmin a na transformação de por/o em sujeito político: sujeitos que reivindicam de maneira consciente e organi zada uma presença ativa e de real importânc ia na sociedade a que pertencem. Outros r'êem nestas práticas um método geral para a elaboração teorica. quer no campo da educação quer no das ciências sociais, contribuindo com isso para a diminuição das fissuras geralmente existententes entre teoria e prática, sujeito e objeto nas prátrcas de investigação social e educac ional.

Não faltam aqueles que vêem na pesquisa participante um componente de processos de planejamento social que envolvem determinados grupos de uma ou mais comunidades, os quais, devido à maneira como se estrutura a sociedade, vivem em condições de dominaçáo e pobreza. De fato, formas coletivas de planejamento local proporcionaram nos últimos anos um contexto importante pata a aplicação de estratégias participativas de pesquisa social e açáo educacional.

. As alternativas anteriores são uma ilustração das diferentes faces de uma mesma moeda. Embora estejam separadas por fins puramente analiticos, é necessário reconhecer que a existência de tradições de pensamento distintas e de práticas de pesquisa diversas conferem alcances e significados diferenciados a atividades que se desenvolvem sob o mesmo rótulo: pesquisa participante ou investigaçáo participativa. A assertiva anterior não impede reconhecer, no entanto, alguns traços comuns às diversas alternativas, os quais permitem uma prime tra aproximação a estes processos. Entre eles, cabe assinalar os seguintes:

1) explicitaçáo de uma intencionalidade política de trabalho

junto

e uma opção aos grupos mais relegados da sociedade;

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

I

2) integração de investigação, educação e participação social como momentos de um processo centrado na análise daquelas contradições que mostram com maior clareza os determinantes estruturais da realidade vivida e enfrentada como objeto de estudo; 3) incorporação dos setores populares como atores de um processo de conhecimento, onde os problemas se definem em função de uma realidade concreta e compartilhada, cabendo aos grupos decidir a programação do estudo e as formas de enc ará-la; 4) sustentação das atividades de investigação e ação educatir a sobre uma base (ou grupo) organizada de sorte que esta atir idade não culmine em uma resposta de ordem teorica. ntas na geraçào de propostas de ação e\pressadas enl uma perspectir a de mudança social.

À maneira como essas experiências evoluíram e às projeções possíveis farernos referência nas partes seguintes.

Origens e evolução dos estilos participativos de investigação social e ação educativa Da investigação temática à investigação-ação: os anos sessenta

Em um ensaio recente (Zurtrga, 1982), reivindica-se para Paulo Freire o título de " criador" de um estilo alternativo de pesquisa e ação educativa. Por trás de tal afirmação, está o conjunto de experiências que? sustentadas pela concepção consci entizadora de educação, desenvolveram-se em fins da dec ada de sessenta, no âmbito das transformaçõe s agrârias operadas em alguns países da região. Chile e Peru são, talv ez, os casos mais significativos de ações orientadas paÍa incrementar a partrcipação dos camponeses beneÍiciários de tais mudanças a fim de tntegrér-los a novos modelos de produção, ao consumo e às alternativas que os modelos vigentes apresentavam, em termos de gerar uma maior participação social. Os processos de moderntzaçã,o característicos desta époc à a, dentre eles, os processos de reforma agrárta, provocaram novas articulações, oposições e alianças que permitiram o desenvolvimento da capacidade de organizaçáo dos assalariados do campo , e à possibilidade de estes apre>entarem suas demandas e reivindicações sociais. Era, pois, uffi mol&, :.: '

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

2) integração de investigação,

N

educação e participação como momentos de um sociar processo centrado na anárise daqueras contradições que mostram com maior clareza os determinantes estruturais da realidade vivida e enfrentada 3) incorporação dos setores como objeto de estudo; populares como atores processo de conhecimento, de um onde os problemas se deÍinem em função de uma realidade concreta e cornpa rtilhada, cabendo aos grupos decidir a programação do estudo e as formas de encará-ra; 4) sustentação das atividades de investigação e ac.-àtr e,Jucarii sobre uma base (ou grupo) organ izada de sorre .ruc elr. ri;i:dade" não culmine em uma resposta de ordenr tctirrcJ. rnas nJ se râr,, àtr ,re propostas de açào expressadas v:rt,rrJ)..Lrds cm em uma ,,rrr--:" perspectira de mudanca social

À mu'eira como-essas experiências evoluíram e às projeções ru"iurtes seguintes.

possíveis faremos referência

Origens e evolução dos estilos p articipativos de investigação social e ação educativa Da investigação tem áticaà investigação-ação: os anos sessenta

Em um

ensaio recente (Zuf,iga, _

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de um esrlo arternarivo de pes-

Por trás de tal afirmação, es.tá o conjunto de experiências sustentadas pela concepção que, consci

entizad,á.u de edu cação,desenvoli eram-se em fins da decada de sessenta, no âmbito das transfor:nações agtánas operadas em alguns países da região. chile e peru sio' talv ez' os casos mais ,igrfr.ativos de ações orientadas :rcrementar a participação our,dos :udanças a Íim de integrá-ros camponeses beneficiários de tais

a novos modelos

de produção, ao '-'nsumo e às alternativas que os modelos vigentes apresentavam, de gerar uma.maior part ':r termos icipação sociar. os processos :rd ernizaçã'o característicos de a.rà época'e, -: re tbrma agrária, provoc aram novas dentre eles, os processos : rnças que permitiram o desenvolvimentoarticulações, oposições e

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Ja capactdade de orga-::''-ào dos assalariados do campo, e a possibilidàa. de estes apre_ ilrem suas demandas e reivinàicaçoes

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sociais. Era, pois, uÍrl mo_

1!

CARLOS RODRIGUES BRAITDAO (org')

fator educativo em nlenro que possibilitava a transformação do que ampliou o esct-rr,ponente de um processo geral de mudança paço de participação e mobrhzação popular

'

Tal situação supunha o desãnvorvimento de uma estratégia

então que os campoque possibilitasse tal participação. Supunha-se não poderiam ser neses e os grupos mais rerãgados da sociedade como mantivessem se se sujeitos de um processo historico alternativo setores aqueles somente uma categoria social passiva e carente. e de seus interesses, prâtrca de org amzaçáo dotados de consciência

e de real signifireivindicações poderiam ter uma presença ativa deste marco Dentro lg12). caçáo social e política (Gomes de sousa, o compore percepção evoluíam as idéias a respeito de investi gar a beneficiários tamento dos grupos *ãno, privilegiados do campo, dos processos de potenciais de uma redistribuição da terra e atores mobili zaçáo PoPular nesse meio' a respeito da Em tal contexto, desenvolviam-se também idéias permitissem que necessidade de delinear estratégias metodológicas nos presentes teoria-prâtica, superar as dicotomias sujeito-objeto, produção uma possibilitando processos de pesquisa .àrr.u.ional, interesses e necescoletiva de conhecimentos em tomo de vivências, Isto é, aqueles socialmente. e histórica sidades dos grupos.situados

uma camponeses que vrviam na condição de arrendatários, rural' meio no dominaçã,o da exercício de formas mais clássicas participatrabalho Junto a eles surgiram as primeiras propostas de cultural campoátrca tem da investigação ger adaa tivo. com eles foi gaçáo temática. nesa, conhecida genericamente como investi nas idéias pedagooriginalmente inspirou-se Esse trabalho pesquisa e a coorgicas de pauro Freire, gue foi quem idealizou a uma unidade ecode camponeses os denou em sua primeira fase. a parttcipar de convidados foram nômica reform ada (asentamiento) atividades eduum estudo que possibilitaria uma pro gramação de Subj azia a esta interesses. e necessidades suas cativas de acordo com qualquer açáo eduproposição um pressuposto específico: o de que produção de conhecicativa deveria ser entendida como um ato de do campesimentos em consonância com a realidade e a situação investigar o nato. Como na tarefa de alfabetizaçáo, era necessário implementar para ,,universo vocabular" e as " palavras geradoras" de consciência um programa que permitissô aos sujeltos a tomada das

sua dimensão técnica e sobre sua situação; a pós-alfabetizaçáo, em que Paulo Freire denominata social, exigia o'conh.ôi*.rrto daquiÍo ,,universo temático significativo" e rrtemas geradores". Para Freire,

REPEIVSANDO

í

PESQUISA

PARTICIPANTE

Ig a apreensão de ambos os elementos, tanto gadores como pelos ptop'ià, camponeses, pela equipe de investi-

fundamento da tomada dàveria permitir o aprode consciência e concretas de encontrar das possibiridades reais caminhos de ,oirçao. e d

e,,,T:.i:,,.",:;í.Hff:,:Í**..

:T,Tx# : f;, Í;;,,,T,ã compreen dia a investigação em suas fases de codificação

-'mf;"?":'f[Íl *ffi','f;; ;;,,0,,

É 1;,1,

rlil

.ffi.

de prosraÍn



TlH.Tfi

e decodião e d esen -

As etapas de obrse^aç:ào e ctrditrcar--àr-r se rrrieniar-rm construçâo dos codigt-'s pf,r, a ,.lue poss:::ir:ar.:: situaçôes sociais o pt-rSte;-ior ana]rse ,cas ':trit;r;;. cr)trrrtr char es para a compreensào rormas peras quais os camponeses das construíam arearidade; cepção e comporramenro sua per_ diante dela. A decodificaçào análise conjunta enfaúzava a de,tais situaçôes.

A hipótese subjacente a este profur? , nãoapenas zariut código de perce;;;", se obteria o :eu provocados p.tu'iragem e apoiados pela intervençãô uürizada de um coordenador Neste sentiào' a extr decodi Íicaçao resurtariá para decompor e em um ;H:r;".:iJrff; analisar as'iaug.r, e, conseqüentemente, cessos e relações os pro_ nelas contidàr. Co, trq não apenas se obteria discurso popu lar' a cessos e relações nelas

ton'iãlr. com

forrna coÍno grupos o e organ izações descreviam interpretavam as mensagens, como também e começ avama se produ-

;:#j::rffi;nffr.iã ae p.r..uer as esrrururas exisrenres, modi_ { ssim, arravés de,; ::#:ff:'T:#,Í}: i:'r,:t; IfH,*:::, apontar-se-ia para

uma problemas' possibilitango compreensão cad,a vez;;,, grobar dos u p.àg.rmação de atividades pedagógicas adequadas aos níveis de t*"}ência ' ut"unçados erigências de sua própri pero grupo e às a prática sociar e produtiva. A experiência a que aludimos rearizou-se Recurso' unidade no asentamientoEr

*ittlo

nada;;. base ;"; seguinres mero de famílias critérios: nú_ estaberttiau., antecedentes dade' facilidade históricos da rocariat- utt"o e inexistência

à.

,;"1";';:1ff;ux#{.111*t}t}.. estrutura gerar do p.ljero, proãoeu_se de visitas ao local ;

investigações prévias

u,n i ãrd. o.-,,u u i_

à;rrl,1ffi"T:rr;?

Jr:i: fãram ã* argurnas entrevistas eropósito: desvendar com dupro antecedentes soble a propriedad. .tr"# informar aos camponeses fi* os objetivos .::ilr: e amerodorogia do

i

CARLOS RODRIGUES BMNDÃO 1org.;

Como resultado dessas observações iniciais, entrevista e .jesvendamento dos dados gerais da area, reconstruíram-se as formas de org amzaçáo dos membros da comunidade e foram selecionadas, com base no marco teórico do estudo, as chamadas "situações existenciais" que tornavam possível a codific açáo, a inscrição

grâfica em imagens e a posterior análise coletiva nos chamados "círculos de investigação". Dois critérios foram utilizados para a seleção das diversas situações a partir das quais se organi zaria a análise coletiva. De um lado, o grau de importância que estas situações aparentavam ter p ara o grupo camponês ou o significado que o grupo dava a elas; de outro, o grau de significação que tais situáções

apresentavam com relação ao marco teórico da investigação. Com respeito ao primeiro critério, foram utrlizados como indicadores da importânc ia atrlbuída pelos camponeses a determinadas situações atuais ou passadas tanto as expressões que estes revelaram

na etapa de entrevistas como a constância com que as situações

apareciam e a intensidade de sua referência. Com relação ao segundo critério, considerou-se, com base nas observações realizadas pela equipe de investi gaçáo, os principais processos desenvolvidos no estabelecimento rural e o tipo de relações presentes no seu interior. Tiveram prioridade aqueles processos que mantinham correspondência com as situações concretas vividas pelos camponeses. Em tais processos, foram distinguidos diversos tipos de relações estruturadas a parttr de contradições que eram, ao mesmo tempo, síntese das situações observadas e expressão da estrutura de p...àpção a elas subjacente. Processos, relações e situações sociais constituíram os elementos básicos para a elabo raçáo de codigos e a inscrição destes em grâficos (Gajardo, 1981:53-68). Os codigos estão sin-

tetizados no Quadro l, a fim de ilustrar o modo de operação nas atividades de seleção de situações, determinação de .orrt.udições e gráficos utilizados. A cada conjunto de contradições postuladas paÍa a análise coletiva correspondia um referente das diversas situàções próprias da vida cotidiana dos camponeses dessa comunidade particu lar. Estes apareceram a partn das primeiras observações. Assim, por exemplo, àquelas contradições referidas aos processos e relaçOes de produção correspondiam situações tais como: movimentos reivindicatórios no estabelecimento, as causas de tais movimentos, estrutura de posse da terta, desemprego e produtividade no estabelecimento, comerciahzação dos produtos e distribuição de excedentes, problemas derivados da produção individual ou coletiv a na exploráção da

REPENSANDO

4

PESQUISA PARTICI PA\TE

QUADRO-RESUMO N.O í Processos, re ,El".l rtes Írâ inrro-jf!::s,,con_tradições.

*ecurso Re/açôes

e situações ou

Contradições

ReferenÍes

referentes camponeses

1. Processoser",rnõ". de produção n, ÀãIj lade " no ;;;;_''='tamiento

I _- ::Trynê. I - lll?, ,

I

x

terra

:rmp.oneses traba lho individual x trabalho coletivo trabalho x Oiversat

sítuação de trabalho situação oe conriito trabalhista

trabalho individual x trabalho coletivo da terra

situação de jogo

esportivo

diretiva x

gestação e estru_ turação do poder

3.

asenÍados CORA x asenÍados

Processos de

pais

socialização

4.

filhos

educação formal x educação informal-'

Processos de religio_ sidade camponesa

Fonte:

x

assembléia de

asenÍados

Deus x crentes sacerdotes x fiéis

#xffi,#"T,J:3,

terra' vantagens e desvantagens,

necessidades de para assegurar uma a comer ciaúzação e o .or.u*o, entre";::#í:T: contradições referidas aos processos

de sociari zação tinham referente em situações seu familiares, na partici da mulher nas paçãoescassa atividades ou ao.rtJerecimento,

nura

as artas taxas de nata-

:5;k.Xi,:3j:Hr:1, Iu: uiío.o*o á1ã,u üva d,amigração, a ün ic a, M qu. ;?Til::àr#:,;:;.::;:TaiÍ*í ";; :.;;ü'JT.Í:.:ii'?oro d;;ii*.,,;, ",, siruaçõ;-;. if,,,$i{ : r;



rereri am,

I-*1",';J1"'J;,'.T, Íi{}l{} }::. : ;, : o enri dade j: #Jil,H] . =-s referidas "*[,:iil:;,;rJil:l à religioriauj.;;ü f],.lT#i ' :

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i,".T

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co

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j:de'

à, úiu^à*çao de uma igleja que à presença. na aparecia.oÀã^p.orongaràrto da casa

patronal, a interferência do patrão na atividade religiosa e o papel do sacerdote como sancionador dos atos dos camponeses , patttcularmente diante das atividades que afetavam os interesses do

proprietário das terras. Junta-se a isso a importância atribuída pelos camponeses à "ação divina" e seu conseqüente fatalismo. Durante os meses de outubro e novembro de 1968, procedeuse à real rzaçào das decodi ficações nos círculos de investi gaçáo Nestas reuniões, o grupo debateu em torno dos filmes projetados, exteriorizando a sua forma de visualizar ou perceber as diversas situações. O debate foi gravado e transcrito, dando forma ao discurso camponês, corpo de anétlise para a determinação do universo .

temático e dos temas geradores, eixos do planejamento educativo e da pro gramação de um ou mais cursos de açáo. A seleção do caso anterior ilustra uma das propostas de encarar aparticipação dos setores populares na investigação social e na prâttca educativa. Sua resenha obedece ao fato de ter sido o primeiro a engendrar outro conjunto de ações de características similares. Neste sentido, ele contribuiu para o desenvolvimento de uma alternativa de trabalho neste campo. Embora esta experiência, eflquanto tal, seja pouco conhecida na América Latrna, é certo QUe, como estratégia metodolo gtca, inspirou um número importante de projetos desenvolvidos em nosso continente. Projetos onde a partrcrpaçáo em seus diferentes níveis e a açáo organi zada para a geração de ações de transformação social e econômica são duas idéias que

permaneceram constantes, tanto nos escritos de Freire como nos projetos baseados em seu pensamento. Permaneceu constante tam-

bém a idéia de reverter a função reprodutora da educaç áo , redefinindo-a como instrumento de apoio aos processos de transformação sociopolítica.

A educação passou a ser entendrda, em tais projetos, como uma atividade que possibilitava aos grupos menos privilegiados compreender e interpr etar a racionalidade e o funcionamento dos sistemas de dominação social e adquirir os conhecimentos apropriados para melhorar seu nível de informação e capacidade de movimento. Isso explica a ênfase especial posta na interpretação dos processos sociais e das relações de produção vigentes, bem como a tendência para elevar níveis de consciência e fortalecer o nível organtzactonal dos setores populares. Provém daí também o componente

"ativo", presente na investigação temáútca. Nesta proposta, a atividade de pesquisa não culminavaem uma resposta de ordem teórica, mas na ger açáo de alternativas de açáo expressadas em uma pers-

REPENSANDO,{

PESQUISA PARTICIPANTE

a;

pecti'a de mudança sociar. É isso que exprica em parte sua incidên_ atuui' de invlsti sação participariva

;;1,,1i;*l::ostas

e pesquisa

A investigação-ação e a década de setenta: mesmo conceito duas vertentes para um Embora

se reivindiqu paulo Freire introdu zido um enfoque e para a pri maziade haver ;.r;;;;"';";: *rrcada conotação socio_ política na educação p..qriru educativa. dos canos' o conceito países latino_ameri_ " de in".rtigu ção-ação, util izad,o a partir setenta para caracte dos anos rizar provém de uma vertente os estitor'pa.ticipacionistu, de pesquisa, mais sociológica do que propriamente cacional' Por trás edudesse ct ncei to, jaz umaforte .riti ,u aunidade método prevalecente de nas ciência, ,o.irii à preeminência de uma visão parcel ada e unidimensionar da ,"uíi,daáe ,o.iur, à radical entre ciência separação e polít ica, à desvincuração prática nos procedimentos totar entre teoria e científicos ar aparticipação .or.riru e à manipuração dainformano, processos de gesrão :::::;i:r', por parte das sociar carnadas de dlstituídos latino- ui'"?' das sociedades denr

e,,

ü: :':fi . jl:*;:,, #.r,?l;,ir"J;

* :T::lfi: {

;;

da sociologia' como reação aos paradigmas predominantes nas ciais sociais' propondo ciêncaminhJs arternativos de ação. o trabalho

mais tigniÍi.utiro

dentro dessa proposta nas experiências encabeçãaur acha-se oo, orrando Fars bo.ãu, sociórogo colombiano' ensaiaol' em funçao de estu dar

social dos setores asituação histórica mais pobr., . urru.udos e dasociedade corombiana efetivar a vinculação da pesquisa com as desenvolvidas pelos g'upo, . orgu nizaçõ., ações sociais e poríticas Àui, conscientes do país .*prriencias se susrentavam il'j,:'^^::')-' em um e de

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. :;il:?' i:'-

idade que privilegi; ff:[:'f.

r o p u I ar

con_

;l*: ltllífu.J,;i.,i:

á' a manutenção do sistema e dependente, e a primeira vigente , capitadefinida como o ,,conhecimen_ ''r empírico, prático, de ,rnro-ro*r* ''

'i

sta

t::il t

que tem sido um bem ideológic.o ancestral cur_ '-c) permttiu ctiar' ftabalhardas camadas da base ro.iut, o quar e interpr etar- a rearidade predomi_ recur.o, q, e a naturezaorerece

=-J,:;Til;,,,";fi:rle

ao homem,,

24

C.{RLOS RODRIGUES BRANDÃO (ore.)

P.:. F:. s B,.':,ii. a ciôncia e o trabalho científico têm uma - I t: - :: :r: i. ;3 ;..s.s e. mesmo que se procure evitar a adje- , :,: - -: -: :'. "- :,ia. :1,-- :s rtrde deirar de precisar QUe, embora

j - :-- : :;.: -: :: .-í:: :,,:,:ji:zadOr e ConStante, expfesSadO pof :.:-3:: ; ..::>3: ;:'. =t>.-': a:: üererminadas sociedades e conjunturas hrsl{'naêi. cb .-rllthaa i:T:ünxt-rS. ciarjtrs. tatt-rs e tàtores se articulam

segundtr (x interesses das classes sociais que lutaram pelo predomínio social,político e econômico. Assim. diante da existência de

paradigmas científicos que servem aos interesses dos grupos social e economicamente dominantes, torna-se necessário contrapor paÍadigmas alternativos construídos a partir de uma aproximação aos setores populares e às suas organi zações de base, com o intuito de "entender de dentro a versão de sua propria ciêncraprática e de sua

reprimida extensão cultural, e buscar formas de incorporá-las a necessidades coletivas mais gerais sem fazer com que percam sua identidade e sabor específicos" (Fals Borda, 1981 : 155). Grande parte dos postulados do autor, jâ resenhados nos parágrafos anteriores, deriva das experiências desenvolvidas com organizações populares no meio urbano e rural por grupos vinculados à Fundacion Rosca de Investigacion y Acción (FUNDARCO), hoje desaparecida. Para Fais Borda, são seis os princípios metodológicos que devem ser respeitados com o objetivo de impulsionar práticas de investi gaçáo vinculadas aos interesses do movimento popular: autenticidade, antidogmatismo, devolução sistem áúica, retroalimentação de intelectuais orgânicos, ritmo e equilíbrio entre açáo e reflexão e, finalmente, desenvolvimento de uma ciência modesta basea em téc-

nicas dialogicas (Fals Borda, t982). Por trás desses princípios, ja, toda uma postura que visa integrar os setores populares à determinação dos conteúdos de pesquisa, bem como incorporá-los à investigação na qualidade de atores do processo. O investigador aparece, em tais processos, como um intelectual comprometido com os interesses do movimento popular, e a investi gaçáo-ação surge como espaço de participação social e método de ação política. Como uma forma renovada de fazer política e uma forma alternativa de fazer educação, mesmo quando esta última não chegue a ser explici tada. Neste contexto, não se pode deixar de reconhecer que, effi muitas experiências baseadas na proposta de investigação-açáo, subjaz uma tentativa de contribuir ao desenvolvimento de novas teorias e estratégias metodologicas no campo da investi gaçáo social e da prâtrca pedago gtc,a. De fato, vários princípios que regem as estratégias e concepção presentes nos

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

25

atuais estilos de investigação participativa evidenciam pação crescente em uma preocuavançar na consolidação àqueles que tradicionalm.nt.lã;;;;dado de um estilo alternativo as práticas de inves_ tigação social e os processos de ensino-upr., d,izagem. FalsBordacolocaesSaassertiVanosseguintestermos: o próprio

"A crise do paradigma

da 'conscie

pata transcendê-lo ("') l!.iruç?o' revou à procura de formas A pedra filosofar da transiendência paradigma

de um a outro radicou-se na id,eiade que o conhecimento transfotmaçãe social para a não se radicava na formação libertadora da consciência' mas na prática dessa consciência. AIém disso (...), dessa passagem e desse sentir da práxis tambem ,. prodrzem um saber e

:##:"ru,'ll"#T,'*'.:l,tr;,r"xff prática' de outro' Havia uma

r

i:";,;:,ir."ff

,ffi

J": pura e aplicada' Reconhecia-setendênc ia paradefinir a ciência como certa relação entre uma sentido de que a teoria e outra, flo permitiria maior efrcácia da prática, que a prática se inspj taria na ieoria e, desss fatia avança' " to'hecimento ryoo, que essa combin açã,o em minha opinião' permitiu científico. Foi_essa possibiridade Que, superar as dificuldáai políticas do patadigma ideorógicas e da conscientiz ação. Durante meiros anos d'a deiad'a aqueres pride setenta,

investig açã,o_ação,, (Fals

Borda,

esta passagem foi denominada

1gg2).

A investigação-ação na vertente educativa Paralelamente ao desenvolvimento a decada de setenta assiste conceitual no campo socioao desenvorvimento estratégia no-.u-fo das pratica educativas. de uma Tetodológicl tegia é também de'ãminada .oiro processo cle investigaç Tal estranos seus traços gerais ão-açã,o e, recolhe os momentos , fases e etápas derineados por Paulo Freire ' para a inves tigação temátiça. A metodorogia, proposta por João Bosco Pinto, encontra na expe .iência Paulo

lógico'

iniciar de Freire os elementos de um marco teórico-metodorógico partir do qual constrói a diversas

técnicas que vêm sendo com maior ou menor apricadas êxito em microprocessos de planejamento inseridos gerarmente eÍn programas de desenvotrirr.nto rurar. Teoricamente' Baúo Pinto sustenta sua propos conceito de educação ta apartir do libertad;;;, entendendo-a que tendem a recolocar .ô*o os processos h";;;;primido,tradicionarmenre L'ido como objeto " conceda edutuçaol ,o centro do processo educativo. Dando prioridade à ação junto a camponeses bàneficiários de pro-

l-

CARLOS RODRIGUES

B}+NDÃo

(ore .)

,'t

-:"ii'§::stitucionais de mudança agrârta, este autor defende a incorda atividade educativa à transformação de uma estrutura :--{r:l definida como capitalista e dependente. Concebe esta contri:*rüào em termos de uma redefinição da funcionalidade social da educação eue, ao situar-se em urna perspectiva de classe, pode contribvtÍ para apoiar os processos de mobili zaçáo e organi zaçã,o popular. Nesse sentido, postula urna educação entendida como "um processo permanente de formação da consciência crítica dos

:, -i:lo

setores populares, concebida esta como o desenvolvimento e o aperfeiçoamento da capacidade de compreender criticamente a realidade historico-cultural em que vivemos, p aÍa encontrar nela a explicação de sua situação objetiva, assim como as formas e instrumentos que the permitem superá-la mediante um esforço coletivo, sistemático e orgamzado, conduzindo-os a atingir a plena participação na gestão e direção do processo produtivo e no desfrute da rrqueza, bens e serviços gerados socialmente" (Bosco Pinto , 1977:8).

Em termos da investigação e das ações de desenvolvimento coletivo, a definição anteri or traz as seguintes implicações para os setores populares:

1) O acesso universal ao conhecimento científico e técnico, que possibilita a participação no desvendamento (deside ologização) da realidade concreta e sua efetiva transformação através do trabalho.

2) O desenvolvimento da criatividade, a fim de gerff novas formas de participação em todos os níveis e aspectos que afetam o desenvolvimento social e econômico. 3) A organi zaçáo dos grupos em núcleos de base sólidos e autônomos, nos quais sejam o sujeito agente de sua própria libertaçáo. 4) O emprego de meios de comunicação dentro de um sistema no qual os grupos organizados tenham acesso direto à gesrão, produção das mensagens e seus conteúdos (Bosco Pinto, 1977:8). Os alinhamentos metodologicos para a açáo educativa se inse-

rem fia concepção anterior, e métodos e técnicas se adequam ao mesmo, tomando como pontos de partida do processo educativo tanto a reahdade quanto o diálogo. A seqüência metodologica proposta, da mesma forma que a de Freire, compreende o momento de investigação, o de temati zaçã,o e, por último, o da pro gramaçáo , cada um com seus instrumentos e técnicas correspondentes, confbrme indica o Quadro-resumo n.o 2.

REPENSANDO A :PESQUISA PARTICIPANTE -: .-.

QUADRO-RESUMO da Momento

N.O 2

Seqüência

metodológica investigaçaô_à;;;.;;a

verrenre educa tiva

Fase e seu objeto selecionar uma área específica de trabalho para

aproximação

lnstrumentat rnapas conta tos pessoais

aos grupos de camponeses stitu içã

definição da área de trabalho

(local de desen-

volvimento, por exemplo)

(definição peta rn

Atividade e prática

o)

recolher informação básica sobre a área de traba lho

documentação contatos pes_ soais e institucionais

compilação de

dados (trabalhos a nteriores,

monografias, estatísticas,

metas etc. ) entrevistas estruturais trabalho em grupo interdisciplinar

o

r{

o,'

Í

o

r(

(-)"

o FU) TU

z

observarG lizar investígações individuais

guias de per_

guntas diário de campo ficha de descobrimento

elaboração de uma lista de perguntas. guia de entrevistãs com os campo_ NESES

uso do diário de campo, um

caderno de informações das entrevistas na participação no trabalho dos camponeses

(fundamental) execução de fichas, formali_ zação e seleção da informaçáo

compilada (par_ ticularmenté a partir do diário de campo); ativídade a se rea_ lizarem grupo contin ua

2:

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org')

28

Momento

Fase e seu obieto

ln§,rumental

Atividade e Pratica os grupos estratégicos são os grupos de produtores ligados por interesses comuns nas re-

selecionar e treinar os gruPos

estrategicos

laçÕes de Pro-

dução; geradores diretos da riqueza social, assumem um papel essencial no processo de mudança

estrutural sistematizar

a

informação

estrutura de relações

construção de estruturas que são extremos

implementando

o

os diversos

r(

elementos e

(.>

ío

suas relações, para começar a

r{

entender qual é a percepção que têm os carriPoneses da comu-

(->

(, F

a

nidade e seu

tU

funcionamento

=

realizar a inves-

cod igo de

tigação coletiva e devolver a informação aos grupos campo-

investigação círculo de investigação

NESES

realização de codigos de investigação: são a represen-

tação gráfica ou gestual (teatro,

jogo de paPéis etc. ) das situaçÕes rea is, que permitem o diálogo nos círculos de investigação realização de círculos de

investigação: são reuniões nas quais, a Partir da discussão de um continua

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE Momento

Fase e seu objeto

lnstrumental

Atividade e prática codigo, se procura: o a verificação e/ ou aumento de informação . detectar as

o

r( o^

í

o r(

percepções que têm os

o^

produtores da

(,

realidade representada no cod igo recompilar todas

Fa

TU

z

as informações

em forma de

notas, grava_ ções e sistema_ tizar com fichas e estruturas

compatibilizar os elementos de informação com o marco

marco teo_ rico de referência

teorico (teorização)

trabalho de equipe para com parara teoria com a percepção dos g ru pos. para d* tectar os vazios distorçÕes no con hecimento de sua realidade

buscar uma ampla explicação e uma compreensão dos p rocessos reais de funcio_

namento da sociedade (analisar os elemen_

tos, identificar suas interrelações e a

dinâmica histo_ redução

t";;i;;

rica)

:_

temassera_

identificar con_

juntos de

ele_

mentos que con-

Íormam os

te_

mas significa_

tivos na percep_ contin ua

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

30

Momento

Fase e seu obieto

lnslr"umental

Atividade e Prática ção dos gruPos (temas geradores) e Permitem a iniciação de um processo pedagogico de desenvolvimento da consciência

detectar os tiPos de explicação que os camponeses dão aos fe nô me nos,

fatos ou ProcesSOS

identificar as debilidades e distorções da relação Perpercepção/ teorização

o

r{

(-}.

N

F tU

F

elaborar um programa pedagog ico

unidades pedagogicas, materia I d idático

ordenamento de temas em unidades, partindo do mais simPles ao mais complexo, do concreto ao abstrato etc. elaboração do material didático que representa a expressão visual, oral ou audiovisual dos elementos ou temas que vão servir no codigo. Utilizado para os círculos de cultura (codigo que combina elementos da percepção/ realidade com um guia pedagog ico para facilitar o d

ialogo) co ntin

u

a

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

Momento

Fase e seu objeto

lnstru mental

Atividade e prática

:-

cÍrculos de 'q.uttura

o

r{

realização de círculos de cultura, que são reuniões de grupos não maiores do que 15

(-)^

pessoas, nas

quais se busca, a partir do ma_ terial d idático elevar o nível de consciência dos participantes em um processo de

N F

,

l.rl

F

redescobrimento de sua propria realirealização dos círcu los de

cultura

dade. círculos de cultura

orientação dos círculos em dire_ ção ao questionamento crítico da s in te rp re-

tações que cá c grupo Ce s..,a realiCaCe

avaliaçÕes e tra_

r{

tamentoem equipe Cos cír_ culos de cultura organização de peguenas as_

N

sembléias e reu_ niões dos g ru _

o

()^

pos estratégicos trabalho em grupos e em cír_ cu los de cu ttu ra

É. C)

o

É.

À

classificar os problemas

detectados ordem de prio_

grupos de trabalho

ridade

elabore e sele_

cionar projetos de ação difundir a ação ed ucativa

meios de di-

fusão escritos, audiovisuais

realização de assembléia geral para apresentar contin ua

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (ore')

32

Momentc

Fase e seu

objeto

L

lnstrumental

Atividade e pratica a problematica e os projetos de

ação analisar os recursos hu ma nos e materiais

elaboraçãc ce proletos deftnitivos

programar as ações

estabelecer

estrut uras de

mecanismos de controle dos projetos pela

controle avaliação permanente

população executar os projetos e avaliá-los de f orma permanente

o

r{

(->

criação de estruturas de controle pela poPulação, discussão de mecanism os est rutura is execução dos

projetas esPecíicas avaliação Permanente é ação crítica que os executores exercem sobre sua propria ação, period ica e siste-

f

É.

(,

o É.

ÍL

maticamente; os resu ltados devem ser su bmetidos a PoPulação atraves de

mecanismos de con trol e (trab a-

lho em comunidade) y J . B. "Metodologia de la investigación-acción, momentos fases", in: Preparacion y evaluacion de proyecfos, Quito, Junta Nacio-

Fonte: pinto,

nal de Preinversion

, 1976,

mimeo

'

pode apreciar no Qua dro 2 e será visto em outros esquemas, e ste estilo de investigação não utíltza uma seqüência metoáologica como a que se propõe para a investi gaçáo científico-acadêmica. De fato, a maioria das propostas neste campo sugerem estratégias metodológicas que contemplam uma sucessão de passos e etapas compartilhados por aqueles que investigam. Essas passagens adquirem denominações distintas de acordo com as propostas, ãpur...rrdo como as mais difundidas as que se inserem no âmbito de Como

se

REPE\SANDO '

:

A PESQUISA PARTICIPANTE -- r'\r\rr\-lrANl'E

33 )^ t 'projeros '- de pranificação coretiva de diversos cursos de ação.A nos mo"'i::t:j parti_ d:.devoruÇão sisremátic a d,arearidade estu_ iterativr' traburhf J.'J,.::l;'" esras merodorogias de

;'áti"

.;;;;;;;;r.

:ffil,H:j,#

f,:::l t'?ffi: ;ü*Íl;1* Í$ {.::ff ;fi ill

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em projetos de invesrigaçâo clentifi.o-u.àdêmica

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etapas ár

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e, de

::. i:: o- sramação,execução effi:T ?r,,r; avatiaçãode

Tec

cipariv",l.';;#.'#?.iHi;ff ciais' pattit'lu'mtnit

:fài:.i jff ,Í:ffi fi

:,.:i:T:,íJ::: fase a obrenção e/ou 'u de de pesquisa desses processos. De fàto. proárção .orÀ..fu;;medianre

e a ação não é, a a em nenhuma d _Tt'iante rnte^ ençào modo de se obter inrormações para o estudo de um probrema particurar ,usrrarn üi::;íl' j';,

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Assin ala opesquisador rindo-se ao tipo em questão, retba. irrt.urnento empregados, Que:

também necessitei de técnicas normais da ciência sociar comunidade). ri, uma vez .,q,i,., sobre a siruação da

;J:.1J::fl t:'ji ardeia (...rlur,. r,r';f:ffi::r: #:l,I;:i;,,.rd mais idosa)

(".) po. meio desre

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1

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contradições do poder.',

de baixo,,

com meus j lottivei r a .strutura rocar de

jt[t*{:fii*;;;i*

rrrrir..l"irrr,rrrs

assuntos básicos

. ,,

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org')

34

QUADRO.RE.SUMO N.O 3 Comparação de seqüências metodologicas em dois estilos'de investigação social t

n ve stig ação ci e ntífi co- ac adê m

tnvestígação -ação

ica

1. Formulação do Problema

'1

1. Antecedentes 1.2. Justificação 1.

1.3. Definição de conceitos 1 .4. Conteúdos e/ou alternativas 1.5. Limitações

.

Etapa previa: formação da equipe e elaboração de diretrizes básicas sobre a sociedade na qual se dá o trabalho de investigação e realidade a ser abordada, diretrizes gerais sobre o manejo de técnicas e instrumentos de inves tis

I I I

ação

Passo 1:formação da equipe investi gadora com representantes de setores

Populares inte-

Passo 2'. autocapacitação e gração de d iversas

2. Momento

Objetivos 2.1 2.2

. Gerais . Específicos

1'.

lnvestigação

Fase 1'. construção de um marco de referência Fase

2: seleção de áreas e unidades ou grupos estrateg icos

Fase 3: observação ParticiPante ou aProximação às unidades esPecificas Fase

4: investigação da Problemática das unidades esPecíficas. Cod if icação/ decod if icação

3. Marcos de referência (quadro teorico)

conceitual

I I

I I I I I

I

PercePções e exPeriências assim como distintas orientaçÕes a resPeito de teorias sobre o modo como se organiza a sociedade e o PaPel da investigação social

2.

I

3. Momento 2: Tem alização Fase 1. redução teorica Fase 2'. redução temática e determ inação de temas geradores Fase 3: elaboração de um Programa Pedagogico co ntin ua

REPE\SANDO A PESQUISA PARTICIPANTE 'l

4.

n ve st i g a ç ã o

c ie

ntífi co-acadê m i ca

lnvestigação-ação

fuletodologia (ou marcos metodo_

log icos )

4.1

.

Formulação de hipoteses 4 .2. Seteção e operàüonati zação

de variáveis 4.3. Es_boço de instrumentos 4.3.1. Seleção da amostra 4,3.2. lnstrumentos propria_

mente ditos (en_ 4

4 Ap

r

ica

Momento 3: programaçã olação Fase 1: realizaçãó Oe cíiculos de irradiação da ação edu_

Fase

ela bo ração d e p rojeto s e determinação de neces_

ca t iva

Fase

ç?§l:,';,: T'"",::I:jl

mentos e controle Ce varta_

estu do

Fase

sidades ediJCe: ,,as

4

exe:-;ã_

a =,= =-Z.:='a.e::s:zz:.à:

veis

4.5. Coleta de dados 4.6. Processamento e análises dados

de

codificação análise estatística construção de tabelas

etc.

1

?^ lnterpretação dos dados

4 .8

.

Relatorio fJnat

Fonte: Gajardo,

op. cit., p. 32.

Nenhuma das propostas que dão forma a este estilo de trabalho emprega técnicas estatísticas sofisticadas. As experiências que se orientam com base numa compreensão dapercepção e compor_ tamento dos setores populares utrlizam, em geral, análises de conteúdo ' Em nenhum caso estas experiências se valem de técnicas de análise multiv ariada que permitam a valid açãoe a gen erarização dos conhecimentos ptoduzidos nos termos classicamente programa pela investigação dos

científica, nem tampouco esse é seu objetivo. o tipo de técnicas empregadas e a escassa ou nula sistem attzação e avaliaçã'o destas experiências têm levado alguns críticos a assinalar que o propósito deste tipo de estudos diferà fundamentarmente do da investi gação científica. Não há tentativas de construir sobre a experiência e o trabalho acumulados, e seus impulsos em geral não levam em conta a contribuição de outros estudos realizados no campo' Muitos desses estudos não explici tamo quadro conceituai o enfoque teórico que os susten e tam, nem formulam hipóteses a serem comprovadas' os " porquês" da falta de sistem atização e avaliação das experiências e, .r, muitos casos, da farta de rigor encontram-se nas exigências colocadas pera ação em face do tra-

-ró

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org')

constib,aiho de pesquisa. euestionar essa relação e seu equilíbrio

de ruem aspectos para reflexão, tendo em vista o desenvolvimento erperiências futuras nesse camPo A observação acima ganha realce na medida em que um dos e ação pressupostos básicos dos estilos participativos de investi gaçáo organizações com e geral, em grupos educacional é o trabalho com populares em particular. Isso constitui elemento comum às distintas grupos prápostas já resenhadas. As diferenças radicam no tipo de técnicas as entre aração comp na e hzada uti atendidos, na estratégia de investigação e as ações desenvolvidas. De modo geral, tanto a estrategia postul ada pela investigaçáo temática como a investigaç áo-açáo privilegiam o trabalho com orgaoperários, mzaçóes econômicas e sociais. os movimentos de base de as popue vicinais grupos os como camponeses e indígenas, assim do termos em prioridade deu se quais lações foram os atores aos particularmente ativa, investigaçáo desenvolvimento de projetos de um durante os anos sessenÍa e setenta. Nos últimos anos, verifica-se margiorganizações às direção deslocamento das experiências em nais urbanas e grupos heterogêneos, nos quais se percebe algum potencial organi zat1o. No meio rural, os programas de apoio ao movimento *op..ativo e sindical, proprios das décadas anteriores,

tenderam a ser recolocados em uma perspectiva de ttabalho com adultos em geral, e comunidades camponesas em particular, transformando-se em componentes de microprocessos de planificação parao desenvolvimento rural. Isso fica evidente ao se observar o tipo implede base orga mzatla com a qual se trabalha ou se buscam mentar no meio rural. para a década de oitenta, é notória a transferência dos projetos do meio rural para o meio urbano, do trabalho com camponeses e indígenas paf a com operários e populações marginais urbaIsso nas, cobrindo as mais distintas áreas de atividade e conteudo. tendênpode ser explicado, em parte, pelos efeitos da reversão das países e cias de dem ocratrzação social em um número importante de pela conseqüente mudança nas estratégias de investigação e ação educativas, eue passaram a considerar prioritário um trabalho organtzativo sustàntádo pela atençáo às necessidades rnínimas de subsistência (trabalho, moradia e saude) dos grupos que vivem em condições de pob reza çtitrça. Nesse sentido, é necessário destacar um aspecto adicional. qual seja, a maior participação no trabalho com organizações de para a entidades não-governamentais e da Igrej a. Isso é válido

REPENSANDO A PESQUISA vr.,Ã ran PARTICIPANTE r IUIPANTE

37

maioria dos países' com exceção -.ri.ortradaqueres cativo em

seu conjunto se .em que o sistema edusubmetido de dem ocratização a uÍn e/ou irrrfi.-enração de políri.; Pode-se expl icar fiffli;:riJJ3] a característica upàrirda em funçao do que se chama atuarmente de mudança na.rnterlocução. cura ressaltar o fato co m lsso, se pro_ de gue, nas décadas passadas, o interrocutor o prtuao, cenrrar da invesrigação

ã;;;1r.. ffi'ffl:tlillrsido educarivas Na u,,'Ír,ffi::::i[it Ti:::,Í::.i*1,,.,,,o.iui, e Iares e suas organi zaçõesrepresentarivas

para a formuração

de ações coraborati\-as.

como

inrerr":irti:J:t

illJ;

Dadas as poucas possibilidadesd. influir massivarnente partir do aparerho es tatal, os focos de atençâo começam a se ferir em direção à busca de

a

trans-

mec

cia social e/ou' g"ruçao de riências sustentadas em estilos participativos para um interlocutor de pesquisa apontam distinto do Estado e dos grupos que o contro_ lam' embora existam ainda em alguns pu1r., processos impursionados pelo

rn;::'[frffil'fiffiJffi*,:ffi

aparelho est atal' Todos

eles têm em comum mar a atenção para a atitude de chaaqueles gruposQue, pero fato de estarem or-sa-

#::3:JJi:i:fi:T ;f.::,','JJlr tintas das oficiais. Isso diz

de

o.;;;

::;^lo,podern

reso.;"*;'ffi:';::H:il

campo, a qrtal discutiremo. u r.guir. Da investigaç ão-ação à investigação

in n

u i r e n,

:l§:l,tJ;i;

m,itante

As alternativas

r Bosco pinro ;.;;f;flTil,lffJ#,J

i fÀ,"Tll;

;,.ill;

político-partidáttio: isso, pelos menos, é o que aparece :scritos (Fals Borda' em um de seus lg77)' outras es trategi,urs surgidas neste mesmo :eríodo colocam talcompromisso

como eixo centrar de :eórico-metodológica sua proposta no campo da investiguiuo S uas origens sociar e educativa. provêm tanto do campo -.ién.iu, das s d u cação sociais recebendo como da -inrestigação

'

ate agora

àuu, a.roÀinaçõer,

:i I T:: H' t',ffi T.Tl,Jilt*11fl;})rop

o ra roi i*pír., ã';rda em t-'foqut sócio-eau.utiuo, 'Te Rosista Darcy foi ;H',r.u;rT:l#i;l?: roS Miguel J. óri, e'ira. x.rtu úrtima, procura-se : :er-relacionar os princípios' s

au-.àu ruçao iiuà.tudora proposta por

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

38

P aulo Freire e as obj eções levantadas à sociologia positivista pela chamada sociologia critrca. Como esta proposta reproduz os objetivos gerais e a seqüência de passos e etapas da investigaçáo temâttca, não a Íesenharemos neste artigo. Apresentaremos, flo entanto, os traços metodológicos centrais do chamado paradigma da investigação militante, visto que nele aparecem dois elementos não explicitados nas propostas anteriores : os partidos políticos e o papel do intelectual orgânico. Acosta, Briceno e Lenz caracterrzam o patadigma da investigação militante como um modelo que compreende uma diversidade de etapas, âs quais ocorrem sempre vinculadas a uma prâttca político-partrdâria, de acordo com o Quadro 4.

QUADRO -RESUMO N.'4 Paradig ma da investigação militante

Passos da investigação

1.

I

nstruções operacionais

Posição do investigador no processo global de produção Objetivos a) identificação da classe social b) identificação do proprio contexto de t rabalho no contexto sociotemporal mais amplo c) identificação da conjuntura política das práticas sociais

em que e onde se trabalha (zona e empresas)

ldent ificação das contradições em determinada conjuntura Objetivos traçar lin has de ação política a curto e méd io prazos

relação entre os conflitos imediatos e outros percebidos como

:

2.

:

3.

Posição da informação

Objetivos: ai treinar a coleta de informações através de diferentes técnicas b) identificar as linhas relativas a tomada de decisões, seus agentes , áreas de ação etc.

condições objetivas do trabalho orga nizaçáo dos trabalhadores relação com outros ramos da

produção

conflitos locais imediatos, quem participa (indivíduos , gruPos, instituições, sindicatos, associações, câmaras etc . )

exterio res quais são estes Últimos

instituições, individuos, gruPos, partidos etc. aos quais se Possa identificar como antagÔnicos discussões sobre o tratamento a ser dado aos conflitos quem é afetado diretamente Pela situação e que tipo de informação pode prestar identificar informação oficial sobre a situação

imprensa e opinião pública, em especial a proveniente de autorid ades continua

REPE\SANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

Passos da investigação

4.

Primeira fase da organização da informaÇão Objetivos: a) treinar a sistematização das l

informações

b) elaboração de modelos analíticos

c) fundamentação teórica

pol Ítica desses modelos

5.

e

§qgunda fase da organização da informação Objetivos: treinar algo que se poderia chamar desagregação dos modelos de análise a fim de obter subprodutos de uma investigação a) para a ação política tática b) para a ação política estratégica c) para a formação teorica em investigação mil ita nte

apresentação da informação obtida, organ izada segundo: a) caso gue se investióa b) fontes de inforrrção c) interesse potítico iinediato do caso (hierarquizar com outros casos

)

discussão de todo o item anterior, ísto é. a) da emergência do caso bl da validade das fontes

apresentação dos informes perti_ nentes aos objetivos do passo 4 estes informes políticos deveriam ser discutidos em outras instâncias do partido este informe deveria ser na comissão gue promove a investigação militante

Fonte:

Pesquisa participante e investigação participativa:

primórdios dos anos oitenta

Até aqui procuramos resenhar as principais

propostas presentes nos estilos participativos de investigaçao sociaf e prática educativa' com o objetivo de chegarmos ao que se conhece hoje como investi gação participa tr.va.o, p"..qrisa participante

A

. pesquisa participanie surge, conceitual e metodologicamente' no início da déc ada de oitenta, quurdo a realidade de um número importante de sociedades latino-americanas se caracteriza pela presença de regimes autoritários e modelos de desenvolvimento manifestamente excludentes, flo aspecto porítico, e concentradores. no aspecto econômico' As tendências democ ratrzantes;;;r*.tivas próprias dos estilos modernizantes e integradores dos anos sessenta' que defendiam a incorporação de amplos setores da população à vida social e pol ítica, ..à.ru. lugar às exigências

impostas

40

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

por uma reestruturação autorit ârta eue, reduzindo as margens da heterogeneidade, substituíram as fronteiras difusas do populismo por classes de perfil mais definido. Nesse âmbito, continuam se desenvolvendo alternativas de trabalho com os setores populares e continua também o delineamento de estratégias visando incorporar os setores populares aos processos de produção e comunicação de conhecimentos. É1, assim que surge uma proposta hoje como tendência emergente: a investigação participativa ou pesquisa participante. Nela se sintetizam as propostas anteriormente resenhadas e se incorpora a experiência acumulada na AmértcaLatina durante as décadas passadas. Nesse sentido, pode-se dtzer que as diversas experiências se adequam a momentos particulares e conjunturas as quais atravessa cada sociedade e) com isso, emergem novas estratégias metodológicas e novas denominações para prâticas que comp artrlham um objetivo comum. Se se procura uma caracterízação de tais processos a partir da perspectiva da estratégia de investigação que utilizam hoje, deve-se reconhecer gue, como nas décadas passadas, a maioria das experiências tenta partir da realidade concreta dos grupos com que trabalham , e defendem o estabelecimento de relações horizontais e antiautoritárias. Propõe-se a utrhzação de mecanismos democráticos na divisão do trabalho e o implemento de processos de aprendizagem coletivos através de práticas grupais. Como as anteriores, esta proposta reconhece as implicações políticas e ideológicas subjacentes a qualquer prátrca social, seja ela de pesquisa ou de finalidades educativas, e propugna pela mobili zaçáo de grupos e organizações para a transformação da realidade social ou pata o desenvolvimento de ações que redundem em benefício coletivo. Metodologicamente , tal enfoque, enfatizando a produção e comunicação de conhecimentos, propõe os seguintes objetivos: 1) promover a produção coletiva de conhecimentos. rompendo com o monopolio do saber e da inform açáo e permitindo que ambos se transformem em patrimânio dos grupos subalternos; 2) promover a anáúrse coletiva do ordenamento da informaçáo e da utllização que dela se pode fazer;

3) promoyer a análise críttca, utthzando a informaçáo ordenada e classifi cada a fim de determinar as raizes e as causas dos problemas e as possibilidades de solução; 4) estabelecer relações entre os problemas individuais e cole'

tivos, funcionais e estruturais, como parte da busca de soluções coletivas aos problemas enfrentados (ICAE, 1981 : 16- 18).

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANT

E

{]

o

Quadro-resumo n'o 5 ilustra a forma como se estruturam os de ida e volta da informação em uma das estratégias metodorógicas de pesquisa participante. processos iterativos

QUADRO.RESUMO N9 5 seqüência metodorógica da pesquisa participante

a)

;:#:i;ZntZt"'

montasem institucionat e metodotosica dapesqulsa

Nesta primeira fase'

'::f

a equipe promotora da pesquisa participante nizaçõe'' Àp,"" entativas da poputação conreari::::;,;?3,::"?:*

informação e discussão do projeto ce pesquisa participante com a poprlação e seus representantes formulação do qrrdro teorico -Ja pesquisa participante (objetivos, conceitos, hipoteses, métodos) r delimitação da zona a estudar orga nização do processo de pesquisa participante (instituições

grupos envolvidos, distribuiçào

i* tarefas, estruturas são... ) seleção e capacitação dos pesquisadores elaboração do pr"jrrposto

elaboração do catenàãiio

pante

or.

e

de

deci-

principais etapas da pesquisa partici-

b)Segundafase.,estudopreliminareprovisorioo, em estudo

o trabalho

de conhecimento da rearidade deve ser permanente ao longo de todo o processo,da pesquisa- participante. ài',"J,acionai ãs i,es tipos de inrorma. a estrutura social da população o ponto de vista dos habitantes-em estudo ár, ar"as geográficas e estruturas sociais em estudo, e os principais uma informa ção sÓcio-economicaeventos de sua historia sócio-económicos e tecnologicos e técnica, ut:ilizando indicadores A retroalimentação da primeira fase os objetivos oeóta entrãga e discussão dos resurtados são os seguintes: promover nos envorvidos e o"rri, mais objetivo da sua situação -. -"'ur habitant"r- u, conhecimento identificar, com os pesquisados, os probremas gue consideram prioritários e que qr"i", estudar para sorucioná_ros conhecer a reação da população diante dos resultados do diagnósorientar as rasel ,úrintes do

|ffiiffi?,::::.:?;;;ü;J,

Hi,:,Jfl,j"

óro."rro de

pesquisa

As atividades de retroa,,r:!!roão supõem não apenas a eraboração de cartazes etc ) para apreseni:::"Jã§?Jfi.ff;."x:i::::: tar os resurtadosoe uma r;:ü; ffi;:l:"r'JJ:iff,"r',l,,i;l uma "dinâmica de grupo " para discutir esses resurtados, comparar pontos de vista, prõpor os noy€s orientações de inràriigação, e discutir probremas,' serecionar rormrl* novas hipoteses etc.

il-:r:s,

,;:X?ilffi-

,

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

42

c)

1org.;

Terceira fase; anátise crítica dos problemas considerados prioritarios e que os pesguisados deseiam estudar Constituição dos "círculos de estudo" Esta terceira fase do processo de pesquisa participante está dedicada a um primeiro trabalho de análise crítica dos problemas por parte dos

"círculos de estudo" que desejam se organizar em tomo desses problemas O treinamento

do "animador" dos circulos de estudo, a respeito

de:

metodologia de investigação socio-econômica sociologia do conhecimento dinâmica dos grupos tecnologia (por exemplo agrícola, se trabalha no meio rural) métodos e técnicas de educação popular

Além disso, este animador deve ter conhecimento e experiência do

meio social, econômico e cultural ao qual pertencem os membros do círculo de estudo. Analise crítica dos problemas Trata-se de partir dos fenômenos para buscar o essencial, por trás das €xperrêncras e das relaçÕes cotidianas imediatas. lsto é, não sÓ se deve :es3reve: cs gl,cblemas como tambem explicá-los e buscar estratégias 3.3SS vs S de açãO Q.

mcfilenlo fazer a'representação" cotidiana do problema

Segundo momento: questionamento da representação do problema 'Limitar-se a estudar o 'concreto percebido' para descrevê-lo, acumular observações empíricas para explicá-lo levaria a agregar uma série de pontos de vista, a reforçar condicionamentos ideologicos,

determinando a percepção dos participantes, a confundir causas

aparentes com os fatores determinantes e estruturais que produzem o problema e geram a situação enfrentada."

Terceiro momento: recolocação do problema Procura-se uma reformulação mais objetiva do problema através de: a descrição do problema (identificação dos "pontos de vista" e dos "aspectos": enumeração, classificação e comparaçáo das informações; identificação das contradiçÕes entre vários elementos da situação: localização do problema no tempo) explicação do problema, isto é, determinação de suas causas não somente imediatas como também estruturais A necessidade de soluções coletivas a longo prazo não elimina a possibilidade de tratar de melhorar a situação localmente e a curto prazo. O que vale é identificar claramente as limitações destas ações. Atividades de retroalimentação desfa terceira fase Cada "círculo de estudo" pode comun icar os resultados de seu trabalho aos outros círculos e ao conjunto da "comunidade".

d)

Quarta fase; programação e execução de um plano de ação (incluindo ações educativas) para contribuir para enfrentar os problemas colo-

cados O plano de ação inclui: atividades educativas que permitam analisar melhor os problemas e as situações vividas

REPE\SA\DO A PESQUISA PARTICIPANTE

r

medidas que possam merhorai, a situação a níver rocar

::3::

açÕes ""1::"1,y:::.y:.031*t3, para promover as sotuçoeJ",t';;;;,txiT."1olio," _;;prir essas medidas _ _: prazos, em nível local ou

,rirlÃplo

Retroalimentação do plano de ação o plano de açâo túãlmpLemJntãçao

"

::Xi:'r'.X A

""0:

:iliij:ffíi;'oã##f

e tonso

deve também dar rugar a uma ntes oe sua orientaçãL, de seu

-

pesquisa participante: ''"umprocess o permanente

o processo

de pátq'iI p,rticipantã "não terminL com aquarta fase anteriormente descrita' A análise crítica da rearidade, aexecução

: :' ff ,?::1XTJ,T ;,,. J.:'o.: T nnrla ê^F rr.^pode ser um" r

";"

das

e,,:,

ff * :ffi'.,#."Jr :i,, : :,1 A ação ront;;;;:.1;':i;":'I;J;:?:,'fi0:?':1i1"

Fonte:

Boterf

;

r

o b,

Schutter,, /-\. , ()p. ctt., pp . 235_236.

,

A seqüênc ia anterior foi predominantemente ticas de investigação e ação educativas inscritas noapli cadaem práà.bito de processos de mudança impulsionados gelo upu..lho estatal. Hipoteticamente é possível pensar que um clima favoráver ' por parte daqueles que ocupam posições ,à aparelho de Estado condicionam grande parte o desenvolvimento em do trabalho de pesquisa, de tempo e recursos' Para em termos muitos, a metodologia anteriormente descrita pode aparecer como um processo ampro e de arto custo, sobretudo pela perspectiva de implementar projetos visando atender comunidades pequenas com escassas ou nulas possibilidades irradiação ou de influência de social e política. Ao cántrário, jetos' como microprocessos tais prode experimen taçãoe planificação e educativa' valorizam-se social positivamente à medida que seus resultados' diante de eventuais mudanças de por íticana Am erica Latina, puderem ser gen etalizados para o conjunto da sociedade.

No

o'

o apoio estatal a essas práticas é escasso na Améri ca Latina' Isto, somado às urgências enfrentadas peros setores populares na satisfação de suas mínimas necessidades de cia' levou subsistênentant

muitos investigadores e educadores a formurar alternativos que' tendtnão métodos puru o mesmo fim, encurtam e barateiam estes processos, numa tentat.a de atenuar ou solucio naras necessidades mais urgentes dos grupos

subarternos. Dentre essas altetnativas, ãub, destacar o surgimento de estrategi as metodológicas que adotaram ou delinearam caminhos consonância com a realidade e a conjuntura que atravessamem países e os grupos os com os quais

trabarham. Dentre eras, podemos

44

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

(oTg.;

menc ion a r: as práticas desenvo h'idas sob a denominação de enquete conscientizadora. metodo surgido como resultado do trabalho realizado por I\ODEP com dirersos grupos de base (Lopez de Ceballos, l9-9 ): o autodiagntistict-r resultante das erperiências de investi gaçáo e capacitaçào camponese no meio rural mexicano (Sotelo & Schmelkes. 1980 t; a enquere parricipatir a (UNESCO, 1978); a observação militante (Oliveira & Oliveira. 1980) à qual já se fez referência em item anterior; a investigação na ação, da qual dào conta os projetos desenvolvidos no Chile depois do golpe militar de 1973. Nessas alternativas, difundidas em vários escritos esclarecendo os princípios que as sustentam, pode-se constatar uma ten-

dência manifesta para incorporar os grupos com que se trabalha à tarefa de definir o problema e/ou objeto de investigação, e de participar ativamente da coleta, sistem atizaçáo e análise de dados. As diferenças radicam no grau de participação atribuído aos setores populares durante as distintas fases do projeto e no posterior planejamento, execução e avaliação dos projetos de açáo. A tipologia elaborada por Ema Rubín de Celis (1982) ajuda a entender os níveis distintos de participação dos setores populares na i*plementação destes projetos. Define a autora cinco tipos possíveis de participação nesses processos, a saber: 1) participação a pafiir da devolução de inform açáo; 2) participação a partir da coleta de dados; 3) participação em todo o processo sobre o tema proposto pelo cientista; 4) participação em todo o processo sobre um tema proposto pelo próprio grupo; 5) participação na pesquisa a partir da açáo educativa.

A participação popular varia efetivamente nas diferentes propostas de investigação e seus projetos, podendo-se perceber inclusive algumas contradições entre os níveis de participação implícitos nas metodologias e os pressupostos subj acentes a estas estratégias de trabalho com movimentos populares.

Considerações finais Uma râpida mirada sobre as realizações neste campo permite constatar certa heterogeneidade de propostas e de proj etos, cuj o elemento unificador é dado por sua inserção determinada em uma perspectiva de mudança social e por se voltarem prioritariamente para os pólos dominados da sociedade. Qualquer que seja a denominação utrlizada para çaracterizar estas práticas sociais, elas po-

REPENSANDO A

:ESAUISA

PARTICIPANTE

45

dem ser entendidas como uma'atividade onde se procura mod ifrcar a realidade circundante e o comportamento dos grupos, derivando daí alinhamentos teóricos e metodológicos suscetíveis de serem generalizados para o conjunto da sociedade. E por isso àu. não se pod e farar em um novo paradigffiâ, nem numa proposta representativa de um estilo participativo de investigação' mas

sim em definições diversas e experiências distintas já foi r.isto ao se

segundo os propósitos que se diz perseguir. Isso analisar os diversos enfoques propostas e

presentes neste

fato' se se observar os proj etos à luz desies nalar que' dependendo de determinados

i àr

campo

De

en toq ue S pt-r,Je-sc assi-

momenros e conlunturas. surgem alternativas di'ersas de aplicaçào deste tipo de açôes. Assim. por exemplo' segundo seus propositos e impacto, podem ser l.isualizados alguns tipos de práticas enumeramos àr. a seguir. A primeira vincula-se à planificação do desenvolvirnento local, que proporciona

um contexto de apli.caçã,o de estratégias de pesquisa participante, sejam estas implemántadas como projetos de investigação temática, investigação-

ação, pesquisa participante ou investigação participativa. eqli se inscrev. u* número importante de projetos de desenvolvimento comunitário em ger al, ede desenvol-

vimento rural em particular. Embora geralmente contemplem avaliação dos seus resultados, os proj etos existentes

a

raramente proporcionam antecedentes a respeito de seus resultados. um trabalho recente avaliando resultados obtidos no desenvolvimento destas experiências assinala, dentre as vantagens do método, a de ter produzido efeitos imediatos na compreensão e no comportamento de grupos camponeses diante da mudança social, e o fato de ter contribuíd o para o desenvolvimento de uma pedagogia social que possibilitou aos grupos o surgimento de uma organ ização capaz de pôr em marcha projetos de desenvolvimento .ã*unitário e de apoiar processos de mudança social. Nesse sentido, destaca-se a importância de um tipo de experiências que, tanto em décadas passadas como na atualidade' se desenvolvem como componentes de políticas nacionais

de desenvolvimento, particularmente naquelas sociedades onde se dão processos de abertura social e política. Muitos elementos desse tipo de projetos foram incorporados corno parte intesrante de políticas de cooper ação técnica internacional (rrcy/ SEEC, 1983; Rahman, l9g0). um segundo grupo obedece aos propósitos de desenvolvimento de estilos alternativos de org anu,ação social e desenvolvimento edu_ '-ativo' Neste caso, se inclui a maioria dos proietos de investigação

CARLOS RODRIGUES BRANDÁO (org.)

na ação, onde a pesquisa adquire a conotação de ':r{nl icada" , na medida em que procede à devolução do conhecimentb obtido junto aos grupos com que trabalha e, ao mesmo tempo, evidençia a factibilidade operacional do modelo experimentado. Essa visão. situa o investigador à margem dos acontecimentos, visto que sua função não se orienta para atuar sobre uma realidade, modificand o-à, mas a uma observaçáo participante da atuação de outros. Sobre esta atividade, existem algumas avaliações que se somam aos resultados produzidos na investi gaçáo ocorrida no interior do processo. Todas elas coincidem em assinalar as vantagens de se intro duzir formas de organi zaçáo e de trabalho coletivo através da açáo desenvolvida por pequenos grupos, os quais incorporam rapidamente novas idéias e valores, modificando também seus padrões

de comportamento. No entanto, na medida em que se trata

de

microexperiências de desenvolvimento educativo e organi zativo, é escassa ou nula sua influência ou massificação, particularmente quando são desenvolvidos por organismos não-governamentais. Essa prática alternativa permite réplicas em diversas áreas, mas seus resultados não se generalizam o suficiente a ponto de constituir uma açáo alternativa aos modelos dominantes. A terceira alternativa e a linha de trabalho que aparece vinculada à luta pela democratizaçáo das estruturas sociais ou alteração profunda nas bases da sociedade a fim de superar as desigualdades sociais e econômicas. Nela se inscrevem as experiências de investigação-ação vinculadas aos esforços de formular um novo paradigma nas ciências sociais, e aquelas vinculadas diretamente às práticas político-partidárias. Cuba e Nicarágua são os casos mais evidentes onde não ocorreram projetos isolados de investi gaçáo e educação partrcipativa, mas sim ambos os elementos se subordinaram às políticas concebidas, executadas e avaliadas pelos aparelhos de Estado e pelas alianças populares no seu interior. Por outra parte, também em países onde existem processos de abertura política ou condições mínimas para o desenvolvimento da capacidade de mobilizaçã,o popular, é possível detectar experiências inseridas em políticas concebidas pelo movimento operário e pelos setores populares em geral. Este também é, atualmente,, um dos traços da proposta de investigaçáo participativa ou pesquisa parttcipante, mesmo que não se disponha de elementos avaliadores que permitam dar conta de seu impacto em termos de melhorar os níveis de informação e capacidade mobili zadora do movimento operário e camponês. Um grande vazto gera, além disso, muitas interrogações a res-

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

peito de seu igrpacto: a ausência de testemunhos operários' camponeses e opiniões de e indígelu, ;;. tenham tipo de experiência' participado deste Isto e particularmànte importunt. se pensarmos que a pesquisa social e educ ativa tem u,n impacto maior na medida em que se vincula ou é soli citada il organismos decisão' e quando com poder de os resultados .oin.iaem com as tendências gerais que estes promovem' Este não participativos de investigação é, evidentemente, o caso dos estiros e ação educat iva,exceto em muito particulares onde situações estes processos coincidem redistributivas ou onde com poríticas existe. a decisão porítica de irpursionar processos de_mob irização

e participaçào sociar. fenômeno indicado acima é um dos mais implantação de experiências perceptíveis na de pesquisa

o

participante. Em certa

medida' poder-se-ia

dizer que as mudanças em sua conceituação estratégias refletem e as variàções das poiiri.u, a. á.renvorvimento vigentes na América Latina, âs mudanças nos aparerhos mentais

governaque por desempenharem as agências oo estado de apoio ao-desenvolvimànto um papel organi zativo dos setores popurares, não apenas rimitàram ;HL;,::"1'JT: as ram' em um número

ff:jfí:-,:* import.r;lf,H?r:1"í1ff:,,::il;rrT*;

movimentos e de suas organizações. se se observar riências desenvolvidas o tipo de expee sua base organi zativa,é cabíver pensar que em alguns casos elas aparecem onde existe

espaço porítico para tanto' e se reconstituíram a partir da ."p.riêncla dos movimentos sociais, de participação perfii*oo-r. ,o*o uma atividade segue a criação de que pernovos espaços onde possam se desenvorver corearrernatiros de trabarho sociar, porírico, econô-

Irff:::r}:deros

Nesse sentido' seria possív sente nesses estilos de trabalho

el

dizer que. a heterogeneidade preas possibi_

reflete*, u.i,,u de tuão,

Iidades de açã'ojunto a setores populares dentro de rimites sociar politicamente restritos, com vistas

a erevar os níveis de apoiar o fortalecimento consciência organi zativo. os moderos indagação arternativos e criação

e e

de

cult uruí paradigma" de produção ia não aparecem então como um ,,novo e comunicação de conhecimentos, como

um conjunto de ações mas que contêm em germe se propõem como os erementos que alternativa ,uiio" pu;;' u educação e pesquisa educativa quanto para

a sociedade em seu conjunto . Nas paravras Gómez de §ouza,,aol'uções de urr.ripado.as, 1*r.riências do futuro' que podem portadoras chegar a ser laboratórios sociais e lugares de

48

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

'

;r'

experimentação, Embora muitas não dêem resultados positivos (...) outras poderão ter um efeito multiplicador e de irradiação. O desafio é saber detectar, em situações concretas, quais as que têm realmente dinamismo criador" (G om ez de Souza , 1982). ,

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REPEN§ANDO

A PESQUISA

PARTICIPANTE -í9

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v rnetodorogia

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Gajardo'

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sobre uiià.rrtivas mero

pp..s3-64.

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CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

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yopo.

'

B. "El taller

Pesquisa participante Propostas e reflexões metodológicas* 9,y

Le

Botef

:

*

o artigo que aqui apresentamos é o resultado de um certo número de reflexões críticas realizadas sobre diversas experiências

de "pesquisa participante " (ou e_nquete-participação)

nas quais o autor colaborou ou que vem estudaia, já' há quinze anos. É particularmente apos a experiência de três anos de trabalho na América central como funcionario da UIvESco, que o autor propõe uma orientaÇão metodorogica para o tipo de ,,pesquisa ativa" quu constitui a pesquisa participante.

Em uma pesquisa tradicional a população pesquisada é considerada passiva, enquanto simples reservatório á. infor-ações, incapaz de analisar a sua propria situação e de procurar soluções para seus problemas' Nesse caso, a pesquisa ftca exclusivamente a catgo de "especialistas" (sociólogos, l.oromistas etc.), pois somente estes possuiriam a capacidade de formular os problemas e de encontrar (.) "La

il::i:';à

recherch".

#f*:,Snil

.p"rticipative: propositions et réftexions metodotoii.,*ar7ê,t1tê, s3:21_46, 1eB0 rradução

ii:::,,:Zi,

de

(** ) Guy Le Boterf foi educador na Africa, orientou trabalhos de formação' pesquisa e organização de sistemas educacionais -Real na cutture et Developpemente mais tarãe na Quaternri" izoutrabarhos de consultoria para a ocDE e para a uNEsco. Education. Foi, durànte três anos. especiarista uNESco na America central. Trabalhos publicados: da Enquete-participation et Animation 19TO;

, Ç{:::í:i;,1?5;

Formation

Àítà,grriior,

esÉ_eME, 1974; Formation et 91 1e75; Metiers "de Formateurs (em coraboração com F

CARLOS RODRIG UES BRANDÃO

::

(org')

1'"

; .. ficam pesquisa da resultados : -- ::ras de os resolver. Desse modo, os a conhecer levada é não &população :ise,.',-ados aos pesquisadores , a lais resultados e menos ainda a discuti-l0s. Essas várias características explicam a pouca eftcâcra que podem alcançar as medidas decidida§ a partir de tais pesquisas. De fato, essas medidas deparam com a resistência da população, QUe não faz questão de se ãngajar num projeto em cuja elaboraçáo ela não teve possibilidade de participar.

Considerando as limitações da pesquisa tradicional ,

a pes-

quisa participante vai, ao contrário, procurar auxiliar a população envolvtda a identificar por si mesma os seus problemas ) a Íealizar a análise crítica destes e a buscar as soluções adequadas. Deste modo, a seleção dos problemas a serem estudados emerge da população envolvida, que os discute com especialistas apropriados, não emergindo apenas da simples decisão dos pesquisadores '

Proposta de um modelo de pesquisa participante Não existe um modelo único de "pesquisa participante", pois trata-se, na verdade, de ada ptar em cada caso o processo às condi(os recursos, as limitações particulares de cada situação concreta etc')' perseguidos ções, o contexto sociopolítico, os objetivos adaptado a ser portanto, O método que se prop orâ aqui deve, os instruapresentaremos não cada projeto espãcífi.o., Também

mentos (roteiros de entrevista, questionário, fichas de coleta de dados estatísticos etc.) que correspondem a cada etapa do método exposto. Esses instrumentos não podem, com efeito, ser elaborados antecipadamente e sem estarem relacionados a cada projeto particular de pesquisa participante e às condições específicas de sua reahzação.

Assentadas essas considerações preliminares, o modelo de pesquisa participante que propomos neste artigo comporta as quatro fases seguintes:

(1) Esses projetos podem ser, por exempto: a elaboração de um planejamento educacional regional; a elaboração de um currículo escolar baseado

extra-esnos problemas da comunioaoe ; a programação de ações educativas colares para adultos; a programação de um sistema de formação agrícola; específicos; a seleção de tecnologias a[ropriadas em resposta a problemas (saÚde, educaa organ izaçáo de uma consulta popular em determinada área ção, habitação); etc .

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPA\TE

pesq

Primeira fase u I sa

A montagem institucional e metodolosrca ür.

" participante.

o"or,iíu'r'!ir,#i,íor:

' '

a identifi caçã,o da estrutura sociar da população; o conhecimento do

,Tfiltt '

estudo preliminar e provisório da região e da

ponto de vista oos indivíáro, e dos grupos das envolvidas' bem como dos principais evenros de sua his-

o recenseamento dos dados sócio-econômicos e tecnológicos, zando para isso

"indi.uào..s,, apropriados.

utili-

Ao final desta etapa, são organi zad,os ofeedback dos resultados desse e a discussão diagnostico com a popu raçãoenvorvida.

;:l Ij

Terceira fase" Aanálise críticados probremas que a popuração s (or guii.uo o s ô::?,'#;::::]::"'.ffi

;.-

.1i :',T,*:T'ro

Ao final desta etapa, também é organi zad,o o feedback resultados do trabalho dos dà cadagrupo de .rtudo, aos demais grupos e é comunicado Que ao conjunto da popuração. QuarÍa íos"" A programação e a aplicação de um plano (incluindo atividades de educacionais) ou. contribua paraa solução dos problemas encontrados. ação

Após a apresentação geral deter-nos-emos em cad,ar.úeras das principais fases em particular.

do método,

Primeira fase: a montagem institucionar e metodorógica

da pesquisa participante

No decorrer desta primeira

fase, aqueles que promovem pesquisa participante, a em associação estrelta com as organi záçõcs representativas da população, devem realizar as seguintes

' ' .

o'

+'i.l'i3irir".flHj:,

tarefas:

pesquisa participante

com

apopulação

definição do quadro teórico da pesquisa participante, tivos, conceitos, hipóteses, isto é, objemetoOos etc.; delimitação da regi ão aser estudada;

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

. . .

?;

rr

tzação do processo de pesquisa participante (instituições

e

-:-rpos a serem associados, distribuição das tarefas, procedimenItrS e partilha das decisões etc.); seleção e form açáo dos pesquisadores ou de grupos de pesquisa; elaboração do cronograma de operações a serem realizadas.

Essas diferentes tarefas supõem o estabelecimento de uma estrutura de orientação do projeto que assegure estes objetivos e que seja representativa das suas diferentes partes. Ela deve trabalhar em

e de pesquisa, encarr egada de promover as várias atividades científicas e técnicas do processo a ser encaminhado. estreita relação com uma equipe de intervenção

Segunda fase: o estudo preliminar da região e da população envolvidas

Esta segunda fase da pesquisa participante o diagnostico inclui três partes: e provisório

preliminar

. . o

-

a identificação da estrutura social da população pesquisada;

a descoberta do universo vivido pela população de pesquisados dos principais acontecimentos de sua história; o recenseamento dos dados sócio-econômicos e tecnológicos.

e

Estes três tipos de info rmaçáo não são independentes entre si.

E necessário estudar as suas relações: as necessidades experimentadas e exprimidas, por exemplo, não são independentes da posição ocupada no processo de produção por aqueles que as experimentam. Trata-se? na verdade, de três momentos complementares na unidade do diagnóstico.

Identificação da estrutura social da população envolvida Uma das tarefas essenciais a ser efetuada durante esta fase é a identifi caçáo da estrutura social da população pesquisada. Esse trabalho se mostra fundamental na medida em que permite:

. .

diferenciar as necessidades e os problemas da população estudad a segundo as categorias ou as classes sociais que a compõem; selecionar a população para a qual e com a qual se deseja inter-

vir;

'

preparar uma efetiva descentralização ao nível dos grupos sociais !: pesquisa participante mais oprimidos e mais afastados

poder, de modo geral.

do

Nessa perspectiva, toma-se importante assinalar os diferentes grupos sociais existentes, as relações il; estes mantêm entre si, a sua função social, as ações efetiv;s quá-.rr., conduzem ou os obje_ tivos que perseg"T. Esse tipo de ánálise põe em xeque anoção abstrata de "comunidade" 1r'o**unity, comunidad) e de ,,meio,, a serem esfudados' o proprio 'faz termo "comunidade,, referência a um conjunto de indivíduos relati'arnenre homo-eêneo. EIe oculta o próprio fato da diferenciaçâo social interna, âs posições dos grupos e até mesmo as relações conflituosas existentes entre estes últimos: em comunidades aldeãs, os vizinhos são freqüentemente rivais. o termo "comunidade" mascara os interesses opostos que existem entre os grupos sociais porque estes ocupam posições diferentes no processo de produção' E necessário,

portanto,

identifi caros segmentos ou as frações de classe que constitu.- ,,comunidade,,. a Como escreve Eric Wolf:

"o

antropólogo' com sua experiência em

comunidades restritas, sabe 9u€' por sua maneira de pensar e por seu comportamento, o arrendatátio se distingue do práprietário, o camponês pobre do camponês rico' o agricultor artesão do simples lavrador, o camponês responsável por todas as operações agrícolas, em sua fazeida alugada ou comprada' do trabalhador assalariado que trabalha por dinheiro sob a tutela de outros' Ele sabe também qr. convém distinguir entre o camponês que vive perto de uma cidade e que participa dos assuntos e do mercado urbanos e aquele que vive numa aldeia isolada, entre o camponês que começa a enviar seus filhos e filhas paraas fábricas e aquele que continu a trabalhando nos rural' As distinções entre propriedadelimites do seu pequeno universo e farticipação na propriedade em relação tanto com os mercados quunio

,ffi:ÍtJilil:?

com os sistemas de comu-

,,p;""'-lhe importante quando ere observa popu-

Por outro lado, se tomamos o caso de arguns países da rica Latina' a "comunidade Améindígena" também não constitui grupo homogêneo, com um relações sociais harmoniosas, onde predo-

1974.

(2) Eric wol{,

Les

guerres paysannes du 20e. siêcle, paris, Maspero,

:i-

C.{RLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.) i.

-À-:i:

-

reiações de coordenação entre os membros que a constista também não é um conjunto de indivíduos ou de famílias :3':é-i por um consenso socialou por um sistema de valores comuns

-ÉT

E

afirmar uma identidade e se opor às diversas i-3 :gressões exteriores (econômicas, culturais etc.). As " comunidades lhes permitisse

rndígenâs", tais como existem hoje, são um produto da his toria. A

sua origem pode ser procurada ao mesmo tempo em um certo direito

consuetudinário pré-hispânico e na política colonial de "reagru pamento" dos índios em encomiendas ou nos pueblos de reduccion. Em todo caso, elas constituem hoje um espaço social onde se dão e se desenvolvem relações de poder, de domin ação e de explor ação. A estrutura dessas últimas é extremamente complexa, na medida em que se entreçÍuzam as estruturas tradicionais e as provenientes da penetraçáo de estruturas capitalistas e "modernas'l Nos "municípios" coexiglem freqüentemente estruturas tradicionais de poder, de tipo civil-religioso, e estruturas oficiais. Podem existir, assim, duas prefeituras. Também não pode passar sem referência a oposição entre os "indígenas" e os " ladinos" (os que não são índi,os), âs verdadeiras guerras de religião entre as igrejàs'e as rivalidades entre os partidos políticos. Todo este estudo da situação social da " comunidade ", da "populaçáo", do "meio" estudado é da mais alta importância para diferen çiar os problemas e as necessidades em função daquela. Os interesses, problemas e necessidades dos camponeses pro-

letarrzados não serão os mesmos do artesão, dos comerciantes ou do camponês médio, proprietário de uma extensão de terra

que lhe permite a sobrevivên cia da família. As " representações " das situações vividas ou as aspirações podem vaúar segundo as características religiosas e ideologicas. Vê-se, portanto, a utilidade dessas precisões quando se trata de organi zar, por exemplo, ações educativas baseadas nas necessidades experimentadas percebidos.

àu nos problemas

Por outro lado, se a pesquixa participante quer se colocar a serviço dos oprimidos e ter um impacto *oCirl importante, é indispensável que se possa escolher, com conhecimento de causa, junto a quem e com quem ela deve intervir. Assim, diversas estratégias podem ser cogitadas. De acordo com algumas destas, os p.rq,riru-

(3) Cf. Carlos Rafaet Cabarus, La cosmovision k'ekchi en proceso de cambio, São Salvador, UCA Editores , 1g7g.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPA\TE

:*

dores der em trabalhul junto às categorias sociais mais exploradas Ê mais proletarizadas. De acordo com outras, será preferível e scrltrher

como grupos privilegiados aqueles que dispõem de uma

,,cerra

margem de manobra" frente ao poder. Todas essas informações são igualmente pertinentes para organizat depois, no processo de pesquisa participante, a atribuição ou divisão da orientação da pesquisa e da intervenção. Da escolha dos grupos que se encarregarão da descen trahzação da pesquisa participante dependerá a orien taçã"o política desta. Isto não significa que somente os grupos formalmente constituídos (associações, sindicatos, cooperativas, grupos religiosos etc.) intervirão na direção ou co-direção da pesquisa. outros grupos, constituídos no momento de

tal intervenção, poderão igualmente tomar parte dela. podemos

também levantar a hipotese de que estes últimos refletirão as divisões ou fragmentações sociais existentes ao nível do conjunto da

população' Essa tipologia dos grupos deve ser tra tad,a com prudência' os pesquisadores, com efeito, correm o risco de se deixarem influen ciar demasiadamente pelas proprias concepções ou ideologias pessoais. Daí podem resultar clàssiricaçoes simplistas ou maniqueístas: os bons e os maus, oS reacionários e os progressistas, os exploradores e os explorados etc. Trabalhos de análise institucional de grupos e organi zaçõesa têm demonstrado a complexidade da estruturação e da dinâmica interna de tais,_erupos. Descob erta do universo vivido pelos pesquisados

o momento da pesquisa qualitativa merece ser examinado de perto. Em que ele consiste? Num primeiro momento, é importante compreender, numa perspectiva "interna", qual é o ponto de vista dos indivíduos ou grupos sociais acerca das situações que vivem. eual a percepção

destes sobre tais situações? Como eles as interpretam? eual o seu sistema de valores? Quais os seus problemas? as suas preocueuais pações? É necessário aí apreender qual e a logica dos pesquisados , mesmo 9ue, a primeira vista, as suas inferências e raciocínios possam par ecer irracionais. Não nos esqueçamos que uma das principais catacterísticas da pesquisa participante que é ela parte dos (4) Cf', na FranÇa, os trabalhos de J. Guigou, G. Lapassade, R. Lourau.

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (ore.)

:-

-

pelos pesquisados, problemas que eles estão i3-',iios a estudar. Ela parte do mundo cotidiano do povo e escuta

: 3:.rs colocados

reve- i \ oz. Importa igualmente cornpreender a tristoria vivida, as conflitos, quais os são coletiva: e .ria pela memória individual cotidiana historia A pela terra? lutas as e ,iesconfianças, âs ahanças de um povo é a da luta cotidiana contra a opressão. Em toda essa pesquisa, supomos que existe uma certa "filosofia espontânea" que se exprime no senso comum, flo sistema de crenças e de conhecimentos empíricos, e que tudo isso é fundamental para relacionar a :

práxis com o saber e com a cultura popular. Na linguagem de MichelCrozter, poderíamos dizer que o objetivo desta análise qualitativa é identificar e explicar as "estratégias" de diferentes tipos de agentes nas situações com as quais eles se defrontam. Como eles compreendem essas situações? Quais as oportunidades que elas lhe

parecem oferecer? Quais as suas capacidades de as apreender e utilizar? Esta análise qualitativa do ponto de vista dos indivíduos e grupos que compõem a "comunidade" olt o "meio social" a ser estudado é, pois, um momento importante do processo do diagnóstico. Não se trata, pois, de um simples contato com a população pesquisada ou da pura "ambientação" por parte dos pesquisadores. Um trabalho de pesquisa como este não é facrl, sem duvida. Ele exige do pesquisador uma postura muito aberta em relação à pesquisa, um a grande capacidade de se "descentrat" para "se colocar no lugar do outro", do interlocutor. Nesse estágio, o pesquisador deve "colocar entre parênteses" o seu próprio quadro de análise paÍa compreender o do pesquisado . Trata-se, portanto, de identificar na população os diferentes grupos sociais que a compõem. Trabalhando ao nível das "representações", o pesquisador deve aceitar igualmente (o que não significa aprovar ou adotar) a ideologia dominante e seu impacto. Essa "aceitação" supõe uma atitude positiva de escuta e de emp atta, tão longamente descrita pela corrente de psicologia social derivada de Carl Rogers. Ela também implica "viver junto" com a coletividade estudada, em partllhar o seu cotidiano, a sua utthzação do tempo e do espaço: ouvir, effi vez de tomar notas ou fazer registros; ver e observar, em vez de filmar; sentir, tocar em yezde estudar; "viverjunto" emvez de visitar. É em geral preferível deixar de lado os cadernos de notas, os gravadores e os questionários. A pesquisa nesse ponto não é estruturada. Nessa situação de pesquisa, o pesquisador se "colocará como um diapasão" dos pesquisados. Assim, no meio rural, é fundamental poder

RL

Pt\SA\DO A PESQUISA PARTICIPA\TE

compreender e discutir os problemas relativos aos cultivos, às colheitas, ao regime de chuvas, à erosão do solo etc.

O percurso nesse ponto é muito próximo ao do etnólogo, ao das pesquisas "em ritmo lento". Ele poa., com efeito, levar tempo

paÍa ser completado. Freqüentemente é necessário , longo tempo para que se adquira confiança, sobretudo nos contextos em que as relações de manipulação, de domin ação e de explor ação se fazem sentir, por vezes fortemente, durante ou depois das ações ditas sociais ou de pesquisa. Este" abandoÍro" pelos pesquisadores de seus próprios critérios, neste momento da pesquisa. põe em questão

muitas das concepções "científicas". De certo nrodo. uma corrente contestadora de numerosos antropologos denuncia as práricas do etnocídio generalizado. Escrevem Miguel Chase Sardi e Marilv,n

Rhenfeldt:

J

"No Paraguai, nós, QUe tínhamos mais de dezanos de cantato com as etnias do país. abandonamos as 'notas' e as 'questões,, os ,métodos,

as 'orientações em campo' para pesquisar categorias internas

e

a partrr do interior, de da cultlJta,. ,o. i*pr.gnamos que é mais

dificil a partir de uma perspectiva exterior de seus fundamentos axiológicos. Começamos então a notar gue, -entre as sociedades e as populações das etnias oprimidas, existiam aspectos positivos integradores que eram desintegrados pela atividaàe 'intógracionista, dos dominadores,'. s Esta abordagem qual rtativa e não-estrutu rada, o contato direto com a "realidade" vai no sentido da redução, des ejada por Gramsci, da distância entre os intelectuais e o povo. Ela não está, entretanto, isenta do perigo de um certo romantismo pequeno-burguês, segundo o qual o povo ou as massas têm ,.*pr. razã,o e não podem se enganat. Junto a isso, altás, se encontra freqüentemente o que o sociólogo colombiano Fals Borda chama de ,,masoquismo populista", segundo o qual o pesquisador ou intelectual deve viver penosamente, pôr as mãos na sujeira etc. E isso não conduz itra, do mesmo modo, âo perigo de afundar no "subjetivismo,,, no abandono da pesquisa "sobre fatos objetivos"? O risco existe, mas não é (5) Miguel Chase Sardi & Marilyn Rehnfeldt, "Marandu, resena de una experiencia informativa", Asociacion de parcialidad índigenas , 1gTT. Docu mento preparado para a reunião de especialistas nas modalidades e conteudos das entidades coletivas na perspectiva da educação permanente. caracas, U N ESC O,

1977

.

,l-.rv,!§§üffir:

60CARLOSRODRIGUESBRANDAO(org.) inicialinevitável. Isso, ao menos, pelas duas razóes que seguem: não mente, não vemos por que a subj etividade dos pesquisados I poderia ser um dado objetivo a ser estudado. 'Além disso,

essa

pesquisa do ponto de vista subjetivo dos pesquisados deve se combia nar e articular com a análise das situações vividas, mas desta vez instrucom juntamente part ir de um quadro teorico de análise, mentos estruturados.

Pesquisa dos dados sócio-econômicos e tecnológicos no universo vivido pela população a pesquisada não deve dispensar a pesquisa de dados objetivos sobre diagde trabalho seu effi ,ituuçao dela. A pesquisa participante, dois nostico permanente da situação, deve associar ou relacionar os de ponto do momentos inseparáveis da pesquisa "não-estruturada", e sócio-econômicas r-ista dos pesquisados e da coleta de informações sócio-ecoindicadores de técnicas. ut ilizando um conj unto coerente nômicos e tecnologicos. Trata-se, então, de uma "pesquisa estruturada", fund ada num quadro teórico (conceitos e hipoteses) envolvendo os aspectos pertisociais, econômicos, políticos e tecnológicos que se mostrem

A penetração, sem

a

priori,

nentes para a reahzaÇão do diagnostico da situação da região a estudar, localtzando tudo em seu contexto regional e nacional. Num diagnostico desse tipo, os principais domínios a estudar, no que concerne a uma comunidade rural, seriam:

.

do os aspectos biofísicos (clima, regime de chuvas, uso potencial águas); solo, regime de o os aspectos demográficos (distribuição da população, correntes

migratorias);

o os aspectos econômicos (atividades econômicas, produção agrícola, distribuição e aplic açáo dos créditos, comerçtahzação etc.); o os aspectos sociais (saude, habit açáo, comunicações e transportes, organi zaçóes existentes, tradições culturais etc.); o os aspectos educativos (perfil educativo da aldeia, educação esco-

.

lar

e extra-escolar); aanálise da situ açáo e da atividade econômica das famílias.

Esta "pesquisa estruturada" poderá se apoiar em diferentes fontes de inform açáo e ltrhzar procedimentos variados. Assinalajá reahzados mos., entre outros: a análise documentada de estudos

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

sobre a região e dos arquivos, as entrevistas realizadas com de diferentes instituiçoes pJuti.u, ou priruou, (técnicos técnicos agrícoras. médicos, enfermeiros, engenheiros etc.;, bem como com autori_ [.upos orsanizados, agências de pesquisa

ji:?lm;J,*",:f].,

Nesse momento, é necessário observar que os estudos ,,técnicos" (sobre a economia, a come rcializaçãot,o estado da hab itaçã,o, a situação alimentar etc') são normalmente marcados pela ideologia dominante' ou estão ligados a inreresses pur:ri;;i;r. Deveríamos ignorá-los por isso? certamente

nao. ilr constituem de fato fontes apreciáweis de informação. não apenas peros dados úteis que podem fornecer (n atureza dos solos. estruturas demo gráficas, nível de escolarização etc')' mas tambem pelos interesses e posições que podem refletir' Eles constituem , então, preciosos ,,reveradores,,.

Muitas vezes não é possível nem mesmo desejável efetuar diagnóstico muito elaboruào um e completo durante a primeira fase. os recursos disponíveis (tempo, pessoal, meios financeiros etc.) não o permitem' Além disso, âs "populações pesquisadas,, estão muitas vezes cansadas de diagnóstico, ,.. conseqüências, de estudos diversos após os quais não surgem

resultados nem ações conseqüentes. Por essas diferentes razões, é muitas vezes preferíver rear izar um "diagnóstico

provisório",

limitado, Dâ primeira fase. por conse-Quinte' é ao longo de todo o processo de pesquisa participante que

;:ll'rffi:l

compl etar o diagnóstico', que rom

ara

enrào

um carárer

Difusão dos resultados junto à população

Ao final desta segunda fase, junto à população envolv os resultados obtidos são difunida, que terá assim ocasião cuti-los, de disdidos

aprová-los, questioná-ros ou completá_los.

No decorrer destefeedbock, a discussão aceÍca do confronto são particularmente importantes entre os resultados do diagnóstico sócio -econômico e técnico, por um rado, e as opiniões ou os pon_ tos de vista exprimidos diretamente peros pesquisados, por outro I ado.

'

os objetivos dessas atividades prolrlover entre os participantes mais objerivo de suaiitruçáo;

de

feedbock são os seguinres: um conhecimento

d,a pesquisa

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO lorg'; :

;.i:

r

fi

carjuntamente com aqueles os problemas que consideram

lrirrritários e que querem estudar, a fim de Procurar as

suas

>t-rluções i

conhecer a reação da PoPulação frente aos resultados do diagnostico, e isto a fim de orientar as fases seguintes da Pesquisa participante. Tais atividades defeedback supõem não apenas a elaboraçáo de meios de comunicação simples (painéis desenhados, quadros etc.) para apresentar os resultados de um modo facilmente compr..rrível, mas também a animação de uma "dinâmica de grupo" ,r...r, âria para a discussão dos resultados, a comp ataçáo dos pontos de vista, as propostas de novas orientações da pesquisa, a seleção e a discussão dos problemas, a fomulação de novas hipóteses etc. No que respeita à importâncrae à prioridade dos problemas, é muito importante intro duzir a reflexão sobre a diferença entre um problema "prioritário" (isto é, um problema-chave do qual dependem outros problemas), e um problema " imediato" (que pode necessitar ser resolr,,ido a curto prazo mas que não constitui um fator dec isir o para a compreensão e solução de outros problemas).

.

Terceira fase

prioritários

anâlise crítica dos problemas considerados

e que os participantes da pesquisa deseiam estudar

Esta terceira fase é consagrada a um primeiro trabalho de anâyse crítica dos problemas considerados prioritários na fase precedente. Para isso, formamos "grupos de estudo", que podem ser compostos de alunos (se, por exemplo, o processo de pesquisa p artrcipante se reahza como uma atividade educativa no quadro do sistema escolar propriamente dito), ou de habitantes (se, por exemplo, a pesquisa participante se re ahza diretamente ao nível de uma localidade ou região).

E importante assinalar que se trata aqui de um "primeiro" trabalho de análise crítrca, pois tal análise não pode ser concluída numa eÍapa anterior à própria açáo. As ações e os seus resultados

poderiam igualmente ser estudados. A ação torn a tgnalmente possível tal análise. Não se trata somente de compreender a realidade, mas de transformá-la. Além disso, por razões sociopedagogicas, é importante levar em consideração que aqueles que participam no estudo de um problema não podem alcançar os resultados de uma long a aná,-lrrse antes

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

de agirem. Assim, é necessário iniciar o processo de análise e aprüfundá-lo durante a própri a realizaçáo da açã,o.

As características desejáveis do orientador dos ttgrupos de estudott

os grupos de estudo necess itam, fla maioria dos casos, da intervenção de um orientador que auxilie na realização do trabalho de análise dos problemas . É, pois, i-portante que este orientador tenha uma formação adequadá para.riu função. Entre os principais elementos que devem compor a sua form açã,o destacaremos: o o método da pesquisa participante;

. . . .

a sociologia do conhecimento; a dinâmica de grupos;

a tecnologia (tecnolog ia agrícola, por exemplo, se ele trabalha no meio rural); os métodos e técnicas de educação popular.

Além disso, este orientador deverá possuir um bom conhecinrento e uma experiência concreta do meio social, econômico e cultural a que pertencem os membros do grupo de estudo.

A anáIise crítica dos problemas

o objetivo das atividades de análise críttca e o de promover, los 'grupos de estudo, ufi1 conhecimento mais objetivo dos proble:nas e da realidade. Deve-se partir dos fenôm.rt, para bus car

o :ssencial, além das aparências e das relações cotidianas imediatas. t)s problemas não devem somente ser descritos, : tlm de se procurar as estratégias possíveis de ação.mas explicados, Nesses grupos de estudo, o orientador estimula e desenvolve -IT'r processo de análise que pode se articular em três momentos:6

(6

=-

)

Trata-se antes de "momentos" que de "etapas,,, pois

- ' z-

processo

o de se retornará várias vezes durante esses momentos, êrn função dos proble: s estudados e de sua evolução, dos obstácutos encontrados, dos métodos z:cos e das caracterfsticas do grupo de estudo propriamente ditas. A 2 se não se realiza segundo u, tinear e preestabelecido. "rqirema

&

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO lorg';

primeiro momento: A expressão da "representação" cotidiana do problema.

Nesse momento, os participantes dos grupos de estudo exprimem como "Se representam", fOrmulam Ou cOlocam O problema que querem estudar e resolver. O papel do orientador consiste, desse modo, effi auxiliar os participantes a mostrar como eles percebem o problema, como eles o explicam, como analisam a situação e que

tipo de solução

eles vislumbram.

para execut ar tal função, o orientador pode utilrzat üm feixe de questões que ele tetâ de adaptat, evidentemente, a cada problema tratado e açada tipo de grupo. A título de exemplo, podemos

citar

'

o

. o

. . . . .

as seguintes: de que problema se trata? o que já sabemos dele? quais são os fatos que o determinam? como se manifesta o problema?

onde ele existe? quando ele surgiu? quem e afetado Pelo Problema? quais as conseqüências do problema? houve ações que tentaram resolver esse problema e fracassaram?

por quê?

o o que poderíamos fazer para contribuir

.

p ara a resolução do pro-

blema? quâis são as ações e os meios ao nosso alcance? quais aqueles

fora de nosso alcance? etc. Segundo momento: colocar em questão a representação do problema. O papel do orientador consiste assim em auxiliar os participantes do "grupo de estudo" a questionar as suas "representapara o desenvolções" do problema. Este momento é fundamental coticonhecimento do crítica" de "análise processo u* vimento á. etc.). situação (problema. fenômeno um de diano Neste caso, a "matéria-prima" sobre a qual se exercerá o questionamento é a formulação dos problemas e suas representações tal como foi exprimida pelos participantes no momento precedente. De fato, limitar-se apenas a estudar o "concreto familiar" para descrevê-lo e a acumular observações empíricas para explicálas resultaria no acúmulo de uma série de pontos de vista, no reforço dos condicionamentos ideologicos que determinam a percepção dos participantes, e na confusão das causas aparentes com os fatores

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

65

determinantes e estruturais que produzem o problema e engendram a situação a ser enfrentada. Isso resultaria em limitar a análise a uma simples de§crição das manifestações externas de um problema, ao invés de procurar as causas fundamentais deste. Em relação a um problema de subnutrição, por exemplo, consistiria erro considerar que suas causas seriam essencialmente educativas, julgando-se assim que a vítima seria a culpada.

Assim' uma abordagem empírica red uziria o problema da subnutrição a um probl.*u de preparação e conser'ação dos alimentos' sem analisar as causas deteiminantes de um tal prob,lema. tais como o sistema de propriedade e de distriL,uiçào,Jas rerras. o sistema de credito e de comercializaçào. as esrrate-eias das empresas multinacionais na indústria agrícola, a di'isão internacional

trabalho etc.

do

Nesse trabalho de questionamento da representação do problema' é muito importante levar em consideração

as contradições do conhecimento cotidiano. com efeito, este compreende simultaneamente fragmentos de conhecimento cientíÍico, dados objetivos, uma consciência parcial das causas do problema e conhecimentos empíricos úteis. No meio rural, existe, por exemplo, todo um ,,saber popular" sobre plantas medicinais, ,àb.. o tratamento empírico das doenças comuns, sobre o meio ambiente, sobre a cri açãode animais etc' que responde a necessidades reais e possui, sem dúvida alguma, uma eficácia real' Esse ".up ital popular" de conhecimentos não pode ser subestimado. Entreianto, esses conhecimentos são também limitados pelo próprio fato de que não se fundamentam numa abordagem científica' Para retomar o mesmo exemplo da subnutrição, os camponeses que participam de um grupo de estudo estarão certamente conscientes de que esse probl.Ãu ,ao pode ser resolvido por uma ação educativa de tipo "culinário", pois que envolve outros fatores como o da produçaà agrícola e do sistema fundiário. No en-

tanto' talvez eles não analisem bem o papel da alimen tação na reprodução da força de trabalho, os mecanismos de crédito, o sistema nacional e internacional de comerc

ializaçã,o dos produtos, mecanismos de fixação dos preços agrícolas, as características de um regime alimentar, o papel, as possibilidades, as condições e os limites das cooperativas de produção etc. Por isso, interessa-nos deixar claro que a ação individual fundada somente em conhecimentos empíri.o, não é suficiente para resolver um problema' Faz-se necessária uma açãocoletiva fund ada num conhecimento crítico e científico. os

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

66

Nesse segundo momento, uma das principais tarefas do orien-

tador é fazer com que os membros do grupo de estudo tomem consciência do modo pelo qual eles próprios analisam um problema. Para isso, ele deverá visualizar e conceituar a prâtrca dos participantes. Da mesma forma que no primeiro momento, ele poderá dispor de um conjunto de questões que auxiliem a refletir de maneira crítica sobre as "representações" exprimidas. Essas questões podem nos ajudar a levar em consideração, por exemplo, o fato de que o problema pode ser estudado segundo diferentes pontos de vista, que ele apresenta diversos aspectos, que vários tipos de açào podem ser vislumbrados, que a simples descrição do problema é insuficiente eÍn seus dados objetivos, que tal problema não existe apenas ao nível de uma aldeia mas tambem ao nível de toda uma categoria social da população etc. O tipo de questionamento a ser enrpreendido depende. pois. de cada grlrpo de estudo. O essencial é que os participanles. ao flnal desse trabalho. tenham consciência de que sãt-r possir eis ,iir ersas tbt-rrdagens. que as ações j á cogitadas Ct-rntpt-rrrsrrr de tato hipr-rteses intplícitas. que a Sua colocação como problema é lintitada. que é possír'el aprofundar a análise e que é possir el completar e estruturar os dados objetivos que já possuem.

Terceiro momento: a reformulação do problema

Apos o questionamento do momento precedente, chega então o momento de reformular mais objetivamente o problema a

sua primeira configuração. Esse trabalho de

obj etiv

partn

de

açáo com-

preende:

A descrição do problema: a identificação dos "pontos de vista" e dos "aspectos"; a enumeraçáo, classificação e comparaçáo das informações; a identificaçáo de contradições entre diferentes elementos da situação; a localização do problema no tempo e no espaço; a relação deste com outros problemas; as dimensões regionais e nacionais etc.7

A

a investigação das causas não apenas imediatas, mas estruturais, bem como as leis, as relações entre explicaÇão do problema:

(7) Cf . Jean-François Chosson, L'Entrainement mental, Paris, Le Seuil 1975. (Col. "Peuple et Culture").

,

REPENSANDO A PESQUISA

,H[,l:"blemas,

PARTICIPANTE

I

-

a indi cação das "variáveis,, nas quais é poss;\ü.

est,ategias possíveis de ação.' a formulação das hipóteses de açào ;if;;;nciação ,rtr. as soluções de tipo imediato e as que " rt; cogitadas a prazo mais longo, bem como entre as que estão ao alcance dos participantes e as que exigem -do, :,TJ,:'J:.::rX#"::jervenção; a análise das ações corerivas . '4s

e a at'aliação dos seus resultados;

Se damos por verdadeiro que a maior parte dos problemas pode ser resolvida num não nível individual e local, e import ante,portanto' delimitar com precisão os níveis possíveis de açã,o. As ações coletivas necessárias a longo pÍazo não devem, entretanto,

exclu ir a possibilidade de tentar melhorar a situação rocarmente e a curto prazo' os limites dessas ações a curto prazo devem ser bem neados para que estejamos dericonscientes

àu, condições necessárias e das ações a serem empreendidas numa escala mais import ante,onde influir sobre os fatores estrururais que

::ffi["j;X.o"'

dererminam

No decorrer deste terceiro momento, é necessário que :icipantes compreendam os parque o processo de análise crítica não ter:ttin a aí' Ttata-se tão-somente de estimurar e desenvor'er uma dinâ:rica e uma capacldade de análise crítica p...anente. o próprio r'lrlpreendimento de ações destinadas a -.thorar a situaçào ou a ::solver os problemas deve também l:trblemas, de novas informaçoer, resul tar nacolocação de no\.os de novos obstáculos, de novas .'\ p I icações, de novos conceitos etc.

{s atividades

de

feedboclr desta terceira fase

Nesta terceira fase, as atividades defeedback

consistem em -e cada grupo de estudo possa comun icar os resurtados de seu :'balho aos demais grupos e ao conjunto da popuração envorvida. A finalidade desta comunicação é a de pôr em evidência -' as existentes -

"cÔes

entre os problemas estudados

- ::lecimento que o conjunto

e a de aprimorar o d,a população dispõe da situação.

(8) cf' Guy Le Boterf, (9) Moema wiezzer, Formation ?t prevision, Edições ESF-EME, 1g7s. -= -r]er de las §i ,, i;;;ibn naoai...' Testimonio de Domitira. minas de Boli viaiu Érãno, Aires, Editorial Siglo XXl, rcn.

68

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

Quarta fase - programaÇão e realizaÇão de ,um plano de ação (inclusive ações educacionais) para contribuir para a solução dos pt'oblemas

O plano de ação elaborado a partir dos problemas analisados deve comportar:

.

atir idades educatir as que permitam analisar os problemas e as situações vividas; que possam melhoÍaÍ a situação a nível local; ações educativas que tomem possível a execução de tais medidas; ações que encaminhem soluções a curto, médio ou longo ptazo, a nível local ou numa escala mais ampla.

o medidas

. .

Este plano de ação bem como a sua rcahzação devem por sua vez dar lugar a um processo defeedback, isto é, a uma discussão e avaliação permanente de sua orientação, de seu conteúdo e de sua reahzação.

O objetivo visado nesse momento é o da participação da população na esfera das decisões, do mesmo modo que ela esteve presente nas etapas anteriores do diagnostico e da análise dos problemas.

A pesquisa participante: o processo permanente O processo da pesquisa participante não termina nesta quarta fase que acabamos de descrever. A análise critica da realidade e a realtzação de ações pro gramadas conduzem à descoberta de outras necessidades e de outras dimensões da realidade. A açáo é uma fonte de conhecimentos e de novas hipóteses. O diagnostico, a anâlise crítica e a açã,o constituern, assim, três momentos de um processo permanente de estudo, de reflexão e de transformação da realidade, os quais se nutrem mutuamente.

Algumas reflexões sobre a pesquisa participante A "retroalimentação"

ou feedback

O feedback consiste numa atividade de "retorno " das informações colhidas no decorrer de uma pesquisa àqueles que foram

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

69

pesquisados' os resultados da pesquisa serão então colocados em discussão' As modificações alcançadas e as reações dos participan tes serão introdu zid,as no proprio processo da pesquisa. Tal atir idade não pode ser neutra ou desprouiau de inte..rr.r, visto que o rerorno da inform açáo é sempre uÍ,'ato político. Na maior parte pesquisas, os .esultados em geral retornam exclusivarnente .das

à "comuniaua. científi

ca,,. os pesquisados seriam "cobaias" que não têm o direito de conhecer a conclusão do trabalho de que são objeto. Por serem consi,cerados entes passir os. Ilca implícito que não se osjulga aptos à discussào rlç. sua prtrpria

situação, ou então que e perigoso rue isso \ enha a âcr)ntecer. coordenada pelos poderes instituídos. a pesquisa

social é treqüenremenre manipulada pelos grupos dominantes. Nessas condições, o feedback aos pesquisados pode constituir um meio de reforçar as

e de açã'o dos dominados. Na introduçãoc apacidades ao depoimento que faz das condições de vida, de trabalho, das lutas operá:ras e da repressão nas minas dos Andes, Dom itila,uma mulher da :iasse operária boliviana, insiste em sua propria linguagem sobre a :ecessidade de retorno da inform de análise

*

r

açã,o

es

q

ui sas a serviço dos

explorados:

e sobre o engajamento

das

"Eu fui entrevistada por centenas de jornalistas, historiadores, muitas pessoas da televisão e do cinema, de diferentes partes do mundo. E da mesma forma, eu sei que antropólogos, sociólogos e economistas vêm visitar o restante do páir e estud á-lo. Mas, de todo esse material que eles obtêm, muito pouco retoma ao seio do povo, não e? por isso, eu gostaria de dizer a todas essas pessoas gue, se pensam em coraborar conosco, façam com que esse material que eles conseguem retorne a nós (' " ) paru que iirru ,o estudo de nossa propria realidade' si me permiten

habiar... deve serviráo poro porque retorna ao proprio seio do povo. Do mesmo modo, eu acho que os filmes, os documentos e os esfudos que são feitos sobre a realidàd. do povo bolir iano devem regressu. urri* ao próprio seio do povo uoiiriano, para serem analisados r0 e

'

:

criticados".

'{ difusão das informações não deve, no entanto, ser demasia- r'nte valorizada' As atividades d,efeedback

têm suas limitações. : - : i 3ssário constatar inicialmente que os grupos oprimidos não :'r;:jm - felizmente - pela pesquisa partic'ipánte cám seus./e ed_ Traduzido da versão em francês feita pero autor. (N T

)

C.\RLOS RODRIGL ES BR{\DÀO (ore.)

7C

organtzarem, lutarem ou reir indicarem. Adifusão dos :-esultados de uma pesquisa que lhes diga respeito pode reforçar as sues capacidades de anâlise, de org anrzaÇào e de ação, mas de modo

,à..;. ^;.,

pera

se

algum pode criá-las. Além disso, o feedback nào se limita a uma questão de linguageffi, de tradução dos resultados em termos compreensíveis e adaptados aos pesquisados. Se os pesquisados não têm acesso ao saber, é sobretudo porque eles não participam na elaboraçáo desse saber. Este ultimo thes é estranho, ele vem de fora. Esta é fundamentalmente a razáo pela qual umfeedback único ao final da pesquisa não teria efeito. Os resultados apresentados são o ponto de õhegada de todo o percurso da pesquisa, que foi reahzada por especialistas. Não tendo participado no processo de sua elaboraçáo, os pesquisados não podem se apropriar dela. A pesquisa participante não deve ser definida essencialmente pelo feedback, mas acima de tudo pelo fato de os próprios pesquisados se encarregarem do processo dé pesquisa. Qual é, aftnal, a validade científica do de um resul,feectback'? Qual o valor da elaboração e apresentação tado global, de um discurso geral elaborado a partir de discursos particulares? A propria estruturação desse resultado (apresentaçáo àa média das opiniões, escolha entre posições contraditórias, seleção dos exemplos "significativos", eliminação das informações consideradas "insignificantes" etc.), assim como a escolha da linguagem (oral, grâfi,ca, audiovisual etc.) são atos de poder, isto é, à imposição de um determinado codigo. A principal questão a ser colocada aqui ainda é a mesma: quem decide sobre este codigo? quem seleciona as informações? Tais questões não devem condu ztr à demissão dos técnicos da pesquisa. O import ante e que reconheçamos a existência desse poder, que o submetamos à discussão e assim nos precavenhamos de acreditar que a operação de feedback é uma operação neutra. A comunicação de informações a outros é também revelar-se concor dar em compartilhar o poder de que esses dispõem, orientar e guiar estes outros numa problemáúica determinada. Em certa meáidu, as atividades defeedback obrigam o grupo a ouvir e levar em consideração o ponto de vista do outro. Isso não significa que essas

atividades irão preparar o grupo para ag:r em favor dos interesses alheios. Tomemos um exemplo: numfeedback reahzado numa aldeia rural, os habitantes conhecerão a opinião dos técnicos agrícolas sobre os problemas de fertilizaçáo dos solos, ou a dos técnicos da habitação sobre as possibilidades técnicas de aprimoramento das moradias. Eles obterão também informações técnicas e conhecerão

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

7I

outras alternativas além daquelas \ías' uma ,ez que essas infoimaçõesde que dispõem ateo momento. lhes tenham sido comunicadas, nào se de'e pensar que eles as ignoram, nem que agem como se as ignorassem. Tudo se passa como num jogo, pois existe

aíum novo dado' Nesse mesmo feedback, contrariamente ao que acontece' os técnicos gerarmente da administraçáo pribrica deverão ouvir os pontos de vista dos aldeões' Esta comunicação pode constituir uma pressão no sentido de uma melhor traçào pública às necessidades ^à:;;;^ção da ação da adminis_ ou problemas dos aldeões.

pode

\Ías. ela permitir também uma forrna merhor de manipurá-ros. o

back não é a no man,s lartcl da

espaço de connitos : d. ..ruço.f:'J todos os atores implicados.

t.eed-

;:[.:iT;j:::,;jH,T#:.#

Á.o.posição sociar dos grupos cutem os resultados que disda pesquisa também não deve ser negrigenc iada' Freqüentemente, encàntramos

nesses grupos aqueles sempre participam de que tais ativid,ades e associações diversas, mas a representatividade destes pode ser colocada em dúvida. Essas

característitu'

do

rnteressante para a pesquisa.feedbock tornam-no ariás bastante Não sendo neutra a inform quando ela intervém pode-se açã"o, levantar hipóteses sobre as reações que ele provoca' podendo-se assim cercar melhor as estratégias que f, re s entes. estão

Em todo caso, o feedback não pode ser assimilado simples regulação de a uma tipo cibernetico.

As atividades de feedback podem também ser uti rizadasnuma rerspectiva reac ionária' E este é o caso em que o que recebe a rl ensagem pode tão_somente reagir, d,ar sua opinião, :t-rder de modificar sem ter o o próprio conteúdo da mensagem. Em uma tar 'ttuação' o " receptor" naà pode d3 mooo utgum contror ar omeio de 't)Irlunicação' permanecendo limitado ao .., papel de ,,receptor,,. : sse tipo de retroalimentaçào é comum nas emissões :':n que os "ouvintes" radiofônicas são consultados. Do mesmo modo, ocorre :ssit,, chamada "democ na racia por sondagem,,, efl1 que o o.squisado, ' 'mado de improviso' sem ter acesso a fontes de informações diver::ticadas e sem participarde debates, deve darsua opinião p araque :'a entre como input no cômputo das opinio., indiviáuais, râl graças ao uma . opinião maj oritárià e "demo crática,, se el aboraria.conce-:da desta forma, a à..o cracia é apenas ,Àu palavra e uma más_ ainda não deve ser esquecido, ou seja, o da utiri-

'ira' outro risco

72

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO 1org.;

Como situar a "pesquisa participante, (ou "enquete-participação,) ?

Normalmente. se associa a pesquisa participante à "pesquisaação" (ou "pesquisa ativa" ). Entre os principais critérios que a

caracteri zam. destacamos os se,quintes:

o d escolha dos problemas a serem estudados não se efetua a partir de um conjunto de hipoteses previamente estabelecidas pelos

pesquisadores, mas tem sua origem nas situações sociais concretas que os pesquisados que participam do processo de pesquisa querem estudar e resolver. A tarefa dos pesquisadores consiste em auxiliar os grupos interessados a formul ar e analisar os problemas que estes mesmos desejam estudar. o [xiste entre a pesquisa e a ação uma interação permanente. A produção do conhecimento se realiza através da transformação da realidade social. A ação e a fonte ,Co conhecimento e a pesquisa

c0nstitur. ela propria. unta açào transformadora. A pesquisaaçào é uma práris. isto é. ela reahza a unidade dialética entre a teoria e a prática. Atrar'és da pesquisa, produzem-se conhecimentos que são úteis e relevantes para a prática social e polí-

t

ica.

o { pesquisa-ação intervém em situação reais e não em situações

de laboratório. Trata-se de um trabalho com grupos reais, com as limitações e recursos existentes, "Íla sua real grande za,, e não , nas condições artificiais em que se dá, por exemplo, a maioria das experiências de "dinâmica de grupos" oriundas da corrente psi-

cossociológica.

o I intervenção se dâ numa escala relativamente restrita (uma "coletividade rural", região, oÍgantzação, ou um bairro etc.). Essa limi taçáo volunt ána da área de ação deve permitir um con-

trole melhor do processo e uma avaliação mais rigorosa dos resultados obtidos. Esta característica e acompanhad,a, aliás da hipo, tese (implícrta ou explícita) e da possibilidade da generalizaçao dos resultados e do processo a uma escala mais amplá. o d pesquisa participante se coloca a serviço dos grupos ou categorias sociais mais desprovidos e explorados. Ela busca não somente desencadear ações suscetíveis de melhorar as suas condições de vida, mas também desenvolver a capacidade de análise e resolução dos problemas que enfren tam ou convivem cotidianamente. Torna-se pois importante que a pesquisa participante ou a pesquisa ativa esclarcça "para quem" se trab alha. O peiqui-

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

73

sador não é neutro, pois se coloca a serviço dos mais oprimidos e "desfavorecidos". Esta "tom ada de posição',, longe de ser fácLL, necessita de um trabalho permanente de reflexão crítica do pesquisador sobre as implicações teoricas e metodologicas de sua intervenção e do processo de pesquisa-ação. Essa função que o pesquisador desempenha .onrtitui determinado poder que não deve ser mascarado por uma ideologia de orientaçã; neutra e nãodiretiva.

rl

o I pesquisa-ação consiste num processo educatir o. {o participar do próprio processo da pesquisa e da ,Jiscussào pcrnrspefltc. 6os resultados obtidos, os pesquisados po,Jem a,Jquirir um conhecimento mais objetivo de sua situaçào. assim como analisar com

'

maior precisão os seus problemas, descobrir os recursos de que dispõem e formular ações pertinentes. Os "pesquisados" participam não apenas da discussão dos resultados da pesquisa, mas sobretudo do processo desta. A função

da pesquisa não é a de ser "propriedade privada,, dos especialistas' Ela deve ser compartilhada, sendo possível traçar aqui algumas analogias com a distribuição da função de intelectual desejada por Gramsci.

Outro modo de situar a pesquisa participante consistiria em fazet referência à class ificaçã,o r.uii zadi por Marcel Lesne n sobre Js "formas de trabalho pedagogico". Este constitui, com efeito, um tnstrumento de análise bastante útil. Lembremos, de início, que \Íarcel Lesne distingue três grandes "formas de trabalho pedago-

jlico"

'

r

:

A forma de trabalho pedagógico de tipo transmissiva, de orientação norma tiva, através d; qual se tránsmitem saberes, valores ou normas, modos de pensar, de perceber e de agir, ou seja, bens culturais e ao mesmo tempo uma organi zaçã,o social corres"

pondente. (FTP l) -\ forma de trabalho pedagogico de tipo incitativa, de orientação pessoal, que opera principalmente ao nível

das intenções,

dos

(11) Nos nos juntamos atualmente às críticas formuladas J.-M. e M ' Lesne sobre a concepção do orientador que ,,recusa por o poder,,, ::^forme expusemos em Enquêtdp-articipation et animation, Culture et Déve: I3ement, 1970. (12) Marcel Lesne, Travail pedagogique et formation d,adultes, paris, ='- =" 1977. 3a'bier

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (ore.)

74

motivos e das disposições dos indir'íduos, procurando desenvolver um apren dizado pessoal do saber. (FTp 2)

o { tbrma de trabalho pedagogico de tipo aproprrativa, centrada

sobre a insercàtr social do indir'íduo. considerada enquanto mediação pela qual - e\erce o ato de formação. como ponto de

partida e ponto de che-eada da apropriação cognitiva do real. (FTP 3;"ts

Segundo nos parece, a pesquisa participante, pelo menos do modo como a concebemos, oscila entre a FTP 2 e a FTP3. Ela nunca é completamente assimil á.vel a um desses modelos e isto porque, definitivamente, não é a vontade dos seus promotres que a orienta, e sim as determinações sociais nas quais ela se situa. Entre as principais características da FTP2 podemos citar as seguintes:

'

Uma pedagogia do "educando", que concebe a educação como um processo de apropriação do conhecimento por parte das pessoas em formação. e não uma "pedago Eià", que concebe os indi-

r'íduos como receptores passivos do conhecimento. Uma concepção daquele que intervém (seja o professor, o orientador, ou o pesquisador) enquanto uma fonte de saber dentre outras, de modo 9ue, numa situação defeedback dos resultados da pesquisa ou em uma de suas fases, o agente interventor informa mas evita orientar os resultados da discussão. o { organizaçáo das "situações-estímulo", de modo a se referirem aos problemas vividos pelas pessoas ou grupos em formação. Este tipo de situação é buscado pelos formadores para aí desenvolverem as ações educativas.

'

o { utilização sistem âtica do saber do grupo, de suas potencialidades e dos recursos de que este dispõe.

o Q interesse privilegiado que os formadores dirigem para os progressos (de pensamento, de análise, de raciocínio) dos "educandos ".

' o

IJma concepção de avaliação que dispõe de um a atenção especial em relação aos aspectos quaritativos do processo da pesquisa participante e de seus resultados.

I

importância do grupo, e do pequeno grupo, como sustentá-

culo da form ação.

(1

3) Marcel

Lesne, op. cit.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

75

' um perfil

daquele que intervém como possuidor sobretudo de . unálir. de grupos. A personalidade do formador seria aqui como que um dos principais capacidades de orientação, condução

in

strumentos da intervenção. Por outro lado

, a pesquisa

nos seguintes pontos:

p articipante se aproxima da

FTp

3

o d pessoa em formação (o "pesquisado ativo" da pesquisa participante) é considerado um agente social, e não upr indir ídutr iso-

lado do meio social e privado das relações sociars ,Je pro,JuÇào nas

quais se situa. Isto é particularnrenre manitestt-r na análise das necessidades- na articulaçào entre o conhecimento do ponto de vista dos pesquisados e o diagnostico socio-econômico de sua situação, bem como nas atividades de análise crítica dos problemas a serem estudados pelos "grupos de estudo".

' A existência de uma alternância entre o "meio social reali, e o "meio de forrnação" . O processo da pesquisa participante, por suas atividades educativas, suas comissões de trabalhá e grupo, de estudo, busca constituir uma certa "proteção necessária " puru a expressão e anâhse das situações.

o A busca de uma estreita relação entre as atividades educativas e as atividades concretas das pessoas "pesquisadas

"

e em forma-

ção.

'

O fato de levarem consideração, como ponto de partida das atividades educacionais, o "concreto familiar" dos p.rquisados a fim de con duzir à análise crítica das situações vividas e cheg ar a um "concreto construído". Este constitui o eixo principal da análise crítica dos problemas identificados na pesquiru pu.licipante e estudados pelos "grupos de estudo".

o A "apropriação" do real através do conhecimento e da açáo, a fim de real tzaÍ a unidade dialéti ca d,a teoria e da prática. Essas diferentes características concernentes à pesquisa parti;ipante que acabamos de enumerar não formam uma lista exaus-

::\'a' Foi nossa intenção escolher apenas algumas as -provavelmente :rincipais a fim de tentar situar o método da pesquisa-ação em :elação às -, "formas de trabalho pedagógico" propostas por Marcel ' esne' E importante assinalar que, apenas respeitando as profundas :iterenÇâs, podemos situar a pesquisa participante em rel açã,o àque's modelos. É,, aliás, demonstrando intereise por esses modelos ;re podemos saber melhor em que "ponto" estamos, quais avanços

:6

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

já fizemos, quais os "desvios possíveis", quais etc.

as tendências em ação

A pesquisa participante: seus códigos e técnicas A pesquisa consiste num instrumento, ou antes, num conjunto

de instrurnentos. Os questionários, as amostragens, os relatorios, os

roteiros de entrevista, os quadros de análise, os cronogramas, âs fichas de informações, a formul açáo de hipóteses, as técnicas de análise do conteúdo etc. são os inúmeros instrumentos encarregados da coleta, do tratamento e da transmissão de informações. Esta é a função formal desse instrumental, Mas qual é realmente a signifi caçáo e o efeito desse arsenal tecnológico? Poderíamos analisá-lo na perspectiva de uma pesquisa participante? Envolvidas em sua objetividade, as técnicas de pesquisa se desejam científicas, visto que existem paraconstruir obj.iiru*ente a verdade. Sem querer negar esse rigor científico, é r...r, ârto notar também que a objetividade mas carao mais das vezes não - embora sempre direcionamento da pesquisa. As técnicas de pesquisa não somente recolhem os dizeres, mas também forçam a drzer. Essa linguagem tecnológica dos sociólogos, metodólogos e orientadores impõe seu codigo. Os pesquisadores temem sempre deixar - uma escapar inform açã,o pertinente. Bastaria apenas um turu.o na rede para que a pesca de dados fosse infru tífera, senão desastrosa. O que mais tememos, no entanto, é menos o problema da perda de informações que o da seleção ou sobretudo o da inform açáo forçada. Ern última instância, poderíamos falar aqui em um totalitarismo da pesquisa, exatamente como Roland Barthes fala de um totalitarismo da linguâgem;

r+

"A linguagem é uma legislaçáo, a língua seu código. Nós não vemos o poder que reside na língua porque nos esquecemos de que toda língua é uma classificação e toda classificação e opressiva ( ) Falar, e com maior razáo discorrer, não é comunicar, como se repete com demasiada freqüência, é sujeitar. Toda língua é uma reição general

izada

("')' A língua, como desempenho de toda linguagem;não é nem

Ed.

(14) Roland Barthes, Aula inaugural no Cotlege de France, São paulo, 1980, pp. 12-14, trad. Leyla perrone-Moisàs.

cultrix,

REPENSANDO A PESQUISA

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PARTICIPANTE

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77

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A denúncia pode parecer brutal, mas, em todo caso, ela incita de dtzer",-encontramo-la bem analisada justamente a propósito dos métodos de pesquisa interro gativa na reflexão desenvolvida por Michel Morin rs icerca d,a,,interro-gação ": à reflexão' Esta "o-brigiçã,o

"A pesquisa' com efeito, qualquer que seja^a forma que ela assu ma, possui uma orientação discursi"". 'ú1; forma simpres, esta -ui, orientação imp lica, enquanto fundamento sintático, a transformação interrog ativa das sentenças afirmativas. ora, tar transformação não e de modo algum inocentl, e se nos divertimos em desmon tá-lapara reconstituí-la' temos rapidamente a sensação de que essa transti-rrmação no inverso vai bem além, porque diz muito mais do quÊ r-r S;jeito do enunciado qreria iirrr, isto à, vai muito além das concr.-ões de produção de seu enunciado (...).'s. ua,nl,imos então que rtnüJ transformação interrog ativa impiica a manutençào dos presiuo.r!rtrS que o interlocutor deve aceitar em sua resposta. pdoeren:os Drtllr-)!, reciprocamente que as sentenÇas interrogatir-as r eicu iar: p:,.-,Fr>rçces que são passíveis de ser det..*inadar. ]na.., ai;iia

-.aj> demos levantar a hipotese a. qra esses pressuposrt-is

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irrr{3. F\-

SStr r;emer:ros ,Je um sistema de representações sociais Y"\' que Lsr caraclsrzam st tsI I Ldrn Ufne COnCepde mgndOtt.

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o que está em .questão aqui não é a utilização da pesquisa pata fins de exploração, dominaçao ou manipulaçáo, mas a pro.,;;;nto instrumento, o que eraeimpõe,

flT,1X',T1.,íX,r,Xl?::H1

Diante de tais análises, é necessário rejeitar esse instrumento? Nos não pensamos assim. ou, então, seria ,r...r, ário açabarcom logica e refut ar tod'a a linguaâ.rr, a toda comun icaçãobaseada num codigo' se a pesquisa socio-lógi".u, do mes*o àodo

que a pedagogia, é uma "violência simbólica"Jo então ela emerge, como toda violência, da "dialéti ca d,a coerção e do consentimerit á,, . ri- Ér.rr. ponto que o sentido da pesquisa participante deve ser reencontrado e reestudado' A participação dôs p.rq'uisados ou propria eraboração do

cautniJli},,,Yr§l?5#:''t' L'imasinaire dans

reducation permanente, paris,

(16) No sentido usado por Bourdieu passeron. (17) "La question de ra viorãnã";, e Echange

et

projets, 12, 1977.

',

I'ARLOS RODRIGUES BRANIDAO (org,)

: >:,: s:rir t-r (problemáttca metodologia, instrumento, tratamento r:-s cedos ) da pesquisa deve permitir amentzar o que foi imposto r:r-r aumentar o espaço daquilo que se institui. A participação na e orientação do dispositivo não deve ser um "nível a

;. ab,oração

n'rais", ou um "grau a mais" na participação dos pesquisados, pois ele constitui o núcleo essencial da participação, na ausência do qual essa participação permanece apenas um refinamento da domin açáo

objetiva dos tecnologos das ciências sociais (sejam quais forem, bem entendido, os seus objetivos ou fantasmas pessoais). A pretensão da pesquisa participante não e a de suprimir os códigos, mas fazer com que estes sejam analisados, e favorecer ao máximo a expressão e a emergência do codigo dos pesquisados. Mas, onde se pode tomar apoio na pesquisa para transformâla? Seria isso uma aposta, uffi desafio ou simplesmente uma hipotese?

E necessâtto, aliás, reverrnos o papel ou, sobretudo, o poder da escritura no trabalho de pesquisa. Quer se trate da elaboração de um roteiro de entrevista, da redação de um questionano, da redaçáo de um relatório ou de tomar anotações, é sempre a cultura da linguagem escrita, da escritura e da redaçáo que predomina, que se impõe. A pesquisa sociológica está nas mãos dos que monop ohzam e dominam a escritura. Podemos considerar a pesquisa como o confronto entre os mestres da escritura (os técnicos, sociólogos etc.) e a expressão oral dos pesquisados. O mundo dos sociólogos é com efeito muito cinzento. Diferentemente do mundo dos etnólogos ou

dos geógrafos, ele contém poucas imagens, fotos ou desenhos. À força de lidar com conceitos, esquecemos o sabor do concreto.

"Os sociólogos acabaram por impor uma imagem bastante triste da sociologia. A sociologia tendia a se tornar uma espécie de ciência bastante pomposa e loquaz; o fato de que os sociólogos não empreguem nunca uma imagem é por si mesmo um indício. Os etnólogos tinham pelo menos o recurso da fotografia (mesmo que fosse para mostrar o eterno indígena com o aparelho genital coberto diante do fotógrafo), faziam desenhos, esquemas, mapas; relatavam documentos, objetos. A sociologia tornou-se uma espécie de ciência sem conceito concreto." 18

(18) "Les intellectuels sont-ils hors jeu?", entrevista de Pierre Bourdieu a François Hincker, La Nouvelle Critique, 1111112, fev.-mar. 1978.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

79

As palavras substituíram as coisas. curiosa ciência do real em que os sons' os odores,

âs imagens, \-'L' rwrvvu§ ----ov'^v' os relevos (i e us os gostos est estão muito pouco presentes. 1 "Uma vaca, não se escreve, se vê,, Triste saber que

éo

gaio saber dos sociólogos.zo

Qual é pois o efeito produzrdo pela o que o sociólogo ganha ou perde, transcrição da palavra escrevend o-a? Dar prioridade à escritura é àa. poder àqueles que aprende-

falada?

ram o seu código particularmente , os que freqüentaram escoras universidades' Aquele que

e

escreve, Que transcre\-e é o que fbi escola' que foi instruído. o pesquisuáo. que toma noras ou que à as apresenta aparece ao pesquisado analfabeto, ou pertencente a uma cultura essencialmente oral, como um ser que pertence a uma outra cultura' A pal avra faladaque foi dada não pertence mais ao pesquisado' ela vai passar pelo .riuo dos instrum.nto, da esc rita(quadros, modelos' relatórios, esquemas etc.). Diante de hl monopólio, participação dos pesquisados a na elaboração da pesquisa ou na discussão de seus resultados torna-se bastante diÍícil, e por vezes impossível.

sob este ânguro, a "reração pesquisador-pesquisado,,

écom_ parável à do analistae analisando. o cliente e o pesquisado falam; o analista e o pesquisador tomam notas e interpretam. A pesquisa social e a pesquisa-particip ação não estão comprornetidas com um modelo psicoterapêutico implícito? Nos dois casos, é o que escreve quem interpreta, ou seja,

aquele que possui

a,,chave,,. Nos dois casos também, trata-se de resolver os "problemas,, do cliente, seja

um indivíduo ou um grupo.

É possível ultrapassar est a relaçã,o? podemos imaginar uma pesquisa que utilize apenas os meios de expressão ou o codigo dos proprios pesquisados?

À

medida que caminham nossas experiências de pesquisa .o*p., com a domin ação da rscrita' e favorecer a emergência

stit'a' aparece-nos como necessário

e a util izàçã,odos próprios meios de i\pressão dos pesquisados. se a cultura é oral, utilizemos mais as :euniões' os debates ou as narrativas. euando se tratarde exprimir a-i necessidades percebidas, por que não tornar possíver o

uso da

(19) Título de um artigo da revista Education permanente (20) para retomar o títúto , 37, I g77. de uma obra de R. Lourau, s::tologues, Edições Le gai savoir des UGE, 1gT7.

-

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (ore.)

80

expressão grâfrca, da fotografra, da exposição de objetos, da dança, dos passeios, das experiências com plantas medicinais etc.? Pedir aos

aldeões pesquisados que façam uma exposição sobre a sua situação vivida pode ser um excelente meio em vista desse objetivo. A pesquisa participante necessita do uso de um grande número de codigos. E apenas na medida em que essa variedade seja suficientemente grande e rica que os pesquisados poderão realmente intervir ativamente, e participar da criação de instrumentos de pesquisa cuja linguagem será deles próprios.

A pesquisa participante: um equílibrio difícil Pela transposição aqui de determinados conceitos utilizados

por Ivan Illich e seus colaboradores, zt podemos considerar a pesquisa participante como um processo de interação entre um "modo de produção autônoma" e um "modo de produção heterônoma" das

informações. J.-P. Dupuy

e

J. Robert ilustram por alguns exemplos

significatir,'os esses dois conceitos: "Podemos'aprender observando, agindo, trabalhando para os outros e para o nosso meio: este é o modo de produção autônoma. Podemos também ser educados, isto é, receber uma inform açáo obrigatória da parte de pessoas que existem para isso: este é o modo de produção heterônoma. Podemos nos deslocar de um lugar a outro por nossos próprios meios, utilizando nossa própria energia metabólica. Podemos ser deslocados de um lugar a outro como um pacote, num veículo qualquer. "

Poderíamos acrescentar: Podemos efetuar nós mesmos uma pesquisa sobre nossa própria situação, identificar e analisar coletivamente os problemas que se colocam à coletividade à qual pertencemos: este é o modo de produção autônoma. Podemos ser pesquisados, ser informados sobre nossa própria situação por especialistas da pesquisa social: este é o modo de produção heterônoma. Como escrevem J.-P. Dupuye J. Robert, esses dois modos de produção são "tipos ideais" e não existem nunca "em estado puro" numa determinada (21) Notadamente lvan lllich

, Nemesis médicale, Paris, Le Seuil,

1975;

J.-P. Dupuy & J. Robert, La trahison de l'opulence, Paris, PUF, 1976. (Col. Economie en Liberté. )

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

8I

sociedade

' Existem pontos de equilíbrio, uma sinergia entre os dois modos de produção àgindo em

e muitas I'ezes indispensável

interação. o mínimo de heteronomia à realizaçã,o das atrvid,ades autônomas.

Inrersamente' o excesso de heteronomia além de certo ponto acarreta uma efeito "contraproducente " e destrói a realização das ati_ r idades autônomas: este é notadamente o caso da maioria dos sistemas educativos, médicos e de transportes. Na pesquisa participante' esta sinergia é bus cad,apermanentemente. como combinar e equilibrar as intervenções

dos.rp..iaristas

dapesquisa e da população? Quais são os pontos de equilíbrio e os princípios reratir os ao nír-el de intervenção da orga nizaÇào

predeterminada e indispensár.er da pesquisa e da iniciatii a .rflrtânea e or-san izada dos pesquisados? o excesso de inter'enção dos "in'estigadores,,constitui táculo a toda capacidade obsde inic iativados pesquisados e os limita a desempenhar um papel passivo. A ausência total de pesquisadores, por sua vez' atribui ao processo um espontaneísmo improdutivo, deixa-o à domin ação dos grupos mais poderosos e sob o risco da ausência de rigor científitol xà p.rquisa participant., esta dia retica de p'odrçao

:lH;J;r3ff"modos

é p.i-unenre.

o equlíbrio é

Notas para o debate sobre pesquisa-ação* Michel Thiollent*x

\as presentes notas tentamos esclarecer diversos problemas teoricos e metodologicos relacionados com a concepção da pesquisaaçào. \a situaçào atual. achamos que ninguém pode pretender ter tbrmulado uma concepção definitiva, acabada ou comprovada. Precisamos acumular os resultados de muitas experiências, avaliações e críticas e, também, suscitar uma ampla discussão. Apresentaremos aqui um trabalho de "reconhecimento" e de reflexão acerca de alguns aspectos problemáticos da pesquisa- açáo, inclusive seu envolvimento no plano valorativo e a questão dos fundamentos teóricos desse

tipo de pesquisa.

Distinção entre pesquisa participante

e pesquisa-ação

Muitas vezes as expressões "pesquisa participante" (PP)

e

"pesquisa-ação" (PA) são dadas como sinônimas ou quase sinônimas. A partir do exame dos seus princípios, tais como aparecem na literatura disponível, podemos consid eÍar que existem diversos

(*) Documento apresentado na lll Conferência Brasileira de Educação, Belo Horizonte, junho de 1982. (**) Doutor em Sociologia pela Universidade de Paris. Atualmente é professor e pesquisador da COPPE/Universidade Federal do Rio de Janeiro. E autor e organizador do livro: Crítica Metodologica, lnvestigação Social e Enquete Operária, São Paulo, Polis, 1980. Trabalha atualmente sobre problemas de metodologia voltada para estudos de tecnologia, organização e comunicação.

REPE\SANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

83

tipos de PP e diversos tipos de PA. uma craradistinç ão enecessária. A PA é uma forma de pp, mas nem todas as pp são pA.

A PP se preocupou sobretudo com o papel do investigador dentro da situação.in'ulstigada e chegou aprobr ematizar arelação pesquis adot/pesquisado ;o

sentido de estabelecer a confia nça e outras condições favoráveis a uma melho r captação No entanto' os pattidários de inform ação. da Pp não concen traramsuas pações em torno preocud'a re.laÇão entre investigação e ação dentro da situação consi detad'a'

É tamente esse tipo de reraçào pecificamente destacadoius q ue é esem r,árias concepçôes da p.{ . .{ p.{ é apenas pp, é um tipo -;;rr,r;;" n ào d. centrada

na questào

agir.

do

Diversos autores concebem a PP como uma técnica de ,,obserpatticipante" que foi elaborada prir.ipalmente 'ação da pesquisa antropológica no contexto ou etnogr afi-ca. Trata-se uma adequ ada participação de estabelecer dos pesquisadores dentro observados de modo dos grupos a reduzir a estranhe za recíproca. dores são levados a os pesquisacom partilhar, pelo menos superficialmente, os papéis e os hábitos dos grupo, obs.ruuao, I araestarem em condição de óbservar fatos' situações e comportamentos que não ocorreriam ou que seriam altetados napresença de estranhos. Embora esse tipo de pesquisa seJa, muitas u.r.r, condu zid,o de modo intuitivo e sem sistematicidade' ele pode também seguir regras do crássico procedinrento de formul ação .--ào.

de hipóter.;,

1

Na

PP

;;;;

de dados e comprova_

a preocupação participativa

' est á mais concentrada :tilo pesquisador no do que no pólo pesquisado. Arém disso, não se ::ata de "ação" na medida em que

os grupos investigados :obilizados em torno de não são objetivos específicos e sim são deixados às 'iâS atívidades comuns' o fato de à, pesquisadores participarem :-.s situações observadas não é uma condiçãà suficiente ;n PA' Pois, além d,a participação parase farar -Ea participação dos interessados dos investigadores, ÍI pA supõe na própria pesquisa organi zad,a .l:,j:rTl.o' uma determ inad,a r?l?. :.:

r

ro o u,lffç;:',",i*i,?;ff S.;,T não corresponde apenas

i ' i'-'r

',

,

ao

du.iipo de ação? Em gerar,

Uf

I*lH*Í

,;pi;*ou3.tiro

il::ffi

de merhorar

a

1) Veja descrição dos procedimentos da observação participante, ho .:-J'?,

;l:ffi:i:?i *"T,,,lXffi [;::,,,xH:,,?^r:,

rpant-i o íi,,

a, i o

n,

rvo,ã

84

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO 1org.;

qualidade da obs ervaçáo. As expressões PA e PP não são sinônimas, embora na práúrca a PA requeira uma forma de observaçáo partic ipante assoc tada à açáocultura 1, e duc ac i o nal, orga nrzactonal, política ou outra. Ao recoÍrermos a metodos de PA, e preciso definir melhor o conteúdo da proposta. Pois PA poderia designar qualquer forma de pesquisa ligada a qualquer forma de ação. Se fosse o caso, seria uma proposta indeterminadâ e ,, logo, inutil.

Variedade dos objetos da PA Uma das caracteristicas da PA consiste no fato de que seu dispositivo. concebido de acordo com a sua dimensão social, estabelece uma rede de comunicação ao nivel da captação de informação e de dirulgação. A PA faz parte de um projeto de ação social ou da resoluçào de problemas coletivos. Em ambos os casos os investigados precisam de um certo nír'el de informação. A PA supõe que haja apoio, pelo menos em termos relativos, do movimento, da org amzaçáo social, cultural, educacional, sindicalou política na qual está concentrada. Muitas vezes, não se trata de um completo apoio institucional por parte da organizaçáo, e

sim de um apoio limitado oferecido por alguns grupos ou

ele-

mentos.

A variedade das propostas de PA é proporcional à variedade de projetos sociais inscritos em diversas conjunturas e sociedades. No contexto da Am értça Latina a pesquisa-ação é sobretudo ligada à visão emanc ipatótta, tanto no meio rural como no urbano e especialmente aplicada em projetos de educação popular ou de comumcaçáo social.2 Quando a PA é centrada num movimento popular dotado de autonomia, a investigação relativ a à açáo pode consistir na elucidação da estrategia, da tâtica, das decisões e dos atos efetivos. Mas

nem sempre é assim. Pois existe toda uma tradição de PA instrumentalizada dentro de práticas sociais ou orgafirzacionais sem preocupação popular. Desde as suas origens, nos anos 40, um tipo de PA e utílizado no contexto da psicossociologia norte-americana de uma (2) Maria Cristina Mata, "La investigacion asociada popular", Cultura Popular, 2:114-121, 1981.

a la educación

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

85

maneira que não é autocentrada nem emanc ipatoria. por meio PA' grupos pretendem estuda da r e transformar as atitudes de outros grupos e pessoas para com determinados fatos sociais (hábitos de consumo' formas de autoridade, etc')' Muitas vezes, essa práúrca comporru*.ntos organizacionais leva u ,*u psicolo gização darealidade social e não a uma consci entizaçaã-'so.iopolítica do tipo daquela que é procu radapela concepção críttcada pA. Dentro de uma de "mudança controlada", 'isâo a psicossociorogia das organ izaçôes e a chamada sociotécnica propõem programas de p.A que são respectivamente empenhados no "ó.sen\ olr ,

imento o.g anizacit-rnaI e ne melhoria da organizaçào do trabalho ou,Ja qualr,Ja,Je,Je rr*la nü trabalho' 3 os objeti\ os dessas práticas são basranre limitados em função dos interesses empresariais relativos à modernizaçào. eÍicientização e hum anização do trabalho

e das

organizações. Na Europa do Norte' existem propostas de PA no contexto da sociotécnica associadas à visão reformista de democ ratizaç,ã,o ,,rerações

das industriais" (relações entre trabalhadores e empresários). Essas experiências não podem ser consideradas como verdadeiras alternativas de conhecimento social. Todavia, merecem ser estudadas e avaliadas' e podem sugerir novot iipos de inform açãoe novos estiros de intervenção no meio industrial. um tipo de pA instrumental izad,a existe tambem no contexto da análise de sistemas. Trata-se de uma metodologia de resolução de problemas de nat urezainformacional

r $l

f

técnico-organizacional com

i

e

participação

dos analistas e dos usuários dentro de uma estrutura dà aprend izagemconjunta. a É prováwel que certos tipos de pA rito das tecnologias e das metàdologias vãnham participar do espíalternativas.

Isto é, de uma a partir da qual se pretende adequar as investigações e certas

filosofia

mesmo técnicas produtivas, habitaciÀais, comunicacionais, educacionais e higiênicas às condições concretas de uma atuaçã,o popular' São métodos e técnicas "apropriados,,

às necessidades das populações ou coletividades. Nesta perspe ctiva, são procuradas maior autonomia ou independênci a paracom as tecnorogias impostas pelo "sistema dominante". Reduz-se assim a,,importação,, técnicas e aparelhagens de custosas e as correspondentes concepções

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I;,?',::r;.,:: lsl: o " o s a ", i n : v ár o s a u t o re s, (4)ü' Paul Jobim Filho, (Jma meto,àologià para o ptanejamento

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tecnoburocráticas. Além disso, evita-se parte da dependência financeira e seu decorrente controle burocráti co-po I íti co.

Aspectos valorativos Todos os metodos e técnicas de pesquisa são utilizados em determinadas concepções da investigação de pretensão científica mais ou menos acentu ada. De acordo com o ideal científico, pretende-se que seja necess arta a demarcaçã,o entre os aspectos cognos-

citivos das exigências científicas e os aspectos valorativos. No entanto, devemos reconhecer que esses últimos não podem ser tão facilmente descartados. Sempre estão relacionados, de algum a maneira, com a orientaçáo e a seleção dos procedimentos utilizados. Na aplicação de uma determinada linha metodológica, sempre hâ algum pressuposto filosófico, valorativo, moral ou político. Não pretendemos que a investigação seja possível de modo totalmente separado dos valores, o que, flo caso, seria mais uma afirmação de cunho positivista e paradoxal, na medida em que ela mesma corresponde a certos princípios valorativos. A PP e a PA entretêm relações com certas posições filosóficas e valorativas. Lendo diversas contribuições à PP, podemos rep arar que há' uma relação predileta com a concepção humanista, mais freqüentemente cristã do que marxista, embora haja, em certos casos, uma afinidade entre certos aspectos da filosofia cristã e elementos de marxismo ou de gramscismo. PP é uma proposta que suscita muita simpatia entre aqueles que, ideológica ou ate religiosamente, enfatizam certos valores comunitários. Podemos identifi-

car vários princípios gerais. A idéia de participação ou de ação coletiva relacionada com a pesquisa evoca, para certos pesquisadores, a possibilidade de "comungar", de estabelecer uma comunicaçáo efetiva, cultural e social que é transponível com bastante facilidade nos planos simbólico, afetivo ou até místico. Outras idéias valorizadas seriam as de estar do lado dos humildes, fazer participar os humildades da geração do conhecimento de que precisam, conhecer sua própria situação etc. O comprometimento com os humildes, a comunhão com o povo e outras expressões semelhantes têm a ver também com o fato de mintmtzaÍ a relação dirigentes/dirigidos. Na mesma linha, é desejado que a ação seja a expressão da comunidade, desenvolva o sentimento de solidariedade, de autodefesa, de compreensão mútua etc.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPA\TE

Há ainda outros aspectos favoráveis ao encaminhamento das propostas de tipo PP ou PA. Principalmente no tocante

aos valores associados ao modo de utilização dos resultados e do conhecimento

em geral'

A pesquisa acadêmica e suas convencionais técnicas de pesquisa predispõem a uma forma de conhecimento codiÍicado de acordo com regras do mundo universitário sem retorno em direção ao povo'5 De acordo com esse tipo de crít ica, a pesquisa acadêm ica e pouco utilizada concretamente, só serve para a obtenção de títulos entre uma

pequena minoria privilegiada. A pA e também certas formas de PP seriam um meio de melhor adequar apesquisa aos temas e problemas encontráveis no seio do povo. Além disso, graças aos canais de comunicação estabelecidos pela própria pesquisa, i3:i Nsi:r ei dir ulgar imediatamente os resultados considerados -ll'r, r *i*ize\ ers dentro do meio social que os gerou. Da nossa parte, abordaremos a questão da seleção ou da justii'-açào da pA distinguindo duas posturas: "

a) A primeira consiste em propor especialmente

,riri .tl§.

;?- :i-

pp

a por estar de acordo com uma ideolo gia daparticipação popular, ou a pA por estar de acordo com uma ideol,ogia d,a ação coletiva ou da "comunhão"

de espíritos.

b) A segu nda faz decorrer a PA

de uma alternativa metodológica diferente das convencionais técnicas de pesquisa e a ser cientiÍicamente contro rada, mesmo dentro de uma concepção geral da cientificidade que seja diferente do padrão positivista.

A primeira postura se situa principalmente no plano dos valores e a segunda no plano metodológico é espistemológico.

mos exclusivamente pela segunda.

o

Nós opta-

que requer, de um lado, uma reflexão crítica a respeito dos envolvimentos valorativos da pp e da PA (mesmo quando nos parecem "simpáticos,,) e, por outro lado: rr'\'v' uma melhor fundamentação no plano metodológico e ,.orirà.

Do ponto de vista científico, a PA não nos parece

menos exigente do que outros procedimentos e, sem dúvida, exige muito mais disciplina intelectual do que os pacotes de perguntas da comum pesquisa de opinião. Parà seu próprio fortaleclmento, apA deveria ser objeto de muitas experiências práticas como também de um amplo programa de pesquisa metodológica e de crítica de eventuais desvios ideológicos.

(5) Brandão

'

Esse aspecto é enfati zado no livro organ izado

Pesquisa

participante, são Paulo. giàsiriense,por carlos Rodrigues 1gg1 , 211 paginas.

88

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (ore.)

Contra o "ideologismo" Certt-s 3utr-rreS encarem e PA como sendo uma proposta de caráter ideol.-rgico. Sc'ria apenas um tipo de atir idade de agrtaçáo ditusa no seio de uma ,--oletir idade sem que haja requisitos ou poscionamento cientit-rcos. Der e-se reconhecer que. em certos casos, a PA e tambem a PP podem estar abson.idas por uma proposta ideologica. No caso, seria sobretudo uma maneira de atuar dentro de uma coletividade e de captar acrrtiçamente a informação ideologica gerada por ela. O aspecto "atuação" pode inclusive consistir num tipo de prop aganda dos pesquisadores em direção aos membros da coletividade considerada. Certos partrdáxios da PP recusam esse tipo de atuação e dão privilégio a uma atitude de "escuta" do pessoal observado. A PP é algumas vezes apresentada como sendo uma maneira de desconfiar das pretensões científicas proclamadas pelos con\ encionais modos de investi-eação e como maneira de expressar o saber popular. o folclore. as crenças, a cultura e as técnicas populares. enfim. tudo o que se manifesta espontaneamente no seio do povo. A negação do "cientificismo" deve ser cuidadosa para que não

nos leve a negar a propria idéia de pesquisa científica, o que é sempre perigoso porque a deixa aberta a qualquer manobra ideologica. Além disso tal posição pode levar à negação do papel decisivo da teoria dentro da investigação social. Deve-se; então, evitar o regresso às posturas anticientíficas, "espontaneístas" ou "populistas". Uma adequada compreensão do saber popular não deve alimentar as posições antiteóricas e antiintelectuais. A participação dos investigadores em sistemas de PA ou de "intervenção" dentro de organizações ou de movimentos sociais não significa que haja adesão aos valores ou ideologias dessas entidades. Esse ponto é sublinhado por A. Touraine: "O sociólogo deve reconhecer sua solidariedade com as ações coletivas sem as quais the seria impossível captar o seu objeto de pesquisa. Mas este princípio não exige que o sociólogo adira a uma organi zaçáo política ou sindical porque esta possui objetivos diferentes dos objetivos de conhecimento, produz necessariamente uma ideologia e submete-se a exigências táticas e estratégicas, deixando no segundo plano as exigências do conhecimento e da pesquisa".6

(6) Alain Touraine, La voix et le regard, Paris, Seui!. 1978, p.

251.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

5v

Nesse quadro, a situação dos investigadores, aparentemente paradoxal, supõe uma constante avaltaçã,o dos seus envolvimentos

na açã,o observada.

Outros aspectos de um eventual "ideologismo" têm a ver com as condições de participação dos investigadores e dos investigados nos procedimentos da PP e da PA. A nosso ver, um dos riscos que apresenta a noção de PP consiste no fato de referir-se à noção de

"participação", sempre bastante ideolog rzada. Desde os anos 60. em vários países, as ideologias da participaÇão se espalham n(rs discursos do poder como forte arsumento de manipul&ç-ào e Ce esc3moteamento das relações sociais e especialmente das rela..-ões r3e poder. O uso da noçào de "participaçào" é sempre suteito a interpretações equivocadas. Esse uso pode trazer para dentro do campo da investigação as manipulações que ocorrem na concepção da política. O pesquisador deve ficar atento aos riscos associados as ideologias de participação. Ao criticarmos o participacionismo, isto não quer dizer que estejamos a favor de um relacionamento sem participação, unilateral, exclusivo ou autoritário. Trata-se sobretudo de impedir a reprodução de certas ambigüidades ou ate paradoxos - no fundo, muitos contidos nas propostas de participação quando, -elementos da situação se opõem a ela. Em cad,a pesquisa, as condições da participação devem ser cuidadosamente esclarecidas. Como qualquer técnica de pesquisa, os procedimentos da pA são utrlizados dentro de um campo social cujas dimensões ideologicas e políticas devem ser avaliadas por parte dos investigadores

e

usuários. Pelo fato de estar organi zada em torno de uma açã,o, a PA supõe que todos tomem posição. O problema é delicado, sobretudo nas situações conflitivas. A PA não pode deixar de considerar as oposições entre os grupos investigados. Mesmo quando não há conflito aparente, os membros das instituições nas quais a pesquisa ocorre sãe divididos por rígidas relações de autoridade o, p.r-

tencem a classes distintas.

A configuração da PA é variável em função do contexto da aplicação. Não são idênticas as aplicações feitas em instituições divididas em classes e as aplicações org anizad,as por grupos homogê-

neos com autonomia de decisão e ação.

No primeiro caso, há sempre risco de envolvimento das rela-

ções heterônomas, especialmente entre dirigentes e dirigidos. É preciso questionar o que significa a açáo (ou á participaçáo) dos diri-

gidos quando, flo fundo, todas as decisões são monopolizadas

e

90

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO 1org.;

tomadas por dirigentes. Isto e patente nas organizações industriais educacionais ou outras. No segundo caso, o problema principal consiste na elucidação

da açáo do grupo animado por um objetivo consensualmente definido. No contexto sindical e político ou em associações volunt ánias, as relações dicotômicas também existem, o que deve ser levado em consideração na concepção da pesquisa. Talvez a PA possa contri-

buir para evidenciar os fenômenos de monop olizaçã,o de informação e de poder e, também, as condições de execução da ação.

Dentro do molde empresarial ou organi zacional, eue remete primeiro ao caso, o tipo de PA utrltzad,a em "desenvolvimento organizacional" e em análises "sociotécnicas" encontra certas limitações devido à heteronomia das relações sociais. Em certos casos, a açã"o se limita ao nível dos executivos ou chefes de nível intermediário que estão inseridos no processo de PA para que, conjuntamente com os analistas, possam formular a solução de problemas ligados à gerência e sobre os quais eles têm uma "parcela" de poder. Procedimentos semelhantes podem envolver também os trabalhadores, so que sua ação é filtrada e canahzad,a no sentido de se conformarem aos objetivos da empresa: lucratividade, produtividade, qualidade dos produtos etc. A PA aplic ada nesse contexto estabelece, ao nível da investi gaçáo, uma forma de participação possuindo todas as ambigüidades da participação dos dirigidos no

plano político.

A questão do "misticismo" As propostas de PP e) em alguns casos, de PA, são consideradas como "místicas" por parte de certos sociologos. É o caso, em particulat, de P. Bourdieu, que é conhecido por tel criticado as técnicas de pesquisa convencional sem considerar que a PP ou outras

formas semelhantes sejam uma alternativa válida. Segundo esse autor, a PP teria mais a ver com uma "participação mística na prâtica". A idéia de PP não satisfaria às exigências da ciência social, segundo as quais é necessária a "análise teórica" da préúica de investigaçáo e de sua relação com o objeto investigado.

(7)

7

Pierre Bourdieu. Questions de Sociologie. Paris, Minuit, 1g80, p. 69.

'{ respeito do risco de misticismo, podemos observar que esre :'lt-r e inerente às propostas de PP ou PA. certas formas de misti-:smo e\istem em obras positivistas, por definição contrárias a tudo 'lue e metafísico ou místico, e também se manifesta até mesmo de -'c"jo paradoxalmente associado ao espírito de rigor logico. 8 \lesmo quando certos autores ou pesquisadores possuem ceri> :nclinações místicas, isto não é suficlente p ara considerar que a ; ir 3 a PA são essencialmente místicas. É necessário in'estigar con-r -.i:s cuidados formas de misticismo que possam interterir na crir-;lçào da investigaçã,o social, especialmente quando sào uriliza,Jos :'':trdos participativos e ativos, por exemplo. nos setores de estudr-r

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ufl icação ou da educação.

Transportada pata o plano místico, a relaçào comun icat ir a estabelecida pela pesquisa rámete aos fantasmas do vivido comunitário e ao espírito de comunhão. Não se trata de criti car o sentido humanista que anima certos pesquisadores nessas áreas. Não se trata de negar as razões de ser dessas concepções . É il.ir" ."idenciar melhor certas i*plicações extracientíficas. seria perigoso propor uma PP como se fosse mero instrumento de pesquisa científtca' neutra no plano valorativo, ou como mera altetnativa metodologica auto-suficiente. sem pano de fundo metafísico ou metasso-

cial' Esse pano de fundo tem a ver com normas e valores

humanos e é também relacionado com visões reli.-eiosas da sociedade. Não se deve confundir o nível d,a análise das relações

inter-humanas com o metanível da significação ideolo gizada ou "mistific ada,, do mundo social' Qualquer confusão entre esses planos prejudi ca a clarezados projetos de investi gaçã,o e d,á argumentos às pessoas que, por di_ versos motivos políticos e ideológicos, são hostis à pp e à pA.

Filosofia da Ciência De acordo com as nossas avaliações precedentes, pensamos que o desenvolvimento da PA não deva recair necessariamente nas posturas espontaneístas e ideológicas e que é possível manter a idéia de PA dentro de uma concepção da investi gação socioló gtça, da pesquisa edu cacional e da pesquisa em comunicação embasadas em elementos teórico-cientificos . (B) o tema é abordado por Bertrand Russer, Misticismo

Zahar. 1977 et passim.

e

Logica. Rio,

C.{RLOS RODRIGUES BRANDÃO (ors.)

92

da PA existe e ia foi especifiu-onte\to das chamadas "ciências da organizaçào" tais como Sãtr crrflcebidas pela corrente sociotecnica. E formulada. entre ourros. por \Í. Liu. que j ustihcou a PA dentro desse e campo de estudo corno sendo urna erigência científica. O catater atir-o da investigaçào j á eriste no proprio campo das ciências da natureza corno condiçào de observação. No campo socioorgafirzacional, a PA possui um aspecto "catalisador" objetivamente necessário paraobservar os fenômenos significativos. De acordo com atuais discussões da filosofia da ciên cta, a PA pode ser vista como uma orientação adaptada às especificidades do campo social, organizacronal e comunicacional. Trata-se de insistir na elucidação de processos complexos e não-seqüenciais nos quais está contida urna capacidade de inovação ou de criatividade. São processos nrarcados por urna srande diversidade qualitativa. Hoje em dia. ranto no canlpo das ciências da natureza quanto no campo das ciências sociais. essas ideias estão ganhando mais agdiência e opõern-se ao padrão da fisica clássica que foi transportado pelos positivistas à aÍea das ciências sociais. Essas idéias, é claro, não são objeto de unanimidade, mas são discutidas por um crescente número de cientistas, sobretudo entre aqueles que ainda possuem sentido crítico e independência intelectual para com as ideologias dominantes. Do ponto de vista sociologico, podemos salientar a irreversibilidade dos fenômenos sociais, seu çarâter holístico, não-repetitivo, emergente etc. Os fenômenos comunicativos e educacionais apresentam aspectos comumente chamados "cons çtenÍtzaçáo", "criatividade", "inovação" etc. Quando adequadamente concebida, a PA A

po srura c ientit'ica a respeito

camente iormula,Ja

nt-\

insere-se num processo social e pretende dar conta dessas diversas

qualidades que os investigadores tradicionais costumam negligenciar. Especialmente quando as pessoas ou grupos estão em situação de agtr, de tornar decisões , manifestam-se fenômenos qualitativos, inclusive no plano da significação e da elucidação que os instrumentos não apreendem. Entre outros aspectos, a presença do polo investigador faz parte da situ açáo investi gada e interfere na significação e nas possíveis interpretações . Na concepção dominante dos métodos de pesquisa, as propriedades emergentes e significativas (g ) M ichel Liu , Reftexions sur la Recherche -Action en tant que démarche de recherche. mimeo., s.d., 17 pâginas'

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

Qi

das situações de investi gação são mal equacionadas, ou até mesmo

negadas.

No campo da investigação social, qualquer ação, manipulação

ou medida exerce um efeito tornando ambíguo ; significado dos resultados, o qual está relacionado tanto com o fato observado quanto com as características do instrumento de observ ação. No tocante a fenômenos essencialmente qualitativos, fatos de significação cultural e política, não podemos frcar apegados ao quadro quantitativista dos positivistas. Apesar dos adestramentos escolásticos. ,Jer emt s re.lprr-irtrer i estudar a vida social na sLra "dir ersi,Ja,Je quJliratir.r". Isrr-, suptle que o padrão de quantiflcaçào de pefiornttntL €.t (pesos. rieqüen.ir.. intensidades etc.) não seja considerado como nec pltts ttltr-a da cientificidade. É possível estudar o social a partir de modelos de natu reza mais qualitativa e dando conta das transformações que ocorrem nas situações de observ açã,o. Os fatos evoluem. Nesta evolução, não se trata apenas de fenômenos cumulativos ou aditivos. Há também mudança na significação que adquirem os fatos observados pelos pesquisadores. Essa significação A, em parte atribuída pelos pes, quisadores em função das teorias e métodos que lhes são disponíveis' Não se pode entender esse tipo de complexidade somente a partir de um procedimento de medição de variáveis isoladas independentemente dos fatos de significação no qual interfere o próprio dispositivo de pesquisa.

De acordo com o espírito da "Nova Aliança" de prigogine

e

Stengers, precisamos superar o padrão da ciên cia clâssica no qual o observador é eliminado e a observ açã,o concebida de um ponto de vista exterior ao mundo.r0 Segundo esses autores, particularmente qualificados nas ciências da natnreza, até mesmo as ciências ditas "exatas" devem sair dos laboratórios. "As situações idealizadas não vão nos entregat a chave universal." O diálogo é necessário entre as

ciências

da

natureza, as ciências sociais , a filosofia e as outras formas de saber. Segundo Prigogine, não é mais privilégio das ciências da sociedade o fato de reconhecer como necess éxio ,,diálogo o como os saberes preexistentes a respeito de situações familiares cada um"' Continua o autor: "Como (1

já acontece nas ciências

0) llya Prigogine & lsabelle Stengers, La Nouvelle Attiance.

morphose de la science. paris, Gallimard. lõ1g,305 paginas.

de

da

Méta-

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (ore.)

94

sociedade, as ciências da natureza não poderão mais esquecer o enratzamento social e histórico que supõe a famitiaridade necess ixra paÍa a modelagem teórica de uma situação concreta. Mais do que

nunca, importa que não façamos deste enraizamento um obstáculo. ..'» 11

A disposição ativa do observador na situação observ ada, seu diálogo com as formas de conhecimento familiar e outros temas semelhantes são de maior relevância na concepção da metodologia das ciências sociais e adquirem respeitabilidade dentro das ciências da natutreza, embora tenham nelas significações e implicações diferentes . É da maior importância também o fato de conóeber-o diálogo com o conhecimento familiar, não como "capitulação teórica" ou como "diluição" no senso comum e sim como condição de uma

modelagem ou de uma teori zaçã,o mais adequadas. A nosso ver, independentemente das sugestões específicas dos referidos autores, mas de acordo com uma orientação convergente, a formulação de propostas alternativas em metodologia das ciências sociais pode apoiar-se em certos princípios discutidos na filosofia da

ciência ativa, segundo a qual é possível enco ntrar um caminho passando pelo diálogo com diversos interlocutores e diversos tipos de saber, inclusive a respeito das situações familiares e abrindo novos espaços para a teorizaçã,o. Esta concepçáo, diferente da visão unilateral e antidialógica dos pesquisadores adestrados em moldes convencionais, adquire particular relevo no contexto educacional e comunicacional. As suas diferenças encontram maior significação entre os próprios interessados. Essa concepção nos parece bastante sugestiva no contexto d,a discussão acerca de novos métodos de pesquisa de tipo PA. Uma yez afastadas as confusões relativas à visão ideológica ou mística , tratase de pensar a PA como sistema de expressão e de "escuta" inserida no movimento ou na práúrca social. Trata-se de captar expressões ou discursos que se manifestam em diversos momentos ou em diversas situações sociais. Os atores dessas situações não seriam mantidos em posição de simples informantes e sim interessados na própria conduta da pesquisa. Nesse sentido, mais do que uma técnica particular, a PA seria uma visão de conjunto contrária à reificante observação passiva que oferece possibilidades de utilização de tipo burocrático. Em lugar deste tipo de util izaçáo prevalecente, a PA oferece

(11) lbidem. p. 280.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

vi

outras possibilidades que são principalmente relacionadas com interesses das

os popurações consideradas. De acordo com a nossa concepção geral da metodologia, a pA uma proposta

é de investi ga,ção a .., ãrticulada dentro de uma ampla visão da açã'o e da inteiaçao social. A investigação não pode mais ser concebida de modo indiferente aos aspectos de interação entre investigadores e investigados . A pA inseie-se num processo . expressivo' interativo, inovado-r. consci entizador. É;; a orientação de metodologia socioló gica, podendo ser estendida a outras disciplinas e concretizad'a no contexto particular das pesquisas em educação, comun icação e organ ização. \ uma certa medida. é uma proposta de ruptura com as concepçôes e adestramentos dos pesquisadores convencionais, embora haja muitas possibilidades de ,,convivência" entre diversas tendências. É f...iro sublinhar que não é uma proposta anticientífica e sim uma proposta apenas diferente do padrão "cientificista" Que, hoje em dia, está sendo contestado, inclusive por parte de grandes cientistas da natureza.

Sociologia da ação Mais do que uma simples tecnica de pesquisa, a pA pode ser abordada como tema metoàológico dentro do conhecimento

sociológico' No estudo da sociologia, -rão existe ponte interm ed,iáriaentre as teorias gerais e as técnicas de p.rqriru E' verón: "A grande teoria traduz-se ao nívelempírica. como diz aa tecnica pelo

método de entrevista".12 como tema metodológico, a PA remete a uma série de problemas com respeito à questão da relação entre elaborações teóricas e captaçã"o de inform açáo empírica, o que situaria pA no território intermed iánio entre teoria e pesquisa o tem a d,a de campo. Ao lado desta delimitaçã'o, é preciso também .rp..in car aquestão da açã,o,

ou da

1elação entre pesquisa social e uçio. É bom lembràt q.r., independente de uma preocupação estritamente metodológico-emp

ínci, existe na tradição

sociológica amplas proble mattzações d,a açáo social, uma das mais conhecidas sendo a de Max weber. A ação social é central na sociologia

(12) Eliseo Veron, A produção do sentido, São paulo, r vvrv, Cultrix/EDUSp vL.rlrt'\,r-r.-r\J\)r, ' -YY

1981 . p.4g.

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

96

\\'eberiana e permanece central em diversas propostas sociológicas recentes, tal como, por exemplo, a tendência acionalista de A. Touraine, eue desembocou numa metodologia de "intervenção sociologica" intimamente relacionada com a PA. 13 Além disso, é bom lembrar que o tema da ação é também central em discursos de cunho positivista ou neopositivista, como é o caso dos discursos influenciados pelo funcionalismo, o sistemismo e a cibernética. Noutros casos, a análise da açáo é sistematrzada na ârea organi zacional sob forma de praxiologia e, nos estudos de comunióação, sob forma de "pragmâtica da comunicação". É interessante notar que certos autores influenciados por essas diversas tendências chegam a formular propostas relacionadas com a PA sem reproduzirem, é claro, a radicalidade da PA, quando concebida a partir de orientações críticas. A referência à noção de PA, por si só, não estabelece uma ruptura com certas formas de positivismo ou de instrumentali smo.

Em estudos recentes, pode-se notar uma nítida preocupação teórica em torno da açáo e também uma preocupação observacional, Apesar da diversidade das abordagens, vê-se a possibilidade de um novo espaço de problematizaçáo da relação entre teoria sociológica e procedimentos de investi gaçáo empírica. O dispositivo de pesquisa associado à ação seria um meio importante para levar a cabo essa proble matização. O que precede pode ser discutido ao nível geral da sociologia e também nos contextos específicos da pesquisa em educação, comunicação e org antzaçáo. Os aspectos educativos, comunicativos e organtzativos teriam a ver com formas de açáo social a serem analisadas como tais. São aspectos qualitativamente diversos, mas possuem fortes analogias a parttr das quais delineia-se a aplicação de

uma metodologia relativamente homogênea relacionando teoria e açáo e pesquisa sobre a açáo. Em todos eles, a forma de açáo envolve inform açáo

e

direção.

Capacidade de apren dizagem Na PA, uma capacidade de aprendrzagem é associada ao processo de investigação. Isto pode ser pensado no contexto das

(13) A. Touraine , op.

cit.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

9-

pesquisas em educação, comunicação e organi zação. o fato de associar PA e apren dizagem sem dúvida possui maior relevância na pesquisa educacion al, mas é também váliào nos outros casos.

As pesquisas em educação, comunicação e organ izaçãoacom.o*rnicar e organi zar. os ,,atores,, sempre

panham as ações de educar, têm de gerar,

utili zar informaçoes à tu*uém ori entar a açã,o, tomar decisões etc' Islo faz parte tanto da atividade planej ada quanto da atividade cotidiaru, I não pode deixar de ser diretamente observado dentro da pA. As ações investigadas envol,em produção e circulaçào de informação' elucidação e tom ada de dàcisão e ourros

aspectos supondo uma capacidade de aprendizagem dos parricipanres. Estes já possuem essa capacidade adquiridalu atividade ,;;;1. il.i.cunstâncias particulares da PA, essa capacidade tem de ser aproe enriquecida em função das e*igôncias d,a ação em 'eitada torno da qual se desenrola a investigação.

o processo de pesquisa insere-se remete a considerações estratégicas

na ação. sua orientação táticas, a partir das quais decisões são tomadas sua efetivação consiste na geração ' de informação adequ ada, a ser divulgada e aprove itada em determinadas capacidades de apr end,izagem ão. atores da situ ação.ta Numa relação de investigação convencional pretende-se, em nome da objetividade, fechar aJ máximo o mecanismo de cap tação, para que as respostas das pessoas interrogadas sejam emitidas sem et-eito de apendi zagem e sejam diretam.ãt.,,encaixáveis,,

e

naquilo que o investigador deseja mostrar ou justificar. Assim, perde-se de ista a questão da aprendizageme " da criação ao nível das pessoas ou irupos implicados na situação. Se fosse àp.or. itada, a capacidade Je aprend iz-agem permit iria produzi, umâ inform açã,o muito mais rrr--â e significativa' Seriu porrivel sup erar o caráter individual izado e istereotipado

irabalhada"

das respostas e possibilitar uma inform ação mais

e direcionada

.*

frrção das condições

da ação. No campo da comunicaçã,o, a PA ftata de inform açãocomuI i''-âda no senti'do d'a captação e também no sentido da divulgação. )s efeitos :

it'rS

de apr end'izagem podem ser observados em ambos os senos objetivos da lnvestigação,

' Entre

poJ.*os considerar que

o

(14) Em outro contexto, a interligação desses aspectos é sugerida pera tar como pá; Jacqr""-ú9te.se, ,,L,approche : -e Une transitio n?",",^di.:rtiã, syste_ in ; La renõontre àá-iiiàenieur r x r paris, Editionsd'organization, et du phirosophe, 1g80, pp.Bg-103.

' -'ã: sistêmica

;

:

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

J-

' '

princípio de identidade: quem age? como o autor de autodefine., princípio de oposição , uçào contra quem? como é definido o adversário?

'

princípio de totalidade

:

Independente

ação sobre o quê? ação em que terreno?

de alguns de seus pressupostos teóricos, esses princípios podem orientar, numa fase descritiuu,o repertório das expressÔes da linguagem dos atores em função dos elementos significativos designados na situação inves tigad,a. Há' também todo um

Équ. de outras

expressões da açã,o, relativas à radicalidade, novidade, extensâo ou intensidade etc. Em um nível superior ao de unt simples repertorio, as expressões d,a ação podem ser analisadas pelo, p.rquisaáores dentro a^. .onsiderações pragmáticas' o estudo da comunicação e, especialmente, da passa-qem da expressão ao ato remetem à pragmática, inclusive com o os freqüentes paradoxos que se manirestam

H:X:.Í;.:yidenciar o estudo da açã'o é muito diversificado.

Abrange ele os comportamentos conscientes ou não, flo nível das pessoas ou dos grupos, a ação planej ada e decidida em grupo ou instituições. No campo educativo e comunicativo há. , também aspectos simbolicos d,a ação ou, até mesmo, formas de ação simb olica. De modo geral, atos, comportamentos, projetos,, decisões, ação simbolica são aspectos a serem considerados e analisados a partir das expressões da linguagem da açã,o em situação. certas discussões de ordem sociologic a, liÃgüística e epistemológica são aproveitáveis para quem quiser conceber procedimentos de pA.

Aspectos metodológicos

A PA pode ser concebida como procedimento de natureza 3\ploratória, com objetivos a serem detàrminados pelos

pesquisa'lt)l'eS conjuntamente com os interessados. os resultados daexplo:ação são úteis pata eluci dar a ação e paradesenc

ad,earoutras pes;uisas' Na sua função elucidativa, pA a pode contribuir à formu_ (17) M. Thiollent, ,,A captação de informaçã9 nos dispositivos de pessocial: problemas de distorção e relevância" , Cadernos

Ceru, l6:g1_'105,

100

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO 1org.;

lação de objetivos, de reivindicações e outros meios de açáo. Ela pode funcionar conjuntamente com outras técnicas, mais convencionais, de menor profundidade e de maior extensão. Numa concepção de c arâter mais instrumental do que crítico, a PA pode serorientada em função da resolução de problemas com a participação de analistas e usuários. Nesse caso, trata-se de: 1) identificar problemas relevantes dentro da situação investi gada; 2) estru-

turar a explicaçã,o dos problemas; 3) definir um pro grama de ação para a resolução dos problemas escolhidos como prioritários ; 4) acompanhar os resultados da açáo por intermédio de diversos meios de controle (ver até que ponto o problema está sendo "resolvido" ou apenas "deslocado"); e 5) fazer uma síntese dos resultados obtidos em todas as fases. A compar açáo de várias sínteses pode chegar a favorecer uma generahzaçã,o do conhecimento alcançado em todas elas. Esse procedimento de PA, ou algum semelhante, é formalmente utlhzado por especialistas em sociotécnica e análise de sistemas e, nesse caso, não é incompatível com o prevalecente positivismo.

A PA pode ser orientada especificamente para o contexto da tomada de decisão. Nesse caso é necessário detectar todos os grupos, os fatores e os critérios interferindo na decisão de uma ação. Esse caso possui analogias com o precedente.

A PA não é unidisciplinar. Embora seja ela de origem sociologica ou psicossociológica, a PA abre um espaço de investigação no qual podem se entrosar especialistas de várias disciplinas (ciências sociais, economia, educação, comunicação, organ izaçáo e tecnologia). Nos casos que nos interessam, a PA pode agrupar as disciplinas de base, de modo a privilegiar, em diversas situações, o equacionamento dos aspectos educacionais, comunicacionais e organizacionais. A interpretação dos fatos observados e dos dados colhidos não deve ser deixada ao senso comum nem aos impulsos dos participantes. Os pesquisadores profissionais envolvidos na PA trazem a bagagem teórica que possuem para estabelecer explicações e interpretações adequadas. Estas são expressadas sob forma popular para serem, pelo menos aproximadamente, entendidas pelos não-cientistas que, eventualmente, possam enriquecê-las. A interpretação é praticadapelos especialistas, mas não é monopolizada por eles, pois

é constantemente submetida ao entendimento dos membros

dos

grupos implicados. Todas as sugestões destes últimos são levadas em c

onsideração.

I (-,1

cARLos RoDRIGUES BRANoÃo (org.)

Conclusão :1

Sem retomarmos todos os aspectos abordados nas precedentes notas, concluiremos com um posicionamento favorável à pA. Embora essa concepção da pesquisa, a ser distinguida da pp, possa ser invocada por pesquisadores pouco escrupulosos, consideramos 9ue, pelo menos no plano ideal, ela possui certas qualidades metodológicas a serem devidamente exploradas. A eventual inconsistência de certas pesquisas não está ligada à presença ou à ausência de uma preocupação de tipo PA. Pois, nos meios contrários a esta orientação, é facil encontrarmos numerosos relatórios de pesquisa de opinião e de atitudes que, no seu gênero, são obras-primas de inconsistência metodoló gicae sociologicá. A PA não consiste na adoção de uma simples participação dos pesquisadores no meio investigado e não significa o abandono das preocupações teoricas da sociologia ou das outras disciplinas envolvidas no estudo da educação, da comunicação ou d,a organi zaçáo.

Boa parte da teoria sociologica está centrada na análiú da açáo social' O desenvolvimento da PA não pode ignorar os princípios da teoria da açã"o. Quando adequadamente direcionada no plano teórico, a PA pode contribuir para o estudo de situações, instituições,

movimentos ou processos sociais nos quais está em jogo uma açáo

coletiva. Além disso, a inform açáo captada nessas circunstâncias pode ser objeto de diversos procedimentos cujos resultados seriam cotejados com as interpretações teóricas. Parece-nos necess ário evi-

tar os riscos de uma eventual "demissão teóri ca" que faria recarr investigação Ílo "espontaneísmo" e noutras formas de desvio.

a

Mesmo reconhecendo QUe, em certos contextos, a PA é associada a valores, ideologias ou até mesmo formas de misticismo, não podemos condenar as tentativas de tipo PA, na medida em que são portadoras de possibilidades metodologicas diferentes da orien tação convencional. A exploração dessas possibilidades pode ser encaminhada de modo relativamente independente da quástão dos valores. Algumas dela_s são de grande relevância do ponto de vista das atuais discussões sobre a filosofia d,a ciência, .rpLrialmente no tocante à diversidade qualitativa no real e as exigên.iu, de diálogo entre diversas formas de saber que não se deixam mais enquadrar num padrão

úrnico de abordagem.

Nos campos da edu caçáo, comunicação e organi zação, a pA exige dos pesquisadores uma grande dedicação e o simultâneo domínio das questões teóricas e práticas da investi gação. A pA é o

,' REPENSANDO . .. ,

A PESQUISA

PARTICIPANTE

rr,,:

contrário de uma "receita" ou de uma"panacéia". E sobretudo uma orientação de pesquisa cuja aplicação, experime ntação ou intervenção não exclui outros recursos técnicos mais convencionais que per-

manecem necessários em determinadas circunstâncias.re O papei da metodologia consiste em descrever e avaliar as propriedades, qualidades, insuficiências e distorções que são inerentes a cada tecnica. A lA não pretende substituir todas as outras. Em particular.

ela

5e

aplica a grupos de pequena ou média dimensão: recnicas n:sis abtangentes sempre serão necessárias. No entanttr. o D:rn; rr j. ü..safio da PA consiste em produzir no\as torrn:s üe J.\:i.e;r:rií::.-, social e novos relacionamentos entre pesÇ u:sadrre e = lesy;:,=.j.,ie novos relacionamentos de ambos ç-orrr r) saL,er. para enfrentar tai desafio, é claro que a PA precisa ser utilizadadentro ,Je uma prob,iemática teorica de orientação crítica e não apenas instrumental.

(19) Tema anteriormente abordado no nosso artigo: "lnvestigacionin Chasqui. Revista Latinoamericana de Comúnicacion, 1:TGTB,

AcciÓn", 1981.

E,lementos metodológicos d a pesquis a particiPante* Pedro Demo** Tentaremos fazer uma aproximação metodológica da Pesquisa Participante (PP), tro sentido de elaborar algumas referências fundamentais para se constituir como gênero de pesquisa. Preocupa na pp, entre outras coisas, até que ponto é mais participação do que pesquisa e em que medida participação pode ser uma maneira de descobrff arealidade e de a manipular. A crítica feita aos métodos tradicionais de pesquisa deve vir acompanhada de uma contraproposta. Diríamos QUe, pelo menos sob forma latente, existe na PP uma contraproposta. Mas existem igualmente sérias fragilidades metodológicas, desde a pretensão vã de se constituir na única forma válida de pesquisa, ate posturas meramente ativistas que banalizarn não só a idéia de pesquisa, mas também a idéia de particiPação. A PP tem tudo para ser apenas a próxima farsa. Em Yez de superar a decepção hist orrca com respeito à utilidade das ciências roôiuir paraos dominados, pode refinar os controles sociais vigentes e, num pacote bonito, esconder um "presente de grego". A farsa não seria, de modo algum, peculiaridade de instituições oficiais ou

|NEP,

(*) Cap. Ill de: Pesquisa Participante: mito e realidade, Brasília, U nB/ 1982. _ (**i'O autor é sociologo; foi secretário-geral do MEC na gestão do

Ministro Eduardo Portella. E prôtessor do Departamento de Ciências Sociais da UnB e sociologo do lnstituto Nacional de Estudos Pedagogicos - INEP.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANI"E

governamentais, sempre muito comprometidas com a ordem vigente. Ela não é menos possível entre os pesquisadores que se querem de "esquerda", quando, por exemplo, não problematizam sua identidade com os dominados. Ao mesmo tempo, banqueteiamse na PP, por vezes, precisamente aqueles pesquisadores mal formados e medíocres, que alimentam a esperança à. ,., reconhecidos pela fumaça que levantâffi, porque na verdade não possuem fogo. Ademais, a PP ainda vive, de modo geral, mais do entusiasmo do que da fundamentaçáo teórica. Alguns simplesmente se retusiam no materialismo histórico. transformando-o numa "receita cuiinaria", ou seja, precisamente naqurlo que se re_ieitar a ne F,esüu:s3

tradicional. outros manipulam a ideia raga,J. que

a*i

esrruturas de

poder precisam ser superadas. tendo em vista a presenr,-a maciça de marginalizados, mas não refletem sobre a questâo vital. a de que nenhuma sociedade sobrevive e se orga nrza sem estruturas do poder.

A participação não elimina o poder, mas busca uma

alternativ'a

democ úfitca dele. As questões são inúmeras. Não podemos pretender exauri-las

mas tão-somente levantar alguns elementos metedologicos para aclar ar a problemá tica.

Teoria e pr ática "Para as ciências sociais, uma teoria desligada da prâtrcanão chega sequer a ser uma teoria. E é neste sentido que muitos diriam ser a prâtica o critério da verdade teórica. " No entanto, não se pod e dizer que a prâttca seja o critério da verdade, pura e simplesmente. E um critério da verdade porque o simples fato de uma teoria chegar à préttica não a faz necess ariamente verdadeira. Porquanto de uma mesma teoria podemos dedu1

zit várias práticas

opcionais, inclusive contraditórias. Assim , da teoria marxista existem muitas práÍrcas, até mesmo contraditorias, e se a mera ptáttca tornasse todas verdadeiras, teríamos verdades contraditórias. Neste sentido

, para estabelecermos

a verdade

sempre rela-

tiva de uma precisamos de outros critérios -mais, como sua - teóricateoria, solidez e lógica, sua capacidade de objetiv ação, sua ade(1) P. Demo, lntrodução ria e Prática".

à

metodotogia

da ciência, op. cit., cap. ,,Teo-

106

CARLOS RODRTGUES BRANDÃO (org.)

quação histórica e assim por diante. Mas é correto afirmar que, se uma teoria não leva à prática. nunca foi sequer teoria, porque será um discurso irreal ou alienante. de outro mundo. Ai ia temos uma característica fundamental da prâtica: é sempre uma opção da teoria que a fundamenta por trás. Da mesma bíblia pro duzem-se muitas seitas. Não é possível imaginar que de uma mesma teoria se derive uma unic a prâtica, a não ser sob o peso do dogmatismo e do fanatismo. O fanatismo é precisamente isto: parte da necessidade de interpr etaçã,o única, da qual derivam uma prática exclusiva, fora da qual não há salvação. A partir daí, outra característica da prática é seu traço concreto, ao contrário da teoria, que é generahzante. Assim, não se pratica toda a teoria, mas versões concretas dela, o que quer tambem dizer que a prâtica tende a ser exclusivista, porque opcional. A teoria usa conceitos universalizantes, mesmo porque esta é uma marca propria de qualquer conceito em sentido logico. É uma abstração e que, Por isto mesmo. diz respeito a todos os casos concretos cobertos por ele. mas não é em particular nenhum deles. O conceito de democracia aplica-se a todos os casos concretos historicos, aos quais imaginamos poder ajustar seu conteúdo teórico, mas não se esgota nos momentos particulares subsumidos. Assim, podemos dizer que a democ racia americ ana é tão-somente um caso possível do conceito geral de democ racia. S eria obtuso pretender mostrar que o caso concreto da democ racia americ ana esgote a potencialidade do conceito geral de democ racia. Quando, porém, optamos pela democracia, não praticamos o democtacia, pois isto seria mera abstração ou fuga teórica, mas uma versão historicamente condicionada dela, ou seja, a versão gÍega, suíça, brasileira, do capitalismo liberal, ou outra qualquer, e assim por diante. Que cada democraçia em particular levante a pretensão de ser a unica possível, isto já é uma questão ideologica de auto-

justificação, buscando manter-se e impor-se. À sombra desta característica aparece outra que é o caráter limitonte da prática, €ffi face da teoria. Toda prátiôa apequena a teoria, porquanto não ultrapassa a condição histórica de uma versão dela. E é neste sentido qu e a prâtica sempre também trar a teoria. É comum ouvirmos que na prática a teoria é outra. Uma coisa é a realidade teoricamente estruturada e sistemat izad,a, outra é a realidade como se dá efetivamente no mundo real.

Assim, toda prâtica, âo mesmo tempo que realtza a teoria, também a limita, no sentido de que não consegue esgotar todas as

.:

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

potencialidades teóricas. A teoria contém geralmente elementos utópicos, quer dizer, irtealizáveis historicamente. euando dizemos que a democracia é o "governo do povo, pero povo e para o povo,,, ttata-se de uma afirmação teóricá , iá qu. na préttica não se constata que o povo' e111 pessoa, chegue ao governo. Chega somen te através de representantes 9Ue, pretensamente, o representam. Na prática, pois' a democ rucia não é governo do povo, mas de seus possír,eis representantes, o que introduz tnitrr..à, limitações conhecidas dos processos democráticos

.

[Jma coisa, para tomarmos outro exemplo. seria o sLrcia]ism,-., como se desej a nateoria; outra coisa e o socialismLr conlo e r jar ei ni.l ptática' A ditadura do proletariado nào passou ate hoje de uma pretensão teórica; na prática a ditadura e do parrido. E interessanre notar, por esta otica, a evolução do socialismo ao tempo de Lenin. Em teoria, o socialismo deveria ser universal, o partido de'eria ser apenas orgão da massa ) a superação das necessidades materiais através da produção ilimitada dev eria ser condição previa e assim por diante' Na ptática. Lenin introdu ziu a modifi cação do ,,socialismo num só país", abandonou a rd,eiade espontaneidade da massa (desentendeu-se, por exemplo, com Rosa Luxemburgo) e teve de se virar num país subdesenvolvido. Por isso mesmo, o socialismo soviético é somente uma versão possível. A idéia de que a única interpretação possível do socialismo deva ser a soviéti ca e dogmatismo primário e excrescência ideologica.

Ademais, toda ptática e necessariamente ideologica, porque política. Nã;; á;;;t".oriu não seja também ideológica, porquanto o próprio distanciament;il;; , prática significa um tipó de compromisso ideologico. Mas a teoria pode se realrza dentro de uma opção

imaginar-se pura, isenta, objetiva, enquanto a prática sequer iza sem a imissão ideologica. Na verdade, assume diretamente a ideologia e e a reali zação de uma ideologia. por isso é um traço típico das ciências sociais, que possivelmerie não se aplica às ciências naturais ' A fisica, por exemplo, tem o problema de sua utilização social, mas não é uma práiica intrínseca. Embora façaparte do projeto de socied ade, poryu. é um produto também social, a ideologia aparece no tratamento dado à realidade Íísica, não nela mesma ào passo que a realidade social é fundamentalmente ' WáLtica, e por isso intrinsecamente ideológica. A ideologia não aparece somente na opção de ttatamento científico dado a rãalidade social, mas na próptia constituição da realidade social, porque está inevitavelmente polarizad,a entre opções históricas e políticas possíveis. se real

108

cARLos RoDRTGUES BRANDÃo

(org.)

Não é somente dada, como a realidade fisica e; é também produzida, interpr etada, conflituosa e potencial.

A prâtica é condição de historiciclctcle da teoria; caso conttâtio, não acontece. A mera teoria é uma fuga da realidade. Mesmo que aptática limite a teori a. atraia e a deturpe. não há hist óriareal

precisamente sem limitações. sem traiçôes e sem deturpações. Ãi está toda a gran deza da prática: a de ser real ização histórica con-

creta.

Recompõe-se nisto a qualidade dialetica do relacionamento entre teoria e prátrca. Ambos os termos se necessitam e se repelem,

numa identidade de contrários. Quer dizer, um não existe sem o outro, mas cada um possui densidade própria, que o possibilita um relacionamento dinâmico. De um lado ternos a propensão absolu-

tizante da teoria. Somente em teoria podemos imaginar uma ciência totalmente evidente, verdadeira, acabada. Na prá tica, e um produto historico. ou seja. limitado. relativo. processual, infindável. A teoria pode ser absoluta' abstrata. utopica, universal; prática, vez, é relativa. concreta, real izada, particular.

a

por sua

O conteudo fundamental da historia e sua incompleição, não como defeito, mas como marca propria. A tradução mais concreta desta incompleição é o conflito, entendido como fenômeno intrín-

seco e normal' A historia é dinâmica, produtiva, criativa, nova porque é contraditória. O factual nunca esgota o possível. O rcayzado não consome a utopia.

Dizemos que é mister "sujar as mãos com a prática,, porque se usa a idéia de que a ptática nos leva a compromissos atacáveis. Mas

isto não é um defeito;

é característica da historicidade

dialética.

Porque não há outra maneira de se fazer história, a não ser comprometendo-se com opções políticas concretas. Como, porém, toda histótra é intrinsecamente defeitu e é por isso que se mantém histórica -, os Çompromissos históricos porru.m conseqüentemente defeitos' Toda prática histórica pode i., conden ada, diante de outras opções adversas. Porquanto a prática não esgota a história, mas a realiza relativamente.

O teórico foge muitas vezes da prártrca, porque tem medo da condenação histórica, do compromisso atacáwel. prefere

criticar

a propor, porque toda proposta, se for prá ttca, é também atacável, qois não repres entará" a perfeição histórica, mas uma versão dela. Todavia, a fugu da prática é, à revelia, uma práúrca, uffi tipo de compromisso político, geralmente conservador. Assim , &o querermos não sujar as mãos, sujamo-las mais ainda, ou por malandra-

gem, quando escamoteamos compromissos escusos e que não gostamos de revelar, ou por inocência útil, quando não .h.gu*ú a tomar consciência do compromisso latente qu e é a

misso.

falta de óompro-

Não existe verdade absoluta. Na prática, ela é relat tva, histórica; quer dizer, superável. Nem por isso o conceito de verdade absoluta perde seu sentido. Ao contrário, faz parte integrante do processo científico, sem o qual nos satisfaríamos com os produtos relativos' Para não recairmos no simplismo de que uma determinada versão científica se erua em parâmetro final, é mister voltar à

teoria que, effi sua pretensão absoluta, encontra sempre suficientes defeitos históricos paÍa a declarar superável. É preciru*.rrte este o papel da utopia; não é historicamente realizâvel, mas faz parte

história' onde não há utopr&, sacrali

da

za-se uma situação dada, como

sejá não houvesse alternativa. Assim, não podemos sacrifi çar a teoria em nome da prátrca, nem a ptática em nome da teoria. Nada faz tão bem à teoria como sua ptática, e vice-versa. A prátrca, por estar exposta a todas as fragilidades históricas naturais, não deixa de ser importante, assim como a teoria, por ser uma construção abstrata, não é inutilidade

YAZta.

A discussão em torno da consciência verdadeira coloca adequadamente este problema. Como sabemos que uma consciência é ou não verdad eira? Por exemplo, ao atribuir ao proletariado consciência verdadeira, e aos burgueses consciência falsa, eue argumentos se usam?

Esta questão não tem solução fech ada, porque na prática não existe a consciência absolutamente verdadeira, mas uma consciência relativamente verd ad,eira, dentro do espaço e do tempo em consideração' Não temos argumentos cabais, mas há os relativos. por exemplo, o proletariado per faz a maiori a da sociedade; é quem realmente produz, embora não tenha a posse da produção; é quem representa a contradição da sociedade capitalistà e a potencialidade da mudança; são os excluídos do proã.rro; e assim por diante. Tudo isto não é argumento cabal, porque a maioria não precisa ter razáo,

porque os marginalizados também sofrem de alienação social, porque o burguês também pode apreender criticamen te arealidade etc. relativamente válidos e que possuem sua ver-

Ytt ?i". lt$u*entos oaoe hrstorrca.

Se a questão for fechada, perde-se a tônica do argumento e passa-se à submissão à autoridade. No socialismo, atribui-se nor-

110

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

malmente consciência \ erdadeira ao partido, que a define em seu conteudo concreto. Isto pode serjustiflcado. em nome de uma práLtica historica. no sentido de autodetesa ideologica. Mas é claro que pre\ alece o "argunleÍrtt-)" ,Je autoridade. Tal característica pode tacilmente ser apreendida nos momentos em que se põe em questão a condição do parrido como representante le-qítimo do proletariado. No caso da Polônia,, quem tem consciência r.erdadeira: o partido ou o povo contrário à condução partidária? Assim, parece claro que: 1) pelo simples fato de ser ptâtica, uma teoria não precisa ser verdadeir a; 2) não se define a consciência verdadetra fora de uma prática ideologrca, ou seja, não hâ somente argumentos, mas opções políticas concretas. Quando se assume uma prâtica, opta-se por ela, com virtudes e defeitos. Lança-se mão da ideologia para justificar a pratrca, para enaltecer as virtudes e para encobrir os def-eitos. Tudo isso e simplesmente historico. Quem nào tir er corasenr de assumir tambem os defeitos da prâttca,jamais chegará a prática. Prrr r)urra parre. tlca patente que toda prática possui tendência

it'isra. porque é uma marca propria da ideologia, a busca de autodefesa. Duas dimensões são aqui vitais: em teoria defendemos

e-rc/rrs

facilmente o pluralismo ideologico; na prátrca, pratrcamos nossa ideologia. Por ser opção polítrca, excluímos as demais; caso contrário, seria indiferente assumir qualquer pratrca. Assim, náo hâ decisão histórica práúrc4 sobretudo aquelas mais ostensivas e contestadoras, sem pelo menos um pouco de fanatismo, porque é em nome dele que se chega a dar a vida por um projeto político determinado.

Quem passa a vida "em cima do muro", não faz história, ou

é

tragado por ela. Por medo do compromisso, inutiliza sua passagem pela história, ou serve a compromissos escusos. Isto significa, de

novo, que não hâ como fazer história, sem "srrjar-se" com ela. Todavia, por causa disso, é importante demais sempre voltar à teoria, paru aperceber-se do fanatisffio, para aprender de outras prâtrcas e para, se for o caso, até mu dar de prática. Quem não volta à teoria, deixa de ser crítico e autocrítico, submergindo no ativismo fechado e obtuso, e passa a condenar tudo que não esteja de acordo com sua teoria ou com sua prâttca. Em ciências sociais, a dialética entre teoria e práútca é condição fundamental da pesquisa e da intervenção na realidade social. Se admitimos que estamos de qualquer maneira comprometidos, já

não levantamos a pretensão tola de nos isentarmos de qualquer

1llqmll"

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

compromlsso, mas vamos logo àquilo de que se trata de fato: que tipo de compromisso vamos justifi car?

Ao mesmo tempo, a prâtrca é elemento metodológico inte-

grante do processo científico, tanto no sentido de servir de constante leste para a validade da teo ria, quanto no sentido de assumir que

a

propria pesquisa é uma intervenção na realidade. Assim, effi ciências sociais , a prática é uma forma de conhecimento, porque através dela testamos o conhecimento vigente e produzimos o noyo. bem como dialogamos dinamicamente com a realidade e conosco mesmos, na medida em que também fazemos parte da realitJa,Je socrai. Sem o componente da prática. nossa reoria nào tlca hisrorica: produzimos a típica alienação acadêmica de r er o mundo arra\ és da sala de aulas. Ao mesmo tempo, recebemos uma tbrmação alienada. porque não nos serve na manipulação da realidade, nem temos noção clara daquilo que é viável, daquilo que é possível, daquilo que

é realizável.

O senso de relativa inutilidade que assola hoje as ciências título de rigor lógico e de objetividade, montamos a farsa à. .*pectadores de sociais se deriva em grande parte do absenteísmo prático. A

um estranho circo, do qual, contudo, somos necessariamente atores. Não adianta escamotear a ideologia. E melhor discutir qual é a

preferencial.

A

prâtica ttaz novas dimensões ao conhecimento científico

social, que são essenciais para sua construção. Em primeiro lugar, obriga à revisão teórica, porque na prática toda teoria é outra. Em segundo lugar, leva o cientista a "sujar" as mãos, tornando-o concretamente histórico, ou seja, ao mesmo tempo aproveitável e condenável. Em terceiro lugar, assume a opção ideoiogica e pratica a se dá ao escamoteamento de suas justificações políticas. Em quarto lugar, pode colaborar no controle ideológico, na medida em que não se da ao escamoteamento de suas justificações políticas. Em quinto

lugor, torna a teoria muito mais produtiva, porque a obriga à adequar-se a uma realidade processual, inquieta, conflituosa, que pouco tem a ver com uma visão muito arrumada e estereotipadà da realidade sociai. Em sexto lugar, submete a teoria ao teste saudável da modéstia, porque em contato com a realidade concreta e política descobre-se facilmente que uma coisa é o discurso, outra a práttrca. Não esgotamos a realidade, nem temos toda a verdade na mão; somos apenas pesquisadores, ou seja, gente que duvida, Que erra,

que deturpa, mas que, sabendo disso, quer redu zir o desacerto. Em sétimo lugar, leva ao questionamento constante da formação aca-

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

dêmica, centr ada em superficialidades e irrelevâncias, que divertem a alien açáo universitária mas que não conseguem tornar as ciências sociais baluartes concretos de realizaçáo humana, de salvaguarda da democracta, de vigilância indomável contra as desigualdades sociais.

Em oitavo lugar, repõe a importância do componente político da realidade, a qual não somente acontece, mas pode, pelo menos em parte, ser conduzida, influen crada, redirecionada; a prática traz a oportunidade histórica de construirmos, até onde é possível, nossa propria historta, para que o projeto político seja expressão da sociedade desej ada, ou pelo menos tolerada.

Não conseguimos, a pretexto de objetividade e isenção analítrca, nos colocar fora da história, actma dela, ou ao lado dela, imaginando que isto nos daria condições melhores de a conhecer. Nos mesmos somos produto histórico. Por isso estamos imersos na práúrca, também quando desejássemos fazer pura teoria. Porquanto a alienaçáo é uma maneira de fazer historia, mas é péssima, porque sequer sabe disso. Não conseguimos ser meros observadores de uma

trama que é necessariamente nossa. Por outro lado , a pratica não pode ser a porta escanc arada da devassidão ideologica. Se for prâttca no contexto científico, há de predominar o argumento sobre a ideologia. Ao dtzermos que a práttça é necessariamente ideologica, não quer dtzer que seja só ideologta cientificamente apreendida e controlada. Se não perdermos o relacionamento dialético entre teoria e práttca, fica mais fácil evitar o ativismo e o fanatismo de uma prâtica quejá desfez a sensibilidade pela teoria crítica.2

Postura dialética E praticamente impossível a PP fora de uma postura dialética. Sua forte crittca à pesquisa tradicional acaba coincidindo com a reivindicação de uma metodologia própria para as ciências sociais, que não tenta imitar tacanhamente as ciências naturais. Tal postura pode vir macul ada pelos excessos mais ingênuos, desde imaginar que a dialétrca acabe com a logica e a experimentação, até imaginar

(2)

A

. S. Vasq uez, Filosofia da

Práxis, Rio de Janeiro, Paz e Terra

1977; F. Chatelet, Logos e Práxis, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1972; Dialetica do Concreto, Rio de Janeiro, Paz e Terra , 1976.

,

K. Kosik,

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

113

que a dialética seja a tábua de salvação das ciências sociais e da humanidade. 3 De todos os modos é preciso visu alizar algo da dialéti ca para entender muitas das pretensões da PP. Todavia, temos aqui um problema logo de partida: a draletica, como qualquer outra meto-

dologia, não é unitária. É um erro primário r.rpo. que a única dialética possível ou aceitável seja o materialismo dialético. por isso, torna-se difícil compor elementos gerais da d,raletica, no sentido de serem bem comum de todas as versões praticadas, mesmo porque há as antagônicas. Seja como for, levantamos aqLli alguns elementos pata início de discussão e que são necessárir-rs para aprec'fldermos certos rumos da PP.

Num primeiro momento, r'ale dizer que a dialetica é r'ista

como a metodologia propria das ciências sociais. Isto nào precisa coincidir com exclusivismos, como se as ciências sociais não pudessem lançar mão das metodologias das ciências naturais. Porquanto não há pureza metodológica, mas relativa especificidade. O que permite uma definição própria, mas igualmente a convivência com outras , ainda que conflitos também. Não e fácil mostrar que as ciências sociais trabalham com uma realidade tão específica que merecem ser tratadas especificamente do ponto de vista metodologico. Mas não é problema muito diferente aceitar que a realidade é unitá rta, devendo-se, pois, aplicar a ela metodologia unttária, retirada dos cânones das ciências naturais. Na verdade, isto depende da concepção de realidade, Que pode ser explicitada, mas não propriamente demonstrada. Não dá para mostrar dialeticamente que a realidade é dialética. Temos ài, pois, uffi ponto de parttda, já que não há partida sem ponto, mas que é um pressuposto no sentido lídimo do termo: supomos que seja assim, pelo menos como hipótese de trabalho. Em todo caso, a Pp supõe que assim seja e por isso lança mão da metodologia díaletica. a Ao mesmo tempo, desiste-se da idéia de que a dialética seja metodologia unitári a paÍa todas as realidades. Ela serve para captar (3) H. Lefebvre. Logica formal /logica dialetica, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1975; J.-P. Sartre, QuesÍão de método, São paulo, DIFEL, 1972; M . Harnecker, Los conceptos elementales det materialismo historico, Buenos Aires, Siglo XXt, 1972; A. Cheptulin, A diatetica materialista, São Paulo, Alfa -Omega, 1982; B. M. Lakatos e M. de A. Marconi, Metodotogia científica, São Paulo, Ailas , 1982. (4) H. Marcuse, "Zum Probleme der Dialektik", in Die Gese/schaft, 7 (1930); H . Frey, Socio logia, ciencia de ta reatidad, Buenos Aires , 1944.

tt4

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

paÍa fenômenos historicos , caractertzados pelo constante devir, não ' que dados.s são naturais, fenômenos captar Caracterrza profundamente a dialética a idéia de que toda formação social é suficientemente contraditoria para ser historicamente superável. Embora nem todas aceitem isto, serve como ponto de partida. Privilegia-se na realidade seu lado conflituoso, não como defeito, mas como característica historica natural. No fundo, entende-se o histórico como conflituoso. A superação histórica é um fenômeno natural, porque predominam conflitos, não somente conflitos de menor porte, mas igualmente conflitos que não conseguimos resolver e que decretam o término de um sistema dado. Tais contradições não são extrínsecas, embora possa haver; são intrínsecas, no sentido de que fazem parte constituinte da realidade. A historra é irrequieta, inacab ada, superável, porque é contraditória. Uma historia não contraditoria coincidiria com uma história parada, tranqüila, onde jâ nada acontece. Ou seja, não é um fenômeno histórico. A pedra de toque da dialética e o conceito de antítese. Do seu entendimento surgem as mais variadas versões dialéticas, inclusive contraditórias. De modo geral, antítese signifi ca a vigência de contradições dentro de determinada formação social, ou seja, a convivência num só todo de polos contrários, o que resulta na identidade de contrários. Se a antitese for radical, leva à superaçáo do sistema, porque reflete um conflito que o sistema j â náo consegue absorver ou resolver. Se a antítese não for radical, determina a manutenção do sistema, ainda que introduz modificações internas. Simplificando as coisas, as superações históricas são trabalhadas por antíteses radicais que levam a mudanças do sistema. Antíteses não radicais induzem mudanças dentro do sistema ou a relativa manutenção da situ açáo dada. De todos os modos, a realidade histórica é uma polarizaçáo intríns eca e nisto exercita sua dinâmica própria de uma totalidade em infindável processo de mudança. A histona é uma sucessão de fases. O conceito de fase introduz os dois movimentos típicos da antítese: existe a persistência histórica relativa, sem a qual a fase não se institu cionaliza; mas não

(5) Assim, a idéia clássica de Engels de construir uma "dialética da natureza" estaria em decadência. A natureza possui talvez cronologia, mas não propriamente historia; está estruturalmente dada, e por isso não é propriamente produzida na e pela história.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

I15

passa de fase, ou seja, é provisória, porque nahistória tudo nasce. cresce, vive e morre. Embora seja correto que a dialé trca privilegia o fenômeno da tran sição historica, ela faz parte

ocidental, ou

sej

a, também

da visão metodológica da ciência

é no*o tettca. concebe-se como esquema

explicativo de mudanças historicas, mas não desaparece com o desaparecimento dos sistemas. contem, pois, formalizações e é, no fundo' um tipo de logica. Elabora, senão leis do devir. pelo rrenos regularidades do acontecer. Ao aplicarmos a certo tipo ,Je tentr*Ê.r,.r histórico o conceito de revolução. suponros grr.- e ilr rt-rrj jL, rr-:r; de mudanÇas radicais, muita coisa aí sc re pi--id. iJrir, c-!, >.. :1.:;"

Lmesmo conceito. Ao mesmo tempo- se aceitamos que a histrrns ptrrJe tambem ser feita e planejada- isto somente é possír el >e a adnritimos pelo menos regular, para ser previsível e manipulár'el Decididamenre.

não sabemos trabalhar com uma realidade que fosse irregular. imprevisível, caótica ou totalmente subjetiva. pelo menos um lairo de determinismo é típico de nosso modo de fazer ciência. Mesmo a história não acontece de qualquer maneira, mas é tal sorte que tudo o que acontece na história condicionada, de é historicamente explicável' Por mais que o salto seja qualitativo e radrcal, foi causado por fatores antecedentes. Não cai do céu, nem é puramente decidido pela vontade humana. Há também um modo próprio de ver o relacionamento entre sujeito e objeto derivado da concepção específica de realidade social, não apenas fisicamente d,ada, mas também construída na história. A consciência históri ca e a possibilidade de intervenção humana são constituintes centrais deste processo. Entre sujeito e objeto não há mera observaçã'o por parte do primeiro, nem imposição evidente por parte do segundo, mas interação dinâmica e dialetica. Acabamse identificando, sobretudo quando os objetos são sujeitos sociais também, o que permite desfazer a idéia de objeto, Que caberia somente em ciências naturais. Ao mesmo tempo, dentro do quadro d,a teoria e d,a prátrca, admite-se como central o componente político, definido como a participação e intervenção do homem

o que determina a

nos acontecimentos históricos,

ideologia intrínseca da realidade social,

nunca é apenas dada objetivamente, mas também

que

construída socialmente' Embora objetivamente condicionada, o fato de que nossa história se desenrole da maneira que aí está é uma das opções

políticas

pos síveis

.

i

i6

CARLOS RODRTGUES BRANDÃO (ore.)

Colocados tais elementos esparsos. surgem já algumas divergências, o que ocasiona versões diversificadas na prática. Algumas dialéticas são mais "objetivistâs", porque acentuam os condicionamentos objetivos' E o caso do materialismo historico. que admite a intervenção política humaLà, mas determinada em última ins tància

pela infra-estrutura econôm tca. Outras são mais subjetivistas, do tipo hegeliano, que vêem a história mais feita pelo homem do que acontecida objetivamente. E outras procuram um meio termo, atribuindo ao elemento político o mesmo peso dos elementos ditos

infra- e struturai

s

.

Ademais, a visão da antítese historica e variada. No materialismo histórico predomina a tendência de considerar o capitalismo o último modo contraditório de produção, que baseia a idéia constante de entender a históri a até ao capitalisrno como pré-história. É incisivo este texto da contribuição à crítica

da uroio*ia política;

"A traços largos, os modos de produção asiático anti.go, feudal e , burguês moderno podem ser qualificados como épocas progressivas da form ação econômica da sociedade. As relações de produção burguesas são a última forma contraditória do pro..rro de produção social, contraditória não no sentido de uma contradição individual ^r"rt.i mas de uma contradição que nasce das condições de existê;;; dos indivíduos' No entanto, as forças produtivas que se desenvolvem no seio da sociedade burguesa criam ao mesmo tempo as condições materiais para resolver esta contradição. com esta organização social termina, assim, a pré-história da sociedade human a,, . 6 Destarte, depois do capitalismo teríamos outra já não mais rad,ical, porque não contraditória. ótica d,a antíA idéia toda formação social seria suficientemente contraditória de que para ser historicamente superável valeria ate ao capitalismo. As condições tese,

econômicas novas , capazes de satisfazer ; todas as necessidades materiais superando o reino da necessidade, produziriam as condições suficientes do reino da liberdade, radicalmente diverso. Parece muito discutível esta postura, porque tende a camu flar

os conflitos do socialismo ou de qualqu.i fur. que venha após o capitalismo' Não seria o socialismo simplesmente uma fase histórica como qualquer outra, também conflitroru, também superável? se superarmos o conflito de classes caprtalista, superamos tão-somente

(6) K' Marx, Contribuição para a crítica da economia política, Lisboa,

Estam pa,1973, pp. 2g-2g.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

Tn

a maneira histórica própria

do capitalismo de o conflito acontecer. mas não se supera a catacterística específica conflituosa da historia. se o dinamismo dela provém de suas contradições, que história seria esta já sem contradições radicais? Neste desdobramento, os soviéticos invent aram não-antagônica", correspondente precisamente

a ,,dialética

a uma situação histori ca já sem conflitos radicais, porque não apresentaria o conflito de classes' certamente não apresenta o conflito de classes como no capitalismo, porque não existiria mais-valia. Mas apresenta o conflito

da desigualdade, instrument alizad,o não mais pela

posse ou não-posse dos meios de produção., mas pelo acesso à elite burocrá-

tica e parti dária' Por isso mesmo, continua histórica, ou seja, conflituosa e superável. 7

o conflito, teoricamente considerado, não é um problema capitalista, mas da história como tal; é problema do capitalismo o conflito de classes, somente. Trava-se, então, uma polêmica forte entre dialéticas de inspiração marxista e outras ditas histórico-estruturais. Estas admitem que a história tenha estruturas dadas, como a própria infra-estrutura econômica' Sobretudo, porém, a desigualdade social é uma estrutura histórica, no sentido de que não há história que não contenha esta característica. E mais: são historicas por causa desta característica' Tais estruturas, porém , nã,o esfriama histó ria, como no caso da metodologia estruturalista, mas são precisamente a fonte do dinamismo histórico.8

As

superações históricas se concentram sobre a questão da desigualdade social, que é um conflito tipicamente insuperável: conseguimos teduzit, não eliminar. Por causa dela, continua a sociedade inquieta, pre cária, problemática, superável. por mais que a sociedade possa sonhar com a utopia d,a iguald ade, a realidade, por ser histótica, teahza formas concretas de desigualdade. O fenômeno da desigualdade seria, assim, âo mesmo tempo , à,desgra ça,, e o dinamismo historico. o materialismo histórico, por conter a noção de que a história contraditóri a vai até ao capitalismo, imagina uma historia posterior

(7) Ch. Bettetheim, A tuta de c/asses na tJnião Soviética , Rio de Ja_ neiro, Paz e Terra , 1gT6; R. Bahro, Die AJternative : Zur Kritik des rear existierenden Sozialismus, Rororo , 1gTO. (8) Cf' sobre a questão historico-estrutural, p.

introdução crítica, Aflas, 1gg3.

Demo, Socio/ ogia: uma

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo (org.)

não-contraditlrra, sem a "dominação do homem pelo homem"; embora persistam conflitos, estes seriam não-antagônicos.e Jâ não se colocaria a superação histórica. Pode-se pergun tar; como pode uma historia contraditoria gerar outra não-contraditoria? E claro gue, apelando-se para as potencialidades historicas,, consideradas praticamente inesgotáveis e nunca totalmente conhecidas, é permitido levantar a hipotese de uma historia profundamente diferente da conhecida. Mesmo porque a historia passada não e parâmetro definitivo para a futura. Mas a hipotese conffârta, de que a desigualdade social é estrutural e disto a histona retira seu dinamismo social próprio, também é válida e tem a seu favor a história conhecida. A hipótese anterior está mais próxima do mito do que a segunda. Por estas razões, existem divergências sobre a profundidade das superações históricas. Não parece possível defender a revolução total, no sentido de que o conseqüente já não seria explicável pelo antecedente. Retomando o texto anteriormente citado por Marx, dtz ele

:

jul*ea um indir'íduo pela idéia que ele faz de sl julgar uma tal época de transformação pela sua consciência de si; é preciso, pelo contrário, explicar esta consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito que existe entre as forças produtivas sociais e as relações de produção. Uma organizaçáo social nunca desaparece antes que se desenvolvam todas as forças produtivas que ela é capaz de conter; nunca relações de produção novas e superiores se the substituem antes que as condições materiais de existência destas relações se produzam no próprio seio da velha sociedade. E por isso que a humanidade só levanta os problemas que é capaz de resolver e assim, numa observação atenta, descobrir-se-á que o próprio problema só surgiu quando as condições materiais para o resolver jâ existiam ou estavam, pelo menos, em via de aparecer" .lo

"Assim como não

proprio, não

se

se poderá

À luz deste texto, paÍece claro que a superação histórica não produz o novo total, mas o novo relativo, ou seja, predomina o novo sobre o velho. Seria uma colocação a-histórica aquela que previsse

(9) Visão típica de F. Engels, Do socialismo utopico ao socialismo científico. Lisboa, Estampa, 1972, p.98. "O governo sobre as pessoas é substituido pela administração das coisas e pela duração dos processos de produção. O Estado não será 'abolido', extingue-se" (10) K. Marx, op . cit. .

REPE\SA\DO A PESQUISA PARTICIPANTE

119

, que jâ não fosse historicamente explicável. Por isso, a ideia de que a historia futura, pós-capitalista, jâ náo seria antagônica, nos parece uma expect ativa possível, na ordem da utopia, mas praticamente infund ada e) no fundo, uma concessão mítica. um salto de tal ordem

O materialismo histórico pode igualmente exceder-se em sua acentuaçáo objetivista, secundarizando o lado da intervenção humana. A questão do poder não nos parece supra-estrutural,, embora seja facilmente condicionada pela infra-estrutura mareria I . Dificilmente a mudança nas estruturas da desigualdade se Íazem sem 3 intervenção dos desiguais. Para a PP. que insiste murro nesra pt-'ssrbilidade de participação historica. o "objetir ismo" e.\cessr\ o âu-âLr& desestimulando, mesmo porque não há re\ olução sem ideoloeia revolucionária. Não se trata, por outro lado, de privilegiar aspectos políticos da intervenção humana na história sobre condições materiais. Nossa posição tenderia a ver os dois fatores no mesmo pé de igualdade. O lado material circunscreve precisamente os limites e possibilidades da açáo humana. Concretamente falando: mera consci entização política não adianta, porque não interessa mera pobreza participada. É mister a produção, na mesma importância. Todavia, a capacidade de assumir, pelo menos em parte, seu destino historico, elaborando a opção política que mais pareça conveniente à comunidade , é a fonte da energia humana, que não se contenta em esperar, em observar, e muito menos em se conformar. Porquanto historia humana é aquela feita pelo homem a serviço do homem, não aquela que acontece à sua revelia. O equilíbrio entre o objetivo material e o subjetivo político é complicado, mas é preciso obtê-lo. Não cremos que a questão do poder seja uma questãg Capitalista e que, superando-se o capitalismo, supera-se o problema do poder' o fato de podermos consid erar o caprtalismo como a fase histórica mais perversa jamais conhecida é outra coisa. É uma uirào

curta descrever o capitalismo como o resumo de todos os males, tanto porque superv alotizamos a impor tància apenas relativa de uma fase histórica, como porque faciimente isentamos fases poste-

riores da ctítica, como se fossem necessariamente melhores. Temos de reconhecer a complexidade desta discussão, bem como seus reflexos ideológicos. E é uma pena que a pp não a tome a sério, supondo-se muitas vezes ingenuamente dialética, ou imaginando que a única dialética possivet seja a versão do materialismo histórico' Em nossa concepção, preferimos uma visão de tipo maoís-

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org')

r20

tà, de estilo historico-estrutural. e que é a mais próxima das pretensões da pp.11 Em primeiro lugar. ao aceitar-se uma revolução cultural e não somente ao nír'el da mudança do modo de produção, fica superado o esquenta tendencialmente monocausal de uma única infra-estrurura que derermina em ultima instância. Abre-se o espaço para o político. nào para substituir o econômico, mas na mesma ordem de importância. Se conservássemos a linguagem da infraestrutura, nela colocaríamos pelo menos mais a questão do poder, que é certamente condicionada pelo econômico, mas que existe em qualquer sociedade, mesmo quando não havia um modo organi zado de produção.

12

tempo , ào aceitar-se a revolução permanente, realista de que é preciso abalar a história de mais idéia a monta-se tempos em tempos, jâ que não existe uma de permanente, forma

Ao mesmo

historia não-antagônica. Por eremplo. é estrutural na história a tendência de o partido distanciar-se da massa e tornar-se uma burocracia prir ilegiada. \ào é uma problemática capitalista, mas simplesmente social: em roda sociedade existe poder e ele caractettza-se principalmente pela desigualdade entre grupo dominante e maioria dominada. Para recompor a transição na rota de uma organizaçáo cada vez mais demo cratrca da sociedade, é preciso, de tempos em tempos, conclamar uma revolução para restabelecer a oportunidade dos dominados e submeter a seu juizo o processo social. Esta ótica, que pode ferir crenças do materialismo histórico, parece-nos muito mais realista. E facil demais mostrar que o revolucion ário de hoje po derâ ser o reacionano de amanhã. Se chegar ao poder, verá a sociedade de cima para baixo, e pro cutatá instaurar uma ordem social, que esperamos seja preferível, mas será certamente uma ordem institucionali zada. E isto é profundamente histo-

rico, porque não hâ somente transição, mas também institucio(1 1) O. Weggel . "Der ideologische Konflikt zwischen Moskau und Peking, Beilag e zur Wúnenzeitung " , Das Parlament, 3.28-70, 11.7 -1970. Wf As sociedades ditas "primitivas" conheciam o fenÔmeno do poder,

embora não possuíssem um modo organizado de produção. E claro que havia o condicionamento da sobrevivência material, mas o acesso ao poder era instrumental tzado fundamentalmente pelas crenças míticas. Ao mesmo tempo, não é possível imaginar que a desigualdade política possa ser extinta pela superação da carestia material. Ela existe na carestia e na abundância, porque possui raízes no proprio relacionamento social entre os homens, grupos, comunidades e sociedades, e não apenas no relacionamento dos homens com sua realidade externa. Assim , se, por hipotese, pudéssemos dominar os condic ionamentos objetivos da desigualdade, restariam ainda os subjetivos.

RE

PENSANDO A

PE

SQUISA PART ICIPANT

E

I2I

nalízação historica. uma revolução que se institu cionaliza, ao mesmo tempo se realiza e envelhece. O conceito de antítese prevê as duas modalidades: o movimento radical que leva à transição histórica e o movimento não -antagônico que produz a permanência

h

istorica.

Assim, é uma ótica apressada imaginar que pp a deva somente produzir efeitos transformadores, porque pode produzir efeitos reformistas , quando não pro d,uz efeitos conservadores e ate reac ioná-

rios. Depende da ideolo_eia política.

Como se entende a pp Tentaremos agora fazer um rápido percurso sobre a autode_ finição da PP , pàra posteriormente avaliarmos

sua adequação como

pesquisa.

Segundo Hall , " a pp é descrita de modo mais comum como uma atividade inte gtad,a que combina investigação social , trabalho educacional e ação. A combinação destes elementos num processo inter-relacionado ocasionou tanto estímulo quanto dificuldade para quem se engajou na PP ou experimentou entendê-la. Algumas das cataçterísticas do processo incluem

"a) o problema trabal ho;

:

se origina na comunidade ou no proprio local de

b) A finalidade última da pesquisa é a transformação estrutural fundamental e a melhoria de vida dos envolvidos. os benefi-

ciários são os trabalhadores ou o povo atingido; c) A PP envolve o povo no local de trabalho ou a comunidade no controle do processo inteiro de pesquisa; d) A ênfase da PP está no trabalho com uma larga

camada de grupos explorados ou oprimidos: migrantes, trabalhadores, popula-

ções indígena s, mul heres

;

e) a central pata a PP o papel de reforço à consc tentização

no povo de suas próprias habilidades e recursos, e o apoio à mobil rzaçã,o

e à organização;

0

O

te

rmo "pes qu isador" pode referir-se tanto à comunidade de trabal ho como àqueles com

ou às pessoas envolvidas no local

treinamento espec ialtzado; g) Embo ra aque les com saber/ trei namento especia hzado mui tas vezes provenham de fora da situação, são participantes compro-

%,

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

t22

metidos e aprendizes num processo que conduz mais a militância do que ao distanciamento" . 13

Este texto é bastante ilustratir,o porque procura combinar o problema daparticipação com o da pesquisa. acentuando que é

típico compromisso político talvez mais do que o compromisso com a pesquisa. Mas existe consciência da descoberta da realidade, o que pode ser visto, por exemplo, na ideia de "transferir poder ao povo através do processo de conhecimefltorr,t+ preocupando-se muito com o problema de que o pesquisador treinado não substitua o povo. Ao mesmo tempo, a PP signifi ça a repulsa contra a manLpulaçáo das comunidades, buscando produzir o sab er através da análise coletiva e mantendo o controle nas suas mãos. Assim, criar saber popular é um dos objetivos da PP, porque acredita-se que o domínio do saber é uma fonte de poder, o que colabo raria no projeto de transtormação social. r: Hall ret'lete uma posição crítica em fàce do materialismo historico. reconhecendo sua utilização possível mas de forma não-dogmática. para respeitar a criatividade propria da PP, que pode út gerada dentro de outras versões dialéticas, e ainda usando outros métodos possíveis. Todavia, é clara a insistência sobre o problema do poder, no sentido de compromisso transformador. "A PP pode somente ser julgada a longo prazo se não possui a habilidade de servir aos interesses específicos e reais da classe trabathadora ou das populações oprimidas." 16 Daí a import ància da criação do poder popular, que Fals Borda chega a denominar "ciência do povo",17 dentro de um novo paradigma de conhecimento, cujos traços poderiam ser: (13) Budd, Hall, " Participatory Research, Popular Knowledge and poconvergence, 14 (3):7-g, 1gg1 (14) lbidem, p. 11 ; Rajesh Tandon, "Pârticipatory Research in the Empowerment of People", Convergence, 14 (31, 1981 usa-se o termo ,,empower; ment of people" (15) R. Tandon , op. cit., p.21 . " Knowledge has been and will continue to be a source of power. Participatory research has been an attempt to shift

wer:

a personal reflectio n" ,

.

.

this balance of power in favour of the have-nots." (16) B. Halt, op. cit., p. 13. (17) lbid., p. 14; O. Fals Borda, " Science of the Common people". lnternational Forum of participatory Research, lugoslávia, 1gg0.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE " a) retomar a informação ao povo na ringuagem e na forma culturai na qual, foi originada; b) estabelecer o controle do trabarho pero povo e pelos movimentos de base;

c) popular izar técnicas de pesqui sa; d) integrar a informação como base do ,interectual orgânico,; e) manter um esforç o consciente no ritmo ação / reflexão do trúalho; 0 reconhecer a ciência como parte do dia-a-dia de população

toda

;

a

g) aprender a escutar".l8 Em trabalho anterior.

Hall desen'ol'eu uma serie de pontos, na ática da pesquisa' Segundo sua visão, os princípios da pp seriam: todos

os métodos de pesquisa estão impregnados de implicações ideológicas; o processo de pesquisa não iod-? se esgotar num produto acadêmico, mas ,.p..'r;;;rr benefíclo direto e imediato munidade'- ou seja, dever à co_ ter alguma utilidade prática comunidade ou a população sociar; a deve ser envorvida ," até à busca de soluções ;r;cesso inteiro, e à interpretação dos achaàos; se a meta é mudança deve haver envolvimento ' de todos os interessados processo de nela; ..o pesquisa deveria ser visto como parte de uma experiência educacional total, Que serve para estabelecer as necessidades comunidade' e aume ntar da a cons cientizaçãoe o compromisso da comunidade"; "o processo dentro de pesquisa deveria ser visto como um processo dialético um diálogo através do tempo, e não ' desenho estático a partir como um

:l$::ii:#r5tencial .o*rrlã;J"" ponto

ma

d; urn ponto no tempo,,; a meta é a

criativo

momento

,

ea

mobli zaçãono senrido de resorver

àeentuava, ao farar do envolvimento da

is radical de diferença

tanto dos enfoques ortodoxos pesquisa' como dos de enfoques teóricos melhorados. tigativo deve estar baseado.* o processo invesr* sistema de discr..ãã, investigação e análise' em que os investigados formrm ; artedo processo ao mesmo nível do investigador' As teãrias não se desenvolvem de antemão para

(íB) B Lrtl , op. cit. , p. 14. u"rnrnlJ,'à,?, !,,i'1'r-t'iiitip'torv Research: an approach ror chanse,,,

con_

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

t24

serem comprovadas nem esboçadas pelo investigador a partrr de seu contacto com a realidad e. A realidade se descreve mediante o processo pelo qual uma comunidade desenvolve suas próprias teorias e soluções sobre ai mesm utt 2o

Tandon constroi as seguintes caÍacterísticas da PP: E um processo de "conhecer e agt. A população engaj ada na PP simultaneamente aumenta seu entendimento e conhecimento

a)

de uma situação particular, bem como parte para uma açáo de mudança em seu benefício". b) É iniciada na realidade concreta que os marginalizados pretendem mudar. Gira em torno de um problema existente. Caso haja consciência suficiente, a propria população inicia o processo e pode até mesmo dispensar o perito externo. Mas,, ainda começando pelo perito, o envolvimento da população e essencial. c) Variam a extensão e a naÍureza da participação. No caso ideal, a população participa do processo inteiro: proposta de pesquisa, coleta de dados, análise, planej amento, e intervenção fla real idade.

d) A população deve ter o controle do processo. e) Tenta-se eliminar ou pelo menos reduzir as limitações

da

pesquisa tradicional. Pode empre gar métodos tradicionais na coleta de dados, mas enfatrza posturas qualitativas e hermenêuticas, e a comunicação interpessoal. f) É um processo coletivo. g) É uma experiência educattva.zl

talvez porque o por educamarcado movimento da PP tenha sido profundamente MacCall adultos.22 de dores, principalmente no campo da educaçã,o o que e organtzaçáo, une a trilogia: pesquisa, educação I tretnamento

O elemento educativo é muito acentuado,

(20) B. Hall, "La creación de conoc imiento : la ruptura del monopolio, métodos de investigacion, participacion y desarrollo", in Critica y Política en Ciências Socia/es, Simposio Mundial de Cartagena, v. l, Bogotá, Ed. Punta de Lanza, 1978; Idem, " Participatory Research: expanding the base of analysis", in lnternational Development Review, 4:23-26, 1977 (21) Rajesh Tandon. op. cit., pp. 24-26(22) Um dos veículos mais importantes de divulgação tem sido a revista Convergence, que traz o subtítulo I " An lnternational Journal of Adult Edu.

cation".

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,;,,,X.

125

:r:jJs entàtiza aligação - : í',-: :,:- ; 3: : :n tgff-if . entre teori a e práttica, entre '

23

conhecer

e

i - - i-etorno da pesquisa ao povo é um elemento cons'i-u: : Jenominado freqüentemente de retroalime ntação. De õoterr vrsuali za a PP lig ada a ôerto "processo experimental,,, que é assim montado: formul ação da problemá tica provis oria(conceitos, i:''f

h

. .,,.-n iPESQLIS.{ PARTICIPANTE

*r:

r

*ni

{

objetivos, hipóteses); escoiha das variáveis a observar e dos instrumentos de pesquisa; observ ação das variáveis; análise e síntese dos dados; elaboraçã,o (afinação, transformação) de uma pe\ â prob,lemâtica' A PP utiliza-se destes passos e é con.truíd: .:r ::.s i:>es 1) la -fase ; "r.rploruç.rir) !t:t.tii cirt.

1,,irlj,r

i..../.j.i,c

a) fixação dos objerir os b) seleção de variár eis e dos instrumenros de pesquisa c) realização da pesquisa d) síntese; 2)

2"

fase: identfficação das necessidades

basicas

a) elaboração da problemá ticada pesquisa b) nova seleção das variáveis e dos lnstrumentos

2a

c) realização

d) análise e síntese; 3) 3" faset elaboração de uma esÍrategia educativa a) elabor ação de estratégias hipotéticas b) elabor açã,o de dispositivo de comprovação

c) discussão com a população d) comunidade assume estra tegia e) execução.

Neste processo de três fases há também momentos de retroalimentação: ao terminar a primeira fase; ao terminar a segunda fase; e na altura da discussão da 3a fase com a população. com este

processo consegue-se: identificar as necessidadàs;

fo.*ular

estratégia de ataque; levantar os recursos disponíveis; partir para solu2s ções'

Le Boterf é um dos autores que

*uis

carac teiizamo aspecto de

(23) Brian, MacCall,-.'P-opular

ces". Convergence, 14 (3):61_T8, f gAf Participation, Research and New Altian(24) o autor fala de necessidades educativas .

,ã, poderia

básicas (NEB), porgue se

ser apricado a.q;tquer projeto :""rffi Â:*J,J:,."J3;rlffir.ionar; (25) Guy Le Boterf., " Descripcion del método de ,encuesta participativa' utilizado ' una investigación ràur" necesidades educativas básicas de la populacion de seis comunidaáes rura les en una área centroamericana,,. project INMUD / UNESCO, Brasítia, 1gTB, p. 12_18.

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

t26

pesquisa da PP. Une pesquisa, com formação e ação, effi cima de alguns postulados: potencialidade do grupo; para se chegat à açáo e preciso a participação do interessado: é necessária a confrontação crítica com os resultados (retroalimentaçào ): o técnico é educador; e pesquisa e é aÇào: 3 pt-rpulaÇào tem e\pectatir as. recursos, reàções.

\um

encoorrtr em Toronto.

em

1977.

toi

formul ada uma

definição de PP, que Grossi assim e\pressa: "É um processo de pesquisa no qual a comunidade participa na análise da sua própria realidade, com vistas a promover uma transformação social em benefício dos participantes, que são oprimidos. Portanto, é uma atividade de pesquisa, educacional e orientada para a ação. Em certa medida, a tentatla da PP foi vista como uma abordagem que poderia resolver a tensão continua entre o processo de geração do conhecimento e o uso deste conhecimento, entre o mundo 'acadêmico' e o 'irreal', entre intelectuais e trabalhadores, entre ciência e vida". 26

Embora com possíveis exageros, a PP constitui-se num ato de fé na potencialidade da comunidade. Por mais pobres que possam ser as comunidades e ainda que nunca tenharn todos os recursos necessários, são dotadas de criatividade, que as torna capazes de visualizar o desenvolvimento que lhes convém.27 Busca-se, ademais, fundamentar a tdeta de que o "conhecimento não nasce nos cérebros de uma parte da sociedade, mas é socialmente produzido através de

um processo compartido por todas as partes. Não hâ diferença qualitativa entre conhecimento teórico e prático; pertencem a dife-

rentes finalidades do mesmo contínuo.

Himmelstrand, ao lado de críticas relevantes, conota

a

PP

como uma combin açáo inseparável de teoria, pesquisa e prâtica, caracterrzadas pelo diálogo entre atores e pesquisadores, iluminando os atores , bem como os pesquisadores acerça do significado da açáo "

pretendida, e resultando eventualmente numa autonomia aumentada dos atores em relação aos pesquisadores e à em ancip açáo de crenças questionáveis e res tritivas na inevitabilidade da ordem dada das coisas"

.

(26) P. V. Grossi , "Socio-political implications of participatory re1 981. search" . Convergence,l4 (3):43, (21) Nat J. Coletta, ;'Participatory research or participatory putdown? Reflections on the research phase of an lndonesian experiment in non-formal education": Convergence, 9 (3) :43 et passim.

REPE\S.{\DO A PESQUISA PARTICIPA\TE

Retomando um esquema de Moser, orga nrza três passos üi PP: coleta de informação no contexto da açã,o; discussão da informação entre atores e entre atores e pesquisadores, para clariticar problemas e intenções, e para trabalhar diretivas da açáo social; açáo social. Estes três passos são vistos, ademais, dentro da circularidade sistêmiça da retroalimentação , jâ que o terceiro passo pode engatar no primeiro. A postura mais interessante talvez seja a apreensão de que a PP une os enfoques objetivista e hermenêutico. De certa forma, o paradigma científico tradicional preocupa-se mais em "entender como somos produzidos pela sociedade, mas tem pouco ou nada a dizet como produzimos ou poderíamos produzir a sociedadett.28 Entende que o materialismo historico perfa z esta combinação: "O enfoque objetivista indaga pelas características objetivas inerentes o enfoque hermenêutico ilumina as implicações destas características objetivas para a formação da aos diferentes modos de produção, e

consciência de classe e para a auto-realtzaçáo humana".

2s

Por vezes parece que Himmelstrand confunde o enfoque objetivista com a pesquisa tradicional e, por outra, esquece que paÍa o materialismo historico clássico, por mais que se unam os enfoques, prevalece o primeiro, já que a determinação econômtca e mais fundamental. Mas é pertinente a ideia em si: a PP combina o tratamento de condições objetivas dadas com nossa c apacidade histórica de intervir nelas, recolocando a importânc ia da participação politica humana na história. Da ótica do educador, acentua-se persistentemente a idéia de apren dizagem co letiva" 'n

.

"Em seus traços gerais, tal estrategia se desenvolve com base na realidade. Vivências, experiências e interesses dos membros de um grupo, se sustenta sobre uma horizontalidade e diálogo entre os que parti-

cipam do ato de aprender , Se operaci onaliza através de métodos de trabalho grupal e aprendi zagem coletiva e se orienta para o forta(28) lbidem, p. 60; Heinz Moser, " La tnvestigacion -Accion como nuevo paradigma en las ciencias sociales", in: Crítica y Potitica en Ciencias Sociales. Simposio Mundial de Cartagena, vol. l. Bogotá, Ed. Punta de Lanza. 1g7B p.117 et passim. (29) U. Himmelstrand, "lnvestigacion-Accion y Ciencia Social aplicaca: valor cientifico, beneficios practicos y abusos". ln: Ciitica y Política en Ciencias Sociales, op. cit. , p. 174-175.

(org') CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

128

privilegiados. Portanto, recimento orga nizacional dos grupos menos por objetivo estabeletêm que uço.s u, com se vincula estreitamente em benefício redundem que cer linhas de trabalho e arganização coletivo."

30

coEmergeffi, assim, três passos fundamentais: o diagnóstico ;,primeira fase de um trabalho de educação participamunitário, a anáitse dos "aretroalimentação no processo de PP ou seja'

tiva" ; zaçáo de grupos dados com participação comun rtaÍra" , e a organi que as instrumentais que assumem a ação.31 É, mister reconhecer ao isto, e desejam comunidades podem assumir responsabilidade não governo do que se constata que a açáo exclusiva mesmo tempo

inicial prevê

De *ódo geral o diagnóstico resolve os p.oui.mas. o levantamento dos principais problemas importantes: três coisas recursos humanos e que a comunidade enfrenta; a espec tfi,caçáo dos a detecção possíveis; materiais disponíveis e o provimento de outros já existentes formais não de componentes organiza'cronais formais e 32

33

para a solução de Problemas ' força o objeTambem na ótica do educador, acentua-se com Freire' Paulo de nome o liga se qual tivo da consci entizaçáo, ao mobivigente; social ..álidud. da Inclui passos tais como: "crítica ação da crittca revisão social; Itzaçáo coletiv a para a transformação diagdo reavaliação futura; açáo da implementada, replanejamento nostico prévio da realidade social" '34 ou "pesquisa Também e uttltzada a expressão "observação"

clássico de militante,,, seja no sentido de distinguir do conceito ,,observação participante", típico da antropologia, mas que signiobjeto de pesquisa, ftca somente a convivência de perto com o estratégia da pese seja sobretudo no sentido de " instrumento alter-

(30) Marcela Gajardo e Jorge Wertheim, Educação Participativa: nativas, (a sair pela Editora Paz e Terra)' (31) lbidem, P- 20 eÍ Passim' i'participatory Research by lndian women in Ner(32) Graee Hudson, of Participatory Research, thern ontario Remote communities ", in' Forumunsatisfaetory situation is for this changíng to "Th" key zs, lugoslávia,"ióao,-p have the capacommuníties and. peõptã indian that recognize to government and to make available the city and the desire tô provide for theii own needs, people are free to deverndian that so resourees and necessary responsabirity provid'e the services that thei themselves choose"' lop and

(33) M. Gajardo eJorge Wertheim'' op ' cit''p'20' ,,põpular Education: concept and implications", (34) F. F. Grossi , Education, Trinidad, maio 1981 , p'71 ' Adutt for cauncít rnternationar

in:

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

Dg

quisa-ação",i5 ou da insistência sobre o aspecto do envolvimento político.

A tônica

bás

ica, todavia, do ponto de r ista metodologico é

união entre conhecimento e ação.

a

"conhecimento e ação são dois aspectos inseparár eis da ati'idade humana' o conhecimento não é mera contemplação. nem a prática mera atividade; separada d,a práfiica, a teoria

se rec uz

a meros enunciados verbais; separad a d,a teoria, a prática não e nla:s que um

ativismo inconducente. Não há, pois, autêntico conhecirn.nrc e .1utêntica ação, se não se expressam numa permanente ^vrrl\' inrer-relacào

unitári a.,,36

A autodefinição d,a PP insiste em certos_ traços que são. ao longo desta sumária revisão catacrerísricos.- -;;1;;r. , É a filiaçào educativa, a idéia de superação dos procedimentos tradicionais de conhecimento, a opção critica e política, a união entre teoria e práttca' o envolvimento comunitário. Em certos autores, a preocupação com o aspecto da pesquisa mantém-se vivo e, de modo geral não chega a ser abandonado. Porquanto sempre resta pelo menos interesse em diagnósticos, avaliações, planejamento, levantamento de dados preexistentes etc., mesmo no maior ativismo. Mas é patente também que a teoria é freqüentemente sacrificada em favor da prática' ttatando-se já de questàes mais propriamente educati'as

participatlas do que de pesquisa. se aceitarmos o relacionamento dialetico entre teoria tica' não seria possível negar que

a práttica é componente

também do processo de conhecimento e de intervenção

e

e

prá-

essencial

na realidade. Ao mesmo tempo, a metodologia que cabe à pp é certamente a dialetica, porque é a que assume o contexto histórico, privilegia a

apreensão e o tratamento dos conflitos sociais, propug na atransição historica e acredita no fator humano como capaz de interferir em condições objetivas dadas . É essencial à pp o reencontro com a capacidade criativa humana, sobretudo dos humildes, dos oprimidos' dos carentes, 9ue, à primeira vista, tendemos a estigm atizar como impotentes.

(35)

M

' Gajardo, "Evolucion, situacion actuat y perspectivas particip"iir" en América Latina, santiago, de las FLACp ,g,fJ%,','.1ióí0. revistã ó,0,i-."0a peio

estratégias de investigacion

i.?i,,Ti T'X?i, J; âliJ3"?::UÍiT (36) Luis Rigal, "sobre ól sentiáo, uso de ra lnvestigacion-Accion crítica y potítica en-cienciats socialãs , õ0. cit., p. 3.

,,

, in

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

130

Do que tbi r isto. pode-se igualmente concluir que a fundamenraçàt'r ,Jialerica ,Ja PP é incipiente. Isto já denota que é impulsionatJa por pesquissrJtrrÊS marcados ou pela saturação teórica e empirica tie esri,o lra,Jicional. rru pela desralori zaçáo da atividade acadêmica. Lru mesmo pela ilusào do atir ismo. Cremos que vai nisto tieqüentemente o equí\ oco de querer superar um erro com o erro

oposto. A crítica, muitas vezes brilhante , contra a ciência clássica não é seguida da necessária fundamentação do novo paradigma. É disto qr. resulta a constante insinuaçáo de que a PP já seria o único gênero válido de Pesquisa.

É preciso entender que a PE, por maiores limitações que tenha, tem elaborado uma fundamentação extensiva e frutificou

uma plêiade de tecnicas dignas de nota. Assim, não resta duvida de que o discurso sobre quantificação está mais adiantado que o discurso sobre propostas qualitativas. Nestas prolifera ainda a "con\-ersa fiada". por vezes como refugio de pesquisadores que não

teriam condições de entrenrar o mínimo rigor logico e empírico. Assim. embora devendo-se reconhecer que a PP seja um gênero r-álido de pesquisa. criativo. potencial e promissor, está cercada de ban ayzações excessivas, que o simples entusiasmo não pode supe

ÍaÍ

.

Causa popula r) crencia popul ar uma .l\

o

metodologia do conhecimento científico através da ação* K:l::: lyrilta, ,Gonzato castiilo, ort ando Fats B orrú u; *;Z' íií;rros * * PróIogo

o presente texto é um esforço de sistem atizaralgumas riências acumuladas pelos expeautores durante mais de um ano de trabalhos de campo em várias regiões corombianas, eÍD contato com a realidade das populações toruÃ, seus problemas, suas preocupações e aspirações' Além disso, trata-se de um trabarho ."[]"o que representa a culminação de um intenso processo de críticae autocrítica por parte de cientistas sociais de diversas disciplinas, de tal forma que a presente obra pode ser considerada um verdadeiro interdisciplinar' A reáação esforço é igualmente fruto de um trabarho em equipe. como resurtado, acreditamos que há bases para propor método especialmente um adequado que aqui denominamos ,,es_ tudo-ação" e que leva à "investigação militante" que permite aos cientistas sociais responderem úiticamente às exigências sem detrimento da ciên históricas cia, colocando-a a serviço dà camadas populares.

y"ry,,,!J)

r'ián:"i:'i:

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p-oputay: una metodotogia det conocimiento

;" Jutio Ass,, r,Xíá::: Bosotá, ("*) os auto'"t táo cientistas

rraduçao

Pubtiããtior"r" J""rã' Rosca

,

1srz.

sociais corombianos intensamente tificados com movimentos idene lutas o-opr,rres em seu país. orrando Fars ;ri,iÀà Borda é sociorosú;,, da pesquisa participante I:'ffiX?iJl",_jfirr: inicúoor oã

,

132

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo

(org.)

Ninguém negarâ a necessidade e a urgência desta atitude crítíca diante da ciência social e da sociedade. com todas as conseqüências práticas que ela traz. Por isso. esperamos receber dos leitores observações concretas sobre o método de estudo-açáo aqui proposto, que ajudem não apenas a conhecer melhor a realidade mas também a transform á-la.

Ciências sociais e neocolonialismo A vinculação entre a ciência social e o compromisso político volta a ser colocada hoje com urgência. Este problema antigo adquire nova vigência especialmente por circunstâncias históricas que contribuíram pata modificar o panorama político internacional, sobretudo após o término da Segunda Guerra Mundial. De um lado, a onda de movimentos antiimperialistas e de libertação nacional, que abal aram o poder colonial em vastas regiões da Asia, Africa e, mais recentemente , da América Latina: a tentativa de revolução socialista na Bolívia em 1952, âs medidas antiimperialistas do governo de Jacobo Arb enz na Guatemala em 1954, a revolução cubana em 1959, o movimento constitucionalista na Republica Dominrcana em 1965, o triunfo da Unidade Popular no Chile em 1970, movimentos guerrilheiros em vários países como Y enezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, República Dominicana e Guatem ala. De outro lado, a ascensão dos Estados unidos à posição de vanguarda do sistema capitalista-imperialista e dos interesses das grandes corporações espalhadas pelo mundo, buscando por todos os meios impor sua domin açáo hegemônica nos campos econômico, financeiro, comer-

cial, tecnológico, político e militar, como também no cultural e no educativo. Estas pretensões expansionistas do império norteamericano entraram em conflito aberto com os movimentos de libertaçáo nacional e também com os países socialistas, principalmente a URSS e, a parttr de 1948, a Republica Popular da China. Neste cenário de conflitos de classe, de luta pelo controle do poder político tanto no plano nacional como internacional, as ciências em geral, e as ciências sociais em particular, não poderiam ficar à margem da contenda. Elas se converteram efetivamente em uma arma do imperialismo não apenas através de investigações sociais de çarâter contra-revolucionano,l como também mediante a difusão de (1) Com a guerra do Vietnã, os Estados Unidos se interessaram

cada

vez mais em determinar as caracterfsticas sociologicas e psicologicas das orga-

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

.:.:

uma ideologra'guepretende mostrar as sociedades capitalistas dominantes -- principalmente os Estados unidos e seus procuradores

estandartes

como metas de desenvolvimento

ou

ou modelos de - cracta para progresso e demo os países do chamado Terceiro Mun_ do.

Em conseqüência, o mundo acadêmico

foi reestruturado de acordo com as novas necessidades d,a administração e manutenção do império'

As universidades, por exemplo, experimenrara* un.r rápido processo de moder niru,,çào, ,qraças ao respaldo tl nance:r._ e político das grandes corporações e das agen,,-ias go\ er:ri:-..:.ir;i

Muitas universidades que. dLrranre trS irtrS d; Seiurd: G -er:., Mundial, tinham-se lieado ao Deparramenro de De :esa para r pesquisa belica' ficaram entào encarregadas de ohter e rnterprerer informações sobre sociedades pouco conhecidas. especialmenre aquelas onde os interesses do imperio estavam ameaçados pela insurreição popular' Isto explica por gue, nas últimas decadas. se incrementaram notavelmente os àstudos de história, sociologia, antropologia e economia bem como os departamentos de estudos

tino-americanos, africanos e asiáticos.

la-

2

nizações guerrilheiras' Em particular, o pentágono procurou identificar os fatores que conduzem os camponeses em sociedades ,,subdesenvolvidas,, prestarem lealdade a uma orga a nização política clandestina, pondo em risco suas proprias vidas' A orga niiação oe lnvestigaçães para operações Especiais (soRo) e o centro de lnvástigrçao o" sistemãs'sàciais (cRESs) promoveram estudos sobre as organizações revolucionárias no Vietnã do sul, tais como Lao Dong (Partido Revólucionário do pàvo), a rràÀte Nacionar àã Libertação do vietnã do sul e suas org.anizações de massa associadas. Também a corporação RAND realizou vaiios esiuoos sobre "a máral e a motivação do vietcong" e mantém contratos de i1r"tl,gação social fin-anciados pelo pentágono. Desde 1966' os grupos minoritários" do sudeste Asiático fo ram estudados conjuntamente por soRo-cREss-nnrvo e-p;;rárias universidades norteamericanas' A cREss efetuou estudos semelhantes também na Africa, incluindo a pesquisa de minoriat f;úàilsas, etnicas e sociais. o objetivo deste estudo foi a mobitização e a.utilizJção de grúá;; minoritários por parte dos programas norte-americanos de conira-revolução (2) A universidade do Estadô'ã" Mión-iõã-n orgutha-se de ter centros estudo de três continentes: um de de Estudos Asi-áticos, outro de Estudos Americanos e outro de Estudos LatinoAfriãàno.. outros programas parareros vem vastas áreas acadêmicas tais como as comunicações internacionais.envoreducação' desenvolvimento econômico, agricultura g nutrição, administração internacional (baseado nas experiênciaõ no arasir e em outras partes do mundo) e administração e política de dásenvolvimento dentro de Íaculdades ciências sociais, respãldadas finãnããi/rmente de peta Fundação Ford. o Departamento de Estado dos EuA Àtó. fooos estudos pologia, a economia, a sociorogia, ", ãte* de estudos "à."i ringüísticosenvorvem a antro.

134

CARLOS RODRIGUES BRANDAO 1org.)

De lg45 a 1960, as investigações em todos os campos da ciência refletiram a preocupação com a defesa nuclear eotlra'a'URSS com vistas a um eventual confronto armado no contexto da chamada "guerra fria". De 1950 em diante, a atenção do imperialismo dirigiu-se para o Terceiro Mundo, e as universidades norte-americanas se adequaram mais uma vez à tarefa de ministrar o conhecimento e o pessoal necessários aos fins perseguidos. A situação latino-americana foi o principal foco de atenção do imperialismo durante o governo de J. F. Kennedy, quando as universidades foram convocadas a canalizar e controlar a direção da mudança induzida de forma a não tocar nos interesses das classes dominantes.3 Para tratar de ocultar esse compromisso aberto com o sistema imperialista, promoveu-se o desenvolvimento de uma ciência social livre de valores. Seus mais notórios expoentes (como Knorr, Bell , Lipset, Rostow, Silvert e outros) pretendiam transcender o nível das ideologias que se achariam em plena confrontação, afirmando que estas haviam morrido e que. por conseguinte, eta possível uma explicação "neutra" e "objetiva" de qualquer sistema social. Não obstante, os cientistas sociais desta corrente acreditam na sociedade capitalista e apóiam-se no pressuposto de que o desenvolvimento social, econômico e político dos países dominados segue um roteiro previamente determinado pelos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, flo Terceiro Mundo, floresceram como nunca as faculdades de ciências sociais, com o respaldo de fundações norte-americanas e de programas internacionais de desenvolvimento: edifícios, bibliotecas, becas , pesquisas e professores-visitantes foram financiados generosamente. Desses centros acadêmicos saíram os sociólogos, os economistas e os cientistas políticos que depois de incorporaram

aos

(3) O exemplo mais conhecido na América Latina é o chamado Projeto Camelot e seu afilhado, o famoso "Plan Simpático", referente à Colômbia. Tratava-se basicamente de um projeto para medir e prever as causas das revoluções e insurreições nas áreas subdesenvolvidas do mundo. Procurava-se também encont rar os meios para eliminar essas causas ou para enfrentar revoluções e insurreições . O Camelot era patrocinado pelo exercito nort e-americano mediante um contrato de quatro a seis milhões de dólares com o SORO, uma agência da American University de Washington, D. C. As investigações do SORO incluem: Ievantamentos analíticos de áreas estrangeiras; preservação

de informações atua!ízadas sob re complexos militares, politicas e sociais daquelas áreas; preservação de uma lista de informação rápida para o exército com respeito a qualqu er situação considerada importante do ponto de vista militar.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

135

: :: -1> .governamentais de desenvolvimento nacionais e interna- " : rI s . \{as, ao- contrfuio do esperado pelas agências financiadoras, - 3§>3> mesmos

centros se formaram muitas \ ezes professores e -ilt)s que, âo tornarem consciência do papel das ciências sociais, se : -seram a serviço dos verdadeiros interesses nJcitrnais e populares. ?:e.'-isamente no auge dos estudos e pesquisas So.-rais. a ciência T'lr\ista põe um pe na universidade latino-ame nr-anl. trÍerecendo -:rl parâmetro teórico e metodolo-eico alternatir .. DJri r-) c stu..Jo e a :ransformação da sociedade. Esse desenr rrlr in:in:.. jrr':re::,Jo das escolas de ciências sociais ler ou as fundaçôe> esr:engili-Js e rrS go\ ernos nacionais a modiÍ-rcar seu apoit-r. \o Brasil. com ur etrlpe militar de 1964, a sociologia torna-se proibida e muitos cientistas sociais são expulsos da universidade, encarcerados ou exilados. Na Argentina, com o golpe de Estado militar de Onganía em 1966, as ciências sociais são duramente reprimidas. Na Colômbia, se instauraram os famosos "conselhos de gue rra" contra estudantes acusados de "crime de subversão". Essa repressão foi dirigida particularmente às escolas de ciências sociais, onde os estudantes, sob a influência de cientistas como Camilo Torres, conseguiram deter em patte o controle que as fundações norte-americanas haviam exercido sobre aquelas escolas, especialmente a partir de 1960. Pode-se dizer que as ciências sociais, apesar do controle que sobre elas quiseram exercer de forma absoluta as classes dominantes, continuam abertas ao serviço de propósitos populares. Isso se evidenciou claramente em diferentes pronunciamentos como os tirados do congresso cultural de Havan a (4-12 de janeiro de 196g), do congresso latino-americano de economistas reunido no México em junho de 1965, do congresso cultural de Cabimas, Vene zuela, em dezembro de 1970, e do simpósio de antropólogos de Barbados, em j aneiro de 197 0 .

:

Hoje, mais do que nunca, os cientistas sociais se vêem na contingência de tomar partido, de colocarem com urgência a que interesses sociais e políticos servem. Como nos tempos de Hitler, os cientistas que guardam silêncio ou pretendem ser neutros estão , frà ptâtrca, tão comprometidos com as atrocidades do sistema vigente como aqueles que o fazem conscientemente. Na Colômbia, diversos grupos de cientistas sociais e intelectuais têm colocado estes dilemas sobre a relação entre política e ciência e, em alguns casos, foram postos à prova princípios _perais pertinentes. Desejou-se verificar as possibilidades reais de uma ciência social comprometida com as classes populares e suas lutas. o que

,

campos d,t:t: De lg45 a 1960, as investigações em todos os eonl'ra a'uRs,s nuclear cia refletiram a preocupação com a defesa contexto da chama.da no armado confronto com vistas a um eventuál ,,guerra fria". De 1950 em diante, a atenção do imperialismo dirinorte-americanas giu_se para o Terceiro Mundo, e as universidades o de ministrar conhecimento e se adequaram mais uma vez à tarefa A situação latino-amerio pessoar necessários aos fins perseguidos.

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foi o principar foco de atenção do imperialismo foram convogoverno de J. F. Kennedy, quando as universidades induzida de mudança da cadas a canartzar e controrar a direção caÍta

dominantes.3 forma a não tocar nos interesses das classes p ara tratar de ocurtar esse compromisso aberto com o sistema de uma ciência social imperialista, promoveu-se o desenvolvimento (como Knorr, Bell , livre de valores. Seus mais notórios expoentes transcender o nível das Lipset, Rostow, Silvert e outros) pretenáiuconfrontação, afirmando que ideorogias que se achariam em plena era possível uma estas haviam morrido e gue, por conseguinte, social. Não sistema ,,neutra,, e "objetiva" de qualquer explicação sociedade na acreditam obstante, os cientistas sociais desta corrente desenvolvimento o que de. capitalista e apóiam-se no pressuposto dominados segue um roteiro puir., ào, porítico e econômico sociar, previamente determinado pelos Estados unidos' como Ao mesmo tempo, flo Terceiro Mundo, floresceram fundade respaldo o com nunca as faculdades á. ciências sociais, desenvolvie de programas internacionais de ções norte-americanas

mento: edificios, bibliot.rár,

becas

, pesQuisas e professores-visi-

tantes foram financiados generosamente. os sociól0gos, os econoDesses centros acadêmicos saíram

de incorporaram mistas e os cientistas políticos que depois

aos

(3)oexemplomaisconhecidonaAméricaLatinaéochamadoProjeto ,,pran simpático", referente à colÔmbia ' camerot e seu afirhado, o famoso para medir e prever as causas das Tratava-se basicamente de um projeto do mundo' Procurava-se subdesenvolvidas áreas nas insurreições e revoluçÕes ou para enfrentar revocausas essas eriminar para tambem encontrar os meios pelo exercito nort e-ameriera fatrocinado ruções e insurreições . o camerot com o soRo' dolares de milhões sers ã quatro cano mediante um contrato de investigações As c. D. washington, de uma agência da American university preservação

de áieas estrangeiras; do soRO incluem: levantamLntos aáalíticos politicas e sociais da,orpr"*o: re sob ízadas atuar -militares, rápida para o exército de informações informação de rista uma de queras áreas; preservação importante do ponto de vista com respeito a quarqu er situação considerada militar.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

135

planos .$overll4mentais de desenvolvimento nacionais e internacionais ao con trário do esperado pelas agências '1t, centros se formaram m u itas vezesfinanciadoras, nesses mesmos professores e alunos 9ue, ao tomarem consciência do papel ,Jes ciênclas sociais, se puseram a serviço dos verdadeiros interesses il.1,.'ionais e populares. Precisamente no auge dos estudos e pesq i-rr s3s st'rciais. a ciência marxista põe um pé na uni'ersidade latrno-.r,nei:.-3:f . t-rÍerecendo um parâmetro teórico e metodologico alremJ::-., , esru,Jrr e a ri:j transformação da sociedade. Esse desu.n\ trl..::3-.:, .tr..tr,r: j, J j> escolas de ciências sociais ler ou as f uniaJi,ii ci::i:.:i r:: c r.: rtavernos nacionais a mttdiÍlcar seu 3poit-r. \* Bras:.- it.)rr \_-,, ::,:,lle militar de 1964' a socioloeia torna-se prtriL,rrJa L' ffrurltr: crenirsr3s sociais são expulsos da universidade. encarcera,Jos ou e.rila,Jos. \a Argentina, com o golpe de Estado militar de onganía em 1966. as ciências sociais são duramente reprimidas. Na colômbia. se instautaram os famosos "conselhos de gue rra" contra estudantes acusados de "crime de subversão". Essa repressão foi dirigida particularmente às escolas de ciências sociais, onde os estudantes, sob a influência de cientistas como camilo Torres, conseguiram deter em parte o controle que as fundações norte-americunu, haviam exercido sobre aquelas escolas, especialmente a partir de 1960. Pode-se dizer que as ciências roóiais, apesar do controle que sobre elas quiseram exercer de forma absoluta as classes dominantes, continuam abertas ao serviço de propósitos populares. Isso se evidenciou claramente em diferentes prorrurciamentos como os tirados do congresso cultural de Havan (4-r2 a de janeiro de 196g), do congresso latino-americano de economistas reunido no México em junho de 1965, do congresso cultural de cabimas, yenezuela, em dezembro de 1970, e do simpósio de antropologos de vv Barbados ,"..LLL'ct\r\-'ü, r---

emjaneirode

1970

Hoje, mais do que nunca, os cientistas sociais se vêem na contingência de tomar partido, de colocarem com urgência a que interesses sociais e políticos servem. como nos tempos de Hitler, os

cientistas que guardam silêncio ou pretendem ser ptática, tão comprometidos com as atrocidades neutros estão, na do sistema vigente como aqueles que o fazem conscientemente. Na Colômbia, diversos grupos de cientistas sociais e intelectuais têm colocado estes dilemas sobre a relação entre política e ciência e, em alguns casos, foram postos à prova princípios gerais pertinentes' Desejou-se verificar as possibilidades reais de urna ciência social comprometid,acom as classes populares e suas lutas, o que

136

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

(oTg.1

levou naturalmen te a um reexame da teoria social e dos métodor' d. investi gação que têm vigorado no país. Os autores do presente texto

chegaram, por diferentes caminhos, a um encontrolq,r., de uma forma ou de outra, expressa a busca por dar a seu compromisso

social maior eficácia no contexto da mudança, ou protoc oltza a insatisfação que sentem ante o desenvolvimento político atual, ou ainda trata de descobrir formas de renovação acadêmica e científica dentro do mesmo contexto. É evidente que esforços como este têm implicações teóricas e prâticas que levam a conseqüências políticas. Fundamental em todo processo é determinar um método adequado que responda às necessidades colocadas e dele derivar as técnicas de trabalho de campo eficazes pata os fins da mudança que se persegue e que os tempos demandam. O presente inventário pode seivir a este objetivo.

Em busca de um método A primeira tealização e aceitar a origem intelectual pequenoburguesa de empreendimentos dessa espécie. Mas, nos casos que nos interessam, surge uma característica que não ocorre em outros: a de se haver adquirido a consciência maior de que não basta conhecer a realidade, mas é preciso transfo rmá-la, o que se torna imperativo historico em situações como a da Colômbia. para tanto, é necessário adotar mente aberta para o que se há de aprender com as novas experiências e trabalhar com técnicas às vezes modestas mas igualmente eftcazes nos procedimentos científicos.

Esta atitude básica de busca e descobrimento simultâneos era e ia antes, se denominava "compromisso". Este conceito amplamente debatido em muitos círculos literários e científicos4 - serviu como impulso p ara tentarmos nos libertar dos moldes "científicos" e dos parâmetros teóricos que se impunham

o 9ue, nesse momento

sobre nós como camisas-de-força. O compromisso também nessa

época levava a recolocar em pauta o problema do método de inves-

tigação e a orientação do conhecimento científico. Estes não mais (4) Ver inventário em Fals Borda, Ciencia propia y colonialismo intelectual, México, Nuestro Tiempo, 24 ed., 1971. n poteri., estendeu-se da sociologia a quase todas as ciências sociais, especialmente a antropologia e a ciência política. Desenvolve-se hoje em muitos países ocidentais, e com particular intensidade nos Estados unidos, Alemanha e França.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

I3'7

:

seriam objeto de simples curiosidade

erudita que implica uma nem mais seriam -; dirigentes para despertar as classes e in-

atitude ingênua da parte do cientista social

trombetas apocalípticas 'Juzi-las a serem mais responsáveis uma atitude moralista nem permitiriam sua utilização para que as classes dirigentes-;se perpetuassem no poder, por meio de mudanças graduais e revirar oltas calculadas "cientificamente" uma conscientemente - essas atitude comprometida com o sistema. Agora, ciências seriam postas a sen'iço da causa popular, como um esforço de conter a dominacào imperialista e a exploração oligárquica tradicronal. ptrr uffi la,Jo. e. por outro, como um meio de afiançar e dinamizar as or_qanizações autenticamente populares- equipando-as ainda melhor paÍa atin-

girem seus objetir os.

Nesse momento de reorien taçã,o intelectual e política as tecnicas conhecidas de investigação que estariam mais próximas do que se pretendia realizar eram as gue, em antropologia e sociolo gia, são

chamadas de "observação participante" iobservação e por experimentação" (participação-intervenção), âs quais imptic am, sem dúvida, o envolvimento pessoal do investigaao. nas situações reais e a sua interferência nos processos sociais locais. Mas logo se viu que

estas técnicas

tinham efetivamente pouco a dizer em face das exigências de vincular o pensamento à ação fundamental necess âria. Depois, por volta de 1969, apareceu o conceito de ,,inserção,, que fez avançar o nível de compreensão teórica do cientista social (e

natural) sobre o novo compromisso político vislumbrado. Serviu

então como um desaÍio para i*plementar o compromisso e impulsionar os intelectuais à linha de ação com um quadro metodologico já um pouco mais claro. A maioria dos cientistas sociais, todavia, captados e incorporados pela ofensiva imperialista da década através de seus inumeráveis projetos e planás "de desenvolvimento,,, centros de investigação, agências de pianejamento, missões técnicas, e de seus burocratas reformistas ou intimidados pela repressão, enconttaram-se psíquica e praticamente impossibilitados de acertar

conceito de inserção constituiu o que às vezes se define como um "salto adiante", ou o impulso definido. que abre novas perspectivas. Inicialmente, a inserção foi .or.àbidu como um passo que implica não apenas a combinação das duas técnicas clássicas de observação já mencionadas, e rirr, ,,ir mais além , para obter uma visão interior completa das situações e processos estudados com vistas à ação presente e futura. Isto implica que

o cientista

se

138

CARLOS RODRIGUES BRANDÃo (oTg.)

envolva como agente do processo que estuda, porque tomou uma posição a favor de determinadas alternativas, aprendendo assim não só a pattir da obs ervaçã,o que faz como tambem do proprio trabalho que executajunto às pessoas com quem se identifica".5 Em outras palavras. a inserção era concebida como uma técnica de observaçào e análise de processos e fatores que inclui, em seu esboço, â Írlilitância r oltada a alcançar determinadas metas sociais, políticas e econômicas.Hoje ela continua a ser aplicada por investigadores a fim de realizar, com maior ou menor eficácia e entendimento, mudanças necessárias na sociedade. Ao mesmo tempo, a inserção, como técnica, incorpora o investigador aos grupos popu-

lares, não mais de acordo com a antiga relação .*plo.adora de "sujeito e objeto", mas valorizando a parcela de contribuição dos grupos quanto à informação e interpretação, bem como seu direito ao uso dos dados e de outros elementos adquiridos na investi gação. Como se pode observar, esta concepção de inserção carrega consigo dois determinantes: 1) constituem uma experiência de anétlise, síntese e sistem attzação realizada por pessoas envolvidas nos processos como quadros comprometidos em vários níveis de estudo e

ação; 2) incluem diversos modos de aplicação local segundo várias alternativas historicamente determinadas. Em essência, estas técnicas o outras que possam ser desenvolvidas mais adiante constituem assim um método especial, o método de estudo-ação, cujo objetivo é aumentar a eficácia da prática política e prover fundamentos para enriquecer as ciências sociais que cooperam no processo.

Houve alguma convergênc ra na aplicação destes princípios em vários países (conforme foi parcialmente coletado), mas falta muito ainda pata se cheg ar à sistem atização das técnicas de inserção e ao aperfeiçoamento do método de estudo -açáo. Não obstante, todos aqueles que o experimentaram concordam conosco quanto a sua importância teórico -práúrca.

Inserção desfocada Segundo a modalidade de aplicaçáo, a inserção pode produzir determinados resultados, como se deduz dos casos observados na

(5) lbidem, p. 58.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

N9

colômbia' Existem pelo menos duas tecnicas

de inserção que podem ser assimiladas pelo sistema vigente e postas a seu serviço, contradi-

zendo assim a tese do comprãmirro conseqüente que leva à ação válida e ao estudo pertinente e necessário da atual conj untura. Essas técnicas desfocadas são: a inserção para man ipu lar e a inserção para agitar, tal como são deÍinidas a seguir. Inserção para manipular. Nas màos ce l:t-,.-ur-3,Jr-rres do sistema vigente, ou praticada por aqueles que ren: j= j:i'icá-ltr

r,-. sem o compromisso conseqüente com os'erdac.ir,-.s ::r:3:3ssei J3 classe popular' a tecnica da inserçào pode Frt-r*Juzr: ,r::Ji:.::. Jei,--,rrnf,ções e resultados ne-Qatir os. {lguns ,Jt-} resui:a,Jos

observar diretamente sào:

qu. Fudr:,üs lr a detormaçàtr pror'issronal. pela rna-

neira como são empregados' remunerados e manipulados os pesquisadores' geralmente dentro de programas oficiais ou semi-oficiais. 2) o estabelecimento de novas fármas de dependência e neocolonialismo intelectual, quando se real iza a inserção com o proposito de

"impor uma linha" ou ensinar uma "doutrina correta,,; 3) o refor_ mismo ou desenvolvimentismo pela busca consciente ou incons-

ciente de fórmulas de continuidade do sistema,

ou paraprevenir ou neutralizar a insurreição popular. Nos três casos, falta o respeito pela autenticidade do conhecimento e pelos próprios grupos em cujo benefício se diz atuar. o conhecimento adquirido

dessa maneira revela-se falso e deformado por ser unicamente um reflexo dos preconceitos próprios da sociedade vigente, ou de seus pesquisadores, e não da realidade mesma que se deseja conhecer. Tal ,,conhecimento" conduz apenas à evolução da ordem injusta, âo paliativo calculado para subtrair forças a pressão popular e, ocasionalmente,

à mod ificaçã'o parcial de instituiç0., que deveriam sofrer uma mudança tadical, práticas que não erradicam as causas da injustiça, não corrigem seus efeitos nem enriquecem a ciência social, criando antes confusões e frustrações ao nívú popular. Essa técnica é parecida com a que os antropólogos clássicos chamaram " intervtnção" (participação-intervenção) e, com

efeito, pode ser o que de mais próximo à inserção bem feita poderia oferecer a antropologia tradicional. Na colômbia foi aplicada em regiões rurais por assistentes sociais agrícolas e indigenistas; nos bairros

grandes cidades, por comunidades religiosas e alguns

das

grupos de esquerda desorientados. Aqui se colocam também as atividades da "ação comun&1" , os projetos de desenvolvimento da comunidade, a "ação cívico-militar" inspirada por ideólogos do pentágono e adotada pelas Forças Armadas do país, os trabalhos do cãrpo de paz

140

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

patrocinado pela Agência de Desenvolvimento Internacional

dos

Estados Unidos, e as atividades mission arias de entidades católicas e protestantes (tais como o Instituto Lingüístico de Verão, Plano do Noroeste de Evangelizaçáo e Desenvolrimento da Igreja Presbiteriana, Plano de Desenvolvimento do Catatumbo da Fundação Menino de Deus. Ação Cultural Popular e suas Escolas Radiofônicas etc.) entre fàr elados. camponeses e indígenas. Inserção para agitar. Outra tecnica de inserção é a chamada "ativação", cuj a aplicação até o momento teve efeitos duvidosos na articulaçáo real das massas ao processo de sua propria libertaÇão, embora tenha sido esta sua intenção. A ativaçáo se baseia fia hipotese de que quanto mais estratégica seja a mudança proposta em uma sociedade, maior será o conflito gerado. Daí que o ativista investigue contradições específicas em uma comunidade e nela se insira esperando acirrar conflitos e acentuar contradições , adotando

o papel de mecânico das forças sociais, as quais acredita

com-

preender, sem no entanto se certificar de que as proprias massas estejam em condiçoes de produzir as ações necessárias no momento oportuno.

Ate agora, os acontecimentos indicam (como nos casos promovidos por alguns grupos políticos na Colômbia) que o ativista, na verdade, consegue fomentar alguns dos conflitos postulados teoricamente, mas não consegue projetá-los sobre a estrutura de classes existente devido às limitações dos marcos de referência empregados (muito confuso, às vezes), nem consegue fazer com que as populações alcancem o nível adequado de consciência políttca paÍa assegurar a continuidade autônoma do processo iniciado. Muitas vezes o quadro acaba expulso da comunidade sem que esta se tivesse organizado realmente para a luta, alertando o inimigo e provocando sua reação fazendo da qual a comunidade será a única vítima com que as populações retrocedam em nível político. Por isso, esse tipo de inserção nas circunstâncias descritas tem-se revelado contraproducente.

A investigação militante A inserção como técnica de aproximação da realidade se baseia em uma combin açáo de atitudes e de conceitos teórico-práticos que põem em xeque muitos dos mitos entre os quais se formaram os intelectuais e gue, precisamente por não corresponderem à reali-

REPENSANDO A PESQUISA PARTIC

IPA\TE

l-il

dade' interferem na ação produzindo desfocagens. No caso colombiano, alguns profissionais têm sentido a necessidade de inserção no processo historico em vários níveis, especiatmente local ou regional, como forma de romper com modelos inadequados de explicação e ação' Pata tanto, alguns de nos abandonaram os recintos universitários (reconhecendã serem, em geral, f;íbricas de quadros para o imperialismo capitalista) ou pusemos em quarentena os marcos de referência da ciência ortodo^à . parcel adairunr*itida pela universidade tradicional (a que se inspira em scheler e nos foi transportada mais tarde, especi alizada á a.purtamental izadasegundo interesses ideológicos e políticos .r.oú.rtos pelo manto acadêmico). Saímos então a campo para experir.ntui u interdir.r;;;'ü;;á, reformular conceitos e trabalhar com as populações à base da sociedade' descartando as três atitudes anteriormente assinaladas como caraçterísticas do intelectual alienado: a ingenuidade, o moralismo e o compromisso consciente com o sistema. b ,orceito-guia foi o de colocar o conhecimento a serviço dos interesses populares, como se detalh ará mais adiante.

Naturalmente, como

modalidade teórico -prátrca de trabalho, esta forma de focalizar o compromisso e experimentar a inserção não constitui nenhuma novidaà e, iáL que tem sido recomendada e aphcada por diversos marxistas, notadamente por Lenin. Mao e Giap em seus próprios termosl ao se referirem ao ,,obse^.ador -

- ou quadro adestrado obseivador militante nas téccompromeiiàú.á;;;;;r. popular ttaduz em realidade o compromisio, reconhecendo todas as suas conseqüências ' o resultado é u*u técnica de inserção muito mais decidida e efic az do que as mencionadas anteriormente. Esta técnica pode ser denomina da investigação miritante. militante"'6

o

nicas de investigação social e

(6) Em Mao Tsé-tung, esta técni.., contribui pa ra a teoria do conhecimento ,- que i d* em seu princípio massas - se express? especialmente aplicada na etapa de Hunan: ver suas obras às massas,, e foi escogidas, t. ,r, Pequim' Ediciones en tenguas Extranjeras,_196g, p. r rg. De Lenin podem ser consultadas diversas obras, especialmênte eue fazer? (Trad. Oras., São paulo, HuclrEc' 19JP) e o enfo!ue oãoôãor probtemas ãá articuração do movimento operário na RÚssia ' outro autor notável, antijã p-roFessor de historia, Nguyen Giap, o atual estrategista e Vo norte-vietnaõritá Oe quem se pode quisa sobre camponeses ler pes_ e ouúos onde se combina a observação com "n.rio., com a seriedade necessária às tareras historicas a ;rilffili'Sàr"ffX sue se

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

t42

(OTg.)

Pressupostos teóricos

O cientista que penetra na realidade como investigador militante tem uma forma de conceber a si mesmo e à sua própria arte, isto é, baseia-se em uma série de pressupostos teoricos que orientam sua atividade e que podem ser resumidos como se segue:

1) a metodologia e o investigador não são duas coisas separadas. Assim, a metodologia de aproximação não pode ser utilizada ou manipulada ate as últimas conseqüências por um pesquisador não-militante, porque apenas este pode extraí-la da teoria e de sua própri a prâtica, aphcâ-la, critrcát-la e assegurar-se de que é ou não válida e eficaz no que diz respeito aos fins perseguidos, se é adequada para tal região ou tais circunstâncias. Assim, o investigador militante imprime um caráter dinâmico ao método de aproximação. Somente ele está habilitado a descobrir quais são suas aptidões e de que maneira pode ser mais utilpara a causa do setorpopular em que está inserido. Um cientista social não comprometido com a causa popular nunca conseguiria isso, mesmo se soubesse de cor alguns conselhos práticos sobre metodologia de aproximação;

2) a metodologia é inseparâvel dos grupos sociais com os quais o investigador trabalha . A metodologia não será a mesma conforme se trate de um grupo camponês ou operário urbano, conforme se trate de um grupo de trabalhadores predominantemente negros ou mulatos, brancos ou mestiços, ou de camponeses indígenas;

3) a metodologia yarta, evolui e se transforma segundo as ou a correlação das forças sociais, effi

condições políticas locais

conflito velado ou aberto. Assim, se as forças reais do advers âno social forem mais poderosas que as dos explorados será então desaconselhável um tipo de metodologia que faça abstração de tais condições; 4) a metodologia depende, em grande medida, da estratégia global de mudança social adotada e das táticas a curto e médio prazo. Assim, a metodologia não é uma enumeração pura e simples de certas regras ou princípios sem referência a uma compreensão global do processo de mudança tal como foi coloc ada pela organizaçáo popular que o persegue.

,

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE .;

t43

Coordenadas metodológicas

l)

IVÍodo de aproximação

A) Antes de vir à região, sindicato ou bairro, é necess ârio infbrmar-se o suficiente sobre esses lugares ou grupos sociais. Ler livros, recortes de jornal , relatórios, documentos fazer entrevistas , com pessoas que conheçam esses lugares mesmo de maneira superficial ou oficial. B) Ir ao local a fim de tàzer ume

rnspeçào ou reconhecimento pode consistir em: a) visitas aos cenrros de trabalho: b) consultas a instituições do gor'erno ou da empresa prir-ada

inicial,

Que

que possuam documentos sobre a região, estatísticas, planos de , mapas, custo de vida e empresas comerciais, industriais, extrativas ou financeiras que operam na região. Exemplos de instituições: c àmara de comêrcio, INDERENA, IDEMA, Agência Regional do DANE, Arquivos Municipais, INCORA, ICA desenvolvimento, ruas

etc. ;

c) conversas com profissionais que trabalham na região para

saber quais são, no seu modo de entender, os principais problemas e a importância da regiã,o, as atividades culturais e o modo de ser das pessoas, quais forma foram os conflitos mais relevantes

ali ocorridos

etc.;

d) visitas a sedes sindicais, de usuários ou cooperativas, a fim de solicitar seus periódicos ou boletins ou informar-se de suas atividades e filiações em nível nacional, do número de operários sindicalizados e em quais ramos da economia, enfim, sobie a existência ou não de operários por empre itada ou outros tipos de trabalha-

dores;

e) entrevistas com sacerdotes, professores e outras personali-

dades do campo religioso ou educativo.

C) Identificar as classes, grupos sociais ou pessoas da região vir a ser aliados a curto ou médio piuro (autoridades simpatizantes, membros do clero, funcionários públicos, médicos que podem

etc.).

D) Averiguar quais grupos políticos existem na região e que forma de pressão ou de controle exercem sobre grupos sociais organizados, sejam estes preservadores do sistema social vigente, ques-

IM

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

tionadores do mesmo ou simplesmente opositores alternados do governo, analisando os resultados reais obtidos por uns e outros.

E) Com as informações prévias ou com os dados obtidos do "reconhecimento inicial". tentar uma análise primária e provisória

a:: ;.*a:iõ í :n I-.:'-::-i í :i:*:3zr .le >CuS COnt-litOS COm baSe nO ;r:lcrjo cie pro.lliçàrr pre,jt-rrnlnanle e as relaçÕes de produção e troca existentes.

F) Identificar o tipo e a natureza das lutas registradas na região ou promovidas no passado por grupos sociais determinados, ou que estão se produzindo no presente (dentro do sistema, contra o governo, contra o patrão ou corporativas, lutas cívicas ou reivindicativas que interessam a toda uma gama de grupos sociais inclusive opostos entre si, "fora da lei" e outras); analisar os resultados de uma e de outras lutas, o tipo e o nível de consciência que as moveram ou movem (consciência corporativa, cívica ou regionalista, de classe ou política) e o papel que desempenharam ou desempenham os srLrpos populares em tais lutas. G) Analisar os planos de desenvolvimento sócio-econômicos que podem afetar a curto e médi o prazo o futuro dos grupos populares, tais como deslocamento de bairros, automatizaçáo da produção, construção de vias de comunicação, instalaçáo de novas indústrias ou de fontes de emprego reais ou fictícias. H)

Fazer um inventário das formas de controle social diretas ou indiretas exercidas pelo sistema vigente, em aplicação ou em estudo fiuntas, comitês, movimentos etc.).

D Estudar as çaracterísticas culturais e étnicas da região, e determinar provisoriamente quais são os elementos etnoculturais que parecem ter desempenhado ali um papel relevante nas lutas sociais e reivindicativas.

Uma vez realizados os estudos anteriores, o investigador terá em seu poder um conhecimento provisório, não definitivo nem completo. O passo mais importante ainda está para ser dado: o conheciment o de dentro, através de contatos e relações políticas que expressem seu compromisso com a causa dos grupos sociais identificados como "chaves". Como drzram alguns investigadores militantes do PRP do Vietná: "Nossa estimativa não se baseia nos livros, mas na prártica, não é feita de fora, mas de dentro, e se baseia nas experiências e na luta cotidianas. Não poderíarnos drzer se nossas

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

145

conclusões serão validadas em outras partes, mas estamos efetiva_ mente convencidos de que, flo que se refere ao Vietnã, elas são corretas". T

2) Conhecimento

o objetivo

através da ação

do investigador militante é colocar suas técnicas e os conhecimentos adquiridos a serviço de uma causa. Esta causa é, por definição, uma transformação fundamental da sociedade enrolvente da qual o grupo, a região ou a comunidade estudada tazem ' parte' Do ponto de vista da inr estigaçào. esre conlpi-trnr:>>ü rirplrcr metodologicamente o segui nte itinerárc,.

A)

Analisar a estrutura de classes ,Ja regiãrr tru zona para determinar os setores e que desempenham ari um paper_ -qrupos

chave.

B) Tomar desses setores ou grupos-chave os temas e entoques que devem ser estudados com prioridà0., de acordo com o nír.el de consciência ou de ação dos próprios grupos. C) Buscar as taízes históricas das contradições que dinami-

zam a luta de classes na região . D) Devolver a esses setores ou grupos-chave os resultados da investi gação

com vistas a atingirem maior

ação.

c

lareza e eficácia em sua

Este último ponto (a devolução do conhecimento) afeta e condiciona toda a técnica do investigador militante. Baseia-se em um sentido ético distinto do usual nas investigações sociais correntes e fornece as bases para julgar a validade áo, dados recolhidos em campo ' Impli ca fazer com que o próprio pesquisador seja objeto de investi gaçáo: sua ideologia, seus conhecimentos e sua prática estão submetidos ao julgamento da experiência popular. Rej eita a explotação das populações (um verdaãeiro ,uqr. a seu acervo cultural e ao tesouro de sua experiência) quando àstas são estudadas como "objetos de investigação", e ind'uz ao respeito às pessoas, à sua contribuição direta, sua críticae sua inteligéncia. a necessidade que o investigador militante se impõe de devolver às bases populares o conhecimento adquirido repousa, além do mais, no pressuposto de que a classe popular campesinato, por exemplo embora

)

1969,

(7) W ilfred G.

p.

18S.

Bu

rchet

, El

tri

u

nf o de

Viet-nam, Ed. Ancho Mundo,

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org')

146

contrário, é dona analfab eta, não é por causa disso ignorante: pelo modos e maneiinúmeros de uma rica .^p..iência de luta, -.orh.ce amiúde dê'uma participa defender: se e sobreviver ras de aprender,

respeimemoria coletir-a. que torma uma base ideologica e cultural que se adiante passo qualquer que compreende tár.e[ e. portanro. j exisá pretenda dar der-e esrar afiançado por este conhecimento popuclasse da tente. Em conseqüência. os setores ou grupos-chave aqueles que Lar aparecem como grupos de referência que deslocam nos centros e país do haviàm sido adotados nos meios universitários

ou de esacadêmicos europeus e norte-americanos (de direita autoridades as ser de querda), cujas figuras ou pensadores deixam finais ou inaPeláveis. Tudo isso, na Ptártrca, imPlica: 1) que os trabalhos são concebidos com os setores ou gruposchave de base e seus órgãos de açáo;

Z) que a produçáo das técnicas de pesquisa está primordial-

próprios termente voltada aos setores da classe popular em seus ele se cientista, do (no caso eles com mos, isto é, escritajuntamente seu instru,,expropriar" e técnicos conhecimentos seus de deixa seu processo mento pelos setores-chave com o intuito de dinamizar histórico);

que formas adequadas de comunicação dos resultados são mais claro e requeridas, estabelecendo-se um novo "idioma", muito tradicionais; honesto do que o costumeiramente usado por cientistas enconemergentes hipoteses e conceitos que os 4) finalmente, e imetram sua confirmaçao ou rejeição através do contato direto mãos nas ter diato com a realidade e pela utilidade que demonstrem de de setores e grupos-chave , para a formação e desenvolvimento que organizativa sua consciência de classe, . ãr acordo com a força se busca essa não conseqüência, Em engendrar. de capazes sejam

3)

.rqrr.*u, teóricos de "grandes pensadores" da universal" a qual, nesse sentido, não pode existir, por-

confirm açáo nos ,,ciência

que aquela que assim se considera é apenas parte do aparato

de

domin açáo imposto sobre nós pelas metrópoles' transOs setores-chave majoritariamente estratégicos para a enconvanguarda) de os (como colômbia na formação fundamental isto é, as tram-se entre as classes expl0radas urbanas e rurais, de proprocesso no trabalham que camadas formadas por aqueles cirdas depende concretamente esses são dução. Saber que setores e relações produção de (modos históricas ou regionais cunstâncias

REPENSANDO A pESQL-ts.{

p

{RTir.ip {\TE

A incentivação Munidos destes

conceitos e pressuposições, e com o conhecimento obtido por um modo correto de ãproximação, o metodo de estudo -ação leva-nos geralmente ao que se tem chamado de incen_ tivação' Esta se dá quando o p.rqrisador militante, inserido em uma região ou comunidade, .orr.gue determinar pontos de partida reais (níveis de consciência) para reivindicações que podem levar a esforços sucessivos na luta p.tu justiça (lutas cívicas, salariais, pela posse da tetra, por serviços priuíicos, escolas, postos de saúde etc.), até chegar a conflitos de classe orientados para mudanças mais fundamentais e estratégicas. Neste processo, a investigação consegue determinar os incentivos parciais que mobili zam o maior número de elementos da localidade, tanto humanos quanto materiais e historicos' os incentivos provêm do tipo de problemas que as comunidades experimentam, segundo a forma específica de exploração à qual as populações se acham mais sensibi lizadas, sejam tais formas institucionais ou grupais, econômicas ou culturais. uma modalidade dessa te;cnica e a que se poderia denominar recuperação crítica' A recuperaç ão crítica é feita quando a partir , de uma inform ação histórica e de um reconhecimento efetivo adequados' os investigadores militantes chegam às comunidades para estudar e aprender criticamente a partir da base cultural tradicional, prestando atençã,o preferencialmente àqueles elementos ou institui_ ções que fo.ram úteis para enfren tar, no passado, os inimigos das classes exploradas' uma vez determinadàs esses elementos, procede-se à sua reativação, para utilizá-los de maneira similar nas lutas de classe do presente. Exemplos de práticas tradicionais ou

I4SCARL0SRODRIGUESBRANDÃo(org.) são: o resguardo dos indíinstituições recuperáveis dessa categoria a guachinga' a tiradeira e a genas, o cabildo, u ttotu á. Útu:or, ão *.io rural colombiano) ' mina(expressões culturais e econômicas de base e outras pessoas inforNesta técnica, o papel dos quadros (que souberam resistir à ideologia madas dentre as crasses populares dos valores populares) das classes estrangeirizantes, depráciadora e prodvztraÍn conhefoi fundamental pela forma como responderam As comunidades incencimentos dentro do processo de estudo-ação. um considerável salto adiante tivadas dessa forma conseguiram dar no nível de consciência Potítica' simplista ao primitivo Esta técnica não persegue um retorno aspectos passivos da tradição, ou bucólico, nem fecha os olhos aos Trata-se simplesmente de uma nem pretende ide altzar o passado.8 recursos que a memória coletiva utirização dinâmica e realista dos

antzattuu qr. as classes populares oferece, e da infra-estrutura org mais aperfeiçoados de orgaproduziram para poder pass ar a níveis da luta. lsso obriga os investinização de acordo com a natureza trabalho ao nível real de consciêngadores militantes a começar seu nível que os próprios quadros cia política das populações e não ao reflete uma atitude dogmática rêm, já que esta uú;;possibilidade geral, conduziu a lamentáveis fra' de superioridade QUe, por regra cassos na

práttica'

Ão

inr.en

,se às comunidades para

^ô Comastécnicasdeincentivaçãoval. de contribuindo com diversos projetos realidades, aprender suas de gama ampla a descobre-se colaboração local. Nestes projetos,

ou grupos de base, expressados ' recursos com que contam os setores a " merancolia da raça indí(g) os ideorogos do sistema fararam sobre Juán c- Hernández, Luis sorano, (Arnranào 'u*, dado ei*rirr"r

gena,,como argo deformação cultural ser ãi, López de Mesa, entre oúiros1, ocurtando abençoada pela relieiproração oe ãnoas causada por sucessrvas que fazer com as ".óÀo*ica o de questão a com gião coroniar. Hoje defrontamo-nos país que se encontram na vanguarda da dó denmassas de camponeses indígenas buscam "introd uzir inovações" luta em muitas partes. os conservadores grupos avançar dentro esses a permita tro de uma margem de segurança orá dírecionaãas"' sua filosofia se do sistema capitaustal õü;d;'fi;ir;;à; resistente à mudança' intrinsecamente e camponês que o baseia em acreditar àquilo qu9 vem de convém, tnã qu" Àao áã resiste rsso não é certo, ;a quã ere obstáculos na vêem só r"rótr.ionários poróutro rado, *üIoê cima para baixo. e a historia sociedades as tãâ* "á Àirtoria'de tradição, esquecenoo-ãà ã" que

evidências nistoria é a que nos proporciona de uma ruta de crasses,, , e que "rrá classes populares atcàÀçao" p_"1:: conscicncia de hiver e indícios a respeito of pàó"o afiançár-." paia atingir o desenvolviem uma rerigião, sobre a quar e de consciência e ação. mento em direção a niráir'*ais eievados

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

I

por exemplo' em sua história, seu folclore, seus líderes (lidera:go t em sua "malícia" e experiência o que os leva a aglutinar_se em torno de interesses, acererando situafoes críticas ,;.;;;;;i;r';. conduzem a um nível mais elevado de consciência social e política. "

Esforço próprio

e

ajuda externa

o investigador militante precisa comer e atender a suas necessidades' e o desenvolvimento da investigação científica demanda gastos em todas as suas etapas, desa. o prime iro des locamento (transporte) ate a devorução áo conhecimenio adquirido (os meios

de comunicação).

Este problema financeiro deve ser colocado no grupo de base com que se faz a investigação. o apoio financ;;;;; parte desses grupos, embora seja mínimo, é o mais importante porque lhes

permite considerar diretam.ri. o custo i-plicado pela defesa de

seus interesses' ao mesmo tempo que tempera

o caráter através de maior interesse e necessidade de àrr.gu*, um bom manejo dos fundos disponíveis, quando estes representam esforço próprio: isso leva-os também a cuidar que o dinheiro seja empregado correta-

mente a serviço dos grupos populares e não em benefício de pessoas oportunistas; ensina, além disso, que embora o dinheiro seja necessário' o principal que impri me razão de ser ao financia- aquilo utilidade e prestação de serviços que rem

,H:n**ff.?3i:,tinde

a

A importância de obter o apoio financeiro popular local ou nacional é assinalada pela Frente pRp do

seguinte forma:

do vietnã do sul

da

"Nossa luta é feita exclusivamente pelo povo:

Íls forças constituídas por nós mesmos (" A ajuda ') externa nos poderia ser útil, mas os do povo

:i*iTs

sul-vietnãmita devem continuar sendo o fator deci-

Quanto à "ajuda externa" (a que provém de fora, de outros grupos ou pessoas, de instituições naciônais ou estrangeiras), ela coloca dificuldades e implica riscos que os investigadores militantes e as organizações de base deverão considerar ein cada caso particu(9) Burche t. op. cit., p. 1gS.

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO'(org.)

150

lar, com vistas a superá-los. A decisão de aceitar ou não a ajuda externa não ,Ceverá ser tomada com base em um falso puritanismo financeiro que rejeite todo au\ílio econômico proveniente de instituições. pessoas e entidades pela unic a razão de não estarem abertamente comprometidas com a causa popular. Tal rejeição pode resultar simplesmente em deirar o campo da investigação científica entregue apenas aos inimigos da causa. O investigador militante e as organizações populares interessadas no conhecimento científico farão bem em recordar que mesmo movimentos de carâter indubitavelmente popular e antiimperialista, como o iâ citado PRP do Vietnã, declaram a respeito que "aceitamos toda ajuda incondicional, venha de onde vier, dos países ocidentais , da França , da Inglaterra e ate dos Estados Unidos, desde que reconheçam uma independência verdadeira ao Vietnã do Sul, retirem suas tropas e nos ofereçam ajuda politicamente desinteressada".r0 De forma semelhante. toda org anização popular e toda instituição que leve a cabo a investigação militante der-erá impor condições à ajuda externa, com respeito nào à sua origem. mas à sua absoluta incondicionalidade. lsto quer dizer: l) que se respeite a política traçada pelos grupos receptores da ajuda no que se refere à concepção e ao desenvolvimento da investigaçáo, bem como sua aplicação ou reserva; 2) que os doadores não intervenham nem antes, nem durante , nem depois na investi gaçáo militante; 3) que não haja nenhum tipo de supervisão contábil sobre o manejo dos recursos recebidos.

Todavia, é preciso enumerar os seguintes riscos que pode acarretar a "ajuda externa"

:

1) A tendênci a a gerar nos grupos populares que a recebem uma atitude de dependência que castra ou desestimula suas verdadeiras potencialidades de auto -susten taçáo, chegando às vezes a produzir uma atitude de menosprezo a seus próprios esforços; 2) O risco de permitir que o trabalho de base seja determinado pelos interesses, inclinações ou preferências dos doadores. Isso às vezes se produz por ingerência direta, a qual deve ser repelida imediata e energicamente. Outras vezes é feita de forma mais sutil,

por meio da oportunidade calcul ada com que são oferecidos os recursos ou pela destinação dos mesmos para certos aspectos da investigação, que passam a ter prioridade porque "há fundos pata isso";

(1

0) lbidem, p. 1Bg

.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

15I

3) A corrupção

que sempre espreita os responsáveis de toda organização, quando é possívelo gurio de recursos som uma estrita disciplina dit ada pela cànsciência mais eler Ess ada da \rc{' vr .l;;; p"p";, e de sua causa. Esses perigos podem e devem ser mantirJt-rS sempre presentes e confrontados por meio de contínua atitude de r igilância. Se a organização popular e os investigadores militantes nàc esràtr seguros de poder dominá-los, é melhor não aceitar a aj uda .\re:-n3 \Ías se o não aceitá-la não seria uma talta gra\ e con:ri i c3!sa

,Tj:"'

F.-pu-

Resumindo As técnicas de investigação militante vão mas clássicas de observ uçao participante, mais além das forsurvey, camuflagem, entrevista diplom ática ou equilibrada i empatia sem compromisso ulterior' todas as quais funàam-se em uma busca de consenso ou acordo entre as partes. Por isso, essa modalidade de estudo -ação não serve para o mero administrador de projetos, nem para o manipulador da ação comun rtária, nem pata o erudito que persegue os louros da academia. Nesta forma, consegue-se passar do que tem sido, na prática, uma metodologia do consenso para o que chamaríamos uma meto_ dologia da contradição, ern cànformidade com os postulados da teoria do conflito, com a qual se trata de expl icar a atual problemática colombiana(ver mais adiante). A atitude decisiva do investigador militante é o respeito para com as populações imersas nos processos sociais que se deseja estudar. Esse respeito se expressa particularmente através da dwolução do conhecimento aos setoreschave da classe popular, cujos interesses são assumidos pelo pesquisador' Sua tarefa específica como cientista social é devolver às massas com maior clareza e de forma sistem atizad,ao

que delas recolheu difusamente.

conhecimento

Implicações científicas e teóricas

o método de estudo-ação tem o mérito de colocar e buscar a interação permanente entre a reflexão e a prártica diária. por isso, os

|52CARLOSRODRIGUESBRANpÃo(org.) nas tecdefinem como pessoas treinadas investigadores militantes se e política' e formadas na prática social nicas de observação científica se princípios seus os todos contra trabalho se desvirtuaria e iria

o

os um empirismo rimitado a constatar suas causas, ou um aventureirismo fenômenos sem indagar por se no plano da o ensaio-e-erro, ou ainda

estas pessoas praticassem

irresponsável onde primasse o ttaconceitos centrais que guiam reflexão fizessem abstração dos teóricos prévios e emergentes' balho de campo e dos marcos perigo: o de enganarem a si No caso dos empiristas , hâ;";t; originais, pois neste domípróprios pensando serem absolutamente com que o pesquisador chega a campo nio não se parte do nad a, iir por

técnicas que foram reunidas algumas iáeias básicas e certas produto que o precederam ou que são investigadores ou cientistas continuidade esta reconhecer do ambiente onde cresceram. Nã;

mãos e que possuem tt signit-ica desperdiçar os recursos eul -ttT-em muito menos erráticos do que o nlerittr de tazer os ?'ot:::-"^t-::tiais militante. em duas diversas modaparecenl. ptrr issr.. a in\ esrigação técnicas de investigaçáo com-

de li,Ja,Jes. nãtr implica tr abandono prt-rr adamenre

de grupos sociais' a uteis. como a pesquisa atual todas

urquiro, a medição estatística' ampl0s e ágeis. Deve-se partir inseridas em marcos óonceituais um vazio trabalhou nem se trabalha em então do fato de que não se

de anárise historica. a pesquisa

roteiros técnicos conceitual: pelo contrário, existem

e

teóricos prévios

ou inconsciente' uttltzados dã maneira consciente que o capitatismo tem sua tampouco esquecer deve Não se ieoria com a prâtrca, para formar própria maneira de cómbi rrar a conhee criar as formas de exploração suas instituições imperialistas

em impérios modernos foi possível' cidas. Assim, a construção dos adecientífico e tecnológico grande medida, pelo desenvorvimánto

quadoaosfinsperseguidosporseuspropriosinteresses. científica imperialista, os Em contraste com essa corrente mili-

a si mesmos como investigadores cientistas sociais que colocam do método de estudo- açáo visam tantes e seguem as pautas próprias explorados e

dos grupos pôr o conheci*.nio aaquirido a serviço fundamental. Em de transformação

oprimidos, effi uma causa

con-

vários cientistendência (obsárvad a iiL em seqüên cra,continuamos a se menciona como anteriores, tas sociais colombianos de décadas que dominar por escolas sociológicas mais adiante) de não se deixar opressoras ' o poder das classes serviram na prátic a para afiançar da ca cientíÍi de explicação os modelos Assim, seguimos desôartando positivista, tradição sociedade provenientes da

por refletirem

os

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

...

153

interesses de uma aristoc racia(pos-napoleônica , rrà Europa) que se identificou com o surgimento aà capitalismo e cujas tendências particulares persistem até hoje.11 Tambem conn.-u'Ãor-rorru

rejeição anterior' por inadequaçaó, dos parâmetros do estruturalismo funcional'l2 que descreve a sociedade como o produto de um ,,equilíbrio" baseado em um or'denamento interno e no princípio da integração social' Não consideramos satisfatoria tampouco a escola formalista, por encont rá-la reduzi,Ja 3 rnedicões

e\ternas e nrecânicas dos fenômenos sociais ou e e\p::ce..-,jes ,:nr:a,i:s da cu!tura

manifesta.r3 Não é tarefa f,ácil para o crentrste Strclê. Iürrn-tio ness.?,s ::id:burguesas ções descartar seus marcos de retlréfir,-râmas ie atrngiu esse ponto por meio de diferentes itinerários. cabe recordar a ot,ra ,Je rebeldes como camilo Torres Restrepo, que, partindo de um pr-,sitivismo algo ingênuo, culmina sua vida ,o interior do mar\ismo. plenamente identificado com a luta popular. Teóricos como RaÍàel uribe uribe e Luis E. Nieto Arteta deram contribuições igualmenre importantes' Ignacio Torres Giraldo soube combi nara teoria com a ação revolucionária em sua época. Todos eles procur aram enraizaru. realidaà., terrígenas para chegarem a postuiljJJ:ffi,fl;JJ,i

(11) o fundador dessa escola, Auguste comte, deu origem do mesmo modo a uma religião da sociedade qú" muitos adeptos na America Latina ' Foram seguidores do positivismo, "ncontrou Arturo Torres, salvador camacho Roidán, entre nós, escritores como carlos Luis-r-àõ". de Mesa, Rafaer Bernar Jiménez e outros sociologos. (12) Esta escola se origina a pr.t-t]r de proposições de cientistas sociais como Bronislaw Malinowski, Á nadcliffe-Brown'e Max weber, retomadas na sociologia por Talcott Parsons, Robert cana. Muitos antroporogos na corômbia Merton e outros da escora norte-ameriseguiram essa tendência. (13) contribuições importantes oeúro dessa escora

austríaco Moreno e de geógrafos trabalhos (especialmente-tesõs) da

nrrrno,

àntig,

são as do sociorogo Arguns

A. Demangeon. o" sociorog)a da

como

racúitãã sidad Nacionar podem ser ctassíficado, Univern"r., categoria (14) Encontra-se maioii;;pffiã.o no exeripro e nas obras de diversos rebeldes nacionais que, por regra geial, os nistoiãdores da colômbia, tindo somente os int'eresses oaé reflecla-sses dominantes, ignoraram. pertinentes existem e um, dos os materiais ooi"tirãs da Rosca-9" Investigacion y Accion social tem sido descobri-los, r;;üó;;ã-ro, projeto de publicar as memorias .9 qirrrgà-ror. Rearizou-se assim o oo exiraordinário ãàrbatente inãigena do sé-r"rr, culo XX, Manuel Quintín Lame, in-dài"r* editado por Go nzalo castillo cárdenas (Bogotá, pubricrãion., de mi de ra Rosca , 1gr1); acaba-se de publicar também a biografia política de lmpõe-se a busca da lúeratura sobre Maria caÃo, por lgnacio Torres Giraldo. a tuta poputai oesoe fins do século XVlll: .

BRANDÃO (OTg') CARLOS RODRIGUES

t54

da confron-

intelectual q":, se nutre Esta esquecida corrente que busca a rarz das contradições taçáopopular com o sisteÍrâ,

de

cadaépoca,QUedestacaoSantagonismoSeoSinteressesdasc1asses a escola sociodissimulada con'erge para são sociais, el,r luta abertaou Dentro dessa escora, evidentemente' seus logica do conflito social. de e sua principal figura pertinentes as obras de Marr a vertente que aqueles que seguiram seguidores, muito mais do de construrr Gumpro*i.r. Trata-se agora aparen Íadade Bagehot naturalantigos que desembocam sobre fundamentos intelectuais 15 da luta de classes' por mente na conhecida teoria e hipóteses desenvolvidos ttzaconceitos concre Esta teoria constitui não dentr;.;fora 1:,1"t' o que observadores da sociedade, tomada de uma a equivalha embora não é no'idade de maneira algu rna,

::::1:'' ^':tu*' posição ou a uma n..ãr, a,a sim tratar de a essa teoria, e con\ eniente aderir dogrnaticamente quadros de er idência recolhida l"^i, redet-rnir cLrnceitos à ruz.da social.e ciência a E necessário recordar que cuJo inr estigaç.-ões militanres. um sistema hipotetico-dedutivo dtzet no areoria sociar não constituem são' mas eternas, e obietir o seta formurar dogmas 'erdades soctal aparece clarific açáo

,,julgamentos sáciais da prática". A ciência do movimento realidade, "COmo o produto ao então como deve ser na revolucionária a ser

de

\1ar\.

que chega historico e como uma ciência

a revolução de

1852''

a frente; os artesãos duranteos operários e os com uneroscom Garán oo-lrt à, nntiãquiu; .lideres antitaiiiunáirt* guerrilheira do tradição os camponeses ;;;, 1g1g; u p"riii de índios levantiscos etc' camponeses da costa Ailântica negros cimarron", á dos em país; a tradição-rebelde dos do conflito sociar encontram-se (15) os fundamentos da escola *"no, sistemalizada' No caso do maneira mais ou lbn Khaldun' Hobtodos os continentes de sobresrr"* Heráclitoã Éoríbio, Nkrumah' Lumumba' ocidente, como se sabe, ,lorrecgT tr',tao' Giap' e Mariátesui' bes, Hegel e Marx. ultimamen," Nyerere 'ã' irnãn . ua'Ãmerica çi'il'r'^yfl,I'-i";t'Éonifácio é útil paru ilustrar o quadro sociais

;políticos Entre os autores A leitura desses autoi"='- nã'cotoÃbia, não prrrl*plica-la' e Eugenio Ancízar generic; ã rrtã o" ctaêes vt'nuel do ,áóuro xrx, corombianos mais p"rtin"ntes Emiro Kastos, "tião colocou em 1851 a ameaça que a miseria Diaz,sobre o probrernã iriãr; óár seu estuqo sobre

Miguel samper, em diversas imperiarista norte-am"ri"un"; e'Died-o Mendoza Pérez' ü"àrroó"n,rás carinão, ja mgncionados no texto: urbana; Aníbar ateri-oos Neste'rà*ro, passagens de seus Hernández Rodriguez' "r.ritôr. i.-ôoràr, cuiitermo piimeiras fases); Antonio Arejandro Lopez .r. õ., Êugenio úrtimos rrà-r g.:j^ Posada' "* rtnáiôArrubla' Francisco Friede rndatecio L. Aguirre (estesprimeiã;';b*ri, e zurera' Juan Garcia (especiarmente suas r=üniriro ar, õ*rr ru.gntgr" representa a culmiobra Rafaer Baquero, Diego àúrà Restrepo,' Torres outros, assim .oro-"õr*ito e polfticas ' nação'0"úr tendêÁcús intelectuais

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

155

deixar de ser doutrin ária,, ,portanto, não se faz aqui nenhum decalque de teorias tal como foram formuladas em

outras latitudes epaíses' nem se incorre no colonialismo intelecir;i-de

esquerda que castrou tantos grupos revolucionários e universitários, porque o método de estudo-ação procura afiançur-o^n;;;;iidades colombianas' nutrir-se delas uo mesmo tempo que exige uma resposta autêntica a estas realidades em termos de atos e evidências, e não

apenas de paravras ou debates meramente ideorogicos. Tudo isso leva a recolocar a sociolo-eia mar\ista do contlito enr termos de especificidades historicas

e.oldicionamenros

regronais e locais' Esta recolocaçãojá se acha implícita nas reses aruajmenre ern voga sobre "dtpendência" e "subversào" que analisam ao macronível "latino-americano" as formas concretas de e\proração externa e interna que se verificam no continente, bem como as formas de pressão popular e suas expressões organizativas em termos da luta antiimperialista e antioligârquica. Entretanto, essas teorias necessitam ainda ser enriquecidas matizad,as e coloridas pelos , condicionadores econômicos, históricos e culturais de cadaregião e localidade colombianas, o que viria a ser uma manei ra propria de ver e entender' em seu conjunto, nossos atuais conflitos e a naturezade nossa sociedade dependente e expl orada. É ;;;i; ; ;r. se referia Torres Giraldo ao falar em "nacio naltzar o marxismo,, segundo as situações concretas do país.17 Em nossa própria experiência de campo este esforço significou primordialmente um a grande flexibi' lidade e abertura, no aspecto metodológico, e uma sensibilidade especial aos modos e maneiras historicaÃente assumidos pela luta de classes em cad'aregião, tendo em vis ta não somente as expressões econômicas e reivindicativas como também as culturais e sociais. Pôde-se

assim identifi car zonas sócio-econômicas de predomin ància etnica indígena ou negra onde a consciênc ia etnrca tende a coincidir com a consciência de classe e onde a histó ria daluta de classes esteve intimamente ligada à afirm ação da etnia e de seu patrimônio historico '18 Nessa mesma linha ganharam importância diferencial diversos fatores que poucas vezes são valoriiados do ponto de vista da

(16) K' Marx, La miseria de la filosofia , Buenos Aires, siglo XX l, 1gr1 (17) lgnacio Torres Gira ldo, Maria cano, muier ter reoetde, rebelde, tBogotá, publicaciones de ta Rosc p.1 09.

,

a,1g72,

pp

.ll'l_liz.

(18) ver estudos sgorô etnia; ;rltu ra e classe sociar, a ser pub ricado proximamente por Roscade r*ãriiJá"]o, y Accion sociar.

156

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

luta pela mudança radical, tais como

a

arte popular, o folclore, o

sentimentoregiona1ea1gumasinstituiçõeS.comoaSmencionadaSem outra parte deste estudo (ver p. 147) que são proprias da tradição específica de alguns setores da classe popular colombiana e que podem ser recuperados para sua luta atual. A sorna de interpretações dessas realidades daria un'ra teoria propria e adequada da luta de classes e o contlito social na Colômbia. mais util ainda paÍa a determinação dos grupos-chave regionais e em termos das mudanças perseguidas por eles. Naturalmente, esta teoria propria encontra-se ainda em germe

e sua elabor açáo constitui um desafio a todos aqueles que estão atuando e estudando como investigadores militantes ou em outras capacidades dentro do processo histórico colombiano.

Em conseqüência, contorna-se agora a exigência de maior rigor na tarefa do investigador militante. Deverão ser desenvolvidas além das já conhecidas, que e ensaiadas técnicas de estudo e ação permitam apreender a que novas outras e adequadas, sejam complexa realidade em sua propria função, sem distorcê-la. Isto implica também a prâtica de uma verdadeira ciência social interdis-

ciplinar, na qual a sociologia, a historta, a antropologia, a economia e a geografia se combinem na figura do investigador militante de maneira simultânea, tratando de romper os compartimentos estanques em que estas ciências se encontram , para pro duzrr uma ação mais efrcaz e uma teoria mais ág1l e realista. Além disso, o investigador militante deverá saber dirigir a atençáo para os fatos mais pertinentes e significativos de cada região para fins de org antzação, educação e açáo sobre ela; deverá combinar o estudo do "macro" com as análises do "micro"; e ttatatâ de antecipar um determinado nível de síntese e sistemattzaçáo de conceitos que revertam depois em inform açáo aos grupos de base para a

constataçáo final da realidade. Este tipo de constataçáo pode ser suficiente para ir acumulando o conhecimento do ponto de vista científico, sem necessidade de recorr er a computadores eletrônicos ou referir-se a parâmetros "universais" de pensadores ilustres de outras latitudes com esse mesmo fim; e para ir construindo assim uma ciência propria e popular que parece conver gt paÍa dimensões igualmente universais, através de sua constataçáo na experiência de todas as classes exploradas do mundo.

'

Em resumo: p aÍa que a ciência possa continuar existindo como tal nas condições impostas pelo neocolonialismo econômico e cultural como as prevalecentes na Colômbia, o cientista não pode

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

$7

desconhecer nem passarpor alto dessas realidades, mas enfrentá-las de forma efrcaz, d.u. ir se enriquecendo com a passagem das gera' ções que experimentam o conflito e r'ào em busca da justiça social e

econômica' Assim concebida e praticada. a ciencia é uma ferramenta crítica para a mudança social especialmenre

util quando alguns de seus marcos gerais se rompem e dàcr pessagem a esquemas mais adequados de explicação. os marcos des.-an3\.rs sào aqueres que refletem valores sociais conse^ adores e Ser-,, r,= :: .-..s.es erploradoras e às sociedades imperialistas.

outros já demonstraranr comtr Ljr-nj i\1.:;r.r; :í,--:r-; ,dequada da realidade facilita a acào pt-rllr:ca i. sr:Tulr"x.:ia=.nxe. como o processo chega a ser uma contrib.,uicào J ciei:cia E F\.ssrr e, que as ciências sociais na colombia sejam mais claras e et'icazes ao

cabo de esforços de busca autônoma como o que se procura promover através do método de estudo -ação que aqui propomos. Sobreviverão e serão acumulados aqueles conceitos e técnicas que passarem pela prova de fogo da experiência das massas erguidas em defesa de seus interesses de classe. Estes serão seguramente os mesmos que futuras gerações de investigadores militantes aplicarão nas tarefas subseqüentes de reconstrução nacio

ses

nos.

populares terão o pode

r para decidir

nal, quando as clas-

sobre seus próprios desti-

Pesquisa participante em um contexto de economia camponesa* Vera Gianotten e Ton de Wit**

Introdução

A p.tquisa participante, como novo enfoque nas ciências sociais, foi objeto de crescente interesse nos últimos anos em diferentes âmbitos de trabalho: programas de desenvolvimento rural, políticas de planificação partici pativq educ ação não-formal, capaci taçáo camponesa etc. A partir do reconhecimento de que os programas de desenvolvimento não tiveram o êxito esperado, planejava-se um conjunto de idéias e princípios que permitiriam reduztr os problemas encontrados: por exemplo, basear-se nas necessidades fundamentais da população, buscar a participação ativa dela nos diferentes programas e projetos, usar métodos e técnicas de educação e/ ou investigação mais simples etc. Desse modo, a pesquisa participante se situa entre as corren-

tes das ciências sociais que rejeitam a chamada neutralidade cientifica e partem do princípio de que a investi gaçáo deve servir a determinados setores sociais, buscando uma resposta coerente que

permita, por um lado, socializar o conhecimento e, por outro, (*) "lnvestigacion participativa en un contexto de economia campesina", México, ll Semina rio Latinoamericano de lnvestigacion Participativa, maio de 1982.

(* *) Cientistas sociais e educadores holandeses com muitos anos de trabalho junto a comunidades camponesas na América Latina. Junto a Universidade Nacional de San Cristobal de Huamango, realizaram em Ayacucho, ro Peru, uffi programa de capacitação de camponeses. Residem e trabalham atualmente na Nicarágua.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

ts9

democratizat os processos de investigação e educação. A pesquisa participante sustenta acertadamente que os métodos e técnicas convencionais tgmam o grupo investigado como objeto de pesquisa e não como sujeito principal e que não existe uma separação .indesejável entre a teori a e a prática, Lntre pesquisa e ação concreta. A pesquisa participante revela-se umsocial ;ãq;;t; ;;;;il" abrangente que aparentemente elimina um conjunto de problemas que haviam sido encontrados na pratica, por popular' promoção camponesa ou qualquerexemplo, da educação outro prograrna

de desenvolvimento rural iniegrado. Todar ia. pode-se Ctrr-rsrer3r que. em que pese o fato de partilharent a nresm3

trpCàt-r r3et

iogic:.

trS diferentes programas que utili zant parcialmenre es i,Jeias cia pesquisaparticipante têm em comum apenas o uso de meios rjidaricos e técnicos de investigação não-convencionais, e alguma tbrnra de participaçã'o da população no trabalho de campo e no planejarnento de

ações concretas.

Não é demais

reiterar que a pesquisa participante e um conjunto de procedimentos op..à.ionais e de técnicas que podem ser implem entadas no interior de diferentes corpos teóricos e ideologi-

cos; entretanto, suas características específicas fazem dela uma fer_ necess ária para todos aqueles programas que buscam a partictpaçáo de setores populares na produção de novos conhecimentos (científicos) e em um a prática àrientada a uma ação transformad ora da sociedade Nos últimos anos, aumentou consideravelmente a bibliografia sobre pesquisa participante, e e de suma importância que hajainteresse cada vez mais crescente pela util iraçào desse ,àuo enfoque.

ramenta

No entanto, não basta deÍinir a pesquisa participante como um processo de investi gação, educ ação e açáo onde há, a participação da comunidade juntamente com um compromisso intelectual apontando para a transformação social. consideramos que se ficarmos por aqui, sem precisar melhor os diferentes conceitos e

opções (ideologicas e metodologicas) da pesquisa participante, esta pode correr o risco de se converter em uma nova ,,onda passageira,, das ciências sociais. Pensamos que já se conseguiu determinar e precisar as catacterísticas necessárias a serem cumpridas para definir uma pesquisa social como pesquisa participante; tod avta,chegou o momento de reconhecer que essas características por si sos não são suficientes para entender o processo de pesquisa participante em todas as suas dimensões políticas, econômicas, ideologicas e científicas

.

160

CARLOS RODRTGUES BRANDÃO (org.)

É

nossa intenção, no presente trabalho, tentar esclarecer a 'diferença entre as condições necessárias e suficientes que definem uma pesquisa participante como tal. Uma vez que a maior parte de nossas apteciações e especificações é fruto de experiências concretas

acumuladas durante um programa de capacitação camponesa

e

desenvolvimento rural integrado que a Universidad Nacional de San Cristobal de Huamanga realiza na zona andina do Departamento de Ayacucho (Peru), pensamos ser necessário incluir algumas idéias sobre a cham ada educação popular e sobre a economia camponesa (o contexto específico em que se desenvolve a experiência). A primeira parte deste estudo trata de form a geral e teórica a educação popular e a pesquisa participante, buscando uma relação adequada entre uma opção ideologica e uma opção metodologica, ou seja, buscando a organicidade de ambos os processos. As idéias

expostas na primeira parte serão sustentadas a seguir, onde se oferece alguns exemplos de um caso específico de pesquisa participante em um contexto de economia camponesa. Nessa experiência concreta de pesquisa participante, esta e entendida como um trabalho organico de assessoria em um processo no qual a investigação e a educação tradicionais espontâneas se convertem em investigação e educação orgânicas.

Educação popular e pesquisa participante Nos últimos anos, a chamada "educação de adultos" não se situa mais entre os enfoques tradicionais de educação, inscrevendose na perspectiva da educação permanente . Dentre os novos princípios da educação de adultos, o que mais se sobressai é a participação, Por meio da qual o indivíduo não é mais objeto e sim sujeito comprometido em seu processo educativo. Foi precisamente o conceito de participação que significou uma superação substancial nos programas de educação de adultos, especialmente aqueles destinados ao desenvolvimento (rural) integrado; contudo, o mesmo conceito, por outro lado, deu lugar a muita confusã,o arespeito da finalidade da educação de adultos até o momento em que foi apropriado por vários profissionais para legitimar de modo geral seu "compromisso" com os setores popula..r. Vejamos, em primeiro lugar, como se entende de modo geral a participação da população nos programas de educação e/ou inves-

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPA\TE

: para em seguida ver em que se distingue achamada ' cação popular d,a pesquisa edu_ participante. í Pata ser um instrurnento efetivo tigação

de desenvolvimento,

cação deve abandonar

u' .olocações acadêmi.us truai.ionais aeducentrar-se na hrefa de e conoat ,espostas às necessidades (sentidas e reais) do campesinato' A realioade ,oriru que as

respostas dadas especialistas poucas vezes correspondem resses e problemas aos intereais da população rurar : daí, sustenta-se que não se deve identifi , cat a pri'ort as necessidades, pois essa identificação há de surgir a partir da realidade das comunidades. populações pesquisarão com a assessoria dos profissionais. cujas

por funcionários

e

perspectiva, a investigação \essa não é um instrumento empregado especialistas para averiguar por se estes estão corretos na identificação apriori das necessidades, mas um instrumento para susc itara reflexão da comunidade sobre sua situação e seus probremas. por investigação isso. a

não é uma atividade anterior à atividade educati'a.

ffi:,::ü'Jfff.'#i:1"J,::o"'so

educarivo, do q,ãr a popuração

Em

gerar, pode-se d,izer influir direta ou indiretamente que o objetivo d,a participação é cial, nos aspectos econômicos, na transformação d,arealidade sopolíticos e sociais ora, r idade humana toda ati_ está dirigida ; um objeto, para transformá-ro. o objeto pode ser uma determ inada m-atér'ia-pri ma, um indivíduo :solado' classes sociais e ate mesmo uma sociedade inteira. o pro:lema' pois' não reside tanto em buscar a transformação :ade social' já que qualquer da reari. questão é com que objetivo atividade humana tem esse objetivo; e como. Muitos educadores e investigadores se entusiasma ram com Jr;ias de transformação as social e participação. De certo

: '> supõem que

a

;::::ffifi.:.rt"'"ersão :

"

modo,

muiaceitação de ambos os conceitos implica auto-

a uma posição comprometida com

os

Existe um conceito específico de mudança social e particif o popular que sustenta que o objetivo final é alcançar uma

'1) Façamos constar gue o trabalho ,*: -:.,catívas com adultos

está fundamentado em experiên-

camponeses em um : : -' s3 e comunidades camponesas de população contexto de economia cam_ "q-:-: :'abalho úàig"nr.

;:

se baseiam.em experiências

Á, ijeias

expostas ,drÃriao* em um programa de ;: l:?ji?::ffi,Ê:,:"çaã^ã#[on",, na,ãiiao,rto_,iáj,, oo Depar_

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo

16:

(org')

a mudafiça distribuição mais eqüitativa do poder. promovendo

:

so-

organizandocial em favor das populações opii*idas e exploradas, conduzir"'à devem ações Essas econômica. e poiiti.a as como força a pobreza' dependênmudança das condições últimas que geram a cia e a exPloração

Educação PoPular

Dentro desta última perspectiva de mudança e participação e pesquísa popular se situam os programas de educação popular seus disconsiderando participante; ou melhor, deveriam situar-se, investigaçáo de e atla cursos teóricos. No entanto, a prâtrca educ aplicáveis a não superam as características comuns e correntes inicial aos critrca qualquer tipo de educação de adultos.2 como programas de educação popular podemos mencionar:

não1) O característico so está dado no processo educativo não-convencionais' instrumentos e tradicional e no uso de meios de aprendtzagem Assim, limita-se a açáo educat Lva a um processo uma educaçáo oferecer de tarefa a dirigida,3 acreditando-se cumprir

de Educação de (2) Na reunlão de diretores nacionais dos Programasem 1973, haviam acontecida caribe, e Latina América na região da

Adultos

da educação de sido mencionadas, entre outras, as seguintes características adultos (CREFAL, 1976): permanente; 1) a educação de adultos é uma modalidade de educação para o desene sociedade da estrutural para transformação a 2) aponta volvimento integral dos Povos; a participação dos 3) coadjuva uma ação mÚltipla, a qual pressupõe de base; organizações e instituições suas de átravés membros da comunidade do criadoras potencialidades das valor o 4) reconhece expressamente social; e individual homem para ser o construtor de seu destino dos s) aproveita ao máximo o cabedal de conhecimentos e experiências comunidade; da dentro educativa adultos e da interação facilita a 6) considera o papel de educador nato que todo homem tem; auto-educação Permanente; e trata de 'ação da escolaridade 7) esforça-se por superar a rigidez propria ed ucativa não-escolarizada' de formàs diversas e novas implementar 1972.98. (3) Distinguimos três processos de aprend izagem (Ludojoski, 1

10):

aPrende sem 1) um Processo de aPrendizag.em espontâneo: o sujeito. estímulo é o amque ninguem se proponha a ensinar-lhe algôespecífico. O biente sócial e físico e as necessidades do sujeito; se segue uma ordem 2) um Processo de aPrendizagem oiasional: não é Preestabelecido, não o conteÚdo pelo educador, antemão estabelecida cje surge das circunstâncias substanciais ;

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

163

alternativa adequada para os setores populares. No entanto, é ingênuo pensar que o uso de meios edu.utit o, nào-convencionais como o teatro' sociodramas, bonecos etc. é proprio ,Ja educação popular e, conseqüentemeRte, a definem como tal. r isro que os mesmos instru-

mentos podem ser usados pela instrução escLr Iar 2) Muitas vezes, procura-se superar es sa

.-

rl c ia I

i:r:

.

ào atra\.es de discursos teóricos que caem num teoricismo ron;,r::.,,-,. no sentido de que explicam somente ao nír'el teórico que i ec;;f,;i.. pu-Fular deve ser entendida como educaçâo poritica orrer:ici ri:3 i cisei:_ volvimento da consciência de classe das rnessàs p" r:.":es. rr,> dirtintos níveis e campos em que se da a lura i; .r;*.:.-;*ii:caric ; -. a educ ação popular constitui um grande proJero ilrsrorcü aire*.ri. o ao sistema dominante, a fim de se atingiia e-- no'a hegemonia culttrral v

e

política das massas

i

rau-

populares.

conseqüências da abismal distância entre

o que se susrenra teoricamente e o que se faz na práticaeducativa podem ser um no\ o paternalismo ou, ainda, um romantismo extremado.

os dois perigos, o paternalismo e o romantismo, provêm da interpretação e da análise feitas do conceito de ,,saber popular,,. Por um lado, os que sustentam que aeducação popular deve proporcionar a passagem de uma forma "oprim id,a,, de consciência a um reconhecimento da verdadeira

.orr.iência de classe podem ser' na ptática, tã,o paternalistas quanto os tradicionais assistencialistas dos anos 50 e 60. uma descrição rápida de ambas as prâticas mostra-o claramente

:

o o assistencialista (rural) tradicional: "os camponeses são conservadores, fatalistas e tradicionalistas; eu sei o que é bom para eles' como podem e como devem partici par do processo de desenvolvimento-moderni zaçã,o; vou motivá-los a participar,,. o ' educador popular: "os camponeses têm uma consciência falsa e imediata' um saber popular demasiadamente influenciado pela ideologia dominantel .y sei o gu-e é bom pata eres, como podem e devem participar d,a luta de classes; portanto, vou motivá-los a participar"

3) Um processo de aprendizagem

dirigido: o conteúdo já foi programado de antemão' assim como os meús e instfumentos. Deve-se despertar no por um tem, qr"

;:,T'J.:J::"j:tse

ó-r"r,.no não escoiheu mas roi proposto

l6t

cARLoS RoDRIGUES BRANDÃo (org.)

Por outro lado, temos o perigo do romantismo, gue sustenta que o povo tem todas as respostas porque dispõe do verdadeiro conhecimento, sacralizando-se assim o saber popular. Certas correntes da chamada "tecnologia adequada" situam-se nesta prâttca educativa para o desenvolvimento, prátrcas que, em ultima análise, revelam-se conservadoras, considerando o campesinato como um agrupamento humano que atua econômica, política e culturalmente de forma isolada da sociedade global. Agora, depois de ter analisado alguns problemas iniciais da educação popular, é necessário defini-la mais precisamente. A educ açáo popular parte das seguintes premissas:

o a educação oficial é uma conseqüência superestrutural do o

'

que

ocorre na base econômica; na base econômica, se dá o desenvolvimento das forças produtivas com base na unidade dialetica de contradições, estas contradiçÔes se ret'letem de uma forma ou de outra na esfera ideologica e. por consesuinte. rambem na educ açã,o.

Se é em nír'el da ideologia que se manifestam as relações e contradições que ocorrem na base econômica, qual é, no caso da educação oficial, o equivalente antagônico? Ele deve ser a educação popular, que não reflete os interesses da classe dominante mas os das classes exploradas. A educação popular sempre existiu ao lado da educação oficial como equivalente antagônico da mesma unidade dialética, em forma espontânea ou estrutur ada. A educ açáo popular não se situa somente no plano ideologico. Nas formas espontâneas de educação popular, ela sempre esteve relacionada com ações econômicas e políticas concretas. As formas estruturadas, ou seja, os programas de educação popular têm de se adequar ao funcionamento da educação popular espontânea, paÍa que ela se converta em uma verdadeira educação de classe, organicamente relacionada com a educação popular es-

pontânea, em todas as suas dimensões e ações. Dai seguem as características fundamentais d,a educação popular estrutu rada:

1) A

educ ação

popular parte de prâttca concreta dos

setores

populares e retorna a ela, buscando cientificamente as causas estruturais para transformar a sociedade de acordo com os interesses imediatos e históricos dos setores populares, integrando a teoria e a prática em um a prâxis social definida.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

165

2) A educação :popular recupera criticamente as di stin tas manifestações .culturais proprias dos setores populares; recupera criticamente a histo na. 3) A educação popular situa o conteúdo da educação no contexto sócio-historico em que ocorrem as relações de poder e os interesses de classe.

4) A educ ação popular concebe a si mesma como uma tarefa de sist ematização permanente da experiência econôm tea, política e

ideologica dos setores populares para colocar ações concretas no plano econômico, político e ideologico. 5) A educação popular converte-se em uma tareta de classe. isto é, uma educação real da experiência de classe. o que significa

preparar as condições para que sejam os setores populares que assumam, como tarefa de classe, sua propria educ ação.

Em síntese, os programas de educação popular ajudam

a

educação de classe espontânea a se converter em educação de classe orgânica.o A estrategia da educação popular é, pois, contribuir para a organrzaçã,o político-econômica dos setores populares. Ora , diante do problema de possíveis opções políticas, deve-se

levar em conta diferentes variáveis que diferem de um país paÍa outro, de uma região paÍa outra, de acordo com as características específicas do lugar onde se trab alha, o setor social, o tipo de lutas políticas a seu alcance, as orgamzações políticas e econômicas existentes e, em geral, diversos aspectos conjunturais que devem ser reflexionados amplamente

.

Em um contexto de economia camponesa e de organi zação comunal (tradicional), a opção da organi zaçáo intercomunal permite ao campesinato relacionar-se com a sociedade abrangónte como classe social. O papel da educação e a investigação aponta para esta opção político-econômica na qual ambas se convertem em instâncias populares orgânicas.

(4) Carlos Brandão, êIÍl palestra não publicada (Punta de Tralca, Chile, março-abril 1982), fala em conv erter a educação de classe tradicional em educação de classe orgân ica. Preferimos empregar o termo " espontâneo,, em lugar de " tradicional", tanto pelas conotaçóes -negativas que aãquiriu o conceito " tradicional" como porque o conceito " espontâneo", no sentido gramsciano, é uma categoria anatítica q ue nos ajuda a visualizar melhor a relação entre educação popular e pesqu isa participante, assim com o entender com maior clareza a relação entre senso comum e bom senso, ou seja, entre saber popu lar espontân eo e saber popu lar orgânico

(org'; CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

166

eOY:.ução popular podeNo entanto, dentro dos programas de 1977) que não chegaram mos encontrar duas concepções tÕ.^'antes de transição de uma processo no a entender o papel da educaçào popular orgânica' educação espontànea a uma educaçào

como um processo I ) .1 cotlcepÇão €tttpiricisro. Apresenta-se descuidando da dimensão pedagogico fundamentalmenre empírico. a ser uma simplificação da analítica e reflexiva do processo. Tende sistemático da realirealidade social e a desvincular o conhecimento

reduzindo esta a suas dade, reratrvizando o valor da teoria ou trabalha-se com uma expressões mais simples. como resultado, a açáo pela ação "em visão emotiva e romântic a La qual se coloca dos problemas exisnome do povo,, . ou então se reduz a solução a pedido da comunidade e tentes à execução de projetos concretos vinculados a uma organicom a,,participação" dela, Sem estarem interesses das forças sociais' zaçáopolítico-econômica que integre os

2)AconcepÇãopedagogista.Apresenta-Secomoumaconcep-

pedagoaplicação rígiáa de certos esquemas ção caract ertzadã pelá extraídos basicamente da

gicos e metodologicos pr..rrubeleõidos, tudo o que se refere à ação colocação de Freire, descuidando de Nesta corrente se política como saída logica do processo educativo. que , ào nível teómencionados situam os programas anteriormente da "verdadeira obsessiva quase rico, se encerram em uma busca que educativos programas consciência de classes,,, assim como os não comunicativos e pensam que ao uttltzarem meios didáticos fotograaudiovisuais, convencionais (bonecos, teatro, sociodrama, educação popular" ' fias etc.) se está desenvolvendo uma "autênttca autoproclaMais adiante, veremos como muitas investigações correntes aS ,,participantes" cometem oS mesmos erros que madas

popular acima mencionadas. relação dial etica entre o Estas não chegaram a compreender a crara definição e aplicação saber e a ação, carecendo pois ã. uma

de edu cação

do que podemos chamar práxis social'

dados, fenômenos Na educação popular, reflexiona-se sobre realidade em moviuma de parte como processos, analisando-os ser passivo. o saber, por si mento dentro da qual o hom.* não é um a rearidade: é indispensável que o saber e

mesmo, não traniforma que o reflita e vice-versa' esteja relacionado a uma açáo organizada e organi zar formas Na educação popurar , deve-se então estruturar que através da supor de açáo que dêem vida às idéias . É errado gerais da realidade: leis das reflexão se chegará ao descobrimento

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

r67

por exemplo, está presente na realidade objetiva, não na reflexão sobre ela. Por outro lado, uma açáo em reflexão resulta em uma açáo "cega" (ação pela ação). Por conseguintes, o saber e a açã,o formam p arte da mesma unidade diale,trca, a práxis, corio processo contínuo de reflexão-ação e ação-reflexão. Somente a açáo política reflexionada tende à transformação social, o problema da dominação,

à, à uma açáo organi zada. Sustentamos, então, que a mera proclamação (teorica) de que "a educaçáo popular aponta para a transformação social" nào sen e pata definir a educação popular. assinr conro r imos gu.' a ideia de

ou

sej

participaçáo em si não signitlca automaticamente educaçào ptrpular. Tampouco sen'e dizer que a educaçào popular se caracteriza por ser educação políti ca, ja que toda educaçào é política: apenas ocorre que a educação oficial e muitas outras formas de educação não-formal ocultam suas dimensões políticas, ao passo que a educação popular procl ama explicitamente sua orientação política.

O trabalho da educação popular estruturada e dos programas de educ açáo popular deve ser um trabalho orgânico de assessoria para que a educ açáo popular espontânea se converta em uma educaçáo

popular orgânica:

s

. trafisformar o saber popular .

espontâneo em saber popular orgânico (dimensão ideologica e científi ca); transformar a organi zaçáo popular espontânea (tradicional) em uma organi zaçáo popular orgânica (dimensão política e econô-

mica).

E nesse processo de mudança da educação popular espontânea para educ açáo popular orgânica que se deve situar não apenas o programa de educação popular como também a pesquisa participante e todos os demais programas de promoção e desenvolvimento integrado, que partam do princípio de "participação da população na transformação social e estrutural da realidade", jâ que é justamente nesse processo que a parttcipação se converte em uma açáo reflexionada, onde se inter-relacionam continuamente o político, o

(5) Deve ficar claro também que a educação oficial e as outras modalidades de educação não-formal influem na educação popular espontânea; da mesma maneira, a ideologia dominante influencia o saber popular espontâneo mas não com o objetivo de transformá -lo em educação popular orgânica ou saber popular orgânico.

168

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

econômico, o ideológico e o científico, ou seja, em um a prárxis social determinada.

Pesquisa Participante

Não só sustentamos que a educação popular deve ser um trabalho orgânico de assessoria no processo de mudança da educação popular espontânea para uma educação popular orgânica, mas também que o trabalho de investigação deve se situar nesse processo de mud ança para poder converter-se em uma investigação orgânica. Denominamos, então, pesquisa participante àquela investigação em que existe um trabalho orgânico de assessoÍta para que a investigação se converta em uma investi gaçáo orgânica; em outras palavras, quando a partrcipação se situa no processo orgânico de produção de conhecimentos, no qual o conhecimento popular espontâneo transforma-se em conhecimento popular orgânico (conhecidamento científico). A pesquisa participante6 em poucos anos ganhou certo prestígio no mundo das ciências sociais e graças a valiosas experiências concretas; sobretudo no campo da educação, os entusiastas da pesquisa participante puderam delinear as suas características, não só para distingui-la de outros tipos de investigação social mas também para dar-lhe seu próprio conteúdo e definição. A pesquisa participante ganha cada vez mais reconhecimento oficial no mundo científico. Muitas características específicas da pesquisa participante, hoje em dia, jâ não são discutíveis, e os que reahzam um trabalho nesse estilo consideram-nas indispensáveis. Estas características se referem tanto a opção ideológica como à metodologia, no sentido de que prima a opçáo metodologica que, poÍ sua vez, encontra fundamentação em uma opção ideologica.

Podemos resumir brevemente

as

características principais

encontradas em documentos de trabalho que propõem, descrevem ou avaliam um projeto de pesquisa participante. Uma definição geral e bastante acertad a já foi formul ada em 1977 em uma reunião inter(6) Neste trabalho, empregamos o termo "pesquisa participante" para nos referirmos à investigação-ação, à auto-investigação, à enquete participativa e à pesquisa participante , já que entendemos por participação "a ação reflexionada em um processo orgânico de mudança".

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

169

nacional sobre pesquisa participante convocada pelo Consejo Internacional de Educación de Adultos:

Nesta definiçào estàrr presenles irrü3S jS p:a,;.r:J.,-=i> ;-.. :.-transcorrer dos anos. foram esclarecirJas cr-rrr rrlilr trí cetaihe. .r;i: i

sej am:

1) A investi gação não pode aceitar a distância tradicional entre sujeito e objeto da pesquisa, por isso deve-se buscar a participação ativa da comunidade em todo o processo de investigaçào. 2) A comunidade tem um acúmulo de experiências vividas e de conhecimentos; existe, portanto, um saber popular que deve servir de base para qualquer atividade de investigação em beneficio dela' É a comunidade que deve ser o sujeito da investigação sobre

sua própri a realidade.

3) A pesquisa participante

estabelece assim uma nova relação

entre teoria e prátrca, entendida esta última como

a

ação para

a

transformação. 4) o processo de pesquisa partic ipante considera a si mesmo como parte de uma experiência educativa que serve para determinar as necessidades da comunidade e para aumentar a consciência.

5) A pesquisa participante é um processo permanente de A ação cria necessidade de investigação. A pesquisa participante nunca estará isolada da ação, dado que não se investigação e ação.

trata de conhecer por conhecer. 6) A participação não pode ser efetiva sem um nível adequado

de organizaçã,o, ou seja, as ações devem ser org antzadas.

Essas catacterísticas

timos anos.

já foram amplamente discutidas nos úl-

Já é chegado o momento de analisar criticamente se as últimas

tentativas de pesquisa participante conseguiram pro duzir novas idéias e maior precisão, ou ainda se nos contentamos com estas catacterísticas para definir a especificidade da pesquisa partici-

I

^0

cARLos RoDRTGUES BRANDÃo

(org.)

pante. Como foi feito com relação aos programas de educação populat, é oportuno mencionar algumas críticas àqueles projetos de pesquisa participante que consideram as características mencionadas acima como suficientes para se falar em pesquisa participante. Sustentaremos que as condições mencionadas são necessárias mas não suficientes para especifi car a pesquisa participante. Não é nossa

intenção expor neste trabalho todos os pormenores da pesquisa participante. Neste estudo, analisaremos algumas de suas características específicas para depois expor como entendemos, na prártica, o seu processo.

Opção metodológica da pesquisa participante

A idéia

de participação em si não implica que a investi gação

seja pesquisa participante. Para diminufi a distância entre objeto e sujeito e para assegurar que a pesquisa participante se baseie nas

experiências e conhecimentos populares, elaborou-se um esquema de como assegurar a participação ativa da população no processo de investi gação (sintet izado em De Schurter, I 9g l:246).

A

. ' . . ' . ' . . '

participação ativa da população se expressa através de:

formulação dos objetivos da investi gaçã,o; definição dos temas e problemas a inves tigar; coleta de dados (uma parte ou o total); anâlise dos dados;

interpretação do significado da nova informação; formulação das prioridades; identificação de recursos internos e externos à comunidade; programação das ações; avaliação permanente das ações; colocaçáo de novas exigências de informação, formação e ação.

Lamentavelmente, em que pese este esquema manipulado por atla da população só se reduz àquelas etapas no processo de investi gaçáo que tradicionalmente se

todos, muitas vezes a participação

denomina trabalho de campo. Sem a intenção de menos prezaÍ a validade daquelas investigações que buscam a participação crítica da comunidade no trabalho de campo, elas não podem ser consideradas como um trabalho orgânico de assessoria parc que a investigação se converta em um a pesquisa orgônica.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

t7

I

Como os programas de educação popular, muitas investigasociais se contentam quando há participação da população na ções coleta de dados. Além disso, para prosseguir a comp aração com a educação popular, pensa-se cumprir as exigências de uma pesquisa participante quando se emprega técnicas simples no trabalho de campo, rejeitando as técnicas tradicionais. A respeito disso, podem ser feitas as seguintes observações:

a) E ingênuo pensar que a pesquisa participante. por ser uma pesquisa qualitativa, não pode fazer uso em determ inados momentos de instrumentos típicos de unra pesquisa quanritarir a. ctrrlo. por exemplo, o questionário tradicional preestabelecido. Se a pesquisa for orgânica, suas técnicas e instrumentos, quaisquer que sejam, terão uma característica orgânica, isto é, " paÍa e pela comuni-

dade". É errado pensar que a opçáo ideológica de uma investi gaçáo é definida pelas técnicas e instrumentos que são empregados.

b) Ao rejeitar as técnicas tradicionais enfatiza-se a necessidade de técnicas simples: fotografias, audiovisuais, historietas, programas radiofônicos, graYações etc. Longe de querer rejeitar essas técnicas, nossa pergunta e: por que elas são consideradas simples? São simples porque o pesquisador está convencido de que as técnicas que ele aprendeu na universidade são demasiado complexas para serem utihzadas pelo "povo". Isso é correto, mas no dia em que um grupo de pesquisadores profissionais se reunir paÍa analisar um problema de sua própri a realidade (por exemplo, a autonomia universitária) e só empregarem historietas, audiovisuais etc. se darão conta de que a técnica de escrever uma historieta ou o guia de uma

fotomontagem e tã,o complicada quanto a elabo raçã,o de um questionário preestabelecido. Em resumo, âs técnicas e instrumentos de investi gaçáo nãoconvencionais por si mesmas não garantem que a investi gação seja pesquisa participante e constitui equívoco dar-lhes a conotação de "simples". c) Um método muito empregado é o da devolução; muitas técnicas não-convencionais servem para que haja devolução de conhecimentos adquiridos . Há momentos na investigação em que se deve devolver certos resultados ao grupo que está pesquisando, porém essa exigência não é feita somente ao pesquisaàor profissional, mas a qualquer pessoa envolvida na investigação. Quando em uma comunidade um grupo de idosos e jovens está sistem atizand,o os conhecimentos existentes sobre, por exemplo, plantas e ervas medi-

t74

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

implica uma seqüência de relações específicas, qual seja, a "necessidade de um compromisso de participação por parte da comunidade durante um período mais amplo do que ocorre com outros métodos de pesquisa. A unica coisa que pode justific ar tol solicitude e fazê-la bem-sucedi da e a perspectiva de obter maiores benefícios diretos... " (De Schutter, 1981:262: grifo nosso). Sustentarnos que esta afirmação e a propria negação da legitimidade de um projeto de pesquisa participante.

Investigação-ação Como a participação, a açáo em si mesma não garante automaticamente que a pesquisa estej a relacionada adequadamente com a açáo, ou seja, que possaÍnos falar de uma ação reflexionada. No que se refere à relação investi gaçáo-ação, esta ultima pode ser empregada como nova forma de manipulação:

Ao executar um

proj eto de pesquisa

participante, a equipe

se

propõe também a apoiar ações concretas da comunidade. E assim que o pesquisador profissional executa seu projeto de pesquisa

e, ao mesmo tempo, a equipe promotora apoia a execução

de

pequenos projetos (por exemplo, granjas comunitárias de pequenos animais, oficinas de artesanato, baruacas comunais etc.) ou desenvolve projetos de alfabetizaçáo. Fica claro que essas ações nada têm a ver com a pesquisa, jâ que não há, uma relação dialetrca entre reflexão e açáo, ou seja, de maneira alguma pode-se falar em práxis social. Podemos nos perguntar, em outros termos, se a equipe promove a comunidade ou o pesquisador profissio-

nal, ao motivar o grupo camponês a participar na pesquisa do profissional através de uma técnica manipuladora de apoio a ações concretas. Mais adiante, retomaremos a relação entre pesquisador profissional, equipe promotora e comunidade. Outra técnica manipulativa é utthzar uma açáo concreta paÍa que a comunidade faça, por exemplo, seu autodiagnóstico cumprindo os diferentes passos da pesquisa participante (ver acima), enquanto os resultados dessa pesquisa servem a um tema de investigaçáo que não tem nada a ver com a açáo concreta, mas é o tema proposto pelo profissional a si mesmo (por exemplo: a açáo

visa estabelecer na comunidade um posto médico, enquanto

o

tema de investigaçáo é estudar a relação entre as formas de orga-

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIP.{\TE

175

nlzação social da comunidade e as atividades de produção e coialização) . Tambem a investigação pode ser empregada como meio para obter a participação ativa da comunidade nas ações do progra.ma de ,cesen'olvimento, que em si não é discutível me rc

'

os três exemplos carecem de duas condições necessárias para r falar em investigação-ação:

.c pode

1) não há presença da org anização que guia a ação, uma yez :ue a ação, em úrtima instânc ia, é uma açã,o política; 2) não se trata de uma açã,o reflexionada, mas de ações separadas do trabalho de pesquisa, que neste caso é somente uma práIrca teórica diferente da práxis sociar. Pata que haja uma

relação adequada entre pesquisa e ação, onde a ação não se reduza a uma mera táttica (manipulativa), nem a investigação se conv erta numa nova prática teórica, deve haver uma instância mediadora , qual seja, a organi zaçã,o. É a organi zaçã,o

(político-econômica) que dá garantia para que:

l) a pesquisa científica seja uma investigação própria dos tores popul ares, inserida e não apenas ,,baseada,, na

se-

sua

idade social; em suma, uma invãsti gação orgânica (a opção ideológica como objetivo final dos profiJsionais comprometidos); 2) o trabalho do pesquisador profissional seja um trabalho de assessoria que permite ao saber popular espontâneo converter-se em saber popular orgânico; isto é, urnu investi gação-ação com um trabalho orgânico de ação reflexionada (opção áetodológica). real

Essa instância de organização, onde o esforço da pesquisa é um trabalho de assessotia, supera as características iniciais da pesquisa participante, as que chamamos necessárias mas não suficientes' F azia falta à nossa afirmação a condição de organi zação que garantirá uma pesquisa orgânica.

Intelectual orgânico Para terminar esta primeira parte, resta-nos uma observ ação: a relação entre pesquisador e grupo popular no processo de trans-

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo

176

(org.)

formar o senso comum em bom senso.e A pesquisa.participante é conhecida como a primeira corrente de pesquisa social que procura diminuir a abismal distância entre pesquisador profissional e comunidade. À parte o fato de a pesquisa participante conter um conjunto de técnicas para fazer com que a população participe da pesquisa (ver acima), tambem deu a esta tarefa um conteúdo ideologico.

Foi Gramsci quem esclareceu de maneira bastante acertada o conceito de intelectual empregado amplamente na educação popular. No entanto, nota-se em vários trabalhos uma interpretação equivo cada do que Gramsci chama "intelectual orgânico". De acordo com as colocações de Gramsci, a relação pesquisador profissional-comunidade pode-se dar, consciente ou inconscientemente, de duas formas distintas. A primeira forma é aquela que tenta criar uma unidade ideologica entre "os de cinra e os de bairo". entre o "povo" e os intelectuais. nào para que o po\ o produza o mesmo nível de conhecimenro cientítlco. mas para manter os subalternos em sua filosofia de senso contum. erigindo dos intelectuais que não ultrapassem os limites desse senso comum e se adaptem ao saber popular espontâneo.

Reduzindo a pesquisa participante a um simples método, justificando a participação pelo uso de técnicas simples, pode-se cair facilmente no erro de impedir o progresso intelectual dos setores populares, ou seja, impedir uma pesquisa orgânica, o QUe, por sua yez, permite ao pesquisador profissional continuar investigando como sempre. Esse tipo de pesquisa participante pode ser criticado da mesma forma como Gramsci criticou a Igrej a Catolica: "A Igreja Romana sempre foi tenaz em seus esforços para impedir que se formem 'oficialmente' duas religiões: a dos 'intelectuais' e a das 'almas simples', mantendo os 'simples' em sua primária filosofia de senso comum" (Gramsci, 1967:70). A outra forma é a antítese da mencionada acima: orienta-se para guiar os "simples" paÍa uma concepção superior de vida. " S e se afirma a necessidade do contato entre intelectuais e simples, não e para limitar a atividade científica e manter a unidade ao nível baixo da massa, mas precisamente para crtar um bloco (9) Os conceitos "saber popular espontâneorr e rr saber popular orgânico" têm semelhança com o que Gramsci chama de " senso comum" e "bom senso"

.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

177

':ielectual-moral que torne possível um progresso :'jssa e não unicamente dos grupos reduzidos intelectual da de intelectuais,, ú:-amsci, 1967:73). No *o*.nio em que esse "progresso intelec:-'il" se constitui em um processo orgânico no qual o saber popular -u :lpontâneo torna-se um saber orgânico, podemos afirmar q'* :'i estigação é uma pesquisa partlcipuni., que aponta para sua

:insformação em pesquisa orgânica. Desta segunda forma de relação entre pesquisador :'i e comunidade pode-s e d,izer que se trata de um trabalhoprofissioperma:'nte de assesso tia para "elevar constantemente o nír el intelectual ias c amadas populares mais amplas. o que signitica trabalhar para f romover 'elites' de intelectuais de um no\ o tipo. surgidos diretarnente daqueles que permanecem em contato para se transforrnarem no núcleo expressivo básico " (Gramsci, 1967:g I ). Com isso, tocamos no conceito mais conhecido de Gramsci, que é também o mais mal interpretado: :

o intelectual orgânico. Partimos da premissa de Gramsci, segundo a qual todos os homens são intelectuais embora nem todos desempenhem na sociedade a função de intelectuais. E necess ario, então, criar um novo tipo de intelectual, ligado organicamente ao desenvolvimento

da organi zaçã'o político-econômica do setor popu lar. Ao criar esse novo

tipo de intelectual, o problema essencial vai ser a relação entre o intelectual como categoria orgânica, o intelectual tradicional e a comunidade em geral. Deve ficar claro que o intelectual tradicional não é um intelectual orgânico do setor popular por mais que se autoproclame como " pesquisador consciente de seu papel de intelectual orgânico" (De Schutter, 198 l:259). A tarefaprimordial do setor populat é, por um lado, criar intelectuais próprios, orgânicos, e, por outro , assimilar intelectuais tradicionais. o segundo, o intelectual tradicional, tem como tarefa assessorar o trabalho de pesquisa para que o setor popular produza conhecimentos científicos "o rgânicos" (saber popular orgânico) Este trabalho deve ser obrigatoriamente uma pesquisa participante. o intelectual orgânico tem como tarefa levar adiante uma verdadeira investigação orgânica. Ambos têm uma tarefa crítica e criativa' crítica no sentido de apropriação da ciência e tecnologia existentes, e cri ativa no sentido de responder cient ífica e tecnicamente às necessidades e interesses do próprio setor popular. Para terminar esta parte, é oportuno filar sobre o papel da equipe promotora. Em todos os programas de educação popular. .

desenvolvimento rural e pesquisa participante, conta-se com equipes

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo

178

(org.)

promotoras. Lamenta\ elmente. o pesquisador profissional ou o teórico da educação popular muitas \ ezes subestima o papel sumamente i-portante dessas pessoas. Se há um grupo de intelectuais que pode se apropriar do títulr-r de " intelectual orgânico", é este. Porem. pelo tàto de trabalhar sempre em conjunto com o setor popular e para ele. essas pessoas não têm tempo de "estudar" as obras de Gramsci, de modo que o pesquisador profissional acaba sendo-lhes superior: e este se sente muito feliz e engaj ado com seu

novo título de "intelectual orgânico". Por isso, é urgente criar oportunidades para que as equipes promotoras tenham tempo e possibilidades de sistematizarcm suas próprias experiências. Se dizemos que os setores populares podem e devem sistematizar suas experiências, conhecimentos e vivências, deve-se sustentar o mesmo com respeito às equipes promotoras, os representantes mais nítidos tanto de intelectuais orgânicos quanto de intelectuais tradicionais assimilados pelo povo.

Pesquisa participante em um contexto de economia camponesa: um caso Nesta parte, analisaremos brevemente um caso concreto de pesquisa participante nos Andes peruanos, em um contexto de economia camponesa, para visualizaÍ as idéias expostas anteriormente. Mostramos que não basta a mera proclamação ideologica de que a educ açáo popular ou a pesquisa participante devem apontar para a transformação da sociedade. Do mesmo modo, vimos que a participação em si não significa automaticamente educação popular ou pesquisa participante, tampouco é suficiente drzer que ambas se caracterizam pelo uso de meios educativos e/ou técnicas de investigação simples e não-convencionais. Consideramos tudo isso como condições necessárias porém não suficientes. É importante, além disso, conceber a educação popular e a pesquisa participante como

um trabalho orgânico de assessoria para que:

. .

a educação popular espontânea se converta em educação popu-

lar orgânica; a pesquisa popular espontânea se converta em uma pesquisa popular orgânica.

Além disso, esse processo deve ocorrer em quatro níveis:

RE

PE\SANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

179

i-,-rntimicO e o político (a organização popular orgâni ca); -.eniltlco e o ideológico (o saber popular orgânico). Somente assim podemos falar de uma participação da popu-.-

l,-' ç-trrrlo uma açáo reflexionada, como uma práxis social. Essa interação entre o econômico, o político, o ideológico e o

- :::t tlco deve encontrar sua concreção no trabalho orgânico de :. iÊSsoria, daí que , flà prâtica concreta, não existe um processo :..ritamente seqüencial , tampouco é possível isolar ações de uma : :llensão das de outras. No que se ret-ere a ações educati\ as. ecopolíticas, já.é amplamente aceita sua inter-relaçào perma rr'Irt€. Lamentavelmente , a ação de pesquisa ainda nào se integrou It'rtâlmente a este processo multidimensional de ação reflexionada, no qual também a pesquisa participante deve ser um trabalho :. -inticas e

rrrgânico de assessoria. Nas linhas seguintes se descreve, então , um caso concreto que husca permanentemente fazer todas as suas ações constituírem um trabalho de assessoria nos planos educativo, econômico, político e

científico. Os exemplos mostram claramente

a

inter-relação entre

essas esferas.

O Centro de Capacrtación Campesina (designado de ora em diante como Centro) iniciou suas atividades em 1977 na zona andina do D epartamento de Ayacucho, como um programa da Universidad Nacional de San Cristobal de Huamanga. Como já dissemos, é difícil isolar uma ação concreta da outra; apenas por razões estritamente prâtrcâs, podemos dizer que o Centro trabalha com:

1) capacitaçáoleducação popular; 2) investigação social e tecnologica; 3) assessoria a projetos comunitánios e intercomunitários; 4) organi zação comunitária e intercomunitária. Atualmente , trabalham quatro equipes multidisciplinares quatro ambientes geográficos (núcleos intercomunitários) que

em de-

senvolvem as atividades assinaladas. Um núcleo consiste em várias comunidades, cada qual com sua organizaçã,o comunitánia, onde existe um comitê intercomunitánto eleito por cada uma das comunidades na assembléia comunitária que controla e fiscaliza suas ações. A descrição anterior mostra que a comunidade camponesa continua sendo a base da organi zaçáo intercomunitá ria, porque a

cARLos RoDRIGUEs BRANDÃo

180

este nível

(org.)

é que se controla os recursos da terra, água e força

de

trabalho.

E fundamental compreender a base econômica da organizaçáo comun rtârra porque é ela que determina, em ultima instância, as possibilidades e limitações da economia familiar camponesa As comunidades na zona de trabalho sào muito bem organizadas e ainda pouco diferenciadas. O isolamento geográfico e os conflitos entre as comunidades parecem influir na coesão da organizaçáo comun ttarta.

As comunidades são extremamente pobres e a região é das mais oprimidas do país: não existem serviços de saúde, água potâvel, assistência técnica, infra-estrutura de irrigaçáo, estradas; a produção agrope çlarta é muito baixa e, juntamente com a produção artesanal doméstica, continua sendo destinada principalmente ao uso da unidade doméstica.

O conjunto de fatores faz com que o nível de vida da popu-

lação seja muito baixo.

Em Víctor Fajardo, província onde está situada a maior parte das comunidades com as quais trabalha o Centro, a esperança de vida é de 40 anos e a taxa de mortalidade infantil,24,3o/o (Amat & Leon, 1981:42).

Encontramos o fenômeno da migração em todas as comunidades, apesar de se encontrarem geograficamente isoladas. A migração sazoflal não é tão recente, como muitas vezes se afirma, pois há muitas décadas a migr açáo é uma atividade elementar na região para completar a renda familiar. No princípio deste século, os camponeses caminhavam para a Costa, numa viagem de até 8 dias, puri trabalhar nas grandes fazendas. Eram fazendas de monocultura (principalmente algodão) destinada à exportaçáo que, effi época de colh etta, requeriam muita mão-de-obra (Zervalos, 1982). Na década de 60, diminui a demanda de mão-de-obra nas fazendas costeiras e cresce a necessidade de mão-de-obra b arata para a industÍra, motivo pelo qual aumenta a migração temporária.

Na dec ada de 70, retoma importância a migração sazonal, desta vez paÍa a Selva, onde o auge da produção de café e cacau requer mão-de-obra barata para a colheita. E o desenvolvimento do mercado interno que, juntamente com os termos desiguais de troca, aumenta a necessidade de dinheiro, obtido principalmente por meio da migraçáo sazonal, iâ que não há maiores excedentes agropecuárias ou artesanais que possam ser oferecidos no mercado.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

18r

Embtrra o sistema de troca por escambo (intercâmbio

de va:r: Ji L^rSt) entre diferentes territórios ecológicos) persista ainda, i, s pode negar os amplos contatos com o mercado. '\ produção é organi zad,a pela unidade dornéstica em um

' -:I3\to :.:rria.

de economia camponesa no interior da organi zação comu-

Esta

organizaçáo tem uma logica própria de funcionamento denominamos "racionalidade camponesa": essa racionalidade e 'lue 'r conj unto de arranj os sociais, econômicos, tecnológicos. políticos e :deologicos que asseguram a estrategia de sobrer ir ência. qLle enrranl

'-ada Yez mais em contradição com a racionalidade do mercado. Com base em um reconhecimento global da região (indispensár'el para o profissional que ali trabalha) confrontam-se as diferentes visões sobre a realidade em assembléias comunitárias, pequenos cursos de capacitação, grupos de discussão com autoridades comunitárias, dirigentes e comuneiros em geral. planeja-se um conj unto de ações alternativas que podem .*[i. trabalhos específicos: pesquisa, capacitação, execução de algum projeto etc. Até aqui, o profissional continua sendo o promotor ou organi zador do pro-

cesso' Reconhecendo que a comunidade cumpre funções econômicas

(controle da terra, água e força de trabalho), políticas (defesa dos recursos coletivos e individuais) e culturais (oferece uma ,,identidade" ao grupo humano), as atividades educacionais, de pesquisa e de promoção giram em torno destas funções. Embora o camponês usufrua da tetta agrícola individualmente, a comunidade lhe garante o acesso aos diferentes terrenos ecológicos da comunidade, e

todas as áreas de pastagem pertencem à comunidade.

No entanto, a organizaçã,o comunitánia se encontra por

sua

vez limitada no "enfrentamento" com a sociedade maior, e é assim

9ue, a pafitr de 1979, se chega a coloc ar a organi zaçã,o intercomunitéma como eixo central do trabalho. Na reflexão

inicial sobre

a

nizat|as e administrativas internas (eficiência de trabalho) mas

a

organi zaçáo intercomunitária perfilam-s e razões e motivações orga-

perspectiva é clata desde o início: enco ntrar uma resposta adequada pata a defesa dos interesses de todos os camponeses. Essa dimensão de classe se vem perfilando no trabalho p.r*unente com a comunidade nas diferentes ações que se desenvolve; é o momento em que as atividades do Centro começam a adquirir as características de um trabalho orgânico de assessoria Na região não existiam fatores "externos" que gerassem uma experiência de luta coletiva, pois não houve ali prár.nlu importante .

r82

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

de latifundios, o que fez com que não se tenha conhecido a expropriação de terras por latifundiários (embora existam algumas e''nidências históricas em Quispillaqta, onde parte dos comuneiros rê estabeleceram em caráter permanente na a\ta da comunidade 4000 m sobre o nível do mar paÍa defender as teruas comunais

contra as invasões de latifundiários) Na epoca pre-colonial, a região foi controlada pelos incas sob o princípio de "dividir para governàÍ", colocando em uma região relativamente pequena diferentes etnias tradicionalmente inimigas e de dificil controle. Estas Çomeç aram a lutar entre si para recuperar identidade coletiva e as lutas entre as diferentes comunidades se mantiveram durante séculos, até a atualidade. Essas lutas asseguraram a "pa, social" e ftzetam com que a região fosse abando nada todo o tempo por qualquer espécie de serviços, já que não existia a necessidade de "apadrinhamento estatal"

(Scott, I976:215) para suavizar

os conflitos sociais estruturais. Aparentemente, esse contexto não é precisamente um terreno fértil para uma organizaçã,o intercomunal; no entanto, é a partir do desenvolvimento do mercado interno, que se expressa em problemas concretos e imediatos, que as comunidades começ aram a colocar a dimensão intercomunal como forma de luta contra a contradição primária. As comunidades estão se dando conta de que as contradições litigiosas thes fazem perder seus fundos (comunais) , para pagaÍ juízes etc., sem que haja sequer as mínimas condições para melhorar os níveis de vida. Ora, nem as comunidades nem o Centro optam por negar simplesmente essas contradições secundárias, effi seu afã, de trabalhar somente em função da contradição primária. O que está claro é que ambos estão em um processo no qual a orga ntzaçã,o tradicional está se superando em direção a uma organi zaçáo orgânica de classes.

Nos encontros e reuniões intercomunais, se observa quais tipos de problemas vão sendo dimensionados como problemas de inte-

A necessidade priorit ária colocada de encontrar formas coletivas de defesa contra o roubo de gado mostra que a organi zação comun itárta de defesa contra um problema com QUe, se perdura, põe em perigo os frágeis níveis de subsistência pode ser mais efetiva se estiver liga da a uma organi zaçáo maior -de resse comum.

defesa, como uma forma de obter maior forç a na negoci açáo com a sociedade global para conseguir a homogeneidade dos interesses e, assim, a identidade de classe.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE .,,,

Para evitar o iminente perigo de um apadrinhamento assistencialista para a orgamzação

1i"t.r)comunrtâriapelo centro,

este optou em 1980 por não ter fundos para a conc retização de projetos, destinando à organização intercomun itária recursos que podem ser usados autonomamente pelas comunidades

e de acordo com as o manejo desse fundo ajuda também as comunidades a procurar e exigir recursos de or1.u, instituições tgovernamentais e não-governamentais). Tanto no manejo do fundo rntercomunitário como na dificílima tarefa de consesuir outros fundos, o centro tem um paper de intermediador e assessor. Nesse contexto de org anizaçâo comunrraria e lnrercomunitária, realizam-se atir idades de capacitaçào e inr estigação que podern ou não ser desenvolvidas ao redor de algum projeto concreto. mas de qualquer maneira sempre estão ligadas a ações concretas 9ue' por sua vez, estão em relação com a organi zaçã,o (inter)conecessidades e interesses;

munal.

Já que todas as

comunidades se encontram entre 3 000 e 4000 metros sobre o nível do mar, uma atividade importante é a crtação de gado, motivo pelo qual a saúde anim al etema de discussão e ação sempre presente.

Uma das alternativas de solução pode ser um serviço veterinário' Atualmente, três núcleos intercomunitários estão implementando um posto veterinário e discutindo a forma de administrá-lo e organizá'lo, para que seu funcionamento seja coerente com a organizaçã'o comunitária existente e com a orga nizaçã,o intercomun itária (o posto tem uma função intercomunitárú). Evita-se qualquer imposição de uma nova forma organi zativa para o posto sem relação com a organi zação (inter)comun itánia.

Ao mesmo tempo, o posto torna necessária a reali zação de um o número de cabeças de gado e estão sendo pesquisadas diferentes formas de cura tradicional em compataçã,o com tratamentos "modernos,, para se verificar qual é o mais adequado segundo uma lógica dupla: a da economia camponesa e a da dinâmica da economiá capitâlista. os comuneiros' conscientes de que vale mais se basearem em seus próprios recursos em Yez de comprar remédios modernos sem maior conhecimento sobre sua eficácia e conseqüências, manifestaram também a necessidade de saberem se seus conhecimentos empíricos, acumulados durante séculos, sobre ervas e plantas medicinais são corretos e verdadeiros; exigiram então uma pesquisa sobre a eficácia e as conseqüências do uso de remédios tradicionais. Colocaram claracenso pelas comunidades para se conhecer

184

CARLOS RODRTGUES BRANDÃO (org.)

mente que não lhes ajuda em nada um romantismo cego no sentido de fundamentarem-se indiscriminadamente nos remédios tradicionais: dever-se-ia investi gar ambos os tipos de remédios quanto à eficácia e à utilidade, para se poder escolher adequadamente

entre

as diferentes alternativas. "Adequadamente " refere-se, então, dupla lógica econômica: adequados à economia camponesa

relações que o campesinato mantém com o mercado.

a

à

e às

Ora, qual

é a relação entre Centro e comunidades durante toda essa problemâtrca de sanidade animal, especificamente no que toca ao censo da posse do gado e à investigação sobre remédios

adequados?

Deve ficar claro que a atual maneira de trabalhar entre o Centro e as comunidades camponesas é fruto de todo um processo conjunto' Ao iniciar suas atividades na reg iã,o, o Centro estava longe de seu papel assessor; o alcance está no fato de todos terem experimentado esse processo, no qual a relação entre Centro e comunidades tem sofrido mudanças continuamente. Deve ficar claro também que aquilo que chamamos de elementos minimamente necessários de uma pesquisa p artrcipant e já estão presentes nesta fase, como, por exemplo:

'

a partici paçáo da população se expressa em todas as fases da investi gação, desde a definição do tema e a formul açáo dos obje-

tivos ate a interpretação da nova inform ação e a programação de ações e novos temas de investigação;

o o uso de métodos e técnicas adequados ao tema de pesquisa, entre os quais a devolução permanente.

O que queremos mostrar com esse exemplo é como o saber popular espontâneo passa a ser um saber popular orgânico, através de um processo de pesquisa participante àr., por sua vez, ajuda a tornar também orgâni ca a investi gação. o trabalho da equipe promotora é um trabalho de assessoria em um processo de açã,o refle-

xionad a da própria população.

Yuraq Ctuz é uma aldeia na região Pun a (4000 m de altitude); a atividade principal, condicionada pelo fator climático, é o gado. Todos os comuneiros tamb ém têm acesso ao terreno ecológico euechua (2000-3500 m de altitude), onde se pro duz principalmente milho' A aldeia faz parte da comunidade camponesa ta, que lhe assegura o acesso aos diferentes terrenos euispillaq pel o ecológicos. o fato de a atividade produtiva principal ser a criação de gado, o centro intensifica seu trabalho nessa área.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

}-.

Para o Centro, é importante conhecer o número e a posse dos ::lerentes tipos de gado, como também da posse da terraparatraçar

:€l trabalho futuro' Quando os profissionais iniciaram seu trabalho f i' '--omunidade de Quispillaqta, da qual faz parte yu raq Cruz, foi ::rro um reconhecimento gtouat da regiao, mas apenas com fins ::3ticos, iá que eles deveriam saber d; existência e das possír,,eis : r;lseqüências de uma diferenciação camponesa no interior da co:unidade (distribuição de riqu eza. poder etc.). Mesmo assim. era :3cessário pata eles conhec.i os problemas relatir os ao gadc. trS :lis importantes da região. Sabíamos de antenràt-r que

a intorma"-ào :tida estava distorcida. já que não hou\ era parricipacào ,Ja p..pu':ção na pesquisa. Tampouco essa parricipaçào

toi

buscada

t-ru ::'lottvada, o que resultal'a numa tecnica de manipulação muito sutil. -'á que a população naquele momento não sentia a necessidade de tal Fesquisa, e o centro não poderia justificar ainda por que pensa\

a que a pesquisa era útil e importante para ela. ó que se fez foi devolver o resultado do estuáo de basà, através de um folheto e audiovisual para começar uma discussão com a comunidade sobre a r isão que os profissionais obtiveram d,a realidade e sua proble mát

ica.

A pesquisa

logo se tornou útil e importante para a comunidade, quando se apresentou um problema agudo que afetou a pre'-ária situação econâmica de todos os comuneiros: tratava-se de uma enfermidade animal bastante generalizada e de conseqüências fatais' o alicuya (fascíola hepática) . os profissioanis conseguiram explicar aos comuneiros que somente um tratamento coletivo poderia solucioÍrar o problema , iá que o alicuya era contagioso. Desse modo' a população se deu cónta de que ,rá i*portante e útil conhecer o número e a posse dos diferentes tipos de gado. A assemb

leia itátia concordou em executar um censo pecuário, encarregando sua organi zação às autoridades locais assessoradas pelos prot-issionais' As autoridades locais decidiram formar um grupo de "pesquisadores " constituído por eles mesmos, jovens da comunicomun

dade e os profissionais . Foram incluídos os jovens porque são os que sabem ler e escrever; as próprias autoridadãs parti ctparam porque a assembleia declarou que não se obteria um bom censo se apenas os jovens se encarregassem dele, pois sendo estes pessoas sem maior

autoridade

junto à comunidadà, nem todas as famílias poderiam

Ihes passar as informações verdadeiras.

Foi assim que um problema

real e sensível deu início a todo um processo de investigação sobre a ati'idade econômica principal : a criação de gado.

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

186

Mais adiante, a enfermidade provocou uma discussão'sobre e as diferentes alternativas paÍa sua solução. Concordou-se também em real izar uma investigação ampla sobre a medicina popular e a medicina moderna em pecuária. A assembléia suas origens

concordou que a equipe encarregada da pesquisa incluísse mulheres, jovens e profissionais: as mulheres porque se dedicam principalmente a trato do gado e. portanto. têm maiores conhecimentos acumulados sobre formas tradicionais de tratamento de doenças; os jovens, para que aprendessem os conhecimentos existentes dos anciãos; os profissionais, para auxiliar os diversos passos da pesquisa, especialmente na análise química dos tratamentos. Os passos da investi gaçáo foram os seguintes:

. . . .

.

.

sistemat tzaçáo das principais doenças do gado na região ; coleta de dados relativos ao conhecimento existente sobre ervas e plantas medicinais adequadas para tratar de doenças do gado; coleta de dados relativos ao conhecimento existente sobre a forma de prep aÍação dos remedios;

análise das causas das doenças; os profissionais, de um lado, argumentavam que o alicuya era conseqüência da contaminação da âgua, enquanto os comuneiros afirmavam ser um castigo de Wamani (o deus da colina). As duas explicações são levadas em consideração; através de provas empíricas se procura a resposta adequada;

análise dos tratamentos caseiros: essa análise se realtza tanto no próprio camp o, através de provas empíricas (na comunidade existe um "laboratório de campo") como em laboratórios reconhecidos, paÍa definir os elementos ativos de uma planta ou erva, isto é, também fazem parte da investigação algumas técnicas complicadas;

depois de saber quais tratamentos serviriam para comb ater o alicuya (devolução dos resultados a todos os comuneiros), analisase qual das alternativas é mais adequada economicamente, partindo da ja explicada dupla logica de racionalidade econômica. Esse exemplo mostra como

o saber popular espontâneo (co-

nhecimento empírico, crenças, mitos etc.) passa a ser saber popular orgânico (conhecimento científico surgido em função da realidade política e econômica da comunidade). A pesquisa é participante não apenas no sentido de que a população dela participa, nem só pelo fato de a investi gaçáo estar baseada no saber popular e na realidade sócio-econômrca, mas

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

187

tambem por tornar-se uma investi gaçã,o orgânica. Tanto os comuneiros como os profissionais desempenham uma tarefa críttca e criatir.a' buscando criticamente quais avanços da ciênc ta e da tecnoiogia existentes podem ser úteis e geram criativamente novos conhecimentos, aceitando ou rejeitando conhecimentos existentes. A ação reflexionada mostra-se mais claramente no último passo, onde se deve definir qual e a açã,o mais adequada no interior 'Ja economia camponesa e das relações existentes com a sociedade mais ampla; por exemplo, um remédio caseiro pode ter rentabilidade econômica se se considera o gado como mercadoria. mas o mesmo remédio não é rentável se o gado tem apenas yalor de uso. Eristem também, naturalmente. casos inr-ersos. Em todo esse processo de investigação se observa claramente que o papel dos profissionais já é o de assesso rra; nesta fase do programa, é a comunidade que se encarrega da investi gaçã,o, sem subestimar o papel importante dos profissionais; com isso se está criando sobretudo intelectuais próprios, orgânicos, e assimilando in telectuais tradicionais. A experiência demonstra que não é a simplicidade da técnica o que determina a pesquisa como participante. São os camponeses, por meio de um processo de reflexão conjunta, que estão sistem atizando suas experiências e gerando novas opções, criando assim, em um processo de educ açã,o orgânica, seus proprios

intelectuais. papel do profissional tradicional é fundamentalmente distinto apenas na medida em que se assimila a este processo, é de

O

e,

asses-

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Em busca de uma metodologia de ação institucional uma experiência de pesquisa e planeiamento participatiyo nos sertões do Canindé* Manuel Albe rÍo Argumedo** Definição participativa de um convênio

de cooperação técnica

Ett fevereiro de 1980, iniciou-se a execução do convênio de cooperação técnica entre a Secretaúa de Educação do Estado do Ceará e o Instituto Interamericano de Coope ração para

a Agricultura (IICA), visando apoiar o desenvolvimento a. programas de educação integrada na zona rural do estado. Apesar de incluir o texto do convênio algumas definições mínimas com relação aos objetivos e metas da cooper açáo técnica, considerou-se necess ário começar o trabalho a partir de uma reflexão conjunta de todo o pessoal da Secretarta envolvido na execução de açoãs educativas na zona rural, procurando delimitar as principais dificuldades enfrentadas ' O plano de trabalho do convênio deveria surgir desse diálogo, como um esforço por encontrar iuntos caminhos alternativos pãru superar essas dificuldades

.

Assim, a primeira atividade dos técnicos do IICA foi conhecer a realidade: situação da educação rural no estado, principais pro-

(-) Relatorio de experiência de um sistema de educação rural em um projeto de desenvolvimento. rurat integrado realizado pela §ããr"trria de Edu, cação do Ceará e pelo lnstituto lnteramericano de Cooperação a Agricultura llcA' Autor agradece as inrormàçoãã e os materiaispara proporcio- Beatrizo Feitosa nados por oê Carvalho, que acompanhou o traba lho desenvolvido.pgla gomunidade de Bonitinho, canindé, cE. (**) Peruano, educador, técnióo oo rrcÁ nõ arasit.

leO

cARLos RODRIGUES BRANDÃo (org.;

blemas, ações em execução e programadas pela Secret artae outros órgãos. A seguir, realizou-se um seminário com a partrcipação de todos os técnicos da Secretaria que direta ou indiretamente tinham relação com os projetos de educação rural. O seminário teve, como tema central, "Educação Rural: uma estrategia de ação,, e desen, volveu-se em uma série de debates em pequenos grupos e plenárias sobre um conjunto de parágrafos brevôs qr. pr.i.nàiu* subsidiar as definições estratégicas esperadas como resultado das discussões. Como apoio para os trabalhos de grupo, foi elabor ada uma coletânea de textos de diferentes autores que discutiam afrcmações contidas nos diversos parágrafos do texto-base. O resultado desse seminário foi um documento que definia as

diretrizes a serem seguidas para que a educação rural pudesse assumir seu papel em um programa de desenvolvimento integral, concebido como "um processo sócio-econômico, político e cultural das populações rurais cont vistas a melhorar suas condições de Vida"- que der erá necessariamente realizar-se " através da participacào consciente e crítica dessas populações na análise de seis problemas- de suas necessidades e interesses, no encaminhamentô de soluçÕes. na tom ada de decisões e na ação orienta da a transformar sua situação e superar os problemas de suas comunidades no contexto global da sociedade" (LTNIESCO, l97g:14). A educação foi definida como uma dimensão do processo global de desenvolvimento, como uma interação entre os sujeitos desse processo visando atingir determinados aprend izados considerados necessários com relação ao projeto social do grupo. As atividades educativas são assim "integradas", de modo que contribuem pata estender certas formaS de compreender e agir súre a realidade que facilitam o alcance dos objetivos estabelecidos pelos próprios atores do processo. Além do rnais, considera-se a eãucação ôo*o uma dimensão do desenvolvimento com capacidade "integradora,,, na medida em que constitui a dimensão reflexiva do processo, o momento em que os atores pensam o processo e chegam a compreendê-lo como integral.

Partindo dessas definições, estabeleceram-se três diretrizes

fundamentais parauma educação inte grada. parti cipação da comunidade, desenvolvimento da consciência e vinculaçãã Our atividades educativas com as ações sócio-econômicas da comunidade. Com base nas conclusões do seminário e respeitando as diretrizes definidas, o documento estimava que a cooper ação técnica do IICA devia centrar-se na reahzação de experiências de planejamento par-

ticipativo que possibilitassem a construçào progressiva de uma metodologia de trabalho dos agentes educacionais junto às comunidades rurais. A experiência permittrta concentrar as açcies. ate o momento dispersas, da Secretaria de Educação e. alem .io nrais. integrá-las às ações desenvolvidas por outros orgãos do e=reic n J Zt-rDâ rural. As

próprias comunidades, com a cooperaçàr-r dr, *:r : r'ü .i ipe interdisciplinar de técnicos, real izariam um diagDt'rS!r.-,,, :i::,-,lanre ct-rpo

ponto de parttda pata formular unr plano .je :;, - ,: \r>:J> a trabalhar em conjunto para sLlperar t-rS pr:r.::-:.s ::,. i.r:-.:s rí--n-trnhecidos. Tratava-se de unt estudtr ,.je re:i:ü3Jo, \ r.r rú; pe.;, jtar. .:i através de sua percepçào dessa realrdade. qLie >;'rii, 1) ptriii,-, .je patttda, a matéria-prima de um processo "dinâmictr e perrnanente de conhecimento centrado na descoberta. análise e rranstormaçào da realidade pelos que a vivem" (Oliveira 8{ Olir eira. 198 I : l9 ).

Algumas palavras mais sobre as diretrizes As três diretrizes gue, segundo as conclusões do seminário, orientariam a experiência de edu caçáo rural integrada nasceram da dificuldade que os técnicos da Secret arta consideravam mais complexa: como integrar as ações educacionais entre elas e com as ações das outras instituições que atuam nas zonas rurai s ? A respo sta a essa questão encontra-se evidentemente nas diretrizes e foi aparecendo cada Yez com maior clareza ao longo do trabalho nas comunidades. Eta a propria situação problem atrca onde se manifesta a integração, na realidade vivenciada e compreendida pela população rural. As ações de apoio institucional so poderão atingir um adequado nível de articulaçáo se são planejadas e executadas a partir dessa situação problemática. As instituições surgem delimitando seu campo de atuaçã,o, recortando uma realidade glob al para determinar sua função específtca. Cada uma reivindica depois paÍa si aquela parte da realidade como sua propriedade, e procura que ninguém interfira no que considera de sua competência específica. Uma vez separadas e distribuídas as diversas dimensões da realidade social, procura-se integrar as ações institucionais . Ora, a verd ad,etra integração deverá ser procurada na realidade, perguntando-se sobre a relação orgânica das diferentes dimensões em uma situação social .on...1u, historica e geograficamente loc ahzada.

§ 192

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo

(org.)

E as diretrizes apontavam jâ nessa direção: afirmava-se gue participação eÍa a da propria comunidade, o crescimento da consciência dos sujeitos e a vinculação da educação com a situação concreta vivida por eles o que poderi a garantir uma açáo educativa integrada.

A participação define-se como o momento em que a comunidade assume a ação educativa como propria, interferindo no seu planejamento, execução e avaliação. Essa definição se fundamenta em uma compreensão global da ação como o conjunto dos momentos em que se progtama, se executa e se avalia o realizado. A separação desses três elementos só pode ser analitica, mas eles existem na realidade como uma síntese: a ação. Quando se fala de "participação" para designaÍ a interferência dos sujeitos em alguns desses três momentos, trata-se só de uma paródia da participação autênttca. Um momento aparece definido como supostamente participativo com relação aos outros que devem ser não-participativos. Porém, quem determina finalmente o conteúdo é aquele que conserva a visão global dos três momentos, e só ele é o sujeito da açáo, em um sentido pleno. Deve-se ainda salientar outr a çaracterística fundamental nesta concepção de participação: entende-se a comunidade como sujeito das ações. A comunidade define-se como "um grupo social com interesses comuns, com uma historia e um projeto comuffi, situado em um espaço geográfico determinado" (Secretaria de Educação do Ceará, 1980:31). Ao mesmo tempo se afirma que essa participação deve ser permanente, como elemento necessariamente constitutivo do processo, e não meramente circunstancial. Em conseqüência, de ambas as características coletiva e permanente deriva uma terceira: a participação deve ser orgânica, ou seja, desenvolvida através de organizações democráticas que façam possível sua conçrettzação.

A segunda dtretrrz implica entender que toda açáo educativa deverá contribuir para incrementar os níveis de compreensão crítica da realidade , a partn da consciênci a real e possível do grupo social. Visando esse progressivo desenvolvimento da consciência, o ato de educar deve ser considerado como facilitaÍ a apropriação de instrumentos que permitam construir uma metodologia para analisar a realidade e pôr à disposição da comunidade as informações necessárias e suficientes para conhecer a inter-relação entre sua situação particular e o contexto social global no qual ela está inserida.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

-:

E neste âmbito da consciência que se manifesta o porencrl. integrador das ações educativas. O grupo toma consciência da realidade como totalidade em um contexto teórico, visualizando as interrelações entre os diferentes problemas. Esse processo de passagem da consciência de um contexto concreto a um contexto teórico éo que Freire considera um processo de conscienti zação (Freire lgTg). A terceira dtretriz indica a necessidade da aprend

,

tzagem

se

produzir nas ações que a comunidade realiza para satisfazer suas necessidades- No andamento InÊStntr,Ja e\periência. esra detlnicão foi se tornando cada vez mais clara. Inicialmenre. Frerriu-se de entender que toda ação educatir a der eria esrrr lisada ou r inculada às atividades econômicas e sociais da com unidade. tundamenrar-se

na experiência de trabalho dos sujeitos, r'alorizando suas práticas sociais e incrementando sua capacidade paÍa produzir mais e me-

lhorar suas condições de vida. Entendia-se esta terceira d,iretriz

como a proposta de integração de estudo e trabalho, de teoria

e

prática. As sucessivas discussões e a avaliação final do trabalho ajudaram a construir uma definição mais clara: a validade das uçá., educativas demonstra-se na prátrca, fl& capacidade que delas resulte para modificar as condições objetivas de vida da comunidade e não apenas sua consciência. Esta terceira d,iretriz refere-se portanto à tbrça potencial da edu caçáo como instrumento para transformar a realidade objetiva; em ordem aos interesses do grupo social protagonista da açã,o. Exige-se que as ações educativas proporcionem elementos úteis pata modificar a qualidade de vida das comunidades rurais e, especialmente, sua capacidade econômica que condiciona essa qualidade.

A região experimental Junto aos técnicos da Assessoria de Planejamento e Coorde-

nação da Secretaria de Educação, foram definidos alguns critérios para escolher a região na qual se reahzaria a experiêncú. p*bora os criterios atendessem aspectos econômicos . ,o.iuir, na préttrca predominaram considerações de caréúer político-institucional no mo:r ento da escolha da região. Em conseqüência, foi selecionada

nticrorregião homogênea dos Sertões de Caninde e, dentro dela,

rnunicípios de Canindé e Caridade.

a

os

REPENSANDO A PESQUISA

:

PARTICIPA\TE

Nos municípios onde se desenvolveu a experiência

predominam os pequenos estabelecimentos: ru'rtâl tinham- em 1975 uma extensão de até menos de 50 Caridade

*&

canrn.je 93oio do

ha. A maio:3 dos pequeno§ produtores é de parceiros ou ocupantes: 72% em f.aridade e 69,2o/o em Canindé .

os serviços estão concentrados na sede dos municípios, espe::'rlmente na cidade de canindé, Que constitui o centro comercial e : ':itural da região, cidade-santuário e local de romarias. A Igreja j:senvolve uma ação

comun itária signifi cativa, voltad a para os as:intos religiosos. A assistência médi ca é mínima ao nível das comu: i'Jades rurais, obrigando o pessoal a deslocar-se ate a sede do =unicípio de canindé, em turo de doença grave. o consumo de rgua poluída e a desnutrição, resultante de uma alimen tação insu-

:lciente e inadequada, são fontes permanentes de doenças que afe:am especialmente as crianças.

Na zona rural dos dois municípios onde se realizou a expe:iência, a população sem instrução supera 7 5%. E essa situação :ende a reproduzir-se:

de cada 100 alunós matriculados na primeira serie, so 3 conseguem completar a quarta série em Canindé

e ne:hum deles em caridade. Além do mais, o índice de repetência i;lpera

50% em ambos os municípios e nove de cada dezprofessoras :.ào têm primeiro grau completo.

sobre os fundamentos da experiência Qual deveria ser a experiência que possibilitasse levar

"''-â o que

à

prá-

o seminário sobre estratégias de ação para a educação :-ral tinha definido como uma "açã,o educativa integra

da,,? Era :'r'-essário respeitar as diretrizes definidas em comum: participação :: comunidade, vincul ação com as atividades econômicas e sociais

: 's sujeitos e desenvolvimento da consciência. pensou-se que o :'*-rmpanhamento de algumas comunidades rurais no processo de :boração de seu plano educativo, visand" l;;;;ãto, = em nível : inicipal, aos planos dos órgãos educativos, permitiria atender ;i sas diretrizes. Porém, a elabor ação participativa do plano educativo devia :''dentemente ser precedida por uma ação reflexiva que levasse as - : :rl unidades a identificar suas reais necessidades. perguntar sim: esmente que atividade educ ativa queriam só podia resultar "

em

196

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

uma resposta alienada. Antes de refletir, é comum que as comunidades rurais, como resultado de uma longa experiência de imposições e desvalo rrzaçáo de sua própria cultura, escolham o que os mesmos técnicos colocaram dentro dela. Uma escolha verdadeiramente livre só existe depois de uma reflexão que permita superar as respostas do senso comum e da ideologia. Esse momento de reflexão inicial consistiria em um diagnóstico participativo. O diagnostico seria uma pesquisa realizada pela mesma comunidade, uffi processo de obtenção, sistematizaçáo e análise das informações que configuraram sua situação problemática e um ponto de partida para formular um plano de açáo com vistas a superar essa situação. Seria, portanto, uma pesquisa participante, mas o que deve entender-se por pesquisa partrcipante? Como diferen crar a pesquisa participante do que se denomina às vezes como "pesquisa tradicional"? A linha demarcatória não está nem na c apacidade de pro duzrr

mudanças, o que poderíamos chamar "compromisso político" da pesquisa. nem na capac idade de pro duzrr conhecimento, sua validade "científica". A pesquisa participante não é necessariamente progressista

nem revolucionária, assim como outras modalidades de pesquisa não são também necessariamente reacionárias. "A pesquisa social como ciência, quer dizer, effi sua capacidade explicativa, relativamente preditiva e crittca, proverá sempre a mudança, deixando de lado os exercícios descritivos do experimentalismo. " (Batallán, re82)

Quanto à capacidade da pesquisa participante para produzir conhecimentos, sua "cientificidade", acredita-se que o conhecimento se justifica por referência a uma práxis social concreta, se baseia na sua utilidade para colaborar na solução "de problemas de grupos sociais específicos em conjunturas históricas determinadas" (Oquist, 1978:2). Segundo esse critério, uma prâtica pode ser considerada não-científica , nà medida em que não tenha capaçidade para resolver alguma necessidade social específica. "A produção do conhecimento, como qualquer outro problema, deve ser abordada em relação a contextos historicos e sociais específicos, na busca de respostas." (Oquist, 1978:19) Nem os defensores da pesquisa participante, gue a definem por sua capacidade de comprometimento político, nem seus detratores, que a rejeitam como não-científica, conseguem descobrir sua especificidade. Essa caraçteristica que define a pesqu isa partici-

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

t-

pante encontra-se na determinação do sujeito, QUe pesquisa sua propria realidade apafttr d,a compreensão que tem dela. A pesquisa participante "fundamenta-se na concepção da realidade como unidade de aparência e essência, de modo e estrutura, de forma que entender o modo particular de compreensão da realidade do próprio grupo envolvido no processo de pesquisa signific a avançar na compreensão e explicitaçáo dessa mesma realidade" (Batal lém, 19g2:6).

Assim definida a especificidade da pesquisa participante, é possível des cattar falsas propostas. Quando se fala, por exemplo, em enfoques que "i*pliquem a participação das pessoas a serem beneficiárias da pesquisa",, ou se propõe basear o processo da pesquisa "em sistemas de discussão, investigação e análise, nos quais os pesquisados sejam incorporados ao processo do mesmo modo que o pesquisador" (Hall , 1978:7), quando se fala nestes termos, enfim, é evidente que se trata mais de uma pesquisa ,,participada,, e não "participante ", que conserva as diferenf as e as distâncias entre destinador e destinatário, entre sujeito e objeto da pesquisa. Podemos distinguir, basicamente, três dimensões em uma pesquisa autenticamente participante: a produção de conhecimento, a educ ação e a ori entaçáo para a açáo. entendida esta última como

modifi cação intencional da realidade (Beca, l9g2:l). Assim, poderíamos defini-la como "produção de conhecimento para orientar a prâtica, que inclui ou abrange como parte do mesmo processo de pesquisa, a modificação da realidade" (Oquist. l97g:6t. nela r-) conhecimento se pro duz simultaneamente à modificaçào da realidade' Ao mesmo tempo "adquirir conhecimento é construir. criar: ou seja: pesquisar. O conhecimento e reprodução da realidade pelo pensamento e s6 é possível aceder a ele no ato de pro duzr-Io,, (Batallán, 1982:6). Daí que é impossível "devolver" resultados da pesquisa a grupos que não participaram de sua produção, do processo de criação de conhecimento.

Esta concepção de pesquisa participante orientou o diagnostico, a seleção das técnicas a serem utrlizadas e as discussões na

equipe que cooperatiacom as comunidades no processo. permanentemente, procurou-se ter presente que era necessário deixar o espaço para que o grupo começasse a partictpat, renunc iar a fazer. aceitar os silêncios, superar as angústicas originadas na ideologia do ,,efi-

cientismo" dos técnicos. A participaçáo não é algo que possa dado, porém, é indispensável abrii .rpuço, para que era

feste.

ser

se mani_

Desenvolvimento da experiência A primeira dificuldade foi integrar uma equipe na qual patnticiparam técnicos de diferentes instiúições. Entendida a educação como uma dimensão do processo, essa integração da equipe L.u necess ária para gatantir uma reflexão sobre a situação da comunidade como totalidade pluridimensional e evitar cair em uma perspectiva "educacionista". Mas, foi impossível conseguir a partici-

paçáo de outras instituições; embora se interessassem pelo trabalho, estavam demasiado ocupadas com suas tarefas específicas, não dispunham de pessoal ou desconfiavam do resultado final

da experiência' Mesmo ao interior da Secret aúa foi trabalhoso constituir uma equipe integrada por técnicos dos diferentes departamentos e coordenações, especialmente de nível central. Depois de sucessivas

negociações, ficou integra da a equipel com quatro técnicos da secretaria estadual de Edu cação, dois do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura, e mais seis dos órgãos municipais de

Educação de Caninde e Caridade. Posteriormente, um dos técnicos do IICA foi solicitado para cooperar em outros projetos da Secretarra de Educação e afastou-se da equipe. Além disso, outros tecnicos prestaram sua colaboração em alguns momentos do anda-

mento da experiência. 2 Os técnicos seriam capacitados através de sua participação no trabalho, para estender a experiência ao nível da microrregião e do Estado' Partiu-se do pressuposto de que só a prática poderia contribuir para desenvolver no técnico as atitude, à. .o-promisso

, antidogmatismo e renúncia a qualquer papel de protagonista, as quais constituem condições essenciais para dásempenha, pupel ã de ,,facilitador de um processo de autoconhecimento, organ ização

comun itárta" (Beca , l9g2: l g) .

e

ação

(1) os tecnicos que integraram a equipe durante todo o andamento da pesquisa foram: Beatriz Feitosa de carvalho (Coordenação de Estudos e pesquisas, Departamento de Apoio Tecnlóo, sEDUC), Maria José Barbosa costa (Primeira Delegacia Regional de Educação, SEDU'C), Maria Marilene pinheiro Jucás (Primeira Delegaóia Regional de Educação), (Programa de Educaçáo naZoÁa Rural, pRonÜnÁL,Maria Luzia Alves Jesuino sEDuct, (convênio sEDUc/ llcA), Elga Martins ioorigues Manuet Alberto llg'medo e Maria de Jesus Magalhães Braga (Departamento t\4unicipal de Educação canindé), Mariaci Ferreira Braga e Maria simone Martins Bittencourt (óô;" nr'üicipal de Educação Caridade). etc.

-(2) Rolando Pinto

Contreras (llCA), Maria Nobre Damasceno (UFC)

-

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

I99

A primeira tarefa consistiu na discussão do projeto com a :'luipe tecnica, em nível central e municipal. chegando a um coni3i-lso sobre os resultados esperados, que poderiam ser assim sinte:

'

'

zados:

Formulação de uma metodologia de p.,.J*is3 L- planejamento participativos que pudesse ser utilizada lel:i :r.inres com,niJades rurais, incentivando desse modo seLr ür,:i:.. ,.., ::riirtt-r

nomo e autoconfiante e incrementando Sr.L l.-. _,. :.- :;.:::.. pendência do exterior (Fars Borda. I 9\ : :-l_:

::dr._

crescimento

do nível de orga,izau.-ào ,i;= -,,\r-,*:-.;=üs.. - :. sultado das ações de pesquisar e planeie' e;, c"rii-._rr,,-,. í. r,-oltseqüência, um aumento do seu poder de barg.nh, ,Jianre

instituições públicas reais interesses.

'

.;;;

r

,

para negociar sen-iços que respondam a s

Compreensão por parte dos funcionários e técnicos das instituieducativas de nível central, regional e municipal, das \.anta,

u,-ões

gens de uma açáo mais parttcipativa e integrada, articu lada também com órgãos que apoiam o desenvolvimento rural agindo em outros segmentos do processo.

A seguir iniciou-se a etapa que se denominou pré-diagnostico uma caracterização geral dos principais proble-

-' que consistiu em

:las dos municípios e suas inter-relações com a situação do Estado Jt) Brasil' Este trabalho realizou-se a partrr de informações

e

secun-

:arias, contatos com instituições que desenvolvem ações em nível 'rcal e regional, visitas aos aglomerados rurais e conversas informais

trlr] pessoas dessas comunidades . o pré-diagnóstico visava uma omada de consciência dos próprios técnicos sobre as relações da .'ducação com as outras dimensões da realidade social, compreen:endo a situação global na qual se encontravam inseridas as comu:idades' Era importante evitar tanto o "reducionismo,, educacional -

''trlno a tendência a considerar isolada a situação de cada comuni-

:ade.

Além do mais, as informações coletadas subsidi aram

a seleção ias comunidades às quais seria proposto participar na experiência. Para esta escolha, considerou-r. .rp.cialmente a existência de

um ;erto grau de homogeneidade na população e a ausência de conflitos rolíticos internos graves, Que poderiam ter tornado demasiado comrlexa a iniciação dos técnicos locais na metodologia de pesquisa e rlanejamento participativo. Atendendo a esses critérios foram sele;ionadas as seguintes comunidades: Bonito, Ipueiras dos Gomes e

Monte Alegre, ro município de canindé, e São Domingos, no município de Caridade, todas sedes do distrito do mesmo nome, sendo que no caso das três últimas incluíram-se também povoados vizinhos, praticamente integrados econômica e socialmente à sede. Tanto em Ipueiras dos Gomes como em Bonito participaram da experiência aproximadamente 60 famílias o que signifiôa aproximadamente umas 300 pessoas. Em São Domingos e Monte Alegre participaram ao redor de 500 pessoas, quer dizei, quase 100 famílias em cada local. Em Monte Alegre, finalmente, o trabalho ficou

centrado em uma comunidade viztnha da sede, yazantes, que mos-

trou maior interesse e comprometimento durante todo o processo.

Como resultado do pré-diagnóstico, a equipe técnica passou a dispor de um certo referencial que facilitaria o início do diálogo com as pessoas da comunidade e proporcion ava elementos para motivar a participação da maioria na primeira reunião geral onde seria proposto o trabalho a comunidade.

A segunda etapa começou com a constituição de equipes integradas por um técnico da Secretaria e outro do muniôíplo, para cooperar com o desenvoh'imento do trabalho em cada comunidade. Procurava-se evitar um número excessivo de pessoas estranhas na comunidade, considerando que isso poderi a atrapalhar o desenvolvimento autônomo do grupo interno de trabalho. Sendo poucos os técnicos, diminuiriam as possibilidades de eles assumirem tarefas, procurando demonstrar sua eficiên cia, ou de que as pessoas da comunidade se encostassem nos técnicos, provocando respostas paternalistas. Escolhidas essas equipes, deslàcaram-se até as comunidades para conviver um certo tempo com elas. Esse momento de convivência teve por objetivo que a comunidade reconhecesse os técnicos como pessoas estranhas e os aceitasse como alguém que tenta colabo rar na realização de um trabalho que será útil para ela mesma. Os técnicos teriam oportunidade de conhecer as pessoas da comunidade, experimentar como viviam seu dia-a-dra, como se comunicav am, quais eram seus hábitos e costumes, qual o papel que cada uma dessas pessoas poderia desempenhar no momento da pesquisa e d,a elaboração do plano de açáo. Durante sua permanência no lugar, os técnicos reayzavam visitas domiciliares, convidando todas as famílias a assistirem a uma reunião geral na qual seria apresentada a proposta de trabalho e, sempre que a comunidade aceitasse p articipar na experiência, seria escolhido um grupo de pessoas que coordenasse as atividades. No momento final desta etapa foi rcaltzada em cad,a comunidade a

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

reunião, contando em todos os casos com uma participação maciça \essas reuniões, os técnicos propuseram às pessoas da comunidade a participação em um processo de reflexão sobre seus principais problemas, o qual culmin arta com a elabor açáo de um plano de ação para fazer frente aos problemas por elas mesmas detectados. Os participantes ace itaram a proposta e falaram do que considera\ am seus principais problemas, que iam sendo registrados em um carÍaz à frente da assembleia. Finalmente, foram escolhidas as pessoas pata integrar o grupo de trabalho, que se denominou grupodiagnostico. Inicialmente, os grupos estavam constituídos por cinco pessoas, mas no decorrer da experiência foram se incorporando ao grupo outras pessoas interessadas no trabalho. Ern geral, cada

srupo contava com um agricultor, jovens ligados ao trabalho

da

Igreja, professoras, comerciantes e artesãos. A partir desse momento, desenvolveram-se as diferentes etapas previstas no projeto, enriquecidas pela troca de experiências entre as pessoas da comunidade e, no interior da equipe técnica, entre os grupos que cooperavam mais diretamente com o trabalho em c ada uma das comunidades. Esses momentos de trabalho junto às comunidades, envolvendo a cooperaçã,o com o grupo-diagnóstico que coordenaYa a partrcipação ampla da comunidade no processo,

foram: a capacitaçáo dos grupos, a pesquisa e a elabor açáo do plano. Porém, a capacitação não foi apenas um momento inicial: desenvolveu-se ao longo de todo o processo, como conteúdo das

atividades de acompanhamento dos técnicos ao trabalho comun itáLbrevemente as atividades real rzad,as em cada um desses três momentos.

rio. Tentar-se-á resumir

l)

Capacitação dos grupos-diagnóstico

Esta etapa começou por uma reflexão sobre as técnicas a serem utilizadas- Era necessário escolher procedimentos que estivessem ao alcance das comunidades para evitar que o técnico fosse o aplicador principal, desempenhando as pessoas do grupo o papel de auxiliares. Porém, entendida a pesquisa como um processo educativo, esses procedimentos deveriam implicar um avanço para a comunidade quanto à compreensão de sua realidade. Também era necessário evitar um saber fazet que se transformasse com facilidade em fator de poder, pelo fato de ser pouco comum entre as pessoas da localidade.

:u2

cARLos RoDRIGuES BRANDÃo

(org.)

Considerou-se que a tecnica mais adequ ad,a para o processo de pesquisa participante era a entrevista aberta. porque permitiria que os sujeitos participassem de sua estruturação. sem se transformarem em meros intermediários entre entrevistador e informação. Ora, era preciso capacitar o grupo na pro gramação e aplicação de entrevistas

e também em outras habilidades que deveria assumir durante

o processo da experiência: sistem atizar as informações. elaborar mensagens para as reuniões com a comunidade, coordenar essas reuniões, registrar o processo etc. Antes de tudo era necessário discutir

novamente

com o grupo o projeto da experiência e seu papel na comunidade promovendo e coordenando particrpação a das pessoas. A equipe resolveu reahzar a capacitação numa série de encontros breves, próximos do momento em que as técnicas deviam ser utrlizadas' Deste modo, os membros do grrpo-diagnóstico estariam de posse de todos os elementos necessários para recriaras propostas. A metodologia utilizada foi a de "aprendei a fazer fazendo,,. mas a partir de um fazer real e não simulado. Durante o primeiro encontro, os grupos elabor aram as hipoteses da pesquisa, com base na inform ação coletada na primeira reunião da comunidade. No processo de elabor açã,o das hipóteses que os grupos chamaram "suposições", como expressão dáquilo que a comunidade " acha" sobre sua situação ) foram realizadas en-

trevistas e ordenadas as informações surgidas dessas entrevistas. cada um dos grupos colaborou com outro, entrevistando-o para

esclarecer suas suposições sobre os principais problemas ,,sentidos,, pela comunidade e devolvendo-lhe ordenadamen te a informação colhida nessa entrevista. Finalmente, os grupos refletiram sobre o processo vivido e planejaram seu trabalho de pesquisa na comunidade.

2) A pesquisa participante

o

tipo de pesquisa a ser realizad,o pela comunidade objeti-

vaYa delimitar os principais problemas em função de interesses necessidades comuns; procurava-se

e

atingir um consenso, no sentido que especifica Laing (1974), de "achai com os outros um senso comum' compartilhado, do mundo circundante". Durante esse trabalho' a comunidade terát reahzado um processo educativo: descoberta e reflexão de contradições na leitura de sua realidade, compreensão de algumas dificuldades como "emergências,, de proble-

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

203

*"r:

=als lmportantes, explicitação das relações entre problemas r:r.stemente "isolados'r . Ja definidos por ela mesma seus "nú' ir > rroblemáticosrf , a comunidade poderá desenvolver pesquisas

'r'

rr

::i-no desses núcleos, com metodologias e instrumentos adequa-

Ir "-

; .-3da problema. O tecnico so participou como facilitador. colocando seu saber

: : istrSição da comunidade , pàra que ela reelahorasse slra propria - : ' ..dologia, segundo sua racionalidade. Assim. as arriculações i"-:a internas: entre o grupo-diagnostico e o resto tJa ct'rrtunidade. !*':§'§ sentido, procurou-se questionar constantemente sr grupcr para

-

:

*: não substituísse a comunidade em nenhuma decisào e manri5s um estreito contato com ela, obrigando-a a acompanhar todo o -

_

cesso.

O grupo-diagnóstico elaborou um roteiro para real izar entre-

"sles com as farnílias da comunidade e determinou a forma como ';:ia registrada a inform açã,o. C ada um dos grupos-diagnostico

:: tre vistou, em média, umas 40 ou 5 0 famílias. As informações 'rtidas nessas entrevistas foram ordenadas em um primeiro nível e :3rtiu-se para a realização de entrevistas grupais, visando compl etar § dados que permitiriam confirmar ou não as suposições e a com-

rro\-ar a existência real de algumas contradições registradas durante

::

entrevistas familiares

.

Reunidas todas as informações, os grupos começ aram um processo de reflexão, agrupando-as por suposição, diferenciando "-aracterísticas de causas e soluções propostas, explicitando as múliiplas inter-relações entre os diferentes grupos problemáticos. Este processo de análise concluiu com a elabo raçáo de pequenos textos, cartazes e, na comunidade de Monte Alegre, de uma peça teatral, que representava um momento de síntese. Este exercício preparou os membros dos grupos-diagnóstico para a reafizaçáo de uma série de pequenas reuniões nas quais eram novamente discutidas as informações e o próprio trabalho de sistem atizaçáo realizad,o, introduzindo-se todas as modificações sugeridas pelos participantes.

3) A elaboração

dos planos

Nesta etapa, os grupos-diagnóstico elaboraram, a partir das

informações das pesquisas, um plano ger al d,a comunidade. O plano geral foi concebido como a explici tação do projeto de desenvolvimento da comunidade: registrava a solução ace ita para cad,a um dos problemas sentidos como entraves para seu avanço. A partir deste

244

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

plano, effi reuniões comunitárias, foram determinadas as prioridades de açáo a curto e medio prazo e elaborou-se o plano educativo, como relação das ações educativas g ue, a júzo da mesma comunidade, poderiam contribuir para atin-qir as metas definidas como prioritárias.

O plano educatir o comunitário é um instrumento que aumenta o poder de negociaçào da comunidade: quando ela sabe o que necessita e por que necessita disso, está em condições de dialogar com os órgãos técnicos, políticos ou financeiros que venham ofere-

A

comunidade jéL compreende que as ações educativas se justificam e têm sentido paÍa ela, na medida em que contribuem para apoiar as soluções que integram seu plano geral.

cer-lhe colaboração.

A continuidade do processo e o nascimento de uma nova experiência Na perspectiva das quatro comunidades que tinham participado da experiência, o resultado final não podia reduzt-se a uma compreensão mais crítica da sua realidade. Era importante "tanto a participação no processo de geraçáo de conhecimentos sobre qual o planejamento repousa, como no processo de tomada de decisões que ele implica" (Cohen , 1981 :90). O processo deveria ter contribuído também para gerar uma organi zaçáo çapaz de coordenar a participação da comunidade na execução do plano, frà avaliação e no replanejamento. Assim, o grupo-diagnóstico, por decisão das mesmas comunidades, foi ampliado e convertido em grupo de trabalho para coordenar as atividades a serem realizadas internamente e negociar o apoio necessârio das instituições, visando atingir as soluções propostas no plano geral e no plano educativo. Para colaborar com essa etapa do processo, a equipe técnica organizout um seminário que foi realizado na cidade de Canindé, com a participação dos membros dos grupos-diagnóstico e outras pessoas representativas das quatro comunidades. Os obj etivos do seminário eram facilitar a troca de experiências entre as comunidades e estabelecer um primeiro contato entre elas e as instituições responsáveis por outras dimensões ou' áreas do desenvolvimento rural. Visando possibilitar esses cantatas foram convidados a parttcipar do seminário e ouvirem os planos elaborados pelas comunidades, funcionários da Prefeitura, de EMAIER-CE, Secretarta de Saúde, Comissão Estadual de Planej amento Agrícola, Fundação

REPENSANDO A PESQUISA ,,

.

SESP,

PARTICIPANTE

205

MOBRAL, Igreja etc. Durante a realizaçã,o deste seminário

surgiu uma nova experiência.

[Jm grupo de: pessoas da comunida,Je de Bonitinho, aglomerado rural vizinho à sede do distrito de \Íonre .{ legre. apresentou-se no momento final do seminário, solicitando ;ri;-r enrrer ista com ,,os técnicos da Secret atia" . Eles tinham noticia c.', ::rbalho real izad,o

na sede do distrito, particularmente em Vazirir,:. i -lue riam que a equipe colaborasse para desenvolrerem ele. :r:.r;r-. -i:r.l e\pcriência na sua comunidade. Eles mesmos. em j:: :.\:. _; ::::..ri laram "Histórico da comunidade". resuma:r c!:; s.:-:;1,: .:.-:"."

"A

comunidade de Bonitinho era uma cornunldade ptrLrre e maiorgantzada. Com tantos problemas que serts propnos morar3ores eram desinteressados e incapazes de sequer chegarem a conclusào de que rx problemas comunitários em parte seriam organizados e solucionados pela própria comunidade. Não tínhamos condições de nos reunir para uma palestra, um debate, pois não conseguíamos juntar os nossos amigos . Fazíamos convites, mas nada! Tudo era em vão. Depois surgiu nas nossas comunidades viziúas com a ajuda da Secretaria de Educação do Estado do Ceará, na qual vimos participaçáo e bom desenvolvimento na comunidade. §ohcitamos que os técnicos do orgão trabalhassem conosco a fim de que pudéssemos pelo menos nos organizar e fazer alguma coisa".

Os técnicos de nível central e regional atravessavam nesse momento uma etapa difícil, com muitas exigências de trabalho e discussão interna. Estava próximo já o momento de finahzação do convênio Secret arta da Educaç ão I IICA, e era necess ário definir as ações que a própria secretaria desenvolveria para garantir a continuidade do trabalho nas quatro comunidades, o apoio institucional aos planos comunitários na área de educação. Além do mais, devia ser programada uma série de encontros de capacttaçáo, visando transferir aos outros técnicos do Programa de Educação Rural a metodologia de acompanhamento sistem atizad,a ao longo d,a experiência, e também os relatórios do trabalho reahzado tinham de ser revisados e preparados para sua edição. Em conseqüência, ftcava difícil comprometer-se a cooperar com o processo de pesquisa e planejamento de outra comunidade. Porém, também não era possível deixar passar a solicitação: tanto pelo fato de serem as pessoas da comunidade que solicitavam a cooperaçáo quanto pela possibilidade de testar uma série de "supo-

206

cARLos RoDRTGUES BRANDÃo (org.)

sições" da propria equipe técnica. Acreditava-se que os centror''d. Educação Rural. que as prefeituras municipais instalavam na sede dos distritos com a assessoria e a cooperação da secretaria estadual de Educação. poderiant utiltzar a metodologia de pesquisa e planejamento participatir o nas comunidades rurais do dlstriio. pensou-se tambem que o processo todo. ate a tbrmulação do'plano, podia ser desenvoh'ido em menos tempo: a realização da primeira experiência demorou quase um ano. Seria possível abreviar esse tempo dimi-

nuindo a "distância" cultural entre técnico cooperador e comunidade e afastando o processo da burocr acia das instituições estaduais?

Dessas reflexões nasceu o novo projeto: algumas pessoas do grupo-diagnostico de Yazantes comunidade mais próxima a Bonitinho que tinham vivenciado todo o processo de pesquisa e - cooperariam com a comunidade planejamento de Bonitinho na realização da "experiência" e uma das técnicas da equipe central Beatriz Feitosa de Can alho outra do município de Canind é lvÍaria de Jesus \Íagalhães Brag ficariam à disposição da nova equipe para acompanhar e apoiar o trabalho. As pessoas d,e yazantes que colaboraram com a comunidade de Bonitinho foram principalmente Dona Railda (professora, tigad,a ao trabalho da lgreja), Lourdes (professora, de famiha de artesãos), Noel e Bosco Uovens filhos de agricultores da região). Assim começou a nova experiência, uma comunidade cooperando com outra pata realtzar sua pesquisa e elaborar seu plano de ação.

O trabalho em Bonitinho Algumas informações sobre a comunidade de Bonitinho

são

necessárias, antes de rclatar como se desenvolveu lá a experiência. Trata-se de um aglomerado rural distante apenas uns quatro ou cinco quilômetros de Y azantes, por uma estrada de terra. A população trabalha na agricultura, cultivando algodão, milho e ferjaó, e algumas famílias têm pequenas bodegas. A maioria dos agricultores

são minifundistas, com problemas de regulaúzaçáo, e existe um proprietário médio, Seu Joel. Ele foi uma das pessoas que solicitou que a experiência fosse realizada em Bonitinho, e colaborou ativamente durante todo o trabalho, dado que era um líder na comunidade.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

207

Essa situaçã a diferença entre Seu Joel e o resto da comunidade, agricultore§ minifundistas, e seu papel de líder foi discutida na equipe. Seu Joel tinha a única casa de tijolos de- Bonitinho, uma camion eta e um velho ônibus que ele coloca\ a sempre à disposição da comunidade, e uma ârea r'izinha à sua casa. aberta e com piso, que era utiÍtzada para as festas e reuniões ctrrrlunitárias. inclusive para o ofício religioso. Porém, trabalha\ a so umr pequena e\tensão da sua propriedade e só tinha condiçÕes ,ic rs=:I.rrier epenas a uns poucos camponeses das redondezas. Tambc::: rirr ::nha relação com as lideranças políticas do municipio e r>st, :nes:-nü .-ofirnbuía a que a comunidade tosse desatendida. Eni ct-rnseqüencia. a equipe estimou que os interesses de Seu Joel nào eram opostos aos da comunidade e que a diferenciação encontrar a-se dentro de limites aceitáveis para continuar falando de "comunidade". O grau

de heterogeneidade não era táo grande a ponto

de atrapalhar

o

trabalho.

O trabalho começou com a assembleia da comunidade, coordenada por Dona Railda com a colabo raçáo de outras pessoas de Yazantes. Participaram da reunião aproximadamente 200 pessoas, e depois de conversar sobre os principais problemas da comunidade, escolheram seis pessoas da comunidade para integrar o grupo-diagnóstico: duas professoras, uma catequista e três agricultores, dois deles pequenos proprietários e outro posseiro e semi-assalariado de Seu Joel. Posteriomente, o grupo realizou um encontro em Vazantes para formular as suposições e capacttar-se para realtzar as entre-

vistas. Os técnicos que acompanhavam o trabalho participaram tanto do encontro de çapacitação como da reunião inicial, mas procurando interferir só quando solicitada sua participaçáo. Nesta primeira etapa revelava-se surpreendente para os técnicos a . facrlidade de comunicação entre os membros do grupo diagnostico de Y azantes com as pessoas de Bonitinho. A linguagem " simplificada" dos técnicos nas etapas iniciais do trabalho fluía convertida em linguagem "simples" no diálogo entre as duas populações rurais. Em vários momentos, os técnicos tiveram de conter sua preocupação pela "eficiência" e pela "perfeição", aceitando o nível real de consciência dos grupos que estavam desenvolvendo o trabalho. Embora questionassem algumas asseverações, quando esse questionamento não era aceito, não ficavam insistindo. Procurava-se entender que essa consciência "falseada", com uma mistura de elementos culturais próprios e ideologia imposta, não é um demônio que deve ser exorcizado, mas a consciência real dos cam-

t

CARLOS RODRIGL ES BRANDAO (oig')

208

o ponto de poneses no momento de iniciar um processo de reflexão, partida do trabalho. sobre os O grupo-diagnóstico elaborou as seguintes suposições assembléia: da registros problemas da comunidade, com base nos

1) muitas crianças ficam fora da escola. por falta de prédio escolar;

2) faltam catequistas

e evan gehzadores, por

da comunidade;

3)

falta de cuidados com

a

âgua,

falta de interesse

por falta de interesse

da

comunidade;

4) falta uma capelinha, por falta de condições da comunidade

e incentivo;

5) falta energia elétrica, por falta de assistência

dade

das autori-

s:

6) falta de assistência a saude: -) o GESCAP não toi suficiente' 8 t falta educação Para os adultos

falta de interesse

da

9) má situação financeira e a gente não pode fazer nada

fia

' p or

comunidade:

parte de saneamento; 10) falta trabalho para as mulheres'

Formuladas as suposições, o grupo programou a reahzação pessoas : um a frdas entrevistas. Resolveu-se formar grupos de duas com que se fazet procurando e cafla atendendo a conversação as registraria outra e roteiro, no incluídos falasse de todos os temas converflexível , suficientemente foi não respostas. De fato, o roteiro ter contritendo-se quase em uma série de perguntas que devem em quesaberta entrevista a ttansformar a casos , buído, effi muitos tionário.

A seguir, o grupo realtzou mais ou menos 40 entrevistas fami-

respostas liares e sistem atizou as informações coletadas, reunindo as resposta a quando freqüência da indicação com a cada pergunta, observar pode-se seguir, a incluídos exemplos Nos era semelhante. como foi sist ematizada a informação pelo grupo-diagnóstico: tt

lo Como anda a situação do prédio escolarpor aqui ? l) A situação do prédio anda mal, estragado piso até telhado' 2)Achoqueestáfaltandoprédioescolar./ 3) Está uma coisa demais! Muito estragado.

4)

IIII está quase desprezado, prédio o fracassada. pouco um Que Anda faltando carteiras e a reformaçáo'

I I I

i

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

209

5) A situação

de prédio escolar por aqui é falta de professoras e falta de condições do povo da comunidade para reformar o pré-

dio.

6) Não está boa porque é muito

pequen o. I I I 7) Está ruim porque precisa ajeitaíe não ajeitaram. II 8) A situação de prédio escolar é que está pequeno,

da

data que

foi construído não foi feito mais ràou nele.^só prometimentos e a

comunidade só fica esperando chegue este benefício. escolar está precisando de uma reforma geral para me-

9) o prédio

lhorar nossa comun idade

.

l0) Está muito estiorado causando ate medo de se ciar aul: .l.i-ridir está chovendo. Tudo é perigo tanto para rs prt-rrc::ür;S j,.r3i, alunos.

I1) A situação está rnal: só temos um predio e quase todo caído.

t2)

rneSrrrtr assim esra

o

prédio foi construído em 1968. E as condições de conse^.ação do mesmo é das piores, muradas ao chão farta de sanitários, , fossas; existe apenas uma sala de aula e a mesma não oferece

condições para suportar o número de alunos existentes.

l3) Não tem respeito e está muito ruim a situação dele. t4) Está muito sem respeito. A maíor parte dos moradores fazem é acabar de derrubar, fazem o que querem . I II l5) Está muito feio, muito estragado, não tá com nada. t6) Andapéssimo, anda mall ll//l t7) Das piores. o prédio existente não oferece condições de uso devido à falta de conserv ação, por falta das autoridades compe18)

tentes. situação do prédio se encontra em péssimas condições, haja visto a falta de manutenção e conservação do

A

mesmo,,

.

"12'0 O que acha do atendimento do GESCAp a menores e agricultores sem terra? 1) o GESCAP vai muito mal, não atende nem os menores. il r 2) O GESCAP não tá com nada! 3) Eu acho que vai mar. Devia ajudar mais dar mais apoio. r r 1 , 4) Não é bom não! Émuito fraco I I I I I 5) o atendimento é péssimo ate para os maiores,

quanto mais

6)

a

menores. I ll Seria muito bom se realmente o atendimento fosse estendido aos menores e aos que não têm terras . I I I I

7) Acho um problema sério; porque não beneficia a todos! só maiores de idade.

8) Muito importante atualmente e de grande valia neste

aos

lugar!

Mas no último alistamento não foram atendidos os menores

nem os maiores solteiros.

e

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo (org )

2t0

9)

que todos para merhor atendimento do GEscAp: era necessário

os agricultores trabalhassem, menores e solteiros: quanto pois trabalham nas mesmos os ainda. terra é mais complicado aprontamesmos os para propriedades alheias,, não sobra tempo em alhando trab mesÍt1o roçados. seus rem terras para fazer os terras alugadas' ipq 3ren.1ime alendimentos seJam prrincipalmente for10) E, mais r iár el que esses proprios serem pesnecidos a esses elementos. em r irtude dos soas desalojadas financeiramente ' querem, porque 11) Se não têm terras para trabalhar e porque não 3 dias para o trabalham folga têm! o diário não é direito, só Sem

patráo, o resto é deles !

12)

É muito fraco ! o ganho é muito pouco que mal par ' /

dáL

para

esca-

/

' Á^ êFqí-'ap âôq rr menores preJtrdica muito, ^-an do GESCAP aos 13) O não atendimento pais de família só tanta gente de menor que precisa comer! os mixaria desta ' uma com sustento faltam é morrer paÍa dar o por que não beneficiamento, um e se atendimento,, 14) i péssimo o beneficia a todos os necessitados?"

A infomação coletada nas entrevistas familiares e sistem atr-

material p aÍa orienzadaspelo grupo-diagnostico foi util rzadacomo

grupais, que tar o diálogo nas entrevistas grupais. Essas entrevistas alguns pro de tinham sido utthzadas paf a aprofundar o tratamento aqui mais blemas nas outras quatro comunidades, desempenharam entrevistas nas o papel de reflexão sobre as respostas registradas sistem atr' familiares, e de revisão da maneira como o grupo tinha zado essas resPostas.

interNeste momento, o grupo-diagnostico passou a ordenar, trapretar e orga ntzar todas as informações coletadas. o primeiro uma em balho foi cJpia, cadaopinião surgida durante as entrevistas com as folha de papel-jornal, indicando se procedia da conversação

lado, prefamílias ou das reuniões grupais (EF ou eg). Por outro identificado deles um param-se dez envelopes tamanho ofício, çada com o número e o texto de uma das suposições' jornada, flo O trabalho de sist ematrzaçáo reafizou-se em uma

dos grupo escolar de Yazantes, com participação dos membros que acomtécnicos dos e comunidades lr"pos-diagnóstico das duas a cada

panhavam a experiência. uma pessoa do grupo dava leitura folha e se dialogava sobre o conteúdo da informaçáo procurando Depois definir sobre qrrát ou quais das suposições trazta inform açáo. grupo o correspondente. Quando .rrrelope ,ro g.ràrdada a folha ..u

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

211

achava que o conteúdo se refe rta avárias suposições, copiava-se em outras folhas para colocar uma copia em cadà um dos envelopes que o grupo considerava necessários, indicando na folha com que outras suposições se estim avaque a infonnação esta va relacionada. Concluída ess a tarefa, o grupo passou a trabalhar com cada um dos envelopes, analisando as iáFormações que tinham sido colocadas dentro deles. Por exemplo, no envelope identificado com o texto: "Falta um poço profunáo. faltam cuidados com a água. por falta de interesse da comunidade". tinharn sido colocadas as seguintes informações, uma em cada tolha ,Je pepel__r trr-rJl .

" Porque

nunca pensaram nrsso. Sc

solver o problema. EF

Ter mais cuidado, tornar ela. eg

á*eua

per>3:::-. : _:a j :i:: j:-1:.

:a-

pelo menos flltrada e zelar por

Nossa âgua não tá com nada! eg A gente bebe mais porcaria do que água. eg A água não é boa. EF Devemos procurar as autoridades no sentido de que construam um poço profundo. EF A solução e cayar um poço. eg Cercar o cacimbão. eg Só se tampasse o cacimbão! eg

E limpar o cacimbão e só quem tira água dele e gente grande, pegar os meninos e amarrá -los. eg Um chafariz resolvia o problema. EF Para melhorar nossa água, antes fazer limpeza para termos uma água bem tratada. EF Falta de uma pessoa quejunte homem pra limpar o cacimbão e também de uma autoridade que faça alguma coisa. EF Se tivesse um local que a âgua pudesse ser evitada a sujeira. EF Construir um poço e conservar. EF Um poço profundo. EF E termos mais cuidado na higiene com a água. EF Não temos âgua tratada por farta de condiçao. EF Juntar a comunidade e pedir ajuda a algumas entidades. EF

í E

muito difícil, porque paÍa nós porruirmos

átgua

mais

ou

menos é preciso cavar cacimba todo dia. EF Não tem higiene. EF se todos os cacimbões fossem limpos, era mais boa. EF Maior interesse da comunidade junto das autoridades que nos pudessem ajudar. EF

Como falamos nos itens anteriores,

a falta de professores, a

falta de energia elétrica e a pouca formação dos moradores, fica

cARLos RoDRIGUEs BRANDÃo'(ors')

2r2

na parte impossibilitado parcialmente um bom aproveitamento

de

saneamento. EF

o sisAnda em péssimas condições, visto que ainda é adotado EF". ingeridor. cada de tema cacimba, que é prejudiciar à saude

cada informação, descobrindo confirmava ou negava a suposição, se indicava só de uma catacterística do problema, se se tratava de uma causa ou para o proposta ou uma soluçã oiáL experimentada pela comunidade do reflexão de futuro. Este constitui o momento mais importante dos grupo e permitiu avançff significativamente no conhecimento das membros dos problemas pesquisados , taspeitando a percepção consciência sua de limites comunidades, sem puxar puru além dos

o grupo procurou refletir sobre

em que

*.âioà

possível.

o

trabalho de sistem atrzaçáo concluiu com a elabor açáo

de

caraçterístimapas onde eram apresentadas em forma resumida as comunidade. da problemas cas, causas e soluções dos diferentes Apresentam-se em seguida alguns exemplos:

6o Falta de assistência à saude Soluçõ es

Características Falta de assistência a saúde. Falta médico Falta remédio.

Falta miniPosto.

Cuidar da saÚde.

Falta de reunião Para discutir os Problemas da comunidade '

Médico ao menos uma vez por mês. Miniposto.

Alimentação.

go

Falta educação para os adultos, por Falta escola Para os ad ultos.

íolt,

de interesse da comunidade

Desinteresse da

cornunidade. Falta de Professores para adultos. Falta de formação da com u n idade.

Arranjar Professores. lnteresse da comunidade.

Ajuda das autoridades co m Pete ntes

.

O passo seguinte foi procurar faiet com que os membros

do

e ilusgrupo tentassem escrever pequenos textos sobre os problemas

comunitrá-10s. A mesma tarefa tinha sido reahzada nas outras interiofizar a dades, revelando-se uma atividade importante para reflexões do as compreensão do problema. o esforço por traduztr

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

lr3

grupo em um texto pessoal e em um desenho contribui a esclarecer ainda mais tudo o que se tinha falado e ouvido sobre cad,a um dos

Citam-se a seguir alguns textos elaborados por elementos do grupo-diagnóstico:

I.

"Jâ falamos em todos os nossos problemas: falta de energia eletnca, que falta prédio escolar , falta de professores para adultos. que falta capela, falamos sobre o GESCAP, e por fim vanros talar' :.: ::i

situação financeira.

Que é o problema maior dos prob'ler:r:.. \Íe.:..' - -í i :=-..: tenha boa-vontade e interesse de trab,rl::: l-i:i tr-::i -.:-:..J,i;í. não temos condições. .\ srtuaçàt-r flna:i.'a:rJ üe :a,>st, ..rr -::i:ie :f ., é boa! Não temos condiçÕes de constFUlrrrrr-rS trrssas e nem de ct)rnprarmos filtros para bebermos á*9ua limpa. \Ías interesse temos demais"' M.E.R.B. II. "Aqui em Bonitinho está faltando assistência para a saúde do povo de nossa comunidade. Primeiramente, nossa saúde e precária em termos de alimentação. Não temos uma boa alimentação, as crianças não são bem alimentadas. o que causa pior o problema de saúde. Precisamos de assistência médica ao menos uma yez por mês, assistência dentánia, remédios e de reunião para vermos a possibilidade da construção de um miniposto de saúde." M.T. III. "As mulheres de nossa comunidade precisam trabalhar profissional para ajudarem financeirarnente seus maridos nas despesas de casa. Primeiro vamos pensar na falta de incentivo, pois elas não são incentivadas a trabalhar, a exercer uma profissão que lhes renda algum dinheiro. Depois vamos pensar no salário, que é pouco. Mas tão pouco que não lhes propõe o interesse de trabalhar, mesmo sendo qualquer tipo de trabalho. Como: fazercm crochê, tranças de palha,

costuras. Os lucros seriam aquela mixaria que nem chegariam compensar. " M.I. F. S .

a

Após esse momento de sistem atizaçáo das informações, o grupo planejou a reahzaçáo de reuniões com a comunidade objetivando discutir a proposta de sistemattzação das informações, refletir sobre os núcleos problemáticos e definir prioridades para a elabotaçáo do plano de açã,o comunttária e do plano educativo. Para alcançar esses objetivos, optou-se neste caso- por um processo em duas etapas : a primeira consistiria na organi zaçáo de pequenos grupos de estudo com as pessoas da comunidade, e a segunda, como momento final, seria a apresentação de uma peça dramatizando os problemas da comunidade.

214

CARLOS RODRIGUES BRANDÃ0 (org.)

O texto da peça resume os resultados da pesquisa em forma integradâ e, sempre que foi encenado. motivou novas discussões e conversas sobre os problemas da comunidade:

,,DRAMA DOS PROBLEMAS DA COMU\-ID.4DE Boa tarde, comadre Maria. Boa tarde, compadre Chico, tudo bem por lá? Comadre, só não está melhor, porque estou muito preocupado com os meninos que estão sem estudar. Ói co-padre, este problema está mexendo com todo mundo,

aqui em casa ficaram 3 meninos sem estudar, e eu não sei o que fazer, se aqui tivesse escola de noite, até eu estudava; mas é um problema, se tem quem ensine, não tem local. Você já viu o grupo, está em tempo de cair, se chove fica cheio d'agua, não tem carteira suficiente, se aquele grupo fosse reformado, fizessem duas salas de aula e completasse de carteira ficaria muito bom,, daí podia ser que tivesse escola suficiente pelo menos até a 4u serie. Comadre, a situação está preta, acho que todas as famílias estão sofrendo muito, pense bem: lá em casa somos 4 homens,2 trabalham no GESCAP, e 2 náo trabalham porque não têm idade, mas eles comem ate mais que eu que sou mais velho, agora o pagamento falta e não sai mais, e quando sai não dá pra comprar nada, é so pra pagar, e o tempo é pouco para GESCAP e cuidar da roça da gente. É,, compadre, se o governo desse uma olhadinha pra este povo que sofre e tivesse dó, e fizesse alguma coisa, além da situação ser feia, aqui não temos nada, deveri a ter aqui ao menos uma Yez por mês médico, dentista pra cuidar da saúde destas crianÇâs, uma consulta, uma vacina, a gente tem que andar a pe ou mesmo de carro, mas precisa de dinheiro para as passagens e é aquela confusão! Um lugar como este, grande, de muita gente deveria ter era um minip osto. Olha, comadre, aqui é como diz, fala-se de uma coisa e puxa

outra, quando falamos em miniposto vem ài, você já viu aquele cacimbão do Sr. Joaquim? Que a água está podre de tanta porcaria,

este povo daqui também é demais, este ano o inverno está fraco, e se faltar água? Ninguém tem cuidado com aquele cacimbão, se a comunidade se reunisse e limpasse, será que valia a pena?

Claro, compadre, eu tenho muita fe em Deus que estes problemas sejam solucionados, nós é que devemos ter cuidado com a âgua que bebemos, depois de limpa, se as autoridades fizessem logo um poço profundo , era uma boa. Sabe o que está faltando? Uma pessoa pra fazer campanhas de saúde, por exemplo: campanha de filtros, fossas, farmâcia comunitíria, melhoraria cem por cento.

R.EPE\S

{\DO A PESQL ISA PARTIC IP.{\TE

.

;

Mudando de pau pra cacete, o que o compadre g\,Ircl da acha --..^r*v^v \I(f rerls:i:

daqui?

Está mais ou menos, ô compadre, se aqui tivesse uma capera.

era muito bom.

Mas, compadre chico, pra ter uma capela é preciso

de muita coisa, em primeiro lugar catequistas, eu sei, uma capela aqui seria muito bom, motivava mais o pàuo, o que está faltando é uma pessoa que se encarregue, quer dizer, interesse da comunidade, e tambem as condições são poucas. Bom, com isso vou te contar uma coisa, sábado passado

eu fui matricular meus meninos no catecismo. tir.e foi pena de D. Rita. sahe quantos meninos tinha matriculados. cem crianças de 6 anos acima só pra uma catequista.

Agora, compadre, eu pergunto, cadê o povo dessa comunidade? As moças, os rapazes,

e

ttl primeiro rugar, o que estão

fazendo? Mas é assim mesmo, não tem quem queira se respons abrlizar por nada' dar uma aura aos sábados acham demais.

olha' comadre Maria , se tivesse a capelinha,

uma

pessoa encarregada' depois viesse a energia elétrica, melhorava muito o nosso lugar.

você acha, comp adre, que nós temos alguma possibilidade de termos energia aqui? Sim, por que não?

É, quem espera sempre arcança, pode ser que pero meio tanta coisa sobre alguma coisa pras mulheres, já

de

pensou só quem ganha é professora e é pouco que faz vergonha, devia ter assim um trabalho que as mulheres pudessem trabalhar pra ajudar a seus maridos.

É, eu também achal,a

bom. mas de todo feito é ruim, tem mulheres que sabem fazer alguma coisa, mas se fizeram não tem onde

vender.

o que temos que fazer é trabalharmos juntos pra ver se alguma coisa tem solução, é o que esta comunidade espera e quer. I.c.G.,,.

com os quadros resultantes da sistem atizaçã,o discutidos e modificados pelas comunidades nas reuniões de estudo, o grupo começou a elaboração do plano comunitário. Essas mesmas reuniões proporcionaram subsídios sobre os problemas que a comunidade considerava prioritários e as possibilidades de começar a implementar algumas soluções por si mesma. Assim, esse plan o geral de ação incluiu as soluçõàs que a comunidade considerava

prioritárias

e possíveis

para desenvolver no prazo de um ano, momento de dar passo a outro processo de planejamento.

ate o

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

216

A partir desse projeto de ação comunitária, o grupo refletiu sobre o tipo de atividades educatir as que poderiam contribuir para atingir as soluções propostas pela comunidade. Uma yez definidas essas atividades, analisou-se o papel que o srupo-diagnostico desempenharta na sua execução e a tunção do departamento de Educação

do município e da Secretaria de Educaçào. como instituições que deveriam cooperar com a comunidade na implementação das ações educativas previstas. Os tecnicos de acompanhamento apresenta-

ram também um informe sobre ações e programas de outras instituições que atuavam no município e podiam colaborar com a comunidade nas suas ações.

Já elaborado o plano geral e o plano educativo, o grupodiagnostico realizou uma nova assemb leia da comunidade p-ara apror.á-los e decidir sobre como seriam executadas as ações prer istas. \essa assembleia foi revisado todo o processo, desde o momento em que a comunidade aceitou iniciar o trabalho de pesquisa e planej amento. apresentou-se novamente o drama dos problemas da comunidade e constituiu-se um qrupo de trabalho para coordenar as ações.

As primeiras atividades desenvolvidas foram a limpeza do cacimbão para melhorar a água que a comunidade utilizava, a formação de equipes paÍa fazer tijolos destinados à construção da capelinha e a elaboração dos estatutos da associação de moradores. Com a colaboração da assessoria jurídica da SecretaÍta de Educação, o

estatuto foi adaptado às exigências legais e publicado no Díario Oficial do Estado: assim, a comunidade tinha uma estrutu Ía jurídica que aumentava suas possibilidades de receber apoio institucional. O andamento dos trabalhos demonstrava que os esforços da comunidade não eram suÍicientes para superar muitos dos problemas detectados. O "desinteresse" da comunidade, Que parecia no início uma das causas principais das dificuldades, à medida que a comunidade começava a recup erar a confi ança nela mesma e a valorizar seus esforços, ia deixando lugar para perceber o desamparo e o "desinteresse" de instituições que deviam estar a seu serviçó. Como o grupo tinha descoberto o poder do teatro como instrumento paÍa promover a reflexão e a participação das pessoas do lugar, uffi segundo drama mostrou esse momento do processo: "Ainda bem que em alguns problemas já estamos vendo a solu çáo, o

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reunind o



frzerambastantes tijolos e assim a genre rai gii:--i.i-rrx," se Deus quiser lur"r, contamos corn : . -, r;[

paraa construção, devaga, de todos vocês.

Aqui também é um problema sério d'água, pois os cacimhü* que tem estavam todos secando, foi aí que convidamos uns homens e eles fizeram limp eza no cacimbão do Sr. Joaquim, foi trabalho porque estava cheio de lama e tudo que era porcariatinha dentro. Agora tem água a va\er, não bem limpa, porque não presta pra beber- mas pros animais e uso doméstico, é otima. D. Rita, a coisa melhorou cem por cento, a gente vê que esra bem encaminhado o nosso trabalho, e pedimos encarecidamente ⧠s sos pro b I e ma s e aj u d e m -

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A comunidade resolveu organi zar uma reunião fia sede do município pata que o grupo de trabalho solicitasse apoio às instituições oficiais com atuaçáo na região. Eles mesmos solicit aram, com colaboraçáo do departamento municipal da Educação, Casa de Catequese, prepar aram os dramas e çartazes para aprese ntar os resultados da pesquisa e os planos, e mimeografavam convites p aÍa as instituições e os grupos-diagnóstico das quatro comunidades que participaram da experiência. Na reunião, o grupo de Bonitinho expôs os resultados de seu trabalho, solicitando apoio para implementar as soluções propostas pela comunidade. Algumas das instituições presentes consideraram-se agredidas, porque a simples leitura da realidade eviden ctaya sua omissão diante de problemas que estavam incluídos no cumprimento de suas funções específi.àr. Outras apoiaram decididamente as propostas dos planos, comprometendo-se a lutar junto ao grupo e à mesma comunidade para

atingir algumas soluções.

Á guisa de conclusão O trabalho em Bonitinho, tanto ao nível d,a comunidade mesma quanto da equipe técnica de acompanhamento, chegou em certa medida a convalidar a experiência. Os resultados confirmaram que era possível atingir os objetivos propostos: o um grupo de técnicos da secretaria estadual da delegacia regio, nal e dos órgãos municipais de Educação foram treinados em

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218

cARLos RoDRTGUES BRANDÃo (org.)

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REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

Ng

uma metodologia de acompanhamento ao trabalho de pesquisa e planejamente que a própriâ comunidade desenvolvera; o no" mesmo pfocesso de treinamento, os técnicos foram aperfeiçoando e adequando a metodologia proposta à realidade das populações rurais do Estado;

'

as comunidades vivenciaram todo o processo

de pesquisa e planejamento ate elaborarem um plano glrat comun itário e um plano

educativo para orientar sua ação;

o os técnicos dos órgãos municipais de Educação começaram a compreender que os planos educati\ os municipais der iam ser a

' '

base para a formuração dos pranos municipais. um grupo de pessoas da propria comunidade

toi capacitado em técnicas para promover e coordenar a participação das pessoas do lug ar na rearização de ações conjuntas; ainda mais, ficou demonstrado que esses camponeses têm suficiente capacidade para promover o surgimento de outros grupos

nas comunidades vizinhas.

Porém, ficaram também evidenciados os limites de um prode participação convocado por instituições públicas. Esses limites levaram a equipe a profunào. questionurrr.ntos, superados só perante a evidência de que o trabalho estava efetivamente cooperando com as comunidades e não se podia abando nar o espaço, embora cesso

pequeno, que possibilitava essa ação. E essa constatação fimedida que o processo avançava: os grupos diagnostico cresciam por adesão espontânea de novos representantes , âs lideranças internas começ avam a questionar seu próprio autoritarismo e a descobrir a capacidade do coletivo para pensar e decidir, muitas pessoas que no início desval orizavu* ,uu experiência e desacreditavam de tru, possibilidades de apreender e ensinar reencontravam-se com seu valor e suas forças. os técnicos podiam sentir nas pessoas da comunidade que trabalh avam mais ligadas a eles "uma maior sensibilidade para os problemas comunitários, disposição para continuar o processo de org anização,um amadurecimento pessoal e sobretudo uma consciência do seu papel e do papel da comunidade na solução de sua probl emática,, (Cearét, caYa cada dia mais clara à

1982:7 5).

Mas as dificuldades existem

podeffi,

que o , trabalho fique limitado a uma experiência em cinco comunidades rurais, Iembrada até com satisfação na história da instituição, poe

é claro

fazercom

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

220

rem sem continuidade. Quais são essas diflculdades na percepção da equipe?

oI

desinte gração que det-ine

a estrutura institucional, e o pro-

cesso mesmo de instituc ionalização do Estado: cada órgão, depar-

tamento ou seçào cria-se e perdura de modo que possa "recortar" com precisão a parcela da realidade que é de sua competência. Nem a proposta de trabalho, elabor ada participativamente, nem os resultados alcançados, aceitos e elogiados ao nível

do discurso, chegaram a ter a força necess âria para promover um trabalho mais articulado, pelo menos no interior da própria área educativa.

o { marginalizaçáo de uma proposta inovadora de trabalho, que pode chegar a modificar as formas rotineiras de planejamento, execução e controle da instituição: essa margin alizaçã,o, apesar inclusive das boas intenções de muitas pessoas, é uma evidência constatár el em r ários aspectos. A prioridade atribuída às tarefas burocráticas. os escassos recursos investidos na experiên-

cia. o tamanho reduzido da equipe técnica e as dificuldades entrentadas para sua constituição, a subutrhzaçã,o dos resultados do processo constituem alguns desses aspectos. Finalmente, uffi claro indicador desta situação foi manter cuidadosamente o trabalho desenvolvido afastado das equipes técnicas da secretaria envolvidas com as ações do segmento Educação no Programa de Desenvolvimento Rural Integrado do Ceará, sendo esse evidentemente o espaço próprio, dentro da secretaria, para uma experiência de " educ açáo rural integrada" .

Além disso, a equipe técnica considera necess ário revisar alguns pontos para avanç ar na formulação da metodologia de trabatho de pesquisa e planejamento participativo. O papel da teoria no processo deverá ser esclarecido, para evitar um cego praticismo

e

para não cair em tautologias. Considera-se necess ário promover momentos de reflexão sobre os próprios conceitos utilizados como instrumentos pata sistematizar a prâttca, tais corno "causâs", "soluções", "contradições", sobre sua capacidade explicativa e seus limites, evrtando que se transformem em simples "rótulos". Poderse-ia pensar que a continuidade do trabalho, pesquisando-se mais detidamente um problema que a própria comunidade considere prioritário, proporcionaria a oportunidade para esses momentos de reflexão . Concentrando os esforços no problema priorit ámo, poder-

REPENSANDO A PESQUISA

se-ia chegar a colocar em evidência as

PARTICIPANTE multiplas dimensões que

221

ele

envolve e formular estratégias de ação mais detalhadas. Com relação ao problema do tempo. t) trabalho de Bonitinho

mostrou que não é possível nem con\ eniente acelerar o processo. Superando entraves burocráticos. a propri a c tr:t u n idade foi estabelecendo momentos de àndamento mais tru ririrr'S iapidos. ate pausas e retrocessos que, flo fim. ler aram a j:. j J *:f .-àtr total de aproximadamente um ano. A equipe pfeclSt)'i :;í.::: *-r. t, :i:mt. da propria comunidade para iniciar unr plt)CiSSt) C3 :i:--.-.a;.'ita a :eflexão é demorado, especialmenre qua:d,,, r -,:t: : :,.::a r:

l,l I

juntos.

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.

e

jul .ldez.,l97B.

A particip açáo da pesquisa no trabalho popular* Carlos Rodrigues Brandão** Para Terezinha

e

Paulo, para ldalice e Tião

Particip ação? Já q.re, nos dias

de hoje, na boca de quem manda o trabalho participante, e importante rever o que

de quem faz pode ser sempre

significaparticipar, na hora de fazer. Tal como tem sido escrita e ptaticada, a ideia de pesquisa participante e recente, embora aqui e ali algumas formas pioneiras tenham sido reahzadas. Um exemplo: o questionário da enquete de Marx entre operários que, mais do que coletar dados sobre a sua condição, era um exercício de fazê-los pensar, enquanto respondiam. Outro exemplo: o levantamento do universo vocabular no método de alfabet izaçáo de Paulo Freire que,

já nos princípios da década de 60, convocayaa comunidade pesquisada a participar tanto da pesquisa quanto dos trabalhos de educaçáo popular a que os seus dados serviam. Quando hoje se fala sobre o assunto três princípios parecem estar em jogo. Eles estão na base da crítica do que apressadamente se convencionou chamar, por oposição, de pesquisa tradicional, assim como servem para justificar a proposta alternativa de uma pesquisa participante. Primeiro: a possibilidade lógica e política de (*) Documento apresentado durante o ll Seminário Latino-americano

de Pesquisa Participante, pátzcuaro, Mexico, 9 a 13 de maio de 1 gB2. (**) Antropologo, professor do Departamento de Ciências Sociais da UN

ICAMP.

224

cARLos RoDRIGUES BRANDÃo (org.)

suj eitos e grupos das classes populares (operários, subopêrários , lavradores sem terca, posseiros, camponeses, migrantes, homens e mulheres de lugares e trabalhos servis) serem os produtores diretos ou, pelo menos, os participantes associados do próprio saber orgânico da classe, um saber que nem por seÍ popular deixa de ser científico e crítico. Um saber que oriente a ação coletiva e QUe, justamente por refletir a pratica do povo, seja plenamente crítico e científico, do seu ponto de vista. Segundo: o poder de determinação do uso e do destino político do saber produzido pela pesquisa, tenha ela tido ou não a participação de sujeitos populares em todas as suas etapas. Terceiro: o lugar e as formas de participação do conhecimento científico erudito e do seu agente profissional de saber, no " trabalho com o povo" que gera a necessidade da pesquisa, e na propria pesquisa que gera a necessidade da sua participação. Ora, com muita freqüência, a idéia de participação na pesquisa, nâ prática coletiva e na acumulação do saber que ambas deveriam pro duzir reforça apenas um dos lados da questão: o das alternativas de presença ativa de índios, camponeses e operários no trabalho de real rzar momentos de pesquisas de campo pré-definidas e controladas por agentes eruditos de mediação.1 Participação , participar são palavras que traduzem ài, portanto, a possibilidade do envolvimento do trabalho popular na produção de conhecimento sobre a condição da vida do povo. Homens e mulheres de comunidades populares são convocados a serem sujeitos das pesquisas de que eram antes o objeto de estudo. Mas sujeitos do quê? Em que condições? Até quando? Sem deixar que se perca a força desta idéia renovadora, quero discuti-la aqui, procurando compreender o seu outro lado, aquele cuja complexidade não raro se acentua a tal ponto que a pesquisa participante acaba sendo inviável, seja como pesquisa, seja como

(1) Agentes eruditos de mediação, agentes de mediação; este é o nome que tenho dado para o que somos, quase todos. Profissionais com especializaçÕes setoriais (educadores, alfabetizadores, cientistas sociais etc.) que, em nome e através de alguma instituição promotora de programas de educação, desenvolvimento etc., realizam práticas de intervenção junto a comunidades populares. Fora o aspecto secundário de ser uma prática prof issional, a caracterfstica mais relevante e que ela sempre ocorre como uma ponte entre a agência e acomur,idade. Uma outra característica da mediação é que o agente, em geral, não participa das instâncias decisorias das diretrizes de programas de intervenção sociopolftica junto as classes populares através das práticas socia is setoriais que realiza. Não é raro que esta seja, ao mesmo tempo, a condição do trabalho e uma razáo séria das contradições do agente de açÕes comunitárias.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

225

participante. Falo da questão antecedente da participação da pesquisa no interior de trabalhos de mediação com as classes populares. Falo da possibilidade de transformação de uma práti ca cientifica, que durante tanto, tempo ocultou o seu ser política. em um a prâtica que justamente por afirmar-se política na origem e no destino, re clama ser cientifica. Proponho pensarmos junros. leitor. o problema da participação da pesquisa no trabalho popular. para r.-oÍrcluirmos, a partir daí, as alternativas de participação popu lar 6t-\ trabalho da pesquisa.

Muito de propósito, ao inr.és de trabalhar sohre reorias ou. como é usual, sobre os dados de uma unica experiência de pesquisa. escolhi contar uma historia. Relato o caso das relaçÕes. ora dificeis.

ora francamente animadoras, entre o trabalho de pastoral popular de uma igreja nó interior do Brasil e as pesquisas que em alguns dos seus momentos foi necessârio fazer. Recuo a um tempo que começa entre 1968 (noite negra) e 1970 e conto como, ao longo de 15 anos, diferentes alternativas de investigações de campo for im artrculadas, discutidas, feitas e demonstradas: umas úteis, outras desnecessárias.

Em um primeiro momento descrevo, item por item, as pesquisas feitas e as razões práticas do seu fazer, ao longo do trabalho de uma Igreja que a si mesma se definiu "comprometida com os pobres e oprimidos" de uma região do Estado de Goiás cuja vida social é inteiramente dominada pela atividade agropastoril2 Em um segundo momento detalho um modelo de pesquisa participante gue , depois de pensado com muita amplitude, foi real rzado apenas em (2) Fora do contexto brasiteiro nem sempre é fácil compreender

o

sentido de expressões como "lgreja do Evangelho;, "lgreja pobre", "lgreja da Libertação". São títulos freqüentes e conflitivos no Brasil. São nomes, na verdade autodenominações, atribuídos a setores da lgreja Catolica que se consideram alinhados político-pastoralmente com as classes populares. Não se confundem com setores apenas progressisfas das igrejas catolicas e evangelicas que lutam, em toda a America Latina, pela defeJa dos dire itos humanos. São setores da lgreja que reconhecem ser tarefa evangélica sua o colocarem-se a serviço de projetos de construção de bases sociais do poder popular: a) criando movimentos populares sob seu controle, mas destinados aos interesses das classes dominadas; b) ajudando de forma assessora aos movimentos populares comunitários; c) apoiando os movimentos populares de classe (este, o terreno mais difícill. São, no Brasil, os setores, os movimentos, os grupos e pessoas mais sistematicamente reprimidos e postos sob controle põtitico, lurídico e policial. Recentemente o Centro Ecumenico de Documentação e liformação publicou um longo dossiê sobre a repressão oficial a tais setores da lgieja Catolica

.

226

CARLOS RODRTGUES BRANDÃO (org.;

uma pequena parte. Em urn último momento saio dos casos contados para a sua crítica e, dela, para uma avaliação do sentido da participação da pesquisa nas situações em que ela.se propõe

p es quis a p

arti

c ip

ante.

uma

Pesquisas com ravradores nos sertões de Goiás

Apartir

do ano de 1968 começou a existirno interior de Goiás,

em uma região de Goiâni

t3 municípios que vai desde perto a' até as beiras do rio Araguaia, uma experiência da capital,

de relações entre dioceses católicas e comunidades de camponeses e lavradores, hoje tida como renovadora em muitos aspectos. Até então apresença de um trabalho de Igreja na região apenas atualizara de muitas maneiras estratégias-de controle de monopólios sociais e religiosos' Algumas experiências de movimentos de cristãos da década de 60 haviam sido poucos anos antes desarticulados. Mesmo os casos pioneiros de envolvimento de setores da Igreja com questões de causa popular dos quais o problema d,a terra foi sempre o mais intenso deixavam por definir propostas duradouras do que começou a ser chamado de um "compromisso com o povo,,, na rinha de um trabalho de "pastoral popular" que participasse da história e daptática de real ização de uma "libertação dos oprimidos,, . o bispo nomeado para ocupar a sede da Diocese de Goiás (nome

da cidade que foi ; primei ra capital do estado) veio da região de conceição do Araguaiá onde, desáe então ate hoje, eram e são graves e constantes os conflitos entre lavradores posseiros e empresas rurais'3 Durante alguns anos imediatamente anteriores à sua transferência

do Par á para Goiás, ele foi um dos integrantes mais ativos da equipe local do Movimento de Educação de Base. pouco (3) Posserro é o usuário de terras ainda não tituladas. ou seja, tendente às terras sobre as quais trabalha Àãr;;nrao da fronteira é o preBrasil em direção às áreás agrícotas agrária no áo Extremo oeste e à Amazônia recrudesceu a luta dos posseiros pãla defesa de terra, qr" ocupam, arguns há mais de 30 anos de trabalho contínuo, àãntià as ações expropriativas combinadas autoridades governamentais, rr="noàiro, 'latifunoiáiias de e empresas multinacional' Dois rir.t oo ,o.rtãlogã de capital José o"'sãria Martins são tais para a compreensão das qr"rüár fundamenagrárias Ào Brasil e,,nosobretudo, AmazÔnia. ElOroOriação e Viotênciana questão a potítica campo (São Paulo' HuclrEC' rgáo)eos ca*poneses ea potítica no Brasit

soctais no campo e

o

seu

lugar-rór;;;"" o potítico. (petropolis, vozes, -as

lutas

t9B2).

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

depois de har.er constituído

r

a

suâ'

227

,primeira equipe de trabalho.

buscou meios de transferir para lá a experiência do MEB com edu.'acào popular via escolas radiofônicas.a Um Projeto de Educação da Contunidade PEC chegou a ser discutido e escrito. No entanto, - o PEC fosse posto em ação,'dois fatos importantes :ntes mesmo que ;r.'oflteceram. De um lado, os direitos da radioemissora da Diocese ,Je Goiás foram cassados pelo governo e nunca mais devolvidos. De

trutÍo lado, a equipe de agentes de pastoral concluiu. contra as primeiras deliberações, que era outra a realidade de r.ida e trabalho dos lavradores da região e, portanto. outras der eriam ser as relações de trabalho pastoral entre a Igrej a e eles . j

Depois dos acontecimentos militares de l96f e principalmente de 1968, ce ssaram os acordos entre setores do Governo Federal e setores da Igrej aCatolica que até então estiveram associados para a realização de projetos de educação e desenvolvimento, como o que deu origem ao próprio Movimento de Educação de Base. Apos a desarticulação de grupos, movimentos e apos os acontecimentos políticos

instituições que geraram no Brasil a idéia e a prâtrca de Cultura Popular e de EducaÇão Popular, o Estado tomou a seu cargo a iniciativa de produção direta de trabalhos semelhantes com lógica, ótica, etrca e política diferentes de educação e de comunidade, tanto em meio rural quanto nas- cidades. Aos poucos, nas áreas onde bispos progressistas não o extinguiram, por falta de condições de continuar reahzando o mesmo tipo de prática pedagógtea, o MEB foi tomado por setores conservadores da Igreja Cato(4) O Movimento de Educação de Base, MEB, resultou de um convênio celebrado em 1961 entre a Confederação dos Bispos do Brasil e o governo brasileiro. Dedicou-se à Educação de Base nas áreas rurais dos estados mais subdesenvolvidos da federação. Entregue a leigos católicos, avançou em direção a uma prática de compromisso popular. Em 1964 o governador do então Estado da Guanabara apreendeu em uma gráfica milhares de cartilhas de alfabetização do MEB, Viver e Lutar. Apos o golpe militar de 1964, o MEB foi reprimido com violência em alguns estados. Os bispos progressistas retiraramse dele e o denunciaram sobretudo apos 1968 e 1970. Ver o estudo de Emanuel de Kadt, Catholic Radicals in Brazil (Londres, Oxford University Press, 1970). No momento há quatro teses de mestrado e doutoramento sendo elaboradas sobre o MEB. (5) Uso aqui as expressÕes costumeiras na área da Diocese de Goiás: agente de pastoral é o profissional que, através das equipes de pastoral da lgreja , realtza o seu trabalho junto às comunidades; agente de base é o nome dado aos sujeitos das comunidades populares participantes dos movimentos populares em vinculação com a lgreja. São os lavradores, as mulheres lavradoras, os migrantes das periferias (lavradores ainda ou subempregados urbanos, e ffi maioria).

228

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

lica. Em tempos de acentu ada repressão política a toda e qualquer experiência coletiva que redundasse em acumulação de pod

er

popu-

lar, ou mesmo de poder civil, o poder de Estado acumulou estratégicas e razões para impedir o surgimento, ou destruir a ameaça de continuidade de experiências de trabalhos de mobilizaçáo popular. A hipotese de uma outra ampla instituição nacional do tipo do MEB foi então descartada. Do mesmo modo, râ totalidade das dioceses catolicas onde aos poucos se estabeleciam linhas de uma pastoral popular foram deixadas de lado ações complexas de educação duradoura. Pequenas unidades de trabalho de mediação entre a Igreja e o povo começaram a surgir. Serão as formas pioneiras das comunidades eclesiais de base ou dos círculos bíblicos . Em Goiás, por exemplo, grupos ágeis e dedicados à análise político-pastoral "da realidade" esparramatam-se por toda parte e tomaram o nome de Grupo do Evangelho. Esse é o momento em que pela primeiravez surge ali a idéia de reahzação de uma pesquisa como um meio direto de se obter conhecimentos sobre a "realidade social" capazes de servir à orientação dos trabalhos. Uma das primeiras assembléias diocesanas, onde era ainda não-significativa a participação de representantes dos lavradores, decidiu a reali zaçáo de uma ampla pesquisa sócio-econômica

com questionários aplicados junto a comunidades populares

de

todos os municípios da Diocese: grupos de lavradores residentes em fazendas; famílias de camponeses sitiantes, de parceiros e de lavradores residentes em aglomerados de sítios e chácaras ou nas vilas rurais, aos quais os goianos dão o nome de patrimônios; lavradores ou ex-camponeses migrados para a periferia das cidades da região. Alguns pressupostos da pesquisa sócio-econômica poderiam

ser resumidos aqui. Importante lembrar que eles apenas foram ficando claros ao longo do próprio trabalho e que, em alguns casos, foi muito grande a distância entre o pensado e o vivido, entre o projeto, a realtzação da pesquisa e a utrhzação dos seus dados. 1) A pesquisa, depois de ter os seus usos definidos pela propria assembléia dioces ana, seria reahzada através da aplicação de um mesmo longo questionário que deveria levantar todos os indicadores mais importantes das condições atuais de vida e trabalho das famílias pobres da região: participação familiar no trabalho produtivo, renda familiar, condições de habitação, higiene, saúde, educação, comunicação e lazer.

2) Fora um assessor eventual, não seriam chamadas pessoas alheias aos próprios quadros de agentes de pastoral da Diocese.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

11O

Assim, âs mesmas pessoas que decidiram a reali zação da pesquisa fariam o trabalho de sua execução e usariam os seus dados. 3) Depois de concluída a aplic açáo dos questionários e depois de escrito o seu relatório, a pesquisa se .onu.rteria em um instrumento: a) de conhecimento direto da " realidadê local" por parte dos agentes de trabalho; b) de base para a montagem e articulação dos planos setoriais de trabalho direto com as .o*uridades populares. c) de instrumento de denúncia pública sobre processos de e.\propriaçáo das condições de trabalho, tanto de pequenos proprierárics quanto de parceiros e assalariados rurais: d ) de rnarelal pare usc dos grupos de trabalho pastoral. Foi feito como fora decidido. Um questionário maior do que o necessário foi elaborado, discutido e revisto ( mas não reduzido I Depois de pronto e depois de treinado o pessoal de aplicação. ele foi levado a cerca de I 900 residências de p.rrou, da iegião. euando reunidos e trabalhados, os dados resultaram em um relatorio que, mimeografado, foi distribuído a todas as equipes de trabalho pasto.

ral.

Alguns meses mais tarde, util número então reduzido de bispos do Nordeste e do Centro-Oeste deliberou apresentar documentos de avaliação ctitica das condições presentes dá vida do povo de suas

regiões' Em um tempo de silêncio, aqueles foram exemplos quase únicos de denúncia pública. O documento tomou corno base a pes quisa sócio-econômica-religiosa da Diocese de Goiás, à qual foram reunidos depoimentos de inúmeros lavradores do Estado de Goiás. Transcrevo um momento do documento em que dados da pesquisa são usados:

"De 1955 pessoas com quem procuramos falar, l2l0 disseram que estão desempregadas e enfrentam o trabalho que aparece na hora, flo tempo em que é maior a precisão. Quer dizer que se a gente pega três

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não, um mês sim, outro não. .. todo mundo sabe como é. E todos disseram que têm profissão. Quer dizer, o que falta mesmo é o emprego" (apud pSERDGoiós, p. 6).6

(6) Outras pesqu isas têm sido feitas em outras regiões do pals. Há nelas o objetivo de produzir dados e materialde conhecimànto da realidade local e de reunir informa.gões que possam fundamentar denúncias feitas por setores da lgreja, de sindicatos, de movimentos populares. Um exemplo pode ser a oe-

r30

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

Entre 1972 e 1973 uma pequena série de acontecimentos muito decisivos na trajetória das relações entre os agentes de pastoral e Ôs agentes de base prodvzrv pouco a pouco modificações na maneira de pensar, fazer e usar pesquisas locais na região. Uma primeira intenção de presença da igreja local na vida e nas iniciativas setoriais de organi zaçáo popular tornou-se em pouco tempo um compromisso de ahança direta da Igreja com as comunidades populares. Uma 5.u assembléia dividiu em dois momentos a história que narro aqui, a partn de sua face de produção de conhecimento para a orientaçáo da prâtica. Desde então a " Igreja de Goiás" reconheceu-se compromissada com um projeto de libertação popular, cuja condução foi entendida como devendo ser dos próprios agentes do povo organizados como classe. Este compromisso provocou um rompimento político de prestação de serviços dos agentes de pastoral com sujeitos e grupos das classes dirigentes, representadas na região pelos grandes fazendeiros e por autoridades políticas de controle. Em termos concretos, a "opção pelo povo" orientou a práttça pastoral a ser um serviço de criação, ajuda e apoio a grupos e movimentos populares, inicialmente apenas de camponeses e outros trabalhadores rurais e, depois, das diferentes categorias de sujeitos populares migrados para as cidades: operários, subempregados , artesãos, lavadeiras empregadas domésticas. EducaÇão Popular era, então, uffi dos nomes que tra:duzta o trabalho ali reahzado. Um trabalho exercido por agentes de mediação que, procurando abdicar de possuírem projetos históricos alternativos, colocavam-se a serviço do trabalho popular de pro duzr-los, fortalecê-los e conduzi-los através tambem da acumulação do saber e dopoder do saber.T

caso Araguaia-Tocantins, elaborada pelo pessoal da Comissão Pastorat da- Terra (Goiãnia, 1981). Outra é a pesquisa "O Peão Entrou na Roda, o Peão", que analisa as relaçÕes entre lavradores posseiros, peões e fazendeiros da região do rio Araguaia, ro Estado de Mato Grosso (São Felix do Araguaia, 1980). Esta última acaba de ser republicada no n.o 13 dos Cadernos do CEDI Garimpo. (Pedidos ao CEDI : Rua Cosme Velho, 98 Fundos Cosme Velho, Rio de Janeiro. ) (7) Educação Popularé o nome dado pelas equipes de pastoral de Goiás a todo tipo de prática de mediação que promove ou assessora os movimentos populares. A extensão do nome "educação popular" justifica-se, em primeiro Iugar, porque os seus trabalhos implicam processos de reflexão, crítica da realidade, produção de saber popular (ar coloca-se a pesquisa participante); em segundo lugar, porque servem, como uma atividade de reflexão e organização de grupos populares, à melhoria das condições pessoais e coletivas de participação popular em seus proprios movimentos

nuncia

.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

231

Aos poucos alguns parâmetros sobre o que signifi eava conhe'-er " a realidade social do povo" foram sendo mudados. Não era lastante acumular dados a respeito de "condições de vida,,. De um lado, a maior parte dos agentei vivia junto aos lavradores e, convir endo com eles, aprendia com a própria observ ação direta da vida social a apreender as suas condições. De outro lado, a partir do rnomento em que, erl suas comunidades, sujeitos populares criavam os seus próprios grupos de trabalho de representação e luta, era a partir deles, do que enfrenta'am passo a passo e do que precisavam conhecer, que se definiam as prioridades de conhecimenro. logo. de pesquisa' Assim, as investigações sesuintes procuraram responder a duas exigências: I ) ser um instrumento de outros instrumentos de trabalho, como meio de produção de conhecimentos que orientassem diretamente ͧ atividades de educação popular, elas proprias pensadas como meios de org anização e instrumental ização das unidades populares de prâtica social e política, de que o Movimento dos Trabalhadores foi, durante muito tempo, uma das mais importantes; 2) ser um instrumento á,gil de ronh.rimento direto de questões que tivessem a ver com necessidades imediatas e que pudesse ser incorporado, sem dificuldades, tanto ao trabalho reayzado pelos agentes de pastoral nas atividades que eram proprias da Igreja (Grupos de Evangelho, cursos, assembléias) quanto ao trabalho feito pelos agentes de base e que eram proprias do movim.nlo-

;;o;i;, (Movimento dos Trabalhadores, sindicatos, oposições sindicais, associações de moradores, comissões de saúde). s

Relato alguns exemplos sucessivos de pesquisas que inicialmente, mesmo não contando com a partici pação popular ativa no processo, procuravam estar participando de trabalhos populares a que deviam servir.

(8) Em Goiás há um reconhecimento de que existem trabalhos populares que os agentes de lgreja geram e dirigem por sua conta, ainda gue mais adiante agentes de base possam co-participar da direção ou possam mesmo assumi-la ' são os movimen.tos populares

da lgreja, pensados como instrumentos de trabalho pastoral a serviço oor tavraãoies. são os trabalhos que a lgreia faz ' Ha movimentos poputares das comunidades, sejam elas rurais, ou sejam de periferia das pequenas cidades. são piàJr=idos nidades e devem ser dirigioos petos iárr representantes. pelas proprias comusão os movimentos que a lgreja aiuda e parte desta ajuda áLr"*ora q..iÜ rã .ãilij"ra como uma das faces do trabalho de edicaçaà poputar.é o populares de c/asse em que os laúradores, por Há, finalmente, movimentos exemplo, entram como categoria de trabalho (sindicatos, op_osiçoes sindicais) ou como categoria política (Movimento dos Trabalhadores,'partioo dos Trabalhadores). são os movimen.

t32

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

A pesquisa sobre as terras do município de Britânia Em um dos municípios mais distantes da sede da Diocese, Britânia, o então governador do Estado de Goiás usava o seu poder a fim de pressio nar pequenos proprietários para que the vendessem suas terras. Autoridades locais

e capangas armados pressionavam,

primeiro com o pregão das vantagens na venda e depois com ameaÇâs, aqueles que resistiam à venda forçada. De outra parte, lavradores sem terras eram cada vez mais impedidos de plantar o seu artoz de subsistência no solo fertil que a seca sazonal do lago dos Tigres, às margens da cidade, deixava à espera da semente. Pouco menos de 100 camponeses acabaram vendendo suas propriedades. Convocados por eles e outros, agentes de trabalho pastoral da Igreja procuraram articular uma dificil resistência. Um dos seus instrumentos foi uma pequena pesquisa feita junto a 52 camponeses que recém haviam vendido suas terras. Entre os itens da folha aplicada, os mais importantes eram sobre as condições em que se

deu o processo de venda forçada.

Como os dados da pesquisa seriam para servir a uma açáo imediata de resistência, sequer foi elaborado um relatório final. Escrita a mão, a síntese dos dados foi devolvida às pessoas do lugar e serviu como instrumento de discussão em suas reuniões. Dentro de uma situação onde não raro apenas o testemunho de um momento de luta popular é tudo o que sobra, o material d.a Pesquisa dos

lavradores de Britânia que não conseguiram reaver suas terras nem conseguiram coletivamente outras, dentro do estado fo i acrescentado a tantos outros eue, por algum tempo, foram usados em documentos públicos de análise e denúncia dos processos de expulsão da terra.e

tos que a lgreja apoia. Para simplificar, estas unidades operativas da prática de organização popular são chamadas de: movimentos de lgreja, movimentos populares, movimenÍos de c/asse. Em termos gerais, chamo-os de movimenfos populares.

(9) Docu mentos que circulam entre os lavradores e que, em u m primeiro momento, a lgreja e outras instituições eruditas comprometidas com a causa popular faziam para os lavradores e outrqs grupos populares. Hoje em

dia, com o fortalecimento e a apropriação popular dos meios eruditos de comunicação, os proprios movimentos populares e movimentos de classe produzem os seus boletins, volantes etc. Há uma grande circulação deles por todo o interior do pais. A Diocese de Goiás faz, para seus agentes e para as comu-

nidades, uffi Boletim. Assim também, mas agora a nível nacional,

o faz

a

Comissão Pastoral da Terra. Grupos comprometidos não vinculados com a

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

t P6quisa sobre as famíIias migrantes "da roça" para

233

as cidades

Todo o trabalho mais definidamenre político da Igreja

de

: I : i s agrárias: povoados

de fazendas ou po\ oados de camponeses. \'' sntanto, sobretudo após o ano de l9-tr. rrr-orreu na região - -'l em tantas outras de todo o territorio nacrt-ri.r.ri um acele-::3nto do êxodo rural. Famílias de lavradores em l:.-lorcries geoeram forçadas a abandonaren'r as suas reríó> ,ie prtrprie'::icas

::Je e cultivo, como no caso da pequenos proprietBntrS ,ie Fr-..,Juçàt-r -::lponesa que, poÍ pressão, Pâuperizaçào ou endir rdemenro. erarn lrr gados a vender suas terras.

Em número ainda maior, inúmeras famílias de lar-radores larceiros, agregados, eram forçadas a deixar terras de fazendas. lorque os "donos" as expulsavam para substituir campos de lavoura lor pastos de gado, ou para substituir lavouras de cereais cultivadas Jom força de trabalho humano por lavouras mec antzadas. A ,,expul'ào do campo" deslocou em pouco tempo uma proporção muito grande de famílias das áreas rurais paÍa a periferia das pequenas cidades da região, as maiores delas com não mais do que 10 000 habitantes. No entanto , a maior parte dos trabalhadores rurais misrados para a cidade permanecia ocupada com o trabalho agrário, como trabalhadores volantes ("bóias-frias") ou como,,meeiros,, (lavradores parceiros). Também de 1972 em diante começou a aumentar geometricamente o número de trabalhadores desempregados no campo e na cidade.

Esta eÍa urna nova situação para os planos e trabalhos reali-

zados pelas equipes de agentes. Muitos dos próprios militantes "de base" haviam migrado também paÍa as "pontas de rua" da cidade. Tornou-se urgente uma reorientação da prátrca polític a da educ ação

popular

.

Um dos instrumentos de discussão e reorientação dos tra-

balhos de mediação dos agentes de pastoral foi uma "pesquisa sobre

as famílias migrantes". Ainda nesta investigação não houve uma participação popular. A idéia apenas amadurecia, à medida que cada Yez mais agentes populares assumiam o controle dos movi-

lgreja tendem a especializar-se na produção de material popular e eles tendem a tornar-se veiculadores de pesquisas. É*emplos' êrupó oe Documentação e Reflexão (Goiânia), Centro de Esiudos do frabatÁo lerlo Horizonte). URpLAN (São Paulo).

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org')

234

mentos de lgreja (como os Grupos do Er.angelho) ou dos movimen(como as asso{iações de tos populares, tanto ao nível da comunidade moradores ou as comissões populares setoriais). quanto ao nível 9." classe (como o Movimetno dos Trabalhadores . as oposiçõ'es sindicais e, mais tarde, o Partido dos Trabalhadores

-

PT)

Os agentes de pastoral elabor aram uma pesquisa montada ainda sobre um questionário que foi aplicado junto a cerca de A 200 famílias de lavradores migrantes para as "pontas de rua". anteduas as entre investigação conseguia agora fazer uma síntese

riores. De um lado ela produziu conhecimentos sobre indicadores de e condições de vida: moradia, saúde, educaçáo, trabalho e salário outro De cidade. na residência vida comun rtârta na nova situação de lado, ela investigou o próprio processo do êxodo "da roça" para a cidade: as razões atribuídas à migr açáo, o modo de vinda da família

do campo, as estratégias de reorga mzaçáo da vida familiar na cidade.

ro

por volta de lgl3. uma dinâmica de

relaçõe

prâttca polí-

tico-pedagogica .-{> reuniões periodicas de avaliação e reorientação **t" da linha de trabalhos (assembléias diocesanas ou avahações) pesquisas setoriais instrum entahzadoras da prâttca direta e das reuniões constituiu-se como uma rotina. O fortalecimento dos

grupos populares, não só devido à presença da Igreja de Goiás, mas também aos proprios processos de amadurecimento e às conquistas de espaço por parte de comunidades e grupos políticos de lavradores, alterou significativamente o teor das relações entre os agentes de ser base e os ogritrs de pastoral. A trajetória desta variação poderia escrita da seguinte maneira: etapa: o processo decisório e as situações de produção de conhecimento são controlados pelos agentes de pastoral, mesmo quando todo o trabalho de educação popular destina-se à rcaltzação



d. ,r* projeto de "libertaçáo popular", cuja condução deveria ser ttda basett

;

ampli ada dos agentes de base (lavradores, mulheres de lavradores, categorias populares ur-

2L etapa: hâ uma co-participação

banizadas) nas assembléias e avaliações decisórias da linha de ação

e

na co-direção dos movimentos populares da Igreja;

(10) uma das antigas militantes das equipes de Goiás escreveu

um

das estudo posterior, com baãe nà pesquisa das famílias migrantes: O Povo

Pontas de Rua.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

23s

3" etapa: o trabalho político desloca-se, aos poucos para os , movimento.s populares de comunidade e de classe , fr& mesma medida em quê os agentes de base participam eferivamente de grupos de decisão e das óquipes de pesquisa e programação dos trabalhos

da diocese.

11

Pequenas pesquisas de trabarho setoriar

Depois de consolidada a prática ,Je :nr.r;aleiJ:r\:.ja,.Jes ,Je investigação com momentos de traba lho ,Jirero. aq u r e alr surgem iniciativas setoriais. Pesquisas sào t-eiras para cobrir aspecros especí. ficos do trabalho real izadQ ou para sondar caminhos a seguir. Uma delas foi uma ampla investigaçào a respeito do sentido da presença e

das contradições de uma Igreja que, sendo estruturalmente associada ao longo da história brasileira às classes dominantes, procura alianças e pro duztrabalhos político-pastorais dirigidos de um modo cada vez mais definido ao fortalecimento do poder dos movimentos lr

oe classe.

Esta foi uma das mais demofadas e provavelmente a mais inútil experiência de pesquisa da diocese. Embora tenha sido apontada como uma necessidade urgente, ela não nasceu de um consenso

dos próprios agentes de pastoral. Por outro lado; em momento algum conseguiu inserir-se naturalrnente no dia-a-dia de seu trabatho pedagógico. Foi totalmente desçonhecida pelos militantes de base e, assim, depois de concluíd,a, a pesquisa habita a poeira de uma estante pouco freqüentada do Centro de Treinamento, em um

relatório com o nome de: Á lgreia /o Evangelho. Será provavelmente um dos documentos mais imp'ortantes para quem no futuro pretenda estudar a história da Igreia de Goiás. Mas não serviu para orientar e fortalecer o seu trabalho. Algumas pequenas pesquisas são reahzadas para responder a dúvidas a respeito do comportamento dos agentes, especificamente

(11) Este é um duro momento ooô trabalhos de um setor popular da lgreja' Aquele em que uma parte significativa dos seus trabalhos divide-se com grupos e movimentos populares quê, como tal, estão flecessariamente desvinculados de uma orientação direta e de qualquer tipo de contro le direto, tanto da lgreja catotica, quanto de qualqr"i outro grupo, instituição ou programa de mediação, mesmo quando eies estejam oeiin idamente comprometidos com . projetos de produção de poder popula r.

:

_r6

CARLOS RODRIGUES BRANDAO (org.)

no trabalho religioso. Questões às vezes descuidadas no calor de um trabalho de educação popular ou no envolvimento dos agentes com a linha de frente do Movimento dos Trabalhadores e das oposições

sindicais de lavradores são, no entanto, muito importantes para os próprios lavradores.l' Este é o motivo por que foi feita uma pequena pesquisa sobre o batismo. De uma ampla consulta a lavradores "da roça" e da cidade, foram tomados pontos de orientação do trabalho propriamente religioso. Até aqui apenas narrei as relações entre o trabalho popular e as pesquisas reahzadas pelos agentes de pastoral da Diocese de Goiás. A primeira parte destas reflexões serve para exemplificar um modo de prática com classes populares rurais onde a pesquisa tenta existir como um recurso político-pedagogico de acompanhamento dos trabalhos. Ela serve à produção de conhecimento para a programação tanto quanto para a avali açáo do que foi feito. No espaço entre um ponto e outro, serve para a reflexão de equipes de agentes que trabalham na base. Fora a consciência de que a pesquisa, em um contexto de ttabalho com comunidadesrurais e de periferia, devia ser dirigida cada vez mais a elas proprias e devia, portanto, ser feita em função de ações coletivas ali realtzadas concretamente, para responder às suas duvidas diretas, aos poucos os agentes alcançaram uma outra compreensão do assunto. Ela foi o caminho para a descob erta da idéia da participação popular em um modelo de pesquisa participante que buscava ser parte integrante de um programa de educação popular e servia ao seu encaminhamento, à sua realtzação. Descobriu-se com a própria experiência que até então quase todo o trabalho de produção do conhecimento e quase todo o uso político-pedagógico deste conhecimento estavam concentrados nas mãos dos agentes de pastoral. O fato de eue, em intenção e, às vezes, na realidade, o conhecimento produzido com a pesquisa fosse "usado para o trabalho popular" ou "levado ao povo em reuniões" não anulava a evidência de que a prâtrça da pesquisa negaYa em ato o que eÍa a todo momento afirmado e reafirmado nas reuniões e condiassembléias: que o exercício do controle político popular

-

(12) Em vários municípios onde os sindicatos do trabalhador rural eram controlados por lavradores "pelegos", controlados pelo Estado ou por grupos de fazendeiros, surgiram movimentos de Oposição Sindical. Em alguns deles houve vitórias eleitorais destes movimentos, sempre apoiados pelos agentes de pastoral.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

237

ção de um processo social de libertação deveria começar no interior dos próprios grupos e das instituições mediadoras comprometidas com as classes populares. Assim, qual seria o sentido e o r alor de esrudos, seminários e pesquisas "sobre" o povo da região. sobre os seus problemas e sobre os determinantes político-econômicos dos seus problemas? pesquisas e estudos onde o camponês, mesmo senit-, : r,.íeiro cla praiica pastoral e o suposto sujeito do projeto polític,) -i€ .'. r.ríulç-io. nào era o sujeito, mas o objeto dos traballtadores uLifr,_ r--'i _-,. ,je realizaçào desta prática e deste projeto. Esboça\ a-se d parii: da: a l3ssagern ,Ce pesquisas soÔre para pesquisas com. e esle iül cr ,.-ürrleco de urn passo bastante importante.

A participação popular na pesquisa participante Quando a diocese completou 10 anos de atuação em áreas rurais de Goiás, foi decidida a realização de uma pesquisa que atualizasse o conhecimento dos agentes de pastoral e agentes de base

"a realidade social" da região, avaliasse o andamento e as condições de trabalho dos diferentes grupos e movimentos populares da Igreja, os das comunidades e os das categorias de trabalhadores rurais ajudasse a decisão do trabalho da Igreja de Goiás feito até então. A primeira idéia foi a da repetição, 10 anos depois, da grande "pesquisa sócio-econômica". De imediato a proposta mostrou-se inadequada. Tinha havido um avanço muito grande em termos de compreensão da realidade local. Se, antes, tratava-se de equipes recém-chegadas a uma área rural de atuação, agoru elas contavam com 10 anos de experiências diretas junto às comunidades camponesas. Ao longo do tempo tornou-se claro que o trabalho diário sofria interrupções prejudiciais quando era repartido com uma atividade absorvente como uma pesquisa. Os próprios sujeitos do trasobre

balho de edu cação popular haviam sofrido mudanças de peso. Haviam migrado paru a cidade e, com isto, transferido para as suas periferias o polo operativo das ações de assessoria das equipes de agentes. Haviam constituído os seus próprio5 movimentos e reclamavam uma participação mais direta em todos os espaços anterior-

mente criados pela ação da Igreja na região. Segundo alguns,

a

própri a prâtica dos agentes da Igreja e do campesinato era o melhor instrumento do conhecimento da realidade local (condições de vida e

cARLos RoDRIGL.ES BRANDÃo (org.)

238

determinantes dessas condições). assim como do próprio andamento da prártica da educação popular e dos movimentos populares. Por que razóes perguntar com questionários aquilo que a vida respondia por si mesma, todos os dias?

Surgiu então a proposta da elaboração de um modelo

de

pesquisa que se incorporasse a propria prática cotidiana. Um tipo de investigação que fosse o mais plenamente possível co-participada por agentes de um lado e do outro; que estivesse o mais diretamente açáo que grupos, equipes, movimentos e e do campesinato estivessem comunidades das eja, Igr da comissões fosse um instrumento de que momento; naquele desenvolvendo ou seja, separado trabalho, o para instrumento não um e trabalho e orienconhecimento de material produzisse portanto dele. Que, , taçáo ao longo de sua marcha, e não apenas em um momento final.

possível

"colada" à proprra

Por outro lado, o que se constatou era que, ilo momento em que se tem um tipo de envolvimento agente-povo configurado e em processo e no momento em que se tem uma associação de práttca popul ar * prática de mediação (o trabalhodireto das comunidades e grupos populares com a participação e assessoria de instituições e

grupos de agentes comprometidos), estes eram os pólos determias "portas de entÍada" de todas as questões a serem nantes

conhecidas, pesquisadas e discutidas.

Este é um ponto muito importante. Ele não só abre caminho para a participação de militantes populares fia produção do seu conhecimento, como coloca, mais do que métodos e técnicas rotineiros, a ptopria estrutura de produção social do conhecimento através da pesquisa, em funÇão dos movimentos populares, a seu serviço . Tratava-se de descobrir como pensar, Progtamar e realizar pesquisas compatíveis com a prâtrca político-cultural popular, o que é diferente de convocar sujeitos do povo a virem participar de pesquisas sobre ele proprio e seu mundo, dentro de nossos padrões tradicionais apenas estrategicamente "popularizados" Neste momento quero calat a minha escrita e fazer ouvir-se aqui uma fala coletiva do passado. Com algumas pequenas revisões que em nada alteram o sentido, transcrevo um dos documentos em que as discussões de 1979 foram "postas no papel" .

,,A sugestão vinda do grupo

piloto de disôussão sobre a pesquisa foi

a

o. fosse uma de que ela só teria sentido e só deveria ser feita se: I para o próprio consciente modo algum de necessidade real e efetiva, povo; 2.'. em todas as suas etapas fosse realizada com o conhecimento

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

e a participação (populares) .

-

inclusive decisória

-

239

de representantes da base

Por outro

lado, foi decidido que nós não nos preocuparíamos em investigar 'setores' da 'realidade da região da diocese,. procura-

ríamos principalmente pesquisar os niveis de relações sociais que ajudem a explicar como estes vetores da vida social dos lavradores estão articulados agora, como eles envolvem e control am a vida dos Iavradores e como a nossa práttica está colocada frente ao que acon-

tece neles. Não se

trata, portanto, de pesquisar condições de r.ida. ou rurais. ou de periferia. quanro a isrt-, t-ru àquilo' Há um trabalho nosso egenre b.:se: r3 s::rr.r\.s üe diferentes tipos de contritos entre ca:e::t.,í.js ie >._,e;:üs >c{r3:s i-. a situação das comunidades

várias áreas da regiào: ha drterentes rormas,le resprrSia pc,pr.liar. Es:e conjunto de fatos da dinâmica da r ida polÍtica qr. , rorJos cornprr-rmete e o foco da pesquisa. Esta ideia será mais desenrolr-ida adianre. EIa poderia por enquanto ser representada conforme Figura l. Estes serão os passos durante os primeiros períodos de resolução e realizaç.ão da pesquisa: l) a equipe proviro.iu de coordenação deve levar a idéia à Equipe Diocerunu de coordenação para estabelecer ali uma discussão decisória sobre o assunto ; 2r) a proposta deverá ser amplamente debatida nas comunidades, mesmo considerando-se que nas discussões anteriores sempre houve representantes

FIGURA

1

sde

como

conhecimento da realidade social da região

A I I I

nossos trabalhos de apoio à luta pela terra

.

I

trabalhos de apoio às lutas populares por melhores

condições de tra ba lh o

. nossa participação naslutas e movi-

mentos de sa

úde

como avaliação de nossa prática pastoral

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

240

das bases; 3n) como material-piloto, âs equipes locais ,deverão fazer levantamentos simples, com participação popular. Estes levantamentos da realidade local devem enrolr.'er: a) situações de conflito entre lavradores e fazendeiros, por eremplo. assim como formas populares de resistência em todas as áreas de atuação dos movimentos populares (terra. trahalho. direitos humanos. educação, saúde, etc. ): b ) erperiências de trabalho de educação e pastoral popular em diferentes setores de atuaçào. Como um passo preliminar da pesquisa. tal trabalho-piloto de simples levantamento de situações de conflito e experiências de pratica deverá resultar em pequenos relatórios, sobre os quais trabalharíamos como base para a elaboraçáo dos passos seguintes. Ao mesmo tempo o pessoal de assessoria da pesquisa fará os estudos necessários ao seu aprofundamento. Estes estudos serão somados aos dados de nossos levantamentos , para a discussão de um modelo de pesquisa.

Eis, portanto, a idéia básica da pesquisa. Não se trata de manter o controle de todo o trabalho e apenas'explicar' às bases que uma investigaçã"o vai ser realizada, pedir sugestões esparsas ao povo e prometer que os resultados serão 'devolvidos' a ele. Ao contrárro, a idéia é a de construir uma autopesquisa. No modelo tradicional mo quando o pesquisador se sente comprometido com o povo 'centro de direção'é alheio a ele. Ali se define como a investigação vai ser feita, por que ela vai ser feita e quem vai ter que tipo de acesso aos seus dados. Assim, o mesmo povo considerado como'o sujeito'de um processo de mudanças sociais que se deseja provocar segue considerado como objeto da pesquisa feita para produzir o conhecimento necessário ao encaminhamento de tal projeto de mudanças. O que ocorre são expropriações impostas uma vez mais:

a) os agentes da base não participam do processo decisório a respeito da definição e da construção do modelo de investig açáo; b) durante a sua realizaçáo, eles e tudo o que cerca as suas vidas (a comunidade, os grupos tradicionais ou orgânicos, suas condições de vida, suas maneiras de sentir e pensar) são constituídos e abordados como'objetos de pesquisa', algo externo a respeito do que se investiga; c) as comunidades de base não participam do processo de tratamento e análise dos resultados da pesquisa, os mesmos resultados que são diretamente fornecidos por elas como'dados da investigação'; d) finalmente, as comunidades não possuem acesso direto a tais resultados QUe, muitas vezes, sequer são comunicados ao povo, sendo em geral redigidos em linguagem hermética, distante de uma verdadeira discussão entre pesquisadores e agentes populares.

REPENSANDO A PESQUISA

PARTICIPANTE

241

ora, grupos de agentes comprometidos, a prâtica .para política pedagogica anterior à própria pesquisa é que deve determ inâ-ra. E que deve definir como e por qre ela dere ser feita. E esta prática existe eq um ponto de relações entrÊ crg€ ttÍes de educação e agentes de base (das comunidades, dos mo\ inre 'ão, -g.rpo, nros poprlur.r, . comissões)' Assim, todo e qualquer processo de produção de conhecimento que venha a ser incorporrdo a esta prática e aos processos de transformação que ela ob,iet ir a. ,Jer e ser uma ,.mpreitada, comum 9ue' em um mesmo trabalht-r. itlrlsrometa todos os grupos e su_ieitos envolvidos. Isto vale para toü3: :i :-:\3\. :-1::rr J> cr' ,.,.-;^-...;. , 9

üu3nIo

as de decisão e u.\o.

Sobra então uma pi,.rSunl3: e F\i:S.ie, :;:.:z:: t:1,-r :j :1:.ri1.-..1 . Para o nosso caso e-risrem ,iuas irjeias. rit-rrS ffitrrie ic,s m:rs lsua:s. m3s nós teremos que construirjuntos o nosso caminho:

l.o

modelo:

a) os agentes de pastoral discutem com os do po\-o a necessidade da pesquisa e os seus procedimentos; b) os agentes resolvem sobre a metodologia e os procedimentos.

criam os instrumentos de pesquisa e os aplicam junto às comuni-

dades;

c) de posse dos dados obtidos, eles fazem o tratamento necessário e elaboram um relatório; d) finalmente, simplificam os dados, colocam a linguagem do relatório em um 'nível popular' e os devolvem ,ao povo,. 2.o momento: a) os agentes discutem com os representantes do povo sobre

a partir de uma prática antecedente; b) agentes de um lado e do outro decidem sobre ela, elaboram os seus procedimentos (quando os agentes de educ açã,o traduzem o linguajar científico em uma linguagem adequada aos lavradores) e articulam métodos e procedimentos de investigação que permitam

pesquis a a

tanto uma aplicação no campo quanto um tratamento e uma análise co-participada (mesmo que haja- aí tarefas

c)

de posse dos dados obtidos com

diferenciadas)

o trabarho

;

de campo,

agen_ tes e povo analisam o material, discutem o seu significado e os seus usos diretos (fazer relatório? levar para discussão nas comunidades?

usar como documentário atual de denúncia da situação da vida do

povo?).

Partindo destas premissas, a proposta da pesquisa sobre a situação do povo e o andamento oas luia, foi,Ju.., na região dos municípios é a que se segue. Não proceder a uma investig ação sobre ,realidade a social, através da captação dos indicadores do nível de vida dos lavra-

cARLos RoDRTGUES BRANDÃo (org.)

242

dores e dos migrantes para as ,pontas de rua'. ou seja, não proceder como na 'Pesquisa sócioeconômica' feita há l0 anos. Não concentrar, por outro lado, a investigação sobre um

único aspecto'da üda do povo 'da roça' e da cidade, por exemplo: as condições de acesso ao trabalho. à saude e à educação. Finalmente, não realizar uma investigação centrada em algum aspecto da prática que estamos desenvolvendo como um tipo de avaliação de um setor unico de nosso trabalho, como já foi feito com outras pesquisas. Como pensar, portanto, uma pesquisa que esteja inserida plenamente em nossa realidade e que envolva todos os tipos de pessoas

participantes de um mesmo trabalho de libertação? Um càminho seria o de pensar uma investig ação que nos permita compreender a realidade social olhando-a através d,e nossa pratica. Isto é mais ou menos o mesmo que afirmar que a pesquisa deve avaliar a nossa prática atraves de seus efeitos sobre a vida iocial da região. Este poderia ser um primeiro passo para criarmos juntos um tipo de pesquisa que escape dos padrões acadêmicos e se adeqüe às nossas condições de trabalho e à experiência de tantos anos de envolvimento lavradores-agentes em Goiás. É um caminho para tomar efetiva a participação popular em uma pesquisa que, por sua yez, participe, como um instrumento de trabalho, dos movimentos de Igreja, de comunidade e de classe. Melhor do que nós são os agentes da base os que sabem definir quais os aspectos da vida social que eles precisam conhecer ou aprofun dar para orientar a sua práttica (nas comissões, nos grupos de base, nos movimentos); que eles querem conhec er a respeito de si próprios para redefinir a sua práttica (questões de identidade popular, ideologia do campesinatà, posição de classe, interesses de classe, etc.); que eles consideram relevantes como contribuição de nosso trabalho de educação popular nossas ativi- de acordo dades avaliadas com melhores critérios pelo próprio povo, como incidiram sobre ele e tal como ele a pàrtir daí atribui significados a isso.

Assim, ao invés de uma equipe de agentes de pastoral determinar o que é importante investigai, perguntando depois aos representantes das comunidades e dos *oui*ãntos populáres o que eles

acham disso, nós vamos estabelecer os pontos a serem pesquisados a partir de um levantamento feito com esses próprios ,.pr.r.ntantes. E possível que tenhamos surpresas aí. Podêmos'th.gu, com algumas idéias prontas e ouvir dos representantes que são outras as questões que os estão preocupando mais. A sensibilidade para ouvir e compreender o ponto de vista e as razões dos grupos de base é o primeiro passo. Sem ele os outros se perdem.

REPE\SANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

243

Poderíamos, em princípio, desenvolver a idéia que foi colocada por alguem em nossa prim etrareunião. Muito bem, se o nosso projeto de conhecimento da iealidade e de avaliação de nossa prática político-pedagogica sobre ela não é rigorosamente

acadêrni.à, então não devemos recortar academicamente o 'objeto de pesquisa,. vejamos, o nosso compromisso aqui é com a libert ação de um povo oprimido e

não apenas com a melhoria setorial de alguns aspectos de sua vida material' o processo de realização desta 'liber tação, são transformações estruturais significativas, incidindo sobretudo nos polos de rela-

ções sociais que produzem as condições de opressão (questào agraria. questão das relações capitalistas de trabalho. quesràr-r rJtr pc.,rJer poDu-

lar etc.). ora, o caminho de opção da Ierera .re Goras e o ,Ja realr_ zação de transformaçôes estruturais atra\ es da conqursta ,Jo puri, r. popular sobre as estruturas de decisào da rida política local. resional

e nacronal

Assim, toda a nossa prática de pastoral popular (que temos chamado tambem de uma prática de educação populor) estérdirigida à transformação de toda a realidade. Porém, ãtu incide com prioridade sobre alguns setores específicos de tal realidade, com a esperança de que haja aí um efeito multiplicador (não somos os únicos nem a nossa e a unica região onde se dão trabalhos de mobiliz ação popular) QUe, por sua Yez, participe do processo de articulação de

relações que contribuam para a transformação de todas as estruturas sociais de teor político. É sobre certas areas conflagra,ias de relações sociais que temos trabalhado preferentemente. Por outro lado, é o que acontece aí no interior de tais áreas de relações o que explica da melhor maneira aquilo que está acontecendo em toda a armação da vida social. por exemplo, o exame d,a luta entre os lavradores e os fazendeiros de Britânia pela posse de terras, ou o estudo das difíceis relações entre os lavradores de Juçara e a empresa de semente de capim que os conttata a preços aviltados é o que ajuda a entender como funcionam as relações de poder em nossa região; a) entre os proprietários de terra e

os seus subordinados;

b) do aparatojurídico-político

de poder e controle; c) dos diversos grupos da sociedade civil associados politica-

mente aos donos do poder (partidos da situ ação, igrejas

dominantes etc'); d) das comunidades, da classe camponesa, de suas e outras

categorias de trabalhadores (pequenos proprietários, lavradores

parceiros' arrendatários, agregados assalariados, volantes bóias-frias, biscateiros); e) dos grupos e instituições da sociedade civil compro-

metidos com os grupos populares, corno é o nosso próprio caso. Mais do que isso, o exame destas relações de conflito coloca em evidência o funcionamento, como objeto de estudo, das contradições de um tipo de sociedade como a nossa e das relações concretas entre as diferentes categorias de grupos e movimentos populares dentro do seu contexto.

244

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO lorg';

de um Assim, sugiro pensarmos na possibilidade de partirmos ,áreas mobilizade e sociais relações de quentes' levantamento das o nosso compromisso e o nosso ção popular que envolvem diretamente

prática. podemos com eçar por sep araÍ regiões geográficas significapatrício. Serra Dourada, Rio vermetivas (uru Fartura, vale do são

de lho) e fazer o levantamento dos setores de ação social (produção de e comunitários grupos de terra + trabalho. organização bens

recorte entre classe, saude, educação. comunicação, religião). Neste sociais entre relações das aspectos destacar podemos * setor, lugar adequados: mais os como que consideremos pessoas de categorias ali aconteceu realmente que 1.') para explicar, através de pesquisa, o por exemplo, saúde, de questões a relação (não como á poro está com está sendo a mas como estão se dando as relações de poder e como região); atuação movimentos populares x instituições de saúde na pesquisas pequenas várias de 2.") para explic at, affívés da integração parciais, como funcion a a estrutura social e o que está acontecendo

da nela agora; 3.o) para explicar, como um momento de avaliação trabalho nosso o e presença pesquis a, quar e como .rla sendo a nossa de educação PoPular na região'

Tal como foi colocado antes, podemos partir de levantamentos paÍa preliminares e decidir juntos quais serão os mais relevantes envolverão serem investigados mais a fundo. Não serão todos. Não Não incitodas as regiões geográficas, nem todos os 13 municípios. e termos fundamental o importantes. dirão sobre todas as questões

reconstium conjunto de situações concretas da vido social que serão pastoral e tuídas como objeto de uma pesquisa feita por agentes de um agentes de base. cada uma das áreas escolhidas constituirá completa, ,locus, pesquisa uma feita será ali e pesquisa de mesmo articulada sobre o acontecimento social escolhido. os seus Depois de concluídas todas as pesquisas parciais e feitos reuem e, material o todo aglutinar de relatórior, huuerá um tempo um produzir e discutir comunidades, nas inclusive niões sucessivas, não de o será relatório integrado das pesquisas locais. O seu objetivo mas: a) expliapenas mostrar indicadores sociais da vida do lavrador, b) indicadores; daqueles produção de citar processos sociopolíticos de futuras bases estabelecer c) trabalho; ,rorro ô criticamente avaliar atuação dos movimentos populares'"

Até aqui, o documento de estudo prévio da pesquisa de 1979' como tarefa inicial, as equipes locais deveriam fazer o pequeno os levanlevantamento sugerido. uma reunião posterior examin arta e os geográficas tamentos e determinaria, em princípio, âs regiões pesuma de objeto setores de relações/práticas que se tornariam trade a era básica idéia A quisa participante muito mais longa.

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

245

balhar com métodos antropológicos, mais do que com métodos tradicionais, "neutros " e quantitativos,

observação participante, aproveitamento de reuniões de grupos para coleta direta de dados "na ação", análise de conflitos, pesquisa direta com base em ,,dramas sociais" etc' Justamente uma das tarefas da assessoria da pesquisa seria a de estudar a questão epropor métodos que tomassem a pesquisa um trabalho incorporado cs práticas diretàs das pessoas e grupos, ao invés de ser um tipo de trabalho àparte.

locais.

Eis o roteiro do levantamento preliminar sugerido as equipes

"Roteiro

1) Localizar dentro do município uma comunidade rural, uma comunidade de 'ponta de rua', uma fazend,a, uÍrt espaço social de trabalho (relações de luta entre lavradores e fazendeiros, por exempio)' onde estejam havendo situações de conflito, ou de trabalho popular significativo.

2) Definir o tipo de fato que vai ser descrito: um conflito por terras? um conflito trabalhista? um conflito por questões de saúde (como no caso de Itaguarú)? 3) Descrever a conjuntura em que se deu o fato que

vai ser descrito: a situação antecedente. a composição de forças de um lado e do outro, os determinantes imediatos da oáRagr açã,o do conflito etc. 4) Descrever de modo sumário, mas o mais completo possível, o fato escolhido. A descrição deve ser a de um acontecimento social, narrado do ponto de vista das trocas e relações sociais mais impor. tantes participantes da questão. se possívll, incorporar pequenas 'rclaçaiuol entrevistas (passagens curtas) sobretuào com lavradores envolvidos.

5) Descrever o encaminhamento do fato.

as possibili-

euais dades de desenvolvimento do conflito? Em que ele está comprometendo a vida e as relações entre categorias soclais de sujeitos do lugar (fazendeiros, autoridades, lavradores etc.)? 6) Discutir o modo como os grupos e instituições sociais

de compromisso popular estão participuroà dos acontecimentos. Analisar' principalmente, o teor da partiãipaçao daequipe local de agentes de pastoral.

7) Relacionar as fontes diretas e indiretas de dados sobre o acontecimento, paÍa o caso de ele ser um dos escolhidos como objeto da pesquisa mais ampla.

cARLos RoDRIGUEs BRANDÃo (org')

216

alternativas As relações pesquisa/ação: problemas e a pesquisa partiTal como foi pensada em primeira instância, e reproduzrda l9i9 em cipante cuja proposta foi redigida por mim 1978 e 1979, entre actma não foi reartzada em Goiás. Justamente através anual, assembleia quando era foi primeiro decidida em uma e dos de agentes de trabalho do voto de agentes popurares da região depois u , pré-elaborada em duas

de Educação Popular da Igrej ", de pesquisa, alguns reuniões de uma comissão de coordenação região da Diocese na acontecimentos muito importantes ocorreram de Goiás.

e de classe des-

1) os movimentos popurares de comunidade da lgreja' Este vincularam-se de uma tutela relativa dos agentes horizonte diretor de todo o sempre foi um momento esperado e um que o desejado eta trabalho de Educação popular. Todos sabiam de criação e que, após um período de trabalho político-pedagogico Igreja (de que os Grufortalecimento de movimentos pop;lares da surgissem e se forpos de Evangerho foram o melhor instrumento), rurais e perifertcas movimentos talecessem em todas as comunidades

submetidos ao conefetivamente populares, ou seja, movimentos fia sua maioria, repretrole exclusivo de agentes locais, lavradores das associações de morasentantes da comunidade (como no caso (como as oposições sindores), ou do campesinato enquanto crasse o trabalho de educação dicais). Este seria o momento em que todo . Ele passaria a agrr popular atingiria um momento de maturidade eruditos (educadores, ciencomo espaço de assessoria de militantes e enfermeiras) aos próprios tistas sociais, agentes religiosos, médicos cuja prática serta então o elemento determi-

movimentos popurares, nante de todo o nosso trabalho de mediação ' Ilusão z) Houve alguma divisão entre os próprios lavradores.

operári os, laimaginá-los como uma classe perfeita e indivisível. com a práfirca aprendem vradores e outras categorias de subalternos

política de sua organi zaçã,o.

o

caminho é difícil e as oposições

delas manipuladas internas nos movimentos popurares - algumas também de incentivadas de fora peros grupos dominantes, outras agindo ora, exceção. uma fora por grupos mediadores - não são popuprojetos com como p.úrrionais e militantes comprometidos alterprojeto um possuírem lares e) portanto, sem aparentemente que o também, dividiram-se pastoral nativo próprio, os agentàs de equipes das proprias provocou momento, d. tensão ã conflito dentro a um trabalho necessárias unidade de de pastoral. As condições

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

247

como uma pesquisa ampla e participante estiveram perdidas durante algum tempo e so mais iarde io.u* em parte recuperadas. 3) Por outro lado, alguns agentes de Igrej a se negavam a participar de toda e qualquer prática de pesquiia que não fosse iniciada e dirigida pelos movimentos de larra,Jores. por que uma instituição como a Igreja procede a uma pesquisa e enrolve nela o trabalho dos lavradores, quando eles proprios. e parr ir dos seus movimentos, sindicatos e partidos poderiam tazer- r>rt'i. ct)nr idando. quando quisesseffi, agentes profissionais para. eies )rni. parrrciparem dos trabalhos como assessores'l rhá e\effipit-r: redrs ,Jisr.- em sindicatos de operários do Rio e de Sào paulo r. 4) Finalmente. após retirar-se como instituição de iniciatir as de produção de movimentos populares que as classes populares -jáiniciativas ocupavam por sua conta este espaço de políticas as -t equipes de pastoral retornaram a dois tipos de atividades na região, fora as do trabalho propriamente religioso: a) o apoio aos movimentos populares de comunidades e de classe; b) a realização de trabalhos setoriais de educaçáo popular: saúde alfabetrzaçfo, me, lhoria de condições de vida nas "pontas de ruas" etc. Foi justamente destes últimos espaços de trabalhos de edupopular que as pesquisas pensadas no item anterior foram de novo programadas e, apenas no caso de uma delas, plenamente realizadas. Descrevo sumariamente dois exemplos. caçáo

Grito- um estudo sobre as condiçõesr os direitos, o valor o trabalho popular associados ao problema da saúde em Goiás

O meio e

Lavtadores e sobretudo mulheres das comunidades rurais e rua" pediram à comissão regional de saúde uma "cartilha" para que nela eles aprendessem a se relacio nat com os serviços médicos dos sindicatos e de trabalhadores rurais ou da Previdência Social. Foi sugerido que, em vez de uma resposta direta da comissão, todos juntos participassem de uma ampla pesquisa na "região do Vale do São Patrício". A pesquisa foi feita e, em certa medida, tornou-se um modelo bastante criativo de trabalho participante. De seu processo saíram: a) um relatório sobre questões e lutas de saúde, publicado pelo Centro Ecumênico de Document ação e Inform açáo e dirigido a agentes de educação popular; b) uma versão popular da pesquisa escrita para os lavradãrês pelo médico da comissão, depois de haver sido ampla e demoradamente discudas "pontas de

CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (org.)

248

tida pelas próprias equipes populares que reahzaram a pesquisa; c) a cartilha anteriormente solicitada pelos lavradores e que veio a

A Lamparina (existente so em versão dos lavradores e circulando apenas entre eles); d) um documento didático escrito pelo médico da comissão, chamado O Reloto do Meio Grito, não chamar-se

publicado ainda.13

A educação nas comunidades de camponeses

e

lavradores

Em algumas comunidades foram solicitados cursos de alfabettzaçáo, de pos-alfabetrzação e de supletivo. A decisão das equipes de pastoral foi a de não impl antar um "progr ama de alfabettzação" (modelo considerado como ultrapassado). Dentro de uma prática de respostas assessoras às reivindicações das comunidades, a sugestão foi a de participar da construção e re ahzaçáo conjunta de núcleos de alfabettzaçáo, etc., apenas nas comunidades onde isto apatecesse como uma exigência popular e onde o trabalho, desde o início, fosse assumido em co-responsabilidade pela comunidade e pela equipe de pastoral. Ampliando um pouco a proposta de investi gaçáo do universo vocabular e do universo temático em Paulo Freire, foi pensada uma pesquisa participante sobre questões e atitudes da comunidade a respeito da reproduÇão do saber. A pesquisa é para ser reahzada apenas naquelas comunidades onde haja uma disposição em co-dividir um projeto de escolarrzaçã,o popular. ta É, neste sentido, um primeiro passo do proprio trabalho pedagógico.

A pesquisa com os lavradores e famílias migrantes

Na 1 1ê Assembléia Dioces ana foi decidido, com voto unânime, inclusive o de uma maioria absoluta de representantes das

(13) O Meio Grito, effi sua versão para os agentes de pastoral, foi publicado inicialmente em Cadernos do Centro Ecumênico de Documentação e lnformação ne 3 e, depois, em Pesquisa Participante, São Paulo, Brasiliense. 1981.

(14) Escolarização Popular é

o nome da Educação Popular quand

realizada através de atividades propr iam ente escolares: curso ção, p os-a lfa betiza ção etc.

o

s de alfabetiza-

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPANTE

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comunidades, QUe um dos trabalhos mais urgentes seria o de um novo amplo estudo sobre a situação dos lavradores e famílias migrantés pata as cidades. Criou-se uma equipe de coordenação da equipe envolvendo agentes de base e de pasioral. Foi resolvido que a pesquisa somente seria programada depois que as comunidades de cada município que assumissem realizát-la decidissem a respeito de como ela deveria ser exercida ali. Foi previsto um segundo encontro na cidade de Goiás, onde os representantes das Çomunidades levariam as decisões de suas bases. Então. a "pesquisa das periferias,, seria programada e posta em estado de realizaçào. Narrei até aqui casos e seqüências de uma histr-rria de incorporaçã'o de sucessivas experiências de pesquisa a um rrabalho que. em

termos amplos, pode ser definido como de Educaçào popular. Narrei uma história de idas e vindas, de sucessos e fracassos que r ir i de perto, algumas vezes profundamente envolvido. Houve avanços muito importantes, mas eles são parte dos momentos de recuo, de eÍros' A maior de todas as pesquisas, aquela que incidiria sobre as questões a nosso ver mais relevantes, e que teria a mais significativa participação popular, não foi leva da iefeito. outras, como a de educação nas comunidades, estão quase paralisadas,

porque o pró-

prio trabalho não aYança. Não há, .oráições de construirmos ali modelos pré-fabricados de participação e de pesquisa participante paru podermos escrever relatórios invejáveis. A pârtir áo momento em que um trabalho coletivo de produção de conhecimento militante deixa de ser a atribuição do poder decisório de uma equipe que gerencia, inclusive, o controle sobre os convites e os limites d,a participaçáo popular , ele se envolve de todos os atropelos que fazem a rotina de qualquer tipo de ação mediadora verdadeiramente a ser-

viço do trabalho popular.

A participação da pesquisa no trabalho popular Que idéias poderiam ser reunidas aqui a partir da pequena historia de trocas de saber entre equipes à. agentes de educação

popular e comunidades e grupos organi zados de lavradores? Em que poderia nos ser útil pensar a partir de uma trajetória de 12 anos de buscas dirigidas a coloc ar apesquisa social co,mo um instrumento rda educaÇ,ão popular, da causa popular? E a propria questão da participaçãao que está em jogo. Um dos atributos mais usuais das estratégias autoritárias é jurtÃente o de

REPENSANDO A PESQUISA PARTICIPA\

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uT. t.eor político de participação. Ela não é ainda um instrurne::c

político e pedagógico de produção científica de um tipo necessrj-:,-, de sabêr popular e de orientação de ações populares que sin an: efetivamente aos seus objetivos. No caso do segurdo,tipo de vinculação, arnd,a que possa haver um baixo índice de participação popular (em nem todas as fases da pesquisa existe uma participação da comunidade) , ela é politicamente uma pesqui saparticipondo (sendo orientadapara e servindo a) de projetos populares de pioduçào e uso de saber' Isto não significa que experiências intermediárias,Je rrabalhos de produção de conhecimento social com participacàtr popuiar não devam ser postas em prática. Qualquer que se-ia o ptr,rtr ,Je início de um tal tipo de pesquisa. as determ inaçÕes de sua conrrnuidade e a direção efetiva do uso de seus produtos serão o seu melhor meio de avaliação.

É neste sentido que eu quero tomar uma ideia recentemente

exposta pelo professor José de Souza Martins para estabelecer paralelos' Do ponto de vista d,a equação entre forma de participação da

pesquisa no trabalho

popular x forma de participação do trabalho popular na pesquisa, há três alternativas possíveis. Mais do que tipos irreconciliáveis

como algumas pessoas acredi tam que seja o a "pesquisa participànfs,, são modalidades de trabalho científico, pedagogico -, e po1íti.o QUe, dentro de uma ação mais ampla, podem ser seqüentes e comple-

-

caso entre a "pesquisa acadêmi ca" e

mentares.

A prim eka opção de pesquisa descrita linhas atrás é a de uma pesquisa compartilhada. Proposta por um programa antecedente, dela participam sujeitos populares mesmo que a propria pesquisa

não participe de um efetivo trabalho político de acumulação de saber-e-poder populares, e não seja controlad,apor agentes do povo em seus pólos de decisão, ou seja, 'antes do começo" e " depois do fim" da pesquisa. A segunda opção descrita é a de uma pesquisa

participante' Proposta desde o interior de uma préttica que associa politicamente agentes de mediação e agentes populares, estes últimos participam da pesquisa porque tanto ela-quanto o trabalho a que se vincula participam antecedentemente de projetos e processos de acumulação de saber-e-poder populares. Uma terceira modalidade pode ser colocada num ponto próximo a um horizonte desejado' Quero ch amá-la depesquisa popular g imaginar um trabalho de produção de saber de classe gue, proposto e dirigido desde os movimentos populares, envolva a participaçao comprometida e assessora de agentes de mediação.

cARLos RoDRIGUEs BRANDÃo (org.)

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- e eu trago de volta ideias aprendidas com José de Souza Martins de pensarmos sobre a possibilidade da Este é o momento

redução imediata ou da extinção da desigualdade de saberes entre tipos diferentes de agentes como fundamento da pesquisa participante. Esta é urna ilusão que atrapalha porque mente. Supor qu'e a participação está baseada em uma relação de troca constituída sobre urna suposta igualdade de poder e saber oculta o fato real de QUe, entre o agente de mediação (um intelectual não raro de "nível superior") e a "comunidade " (lavradores, subempregados, operários), há uma desigualdade antecedente. Tal desigualdade não se resolve metodologicamente, nem na relação de compromisso entre os dois lados, nem, de modo específico, flo interior de uma pesquisa participante. Constituída por relações desiguais da estrutura social de saber e de poder, tal desigualdade é constitutiv a da propri a açáo mediadora do agente a quem, não raro, gostamos de dar o nome de intelectual orgânico a serviço das classes populares. O seu trabalho de agente é útil ao povo porque é conjunturalmente desigual, ainda que no seu horizonte exista, na bruma da manhã, a aurora de um mundo onde a diferença que faz a liberdade não se estabeleça sobre a desigualdade que gera e preserva a opressão. A questão fundamental e a de saber colo car a desigualdade a serviço. Deve-se desconfiar de modelos únicos e de experiências exclusivas, cuja perfeição de laboratório justamente impede a possibilidade de sua repeitção e de sua incorporação aos trabalhos " de base". Não há modelos únicos e não há usos normativos de tipos de pesquisa participante. Ela é um instrumento dentro da àção populor. O papel do intelectual (o educador, o cientista social, o agente de mudança) é o de ser um ouvinte atento das decisões dos movimentos populares, ou de necessidades comunitárias efetivas. E o de ser um mediador que responde, com os instrumentos do seu saber e de sua profissáo, a tais decisões e exigências, colocando-os a serviço náo da comunidade (isso a " Alian ça paÍa o Progresso" fazra), mas da préúrca política popular na comunidade. Este é o caminho pelo qual, flo limite, a pesqvtsaparticipa, como um instrumento de educação popular, dos movimentos populares. Quando as pessoas do povo vêm partici par dela, há de ser porque de algum modo ela jâ faz parte de suas práticas, de seus projetas de classe e é, por isso, parti' cipante.

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Vera Giahotten e de Wit\ Em busca de umàmetodol bia de a instituclonal Manuel Alberto Ai, A participação da pesquisa no lho po Carlos Rodrigues Brand

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