Os Pensadores 20

Table of contents :
Capa
Idéia geral da obra
Do estabelecimento dos princípios
Da sabedoria poética
Da descoberta do verdadeiro Homero - Excertos
Índice

Citation preview

XX

GIAMBATTISTA VICO

-

PRINCIPIOS ,,....

--e 1E N e 1A

DE (UMA) NOVA

(ACERCA DA NATUREZA COMUM DAS NAÇ.ÕES)

Seleção, tradução e notas do Prof. Dr. Antpnio Lázaro ~

EDITOR: VICTOR CIVITA

~lmeida

Prado

Título original: Principi di una scienza nuova dintorno alla cornune.natura delle nazioni.

1. ªedição -

outubro 1974

~ - Copyright desta edição, 1974, Abril S.A. Cultural e Industrial, São Paulo. Direitos exclusivos sobre a presente tradução, 1974, Abril S.A. Cultural e Industrial, São Paulo.

Nota do Editor Quer por sua riqueza, quer pelo arcaísmo da linguagem, o texto de Giambattista Vico oferece dificuldades especiais de tradução. Pata contorná-las, o Tradutor inseriu no próprio texto pequenas interpolações, além de utilizar notas de rodapé onde se fazia necessária alguma explicação mais longa. As referidas interpolações estão assinaladas por colchetes.

IDÉIA (GERA~)

PA OBRA

Explicação da Gravura Ilustrativa Proposta no Frontispício E que Serve de Introdução à Obra. Tal como o tebano Cebes procedeu em relação às morais, de modo análogo oferecem.os, aqui, à inspeção uma Tábua das coisas civis, que aproveite o leitor para chegar à concepção da idéia desta obra, antes mesmo de a ler, ou lhe sirva para mais facilmente a reter na memória, depois de a ter lido, fazendo uso deste recurso que lhe subministra a fantasia. A mulher de têmporas aladas,. que, altaneira, se sobrepõe ao globo terrestre, isto é, ao mundo da Natureza, é a Metafisica, como já o indica o sentido próprio de seu nome. O triângulo luminoso, em cujo interior se inscreve um olho inspectante, representa Deus, sob o aspecto de sua providência. E é sob esse prisma que a Metafisica, como que em ato de êxtase, o contempla, qual o têm contemplado, até agora, os filósofos, ou seja, por sobre a ordem das coisas naturais. Justamente essa a razão de ela [a Metafisica], nesta obra, elevando-se sempre mais altaneira, contemplar em Deus o universo das mentes humanas, ou seja, _o universo metafisico, manifestando assim a sua providência no universo das mentes humanas, que é o mundo civil ou o mundo das nações.,Este, como de seus constituintes, é formado de todas aquelas coisas representadas nesta pintura pelos hierógllfos, que ela mais abaixo exibe. Por isso mesmo, o globo, isto é, o mundo físico e mesmo natural, está apoiado apenas num lado do altar: eis que os filósofos, até agora, tendo contemplado a divina providência apenas do ângulo da ordem natural, obviamente nos deram a demonstração de uma só parte dela, justamente daquela mediante a qua1 a Deus, como a Mente soberana, livre e absoluta da natureza - eis que com seu eterno alvitre nos deu naturalmente o ser e também naturalmente no-lo conserva - , se prestam por parte dos homens, cultos de adoração, mediante sacrifícios e outras honras divinas. Não a contemplaram ainda pelo ângulo mais consentâneo aos homens, cuja natureza tem como principalíssima propriedade o serem eles saciáveis. Provendo Deus a esse particular, de tal forma ordenou e dispôs as coisas humanas, que os homens, decaídos da íntegra justiça em virtude do pecado original, muito embora intentassem agir diversa e até contrariamente [ao estabelecido] - razão por que, a fim de servirem ao útil, viviam na solidão das bestas feras - , por aquelas mesmas suas vias diversas e contrárias viram-se impelidos pela utiliconservarem-se dade, na condição própria de homens, a viverem com justiça e~

10

VICO

em sociedade, corroborando, assim, suá natureza sociável. Ao longo da presente obra se demonstrará ser essa a verdadeira natureza do homem, existindo, pois, um direito natural. Dessa conduta da providência divina incumbe-se, maximamente, de discorrer esta Ciência, correspondendo ela, sob este aspecto, a uma verdadeira teologia racional da providência divina. Na faixa zodiacal que cinge o globo terrestre, superiores aos demais em majestade e evidência, apenas os dois signos de Leão e da Virgem: corp.o a signifia Hércules, car que esta Ciência, em seus princípios, contempla priot~amen já que, segundo se constata, cada uma das nações dos antigos gentios fala arespeito de um [Hércules] que a fundou, enfocando-o em sua proeza máxima, qual a de haver matado o leão que, a vomitar chamas, incendiara a selva neméia. Adornado com os despojos desse leão, foi Hércules alçado até as estrelas. Tal leão simboliza aqui a enorme selva antiga da terra, à qual Hércules, como protótipo dos heróis políticos, anteriores aos heróis bélicos, incendiou e reduziu à condição de cultura. E isto, por outro lado, assinala também o princípio dos tempos, o qual, entre os gregos (de que herdamos tudo' quanto nos resta da gentilidade antiga), começa com as olimpíadas e com os jogos olímpicos, de que se narra ter sido Hércules o fundador. Tais jogos terão tido início entre os neméios, implantados que foram para festejar a vitória de Hércules, obtida a partir da matança do leão, o que dá ainda a enten,der que os tempos dos gregos começaram a partir do momento em que entre eles teve início o cultivo dos. campos~ E a Virgem, que os poetas apresentaram aos astrônomos, descrevendo-a coroada de espigas, dá a entender que a história grega começou pela idade de ouro: já que os mesmos poetas patentemente asseveram haver sido a primeira idade de seu mundo. Nela, e por largo decurso de séculos, os anos enumeraram-se computados pelas colheitas do trigo, reconhecidamente o primordial ouro do mundo. A essa tal idade áurea dos gregos corresponde, a um nível similar, a idade de Saturno dos latinos, assim cognominada a partir da expressão a satis, ou seja, a das semeaduras. Em tal idade de ouro, como no-lo asseveraram explicitamente os poetas, os deuses confabulavam com os heróis sobre a terra: por isso, ao longo desta obra se haverá de mostrar que os primeiros homens da gentilidade, singelos e rudes, em virtude de vigorosa ilusão de robustíssimas fantasias, todas repletas de estarrecedoras superstições, acreditaram piamente ver na terra os deuses. E depois se constatará igualmente que, em virtude de uniformidade de idéias, já que uns nada sabiam a respeito dos outros, entre os orientais, egípcios, gregos e latinos, foram os deuses alçados às estrelas errantes e os hérois, às estrelas fixas. E assim, a partir de Saturno, que é Khrónos para os gregos, sendo khrónos o tempo para os mesmos, originaram-se outros princípios para a cronologia, vale dizer, para a doutrina dos tempos. Nem te deve parecer inconveniente que o altar esteja sob o globo e a sustentá-lo. Mesmó porque se constatará que os primeiros altares do mundo erigiramnos os Gentios no primeiro céu dos poetas. Estes, em suas fábulas, textualmente nós forAeceram a versão de haver o céu reinado sobre os homens, p~ociand

IDÉIA (GERAL) DA OBRA

11

também muitos benefícios ao gênero humano, naquele tempo em que os homens primígênios, quais infantes do nascente gênero humano, acr_editaram não esti·vesse o céu situado muito acima do cimo das montanhas (como ainda hoje os meninos o crêem pouca coisa mais elevado do que os tetos de suas casas). A seguir, desenvolvendo-se mais e mais as mentes gregas, foi o céu elevado até as culminâncias de altíssimos montes, tal como se deu com o Olimpo, onde Homero narra situarem-se, nos seus tempos, os deuses. Alcandorou-se, por fim, sobre as esferas, como hoje no-lo demonstra a astronomia, alçando-se, também, o Olimpo por sobre o céu estrelado. Similarmente alçado até o céu o altar ali também se inscreve como signo celeste. E o fogo que está sobre ele [altar] propagou-se para a casa vizinha, que é, como aqui podes ver, a do Leão. Este, como já tornamos· claro, foi a selva neméia, que Hércules incendiou, para convertê-la em cultura. Eis que, por essa razão, e, como troféu de Hércules, os despojos do leão foram elevados até as estrelas. O raio que, procedente da divina providência, ilumina uma jóia convexa, com que se exorna o peito a Metafisica, significa o coração terso e puro que dela ali se requer, um