Os Inocentes do Leblon

Table of contents :
OdinRights
Prefácio
Introdução
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Epílogo

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DADOS DE ODINRIGHT Sobre a obra: A presente obra é disponibilizada pela equipe eLivros e seus diversos parceiros, com o objetivo de oferecer conteúdo para uso parcial em pesquisas e estudos acadêmicos, bem como o simples teste da qualidade da obra, com o fim exclusivo de compra futura. É expressamente proibida e totalmente repudíavel a venda, aluguel, ou quaisquer uso comercial do presente conteúdo.

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        ROBERTO MOTTA  

3333333333 OS INOCENTES DO LEBLON UMA BIOGRAFIA DO IDEALISMO

  A INSPIRADORA, POLÊMICA E INÉDITA HISTÓRIA DA CRIAÇÃO E DOS PRIMEIROS DIAS DO PARTIDO NOVO, CONTADA POR SEU OUTRO CRIADOR       COM PREFÁCIO DE RODRIGO CONSTANTINO

    1ª EDIÇÃO - 2021  

    Capa: Luciano Cunha Revisão: Betty Vibranovsky Diagramação: Leo Delfino                                 Entre em contato comigo. Eu adoraria saber o que você achou deste livro.  

E-mail: [email protected] Site: www.robertobmotta.com.br YouTube: www.youtube.com/c/RobertoMottaX Facebook: www.facebook.com/RobertoMottaPagina Twitter: www.twitter.co/rmotta2 Instagram: www.instagram.com/robertomottaoficial     Visite o site do livro para consultar documentos mencionados no texto e receber informações sobre eventos com o autor e novas publicações: osinocentesdoleblon.com.br

               

 

      Para   Alexandra, Maria Fernanda e João Felipe     minha mãe, Marly, e meu pai, Sertório     meus amigos Marcelo Ciuffo, Stuart Graham e Fábio Beato Costa, que foram embora prematuramente     Fábio Lopes Sampaio, amigo de todas as horas há mais de quarenta anos

 

             

Agradecimentos    

Este livro não teria sido possível sem Márcio Duarte, querido amigo baiano, guerreiro incansável e apoiador de primeira hora. Foi Márcio quem deu a ideia e me encorajou a seguir em frente. Agradeço ao meu amigo Victor Bosch por sua amizade, patriotismo e dedicação ao Brasil. Agradeço a Roberto Ventriglia, que foi meu braço-direito nas batalhas eleitorais de 2018 e 2020 e em todo o trabalho realizado pelo Rio de Janeiro e pelo Brasil. Agradeço a Rafael Hollanda, Robson Abreu, Rodrigo Sias, Marcelo Rocha Monteiro, Heleno Palmieri, Renata Silbert, Guilherme Azevedo, Ana Paula Oliveira, Ana Cláudia Moreira, Marcus Moraes, Dennys Andrade, José Ernesto Marino Neto, Davi Oliveira, Marcelo Lessa e especialmente a Fernando Mousinho pela leitura cuidadosa das primeiras versões deste manuscrito e pelas preciosas sugestões. Agradeço a M.G. pela ajuda com a redação, correção e edição de passagens cruciais do texto.

            A vida é mais, muito mais labiríntica do que é mostrado em nossa memória – nossas mentes estão empenhadas em transformar a história em algo suave e linear, o que nos faz subestimar o papel do acaso. Nassim Taleb           Não basta fazer coisas boas – é preciso fazê-las bem. Santo Agostinho           É mais difícil conviver com os colegas de partido do que lutar contra seus adversários. Jean-François Paul, Cardeal de Retz, 1702    

            AVISO IMPORTANTE   Este livro menciona o nome de muitas pessoas com as quais tive contato – ou me associei de alguma forma – durante o período da concepção e criação do Partido Novo. Essas menções têm como objetivo documentar e contribuir para o entendimento da sequência de eventos históricos. A menção de um nome não significa necessariamente que a pessoa citada tenha aderido ao projeto do partido ou concordado com suas ideias e premissas. Da mesma forma, é possível que tenham sido omitidos nomes de pessoas que tiveram participação relevante nos eventos descritos no livro. Todo o esforço foi feito para apresentar os eventos como de fato aconteceram, tendo como referências documentos em meu poder, depoimentos pessoais e, inevitavelmente, minhas recordações. Erros podem ter sido cometidos. Sugestões de correções ou inclusões assim como contribuições de documentos e depoimentos para futuras edições podem ser enviadas ao autor através do email [email protected].    

Prefácio Eu Sou Testemunha Rodrigo Constantino  

A esperança de uma nova política, feita por gente que nunca foi político de carreira, gente séria, preparada e com espírito público: o Novo alimentou isso em mim e em milhares de pessoas. Roberto Motta estava lá desde o começo, como peça-chave e amigo de longa data de João Dionísio Amoêdo, o principal financiador do projeto, cujo nome passaria a ser sinônimo do Partido Novo – um partido que ele, Motta e mais de uma centena de idealistas criaram. Neste livro, Motta faz um relato de como tudo começou, revela detalhes de reuniões e também apresenta um perfil de João Amoêdo. A trajetória de encontros e desencontros de Motta e Amoêdo termina em ruptura, estampada num evento social em que ambos sequer se cumprimentaram. Entender como isso aconteceu é essencial para compreender o que parece ter dado errado no projeto. Algo se desviou da meta – ou a meta sempre foi outra e muita gente foi enganada. Sim, estou decepcionado com o Partido Novo e com João Amoêdo, e tenho minhas razões. Afinal, participei de tudo – se não desde o primeiro momento, como o Motta, pelo menos desde a fase inicial do partido. Participei de inúmeras reuniões fechadas, em “petit comitê”, para ajudar a criar um DNA doutrinário para o projeto, que era formado, basicamente, por engenheiros que pensavam somente em um “choque de produtividade” no poder Executivo. Fui um dos que emprestaram tempo, nome e empenho para que o Novo fosse associado ao liberalismo, bandeira que defendo há décadas. Antes, porém, vale contar como cheguei ao João Amoêdo. Sua filha foi minha estagiária ainda nos anos de

mercado financeiro, na empresa de gestão de recursos – Family Office – da qual eu era sócio. Era uma menina muito inteligente e educada, que causou ótima impressão em todos nós. Ela notou que eu passava um bom tempo falando de política, debatendo em redes sociais e escrevendo textos sobre o assunto. Eu já era um militante da causa liberal com certa exposição pública, e dividia meu tempo entre o trabalho no setor financeiro e minha verdadeira vocação. Certo dia ela mencionou o projeto que seu pai liderava, e perguntou se eu tinha interesse em conhecê-lo. Marcamos o encontro. Ali começou uma longa parceria. Fiz palestras para o Novo, divulguei o projeto, ajudei a dar uma roupagem liberal ao partido. Por pressão do Amoêdo, aceitei inclusive me filiar ao Novo quando ele efetivamente nasceu, o que nunca tinha sido minha intenção: como comentarista e ativista liberal, não quero estar preso a um partido, qualquer que seja ele. Mas confiei tanto no projeto que abri essa exceção – da qual me arrependo. Também publiquei imagens minhas com a camisa do Novo. Ou seja: eu literalmente vesti a camisa do projeto de Amoêdo e seus colegas. Onde foi que ocorreu o afastamento? O Novo é um partido que abriga liberais mais “progressistas” e outros mais conservadores. Até aí, tudo bem. Eu mesmo recomendava que o Novo deveria evitar cascas de banana. O projeto era menos ideológico e mais prático: tornar o estado mais enxuto e eficiente. Temas como aborto e legalização de drogas serviriam apenas para causar fissuras internas e afastar gente competente. Eu nunca achei que o Novo fosse um partido conservador, e eu mesmo não tinha me tornado ainda um liberal mais conservador – o processo estava em curso, como expliquei em meu livro Confissões de um ex-libertário. A decepção não veio tanto pela postura “progressista” de muitos filiados, e sim pela postura do próprio Amoêdo, principalmente durante o governo Bolsonaro. Sua obsessão

em atacar o presidente o tornou uma espécie de sensacionalista demagogo, um típico esquerdista da velha política que fica “lacrando” nas redes sociais. Amoêdo passou a culpar o presidente por tudo de ruim que acontecia no mundo, terminando cada mensagem com a bandeira do impeachment. Ali ficou claro que ele tinha um projeto pessoal de poder, e não um projeto de país. O controle do partido sempre foi exercido com mão de ferro. Amoêdo foi quem colocou a grana, mas cheguei a acreditar que ele tinha feito isso por total espírito público. Um homem muito rico, multimilionário, com três filhas jovens, pode ser tocado por uma experiência pessoal e se dedicar a um projeto altruísta. Foi nisso que confiei. Acredito que fui ingênuo. Muitas denúncias de “caciquismo” mostraram que Amoêdo não pretendia renunciar ao comando total da sigla que financiara. Mas o Brasil não precisa de mais um partido com dono. Isso é exatamente a velha política que pretendemos denunciar e derrotar. Apesar de ótimos quadros no Legislativo e também no Executivo – como o governador Romeu Zema em Minas Gerais –, ficou claro que o Novo tinha uma pegada “tucana”, um foco estritamente economicista voltado para os interesses da Faria Lima. O laranja passou a ser o novo vermelho, ainda que desbotado. Mas política não é como um negócio, a escolha de um candidato não é a de um CEO e o “purismo” pode ser uma forma de ignorar que o ótimo é inimigo do bom e de esquecer que política é a arte do possível. Passei a ver o Novo como um PSDB melhorado, e isso está muito distante do partido liberal que imaginei. Na vida quase nada é binário. Não guardo necessariamente mágoas, apesar da decepção. Acho que o nascimento do Novo fez bem ao país, e comparado ao que temos na vida política é, sem dúvida, muito melhor do que a média. Tem, como já disse, muita gente boa. Mas o Brasil vive tempos perigosos, com o establishment unido no

esforço de derrubar o presidente eleito para facilitar a volta dos corruptos socialistas. Críticas pontuais e construtivas em relação ao governo ou ao presidente são legítimas e necessárias. Mas não foi nada disso que Amoêdo passou a fazer diariamente. Ele chegou a elogiar um ativismo judicial que claramente se tornou uma das maiores ameaças à nossa democracia, com sua partidarização e abuso de poder. Essa obsessão estragou tudo, na minha opinião. Essa postura lamentável do Amoêdo destruiu em mim a imagem que eu fizera dele ao longo dos anos. Eu não me dediquei tanto para ajudar a construir um novo PSDB, muito menos para contribuir com algum projeto pessoal de poder do próprio Amoêdo. E é exatamente assim que vejo as coisas hoje. Uma pena. O livro do Motta, através da simples exposição de fatos e acontecimentos, ajuda a vislumbrar melhor esse personagem ambicioso, oculto num homem gentil e com fala mansa. Quando terminei de ler, fiquei mais convencido de que fui atraído para um projeto pessoal dele, e não era isso que me interessava. Que o Novo, então, siga seu próprio rumo, colaborando para bons projetos. Mas aquela fase de defesa quase apaixonada e incondicional ficou para trás. Eu me sinto traído.              

   

 

Introdução O Sonho Não Acabou   Uma das grandes aventuras da minha vida foi ter participado da criação de um partido. O Partido Novo foi o primeiro da história brasileira a ser concebido e criado sem a participação de políticos. Boa parte da minha energia, dos meus sonhos, da minha capacidade de trabalho e da minha esperança foram investidos nesse projeto, durante oito anos. O envolvimento com uma atividade dessa natureza afetou decisões profissionais, pessoais e familiares, com repercussões – positivas e negativas – que ficarão comigo para o resto da vida. Viajei por todo o país falando sobre uma nova forma de fazer política, em nome do bem comum, com menor intervenção do Estado e mais liberdade, segurança e prosperidade para todos. Expliquei que política não pode ser negócio. Mostrei quanta riqueza o Estado retira de nosso bolso – no Brasil, quase 50% do que ganhamos. Falei da tragédia da segurança pública, um drama inaceitável que tira a vida de milhares de brasileiros todos os anos e nos submete a um regime permanente de medo. Comovi, e fui comovido com o que disse e escutei nessa jornada. Até que, em 2016, decidi deixar o partido que ajudei a conceber. O partido seguiu sem mim, como fazem os filhos adultos, acertando talvez mais do que errando, traçando na história política brasileira um caminho que, embora muito diferente daquele que eu imaginava, dá sua contribuição para a mudança de um cenário político corrupto, violento e obsoleto.

Se o Novo não fez e não representou ainda mais, a culpa não é da multidão de brasileiros que acreditou, apoiou e continua apoiando o projeto, nem dos candidatos eleitos – em sua maioria, muito acima da média nacional –, mas de uma liderança partidária sem vocação política e subordinada a uma centralização excessiva e do equivocado pensamento de que um partido deve funcionar como uma empresa. Na verdade, um partido é completamente diferente de uma empresa. Uma empresa tem um dono, que contrata e demite funcionários. A razão de existir da empresa é o lucro. O partido é uma organização voluntária, movida por ideias e sonhos, e sua principal missão é servir como filtro de acesso à política institucional. O dono da empresa não representa seus funcionários. O líder político sem representatividade tem carreira curta. Não existe ambiente mais propício para desentendimento, traição e conflito do que a política. Mas, como recomenda Nassim Taleb, devemos resistir à tentação de impor uma narrativa emocionalmente satisfatória a uma sequência de fatos passados que, provavelmente, obedeceram mais às regras do acaso e a imperfeições individuais do que a qualquer plano maléfico. É nisso que escolhi acreditar – e por isso é importante registrar os fatos e contar as histórias por trás desse ambicioso, idealista e muitas vezes ingênuo projeto de construir um partido político sem as contaminações usuais. São histórias de gente comum que deixou de lado suas vidas, correu riscos e enfrentou obstáculos em nome do sonho de um país melhor. Esse é um registro histórico justo e absolutamente necessário. Meu projeto é um Brasil decente, seguro e estável, onde possamos criar nossos filhos com a certeza de que o dia de

amanhã será melhor que o dia de hoje. Há muito tempo eu tento ser digno dessa ideia, que exige desprendimento, generosidade e abertura para o novo. E é do Novo – e dos homens e das mulheres que o criaram – que trata este livro.        

Capítulo 1 O Começo   Meu pai trabalhou na Petrobras como engenheiro geofísico a vida inteira, praticamente desde a criação da empresa, levado por meu tio Lindonor Mota[1], um dos pioneiros da exploração de petróleo no país. Tio Lindonor protagonizou uma famosa briga com o geólogo americano Walter Link, que jurava que não existia petróleo no Brasil. Por causa do trabalho do meu pai, moramos primeiro em Belém do Pará, onde nascemos eu e meu irmão Danilo, e depois em Salvador, onde nasceram Paulo e Leila. Em 1973, nos mudamos para o Rio. Meus pais nos colocaram, junto com um monte de malas, no Opala azul de duas portas e pegamos a estrada. A embreagem do Opala quebrou perto do Posto Rosa Cruz, na BR 116, alguns quilômetros ao norte de Teófilo Otoni, em Minas Gerais. Ficamos quase uma semana morando no carro enquanto um emissário enviado por meu pai comprava uma peça para o conserto. Chegamos ao Rio em meio a uma forte tempestade. Meu pai dirigia bem devagar, sem enxergar quase nada, em uma época em que os carros da classe média não tinham ar-condicionado nem desembaçador. Nos instalamos em Botafogo, primeiro em um apartamento emprestado por um amigo, que ficava em uma cabeça de porco [2] na praia de Botafogo, e depois em um apartamento que meu pai conseguiu comprar na rua Voluntários da Pátria. Eu e meus três irmãos entramos no Colégio Santo Inácio – essa foi a razão pela qual meus pais escolheram morar em Botafogo. Comecei no sétimo ano do ensino fundamental, e fiquei conhecido como Bezerra. Eu e Danilo íamos a pé,

sozinhos, para a escola, e Paulinho e Leila iam no Opala com minha mãe ou a pé com a babá. Minhas memórias do Santo Inácio não são todas agradáveis. Naquela época o termo “bullying” ainda não tinha sido popularizado no Brasil, mas a prática já era bem conhecida. Como eu tinha sotaque nordestino, ganhei logo o apelido de “paraíba” e virei alvo dos valentões. Minha vida se transformou em um inferno, e durante muito tempo recriminei meu pai por nos ter tirado de Salvador, onde morávamos em uma casa no conjunto habitacional Paulo VI, na então deserta e quase rural Pituba, cercados de natureza e de amigos. Quando passei para o ensino médio, as coisas começaram a melhorar. Ajudou muito a perda do sotaque baiano. Eu continuava tímido e tinha um círculo de amizades bastante restrito. Passava o intervalo do recreio quase sempre na biblioteca. Os garotos populares da escola jogavam futebol. Eles sempre formavam dois times: Cobras e Lagartos. Dois dos melhores jogadores tiravam par ou ímpar e faziam a escalação dos seus times. Eu nunca era escolhido. Minha falta de intimidade com a bola é total (até hoje). No terceiro ano do ensino médio, minha vida melhorou mais ainda. A direção da escola resolveu misturar todos os alunos e refazer as turmas. Eu caí na 34, uma turma à qual devo minhas melhores memórias do colégio. Na sala ampla, arejada e bem iluminada, como são todas as salas de aula do casarão do Santo Inácio, eu me sentava no meio, um pouco para o lado direito. Ao meu redor, sentavam-se aqueles que se tornariam meus amigos mais próximos, uma menina e dois rapazes. Éramos tão unidos que nos demos o apelido de “Camarilha dos Quatro[3]”: eu, Verônica, Marcelo e João.

Nossas cadeiras ficavam em uma região intermediária entre a ordem e o caos. Na nossa frente ficavam os nerds – naquela época chamados de CDFs (se você não entendeu a sigla, pergunte pro seu pai). Era a turma que prestava muita atenção e copiava tudo do quadro-negro. Atrás, ficava o “fundão”, também conhecido como “cozinha” – os bagunceiros, que não queriam nada com a hora do Brasil e passavam a aula jogando batalha naval (era o equivalente da época ao joguinho de celular de hoje). Naquele meio de campo, encontramos um ponto intermediário entre a seriedade e a zorra total que nos permitia aproveitar o auge da adolescência ao mesmo tempo que nos preparávamos para ser alguém, algum dia. Verônica era um doce: bonita, meiga e sensível. Se me lembro bem, tinha uma irmã mais nova chamada Vivian. Depois do Santo Inácio, perdemos contato. (Verônica, se você estiver por aí, mande um sinal.)   Marcelo era expansivo, brincalhão, generoso, namorador e gostava das coisas boas da vida, embora sua própria vida não fosse fácil. Ele estava repetindo o terceiro ano do ensino médio e por isso tinha amigos mais velhos (naquela idade, um ano de diferença já tornava alguém “mais velho”). Ele perdera o pai ainda criança e morava com sua mãe, D. América, em um apartamento na rua Senador Vergueiro, quase esquina com Praia de Botafogo. João e eu zoávamos de sua preferência por hábitos sofisticados, adquiridos na convivência com alguns de seus amigos – mais velhos – cujas famílias eram ricas. João era tranquilo, quieto, quase tímido, mas inteligente, determinado e seguro de si. Eu frequentava a casa de sua família – primeiro um apartamento na Av. Oswaldo Cruz, no Flamengo, e depois outro no Leblon –, onde era sempre muito bem recebido. Acabamos descobrindo que nossas mães se conheciam do tempo em que eram jovens e moravam em Natal, no Rio Grande do Norte.

O pai de João tinha uma clínica radiológica em Botafogo, e João ajudava na administração. De vez em quando, eu o acompanhava em alguma tarefa. João dirigia um Fiat 147 da família. Um dia fomos entregar um documento qualquer da clínica. João parou o carro na frente do Shopping da Gávea e saiu. Eu fiquei. Dali a pouco um guarda batia no vidro do carro. “Você sabe dirigir?”, ele me perguntou, com cara de poucos amigos. “Sei”, respondi. “Então, tira esse carro daqui antes que eu multe”. Eu liguei o 147 e dei uma volta no quarteirão até o João voltar. Nas férias de junho eu fui convidado por João a passar alguns dias em uma casa que sua família tinha no centro de Petrópolis. João e as irmãs tinham um grande círculo de amizades, e íamos a reuniões, festas, jogos e sessões de cinema. Eu me sentia acolhido e bem-vindo.       Em março daquele ano – 1979 – tomara posse como presidente o General João Baptista de Oliveira Figueiredo, sucedendo o presidente General Ernesto Geisel. Era a etapa final do regime militar. Chame-o do que você quiser: revolução, golpe, ditadura. Mas quem tem menos de 55 anos não pode me dar aula sobre isso. Eu vivi aquela época. Ninguém tem a percepção correta da época que está vivendo. Só retrospectivamente é possível colocar as coisas e as pessoas em seus devidos lugares e proporções. Em 1979, como diz meu amigo Marcelo Rocha Monteiro, as opções ideológicas disponíveis e aceitáveis eram extrema-esquerda, esquerda radical e esquerda.  

Computadores pessoais ainda não haviam sido inventados, muito menos a internet ou o telefone celular. As únicas fontes de informação eram os jornais (os principais eram o Jornal do Brasil e O Globo) e a televisão, com meia dúzia de canais (nada de TV a cabo). Minha diversão principal era ler, mas livros eram caros, e a seleção disponível bastante limitada. Quando eu comecei a ler em inglês, para melhorar minha fluência, tinha que pegar livros emprestados na biblioteca do Consulado Americano, na Av. Presidente Wilson. Não me lembro de ter discutido política alguma vez com João ou com Marcelo. Nossa amizade girava em torno de outras coisas. Política eu conversava com outra turma, mais ligada nisso. Foi com um desses outros amigos que fui, no auge dos meus 17 anos – e morrendo de medo – à sede do Partido Comunista Brasileiro, na Cinelândia, pegar adesivos da campanha pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita. Quando soube disso, o então coordenador do meu ano do ensino médio, Georges Frederic Mirault, me chamou na sala dele. Georges era um cara especial. Filho de um famoso pianista, Aloysio de Alencar Pinto, e bacharel em direito, Georges cuidava da nossa turma, pelo que lembro, desde que entrei no Santo Inácio.   Quando me sentei na cadeira em frente à mesa dele, Georges me perguntou, cheio de tato, se eu sabia quem eram as pessoas que seriam beneficiadas com a anistia e o que elas tinham feito. Eu não sabia. Ele me explicou, e eu saí da sala dele um pouco menos ingênuo.     Subitamente, o ano de 1979 acabou e demos adeus ao Santo Inácio. Cada um de nós seguiu seu caminho e seu destino.

Perdi totalmente o contato com Verônica. Marcelo Ciuffo de Aguiar Silva se tornaria um médico psiquiatra conhecido no Rio, e estaria sempre, de uma forma ou de outra, próximo de mim. E o destino decidiu que eu ainda ouviria falar muito do João. João Dionísio Filgueira Barreto Amoêdo. João Amoêdo.  

Capítulo 2 Quando Éramos Jovens e Sabíamos Tudo   Como o próprio João já contou[4], o Partido Novo começou com uma conversa que nós dois tivemos e, durante um bom tempo, foi um projeto limitado a ele, eu e nossas famílias. Mas é preciso voltar um pouco mais no tempo para conhecer a história por inteiro – ou, pelo menos, as partes que eu conheço e posso contar.     Quando saímos do Santo Inácio, eu fui cursar Engenharia Civil na PUC, Marcelo foi cursar Medicina na UFF e o João foi fazer Engenharia Civil na UFRJ e, ao mesmo tempo, Administração da PUC. Mantínhamos um contato infrequente, mas continuávamos amigos. Lembro de um dia, em 1982, quando saímos para comer uma pizza com um grupo de amigos do João. O tópico de discussão era as próximas eleições para governador, e o candidato favorito era Leonel Brizola. No grupo estava uma menina muito bonita, que atraía todas as atenções. Pouco tempo depois eu a reconheceria nas telas de tevê: era Malu Mader. Em 1984, meu último ano de faculdade, fiz vários concursos públicos e, antes de saber dos resultados, comecei a trabalhar na então Arthur Andersen, uma empresa de consultoria americana que começava no país. João foi trabalhar no Citibank e sugeriu que eu fizesse uma entrevista no banco. Mas, a essa altura, eu já havia sido aprovado nos concursos para a Vale do Rio Doce (na época uma estatal) e para a Petrobras, onde fui trabalhar. O tempo passou e fomos perdendo o contato. Um dia encontrei um amigo em comum, Marcelo Lessa, colega da Petrobras, que me contou a novidade: “João saiu do

Citibank. Foi contratado para ser diretor de outro banco ganhando mais que o chefe do seu chefe”. Essa foi a última notícia que tive do João por um bom tempo. Marcelo Ciuffo e eu nos reaproximamos – ele já médico formado. Era o final dos anos 1980, e o Brasil era um lugar complicado para se viver. A inflação alta tornava a vida difícil, e a criminalidade já projetava sua sombra escura sobre o dia a dia do carioca. O trabalho na Petrobras – na área de suporte de sistemas de mainframe – não me satisfazia, e eu não conseguia ver qualquer perspectiva de melhora; nem para o trabalho, nem para o país. Coloquei na cabeça que iria embora. Entrei para o curso de inglês Brasas e comecei a estudar francês na Aliança Francesa. Junto com colegas de trabalho, contratei um professor de inglês chamado Gary, que nos dava aula nos canteiros na frente do edifício-sede da Petrobras, na hora do almoço. Entre os alunos estava Pedro Cintra, que sairia da Petrobras para fazer brilhante carreira no exterior trabalhando, entre a Europa e os EUA, nas empresas Amadeus, Intel e agora na Google. Na minha ânsia de ir embora, inscrevi-me em vários programas de bolsa de estudos no exterior. Em 1989 meu esforço deu resultado: fui chamado para fazer entrevistas para uma posição de consultor do Banco Mundial em Washington DC, com especialização em sistemas DEC/VAX. Fui, fiz as entrevistas e voltei. Um dia recebo uma ligação dizendo que aquela vaga havia sido cancelada, mas que surgira outra em uma área que eu também dominava: mainframes IBM. Será que eu tinha interesse? Lá fui eu outra vez para Washington DC para mais uma série de entrevistas. No final do ano, recebi a confirmação do Banco Mundial de que o emprego era meu, ao mesmo tempo que fui aceito em um programa de bolsa de estudos para MBA na Universidade de Louvain, na Bélgica. Escolhi o Banco. Vendi

meu Chevette 1984 e no dia 27 de dezembro de 1989, enquanto uma tempestade de verão caía sobre o Rio, peguei um voo para Washington com conexão em Nova York. Fui embora para não voltar.     Parênteses: comentei com colegas da Petrobras sobre o programa de bolsas da Bélgica e, no ano seguinte, dois deles – Marcos Sobral e Marcelo Lessa – se inscreveram e ganharam bolsas de MBA. Por sua vez, Marcos Sobral comentou sobre o programa com um amigo dele, Eduardo Bartolomeo, que também se inscreveu e foi estudar na Bélgica. Eduardo hoje é CEO da Vale. Fecha parênteses.   Nos Estados Unidos, como disse Guimarães Rosa, eu fui “feliz e infeliz, alternadamente”. O trabalho no Banco Mundial me realizava profissionalmente e durante muito tempo vivi uma vida quase perfeita. Três meses depois de chegar aos EUA, no dia do meu aniversário – 22 de março de 1990 –, entrei em uma concessionária só para olhar os carros na vitrine, e saí dirigindo um Honda Civic último modelo – talvez o carro mais sofisticado que já tive. Até o cinto de segurança do motorista era automático. Viajei bastante pelos EUA, especialmente pelo Colorado, onde morava uma americana que namorei por quase um ano. Mas o estilo de vida era muito solitário e a saudade da família era grande. Esses eram tempos pré-internet e chamadas telefônicas internacionais eram caras. Eu mantinha contato esporádico com os amigos do Brasil. Em 1994 decidi voltar de vez ao Brasil. Fui trabalhar na Shell como Gerente de Infraestrutura de Tecnologia. Retornei ao Brasil com olhos de estrangeiro. Tudo parecia estranho e errado, dos apontadores do jogo do bicho em cada esquina ao trânsito que parecia não obedecer a lei alguma. Quando minha mudança chegou, fui fazer o

desembaraço na alfândega. Tudo o que eu trazia na mudança deveria ser, por lei, isento de qualquer imposto, e para isso eu já tinha cumprido com todos os procedimentos burocráticos no consulado brasileiro em Washington. Mas o fiscal encarregado da liberação dos meus pertences resolveu mudar a regra e me cobrar o imposto do qual eu era isento. Quando eu disse que a lei me isentava de impostos, ele respondeu: “A lei aqui sou eu”. Era assim que o país me recebia de volta. Eu me indignava, acima de tudo, com o crime. Nos quatro anos e meio em que morei nos EUA nunca conheci uma única pessoa que tivesse sido vítima de um crime. Meu chefe no Banco Mundial, o sueco Anders Bergvind, deixava a porta de casa destrancada para a faxineira entrar. Isso em Washington DC, cidade que, na época, era considerada uma das mais violentas dos EUA. Retomei contato com Marcelo e João. Marcelo logo se tornou meu amigo mais próximo e confidente. Casado com Ivna, uma linda morena de olhos verdes e muitos centímetros a mais que ele, Marcelo já tinha dois enteados (do primeiro casamento dela) e uma filha, Carolina. Com João meus contatos eram menos frequentes. Falávamos de vez em quando por telefone e nos encontrávamos quando eu ia a São Paulo. A transformação dele tinha sido impressionante: o menino tímido e quieto que conheci no Santo Inácio tinha se tornado uma das figuras mais conhecidas do mercado financeiro. Descobri, surpreso, que todos os meus amigos e conhecidos ligados a finanças falavam dele com respeito. À medida que subia no mundo dos negócios, ele adotava o esporte como válvula de escape. Além de já ter completado inúmeras maratonas, ele agora competia em nível profissional em provas de Ironman, a modalidade mais dura de triátlon. Um triátlon é uma competição de natação de 3 mil metros no mar, seguida por um trecho de bicicleta de 180 km (o equivalente a ir do Rio a Búzios), seguida de uma

maratona – 42 km de corrida. João também fazia windsurfe, esporte que eu havia aprendido quando ainda morava nos EUA. João parecia conhecer todo mundo que tinha alguma relevância no Brasil. Um de seus companheiros de competições era o João Paulo Diniz, herdeiro de Abílio Diniz, dono do grupo Pão de Açúcar. Ele era próximo de Fernão Bracher, de quem foi sócio no BBA. Uma vez fui com ele a uma reunião na Casa das Garças, um think tank localizado em uma mansão no Jardim Pernambuco, no Leblon. Acabada a reunião, um grupo se formou em volta do João. Um senhor alto me estendeu a mão, apresentando-se: “Prazer, Pedro Malan”. Eu só consegui sorrir e gaguejar: “Eu sei quem você é”.     Em 2001 aconteceu um incidente que me impressionou pela forma como expôs a fragilidade da nossa segurança no Brasil. Um dos funcionários da minha antiga equipe da Shell, Alexandre, se preparava para atravessar uma rua de Niterói, de mãos dadas com seus dois filhos, quando um carro furou o sinal em alta velocidade, quase atropelando os três. Ele reclamou em voz alta – pode ter dito um palavrão – e continuou a andar. Um pouco à frente, pressentindo algo, ele se virou e viu o carro parar e dele desembarcar um homem, que assumiu posição de tiro e disparou três vezes uma pistola em sua direção. Alexandre estava de mãos dadas com os filhos e parado em frente a um ponto de ônibus lotado. Ele caiu ferido por um dos disparos, que ricochetou em sua omoplata e perfurou seu pulmão. O atirador retornou calmamente ao seu carro e saiu sem pressa pela manhã ensolarada de Niterói.      

Em 2002 me casei com a mulher da minha vida, Alexandra, na Igreja da Glória. Marcelo e Ivna foram padrinhos. Nosso primeiro filho, João Felipe, nasceu em outubro de 2003.     Em nossos encontros eu sempre dizia ao João: “Você já resolveu sua vida. Tem que voltar para o Rio, comprar uma lancha e uma casa em Angra e aproveitar”. Um dia descobri que ele tinha feito exatamente isso. No verão de 2004 ele nos convidou para um final de semana na casa que estava alugando em Angra dos Reis. Fomos eu, Alexandra, João Felipe (na época com apenas um ano de idade), Marcelo Ciuffo e Ivna. Um episódio desse final de semana foi muito curioso. A casa era na beira do mar e, bem em frente, a mais ou menos um quilômetro, ficava uma daquelas pequenas ilhas paradisíacas que existem em Angra. Combinamos, Marcelo, João e eu, de ir nadando até lá. Por segurança – como eu não era nenhum atleta de elite – resolvi colocar um pé de pato. Quando João percebeu, disse: “Ah, então vou colocar uma roupa de neoprene para melhorar a flutuação”, como se estivéssemos em uma disputa. Eu e Marcelo rimos muito disso. Claro que João chegou à ilha primeiro. A casa também tinha uma mesa de totó – futebol de mesa –, e as partidas eram, previsivelmente, disputadíssimas. Foi um final de semana maravilhoso.     Em maio de 2007, Alexandra, eu, Marcelo e Ivna decidimos tirar férias juntos e viajar aos EUA. O roteiro incluía São Francisco e a região ao norte da cidade, uma área de vinícolas chamada Sonoma Valley (que Alexandra insistia em chamar de Napa Valley, que era a região ao lado). Foi uma viagem mágica – Marcelo devia estar pressentido o golpe que o destino iria lhe dar pouco depois.

A primeira parada da viagem foi San Diego, para visitar o João e a família, que estavam morando nos EUA por um tempo, em uma casa alugada em La Jolla. Marcelo e Ivna ficaram em um hotel, e Alexandra e eu ficamos hospedados com João e Rosa. Era uma casa de design moderno, dividida em vários níveis em declive. Ficamos no nível inferior, em um quarto de hóspedes bonito, confortável e iluminado. A família Amoêdo havia se adaptado ao american way of life. À noite, sentávamos juntos nos sofás da sala de TV para assistir Borat, que acabara de ser lançado, e jogar conversa fora.     Em novembro de 2010 nasceu nossa filha, Maria Fernanda. Uma das poucas visitas que recebemos ainda na maternidade foi a de João e Rosa, que deram de presente a Maria uma corrente de ouro que ela guarda com carinho até hoje.

Capítulo 3 Enquanto Isso, O Brasil   Enquanto isso, o Brasil seguia seu caminho como sempre: aos trancos e barrancos. Quando fui embora do país, em 1989, Collor tinha sido eleito. Uma madrugada, já morando em Bethesda, subúrbio de Washington DC, fui acordado pelo toque do telefone: do outro lado da linha, meu amigo Fábio Sampaio me informava que Collor havia congelado a poupança. Acompanhei de longe o drama do seu impeachment. Quando voltei ao Brasil em 1994 o presidente já era Itamar, e o plano Real, de combate à inflação, tinha sido recém-implantado e já dava resultados.   Quem tem menos de 50 anos não sabe o que é inflação. A febre de desvalorização da moeda e aumento de preços foi contraída pelo Brasil no início dos anos 1980, e atingira seu ápice em março de 1990, quando o índice de inflação atingiu 80% ao mês. As coisas quase dobravam de preço de um mês para o outro. O Brasil já tinha feito várias tentativas de debelar esse monstro. Seis “planos econômicos” já haviam sido tentados: Plano Cruzado e Plano Cruzado II (1986), Plano Bresser (1987), Plano Verão (1989), Plano Collor (1990) – foi esse que congelou a poupança – e Plano Collor II (1991).   Quando ninguém tinha mais qualquer esperança, Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda de Itamar Franco, reúne um grupo de economistas jovens e ousados e pimba: dá um tiro certeiro no dragão inflacionário.   Agora o Brasil decola, eu pensei. E durante muito tempo mantive esse pensamento, principalmente depois que, em

1995, FHC foi eleito presidente. Meu entendimento de política e assuntos associados – economia, ideologia, filosofia, história e tantas outras coisas – ainda era incipiente. Tudo o que eu conseguia fazer na época era comparar o currículo de FHC – intelectual, poliglota, professor de universidades estrangeiras, comandante do Plano Real – com o de seus predecessores imediatos e de outras personalidades poderosas do meio político. A diferença era gigantesca, a favor de FHC. Votei nele em 1994 e 1998, com convicção.   Um grande marco da época foi a privatização das estatais de telecomunicação, dinossauros pré-históricos que só serviam para enriquecer políticos. Telefonia no Brasil era uma piada. Você comprava uma linha de telefone fixo. A espera pela instalação levava até quatro anos. Uma linha telefônica era considerada patrimônio – devia ser informada na sua declaração de imposto de renda.   A privatização ocorreu em 1998, e incluiu todas as empresas estaduais de telecomunicação – na época, cada estado tinha uma. A empresa do Rio era a Telerj. Eu já havia saído da Shell e trabalhava na HP, uma multinacional de informática. Meu nome foi recomendado por Silvio Genesini, ex-sócio da Arthur Andersen (na época já rebatizada de Andersen Consulting), para ser um dos gerentes da área de tecnologia da Telemar, a recém-criada holding que passou a controlar 16 antigas empresas estaduais de telecomunicação, do Rio de Janeiro ao Amazonas.   Comecei no meu novo emprego em janeiro de 1999 e entendi ainda melhor o estrago que a política patrimonialista faz no Brasil. Uma de minhas missões foi revisar todos os contratos existentes da área de informática. Descobri que uma famosa multinacional tinha um contrato milionário de aluguel de um computador mainframe para

uma operadora estadual, sem que ninguém soubesse dizer onde estava o computador. Desperdício e ineficiência eram a regra.   Embora incomodado com isso – e com coisas que via nas ruas e na mídia –, eu mantinha uma distância segura da política. O máximo que eu fazia era escrever. Em outubro de 1999, a revista Você S.A. publicou meu artigo “Por que os Estados Unidos são o que são – Quatro lições que aprendi na América[5]”. Fora disso, meu foco era minha vida pessoal e minha carreira.   Confesso que não me lembro em quem votei na eleição presidencial de 2002. Acho que foi no Serra. Meu estado de indiferença em relação à política permanecia o mesmo. Mas, quando o Jornal Nacional mostrou uma matéria especial sobre Lula, com um trecho em que ele recebia a faixa presidencial das mãos de FHC, eu me emocionei. O menino de Garanhuns – um operário! – virando presidente.   Esse país está mesmo mudando, eu pensei. Quanto tempo foi preciso até que percebêssemos o que estava acontecendo de verdade? – que o Brasil estava sob o comando de uma quadrilha? É difícil dizer com certeza. Mas os sinais não demoraram a aparecer. No período de 2003 a 2006 trabalhei na área comercial de algumas empresas de tecnologia, e histórias sobre conversas esquisitas e pedidos estranhos de funcionários de estatais ou de governos se multiplicavam. Mas não era possível, eu pensava comigo mesmo. É o Partido dos Trabalhadores que está no poder. Como é que alguém pode estar sugerindo práticas ilícitas? Nesse período, profissionalmente turbulento, aprendi o que significava fazer negócios com o governo e como a lei 8.666, que regulava as licitações públicas, tinha gerado um

ecossistema especializado em burlar licitações. Era inacreditável. Em 2005 estourou o Mensalão. Segundo uma denúncia, o Partido dos Trabalhadores havia pago 30 mil reais por mês a vários deputados para que aprovassem legislação de interesse do partido. O dinheiro vinha dos orçamentos de publicidade das empresas estatais, canalizados através de uma agência de publicidade. Era o primeiro sinal. Mas Lula foi poupado e se reelegeria em 2006. No final de 2006, em uma viagem de trabalho aos EUA, ouvi falar de uma tecnologia da empresa ShotSpotter que detectava disparos de armas de fogo e informava sua localização à polícia em menos de 15 segundos. Vou ficar rico vendendo isso no Brasil, pensei. Eu sabia que a situação de segurança era crítica. Se havia algum mercado para aquela tecnologia, era no Brasil. Em 2007 criei uma empresa – a American Security International do Brasil – e negociei com a ShotSpotter a representação comercial exclusiva para o país. Andei por todo o Brasil fazendo reuniões e apresentações sobre a tecnologia, ao mesmo tempo que aprendia como funcionava nosso sistema de segurança pública. Me espantavam o atraso, a improvisação e as práticas estranhas que eu descobria. Segurança pública viria a se tornar um de meus interesses principais. Acredito que posso dizer que eu, um engenheiro civil com mestrado em gestão de empresas, sou hoje uma das pessoas que melhor compreende – e explica – o processo de degradação de nosso sistema de justiça criminal. Como empreendedor, fui extremamente ingênuo. Achei que conseguiria prosperar vendendo um produto cujo único cliente era o Estado, sem precisar flexibilizar meus padrões éticos e morais. Foi uma experiência duríssima. Conseguimos vender dois projetos piloto: um para o governo do Rio de Janeiro em 2010, que foi instalado na

Tijuca (e que ajudou na proteção à Copa do Mundo de 2014), e outro para o município de Canoas, no Rio Grande do Sul, em 2011. Embora os resultados dos projetos tivessem sido excepcionais (Canoas registrou queda de 41% no número de homicídios[6]), a burocracia excessiva, a lentidão interminável e os pedidos impróprios – que aconteciam frequentemente – me levaram a uma decisão amarga: fechar a empresa. A essa altura o país começava a perceber o que eu já tinha descoberto: que o Partido dos Trabalhadores tinha se tornado uma grande decepção.   Em 2007 me envolvi com uma iniciativa chamada Projeto de Segurança de Ipanema, criada e conduzida por Inês Barreto, uma líder comunitária, com o objetivo de cuidar da segurança do bairro. Foi minha primeira experiência com ativismo. Foi nessa época que mandei uma carta aberta ao então presidente da OAB do Rio de Janeiro, Wadih Damous, pedindo a ajuda da entidade no combate ao crime (eu continuava ingênuo). Comecei a participar da Associação de Moradores de Ipanema. Era preciso fazer alguma coisa. Comecei a levar sacos de lixo industrial para a praia e fazer uma faxina geral em um raio de 20 metros ao meu redor. Até hoje – para vergonha dos meus filhos – mantenho esse hábito. O ano de 2007 era o primeiro ano do mandato de Sérgio Cabral como governador do Rio de Janeiro. Entre as novidades, ele havia empossado um delegado da Polícia Federal como secretário de Segurança, José Mariano Beltrame. Tudo indicava uma grande diferença entre o novo secretário e seus predecessores, que marcaram o Rio de Janeiro com desempenhos medíocres e a utilização da Secretaria como trampolim para a política eleitoral. O Rio de Janeiro sentia renascer, mais uma vez, a esperança de que as coisas pudessem mudar. Por razões profissionais – eu havia acabado de fundar uma empresa de

tecnologia de segurança –, eu acompanhava de perto as notícias sobre criminalidade. Uma das minhas principais fontes de informação era a coluna Repórter de Crime, do jornalista Jorge Antônio Barros, com quem eu, às vezes, me correspondia por e-mail. Em agosto de 2007, Jorge pediu a seus leitores sugestões de perguntas para o novo secretário de Segurança. A melhor pergunta seria enviada ao secretário e a resposta publicada na coluna. Minha pergunta foi baseada em uma notícia veiculada nos jornais cariocas pouco tempo antes. Um dos acusados pelo sequestro, tortura e morte do jornalista Tim Lopes em 2002 – o criminoso Eliseu Felício de Souza, o Zeu –, que havia sido condenado a 23 anos e seis meses de prisão pelo crime, recebera o benefício da progressão para o regime semiaberto depois de menos de cinco anos preso, e imediatamente fugira. Minha sugestão de pergunta para o secretário foi: “Prezado secretário, a fuga desse criminoso revela a existência de uma lei absurda. Presos condenados por crimes como esse não podem receber benefício algum. Por que o senhor e os outros secretários de Segurança do Brasil não se mobilizam e vão à Brasília mudar essa legislação?” A resposta do secretário não era a que eu esperava. Ele respondeu: “Roberto, essa é uma tarefa da sociedade. É a sociedade que precisa se mobilizar”. Resolvi levar a recomendação do secretário a sério, e segurança pública veio a se tornar minha pauta principal. Eu não imaginava as surpresas que o destino me preparava: em 2018 eu dividiria um palco com o próprio Beltrame, em uma apresentação sobre segurança pública para a equipe do projeto Segurança Presente, no auditório do Maracanã. Mas as surpresas maiores vieram no final daquele ano. Primeiro, fui nomeado um dos coordenadores da equipe de transição do recém-eleito governo estadual, com a missão de conduzir a transferência da gestão da segurança pública do Rio da equipe do Gabinete de Intervenção Federal para

as recém-criadas Secretarias de Polícia Civil e Militar. Em seguida fui nomeado Secretário de Segurança, exercendo o cargo por um curto período.[7].    

Voltando a 2008: eu conversava com meu amigo David Zylbersztajn, primeiro Diretor Geral da Agência Nacional de Petróleo, quando soube que Fernando Gabeira seria candidato a prefeito do Rio. Considero Gabeira uma figura singular de nossa cena política e intelectual. Li seu livro O Que É Isso Companheiro? aos 18 anos e fiquei impressionado. Suas posições políticas se originaram de convicções, nunca da busca por fama, poder ou riqueza. Quando suas convicções mudaram, ele mudou de posição. Isso o levou da extrema-esquerda – da guerrilha das décadas de 1960/70 – para uma posição de não alinhamento com posições ideológicas puras. Gabeira fez o mea-culpa a respeito do socialismo que a maioria dos intelectuais jamais teve a coragem moral de fazer. Ele enfiou o dedo na cara do então presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, acusado na época de receber dinheiro em troca da concessão do restaurante da Câmara dos Deputados. As palavras de Gabeira para Severino ainda ecoam no Congresso Nacional: “A sua presença na presidência da Câmara é um desastre[8]”. “Por que não conversamos com ele?”, perguntou David. “Quem sabe podemos ajudar.” Topei na hora – e logo comentei a história com o João Amoêdo e perguntei: “Você não quer conversar com o Gabeira também?”. Ele queria, e a primeira reunião foi marcada no escritório do David, que ficava no início da rua Visconde de Pirajá, próximo ao canal do Jardim de Alah. Gabeira é uma figura impressionante: calmo, seguro, articulado e extremamente culto. Ele se expressa com clareza e concisão, e ouve com atenção. Sua esposa, Neila Tavares, sempre envolvida com suas

campanhas, é inteligente, gentil e observadora afiada da cena política. João já tinha voltado de vez para o Rio e morava em um apartamento moderno ao lado do Country Club. Nos encontrávamos de vez em quando, no Rio ou em São Paulo, onde ele passava alguns dias por semana cuidando de seus negócios. O projeto do Gabeira nos entusiasmou. Era a chance de fazer alguma coisa de concreto pelo Rio. Minha preocupação principal já era com segurança pública. Participei de algumas reuniões no comitê eleitoral do Gabeira, que ficava na esquina da Av. Rio Branco com a rua da Candelária. Um dos coordenadores do programa de governo era o Eloy Fernandez y Fernandez, e a comunicação ficou com o Moacyr Góes. Preparei um material apresentando uma série de medidas para dar à Guarda Municipal protagonismo no combate ao crime, usando inovações tecnológicas e operacionais (isso em 2008!). Gabeira fazia campanha com o coração; lembro de alguém dizendo que ele abandonava os scripts preparados e gravava seus programas eleitorais falando o que lhe vinha à mente – e ele fazia isso muito bem. Tão bem que, na votação do primeiro turno, que aconteceu no dia 5 de outubro de 2008, Gabeira ficou em segundo lugar, com 839.994 votos, enquanto Eduardo Paes ficou em primeiro com 1.049.019 votos. Dobramos a energia e o entusiasmo. Infelizmente, como tantas vezes acontece em política, não era para ser: Gabeira perdeu a eleição no segundo turno por uma diferença minúscula: de apenas 1,66% de votos válidos. O governador Sérgio Cabral havia decretado feriado às vésperas da eleição, e muita gente viajou. Gabeira perdeu a eleição por aproximadamente 45.000 votos. A imprensa estimou que 90.000 cariocas viajaram no feriado. Fico imaginando como a história do Rio – e nossas histórias pessoais – teriam sido diferentes se Gabeira

tivesse vencido aquela eleição. De qualquer forma, aquela campanha teve um efeito importante, ainda que indireto e não premeditado: foi aí que João e eu começamos a falar mais a sério sobre política.     Ainda em 2008, em um dia quente no final de novembro, tocava meu celular. Era João. “Motta, tem um minuto?” Eu saí da sala de reunião onde estava e fui para o corredor. João queria minha opinião: Eduardo Paes o havia convidado para ser secretário de Finanças. Aceito ou não? João queria saber. “Claro”, eu respondi. “É uma oportunidade fantástica.” Conversamos muito; João não tinha certeza se teria a independência necessária.   O prazo para dar a resposta era de poucos dias. Era realmente uma responsabilidade grande. No final, João decidiu mandar um e-mail para Eduardo Paes estabelecendo os termos nos quais ele aceitaria assumir o cargo. Ele pediu que eu o ajudasse revisando o texto. Era um e-mail duro: se me lembro bem, havia mais de dez itens com as condições exigidas por João. A primeira dizia que o secretário deveria ter total autonomia para tomar decisões técnicas, sem qualquer interferência política. O resto do texto era no mesmo tom.   João enviou o e-mail, e ficamos – os dois – em uma grande expectativa. Os dias se passavam, e não vinha nenhuma resposta.   Uma semana depois, Eduardo Paes anunciava a economista Eduarda La Rocque como secretária de Fazenda.

Capítulo 4 E Se Fundássemos Um Partido?   No período que se seguiu à campanha do Gabeira, João e eu continuávamos procurando uma forma de ajudar o país. Uma vez, fomos almoçar no restaurante Gula Gula que ficava na rua Henrique Dumont, em Ipanema, com uma conhecida dele, diretora de um projeto chamado Rio Como Vamos, uma ONG que produzia indicadores sobre o Rio. Mas criar uma ONG não parecia ser o caminho. Ouvimos falar de um milionário africano que tinha criado uma espécie de “prêmio Nobel” anual para os melhores gestores públicos da África, e durante um tempo debatemos essa ideia e rascunhamos um projeto, mas isso também não nos entusiasmou. Conversávamos com ativistas, empreendedores, políticos – chegamos até a mandar um email para o então senador Jarbas Vasconcelos em resposta a uma declaração dele sobre renovação política. Nada ia para a frente. Até que, no início de 2009, voltamos mais uma vez ao assunto, muito provavelmente durante um jantar em um restaurante da rua Amauri, em São Paulo. Falamos primeiro de esportes – de windsurfe e de natação, que eu, na época, praticava com assiduidade. João comentou sobre um banqueiro, conhecido seu, que deixara de frequentar a academia porque isso “lhe tirava o foco”. (Não vou citar o nome do banqueiro.) Rimos daquela tolice. Quando mudamos o assunto para a política, eu sugeri: “E se fundássemos um partido?”. A ideia ficou no ar. Nos inspirava, entre outras coisas, a história de Sergio Fajardo Valderrama, ex-prefeito de Medellín, na Colômbia, entre 2004 e 2007. Doutor em matemática, Sergio, segundo o que escutávamos, tinha feito uma gestão independente e técnica com grande

aprovação popular e, em seguida, lançara-se candidato à Presidência com uma plataforma sem ideologia. A ideia parecia perfeita: uma política sem ideologia, centrada na gestão, executada por técnicos e tendo, como única finalidade, o bem comum. Em março de 2009 já discutíamos qual seria a melhor estratégia. João tinha dúvidas se seria melhor encontrar uma forma indireta de ajudar ou se deveríamos entrar direto na política, com um partido diferente. Em 9 de novembro daquele ano, João sugeriu que começássemos a pensar os pontos básicos do partido: objetivo, princípios, ações e estrutura. No dia 18 de novembro, eu enviava a ele um documento chamado “Partido Novo”, com o seguinte texto: Um Novo Partido Político Brasileiro 18 de Novembro de 2009 Objetivo O Novo Partido será o canal de expressão de ideias e de uma visão política que não encontram ressonância nos partidos e organizações políticas existentes. O debate e a ação política no Brasil encontram-se dominados e prejudicados por uma divisão maniqueísta, ultrapassada e estéril entre esquerda e direita, e por uma visão patrimonialista que tem como principal objetivo o uso da máquina administrativa para objetivos pessoais e políticos. O resultado é um Estado inchado, ineficiente e com índices de transparência baixíssimos, incapaz de prover serviços e bens públicos compatíveis com a carga tributária e com o tamanho da máquina estatal. Os objetivos principais do Novo Partido são: Unir todos os cidadãos brasileiros que não aceitam o estado atual de nossas instituições políticas em torno de uma ação efetiva de mudança. Trazer para o debate político e para a ação legislativa e executiva ideias modernas e inovadoras, e uma ação efetiva na construção de um país moderno onde todos desfrutem de liberdade, segurança, saúde e oportunidades de progresso social e material. Promover a inovação e modernização da administração pública, de acordo com as melhores práticas de gestão. Desenvolver novos talentos para a gestão e administração pública. Reduzir a carga tributária.   Princípios

Representação política esclarecida e adequada. Voto distrital. Voto não obrigatório. Responsabilidade individual. Cada indivíduo é livre para fazer suas escolhas, e deve arcar plenamente com os ônus e consequências dessas escolhas. Redução da carga tributária. O Estado é péssimo administrador e investidor de recursos; é melhor que o dinheiro fique com o cidadão, que pode utilizá-lo da forma que mais lhe convier.        

No final de 2009 Marcelo Ciuffo descobriu um tumor maligno no rim. Foi submetido a uma cirurgia, mas, aparentemente, o médico hesitou quando deveria ter retirado todo o órgão, e parece que não conseguira extrair todos os gânglios contaminados. Em fevereiro de 2010 o resultado de um exame feito por meu pai indicou um tumor maligno no pâncreas, com prognóstico de três meses de vida. Começaria uma rotina de internações, quimioterapia e muito sofrimento.      

Um dia – não me lembro exatamente da data – fui convidado para uma reunião no escritório que o João mantinha na rua Afrânio de Melo Franco, no Leblon, ao lado das Lojas Americanas. O assunto era a criação de um partido. Lembro que estavam presentes, além de João e eu, Fábio Ribeiro, sócio do João no mercado financeiro de São Paulo, e Ricardo Taboaço, que, além de amigo do João, era seu ex-colega de Citibank e executivo conhecido no mercado financeiro do Rio. Não me recordo da presença de Marcos Alcântara Machado ou Christian Lohbauer nessa reunião, mas eles logo passariam a integrar aquele grupo[9]. Todos os que estavam reunidos ali eram pessoas excepcionais: preparadas, bem relacionadas e muito bemsucedidas.

Todos aprovaram a ideia de criar um partido. A discussão passou a ser então sobre o que era necessário. “Será preciso coletar 490 mil assinaturas, com um número mínimo a ser alcançado em nove estados”, alguém informou. “Moleza”, disse outro participante da reunião que ainda afirmou: “Com organização, em seis meses está tudo pronto”. Era o primeiro passo. Logo se estabeleceu entre João e eu uma divisão de tarefas muito clara: João cuidaria do processo de formalização do partido – a coleta de assinaturas, os procedimentos jurídicos e o levantamento dos recursos financeiros – enquanto eu dedicaria a maior parte do meu tempo à construção do ideário do partido, à divulgação das ideias e à atração de filiados. Minha paixão era evangelizar; ver o brilho nos olhos das pessoas quando elas compartilhavam meu sonho de um país melhor e possível. De certa forma, cada um – João e eu – seguiria a sua vocação.      

Em abril de 2010 eu mandava para João um conjunto de slides chamado “Um Novo Partido”. O primeiro slide definia o que seria esse partido: Uma organização que prepare e eleja melhores representantes legislativos e executivos.

Mas por que criar um partido? O segundo slide explicava: Porque os partidos atuais estão engajados em uma política viciada onde interesses particulares se sobrepõem aos públicos. Porque o nível dos representantes legislativos e executivos é muito ruim. Porque é preciso resolver graves problemas que a atual classe política não tem interesse nem capacidade de enfrentar.

O terceiro slide listava o que seriam as “crenças básicas” do partido: Fora com a política profissional.

Fora com o crime na política. Pragmatismo: ideias que virem ações. Inovação e criatividade. Privilegiar a iniciativa e promover a responsabilidade individual.

Os slides seguintes continham o primeiro esboço das regras e propostas do partido: os candidatos deveriam ter preparação adequada e ficha limpa. O slide 7 apresentava uma regra importante: Ninguém pode ser candidato à reeleição no mesmo cargo. Depois do mandato, o membro volta ao partido para treinar futuros candidatos ou retorna à sua profissão original.

É exatamente isso: a regra original não permitia nem mesmo uma reeleição. Eu tinha uma forte convicção sobre esse ponto, compartilhada pelo João. Só posteriormente é que a regra foi alterada para permitir uma única reeleição.     No dia 27 de abril eu publicava na minha página pessoal no Facebook[10]: Alguém aí topa fundar um novo partido? Sem políticos profissionais. Trazer ideias inovadoras e ação efetiva, modernizar a administração pública, reduzir impostos, implantar o voto distrital não obrigatório. Interesse público acima do privado. Visão de longo prazo. Cumprimento da lei. Iniciativa e responsabilidade individual. Menos leis, alinhadas com o mundo real. Um novo partido: tô falando sério. Alguém topa?

O post recebeu um like e quatro comentários. Um deles foi do João: Também estou dentro. O desafio inicial é termos os conceitos claros, difundidos e assim agregarmos as pessoas. Nada é impossível.

No dia 28 eu criava uma "causa" – uma página especial para ações ativistas no Facebook, que não existe mais – chamada "Um Novo Partido Político": Meus amigos, a tecnologia se junta com a indignação em um momento histórico. Chegou a hora de criarmos um novo partido político, que seja a expressão da nossa insatisfação e o instrumento da criação do futuro que queremos e merecemos. Chega de reclamar e se frustrar em um sistema que foi montado para que os mesmos se perpetuem no poder. Vamos mudar o sistema! Precisamos de 1 milhão de assinaturas, e de todas as sugestões e ideias que vocês tiverem.

    Enquanto meu pai lutava contra o câncer terminal, minha mãe descobrira um tumor no seio esquerdo – o direito já havia sido removido – e começamos a planejar a mastectomia. Marcelo Ciuffo começava as sessões de quimioterapia.     Em maio de 2010 enviei ao João um texto que circulava na época, escrito, pelo que me lembro, por um publicitário famoso, e que começava com a frase “O problema do Brasil político é a falta de uma proposta para o país. Partidos e políticos, sem convicções, acabam orientados por pesquisas e marqueteiros. Como as pesquisas são as mesmas, todos os políticos falam o que o povo quer ouvir. E não o que o povo precisa ouvir”. E completava: Políticos têm que manter suas convicções. Não podem vendê-las na baixa e comprá-las na alta. Os políticos ficam procurando marqueteiros, quando deveriam procurar economistas, gestores, urbanistas e antropólogos. Hoje, no Brasil, quem tem inteligência é frio. E quem tem coração ou não tem visão, ou não tem gestão.

O mais interessante era a parte final: os passos recomendados para um candidato a prefeito do Rio: 1. 2. 3. 4. 5. 6.

Fazer um plano.                Conquistar early-adopters.                Conquistar a Zona Sul.                Conquistar o tecido político.                Conquistar o funding.                Partir para o povo.               

        Meu pai morreu em 2 de maio de 2010. João e Rosa foram ao velório, na capela do cemitério São João Batista. Marcelo

Ciuffo não foi porque estava hospitalizado, fazendo quimioterapia. Meu pai foi cremado, e joguei suas cinzas no mar, da Pedra do Arpoador. Uma semana depois minha mãe entrava na sala de cirurgia para a mastectomia.    

Foi em maio de 2010 que eu coloquei o Novo no Facebook criando uma página e um grupo. No dia 24, a pedido do João, eu acrescentava uma notícia na página: de janeiro a abril de 2010 o governo federal gastara 63% a mais com publicidade que no mesmo período do ano anterior[11]. João comentou: “No nosso partido não haverá propaganda do governo, não tem sentido, nenhum benefício para a população”. No dia 30 de maio eu postei na minha timeline: Pessoal, esqueçam as farms, smiles e outras distrações tais do Facebook. Venham para Um Novo Partido Político - Brasil 2.0. Rebeldia civil, desobediência institucional, tomada do poder pelos próprios neurônios.  

Começamos a procurar alguém para fazer o site do partido.      

Dado o pontapé inicial, surgiram as primeiras dificuldades – na verdade, quase uma impossibilidade. Nenhuma figura de peso – alguém capaz de alavancar a organização e o financiamento do projeto – se interessou em participar. João procurou várias pessoas de projeção que faziam parte do seu enorme círculo de relacionamentos, mas ninguém se interessava. Um dia de manhã, enquanto eu aguardava meu filho terminar uma aula de tênis no Clube Monte Líbano, meu celular tocou. Era João: “Motta, vou desistir. Ninguém se interessa, ninguém quer ajudar. Assim não dá.” “O que é isso, João?”, respondi. “Desistir nada. Esse é um projeto importantíssimo. Você vai escrever o seu nome na história do Brasil.” Essas foram minhas exatas palavras.

     

Em junho Marcelo Ciuffo fez uma sessão de quimioterapia. Ele deveria ter tomado dez doses, mas não conseguiu suportar os efeitos e parou na sétima. No dia 16 de junho, Alexandra, João Felipe e eu jantamos na casa dele. Marcelo amava a vida e as boas coisas da vida. Ivna – que cozinha como ninguém – fez salmão na crosta, que comemos acompanhado de várias garrafas de vinho.    

Aproximava-se a eleição para governador, e tudo indicava que Gabeira seria candidato. Desta vez o inimigo a ser derrotado se chamava Sérgio Cabral. Moacyr Góes era de novo o responsável pela comunicação da campanha. Gabeira não tinha marqueteiro. No dia 9 de agosto, enviei a Neila, esposa do Gabeira, um e-mail, com cópia para o João, contendo ideias para o programa de governo. Entre elas, estavam: [...] a extinção da contratação de agências de propaganda pelo Governo do Estado, a extinção dos carros oficiais, à exceção dos usados pelo governador e secretários de topo, a venda dos helicópteros usados pelo Governador, aumento salarial imediato para a Polícia Militar, integração entre as operações da PM e polícia civil, implantação do Termo Circunstanciado, para que a PM possa fazer registro de ocorrências de menor potencial ofensivo, construção de moradias para os policiais e implantação da Ronda do Quarteirão, seguindo o modelo do Ceará.

Em setembro João achou que precisávamos conversar com alguém de marketing sobre o projeto do partido – que ainda era só uma ideia – e entrou em contato com uma famosa publicitária. A resposta dela veio em um enorme e confuso e-mail, que o João resumiu assim: “Ela me parece estar acostumada a vender produtos onde a chance de sucesso tem que ser 99%. O nosso produto, por outro lado, será vendido de graça ao consumidor e já estamos dispostos a aceitar uma chance de sucesso de 50-60%”. Em um e-mail de 10 de setembro, eu respondi: Eu acho que a chance [de sucesso] de criarmos um partido é de 100%, dados os recursos e esforço necessários. A chance de criarmos um partido que se

torne uma força influente na política nacional eu não consigo estimar, nem acho necessário. O nosso esforço já terá dado resultados mesmo que o produto seja simplesmente mostrar que há um grande segmento da sociedade que não se conforma com o esquema atual, e que está disposto a trabalhar por coisas melhores.

Naquela época ouvimos, pela primeira vez, que havia outro partido em formação, que iria se chamar Livre. Seria uma dissidência do PV em Minas – que já teria 100 mil assinaturas.     O nome do partido foi sugestão de uma das filhas do João. Ao ouvir uma discussão sobre o assunto, ela teria sugerido: "Não é um novo partido? Por que vocês não o chamam de Novo?". A ideia era simples e genial. E todos adoraram o nome.     No dia 3 de outubro João me mandou um e-mail com um texto publicado no site de um dos membros de um movimento chamado Endireita Brasil[12], dizendo: “Precisamos de gente com essa cabeça”. O membro era Ricardo Salles, que seria candidato a deputado federal pelo Novo em 2018 e depois ministro do Meio Ambiente do governo do presidente Jair Bolsonaro. João e eu íamos atualizando e aperfeiçoando o material do Novo no Facebook. Colocamos um vídeo com denúncias da Cidinha Campos, que depois foi substituído por um vídeo de Fernando Henrique Cardoso. Com a aproximação das eleições, o debate esquentava nas redes. Nossas cabeças iam captando uma imensa quantidade de informações e tentavam processar tudo aquilo. Em 29 de setembro, por exemplo, eu postava: E por último: por que aqui todo mundo é de esquerda? Eu não conheço ninguém de direita. E, se todo mundo é de esquerda, por que no Brasil direitos como segurança, educação e justiça são desrespeitados diariamente? O que significa ser de esquerda? Para a maioria, significa isto: usar um certo discurso

nas eleições e agir exatamente como os outros depois. O mundo real, meus amigos, não tem ideologia.

Em uma postagem de 4 de outubro, eu tentava explicar a situação do país com um exemplo concreto: Para quem ainda não entendeu: eis aqui os mais votados, que vão decidir nossos destinos e os dos nossos filhos: Netinho (SP), Tiririca (SP), Moacyr Franco (SP), Leandro e Kiko do KLB (SP), Popó (BA), Miryan Rios (RJ), Reginaldo Rossi (PE), Batoré (SP) e Vampeta (SP). Está aí nosso Congresso e nossas Assembleias Legislativas. E nós?

Surgiu uma oportunidade para o João falar com FHC, e eu o encorajei a aproveitá-la. Pelo que me lembro, o encontro aconteceu, mas, até onde sei, jamais resultou em qualquer envolvimento de FHC com o partido, ou a qualquer relação, formal ou informal, com o PSDB. No final de outubro já tentávamos escolher o logotipo do futuro partido, e procurávamos pessoas que pudessem nos apoiar nas muitas tarefas com as quais não tínhamos experiência. Uma dessas pessoas foi o consultor Cláudio Torres, autor do livro A Bíblia do Marketing Digital. Outro era Gustavo Portela, um antigo colega do Santo Inácio, que agora era designer e se ofereceu para produzir a identidade visual do partido. Gustavo nos apresentou várias propostas para o logotipo. Depois de algum debate, escolhemos – pelo que me lembro, por unanimidade – a agora conhecida marca do partido, o “N” com as três pequenas asas do lado esquerdo. Gustavo também sugeriu a produção de camisetas, que seriam vendidas para arrecadar fundos para o partido. Comprei uma boa quantidade para distribuir aos amigos. Naquele período no final de 2010 e início de 2011, Cláudio, Gustavo, João, Rosa e eu trabalhamos intensamente definindo as linhas gerais do que seria o Novo e preparando o partido para participar do processo eleitoral para prefeitos e vereadores em 2012. Outra pessoa que se interessou muito e começou a contribuir bastante com o grupo foi Ana Cláudia Moreira.

A expectativa era coletar 500 mil assinaturas em quatro meses; a realidade se mostraria um pouco mais complicada, como iríamos descobrir. Foi por essa época que começaram a aparecer ofertas de alternativas mais rápidas para a criação do partido. Por exemplo: no dia 4 de novembro, João e eu recebemos um email de um conhecido em comum que dizia: Conversei com um amigo e ele me fez pensar em uma alternativa. Devem existir dezenas de partidos nanicos, até sem vereadores. Que tal a gente tentar comprar um desses?  

A resposta do João foi imediata:  Infelizmente não dá. Fico imaginando a gente se apresentando: "Nós agora somos os responsáveis pelo partido XPTO, assumimos a gestão, fizemos um acordo com os antigos líderes, pois achamos que era muito complicado e trabalhoso conseguirmos 500.000 apoiadores.  

Era exatamente a minha opinião. “Comprar” um partido – prática corriqueira no país – me parecia uma violação do princípio mais básico que nos movia: o de fazer política pelas razões certas e da forma certa. O conhecido que fez a sugestão de “compra” de um partido acabaria se tornando um dos caciques do Novo.     Em novembro também começamos a discutir o estatuto e a estrutura do partido, com o apoio de um escritório de advocacia. Nesse mesmo mês contratamos o desenvolvimento do site, um trabalho que eu inicialmente coordenei e que, a seguir, foi assumido pelo Cláudio Torres. Os domínios www.partidonovo.com.br e www.novo.org.br foram criados nessa época. No final do mês já tínhamos representantes escolhidos no Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Pará e Pernambuco, e João estava fechando o aluguel de uma pequena sala para a sede do partido em Brasília. No início de dezembro foi gravado o primeiro vídeo do Novo, produzido por Ruy Nobre, com um depoimento meu e

outro de uma das filhas do João. O vídeo foi gravado em Copacabana, em um estúdio quase na esquina de N.S. de Copacabana com Figueiredo Magalhães.     No dia 6 de janeiro de 2011, João recebia dos advogados a primeira versão do estatuto, que ele compartilhou comigo. No dia 12, recebíamos as versões finais. Começamos a planejar a reunião de fundação do partido. No dia 11 de janeiro, Cláudio Torres, que monitorava a página do partido, informava que já tínhamos 35 pessoas cadastradas. No dia 16 março de 2011, começávamos o processo de captação de assinaturas de apoio com uma postagem na minha página no Facebook: "Peço a TODOS os meus amigos que cliquem no link, imprimam, preencham e enviem a ficha de apoio à criação do NOVO (porte pago). Isso não cria compromisso, vínculo ou filiação – apenas dá ao NOVO o direito de existir como força política. E de oferecer melhores opções de voto. Essa iniciativa é o resultado de 3 anos de esforços. Não leva mais que 5 minutos. Envie sua ficha e replique essa mensagem. O futuro agradece."  

No dia 30 de março, eu publicava o seguinte texto, desta vez na página do Novo:  

"É inédito que cidadãos comuns (que nunca tiveram envolvimento com política) achem que têm direito a voz política própria. É incrível que se mobilizem, atraiam outros cidadãos, expressem suas ideias de forma clara e objetiva. E o mais difícil de aceitar: que o façam com seriedade, qualidade e transparência – da mesma forma que conduzem suas vidas privadas. Mas é o que estamos fazendo."  

Eu também produzia, quase todos os dias, uma matéria para o blog do Novo.  

    Os aportes financeiros iniciais, até onde sei, foram feitos, na maior parte, pelo João. A única informação que tenho sobre os valores vem de uma reportagem da revista Época[13], que diz que, entre 2011 e 2014, a criação do

partido custou R$ 5 milhões. Jamais tive, ou quis ter, qualquer envolvimento com as finanças partidárias. Havia muitas pessoas mais qualificadas para essa função do que eu. Além disso, minha situação financeira, completamente distinta da situação do João, não permitia que eu colaborasse financeiramente como eu queria, muito menos nas mesmas bases que ele. Minhas doações ao partido foram modestas; foram aquelas que minhas condições permitiam. Minha colaboração principal foi em tempo, credibilidade, suor e trabalho duro. Doei sete anos da minha vida.     Em 2010, a esquerda experimentava o auge do poder. A economia cresceria 7,5% naquele ano, a taxa de desemprego era a menor dos últimos 8 anos e a popularidade de Lula batia recordes e chegava a 97%. Em 2010, Lula elegeu sua sucessora, Dilma Rousseff. Dilma, que havia sido ministra das Minas e Energia e ministra-chefe da Casa Civil de Lula, fora apresentada ao Brasil, através de um cuidadoso e persistente trabalho de marketing, como a “gerentona” do governo. Em 2010, Sérgio Cabral venceu a eleição para governador no primeiro turno com 66% dos votos, e Gabeira ficou em segundo lugar, com 20%.

Capítulo 5 Fundação   Seguia o esforço de captação de assinaturas e organização formal do partido. João já tinha montado uma pequena estrutura no Rio, que contava com uma estagiária e um funcionário: Marcelo Lessa, aquele meu ex-colega de Petrobras. Depois que voltara do MBA na Bélgica, Lessa trocara a Petrobras por uma carreira na iniciativa privada. No início de 2011, recém-saído de uma posição de gerência no Bob’s, Lessa estudava uma oferta para ir trabalhar na Starbucks. Mas o cargo era em São Paulo, o que significaria ter que ficar longe da esposa e do filho durante a semana, uma experiência que ele já vivera e não queria repetir. Foi quando, em um encontro com o João e a Rosa, ele ouviu deles a história do projeto do Novo. Lessa, impressionado com o tamanho do desafio e com o trabalho que seria necessário para criar o partido, aconselhou o João a montar uma equipe de funcionários. João gostou da ideia e fez ao Lessa a mesma oferta do Starbucks para que ele, Lessa, se juntasse ao projeto como o primeiro funcionário do Novo. Em fevereiro de 2011, Lessa começava a dar expediente no escritório do Leblon, organizando os bastidores do partido, fazendo contatos com apoiadores em todo o Brasil e contratando fornecedores. Naquele momento o objetivo era conseguir as assinaturas até setembro, possibilitando ao Novo concorrer na eleição de 2012. O foco do esforço estava na coleta de assinaturas e na criação de diretórios em nove estados diferentes. Foram contratadas empresas para criar o site do partido, assessorias de imprensa e de marketing e empresas especializadas na coleta de assinaturas. A coleta também era feita por voluntários. Foram organizados treinamentos no Rio e em São Paulo para as pessoas que iriam trabalhar

nas operações de coleta, e Lessa chegou a viajar a Teresina para encontrar apoiadores e coletar assinaturas. Certo dia Lessa me chamou para ir com ele a Nova Iguaçu. Fomos no seu carro. Ele foi dirigindo por ruas desconhecidas até chegar a uma espécie de garagem, onde um grupo nos aguardava. Era para ser uma reunião de apresentação do partido, mas a conversa logo tomou um rumo esquisito, com menções a caciques locais e “acordos” que precisariam ser fechados. Lessa e eu passamos algumas horas difíceis, pensando em um jeito de ir embora sem provocar a ira do grupo.   A fundação do Novo, tão falada por tanta gente, foi uma reunião formal realizada para cumprir uma exigência da legislação eleitoral. Era preciso que um determinado número mínimo de pessoas estivesse presente e assinasse a ata da reunião. Cada um de nós fez um esforço grande para convidar a família, amigos e conhecidos para comparecerem em um sábado de manhã ao salão de reuniões do edifício Lagoa Corporate, no Humaitá, e assinarem o livro de fundação. O texto do convite enviado foi: Em continuação ao processo de formação do NOVO, iniciado nos encontros realizados em dezembro de 2010, iremos agora proceder o registro junto ao Cartório Civil.   Como condição precedente para finalizarmos esta primeira etapa, a legislação determina que os fundadores, reunidos formalmente, aprovem o Estatuto, o Programa e a nomeação dos dirigentes provisórios do partido.   Considerando a concentração de fundadores residentes no Rio, a necessidade de iniciarmos o quanto antes a coleta das assinaturas de apoio, a ausência de vários fundadores durante o mês de janeiro e a dificuldade de locomoção dos fundadores de outros Estados em dia útil, agendamos a referida reunião para o próximo dia 12 de fevereiro, no Rio de Janeiro.   A reunião será realizada a partir das 10h da manhã na Rua Humaitá 275.   No intuito de tornarmos a reunião breve, disponibilizamos o Programa, os Princípios e o Estatuto do NOVO para o seu conhecimento. Estou, junto com os

advogados, à disposição para esclarecermos qualquer dúvida sobre o material.   Para que a reunião cumpra o seu propósito, teremos que contar com, no mínimo, 101 fundadores de 9 estados da federação. Peço que você confirme, assim que possível, a presença através do e-mail [email protected].   Por isso gostaria muito de vê-lo no próximo dia 12 de fevereiro para formalizarmos a aprovação dos documentos constitutivos, assinarmos a ata definitiva de fundação e o requerimento para registro do NOVO.   Como cidadãos conscientes, é nossa responsabilidade trabalharmos por uma nação mais eficiente, e um partido político é o instrumento democrático mais adequado para este fim.

  Até a última hora não tínhamos certeza se conseguiríamos o número necessário de pessoas. Mas deu tudo certo:  no dia 12 de fevereiro de 2011 o tal livro foi assinado[14] e o Novo foi fundado. O primeiro a assinar o livro foi João. Marcelo Lessa foi o quarto. A assinatura da minha mãe, Marly Bezerra Motta, está na 12ª posição, a da nossa querida amiga Daniela Meyn está na 24ª e a da minha mulher, Alexandra, na 25ª. Eu fui o vigésimo-sétimo a assinar. Meu sogro Isaac assinou na linha 29, meu amigo Antônio Leandro na linha 60, Marcelo Ciuffo na 86 – precedido por seu enteado Felipe na 84 e sua esposa, Ivna, na 85, e seguido por sua filha Ana Carolina na 87 e sua mãe, a querida D. América, na linha 88. Carlos Alberto Ghazi, meu colega de primário no Santo Inácio, assinou na 119ª posição. Ana Cláudia Moreira assinou na 133ª posição, e Carlos André Hermann na 136ª. Victor Schumer, meu colega de Telemar, assinou na 137ª. Tempos depois, Fernando Mousinho chamaria minha atenção para um detalhe. Ele disse: “Foi muito ruim o João não ter te chamado para assinar no segundo lugar”. Eu nem tinha percebido isso, nem me incomodei – para mim, a ordem das assinaturas não tinha nenhuma importância. Mas Fernando, mais velho e muito mais experiente que eu, já estava vendo o que eu não via. O tempo lhe deu razão – e me ensinou que, na política, onde as situações são

carregadas de simbolismo, esses pequenos detalhes têm, sim, enorme importância. Existe uma história que poucos conhecem: a cerimônia do dia 12 de fevereiro foi a segunda tentativa de fundar o Novo. Já tinha ocorrido outra, alguns meses antes, no dia 16 de dezembro de 2010, no apartamento do João, com a mesma mobilização. Mas os advogados do partido encontraram um problema com o procedimento adotado. O livro de assinaturas ficara disponível na sala de estar do João, e as pessoas chegavam, assinavam e iam embora. Os advogados acharam que isso poderia dar margem a futuros questionamentos legais. Uma leitura mais rígida da lei dizia que era necessário que o livro fosse assinado por todos durante uma reunião e que, só depois de completadas as assinaturas, a reunião poderia ser finalizada e as pessoas poderiam ir embora. Por isso, foi necessário refazer todo o procedimento no dia 12 de fevereiro. Como parte do procedimento de fundação do partido, era necessário criar o diretório nacional. João seria, naturalmente, o presidente. Ele nomeou Marcelo Lessa, que ainda era funcionário do partido, para duas vicepresidências[15]. Para outras duas vice-presidências, João escolheu o Fábio Ribeiro e um funcionário da empresa que administrava o seu patrimônio – que vamos chamar aqui de “Gonzaga” –, de quem ainda ouviríamos falar.   E assim foi a fundação do Novo. Agora faltava a parte mais difícil: coletar as 500 mil assinaturas necessárias para colocar o partido de pé, preparar candidatos e ganhar eleições.   No dia 14 de fevereiro, enviamos um e-mail a todos que tinham participado da fundação: Muito obrigado por sua presença e participação na reunião de sábado. Finalizamos com 181 fundadores distribuídos em 10 estados.    Primeiro desafio cumprido!

   Vamos ao próximo passo: 500 mil fichas de apoio.    Algumas orientações:     - O mais importante é conquistar as pessoas, fazer com que gostem e divulguem o projeto. Lembre-se de que não basta colher assinaturas de conhecidos, é de suma importância montar um “exército” para multiplicá-las. Cada amigo ou conhecido deve virar um “soldado”, ajudar na criação da onda.     - INDISPENSÁVEL é o preenchimento da ficha SEM ABREVIATURAS com o nome completo da pessoa, nome completo da mãe, data de nascimento e a assinatura, pois com esses dados podemos completá-la utilizando o link http://www.tse.gov.br/internet/servicos_eleitor/consultaNome.htm.    - Importante também é que o Município e o Estado devem ser o do local de emissão do título e não do nascimento. O e-mail e telefone não são obrigatórios, servem apenas para localização e para dúvidas caso haja alguma inconsistência nos dados.    - Devemos frisar que assinar a ficha não significa filiação ao partido. A ficha é apenas o apoio para constituição do NOVO.    - Envie as fichas prontas para:   PARTIDO NOVO, Caixa Postal 12345, CEP 01214-970, São Paulo, SP ou entre em contato conosco ([email protected]).    - Em anexo estão: os arquivos com os dois modelos de fichas de apoio e um breve resumo do NOVO. É só baixar, imprimir e fazer quantas cópias precisar.    Contamos com você.    Atenciosamente,   NOVO www.novo.org.br

      Em 17 de fevereiro de 2011, o Diário Oficial da União publicava a ata de fundação e o estatuto do partido. Foi também em fevereiro que começamos a criar grupos de trabalho para tarefas como a divulgação do partido e a

coleta de assinaturas. Eu me ofereci para participar dos grupos de divulgação e planejamento político. Foram criados inicialmente três grupos de divulgação. Eu coordenaria o Grupo 2, que seria formado por Alexandra Marzo, Ana Cláudia Moreira, Bernardo Leão, Cristina Campelo, Guilherme Libânio, José Umberto de Luca, Lívia Pereira, Márcia Tinoco, Maria Helena Hiernaus e Sérgio Conrado.     As pessoas envolvidas no projeto, e as que eram convidadas a apoiá-lo, tinham muitas dúvidas quanto ao processo. Para esclarecê-las, eu propus, e o João aceitou, publicar no blog do partido o seguinte texto: Criando um NOVO Partido – A Diferença entre Fundadores, Filiados, Dirigentes e Apoiadores     A maior dificuldade encontrada por cidadãos brasileiros que desejam criar um novo partido como forma de expressão política é a complexidade da legislação. São necessários vários procedimentos, que devem ser executados de acordo com regras rígidas, para que um partido possa ser considerado criado.     O primeiro passo é a fundação do partido, que acontece em uma reunião com a participação de, no mínimo, 101 pessoas. Todas assinam a Ata de Fundação, aprovam algumas medidas (como o programa, estatuto e eleição de dirigentes) e são consideradas fundadoras do partido. Um fundador é, portanto, alguém que estava presente na reunião e assinou a ata de fundação. O fundador não tem direitos especiais, nem qualquer tipo de controle sobre o partido.     Os dirigentes, eleitos pelos fundadores na reunião de fundação do partido, são responsáveis pela direção das atividades.     Uma vez fundado o partido de acordo com os trâmites da lei, o passo seguinte é a obtenção do registro no TSE. Para isso é necessária a obtenção de, no mínimo, 500 mil assinaturas, além do apoio de um décimo por cento do eleitorado nas últimas eleições para a Câmara de Deputados, em 9 estados.    As pessoas que assinam o pedido de criação do partido são apoiadores. Todo eleitor pode dar o seu apoio: basta a assinatura e os dados do seu título eleitoral. Observem que o apoiador não está se filiando ao partido. Ele está apenas dizendo “apoio a criação deste partido”. Não há nenhum problema se o apoiador for filiado a outro partido. O apoiador não assume nenhum

compromisso com as atividades do partido (embora seja lógico que ele apoie porque acha válida a proposta do partido).     Só após a obtenção das 500 mil assinaturas e do registro no TSE é que o partido é considerado criado, e pode então ter filiados.    Em resumo:  - Fundadores: os cidadãos que assinaram a ata de fundação do partido. Não têm direitos especiais nem controle sobre as atividades do partido.   - Dirigentes: são os eleitos na reunião de fundação para dirigir as atividades do partido.   - Apoiadores: os cidadãos eleitores que apoiam, através de sua assinatura, a criação do partido. Não têm vínculo com as atividades do partido.   - Filiados: os cidadãos que se filiam ao partido, através de processo específico, depois que o partido obtém o registro no TSE.      

  No dia 15 de março de 2011, realizamos na minha casa a primeira reunião do “Grupo 2 de Apoio ao Novo”. Estavam presentes, entre outros, Ana Cláudia Moreira, Maria Helena Hierneis, Bernardo Leão, Cristina Campelo e Sérgio Conrado. Primeiro, Marcelo Lessa fez uma apresentação sobre o projeto do partido. Depois o grupo discutiu como preparar material para as apresentações que começaríamos a fazer, inicialmente apenas em casas de amigos. Lembro de uma apresentação que fiz, no dia 5 de abril, em um apartamento na rua Visconde de Albuquerque, no Leblon – não me lembro quem eram os donos da casa. Talvez tenha sido minha primeira apresentação, e foi representativa do esforço que fazíamos. Alguém ofereceu sua casa, convidou vizinhos e amigos e, no dia marcado, lá fui eu, notebook debaixo do braço e lutando ferozmente contra a timidez e introspecção que sempre me caracterizaram (até hoje sou assim). Cheguei ao apartamento às 19h30 (a reunião estava marcada para as 20h), conectei o computador na televisão, testei tudo e

fiquei esperando as pessoas chegarem. Uns quarenta minutos mais tarde, quando a dona da casa deu o sinal, eu comecei a minha apresentação, para uma plateia de, no máximo, dez pessoas. Uma regra que eu aprendi logo cedo é que o esforço gasto em uma apresentação é inversamente proporcional ao número de pessoas. Fazer uma apresentação para um grupo pequeno é muito mais cansativo do que fazer para uma plateia de mil pessoas. Em um grupo pequeno, as pessoas se sentem à vontade para exigir atenção individual. Um grupo pequeno também encoraja as pessoas a te interromperem e a fazer perguntas que são, na verdade, discursos. Há sempre alguém que resolve te confrontar, exigindo um debate exclusivo. E assim foi naquele dia. Eu contei a história do partido, falei das ideias e propostas, respondi perguntas, debati, ouvi críticas, debati outra vez, ouvi sugestões e conversei sobre amenidades (outra coisa difícil para mim). Só consegui ir embora tarde; cansado, muito cansado, mas satisfeito. Eu iria repetir esse mesmo ritual dezenas de vezes nos meses seguintes – meses não, nos anos seguintes. Todo o tempo e esforço que eu viria a dedicar ao projeto do Novo só foram possíveis porque sempre tive o apoio incondicional de minha mulher. Mesmo quando as reuniões, palestras e viagens começaram a roubar muitas horas de convívio com a família, Alexandra sempre entendeu a importância do que estávamos fazendo e, mais do que me apoiar, se envolvia também. Além de sentar-se, quase sempre, na primeira fila de minhas apresentações, ela preparava um “kit palestra”, que incluía lista de presença, prancheta, canetas, lanches e outros materiais, me maquiava para os filmes e estava sempre – sempre – pronta para abrir as portas de nossa casa para as centenas de reuniões que fazíamos, algumas sem aviso prévio, e que frequentemente avançavam madrugada adentro.

Ela compartilharia comigo a indignação de ver várias pessoas, que recebíamos em casa e com quem partíamos o pão, se transformarem, sem explicação, em inimigos ferozes – isso, eu descobriria, é fenômeno comum na política.     No mesmo 15 de março de 2011, enquanto fazíamos nossa primeira reunião de trabalho em minha casa, o blog Diplomatizzando, do Embaixador Paulo Roberto de Almeida, publicava um texto do economista Mansueto de Almeida (que viria a ser secretário do Tesouro) com observações críticas ao projeto do Novo[16]. Dizia Mansueto: “A ideia parece ser muito boa, mas acho difícil que tenha sucesso por pelo menos quatro motivos”. Ele os enumerava: “Primeiro, eles partem de uma concepção ingênua que gestão pública é semelhante à gestão privada de uma empresa”. Ele enumerava mais dois pontos, e finalmente o quarto: “Por fim, o Partido Novo não quer ter nos seus quadros “pessoas viciadas no processo político”. Isso significa que esse partido já nascerá pequeno. Política é uma atividade profissional”. Tanto eu quanto o diretório nacional enviamos respostas aos comentários de Mansueto[17] (a minha resposta foi mais dura e direta). Mas o tempo mostraria que, nesses dois pontos, Mansueto, corretamente, percebia algo que não enxergávamos. No dia 16 de março, João me pediu ajuda para responder a perguntas feitas pelo jornal Tribuna do Norte. No final de uma das respostas, eu dizia: Nosso objetivo é criar um Estado justo, eficiente e pacífico onde os indivíduos possam desenvolver suas vidas de acordo com seus desejos e competências, em busca da felicidade. Tudo o mais é retórica vazia. Qualquer regime que oprima o homem e afete sua liberdade está fadado ao fracasso.

No dia 17 de abril, domingo, fizemos uma operação de divulgação do partido no calçadão de Ipanema, liderada pelo Marcelo Lessa. O ponto de concentração foi o Posto 10.

Pouco depois, quatro meses depois de ser contratado – em maio de 2011 – e considerando que o projeto agora levaria muito mais tempo que o previsto para ser completado, Marcelo Lessa colocou seu cargo à disposição e deixou o Novo, sem que isso afetasse seu relacionamento com o João. Você provavelmente nunca ouviu falar do Marcelo Lessa. Entretanto, ele ajudou a lançar várias pedras fundamentais do partido. Enquanto o Lessa permanece anônimo, muita gente se apresenta por aí como fundador do Novo, quando a única coisa que fez foi assinar o livro na reunião de fundação.       No final de 2010, eu acompanhei Marcelo Ciuffo a um exame de PET scan de rotina. Desde que ele ficara doente, era comum que eu o acompanhasse em consultas e procedimentos médicos. O PET scan é aquele exame em que você se deita em uma maca estreita e é empurrado para dentro de um tubo enorme, que faz um barulho horrível. Quando o procedimento acabou, Marcelo se levantou e fomos juntos até a console do equipamento, onde o técnico olhava as imagens. Marcelo era médico e sabia interpretar o que via. Não foi preciso que o técnico dissesse nada. Na imagem apareciam várias metástases. O câncer havia retornado. Nos meses seguintes, o progresso da doença e a dor resultante foram tornando inviável sua rotina doméstica. Em junho de 2011, depois de ser o padrinho de batismo da nossa filha, Maria Fernanda, na Igreja da Ressureição, no Arpoador, Marcelo decidiu se internar pela última vez em um hospital, como forma de aliviar seu sofrimento, sabendo que não mais sairia dali.

Marcelo, meu melhor amigo, um anjo em forma humana, morreu em 15 de julho de 2011. A missa de 7º dia foi realizada no sábado dia 23, às 9h30, na Igreja da Paróquia da Ressurreição, na rua Francisco Otaviano em Ipanema – a mesma igreja onde ele batizara a minha filha. Marcelo faz muita falta em nossas vidas.

Capítulo 6 Os Pioneiros Passei a dedicar ao Novo boa parte do meu tempo livre, da minha energia e da minha capacidade intelectual. Entramos em um ritmo intenso de organização de reuniões e palestras para apresentar as ideias do partido, e ao mesmo tempo coletar as assinaturas necessárias para a formalização no TSE. Nem tudo eram flores. Aliás, quase nada eram flores naquele começo. Rejeição era a regra. Naquele tempo, como ainda ocorre hoje, muita gente fazia questão de me dizer, em alto e bom som, que não queria nenhum envolvimento com política. Por exemplo, no dia 3 de abril de 2011, eu enviei um e-mail aos ex-colegas de uma das empresas onde trabalhei convidando-os a conhecer o projeto do Novo. A resposta de um deles foi: Caro Motta,   Obrigado pelo convite. Não tenho interesse.   Grande abraço,

  Em compensação, no dia 4 de abril de 2011, recebíamos um contato de uma lenda viva do windsurfe brasileiro, Bob Nick, que queria conhecer o Novo. Bob me acompanha até hoje. Montei um blog pessoal e publicava artigos com frequência, falando das ideias e do projeto do partido. Lendo os textos daquela época, me espanto como evoluí em minhas posições. Como exemplo, um desses textos terminava declarando: “Portanto, aos que nos cobram posicionamento ideológico: não somos de direita nem de esquerda”. Como mudei .

Outra questão sobre a qual não hesito em dizer que mudei totalmente de posição foi a liberação ou legalização das drogas. Durante muito tempo acreditei nessa falácia, até que Marcelo Rocha Monteiro me educou a respeito da realidade do tráfico de drogas[18].     Chegara a hora de apresentações para grupos maiores. Na noite fria da quinta-feira, 19 de maio de 2011, fiz minha primeira apresentação pública sobre o partido, na Universidade Cândido Mendes, em Ipanema, junto com Marcelo Lessa. Conseguimos o espaço graças à Ana Cláudia Moreira. Foi um dia de muita alegria: a plateia, embora pequena, era composta de pessoas interessadas e atentas, entre as quais estavam vários amigos queridos. O vídeo gravado naquele dia[19] mostra um Roberto jovem e seguro de si – embora ainda ingênuo e sem qualquer experiência prática em política –, que fala sobre um projeto que seria, talvez, o mais importante de sua vida. Estas foram algumas das coisas que eu disse: O Novo é uma iniciativa política diferente de todas as que vocês já viram no Brasil até hoje. O Novo é um partido político que foi fundado com foco em duas coisas [...] primeiro é preciso gestão, o Brasil precisa de uma gestão pública eficiente e de qualidade. A segunda coisa que o Novo propõe é a cidadania, manifestada na eleição de cidadãos comuns.   Até onde a gente sabe, nenhum partido no Brasil propõe com convicção a redução de impostos. O político brasileiro tradicionalmente é a favor de mais impostos [...] nós acreditamos na redução de impostos e na eficiência na gestão dos recursos públicos. Essas coisas são básicas, a gente não abre mão disso.   Nós somos também único partido brasileiro que foi criado sem a interferência de nenhum político [...]   A gente defende um Estado mais eficiente, porque sem um estado mais eficiente não existe uma sociedade igual, justa e democrática. São palavras ocas dizer que no Brasil existe justiça social quando você tem um problema qualquer, entra na justiça e o seu processo leva 20 ou 30 anos para ser resolvido. Não existe igualdade quando você precisa de atendimento médico, e se você não tem muito dinheiro, um plano de saúde bom, você não tem atendimento médico.

  Outra coisa na qual a gente acredita é a participação do cidadão comum. Isso é uma parte integral do nosso projeto. Muita gente pergunta: mas por que os políticos do Novo vão ser diferentes dos outros políticos? Porque os políticos do Novo vão vir de vocês. É parte integrante do nosso projeto que as pessoas que vão se candidatar a cargos eletivos sejam pessoas comuns, representativas da sociedade. [...]   Nada é mais poderoso do que uma ideia cuja hora chegou.  

No vídeo, é possível ver que eu usava no pulso direito uma pulseira amarela, produzida pela fundação do ciclista Lance Armstrong. A fundação foi criada por Lance em 1997, quando ele foi diagnosticado com câncer testicular. A pulseira simbolizava o apoio àqueles que lutavam contra o câncer. Marcelo Ciuffo tinha me dado a pulseira. Na mesma noite da apresentação na Cândido Mendes, recebi um e-mail do meu amigo Alexandre Arraes: Aceite uma crítica construtiva. Faltou emoção! Política é envolvimento e sem emoção fica mais difícil. O Lessa estava muito sisudo. Quando desceu da mesa, relaxou e parecia outra pessoa. A apresentação em si, apesar de objetiva e do tamanho certo, poderia emocionar mais. As pessoas decidem as coisas com um pouco do racional, mas muito mais com o emocional. Sei que é difícil emocionar sem ser piegas ou apelativo ou lugar-comum. Esta me parece que é a missão a enfrentar.  

    Em maio começamos a produzir um vídeo de animação para divulgação do Novo. Nesse mesmo mês, vi, no Facebook, um anúncio do Liber, um partido libertário. Tínhamos contratado uma agência para ajudar na produção do material de divulgação, mas, à medida que o projeto ganhava corpo, ficávamos mais desconfortáveis em ter textos com posicionamentos importantes sendo escritos por alguém que não era parte do núcleo do projeto. Além disso, vários dos textos eram confusos e tinham informações erradas. Acabamos desistindo da agência.  

Em julho de 2011, o site do Instituto Mises Brasil publicou uma matéria crítica ao Partido Novo[20]. Entre outras coisas, o texto dizia: A "eficiência na gestão pública" parece ser a única bandeira do Partido Novo, "um partido formado por empresários", por pessoas que sabem administrar, que irão trabalhar com metas, e isso torna irônico o nome Novo, pois todo esse papo é velho e muito comum na política.

A crítica, que nos pareceu injusta e superficial, doeu.     No dia 16 de novembro de 2011, às 19 horas, no Hotel Marina, no Leblon, foi realizada aquela que pode ser considerada a primeira reunião geral de trabalho do Novo. Os participantes foram João, Rosa, Carlos Werneck, Luiz Russo, Luiz Guilherme Gama, eu, Regina, Geovana, Luiza Amoêdo, Carla Costa e Lívia Pereira. Nessa reunião, entre outros assuntos, discutimos a dificuldade de conseguir o engajamento das pessoas no projeto e na coleta de fichas de apoio. Estabelecemos que haveria reuniões semanais de trabalho no Hotel Marina, o que acabou não acontecendo. Em 13 de dezembro de 2011, Alexandre Arraes levou João e eu para uma conversa com a então vereadora Andreia Gouveia Vieira. Andreia era uma parlamentar excepcional, e procurávamos uma oportunidade para juntar forças, mas a conversa não evoluiu. Em fevereiro de 2012, João me convidou para integrar um “Comitê Executivo do Novo”. A primeira reunião foi realizada no dia 5 de março, no salão de festas do prédio dele. A segunda aconteceu em 19 de março, no Hotel Marina. Não me lembro de ter havido uma terceira. No sábado seguinte, 24 de março de 2012, foi realizada em São Paulo a primeira reunião nacional de coordenadores do Novo, em um escritório na Av. Juscelino Kubitschek, no bairro do Itaim Bibi.    

Um ano depois, em março de 2013, começamos a discutir a montagem dos diretórios. Entre os nomes cogitados para serem dirigentes do partido no Rio, estavam Carlos Alberto Ghazi, Bernardo Santoro e Ricardo Taboaço. Na sexta-feira, 22 de março de 2013 – meu aniversário –, João, Bernardo Santoro e eu nos encontramos no Iate Clube para falar sobre os próximos passos para o partido. Bernardo já era um veterano da política, embora ainda muito jovem, e nos impressionou com seu conhecimento sobre o funcionamento de partidos e sua visão da cena brasileira. Ele já havia coletado mais de 2.000 fichas de apoio. Foi por essa época que conheci Andrew Hancock. Andrew é um jovem e brilhante executivo do mercado financeiro, membro do Instituto de Formação de Líderes e sempre presente nas boas iniciativas em prol do Rio e do Brasil. Logo a seguir conheci Felipe Dias, amigo de Andrew. Ambos sugeriram o nome de um terceiro amigo – André Strauss – para participar do diretório do Rio. Na terça-feira, dia 28 de maio, eu me reuni com Andrew, Strauss e Felipe Dias no escritório do João no Leblon. O projeto de criação do partido ganharia um novo impulso a partir da entrada dos três, que compartilhavam comigo uma insatisfação extrema com a realidade brasileira e a disposição de fazer algo a respeito. Naquela altura, o partido já tinha 78 mil assinaturas certificadas e 403 mil fichas já preenchidas, ainda a serem apresentadas aos cartórios eleitorais.     Foi em junho de 2013 que eclodiram as primeiras manifestações populares desde o impeachment de Collor. Inicialmente motivadas pelo aumento nas passagens de ônibus, as manifestações logo assumiram caráter de protesto genérico contra um sistema político corrupto e ineficiente. Várias capitais registraram tumultos, ônibus incendiados, tentativas de invasão de prédios públicos e

conflitos com a polícia. Observávamos com cautela aquilo tudo. O Brasil começava a acordar de anos de uma embriaguez insensata e corrupta.     “Motta, gostaria que você assumisse a presidência do diretório estadual do Rio”, João me disse um dia, no final de maio de 2013, em uma reunião com a presença da Rosa. “Parabéns, presidente”, me cumprimentou ela. Assinei o termo de posse em 10 de junho, e no dia 25 de junho de 2013 o TRE do Rio de Janeiro recebia um ofício assinado por mim na qualidade de presidente do diretório estadual do Partido Novo, solicitando o registro dos órgãos de direção partidária do estado do Rio e dos municípios do Rio e de Angra dos Reis, e encaminhando em anexo certidões de 11.087 assinaturas de apoio. Outros diretórios estavam sendo criados no Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Roraima, São Paulo e Espírito Santo. Em 20 de junho de 2013, fizemos uma apresentação com plateia lotada no auditório do Shopping Leblon, que foi aberta pelo economista e escritor Rodrigo Constantino. Intelectual preparado, orador nato e muito corajoso, Constantino foi uma das primeiras vozes a denunciar o desastre criado pelo PT. Incansável defensor do liberalismo, ele teria papel fundamental no processo de formação do Novo, participando de inúmeros eventos e apresentações e atuando, muitas vezes, como nosso mentor. Naquela noite, a plateia do auditório do Shopping Leblon recebia boa parte da elite do mercado financeiro do Rio. Ainda tínhamos o receio de que o projeto esfriasse e nunca saísse do papel. Aquela apresentação nos reanimou e marcou o início de uma nova fase. A partir dali os acontecimentos começaram a se acelerar, com reuniões e apresentações cada vez mais frequentes, e contatos com grupos interessados em todo o país. Foi nessa época que

começamos a organizar melhor o cadastro de apoiadores, por exemplo. Sugeri utilizarmos o diretório do Rio como projeto piloto a ser seguido pelos demais diretórios. Começamos a pensar nos preparativos para as futuras filiações e a debater quais seriam os conceitos principais do ideário do partido. A administração do site e da página do Facebook foram transferidas para o escritório de São Paulo.   O escritório do Leblon estava sempre movimentado e cheio de gente. Além das pessoas contratadas, estavam sempre presentes João e Rosa, que se entregaram de corpo e alma ao projeto e gastavam muito tempo e esforço respondendo a comentários, postagens e e-mails. Lembro de ter achado curioso isso, que o líder de um partido político – especialmente alguém na condição social do João – se entregasse ao projeto a ponto de ficar muito envolvido com tarefas operacionais que consumiam tempo precioso. Mas havia outras tarefas urgentes esperando: a definição do ideário e da estratégia política. Abracei essas tarefas e as levei para nossas reuniões semanais. Decidimos criar grupos de trabalho temáticos, dedicados a cada uma das questões. Tínhamos grupos dedicados à preparação do processo de filiação (para quando o partido fosse formalizado), preparação para eleições, coleta de assinaturas, divulgação do partido, promoção da liberdade econômica e da competitividade e o GEN – grupo de estudos do Novo. Os grupos de trabalho tinham uma função dupla: ao mesmo tempo que somavam esforço e talento individual para preencher as lacunas no arcabouço teórico do partido, os grupos serviam também como ferramenta de envolvimento e motivação das pessoas. Muito mais tarde fui encontrar nos escritos de Saul Alinsky, o bruxo da guerra cultural esquerdista americana, a justificativa teórica para aquilo que eu já tinha descoberto na prática: dar as pessoas a oportunidade de contribuir para uma causa comum é,

muitas vezes, o que de mais importante um partido ou movimento político pode fazer por elas. Criamos fóruns de discussão online no Google Groups: um fórum nacional, do qual participavam João, Rosa, Marcos Alcântara, Fábio Ribeiro, Christian Lohbauer, Fábio Barbosa, ex-CEO do Banco Real (com quem nunca encontrei), e eu; e outro fórum para a turma que começava a formar o Novo do Rio de Janeiro.     No dia 1º de julho de 2013, João fez uma palestra na PUC do Rio, no auditório B6 do 6º andar da ala Frings, no Edifício da Amizade. Mais uma vez, contamos com a participação do Rodrigo Constantino. O evento teve pouca audiência porque, pouco antes do horário marcado, um temporal caíra sobre a cidade, paralisando o trânsito. Alexandre Arraes, já veterano da política, acompanhava o desenrolar do projeto meio de perto, meio de longe. Um dia, ele sugeriu que eu conhecesse um de seus amigos, o “Beto”, que tinha muito interesse no projeto do Novo. Quando eu abri a porta do escritório do Leblon, imediatamente reconheci o Beto: era Carlos Roberto Teixeira, que fora diretor de TI e meu chefe na Shell, e que iria, em breve, fundar o VoteNet, uma iniciativa inovadora de promoção da consciência política eleitoral usando a tecnologia. Foi nessa época que conheci Wilson Cukierman, através de um e-mail que ele havia mandado para o Novo. Wilson foi executivo do mercado financeiro, morou em Israel e hoje é diretor de uma importante escola no Rio. Seus filhos Dan e Ilan eram presenças frequentes nos eventos do Novo. Wilson é uma pessoa gentil, agradável, preparada e genuinamente preocupada com nosso país. Naquela época também se juntou a nós André Segadas, outro jovem que mandava e-mails para o partido. Apareceu também o grande velejador Guto Brito, levado pelas mãos

do Bob Nick. O advogado Fabrício Rodrigues também entrou no projeto, trazido por Felipe Dias. No final de agosto era Manolo Salazar que mandava um e-mail oferecendo-se como voluntário, e no início de setembro Orlando Puppin, que havia sido diretor da Shell e – descobri depois – irmão do Gilson Puppin, meu antigo professor de álgebra no Santo Inácio. Logo a seguir eu conheceria Gabriel Renault Magalhães, trazido por Strauss. Outros que entraram nessa época foram Raphael Rottgen, Renan Dejon, Gabriel Menegale (futuro coeditor do Boletim da Liberdade), Maurício Martins (que assumiria a responsabilidade por criar o Novo Niterói), Igor Blumberg, Juliana Volpe, Daniel Runkel, Juliana Ribeiro e Abner Velasco. Foi nessa época também que conheci Fernando Mousinho, pernambucano, executivo aposentado, lutador de jiu-jitsu e boxe, pai de uma família linda e bem-sucedida e, como eu, indignado com os rumos deste país tresloucado. Fernando é uma das pessoas mais inspiradoras que tive a oportunidade de conhecer. Ele está sempre me aconselhando, apontando erros e me cumprimentando pelos acertos.     Comecei a fazer reuniões semanais no escritório do João, com horário certo: segunda-feira às 20h. Às vezes João participava. As pessoas apareciam, conversavam, ficavam, chegava mais gente. Debatíamos todos os assuntos: educação, saúde, segurança, economia, transporte. Pessoas cansadas, saídas de um dia de trabalho exaustivo e com famílias esperando em casa, sacrificavam seu tempo pelo que parecia, ainda, um sonho quase impossível. Um trazia o outro. As histórias desses encontros encheriam um livro. Não vou lembrar de todos os nomes, mas alguns desses pioneiros merecem menção especial. Otávio Cintra, que tinha entrado comigo na Petrobras (ele é irmão do Pedro Cintra, que foi da minha sala no Santo

Inácio, também havia sido funcionário da Petrobras e hoje é Senior Finance Operations Manager da Google na Califórnia), foi um dos primeiros a entrar no projeto do Novo, em abril de 2011. Para minha surpresa, Otávio, que nunca tinha se interessado por política, se tornou participante ativo do Novo e, quando criamos formalmente o diretório estadual, eu o convidei para assumir o cargo de vice-presidente. Robson Abreu, sargento da Marinha – hoje suboficial – especializado em operação de radares e controle aéreo tático, nasceu e foi criado no morro do Caracol na Penha. Robson é um dos sujeitos mais preparados, cultos e determinados que eu conheço – um conservador raiz, que construiu a si mesmo em meio a um ambiente de pobreza e hostilidade. Victor B., comprometido com o Brasil e com a causa liberal, amigo até hoje. O dentista José Lopes Teixeira, com quem eu conversava muito sempre que podia. O auditor fiscal e guerreiro da liberdade Marcelo Silva, dono de uma combinação rara de inteligência, espírito inovador e generosidade. Marcelo, que entrou em contato conosco por e-mail no dia 22 de setembro de 2014, é mais um conhecido daquela época que se tornou meu amigo. Renata Silbert, que tinha estudado comigo no Santo Inácio (embora não fôssemos amigos naquela época), foi uma das forças por trás da atração de filiados e da divulgação das ideias do Novo e veio a se tornar uma amiga querida. Sandro Gomes, empreendedor e comerciante, homem de sorriso fácil e percepção política aguçada, e que estaria presente em muitos momentos da minha futura trajetória. Márcio Assis Brasil, importante executivo do setor de telecomunicações, apoiador participante e comprometido. Sálvio Formisano, quase um sobrinho, que eu vi nascer e crescer.

André Zacaron e Manu Lane – ele médico especializado em cirurgia bariátrica, ela em nutrição –, um casal de cuja amizade desfruto até hoje. Fernanda Torós, PhD em economia pela Universidade de Illinois Urbana-Champaign, que fez carreira no mercado financeiro e hoje é CEO da WeSpline, uma startup de tecnologia, além de uma trabalhadora incansável pela aproximação do Brasil com Israel – ideia que ela trouxe para o Novo quando começou a participar de nossas reuniões, logo no início. Leonardo Fiad e Andreia D’Oliveira, ele advogado, ela empreendedora, observadores afiados da cena política, amigos queridos, inteligentes e espirituosos – a definição de uma boa companhia –, sempre dispostos a partilhar pão e vinho em torno de uma boa conversa. Marco Paulo Costa, um dos primeiros a participar de nossas reuniões, sempre com opiniões fortes e posturas firmes. Alessandra Pinho, uma das líderes do movimento Vem Pra Rua no Rio de Janeiro. Bonita, inteligentíssima, muito beminformada e articuladora política nata, Alessandra teve papel fundamental na organização do movimento próimpeachment da Dilma no Rio. Marcus Werneck, uma lenda do mergulho nacional, hoje consultor financeiro. Tayssa Sato, filiada e apoiadora que muito ajudou na comunicação com novas pessoas e na organização dos eventos. Um dia ela sumiu. Onde está você, Tayssa? Maria Fernanda Gomes também entrou no Novo Rio de Janeiro no início, e sempre foi participante ativa e entusiasmada. Rinaldo Paulino de Souza, apoiador de primeira hora, responsável pelas primeiras imagens em vídeo do Novo Rio de Janeiro. Marcelo Goes, velho amigo que se juntou com entusiasmo ao nosso grupo. Rafael Hollanda, jovem brilhante e idealista, dono de vasta bagagem cultural e de grande sensatez e coragem moral. Tenho a honra de chamar Rafael e sua família de amigos.

Acácio Dorta, outro jovem cuja perspicácia, bom humor, inteligência e coragem marcaram os tempos iniciais do Novo. Outras pessoas que  conheci naquela época, no início do início: Davilson Brasileiro, o querido casal Alessandra Santiago e Breno Gentil (na época recém-chegados do exterior), o outro querido casal Guilherme Piccard e Isabela da Cunha Rocha, Carlos Nepomuceno, Diego de Souza, Eduardo Sholl Machado, Felipe Fabres, Felipe Lungov, Fernando Segalote, Flávio Cabral, Flávio Maia, Frederico Lanza, Gianelli Rodrigues, Gustavo Agostini, Gustavo Lima, Gustavo Mousinho, Ida Breyer, Igor Akhnaton Kardush, Ítalo Tertuliano, João Pedro Schara Francese, João Pizysieznig Filho, José Clark, Kátia Leituga, Krysamon Cavalcante, Laura Yanovick, Lucas Jazbik, Luiz Armando Daudt, Marcus Cortez Brito Leite Póvoa, Milton Alves da Silva, Roberto Argento, Rodrigo Mousinho e Tito Santos. Essa era a turma que participava das reuniões, organizava os eventos, ia às ruas divulgar as ideias e ajudava, de formas variadas, a colocar de pé o sonho de um partido diferente.     No dia 6 de agosto de 2013, realizamos um evento no auditório do edifício Leblon Corporate, de novo com a presença do Rodrigo Constantino. Nesse dia, Constantino fez uma das mais brilhantes exposições a que eu já assisti sobre a catástrofe causada pelo domínio do país pela esquerda. Começavam os ataques ao projeto do partido. No dia 10 de agosto, o site Brasil 247 publicou uma matéria chamando o Novo de “partido de centro-direita[21]”. Alguns dias depois, um jornal de Maceió chamava o Novo de “extrema direita”. Nesse mesmo mês, Marina Silva apresentou ao TSE o pedido de registro[22] do seu partido, o Rede

Sustentabilidade, mesmo sem ter todas as assinaturas necessárias, sob alegação de que os cartórios eleitorais estariam descumprindo prazos. O registro acabaria sendo negado pelo TSE, mas o comentário sobre os prazos dos cartórios estava correto: era imprevisível o tempo que a burocracia eleitoral levava em cada etapa do processo. Por exemplo: o processo de registro dos diretórios do Rio, iniciado havia sessenta dias, andava a passos de tartaruga. No dia 27 de agosto, terça-feira, fui à Procuradoria Regional Eleitoral perguntar sobre a razão da demora. Não me lembro o que me disseram, mas, depois da minha visita, o processo começou a andar. No dia 28, fizemos um encontro do Novo em São Paulo, no Radisson Hotel da Av. Cidade Jardim, também com Rodrigo Constantino. No dia 2 de outubro, o TRE deferiu o pedido de criação dos diretórios do Rio. A estrutura do Novo, naquela época, era essa: Diretório Nacional: João Dionísio Amoêdo – Presidente Nacional Fábio Ribeiro – Vice-Presidente Nacional José Carlos Santos – Secretário Administrativo Marcos Alcântara Machado – Secretário Nacional de Finanças   Diretório Estadual do Rio de Janeiro Roberto Motta – Presidente Otávio Cintra – Vice-Presidente Luiz Guilherme Gama – Secretário de Relações Institucionais e Legais Maria Helena Hierneis – Secretária Administrativa   Diretório Municipal do Rio de Janeiro Ricardo Taboaço – Presidente André Strauss - Vice-Presidente José Cláudio - Secretário Administrativo

  No dia 9 de outubro de 2013, o “fale conosco” do partido me encaminhou um e-mail de um interessado em participar do Novo. Assinava o e-mail o advogado Alexandre Teixeira de Freitas Rodrigues, que viria a ser um dos dois primeiros deputados estaduais eleitos no Rio pelo partido em 2018.

 

Capítulo 7 O Hotel Marina Quando Acende Um dos eventos mais memoráveis do Novo aconteceu no dia 8 de outubro de 2013 no Hotel Marina, no Leblon – aquele citado na música Virgem, da cantora e compositora Marina Lima, que diz: “O Hotel Marina quando acende / Não é por nós dois[23]”. Os salões reservados lotaram. Estavam presentes, entre outros, o cineasta Marcos Prado, produtor do filme Tropa de Elite, o empresário Fred D’Orey, criador da Totem, ambos ex-colegas do Santo Inácio. Todas as cadeiras estavam ocupadas e havia muita gente de pé. Abri a reunião falando do projeto e apresentando o João, que falaria depois de mim. Encerrei minha apresentação com estas palavras: Apresento João Dionísio, meu colega de Santo Inácio, engenheiro e administrador de empresas, que fez brilhante carreira no mercado financeiro e hoje é conselheiro de várias empresas. Para quem acha que o NOVO não vai longe, eu gostaria de informar que o Joao é também atleta de elite, e já completou vários Ironman, a prova de elite do triátlon mundial.   

Em seguida falou João. No dia 19 de novembro, fizemos outro evento no mesmo Hotel Marina, no qual a economista Elena Landau fez uma apresentação sobre sua experiência com privatizações no governo FHC. Naquele novembro, a aproximação do verão deflagrou uma onda de arrastões nas praias da cidade. Eu dei uma entrevista ao Bom Dia Rio explicando a gravidade da situação e pedindo providências[24].     As apresentações não paravam. Descobrimos o Clube Israelita Brasileiro (CIB)[25] em Copacabana. Seu presidente, Altamiro Moysés Zimerfogel – o Miro – nos recebeu de braços abertos. Ali realizamos apresentações com

convidados como Paulo Rabello de Castro e Carlos Andreazza. Hélio Beltrão, fundador do Instituto Mises Brasil e da editora LVM[26], apresentou uma série de palestras sobre as Seis Lições de Mises. Em uma dessas palestras, conheci Alex Catharino e o professor Ubiratan Jorge Iório, dois expoentes do liberalismo e conservadorismo. Também recebemos o professor Marcos Cintra, para falar sobre sua ideia de imposto único. Tínhamos casa cheia sempre. Me preocupava a quantidade de pessoas desconhecidas que estavam frequentando o escritório do João no Leblon. Propus então que encontrássemos outro local, que significasse menos exposição para ele e mais segurança para todos. André Strauss sugeriu que usássemos os escritórios da empresa da qual ele era sócio, em um prédio próximo, o que fizemos durante um tempo a partir de janeiro de 2014. Foi lá que recebi pessoas remanescentes de um projeto de reativação do antigo Arena, o partido político do governo na época do regime militar. Uma das pessoas com quem conversei, o Dr. Marcelo Kokis, médico conservador de boa estirpe, se tornou meu amigo (e ortopedista). Era um trabalho exaustivo, mas eu adorava. Mas era exaustivo. Em cada uma dessas reuniões eu apresentava o projeto do partido, ideia por ideia, e a apresentação era sempre seguida de alguma discussão, às vezes de debate acalorado. Quase nenhuma reunião levava menos de duas horas. Foi assim que atraímos dezenas de pessoas qualificadas e interessadas no projeto de um Brasil melhor: com trabalho duro, ideias originais e disponibilidade para conversar e discutir. É assim que faço política até hoje.     As reuniões aconteciam sempre às segundas-feiras, às 20h, no Leblon. Eu estava lá, toda segunda, mesmo que aparecesse só uma pessoa – e isso aconteceu várias vezes.

Além disso, eu estava sempre disponível para tomar um café com qualquer um que estivesse interessado em saber mais sobre o projeto. Eu, que nunca gostei de café, devo ter bebido uma safra inteira – uma não, várias. Uma vez, um rapaz chamado Gustavo me convidou para tomar um suco no Bibi Lanches, no Leblon. Enquanto eu tomava meu açaí, descubro que o “rapaz” (ele tem cara de garoto mesmo) é diplomata do Itamaraty e estava terminando seu PhD em Administração Pública pela Universidade de Illinois-Chicago. Gustavo Maultasch de Oliveira é, simplesmente, um dos pensadores mais originais sobre política, ideologia e liberalismo que eu conheço – um gigante intelectual e pessoa agradável, modesta e gentil. Ainda hoje conversamos com frequência e sempre aprendo muito com ele. Outra vez eu cruzei com o Lars Grael e não resisti: dei o meu cartão e falei do projeto do Novo. Dias depois ele me mandava uma mensagem: “Conversa com essa amiga”. A amiga era a Fabiana Bentes, que eu logo convidei para um café no Rio Design Center no Leblon. Conversamos umas duas horas, durante as quais eu devo ter falado uns 5 minutos (ela vai me matar quando ler isso ). Fabiana, que se mostrou articulada, consciente e determinada, era CEO da ONG Sou do Esporte, consultora do BID, atleta de elite e seria, um dia, secretária de Estado de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro. Outra história: conheci um senhor em uma das apresentações, trocamos cartões e ele me convidou para um café. Nos encontramos no Shopping Leblon, em frente à Casa do Pão de Queijo. Ele era meu xará – Roberto Font Júnior – e professor de inglês. Entusiasmado pela ideia do Novo, já tinha ido a várias apresentações. Pela primeira vez ele tinha a chance de se sentir verdadeiramente parte de um projeto político que tinha relação com sua vida, seus anseios, suas preocupações. Conversamos, comendo pães de queijo, por mais de uma hora.

Multipliquem essas conversas e encontros centenas de vezes, com pessoas de todas as idades e situações, em todos os locais da cidade e vocês entenderão como era a minha rotina. Gustavo, Fabiana e Roberto eram parte de uma multidão, espalhada pelo Brasil, que compartilhava comigo um sonho. Realizá-lo era a minha missão.     No final de 2013, o escritório do Leblon trabalhava fazendo a estruturação dos diretórios existentes, identificando novas lideranças regionais e lidando com a enorme quantidade de postagens no Facebook. Já fazia algum tempo que havíamos começado a prática de realizar uma reunião geral mensal do Novo Rio de Janeiro, quase sempre no Clube Israelita Brasileiro.     No dia 24 de novembro, jantamos com Mansueto Almeida no Rio. O jantar, organizado pelo Felipe Dias, foi uma aula sobre o Brasil. Participaram do jantar, além do Felipe e eu, João, Andrew e Gabriel Renault Magalhães. No dia 16 de dezembro de 2013, uma segunda-feira, às 19h, realizamos uma reunião geral do Novo Rio no Clube Israelita Brasileiro. Eu abri a reunião e João falou depois. A seguir cada um dos grupos de trabalho (divulgação, ideário, coleta, eleições, governança e filiação) apresentou suas ideias, propostas e primeiros resultados. Felipe Dias encerrou apresentando um panorama econômico. Aprendi bastante com o Felipe sobre economia e liberalismo. Muito jovem, Felipe já era excepcionalmente culto e bem-informado, e mudou minha forma de pensar sobre várias questões. Foi Felipe quem me deu de presente um livro sensacional, Além da Democracia, que fala sobre os problemas enfrentados pelas modernas democracias ocidentais. Foi a primeira vez que comecei a pensar sobre

os problemas e defeitos do sistema político que consideramos quase sagrado. É um livro fantástico, leitura obrigatória. Foi nas discussões com Felipe que comecei realmente a entender como é maléfica a intervenção do Estado em nossas vidas, mesmo quando a intenção é a melhor possível. Em paralelo, seguia a coleta de assinaturas. Fazíamos um ranking periódico dos membros do diretório do Rio por quantidade de assinaturas de apoio coletadas. Por exemplo, no ranking de 7 de março de 2014, o primeiro lugar foi de Ana Cláudia Moreira, com 127 assinaturas, e o segundo foi de Marco Paulo Costa, com 109 assinaturas.     O ano de 2014 começou com eventos no Clube Israelita Brasileiro, reunindo cada vez mais gente. Em maio, recebi um convite para substituir o João em uma apresentação sobre o Novo para o grupo carioca do Instituto de Formação de Líderes (IFL), uma entidade que forma lideranças com base nos valores de estado de direito, liberdade individual, livre mercado e respeito à propriedade privada. A apresentação foi no dia 26 de maio, na residência da Paula Guedes, presidente do IFL no Rio. Eu não seria o único apresentador. Havia um outro convidado, o então secretário municipal de Transportes, Carlos Roberto Osório, que já preparava sua futura e bem-sucedida candidatura a deputado estadual. Como Osório tinha outro compromisso em seguida e precisava sair mais cedo, ele falou primeiro, apresentando os planos da prefeitura para o transporte público. Depois foi minha vez. Com o entusiasmo de quem fala sobre aquilo em que acredita, expliquei o Novo, sua criação e seu ideário. Lembro de ter criticado a arrogância implícita no pensamento exposto pelo Osório (arrogância do raciocínio, não do Osório, que é, provavelmente, o político mais gentil, educado e refinado que eu conheço[27]) – a arrogância do

conceito de planejamento centralizado, que dá a burocratas sentados em um escritório refrigerado o poder de tomar decisões que afetam as vidas de milhões de pessoas, sem que essas pessoas tenham sido consultadas. Enquanto fazia a minha exposição, alguém abre a porta e se senta ao lado da Paula. Olhando pelo canto do olho, eu o reconheci e congelei: o recém-chegado era nada mais, nada menos que Paulo Guedes. Paulo era o pai da Paula, e eu não sabia. Eu me senti totalmente envergonhado de falar sobre liberdade econômica enquanto Paulo Guedes – um dos maiores economistas do país – assistia. Meu encontro seguinte com Paulo Guedes também seria acidental. No início de 2018, Flávio Rocha havia se lançado pré-candidato à Presidência da República e ainda procurava um partido. Em fevereiro alguém do MBL (Movimento Brasil Livre) me ligou dizendo que o Flávio estaria na cidade para um evento sobre varejo, será que eu gostaria de conhecê-lo e ir junto? Encontrei com Flávio e sua comitiva para um café em Botafogo, e seguimos para o teatro Oi Casagrande, onde estava sendo realizado o evento Pós-NRF, que seria encerrado por ele com um discurso. Acabado o evento, eu já me preparava para ir embora quando me convidam para uma reunião ali ao lado. “Reunião com quem?”, perguntei. Paulo Guedes. Caminhamos até o escritório do Paulo, na esquina de Ataulfo de Paiva com Afrânio de Melo Franco – curiosamente, no canto oposto da mesma esquina onde ficava (ou ainda fica) o escritório do João, que foi o primeiro escritório do Novo. O objetivo da reunião era conseguir o apoio do Paulo à candidatura do Flávio Rocha. Paulo é sempre brilhante, e durante umas duas horas falou sobre tudo o que nos interessava: economia, política, até sobre segurança (Marcelo Rocha Monteiro, que também estava presente, adorou). Mas no final disse que já tinha um candidato a presidente: Jair Bolsonaro. Veja: estávamos em fevereiro de

2018, uma época em que muita gente ainda dizia que a eleição seria ganha com tranquilidade por Alckmin. Mal sabia eu que estava testemunhando a história viva.     Parênteses para viajar no tempo: não me lembro quando ouvi falar pela primeira vez sobre o MBL. Deve ter sido no Facebook. Minha curiosidade aumentou quando o Leo Fiad e a Andreia D’Oliveira assistiram a uma manifestação organizada por eles em São Paulo e voltaram fascinados com o grau de organização. Um dia, Alexandre Borges realizou um evento com o MBL no shopping Fashion Mall. Um dos participantes era o Kim, o outro – eu acho – era o Renan. Fiquei impressionado com o Kim, apesar de achá-lo jovem demais para receber a reverência que já começava a atrair. Alguns conhecidos se envolveram com o MBL, que começou a se organizar no Rio, com uma base inicial em Niterói. Quando começaram as grandes manifestações pela saída da esquerda do poder e a favor do impeachment da Dilma, o MBL marcou presença com carros de som e organização, embora nunca chegassem a ter no Rio a mobilização, o tamanho e o impacto que tinham em São Paulo. Em algum momento desse período, eu agendei uma reunião do João com a cúpula do MBL. A reunião aconteceu no escritório do Novo em São Paulo. A ideia era que pudesse ser traçada alguma ação conjunta entre o MBL e o Novo, ou que os expoentes do movimento pudessem se candidatar pelo partido, mas não houve entendimento. Em junho de 2017, quando eles vieram ao Rio, Alexandra e eu os recebemos em nossa casa para um jantar. Vieram Kim, Renan, Holiday e Arthur, além de alguns membros locais do MBL. Todos eram articulados e tinham um conhecimento incomum de política, e a conversa foi até as duas da manhã. Também estava presente Marcelo Rocha Monteiro. Foi nessa noite, depois de uma conversa do

Marcelo com o Kim em torno de um prato de lasanha bolonhesa, que o MBL começou a colocar segurança pública em sua pauta. Marcelo Rocha Monteiro e eu criamos um plano nacional de emergência de segurança pública[28] e, com a ajuda do Leo Fiad, um projeto de lei com modificações na legislação penal[29]. Através dos contatos do MBL, consegui apresentar o plano ao então ministro Moreira Franco e ao presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia, infelizmente sem nenhum resultado concreto. Mas ainda hoje, um dos interlocutores que mais respeito quando o assunto é segurança é o policial civil paulista Lucho Andreotti, ligado ao MBL. No dia 15 de setembro de 2017, Kim participou de um histórico evento do Ministério Público do Rio de Janeiro. O seminário, cujo tema era segurança pública e ideologia, durou um dia inteiro, e tinha vários outros palestrantes; entre eles, eu e Alexandre Borges. Nós três – Kim, Alexandre e eu – fomos os últimos a falar, no final da tarde. A visibilidade e a abordagem do evento – uma denúncia da influência da ideologia esquerdista na destruição do sistema de justiça criminal do Brasil – incomodaram a esquerda, que sempre monopolizou a pauta de segurança pública. Quando saímos para almoçar, já havia militantes acampados na porta do prédio do Ministério Público. Ao voltarmos do almoço, fomos hostilizados. Depois viemos a saber que, enquanto nós três palestrávamos, uma notória militante da extrema esquerda carioca tentara invadir o auditório, sendo impedida a muito custo pela segurança. No final de semana de 11 e 12 de novembro de 2017, eu participei de um painel sobre segurança pública no 3º Congresso Nacional do MBL, em São Paulo. Meus colegas de painel foram Marcelo Rocha Monteiro e Benê Barbosa, o maior especialista brasileiro em armamento. Nosso painel aconteceu no maior salão, no qual estavam, com certeza, mais de mil pessoas – minha maior plateia até então.

Foi assim que fui parar naquela reunião com o Paulo Guedes, em fevereiro de 2018. O MBL flertava com o apoio à campanha de Flávio Rocha à Presidência da República. Eu cheguei a viajar com o Flávio pelo norte e nordeste, assessorando-o no assunto segurança pública. No início de março de 2018, tive a honra de dividir com ele – e com Marcelo Rocha Monteiro e Benê Barbosa – o palco do Teatro Riachuelo, na Cinelândia, no Rio de Janeiro, em um evento sobre segurança pública organizado pelo Movimento Brasil 200[30]. Foi nesse evento que conheci muitas pessoas do MBL Rio de Janeiro, como o grande José Maria Filho, o Zema, que na época era o coordenador do MBL na Baixada Fluminense. A partir dele, conheci Vinícius Ziza, Bruno Christo, Bruno Souza, Renato Borges, Rafael Pereira, Rogério Ramos, Matheus e muitos outros. No evento do Teatro Riachuelo, foi lançada a campanha “Eu Apoio As Nossas Tropas”, em apoio à intervenção federal na segurança pública do Rio, que havia sido decretada em fevereiro. Em julho de 2018, fui a São Paulo gravar com Kim e Arthur o quadro de entrevistas “Teste do Sofá”[31]. Em outubro, voltei a São Paulo para o 4º Congresso Nacional do MBL, dessa vez levando meu filho João Felipe. Vimos Paulo Guedes e Salim Mattar serem aplaudidos por um auditório ainda mais lotado do que aquele para o qual eu havia palestrado no ano anterior. Em determinado momento, a multidão começou a gritar: “Privatiza! Privatiza!”. Em janeiro de 2019, organizei o encontro de uma comitiva de deputados recém-eleitos com o então ministro da Justiça Sergio Moro, com o objetivo de pedir o endurecimento da lei penal[32]. Estavam presentes à reunião, realizada no dia 30 de janeiro às 14h, além de Kim Kataguiri, os deputados Marcel Van Hattem, Alexis Fonteyne, Paulo Ganime, Vinícius Poit, Lucas Gonzales e Tiago Mitraud – eleitos pelo Novo –, Luiz Lima, Bia Kicis, Carla Zambelli e o amigo Maurizio Spinelli. Entreguei ao

ministro Moro o texto do projeto de endurecimento da lei penal elaborado com Marcelo Rocha Monteiro e Leo Fiad[33]. Moro folheou o documento sem comentar. No final, anunciou que na segunda-feira seguinte já estava encaminhando ao Congresso uma nova legislação, que ficaria conhecida como Pacote Anticrime. Ao longo de 2019, fui me afastando do MBL por perceber uma mudança de rumo, que foi primeiro sinalizada por uma dificuldade de comunicação com eles e confirmada quando anunciaram, para o 5º Congresso Nacional do movimento, a participação de José Sarney, Michel Temer, Fernando Collor, Lula e Dilma Rousseff. Respondi com uma nota pública de repúdio. A nota dizia[34]: Comunico meu REPÚDIO ao "painel de debate" do MBL com Sarney, Temer, Dilma, Collor e – se não estivesse preso – Lula. Isso afronta minhas convicções, a confiança e os votos de milhares de pessoas e também a narrativa que projetou o MBL: o combate à corrupção e à esquerda.   Esse “painel de debate” do MBL é mais do que um ato equivocado, feito no pior momento; ele é um gesto político incompreensível, inexplicável e inaceitável.   Coloquei fé, apoiei, participei das manifestações com eles. Estou decepcionado e expressando meu repúdio a essa atitude inconsequente, irresponsável e infantil, que trata a política como um concurso do meme mais zoeiro.    

Meu afastamento dessa nova direção que o MBL tomou não afetou o reconhecimento da contribuição que o movimento deu para a remoção de Dilma e do PT do poder, e para o engajamento de uma nova geração de jovens na política. Mas pouco depois o MBL começava uma guerra aberta contra o governo. Eu não podia me calar; isso foi motivo de uma outra nota minha[35], de 10 de junho de 2020: Em setembro do ano passado manifestei repúdio ao "painel de debate" da convenção do MBL com Sarney, Temer, Dilma e Collor. Era um mau sinal. Hoje manifesto meu repúdio ao uso, pelo MBL, de táticas da extrema-esquerda que tanto combatemos. Para fazer isso, já temos o PSOL.

  Fecha parênteses. Voltemos a 2014.

Capítulo 8 Novas Portas Em 2014 comecei um mestrado em gestão na Fundação Getúlio Vargas. Na entrevista de admissão, com o Prof. Marco Túlio Zanini, falei entusiasmado sobre o projeto do Novo. Quando as aulas começaram, o Partido Novo continuou a ser assunto de sala de aula, especialmente quando eu me deparava com professores cuja linha de pensamento tendia para o lado oposto ao do liberalismo. Eu não havia entendido ainda o que Olavo de Carvalho já dizia nos anos 1990, e que só fui entender com clareza quando li Intelectuais e Sociedade, de Thomas Sowell: existe um consenso no mundo acadêmico em torno de posições de esquerda. É um monopólio “progressista”, silencioso, invisível e onipresente. Qualquer tintura ideológica um pouco mais forte que a social-democracia pode destruir uma carreira acadêmica. Liberalismo econômico e conservadorismo político, mesmo em suas formas mais tímidas, são persona non gratas na academia, onde muitos vivem de recursos públicos, inventando projetos malucos e teses radicais para conseguir protagonismo. Como explica Thomas Sowell, quanto mais rebelde, esdrúxula e radical a ideia, mais destaque o acadêmico consegue. O problema é que, depois, esse lixo intelectual é consumido pela sociedade como dogma. A coisa é tão complicada que, dois anos depois, quando pensei em fazer um doutorado, um dos professores da banca examinadora (não vou citar o nome da instituição), depois de conhecer a minha história, me fez a seguinte pergunta: “Como você se sentiria tendo um professor esquerdista?”. Mas eu ainda não tinha consciência disso quando me sentei nos bancos da FGV. Aprendi muito ali. Os pontos altos do curso eram as aulas do Prof. Álvaro Cyrino – nas quais ele

usava estudos de caso de Harvard – e do Prof. Marco Túlio, que era também o coordenador do curso. O mestrado abriu novas portas, não só pelas aulas, mas porque decidi ir a fundo na exploração das fontes de conhecimento que me apresentavam. Segui uma recomendação do meu amigo Márcio Colmerauer: o que você tira do mestrado depende do esforço que você coloca nele. Quando um professor entregava o plano de aulas com a lista de referências bibliográficas, eu comprava todos os livros que conseguia encontrar. Os livros em inglês eram os mais fáceis: esses eu comprava no site da Amazon americana. Pouca gente sabe que a Amazon vende livros usados, que costumam ser muito baratos (cheguei a comprar livros por 1 ou 2 dólares). Eu comprava e lia tudo. E assim fui percebendo que, muitas vezes, a aula do professor era só uma versão diluída e altamente simplificada de um assunto riquíssimo. Foi assim que descobri autores como Geert Hofstede, o psicólogo social holandês, criador da teoria das Dimensões Culturais. Seu livro Culturas e Organizações: O Software da Mente explica, com base em estudos estatísticos de décadas, como adquirimos a cultura e como essa cultura produz as diferenças que observamos entre os países. Descobri também Peter Drucker (A Sociedade PósCapitalista), Douglass North (Institutions, Institutional Change and Economic Performance), Michael Porter (Competitive Strategy) e muitos outros que não caberiam aqui (mas estão listados na bibliografia no final deste livro). Um dia, pegando carona de volta para casa com o Prof. Marco Túlio, descobrimos que morávamos em prédios colados – literalmente, se eu abrir um buraco na parede da minha sala caio quase dentro do apartamento dele. Fomos nos aproximando; de vez em quando íamos caminhar na praia e um dia levamos nossas filhas – que são quase da mesma idade – para brincar. Eu ia com frequência ao seu gabinete na FGV trocar ideias e falar de projetos e política.

Em pouco tempo nos tornamos amigos, e a amizade passou a envolver nossas famílias. Marco e sua esposa, que também era professora da FGV, tinham comprado uma propriedade em Araras que reformaram totalmente, com a intenção de montar um centro de estudos e conferências. Passamos lá vários finais de semana regados a vinho e boa conversa. Nossas filhas ficaram amigas e iam com frequência brincar na casa uma da outra. Também nos encontrávamos em nossas casas para almoços e jantares, e Marco e sua esposa sempre ouviam com curiosidade meus relatos sobre o Novo. Aqui cabe uma observação: a esposa do Marco tinha uma visão do mundo nitidamente social-democrata e progressista – de esquerda – e identificação com pautas conflitantes com o ideário que eu construía no Novo, o que, muitas vezes, me colocava em situações difíceis em nossas conversas. A esposa do Marco também era professora do mestrado. Seu nome era Carmen Migueles.     No domingo, dia 16 de fevereiro de 2014, fizemos o primeiro Dia do Novo, um evento de rua nacional que acontecia simultaneamente em várias cidades, para coleta de fichas de apoio. Nessa altura, já tínhamos cerca de 346 mil certidões e mais de duzentas mil fichas em processo de certificação. Finalmente, em julho, o partido dava entrada com o processo de registro no TSE, apresentando mais de 500.000 assinaturas certificadas. Agora era esperar. No dia 16 de agosto, realizou-se a primeira Reunião Nacional do partido em São Paulo, no Renaissance Hotel Marriot, na Alameda Santos. Fui convidado para fazer uma das palestras e aceitei com prazer[36]. Subi ao palco de terno e abri meu coração: Vocês não sabem a emoção que eu sinto de estar aqui hoje. Eu não sei como estou conseguindo falar [...] conheço algumas pessoas que estão envolvidas no

projeto do Novo há bastante tempo. Eu me lembro de uma reunião, em uma sala do Rio de Janeiro, há três, quatro ou cinco anos atrás, três ou quatro pessoas ao redor de uma mesa, falando sobre mudar o Brasil [...] por que a gente não cria um partido? Mas, para criar um partido, precisamos de 500 mil assinaturas [...] e cá estamos nós com as 500 mil assinaturas.

Em seguida, fiz agradecimentos: Eu queria fazer um agradecimento sincero ao João, que é um cara de coragem cívica e disposição espetaculares, e queria agradecer também à Rosa, que teve um papel enorme nesse projeto.

Agradeci ao Marcos Alcântara, ao Cristian Lohbauer e ao Fábio Ribeiro, e entrei no assunto principal: Temos duas formas de descrever o Novo. Uma forma é dizer que ele é um movimento de cidadãos que estão insatisfeitos com o país e querem mudanças profundas. Uma outra forma de descrever o Novo é dizer que ele é o único partido político do Brasil, existente ou em formação, que está sendo criado sem o envolvimento de nenhum político.

A plateia aplaudiu, eu respirei fundo, andei para o lado direito do palco e continuei a falar das ideias e propostas do partido. A atração principal do evento foi Bernardinho. Durante muito tempo, João teve a esperança, que chegou a virar expectativa, de que Bernardinho fosse o candidato do Novo na primeira eleição para o Executivo (que provavelmente seria em 2016). Não existe nada mais imprevisível do que política, mas eu acho que Bernardinho teria sido um bom candidato. No dia seguinte, 17 de agosto, um domingo, foi realizada uma reunião interna com pessoas que estavam organizando o partido em vários estados. A reunião foi marcada por muita discussão e debates, alguns bastantes acalorados, sobre a autonomia que os diretórios teriam após a formalização do partido pelo TSE. Lembro que dois dos participantes mais interessados nessa questão eram Patrícia Bueno, filiada ao Novo de São Paulo – que seria candidata a deputada em 2018 – e Rodrigo Saraiva Marinho, do Ceará. Os dois – principalmente Rodrigo – subiram a temperatura da discussão, resistindo com firmeza ao que identificavam como uma centralização excessiva na estrutura do partido. Foi nesse evento que conheci Hélio Beltrão.

Hélio, cujo nome completo é Hélio Marcos Coutinho Beltrão, é filho de Hélio Beltrão, que foi ministro do Planejamento em 1969 e ministro da Previdência de 1982 a 1983. Mas o Hélio pai ficou mesmo conhecido como o primeiro ministro da Desburocratização do Brasil, de 1979 a 1983. Isso o tornou extremamente popular; me lembro de suas aparições na TV anunciando medidas de combate à monstruosa burocracia deste país, que até hoje nos afoga. Hélio Beltrão, o filho, participa da luta pela liberdade no Brasil. Além de fundar e ser membro do conselho consultivo do Instituto Millenium, fundou e preside o Instituto Mises Brasil e a editora LVM. Desde nosso primeiro encontro, sempre esteve à disposição para ajudar com o projeto do Novo. Foi com Hélio e com o Rodrigo Constantino que tive minhas primeiras aulas sobre Liberalismo (e Libertarianismo).    

No dia 25 de agosto, Christian Lohbauer veio ao Rio, e fui encontrá-lo no Copacabana Palace. Tomamos um café e falamos sobre a estratégia do Novo e os desafios que nos aguardavam. A impressão que tive do Christian sempre foi a melhor possível – talentoso, bem-informado, preparado e bem-intencionado.     No dia 11 de setembro, fizemos uma reunião geral do Novo Rio de Janeiro no Clube Israelita Brasileiro, com o salão completamente lotado. Foram 334 convidados previamente registrados e outros tantos que se registraram na hora. Eu abri o evento, e João falou depois de mim. Foram estas as palavras que usei na abertura: Bem-vindo ao NOVO   Obrigado por sua presença na Reunião Geral do NOVO Rio de Janeiro.   O NOVO defende uma democracia republicana com economia de mercado, gestão pública de qualidade e verdadeira representação eleitoral. Acreditamos

que o indivíduo é o único gerador de riquezas. Defendemos uma visão de longo prazo. Acreditamos nas liberdades individuais, e não do Estado babá, que precisa interferir na vida dos cidadãos a todo momento. Acreditamos na igualdade de todos perante a lei. Somos contra todos os privilégios.   Acreditamos na simplificação da legislação. Acreditamos no livre mercado com o mínimo de intervenção estatal. O Estado deve oferecer excelência nos serviços essenciais – saúde, educação, segurança e justiça. Acreditamos na necessidade de redução da carga tributária, que esmaga o cidadão e sufoca a economia.   Criamos um partido diferente, com ficha limpa também para filiados, onde dirigentes partidários não podem ser candidatos para que não usem o partido em benefício próprio, e onde os candidatos só podem ser reeleitos uma vez para o mesmo cargo. Um partido criado sem o envolvimento de nenhum político – para que pudéssemos pensar como cidadãos, sem a influência de nenhum outro interesse além de entregar um país melhor aos nossos filhos.   Porque a política, antes de tudo, tem que fazer sentido. Porque democracia não é suficiente; é preciso cidadãos que sejam dignos dela – e é preciso ter esses cidadãos no poder.   Todos são bem-vindos.      

Eu continuava produzindo grande quantidade de textos sobre o partido, que postava no blog e no Facebook. Um dia um dos meus textos foi comentado por Stephen Kanitz. Ele era um ídolo, um guru dos negócios –o responsável pela edição anual das Melhores e Maiores da revista Exame, que listava as empresas brasileiras com melhor desempenho a cada ano. Imediatamente mandei uma mensagem pelo Facebook, trocamos telefones e eu liguei para ele no dia 17 de setembro. Ficamos mais de duas horas falando sobre o projeto do Novo. Stephen fez várias sugestões inovadoras e originais. Ele tinha um cadastro com mais de dois mil nomes dos melhores executivos e profissionais de negócio do país – por que não os convidar a formar uma tropa de elite para ajudar o Novo? Ele chamava essa tropa de Equipe 2.000. Outra ideia interessantíssima era a transformação do Senado; os estados passariam a ser representados lá por seus vice-governadores, e não mais por senadores eleitos

para isso. Naquela época, Stephen já tinha também uma grande preocupação com o ativismo judicial. Stephen ficava em São Paulo, onde o João passava a semana. Liguei para o João e agendei um encontro dele com o Stephen. Eles conversaram, mas não houve nenhum resultado imediato. Eu encontraria Stephen pessoalmente só muitos anos depois, em uma visita sua ao Rio. Presenteei-o com um exemplar do meu primeiro livro, Ou Ficar A Pátria Livre, e ganhei um boné verde bordado com letras brancas que formavam a frase “Make South America Great Again”.     No dia 22 de setembro de 2014, João foi o convidado do evento Fashion Monday, que o Alexandre Borges organizava na Livraria Cultura do shopping Fashion Mall, e no dia 30 organizamos outro evento no teatro do Fashion Mall, com 307 pessoas na plateia. Eu fiz a abertura, João falou em seguida, e depois falaram Rodrigo Constantino e o advogado, político e amigo Rodrigo Mezzomo.      

É fácil criticar as posições do passado com o olhar privilegiado do futuro. O fato é que, nas eleições de 2014, Aécio Neves era a grande esperança dos brasileiros que não aceitavam outro mandato presidencial nas mãos da esquerda. Era Aécio ou Dilma – e muita gente, eu inclusive, fez campanha para Aécio, discutiu com amigos e parentes e entrou, pela primeira vez, em batalhas nas redes sociais por causa da política.   No início de outubro, eclodiu um debate interno: o Novo deveria ou não se posicionar nas eleições presidenciais? Finalmente, o diretório nacional fez uma consulta aos líderes do partido sobre uma eventual manifestação de apoio do

Novo à candidatura de Aécio Neves. O líder de Rondônia foi a favor: “Não podemos cogitar a possibilidade de um quarto mandato do PT”, disse ele em um e-mail de 9 de outubro. Outro líder, do Rio Grande do Sul, foi contra: “Voto no Aécio e faço campanha para ele. Mas não vejo o que teremos a ganhar ao declarar apoio. Sou contra. Radicalmente contra!”. Eu respondi: “Nem tudo o que fazemos é porque vamos ganhar alguma coisa com isso. Terrível vai ser não fazer nada e a Dilma ganhar”. Um líder de Santa Catarina disse: “Acredito que perderíamos mais credibilidade ainda se nos mantivermos calados neste momento tão importante”. O jornal O Dia oferecera ao João a possibilidade de publicar um artigo na sua página de Opinião, na edição de domingo. João me perguntou se eu tinha interesse, e eu enviei um texto, que foi publicado por O Dia em sua edição de 5 de outubro de 2014[37]: A Fraude do Radicalismo   Nessa época é comum ver o político de punho fechado. “É preciso mudar o que está aí”, ele diz. “É preciso uma mudança radical”.   O Brasil está cheio de radicais, de pessoas comprometidas com a mudança. O que importa é ser intransigente e esbravejar.  São os radicais da piada pronta, sem preparo e sem entendimento de como funciona o mundo. “Vamos parar de pagar a dívida pública”, anuncia um deles, sem saber que o dinheiro que tem na poupança faz parte desta dívida.   Os radicais fizeram uma Constituição que nos garante inúmeros direitos, e o país continua violento, injusto, corrupto. Proclamam-se como sagrados nossos adolescentes, que não podem ser presos ou punidos, mas podem mendigar pelas ruas e crescer em reformatórios. Nossos legisladores radicais, incapazes de legislar, nos legaram um Código Penal que permite que assassinos andem livres, uma Justiça que leva décadas para julgar, e leis trabalhista e tributária campeãs mundiais de complexidade, atraso e injustiça social.   Escolhemos representantes sem nenhum critério. Elegemos indivíduos só porque foram bons esportistas, ou estiveram no BBB, ou são filhos de caciques políticos. Elegemos garotos que nunca tiveram um emprego, nunca souberam o que é um chefe – gente que nunca emitiu uma nota fiscal, varreu uma sala, ensinou uma matéria ou cuidou de um paciente.  

São esses radicais que criaram a lei que regulamenta as mesas de sinuca dos botecos de São Paulo. São eles que querem proibir a importação de publicações estrangeiras. São eles que resolveram trocar todas as tomadas do país. São eles que inventam as regras e regulamentos que complicam nossa vida. É por causa deles que somos achacados por fiscais, guardas de trânsito e burocratas corruptos. São eles que comem caviar nos jatinhos da FAB.   O verdadeiro radicalismo é reduzir o desperdício de dinheiro público, o número de cargos comissionados, a carga tributária, o salário dos parlamentares, o número de leis. É diminuir a burocracia e aumentar a competição entre as empresas, reduzindo preços para o consumidor. É garantir a plena cidadania e a igualdade de todos perante a lei, com uma polícia que nos proteja e uma Justiça que resolva nossos problemas rapidamente.    É acabar com o voto obrigatório, para que o voto seja um gesto voluntário e consciente.   Porque política não é profissão, mas uma missão de serviço ao país a ser cumprida por quem tem a seriedade, a competência e a determinação necessárias.    O resto é pura fraude.

    A votação do primeiro turno das eleições presidenciais foi no mesmo dia em que o artigo foi publicado. Dilma teve 41,59%, Aécio ficou em segundo com 33,55% e Marina Silva em terceiro com 21,32%. Haveria segundo turno.   No dia 10 de outubro, o diretório nacional resolveu divulgar a seguinte nota no Facebook: "O povo brasileiro, nas últimas décadas, obteve duas conquistas importantes: um Estado democrático com as instituições de direito e a estabilidade econômica. Há ainda uma terceira conquista fundamental a ser alcançada: a redução do tamanho e da interferência do Estado, devolvendo maior autonomia e liberdade ao cidadão. Somente desta forma teremos um ambiente menos propício à corrupção, permitindo maior geração de riquezas e melhor qualidade de vida para todos. Gostaríamos muito de ir às urnas para eleger um candidato que se comprometesse com esta proposta. Infelizmente, no Brasil, essa iniciativa não é defendida de forma clara e com convicção por nenhum dos partidos políticos existentes – e por isso o NOVO está sendo criado. O momento, portanto, não é de avanços, mas deve ser, ao menos, de preservação. A democracia brasileira e

o poder de compra da nossa moeda estão cada vez mais ameaçados por um governo que adota uma ideologia ultrapassada, é péssimo gestor e tem como objetivo se perpetuar no poder a qualquer custo. Nesta situação, não podemos nos omitir. O projeto do PSDB não é o projeto do NOVO, mas preservar as conquistas obtidas é fundamental para progredirmos e implementarmos o modelo em que acreditamos. No dia 26, vamos manifestar o nosso descontentamento com o que vivenciamos nos últimos anos. Vamos votar no candidato da oposição ao atual governo e continuar trabalhando arduamente para tornar as ideias do NOVO conhecidas, entendidas e aceitas, transformando o Brasil em um país admirado."

  No dia 24 de outubro, uma pesquisa feita pela revista Isto É e pelo instituto Sensus mostrava Aécio Neves com 54% das intenções de voto, contra 45% da Dilma. No dia da votação do segundo turno, fomos às urnas cheios de esperança. Votei de manhã cedo. No início da tarde, o clima era de euforia contida; rumores nas redes sociais diziam que Aécio já providenciava um jatinho para se deslocar para Brasília e comemorar a vitória. Muitos já ensaiavam uma celebração pela derrota do PT. Mas, quando os resultados foram anunciados, Dilma Rousseff tinha sido reeleita com 51,64% dos votos. A reeleição da Dilma seria a gota d’água para muitos de nós. As perspectivas para o futuro eram, mais uma vez, desastrosas. Havia genuíno desespero nas pessoas. Lembro que, ao final de um dos eventos no Fashion Mall, uma senhora – esposa de um de nossos companheiros – veio falar comigo, agitada: “Vocês precisam ir para Brasília urgente!”. Mas o partido ainda não tinha nem o registro.     No dia 29 de outubro, João e eu voltamos ao Fashion Mall para nova apresentação, e dessa vez o convidado especial foi Alexandre Borges, que falou sobre doutrinação cultural. Na hora das perguntas alguém mencionou o momento desesperador que o Brasil vivia, sofrendo uma “infiltração do mal” em todas as instituições – um sentimento parecido

com o que existe hoje, enquanto escrevo este livro, em meio a uma pandemia e mais uma crise política. Foi assim que respondi[38]: O Brasil não vai acabar amanhã. O Brasil não vai acabar. O Brasil é muito maior do que o PT, vocês são muito maiores do que o PT. O que a gente encontra no nosso dia a dia do Novo de gente inteligente [...] do jeito que tem infiltração do mal, tem infiltração do bem. Todo dia eu recebo um e-mail de um cara da Receita Federal, do Ministério Público, da Polícia Federal. As pessoas de bem estão em todos os lugares. Talvez elas estejam com medo [...] A gente só precisa fazer essa coisa acontecer.  

Em seguida, alguém fez uma pergunta sobre doutrinação cultural e o que fazer para esclarecer as pessoas mais humildes, evitando que caiam nas falácias divulgadas pela esquerda. Sobre isso eu fiz o seguinte comentário[39]:  [...]estudei em um colégio tradicional no Rio de Janeiro. Na semana passada eu bati boca com uma ex-colega de colégio [...] ela comentou um post meu e disse “concordo com tudo isso que você falou, mas para mim socialismo é a gente querer que todo mundo tenha a mesma oportunidade”. Eu disse para ela: “Querida, isso é solidariedade. Você está confundindo. Socialismo é quando todos os meios de produção pertencem ao Estado”. É como o Alexandre (Borges) falou: esse combate está na hora da gente fazer no dia a dia. Chegou um amiguinho com camiseta do Che Guevara, não dá mais para dar aquele sorriso condescendente e deixar para lá, porque eu não vou me indispor com o cara. Tem que sentar o cara aqui e [perguntar] você sabe quem é [Che Guevara]? Você já foi a Cuba?

Sem que eu percebesse, as questões dos valores morais e da guerra cultural começavam a entrar no meu radar.  

Capítulo 9 Da Alemanha à Tijuca No meio de 2014, fizemos um contato com a Fundação Friedrich Naumann, ligada ao Partido Democrático Liberal alemão (FDP), através de sua então presidente, a gentilíssima Beate Forbiger. A Naumann era conhecida por apoiar organizações liberais brasileiras e patrocinar intercâmbio para entusiastas da liberdade. Fomos convidados a enviar um representante a um workshop sobre estratégia política que seria realizado na Alemanha, na cidade de Gummersbach. João sugeriu que eu representasse o Novo. A Naumann pagaria hospedagem e transporte, e eu pagaria uma taxa de 260 euros. Embarquei no dia 10 de outubro para Frankfurt e de lá peguei um trem para Colônia, onde me esperava um carro para me levar até Gummersbach. Era a minha primeira visita ao país, e a Alemanha foi uma surpresa para mim: o país parecia uma versão melhorada dos Estados Unidos. A organização, a beleza dos lugares – tanto na zona rural quanto nas cidades –, a limpeza, a variedade dos hábitos, tudo me impressionou. As estradas eram absolutamente perfeitas. Os banheiros públicos, impecáveis. As casas, grandes e pequenas, eram bem cuidadas nos mínimos detalhes. Era inimaginável pensar que aquele país tinha sido arrasado pela guerra. O workshop foi conduzido pelo alemão Wulf Pabst e pelo sul-africano Nick Clelland, que começaram do básico, explicando os fundamentos da atividade política até chegar ao planejamento estratégico. As três dezenas de participantes – vindos das Filipinas, Mongólia, Costa do Marfim, Índia, Tibet, Rússia, Jordânia, África do Sul, Indonésia, Kosovo, Honduras, Paquistão, Zimbabwe, Bulgária, Ucrânia, Malásia e Guatemala – eram divididas em

grupos para a realização de diversos trabalhos e exercícios, que deveriam evoluir até o trabalho final, quando todos se engajariam na preparação do plano estratégico para um partido político. E aí é que estava a cereja do bolo: cada um dos participantes faria uma exposição sobre o partido ao qual pertencia, para que um deles, e somente um, fosse escolhido para ter seu plano estratégico formulado pelo grupo. Adivinhem qual foi o partido escolhido? Foram dias em que aprendi que muitos dos nossos problemas e questões, que achamos que são específicos do Brasil, são, na verdade, problemas de todos os países – são os problemas da política, questões universais de aquisição, manutenção e uso do poder. Sentávamo-nos todos os dias em uma enorme mesa em formato de “U”. No meu lado esquerdo se sentava Mian Imran Masood, do Paquistão, e no lado direito Thomas Walters, da África do Sul.  Se você acha a política brasileira complicada, imagine a do Paquistão. A África do Sul tem problemas parecidos com os nossos, especialmente a criminalidade, que lá é tão grave ou pior que no Brasil. Meus dois vizinhos de mesa eram gente finíssima, mas, enquanto Thomas era discreto e quase tímido, Mian tinha a autoconfiança e a postura de quem tinha uma posição poderosa e uma carreira promissora – ele já havia sido ministro da Educação e da Saúde do Punjab. Quando conheceu a minha história, passou a me chamar jocosamente de “El Presidente”. Durante o processo de escolha do partido para o qual prepararíamos a estratégia, cada um falou de seu partido e do contexto do seu país. Uma das maiores satisfações que tive na vida foi explicar àquele grupo quem era Lula (que

ainda era considerado, pela maioria dos que estavam ali, como quase um santo). A Fundação Friedhich Naumann fora criada após a Segunda Guerra Mundial. Todos os partidos alemães têm uma fundação. Existe orçamento no parlamento alemão para as fundações dos partidos políticos. O desembolso dos recursos é baseado na média dos resultados das últimas quatro eleições. Como eu era membro de um partido que trabalhava pelo fim do financiamento público de partidos, foi interessante saber que o Estado Alemão via nesse financiamento um instrumento importante de manutenção do sistema democrático. Conversando com um membro do FDP, o Partido Democrático Liberal alemão, falamos do papel do Estado e de como é complicado atingir um equilíbrio. Eu perguntei em que ponto o Estado alemão ainda poderia se aprimorar. Para minha surpresa, sua resposta foi que a polícia poderia ser melhor. “Hoje, se você é vítima de um crime ou delito que eles consideram menor – alguém roubou um objeto seu, por exemplo –, eles não dão muita importância, pouca coisa acontece”. Eu falei sobre os 57.000 assassinatos anuais no Brasil, os 92% de inquéritos de homicídios que não apontam culpados e os 2% de investigações de assaltos que são solucionados. O queixo dele caiu. Fiquei surpreso ao constatar que o termo liberal não parecia ter o mesmo significado para todos que estavam ali. Conheci naquele grupo vários liberais que eram políticos profissionais, sempre com cargos no governo, o que afrontava o conceito de liberalismo que pregávamos na época. Uma das coisas que anotei, e jamais esqueci, foi uma observação de Nick Clelland, que era membro do partido Aliança Democrática da África do Sul: "Nosso desafio é descobrir como gerenciar um partido político liberal, onde cada um tem sua opinião e cada um quer decidir os

destinos do partido. Precisamos investir menos energia e esforço lidando com nossos membros e focar mais no cidadão que vota ou pode votar em nosso partido”. Eram palavras proféticas.       De volta ao Brasil, no dia 13 de novembro de 2014 realizamos nosso primeiro evento fora da zona sul, no Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro – ISERJ[40] –, na rua Mariz e Barros, na Tijuca. O evento só foi possível graças a uma autorização especial para que usássemos o auditório do instituto. O auditório era gigantesco – era, na verdade, um enorme teatro, com um palco espaçoso e alto. Minha primeira preocupação foi: como vamos encher todas essas cadeiras?   Aquela apresentação foi um marco. Por incrível que pareça, havia muita resistência por parte de algumas pessoas em sair da zona de conforto do Leblon e bairros vizinhos. Ir à Tijuca foi um ato de ousadia (e já estávamos até planejando a próxima apresentação em Irajá). Além disso, faríamos uma apresentação em uma instituição pública dominada – como quase todas eram, e ainda são – pela mentalidade do Estado onipresente, a quem tudo cabia resolver. E se a turma da esquerda resolvesse atrapalhar? E se desse confusão? Fomos à Tijuca preparados para o pior. Foi na palestra do ISERJ que incorporei uma dica que Fábio Ribeiro havia me dado ao assistir o vídeo de uma das primeiras versões da minha apresentação. Ele tinha dito: “Motta, você fala bem, mas o tom está muito negativo. As pessoas chegam ao final desanimadas”. Ele tinha razão; a partir daí entendi que, quando as pessoas te dão licença para que você entre momentaneamente na mente e no coração delas, é importante que você deixe uma mensagem de esperança. Até hoje sou grato ao Fábio pela lição.

Quatrocentas pessoas se inscreveram para o evento do ISERJ, vindas de vinte municípios diferentes. Uma pesquisa feita no momento da inscrição indicou que, na opinião dos inscritos, os principais problemas do Brasil eram corrupção, educação e impunidade. Convidei vários membros do grupo para subirem ao palco e dizerem algumas palavras. Lembro que Rafael Hollanda e Marco Paulo Costa falaram. A abertura foi feita pelo Andrew Hancock: Eu sou voluntário, meu nome é Andrew. Estou como membro do diretório do Rio de Janeiro como voluntário. Sou profissional liberal. Estou muito feliz de fazer parte desse novo instrumento para a gente fazer política da forma correta no Brasil que é o Novo. Queria trazer ao palco Roberto Motta, presidente do diretório do Rio de Janeiro.

Subi ao imenso palco um pouco nervoso, vestindo a camiseta branca do Novo e uma calça jeans. Atrás de mim, os slides eram projetados em uma tela gigante. Comecei a falar com a mão esquerda no bolso da calça. Entre outras coisas, eu disse: A mensagem do Novo é muito simples. Ela não é nenhuma ideia revolucionária e não envolve nenhuma ideologia exótica criada por homens barbudos do século passado. A mensagem principal do Novo se resume em duas ideias. A primeira é que política não é negócio. Política não é meio de enriquecimento. Política é uma forma de servir à comunidade. A segunda ideia é que políticos e administradores públicos precisam ser competentes. Essas são as duas coisas mais importantes desta apresentação. E para explicar o porquê dessas ideias eu queria contar para vocês a história de duas mulheres. Duas Marias.

Na tela atrás de mim foi projetado um slide com a foto antiga de uma mulher, aparentando entre 30 e 40 anos, cabelo preto cortado curto e usando um vestido branco. Eu continuei: Ela nasceu em 1886 em Mariana, no interior de Minas Gerais. Ela nasceu durante a administração do presidente Prudente de Morais, terceiro presidente da República do Brasil. Levava uma vida humilde. Tinha um pedaço de terra que ela cultivava com o marido. Em 1926 Dona Maria teve o seu quinto filho. A família fabricava tijolos em uma olaria caseira, colocava os tijolos em lombo de burro e saía vendendo pelo interior de Minas. Dona Maria foi uma mãe dedicadíssima. Depois da Segunda Guerra Mundial, foi lançado no Brasil o primeiro antibiótico, a penicilina, que era anunciado como remédio milagroso.

Dona Maria não sabia direito o que era aquilo. Mas ela juntou o dinheiro que tinha em casa e levou os cinco filhos para tomar uma injeção de penicilina [...] O filho caçula de Dona Maria era o meu pai.

Contei um pouco da história da minha família, do Brasil de quando eu era jovem, da minha ida para os EUA e de como isso tinha mudado a minha cabeça, e voltei ao tema central: Aqui entra a função principal do Novo: ser um instrumento de participação do cidadão comum na política. Vamos selecionar, preparar e eleger pessoas cujo único compromisso é com o bem-estar da sociedade. Nós somos contra o político profissional. Política é coisa para amadores. Na definição da palavra amador: aquele que ama. Que ama sua família, que ama sua cidade, que ama o seu país. O Novo foi criado para que esses cidadãos amadores, sérios e trabalhadores tenham uma chance na política. Acreditamos que a liberdade precisa ser respeitada. A liberdade de ir e vir em paz, a liberdade de se expressar, de ter sua casa protegida, liberdade para dormir tranquilo de noite.

Falei das ideias e propostas, do estatuto do partido, e depois perguntei: “Vocês lembram que eu disse que ia contar a história das duas Marias?”. Nesse momento foi projetado de novo o slide com a foto da minha avó. A primeira foi Dona Maria José, minha avó que morreu muito antes de eu nascer. A única coisa que a família tem dela é essa foto.

O slide na tela mudou: agora era projetada uma foto recente de uma garotinha sorridente, em um vestido rosa e roxo. A segunda Maria é a minha filha, Maria Fernanda. Ela tem quatro anos, e foi por causa dela e do seu irmão que eu me envolvi no projeto do Novo.    

Quem também falou, pela primeira vez, foi Leonardo Fiad. Excepcional é uma palavra que serve bem para descrever o Leo. Ele assistira às apresentações no Shopping Leblon e no Hotel Marina, e acabou pegando o meu contato em uma apresentação no Shopping da Gávea. Aos poucos foi se integrando às nossas atividades, sempre muito tranquilo – tranquilidade é outra palavra que descreve o jeito zen do Leo e que disfarça seu imenso preparo, cultura e inteligência. Eu não tinha a mínima ideia do que ele fazia. Era muita gente, muita agitação e muita adrenalina ao meu

redor, e eu não conseguia acompanhar tudo. Até que, no dia do evento do ISERJ, fiquei surpreso com o que ele disse. Um dos problemas que ainda tínhamos era a falta de pessoas suficientes para responder às perguntas que eram feitas sobre o partido no Facebook. Pedi ao Leo então que preparasse um “FAQ” – um texto com as perguntas mais comuns e suas respostas.  Quando eu recebi o texto, fiquei chocado: o texto do Leo era perfeito, não só no estilo, na clareza e na didática, mas no entendimento de todos os conceitos e princípios. Imediatamente convidei Leo para almoçar. Nos encontramos no restaurante que fica no subsolo do edifício do Clube de Engenharia, na Av. Rio Branco. E naquele almoço eu descobri que o Leo – com sua cara de garoto, aparentando vinte e poucos anos – era advogado e tinha um cargo importante. Iniciamos uma amizade que logo incluiu nossas famílias – sua esposa Andreia Oliveira, empreendedora e empresária, foi também participante ativa do Novo, coordenando várias atividades como o Grupo de Trabalho sobre Liberdade Econômica e Competitividade. Nossa amizade dura até hoje e, agora, inclui o Guga.  

  Pouco depois o grupo de estudos do Novo divulgava a primeira lista de livros recomendados para os filiados iniciantes: 1. 2. 3. 4. 5. 6.

A Lei, de Frederic Bastiat A Anatomia do Estado, de Murray Rothbard As Seis Lições, de Ludwig von Mises Economia numa Única Lição, de Henry Hazlit A Mentalidade Anticapitalista, de Ludwig von Mises O Caminho da Servidão, de Friedrich von Hayek

 

  Com o apoio da Fundação Naumann, decidimos organizar um Seminário de Formação de Multiplicadores do Novo, com o objetivo de promover uma melhor integração do nosso grupo no Rio. O evento foi realizado no final de semana de

22 e 23 de novembro, nas salas Arcos da Lapa e Corcovado do Novotel Santos Dumont, na Av. Marechal Câmara, no centro da cidade. O seminário foi conduzido por um consultor especializado, um ser humano excepcional e grande conhecedor da boa política, chamado Marcelo Puppi, que nos deixou precocemente no início de 2021. Marcelo, que veio a ser eleito prefeito de Campo Largo, no Paraná, em 2017, combinava experiência, didática e capacidade de emocionar. Umas vinte pessoas participaram do seminário, que incluía dinâmicas e exercícios e deu a cada um a oportunidade de se expressar e conhecer os outros. Enquanto Marcelo Puppi operava sua mágica, eu tirava fotos. Em um determinado momento, Marcelo parou o que estava dizendo, fez uma pausa na frente do grupo, olhou na minha direção e disse: “Já mediei muitos eventos como esse, mas nunca vi um líder que tirasse fotografias de sua equipe”. Querido Marcelo, hoje eu posso dizer: na minha longa estrada nos negócios e na política, eu nunca vi alguém conduzir reunião ou seminário com tanta sensibilidade como você. Vá com Deus, meu amigo. Sugerimos ao diretório nacional adotar o modelo de seminário do Marcelo Puppi em outras cidades. No dia 15 de dezembro de 2014, fui convidado para uma reunião do diretório em São Paulo com a presença do Marcelo e da Beate, para discutir o assunto. Estavam presentes João, Marcos Alcântara, Fábio Ribeiro, Christan Lohbauer e Bia Gentil. Por alguma razão, a ideia não vingou.     Em novembro, a revista Veja publicou uma entrevista com João nas suas famosas Páginas Amarelas – a primeira seção da revista –, ilustrada com uma foto grande e a citação: “Nossos filiados, uma vez no poder, terão como missão reduzir o poder de quem lá chegou, como eles”.

    No dia 17 de novembro, recebi um e-mail de Ricardo Guadagnin, empresário de Cabo Frio. Era meu primeiro contato com o grupo que iria, um dia, criar o núcleo do Novo na cidade.     Eu trabalhava no meu computador uma noite, já no final do ano de 2014, logo após a reeleição de Dilma, quando recebo um e-mail de um Procurador de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro. Gelei. A primeira coisa que me veio à cabeça foi: o que é que eu fiz de errado? Meu interesse principal já era segurança pública, e eu frequentemente publicava artigos com críticas ao sistema de justiça criminal. Fiquei preocupado. O e-mail solicitava uma reunião comigo. Marcamos encontro em um restaurante do Fashion Mall. Pedi ao Marcus Moraes que fosse também, por segurança (vai que o Procurador me prende). Cheguei ao restaurante com medo e apreensão. Quebrado o gelo, conversa aqui, conversa ali, eu descubro, surpreso, que o Procurador de Justiça do Ministério Público, Marcelo Rocha Monteiro, tem exatamente a mesma visão que eu tenho sobre a crise da segurança brasileira, e uma posição moral idêntica. Ele se surpreendeu também que um engenheiro civil e político amador entendesse alguma coisa sobre segurança pública. Da surpresa mútua nasceu uma parceria e uma amizade que se mantém até hoje. Já fizemos dezenas de palestras por todo o país, explicando a realidade do sistema de justiça criminal brasileiro. Além de Procurador de Justiça, Marcelo é professor de Direito há mais de vinte anos, apreciador de ópera e de Frank Sinatra, leitor voraz, intelectual formidável, palestrante de enorme talento – já vi plateias rolando de rir

com suas observações irônicas e mordazes – e um amigo de caráter, firmeza e disponibilidade inigualáveis. O encontro com o Marcelo é prova de que a política nos dá inúmeras oportunidades de descobrir pedras preciosas em meio à lama geral. É só prestar atenção e estar disponível. Eu sempre estou.     Alguns dias depois, Marco Túlio me convidou para uma visita ao BOPE. Meu colega de turma no mestrado da FGV, o major da Polícia Militar Maurílio Nunes – hoje tenentecoronel e comandante do BOPE – nos recebeu no dia 21 de novembro. Marco levou também na visita um grupo de amigos e ex-alunos dele: Augusto Sales, Ovídio Rovella e César Franco. Chegara a hora de começar a preparar a dissertação do mestrado. Conversei com Marco e ele me recomendou adotar Carmen como orientadora oficial.       No final de 2014, o diretório do Novo no Rio de Janeiro tinha, provavelmente, o maior grupo de apoiadores entre todos os diretórios: aproximadamente 200 pessoas, altamente motivadas, algumas muito qualificadas, participando das atividades partidárias. Era, realmente, um partido de cidadãos comuns e sem caciques – um fenômeno inédito na política que despertava curiosidade, interesse, admiração e inveja. Eu adotei a prática de dar espaço nas apresentações para que outros falassem. Era preciso treinar nossos futuros políticos. Marcelo Rocha Monteiro era meu parceiro mais frequente, mas Leo Fiad, Manu Lane, Márcio Assis Brasil,

Marcus Werneck, Marcus Moraes, Rafael Hollanda, Marco Paulo Costa e outros subiram em palcos por todo o Rio para dar seu recado.     No dia 11 de dezembro, João fez uma apresentação em Natal, no Rio Grande do Norte.     Marco Túlio e Carmen Migueles nos convidaram para um final de semana em Araras. Fui à peixaria que fica ao lado do Forte de Copacabana, no Posto 6, e comprei mexilhões, camarões, lulas e uma garoupa inteira. No sábado, na cozinha de Araras, juntei tudo em uma panela e preparei uma mariscada. Depois fomos tomar banho no rio que cruzava o terreno deles. No dia 1º de janeiro de 2015, Dilma Rousseff tomava posse de seu segundo mandato.       No dia 21 de janeiro, fizemos uma apresentação no Clube Israelita Brasileiro. Os apresentadores foram eu e Marcus Moraes, e a abertura foi feita por Manu Lane[41]. Manu dava treinamento para um grupo de estudantes que teriam a missão de divulgar o Novo nas escolas e universidades, além de organizar outro grupo de oratória. Aqui vem uma história curiosa. Marcus Moraes foi responsável por uma das startups mais bem-sucedidas do mercado de venture capital no Brasil, uma empresa de data center que ele fundou com um sócio – Sidney Breyer, outro cara sensacional – e que foi vendida por milhares de vezes o

valor do investimento original. Marcus tirou então dois anos sabáticos, que dedicou à leitura e ao estudo, principalmente dos pensadores liberais. Marcus me foi apresentado pelo Felipe Dias em uma reunião no dia 10 de março de 2014. Logo na primeira conversa já percebi que Marcus seria uma grande adição ao projeto do Novo, e marquei uma reunião para apresentá-lo ao João. Para minha surpresa, decepção e (confesso) um pouco de vergonha, João não demonstrou nenhum interesse na conversa, e a reunião foi curta e embaraçosa. Marcus continuaria interessado, ajudando e contribuindo muito sempre que podia. Através dele conheci o publicitário Bruno Dreux e o cineasta Neto Favaron, que foi responsável pelas melhores imagens em vídeo de eventos do Novo e por minhas fotos em futuras campanhas políticas. Em 15 de agosto de 2014, Marcus me mandou um e-mail para que eu encaminhasse ao João. Nesse e-mail Marcus explicava a sua visão estratégica para o Novo e os desafios que deveriam ser enfrentados. Vale a pena citar aqui alguns trechos desse e-mail: Caro João Dionísio, Tenho plena convicção que a situação geral do Brasil é grave e se deteriora rapidamente, os problemas vão além da corrupção e violência endêmicas, inflação e baixo crescimento econômico, estes são antes as consequências de uma situação moral e política caótica que precisa ser detida antes que as bases da sociedade organizada, leia-se família, religião, alta cultura e império das leis, sejam solapadas de tal forma que a recuperação se torne virtualmente impossível em um prazo imaginável. Em minha opinião, tamanha desordem não aconteceu por acaso, não foi, em hipótese alguma, consequência de uma sucessão de fatos aleatórios e eventuais ações desconexas de agentes oportunistas, mas antes a ação consciente, coordenada e consistente de dezenas de grupos organizados, alinhados ideologicamente e com o objetivo de tomar para si, de forma duradoura, um poder totalitário ao qual não será possível reagir [...] Vivemos em uma sociedade hipnotizada que percebe os sintomas, entre os quais a corrupção que, não por acaso, é o mais notado, mas nem de longe imagina as suas causas e menos ainda tem ideia de para onde caminhamos [...] Urge opor este processo de forma enérgica e organizada. O Novo, na minha visão, deve ser, antes de tudo, um instrumento desta oposição. Para tal é necessário promover a coalizão ampla de todos os grupos que, mesmo com profundas diferenças de ideias, acreditem e desejem uma sociedade baseada na

liberdade individual, no respeito à propriedade privada e na limitação – esta clara e intransponível – da divisão e alternância do poder governamental [...] Ao enfrentar tamanho desafio não poderemos jamais nos utilizar do axioma básico da mentalidade revolucionária, à qual queremos combater, de que os fins justificam os meios. Portanto, que possamos agir até mesmo de forma ilegal quando se tratar de descumprir leis imorais, mas nunca, nunca ir de encontro à moral absoluta e universal que deve reger as ações dos homens de bem.

Marcus e eu discutimos também a criação de um “Foro do Rio de Janeiro” – em oposição ao Foro de São Paulo – que materializaria a ampla aliança a ser formada e liderada pelo Novo, em defesa da liberdade.    

Capítulo 10 As Assinaturas Se você quer fundar um partido, a captação de assinaturas de apoio é fundamental. É uma tarefa chata, trabalhosa, cara e até – como descobrimos – potencialmente arriscada. É sobre isso que vou falar agora. Se você não está interessado nesse assunto, pode pular este capítulo. Inicialmente foi feita uma tentativa de contratar empresas especializadas nessa atividade. Essa experiência inicial não foi bem-sucedida. O custo do serviço era alto, e a qualidade ruim. Acabamos descobrindo que, como ganhavam por assinatura coletada, muitos funcionários das empresas simplesmente forjavam assinaturas, o que fez com que o partido fosse intimado a prestar depoimento na Polícia Federal. Felizmente logo a polícia se deu conta de que o partido, na verdade, tinha sido a vítima[42]. Com isso, mudamos para um sistema misto: contratamos empresas com melhores credenciais, ao mesmo tempo que fazíamos operações de coleta de fichas com voluntários em todo o Brasil. Essas operações eram feitas geralmente em finais de semana, em locais de grande circulação. No Rio fizemos várias mobilizações nas ruas da praia, que são fechadas ao tráfego aos domingos (Av. Atlântica e Vieira Souto), na orla da Lagoa Rodrigo de Freitas, na Barra da Tijuca, na Praça Saenz Peña, nas saídas do metrô, na estação das barcas da praça XV, na Rodoviária e na estação de trens da Central do Brasil. Nessas operações um grupo de voluntários se revezava durante horas, abordando as pessoas que passavam. Era um trabalho que exigia paciência, desinibição e jogo de cintura. Às vezes, antes de assinar, a pessoa queria debater com você a situação do país e os detalhes do projeto do Novo. Ao contrário do que acontece hoje com, por exemplo,

o Aliança Pelo Brasil – um partido ainda em formação quando escrevo isso –, naquela época, ninguém conhecia o Novo. Para muita gente, parecia pilantragem. Em compensação, algumas regras da justiça eleitoral eram mais simples; por exemplo, os apoiadores – as pessoas que assinavam as fichas – podiam ser filiados a outros partidos, o que hoje é proibido. A assinatura de apoio era coletada através do preenchimento de uma ficha. Na parte de cima, estava escrito: Manifesto, assinando abaixo, meu apoio para a obtenção do Registro Legal do PARTIDO NOVO (a assinatura deste formulário não representa filiação partidária)

  A ficha tinha campos para nome do apoiador, nome da mãe, data de nascimento, e-mail, informações do título de eleitor (número, zona, seção, município e estado) e, claro, a assinatura. Logo descobrimos o óbvio: ninguém sabe o número do título de eleitor, nem o leva na carteira. Passamos, então, a pedir que a pessoa colocasse apenas seu nome completo e o nome da mãe. Com essas informações era possível, posteriormente, entrar no site do TSE – e mais tarde, em um sistema desenvolvido pelo próprio partido – e completar a ficha com o número do título, zona e seção Criamos uma versão da ficha com porte pago: era só preencher e colocar no correio, sem necessidade de selo. Além disso, todos nós fazíamos um esforço para coletar as assinaturas entre família, amigos e conhecidos. Eu andava com dezenas de fichas dentro da mochila.   Em fevereiro de 2011, já tínhamos um projeto piloto que coletava, em média, 2.500 assinaturas por dia. Ao longo do tempo, foram desenvolvidos métodos e abordagens que facilitavam o trabalho, e preparamos recomendações para

os voluntários que participavam das operações de coleta de assinaturas. Segue um exemplo dessas recomendações: Dicas de coleta Onde colher assinaturas: Entre amigos, parentes e conhecidos, e em locais onde você frequenta, como escola, trabalho, igreja, clube. Ao abordar, trate apenas de 1 ou 2 pontos. Você não precisa apresentar todas as diretrizes e programa do NOVO para que uma pessoa assine a ficha de apoiamento, apresente 1 ou 2 pontos que você acredite ser do interesse da pessoa e, em seguida, peça que ela assine a ficha. Tenha algumas fichas já assinadas. As pessoas se sentem mais seguras em assinar algo que já foi assinado por outras pessoas. Tranquilize a pessoa que está assinando. Se a pessoa ficar desconfiada ou preocupada em assinar uma ficha para um partido político, explique que o apoio não resulta em filiação e a tranquilize afirmando que a assinatura não acarreta nenhum compromisso com o NOVO. Não perca tempo. Se a pessoa parecer mais interessada em questionar ou discutir os pontos do programa ou em contra-argumentar, agradeça e procure outra pessoa. Não perca tempo discutindo ou apresentando detalhes do programa ou estatuto. Não se estresse. Ao conversar com várias pessoas, eventualmente você encontrará pessoas radicalmente contrárias ou mesmo pessoas que simplesmente te ignorarão. Não se preocupe com elas. Tente diversas alternativas e aprenda com seus erros. Apesar das dicas, cada pessoa tem mais facilidade para abordar pessoas de uma forma e pessoas diferentes respondem de forma diferente aos mesmos estímulos. Então, teste diversas formas de colher assinaturas e veja qual forma se encaixa melhor à sua personalidade e ao seu público-alvo. Tenha perseverança: Geralmente (e com razão), as pessoas estão saturadas com a política nacional. Persevere. Algumas pessoas conseguiram mais de 100 assinaturas por dia. É possível!

  As assinaturas coletadas eram então encaminhadas ao escritório, onde as informações eram validadas e completadas usando o sistema do TSE ou do partido. Depois as fichas eram separadas por zona eleitoral e encaminhadas ao TRE para validação. O processo de validação era uma caixa-preta. Entregávamos, por exemplo, mil assinaturas em um cartório da justiça eleitoral e, algumas semanas depois, recebíamos de volta uma certidão na qual constava que apenas metade das assinaturas haviam sido validadas – mas o TRE não informava a razão da rejeição.

A coleta de assinaturas foi o grande caso de sucesso do Novo:  do início de 2011 ao meio de 2014, foram coletadas mais de 1 milhão de fichas de apoio em 17 estados. Entretanto, apenas quinhentas e duas mil assinaturas foram validadas pelos cartórios. Quase 50% das assinaturas coletadas foram rejeitadas pela justiça eleitoral. Em determinadas zonas eleitorais, o índice de rejeição passava de 60%. Um incidente curioso acendeu uma pequena luz sobre o mistério do processo de validação de assinaturas. Uma das pessoas mais ativas no Novo a partir de 2013, e que iria, no futuro, assumir um cargo no diretório, teve a sua ficha de apoio rejeitada pelo TRE. Como, evidentemente, os dados estavam 100% corretos, era importante entender o motivo da rejeição. Após duas tentativas frustradas, ele conseguiu entrar com uma petição ao juiz eleitoral solicitando a revisão da ficha de apoio. Em uma conversa informal, a funcionária que o atendeu deixou escapar que o fato de ele não ter votado no segundo turno das últimas eleições provavelmente fora decisivo na rejeição de sua ficha.    

Capítulo 11 O Partido Como Empresa   Tudo na vida tem começo, meio e fim – e assim foi com minha excelente aventura de criar um partido político. O final, para mim, começou em algum momento entre 2014 e 2015. Foi quando João trouxe, para ajudá-lo na gestão do partido, aquele ex-funcionário da empresa que administrava seu patrimônio – “Gonzaga” –, que tinha sido nomeado vicepresidente na época da fundação do partido, no início de 2011. Uma das primeiras ações do “Gonzaga” foi me ligar. Quando atendi o celular, estava olhando a rua, da janela da minha sala. “Gonzaga” telefonava para avisar que eu não poderia mais usar meus slides nas apresentações. “Só slides oficiais”. Por entre as folhas das árvores, eu via os carros passando lá embaixo enquanto tentava entender o que estava ouvindo. “Slides oficiais?”, perguntei. “Você está falando daqueles slides cheios de texto, sem nenhuma foto e com termos que só são compreendidos por 1% da população?” A conversa não progrediu. Era evidente que o problema não eram os meus slides. Mas eu ainda não tinha clareza da onda que estava se formando.       Em 4 de fevereiro de 2015, o diretório nacional emitiu um documento chamado “Reunião do Novo – Organização

Interna”. Logo no início, o documento informava: Prioridades do NOVO:   1) Organização interna (montar o NOVO como uma empresa).  

E mais adiante, ele estabelecia a seguinte regra: Todos os políticos com mandato devem ser encaminhados para o “fale conosco”.  

O que o documento queria dizer era isto: se por acaso o presidente de um diretório fosse procurado por um deputado, senador ou governador, ele deveria se recusar a conversar e solicitar que o político enviasse um e-mail para o “fale conosco” do partido.       No dia 26 de fevereiro, Marcelo Rocha Monteiro e eu fizemos uma apresentação para um grande público no salão de um hotel na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio. Dois dias depois, a revista The Economist mencionava o Novo em uma matéria: [...] Em breve, essas pessoas terão um novo partido político para representá-las. Chamado simplesmente de Novo, o partido defende abertamente o livre mercado, um estado mínimo, impostos baixos e liberdades individuais. Isso ampliaria o estreito espectro político do Brasil. O Partido dos Trabalhadores da presidente Dilma Rousseff é decididamente de esquerda. O principal partido da oposição, o Partido da SocialDemocracia Brasileira (PSDB), é mais amigo do mercado, mas, como o próprio nome sugere, não é de forma alguma thatcherista.      

Na segunda-feira, 2 de março de 2015, fizemos uma reunião interna do Novo Rio de Janeiro. Os grupos de trabalho que participaram da reunião, e os seus respectivos coordenadores, foram os seguintes: - Mobilidade Urbana – Maria Fernanda Gomes - Sustentabilidade – Ricardo Negreiros e Daniel Runkel

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Segurança Pública – Marcelo Rocha Liberdade Econômica – Andreia D’Oliveira Governança/Diretoria de Eleições – Gabriel Renault Saúde – André Zaccaron Oratória – Manu Lane Grupo de Estudantes – Lucas Jazbik Grupo de Professores – Isaias Oliveira Grupo de Estudos do NOVO (ideário e filosofia) – Pedro Faraco Recepção de Novos Participantes – Tayssa Sato Grupo de Inovação – Cezar Taurion Base de Conhecimento – Leonardo Fiad

    Nessa época, o Leo Fiad e a Andreia D’Oliveira já faziam parte do grupo responsável por me ajudar a responder aos e-mails que chegavam, em grande volume, ao Novo Rio de Janeiro. Eram pessoas de todas as situações e todos os municípios, querendo informações, tirando dúvidas ou dando sugestões. Alguns dos e-mails eram enormes; as pessoas abriam seus corações. Por exemplo, no dia 8 de julho recebemos um e-mail de Manu Campos, moradora do Grajaú, que dizia, entre outras coisas: “tenho muitas ideias e projetos, e quero contar minha história para vocês. Sozinha eu sei que não consigo fazer muito, mas juntos somos muito fortes”. Cada um dos contatos era respondido de forma completa e cuidadosa, e frequentemente gerava uma reunião ou um encontro. Era um trabalho feito com atenção, dedicação e carinho.      

No dia 15 de março, junto com um grande grupo do Novo, fui a uma manifestação contra Dilma e o PT em Copacabana. Nos encontramos às 9 da manhã em frente ao então restaurante Astor, em Ipanema (onde fica hoje o Boteco Boa Braça, do meu amigo Flavio Sarahyba), e fomos

caminhando até o ponto de encontro no Posto 5, na Av. Atlântica, onde a manifestação começou. Reeleita com uma margem apertada de 51,64% dos votos válidos, Dilma Rousseff tinha lançado um plano de ajuste fiscal que incluía mudanças nas regras de benefícios previdenciários, corte de gastos e de programas sociais, o que contrariava toda a sua plataforma de campanha. Ela estava sendo acusada de estelionato eleitoral, e sua popularidade caíra de 52% em dezembro para 7% à época dos protestos. No dia 24 de março, Marcelo, Leo e eu fizemos uma apresentação no auditório da Unisuam, em Bonsucesso, quando conheci meu hoje querido amigo André Nakamura. No dia 5 de abril, Leo, Andréia, Marcelo e eu fomos à Cinelândia para outra manifestação, organizada pelo MBL Rio, em frente à Câmara de Vereadores.       O partido começara a emitir uma série de comunicados. Um deles, de abril de 2015, informava: Comunicado 07 – 2015 São Paulo, 12 de abril de 2015   Assunto: Expansão dos Núcleos do NOVO   Pela representatividade atual do NOVO, trataremos internamente todas as representações do NOVO como NÚCLEOS.   Diretório Nacional  

Traduzindo: estava proibido o uso da palavra “diretório” – exceto, é claro, no caso do diretório nacional.      

No dia 11 de abril, ampliamos nosso raio de ação com uma apresentação em uma quadra na Taquara, organizada com a ajuda de uma ativista de uma comunidade local. Além de mim, falaram Marcelo Rocha Monteiro, Marcus Werneck e Márcio Assis Brasil. Wilson Cukierman e seus filhos estiveram presentes. No dia seguinte, um domingo, Alexandra e eu fomos a mais uma manifestação “Fora, Dilma” em Copacabana, dessa vez levando o João Felipe e a Maria Fernanda (no seu carrinho de bebê).       No final de abril, “Gonzaga” resolveu vir ao Rio. No dia 28, estava agendada uma apresentação no município de Duque de Caxias. Foi um evento planejado com muito cuidado, com a ajuda de Milton Alves e Alex Forte. Era nossa primeira apresentação na Baixada Fluminense, uma região marcada pela pobreza e pelo crime. Já que estaria no Rio, “Gonzaga” iria assistir à apresentação. Convidei também a professora Carmen Migueles, que havia sido secretária de Cultura do Município de Duque de Caxias de 2005 a 2007, na administração de Washington Reis. Embarcamos todos em uma van na praça Eugênio Jardim, em Copacabana, rumo a Duque de Caxias. A apresentação – feita no grande salão de uma casa de festas – ocorreu normalmente, embora a plateia prestasse muito mais atenção nas partes em que falamos sobre crime do que quando falamos de economia ou liberdade. Segurança continuava sendo o assunto que mais mobilizava as pessoas. Aliás, nossa própria chegada ao local ocorreu com atraso, devido, segundo comentários, a um arrastão realizado em uma das vias próximas. No final da apresentação, fomos cercados por pessoas que queriam dividir conosco suas esperanças e frustrações.

Retornamos já de noite, cansados, mas imensamente satisfeitos e com a sensação de missão cumprida. Alguns dias depois, fomos avisados pelo comando do partido que “não seria mais autorizada nenhuma apresentação fora da zona sul do Rio”, porque o partido “ainda não está preparado para ir aos subúrbios”.       “Gonzaga” também participaria de nossa reunião geral, marcada para o dia 30, dois dias depois, no auditório do Lagoa Corporate. No dia da reunião, um problema familiar me atrasou. Enquanto eu não chegava, “Gonzaga” conversou com minha equipe, ainda no hall de entrada. Depois eu soube que a conversa consistiu inteiramente de críticas a mim. O programa da reunião previa a apresentação de cada um dos grupos de trabalho do Novo Rio de Janeiro. E assim foi feito: os representantes de cada grupo falaram de suas ideias, das propostas e resultados, com a mesma energia, entusiasmo, orgulho e dedicação de sempre. Terminadas as apresentações, eu agradeci a todos, e comuniquei que iríamos ouvir as palavras do representante do diretório nacional, o sr. “Gonzaga”. Não me recordo exatamente as palavras que ele usou. Talvez ele tenha dito que estávamos fazendo “montes de areia na beira do mar” ou “colocando um band-aid em um paciente de UTI”. Foi alguma coisa desse gênero. A memória exata me falha agora – e ainda bem. Porque a essência do que ele disse, de forma bem clara, foi: nada do que vocês estão fazendo tem qualquer sentido ou utilidade. A única coisa que queremos de vocês é que arrecadem recursos e cumpram as determinações do diretório nacional. E completou: “quem não concordar conosco, que se mude”.

Ou, como ele disse a outro interlocutor: a função do filiado é pagar a mensalidade e votar em quem o partido mandar, mais nada. Estava claro que “Gonzaga” estava cumprindo uma missão.           No início do ano seguinte, fui fazer uma palestra em Salvador a convite do núcleo local do Novo. Na primeira oportunidade que tiveram, meus amigos baianos me mostraram uma pilha de papel: eram mensagens de e-mail do “Gonzaga”, cada uma mais grosseira e desrespeitosa que a outra.         O que aconteceu no Rio estava acontecendo em todo o Brasil. Voluntários, pessoas comuns movidas por um ideal, que construíram do zero um partido político com sacrifício e risco pessoal, eram tratadas com arrogância, despreparo e desprezo. Em maio de 2015, explodiu uma revolta no grupo de WhatsApp que reunia os coordenadores dos núcleos do partido pelo Brasil, causada pelas ações insensatas e desrespeitosas do “Gonzaga”. Os que ousaram protestar foram Saulo Vieira, de Aracaju, Alexandre Paiva, de Florianópolis, e eu. No dia 4 de junho, o diretório nacional emitiu o “Comunicado 08”:

Comunicado 08 – 2015 São Paulo, 04 de junho de 2015   Assunto: Inativação de Núcleo e substituição de Líder   Dentro dos princípios de eficiência e da transparência que serão a base de todos os nossos procedimentos, o Diretório Nacional tomou as seguintes decisões:   -  Desativação do Núcleo Aracaju -  Troca de liderança em Florianópolis

   

  O idealismo e a generosidade no trato com as pessoas começavam a ser substituídos por algo muito diferente, como descobriu um grupo de apoiadores de Joinville. Eles haviam enviado um e-mail para o diretório do Novo São Paulo, no dia 16 de junho, com cópia para mim e para o João, que terminava dizendo:   Gostaríamos de sugerir um encontro de parte de nossos apoiadores com vocês em São Paulo ou outro local que preferirem para que possamos nos conhecer e entender os caminhos possíveis para o futuro próximo.

  A inacreditável resposta do diretório de São Paulo foi esta:  

Tendo em vista o seu bom relacionamento com o núcleo de Florianópolis, o mesmo deveria ter lhe informado que solicitações sobre núcleos futuros devem ser feitas pelo "fale conosco" no site (novo.org.br).

O grupo de Joinville respondeu:   Francamente, como somos todos voluntários oferecendo nosso tempo e esforço para a concretização desse projeto, eu esperava um pouco mais de carinho na resposta do DN. Afinal, voluntários trabalham em troca de motivação, e esse tipo de tratamento não contribui em nada para isso, pelo contrário.

Quando vi o que tinha acontecido, respondi ao grupo:   O diretório do Rio de Janeiro está à disposição para recebê-los e falar sobre a nossa experiência.  

    No dia 26 de junho de 2015, recebi um e-mail de Leopoldo Butkiewicz, um amigo do Novo de São Paulo. No email, Leopoldo e Clynton Cortez manifestavam a intenção de fazer uma visita ao Rio de Janeiro e conhecer nossa experiência. O encontro ficou marcado para 14 de julho. Nesse dia, Maria Fernanda Gomes, Marcelo Rocha Monteiro e eu encontramos o Leopoldo e o Clynton para almoçar.   Leopoldo é um cara sensacional: maduro, bem-humorado e motivado. Clynton é igual. O almoço foi uma troca de ideias entre pessoas apaixonadas pelo mesmo projeto. Nos despedimos fazendo planos para um próximo encontro, dessa vez em São Paulo – possivelmente uma palestra para atração de filiados.   No dia 29 de julho, Leopoldo mandou por e-mail uma proposta concreta: faríamos uma palestra em Ribeirão Preto em setembro, junto com um seminário para a troca de experiências entre a equipe do Rio de Janeiro e o grupo de apoiadores de Campinas, Rio Claro, Piracicaba e Ribeirão Preto.   Em 10 de agosto, chegou outro e-mail do Leo:   Prezados, Bom dia! Tudo bem? No sábado tivemos uma pequena reunião com o “Gonzaga”.  Fomos alertados de que não há interesse do NOVO em realizar integração entre grupos estaduais ou regionais[...] Vocês já tinham comentado sobre isso, mas da maneira que agimos não esperava que tal fato ocorresse da maneira que ocorreu [...]

Insistimos nessa reunião com o “Gonzaga” que toda a nossa ação foi comunicada ao Diretório Estadual, prévia e posteriormente, inclusive, com a concordância do Diretório Estadual com nosso encontro, desde que fosse realizado a portas fechadas. [...] Eu particularmente acho um erro que colaboradores voluntários do NOVO, sejam de onde forem, não possam se comunicar, trocar experiências e visões de trabalho ou de política [...]   Leopoldo

        No dia 7 de agosto de 2015, João me mandou uma mensagem: “Motta, passa lá no partido na segunda-feira para conversarmos”.   Na segunda-feira, dia 10, eu batia na porta do escritório do Leblon.   Ele me recebeu sozinho. Sentamos e ele foi direto ao ponto: “Conversei com o pessoal do diretório nacional e não estamos satisfeitos com o seu desempenho. Decidimos por unanimidade retirar você do cargo de presidente estadual”.   Não sei o que ele esperava ouvir de mim. Mas o que eu consegui dizer foi: “Ok, João. Sem problemas”.   Ele olhou para a mesa, olhou para o lado. Afinal, olhou para mim e acrescentou: “mas ano que vem tem eleição para a prefeitura, e nós contamos com você”.          

Saí do escritório meio sem direção. Marcelo Rocha Monteiro, Leo Fiad, Andreia D’Oliveira e eu tínhamos agendado uma apresentação em Volta Redonda no dia 12 de agosto, quarta-feira – dali a dois dias – e não podíamos faltar ao compromisso.   No dia marcado, embarcamos no carro do Marcelo e seguimos para Volta Redonda. Foi uma longa viagem, durante a qual discutimos o que estava acontecendo e o que poderíamos fazer a respeito. Na chegada, nos aguardavam Rodrigo Arbach e André Amêndola.   Fizemos um enorme esforço para guardar o segredo – ninguém sabia ainda da minha saída da presidência – e esconder nosso desânimo e decepção. Afinal, nossa missão ali era justamente motivar apoiadores e criar entusiasmo com o partido. Ficamos hospedados no Hotel Dexter, o mesmo nome do serial killer de uma série de TV.   Sentado no restaurante do hotel – um espaço imenso, meio escuro e, naquele momento, vazio –, eu aguardava a hora da apresentação mergulhado em aflição e tentando controlar a vontade de desistir de tudo e voltar para casa. Afinal, depois do que acontecera, o que eu ainda estava fazendo ali?   Seguramos nossos sentimentos, fizemos a apresentação e fomos jantar com o grupo de voluntários locais.   Assim que retornamos de Volta Redonda, no dia 13 de agosto de 2015, enviei o seguinte texto aos filiados do Rio por e-mail:   Prezados Amigos,   Seguindo o processo de renovação acertado com a Executiva Nacional, e observando o regulamento e o calendário eleitoral, comunico a minha saída da

direção do NOVO Rio de Janeiro. Está na hora de encarar outros desafios e abrir espaço para novas lideranças.   Minha experiência nesses seis anos foi enriquecedora. Tive a chance de articular e compartilhar minha visão sobre o Brasil e sobre o que podemos fazer para que nossos filhos vivam melhor que nós. Minha recompensa foi conviver com vocês. Agradeço ao João Dionísio, fundador e presidente do NOVO, a oportunidade e a confiança, e a cada um de vocês o privilégio da nossa convivência. O novo responsável pelo Rio de Janeiro, André Strauss, tem meu apoio incondicional.   Recebam meu abraço e meu desejo de que permaneçamos em contato e trabalhando juntos por um país melhor.   Roberto Motta

    No dia 19 de agosto, eu recebi o seguinte e-mail do diretório nacional do partido:   Olá, Motta, tudo bem?   Estamos reestruturando os e-mails do NOVO e vamos precisar encerrar a sua conta de e-mail: [email protected]   Se você precisar de algum tempo para salvar seus e-mails e avisar as pessoas da mudança, por favor me avise.   Aguardo seu contato,   Rafael

          Em 27 de agosto, foi realizada uma reunião geral do Novo Rio de Janeiro, em um auditório da rua Desembargador Izidro, na Tijuca. Previsivelmente, o tópico principal foi minha saída da presidência. A discussão esquentou, liderada por Pedro Werneck, produtor rural, líder conservador de Teresópolis e parente distante de Carlos

Lacerda, que criticou a forma como a minha saída tinha ocorrido, lembrando, entre outras coisas, da inevitável interrupção de todo o trabalho em andamento na construção do partido no estado.   Algum tempo depois de comunicada a minha saída, o nome de André Strauss havia sido anunciado como meu sucessor. Strauss pediu para conversar comigo, e eu o recebi em minha casa. Ele fez uma tentativa de explicar o que estava acontecendo, sem muito sucesso. Em seguida, confirmou minha apreensão dizendo uma frase que ficou marcada na minha memória: “Não tenho a menor intenção de fazer isso que você faz, receber pessoas na sua casa a toda hora”.   De fato, minha casa vivia cheia de gente do Novo, desde o início. Minha vida estava entrelaçada com o partido, e assim permaneceria por muito tempo, apesar do que acabara de acontecer e do que ainda viria pela frente.         João me convidou para ir a Brasília, acompanhar o julgamento do TSE sobre o pedido de registro do Novo. Na manhã do dia 15 de setembro, fui encontrá-lo em seu apartamento, de onde fomos no seu carro até o aeroporto de Jacarepaguá, com uma parada no escritório da João Fortes Engenharia, empresa da qual ele era conselheiro. Embarcamos no avião que o João possuía em sociedade com amigos. Eu nunca tinha entrado em um avião particular. Voamos em céu de brigadeiro até Brasília. Do aeroporto fomos direto para o auditório do TSE. Acompanhamos a sessão sob grande tensão, pois era impossível prever o resultado do julgamento. Finalmente, o

registro do partido foi aprovado e a legenda recebeu o número 30.   Tiramos uma foto com a bandeira do Novo no salão de entrada do TSE. Na fotografia sou o único que não está de terno escuro e gravata laranja. Seguimos para uma comemoração no restaurante Delfina, no Lago Sul. João fez um breve discurso; essa foi uma das duas únicas vezes em que ele mencionou publicamente meu papel na concepção do Novo (a outra foi na entrevista ao Luciano Pires).         No dia 19 de setembro, com o partido oficialmente criado, pude solicitar minha filiação através do site.         No dia 7 de novembro, o partido atingia a marca de 966.290 curtidas no Facebook, à frente do Partido dos Trabalhadores e atrás apenas do PSDB. Eu ainda lembrava do dia em que comemoramos mil curtidas.         No dia 15 de novembro, montamos uma barraca do Novo na pista da Vieira Souto, fechada aos carros no feriado. Uma foto desse dia mostra minha filha desenhando em um quadro branco no qual está escrita a frase “Filie-se ao Novo”. No mesmo dia barracas similares foram montadas em Campo Grande, Ribeirão Preto, Recife, São Paulo e São José dos Campos.  

No dia 23 de novembro, João fez uma apresentação sobre o partido no Teatro Clara Nunes, no Shopping da Gávea. Era a primeira apresentação no Rio da qual eu não participava. Desta vez eu me sentava na plateia. Não muito distante de mim, estava Bernardinho, que acenou quando me viu.           No dia 2 de dezembro de 2015, o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, aceitou uma denúncia por crime de responsabilidade contra a presidente da República, Dilma Rousseff.         No final de dezembro o Partido Novo atingiu um milhão de seguidores no Facebook e 5.808 filiados.

Capítulo 12 O Dinheiro ou a Alma No dia 30 de novembro de 2015, eu defendi minha dissertação de mestrado, cujo título era “Os Efeitos da Cultura Nas Relações Entre Estilo de Liderança, Confiança e Comprometimento: Comparando Equipes de Operações Especiais no Brasil e Estados Unidos”. A defesa do trabalho foi diante da banca composta pelos professores Marco Túlio, Carmen Migueles, Maria Betânia Borges Barros e Hélio Irigaray.   A cerimônia de formatura foi no dia 3 de março de 2016. Fui escolhido o orador da turma. No meu discurso eu disse:   Aprendemos estratégia, processo decisório, estrutura das organizações; mas também aprendemos a pesquisar, a ler de forma produtiva e a confrontar diferentes explicações sobre a realidade.   Aprendemos a fugir das teorias totalitárias que ambicionam ter todas as respostas.   Aprendemos a importância da ética, da transparência e da governança, temas fundamentais nos dias de hoje, em que todos os valores morais do nosso país parecem ter sido invertidos.   Vamos precisar de coragem cívica e moral para honrar o que aprendemos nessa casa.   Coragem para levantar nossas vozes – nas empresas, nas entidades públicas e nas associações de classe – e dizer que o caminho para o desenvolvimento e uma vida melhor é pavimentado com estudo, com trabalho e com empreendedorismo.   Não há outro caminho.   Nessa casa, todas as portas em que batemos se abriram, e todas elas levam em direção ao futuro.   Entremos por elas sem medo.  

Chegou a hora da despedida. Adeus, Fundação Getúlio Vargas, muito obrigado.   E que nenhum de nós esqueça a sua missão: deixar, para as futuras gerações, um legado de prosperidade, de transparência e de justiça na gestão do país.          

O ano de 2016 seria movimentado. Eu não tinha mais nenhum cargo no partido, mas ainda era visto por muitos como seu representante e principal divulgador.   Em janeiro fui convidado para ir a Salvador, fazer uma palestra para o núcleo local. Aaron Britto me esperava no aeroporto e fomos direto ao Ki Muqueca, onde passei horas relembrando o sabor da comida baiana e conversando sobre o que estava ocorrendo no partido. Foram muitas perguntas e questionamentos; para a maioria deles, eu não tinha resposta ou explicação.  

Depois de tudo de ruim e estranho que acontecera em 2015, estar em Salvador, um dos lugares que mais amo no mundo – e estar lá cumprindo a missão que eu mesmo me dei –, era uma sensação maravilhosa, daquelas que só são possíveis quando pessoas se reúnem em torno de um mesmo propósito, muito maior que elas.  

Foi nessa viagem que conheci o médico Márcio Duarte, que até hoje é meu amigo e foi o responsável pela existência deste livro. Foi nessa viagem que conheci a fantástica, extraordinária e excepcional Manuela Silveira, cardiologista, triatleta e defensora da liberdade, cujos textos nas redes sociais ajudaram a iluminar alguns dos momentos mais escuros de nossa história recente.   Foi nessa viagem que conheci o médico intensivista Eduardo Abreu – em um almoço no restaurante Coco Bambu, pelo que me lembro.

Foi nessa viagem que conheci Mariângela Pinheiro e Priscila Chammas Dáu – a Capitalista Morena das redes sociais –, que em 2016 seria candidata a vereadora pelo PSL (via o Livres), candidata a deputada federal em 2018 e novamente a vereadora em 2020, nessas duas últimas eleições, pelo Novo.   Quero acreditar que mudei rumos e influenciei trajetórias com aquela ida a Salvador.              

Em fevereiro recebi novo convite para palestrar, dessa vez em Sorocaba. No dia 21 de fevereiro, eu era recebido pelo estudante Nikolas Diniz e pelo médico Vinícius Rodrigues. Vinícius conhecera o Novo em 2012, quando ainda morava em Marília. Como qualquer pessoa que não fosse de esquerda naquela época, ele se sentia órfão politicamente, sem qualquer partido que o representasse. Quando um colega lhe falou do Novo, Vinícius começou a se informar sobre o partido e resolveu ajudar na coleta de assinaturas de apoio, e em 2014 participou do primeiro encontro nacional em São Paulo, aquele em que eu havia falado.   Em outubro de 2015, quando já morava em Sorocaba e o Novo já tinha o registro no TSE, Vinícius criou no Facebook a página Partido Novo Sorocaba. A partir dos contatos feitos ali, ele começou a organizar encontros semanais com outros interessados na proposta do Novo. Essas reuniões, que aconteciam nas manhãs de domingo com um grupo de quarenta pessoas, eram divididas em duas partes. Na primeira parte da reunião era feita a leitura do estatuto do

partido, e na segunda parte o grupo discutia de que forma aqueles conceitos poderiam ser aplicados na realidade municipal de Sorocaba. Rapidamente o grupo se tornou grande conhecedor do estatuto.  

Sorocaba – eu não sabia – era conhecida como a capital mundial da coxinha (o salgadinho), e a primeira coisa que fizemos foi ir à padaria mais famosa da cidade experimentar a especialidade.  

Os voluntários tinham investido muito esforço na organização do evento, que aconteceu no Hotel Royal, onde também fiquei hospedado. Nikolas, que estava bastante nervoso, abriria a minha apresentação – o que ele fez muito bem. Apresentei minha palestra “Que País é Esse?” para um auditório lotado e atento. Lembro muito bem da conversa que tive com um dos apoiadores do partido, Márcio Gattaz Dias, que me impressionou por seu entusiasmo e determinação em fazer alguma coisa pelo país. Depois da apresentação, fui convidado para jantar. Fomos a um pequeno restaurante com um grupo de umas doze pessoas, sentadas ao longo de uma mesa comprida. Fizemos os pedidos. Quando a comida chegou, uma pessoa do grupo, Rafael, um motorista de táxi, perguntou: “Alguém se incomoda se rezarmos?”. Ninguém se incomodou, e abaixamos as cabeças e oramos agradecendo aquela refeição. O momento ficou marcado: ali estava eu, com um grupo de pessoas que acabara de conhecer, cada uma com sua vida, suas dificuldades e seus sonhos, unidas em torno de um ideal e, naquele momento, da mesma fé.  

Vinícius Rodrigues viria a desempenhar papel importante nos acontecimentos do Novo nos meses que se seguiram, e que reverberariam também em Sorocaba. Em 2021 Vinícius seria nomeado secretário municipal de Saúde.    

   

No dia 13 de março de 2016, participei de uma manifestação pelo impeachment da Dilma em Copacabana, e discursei de cima do carro de som do MBL[43]. A multidão cobria a Av. Atlântica de um extremo ao outro. Foi isso que eu disse:   Eu tenho um sonho. Eu sonho com um país onde todos sejam iguais perante a lei. Onde a Justiça trate da mesma forma o rico e o pobre, o político poderoso e o cidadão comum. Eu tenho um sonho. Eu quero andar pelas ruas do meu país sem sentir medo, sem ter que segurar a bolsa apertada contra o peito. Meu sonho é um país onde não morram 60 mil pessoas assassinadas todos os anos. Eu tenho um sonho. Eu sonho com um país onde a política não seja um balcão de negócios, onde senadores, deputados e ministros do Supremo vão ao trabalho dirigindo seus próprios carros. Um país onde assassinos perigosos sejam presos e condenados a cumprir longas sentenças, sem direito a visita conjugal e a saídas nos feriados.  Onde eu possa abrir o jornal e dizer ao meu filho: "Olha, filho, que exemplo bonito, que país decente este em que vivemos". Eu sonho com um país que não gasta um centavo com reforma de estádios porque todo o dinheiro foi usado com a reforma de escolas. Eu sonho com um país em que os jovens pensem em criar, inventar, empreender, e não em fazer concurso para fiscal. Um país que não usa dinheiro de nossos impostos para divulgar ideologias criminosas. Um país que não faz o elogio da pobreza e da ignorância. Eu sonho com um país onde todos têm acesso às mesmas oportunidades, mas também têm o direito de fazer escolhas diferentes e o dever de assumir responsabilidade por essas escolhas. Um país que não escolha seus líderes baseado na bolsa-disso ou bolsaaquilo. Eu sonho com um país que ganhou o prêmio Nobel. Eu sonho com um país que não gastou uma fortuna para trocar todas as tomadas de todas as casas, porque existem outras prioridades. Eu sonho com uma cidade que, antes de fazer aquários e museus com vista para o mar, cuidou de suas favelas. Cuidou de suas calçadas. Cuidou de suas crianças. Eu tenho um sonho. Eu sonho com um país onde os políticos não sejam milionários, um país onde o melhor negócio não seja fazer negócio com o Governo.

É preciso ajudar o cidadão a ser independente. Isso significa três coisas: dar uma educação básica de qualidade; dar a oportunidade de ter uma profissão ou um negócio, e garantir segurança, justiça e saúde. Eu tenho um sonho. Eu abro os olhos e vejo meu sonho acontecendo aqui e agora! Vejo milhões de outras pessoas sonhando o mesmo sonho. Eu vejo o juiz Sergio Moro, o promotor Deltan Dallagnol. Vejo mulheres e homens que não ficam calados diante das injustiças. Que não pagam e não aceitam propinas. Que exercem sua profissão, seja ela qual for, com dignidade, decência e justiça. Às vezes me perguntam: Roberto, por que você está se envolvendo com política? Você acredita mesmo que vai conseguir mudar alguma coisa? Para essas pessoas eu tenho uma resposta. Eu respondo usando uma frase do meu amigo João Dionísio Amoêdo. Ele diz: algumas coisas você faz porque acha que vão dar certo. Outras você faz porque elas precisam ser feitas. Eu tenho um sonho.        

Uma grave crise havia se instalado no governo Dilma Rousseff, e todos viviam de olho na televisão, acompanhando os acontecimentos que se sucediam em velocidade extraordinária.   Na quarta-feira, 16 de março, o juiz Sergio Moro retirou o sigilo de interceptações telefônicas do ex-presidente Lula. As conversas gravadas pela Polícia Federal incluíam um diálogo gravado na própria quarta-feira entre Lula e a presidente Dilma Rousseff. Dilma havia nomeado Lula como ministro-chefe da Casa Civil (a nomeação acabou suspensa pelo STF).  

Na conversa telefônica, Dilma avisava Lula que estava enviando ‘Bessias’ com o termo de posse para o cargo de ministro da Casa Civil. O diálogo era, claramente, uma tentativa de obstruir a Lava Jato, porque a nomeação daria foro privilegiado a Lula e o tiraria do alcance do juiz Sergio Moro. 

  Aquelas palavras ecoaram por todo o Brasil:   Dilma: Seguinte, eu estou mandando o 'Bessias', junto com o papel, para a gente ter ele e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse. Lula: Aham. Tá bom, tá bom. Dilma: Só isso, você espera aí que ele está indo aí. Lula: Tá bom, estou aqui. Fico aguardando. Dilma: Tchau. Lula: Tchau, querida....  

Começamos a ligar uns para os outros. “Temos que voltar às ruas imediatamente”, foi a conclusão. Larguei tudo o que estava fazendo e fui para nosso ponto de encontro tradicional, em frente ao Posto 5, em Copacabana. Quando cheguei lá, no final da tarde, havia umas 30 pessoas. Pouco depois já eram 100, depois 500, e em breve estávamos cercados por uma multidão, que cantava músicas como essa:   Fora, petista Bolivariano A roubalheira do PT tá acabando Sua conduta É imoral Fere os princípios da CF nacional   Olê, olê Olê, olê Vamos pra rua pra derrubar o PT  

Não acho que verei algum dia espetáculo mais bonito que o daquela noite. Eu vestia uma camiseta do Novo e carregava uma bandeira do Brasil. De repente, a multidão começou a se movimentar, pegando uma das ruas transversais e entrando na Av. Nossa Senhora de Copacabana. Eu vi uma das ruas mais movimentadas da cidade – naquele horário geralmente cheia de carros e ônibus – ser completamente tomada por um oceano de gente. Andamos muitos quarteirões agitando bandeiras do Brasil, cantando, olhando nos rostos uns dos outros e

sorrindo, surpresos com a súbita descoberta do nosso poder de mobilização. De vez em quando algum petista revoltado aparecia em uma janela para gritar palavrões ou jogar ovos e água na multidão. Mas a sensação que predominava era de paz e alegria. Eram milhares de pessoas ocupando as vias principais de um dos bairros mais movimentados da cidade, sem uma única briga, sem qualquer confusão. Jamais esquecerei aquele dia.        

Em meados de março, procurei João no novo escritório do partido e perguntei: “Você acha que devo ser candidato a prefeito nas eleições deste ano?”. A pergunta não poderia ser mais objetiva e direta.  

Ele disse que ia conversar “com a turma de São Paulo” e me daria uma resposta em breve.   Duas semanas depois, eu estava preso em um engarrafamento em frente ao Gávea Golf Clube, em São Conrado, quando João me liga no celular. “Falei com o pessoal, e achamos uma boa ideia você se candidatar. Mas tem que fazer o processo seletivo”.         Marco Túlio e Carmen tinham uma empresa chamada Symballein, que prestava serviços de consultoria a clientes privados e a entidades públicas e governos. Com a nossa crescente proximidade, começamos a falar sobre um projeto de trabalho. Marco já tinha me convidado para dar aulas para alunos de alguns programas de MBA que a FGV

conduzia em conjunto com universidades estrangeiras. Como eu era fluente em inglês, e conhecia bem a situação econômica e política do país, não tive qualquer dificuldade. Em 2014 e 2015, dei aulas para grupos do Corporate International Master, um programa de mestrado oferecido em conjunto pela FGV, pela ESADE Business School de Barcelona e pela Georgetown University dos EUA. Em 2015 e 2016, também dei aulas para turmas do programa de EMBA da ESADE, para grupos do programa Microeconomics of Competitiveness da Universidade de Lisboa, e aulas sobre o panorama de negócios do Brasil para um grupo da Universidade de Wharton. Marco e eu estávamos cada vez mais próximos. Passávamos finais de semana em família. Um dia me perguntaram: será que eu gostaria de fazer parte do quadro de consultores da Symballein? Aceitei o convite, e minha foto passou a constar do site da empresa. Também investi muito tempo e esforço na montagem de um material de divulgação do centro de estudos que seria montado na casa de Araras. Nunca fizemos nenhum trabalho juntos, mas, quando eu visitava o escritório deles – que ficava na rua Rainha Elizabeth, ao lado de um restaurante –, falávamos sobre os projetos da empresa. Lembro especialmente de um projeto gigantesco em que eles trabalhavam, para a Secretaria Estadual de Educação.       O dia 14 de abril de 2016 amanheceu com céu completamente azul, pontilhado de nuvens brancas. Peguei um ônibus para Cabo Frio. Tinha sido convidado para palestrar pelo grupo de apoiadores do partido na cidade. Fui recebido por Dulphe Kpseg, um dos organizadores, e conheci um grupo de pessoas especiais: Cacau, Ricardo

Guadagnin, Marco Antônio, Gerson Gomes, Milton Lima e muitos outros com os quais até hoje me encontro sempre que vou à cidade. Em Cabo Frio apresentei a minha palestra Que País É Esse?[44].       No dia 17 de abril, um domingo, a Câmara dos Deputados votou o impeachment de Dilma. Fomos todos a Copacabana para uma manifestação gigante. Manifestações similares ocorreram por todo o Brasil. Na Av. Paulista, Geraldo Alckmin e Aécio Neves foram vaiados pela multidão. A Câmara dos Deputados aprovou o impeachment por 367 votos a favor e 137 contra.         Em algum momento de março, a pedido do João, me inscrevi no “processo seletivo” do partido. O que foi esse “processo”? Primeiro, fiz duas “provas” online. As “provas” eram perguntas sobre política, algumas formuladas de modo rudimentar. Em seguida, recebi um e-mail confirmando que passara para a “segunda fase”: uma entrevista. O e-mail terminava com um “Boa sorte!”. No dia 26 de abril, eu compareci à nova sede do Novo Rio de Janeiro, na rua Aníbal de Mendonça, 132. Lá fui “entrevistado” pelo João, que me conhecia desde 1979 e com quem eu tinha criado o Novo. A seguir, fui entrevistado por Ricardo Taboaço. Foi uma conversa curta, estranha e constrangedora.

Taboaço era personalidade respeitada no mercado financeiro e, por tudo o que eu sabia, profissional extremamente bem-sucedido. Mas, além de pouco entender de política eleitoral, sua trajetória no Novo tinha sido, até então, marcada pela ausência – por sua não participação na absoluta maioria das atividades que realizamos. E agora Taboaço estava ali, me “entrevistando” para julgar se eu deveria ou não ser escolhido como o candidato a prefeito do partido. O outro pré-candidato a prefeito era Ricardo Negreiros, consultor de gestão. Leo Fiad tinha se candidatado a viceprefeito. Era isso que eu sabia naquele momento. Fiz as “entrevistas” e fui para casa tocar a minha vida. Pouco tempo depois, meu telefone tocava. Era a Carmen – Carmen Migueles – me informando, para minha completa surpresa, que tinha se inscrito como pré-candidata a viceprefeita pelo Novo. Eu nem sequer sabia que ela tinha se filiado ao partido.       Alguns dias depois quem me ligava era Marco Túlio. “Roberto, a Carmen precisa conversar com você. Ela pode ir em sua casa?”. Pouco tempo depois chegava a Carmen. Ela se sentou no sofá marrom da sala, enquanto eu me sentei no sofá branco de dois lugares, de costas para a porta de entrada. Na cozinha, Alexandra lavava a louça do almoço e ouvia tudo. “Tem uma coisa esquisita acontecendo, Roberto”, me disse Carmen. E explicou: ela tinha feito a entrevista para a candidatura a vice-prefeita, e a conversa tinha sido muito boa. Mas muito boa mesmo, enfatizou. Taboaço e João tinham se interessado muito por seus conhecimentos de

gestão e por sua experiência na área pública (como secretária de Cultura de Duque de Caxias). “E aí, Roberto”, ela completou, “eu recebi um convite para ir a São Paulo amanhã, para outra reunião. Mas não sei por quê, não sei o motivo”. Ela disse isso e ficou em silêncio, me olhando. Eu não soube o que dizer. “Talvez eles estejam de olho em você para algum cargo”, comentei. “Não tenho nenhuma pretensão política”, ela disse. “Você sabe, nosso interesse mesmo é vender serviços de consultoria. Não sei o que está acontecendo. Mas amanhã, assim que retornar, te ligo”.      

No dia seguinte ela me ligou – tarde. Já deviam ser mais de dez horas da noite. “Roberto, foi muito esquisito. Quem estava me esperando na porta do elevador era o Fábio Barbosa (ex-CEO do Banco Real). Me reuni com todo o diretório nacional. Sinceramente, não sei o que está acontecendo. Mas está tarde, amanhã te ligo para conversarmos com calma.” Essa foi a última vez que ouvi a voz da professora Carmen.       No dia 3 de maio, recebi um e-mail enviado pelo remetente “Partido NOVO - Quero Ser Candidato [email protected] ”: Prezado, iremos divulgar o resultado da segunda etapa do processo seletivo para prefeito / vice-prefeito nesta sexta-feira, dia 06/05/2016.   Atenciosamente. Equipe do NOVO

        Alguns dias depois, no dia 5 de maio de 2016, recebi uma mensagem do André Strauss. “João quer falar com você”. Imediatamente me perguntei por que o João precisava mandar um recado pelo Strauss. Pensei isso, mas respondi: “Ok”. Ele completou: “Sábado à noite, na casa dele”. No sábado, dia 7 de maio, fui andando pelo calçadão da Vieira Souto até a casa do João. Quando cheguei, me esperavam três pessoas: João, Taboaço – presidente do diretório municipal – e André Strauss, meu sucessor como presidente do diretório estadual. Taboaço falou primeiro. Lembro de suas palavras: “Motta, você é o melhor representante do Novo no Rio de Janeiro. Você é o símbolo do partido”, e mais algumas frases nesse tom, que soaram como aqueles elogios que precedem uma notícia complicada. Depois do Taboaço, falou João. Strauss ficou calado olhando para o chão. Do lado de fora das janelas, muito embaixo, as ondas quebravam na areia da praia do Leblon. João finalmente entrou no assunto: “Achamos que, em vez de ser candidato a prefeito, você deve sair candidato a vereador e liderar os outros candidatos”. Lembro de ter pensado: liderar? Os candidatos a vereador competem uns com os outros. Lembro de ter pensado também como seria ruim para os candidatos receber a notícia, nesse momento adiantado, de que eu seria candidato e poderia tirar votos deles. Pensei, mas nada falei. Ainda estava tentando processar o que ouvia. João continuou falando por algum tempo, depois Taboaço retomou a palavra. Eram variações sobre o mesmo tema. A

ideia era essa: eu seria candidato a vereador, e o Novo não teria candidato a prefeito. Até que todos se calaram. Era minha vez de falar. Sem saber como começar, eu me ouvi dizer: “É claro que minha intenção é colaborar com o partido”. Essas palavras seriam seguidas de outras. Era o começo de uma frase. Mas não consegui terminar a frase. Ao ouvir as primeiras palavras, e de uma forma tão brusca que me surpreendeu, Taboaço se levantou e apertou minha mão. “Eu sabia”, ele disse. “Sabia que podíamos contar com você”, disse encaminhando-se para a porta. “Agora tenho que ir para outro compromisso”, e foi embora. Ficamos eu, João e Strauss, que inventou uma desculpa e saiu. Sem saber o que dizer, eu também me despedi e fui embora. Resolvi caminhar até minha casa. Fui pensando, atordoado.       Quando cheguei em frente à Casa Laura Alvim – uns 10 minutos de caminhada –, me dei conta do que tinha acontecido. Peguei o celular e liguei para o Strauss. “Olha só, Strauss”, eu disse, controlando meu tom. “Se o partido não lançar nenhum candidato a prefeito, tudo bem. Mas se isso for uma história da carochinha para me enrolar, vai ficar muito chato”.      

No dia seguinte, domingo 8 de maio, enviei o seguinte email aos três:   Caros João, Taboaço e Strauss,   Pensei muito sobre nossa conversa de ontem e conversei com várias pessoas.   Não está claro que a melhor opção para o NOVO, e para os candidatos a vereador, seja minha entrada na disputa com eles. Além disso, é preciso considerar o impacto dessa decisão sobre os filiados do Rio de Janeiro e minha própria motivação.   Me parece que a missão de liderar e motivar os candidatos a vereador será muito melhor cumprida se eu for candidato a prefeito. Tenho todas as qualificações necessárias para trazer votos para o NOVO, e já tenho apoio financeiro e social.   Entendo que a Direção Nacional é soberana na escolha da estratégia do partido, e, mais do que ninguém, trabalho para o sucesso do NOVO. Entretanto, uma decisão como essa precisa de mais discussão e reflexão.   Não ter candidato a prefeito significa aceitar que seremos governados por mais quatro anos por pessoas incompetentes e corruptas. Serão mais quatro anos de desânimo e frustração. Foi para acabar com isso que criamos o NOVO. Não entrar na disputa agora significa passar uma mensagem de falta de determinação e vontade – justo o contrário do que queremos transmitir.   Como candidato a prefeito trarei reconhecimento, recursos, filiados e votos para o NOVO. E esperança para os que apostaram em nós.   Por isso tudo comunico a vocês que preciso refletir e conversar mais, com a turma do Rio e com vocês, antes de tomar uma decisão sobre a mudança de minha candidatura.   Abraço,   Roberto

       

Menos de uma semana depois, o Partido Novo anunciava, como sua candidata à prefeitura do Rio de Janeiro, a professora Carmen Migueles.         Passados alguns dias do anúncio, por volta de duas da tarde, eu conversava com Alexandra quando tocou o telefone. Era um dos dirigentes do partido que estiveram na reunião de sábado. Fui atender no quarto do meu filho, João Felipe, perto da janela, onde o sinal de celular era melhor. “Motta, não esquenta com isso, não”, disse ele. “Esse negócio de processo seletivo é besteira. É que nós somos coxinhas[45]. Vamos apanhar muito nessa eleição, por isso precisamos de um candidato da área de humanas.”       Leo Fiad recebeu a notícia de que tinha sido aprovado para candidato ao cargo de vice-prefeito, mas declinou.

Capítulo 13 Incontrolável A decisão do partido provocou um choque no Novo Rio de Janeiro. Quando a notícia se espalhou, minha casa ficou cheia de amigos e companheiros de partido. Foi criada uma petição online a meu favor, que ao final angariou mais de 700 assinaturas. Até que alguém, lendo o estatuto, verificou que um dos artigos dava aos filiados o direito de fazer indicações de candidatos para a convenção partidária, bastando reunir um número de apoios correspondente a 10% dos filiados do diretório municipal. Mas as assinaturas teriam que ser entregues até 22 de junho. Conversa com um, conversa com outro, logo se formou um time disposto a me ajudar nessa campanha, com a liderança informal do Marcus Moraes. Mas, assim que o grupo começou a trabalhar, tivemos nova surpresa: no exato momento em que comecei a entrar em contato com filiados e pedir apoio, iniciou-se uma onda de ataques contra mim nas redes sociais, por e-mails e mensagens de celular, questionando a legitimidade da minha pretensão de ser candidato e ofendendo minha honra. Como aquilo podia estar acontecendo? Durante muito tempo não tive uma explicação razoável. Hoje, ainda não sei se tenho. Quem reclama da virulência dos “minions” de hoje em dia, e de seus ataques nas redes sociais, não faz ideia do que aconteceu comigo naquela época.  Pessoas que nunca tiveram qualquer contato comigo, nem tinham ideia da minha participação na história do Novo, passaram a divulgar calúnias a meu respeito e a me ofender abertamente nas redes sociais. Pessoas que conviveram comigo durante anos, que frequentavam minha casa,

comiam na minha mesa e brincavam com meus filhos, passaram a me difamar e a espalhar as piores mentiras sobre mim. Era um verdadeiro esforço de assassinato de reputação.   Uma das que mais me feriu foi a narrativa de que eu estava falido e precisava ser eleito para conseguir me sustentar. Era uma óbvia mentira, facilmente desmontada. Sempre vivi do meu trabalho como especialista em tecnologia, gestor de empresas e empreendedor, e da renda do patrimônio que acumulei com meu próprio esforço. Além disso, se meu objetivo fosse financeiro, fazia muito mais sentido ter aceitado a proposta para concorrer a vereador, em que a chance de ser eleito seria maior, do que concorrer a prefeito, posição para a qual a disputa seria muito mais difícil. Isso era evidente. Mas a mentira perversa influenciava quem não me conhecia. É preciso entender o pior aspecto dessa história: essa calúnia vulgar não foi espalhada por políticos profissionais, corruptos e populistas; ela foi disseminada por pessoas da elite carioca, apoiadoras de um partido que pretendia renovar a política nacional. Sei os nomes de várias pessoas que fizeram isso.       O partido resolveu então divulgar oficialmente a narrativa de que eu teria sido “reprovado” no processo seletivo por não ter as qualificações mínimas exigidas – fez isso em uma nota oficial –, dizendo que, portanto, a campanha de coleta de assinaturas que eu realizava não teria validade. O toque final, que durante muito tempo prevaleceu como versão oficial, e que até hoje é a única versão da história conhecida por muita gente, foi quando o partido denunciou publicamente que eu só queria ser candidato porque tinha

um projeto pessoal, em vez de pensar no que era melhor para o país.       Assim que a petição a meu favor foi colocada no ar, enviamos um e-mail para minha base de contatos pessoais pedindo apoio e assinatura na petição. E aí aconteceu um problema: o técnico encarregado de enviar o e-mail – de uma empresa terceirizada –, sem entender direito o contexto, achou que se tratava de um material oficial do partido. Tentando ser proativo, e sem que ninguém tivesse pedido, ele incluiu no e-mail o logo e a assinatura do Novo – o que, compreensivelmente, deu a quem sabotava minha candidatura a oportunidade para mais um ataque contra mim. Mas o que se seguiu foi inaceitável: o partido enviou a todos os filiados um e-mail, assinado pela "Equipe NOVO", classificando meu pedido de apoio de "iniciativa fraudulenta". Quando nos demos conta do ocorrido, enviamos imediatamente uma retratação a todos os que haviam recebido o e-mail inicial com a assinatura indevida, explicando o que havia acontecido (erro material cometido de boa-fé) e fazendo uma oferta de retirada de seus nomes da petição, caso desejassem. Das 300 pessoas que já haviam assinado a petição eletrônica até então, apenas duas fizeram essa solicitação, que foi prontamente atendida. Também foi enviado um e-mail com um pedido público de desculpas à direção do NOVO. Apesar disso, a mesma "Equipe NOVO", sempre escondida atrás do anonimato, repetiu, em mensagem posterior, a mesma menção a uma "iniciativa fraudulenta",

mencionando mais uma vez o meu nome – mesmo após o devido esclarecimento ter sido prestado. Por último – no primeiro teste de uma tática que iria se repetir nos anos seguintes contra outras pessoas que ousaram se opor às decisões dos controladores do partido –, fui informado que uma “Comissão de Ética Partidária” tinha aberto sindicância contra mim. No dia 17 de junho, recebi este e-mail: De: Partido NOVO - Filiação [mailto:fi[email protected]]  Enviada em: sexta-feira, 17 de junho de 2016 17:58 Para: r*******@******.com.br Assunto: Pedido de esclarecimentos   Prezado filiado Roberto Motta, Conforme determinação da Comissão de Ética Partidária (CEP) do NOVO, após receber manifestações de filiados em canais oficiais do NOVO, solicitamos que sejam esclarecidos no prazo de 5 dias os questionamentos a seguir:    1. O Sr. tem conhecimento do abaixo-assinado anexo enviado para vários filiados e simpatizantes?  2. De alguma forma o Sr. participou desta ação?  3. Em sabendo do fato, que medida o Sr. tomou a respeito?    Informamos ainda que todo contato sobre o assunto deve ser tratado diretamente com o e-mail ´[email protected]´ e que o prazo de resposta tem início a partir do envio deste comunicado.    Att.  Equipe do NOVO  

  Respondi com um e-mail, enviado em 21 de junho, onde explicava o ocorrido – que já era de pleno conhecimento de todos – e que terminava assim:  

Aproveito o ensejo para solicitar a V. Sas. que me forneçam as seguintes informações:   (i) qual o nome da(s) pessoa(s) que formularam o requerimento ao Conselho de Ética Partidária? (ii) há alguma infração estatutária imputada à minha pessoa? (iii) quem são os componentes da Comissão de Ética Partidária?

(iv) quais os nomes dos subscritores dos dois e-mails do NOVO que me associaram a um ato supostamente fraudulento?

Até hoje espero a resposta.       Apesar disso tudo, e apoiado por um grupo de fiéis amigos – entre eles, Marcus Moraes, Marcelo Rocha Monteiro, Marcelo Silva, Otávio Cintra, Leo Fiad, Andreia D’Oliveira e Gustavo Lima –, embarquei em um grande esforço de coleta de assinaturas de apoio para que meu nome fosse levado à convenção partidária e submetido aos filiados. Mas eu precisava das informações de contato dos filiados do Rio. O partido que defendia que todos são iguais perante a lei se recusou a me fornecer o cadastro de filiados, um direito expressamente previsto no estatuto, usando diversas desculpas.  Depois de muita insistência e inúmeras trocas de e-mails, recebi uma mensagem me convidando a comparecer ao escritório do partido. Quando cheguei lá, recebi das mãos do próprio presidente nacional do partido uma lista impressa, com os nomes dos filiados fora de ordem alfabética, as informações eleitorais ilegíveis e sem qualquer informação de contato. Era dessa forma que o partido que ia renovar a política brasileira cumpria com a obrigação determinada em seu próprio estatuto.         Enquanto isso, o partido recebia manifestações como esta de Pedro Cintra, ex-colega de Santo Inácio:   Aos membros da Executiva Nacional do Partido Novo,

  Sou filiado ao Partido Novo e gostaria de saber qual foi o critério utilizado para que o Roberto Motta não fosse selecionado como pré-candidato a prefeito do Rio de Janeiro.   Conheço o Roberto há quase 40 anos, tendo estudado e trabalhado com ele durante vários anos, e posso dizer com confiança que ele seria um excelente prefeito, com sua capacidade de trabalho e execução, sem falar na sua inteligência e habilidade de se expressar de forma clara e convincente.   Agradeço atenciosamente por uma resposta, Pedro Pessôa Ladvocat Cintra

  Ao mesmo tempo, e depois da campanha de ataques públicos lançada contra mim, muitos dos e-mails que enviávamos com pedidos de apoio eram respondidos com ofensas. Cada resposta dessas era um soco no estômago.         Apesar de todos os obstáculos, da avalanche de ataques morais e ofensas públicas, e do enorme desânimo e decepção que caíra sobre minha família e sobre mim, na segunda-feira, 20 de junho de 2016, às 12h30, acompanhando dos amigos Marcelo Silva e Otávio Cintra, cheguei ao escritório do partido para entregar as 112 assinaturas de apoio, mais do que a quantidade mínima exigida.   A pessoa que se encontrava lá – e que, por enquanto, prefiro deixar no anonimato – se recusou a receber a documentação, só aceitando fazê-lo após muita insistência minha, do Marcelo e do Otávio, que tinham me acompanhado justamente para servir como testemunhas, se houvesse mais uma surpresa me esperando.      

  O partido então enviou e-mails e telefonou para boa parte das 112 pessoas, perguntando se elas haviam realmente assinado a ficha de apoio e, mais uma vez, pressionando-as a mudar de posição, avisando que minha pretensão era ilegítima, pois eu não estava qualificado para ser candidato.   Outras narrativas foram criadas para justificar os ataques contra mim. Passaram a dizer que o indeferimento da minha candidatura era porque eu havia deixado a presidência do diretório estadual do NOVO Rio de Janeiro em agosto de 2015, e, portanto, estaria impedido de apresentar minha candidatura a cargo eletivo nos doze meses subsequentes, conforme previsto no artigo 37, parágrafo 5º, do Estatuto do partido. Ocorre que o artigo 98, inciso XVIII, do mesmo Estatuto, em contradição com o primeiro artigo citado, estabelecia que o prazo de vedação é de 12 meses anteriores a outubro do ano em que se realizam as eleições. Essa segunda norma sempre prevaleceu, por consenso, no âmbito do partido – até que eu começasse a representar um problema.   A situação ficaria pior ainda: enquanto usavam essa alegação sem sentido para me barrar, o partido aprovava a candidatura de uma dirigente partidária de Minas Gerais – Carolina Antunes – que havia sido nomeada para o cargo de vice-presidente estadual do Novo MG em 12 de agosto de 2015 – data posterior à minha saída da presidência do diretório do Rio.   Quando isso foi descoberto, e o fato exposto, subitamente a dirigente desistiu da candidatura.        

  A alegação seguinte foi que eu não teria entregado todos os documentos necessários; uma mentira, pura e simples. Entreguei no dia 21 de junho de 2016 todos os documentos necessários, e tenho em meu poder um documento oficial do NOVO, assinado por uma de suas funcionárias, atestando a entrega.           O desespero em barrar minha candidatura foi tão grande que argumentaram até que eu não tinha entregado os originais das assinaturas de apoio, exigência que não constava do Estatuto ou de qualquer determinação do partido. Vejam: o próprio partido entrou em contato por email e telefone com vários dos 112 apoiadores para confirmar que haviam assinado o termo de apoio.   A exigência da entrega de “originais” – insinuando com isso que existiria a suspeita de falsificação de assinaturas de apoio – tinha o inconfundível odor de uma política velha e cansada, que o partido tinha sido criado justamente para mudar.         No dia 5 de julho de 2016, recebi um e-mail do "Núcleo/Diretório Rio de Janeiro" do Partido Novo, com o seguinte texto:   Prezado filiado,   Segue em anexo a intimação em relação aos pedidos de impugnação recebidos por esse Diretório em relação a sua pré-candidatura. O prazo de

resposta segundo o artigo 106 do estatuto do novo é de 5 dias.   Favor acusar recebimento.   Atenciosamente, Equipe NOVO Rio de Janeiro

    O e-mail continha um anexo com 27 pedidos de impugnação, sem a identificação de seus autores. Os pedidos não continham nenhuma documentação comprobatória, e solicitavam a minha impugnação com base em três alegações: que eu havia sido reprovado no processo de seleção, que eu denegri a imagem do Novo no Facebook (sem indicar a postagem em que isso teria ocorrido) e que eu teria enviado um "e-mail fraudulento". No mesmo dia enviei uma resposta demonstrando o equívoco da argumentação apresentada e a inverdade das alegações feitas contra mim. Até hoje não houve resposta do partido.   Quando a autoria dos pedidos de impugnação foi revelada, descobriu-se que quase todos vieram de funcionários ou dirigentes do NOVO de outras cidades que não o Rio de Janeiro. Apenas dois pedidos vieram de pessoas do Rio de Janeiro, uma das quais era (e ainda é) funcionária assalariada do NOVO.           A decepção se espalhava entre amigos e apoiadores. Um deles comentou, em um e-mail de 10 de julho:   Cada vez mais inacreditável.   Fico pensando se agem tão arbitrariamente no simples comando de um partido político, como agiriam se viessem um dia a comandar o Brasil?

 

      Esse era o resumo: era inacreditável que algumas das pessoas com as quais eu tinha me associado para criar um partido que iria revolucionar a política brasileira, tinham, em questões de dias e pelas piores razões possíveis, se engajado em um processo de destruição da minha imagem pública, só para impedir que eu exercesse o simples direito de submeter o meu nome à apreciação dos filiados para uma candidatura majoritária.   Mas era isso mesmo que estava acontecendo.           No dia 11 de julho de 2016, a direção partidária municipal reuniu-se para analisar uma longa lista de acusações contra mim. Minha candidatura foi rejeitada. A ata da reunião poderia ter sido retirada de um dos livros de Kafka.         Quando soube da decisão do partido, Alexandra imediatamente enviou um e-mail ao João exigindo que ele explicasse por que eu não poderia ser candidato. A resposta do João foi:   Obviamente se ele não foi aprovado é porque houve um entendimento de que ele não atendeu os quesitos como experiência na área pública e ou histórico de sucesso em gestão nos últimos anos e ou conhecimento básico sobre a prefeitura do Rio.

 

“Que qualificações são essas?”, ela insistiu. Trocaram quase dez e-mails, até que ela desistisse de tentar obter uma explicação. Seu último e-mail para o João, no dia 25 de maio, tinha este texto:   Infelizmente não convenceu, e por isso tantos estão descontentes e de fato se desfiliando. Estes requisitos não eram pré-requisitos para se candidatar às vagas e você o autorizou a se inscrever já sabendo das qualificações dele, ou seja, tudo errado!   Uma pena esta amizade de 36 anos se desgastar por você não ter tido a coragem de sentar-se com ele e conversar de homem pra homem, já que ele não era um candidato qualquer, mas sim um amigo leal, frequentador da sua casa, fundador e apaixonado pelo NOVO, merecia uma explicação digna e não esta confusão de informações dos dirigentes, onde fica evidente que houve uma posição pessoal sua interferindo no processo. Uma pena!   Só quem perde é você e o partido, mas vamos em frente porque o projeto de um Brasil melhor, este sim não abandonaremos jamais!

        No dia 17 de julho de 2016, eu pedi desfiliação do Partido Novo.         No dia 31 de julho, fui à manifestação pelo impeachment de Dilma em Copacabana, e discursei em três carros de som diferentes. Esse foi o meu discurso: Olhe ao seu redor. Olhe ao seu redor: os prédios, o posto de gasolina, os quiosques da praia, os bares, os automóveis nas ruas, o helicóptero lá em cima. Tudo tem a mão do Estado. Para que essas coisas existissem foi preciso pagar 10%, 30%, 55%.

Foi preciso conseguir uma permissão, tirar um alvará, fazer registro na junta, aprovar o projeto na secretaria, esperar a vistoria. Até carrocinha de pipoca precisa de licença da prefeitura. O Estado brasileiro é um parasita, que suga o esforço de cada cidadão. Está na hora de mudar o país É preciso começar uma nova era. Política não é negócio. Política não é meio de enriquecimento. Administradores públicos precisam ser competentes. Chega de eleger ex-BBBs. Chegar de eleger comediantes. Chegar de eleger gente que elogia a mandioca. Precisamos diminuir o tamanho do Estado brasileiro. Precisamos aumentar a liberdade e a riqueza do povo. Um Estado grande é um Estado corrupto. É um Estado que faz de tudo – produz petróleo, decide os livros que você pode ler, Os brinquedos que seu filho pode usar, qual a tomada da sua casa. O Estado grande decide até assuntos importantíssimos, Como, por exemplo, o dia nacional do macarrão (25 de outubro, de acordo com a Lei 13.050, de 8 de dezembro de 2014, assinado pela ex-presidente da República, a senhora da mandioca). O Estado grande faz tudo pra você. Menos cumprir com suas obrigações essenciais: saúde básica, segurança, educação e justiça. Em 2014 o BNDES emprestou mais de 200 bilhões de reais a juros baixos para grandes empresários. 200 bilhões = mais que os orçamentos dos ministérios da Saúde e Educação SOMADOS. Somos um país que endossa o paternalismo. Chega. É preciso recomeçar do zero. É preciso construir um país próspero e seguro para todos. E essa construção tem uma regra muito simples: todos são iguais perante a lei. Seja você um vendedor ambulante ou um ex-presidente da República. Viva o Brasil. Fora, Dilma.

 

  Um pedaço do quebra-cabeça: um dos pioneiros do Novo, que participou das entrevistas com os candidatos (mas não da minha), me disse que testemunhou um dos dirigentes do Novo – um dos três que estavam naquela reunião de sábado à noite na casa do João – dizendo, no escritório do partido, em voz alta: “O Motta não pode ser candidato porque o Motta é incontrolável”.       Outro pedaço: há poucos meses, no início de 2021, Fabiana Bentes foi convidada para uma conversa com um mandachuva do Novo do Rio. Ele fez um convite para que ela se filiasse ao partido. Fabiana se surpreendeu: “Mas eu fui reprovada no processo seletivo em 2016! Por que vocês mudaram de ideia?”. A resposta do mandachuva foi direta, seca e sem nenhum constrangimento: você foi reprovada porque era muito próxima do Roberto Motta.       No dia 31 de agosto de 2016, o plenário do Senado condenou Dilma Rousseff à perda de seu cargo sob a acusação de ter cometido crime de responsabilidade fiscal. Dilma, entretanto, não perdeu seus direitos políticos, como previa a lei.           Em determinado momento, no meio da batalha pelas assinaturas, cansado e emocionado, enviei um e-mail de

agradecimento aos companheiros que lutavam comigo, e recebi esta resposta do Marcelo Silva:   Caro Motta,   Também estou emocionado porque foi você que me trouxe esperança de um Brasil melhor quando eu já não acreditava que era possível na minha geração. Sua energia é a mesma que irriga muita gente [...] Mesmo que a gente não ganhe agora, o legado deste movimento é manter as esperanças e o espírito de luta do grupo. Dos 200 apoiadores ativos que você calorosamente recebeu. Acredite. [...] Resiliência é nossa maior virtude. E a luta é o que cura as lágrimas das injustiças porque todo líder passa. Abraços com afeto, Marcelo de Sousa Silva    

      Esse era o Partido Novo que eu havia criado e que, para mim, deixava de existir ali.

Capítulo 14 São Paulo Em 2015, Dennys Andrade, um filiado do Partido Novo de São Paulo – executivo de marketing, pai de três filhos e autor de dois livros (por enquanto) – criou um blog chamado 30 Diários[46] para a comunicação entre filiados. No dia 28 de novembro daquele ano, foi publicada no blog a matéria “Almanaque do Partido Novo”. Esse texto, atualizado várias vezes, e ainda no ar, é uma coletânea de fatos e curiosidades sobre o partido. Com o passar do tempo, por falta de alternativas, o blog virou o canal de comunicação principal dos filiados de São Paulo. Até que, um dia, Dennys recebe uma ligação dos Estados Unidos: era o tesoureiro do Novo pedindo que Dennys retirasse do blog todas as referências ao partido, pois as pessoas estavam achando que ele – Dennys – era o porta-voz oficial do Novo. Quem clica hoje no link do Almanaque[47] verá, no início da página, esse parágrafo: Este BLOG deixou de apoiar o Partido NOVO em julho de 2016, tendo como causa o esgotamento das tentativas por parte dos filiados em apontar os erros de navegação e de ouvir, em retribuição ao tempo, energia e até reputação pessoal empregados em torno de um projeto em que todos acreditavam, uma única mensagem, repetida exaustivamente: “Acreditem em mim” (João Amoêdo).

    O Novo foi concebido no Rio, mas nasceu, quase ao mesmo tempo, em São Paulo. Lá ficava o escritório que João dividia com seu sócio, Fábio Ribeiro, e onde começou a funcionar o diretório nacional. Logo foi criado uma presença local, sob o comando de Christian Lohbauer, doutor em ciência política pela USP. O diretório municipal era presidido por Erich Tavares, e o diretório estadual por Maria Beatriz Figueiredo. Os dois, junto com Beatriz Znidarsis, operavam o

“Fale Conosco” de São Paulo, respondendo às mensagens de filiados e apoiadores. A ideia do Novo teve, em São Paulo, a mesma aceitação que em outros lugares. Os voluntários surgiam em grande número e diversidade de talentos. Em um ambiente de decepção com a política tradicional, o Partido Novo exaltava o “indivíduo como agente de mudanças” e o único gerador de riquezas, ideias atraentes em um ambiente sedento por “liberdade com responsabilidade”. No ano de 2015, multidões tomavam as ruas pedindo o impeachment de Dilma Rousseff. Naquele momento, a ideia de participar de um projeto político baseado em valores compartilhados e com princípios claros e genuínos atraía muitos interessados. Entre eles, estavam personalidades como o membro da casa real brasileira e atual deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança. Outros nomes de destaque eram Alexandre Gama, Beatriz Sander, meu querido e aguerrido amigo Luiz Eloy Oliveira, Patrícia Bueno, Naomi Yamaguchi, Tamara Bertoldo, Júlio Casarin e o especialista, consultor e investidor em hotelaria José Ernesto Marino Neto. O Novo engajava pessoas que jamais pensaram em envolvimento com política. Mas os problemas não tardaram a aparecer; eles apontavam para um divórcio entre a teoria e a prática dos dirigentes. Um exemplo: em 2015, José Ernesto Marino Neto disponibilizou um grande imóvel no Morumbi, próximo à favela de Paraisópolis, para que o partido criasse um centro de formação e de encontros, e enfrentou desinteresse e resistência. Depois de grande esforço, ele conseguiu autorização para organizar uma apresentação do partido no imóvel. No dia marcado, com a casa lotada de simpatizantes, Marino foi, inesperadamente, impedido de falar pela direção do partido, sob a alegação de que ele não era um “palestrante credenciado” do Novo.

Era um mau sinal vindo dos líderes do projeto cujo pilar era a confiança nos indivíduos.    

Em fevereiro de 2016, o Novo São Paulo tinha a seguinte estrutura de voluntariado: Apoio Jurídico: Ives Braghittoni e Luiz Módolo; Gestão de Voluntários: Suzana Herzka; Coordenação do Novo nas Ruas: Alfredo Fuentes e Isabel Barcello, com as seguintes equipes: Centro – Jaime e Uriel Puskas; Zona Norte – Roberto Paiva e Robson Bombonatti; Zona Oeste – Dennys Andrade e Nilton Rossano; Zona Sul – Paulo Lázaro de Moraes e Luiz Aguilar; Zona Leste – João Marcello Ortega e Nicholas de Oliveira. Captação: Arthur Rozenblit; Coordenação dos Diagnósticos: Fernando Meira; Estrutura Administrativa e Financeira Municipal: Cláudia Bachega; Saúde: Paulo Lázaro de Moraes.       A militância do Novo paulista era dividida entre filiados – conhecidos como os “A30” – e voluntários – chamados de “V30”. A distinção tinha uma origem curiosa e, em retrospecto, significativa: os V30 eram voluntários que participavam das ações e atividades externas de divulgação do partido, mas não podiam participar das reuniões mensais do diretório, pois, diferentemente dos filiados A30, não pagavam uma contribuição mensal. Na noite de 10 de maio de 2016, reuniram-se, pela primeira vez, os filiados A30 e os voluntários V30. O local era a Fecomércio, e o motivo da reunião era o anúncio do

resultado do processo seletivo de pré-candidatos. Os A30 e os V30, reunidos para conhecer os nomes dos aprovados para concorrer nas eleições daquele ano, estavam imbuídos do espírito de uma frase do presidente do partido, João Amoêdo, que dizia: “O que nos motiva não é a certeza do sucesso, mas o senso de obrigação que temos com o país e com as futuras gerações”. Ninguém esperava uma vitória espetacular do NOVO na primeira disputa eleitoral, claro – mas todos esperavam que o NOVO competisse. E os filiados queriam competir: segundo Alfredo Fuentes, então presidente estadual do partido, em entrevista concedida a Clynton Cortez para o podcast do 30Diários[48], o núcleo paulistano “esperava umas dez, vinte, no máximo trinta candidaturas, e apareceram duzentas”. O presidente do diretório municipal, Erich Tavares, abriu a reunião anunciando que a qualidade dos pré-candidatos fora altíssima e que o diretório poderia ter aprovado candidatos para concorrer às oitenta vagas disponíveis na Câmara de Vereadores. Entretanto, disse ele, os dirigentes preferiram aprovar apenas os candidatos mais bem avaliados, evitando uma “canibalização” das candidaturas. Era uma decisão controvertida e, na opinião da maioria dos militantes, claramente equivocada. O partido já afirmara que os candidatos não teriam recursos partidários à disposição. Logo, não havia qualquer justificativa financeira para lançar um número reduzido de candidatos. Além disso, qualquer um que conheça os rudimentos do sistema de eleição proporcional adotado no Brasil sabe que o número de cadeiras conquistadas no Legislativo é proporcional ao total de votos conquistado por todos os candidatos do partido somados. Portanto, quanto mais candidatos, melhor – especialmente se, como dissera o representante do partido, a qualidade dos inscritos fora tão alta que o diretório

poderia ter aprovado candidatos para concorrer a todas as vagas. A decisão do partido não fazia qualquer sentido. A crítica se transformou em revolta com o anúncio seguinte: o partido não lançaria candidato à prefeitura de São Paulo. Vinte filiados haviam se inscrito para a vaga de précandidato à prefeitura; desses vinte, treze foram aprovados para a segunda fase do processo. Mas nenhum fora considerado apto a concorrer à eleição.   Os A30 e V30, reunidos pela primeira vez, ouviram com assombro a explicação da então presidente do diretório estadual paulista: “Nenhum dos concorrentes possuía ‘luz, carisma e propriedades pessoais acima da média[49]’”. Mas os presentes sabiam que, entre as candidaturas apresentadas para a prefeitura, estavam Luiz Philippe de Orleans e Bragança e lideranças como Davi Oliveira e Naomi Yamaguchi. A explicação não tinha qualquer lógica. Os presentes questionaram se esse rigor extremo não era contraproducente e danoso ao objetivo de longo prazo do partido. Nas palavras de um dos filiados presentes, “por mais exata e acertada que seja a régua do partido, há momentos em que a sensibilidade humana deve falar mais alto”. Disse outro: “Temos que usar esta eleição para aprendizado, pois não vamos ganhar. Não precisamos de outra eleição apenas para aprender como fazer uma campanha para vereador”. Luiz Aguilar, líder da equipe de Inteligência Eleitoral, apresentou uma análise dos resultados e da legislação. A decisão de não lançar candidatura à prefeitura paulistana seria danosa, afirmou ele, não apenas emocionalmente, mas também do ponto de vista racional. Ela resultaria em perda de tempo de exposição na mídia, nos debates, na veiculação gratuita em horário nobre e no engajamento de filiados e simpatizantes.

Nenhum argumento foi considerado pela direção do partido. Os filiados e apoiadores presentes, então, votaram pelo lançamento de um candidato à prefeitura de São Paulo. Essa decisão tomou a forma de um abaixo-assinado, elaborado por Rodrigo Sanches e encaminhado ao diretório nacional. A bola agora estava com o diretório. Cabia a ele dissipar a impressão de que a centralização excessiva estava levando o Novo no mesmo rumo dos outros partidos e praticar o que pregava: respeito pela liberdade individual e pelo indivíduo como agente de mudanças. Na semana seguinte acontecia nova reunião, dessa vez com a presença do presidente nacional do partido. Filiados e voluntários voltaram à Fecomércio e apresentaram, de novo, seus argumentos. Depois de ouvir a todos, João anunciou que estava atrasado para pegar um voo e saiu sem responder aos questionamentos. Apenas repetiu que não haveria candidato à prefeitura e que aquela era a decisão correta. “Confiem em mim”, ele disse, e foi embora.     Um dos filiados que havia participado do processo seletivo para a candidatura à prefeitura, Davi Oliveira, decidiu utilizar o recurso do estatuto que previa a ida para a convenção partidária do pré-candidato que reunisse um número de apoios correspondente a 10% dos filiados do diretório municipal. Era a mesma posição que eu adotara no Rio: exigir que o partido cumprisse o próprio estatuto. Mas, quando os documentos com as assinaturas de apoio chegaram ao diretório de São Paulo, Davi recebeu um telefonema do partido. Os dirigentes questionavam o motivo daquela mobilização, já que estava decidido que não haveria candidato. Para Davi, a resposta era óbvia: os filiados queriam um candidato e não concordavam com o

posicionamento do partido, e o recurso estava previsto no próprio estatuto. Era evidente que o diretório teria o poder de veto – e foi exatamente isso que fizeram, depois de tentar, sem sucesso, tentar convencer Davi a retirar sua candidatura. Davi ainda recebeu uma oferta para ser candidato a vereador, mas não aceitou e se desfiliou logo após a convenção do partido.       No final do mês de maio de 2016, filiados do Brasil inteiro assinaram um manifesto do 30 Diários. Segue um trecho abaixo: “Os eventos relacionados às primeiras eleições a serem disputadas pelo NOVO têm levado a um crescente número de questionamentos quanto aos processos internos e decisórios e suas consequências, a curto e longo prazo. A preocupação com a evolução do partido e seu projeto de Brasil é compartilhada por filiados de todo o país. Confiando no espírito liberal e na boa-fé dos fundadores, reafirmamos o nosso desejo de trabalhar de maneira construtiva na busca de um projeto de partido alinhado com a expectativa de todos. Tomados por este sentimento comum, resolvemos, amparados pelo Estatuto e por aclamação, publicar esta carta aberta, convocando os filiados a reafirmar os valores e princípios que nos uniram: confiança, transparência, ética e o respeito mútuo e democrático, consagrados em seu Estatuto. (…) comunicamos por meio deste documento o desejo de oficializar a CORRENTE NACIONAL DE FILIADOS DO NOVO, o CONFIA-NOVO, cujo objetivo será o de aglutinar os anseios e aspirações dos filiados, contribuindo de forma construtiva para o crescimento e o desenvolvimento do NOVO.”

    No dia 4 de junho de 2016, quarenta filiados[50] de quatro estados brasileiros reuniram-se na casa de Paulo Lázaro de Moraes e fundaram o 1° movimento independente de filiados ao Partido Novo, o CONFIA. Baseado no tripé

“Filiados – Dirigentes – Parlamentares”, a corrente defendia os principais valores do Novo, com o objetivo de contribuir para que o partido cumprisse sua missão. Ao final daquele mês, o movimento já contava com a participação de 150 filiados de seis estados. O estatuto do partido previa que todos os pré-candidatos deveriam ser votados e aprovados pelos filiados na convenção partidária, a ser realizada em 31 de julho[51]. Mas houve apenas a apresentação dos candidatos aprovados pelo “processo seletivo” e uma votação simbólica, ratificando a decisão do diretório e relegando os filiados a meros espectadores. Foi um banho de água fria. A mensagem era clara: as decisões não passariam pelo indivíduo, e o filiado seria apenas um soldado obediente. Seguiu-se uma onda de desfiliações em São Paulo.

     

Júlio Cesar Casarin, candidato a vereador pelo partido em São Paulo, processou o então presidente do diretório municipal e o próprio partido, pedindo ressarcimento por danos materiais e morais resultantes de ataques do próprio partido à sua campanha. Diz um trecho da ação[52]: Para espanto do autor, numa estratégia totalmente equivocada, que provou ser um tiro no pé, o partido começa a tratar filiados de forma “bovina”, dizendo em alto e bom som nas reuniões que “Aqui é partido que tem dono, manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Isto era voz corrente nos encontros e o autor tem dezenas de testemunhas.  

Em outro trecho, Júlio descreve a razão da perseguição de que foi vítima:   Alguns amigos da diretoria confessaram ao autor que o partido tinha seus escolhidos e “preferidos” para eleger e que estes seriam beneficiados de todas as formas [...] O autor era visto como uma ameaça, pois sua forte militância política o levava a ter um prestígio nas redes sociais, que, se

transformado em votos, o guindaria aos primeiros lugares entre os postulantes do NOVO aos cargos no legislativo municipal e isto não era desejado pelo partido. Segundo tais amigos, o autor estava sendo boicotado de todos os eventos, convites, hangouts, verbas, [...]    

Júlio então descreve a tentativa final de sabotagem de sua campanha:   [...] A dez dias do pleito e a poucas horas do maior evento de sua campanha [...] o autor publica mais um vídeo em sua página do Facebook, desta feita falando sobre questões relativas ao IPVA (imposto estadual). E pasme, Excelência; na própria página do autor, sem qualquer autorização para tal, de forma sórdida e rasteira, o presidente municipal do Novo 30 (partido pelo qual concorria o autor) escreve com todas as letras: ISTO NÃO É PROPOSTA, É ENGANAÇÃO!!!! [...] o autor foi impugnado, sabotado, preterido, destroçado pela sua própria sigla partidária.

Antes do julgamento da ação, o presidente municipal propôs o pagamento de uma indenização a Júlio Cesar para que ele encerrasse o processo, o que foi feito. Com isso, o juiz considerou extinta a segunda ação contra o partido[53].      

Passados dois meses de minha palestra na cidade, o grupo dos apoiadores do Novo em Sorocaba, liderado pelo Dr. Vinícius Rodrigues, continuava com as reuniões semanais de estudo do estatuto. O grupo incluía, até onde eles sabiam, todos os filiados da cidade. Mas em abril de 2016 eles descobriram, no site do TSE, que o número oficial de filiados do município era maior do que o número de participantes das reuniões: havia filiados que ainda não faziam parte do grupo. Eles, então, entraram em contato com o partido, através do “fale conosco”, solicitando as informações de contato dos filiados da cidade, para que todos pudessem ser convidados para as reuniões do grupo.   A resposta da Renata, do “fale conosco”, foi:

  Infelizmente, não podemos passar essas informações, pois não temos autorização para isso. Nosso Estatuto prevê a divulgação de dados dos filiados apenas para pré-candidatos, para que possam divulgar suas propostas.

Vinícius respondeu explicando que a questão estava claramente definida no artigo 12 do estatuto: era direito de qualquer filiado obter informações sobre outros filiados, e não só em período eleitoral. A próxima resposta do partido veio assinada por “Gonzaga”: Nossa interpretação do estatuto é que informações de filiados devem ser fornecidas para pré-candidatos a fim de divulgarem suas propostas. Mesmo se não fosse esta a nossa interpretação, as condições sistêmicas atuais nos impediriam de atender esta demanda, pois temos mais de 8.500 filiados.

“Sem problema”, respondeu Vinícius, percebendo naquela resposta um subterfúgio. “Nosso grupo está disposto a contratar os serviços de um profissional para criar e organizar o cadastro, sem qualquer custo para o Novo”. A posição do partido continuou a mesma. “Gostaríamos de marcar uma reunião presencial com algum representante do núcleo estadual”, pediu Sorocaba. “Peço que informe em detalhes qual seria o objetivo da reunião”, respondeu “Gonzaga”. Vinícius então envia um último e-mail com a explicação detalhada, que termina assim: Essa reunião é para nos acertarmos! Afinal, quando nos envolvemos inicialmente com as ideias do NOVO, durante uma palestra do João, ele disse que buscava sócios, e não filiados. O que sócios fazem quando não se entendem sobre o estatuto da empresa? Sentam-se à mesa e conversam sobre os rumos, os planos e as interpretações de cada lado! Buscando ouvirem e serem ouvidos pelo bem maior que é o projeto, nesse caso, o NOVO.

A resposta de “Gonzaga”, enviada em e-mail de 25 de abril, foi: Todos os assuntos que serão abordados na reunião já foram esclarecidos. De modo objetivo, não vemos necessidade de haver reunião para tratar destes assuntos.

Conversando com filiados de São Paulo, Salvador e Rio, Vinícius e seu grupo descobriram que coisas semelhantes

ocorriam nas outras cidades; a postura do diretório era a mesma. Vinícius ainda recebeu um último e-mail de uma pessoa ligada ao presidente, que dizia: “Pare de questionar, confie no João. Ele é muito competente, foi ele que construiu o partido”. A resposta de Vinícius foi: Um partido político não é uma casa. Se eu construo uma casa para mim, posso definir quem entra e quem não entra, e defino suas regras e horários de funcionamento, porque é a minha casa. Mas o partido é como um filho; você o cria, educa, passa os seus valores, mas ele não pertence a você. Uma vez que o partido exista, a sociedade pode entrar nele e mudar os seus rumos. O João acha que o partido é uma casa, e não um filho.

Algumas semanas depois, todo o grupo de Sorocaba também se desfiliava do partido.  

Capítulo 15 Rio Grande do Sul[54] Mateus Bandeira conheceu João Amoêdo entre 2013 e 2014, apresentados por um amigo em comum.   Mateus era CEO de uma das empresas de consultoria mais prestigiadas do Brasil, a Falconi Consultores de Resultado, firma que ele, Mateus, tinha recebido como missão reestruturar. Como parte dessa missão, Mateus já fora responsável pela mudança do nome – a empresa antes se chamava INDG. Era mais uma posição em uma carreira que começara como analista de sistemas, seguira na Secretaria de Fazenda do Rio Grande do Sul, passara pelo Ministério da Economia, pelo Senado, pelo tesouro estadual na administração da governadora Yeda Crusius, pela Secretaria de Planejamento do estado e pela presidência do Banrisul. Mateus também tinha sido bolsista da Fundação Estudar, fundada por Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles.   Embora interessado no Novo, Mateus preferiu não se filiar ao partido para não prejudicar a consultoria. Em abril de 2016, Mateus e João se encontraram em um seminário organizado por estudantes brasileiros da Universidade de Chicago – o mesmo no qual falou Sergio Moro. Meses depois, João foi convidado a falar sobre o Novo em um dos eventos mensais que Mateus realizava em São Paulo e, no final de 2016, João assistiu, como convidado especial, ao evento anual organizado pela Falconi, que reuniu os exministros Pedro Malan e Gustavo Franco.    João então convidou Mateus para uma conversa, que aconteceu em um almoço na Churrascaria Fogo de Chão, na Praia de Botafogo, no Rio, na quinta-feira 19 de janeiro de

2017. Segundo Mateus, João explicou a situação do Novo e disse que o partido se preparava para lançar candidatos ao governo em vários estados. No Rio, o plano era lançar Bernardinho; também já tinham candidato em Minas Gerais. “E precisamos de sua ajuda no Rio Grande do Sul”, completou.   “Claro que ajudo”, respondeu Mateus. “Vamos encontrar um bom candidato”.   “Queremos que você seja o candidato”, disse João.  

De jeito algum, respondeu Mateus. Ele não tinha interesse nem disponibilidade. Nem filiado ao partido ele era. Mas certamente ajudaria o partido a encontrar um candidato, só isso. E assim ficou a conversa.   Na semana seguinte Mateus se reuniu com Falconi, o sócio principal que dava nome à empresa, para falar sobre questões relacionadas à reorganização – e essas questões acabariam levando Mateus e outros três sócios a deixarem a consultoria.   Quando João soube da notícia, ligou e renovou o convite: “Vem com a gente”.   Mateus levaria três meses até tomar uma decisão. Era um desafio grande. O estado tinha apenas 400 filiados e, como o partido não faria coligação, não teria nenhum tempo de TV. Nesse meio-tempo, ele conversou com muita gente, incluindo ex-conselheiros da Falconi e empresários gaúchos.   E resolveu aceitar.        

 

Em outubro de 2017, Mateus se filiava. Com o apoio de Winston Ling, ajudou a convencer o deputado estadual Marcel Van Hattem, então no PP, e uma estrela do liberalismo no país, a vir para o partido. Marcel também recebeu o incentivo de muitas outras pessoas. “Mas ele vai ter que fazer o processo seletivo”, disse o diretório. Processo seletivo? Para um parlamentar excepcional, cujo trabalho em favor da liberdade era público e notório? Mas Marcel não viu problema algum nisso: o “processo seletivo” foi feito e ele foi para o Novo, dentro do prazo previsto na lei para troca de partido – a janela partidária.   Alguns meses depois, Mateus participou em São Paulo de um evento do banco JP Morgan, no qual estava presente Rogério Chequer, um dos dois fundadores do movimento Vem Pra Rua. Mateus ficou sabendo que Chequer tinha dois convites – um deles do PSL – para sair candidato a deputado federal, e sugeriu que o Novo conversasse com ele.   Feito o convite, Chequer aceitou: seria candidato ao governo de São Paulo.   E aí começou a acontecer uma coisa estranha: nada.  

Nenhuma providência era tomada para preparar a candidatura de Chequer. O tempo passava e, preocupado, Chequer procurou Mateus, que, por sua vez, procurou o então presidente do Novo (João havia se afastado para se candidatar a presidente da República). Por telefone, Mateus ouviu a explicação do presidente do partido para a falta de providências:   "A gente acha que ele não é o candidato ideal."  

Atordoado com a explicação, Mateus ligou para o presidente do diretório estadual de São Paulo, que estava furioso, mas não podia ajudar. Mateus então ligou para uma dirigente nacional do partido, que recomendou: “Você tem que falar com o João".   Embora João não fosse mais presidente, foi só depois de uma conversa com ele que se chegou a um acordo: Chequer apresentaria um plano de governo, e o partido decidiria sobre a candidatura.   O plano de Chequer foi aprovado e em maio de 2018 o Novo lançava as candidaturas de Chequer a governador e de Christian Lohbauer ao Senado.            

Para a estratégia de campanha de Mateus Bandeira, era importante que o partido lançasse um candidato ao Senado pelo Rio Grande do Sul. Depois de hesitar, o partido convidou um ex-presidente do Instituto de Estudos Empresariais, que não aceitou. O partido então convidou o advogado Bruno Miragem, que conversou com Mateus.   Bruno aceitou o convite e, depois de aprovado nas sabatinas partidárias, tomou as providências iniciais: transferiu a titularidade do escritório de advocacia para sua esposa e pediu licença da universidade.   Mas, no início de abril, Bruno liga para Mateus e diz: “O partido não formalizou minha candidatura”. Mateus então liga para o presidente nacional do partido.  

"Não vamos ter candidatura ao Senado", responde o presidente. “É decisão tomada.”   Mas nada havia sido comunicado nem ao Mateus nem ao Bruno.   “Então o partido também não terá candidatura ao governo do estado”, foi a resposta de Mateus. “Vocês têm 24 horas pra resolver isso”.   Antes do prazo estipulado, o partido entrava em contato: “Resolvemos o problema”, informaram a Mateus. “Vamos publicar um edital de processo seletivo, e o Bruno poderá se candidatar”.   Não foi preciso. Diante desse quadro, Bruno Miragem desistira da candidatura.   Mateus então convidou Bruno para ser candidato a seu vice-governador. E aí surgiu um novo problema.   “Não é assim que funciona”, informou o partido. “Essa decisão tem que passar pelo diretório."   “Vou inscrever a chapa com o nome do Bruno", respondeu Mateus. “E vocês façam o que quiserem.”   O partido acabou aceitando.          

No dia 6 de setembro de 2018, o então deputado federal e candidato favorito à Presidência da República, Jair Bolsonaro, era carregado nos ombros de uma multidão em Juiz de Fora quando foi ferido com uma facada no abdômen.

Uma onda de espanto e comoção varreu o país. Bolsonaro estava fora da campanha, e correndo sério risco de morte.   Era um momento grave e trágico, sem comparação na história recente.   Naquele dia, Mateus Bandeira, cidadão brasileiro e candidato do Partido Novo ao governo do estado do Rio Grande do Sul publicou, na sua conta da rede social Twitter, uma mensagem:   “Deputado @jairbolsonaro, estimo tuas melhoras e, como candidato ao governo do Rio Grande do Sul pelo @partidonovo30, saibas que tu contas com nossa solidariedade para superar este episódio e continuar na corrida presidencial.”

 

Pouco tempo depois ele recebia uma ordem do partido: "Apaga esse tuíte".   Mateus não apagou.          

Próximo ao final da campanha, Mateus foi convidado para um debate de candidatos na TV Record. Era uma grande oportunidade. O debate estava marcado para o último sábado de setembro, dia 29, às 13h25.   Faltando poucos dias para o debate, Mateus recebeu um recado do diretório estadual: “João mandou te avisar que ele vai fazer o encerramento no Parcão (apelido do parque Moinhos de Vento, em Porto Alegre) no sábado às 14h".   Era quase exatamente na hora do debate.   Mateus ligou para o coordenador de campanha do João – que em 2020 viria a ser o candidato a prefeito do partido na cidade do Rio de Janeiro – para pedir ajuda. Recebeu o

conselho: “Você precisa se entender com o diretório estadual".   Quando Mateus afinal conseguiu falar com o João, ouviu exatamente a mesma coisa: "Você tem que se acertar com o diretório".   Mas era evidente que o problema não era o diretório estadual.   Não houve nenhum tipo de acerto.        

O encerramento da campanha presidencial do Partido Novo foi realizado no Parque Moinhos de Vento, com a presença de Bernardinho e da militância partidária, exatamente no mesmo dia e hora em que o candidato do partido a governador, Mateus Bandeira, participava do debate da Record.   Alguns meses após o fim da campanha, Mateus se desligava do Novo, junto com uma centena de filiados.   Sua carta de desfiliação[55], divulgada publicamente, dizia:   O Novo surgiu com o claro propósito de ser diferente, firmando-se como alternativa aos brasileiros cansados da velha política. Pretendia ser novo na atitude, na participação voluntária, no desejo de transformação, na busca pela liberdade [...]   Queríamos uma sigla sem dono, construída efetivamente pelas pessoas. Idealistas, buscávamos construir uma nova cultura política [...]   Porém, com o passar do tempo, fomos percebendo que a teoria do Novo não se refletia na prática. Desde a campanha, discordamos de diversas atitudes tomadas pelo Diretório Estadual e pelo Diretório Nacional. De forma centralizadora, as decisões são impostas de cima para baixo. Também, os dirigentes não percebem a importância de um

firme posicionamento contra a hegemonia de esquerda no atual momento. Confundem toda política com velha política, negando a máxima de que a política é a arte do possível.   Todas as tentativas de colaborarmos foram desconsideradas. Grupos de filiados de diversos estados registraram fatos que comprovam o descompasso entre a realidade e o que o partido prega [...]   Devido aos fatos expostos e por não vermos no horizonte chance de mudança na condução do partido, decidimos pela desfiliação. Saímos do Novo, mas levamos conosco todos os valores que nos uniram. Continuaremos empenhados e buscando espaços de participação onde possamos colaborar para melhorar a política nacional.   Porto Alegre, 3 de abril de 2019.

Capítulo 16 Depois da Tempestade Sempre escrevi muito. Ao longo dos anos o material foi se acumulando, e eu tive a ideia de fazer um livro. Trabalhei meses revisando tudo e preparando um capítulo especial sobre o assunto que me interessava mais: segurança pública. Só havia um problema: nenhuma editora se interessava. Para um autor estreante e desconhecido, sem o aval da academia, publicar um livro é tarefa quase impossível. Se for um livro de ensaios sobre política, cultura e criminalidade, como era o meu – esquece. Em maio de 2016, retomei a ideia. Surgia então uma nova alternativa para autores na minha situação: o financiamento coletivo, ou crowdfunding. Através de sites especializados você podia apresentar sua ideia ou projeto, e os interessados contribuíam para a sua realização (o site ficava com um percentual das contribuições).   Escolhi o site, montei a campanha e ficou tudo pronto no final de maio. Cada pessoa que contribuísse com um valor mínimo ganharia um livro. No dia 14 de junho, lançamos a campanha, que foi até 11 de agosto, atingindo o objetivo através da contribuição de 362 pessoas. Levantamos recursos suficientes para a impressão e envio de 1.000 exemplares do livro Ou Ficar A Pátria Livre: Ideias Para o Bom Combate Contra Pilantras, Tiranos e Populistas e o Monopólio Ideológico da Virtude , que hoje está esgotado. Nos últimos dias do financiamento coletivo, ainda faltava um valor significativo para viabilizar o projeto. De repente, entrou uma doação naquele valor. Imediatamente entrei em contato com o doador, Felipe Aprigliano, disse que gostaria de conhecê-lo e o convidei para almoçar. Nos encontramos na cidade, no restaurante do prédio da FIRJAN. Felipe era

uma pessoa simples, com uma vida normal, e interesse genuíno em melhorar o Brasil. Sou muito grato a ele por ter viabilizado a publicação do meu primeiro livro.      

Em julho de 2016, Juliana Volpe, que esteve entre as primeiras pessoas a se envolver no projeto do Novo, me chamou para conversar. Junto com dois sócios, Juliana tinha criado a iDTV, uma startup que inventou um nicho único de mercado: o fornecimento de serviços de TV corporativa para plataformas de exploração de petróleo e navios-sonda. Embora ainda pequena, a empresa já tinha filiais em Houston e Dubai e presença em Londres. Ela estava de malas prontas para um MBA nos EUA e precisava de alguém que a substituísse como CEO da empresa. Embarquei naquela nova missão, que me traria muita satisfação nos anos seguintes.       O interesse pela política seguia comigo. No final do ano realizamos em um auditório do Edifício Argentina, na Praia de Botafogo, o primeiro evento do i9, uma iniciativa concebida pelo Leo Fiad para abrir novos caminhos para atividade política de qualidade. O nome do evento foi Os Liberais e o Brasil Pós-Impeachment. Estiveram presentes, entre outros, Alexandre Borges, Pedro Duarte, Priscila Chammas e Bernardo Santoro. Beate Forbirger e Helio Beltrão abriram o evento com o painel “A Redescoberta do Liberalismo no Brasil”.      

Em novembro de 2016, fui procurado por alguém que eu não conhecia – João Sardinha, que havia sido candidato a vereador pelo Novo no Rio de Janeiro (era a sua primeira e, segundo ele, última candidatura). Nos encontramos para um café no Cine Odeon, na Cinelândia. O motivo do contato, ele me disse, é que muitas pessoas que haviam se candidatado a vereador pelo Novo no Rio, inclusive ele, estavam revoltadas com a atitude do partido, ou pelo menos de seu líder. Sardinha então teve a vontade de conhecer e conversar comigo – alguém que, até aquele momento, era apresentado dentro do partido como um “desertor”. O motivo da revolta dos candidatos: em uma das últimas reuniões antes das eleições, o presidente do partido, João, deixara claro – segundo Sardinha – que havia um candidato favorito que receberia a maior parte do apoio. Segundo outro candidato presente à reunião, João teria dito que a campanha era como a corrida ciclística “Tour de France”, onde todos eles trabalhariam para um escolhido vencer. João Sardinha teve então conhecimento das doações do próprio João a esse candidato, que seria Leandro Lyra. O apoio do presidente do partido a um candidato preferido pegou de surpresa até os próprios funcionários do escritório do Novo no Rio. Quando questionados por Sardinha sobre as doações do presidente a apenas um candidato, eles inicialmente negaram, afirmando tratar-se de uma “teoria da conspiração”; depois, constrangidos, confirmaram o fato, sem dar (na verdade, sem poder dar) qualquer explicação. Quando apenas o candidato favorito foi eleito, vários outros candidatos se sentiram usados e pediram uma reunião para conversar comigo. A reunião acabou nunca acontecendo, mas o Sardinha – um cara sério, idealista e agradável – é meu amigo até hoje.  

A candidata a vereadora que tinha sido a segunda mais votada no Rio em 2016 – ou seja, aquela que era a primeira suplente – deixou o partido logo após as eleições, insatisfeita com o tratamento que recebera dos dirigentes. O único vereador eleito, Leandro Lyra, iria, dois anos depois, se desentender com a direção do partido – um desentendimento que chegou à Justiça – e se desligar dele em 2020. Antes de sair, em abril de 2018, Leandro Lyra enviou ao diretório nacional do partido um memorando sobre a reforma do estatuto feita pelo partido pouco antes, em junho de 2017. Segundo o documento de Leandro[56], a reforma, que foi feita sem qualquer divulgação interna ou externa e sem nenhuma transparência, fez alterações no estatuto que, “além de irem contra princípios democráticos, republicanos e liberais, atentam contra as próprias diretrizes e ideias defendidas pelo NOVO”. O resultado foi a concentração ainda maior de poder no Diretório Nacional, em particular no presidente, inclusive retirando os deputados federais da convenção.    

Entre as qualidades conhecidas de um certo deputado carioca do PSOL, amante da piscina do hotel Copacabana Palace, não está a de defensor do meio ambiente. Apesar disso, no dia 21 de agosto de 2019, em sua conta no Twitter, o deputado questionou o Partido Novo sobre o fato de o ministro Ricardo Salles ser filiado e estar, de acordo com o deputado, “à frente das políticas de devastação ambiental do governo Bolsonaro”. No dia seguinte, 22 de agosto de 2019, a direção do Novo publicou, prontamente, nas redes sociais, um [57] esclarecimento em relação ao ministro . O partido informou que não indicara Ricardo Salles para o Ministério do Meio Ambiente e nem influenciava sua atuação.

Enfatizou, ainda, que Salles não representava o Novo e respondia diretamente ao presidente Jair Bolsonaro. O partido foi criticado pelo posicionamento; vários dos críticos acusaram o partido de ter se rendido à narrativa da esquerda e, com receio de desgaste, jogado seu filiado, Ricardo Salles, aos lobos – ou melhor, aos PSOListas. O próprio deputado do PSOL renovou sua crítica, afirmando que o Novo não teria tido “coragem de se posicionar sobre as atrocidades de Salles”. Em seguida, iniciou-se dentro da própria organização do partido um movimento contra o ministro Ricardo Salles. Alguns dias depois da nota oficial do Novo, no dia 25 de agosto de 2019, um deputado estadual eleito pelo partido no Rio de Janeiro publicou em sua conta no Twitter a notícia de que ele e mais dois filiados – um ex-candidato ao governo do Rio pelo Novo em 2018 e um ex-candidato a deputado federal pelo Novo, também em 2018 – tinham entrado, no dia anterior, com um requerimento contra Ricardo Salles na Comissão de Ética do Partido[58]. O requerimento solicitava que Salles fosse suspenso do quadro de filiados enquanto o partido avaliaria a possibilidade de sua expulsão definitiva. No dia 7 de maio de 2020 a Comissão de Ética do partido decidiu pela expulsão do ministro Ricardo Salles do Novo. A ironia da história é que, no momento em que escrevo este texto, em abril de 2021, nenhum dos quatro personagens dessa história – o ministro Ricardo Salles e seus três acusadores[59] – pertence mais ao quadro de filiados do partido.        

Capítulo 17 Ideologia, Eu Quero Uma Pra Viver Quando o Novo foi concebido, ele não tinha qualquer ideologia explícita ou pensamento teórico formulado. Nosso objetivo era apenas melhorar o Brasil.   Eu nada conhecia sobre liberalismo. Zero. Tive minhas primeiras lições assistindo às palestras que Rodrigo Constantino fez para o grupo inicial do partido. A primeira vez que ouvi falar de Escola Austríaca, achei que era uma escola do Rio, como a Escola Americana e a Escola Alemã. As primeiras informações organizadas que tive sobre Mises e Hayek foram nas palestras de Helio Beltrão.   Nos anos em que morei nos EUA eu havia experimentado na prática, na vida real, a enorme diferença entre o padrão de vida americano e o brasileiro, e comecei a relacionar essa diferença a alguns contrastes gritantes entre o Brasil e os EUA. Por exemplo: notei que quase tudo que eu comprava nos supermercados e lojas dos Estados Unidos era importado. Inexistia o preconceito governamental contra importações que eu conhecia no Brasil. Os carros dos Estados Unidos eram quase todos japoneses. A castanha de caju, de altíssima qualidade, que eu comprava no mercado de Washington era mais barata que a castanha de segunda linha à venda no Brasil. Casas, carros, educação: tudo nos EUA era financiando a prazos longos e com juros baixíssimos. O americano detestava o governo federal, ao contrário do brasileiro, mas respeitava e participava do governo local, também ao contrário daqui. Era possível morar em praticamente qualquer lugar, porque em quase todos os lugares havia emprego e oportunidades – ao contrário do Brasil, onde tudo se concentra nos grandes centros urbanos. Os pobres americanos moravam em casas

que dariam inveja à classe média brasileira. A maioria desses pobres possuía carros (segundo Alan Reynolds, no livro Income and Wealth, em 2001 aproximadamente 72% dos americanos classificados oficialmente como abaixo da linha de pobreza eram donos de um automóvel).   Essas observações me ensinaram o que dava certo em termos de política pública e cultura nacional. Mas só fui encontrar o embasamento teórico para aquela experiência de vida muito depois de voltar ao Brasil.   O Novo não foi lançado como um partido liberal. Esse nunca foi o posicionamento quando o criamos. O primeiro slogan do Novo, ainda bem no início, era “Gestão e Cidadania”. Criamos um partido cujo objetivo era profissionalizar a gestão pública e permitir o acesso de cidadãos comuns à política. No início era só (ou tudo) isso.   Muitos apoiadores da filosofia liberal se identificaram com as propostas iniciais e as práticas do Novo, e se juntaram a nós. Existia também, entre os primeiros participantes, um número elevado de libertários, o que tornava as discussões interessantes, e às vezes fazia subir a temperatura. Eu nunca tinha ouvido falar de libertarianismo.   Como disse o Felipe Dias, em uma discussão por e-mail em 3 de dezembro de 2013:   [...] temos que lembrar que o Novo não é um partido liberal, ele é um partido que adota o liberalismo porque entende que esse é um caminho mais eficiente e correto para o desenvolvimento de uma sociedade melhor. Há uma diferença. Um partido liberal colocaria as escolas com vouchers de educação ou aboliria as escolas públicas, mas nós precisaremos pensar como trazer eficiência para escolas, no modelo brasileiro atual.

   

No dia 22 de dezembro de 2014, eu enviei o seguinte email para o fórum de discussões do Novo Rio de Janeiro:   Tenho respeito por pensadores que estudam profundamente assuntos e esclarecem e explicam conceitos e ideias.   Mas meu respeito é ainda maior por aqueles que, mesmo sem ter o mapa completo na mão, começam a navegar.   Nosso objetivo é chegar em um país melhor. Um país próspero, onde possamos viver com liberdade e segurança.   O navio que vai nos levar lá é o NOVO. Usamos instrumentos de navegação: um deles é o liberalismo (outro é a ciência econômica, outro o direito, etc.).   É um erro confundir o meio de transporte ou o instrumento de navegação com o objetivo final.

  Esse era o meu pensamento. Em outro e-mail, de 30 de março de 2015, eu dizia:   Vale a pena lembrar mais uma vez: o NOVO não se posiciona nem se classifica como um partido liberal. Não se esqueçam disso.   E aí temos um segundo ponto: nós temos, sim, um projeto para o Brasil, que não se limita a repetir que o Estado é um mal e precisa acabar. Nosso projeto é reduzir o tamanho do Estado e aumentar a eficiência das áreas essenciais, reduzindo impostos, desregulamentando e implementando várias outras ideias e propostas que estão atualmente em discussão entre nós. Provavelmente isso tomará a forma de um documento a ser divulgado em breve.

          À medida que o tempo passava, é justo dizer que o Novo foi, sim, incorporando firmemente no seu ideário conceitos do liberalismo econômico e até algumas pitadas de libertarianismo.  

Na minha opinião de hoje, em 2021 – opinião construída ao longo de muitos anos e de duras e custosas lições de vida e política – ficou faltando ao Novo incorporar aspectos do conservadorismo político, especialmente preocupações com a guerra cultural (única forma de reverter a dominação absoluta que a esquerda exerce hoje sobre todas as instituições); com a defesa incondicional da liberdade, opondo-se a todo tipo de totalitarismo, de esquerda ou de direita; com a defesa do modelo republicano, opondo-se ao ativismo judicial e a qualquer interferência na separação dos poderes; e com a apresentação de uma pauta clara de valores morais – esta última, elemento essencial para enfrentar as questões mais críticas do país: a impunidade e a destruição do sistema de justiça criminal.             Desde o início, os pontos principais do ideário e do programa do partido eram discutidos em nossas reuniões semanais, em debates que entravam pela noite. Todo mundo tinha uma opinião, e a maioria não hesitava em dizer o que pensava. Queríamos um partido que representasse uma ruptura com o modelo tradicional, paternalista, populista e patrimonialista de fazer política, e que refletisse nossos valores.   Eu recebia um enorme volume de sugestões por e-mail e Facebook. Muitas vezes, após as apresentações, eu era abordado por simpatizantes entusiasmados que me entregavam calhamaços de papel com estudos sobre os mais variados assuntos (reforma tributária era um dos temas favoritos). Meus registros mostram uma ampla variedade de sugestões, que iam do requisito de ficha limpa

para candidatos até ideias menos ortodoxas, como, por exemplo, revogar todas as leis que criminalizam o não pagamento de tributos.   Conceitos como liberdade individual, livre mercado e eficiência na gestão estiveram presentes desde o início. Outros, como a ideia de criar mecanismos para evitar que política fosse transformada em uma profissão, em vez de ser apenas o exercício temporário de uma representação da sociedade, surgiram depois.   O fato é que as discussões entre os participantes e apoiadores foram muitas, longas e acaloradas, e geraram extenso material. Ao mesmo tempo que elas ocorriam, a cúpula do partido, que, à exceção do João, ficava toda em São Paulo, tinha as suas próprias conversas, nas quais – não há dúvida disso – a palavra final era do João.   O produto final – o que ficou conhecido como os “princípios e valores” do Novo – foi um dia apresentado a todos e, como correspondia mais ou menos ao que a maioria pensava, foi aceito sem grandes problemas.   Os valores eram: Liberdades Individuais com Responsabilidade, Indivíduo Como Único Gerador de Riquezas, Igualdade Perante a Lei, Livre Mercado, Indivíduo Como Agente de Mudanças e Visão de Longo Prazo.   Além disso, foram definidas algumas regras que, embora o nome não seja o melhor, foram chamadas de princípios:   - Filiados e candidatos devem preencher os pré-requisitos da lei Ficha Limpa.   - Limitação ao carreirismo político: é vedado ao filiado eleito para cargo no Poder Legislativo se candidatar a mais

de uma reeleição consecutiva para o mesmo cargo (a redação original vedava qualquer reeleição). É também vedada a possibilidade de afastamento do mandato eletivo para concorrer a outro cargo ou ocupar cargo no Executivo.   - Gestão independente: a gestão partidária não pode ser feita por candidato a uma eleição ou por ocupante de cargo eletivo.   - Vinculação do candidato às suas propostas: deve haver a definição prévia de um Compromisso de Gestão e do Compromisso de Atuação Legislativa prevendo metas a serem cumpridas.   - Independência dos suplentes e vices: ambos são escolhidos em convenção de modo independente da candidatura ao cargo principal.   - Não utilização do Fundo Partidário.   - Uso de um processo para seleção de candidatos qualificados.           Acredito ser justo afirmar que a esmagadora maioria dos que participaram das discussões sobre a definição dos valores e princípios tinha pouca experiência prática com política (como atuação em partidos ou campanhas) e quase ninguém tinha experiência eleitoral como candidato.   Era o meu caso, por exemplo. Minha experiência se resumia à participação, curta e limitada, na campanha do Gabeira. Não só minha experiência prática era quase

inexistente como eu também não tinha qualquer formação teórica sobre estratégia política. Os livros que eu leria, e que me informariam sobre os conceitos básicos da prática política e da disputa eleitoral – livros como A Mente Moralista, O Cérebro Político, A Arte da Guerra Política e Regras Para Radicais –, ainda me aguardavam no futuro distante.   É difícil citar aqui tudo o que eu li ao longo dos anos e que contribuiu para a visão de política que tenho hoje – uma visão peculiar, só minha, e que ainda está em processo de evolução. Mas vale mencionar alguns dos principais autores: Thomas Sowell (Economia Básica e Os Intelectuais e a Sociedade), David Horowitz (A Arte da Guerra Política), Saul Alinsky (Regras Para Radicais), Niall Ferguson (A Grande Degeneração), Henry Hazlit (Economia Em Uma Única Lição), Hayek (O Caminho da Servidão), Mises (Ação Humana), Roger Scruton (Como Ser Um Conservador), Russel Kirk (A Mentalidade Conservadora), Christopher Hitchens (Hitch 22, Arguably) e Bastiat (A Lei). Uma lista um pouco maior do que eu li e me influenciou está na bibliografia no final do livro.   Além disso, hoje tenho anos de experiência prática com a política, primeiro no Novo e depois em outros partidos e movimentos. Fui testemunha e participante ativo de um dos períodos mais conturbados da política brasileira, que se iniciou em 2013 com as primeiras manifestações populares, passou pela queda da Dilma e do petismo e pela eleição do Bolsonaro, e ainda não acabou. Conheci e convivi com alguns dos protagonistas mais importantes desse período. Testemunhei sucessos espetaculares e fracassos inacreditáveis, vi pessoas anônimas alçadas ao poder e à fama, e homens poderosos e famosos serem destruídos completamente.  

O conhecimento e a experiência que adquiri inevitavelmente mudaram minha visão em relação a pontos sobre os quais, no início, eu tinha posição dogmática e inflexível, fruto de ingenuidade, idealismo desinformado e falta de vivência.   Mudei. É possível acompanhar a evolução do meu pensamento ao longo dos anos lendo meus livros e artigos, e assistindo aos vídeos que produzi.   Os valores que definimos para o Novo permanecem, para mim, imutáveis – mas, hoje, eu os reescreveria usando termos de mais fácil entendimento e de maior eficiência emocional. Não creio que expressões como “Indivíduo Como Único Gerador de Riquezas” ou “Indivíduo Como Agente de Mudanças”, ou mesmo “Visão de Longo Prazo” mobilizem o grande público, o cidadão comum cuja mobilização é essencial. Vejam: uma coisa é o conceito e outra é a comunicação – a forma com a qual esse conceito é expressado. David Horowitz e Saul Alinsky – dois dos maiores teóricos da guerra política, o primeiro da direita e o segundo da esquerda, respectivamente – explicam bem isso, assim como Drew Westen em O Cérebro Político. Daniel Kahneman analisou em detalhe a forma como as pessoas captam e processam informações; está tudo no seu fantástico livro Pensando Rápido e Devagar. A forma de apresentação de uma mensagem é tão importante quanto o seu conteúdo.   Eu não sabia nada disso quando redigimos as expressões que definiram os valores do partido, em 2011. Agora sei.          

O mesmo se aplica aos “princípios” do Novo. Minha experiência prática, e a própria história do partido de 2016 até hoje, sugerem que algumas dessas regras devem ser modificadas ou simplesmente abolidas.   O Partido Novo não foi criado para obedecer, ad eternum, a um conjunto de regras imutáveis. Essa não é a razão de sua existência. Ele foi criado para tornar o Brasil um país melhor para se viver. Regras são um instrumento, não a finalidade. Acredito que posso afirmar isso com autoridade; fui um dos criadores do partido.   Examinemos o caso da não utilização do Fundo Partidário. A disputa eleitoral é uma guerra. Você não pode entrar em uma guerra e esperar vencer se você abre mão de armas legais que são usadas por seu adversário. Mas então é certo usar dinheiro público para financiar campanhas políticas? Eu continuo achando que não. Porém, enquanto o Fundo Partidário e o Fundo Eleitoral existirem, e estiverem disponíveis aos nossos adversários, não faz qualquer sentido não os usar. Percebam: devemos continuar sendo contra o financiamento público de partidos e campanhas, e trabalhar para que isso, um dia, acabe. Enquanto isso não acontece, não vamos abrir mão dessa arma, ou jamais chegaremos a ter o poder necessário para, efetivamente, alterar as regras de financiamento público de campanhas. Afinal, temos ou não temos confiança na nossa capacidade de usar recursos públicos de forma própria, ética e eficiente?   Outro passo importante é esquecer a visão ingênua expressa na afirmação de que “política não é profissão”. Claro que é – e uma das profissões mais importantes para a sociedade e a democracia republicana moderna. Como observou Fernando Mousinho uma vez, em uma conversa comigo, “todos somos políticos desde que nascemos. Quem

dedica tempo integral, recebendo ou não remuneração, pode ser caracterizado como político profissional”. Nesse sentido, política é uma atividade altamente especializada e que exige dedicação integral – vinte e quatro horas por dia, todos os dias. Não existe político profissional em tempo parcial. É evidente que o sujeito precisa ter preparo, e a evolução da sociedade e da democracia dependem do preparo dos seus políticos. Isso significa dizer, entre outras coisas, que se espera que o candidato a político tenha alguma história; que tenha uma profissão – médico, bombeiro, mestre de obras, advogado, piloto de avião – com alguns anos de experiência; que já tenha assumido responsabilidades profissionais e liderado pessoas. Mas, a partir do momento em que ele se lança em uma carreira política, essa passa a ser sua nova profissão. Negar isso é se recusar a enxergar uma realidade óbvia e presente em todas as modernas democracias ocidentais.   Soa bonito dizer que “política não é profissão” – mas a realidade mostra o contrário. Por exemplo, nas eleições de 2020 para vereador no Rio de Janeiro, o único eleito pelo Novo – uma pessoa cuja trajetória acompanho, e de quem gosto e respeito, cabe enfatizar – foi um jovem que nunca teve qualquer atividade profissional que não fosse a política, desde os tempos de universidade.   E, como política é profissão, é importante que o político tenha liberdade para fazer a gestão de sua carreira, ajudando a promover as suas ideias e o ideário do partido, e aproveitando as oportunidades que surgem, quase sempre inesperadamente. Se alguém, após ser eleito vereador, tem a chance de ser eleito deputado federal dois anos depois (no meio do mandato de vereador), qual o sentido de negarlhe essa oportunidade? “Ele tem que cumprir o mandato para o qual foi eleito”, respondem alguns. Por quê? Se ele tem preparo, se tem as ideias corretas e faz um bom

trabalho, por que fazê-lo perder a oportunidade de se tornar deputado federal, onde seu trabalho terá uma abrangência muito maior?   Quem discute essas questões geralmente não considera um ponto importantíssimo, só bem compreendido por quem já participou de uma disputa eleitoral: estar exercendo um mandato eletivo dá ao candidato uma imensa vantagem competitiva em uma eleição. Explicando de forma mais clara: um vereador que concorre a uma eleição para deputado federal tem muito mais chances de ser eleito do que um cidadão comum, mesmo que não use a máquina pública.   Além disso, se o vereador for eleito deputado, outro candidato do mesmo partido – com preparo similar e o mesmo ideário – irá substituí-lo como vereador. O partido nada tem a perder, ao contrário.   Então, qual o sentido dessa regra? Hoje a minha opinião é: nenhum. É a mesma opinião do vereador Leandro Lyra, eleito pelo Novo em 2016 e que tentou concorrer para deputado federal em 2018. Suas pretensões foram barradas pelo partido em uma disputa confusa, obrigando-o a recorrer à Justiça, que acabou lhe concedendo o direito de ser candidato. Leandro – um candidato excelente, com preparo e conhecimento muito acima da média – teve uma boa votação, mas não conseguiu se eleger.   Em todo esse processo, Leandro foi atacado nas redes sociais, ofendido e acusado de ter traído seu compromisso com o partido. Provavelmente devido a isso, pouco tempo depois ele se desligaria do Novo.   Perderam todos – o candidato, o partido, os eleitores e os filiados. Perderam o Rio de Janeiro e o país.

  As mesmas considerações valem para a regra que proíbe que um parlamentar se licencie do seu cargo para exercer um cargo no Executivo. Ela foi criada com as melhores intenções, e minha participação. Mudei de ideia. O motor principal da política é o poder de realizar, de efetivamente fazer com que coisas concretas aconteçam. Esse poder está desproporcionalmente concentrado no Executivo. Ter a chance de exercer por algum tempo uma função no Executivo como secretário de Estado ou ministro, por exemplo, é uma oportunidade valiosíssima para que o parlamentar coloque suas ideias – e as ideias do partido – em prática e adquira conhecimento e experiência.   Além disso, a projeção e o protagonismo que o parlamentar passa a ter o colocam em outro patamar do ponto de vista de futuras disputas eleitorais – desde que, é claro, ele tenha bons serviços prestados à população. O Congresso tem 513 deputados – quem sabe o nome de todos eles? Mas existem apenas duas dezenas de ministros. A Assembleia Legislativa do Rio tem 70 deputados; a maioria é desconhecida do público em geral. Mas o nome dos secretários estaduais e municipais estão quase todos os dias na mídia.   “Ah, mas você só pensa em eleição”, alguém vai comentar. Eu não – a democracia. O sistema democrático republicano, baseado no voto universal obrigatório, tem um motor: as eleições. O político que não consegue se eleger não existe. O partido que não consegue eleger políticos, não vai existir por muito tempo – e jamais vai conseguir fazer do Brasil um país melhor.   E, no entanto, um deputado estadual eleito pelo Novo em 2018 no Rio de Janeiro teve que renunciar ao mandato no início deste ano (2021) para que pudesse assumir o

importante cargo de secretário de Desenvolvimento Econômico do Município do Rio de Janeiro.   Novamente, perderam todos.           Por último, a regra que virou uma piada de mau gosto: a gestão partidária não pode ser feita por candidato ou por ocupante de cargo eletivo.   Vamos relembrar o espírito com o qual essa regra foi criada: a ideia é que o partido não possa ser controlado por um candidato que use o partido exclusivamente para se eleger (fato comum no sistema partidário brasileiro).   A ideia por trás da regra era (e continua sendo): se você tem pretensões eleitorais, não deve ser gestor do partido.   Como a regra foi burlada: o controlador e presidente do partido se desligou para concorrer às eleições presidenciais de 2018, e depois das eleições reassumiu a presidência.   Qual a diferença entre isso e ele ter se mantido na presidência do partido durante todo o tempo? Será que a influência dele sobre a máquina do partido acabou durante o curto período em que ele esteve fora da presidência?   É uma pergunta justa, honesta, que precisa ser feita.      

Há muita especulação sobre a possibilidade de o Partido Novo ser uma “filial” do PSDB, ou um projeto camuflado de

poder dos mesmos grupos políticos que ditam a política brasileira há décadas. Minha resposta é a seguinte: só quem permaneceu no partido depois da minha saída e ficou responsável por ele – seus dirigentes – é que pode dizer o que aconteceu a partir de 2016. Mas até meu último dia como presidente estadual do Rio de Janeiro, em agosto de 2015, eu posso afirmar que o Novo era exatamente o que foi descrito neste livro: a primeira tentativa de se criar um partido no Brasil sem a interferência de políticos.   Um projeto arriscado, ingênuo, muitas vezes refém da inexperiência e, depois, da mosca azul que morde os que se aproximam do poder – mas um projeto sincero e genuíno, ao qual centenas de cidadãos comuns, por todo o país, dedicaram seu esforço, seu tempo e seu dinheiro, e no qual depositaram suas últimas esperanças de um futuro melhor.   Eu tenho um compromisso com essas pessoas, que eu honro até hoje. Foi pensando nelas que escrevi este livro.   É evidente que eu nunca tive acesso a todas as conversas ou fui incluído em todas as reuniões que aconteceram nos anos em que o Novo foi formado. É provável que muitas coisas tenham acontecido das quais eu nunca tive conhecimento. Mas minhas discordâncias – em certas questões, profundas e éticas – com o rumo que o partido tomou, as circunstâncias que provocaram a minha saída e as atitudes inconcebíveis vindas de pessoas que diziam buscar a renovação da política não são elementos suficientes para concluir que tudo era uma farsa, criada para inserir no jogo uma nova força política, com cara moderna e cheiro de nova, que não passa de um instrumento de perpetuação dos mesmos grupos de sempre.  

É preciso lembrar que concebemos a ideia do Partido Novo em uma época em que Luiz Inácio Lula da Silva era considerado grande estadista e redentor dos pobres, e na qual o PSDB de FHC e Aécio Neves era considerado um partido de direita.   É importante não menosprezar as dificuldades que enfrentamos ao tentar lançar um partido que pregava um Estado enxuto em um país que sempre acreditou que a solução de todos os problemas passa pelo Estado. Naquele momento, e com todas as dificuldades que enfrentávamos, pareceu mais sensato adiar o debate sobre as questões morais – e isso foi um gigantesco erro.   A existência de uma direita que não se envergonha de se denominar assim é um fenômeno relativamente recente no Brasil – começou a surgir de 2014 para cá. Mais recente ainda é a existência de quadros políticos com o preparo cultural e intelectual para efetivamente sustentar ideias e programas liberais e conservadores.   O tardio e ainda pequeno espaço conquistado pela direita[60] é permanentemente ameaçado pela dominação que a esquerda continua a exercer sobre a máquina do Estado, sobre o ensino público e privado, sobre quase toda a atividade artística e cultural e sobre a mídia. O discurso de “diversidade” dos progressistas significa apenas a aceitação de uma variedade de matizes dentro da própria esquerda.   É uma batalha para a qual a direita não está preparada e ainda não tem os recursos necessários. Uma das maiores evidências disso é a forma como o termo “liberal” está sendo cooptado pela esquerda brasileira, igual ao que aconteceu nos Estados Unidos.  

Se, no nascedouro, o Novo não tinha identidade ideológica clara, é evidente hoje, em 2021, que o preço de manter essa pseudoneutralidade pode ser alto demais: a transformação do partido em reduto cada vez mais progressista, a serviço do mesmo establishment populista, autoritário e concentrador de riqueza que o partido foi criado para mudar.  

Capítulo 18 De Costas Para O Jogo   Em algum momento entre o final de 2015 e o início de 2016, foi realizado um evento em Niterói cuja atração principal era uma palestra de João Amoêdo, presidente nacional do Partido Novo. Com a confusão gerada pela minha saída da presidência estadual e a especulação em relação às primeiras candidaturas do partido, era grande a expectativa em torno do que ele diria. Alguns companheiros e amigos, ainda mantendo a esperança de alguma boa novidade, se encheram de entusiasmo, vestiram suas camisetas laranja e atravessaram a baía para ouvir boasnovas e, quem sabe, ter uma chance de convencer o presidente nacional do partido a retomar o rumo original do projeto.   Pelo que me contaram, a esperança não durou muito. Em determinado ponto da palestra, João teria pronunciado uma frase que, durante muito tempo, rodou nos círculos do partido.   Ele teria dito que os filiados ao partido deveriam ser como os voluntários que trabalhavam na organização de eventos esportivos como a Copa e as Olimpíadas.   Esses voluntários, quando participavam de um evento, ficavam de costas para o jogo.  

Capítulo 19 De Volta Para O Futuro   No dia 14 de março de 2021, o jornal O Estado de São Paulo publicou uma matéria com o título “Racha no Novo vai além de conflitos por impeachment e oposição a Bolsonaro[61]”. Um trecho da matéria dizia:   Por fim, embora a ideia de promover um processo de seleção dos candidatos do Novo, para que tenham aderência aos valores e princípios do partido, pareça uma boa solução na teoria, na prática não está funcionando como se imaginava. [Christian] Lohbauer conta que, no processo seletivo dos candidatos às eleições municipais de 2020, algumas perguntas feitas pela banca examinadora foram "muito mal formuladas". "Quantos votos o João teve nas eleições de 2018?" era uma delas. "Quais são os autores liberais mais conhecidos?", outra.   "Nós não temos pessoas com capacidade de interpretar o ambiente político com a missão de escolher pessoas para serem políticas. Não é que a gente seja idiota. Estamos tentando fazer a coisa certa, mas não temos os entrevistadores mais preparados para ouvir todo mundo pelo Brasil afora", diz. "A gente errou muito em 2020, porque não soube se adaptar, ser maleável, e não se permitiu errar, escolher mais gente, competir em mais lugares. Quis escolher só gente nota 10, na visão sei lá de quem. A sociedade é heterogênea, as pessoas são diferentes, não têm formação política. Não estou dizendo que tem de nivelar por baixo, mas o resultado está aí: lançamos 34 candidatos a prefeito em 5.570 municípios e elegemos apenas um."

 

Capítulo 20 As Perdas   No dia 13 de novembro de 2017, Alexandra e eu fomos à estreia de um documentário sobre Fernando Gabeira dirigido por Moacyr Góes.  O evento, que estava marcado para as 20h no cinema Estação NET Ipanema, na rua Visconde de Pirajá 605, do outro lado da rua do antigo escritório de David Zylberstajn, atrasou mais de uma hora. Aproveitamos para comprar pipoca; na fila esbarramos com Ronaldo Gomlevsky, o jornalista responsável pela revista Menorah e pelo programa de rádio Confronto Metropolitana, do qual tantas vezes participei e que tive a honra de comandar, substituindo o Ronaldo quando ele precisou se ausentar por motivo de viagem. Encontramos também com o próprio Gabeira. Fotos registram esse momento.   Entramos na sala de projeção e, na hora de sentar, uma saia justa: “João está ali atrás com a Rosa”, disse Alexandra. Apagaram as luzes e o filme – excelente – começou. Quando acabou, acenderam as luzes e nos levantamos. Alexandra me esperou no hall do cinema enquanto eu ia ao banheiro. Quando voltei, me deparei com a seguinte cena: Alexandra me esperando, já quase na saída e, um pouco antes dela, em pé, Rosa Amoêdo. Ela esperava o João que, de repente, apareceu.   João e Rosa estavam entre Alexandra e eu.   Como se obedecêssemos ao script de alguma novela das oito – ambientada no Leblon, naturalmente –, olhamos todos para o chão, fingindo que ninguém via ninguém.  

Eu caminhei em direção a Alexandra, peguei sua mão e fomos embora.   E essa foi a última vez que encontrei com o João.    

Capítulo 21 O Que Precisa Ser Feito Muita gente pergunta: é possível recolocar o NOVO em seu caminho? Claro que é.   Para isso, a primeira providência é atualizar o estatuto do partido para evitar que o controle fique nas mãos de um dono e de seus prepostos.   A segunda providência é corrigir as regras que se mostraram equivocadas, eliminando mecanismos autoritários – como o uso da infame comissão de ética para expurgar dissidentes – e incorporando, de forma estruturada e clara, uma posição verdadeiramente liberal-conservadora aos princípios e ideias.   É preciso deixar explícita a importância dos valores morais, do fomento de uma cultura de liberdade e respeito à vida, e da proteção aos direitos naturais do indivíduo em todas as áreas da sociedade – no trabalho, na cultura, no ensino, na segurança pública e no mercado. Isso significa, inevitavelmente, uma oposição direta moral, cultural e política às práticas coletivistas e totalitárias da esquerda.   O terceiro passo é o mais inspirador: fazer, mais uma vez, uma grande caminhada pelo Brasil refundando o partido. Andar pelo país de norte a sul, apresentando ideias, incentivando o debate, atraindo e identificando talentos e lideranças, semeando a ideia de liberdade com responsabilidade, e do liberalismo e do conservadorismo como princípios básicos da prosperidade, da segurança e da liberdade que este país pode conquistar em pouco tempo. Traduzir esses conceitos para que sejam entendidos pelas pessoas comuns, sem falsa erudição e sem a afetação típica

de “especialistas” transplantados da academia ou de mesas de operações cambiais. Comunicação é essencial. É fundamental engajar todas as classes, oferecendo oportunidade para a ambição de cada um.   Esse novo partido precisa de um processo de escolha de candidatos informado tanto pela necessidade de construir representatividade genuína quanto pelo reconhecimento de que o julgamento final sobre as qualidades de um candidato virá das urnas. Isso significa adotar uma postura de humildade, a partir da qual o partido se limita a verificar que os candidatos cumpram com requisitos básicos e tenham alinhamento moral e filosófico – demonstrado não em “provas”, mas em uma história de vida – com as ideias do partido. As urnas farão o verdadeiro processo seletivo.   Essa era a ideia original.   A postura arrogante de quem acha que sabe tudo – e que já foi descrita pelo economista Thomas Sowell como a visão dos ungidos – deve ser substituída pelo reconhecimento de que surpresas são parte integrante do processo eleitoral e de que o partido, em vez de tentar inutilmente evitá-las, com alto custo institucional e moral, deve, ao contrário, aprender a tirar vantagem delas, criando um processo que Nassim Taleb chamaria de antifrágil. Em outras palavras: o partido não tem a capacidade de decidir quem vai ganhar, nem precisa ter. O segredo do sucesso eleitoral estará no reconhecimento, por parte dos eleitores, de que o partido representa posições morais e filosóficas e práticas políticas que não são encontradas em nenhuma outra organização.   É evidente que um partido como o descrito acima não pode ter dono, acionista majoritário ou controlador. Um partido de homens livres, com convicções firmes e baseado nos princípios do liberalismo e do conservadorismo não será,

de forma alguma, um partido fácil de ser gerenciado. Mas aí está a questão: um partido como esse deve ser liderado. E essa talvez seja a maior contribuição à sociedade que pode ser feita por um partido rejuvenescido e reunido com versões aperfeiçoadas de suas ideias originais: tornar-se uma incubadora de líderes políticos, pessoas com coragem, determinação, abnegação e generosidade suficiente para dedicar boa parte de sua vida ao serviço da Pátria.   A esses líderes o partido deve apoio, orientação, estrutura e um mecanismo de sustentação nos momentos difíceis que inevitavelmente ocorrem em uma carreira política.   Essa nova organização partidária precisa ser aberta para a sociedade. É preciso correr esse risco.   Não há nenhum mecanismo de controle apropriado a uma organização liberal ou conservadora que possa ser usado como obstáculo à tomada de poder no partido por forças dissidentes.   O preço da liberdade é a eterna vigilância. O que impedirá a transformação do partido em mais uma organização política a serviço do status quo é o seu DNA, materializado nas ações e na militância dos seus apoiadores e filiados. É exatamente isso que caracterizava o Partido Novo que eu ajudei a criar.   A existência de um dono ou controlador não garante segurança ou estabilidade. Pelo contrário; esse modelo submete as aspirações políticas e os ideais de milhares de pessoas – os filiados - aos caprichos, inseguranças e necessidades de poder de poucos controladores.   “Mas qual é o primeiro passo para a mudança?”, vocês podem perguntar. E eu respondo: o primeiro passo já foi

dado.   O primeiro passo é este livro.   Agora é com vocês.    

Epílogo Os Inocentes   É possível que, ao chegar a este ponto do livro, o leitor sinta falta de uma explicação definitiva sobre por que algumas pessoas, próximas de mim e, na minha percepção, até amigas, agiram da forma que o fizeram.   Até hoje me martela essa questão. Por que destruir a amizade de uma vida inteira, usando subterfúgios e manobras, e contaminar a pureza de um projeto idealista com práticas da política arcaica que nos propusemos a combater?   Não tenho essa resposta.   Na política, como na vida, as ideias importam muito; porém as pessoas importam mais. As pessoas comandam os processos de implantação das ideias, e o poder, frequentemente, as leva a abandonar ou desvirtuar essas ideias.   Pessoas originalmente bem-intencionadas, que acreditaram que seu enorme sucesso profissional e financeiro as qualificava automaticamente para posições de liderança política, caíram vítimas das armadilhas que esperam os que se envolvem com essa atividade sem o preparo intelectual e o comprometimento moral necessários.   Para essas pessoas o poder é um veneno terrível.   Assim aconteceu com os inocentes do Leblon.   Sobre a origem no Leblon, não resta dúvida.

  Quanto à inocência, que o leitor seja o juiz.  

Posfácio Refugiados da Utopia ou Por que Me Tornei Conservador Minha experiência na política me convenceu da importância dos valores morais. Política sem moral é uma das piores atividades nas quais o homem pode se envolver. Mas, no Brasil de hoje, é preciso determinação e coragem para defender essa posição. Predomina na política o relativismo moral. Segundo esse pensamento, o que define se uma ação é certa ou errada é seu objetivo. Os fins justificam os meios. Exemplos não faltam. Eu sofri isso na pele, dentro de um partido que ajudei a criar e construir e, depois, em praticamente todos os passos posteriores. A política sem moral é, invariavelmente, voltada para o engrandecimento pessoal do político ou para o seu enriquecimento. A política sem moral flerta permanentemente com regimes totalitários, com o populismo mais rasteiro, e subscreve, ou considera aceitável, a pregação revolucionária de esquerda. O exemplo mais ultrajante, violento e destrutivo desse tipo de política foi a anulação das condenações de um certo criminoso, ex-presidente da República, que havia sido condenado em todas as instâncias da Justiça brasileira. Para mim se tornou evidente que a moral deve preceder a política e a economia. Mas eu tinha dificuldade – dentro do campo estrito do liberalismo – de encontrar confirmação para esse posicionamento. Até que um dia, lendo autores importantes como Edmund Burke, Russell Kirk e Roger Scruton, descobri que outros pensavam da mesma forma. Talvez o livro mais importante tenha sido O Imbecil Coletivo, de Olavo de Carvalho, que li em algum momento

em 1997 ou 1998. Esse livro começou a mudança na minha cabeça. Através dele descobri que era possível criticar as vacas sagradas da “cultura” nacional. Foi quando descobri que não era só eu que achava tantas coisas absurdas no Brasil. O Imbecil Coletivo é, acima de tudo, um manual de como raciocinar. É uma leitura obrigatória. Eu, que comecei na política como liberal, me descobri conservador. O conservadorismo é o aperfeiçoamento do liberalismo – é a defesa da liberdade, não só nos planos econômico e político, mas também no aspecto moral. Conservadorismo sempre existiu como forma de pensamento desde a Antiguidade Clássica, mas o marco do conservadorismo moderno foi o trabalho do estadista irlandês Edmund Burke, por volta de 1790. Em sua obra mais importante, Reflexões Sobre a Revolução na França, Burke previu que a Revolução Francesa terminaria em um desastre, porque seus fundamentos abstratos, supostamente racionais, ignoravam as complexidades da natureza humana e da sociedade. O conservadorismo ressurgiu em 1950 graças ao americano Russell Kirk, que era lido por Ronald Reagan (dono de uma grande biblioteca), e cujo pensamento orientou até a campanha de Donald Trump. O inglês Roger Scruton é outro autor importante do conservadorismo atual: seu livro Como Ser Um Conservador é leitura essencial.       O primeiro fundamento do conservadorismo é a crença em uma ordem transcendente, uma lei natural que funciona como a consciência da sociedade.  Os problemas políticos são, no fundo, problemas morais.

O conservador acredita em preceitos morais e éticos que independem da época em que ele vive. Ele sabe que uma racionalidade estreita não pode, sozinha, satisfazer as necessidades humanas. A realização plena da vida humana não depende da construção de uma sociedade perfeita, utópica, nascida dos devaneios de planejadores todo-poderosos e implantada a ferro e fogo através da destruição de todo o legado da humanidade. Os homens não são anjos; portanto, não é possível construir um paraíso terrestre. O conservador reconhece nessa utopia política quase uma religião, e se recusa a adotá-la. A satisfação do ser humano depende, na verdade, do cumprimento de um pacto transcendente, feito entre os que já morreram, os vivos e os que ainda vão nascer. É em nome desse pacto que nos dedicamos a proteger e cuidar de nossas famílias, de nossa cidade e do nosso país, e a trabalhar para conservar a liberdade, a lei, a educação, os empregos, a saúde e o meio ambiente. Conservar é o ato que dá nome ao pensamento: conservadorismo. Em vez de se apegar a dogmas ferrenhos, o conservador guia sua atividade política por princípios gerais. Esses princípios foram formulados ao longo de anos, com equilíbrio, através do desenvolvimento dos costumes e tradições. Mas até esses princípios precisam ser aplicados com prudência, de forma adequada a cada nação e cada época. Tanto o impulso de renovação quanto o desejo de conservar são necessários ao perfeito funcionamento de uma sociedade. A hora de adotar uma ou outra estratégia depende das circunstâncias. É preciso reconhecer que nem toda mudança é positiva; inovações ou reformas inadequadas ou mal planejadas, em vez de sinalizar progresso, podem representar o início de graves conflagrações sociais.

O conservador desconfia, acima de tudo, de mudanças radicais.       A ordem social, considerada essencial pelo conservador, é reflexo e fruto da ordem interna pessoal de cada indivíduo. Essa ordem, completada por justiça e liberdade, dá a cada indivíduo a oportunidade de construir seu próprio caminho, tendo como base os costumes, tradições e instituições que herdamos dos nossos antepassados. Essa herança cultural e social orienta nossa vida diária usando toda a sabedoria e experiência acumulada pela humanidade durante centenas de gerações. Toda a civilização que vemos ao nosso redor levou séculos para ser construída, mas pode ser destruída em pouco tempo. Esse é o objetivo dos revolucionários. O conservador sabe disso. Por isso não existe “conservador radical”. No conservadorismo não existem radicalismo, extremismo ou revolução. A essência do conservadorismo é a busca da estabilidade, respeitando as tradições, escolhendo o que funciona, separando o bom do ruim e promovendo independência e o progresso pelo trabalho. Os conservadores acreditam na igualdade diante de Deus e perante a lei, mas reconhecem no conceito de igualdade material uma impossibilidade lógica e moral – já que a condição de cada um depende sempre, em maior ou menor grau, do resultado dos seus esforços – e um instrumento de criação de regimes totalitários. Todos os homens têm os mesmos direitos, mas não têm direitos às mesmas coisas. Os direitos de propriedade e de liberdade estão intimamente conectados. Quebrada essa conexão, o Estado se torna senhor de tudo e de todos.

        A missão principal do político conservador em nosso tempo é combater a ação nefasta dos radicais de esquerda, erradamente chamados de “progressistas”. Para esses radicais só existe uma única pauta: a destruição completa das instituições e da ordem social para a construção de uma nova ordem, criada a partir do nada, baseada na centralização totalitária do poder nas mãos de um pequeno grupo de iluminados. O século XX viu, inúmeras vezes, que esses experimentos acabam sempre da mesma forma: em ditaduras sanguinárias, campos de concentração, censura, miséria e fome. A missão do conservadorismo é impedir isso, e conservar nossa liberdade, segurança e direitos. Por isso, ser conservador nos dias de hoje é combater a ideologia de gênero, o racismo “do bem”, a censura nas redes, o “desarmamento” civil (que mantém o monopólio das armas nas mãos dos criminosos), os ataques ao ocidente, o ativismo judicial e o terror sanitário. O conservador não deve ser confundido com o reacionário, que deseja um simples retorno a uma época imaginária no passado, na qual tudo era perfeito. Nunca existiu época assim. Na verdade, o reacionário é a imagem espelhada do revolucionário: os dois desejam uma mudança radical, o reacionário para voltar ao passado, e o revolucionário para criar uma utopia. O conservador sabe que o caminho para o progresso é uma evolução cautelosa, com prudência, sem experimentos radicais, respeitando a tradição, a liberdade e os direitos, e adaptando os conceitos teóricos às exigências práticas da vida real.  

      Os políticos brasileiros, em sua maioria, não são conservadores. São raros aqueles que conhecem e acreditam nas ideias do conservadorismo, e pautam sua vida e atuação política por essas ideias. Há alguns meses, escrevi um texto nas redes sociais mostrando como a esquerda sempre gera ditaduras, o que nunca acontece com o conservadorismo. Lendo as respostas, fiz uma terrível constatação: pensei que iria argumentar com discípulos de Marx, mas acabei discutindo com alunos de Paulo Freire. O grau de desconhecimento e demonização das ideias conservadoras no Brasil é total, e pode ser ilustrado por uma pequena história. Aconteceu na campanha eleitoral de 2020. Fui convidado a participar de um debate com três outros candidatos. Um deles era um rapaz que, embora se classificasse como “liberal”, limitava-se a repetir clichês progressistas. Quando o tema passou a ser segurança pública, vi uma oportunidade de desmascarar a verdade sobre suas ideias. Usei um truque que nunca falha. Falei do tráfico de drogas e – citando fatos e dados – expliquei o papel central que ele desempenha na catástrofe do crime no Brasil. O jovem “liberal” – na verdade, um esquerdista e, como todos, profundamente despreparado – reagiu furiosamente aos meus comentários. Depois de defender o "uso recreativo" da maconha e a estatização do tráfico de drogas, passou a atacar meu conservadorismo. E aí vem a parte mais irônica, engraçada ou – dependendo do ponto de vista – trágica dessa história.

O jovem candidato narco-liberal, depois de dizer horrores do meu conservadorismo, se despediu dizendo que só prometia a seus eleitores "sangue, suor e lágrimas". Essa frase é de Winston Churchill, primeiro-ministro do Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial. Churchill foi o homem que enfrentou a Alemanha nazista. Churchill foi dos maiores estadistas conservadores da história.       A grande questão da política atual é a questão moral. Todo o resto é secundário. A capacidade de distinguir o certo do errado, e optar pelo certo – mesmo quando isso significa um alto custo político e pessoal – é característica essencial em um político. Não é possível entrar em qualquer acordo com corruptos, populistas, socialistas ou comunistas. Não faz sentido trabalhar com aqueles cujo único objetivo é te destruir. A aliança de crime, extremismo de esquerda e populismo está destruindo o Brasil. Esses são nossos inimigos, não importam as cores bonitinhas que eles vestem e os slogans fofos que eles usam. Nossa civilização foi construída em cima da filosofia grega, do direito romano e da ética e moral judaico-cristã. Tem muita gente tentando destruir isso: Os terroristas que atacam Israel e a Europa Ocidental. Os progressistas que defendem pautas como imigração sem controle, tolerância com culturas intolerantes e liberação das drogas. Os radicais de esquerda que buscam reescrever a história, menosprezando e demonizando grandes conquistas e líderes do passado. Os que sabotam o direito com teorias como o "garantismo penal" e o "direito penal do inimigo".

Os que sabotam a filosofia, produzindo "doutores" tatibitates, porta-vozes de um radicalismo de aluguel. E aqueles que promovem ideologia como se fosse cultura e "desconstroem" sistemas de ensino, trocando matemática, português e ciência por promoção de conflito étnico, confusão de gêneros, luta de classes, demonização da prosperidade e apologia das drogas. É preciso resistir a esses ataques. Por isso me tornei conservador.         Como conservador, não acredito em nenhuma ideologia. Minhas ações são determinadas por meus valores e princípios. Na minha opinião, ser conservador no Brasil de hoje é defender, no mínimo, liberdade econômica, liberdade de expressão e de ir e vir, direito inviolável à propriedade privada e à legítima defesa armada, igualdade perante a lei, combate rigoroso ao crime, às drogas e à corrupção, soberania nacional, educação sem ideologia, redução do Estado e de impostos, fim da ideologia de gênero e do ativismo judicial, respeito pelas religiões e voto auditável.   Não acredito em revoluções, apenas no progresso construído com trabalho e sacrifício.   Não acredito em nenhum tipo de coletivismo ou socialismo e rejeito todos os regimes totalitários.   E sou dedicadamente anticomunista.   Eu não choro pelo Brasil. Eu luto por ele. Quem tem que chorar são os bandidos e os corruptos.  

       

Cronologia Linha do Tempo dos Principais Eventos do Livro   1979 – Os criadores do Partido Novo se conhecem no Colégio Santo Inácio. 2008 – João e Roberto colaboram com a campanha de Fernando Gabeira à prefeitura do Rio. 2009 – Acontecem as primeiras conversas sobre a criação do partido. 2010 – São definidas as linhas gerais do partido e começa a coleta de assinaturas. 2011 – Realizada a reunião de fundação do partido. 2013 – São criados os diretórios estadual e municipal do Rio. Roberto assume a presidência estadual. 2014 – O Partido Novo entra com o processo de registro no TSE, apresentando mais de 500.000 assinaturas. 2015 – Roberto deixa a presidência do diretório estadual em agosto. O registro no TSE é aprovado em setembro. 2016 – Roberto se desliga do partido.  

Apêndice Projeto de Lei de Reforma da Legislação Penal Brasileira Este é o texto da proposta de alteração da legislação penal, de autoria de Leonardo Fiad, Marcelo Rocha Monteiro e Roberto Motta, que foi entregue ao então ministro da Justiça, Sergio Moro, em uma reunião no Ministério da Justiça em 30 de janeiro de 2019[62].   O texto original é apresentado aqui, com notas explicativas.   Justificativa do Projeto   Este projeto de lei tem por objetivo principal extinguir o regime semiaberto de execução de penas privativas de liberdade, além de promover alterações nas regras atinentes ao regime aberto e ao livramento condicional.   O regime semiaberto, que se pretende extinguir, consiste, tal como concebido pelo Código Penal (art. 33, § 1º, “b”), na execução de penas privativas de liberdade em “colônia agrícola, industrial ou similar”.   O Brasil, todavia, possui pouquíssimas colônias penais com essas características, o que, na prática, acaba por equiparar o regime semiaberto ao aberto. Isto é, os presos em regime semiaberto cumprem suas penas fora do estabelecimento prisional, sem qualquer controle ou vigilância, tendo apenas o dever de pernoitar no presídio.  

Esta situação, aliada ao atual sistema de progressão de regime (que demanda, objetivamente, em geral, o cumprimento de 1/6 da pena no regime inicial a que condenado o réu, e, no caso específico dos crimes hediondos, 2/5 da pena para réus primários e 3/5 para reincidentes; e sob o aspecto subjetivo, a mera lavratura de ‘atestado de bom comportamento carcerário’ pelo diretor da unidade prisional), vem contribuindo para o descrédito do sistema criminal brasileiro na medida em que despe a pena das funções que lhe são inerentes: a punição proporcional à gravidade do crime, o caráter pedagógico (geral e especial) e a proteção da sociedade. Um réu primário condenado a 6 anos por homicídio simples, por exemplo, em 1 ano passará do regime fechado para o semiaberto nos moldes acima descritos; um réu primário condenado a 5 anos e 4 meses por roubo à mão armada estará de volta às ruas em 11 meses.  Nenhum país que se pretenda civilizado, que ponha em primeiro lugar a proteção da vida, liberdade e propriedade dos seus cidadãos, pode conviver com esse descompasso[63].

 

Para mitigar esse quadro, o projeto prevê que as penas de reclusão, que sancionam os crimes mais graves, devem ser cumpridas em regime fechado; as penas de detenção, a seu turno (salvo necessidade de transferência para o regime fechado nas hipóteses previstas), devem ser cumpridas em regime aberto, ora definido como execução da pena em domicílio, com monitoração eletrônica (artigos 1º e 2º)[64].

 

Além disso, o projeto altera alguns dos requisitos para a concessão do livramento condicional

(cumprimento de 2/3 da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes; e cumprimento de 4/5 da pena nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo ou se o condenado for reincidente em crime doloso).  Adiciona também, como requisito para a concessão do livramento condicional, a aptidão do condenado atestada em avaliação criminológica realizada por equipe multidisciplinar (artigo 3º).   Em um cenário nacional de conflagração, insegurança e descrédito das autoridades públicas, que gerou, inclusive, inédita intervenção federal na área de segurança pública no Estado do Rio de Janeiro, estamos certos de que este projeto constitui o primeiro passo de uma grande virada para a devolução da tranquilidade e paz aos brasileiros sitiados pela criminalidade.  E de que a Casa do Povo, com senso de prioridade e em perfeita sintonia e conexão com os seus representados, não se furtará a liderar este processo.     Rio de Janeiro, março de 2018.

Projeto de Lei O quadro comparativo a seguir apresenta as sugestões de modificação da legislação propostas pelo projeto. Para cada alteração é descrito seu objetivo e apresentada a legislação atual e como ela ficaria após a mudança.

Artigo 1º: Objetivo: eliminar o regime semiaberto. Mudança: altera a redação do artigo 33 do Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal) e suprime a alínea “c” do § 1º. Redação Atual da Lei:         Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.         § 1º - Considera-se:         a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;         b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial

ou estabelecimento similar;         c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. Nova Redação da Lei: Art. 33 - A pena de reclusão deverá ser cumprida em regime fechado. A de detenção, em regime aberto, salvo necessidade de transferência para regime fechado. § 1º.  Considera-se: a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b) regime aberto a execução da pena em domicílio, com monitoração eletrônica. Redação:        

Artigo 2º: Objetivo: altera as regras do regime aberto transformando-o em

prisão domiciliar com monitoramento eletrônico Mudança: altera o §1º e o §2º do art. 36 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Redação Atual da Lei:   Art. 36 - O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado.          § 1º - O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.          § 2º - O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada.    Nova Redação da Lei:

Art. 36 - O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado.  § 1º - O condenado deverá permanecer em seu domicílio com monitoração eletrônica, somente podendo ausentar-se para tratamento de saúde, com prévia autorização judicial.   § 2º - O condenado será transferido para o regime fechado se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada.      

Artigo 3º: Objetivo: cria uma pena mínima de 40 anos para o criminoso que comete crime doloso com violência ou grave ameaça. Mudança: o artigo 63 do Decreto-

lei 2.848/1940 (Código Penal) passa a vigorar acrescido de um parágrafo único. Redação Atual da Lei:   Art. 63 - Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. Nova Redação da Lei: Art. 63 - Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. P. único: Ao réu condenado pela terceira vez por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça será aplicada pena de 40 (quarenta) a 50 (cinquenta) anos de reclusão.    

   

Artigo 4º: Objetivo: elimina-se o prazo de cinco anos a partir do qual um crime anterior deixa de ser considerado para efeito de reincidência. Mudança: revoga os incisos I e II do art. 64 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Redação Atual da Lei:   Art. 64 - Para efeito de reincidência:         I - Não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação;          II - Não se consideram os crimes militares próprios e políticos.

    Nova Redação da Lei: Art. 64 - Para efeito de reincidência não se consideram os crimes militares próprios e os crimes políticos.      

  Artigo 5º: Objetivo: aumentar o tempo máximo de cumprimento de pena para 50 anos, Mudança: altera a redação do artigo 75 do Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal), Redação Atual da Lei:   Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos.   

        § 1º Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40 (quarenta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo.           § 2º - Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido.   Nova Redação da Lei: Art. 75 O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 50 (cinquenta) anos.           § 1º - Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 50 (cinquenta) anos, devem

elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo.                 § 2º - Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido.                 § 3º - O cálculo para concessão de livramento condicional ou qualquer outro benefício será feito com base na pena efetivamente imposta na decisão condenatória.  

         

Artigo 6º: Objetivo: aumentar o tempo de cumprimento de pena exigido para a concessão do livramento condicional. Mudança: altera a redação dos incisos I, e V, do art. 83 do Decreto-

lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal) e acrescenta novo inciso VI. Redação Atual da Lei:     Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:                          I - Cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;            II - Cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;            III - comprovado:                          a) bom comportamento durante a execução da pena;       

        b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses;                             c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e                       d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto.                 IV - tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;                            V - cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.        

            Parágrafo único - Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.           Nova Redação da Lei:     Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:                    I - I - Cumpridos mais de dois terços da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;           II - Cumpridos mais de quatro quintos da pena, se o condenado for

reincidente em crime doloso ou não tiver bons antecedentes;           III - comprovado:                          a) bom comportamento durante a execução da pena;                b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses;                             c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e                       d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto.                 IV - tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;              V - Ter sido considerado apto em avaliação criminológica realizada por equipe multidisciplinar;

  VI - Cumpridos mais de quatro quintos da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.        

Artigo 7º: Objetivo: aumenta a pena mínima para homicídio. Mudança: altera a redação do artigo 121 do Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal). Redação Atual da Lei:           Homicídio simples   Art. 121. Matar alguém:  

        Pena - reclusão, de seis a vinte anos.           Caso de diminuição de pena           § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.           Homicídio qualificado           § 2° Se o homicídio é cometido:           I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;           II - por motivo fútil;  

        III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;           IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;           V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:           Pena - reclusão, de doze a trinta anos.   Nova Redação da Lei:   Homicídio simples   Art. 121. Matar alguém:           Pena - Pena – reclusão de 12 (doze) a 20 (vinte) anos.

          Caso de diminuição de pena           § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.           Homicídio qualificado           § 2° Se o homicídio é cometido:           I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;           II - por motivo fútil;           III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou

outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;           IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;           V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:           Pena - reclusão de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos.      

Artigo 8º: Objetivo: elimina o regime semiaberto e a progressão de regime. Mudança: revoga o art. 35 do Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal), e arts. 112, 113, 114, 115, 116, 117 e 118, da Lei 7.210 de 11

de julho de 1984 (Lei de Execução Penal).        

 

Bibliografia   ALINSKY, Saul, Rules for Radicals: A pragmatic primer for realistic radicals, Vintage Books, NY.        ARENDT, Hannah, A Report on the Banality of Evil.             BERGGRUEN, Nicolas; GARDELS, Nathan, Intelligent Governance for the 21st Century: A Middle Way Between West and East, Polity, 2013.             BEEVOR, Antony, The Fall of Berlin 1945, Viking Books.             BLOCK, Walter, Rumo A Uma Sociedade Libertária, LVM, 2018.             CARVALHO, Olavo de, O Imbecil Coletivo, Record, 2018.             CHEMIM, Rodrigo, Mãos Limpas e Lava Jato: A Corrupção Se Olha No Espelho, Citadel Grupo Editorial, 2017.        DRUCKER, Peter, A Sociedade Pós-Capit alista, Actual, 2015.        FRANKL, Viktor, Em Busca de Sentido, Beacon Press, 2006.             FERGUSON, Niall, A Grande Degeneração, Planeta, 2013.             GARSCHAGEN, Bruno, Direitos Máximos, Deveres Mínimos, Record, 2018.        GLADWELL, Malcom, A Decisão Num Piscar de Olho s, Sextante, 2016.             GORDON, Flávio, A Corrupção da Inteligência: Intelectuais e Poder no Brasil, Record, 2017.             GRAYLING, A. C., Ideas That Matter: The Concepts That Shape The 21st Century, Basic Books, 2010.        HABER, Stephen, How Latin America Fell Behind: Essays on the Economic Histories of Brazil and Mexico, 18001914, Stanford University Press, 1997.       

HAMILTON, A.; MADISON, J.; JAY, J., The Federalist Papers, Dover Publications, 2014.             HAYEK, F.A., A Pretensão do Conhecimento, LVM, 2019.

      

HOFSTEDE, Geert, Cultures and Organizations: Software of the Mind, McGraw Hill, 3ª edição, 2010.        HOPPE, Hans-Hermann, O Que Deve Ser Feito, LVM, 2019.        _____________. Uma Breve História do Homem, LVM, 2018.        _____________, Democracia – O Deus Que Falhou, LVM, 2014.        HOROWITZ, David, The Art of Political War and Other Radical Pursuits, Spence publishing Company, 2000.             ____________. Take No Prisioners: The Battle Plan for Defeating the Left, Regnery Publishing, 2014.             JUDT, Tony, Pós-Guerra: Uma História da Europa Desde 1945, Objetiva, 2007.             KIRK, Russel, A Mentalidade Conservadora, É Realizações, 2020.             KORNAI, Janos, The Socialist System: The Political Economy of Communism, Princeton University Press, 1992.             KARSTEN, Frank; BECKMAN, Karel, Além da Democracia, Instituto Ludwig von Mises Brasil, download gratuito em http://www.mises.org.br/Ebook.aspx?id=82.             LEWIS, Anthony, Freedom for the Thought That We Hate: A Biography of the First Amendment, Basic Books, 2007.        LIJPHART, Arend, Patterns of Democracy: Government Forms and Performance in Thirty-Six Countries, Yale University Press, 2012.        NAIM, Moisés, O Fim do Poder, Leya, 2019.       

NORTH, Douglass, Institutions, Institutional Change and Economic Performance, Cambridge University Press, 1990.             MAGALHÃES, Mauro, Carlos Lacerda, O Sonhador Pragmático, Edição do Autor, 2019.             MISES, Ludwig Von, Ação Humana, Instituto Mises Brasil, 2010.             MOLINARI, Gustavo de, Da Produção de Segurança, Mises Brasil, 2014.             PESSI, Diego e GIARDIN, Leonardo, Bandidolatria e Democídio, Resistência Cultura, 2017.        PIOVEZAN, C.; BRIGUET, P.; TAVARES NETO, C.; MONGENSTERN, F.; LINS GRILLO, L.; ROCHA MONTEIRO, M.; CZELUSNIAK, M.; FREYESLEBEN, M.; GRECO, R.; SPONHOLZ, S., Inquérito do Fim do Mundo, E.D.A, 2020.        ROBERTS, J.M., O Livro de Ouro da História do Mundo, Ediouro, 2001.             SAMENOW, Stanton, A Mente Criminosa, Vide Editorial, 2020.        SANDEL, Michael, Justiça, Civilização Brasileira, 2011.             SOWELL, Thomas, Economia Básica Volume I, Alta Books, 2018.             ___________, Economia Básica Volume II, Alta Books, 2018.             ___________, Os Intelectuais e a Sociedade, É Realizações, 2011.        ___________, The Thomas Sowell Reader, Basic Books, 2011.        SHLAES, Amity, The Forgotten Man, Harper Perennial, 2007.             STEARNS, Peter, The Encyclopedia of World History, Houghton Mifflin Company, 2001.        TALEB, Nassim Nicholas, Antifrágil, Objetiva, 2020.        TUCKER, Jeffrey, A Bela Anarquia, LVM, 2018.             WILSON, Edmund, Rumo à Estação Finlândia, Companhia de Bolso, 2006.       

  [1]

O “Mota” do sobrenome do meu tio tem um “t” apenas, embora o sobrenome do nosso avô, José Lourenço, fosse “Motta”, com dois “t”s. Não me perguntem por quê. [2] “Cabeça de porco” era o termo usado para descrever prédios com grande quantidade de apartamentos minúsculos. [3] A Camarilha dos Quatro é como ficou conhecida uma facção composta por quatro membros do Partido Comunista da China que ganharam proeminência no período de implementação da Grande Revolução Cultural Proletária (19661976): Jiang Qing (esposa de Mao Tsé-Tung), Zhang Chunqiao, Wang Hongwen e Yao Wenyuan. [4] Entrevista a Luciano Pires, no LiderCast 125 de 17/09/2018. Disponível em: http://portalcafebrasil.com.br/resumos/lidercast-125-joao-amoedo. O trecho relevante contém o seguinte diálogo: Luciano: (...) Um belo dia você está lá, entra uma luz pela janela e vem uma voz e fala assim: João, vá mudar o Brasil. Como é que foi, o que foi isso, cara? João Amoêdo: Foi mais simples, eu estava jantando com um amigo meu, que a gente estudou junto num colégio, ele é carioca, estava por aqui por São Paulo e aí eu falei para ele, fulano, eu tinha vontade de ir para administração. Luciano: Quem é o fulano? João Amoêdo: Roberto. Luciano: O Motta? João Amoêdo: Roberto Motta. Luciano: Esteve nesta cadeira aqui umas semanas atrás. João Amoêdo: Então, eu falei para ele, Roberto, eu tinha vontade de fazer alguma coisa para melhorar a gestão pública [...] E aí ele me colocou em contato lá, na época, com uma pessoa próxima ao Gabeira [...] E aí resolvemos colocar essa ideia de pé em 2010, no final de 2010. [5]

https://www.linkedin.com/pulse/20140928034923-458602-quatroli%C3%A7%C3%B5es-que-aprendi-na-am%C3%A9rica [6] https://www.terra.com.br/noticias/brasil/policia/homicidios-caem-41-apossistema-de-deteccao-de-tiros-nors,06b84fc7b94fa310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html [7] O nome oficial do cargo passara a ser Secretário de Estado Executivo do Conselho de Segurança Pública. A Secretaria sob meu comando era a antiga SESEG (Secretaria de Estado de Segurança), que deveria ser extinta em seis meses, conforme plano de governo. As duas polícias já tinham sido transformadas em secretarias independentes. A SESEG foi extinta menos de um mês após a minha nomeação. [8] https://www.youtube.com/watch?v=rGsipC91sSk [9] Em entrevista à revista Época, em setembro de 2014, João declarou: “Inicialmente éramos um grupo pequeno, umas dez pessoas. Alguns estudaram

comigo no colégio, fizeram faculdade juntos, e outros eram meus sócios no mercado financeiro”. Disponível em: https://epoca.globo.com/tempo/eleicoes/noticia/2014/09/bjoao-dionisioamoedob-gente-quer-acabar-com-os-privilegios.html [10] https://www.facebook.com/roberto.motta1/posts/122568714423189 [11] https://oglobo.globo.com/politica/de-janeiro-abril-de-2010-governofederal-gastou-com-publicidade-632-mais-do-que-no-3004046 [12] Um “think tank” conservador. [13] https://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/11/partido-novo-o-intrusoliberal-na-politica-brasileira.html [14] https://cdn.novo.org.br/novo/conheca/historia-do-novo/ [15] https://vimeo.com/24563518 e https://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po0503201107.htm [16] https://diplomatizzando.blogspot.com/2011/03/oartido-novo-umcontraponto-mansueto.html [17] https://diplomatizzando.blogspot.com/2011/03/partido-novo-um-debateque-se-engaja.html [18] O assunto é extenso e não será discutido aqui, pois já foi abordado nos meus dois primeiros livros, Ou Ficar A Pátria Livre e Jogando Para Ganhar: Teoria e Prática da Guerra Política. [19] https://www.youtube.com/watch?v=ixvPoKyP06U&t=13s [20] https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1034 [21] https://www.brasil247.com/poder/conselheiro-do-itau-cria-partido-dedireita-o-novo [22] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/08/1332072-mesmo-semapoio-suficiente-rede-de-marina-silva-entra-com-pedido-de-registro-no-tse.shtml [23] https://www.youtube.com/watch?v=ZkMcoDwV-y4 [24] https://youtu.be/1vm2At5MUCw [25] Que, depois eu soube, teve entre os seus fundadores um dos avôs da minha esposa Alexandra. [26] A LVM editou meu segundo livro, Jogando Para Ganhar: Teoria e Prática da Guerra Política. [27] Fato curioso: na campanha eleitoral de 2016, eu recebi Osório – então candidato a prefeito – em minha casa para uma apresentação. Foi de longe o candidato com a maior aceitação pelo público feminino... [28]  https://drive.google.com/file/d/1S7STuF6L_lDda2ADhE3PdnPJuChLFxv/view?usp=sharing [29] Ver Apêndice no final deste livro. [30] https://youtu.be/0-6ZyfYI6NQ [31] https://youtu.be/49DhNnC9yks [32] https://youtu.be/Qu0oYdsKgI4 [33] O texto do projeto está no Apêndice no final deste livro.

[34]

https://twitter.com/rmotta2/status/1172103726921859072?s=20

  [35]

https://twitter.com/rmotta2/status/1270772015163736064?s=20

  [36]

https://youtu.be/_yZiX-JmT5s https://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2014-10-05/roberto-motta-a-fraudedo-radicalismo.html [38] https://youtu.be/p7NRQ97venk [39] https://youtu.be/KBzaSO0aKdU [40] https://youtu.be/kCYW3CrZfXk [41] https://youtu.be/pLTgyQGLbGA e https://youtu.be/gJjp_L3znRQ [42] https://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/11/partido-novo-o-intrusoliberal-na-politica-brasileira.html [43] https://youtu.be/EgIq2L67Oi8 [44] https://youtu.be/6OfKO-1nbQw [45] Termo usado na época para denominar os liberais e qualquer um que não fosse apoiador do PT. [46] https://30diarios.wordpress.com [47] https://30diarios.wordpress.com/2015/11/28/almanaque-do-partido-novo/ [37]

[48] [49]

https://soundcloud.com/30diarios https://30diarios.wordpress.com/2016/05/11/nasce-uma-alma/

[50]

Estavam presentes Marcelo Rocha Monteiro, Luiz Philippe de Orleans e Bragança, Tamara Bertoldo, Alexandre Gama, Beatriz Sander, Dennys Andrade, Luiz Eloy Oliveira, Naomi Yamaguchi, Luiz Aguilar, Leandro Monteiro, Riva Monteiro, Nicholas de Oliveira, Nilton Rossano, José Ernesto Marino Neto, Alexandre Gama, Beatriz Sander, Davi Oliveira, Rafael Leal, Cassiano Polesi, Luiz Módolo, Rodrigo Sanches, Júlio Casarin e Roberto Motta. [51] Segundo explicou Alfredo Fuentes em sua entrevista a Clynton Cortez. [52]

https://drive.google.com/file/d/17OYrUecuwGSdYk6yfmDPuD4N9ELrLjeu/view? usp=sharing e https://esaj.tjsp.jus.br/cpopg/show.do? processo.codigo=0G0005ER70000&processo.foro=16&processo.numero=10062 7507.2017.8.26.0016&uuidCaptcha=sajcaptcha_a9e47d9239cb4d2db78864a0cab 42c2c [53] https://esaj.tjsp.jus.br/cpopg/show.do? processo.codigo=0G0005KRJ0000&processo.foro=16&processo.numero=10100 0963.2017.8.26.0016&uuidCaptcha=sajcaptcha_76f869110baa42858bcd0ca1ef11 a76f [54] Este capítulo é baseado em um depoimento concedido ao autor em março de 2021.

[55]

https://drive.google.com/file/d/1D59rgNblRDpyDzTPwbGa0hBj77QPCv0g/view? usp=sharing [56] https://drive.google.com/file/d/10dc8v4EaXaePCh6BP8efClXbySK9jrl/view?usp=sharing [57] https://twitter.com/partidonovo30/status/1164643211840806912?s=20 [58] https://twitter.com/ChicaoBulhoes/status/1165663610661670912?s=20   [59] https://blogs.oglobo.globo.com/ancelmo/post/apos-pedir-saida-de-sallesmarcelo-trindade-decide-deixar-o-partido-novo.html, https://www.facebook.com/rangel.ricardop/posts/540843233354537/ e https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/12/05/deputado-chicaobulhoes-vai-assumir-a-secretaria-de-desenvolvimento-economico-inovacao-edesburocratizacao-de-eduardo-paes.ghtml [60] Entendendo “direita”, essencialmente, como a visão de que cada um tem o direito e dever de cuidar de si; ao Estado cabe garantir esse direito. Já a “esquerda” acredita em um Estado todo-poderoso que deve resolver tudo para todos, o tempo inteiro. [61] https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,racha-no-novo-vai-alem-deconflitos-por-impeachment-e-oposicao-a-bolsonaro,70003646759 [62] https://youtu.be/Qu0oYdsKgI4 [63] O chamado “pacote anticrime”, Lei n. 13.964, de 24 de dezembro de 2019, trouxe algumas modificações na legislação, inclusive nas regras de progressão de regime carcerário. No caso do crime de roubo com arma de fogo, por exemplo, a pena mínima passou a ser de 6 anos e 8 meses, e não mais de 5 anos e 4 meses, e a lei passou a exigir o cumprimento de 40% da pena – ou seja, o cumprimento de 2 anos e 8 meses, no caso de aplicação de pena mínima – para permitir a progressão para o regime semiaberto.   [64] Ou seja, o projeto extingue o regime semiaberto, fazendo com que as penas por todos os crimes mais graves – como homicídio, roubo com ou sem arma, extorsão, extorsão mediante sequestro, estupro, tráfico etc. – ou de média gravidade – como furto, estelionato, receptação etc. – sejam cumpridas em regime fechado.