O Sol e a Sombra

Table of contents :

Citation preview

retratada cm c.1pitulos muito importamcs, mesmo se bastan te cliscutfveis.' O que ali escreven sobre a administração colonial tornou-se ponto de referência d urante d ~cadas, pois conseguia um certo equillbrio entre a demonstração emplrica e a análise, ultrapassando tanto os tr~balhos meramente descritivos - como os indicados na abertura desta reflexão-quanto os eminentemente analiúcos e generalizantes - como o de Caio Prado Jr., que se examinará a seguir. Segundo a interpretação de Faoro, o sistema administrativo portuguc% foi transposto com sucesso prrnaçlfo do 8rMil cnntcmporclnto Co16uia~ S.to l\1ulo. l.ivrnria Marl i n:s Edi1ora, 1942, p. 299. 1l..Ibid.. p. 30 l. 1t.lt.1O império mRritimo pormguê.s... ,p. 286. !~. lbid.. p.299. .'ti. Carlos Malheiro Dia~, Histórin tln coWnização poliugue$a do Bmsil.Porlo, 1i1ogmG• Nacional, 1921, 1923, 1924, 3 vols.

43

aspectos co ndenáveis do Estado Novo." Preenchendo uma lacuna considerável, portanto, Francisco Bethencourt e Kirti Chaudhuri publicaram, em 1998, os cinco volumes da Hiuória da expansão port11guest1, para a qual, além de portugueses e de um brasileiro Ca io Cesar Boschi - , contribuíram autores de 11acionalidades várias, entre eles um dos mais conhecidos discf pulos de Boxer, A.). R. Russell-Wood. Escapando, no titulo, da associação ideologicamente comprometida - afinal, Império teimava em invocar o Estado Novo" - , a HistBfJ!I da expq_nsào portuguesa ~~cura~a assim aliar duas tradições de estudos sobre_ im.r.érios: a.12ortuguesa e a britânica, rep resentada ali por Kirti Chaudhuri. O que ressalta da obra como um todo éa preocu,.p4ção en~!~ros nexos comuns do Império e, ao mesmo tempo, destacar as especificidades. No que diz respeito ao Brasil, e dentro do assunto tratado aqui, cabe destacar dois capítulos: "Covernan tcs e agentes", de A. J. R. Russell-Wood, e "América Portuguesa': de autoria de Francisco Bethencourt." Ambos indicam a necessidade de estudar as carrei-

fa

27. Cf. Vitorino Magalhães Godinho, "Portugal, as frotas do açúcar e as Ífúlas do 011ro (1670-1770)'; Revi.stn delíi.stôrúl, 11' JS, São Paulo, 195-0, pp. 69-88; Prixer

,

monnaiesau Portugul(J 750~1850), Paris,Armand Colin. 195S;A1itof! mcrcadoda, µ/opia eprática de navegar. Si!culosXIJ /-,X Vili, Lisboa, Difcl, 1990. Sobre a dimensão atlântica do iJnpÇrio português. pnrticularmente nas relações (ôm o Br:Jsil, ver Frédéric Mauro, Le Portug•I el l 'Atlantiquea11 X\f/ r sitde (1570-1670) - Éwde &omJmíq11e., Paris, 1960) e. ninda, id., Euules ~Cónómique$ sur l'expansion portugaise, 1SOO· H>()(), Pari>. Ccmro Cultural Português da Fundação C.louste Gul· benki:an, 1970. Aõladodade Boxer,aobra de Mauro tarnbénlinílueudou o tra· halho de Luls Fdipe de Alencastro. 28. Em comunicação ainda il'1édíta, Ma riu Fernanda Bicalho destacou essa asso· cia.ção. C( .. Hlstoriogi~fia e Império", comunic01ção feita no simpósio "O govcr· no dos povos·: Paraty, 111 de setembro> 2005. 29. A. J. ll Russefl-Wood, .. Governantes e agentes-:.; Francisco Bethencour1-, ''A América por tuguesa'; in Francisco Bcthcncoun e Kirti Chaudl1uri (orgs.), História tla expanslúJ pórtugueia. O Brasil11a balança dolmp~riu(l697- 1808).Lis· b-Oa, Circulo de Leitores, 1999,respectivamente, pp.169-92, 228·49, VQi. llL

44

;1sdc administradores para melhorentendero funcionamento do Império, e realizam um ótimo trabalho sistematizador dos níveis da adrn inistração colonial, aliando, assim, a emp iria e o enquadralllcnto mais analítico. Quando reconhece, nas páginas iniciais, a "tirania da distância" e o caráter impreciso das áreas de jurisdição, Russcll-Wood deixa vislumbrar a presenç11 da matriz explicativa de Caio Prado Jr. Ao insistir, contudo, sobre o aspecto sistêmico da t-' •b~enlralização admiuistrativa e as numerosas atribuições e res1ri-f ponsabilidades do "homem no local", remete a outro paradigma ~ ~xpl icativo, tributário dos estudos de Jack P. Greene, como se verá '{ .1diante, consideravelmente popular entre os estudos mais recen- ~ lcssobre o assunto.'' Russell-Wood fornece importantes subsfdios para se detectar um aspecto fundamental, ainda mais explícito no capítulo de llclbencourt: as lógicas próprias_do.filstema admin i§J;rativo do Império. Isso fica ev iden te quando mostra que a duração dos l\t>vernosera mais ou menos uniforme, ocorrendo certa flutuação no cotejo entre a índia e o Brasil; ou que havia "qualidades desejáveis mm1 vice-rei, capitão-geral ou governador", capazes de norlcar a escolha para o cargo - tais como sangue nobre, penencimcn toa redes familiares, idade madura, experiência mil itar. Não é esse aspecto sistêmico, nem essa lógica específica, con tudo, que mais mobil i.zam Russell-Wood, mas a atuação dos agentes loca isé Hespanha reiterava ali a teoria da est rutura polisinodal, sugerin- li do que a lógica do império português se assentava na "modularidade das partes componentes e sobre a economia dos custos políticos da admini straçiio dos territórios". O óltimo período do capítulo reforça o sentimento de que o império de suas cogitações era sobretudo o orie ntal:

volrnda pa.ra a revisão daquilo q ue se convencionou chamar de l'.'I ado moderno- tem por o bjeto as manifestaçõeserninentemen '" européias do fenômeno. O que lhes interessa, muitas vezes na 1lsobretudo na Ale.manha t 1t.1 Itália, eac.ha parndoxal que renha incidido menos rob~ a hi$toriografia con\l'rva1.1ção de absolutismo. Para ele, a noção dá~ica de Estado moderno tende a se rest ringir: "Moderno é apenas o Estado dotado de vocnção para proj~tar; moderno~ apenas o Estddo-admi 11istrador contemporâneo''." Nessa discussão, a existência de Estados com impérios coloniais

I

50 ~Lu'flio M u.i;i,.. Um assohJ1t~mo prerifor mof('lre?~ i.n L'lt11lw tlci Viceré- mft .. grnzfone t resisttu.ta ud sislemg spagrmolo, 2• cJ., S.:ilernOt Avagliano, 200 J) pp. 225-41, ótação • p. 2JL"Jguns c>emplos ~ hi>1oriograf1.1: L Blanria anmüm.~tr11.. costi1.uz1011t, A11nale ISA!' 2, 1994, PP· 25\1-97; e. 1- Hcrnaodo S.1nchlllltl de la

ss

o

Jfi""

1 \

\I:}·

'l~

\

mais iml\ortantes que tenham sido as análises sobre as teo riascon-

\OCS de _ErOdUçãO, niera rguiaSOCia}, confli tualidade, eXe!fÍCÍO do

cratualistas subjacentes à constituição do poder pol[tico na ~poca

poder, tudo teve, no Brasil, que se me1/(J tia Uf11I Rx-srafã'', SEo Paulo, Annablumc, l 996; id., Homens de negócio- n ;11111rfo~ r1 ..oçfi d11 mctróplc e do c.oméf'Cio rias ,\finas setecemist11s. S;io Paulo. Hucitec, 1•>99.

117. No que diz rcsp.eito-aosestud(ls sobl'e escravidão,kvantei esse problema num \'nM.lio biblic)grófico, "O escravismo brasíleii:.g l).~tredes .::~~~comentário de •1•1.1lro trabalho> n-cenlL-S sobre esc.:ra:vldão,. (rtSenha dos Jivros de Ld hi Me1.an AINt.anti>O feit hi implicações mais fund~s. Mesmo que, acatan1111 • 111 se limite o alcJncedo conceito de Antigo Sistema Colo· 111.11 ·'" 'éculo X\'lll ou, quando muito, ao período posterior à Ih .1.111r.1ç,10 de L640; ou .iinda que se pense na sua acepção plural ~"t~mas Colo.ninis expressaria melhor relações tão distintas 1111>11llu JS estabelecidas, atravé> dos séculos, entre a França, a l l11l.111d.1, li Inglaterra e >uns respectivas possessões-, ~~ca11••• •I"'' '"'conceito ven hasendo ecli psado pelo deAntigo Regim~. , 1l.1dn p.1r,1designa ra ordem imediatamente a.n terioràRevolução l 11u1n•s,1. 0 1) A11t igo Regime fo i defi nido e circunscrito a partir de um

j,,,,,

68. /\1611 tla' obr."' Sflttma tolot1ful.

ta me ntc a su pressào dos poderesconcorrentes: "Amonarquia absolu ta nilo é senão essa vitória do poder central sobre as autoridades tradicionais dos senhores edas comunidades loca is~ diz!' De fu ro, Tocquevillc acreditava que o Antigo Regime francês havia conse guido levar a cabo a centralização admimstranva, "a única parte da ronstituiçào política' da época capaz de sobrevi,·er à Revolução, por ser a única compatível com o novo E.çtado social então criado." f:.sbatcr o papel do Estado, valorizando o~~res intermc· cliários, e man ter, sem nuances, o designação de Antigo Regi me \ para um mundo que, como o luso-americano,nãg conheceu o íeu - \" dalismoLtraz portanto problemas consideráveis. Nesse sentido, a coletânea que se vem aqw discutind.o propoe um Antigo Regime totalmente ahpico ao mesmo tempo que afirma a sua tipicidade: ele é 1ambérn atlântico e escravista, j:I que" la] escravidão foi uma insti1uiçilo plenamente incluídJ nn lógic.i societária do Antigo Regime"."' De foto, numa sociedade hier.1rquizada e assentada em ordens q uc se distinguiam confonne o privilégio, a hon ra e a esti ma social - na Pcnínsulalbérica distinguimn ·se ainda pelos estatutos de pureza de sangue-, aescrJv1dao vinha a calhar." Porque,

.!!!Sta de forma~.i.o, migrou para o ntoliber;.!isano e •lwJOu, nap.1ss.agem ciudJ)u terror e a \Ut,'!Uil(', financiado pela Fundaçso para a CiéndaeTccnologia desci e 2000.

71

periferias e o"equilíbrio dos poderes no Império'; mas o "fato de as distin ta> instâncias, e as respec1ivas elites, mu tu amente se tutelarem e manterem vínculos de comunicaçao com o centro"." A contribuição pri ncipal reside, contudo, no mapeamen to das lógicas que presidiam à escolha dos governantes coloniais: qual a hierarquiad~cargos-como,quandoeporqueos governos da f ndid fo. ram mais imponantes que os do Brasil e África, ou '~ce-versa - ; qual o mecanismo das escolhas- por quais Conselhos elas pas:.a· vam; quais os cargos que enobreciam, e de que categorias sociais saíam osselLç ocupantes. Por trás de tudo, o rei e os conselhos defi n iam que1t1 governava o Império, mesmo que houvesse pressões próximas - da Corte-ou distantes - das Conquistas. O cuidado com o sistema de recompenSàO em âmbito imperial - o pagamento ou remuneração de serviços é outra contribuição decisiva dada pela historiografia portuguesa aos est udos do !mpério, cabendo destacar os 1rabal hos de António Manuel Hc~ panha,Ângeb ll. O nome~ o snHgttt - uma frat1Ât g~nta~tro ttõ Prntnmb1t rolonin~ São Paulo,C:omr~1nhind.1sl e-tr3-' 1989; Afrondndosmazombos- nobreswntrtJmas· rates. Prrnu111l111rn, 1666- 1715. Sõo l»ulo, C,ompanhia das L~tras, 1995. 93. Hes()llttha, "La economia de lo gracia~ in id., 1o ~raNtt dtl Dtrecho. .., pp. 1~t • 76; Ângela IJarreto Xa1•ler< António Monud lie>panha."tu. redesdienlelam~ in José Maltoso (dircç.10), /f1stôria de Portt1g11/ oAntigo Regime (ooordonaç.10 dt António ManuI«1npo, 1998, pp. 339·49; ~ei:!!_anda Olivnl, At ordt1i.s m1titare$ to Esrado ModtruOi pa5Slm, sobretudo pane t,cap. 2, '"A) ~ ordens mih~1re-s: um forte pilar do F..st01do Modcmo'~ítcm 2.2,..Aorganluç.iod;a econonua ela merce~ pp. t07 ·31. 94. Jia lembrei, acima, que MaUM ~ a d..tdh-a par3 um contt'Xt:o tm que a troca .. faú• c;om ba>eem \'l!loressimbóli>.c nlo11U1teriais. Oadventodocap1- \ tal.ismo e 3. teoria mar.>t.ista da tcifiClçãQ, pu«t·mr. limit.un fondamrntalmentt a aplicob1lidade da teoria de Mausspara sociedades complexas. Para wna releilu· 4

/

73

\

'

Se a complexidade das questões levantadas pela análise do Império e da administraç.~o impõe não perder de vista o enquadramento teórico, os escritos mais recentes- de Russell-Wood.Bethenco u rt, Nuno Monteiro, Maria Fernanda Bicalho, Maria de Fátima Gouveia, João Prngoso - insistiram na importância de se estudar casos particulares, e creio que isto vale tan to para i!_idivíduus (os agentes) quanto instituições (conselhos, tribunais, câmaras, secretarias)." O consórcio entre empiria e teoria deve possibilitar o desenvolvünento de uma hifilória renovada da política eda administraç.'io no Império português em geral e na América portuguesa em particular, e o escopo comparativo pode ~r, neste sentido, um dos mais interessantes: ta1Jto no interior do Império português - como fez Boxer-quanto externamente a ele, comparando-~ impérios dife· rentes - os ibéricos, mas também o inglês, o holai1dê.5, e o francês."'

ra inteJigenh.: dri obra de Mauss - além do ensaio dissico de Lévi-Strauss- \'Cf Mourice Godeüer, O enigma do dom, Rio de Janeiro, Cíviliza\iio Bra~ilcira, 2001, em que ficam daras as limiLações de se aplicar i11e-Ji:aintamcnte - e ani.storicamente - o modelo cxµHcarivo da dádiYtl. Para o oposto, ou seja, como modelo do que ~eve ser feico, ver J2cques T. Godbóut, O esplrito da dádiv•, Rio de Janeiror Fw1daçâ0Getúlio Vargas, 1999.P l\1mnles - E.S.C., 39' ann6:, 6, 1984, pp. l 24 t-Rio de Janeiro, Publicações da Academia Brasileirn de letras. J939, 2 vols.>cira~ao no volume 2. p. 139. 5. ApudAntonil, Cultum e opulência.. ..• p. 568. Desc1wolve;:rei este-argu1ne:mo no capiluloscguinte. 6. lb id., p. 587. 7. Jbid.• p. 588.

80

vamos benefkios advindos da descoberta da.~ M inas. E havia, por íim, a falsa euforia p rovocada pelo metal precioso, acarretando abandono da cultura do tabaco e do açúcar, "a.~ duas como bases e colunas em que o Rei no de Vossa Majestade estriba as suas maiores dependências", adiantava Dom João de Lencast re.• Sobre a América portuguesa, pairava o d u pio temor da ameaça externa (os fra nceses e demais estrangeiros q ue investiam sobre a costa brasi]eira) e da interna (os colonos sem peias, sen hores da sua vontade e determinação). Portugal v ia-se ameaçado pela impossibilicla_tl!!Sl~ man le r u m3 p_q lítica externa n eu tra quatido a é poca era de conflagração e uropéia. O século começava crít ico tanto na metrópole como nos seus domínios ultra marinos. Nestes, a descoberta do ouro havia provocado um desequilí- . b rio sem precedentes. Levas migra tórias numerosíssimas desabaram ~o_brea n9va_regiâodasMinas,quea té finais do século X Vil fora morada d e índio e cenário eve ntual das andanças paulistas. Esses ca~s humanos vinham das regiões de colon izaç.ão mais a nt iga e eram formados tanto por habitantes luso-brasileiros de Salvador ou do Rio de Janeiro quanto por reinóisatraídosdo além-ma r a nte a possibilidade do enriquecimento fácil. Do c hoque entre os primeiros habitantes das Minas. paulistas na maioria, e os adven úcios resultou o primeiro conflito do século, a guerra dos emboabas (1 707-1709) . lmporta menos examinar sua d imensão do que sel1significado, pois não parece ter sido mais que uma série de escaramuças bastan te confusas e de resultado indefinido.' Contudo, se os conflitos da segunda metade do Seiscen tos-o da Cachaça, no Rio de Janeiro ( 1660-1661); o de Beck: 8. lbid. 9. Sobre QS e1nboabas) veja-se a boa sintcsc de Charles R. Boxcr. A Jrfode de Ot4ro rfuBmsit-dcresdecrcsciment() de11mn sociedade colonial, "J;led.,São Paulo. Com panhia ~ditora Nacional, l 9-69, pp. 83-1 OS. Entr~ o~ ~Ludos mais espedficos, ver J~~ de Mdo, Embuabas, «liçilo fac-sirnilada do primeira edição de 1906,

81

~n, no Maranhõ.o (1684)-haviam sido ma rcados pela po!emica em !orno da cscr.iviLação dos !ndios, opondo nitidamente jesuítas a colonos, Ç2_nfrontando dois projetos colonizadores irredullvei~, tinha-se, agora, uma situação nova. Colonos opunhamse a colonos cm funç.io de inlere.ses cuja distinção ia se tom ando mais sutil.' Tralava-sc, no caso emboaba, da luta da rotina contra a a•cntura, e surpreendentemen1e os conservadores de então eram os avenrurciros da véspera, islo é, os paulistas desbravadores que, uma vez fixados nos arrai,1is aurlferos, desejavam explorar com exclusividade os veio~ sobre os quais tu1ha111 sido os primeiros a deilar olhos. Es.~ cxploraçJo. por sua vez, era imedia la e não comportava inovações 1écn1ca~. li mirando-se ao uso das bateias q ue, nas águas dos regatos, separava o metal do cascalho. Já os adventf· cios, batizados pelos paulistas de emboabas-palavra cujo significado é obscuro mas tinha indiscutível conotação pejorativa-, iam int roduzindo técnicas novas e mais sofisticadas. desviando o curso dos l"ios e exigindo invcslimeatos mnis vultosos. "

São Paulo, Cow:1'1H) do E.~Hhfo, l987;Eduardo Canabn1V'a 611rrtiros, EpisDdJos dos

embooba1 t s11n sroJlmfia, l\clo HoriTA>nlc, llal iaia, Sào Paulo, Edusp, 1984. Ver •indo lsofasGolghcr, C11m11 do1clhosdc Estado em Lisboa, raramente um indivíduo na>c1do no Brasil ro veio - o imagi11drio 1la Restaurarão Per11nm/mct111a, Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1986, p. 106; A fronda dos mazombos nobres contra 1no.éculo xvm (no1a5 a respeito de um parecer do Conselho Uhramarino, 1732)",comunicaçiio apresentada oo Seminario Internacional 2Snnos do2Stkabril: urn balanço, Rio deJanciro, lltJ\J, 26dc outubro, 1999,exemplnrdatiloscrito, pp. 2-3. 2'1. Cf. Isabel Cluny, "Elite; aristocr:ltic.is: diplomacia e guerra': Cul111ra llrvista de Histórin e Teorin das Idéias- Cillrcin e Polltica, vols. xvr-xv11, 2003, pp. J.15 56,aqui,245.Parao 3c.id~mico, ver lsal>oa, Minerva Coimbra, 2003, referência il p. 377. lris Kantor nos conta que, 1l11r.mtc o reinado de Dom JoJo v, o mulo de cronista ultromarino voltou a ~r v.1l nritado. mas faltam estudos mais sistemáticos qu~ mostrem como tal ati-

nas, s~~indo que via o Império como parte const itutiva da Eu ropa." Em 1728, ent rou p ara o Co nselho do Rei e tornou-se fidalgo dn Casa Real:" O período de atu,1ção de Rodrigues da Costa junto ao Con selho correspondeu justamente a um dos mais conturbados da história do domlnio português sobre a América, compreendendo, no marco inicial, a Guerra dos Emboabas, cm Minas (1707-09) e, oo final. a Revolta do Terço Novo, em Salvador { 1728)." Dias antes de morrer, cm 1732, red igiu uma Consulta em que fazia um balanço agudíss imo da situação do 1mpério. parn ele praticamente sem saída. Taimc Cortesao e,com base nele, Luciano Piguciredo chama-

vidadc S< irucri.1 n• •cimmi>lr.IÇlo púl>liu porlugucs. d.i época. C[ Cst11«•ado" rt·tursâdos - fos1or1ografia acadimica /11so-t111lt7'1w1111 (1714-1759),Sóo Paulo• Salvador, Hucitcc/Ccntrod• l:.stud0$ Baianos/tr1~•. 2004.p. J3.AmcsD"I• aul01• cedeu-me gcnlilme111c a rdcrencia 1.1 dois escrito~ de Rodrtgucl> da Costa: }11$tifrCt.1f'10 de Port11g;1J «n /ti n:solunon deAyrulnrn ln Nncum l!'sptmola n sacudir eJ yu,~o Fmnt.1$ y po11tr rtJ tl 11'iJttoRcalde sit lvfonarchfr111l reyrarl10Jk.o Carlos Ili,Oficina de Acosl;;l Desfondts, 1704; Relaçam do)J1tCt'$~0S exforiosilS urções mtlitnres obra· ( das"º Estado da lmJ;n, ordenadas e. dirigidtU pelo t·fo: rcr e capitam gmertJf Jn \ ~ mesmo Enodo Vaxo h:r111u11ks Cear~ .'Wt11tstS tlll 17JJ. Oficina de Antonio / PedroGJ!ram, 171S. 25. Cf Kantor, E.1'11i!ade ~ao 5'1lv•dur do P>raíba do Sul, Riu dt )•neiro { t 730) e revolta cm Cmabá, Maio (,ro.">. não hesitariam em cair ~brc ela. Se não partisse, os re"ohosos ficavam sem castigo, e encorajados a continuarem a sublevação." Em 1712, ao opinar sobre o abandono do go,·erno de Pernambuco por Sebas1ião de Castro Caldas, verificado em plena guerra dos ma scares, Rodrigues da Costa mostraria o quanto pre36.Maqui;~J.Oprl11âpe,pp. l l6e 118. Para ..rgum•ni.ç~odel\odriguesdaCo.mu110,~rigos...".p. 11 37. ªSobtt a caru que 1.-sp11/ê11cia... de An 111nil. Aconsulla que proibiu a circulação da obra possui três assi11.uuras, de resto presentes em boa parle das consultas da época: ··:-.yha_ Telles. C,o~ta". N;Jo há sombra de dúvida que •costa" é o nosso conselheiro. Não há sombra de dúvida, igualmente, que h,1via sido ele o inspirador da proibição, o lci1or avisado a perceber ·" implicações políticas que, num contexto em que a acirrada luta pela hegemonia européia transitava para a disputa por mercados

l•.tlJ c.LMtlife(çuça.squeseacham nospauli.s:ru com o~ reinóis deste Re1no;e..,Jo ..... Jl·•f~is qut K •c;.u>&m." Q_ocumentos l-li.stõricos~ Rio d~ Janeiro. Biblioteca , ... ional. 1951 ,pp. 2·12-5.átaçõesaspp.242-J. YI. 93. \M. ·o que 't' a~iJtiu dianttda n-p~o às rcbcldi.1' wk,ni1is foram consuntC"~ 1f1.omcndai;oc .. t.lt di»lmul;J;ç-ão t- segredo, cmbon nao poucos governadorc.\ k11ham c.edido li nplieação imedi:ita du pena copii~tl. O apttite de conquista de u.u,oes e&irungciras e a Jc~cn fianc;a da fidcl.idade dc,.,se' :,liditos di.stan tesjUSLifi· t .1V1tmo emprego dc:-.11c traço da política bano1.:J, muito comurn no sécuJo xvu, tiuc pregava a 'teori.1 da legitimidadt dn dis.simufoçlo~.. Luci~no Figueiredo, Ut·~·...,11~, futtJidt1dc t Uln11itlatk colonial.... p. 229. Ver também Rosario Villari, l)Qgfo tk/Ja distimularitine. ÚJ foua pclilita trtl Cit1Q't1t.O. 2' td.. Rorod, Latcl'Zõl, IW.\. pp. 1S.9. Jo~ Antonio ~branll. A cultura ,/o &rrOt'O - análise de imtn """"""' b1116nM. SSo P•ulo, &11up/ Imprensa Olici•l, 1997. \'J.(..on~uhad~ l&d,110,cmbro, 1712. in Oocuinen1osf listóric~RiodtJo1nciro, llihlioteca Nacinnol. 1952. 9S. pp. 174-7. citoçlo l• PI'· 176-7.

"º'·

97

coloniais, certa1nente ad,,íriam do conhecimento dos caminhos para as Minas- caminhos que deveriam pemlanecer em segredo, como aliás todas as matérias de importância política. Em sua admirável edição crítica, And réc Mansuy forneceu ~ todos os elementos para se desvendar o mistério, ~as não o fez ~ · t:

rorqu.e nãg §f_{[ebru_çg_u. sob!'.e o se11tido ~ crj;>e gu_e abalava o Império, e que:: o Conselho Ultran~rino, ben1 co1no os conselheiros, procuravam estancar. _

ilo de São l>aulo; a região da bacia do Amazonas, situada a nor te, de fato instituída, com a criação do Estado do Ma.r anhão em 1621, corno um estado separado". Do ponto de vista mais teórico, a estrutura imperial portuguesa baseava-se "nos princípios funda mentais da fragmentação colonial e da centralização imperial''.·'• f\ idéia de Império adotada por portugueses e espanhóis era,

( omo viu o h istoriador br itânico Anthony Pagden, a de Tácito, um" imenso corpo imperial•; "ou seja, [... ] uma unidade estabet~­ cida sobre diferentes Estados preexistentes, que podiam inclusive

AS PA RTES E O TODO

estar cspacia 1mente separados" - a Asia, o México ou Peru - , o u "sobre wn território virgem de estrntura estatal desenvolvida, como ocorrerá no restante das Américas"." .E certo que teoria e

Nos C11pftulos de história colonial, Capistrano de Abreu acreditou que CulNlra e opulência tin ha devido sua proibição ao fato de, subversivamente, ensinar o Brasil aos brasileiros, ou seja, to m á-los conscientes de suas riquezas e, conseqüentemente, levá-

cada capitania uma dependência direta de Lisboa, impedindo a

los ao desejo de a utonomia. Mansuy desmontou essa afirmação,

integração da América portuguesa como um todo "ou o desenvol -

retomando, sob uma perspectiva renovada, a velha idéia de que a o bra fora proibida por revelar segredos da produrão colonial aos concorrentesestra ngeiros:..J\lém do mais, não existiam então nem Hrasil nem brasileiros, e.ª persrectiva de Capistrano tem muito de

globalmente a colônia": nenhuma i:1:1stituição encarnava as terras

teleológi~.

O velho mestre, contudo, !!!irou no que viu e acertou no que não v·iu. Os colo~1os, vassalos dei Rei, não se considerava m como formando um todo, e sim comoJ ntegrantes de segmentos isolaÊ2S: eram luso-brasileiros a viverem cada qual em sua região, ignorando o mais das vezes o que ia pelas outras. QLtando muito, seguindo Stuart S..do Ura. francc:se-ória. pauliswno U>d1\>.

?I Sohrrosmoun1•n1i1e>uill«»an SJo P•ulo. l':11cm/ÚtlOl'llW, .• p.32..

24 T.ambemJohn M11tHnr0\1U nJ gucrrado.)emhoob~oap>eedilsimagenscon­

110

'"°'.,

Ul

m Santa Crur de Camctá. Albuqu•rciue"" tomou governador do Grão· Pará (l 685-1690) e do Maranhão ( 1690-1701)."Cf. A. ). R. Russcll-Wood, "Jdentidade, etnia e "utoridn de nas ~·Jinas Geraj~ do século xv111: leituras do C6dke Costa A1tlfoso~ Rt!'ofi.srn Varia lfisroria,n'2 l I NúmeroEspecialCódiceCo"a 1VlatM>),jLtlho, 1999, pp. 10(). IS.citação à p. L09. Pnra uma breve biografia de Anlunio de Albuquerque. ver Aureliano Ltilt,.A11toniodeAlb1tquerq11e Coentode Carvnllio- capfrào~geuerot d~ São Paulo e }.1.iuas do Ouro, rw Rrasi~ lisboa. Ag~11cia Geral da.' Colônias~ 1944. John Monteiro observou que, apesar de recorreotemtnte considerados rebelde.'i e info1.1S0s à autoridade régia~os paulistas afirmavam sua fideUdadc e vassalagem ao r~l, mesmo que escarneceMem dos representantes por cJcenviados.ãs colônias; ..Trota·se, portanto, de um discurso arnbiguo, que ~apta lodo o conflito entrt difen·ntcs percepçõe..; lugdõ. Sab.lr.lbuçu, Cacléc lti11 dJs \'elh.1', c;iminharJm a buscar a ~1.rnuel Nunes \'iana, e o ck1'' r.1111 por seu governador t de Lodlmo, prlas qrmis ;6segowr11nvnt11, c:trqiwnlof'1·rrÍ porstrt...'Igoverrwtlc'r~~ e wir1~IfO>OS ntlu pu11/u11w ob1 ,l1btci11 tle VtJ.5.stlll!S. com a t1bs~n'lhtâ11 d~o reais preceito>

Ante as instâncias dos povos das \li nas de Ouro Preto e Riu das /'.fortes para que aceitasse o cargo, 1'unes Viana aquiesceu. O .U"gumentn erJ que"o partido du' p.wliscas" t:Slf1va "mui podcrofü" n.1q uclcs distritos, "usando da lilierdnde ei11solê11cia. e111 q11c• cos t1murn1111 viwr, e conservando o ódio entranhável contra todos o~ forasteiro~·:

Fdigno de nota que PillJ imcna o argumento: quem de.respeita o governo portugues está, na verdade, garantindo o cone role lusitano na Amàica portugucsJ, .1 in>ubordinação aparente tor· nando ~e. 11.1 essência, fidelidade JO rc1. Toda a narrat iva ~obre a chegada de Dom Fernando Martins Ma~carenh~ de Lcnca~trc ~' Minm. é nitidamente ernpcn had.1, influenciando tanto o; relatos posteriores quanto a historiografia. Corria, diz-nos Pitta, que o J2. ~~b.utl~' d.t R.1'Ch:a Pm.-.. HoJ6m1 ,/,10·\ffahk.:t p._ntut:UCM'l'~'leo ,o;._-,.1, twl~ '1tm1l1t ,,,,.., ,/,, U"11 ,J1:·~co'1nm,-.,.,to Jtr o tlc mal~ •e/( '°'nt~ ~ li•rtt~ quntr~' 2' cd.. I ~ boJ. l-1J.nd"'uAnhurdaSih'a. JSt-.O,p !ltY. .33. lhu.t , I' 27 J. O 11jlioo t rncu.

ll4

"1 pau listas e ia prender os forastci ros, '"·'" ,.,,(•sconvcnceram Manuel Nunes Viana e ío ram esperar Dum I • 111.111tlo cm Congonhas. O chefe cmboalM aparece quase cons11.1111:id1) no episódio. argum Mina~ "''"'~ido, portanto, uma reivindicação emboaba, atendida pelo 1\'i; ma~ foi em vHo, ajuíza Pitta,que i) governador tentou dissuadir "' p.1u lblas-" ircsolente turba" -de persistirem no "impulso, em •1ue administradores, quantos provedores. quantos tesourei-

ros, quanto' almmarifes. quantos e:>a>Sem l1aviam de ir para as mina,; e'º' m~mosnão havie1sd~Stt \'ON'>,porque\'osha,1am de apenar para o que u,·ésseis présúnw: e só os vontisfeitos os reinóis, e da mesma sorte nqueles, se elegesse algum deites; convoquei a núnha presença o~oficiais do senado da cln1Jra e, tratando ta matéria com eles,~ n.ao per~undiram a insinua.r-me o lnJi~ c..ipaz e conv~nitnle. ."

37. Romeiro. •J«vt.tõitJn(fnaguerra do! em~b.u...:. p. 399. 38. lbid.1>. 100. 39. Rodrigo CO...r de Mcnôô. Cana~ t' r~rê'' ~m1nÍ\tUt:\'OS concc:mcntQ ,\ C;;Jpitani~ de~I' r IS mmas de-0..i.abá. enviac.f..,, por R.udritto Cesar dt Mtn«!'Sd a t1

rei.datada; d~'rrda< mmasde 1729 l•icJ,UJertão donde ficou mais franqueada 11 entrada àqueles que nesses lugares quiseram estender seus gado~

para sustento de todo o Brasil." 45. Urn dos pon10~ :lho~ da dissertação de Juarez. Donisele !\Jnbires, d3 qual rnc valho ;·1qui, é o capiluJo em que trata da oposição entre os panidáriosda adminl$tração t.io~ índios por parriculares, como Alexandre dcGusm3o~ Bcnci e 1\otonil, eaquc1csque.como Vicirn, a condi:.navam.À página 130,diioautrquco ouro, de.'it'.obe1·to cm 1693, íoi det~nnimmlc na simpatia da Cone pa.rn com a posição p:iuHsta.contrária à deVicira:'"As 11lini:1s1 contudo.ernquca priJlC:.ípio Vieirtl não cria, tornaram ..se un1a rc\llídade que cstuUiv~os sava em pó ou moeda para os"reinos ,o IJ(•gra eo detinqaeute, 1.at1to que se CQlhcm no camú1ho das mi11asestâo S>océncia em ~te1odolog1P, 1992. p. 47 (tx. mimrografado!. Yeratnda Mm~ ~~o,Aop~­ ltrtân rdntn·1Mda ->i1:ú/i:adtn eamomu.oJ ~s«iau: àos n!vtis de, •"'4i dos J...abi

ª"

Ui1'tf•i•rt-gidot14pl•ll•ltodtPim11>11ngo-/648-l~Z.~o.dcMcsttado

ultico que ress.iltava o carater mameluco. Crbtlintcl!ia prruhstann llistórirn e gc11ealóg1ca,, S5o PaulÕ> l'u~ blic~çõcsdo 1vCentmóriodeSaot'aulo, FdltoraMnrtins. 19:;3. p. 206, t.u.

143

tu,11 de toda uma elite paulista habitu.1Ja ,1 invocar anrecedcntl"> tndigenas quando os traços füioru'n111co' da IJmília acusam me>· tiçagem indisfarçável.

.1p.11xonadas, ª le•>O quando se trata de .1:.pectos da história p1111l1stu, inclusive no tocante aos episódios

P;ir,1 além dos vícios ~t ru111ruis,a obra de Taques ecoa a conj uatura tenebrosa distinto, pois a região mal se aproximova de um sécu lo de existência: a Cláudio Ma nuel da Costa wubc i11ve111ar 1111m tradiçdimcn tada ~história mais antiga de S.'io Paulo. Os feitos bandeirantes e a antigOidade do povoamento paulista serviam assim de antídoto ao rápido e tempe,tumo proce~so de ocupação do 'lO]o mineiro. Qualificar positivamente os paulistas significava soterrar

r:

Ef1\aJ) Wtl.i vt.c o p.a.rtir de Taw1av que cheguei ao poema de Garcão. dt.ido .i p. bt de -eu"""'"' "l'pcclfica.~ que introduziu acomodaram-se facilmente naquela csrrutura".' D.ir, na pa~sagcm do século XVlt para o xvm, senhor de engenho ser ''tlrulo a que muitos ~spi ram': por traier consigo obedi~ncia, respeito c"o ser servido·; ou ~eja, o ócio. Quando acompanhado de riqueza e autoridade-"cabedal e governo" - , o senhor de engenho podia ser comparado ao fidalgo do reino.' Até o século

U!dA SOC l l:.DADI! IMP ROV ISADA 1:. INCÔ~O DA

1. José An1on10 Gan111,.., dt ~Mio. Tt,..podosjlnmt"lº'• Recife. fundação Joaquim N•bulaS [!assa ram ~scralrib':!!.dos lamb~m aQ_S .!!' ineiros. Na região aurífe· ra, dizem as fontes, eswbeleciam-se "sem inário.~ de facinorosos" e os paulistas, "sem temor de Deus nem respeito às leis, vivem como

Após a Guerra dos Emboabas ( 1707-1709), quando pela primeira vez os habitantes da América ensaiaram tomar o freio nos dentes e aclamaram Manuel Nunes Viana governador da região, as Minas, descobenas havia cerca de quim,e a11os, fo ram desmembradas do Rio de Janeiro e passaram a constittúr, junto com São Paulo, uma nova capitania. Como se viu nos capítulos anteriores, o episódio é marcado pela ambigüidadc_entâo imperante nos juízos sob re os paulistas: este:; pro tcBta ram fidelidade ao rei quando os "emboabas" escoU1erain líder próprio, mas, mesmo ass im, foram quase unanimemente retratados nas fontes coevas, de Manuel da Fonseca a Rocha Pitta, como traidores vis." Os governadores designados para a nova capitanfa não pouquebrnsconrra a população das!Vlinas,sempre acentuando seu caráter heterogêneo, ind ômito, revoltoso, deixando ver, nas en trelinhas. que o imprevisto e o difere nte daq uela formação social assustavam tanto quanto o seu presumido potencial rebelde. Asociedadedas.Minasera diversa de boa parte4,aAmérica portuguesa,.~~·a div~rs31 tamb_§m_da sociedade metropolitana. Um dos elemenlos simbólicos mais invocados pelos governantes das Minas veio justamente a ser aq uilo que nelas faltava..:.!_ nobreza e a estirpe dos agemes do poder. Aliada à kaldade no serviço do rei, essa foi uma das armas de que os capitães-generais se valeram para impor o mando em meio ao q ue consideravam uma verdadeira turba. Tal mecanismo poderia ;Hé su.rt ir efeito muna sociedade esta mental de moldes eu ropeus. Mas nas M inas da

feras e morrem como brutos, carregados de homicídios vohmtários, roubos e insolências'; sem "poder q ue os sujeite nem raz.'lo que os convença''." A situação das Minas era, de fato, grave. A região se povoara rapidamente: os primeiros descobertos oficiais dataram de 1694, as primeiras vilas de 17 10, o primeiro bispado de 1745. Antes que o controle por tuguês da região completasse um século de existência, o número dos habitantes, o riginários de diferentes partes do Império, era estimado em pouco menos de 380 mil. A corrida do ~u i:_o mineiro foi a primeira das que se verificaram na época moderna, ·e apresento u as caracteristicas próprias a movimento~ do tipo: congregou elementossocia.is variados, massobretudo os que, contando com perspectivas reduzidas nas terras de origem, dispunham-se a ganhar riqueza em pouco tempo. Dificilmente iria para as Mii1as aquela parle Jmu mo':!l!e~da" da sociedade. Como as Califórn ias que se seguiram, a sociedade das Minas foi basicamen· te composta, nas primeiras décadas, por avcn 1urciros ~ arrivistas. 15. Vt..7 a respeito asr.xcdemes págmas de Rodrigo 8cntesMo n1e:ir~ O rei uo (S/>t· /Ir - a morrorqu1a porwg11tsa e a cofo11izaçào tia Amtncn - 1640- 1720, SAo Paulo, Hutitec, 2002, pp. ;3-72. Júnia Furlado já observa,., as contradições exis· tentes no tr.uo com os pauliMuf> e"º" ccmc;epçõe.-. que vigõra\Tnm S·

Quando ,1; hierarquias eram füud;u, e

º' parlmetros duvido·

pons.hcl pela maldJde e rebeldia dos mineiro>. Havia um defeito de origem: di,correndo sobre a «fu ndaç,10 de Minas'; Assumar

sos, o afil de cnfotiz.,.Jo; mai§ tr.izia pre111iio do_g_ue benefício,

lembrava ser notório a todos "que a r.ipida e defeituosamente: a

tudo isso 50ava falso: ;;e títulos e atribuiçocs 11;10 tinham respaldo

grandcdist:lnda fez das~ finas "couto de tmolentcs", o ouro atraiu tanta gente "que no limitado espaço de

\Ili te

e três anos chegan1

hoje alguma>de s uas vilas a çompetir, reservando a Bahia, com as mais ci(fadcs d11111arinha''." Dom Pedro de Almeida foj o primeiro governante a deixar ttm retrato, mesmo ;.e eivado de preconceitos, da sociedade das

Minas no seu momento formativo, o que reforça a importância do 19.AtqwV\'ll'llbllro.\fir.ciro.ScçãoCotoniaJ. n~o lembraJ\ o1qui, Rnymundo Faom, 0.s donos rio poder. FQrnu1çtlo do piltrotwlrJ polltilkiru. 2• cd .. Porto Alegre, Globo. $.lo P•ulo, Ed.,sp. 1975, vol. 1, PP· 164·5. rari&: uma aníllue recmtedasocic n m, ClA J. R. R11S>ell Wood, "O i:ovcrno lsinato cm mais de uma ocasião-quanto da:. injúrias e descortcsiascomeLidns pelos habitan1cs.1'Jo seu en tender, as Minas ped iam "pessoa de grundc esfera e autoridade", que lá estivesse presente o tempo todo. Governos interinos. exercidm por oficial imediato ou qualquerourra pesCicdade convulsionada, irreverente, refratária aos principios ,[,, l1onra, hierarquia, tradiçãO,(!ra preciso ser homem do mundo, 1•dor~RAl'M,ano VJ, l 901. pp. IS5·8. 41 ...-Em Por1ugal,a op1nilocomwnéadequeo4."0oitumc loc.ildc~.scr altnJldu, mesmo quando con1ráric- ao direito comum. dtsdt (iU e se \.-erifiqucm ccrtOl rcqui.9tosdasu.1 v.1lid.tdt"1 nomtadamente .i su.i pr~riç.lo e r.icionalidadc)."Cf. António Manuel H~pa nh.a, As \.Y"Spems do Levtatha11 /r1$f 1turf6N ~ potkrpolftico. l'!muga~ skuloXl'lf.Co1mbra, I ivrariaA!medino, 1994,

p. 362.

111STINÇAO E RESSBNT IMEN

ro

Em "Metais e pedras preciosas". de Sérgio Buarque de Holan''·'· cstao algumas das melhores p.íginas lá escrit~sobre ~nas. !'\'a .irte final do capítulo, usando as Cartas clii/enas, S~rgio cara~eri11

mineira de aluvial, "feita em sua imensa maiona de 111 udJ> de imigrantes, que não conheceram, em sua terra dt ori1\•:m, a oportunidade de assimila r os altos pad rões de civilidade e 1,1 ,1 sociedade

hllimento". Aluvial porque as várias camadas não se sedimc ntav,1111, renovando-se sempre, "pa$!1Jndo a abrigar elementos diver"" que ~obem dos socavões ou das tendas de negócio''. Em ta1 meio, foram "desaparecendoª' manifestações consagradas de kwro e urbanidade", e assist.iu-se a um generalizado "descrédito 1 .tm form;ilismos''." Sua interpretação edecisiva, mas cabe matiwr certos pontos.

'\ rand( crise que se abre nas Mina~. sobretudo ao longo da déca11 ll.. V•lho nt< aqm Josobsernçórlo• Zcron '>obre• forçado oos1unic nJ 1,.J,.dc turopti.J.• ,w,enta outros. E p_Thamp..on. CosmmtS m rommon itu.IN...,,H 1wd11immlpopular0llturr.N0\.1 York. Th~ N~ Pres.s.1993._ 1 '· !'crgJo nuarque de Holanda~ "'Meiat.S t pedra~ prtc:io,as•. in K.L Htsl4.iru1 ~--cml do 1 rnU..:r,{11l' bra.1rle1ra. pp. 2sq.31 o. cttaçõt~ .i p. 299. t. J, ,·ol. 2.

"lf..

da de 80 do século xv111 , trnzà ton a in ti::rcs;cs irrcconcili~vcis jus-

Cláudio Manuel da Costa, que pe rtencia, como disse Joilo

tamente porque a sociedade começava a >C sedimentar. O aluvio-

Ribeiro, k:g! pocfrr, S.t ?.mio. Atiu, !986. \er sobretudo anexo J8 ...Liugiocnt~inn1ncfackscokmiais mintiraOdo i•rdminr fonçl\es e~duttvamt:ntC àt> graças do lC\I thcfe': n1•1•v;ntio dM pcJftlCOS sc•g1111flo fU mHJ do Br.uiL Bdo Horilon1e/São J>.ulo. lt•t..,iaJEdusp.

1981.p.9'·"º1.3.

187

Voltando ao século xvm, merece registro o relato colorido de Manuel da Fon= na Vida do ve11er1frel padre Belchior de Pontes, no qual fica dito que o biografado profetizou o levantamento e mencionam-se aspectos cotidianos e ritualizados da revolta - as "as~uadd••constantes, os bandos de mascarados que desciam o morro- , sem hnvcr, porém, menção aos nomes dos cabeças ou à execução exemplar do principal acusado.• Ra~t reando-se a memória do levante nas obras gerais, nota-se que não conca ~nào com duas páginas na História geral do Brasil do vis.:onde de Porto S~uro e acha-se ausente da História geral da âv1l1utçtlo brasileira organizada por Sérgio Buarque de Holanda.' A \.ldhomn

'f.

y

1-: R

o

{}

..

,,..,,.........., '"""'~

,_.,'"'~...,

f"'1 J1,r~;y­

f..1~ ,.....,..,

ti

':

1'11t1f~ ,.,.,,,..".'.Jl~.J,,,p;

~~~

r~~.1- ) ,, '~ '"""J""',.,.,~

I

F#fJ1"f,_ , ' ' .;.....,.,

A esquadrn fmnas.il comandada por Dougay..Trouin rruz" a entmdo dtl b"fa de Gunnnbarn: co11cretfam·a-st o rumor de invasão inimiga que vinha atemorizando os lwbit111ire; da Américn portuguesa flb tl1~1mm...,, ~»C~ Jromt.•ns e11cnncn~·m11.

no di.1 '' cii.i. um mpc.,·1u 1fo mmrtlo 1nctropc.,l1rmuJ..

,.,,.kzt,,

Enrre os dissabores dt um reinai qcu acabou virando padre, constam tt mordida de cobra, a rocaia e a passagem por Miuas 1w rempo dos emboabas.

Um dos governadores que Jiõs ordem,. ttos ''matts frutm1J da tfn·orc paulista, go11ernando a atp;tcwill de Siio Pa1tlo npds um periodo em que da 1i11hn perdido 11 a11ro11omia: luís Antonio de Sousa Boielho i'víouri!lo, ou Morgado de Mateus. 1

Nobreza de sangue: 110 norte de Portrigili, a casn dt Mateus, solar da familia de Luls Antonio de Sousa Bo1ellw Mt111riJo, govemarlor rle Silo l'llu/o.

L

Nobrez,, dL' cost11n1e: no arrnia/ rfo Tijuco, l\lfiuas Gerais, a Ctl$lt edrn de t\lmeit{a, cunrle rir Assunwr, prrle11cin à nobreza que doarem se11s brrisões entre a. guerr,1 dn Rcstaurafifo pórtugl1esc1, na qual comboteram s''"s (lllltpas$CJdOs, e a guerra de SttCC'>-"''º cspmzhola, da qul1l cli ptdpno p11rtiâpo11.

mulma e; mãe dos fi/l;os dis. e11vcrt•dou pelo SfJ·viço JlO lmpériÕ) govermmdo Afinas lllltll pcríódo critJ°có ,. cmu111islnnd"· como vice-rei da fndin, Alor11a para D. j()lJO V.

PLAN TA daBarra do R.io

deJ a.ngro.

,,

. Uma vista da e11tnula da b~rrn do Rio de Janeiro sob a perspect1v~ ~os ttue~ da ciflade, temiam ~livtsar

velas inimigas rw 1ionzonte.

As fortakzas da barra do Rio de Janeiro, qp. l58.

193

I

'

desordens que o prejudiquem~'" An tes de Fcu de Car valho, ainda, Diogo de Vasconcelos rclaüvizou o despotismo de A.~suma r e o clima aterrorizador cm que viveriam as populações, os mascarados qucdesciC, pofü•riurmente,o cônego Raimundo Trindade e Waldemar

1k• Almdda l3;1rbosa. Para o primeiro, "o heroísmo ele Filipe dos ~.1 11 1 0.
a cidade e no Rio dt Janeiro se interpretavam sinistramenle algum:is resoluções sobre o ca•tigo d; sublevação, pondo-se cm dtlvidn ~cu t>laria incur.tudu Mlbreaculru~ucaem ~tinas no primrito4.111.ar1el 6'> ((CU.lo xv111. lrAnKrC\'Oaqui su.a inforrm.ção:"Sq;undo o p;tdrT l>a.&nl> Ma'lud Lopud•(.a.,•llio.oinuitaAnronioCorma 1inh um intel'CS>< p.iniculu ptb Clnv•.f Prc,r•1ct,1ru·nJ~ P.idre \'íau: .... 'viu em i.lgurmsquestõn do Clavis Propl1 dc

Ai nda na década de 1720, havia ocorrido u m episódio curios~,

ção em .!vliMs." Através da literatura de viagens, é possível saber um pouco do que aconteceu com ele nesses anos silenciosos.

o seu descômodo, cio qual não deixo de compadecer-me mu ito,

qu~ wlni inou com o exílio pa ra fora de Lisboa de vários nobres,

como que1n o experimenta em si mesmo, e sei o que isto cusra; e

e do qual Assumar teria pa rlicipado._Luís César de Meneses, filh o

para V Mercê se inteirar bem desta verdade, julgue qual de nós esta-

do vice- rei do Brasil, conde de Sabugosa, protestou contra a p ri-

rá m•isdesacomod,1do, se V. Mercê cm Pitangui,donde todos os três

são de um seu cr iado, fei ta po r certo corregedor na praça do

dias pode ter 11ovas de sua casa , se eu longe d• minha tantas mil

Ross io, e tentou libertá-lo. Enquanto o fid algo discutia violenta-

léguas, com a incerteza de saber dela apenas uma vez no ano, e vindo

mente com a auroridade, trinta condes e ou tras pessoas de quali-

para tuna distância tão dilatada, pudera ser que quando saísse de

dade saíram d a Coméd ia, próximo ao local da cena, acorreram

Lisboa deixasse minha mulher em maior perigo em que nlio esteja

em massa e arrancaram o prisionei ro das mãos do corregedor.

a de V. Mercê, e depois de cá estar, e de me haver morto o único

Este não deu nenhuma providência de imediato: foi por isto

sucessor que tinha a minha casa, fiz todos os esforços com S. Majes-

demi lido pelo rei, "e, po r a j ustiça de Sua Majestade abrnnger

tade para que me aliviasse deste governo; e agora, pelas canas que

grandes e pequen os, exilou a maior p a rte d estes senhores, tendo

recebo de Lisboa, vejo que o dito Senhor não foi servido deferir-me

apenas repreend ido os gue tinha m m enores cul pas na desor-

ao meu requerimento; antes entendo que me dilata aqui o tempo

dem". Entre os que participaram da assuada, está o "Con de de

que eu não quisera,~ vista deste e.~ernplo que El -rei me dã, porque

As51m1ar, fil ho, exilado para Messejana''."

talvez entenderá que assim convém mais ao seu serviço, julgue V. Mercê como por atenção ao mesmo serviço lhe poderei eu deferir, mas se V. Mercê acha que pode ter conveniência em farer aJ conduzir a sua família, razão é que se não prive desta mesma consolaç.io que eu não posso lograr com a minha." Ern 1720, comeu_o pão que o Q.iabo ~assou por conta deu m levante, depois denominado "de Filipe dos Santos': e da repressão intempestiva que ordenou contra os responsáveis. De volta ao Reit10, em J 722, o conde desaparece por bom tempo dos d oeu40. Cartn para Francisco Duarlc Meirellt.s, escrila ll 22 de março de 1720, d 1,1d,1 tm Fcu de Car·valho> Enumtdrio...)pp. 67-8.

41. tAN1T.t-.1anuscJ'itos do Brasil) Jivro 2."Pareceres sobre o projeto da capitação, e maneio de que leva cópia Martinho de Mendonç.l~ O. 1S. São ao tOeu gêrno l•mbtm este st muda com Olrnlpo, porque os mando~ f11~m mulhtrQ, da C$ti cm um.1 casa mui rica. gasundo muito com

ª'

muita,amig..u;aquemd.amu1tosrrtMnle-s,nu.si5to~u.a\"emm1cs.clhepodturar.

~mmtnftm1dt,u1~nude.u.simcomooSJ010