O Império do Belo Monte - Vida e morte de Canudos
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famigerada de 1877, causando

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saldo final que ultrapassou os 100 mil

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1888, que atirou ao

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cas dariam origem âquela que seria uma verdadeira guerra de um país inteiro coneo

tra um minúsculo povoado perdido no mais recôndito sertão. a USE

às guerras camponesas (En-

gels), às rebeldias pré-políticas (Hobsbawm) e aos movimentos utópicos regidos pelo princípio

esperança

(Ernst

Bloch), a

Guerra de Canudos se ergue como um modumentoa seus mortos, a perturbar a glorificação de nossa história.

O IMPÉRIO DO BELO MONTE

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WALNICE NOGUEIRA

GALVÃO

O Império do Belo Monte Vida e morte de Canudos

EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO

Fundação Perseu Abramo Instituida pelo Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores em maio de 1996.

Diretoria Luiz Dulci — presidente Zilah Abramo — vice-presidente

Hamilton Percira — diretor Ricardo de Azevedo — diretor

Editora Fundação Perseu Abramo Coordenação Editorial Flamarion Maués

Projeto MEMÓRIA E HISTÓRIA Coordenador Alexandre Fortes

Comitê de História Chico Alencar, Dainis Karcpovs, Daniel Aarão Reis Filho, Eclca Bosi,

Jacob Gorender, Luiz Felipe de Alencastro, Marcelo Ridenti, Maria Célia Paoli,

Maria Victória Benevides, Michael Hall, Mirian L. Moreira Leite, Vladimir Sacchetta, Zilda lokoi. Coordenador

da coleção

Marco Aurélio Garcia

Equipe Editorial

Alexandre Fortes, Antonio Negro (editor deste volume), Fernando Teixeira, Hélio da Costa e Paulo Fontes

Capa, projeto gráfico e editoração eletrônica Eliana Kestenbaum Imagem

da capa

Flávio de Barros /Muscu Pesquisa

Histórico Nacional

iconográfica

Cia. da Memória Revisão Maurício Balthazar Leal

Candice Quinclato Baptista

O Imperio do Belo Monte: Vida e morte de Canudos

Copyright (a) 2001 by Walnice Nogueira Galvão ISBN 85-86469-47-5

1º edição: maio de 2001 Todos os direitos reservados à Editora Fundação Perseu Abramo Rua Francisco Cruz, 234

04117-091 — São Paulo — SP — Brasil

Telefone: (11) 5571-4299 » Fax: (11) 5571-0910 Correio eletrônico: editoravendas(d)

Ipabramo. org. br

Na internet: http://e ditora. Ipabramo.org br

A JOSÉ CALASANS

Sumário

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As linhas mestras do povoamento: carpa

Litoralie sertão: 2275 A palavra

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Sertão, entradas e bandeiras... umano

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Primeiro passo: medo do êxodo dos trabalhadores ......

Segundo passo: medo da destruição da propriedade... Política e delação =.

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O medo da Joreja asassessntgioatos cre rrenan -eia e e Repu HELGSO roseeas ocre ertimaicrer dd Igreja

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Antecedentes

Por que se amotinam

as gentes, e os povos imaginam

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(SALMOS 2,1)

O. tempos que se sucedem à proclamação da República em 1889, um ano após a libertação dos escravos, assistem à eclosão de insurreições mais ou menos

profundas e duradouras, ou às vezes limitadas a pequenos levantes locais. Até que o novo regime se consolide e passe a funcionar, vários anos decorrerão. A Guerra de Canudos — desencadeada no sertão da Bahia em 1896-1897 — não é mais do que uma dessas revoltas que compõem o cortejo de uma mudança de regime, e

nem sequer figura entre as mais extensas ou amplas.

As linhas mestras do povoamento As caracteristicas que tornaram o sertão e a própria Canudos tão pec uliares decorrem das linhas mestras do povoamento do vasto território que futuramen -

te constituiria um país por nome Brasil.

A exemplo de quase toda a Terra, o Brasil, segundo o estágio atual dos estudos, era inicialmente desprovido de população autóctone. A espécie hum ana proviria da Africa, onde se situam as mais antigas jazidas fósseis de hominídeos, que a»

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO o

dali teriam partido para o resto do planeta. Atualmente, anda em descrédito à outra hipótese, durante muito tempo vigente — e que Euclides da Cunha subscreve, em

Os sertoes, postulando

a existência de um

homo

americanus autóctone -,

a de que a espécie humana teria surgido mais ou menos simultaneamente por toda parte.

O Novo Mundo, como hoje se acredita, teria sido povoado inicialmente

por sucessivas levas de migrações provenientes da Ásia através do Estreito de

Bering, região fronteiriça entre a Rússia e o Alasca, bem ao norte do globo terrestre. E talvez por outras correntes migratórias, oriundas da Polinésia, hipotese que se levanta a proposito das travessias de barco pelo oceano Pacífico. Assim foi povoado o Havai, bem como a Ilha de Páscoa. O primeiro modelo

implica o parentesco genético dos nativos de todo o continente, mais cedo ou

mais tarde chegados, incluindo, afora nossos índios, os peles-vermelhas de Estados Unidos e Canadá, os maias e os astecas da América Central, bem como Os numerosos povos reunidos no império andino dos incas. As datas atribuídas

a essas migrações não cessam de recuar; recentemente, novas medições e des-

cobertas arqueológicas colocaram-nas bem mais para tras do que os 12 milênios até então incontestes. Quando os portugueses arribaram ao Brasil em 1500, por todo o território se disseminavam os índios, divididos em tribos. Estima-se seu número entre 2 milhões e 5 milhões, comportando centenas de povos com centenas de linguas

diferentes, embora pertencentes a apenas quatro troncos — tupi, jê, caribe e aruaque —, havendo ainda algumas outras não afiliadas a eles. Os padres jesuitas, Os primeiros europeus a estudarem as línguas indígenas e a escreverem gramáti-

cas e vocabulários, como aquela célebre da autoria de Anchieta, costumavam

chamar estas últimas linguas — não afiliadas ou alófilas — de linguas “travadas”, ou circunscritas. À designação considerava-as de certo modo opostas à “lingua geral”, uma espécie de tupi básico em que os diferentes falantes de linguas incompreensiveis umas às outras se comunicavam e se entendiam. O fenômeno é co-

mum e já foi registrado várias vezes na história, em diferentes ocasiões Tiveram esse papel tanto a koiné, do grego, em que o mundo da épo ca helenistica se expressava, como o latim vulgar, levado aos confi ns da terra pelo s conquistadores romanos. À população indigena do continente seria dizimada num a progressão incalculável ao longo de cinco séculos. “10º

O Império DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

As primeiras incursões da Conquista à nova terra nada mais fizeram do que explorar os poucos pontos que as naus lusas abordaram. Como não havia nem ouro nem pedras preciosas à vista — como haveria, em quantidade tal que o planeta jamais sonhara, nas possessões espanholas dos impérios asteca, maia e inca —, decorreriam

algumas

decadas

antes que a parte outorgada

aos portugueses

pelo

Tratado de Tordesilhas despertasse interesse nos conquistadores. A única riqueza percebida inicialmente foi a abundância de pau-brasil (cor de brasa), muito estimado no Velho Mundo por suas propriedades corantes, sobretudo para tecidos. A madeira, de um belo carmim, alcançava alto preço na Europa.

Para abater e transportar até os navios os grandes troncos, apos terem

seus ramos desbastados, era preciso grande quantidade de mão-de-obra, que era fornecida pelos nativos, na inexistência local de bestas de carga. E foi tão predatória a escala em que os aventureiros estrangeiros extrairam a árvore para negocia-la na Europa, que a espécie ficou praticamente extinta. Não foi, portanto, sem razão que os dois presidentes de República, do Brasil e de Portugal, escolhe-

ram simbolicamente plantar uma muda de pau-brasil para comemorar, no local onde os portugueses aportaram, os 500 anos do 22 de abril de 1500.

O fruto dessa coleta, o pau-brasil, bem como os alimentos que os Indios forneciam aos portugueses eram objeto de escambo entre as duas partes: os indios recebiam em troca coisas de que não dispunham, como miçangas, espelhos, utensilios de ferro e aço, armas e pólvora. Em alguns pontos da costa instalaram-se feitorias, que serviam como postos avançados para o abastecimento dos navios e como sede para o escambo. Paralelamente, armazenava-se ali o pau-brasil para a próxima remessa. Embora ainda fosse escasso o número de portugueses que por

aqui ficavam, já se iniciou o processo de mestiçagem, que se acentuaria cada vez mais, absorvendo outros e futuros grupos étnicos,

Essa situação inicial de contato se alteraria radicalmente com à instituição das capitanias hereditárias em 1534. Começa aí propriamente a empresa da colonização, para a qual o invasor luso iria requisitar a contribuição indigena não só como parceira de escambo e rede. Passar da fase de mera coleta de bens naturais

para a fase de colonização propriamente dita implicou um triplo. processo de expropriação territorial, escravidão e destribalização, À partir dai avolumou-se o número de portugueses que-para aqui vinham

moveu-se uma guerra sem quartel às tribos, com campanhas

11»

e

que visavam a trans-

HISTORIA

DO

BRASILEIRO

POVO

formar os indígenas em escravos para trabalhar para os brancos, os quais passaram a impor sua hegemonia e suas instituições, massacrando-os quando resistiam. Foi então que se iniciaram as grandes migrações internas, que acabariam ao

longo dos seculos por concentrar as populações nativas nos extremos do pais, expulsando-as do litoral e acuando-as até a Amazônia e o Mato Grosso, regiões fronteiriças. Foram chacinadas a ferro e fogo, bem como por moléstias ocidentais, as vezes banais, como a gripe e a variola, para as quais não dispunham de anticorpos. Iniciou-se então o longo calvário que levaria essa população — antes senhora de vastas extensões ferteis, com florestas ricas, caça em abundância, rios imensos e 8.000 quilômetros de litoral para o exercício da pesca — a quase se

extinguir. Nas

Litoral e sertão Inicialmente, o empreendimento colonizador, para desgosto de muitos de seus partidários, não penetrava o território. Na conhecida formulação de frei Vicente do Salvador, os portugueses são equiparados aos caranguejos, por se contentarem com arranhar o litoral. No primeiro século e meio, ou até aproximadamente o surgimento dos primeiros indícios de ouro, haveria no máximo a implantação de lavouras de cana-de-açúcar em São Vicente, Bahia e Pernambuco, onde se localizavam manchas de terra fértil. Plantou-se cana para fabricar açucar, remetê-lo a Portugal e dali a uma Europa gulosa de especiarias. Foi essa agricultura que, em rápida expansão, demandou mão-de-obra em grande quantidade para o exercício do trabalho compulsório, a qual acabou por ser buscada na África, trazendo a terceira etnia para compor a futura população brasileira. E preciso atentar para a maneira como tudo dava as costas para o continente

e era determinado pela Europa. Foram as necessidades do mercado europeu, € não outras, que obrigaram ao plantio da lavoura açucareira — como mais tarde ocorrera com o cafe. Não havia mercado interno que desse vazão à produção, que por isso se destinava a atravessar o Atlântico. f

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Entrementes, era preciso alimentar todo esse contingente envolv ido no pro-

cesso agroindustrial exportador. Toda via, era pre ciso fazê-lo sem abrir mão da

ocupação da terra boa pela agricultur a da cana-deaçúcar, que era o empreendiSafigue

O Imrério vO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

mento mais rendoso. E a terra era boa por duas razões: primeiro, pela fertilidade; segundo, pela proximidade do embarque nos navios. Não Revnpensnãs plantar longe e arcar com os custos do carreto até os portos, num vasto perímetro destituído de estradas e sob a mira de grupos indigenas hostis. Pouco a pouco, as terras menos produtivas e mais distantes foram sendo amealhadas para os reba-

nhos de gado, destinados à alimentação da população. Para eles, o ideal era o sertão. Foi assim,

e determinada

por essas razões, que começou

a conquista

do

sertão, de que resultariam certas características que o distinguiriam em conjun-

to, embora suas fronteiras nunca tivessem sido demarcadas. Sem dúvida, coinci-

de com o coração do país, sua porção mais interior. Recobre uma boa parte dos

estados, só deixando de fora sua faixa costeira, muitas vezes chamada “zona da mata”: é o que ocorre com o Norte e o Nordeste, agregando-se ainda parte de

Minas Gerais e de Goias.

A paisagem sertaneja não é uniforme, percorrendo uma gradação que vai

desde o calcinado poligono das secas até os campos gerais, de boas pastagens

naturais. No poligono não chove e os rios não passam de uedes, ou seja, rios

secos de regime torrencial que só correm por ocasião de cheias causadas por aguaceiros, o que é raro na região. Mas o território é atravessado por um dos maiores rios do mundo, o São Francisco, com seus numerosos afluentes. E se o sertão é notório por sua secura e sua esterilidade, também comporta bosques e veredas, como são chamados no interior de Minas os riachos com renques ciliares de palmeira buriti, bem como com uma vegetação de cerrado, se bem que enfezada e raquitica, rica em diversidade de plantas e de espécies animais. Os cronistas coloniais que acompanharam o desenrolar do processo bem perceberam a conveniência de ocupar esses ermos desmedidos com gado. E menos mal, pois implicava aproveitar o solo safaro da região. Nas palavras de um historiador que foi dos primeiros a estudá-los, Capistrano de Abreu: “Do que não pode haver dúvida é que as caatingas pouco remuneram a lavoura, como então, mais ainda que hoje, se praticava — sim ples latrocínio da natureza,

sem compensação alguma oferecida por parte do homem, Urgia dar-lhes desti-

no, mesmo porque a área dos caatingais era enor me, e descurá-la tanto monta-

va a deixar sem proveito a maior parte do pais. À criação do gado resolveu o problema”, Ea

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

De fato, a pecuária extensiva, tal como se praticava e se pratica nessas Plagas, é tão rudimentar que pouco ultrapassa a fase da coleta, como ocorria com o pau-brasil. Muito longe da racionalidade da produção atual, a criação que então

se dizia “à gandaia” pedia pouquissimo capital, fosse como investimento fosse como salário. Precisava de raros braços para o trabalho, e mesmo estes vinham remunerados em espécie: a paga era a quarta dos bezerros, ou seja, de cada quatro bezerros nascidos, um pertencia ao vaqueiro. À terra, devoluta ou sem dono

claro, havia sobrando, e bastava tomar posse dela ou requerê-la em sesmaria. A

nutrição que fornecia ao gado era tão escassa que demandava muitos quilôme-

“tros quadrados por cabeça. Longe da faixa litorânea, onde subsidiava o mantimento da população enga-

jada nas atividades produtivas prioritárias, o gado acrescentava a dupla vantagem de dispensar carreto e estradas. Entre suas virtudes, assinaladas pelos cronistas coloniais, essas são as que sobressaem: “os gados não necessitam de quem os carregue; eles são os que sentem nas longas marchas todo o peso do seu corpo e apenas se faz necessário que haja quem os encaminhe”. Essas são suas caracteristicas, como as resume Capistrano de Abreu: “o gado, essa mercadoria que se transporta”, O trato com o gado também criou um setor populacional com características particulares. Logo reconhecido como um ofício que não ostentava a pecha infamante do trabalho manual, restrito aos escravos, cedo se tornaria privilégio de homens livres, embora pobres. Sendo um ofício em que se andava a cavalo,

distinguia seus praticantes com esse traço de qualificação social, num meio onde quase todo mundo andava a pé e descalço. Acarretava ainda a ilusão da liberdade,

pois, avesso ao sedentarismo, associava-se à noção dos espaços largos e da locomoção aventurosa. E, com

a quarta das crias como remuneração, jogava com

mobilidade social, acenando para a virtualidade de o empregado tornar-se patrão assim que seu rebanho tivesse bom tamanho.

a

Afora essas caracteristicas objetivas, o sertão com o decorrer do tem po foi

adquirindo outras conotações, que em muito extrap olaram

de seu recorte ime-

diato. Região bravia e indômita, o sertão passou a implicar também significados de desconhecido, não desbravado, espaço de mistér ios e de enigmas, fora do alcance do braço da lei, inciv ilizado — e certamente como

oposição ao termo cidade”, este sim implicando império da lei, da civilização e dos valores urba-

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Mapa de Canudos e suas cercanias, elaborado por José Siqueira de Menezes,

chefe da Comissão de Engenharia da 4º Expedição.

nos. Por extensão, seus habitantes passaram a personificar a coragem e o estoicismo perante condições adversas, mas também a pureza e a inocência típicas de quem não foi corrompido pelos costumes urbanos. Essas conotaçõe s de sertão e de sertanejo se farão cada vez mais conspicuas, especialmente na lit eratura. *

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HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

A palavra sertão Embora, naturalmente por desconhecimento, se continue a repetir que a palavra sertão deriva de “desertão”, não há maneira de justificar pelas leis da fonética histórica nem pelos documentos tal evolução. Consoante Antenor Nascentes, no Dicionário etimológico da lingua portuguesa, abonando-se em apenas duas

fontes, e ambas modernas: “É de explicação difícil o ensurdecimento do s sonoro”. No entanto, a questão da origem da palavra está há tempos elucidada, em texto pouco conhecido de Gustavo Barroso, que em boa hora o Núcleo Sertão da Universidade Federal da Bahia tomou a iniciativa de republicar. Num paciente trabalho de erudição, Gustavo Barroso percorre os principais dicionários e autores clássicos portugueies e brasileiros, chegando a algumas conclusões. Que, por exemplo, a palavra já era usada na África e até mesmo em Portugal. Ainda mais, que nada tinha a ver com a noção de deserto (aridez, secura, ester ilidade) mas sim com a de “interior”, de distante da costa: por isso, o sertão pode até ser formado por florestas, contanto que sejam afastadas do mar. Não menos interessante

é a constatação de que o vocábulo se escrevia mais frequentemente com c (certam e

certão, como alias aparece em folhetos proféticos encontrados em Canudos) do que com s. E vai encontrar a etimologia correta no Dicionário da lingua bunda de Angola, de

frei Bernardo Maria de Carnecatim (1804), onde o verbete muceltão, bem como sua corruptela certão, é dado como locus mediterraneus, isto é, um lugar que fica no centro ou no meio das terras. Ainda mais, na lingua original era sinônimo de “mato”, sentido correntemente usado na África Portuguesa, só depois ampliando-se para “mato longe da costa”. Os portugueses levaram-na para sua pátria e logo trouxeram-na para o Brasil, onde teve longa vida, aplicação e destino literário.

Sertão, entradas e bandeiras Foi a escravização dos indios, primeiro, e depois a prospecção de minas de metais ou pedras preciosas que obrigaram à penetração de um vastissimo terri-

tório, o que mais tarde daria origem a um pais de porte quase continental.

Sérgio Buarque de Holanda recomenda não atribuir aos bandeirantes nenhum nobre designio politico de aumentar a obra portuguesa no ultramar, medi“16º

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O Império Do Beto MonTE

— VIDA E MORTE

ante o reconhecimento do território. Ao contrário, numa primeira fase, era “prear” indios, conforme a Nessa primeira fase, procedeu-se a dois tipos de tradas e as bandeiras. As primeiras implicavam deixar o

DE CANUDOS

diz ele, seu único objetivo, expressão da época. excursão exploratória: as en-

litoral e penetrar pelo continente adentro, em incursões de curto fôlego e duração. Já as bandeiras demandavam preparação, pois podiam demorar de alguns meses até vários anos. Exigiam carregadores para armas, munições, utensílios e implementos de todo tipo; canoas, indis-

pensáveis para os longos trajetos fluviais mas que, entre um rio e outro, tinham de ser transportadas por terra a força de braços; ou, quando não, fabricavam-se em viagem

canoas do tipo piroga, que eram afeiçoadas a partir de troncos inteiros, escavados a enxo e fogo; guerreiros armados para defesa e ataque; sem falar na alimentação, da

qual parte cra fornecida pela caça e pela pesca, e outra parte por roças plantadas ao



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longo das veredas. Cada bandeira absorvia, assim, um número enorme de escravos indigenas, que além do mais eram os guias dessas expedições, posto serem peritos no conhecimento dos recursos do interior, na arte de rastrear e de construir canoas, bem como em matéria de caça, pesca e remédios naturais. O objetivo final das bandeiras era atacar aldeias indígenas para fazer prisioneiros, sendo estes levados para São Paulo, centro de venda de escravos, onde, nos séculos XVI e XVII, eram muito re-

questados, para a lavoura, para transporte de carga e para o serviço doméstico.

São Paulo, núcleo irradiador de bandeiras e de bandeirantes, situa-se no topo do planalto de Piratininga, relativamente longe da costa. Enquanto nos primeiros tempos da Colônia a regra geral era a de estabelecimentos costeiros, meros entrepostos destinados ao contato com a Metrópole por meio de navios, a gente paulista, circunscrita por suas condições até topograficas, não desenvolveu nos dois primeiros séculos nem a grande lavoura nem o tipo de sociedade que Gilberto Freyre chamou de patriarcal, quando estudou o Nordeste. Avessos à sedentarização, que não era economicamente compensadora e que os reteria próximos do mar como reteve a população mais ao norte, os paulistas

lançaram-se ao interior do país. Isso porque, por todo o periodo colonial, a São Paulo planaltina não atinou com algum tipo de produto que pudesse ser objeto da cobiça do mercado internacional, o que, ao contrário, logo faria a cana-de-açúcar se alastrar por todo o litoral do pais. Durante dois séculos a grande riqueza de São

Paulo seria uma forma de coleta de produtos naturais, a coleta de escravos índios

visando à comercialização e ao emprego como mão-de-obra. Secundariamente, e SE

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

avolumando-se com o passar do tempo, se desenvolveria a própria lavoura de subsistência (milho, feijão, mandioca, arroz, tabaco, algodão etc.) e um crescente co-

mércio de gado, equinos e muares — que iam do Sul para São Paulo, e de São Paulo para o Rio, para Minas Gerais e para o Nordeste. Só a partir de 1830, portanto ja

após a independência, São Paulo acertaria no cultivo do café, que interessava ao mercado mundial e que seria a base de seu florescimento econômico. As bandeiras levariam à descoberta de ouro e pedras preciosas um pouco por toda parte, mas com esplêndida safra numa região em que se ofereceram tão abundantes que legaria à história o topônimo de Minas Gerais e de sua capital Vila Rica, a futura Ouro Preto. Mesmo após os índios terem começado a escassear, o impulso dado pelo achamento do ouro em tantos quadrantes ainda acabaria por devassar todo o território futuramente denominado

Brasil. É assim que a ocupação e o povoa-

mento do interior do pais, também chamado sertão — e como decorrência não intencional —, viriam a ser principalmente obra das bandeiras. Ora, foi nesse mesmo movimento das bandeiras sulcando o sertão em todos os

rumos que se procedeu à ocupação pelo gado. Com o passar do tempo, o reconhecimento cedeu lugar à fixação. Fazendas de criação de gado foram se estabelecendo

pelo interior do pais, nos rincões mais ermos, com base em doação de sesmarias, localizadas ao longo do rio São Francisco, seu principal ponto de referência. Segundo Capistrano de Abreu, “Ainda antes do descobrimento das minas sabemos que nas ribeiras do rio das Velhas e do S. Francisco havia mais de cem famílias paulistas, entregues à criação de gado”. E a penetração pelo território no rumo norte foi tal que, em pouco tempo, ja se praticava a pecuária no interior do Piaui, enquanto no rumo oeste

chegaria a Mato Grosso e dali à bacia amazônica. Um bandeirante chegou a identificar-se de tal modo à região em que se tornara um especialista, que acabou adotando como nome a alcunha que lhe deram: é o caso de Domingos Afonso Sertão. Apesar de serem numerosas na região do São Francisco as fazendas imensas, que podiam rivalizar em tamanho com um pais europeu, sobressai dentre todas a de Garcia d' Ávila, a Casa da Torre. Adicionando sesmarias obtidas por requerimento, chegou a cobrir a espantosa cifra de 260 léguas de testada ao longo do rio, ou mais de mil quilômetros.

Foi em terras pertencentes a essa casa, bem depois de ter sido desmembrada e ter entrado em decadência, que se veio a formar um arraial chamado Canudos. E

O poder local

As raízes de Antonio

Conselheiro

brasileira, e não só no sertão, foi por séculos dominada pelo Pic patriarcalismo, com base em familias possuidoras de grandes propriedades fun-

diárias formando a classe dominante e detendo o poder politico. Essa situação

era pontilhada pelas lutas desses potentados reunidos em clãs que tudo disputavam: os votos dos eleitores, os empregos públicos, o controle da policia, os recursos a que os postos administrativos davam acesso, a posse de terras, os limites

entre fazendas, as aguadas para o gado, os melhores pastos, os rebanhos. A família de Antonio Conselheiro, embora modesta, seria alvo de um desses clãs, implicando lances que passaram à história. Entretanto, a crônica de sua família só veio à luz quando a Guerra de Canudos o colocou em foco. Foi então

que João Brigido, jornalista radicado no Ceará, oriundo da mesma Quixeramobim natal do Conselheiro, de quem fora colega de escola e companheiro de folguedos, publicou artigos intitulados “Macieis e Araújos” e “Antonio Conselheiro”, que, posteriormente reunidos, fariam parte de seu livro Ceará — Homens e fatos. O trabalho sai publicado no jornal cearense República em 1897, e é em 2

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HISTORIA

seguida republicado

DO

POVO

BRASILEIRO

no Jornal do Brasil (22 de fevereiro de 1897), com nota que

reivindica a anterioridade de ter estampado uma notícia do autor sobre o assun.

to já em 28 de junho de 1893.

Familia conhecida em Quixeramobim, o pai de Antonio Vicente Mendes

Maciel, o Conselheiro, por nome Vicente Mendes Maciel, era comercia nte na

cidade, dono de estabelecimento em cujo predio morava, e que lá se encon tra hoje tombado. Possuia ainda duas outras casas, que construira. Casou-se duas

vezes, tendo três filhas afora Antonio. Ele próprio um bastardo, conf orme os documentos, o filho e as duas filhas do primeiro casamento seria m bastardos

também, pois só se casaria com a mãe deles in extremis — ela faleceria em 1834, quando o filho tinha apenas quatro anos —, assim legitimando a posteriori a

descendência. Com a mãe de mais uma filha se casaria regularmente . Ao batizar o filho, Vicente homenageava seu próprio pai, Antonio Macie l, e igualmente o padroeiro da freguesia de Santo Antonio de Quixeramobim. Corria o ano de 1830. À certidão de batismo atribui ao menino a categoria de pardo e os padrinhos que ali figuram ficariam famosos, ou pelo menos famigerados, em casos de crimes cometidos por encomenda, O padrinho, Gonçalo Nunes Leitão, daria proteção a Joaquina Maria da Conceição, mesmo depois que esta fez seu escravo e amante matar-lhe o marido, em 1837, pelo que foi para a prisão. A madrinha, Maria Lessa, conhecida como Marica Lessa, seria mandante, em 1833, do assas-

sinio de seu marido, de quem vivia separada e cujo sobrinho era seu amante, por um escravo. Foi presa, julgada e condenada em Fortaleza, cumprindo pena na cadeia da capital. Serviria de modelo para Dona Guidinha do Poço, belo romance regionalista de Manuel de Oliveira Paiva. Tudo isso se passou em Quixeram obim, na décaida de 1830, enquanto Antonio Vicente ainda era criança. Sua escolaridade, atestada por João Brígido, incluía não só as primeiras letras e aritmetica, mas também latim, de que faria farto uso em sermões, segundo testemunhas que o ouviram e como se pode verificar nos dois livros manuscritos que deixou. |

Quando o pai morreu, Antonio e as filhas continuaram no prédio — Antonio tocando o negócio, que ja ia mal. Com o tempo, e após terem se casado as três

irmãs, Antonio também se casou, com uma Maciel. Os Macieis, como eram chamados, eram valentões, destacando-se na crônica de Quixeramobim especial“20º

O Imrénrio DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE

DE CANUDOS

mente seus tios, os irmãos Miguel Carlos e Helena Maciel, esta mandante de vários crimes. Empenharam-se em longa vendeta, que atravessou vários anos, com os Araújos. Os dois clãs confrontaram-se, praticando assassinatos mútuos. A origem de tudo estava na acusação que os poderosos fazendeiros Araujos fizeram aos Macieis, vaqueiros, de terem roubado gado que lhes pertencia. Sabedores de que os Macieis pretendiam vingar-se da afronta, tomaram a iniciativa, convocaram os capangas e lhes fizeram um ataque coletivo, mas tiveram que recuar, derrotados. Isso se deu em 1833. Um segundo ataque, com matadores alugados, teve melhor resultado, com os Maciéis se rendendo sob a promessa de serem

levados a julgamento em Sobral. Todavia, ainda a caminho, foram chacinados. Pereceram desse modo, entre vários outros, o avô e xará, bem como o tio-avô Manuel Carlos, em 1834. Miguel Carlos, que ficaria celebre pela bravura, apesar de manietado e amarrado ao cavalo, conseguiu escapar. Perseguido, foi alcançado no dia seguinte, numa tapera em que se refugiara com uma de suas irmas, a qual tombou fulminada pelos que a cercavam. Atearam fogo à cabana, mas Miguel Carlos conseguiu outra vez escapar, por entre os sitiantes.

Dai para diante teria a companhia e a aliança de outra irmã, Helena, a quem João Brigido deu o epiteto de “Nêmesis da família”. Quando um Araújo se dirigia para a igreja onde se casaria naquele dia, foi alvejado e morto. Miguel Carlos dedicou-se a eliminar aqueles a quem considerava espiões dos Araújos. Mas foi tocaiado, acossado e morto um dia, quando se banhava no riacho da vila, por um bando chefiado por Manuel de Araújo, irmão do noivo. Sua valentia era tal que, morrendo, ainda esfaqueou o chefe inimigo no pescoço, matando-o igualmente. Helena, depois, mandou espancar um outro parente dos Araújos, sob pretexto de que era ele quem espionava e delatava as idas e vindas do irmão. Não se sabe que participação teve Vicente, o pai de Antonio, nesses lances dramáticos, se é que teve alguma. Apôs a morte do pai, em dificuldades matrimoniais, Antonio resolveu ir

embora da cidade juntamente com a mulher. Liquidou o estabelecimento co-

mercial, deu a casa em pagamento e mudou-se para Sobral em 1859. Ali traba-

lhou como caixeiro em outra venda. Mas acabou por desmanchar o casamento,

devido à má conduta da mulher, mudando-se para Campo Grande, onde trabalhou como escrivão de paz. Iransferiu-se depois para Ipu, onde foi requerente do foro. O exercicio de tais profissões mostra que Antonio tinha instrução. 7 a)

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HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

João Brigido é de opinião que foi em Ipu que Antonio acabou por perder a

razão, devido a um sargento do exército ter fugido com sua mulher, a qual, depois abandonada, passou a mendigar. Ainda seria visto no Crato. Segundo o cronista, que fora companheiro de infância de Antonio, o pai deste ja era tomado por surtos de demência. Antonio, por sua vez, teria dado sinais de desequilíbrio

quando criança, e as sucessivas desgraças por que passou — falência dos negócios

herdados, casamento publicamente malsucedido — transtornaram-lhe o juizo por completo. À loucura, portanto, ja viria da família, e seu veredicto a respeito é que ele se tornou “um monomaniaco”,

Afora isso, testemunha que, desde que o conhecia, era “de índole dócil, inteligente, trabalhador e alheio a todos os prazeres. Não saía de casa, ocupado

exclusivamente do comércio de seu pai”.

Depois de desaparecer do Ceara, Antonio retorna em 1876 a Quixeramobim, via Fortaleza, preso e escoltado pela polícia baiana. “Veio em estado lastimoso, a cabeça raspada, seviciado, maltrapilho e cadavérico” Já adotara o hábito de brim azul americano e um regime ascético, não comendo carne, jejuando e dormindo no chão. Quando lhe davam uma esmola em dinheiro, aceitava uma fração e devolvia a maior parte da importância. A essa altura, tinha se transformado num penitente, ou, como passaria a assinar, “O Peregrino”. Ninguém conheceu tão bem a vida

pregressa do Conselheiro quanto João Brigido. No entanto, os boatos surgiam e tomavam vulto. À versão de um Antonio Conselheiro matricida e uxoricida disseminou-se de tal maneira, sendo encontrada por toda parte, e a tal ponto que uma

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Litografia publicada no volante “Breve noticia sobre o

célebre fanático Antônio Conselheiro”, que circulou em Pernambuco durante a Guerra de Canudos, em 1897.

peça de teatro de autoria de Júlio César Leal, Antonio Maciel. O Conselheiro, foi publicada por inteiro em vários jornais, ina

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O Imrério DO BeLO MonTE

— VIDA E MORTE

DE CANUDOS

O argumento da peça era mais ou menos o seguinte. A mãe de Antonio Conselheiro detestava a nora, e por isso tratou de convencê-lo de que ela o traia. Antonio posta-se em tocaia, e ao ver um vulto embuçado entrando em sua casa

pela janela, atira e mata... sua mãe, que se disfarçara para fingir ser o amante da adúltera, a qual também morre baleada. Nem é preciso dizer que se trata de pura ficção. Mas essa ficção acompa-

nhou as representações feitas de Antonio Conselheiro, embora tivesse sido sempre desmentida, inclusive por João Brigido. Depois, o jornalista veio novamente a público defender o Conselheiro, pon-

derando que o acossamento de que foi objeto so agravou o porte e o alcance de suas reações. Para fundamentar suas afirmações sobre a inocência dele, transcreve os documentos relativos ao aprisionamento em 1876, tanto o da policia baia-

na presumindo um passado de delinquência em seu berço natal como o do juiz de Quixeramobim, declarando não constar qualquer registro criminal.

Um

potentado do sertão

Um notável exemplar desses clãs familiares imperava na região de Canu-

dos, na pessoa de Cicero Dantas Martins (1838-1903), barão de Jeremoabo. Foi

ele um homem público de considerável influência tanto no Império como na República, tendo exercido vários mandatos parlamentares. À esta história interessa sobretudo seu desempenho nos acontecimentos de Canudos, pois ele era o incontornavel chefe político de todo aquele recanto do sertão, onde nascera na

fazenda de Caritã, município de Jeremoabo.

Dificilmente alguém poderia disputar-lhe o posto de maior proprietário fundiário da região. Suas 61 fazendas espalhavam-se pelos municípios baianos de

Jeremoabo, Itapicuru, Natuba (depois Soure), Bom Conselho, Coité (hoje Paripiranga), Cumbe (hoje Euclides da Cunha), Monte Santo, Raso (hoje Araci), Curaçá e Santo Amaro, além do município sergipano de Campos (hoje Tobias

Barreto). No municipo de Santo Amaro, situado no Recôncavo Baiano, o barão possuia um importante engenho. Bom administrador, além de bacharel em direi-

to, cuidava de suas fazendas pessoalmente, embora tivesse passado parte de sua vida na Corte e em Salvador, ocupando cargos parlamentares. Antes dele, seu sas

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

avô ja fora um destacado político baiano e tivera papel decisivo por ocasião da Independência, tendo até contribuido com tropas. Pode-se aquilatar a extensão do

poder pessoal do barão, que no âmbito

estadual cobria varios municipios. Político profissional, controlava as informações em toda a sua zona de influência, percorrendo-a a cavalo e munindo-se de

um Livro de Notas em que registrava para cada membro de sua vasta clientela as

datas de nascimento, casamento e morte, completando-as com seus comentários. Bom Conselho, antiga freguesia, foi elevada a municipio por iniciativa sua quando deputado; ali exerceria os cargos de vereador e presidente da Câmara.

Grande parte do controle que exercia sobre tão extensa rede de relações,

que abrangia em suas malhas parentes, amigos, compadres, eleitores e clientes, operava por meio de cartas, além de favores: durante sua vida, cuidadosamente anotadas em seus livros de registro, escreveu e enviou mais de 40 mil cartas. Daí a importância que o estudo da correspondência passiva implica para a Guerra de

Canudos, já que os signatários são políticos e latifundiários como ele, ou então negociantes, padres, vaqueiros e juízes. Os caminhos do barão se cruzaram várias vezes com os de Antonio Conse-

lheiro. O perímetro das peregrinações deste coincidia grosso modo com a distribuição territorial das fazendas do barão, cobrindo uma faixa que ia da Bahia a Sergipe, delimitada ao sul pelo rio Itapicuru e ao norte pelo Vaza-Barris. Foi na

vila de Itapicuru que começou a trajetória baiana de Antonio Conselheiro, desde que, em 187/4-75, o delegado Boaventura Caldas, homem do barão de Jeremoabo, mandou prendê-lo uma primeira vez por estar rezando o “ofício da madrugada”, atendendo à reclamação dos vizinhos quanto ao barulho que não os deixava dormir. O Conselheiro não se submeteu, pelo que se apelou às autoridades pro-

vinciais para que enviassem um destacamento policial. Mas quando a força chegou, em lance que se repetiria outras vezes, o Conselheiro, avisado de antemão, já desaparecera com seu séquito. Mas será de fato preso quando voltar a Itapicuru, em 1876.

Durante o Império, vale lembrar, o poder se alternava entre dois partidos de constituição oligarquica, o Liberal e o Conservador, que reuniam a elite do pais. Quando um deles tendia a se eternizar na posição de mando, o imperador,

a quem cabia o assim chamado Poder Moderador, intervinha e o apeava. É claro que isso se repetia na esfera estadual e na municipal. No que tange aquela parte PDA

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O Imrvério DO BeLO MONTE



VIDA E MORTE

DE CANUDOS

do sertão, o barão era conservador e um lider em escala nacional, enquanto vários de seus parentes eram liberais. E em 1878, quando o gabinete conservador completou dez anos, o imperador dissolveu-o e em seu lugar colocou outro

formado pelos liberais. Com o advento da República, o barão foi eleito senador estadual e participou da Assembléia Constituinte baiana de 1891. Para primeiro governador da Bahia, a Assembléia elegeu seu 5grande amigo e correligionário José Gonçalves, cuja vida também se mesclaria aos acontecimentos da Guerra de Canudos, por ser lider politico com sede em Vila Nova da Rainha, na mesma região. Dissolvidos os partidos imperiais, ambos passariam a militar no novo Partido Republicano Federalista, Quando começaram os conflitos que levariam à guerra, era governador da Bahia Rodrigues Lima, do mesmo partido, cuja gestão se estendeu de 1892 a 1896. Em 1893 o partido se dividiu, dando origem a dois outros: um deles, o Partido Republicano Federal, contava com o governador e com a liderança de Luiz Viana; o outro, o Partido Republicano Constitucional, era chefiado por Jose Gonçalves e pelo barão de Jeremoabo. Ambas as facções passaram ao confronto. Assim, por exemplo, segundo denuncia o barão nos dois artigos que escreveu sobre Antonio Conselheiro, o governador teria passado a nomear para cargos administrativos, policiais e judiciários na circunscrição dos dois amigos apenas seus aliados. Tanto o barão como José Gonçalves, nessa época, estavam na oposição em plano estadual. O barão se encontrou duas vezes com o Conselheiro, em Soure e no Bom Jesus, ocasiões que aproveitou para, com todo o peso da autoridade e do prestigio de que gozava naqueles sertões, admoestá-lo a propósito de suas atitudes anti-republicanas. Segundo o próprio barão, o Conselheiro não lhe deu ouvidos,

antes reafirmando suas convicções. Ao argumento do barão de que uma enciclica

papal recomendava ao clero e aos fiéis que acatassem a República, retorquiu que o papa estava errado, a República era obra do demônio e a própria palavra “ré

pública” já era reveladora. Mesmo na oposição, e naquele momento sem cargo oficial, o barão esteve

na origem do envio de tropas pelo governo que redundaria na refrega de Massete, em 1893: foi ele quem as requisitou. A força policial, composta por três dúzias de praças sob o comando do tenente Virgílio de Almeida, foi recebida e PEDRO

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

acomodada pelo barão. Logo em seguida, ante o insucesso em Masseté, solicitou outra, que perseguiu os conselheiristas até Serrinha, de onde voltou por ordem do governador, ao que parece temeroso de outra derrota dado o pequeno con-

tingente mobilizado.

Pode-se bem avaliar que, instalando-se a grei conselheirista em Canudos a partir de 1893, e começando a avultar pela afluência de fiéis de todo o sertão, a inquietação de quem por ali morava crescesse paralelamente. Numerosos eram

os apelos e os avisos que cruzavam os ares da Bahia, pessoalmente, por recado,

por carta — e que apareciam esporadicamente nas paginas dos jornais —, retratan-

do o desassossego. O próprio barão, devido a sua posição de potentado, era alvo

de conversas pessoais e de missivistas que lhe transmitiam seus temores, pedindo

alvitre ou ajuda. Todavia, foi para atender à convocação do juiz Arlindo Leoni, de Juazeiro, que a 1º Expedição foi montada. Não se tem notícia, tampouco, de que o barão interferisse diretamente no envio das demais expedições. Mas sua mão aparece na assistência que prestou — ele, sua parentela e seus clientes — aos militares. À 2º Coluna, com todos os seus 2.500 homens e mais os animais, acampou em sua fazenda Barriguda, durante a marcha. Chefe político naquelas paragens, ele como que fazia as honras da casa às forças que iam executar os desig-

nios de sua classe.

Vários de seu sangue desempenharam algum papel. Para começar, um sobrinho, João Dantas de Magalhães, era médico do exército e exerceu suas funções na campanha, tendo o barão lhe confiado carros de boi para ajudar no trans-

porte dos feridos. Um primo, Genes Martins Fontes, era juiz em Monte Santo, e seu irmão Paulo Fontes ocupava idêntico posto; ambos possuíam várias fazendas perto de Canudos. Outro primo, Antonio Ferreira de Brito, era o chefe político de Pombal, ameaçada pelos conselheiristas. Mais um, Sebastião de Sousa Dantas, fora promotor em Monte Santo, e seria mais de uma vez deputado federal. Outro, Francisco Dantas, ocupara o cargo de intendente em Soure. E um parente, o

“coronel? José Américo Camelo de Souza Velho, foi dos mais aguerridos oposito-

res dos canudenses e um dos maiores fornecedores do exercito na região. Tornou-se amigo intimo do comandante-em-chefe da 4º Expedição, general Artur Oscar de Andrade Guimarães. Intentaria um processo contra o governo após o

fim da guerra, pedindo indenização pelos danos sofrid os, em propriedades e 26»

O Império vO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

boiadas, e seria ressarcido em toda a linha. Esses são nomes do clã do barão, sem

falar nos aliados e clientes, que aparecem a toda hora nos relatos da guerra. Finda a contenda, o barão continuaria sua atuação de chefe político local e líder da oposição baiana, com contatos de peso na esfera federal, até seu faleci-

mento em 1903.

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Á paixão de Antonio Conselheiro

Catolicismo popular SF

condições estavam engatilhadas para o que aconteceu depois, ten-

do-se em mente o catolicismo tradicional que vigorava no interior. Não se trata-

va ali de uma corruptela dos preceitos da Igreja romana, mas de um conjunto de praticas que comportavam uma real presença da religião, como auxílio instrumental, no dia-a-dia dos fiéis. Em toda grande religião, com o passar do tempo a

divindade principal acaba por tornar-se, na expressão de Mircea Eliade, um Deus Otiosus, elevando-se a alturas tão rarefeitas que não mais ouve, nem atende, as preces de seus fiéis. Criam-se então outras divindades, mais próximas das tribulações dos humanos e menos assustadoras, com as quais os crentes se apegam por terem com elas menos cerimônia. Pense-se na multiplicação de santos meno res no catolicismo, especializados em causas também menores, como achar objetos perdidos ou providenciar casamentos.

Afora a fé e a caridade, a presença de outra das três virtudes teologais, a esperança, a assomar em toda latência messiânica segundo Ernst Bloch, mostra que a religião, ou o tipo de religiosidade praticado pelos seguidores do Conse“29º

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

lheiro, nada tinha de desviante, antes constituindo a normalidade, embora normalidade de pobres e oprimidos. As populações interioranas crentes nesse catolicismo rústico, mais habituadas a um tipo de dominação tradicional estruturada pelo patriarcalismo, recebe-

ram mal os primórdios de uma modernização que as atingiu em vários pontos do

pais. Essa modernização, que incluia tanto a abertura de estradas de ferro (caso do Contestado) como a instauração da República (caso de Canudos), alteraria desde os impostos, a moeda, os pesos e medidas, até a instituição do casamento,

que deixou de ser um sacramento obri gatório para tornar-se um simples contra-

to civil, quando a República ordenou a separação entre a Igreja e o Estado.

Pouco antes, na segunda metade do Oitocentos, a Igreja passara por uma profunda reforma, conhecida como romanização, resultante do Concílio de Trento. À reforma visava a fortalecer o poder do Vaticano e a pôr nos eixos um cato-

licismo laxista e eivado de crendices. No Brasil como no mundo, o avanço da maçonaria anticlerical, do positivismo e do protestantismo causava preocupação à Igreja. Foi a maçonaria o pomo da discórdia entre o trono de Pedro II e essa mesma Igreja, que passou à história como a Questão Reli giosa. Sendo o imperador o chefe da Igreja no Brasil, a Questão enfraqueceu os laços entre ambos, e assim O regime monárquico veio a perder mais um apoio. Com a romanização, no Nordeste brasileiro deu-se uma rearticulação de dioceses, uma reaproximação com o povo, um reavivamento espiritual conduzido pela hierarquia, combinando-se com a fundação de seminários e uma injeção

de sangue novo por meio da chegada aos postos locais de padres que representavam o novo ideário. É por essa época que surge no Ceará, torrão natal de Antonio Conselheiro e

do padre Cicero (1844-1934), o padre José Maria Ibiapina (1806-1883). Seu

nome era Jose Antonio Pereira Ibiapina, mas, devoto da Virgem, acrescentou o

nome dela ao seu e estendeu-o a seu rebanho. Vale lembrar que Nossa Senhora só recentemente tivera sua Imaculada Conceição tornada dogma pelo papa, em 1854, num século que presidiu a várias de suas aparições miraculosas. O padre Ibiapina era um militante religioso consoante o modelo recêm-surgido

e ampliaria sua

atuação a seis estados da região. Em sua ação missionária, criou por toda parte Casas de Caridade, 22 ao todo, as quais eram administradas por beatas. Mas suas iniciativas extrapolavam da mera devoção, pois o reavivamento incluia à execução Pa

O.

O Império DO BeLO MonTE

— VIDA E MORTE

DE CANUDOS

de obras muito necessarias por ali, como o reparo de igrejas e cemitérios ou a construção de estradas e açudes. Seu prestígio foi de tal ordem que, tido por profeta e santo milagreiro, acabou por despertar de pôr os pés na diocese de Sobral, onde atuava, de seu apostolado, colocando-as sob o comando O padre Ibiapina morreu mas seu exemplo

as iras da Igreja, que o proibiu e retirou as Casas de Caridade da diocese de Fortaleza. frutificou, e vamos encontrar

ecos dele, afora em padre Cicero do Juazeiro, também na conduta de Antonio Conselheiro. Com efeito, este foi defensor da ortodoxia, agente de reavivamen-

to espiritual, peregrino (epiteto que adotou), condutor de um séquito de beatas e beatos, devoto da Virgem Maria, construtor de igrejas, açudes e cemitérios,

perambulando com sua pregação e suas obras por todo o sertão durante um quartel de século.

Ao mesmo tempo, tornando-se padrinho de batismo de uma infinidade de afilhados, parceiro de Nossa Senhora, que era invariavelmente a madrinha, ia tecendo uma extensa rede baseada no compadrio, com a força que se sabe que essa instituição ostentou no sertão. A relevância desse componente se acentua quando se pensa que o laço espiritual, que assim se criava, tornava um compadre do Conselheiro e de Nossa Senhora infenso ao laço social interclasses costumeiro no apadrinhamento de um pobre por um potentado local. Assim, todas as pessoas implicadas nesta outra rede como que sutilmente se subtraiam à estrutura de poder vigente, entrando numa outra, concorrente daquela. Quando chegar

a hora e o padrinho lançar uma convocação, compadres e afilhados acorrerão em massa em sua defesa de todos os recantos do sertão.

Equivoca-se quem considera Canudos uma cidadela amurada, sem contato com o exterior. O Conselheiro era benquisto. O arraial entretinha relações comerciais e de recebimento de donativos com fazendeiros de localidades vizinhas

cujos nomes a história reteve, como os coronéis Janjão, como era conhecido João Evangelista de Juazeiro, José Leitão, chefe político de Santa Luzia e pai de deputado, Ângelo dos Reis, proprietário da fazenda Formosa do outro lado do Vaza-Barris, Pedro Simões, Fiel José de Carvalho, dono de terras em Cocoroboó e Poço de Cima, Florisbelo de Morais, de Amparo do Pombal, Antonio dos Poci-

nhos, que tinha loja de tecidos. Seu prestigio era tal entre os de posses que o

barão de Jeremoabo, com irritação, comenta que, com exceção da sua, todas as

familias assistiam às orações do Conselheiro, chegando ao ponto de convidá-lo Sea

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O riokaza-Barris, às margens do qual ficava Canudos antes da construção do açude de Cocorobó, é um rio periódico ou de

regime torrencial, correndo somente quando despencam trombas d “água, para logo depois estancarem.

para ir a suas casas quando não podiam comparecer aos locais de reunião. Seu poder igualmente adquiria alcance surpreendente. Em episódio relatado pelo combatente Constantino Néri, durante a marcha da 2º Coluna o administrador da fazenda Tarraxil, indagado por que não ia vender o gado que ali se via nas feiras da região, alegou que o governo proibira. Questionado sobre qual o governo que impusera uma proibição tão absurda, respondeu que tinha sido “o governo de Canudos, do Conselheiro”.

Primeiros registros de Antonio

Conselheiro

Antonio Conselheiro é apenas um entre os vários conselheiros de que ha noticia na época: havia um por nome Francisco, em Itiúba, na Bahia, outro por nome Guedes, em Pernambuco, e outros mais. Assim eram designados no sertão os leigos andarilhos e pregadores de sermões, chamados “conselhos” por não provirem de padres ordenados. Abaixo do conselheiro havia o beato, que angariav a es-

O

Imrério vo BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

molas para obras piedosas, puxava terços, dirigia ladainhas e entoava benditos. Quando um beato adquiria condições para, além disso, proferir prédicas, ou conselhos, passava a conselheiro. Tudo isso informal e oficiosamente, ou seja, conforme categorias da religiosidade popular não oficialmente reconhecidas pela Igreja. Quando se pensa nas sucessivas secas que assolaram o sertão na segunda metade do seculo XIX e culminaram na famigerada de 1877, causando uma crise econômica sem precedentes e um saldo final que ultrapassou os 100 mil mortos; e quando se

soma a isso a libertação dos escravos em 1888, que atirou ao desamparo milhares de pessoas em todo o território nacional, muitas das quais iriam engrossar as hostes conselheiristas; não é de admirar que tenham surgido tantos conselheiros, tantos beatos e tantos séquitos, pois era uma época e uma região de carência. Quanto ao próprio Antonio Conselheiro, podem-se acompanhar as peripécias de sua peregrinação, antes de Canudos, pelas primeiras notícias que sobre

ele foram publicadas, mais de 20 anos antes da conflagração. Um pequeno jornal

da cidade de Estância, em Sergipe, noticia sua passagem tão cedo quanto 1874. A

matéria ja fixa certos traços constantemente reiterados ao se falar dele: seu tipo

físico de sertanejo, com barba e cabelo comprido, o camisolão azul de brim, a

aparência desmazelada, o carisma, as obras em andamento de restauração de

uma capela — e, naturalmente, o perigo para a ordem constituida. Acrescentava ainda a noticia que só podia ser um penitente, portanto um criminoso a expiar seus pecados e fugitivo ao braço da lei. Esse boato deve ter-se espalhado, porque dois anos depois, em 1876, de

volta a Itapicuru para concluir a restauração da capelinha da Rainha dos Anjos,

iniciada em 1874, Antonio Conselheiro foi preso e levado a Salvador, capital do estado, e dali encaminhado ao Ceará, primeiro a Fortaleza e em seguida a sua Quixeramobim natal. Ali verificou-se que nada constava contra ele, e foi solto e

inocentado de qualquer acusação. Mas os boatos continuariam e aumentariam até adquirir proporções teratológicas, criando a lenda, como vimos, de um An-

tonio Conselheiro matricida e uxoricida. Devido a ter sido preso na Bahia, os

jornais locais estampam farto noticiário a seu respeito, o que ecoaria até na capi-

tal do país, quando a Folhinha Laemmert, de 1877, daria cobertura anunciando seu

aparecimento e peregrinações. Dois anos depois, em 1879, seria a vez de Sílvio

Romero,

em artigos que escreveu para a Revista Brasileira e depois reuniu em

Estudos sobre a poesia popular no Brasil. Ao transcrever versos que ja então se faziam ma

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

sobre o beato, Romero aproveita para registrar sua impressões, embora não decline a identidade dos informantes. Entre estes, talvez ele mesmo, pois no ano em que saiu a primeira noticia no jornalzinho de Estância, 1874, Silvio Romero

era promotor na cidade. Além de repetir os traços já fixados, afirma ser Antonio

Conselheiro um criminoso; mais tarde chamãá-lo-ia também de fanático. Em seguida, temos um testemunho de primeira mão dado pelo chefe do Corpo Policial da Bahia, Durval Vieira de Aguiar, autor de um importante livro publicado em 1888, Descrições práticas da provincia da Bahia, no qual meia página se ocupa de Antonio Conselheiro, que o autor encontrou no Cumbe, perto de

Monte Santo e de Canudos. Ele repete os traços já conhecidos, mas acrescenta anotações perspicazes. Por exemplo, que a tolerância da Igreja, que o deixava

“passar por santo”, tinha por base ser ele infenso a interesses pecunia ários, canalizando os proventos de tudo o que promovia, novenas, festas, batizados, casamentos — embora não ministrasse os sacramentos, pois não era sacerdote ordenado —, para os cofres da Igreja. Ao comentar duas igrejas erguidas pelo Conselheiro, em diferentes localidades, chama uma de “elegante” e a outra de “excelen-

te”, E percebe que, apesar da movimentação de gente que para ali acorria , a ouvir sua pregação, ele era responsável pela manutenção de “admirável paz” —

afirmação tanto mais surpreendente quando se pensa nas turbulências do sertão, à época. Como que prevendo a potencialidade de desenvolvimentos futuros, adverte ser a fidelidade do povo tão cega que “resistirá, ainda mesmo a qualquer ordem legal”. No cômputo geral, considera-o “um fanático ignorante”. No entanto, quando anos mais tarde estourar o primeiro confronto, na re-

frega de Masseté, município de Tucano, em 1893, Durval Vieira de Aguiar envia-

rá uma carta aos jornais alertando para o perigo de um banho de sangue no sertão. Nessa carta, afirma que o Conselheiro era inofensivo, entregue a sua devoção e prestando bons serviços cívicos. A refrega foi consequência de uma das primeiras iniciativas pública s do Conselheiro, com sobretons políticos, quando liderou em Bom Conselho, Itapicuru, Soure, Amparo e Bom Jesus, tudo no lapso de oito dias, uma queima das tabuas com os editais dos novos impostos republicanos, os quais, como é óbvio,

viriam sobrecarregar de gravames a economia de penúria dos pobres. Regulamentando-se nesse ano e delegando-se à esfera do municipio a responsabilidade

pela cobrança, afixava-se o edital numa tábua às portas da Câmara. Por todo o “34º

O Império DO Beto MonTE

— VIDA E MORTE

DE CANUDOS

“UM ANJO MANDADO POR MEU PAI” [...] Há de aparecer um Anjo mandado por meu Pai terno pregando sermões pelas portas, fazendo Povoações nos desertos, fazendo Igrejas e Capelinhas e dando seus conselhos. Muitos acreditarão e muitos dismoralizarão seus preceitos [...] Em verdade vos digo, quando as Nações brigarem com as Nações, o Brasil com o Brasil, a Inglaterra com a Inglaterra, a Prucia com a Prucia; das ondas do mar Dom Sebastião sair com todo seu exército desde o princípio do mundo que se encontrou com todo seu exército, em guerra, e restitiu em guerra. E quando encontrou-se afincou a espada na pedra ela foi até os copos e ele disse - adeus Mundo, até mil e tantos, a dois mil não chegaras. Nesse dia quando sair com seu exército tera a todos no fio da espada, deste papel da república — o fim desta guerra se acabara na casa Santa de

Roma e o sangue há de ir até a junta grossa”

(Trecho de profecia encontrada em Canudos. Euclides da Cunha, Caderneta de campo.)

final do Império, alastraram-se pelo Nordeste os motins populares que recebe-

ram o nome genérico de “Quebra-quilo”, pois o alvo das iras do povo eram os padrões de pesos e medidas, ou as tábuas de editais, em que os novos impostos se materializavam. Nisso ecoavam a seu modo o gesto dos ludditas ingleses no inicio da Revolução Industrial, quebrando as máquinas que lhes usurpavam o ganha-pão, entre outras formas de protesto. Fosse como fosse, tratava-se de um ato aberto de desobediência civil: por causa disso, a polícia baiana foi cham ada e, no confronto, sairia derrotada. A refrega de Masseté, em 1893, na qual os seguidores do Conselheiro puseram em debandada a força policial, marca o ponto de inflexão em sua trajetória. Foi ai que ele sustou a peregrinação de tantos anos e se estabeleceu em Canudos, no

fundo do sertão e no alto de serranias, longe de tudo. Ali instauraria o Belo Monte.

Notícia sobre as obras do Conselheiro Nos seus dois decênios de errância pelos sert ões são invariáveis as noticias sobre as obras do Conselheiro, que convocav a as pessoas e as liderava na

missão que se impusera de construir ou conser tar igrejas, cemitérios, açudes. SA

*

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Afora o exemplo do padre Ibiapina, era usual, embora pouco lembrado, que as incursões das Santas Missões se devotassem

não apenas ao reavivamento

espi-

ritual e a ministrar sacramentos, mas também a obras públicas, congregando a população para edificar ou reparar igrejas, cemiterios, açudes e tanques, estra-

das e calçadas.

Esse lado prático era mais um motivo pelo qual, embora considerassem o Conselheiro perigoso, o acolhiam com favor nas várias localidades por onde passava. Em suma, havia padres que o toleravam por causa das vantagens que a Igreja

auferia, e o poder civil apreciava-o enquanto capataz de uma legião de mão-de-

obra gratuita. Havia poderosos, religiosos ou leigos, como fazendeiros sertanejos, que tomavam a iniciativa, solicitando ao Conselheiro que viesse trabalhar em seus municipios e freguesias. Rendosa penitência, para eles. Futuramente essa

simbiose se desequilibraria e o Conselheiro seria hostilizado tanto pela Igreja como pelo poder civil. O historiador José Calasans, o maior especialista no assunto, levantou as fontes e percorreu os caminhos, refazendo o percurso do Conselheiro e vistori-

ando suas edificações, que se situam no perímetro de sua peregrinação. A tradição oral atribui ao lider a promessa de erguer 25 igrejas, mas nenhuma no terri-

tório do Ceará. Em seu interrogatório policial, quando preso na Bahia e remetido aquele estado, declarou-se um penitente consagrado a dar “conselhos” e a

construir tanto igrejas como cemitérios. Tal declaração é ainda confirmada por

um trecho de seu livro de sermões. Ao fim e ao cabo, veio a ser o maior arquiteto do sertão baiano. Somando todas as suas obras identificadas, o historiador chegou a um total bem próximo do número 25 da tradição oral, a maioria na Bahia e algumas em Sergipe, como segue. Em primeiro lugar, a restauração da capela da Rainha dos Anjos, na fregue-

sia de Nossa Senhora de Nazaré do Itapicuru de Cima, em duas fases, documentadas como datando de 1874 e 1876. Depois, foi a vez da reparação de dois cemitérios, um em Aporá, em 1875, e o outro em Itapicuru. O de Aporá ficou inconcluso, porque, tendo o Conselheiro se disposto a rezar o terço, foi todavia proibido pelo vigário de pregar, retirando-se então. Sucessivamente, ergueria vários templos em diferentes rincões. Na fazenda do Mocambo, terminada em 1882 mas hoje demolida, e no Cumbe, iniciada no *36+

O Império nO BELO MonTE

— VIDA E MOKTE DE CANUDOS

mesmo ano, aquelas duas a que Durval Vieira de Aguiar aplicou os adjetivos de

“elegante” e “excelente”. Aqui os testemunhos divergem, havendo alguns que atribuem a do Cumbe a um outro conselheiro contemporâneo, por nome Francisco. A igreja de Chorrochó, datando dos anos 80, foi a mais ambiciosa e de maiores dimensões, até então. Reza a tradição que o Conselheiro pregava do alto da balaustrada do cruzeiro erigido defronte à igreja. À igreja do Bom Jesus, na fazenda Dendê de Cima, perto de Itapicuru, foi edificada a partir do zero. A certa altura dos anos 80 o Conselheiro decidira assentar-se ali, tendo ordenado a seus sequazes que limpassem a área, levantassem casas, erguessem um barracão para romeiros e escavassem um tanque para fornecimento de água. Foi ele quem deu o nome de Bom Jesus ao arraial, embora ali não se demorasse e acabasse indo embora com sua grei, em episódio pouco elucidado. Também a igreja de Beritinga, antiga Manga, lhe é atribuida pela tradição oral. E mais o cemitério de Entre Rios, cujo muro foi reconstruído pelas boas obras dos conselheiristas, em 1887-88.

A via-sacra de Monte

Santo

Também aqui colaborou a mão do Conselheiro. O calvário de Monte Santo,

com os Passos da Santa Cruz, fora construído pelo capuchinho italiano frei Apolônio de Todi ainda no século XVIII. O capuchinho viera da Itália para a região

para operar o reavivamento espiritual, pregando as Santas Mis sões em caráter

itinerante, percorrendo muitas localidades, e deixando memórias escritas. Até que chegou em 17785 ao pé da serra de Piquaraçã, onde só aparecia um vigário a cada quatro ou'cinco anos, e teve uma especie de visão ao desper tar-lhe a paisagem reminiscências de Jerusalém. Conclamou os fiéis a se dedicarem à construção de uma via-sacra serra acima, com estrada e escadarias de pedra, pontilhada de Pass os da Cruz em louvor de Nossa Senhora das Dores e de Nosso Senhor Aco rreram eles de todos os quadrantes do sertão e se entregaram à obra, em penitê ncia. No dia de Todos os Santos, 1º de novembro, inaugurou-se a edificação. Ao fim da Santa Missão que

ali realizara e que terminara nesse dia, o capuchinho encabeçou uma procissão REA

os

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Em Monte Santo, onde o Conselheiro, segundo a tradição, ergueu os muros de arrimo que suportam o leito do caminho da via-sacra edificada um século antes, o exército instalou uma base de operações para combater os canudenses.

serra acima carregando cruzes de madeira e instalando-as a intervalos regulares ao longo da via-sacra. Para culminar, o capuchinho batizou o lugar, dando-lhe o nome de Monte Santo. Com o tempo, disseminou-se a idéia de que a via-sacra era milagreira, acorrendo os romeiros e marcando o início do povoamento daquela que seria freguesia em 1790, vila e municipio desmembrado de Itapicuru em 1837, comarca em 1850 e finalmente cidade em 1929. Do municipio inicial

seriam posteriormente desmembrados os de Cansanção, Uauá, Cumbe (hoje Euclides da Cunha) e, em 1985, o de Canudos.

Monte Santo tornou-se centro de romaria, que ocorre esporadicamente o ano todo e especialmente na Semana Santa, mas se concentra em particular no dia de Todos os Santos. Foi este trabalho de engenharia, arquitetura e piedade que, cerca de cem anos mais tarde, o Conselheiro e suas coortes envidariam

esforços para reparar. A tradição atribui-lhes o erguimento dos muros de arrimo que suportam o leito do caminho empedrado que acompanha a linha da crista da serra, onde se localizam as 21 capelinhas e o santuário que as arremata no topo da subida. Em 1892, tendo-se passado mais de 100 anos desde a construção, ao

término de uma novena de Santa Missão, o Conselheiro liderou uma procissão “38.

O Imrénio DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE

DE CANUDOS

serra acima. Mais 100 anos, e o lugar continua funcional, além de figurar entre os mais importantes centros de romaria dos sertões. Euclides da Cunha, ele proprio engenheiro e admirador das proezas de sua profissão, dar-lhe-ia o epíteto de

“maravilha dos sertões”,

Outras obras Continuando em suas andanças, várias testemunhas afirmam que o Conse-

lheiro construiu outros dois cemitérios: o da Ribeira do Pau Grande, hoje Ribeira do Amparo, e o de Timbó, no municipio de Esplanada, onde também há refe-

rências a uma outra igreja, não identificada.

Em seguida, aparecem duas obras no estado de Sergipe: o cemitério de Vila

Cristina (hoje Cristinópolis) e a reparação da igreja de Campos (atual Tobias

Barreto).

De volta à Bahia, dedicou-se à restauração da igreja e do cemitério de Natuba (que depois foi Soure e Nova Soure), o que provocou um incidente com o vigário local. Natuba fora, nas priscas eras, missão jesuítica, e sua igreja estava

arruinada. Apelou-se para o Conselheiro, à revelia do vigario local , que com ele não se dava; atendendo ao apelo, tratou aquele de acumular pedras para depois proceder aos trabalhos. Regressando o vigário, aborreceu-se e mandou devolver as pedras aos doadores, que aproveitaram para ladrilhar as calç adas fronteiras a suas casas. O Conselheiro retirou-se e dizem que amaldiçoou a cidade. Mas tempos depois, novamente chamado, acudiu e cumpriu a tarefa, Finalmente, chegamos às obras em Canudos, onde o Conselheiro e suas

falanges se estabeleceram em 1893. Consta que o Conselheiro já passara por lá em sua errância, ocasião em que prometera construir nova igreja na localidade, que só dispunha de uma capelinha. E de fato construiria a | greja de Santo Antonio, seu epônimo. Ali, no cruzeiro defronte, figura a inscrição: “Edificada em

1893. A.M.M.C?, sigla de Antonio Mendes Maciel Conselheiro. Depois, decidiu-se a levantar uma outra muito maior, notável tanto pela espessura dos muros como pela altura das torres. Consagrada ao Bom Jesus, passaria à história como

a Igreja Nova de tantas reportagens, livros e memórias, enquanto a de Santo Antonio receberia a alcunha de Igreja Velha. O estopim da discórdia foi a compra 2

49?

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

de madeiras para a Igreja Nova em Juazeiro, porque, ja pagas, não foram entre-

gues e os beatos mandaram dizer que iriam buscá-las à força, Assustadas, as autoridades locais pediram tropas ao governo estadual, e estas, ultrapassando Juazeiro, enfiaram para Canudos. O encontro fatal entre tropas e conselheiristas ocor-

reu em Uauá, e dai para diante a contenda engrossou em avalanche. Afora esses, informa-se ainda sobre o cemitério de Canudos, atrás da Igreja Velha, e mais um outro em Riacho Seco, municipio de Curaçã. É um impressionante

curriculo, mostrando

o Conselheiro

como

um bene-

mérito das populações do sertão. E perpassa pelos textos ou pela tradição oral, intermitentemente, ao longo de todos esses anos, a silhueta de um cortejo de

esfarrapados carregando pedras na cabeça, forma usual de penitência, aqui cana-

lizada para obras úteis a todos.

“AO.

No Belo Monte

Fa

como for, ja ia completar duas décadas a peregrinação do Conse-

lheiro. Bem ou mal acolhido no território que delimitara, palmilhando-o em suas andanças entre o Vaza-Barris ao norte e o Itapicuru ao sul, persistira em seus

intentos. Ao longo desse periodo, fora objeto de incessante correspondência entre os vigários das localidades por onde passava e o chefe deles na hierarquia eclesiástica, o vigário capitular da Bahia, sediado em Salvador. Os vigarios pe-

diam instruções sobre como proceder e também forneciam informações, constituindo hoje preciosa documentação para o obscuro período anterior à guerra.

Alguns eram-lhe favoráveis e até se tornariam seus amigos, enquanto outros lhe

eram hostis. Mas, até então, o apoio institucional e oficial da Igreja não lhe fora

sonegado, apesar da circular de D. Luiz Antonio dos Santos, primaz da Bahia, em 1882, proibindo aos sacerdotes que lhe concedessem o que pretendia. Ão que tudo indica, a refrega de Masseté, no município de Tucano, em 1893, pode estar na raiz da decisão do Conselheiro de pôr um freio a sua errância. Até agora pouco elucidada, sabe-se — pelas discussões registradas nos anais parlamentares estaduais e federais, tanto quanto pelos documentos trocados entre autoridades civis e militares, além dos comentários na imprensa baiana — que se tratou de um Sri

pos

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

recontro em que os beatos puseram a polícia estadual para correr. Certos comen-

tários indicam uma alteração no padrão de comportamento do Conselheiro e de

seu sequito, que até então se votavam a passividade e não revidavam as agressões.

Passo a passo ganhando poder e volume, à medida que a perseguição se acirrava,

alterariam seu comportamento para uma afirmação

ta. Vigários, delegados

mais agressiva e menos corda-

e fazendeiros começaram a temer tornarem-se objeto de

desacato. Consoante declaração do Peregrino a frei João Evangelista mais tarde,

deixara-se prender em 1876 porque acatava a lei do Império, mas quando tenta-

ram mata-lo em Masseté reagiu porque não reconhecia a lei da República, A partir de Masseté o estatuto do Conselheiro mudou, preocupando o governador da Bahia, que solicitou tropas ao governo federal, embora suas precauções não passassem dai e não tivessem sequelas imediatas. As tropas federais chegaram a

entrar pelo sertão até Serrinha, mas desse ponto retornaram a Salvador. Datado

de fins de maio de 1893, assim encerrou-se o episódio de Masse té. Mas não para o Conselheiro e seus proselitos. Menos de um mês depois, em junho de 1893, já estão estabelecidos em Canudos, naquilo que se poderia chamar de retirada estratégica para entrincheiramento e fortificação, como se tivesse soado um toque de recolher. Os conselheiristas pressentiram que os conflitos

iriam se aguçar.

As terras em que ficava Canudos foram no passado recebidas em sesmaria para integrar a Casa da Torre, de Garcia d' Ávila — aquela que a certa altura contava 260 léguas de testada ao longo do rio São Francisco. Não eram desertas e ali um povoado com esse nome já tinha previamente existência. Situava-se à mar-

gem do Vaza-Barris, um uede, e postava-se na intersecção de várias estra das, que depois aparecerão repetidas vezes nos relatos da guerra: tais são as de Jerem oabo, Rosário, Cambaio, Massacará e Calumbi. Duas outras, as de Uauã e Canabrava, ali começavam. Todas elas demandavam o rio São Francisco, a mais importante referência para penetração e povoamento de toda aquela região. As atividades econômicas que permitiam a sobrevivência num ponto tão remoto e desguarnecido do sertão tinham que ser, naturalmente, rudimentares.

Para começar, uma parca agricultura de subsistência, consi stindo principalmen-

te de mandioca para o preparo de farinha e de cana-de-açúcar para a fabricação

de rapadura, ambas mal vingando nos lugares onde era possivel prevalecer-se de alguma umidade. Essas manchas de terreno mais fértil recebem localmente a "odds

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O

Império DO BeLO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

denominação de praias, mesmo que longe de qualquer água. Afora isso, como até hoje, criavam-se cabras, único vivente capaz de não perecer na caatinga sem agua 5 ”

e sem verdura. Delas provinha o couro que, depois de curtido, era vendido nas

localidades próximas. E a intersecção de estradas propiciava o artesanato dos ferreiros, especialistas no cuidado das ferraduras das montarias dos transeuntes. Como se verifica, era pouco, ou quase nada.

Dos habitantes do arraial anteriores à instalação dos conselheiristas, dois ficaram registrados pela história. Um deles é Antonio da Mota, dono de pequena casa de comércio e negociante de couros de bode. Era compadre de Antonio

Conselheiro, que lhe prometera retornar para construir uma igreja. O outro é Macambira, também negociante e dono de fazenda próxima, que teve desempenho destacado na guerra e se tornaria, bem como um de seus filhos, personagem

de varias narrativas, inclusive de Os sertões. Configurava-se assim um lugarejo

minúsculo, como tantos outros da região, com alguns casebres de taipa cobertos de palha, duas ou três casas de alvenaria e telha — certamente as desses dois homens de negócios —, incluindo uma capelinha. Tudo isso à margem do VazaBarris, rio intermitente. Apos a instauração do Belo Monte, sobrepondo-se à Canudos preexistente, o panorama mudou de figura. Nem todos eram miseráveis no séquito. Havia

gente de posses, que liquidava seus bens para acompanhar o Peregrino. Em pou-

co tempo havia uma rua principal de um lado só, na praça das igrejas, que ficou

conhecida como a rua das Casas Vermelhas, assim chamadas devido à cor das telhas, por isso destacando-se visualmente do conjunto. Essa mesma rua também

era referida como do Comércio ou das Igrejas, todas denominações não-oficiais,

evidentemente, mas que bem dizem de sua importância fulcral no povoado. As duas igrejas, por sua vez, defrontavam-se de dois lados da praça. À pri-

meira era a de Santo Antonio ou Igreja Velha, cujo orago era epônimo do Conselheiro, mais antiga, benzida e inaugurada provavelmente em junho de 1893, coincidindo com o dia do santo a 13, com grandes festas que incluíram casamentos

de canudenses ilustres. A segunda, a do Bom Jesus ou Igreja Nova, muito mais

ambiciosa e de maiores proporções, que a conflagração impediria de chegar a termo. Pode-se aquilatar a força simbólica dessas invocações quando se sabe que

o Peregrino também era chamado de Santo Antonio ou Santo Antonio Aparecido, e Bom Jesus ou Bom Jesus Conselheiro. Mais tarde, diriam que o Conselhei“Ass

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HISTORIA

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Croqui esboçado por Euclides da Cunha em sua caderneta de campo, à vista de Canudos.

ro dera muros fortificados à Igreja Nova de propósito, ja prevendo sua uti lização como baluarte durante o futuro assédio. A antiga capelinha de Nossa Sen hora da Conceição, anterior à ereção de ambas as igrejas, passou a ser chamada de Santuá rio,

preservando o altar e abrigando inúmeras imagens de santos. Num qua rtinho anexo morava o Conselheiro e ali seria sepultado. Ao redor desse centro formado pelas residências das pessoas de mais posses e pela praça das igrejas, com seu quadriculado confortador da percepção humana, divisavam-se poucos arruados, perdidos em meio à aglomeração indistinta de casebres. Eram a rua do Monte Alegre, quase reta, que saía da praça em direção da estrada de Uauá, a rua da Caridade, a rua do Campo das Abóboras, a rua da Professora, a rua dos Caboclos, a rua dos Negros etc. Vale lembrar que as choças, improvisadas, eram cobertas de folhas de icó e erguidas em taipa ou pau-a-pique, ou seja, barro reforçado com galhos ou ramos, como se pode ver em algumas fotos de Flávio de Barros, fotógrafo da 4º Expedição, que no entanto só mos tram

ruinas, após a queda e o incêndio do arraial. Os precários materiais de constr u-

ção davam o tom à cidadela, tornando-a indistinguível tanto do chão como dos arredores, na mesma monotonia parda da caatinga. Na vida cotidiana do arraial predominava a religião, embora fosse, como de habito no sertão e mesmo em geral no interior do pais, uma religião festiva. Ja

anteriormente, na fase nômade, a entrada do séquito nos lugarejos e povoados *44.º

O Império Do Beto MonTI

ViDA E MORTE

DE CANUDOS

As casas de Conudos

eram choças de taipa ou

pau-a-pique, cobertas de folhas de ico. Por isso

originaram o epiteto de “Troia de taipa”, com que Euclides da Cunha celebrizou o arraial. Destacam-se também as suas pequenas proporções,

como se pode ver nesta foto de Flávio de Barros.

era assinalada pelo espoucar dos foguetes. Nada disso era incompatível com a austeridade preconizada pelo líder, da qual ha abundantes testemunhos. Fazia fogueiras com artigos de luxo pelos lugares onde passava, por exemplo xales e

outros objetos de adorno. Tampouco tolerava abusos ou relaxamentos de condu-

ta, o que estã amplamente documentado. Havia dois ofícios diários, à madrugada e à noitinha ou fim da tarde, e periodicamente os conselhos com data marcada, para os quais acorria gente até de longe, ansiosa por ouvir a palavra do Peregrino. Canudos assim tornou-se um centro de

romaria, atraindo crentes que ali chegavam para pedir audiência e fazer doações.

Avizinha-se a guerra e o arraial cresce Mas o arraial mudaria seu perfil à medida que a guerra se avizinhava, quan-

do começou a acorrer gente de todos os quadrantes do sertão. Apôs o inicio das hostilidades em 1896, cresce vertiginosamente o número dos que chegam. São muitas as cartas dos canudenses reproduzidas nas reportagens e nos livros de quem lá esteve, chamando parentes e amigos para virem em seu socorro, porque o desenlace está próximo e precisam fortalecer-se com a afluência de correligionários (veja boxe a seguir). Consoante a mais famosa dessas epistolas de cone

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

vocação aos fiéis entre os infiéis, a exemplo das do apóstolo São Paulo no Novo

Testamento —a de Ezequiel Profeta de Almeida, reproduzida em vários textos —,0 Belo Monte era a “Barquinha de Noc” num mundo cuja impiedade o fadava à destruição. À convocação deu resultado, sendo até hoje incalculável a quantidade

de gente de todo aquele sertão em roda que liquidou seus haveres e acudiu a Canudos, carregando familia e agregados. O aspecto caótico de cidade sem ruas acentuou-se, pois proliferaram como

fungos os casebres de mesmo

modelo: cafuas de pau-a-pique, cor de terra, mi-

núsculas e com uma única porta como abertura. Uma das descrições mais abrangentes é a de Euclides da Cunha no Diário de uma expedição, em que anotou que o arraial compreendia cinco bairros, espalhados sobre o dorso das colinas, estando as edificações concentradas no interior de cada bairro e mais esparsas nos seus

limites. De fato, dá a impressão de estar descrevendo a resultante de sucessivas

levas de povoamento precipitado, irradiando a partir de núcleos periféricos. E continua, falando do “[...] acervo incoerente de casas — todas com a mesma feição e a mesma cor, compactas e unidas no centro de cada um dos bairros distantes [...]”. Ainda segundo o escritor, corroborado por outros depoimentos, o con-

“..+ ELE AGARANTE A SALVAÇÃO”

“Lovado S.N.Senhor Jesus Cristo

Belo Monte 3 di 10 bro de Rosendo estimoti boa saude em comp” da sua fam” Meu Concelhero está procurando por voceis venha embora breve q. esta se vendo não entrar m, ninguem casu os republicano venham com sintido assim diz meu concelleiro. O que eles

apanhá mata venha morrer no péis do bom J* O Concelheiro disse 3 vezes q. oq. morreu no belo Monte ele agarante a salvação já morreo dos nosso irmão 74 no | fogo q. hove morreo 5 republicano i morreo muito cabeludo. O Concelheiro está

entereçado q. voceis venhão hoi o golpe na chegada do principo não passa janeiro fora por lei nenhuma. L** aos conhecidos. Aqui fica teu Pai Bonifacio Mel João”

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(Carta encontrada em Canudos. Euclides da Cunha, Cade rneta de campo) —

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O Império no BeLo MontTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

junto, sem um minimo de cuidados de urbanização — como arruamento, calça-

das, esquinas, e muito menos saneamento, sarjetas, esgotos, água encanada, ilu-

minação etc. —, formava “um labirinto inextricável”. Embora não fosse de modo absoluto uma comunidade igualitária, havendo distinção até visivel entre mais ricos e mais pobres, como a aparência das casas, todavia alguns traços de igualdade havia, e certamente dados pela religião comum — que costuma apagar apenas idealmente as barreiras de classe ao criar uma organização social sui generis que prega a fraternidade. O mais marcante desses traços era a inexistência de propriedade privada da terra. Quem chegasse podia erguer seu barraco, sem pagar nada a ninguém. Segundo testemunhas, a capela possuia como doação uma légua em quadro, que se dispunha em seu entorno, e era nessa terra que os recém-chegados recebiam permissão para se instalar. Eram distribuidos alimentos, roupas e até dinheiro, recebido em donativos pelo Conselheiro e repassado aos destituídos. Por toda a duração do arraial, emissários percorreriam o sertão solicitando esmolas em espécie ou em numerário, o conjunto das quais era administrado pelo líder. Alguma estrutura teria de ser necessária para que a comunidade fosse funcional. Havia, por exemplo, e mais importante que tudo porque formando os quadros de imediato apoio ao Conselheiro, seu estado-maior, por assim dizer, a Guarda Católica, constituída por 12 apóstolos armados, criada logo após a refrega de Massete, em fins de maio de 1893. Eles eram uniformizados, armados e municiados pelo Conselheiro, de quem recebiam soldo. Postavam-se de sentinela defronte ao Santuário, onde residia o Peregrino, revezando-se de quatro em quatro horas. Em seguida, vinha a Companhia do Bom Jesus ou Santa Companhia, bem mais numerosa. Segundo quem a viu pessoalmente, contava cerca de mil cabeças, ou 800 homens e 200 mulheres, todos uniformizados, na estimativa de frei João Evangelista; ou 1.200 homens em farda de brim azul, na do Dr. Albertazzi, que lhe dá o nome de Guarda Negra, em ataque à 2* Expedição. Um cenáculo de beatas, chefiadas por uma mordoma, cuidava da administração da residência do Conselheiro, no Santuário. Ele, conforme se sabe, quase não comia, apenas o

suficiente para se manter vivo mas em total abstinência. O arraial contava com um chefe militar, comandante supremo das operações de guerra, delegando funções ou tarefas a uma série de cabecilhas que lideravam

piquetes, e ainda um chefe civil, responsavel pela boa ordem da comunidade. E

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Também contava com uma professora, pois a educação das crianças não era

descurada. O próprio Conselheiro frequentara escola, sabendo ler e escrever e

conhecendo até rudimentos de latim. Havia ainda um

curandeiro, perito tanto

em remédios silvestres como em simpatias, e um secretário, que atendia como

escriba ao Conselheiro.

Entre tantos heróis anônimos que desempenharam variados mas fundamentais papeis nos destinos do arraial, alguns tiveram seus nomes retidos pela história, indo e voltando o catálogo nos diferentes relatos da época. |

Catálogo

dos heróis

O nome que surge mais amiúde é o de João Abade, que recebia os epite-

tos de Chefe do Povo e Comandante da Rua. Seu posto era o mai s alto de todos, pois chefiava a própria Guarda Católica, portando armas, encarr egando-se da segurança pessoal do Conselheiro e da defesa do arraial. Tinha ant ecedentes de valentia, como clavinoteiro. Ficou célebre pelo uso de seu apito para transmitir ordens e coordenar manobras. Morreria baleado, pouco ant es do fim da guerra. Dos mais antigos companheiros do Conselheiro e amigo fiel era Paulo

José da Rosa, pertencente à liderança do séquito devido a sua constância, provada em todas as tribulações. Sua presença ja é assinalada desde 1876, ou seja, apenas dois anos após o início da peregrinação, quando foi preso junto com o Conselheiro em Itapicuru e dali remetido a Salvador. Era o “civil” de

maior autoridade, digamos assim, tanto quanto João Abade era relevante mi-

litarmente. Mais velho que o Conselheiro, sobre quem demonstrava ascen-

dência, era já bem idoso à época de Canudos. Dizem que não foi combatente

e que morreu de morte natural. Combatente ilustre foi o pernambucano Pajeú — apelido sem nome, indicando sua procedência, Pajeú de Flores, celeiro de valentões —, Salteador negro, ex-soldado ou ex-policial, famoso por sua imaginação tática ao ela borar ardis guerrilheiros em vários lances da guerra, tal como ficou regist rado nos relatos. Também por lá tombou, embora seja nebuloso seu fim e a data, sujeitos a versões conflitantes.

O Imrério Do BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

Pedrão, negro imponente e hercúleo, donde o aumentativo, chamava-se Pedro Nolasco (ou Jose) de Oliveira e era originário dali mesmo, da Varzea da Ema. Seu casamento, bem como os de Manuel Ciriaco e José de Totó, dois gran-

des amigos seus, foi oficiado pelo padre Vicente Sabino, vigário de Cumbe, na recem-benta igreja de Santo Antonio em Canudos, em

18 de agosto de 1893.

Teve numerosos filhos, tendo-se tornado compadre de batismo do Conselheiro. A esposa e uma das filhas foram feridas no cerco, enquanto a sogra tombou na

ofensiva da 3º Expedição. Um cunhado seu sucumbira na refrega de Masseté, mostrando que a familia de sua esposa já fazia parte há tempos do séquito. Muito

guerreou, até quase o fim, quando deixou o arraial após a morte do Peregrino. Integrava a Guarda Católica, tendo portanto o privilégio de ser um dos 12 apóstolos de sentinela no Santuário; coube-lhe o comando de um piquete durante a conflagração. Sobreviveu a esta, para passar ainda por peripécias diversas, como

chefiar uma volante contra Lampião, sem chegar a alcançá-lo, migrar por vários estados e voltar a Canudos, onde morreria muitos anos depois. O historiador Jose Calasans aí o conheceu, nos anos 50, e com ele teve muitas conversas, que granjearam sua admiração. Invalido das pernas, observou ao interlocutor: “Faz pena um homem como eu morrer sentado”. Antonio Beatinho ficou conhecido porque negociou a rendição de 300 pessoas, entre mulheres, crianças, feridos e velhos, nos últimos dias do arraial. E do

resultado dessa negociação a mais famosa foto da guerra, de indescritível impacto, que figura em vários lugares, mostrando a multidão andrajosa, doente e esquelética (ver p.94). Tanta abnegação foi recompensada pela degola que o Beatinho recebeu das mãos dos soldados. Fora acompanhado na tarefa que o tornou conhecido por Bernabé José de Carvalho e mais outro, também degolados na mesma ocasião. Testemunhas anotaram os cabelos louros e olhos azuis de Bernabé. Em depoimentos orais surge também o nome de um Zé Beatinho, que puxava terços.

Aquele Joaquim Macambira já residente em Canudos antes da chegada do

Conselheiro, dono de uma fazenda próxima, continuou a ser, por sua condição de pequeno negociante e dono de loja, um dos homens de destaque no arraial. Era pai de muitos filhos, e foi um deles, seu xará, que passou à história num

episodio muito glosado. O jovem Joaquim Macambira, com um grupo de camaradas e com as bênçãos do pai, tentou tomar o canhão alcunhado de Matadeira. Sua audácia valorosa cobriu-o de glória. Tombou morto ali mesmo. "49º

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO e

O sineiro Timotinho, por nome Timóteo de Oliveira, compadre de Antonio

Conselheiro e de Nossa Senhora, desafiava o exército insist indo em tocar o sino da Igreja Velha todos os dias, ao cair da tarde. Nesse moment o, a fuzilaria inteira das tropas inimigas se concentrava nele, que continuava a tan ger o sino num exemplo de tenacidade. Um dia, em setembro, dois tiros de can hão acertaram a torre, que desmoronou, jogando o sino a distância e aniquilando o heróico sineiro. Manuel Quadrado, médico na medida das condições locais, era um curandeiro e benzedor muito respeitado, que cui dava dos doentes e dos feridos em combate. Chamavam-no de “tratador” do Con selheiro, que era seu paciente. Sucumbiu na guerra. O Conselheiro dispunha de um secretário ou escriba, que anotava o que

fosse necessário, tomava ditado de suas cartas — em geral pedindo doações, como aquela em que solicita modestamente “uma rês” , cujo original pode ser visto no

Instituto Histórico e Geográfico da Bahia — e red igia seus sermões. Era empregado na loja de Antonio Vilanova como guarda-livro s. Por nome Leão da Silva ou Leão Ramos, era originário de Natuba (depois Sou re), embora outras testemunhas apontem proveniências diversas. Morreu na guerra.

Benta, ou Tia Benta, ocupava o posto de mord oma do Conselheiro, administrando sua residência no Santuario, distribui ndo as tarefas entre as demais

beatas do cenáculo, gerindo seus recursos dom ésticos, supervisionando sua alimentação.

Também havia aquela que se chamava a Professora, bem como uma rua da Professora, fazendo supor que ali residisse, que ensinava as crianças por designio do Conselheiro. Cada criança pagava 2 mil réis por mês, conforme anotação de Euclides da Cunha em sua caderneta de campo; a aula , à qual acorriam muitos alunos, era mista. Há, conforme diferentes fontes, vários nomes para essa pro-

fessora, que seria Maria Francisca de Vasconcelos ou Maria Bibiana ou ainda Marta Figueira,

Outro destemido clavinoteiro foi o sergipano Marciano, o qual, numa reunião de cabecilhas após a morte do Conselheiro em 22 de setembro, para deliberar sobre a conveniência de deixarem ou não O arraial, enquanto alguns reso]viam partir recusou-se a sair, dizendo que se o Conselheiro morrera ele não

queria sobreviver. Ficou até o fim e, depois de preso, foi degolado, ou, segundo uma das fontes, picado em pedacinhos.

“AO.

O Império DO BELO MonTE —

VIDA E MORTE

DE

CANUDOS

Jose Felix, o Taramela, ja era acólito do Conselheiro antes da instalação em Canudos. Servia-lhe de criado e era seu homem de confiança. Tornou-se renomado tanto por sua lingua como por sua imaginação sem peias, que o levavam a inventar e contar casos mirabolantes, inclusive, posteriormente, sobre a subida aos céus, que presenciara, de tantos canudenses mortos. Segundo uns, a alcunha viria de ser chaveiro e guarda das igrejas — portanto abriria as portas para O

Conselheiro. Segundo outros, viria antes do sentido sertanejo da palavra, que designa uma pessoa que fala demais, que inventa histórias. O Taramela sobreviveu à guerra, voltou a sua cidade natal de Soure e morreu muitos anos depois, pacificamente, mas sempre tecendo lendas a respeito de Canudos.

Importante chefe de piquete era José Venâncio, a quem se atribui um passado de banditismo: contaria com muitas mortes nas costas e teria sido cangaceiro do bando de Volta Grande. Homem de confiança do Conselheiro,

viu-se encarregado de missões de coleta de fundos e de compra de armas,

entre outras. Assim como, antes da 3º Expedição, de derrubar cerca de 40 casas e palhoças nas redondezas — E de Canudos, para ampliar a visk A | são desde o arraial e desimpedi-

|

|

las de obstáculos que servissem

de anteparo aos soldados prestes a se aproximar. Seu prestígio

pode ser medido pela incumbência que recebeu pessoalmente do Conselheiro de interpelar os capuchinhos, para saber se celebrariam ou não a última missa. Após uma discussão, frei João Evange-

lista o amaldiçoou, e João Venâncio revidou amaldiçoando-o também.

Entre os muitos artesãos que

labutaram na arquitetura pia do Conselheiro, o nome mais importante que a história reteve é o de

Rara imagem

EUA

de um conselheirista, que acaba de ser preso.

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Manuel Faustino, mestre-de-obras que, por delegação do lider, presidiu aos tra-

balhos tanto na igreja do arraial do Bom Jesus (hoje Crisópolis), incluindo o

cruzeiro que lhe fica defronte e que assistiu à pregação do Conselheiro, como da

Igreja Nova em Canudos. Era também

entalhador, e de sua lavra eram as talhas

desta última igreja, depois arrasada, mas sobrevivendo ainda no altar-mor e nas portas em Crisópolis.

Antonio Fogueteiro, como a alcunha indica, fabricava fogos, a que o povo do sertão em geral e o de Canudos em particular era muito afeiçoado. Nem por

isso mostrou-se de menor bravura, pois, comandante de piquete, ataque, em seu posto.

pereceu num

Norberto das Baixas, assim conhecido pelo nome de sua fazenda em Bom Conselho, era homem de posses e compadre do Conselheiro. Muito respeitado

no arraial, fornecia madeira de sua fazenda. Sacrificou filhos na guerra, onde tombariam ele mesmo e sua mulher. Os irmãos Vilanova se distin guiriam de maneira diversa. Antonio Vilanova, que viria a ser o homem mais abastado do arraial, era originário de Assaré, no Ceará, de onde migrara para a Bahia com toda a sua família, como retirantes da seca de 1877. Nesse ano ocorreu a pior seca de todas, quando muito comerciante quebrou, por falta de fregueses que pagassem. Instalou seu negócio primeiro

em Vila Nova da Rainha (hoje Senhor do Bonfim), alcunha com o tempo incorporada a seu sobrenome. Foi quando ouviu falar da aglomeração crescente em Canudos, em torno do líder que já conhecia desde sua passagem por Assaré no início da errância. Deslocou-se para lá com o intuito, nunca disfarçado, de ganhar dinheiro, pois seu tino de negociante adivinhara que a população viria a aumentar. Adquiriu grande prestígio no arraial, e se tornou uma espécie de “che-

fe civil” ao lado do comandante militar João Abade, ambos conjuntamente gover-

nando o arraial. Prosperou mais do que ninguém e, quando viu o Conselheiro morto e a guerra perdida, foi embora com sua parentela, levando o que amealhara em alguns sacos. Voltou à terra natal e refez sua vida, que continuou por alguns prósperos anos, embora tenha morrido cedo,

Seu irmão menos conhecido, Honório, ultrapassaria os 100 anos e ganharia notoriedade graças ao importantíssimo depoimento que daria bem mais tarde à

Nertan Macedo, no Memorial de Vilanova, com inestimáveis pormenores sobre o cotidiano dentro do arraial. Sua mulher, que devido à boa aparência era chamada

O Império DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

de Pimpona, trabalhava na loja do irmão, combateu ferida, antes de ir embora,

na defesa do arraial e foi

A existência dos Vilanova esteve ligada à do maior negociante de Canudos antes de tornar-se Belo Monte, Antonio da Mota. A posição deste era confirmada pelo fato de morar numa casa de telha ao lado da Igreja Nova, onde também abriu sua loja. Afora isso, possuía um trato de terra, nas margens do Vaza-Barris. Era velho amigo e compadre do Conselheiro, desde que este por ali passara pela primeira vez, e a quem fizera prometer que voltaria para construir uma igreja, que viria a ser a Igreja Velha. Espalhou-se o boato de ter passado informações ao inimigo, quando da 1º* Expedição, comandada pelo tenente Pires Ferreira, que redundara no recontro de Uauá, onde muitos conselheiristas tombaram. Embo-

ra protestasse inocência, foi morto com os filhos adultos pelos circunstantes exaltados bem na praça das igrejas, sem que o Conselheiro, a quem apelou, inter-

viesse para salvá-lo. A mulher e as crianças sobreviveram, sob a proteção de Macambira. José Calasans chama a atenção para o fato de Antonio da Mota ter sido o maior concorrente de Antonio Vilanova, que dai para a frente manteve seus privilégios incontestes. Manuel Ciriaco, negro, só se tornou conhecido decênios após o fim da guerra, quando serviu de guia em Canudos a José Calasans, que o entrevistou varias vezes. Ele e seu irmão José Ciriaco tinham sido combatentes e se tornaram fonte de preciosas informações.

Fora do catálogo Um anti-heroi: nem por ser um traidor reconhecido e reincidente se pode deixar de mencionar Jesuíno Correia Lima. Era mascate de profissão, por si mes mo um ofício itinerante que lhe ensinara o dominio das trilhas e dos caminhos. Dirigiu-se a Canudos, tal como Vilanova, atraído pelo crescimento da freguesi a, e se tornou negociante respeitado, cidadão benquisto e bom conselheirista. Todavia, seguiu-o a reputação de ser aquilo que mais odiavam, ou seja, um quadro do aparelho republicano: fora juiz de paz e capitão da Guarda Nacional em sua vida

pregressa. Tanto bastou para que fosse expulso quando descoberto e seus bens pilhados, pouco faltando para que fosse justiçado, como Antonio da Mota. Como a

ao

HISTORIA

não era um matuto

ignorante,

DO

POVO

procurou

BRASILEIRO

representantes

da im prensa e, assumin-

do o martírio por ser republicano, denunciou os conselheiristas. Com invejável afinco, e utilizando seu tirocinio de mascate, tornou-se O guia de todas as quatro expedições militares contra Canudos. Figurou entre aque-

les que identificaram o cadáver do Conselheiro para a comissão do exército.

Juntando seu posto na Guarda Nacional a seus antecedentes conselheiristas, era chamado pelos soldados de Capitão Jagunço. Consta ainda um detalhe pior: querendo vingar-se de Pajeú, contra quem nutria antigo ressentimento, foi chamado pelo comandante da 4º Expedição, general Artur Oscar, a quem servira pessoalmente de guia, para assistir à degola daquele bravo aprisionado, ao que não se esquivou. Como as circunstâncias da morte de Pajeú permanecem ignoradas,

outra versão, recolhida por José Calasans, conta em linhas gerais o mesmo episódio, mudando apenas o nome do canudense, também de cor e espadaúdo, que

seria Vicentão, ou talvez Ladislau ou Lalau, que desfeiteara Jesuíno no Belo Monte e lhe puxara a barba, passando este a acalentar a desforra.

*s4º

Reações: o despontar do medo

O medo

da oligarquia

[Sm das maiores sedes de poder da sociedade brasileira de então havia muito manifestavam seu alarme ante a existência de Canudos: a Igreja Católica e

os coroneis, como eram designados os proprietários fundiários, a partir da pa-

tente que em regra obtinham da Guarda Nacional ao tempo do Império. Na Bahia, como vimos, sendo governador Rodrigues Lima, o partido governista se cindira em junho de 1893, a mesma data em que o Conselheiro se instalou em Canudos. Formaram-se duas facções, os vianistas e os gonçalvistas, denominações derivadas do nome de seus chefes políticos. Os vianistas obede-

ciam a Luiz Viana, futuro governador, e os gonçalvistas a José Goncalves, ex-

governador, presidente do partido antes da cisão e intendente, isto é, prefeito,

de Vila Nova da Rainha, hoje Senhor do Bonfim — bem no perimetro das pere-

grinações do Conselheiro.

Os gonçalvistas, liderados pelo mais importante

fazendeiro da circunvizinhança, o barão de Jeremoabo, passariam a fazer oposição aos vianistas dominantes. Briga de coronéis com coronéis, no seio da mesma oligarquia. As

DO

HISTORIA

POVO

BRASILEIRO

O poderoso barão foi dos maiores alarmistas a respeito do perigo represen-

tado por Canudos, e teve oportunidade, além de tudo o que tramou nos bastidores e publicamente no Parlamento, de escrever dois artigos nos jornais, como vimos, quando mais acesa ia a luta, em que denunciava os canudenses e clamava por seu extermínio. Residiria a vida toda, quando não estava no Rio, na fazenda Camuciatá, bem no municl pio de Itapicuru.

Como

foi nesse municipio que mais influência e per-

manência teve o Conselheiro no auge de sua trajetória de peregrino, antes de assentar-se em Canudos, pode-se dizer que o barão presenciou tudo o que acon-

teceu praticamente no seu quintal. Ali o Conselheiro foi objeto de uma tentativa de prisão em 1874-75. O delegado de polícia de Itapicuru, Boaventura Caldas, correligionário do barão, foi responsável por essa tentativa. O Conselheiro arribara com seu séqui-

to e se instalara numa tapera, conduzindo rezas coletivas à qual afluiam cada vez mais pessoas. O delegado advertiu os peregrinos de que a população nativa estava reclamando do barulho. Não sendo atendido, solicitou, e obteve, do governo baiano um destacamento policial que de fato veio a Itapicuru; mas os conselheiristas, prevenidos, já tinham escapado. A prisão, todavia, fora apenas adiada. O incidente repetiu-se em suas linhas gerais: o Conselheiro e sua grei voltaram a Itapicuru, onde um outro delegado

requisitaria tropas de Salvador e o prenderia na cadeia da vila, em junho de 1876. Remetido a Salvador e dali a Fortaleza e Quixeramobim, como vimos, seria afinal inocentado de qualquer acusação.

Oligarquia e eleições Em esfera local, verificou-se a expansão de um tipo de medo, que se desenvolveu em duas etapas. Já era preciso lidar com a derrocada infligida pela recente abolição do cativeiro, que privou as fazendas de mão-de-obra escrava, condenando muitas à ruína. À isso veio somar-se o êxodo — era essa à palavra que empregavam — em massa para acompanhar Antonio Conselheiro.

Além dos ex-escravos, sabe-se que os índios de alguns aldeamentos da região, de origem jesuítica, cujo trabalho era compulsoriamente utilizado “56»

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O Imeério DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

pelos fazendeiros, abandonaram seus domicílios e foram para Canudos, onde havia a comprovar essa contribuição demográfica uma Rua dos Caboclos. Restou na tradição oral a memória do coronel José Américo Camelo de Souza Velho como um dos mais truculentos entre os fazendeiros locais que os escravizavam, oferecendo-lhes a alternativa de irem morrer na Guerra do

Paraguai. O médico da 2* Expedição, Edgar Henrique Albertazzi, depõe em suas memórias que no combate do Tabuleirinho, na serra do Cambaio, viu

participarem cerca de 400 indios dos aldeamentos de Rodelas e Mirandela, tombando muitos mortos. Esses índios pertenciam às nações Kiriri e Kaimbé, e os aldeamentos eram respectivamente os de Mirandela (município de Banzaêé) e Massacará (municipio do Cumbe), próximos de Canudos; mas ha referências também aos Tuxá do sertão de Rodelas e aos índios de Natuba (Soure). Ate hoje seus descendentes se lembram de que por lá transitaram toras de madeira para a construção da Igreja Nova, vindas de um lugar chamado Baixão, nas cercanias de Mirandela. De modo similar, guardaram a lembrança da passagem do Conselheiro em suas andanças, arrebanhando-os como seguidores. E sabem identificar pelo nome seus antepassados que se teriam tornado canudenses. Entre eles, dois dos mais famosos: tanto Antonio Fogueteiro, que era Kiriri, como Manuel Quadrado, o “tratador” pessoal do Conselheiro, que era Tuxá de Rodelas, este último um

paje entre os nativos, o que corrobora seu conhecido papel de curandeiro e dispensador de mezinhas. Os donos das terras viram ir-se definitivamente seus trabalhadores, nas váà-

rias formas que essa subordinação assumia, e ainda assume, no interior camponês: empregado, diarista, agregado, morador, meeiro etc. Mais um passo, e ao

medo de verem suas propriedades definhar por falta de trabalhadores acrescentariam o medo premonitório de verem-nas invadidas e tomadas pelos pobres.

Nem é preciso dizer que tal coisa nunca se deu, nem fazia parte do ideário dos conselheiristas. As exações eram modestas — “uma rês”, como vimos na carta

ja citada do Conselheiro — e havia fazendas nas cercanias que continuavam a ope-

rar. Mas as duas faces do medo existiram, fundamentariam muitas decisões que viriam a implicar o pais inteiro e seriam cruciais no deflagrar da guerra. Tais

passos podem ser acompanhados à leitura da preciosa correspondência passiva do barão de Jeremoabo, só recentemente vinda à luz. Mis

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deando-o com informações sobre o correr das coisas no seio do povo enquanto

tentavam influenciá-lo em favor de represálias. As primeiras com essa temática ilustram o passo inicial, ou Seja, a preocupação com o carisma do Conselheiro que lhes arrebatava os trabalhadores. Assim, os correspon dentes, desde 1894, vão dando notícia, às vezes até com o número exato, de famili as que abandona-

vam a região para integrar O séquito,

Outros

testemunham

em

termos generi-

cos o despovoamento das localidades em que moram, pela mesma razão. Ainda outros reclamam, por interposta pessoa, do governado r, que demora a tomar providências.

De todos esses, o mais desabrido é o coronel José Américo Camelo de Souza Velho, primo e compadre do barão, que mui to interferiu no curso dos acontecimentos — e não só por carta. Seu nome aparece registrado em várias fontes, “ç8º

O Imrério Do BeLo MonTE

=— VIDA E MORTE DE CANUDOS

destacando-se pela virulência de suas formulações. Confessa, ja em 1894, em seu discurso vívido e de enunciados pitorescos, estar inquieto porque suas fazendas ficam próximas de Canudos, onde ocupou o trono um mero retirante, a quem chama de “Conselheiro Antonio da Malvadeza”— mostrando que a alcunha é antiga na Bahia. Devido a sua ascensão incontrastada, diz ele, esse retirante hoje se tornou um verdadeiro Napoleão I. Por causa disso desanimou de ser brasileiro e pretende naturalizar-se... africano. Segundo ele, Antonio Conselheiro está confiscando o sertão, constituindo um exército privado integrado por ex-escravos e criminosos, ja dispondo de 16 mil pessoas. Dois anos depois, em 1896, a veemência do coronel ainda aumentou. Da

notícia de que os conselheiristas estão percorrendo as vilas da região, em cortejo de mendicantes. Além de conseguir muita espórtula e madeira de que necessitava, segundo o missivista raspando os últimos vinténs dos habitantes, tambem

inclusive pessoas que não se esperava que arregimentou mais alguns seguidores, 5 o fizessem.

O vigário de Bom Conselho, que também escreve, após observar que o relatório dos capuchinhos, adiante examinado, não tinha recebido qualquer atenção das autoridades estaduais, alerta para a transformação ocorrida ultimamente no Conselheiro. Este não é mais o homem que já foi, ou seja, o humilde peregrino, pois o poder subiu-lhe à cabeça, considera-se um governador, promulga leis e desafia a hierarquia eclesiástica. E adverte para o fato de não se encontrar em posição de reagir quando o séquito vai a Bom Conselho, pois corre o risco de se ver desprestigiado, ou sujeito a coisa pior.

Segundo passo: medo da destruição da propriedade Ãos poucos, o teor das cartas se altera, e o segundo passo vai substituindo o

primeiro, cessando as reclamações sobre o despovoamento das fazendas e surgindo a preocupação com o movimento contrário. Ou seja, que em vez de Canudos atrair para seu seio os habitantes, os canudenses se despejassem sobre a re-

gião. O combate de Uauá, estopim imediato da guerra, receberia vários comentários nesse ano de 1896, por ter tornado mais concretos os temores: passam

todos a se referir a uma possivel invasão de canudenses. São referidos fatos que ja EAD”

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

conhecemos, como a promessa dos canudeneses de irem buscar um tabuado para a igreja que estão construindo. De um lado se noticia a chegada da coluna de 100

homens, atendendo ao pedido de socorro do juiz de direito de Juazeiro; de outro, a evacuação de Uaua. Pouco depois, as noticias ja falam da batalha havida em Uauá, A contagem

dos mortos € alarmante, resultando numa centena de insurretos para uma dezena de soldados, o que perfaz uma proporção de dez para um: o ardor e a abnega-

ção dos conselheiristas aumentam a sensação de ameaça. Como se haver com adversários tão arrojados? Outra notícia que não é de molde a trangiilizar ninguém é a do assassinato de Antonio da Mota, dentro do arraial sublevado. Dão conta também de que o Cumbe está se esvaziando, pois correu o boato de que logo o Conselheiro viria liquidar com os republicanos dali, entre eles, mencionado nominalmente, o coronel José Américo. O assunto do momento é o combate de Uauá, mas já se vislumbra na sequência a expedição comandada pelo major Febrônio de Brito, os correspondentes contando ao barão que já chegaram a Queimadas mais de 200 praças, enquanto reforços são aguardados. O missivista se regozija por ver que o ocorrido em Uauá abriu os olhos do governo, que já está enviando outra expedição. Mas teme que uma vitória das tropas transforme os sobreviventes em bandos errantes, que passem a atacar as fazendas. E de assinalar a audácia dos canudenses, vindo supreender os soldados durante o sono. Entre os que escrevem estã um vaqueiro do barão, que é testemunha de vista pelo menos dos mortos, cujo cômputo calculou pessoalmente. Observase que o barão pedia noticias até de pontos remotos, e não desprezava o que recebia de um vaqueiro, mesmo que este não fosse um de seus pares. Alem dos

mortos, fala das casas de negócios incendiadas pelos soldados, ao que parece em represália à fuga dos cidadãos, concluindo que foi “uma derrota”. Acrescenta duas notas interessantes: primeiro, que os moradores de Uauá foram

considerados traidores pelas tropas, o que é injusto; segundo, o boato de uma vingança do governo, ameaçando arrasar o povoado na próxima expedição. Confirma que, num raio de cinco léguas, “não ficou gente em casa, pois temiam

o pior, aqui só não saiu eu”. O último boato provocou novo êxodo da popula-

ção, que já tinha retornado; nas palavras do bravo vaqueiro: “Com esta notícia, os que voltaram para casa estão de novo saindo, é uma revolução morosa”, «bo:

O Imrénrio DO BELO MoNTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

A arrancada da 3º Expedição é comunicada ao barão desde Salvador por um juiz federal, proprietário na região, ja temendo futuros prejuízos e prevendo que de sua fazenda não sobraria pedra sobre pedra. Com efeito, ele instauraria um

processo por perdas e danos, ao fim da guerra. O aguçamento da conflagração,

que custa a se decidir, vai extraindo dos

correspondentes decisões de fugir. Atribuem ao Conselheiro, se vitorioso, uma ordem para arrasar Cumbe, Monte Santo, Pombal, Tucano, Soure e Itapicuru, bem como o propósito de distribuir as fazendas de seus inimigos, precisando que

as pertencentes a José Américo e ao Dr. Américo caberão a frei Mateus, o engenho do coronel Antonio Ferreira de Brito em Pombal a João Abade, o engenho Camuciatá do barão, depois de assassinado, é claro, a Vilanova. Outro, que de modo idêntico se declara prestes a fugir, adiciona pormenores aos danos sofridos, com lugares e nomes, afirmando que o Conselheiro mandou um contingente de 100 homens arrasar Patamuté e saquear os bens do amigo Galdino de Matos, que escapou por um triz. Além disso, manda dizer que os insurretos passaram a praticar um recrutamento indiscriminado, levando as pessoas amarradas com cordas para Canudos. O desastre da 3º Expedição só contribuiria para agravar o quadro. Se-

gundo o coronel José Américo, Monte Santo, Cumbe e Tucano já estavam

desertos, bem como as localidades dos arredores. O crescendo do pânico que pouco a pouco predomina sobre o bom senso é palpavel em muitas des-

sas manifestações. Não das menores razões, várias vezes apontadas, é a participação, nas hostes do Conselheiro, de ex-escravos, também chamados de 13 de maio e de carijes. Pelas cartas se verifica que, após o desastre, o esvaziamento da região se acentuou, com as famílias fugindo apavoradas, prevendo ataques e invasões dos insurgentes. Um deles conta como foi acordado no meio da noite por um aviso de iminente ataque, causando sua fuga com todos os seus: observa que a retirada parecia o dia do Juizo, e até o alferes que

primeiro chegou a Tucano julgava ouvir atrás de si o tropel de “legiões de

carijes”. Isso não se verificou; ao contrário, nessa ocasião Canudos se fechava

e se entrincheirava ante o próximo recrudescimento do assalto, que todos

estavam cientes ser inexorável. Entre outras coisas, as cartas relatam que os conselheiristas emboscavam, atacavam e destroçavam os carros de bois que transitavam com manti“61:

HISTORIA

mento

e munição

DO

para o exercito,

POVO

bem

BRASILEIRO

como

as boiadas

— reservando

a mu-

nição mas sem aproveitar a comida por ser republicana, ou impura. Também

faziam surtidas de todo tipo, sempre pelos arredores. As cartas dão cont a de vários

ataques a fazendas, com saques, incêndios e just içamentos. Embora a maioria seja imputavel a desmandos da imaginação, José Calasans confirma pelo menos um deles, o assalto à fa zenda Ilha, em Massacará, do odiento coronel José Américo. O relato se repe te em vários autores, segundo os qu ais, inteirado do que se passava no dia 25 de junho, no caminho de Juá pa ra Aracati, logo após o Rosário, Artur Oscar enviou socorro, que afugentou os canudenses. O ataque, que mobilizou um destacamento de 60 homens, chefiado por Pajeú, depredou e incendio u a sede. Muitos dos trabalhadores da Ilha eram devotos do Conselheiro, e fugiram para Canudos. O coronel, pr evenido por um afilhado, se encontrava refugiado em outra de suas propriedades, em Serra Branca, E de fato, por ordem do líder e por motivos tá ticos, Jose Venâncio comandara a destruição e o incêndio de todas as casas na circunvizinhança, ante a aproximação da 3º Expedição. O deslanchar da 4º Expedição é motivo para uma ampliação do medo, ventilando conjecturas sobre qual será o destino de fazendeiros e negociantes se essa nova expedição também falhar: eles mesmos acreditam ser as vítimas privilegia-

das dos conselheiristas. Mas, como se nã o bastasse, se a expedição for vitoriosa

outros imaginam que a liquidação do arraia l trará coisas ainda piores, pois os band

os ficariam descontrolados e errantes, assolando o sertão. Vários missivistas repisam idêntica tecla,

Política e delação Mais de um dos membros ou clientes da oligarquia foi denunciado como conselheirista, e disso se queixam ao barão, que sofreria idêntica calúnia. Por ai se vê como a acusação, sem fu ndamento, não só expressava o pavor generalizado como era utilizada como difamação para obter vantagens poli ticas. Um deles lamenta ter perdid o o cargo de coletor “por influê ncia do Passinho

a pedido do Dr. Américo, Catão e João Prado”, que injustamente o acusaram de ser conselheirista, com isso querendo

“692:

atingir seu amigo e pro-

O Império DO BeLO MONTE

tetor, O barão. Ao

mesmo

tempo

que

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

se inocenta,

aproveita para

delatar no-

minalmente seus acusadores, com bons argumentos. À um, por ter acoitado

alguém que matara um oficial no combate de Moreira Cesar; a outro, porq ue

foi a Canudos entregar ao Conselheiro uma esmola — o que de fato muitos faziam —; a outro, porque emprega um vaqueiro que lutou no Masseté e disso

se vangloria, mostrando como prova uma espada que trouxe como buti m:

ainda a outro, porque tem um empregado cuja mãe mora em Canudos. Assim, mais uma vez se comprova como as relações sertanejas eram intricadas

e se estendiam dentro e Um missivista, com zo que uma tal imputação pelo exercito. Caluniado

fora do arraial, mediante mil vasos comunicantes. casa de comércio em Monte Santo, lamenta o prejuílhe trouxe, na vila ocupada como base de operações como espião e compadre de Antonio Conselheiro,

quando precisa sair em viagem já espalham que vai a Canudos leva r informações sobre o número de soldados e os planos de campanha, ou mes mo munição e mantimentos. Por isso, ouve desaforos dos oficiais e tem seu negócio

vasculhado a todo momento. Nessa curiosa carta, que mostra os danos obrados pelo exér cito, ecoará uma outra, após o término da guerra, que criou um qiiproqu ó. Só dispomos das

cartas do remetente, mas entre uma e outra figu rou

uma resposta. O remetente,

juiz federal e primo do barão, juntara volumosa documentação que enviara ao destinatário para ser encaminhada aos canais competentes, requerendo indeniza-

ção por danos mil cabeças de o equivoco em tinham sido os

e perdas havidos durante a guerra. Não eram pequenos: cerca de gado bovino, ovino e caprino. À segunda carta trata de escl arecer que o barão caíra, elucidando-o sobre o causador do prej uizo: não canudenses, como o barão entendera, porém... o exér cito. Mais

uma vez, o missivista confirma as informações de que os insurretos não lançavam mão do que chamavam de “bens dos republicanos”, que eram impuros. Eles destruiam os comboios, expropriavam armas e munições, mas não tocavam na co-

mida. Em compensação, as forças legais durante a 4º Expedição consumiram todos os rebanhos das fazendas da região e atearam fogo às moradias num raio de muitas léguas. Os termos da carta chamam a atenção por essas implicações. A

indenização seria afinal obtida, anos mais tarde. Indenização também requereu José Américo, o qual, por ter sido fornecedor do exército durante a campanha, tornando-se amigo do general Artur Oscar, “63.

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

obteve deferimento mais depressa — ou pelo menos € o que diz o juiz, ao tomá-

lo como termo de comparação. Impressionante é o rancor alim entado pelo sanguissedento coronel, rancor expresso em termos de arrepiar. Eis o que diz o missivista, para quem as tropas,

finda a contenda, estariam degolando poucos prisioneiros: “Houve para mais de 200 degolados de dois para três dias, seguindo assim, e assim tem seguido. Muitas mulheres e crianças em Monte Santo, seguindo para Bahia para dar maior dispêndio ao Estado!! que devia era tudo ser degolado. EA

O medo

da Igreja

Afora a oligarquia, a outra grande sede do poder na região era a Igreja. Se a primeira tinha poder político municipal, estadual e nacional, assim imbricando o

episódio de Canudos pelo menos em três níveis de articulações políticas, a segunda, além do mais, era e é uma instituição internacional. Assim, muito do que viria a influir no episódio decorre das campanhas da Igreja de Roma em favor da romanização oitocentista, como vimos, e de sua estratégia contra os positivistas,

maçons e protestantes na Europa, com repercussões no Brasil. Tudo isso era con-

sequência do duro golpe desferido pela Revolução Francesa, do qual a Igreja ainda estava tentando se reequilibrar. As características de reaproximação com o povo e reavivamento espiritual que acompanharam a romanização teriam um per-

fil próprio nos sertões.

Inicialmente, e como se sabe desde a publicação do livro de sermões de

Antonio Conselheiro, o Peregrino operava dentro da mais estrita ortodoxia, negando-se inclusive a ministrar os sacramentos por não ser sacerdote ordenado. Não se distinguia de tantos beatos que palmilhavam o sertão e que o padre Ibia-

pina estimulara ao seu redor, criando ordens leigas tanto de mulheres como de

homens e instalando 22 Casas de Caridade em seis estados do Nordeste. Como essas ordens não eram sancionadas pela hierarquia da Igreja, Ibiapina acabaria sendo punido por seus superiores, que lhe tomariam o controle delas, bem como das Casas de Caridade. Embora não se saiba se os dois jamais se encontraram,

antes de tomar o hábito Ibiapina fora juiz em Quixeramobim, ao tempo dos conflitos que envolveram os Maciéis. “64º !

ú

4

d

O Império DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

No início de seu apostolado, portanto, não havia razão para que Antonio Conselheiro e seu sequito não fossem benquistos: legiões de beatos eram

um espetáculo corrente no sertão. A Igreja apreciava os ganhos em dinheiro que resultavam de suas ações de reavivamento e do reparo de obras que lhe poupavam despesas, como igrejas e cemitérios. A oligarquia se beneficiava com o emprego de mão-de-obra gratuita e voluntaria em obras públicas, tanto quanto lhe convinha tratar bem tamanho contingente de votos potenciais. É O Peregrino

não

usurpava os direitos canônicos,

deu ministrar os sacramentos,

como

pois nunca

preten-

casamento, batizado, comunhão

etc.

Bom católico e bom cidadão, eis a avaliação de Antonio Conselheiro feita pelos dois principais poderes a imperar no sertão — a oligarquia e a Igreja — no começo de sua trajetória. Prova disso é sua aliança com vários vigários das localidades por onde passava em suas andanças, executando boas obras. Alguns permitiam que pregasse no adro da igreja, ja que, por não ser ordenado, não poderia pregar no altar. Mas, à medida que seu prestígio crescia, essas relações começaram a se deteriorar. Pode-se dizer, de modo geral, que, de uma aceitação inicial, devido a sua normalidade — a presença de mais um cortejo de beatos no sertão não constituindo uma excentricidade ou uma ameaça —, a posição da Igreja, ou pelo menos a do clero sertanejo, evoluiu para uma atitude de ambivalência. À Igreja

Católica, instituição que teve 2.000 anos para aprender a astúcia da sobrevivência, assinala-se por sua capacidade de acomodação tanto à direita como à esquerda, tanto com forças sociais reacionarias como com progressistas, tanto

com a TFP (Tradição, Familia, Propriedade) como com a Teologia da Libertação

ou as comunidades eclesiais de base. Jamais deixou de reivindicar as palavras de Jesus Cristo nos Evangelhos,

para justificar essa extrema flexibilidade tati-

ca: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

Na decada de 1880, sobre a qual escasseiam as informações, ao que tudo indica o Conselheiro teria feito uma primeira tentativa de assentamento, im-

plantando o arraial do Bom Jesus (hoje Crisópolis) em terras da fazenda Dendê de Cima, a 30 quilômetros de Itapicuru. Ali concitou suas coortes a derru-

bar a mata, erguer moradias, escavar um tanque para armazenagem de agua e

edificar uma capela cujo orago era Nosso Senhor. Documento exarado pelo “6ç»

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO TESS

36 com] comprova a construção. Ja então se Nota essa 1886 em delegado de Itapicuru , ndên espo Corr na idas cont ias notic as rme o nf co , ia nc lê inflexão para a ambiva dor. Por Salva em cese idio Arqu a com jos cia dos vigarios sertane no “SSa Epoca à +

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a:

Ê

is

+

jav Arquidiocese, oficialmente, repudiava o Co nselheiro e Pp proibia que fosse rece.

bido pelos párocos: nesse sentido, é clara a circular do arcebispo D, Luiz Ântonio dos Santos, primaz da Bahia, em 1882. Em seu zelo, quando bispo no Ce. ará fora ele quem cortara as asas ao padre Ibiapina. Alguns vigários acatavam a diretriz. Assim, o Conselheiro foi expulso de Coité na Bahia, de Lagarto e Simão Dias, ambas em Sergipe, sempre por iniciativa do vigário local. É de assinalar que não revidou, talvez porque isso se tenha passado durante a vigên-

cia do Império, conforme vimos. Essa poderia ser a razão da resistência ao ataque em Massete, já no período republicano. Outros vigarios, como o padre Antonio Porfírio Ramos, de Inhambupe, eo cônego Agripino Silva Borges, de Itapicuru, a ele se aliavam e permitiam

sua pregação. Este último, bem no centro dos acontecimentos e cruzando

seus destinos com

o do Conselheiro

mais de uma

vez, aparece

como um

prodigio de conciliação. Homem importante, político, correspondente do barão de Jeremoabo, foi um dos celebrantes da missa que inaugurou em 1895 o sobrado de Camuciatá, construído pelo barão. Logo depois, oficiaria as bodas do filho deste, João Costa Pinto Dantas. Exerceria mandatos parlamentares no Império e na República, afora ter sido intendente de Itapicuru. Apesar disso, manteve 20 anos de aliança com o Conselheiro, associando-se os nomes de ambos a vários relatos e episódios, desde os primeiros eventos em Itapicuru nos anos 70, com registro de batizados ali oficiados em 1875 pelo vigário sendo padrinho o Conselheiro, até a bênção de igrejas edifica-

das por ele, já nos anos 90.

E o vigário do Cumbe, paróquia de que Canudos era freguesia, padre Vicen-

te Sabino dos Santos, tinha até uma casa em Canudos, apoiando Antonio Conselheiro em tudo, antes que sobreviesse o rompimento. O fato é que o povo sertahejo dava mais ouvidos ao Conselheiro que aos sacerdotes ordenados, preferindo seus conselhos às missas formais na igreja. E certamente nenhum daqueles Vigarios de lugarejos contava com uma tal falange de fiéis. Era dificil a posição deles. Assim, as cartas dos que lhe eram avessos estão cheias de reclamações acusando-o-o de arroganc ânci ia, prepotênêncciia,a, ii nsubord ininaçaçãão. "66+

O Império no Beto MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

Igreja e República As medidas laicas que a novel Republica implantara tinham desagradado sobretudo ao baixo clero. Os altos escalões da hierarquia católica logo se acomodaram, mas por muitos anos os vigários recalcitraram.

Ja se insinuou que teriam

sido eles os insufladores de um Conselheiro anti-republicano. Não podiam aceitar a separação entre a Igreja e o Estado, consórcio fincado na tradição, nem a

decretação da liberdade de religião pela Constituição republicana, que subtraia à

Igreja o monopólio do sagrado e dava a qualquer seita protestante ou espirita o

mesmo estatuto. Sem falar na diminuição de poderes e rendas que implicava a

instituição do casamento civil — até então exclusividade eclesiástica — ou a laicização dos cemitérios, entre outras coisas.

Mas a Igreja logo endurece, e em meados dos anos 90 toma simultanea-

mente duas medidas radicais: o padre Cicero é suspenso de ordens em 1896, ano em que a instituição retira oficialmente seu apoio, mesmo que relutante, a Antonio Conselheiro, em vista do malogro de uma missão dos capuchinhos em 1895, como se verá. À reaproximação com o povo, parte integrante da romanização, tinha ido longe demais nos sertões, adquirindo uma dinâmica própria, que fizera a Igreja perder o controle do processo. Se a oligarquia temia o esvaziamento do campo e a destruição da propriedade, o medo da Igreja se dirigia a outros alvos. Em primeiro lugar, a perda da freguesia, com os fiéis sendo usurpados por lideres carismáticos, fossem sacerdotes ordenados como o padre Cicero, fossem leigos como o Conselheiro. O

que estava em jogo não era bem a defesa da ortodoxia,

pois nem um nem outro

eram heréticos, e certamente não iam derrubar os predios das igrejas. Mas bem

poderiam fundar novas religiões, como tanto se viu no pais durante o século XX, quer nascidas de cismas, como a Igreja Católica Brasileira, quer resultantes de sincretismo, como o candomblé, a umbanda etc. A Igreja percebeu os perigos de voltar a mergulhar nos anseios do povo, o que podia ser tão subversivo para a ordem quanto o fora o cristianismo primitivo, antes de se tornar a religião dominante, hierarquizada e subserviente ao poder, esquecendo-se de suas origens

enquanto fé e esperança dos pobres.

Viu-se então a Igreja a empunhar as rédeas do processo com renovada firmeza e a reconduzir seus rebanhos ao aprisco da ortodoxia mais estrita. Primei“67º

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

ro foi a vez do padre Ibiapina, proibido de entrar em Sobral e destituído das 22 Casas de Caridade que fundara. O padre Cicero curvou-se, aceitou renegar seu

“milagre” e foi recebido de volta em seu seio. O Conselheiro recalcitrou, selando

a destruição de Canudos.

A missão dos capuchinhos Em 1895 o arcebispo da Bahia recebe um pedido do governador, que por sua vez o recebera da situação e da oposição na Assembléia estadual, que sabiam se unir em defesa dos interesses da oligarquia. Atendendo ao pedido, envia dois frades capuchinhos, frei João Evangelista de Monte Marciano e frei Caetano de São Leo, em missão ostensivamente de reavivamento espiritual, mas de fato para um diagnóstico e ultimato. O relatório, publicado no mesmo ano, é um precioso documento para a apreciação do desencontro de opiniões que havia entre repre-

sentantes oficiais da alta hierarquia da Igreja e a grei conselheirista.

O laudo é totalmente desfavorável, insistindo na anarquia, na insubordinação, no fanatismo ali reinantes, mas também na esqualidez e na miséria. Os dois embaixadores chegaram acompanhados do vigário do Cumbe, padre Vicente Sa-

bino dos Santos, em cuja casa se hospedaram, e que lá não ia ja fazia um ano, pois fora alvo de desacato não especificado. O relatório adquiriu importância por ser um dos raros documentos escritos por quem viu Canudos por dentro. Descontada a má vontade da perspectiva adotada, pode-se prestar atenção à riqueza de pormenores e à capacidade de

observação, bem como a uma espécie de impregnação da atmosfera ambiente.

De saida, um encontro premonitório. Numa curva do caminho, ainda longe do arraial, um grupo maltrapilho, armado e com cara de poucos amigos, se recusa a indicar aos viajantes o rumo que deveriam seguir. Depois, ja no arraial, onde foram bem recebidos graças à Santa Missão que tinham vindo realizar, o próprio Conselheiro fez as honras da casa, mostrando-lhes as obras incipientes da Igreja Nova, Pregaram ao ar livre debaixo de uma latada, como é costume no sertão, nesses casos. Estranharam que os circunstantes assistissem à cerimônia religios a arma-

dos até os dentes, Os protestos dos missionários não conseguiram dem ovê-los. “68.

O

Imrério DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

A audiência foi de 5.000 a 6.000 pessoas, a maioria acorrida das cercanias. Tudo ia bem, com o Conselheiro assistindo em posição preeminente ao lado do

altar, até que certo dia, falando de jejum aquela gente esquelética, explicaram que não era preciso morrer de fome, sendo permitido tomar café de manhã e comer um pedaço de carne à noite. Em vívida cena, o Conselheiro é mostrado esticando o lábio inferior em trejeito de desprezo e meneando a cabeça em nega-

tiva. O povo começou a murmurar e uma voz exclamou: “Ora, isso não é jejum, é comer a fartar”.

Pondo de lado a falta de tato, em falar de jejum para quem já não tinha o que

comer, a cena é interessante. Mas o pior estava por vir. Um dia, resolveram os capuchinhos desafiar o Conselheiro durante o sermão, conclamando os fieis a acatarem a República, com argumentos variados. Que o poder civil é uma coisa e a autoridade religiosa outra. Que ate os monarquistas aceitam as leis republicanas. Que mesmo a França havia mais de 20 anos ja era republicana. Que deveriam depor as armas e voltar a seus lugares de origem.

“QUANTOS HOMENS FORAM FALSOS À COROA ...”

“[...] Antes deste tempo deste homem ha de aparecer muitas linhas de ferro

e dai quando meu Corpo entrar no dia de S.João Batista, dai principiara as dores do Mundo, e dai quando veres o Sol escuro e daí quando correrem as Estrelas, sera o principio do fim destas idades e dai quando os sujeitos forem livres, e dai havera uma grande fome e no fim destes tempos haverá um tempos de prêmio de frutos de flores e de semente no meio deste tempo, haverá uns bichos para dis-

truir estas sementes..[...] A Profecia de Jerusalém marca. Quantos homens foram falsos à Coroa em 1822 se desenganaram os que ficaram inganados. Em 1830 se desinganaram quando correram as estrelas do Céu. Em 1854 uma grande colera havera que na medicina não haverá médico que saiba tratar. Em 1862 pedra e fuzil no [ilegível] e causas mil — o sangue há de correr até o salto da botina. Em 1867 que foi os primeiros sinais desta idade. Para 1868 muitas linhas de ferro | havera quando correrá uma milha de fogo porcima daquelas, que hã de ser a desgraça do País Brasileiro...” (Trecho de profecia encontrada em Canudos. Euclides da Cunha, Caderneta de campo.)

“69:

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

A algazarra que se elevou pôs fim ao sermão e os padres se sentiram pessoal-

mente ameaçados. Decidiram por isso interromper a Santa Missão no sétimo dia — era de uso durarem de oito a dez dias — em represália. A seu ver, esta surtiu

efeito, para consternação geral, pois o sacramento do crisma só seria ministrado

no último dia. Segundo eles, a maioria do povo se retirou, só ficando no arraial cerca de mil pessoas, entre os mais fiéis. Os padres deixaram o local pela porta dos fundos da casa do padre Sabino, onde os aguardavam as montarias. Suas acuradas observações registram vários aspectos de relevância. Ja se men-

cionou a Companhia do Bom Jesus ou Santa Companhia, integrada por 800 homens e 200 mulheres, vestidos com idênticos trajes de azulão e fortemente arma-

dos. Esses são os mil fieis que permaneceram. Observaram a passagem de oito

enterros num só nutrição, higiene dos bens de quem caixa comum, e a

dia, o que era eloquente sinal das péssimas condições de vida, e saúde que lá vigoravam. Confirmam a doação da maior parte chegava para se integrar à comunidade, doação destinada a uma distribuição pelo Conselheiro de alimentos e dinheiro aos neces-

sitados. Constataram que não havia sacramentos nem ritos havia um ano, desde que o padre Sabino se fora. Eles mesmos tinham, de desobriga — sacramentos ministra-

dos para dar o aval da Igreja a situações de fato, comuns no sertão por falta de sacerdotes, como mancebias, bastardias, crianças pagãs etc. —, celebrado 55 casamentos, 102 batizados e ouvido mais de 400 confissões.

Termina o relatório requerendo com ênfase a intervenção do poder civil,

para pôr cobro àqueles excessos de fanatismo, atendendo ao perigo que o reduto constituía para a ordem pública, pois não apenas se posicionava contra a religião porém contra o Estado. Os termos inflamados do fecho declaram que “O desagravo da religião, o bem social e a dignidade do poder civil pedem uma provi-

dência que restabeleça no povoado dos Canudos o prestígio da lei, as garantias do culto católico e os nossos foros de povo civilizado”. Mais perfeito halali nunca se viu. Estava dado o sinal para o massacre.

PPA

Á guerra

AV

que seria uma verdadeira guerra, de um país inteiro contra um

minúsculo povoado perdido no mais recôndito do sertão, começou de modo quase despercebido. Como os arbustos enfezados e os cactos da caatinga não fornecem madeira para construção, os canudenses tiveram que comprar fora as vigas e outras peças de que necessitavam para a Igreja Nova, cuja edificação já ia adiantada. À encomenda foi feita e previamente paga a um negociante de Juazei-

ro, de que eram bons fregueses.

Entretanto, fora recentemente nomeado juiz em Juazeiro Arlindo Leoni, protegido do barão de Jeremoabo, que antes tivera o mesmo cargo em Bom Conselho, bem na época dos incidentes com Antonio Conselheiro. Quando, após

a visita dos capuchinhos em 1895, o líder fora a Bom Conselho com seu séquito

para esmolar com vistas à construção da Igreja Nova, Arlindo Leoni se apavorara, indo refugiar-se numa fazenda. Há várias versões sobre a causa da inimizade, mas o fato é que o juiz era um desafeto do Peregrino e não perdia oportunidade de prejudica-lo. Nessa ocasião, influiu sobre o negociante para que não entregasse a madeira, algo inédito, porque os conselheiristas gozavam de bom crédito e normalmente faziam suas compras por toda a região. Inclusive lá mes mo em JuazeiO

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

ro, onde o chefe politico local, coronel Janjão, João Evangelista, era o principal

comerciante e amigo de Macambira. Os conselheiristas, revoltados, mandaram menda pessoalmente.

dizer que iriam buscar a enco-

Foi o pretexto para o juiz telegrafar ao governador Luiz Viana, requerendo

providências para proteger a cidade, segundo ele ameaçada por bandidos.

A 1º Expedição Armou-se assim no início de novembro de 1896 aquela que viria a ser cha-

mada de 1º Expedição, pois outras se seguiriam. Era comandada pelo tenente

Pires Ferreira, contava cerca de 120 homens, e chegou de trem a Juazeiro. Após

al guns dias, como nada se passasse, o tenente tomou a iniciativa de sair com suas

tropas para atacar Canudos, que ficava a mais de 200 quilômetros dali. À tropa seguiu a pe, por péssimos caminhos, e ao cabo de uma semana de marcha só conseguira atingir Uauá, faltando ainda uns 100 quilômetros até Canudos. Os homens estavam exaustos, andando debaixo de um sol inclemente, sem uma sombra sequer para descansar. Em Uauá, embora o tenente tivesse

disposto sentinelas pelos caminhos, a população logo tratou de escapar, o que fez

furtivamente. De madrugada, os conselheiristas, havia muito prevenidos por seus simpatizantes, que eram maioria em toda a região, e auxiliados pela delonga que a tropa punha em chegar até Canudos, deram assalto. Surpreendidos, os soldados não conseguiram defender o perimetro do povoado, e assim os conselheiristas ocuparam parte dele. O combate durou várias horas e terminou com um incêndio ateado pelos soldados, Desbaratados, os conselheiristas se retiraram deixando cerca de uma centena de mortos. Suas perdas foram elevadas, quando comparadas com as quase inexistentes, não mais que dez, das tropas. No entanto, foi uma estranha vitória, porque as forças legais deixaram o inimigo ir embora, não o perseguiram e não atacaram Canudos. Pelo contra-

rio, voltaram rapidamente para Juazeiro. E os conselheiristas ganharam a fama de invenciveis. Data daí, se é que ja não vinha vicejando subterraneamente, a eclosão pública da rixa entre o governador Luiz Viana e o comandante do 3º distrito militar, 2

O Império DO BeLO MonTE —

VIDA E MORTE

DE CANUDOS

O 30º Batalhão de Infantaria na trincheira, em Canudos. Pela foto, pode-se ter uma ideia da desproporção

de poderio

entre o exército e os canudenses.

com sede em Salvador, general Solon Ribeiro, aliás sogro de Euclides da Cunha. Ambos se culparam mutuamente pela ineficacia da 1* Expedição, usando os mesmos argumentos de má avaliação do inimigo, resultando no envio de um contingente demasiado pequeno e mal equipado. De idêntico modo se alcunharam um ao outro de “conselheirista”. À querela avultaria até chegar a demissão do general

Solon, requerida por Luiz Viana ao governo central.

A De Expedição Armou-se logo em seguida, ainda em fins de novembro, a 2º Expedição, com o dobro de homens, cerca de 100 do exército e outros 100 da policia. À

patente do comandante aumentou, de tenente para major, sendo designado o major Febrônio de Brito, escolhido por Solon Ribeiro por ser gonçalvista, por-

tanto adversário dos vianistas. O governador e o general se desentenderam, noJa

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

vamente, cada um achando que comandava as operações e dando ordens desencontradas. O trajeto seguido pela expedição foi diferente do anterior. Desta vez, as tropas apearam do trem em Queimadas, dali seguindo a pé rumo norte para Monte Santo, a caminho de Canudos. O contato em Queimadas era o mesmo

juiz Arlindo Leoni, transferido de Juazeiro. Logo

instalou-se a desorganização. Antes que as tropas atingissem Monte

Santo, o general Solon procurou atalhá-las mandando um telegrama para Cansanção, ordenando que a expedição voltasse a Queimadas, por estar insuficientemente armada e com poucos homens. O major Febrônio refugou. Enquanto isso, a metade da tropa pertencente à policia estadual, portanto diretamente afeta ao governador, recebeu deste ordem de avançar até Monte Santo. Do desforço saiu vencedor Luiz Viana, e o general Solon terminaria destituído. Ao fim e

ao cabo, os recursos da expedição foram aumentados e o major Febrônio finalmente seguiu para Monte Santo com 600 homens.

Em janeiro, depois de uma demora injustificada em Monte Santo — doravante base de operações das demais expedições —, que só serviria para prevenir

os canudenses, dando-lhes tempo de preparar-se para o confronto, o major Fe-

brônio avançou para assaltar Canudos com seus 600 homens agora bem armados e municiados, até com dois canhões Krupp 7,5. Antes de chegar lá, a expedição já deparou com o fogo de piquetes de conselheiristas dispostos nas principais passagens de aproximação. Ainda assim, conseguiu avançar até que foi totalmente cercada pelo inimigo; e, como desde a véspera estava com fogo engajado, com a munição no fim. Diante desse quadro, o major Febrônio deu ordem de retirada para Monte Santo, 100 quilômetros distante.

O major, considerado responsável por tanta tergiversação e incompetência, enquanto ele mesmo acusava os políticos e as ordens desencontradas que deles recebia, seria submetido a conselho de guerra mas sairia absolvido.

A 3º Expedição y

-

.

Apôs dois insucessos, o governador da Bahia, que ate então hesitava em comprometer a soberania do estado, numa época em que o recente federalismo lhe conferia muita independência, decidiu-se a apelar para o governo federal “Td

3

O Império DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

O

alegando que o problema era demasiado grave para encontrar solução dentro da

esfera estadual de poderes.

co o ra pa o d a e m o n i . Fo os iv at ar ep pr A 3º Expedição começou então seus o coronel Moreira

mando novamente uma patente mais alta que a anterior, agora

César. Vinha precedido por uma reputação de florianista e sanguinário. Na re-

pressão à Revolução: Federalista no Sul do país, ganhara o apelido de “Corta-

cabeças” ou “Corta-pescoço” porque, infringindo todas as leis e regulamentos,

mandava degolar aos que fazia prisioneiros. No início de fevereiro as tropas reunidas no Rio de Janeiro seguem de navio para a Bahia. Após o desembarque em Salvador, continuam de trem para Queima-

das, e de lá a pé para Monte Santo e Canudos, como fizera o major Febrônio. O

contingente é bem maior desta vez, contando 1.300 homens e seis canhões Krupp. As manobras foram agilizadas. Moreira Cesar não perdeu tempo mas, para

poupar seus homens, avançava em etapas diárias de não mais que dez quilômetros. Dias depois estava à vista de Canudos e anunciou que o assalto se faria dai a 24 horas, quando as tropas estariam descansadas e reorganizadas. Mas antecipou-se e na manhã do dia 3 de março ordenou que o assalto, anunciado por tiros de canhão, se iniciasse. Após algumas horas de fogo, o próprio Moreira César foi ferido, retirando-se para receber cuidados médicos, tendo o comando passado para o coronel Tamarindo, que deu prosseguimento ao combate.

Entrementes, Moreira César faleceria durante a noite. Um conselho de ofi-

ciais decidiu efetuar uma retirada formal no dia seguinte; mas as tropas, ao saberem

da morte do comandante, começaram a debandar. E não houve quem as segurasse. Nas vascas do terror que as acomcetia, para poder fugir mais depressa iam largando pelo caminho armas, munições, peças de fardamento, botas, tudo o que estorvasse os movimentos. Segundo se conta, os 100 quilômetros entre Canudos e Monte Santo ficaram coalhados desses materiais, que chegaram a formar uma trilha,

E que constituíram um maná caído do céu para os conselheiristas. Paupérrimos e vivendo uma subsistência de mínimos vitais, não tinham armamento que valesse a pena mencionar. Lutavam com armas mais que obsoletas, como bacamartes, arcabuzes e clavinotes, desses bem primitivos, de armar pela boca,

ronqueiras, garruchas, cacetes, facões, machados e chuços, também chamados zargunchos, origem da palavra jagunço. À pólvora, improvisada, produzida lo-

calmente com salitre e enxofre, era de péssima qualidade. Como munição utie

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

lizavam pedregulhos e pregos, ou o que estivesse à mão. À retirada trouxe-lhes

a abundância, e a 4º Expedição depararia com quatro canhões Krupp tomados pelos conselheiristas e por eles desmantelados quando perceberam que não tinham condições de utiliza-los. Agora dispunham de armamento moderno, sobretudo o cobiçado fuzil, ou carabina (rifle) de repetição austríaco Mannli-

cher, nome do fabricante que no sertão passou a substantivo comum manuliche ou manulixa, e a espingarda Comblain, do nome da cidade belga de que provinha, e que sofreu o mesmo processo, passando a comblé e combléa. Euclides da Cunha registraria o uso desses vocábulos, e Guimarães Rosa ainda o faria bem mais tarde. À espingarda Comblain era mais antiga, mas o fuzil Mannlicher já tinha o interior de seu cano trabalhado em espiral, de modo que o impulso

dado ao projétil via-se multiplicado pela rotação, aumentando o alcance. Tra-

tava-se de uma arma de última geração, adotada pelo exército da Áustria tão

recentemente quanto

1886.

Croqui da zona de operações contra Antônio Conselheiro.

O Imrvério DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

Até hoje ninguém conseguiu explicar a lógica de uma derrota tão fragorosa e de uma

Segundo

retirada tão vergonhosa.

vários ataques

epilepticos

nos dias anteriores,

consta, Moreira o que

César teria tido

explicaria

suas ordens

contra-ordens erráticas, de péssima estratégia.

Os mortos do exército também seriam de utilidade para os conselheiristas, que deles fariam um uso tétrico. Penduraram-nos nos garranchos dos arbustos que

ladeavam os caminhos de acesso a Canudos, reser vando um lugar de honra,

mais alto que os outros, numa árvore no sítio chamado Angico, ao coronel Tama-

rindo. Reconhecíveis pelas fardas e pelos galões ou alamares dourados costurados em dólmãs ou quepes, quando finalmente a 4º Expedição chegou até lá esta-

vam reduzidos a esqueletos e caveiras. Era uma visão tão impressionante que quem a viu dela falou ou a descreveu.

Repercussões

Hoje, ha mais de 100 anos de distância, e tendo-se noção tanto das reduzidas dimensões do conflito como das reais forças de que os conselheiristas dispu-

nham, não dá para fazer uma idéia do pânico que se alastrou pelo pais. Não se

sabia muito bem se a ameaça equivaleria a uma invasão iminente por hordas estrangeiras ou a um cataclismo em que as forças da natureza se desencadeassem. De qualquer maneira, estava à vista a catástrofe. As notícias começaram a chegar a Salvador, o centro metropolitano mais proóximo, trazidas pelos soldados em fuga, dali atingindo o Rio pelo telégrafo. O Rio de Janeiro, lembremos, era o coração da vida política do país. Até pouco tempo

designado como a Corte, na virada de século contava 700 mil habitantes, quando

uma acanhada e provinciana São Paulo mal ultrapassava os 200 mil. Tudo

se passava

là, como foi tantas vezes registrado pelos cronistas da cidade ou pelos viajantes.

Sua principal artéria era a rua do Ouvidor, no centro, que comandava tudo O que ocorria no tecido urbano: tudo, mas tudo mesmo, ia ali parar, quando não tinha ali começado. É o que nos relatam os cronistas da época. Basta compulsar a numerosa obra de Machado de Assis para notar a preeminência da rua do Ouvi-

dor, Lugar elegante da Jlânerie vespertina, era nessa rua que se bisbilhotavam as

novidades políticas e amorosas. Ali sediavam tanto as casas de alta costura como Epis

e

HISTÓRIA

os principais jornais. Um

DO

POVO

BRASILEIRO

viajante estrangeiro, Karl von Koseritz, observou e

anotou, em 1883, em Imagens do Brasil: “O Rio de Janeiro é o Brasil, e a rua do Ouvidor é o Rio de Janeiro. Quem quiser aprender a maneira por que o Brasil é governado e os negócios públicos conduzidos, não tem mais que passear algumas horas por dia na rua do Ouvidor”. As manifestações de rua, inclusive o carnaval, tinham seu ponto de encontro na rua do Ouvidor. E, naturalmente, os motins que explodiram no centro vital do país quando as primeiras notícias chegaram foram parar na rua do Ouvidor, rebatizada na ocasião como “rua Moreira César”. Parlamentares, jornalistas e militares jacobinos convocaram um comício, no qual alertaram para a iminência da revogação da República e restauração do Império, de que Canudos seria apenas o foco deflagrador. A turba assim incitada acabou invadindo e empastelando três jornais monarquistas, a Gazeta da Tarde, O Liberdade e o Apostolo, enquanto o Comércio de São Paulo na capital paulista sofria idêntica sorte. O proprietário do primeiro deles, Gentil de Castro, veio a ser assassinado por um grupo de militares, posteriormente submetidos a julgamento e absolvidos. Parecia que um sopro de loucura, de um momento para o outro, varria o pais.

Foi a derrota da Expedição Moreira César que acirrou os ânimos, apavorando a opinião pública, que desde então passou a ser habilmente orquestrada pelos jornais, sem, como se verá, dar-se conta dessa manipulação até após o término da guerra. O tom dessa informação, que de tão tendenciosa antes mereceria ser

chamada de desinformação deliberada, era dado pelo mais exaltado jacobinismo

predominante na época,

Antecedentes

republicanos

Tudo isso se enquadra na fase que a novel República então atravessava. Deodoro fora convencido a proclamá-la por um punhado de militares, entre os quais Solon Ribeiro, então major e futuro sogro de Euclides da Cunha, que desemp enhou um papel importante no desencadear do golpe, tomando a iniciativa de espalhar boatos de que o governo imperial invadiria quartéis, prendendo os líderes republicanos. Foi ele o portador da ordem de bani mento da família real, entregando em mãos a D. Pedro II a carta de Deodor o.

O Imrério DO BELO MonTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS

Contrastando com o Império, a República inaugurara um período de insta-

bilidade institucional, viradas súbitas, fechamentos do Congresso, golpes e con-

tragolpes, estados de sitio, banimentos para o exílio, férrea censura à imprensa, arbitrariedades, prisões sem habeas-corpus, fuzilamentos sumários de dissidentes etc. A elite militar comandava o processo: em estado de pré-sublevação, e desde a Guerra do Paraguai, passara, pela primeira vez em nossa história mas infelizmente não pela última, a dar as cartas em política. Deodoro, desde o 15 de novembro presidente provisório enquanto a Assembléia Constituinte legislava sobre as primeiras eleições republicanas, mantinha-se agarrado ao poder e não dava sinais de querer transmiti-lo democraticamente. Por entre escândalos de corrupção e favorecimento a parentes ou amigos, acabou sendo eleito nosso primeiro presidente — por eleição indireta —, porque a facção de seus adeptos era forte e amplo seu prestígio no exercito. Floriano Peixoto, futuro marechal, foi eleito vice-presidente. No entanto, o aprofundamento da crise politica originaria uma tal pressão que Deodoro, mesmo dissolvendo o Congresso e decretando estado de sítio, acabaria perdendo o apoio do exército e da marinha, sendo obrigado a renunciar logo depois, no dia 23 de novembro de 1901, portanto com apenas dois anos de governo discricionário. Apesar disso, quando se sabe o

que veio depois com seu sucessor Floriano Peixoto, vê-se que deixaria saudades.

Floriano assume interinamente a presidência no mesmo dia, reabrindo o

Congresso e revogando o estado de sítio. Mas nem todos ficam contentes, porque a oposição tanto civil como militar entendia que a Constituição não o permitia, exigindo a convocação de novas eleições presidenciais. Disso discordavam

Floriano — que manteria o título de vice-presidente até o fim do mandato — e seus seguidores, entre eles um de seus mais vigorosos sustentáculos, que era a burguesia cafeeira paulista. Do confronto resulta o Manifesto dos 13 Generais, um abaixo-assinado dando um ultimato ao presidente nesse sentido, datado de 6

de abril de 1892. Floriano, ria, o de Marechal de Ferro, e sem titubear destituiu do reformando-os do exército público. Tratou de abafar as tado de sítio, prendendo e E.»

que bem mereceu o epiteto com que passou à históanunciou ter desmantelado uma rebelião deodorista cargo todos os 13 militares (nem todos generais), e da marinha, enquanto demitia os civis do serviço demais manifestações de desagrado, decretando esdeportando para a Amazônia os descontentes. Mas Ma

x

logo em agosto do mesmo ano concederia anistia a todos. O»

HISTORIA

DO

POVO

As bases de apoio a Floriano nas to, constituiriam uma influente força ceberia a alcunha de jacobinos, termo mista da Revolução Francesa. Pesaria

BRASILEIRO

Forças Armadas, sobretudo no exércipolitica que, por seu radicalismo, reemprestado de uma tendência extreconsideravelmente sobre os destinos

do pais e se faria sentir por muitos anos, tendo desempenhado papel de rele-

vo na Guerra de Canudos. Ali, como foi amplamente testemunhado, mesmo

o Marechal de Ferro já estando morto há dois anos, seu nome era objeto de

vivas nas ofensivas e a soldadesca trazia ao pescoço medalhas com sua efígie gravada. Na boca de todos, “Viva a República” e “Viva o marechal Floriano”

iam a par.

À gestão de Floriano foi marcada por duas insurreições maiores que leva-

ram à guerra civil, conturbando o periodo e impedindo o pleno funcionamento

das instituições democráticas. A primeira delas, a Revolução Federalista nos es-

tados do extremo Sul, que convulsionou a região com batalhas, incêndios, pilhagens e massacres, estendendo-se de 1893 a 1895.A segunda, a Revolta da Armada, chefiada pelo contra-almirante Custódio de Melo, que se estendeu de 1893 à 1894 e se encenou na Baía da Guanabara, de onde os navios amotinados bomba r. deariam a cidade do Rio. Por mais que fosse atrabiliário e ditatorial, Floriano teve como sustentáculo o exército e boa parte da população civil, que o admirava justamente pelo cunho moralista de seu desempenho. Era decididamente antidemocrático, tendo por sua maior bandeira o patriotismo.

Temerosos dos radicais jacobinos, e fortes de sua aliança com Floriano, os cafeicultores apontam candidato próprio, paulista e civil, à sucessão, naquela que seria a primeira eleição direta da República. Em 1894, Prudente de Morais é

eleito presidente e o baiano Manuel Vitorino vice-preside nte. Nessa gestão, e em

grande parte decorrendo das marchas e contramarchas da rivalidade entre os partidários de ambos, eclodiria a Guerra de Canudos. O novo presidente enfrentava a oposição dos jacobinos desde antes das elei-

ções, porém depois delas o confronto se avolumou, e volta e meia ameaçavam depô-lo. A morte de Floriano em 1895, privando-os de seu lider, em vez de

apaziguá-los só veio a incrementar o dissídi o. Proclamavam-se guardiães da pu-

reza republicana e seus defensores contra um a restauração da monarquia, mesmo que implausível; e tudo em nome do patriotismo. =

!

“80:

O Imrério vo BeLo MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

Uma crise política surge quando Prudente de Morais se licencia para trata-

mento de saúde em fins de 1896 e Manuel Vitorino assume interinamente o cargo. Este abre os braços para os iaebigs e seineçara cogitar em se perpetuar na presidência, valendo-se do apoio deles e da hostilidade para com Prudente. Ao perceber o perigo, o presidente reassume em 3 de março do ano seguinte, bem a tempo de ver sua posição fortemente abalada e ser quase derrubado, devido à degringolada da 3º Expedição contra Canudos, no mesmo dia. Imediatamente os jacobinos acusam o presidente de fraqueza, de imprevi-

dência e até de conivência com os canudenses. Essas acusações se refletiriam na política interna do estado da Bahia e mesmo após o término da guerra ainda haveria repercussões. Recebendo pessoalmente as tropas que desembarcavam de volta no cais do Rio de Janeiro, Prudente de Morais seria alvo de um atentado

cometido por um soldado, o anspeçada Marcelino Bispo dos Santos, do qual escaparia por intervenção do ministro da Guerra, marechal Carlos Machado Bit-

tencourt, que perderia a vida em seu lugar. O processo judiciário que então se

seguiu foi motivo para prisão e desterro de jacobinos de destaque, civis e militares, implicados na conspiração para o atentado, e para novo estado de sítio. Da

crise, o presidente sairia com sua posição reforçada e o jacobinismo destroçado.

À politica estadual baiana era dominada pela oligarquia, que, como nos de-

mais estados, se dividia em duas facções que disputavam o poder e nele se alternavam. À descentralização operada pela República com a instituição do federalismo só aguçou uma situação que já vinha de antes. No momento da eclosão da Guerra de Canudos, como vimos, de um lado alinhavam-se os partidários de

José Gonçalves e do barão de Jeremoabo, e de outro os de Luiz Viana, governador do estado. Já no que diz respeito à esfera federal, a influência do estado era

consideravel: os baianos forneceram um terço dos primeiros-ministros do Impe-

rio, e no periodo de 1880 a 1888 chegariam a constituir a maioria.

A Guerra de Canudos foi objeto pouco disfarçado de manipulação política. Prudente de Morais, para dar mostras de liderança e desarmar a oposição feroz dos jacobinos na capital federal, desdobrou imensos recursos para a 4º Expedição, prestigiando o exército, seu principal adversário, com sua assistência. José Gonçalves e o barão de Jeremoabo, ambos inimigos de Luiz Viana e potentados

na região de Canudos, exageravam

o perigo representado por Antonio Conse-

lheiro e acusavam o governador de cumplicidade. Não perderiam por esperar, e «BI.

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

não tardariam eles mesmos a serem chamados de conselheiristas. O jornal carioca O Jacobino daria ao barão o epiteto de “monarquista encapotado” e de protetor do Conselheiro. Por sua vez, Luiz Viana minimizava o perigo e por isso não tomava providências nem fornecia recursos. Em outro dissídio, entre Luiz Viana e o general Solon, o primeiro saiu ganhando e obteve do governo central a exo-

neração do segundo do cargo de comandante do 3º Distrito Militar, com sede na Bahia. O choque foi causado pela disputa na condução do processo de envio de

expedições contra Canudos, como já vimos, cada um dos dois acreditando ser ele próprio a autoridade suprema. Destituído, o general acabou engrossando as fileiras adversárias e dedicou-se a enfraquecer a posição, periclitante naquele momento, do governador. Em suma, em todos esses conflitos politicos, os lideres se safavam exagerando o perigo representado por Canudos e contribuindo para o acirramento da

luta. Assim, um por um, a começar pelo presidente da Republica, passando pelo governador do estado e chegando aos parlamentares e ex-parlamentares, todos acabariam consagrando o melhor de seus esforços a apagar do mapa o arraial.

A 4º Expedição Convocada a toque de caixa, a 4º Expedição baseou-se no tripé tecnológico fornecido pela Revolução Industrial que, desde a Guerra de Secessão norte-ame ricana (1861-1865), passara a definir a guerra moderna: trem, telégrafo e jornal. O novo tipo de conflito usaria a estrada de ferro para mobilizar massas de tropas

através de vastos territórios. Tal estratégia depende da instalação de uma linha de telégrafo até a base de operações, visando à agilização das com unicações que presidem ao transporte de massas. E o jornal, valendo-se da rapi dez das comunicações via telégrafo que permite a utilização de enviados espe ciais ao teatro da

guerra, é arma no controle da opinião pública, O comando da nova expedição foi entregue ao general Artur Oscar de Andrade Guimarães, que lutara na Guerra do Paraguai; a exemplo de Moreira

Cesar, era florianista e tinha feito suas provas na Revolução Federalista, ocupando no momento o posto de comandante do 2º Distrito Militar, com sede em Recife. )

O ImpériO DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

Recursos não faltaram, chegando a se engajar gradativamente um efetivo calculado entre 10 mil e 12 mil homens, acorridos de todo o pais em diversas levas. Quando se tem em mente que o efetivo total do exército brasileiro naquele ano era de cerca de 25 mil homens, pode-se avaliar melhor a amplitude da

guerra. Só no combate final de 1º de outubro, de que resultaria a queda do arraial no dia 5, entraram em ação 5.871 combatentes. A maioria seria fornecida pelo

exército, acrescido de quatro batalhões de polícia estadual — de São Paulo, Bahia,

Pará e Amazonas. Além das duas colunas iniciais, trariam reforços o general Migue] Maria Girard, comandante da Brigada que levaria seu nome (Canudos — 15 de agosto); o marechal Machado Bittencourt (Monte Santo — 6 de setembro); e o general Carlos Eugênio (Canudos — 28 de setembro), acompanhado por uma brigada de infantaria. Além do mais, estava-se implantando a partir de Queimadas, desde inícios de abril, a linha de telégrafo que atravessaria o sertão até Monte Santo, visando a facilitar as comunicações. Esta foi a tarefa da comissão de engenharia, presidida pelo tenente-coronel Siqueira de Menezes e integrada por cinco oficiais. Outra

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Esta foto mostra as forças governamentais já dentro de Canudos. No total, o efetivo utilizado pelo exercito foi calculado

entre 10 mile 12 mil soldados.

|

83.

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

missão de que se encarregou foi a de abrir caminhos adequados à passagem dos 17 pesadíssimos canhões trazidos pela 1º Coluna, puxados a tração animal, que demandavam às vezes 13 juntas de bois — caso extremo do canhão Whitworth 32 — para avançar por terreno acidentado e, acercando-se de Canudos, por serranias e desfiladeiros. A picada aberta para a instalação da linha de telégrafo seria útil aos que se retiravam, porque bem mais direta que as trilhas tradicionais. Tanto num caso como no outro, o desempenho da comissão de engenharia foi impecável, recebendo a chancela da unanimidade dos louvores.

Quando começaram a chegar a Salvador as notícias das calamidades que se produziam no teatro das operações, as autoridades baianas convocaram voluntários entre os estudantes de medicina e de farmácia, que constituiram o Batalhão

Acadêmico e embarcaram no trem em 27 de julho. A um dos integrantes do

batalhão, Alvim Martins Horcades, da Faculdade de Medicina, devemos um dos melhores depoimentos de testemunha de vista. E se a 1º Expedição estivera em mãos de um tenente, a 2º de um major, a 3º de

um

coronel, esta agora contaria com nada menos

que cinco generais e ate um

marechal. O próprio ministro da Guerra, o malogrado marechal Machado Bittencourt, ao ver as coisas malparadas, terminaria por deslocar seu gabinete do Rio para Monte Santo, onde permaneceria desde 6 de setembro até o fim da guerra.

Composição das forças O comandante dividiu as tropas em duas colunas, cada uma com três brigadas, que demandariam Canudos partindo de direções diversas, para la convergindo e envolvendo o arraial num movimento de pinça. À tropa seguia a pé, enquanto os oficiais iam montados. À 1º Coluna, comandada pelo general João da Silva Barbos a, com a qual

viajava o próprio Artur Oscar, partiria de trem de Salvad or até Queimadas, seu ponto de concentração, dali infletindo em direção nor te, passando por Conten-

das, Tanquinho, Cansanção e Quirinquinquá, até Monte Santo. Esses topônimos serão frequentes no noticiário, nas reportagens e nos livros sobre a campanha. As três bri gadas de infantaria que a compunham eram assim comandadas: 1º — coro-

nel Joaquim Manuel de Medeiros: 2º — corone l Inácio Henriques de Gouveia:

O ImpériO DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

eme

32

coronel Antonio Olimpio da Silveira, incluindo, além da infantaria, mais um

regimento de artilharia. Completavam a 1º Coluna uma companhia do 1º batahão de engenheiros e o 5º corpo policial da Bahia, com 500 homens. A 2º Coluna, comandada pelo general Cláudio do Amaral Savaget, partiria de seu ponto de concentração em Aracaju rumo oeste, via São Cristóvão, Itapo-

ranga, Lagarto, Simão Dias e Jeremoabo. Era também dividida em três brigadas de infantaria, cada uma com três batalhões. Comandava a 4º o coronel Carlos Maria da Silva Teles, a 5º o coronel Julião Augusto da Serra Martins e a 6º 0 coronel Donaciano de Araújo Pantoja. Levava ainda um contingente de 50 praças do 1º batalhão de engenheiros. O “ponto de concentração”, consoante os preceitos castrenses, destina-se a ultimar a organização, pondo-a em pé de mobilização, e a completar o aprovisionamento. Foi assim que este se constituiu na maior preocupação do general Savaget, pois implicou providenciar tanto víveres para os homens como forragem

para os numerosos

animais:

cavalos para montaria;

bois para alimento

e para

tração de carretas ou canhões; muares de tiro para carroças, ambulâncias e carga, esta na base de uma carga por animal. Ora, o que se verificou foi que as feiras semanais ao longo do trajeto, que ofereciam víveres e animais, se esvaziaram ante a suspeita de um possível recrutamento, sempre o terror das populações

destituidas por toda a história do Brasil. Sumiram os viveres, as cavalhadas, as

boiadas, os muares etc. A solução adotada por Savaget foi abrir concorrência

pública para o fornecimento, das três que se apresentaram ganhando a proposta mais vantajosa, a do coronel Sebastião da Fonseca Andrade, que por contrato lavrado encarregou-se de tudo, Concluídos os aprestos, a arrancada da coluna se cfetivaria em levas sucessivas de 15 a 22 de maio,

Quanto à artilharia, seguia quase toda com a 1º Coluna, que contava com três baterias Krupp 7,5, uma bateria de tiro rápido de metralhadoras Norden-

feldt 37 mm e um canhão Whitworth 32, a famigerada Matadeira, conforme o epiteto que os jagunços lhe atribuíram, tais os estragos que causava. À 2º Coluna coube apenas uma bateria Krupp 7,5, comandada pelo capitão João Carlos Pe-

reira Ibiapina. Mais tarde chegariam a Monte Santo e ali se deteriam dois canhões Canet (de fato, morteiros ou obuses), puxados por duas juntas de bois cada um, os quais, no dizer dos comentaristas, só serviriam para salvar a vitória.

No total, a 4º Expedição contou com 21 canhões. 85.

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HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Quanto às demais armas, variavam conforme o contingente a que pertenciam, Às tropas traziam consigo as armas de seus quarteis de origem, embora às

vezes elas fossem trocadas por melhores ou em melhor estado nas centrais de reunião em Salvador, Queimadas, Monte Santo ou Aracaju. À maioria já estava munida de fuzis ou carabinas de repetição (rifles) de última geração, das marcas Mannlicher, austriaca, e Mauser, alemã, embora ainda houvesse quem portasse as menos recentes espingardas Comblain belgas. Os revólveres mencionados são o Girard e o Nagant russo. Os 4.000 homens da 1º Coluna, agregados aos 2.500 da 2º Coluna, perfaziam um efetivo de 6.500 combatentes. Posteriormente, chegariam varias levas

de reforços e haveria reorganização dos contingentes. O problema maior que a 1º Coluna enfrentou foi a organização da intendência,

ou aprovisionamento, falha que não afetou a 2º Coluna. À epoca o sustento dos homens convocados era dado por comida “ao vivo”, ou seja, gado bovino, farinha e

sal, em refeições preparadas na hora. Esse tipo de alimentação seria depois superado, e no século XX passou-se a utilizar exclusivamente rações individuais enlata-

das, que os soldados carregam consigo em doses calculadas para alguns dias, típicas

de um mundo já altamente industrializado, em que a comida das tropas sai da linha de montagem. Por isso a concepção de grandes boiadas conduzidas por militares e

encalçando o exército é coisa do passado. Alguns elementos já tinham sido pesquisados anteriormente, com especial ênfase nas guerras revolucionárias — da Revolução Francesa, incluindo as campanhas napoleônicas, que mudaram para sempre a face das conflagrações —, quando ja se utilizara o leite condensado e a batata em pô, esta tomada aos índios andinos, que a criaram e a empregam hã milênios. Tudo

isto

era objeto dos cursos do oficialato na Escola Militar, os quais analisavam as principais guerras da história e se inteiravam desses pormenores. O apoio logístico para aprovisionamento, em lenta evolução desde as le-

giões romanas, depende ou de recursos que seguem junto com as tropas, ou de

armazenagem espalhada pelo território ou ainda de confisco ás populações locais. Nesta guerra deveria predominar a primeira, dadas as características da região a atravessar, sertão à mingua de qualquer tipo de vitualha. As boiadas reunidas em Queimadas, ponto de concentração da 1º Coluna, à falta de invernadas entraram a definhar — e isso antes de enfrentar o trajeto de centenas de quilômetros sem pasto e sem agua até o teatro das operações. +86»

O Império DO BELO MonTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS

Esse foi o partido tomado pela 1º Coluna, que levou consigo desde a saida

de seu ponto de concentração em Aracaju, além das boiadas, 42 carroças, 40

carretas puxadas por bois, mais algumas centenas de muares cargueiros, transp ortando um total de 50 mil arrobas de munição de guerra e de boca, inclusive

500 mil cartuchos. Preveniam-se assim, sabendo que não podiam contar com armazenagem prévia em pontos determinados, nem com o confisco local. Como

a 2º Coluna não seguiu

esse padrão,

estava com as munições a ponto

de esgotar-se quando foi socorrida pela 1º Coluna, em 27 de junho. Para se alimentar confiou principalmente no minguado confisco possível, tendo logo a sol-

dadesca começado a passar fome, a “brisa”, eufemismo que ali utilizavam. Só depois de regularizado o abastecimento, sobretudo de viveres, ou munição de boca, pelo ministro da Guerra, instalado em Monte Santo a partir de 6 de setembro, é que as coisas entraram nos eixos. Euclides da Cunha mor que a vitória afinal dependeria de um humilde animal, mansos valiam na emergência por dez mil heróis”. O fato ministro da Guerra chegou a campanha mudou de figura, a passaram a seguir para Canudos comboios diários, quando vando gado, farinha, sal e munições.

Andamento

observaria com huo burro: “Mil burros é que depois que o fome se extinguiu e não dois por dia, le-

das operações

Até hoje não se explicou por que o general Artur Oscar demorou tanto

para iniciar a ofensiva, ja que nem por isso a desorganização foi menos grave.

Tendo chegado a Queimadas em tempo recorde, já estava ali no dia 21 de março, ou seja, menos de três semanas após o desastre de Moreira César. No entanto,

iria permanecer nas paragens por cerca de três meses, sem iniciar as hostilida-

des, só atingindo Canudos no dia 27 de junho. Ninguém conseguia entender o que se passava, e as notícias, agora pelo | telégrafo, chegavam rapidamente ao país todo. Desenr olou-se intenso debate parlamentar e jornalístico sobre esse retardamento injustificável, sugerindo incompetência de comando. Numerosas vozes pediram a cabeça de Artur Oscar. dé fim, em : A ts Rca Por 12 de agosto o própri o minist ro da Guerra desembarcava com novas

tropas em Salvador, dali seguindo de trem até Queimadas e a cavalo para Monte

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Santo. Em sua comitiva e na qualidade de adido a seu estado-maior viajava Eucli-

des da Cunha, engenheiro-militar reformado no posto de tenente, duplicado de

correspondente do jornal O Estado de S. Paulo, na qualidade de enviado especial ao palco dos acontecimentos. Primeiro fenômeno de ampla cobertura de mídia no Brasil, a Guerra de Canudos contou com muitos enviados especiais, quase todos

militares, a maioria beligerantes. Um dos principais críticos da estratégia (ou de sua ausência) de Artur Os-

car, foi o capitão honorário do exército Manuel Benício, que ja estava enviando extensas e ricas reportagens ao Jornal do Comércio carioca desde o dia 4 de julho,

embora a publicação demorasse um mês. As suas são, de longe, as melhores, mais rentes à experiência e mais vivazes entre as várias reportagens, sendo sem dúvida as menos tendenciosas; desmente com vigor, por exemplo, a hipótese de conspiração monarquista, o que é raro, à época. É de lamentar que, justamente por isso — e não ha como lê-lo sem se convencer da incúria de Artur Oscar, pois até fome as tropas estavam passando —, fosse expulso do acampamento e obrigado a regressar a seus pagos, onde foi homenageado com um sarau de desagravo no Teatro Municipal de Niterói. Sua última matéria é datada de 24 de julho; a seguinte, datada de 8 de setembro, já é assinada por seu substituto. Manuel Benício

aproveitaria seu tirocinio na campanha para escrever um romance,

O rei dos ja-

gunços, postando-se entre os primeiros a publicar um livro sobre a guerra. Graças a quem lá esteve, temos acesso a dados interessantes sobre coisas que mudaram desde então. Assim sabemos, por exemplo, que a viagem de Salvador a Queimadas por estrada de ferro levava 14 horas, e que a 2º Coluna percor-

reu 72 léguas de Aracaju a Canudos. Também tomamos conhecimento da profu-

são de vivandeiras que marchavam na retaguarda das tropas e que se instalariam no acampamento militar em Canudos. As praças de linha, ou soldados rasos,

tinham o habito de ir para a guerra com toda a familia, mulheres e crianças. A respeito delas não há mais do que anotações — como se fossem invisíveis apesar

do volume coletivo de sua presença —, provavelmente porque empanariam o brilho épico das narrativas de guerra,

O comandante-em-chefe determinara que as duas colunas convergissem nos arredores de Canudos no dia 27 de junho. Entrementes, desde o dia 25 a 2º Coluna já estava sob o fogo cerrado dos conselheiristas, que emboscariam as duas colunas em vários pontos, fustigando-as de posições a cavaleiro dos cami. o PE

O Império DO BELO MonTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

——s

nhos. Quando a 2º Coluna se embrenhou na garganta de Cocorobó, a apenas 13 uilômetros de Canudos, sofreu pesadas baixas, porque o inimigo se entrinchei«ava no alto dos paredões que ladeavam o desfiladeiro, e as tropas só o ultrapas-

saram após expugnar as fortificações a baioneta e lança. À partir dalí os conselheiristas, rechaçados, se reagruparam mais adiante, sempre pelo alto dos serros,

e deram fogo incessante até o arraial, num combate intermitente que durou três

dias. O próprio general Savaget sairia ferido de Cocorobó, e logo depois se ausentaria da campanha para tratar-se.

Por seu lado, a 1º Coluna finalmente avançou e ocupou uma posição sobranceira ao arraial e a cerca de um quilômetro de distância, o que facilitava a

linha de tiro para o bombardeio. À essa posição deu-se o nome de Alto da Favela, devido à abundância de uma planta com esse nome; o substantivo comum, toma-

do à botânica e transformado em topônimo, teria longa vida e passaria por outras metamorfoses. De volta ao Rio, as tropas receberiam permissão para edificar seus barracos nos morros desertos da cidade, ao primeiro dos quais dariam o

nome de Morro da Favela, em lembrança do outro. Dali, o topônimo novamente

se tornaria substantivo comum, mas mudando de significado, para designar todo

tipo de aglomeração urbana de caráter precário. A posição no Alto da Favela ficou na mira dos canudenses, que logo perceberam seu ponto fraco e a cercaram. O morticínio então havido e que se estendeu por vários dias não resultou de combate. Segundo os relatos, as tropas, inclusive os feridos que ali jaziam, se instalaram no topo do terreno que comportava um raso ou depressão com colinas atrás, de modo que os canudenses subiam

ainda mais acima para alvejar do alto os soldados, ensejando uma hecatombe diurna e noturna que foi chamada de “caçada humana”. A defesa já estava vulneravel e sem munição quando o general Savaget a socorreu com sua coluna. E só em 18 de julho haveria tomada de iniciativa, quando as tropas atacam Canudos, num grande assalto, um dos maiores da guerra, que durou muitas horas e infligiu perto de mil baixas ao exército. O quadro do acampamento à vista de Canudos é sinistro. Fome incessante,

que só será aplacada quando o ministro da Guerra organizar transporte regular de viveres desde Monte Santo, Um hospital de sangue improvisado ao ar livre, onde nem sequer havia anti-sépticos, cheio de moscas e de sujeira. Alvim Martins Horcades, estudante de Medicina que foi prestar serviços hospitalares, fala “89.

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

em centenas e centenas de feridos — alias sem comida e sem atendimento —.

afora os 600 que ja deparara em Monte Santo. Água para beber poluída por cadáveres. Tifo e cólera, além de uma epidemia de varíola. Assédio do tiroteio, matando com frequência praças que dormiam nas barracas e feridos no hospital. Boa parte dos soldados rasos não tinha calçados, e marchara centenas de quilô-

metros pelo solo ingrato do sertão de pe no chão. Enfim, nada mais inadequado

para a região e o clima, até do ponto de vista tático, do que a pesada farda de lã que usavam: a calça vermelha e o dólmã azul-marinho com galões dourados tornavam-nos alvo privilegiado pela maneira como se destacavam contra o fundo pardo da caatinga. Mais para o fim da campanha, as tropas e mesmo os oficiais abandonariam a farda e combateriam à paisana, a maioria passando a adotar as folgadas bombachas gaúchas, como se verifica pelas fotos de Flávio de Barros. Um dos maiores problemas que o exército enfrentou na campanha, em que pese sua superioridade bélica, foi o equivoco gerado pela divergência de estratégias. Enquanto os canudenses se engajavam em táticas de guerrilha, o exército

Nesta foto de Flávio de Barros pode-se ver o coronel foaquim Manuel de Medeiros (terceiro à esquerda) e seus auxiliares vestidos com bombachas gaúchas, ou seja, dispensando a farda do exérc ito

*90º

O Império DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

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ou conhecia não porque mesmo encional, cons guerra de respondia com táticas baioneta, fazer assaltos de cargas dar ados, organiz rões esquad em ar nç tras: ava a

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de cavalaria. Os canudenses, comportando-se como guerrilheiros e não como

soldados de um exército formal, fustigavam sem cessar o adversario, mas não se deixavam ver: escondiam-se em cima de árvores, em buracos no chão, rasteja-

vam por baixo dos entrançados de macambira, de cobrir-se com galhos de folhagem e avançar ofereciam como alvo ou ficavam parados num tos, saltando e correndo de um para outro,

utilizavam até o truque dos índios sob essa cobertura. Raramente se so lugar: atiravam de varios pontornando impossivel alveja-los e

multiplicando ilusoriamente seu número, fazendo crer que eram muito mais numerosos. Às vezes um único passava um bom tempo castigando o inimigo, disparando a intervalos com pontaria certeira para dentro do acampamento ou então para o grosso das tropas em combate. Euclides da Cunha fala de um que enfrentou sozinho o exército, num “duelo de morte contra mil homens”, mirando de dentro de um fojo durante varias horas: ele mesmo contou os 361 cartuchos que o atirador solitário deixou para tras quando escapou, sem que ninguem conseguisse atingi-lo. Fazia parte do propósito de desmoralização o grito de desafio dos canudenses: Avança, fraqueza do governo!, cuja derrisão evidencia como

era dificil lidar

com um adversário desses. Para maior exasperação dos sitiantes, os casebres do

arraial, feitos de pau-a-pique e cobertos de folhas de icó mantidas no lugar por uma camada de barro, eram tão precários que não desmoronavam sob o tiroteio mas permitiam que as balas os varassem de lado a lado. Dentro, os moradores tinham cavado fossos, de modo que podiam disparar as armas de dentro de casa, se fosse necessário, e sem se expor; também abriram túneis que ligavam as casas umas às outras, o que facilitava mudar rapidamente o ângulo de tiro ou bater em retirada sob cobertura. Essa estratégia baseada em táticas de guerrilha, notável pela originalidade e pelo talento de aproveitar o menor acidente de terreno, inclusive as durissimas condições de vida na caatinga — dispensando o uso da incômoda farda de lã, aumentava a flexibilidade das manobras —, suscitou sanções morais das autoridades militares. Estas, em vez de admirar a inventividade do adversario, diziam que

ele era covarde por não enfrentar de peito aberto a luta, por esconder-se em buracos e fossos etc. Se assim fosse, a guerra, dada a disparidade de recursos “GI



HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

bélicos entre os dois lados, não duraria um dia e Canudos seria arrasada num instante. Percebe-se, pelas ordens do dia e outros pronunciamentos, a indigna-

ção dos militares ante um inimigo que lhe causava fortes baixas e era praticamen-

te invisivel.

Fecha-se o cerco Chegaria em 15 de agosto mais um general, Miguel Maria Girard, liderando aquela que ficou conhecida como a Brigada Girard, com novos bat alhões de infantaria, acompanhada por batalhões de polícia estadual. Ainda viria mais outro general, em 28 de setembro, Carlos Eugênio de Andrade Guimar ães, irmão de Artur Oscar, trazendo uma brigada de infantaria. Seria ele o novo comandan-

te da 2* Coluna em substituição a Savaget, que fora ferido no passo de Cocorobó e se retirara para tratamento. Ao todo, como vimos, seriam engajados entre 10

mile 12 mil soldados.

Ganhando posições, duas importantes conquistas seriam levadas a cab o pelo exercito. No combate de 18 de julho uma fração do arraial fora ocu pada, tendo os combatentes chamado de “Linha negra” a fronteira interna assim delimitada.

Depois, em operação realizada em 7 de setembro, expugnari am a Fazenda Velha, donde os canudenses castigavam os soldados, a partir dali fortificando-se-se uma “Trincheira Sete de Setembro”. Ambas podem ser confer idas nos mapas da campanha traçados pela comissão de engenharia e publicados em vários livros. Graças a essas medidas, impede-se a chegada de reforços, a realização de surtidas, o aprovisionamento e o abastecimento de àgua. Ainda assim, uma via de acesso, a estrada de Uauá, se manteria aberta de propósito até o fim, para facilitar a saída de canudenses.

Entre estes, que se bateram com um denodo que desper tou a admiração de

todos, foram tombando sucessivamente os prin cipais chefes, Antonio Conselheiro finou-se em 22 de setemb ro. Foi quando nova, Pedrão e Taramela, todos da cúpula, decidiram salvar-se, Em 1º de outubro, deflagra-se o assalto final. Espalha-se

até que o próprio os dois irmãos Vila-

e foram embora,

querosene sobre a

parte do arraial ainda ocupada pelos resistentes, e sobre ela jogam-se bombas de dinamite, que ao explodirem ateiam fo go ao querosene, cobrindo o arraial co m “02:

O Império DO BELO MonTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS

Antonio Conselheiro morreu em 22 de setembro de 1897, poucos dias antes do ataque final a Canudos. Esta é a foto que

documentou o laudo oficial de reconhecimento de seu cadáver pela comissão especial do exército.

um lençol de chamas, que faz entrar em combustão casas e corpos vivos. Ainda assim, eles não se entregam. No dia 3, Antonio Beatinho com dois companheiros deixa o arraial e procura o comandante em missão de paz, para negociar uma rendição. Após o

acordo, torna a penetrar no arraial e volta acompanhado por cerca de 300 pessoas, entre mulheres, crianças e velhos, todos esqueléticos, doentes, fa-

mintos e feridos, como se pode verificar pela fotografia que documentou a ocasião. Os chefes, que aguardavam uma rendição de combatentes, acharamse enganados pelo Beatinho: após a entrega dos prisioneiros, o tiroteio vindo do arraial recrudesceu. Os membros da tripla embaixada acabaram degol ados, no mesmo dia. Deve-se a Alvim Martins Horcades a primeira e candente denúncia das atrocidades, com destemor apontando como responsável o comandante-em-chefe general Artur Oscar, em livro publicado tão cedo quanto 1899. Entre outras coisas, relata que presenciou a chegada de 800 prisioneiros no dia 5, inclusive mulheres e crianças, atestando que quase todos foram degol ados. Também viu a degola de Antonio Beatinho e de seus dois companheiros de negoo

e in

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Esta talvez seja foto mais conhecida e mais marcante da Guerra de Canudos. Retrata cerca de 300 pessoas, entre mulheres, crianças e velhos, que se renderam do exército nos últimos dias da luta.

ciações, apesar de todas as garantias que tinham recebido do comandante, no dia 3, num lote de 18 que foi o primeiro, não da campanha mas da batalha final. No mesmo ano de 1899, o baiano César Zama, sob o pseudônimo de Wolsey, denunciaria numa publicação tanto o trucidamento dos prisioneiros como a anuência do comandante. Quanto aos correspondentes dos jornais,

que tinham assistido a tudo, por unanimidade escamotcariam os fatos: nas re-

portagens encontra-se apenas uma menção, feita por Lélis Piedade, assim mesmo depois que a guerra acabou. Anos mais tarde, em 1 902, Euclides da Cunha faria de Os sertões um libelo a vituperar o crime.

O arraial resistiu até o dia 5, quando, e todos os relatos ressaltam o fato, morreram seus últimos defensores — dois homens, um velho e um menino —,

que continuavam a disparar de dentro de um fosso escavado na praça das igre jas. "94º

O Império no BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS ——msseso À

Assistência de retaguarda A assistência de retaguarda aos feridos dependera de iniciativas civis. Cria-

-a-se em Salvador o Comitê Patriótico, cujo presidente era Franz Wagui

o te-

coureiro Fernando Carlos Koch e o secretário Lelis Piedade. O Comitê iniciou

uma campanha para angariar donativos, colocando caixas para esmolas na lovindo gradouros centrais. Lelis Piedade desempenhou papel de relevo, do suis Queimadas

e Cansanção, onde o Comitê

instalara postos de saúde, e a

capital, além de mandar reportagens ao Jornal de Notícias baiano. Ainda

Ene

um livro, em que reuniria as reportagens, o relatório final e mais um histórico. Após o término da guerra, o Comitê ampliaria suas atribuições, encarregando-

se também de assistir naqueles postos às mulheres e crianças canudenses sobreviventes. Assinam o relatório da comissão especial Américo Barreto Filho, outro

Wagner de prenome Carlos e Dias Lima Sobrinho. O Comité, ciente de que o exército, de uma República que vinha de separar Igreja e Estado, não admitia capelães, procurou, na pessoa até do protestante Carlos Wagner, os superiores dos conventos dos franciscanos alemães e dos capuchinhos italianos, pedindo-lhes ajuda. O primeiro delegou a tarefa a dois dos seus, os padres Gabriel Grômer e Pedro Sinzig, enquanto o segundo indicou frei

Jerônimo de Montefiore. O governo do estado ofereceu um trem especial, no qual viajaram em companhia de Carlos Wagner e outros, para conduzi-los até Queimadas, onde desem-

barcaram em 21 de agosto de 1897. Em Canudos havia um hospital de sangue, e mais outro em Queimadas. Os feridos voltavam a pé do primeiro para o segundo, enquanto apenas aqueles em estado grave eram transportados em carro de boi, e

dali seguiam de trem para os lazaretos de Salvador. Os franciscanos decidiram que iriam ambos se instalar em Cansanção, a meio caminho de Monte Santo, enquanto

o capuchinho ficaria em Queimadas; a este viria se juntar mais tarde o franciscano

frei Electus, Levaram consigo fartos mantimentos, além de redes, roupas e uma farmácia portátil, tudo fornecido pelo Comitê. Ficariam aguardando o médico prometido, mas teriam que se contentar com um sextanista — que alias cuidaria dos soldados mas se recusaria a tratar as mulheres e crianças, opinando que deveriam ser todas passadas a fio de espada — e um calouro de medicina. Os missionários só

regressariam a Salvador em 27 de outubro, tantos foram os sobreviventes necessiSud

a

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

tados de tratamento que começaram a transitar por ali desde o dia 5, quando o arraial caiu. Em Cansanção montariam também uma enfermaria para variolosos. Devem-se a frei Pedro Sinzig boas observações. Uma delas, a respeito do deserto em que se tornou a re gião, com a população fugindo e se escondendo apavorada ante a aproximação das tropas. Outra, a respeito da politica de terra

arrasada destas, tocando fogo a tudo com que deparasse pelo caminho, casas, currais, roças. Outras ainda, sobre as condições lamentáveis das prisioneiras, bem como sobre a degola dos homens válidos — e às vezes até das mulheres, como testemunhou Euclides da Cunha.

Outras

consequências

O fim da guerra, quando, por um lado, se descobriu que ela não ultrapassava aquele foco, aliás irredutível, e que nada tinha a ver com uma tentativa de restauração da monarquia, e por outro lado, se divulgaram os métodos adotados pelo exército, provocou uma reviravolta de opinião. O desiderato coletivo anterior à guerra, que se encontra nas mais variadas modalidades de discurso militar, civil, governamental ou jornalístico, foi formulado com candura, sem nenhum fanatismo ou horror ao diferente, pelo alferes Benedito T. Cordeiro: “exterminar o último elemento de desordem que embaraça o progresso do pais”. Se um jovem alferes assim se expressava, pode-se comparar suas palavras com as de um jurista liberal, o de maior reputação do pais. Rui Barbosa, ao acusar os canudenses de serem uma “horda de mentecaptos e galés”, sustenta que não passavam de um caso de polícia, cuja intervenção, a par com a do exército, convoca, para limpar o território nacional, “des inçando-o de uma colônia de bandidos”. Mais tarde, finda a guerra e o perigo liqu idado, passaria a devotar-se aos canudenses mortos, chamando-os de “meus clientes” e lamentando não ter pedido habeas-corpus para eles enquanto vivos. Se antes a grita clamando pelo extermínio emanava de todo s, mudou de figura depois que a guerra acabou. Assistiu-se a um mea culpa generalizado, que acometeu a muita gente e encontraria sua forma mais alta mente elaborada em Os sertões, de Euclides da Cunha, o que, à parte seu s indiscutíveis méritos, tem muito a ver com seu êxito imediato e a glória que cobriu seu autor. *96+

E

O Império DO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS

próna e , ante omin pred a ênci tend a pou esca efe Nem o comandante-em-ch

ria parte oficial que dá conta da vitória no dia 5 de outubro elogia a bravura dos P da do adversar os. À isso acrescentaria, em proclamação a seus comandados data quandia segui nte, o reconhecimento de que os canudenses eram tão brasileiros

to os soldados, ambos

defendendo ideais opostos. E iria mais longe

ainda em

discurso no banquete que lhe foi oferecido pelo governador da Bahia, ao afirmar

que O monarquismo do Conselheiro era meramente religioso e não político, manifestando-se “menos como um meio de fazer mal à República do que com intuito de sustentar a religião”. Os estudantes, antes entusiasmados defensores da República ante o perigo da restauração monarquista representado por Canudos, agora se arrependem e publicam um manifesto, condenando, em termos ardentes que invocam a razão e o direito, o trucidamento em massa de prisioneiros manietados.

Apesar das festas e comemorações então havidas, o fato é que o exercito saiu da campanha coberto de opróbrio. O jacobinismo, que vicejava entre os militares, envolvido na denúncia da conspiração para repor o imperador no trono e desde o começo o maior alarmista contra Canudos, expirou com a devassa do atentado contra o presidente. O prestígio do exército levou décadas para ser recuperado, sucedendo-se os governos civis. Até mesmo o comandante-em-chefe foi sistematicamente preterido nas promoções de general-de-brigada a general-de-divisão nos

anos seguintes. Só mesmo no surgimento da sexta vaga, em 1900, é que viu chegar sua vez, passando-lhe à frente camaradas mais novos, e até subordinados seus como

Savaget, quando o mínimo que esperava era uma condecoração pela vitória. Ao propor ao Congresso uma medalha especial para os veteranos da guerra, Artur Oscar recebeu uma negativa baseada em parecer do general João Tomas Cantuária, ministro da Guerra, com o argumento de que dos dois lados se vertera sangue brasileiro, e portanto não havia motivo para celebrações. Comentando o parecer, Aristides Milton compara a resistência dos conselheiristas à de Heitor em Tróia e à

de Vercingetorix em Alésia, deplorando em nome da pátria “o sangue de sete mil

filhos seus, derramado sem necessidade”. Pode-se dizer que o exército sofreu um rebaixamento, pois se até ontem cogitava estar encarnando a Revolução Francesa no Brasil, agora se via desiludido. Corria no ideário da Escola Militar que o advento da República, tornando obsoleta a monarquia, equivalia à derrubada do Antigo Regime por aquela revo“args

HISTÓRIA

lução. Foi esse tipo de concepção

DO

POVO

BRASILEIRO

que presidiu à escolha do titulo do artigo,

publicado em O Estado de S. Paulo, em que Euclides da manifestou sobre a guerra: “A nossa Vendeia”. Ora, contra-revolucionária, monarquista, aristocrática e batizar Canudos, confirmava essa linha de reflexão. A

Cunha pela primeira vez se a insurreição da Vendéia, camponesa, servindo para expressão foi uma escolha

feliz no momento, porque se popularizou, sendo repetida e copiada. Durante

bom tempo foi mantida como título do futuro livro de Eucl ides, porém acabou

sendo superada pelo próprio autor, que percebeu sua inadequação. Mas as marcas da Revolução Francesa foram muitas na guer ra. Durante o cerco, o 14 de julho, dia da tomada da Bastilha e simbolo rev olucionário, foi

saudado por uma salva de 21 tiros de canhão, por ser con siderado “data nacional?. As ordens do dia colocam o democrático título de “cidadão”, apelativo tipico do período revolucionário francês, antes da patente militar: cidadão general etc. E se encerram com o fecho de “Saúde e fraternidade ”, da mesma origem. A

exclamação “Viva a República!” era o grito de guerra em Canudos, emitido por milhares de bocas a cada investida. De modo equivalente, era a saudação final das ordens do dia e dos telegramas dos correspondentes dos jornais. Não há dúvida de que o país inteiro acreditava defender à República de uma iminente restauração monárquica, de que Canudos seri a o foco deflagrador. Poucas

vozes, entre elas a de Rui Barbosa, que fora monarq uista e aderira ao novo regi-

me, se elevaram chamando a atenção para o equivoco. Os próprios monarquis-

tas, todos eles gente branca, rica, cosmopolita e de fumaças aristocráticas, ficaram horrorizados com a aproximação e protes taram sua inocência. O fato é que O levante conselheirista foi visto como uma irr upção de atraso, ignorância e su-

perstição de um Brasil profundo, que uma fase de otimismo progressista trazido pela extinção do trono e do cativeiro parecia deixar para trás. O que em parte

explica por que todos se apressaram a renegar os canudenses e a reclamar irracionalmente seu extermínio.

Quando se somam todas essas manifestaçõe s de republicanismo, associande

do-as ao que era estudado na Escola Mili tar da época, verifica-se que o oficialato era submetido a uma verdadeira imersão nas noções que a Revolução Francesa imbuia

em seus soldados. Entre elas, a concepção de que o soldado é um “cidadão armado”, sendo sua missão mais civilizatória que bélica, portanto de vendo dedicar-se à difusão dos ideais revoluci onários pela pregação e pelo exemplo. Foi “98:

O Império nO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS Di

o que as forças armadas acreditaram estar levando a Canudos. Por isso, não e de considese que cito exer um ndo qua giu, atin se que ica trág espantar à dimensão codes ado Est ro cei Ter do ado arm ço bra o e rda gua van à po tem rava ao mesmo briu-se massacrando a plebe que o constituia. baixas as que de fato o igualmente pesou concretos, No saldo dos dados '

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te por ao s nai cio por pro des nte ame eir int e s, rme eno am for to rci exé sofridas pelo da guerra. Mesmo sem mencionar os milhares de feridos, o relatório oficial do

ministro da Guerra ao presidente da República registra 910 mortos da 4º Expe-

dição, ou seja, cerca de 10% do efetivo engajado.

Uma análise dos dados mostra

que a maioria tombou nos combates mais importantes, os de 28 de junho, 18 de julho — o maior de todos — e 1º de outubro. O balanço de 28 de junho inclui as baixas para chegar a Canudos, pois os conselheiristas emboscaram as duas colunas em vários pontos e as mantiveram sob fogo cerrado nos dias 27 e 28, incluindo a noite de permeio.

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a guerra e incendiado o arraial, as forças legais se retiraram,

deixando para trás, como carniça de matadouro, uma profusão de cadáveres insepultos. As últimas testemunhas, horrorizadas, falam dos bandos de cães que

surgiram de todos os lados, alimentando-se dos corpos. Afinal, Ângelo dos Reis, dono da fazenda Formosa no outro lado do Vaza-Barris e amigo dos canudenses, apareceu com uma turma de trabalhadores para inumá-los. Para os soldados, o exército tivera o cuidado de implantar um cemitério. À partir de 1909 alguns sobreviventes foram retornando, ressabiados, e

aos poucos se reinstalaram precariamente. Na década de 1930, os homens que

trabalhavam na abertura da estrada Transnordestina, cujo traçado por ali passava, foram se assentando no arraial, Seguiu-se o início da construção do vasto açude de Cocorobó pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS, à época IFOCS), trazendo mais gente. Guardou-se alia memória de que

teria sido Getúlio Vargas, visitando a região nos anos 40, quem prometera a providência tão necessária. Um ponto a considerar é que, sendo amplo o sertão e a falta de água generalizada, se tenha tomado um partido implicando a obliteração do arraial, lugar de memória da desonra das forças armadas brasi*TOI

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO mi

leiras, num dos desempenhos de maior barbárie de toda a sua história. E que uma ditadura militar tenha se encarregado de concluir e inaugurar a obra em 1969, ano seguinte ao Ato Institucional nº5 (AI-5), quando a sociedade civil estava em convulsão e o evento, não divulgado, passou despercebido. Foi só mais tarde que soou o alarme. A engenharia aproveitou o desfiladeiro ou garganta de Cocorobo, onde renhida batalha se travara, para represar a torrente da cheia do Vaza-Barris. E o arraial continuou a se expandir. Antes, em 19477, por ocasião do cinquentenário do fim da guerra, Odorico lavares, jornalista pernambucano radicado na Bahia, publicou na revista

O Cruzeiro, do Rio, uma materia feita no local e ilustrada com fotos de um jovem fotógrafo francês, Pierre Verger. Encontrou ainda antigos

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nudense Joaquim Macambi-

ra, Maria Avelina da Silva, Mariano, Francisca Guilher-

mina dos Santos, José Travessia, filho de um combatente que tombou ao lado de João Abade, Manuel Ciriaco,

Francisco Cardoso de Macedo, Maria Guilhermina de Jesus, Idalina Maria da Con-

ceição. À reportagem chamou a atenção do historiador José Calasans, que efetuaria

Esta imagem da Igreja de Santo Antônio ou Igreja Velh a, em ruínas

apos o ataque, mostra o estado em que o canhon eio deixou o arraial. O fim da guerra provocaria um mca culpa generalizado, devido à

divulgação das atrocidades cometidas pelo exército. “102º

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conselheiristas, tendo entrevistado Francisca Macambira, filha do importante chefe ca-

a partir de 1950 várias viagens nas quais recolheu depoimentos, acrescentando a esses os de Pedrão — inesti-

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O Império vo BeLo MonTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS ——

máveis, por provirem de um dos cabecilhas da guerra —, de Ioiô da Professora

e do filho do sineiro Timotinho, entre outros.

Daí se originou toda uma nova linhagem de estudos sobre Canudos, procurando ventilar outros elementos, que no processo tinham ficado obscureci-

dos pelo brilho de Os sertões. Ao longo dos anos, o próprio historiador foi publicando um sem-número de estudos, aqui aproveitados, que foram esclarecendo vários aspectos. Entre eles, vale mencionar tudo aquilo que se refere à

vida pregressa de Antonio Conselheiro, os anos de peregrinação e a constituição de seu séquito; seu papel como lider de mutirões para edificação ou reparação de igrejas, cemitérios e açudes; as histórias de vida das principais personagens do arraial e da guerra; a ambigiidade da posição da Igreja, cuja tomada

de partido seria decisiva para a destruição do arraial. Tudo isso, sem esquecer

o ponto de origem que foi a prática antecipada da história oral e do cotidiano, bem como o realce devotado à crônica dos vencidos, viria contribuir para aos

poucos mudar o perfil dos estudos. A tecla, repisada à época, de uma loucura coletiva que se apoderara de Antonio Conselheiro e contagiara seus adeptos,

À GUERRA DE CANUDOS NA CHINA

Realizou-se em Pequim, em 1959, uma celebração do cinquentenario da morte

de Euclides da Cunha, patrocinada pela União dos Escritores Chineses e com alguns brasileiros presentes, que ficou documentada por uma plaquete. À tradução chinesa de Os sertões é única em língua não-européia. Lendo nas entrelinhas, supõe-

se um paralelo entre Antonio Conselheiro e Mao Tse-tung, ja que o brasileiro, tal como o chinês — e antes da Coluna Prestes nos anos 30 — liderou uma peregrin ação de um quartel de século pelo mais agreste interior do país. Mao entr ou para a história com a Longa Marcha, que ziguezagueou pelo coração da Chin a durante décadas, até tomar o poder. Tanto um como outro chefiaram insu rreições camponesas, uma abortada, outra vitoriosa. Somando todas as indicações, pode-se inferir que para os chineses Antonio Conselheiro seria precursor de Mao Tsé-tung,

(Meeting — In commemoration of the SOth. anniversary of the death of Euclides da Cunha, Brazilian author and great “figure of world culture, The Chinese People's Committe for World Peace /

The Chinese People's Association for Cultural Relat ions with Foreign Countries / The China Federation of Literary and Art Circles / The Chin ese Writer's Union, Peking, 1959.) iii

*103+

a

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

interpretação que predominara, acabou por cair em descrédito. O que ali ocorrera não era da ordem do patológico, que implicaria a desagregação da vida no arraial, mas ao contrário uma “desesperada tentativa no sentido de uma nova organização social”. O rótulo generico de “fanáticos” com que se definiam os

proselitos deixou de ser empregado. E mesmo o termo tão pejorativo de “jagunços”, que afinal é sinônimo de capanga e de bandido, passou a ser usado com mais cuidado.

Novas fontes documentais

foram pesquisadas, entre elas: as reportagens feitas pelos enviados especiais ao palco dos acontecimentos; o noticiário dos pe-

riódicos; os livros escritos pelos participantes da guerra, sobretudo combatentes; as ordens do dia e outros documentos militares; os relatórios do governo estadual e federal; as atas parlamentares; as cartas trocadas entre a Arquidiocese e Os vigarios sertanejos; os dois manuscritos de sermões do Conselheiro: os ar-

quivos militares; a correspondência do barão de Jeremoabo. Quando,

em

1969, a barragem foi concluída e a água se espraiou, os

moradores abandonaram Canudos e se instalaram à margem do açude de Cocorobô, num povoado que com o tempo adotou o nome de Nova Canu-

dos. Em 25 de fevereiro de 1985, a Lei Estadual nº 4.404 criou o municipio

de Canudos, desmembrando-o do antigo Cumbe (hoje Euclides da Cunha). E em 30 de junho de 1986 foi criado pelo Decreto 33.333 o Parque Estadual de Canudos, sob a responsabilidade da Universidade do Estado da Bahia e da Secretaria de Educação e Cultura. Tal parque, entre várias instituições e re-

cursos, devera ter um museu, um laboratório de arqueologia, uma estação

de agronomia e outra de meteorologia, tudo isso convergindo para o objetivo de preservar a área do ponto de vista ecológico, arqueológico, científico, histórico e educacional.

A esta altura ja foram feitas várias campanhas arqueológicas, com prospecção e levantamento de trincheiras, fortificações, cemitérios, material bélico, ossadas, utensilios e restos domésticos, encontrando-se resgatadas a Fazenda Velha e a Igreja Velha, com medições e fotos. E de assinalar que o próprio Conselheiro tenha sido recuperado pelos letrados urbanos como icone da resistência dos oprimidos, da qual Canudos seria o baluarte, atribuindo-se a líder e seguidores uma perspectiva até socializan te, com perfil adequado à projeção do ufanismo regional. * LOM.

O Império DO BELO MONTE

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

me

sebastianismo, milenarismo, messianismo A primeira providência para elucidar a questão da presença ou não dessas

tentar caracteristicas em Canudos é não as tomar em bloco indiferenciado mas

analisá-las em sua diversidade, por exemplo separando aquilo que emana do Conselheiro das crenças que seus fiéis nutrem. Para a compreensão do quadro é indispensável a leitura do livro de sermões do Conselheiro, já publicado. O aparecimento desse livro em 1974 foi a primei-

ra evidência insofismável de que o Conselheiro não era nem herético nem heterodoxo, como tudo fazia crer conforme os contemporâneos e os que tinham

escrito sobre ele. O organizador da edição, ele mesmo católico e conhecedor da doutrina, logo expendeu seu laudo, ali mesmo na apresentação do livro. O volume, que leva o titulo barroco de Tempestades que se levantam no Coração de Maria por ocasião do mistério da Anunciação, consta de uma primeira parte com 29 mis-

térios mariais, cada um ocupando uma prédica, conforme o titulo indica. À segunda traz dez sermões, dedicados aos dez mandamentos da lei de Deus, a terceira textos

das Escrituras Sagradas com comentários e a quarta prédicas de circunstância sobre a cruz, a mis-

sa, a confissão, o recebimento da

chave da igreja de Santo Antonio, padroeiro do Belo Monte etc. Seguem-se o sermão sobre a Republica e a Despedida.

A teologia do Conselheiro, conforme as análises existentes, Após o ataque final do exército, da Igreja do Bom Jesus ou Igreja Nova so restaram escombros, assim como de todo o arraial.

*

IO

ressalta o papel de Maria na obra

da salvação, por meio de tudo o

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DO

POVO

BRASILEIRO

que a relaciona com Jesus Cristo, seu Filho e seu Deus: Jesus Cristo é o Redentor e a Igreja é o único caminho para a salvação. Nada diverge do pos-

tulado pelo Concílio de Trento e pelo Vaticano I, e tem sua fonte mais imediata na Missão abreviada, sermonario popular novecentista originário de Por-

tugal, instrumento para o apostolado leigo concebido pela Igreja e bastante difundido em nosso pais à época, Os sermões do Conselheiro adaptam esse livro, resumindo, explicando, operando permutas e combinações de suas partes, mas deixando o modelo claramente reconhecível. O universo é hie-

rarquizado, com todos em seus lugares desiguais, tendo o papa como chefe da ordem espiritual e o monarca como chefe da ordem temporal. À vida humana na Terra nada mais é do que um “interim” indispensável para a inter-

venção salvifica da redenção. Outros pontos corroboram a configuração de um ideário conservador. Há

ricos e pobres, cabendo aos primeiros dar assistência aos segundos por meio do exercício da caridade, que os segundos devem solicitar. A propriedade deve ser respeitada e o roubo proibido. A família é o modelo de funcionamento universal,

rei e Deus sendo análogos ao pai para com os filhos. Judeus, maçons, protestan-

tes e republicanos são os inimigos da Igreja, contra a qual pregam falsas doutrinas. O Diabo está atento e para não se condenar à danação o homem deve prati-

car a ascese, a oração e a penitência. A ressurreição só é mencionada uma vez, enquanto a ênfase recai sobre a morte em seu aspecto sacrifical. O unico ponto em que a pregação do Conselheiro destoa da posição conservadora, que recomenda manter a situação vigente com cada coisa no seu lugar, é no que diz respeito à escravidão. Nesse ponto, sua acusação ao caráter degradante da instituição e sua exaltação da princesa Isabel como a benemeérita dos cativos não deixam dúvidas. Quanto ao sebastianismo — Antes de mais nada, é preciso lembrar que sebastianismo é como se nomeou originalmente um fenômeno no âmbito da

história de Portugal, ocasionado pela morte dramática e prema tura de Dom Sebastião em Alcácer-Quibir (1578).A consegiente perda de autonomia nacio-

nal, com a passagem do reino para a coroa espanhola, gerou intensos abalos

que redundaram na espera do retorno de Dom

Sebastião para regenerar a vida

no pais. Data daí o surgimento de inúmeros dons sebastiões durante séculos e de sucessivas decepções, processo por muitos pe rcebido como compensatorio * 106»

O Império DO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS

1 decadência que se abateu sobre Portugal após o período áureo das navegações e dos descobrimentos.

Ressalte-se que o sebastianismo não tinha qualquer conotação de anti-republicanismo, mesmo porque a República só adviria varios séculos depois. Ali se tratava de restauração, sim, mas da nacionalidade: voltar a ter um rei português

e não espanhol, mas em qualquer caso um rei. Se estendermos o termo, em seu sentido mais amplo, a todo movimento que aguarde o retorno de um monarca, morto ou vivo, teremos que examinar algumas evidências, como segue. Sem esquecer que o sebastianismo pode se apresentar como apenas uma particularização do messianismo, quando o messias é identificado a D. Sebastião. A incidência mais célebre de sebastianismo em nosso país foi o episódio tantas vezes estudado de Pedra Bonita (1836-1838), em Pernambuco, onde D.

Sebastião era a presença tutelar, conjurada à custa de sacrifícios humanos. Quando se começou a falar em Antonio Conselheiro e Canudos, várias vozes logo se alçaram utilizando o próprio termo sebastianismo, aplicando-o ao novo fenômeno, O termo é culto, e é verdade que essas vozes eram de parlamentares e jornalistas, portanto vozes brancas, litorâneas e com certo perfil de classe, provenientes principalmente do Rio de Janeiro. Usavam-no exclusivamente como sinônimo de monarquismo. Desde o primeiro momento, portanto, aplicou-se a Guerra de Canudos a pecha de sebastianismo. Ja em Canudos praticamente não se encontra sinal de sebastianismo. Basta

comparar com a sublevação do Contestado (1912-1916), de sebastianismo não

só evidente como explicito na boca dos insurretos. Nessa “Guerra Santa”, São Sebastião, fusionado com D. Sebastião, era santo padroeiro, invocação no intrói-

to solene dos documentos, ao lado da Santíssima Trindade, e aparição habitual para os combatentes,

No mais notório dos sermões do Conselheiro, aquele proferido contra a República, está escrito que “o digno príncipe o senhor Dom Pedro 3º tem poder legitimamente constituído por Deus para governar o Brasil”. Portanto, não hã dúvida de que se espera o retorno de um monarca, chamado apenas de

“Principe” nas cartas dos canudenses — no caso, vivo, pois o herdeiro presuntivo do trono, por nome Pedro, era o primogênito da princesa Isabel e neto de D. Pedro II. * 107º

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

“E BRASIL FICOU ATOA”

“Brincando ficarão eles Com toda a fidalguia

“Sebastião ja chegou conta muito rijimento

Ja vem os reis mais perto Fazendo grande Armonia”

acabando com o Civil e fazendo os casamento”

“Caio D. Pedro Segundo Para o reino de Lisboa Acabosse a Monarchia

“Visita vem fazer Rei D. Sebastião

Coitadinho d'aquele pobre

E Brasil ficou atoa”

Que estiver na lei do Cão”

(Versos encontrados em Canudos. Euclides da Cunha, Caderneta de campo)

Por outro lado, as numerosas testemunhas de vista, cujos relatos viemos exa-

minando, jamais mencionaram D. Sebastião. Tampouco os sobreviventes entrevis-

tados se referiram a esse rei nem a qualquer anelo sebastianista. É nos folhetos proféticos encontrados no arraial e reproduzidos em diversos autores que se fala na volta de D. Sebastião, o que é confirmado por versos da poesia popular.

Quanto ao milenarismo — Tomado no sentido estrito de um surto provocado

pela iminência do fim do século ou do milênio, encontra-se ausente de Canudos. Antes, tudo indica que a comunidade conselheirista se colocasse jora da história, vivendo um “interim” atemporal. Mas os folhetos proféticos e os versos populares mostram essa tend ência, mesmo que apenas vestigial. Duglas Teixeira Monteiro fala da “corrent e subter-

rânea escatológica” que percorre as insurreições religiosas, que acabam colocan-

do sua visada no Jim dos tempos. Sabendo-se a importância que a Missão abreviada teve como fonte para os sermões do Conselheiro, vale lembrar que ela contém um capitulo inteiro dedicado ao Anticristo e ao fim do mundo, o que apareceria com clareza nos folhetos proféticos e na poesia popular. Quanto ao messianismo — Se considerarmos messianismo no sentido lato como

todo movimento reli gioso que siga um líder carismático de quem emana a salva-

ção, não pode haver dúvida de que disso se tratava, Ainda aqui, o Conselheiro jamais afirmou que era o Messias, ou Jesus, ou

Santo Antonio. Nos dois livros de se rmoes que deixou assina-se “o Peregr ino — “108:

O Império DO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS E

Antonio Vicente Mendes Maciel”, e neles não se encontra sequer uma insinuação nesse sentido. Testemunhas de vista tampouco lhe atribuíram tal identificação.

Pedrão guardou a lembrança, que relatou a José Calasans, de um episódio em que um crente se ajoelhou ante o Conselheiro, que o repreendeu, dizendo: “Le.

É

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é

vante-se, que Deus é outra pessoa”. Mas sua grei sim, e aí são numerosos os depoimentos contemporâneos ou de sobreviventes, que a ele se referem como Santo Antonio, Santo Antonio Aparecido e Bom Jesus Conselheiro. Davam-lhe assim vivas ao começo e ao fim das prédicas, quando chegava ou deixava povoados e fazendas. E em Canudos era usualmente saudado como Bom Jesus Conselheiro. Ao que tudo indica, essa foi sua derradeira renominação, depois de responder sucessiva ou alternadamente aos apelativos de Irmão Antonio, Meu Pai, Nosso Pai, Santo Conselheiro. Afora a Virgem Maria — culto de origem tridentina, e similar ao do padre 3

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Ibiapina —, a devoção pessoal do Conselheiro se endereçava a Santo Antonio e ao

Bom Jesus. No caso do primeiro: era seu nome; nome de seu avô Antonio Maciel; nome e padroeiro de sua vila natal, Santo Antonio de Quixeramobim; orago da primeira igreja que construiu em Canudos; e padroeiro do Belo Monte. Até

hoje, a mais concorrida festa anual de Canudos é a de 13 de junho, coroando uma

trezena. No caso do segundo: topônimo do primeiro arraial que fundou nos idos de 1880, o de Bom Jesus, ao pé da capela de mesma invocação; orago da mais

nova e maior igreja que construiu em Canudos; identificação e sincretismo entre ambos, cunhando o apelativo de Bom Jesus Conselheiro; e propriamente, como

é óbvio, o Messias, o Salvador, o Redentor etc.

Em suma: não há afirmação de juízo final explícito em nenhum momen-

to, embora contemporâneos afirmassem que o Conselheiro pregava anunciando o fim do mundo — de novo, a não ser nas profecias e nos versos. Às cartas de canudenses convocando reforços falam apenas na guerra que se avizinha, aduzindo que é a última oportunidade de “morrer com nosso Conselheiro” e assim alcançar a salvação. Mas nessas mesmas cartas, das quais um exemplo é a supracitada de Ezequiel Profeta de Almeida, quando a esperança terrenal ainda imperava, a proposta é a de salvar-se em vida porque o resto do mundo, e não Canudos, é que se encontra votado à perdição. Pode-se inferir que houve uma fase em que predominavam as expectativas de vitória sobre o inimigo, seguida

por outra em que os fatos as desmentiram, As alusões de prisioneiros e sobre* 109º

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

viventes, quando diretamente interrogados, dão conta de que o Conselheiro

não prometia a ressurreição, mas sim “salvar a alma”. É o que registram, entre vários outros, Euclides da Cunha, que assistiu ao interrogatório de Agostinho,

de 14 anos, e o combatente Benedito T. Cordeiro, transcrevendo as respostas de Maria Leandra. Pena é que para nós essa seja uma linguagem enigmática, e

que tentemos decifrar o que nós, do mundo desencantado, já não entendemos.

Para eles, que tiveram o mundo reencantado, não havia enigma: talvez mistério, mas no sentido teológico.

Resgate da memória Ãos poucos, a memória da Guerra de Canudos foi sendo reavivada nas mesmas paragens onde ocorrera. A Igreja Católica, penitenciando-se, interessou-se pela sorte dos moradores, por meio da Pastoral da Terra. Em 1984 faz-se uma ampla cerimônia, passando-se a rezar missa pelos mortos em 5 de outubro, data em que a guerra terminou. Afora a missa anual, e tendo em vista a crescente ocupação das terras da região por grilagem praticada pelos fazendeiros, desenvolveu-se o movimento do “Corta-cerca”, uma contestação à prática de cercar terras tradicionalmente desocupadas, tolhendo o direito comunitário de apascentar livremente as cabras. Participantes do movimento foram presos e intimidados. Ante as acusações de subversão e as manipulações politicas dos poderosos proprietários, a Igreja acabou por desativar o programa. Pouco depois, ao criar-se o Centro de Estudos Euclides da Cunha, da Universidade Estadual da Bahia, seus membros passaram a fazer trabalho comu nitário em Canudos. Desse trabalho resultou a escrita de um livro didático , discuti-

do a cada passo com a comunidade, que visava a uma reconstituição dos eventos

desse ponto de vista. Foi assim que surgiu a Cartilha histó rica de Canudos (1989),

de autoria de Renato Ferraz, José Carlos da Costa Pinheiro e Manuel Neto, em co-edição da prefeitura local e da Universidade Estadual da Bahia, desde então adotada como material didático de 1º e 2º graus nas escolas de Canudos, onde o tema passou também a ser de inclusão obri gatória no currículo. Cada vez mais, comenta-se a similitude do Movime nto dos Trabalhadores

Rurais Sem Terra (MST) com o dos conselhe iristas. Eles mesmos reivindicam “TIO:

O Império DO BELO MonTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS Dc

tais

precursores, batizando, entre outros, um assentamento em Tangara da Serra

(Mato Grosso) de “Antonio Conselheiro”, e outro em Campestre (Goiás) de “Nova Canudos”. Sem dúvida, a iniquidade socioeconômica que caracteriza a sociedade brasileira, na qual uns poucos possuem tudo e a maioria não possui nada, está na

raiz tanto da Guerra de Canudos como do MST. Entretanto, certas diferenças também se observam. Primeiro, o MST reivindica aqui e agora, enquanto no

Belo Monte apenas se aguardava a salvação da alma. Além disso, o MST vai ocupando terras, organizando protestos e penetrando ativamente na sociedade nacio-

nal, ao passo que os conselheiristas se recolheram a sua cidadela. Por último, o Belo Monte era regido pela religião, uma só e indiscutível, seu cimento de coe-

são social: o que não é o caso do MST. Estas são algumas das disparidades notadas por uma observação mesmo que superficial. A lição principal que fica de uma guerra fratricida e desnecessária é a admiração pelo esforço desenvolvido por populações carentes de tudo para criar novas formas de vida em comum. De um modo ou de outro, engendraram uma

estrutura alternativa de poder que as subtraía ao mando de fazendeiros, padres e delegados de policia. No dizer de um militar que deixou seu testemunho, Antonio Conselheiro estava “fazendo da religião instrumento de governo”. E o psiqui-

atra que diagnosticou a distância a loucura do líder e de seus seguidores descortinaria “o segredo da bravura e da dedicação fanatizada dos jagunços que, de fato, se batiam pelo seu rei e pela sua fé”. Aparentada às guerras camponesas (Engels), às rebeldias pré-políticas (Hobsbawm) e aos movimentos utópicos regidos pelo principio esperança (Ernst Bloch), a Guerra de Canudos se ergue como um monumento a seus mortos, a perturbar a glorificação de nossa história. Ou, no verbo arrebatado de Euclides da Cunha: “Não lhes bastavam seis mil mannlichers e seis mil sabres; braços, e o acalcanhar de doze mil coturnos; e seis mil nhões, e milhares de granadas, e milhares de shrapnels; e incêndios, e a fome, e a sede; e dez meses de combates, e

e o golpear de doze mil revólveres: e vinte caos degolamentos, e os

cem dias de canhoneio continuo; e o esmagamento das ruínas; e o quadro indefiniível dos templos derrocados; e, por fim, na ciscalhagem das imagens rotas, dos altares abatidos, dos santos em pedaços — sob a impassibilidade dos céus tranquilos e claros —, a queda de um ideal ardente, a extinção absoluta de uma crença consolado ra e forte...

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Notas e referências

regou a O título deste livro é homenagem a Maria Isaura Pereira de Queiroz, que emp

p. 203). expressão em O messianismo no Brasil e no mundo (São Paulo, Dominus / Edusp, | 965,

Antecedentes *P. 13-—A citação de Capistrano de Abreu está em Capítulos de história colonial (Livraria Briguiet,1934, 3º ed., p. 143).

*P 14- A observação sobre as vantagens do gado é do autor anônimo do “Roteiro de

Maranhão a Goiás pela capitania do Piauí”, apud Capistrano de Abreu, Caminhos antigos e povoamento do Brasil (Livraria Briguiet, | 930, p. 100).A observação seguinte de Capistrano de Abreu sobre o mesmo tema está em Irineu Joffily, “Notas sobre a Paraiba”, apud Capistrano de Abreu, Ensaios e estudos (Livraria Briguiet, 1932, 1º serie, p. 225).

* P

16 - O texto mencionado

de Gustavo Barroso é “Vida e história da palavra sertão”

(Salvador, Núcleo Sertão/UFBA, 1983). * P 16/17 —A referência a Sergio Buarque de Holanda vem de O extremo oeste (São Paulo, Brasiliense, 1982) e também de Monções (São Paulo, Brasiliense, 2000, 3º ed., 1º reimpr.) e de Caminhos e fronteiras (São Paulo, Companhia das Letras, 3º ed., 1º reimpr.). *P 18-A citação de Capistrano de Abreu estã em Capítulos de história colonial, op. cit., p. 105. * P. 19 — As referências ao poder local na vida brasileira vêm das obras de Vitor Nunes Leal (Coronelismo, enxada e voto. Rio de Janeiro/ São Paulo, Revista Forense, 1948) e Maria Isaura Pereira de Queiroz (O mandonismo local na vida politica brasileira e outros ensaios. São

“113º

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

Paulo, Alfa- Omega, 1976 [1º ed. IEB 1969)). * P. 20 — À informação sobre os padrinhos de Antonio Conselheiro está no texto de José Calasans “Antonio Vicente no Ceará” (In: Cartografia de Canu dos. Salvador, Secretaria da Cultura e Turismo do Estado da Bahia/ Conselho Estadual de Cult ura, 1997), — Em relação aos dois livros de sermões deixados pelo Con selheiro, um é o editado por Ataliba Nogueira, Antonio Conselhcio e Canudos (São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1978, 2º ed.); o outro, doado por Jose Calasans ao Núcleo Sertão do Centro de Estudos

Baianos da Universidade Federal da Bahia, encontra-se em vias de publicação. * P 22 — Sobre a publicação da peça Antonio Maciel. O Conselheiro, ver No calor da hora, de Walnice Nogueira Galvão (São Paulo, Ática, | 994 , 3º ed). À peça está publicada integralmente em Mitológica rosiana, da mesma autora (São Pau lo, Ática, 1978). * P. 23 — As informações sobre o barão de Jeremoabo estão no texto de Álvaro Dantas de Carvalho Jr., “Canudos: a posição do barão de Jeremoabo” (In: Consuelo Novais Sampaio (org.), Canudos — Cartas para o barão. São Paulo, Edu sp, 1999).

* P. 25 — Para as imbricações do combate a Canudos co m à política estadual e federal ver Edmundo Moniz, À guerra social de Canudos (Rio de Janeir o, Civilização Brasileira, | 978). — Os artigos do barão de Jeremoabo sobre o Conselheiro foram publicados no Jornal de Notícias (“Antonio Conselheiro”. Bahia, 4 e 5 de março de 1897). Nos mesmos artigos estão seus argumentos sobre a encíclica papal. Á paixão de Antonio Conselheiro * P. 29 — Sobre o catolicismo popular ver as seguin tes obras de Duglas Teixeira Monteiro:

“Um confronto entre Juazeiro, Canudos e Contestado ” (In: História geral da civilização

brasileira, II — O Brasil republicano, 2 — Sociedade e instituições. São Paulo, Difel, 1978, 2º ed.); Os errantes do novo século (São Paulo, Dua s Cidades, 1274) e “Sertão e civilização: compassos e descompassos” (In: Anais do Colóqu io de Estudos Regionais. Curitiba, Dept. de História/UFPR, 1974),

* P 30/31 — As informações sobre o padre José Maria Ibiapina são de Ralph Della Cava, Milagre em Juazei ro (Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976).

* P 31 — Sobre a rede de compadrio ver José Calasans, “Aparecimento e prisão de um messias (ln: Cartograf =

5

' iap de Canudos, op. cita .), e Duglas Tei“xeira Monteiroa , “Um confronto entre Canudos, Juazeiro e Contestado”, Op. cit. * É 31 — Sobre as relações comerciais do arraial de Canudos ver Calasans, um depoim ento para a história,

de Marco Antonio Villa e José Carlos da Costa Pinheiro (orgs.) (Salvador, Centro de Estudos Euclydes da Cunha, Uneb, 1998).

*F 31/32 — O comentário do barã o de Jeremoabo está em seus arti gos ja citados. * É

32 — Sobre o “governo de Canudos” ver A. Constantino Nery, 4 4º Expedição cont ra Canudos (Pará, Tip. Pi nto Barbosa, 1898).

CLIMA

O Império DO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS O

to para a en im po de um , ns sa la Ca r ve a, oc ép à existentes p 32/33 — Para os varios conselheiros os. unç jag de s fia gra bio se Qua : (In ” os at be dos s história, Op» Clt.; € José Calasans: “Notícia ). 6 8 9 1 , A B F U , r o d salva udos “Can , sans Cala José ver iro elhe Cons nio Anto de s stro regi s ro ei + p 33 Sobre os prim s para a sua io íd bs Su — s do nu Ca . ii al et o t e N o z Sampai Va o t s u g u A sé Jo n: ” (h no ia id cl eu o nã Casa de Rui Barbosa, 1996). a

|,

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“avaliação histórica. Rio de Janeiro, Fundação

»P 33/34

A

lidiano”, euc não os nud “Ca ns, asa Cal é Jos em á est ro me Ro vio Síl a referência

op. cit.

Aguiar, foi de ira Vie val Dur de ia, Bah da cia vín pro da as tic prá s çõe cri «PP 34 — O livro Des

9). 197 C, ME a/ dr te Cá o, eir Jan de o (Ri ia Bah da cia vín republicado com O título de Pro a de Jose obr a e abo emo Jer de ão bar do s ado cit já tos tex os ver uas - Sobre a queima de táb tina, 1950). edi Ben . Tip , hia (Ba ro hei sel Con s Jesu Bom do o ric cló fol o cicl O ns Calasa

s — Lutas sociais no ilo -qu bra Que or, Mai to Sou o and Arm ver o” uil a-q ebr “Qu * P 35 — Sobre o

1978). outono do Império (São Paulo, Companhia Editora Nacional /MEC,

utor de str con ro, hei sel Con io ton “An ns, asa Cal é Jos ver ro hei sel Con do as obr * Sobre as

igrejas e cemitérios (ln: Cartografia de Canudos, op. cit.). dido da Costa e * P 36 — Para a descrição do funcionamento de uma Santa Missão ver Cân Bahia (São Paulo, Silva, Roteiro da vida e da morte — Um estudo do catolicismo no sertão da Ática, 1982). Rocha, O ens Rub e ra rei Ped ás Tom ro Ped ver to San te Mon de io vár cal o re é P 37 — Sob

das ia tór his s à dio bsí “Su ns, asa Cal é Jos e 3) 198 ur, Emt , hia (Ba io lôn Apo frei de to San te Mon capelas de Monte Santo” (In: Cartografia de Canudos, op. cit.). da *P 39-A citação de Euclides da Cunha está em sua obra Diário de uma expedição, organiza por Walnice Nogueira Galvão (São Paulo, Companhia das Letras, 2000).

No Belo Monte

* P 41 — Para mais informações sobre a correspondência dos vigários a respeito do Conselheiro ver José Calasans, “Aparecimento e prisão de um messias” (In: Cartografia de Canudos, op. cit.).

— Sobre a documentação relativa à refrega de Masseté ver José Calasans, “Canudos não euclidiano”, op. cit.). * P 42 — Sobre a alteração do comportamento do Conselheiro e de seu séquito ver Canudos — Cartas para o barão, op. cit. (Carta do padre Vicente Martins, vigário de Bom Conselho — 22 de janeiro de 1896). — A citação do frei João Evangelista esta em Relatório apresentado pelo Revd. Frei João Evangelista de Monte Marciano ao Arcebispado da Bahia sobre Antonio Conselheiro e seu séquito no Arraial

de Canudos — 1895 (Salvador, UFBA, 1987, ed. facs.).

— Sobre o estabelecimento do Conselheiro em Canudos em junho de 1893 ver José CalapI e

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO

sans, Origem e desenvolvimento de um arraial messiânico” (In: Cartografia de Canudos,

op. cit.).

* P. 43 — Sobre as duas igrejas de Canudos ver José Calasans, “Antonio Con selheiro constru-

tor de igrejas e cemitérios”, op. cit. A data da construção da Igreja Velh a tem sido discutida, inclusive pelo proprio Calasans. *P 44 - Sobre a capelinha de Nossa Senhora da Conceição ver Jose Calasans, “As igrejas de Canudos” (In: Cartografia de Canudos, op. cit.).

* P 44/45 — Sobre o caráter festivo da religião ver Calasans, um depoimento para a história, op. cit.

*P 45 —- À referência às fogueiras feitas com artigos de luxo está nos artigos citados do barão de Jeremoabo.

* P. 46 — A epistola de convocação aos fiéis de Ezequiel Profeta de Alm eida está transcrita na correspondência de Hoche para O País (Walnice Nogueira Galvão, No calor da hora, op. cit., p. 478-479).

* P. 47 — As informações sobre a Companhia do Bom Jesus ou Santa Companhia estão no Relatório apresentado pelo Revd. Frei João Evangelista..., op. cit.; as sobre a Guarda Negra estão em Edgar Henrique Albertazzi, Páginas íntimas (Da tiloscrito, Núcleo Sertão do

Centro de Estudos Baianos, UFBA). * P 48 — Sobre os heróis anônimos de Canudos ver Jose Calasans, Quase biografias de jagunços » OP. cit.

* P. 49 - À declaração de Pedrão está em Jose Calasans, Qua se biografias de jagunços, op. cit. — À referência a Zé Beatinho está em Calasans, um depoiment o para a história, op. cit. * É 50 —AÀ fonte que diz que Marciano foi picado em ped acinhos é Nertan Macedo, em suas obras Memorial de Vilanova (Rio de Janeiro, Renes/ INL/ Pró-memória, 1983, 2º ed.) e Antonio Conselheiro (Rio de Janeiro, Record, 196 9).

* É 51 — Sobre a troca de maldições entre frei João Evangelista e João Venâncio ver as mesmas fontes citadas na nota anterior. * P 53 — As informações sobre Manuel Ciriaco est ão em Calasans, um depoimento para a história, op. cit.

*P 54 A versão de José Calasans está em sua obr a “Canudos — Notas antigas” (Revista Canudos, v. 2, nº. 2, outubro de 1997).

— À referência a Vicentão está em Calasans, um depoimento para a história, op. cit.

*P. 55 — Sobre as manifestações de alarme da Igreja e dos coronéis ver Consuelo Novais Sampaio, “Canudos: a construção do medo” (In: Canudos — Cartas para o barão, op. cit.). *P. 56—A referência ao delegado Boaventu ra Caldas esta em José Calasans, “Apare cimento e prisão de um messias” (In: Cartografia de Canudos, op. cit.),

— À informação sobre a ida de indios de aldeamentos da regiao para Canu dos está nos artigos do ba rão de Jeremoabo (op. cit.), que se refere a“índios de Mirandela, com arcos e flechas”.

“116:

O Império DO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS cce

p57-As informações de Edgar Henrique Albertazzi estão em sua obra já citada Páginas intimas.

s o d u n a , o C m s ã e a ç a h a d n n o e T r “ a c s a a M i F. c a ú i L r ê sr Ma 18e93-os1 in ÉSo(br 7)os — KiÍnridirios e eKmaimCbanudve o (Memoria e tradição oral da participação dos Kiriri e 89di Euclides s udo Est de tro Cen 2, º 2,n v. s, udo Can ta vis (Re Kaimbé na Guerra de Canudos)” da Cunha, Uneb, out. 1997).

rão, ba o ra pa as rt Ca s — do nu Ca em o tã es ab mo re Je de o rã - A correspondência passiva do ba

op. cit. s “ Sobre o carisma do Conselheiro e o seu papel para arrebatar trabalhadore ja havia Pp, o chamado a atenção Rui Faco em Cangaceiros e fanáticos (Rio de Janeiro, Civilizaçã Brasiza, leira, 1978, 5º ed.). Ver também Abelardo F. Montenegro, Antonio Conselheiro (Fortale

A. Batista Fontenele, 1954) e Xavier de Oliveira, Beatos e cangaceiros (Rio de Janeiro, Tip. Revista dos Tribunais, 1920). * P 62 — Sobre o assalto à fazenda Massacará ver José Calasans, “Canudos — Notas antigas”, op. cit.

— Sobre o socorro prestado por Artur Oscar ver Henrique Duque Estrada de Macedo Soares, A Guerra de Canudos (Rio de Janeiro, Tip. Altina, 1902). respeito da romanização da Igreja ver Ralph della Cava, “Messianismo brasileiro *P. 64 e instituições nacionais: uma reavaliação de Canudos e Juazeiro” (Revista de Ciencias Sociais, Universidade Federal do Ceara, VI, 1975). — O livro de sermões do Conselheiro a que se faz referência aqui é aquele editado por Ataliba Nogueira, op. cit.

— À informação de que o padre Ibiapina fora juiz em Quixeramobim estã em Calasans, um depoimento para a história, op. cit.

* P. 65/66 — O documento sobre a construção em Bom Jesus esta em Jose Calasans, “Antonio Conselheiro, construtor de igrejas e cemitérios”, op. cit. * P. 66 — Sobre a ambivalência a respeito do Conselheiro ver José Calasans, “Aparecimento e prisão de um messias”, op. cit.

— Às informações sobre as relações entre o cônego Agripino Silva Borges e o Conselheiro estão em Alvaro Dantas de Carvalho Jr., “Canudos — À posição do barão de Jeremoabo”, op. cit. e em Calasans, um depoimento para a história, op.cit.

* P. 67 — Sobre as relações entre Igreja e República, ver Sérgio Lobo de Moura e José Maria Gouvêa de Almeida, “A Igreja na Primeira República” (In: História da Civilização Brasileira, III, O Brasil Republicano 2, São Paulo, Difel, 1978, 2º ed.).

* P. 68 — Sobre a união da oligarquia para defender seus interesses ver Calasans, um depoimento para a historia, op.cit. — Sobre | a missão dos capuchinhosRe ver o Relatório apresentado pelo Revd. Frei João Evangelista

es op. cit. Ver amostras de sermões tipicos das Santas Missões escritos por frei João Evange-

“117º

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO mm

lisa do Monte Marciano e por frei Caetano de São Leo em Cândido da Costa e Silva, op.

cit.

* P. 70 — Sobre a duração da Santa Missão ver Cândido da Costa e Silva, op. cit.

À guerra * É 72 — Em relação ao governador Luiz Viana, cabe destacar que ele faria vários relatórios oficiais, conforme o andamento da guerra. Ver Mensagem apresentada à Assembléia Geral Legislativa pelo Exmo. Sr. Dr. Luiz Viana, governador da Bahia, em / de abril de 1897 (Bahia, Tip. Correio de Notícias, 1897); Mensagem do Dr. Governador da Bahia ao Sr. Presidente da República sobre os antecedentes e ocorrências das expedições contra Antonio Conselheiro e seus sequazes (Bahia, Tip. Correio de Notícias, 1897 [datada de 15 de março)); Mensagem apresentada é Assembléia Geral Legislativa pelo Exmo. Sr. Dr. Luiz Viana, governador da Bahia, em 14 de abril de

1998 (Bahia, Tip. Correio de Noticias, 1908). Acrescente-se a entrevista que deu ao

correspondente especial Favila Nunes, divulgada em plaquete impressa: “Inter view — O

governador do estado da Bahia Dr. Luiz Viana e o representante da Gazeta de Notícias, do Rio — agosto de 1897 — Distribuição Gratuita” (Feira de Santana, Tip. dO Propulsor, 1897). Deve ser apreciado conjuntamente o relatório do general Solon Ribeiro: Relatório apresentado ao ministro da Guerra sobre fatos que se relacionam às expedições da força federal no

interior do estado da Bahia e que tiveram lugar durante o meu comando no 3º Distrito Militar (Rio

Janeiro, Anais da Câmara dos Deputados, Sessões de 1 a 21 de julho de 1897, Imprensa Nacional, 1897, Vol. 3).

* P 73/74 — Sobre as disputas entre gonçalvistas e vianistas ver Calasans, um depoimen to para a historia, op. cit.

* P. 74 — Sobre a 2º Expedição recomenda-se como fonte, afora os relatórios de Luiz Viana

e do general Solon Ribeiro, a obra ja citada de Edgar Henrique Albertazzi, médico desta expedição.

* É. 75 — Sobre o coronel Moreira César ver Oleone Coelho Fontes, O Treme-terra — Moreira

Cesar (Rio de Janeiro, Vozes, 1996). — Sobre o conceito de minimos vitais ver Antonio Candido, Os parc eiros do Rio Bonito (Rio de Janeiro, José Olympio, 1964). — Sobre a origem da palavra jagunço ver Jose Calasans, “Os jagunços de Canudos” (In: Caravelle. Toulouse, v. 15, 1970). * P. 76 — Sobre os canhões tomados pelos conselheiristas ver Dantas Barreto, Última expedição a Canudos, op.cit.

* P.77 — Sobre os mortos deixados em Angi co ver Alvim Martins Horcadas, Descrição de uma viagem a Canudos (Bahia, Lito-Tip. Tourinho , 1899, republ. Salvador, UFBA, 1996).

.

P. 78 —e Sobre os - parlament> ares,ET jornalist lo 1]: . as . e milita res jac obi.nos ver Suely Robles Reis- de Queiroz, Os radicais da Republica — Jacobinismo: ideologia e ação, 1893-1897 (São Paulo, o, BrasBras ilieilie ns nse, 1986). Para ? o papel dos monarquistas no período ver Maria de Lour-

sacana

O Império DO BELO MONTE — VIDA E MORTE DE CANUDOS

da República (São Paulo, Brasiliense, 1986); e Pedro subversivos Os Janotti, aco des Mor lógico HisMonQ iz de Aragão , “Canudos e os monarquistas” (Revista do Instituto Arqueo 1944). IX, XXX v. fe, Reci , ano buc nam Per o fic grá Geo € tórico

Celso Castro, Os militares e a ver ica úbl Rep da pe gol no o eir Rib n Solo de l pape o e — Sobr , 1995). República (Rio de Janeiro, Zahar « P 80 — Sobre as medalhas com a efígie de Floriano Peixoto ver, entre outros, a obra do

«leres Benedito T. Cordeiro, em que ele conta como comprou no Rio e levou para Canudos uma grande quantidade dessas medalhas ("Canudos — Limiar do inferno”, Revista

do Clube Militar, Rio de Janeiro, Nos. 147 e 148, 1957 e 1958). +» P 81 — Sobre a influência baiana na esferal federal ver Marco Antonio Villa, Canudos — O povo da terra (São Paulo, Editora Ática, 1999, 3º ed.). * P 82 — Sobre o epiteto do barão de Jeremoabo ver Canudos — Cartas ao barão, op. cit. (Carta

de Ubaldo Soares da Silva - 13 de fevereiro de 1897). — Para a 4º Expedição, ver Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo general-de-divisão João Tomás Cantuária, Ministro de Estado dos Negócios da Guerra

(Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1898). Para a 1º Coluna, ver as reportagens dos

enviados especiais em Walnice Nogueira Galvão, No calor da hora, op. cit., bem como

coronel Dantas Barreto, Última expedição a Canudos (Porto Alegre, Franco & Irmão, 1898).

Para a 2º Coluna, ver do membro da estado-maior do general Savaget, major Antonio

Constantino Nery, 4 4º Expedição contra Canudos, op. cit.; e do tenente Henrique Duque

Estrada de Macedo Soares, A Guerra de Canudos (Rio de Janeiro, Tip. Altina, 1902). Para a fase inicial da 1º Coluna, e do raro ponto de vista de um soldado de baixa patente, ver o diario de campanha do alferes BeneditoT. Cordeiro, “Canudos — Limiar do inferno”, op.

cit. Para a fase final das operações, após a junção das duas colunas, ver Euclides da Cunha, Diário de uma expedição, op. cit. Para uma análise técnica posterior ver general Tristão de

Alencar Araripe, Expedições militares contra Canudos (Seu aspecto marcial) (Rio de Janeiro, Imprensa do exército, 1960).

* P 83 — As informações sobre o efetivo de tropas oficiais na Guerra de Canudos e sobre o número de soldados no combate final estão em Alvim Martins Horcades, op. cit. Em relação ao efetivo total do exército ver José Augusto Vaz Sampaio Neto et alii, Canudos — Subsídios para a sua reavaliação histórica, op. cit.

— Sobre os reforços do marechal Machado Bittencourt ver Euclides da Cunha, Diário de uma expedição, op. cit.

* P 85 — Sobre o conceito de “ponto de concentração” ver BeneditoT. Cordeiro, op. cit.; e A. Constantino Nery, op. cit. — Sobre os canhões da 2º Coluna ver BeneditoT. Cordeiro, op. cit. * P. 86/87 — As informações sobre as boiadas reunidas em Queimadas e as carroças e carretas que transportavam munição estão em Henrique Duque Estrada de Macedo Soares, op. cit.

“II9º

HISTORIA

DO

POVO

BRASILEIRO E.

* P. 87 — Sobre a fome, ou a “brisa”, ver reportagem de Manuel Benício na obra de Walnice Nogueira Galvão, No calor da hora, op. cit., p. 237-325. Ver também Dantas Barreto, op. cit.

— À citação de Euclides da Cunha está em Os sertõe s (Edição Critica de Walnice Nogueira

Galvão, São Paulo, Ática, 2º ed., p. 413).

— Sobre a ida do ministro da Guerra para para a frente de guerra ver Benedito T Cordeiro, op. cit.,p. 137.

* P 88 — Além do romance de Manuel Benicio, outro romance precoce é o de Olívio de

Barros (pseudônimo de Afonso Arinos de Melo Franco), Os jagunços (São Paulo, O Comércio de São Paulo, 1898), publicado em folhetins do jornal a partir de outubro de

1897; o autor não figura entre os que foram a Canudos; ver a proposito Walnice Nogueira Galvão, “De sertões e jagunços” (In: Saco de gatos, São Paulo, Duas Cidades, 1976).

* P 89/90 — Sobre a “caçada humana” e os 600 fer idos que haviam em Monte Santo ver Alvim Martins Horcades, op. cit. Ver também a reportagem de Manuel Benício, Op. cit, * P. 91 —A citação de Euclides da Cunha está em Diório de uma expedição, op. cit., p. 181.

* P 93 - A obra mencionada de Alvim Ma rtins Horcades é citada anteriormente nestas notas.

*P 94 - A obra mencionada de Wolsey é Libelo republicano acompanhado de comentári o sobre a campanha de Canudos (Bahia, Tip. Diário da Bahia, 1899).

- À informação sobre os correspondentes de jornais está em Walnice Nogueira Galvão, No calor da hora, op. cit., p. 97.

*P 95 — O livro de Lélis Piedade mencio nado é Histórico e relatório do Comitê Pat riótico da Bahia (Bahia, Reis & Cia., 1901). — Sobre os canudenses sobreviventes ver “Os sobrevivos de Canudos”, Relatório do Comité Patriótico (In: Walnice Nogueira Galvão , No calor da hora, op. cit.). — O frei Pedro Sinzig escreveu sobr e esta missão em seu livro Reminisc ências d'um Jrade (Petrópolis, Vozes, 1925, 2 ed.).

* P 96 — À citação de Benedito T. Cordei ro est! em sua ja citada obra.

— À citação de Rui Barbosa está em Wa lnice Nogueira Galvão, No calor da ho ra, Op. cit., p. 27. À segunda citação (“meus clientes”) está em Olimpio de Sousa Andrade, Hi stória e interpretação de “Os sertões” (São Paul o, Edart, 1966, 3º ed.). *P97- Os elogios e as novas posturas em relação aos canudenses estão no Re latório apresentado ao Presidente da República do Brasil pelo general de divisão João Tomaz Cant uária..., op. cit.; e em Aristides Milton, “A ca mpanha de Canudos” (Revista do In stituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeir o, Imprensa Nacional, Tomo LXII I, Parte II, 2º ed. Trim. 1902). — Sobre a não condecoração de Ar tur Oscar ver Carlos Eugênio Andr ade Guimarães, Arthur Oscar — Soldado do Império e da Re pública (Rio de Janeiro, Biblioteca do Exercito, 1965). * E2o

O IMPÉRIO DO BeLo MONTE

ga

— VIDA E MORTE DE CANUDOS

tides is Ar tá es a ri uá nt Ca de er ec ar P rio ao 8) comenta livro no do luí inc foi a” déi Ven a oss “A n «p98-O texto expedição, O] j. IE. rra e u a s G e na c o n ã a ç r u F l o v e R da as c r — Sobre as ma (In: Gatos sa” nce Fra ção olu Rev a e s e d i l Pie

Milton, op. cit.

de Euclides da Cunha, Diário de uma

de Canudos ver Walnice Nogueira de outro saco, São Paulo, Brasiliense,

Galvão, “Euc É 1981). op. cit., p. 97. , ra ho da r lo ca No , ão lv Ga ra ei gu No e A referência a Rui Barbosa vem de Walnic

dernimo te eli s, de li uc “E , ão lv Ga ra ei gu No e ic ln Wa cobre a idéia de “cidadão armado” ver 84).

ca, 19 Áti lo, Pau São a, nh Cu da es lid Euc : (In o” nt me zadora e enquadra é Pcs , a h denpresi ao o entad apres ório Relat o é do iona menc ra Guer da - P 99— O relatório do ministro ria..., Brasil pelo general-de-divisão João Tomaz Cantuá te da República dos Estados Unidos do op.cit.

Desenvolvimentos

nguenta anos depois - P 101 — Sobre a inumação dos corpos ver Odorico Tavares, Canudos. Ci Fundação (1947) (Bahia, Conselho Estadual de Cultura/ Academia de Letras da Bahia/ Cultural do Estado, 1993). é P 102 — A informação sobre as viagens de Jose Calasans esta em Calasans, um depoimento para a história, op. cit. * P 103 — Sobre a idéia da loucura coletiva que se apoderara do Conselheiro e de seus adeptos ver Nina Rodrigues, “A loucura epidêmica de Canudos — Antonio Conselheiro e os jagunços” (Revista Brasileira, Rio de Janeiro, 1897). * P. 104 — A idéia de que Canudos era uma “desesperada tentativa no sentido de uma nova organização social” é de Antonio Candido em “Euclides da Cunha sociólogo” (In: Remate de Males, Antonio Candido — Número Especial, Campinas,

Unicamp,

1999. (Republicação

de O Estado de S. Paulo, 13 dez. 1952). — Sobre as novas fontes que passaram a ser pesquisadas ver Índice remissivo — Documentação histórica sobre Canudos (Bahia, Centro de Estudos Euclides da Cunha, Uneb, 1996).

— Sobre o Parque Estadual de Canudos ver Edivaldo M. Boaventura, “Parque Estadual de

Canudos: criação e evolução” (Revista Canudos, Ano 1, nº 1, Centro de Estudos Euclides da Cunha, Uneb, dez. 1996). * P 105 — As análises da teologia do Conselheiro estão em José Luiz Fiorin, À ilusão da liberdade discursiva — Uma análise das prédicas de Antonio Conselheiro (Dissertação de Mestrado [polic.), USP, 1980); em “O discurso de Antonio Conselheiro” (Religião e sociedade, n' 4 S, jun. 1980); em F. Benjamim de Souza Netto, “Antonio Conselheiro e Canudos: re

nha bibliográfica” (Simpósio, Associação dos Seminários Teológicos Evangélicos, São Paulo, nº 13, agosto de 1975); em Duglas Teixeira Monteiro, “Um confronto entre Canudos, Juazeiro e Contestado”, op. cit.

vos

HISTÓRIA

DO

POVO

BRASILEIRO

206

== 0) cotejo entre a Aissão abreviada e os sermões do Conselheiro foi feito por José Calasans em O ciclo folclórico do Bom Jesus Conselheiro, op. cit., e por Jose Luiz Fiorin nos dois trabalhos citados.

* P. 107 — Sobre o sebastianismo e a decadência de Portugal ver Oliveira Martins, História de Portugal (Lisboa, Guimarães, 199], 20” ed. [1º ed. — 18797); João Lúci o de Azevedo, A evolução do sebastianismo (Lisboa, Livraria Clássica, 1947); Anto nio Sergio, “Por uma in-

terpretação não-romântica do sebastianismo” (In: Ensaios, Tomo 1, Coimbra, Atlântida, 1949, 2º ed.); Eduardo Lourenço, Mitologia da saudade (São Paulo, Companhia das Letras, 1999); Jacqueline Hermann, No reino do Descjado — Contribuição ao estudo do sebastianismo português (São Paulo, Companhia das Letras, 1998). — Sobre o episódio de Pedra Bonita ver Maria Isaura Pereira de Queiroz, O messianismo no Brasil e no mundo, op. cit.

— Sobre a Contestado ver Duglas Teixeira Monteiro, Os errantes do novo século, op. cit.

* P 108 — Sobre os versos populares sebastianistas ver José Calasans, O ciclo folclórico do Bom Jesus Conselheiro, op. cit.; “ABC de Canudos” (Salvador, Cadernos Ant onio Vianna, Comissão Baiana de Folclore, 1969);“A Guerra de Canudos na poesia popular” (Salvador, Cen-

tro de Estudos Baianos, UFBA, Reedições | — nº 14, 1989). — Sobre a idéia de “interim” atemporal ver Duglas Teixeira Montei ro, “Um confronto entre Canudos, Juazeiro e Contestado”, op. cit.

—À referência ao Anticristo e ao fim do mundo na Missão abreviada está nos trabalhos de José Calasans citados na nota anterior. * P 109 — À citação do Conselheiro “Levanta-te, que Deus é out ra pessoa” está em José Calasans, “Canudos não euclidiano”, op. cit. — Sobre as renominações do Conselheiro ver Jose Calasans, O ciclo folclórico de Bom Jesus Conselheiro,

op. cit.

— Sobre os festejos de Santo Antônio ver Elldon Canari o, “Festejos de Santo Antonio, o padroeiro de Canudos” (Revista Canudos, Centro de Estudos Euc lydes da Cunha, Uneb, Ano 1, nº 1, dez. 1996); Equipe Pastoral de Canudos, “Fe stejos de Santo Antonio em Canudos”, ibid.

— Sobre a pregação do juizo final e do fim do mundo pel o Conselheiro ver José Calasans, “Aparecimento e prisão de um messias”, op. cit. *P 110 - Sobre os interrogatórios de Agostinh o e de Maria Leandra ver Euclides da Cunha,

Diário de uma expedição, op. cit. e Benedito T. Cor deiro, op. cit. *P. 111 —A citação de que o Conselheiro estava “f azendo da religião instrumento de governo” est a em Constantino Nery, op. cit. F

a

.



— À citação do psiquiatra que diagnosticou o Conselheiro está em Nina Rodrigues, op. cit. — À citação de Euclides da Cunha está em Os sertões, Op. cit., p. 486.

“EZ2o

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Imprensa . Revista s o ç n u g a j o r os i e e h l e s n o o C i s — Anton o d u n a . C a a n c de i i N m ê d i , p S a e E r u U c G u I o A l RODR neiro, | 897. Ja e d o i R , a r i e l i s a r B a

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2º ed., 1925. es, Voz s, oli róp Pet de. fra m d"u as nci scê ini Rem ro. SinziG, Ped

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anhia mp Co o, ul Pa o o. Sã ri pé Im do no to ou s no ai ci s so s ta souro Maior, Armando. Quebra-quilo — Lu Editora Nacional /MEC, 1978. bibliográfica. Simpósio, nha rese dos: Canu e iro elhe Cons nio Anto de. im jam Ben E. O, NETT a Souz . Associação dos Seminários Teológicos Evangélicos, São Paulo, nº 13, agosto de 1975 dual de Cultura/ Tavares, Odorico. Canudos. Cinquenta anos depois (1947). Bahia, Conselho Esta

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Credito das Imagens Todas as imagens são do acervo da Cia. da Memória. P 15 — Euclides da Cunha, Os Sertões. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. R 22 — Museu

Histórico

Nacional. P 32 — Flávio de Barros/ Muscu Histórico Nacional, B 38— Flávio de Barros/ Museu Histórico Nacional. P. 44 — Caderneta de Campo de Euclides da Cunha/Instituto Histórico c Geográfico Brasileiro. R 45 — Flávio de s Histórico Nacional. PR 51 — Flávio de Barros/Muscu Histórico Nacional, R 58 — Revista Ilustrada, / Museu Barro jan. 1897. P.73 — Flávio de Barros/Muscu Histórico Nacional. P. 76— Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. P 83 — Flávio de Barros/Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. R 90 — Flávio de Barros/Museu Histórico Nacional. P 93 — Flávio de Barros/ Museu Histórico Nacional, R 94 — Flávio de Barros/Muscu Histórico Nacional,

P 102 — Elávio de Barros/Muscu Histórico Nacional. BR 105 — Flávio de Barros/Muscu Histórico Nacional.

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Próximos lançamentos Movimento operário nos anos /0

A legislação trabalhista e os trabalhadores no Brasil

Lais Abramo

John French À luta pela saúde no Brasil A classe operária

na República Velha

Amélia Cohn

Cláudio Batalha Abolição e abolicionismo Maria Joscli Nunes Mendonça

Imigrantes e imigração na história do Brasil Michacl Hall O comunismo no Brasil:

Movimentos sociais e políticos pos- Republica

À tra jetoria dos partidos comunistas

Leonardo Caldas Percira c Alvaro Percira

Marco Aurclio Garcia

O Império do Belo Monte: Vida e morte de Canudos foi impresso na cidade de São Paulo em maio de 2001 pela Donnelley-Cochrane para a Editora

Fundação Perseu foi composto em foram fornecidos «é Supremo 250g; ]

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Abramo. À tiragem foi de 3.000 exemplares. O texto Perpétua no corpo 12,5/15. Os fotolitos c os laser/ilms pela Graphbox. A capa foi impressa em papel Cartão o miolo foi impresso em papel Pólen Soft 80g.

Valnice Nogueira Galvão é professora titular de Teoria Literária e Literatura Comparada na Universidade de São Paulo. ATE

lista de nascimento, estudou Letras e Ciéncias Sociais na mesma

universidade. Aluna

de Antonio Candido, foi convidada para ser

sua assistente, posição que ocuparia por toda a sua vida profissional. É membro do conselho de redação da revista Teoria e De-

bate e trabalha com assiduidade em jornais e revistas. É autora de diversos livros, espe-

cialmente em áreas relativas a Guimarães Rosa e Euclides da Cunha, ou então de critica da literatura e da cultura.

Sobre Guimarães Rosa: As formas do falso (1972), Mitológica rostana ( 1978), Ensayos so1980), edição

bre Guimarães Rosa (México,

crítica de Grande sertão: veredas (Paris, no

prelo), Guimarães Rosa (2000). Sobre Euclides da Cunha e à Og Canudos:

de

No calor da hora (1974), Euclides

da Cunha (org., 1980), edição latino-americana de Los sertones (Caracas, 1981

ti

ção crítica de Os sertões (1985), Correspondência de Euclides da Cunha (1997), edição de Diário de uma expedição (2000). Sobre crítica da literatura e da cultura: Saco

de

Lee

(1976),

Gatos

de outro

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(1981), Le roman brésilien — une httérature an-

thropophage au XXe. Siécle (Paris, 1995), Os melhores

contos

de

(0rg.,1995), Desconversa guerreira

Clarice

Lispector

(1998), 4 donzela-

(1998), Le carnaval de Rio

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Nádia Battella Gotlib, 2000).

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