Organizadores - Organizers: José Mariano Gago (Presidente do Instituto de Prospectiva, Lisboa; Professor do Instituto S
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Portuguese Pages [196] Year 1994
Table of contents :
Índice Geral
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0 FUTURO DA CULTURA CIENTÍFICA THE FUTURE OF SCIENTIFIC CULTURE
José Mariano Gago
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retraduzirão nas noções comuns, o que nos fará descobrir capacidades surpreendentes". As metodologias científicas são postas ao serviço do senso comum. Falta-nos é perceber porque tal derrapage m se faz porque parece ela ser uma tentação constante. No mesmo arUgo, Pierre Livet evoca as teses do célebre colóquio de Córdova de 1979 (Science et conscience, Stock) . Elas abrem caminho à psicokinése: e a psicokinése é um excelente revelador desse fundo arcaico de credu l idad e . O arcaico não é um outrora deixado defin itivamente para trás. Como diz um livro recente de Bruno Latour, "nu nca fomos modernos" . 3.
Tal fundo que é o da magia e do maná anima ainda, e do mesmo modo como opera na magia, certas interpretações da mecân ica quântica e em particular o chamado paradoxo EPR (Einstein, Podolsky, Rosen). O maná dos Melanésios e outras figuras equ ivalentes apresentam-se como uma força difusa no mundo, ou condensada em sacerdotes e chefes. O maná é uma eficácia material , psíquica e vital, ligando invisivelmente tudo, por efeito da simpatia universal que é o fundamento da magia. Duas reg ras caracterizam o maná: tudo é possível é a mesma expressão que Umberto Eco emprega para descrever as teorias contemporâneas do paranormal (La guerre du faux, 1 985) e tudo está em tudo. As duas regras estão ligadas. A capacidade de infl uir passa ao acto porque não há distinção entre o local e o global. As coisas co-pertencem-se nu ma só unidade e podem por isso interagir à distância. A ciência assenta no procedimento inverso: ela distingue-se da magia na medida em que se obriga a um "constrangimento de localidade", como escreve René Thom. A explicação científica é local. Entre outras coisas, isto significa que ela recusa a acção à distância. -
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Precisamente , uma mente dotada de uma força actuante sobre as outras mentes ou sobre a matéria, e o que define a psicoki nése: por exemplo torcer uma colher com o ol har. A psicokinése ignora o constrangi mento de localidade e os obstácu los às faculdades do espírito . Mas, se a mente é capaz de influenciar outras mentes (embora isso, se bem reparamos, seja em si já bastante enigmático) , como poderá agir sobre as coisas? O maná é uma resposta a esta pergu nta. E é este apetite de comunhão generalizada e de poder sobre a matéria que certas leituras da física quântica vem caucionar. Vejamos como.
5.
Os dois pri ncípios que para esse efeito será necessário estabelecer são, justamente , primeiro a possibilidade da acção à distância e a negação do constrangimento de localidade. Como na magia, só dentro do "todo" poderá a consciência comunicar com a matéria: esta comu nicação é o segundo princípio. Ambos encontram uma perfeita expressão na "ordem impliêada" segu ndo David Boh m . (Outras h ipóteses há que vão na mesma direcção) . Uma experiência muito simples - uma pequena gota de tinta que em certas condições experi mentais se torna filiforme e invisível , para depois se reconstituir quando o dispositivo experimental
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funciona em sentido inverso - ilustrará a tese geral de que "cada partícula pertence a um certo conjunto e, neste conjunto, acha-se ligada aos outros elementos pela força de u ma necessidade geral inerente à situação global que os encaminha para a finalidade comum, a saber a reconstituição da gota. Em li nguagem corrente é permitido dizer que todas estas partículas estão conju ntamente implicadas nessa finalidade comum" (p. 1 01 : sublinhei quase tudo ! ) . Um pequeno esforço suplementar far-nos-á passar ao esp írito. A goti n ha de tinta inscreve-se num equ ílibrio cósmico pilotado pela consciência: "A consciência é um factor activo no seio do conjunto da realidade. u nida a matéria em geral por uma necessidade mais profunda, cuja força suscita uma serie de finalidades as quais ambas colaboraram inseparavelmente" (p. 1 1 O). Esta consciência cósmica não conhece travões, ela desdobrar-se-á, até , num corpo astral, como afirmou no mesmo colóqu io Brian Josephson, prémio Nobel de serviço (nestas ocasiões um prémio Nobel é indispensável no g rupo de referência) . O corpo astral "estende-se através do tempo e do espaço" , ele explicaria "fenómenos que relevam de uma metapsicologia sem engendrar a menor contradição". 6.
Os biólogos presentes recordar-se-ão de que o etologista Remy Chauvin " refuta" o darwinismo - para ele a evolução não vai até ao corpo astral - a partir de postulados análogos: uma "orientação programada" da evolução, conforme com " u ma di recção geral que se assemelha a uma vontade difusa em todos os seres animais e vegetais". Chauvin pensa também que "a maneira como o nosso cérebro age sobre o nosso corpo é provavelmente , no fim de contas , a mesma maneira como a vontade evolutiva age sobre a matéria animada" . Pelo seu lado, Richard Mattuck, na sua contribuição ao mesmo colóquio chama-se ela, modestamente, " U ma teoria quântica da interacção entre a consciência e a matéria" - , põe o "postulado de q u e a consciência é não-local, ou seja, e l a pode alargar-se para lá dos limites espaciais do cérebro" (ibid . , p. 80) . Este postulado é prolongado por u m outro: "graças a um esforço da vontade, a consciência pode funcionar activamente" nas operações de medida (ibid . , p. 86) . .
7.
Chegamos ao paradoxo E P R ( 1 935) que é uma experiência i magi nária destinada a evidenciar a incompletude da teoria quântica. (O P rof. José Mariano Gago que me corrija alguma eventual imprecisão). Segundo a teoria quântica, duas partículas em interacção e q ue depois se separam são descritas por uma função de onda global . Sendo assim, quando se mede a posição (ou a velocidade) de u ma das partículas, obter-se-á automaticamente a medida .da posição (ou da velocidade) da outra sem que ela tenha sido directamente submetida a qualquer operação de medida. Nisto consiste o paradoxo, que Ei nstein julgava intolerável. Para o nosso propósito, basta acrescentar que duas séries de
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experiências conduzidas entre 1 965 e 1 982 - passou-se da experiência imaginária à experimentação - confi rmaram a não separabilidade./\.das partícu las. U ma fu nção de onda ún ica descreve os dois sistemas quânticos que interagi ram; quando um é medido, o resu ltado obtido no aparelho de medida fixa instantaneamente o resultado que será encontrado no segundo aparelho.
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Aqui se enxertam as interpretações que vão desembocar na psicokinése . Elas afirmam que a não separabi lidade das partícu las sign i'fica necessariamente que· há . uma transmissão de informação entre as partículas. A medida da posição ou da velocidade de u ma partícula transmite-se a outra por uma acção à distância. De acordo com Olivier Costa de Beauregard , sempre no mesmo colóq uio, a não separabilidade assegura a possibilidade de "telegrafar indirectamente para u m além", tal como pretende a psicokinése e a precognição, que se tornariam portanto "viáveis" . O telegrama acaba no inevitável apelo à sabedoria oriental: " lê se no Veda que a separabilidade é uma ilusão decorrente da nossa abordagem pragmática" dos problemas (Se. et Consc. , pp. 69-70). Simplesmente, essas experiências, em particular uma delas feita com fotões ou seja operando com a velocidade da luz, vieram também estabelecer que os fotões não podem comunicar entre si, a não ser que a informqção transmitida circulasse a uma velocidade superior à da luz e fosse veiculada por ·um suporte físico completamente · descon hecido. A correlação das partículas permanece por explicar - mas supor u m trânsito d e informação entre a s partículas é altamente improvável . Parece temerário admitir velocidades superiores à da l uz e postular o sinal físico que transmiti ria a informação. ·
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Para terminar, q uero marcar duas coisas. � acção à distância pode ser "domesticada" pelo pen�amento científico. E o que fez Newton e é o que almejam outras hipóteses que não desistem de procu rar maneira de fazer "comunicar" as partículas, sem q ualquer atracção pela psicokinése e por uma mística de pacotilha! Em segu ndo l ugar, a exigência de explicações não locais e anal íticas pode ser leg ítima: porém, para não delirar - e delirar quer sobretudo dizer privarmo-nos dos procedimentos conduzindo a uma investigação real -, o conhecimento tem de se contentar com , digamos assim, metáforas desse todo. Por exemplo, o pensamento da forma é um pensamento local de algo que por natu reza é global. A história do paradoxo E P R faz ver como as derrapagens se produzem. O salto torna-se mortal q uando uma correlação inexplicada é explicada por uma hipótese quase mágica: outra coisa não parece ser uma "transmissão sem suporte de informação". Mas a mesma história mostra ao mesmo tempo que as derrapagens· podem fazer-se, não contra a i nteligibilidade científica enquanto tal , mas em nome de princípios explicativos que se acham também no cerne desta inteligibi lidade. '
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APÊNDICE ANNEX
CONFERÊNCIA - CONFERENCE O Futuro da C u ltu ra Científica The Future of Scientific Cu ltu re Edifício-sede da Caixa Geral de Depósitos (ao Campo Pequeno) - entrada pela rua do Arco do Cego - entrance by rua do Arco do Cego Lisboa, 22-23 Novembro Lisbon, 22-23 November
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PROGRAMA - PROGRAMME 2ª feira, 22 de Novembro monday, November 22 09.30h - 1 0.00 Chegada dos participantes - Arrival of the participants 1O.OOh - 10.40h Sessão de abertura - Opening session José Mariano Gago (Organizing Committee) Antonio Ru berti (European Commissaire in charge of Education and Science) Mário Soares (President of the Portuguese Republic)
1 1 .00h - 1 3.00h
O Futuro da Compreensão das Ciências pelo Público The Future of the Public Understanding of Science John Ziman . (Professor Emeritus, University of Bristol, UK) John Durant (Assistant Director of the Science Museum; Visiting Professor in History a:1d Public Understanding of Science, Imperial College, UK) Jon Miller . (Vice President of the Chicago Academy of Sciences and Director of its lnternational Center for the Advancement of Scientific Literacy, USA) Comentadores - Commentators: Paul Caro (CSI, Paris) Correia Jesuíno (ISCTE, Lisboa) José Mariano Gago (IP, Lisboa)
15.00h - 1 8.00h Novas Perspectivas para o Ensino das Ciências New Trends in Science Education Joan Salomon (University of Oxford, UK) Raul Gagliardi (Bureau International d'Education - UNESCO; Laboratoire de Didactique et d'Épistémologie des Sciences - Université de Geneve, Switzerland) Martine Méheut (LIREST - Cachan, France) Gil-Perez (Department de Didactica de las Ciencias, Universidad de Valencia, Spain) Comentadores - Commentators: António Cachapuz (Universidade de Aveiro) Ana Maria Morais (Universidade de Lisboa) Cuiça Sequeira (Universidade do Minho) Odete Valente (Universidade de Lisboa)
3§ feira, 23 de Novembro Tuesday, November 23
1O.OOh - 13.00h Significado e Problemas da Divulgação Científica Meaning and Problems of Popularizing Science Anne-Marie Laurian (CNRS, Paris) Roger Lesgards (Former Director of CSI - La Villette; College de Philosophie, Paris) Michel C rozon (Directeur à l'Information Scientifique du CNRS, Paris) Paul Caro (Délégué aux Affaires Scientifiques, CSI - La Villette, Paris)
1 5.00h 18 .OOh Práticas Correntes e Novos Meios de Comunicação das Ciências Current Practice and New Trends of Communicating Science to the Public -
Luigi Campanella (President of MUSIS, ltaly) Siegfried Hermann (Direktor, Osterreiches Institut für den Wissenschsften Film, Wien, Austria) Jean-Marcel Schorderet (Radio-Télévision Suisse Romande, Geneve, Suisse) Peter Anderson (Technologie Museum NINT, Amsterdam) Rui Trindade
(Instituto de Prospectiva, Lisboa; Jornal Expresso, Lisboa) José Vitor Malheiros (Editor Secção Ciência, Jornal Público, Lisboa)
Moderador - Chainnan:
José Sasportes (Directo( do Serviço ACARTE, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa)
21.30h - 24.00h Ciência e Anti-Ciência: O Futuro da Ignorância, da Superstição e do Cepticismo Science and Anti-Science: The Future of lgnorance, Superstition and Scepticism James Randi (USA) Henri Broch (Université de Nice, France)
Introdução - Introduction:
Fernando Gil (Ecole de Hautes Études en Sciences Sociales, Paris; Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Univ. de Lisboa);
Comentador - Commentator:
Joaquim Pais de Brito (Director do Museu de Etnologia, Lisboa)