Novas Tecnologias: critica da atual reestruturação produtiva 8585833017

194 86 2MB

Portuguese Pages 167 [154] Year 1995

Report DMCA / Copyright

DOWNLOAD FILE

Polecaj historie

Novas Tecnologias: critica da atual reestruturação produtiva
 8585833017

Table of contents :
ÍNDICE
Nota dos editores, 7

Claudio Katz
Evolução e Crise do Processo de Trabalho, 9
Origem e Função do Controle Patronal, 11
Inviabilidade e Crise, 23
Pós-Taylorismo, 31

Ruy Braga
luta de Classes, Reestruturação Produtiva e Hegemonia, 45
A Crise Contemporânea como Crise Orgânica do Capitalismo Tardio, 53
O Fordismo e sua Crise: Elementos Históricos e Vertentes do
Debate Atual, 83
Forças Produtivas, Hegemonia e Imperialismo, 107
Considerações Finais, 129
Bibliografia, 133

Osvaldo Coggiola
Marxismo e Classes Sociais na Atualidade, 137
A Classe Operária Hoje, 147
A "Civilização do Tempo Livre", 157

Citation preview

1

'

~

CRlflCA DA ArLIAl RHSfRUIURAÇAO PRODUllVA

1

Uma organização social nunca desaparece antes que se desenvolvam todas as forças produtivas que ela é capaz de conter: nunca relações de produção novas e superiores se lhes substituem antes que as condições materiais de existência destas relações se produzam no próprio seio da velha sociedade. Épor isso que a humanidade s6 levanta os problemas que é capaz de resolver e assin, mana

~ atenta, descobrir-se-á que o próprio problema só ugiu quando as condções materiais para o resolver lá existiam ou estavam, pelo menos, em vias ele aparecer.

K.Mcrx ·,

Outros fflulos ecltados:

VITRAL DO TEMPO Vinicius Caldevlla

·. :~ •

·

POESIAS 1968-1969 Wolney de Allil

FILTROS, MEZINHAS ETRIACAS As drogas no mla\do moderno Henrique carneiro MARXISMO HOJE James Petras, Jacob Gorender, Michael lowy, Clauclo Katz, Osvaldo Cogglola (org.)

NOVAS TECNOLOGIAS CRÍTICA DA ATUAL REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

CRÍllCA DA ATUAl RH~lRUJURAÇÃO PRODUllVA

Claudio ~atz

~uy ~1aga OsvalCo Coggiola ~)\,:,,.-. '·/·.,).c,tf:-':.-.'fr·'!fi,. ::-..f'i_ 'u;,u::id~.;i

Lt-_:·

1

Ú,.'-1{.;;~J:,,::•:,j;iào, o conceíto de revolução passiva é um instrumento conceituai e estratégico forjado por Gramsci para a análise do Risorgimento italiano (processo de constituição do Estado burguês na Itália que culminou com a unidade nacional ). Ou, nas palavras de Brum Torres, "Gramsci introduz o conceito de revolução passiva

como um recurso''(eórico destinado a esclarecer ao mesmo tempo as peculiaridades do processo de resolução da questão nacional na Itália e as condições peculiares do desenvolvimento capitalista que ali teve lugar" (1980, p. 210). É certo, contudo, que o conceito é posteriormente estendido e generalizado na medida em que Gramsci o aplica nas análises do fascismo e do fordismo. Sua extensão o torna um princípio de elucidação de todas as ações reativas e auto-acomodativas do capitalismo tardio caracterizado, por assim dizer, por um estado de crise e transformação permanente (idem, p. 211). Serve, pois, à interpre58

tação da passagem do capitalismo italiano e americano para sua fase monopolista, tomando o fascismo e o fordismo como formas da revolução passiva 12 • O processo de revolução passiva implicaria sempre na presença de dois momentos, o da conservação, que constitui uma reação à efetiva possibilidade de uma radical mudança "de baixo para cima", e o da inovação, à medida que demandas populares são assimiladas e postas em prática pelas velhas camadas dominantes. O aspecto restaurador não anula o fato de que também ocorram modificações efetivas 13 • Em síntese, teríamos a revolução passiva como a via antijacobina de transição ao capitalismo (caso do Risorgimento) e também dentro do capitalismo (fascismo e fordismo ou a passagem de um regime de acumulação concorrencial para um monopolista). No caso da transição no interior do capitalismo, os conceitos de revolução passiva e de hegemonia se articulariam 14 • A preocupação principal de Gramsci em relação ao Risorgimento é elucidar o sentido social e histórico da ação e das relações

recíprocas dos dois principais partidos envolvidos no processo de unificação do Estado nacional italiano, os Moderados e o chamado Partido da Ação. O projeto moderado tinha como base histórica as iniciativas "progressistas" de Cavour no reino de Sardenha e Piemonte após 1852, principalmente no que tange à instalação de um governo parlamentar, à reorganização do exército, à abolição dos privilégios eclesiásticos e à prática de uma política econômica ao mesmo tempo liberal e preocupada com o provimento da infra-estrutura necessária ao desenvolvimento econômico. · Nesse sentjdo, os objetivos dos Moderados centravam-se em ampliar os limites políticos e econômicos da ação modernizadora capitalista e, assim, garantir a posição privilegiada das regiões mais desenvolvidas qo Norte. Na análise de Gramsci para o caso do

Risorgimento: "O traço mais.fundamental de todo o processo reside no.fato de que obtém-se a unificação, resolve-se a questão nacional, sem atacar o que era o problema social mais importante da Itália de então, o problema do atraso histórico do campo italiano, especialmente no Mezzogiorno e nas ilhas" (Torres, ibidem, p. 126). 59

Gramsci esforça-se, pois, em responder porque não houve na Itália um processo de tipo jacobino autêntico, como no caso dos vizinhos franceses, para a resolução das questões envolvidas na constituição de uma economia capitalista nacional, bem como na consolidação de um Estado nacional italiano. Buscará a resposta na debilidade das classes dirigentes tradicionais, do mesmo modo que no "pânico" destas ao assistirem aos acontecimentos de 1793 associados ao 1848 francês 15 • O Risorgimento traduz-se no momento inicial do longo e irregular, porém exitoso, processo de consolidação do capitalismo italiano. O Estado "empurra" o desenvolvimento e, assim, "fabrica o fabricante" (Gramsci). Na Itália, a questão principal era, segundo Gramsci, criar as condições gerais para que as forças econômicas pudessem nascer e se desenvolver segundo o modelo histórico dos outros países. Na verdade, em sua exposição do que viria a ser o conceito de revolução passiva associado ao que ele próprio chama dialética "inovação-conservação/revolução-restauração", Gramsci parte de uma proposição presente no Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política (1859) onde Marx dirá que "uma organização

social nunca desaparece antes que se desenvolvam todas as forças produtivas que ela é capaz de conter; nunca relações de produção novas e superio_res se lhés substituem antes que as condições materiais de existência destas relações se produzam ·no próprio seio da velha sociedade. É por isso que a humanidade só levanta os problemas que é capaz de resolver e assim, numa observação atenta, descobrir-se-á que o próprio problema só surgiu quando as condições materiais para o resolver já existiam ou estavam, pelo menos, em vias de aparecer" (1977, p. 25). Gramsci constrói o conceito de revolução passiva a partir destes dois princípios fundamentais da ciência política enunciados acima. Originalmente concebida como uma fórmula crítica por Vicenzo Cuoco (ou seja, enquanto denúncia/advertência do processo contrarevolucionário, esta crítica deveria criar uma "moral nacional" de maior energia e iniciativa revolucionária popular), o conceito de revolução passiva converteu-se em uma concepção afirmativa, um verdadeiro programa político e uma moral restauracionista oposta a 60

·,

qualquer possibilidade de intervenção ativa das grandes massas populares como fator de progresso histórico. A reelaboração afirmativa da concepção revolução-restauração toma-se, pois, a expressão do conservadorismo reformista sustentado tanto pelos políticos moderados italianos quanto pelos historiadores de en~o. Em relação ao conceito de revolução passiva, Gramsci opera, na verdade, um resgate do sentido dado a este por Cuoco ao tratar do primeiro periodo do Risorgimento italiano. O debate com a tradição historiográfica representada por Croce deve ser entendido enquanto um desdobramento teórico cuja base fundamenta-se no terreno da história italiana na virada do século. Neste sentido, Gramsci denuncia Croce por desenvolver o aspecto passivo da Revolução Francesa, na tentativa de criar um movimento ideológico correspondente ao movimento de revolução-restauração expresso pelo reformismo que garantiu a permanência dos velhos regimes europeus até 181 O, como, por exemplo, o liberalismo conservador16• Gramsci recusa, assim, o conceito de revolução passiva como programa, tal como o defendido pelos liberais italianos do Risorgimento, e propõe empregá-lo "como critério de interpretação, ante a ausência de outros elementos ativos dominantes (por conseguinte, luta contra o morfinismo político que exala Croce e seu histori· · cismo)" (PP, p. 13). Desta forma, é possível aproximar a iniciativa ideológico-programática de Croce à natureza do movimento fascista- na Itália contemporânea, segundo a hipótese, confirmada, de que haveria sob o fascismo, "uma revolução passiva no fato de que, por intermédio

e intervenção legislativa do Estado e através da organização corporativa, seriam introduzidas na estrutura econômica do país modificações mais ou menos profundas para acentuar o elemento 'plano de produção' ,isto é, seria acentuada a socialização e cooperação da produção, sem·com isso tocar (ou limitando-se tão somente a regular e controlar) a apropriação individual e grupal do lucro" (Gramsci, CDH, p. 223; grifo do autor). O fascismo seria entendido como termo da "única solução" para desenvolver ·as forças produtivas da indústria sob a direção das 61

classes dirigentes tradicionais, em concorrência com as mais avançadas formações industriais de países que monopolizavam as matérias primas e acumulavam gigantescos capitais. O sentido dado por Gramsci ao movimento fascista na Itália é o de um esforço modernizador 17 segundo uma via brutalmente conservadora: "esta ideologia (o fascismo) serviria como elemento de uma guerra de

posiçlio no campo econômico (a livre concorrência e a livre troca corresponderiam à guerra de movimento) internacional, assim como d revolução passiva é este elemento no campo político" (Gramsci, CDH, p. 224) 18 • Ainda quanto a questão da revolução passiva, Gramsci fundamenta sua crítica à concepção político-historiográfica de Proudhon na mesma ordem de argumentos dirigidos à corrente historiográfica neo-guelfa: a "mutilação" do hegelianismo e da dialética. Ou seja, para Gramsci, Proudhon mutila o hegelianismo e a dialética na medida em que, no processo dialético, a tese (pressuposta mecanicamente) deve ser conservada pela antítese a fim de não destruir o próprio processo, o qual, portanto, é previsto como uma infinita repetição mecânica e arbitrariamente pré-fixada 19 • Vale realçar que a crítica à concepção político-historiográfica de Proudhon feita por Gramsci é da mesma natureza que a contida na Miséria da Filosofia de Marx (1841): para Proudhon, os trabalhadores não deveriam se organizar politicamente, por exemplo, em partidos, já que, imitando as formas de organização das classes dirigentes tradicionais, fatalmente se colocariam à mercê delas .. O inimigo, sendo mais experimentado em táticas políticas, tiranizaria, por meios financeiros ou subornos sociais, os líderes revolucionários, provocando a inoperância do movimento. De qualquer modo, mesmo vitoriosos, os rebeldes dariam (adquirindo e preservando o controle de formas políticas do governo autoritário) novo alento à contradição da qual buscam escapar20 • Os operários e a pequena burguesia devem, portanto, impor por via, principalmente, da pressão puramente econômica, seus projetos sobre o resto da sociedade. Tal processo seria gradual e pacífico21 • Com Proudhon, conservaríamos na síntese aquilo que ainda é vital na tese, superada e desenvolvida pela antítese22 • Em Croce, 62

igualmente, a ideologia reformista tende a enfraquecer a antítese (não mais enquanto negação radical da tese), fragmentando-a em uma longa série de momentos, reduzindo a dialética a um processo evolutivo do tipo "revolução-restauração". Gramsci propõe-se a aplicar ao conceito de revolução passiva, documentando-se no Risorgimento italiano, "o critério interpretativo das modificações

moleculares que, na realidade, modificam progressivamente a composição precedente das forças e, portanto, transformam-se em matriz de novas modificações" (MPE, p. 77). O conjunto das contradições histórico-concretas do capitalismo é, pois, reproduzido segundo modificações moleculares (produto da fragmentação da antítese) que desenvolvem a tese (dominação capitalista) sem superá-la historicamente. Na verdade, da oposição dialética entre tese e antítese s(, a tese desenvolve suas possibilidades de luta, até o ponto de atrair pé'.ra si os chamados representantes da antítese23 • Retomando a origem dos termos "revolução passiva" (Vicenzo Cuoco) e "revolução-restauração" (Edgar Quinet), Gramsci dirá que estas fórmulas exprimem, talvez, o fato histórico da ausência de uma "iniciativa popular unitária" (conseqüentemente, ausência de grandes enfrentamentos de classe) no desenvolvimento ~a história italiana, bem como o fato de que o desenvolvimento verificou-se como "(... ) esporádico, elementar, desorgânico das massas popu-

lares, através de restaurações que acolheram uma parte, qualquer das exigências de baixo" (Gramsci, CDH, p. 250).

Esta dialética "inovação-conservação/revolução-restauração" enunciada acima é entendida por Gramsci fundamentalmente enquanto método· de ação política (estratégia de grande período) das classes dirigentes e cuja expressão teórica pode ser encontrada no historicismo croceano, moderado e reformista, que busca entre outras coisas contrapor, por exemplo, o jacobinismo anti-histórico e irracional à razão das classes dirigentes que atuaram nos processos restauracionistas, notadamente após 1815 e 1848. Empreendendo uma crítica radical a este tipo de historicismo, Gramsci busca definir a própria noção de progresso segundo esta dialética inovação-conservação/revolução-restauração: um processo onde a inovação con63

serva o passado ao modificá-lo e aquilo que será conservado do passado resultará no próprio progresso, sustentando um caráter de "necessidaqe histórica". Mas todo progresso pressupõe uma certa força inovadora que não pode deixar de estar já imanente no passado, "não pode deixar de ser, ela mesma, em certo sentido, um elemento do passado, o que do passado está vivo e em desenvolvimento" (Gramsci, CDH, p. 251). Uma força inovadora cuja assimilação a dada dialética inovação-conservação contém em si o passado digno de desenvolver-se e perpetuar-se infinitamente, visto estar o pólo da antítese fragmentado e racionalizado pela ordem. Assim, ao retomarmos o conceito de revolução passiva em Gramsci enquanto formulação crítica é preciso também esclarecer: a) sua utilidade como interpretação da época do Risorgimento e de "toda época complexa de alterações (crises) históricas" (Gramsci, PP, p. 73; grifo do autor); e b) seu perigo referente ao derrotismo histórico, indiferentismo e fatalismo que o conceito carrega consigo. Faz-se necessário ainda dizer que Gramsci entendia estas "épocas complexas de alterações históricas", isto é, períodos de crise orgânica, como processos com muitas manifestações e onde causas e efeitos se complicam e se superpõem. Processos contraditórios e não, simplesmente, fatos únicos repetindo-se de diversas maneiras por uma causa e origem únicas. As crises referidas por Gramsci tratamse de desenvolvimentos e não de meros eventos.Ou, nas palavras de Gramsci, ''pode-se dizer que a crise como tal não tem um começo,

senão somente algumas manifestações ruidosas que se identificam com a crise, errônea e tendenciosamente" (CDH, p. 114). A crise de 1929, especificamente, enquanto um momento deste processo contraditório, dirá Gramsci, inicia-se com a Primeira Grande Guerra, mas não é esta sua manifestação mais primitiva. Tal crise remete-se às origens internas do modo de produção e não aos fatos político-jurídicos tomados isoladamente24 • No limite, o que temos novamente é uma crítica ao economicismo redu_cionista que 64

confere a tais acontecimentos (períodos de crise orgânica ou de grandes alterações históricas) uma definição única, ou seja, uma causa e uma origem únicas. Neste caso, a simplificação significaria "desnaturalização e falsificação" 25 • Temos, pois, até o momento exposta a oposição de Gramsci ao reformismo conservador crociano, segundo uma denúncia teóricofilosófica de implicações práticas: Croce, assim como Proudhon, mutila o hegelianismo e seu método, a dialética, afirmando um dos pólos da oposição (a tese) e fragmentando-racionalizando-assimilando o outro (a antítese) com o claro objetivo de, na síntese, conservar o que de mais fundamental existe na tese. A contradição entre tese e antítese não é superada mas reproduzida e desenvolvida mecanicamente. Chamamos a atenção principalmente para o fato de que a própria noção de progresso capitalista é entendida por Gramsci nos termos desta "dialética mutilada" (inovação-conservação/revolução-restauração). Neste espírito diríamos, analisando a estrutura produtiva conforme este método de ação política (estratégia de grande período),

"(... ) que o americanismo e o fordismo derivam da necessidade imanente de organizar uma economia programática e que os diversos problemas examinados deveriam ser os elos da cadeia que assinalam exatamente a passagem do velho individualismo econômico para a economia programática. Esses problemas surgem em virtude das diversas formas de resistência que o processo de desenvolvimento encontra na sua marcha, resistência provocada pelas dificuldades inerentes à societas rerum e à societas hominum. Um movimento progressista iniciado por uma determinada força social não deixa de ter conseqüências fundamentais: as forças subalternas, que deveriam ser manipuladas e racionalizadas de acordo com os novos objetivos, resistiriam inevitavelmente. Mas também resistem alguns setores das forças dominantes, ou pelo menos aliados das forças dominantes" (Giamsci, MPE, p. 365-6). E Gramsci propunha: a) ver se o americanismo poderia efetivamente determinar um processo ("desenvolvimento") do tipo revoluções passivas, e 65

b) ver se o "desenvolvimento" deve ter o seu ponto de partida no interior do "mundo da indústria e da produção" ou se poderia se verificar a partir do exterior, "através da construção cautelosa e

maciça de estrutura fonnal que oriente de fora o processo de desenvolvimento necessário do aparelho da produção" (Gramsci, MPE, p. 376). Na verdade, Gramsci se propõe a analisar (ao menos enquanto hipótese de trabalho) um processo de desenvolvimento econômico, produto da necessidade de se organizar uma economia planejada (programática) 26 , segundo a problemática do tipo revolução passiva do século passado. Isto é, ver se na dialética inovação-conservação o papel do enfraquecimento (fragmentação) da antítese classes subalternas poderia caber ao movimento progressista de racionalização econômica, determinado pelos interesses inerentes às classes dirigentes tradicionais. Sobre a questão, cabe ainda realçar dois pontos a nosso ver bastante relevantes. O primeiro diz respeito à natureza do objeto tratado que detém uma imediaticidade econômica, a organização da produção, mas cujas determinações fundamentais não podem nunca estar remetidas somente à esfera econômica tomada autonomamente. E o segundo refere-se a out~a hipótese levantada por Gramsci de que seria o fordismo o ponto extremo (dada a época, claro) do processo de tentativas sucessivas da burguesia para "superar alei tendencial da queda da taxa de lucro" (MPE, p. 376). O movimento da racionalização das forças subalternas serviria, pois, aos desejos de fragmentação e assimilação da antítese, bem como desenvolveria a tese (dominação capitalista) na síntese (o "modo americano de vida"). Novamente vale lembrar que este processo fundamenta-se no movimento progressivo de fragmentação-racionalização/recomposição-assimilação/integração da condição de subalternidade das massas à ordem estabelecida, cujo resultado é passível de ser apreendido pela análise histórica: a emergência da sociedade de massas, do Estado burguês burocratizado de tipo welfare, dos grandes sindicatos atrelados às estruturas de dominação, da postura participativa dos partidos social-democratas ... É possível dizer, em resumo, que os problemas anàlisa66

dos sob o título geral de "Americanismo e Fordismo" por Gramsci, expressos pela ofensiva racionalizadora da ordem capitalista, encontram-se no interior do campo de estudo daquilo que este chamou de revolução passiva. Retomando, teríamos: o conceito de revolução passiva relacionase com o conceito de "guerra-de posição", em oposição aos conceitos "iniciativa popular/guerra manobrada" (e cuja última manifestação histórica teria sido a Revolução Bolchevique de 1917), na medida em que estes conceitos surgiram depois da Revolução Francesa como produto do pânico das classes dirigentes, criado pelo Terror em 1793 e, posteriormente, com os massacres de Paris de 1871. Dentro, pois, dos limites da perspectiva onde o essencial é evitar que as massas populares atravessem um período de experiências políticas similares às da França, principalmente nos anos do jacobinismo. É exatamente nesta "formulação teórica de implicações práticas", onde os elementos da antítese são atraídos pela tese e a síntese não representa uma superação mas sim um desenvolvimento daqueles, que devemos considerar a passagem para a luta política de guerra de movimento para guerra de posição, ocorrida na Europa após 184827 • Passaremos agora a tratar da oposição estabelecida por Gramsci entre aquilo que ele entende por "guerra de posição" e "guerra de movimento". A crítica elaborada por este ao conceito de "revolução permanente" de Trotsky é exemplar neste sentido. Em Trotsky, temos a teoria sobre a "permanência do movimento" tomada como um reflexo político da teoria da guerra de movimento·, ou seja, reflexo das condições gerais sócio-econômico-culturais de um país, a Rússia, onde "os quadros da vida nacional são embrionários e

relaxados e não se podem tornar "trincheira" ou ''fortaleza". Neste caso poder-se•ia dizer que Bronstein (Trotsky), que aparece como um "ocidentalista", era, ao contrário, um cosmopolita, isto é, supe,jicialmente nacional e supe,jicialmente ocidentalista ou europeu" (Gramsci, MPE, p. 74). Ao contrário, Lênin, profundamente "nacional e europeu", parece ter compreendido "que se verificara uma modificação da

guerra manobrada, aplicada vitoriosamente no Oriente em 1917, para a guerra de posição, que era a única possível no Ocidente (onde 67

os quadros sociais eram capazes de se tornarem trincheiras municiadíssimas)" (Gramsci, MPE, p. 74). O que se repõe aqui é a dicotomia entre um Oriente, onde o "Estado era tudo" e a sociedade civil era "primordial e gelatinosa", e um Ocidente, onde existiria uma "justa relação" entre Estado e sociedade28 • Sua crítica avança através da formulação dada ao conceito político de revolução permantente, agora como expressão cientificamente elaborada das experiências jacobinas de 1789 em Termidor, Gramsci considerava ser esta própria de um período histórico onde inexistiam ainda grandes partidos políticos de massa e os grandes sindicatos econômicos de caráter corporativo, ou seja, um período caracterizado pela moderna sociedade burguesa de consumo, produto, em grande medida, do americanismo e fordismo. Contrariamente, a fórmula da revolução permanente seria própria àquele momento no qual a sociedade ainda estava, por assim dizer, no estado de fluidez sob muitos aspectos. Com as mudanças advindas da expansão colonial, onde os elementos da sociedade em estado de fluidez modificam-se a ponto de se tornarem relações complexas e maciças, a fórmuta jacobino-revolucionária da revolução permanente é superada pela da hegemonia civil e a guerra de movimento transforma-s_e cada vez mais em guerra de posição29 • A guerra de posição é imposta pela relação das forças em choque, ou seja, pela situação histórica, produto dos processos de revolução passiva30 , na qual a sociedade civil transformou-se numa estrutura muito complexa e resistente às irrupções catastróficas do elemento econômico imediato (crises, depressões, etc). Este é um ponto central que Gramsci sintetiza na seguinte formulação: "As superes-

truturas da sociedade civil são como d sistema de trincheiras na guerra moderna" (idem, p. 73) 31 • A distinção entre uma estratégia e outra decorre da diferença entre realidades distintas. No Oriente foi possível uma vitória rápida, segundo o padrão de guerra de movimento. No Ocidente, devido à "justa medida" 32 estabelecida entre o Estado e .a sociedade, uma vitória nestes moldes seria inviável33 •

68

Hegemonia em Gramsci É preciso esclarecer, no momento, com qual conceito de hegemonia estamos lidando e, para isto, recorremos, novamente, às formulações presentes nos Cadernos do Cárcere onde Gramsci explicita seu entendimento do conceito e da "constelação" (Tosei) que este movimento (crise orgânica, revolução passiva, hegemonia) encerra. Primeiramente, vale dizer que pretendo desenvolver a discussão sobre o conceito de hegemonia através, principalmente, da relação de oposição entre o que singulariza este conceito, o consentimento ativo, e a subordinação ideológica, ou consentimento passivo. Para isto, tentarei identificar, ainda que esquematicamente, qual a importância reservada por Gramsci à relação entre uma concepção de mundo unitária e coerente e a prática unitária e coerente que aquela informa e assegura, o fundamento, no limite, do consentimento ativo. Gramsci parte da constatação de que todos os homens são filósofos, pois dotados de uma dada concepção de mundo (CDH, p. 11-14). Assim, podemos avançar no sentido da superação de um estado anterior caracterizado pela existência de uma filosofia espontânea peculiar a todo o mundü3 4 para o segundo momento, isto é, o momento da crítica e da consciência35 • Criticar a própria filosofia, isto é, a propria concepção de mundo, significa torná-la "unitária e

coerente até o ponto atingido pelo pensamento mundial mais desenvolvido "36 • Este início de elaboração crítica pressupõe a consciência daquilo que somos realmente, não podendo alcançar uma concepção de mundo criticamente consciente, aquele que não alcançar a efetiva consciência de sua própria historicidade. Isto implica dizer que a concepção de mundo crítica tem por base a consciência do conjunto concreto (real) das determinações históricas, no qual todos estamos inseridos. Se um sujeito, ativamente, elaborar sua própria concepção de mundo, isto é, criticá-la até o ponto desta tomar-se unitária e coerente, romperá com as características da "filosofia espontânea" (linguagem, senso comum e folclore) e, no limite, eliminará o contraste entre o pensar e o agir, alcançando, assim, a unidade entre 69

teoria e prática. Através do processo de elaboração crítica do próprio pensamento, a coexistência de duas concepções de mundo, uma afirmada em palavras, a outra na ação efetiva, seria superada por uma concepção de mundo unitária e coerente. A filosofia popular, enquanto conjunto desagregado de idéias e opiniões, deve ser superada, pois é incapaz de dotar a ação do homem qe uma direção consciente37 • Temos, pois, a importância da ação (informada pela concepção de mundo) unitária e coerente no movimento de transformação da realidade. Essa unidade teórica e prática, elaborada sistematicamente pela reflexão crítica dos agentes transformadores, permite a efetiva elevação intelectual daqueles que a conquistam. Trataremos, agora, de discutir em que medida este esforço integra-se à constituição do bloco social, intelectual e moral, verdadeiro sujeito da transformação social para Gramsci. Do ponto de vista gramsciano, um movimento filosófico só merece este nome na medida em que permanece em contato com os "simples" e, melhor dizendo, encontra neste contato a fonte última dos problemas que devem ser estudados e resolvidos. Nas palavras de Gramsci, "(... ) a organicidade de pensamento e a solidez cultural só poderia ocorrer se entre os intelectuais e _os simplórios se verificasse a mesma unidade que deve existir entre teoria e prática, isto é, se os intelectuais fossem, organicamente, os intelectuais daquela massa, se tivessem elaborado e tornado coerentes os princípios e os problemas que aquelas massas colocavam cem a sua atividade prática, constituindo assim um bloco cultural e social" (Gramsci, CDH, p. 18). A "filosofia da práxis", portanto, deve ser apresentada como crítica do senso comum., tornando crítica uma atividade sensível já existente (basear-se no senso comum para demonstrar que todos são filósofos). Caberia, então, à política assegurar a relação entre senso comum e a filosofia superior, isto é, frente à ação crítica sobre aquele, procurar elevá-lo até o ponto atingido por esta38 • Forjar-se-ia, desse modo, ou seja, segundo a ação crítica sobre o senso comum e através de um vínculo indissociavelmevte orgânico 70

entre o novo filósofo e os simplórios, um verdadeiro bloco social, intelectual e moral que tomaria politicamente possível o progresso intelectual das massas, e não apenas de pequenos grupos intelectuais. A elaboração superior da própria concepção do real seria atingida mediante a compreensão crítica de si mesmo. E a luta entre hegemonias políticas, nesse sentido, representaria esta própria elaboração superior, pois o desenvolvimento político do conceito de hegemonia supõe uma unidade intelectual e ética adequada à concepção do real que superou o senso comum e tomou-se crítica. A preocupação de Gramsci em superar o senso comum refere-se fundamentalmente a sua preocupação com a ação histórica do bloco social, intelectual e moral. A constituição desse bloco, o sujeito da transformação para Gramsci, demanda um grande esforço em romper com o determinismo economicista e o reducionismo de classes/corporativismo, presentes no marxismo (principalmente o da II Internacional) de então. A ruptura/superação se dará ao nível prático-crítico, através do conceito de hegemonia. Antes de entrarmos propriamente na discussão deste conceito e sua relação com a reforma intelectual e moral, devemos nos deter primeiramente na questão da filosofia criadora. Em certa altura da CDH, Gramsci questiona-se sobre se seria o mundo exterior (a realidade humana) uma "criação do pensamento". ·Responder afirmativamente significaria identificar por qual pensamento e o que o produz. O problema, responde Gramsci, deve ser colocado de uma maneira histórica e reconhecida, na base deste pensamento criador, a existência de uma vontade racional. Tal vontade só poderá realizar-se concretamente enquanto corresponder às necessidades históricas objetivas. Com isso, Gramsci aP9nta a importância histórica (a realização da vida) de uma filosofia. É possível, pois, dizer que o valor histórico de uma filosofi_a pode ser calculado a partir de sua eficácia prática (efeitos positivos e negativos) sobre a sociedade. O espaço reservado à questão da importância da filosofia expressa, em última instância, o próprio esforço de Gramsci para romper com o determinismo das "leis positivas" da história, afirmado pelo marxismo metafísico do início do século. A ação humana é, então, concebida no sentido de 71

não haver uma separação entre o verdadeiro filósofo e o político. A identificação entre o político e o filósofo representaria a própria atividade transformadora do homem39 • Esta concepção ampliada da política permite a Gramsci afastar-se da concepção epifenomenalista das superestruturas, opondo-se radicalmente ao d~terminismo economicista e ao reducionismo de classes/corporativismo (economicismo reducionista), como já salientado. Na representação da "vontade concreta do homem", ou seja, a aplicação efetiva do querer abstrato aos meios concretos que realizam essa vontade, Gramsci expõe o próprio processo de criação da personalidade, conferindo uma direção racional à vontade. Com isso, a conquista das forças materiais toma-se um modo de conquistar a personalidade. Novamente temos, através da associação entre formas materiais e personalidade, a unidade entre teoria e prática. Pelos elementos enunciados acima, creio ser correto dizer que o conceito de hegemonia em Gramsci movimenta uma problemática anti-reducionista da ideologia, sendo esta sua condição de inteligibilidade. Gramsci considera o economicismo (entendido como uma concepção epifenomenalista e reducionista da ideologia e de sua natureza) a "fonte última" das derrotas sofridas pelos movimentos operários, italiano e alemão, fundamentalmente, na década posterior à Primeira Grande Guerra. Particularmente, a II Internacional afirmava a inevitabilidade da revolução proletária; dadas as condições econômicas do modo de .produção capitalista. Todos os elementos ideológicos apresentavam, necessariamente, conotações de classe, sem nenhuma influência ativa no desenvolvimento do processo, porque opostos à científicidade das "leis" históricas. A classe operária deveria defender seus próprios interesses, desenvolvendo assim as contradições econômicas. O colapso do capitalismo seria simples resultado destas forças. A experiência da Revolução Russa desarruma este "mecanismo". A prática política demonstra ser uma força transformadora, em oposição ao exclusivismo econômico. Gramsci enxerga nessa revolução o produto da irrupção da consciência e da vontade na História. Repensa, então, o conjunto dos problemas centrais do marxismo desde uma perspectiva anti-economicista radical. Assim, 72

o desenvolvimento do conceito de hegemonia em Gramsci se dá através de uma fusão total de objetivos econômicos, políticos, intelectuais e morais, efetuada por uma classe fundamental com o consentimento ativo de outras classes ou frações de classes, através da ideologia. Esta determina objetivos, não somente econômicos e políticos unificados, e tamb_ém, a unidade intelectual e moral do "bloco", agente histórico da transformação. Através do sacrifício de parte de sua natureza corporativa, a classe fundamental que conseguir articular aos seus interesses os de outras classes ou frações, tornar-se-á hegemônica40 • Temos, a partir da distinção entre a hegemonia em Lênin e em Gramsci, que a concepção gramsciana introduz, relacionada à direção política, a direção intelectual e moral. Segundo este, a hegemonia envolve a criação de uma síntese mais elevada, de modo que ocorra a fusão de seus elementos em uma vontade coletiva que se constitui no novo sujeito da ação política. Entretanto, a formulação da vontade coletiva e o exercício da direção política depende da existência de uma direção intelectual e moral. Existe, pois, uma necessidade de se formar uma nova vontade coletiva através da reforma intelectual e moral. A ideologia é "positiva", no sentido de que os homens adquirem "consciência de suas contradições no terreno das superestruturas" (Marx, Prefácio à .Contribuição à Crítica da Economia Política, 1977). Este terreno superestrutura! onde os homens movem-se, adquirem consciência de sua posição e lutam, tem por àgentes de uma prática específica os intelectuais. E constitui o critério segundo o qual Gramsci diferencia aquilo que chama intelectuais orgânicos, dos intelectuais tradicionais, a própria inserção de cada um destes nas relações sociais de produção de uma dada formação social. Assim sendo, somente a análise do modo pelo qual o intelectual se articula à produção, reprodução material e espiritual de um sistema específico, pode identificar o intelectual orgânico, em oposição ao intelectual tradicional. O vínculo estabelecido pelo intelectual orgânico com as massas, o chamado vínculo orgânico, é caracterizado pela elaboração coerente dos princípios e dos problemas que surgem da atividade-prática destas massas. Dito de outra forma, a singulari73

dade do intelectual orgânico advém da "prática", no sentido de atividade humana transformadora (unidade prático-crítica) conjunta com as massas (Gramsci, CDH, p. 18). O vínculú de tipo tradicional, ao contrário, é marcado pelo elemento da mediação, ou seja, o intelectual ocupa o papel de elemento intermediário entre o Estado e os interesses da classe ao qual ele procura representar. Deste modo, os chamados intelectuais de tipo tradicional colocam em contato as massas com o aparelho de Estado. Esta intermediação entre o Estado e a respectiva classe social corresponde, em última instância, a um amortecimento dos atritos existentes entre os diversos interesses, geralmente contraditórios, no interior do conjunto da sociedade. A superação do corporativismo é fundamental para o entendimento do conceito de hegemonia, pois, sem aquela, é impossível pensar o consentimento ativo (elemento diferenciador do conceito) e sua relação com o "processo de universalização". Esta questão diz respeito ao exercício da direção intelectual pela classe hegemônica, na medida em que constitui a autonomização do sujeito histórico, agente potencial da transformação social. Podemos dizer que a elevação intelectual das massas juntamente com a elaboraçãó de uma concepção de mundo unitária e coerente (processos concomitantes) são, em essência, os elementos constitutivos do "bloco social, intelectual e·moral", bem como instrumentos indispensáveis do processo de superação do corporativismo e reducionismo de classe. Sobre a distinção estabelecida por Gramsci no interior do conceito de hegemonia, é possível dizer que uma classe fundamental pode se tomar hegemôníca através de duas formas: o transformismo e a hegemonia. Aquele é marcado pela integração gradual e contínua, via o "critério interpretativo das modificações moleculares" (Gramsci, MPE), dos elementos ativos que haviam surgido das classes ou frações aliadas e até de oposição (caso da revolução passiva, como visto anterjormente). Ao contrário, a hegemonia será expansiva se fundada no consentimento ativo (vontade coletiva), produto de·uma 74

genuína adoção dos interesses das demais classes subalternas por parte da classe hegemônica. Para entendermos melhor este ponto, primeiramente vale lembrar que Gramsci questionou a concepção reducionista que convertia a ideologia em mera função da situação de classe dos sujeitos. Assim, é (re)afirmada a possibilidade de se pensar uma unidade ideológica entre distintos grupos sociais. A importância da reforma intelectual e moral traduz-se na criação de uma nova vontade coletiva sobre a base de uma visão de mundo comum: a classe fundamental e seus aliados fundem-se na vontade para formar um "novo homem coletivo" (Gramsci, CDH). Em outras palavras, da fusão, num objetivo, de múltiplas vontades sobre a base de uma única e superior vontade coletiva, temos exatamente a distinção entre hegemonia (e consentimento ativo), de um lado, e transformismo (e subordinação ideológica), de outro. Nesse sentido, a criação de uma nova hegemonia implicaria na transformação do terreno ideológico anterior e na criação de uma nova visão de mundo que serviria de princípio unificador para uma nova vontade coletiva. A formação de uma consciência autônoma e transformadora demanda, pois, a própria crítica ao conjunto ideológico anterior e mudanças no peso relativo dos elementos na velha ideologia. Este processo de transformação ideológica é chamado por Gramsci de reforma intelectual e moral das massas. Esta não significa, para Gramsci, a destruição de toda uma visão de mundo anteriormente existente, substituindo-a por uma outra completamente nova e já reformulada. Gramsci entende a reforma como um processo de transformação e rearticulação dos elementos ideológicos já yxistentes. O objetivo dessa luta, que deveria integrar tanto a ideologia quanto a economia e a política, não é negar totalmente o sistema hegemônico dominante e sim rearticulá-lo de modo que este. possa expressar a nova situação. A perspectiva reducionista, ao postular a existência de ideologias para cada classe social, opõe-se a este entendimento da reforma intelectual e moral das massas. Ao aceitar a hipótese reducionista, a reforma intelectual e moral consistiria tão somente em reimplantar uma ideologia de classe em substituição_ a uma outra41 • 75

A hegemonia consiste, efetivamente, no exercício de liderança política, intelectual e moral, solidificada por uma concepção unitária e coerente de mundo (ideologia orgânica). Esta direção não se confunde com a subordinação à ideologia da classe hegemônica pelos grupos aliados. Toda relação hegemônica é, necessariamente, pedagógica e se dá entre as distintas forças que a compõem. Esta concepção de mundo que unifica o bloco hegemônico é realmente a expressão orgânica de todo o bloco. Sobre o caráter de classe de uma ideologia, podemos dizer que o princípio unificador de um sistema ideológico, isto é, o que articula os elementos ideológicos, é o "princípio hegemônico". E este caráter de classe de uma ideologia provém do princípio hegemônico que a articula. A questão da vontade coletiva nacional-popular42 consiste na luta de uma classe pela hegemonia (intento de articular em seu discurso e sua prática todos os elementos ideológicos nacional-populares). O caminho até a hegemonia deve compreender, além de uma consciência de si mesmo enquanto grupo autônomo, a criação de uma base de consenso entre a classe fundamental e as demais classes e frações subalternas, através do consentimento ativo. Em síntese, temos que uma classe é hegemônica quando chega a articular em seu discurso e em sua prática a grande maioria dos elementos ideológicos, políticos e econômicos característicos de uma determinada formação social. Assim, ao sistema de valores próprios de uma classe somam-se outros elementos ideológicos existentes em uma determinada conjuntura histórica. Finalmente, Gramsci concebe a revolução como um processo global que, embora opere através da conquista progressiva de espaços e posições, tem como meta a transformação da totalidade social.

76

NOTAS

1 Refiro-me aqui, notadamenti:, à crise pela qual passa o moderno capitalismo desde o final dos anos 60 e que,com modificações, se estende até os dias atuais. 2 "Essa crise se instaura no cenário da expansão imperialista que se opera através da interna-

cionalização das forças em presença, a nível de cadafonnação nacional" (Tude de Souza, op. cit., p. 1)

3 "Entre 1970 e 1977, a caxa (média) de crescimento anual da indústria foi na Coréia do Sul de 17%, na Indonésia, 13%, na China Nacionalista, 12%, na Tailândia, 10%, entre outros países do sudeste asiático; e similarmente, na América Latina a situação era a seguinte: Equador (13%), Brasil(] 1%), México(6%)" (idem, p. 4). Obviamente, estes dados devem ser relativizados, afinal, mesmo pequenos montantes de investimento de capital (quando comparados a países imperialistas) assumem proporções assustadoras em países de capitalismo dependente. Contudo, estes servem perfeitamente para demonstrar-nos como a forma da industrialização dos países do Terceiro Mundo permaneceu atrelada às demandas do processo de internacionalização do ciclo de acumulação do capital nos últimos 20 anos.

4 Este período foi marcado ttunbém pela aplicação intensificada da ciência e da indústria na manutenção do equilíbrio entre os blocos de nações capitalistas e coletivistas de Estado (o chamado Bloco Socialista): "A importância da Guerra Fria consistia, exatamente, em sua capacidade de coordenar afonna de expansão econômica com o processo de consolidação do moderno Estado-nação, simultaneamente no Velho e no Novo Mundo. Assim, enquanto osgastos com annamentos somavam mundialmente algo em torno de 400 bilhões de dólares, em 1978, 40% de todo investimento em pesquisa científica estava voltado à defesa nacional" (Beaud, 1987, pp. 308 e 315; citado por Tude de Souza, op. cit., p. 3). S "De modo mais geral, o período de 1965 a 1973 tornou cada vez ,nais evidente a incapacidade do fordismo e do keynesianis,no de conter as contradições inerentes-ao Cqpitalismo. Na superficie, essas dificuldades podem ser melhor apreendidas em uma palavra: rigidez. Havia problemas com a rigidez dos investimentos de capital .fixo em larga escala e de longo prazo em sistemas de produção em massa que impediam muita flexibilidade de planejamento e presumiam crescimento estável em mercados de consu,no invariantes. Havia problemas_ de rigidez nos mercados, na alocação e nos contratos de trabalho (especialmente no chamado setor 'monopolista') e toda tentativa de superar esses problemas de rigidez encontrava a força aparentemente invencível do poder profundamente entrincheirado da classe trabalhadora --- o que explica as ondas de greve e os problemas trabalhistas do período 1968--1972" (Harvey, 1992, p. 135). Contudo, é preciso que se diga que, neste particular, Harvey compartilha a base da concepção economicista dos teóricos da regulação já que para além da elevação dos custos sociais do emprego diretamente produtivo, o modo de acumulação intensivo abrigava em seu interior uma tendência inflacionária determinada por financiamentos ao consumo, à pesquisa e ao desenvolvimento e gastos com armamentos.

6 O conceito de crise orgânica nos apontaria situações onde um conjunto complexo de determinações histórico-concretas "fraturam" o aparelho de hegemonia do grupo dominante. Este mesmo grupo é obrigado a lançar mão de um conjunto de contra-tendências expresso no que Gramsci chama estratégia de grande período ou estratégia da revolução passiva - guerra de posição. Esta modalidade de intervenção no real traduz-se em· um modo renovado de unificação (constituiçãp) da classe dirigente (reagrupamento de um grande número de partidos sob a bandeira de um único).

77

7 Em períodos de crise orgânica parece ser mais apropriado falar cm dominação - supremacia do elemento econômico-corporativo, do que em direção - ênfase no aspecto ético-político. 8 Cf. a importante distinção analítica empreendida por Burawoy, 1985, p. 87.

9 O trotskista inglês Alex Callinicos elabora em seu livro (A Vingança da História, 1ª edição, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor,1992), recentemente traduzido para o português, um interessante painel ideológico dos sentimentos de conservadores e progressistas durante o desenvolvimento do processo revolucionário que derrubou os regimes stalinistas do Leste europeu. Particularmente a inrelligenrzia liberal de esquerda, quase de modo absoluto, tendeu _a perceber a derrocada do stalinismo enquanto consumação da vitória do capitalismo sobre o seu rival histórico, o socialismo (na verdade, o bloco coletivista de estado). A tranformação dos antigos PCs em partidos social-democratas (cujo exemplo clássico é o curocomunismo) foi abruptamente acelerada pelos acontecimentos de 1989. As conclusões apocalípticas reproduziram-se rapidamente por entre a esquerda socialista em quase todos os países do mundo onde esta se encontrava razoavelmente organizada. Um certo "espírito de consenso" foi forjado tanto no campo da esquerda quanto no campo da direita apontando para uma conclusão razoavelmente clara: o capitalismo triunfara e o marxismo, se não inteiramente liquidado, encontrava-se no que bem poderia se tornar uma "crise terminal". Aos defensores das virtude dessa nova ordem (imperialista), fundada no capitalismo "desregulamentado" (para os trabalhadores, sobretudo) resta, como última saída, "defender o mercado com uma face humana".

10 "Le fascisme er l 'americanisme sont indilidualisés, comme autanr de fonnes de ceue révolution passfre" (Tosei, 1981, p. 35). 11 Gramsci chega mesmo a indicar a "superioridade" da forma americana da revolução passiva que permitiu destruir as organizações de combate operário (o sindicalismo de base territorial) e incorporá-las ao sistema, paralelamente ao desenvolvimento das forças produtivas no seio de uma democracia representativa (ver, para isso, "Americanismo e Fordismo•, in MPE, pp. 375-412).

12 Já Glucksmann e Thcrborn (1981, citados por Coutinho, 1988) haviam empreendido uma análise da ação da sgcial-democracia européia no período posterior à II Guerra Mundial partindo do conceito de revolução passiva. 13 "Como reações a moiimentos pop1dares reais e potendais, as classes dCRninantes empenharamse em "resiaurações" que, em última instância, produziram importantes modificações na composição das classes e prepararam o caminho para novas tranfonnações reais" (Coutinho, ibidem, p. 109). 14 Dessa forma, seria possível nos referirmos ao conceito num sentido restrito (caso do Risorgimento) e ampliado (caso do fascismo, fordismo e, talvez, a acumulação flexível).

15 "Toda singularidade e interesse hislÓrico do risorgimento radica nessa impossibilidade/impo1ência do jacobinismo, pois é dela - do fracasso de uma revolução burguesa de tipo francês - que emerge a 'ria italiana', a rerolução passiva como forma política específica do desenvollimento capitalista na Itália" (Torres, op. cil., p. 218). 16 A este respeito, dirá Gramsci: "As exigências que encontraram na França uma expressão jacobino-napoleónica foram (na lrália) satisfeitas em pequenas doses, de uma maneira legal e reformista, conseguindo-se assim salvar a posição política e econômica das velhas classes feudais, elitar a refonna agrária e, notadamente, eviiar que as massas populares atrm·essassem wn período de-experiências políticas similares às da França nos anos do jacobinismo, em 1831, em 1848" (CDH, p. 223). .

78

17 Fundamentalmente orientado pelo grande desenvolvimento das maiores nações imperialistas da época.

18 Vale lembrar que a distinção empreendida por Gramsci entre campo econômico e campo político é puramente analítica, servindo às condições determinantes da análise no momento. Tal distinção de modo algum deve ser interpretada como uma separação orgânica entre asesferas econômica e política (a tarefa de desvincular a esfera da produção econômica, onde atua o trabalhador sob o controle da racionaliqade técnica, da esfera da circulação e distribuição, onde atua o cidadão, foi, no limite, realizada pela economia política burguesa); ao contrário, a unidade entre o político e o econômico afirma-se na própria crítica de Grrunsci à concepção de Croce da paixão como elemento fundamental da política: "A política é ação permanente e dá origem a organizações pennanentes (partidos, exércitos nacionais, Estados-maiores... ), na medida em que efetivamente se identifica com a economia. Mas também tem sua distinção, e por isso pode-se falar separadamente de economia e de política e pode-se falar de 'paixão política' como um impulso imediato à ação, que nasce no terreno pennanente e orgânico da vida econômica, mas supera-o,fazendo entrar em jogo sentimentos e aspirações em cuja atmosfera incandescente o próprio cálculo da vida humana individual obedece a leis diversas daquelas do proveito individual" (MPE. p. 14). 19 Esta concepção foi definida por Edgar Quinet como revolução-restauração que nada mais

é, segundo Gramsci, "do que a tradução francesa do conceito de revolução passiva 'interpretado positivamente' pelos moderados italianos" (MPE, p. 215). 20 A crítica de Marx foi arrasadora e veio, como todos sabem, na forma de um livro, Miséria da Filosofia, surgido em 1841. Nesta obra, Marx acusa Proudhon de interpretar a contradição dialética como mera luta entre o bem e o mal, o que levaria à falácia que ':basta remover o mal para que o bem predomine". No procei.so dialético materialista, para Marx, ambos os aspectos, a afirmação (tese) e a negação (antítese}, são igualmente indispensáveis ao desenvolvimento da sociedade. A verdadeira superação histórica é constituída não pelo triunfo de um lado e pela derrota de outro, mas pelo duelo que envolve necessariamente a destruição de ambos, no caso, a destruição da dominação capitalista e das classes subalternas çnquanto tal.

21 Gramsci, tal como Marx, opõe a esta operação de mutilação filosófica (cujas raízes são práticas) a própria história real onde "(... ) a anrítese tende a destruir a tese, a síntese será uma superação, mas sem que se possa estabelecer a priori o que será conservado da tese na síntese, sem que se possa medir a priori os golpes como em um ring convencionabilente regulado" (CDH, p. 216). 22 Novamente, em relação aos teóricos da revolução passiva em seu sentido afirmativo: "(... ) neles, a incompreensão teórica era a expressão prática das necessidades da tese desenvolverse integralmenre, até o ponto de conseguir incorporar uma parte da própria anrítese para não se deixar superar" (Gramsci, MPE, p. 77). 23 "Exatamente nessa formulação consiste a revolução passiva ou revolução-restauração" (Gramsci, MPE, p. 78)

24 O problema fundamental é o produtivo "e, na produção o desequilíbrio entre indústrias progressirns (nas qlll1is o capital constante foi awnentado) e estacionárias (onde conta muito a mão de obra imediata)" (Gramsci, CDH, p. 115). 25 Para Gramsci, a I Guerra Mundial demonstraria que;: "(... ) na prática, é difícil separar a crise econômica da,s crises políticas, ideológicas etc, se bem que isto é possível cientificamente, ou seja, mediante um trabalho de abstração" (CDH, p. 114).

79

26 Diríamos um movimento progressivo de fragmentação-racionalização/recomposição-assimilação/integração da condição de subalternidade das massas à ordem estabelecida, tal como se

constituiu o americanismo e fordismo no início do século. 27 De modo diverso: "Eis um exemplo sobre como deveria ser compreendida a dialética apresentada em a Miséria da Filosofia: que cada membro da oposição deve procurar ser integralmente ele mesmo e lançar na luta todas as suas reservas políticas e morais, e que só assim se consegue uma superação real, nada disso era compreendido nem por Proudhon, nem por Mal.Zini" (Gramsci, MPE, p. 77).

· 28 O estado no ocidente seria, pois, ao contrário da realidade no oriente: "apenas uma trincheira avançada, por trás da qual se situava uma robusta cadeia de fortalezas e casamatas" (Gramsci, MPE, p. 75). 29 "Na estrutura de massa das democracias modernas, tanto as organizações estatais co,rw o complexo de associações da lida chi/ constituem para a arte política o mesmo que as trincheiras e as fortificações permanentes da frente na guerra de posição: elas fazem com que seja apenas parcial o elemento do movimento que antes constituía toda a guerra" (Gramsci, MPE, p. 92) 30 Daí a impossibilidade de se pensar separadamente revolução passiva-guerra de posição. 31 O elemento econômico imediato, contudo, na guerra de movimento é considerado "como a

artilharia de campo que na guerra abre a brecha na defesa inimiga, brecha suficiente para que as tropas irrompam e obtenham um sucesso definitivo (estratégico), ou pelo menos um sucesso imponante rw sentido da linha estratégica" (Gramsci, MPE, p. 72).

32 Produto da assimilação de parte dos interesses das classes subalternas pelas dirigentes de acordo com o padrão das revoluções-restaurações. 33 "Da mesma forma que ocorria na g.uerra (de posição), quando um nutrido fogo de artilharia parecia ter destruídQ todo o sistema defensivo do adversário, mas, na realidade, só o atingira na sua superfície externa, e no momento do ataque os assaltantes defrorilavam-se com uma linha defensiva ainda eficiente, assim ocorre na política durante as grandes crises econômicas; nem as tropas atacantes, em virtude da crise, organizam-se rapidamente no tempo e no espaço, nem muito menos adquirem um espírito agressivo; reciprocamente, os atacados não se desmoralizam, nem abandonam as defesas, mes,rw entre ruínas, nem perdem a confiança na sua força e rw seu futuro" (Gramsci, MPE, p. 73). 34 Contida na linguagem, no senso comum, no bom senso e folclore, como o conjunto tradicional de crenças e superstições populares (Gramsci, CDH, p. 11).

35 O pensamento, assim,deve ser elaborado de uma maneira: "crítica e consciente e, portanco, em ligação com este trabalho do próprio cérebro, escolher a própria esfera de atividade, participar ativamente na produção da história do mundo, ser o guia de si mesmo ... " (Gramsci, CDH, p. 12).

36 Como dirá Gramsci, significa criticar, também, "toda a filosofia até hoje existente, na medida em que ela deixou estratificações consolidadas na filosofia popular" (ibidem). 37 Entencial", ainda que no campo meramente econômico. O terceiro é o da "fase mais abertamente política" (assinala a passagem nítida da estrutura'para a esfera das superestruturas complexas) onde é possível alcançar além da unidade dos fins econômicos e políticos, também a unidade intelectual e moral: "(Este instante) coloca rodas as questões em torno das quais se ascende à luta não num plano corporativo, mas num plano "universal", criando assim a hegemonia de um grupo social fundamental sobre uma série de grupos subordinados" (Gramsci, MPE, p. 50). Cabe ainda dizer, como bem salienta Gramsci, que na história real esses instantes se confundem reciprocamente. 7 "O elemento decisivo de cada situação é a força permanentemente organizada e antecipadamente predisposta que se pode fazer avançar, quando se manifestar uma situação favorável (e só é favorai·el na medida em que esta força exista e esteja ca"egada de ardor combativo)" (Gramsci, MPE, p. 54)

8 "A crítica às alternativas abertas pelo fordismo deveria levar, de acordo com Gramsci, à reincorporação do ele,nento ético-político capaz de imprimir uma direção à luta pela emancipação proletária" (Tude de Souza, 1992, p.5).

9 Em outros termos, o fordismo seria entendido como uma verdadeira arma política das classes dominant•!s contra a combatividade e a unidade operária, operando a construção de um novo tipo de trabalhador coletivo, através do qual se erigiu uma nova classe operária e uma nova classe média (Gramsci, MPE).

10 "Na realidade, não se trata de noi•idades originais, trata-se somente da fase mais recente de um longo processo que começou com o próprio nascimento do industrialismo, fase que é apenas ma; s intensa do que as precedentes e manifesta-se sob forinas mais brutais, mas que também será superada" (Gramsci, MPE, p. 397; grifos do autor). 11 Em muitos sentidos, o novo padrão das relações industriais introduzido ·pelo fordismo antecipava o Estado burguês de tipo welfare do período fordista-keynesiano. 12 "Mas, logo que os novos métodos de trabalho e de produção se generalizarem e difundirem, logo que o tipo novo de operário for criado universalmente e o aparelho de produção material se aperfeiçoar mais ainda, o turnover excessivo será automaticamente limitado pelo desemprego em larga escala, e os grandes salários desaparecerão" (Gramsci, MPE, p. 405).

13 Ou ainda: "A raâonalização da produção, tomada como ponta de lança das reformas sociais que atingiam o conjunto da iida nacional, determinava assim a necessidade de elaborar um novo tipo humano, conforme o novo tipo de trabalho, capaz de por si mesmo levar a cabo o estrangulamento e a liquidação das antigas orga/'lizações de defesa.dos interesses operários na sociedade americana" (Tude de Souza, idem, p. 17). 14 Produto, como todo projeto, de uma determinada correlação de forças estabelecida entre o grupo dirigente e as classes subalternas. Ver, acima, o sub item referente a americanismo e · fordismo em Gramsci. 15 No entanto, vale lembrar que.a linha de montagem e, sobretudo, a indústria taylor-fordiana dos anos 50/60 (é de lá para cá, mais ainda) deu lugar a um importante processo de (re)incor-

103

poração da força de trabalho feminina: o trabalho feminino de montagem, fragmentado, repetitivo e desqualificado, para além de mal remunerado e precário, não conhece perspectivas de ascensão ocupacional nem investimentos em qualificação.

16 "A revolução científico-técnica consiste essencialmente em que a produção material dependa cada vez mais intimamente