Introdução Aos Materiais Dentários [3]
 978-85-352-3547-0

Table of contents :
Front Cover......Page 1
Introdução aos Materiais Dentários......Page 4
Copyright Page......Page 5
REVISÃO CIENTÍFICA E TRADUÇÃO......Page 6
PREFÁCIO......Page 8
SUMÁRIO......Page 10
SEÇÃO UM: CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS......Page 12
BIOCOMPATIBILIDADE......Page 14
BIOMECÂNICA......Page 15
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 16
A IDADE DAS TREVAS......Page 18
A ERA VITORIANA......Page 19
COROAS E PONTES......Page 20
RESUMO......Page 21
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 22
UNIÃO DOS ÁTOMOS......Page 24
TIPOS DE LIGAÇÕES PRIMÁRIAS......Page 25
A FORMAÇÃO DOS SÓLIDOS......Page 26
O ARRANJO ESTRUTURAL DOS ÁTOMOS NOS SÓLIDOS......Page 28
RESUMO......Page 29
CERÂMICAS CRISTALINAS E AMORFAS......Page 32
A FORMAÇÃO DE UM VIDRO......Page 33
DEVITRIFICAÇÃO......Page 35
MICROESTRUTURA DOS METAIS......Page 38
LIGAS......Page 39
FASES SÓLIDAS......Page 40
DIAGRAMAS DE FASES......Page 41
CONDIÇÕES DE NÃO EQUILÍBRIO......Page 43
MECANISMOS DE POLIMERIZAÇÃO......Page 44
ESTRUTURAS POLIMÉRICAS......Page 47
COMPOSIÇÃO DE POLÍMEROS REAIS......Page 49
TENSÃO E DEFORMAÇÃO......Page 54
TESTES MECÂNICOS......Page 57
PROPRIEDADES REOLÓGICAS......Page 62
PROPRIEDADES TÉRMICAS......Page 65
PROPRIEDADES ÓPTICAS......Page 67
DEGRADAÇÃO DE POLÍMEROS......Page 72
DESLUSTRE E CORROSÃO DOS METAIS......Page 74
DEGRADAÇÃO DAS CERÂMICAS......Page 76
O QUE É ADESÃO?......Page 78
CRITÉRIOS PARA A ADESÃO......Page 79
MECANISMOS DE ADESÃO......Page 82
RESISTÊNCIA DA UNIÃO ADESIVA......Page 84
PROMOTORES DE ADESÃO......Page 86
RESUMO......Page 87
SEÇÃO DOIS: MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO......Page 88
ESTRUTURA DOS AMÁLGAMAS DENTÁRIOS TRADICIONAIS......Page 90
PROPRIEDADES DOS AMÁLGAMAS TRADICIONAIS......Page 92
AMÁLGAMAS DENTÁRIOS COM ALTO TEOR DE COBRE......Page 93
SELEÇÃO E USO DOS AMÁLGAMAS DENTÁRIOS......Page 94
LIMITAÇÕES DOS AMÁLGAMAS DENTÁRIOS......Page 97
MELHORANDO A LONGEVIDADE DAS RESTAURAÇÕES DE AMÁLGAMA......Page 99
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 103
COMPOSIÇÃO E ESTRUTURA......Page 104
DESENVOLVIMENTOS EM COMPÓSITOS......Page 107
CLASSIFICAÇÃO DOS COMPÓSITOS......Page 116
PROPRIEDADES......Page 118
PROPRIEDADES QUÍMICAS......Page 121
COMPÓSITOS ODONTOLÓGICOS DE USO LABORATORIAL......Page 123
CONSIDERAÇÕES CLÍNICAS PARA O USO DAS RESTAURAÇÕES COM COMPÓSITO......Page 124
RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO (COMPÔMEROS)......Page 126
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 129
QUÍMICA DOS CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO......Page 130
PROPRIEDADES......Page 134
APLICAÇÕES CLÍNICAS......Page 137
CERMETS DE PRATA......Page 141
CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA......Page 142
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 144
PROTEÇÃO PULPAR......Page 146
VERNIZES CAVITÁRIOS, BASES E MATERIAIS PARA FORRAMENTO......Page 147
ESCOLHA DOS MATERIAIS RESTAURADORES INTERMEDIÁRIOS......Page 150
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 152
ADESÃO AO ESMALTE......Page 154
ADESÃO À DENTINA......Page 158
IMPORTÂNCIA CLÍNICA......Page 163
APRESENTAÇÃO DOS SISTEMAS ADESIVOS DENTINÁRIOS......Page 164
IMPORTÂNCIA CLÍNICA......Page 167
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 170
CAPEAMENTO PULPAR VITAL......Page 172
MATERIAIS PARA OBTURAÇÃO DO CANAL RADICULAR......Page 175
CIMENTOS SELADORES DO CANAL RADICULAR......Page 177
ASPECTOS CLÍNICOS DOS MATERIAIS PARA CANAIS RADICULARES......Page 180
SISTEMAS DE PINOS E NÚCLEOS......Page 181
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 183
INTRODUÇÃO......Page 186
MATERIAIS DE MOLDAGEM RÍGIDOS......Page 188
MATERIAIS DE MOLDAGEM ELÁSTICOS......Page 190
MATERIAIS DE MOLDAGEM ELASTOMÉRICOS......Page 195
MÉRITOS RELATIVOS AOS MATERIAIS DE MOLDAGEM ELASTOMÉRICOS......Page 197
DESINFECÇÃO DOS MATERIAIS DE MOLDAGEM......Page 202
FRACASSOS NA REALIZAÇÃO DA MOLDAGEM......Page 205
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 206
SEÇÃO TRÊS: MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS......Page 208
QUÍMICA DO GESSO......Page 210
PROPRIEDADES......Page 213
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 214
COMPOSIÇÃO E ESTRUTURA DA RESINA ACRÍLICA......Page 216
ASPECTOS DA MANIPULAÇÃO......Page 218
PROPRIEDADES......Page 220
MATERIAIS EMBASADORES DE PRÓTESE......Page 222
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 224
PROPRIEDADES DESEJADAS......Page 226
LIGAS NOBRES E DE METAIS PRECIOSOS......Page 227
LIGAS DE METAIS BÁSICOS......Page 231
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 234
PERSPECTIVA HISTÓRICA......Page 236
COMPOSIÇÃO DAS PORCELANAS ODONTOLÓGICAS......Page 238
PROCESSAMENTO......Page 239
PROPRIEDADES DAS PORCELANAS ODONTOLÓGICAS......Page 240
CLASSIFICAÇÃO DAS CERÂMICAS ODONTOLÓGICAS ATUAIS......Page 241
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 242
A UNIÃO......Page 244
PREPARO DA SUPERFÍCIE METÁLICA......Page 246
IMPORTÂNCIA DA EXPANSÃO TÉRMICA......Page 247
ESCOLHA DAS LIGAS METALOCERÂMICAS......Page 250
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 252
COROA DE JAQUETA DE PORCELANA REFORÇADA POR ALUMINA (CJP)......Page 254
SISTEMAS PARA NÚCLEOS CERÂMICOS ALTAMENTE RESISTENTES INFILTRADOS POR VIDRO......Page 255
RESUMO......Page 257
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 258
FACETAS DE CERÂMICA......Page 260
CERÂMICAS VÍTREAS......Page 262
RESUMO......Page 265
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 266
REQUISITOS GERAIS PARA OS AGENTES DE CIMENTAÇÃO......Page 268
AGENTES DE CIMENTAÇÃO À BASE DE ÁGUA......Page 270
UNIÃO RESINA-CERÂMICA......Page 277
UNIÃO RESINA-METAL......Page 280
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 287
FERRO......Page 288
AÇO......Page 289
AÇO INOXIDÁVEL......Page 290
RESUMO......Page 293
LEITURA COMPLEMENTAR......Page 294
ÍNDICE......Page 296

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INTRODUÇÃO AOS

MATERIAIS DENTÁRIOS

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INTRODUÇÃO AOS

MATERIAIS DENTÁRIOS TERCEIRA EDIÇÃO

RICHARD

VAN

NOORT BSc DPhil

Professor in Dental Materials Science, Department of Restorative Dentistry University of Sheffield, Sheffield, UK

Do original: Introduction to Dental Materials, 3rd Edition  1994, Times Mirror International Publishers Limited.  2002, Elsevier Science Limited.  2007, Elsevier Limited. Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Mosby – um selo editorial Elsevier Inc. ISBN: 978-0-7234-3404-7  2010 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. ISBN: 978-85-352-3547-0 Capa Folio Design Editoração Eletrônica Rosane Guedes Elsevier Editora Ltda. Conhecimento sem Fronteiras Rua Sete de Setembro, nº 111 – 16º andar 20050-006 – Centro – Rio de Janeiro – RJ Rua Quintana, nº 753 – 8º andar 04569-011 – Brooklin – São Paulo – SP Serviço de Atendimento ao Cliente 0800 026 53 40 [email protected] Preencha a ficha de cadastro no final deste livro e receba gratuitamente informações sobre os lançamentos e promoções da Elsevier. Consulte também nosso catálogo completo, os últimos lançamentos e os serviços exclusivos no site www.elsevier.com.br.

NOTA O conhecimento médico está em permanente mudança. Os cuidados normais de segurança devem ser seguidos, mas, como as novas pesquisas e a experiência clínica ampliam nosso conhecimento, alterações no tratamento e terapia à base de fármacos podem ser necessárias ou apropriadas. Os leitores são aconselhados a checar informações mais atuais dos produtos, fornecidas pelos fabricantes de cada fármaco a ser administrado, para verificar a dose recomendada, o método e a duração da administração e as contraindicações. É responsabilidade do médico, com base na experiência e contando com o conhecimento do paciente, determinar as dosagens e o melhor tratamento para cada um individualmente. Nem o editor nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventual dano ou perda a pessoas ou a propriedade originada por esta publicação. O Editor

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ N741i Noort, Richard van Introdução aos materiais dentários / Richard van Noort ; [tradução Débora Rodrigues Fonseca... et al.]. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2010. il. Tradução de: Introduction to dental materials, 3rd ed Inclui bibliografia ISBN 978-85-85-352-3547-0 1. Materiais dentários. I. Título. 09-5268. 05.10.09

CDD: 617.695 CDU: 616.314-7 06.10.09

015532

Richard van Noort tem o direito de ser identificado como autor desta obra de acordo com o Copyright, Designs and Patents Act, 1988.

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REVISÃO CIENTÍFICA E TRADUÇÃO

REVISÃO CIENTÍFICA

Alessandra Reis Professora Adjunta do Departamento de Dentística da Universidade Estadual de Ponta Grossa, PR Doutora em Materiais Dentários pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP)

Alessandro Dourado Loguercio Professor Adjunto do Departamento de Dentística da Universidade Estadual de Ponta Grossa, PR Doutor em Materiais Dentários pela Faculdade de Odontologia da USP Mestre em Dentística pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, RS

TRADUÇÃO Adriana do Socorro Lima Figueiredo (Caps. 1.4, 3.2. 3.5) Especialista em Implantodontia pela Universidade Camilo Castelo Branco (Unicastelo), SP Cirurgiã-dentista pela Universidade Federal do Pará

Débora Rodrigues Fonseca (Caps. 2.1, 2.3 a 2.5 e 2.7) Mestre em Anatomia (Ciências Morfológicas) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial pela UFRJ Cirurgiã Bucomaxilofacial do Hospital Geral do Andaraí, RJ Subchefe do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Estadual Getulio Vargas, RJ

Lorena Da Rós Gonçalves (Caps. 1.1 e 1.7 a 1.9) Professora do Instituto Orthodontic da Fatec, Niterói, RJ Mestre e Especialista em Periodontia pela UFRJ Especialista em Implantodontia pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) Graduada em Odontologia pela UFES

Marco Antonio Gallito (Caps. 1.6 e 1.10) Professor Adjunto de Clínica Integrada da Universidade Federal Fluminense (UFF) Doutor Mestre e Especialista em Dentística pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

vi

REVISÃO CIENTÍFICA E TRADUÇÃO

Mariana Alves de Sá Siqueira (Caps. 1.5, 2.2 e Índice) Doutoranda em Periodontia pela UERJ Mestre em Ciências (pós-graduação em Ciências Médicas) pela UERJ Especialista em Periodontia pela Universidade Veiga de Almeida (UVA), RJ Graduada em Odontologia pela UERJ

Mariana Ribeiro de Moraes Rego (Caps. 3.6 a 3.8) Professora Assistente do Departamento de Prótese da UERJ Mestre em Reabilitação Oral pela Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB-USP)

Mayra Cardoso (Cap. 3.4) Mestre em Prótese Dentária pela UERJ Especialista em Prótese Dentária pela Universidade do Grande Rio (Unigranrio), RJ

Rodrigo Melo do Nascimento (Cap. 3.9) Pós-graduado em Radiologia Oral (lato sensu) pela UFRJ Graduado em Odontologia pela UFRJ

Sarah Aparecida Ferreira Antero (Caps. 1.2, 2.6 e 3.1) Ex-residente e Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais pela UERJ Especialista em Estomatologia pela UFRJ Integrante da equipe de CTBMF do Hospital Geral de Bonsucesso e do Hospital Estadual Getulio Vargas, RJ

Vinícius Farias Ferreira (Caps. 1.3 e 3.3) Mestre em Clínica Odontológica (Periodontia) pela UFF Especialista em Prótese Dentária pela Puc-Rio

vii

PREFÁCIO

É raro um procedimento dentário restaurador que não utilize um material dentário de um modo ou de outro. Atualmente, com o rápido desenvolvimento dos materiais dentários, a sobrevida típica dos materiais dentários, antes de sua modificação ou substituição, pode algumas vezes ser menor que 3 anos. Portanto, dentro de um período muito curto, muitos materiais atualmente em uso serão substituídos por novos. Temos presenciado a introdução de novos materiais restauradores, tais como cimentos de ionômero de vidro modificado por resina e compômeros, e o desenvolvimento de novos procedimentos para adesão em metais. A necessidade da terceira edição deste livro após apenas 6 anos de sua segunda edição é a prova de que mudanças rápidas estão ocorrendo. Assim, muito do aprendizado sobre os materiais obtido por um estudante de graduação será alterado ou substituído quando ele se tornar um clínico. Para acompanhar os rápidos avanços dos materiais dentários, o dentista precisa estar apto a avaliar o potencial desses materiais novos, o que requer mais que um conhecimento superficial dos materiais usados. O profundo conhecimento e a análise da composição, da química e das propriedades dos materiais dentários fornecerão a base necessária para se alcançar isso. O dentista é o principal responsável sobre a origem dos produtos a serem utilizados no tratamento dentário do paciente, por conseguinte, precisa ter um conhecimento sólido sobre os materiais utilizados. Este livro é dividido em três seções, cada qual abordando um diferente aspecto da ciência dos materiais dentários.

SEÇÃO I: CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS Com capítulos sobre ligações atômicas, metais, cerâmicas e polímeros, essa seção descreve a estrutura dos materiais. Além disso, há outros capítulos que apresentam a terminologia usada na descrição do compor-

tamento físico, químico e mecânico dos materiais. E um capítulo em separado é dedicado aos princípios da adesão.

SEÇÃO II: MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO Essa seção trata dos materiais comumente usados no atendimento odontológico, incluindo amálgama dentário, resina composta e compômeros, cimentos de ionômero de vidro e cimentos de ionômero de vidro modificados por resina. São discutidas a composição, a química, as características de manipulação e as propriedades apropriadas para seu uso clínico. O capítulo sobre materiais intermediários aponta as questões relacionadas à proteção pulpar, o que também se faz presente no capítulo sobre materiais endodônticos – capítulo que foi ampliado para incluir informações sobre a ampla variedade de sistemas de pinos e núcleos. A adesão da resina ao esmalte e à dentina é abordada em um capítulo separado, refletindo a alta importância desse assunto na prática clínica. Os materiais de moldagem também são discutidos nessa seção.

SEÇÃO III: MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS Nessa seção, são apresentados ao estudante os materiais usados pelos técnicos dentários na construção de próteses fixas e removíveis. O conhecimento sobre os materiais disponíveis e sua utilização auxiliará no desenvolvimento da compreensão sobre o trabalho do técnico e facilitará a comunicação com os técnicos protesistas. Também foi incluído nessa seção um capítulo sobre cimentação, descrevendo a ampla variedade de materiais e procedimentos usados na Odontologia quando são realizadas restaurações indiretas.

viii

PREFÁCIO

A filosofia das edições anteriores deste livro era tornar a ciência dos materiais dentários facilmente acessível para o estudante de Odontologia. Embora haja uma tendência de se usar a oportunidade de uma nova edição para se mudar tudo, resisti a isso o máximo possível. Optei por manter a simplicidade e clareza que sinto ter alcançado na primeira edição. Entretanto, os leitores familiarizados com as edições anteriores observarão que, no intuito de refletir as mudanças nos materiais dentários de uso clínico, foram adicionadas muitas informações. Mantive os quadros de comentários ao longo do texto para enfatizar os pontos de importância clínica, os quais espero que o leitor continue achando útil. Deve-se observar que este livro foi elaborado com base na necessidade de conhecimento e é apenas o primeiro passo em direção ao processo de leitura independente

e avaliação crítica dos materiais dentários. Conforme o título sugere, esta obra representa apenas uma introdução aos materiais dentários e obviamente existe muito mais a ser aprendido. A lista de leitura complementar ao final de cada capítulo foi atualizada novamente, e o leitor é instigado a aproveitar o conhecimento que pode ser adquirido ao se ampliar a leitura sobre um assunto. O objetivo deste livro é guiar os leitores por uma longa estrada para que se tornem clínicos bem-informados, que não saibam apenas o que deve ser feito e como deve ser feito, mas também por que deve ser feito. Acredito que o estudante da ciência dos materiais dentários encontrará neste livro o primeiro passo rumo à direção certa. R. van Noort 2007

ix

SUMÁRIO

Prefácio vii

SEÇÃO UM CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

1

1.1

Biomateriais, biocompatibilidade e biomecânica 3

1.2

Uma perspectiva histórica 7

1.3

Estrutura atômica da matéria 13

1.4

Estrutura das cerâmicas 21

1.5

Estrutura dos metais e das ligas metálicas 27

1.6

Estrutura dos polímeros 33

1.7

Propriedades mecânicas 43

1.8

Propriedades físicas 51

1.9

Propriedades químicas 61

1.10 Princípios de adesão 67

SEÇÃO DOIS MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

77

2.1

Amálgamas dentários 79

2.2

Resinas compostas e resinas compostas modificadas por poliácido

2.3

Cimentos de ionômero de vidro e cimentos de ionômero de vidro modificados por resina 119

2.4

Materiais restauradores intermediários 135

2.5

Adesão ao esmalte e à dentina 143

2.6

Materiais endodônticos 161

2.7

Materiais de moldagem 175

93

x

SUMÁRIO

SEÇÃO TRÊS MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS 197 3.1

Produtos à base de gesso 199

3.2

Resinas para base de prótese 205

3.3

Ligas fundidas para restaurações metálicas 215

3.4

Cerâmicas odontológicas 225

3.5

Restaurações cerâmicas aderidas ao metal 233

3.6

Restaurações de cerâmica pura: núcleo cerâmico de alta resistência 243

3.7

Restaurações de cerâmica pura: cerâmicas unidas com resina 249

3.8

Agentes de cimentação 257

3.9

Aço inoxidável 277

Índice 285

SEÇÃO UM CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS Esta seção trata da relação entre a microestrutura e as propriedades dos materiais. Para entender por que diferentes materiais devem apresentar diversas propriedades e o que essas propriedades representam em relação ao seu uso, é necessário compreender algo sobre a ciência dos materiais. Como este livro não procura torná-lo cientista em materiais, mas dentista com um bom conhecimento em materiais dentários, apenas os aspectos do comportamento dos materiais que são pertinentes às aplicações odontológicas serão considerados.

As questões a serem abordadas nesta seção são: ■



Quais são as características microestruturais dos materiais? Como descrever as características comportamentais dos diferentes materiais?

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Capítulo 1.1

BIOMATERIAIS, BIOCOMPATIBILIDADE E BIOMECÂNICA

BIOMATERIAIS Os materiais restauradores odontológicos descritos neste livro são um subgrupo especial que geralmente são descritos como biomateriais. Quando um material é inserido sobre ou colocado em contato com o corpo humano, em geral é chamado de biomaterial. Um biomaterial pode ser definido como um material não vivo designado a interagir com sistemas biológicos. As três principais áreas de emprego dos biomateriais são: ■

■ ■

materiais dentários restauradores, por exemplo, materiais restauradores metálicos e resinosos, e ligas e cerâmicas fundidas para prótese fixa e removível intraoral; implantes estruturais, por exemplo, implantes oral e maxilofacial e próteses articulares; implantes cardiovasculares, por exemplo, cateteres, prótese de válvulas cardíacas e vasos sanguíneos e membranas de diálise e oxigenador.

Neste livro iremos nos concentrar apenas nos materiais restauradores dentários. Um grande espaço é direcionado para dois aspectos importantes no seu uso: sua composição e suas propriedades características. Também há considerações sobre a biocompatibilidade e biomecânica, que devem ser consideradas no uso clínico.

BIOCOMPATIBILIDADE Quando um biomaterial é colocado em contato com os tecidos e fluidos do corpo humano, invariavelmente existe alguma forma de interação entre o material e ambiente biológico. Essa interação é chamada biocompatibilidade. Um material pode ser dito biocompatível quando tem a qualidade de não ser destrutivo no ambiente biológico. É importante observar que essa interação ocorre de duas maneiras: o material pode ser afetado de algum modo pelo ambiente biológico, e, de modo equivalente,

o ambiente biológico pode ser afetado pelo material. Em ambas as vias, a interação deve ser benéfica ao paciente e, acima de tudo, deve ser segura para todos os pacientes contra qualquer reação colateral. As reações biológicas podem ocorrer no local ou distante do sítio de contato (p. ex., sistemicamente). A última, é uma consideração muito importante porque nem sempre estará aparente que os sintomas clínicos tais como reações dermatológicas, reumáticas ou neurais, estejam associados ao biomaterial. Tanto o paciente como os profissionais da odontologia estão expostos a essas interações e potenciais riscos, com o paciente sendo receptor dos materiais restauradores e os profissionais da odontologia, manipuladores dos materiais diariamente. As possíveis interações entre os materiais dentários restauradores e o ambiente biológico incluem: ■ ■ ■ ■

sensibilidade pós-operatória; toxicidade; corrosão; hipersensibilidade/alergia.

A sensibilidade pós-operatória é a reação local ao procedimento restaurador. Está frequentemente associada à inserção de materiais restauradores, onde existe uma reação pulpar adversa após o procedimento operatório. Embora antes se acreditasse que isso decorria da falta de biocompatibilidade do material restaurador em si, agora é bem aceito que um papel importante é desempenhado pelo ingresso de bactérias nas fendas entre o material restaurador e os tecidos dentários. Se o material restaurador foi capaz de prover um selamento hermético, que poderia impedir a invasão bacteriana, a sensibilidade pós-operatória desta fonte seria menos provável de estar presente. Uma reação pulpar pode ainda surgir se o material restaurador for tóxico à polpa. A prevenção de invasão bacteriana é uma consideração importante no desenvolvimento dos materiais restauradores adesivos. Alguns materiais têm efeito positivo distinto na polpa: por exemplo, o hidróxido de cálcio induz a formação

3

4

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

de dentina secundária pela polpa. Isto enfatiza que o requisito para o material ser compatível não é o de estar inerte no ambiente biológico (p. ex., que não provoque nenhuma reação), mas que deve, idealmente, induzir uma resposta que seja apropriada para a situação e altamente benéfica. A corrosão é uma interação indesejada entre o ambiente biológico e o biomaterial. Um dos exemplos odontológicos mais conhecidos é a corrosão dos amálgamas dentários. Essa corrosão causa a alteração de cor dos tecidos dentários e também está associada a uma comum observação da quebra das margens das restaurações de amálgama. Os materiais restauradores à base de compósitos são conhecidos por sofrer alteração de cor na boca devido à ação corrosiva ao ambiente, e isso faz com que sejam substituídos quando a estética se torna inaceitável. Os efeitos corrosivos ao ambiente biológico das ligas fundidas usadas na construção de próteses fixas ou removíveis intraorais também são alvo de preocupação. Quando um material é suscetível à corrosão no ambiente oral, ele tende a liberar grandes quantidades de produtos de corrosão dentro dos tecidos biológicos orais; isso pode provocar efeitos colaterais local ou sistemicamente. Alguns pacientes podem desenvolver reações alérgicas ou de hipersensibilidade a quantidades muito pequenas de metais, tais como: mercúrio, níquel e cobalto; que podem ser liberados devido ao processo corrosivo. Assim, é importante que os biomateriais sejam altamente resistentes à corrosão. O mercúrio é conhecido por ser altamente tóxico quando presente em quantidades suficientes, isso recentemente provocou incentivos para seu uso ser banido. Com base no que foi descrito, deve estar claro que é muito importante que o dentista conheça a composição e a química dos materiais a serem usados na cavidade oral e como esses materiais podem interagir com o ambiente biológico.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Os profissionais da odontologia são os principais responsáveis pelos materiais aos quais os pacientes serão expostos. Eles devem ter conhecimento e entendimento da composição dos materiais a serem usados e como podem afetar o paciente.

BIOMECÂNICA Enquanto a biocompatibilidade está relacionada aos aspectos de segurança e com as interações biológicas e químicas entre o biomaterial e o ambiente biológico, existem outros pontos com enormes implicações para o desempenho dos materiais dentários restauradores.

Por exemplo, precisamos conhecer como os materiais usados são capazes de suportar as forças geradas tanto da mastigação como da oclusão, ou uma variedade de outras fontes, tais como a contração de polimerização ou ,contração e expansão térmica. O ambiente também pode influenciar o desempenho em longo prazo do material, se, por assim dizer, ele é suscetível à corrosão ou à absorção de fluidos orais. A função das estruturas dentais, tais como: restaurações, coroas e pontes depende; portanto, não apenas das propriedades dos materiais, como também da qualidade do desenho empregado. O comportamento dos materiais em estruturas reais é conhecido como mecânica. Os engenheiros usam essa abordagem no desenho de edifícios, pontes, carros etc. Por exemplo, com o conhecimento das propriedades dos materiais e do desenho de uma viga de concreto, é possível calcular se o desenho desta viga suportará a carga da estrutura sobre ela. De modo similar, é possível desenhar pontes suspensas, que não desmoronam com o peso do tráfego. Quando a mecânica é aplicada aos biomateriais, é chamada biomecânica; é a aplicação dos princípios da engenharia ao corpo humano. Um exemplo restaurador odontológico em que as considerações da biomecânica são importantes é a fratura de uma restauração. Esse problema aparece com os amálgamas dentários em particular; cuidado com as limitações desse material restaurador e como essas afetam o desenho das cavidades pode evitar muitas falhas em potencial. A fratura de um segmento cerâmico de uma restauração metalocerâmica pode ocorrer devido a cargas excessivas de interferências oclusais; isso pode ser evitado por um desenho modificado. De modo similar, a falha de uma ligação adesiva entre a restauração e o dente pode ocorrer devido a limitações das propriedades de um dado material em particular, tal como a contração por polimerização, gerando tensão na interface excessiva. A falha adesiva persistente de uma ponte cimentada com resina pode ocorrer devido a um desenho inadequado que é incapaz de resistir às cargas aplicadas. Tal problema não deve ser resolvido meramente pela nova cimentação da ponte, e uma abordagem alternativa deve ser considerada. Quando duas superfícies entram em contato, existe uma tendência para que uma das superfícies provoque remoção do material da outra superfície. Isso é o processo de desgaste, e continua a ser um problema nos materiais restauradores à base de compósitos. A principal contribuição para o processo de desgaste é a carga aplicada. Também é importante conhecer como essa carga provoca dano ao material. As restaurações podem ser desenhadas para que minimizem esse problema, e não devem ser usadas em circunstâncias nas quais o material é inadequado.

BIOMATERIAIS, BIOCOMPATIBILIDADE E BIOMECÂNICA

Esses tipos de interação entre as propriedades de um material, desenho estrutural e ambiente formam a base da biomecânica.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA É importante que o clínico seja capaz de distinguir entre as falhas do material e no desenho do preparo cavidade.

RESUMO O principal objetivo de um bom desenho na odontologia restauradora é evitar o fracasso da restauração. Entretanto, deve-se observar que a falha pode se originar de várias maneiras. Algumas falhas podem ser devido à falta de estética. Um exemplo claro disso é a alteração de cor de materiais restauradores à base de compósitos, e isso

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indica a falta de estabilidade química no ambiente biológico. Um material pode precisar ser removido porque provoca uma reação alérgica ou corrói excessivamente. Esses são aspectos da biocompatibilidade do material. Do mesmo modo, uma restauração pode fracassar mecanicamente porque fratura ou mostra um desgaste excessivo, possivelmente por causa do desenho ruim ou porque o material foi usado em circunstâncias inadequadas para essas propriedades. Então, o desempenho clínico das restaurações dentárias depende de: ■ ■ ■

seleção apropriada do material, com base no conhecimento das suas propriedades; ótimo desenho da restauração; e conhecimento de como o material interagirá com o ambiente biológico.

Todos esses aspectos de biocompatibilidade e biomecânica dos materiais dentários serão abordados de modo apropriado.

LEITURA COMPLEMENTAR Brunski JB, Puleo DA, Nanci A (2000) Biomaterials and biomechanics of oral and maxillo-facial implants: current status and future developments. Int J Oral Maxillofac Implants 15: 15 Eliades G, Eliades T, Brantley WA, Watts DC (2003) Dental materials in vivo: aging and related phenomena. Qintessence Publishing Co, Chicago, IL

Esquivel-Upshaw JF, Anusavice KJ (2000) Ceramic design concepts based on stress distribution analysis. Compend Contin Educ Dent 21: 649 Smith DC (1982) The biocompatibility of dental materials. In: Smith DC, Williams DF (eds) Biocompatibility of dental materials, vol 1, ch 1. CRC Press, Boca Raton, FL Waters NE (1992) Dental biomechanics and the dental curriculum. J Dent 20: 195–198

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Capítulo 1.2

UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

INTRODUÇÃO Acredita-se que a dentição deficiente é um problema dos tempos modernos, iniciado como uma consequência do excesso de tudo que “é ruim, mas é bom”! À primeira vista, a dieta de antigamente, que consistia em carne crua, peixe, pão de centeio e grãos, deveria ser considerada melhor para a dentição do que os alimentos cozidos e com altos teores de açúcares consumidos hoje. Entretanto, os alimentos não eram lavados com tanto cuidado quanto agora, o que significa que continham grãos de areia, pedras e cascas, que tinham o efeito de desgasta as superfícies triturantes dos dentes. A camada protetora de esmalte é fina e a dentina adjacente era desgastada rapidamente. Por fim, a polpa era exposta e invadida por bactérias que, pouco depois, causavam a formação de um abscesso, não deixando outro recurso senão a exodontia do dente acometido. Os problemas decorrentes eram terríveis e retornaremos a estas questões mais adiante. Deste modo, a perda de dentes não é de forma alguma um problema recente e tem acompanhado a humanidade ao longo do tempo.

o ouro para adaptar o dente no lugar. O ouro possuía duas vantagens: ser esteticamente aceitável e ser um dos poucos metais disponíveis com a maleabilidade necessária para a produção de formas complexas. Os romanos devem ter herdado, pelo menos, parte do interesse dos etruscos sobre dentes, como evidenciado em um dos artigos da lei das Doze Tábuas, que estabelecia que: Causar a perda de um dente de um homem livre resultará em uma multa de 300 As. Mais notável, talvez, seja o fato de que esta proteção também era oferecida aos escravos; entretanto, neste caso a multa era de apenas 100 As. Embora não tenham restado evidências físicas sobre o uso de próteses dentais, pode-se inferir que os mesmos tenham sido utilizados com base nos registros escritos. Horácio (65 a.C.) escreveu sobre “bruxas sendo perseguidas e correndo tão rápido que uma delas perdeu seus dentes” e ainda, mais tarde, Martial (40-100 d.C.) fez referência a dentes de marfim e madeira.

A IDADE DAS TREVAS ETRUSCOS (1000-600 A.C.) Para verificar os registros mais antigos sobre o tratamento da patogênese dentária, temos que recorrer a períodos bem anteriores à época de Cristo. Embora muito tenha se perdido com o passar do tempo, os etruscos realmente deixaram um legado odontológico de alta qualidade. Os etruscos foram um povo vindo do Oriente “Próximo” e que se estabeleceram na península da Itália. Foram os antepassados dos romanos (sobre os quais tiveram grande influência) e prepararam as bases para a formação do Império Romano. A qualidade de seus trabalhos artesanais era excepcional. Suas habilidades eram empregadas para boas finalidades, uma vez que desgastavam dentes de cadáver modelando-os como os dentes artificiais e usavam

Pouco se sabe sobre o que aconteceu na Odontologia desde a época de Martial até o século XVI e este período deve ser considerado como a “Idade das Trevas da Odontologia”. Devemos esse período a nossa santa padroeira das doenças odontológicas, Santa Apolônia. Ela foi incitada a proferir blasfêmias, sob a ameaça de ter seus dentes extraídos ou ser queimada na fogueira. Ela escolheu ser queimada! Isto deixou a igreja realmente em um dilema, pois poderia ser interpretado como suicídio, que não era permitido. Neste caso o problema foi contornado ao considerarem a situação como vontade divina. Há registros curiosos dispersos por todo este período, mostrando que a dor de dente era um problema persistente. Por exemplo, uma pessoa ilustre ficou conhe-

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

cida por cobrir seu rosto com um tecido a fim de esconder a perda de dentes, sempre que havia uma importante função a ser executada. Esta era ninguém menos que a Rainha Elizabeth I. Havia também Luis XIV, o “Rei Sol”, que sofria muito com as dores de dente e teve que tomar muitas decisões importantíssimas, como a revogação do Edito de Nantes (em 1642), enquanto sofria com dores insuportáveis. Possivelmente isto aturdiu seu julgamento.

AS PRIMEIRAS DENTADURAS (SÉCULO XVIII) No século XVIII, tornou-se possível produzir modelos razoavelmente precisos da boca com o uso de cera. Estes modelos eram então usados como moldes sobre os quais dentaduras de marfim eram esculpidas na forma necessária. Na fase final do século XVIII, vários artesãos produziam dentes de marfim delicadamente esculpidos. Eles se fixaram nos negócios exclusivamente para fornecer dentes falsos aos mais abonados. Claro que este tipo de Odontologia não estava disponível para a população em geral. Dentaduras inferiores feitas de marfim e dentes de cadáveres funcionavam razoavelmente bem e mantinham sua posição sem muita dificuldade, especialmente se reforçadas por um pouco de chumbo. As dificuldades realmente existiram com as dentaduras superiores que não se mantinham no lugar devido ao peso e ao encaixe deficiente. A fim de superar este problema, a dentadura superior era encaixada sobre a inferior com o uso de molas ou dobradiças. Esta técnica garantia que a dentadura superior seria sempre empurrada para cima contra o palato, porém, como se pode imaginar, eram próteses grandes, incômodas e muito pesadas. Obviamente, o uso de dentes de cadáveres não era higiênico. Da mesma forma, o marfim é levemente poroso e assim apresentava-se como um substrato ideal para o acúmulo de bactérias. De fato, George Washington embebia regularmente suas dentaduras em vinho do Porto, aparentemente para tolerar o gosto desagradável e disfarçar o odor. Em 1728, Fauchard sugeriu que as dentaduras deveriam ser confeccionadas com porcelana ao invés das inserções de marfim com dentes de cadáveres, alegando que a porcelana seria mais atraente (já que poderia ser pigmentada se necessário) e consideravelmente mais higiênica. O que tornou esta sugestão possível foi a introdução na Europa do segredo da confecção da porcelana pelo padre d´Entrecolle, um jesuíta que havia passado muitos anos na China. Devido aos problemas da alta contração da porcelana durante a cocção, não surpreende que tivemos que esperar até 1744 pelo primeiro registro documentado de uma dentadura de porcelana, confeccionada por um homem chamado Duchateau.

A ERA VITORIANA Os vitorianos desaprovavam o uso de dentaduras por se tratar de uma extrema vaidade, porém, mais ainda, devido ao fato de serem inúteis para a mastigação! Contudo, dentes falsos ainda eram usados em grande parte pelos ricos. Comenta-se que o fato de não serem funcionais, combinado com o recato vitoriano, está por trás do hábito que se desenvolveu durante aquela época de comer na cama logo antes do jantar. Um hábito que dava segurança contra qualquer possível desastre na mesa do jantar assim, como tornava possível as afetações românticas que as jovens damas mantinham no ar. Várias descobertas importantes feitas durante o século XIX tiveram um profundo efeito no tratamento das doenças dentárias. A primeira delas foi feita por volta de 1800 por um “dentista” da Filadélfia chamado James Gardette. Ele havia esculpido um conjunto completo de dentaduras de marfim e as entregou à paciente dizendo que não tinha tido tempo de encaixar as molas, mas que voltaria para fazê-lo assim que pudesse. (Era costume naqueles dias que o dentista visitasse o paciente!) Resultou que quando Gardette retornou, ele se espantou ao pedir que a paciente fosse buscar as dentaduras e a paciente respondeu que ela as estava usando desde a entrega. Ela observou que as dentaduras estavam um pouco desconfortáveis inicialmente, mas insistiu, e, logo após, notou que elas estavam bastante confortáveis e que as molas não eram necessárias. Ao examinar as dentaduras, ele percebeu imediatamente que a retenção das mesmas se dava por uma combinação de efeito de sucção, criado pela pressão diferencial da atmosfera e da película de fluido, e dos efeitos da tensão de superfície do fluido. Esta retenção foi conseguida devido ao encaixe preciso da dentadura, tornando as molas desnecessárias, caso a dentadura pudesse ser feita de modo a encaixar-se o mais fielmente possível aos contornos das estruturas bucais. Infelizmente, a produção de dentaduras bem ajustadas ainda representa um sério problema, ao qual retornaremos adiante. Nessa época, a extração de um dente comprometido representava um problema terrível porque não havia métodos indolores para realizar a exodontia. Esta situação mudou radicalmente em 1844 devido à astúcia de um jovem dentista chamado Horace Wells que descobriu os efeitos anestésicos do óxido nitroso, mais conhecido como “gás hilariante”. Numa noite, ele estava presente em uma apresentação pública sobre os efeitos agradáveis do gás hilariante. Um amigo que tinha se submetido ao gás ficou muito violento enquanto estava sob seu efeito e, em meio à confusão, ele tropeçou e feriu gravemente sua perna. Ele não percebeu o ferimento até que Wells apontou para a perna suja de sangue e ele respondeu não ter sentido nada. Wells percebeu imediatamente a

UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

importância da descoberta e no dia seguinte se submeteu à remoção de um de seus próprios dentes com a ajuda do gás. O procedimento acabou sendo altamente bemsucedido e, pouco depois, muitas vítimas de odontalgias foram submetidas a exodontias indolores. Infelizmente, Wells não viveu o suficiente para ver os benefícios de sua descoberta, já que cometeu suicídio três anos mais tarde após tornar-se viciado em clorofórmio. Como consequência da descoberta de Wells, muitas pessoas tiveram seus dentes extraído sem dor. Naquela época, poucos tinham condições de comprar uma dentadura esculpida em marfim ou porcelana. Outras técnicas tinham sido desenvolvidas, pelas quais era possível obter impressões precisas das estruturas bucais e boa parte do marfim era substituída por ouro coesivo, martelado até obter uma estrutura delgada sobre um modelo. A fixação dos dentes artificiais ao ouro era um processo difícil e demorado e, como as dentaduras, era também caro. Esta situação estava para mudar de maneira drástica com a invenção de Charles Goodyear (por volta de 1850) do processo de vulcanização. Neste processo, a borracha era endurecida na presença de enxofre para produzir um material chamado vulcanite. Este material não era apenas barato, mas também fácil de trabalhar; poderia ser modelado para fornecer um encaixe preciso ao modelo e, portanto, às estruturas bucais. Entretanto, a ideia não se propagou tão rapidamente como se esperaria porque a empresa Goodyear Rubber detinha todas as patentes do processo e cobrava dos dentistas até US$ 100 por ano para usá-lo, além de uma taxa de US$ 2 por dentadura. Esta situação mudou quando a patente expirou em 1881 e dentaduras baratas poderiam se tornar disponíveis para as pessoas necessitadas. Atualmente, a vulcanite foi substituída pelas resinas acrílicas, que surgiram com a descoberta dos polímeros sintéticos, inicialmente confeccionados entre as duas Guerras Mundiais. A cera também foi substituída por uma ampla gama de materiais para moldagem bucal com qualidades muito superiores; o que possibilitou a construção de próteses complexas e bem ajustadas.

CONSERVAÇÃO DENTÁRIA Se o século XIX foi a época da substituição dentária, o século XX deve ser considerado a época da preservação dentária. Por exemplo, em 1938, 60% dos tratamentos odontológicos ainda envolviam o fornecimento de dentaduras, mas em 1976 este número caiu para 7%, com o restante consistindo essencialmente em procedimentos odontológicos conservadores. É claro que a ideia de preservar um dente com lesão de cárie não era, de forma alguma, nova. Já no século XI, Rhazes sugeriu que cavidades dentárias poderiam ser preenchidas com uma mistura de alume, barro e mel. O óleo

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de cravo foi lançado por Ambrose Pare (1562) para aliviar a dor de dente e Giovanni de Vigo (1460-1520) sugeriu o uso de folhas de ouro para preencher cavidades. Pierre Fauchard (1728), considerado por muitos o pai da Odontologia, discutiu muitos aspectos desta profissão, incluindo procedimentos operatórios e protéticos, mencionando o chumbo, o estanho e o ouro como possíveis materiais de preenchimento. Entretanto, havia várias lacunas importantes sobre o conhecimento da dentição que impediam o desenvolvimento de técnicas odontológicas conservadoras. Havia uma falta de compreensão sobre as razões que levaram a lesão de cárie dentária, a qual era originalmente atribuída a algum espírito maligno que invadia o dente. Alguns pensavam que a degradação ocorria por causa de vermes e estimulavam o uso de várias tinturas desagradáveis com o objetivo de matá-los. Os primeiros procedimentos odontológicos conservadores sérios não foram colocados em prática até a segunda metade do século XIX. A partir de então foi possível trabalhar nos dentes dos pacientes sem causar desconforto e dor intensa, graças à descoberta dos anestésicos. Esta descoberta tornou possível o uso das brocas odontológicas. A primeira broca somente tornou-se disponível por volta de 1870, o que é surpreendente, já que a perfuração de um dente sem anestesia seria impensável. Agora o preparo dos dentes poderia ser realizado, sendo possível executar procedimentos mais ousados do que meramente a extração em massa dos dentes com lesões de cárie.

COROAS E PONTES Por volta da virada do século, alguns trabalhos odontológicos altamente avançados foram executados de maneira que dentes gravemente destruídos podiam ser reconstruídos com coroas de porcelana. Este procedimento foi beneficiado pela invenção de um cimento que endureceria na boca (isto é, cimento de fosfato de zinco), o qual ainda é até hoje amplamente utilizado. As cartas de Roosevelt, presidente dos Estados Unidos da América, aos seus pais quando era jovem, ilustra a grande satisfação proporcionada pela nova invenção: Depois do almoço fui ao dentista e agora estou sem o meu dente da frente. O dentista o arrancou bem rápido e sem dor, fez moldagem da raiz e do espaço e está cozinhando a peça de porcelana. Espero colocá-la na próxima sexta-feira e, até lá, evitarei qualquer evento social, pois me sinto ridículo falando assobiando que nem uma chaleira e parecendo um banguela. 19 de maio de 1902. Esta carta foi seguida por outra, uma semana mais tarde na qual ele escreve:

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Meu dente já não é um sonho, é um fato consumado. Foi colocado na sexta-feira e é perfeito no formato, cor, brilho, textura etc. Sinto-me como uma nova pessoa e três garotas já me cortejaram. Obviamente um cliente satisfeito! Como é frequentemente o caso das rápidas evoluções, alguns problemas ocorreriam adiante. Um destes foi destacado por um médico inglês, William Hunter, que acusava o que foi então chamado de “Odontologia americana” de contribuir para a má saúde de muitos de seus pacientes. Ele tinha vários pacientes com enfermidades sem diagnóstico até que notou os trabalhos restauradores extensos em suas bocas. Estas pontes e coroas pareciam sujas e estavam circundadas por tecido de aspecto insalubre, já que a higiene bucal era quase inexistente. Naquela época não se executava tratamento endodôntico, então as raízes dos dentes tornavam-se infectadas rapidamente. Em muitas ocasiões, as coroas e pontes eram construídas sobre dentes muito comprometidos. Ele sugeria que estas coroas e pontes fossem removidas e os dentes extraídos o que levava os pacientes a reagir com consideráveis objeções devido ao custo do tratamento odontológico. Porém, dentre os que concordavam com a remoção das pontes, vários apresentavam melhora imediata na saúde. Isto levou Hunter a descrever a Odontologia americana como “mausoléus de ouro sobre uma massa séptica”. Consequentemente, os dentes eram considerados os culpados de todas as classes de doenças que não podiam ser prontamente diagnosticadas e isto fez com que muitos dentes perfeitamente saudáveis fossem extraídos sem necessidade. Finalmente, a razão prevaleceu com a introdução, em 1913, do equipamento de raios X por C. Edmund Kells. Agora poderia ser demonstrado se um dente com raiz necrosada estava saudável ou não. Se estivesse saudável poderia ser mantido e apenas seria removido caso estivesse comprometido. Atualmente consideramos o uso de coroas e pontes como algo certamente garantido. Novos desenvolvimentos ainda poderiam nos estimular, como a introdução das facetas cerâmicas nos anos 1980 e o rápido desenvolvimento da tecnologia CAD-CAM que abriu novas oportunidades com materiais novos como a alumina pura e o zircônio, os quais permitem a confecção de pontes de cerâmica pura.

MATERIAIS RESTAURADORES A metade do século XIX presenciou a organização da Odontologia como uma profissão assim como o surgimento de muitas sociedades odontológicas, bem como de vários periódicos científicos na área. Um dos primeiros atos da Sociedade Americana de Cirurgiões Dentistas (American Society of Dental Surgeons) foi a proibição do uso do amálgama de prata por seus membros, resultando na “guerra do amálgama”. O amálgama é uma mistura de prata, estanho e mercúrio e foi um dos primeiros materiais restauradores usados em Odontologia. Entretanto, muitos problemas surgiram com o uso deste material devido à falta de compreensão sobre suas qualidades. Só depois do trabalho de G. V. Black que alguma ordem foi estabelecida contra o caos. Ele publicou dois volumes sobre dentística operatória em 1895 os quais se tornaram a norma mundial para dentística restauradora. O amálgama não tinha uma reputação muito boa até Black ter estudado o comportamento do amálgama em detalhes e como usá-lo da melhor maneira. Entretanto, a partir de então até nossos dias, o amálgama tornou-se um dos mais importantes materiais restauradores usados em Odontologia. Grande crédito deve ser dado a seu intelecto e habilidade já que apenas agora parte de sua filosofia está sendo desafiada; especialmente à luz do conhecimento atual comparado ao que se sabia nos anos 1900. É uma lição que a Odontologia terá que aprender repetidas vezes à medida que novos materiais são introduzidos no mercado (Tabela 1.2.1).

RESUMO Como se pode observar da discussão prévia, existem várias técnicas restauradoras que os cirurgiões-dentistas precisam conhecer. Além disso, os cirurgiões-dentistas usam uma ampla variedade de diferentes materiais, alguns duros e rígidos e outros macios e flexíveis. É importante que o cirurgião dentista avalie completamente as várias características destes materiais e suas limitações tornando-os úteis nas aplicações odontológicas. Somente assim o cirurgião-dentista estará apto a selecionar o material mais adequado para uma determinada aplicação.

UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

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Tabela 1.2.1 Marcos históricos dos materiais dentários 600 a.C.

Trabalhos de pontes em ouro dos etruscos

1480 d.C.

Primeiro registro autêntico de obturações de ouro em dentes humanos por Johannes Arculanus, Universidade de Bolonha

Anos 1500

Dentaduras de marfim começaram a ser esculpidas em modelos de cera

1728

Fauchard propôs o uso da porcelana

1744

Duchateau registra a produção da primeira dentadura de porcelana

1826

Taveau de Paris sugere o uso de prata e mercúrio para elaborar uma pasta para restauração dos dentes

1839

O primeiro periódico odontológico é publicado: American Journal of Dental Science

Anos 1840

“Guerra do amálgama” – o uso do amálgama de prata é proibido

1850

Charles Goodyear inventou a vulcanite – borracha endurecida com enxofre

1879

É introduzido o primeiro cimento com endurecimento na boca, o fosfato de zinco

Anos 1880

São desenvolvidos os cimentos de silicato

1895

G. V. Black publica o primeiro estudo detalhado sobre as propriedades do amálgama

1907

W. H. Taggart de Chicago inventou um método prático para fundir incrustações (restaurações inlays) de ouro

Anos 1950

Introdução da resina acrílica para restaurações e dentaduras

1955

Buonocore descobriu a técnica de condicionamento ácido para adesão ao esmalte

1970

Os compósitos começam a substituir os cimentos de silicato

1976

Os cimentos de ionômero de vidro são inventados por A. Wilson

1978

Os compósitos fotoativados aparecem no mercado

1983

Horn lança as facetas cerâmicas fixadas por resina

1985

Desenvolvimento dos agentes de união dentinária

1988

Introdução dos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina

1994

O primeiro compômero aparece no mercado

LEITURA COMPLEMENTAR Greener EH (1979) Amalgam: yesterday, today and tomorrow. Oper Dent 4: 24 Hyson JM Jr (2003) History of the toothbrush. J Hist Dent 51: 73–80 Irish JDA (2004) 5,500 year old artificial human tooth from Egypt: a historical note. Int J Oral Maxillofac Implants 19: 645–647 Little DA (1982) The relevance of prosthodontics and the science of dental materials to the practice of dentistry. J Dent 10: 300–310 Phillips RW (1976) Future role of biomaterials in dentistry and dental education. J Dent Educ 40: 752–756

van Noort R (1985) In defence of dental materials. Brit Dent J 158: 358–360 Wildgoose DG, Johnson A, Winstanley RB (2004) Glass/ceramic/refractory techniques, their development and introduction into dentistry: a historical literature review. J Prosthet Dent 91: 136–143 Williams HA (1976) The challenge tomorrow in dental care delivery. J Dent Educ 40: 587 Woodforde J (1971) The strange story of false teeth. Universal-Tandom Publ. Co., London

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Capítulo 1.3

ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA

INTRODUÇÃO Todos os materiais são construídos de átomos ou moléculas, de maneira que não é surpreendente observar uma íntima relação entre a estrutura atômica dos materiais e suas propriedades. A natureza dos átomos e o modo em que se encontram arranjados são importantes neste contexto. Os átomos se combinam para determinar a microestrutura do sólido e, como consequência, estabelecem suas propriedades. Portanto, para se entender as propriedades dos materiais deve-se ter um entendimento da maneira como os átomos podem se combinar para formar sólidos.

UNIÃO DOS ÁTOMOS Quando dois átomos encontram-se próximos podem se ligar e formar uma molécula. Qualquer ligação que se forma é chamada ligação primária. Entretanto, estes podem repelir-se e manter sua característica individual. Dependendo do grau de interação entre os átomos podem ser formados um dos três estados da matéria, sendo estes: gases, líquidos ou sólidos. Estes são considerados os três estados principais da matéria, em que o estado é definido como: a parte estruturalmente homogênea de um sistema e; cada estado apresenta sua estrutura própria e propriedades associadas distintas. No estado gasoso há pouca ou nenhuma resistência relativa aos movimentos dos átomos e moléculas, enquanto no estado líquido a resistência a esses movimentos é consideravelmente maior. Entretanto, as moléculas ainda podem movimentar umas sobre as outras com grande facilidade. O movimento dos átomos e moléculas é restrito a uma vibração local nos sólidos, embora algum movimento em nível atômico seja possível por meio da difusão. O fator que controla a formação da união é a energia e uma união apenas se formará se resultar na diminuição da energia total dos átomos que estão se ligando. Isto significa que a energia total da molécula deve ser menor

que o somatório das energias dos átomos isolados, independentemente da ligação que estiver sendo formada. O diagrama de separação energética é uma maneira simples de visualização deste fenômeno. O diagrama considera o efeito da movimentação de dois átomos próximos em sua energia total. Uma curva típica de separação energética é apresentada na Figura 1.3.1. Quando dois átomos estão separados e distantes, a energia é 2Ea, e Ea é a energia total de um átomo. Conforme os átomos se aproximam, a energia total começa a diminuir até atingir o mínimo Em, a uma distância a0. Posteriormente, com a maior aproximação dos átomos, a energia total aumenta devido à repulsão entre suas camadas de elétrons. Com a aproximação maior ainda, seus núcleos começam a repelirem-se, porém tal proximidade não é em geral encontrada em circunstâncias normais. Desta maneira, diz-se que os átomos tem atração em distâncias maiores e repulsão quando próximos. As condições para que dois átomos se liguem dependerão das configurações dos elétrons dos átomos, que são fatores determinantes da sua reatividade química. Quanto mais estável for a configuração dos elétrons, menos reativo será o átomo, com o extremo da estabilidade sendo os “gases inertes” tais como o argônio, hélio e neônio, que são praticamente não reativos. A quase não reatividade destes é causada pelo fato destes átomos terem sua camada mais externa completa, sem oportunidade para união com outros elétrons no átomo e sem elétrons “reserva” ou “soltos” para deixar o átomo. Todos os átomos tentam encontrar seu estado de menor energia, e isso é o mesmo que terem a última camada de elétrons completa, assim como os gases inertes têm. Os átomos de alguns elementos possuem “lugares” para elétrons em sua última camada, enquanto átomos de outros elementos apresentam elétrons “disponíveis” em suas órbitas mais externas. Pela combinação de um com outro, estas duas diferenças podem tornar as órbitas externas completas. A formação das ligações, portanto, envolve apenas os elétrons de valência mais externos.

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Energia

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Figura 1.3.2 Dois átomos de hidrogênio combinados por ligação covalente para formar o gás de hidrogênio.

Distância interatômica Figura 1.3.1 Curva de separação energética para dois átomos, cada um com energia Ea.

TIPOS DE LIGAÇÕES PRIMÁRIAS Existem três tipos de ligações primarias: covalente, iônica e metálica.

Ligações Covalentes A ligação covalente é a ligação mais simples e mais forte. Ela se dá quando os átomos compartilham seus elétrons de modo que cada camada de elétrons atinge uma estrutura semelhante a um gás inerte. A formação de tal ligação para dois átomos de hidrogênio é mostrada na Figura 1.3.2. À medida em que dois átomos se aproximam e as órbitas dos elétrons começam a se sobrepor, é formada a órbita da molécula onde os dois elétrons são compartilhados pelos dois núcleos. Uma vez que os elétrons passarão a maior parte do tempo na região em que as órbitas se sobrepõem, a ligação é altamente direcional.

Ligações Iônicas Um átomo, tal como o sódio, gostaria de perder o seu único elétron de valência, uma vez que isso o deixaria com a configuração similar à do neônio. Naturalmente, isto não pode acontecer a menos que exista outro átomo próximo que aceite o elétron rapidamente. Os elementos que podem adquirir uma estrutura semelhante a dos gases inertes pela aquisição de um elétron são o flúor, cloro, bromo e iodo, conhecidos coletivamente por halogênios. Portanto, se um átomo de sódio e um de cloro puderem se interagir, ocorrerá uma transferência completa do átomo de valência do átomo de sódio para o de cloro. Ambos atingirão uma estrutura de gás inerte com o sódio apresentando carga positiva devido à perda de um elétron negativo e o cloro apresen-

Cátion

Ânion

Figura 1.3.3 Formação de uma ligação iônica entre o sódio e o cloro.

tando carga negativa pela aquisição de um elétron extra. Esses dois íons serão atraídos um pelo outro devido às suas cagas elétricas opostas com consequente redução na energia total do par com a aproximação. Isso é mostrado no modelo da Figura 1.3.3; tais ligações são denominadas iônicas. Uma diferença importante entre as ligações covalente e iônica é que a última não é direcional. Isto porque a ligação iônica é resultante de campos eletrostáticos que envolvem íons e estes campos interagirão com quaisquer outros íons na proximidade.

Ligações Metálicas A terceira ligação primária é a ligação metálica. Ela ocorre quando se tem um grande agregado de átomos, em geral em um sólido, que facilmente doam elétrons de sua última camada. Em tal situação, os elétrons podem se mover quase que livremente através do sólido, gastando seu tempo passando de um átomo para outro. As órbitas dos elétrons nas ligações metálicas possuem energia menor que as órbitas dos elétrons de um átomo individual. Isto se deve aos elétrons de valência estarem sempre mais próximos de um ou outro núcleo do que estariam em um átomo isolado. Uma nuvem de elétrons, como demonstrado na Figura 1.3.4, rodeia os átomos. Assim como a ligação iônica, esta ligação não é direcional.

Energias de Ligação Uma característica importante de uma ligação é a energia de ligação. Esta é a quantidade de energia que precisa ser fornecida para separar os dois átomos e é igual a 2Ea – Em,

ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA

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Figura 1.3.4 Formação de uma ligação metálica, mostrando uma nuvem de elétrons ao redor do núcleo.

Tabela 1.3.1 Energias de ligação típicas para os três tipos de ligação Átomos ligados

Tipo de ligação

Energia de ligação (eV)

C–C

6,3

C–F

5,6

H–H

Covalente

4,5

H–O

4,4

C–Cl

4,0

Na–Cl

4,2

K–Br

Iônica

3,9

Na–I

3,2

Au–Au

2,3

Cu–Cu

2,0

Ag–Ag

Metálica

1,8

Pb–Pb

0,8

Hg–Hg

0,2

como definido na Figura 1.3.1. A energia de ligação típica para cada um dos três tipos de ligação é apresentada na Tabela 1.3.1. Uma característica geral que pode ser observada da energia de ligação é que a ligação covalente tende a ser a mais forte, seguida pela ligação iônica e então finalmente pela ligação metálica. Existe uma grande variedade de energia de ligação para as ligações metálicas, com algumas se aproximando das ligações iônicas e outras sendo muito baixas. O mercúrio possui uma energia de ligação muito baixa, formando uma ligação que não é forte o suficiente para sequer manter os átomos em posição na temperatura ambiente, resultando na liquefação do mercúrio nesta temperatura.

A FORMAÇÃO DOS SÓLIDOS Sólidos Iônicos Os íons são cercados por campos eletrostáticos não direcionais e é possível que os íons carregados positiva e

Íon negativo

Íon positivo

Figura 1.3.5 Formação de um sólido por ligação iônica dos íons sódio (!) e cloro ( ).

negativamente encontrem um arranjo posicional que pode ser mutuamente benéfico, com o objetivo de encontrar uma energia menor. Os íons podem formar uma rede tridimensional e regular com o exemplo do cloreto de sódio mostrado na Figura 1.3.5. As substâncias iônicas, tais como: os cloretos, nitretos e óxidos de metais são os blocos estruturais básicos para a construção de um grupo de materiais conhecidos como cerâmicas, em que um grupo muito especial são os vidros (Cap. 1.4). Estes materiais são muito estáveis devido às suas altas forças de ligação.

Sólidos Metálicos Um arranjo semelhante àquele dos sólidos iônicos é possível com ligações metálicas. Neste caso, não há uma atração eletrostática forte entre os átomos (como havia entre os íons nos sólidos iônicos), na medida em que se mantêm unidos pela nuvem de elétrons; esta nuvem forma a base dos metais que serão discutidos no Capítulo 1.5.

Sólidos Covalentes Há apenas poucas situações em que os átomos do mesmo elemento se unem por ligações covalentes para formar um sólido; estes são o carbono, o silício e o germânio. É a direcionalidade da ligação covalente que a difere essencialmente das outras duas ligações primárias. A direcionalidade impõe sérias limitações nos possíveis arranjos dos átomos. Um exemplo de sólido ligado covalentemente é o diamante, que é uma forma de carbono. O carbono possui um arranjo de elétrons em sua última camada de tal

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

forma que necessita de outros quatro elétrons para obter uma configuração semelhante ao neônio; que no caso do diamante é alcançado compartilhando-se elétrons com os átomos de carbono vizinhos. A direção dessas ligações é tal que são direcionadas para as quatro extremidades de um tetraedro com os núcleos dos átomos de carbono em seu centro. A estrutura tridimensional do diamante é construída como apresentado na Figura 1.3.6. Os sólidos covalentes constituídos por um único elemento tendem a ser muito raros. As ligações covalentes são mais facilmente formadas entre elementos diferentes em que cada um adquire a configuração de gás inerte. Uma vez que estes elementos tenham reagido para formar estas ligações, a molécula criada se torna altamente não reativa a moléculas do mesmo tipo, e não promove uma base para formação de uma rede tridimensional. As órbitas eletrônicas se superpõem e os elétrons são compartilhados; resultando em uma órbita que é muito estável. Nesta configuração, não há órbitas parcialmente preenchidas disponíveis para ligações adicionais pelos mecanismos de ligação primária. Deste modo, elementos ligados covalentemente resultam em moléculas estáveis e a maioria dos elementos, que se unem por ligações covalentes, tende a ser gases ou líquidos, p. ex., água, oxigênio e hidrogênio. Desses exemplos, a água se solidifica a 0°C e, para isso ser possível, deve haver alguma atração adicional entre as moléculas de água; algo deve ser capaz de manter essas moléculas unidas, porém isto não se deve à ligação primária.

covalente, porém, ao contrário dos outros átomos, a carga positiva do próton não é contraposta pelos elétrons circundantes. Portanto, ele terá carga positiva e será atraído para os elétrons dos átomos em outras moléculas. Uma condição necessária para a formação de pontes de hidrogênio é que um átomo eletronegativo deve estar próximo do átomo de hidrogênio, que por sua vez se liga ao átomo ligado a um átomo eletronegativo. Um exemplo deste princípio é o gelo, em que há uma interação entre o átomo de hidrogênio em uma molécula e o átomo de oxigênio de outra molécula, mostrado esquematicamente na Figura 1.3.7. A força da ligação é de apenas 0,4 eV e é prontamente superada pelo aquecimento acima de 0°C. A ponte de hidrogênio é importante porque é responsável pela extensiva adsorção possível pelas moléculas orgânicas, incluindo proteínas e é, portanto, considerada essencial para os processos vitais. A ligação secundária forma a base da atração molecular em sólidos moleculares.

Ligações Secundárias Uma consequência dos elétrons compartilhados por dois ou mais núcleos atômicos é que os elétrons gastarão um tempo desproporcionalmente mais longo em uma posição particular. O efeito disto é que uma extremidade da molécula pode adquirir uma carga levemente positiva enquanto outra pode se tornar levemente negativa, resultando em desequilíbrio elétrico conhecido como bipolaridade elétrica. Estes bipolos permitem que as moléculas interajam umas com as outras e formem ligações fracas, chamadas ligações de van der Waal. Os três fatores principais, que contribuem para estas interações relativamente fracas, são: ■ ■ ■

Figura 1.3.6 Estrutura do diamante, mostrando a rede tridimensional construída do arranjo tetraédrico das ligações entre átomos de carbono.

interações entre bipolos permanentes; interações entre bipolos induzidos; e interações entre bipolos instantâneos.

O último dos fatores, conhecido como Efeito de Dispersão de Londres, é completamente genérico e acontece sempre que duas moléculas, íons ou átomos, estejam em contato íntimo. Este é o resultado da interação entre movimentos aleatórios dos elétrons de duas espécies. Um caso especial de interação bipolo-bipolo é a ponte de hidrogênio. O átomo de hidrogênio pode ser imaginado como um próton na extremidade de uma ligação

Figura 1.3.7 Formação de pontes de hidrogênio no gelo.

ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA

Sólidos Moleculares É possível se criar uma grande variedade de moléculas diferentes, algumas das quais podem ser sólidas em temperatura ambiente. Se as moléculas forem suficientemente grandes, elas podem ser ligadas entre si devido às inúmeras interações bipolares. A baixa força de ligação significa que tais sólidos terão uma temperatura de fusão baixa e o limite máximo para os sólidos moleculares é de aproximadamente 100°C. A melhor maneira de apreciar como estes sólidos são formados é por meio de um grupo de moléculas conhecidas como alcanos lineares. Estes têm como base uma cadeia linear de hidrocarbonetos, com fórmula geral de CnH2n+2, e n pode ser qualquer número inteiro positivo. O mais simples destes alcanos é o metano (CH4) que possui n=1. Se retiramos um átomo de hidrogênio de cada uma de duas moléculas de metano e unimos as moléculas por uma ligação de carbono-carbono, isto resultará na formação do etano. Podemos continuar a repetição deste processo e obter moléculas realmente grandes (Fig.1.3.8).

Metano (n=1)

Etano (n=2)

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Na medida em que o número de grupos de –CH2– se tornar muito grande, haverá pouca diferença nas propriedades destes materiais, que são conhecidos coletivamente como polimetileno. Este nome é derivado da palavra poli que significa muitos e da unidade estrutural básica de que é constituído, metileno. Um material com este tipo de estrutura é conhecido como polímero e consiste em muitas unidades repetidas chamadas meros. A formação de uma variedade de estruturas sólidas por polímeros será discutida em detalhes no Capítulo 1.6.

O ARRANJO ESTRUTURAL DOS ÁTOMOS NOS SÓLIDOS Considerando as forças de atração que mantêm os átomos intimamente ligados, a repulsão mútua dos núcleos significa que um equilíbrio espacial está atrelado a eles e que estas forças se equilibram. Este arranjo espacial interatômico está apresentado como a0 na Figura 1.3.1. Uma força externa é necessária para mover os átomos aproximando-os ou afastando-os. Este arranjo espacial interatômico é a configuração de menor energia e para alcançá-la há uma tendência dos átomos em adotar um arranjo compacto regular. Se considerarmos os átomos como esferas, é possível fazer uma analogia com esferas empacotadas em uma caixa. A forma mais densa de se empacotar essas esferas é obtida quando são arranjadas de maneira regular e simétrica como mostrado na Figura 1.3.9. Quando os átomos são organizados desta forma diz-se que se trata de um material cristalino. A característica importante de uma estrutura cristalina é que, partindo de qualquer átomo contido nela, o arranjo dos átomos adjacentes é idêntico. Sólidos iônicos e metálicos são normalmente cristalinos em temperatura ambiente. Qualquer sólido que não tenha simetria dos átomos é dito amorfo.

Estrutura Cristalina Um dos arranjos atômicos mais elementares é o cubo simples, em que os átomos ocupam a posição dos oito vértices.

Propano (n=3)

Butano (n=4) Organizado Figura 1.3.8 Os quatro primeiros membros da família dos alcanos, que são hidrocarbonetos de cadeia linear, seguindo a fórmula geral de CnH2n+2.

Desorganizado

Figura 1.3.9 Os arranjos organizado e desorganizado dos átomos.

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Usando novamente o modelo das esferas para os átomos, este arranjo é apresentado na Figura 1.3.10a. Cada esfera toca a sua vizinha mais próxima, de modo que o comprimento do lado do cubo é igual ao diâmetro do átomo. Se considerarmos um cubo simples, contendo apenas uma porção dos átomos em seu interior como mostrado na Figura 1.3.10b, tem-se o que chamamos célula estrutural. Ao se empilhar essas células estruturais umas sobre as outras, pode-se construir um sólido tridimensional. Os átomos não ocupam todo o espaço da unidade estrutural. A fração de espaço ocupado pelos átomos é denominada fator de compactação e é calculada facilmente. Se supormos que cada lado do cubo mede 2a de comprimento, então o volume da célula estrutural é 8a3. De forma correspondente, o raio de cada esfera deve ser a, e seu volume será fornecido por 4/3πa3. Cada esfera contribui apenas com 1/8 de seu volume para a célula estrutural, porém uma vez que haja oito segmentos, as esferas dentro do cubo ocupam um volume total de 4/3πa3. Deste modo, o fator de compactação de um cubo simples é dado por: fator de compactação = volume de átomos dentro do cubo/volume do cubo = 4/3πa3/(2a)3 = π/6 = 0,54 Isto indica que aproximadamente 50% do espaço não está preenchido. De fato é possível para outros átomos menores ocupar este espaço livre sem causar ruptura na estrutura cris-

talina; este assunto será abordado mais adiante ao se discutir as ligas. Devido à grande quantidade de espaço livre nesta estrutura simples, não é surpresa que haja outros arranjos atômicos que tenham um fator de compactação maior. Dois desses arranjos que ocorrem comumente nos metais são as configurações cúbicas de corpo centrado (CCC) e as configurações cúbicas de face centrada (CFC), que são apresentadas na Figura 1.3.11. Os fatores de compactação são 0,68 e 0,74 para as estruturas CCC e CFC, respectivamente. Com estes fatores de compactação maiores é mais difícil para átomos menores ocupar os espaços livres sem afetar a estrutura.

RESUMO De certo modo, não é surpresa que existam três grupos principais de sólidos baseados nos três tipos de ligações primárias, chamados: ■

■ ■

cerâmicas – baseadas nas ligações iônicas, que podem existir na forma cristalina e amorfa, com a última sendo os vidros; metais – baseados na ligação metálica; sólidos moleculares – baseados nas ligações covalentes e ligações secundárias e incluindo um grupo importante de materiais conhecido como polímeros.

Há um grupo importante de materiais que ainda não foi mencionado. Estes são os compósitos, que são baseados na combinação de dois ou mais dos sólidos mencionados.

(a) Cubo Simples

Figura 1.3.10 A estrutura cúbica simples (a) e sua célula estrutural (b).

(b) Célula Estrutural

ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA

CCC (fator de compactação = 0,68)

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CFC (fator de compactação = 0,74)

Figura 1.3.11 Arranjos atômicos das configurações cúbica de corpo centrado (CCC) e cúbica de face centrada (CFC).

Existem vários exemplos de compósitos, tanto naturais como sintéticos. Osso e dentina são compósitos naturais, cujos principais constituintes são o colágeno (um polímero) e a apatita (uma cerâmica). Os compósitos sintéticos incluem os polímeros de fibra de vidro reforçada e polímeros com partículas cerâmicas. Um exemplo

odontológico do último são os materiais restauradores feito de compósitos discutidos no Capítulo 2.2. Outro exemplo odontológico de compósito é o cermet, que é a partícula de carga utilizada em alguns cimentos de ionômero de vidro (Cap. 2.3). O nome é derivado dos seus dois componentes; cer(âmica) e met(al).

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Capítulo 1.4

ESTRUTURA DAS CERÂMICAS

INTRODUÇÃO As cerâmicas são composições de elementos metálicos e de substâncias não metálicas como óxidos, nitritos e silicatos. Elas podem aparecer como sólidos cristalinos e como sólidos amorfos, este último grupo chamado de vidros. Nas cerâmicas os íons carregados negativamente (ânions) em geral são significativamente diferentes em tamanho dos íons carregados positivamente (cátions). Um exemplo já citado é o cloreto de sódio, que possui estrutura cúbica de face centrada. Os íons de cloro tomam posição nos pontos de cruzamento (ângulos) do arranjo CFC (cúbico de face centrada), com os íons de sódio permanecendo em posições entre os íons cloro, as quais são chamadas posições intersticiais. Os íons de sódio podem fazer isso porque são muito menor do que os íons de cloro e se encaixam nos espaços livres deixados entre eles. A exata estrutura cristalina é apresentada na Figura 1.4.1. Outro exemplo desse tipo de estrutura é o óxido de zinco, que é amplamente usado em odontologia. Existem muitas outras aplicações das cerâmicas na odontologia; elas são usadas como cargas nas resinas compostas, nos cimentos de ionômero de vidro e nos revestimentos e porcelanas.

MATERIAIS DE CERÂMICA A sílica (SiO2) forma a base de muitos materiais cerâmicos. Embora tenha uma fórmula química simples, ela é um material versátil e pode existir em várias formas diferentes. A sílica ocorre como um material cristalino na forma de quartzo, cristobalita e tridimita ou como um vidro, como a sílica fundida. Essa habilidade de um composto, tal como a da sílica, de existir em diferentes formas com características distintas é conhecida como polimorfismo. A sílica é usada como base de formação de muitas formulações cerâmicas complexas, em particular em com-

binação com óxido de alumínio, com o qual forma os vidros de alumino-silicato, como o usado nos cimentos de ionômero de vidro. Da mesma forma, os vidros de feldspato são usados em restaurações cerâmicas e são compostos contendo óxidos de alumínio e silício em combinação com o potássio, o sódio ou o cálcio (p. ex., NaAlSi3O8).

CERÂMICAS CRISTALINAS E AMORFAS Transições Cristalinas Quando um sólido é aquecido, ele pode sofrer uma série de transformações, a mais facilmente reconhecida é quando um sólido derrete. Essa mudança do cristal de sólido para líquido é conhecida como transição de fusão cristalina e é acompanhada por uma mudança no volume do material. Essa mudança de volume pode ser monitorada para permitir a detecção das transformações. Um meio simples de evidenciar essa mudança é representar graficamente a variação do volume específico do material (isto é, o volume de uma unidade de massa do material) em função da temperatura. Esse gráfico resulta numa curva, como a mostrada na Figura 1.4.2, e, no ponto de fusão do cristal (isto é, a uma temperatura específica), há uma discreta descontinuidade no volume específico. O volume específico é efetivamente o inverso da densidade. Essa curva específica do volume/temperatura mostra que um efeito da fusão do cristal é um aumento do volume. Não é surpreendente quando se pensa que essa transição é de uma estrutura cristalina organizada para um líquido desorganizado; a densidade de compactação dos átomos no líquido será consideravelmente menor que aquela do sólido cristalino. A curva do volume específico/temperatura para a sílica cristalina é mostrada na Figura 1.4.3. Nesse exemplo, existe uma série de transições sólido-sólido, assim como a transição normal, do sólido para o lí-

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

quido. A sílica está na forma de quartzo em temperatura ambiente, que se transforma em tridimita a 870°C. A transformação seguinte ocorre a 1.471°C, a tridimita se transforma em cristobalita e, finalmente, a cristobalita derrete a 1.713°C. Sendo assim, é possível detectar tanto a transição sólido/sólido, como a sólido/líquido na sílica cristalina.

Transições Vítreas Quando um sólido amorfo como o vidro é aquecido não demonstra uma transição sólido/líquido evidente, já que o material não é cristalino. Em vez disso, o que acontece é que em algum ponto há um aumento na taxa de mudança do volume específico, como mostra a Figura 1.4.4. A temperatura na qual essa mudança de inclinação ocorre é conhecida como temperatura de transição vítrea, Tg. Em geral (mas nem sempre) este também é o caso dos sólidos moleculares. A consequência disso é que não haverá nenhum aumento súbito no volume (daí o volume vazio). O que ocorre é um aumento gradual no volume, com a taxa de

Cl Na

aumento se tornando mais rápida acima da temperatura de transição vítrea. O inverso disso é que um líquido que esfria sem formar uma estrutura cristalina conterá uma grande quantidade de volume vazio. Os sólidos que são formados pela passagem pela transição do vidro e não por uma transição de fusão cristalina serão amorfos e são chamados vidros. Os vidros são um grupo importante de materiais e merecem atenção especial.

A FORMAÇÃO DE UM VIDRO Devido a suas formas regulares, os átomos tendem a formar estruturas organizadas. Moléculas pequenas, tais como o metano, são capazes de formar estruturas cristalinas facilmente, e até alguns alcanos lineares de cadeia longa podem formar estruturas cristalinas se a molécula for considerada como uma haste rígida. Entretanto, quando se tem moléculas maiores e mais complexas, os

Volume específico

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Líquido

Tridimita Cristobalita

Quartzo .

.

Temperatura (ºC) Figura 1.4.1 Estrutura cúbica de face centrada do cloreto de sódio.

Figura 1.4.3 Transições sólido-sólido da sílica (SiO2).

Líquido

Sólido

Tm Temperatura Figura 1.4.2 Transição de um sólido para líquido, em que Tm é a temperatura de fusão.

Volume específico

Volume específico

Líquido

Sólido

Tg Temperatura Figura 1.4.4 Variação do volume específico de um sólido amorfo em função da temperatura.

ESTRUTURA DAS CERÂMICAS

arranjos regulares se tornam mais difíceis de porém conseguidos. Desta forma, moléculas grandes e irregulares possuem uma alta probabilidade de formar um vidro durante a solidificação. Para que ocorra o crescimento do cristal é necessário que estejam presentes núcleos de cristalização. Geralmente eles existem na forma de impurezas, tal como partículas de poeiras, as quais são praticamente impossíveis de eliminar. Então, se há alguma chance de que o material possa formar um arranjo cristalino ordenado, ele o fará normalmente. A sílica pode formar tanto o vidro como sólidos cristalinos, e suas curvas específicas de volume/temperatura estão apresentadas na Figura 1.4.5. Quando a cristalização ocorre no resfriamento (curva a), há uma redução nítida e discreta do volume específico. Essa contração é devido à “contração de configuração”, já que há um grande aumento na fração de compactação quando se modifica um líquido desordenado para um sólido cristalino organizado. Uma vez que essa nítida contração esteja completa, o material continua a se contrair pela contração térmica normal. Se a cristalização não ocorresse, o material seguiria a curva b e o líquido continuaria a se contrair, parcialmente por contração térmica normal e parcialmente pela contração de configuração. O líquido adquire uma estrutura menos frouxa, mas não há nenhum discreto salto no volume específico. Abaixo da Tm, forma-se um líquido super-resfriado instável. Essa contração continua conforme a temperatura decresce até Tg, a temperatura de transição vítrea, ser alcançada, depois do que a taxa de contração diminui gradualmente. Nesse ponto, a contração de configuração paralisa e continua a ocorrer apenas a contração térmica. O que ocorre na temperatura de transição do vidro é que o líquido super-resfriado torna-se tão viscoso que as mudanças da configuração não podem mais ocorrer, e a

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estrutura líquida torna-se congelada. A temperatura na qual isso ocorre não é um ponto nitidamente definido, mas uma faixa de temperatura em torno de 50°C, representada pelo dobramento da curva. Uma vez que o líquido super-resfriado tenha resfriado abaixo da temperatura de transição vítrea, ele é descrito como vidro. É interessante observar que a viscosidade em que isso ocorre é aproximadamente a mesma para todos os vidros, em torno de 1012 Pa.s., embora a temperatura em que isso acontece pode variar de -89ºC para a glicerina até mais de 1.500°C para o vidro de sílica pura. A distinção entre um líquido super-resfriado e um vidro é que o último possui uma viscosidade maior que 1012 Pa.s. O termo temperatura de transformação é de certa forma incorreta, uma vez que não há uma verdadeira transformação a essa temperatura. As mudanças da configuração estão ainda ocorrendo em temperaturas abaixo da Tg, só que a taxa de mudança agora é tão pequena, por causa da alta viscosidade, que para todos os propósitos e intenções, ela está parada. A temperatura de transição vítrea, isto é, a temperatura na qual o vidro que está sendo resfriado cessa efetivamente para realizar alterações na configuração, é algumas vezes denominada temperatura fictiva do vidro. Ela é a temperatura abaixo da qual não existe tendência espontânea do vidro de se tornar mais denso. A questão é: “O que acontece à Tm que determina se a rota de formação do cristal ou vidro é seguida?” Quando a sílica derrete, ela produz um líquido muito viscoso, que significa que as moléculas podem apenas mover umas sobre as outras muito lentamente. Isso não é favorável à formação de um sólido cristalino, já que a cristalização requer um rearranjo rápido e substancial das moléculas. Qualquer núcleo cristalino presente tenderá, portanto, a crescer muito lentamente, em especial devido à estrutura complexa da sílica cristalina, que é similar à de um diamante. Então, se o líquido for resfriado com rapidez, o sólido formado provavelmente será um vidro. O processo de formação de um vidro chama-se vitrificação.

Líquido

Formadores de Vidro

Volume específico

Líquido super-resfriado (b)

(a)

Vidro Sólido cristalino Tg

Tm

Temperatura Figura 1.4.5 Curvas de resfriamento de um material que pode formar um sólido cristalino (a) ou um vidro (b).

O componente essencial que permite a formação do vidro é a sílica, que pode por si só tornar-se tanto um vidro como um sólido cristalino pelo resfriamento. A cristobalita, uma das formas cristalinas da sílica, possui um tetraedro como unidade básica, com um átomo de oxigênio em cada vértice e um átomo de silício no centro, como mostra a Figura 1.4.6. Essa estrutura é um tanto complexa quando se pretende visualizar o desenvolvimento de um vidro, por isso o processo de formação pode ser compreendido de uma forma mais simples se considerar uma representação bidimensional na qual não aparece uma ligação de cada átomo de sílica (Fig. 1.4.7).

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Oxigênio Silício

Figura 1.4.6 Estrutura cristalina da cristobalita.

Quando a sílica derretida é resfriada rapidamente, a estrutura cristalina não tem tempo de se formar, de modo que a sílica solidifica como um vidro que é chamado quartzo fundido (Fig. 1.4.8). O alto ponto de fusão desse material, l.713ºC, torna-o muito caro para uso geral. Se forem misturados certos óxidos metálicos com a sílica a temperatura de fusão é drasticamente reduzida. Como exemplo, uma composição de três quartos de sílica e um quarto de óxido de sódio fundirá somente a 1.339ºC. Tais vidros são chamados vidros de óxidos misturados, e sua estrutura é mostrada na Figura 1.4.9. Os átomos metálicos formam íons positivos que rompem o tetraedro de oxigênio, de forma que nem todos os átomos de oxigênio são compartilhados. A sílica faz a função de um formador de vidro, e o óxido metálico funciona como um modificador de vidro. Os óxidos de titânio, zinco, chumbo e alumínio podem tomar parte na formação de uma rede vítrea e produzir estruturas reticulares rígidas. A soda (Na2O) e a cal (CaO) reduzem consideravelmente a viscosidade, assim como a temperatura de transição vítrea, causando extensiva ruptura da rede. Isso facilita a produção do vidro. O óxido bórico (B2O3) também é capaz de atuar como um formador de vidro, produzindo vidros bóricos. Embora seja possível obter vidros de misturas de sílica cristalina e óxidos metálicos, é uma experiência dispendiosa. É muito mais barato usar os minerais encontrados na natureza com as estruturas vítreas necessárias, porque a natureza já realizou todo o processo de vitrificação.

Figura 1.4.7 Representação bidimensional da sílica cristalina: (a) posição dos átomos, (b) triângulos de oxigênio.

Houve uma época em que apenas os feldspatos naturalmente encontrados na natureza eram usados pelos fabricantes, e foram modificados com outros óxidos metálicos para produzir cargas e porcelanas dentais com as propriedades necessárias. Hoje muitos vidros são sinteticamente produzidos, e isto permite maior controle da composição e das propriedades.

DEVITRIFICAÇÃO É possível que uma pequena quantidade de cristalização ocorra na produção de um vidro, embora a taxa de crescimento do cristal seja muito baixa. Quando um vidro começa a cristalizar o processo é chamado devitrificação. Ele pode acontecer quando o vidro é mantido em uma temperatura elevada por um longo tempo, permitindo alguma reorganização molecular. O vidro tenderá a adquirir um aspecto translúcido devido à dispersão da luz nas superfícies dos pequenos

ESTRUTURA DAS CERÂMICAS

Figura 1.4.8 Representação bidimensional de um vidro de sílica pura: (a) posição dos átomos, (b) triângulos de oxigênio.

cristais. Essa é a base da formação dos vidros cerâmicos (Cap. 3.4). O processo de aquecimento de um material para permitir um rearranjo molecular ou atômico é chamado têmpera e é importante em muitos tipos de materiais.

Figura 1.4.9 Representação bidimensional de um vidro de óxido misturado: (a) posição dos átomos, (b) triângulos de oxigênio.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA As cerâmicas tendem a ser muito estáveis no ambiente biológico e, portanto, são consideradas os materiais mais biocompatíveis.

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Capítulo 1.5

ESTRUTURA DOS METAIS E DAS LIGAS METÁLICAS

MICROESTRUTURA DOS METAIS Os metais consistem em agregados de átomos regularmente arranjados numa estrutura cristalina. A despeito de, até agora, considerarmos a formação de cristais simples, os metais geralmente não solidificam (daquilo que é conhecido como a fusão) como um cristal único, mas ao invés disso são formados de um grande número de cristais pequenos. Isso ocorre porque em geral existem muitos núcleos de cristalização espalhados por todo o metal fundido. Tais núcleos podem se formar quando quatro átomos perdem suficiente energia térmica e se tornam capazes de constituir uma unidade celular. Essas unidades celulares crescerão conforme mais átomos metálicos alcançarem uma energia suficientemente baixa para se unir e assim ocorre a formação do cristal. Esse processo é conhecido como nucleação homogênea. Ela requer equipamentos altamente especializados para que ocorra o crescimento de um cristal único do metal completamente derretido. Mais comumente, a solidificação é iniciada pela presença de impurezas na fusão. Conforme a temperatura diminui abaixo do ponto de fusão, os átomos do metal se depositarão nessas impurezas e os cristais começarão a se formar. Esse processo é conhecido como nucleação heterogênea. Os cristais (ou grãos, como são chamados) continuarão a crescer até que todo o metal tenha se solidificado. Durante seu crescimento, eles começarão a interagir um com o outro, levando a ligações entre os cristais, onde os átomos estão irregularmente arranjados. Esse limite é chamado limite granular e é essencialmente um defeito na estrutura cristalina do metal. O processo de solidificação de um metal é demonstrado esquematicamente na Figura 1.5.1. Um tamanho de granulação fino é usualmente desejado num metal porque aumenta o limite de proporcionalidade, mas a razão para isso não será considerada agora. Uma maneira pela qual se promove um tamanho de granulação fino é a rápida solidificação, como usado na fundição de ligas de

ouro de uso odontológico dentro de um molde de revestimento mantido a uma temperatura bem abaixo da temperatura de fusão da liga. De maneira alternativa, a presença de muitos sítios de nucleação levará a um tamanho de granulação fino. Esse método é também empregado em ligas de ouro de uso odontológico pela adição do irídio. O irídio proporciona muitos sítios de nucleação e age como um ingrediente refinador de grão. É muito útil ser capaz de estudar a estrutura detalhada dos metais, em termos de tamanho dos cristais, sua forma e sua composição, uma vez que essa informação pode acrescentar-nos muito sobre as propriedades do metal e como ele foi feito. Alguma ideia sobre a estrutura pode ser obtida pela avaliação da superfície do metal sob microscopia óptica por luz refletida. A luz é refletida de uma superfície metálica polida, mas a fração de luz incidente que é refletida de qualquer região dependerá das irregularidades da superfície, pois as irregularidades causarão o espalhamento da luz. A ação de substâncias químicas numa superfície polida (conhecida como condicionamento) também pode reduzir a quantidade de luz refletida. A escolha, adequada de um agente químico que condicione certas regiões da superfície do metal. Essas áreas tendem a ser submetidas a elevadas tensões, tais como nos limites do grão, onde existe uma organização imperfeita dos átomos. De fato, uma ranhura produzida espalhará a luz incidente e, portanto, aparecerá como uma linha escura. Esse efeito é mostrado esquematicamente na Figura 1.5.2 para um metal, que tem uma estrutura de granulação muito uniforme. Todos os grânulos são quase do mesmo tamanho e forma; tal estrutura granular é descrita como equiaxial. Um exemplo de estrutura de granular para o aço inoxidável hipoeutectoide, revelada pelo condicionamento, está mostrado na Figura 1.5.3. Muitas outras formas e tamanhos de grânulos são possíveis, e essas propriedades com frequência dependem dos métodos empregados durante a solidificação. Por

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Líquido

Núcleo de cristalização

Congelamento

Superfície polida e condicionada

Sólido

Grânulo Limite do granular

Figura 1.5.1 Solidificação de um metal.

exemplo, se o metal fundido é vertido dentro de um molde com uma secção transversal quadrada ou circular e que é mantida a uma temperatura bem abaixo da temperatura de fusão do metal, os grânulos poderiam se assemelhar àqueles desenhados na Figura 1.5.4. O crescimento do cristal terá sido das paredes do molde em direção ao centro. Muitos metais são prontamente deformados, em especial na sua forma elementar (isto é, pura). Isso permite que eles sejam modelados por martelamento, rolamento, pressão ou cunhagem. Um grande modelo de fundição, conhecida como lingote, pode assim ser transformado em qualquer forma desejada, pode ser um aerofólio de carro, o casco de um barco ou um fio. Quando deformado dessa maneira, o metal é dito como sendo forjado. Se examinarmos a microestrutura de um fio sob microscopia óptica, pode ser observada uma estrutura similar àquela mostrada na Figura 1.5.5. Os grânulos foram alongados na direção do desenho, e se apresentam numa estrutura laminar. Assim, da observação da microestrutura do metal podem ser obtidas muitas informações.

Figura 1.5.2 Reflexão da luz incidente da superfície do metal condicionado.

LIGAS Os metais elementares não são geralmente utilizados por causa de diversas limitações em suas propriedades. Muitos metais usados são uma mistura de dois ou mais metais elementares; algumas vezes elementos não metálicos são incluídos. Eles são em geral produzidos pela fusão dos elementos acima de suas temperaturas de fusão. A mistura de dois ou mais metais ou metaloides é denominada liga. Dois elementos poderiam constituir uma liga binária e uma mistura de três é chamada liga ternária. Uma liga frequentemente consistirá em um número de fases sólidas distintas, onde uma fase é definida como uma parte estruturalmente homogênea de um sistema que é separado de outras partes por um limite físico claro. Cada fase terá sua estrutura própria distinta e propriedades associadas. As fases citadas comumente são as fases gasosa, líquida e sólida, uma vez que são muito diferentes umas das outras. Em uma substância pode exibir várias fases.

Figura 1.5.3 Estrutura granular para o aço inoxidável hipoeutectoide.

ESTRUTURA DOS METAIS E DAS LIGAS METÁLICAS

Por exemplo, a água poderia ser considerada como uma estrutura de fase única, enquanto uma mistura de água e óleo poderia consistir em duas fases. A areia poderia ser considerada como um sistema de fase única, embora seja feita de muitas partículas individuais, uma vez que cada partícula de areia é idêntica. Uma fase pode ter mais de um componente, como o soro fisiológico, por exemplo, que é uma solução aquosa de cloreto de sódio. Igualmente, as fases no metal podem consistir em uma mistura de metais. O cobre pode conter até 40% de zinco sem destruir sua estrutura CFC. Tal solução sólida, como é chamada, atenderá a algumas condições especiais (veja a seguir).

Soluções Sólidas Uma solução sólida é uma mistura de elementos em nível atômico e é análoga a uma mistura de líquidos, que são solúveis um nos outros. Existem dois tipos de soluções sólidas: substitucional e intersticial.

Solução Sólida Substitucional Se um átomo soluto pode substituir diretamente um átomo solvente no mesmo local na rede cristalina, uma solução sólida substitucional de dois elementos será formada. Isso só será possível se: ■ ■

FASES SÓLIDAS



Quando dois elementos diferentes são misturados, o material resultante pode ser uma liga de fase única ou liga de fases múltiplas. Qual delas será formada depende da solubilidade de um elemento no outro, e isso é orientado pela natureza cristalina dos elementos e de seus tamanhos relativos. Existem essencialmente três fases distintas, que podem formar ligas; estas são um metal puro, uma solução sólida e um composto intermetálico. Destas, a solução sólida e o composto intermetálico requerem maior descrição.

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os átomos possuírem uma valência similar; os átomos possuírem a mesma estrutura cristalina (p. ex., CFC); os tamanhos atômicos variarem em até 15% um do outro.

Um exemplo relevante de uso odontológico de tal sistema é uma mistura de ouro e cobre (Fig. 1.5.6). Adicionando qualquer quantidade de cobre sempre formará uma solução sólida. Assim, uma solução sólida substitucional pode ser feita de uma faixa de 100% de ouro a 100% de cobre. Isso é porque esses dois metais (Tabela 1.5.1) preenchem as condições já mencionadas. Outros metais, que prontamente formam soluções sólidas com o ouro, são a platina (2,775Å), o paládio (2,750Å) e a prata (2,888Å), pois todos possuem uma estrutura cristalina CFC.

Soluções Sólidas Intersticiais Como o nome já indica, uma solução sólida intersticial é obtida quando átomos solutos são capazes de ocupar o espaço entre os átomos solventes. Para isso ocorrer, o átomo soluto obviamente deve ser muito menor que o átomo solvente. Na prática, o diâmetro do átomo soluto deve ser Radial

Equiaxial

Figura 1.5.4 Estruturas granulares decorrentes de diferentes condições de solidificação.

Direção do desenho

Au Figura 1.5.5 Grãos alongados do metal desenhado em forma de um fio.

Cu

Figura 1.5.6 Solução sólida substitucional.

30

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

menor que 60% do diâmetro do átomo solvente. Isso é ilustrado pelo exemplo de um tipo de aço que contém uma quantidade pequena de carbono no ferro (Fig. 1.5.7). O espaço intersticial é em geral muito limitado e alguma distorção da rede cristalina ocorrerá para acomodar os átomos extras. Outros elementos, que prontamente formam soluções sólidas intersticiais, são: o hidrogênio, o nitrogênio e o boro.

Componentes Intermetálicos Um componente intermetálico é formado quando dois ou mais metais se combinam, formando uma composição ou proporção estequiométrica específica. Exemplos de metais com composição estequiométrica específica são algumas das fases na liga metálica usada na produção de um amálgama de uso odontológico; a liga pode conter regiões de uma fase Ag–Sn (Ag3Sn) e uma fase Cu–Sn (Cu6Sn5).

DIAGRAMAS DE FASES As ligas podem consistir de uma ampla variedade de diferentes fases, dependendo da composição e da temperatura e uma maneira de representar isso graficamente foi desenvolvida, e é denominado diagrama de fases. Tal diagrama indica as fases (incluindo a fase líquida) que estão presentes a uma dada temperatura, para uma determinada composição da liga. Tabela 1.5.1 Propriedades do ouro e do cobre Diâmetro atômico (Å)

Estrutura cristalina

Valência

Au

2,882

CFC

1 ou 3

Cu

2,556

CFC

1 ou 2

O diagrama de fases mais simples para compreender são os diagramas de fase binária. Um exemplo de diagrama de fases para um sistema simples é apresentado na Figura 1.5.8. Esse diagrama de fases é para o cobre e o níquel; o eixo vertical representa a temperatura e o eixo horizontal, a composição. O cobre e o níquel são tão próximos em termos de características que um substitui o outro na forma de rede cristalina e forma um exemplo de solução sólida substitucional. Desta forma, durante a variação de composição do cobre puro para níquel puro, ocorre apenas uma única fase. Enquanto pode-se esperar que a temperatura de fusão dessa liga metálica decresça para algum valor entre o do cobre puro e do níquel puro, isto não é tão óbvio porque deve existir uma região na qual existe a mistura de líquido e sólido. A linha que define a transição de um líquido puro para uma mistura de líquido ou sólido é chamada liquidus e a linha que separa uma mistura de sólido e líquido de um sólido é a solidus. Quando um metal puro solidifica, a transformação de líquido para sólido ocorre numa temperatura bemdefinida; essa é a temperatura característica de fusão do metal. Se uma curva tempo-temperatura foi construída para tal metal conforme ele se resfria, ela poderia se assemelhar à Figura 1.5.9. O platô transpõe o período durante o qual o metal está solidificando, e o liquidus e o solidus estão efetivamente no mesmo ponto. O motivo para esse platô é a liberação de energia (na forma de calor) durante o processo de solidificação, que mantém o metal numa temperatura constante. Essa energia é chamada calor latente de fusão. Quando dois metais são misturados para formar uma liga metálica, a curva de resfriamento parece um pouco diferente (Fig. 1.5.10), como a liga metálica se solidifica acima da faixa das temperaturas. O liquidus e o solidus são agora pontos distintos na curva de resfriamento.

Temperatura

Elemento

Soluções Sólidas

1.455oC Líquido Sólido+líquido

1.083oC Sólido Composição líquida 100% Cu Fe

C

Figura 1.5.7 Solução sólida intersticial.

Composição sólida

Composição

100% Ni

Figura 1.5.8 Diagrama de fases de equilíbrio para o sistema Cu–Ni, em que uma composição de 50Cu:50Ni a 1.300ºC produz uma mistura de um líquido rico em cobre e um sólido rico em níquel.

31

ESTRUTURA DOS METAIS E DAS LIGAS METÁLICAS

O motivo para esta grande variação de temperatura, incluindo a transição de líquido para sólido para uma liga metálica de cobre com níquel, é que os átomos de cobre e de níquel não são semelhantes. Como consequência, na região entre as temperaturas de fusão dos dois metais, um líquido rico em cobre e um sólido rico em níquel são os componentes mais estáveis. Por exemplo, para uma composição de 50:50 a 1.300ºC, o níquel sólido pode não conter mais que 37% em peso de cobre. Qualquer átomo de cobre acima do nível 37% em peso, portanto, aparecerá na fase líquida, misturado com o níquel remanescente. Tal mistura de sólido e líquido proporciona uma energia livre menor que uma fase simples isoladamente. De fato, o liquidus e o solidus representam os limites da solubilidade e é isso que forma a base do diagrama de fases. Se criarmos uma série de curvas de resfriamento como a mostrada na Figura 1.5.8 para uma variedade de composições, é possível construir o diagrama de fase como demonstrado esquematicamente na Figura 1.5.11. Como a temperatura da composição 50:50 é reduzida, assim que a solubilidade do cobre em níquel aumenta,

Líquido + sólido

Tm

Sólido

Tempo

Temperatura

Figura 1.5.9 Curva de resfriamento para um metal puro.

Solubilidade Sólida Parcial Em geral, os componentes dos materiais não são suficientemente solúveis para formar uma série completa de soluções sólidas. Exemplos disso são o cobre e a prata, que são suficientemente diferentes em tamanho atômico, já que seus átomos estão apenas parcialmente solúveis um no outro. O diagrama de fases para esse sistema é evidenciado na Figura 1.5.12. Para uma ampla variedade de composições, o material consistirá em duas fases sólidas, uma sendo rica em prata e a outra rica em cobre; por convenção, essas fases são denominadas fases α e β, respectivamente. A fase α consiste em prata predominantemente, com uma pequena quantidade de cobre dissolvido nela, enquanto a fase β consiste em cobre com uma pequena quantidade de prata dissolvida nele. Em baixas concentrações de cobre em prata, todo o cobre é capaz de se dissolver na prata e existe apenas uma fase simples. A solubilidade máxima do cobre na prata é 8,8% em peso, e isso ocorre a uma temperatura de cerca de 780ºC. Em baixas temperaturas, a solubilidade do cobre na prata diminui, e o excesso de cobre se separa da segunda, fase β. Comportamento similar ocorre no extremo oposto da variação de composição onde a solubilidade limitada da prata no cobre também leva à formação de estrutura em duas fases. Uma característica importante e interessante do diagrama de fases do sistema Ag–Cu é a redução da temperatura do liquidus na composição de 72Ag:28Cu. Na temperatura de 780ºC, essa composição da liga metálica pode existir como três fases: α, β e líquida. Isso é

Líquido

12

Tliquidus

Líquido + sólido

Tsolidus

Sólido

Tempo Figura 1.5.10 Curva de resfriamento para uma liga metálica.

3

4

1

2

3

Temperatura

Temperatura

Líquido

até aproximadamente 1.220ºC, todo o cobre disponível pode ser dissolvido no níquel, e uma fase sólida única é a configuração mais estável.

Tempo

Composição

Figura 1.5.11 Construção de um diagrama de fases.

4

32

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Líquido

α

Líquido + β

Líquido + α

β

α+β Sólido + Sólido

100%Ag

Composição

Temperatura

Temperatura

γ γ + carboneto α

α+γ

α + carboneto

100%Cu

100% Fe

Aumento do conteúdo de carbono

Figura 1.5.12 Diagrama de fase de equilíbrio para o sistema Ag–Cu.

Figura 1.5.13 Diagrama de fase de equilíbrio para o sistema Fe–C.

chamado ponto eutético e a temperatura de interseção dessas três fases é a temperatura eutética. A composição é chamada composição eutética da liga metálica. Se um líquido eutético é resfriado, ele muda diretamente em duas fases sólidas, sem um estado de interposição como uma mistura de sólido-líquido, o que ocorre em todas outras composições. Essa característica de alguns sistemas de ligas metálicas pode ser utilizada para formar materiais de baixo ponto de fusão, como uma solda. Da mesma forma que um eutético envolve a formação de duas fases sólidas de uma fase líquida única, tal transformação pode também ocorrer em sólidos. O diagrama de fases do sistema Fe–C, mostrado parcialmente na Figura 1.5.13, é um exemplo disso. Para uma composição de 0,8C:99,2Fe, a solução sólida, γ, transforma-se em uma solução sólida de carbono em ferro, α, e carboneto (Fe3C) a uma temperatura de 723ºC. Isso é chamado uma reação eutectoide, e difere apenas da eutética na qual todas as três fases são sólidas. Tais transformações como descritas (e deveria ser notado que existem outras) são importantíssimas na determinação da microestrutura e, consequentemente, nas propriedades da liga metálica.

Anteriormente, foi notado que para uma composição de 50Cu:50Ni a 1.300ºC, uma fase líquida rica em cobre e uma fase sólida consistindo em 63Ni:37Cu coexistem. Sob rápido resfriamento, não é possível que um reajuste de composição para essas fases líquida e sólida, e algum do sólido rico em níquel será retido. Conforme o material, continua a ser resfriado, uma composição mais rica em níquel solidificará, deixando o líquido remanescente e o sólido então formado mais ricos em cobre. O efeito geral disso é que o sólido consistirá em um grande número de cristais de uma ampla variedade de composições, todos na mesma fase. Essa formação de um sólido com uma composição não uniforme é conhecida como segregação composicional. Nos sistemas com fases múltiplas, a fase com maior temperatura de fusão será sempre a primeira a solidificar, seguida pelas fases de menor temperatura de fusão. Conforme a primeira fase solidifica, ela tende a formar uma estrutura de rede conhecida como dendritos. A segregação composicional pode ser eliminada ou reduzida, pelo reaquecimento da liga metálica a uma temperatura adequada abaixo da solidus e a mantendo em tal temperatura por algum tempo. Isso permite que os átomos tenham tempo de se difundir pelo sistema e alcancem sua condição de equilíbrio. O processo de tratamento de aquecimento de uma liga metálica é conhecido como têmpera e, se a intenção é atingir uma composição homogênea, é descrito como têmpera de homogeinização.

CONDIÇÕES DE NÃO EQUILÍBRIO Deveria ser destacado que os diagramas de fases descritos são aqueles conhecidos como diagramas de fase em equilíbrio. O material deveria ser mantido em temperatura preestabelecida por um considerável período de tempo para alcançar a estrutura da fase evidenciada em tais diagramas. Na prática, as taxas de solidificação e resfriamento de ligas metálicas não permitem a formação de uma estrutura de fase de equilíbrio.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Com o objetivo de obter as melhores propriedades mecânicas, as ligas metálicas ao invés dos metais puros são usadas na odontologia.

Capítulo 1.6

ESTRUTURA DOS POLÍMEROS

INTRODUÇÃO Plásticos e borrachas, como são geralmente denominados no cotidiano, têm a propriedade comum de ser polímeros. Polímeros são moléculas de cadeias longas, consistindo em muitas unidades repetidas, conforme discutidos no Capítulo 1.3. Os polímeros não são uma invenção do século XX, são de fato mais antigos que a humanidade, e de uma forma ou de outra, são os constituintes básicos de todo tipo de matéria viva, seja planta ou animal. Exemplos de polímeros que ocorrem naturalmente são o ágar, a celulose, o DNA, as proteínas, a borracha natural, o colágeno e a seda. Só recentemente é que começamos a entender a estrutura dos polímeros e aprendemos como processá-los. Alguns exemplos de polímeros sintéticos, que são hoje conhecidos no dia-a-dia são: o PVC (cloreto de polivinil), o polietileno, o náilon e o poliestireno. Originalmente, os polímeros sintéticos tendiam a ser considerados como substitutos dos polímeros naturais existentes, tais como a borracha e a seda. Hoje, pode ser produzida uma variedade de polímeros tão grande que eles entraram na vida diária, satisfazendo necessidades que não existiam antes. Bons exemplos em aplicações médicas são as membranas de diálises e para oxigenação, e em aplicações dentárias, os materiais restauradores. O material de partida para a produção de um polímero é o monômero. Em um material como o polietileno, a unidade de repetição é um grupamento CH2, com muitas dessas unidades reunidas para formarem uma cadeia longa (Fig. 1.6.1a). O monômero do qual esse polímero é derivado é o etileno (Fig. 1.6.1b). Um polímero com uma estrutura similar ao polietileno é o prolipropileno. Ele é formado pela união de moléculas de propileno (Fig. 1.6.2a). O propileno difere do etileno por apresentar um grupamento metil (CH3) substituindo um dos átomos de hidrogênio, formando o polímero de polipropileno (Fig. 1.6.2b).

O polipropileno é ligeiramente mais complexo do que o polietileno de tal forma que, a disposição dos grupamentos metil pode variar de modo que sejam: ■ ■ ■

todos de um lado (isotáticos); alternados de um lado e de outro (sindiotáticos); mudando de um lado para o outro de maneira aleatória (atáticos).

Exemplos de polímeros à base de monômeros vinílicos são apresentados na Tabela 1.6.1. Pode se notar que as vias químicas pelas quais esses diferentes polímeros são processados são bastante diferentes, e que não é uma simples questão de modificação para formar um ou outro. Cada polímero tem sua própria unidade de repetição característica, ou “impressão digital”, e essa unidade é a base para as propriedades amplamente diferenciadas dos polímeros. Os polímeros mais comuns são aqueles feitos de compostos orgânicos de carbono, mas os polímeros também podem ser feitos de compostos inorgânicos à base de sílica (SiO2). O silício, sendo tetravalente como o carbono, fornece a oportunidade de formar um arcabouço para o polímero, junto com o oxigênio. Um exemplo de um polímero de silício é o polidimetilsiloxano (Fig. 1.6.3). Quando um polímero é formado de um único tipo de monômero, ele é chamado homopolímero; quando espécies diferentes são incluídas, ele é chamado heteropolímero.

MECANISMOS DE POLIMERIZAÇÃO Todos os monômeros mostrados na Tabela 1.6.1 apresentam uma ligação dupla em comum, que é aberta para possibilitar a ligação de um monômero ao monômero vizinho. Esse processo de formação de polímeros através de monômeros é denominado polimerização. Existem duas maneiras pelas quais isso pode ser obtido: por adição e condensação.

33

34

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Figura 1.6.1 O polietileno (a) é derivado do etileno (b).

Figura 1.6.2 O propileno (a) polimeriza para originar o polipropileno (b).

Tabela 1.6.1 Alguns monômeros e seus polímeros Nome

Cloreto de polivinil

PTFE

Polipropileno isotático

Ácido poliacrílico

Monômero

Polímero

H

H

H

H

H

H

H

H

H

H

C

C

C

C

C

C

C

C

C

C

H

Cl

H

Cl

H

Cl

H

Cl

H

Cl

F

F

F

F

F

F

F

F

F

F

C

C

C

C

C

C

C

C

C

C

F

F

F

F

F

F

F

F

F

F

H

H

H

H

H

H

H

H

H

H

C

C

C

C

C

C

C

C

C

C

H

CH3

H

CH3 H

CH3 H

CH3 H

CH3

H

H

H

H

H

H

H

H

H

H

C

C

C

C

C

C

C

C

C

C

H

C

H

C=O H

C=O H

C=O H

C=O

OH

OH

OH

OH

O

OH

Polimetilmetacrilato

H

CH3

H

CH3 H

CH3 H

CH3 H

CH3

C

C

C

C

C

C

C

H

C

H

C= O H

C= O H

C= O H

C= O

O

O

O

O

O

CH3

CH3

CH3

CH3

CH3

O

Polimerização por Adição A polimerização por adição é definida como a que ocorre quando uma reação entre duas moléculas (sejam as mesmas para formarem um homopolímero, ou distintas para formarem um heteropolímero) produz uma molécula maior sem a eliminação de uma molécula menor (como a água).

C

C

C

Esse tipo de reação se dá com compostos vinílicos, que são compostos inorgânicos reativos contendo ligações duplas de carbono-carbono (Tabela 1.6.1). O processo de polimerização por adição para produzir esses polímeros envolve quatro estágios:

ESTRUTURA DOS POLÍMEROS

35

vinílicos, como descrito posteriormente, e são designadas como R•. Entretanto, antes de ocorrer a iniciação o peróxido de benzoíla precisa ser ativado. Essa ativação é obtida pela decomposição do peróxido, devido ao uso de um ativador, tal como: ■

Figura 1.6.3 A estrutura do polidimetilsiloxano. ■ ■ ■ ■

ativação; iniciação; propagação; e terminação.



Ativação A polimerização de um composto vinílico requer a presença de radicais livres (•). Esses são espécies químicas muito reativas que possuem um elétron ímpar (sem par). O processo de produção de radicais livres é descrito como ativação. A ativação ocorre, por exemplo, quando há decomposição de um peróxido. O peróxido comumente usado em materiais dentários é o peróxido de benzoíla. Em condições apropriadas, uma molécula de peróxido de benzoíla pode fornecer dois radicais livres:



C6H5COO – OOCH5C6 → 2(C6H5COO•) Este por sua vez pode se decompor para formar outros radicais livres:

Calor: Quando aquecido acima de 65°C, o peróxido de benzoíla se decompõe, conforme mostrado. Esse é o método usado para a produção de bases de dentadura de resina acrílica (Cap. 3.2). Compostos químicos: O peróxido de benzoíla pode também ser ativado quando entra em contato com uma amina terciária, como a n,n-dimetil-p-toluidina (Fig. 1.6.4). Esse método é empregado em resinas acrílicas de polimerização a frio, usadas, por exemplo, em reparos de próteses, restaurações temporárias, aparelhos ortodônticos e moldeiras individuais (Cap. 3.2). O mesmo método é também usado em compósitos restauradores quimicamente ativados, que consistem em uma pasta-base contendo o ativador que conta, amina terciária, e uma pasta catalisadora contendo o iniciador neste caso, o peróxido de benzoíla (Cap. 2.2). Luz: Ainda outro método para a criação de radicais livres é empregado pelos compósitos ativados por luz, que se baseiam em luz ultravioleta ou luz visível como o ativador da reação de polimerização. Nesses casos, outros iniciadores, ao invés do peróxido de benzoíla, são empregados.

Outras formas de produção de radicais livres incluem o uso de luz ultravioleta em conjunto com um éter de metilbenzoína e de luz visível com uma α-diquetona e uma amina (Cap. 2.2).

C6H5COO • → C6H5 • + CO2 Tais espécies químicas, conhecidas como iniciadores, são capazes de iniciar a polimerização de grupamentos

CH 3 H3C

+

N CH 3

O

n,n -dimetil-p-toluidina

H3C

•!

N

O O O

O

CH 3

" CH 3

O• Radical benzoiloxi

Figura 1.6.4 Peróxido de benzoíla ativado por uma amina terciária.

O Íon benzoato

36

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Iniciação

R

Os radicais livres podem reagir com um monômero como o etileno e iniciar o processo de polimerização a seguir:

H

H

R

HO—Si—O—Si—OH + H2O R

R

Nesse caso, R é um grupamento orgânico, como um metil (CH3), e o subproduto é a água.

H H

R• + C = C → R—C—C• H

H

ESTRUTURAS POLIMÉRICAS

H H

Peso Molecular

Propagação O radical livre é transferido para o monômero que, por sua vez, reage com outro monômero:

H H

H

H

H H H

H

R—C—C• + C = C → R—C—C—C—C• H H

H

H

H H H

H

A repetição desse processo por muitas vezes gera uma cadeia de polímero até que as cadeias em crescimento colidam ou que todos os radicais livres tenham reagido.

Terminação Os radicais livres podem reagir formando uma molécula estável:

[H] H

[H]

R—C—C• + R• → R—C—R [H]n H

[H] n+1

Já que o n variará de uma cadeia polimérica para outra, uma ampla variedade de moléculas longas é produzida. Na maioria das situações, haverá também algum monômero não reagido e alguns oligômeros, que consistem em apenas um pequeno número de unidades de repetição.

Polimerização por Condensação A polimerização por condensação ocorre quando duas moléculas (em geral não as mesmas) reagem para formar uma molécula maior com a eliminação de uma menor (frequentemente, mas nem sempre, água). Neste caso, as unidades monoméricas com ligações duplas de carbono-carbono não são necessárias, conforme mostrado no exemplo a seguir de um silicone, que é um polímero inorgânico formado pela condensação de grupamentos silanóis:

R

R

HO—Si—OH + HO—Si—OH→ R

R

O peso molecular de um polímero é igual ao número de unidades de repetição (isto é, o grau de polimerização) multiplicado pelo peso molecular da unidade de repetição. Tanto na reação por adição como na reação por condensação, o comprimento da cadeia é determinado por eventos puramente aleatórios, nem todas as cadeias serão do mesmo comprimento e, em geral, muitos comprimentos de cadeias diferentes estarão presentes. Assim, o peso molecular pode apenas ser representado por um valor médio. Existem algumas maneiras de determinar o peso molecular de um polímero. As duas principais são o número do peso molecular médio, Mn, e o peso molecular médio em peso, MW.

Número do Peso Molecular Médio (Mn) O Mn é obtido pela contagem do número de moléculas em determinado peso de amostra. A expressão geral seria dada por: Mn = Σni Mi /Σni

Peso Molecular Médio em Peso (Mw) O Mw é obtido pela mensuração do peso das moléculas no peso total da amostra, dada pela expressão geral: Mw = Σwi Mi /Σwi A diferença nas definições para uma distribuição de pesos moleculares em um polímero típico é mostrada na Figura 1.6.5. O Mw é especialmente sensível à presença de polímeros de alto peso molecular, enquanto que o Mn é sensível à presença de polímeros de baixo peso molecular. Por exemplo, se pesos iguais de dois polímeros de Ma = 10.000 e de Mb = 100.000 são misturados, Mw é dada por: Mw = (wa × Ma + wb × Mb) / (wa + wb) em que wa e wb são os pesos de Ma e Mb, respectivamente. Nesse caso, wa e wb são iguais a 1/2W, pois Ma = 10.000 e Mb = 100.000; substituindo esses valores na expressão acima, temos: 1 1 Mw = W × 10.000+ W × 100.000 / W 2 2 = 55.000

(

)

ESTRUTURA DOS POLÍMEROS

O número do peso molecular médio é dado por: Mn = (na × Ma + mb × Mb) / (na + mb) em que na e mb são o número de moléculas do peso molecular Ma e Mb, respectivamente. Nesse caso, na = 10 e mb = 1, desse modo: Mn = (10 × 10.000 + 1 × 100.000) / 11 = 18.200 O peso molecular de um polímero é de grande valor para explicar as variações nas propriedades físicas de diferentes polímeros. Por exemplo, a resistência à tração e o alongamento necessário para romper o polímero aumentam drasticamente para alguns polímeros na faixa de peso molecular de 50.000 – 200.000. Contudo, a melhoria das propriedades físicas pelo aumento do peso molecular é acompanhada por um rápido aumento na viscosidade do produto, e isto aumenta a temperatura de transição vítrea, tornando mais difícil do polímero ser processado.

Configurações de Cadeia As cadeias poliméricas são mantidas unidas por meio de ligações secundárias fracas (ou forças de van der Waal) e pelo entrelaçamento das cadeias, se elas forem longas o suficiente. Quanto maior o peso molecular, maior o entrelaçamento formado, originando um polímero mais rígido e resistente. Em um polímero como o polietileno, que tem uma configuração de cadeia linear, as ligações fracas entre as cadeias podem ser facilmente quebradas pelo aumento da temperatura do polímero. Quando isso acontece, as cadeias podem deslizar umas nas outras de forma que o polímero amolece e se deforma facilmente. No resfriamento, as ligações são restabelecidas, e o polímero se torna novamente duro e retém a forma que estava na temperatura mais alta. A temperatura na qual um plástico amolece de modo que as moléculas possam começar a deslizar é definida

como sua temperatura de transição vítrea. Ela é similar àquela dos vidros, exceto que no caso dos plásticos as temperaturas envolvidas são muito baixas (Cap. 1.4). Um polímero que pode ser amolecido e subsequentemente modelado pelo aquecimento acima de sua temperatura de transição vítrea é conhecido como polímero termoplástico. Exemplos desses polímeros termoplásticos são o poliestireno, o polimetil metacrilato e o polietileno. Para muitos sistemas poliméricos, as cadeias não são lineares como no polietileno. De fato, o polietileno deveria ser idêntico ao polimetileno, mas isso não acontece porque as cadeias no polietileno são ramificadas, portanto, não lineares (Fig. 1.6.6). Tais ramificações dão ao polímero uma estrutura de rede tridimensional, o que impede as cadeias de deslizarem umas sobre as outras facilmente, mesmo quando aquecidos. Assim, o polímero reterá suas propriedades sob temperaturas razoavelmente altas, até que ocorra degradação química da estrutura do polímero. Os polímeros que se decompõem sob aquecimento sem mostrar uma transição vítrea são conhecidos como polímeros termoendurecidos.

Cristalinidade em Polímeros Em um polímero as moléculas geralmente se contorcem e giram, se enrolam e se cruzam de maneira aleatória. Às vezes, entretanto, haverá zonas onde as moléculas são capazes de se dispor mais ou menos paralelas entre si, como mostrado na Figura 1.6.7. Quando isso acontece, o polímero exibe um grau de cristalinidade limitado. As proporções relativas de regiões cristalinas e não cristalinas em um polímero dependerão da composição química, da configuração molecular e do método de processamento. Esses polímeros não são sólidos completamente cristalinos, mas são compostos de um grande número de pequenas regiões cristalinas em íntima aproximação entre si, em uma matriz amorfa.

Peso do polímero

Número do peso molecular médio Ramo do lado propil

Peso molecular médio em peso

Comprimento das cadeias poliméricas Figura 1.6.5 Distribuição de peso molecular de um polímero típico.

37

Ramo do lado metil

Figura 1.6.6 Polietileno ramificado.

38

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Os materiais que mostram a habilidade de se estirar em alto grau até muitas vezes o seu comprimento original são conhecidos como elastômeros. As características de um elastômero são: ■ ■ ■ ■

o material é mole e apresenta um baixo módulo de elasticidade; deformações muito altas (> 100%) são possíveis; as deformações são reversíveis; e o material está acima de sua temperatura de transição vítrea.

As diversas configurações de cadeias poliméricas para polímeros são mostradas na Figura 1.6.8. Figura 1.6.7 Cristalinidade parcial em um polímero.

O polietileno é capaz de cristalizar por causa da regularidade e da simplicidade de sua cadeia polimérica. Na medida em que as moléculas do polímero se tornam mais complexas (devido à ramificação ou grupamentos laterais grandes que restringem a mobilidade da cadeia), é mais difícil para os polímeros apresentarem regiões cristalinas.

Ligação Cruzada Quando cadeias poliméricas são unidas por ligações químicas, se diz que o polímero é de ligação cruzada. Como notado, a ligação cruzada apresenta um efeito profundo nas propriedades de um polímero; essa pode fazer a diferença entre um polímero termoplástico e um polímero termoendurecido. Mais importante, isso pode converter um polímero líquido em um polímero sólido, um processo usado na composição de muitos materiais de moldagem. Os polímeros de silicone apresentam uma temperatura de transição vítrea abaixo da temperatura ambiente, portanto, são líquidos nessa temperatura e acima dela. Quando esses polímeros formam ligações cruzadas, as cadeias não são mais capazes de deslizar umas sobre as outras e um material sólido é obtido. A extensiva formação de ligações cruzadas em polímeros resulta em materiais duros e friáveis. Se o polímero consiste particularmente em cadeias moleculares longas e flexíveis, podem haver ligações cruzadas em vários pontos ao longo de seu comprimento. As moléculas podem ter uma configuração altamente enrolada quando relaxadas e podem se esticar por grandes distâncias (pelo desenrolamento) quando uma carga é aplicada. Quando a carga é removida, as cadeias terão novamente uma configuração enrolada, governada pelas ligações cruzadas. O grau de extensão e a tensão que pode ser gerada por um polímero dependem do comprimento das cadeias, do grau de formação de ligações cruzadas e da resistência das ligações.

COMPOSIÇÃO DE POLÍMEROS REAIS Os polímeros são muito raramente usados em sua forma pura, pelas mesmas razões que os metais puros são raramente usados, em comparação com as ligas. Em vez disso, modificações são realizadas com o objetivo de melhorar as propriedades dos polímeros. Uma dessas modificações que já foi considerada é pela formação de ligações cruzadas nas cadeias poliméricas, para transformar polímeros termoplásticos em polímeros termoendurecidos. Como os polímeros termoendurecidos não podem ser amolecidos e remodelados, a forma do objeto tem que ser criada antes de induzir a formação de ligações cruzadas, e isso coloca sérias restrições aos meios de processamento. Contudo, várias outras opções de processamento estão disponíveis, tais como a mistura, e o uso de copolímeros e compósitos.

Mistura de Polímeros A mistura de polímeros é um processo comumente usado no processamento de polímeros termoplásticos e envolve a mistura de dois ou mais polímeros antes da modelagem. As propriedades do polímero misturado em geral ficará em algum ponto entre as propriedades dos polímeros constituintes. Como os polímeros têm que ser miscíveis (isto é, misturados livremente um com o outro), eles tendem a ser de uma composição química similar. Isso impõe um limite nas alterações de propriedades que são possíveis pelo processo de mistura de polímeros.

Copolímeros Uma alternativa para a mistura de polímeros é a mistura de dois sistemas produtores de polímeros durante o processo de polimerização, isso é a copolimerização. Por exemplo, se um monômero A e um monômero B são misturados antes da polimerização, eles copolimerizarão, para formar cadeias poliméricas constituídas tanto de unidades monoméricas A, quanto de unidades

ESTRUTURA DOS POLÍMEROS

Ramificado

Termoplástico

Parcialmente cristalino

Termoendurecido

Polímero líquido

39

Ligação cruzada

Termoendurecido

Elastômero

Figura 1.6.8 Configurações da cadeia polimérica.

monoméricas B. A sequência dos monômeros originais no polímero pode ser aleatória, produzindo um copolímero aleatório, dando a sequência tal como: –A–A–A–A–B–B–A–B–A–B–B–B–A–A–B–B–A–B– Se os monômeros autopolimerizam mais rapidamente do que se copolimerizam, o resultado será um copolímero em bloco, em que os segmentos de cada homopolímero estão ligados: –A–A–A–B–B–B–B–A–A–A–B–B–B– Tais sistemas podem produzir polímeros com propriedades que são bastante diferentes dos homopolímeros. Por exemplo, um polímero pode ser bastante rígido, enquanto outro é bastante flexível. A produção de um bloco de copolímero permitiria controlar o grau de flexibilidade do material final pelo controle do comprimento dos blocos e das quantidades relativas de cada polímero. Um exemplo de copolímero em bloco é o ABS (acrilonitril-butadieno-estireno), que é formado pela mistura de três polímeros. O acrilonitril e o estireno copolimerizam para formar um copolímero em bloco vítreo, enquanto que o butadieno forma regiões borrachoides esféricas ligadas à matriz de polímero rígido. Embora esse material apresente rigidez e resistência ao creep mais baixa do que o poliestireno, ele é muito mais tenaz a ponto de ser indicado para a fabricação de partes de carroceria de carros.

Plastificantes Se uma substância de baixo peso molecular é adicionada ao polímero, ela tem o efeito de diminuir a temperatura de transição vítrea e o módulo de elasticidade do material. Esses plastificantes reduzem as forças de atração entre as cadeias poliméricas, de forma que as cadeias se tornam mais flexíveis e começam a se deslizar uma sobre as outras, em uma temperatura baixa, o que é responsável pela redução da Tg. Se for adicionado plastificante suficiente, um polímero friável pode ser transformado em um polímero mole, flexível e tenaz. Os plastificantes são em geral adicionados aos polímeros para melhorar seu escoamento (portanto, seu processamento) e para reduzir a fragilidade do produto. Um exemplo é o PVC, que é um polímero muito rígido na sua forma pura, mas pode ser transformado em um tubo flexível após a adição de um plastificante. A exigência básica a ser satisfeita por um plastificante é que este deve ser compatível com o polímero e apresentar um efeito permanente. Ser compatível significa que o plastificante deve ser miscível no polímero, e isso implica a necessidade de semelhança nas forças moleculares ativas no polímero e no plastificante. Para um plastificante ser permanente e não ser facilmente lixiviado do material, ele deve ter uma pressão de vapor baixa e uma baixa taxa de difusão pelo polímero. Um exemplo na Odontologia do uso de um plastificante é quando o dibutil-ftalato é misturado com o

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

polimetil ou polietil metacrilato para a produção de embasadores macios para dentadura (Cap. 3.2)

Compósitos Um compósito pode ser definido como a combinação de materiais na qual os componentes individuais retêm sua identidade física. Mais importante, um compósito é um material de multifases que exibe propriedades das fases constituintes, de modo a produzir um material com uma melhor combinação de propriedades do que poderia ser obtido por qualquer uma das fases constituintes. Em compósitos de dois componentes, é comum referir à matriz e carga, de forma que o primeiro é o componente que une as cargas juntas. O esmalte e a dentina são excelentes exemplos de compósitos, sendo constituídas de uma matriz orgânica (colágeno, proteínas e água) e uma carga inorgânica (hidroxiapatita). Uma grande variedade de estruturas compostas pode ser criada, como indicado no esquema de classificação mostrado na Figura 1.6.9. Em compósitos particulados, a matriz pode ser um polímero termoplástico ou termoendurecido. As partículas de carga podem estar presentes simplesmente para reduzir os custos, ou para desempenhar um papel específico, tal como conferir cor a um polímero incolor. Sua função mais crucial, contudo, é quando elas são usadas para melhorar as propriedades mecânicas dos polímeros. Por exemplo, a inclusão de vidro no polímero aumenta a rigidez e, algumas vezes, aumenta a resistência. As propriedades de escoamento dos materiais de moldagem elastoméricos são em grande parte controladas pela quantidade de carga que é incluída. A forma e a distribuição da carga desempenham um papel importante no modo como as propriedades são modificadas. Além de cargas particuladas, é também possível incorporar fibras ou filamentos. A incorporação de fibras na matriz polimérica pode ter um efeito profundo nas propriedades dos compósitos resultantes. Melhoras significantes na resistência e na rigidez, mantendo um baixo peso, podem ser alcançadas com o uso prudente de reforço de fibra. Filamentos são cristais muito finos que têm proporção do comprimento do diâmetro extre-

Reforçado por fibra

Figura 1.6.10 Cristais de fluorcanasita com uma proporção de aspecto grande.

Tabela 1.6.2 Resistência à tração de fibras e filamentos

COMPÓSITOS

Particulado

mamente grande, como é o caso do exemplo de uma estrutura de fluorcanasita mostrada na Figura 1.6.10. Os valores para a resistência à tração típicos para filamentos e fibras são fornecidos na Tabela 1.6.2. As fibras podem ser curtas ou longas e podem ser distribuídas em diferentes modos na matriz resinosa, dependendo dos tipos de propriedades desejadas (Fig. 1.6.11). Um exemplo de um compósito estrutural é um material composto de folhas de material empilhadas, onde cada folha apresenta fibras alinhadas em certa direção. Isso pode produzir materiais que têm propriedades de alta resistência em uma variedade de direções (Fig. 1.6.12). Em Odontologia, as cargas particuladas são mais comuns, com duas de suas aplicações mais importantes nos materiais de moldagem e nos materiais restauradores à base de resina. Os mais recentes desenvolvimentos buscam explorar o uso de nanotecnologia (escala de um bilhão em um metro), onde são acrescentadas cargas de nanopartículas às resinas para melhorar as propriedades das mesmas. Existe um interesse crescente na aplicação odontológica de materiais compósitos, não somente para materiais restauradores (Cap. 2.2), mas também na confecção de próteses adesivas reforçadas com fibras e de pinos endodônticos (Cap. 2.7).

Material

Estrutural

Figura 1.6.9 Esquema de classificação para compósitos. (Adaptada de Callister WD, Materials Science and Engineering: An introduction. John Wiley & Sons Inc., New York, USA 1994.)

Tipo

Resistência à tração (MPa)

Grafite

Filamento

20.000

Carboneto de silício

Filamento

20.000

Óxido de alumínio

Filamento

14.000 – 28.000

E-vidro

Fibra

3.500

Carbono

Fibra

1.500 – 5.500

Aramida (Kevlar 49)

Fibra

3.500

ESTRUTURA DOS POLÍMEROS

(a)

(b)

(c)

Figura 1.6.11 Representação esquemática de estruturas reforçadas por fibras: (a) fibras contínuas; (b) fibras alinhadas curtas e (c) fibras curtas distribuídas aleatoriamente.

Figura 1.6.12 Estrutura laminada com folhas de resina reforçada com fibras colocadas umas sobre as outras em direções diferentes.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Polímeros são materiais altamente versáteis, pois podem ser sólidos ou líquidos, frágeis ou flexíveis na temperatura do corpo, dependendo da sua composição e configuração.

LEITURA COMPLEMENTAR Suzuki S (2004) In vitro wear of nano-composite denture teeth. J Prosthodont 13: 238–243 Xu HH, Eichmiller FC, Smith DT, Schumacher GE, Giuseppetti AA, Antonucci JM (2002) Effect of

thermal cycling on whisker-reinforced dental resin composites. J Mater Sci Mater Med 13: 875– 883

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Capítulo 1.7

PROPRIEDADES MECÂNICAS

INTRODUÇÃO Quando algo distende um fio de aço ou uma tira de borracha, as respostas desses materiais são completamente diferentes. O fio de aço será difícil de sofrer alteração; embora se torne mais longo, essa mudança normalmente é tão pequena que é difícil de ser observada. Por sua vez, uma tira de borracha se distenderá de imediato e pode facilmente dobrar do seu comprimento. Materiais diversos respondem de modo completamente diferente à aplicação da carga. Podemos produzir um componente e determinar sua resposta a uma carga externa. Entretanto, os dados coletados seriam aplicáveis apenas a esse componente, o que não permitiria predizer o comportamento de um componente com formato diferente que foi feito do mesmo material. Como comparamos o desempenho de material em diferentes aplicações? Precisamos de algum padrão objetivo de comparação que seja independente do tamanho e da forma do material. Uma vez estabelecido esse padrão, ele deve possibilitar a comparação das propriedades dos diferentes materiais e predizer o comportamento dos objetos feitos dele. As bases para tal padrão objetivo são quantidades chamadas tensão e deformação. A descrição das propriedades mecânicas dos materiais é baseada nelas, assim iremos considerá-las em detalhes.

TENSÃO E DEFORMAÇÃO A abordagem mais simples para entender a tensão e deformação é considerar uma vara de um dado material que é mantido sob tensão, sendo sujeito a uma força de tração, ou carga. Como mostrado na Figura 1.7.1, a vara se estenderá. Naturalmente, poderia se esperar que a vara quebrará (isto é, romperá ou se deformará irreversivelmente) sob

ação de uma carga bastante alta. A carga na qual ocorre a quebra é a medida da resistência da vara, mas é exclusiva para a vara com essas dimensões e material específico. A carga que a vara deve suportar sem quebrar-se deve ser aumentada se o diâmetro da vara estiver aumentado e deve diminuir se o diâmetro for reduzido. A quantidade de extensão da vara no momento da quebra depende do comprimento inicial da vara, de tal modo que quanto maior o comprimento inicial, maior a extensão. Então, a força e extensão não representam medidas ideais para definição das propriedades mecânicas de um material. A maneira para superar a dependência das dimensões da vara é introduzir parâmetros de tensão, o, e deformação e para o material em teste. Esses parâmetros são definidos como: ■



Tensão. É a força por unidade de área de uma secção transversal que atua sobre o material. Deformação. É a alteração fracionada das dimensões produzidas pela força.

Assim, se uma vara é sujeita a uma força de tração, F, ao longo de seu comprimento, a tensão (σ) é dada por: σ = F/A em que A é a área de secção transversal da vara. As unidades usadas para medir a tensão são Newtons por metro quadrado (N.m-2 = Pascal = Pa). No mesmo momento em que a força é aplicada, o comprimento da vara altera do seu comprimento original L0, para o comprimento estendido L1. A deformação resultante (e) é dada por: e = L1 – L0/ L0 Esse parâmetro é mensurável, pois envolve o cálculo do comprimento dividido pelo próprio comprimento. Na prática, podemos medir a curva carga-extensão de um material e converter isso numa curva tensãodeformação. Tendo esta informação, é possível predizer

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Força (F)

(a)

Área (A)

Tensão = F/A = σ

L0

L1

Deformação = (L1-L0)/ L0 = e

(b)

Figura 1.7.1 Vara de um material sendo puxada em direção uniaxial.

a curva carga-extensão para uma vara com qualquer área transversal e comprimento. Podemos também comparar a resposta de diferentes materiais a uma mesma força de tração. A tensão e deformação não são propriedades por si só, mas permitem a definição de várias propriedades mecânicas que não podem ser definidas de outra forma. No exemplo descrito, a tensão foi gerada por uma carga aplicada na direção axial (isto é, ao longo da vara), mas, na prática, a carga pode ser aplicada em qualquer direção, e na maioria das situações mais de uma carga está envolvida. Essas cargas originam padrões complexos de tensão na estrutura. Os três tipos principais de tensão são a tensão por tração, tensão por compressão e tensão por cisalhamento, e esses estão mostrados de modo esquemático na Figura 1.7.2.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Quando uma carga é aplicada no dente, essa carga é transmitida ao longo do material, gerando tensões e deformações. Se essas tensões e deformações excederem o valor máximo que o material pode suportar, é muito provável que ocorra a fratura.

Definições de Algumas Propriedades Mecânicas Uma curva típica de tensão-deformação para um metal tal como uma liga de latão é mostrada na Figura 1.7.3. Ela pode ser usada para identificar várias propriedades do material.

Limite de Elasticidade e Deformação Plástica Uma característica importante no comportamento mecânico dos materiais é a relação entre a tensão e deforma-

(c)

Figura 1.7.2 Três tipos principais de tensão: (a) tração; (b) compressão; (c) cisalhamento.

ção. Como pode ser observado na Figura 1.7.3, a liga de latão não mostra uma relação linear entre a tensão e deformação ao longo do comprimento total da curva. A região onde a curva tensão-deformação é linear é conhecida como região elástica linear, e representa a região onde ocorre a deformação elástica. Nessa região, a remoção da tensão sobre o material resulta no retorno do material à sua forma original. Onde a curva inicia o desvio do seu trajeto linear, o material terá excedido o seu limite elástico e começará a deformar de modo permanente; a remoção da tensão sobre o material não resulta no retorno do material à sua forma original. Isso é conhecido como deformação plástica, e está representado pela região de deformação plástica no gráfico.

Módulo de Young Quando um material é tensionado, em geral a tensão inicialmente é proporcional à deformação, e assim sua razão é constante. Em outras palavras, o material deforma de modo linear e elástico. Isso pode ser representado pela expressão: σ/e = E

PROPRIEDADES MECÂNICAS

σRMT σF

Região de deformação plástica

σL σy

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A quantidade conhecida como limite convencional de escoamento (σL) é usada como uma medida do início do escoamento do material e é definida como a tensão necessária para produzir certa quantidade de deformação plástica, geralmente 0,2%.

Tensão

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Ductibilidade

Se em qualquer ponto de uma restauração metálica, tal como uma ponte de três elementos, a tensão por tração excede o limite de proporcionalidade, a restauração se deformará de modo permanente.

Resistência Máxima à Tração Elástico linear Deformação Figura 1.7.3 Curva de tensão-deformação para um material dúctil.

que nos permite definir uma outra propriedade do material, chamada módulo de Young, definido como uma constante que relaciona a tensão e a deformação na região elástica linear e é a medida de rigidez do material. Observe que a rigidez da vara é dependente da sua forma e dimensão e do módulo de Young do qual o material foi construído. Uma vez que conhecemos o módulo de Young de um material, é possível determinar a rigidez de qualquer estrutura feita deste material. Como o módulo de Young é obtido ao se dividir a tensão pela deformação, as unidades são as mesmas da tensão (N.m-2). O valor do módulo de Young com frequência é maior para os materiais reais. Para tornar os valores mais manejáveis, o valor do módulo de Young geralmente é expresso em GigaPascais (GPa), em que um Pascal é 1 N.m-2, e um GigaPascal é 109N.m-2. O módulo de Young em geral é descrito apenas como módulo elástico ou módulo de elasticidade.

Resistência à Fratura Agora é possível definir a resistência à fratura do material, σf, uma vez que é simplesmente a tensão necessária para quebrá-lo.

Limite de Proporcionalidade e Limite Convencional de Escoamento* A tensão na qual a deformação plástica inicia é definida como limite de proporcionalidade, σy. Na prática, esse ponto é difícil de ser detectado, pois existe uma transição gradual ao invés de uma rápida alteração no declive da curva tensão-deformação. *Nota da Revisão Científica: A maioria dos livros recentes de Materiais Dentários na área odontológica disponíveis no Brasil considera os conceitos Yield stress e Proof stress como limite convencional de escoamento (LCE), diferentemente do presente livro, em que o autor prefere utilizar o primeiro conceito como limite de proporcionalidade e o segundo como LCE.

Em uma resposta à tração que está detalhada na Figura 1.7.3, existe uma tensão máxima que pode ser suportada pelo espécime. Essa tensão máxima é definida como a resistência máxima à tração do material, σRMT, e é frequentemente diferente da resistência à fratura que, conforme descrito acima, é a tensão no ponto de fratura.

Ductibilidade A quantidade de deformação plástica produzida no espécime no momento da fratura é chamada de ductibilidade do material. A ductibilidade é mensurada pelo desenho de uma linha que parte do ponto de fratura, que é paralelo à região elástica da curva tensão-deformação. Onde essa linha encontra o eixo da deformação é a medida da ductibilidade do material, e é com frequência apresentada em termos de porcentagem de alongamento.

Resiliência e Tenacidade Quando um fio é curvado e depois liberado, ele volta para sua forma original desde que a tensão não exceda o limite elástico. Isso ocorre por causa da energia estocada no fio que é restabelecida quando a tensão é liberada. A quantidade de energia que pode ser absorvida e depois liberada é uma indicação do potencial de elasticidade do material. A resiliência é a quantidade de energia que um material pode absorver sem sofrer qualquer deformação permanente. É mensurada na curva tensão-deformação como a área sob a porção linear elástica da curva, que é dada por: 1 P2 R= × 2 E em que R é o módulo de resiliência, P é o limite de proporcionalidade e E é o módulo de elasticidade. As unidades são as de energia por unidade de volume, J.m-3 (1 Joule = 1N.m). A quantidade total de energia que um material pode absorver antes dele se fraturar é a medida da tenacidade do material e é indicada pela área total sob a curva tensãodeformação. Também é expressa em termos de J.m-3.

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Tenacidade à Fratura Existem ocasiões em que os materiais fraturam rapidamente e de modo inesperado. Isso frequentemente é resultado de uma fratura rápida e surge quando uma trinca no material se torna instável e cresce de modo muito rápido. Tais quebras causam queda de aviões, navios se partem na metade e pontes colapsam. Esse modo de falha em geral está associado a materiais que possuem características de comportamento friável, tais como vidros e cerâmicas, embora também possa acontecer com muitos metais que não são dúcteis, tais como o amálgama dentário, soldas e resinas duras e friáveis. A tenacidade à fratura de um material é a medida da capacidade desses materiais em resistir à propagação de uma trinca pré-existente. O método usado para medir a tenacidade à fratura de um material é introduzir uma trinca de tamanho e forma conhecidos, e assim medir a tensão necessária para que essa trinca cresça e por fim calcular um parâmetro conhecido como K1C. Valores típicos de tenacidade à fratura de vários materiais estão apresentados na Tabela 1.7.1.

Uma curva tensão-deformação pode ser construída, da qual inúmeras propriedades podem ser determinadas. Alguns exemplos típicos de curvas de tensão-deformação para vários materiais estão mostrados na Figura 1.7.5. Um exemplo de um material dúctil é o aço leve, que mostra uma região de comportamento elástico linear, um ponto de escoamento bem-definido e um grau considerável de ductibilidade. Ao contrário, um sólido friável e duro, tal como o gesso de Paris, mostra apenas uma região elástica linear e depois fratura sem qualquer evidência de deformação plástica.

Célula de carga

Espécime

Parte da base em movimento

TESTES MECÂNICOS Teste de Tração

Material

K1c . (MPam1/2)

Metais dúcteis

100-350

Aço de alta resistência

50-154

Ligas de alumínio

23-45

Madeira

11-13

Náilon

3

Porcelana

1

Tensão

Tensão

Figura 1.7.4 Um modelo para mensuração da resistência à tração.

Deformação Metal dúctil

Deformação Sólido friável

Tensão

Tabela 1.7.1 Dados de tenacidade à fratura de uma variedade de materiais

Base

Tensão

O teste de tração é um teste relativamente simples para compreender, interpretar e possivelmente também é o mais usado. Nesse teste, uma amostra de um material é tensionada numa direção uniaxial, conforme demonstrado na Figura 1.7.4. O teste é realizado com uma taxa de deformação constante (isto é, taxa constante de extensão) e a carga é mensurada por uma célula de carga. O alongamento correspondente à carga aplicada é medido simultaneamente, e pode ser realizado de várias formas possivelmente envolvendo mensuração da separação das peças constituintes da garra acoplada à máquina de ensaios, ou pela fixação de medidores de deformação para o material, caso a deformação seja muito baixa. A tensão e a deformação correspondente podem depois ser calculadas de acordo com as definições já descritas.

Deformação Plástico friável

Deformação Elastômero

Figura 1.7.5 Curvas de tensão-deformação de vários materiais. Observe que as escalas de tensão e deformação não podem ser comparadas.

PROPRIEDADES MECÂNICAS

Muitos plásticos, tal como o polimetil metacrilato, também são friáveis, embora sejam menos rígidos do que o gesso de Paris. O elastômero, do qual os materiais de moldagem de silicone são exemplos, mostra um comportamento muito diferente quando comparado a outros materiais. Primeiro, o elastômero parece não apresentar uma região elástica linear e a região elástica restabelecida é muito grande. A porcentagem de alongamento é muito maior do que a observada com aço ou gesso de Paris e de natureza elástica, uma vez que a borracha retornará as suas dimensões originais após a remoção da tensão. A borracha também possui uma resistência à tração significativamente menor.

Constrição Durante a deformação elástica existe um leve aumento do volume de material porque os átomos que compõe o sólido são empurrados. Entretanto, não há tanta alteração em volume ocorrendo durante a deformação plástica. Durante tal deformação o aumento do comprimento do material deve resultar na redução da área transversal. Isso tende a ocorrer numa região localizada do material, como mostrado na Figura 1.7.6 e é conhecida como constrição. Esse fenômeno ocorre mais prontamente em materiais altamente dúcteis. Os resultados dos testes de tensão podem ser muito úteis ao desenhar estruturas, porque o conhecimento das características da deformação elástica do material é necessário para predizer o comportamento da estrutura quando ela é colocada sob uma carga. O limite de proporcionalidade determina a tensão máxima que o material pode suportar de modo seguro, portanto, a carga máxima que a estrutura pode suportar, embora seja prudente incluir algum fator de segurança. O módulo de elasticidade permitirá a determinação da rigidez da estrutura. Por exemplo, a combinação dessas propriedades permite que se determine a resiliência ou elasticidade de um fio metálico.

Antes

Se técnicas de fabricação, tais como rolamento, modelagem ou prensagem de um fio, estão envolvidas na fabricação de um produto, então é necessário conhecer quanto de deformação elástica o material pode suportar. Se o material mostra alta ductibilidade, então, ele pode ser modelado, mas se não é dúctil a modelagem pela aplicação de cargas não será possível.

Teste de Compressão Para materiais friáveis em particular, o teste de tração é difícil de ser realizado e os resultados em geral mostram alto grau de dispersão. Uma alternativa é o teste de compressão, que é realizado de modo mais fácil nos materiais friáveis e apresentam resultados que mostram menor grau de dispersão. Outra razão pela qual esses testes são realizados nos materiais friáveis é que esses materiais são usados somente sob condições de carga de compressão. A configuração do teste de compressão é mostrada na Figura 1.7.7. Como a amostra é comprimida por fricção num ponto de contato com as bases de teste, existe um aumento da área transversal, assim o material adquire formato de barril. Esse efeito em “formato de barril” produz um padrão de tensão muito complexo no material (também mostrado na Figura 1.7.7) que não pode ser analisado facilmente. Isso torna a interpretação dos testes de compressão muito difícil. Um teste mais adequado é o mensurado da resistência à tração diametral, na qual um disco do material é submetido a uma carga compressiva. A carga aplicada ao disco resulta em tensão por tração numa direção perpendicular à carga aplicada, como mostrada esquematicamente na Figura 1.7.8. A tensão por tração, σ, é calculada da seguinte forma: σ = 2P/πDT

Depois

Redução da área de secção transversal

Figura 1.7.6 Constrição, mostrada por um material dúctil.

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Figura 1.7.7 Um modelo para mensuração da resistência à compressão, mostrando onde a tensão de tração e cisalhamento é desenvolvida.

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

em que P é a carga, D é o diâmetro do disco e T é a espessura do disco. É um teste comumente usado para materiais dentários frágeis, porque é simples e fornece resultados mais reprodutíveis do que o teste de tração.

Teste de Dureza O teste de dureza mede a resistência de um material a uma ferramenta de corte ou endentação. Ele fornece uma indicação da resistência do material à penetração ou abrasão. Também existe uma correlação moderada entre a dureza de um material e sua resistência máxima à tração. O teste envolve o uso de um endentador, que pode ser na forma de uma bola (Brinell), pirâmide (Vickers ou Knoop) ou cone (Rockwell), que obviamente deve ser mais duro do que o material a ser testado. O endentador é empurrado para o interior da superfície do material por um dado período, deixando uma impressão do endentador específico (Fig. 1.7.9).

O tamanho dessa impressão dependerá da dureza do material. Os tamanhos podem ser mensurados e um número empírico da dureza pode ser calculado. A escolha do teste de dureza, em alguma extensão, depende da natureza do material a ser testado.

Teste de Impacto O teste de impacto é designado para testar a resistência de um material a uma rápida aplicação da carga. Uma barra-padrão é sujeita a uma carga de impulso fornecida por um pêndulo pesado. O desenho desse teste é mostrado na Figura 1.7.10. O pêndulo é liberado com um peso conhecido e depois bate e quebra a amostra, que é colocada sobre um suporte paralelo. Alguma energia do pêndulo é usada para quebrar o espécime. Com o conhecimento da altura inicial e final do pêndulo após ele ter fraturado o espécime, a diferença na energia pode ser calculada. Esta é a medida da quantidade de energia que é absorvida pelo espécime, provocando sua fratura. Embora o teste seja empírico, ele fornece um meio útil de comparação da resistência ao impacto de inúmeros materiais. A presença de um entalhe torna esse teste muito rigoroso e fornece uma indicação da sensibilidade do material ao entalhamento na sua estrutura.

Teste de Fadiga Em muitas situações práticas, os materiais são sujeitos a tensões flutuantes ao invés de cargas estáticas que são consideradas anteriormente. O acúmulo gradual de pequenas quantidades de deformação plástica produzida por cada ciclo de uma tensão flutuante é conhecido como fadiga e uma situação clínica, em que tais falhas podem ocorrer é com as limas de Ni-Ti usadas na endodontia.

Ângulo de colisão do pêndulo Espécime entalhado Figura 1.7.8 Um modelo para mensuração da resistência à tração diametral.

Brinell

Vickers

Knoop

Figura 1.7.9 Superfície dos endentadores de diferentes testes de dureza.

Figura 1.7.10 Posição do espécime para um teste de impacto de Sharpy. O pêndulo tem uma cabeça de martelo, que é liberada de uma altura fixa.

PROPRIEDADES MECÂNICAS

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Deformação

Tensão

Aço Limite de resistência Alumínio

4 2 3 1

Número de ciclos

Tempo

Figura 1.7.11 Curvas T-N para aço e alumínio.

Figura 1.7.12 Curva de creep, mostrando os quatros estágios de creep para condições de deformação de longa duração e de creep em alta temperatura.

A fadiga pode levar a tensões bem abaixo do limite de proporcionalidade do material. O teste de resistência à fadiga envolve submeter os espécimes do material a um carregamento cíclico com uma variedade de cargas. O número de ciclos necessários para provocar falha é contado em cada caso. A tensão é marcada como uma função logarítmica do número correspondente de ciclos necessários para provocar a falha. Isso é dado por uma curva T-N, como mostrado na Figura 1.7.11. Duas formas de comportamento podem ser observadas. Para alguns materiais, assim que o número de ciclos de carga aumenta, a tensão permitida é reduzida. Em outros materiais, entretanto, existe o que é conhecido como limite de resistência, que corresponde ao nível de tensão abaixo do qual o material pode ser submetido a um número indefinido de ciclos sem fraturar. A resistência à fadiga é muito dependente das características de superfície do material. Melhoras no acabamento da superfície ou tensões de compressão na superfície que podem ser induzidas mecânica ou quimicamente tendem a elevar o nível da curva T-N. O ambiente de teste também apresenta um efeito profundo na curva T-N em ambientes corrosivos, particularmente, reduzindo a resistência à fadiga.

Teste de Creep

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O fato de um material poder ser resistente a ponto de suportar as cargas aplicadas sobre ele, quando é colocado inicialmente em uso, não significa que ele sempre será capaz de suportar essas cargas.

Sob a influência de uma tensão constante, os materiais podem deformar de modo permanente se a carga for aplicada por um longo período, mesmo se a tensão sobre o material estiver bem abaixo do seu limite elástico. Essa deformação do material dependente do tempo é conhecida como creep, e por fim provocará fratura do material. Isso é particularmente importante quando um material é usado a uma temperatura acima da metade de sua temperatura de fusão ou ponto de amolecimento, por exemplo, algumas fases do amálgama e muitos plásticos. Em temperaturas 40%-50% menores do que o ponto absoluto de fusão, o creep é insignificante. Uma curva típica de creep é mostrada na Figura 1.7.12. Quatro estágios de alongamento podem ser definidos: ■ ■ ■ ■

alongamento inicial devido à aplicação de carga; creep transitório ou primário, que tende a ser de grande efeito; estado estável (secundário) de creep; e creep terciário.

Não consideraremos os mecanismos que originam o creep.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Uma ampla variedade das propriedades mecânicas dos materiais pode ser mensurada. Isso permite que comparações sejam realizadas entre os materiais dentários, embora seu significado clínico possa ser tópico de considerável debate.

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Capítulo 1.8

PROPRIEDADES FÍSICAS

INTRODUÇÃO A forma na qual os materiais dentários são utilizados não condiz com a produção em massa, pois cada novo paciente é diferente do anterior, e o material tem que ser especialmente adaptado para cada caso. Portanto, a maior parte dos materiais usados pelo dentista e pelo técnico de laboratório precisa de alguma forma de processamento antes de seu endurecimento. Esse processamento com frequência envolve uma mistura de materiais com outros para produzir uma pasta ou líquido que pode ser inserido e adaptado para se adequar às necessidades do paciente. O uso bem-sucedido dos materiais dentários, portanto, precisa de algum entendimento do escoamento dos materiais quando são misturados, vazados ou moldados. O estudo do escoamento do material é conhecido como reologia. Quando um paciente bebe uma xícara de chá ou toma um sorvete, as diferenças de temperatura dentro do dente podem ser muito pronunciadas. A polpa do dente reagiria severamente se não for protegida dessas temperaturas que diferem muito do normal ao redor de 37°C. Ao se colocar uma restauração, coroa, ponte ou prótese total, deve-se ter cuidado em proteger a polpa desses extremos de temperatura. Portanto, as propriedades térmicas dos materiais dentários precisam ser consideradas. A restauração da dentição humana tem sido motivada mais e mais da parte puramente funcional para a estética. A maioria dos pacientes quer uma restauração que seja impossível de detectar uma intervenção realizada por parte do dentista. Assim, as propriedades ópticas dos materiais selecionados e usados pelos dentistas têm se tornado muito importantes.

PROPRIEDADES REOLÓGICAS A reologia é o estudo do escoamento dos materiais. Para líquidos, o escoamento é medido pela viscosidade e para

sólidos considera-se o creep e a viscoelasticidade. Creep já foi descrito no capítulo anterior e apenas a viscosidade e a viscoelasticidade serão consideradas aqui.

Viscosidade Quando uma substância escoa sob influência de uma força externa (p. ex., gravidade), as moléculas ou átomos entram em contato com vizinhos diferentes. Então esta interação deve ser quebrada e restabelecida, e isso dá origem à resistência ao escoamento, conhecida como viscosidade. Para um líquido como a água, as forças de ligação entre as moléculas unidas são muito fracas e facilmente superadas, e assim a água escoa mais facilmente e possui baixa viscosidade. Para alguns fluidos, as atrações intermoleculares são muito fortes. Isso em geral está associado a moléculas maiores, tal como o caso do melado. As moléculas podem ainda se entrelaçar uma na outra originando viscosidades muito elevadas. Isso é o que acontece com polímeros de alto peso molecular. Quando agitamos um líquido estamos efetivamente aplicando uma tensão de cisalhamento, e o grau de energia no qual misturamos pode ser quantificado pelo índice de cisalhamento. Tal situação é mostrada na Figura 1.8.1. A tensão de cisalhamento e a taxa de cisalhamento são definidas pelo: Tensão de cisalhamento = ηs = F/A Taxa de cisalhamento = è = V/d Vários métodos estão disponíveis para mensurar a tensão de cisalhamento sobre uma variedade de taxas de cisalhamento para um fluido, e a informação coletada pode ser considerada como a curva da tensão de cisalhamento-taxa de cisalhamento. Essa relação é linear para muitos fluidos e uma curva típica para esse fluido é mostrada na Figura 1.8.2. O desvio da curva é igual à viscosidade e assim a definição científica exata da viscosidade, η, é dada por: η = tensão de cisalhamento/taxa de cisalhamento

51

52

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Dilatante

v d

F Líquido

Placa estacionada

Tensão de cisalhamento

Figura 1.8.1 Cisalhamento de um líquido entre duas placas rígidas que estão separadas por uma distância, d. A placa superior é movida a uma velocidade, v, em relação à placa estacionada e uma força, F, é necessária para sobrepor a resistência do líquido.

Taxa de cisalhamento Figura 1.8.2 Tensão de cisalhamento versus força de cisalhamento para um líquido newtoniano.

Plástico

Tensão de cisalhamento

Placa de área A em movimento

Newtoniano

Pseudoplástico

Taxa de cisalhamento Figura 1.8.3 Comportamento reológico de diferentes líquidos.

é possível definir as características de escoamento desse líquido apenas pela viscosidade. Para alguns líquidos, um aumento da taxa de cisalhamento não provoca o aumento correspondente da tensão de cisalhamento. Isso significa que o líquido se torna mais fácil de ser misturado a altas taxas de cisalhamento do que quando comparado a um líquido dilatante ou newtoniano. Esse comportamento é descrito como pseudoplástico e provoca a característica de alguns líquidos que é comumente conhecida como aumento do escoamento por cisalhamento. Um exemplo odontológico desse tipo de comportamento é a silicona utilizada como material de moldagem, onde o aumento do escoamento por cisalhamento torna o escoamento do fluido por uma seringa muito mais fácil do que seria.

Tixotropia As unidades de viscosidade são pascals segundos (Pa.s). As propriedades de viscosidade das substâncias que possuem uma relação linear entre a tensão de cisalhamento e a taxa de cisalhamento são dadas inteiramente por um simples valor de viscosidade, e são ditas como tendo um comportamento “newtoniano”. Entretanto, nem todos os materiais se comportam da mesma maneira, e algumas das diferentes formas de comportamento são mostradas da Figura 1.8.3. Líquidos com comportamento plástico não escoarão até que uma tensão de cisalhamento inicial tenha sido alcançada. O fluido escoará num modelo newtoniano. Os líquidos dilatantes mostram um aumento da viscosidade à medida que a taxa de cisalhamento cresce. Isso significa que quanto mais rápido se tenta misturar o fluido, mais difícil torna-se a mistura do líquido. Não

Há muito tempo acredita-se que a viscosidade pode ser determinada do conhecimento da tensão de cisalhamento e taxa de cisalhamento em qualquer momento. Para algumas substâncias, a viscosidade alterará a uma taxa de cisalhamento específica, e se traçarmos uma curva da tensão de cisalhamento versus a taxa de cisalhamento para um dado líquido, pode-se encontrar uma resposta tal qual a mostrada na Figura 1.8.4. Nesse caso a viscosidade para uma taxa de cisalhamento que está aumentando é diferente da viscosidade para uma taxa de cisalhamento em redução, que é um exemplo de histerese. Nesses casos, a viscosidade do fluido é dependente de deformações anteriores as quais o fluido foi submetido. Esse tipo de comportamento ocorre quando existe algum rearranjo molecular causado pela mistura e falta de tempo para as moléculas retornarem para seu arranjo normal antes de serem misturadas novamente. O efeito

PROPRIEDADES FÍSICAS

53

Tensão de cisalhamento

Deformação

Mola

t0

Tempo

t1

Amortecedor Taxa de cisalhamento

disso é que quanto mais tempo o fluido é misturado a uma dada taxa de cisalhamento, menor será a tensão de cisalhamento, bem como a viscosidade. Se o fluido for deixado por tempo suficiente, ele se recuperará e todo o processo poderá ser repetido. Esse tipo de comportamento é definido como tixotrópico e um fluido que exibe isso é uma tinta que não escorre.

Deformação

Figura 1.8.4 Comportamento tixotrópico.

t0

Tempo

t1

Figura 1.8.5 Resposta elástica e viscosa para o modelo de mola e amortecedor.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA As propriedades reológicas de um material são importantes, pois têm influência principalmente nas características de manipulação do material.

Viscoelasticidade Uma grande variedade de materiais mostra um comportamento que é intermediário entre o de um líquido viscoso e de um sólido elástico. Para um sólido elástico, afirma-se que a relação entre tensão e deformação é independente de quaisquer fatores dinâmicos tais, como: taxa de carregamento ou de deformação. Entretanto, se for dado um tempo suficiente para fazer isso, alguns sólidos mostram a capacidade de rearranjar suas moléculas sob a influência de uma carga aplicada, e isso é refletido em alguma deformação. Quando uma carga é depois liberada, o material não retorna imediatamente ao seu estado original. Isso significa que o comportamento do material é dependente de tais fatores, como: a duração e quantidade de carga aplicada. Um meio efetivo e simples de visualização desse problema é pelo uso de modelos baseados em mola e amortecedor, que combinam para formar um sistema que se assemelha a um amortecedor de choque. A mola representa o elemento elástico e o amortecedor representa

o elemento viscoso. A variação da deformação com o tempo para esses modelos está mostrada na Figura 1.8.5. Para a mola, a aplicação de carga resulta na deformação imediata que é mantida ao longo do tempo que a carga é aplicada. Uma vez que a carga é removida, a mola retorna instantaneamente para seu estado original. Por sua vez, com a aplicação de carga, no amortecedor existe um aumento gradual da deformação que continua a aumentar durante o período de aplicação da carga. Com a remoção da carga, a deformação não é atenuada, e o amortecedor permanece na sua nova posição. Quando esses dois elementos são colocados em paralelo, cria-se um modelo viscoelástico simples. A resposta de deformação é mostrada na Figura 1.8.6. Nesse modelo, o amortecedor impede que a mola responda elasticamente. Neste momento, o amortecedor deixa gradualmente que a mola se aproxime do estado desejado de deformação. Com a remoção da carga, o amortecedor impede que a mola se contraia ao seu estado de não deformação, que pode agora ser alcançado apenas após algum tempo. Um exemplo odontológico de um grupo de materiais que mostram comportamento viscoelástico são os materiais de moldagem elastoméricos. A curva deformaçãotempo para esse material e o modelo correspondente dos elementos elásticos, viscosos e viscoelástico são mostrados na Figura 1.8.7.

54

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Para evitar deformação permanente excessiva desses materiais, eles não devem ser carregados por mais tempo que o necessário; isso porque os materiais de moldagem elásticos devem ser removidos da boca com movimento de tração curto e rápido. Quanto mais rapidamente uma carga é aplicada e retirada de um material, maior será a sua resposta elástica.

Deformação

Elemento viscoelástico

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Alguns materiais apresentam propriedades entre um sólido e um líquido, que os tornam suscetíveis à distorção. t0

Tempo

t1

PROPRIEDADES TÉRMICAS O material pode ser quente ou frio ao toque. Essa resposta do material a uma fonte de calor, nesse caso as

Figura 1.8.6 Comportamento viscoelástico de uma mola e amortecedor em paralelo.

Carga

Carga

Deformação

Carga

Tempo Figura 1.8.7 Modelo viscoelástico correspondendo ao comportamento reológico de um material de moldagem elastomérico completamente polimerizado. A carga é aplicada num dado tempo t0, e mola A estende-se instantaneamente, enquanto a mola D é impedida de realizar este movimento pelo amortecedor C. Com o tempo, os amortecedores C e B permitem o desenvolvimento da deformação adicional. No tempo t1, a carga é removida, e a mola A se contrai imediatamente. A mola D é impedida de realizar o movimento pelo amortecedor C. Finalmente, no tempo t2, a mola D retornou para seu comprimento original. Alguma deformação permanente se mantém, pois o amortecedor B não retornará ao seu estado original.

PROPRIEDADES FÍSICAS

pontas dos dedos, é dependente da facilidade com que esse calor é transferido através do material. Um material, que prontamente conduz calor, é um condutor térmico e um material que resiste à condução de calor é um isolante térmico.

Condutividade Térmica Um fator que determina a facilidade com que o calor será transferido através do material é a condutividade térmica (K), que é definida como a taxa de fluxo de calor por unidade de gradiente de temperatura; suas unidades são cal.cm-1.s-1.°C-1.

Calor Específico Para alguns materiais, a “sensação de resfriamento” inicial pode rapidamente desaparecer assim que o material se aquece devido à transferência de energia térmica da fonte de calor para o material. O modo pelo qual a temperatura rapidamente aumenta depende do calor específico do material, que é definido como a energia de calor necessária para elevar a temperatura a uma unidade de volume por um grau centígrado. Então, suas unidades são cal.g-1.°C-1 e o símbolo usado é Cp.

Difusividade Térmica A transferência de carga de uma fonte quente para uma fria é dependente tanto da condutividade térmica como do calor específico, com o primeiro regulando a taxa pelo qual o calor penetra e passa através do material, e com o último determinando a taxa pela qual a temperatura aumentará assim que o calor penetrar no material. Isso é representado pela difusividade térmica, h, como:

água, mostrando ser um excelente isolante térmico. Por esse motivo é que os esquimós podem se manter bemaquecidos quando estão em seus iglus.

Expansão Térmica Quando um material é aquecido, a energia extra absorvida provoca a vibração de átomos e moléculas com aumento da amplitude. Como consequência o material se expande. O modo mais comum de mensurar essa expansão é avaliar o comprimento do material, aquecendo-o a uma certa temperatura e depois mensurando a alteração resultante no comprimento. Essa alteração no comprimento, quando determinada por unidade de comprimento para 1°C de alteração na temperatura, é chamada de coeficiente linear de expansão, α. Essa alteração é tão pequena que é mais comum ser expressa em termos de partes por milhão por grau centígrado (ppm/°C). Alguns valores típicos para α estão mostrados na Tabela 1.8.2. Num material restaurador ideal, o coeficiente de expansão térmica deveria ser idêntico ao dos tecidos dentários. Se esse não for o caso, a troca térmica pode levar a formação de uma fenda marginal e a quebra da união adesiva. Tais efeitos serão dependentes do coeficiente de expansão térmica e da difusividade térmica do material. Alguns materiais, tal como a prata, precisam de apenas uma pequena quantidade de energia na forma de calor para elevar sua temperatura e expandir ou contrair rapidamente. Por sua vez, os materiais restauradores como os compósitos apresentam baixa difusividade térmica. Isso fornece alguma proteção contra o estímulo térmico, pois mais energia na forma de calor é necessária para

Tabela 1.8.2 Coeficientes de expansão térmica

h = K/Cpρ em que ρ é a densidade do material. A difusividade térmica fornece uma indicação clara da taxa de elevação da temperatura a um determinado ponto devido à colocação de uma fonte de calor em um outro ponto, e pode ser considerada a mais importante nas aplicações odontológicas. Alguns valores típicos das propriedades mencionadas para inúmeros materiais estão mostrados na Tabela 1.8.1. Uma característica importante é a baixa difusividade da

55

a (ppm/oC) Esmalte

12

Dentina

14

Resina composta

20-55

Selante de fissuras

80

Porcelana

12

Cimento de ionômero de vidro

8

Tabela 1.8.1 Propriedades físicas dos materiais dentários r (g.cm-2)

Cp (cal.g-1.oC-1)

K (cal.cm-1. s-1.oC-1)

H (cm-2.s1)

Esmalte

2,9

0,18

0,0022

0,0042

Dentina

2,1

0,28

0,0015

0,0026

Prata

10,5

0,056

0,98

1,67

Sílica

2,5

0,2

0,003

0,006

Água

1,0

1,00

0,0014

0,0014

56

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

elevar a temperatura e expansão correspondente. Entretanto, se um calor suficiente é fornecido, o material mostrará uma troca expansão/contração significativa com os tecidos dentários. Fraturas de peças fundidas podem ocorrer devido à diferença entre a temperatura da peça fundida e a temperatura do resfriamento, quando existe uma grande troca entre o material refratário e a liga fundida. A correção das alterações dimensionais devido à contração de resfriamento das ligas é muito importante para a adaptação de coroas e pontes. De modo similar, a metalocerâmica depende de que o coeficiente de expansão do metal e porcelana sejam muito próximo.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA As propriedades térmicas de um material dentário podem influenciar a sensação de alimento quente ou frio e podem provocar falhas mecânicas devido a diferenças entre a expansão e a contração.

melho brilhante. Isso ocorre porque a nossa sensibilidade à cor e experiências anteriores será diferente. Existem três características de um objeto que controlam a natureza da luz refletida, são elas: ■





Cor. A cor de um objeto que nossos olhos detectam será em função da fonte de luz fornecida pelo espectro de luz atingindo a superfície e como o objeto transforma esse espectro. Translucidez. A quantidade de luz refletida e o espectro de luz refletida por um objeto e detectado pelo olho dependerá da capacidade da luz em atravessar o material, onde ela mudará devido às propriedades de absorção e dispersão do material e a estrutura de fundo contra o qual ele é mantido. Textura de superfície. A luz pode ser refletida por uma superfície, como um espelho ou dispersa em todas as direções. No primeiro caso a superfície é uma superfície polida que apresenta uma reflexão ideal, ao passo que no segundo caso é uma superfície opaca que dispersa a luz.

Cor PROPRIEDADES ÓPTICAS No mundo real, todo objeto que vimos é resultado da reflexão da luz proveniente do próprio objeto que atinge um fotodectector muito sensível, com um determinado comprimento de onda, chamado de olho (Fig. 1.8.8). Possuímos um tripé composto por uma fonte de luz, o objeto e observador. Cada um destes influenciará o que vemos. Quando colocamos uma maçã na frente de três pessoas e perguntamos qual a cor da maçã, poderemos ter três respostas diferentes. Uma verá simplesmente como vermelho, outra como carmesim e ainda outra como ver-

Fonte de luz

Olho

Objeto Fundo

Figura 1.8.8 A percepção de um objeto depende da fonte de luz, das propriedades óticas de um objeto e da capacidade do olho em discriminar o espectro de luz visível que atinge a retina.

A percepção da cor é altamente subjetiva, pois é uma resposta fisiológica a um estímulo físico. Por exemplo, fazer a escolha de uma cor de um material restaurador para que ele apresente uma cor semelhante ao dente tende a variar levemente, de indivíduo para indivíduo. Isso acontece porque o olho é um detector de luz, seguido da interpretação do cérebro que apresenta pouca definição da energia dispersa ou transmitida pelo material. Esse processo variará de pessoa para pessoa. Isso pode representar um problema real para aqueles que sofrem de daltonismo, o que significa basicamente que os fotodectores são defeituosos. A percepção da cor, portanto, não leva a sua quantificação, mas não é o caso da luz em si. A luz é uma radiação eletromagnética que pode ser detectada pelo olho humano. Newton (1666) foi capaz de produzir um espectro de luzes coloridas diferentes ao iluminar um prisma de vidro, que reflete a luz numa banda multicolorida. Essa banda de luz foi idêntica às cores do arco-íris. Ele mostrou que a luz branca é na verdade o resultado de uma combinação de um amplo espectro de radiação colorida. O espectro da radiação eletromagnética do ultravioleta até o infravermelho é mostrado na Figura 1.8.9. Disso, pode-se observar que a radiação eletromagnética visível ocupa apenas uma pequena parte do espectro total e esta faixa está entre 380-780 nanômetros (1 nanômetro [nm] = 10-9m). Esse espectro vai do violeta (380-450nm), passa pelo azul (450-490nm), depois pelo verde (490-560nm), amarelo (560-590nm), laranja (590-630nm) e finalmente o vermelho (630-780nm). A luz é focalizada na retina e desencadeia os impulsos nervosos que são transmitidos ao cérebro. Existem

PROPRIEDADES FÍSICAS

Raio x

Ultravioleta

Visível

Infravermelho

Violeta

Distante

Vermelho

Anil

10

400

RF

Distante

Laranja Azul

Amarelo

Verde

Próximo

57

Próximo

Comprimento de onda (nm)

700

1.000.000

células em forma de cone na retina que são responsáveis em fornecer a sensibilidade para diferenciar as cores da luz e células em bastonete que são sensíveis apenas ao brilho (isto é, quantidade de luz) que é focalizada na retina. A resposta da retina à luz é indicada na Figura 1.8.10. Ela mostra que o olho é mais sensível à luz na faixa do verde-amarelo e é menos sensível aos extremos do espectro visível, isto é, vermelhos e azuis. As células em forma de cone apresentam um limiar de intensidade. A excessiva exposição à luz de um dado comprimento de onda pode provocar com que estas células não desempenhem corretamente a sua função, resultando em uma distorção ocular e percepção de cores muito diferente. A luz real que vemos não é um único comprimento de onda, mas é composta de uma mistura de diferentes comprimentos de onda que se combina para produzir uma cor distinta. O comprimento de onda e intensidade do espectro da luz que vemos depende da fonte de luz. O espectro de luz para luz do dia e de uma lâmpada com filamento de tungstênio são muito diferentes, conforme mostrado na Figura 1.8.11. Isso significa que a cor de um objeto poderá parecer diferente quando visto sob a luz proveniente de fontes diferentes. A fim de permitir que a informação sobre a cor possa ser transmitida, por exemplo, para que o laboratório consiga confeccionar uma coroa ou jaqueta, precisamos de algum mecanismo para descrever as características da cor dos dentes de um paciente que sejam similares às da restauração. Várias pessoas tentaram desenvolver um método de quantificação da cor e expressá-lo numericamente com o objetivo de tornar a comunicação da cor fácil e precisa. Em 1905 o artista norte-americano A. H. Munsell desenvolveu um método para descrição das cores, que foram classificadas de acordo com seu matiz, croma e valor: ■

Matiz. Ela representa a cor dominante (isto é, comprimento de onda) do espectro de luz de uma fonte. As

Resposta da retina

Figura 1.8.9 Espectro da radiação eletromagnética.

400

Comprimento de onda (nm)

700

Figura 1.8.10 A resposta relativa da retina à radiação eletromagnética visível.





possíveis cores são violeta, anil, azul, verde, amarelo, laranja e vermelho. As três cores principais, das quais todas as outras cores podem ser produzidas são o vermelho, o verde e o azul. Esse fato é usado nos televisores para criar uma imagem totalmente colorida apenas de três cores distintas. Croma. Ele é a força do matiz, em outras palavras, o quão é intensa a cor. Na televisão, ele pode ser representado pelo ajuste de cor. Valor. Ele é o brilho ou o escurecimento de um objeto, e varia do preto ao branco para objetos que dispersam ou que refletem, e do escuro ao claro para objetos translúcidos.

Ao passo que o matiz e o croma são propriedades de um objeto, o valor dependerá da incidência da luz, do polimento da superfície do objeto e do fundo, ou seja, se o material transmite luz. Por esta razão, é importante que a identificação da cor seja realizada sob diversas fontes de luz, com a luz do dia sendo a melhor opção. A base para o sistema Munsell é mostrada na Figura

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Filamento de tungstênio

Energia relativa

100%

Branco

Croma

Valor

58

Matiz

0% 400 Comprimento de onda (nm) 700

100%

Média da luz natural

Energia relativa

Preto

0% 400 Comprimento de onda (nm) 700 Figura 1.8.11 Espectro de luz para uma lâmpada de filamento de tungstênio e de luz natural.

1.8.12. Essa representação tridimensional da cor não é exatamente prática e inicialmente esse método de descrição da cor envolveu uma grande variedade de tiras de papéis coloridos, que mais tarde foi atualizado para um sistema numérico. Nesse sistema, qualquer cor é expressa como uma combinação letra/número e é visualmente avaliado no Atlas Colorido de Munsell. Entretanto, esse sistema possui suas limitações no que se refere à estabilidade da cor do Atlas e ele necessita ser substituído a cada cinco anos, além da necessidade de ser visto sob condições de luz padronizadas. Apesar disso, embora ele possa ser adequado para a combinação da cor de um pedaço de tecido ou de uma tinta, por meio da sua colocação próxima ao Atlas, este não é o mais conveniente método para avaliar a cor dos dentes de um paciente! Além disso, foi mostrado que a variação de cores dos dentes humanos corresponde a apenas 2% da guia de cores de Munsell. Assim, na Odontologia, um sistema mais simples baseado numa escala foi desenvolvido, no qual a escala VITA é uma das mais usadas (Fig. 1.8.13). A escala de cores da VITA é estruturada no princípio da

Figura 1.8.12 Esquema de cor tridimensional de Munsell para matiz, croma e valor.

matiz, valor e croma. Existem quatro matizes básicos, representadas por A (avermelhado-marrom), B (avermelhado-amarelo), C (cinza) e D (avermelhado-cinza). O valor é a escala de cinza e a escala de cores pode ser arrumada de acordo com o quão claro (branco) ou quão escuro (preto) é um dente. O terceiro elemento da escala de cores é o croma, que representa a intensidade da cor principal como é indicado pelo número associado à cor principal (matiz), que é A1-A4, B1-B4, C1-C4 e D1-D4. É importante que a escala selecionada corresponda ao material restaurador usado. O ideal é que a escala de cores fosse fabricada com o mesmo material usado para a confecção da restauração. O fato de os objetos serem capazes de mudar a cor sob influência de diferentes fontes de luz é conhecido como metamerismo. O metamerismo ocorre quando dois objetos com propriedades de reflexão de luz diferentes (gráficos do espectro) apresentam uma aparência de cor idêntica em condições de iluminação e observação específicas, e parecem diferentes quando as condições de iluminação ou observação são alteradas. A maior parte dos consumidores sabe que a tentativa de combinar cores de duas peças de roupa é mais bem sucedida se realizada sob luz do dia ao invés da luz fluorescente da loja. Outra característica importante da luz é que alguns objetos são capazes de absorver luz de um comprimento de onda próximo à faixa ultravioleta (300-400nm), e depois a liberam como uma luz de comprimento de onda maior (400-450 nm). Essa propriedade é a fluorescência, e ocorre naturalmente no esmalte dentário. Esse é o motivo pelo qual os dentes aparentam tão brancos sob

PROPRIEDADES FÍSICAS

59

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A cor de um objeto é uma percepção humana, que se dá em função de um tripé, composto pela fonte de luz, objeto e observador.

Translucidez

A

B

C Figura 1.18.13 Escala de cores Vita mostrando os dentes da escala organizados de acordo com as (a) quatro matizes, (b) com a faixa de valores e (c) de croma para a escala A.

luz fluorescente e porque algumas vezes coroas, pontes ou restaurações são mais perceptíveis sob uma luz fluorescente ao invés da luz do dia. Se os materiais usados na confecção da restauração não possuem a propriedade de fluorescência, a restauração aparecerá escura em relação à fluorescência do dente natural.

Um material transparente, tal como o vidro da janela, permite a passagem de luz de tal modo que ocorre pouca distorção, significando que um objeto pode ser visto completamente através dele. A absorção seletiva de certos comprimentos de onda pode acontecer e isso forma a base dos filtros óticos. Um material translúcido permite que alguma luz passe por ele, e então ele absorve alguma coisa do remanescente, dispersa e reflete o restante da sua superfície ou interface interna. Um objeto visualizado por esse material teria uma aparência distorcida. Um material opaco é um dos que não transmitem luz, mas ao invés disso absorvem, refletem ou dispersam a luz na superfície. A cor de um objeto dependerá de quais comprimentos de onda de luz são refletidos e quais são absorvidos. Por exemplo, o vidro vermelho é vermelho porque ele permite que a luz com comprimento de onda de luz vermelha passe por ele e todos os outros comprimentos de onda sejam absorvidos. Portanto, apareceria opaco se a fonte de luz não contivesse luz com comprimento de onda da luz vermelha, visto que todos os outros comprimentos de onda são absorvidos. Uma escala simples para quantificação do grau de opacidade é mostrada na Figura 1.8.14. Nesse sistema, a opacidade é representada por uma razão entre o contraste da reflexão da luz do dia de uma amostra de espessura padronizada (normalmente 1 mm) quando faz fundo com um padrão preto e a luz do dia aparece refletida quando faz fundo em um padrão branco. O padrão branco apresenta uma reflexão de 70% em relação ao óxido de magnésio (C0,70). Os materiais restauradores podem ser comparados facilmente com esmalte e dentina nessa escala, para encontrar seus relativos graus de opacidade.

Textura de Superfície Caso o material possua uma superfície opaca ou brilhante é em razão de quão lisa uma superfície possa ser. O esmalte tem uma superfície brilhante porque é muito liso e reflete uma grande quantidade de luz que incide na superfície. A luz é dispersa, à medida que uma superfície se torna rugosa e isto torna a aparência opaca. Isso é uma consideração importante em relação aos materiais restauradores, pois a aparência de um dente restaurado pode ser piorada se a restauração tiver uma superfície opaca, tornando-a diferente do resto do dente. O modo mais simples para avaliar isso é visualmente, mas isto

60

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Opaco

1,0

Ra=0,24µm 0,70 Dentina Translúcido

0,35 Esmalte

Transparente

Occlusin

10µm

A

0,0

Ra=0,25µm

Figura 1.8.14 Escala simples de opacidade.

também pode ser analisado numericamente usando um dispositivo conhecido como perfilômetro. Esse dispositivo consiste essencialmente em uma agulha inserida num longo braço de alavanca que é traçado ao longo da superfície e registra o movimento para cima e para baixo da agulha. Um exemplo de um traçado que corre ao longo da superfície de uma resina composta é mostrado na Figura 1.8.15. Ele também permite a quantificação da rugosidade de superfície pelo cálculo de Ra, que é desvio médio aritmético do perfil e quanto mais alto for esse valor, mais rugosa é a superfície.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A capacidade de polimento de um material restaurador é uma consideração importante para a sua seleção.

Herculite XRV

10µm

B Figura 1.8.15 Perfis de superfície produzidos por um perfilômetro sobreposto em uma imagem de microscópio eletrônico de varredura de uma resina composta híbrida (Occlusin, ICI) e resina composta de partícula pequena (Herculite XRV, Kerr UK Ltda).

Capítulo 1.9

PROPRIEDADES QUÍMICAS

INTRODUÇÃO O ambiente oral é um ambiente agressivo. Os materiais podem dissolver na água que está presente na saliva ou liberar componentes solúveis; podem erosionar devido à presença de ácidos; podem alterar sua cor ou se quebrarem devido à absorção de substâncias da saliva; ou podem perder o brilho e sofrer corrosão. Todas essas possibilidades podem apresentar efeitos adversos na estabilidade química dos materiais e limitar sua durabilidade. Os produtos liberados podem apresentar efeitos adversos no ambiente oral, tanto local como sistemicamente. As cerâmicas dentárias são formadas por compostos de oxigênio, como a sílica (SiO2) e alumina (Al2O3). Eles são quimicamente estáveis na maior parte das circunstâncias e imunes ao processo oxidativo associado à corrosão eletroquímica (ou úmida). A degradação das cerâmicas em geral envolve um processo de dissolução química. Por sua vez, os metais não são imunes à corrosão úmida. Com a notável exceção para alguns metais nobres, como o ouro e a prata, os metais geralmente são encontrados na natureza na forma de compostos (sobretudo óxidos ou sulfitos), dos quais o metal é extraído. A corrosão dos metais é, para todos os tipos de intenções e proposições, a reversão das reações empregadas no processo de extração. O produto de corrosão de um metal é com frequência muito similar ao composto do qual o metal foi originalmente extraído. Por exemplo, o ferro é extraído do óxido de ferro que ocorre naturalmente e a ferrugem é apenas um óxido de ferro hidratado. Geralmente, os polímeros não são estáveis também, pois muitos podem queimar se forem inflamados, mostrando que o polímero oxida prontamente. Entretanto, a degradação do polímero em geral é de natureza fisioquímica, tal como plastificação, dissolução ou ruptura de ligação covalente. A última pode ser causada pelo aquecimento ou radiação e invariavelmente resulta na redução das propriedades químicas como resistência e tenacidade.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Em geral, pode-se dizer que os polímeros tendem a sofrer absorção e perda de componentes solúveis, metais são mais propensos ao deslustre e a corrosão, e as cerâmicas podem estar sujeitas à dissolução química.

DEGRADAÇÃO DE POLÍMEROS Sorção de Água e Fração Solúvel Muitos polímeros usados na odontologia, como os usados nas resinas compostas, próteses totais e embasadores macios são suscetíveis à absorção de solventes, particularmente a água e a perda de componentes solúveis. A molécula do solvente força a separação das cadeias de polímeros, provocando plastificação. Assim que a resistência da ligação diminui, o polímero se torna mais macio, a temperatura de transição do vidro é reduzida e a resistência pode ser diminuída. O nylon é particularmente suscetível à sorção de água e isso é um fator significante para limitar a vida útil das escovas de dentes. No caso das resinas compostas, a sorção de água pode ser um fator contribuinte para a eventual descoloração das restaurações e degradação hidrolítica da interface resina-carga. Os embasadores macios para próteses totais perdem sua flexibilidade devido à perda de plastificadores solúveis em água, apresentam maior propensão ao creep e podem fraturar sob pressão osmótica que podem se acumular. A sorção de água pode apresentar um efeito significativo nas propriedades do cimento de ionômero de vidro, pois muito ou pouca água pode levar à perda de translucidez ou a fraturas da superfície, respectivamente. Geralmente é desejável que tanto a sorção da água quanto a fração solúvel dos polímeros sejam a menor possível. Isso assegura que o polímero mantém suas propriedades características, e que nenhum componente

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

seja lixiviados para fora, o que pode influenciar negativamente a biocompatibilidade do material. O método mais simples de avaliar a sorção de água e a fração solúvel de um polímero é monitorar a alteração de peso de uma amostra quando é imersa na água. A análise detalhada da quantidade de sorção de água por materiais poliméricos é complicada pela perda concorrente de componentes solúveis em água como monômeros residuais ou plastificadores, uma vez que esses dois processos ocorrem simultaneamente, embora em velocidades diferentes. É importante na caracterização desses fatores que os dois processos sejam separados. Ambos os processos são controlados pela taxa de difusão da água e dos componentes solúveis em água através do material, como quanto maior a taxa de difusão, mais rápido a água será absorvida e mais rápida a fração solúvel será perdida. É importante que qualquer água que a amostra absorveu da atmosfera seja removida antes da sua imersão na água. Até esse fim, as amostras devem ser estocadas num dessecador até que seja obtido um peso constante. A cinética do ciclo de sorção e perda de água está na Figura 1.9.1. O pico no peso da amostra no primeiro ciclo ocorre em consequência de diferentes taxas de difusão da água dentro da amostra e difusão da fração solúvel para fora da amostra. A água geralmente é absorvida de modo mais rápido do que a perda da fração solúvel do que a remoção dos componentes solúveis, tal como existe no rápido ganho de peso até que a amostra se aproxima da saturação. Nesse ponto, a perda de peso devido à fração solúvel começa a aparecer, pois sua liberação é subvencionada pela dissolução na água absorvida. A quantidade de sorção de água e fração solúvel pode ser calculada da seguinte equação: Sorção de água % em peso = (W1 - W2)/ W2 × 100 Fração solúvel % em peso = (W0 - W2)/ W2 × 100 Se o volume, V, é calculado no final do ciclo de perda de água, e W2 for substituído por V, a sorção de água e fração solúvel pode ser expressa em termos de µg/mm3, conforme recomendado no padrão internacional (ISO/ DIS 4049).

W1

W0

Sorção de água Fração solúvel

W2

Figura 1.9.1 Uma representação esquemática da cinética de sorção de água e dissolução da fração solúvel.

Para a maioria dos polímeros, a quantidade de sorção de água é aproximadamente 30-50 µg/mm3. Para resinas compostas, o valor deverá ser mais baixo, devido à presença de partículas de vidro, mas se isso é levado em consideração, a quantidade de sorção de água dentro da resina deveria estar na faixa apresentada para os polímeros. Os valores mais altos para sorção de água foram registrados para algumas resinas compostas, que podem estar associados à presença de porosidade, espaço livre formado devido à remoção da fração solúvel, quebra hidrolítica da interface resina-carga, ou dissolução da partícula de vidro.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A sorção de água excessiva pode levar à descoloração e à degradação dos materiais restauradores odontológicos.

Ruptura da Adesão A degradação dos polímeros pela quebra de ligação covalente é conhecida como clivagem. Muitas propriedades do polímero dependem do peso molecular das cadeias de polímeros. Se as cadeias dos polímeros forem quebradas pela clivagem da cadeia, então ocorrerá a redução do peso molecular, e isso pode resultar numa perda significativa das propriedades mecânicas. A ruptura da adesão pode ser devido a radiação, calor ou ataque químico. Algumas formas de radiação, tal como a luz ultravioleta, podem penetrar no polímero e interagir com as ligações que mantêm os polímeros unidos. Uma possibilidade é a ionização, em que a radiação UV remove um elétron de um átomo específico convertendo esse átomo num íon. O resultado é que a ligação com o átomo é quebrada e o comprimento da cadeia de polímero é reduzido. Outro resultado possível é que a ligação cruzada pode ser formada e isso também pode ser utilizado como um efeito positivo, melhorando as propriedades mecânicas. Um exemplo disso é a radiação γ do polietileno para introduzir ligações cruzadas, que melhoram sua resistência à maciez e escoamento em temperaturas elevadas. Se um polímero está sujeito a temperaturas elevadas, isso pode resultar em clivagem da cadeia. Isso pode se originar simplesmente por causa do superaquecimento durante o polimento. A capacidade de um polímero em resistir altas temperaturas depende da energia de ligação entre as várias partes constituintes do polímero (veja o Capítulo 1.3 sobre energias de ligação). Outro fator a ser considerado é o ataque químico de polímeros por solventes, como o álcool. A absorção de álcool provoca dissolução da matriz do polímero e enfraquece as interações polares entre as cadeias de polímeros, que pode resultar num material mais macio que é mais suscetível ao desgaste. Entretanto, existem situações em

PROPRIEDADES QUÍMICAS

que a quebra do polímero pode trabalhar a nosso favor. Um exemplo disso são os polímeros biodegradáveis, tais como: os fios de sutura solúveis; e implantes reabsorvíveis. Nesse caso, o processo de degradação converte o polímero em produtos menores (dióxido de carbono, água, sais etc.), que podem ser ingeridos pelas células e transportados para fora das regiões dos implantes.

Fe Fe+2 + 2e –

!

Fe

4e – + O2 2O2

!

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Fe ou Fe2O3

DESLUSTRE E CORROSÃO DOS METAIS O deslustre é descoloração da superfície devido à formação de depósitos moles e duros, por exemplo, sulfetos e cloretos. O deslustre não provoca a deterioração do material em si, mas pode ser indesejável, e é facilmente removido da superfície pelo polimento do metal. Ao contrário, a corrosão é uma reação química entre o material e seu ambiente e, portanto, é um problema potencialmente muito mais sério. O processo de corrosão para metais é coordenado pela redução na energia livre logo que o metal reage com um líquido ou gás. Para materiais metálicos, o processo de corrosão normalmente é eletroquímico, envolvendo a perda de elétrons (e–) no que é chamado reação oxidativa: M→M

n+

+ ne

Figura 1.9.2 Formação de óxido na superfície de um metal.

Ganho linear (Ta, Nb)

Ganho parabólico (Fe, Ni, Cu, Al, Co)



com o metal se tornando um íon positivamente carregado. A região na qual a oxidação ocorre é chamada de anodo. Os elétrons transferirão ou se tornarão parte de outras espécies químicas na reação de redução. Por exemplo, numa solução ácida contendo oxigênio dissolvido, a redução toma forma de: O2 + 4H– + 4e– → 2H2O O local da região de redução é conhecido como catodo. Todos os metais estão propensos ao ataque corrosivo quando o ambiente é muito agressivo. A corrosão é altamente indesejável, pois ela enfraquece o material e pode levar à fratura. Do mesmo modo, os produtos de corrosão podem reagir adversamente com o ambiente biológico. Esse último fator é o de principal preocupação no uso de metais na odontologia, tais como: amálgama, coroas e pontes, grampos para isolamento absoluto, braquetes ortodônticos e fios de aço.

Corrosão Seca Com exceção do ouro e poucos metais nobres, todos os metais formarão um revestimento de óxido na superfície quando a superfície entra em contato com o oxigênio do ar (Fig. 1.9.2). Algumas vezes esse filme fino de óxido na superfície pode ser visto, como no caso do titânio quando produz interferência de cores que são usadas para dar melhor efeito na produção de joias. Desde que a formação na superfície da camada de óxido envolve a adição de átomos de oxigênio na super-

∆M Perda linear (W, Mo)

Figura 1.9.3 Alteração de peso devido à oxidação da superfície.

fície, o material que oxida ganhará peso. Esse processo pode ser monitorado; os três resultados possíveis desses experimentos são mostrados na Figura 1.9.3. Quais destes verdadeiramente ocorrerão depende da estabilidade do óxido formado. Se o óxido é muito estável, então, o processo de corrosão é autolimitante e existe um ponto onde os íons metálicos levam tanto tempo para se difundir na camada de óxido espessa (a despeito de que eles entram em contato com o oxigênio e reagem com ele), que a oxidação quase para. Nesse caso existe um ganho de peso inicial rápido que gradualmente começa a paralisar; isso torna a curva de ganho de peso uma parábola. Alguns óxidos não são muito estáveis e, assim que se formam na superfície do metal, tendem a quebrar ou se separar parcialmente da superfície, expondo o metal subjacente e permitindo a formação de uma nova cobertura de óxido. Nesse caso existe uma formação gradual do óxido, provocando um ganho contínuo de peso.

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

A terceira possibilidade, de perda de peso, é menos comum e ocorre apenas durante a oxidação de certos metais a altas temperaturas. Se a temperatura é muito alta, o óxido evapora tão logo é formado, não oferecendo barreira para posterior oxidação do metal. Consequentemente, o peso é perdido assim que a camada de óxido evapora. Essas formas de oxidação são descritas como corrosão seca. A maioria dos metais é estável sob tais processos devido à presença da primeira camada protetora de revestimento de óxido em si. Por isto, aviões excedentes são estocados no deserto, onde é quente, mas mais importante, é muito seco, e os carros são menos suscetíveis à ferrugem no clima quente e seco. Na presença de um ambiente aquoso, condições diferentes prevalecem e a resposta do material é muito alterada.

Se os íons metálicos são removidos da superfície uniformemente, o processo é chamado corrosão uniforme. Em condições adequadas, corrosão localizada pode se opor à corrosão uniforme e isso é muito perigoso. A corrosão galvânica e por fenda são exemplos dessas corrosões localizadas.

Corrosão Galvânica A corrosão galvânica ocorre quando dois metais diferentes são combinados, resultando na corrosão significativamente maior de um dos metais. Um exemplo clássico disso é a corrosão do zinco no ácido. Quando o zinco está em contato com a platina, conforme mostrado na Figura 1.9.5, a platina reage muito rapidamente com os íons hidrogênio que são fornecidos pelo ácido, e elétrons liberados, produzindo hidrogênio (que é um exemplo de um processo cató-

Corrosão Úmida A corrosão úmida pode ocorrer em ambientes neutros, ácidos ou alcalinos. Quando um metal é colocado num ambiente aquoso, os íons metálicos e elétrons são liberados dentro da água (Fig. 1.9.4). Um oxidante, geralmente oxigênio dissolvido na água, remove elétrons do metal, o que é conhecido como processo catódico. Essa extração de elétrons produz uma corrente chamada corrente catódica. Essa perda de elétrons do metal torna-o positivamente carregado, e os íons positivos são liberados dentro da água, produzindo uma corrente anódica. Os metais não oxidam com a mesma facilidade, sendo que a reatividade relativa dos metais está apresentada no que é conhecida como série galvânica. Isso está mostrado na Tabela 1.9.1 para a série de metais quando colocados em água do mar. As ligas próximas ao topo desse ranking são menos reativas.

Metal

Meio

Tabela 1.9.1 Série galvânica na água do mar Platina Ouro Titânio Prata Inércia crescente

Aço inoxidável Cobre Níquel

Atividade crescente

Estanho Chumbo Ferro fundido Alumínio Zinco

Após ASM Metal Handbook, vol. 10, 8th. ed., 1975.

Metal

Meio

Metal

Meio

e-

ox

M+



+

e-

ox

M+



+

e-

ox

M+



+

(a)

(b)

(c)

Figura 1.9.4 Oxidação de um metal no ambiente aquoso. O oxidante retira elétrons do metal, o que é conhecido como um processo catódico (a). Isso torna o metal carregado positivamente e o meio carregado negativamente (b). Devido à carga positiva do metal, os íons metálicos são liberados o que é conhecido como um processo anódico (c).

PROPRIEDADES QUÍMICAS

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Solução aquosa e-

ox

e-

ox

Platina

e-

Processo catódico

eZn2+ Zinco Zn2+

Figura 1.9.5 Corrosão galvânica do zinco em contato com a platina. O metal nobre (platina) é oxidado mais facilmente do que um metal básico (zinco), pois o processo anódico ocorre na superfície do zinco e os íons zinco são liberados dentro do ambiente aquoso.

dico). Isso gera um desequilíbrio elétrico entre o zinco e a platina, assim elétrons fluem do zinco para a platina. Isso aumenta a liberação de íons metálicos do zinco (processo anódico), levando o zinco a corroer mais rapidamente quando estiver em contato com a platina. O grau em que metais dissimilares serão suscetíveis a essa forma de corrosão depende principalmente de seus índices relativos de reação. A platina é um oxidante particularmente eficaz. Outros metais nobres não apresentam o mesmo efeito, pois não são tão efetivos na oxidação. A combinação de metais que se comportam desta forma é descrita como célula galvânica e pode ocorrer dentro das ligas devido à presença de diferentes fases com diversas taxas de oxidação. Um exemplo é a célula galvânica criada entre as fases γ1 e γ2 no amálgama odontológico, onde a fase γ2 corrói mais rapidamente do que a fase γ1.

e-

Processo anódico

Metal Figura 1.9.6 Na corrosão por fenda, a oxidação ocorre na superfície (processo catódico) e os íons metálicos são doados de dentro da fenda (processo anódico).

O ataque concentrado numa área do metal é muito indesejável, pois provoca o enfraquecimento do metal devido à formação e ao crescimento de trincas. O dano ocorrido está totalmente fora da proporção da quantidade de material destruído pelo processo corrosivo. Assim, a corrosão localizada é muito mais perigosa do que a corrosão uniforme.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Se as condições estiverem corretas, a corrosão dos metais pode ser um processo rápido e altamente danoso.

Corrosão por Fenda Onde existe uma fenda acentuada ou espaço preenchido por fluido, conforme mostrado na Figura 1.9.6, esse espaço geralmente é exaurido de oxigênio. Os íons metálicos ainda serão liberados dentro do espaço e formarão produtos de corrosão, ao passo que os elétrons são incapazes de reagir por causa da falta de oxigênio. Assim, a reação de oxidação deve ocorrer onde há oxigênio, que será na superfície principal, de tal forma que os elétrons terão que se deslocar através do metal, tornando a base da fenda anódica e a superfície catódica. Por isto, ocorre perda de material na base da fenda. Assim que os produtos de corrosão são formados, eles tendem a se acumular na fenda de modo que o suprimento de oxigênio fica cada vez mais restrito. Não existe nada que pare essa reação, o que torna esse tipo de corrosão altamente insidioso. O mesmo processo pode acontecer quando existe quebra do revestimento de óxido da superfície. O que é conhecido como corrosão por pitting.

DEGRADAÇÃO DAS CERÂMICAS Ao contrário dos metais, as cerâmicas são, em geral, muito resistentes à corrosão eletroquímica, mas ainda são suscetíveis à corrosão química. Por exemplo, um vidro feito apenas de SiO2 e Na2O dissolverá rapidamente em água e o CaO é adicionado para reduzir sua suscetibilidade à dissolução. Por sua vez, a capacidade de dissolução de certos ácidos, tais como o HF, em geral é usada para aumentar a criação de superfícies rugosas microscopicamente e melhorar a adesão a resinas pela dissolução preferencial de certas fases na cerâmica. A corrosão química também pode ter um profundo efeito na resistência das cerâmicas. A falha de cerâmicas geralmente está associada à trinca que se tornou tão grande que o componente não consegue suportar a tensão aplicada. Isso pode provocar uma rápida desintegração da cerâmica, tal como ocorre na quebra inex-

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Si

O

OH

Si

O

OH

Si

O

OH

Si

O

OH OH

Si

H 2O

O

O

Si

O

O

Si O

OH OH

OH Si

O

Si

O

Si

Si

OH

OH O

Si

O

Si

O

Si

O

Figura 1.9.7 Crescimento da fenda em uma cerâmica devido à hidratação local no topo da fenda.

plicável de um copo ou vidro de um parabrisa de um carro. Essas falhas frequentemente são causadas pelo crescimento lento e indetectável de uma trinca até que a trinca adquire um tamanho crítico e progride espontaneamente e de modo catastrófico. A interação química entre a cerâmica e o ambiente da ponta da trinca tem um profundo efeito na velocidade do crescimento da trinca. A água ou vapor de água na ponta da trinca pode reagir com a ligação Si–O–Si na ponta da trinca com vidro à base de sílica, formando hidróxidos (Fig. 1.9.7). Esse processo é chamado fadiga estática. Quando as condições ambientais são combinadas com altos níveis de tensão na

cerâmica, tal como pela aplicação de uma carga externa ou tensões aprisionadas internamente, a velocidade de crescimento da trinca será acelerada. Em tais circunstâncias, a falha pode ser descrita como resultado de uma trinca por corrosão sob tensão.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Todos os materiais são suscetíveis ao ambiente oral, tanto que geralmente todos os materiais serão degradados ao longo do tempo.

Capítulo 1.10

PRINCÍPIOS DE ADESÃO

INTRODUÇÃO Desde que a técnica do condicionamento ácido para adesão ao esmalte foi introduzida na Odontologia, o uso de procedimentos adesivos foi desenvolvido a tal ponto que atualmente constitui a maior parte das disciplinas odontológicas. Muitos conceitos que foram utilizados pela profissão por muitas décadas para permitirem um bom tratamento odontológico tiveram que ser revisados à luz desses desenvolvimentos e muitas novas técnicas e materiais foram introduzidas. Dois exemplos de novos procedimentos restauradores adesivos que imediatamente vem à mente são as próteses adesivas e as facetas de porcelana. Esses procedimentos se tornaram possíveis devido ao melhor conhecimento e entendimento das características da superfície do esmalte e da dentina e das condições necessárias para serem satisfeitas a fim de obter uma boa adesão nestes substratos. Esses avanços, por si só, não teriam sido suficientes, mas foram a base para o desenvolvimento de novos materiais e técnicas que são utilizadas na adesão ao esmalte e à dentina atualmente. Uma combinação de fatores permitiu ao dentista dispor de uma variedade de procedimentos para restaurar a dentição. Embora esses procedimentos tenham sido avaliados por um tempo relativamente curto, seu impacto já é bastante considerável. Existem atualmente muitos materiais que se aderem ao esmalte e à dentina, e entre si. Consequentemente, inúmeros adesivos foram desenvolvidos a fim de corresponder com a diversidade de aplicações; tais adesivos incluem as resinas compostas, os cimentos de ionômero de vidro e os sistemas adesivos dentinários. Novos métodos de preparo de superfície, como o condicionamento e a aplicação de silanos, foram pesquisados com a finalidade de descobrir meios de utilizá-los em conjunto com novos materiais, como com as novas cerâmicas vítreas e uma grande variedade de ligas. É esta variedade de aplicações que tem contribuído para a crescente complexidade da odontologia restau-

radora adesiva. Contudo, para apreciar e entender completamente a aplicação clínica das técnicas adesivas, é importante que o clínico tenha um profundo conhecimento dos princípios de adesão, dos materiais empregados, dos sistemas adesivos dentais e de como são aplicados nas situações clínicas.

O QUE É ADESÃO? A adesão pode ser definida como a força que une dois materiais distintos, quando são colocados em contato íntimo. Esta definição é distinta de coesão, que é a atração entre átomos ou moléculas similares dentro de uma substância.

Adesão entre Sólidos Em um nível atômico, as superfícies são rugosas. Isso significa que quando são colocadas em contato, os únicos locais onde existe contato íntimo são nas pontas das áreas ásperas (Fig. 1.10.1). Pressões muito grandes podem ser geradas nesses pontos, de forma que, na ausência de contaminação, pode ocorrer um efeito denominado adesão local ou soldagem fria. Se uma tentativa for feita para deslizar uma superfície sobre a outra, uma resistência conhecida como fricção é experimentada. A fricção é causada pela tentativa de cisalhar ou romper o local de adesão. Geralmente adesão no local é tão forte que o processo de cisalhamento não acontece no local da interface, mas no interior dos próprios sólidos; isso explica o fenômeno comum do desgaste friccional. Enquanto as forças friccionais, devido à adesão local, podem ser bastante altas, a adesão normal (isto é, perpendicular) à superfície geralmente é indetectável. Isso tem sido atribuído ao desenvolvimento de tensões elásticas na direção normal, que é liberado quando a carga sobre o material é removida. Somente metais muito moles, como o ouro puro, podem aliviar estas tensões elásticas por meio da defor-

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CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

Aderente/substrato

Interfaces

Adesivo

Aderente/substrato Figura 1.10.1 Contato ponto a ponto de duas superfícies sólidas em um nível microscópico.

mação e prevenir a ruptura da junção quando uma carga normal é aplicada. Um exemplo odontológico disso é o ouro coesivo.

Adesão entre um Sólido e um Líquido É uma questão de observação comum perceber que uma gota d’água fica pendurada na base de uma lâmina de vidro. Esse efeito demonstra a aderência da água ao vidro que surge em virtude da atração molecular entre as duas substâncias. A atração acontece devido a ligações secundárias (forças de van der Waals). Mesmo uma sacudida forte na lâmina não removerá toda a água e, simplesmente secar o vidro com um tecido, ainda deixará uma fina camada residual de água. A única forma de assegurar que toda a água foi removida é pelo aquecimento do vidro em um forno. Isso ilustra a boa adesão que pode ser obtida entre um sólido e um líquido. Tal adesão acontece devido à habilidade do líquido de apresentar um íntimo contato com o sólido sobre uma grande área de superfície. É o oposto para uma adesão deficiente (descrita anteriormente) que em geral ocorre entre dois sólidos, onde o contato acontece apenas em alguns pontos. Assim, um dos requisitos fundamentais para a adesão é que as duas substâncias que serão unidas devem estar em íntimo contato uma com a outra. A importância desta afirmação pode não ser bastante destacada, mas uma forte adesão somente pode ser criada no caso de íntimo contato molecular. Isso pode parecer um requisito simples, mas não é muito fácil de alcançar contato íntimo em nível microscópico, como descrito para os sólidos. Dado que a distância para que haja interação das moléculas deve ser menor do que 0,0007µm (micrometros; 1 mm = 1.000 µm) para que ocorra adesão, podemos perceber que a adesão é praticamente impossível para duas superfícies sólidas. Esse é um sério obstáculo quando existe a necessidade de adesão entre dois sólidos e, a fim de superar isso, usamos uma terceira substância, normal-

Figura 1.10.2 Terminologia para a descrição de uma junta adesiva.

mente em estado fluido ou semifluido, para agir como um intermediário. A substância que une os dois materiais é definida como adesivo, e as superfícies dos materiais são aderentes ou substratos. O ponto no qual o substrato entra em contato com o adesivo é descrito como interface (Fig. 1.10.2). Naturalmente, o que acontece na interface é de fundamental importância para o sucesso ou falha de uma união adesiva. Isso se aplica igualmente aos adesivos industriais e dentais, portanto é útil, em primeiro lugar, considerar os requisitos gerais de um adesivo e, então, examinar com maior atenção os mecanismos de adesão.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Antes de realizar uma adesão a uma superfície, deve-se ter certeza de que esta está de fato limpa, do contrário não acontecerá adesão.

CRITÉRIOS PARA A ADESÃO Quando lemos a bula de instrução de qualquer adesivo, um dos primeiros requisitos invariavelmente é que as superfícies a serem aderidas estejam ambas limpas e secas. Isso é importante por várias razões. Uma superfície limpa e seca assegura que o adesivo tenha uma melhor chance de criar uma adesão apropriada com o material sólido. A presença na superfície de algo que possa ser considerado como um contaminante dificultará a formação de uma adesão forte, já que o contaminante, por si só, estará unido fracamente ao sólido e impedirá a adesão do adesivo ao substrato.

PRINCÍPIOS DE ADESÃO

Os fatores que governam a capacidade de o adesivo estar em contato íntimo com o substrato são: ■ ■ ■

o molhamento do substrato pelo adesivo; a viscosidade do adesivo; e a morfologia ou rugosidade da superfície do substrato.

Molhamento Para que o adesivo promova uma união entre dois materiais, ele precisa estar em contato íntimo com as superfícies dos substratos, de forma que nenhuma bolha de ar (que enfraqueça a união) seja formada. A capacidade de um adesivo entrar em contato com um substrato depende do molhamento do adesivo sobre o substrato particular. Um bom molhamento é a capacidade de cobrir completamente o substrato, de forma que o benefício máximo seja obtido para qualquer que seja o mecanismo adesivo ativado. A capacidade ou incapacidade dos fluidos de molhar uma superfície é frequentemente encontrada na vida diária. Um exemplo de uma superfície que é muito difícil de ser molhada com água é o PTFE (politetrafluoretileno), que é usado em panelas não aderentes. Quando a água é colocada na superfície do PTFE, formam-se glóbulos que não se espalharão como uma camada plana sobre a superfície. Esse é o exemplo de um molhamento deficiente. Esta e outras possíveis reações são descritas na Figura 1.10.3. A interação entre o substrato e o adesivo é governada por uma força motriz que tende a espalhar o adesivo sobre o substrato, e pela resistência ao escoamento que depende da viscosidade do adesivo, das irregularidades da superfície e da presença de contaminantes. A força motriz é promovida pela energia de superfície do adesivo e do substrato (veja a seguir).

Energia de Superfície Na estrutura de um sólido ou de um líquido, as moléculas estão sujeitas a forças de atração em todas as direções, de forma que a molécula está em equilíbrio dinâmico com as moléculas circundantes. Na superfície, contudo, esse delicado equilíbrio é destruído, resultando em uma rede de atração interna direcionada para um grande número de moléculas na massa do material. É essa força interna que gera a energia de superfície de um material. No líquido, a energia de superfície é conhecida como tensão superficial. Um dos efeitos da tensão superficial é a tendência de o líquido adquirir uma forma esférica em relação a outra qualquer. Isso ocorre porque uma esfera tem uma área mínima de superfície (assim, uma energia de superfície mínima) para um dado volume de líquido, permitindo que a energia total armazenada no líquido seja mínima. Considerando que a tensão superficial de um líquido é uma tensão de superfície real, no caso de um sólido, o

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trabalho é realizado ao sofrer distensão e não na formação da superfície. A mensuração da energia de superfície de um sólido não é alcançada tão facilmente como nos líquidos. Uma abordagem que tem recebido ampla aceitação atualmente é a realizada por Zisman, que introduziu o conceito de energia crítica de superfície.

Ângulo de Contato Quando um sólido e um líquido entram em contato, o ângulo entre a superfície do líquido e a superfície do sólido é conhecido como ângulo de contato, e é dependente da tensão superficial do líquido e da energia superficial do sólido (Fig. 1.10.4). Por meio da mensuração do ângulo de contato entre o líquido e o sólido, obtém-se a medida do molhamento do líquido num determinado substrato. Para o perfeito molhamento, que é a situação ideal para ocorrer adesão, esse ângulo deve ser de zero grau. Neste caso, a superfície é completamente coberta com o adesivo e uma força

Nenhum molhamento

Molhamento parcial

Molhamento perfeito

Sólido Líquido

Figura 1.10.3 Possíveis características de molhamento para líquidos sobre uma superfície sólida.

γlv Vapor

γsv

θ

Líquido γsl Sólido

Figura 1.10.4 O ângulo de contato θ entre um líquido e um sólido, onde γsv é a tensão superficial entre o sólido e o vapor, γsl é a tensão superficial entre o sólido e o líquido e γlv entre o líquido e o vapor.

70

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

máxima de adesão pode ser conseguida. A força motriz que faz aumentar esta tendência de um fluido escoar pela superfície do sólido depende da tensão superficial do líquido e da energia de superfície do sólido. No ponto onde a superfície do líquido entra em contato com a superfície do sólido, suas tensões superficiais devem ficar balanceadas, a fim de que fiquem em equilíbrio: γsv = γsl + γlv cos θ Essa relação pode ser reformulada para se obter o ângulo de contato, θ, e essa fórmula é conhecida como equação de Young: cos θ = (γsv – γsl) / γlv em que γsl é a energia de superfície na interface sólidolíquido, γsv é a energia de superfície da interface sólido-vapor, e γlv é a energia de superfície na interface líquido-vapor.

Energia Crítica de Superfície Se medirmos o ângulo de contato de um número de líquidos diferentes sobre o mesmo substrato e calcularmos o cosseno do ângulo de contato em relação à tensão superficial conhecida dos líquidos, isto resultará em uma relação linear. Esta relação é mostrada na Figura 1.10.5; ela mostra a curva linear sendo extrapolada até o ponto onde cruza a linha na qual o cosseno do ângulo de contato é igual a um. Essa é a situação na qual o ângulo de contato será de zero grau, representando a condição de molhamento perfeito. O valor da tensão superficial na qual o cosseno do ângulo de contato é igual a um é definido como energia crítica de superfície do sólido. Esta energia crítica de superfície é igual à tensão superficial do líquido que escoará na superfície do sólido; tal líquido pode ser real ou hipotético. Qualquer líquido que tenha a tensão superficial menor do que a energia crítica de superfície do sólido molhará tal superfície efetivamente.

Assim, um líquido com baixa energia de superfície facilmente escoará sobre um substrato com alta energia de superfície, porque a superfície do substrato é substituída por uma superfície com uma energia de superfície mais baixa. O PTFE tem uma energia de superfície baixa, tornando difícil encontrar líquidos com tensão superficial menor que possam molhá-lo com sucesso. Outro material com uma energia de superfície similar e baixa é a borracha de silicone. Novamente, é muito difícil aderir qualquer coisa a esse material. Por sua vez, polímeros de silicone, na forma líquida, tendem a adaptar-se bem à maioria das superfícies devido a sua baixa energia de superfície. Esses polímeros são usados para aumentar a eficiência dos materiais de moldagem. Exemplos de energia de superfície de várias substâncias, expressos na unidade de J.m–2 (N.m–1) por conveniência, são apresentados na Tabela 1.10.1. No caso do ácido perfluoroláurico, somente gases inertes condensados podem escoar sobre sua superfície.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Um adesivo deve ser compatível com a superfície a ser unida. Por exemplo, resinas hidrofóbicas não se aderem a superfícies hidrofílicas.

Viscosidade Para um adesivo ser efetivo, ele não deve ter apenas a capacidade de entrar em íntimo contato com o substrato, mas também a capacidade de escoar sobre ele, porém não tão facilmente que seja impossível controlá-lo. A força

Tabela 1.10.1 Energias de superfícies típicas Energia de superfície x 103j.m2 Ácido perfluorláurico

1,0

Cos θ

Energia crítica de superfície 0

γc Tensão superficial do líquido

Figura 1.10.5 Gráfico de Zisman para a determinação da energia crítica de superfície, γc, de um sólido.

6

Cloreto de metila

16

Politetrafluoretileno (PTFE)

18

Politrifluoretileno

22

Álcool etílico

24

Polivinil cloreto (PVC)

39

Água

73

Placa de vidro

20

Aço

230

Óxido de ferro

350

Alumina

560

Mercúrio

488

PRINCÍPIOS DE ADESÃO

motriz para o escoamento do líquido é estabelecida pela sua capacidade de molhamento na superfície do sólido, e a resistência ao escoamento é dada pela viscosidade do líquido. Uma viscosidade muito alta é indesejável, já que impede o fluido de escoar facilmente sobre a superfície do sólido e de penetrar nas estreitas fendas e rachaduras. Em geral, os ângulos de contato são diretamente proporcionais à viscosidade do adesivo, mas isso pode ser uma afirmação falsa se o adesivo é um solvente contendo aditivos. O uso de solventes com baixa tensão superficial com solutos altamente viscosos proporcionará ângulos de contato incorretamente baixos. Embora um ângulo de contato baixo seja obtido, a resistência ao fluxo oferecida pela alta viscosidade do soluto continuará a impedir o escoamento. De maneira similar, um adesivo com alto conteúdo de carga, como uma resina composta, pode ter dificuldade de escoar, o que pode levar a pensarmos que ele apresenta alta tensão superficial e um molhamento deficiente. Contudo, o substrato somente apresenta contato com a resina de baixa viscosidade, que pode facilmente molhar a superfície caso ela possua uma adequada tensão superficial. A resistência ao escoamento da resina composta é meramente devido a sua própria rigidez e não por qualquer resistência por parte da resina em molhar a superfície subjacente. A capacidade do líquido de preencher as trincas e fendas pode ser quantificada pelo que é descrito como coeficiente de penetração (CP), que é uma função da tensão superficial (γ) do líquido e de sua viscosidade (η), de acordo com a equação: CP = γCosθ/2η O coeficiente de penetração é uma medida da capacidade de um líquido penetrar em um espaço capilar, tal como em regiões interproximais, sulcos gengivais e poros. Um exemplo de coeficiente de penetração de alguns colutórios orais é mostrado na Figura 1.10.6.

12 ms )

–1 –2

CP (10

6

A mensuração dos ângulos de contato supõe que a superfície do substrato é perfeitamente lisa. Na realidade, a superfície pode ser inteiramente rugosa em nível microscópico. Esta rugosidade apresenta a vantagem de aumentar a área potencial de adesão, mas pode também levar ao aprisionamento de ar. Tal aprisionamento de ar reduzirá de forma significativa a área efetiva de adesão e resultará em uma fraca adesão. Trincas e fendas constituem irregularidades de superfície e o adesivo deve ser capaz de fluir para dentro delas. Adesivos com alta viscosidade são particularmente propensos a causar aprisionamento de ar, porque sua rigidez pode ser tal que podem formar pontes sobre pequenas fendas e rachaduras na superfície, ao invés de penetrar no seu interior. Na ausência de ar, a ação capilar assegura que o adesivo penetre nas fendas e rachaduras. Para que esta penetração ocorra facilmente, uma alta tensão superficial do adesivo é desejável, isto significa que a atração capilar também é alta. Esse efeito é demonstrado pelo fato de que quanto maior a tensão superficial de um líquido, maior a quantidade de líquido que subirá em um capilar colocado sobre ele. A força motriz que causa uma ação capilar deve trabalhar contra a pressão do ar que é aprisionado pelo adesivo e também superar as forças de resistência devido à viscosidade. Contudo, a tensão superficial do líquido deve ser também suficientemente baixa para molhar perfeitamente o substrato. Sendo assim, o adesivo ideal apresentaria uma tensão superficial exatamente inferior à da energia de superfície do sólido. Se essa condição for satisfeita, então, as irregularidades de superfície podem ser vantajosas para melhorar a resistência de união do adesivo. Uma superfície irregular apresenta uma área de superfície maior que uma superfície lisa, desta forma mais uniões químicas podem ser criadas. Se as irregularidades são de uma morfologia particular, como reentrâncias presentes em nível microscópico, a adesão pode ser aumentada pelo processo de microembricamento mecânico.

Em primeiro lugar, vamos supor que um dos requisitos iniciais para adesão seja satisfeito e que um contato íntimo em nível molecular entre o adesivo e o substrato seja alcançado. Vamos agora observar o que acontece quando os materiais estão em contato e ver como podem interagir. Uma união adesiva pode ser mecânica, física ou química, e mais comumente uma combinação de todas elas.

4 2 0

Rugosidade de Superfície

MECANISMOS DE ADESÃO

10 8

71

Hibident Prodent Listerine Oraldene

Figura 1.10.6 Coeficiente de penetração para colutórios bucais (adaptado de Perdok et al., J Dent 1990; 18: 147).

Adesão Mecânica O método mais simples de adesão é pelo microembricamento mecânico dos componentes. Essa forma de adesão

72

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

pode resultar da presença de irregularidades na superfície, tais como fissuras e cicatrículas que aumentam as reentrâncias microscópicas. Uma condição primária para essa forma de adesão é que o adesivo pode penetrar facilmente dentro das fissuras antes de tomar presa. Esta condição é determinada pelo molhamento do adesivo no substrato, que é governado pela energia de superfície relativa e pelo ângulo de contato resultante; a situação ideal é aquela em que há perfeito molhamento. Para aumentar o nível de contato, qualquer ar ou vapor nas fissuras deve ser capaz de escapar antes da penetração do líquido. Se o adesivo for capaz de penetrar nesses espaços e solidificarse, ele permanecerá preso no interior das reentrâncias (Fig. 1.10.7). O grau de penetração dependerá tanto da pressão utilizada na aplicação do adesivo como das propriedades do adesivo em si. Caso o adesivo se desprenda do substrato, ele deverá fraturar no processo de ruptura e não pode ser retirado dessa reentrância. Isso não é diferente do conceito de retenção, utilizado na colocação de restaurações, exceto que ocorre em um nível microscópico. Entretanto, uma diferença importante é que um bom molhamento não é um pré-requisito para a macroretenção, enquanto isto é de fundamental importância no microembricamento mecânico. A visão geral é que as reentrâncias com frequência proporcionam características mecânicas importantes, mas elas comumente não são suficientes para agir no mecanismo de adesão em si. Há vários mecanismos adicionais de adesão que é devido ao que pode ser descrito como causas físicas e químicas. O termo adesão verdadeira ou adesão específica é comumente usado para distinguir adesão física e química de adesão mecânica. Contudo, o uso destes termos deve ser desencorajado, pois eles são inadequados. A adesão verdadeira supõe que existe também uma adesão falsa, mas um material é adesivo ou não. As adesões física e química são distintas da adesão mecânica, pois elas envolvem uma atração molecular entre o adesivo e o substrato, ao passo que a adesão mecânica não necessita de tal interação na interface.

Adesão Física Quando duas superfícies estão em íntimo contato, forças secundárias de atração surgem por meio de interações dipolo-dipolo entre moléculas polares (Cap. 1.3). As forças de atração que são geradas podem ser muito pequenas, mesmo que as moléculas apresentem um momento dipolo permanente ou tenham uma grande polaridade. A magnitude da energia de interação depende do alinhamento relativo dos dipolos nas duas superfícies, mas é geralmente menor que 0.2eV. Isso é consideravelmente menor do que as ligações primárias, tal como ligações iônicas ou covalentes que são tipicamente de 2.0–6.0eV.

Adesivo

Substrato Figura 1.10.7 Microembricamento mecânico microscópico entre um adesivo e o substrato.

Este tipo de união é rápida (porque nenhuma energia de ativação é necessária) e reversível (porque as moléculas permanecem quimicamente intactas sobre a superfície). Essa fraca adsorção física é facilmente superada pela energia térmica, e não é adequada se uma união permanente é desejada. Mesmo assim, a formação de pontes de hidrogênio pode ser em particular um importante precursor para a formação de uma ligação química forte. O que ocorre é que os líquidos não polares não se ligarão a sólidos polares e vice-versa, pois não há interação entre as duas substâncias em nível molecular, mesmo quando há uma boa adaptação. Os polímeros de silicone líquidos não polares exibem tal comportamento, e não se formam ligações com outros sólidos a não ser com eles mesmos; essa ligação é só possível porque a reação química para formação das ligações cruzadas possibilita locais para ligação entre o sólido e o líquido.

Adesão Química Caso uma molécula se dissocie após a adsorção sobre a superfície e os componentes constituintes, unem-se entre si por forças iônicas ou covalentes, e uma união adesiva forte será formada. Essa forma de adesão é conhecida como quimiossorção e pode ser tanto covalente como iônica em sua natureza. O compartilhamento de elétrons entre dois átomos na ligação química a distingue da interação física. Os adesivos devem ser resistentes e quimicamente atraídos pela superfície de aplicação, de modo que se formem uniões fortes, e isto requer a presença de grupos reativos em ambas as superfícies. Isto aplica-se em especial à formação de ligações covalentes, como as que ocorrem na ligação de isocianatos reativos com as superfícies poliméricas contendo grupamentos hidroxila e amina (Fig. 1.10.8). Por sua vez, a ligação metálica é prontamente criada entre um metal sólido e um metal líquido, que forma a base para a soldagem. A ligação metálica é proporcionada pelos elétrons livres e é quimicamente inespecífica. Contudo, a ligação só será possível se as superfícies dos metais estiverem exageradamente limpas. Na prática isso significa que fundentes precisam ser usados para remover a película de óxidos que, de outra forma, impediriam o contato dos átomos metálicos.

PRINCÍPIOS DE ADESÃO

C C

N C

O

N

H

H

C

O

O

O

C

C

N

N

H

C

O

N

N

H

O

O

C

H

H

Hidroxil

O

73

Amino

Figura 1.10.8 Formação de ligação covalente entre um isocianato e um grupamento hidroxil e um amino na superfície do substrato.

A quebra mecânica dessas ligações químicas torna-se o único meio de separar o adesivo e o substrato, e não há nenhuma razão para que estas ligações sejam quebradas no lugar de qualquer outra ligação de valência. Isso restringe a resistência que pode ser obtida. Se a resistência de união exceder a resistência à tração do adesivo ou do substrato, uma falha coesiva do adesivo ou do substrato ocorrerá, antes que a união falhe.

Adesão pelo Entrelaçamento Molecular Até o momento, tem sido admitido que há uma interface distinta entre o adesivo e o substrato. Em essência, o adesivo é adsorvido sobre a superfície do substrato e pode ser considerado como superfície-ativo, concentrando-se sobre a superfície mas não se dissolvendo no meio subjacente. Em alguns casos, o adesivo ou o componente do adesivo é capaz de penetrar na superfície do substrato e absorver dentro dele e não sobre ele. Deve-se enfatizar que a absorção de moléculas é o resultado do bom molhamento e não sua causa. Caso o componente de absorção seja uma molécula de cadeia longa ou forme uma molécula de cadeia longa dentro da camada penetrada, o entrelaçamento resultante entre o adesivo e o substrato é capaz de produzir alta resistência de união (Fig. 1.10.9).

Adesivo

Substrato Camada de difusão Figura 1.10.9 Camada de difusão por interpenetração difusa originada do entrelaçamento molecular entre o adesivo e o substrato.

Assim, os adesivos devem ser forte e quimicamente atraídos para as superfícies de aplicação a fim de se criar uma forte união.

RESISTÊNCIA DA UNIÃO ADESIVA Uma união razoavelmente forte resulta da ação cumulativa de um grande número de mecanismos de adesão que agem em conjunto, tal como uma maior área de íntimo contato, que proporciona vários locais para a criação de ligações secundárias fracas, e a presença de microrreentrâncias superficiais em nível microscópico.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

Resistência Teórica

É importante sabermos o tipo de união que estamos tentando obter para que os passos de adesão sejam compreendidos. Dessa forma, há menos chance de haver erros.

É possível determinar de uma forma grosseira a resistência teórica de uma união adesiva entre um líquido e um sólido. Se admitirmos uma área superficial unitária do sólido em contato com o líquido, a energia necessária para

74

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

separar esses materiais será a diferença entre a energia das superfícies quando unidas e as energias das superfícies individuais quando separadas (Fig. 1.10.10). Assim, o cálculo da adesão por unidade de área de superfície pode ser definido como: Wa = γsv + γlv – γsl Isso é conhecido como a equação de Dupré, que afirma que o cálculo da adesão é a soma da energia livre de superfície do sólido e do líquido, menos a energia interfacial entre o sólido e o líquido. Da equação de Young: γsv – γsl = γlv cosθ Assim, o cálculo de adesão pode ser reescrito como: Wa = γlv (1 + cosθ) Essa adesão será máxima quando tivermos um molhamento perfeito, neste caso cosθ = 1, de forma que: Wa = 2 γlv Para um hidrocarboneto líquido, a tensão superficial é aproximadamente de 30 mJ.m–2. Caso seja admitido que a força de atração caia para zero na distância de 3 × 10-10 metros, então, a força necessária para puxar o líquido da superfície sólida é dada pelo cálculo de adesão dividido pela distância, sendo cerca de 200MPa. Esse valor de fato excede qualquer valor encontrado na situação real. Por exemplo, duas lâminas mantidas unidas por um líquido interposto são difíceis de separar por tração, mas a separação é facilmente conseguida pelo cisalhamento das duas lâminas, pois o líquido não tem resistência à ação de cisalhamento, a não ser à sua viscosidade. Assim, não é apenas necessário que o adesivo fluido molhe a superfície do substrato e forneça uma ligação química. Ele deve também ser capaz de resistir às forças de tração e cisalhamento, que podem produzir falhas no adesivo. O aumento da viscosidade torna a ação de cisalhamento mais difícil e esse é o fundamento no qual os adesivos, como fitas com superfície adesivas, funcionam.

Figura 1.10.10 Separação de um líquido de uma superfície sólida, resultando na criação de duas superfícies.

Quando duas placas unidas por uma substância viscosa interposta são separadas (Fig. 1.10.11), a relação entre a força necessária para realizar essa ação e a viscosidade do líquido é dada por: 3 F= (πηR4/h3) (δh/δt) 2 em que η é a viscosidade, R é o raio das placas e h é a espessura do adesivo. Não iremos nos preocupar com a origem dessa expressão, mas ela é baseada na necessidade de penetração adicional do agente adesivo no espaço entre as duas placas quando elas são separadas. A expressão mostra que a força é dependente da viscosidade e da espessura da camada de adesivo. Quanto maior a viscosidade do adesivo e menor a espessura da camada de adesivo, maior será a força necessária para separar as duas placas. Essa expressão também mostrada que a força depende da velocidade de separação. Altas velocidades de separação resistem mais fortemente do que baixas velocidades. A união adesiva não resiste a cargas baixas por longos períodos, pois assim ela finalmente falhará pelo escoamento viscoso. A melhor resistência ao cisalhamento seria, portanto, oferecida por um líquido que se transformasse em um sólido, pois isso aumentaria muito sua resistência ao cisalhamento.

Resistência de União Real A resistência de união adesiva é pelo menos de uma ordem de magnitude menor do que aquela prevista pelos cálculos de resistência teórica. Outra observação comum é que a falha adesiva não ocorre frequentemente no local da interface entre o adesivo e o substrato, mas, na realidade, em algum lugar dentro do adesivo, que é essencialmente uma falha coesiva.

Figura 1.10.11 Duas placas mantidas unidas por um líquido viscoso.

PRINCÍPIOS DE ADESÃO

Quando a falha é adesiva em sua natureza, é mais provável que seja devido à incapacidade do adesivo de se adaptar ao substrato, visto que nenhuma interação em nível molecular é possível. Outra possibilidade é que a contaminação ou o aprisionamento de ar ou outros gases na interface possam impedir que um bom contato seja estabelecido. Neste caso, novamente a falha será na interface, ocorrendo devido à nucleação e ao crescimento de trincas em locais fracos ao longo da união. Isso elucida a importância da superfície livre de contaminação para adesão. Na prática, a resistência de união de muitos adesivos é governada pela presença de concentração de tensões no adesivo e não em função das forças locais de atração na interface. Isso é o caso, em especial, quando as estruturas unidas estão sujeitas ao ataque ambiental ou às condições de aplicação de carga de alta magnitude. Em geral, os adesivos tendem a apresentar propriedades mecânicas piores (isto é, resistência à tração e ao cisalhamento) do que os substratos a serem unidos, tais defeitos internos e de superfície podem desempenhar um papel mais importante na determinação da resistência de união da interface adesiva. Por exemplo, se a superfície exposta do adesivo contém numerosos defeitos, a probabilidade de se achar um defeito de um tamanho crítico é maior quando a área de superfície exposta do adesivo é aumentada. Por essa razão, é importante que a espessura da camada de adesivo seja mantida em um mínimo. O adesivo pode ser capaz de ter uma espessura de película muito fina, o que impõe limites na adição de cargas que possam ser incorporadas para melhorar a resistência. Existe outra razão desejável para a utilização mínima dos adesivos, e isso é devido à contração associada ao processo de presa do adesivo. Quando um adesivo contrai durante a presa, a contração pode distanciá-lo da superfície do substrato de forma que a ruptura do adesivo ocorre imediatamente após a sua colocação. Mesmo que a união seja mantida durante a contração inicial, as tensões geradas podem ser suficientes para finalmente causar a ruptura da adesão. Quanto mais fina a camada de adesivo, menor será a contração. Isso é a razão pela qual é importante que restaurações indiretas, como facetas, coroas ou pontes, apresentem a melhor adaptação marginal, caso ela esteja aderida à estrutura dental. A contração de polimerização de materiais restauradores

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Mais frequente do que parece ser, a razão de uma falha adesiva com um sistema adesivo compatível, tal como o esmalte condicionado com ácido e a resina, é geralmente devido ao fato de parte do procedimento não ter sido conduzido corretamente, pois, quando executado adequadamente, a adesão é fortíssima.

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à base de resina, como resinas compostas, que é uma consequência do processo de polimerização, pode gerar altas tensões localizadas na interface e contribuir para a falha da união.

PROMOTORES DE ADESÃO Existem vários casos em que dois materiais precisam ser unidos entre si, mas isso não ocorre em circunstâncias normais porque não apresentam afinidade particular entre si e, consequentemente, não molharão um ao outro. Um exemplo odontológico disso seria o desejo de se obter uma forte e durável adesão entre as partículas de vidro usadas como carga na resina composta e a própria resina. Para permitir que esses dois materiais sejam unidos por outro meio diferente da adsorção física de um sobre o outro (o que seria inadequado), é necessário modificar uma das duas superfícies para se obter a união. Às vezes, uma substância intermediária capaz de se unir a ambos os materiais em questão pode ser utilizada e tal material é conhecido como agente de ligação. Como alternativa, é possível modificar as características da superfície de um ou de dois materiais a fim que uma união possa ser criada. Esses materiais são conhecidos como primers.

Agentes de Ligação A superfície do vidro, sendo iônica por natureza, absorve facilmente água, formando uma camada superficial bemunida, que pode apresentar a espessura de muitas moléculas. A formação dessa camada de água não pode ser evitada durante o processamento comercial do vidro. Como consequência disso, quando o vidro é misturado com a resina para produzir um compósito, seja, um compósito com fibra ou um compósito particulado, a resina não molhará a superfície do vidro e os dois terão uma união deficiente. Isso tem o efeito de produzir um compósito muito fraco, porque o vidro não é capaz de manter o papel de suporte de carga e atua simplesmente como uma partícula solta. Algum método necessita ser realizado para remover a água adsorvida. Uma abordagem é o uso de agentes de ligação. Um agente de ligação apropriado, aplicado ao vidro, deslocará a água da superfície caso a adesão criada entre essa superfície e o vidro seja mais estável do que entre a água e o vidro. A função do agente de ligação é deslocar a água adsorvida promovendo uma forte ligação química entre os grupos de óxidos da superfície do vidro e as moléculas do polímero da resina. Agentes de ligação de silanos são largamente utilizados para esse objetivo e apresentam uma fórmula geral: R – Si – X3

76

CIÊNCIA BÁSICA DOS MATERIAIS DENTÁRIOS

em que R representa um grupo organo funcional e a unidade X são grupos hidrolisáveis ligados ao silano. Esse último está presente somente como um intermediário, pois eles são hidrolisados para formar o silanol, como se segue: R–Si–X3 + 3H2O → R–Si (OH)3 + 3HX Esses silanóis-tri-hidroxila são capazes de competir com a água na superfície do vidro pela formação de pontes de hidrogênio com os grupos hidroxila na superfície do vidro. Quando o vidro coberto com silano é seco, a água é removida e uma reação de condensação ocorre entre o silanol e a superfície. Os dois estágios envolvidos são mostrados na Figura 1.10.12. Uma vez formada essa união, ela não é mais suscetível à hidrólise. Neste momento, quando a resina é colocada em contato com o vidro tratado com silano, o grupo organo funcional, R, reage com a resina e forma uma forte união com ela. Para esse processo ocorrer, é importante que o grupo organo funcional escolhido seja compatível com o sistema resinoso empregado. Tal abordagem produz uma forte e resistente união com a água. Sem o agente de união, esta se deterioraria rapidamente, pois a água se difunde através da resina e se readsorve sobre a superfície do vidro, descolando a resina. A união, como mostrada na Figura 1.10.12, será muito rígida, pois os grupos organo funcionais são muito curtos. As deformações geradas pela contração durante a presa, ou possivelmente pelas diferentes con-

(a)

Si

+H2O HO

Si

OH

H

H O

Os primers, como os agentes de ligação, são outro grupo de substâncias que procuram tornar a superfície do substrato mais adequada para aceitar a união. Os primers são em geral aplicados em conjunto com um adesivo. Um exemplo típico de um primer é aquele usado para selar a superfície da madeira antes da aplicação de um adesivo. Se um primer não fosse aplicado, o adesivo se infiltrariria na porosidade da madeira, de forma que nada permaneceria na interface. Há muitos exemplos odontológicos de primers, como o ácido fosfórico, utilizado para preparar a superfície do esmalte, e uma grande variedade de condicionadores de dentina, que são usados em conjunto com os sistemas adesivos dentinários. Infelizmente, na literatura odontológica, a distinção entre primers e agentes de ligação é inadequada, e os dois termos são utilizados reciprocamente.

A adesão não é um fenômeno simples, nem é compreensível com um único modelo. A formação de uma união adesiva depende de vários fatores e raramente envolve um único mecanismo de adesão.

OH

O

Primers

RESUMO

(b) Sorção

HO

trações térmicas, poderiam ser suficientes para causar a falha da união. Esse problema pode ser superado com a verificação de que os grupos organofuncionais consistem em moléculas razoavelmente longas, que proporcionam o grau necessário de flexibilidade. Neste sentido, a interface criada pelo uso de agentes de ligação deve ser tratada como duas interfaces; a interface vidro-silanol e a interface do grupo organofuncionalresina. Dois agentes de ligação silanos comumente usados são o γ-metacriloxipropiltrietoxisilano e o γ-mercaptopropiltrimetoxisilano.

O

Figura 1.10.12 Formação de pontes de hidrogênio entre um silano e um grupo hidroxila na superfície (a), que, após a secagem, forma uma ligação covalente com a liberação de água (b).

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A adesão se tornou uma das pedras fundamentais da Odontologia. Na Dentística, ela criou a possibilidade de produzir um selamento marginal ao redor das restaurações. Na Prótese, ela proporcionou a oportunidade de explorar novos materiais e técnicas. Não há nenhum aspecto na Odontologia que não tenha sido tocado, de alguma forma, pela melhor compreensão das interações moleculares entre os materiais em suas interfaces.

SEÇÃO DOIS MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO Uma grande variedade de materiais é usada na Odontologia pelo dentista, pelo assistente do cirurgião-dentista e, mais recentemente, pelo técnico de higiene dental (THD). É importante que a forma de manipulação e as aplicações clínicas para os quais eles são apropriados sejam bem-compreendidas. Fatores importantes que contribuem para as falhas das restaurações são o uso inapropriado e o abuso dos materiais dentários. Estes problemas podem ser minimizados com um completo conhecimento da composição e da química dos materiais dentários e um entendimento das suas propriedades físicas e mecânicas.

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Capítulo 2.1

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

INTRODUÇÃO O uso do amálgama dentário como material restaurador teve um começo um tanto desfavorável, no início do século XIX, quando era feito de moedas de prata espanholas ou mexicanas misturadas com mercúrio. Desde então, os amálgamas dentários têm tido uma longa jornada e ainda fazem parte da prática odontológica atual. O desenvolvimento dos amálgamas dentários foi devido, em grande parte, a um dos dentistas mais famosos, G. V. Black, que reconheceu a necessidade de determinar as propriedades dos amálgamas dentários com certa precisão, para que o seu desempenho fosse previsível. No início do século XX, graças a seu trabalho de pesquisa, os amálgamas puderam ser produzidos com características de manipulação razoavelmente previsíveis. Com o passar dos anos, o nosso entendimento sobre esses materiais avançou consideravelmente, embora até o final dos anos de 1960 houvesse poucas mudanças neste campo, e a composição fosse praticamente a mesma dos últimos 50 anos. Durante os últimos 30 anos, parece que a evolução dos amálgamas dentários tentou recuperar essa estagnação, com novas formulações aparecendo em intervalos frequentes. Existe um confronto das aplicações tradicionais desse material com os novos materiais, como a resina composta e os cimentos de ionômero de vidro. Embora isso tenha levado a novas e excitantes descobertas sobre o amálgama dentário, tem tornado o trabalho do dentista mais difícil, já que a seleção do melhor produto disponível a um custo melhor tornou-se mais complicada. Nesta seção, será descrito o desenvolvimento dos amálgamas a partir do final da década de 1960 até o seu estado atual, destacando-se os mais importantes avanços realizados.

ESTRUTURA DOS AMÁLGAMAS DENTÁRIOS TRADICIONAIS Composição O amálgama é formado quando o mercúrio é misturado com um outro metal ou metais. O mercúrio é líquido na temperatura ambiente (solidificação a –39°C) e reage facilmente com metais como prata, estanho e cobre, produzindo materiais sólidos. Quando o dentista seleciona um determinado amálgama dentário, ele é efetivamente a seleção de uma liga com a qual o mercúrio será misturado e reagirá. Estritamente falando, o termo amálgama dentário não pode ser usado até se referir ao material produzido como consequência da reação entre o mercúrio e a liga. A liga pode variar tanto na composição como na forma, e os fabricantes de amálgama dentário utilizam-se destas variantes para produzir uma ampla gama de produtos.

A Liga A liga usada nos amálgamas dentários tradicionais consiste em uma mistura de prata, estanho, cobre, zinco e, às vezes, mercúrio. Uma composição típica é mostrada na Tabela 2.1.1. A prata é o constituinte principal, presente em combinação com o estanho na forma do composto intermetálico Ag3Sn, conhecido como fase γ. O diagrama de fase para o sistema Ag–Sn é indicado na Figura 2.1.1 e mostra que a fase Ag3Sn é a terceira fase pura do sistema, daí a letra grega γ. Essa fase γ reage rapidamente com o mercúrio para formar o amálgama dentário. O cobre está presente para aumentar a resistência e dureza do amálgama, e um efeito mais pronunciado é produzido quando o conteúdo de

79

80

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Tabela 2.1.1 Constituintes de um amálgama dentário típico Constituinte

% do total

Ag

67-74

Sn

25-28

Cu

0-6

Zn

0-2

Hg

0-3

Limalha

Esférica

1.000

α 500

α + β

l íq u

β

β + líquido β + γ γ

Ag 100%

Figura 2.1.2 Representação esquemática das partículas de liga de formas de limalha e esféricas usadas nos amálgamas.

Líquido

ido

γ + líquido

Partículas Esféricas

γ + Sn

Composição

Sn 100%

Figura 2.1.1 Diagrama da fase para o sistema Ag–Sn.

cobre é aumentado além de 6%, mas isso será comentado depois. O zinco está presente como resultado da produção inicial da liga e não exerce nenhum papel importante no processo de amalgamação. Às vezes, o mercúrio é adicionado para fornecer uma reação mais rápida, o que se chama de pré-amalgamação. A liga é usada na forma de pó, e o tamanho e a forma das partículas são fundamentais na determinação das características de manipulação e nas propriedades finais da restauração. A liga pulverizada está disponível na forma de partículas tipo limalha ou esféricas, como mostra a Figura 2.1.2.

Partículas Tipo Limalha As partículas tipo limalha são produzidas pelo torneamento mecânico do lingote sólido da liga no esmeril. O farelo produzido é peneirado, e somente os grãos que possuem uma amplitude de tamanhos específicos são usados no pó para ser amalgamado com o mercúrio. A liga é apresentada na forma de pó de granulação grossa, média ou fina, cada uma com manipulação ligeiramente diferente. Os fragmentos individuais são altamente reativos com o mercúrio devido ao esmerilhamento. Em consequência, a reação de presa é muito rápida, a menos que um tratamento térmico (para aliviar as tensões internas) seja realizado. O tratamento térmico é geralmente feito com a colocação do pó em água fervente.

A produção de partículas esféricas é feita de uma forma diferente. Os vários ingredientes da liga são fundidos juntos e então vaporizados numa atmosfera inerte, onde as gotículas se solidificam na forma de pequenas esferas de tamanhos variados. Esse método de fabricação possui as vantagens de não necessitar de nenhum outro processo mecânico e de que a composição da liga pode ser facilmente modificada. O mais importante para o fabricante é a alta probabilidade de geração de partículas de tamanho correto, o que minimiza o custo da produção. As partículas rejeitadas por serem muito grandes ou pequenas são simplesmente recicladas.

Mercúrio O mercúrio usado no preparo do amálgama deve ser muito puro, caso contrário haverá formação de uma camada superficial de contaminantes que interfere na reação de presa. Por essa razão, o mercúrio é triplamente destilado. A pureza pode ser verificada facilmente pelo exame visual. Se uma superfície opaca for observada, ao contrário de uma superfície altamente reflexiva, o mercúrio está contaminado.

Reação de Presa A reação de presa entre a liga Ag–Sn e o mercúrio é iniciada pela mistura vigorosa dos dois ingredientes. Essa mistura provoca a dissolução da camada externa das partículas da liga no mercúrio, formando duas novas fases sólidas em temperatura ambiente. A reação é a seguinte: Ag3Sn γ

+ Hg → Ag3Sn + mercúrio → γ

+ Ag2Hg3 + γ1

+ Sn7Hg + γ2

{

Temperatura (oC)

α+



líquido

liga não reagida de amálgama

matriz

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

81

Como se pode observar na reação, nem todas as partículas da liga se dissolvem no mercúrio. Pelo contrário, uma quantidade considerável permanece, de forma que a estrutura final é composta por um núcleo de fase γ mantida unida por uma matriz com predominância de γ1, que é entremeada por γ2. A estrutura do material obtido é mostrada na Figura 2.1.3. O cobre na liga de partículas tipo limalha está presente na forma de áreas distintas de Cu3Sn e permanece principalmente dentro da liga original em sua forma não reagente. No caso das partículas esféricas, o cobre é distribuído uniformemente, e a liga pode ser considerada mais precisamente como uma liga ternária de prata, estanho e cobre. Portanto, na estrutura final do amálgama de liga esférica, o cobre não está presente como uma fase distinta, mas sim distribuído amplamente por todo o material. Embora seja inevitável a formação de poros, haverá pouca porosidade num amálgama bem-condensado.

PROPRIEDADES DOS AMÁLGAMAS TRADICIONAIS Não é a intenção abordar aqui todos os aspectos das propriedades dos amálgamas dentários, e somente as propriedades de importância relevante para o uso clínico assim como a evolução das novas ligas.

Resistência A resistência do amálgama é importantíssima, pois a restauração deve ser capaz de suportar cargas consideráveis geradas durante a mastigação; qualquer deficiência na resistência pode levar ao valamento marginal da restauração ou até mesmo à fratura. Embora se tenha dado muita atenção à resistência compressiva final do material endurecido, talvez seja mais importante considerar a resistência à tração e a velocidade na qual a resistência final é conseguida. Como se pode imaginar, a resistência final do amálgama será proporcional às propriedades das fases individuais. Não é simples determinar as propriedades das três fases principais do amálgama, mas as medições das microdurezas sugerem que a fase γ e a fase γ1 possuem durezas similares, enquanto que a fase γ2 é consideravelmente mais mole. A resistência à tração da fase γ2 também foi medida, sendo apenas uma fração da fase γ original, com a fase γ1, tendo uma resistência intermediária (Tabela 2.1.2). Isso significa que o elo fraco no interior da estrutura do amálgama é devido à fase γ2, e se sua proporção na composição final puder ser minimizada, um amálgama mais resistente será obtido. A quantidade de γ1 e γ2 formada é altamente dependente da quantidade de mercúrio na composição final. Quanto maior a quanti-

Figura 2.1.3 Representação esquemática da microestrutura de um amálgama de liga de partículas tipo limalha.

Tabela 2.1.2 Resistência à tração das fases do amálgama Fase

Resistência à tração (MPa)

γ

170

γ1

30

γ2

20

Amálgama

60

dade de mercúrio, mais fraco será o material porque serão produzidas maiores quantidades de fases mais fracas. O conteúdo final de mercúrio depende mais da qualidade da técnica de condensação do que de qualquer outra coisa, tendo o amálgama condensado adequadamente um pouco menos que 50% de conteúdo de mercúrio. Além da técnica de condensação, o tamanho e a forma das partículas da liga também afetarão o conteúdo final de mercúrio. A proporção inicial de liga:mercúrio é menor no amálgama feito com liga de partículas esféricas do que com ligas de partículas tipo limalha porque o material é condensado mais facilmente. Com as ligas de partículas esféricas, um conteúdo final de mercúrio em torno de 45% é facilmente obtido. O tamanho da partícula também é muito importante. Para uma determinada quantidade de liga a ser amalgamada com mercúrio, a escolha por partículas menores resulta em mais superfície de liga exposta ao mercúrio. Isso significa que mais liga será dissolvida no mercúrio, produzindo maior quantidade de fases contendo mercúrio. Consequentemente, um tamanho de partícula muito pequeno é contraindicado.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Seja qual for a forma da liga usada, a remoção consciente do excesso de mercúrio durante a colocação da restauração é de importância vital.

Escoamento e Creep (Fluência) Tem sido postulado que o creep excessivo de um amálgama, resultante da carga oclusal repetitiva, pode causar o achatamento dos pontos de contato, sobre extensão e protrusão das margens da restauração na superfície dentária. A última tem sido a principal causa da fratura marginal. Quando o escoamento dos amálgamas é mensurado, a medição é geralmente realizada por um curto período de tempo logo após a mistura. A medição mais adequada é a do creep. O creep é o escoamento ocasionado por cargas atuantes em longo prazo. É dependente tanto do limite convencional de escoamento como da temperatura do ambiente, e apenas se torna um sério problema quando a temperatura ambiental for maior que a metade da temperatura de fusão do material. Uma vez que as fases do amálgama possuem temperaturas de fusão muito baixas (em torno de 80° C) e as restaurações estão sujeitas a cargas repetidas, existe a possibilidade de ocorrer creep. As fases mais propensas ao creep são as fases ricas em mercúrio, ou seja, γ1 e γ2. Consequentemente, quanto menor a proporção dessas fases (que pode ser obtida com a condensação adequada), menos o amálgama será suscetível ao creep.

Corrosão É bem sabido que os amálgamas se corroem no ambiente oral. De fato, a corrosão é frequentemente citada como uma vantagem, cujos produtos auxiliam no bom selamento marginal. Todavia, a corrosão marginal causada pela formação de uma célula de oxidação na interface pode causar uma rápida deterioração nas propriedades do amálgama. O processo de corrosão é associado, principalmente, à fase γ2. A fase γ2 é consideravelmente mais eletronegativa que as fases γ e γ1. Isso significa que, na presença de uma solução eletrolítica, a fase γ2 atua como anodo da célula de oxidação e, de forma gradual, se dissolve. A reação é a seguinte: Fase estanho- + fluidos → sais + mercúrio mercúrio orais estanhosos livre Sn7Hg + oxigênio → óxidos & + Hg cloretos Normalmente, a formação de óxidos ajudaria a retardar o processo de corrosão pela formação de uma camada superficial protetora. Contudo, na interface entre o amálgama e os tecidos dentários não há formação de um óxido superficial, e os produtos da reação do processo de corrosão se precipitam. O processo também é muito

insidioso, uma vez que a produção de mercúrio livre permitirá reação posterior com a fase γ, formando mais γ1 e γ2. Esse processo enfraquece muito a estrutura do amálgama, e é com frequência citado como uma causa de fratura marginal.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Os amálgamas dentários tradicionais carecem de resistência e possuem creep e corrosão excessivos.

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS COM ALTO TEOR DE COBRE Da discussão anterior sobre as propriedades dos amálgamas dentários tradicionais, pode-se deduzir que seria possível uma melhoria no seu desempenho se sua resistência pudesse ser aumentada. Esse reforço poderia ser obtido pela redução da quantidade de γ1 e γ2, ou, melhor ainda, se a fase γ2, fraca e suscetível à corrosão, pudesse ser eliminada totalmente da estrutura, com o benefício adicional da redução do creep.

Amálgamas com Fase Dispersa No início da década de 1960, foram feitas tentativas para aumentar a resistência dos amálgamas dentários pelo aumento do teor de cobre na liga. A ideia era de que o cobre agiria como um agente reforçador por dispersão. Uma liga esférica (basicamente prata e cobre) com alto teor de cobre foi adicionada à liga de partícula tipo limalha. A escolha pelas partículas esféricas foi feita essencialmente porque em bases experimentais era mais fácil alterar a composição das partículas esféricas que das partículas tipo limalha. As vantagens potenciais, como a condensação facilitada, foram também reconhecidas nesta época. Como se esperava, o aumento do teor de cobre da liga resultou na modificação da reação de presa, que provou ser altamente benéfica. A primeira reação é a mesma da ligas tradicionais, mas esta é seguida por uma segunda reação: γ2 + Ag–Cu → Cu6Sn5 + γ1 Portanto, o amálgama final continha pouca ou nenhuma fase γ2. A estrutura desse amálgama é mostrada na Figura 2.1.4. Inicialmente, pensava-se que toda a fase γ2 era eliminada por essa reação, mas desde então foi reconhecido que alguma fase γ2 permanecia, embora numa quantidade pequena e de provável insignificância. A modificação na reação de presa resultou numa série de mudanças importantes nas propriedades do amálgama, dentre elas:

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

■ ■ ■ ■

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alta resistência à compressão; presa mais rápida para alcançar sua resistência total; redução do creep; e suscetibilidade reduzida à corrosão.

Outras Formulações com Alto Teor de Cobre Com esses tipos de melhorias, logo veio à tona a ideia dos amálgamas de partículas esféricas com alto teor de cobre. Eles combinam todas as vantagens da condensação mais fácil com aquelas já mencionadas, e uma variedade desses produtos está disponível atualmente. O pó nesses casos é uma liga esférica ternária de prata, estanho e cobre e possui a seguinte reação de presa: Ag–Sn–Cu + Hg → Ag–Sn–Cu + γ1 + Cu6Sn5 A relutância de muitos dentistas em utilizar ligas esféricas ao invés das ligas com partículas tipo limalha levou à introdução de formulações de liga exclusiva de partículas tipo limalha com alto teor de cobre. A composição dessas ligas é essencialmente a mesma de todas as ligas de partículas esféricas, exceto a grande diferença no teor de cobre total, que pode variar de 12% a 30%. Ainda assim, não se sabe qual é a porcentagem ideal de cobre. Para aqueles dentistas que preferem a liga com fase dispersa, existe agora uma grande quantidade de ligas disponíveis que possui uma mistura de partículas esféricas e de tipo limalha, em que ambos os tipos de partículas possuem a mesma composição da liga ternária de Ag–Sn–Cu.

SELEÇÃO E USO DOS AMÁLGAMAS DENTÁRIOS Na seleção do amálgama dentário apropriado, existem dois fatores importantes que precisam ser considerados: ■ ■

variáveis controladas pelo fabricante; e variáveis controladas pelo profissional.

Cada uma delas terá um efeito profundo nas propriedades dos amálgamas dentários, tais como: características de manipulação e desempenho clínico. O desempenho clínico de uma restauração de amálgama depende tanto da escolha correta da liga como da execução de um bom procedimento operatório. A realização de um bom procedimento envolve todos os estágios da inserção do amálgama, da etapa da dosagem até o polimento final.

Variáveis do Fabricante As variáveis sob controle do fabricante são: a composição; o tamanho; e o formato da partícula da liga.

Figura 2.1.4 Representação esquemática da microestrutura de um amálgama de fase dispersa. O halo em volta das partículas esféricas é a fase Cu–Sn.

Composição As diferenças mais óbvias na composição são relativas ao teor de cobre da liga, e a primeira pergunta que deve ser respondida é: devo usar uma liga de amálgama tradicional ou enriquecida com cobre? As evidências obtidas de estudos clínicos controlados indicam fortemente que o desempenho dos amálgamas com alto teor de cobre é superior ao dos amálgamas tradicionais. O índice de fratura marginal é certamente mais baixo nas ligas com alto teor de cobre em comparação com as ligas com baixo teor de cobre, embora isso por si só não signifique necessariamente que a longevidade desses dois sistemas será muito diferente. Deve-se lembrar que os amálgamas tradicionais prestaram um excelente serviço por muitos anos e que um tempo de vida maior que 10 anos não é de forma alguma incomum para essas restaurações, mostrando o potencial desse amálgama. A falha prematura de uma restauração de amálgama está mais relacionada à técnica operatória inadequada. Todavia, nas mãos de dentistas experientes e sob condições altamente controladas, os amálgamas com alto teor de cobre demonstraram melhor desempenho. O porquê de os amálgamas com alto teor de cobre apresentarem melhor desempenho clínico ainda não está claro. A resistência ao creep melhorou significantemente, assim como a resistência à corrosão. Ambas têm sido consideradas as razões pelas quais houve redução da fratura marginal, mas não está claro se a reduzida corrosão ou o reduzido creep é responsável pela melhoria das propriedades. Talvez se possa ser pragmático e apenas aceitar que há uma melhoria no desempenho, independentemente da causa.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Uma característica dos amálgamas de alto teor de cobre é a sua maior resistência à compressão quando comparada com os amálgamas tradicionais. Logo após uma hora da colocação, os amálgamas com alto teor de cobre podem ser duas vezes mais resistentes que os amálgamas tradicionais, e isso deve contribuir para a redução da incidência de fraturas do corpo da restauração. Deve-se notar, entretanto, que a resistência à compressão final não é muito diferente (Tabela 2.1.3). Outra característica dos amálgamas com alto teor de cobre é que eles não contêm nenhum zinco. Sabendo que o zinco é considerado a origem da expansão tardia quando o amálgama se contamina por saliva, isso é uma vantagem adicional. Uma desvantagem que foi observada em alguns amálgamas com alto teor de cobre é que as suas superfícies são mais suscetíveis ao deslustre.

Tamanho e Formato da Partícula

apenas o dentista pode decidir, após testar diferentes tipos de amálgama.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA As evidências clínicas atuais são suficientes para dizer que os amálgamas com alto teor de cobre são os amálgamas de escolha e certamente a balança inclinou-se mais favoravelmente para o lado destes.

Variáveis do Operador As variáveis que estão sob controle do dentista e que podem afetar a qualidade final da restauração são as seguintes: ■

O tamanho e o formato das partículas devem ser seriamente considerados porque eles determinam não apenas as características de manipulação da liga, mas também afetam a composição final. Existe a tendência em se optar por ligas de partículas muito finas por serem de fácil escultura, promovendo um acabamento final muito bom. No entanto, o pequeno tamanho de partícula do pó significa que mais mercúrio reagirá com a liga, promovendo um conteúdo final de mercúrio mais alto e, portanto, maiores proporções de γ1 e γ2. Além do mais, a resistência à compressão inicial desses amálgamas é muito mais baixa que aquela dos amálgamas feitos com partículas maiores. Alguns estudos têm mostrado que o uso de uma liga com pó muito fino aumenta a incidência de fraturas marginais e que o seu uso é contraindicado. Em contrapartida, as ligas de granulação grossa são de difícil escultura porque as partículas são facilmente deslocadas da superfície durante a presa inicial. As partículas finas ou médias parecem ser a melhor alternativa neste quesito. Quanto à forma da partícula, a escolha é entre a liga tipo limalha e esférica, ou talvez uma mistura das duas. Isso é muito mais uma questão de preferência pessoal, mas diz-se que os sistemas com liga esférica são condensados mais facilmente que as composições com as ligas de partícula tipo limalha. No final, isso é algo que

■ ■ ■

proporcionamento da liga e mercúrio; trituração; condensação; e escultura e polimento.

Proporcionamento O proporcionamento é mais comumente realizado usandose dispensadores volumétricos ou cápsulas pré-dosadas. As vantagens dessas últimas são que o dentista não precisa se preocupar em obter a melhor proporção de liga e mercúrio (que é pré-fixada pelo fabricante) e que existe risco menor de derramamento de mercúrio durante os estágios de manuseio da confecção do amálgama. Infelizmente, as cápsulas são mais caras que a aquisição do pó da liga em frasco. Portanto, o dispensador volumétrico é uma proposição mais atrativa para alguns dentistas, mas limita a escolha da liga para aquelas de grãos finos, pois as ligas de granulação média e grossa tendem a produzir misturas errôneas. Por sua vez, o dispensador volumétrico permite mais liberdade na proporção liga:mercúrio, que é uma característica que atrai particularmente aqueles dentistas que gostam de iniciar com uma mistura bem molhada. Um alto conteúdo de mercúrio inicial não apresenta problemas desde que seja empregada uma boa técnica de condensação. É importante que seja obtida uma mistura suficientemente plástica para permitir uma amalgamação e uma manipulação adequadas; uma mistura seca

Tabela 2.1.3 Propriedades selecionadas de alguns amálgamas dentários Material

Fabricante

Tipo

% do teor de cobre

% Creep

Resistência à compressão (MPa) 1h

24 h

Amalcap-F

Ivoclar

Limalha

6

2,5

94

410

Dispersalloy

J&J

Misto

12

0,25

226

440

Sybralloy

Kerr

Esférica

30

0,05

315

500

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

deve ser evitada de todas as formas. Em geral, uma proporção de 1:1 de liga:mercúrio basta para as ligas de partículas tipo limalha; mas para as ligas de partículas esféricas, uma maior proporção de liga:mercúrio é permitida devido à menor área de superfície total das partículas esféricas. O baixo teor de mercúrio nesse caso não significa que isto reduz a necessidade da remoção do excesso de mercúrio. É importante que o conteúdo final de mercúrio seja o menor possível, não dispensando ainda uma boa técnica de condensação.

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Expansão

Tempo

Trituração A trituração é uma das variáveis mais importantes do operador. A trituração adequada é essencial para assegurar uma mistura plástica e uma completa amalgamação. O tempo de trituração necessário depende tanto do tipo de liga como do sistema de dispensamento de mistura. As ligas esféricas tendem a se misturar mais rapidamente e, em geral, requerem um tempo de trituração mais curto. Isso é porque as partículas são mais facilmente umedecidas que as partículas tipo limalha. O tempo exato de trituração depende do sistema da mistura. Para um sistema vibrando a velocidade de 4.000 rpm, num deslocamento de 50 mm, o tempo de amalgamação pode ser tão breve como cinco segundos. Para um sistema mais lento, com velocidade de 2.600 rpm, o tempo de trituração pode ser de 20 segundos ou mais. A recomendação geral é que é melhor errar para o lado da supertrituração que para o lado da subtrituração. Se acharmos que o amálgama está tomando presa muito rapidamente, então, o tempo de trituração deve ser aumentado, e não diminuído como se poderia imaginar; a trituração extra promoverá uma mistura mais plástica e com maior tempo de trabalho. O tempo de trituração também afeta as alterações dimensionais que ocorrem quando o amálgama toma presa. O ideal é que o material deve se expandir levemente durante a presa, o que ajuda na adaptação das margens e reduz o potencial de infiltração marginal. Antes da introdução das cápsulas e dos amalgamadores, os amálgamas tradicionais continham grandes partículas de liga que eram trituradas manualmente; essas formulações mostravam uma leve expansão quando após a presa total. A alteração dimensional em função do tempo é apresentada na Figura 2.1.5. Existe uma contração inicial à medida que o mercúrio se difunde pela liga. Isso é seguido por uma expansão assim que a fase γ1 se forma, devido ao impingimento dos cristais de γ1 um com os outros, produzindo uma pressão de direção externa que se opõe à contração. Isso ocorre somente se uma quantidade suficiente de mercúrio estiver presente para produzir uma mistura plástica.

Figura 2.1.5 Alteração dimensional de um amálgama misturado tradicionalmente de forma manual (a) e um amálgama misturado mecanicamente (b).

A introdução dos amalgamadores mecânicos de alta velocidade, baixas proporções de mercúrio:liga, tamanho pequeno de partículas e altas pressões de condensação reduziram a quantidade de mercúrio na mistura, favorecendo a contração do amálgama, de forma que os amálgamas modernos apresentam uma contração controlada depois de tomado presa.

Condensação As exigências mais importantes da técnica de condensação são que o máximo de excesso de mercúrio seja removido, que a restauração final não seja porosa e que se obtenha uma ótima adaptação marginal de forma a impedir a sensibilidade pós-operatória. Para as ligas tipo limalha, pode ser obtido um conteúdo final de mercúrio de 45%. Embora as reduções abaixo de 50% possuam pouco efeito na resistência à compressão após 24 horas, uma resistência à compressão imediata bem maior pode ser obtida, e a suscetibilidade ao creep é bastante reduzida. A alta resistência imediata reduz a probabilidade de fraturas do corpo do amálgama durante as primeiras horas após a colocação. Isso se aplica igualmente aos sistemas de ligas esféricas, exceto naqueles casos em que o conteúdo final de mercúrio é de aproximadamente 40%. Os componentes importantes da condensação são o uso da força máxima; o uso de condensadores de tamanho adequado em relação ao tamanho da cavidade; o uso de porta-amálgamas eficientes e; a inserção de pequenos incrementos. Embora, em geral sejam recomendadas pressões de condensação de 30-40 N, isso não significa que pressões menores de condensação fornecerão um resultado mais deficiente, uma vez que as baixas pressões de condensação podem ser compensadas pela colocação de pequenos incrementos. A colocação de grandes incrementos não só

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

levará à formação de grandes quantidades de γ1 e γ2, mas também produzirá alto nível de porosidade. A condensação dos amálgamas de liga esférica requer uma abordagem diferente dos sistemas de partículas tipo limalha. Uma vez que a mistura escoa mais facilmente mesmo com pequena pressão, pequenas cargas necessitam ser aplicadas por condensadores maiores, se possível. No entanto, uma íntima adaptação marginal parece ser mais difícil com o amálgama de liga esférica devido ao maior tamanho dos grãos destas ligas.

Escultura e Polimento A habilidade em esculpir um amálgama é proporcional ao tamanho e ao formato das partículas da liga. Geralmente, as ligas esféricas produzem um acabamento superficial inicial melhor que as ligas de partículas tipo limalha. A necessidade de polimento do amálgama numa segunda consulta é um assunto em debate. Alguns argumentam que o polimento é necessário por nenhuma outra razão senão a melhoria da estética, enquanto que outros apontam para o alto conteúdo de mercúrio residual na camada superficial, e indicam que este deva ser removido. Pode ser verdade que uma fina camada superficial tenha preponderância das fases γ1 e γ2, mas essa camada é provavelmente tão fina que seria rapidamente desgastada. De maneira similar, existe controvérsia sobre a necessidade ou não da brunidura. Costumava-se dizer que a brunidura dos amálgamas originaria uma camada superficial rica em mercúrio, que aumentaria a possibilidade de corrosão ou fratura. Contudo, estudos mais recentes têm indicado que a brunidura proporciona o aumento da dureza superficial, a redução da porosidade e diminuição da corrosão, melhorando também a adaptação marginal do amálgama. A superfície esculpida do amálgama é certamente áspera, e por isso é necessária alguma forma de acabamento adicional. As opções são chamar o paciente novamente no dia seguinte para polir a restauração ou brunir a restauração no mesmo dia da colocação. A brunidura pode ser um substituto eficiente do polimento convencional dos amálgamas de partícula tipo limalha e, pelo tempo que tem sido usada, associa-se a ela uma melhor integridade marginal.

LIMITAÇÕES DOS AMÁLGAMAS DENTÁRIOS O uso dos amálgamas dentários tem sido tema de consideráveis discussões desde a introdução das novas resinas compostas e dos cimentos de ionômero de vidro. Alguns sugeriram que o uso dos amálgamas deveria ser suspenso. Dado que os amálgamas têm proporcionado um excelente serviço por mais de 100 anos, isso parece ser um ponto de vista um tanto extremo. Não obstante, os amálgamas dentários possuem várias desvantagens.

Estética Deficiente Por serem restaurações metálicas, os amálgamas não são as opções visualmente mais atrativas, contudo, se forem polidas mais frequentemente que a prática atual, podem parecer mais apresentáveis. O polimento final é perdido com o tempo, devido ao deslustre. Embora haja uma demanda crescente dos pacientes por restaurações mais estéticas, no caso de dentes posteriores, o aspecto mais importante a ser considerado é a durabilidade.

Toxicidade do Mercúrio Não se pode negar que o mercúrio é uma substância altamente tóxica e demanda o máximo de cuidado. As principais fontes de exposição ao mercúrio provêm de: ■ ■ ■ ■ ■

derramamento acidental; pouca higiene ao manipular o mercúrio; contato direto com o mercúrio; amalgamadores; e confecção de novas restaurações e remoção das antigas.

O efeito nocivo potencial mais sério é do vapor de mercúrio, e a fonte mais significante desse vapor é o derramamento do mercúrio durante o procedimento operatório. O uso de amálgama em cápsulas pode minimizar esse risco. A equipe odontológica está sob maior risco de contaminação por mercúrio, pois o material é manipulado diariamente. Quando acontece algum derramamento, o fato é de interesse de todos, principalmente da equipe odontológica, que manuseia direta e intensamente o material. Qualquer mercúrio dispersado vaporizará gradualmente, sendo então inalado. O limite de exposição nociva ao mercúrio no ar para a população geral é de 50 µg/m3 de ar. Sabe-se, da experiência com operários de fábricas que trabalham com mercúrio, por exemplo, fábricas de termômetro, que se esse limite for ultrapassado, sinais de envenenamento por mercúrio aparecerão. Esses sinais incluem tremor nas pernas, coceiras, erupções cutâneas, perspiração excessiva, taquicardia, febre de baixas temperaturas intermitentes, irritabilidade, alteração da personalidade, insônia, cefaleia, hipertensão, fadiga crônica e disfunção neurológica. Devem ser adotadas boas práticas de precaução com o mercúrio, e elas incluem: ■ ■ ■



uso de técnica sem contato manual; uso de amalgamadores mecânicos com boa vedação; armazenagem de mercúrio e amálgama antigo em água num recipiente inquebrável, fechado hermeticamente; e limpeza imediata do mercúrio derramado.

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

Percebe-se que os pacientes estão sob menor risco de inalação do mercúrio que a equipe odontológica. Certamente ocorre ingestão pela inalação do vapor de mercúrio durante a colocação de um amálgama, mas acredita-se que esteja bem abaixo do limite de 50 µg/m3. No entanto, existem alguns episódios em que os pacientes reagiram muito mal à presença do amálgama em suas bocas, devido a uma reação de hipersensibilidade tardia ao mercúrio. Embora essas reações alérgicas sejam bem raras, seus sintomas podem ser graves, e o dentista deve estar atento para tal possibilidade. Há também relatos de reações locais tipo liquenoide associadas à presença do amálgama e à remoção da restauração de amálgama é recomendada quando existir um contato evidente com a lesão. Além da inalação do vapor de mercúrio, o desgaste e a corrosão contribuirão com a carga corpórea total de mercúrio. Em média, acredita-se que a ingestão do mercúrio pelo organismo de restaurações de amálgama esteja bem abaixo do limite de 30 µg/dia, recomendado pela Organização Mundial da Saúde. Todavia, deve-se considerar que isso é apenas uma estimativa e é possível que alguns pacientes, possivelmente devido à mastigação excessiva ou ao bruxismo, possam possuir um nível de mercúrio em seu organismo acima da média. Também foi mostrado in vitro que agentes clareadores à base de peróxido de carbamida podem aumentar a liberação de mercúrio das restaurações de amálgama. Portanto, os pacientes que se queixam dos sintomas de toxicidade por mercúrio devem ser tratados com cuidado e consideração. A continuidade do uso dos amálgamas dentários se tornou um assunto controverso em vários países da Europa. Na dentição decídua, o uso dos amálgamas dentários reduziu bastante com o advento dos compômeros e dos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina, tanto que somente em poucos países o amálgama é o material de escolha. O mercúrio das restaurações contamina o ambiente e contribui com a carga total de mercúrio na comunidade. Em alguns países, onde existe controle cuidadoso do uso do mercúrio, isso significa que o amálgama dentário pode ter uma contribuição relevante para a carga total de mercúrio. Em tais circunstâncias uma forte campanha pode ser necessária para desencorajar o uso dos amálgamas dentários, na condição de que se esclareça sobre a elevação do custo do tratamento odontológico em consequência dessa decisão. Embora o uso do mercúrio na odontologia seja de apenas 3% da quantidade total usada mundialmente, todos os dentistas devem ser estimulados a adotar as boas práticas odontológicas de higiene do mercúrio e implementar os procedimentos de gerenciamento de resíduos para impedir a entrada do mercúrio no ambiente. Não obstante, as preocupações com a biocompatibilidade dos amálgamas de mercúrio são suficientes para se considerar seriamente o uso de ligas alternativas.

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IMPORTÂNCIA CLÍNICA É importante que seja enfatizada a manipulação segura do amálgama dentário, para toda a equipe odontológica em todos os momentos oportunos.

Uma tentativa é substituir o mercúrio por gálio, que possui a segunda temperatura de fusão mais baixa depois do mercúrio. Quando amalgamado com o estanho e o índio, é produzido um líquido em temperatura ambiente. Ligas pulverizadas de composição próxima com as ligas usadas nos amálgamas de mercúrio são misturadas com esse líquido, que produz uma mistura com características de manipulação adequadas para ser condensada na cavidade. Embora a liga resultante tenha propriedades físicas e mecânicas similares às do amálgama de mercúrio, a excessiva expansão de presa e propriedades deficientes de manipulação precisam ser superadas antes que esses materiais possam ser considerados um substituto viável. Em outra abordagem, o metal líquido é eliminado de vez com o uso de solda a frio de partículas pré-amalgamadas cobertas por prata. A soldagem a frio ocorre onde existe contato prata com prata entre as partículas. Tal processo é promovido pela exposição das partículas a um ácido fraco para remover quaisquer contaminantes da superfície, que podem interferir na solda a frio. Um problema com esse material é a alta pressão de compactação necessária para consolidar as partículas de prata. Embora seja um material promissor, ele ainda está em estágio de desenvolvimento e ainda não disponível comercialmente.

Alta Condutividade Térmica Como se pode esperar de um material metálico, a condutividade térmica dos amálgamas dentários é muito alta. Os problemas decorrentes disso, tais como a sensibilidade pulpar devido ao efeito hidrodinâmico do bombeamento do fluido através da fenda marginal para dentro e fora dos túbulos dentinários, são facilmente contornados pelas técnicas adequadas de preparo cavitário envolvendo o uso de vernizes ou forradores (Cap. 2.4)

Efeitos Galvânicos Quando duas restaurações metálicas com metais de diferentes graus de eletronegatividade são colocadas próximas uma da outra em um meio eletricamente condutor (nesse caso, o meio é a saliva), é possível que se estabeleça uma célula galvânica. As correntes resultantes podem causar desconforto aos pacientes ou deixar um forte gosto metálico na boca, podendo acelerar a falha corrosiva no metal mais eletro-

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

negativo. Assim, embora o problema raramente apareça, não é recomendado o uso de metais diferentes na boca.

Falta de Adesão A necessidade do uso de desenhos cavitários retentivos com os amálgamas dentários impõe uma severa limitação. Frequentemente, uma grande quantidade de esmalte ou dentina perfeitamente hígidos é removida sob a bandeira da “extensão preventiva”. Esse princípio é questionável, já que o amálgama nunca poderá ser substituto dos tecidos dentários sadios. Novas ideias de preparo cavitário centradas na minimização da remoção de tecido dentário sadio foram desenvolvidas, mas nunca serão tão conservadoras como a abordagem para os materiais restauradores adesivos. Com o intuito de superar a desaprovação dos amálgamas dentários, foi sugerido que a adesão do amálgama aos dentes poderia ser feita, pois possuiria os benefícios de reforçar o dente, auxiliar na retenção e preservar a estrutura dental. De maneira geral, a adesão é obtida pela combinação de um sistema adesivo dentinário e cimento resinoso, que são colocadas antes do amálgama dentário, embora outras opções, tais como as resinas autoadesivas, também tenham sido cogitadas. Os benefícios oriundos desta abordagem são discutíveis, exceto, talvez, em situações em que a retenção esteja seriamente comprometida.

Falta de Resistência e Tenacidade Como observado, os amálgamas dentários são materiais restauradores muito frágeis, com baixa resistência à tração. A forma de lidar com isso é usar o material como um bloco, reduzindo o grau de flexão da restauração, que reduzirá as tensões de tração. Tendo assim, os preparos cavitários devem ser desenhados de forma a se evitar que regiões muito delgadas de amálgama sejam formadas. Isso significa que as caixas devem ser profundas e os ângulos marginais devem estar próximos dos 90°, sempre que possível. Uma consequência disto é que inerentemente o amálgama não conserva a estrutura dental. Portanto, em situações de pequenas lesões de cárie primária, o uso do amálgama dentário pode ser contraindicado por ser muito destrutivo ao tecido dentário, e neste caso é preferível um material alternativo como a resina composta.

Tempo de Vida Reduzido das Restaurações de Amálgama A cada ano, são realizadas centenas de milhares de restaurações de amálgama e, em média, a metade delas é substituição de restaurações existentes. A longevidade das restaurações de amálgama tem sido assunto de vários estudos clínicos, alguns evidenciando que a metade destas restaurações necessitará de substituição dentro de quatro a cinco anos.

Em média, o tempo de sobrevivência das restaurações de amálgama é inversamente proporcional ao seu tamanho. Para complicar, o contorno cavitário é aumentado em pelo menos 0,5 mm a cada substituição da restauração de amálgama, criando uma restauração maior. Em geral, portanto, quanto menor a restauração, maior a sua sobrevivência. De todas essas desvantagens mencionadas, a falta de longevidade e a natureza destrutiva do procedimento são os aspectos principais. As formas de fazer as restaurações durarem por mais tempo serão consideradas a seguir.

MELHORANDO A LONGEVIDADE DAS RESTAURAÇÕES DE AMÁLGAMA Nas últimas três décadas, muitos pesquisadores têm observado as técnicas convencionais do amálgama com um olhar crítico. Os motivos que justificam a substituição do amálgama estão usualmente associados a: ■ ■ ■ ■

fratura dental; cárie recorrente; fratura do corpo do amálgama; e falha marginal.

A falha marginal pode surgir tanto pela fratura das margens do amálgama como das margens de esmalte. Dos fatores citados, a cárie recorrente é considerada a razão mais comum para a substituição da restauração de amálgama (correspondendo a 70% das substituições). Alguns fracassos são inevitáveis e estão relacionados às propriedades adversas dos amálgamas, mas outros podem ser evitados, levando em consideração as limitações dos amálgamas, adotando as técnicas adequadas e evitando as falhas no desenho cavitário e técnica clínica deficiente.

Fratura Dental Estrutura Dental Enfraquecida Quanto mais se remove tecido dentário, mais fraco se torna o dente. O amálgama dentário atua como um efetivo material de preenchimento, mas como não possui nenhuma qualidade adesiva, ele não auxilia no fortalecimento da estrutura dental remanescente. Portanto, as técnicas envolvendo a mínima remoção do tecido dentário devem ser sempre empregadas. Cortando o esmalte paralelo ao longo eixo da direção dos prismas, é possível manter a forma de contorno a menor possível. Essa prática também assegura que os ângulos cavo-superficiais estejam próximos de 90°, o que é ótimo para o amálgama; já que os ângulos cavosuperficiais agudos favorecem a fratura marginal do amálgama. Atualmente existe uma série de adesivos que permite a adesão do amálgama aos tecidos dentários. A adesão

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

89

fornece suporte adicional tanto à restauração como a cúspide, ajudando a fortalecer a coroa dental restaurada. Como a durabilidade da adesão é ainda desconhecida, o desenho da cavidade ainda deve ser de forma a evitar regiões potenciais de fratura. Em caso de cúspides gravemente enfraquecidas, devem ser consideradas técnicas alternativas, tais como onlay de ouro ou cerâmicas aderidas por resina.

de contato com os dentes adjacentes. O sobrecontorno é particularmente propenso ao acúmulo de placa, podendo desencadear a recorrência de cárie. Se o sobrecontorno for subgengival, ele pode causar irritação dos tecidos moles e levar à formação de bolsa periodontal e perda óssea. Uma fita de matriz muito apertada pode causar a fratura das cúspides dentais que foram enfraquecidas pela remoção de grande quantidade de tecido dentário.

Esmalte Enfraquecido

Condensação Insatisfatória

O princípio de planificiar paredes e soalhos numa cavidade pode causar o enfraquecimento do esmalte, como mostra a Figura 2.1.6 numa caixa proximal de uma restauração. O esmalte sem apoio se desprende deixando uma fenda, o que pode levar à recorrência da cárie.

Como já observado, a condensação insatisfatória resulta na porosidade do amálgama e na presença de excesso de mercúrio, ambas reduzindo a resistência do amálgama. A adaptação marginal também será insatisfatória, aumentando o potencial de infiltração marginal, cárie recorrente e corrosão. Para uma boa condensação, é importante que o amálgama seja bem-misturado e que o tempo adequado de trituração seja executado. A subtrituração, em particular, deve ser evitada, pois resultará numa mistura seca que não permitirá condensação adequada

Cárie Residual É de importância fundamental a remoção de toda a cárie residual. Se não, a cárie se alastra e enfraquece a cúspide, podendo causar a sua fratura. A infiltração de toxinas bacterianas também causa inflamação pulpar.

Fratura do Corpo do Amálgama

Recorrência da Lesão de Cárie

Preparos Rasos

Contaminação A contaminação da cavidade por sangue ou saliva resulta na adaptação deficiente da restauração às margens cavitárias.

Técnicas Deficientes de Colocação da Matriz Uma fita de matriz adaptada inadequadamente pode ser causa de sobrecontorno marginal ou da falta de pontos

Amálgama

Os amálgamas dentários possuem resistência à tração muito baixa. Quando colocados em seções finas, eles estão sujeitos a forças de flexão e fraturam. Os preparos rasos só são aceitáveis em restaurações muito pequenas, onde a área superficial é pequena em comparação à profundidade. Para restaurações MOD amplas, deve haver profundidade suficiente na cavidade no soalho oclusal para fornecer massa suficiente para resistir às

Dentina

Esmalte

Figura 2.1.6 Se o soalho gengival da caixa proximal não for terminado (a), então o esmalte sem suporte irá se fraturar (b) e levar à recorrência da cárie. O biselamento do esmalte (c) evita essa ocorrência, mas é necessário fazer uma canaleta no soalho gengival da dentina para resistir ao deslocamento proximal da restauração.

90

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

forças de flexão. Isso pode exigir a remoção de grande quantidade de tecido dentário sadio.

Caixas Proximais Não Retentivas Uma falha observada frequentemente nas restaurações MO, DO ou MOD é a fratura das caixas proximais da seção oclusal do material restaurador. Isso se deve em algum grau à baixa resistência à tração da restauração de amálgama, já que uma carga oclusal pode forçar o amálgama a se deslocar para fora. Todavia, os ângulos lineares internos agudos agravam a situação, que no final leva à fratura e perda da caixa. O risco dessa ocorrência pode ser reduzido preparando-se canaletas de retenção nas paredes laterais e no soalho gengival das caixas. Essa técnica assegura que a caixa seja autorretentiva e se oponha à ação de deslocamento gerado por uma carga oclusal, resistindo ao deslocamento da restauração em direção proximal. Uma vantagem adicional é que não é necessária uma retenção oclusal para a retenção da restauração. Então, o preparo adicional das fissuras oclusais não é necessário quando uma lesão primária está confinada somente à superfície proximal; esse tipo de preparo é em geral descrito como preparo em “cunha”.

Ângulos Internos Vivos A presença de ângulos internos vivos permite a concentração de tensões locais, que aumenta o risco de fratura tanto dos dentes como da restauração, como mostra a Figura 2.1.7. Tais ângulos nítidos devem ser evitados, optando-se por superfícies internas arredondadas. Por

exemplo, as caixas proximais devem ser na forma de pêra, para se conformar à extensão da lesão subjacente, e não devem ser preparadas com ângulos vivos.

Falha Marginal Ângulos Cavo-superficiais Incorretos A causa primária da falha marginal de um dente restaurado é a presença de um ângulo cavo-superficial incorreto, levando à fratura marginal do esmalte ou do amálgama. A falha marginal do amálgama ocorre mais facilmente quando o amálgama possui um ângulo marginal agudo. O amálgama é muito frágil e possui uma resistência à tração muito baixa (60-70 MPa), então qualquer margem pontiaguda resultante irá fraturar facilmente conforme ela se flexiona sob aplicação de uma carga externa. Isso contrasta com os inlays de liga de ouro, que não apresentam os sinais de falha marginal da liga porque esse material é tenaz e dúctil. Consequentemente, a falha é menos provável de ocorrer nos ângulos marginais maiores que 70°, já que isso evita as bordas estreitas de amálgama. A prática de preparar as paredes cavitárias perpendicularmente no aspecto oclusal da cavidade favorece a produção de ângulos marginais agudos no amálgama (Fig. 2.1.8a). Não é possível alterar o ângulo de toda a parede cavitária porque o contorno cavitário se aproximaria muito ou poderia até perfurar o corno pulpar (Fig. 2.1.8b). Um método aceitável de superar esse problema é confinar a angulação aguda somente ao esmalte, como representado na Figura 2.1.8c.

Carga

Carga

Carga

Distribuição de tensões mais uniforme

Concentração de tensões (b)

(a) Amálgama

(c) Dentina

Esmalte

Figura 2.1.7 Ângulos lineares internos vivos (a) podem levar à fratura da cúspide (b) sob forte carga oclusal. As tensões de tração são concentradas no ângulo linear, porém isto pode ser consideravelmente reduzido, criando-se ângulos lineares arredondados (c).

AMÁLGAMAS DENTÁRIOS

Em cavidades oclusais de largura muito reduzida, não é necessário preparar ângulos cavo-superficiais de 90° no esmalte porque o amálgama pode ser esculpido numa forma plana sem interferir com o dente antagonista. O ângulo marginal do amálgama será então obtuso, que dará à margem a resistência adicional devido ao apoio de todo o corpo do material restaurador. Muito cuidado deve ser empregado no preparo das margens cavitárias, de forma a evitar esmalte sem suporte ou ângulos marginais agudos no amálgama.

Expansão Tardia No caso de ligas contendo zinco, o confinamento de saliva no material durante a sua colocação pode resultar num fenômeno conhecido como expansão tardia. A água reage com o zinco conforme a seguinte reação: H2O + Zn → ZnO + H2 Bolhas do gás hidrogênio são formadas dentro do amálgama. A pressão aumenta com o tempo, conforme mais e mais hidrogênio é produzido e armazenado em bolhas. Finalmente, a pressão pode ser tão grande que as bolhas se expandem, causando a expansão da restauração. Essa expansão ocorre durante os estágios iniciais dos amálgamas de presa lenta, já que eles são incapazes de resistir à pressão até terem tomado presa por completo. A expansão pode causar uma pressão interna sobre a polpa ou causar a protrusão da restauração acima da superfície. A primeira causará dor pulpar e o último levará à falha marginal. Em dentes gravemente destruídos, a expansão pode causar também fratura da cúspide. Esse problema pode ser minimizado usando-se isolamento adequado e a seleção de um amálgama de presa rápida.

(a)

91

Sobrecontorno, Subcontorno e Escultura pronunciada Se uma cavidade for superpreenchida e depois não esculpida o suficiente para promover uma transição suave da superfície dental para a superfície da restauração, ocorrerá a formação de um degrau. Esse degrau poderá, finalmente, se fraturar, dando um aspecto de falha marginal à restauração. Isso pode encorajar o cirurgião-dentista a substituir a restauração, quando, talvez, fosse necessário apenas um novo polimento de forma que a restauração se nivelasse à superfície dental. Tal tratamento desnecessário pode ser evitado ao se assegurar que a superfície seja esculpida de forma adequada pós-inserção da restauração. Da mesma forma, um subpreenchimento ou escultura pronunciada (profunda) pode resultar em uma restauração com ângulo agudo que dará origem à fratura marginal.

Creep e Corrosão do Amálgama Os problemas associados ao amálgama como um material restaurador já foram abordados detalhadamente, tanto em termos das limitações impostas pelas suas propriedades físicas e mecânicas quanto pela sua manipulação. A maioria das falhas em curto prazo pode ser evitada se os fatores abordados forem considerados e se for prestada uma atenção cuidadosa ao detalhamento do preparo cavitário e manipulação do material. Em longo prazo, os amálgamas poderão falhar. Quando tais falhas são relativas especificamente ao material, elas são em geral associadas ao creep ou à corrosão, que causam a fratura marginal.

(b)

(c)

Figura 2.1.8 Um ângulo cavo-superficial obtuso (a) produz um ângulo marginal agudo na restauração que levará à fratura marginal e deve ser corrigido. Em (b), o ângulo cavo-superficial é agora próximo ao ideal, mas pode dar origem a uma exposição pulpar. Um método aceitável é mostrado em (c), onde o ajustamento é confinado ao esmalte, sem aumento da forma de contorno.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O ideal é que a liga de amálgama de escolha deve apresentar nenhum ou pouco creep e deve possuir alta resistência à corrosão. Evidências clínicas e laboratoriais indicam que um amálgama com alto teor de cobre e contendo zinco é a escolha de preferência.

RESUMO Os amálgamas dentários continuarão a ser o material restaurador de escolha em muitas situações clínicas. Dedicando cuidadosa atenção à seleção do material e à manipulação e considerando suas limitações, os amálga-

mas podem fornecer ao paciente o restabelecimento da função mastigatória por muitos anos.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Considerando que qualquer alternativa mais estética que o amálgama consome mais tempo para a execução e envolve procedimentos mais complexos, e que os amálgamas dentários possuem comprovação de seu bom desempenho clínico, esse material continua a ser o material restaurador mais conveniente para uso em dentes posteriores. Todavia, as exigências estéticas dos pacientes e o desejo do dentista em preservar a estrutura dental conduzirão ao desuso dos amálgamas dentários.

LEITURA COMPLEMENTAR Brown D (1988) Dental amalgams. Brit Dent J 164: 253 Buerkle V et al (2005) Restoration materials for primary molars – results from a European survey. J Dent 33: 275 Elderton RJ (1984) New approaches to cavity design. Brit Dent J 157: 421 Eley BM, Cox SW (1988) Mercury poisoning from dental amalgam – an evaluation of the evidence. J Dent 16: 90 Hamilton CJ et al (1983) Marginal fracture not a predictor of longevity. J Prosthet Dent 50: 200 Letz H, Vrijhoef MA (1984) Long-term influences on marginal fracture of amalgam restorations. J Oral Rehab 11: 95 Letzel H et al (1997) The influence of the amalgam alloy on the survival of amalgam restorations: a secondary analysis of multiple controlled clinical trials. J Dent Res 76: 1787 Mahler DB (1997) The high-copper dental amalgam alloy. J Dent Res 76: 537 Mahler DB, Nelson LW (1994) Sensitivity answers sought in amalgam alloy microleakage study. J Amer Dent Assoc 125: 282 Mjor IA (1985) Frequency of secondary caries at various anatomical locations. Oper Dent 10: 88 Papadogiannis Y, Boyer DB, Lakes RS (1987) Creep of amalgam at low stresses. J Dent Res 66: 1569

Ritchie KA et al (2004) Mercury vapour levels in dental practices and body mercury levels of dentists and controls. Brit Dent J 197: 625 Roulet J-F (1997) Benefits and disadvantages of tooth-coloured alternatives to amalgam. J Dent 25: 459 Sarkar NK (1978) Creep, corrosion and marginal fracture of amalgam fillings. J Oral Rehab 5: 413 Setcos JC, Staninec M, Wilson NH (2000) Bonding of amalgam restorations: existing knowledge and future prospects. Oper Dent 25: 121 Shaini FJ et al (2001) A comparison of the mechanical properties of a gallium-based alloy with a spherical highcopper amalgam. Dent Mater 17: 142 Staninec M, Hold M (1988) Bonding of amalgam to tooth structure: tensile adhesion and microleakage tests. J Prosthet Dent 59: 397 Summitt JB et al (2004) Six-year clinical evaluation of bonded and pin-retained complex amalgam restorations. Oper Dent 29: 261 Xu HHK et al (1999) Three-body wear of a hand-consolidated alternative to amalgam. J Dent Res 78: 1560

Capítulo 2.2

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

A resina forma a matriz do material composto, unindo as partículas individuais de carga por meio do agente de união (Fig. 2.2.1).

uma massa plástica em um sólido rígido que permite o uso desse material para restauração de dentes. O monômero mais usado tanto para resinas anteriores quanto para posteriores é o Bis-GMA, que é derivado da reação do bisfenol-A e do glicidil metacrilato. Essa resina é denominada resina de Bowen, devido ao seu inventor. Ela possui um peso molecular maior que o do metil metacrilato, que ajuda a reduzir a contração de polimerização (Fig. 2.2.2). O valor de contração de polimerização para as resinas de metil metacrilato é 22% vol., enquanto para uma resina de Bis-GMA, ela é 7,5% vol. Existe também vários compósitos que usam resina de uretano dimetacrilato (UDMA) ao invés do Bis-GMA. Monômeros de Bis-GMA e uretano dimetacrilato são fluidos altamente viscosos por causa de seus elevados pesos moleculares; a adição mesmo de uma pequena quantidade de carga poderia produzir um compósito com uma rigidez excessiva para uso clínico. Para superar esse problema, monômeros de baixa viscosidade conhecidos como controladores de viscosidade são adicionados, tais como metil metacrilato (MMA), etileno glicol dimetacrilato (EDMA) e trietileno glicol dimetacrilato (TEGDMA); este último é o mais usado. As estruturas químicas de alguns desses monômeros são apresentadas na Tabela 2.2.1. Para assegurar prazo de validade adequadamente longo para o compósito, é essencial que a polimerização prematura seja prevenida. Para essa finalidade, um inibidor, como hidroquinona, é incluído, usualmente em quantidades de 0,1% ou menos. A matriz resinosa também contém sistemas ativador/ inibidor para atingir a polimerização. Esses componentes dependem do tipo de reação empregada, que pode ser polimerização química ou fotopolimerização.

Matriz Resinosa

Carga

A resina é o componente quimicamente ativo do compósito. Ela é inicialmente um monômero fluido, mas é convertida em um polímero rígido por uma reação de adição por radicais. É essa habilidade de se converter de

Uma ampla variedade de cargas tem sido empregada nos compósitos para melhorar as propriedades. Essa prática se iniciou no final dos anos 1950, quando cargas, como o quartzo, foram introduzidas nos materiais restauradores

INTRODUÇÃO Um compósito, como o nome indica, consiste em uma combinação de dois ou mais materiais. Cada um desses materiais contribui para as propriedades gerais do compósito, e está presente em sua forma separada (Cap. 1.6). Resinas compostas são possivelmente os materiais disponíveis mais disseminados na Odontologia, pois são usados numa grande variedade de aplicações clínicas, abrangendo materiais restauradores, agentes de cimentação, restaurações indiretas e revestimento de metais para pinos endodônticos e núcleos. Uma adição relativamente recente a esse já grande número de materiais odontológicos à base de resina é a resina composta modificada por poliácido, ou compômeros, na forma abreviada. Neste capítulo, consideraremos primeiro as resinas compostas e depois exploraremos como os compômeros diferem das resinas compostas.

COMPOSIÇÃO E ESTRUTURA Materiais restauradores baseados em resinas compostas (“compósitos” na forma resumida) que são usados na Odontologia possuem três componentes principais: ■ ■ ■

uma matriz resinosa orgânica; uma carga inorgânica; um agente de união.

93

94

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Metil metacrilato Carga de vidro Contração de polimerização

Matriz resinosa Bis-GMA Agente de união silano

Figura 2.2.1 Estrutura de um material restaurador em compósito.

à base de metil metacrilato. A inclusão das cargas proporcionou cinco potenciais e principais benefícios: 1. A polimerização do monômero de metil metacrilato está sujeita a uma elevada contração de polimerização (21% vol.), mesmo quando usada com um sistema pó-líquido (7% vol.). Pela incorporação de grandes quantidades de partículas de vidro, a contração de polimerização é muito reduzida porque a quantidade de resina usada é diminuída e a carga não participa do processo de polimerização. Entretanto, a contração não é totalmente eliminada e dependerá do monômero usado e da quantidade de carga incorporada. 2. Monômeros de metacrilato têm um alto coeficiente de expansão térmica (quase 80ppm/°C). Esse coeficiente é reduzido pela adição de partículas cerâmicas, que tem um coeficiente de expansão térmica similar àquele dos tecidos dentários (8-10ppm/°C). 3. A carga pode melhorar as propriedades mecânicas tal como a dureza e a resistência à compressão. 4. O uso de metais pesados, tais como bário e estrôncio incorporado no vidro, proporciona radiopacidade. 5. As cargas proporcionaram o meio ideal para o controle de várias características estéticas, tais como: cor, translucidez e fluorescência. O desenvolvimento da tecnologia de cargas estão na raiz de muitas das melhoras que levaram os compósitos ao que são utilizados hoje.

Contração de polimerização Figura 2.2.2 Contração de polimerização de um sistema baseado em monômeros pequenos e grandes.

os silanos e um dos mais usados em resinas compostas com carga de vidro é o γ-metacriloxipropiltrietoxisilano, ou γ-MPTS resumidamente, mostrado na Figura 2.2.3 (Cap. 1.10). É muito importante que exista uma união forte e durável entre a resina e as partículas de carga. Primeiro, se não existe união, então a tensão transferida entre a resina e o vidro será feita de forma ineficiente e, como consequência, a maior parte da tensão terá sido transmitida pela matriz resinosa. Isso resultará em excessivo creep e finalmente fratura ou desgaste da restauração. Segundo, a ausência de união entre a resina e as partículas de vidro criará sítios de iniciação de fendas. Uma vez que as resinas não possuem uma elevada resistência à propagação de fendas, isso torna o compósito suscetível à falha por fadiga (Fig. 2.2.4). O problema fundamental é que as resinas são hidrofóbicas, enquanto vidros à base de sílica são hidrofílicos, devido a uma camada de superfície de grupos hidroxil ligados à sílica. Assim, a resina não possui uma afinidade natural para se unir à superfície do vidro (Fig. 2.2.5).

γ -metacriloxipropiltrimetoxisilano

CH2

C

C

O

CH2 CH2CH2

O

Agente de União Para um compósito ter propriedades mecânicas aceitáveis, é da maior importância que a carga e a resina estejam fortemente unidas umas às outras. Se existir uma falha nessa interface, o estresse desenvolvido quando uma carga é aplicada não será distribuído eficientemente por todo o material; a interface agirá como uma fonte primária de fratura, levando à subsequente desintegração do compósito. A união é alcançada pelo uso de agentes de união que são incorporados na resina. Esses agentes de união são

OCH 3

CH3

Si

OCH3

OCH 3

Ativação ácida OH

CH 3 CH2

C

C O

O

CH2 CH2CH2

Si

OH

OH

Figura 2.2.3 Estrutura do agente de união silano antes e depois de ativação ácida.

Tabela 2.2.1 Estrutura química de alguns monômeros Metil metacrilato

Síntese do Bis-GMA

CH3 CH2

C

OH

C

O

CH3 C

O

CH2

OH + 2

CH

O

CH3

C

C

CH2

Glicidil metacrilato

CH3 Bisfenol A

CH3

CH2

CH3

O

C

C

OH O

CH2

CH

OH

CH3 CH2

O

C

O

CH2

CH

CH2

O

O

CH3

C

C

CH2

CH3 Bis-GMA

Trietileno Glicol Dimetacrilato

CH2

CH3

CH3

C

C

CH2

C

O

C

O

O

(CH2)2

O

(CH2)2

O

(CH2)2

O

Uretano dimetacrilato

CH2

Hidroquinona

CH3

CH3

C

C

CH2

C

O

C

O

O

(CH2)2

O

O

H

C

N

CH3 CH2

CH

CH3 CH2

C

(CH2)2

H

O

N

C

O

(CH2)2

O

HO

OH

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

O

CH2

O

CH3

95

96

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

10µm

Figura 2.2.4 Imagem de microscopia eletrônica de varredura da ausência de união entre a matriz resinosa e as cargas de vidro.

OH MA

superfície do vidro (Fig. 2.2.7). Melhoras na qualidade da ligação entre a resina e a carga de vidro têm contribuído significativamente para o desenvolvimento de materiais restauradores, resinas compostas resistentes ao desgaste, que possam ser usados tanto em dentes anteriores quanto anteriores.

Vidro de sílica

DESENVOLVIMENTOS EM COMPÓSITOS Uma visão das mudanças ao longo das últimas décadas imediatamente identifica duas importantes áreas de desenvolvimento: ■ ■

Figura 2.2.5 Esquema das moléculas de monômero resinoso sendo repelidas na superfície do vidro, devido à presença dos grupos hidroxil no vidro.

Nova tecnologia em resinas. Nova tecnologia em cargas.

Tecnologia da Resina Técnicas de Polimerização

A solução para o problema reside no uso de um agente de união adequado. O agente de união silano foi escolhido, pois possui grupos hidroxil em uma extremidade, que são atraídos pelos grupos hidroxil na superfície do vidro. A outra extremidade consiste em um grupo metacrilato que é capaz de se ligar à resina por dupla ligação com o carbono (Fig. 2.2.6). Uma reação de condensação na interface entre o vidro e o agente de união silano assegura que o silano esteja covalentemente ligado à

O processo pelo qual um compósito na forma de pasta se torna um material duro é a polimerização da matriz resinosa monomérica. Com os compósitos iniciais, isso foi alcançado pelo fornecimento de duas pastas, uma mistura da qual poderia conter ingredientes necessários para polimerização. Poderia ser um ativador, tal como uma amina terciária, numa pasta, e um iniciador, usualmente peróxido de benzoíla, na outra (veja o Capítulo 1.6, para obter detalhes desse sistema de polimerização).

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

OH MA Silano

Vidro de sílica

Figura 2.2.6 Esquema do agente de união silano agindo como um elo entre a resina de metacrilato e a superfície de vidro hidroxilada.

No início dos anos 1970, compósitos ativados por luz ultravioleta (UV) tornaram-se disponíveis. Nesses materiais, a luz UV foi usada para criar radicais livres para iniciar o processo de polimerização. A energia da luz UV é suficiente para quebrar a ligação central do éter metil benzoíl a para criar dois radicais livres. Assim, apenas uma única pasta era necessária, que não endureceria até a exposição à luz UV. Entretanto, existiam algumas desvantagens com o uso dos sistemas de polimerização à luz UV. A luz UV pode causar queimaduras nos tecidos moles e também pode causar dano aos olhos. Assim, era essencial o uso de proteção e, em geral, grande cuidado era necessário para se usar unidades de fotopolimerização.

OH Si

OH O

Si

OH O

Si

A fonte de luz UV é uma lâmpada à base de mercúrio, que é cara, sofre do problema de gradual redução da intensidade de luz com o uso, conforme a lâmpada vai ficando mais velha e, tem um limite de profundidade de polimerização devido ao elevado grau de absorção de luz que ocorre durante o seu trajeto pelo compósito. Entretanto, a praticidade de se ter uma pasta única, que poderia ter uma grande demanda, foi prontamente adotada pelos profissionais de odontologia e abriu caminho para a introdução de compósitos ativados por luz visível (ALV). Compósitos ALV usam a canforoquinona como fonte de radicais livres. A energia para excitação é menor que aquela para o éter metil benzoíla, de modo que a luz com o comprimento de onda na faixa do azul (entre 460-480nm) é muito eficiente. Isso tem a vantagem de poder usar uma lâmpada halógena de quartzo que é mais barata, potencialmente menos danosa e a luz é mais diretamente transmitida ao longo do compósito promovendo maior profundidade de polimerização. Filtros especiais são usados para remover luz UV e infravermelha que são acionadas durante o uso, assim evitando queimaduras de tecidos moles e qualquer aumento de temperatura, respectivamente. Os métodos de polimerização estão resumidos na Tabela 2.2.2.

Segurança Interesse tem sido demonstrado nos aspectos de segurança quanto ao uso da luz ultravioleta de alta intensidade e prevenção desses problemas tem sido facilitado pelos novos sistemas de ALV. O uso da expressão “luz visível” introduz um sentimento de segurança, uma vez que é algo ao qual estamos expostos a todo tempo. Todavia, é prudente não se expor desnecessariamente à luz das unidades de produção de luz visível, uma vez que

OH O

Si

Mecanismo de união

Aplicação do silano R

R H

HO

Si

O

O

Si

OH

H O H

H

O Si

O

– nH2 O

H

H

Si

Si

O

Si

O

O

O O

R

R

Condensação

O

O

Si

97

Si

Figura 2.2.7 Aplicação e condensação do silano sobre a superfície de vidro de sílica.

Si

R O

O

O O

Si

Si

O

Si

O

98

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Tabela 2.2.2 Métodos de polimerização Quimicamente ativado Ativador

Iniciador

CH3

O O

+

2

O O

N HOH5C2

O O

C2H5OH

n,n-dihidroxil-p-toluidina

peróxido de benzoíla

radicais livres

Ativação por luz ultravioleta Iniciador

Ativador CH3

CH3 O

O

hn

CH2

CH2 éter metil benzoico

radicais livres

Ativação por luz visível Iniciador

Ar2C

O + RCH2CH2NR’

α-di quetona

amina

Ativador hn

ArC

OH + RCH2CHNR’ radicais livres

dentista precisa estar atento é aquela causada pelo longo período de exposição à luz de alta intensidade. Tal exposição pode alterar a sua percepção de cor, o que significa que a seleção da cor adequada dos compósitos se torna então um real problema, especialmente quando da realização de múltiplas restaurações ou quando se aplicam compósitos para facetas.

superfície pegajosa será prontamente discernível. Isso é um benefício quando da realização de procedimento de colocação de incrementos, pois assegura que uma camada do compósito se unirá bem à outra. Entretanto, isso pode ser um problema quando o último incremento é colocado. Quando é possível, usar uma tira de matriz, isto é em geral suficiente para eliminar o oxigênio e a resina será totalmente polimerizada até a superfície. Para a maioria dos sistemas resinosos, essa camada superficial inibida pelo oxigênio não é superior a poucos micrometros abaixo da superfície. Assim, ela é facilmente removida com uma bolinha de algodão, por exemplo, quando uma fissura é selada. No entanto, existem alguns sistemas resinosos em que a inibição do oxigênio é considerável e é necessário usar um gel especial para evitar o contato com o oxigênio no ar.

Inibição do Oxigênio Onde existe uma interface do

Profundidade de Polimerização Limitada Outra

ar com a resina, a resina não será polimerizada e uma

razão pela qual os compósitos ALV substituíram os sis-

a luz azul em alta intensidade pode causar dano ocular. O uso de luz de alta intensidade por si só pode causar danos na retina, e existe potencial também para dano à retina devido ao uso de “luz azul danosa”. Pouco se sabe sobre o perigo da luz azul e quão sério um problema destes pode ser. Esses potenciais problemas são prontamente resolvidos pelo uso de proteção ocular e é melhor errar para o lado da cautela nesse assunto.

Percepção da Cor Outra dificuldade que um bom

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

seletividade é necessária para assegurar ótimo grau de polimerização e ótima profundidade de polimerização. Para todos os compósitos ativados por luz, a conversão de uma pasta para um material sólido depende da capacidade de a luz acessar e iniciar a polimerização em todas as partes da restauração. O grau que a luz pode penetrar o compósito é limitado, de modo que a profundidade que o material pode ser polimerizado pode ser limitada. Vários fatores afetam a profundidade de polimerização: ■

O tipo de compósito. Quando a luz atinge o compósito, ela é refletida, dispersada e absorvida como mostrado na Figura 2.2.10, e isso limita a quantidade de penetração que é alcançado. Essa é uma preocupação particular para os compósitos de matiz mais escuro, e especial cuidado deveria ser dado para polimerização em toda a profundidade da restauração, usando uma técnica de incrementos e longos períodos de exposição.

Intensidade da luz

temas UV é que a profundidade de cura que pode ser atingida com a luz UV é consideravelmente menor que aquela obtida com a luz visível. Em particular, existe um risco de polimerização incompleta com os sistemas UV quando usados em restaurações profundas, que poderia ser uma séria desvantagem em aplicações posteriores. Para compósitos polimerizados por luz UV, a profundidade máxima de polimerização é um pouco maior que 2,0 mm, enquanto para compósitos ALV, uma profundidade de polimerização de 3-4 mm é possível com uma boa fonte de luz e boa técnica. Entretanto, a profundidade de polimerização é limitada para ambos os sistemas, e existe com frequência o risco de que as partes mais profundas da restauração não sejam completamente polimerizadas. Isso é um problema especialmente com as cavidades proximais de compósitos em dentes posteriores (Fig. 2.2.8). Todas podem parecer perfeitamente satisfatórias na superfície, mas a base da cavidades do compósito pode não estar completamente polimerizada, particularmente quando bandas de matriz de metal estão sendo usadas. Um alto grau de conversão de ligações duplas C=C nas resinas são altamente desejáveis para se alcançar ótimas propriedades mecânicas e isso está relacionado ao tempo de polimerização e à potência da unidade de fotopolimerização. Qualquer falha na polimerização proporciona uma estrutura fraca para a restauração e pode levar à fratura. Isso é devido à ausência de suporte nas margens cervicais, causadas por rachaduras no material restaurador não polimerizado e o desenvolvimento de lesões de cáries recorrentes. Existem vários pontos que necessitam ser enfatizados. A fonte de luz usada com compósitos ALV é mais precisamente descrita como luz azul ao invés de luz visível de intensidade extremamente elevada. Um típico aparelho de fonte de luz visível de boa qualidade poderia produzir um espectro como demonstrado na Figura 2.2.9. A

99

400

500

600

Comprimento de onda (nm) Figura 2.2.9 Espectro de luz para um fotopolimerizador de luz visível.

Reflexão

Fratura

Absorção e dispersão Cárie secundária

Compósito não polimerizado Reflexão do fundo

Figura 2.2.8 Falta de correta polimerização de um compósito ALV na base de uma caixa proximal.

Figura 2.2.10 Reflexão, dispersão e absorção de luz durante a polimerização do compósito.

100





MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

A qualidade da fonte de luz. A polimerização de resinas em compósitos ALV é mais efetiva se iniciada por uma luz numa faixa de comprimento de 450-500nm. A fonte de luz deveria ser projetada de modo que produzisse uma saída de luz máxima de 460-480nm, onde o máximo do coeficiente de absorção da canforoquinona está localizado (Fig. 2.2.8). Assim, não é suficiente simplesmente ter uma saída de luz elevada, mas esta também deve estar dentro de um comprimento correto. Deterioração da fonte de luz também ocorre, e é importante que a qualidade da saída de luz seja avaliada em intervalos regulares. Uma variedade de medidores de luz baratos está atualmente disponível para esse propósito. O método usado. A ponta do fotopolimerizador deveria ser colocada o mais próximo possível da superfície da restauração, pois a eficiência de polimerização diminui muito quando a ponta é afastada da superfície. De fato, a intensidade da luz numa dada unidade de área da superfície diminui com o inverso do quadrado da distância entre a fonte de luz e a resina, como mostrado na Figura 2.2.11. Todos os esforços deveriam ser feitos para assegurar que a ponta do fotopolimerizador não seja contaminada pelo compósito, uma vez que isso poderia reduzir a eficiência da polimerização quando do uso posterior. O material deveria ser exposto à luz por um período que não seja inferior ao recomendado, de modo que não exista o risco de uma subpolimerização. Para restaurações grandes, a ponta do fotopolimerizador pode não ser grande o suficiente para cobrir completamente a restauração e pode existir uma tendência a movimentar o aparelho sobre a superfície. Isso não deveria ser feito, pois é impossível determinar quanto tempo alguma área da superfície foi exposta. Se esta movimentação for realizada, deve ser seguido compolimerização adicional, um ponto de cada vez. Para superfícies grandes, deveria ser assegurada que os sítios sejam sobrepostos.

Existe uma tendência por parte de alguns fabricantes em recomendar tempos de polimerização tão curtos quanto 20 segundos, uma vez que isso obviamente reduz o tempo necessário para execução de um procedimento em particular. Isso pode ser suficiente para aplicações nas quais apenas uma camada muito fina de compósito tenha sido aplicada, mas será insuficiente quando adotado em restaurações grandes. O tempo de polimerização deveria ser de no mínimo 40-60 segundos. Em situações nas quais o acesso à luz é um problema, tais como cavidades distais de restaurações MOD com compósitos em dentes posteriores, recursos para auxiliar a polimerização, como cunhas condutoras de luz e matrizes transparentes, devem ser consideradas. Polimerização por períodos de tempo excessivamente longos, entretanto, não significa atingir maiores profundidades de polimerização. A profundidade de polimerização para um determinado compósito usado em conjunto com uma determinada fonte de luz atinge um limite, que não pode ser excedido (Fig. 2.2.12). Assim, períodos de polimerização superiores há 60 segundos tendem a ser ineficientes. A interpretação dos valores para profundidade de polimerização que são mencionados na literatura é repleta de dificuldades. Até agora, não existe nenhuma definição recomendada para profundidade de polimerização, e uma vez que é altamente dependente da técnica, comparações de resultados de fontes diferentes são quase impossíveis. A regra geral que deveria ser seguida é que uma profundidade de polimerização superior a 2 mm deveria ser evitada, e a fotopolimerização deveria ser de no mínimo 40 segundos. Se a cavidade a ser preenchida é mais profunda que 2 mm, uma técnica de incrementos deveria ser empregada.

Unidades de Fotopolimerização Além da unidade de fotopolimerização de quartzo halógeno já descrita

5

9A

4

Profundidade de polimerização (mm)

I α 1/d2 4A A Fonte de luz

1mm

2mm

3mm

3 2 1 0

0

20

30

40

50

60

70

80

90

Tempo de polimerização (s) Figura 2.2.11 Relação entre intensidade (I) da luz e a distância (d) entre a fonte de luz e a superfície.

Figura 2.2.12 Profundidade de polimerização em função do tempo de polimerização.

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

existe um número de outras lâmpadas no mercado. Isso inclui lâmpadas de diiodo emissor de luz azul (LED-azul), laser de argônio e arco de plasma (xenônio). O fotopolimerizador LED-azul tem a vantagem de emitir apenas luz dentro de uma faixa muito estreita de comprimento de onda em torno de 460–480nm. Ele é, portanto, muito eficiente em termos de energia e pode ser operado com uma pequena bateria recarregável, tornando-o muito móvel. Entretanto, a largura da faixa de luz pode ser tão estreita que, para alguns compósitos que usam um método de polimerização com luz visível não incorporando canforoquinona, sua condição de ótima fotopolimerização esteja fora dessa faixa. Esse poderia ser então o caso do compósito não polimerizar, ou pior, será apenas parcialmente polimerizado, dando a impressão de que está polimerizado. O laser de argônio tem a vantagem de proporcionar uma fonte de luz de intensidade muito elevada, que pode ser mais bem-explorada para o início da polimerização. O laser de argônio produz um maior grau e profundidade de polimerização num menor tempo comparado com os fotopolimerizadores com luz halógena. Isso pode ser muito atrativo num primeiro momento, uma vez que significa redução do tempo de polimerização pela redução dos períodos de exposição e do número de porções usadas na restauração. Entretanto, a polimeriza-

101

ção rápida pode comprometer a integridade da interface resina-dente, pois não permite nenhum relaxamento de tensões durante o processo de polimerização. É possível que o uso do laser em pulsos ao invés de continuamente possa reduzir esse problema. Uma desvantagem séria desse sistema de fotopolimerização é o custo, sendo em ordem de magnitude mais caro que os fotopolimerizadores de luz halógena e LED-azul. As unidades de polimerização de arco de plasma podem proporcionar uma intensidade de luz muito próxima a obtida com o laser de argônio, mas tem um custo menor. Entretanto, assim como o laser de argônio, a conversão rápida da resina pode produzir elevada tensão de contração e a faixa de luz estreita pode significar que alguns compósitos não serão polimerizados.

Contração de Polimerização Como já notado, uma séria desvantagem dos compósitos conhecida há muito tempo é a contração de polimerização. De certo modo, todo o campo da odontologia restauradora adesiva cresceu com essa limitação dos compósitos, pois invariavelmente poderia existir uma fenda marginal com a contração do compósito na cavidade (Fig. 2.2.13). Os compósitos não possuem nenhum mecanismo de defesa intrínseco contra o ataque cariogênico, diferente dos cimentos de ionômero de vidro

Figura 2.2.13 Imagem de microscopia eletrônica de varredura de uma fenda marginal formada devido à contração de polimerização do compósito.

102

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

(CIVs) e dos amálgamas. Dessa forma, quando uma fenda está formada, ocorrerá microinfiltração, que pode rapidamente levar à recorrência de cárie. Deveria ser notado que enquanto o desenvolvimento das unidades de fotopolimerização tem focado na maximização do grau de conversão do monômero, isso também maximiza a quantidade de contração de polimerização. A contração de polimerização do compósito é dependente do tipo de resina empregado e da quantidade de resina presente na sua forma não polimerizada. Muitos compósitos de uso odontológico utilizam resina com valores de contração de polimerização comparáveis. Em geral, uma maior proporção de carga de vidro resulta numa menor contração final. Alguns compósitos com elevado teor de carga de vidro não terão necessariamente menores valores de contração que as resinas microparticuladas, uma vez que as últimas usam partículas pré-poli-

merizadas as quais podem torná-las com uma quantidade final de carga tão grande quanto o dos sistemas de partícula de vidro. O ideal é que a contração de polimerização deveria ser tão menor quanto possível, uma vez que isso aumenta a adaptação marginal, reduz a possibilidade de rompimento da união aos tecidos dentários e inibe o desenvolvimento de cáries recorrentes. Os amálgamas tradicionais minimizam esse problema porque mostram uma pequena expansão e, no devido curso, a fenda é preenchida com produtos da corrosão. Para os amálgamas com alto conteúdo de cobre, a contração é na ordem de 0,1% vol. comparado a 2%-3% vol. para um compósito. Típicos valores de contração de polimerização são mostrados na Figura 2.2.14. Entretanto, um pouco de cuidado é necessário quando da avaliação de tais dados, uma vez que é difícil encontrar um método confiável de quantificar a contração de polimerização e, como a Figura 2.2.15 mostra,

3,5

Volume (%)

3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0

Admira

Surefil

Tetric Ceram

Charisma F

Z100

Solitaire

Figura 2.2.14 Comparação da contração de polimerização volumétrica de várias marcas comerciais de compósitos. Os dados foram obtidos da literatura técnica fornecida por Voco GmbH, Cuxhaven, Alemanha.

3,5

Volume (%)

3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0

Esthet X

Surefil

Tetric Ceram

Charisma F

Z100

Solitaire

Figura 2.2.15 Comparação da contração de polimerização volumétrica de várias marcas comerciais de compósitos. Os dados foram obtidos da literatura técnica fornecida pela Dentsply Detrey GmbH, Konstanz, Alemanha.

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

um fabricante diferente tenderá a classificar os compósitos de maneira diferente. Todavia, é nítido que com a tecnologia das resinas atuais, o menor limite de contração de polimerização está em torno de 2,0% vol. Apesar das maiores vantagens dos materiais odontológicos adesivos (Cap. 2.5), a contração de polimerização tem sido indicada como uma fonte primária de falha na interface de união, resultando em linhas brancas visíveis ou fendas invisíveis na margem entre esmalte e resina. Essas últimas são apenas visíveis clinicamente quando se usa transiluminação ou lentes de aumento. Durante o processo de polimerização, tensões de contração se desenvolvem porque o material está restrito pela adesão às paredes da cavidade. Essas tensões podem ser suficientes para causar falha na interface de união, e desta maneira a vantagem do procedimento adesivo é perdida. Isso ocorre em especial na união à dentina, que é menos resistente do que aquela alcançada pelo esmalte submetido ao condicionamento ácido e, como consequência, a contração tende a ocorrer em direção à interface de união ao esmalte condicionado com ácido se a união à dentina for interrompida (Fig. 2.2.16). A fenda que se forma entre a restauração e a dentina provocará sensibilidade pós-operatória, devido ao efeito hidrodinâmico. Se alguma das margens estiver em dentina, a falha de união ocasionará também infiltração marginal. Isso é especialmente um problema quando compósitos são colocados subgengivalmente em cavidades proximais.

Várias opções têm sido propostas para superar esses problemas, as quais incluem uso de compostos quimicamente polimerizados na base das cavidades, pois se acredita que a contração tende a ocorrer em direção às paredes da cavidade. O uso da técnica de inserção em incrementos, combinada com polimerização através do dente, é outra estratégia que se acredita estimular a contração de polimerização em direção às paredes da cavidade ao invés de contra elas (Fig. 2.2.17). Outro problema potencial é que a contração causará a aproximação das cúspides do dente para o centro, de modo que as tornam altamente tensionadas. Esse efeito tem sido sugerido como uma das razões para a sensibilidade pulpar após a colocação de compósitos em dentes posteriores. Esse efeito pode ser exacerbado se for usada uma tira de matriz firme e rígida, durante a realização da restauração em resina em dente posterior. É óbvio que a eliminação ou pelo menos uma redução significante da contração de polimerização da matriz resinosa poderia representar um dos maiores avanços no futuro. As etapas para evitar ou minimizar as consequências da contração de polimerização são de longe os principais aspectos do consumo de tempo durante o procedimento para a realização de restaurações em compósito e realmente não resolve o problema de forma satisfatória. Possíveis formas de se melhorar a integridade marginal das restaurações em compósito incluem: ■

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A recomendação para o uso dos compósitos é que esses devem ser usados apenas quando todas as margens estão em esmalte.

103



o desenvolvimento de melhores agentes de união à dentina e procedimentos de adesão para melhorar a resistência as tensões geradas pela contração de polimerização; o uso de um material de forramento de baixo módulo para agir absorvendo tensões; e

Autopolimerizado Fonte de luz

Esmalte

Adesão ao esmalte condicionado por ácido

Fotopolimerização de toda a resina em uma única porção Fotopolimerização por incrementos

Dentina Fenda devido a contração de polimerização Figura 2.2.16 Formação de fenda como consequência da contração de polimerização.

Figura 2.2.17 Várias opções propostas para o preenchimento da caixa proximal e minimização dos efeitos da contração de polimerização. A direção da tensão de contração de polimerização é indicada pelas setas.

104



MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

redução da velocidade de reação pelo uso das chamadas unidades de fotopolimerização ‘início lento’.

Desenvolvimento de agentes de união à dentina continua, mas existe um limite em relação a quanto a resistência de união pode compensar as tensões geradas pela contração de polimerização e é possível que esse limite já tenha sido alcançado. A ideia de usar materiais de forramento de baixo módulo de elasticidade carrega com ela o problema de que as tensões geradas pelas cargas oclusais não podem ser facilmente transferidos pela interface entre dente e restauração, e podem causar elevadas tensões em qualquer parte da estrutura dental. A terceira estratégia está baseada na ideia de que a redução da velocidade de reação poderia permitir maior tempo para as tensões geradas pela contração de polimerização ser dissipadas por um processo de escoamento pela superfície livre e relaxamento de tensões. Isso tem levado à introdução de unidades de polimerização com luz azul de início lento, usando perfis de fotopolimerização em rampa, em passos e oscilatório (Fig. 2.2.18). A efetividade clínica de todas essas estratégias é assunto de considerável discussão nas pesquisas da literatura odontológica. Desde que a incorporação de carga de vidro como meio de redução da contração de polimerização provavelmente tenha ido tão longe quanto se possa ir (ver a seguir), a solução será provavelmente encontrada no desenvolvimento de novas resinas, que mostrem pouca ou nenhuma contração de polimerização. Uma variedade de diferentes sistemas resinosos está sendo explorada atualmente, mas nenhum foi desenvolvido ainda como um produto comercial. Esses incluem monômeros do cristal líquido e resinas que abrem anéis, como: oxiranos, espiroorto-ésteres, espiroorto-carbonetos e siloranos, que estão além do escopo deste livro.

Nova Tecnologia de Carga Crítica aos primeiros compósitos era que eles tinham uma superfície final rugosa e uma resistência ao desgaste

Intensidade da luz

Instantânea

Em rampa Oscilatório Em passos

Tempo

Figura 2.2.18 Padrões de intensidade da luz de unidades de fotopolimerização de início lento.

insuficiente. Ambas são diretamente afetadas pela escolha da carga usada no compósito. Os fatores de interesse na seleção da carga são: ■ ■

composição; e tamanho da partícula.

Composição A carga mais usada até recentemente era o quartzo, mas hoje muitos dos compósitos empregam uma ou outra de uma variedade de cargas de vidro à base de sílica, incluindo a sílica coloidal, a sílica de vidro alumínio-lítio e vidros de sílica contendo bário ou estrôncio. A formulação do vidro é fundamental porque ele tem um efeito deletério na coloração do compósito. Seu índice de refração deve ser muito próximo daquele da resina para evitar excessiva ocorrência de dispersão da luz incidente, que poderia resultar em pobre estética e baixa profundidade de polimerização. A inclusão do bário e do estrôncio proporcionou versões radiopacas dos compósitos, e isso facilitou a identificação de lesões de cárie recorrentes. Quartzo é de longe o material de maior dureza usado como carga, mas compósitos formados dessa maneira não são radiopacos. Os vidros de sílica são consideravelmente os de menor dureza, que alguns argumentam melhorar o acabamento da superfície do compósito.

Tamanho Médio das Partículas e Distribuição O tamanho médio da partícula e a distribuição do tamanho das partículas de uma carga são importantes, uma vez que determinam a quantidade de carga que pode ser adicionada à resina, sem as características de manipulação necessárias serem perdidas. O tamanho da partícula também tem um efeito acentuado no acabamento final da superfície da restauração em compósito, de modo que quanto menor for o tamanho da partícula de carga, mais lisa será a superfície. (Deveria ser dito que a dureza da carga, em relação à matriz, é outro fator que deveria ser considerado quando da avaliação da qualidade de acabamento.) A carga primeiramente utilizada nos compósitos foi o quartzo, que tinha um tamanho médio de partícula de até 70 µm. Mudança para vidros mais macios permitiu uma redução no tamanho das partículas, e pela escolha de uma combinação adequada de tamanhos; tem sido possível aumentar consideravelmente o conteúdo de carga das resinas. Um conteúdo de carga tão elevado quanto 74% por volume tem sido exigido por alguns compósitos posteriores, que está bem acima do volume usual de 55%-60% de volume obtido para muitos compósitos anteriores. Obviamente, um elevado conteúdo de carga pode não ser desejável aos compósitos anteriores, já que a qualidade estética poderia ser comprometida; isto claramente não tem a mesma importância para os compósitos posteriores.

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

CLASSIFICAÇÃO DOS COMPÓSITOS É possível categorizar os compósitos de uso odontológico em cinco grupos principais de acordo com a natureza e o tamanho da partícula de carga.

Compósitos Tradicionais Compósitos tradicionais contêm partículas de vidro com uma média de tamanho de partícula de 10-20 µm, e partículas de tamanho maior de 40 µm. Esses compósitos têm a desvantagem de ter uma superfície de acabamento muito ruim, com a superfície tendo uma aparência rugosa, devido às partículas de carga estarem proeminentes na superfície já que a resina foi preferencialmente removida ao redor das mesmas, como mostra a Figura 2.2.19.

Resinas Microparticuladas As primeiras resinas microparticuladas foram introduzidas no final dos anos 1970, e contêm sílica coloidal com uma média de tamanho de partículas de 0,02 µm e uma variação de 0,01–0,05 µm. O pequeno tamanho médio das partículas de carga significa que o compósito pode ser polido, obtendo uma superfície de acabamento muito lisa. O tamanho muito pequeno das partículas de carga indica que ela possui uma área de superfície de carga bastante grande em contato com a resina. Essa elevada área de superfície (comparada com as cargas usadas nos compósitos tradicionais) determina que é muito difícil obter um elevado conteúdo de carga, uma vez que uma grande quantidade de resina é necessária para umedecer as superfícies dessas partículas de carga. Se a carga é adicionada diretamente à resina e uma consistência razoavelmente fluida é mantida, então o conteúdo máximo de carga que pode ser atingido é apenas cerca de 20% vol. (Fig. 2.2.20).

105

Para assegurar um adequado conteúdo de carga, um procedimento de duas etapas para incorporação da carga tem sido desenvolvido. Um material com conteúdo de carga muito elevado é primeiro produzido por uma dentre várias técnicas. Esse material é então polimerizado e desgastado em partículas de 10-40 µm em tamanho, que é depois usado como carga para mais resina. Assim, o que é finalmente obtido é um compósito contendo partículas de carga de compósito (Fig. 2.2.21). Embora o conteúdo de carga de partículas pré-polimerizadas possa ser tão alto quanto o dos compósitos de partículas grandes, o conteúdo total de vidro é ainda consideravelmente menor (quase 50% vol.).

Compósitos Híbridos ou Mistos Compósitos híbridos contêm partículas de carga grande de um tamanho médio de 15–20 µm. Além disso, também

Figura 2.2.20 Um compósito microparticulado homogêneo.

Superfície

Partículas de carga

Matriz resinosa

Figura 2.2.19 Partículas de carga protuberantes na superfície devido à remoção preferencial da matriz resinosa.

Matriz resinosa levemente carregada

Matriz resinosa altamente carregada

Figura 2.2.21 Uma resina microparticulada homogênea, usando partículas pré-polimerizadas que foram adicionadas à resina contendo uma pequena quantidade de sílica coloidal.

106

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

possuem uma quantidade de sílica coloidal, que tem um tamanho de partícula de 0,01–0,05 µm (Fig. 2.2.22). Deve ser observado atualmente que todos os compósitos contêm pequenas quantidades de sílica coloidal, mas seu comportamento é muito determinado pelo tamanho das partículas de carga grande.

Compósitos Híbridos de Partículas Pequenas Métodos melhorados têm permitido a trituração do vidro em partículas de tamanhos menores do que era previamente possível. Isso levou à introdução de compósitos com partículas de carga com um tamanho médio de partículas menor que 1 µm, e uma variação típica de tamanhos de partículas de 0,1–6,0 µm, em geral combinadas com sílica coloidal (Fig. 2.2.23). As partículas de carga de tamanhos menores permitem que esses compósitos sejam polidos até uma superfície de acabamento

mais lisa que aquela obtida com materiais de partículas maiores. Esses compósitos podem alcançar uma superfície de acabamento altamente polida porque qualquer irregularidade aparente da superfície das partículas de carga deve ser muito menor que as partículas de carga e, portanto, estarão abaixo da resolução do comprimento de onda da luz (0,38–0,78 µm). A classificação proposta está demonstrada esquematicamente na Figura 2.2.24 em termos de distribuições do tamanho das partículas. Com o objetivo de aumentar o conteúdo de carga para o seu máximo, é possível selecionar cargas com duas ou mais distribuições de tamanho de partículas complementares. A carga com tamanho de partícula menor se distribui nos espaços deixados pelas partículas de carga maiores (Fig. 2.2.25). Isso tem indicado que a densidade de organização dos materiais restauradores resinosos foi aumentada, enquanto o tamanho da carga foi reduzido. Para assegurar que a estética não foi comprometida, compósitos podem ser usados tanto em dentes anteriores quanto posteriores.

Tradicional

0,01

Matriz resinosa levemente carregada

Partículas de carga de vidro

Figura 2.2.22 Estrutura de um compósito híbrido, contendo partículas grandes de carga numa matriz resinosa contendo sílica coloidal.

0,1

1,0

10

100

0,1

1,0

10

100

0,1

1,0

10

100

0,1

1,0

10

100

Tamanho da partícula (µm)

Híbrido/Misto

0,01

Tamanho da partícula (µm)

Microparticulado

0,01

Tamanho da partícula (µm) Partículas pequenas

0,01

Matriz resinosa levemente carregada

Tamanho da partícula (µm)

Partículas de carga de vidro

Figura 2.2.23 Um compósito de partículas pequenas.

Figura 2.2.24 Classificação dos compósitos com base no tipo de carga, com o eixo horizontal numa escala logarítmica do tamanho das partículas.

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

PROPRIEDADES Características de Trabalho Apesar da introdução da ALV, a realização de resinas compostas é exigente e sensível à técnica. Compósitos resinosos não tem intrinsecamente adesão ao esmalte e à dentina, portanto, o condicionamento ácido com ácido fosfórico e aplicação de um adesivo dentinário são necessários. Quando combinado com a necessidade de colocação de incrementos e atenção cuidadosa aos procedimentos de fotopolimerização, isso significa que a realização de restaurações com resina composta pode demorar três vezes mais que a execução de uma restauração em amálgama de tamanho semelhante. A própria realização da restauração com compósito e os cuidados de manutenção de higiene oral pelo paciente tem em geral maior importância, porque lesões de cárie recorrente podem ocorrer e seu progresso tende a ser mais rápido que com outros materiais restauradores. Existem vários desenvolvimentos relativos à reologia das resinas compostas. O ideal é que a viscosidade de um compósito deveria ser tal que pudesse ser condensado dentro de cavidades grandes e ao mesmo tempo ser capaz de escoar em locais inacessíveis. O material não deveria escoar sob seu próprio peso de modo que pudesse ser esculpido, mas deveria escoar prontamente quando pressionado. Comparado aos amálgamas dentários, os compósitos podem ter uma tendência a se aderir aos instrumentos e isso poderia criar problemas para se alcançar uma boa adaptação marginal. Numa tentativa de melhorar a adaptação marginal das restaurações com compósitos, os chamados compósitos “de baixa viscosidade” foram introduzidos no final da década de 1990. Ao mesmo tempo, compósitos compactáveis apareceram no mercado, os quais buscavam ter características de trabalho similares às do amálgama por terem elevada viscosidade.

Matriz resinosa levemente carregada

Partículas de carga de vidro

Figura 2.2.25 Distribuição do tamanho da partícula bimodal.

107

Com o objetivo de produzir os compósitos de baixa viscosidade, fabricantes reduziram o conteúdo de carga e, como se não tivesse reduzido o bastante, o tamanho das partículas de carga de vidro foi também aumentado. Compósitos de baixa viscosidade podem ser difíceis de ser controlados, devido à sua baixa viscosidade. Assim, esses materiais são usualmente adequados para preparos pequenos, tais como: os preparos feitos por abrasão a ar; reparos de margens e; restaurações preventivas com resina. Com o reduzido conteúdo de carga e partículas de tamanhos maiores, esses materiais não são recomendados para situações que envolvem elevados níveis de tensão ou desgaste. A produção de compósitos compactáveis pode ser alcançada por um pequeno aumento do conteúdo de carga para 1–2% vol. e mudanças na reologia da matriz resinosa. Isso pode não ser tão fácil como parece, pois o conteúdo de carga da maioria dos compósitos já havia sido maximizada e simplesmente adicionar mais carga faria o compósito friável e causaria fraturas. A viscosidade aumentada pode ser executada de maneiras diferentes: ■







pelo aumento da variação do tamanho das partículas de carga, que melhora a densidade de compactação, tal como uma distribuição de partículas trimodais; pela modificação da forma das partículas de carga de modo que elas tivessem a tendência de se unir, tornando mais difícil o escoamento umas sobre as outras; pela modificação da matriz de resina de modo que fortes atrações intermoleculares sejam criadas (p. ex., substituição dos grupos hidroxil no Bis-GMA com hidrogênio para ligações de hidrogênio) e assim aumentando a viscosidade; pela adição de dispersantes (aditivo de controle reológico), que diminui a viscosidade e permite um aumento no conteúdo de carga.

Há um preço a se pagar pelo aumento do conteúdo de carga. Esses materiais tendem a ser mais opacos e ter uma superfície de acabamento inferior e, apesar do aumento do conteúdo de carga, as propriedades mecânicas não parecem ser diferentes daquelas dos compósitos universais, tais como as dos compósitos híbridos de partículas pequenas. Uma vez que a estética está comprometida, os fabricantes fornecem apenas uma quantidade limitada de cores. Esses materiais têm, portanto, uma escala limitada de aplicações e são mais adequados para região posterior, tais como preparos classe II de tamanho pequeno a moderado. Devido à sua elevada viscosidade, a adaptação pode ser um problema e existe um potencial aumentado para incorporação de ar, resultando em vazios nas margens ou dentro da restauração. Por esta razão, foi sugerido primeiro colocar uma fina camada de compósito de baixa viscosidade na base da caixa interproximal antes de o compósito compactável ser colocado.

108

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Deveria ser observado que ambos os compósitos de baixa viscosidade e compactável foram desenvolvidos como uma resposta dos fabricantes às exigências feitas pelos dentistas para produzir compostos com propriedades de trabalho especiais. Dessa forma, esses compósitos não representam um grande avanço no contexto de suas propriedades físicas e mecânicas. De fato, os compósitos de baixa viscosidade têm propriedades mecânicas inferiores e os compósitos compactáveis têm estética inferior, comparados a compósitos universais.

Biocompatibilidade Compósitos resinosos são estruturas complexas e vários componentes e produtos de degradação são liberados desses materiais. Estes incluem resina não polimerizada, aditivos, tais como: estabilizadores de UV; plastificadores e; iniciadores. Perdas de peso de até 2% têm sido relatadas, embora isso seja altamente variável uma vez que depende muito do grau de polimerização que foi alcançado. Alguns dos materiais dissolvidos dos compósitos têm demonstrado ser citotóxico e hipersensibilidade tardia associada as resinas compostas pode ocorrer. Entretanto, isso não deveria ser interpretado como sendo uma indicação desses materiais apresentarem um risco inaceitável à saúde do paciente, pois as quantidades liberadas são muito pequenas e as reações de hipersensibilidade associadas às resinas compostas são raras. Alguma preocupação tem sido expressada quanto ao uso do bisfenol-A e monômeros baseados no bisfenol-A em materiais restauradores resinosos, pois esses materiais mostraram a capacidade de induzir mudanças em células e órgãos sensíveis ao estrogênio. Entretanto, estudos de liberação destes componentes tendem a mostrar que os monômeros de baixo peso molecular, como MMA e TEGDMA são os mais liberadores ao invés dos monômeros de elevado peso molecular, como Bis-GMA e UDMA. Assim, isso se torna um assunto semelhante ao associado aos amálgamas, ou seja, se baixas doses desses componentes liberados com atividade estrogênica das resinas

compostas apresentam ou não um risco inaceitável ao paciente. Até o momento, acredita-se que a segurança das resinas compostas não deveria ser preocupação para o público geral.

Absorção de Água e Solubilidade A absorção de água deveria ser baixa para os compósitos, uma vez que excessiva absorção de água tem um efeito prejudicial na estabilidade de cor e na resistência ao desgaste. Se o compósito pode absorver água, então ele também é capaz de absorver outros fluidos da cavidade oral, que resulta na sua descoloração. Absorção de água ocorre principalmente como uma absorção direta pela resina. A carga de vidro não absorve água no interior da massa do material, mas pode adsorver água sobre sua superfície. Assim, a quantidade de sorção de água é dependente do conteúdo de resina do compósito e da qualidade de união entre a resina e a carga. Desta forma, poderia fazer mais sentido relacionar o valor da absorção de água ao conteúdo de resina do compósito. Isso poderia mostrar ou não se a quantidade de água absorvida é aquela prevista para as características de absorção de água conhecidas da resina apenas ou se é muito elevada. Dados apresentados na Tabela 2.2.3 indicam que quando o conteúdo de carga de um material restaurador é considerado, diferenças marcantes entre valores de absorção de água para uma variedade de compósitos se tornam aparentes. A absorção de água intrínseca para a resina parece ser em torno de 40–45 µg.mm–3, mas para dois compósitos na tabela, a absorção de água é de duas a três vezes aquela esperada. A questão é ‘Para onde vai essa água extra?’. Um valor de absorção de água elevado para um compósito (quando corrigida para quantidade de carga presente) pode indicar uma série de possibilidades. É possível que o material tenha uma fração solúvel elevada, que se dissolve e deixa espaço no qual a água pode fluir (isso é possível devido à incompleta polimerização da

Tabela 2.2.3 Equilíbrio de transporte de água de vários compósitos, adaptado dos dados de Oysaed e Ruyter (1986) Material (fabricante)

No material (mg.mm–3)

Na resina1 (mg.mm–3)

Occlusin (ICI Dental)

12,9

41,6

31

P-10 (3M Dental)

16,0

44,4

36

Profile (SS White)

16,3

37,0

44

Ful-Fil (LD Caulk)

20,3

63,4

32

Heliomolar (Vivadent)

20,6

43,6

47

Estilux (Kulzer)

23,1

82,4

28

P-30 (3M Dental)

36,9

119,0

31

Volume de resina (%)

O transporte de água pela resina foi baseado assumindo-se que o vidro não absorve água e foi calculado usando o volume % de resina mostrado na última coluna. 1

Adaptado dos dados de Oysaed e Ruyter (1986).

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

resina). Além disso, a resina pode conter bolhas de ar introduzidas durante a mistura ou inserção. Outra possibilidade é que a quebra hidrolítica da união entre a carga e a resina tenha ocorrido, permitindo adsorção sobre a superfície das partículas de carga. Isso tem duas consequências importantes. Primeiro, como a união entre as partículas de carga e a resina é perdida, a carga perderá sua efetividade como um agente de reforço, resultando numa rápida deterioração da restauração. Segundo, as partículas de carga perdem a sua coesão, resultando numa elevada taxa de desgaste. Assim, uma combinação preocupante de características para um compósito seria um elevado conteúdo de carga combinado com um elevado valor de absorção de água. É frequentemente sugerido que a absorção de água pode ser, em alguma extensão, compensada pela contração de polimerização, mas a absorção de água é um processo gradual que leva muitos meses para ser completada. Isso pode prontamente ser evidenciado com o conhecimento do coeficiente de difusão, D, para água num compósito, que é tipicamente na ordem de 1,25 × 10–9 cm2.s–1. Para uma amostra de 2 mm de espessura, o material poderia exigir 166 dias para alcançar o equilíbrio, e se a amostra possui 5 mm de espessura, o tempo para se atingir o equilíbrio é de mais três anos. Então, a sorção de água não pode evitar a perda de união na interface, pois não pode agir contra a contração instantânea que ocorre durante a polimerização. No curso devido, um pequeno aumento de volume da restauração pode melhorar a adaptação marginal da restauração, mas as chances são que até lá seja muito tarde. É importante compreender que se as características de sorção de água serão avaliadas, é necessário que as amostras sejam muito finas para ter a capacidade de se atingir equilíbrio de sorção de água num período de tempo realístico. Para comparações dos dados de absorção de água, também deveria ser considerado o conteúdo de carga de vidro.

Coeficiente de Expansão Térmica Para minimizar a possibilidade de tensões desenvolvidas devido a diferenças de expansão e contração, o coefi-

109

ciente de expansão térmica de um compósito necessita ser o mais próximo possível daquele dos tecidos dentários. As cargas de vidro têm baixo coeficiente de expansão térmica, enquanto a resina tem elevado coeficiente de expansão, de modo que quanto maior o conteúdo de carga inorgânica, menor será o coeficiente de expansão térmica. Uma vez que as resinas microparticuladas têm elevado conteúdo de resina, com resina presente tanto na matriz quanto nas partículas de carga pré-polimerizadas, elas tendem a ter um elevado coeficiente de expansão, comparado ao dos compósitos com carga de vidro. Exemplos de coeficientes de expansão térmica de alguns compósitos disponíveis comercialmente são apresentados na Tabela 2.2.4, que também mostra os fatores de expansão diferencial quando comparados ao esmalte.

Radiopacidade Quando os compósitos são utilizados como material restaurador de dentes posteriores, sua radiopacidade é de extrema importância. A detecção de lesões de cárie sob um compósito não radiopaco é praticamente impossível, e permitiria a progressão do processo carioso por um longo período. Alguns compósitos têm uma radiopacidade menor que a da dentina, o que é inadequado porque o exame radiográfico não revela a presença das lesões de cárie. Entretanto, não está claro qual é a radiopacidade ideal para um compósito, uma vez que radiopacidade excessiva pode potencialmente mascarar lesões de cárie que ocorrem atrás da restauração. No entanto, alguns compósitos deveriam ser, no mínimo, radiopaco como o esmalte. Alguns compósitos não possuem essa característica e não deveriam ser usados para restaurações de dentes posteriores.

Estabilidade de Cor As qualidades estéticas dos compósitos são bem-conhecidas. Os primeiros compósitos sofriam da descoloração, que pode ser manifestada por si só em uma das três formas: ■ ■ ■

descoloração marginal; descoloração da superfície em geral; descoloração do corpo.

Tabela 2.2.4 O coeficiente de expansão térmica (α) e o fator de expansão diferencial (D) para alguns compósitos comparados ao esmalte a (ppm.°C–1)

D

11,4

1,00

Híbrido

22,5

1,97

Adaptic (J&J)

Tradicional

25,7

2,25

Herculite (kerr)

Híbrido com partículas pequenas

32,6

2,86

Material (fabricante)

Tipo

Esmalte Z-100 (3M)

Silux Plus (3M)

Microparticulado

41,6

3,65

Delton* (J&J)

Sem carga

90,3

7,92

Dados de Versluis A et al. (1996) Dent Mater 12(5): 290-294 (exceto para Delton).

110

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Descoloração marginal é usualmente provocada pela presença de uma fenda marginal entre a restauração e os tecidos dentários. Detritos penetram na fenda e levam à pigmentação marginal indesejável; a eliminação da fenda marginal deveria acabar completamente com este tipo de pigmentação. Se a margem está em esmalte, é possível solucionar esse problema pelo emprego de condicionamento ácido e adesivo para esmalte. O adesivo entre o esmalte condicionado e o compósito é suficientemente forte e durável para se obter um bom selamento marginal, que evita a penetração de detritos. O uso de agente adesivo sem carga é em geral recomendado, uma vez que auxilia na adaptação marginal. Descoloração da superfície em geral pode estar relacionada à rugosidade superficial do compósito e é mais provável de ocorrer com aquelas resinas compostas que empregam partículas de carga grandes. Detritos ficam retidos nos espaços das partículas de carga protuberantes e não são prontamente removidos pela escovação. Polimento com um abrasivo adequado tais como pastas de óxido de alumínio disponíveis comercialmente devem remover essa pigmentação da superfície. É importante que um processo de polimento gradual seja efetuado, tal como instrumentos diamantados de 20 µm, seguidos por uma pasta de 7 µm e finalizando com uma pasta de 1 µm. Isso permitirá uma superfície final lisa opticamente, sem nenhum orifício ou ranhura no caso dos compósitos microparticulados e compósitos híbridos de partículas pequenas. Algumas vezes orifícios escuros descoloridos podem ser observados, que são oriundos da exposição de bolhas de ar após o desgaste do compósito. Tal descoloração não pode ser facilmente removida e pode ser melhor substituir a restauração por um compósito fotopolimerizável, que praticamente não apresentará nenhuma bolha de ar, se executado com cuidado. Descoloração de corpo, ou profunda, é um problema particular com compósitos polimerizados por amina em duas pastas. A cor da restauração muda lentamente por um longo período de tempo, dando uma aparência amarelada distinta à restauração. Esse tipo de descoloração aumenta, devido tanto ao colapso dos componentes químicos dentro da matriz resinosa quanto à absorção de fluidos do ambiente oral. Os compósitos fotopolimerizados parecem ter uma estabilidade de cor muito melhor. Devido à mesma demanda para introdução dos compósitos compactáveis e de baixa viscosidade, os fabricantes introduziram uma variedade de compósitos altamente estéticos. Esses são compósitos com tamanho de partícula máximo não superior a 2 µm e uma média em torno de 0,6 µm, tornando-os altamente passíveis de polimento. A variedade de cores é ampliada e está disponível, tais como de palheta de cores e translucidezes de um artista.

PROPRIEDADES QUÍMICAS Resistência à Compressão Se alguém comparar a resistência à compressão de vários compósitos e amálgamas com aquela do esmalte e da dentina, a indicação será que esses materiais são pouco adequados (Tabela 2.2.5). É interessante notar que compósitos para dentes anteriores podem ter uma resistência à compressão similar aos dos dentes posteriores, ainda que as recomendações para seu uso seja um pouco diferente. É importante conhecer a importância dessa avaliação. Sendo relativamente fácil de mensurar, a resistência à compressão de um material é mencionada com frequência. Infelizmente, é também uma propriedade difícil de ser interpretada, devido aos possíveis modos de falhas sob compressão: ■ ■ ■

materiais dúcteis podem se achatar diagonalmente, muito semelhantes a uma massa densa; materiais friáveis, semelhantes ao vidro e pedra, podem fraturar em todas as direções; amostras longas e finas podem entortar.

Como se pode imaginar, tensões altamente complexas são geradas nos espécimes quando a resistência à compressão é testada. Se nos perguntarmos se restaurações falham em qualquer das formas descritas, então a resposta é que isso parece ser improvável. É muito mais provável que as restaurações falhem sob tensão (devido à aplicação de forças laterais), uma vez que compósitos possuem muito baixa resistência à tração. Assim, a resistência à compressão é mais um fraco indicador de resistência do material a falha, uma vez que não existe uma relação simples entre resistência à compressão e a tração.

Tabela 2.2.5 Dados de resistência à compressão de uma variedade de materiais Material (fabricante)

Resistência à compressão (MPa)

Molar esmalte

260

Molar dentina

305

Sybralloy (Kerr)

500

Dispersalloy (Johnson & Johnson)

440

Adaptic (Johnson & Johnson)

250

Silux (3M Dental Products)

286

Aurafil (Johnson & Johnson)

345

Occlusin (ICI Dental Products)

310

P-30 (3M Dental Products)

393

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

Resistência à Tração Diametral Se os materiais restauradores são mais prováveis de falhar sob forças de tração, então faria mais sentido mensurar sua resistência à tração que à resistência à compressão. Infelizmente, a mensuração da resistência à tração de materiais friáveis é muito difícil, e provoca uma grande divergência dos resultados. A razão para isso é que tais materiais são altamente suscetíveis à presença de falhas internas ou pequenas fendas superficiais, que são impossíveis de eliminar. Como uma consequência, a resistência à tração dos compósitos é dependente da qualidade da superfície final. O teste de tração diametral é um método alternativo para mensurar a resistência à tração de um material. Novamente, padrões complexos de tensões aumentam no material, mas os resultados são relativamente reprodutíveis e é uma propriedade fácil de ser mensurada. Por essas razões, a resistência à tração diametral é com frequência especificada nos materiais odontológicos. É interessante notar que esse teste é frequentemente aplicado em materiais friáveis. Desta forma, se a resistência à tração diametral é citada ao invés da resistência à tração convencional, isso indica que o material é friável e, portanto, sofre de ausência de tenacidade. Valores característicos para resistência à tração diametral para vários compósitos são apresentados na Tabela 2.2.6. Desses resultados, pode-se observar que o compósito anterior tradicional tem uma resistência à tração diametral similar àquela dos compósitos para dentes posteriores atuais. Além disso, experiência clínica tem nos mostrado que os compósitos tradicionais não se comportam bem na região posterior. Assim, como para a resistência à compressão, a resistência à tração diametral isoladamente não nos dá uma indicação direta para o uso em particular de um compósito ou do seu potencial desempenho clínico. Como os compósitos são cada vez mais usados em restaurações de dentes posteriores, a fratura das restaurações provavelmente se tornará uma causa crescente de falhas; pode ser que as propriedades mencionadas proporcionarão um indicador útil de resistência relacionada a tais fraturas.

Dureza A dureza superficial de um material odontológico pode ser mensurada prontamente por várias técnicas, resultando num valor de dureza que pode, então, ser usado para comparar compósitos diferentes. Em um dado momento, pensava-se que a dureza poderia proporcionar um bom indicador da resistência ao desgaste de um compósito e isso é verdadeiro até certo ponto. As resinas acrílicas originais eram materiais muito macios, mas sua dureza e resistência ao desgaste foram bastante melhoradas pela adição das partículas de carga. A mensuração da dureza inicialmente deu-nos alguma

111

indicação da resistência ao desgaste, mas essa relação infelizmente é interrompida com o elevado conteúdo de carga dos compósitos da geração atual (ver a seguir).

Desgaste O desgaste é um processo pelo qual os materiais são deslocados ou removidos pelas forças da interface que são geradas em duas superfícies que entram em atrito. Os tipos de desgaste que ocorre na cavidade oral são os seguintes:

Desgaste por Abrasão Quando duas superfícies entram em atrito, o mais duro dos dois materiais pode perfurar, produzir buracos ou remover material da outra superfície. Esse desgaste por contato direto é conhecido como abrasão a dois corpos, e ocorre na boca em qualquer local onde ocorre contato dente com dente, chamado por muitos dentistas como atrição. O desgaste por abrasão pode ocorrer quando existe um abrasivo interposto entre duas superfícies de modo que as superfícies sólidas não estão realmente em contato. Isso é chamado abrasão a três corpos e ocorre na cavidade oral durante a mastigação, com o alimento agindo como o agente abrasivo. (Dentifrício age como agente abrasivo entre a escova dental e os dentes.)

Desgaste por Fadiga A repetida carga sobre os dentes produz tensões cíclicas que pode, em determinado tempo, levar ao crescimento de falhas por fadiga. Essas falhas com frequência se formam abaixo da superfície, e no início se propagam paralelamente, desviando em direção à superfície ou se unindo a outras trincas.

Desgaste por Corrosão Ataque químico dos compósitos pode ocorrer por hidrólise da resina, ou por quebra da interface carga-resina ou erosão da superfície devido ao ataque ácido. É provável que todos os mecanismos mencionados estejam envolvidos no desgaste dos compósitos. Nas áreas de contato oclusal, os principais mecanismos de desgaste são abrasão a dois corpos e fadiga, enquanto abrasão a três corpos predomina nas áreas de ausência

Tabela 2.2.6 Resistência à tração diametral de algumas resinas compostas restauradora Material (fabricante)

Resistência à tração diametral (MPa)

Adaptic (Johnson & Johnson)

51

Aurafil (Johnson & Johnson)

52

Occlusin (ICI Dental)

54

P-30 (3M Dental Products)

67

112

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

de contato. Desgaste por corrosão pode ocorrer em uma ou outra situação e, quando em combinação com condições de tensão, pode levar à fratura corrosiva por tensão. Esse processo envolve o crescimento lento da falha, que poderá, finalmente, tornar-se grande o bastante para causar fraturas catastróficas. Uma vez que o desgaste é um processo multifacetado, não é possível mensurá-lo com apenas um parâmetro. A fraca correlação entre propriedades mecânicas e desgaste já foi observada e algumas das propriedades físicas por exemplo uma baixa sorção de água pode apenas proporcionar uma indicação do potencial de resistência ao desgaste, particularmente em relação ao desgaste por corrosão. Em geral, um elevado conteúdo de carga, uma superfície final lisa, uma resina hidroliticamente estável e uma forte união entre carga e resina são características desejáveis em compósitos para dentes posteriores. Entretanto, deveria se reconhecer quais desses por si só não garantem que um material será resistente ao desgaste. Uma abordagem alternativa é simulação laboratorial das condições clínicas. Infelizmente, é muito difícil simular todas as condições orais que contribuem para o processo de desgaste. Embora uma grande variedade de métodos in vitro para mensuração da taxa de desgaste tenha sido testada, nenhum conseguiu predizer com alguma medida de certeza a taxa in vivo de desgaste de compósitos posteriores. Um obstáculo maior no desenvolvimento de um teste laboratorial de desgaste confiável é que algum precisa ser capaz de correlacionar os resultados com os dados clínicos de desgaste, que, por si só, é muito difícil de ser obtido e interpretado. Das muitas variáveis que necessita ser considerada, a variação no desgaste de paciente para paciente é uma dificuldade a mais a ser compreendida. Entretanto, tem sido mostrado que existem diferenças marcantes nas taxas de desgaste entre áreas de contato oclusal e áreas sem contato. Assim, qualquer valor definido para uma taxa de desgaste é insignificante se não for suportado com informações sobre os métodos usados nesta determinação. O tamanho da restauração também pode afetar a taxa de desgaste, talvez por haver uma maior probabilidade do contato direto do dente com a restauração quando se tem restaurações amplas. Também deve ser considerado que restaurações grandes tendem a ocorrer mais posteriormente, onde a carga oclusal é maior. Assim, mesmo dados in vivo sobre desgaste são apenas um guia para a capacidade dos compósitos para dentes posteriores para resistir ao desgaste. A situação é também complicada atualmente pela ausência de um método em geral aceito para mensuração do desgaste in vivo e os resultados precisam ser interpretados com bastante cautela. A melhor mensuração da resistência ao desgaste de compósitos para dentes posteriores é seu desempenho clínico e, apesar das grandes melhoras ocorridas ao longo

dos anos, o uso desses compósitos em regiões onde sofrerão contato direto e carga oclusal elevada deve ser evitado. Assim, a oclusão deveria ser checada no início do tratamento e contatos cêntricos e deslizantes evitados ou pelo menos minimizados o máximo possível.

COMPÓSITOS ODONTOLÓGICOS DE USO LABORATORIAL Facetas, Inlays e Onlays de Compósitos A realização clínica de múltiplas restaurações diretas em compósito possui vários problemas. Estes incluem o natural consumo de tempo para a própria realização, dificuldade de assegurar bom contato entre os dentes, os problemas de adaptação marginal causados pela contração de polimerização e o risco de incompleta polimerização da restauração, devido à limitada profundidade de polimerização. Uma forma de superar esses problemas é usar restaurações indiretas em compósito, tais como: inlays, onlays e facetas. Os inlays de compósitos são elaborados no laboratório de prótese pelo protético, com base na moldagem feita pelo dentista. Inlays de compósitos são idealmente adequadas para aquelas situações onde existe a necessidade de se efetuar múltiplas restaurações em dentes posteriores em um único quadrante ou a substituição de cúspides não funcionais. Em todos os demais aspectos as indicações dos inlays de compósitos são idênticos àqueles para restaurações diretas em compósito para dentes posteriores. A vantagem desse tipo de restauração é que muito do trabalho para alcançar bom contorno anatômico e contatos entre os dentes é feito por um técnico no laboratório protético. Outros benefícios são que a profundidade de polimerização é assegurada, uma vez que o processo de polimerização é realizado em laboratório e não in situ. Embora seja sugerido que os problemas associados à contração de polimerização estejam reduzidos, a experiência é outra. Mesmo uma fina camada de cimento resinoso usada para unir a restauração ao tecido dentário pode causar tensões de contração elevada suficiente para causar falha da união adesiva, especialmente da união à dentina. Assim, problemas com a contração de polimerização não são totalmente eliminados. Existe também alguma dúvida quanto à união entre o cimento resinoso e o próprio inlay. O processo laboratorial de polimerização para um inlay de compósito é tão efetivo que há poucos grupos metacrilatos deixado na superfície para reagir com o cimento resinoso (Cap. 3.7). Muitos compósitos resinosos de uso laboratorial usam essencialmente os mesmos componentes que são empregados nas restaurações diretas. Consequentemente, eles sofrem muitas das mesmas limitações dos compósitos diretos, que, portanto, limitam sua ampla utilização. Desta forma, restaurações realizadas em laboratório com

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

compósito deveriam ser usadas apenas naquelas situações onde um compósito direto possa também ser considerado aceitável.

Compósitos Reforçados por Fibras Compósitos resinosos com carga particulada não apresentam resistência e tenacidade suficiente para serem utilizadas para construção de coroas e pontes. Compósito reforçados por fibras (CRF) oferecem enorme potencial para produção de materiais de elevada resistência e rigidez, mas com peso muito pequeno. Durante os anos 1990, vários sistemas resinosos com fibras de reforço tornaram-se disponíveis, tanto para uso em laboratório quanto para o dentista. Eles são disponíveis em diferentes formas, como mostra a Tabela 2.2.7. Fibras unidirecionais permitem a construção de longas pontes, enquanto os padrões em rede e trançados suportam tensões em diferentes direções simultaneamente. As CRFs possuem resistência à flexão e ao impacto significantemente maior, comparados com resinas com carga particulada, contanto que ocorra um bom molhamento da fibra e união da resina e um elevado conteúdo de fibra seja alcançado. A gama de aplicações sugerida para esses materiais são ferulizações; pontes; coroas e; prótese removível. Entretanto, a experiência clínica com esses materiais é muito limitada.

CONSIDERAÇÕES CLÍNICAS PARA O USO DAS RESTAURAÇÕES COM COMPÓSITO As indicações para o uso de restaurações em compósito estão principalmente associadas à sua capacidade de alcançar excelente resultado estético. Esses materiais são, portanto, idealmente adequados para aplicações em dentes

anteriores, tais como restaurações de lesões proximais, lesões de erosão, abrasão e fraturas de bordo incisal. Para a região posterior, a aplicação dos compósitos tende a ser mais limitada devido a potenciais problemas como ausência de selamento marginal quando a margem não está em esmalte, situação comum em caixas proximais profundas. Desgaste e fratura são também problemas quando as restaurações são grandes e são submetidas à elevada carga oclusal, devido ao contato direto com o dente antagonista. Materiais restauradores resinosos deveriam ser idealmente considerados como materiais restauradores primários para lesões de cárie pequenas e iniciais. As restaurações em compósito deveriam em todos os momentos ser consideradas como uma restauração adesiva. As vantagens são diversas, mas, principalmente, a confiança na adesão ao invés da retenção ajuda a conservar a estrutura dental, aumenta a resistência da coroa dental e proporciona uma barreira à infiltração marginal. Portanto, é importante que esses materiais sejam usados apenas em situações onde uma boa qualidade de união adesiva pode ser alcançada; as seguintes contraindicações são sugeridas.

Evitar Restaurações Grandes Esse problema é mais provável de ocorrer quando do uso dos compósitos em dentes posteriores, onde esses materiais são frequentemente considerados como um substituto de restaurações em amálgama deficientes. Uma vez que essas cavidades são em geral muito maiores que aquelas lesões de cárie iniciais, essa condição não é ideal para o uso de compósitos. Para iniciar, o formato da cavidade foi amplamente determinado pelo amálgama para ser substituído e foi efetuado tendo a retenção em mente e não a adesão. Quanto maior a restauração, maior é o problema da contração de polimerização e menor é a chance de se

Tabela 2.2.7 Produtos de compósitos reforçados por fibra Produto

113

Fornecedor

Tipo de fibra

Forma da fibra

Fibre-Kor

Jeneric/Pentron

Vidro

Unidirecional

Splint-It

Jeneric/Pentron

Vidro

Unidirecional

Splint-It

Jeneric/Pentron

Vidro

Trançada

Splint-It

Jeneric/Pentron

Polietileno

Trançada

Stick

Stick Tech

Vidro

Unidirecional

Stick-Net

Stick Tech

Vidro

Rede

Vectris pontic

Ivoclar

Vidro

Unidirecional

Vectris frame and single

Ivoclar

Vidro

Rede

Connect

Kerr

Polietileno

Entrelaçado

Ribbond

Ribbond

Polietileno

Trançado

Produtos pré-impregnados

Produtos não-impregnados

114

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

alcançar um selamento marginal. A contração de polimerização causa a desadaptação da restauração, embora a união ao esmalte submetido a condicionamento ácido seja suficientemente forte para resistir às tensões geradas pela contração, agentes de união à dentina podem não apresentar alta resistência de união suficiente para resistir. Isso pode aumentar a infiltração marginal e a sensibilidade pós-operatória. Mesmo quando quase todas ou todas as margens estão em esmalte (onde um bom selamento e uma boa união são possíveis), insucesso de união à dentina resultará em infiltração de fluido na fenda sob a restauração. Isso pode também aumentar a sensibilidade pós-operatória, devido à movimentação de fluido para dentro e para fora dos túbulos dentinários quando a restauração está sujeita à carga ou às mudanças de temperatura. Outro fator que contribui para ausência de selamento marginal é a diferença do coeficiente de expansão do material restaurador e os tecidos dentários. Esse é um problema de todos os compósitos e, embora seja minimizado pelo elevado conteúdo de carga de vidro de pequena expansão, isto ainda não foi resolvido. Com restaurações maiores, é mais provável que exista contato oclusal entre a restauração e o dente antagonista. Como os compósitos sofrem com taxas de desgaste consideravelmente maiores em áreas de contato que em áreas livres de contato, contato oclusal combinado com elevadas cargas oclusais, como as experimentadas na região posterior, pode aumentar o desgaste para níveis indesejáveis. Assim, apenas cúspides não funcionais deveriam estar envolvidas. Os compósitos são materiais com baixa resistência e friáveis, e não possuem propriedades melhores que às do amálgama em relação a isso. A restauração produz resistência da sua capacidade de se aderir aos tecidos dentários. Se essa união é rompida, o potencial para fratura é muito maior, ainda mais se submetida a forças oclusais elevadas. A segurança e a durabilidade da união adesiva são mais reduzidas se a restauração for aumentada.

Ausência de Esmalte Periférico

Evitar Preparos Profundos Subgengivais

Uma vez que é impossível obter uma união adesiva entre os tecidos dentários e os compósitos quando as superfícies dentárias estão contaminadas por umidade, qualquer situação na qual o controle da umidade não é possível deveria ser evitada e uma estratégia alternativa deveria ser adotada.

Restaurações proximais sejam anteriores ou posteriores podem se estender subgengivalmente de modo que a base das cavidades se estenda para a dentina radicular. Em tais situações, é muito difícil, se não impossível, assegurar a adaptação marginal e obter um perfeito selamento marginal, mesmo com o uso de adesivos dentinários. Microinfiltração e problemas associados a pigmentação, cáries e sensibilidade são, portanto, prováveis de ser um problema. Embora tenha sido sugerido que a base de tais cavidades possa ser primeiro preenchido com um cimento de ionômero de vidro, existe a possibilidade de o cimento se erosionar, deixando a crista marginal da restauração em compósito sem suporte e possivelmente causando fratura.

O compósito resinoso unido ao esmalte condicionado por ácido é muito efetivo de modo que a falha de suas margens é improvável. Quando um dente sofre uma fratura grave, existirá pouco esmalte remanescente para união e a restauração precisa contar mais ainda com a união à dentina remanescente. Como essa união já não é muito confiável, além disso aumenta a possibilidade de insucesso no selamento marginal quando submetida às tensões da contração de polimerização, às mudanças térmicas e à carga oclusal. O ideal é que as resinas compostas fossem usadas apenas quando todas as margens estivessem em esmalte. A única exceção para isso seriam as restaurações de lesões por abrasão/erosão, que não tendem a ser submetidas a condições de altas tensões e têm provado efetividade clínica razoável, embora falhas adesivas ainda sejam um problema.

Substituição de Cúspides de Trabalho ou Onlays Como observado, os compósitos sofrem taxas de desgaste muito maiores quando são submetidos a contato oclusal com o dente antagonista. Nos dentes anteriores, isso não tem mostrado ser um grande problema, mas posteriormente, onde as cargas oclusais são em geral muito maiores, é mais provável ocorrer desgaste excessivo do compósito. Isto se torna mais um problema para a próxima restauração ser colocada. As cargas em excesso experimentadas pela restauração aumentarão a chance de fratura de cúspide especialmente se precedida pela falha da união adesiva.

Controle da Umidade Deficiente

Bruxismo/Mastigação Habitual Ações de desgaste excessivo associadas ao bruxismo causarão desgaste muito rápido de qualquer restauração que esteja em contato oclusal ou em contato com algo como um cachimbo. Assim, mesmo restaurações de bordo incisal, que não sofram elevadas taxas de desgaste normalmente, são contraindicadas a não ser que o hábito do paciente seja eliminado.

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A introdução das resinas compostas como materiais restauradores teve um grande impacto na prática da dentística restauradora. Muitos dos avanços em novas técnicas são baseados nos materiais à base de compósitos. Suas aplicações clínicas são muitas e variadas e continuarão crescendo, conforme melhoras adicionais sejam alcançadas. Entretanto, existem certas limitações para o uso desse grupo de materiais e é importante que estas não sejam desrespeitadas.

115

Tabela 2.2.8 Composição de resinas compostas modificada por poliácido Componente

Função

Vidro de flúor-alumíniosilicato

Carga e fonte de fluoreto

Monômero de dimetacrilato (p. ex., UDMA)

Forma a matriz resinosa

Resina especial

Fornece grupos carboxílicos

Monômeros hidrofílicos

Ajuda a transportar água e fluoreto

Fotoativadores/iniciadores

Permite a polimerização por radical

RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO (COMPÔMEROS) Uma das principais características dos cimentos de ionômero de vidro é a sua capacidade de proporcionar liberação prolongada de fluoreto, que contribui para a proteção dos tecidos dentários adjacentes à restauração do ataque cariogênico. Materiais restauradores como as resinas compostas não possuem essa capacidade de liberar flúor por prolongado período de tempo. A adição de componentes que contenham flúor (F), tais como o fluoreto estanhoso, a resina composta proporcionará uma liberação inicial de flúor ao longo de um período de algumas semanas, que então diminui rapidamente. Essa liberação inicial é elevada, devido à presença de um componente F sendo liberado da superfície da restauração ou de próximo desta. No entanto, muito rapidamente a camada superficial da restauração se esgota de componentes de F e a liberação quase para, uma vez que os componentes de F não podem se difundir através da matriz resinosa numa velocidade suficiente para manter níveis de liberação razoáveis. Resinas compostas modificadas por poliácido, denominadas compômeros, são de fato resinas compostas, que foram modificados de modo a ser capazes de liberar significantes quantidades de fluoreto ao longo de um período longo. Para alcançar isso, parte da tecnologia dos cimentos de ionômero de vidro foi incorporada na resina composta.

Todavia, isso não seria suficiente por si só, uma vez que são necessários meios para o fluoreto ser liberado do vidro. Isso requer íons hidrogênio capazes de atacar e dissolver o vidro de modo similar ao processo que ocorre com os cimentos de ionômero de vidro. A fonte desses íons hidrogênio é promovida por um grupo carboxila especialmente formulado (–COOH), contendo monômero polimerizável, que copolimeriza com um monômero de dimetil metacrilato como o UDMA (Fig. 2.2.26). De maneira alternativa, o copolímero do ácido policarboxílico de metacrilato empregado em alguns CIVs modificados por resinas pode ser usado (Cap. 2.3). O ingrediente final necessário para a liberação de fluoreto é a água. Esta não está presente no material inicialmente, mas é absorvida por ele na cavidade oral. Essa sorção de água permite uma reação ácido-base entre o vidro e os grupos policarboxílicos da resina especial e proporciona o mecanismo para uma liberação lenta,

Monômeros ácidos

Grupos carboxílicos

Composição A composição de um compômero típico é apresentada na Tabela 2.2.8. Avaliação da composição indica que o material é essencialmente um sistema baseado em resina, com um processo de polimerização por radicais sendo ativado por luz azul que age na canforoquinona. Entretanto, existem várias diferenças importantes ao serem comparadas com as resinas compostas. Uma das diferenças é o vidro, que é similar à composição de vidro contendo fluoreto usado nos cimentos de ionômero de vidro. Esse vidro de flúor-alumínio-silicato é então suscetível ao ataque ácido e proporciona a fonte de íons flúor.

Monômeros de UDMA Polimerização

Figura 2.2.26 Copolimerização de um monômero ácido contendo grupos carboxil e monômero de UDMA num compômero.

116

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

porém contínua de fluoreto, que não era possível anteriormente com as resinas compostas. Para ajudar a difusão de água no material através da matriz, e simultaneamente ajudar a difusão dos íons flúor da matriz, algumas matrizes resinosas utilizadas possuem mais características hidrofílicas que aquelas normalmente usadas em resinas compostas (p. ex., glicerol dimetacrilato). Embora os compômeros tenham tanto reação via radical de polimerização e reação ácido-base, é a matriz que conduz o processo de polimerização desses materiais. A contribuição da reação ácido-base é proporcionar a liberação de íons fluoreto por longos períodos.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Deveria se destacar que, embora o compômero possa ser considerado um híbrido pela combinação da resina composta com o cimento de ionômero de vidro, ele é diferente do cimento de ionômero de vidro modificado por resina.

O material inicial para o compômero é uma resina composta, na qual é depois modificado, da mesma forma que para os CIV modificados por resina, o CIV é o material inicial. Sendo assim, temos um espectro de materiais entre os CIVs e as resinas compostas como indicado na Tabela 2.2.9.

Propriedades Liberação de Fluoreto Os compômeros têm mostrado ser capazes de liberar flúor por longo período. Entretanto, os compômeros liberam menos fluoreto que os cimentos de ionômero de vidro e os cimentos de ionômero de vidro modifica-

dos por resina. A liberação de flúor é altamente variável de produto para produto e não se sabe ainda qual é a liberação ótima de flúor necessária para induzir uma condição anticariogênica ao redor das margens da restauração. As condições locais também têm uma influência significante na quantidade de flúor liberada, uma vez que alguns materiais são mais suscetíveis à dissolução que outros num meio ácido. Todos os materiais restauradores que liberam flúor mostram uma quantidade razoavelmente elevada de liberação nas primeiras semanas, mas gradualmente diminui. Não se sabe se reduzidas quantidades de fluoreto após anos de exposição ao meio oral serão adequadas para proporcionar proteção contra o ataque cariogênico. Tem sido mostrado que os cimentos de ionômero de vidro possuem a capacidade de absorver fluoreto da cavidade bucal e liberá-lo posteriormente. Assim, a restauração pode agir como um reservatório de fluoreto que regularmente preenchido quando exposta ao fluoreto tópico. Essa pode ser uma característica importante da capacidade anticariogênica do cimento de ionômero de vidro ao longo do tempo, que não tem sido mostrada ser possível para os compômeros.

Características de Trabalho O que torna um material com boas características de trabalho é uma questão complexa, uma vez que isso envolve inúmeras características, incluindo reologia (p. ex., fluir e tendência ao escoamento), aderência e tempo de trabalho e de presa. No entanto, é de consenso geral entre os dentistas que os compômeros possuem boas características de trabalho e que são fáceis de adaptar às paredes da cavidade sem se aderir ao instrumental, são fáceis de esculpir e não escoar.

Adesão Diferente dos CIVs e dos CIVMRs, os compômeros não possuem afinidade natural pelo esmalte e pela dentina e precisam ser usados em conjunto com um adesivo

Tabela 2.2.9 Espectro de materiais restauradores dentários estéticos Cimentos de ionômero de vidro

Cimentos de ionômero de vidro modificados por resina

Resinas compostas modificadas por poliácido

Resinas compostas

Chemflex1

Vitremer2

Dyract AP1

Surefil1

Ketac-Molar2

Photac-Fil Quick2

F20002

Filtek P602

Ketac-Fil2

Fuji II LC Improved3

Compoglass F4

Tetric4

Freedom

Revolution5

Fuji II

3

6

Fujii X3

Luxat7

Vivaglass Fil

4

Glacier6

Glasiosite

8

Ionofil8 Opusfil9 1 = Dentsply, 2 = 3M/Espe, 3 = GC, 4 = Ivoclar, 5 = Kerr, 6 = SDI, 7 = DMG, 8 = Voco, 9 = Schottlander.

Admira8

RESINAS COMPOSTAS E RESINAS COMPOSTAS MODIFICADAS POR POLIÁCIDO

dentinário. Para simplificar as características de manipulação quando usados com os adesivos dentinários normalmente usados com as resinas compostas, é recomendado que o condicionamento ácido do esmalte e da dentina seja suprimido do procedimento adesivo. Isso resultará numa menor resistência de união e deveria ser considerado apenas quando do uso dos compômeros em locais onde apenas baixas tensões mastigatórias forem aplicadas. No final das contas, essa orientação é confusa para o dentista, pois não é fácil determinar o que constitui uma situação de baixas tensões mastigatórias. Alguns compômeros são providos de propriedades adesivas, que possuem características de primers autocondicionantes discutidos no Capítulo 2.5.

Contração de Polimerização A contração de polimerização é similar àquelas das resinas compostas (ao redor 2%-2,5% vol.) e a sorção de água não é diferente daquela das resinas compostas, estando na ordem de 40 µg.mm–3. Os compômeros diferem das resinas compostas em suas taxas de transporte de água. Como observado neste capítulo, a difusão de água através das resinas compostas é muito lenta e ocorre por muitos anos até se atinja o equilíbrio do conteúdo de água. Para os compômeros, a matriz resinosa hidrofílica proporciona uma via rápida para a sorção de água com equilíbrio de transporte de água possivelmente sendo alcançado em alguns dias, ao invés de semanas, meses ou mesmo anos.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A rápida sorção de água pelos compômeros proporciona compensação da contração de polimerização da matriz resinosa em uma questão de dias e ajuda a reduzir quaisquer fendas marginais que podem ter se formado durante a realização da restauração.

Propriedades Mecânicas As propriedades mecânicas dos compômeros poderiam geralmente parecer um tanto inferior àquelas das resinas compostas, com reduzida resistência à compressão, à tração diametral e à flexão. Isso impede o seu uso em situações de maior tensão mastigatória, como o reparo de bordo incisal fraturado. Sua resistência ao desgaste é melhor que aquela dos cimentos de ionômero de vidro e

117

cimentos de ionômero de vidro modificados por resina. Entretanto, comparados com as resinas compostas, a resistência ao desgaste é reduzida. É possível que isso se deva ao uso de partículas de carga um pouco maiores que as normalmente usadas nas resinas compostas, combinado com uma redução na integridade da interface entre as partículas de vidro e a resina, pela progressiva reação ácido-base nessa interface.

Aplicações Para ter o benefício da liberação do fluoreto pelo compômero; pode parecer que as propriedades mecânicas tiveram de ser comprometidas em algum grau, comparadas às da resina composta. Portanto, os compômeros não possuem a mesma diversidade de aplicações da resina composta; de fato a variedade de aplicações é similar àquelas dos cimentos de ionômero de vidro e dos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina. Uma vez que suas propriedades mecânicas e resistência ao desgaste tendem a ser inferiores àquelas das resinas compostas, mas melhores que aquelas dos cimentos de ionômero de vidro e dos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina, seu uso está limitado a situações de baixa tensão mastigatória, tais como lesões proximais e por abrasão ou erosão, restaurações definitivas em dentes decíduos e restaurações temporárias de longa duração na dentição permanente. Uma vez que suas qualidades estéticas são comparáveis àquelas das resinas compostas, combinada com a liberação de fluoreto e simplicidade dos procedimentos de união, os compômeros são uma alternativa popular aos cimentos de ionômero de vidro e aos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina, mostrando excelentes resultados após 3-4 anos de uso clínico. Como os CIV modificados por resina, existem relatos de expansão higroscópica excessiva associada aos compômeros, presumivelmente devido ao elevado conteúdo de resinas hidrofílicas. Enquanto tal comportamento pode ser benéfico na redução das fendas marginais ao redor de uma restauração classe V, essa expansão pode também levar à fratura de coroas de cerâmica pura.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Versões fluidas de um compômero não são recomendadas para restaurações de cerâmica pura.

118

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

LEITURA COMPLEMENTAR Braga RR, Ferracane JL (2004) Alternatives in polymerization contraction stress management. Crit Rev Oral Biol Med 15: 176 Clelland NL et al (2005) Relative wear of flowable and highly filled composite. J Prosthet Dent 93: 153 Guggenberger R, Weinmann W (2000) Exploring beyond methacrylates. Am J Dent 13: 82D Leinfelder KF (1995) Posterior composite resins. J Amer Dent Assoc 126: 663 Lutz F (1995) The postamalgam age. Oper Dent 20: 218 Manhart J, Chen H, Hamm G, Hickel R (2004) Buonocore Memorial Lecture. Review of the clinical survival of direct and indirect restorations in posterior teeth of the permanent dentition. Oper Dent 29: 481 Opdam NJ et al (2004) Five-year clinical performance of posterior resin composite restorations placed by dental students. J Dent 32: 379 Oysaed H, Ruyter IE (1986) Water sorption and filler characteristics of composites for use in posterior teeth. J Dent Res 65: 1315–1318

Peutzfeldt A (1997) Resin composites in dentistry: the monomer systems. Europ J Oral Sci 105: 97 Roeters J, Shortall AC, Opdam NJ (2005) Can a single composite resin serve all purposes? Br Dent J 199: 73 Rueggeberg F (2002) From vulcanite to vinyl, a history of resins in restorative dentistry. J Prosthet Dent 87: 364 Schmalz G (1998) The biocompatibility of non-amalgam dental filling materials. Eur J Oral Sci 106: 696 Silikas N, Eliades G, Watts DC (2000) Light intensity effects on resin-composite degree of conversion and shrinkage strain. Dent Mater 16: 292 Soderholm KJ, Mariotti A (1999) BIS-GMA-based resins in dentistry: are they safe? J Am Dent Assoc 130: 201 Vallitu PK (1998) The effect of glass fibre reinforcement on the fracture resistance of a provisional fixed partial denture. J Prosthet Dent 79: 125 Van Dijken JWV (1986) A clinical evaluation of anterior conventional, microfiller and hybrid composite resin fillings. Acta Odont Scand 44: 357–367

Capítulo 2.3

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

INTRODUÇÃO Os cimentos de ionômero de vidro (CIVs), também denominados cimentos de polialquenoato de vidro, são materiais restauradores que consistem em um pó e um líquido que, quando misturados, produzem uma massa plástica que subsequentemente toma presa, formando um sólido rígido. Os cimentos de ionômero de vidro foram descritos inicialmente por Wilson e Kent, em 1971, naquela época representavam uma extensão natural dos cimentos de policarboxilato de zinco que estavam disponíveis no final dos anos 1960. Os cimentos de policarboxilato de zinco se desenvolveram dos cimentos de fosfato de zinco, pela substituição engenhosa do ácido fosfórico pelo ácido poliacrílico (Cap. 2.8). Os cimentos de ionômero de vidro foram imediatamente vistos como um substituto potencial dos cimentos de silicato, em uso há mais de 80 anos e que gradualmente foram sendo destituídos pelas resinas compostas. As duas principais características dos cimentos de ionômero de vidro que lhes permitiram tornar-se um dos mais aceitos materiais dentários são a sua capacidade de aderir ao esmalte e à dentina e a sua capacidade de liberar flúor do componente de vidro no cimento. Portanto, os cimentos de ionômero de vidro combinam as qualidades adesivas dos cimentos de policarboxilato de zinco com a liberação de flúor dos cimentos de silicato. A relação entre os diferentes materiais está mostrada na Figura 2.3.1. Os cimentos de ionômero de vidro foram usados principalmente para restauração de lesões de abrasão/erosão e como agente cimentante de coroas e pontes protéticas. Atualmente sua aplicação clínica foi ampliada e inclui a restauração de lesões proximais, restaurações oclusais na dentição decídua, bases e forramentos cavitários e material para núcleo, pela introdução de uma variedade de novas formulações. Uma recente inovação foi a modificação do cimento de ionômero de vidro pela incorporação de resina, que

permitiu ao material tomar presa através da ativação por luz. Esses novos materiais são, não surpreendentemente, conhecidos como cimentos de ionômero de vidro modificados por resina (CIVMRs), embora algumas vezes sejam denominados híbridos de resina e ionômero de vidro. No entanto, a denominação preferida é CIVMRs. Portanto, esse grupo de materiais merece atenção especial.

QUÍMICA DOS CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO Composição O que faz o cimento de ionômero de vidro um material tão interessante comparado com os cimentos de fosfato de zinco é a enorme variedade de composições que pode ser obtida. Os principais componentes de um CIV são o vidro, o poliácido, a água e o ácido tartárico. A composição do vidro pode variar amplamente, dando muitas diferentes propriedades, além disso ainda existem numerosas combinações de poliácidos que são adequadas para a copolimerização. Em contrapartida, para os cimentos de fosfato de zinco, uma vez tendo a composição otimizada em termos da proporção pó:líquido e a concentração de ácido fosfórico, existirá um curto espectro para melhorias. Obviamente, uma variedade tanto pode ser um obstáculo como pode ajudar, e isto se refletiu no desenvolvimento do cimento de ionômero de vidro, que surgiu no início dos anos 1970. Não se pode alegar que os cimentos de ionômero de vidro tiveram uma passagem tranquila desde a sua concepção. A prova desta afirmação é baseada na observação de que os materiais comercializados na atualidade são bem diferentes daqueles disponíveis originalmente para o uso clínico. Os primeiros materiais consistiam em um pó de vidro ao qual era adicionada uma solução concentrada de um ácido poliacrílico. O ASPA (Dentsply De Trey

119

120

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Ltda, Weybridge, UK) foi o primeiro produto comercial, e foi lançado em 1976.

O Vidro Os vidros para os cimentos de ionômero de vidro contêm três componentes principais: sílica (SiO2) e alumina (Al2O3) misturadas num fluxo de fluoreto de cálcio (CaF2), como mostrado na Figura 2.3.2. A composição do vidro está bem-restrita à região central do diagrama de fase para que se tenha um vidro translúcido. A mistura (que também contém fluoretos de sódio e alumínio e fosfatos de cálcio ou alumínio como fluxos adicionais) é fundida em uma alta temperatura, e a massa derretida é então resfriada de maneira abrupta e finamente triturada para formar um pó antes de ser usada.

Cimentos de fosfato de zinco

Óxido de zinco

Cimentos de policarboxilato de zinco

O tamanho da partícula do pó depende da aplicação a que se destina. Para materiais restauradores o tamanho máximo da partícula é de 50 µm, enquanto que para materiais cimentantes e para forramento ele é reduzido para menos de 20 µm. A taxa de liberação de íons do vidro (que é um fator importante na determinação das características de presa, solubilidade e liberação de flúor) depende do tipo de vidro empregado (veja a seguir). O vidro também tem um papel importante na estética da restauração, pois ela depende tanto do índice de refração do vidro como da presença de pigmentos no seu interior.

Poliácido Existe uma grande variedade de análogos do ácido poliacrílico, significando que é possível uma ampla variedade de formulações, quando estes ácidos são combinados com variações do peso molecular e da configuração. Os poliácidos mais usados nas formulações disponíveis são os copolímeros de ácido acrílico e itacônico ou ácido acrílico e maleico (Fig. 2.3.3). Um produto relativamente novo é um CIV à base de um copolímero de ácido vinil fosfônico. Ele é um ácido muito mais forte que os outros usados nos cimentos

Ácido poliacrílico

Ácido fosfórico

Ácido acrílico

Cimentos de silicato

Vidro de alumíniosilicato

Ácido itacônico

H Cimentos de ionômero de vidro

COOH CH2

C

CH2

C CH2

COOH Figura 2.3.1 Esquema dos vários cimentos odontológicos à base de pó de óxido de zinco e de vidro de alumínio-silicato e dos líquidos consistindo em ácido fosfórico e ácido poliacrílico.

COOH Ácido tartárico

Ácido maleico H

H

C

C

COOH

COOH

OH

SiO2

HC COOH

OH CH COOH

Ácido fosfórico

Variação da composição do vidro AI2O3

CaF2

Figura 2.3.2 Composição do vidro usado nos cimentos de ionômero de vidro.

CH2

CH

HO

P

OH

O Figura 2.3.3 Componentes ácidos usados no cimento de ionômero de vidro.

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

de ionômero de vidro, e a composição deve ser cuidadosamente controlada para produzir um cimento com propriedades de manipulação adequadas. Contudo, acredita-se que ele promova uma maior resistência ao longo do tempo e uma melhoria na resistência à umidade. Existe uma concentração ácida ótima no caso dos cimentos de silicato, mas os cimentos de ionômero de vidro não são tão dependentes desse fator. A força e a resistência ao ataque hídrico aumentam uniformemente com a concentração do poliácido, portanto o fator limitante é a consistência da pasta do cimento. A viscosidade do líquido depende tanto da concentração do poliácido como do peso molecular, que pode variar de 10.000 a 30.000, dependendo da formulação escolhida. O ácido tartárico é um importante componente do CIV, pois tem uma influência importante nos tempos de trabalho e de presa.

Apresentação Pó-líquido Muitos cimentos de ionômero de vidro consistem em um pó de vidro ao qual é adicionado um líquido apropriado. O pó é como o descrito, e o líquido é uma solução aquosa de ácido poliacrílico ou polimaleico e ácido tartárico. Uma série de deficiências foi logo reconhecida com essa forma de apresentação, o que acarretou uma mudança da formulação. Um dos problemas é a excessiva solubilidade do cimento na saliva combinada com a lenta reação de presa, e outro é relativo ao estabelecimento da correta proporção pó/líquido. Existe uma tendência de se reduzir o conteúdo de pó com o objetivo de se obter uma pasta macia e cremosa, mas isso resulta numa reação de presa mais lenta, em um cimento mais fraco que é mais suscetível à dissolução (Fig. 2.3.4).

121

Cimentos Anidros Atualmente, muitos cimentos de ionômero de vidro são do tipo endurecido por água, e o cimento é formado pela adição da correta quantidade de água destilada. O pó de vidro é misturado com poliácido liofilizado e pó de ácido tartárico. O primeiro produto que usou tal abordagem foi lançado comercialmente em 1981. As novas formulações, descritas como sistemas anidros, apresentavam-se como um pó e um líquido. O pó contém vidro de alumino-silicato, pó de poliácido e de ácido tartárico, e o líquido é apenas água destilada.

Cápsulas É sabido que conseguir uma proporção pó/líquido correta ainda pode ser um problema, e é necessário um processo vigoroso de mistura para garantir que todo o pó seja incorporado no líquido. Uma forma de superar isso é o uso de cápsulas pré-dosadas. O conteúdo das diferentes cápsulas não possui necessariamente os mesmos constituintes, por isso não é aconselhável misturá-los. Por exemplo, para assegurar a manipulação e as propriedades físicas mais adequadas, os materiais restauradores possuem partículas de vidro muito maiores que dos agentes cimentantes. Da mesma forma, os líquidos usados podem variar na composição para se adequar a uma determinada formulação de vidro e para se obter os tempos de trabalho e de presa mais adequados. Isso será tratado com mais detalhes posteriormente, de acordo com a aplicação das diferentes formulações.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A dificuldade em dosar e misturar a quantidade correta de pó e líquido desses materiais significa que as cápsulas pré-dosadas são preferíveis para se obter uma melhor consistência.

Resistência à compressão

Reação de Presa A reação de presa dos cimentos de ionômero de vidro é obtida por meio de uma reação ácido-base: MO.SiO2 + H2A → MA + SiO2 + H2O vidro

Tempo de presa Proporção pó-líquido crescente Figura 2.3.4 Os efeitos das alterações na proporção pó:líquido nas propriedades dos cimentos de ionômero de vidro.

ácido

sal

silica gel

O processo de presa do cimento de inômero de vidro envolve três etapas superpostas: ■ ■ ■

dissolução; geleificação; e endurecimento.

Isso acontece por causa das diferentes taxas nas quais os íons são liberados do vidro e da taxa na qual a matriz

122

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

salina é formada (Fig. 2.3.5); como se pode ver dessa curva, os íons de cálcio são liberados mais rapidamente que os íons de alumínio. Isso ocorre porque os íons de cálcio apenas são ligados frouxamente na estrutura vítrea, enquanto que os íons de alumínio formam parte da trama de vidro, que é mais difícil de se romper. São os íons de cálcio e alumínio que podem formar afinal a matriz salina. Os íons de sódio e flúor não participam da reação de presa, mas se combinam para serem liberados como fluoreto de sódio.

nio e flúor. A reação de presa do cimento é um processo lento e leva um certo tempo para o material se estabilizar; a translucidez final do material não é aparente antes de 24 horas após a colocação. Embora o material pareça duro após o tempo de presa necessário (geralmente 3 a 6 minutos, dependendo se for um material restaurador ou agente cimentante), suas propriedades físicas e mecânicas finais não são alcançadas e a reação continua por até um mês.

Dissolução

A presa inicial ocorre devido à ação rápida dos íons de cálcio que, sendo bivalentes e inicialmente mais abundantes, reagem mais rapidamente com os grupos carboxílicos do ácido do que fazem os íons trivalentes de alumínio (Fig. 2.3.7). Isso é a fase de geleificação da reação de presa. A eficiência dos íons de cálcio em fazer ligações cruzadas com as moléculas de poliácido não é tão boa como poderia ser, pois esses íons também são capazes de quelar os grupos carboxílicos da mesma molécula. Várias coisas podem acontecer se a restauração não for protegida do ambiente externo durante essa fase crítica. Os íons de alumínio podem se difundir para fora do material e serem perdidos do cimento, ficando assim incapazes de fazer ligações cruzadas com as cadeias de ácido poliacrílico. Se a água for perdida, a reação não poderá se completar. Em ambos os casos, o resultado será um material fraco. De maneira alternativa, pode ocorrer absorção de umidade adicional, que poderá estar contaminada por sangue ou saliva, comprometendo a estética, com a restauração adquirindo, excepcionalmente, um aspecto esbranquiçado e opaco. A umidade contaminante também enfraquece o material e pode até causar a sua fratura. Portanto, é essencial que a contaminação por umidade e a secagem da restauração sejam evitadas, pelo menos durante o período inicial da reação, quando o material está muito vulnerável.

Quando a solução comercial ou água é misturada com o pó, o ácido penetra na solução e reage com a camada mais externa do vidro. Essa camada perde os íons de alumínio, cálcio, sódio e flúor, de forma que só permanece um gel de sílica (Fig. 2.3.6). Os íons de hidrogênio que são liberados dos grupos carboxílicos da cadeia poliácida podem se difundir pelo vidro e promover a perda de mais íons de cálcio, alumí-

Liberação do íons

F Na Al Ca 0

10

100

1.000

Tempo (min) Figura 2.3.5 A variação das taxas de liberação de íons do vidro.



Políons

Íons de cálcio, alumínio e flúor

Núcleo do vidro

Endurecimento Após a fase de geleificação, existe uma fase de endurecimento, que pode durar tanto quanto sete dias. São

Poliácido líquido Íons de hidrogênio

Geleificação

Polissais de cálcio e alumínio

Sílica gel Figura 2.3.6 Os estágios iniciais da reação de presa num cimento de ionômero de vidro.

Figura 2.3.7 Fase de geleificação do processo de presa.

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

necessários aproximadamente 30 minutos para que a quantidade de íons de alumínio se torne significante, embora sejam os íons de alumínio que forneçam a resistência final ao cimento, pois eles são responsáveis pela introdução das ligações cruzadas. Em contrapartida com os íons de cálcio, a natureza trivalente dos íons de alumínio garante a ocorrência em alto grau das ligações cruzadas das moléculas de polímero (Fig. 2.3.8). Existe uma continuação da formação de pontes de sal de alumínio, e a água se torna ligada ao gel de sílica, que agora reveste o núcleo residual de cada partícula de vidro. Tendo o cimento totalmente reagido, a solubilidade é muito baixa. A estrutura final é mostrada na Figura 2.3.9 e consiste em partículas de vidro, cada uma revestida por um gel de sílica numa matriz de ácido poliacrílico de ligações cruzadas.

123

Embora normalmente seja desejável para os vidros resistir à liberação de íons, no caso dos cimentos de ionômero de vidro é essencial uma liberação controlada dos íons de cálcio e alumínio. A experiência em escolher o vidro e a formulação correta é equilibrar os vários requisitos das boas características de manipulação, baixa solubilidade, liberação de flúor adequada e estética.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Os CIVs possuem presa lenta e necessitam de proteção do meio bucal para minimizar a dissolução ou a contaminação.

PROPRIEDADES Características de Manipulação

Figura 2.3.8 Fase de endurecimento do processo de presa.

Vidro de alumínio-silicato Sílica gel Poliácido de ligação cruzada Figura 2.3.9 A estrutura de um cimento de ionômero de vidro.

Os efeitos da composição do vidro no processo de reação são muito pronunciados e de importância considerável na determinação da aceitabilidade das características finais de manipulação do cimento. A proporção de Al:Si do vidro dos cimentos de ionômero de vidro é mais alta que a dos cimentos de silicato, porque o ácido poliacrílico e seus análogos são muito mais fracos que o ácido fosfórico. Um dos efeitos dessa proporção aumentada é a redução do tempo de trabalho. Contudo, os cimentos de ionômero de vidro são previamente inclinados a ter tempos de trabalho e de presa prolongados. Isso era certamente um problema sério com as formulações iniciais desse cimento até ser superado pela inclusão da concentração ótima de ácido tartárico. Acredita-se que o ácido tartárico possua duas funções. Primeiro, reage rapidamente com os íons de cálcio que são liberados do vidro, havendo a formação de tartarato de cálcio, que possui o efeito de prolongar o tempo de trabalho. Isso é seguido por uma melhoria na taxa de formação das ligações cruzadas de poliacrilato de alumínio, o que acelera a reação de presa (Fig. 2.3.10). Pela manipulação da composição do vidro e do tamanho da partícula e pela incorporação do ácido tartárico, as características de manipulação foram muito aperfeiçoadas no decorrer dos anos e hoje são bem-superiores aos produtos disponíveis inicialmente. Essas melhorias são apresentadas na Tabela 2.3.1. Como consequência de tais mudanças, agora os cimentos de ionômero de vidro possuem uma presa bem mais definida.

Adesão Um dos aspectos mais atrativos do cimento de ionômero de vidro é ser um material restaurador de inserção em uma única porção (não necessita de inserção incremental), que é capaz de aderir diretamente à dentina

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Sem ácido tartárico

Viscosidade

Com ácido tartárico

Poliácido

COO– Ponte de H hidrogênio

COO–

Ca2+

COO– Ligação iônica

Esmalte

Tempo Figura 2.3.10 O efeito do ácido tartárico na curva de viscosidade em função do tempo de presa de um cimento de ionômero de vidro.

e ao esmalte. Foi mostrado que os íons de poliacrilato tanto reagem com a estrutura de apatita (deslocando os íons de cálcio e fosfato e criando uma camada intermediária de íons de poliacrilato, fosfato e cálcio) como aderem diretamente ao cálcio na apatita, como mostra a Figura 2.3.11. A adesão à dentina pode ser do tipo ponte de hidrogênio ao colágeno combinada com uma ligação iônica à apatita na estrutura dentinária. A resistência de união, como medida nos testes de resistência de união por cisalhamento, sugeriria que não é particularmente forte (2-7MPa), mas a experiência clínica indicaria que é durável quando o material é usado para restauração de lesões de erosão. Sejam lá quais forem os detalhes do processo de adesão, a adesão criada é suficientemente forte, tal que quando um CIV se descola, a fratura em geral é no interior do cimento e não ao longo da interface. Por isso, a principal limitação da resistência de união do cimento de ionômero de vidro parece ser a sua baixa resistência à tração, que é apenas ao redor de 7 MPa e é devida à natureza friável destes materiais. Para se obter uma boa adesão à dentina, a superfície deve ser tratada primeiro com um condicionador. O melhor condicionador parece ser o ácido poliacrílico, embora o ácido tânico tenha se mostrado também eficaz. A típica resistência de união por tração que

Tabela 2.3.1 Características de manipulação dos cimentos de ionômero de vidro (CIVs) antigos e novos

Figura 2.3.11 Mecanismos de adesão dos cimentos de ionômero de vidro.

foi medida quando unida à dentina está mostrada na Tabela 2.3.2. O objetivo principal do tratamento da superfície é remover os resíduos e produzir uma superfície lisa e limpa. O ácido cítrico não deve ser usado porque abre os túbulos dentinários, aumentando a permeabilidade dentinária e o potencial de reação pulpar. Além disso, ele desmineraliza a dentina, o que pode comprometer a adesão ao componente apatita.

Estética Um requisito importante para qualquer material restaurador para uso em dentes anteriores é o seu mimetismo com os tecidos dentários adjacentes, de forma a se tornarem indistinguíveis. Os fatores que governam são a cor e a translucidez do material restaurador. Nos cimentos de ionômero de vidro a cor é produzida pelo vidro. Ela pode ser controlada pela adição de pigmentos, tais como o óxido férrico ou o carbono preto.

Tabela 2.3.2 Efeitos dos tratamentos superficiais na resistência de união à tração dos cimentos de ionômero de vidro ao esmalte e à dentina Tratamento superficial

Resistência de união (MPa)

Esmalte Nenhum

3,2

Ácido cítrico

5,6

Ácido poliacrílico

7,1

Material

Mistura

Trabalho

Presa

Acabamento

Dentina

ASPA

60 s

90 s

6 min

24 h

Nenhum

3,1

7 min

Ácido cítrico

3,7

Ácido poliacrílico

6,8

CIV moderno

20 s

75 s

2 min

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

Enquanto a cor não representa um grande problema, a translucidez dos primeiros cimentos de ionômero de vidro era inadequada, sendo mais comparável com a da dentina do que com a do esmalte. Esta falta de translucidez significou que a aparência estética dos cimentos de ionômero de vidro foi sempre considerada inferior à da resina composta. Os cimentos pareciam opacos e sem vida, o que limitava sua aplicação como material restaurador para tratamento de lesões de erosão e cavidades classe III não críticas. Existem essencialmente duas causas para a opacidade dos cimentos de ionômero de vidro: 1. Separação de fase do vidro. De alguma forma tal problema pode ser superado pela redução do conteúdo de alumínio, cálcio e fluoreto do vidro, mas isso reduz a resistência do material e prolonga os tempos de trabalho e de presa. 2. Discrepância do índice de refração. Este problema pode ser minimizado pela redução do conteúdo de alumínio e aumento do conteúdo de flúor; contudo, esse último conduz à separação de fase. Em geral, os cimentos de ionômero de vidro com boas propriedades ópticas tendem a possuir características deficientes de presa. A translucidez de um material restaurador pode ser descrita e medida considerando-se o seu inverso  opacidade. Opacidade é definida como sendo zero para um material transparente e 1,0 para um material branco opaco. A opacidade, ou relação de contraste, é definida como a proporção entre a intensidade da luz refletida por um material quando colocado contra um fundo escuro e aquela obtida para um fundo branco de reflectividade conhecida (70% no caso dos cimentos odontológicos). Esta não é uma propriedade absoluta do material, pois depende da sua espessura e da distribuição do espectro da luz visível incidente. Tal propriedade, denominada C0,70 (Cap. 18), dá valores médios para o esmalte e a dentina de 0,39 e 0,70, respectivamente. As primeiras formulações dos cimentos de ionômero de vidro atingiam valores de C0,70 na faixa de 0,7 a 0,85. Elas foram melhoradas e agora estão se aproximando aos valores do esmalte, com valores de C0,70 de 0,4 para algumas formulações. A opacidade é afetada pela absorção de água, que causa uma diminuição na opacidade. Portanto, clinicamente, a restauração pode escurecer quando entra em contato com a saliva. Selecionar a cor e a translucidez apropriadas é uma tarefa difícil, pois são afetadas pelas propriedades ópticas do material subjacente. Em algumas ocasiões, a translucidez tem que ser sacrificada lançando-se mão de um material relativamente opaco com o objetivo de mascarar uma subestrutura particularmente escura. Nesses casos, os cimentos de ionômero de vidro podem se mostrar particularmente benéficos. Mesmo que a combinação inicial da cor e da translucidez entre o esmalte e o cimento de ionômero de vidro

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seja importante, também é importante que essa boa combinação seja mantida no ambiente severo que é a cavidade bucal. A perda da qualidade estética da restauração pode surgir pelo manchamento que, se for excessivo, poderá ser considerado como falha clínica e necessitar substituição. Os cimentos de ionômero de vidro parecem ser menos suscetíveis ao manchamento que os cimentos de silicato, que os precederam. Isso foi atribuído à adesão superior entre a matriz e o vidro do cimento de ionômero de vidro, quando comparada à adesão entre a resina e a carga no compósito. Contudo, os compósitos melhoraram consideravelmente nos últimos anos e agora são menos suscetíveis ao manchamento superficial. O manchamento das margens em torno dos cimentos de ionômero de vidro também se mostrou bem menos pronunciado que das resinas compostas. Isso pode ser um reflexo da excelente adesão que pode ser obtida entre um cimento de ionômero de vidro e os tecidos dentários. Um outro fator contribuinte pode ser a contração de presa dos CIVs, que é consideravelmente menor que a das resinas. De fato, os cimentos de ionômero de vidro tomam presa por uma reação ácido-base mediada por ligações cruzadas das cadeias de poliácido, que inerentemente produz menos contração que a polimerização. Por isso, tensões interfaciais locais geradas serão menores, e a adesão possui uma melhor chance de sobrevivência.

Solubilidade Devido à sua alta solubilidade, os silicatos odontológicos tinham a reputação de perda do material na boca. Em alguma extensão, isso pode ser atribuído ao preparo e à manipulação incorretos, mas é uma característica inerente de todos os cimentos odontológicos e, como tal, os cimentos de ionômero de vidro não são exceção. Contudo, esse aspecto negativo do comportamento do material pode ser minimizado por uma apreciação dos mecanismos envolvidos e pela adoção de uma técnica clínica apropriada. Os processos que levam à perda de material são complexos, e existem muitas variáveis envolvidas, tais como a composição do cimento, a técnica clínica usada e a natureza do ambiente. A perda de material de um cimento de ionômero de vidro pode ser classificada em três categorias principais: ■ ■ ■

dissolução do cimento imaturo; erosão a longo prazo; e abrasão.

A dissolução do cimento imaturo ocorre antes do material ter tomado presa totalmente, o que pode levar até 24 horas. A proteção temporária por uma camada de nitrocelulose, metil metacrilato ou resina amida atuando como um verniz seria suficiente para minimizar tal efeito. Esta proteção deve sobreviver por pelo menos uma hora, pois leva muito tempo para o cimento de ionômero de

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

vidro obter as propriedades que são alcançadas quando está totalmente reagido. No momento, existe muita controvérsia sobre a qualidade e a duração da proteção oferecida pelos diferentes vernizes disponíveis, e alguns clínicos defendem o uso de uma resina ativada por luz sem carga, pois ela dará uma proteção mais prolongada. Uma alta proporção pó/líquido ajuda, porque acelera o processo de presa, enquanto que uma fina mistura tem o efeito contrário e também afeta adversamente as propriedades mecânicas (Fig. 2.3.4). Tendo o cimento tomado presa totalmente (em geral dentro de 2 a 3 dias; manifestado por uma queda brusca da quantidade de material desprendido na água), tal forma particular de perda de material cessará. Desse ponto em diante, a perda de material pode ser considerada a longo prazo, já que é em função das condições no meio bucal. A perda do material a longo prazo pode surgir tanto do ataque ácido quanto da abrasão mecânica. Isso é muito surpreendente, uma vez que a principal aplicação dos cimentos de ionômero de vidro é a restauração de lesões surgidas por causa do efeito combinado do ácido e da abrasão. O potencial de ataque ácido tende a ser bastante marcado nas regiões de estagnação, tais como em torno da margem gengival. Aqui, a placa se acumula e um ambiente altamente ácido se desenvolve devido à formação de ácido lático. Os cimentos de ionômero de vidro são mais resistentes a tal forma de ataque que os cimentos de silicato, como indicado por uma redução na extensão das marcas superficiais. Os cimentos de ionômero de vidro são usados extensivamente em aplicações, onde estarão sujeitos à abrasão mecânica, como a escovação. Sua resistência à abrasão é deficiente, o que limita a sua aplicação a condições de baixa tensão e certamente impede o seu uso como material restaurador permanente para dentes posteriores. Um teste in vitro, no qual amostras de cimentos foram inseridas em pequenos suportes e submetidas a um jato líquido consistindo em um ácido diluído, tentava verificar a perda de material por uma combinação de abrasão e ataque ácido. Usando esse método, as indicações são de que os cimentos à base de ácido poliacrílico são mais resistentes à abrasão/erosão que os cimentos à base de ácido maleico. No entanto, deve-se lembrar que essa observação é baseada num teste laboratorial e seria necessário ser confirmado clinicamente antes que sua validação possa ser estabelecida.

Liberação de Flúor O fato de que os cimentos odontológicos se dissolvem no meio bucal é considerado um efeito adverso, pois leva à degradação do material. Contudo, o flúor também é liberado, e acredita-se que isso aumenta significativamente a resistência à formação de lesões de cárie do esmalte adjacente à restauração. Ainda é um assunto de debate se

a liberação de flúor ou outros fatores (p. ex., a liberação de outros íons, as propriedades antibacterianas e a capacidade adesiva) exercem um papel importante nas características anticariogênicas dos cimentos de ionômero de vidro. Todavia, têm sido feitas tentativas para conferir tal propriedade aos amálgamas e compósitos, assim como também para os cimentos de ionômero de vidro. É um dilema interessante para o dentista fazer a escolha entre um cimento de ionômero de vidro ou um compósito, com o primeiro sendo definitivamente mais fraco, mas promovendo alguma proteção dos tecidos circundantes, e o último sendo mais estável e mais forte, mas não fornecendo tal proteção.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O cimento de ionômero de vidro é um material de inserção em uma única porção, que libera flúor e que é intrinsecamente adesivo.

APLICAÇÕES CLÍNICAS Deve ser apreciado, do exposto, que os cimentos de ionômero de vidro são designados para se adequarem a uma grande variedade de aplicações, com sua abrangência englobando materiais com propriedades amplamente diferentes. Portanto, embora eles sejam baseados nos mesmos princípios destacados anteriormente, cada formulação possui características que a tornam mais adequada para uma aplicação particular, e é importante que não sejam confundidas. As várias aplicações estão listadas na Tabela 2.3.3, mas apenas os materiais restauradores estéticos serão considerados neste capítulo.

Materiais Restauradores da Cor do Dente Apresentação Os materiais estão disponíveis em três formulações: ■ ■ ■

os sistemas tradicionais pó-líquido com os poliácidos em uma solução aquosa; os sistemas anidros com o ácido ressecado incorporado no pó; versões encapsuladas.

As últimas versões requerem ativação da cápsula e mistura num amalgamador, o que assegura uma proporção pó:líquido precisa, que não diferem das obtidas para as cápsulas de amálgama. Algumas propriedades de alguns cimentos de ionômero de vidro de cor do dente são mostradas na Tabela 2.3.4. As diferenças não são realmente suficientes para sugerir que um material seja superior ao outro.

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

Tabela 2.3.3 Aplicações clínicas dos cimentos de ionômero de vidro Materiais restauradores da cor do dente Lesões de abrasão e erosão Lesões de classe III envolvendo a exposição de dentina radicular Lesões oclusais na dentição decídua Restaurações temporárias anteriores e posteriores Reparo de margens coronárias Bases e materiais para forramento cavitário Cimento de base sob compósitos, amálgamas e cerâmicas Regularização de retenções Cimentação de coroas e pontes

A principal característica de todos esses materiais é a sua baixa resistência à tração diametral, que é uma indicação da sua baixa resistência à tração. Portanto, os cimentos de ionômero de vidro não devem ser usados em locais onde estarão sujeitos a altas cargas de tração, tais como restauração de bordo incisal, substituição de cúspide ou núcleos retidos a pino. Em situações que a restauração estiver totalmente apoiada ao redor por tecido dentário, o cimento de ionômero de vidro estará protegido (até um certo grau) das cargas de tração. O tamanho das partículas do pó de vidro garante a obtenção de uma proporção pó:líquido muito alta e se reflete na resistência à compressão e à tração diametral desses materiais. (Essas resistências são muito maiores que as dos agentes cimentantes e as dos cimentos forradores descritos posteriormente.) Isso também afeta a solubilidade, que é reduzida conforme a proporção pó:líquido é aumentada. Existem diferenças nos tempos de trabalho e de presa dos diferentes cimentos: alguns possuem tempos de presa mais curtos que outros (o que é desejável na limitação da solubilidade precoce), mas o tempo de trabalho é também muito reduzido, o que pode representar um problema para alguns clínicos.

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mas as mudanças recentes na formulação resultaram numa melhora acentuada. A escolha da cor do material restaurador deve ser realizada antes do isolamento do dente ou de qualquer forma de preparo. A cor do lençol de borracha, quando usado, altera a cor do dente. Tal mudança na cor é aumentada ainda mais quando o esmalte é desidratado durante o isolamento. Para a restauração de lesões que envolvem uma extensa quantidade da superfície vestibular, o uso dos cimentos de ionômero de vidro pode não fornecer um resultado esteticamente adequado, e o uso dos compósitos deve ser considerado. Contudo, para aqueles pacientes que são conhecidos por possuir um alto índice de cárie, pode ser melhor sacrificar um pouco da qualidade estética dos compósitos em preferência à proteção do flúor conferida pelos cimentos de ionômero de vidro. Um outro aspecto da estética dos cimentos de ionômero de vidro é a observação de que existe uma alteração de cor durante o processo de presa. Geralmente, a cor se torna um pouco mais escura após o material ter tomado presa totalmente do que no momento da colocação. Acredita-se que tal escurecimento esteja associado ao aumento na translucidez durante a reação, que pode levar até 24 horas para se desenvolver.

Preparo Cavitário A qualidade adesiva dos cimentos de ionômero de vidro determina que uma abordagem ultraconservadora deve ser adotada. Isso significa que é necessária uma remoção mínima de estrutura dental, enfatizando que não é necessária a remoção adicional dos tecidos dentários para a provisão de retenções adicionais ou cauda de andorinha. Contudo, em situações que as restaurações podem estar sujeitas a alta tensão, alguma retenção pode ser vantajosa. No caso de substituição de restaurações, a restauração original deve ser removida cuidadosamente sem remover nenhum tecido dentário, a menos que esteja cariado. As margens cavo-superficiais devem terminar em 90° e não serem biseladas.

Seleção da Cor

Isolamento

A qualidade estética dos cimentos de ionômero de vidro da cor do dente já foi considerada uma desvantagem,

Embora os cimentos de ionômero de vidro sejam materiais hidrofílicos, é recomendável que um cuidadoso iso-

Tabela 2.3.4 Resistência à compressão e a tração diametral de uma variedade de cimentos de ionômero de vidro para restauração disponíveis comercialmente Material (fabricante)

Resistência à compressão (MPa)

Resistência à tração diametral (MPa)

Chemfill-II (De Trey)

230

19

Ketac-Fil (ESPE)

170

10

Legend (SS White)

220

16

Opus-Fil (DSD)

220

18

RGI (Rexodent)

220

16

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

lamento do campo operatório seja realizado. A presença de sangue ou saliva não só impedirá a formação de uma forte adesão, mas também levará à contaminação da restauração, reduzindo, portanto, a resistência de união e a estética. Um cimento de ionômero de vidro bemcolocado não deve falhar adesivamente, pois a adesão à dentina e ao esmalte é pelo menos tão forte quanto à resistência coesiva do cimento.

Preparo das Superfícies Dentinárias A natureza da superfície dentinária varia de local para local, com a distinção principal sendo entre a dentina cortada após a remoção da cárie e a dentina esclerótica.

Lesões de Abrasão/Erosão As lesões na região cervical necessitam ser restauradas para fornecer proteção direta da polpa, impedir o desenvolvimento de sensibilidade pulpar e melhorar a aparência. Como os cimentos de ionômero de vidro são adesivos, não é necessário fazer nenhum preparo ou realizar retenções na dentina. O preparo antes da colocação do material deve envolver apenas a limpeza e o condicionamento da superfície dentinária. O procedimento de limpeza deve ser realizado esfregando uma pasta de pedra-pomes e água por apenas alguns segundos com uma taça de borracha macia ou escova rotatória, com o objetivo de remover qualquer contaminante superficial, tais como placa ou película, que encubra a superfície dentinária. A superfície deve ser lavada cuidadosamente para remover qualquer resíduo. Um condicionador consistindo em uma solução aquosa de ácido poliacrílico pode ser aplicado à superfície por 30 segundos, esfregando levemente com uma bolinha de algodão. Este procedimento assegurará que a superfície seja limpa, mas também resultará em alguma abertura dos túbulos dentinários. Alguns podem argumentar que a exposição dos túbulos dentinários é contraindicada, pois ela aumenta a permeabilidade dentinária, aumentando então a probabilidade de uma reação pulpar. Provavelmente isso não é um problema no caso de pacientes que não possuem histórico de sensibilidade, pois os túbulos devem estar esclerosados, com deposição de dentina secundária. No entanto, para aqueles pacientes com sensibilidade, o tratamento ácido da superfície dentinária não deve ser executado. Existe ainda alguma controvérsia sobre a necessidade da aplicação prévia de ácido poliacrílico na superfície dentinária. Alguns estudos mostraram que isso melhora a resistência de união à dentina, enquanto que outros mostraram que não possui efeito algum. Classe III, Classe V e Outras Lesões Cariosas Não é necessário limpar as cavidades com pedra-pomes e água no caso de lesões cariosas, pois as superfícies se compõem de dentina recentemente exposta. Contudo, existe ainda a lama dentinária a se considerar, que está presente em qualquer preparo cavitário. Como a lama dentinária está fortemente aderida à dentina subjacente, os resíduos

superficiais devem ser removidos, mas de forma a evitar a abertura dos túbulos dentinários. Novamente, o uso do ácido poliacrílico é recomendado. Uma variedade de outros condicionadores dentinários tem sido preconizada de tempos em tempos (p. ex., ácido cítrico, EDTA e cloreto férrico), mas eles não devem ser aplicados na dentina recém-cortada pelas mesmas razões já mencionadas. O condicionador dentinário mais simples e eficaz parece ser o ácido poliacrílico.

Proteção Pulpar A crescente aplicação dos cimentes de ionômero de vidro nos últimos anos levantou alguns problemas interessantes como a toxicidade pulpar associada a tais materiais e se um material de forramento deve ser usado ou não. Se o cimento estiver em contato direto com a polpa, isto resultará numa zona localizada de necrose pulpar, que inibe a reparação cálcica. Contudo, naqueles casos em que existe uma camada dentinária residual, ocorrerá a formação da ponte de dentina. Se a cavidade for muito profunda e houver a possibilidade de microexposição pulpar, então é recomendável a colocação do hidróxido de cálcio como forramento sobre os locais mais próximos da polpa das cavidades preparadas mecanicamente antes da inserção do cimento de ionômero de vidro. Sugere-se que a potencial causa da sensibilidade pulpar quando são usados os cimentos de ionômero de vidro seja devida às diferenças nas técnicas de manipulação do cimento ou também a outros fatores desconhecidos relacionados ao paciente. Ainda assim, não está claro o que origina o pequeno número de casos de sensibilidade pulpar, nem está claro que papel a contaminação ou invasão bacteriana pode ter. Baixos níveis de bactérias estão associados aos cimentos de ionômero de vidro mais do que aos cimentos de fosfato de zinco ou de policarboxilato de zinco. Isso pode ocorrer porque os cimentos de ionômero de vidro aplicados como materiais de forramento possuem um grande efeito antimicrobiano. Contudo, para todos os tipos de cimento de ionômero de vidro (incluindo os cermets de prata), é recomendável o forramento dentinário, especialmente se o dente estiver sintomático ou se o preparo cavitário estiver particularmente profundo. Existem situações em que uma pequena quantidade de cárie pode ser deixada nas partes mais profundas do preparo, quando houver o risco de microexposição pulpar se ela for removida. A habilidade do hidróxido de cálcio em ativar a formação de dentina secundária e sua alcalinidade são de grande valor nessas circunstâncias. Contudo, tal material deve ser usado comedidamente para assegurar que a máxima quantidade de dentina permaneça exposta para adesão do cimento de ionômero de vidro. Em geral, se houver alguma dúvida sobre a espessura de dentina remanescente, é aconselhável forrar a cavidade recém-preparada com hidróxido de cálcio. Para a dentina esclerótica, geralmente não é necessário usar

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

uma base cavitária de hidróxido de cálcio, e o uso de ácido cítrico ou fosfórico deve ser evitado.

Dosagem, Manipulação e Inserção Para os sistemas pó/líquido, deve-se tomar muito cuidado para garantir que a quantidade correta de pó seja misturada no líquido. É importante que as instruções do fabricante sejam seguidas cuidadosamente. Leves batidas no frasco antes do uso garantirão que o pó não fique compactado. O excesso de pó deve ser removido com uma espátula, e não contra a borda do frasco. O pó deve ser espatulado rapidamente no líquido em no máximo dois incrementos. O tempo máximo de mistura é 20 segundos. A incorporação inicial de uma grande quantidade de pó deve ser evitada, pois isso dará o aspecto de que a mistura está satisfatoriamente espessa embora a proporção pó:líquido esteja muito baixa. No caso das cápsulas pré-dosadas, elas devem ser sacudidas antes da ativação. A mistura deve ser realizada num amalgamador de alta velocidade, operando tipicamente em torno de 4.000 rpm, por um período de 10 segundos. Todo o processo de ativação, mistura e aplicação deve ser realizado sem qualquer demora. A contaminação dos materiais restauradores com saliva deve ser evitada durante a inserção, presa e acabamento. A cavidade e a área circunjacente devem estar secas, embora a desidratação excessiva não deva ocorrer.

Acabamento e Polimento Após a presa do material pelo tempo necessário, a matriz pode ser removida, e a restauração deve ser imediatamente protegida da contaminação ou desidratação, cobrindo-a com um verniz à prova d’água. O melhor acabamento superficial é obtido nesse estágio, e a remoção do excesso de material será prejudicial ao acabamento. No entanto, é praticamente impossível colocar um cimento de ionômero de vidro sem depois ter que realizar um desgaste e polimento. O excesso grosseiro pode ser aparado com uma lâmina de bisturi. Como o material ainda está muito fraco e a adesão aos tecidos dentários é fraca, o processo de corte deve ser realizado da restauração em direção ao dente e não no sentido contrário. Foi demonstrado que o uso de instrumentos manuais para escultura pode danificar a integridade marginal da restauração. De fato, um fabricante especificamente recomenda que não sejam usados instrumentos manuais. Foi sugerido que, após a presa inicial, o acabamento deve ser realizado com instrumentos rotatórios, tais como uma pedra branca, ou discos flexíveis lubrificados com algum lubrificante, como a vaselina. O uso do spray de água nessa etapa não é recomendado, pois o material está ainda altamente solúvel. O acabamento final não deve ser realizado, e é melhor deixar para a próxima visita do paciente, de preferência dentro de 24 horas. Uma série de estudos demonstrou que se o acabamento for realizado logo após oito minutos, a superfície

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resultante será muito deficiente quando se usam discos abrasivos, rodas de borracha abrasiva, brocas de tungstênio/carbide ou pedras brancas, mesmo na presença da vaselina. Essa situação pode mudar com os mais recentes materiais de presa rápida, mas até então o acabamento imediato dos cimentos de ionômero de vidro é contraindicado. Após 24 horas o material está suficientemente geleificado para se realizar o acabamento final usando-se tanto uma ponta diamantada de granulação fina, como uma broca de tungstênio/carbide de 12 lâminas. Isso deve ser executado na presença de uma boa quantidade de água para evitar desidratação, que agora é possível, pois a suscetibilidade imediata de dissolução na água diminuiu. O polimento final pode ser realizado com uma variedade de discos abrasivos, novamente na presença de água. Seja qual for o método utilizado, não é possível se obter um acabamento superficial liso num cimento de ionômero de vidro. Isto ocorre devido ao tamanho grande da partícula de vidro usada na produção desses cimentos.

Proteção da Superfície O uso de um verniz é importantíssimo. Em geral são recomendadas soluções de resina natural (Copal) e sintéticas (acetato de celulose) dissolvidas num solvente orgânico, como éter, acetona ou clorofórmio. Os vernizes de poliuretano, que se polimerizam em contato com a água e a nitrocelulose (esmalte de unha), são alternativas menos permeáveis e menos solúveis. As resinas adesivas de esmalte ativadas por luz ou os adesivos dentinários que são fornecidos com os compósitos promovem um efeito selador particularmente eficiente que dura o suficiente para oferecer a proteção necessária. A desvantagem do seu uso é que pode permanecer uma pequena saliência, especialmente na margem gengival, que deverá ser tratada num estágio posterior. Também, eles sofrem inibição pelo oxigênio, por isso a camada superficial permanece grudenta. Contudo, se for aplicada apenas uma fina camada, ela será facilmente removida. O problema pode ser superado pelo uso de uma fita matriz, mas isto é muito trabalhoso de se usar. O polimento posterior deve ser realizado dentro de 24 horas. O uso de lubrificantes ou géis como a vaselina oferece pouca proteção, pois são facilmente removidos pela ação dos lábios e da língua. Ao se realizar outros procedimentos restauradores, as restaurações de ionômero de vidro colocadas há um certo tempo ainda necessitam ser protegidas da desidratação durante qualquer procedimento de isolamento prolongado do campo operatório. Esse é especialmente o caso quando se usa o lençol de borracha, pois a desidratação do cimento pode ser muito pronunciada e a contração resultante pode levar à fratura da restauração. Portanto, todas as restaurações de cimento de ionômero de vidro, coroas, margens de inlays e cermets devem ser protegidas com uma fina camada de verniz.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Desempenho Clínico

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

As primeiras aplicações dos cimentos de ionômero de vidro sempre foram como material restaurador para o tratamento de lesões de abrasão e erosão e como agente cimentante de coroas, pontes e inlays. Com o advento de materiais mais novos e melhores, o seu uso está sendo estendido para incluir restaurações classe III, restaurações oclusais (principalmente em dentes decíduos), material para núcleo de preenchimento e cimento forrador adesivo sob restaurações com compósitos. O grande interesse da avaliação clínica dos cimentos de ionômero de vidro foi centrado em torno do seu uso como material restaurador. A sua facilidade de colocação num só incremento, as suas qualidades adesivas e a sua proteção dada pelo flúor são vistas como vantagens importantes sobre os compósitos esteticamente mais agradáveis. Visto que há bem poucas publicações sobre o desempenho clínico dos cimentos de ionômero de vidro em restaurações classe III e V, seria difícil, se não impossível, tirar muitas conclusões desses dados. Uma compilação dos resultados do desempenho de restaurações classe V é mostrada na Figura 2.3.12. Em muitos dos estudos realizados, houve pouca preocupação em relação à proporção pó:líquido exata para os primeiros materiais que surgiram, bem como a necessidade de proteção durante o longo período de presa. Portanto, os altos índices de insucesso relatados em tais estudos podem ser em consequência do uso de técnicas impróprias ou inadequadas para esses materiais em particular. Estudos mais recentes relataram uma taxa de retenção consistentemente mais alta para as restaurações de cimento de ionômero de vidro, em que existe principalmente confiança na sua adesão ao esmalte e dentina, confirmando a união retentiva que é formada entre o cimento de ionômero de vidro e os tecidos dentários.

Em relação às taxas de retenção clínica das restaurações adesivas de classe V, os cimentos de ionômero de vidro mostraram uma união consistentemente durável aos tecidos dentários.

Embora não sejam recomendados para restaurações classe II em adultos, os cimentos de ionômero de vidro têm sido usados com algum sucesso em dentes decíduos posteriores. É necessário o mínimo preparo cavitário, e o selamento marginal e a liberação de flúor compensam em certo grau a vida útil limitada de tais restaurações, que são aceitáveis quando usadas para suprir uma necessidade de curto prazo. Resultados muito promissores estão sendo obtidos na dentição decídua com os novos CIVs de alta viscosidade, algumas vezes referidos como CIVs condensáveis. A viscosidade maior foi atribuída à adição de ácido poliacrílico ao pó e a um tamanho de grão reduzido (aproximadamente 3 µm). Uma das principais atrações desses materiais é a característica de manipulação, parecida com o amálgama. Embora suas propriedades de resistência sejam pouco diferentes daquelas dos CIVs convencionais, a sua resistência à abrasão parece ser superior aos CIVs convencionais, o que foi atribuído ao tamanho de partícula reduzida do vidro. Os exemplos comerciais desses materiais incluem: PRODUTO CHEMFLEX Fuji IX HI-FI KETAC-MOLAR

FABRICANTE Dentsply, Weybridge, UK GC UK, Ltd, Newport Pagnell, UK Shofu, Tonbridge, UK ESPE UK Ltd, Knutsford, UK

CERMETS DE PRATA 100

Percentual de perda

80 60 40 20 0

0

1

2

3

Anos Figura 2.3.12 Compilação dos dados da sobrevida de restaurações classe V restauradas com o cimento ASPA, retirados de publicações durante o período de 1977-1983.

Por sua natureza, o vidro é muito friável e tende a fraturar com relativa facilidade, quando comparado com os metais. A ideia é que a incorporação de prata no vidro aumente a tenacidade do material resultante por atuar como um absorvedor de tensões e melhorar as características do desgaste. Isso é atribuído tanto ao aumento na tenacidade do material como ao coeficiente de fricção muito baixo da superfície, com a prata conferindo um acabamento metálico polido. Quanto às outras propriedades do material, tal como resistência à compressão, resistência à flexão e solubilidade, os cermets de prata não parecem melhores que os cimentos de ionômero de vidro. Naturalmente, os cermets de prata possuem a capacidade de aderir ao esmalte e à dentina no mesmo grau que os cimentos de ionômero de vidro. Assim como com os cimentos de ionômero de vidro, é recomendado

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

que seja aplicado um condicionador de superfície tal como o ácido poliacrílico à dentina antes da colocação do cimento.

131

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O desempenho clínico dos cermets de prata é tal que o seu uso continuado é contraindicado.

Composição e Apresentação Os cermets de prata estão disponíveis tanto na composição pó-líquido, apresentada em dois frascos separados que têm que ser misturados manualmente, como em cápsulas pré-dosadas que devem ser colocadas num amalgamador de alta velocidade. Em algumas formulações, o pó é apresentado como uma mistura simples de vidro e prata, enquanto que em outras a prata é incorporada no pó de vidro. O último é produzido de uma mistura de vidro e prata em volumes iguais (17,5/82,5% em peso). O tamanho da partícula de prata é de cerca de 3–4 µm. A mistura é formada em bolinhas e então sinterizadas a 800°C até o vidro e a prata se fundirem juntos e formarem uma mistura consolidada. A substância sólida sinterizada é então triturada para produzir o tamanho de partícula correto para a mistura e manipulação. As partículas são arredondadas pelo processo de trituração, o que ajuda na mistura com o poliácido. Portanto, cada partícula consiste em uma mistura de partículas de vidro e de prata intimamente unidas uma à outra pelo processo de sintetização. Além do mais, é adicionado aproximadamente 5% de Ti2O, para melhorar a estética, pois atua como um agente branqueador. O líquido consiste em uma solução aquosa de um copolímero de ácido acrílico e/ou maleico (37%) e ácido tartárico (9%). A resistência ao desgaste dos cermets de prata é adequada para cavidades classe I pequenas, e qualquer outra maior deve ser tratada com cuidado. Informações não publicadas sugerem que os cermets não suportam o desgaste em restaurações amplas com múltiplas superfícies. Portanto, seu uso está muito limitado ao tratamento de lesões cariosas iniciais. Por causa da grande quantidade de prata nas partículas de pó, a restauração final é suficientemente radiopaca para permitir facilmente a detecção de cárie recorrente. Assim como com os cimentos de ionômero de vidro, a liberação de flúor também ocorre com os cermets, o que fornece proteção ao esmalte adjacente à restauração. Contudo, existe evidência para sugerir que a liberação de flúor dos cermets de prata não é tão alta quanto a dos CIVs e que esses materiais não fornecem o mesmo grau de proteção contra lesões de cárie como fazem os CIVs. Os cermets de prata não corresponderam à expectativa, especialmente em restaurações oclusais da dentição decídua. O seu desempenho foi tal que a continuação do seu uso é questionável, especialmente à luz das contínuas melhorias feitas nos CIVs convencionais e a introdução dos CIVs modificados por resina.

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA Algumas das principais desvantagens dos cimentos de ionômero de vidro são: ■ ■ ■ ■

tempo de trabalho curto e tempo de presa longo; baixa resistência e baixa tenacidade; aparecimento de fendas devido a desidratação; e baixa resistência ao ataque ácido.

Com o advento das resinas compostas ativadas por luz, os dentistas começaram a se queixar de que as características de manipulação dos CIVs estavam longe do ideal. Ainda assim, o material continuava a ser usado por causa da sua liberação de flúor e das propriedades adesivas. Os fabricantes almejaram melhorar as propriedades de manuseio dos CIVs pela incorporação de uma resina que se polimerizaria sob a ação da unidade polimerizadora de luz azul. Esses são os materiais conhecidos como CIVs modificados por resina. Embora algumas vezes também sejam denominados CIVs híbridos ou ativados por luz, tais termos devem ser desencorajados porque não são suficientemente específicos e podem ser confundidos com alguns materiais como os compômeros.

Composição O material é apresentado como um sistema de pó-líquido, com o pó consistindo em um vidro radiopaco de flúor-alumínio-silicato e um líquido ativado por luz mantido em um frasco escuro (para proteger da luz ambiente) ou na forma de cápsula. A composição do líquido varia de produto para produto, mas em geral é uma solução aquosa de monômeros hidrofílicos, por exemplo, hidroxietil metacrilato (HEMA), ácido poliacrílico ou um copolímero do ácido poliacrílico com alguns grupos metacriloxi pendentes, ácido tartárico e um iniciador ativado por luz. A escolha da resina é limitada pelo fato de que os CIVs são materiais à base de água e por isso a resina necessita ser solúvel em água. O HEMA é um monômero hidrofílico muito efetivo nesse aspecto e se dissolve prontamente na água.

Reação de Presa A reação de presa ácido-base é essencialmente a mesma dos cimentos de ionômero de vidro e é iniciada quando o pó e o líquido são misturados. O material difere dos outros cimentos de ionômero de vidro no fato de que essa reação é muito mais lenta, promovendo um tempo de trabalho consideravelmente mais prolongado.

132

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

A presa rápida é fornecida pelo mecanismo de ativação por luz, causando a polimerização do HEMA, e, para os materiais contendo copolímero, promovendo ligações cruzadas adicionais por meio dos grupos metacrilato pendentes, como mostra a Figura 2.3.13. Uma vez misturado, o material polimerizará logo após 30 segundos de exposição à luz. Se não exposto à luz, o material poderá tomar presa em torno de 15 a 20 minutos. Deve-se observar que a reação de polimerização por luz precede a formação das pontes de sal de alumínio. Portanto, tais materiais continuarão a geleificar via reação ácido-base por algum tempo após o processo de polimerização ter sido completado. Alguns sistemas também são conhecidos por conter um processo de polimerização por reação de oxidação-redução, promovido por um ativador e um iniciador, nesse caso usando a tecnologia de microencapsulamento. Isso possui a vantagem de que se a luz da unidade polimerizadora não for capaz de penetrar toda a profundidade da restauração, a reação de oxidação-redução assegurará a polimerização do componente resinoso em toda a sua profundidade. Isto significa que não é necessária a inserção incremental dos CIVMRs para os sistemas contendo reação de oxidação-redução. Uma desvantagem com esse sistema é que ele não pode ser fornecido na forma encapsulada, pois as tensões de cisalhamento durante a mistura da cápsula, diferentemente da mistura manual, são insuficientes para quebrar as microesferas de vidro. Como uma nota de advertência, deve-se lembrar que podem ter alguns dos problemas inerentes associados aos compósitos ativados por luz, tais como a profundidade limitada de polimerização, que requer inserção

Luz

Figura 2.3.13 Combinação entre as ligações cruzadas ativadas por luz e endurecimento durante o processo de presa de um CIV modificado por resina.

incremental, e a contração de polimerização, que pode comprometer a adesão ao dente.

Propriedades A adição da química resinosa aos CIVs melhorou de forma significativa muitas das suas propriedades. Usando essa abordagem, as vantagens dos cimentos de ionômero de vidro, tais como a capacidade de aderir à dentina e ao esmalte e a liberação de flúor, foram combinadas com o tempo prolongado de trabalho e uma presa rápida, após a irradiação com luz visível. A restauração pode também ser polida imediatamente. Acredita-se que sua resistência intrínseca e superficial à dessecação e ao ataque ácido foi muito melhorada. A adesão ao esmalte e à dentina é boa, se não superior àquela dos cimentos de ionômero de vidro, pois os componentes resinosos conferem adicional resistência à tração ao cimento depois de pronto. Um exemplo típico das diferenças das propriedades entre os CIV e CIVMR de um mesmo fabricante é mostrado na Tabela 2.3.5. Uma desvantagem potencial com a incorporação do HEMA nesses sistemas é que relatou-se que o HEMA é citotóxico quando entra em contato com os tecidos da polpa dental e os osteoblastos. Portanto, é muito importante seguir os procedimentos necessários que garantirão que todo o HEMA seja polimerizado.

Aplicações Os cimentos de ionômero de vidro modificados por resina só foram introduzidos recentemente, e foram projetados especificamente como materiais restauradores diretos ou como bases ou materiais de forramento para uso sob compósitos, amálgamas e restaurações cerâmicas. Quando usado em conjunção com os compósitos, é obtida uma forte adesão entre o material de forramento e o compósito e não existe necessidade de condicionar a superfície do cimento de ionômero de vidro modificado por resina.

Tabela 2.3.5 Propriedades relativas de um cimento de ionômero de vidro (CIV) e de um cimento de ionômero de vidro modificado por resina (CIVMR) Propriedade

CIV

CIVMR

Tempo de trabalho

2 min

3 min 45 s

Tempo de presa

4 min

20 s

Resistência à compressão

202 MPa

242 MPa

Resistência à tração diametral

16 MPa

37 MPa

Resistência de união por 4,6 MPa cisalhamento ao esmalte bovino

11,3 MPa

Resistência de união por cisalhamento à dentina bovina

8,2 MPa

4,3 MPa

CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO E CIMENTOS DE IONÔMERO DE VIDRO MODIFICADOS POR RESINA

Tais materiais se tornaram muito populares e possuem o potencial de substituir os CIVs como materiais restauradores e muitos tipos de bases e forradores cavitários. Se eles são superiores ou não e substituirão os CIVs, apenas o tempo dirá. Contudo, as indicações prévias mostram que esses materiais são mais populares que os CIVs para forramento. Os CIVMRs também têm melhor desempenho que os CIVs tradicionais como materiais restauradores para dentes posteriores na dentição decídua e são comparáveis aos novos CIVs condensáveis. Alguns dos materiais restauradores mais recentes estão listados a seguir. PRODUTO FUJI-II-LC Improved VITREMER PHOTAC-FIL QUICK RESTORE-PF VLC

FABRICANTE GC UK, Ltd, Newport Pagnell, UK 3M/ESPE, Loughborough, UK 3M/ESPE, Loughborough, UK First Scientific Ltd, Abertillery, UK

Existem diferenças significativas na composição e nas propriedades desses materiais. Os CIV modificados por resina se comportam de modo muito diferente um do outro, dependendo da quantidade e do tipo de elemento resinoso incorporado e dos mecanismos de polimerização empregados. Portanto, cada produto possuirá pro-

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priedades de manipulação que são mais adequadas em função apenas da seleção dos dentistas.

RESUMO Os cimentos de ionômero de vidro tiveram um impacto muito importante na odontologia restauradora. Uma grande variedade de formulações está agora disponível, projetada para uma ampla faixa de aplicações. Os novos CIVMRs são materiais com propriedades superiores. Contudo, essas melhorias são ainda insuficientes para competirem com as resinas compostas em situações de altas tensões mastigatórias, tais como restauração de bordo incisal e restaurações oclusais posteriores na dentição permanente.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Os CIVs são imensamente melhores comparados com os cimentos originais tipo ASPA. Os cimentos de ionômero de vidro mostraram ser materiais dentários restauradores eficazes e ainda são materiais dentários em evolução, como mostra a introdução recente dos CIVs compactáveis e dos CIVMRs, o que sugere que mais melhorias podem ser esperadas.

LEITURA COMPLEMENTAR Billington RW, Williams JA, Pearson GJ (1990) Variation in powder/liquid ratio of a restorative glass–ionomer cement used in dental practice. Br Dent J 169: 164 Chen H et al (2003) Interaction of dendrimers (artificial proteins) with biological hydroxyapatite crystals. J Dent Res 82: 443 Ellis J, Anstice M, Wilson AD (1991) The glass polyphosphonate cement: a novel glass–ionomer cement based on poly(vinyl phosphonic acid). Clin Mater 7: 41 Espelid I, Tveit AB, Tornes KH, Alvheim H (1999) Clinical behaviour of glass ionomer restorations in primary teeth. J Dent 27: 437 Frankenberger R, Sindel J, Kramer N (1997) Viscous glass– ionomer cements: a new alternative to amalgam in the primary dentition? Quintessence Int 28: 667 Kilpatrick NM, Murray JJ, McCabe JF (1995) The use of a reinforced glass–ionomer cermet for the restoration of

primary molars: a clinical trial. Br Dent J 179: 175 Knibbs PJ (1988) Glass–ionomer cement: 10 years of clinical use. J Oral Rehab 15: 103 Peumans M et al (2005) Clinical effectiveness of contempory adhesives: A systematic review of current clinical trials. Dent Mater 21: 864 Qvist V, Manschert E, Teglers PT (2004) Resin-modified and conventional glass ionomer restorations in primary teeth: 8-year results. J Dent 32: 285 Smales RJ, Ng KK (2004) Longevity of a resin-modified glass ionomer cement and a polyacid-modified resin composite restoring non-carious cervical lesions in a general dental practice. Aust Dent J 49: 196 Smith DC (1968) A new dental cement. Brit Dent J 125: 381 Wilson AD, Kent BE (1972) A new translucent cement for dentistry. Brit Dent J 132: 133–135

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Capítulo 2.4

MATERIAIS RESTAURADORES INTERMEDIÁRIOS

INTRODUÇÃO Uma grande variedade de materiais restauradores diretos (p. ex., amálgamas, resinas compostas, cimentos de ionômero de vidro e cimentos de ionômero de vidro modificados por resina) é colocada sobre a dentina, em íntima proximidade com a polpa. Já que a presença de uma restauração pode ter um efeito adverso na polpa, uma variedade de materiais, denominados materiais restauradores intermediários (MRIs), foi desenvolvida para ser aplicada na dentina antes da colocação do material restaurador. Estes materiais incluem vernizes cavitários, bases e materiais de forramento, e como eles devem ser mantidos no local permanentemente, estes materiais não devem ser confundidos com os materiais restauradores temporários. A distinção entre as bases e os forradores cavitários é que o primeiro consiste em uma mistura de material espessa que é colocada no corpo da cavidade, enquanto que o último é aplicado apenas como uma camada fina sobre a dentina exposta. A definição de um forrador cavitário é um selante dentinário com espessura menor que 0,5 mm e é capaz de promover a saúde pulpar pela adesão à estrutura dental ou por ação antibacteriana. Em contrapartida, a base é um substituto dentinário usado para minimizar a massa da restauração ou eliminar as irregularidades cavitárias. Seu papel pode ser protetor, paliativo ou terapêutico, quando aplicado sobre a dentina vital. A escolha por um verniz cavitário, base ou material de forramento requer a verificação da necessidade de proteção pulpar e de como o agente poderá interagir com o material restaurador escolhido para uma determinada situação clínica.

PROTEÇÃO PULPAR Para fazer a escolha correta de qual material restaurador intermediário utilizaremos para um determinado proce-

dimento restaurador, é importante entender a natureza e os mecanismos pelos quais os fatores adversos afetam a polpa. Foram identificadas três possíveis fontes de irritação pulpar: ■ ■ ■

estímulo térmico; estímulo químico; bactérias e endotoxinas.

A importância dos dois primeiros fatores foi reconhecida há algum tempo, porém mais recentemente foi demonstrado que o terceiro fator é provavelmente o mais importante na produção da irritação pulpar.

Estímulo Térmico No dente hígido, as mudanças de temperatura são conduzidas através do esmalte e da dentina até a polpa. Em seguida, as fibras nociceptivas aferentes podem ser termicamente estimuladas, desencadeando uma resposta dolorosa. Como um estímulo térmico direto da polpa é, contudo, improvável exceto quando se prepara uma cavidade ou quando ocorre geração direta de calor de uma reação exotérmica de um material restaurador quando este está muito próximo da polpa. Quando os túbulos dentinários são expostos, é possível que o fluido se movimente para dentro e para fora dos túbulos, denominado efeito hidrodinâmico. Este é o processo responsável pela sensibilidade da exposição radicular e é prontamente resolvido com o selamento da superfície radicular. É quase certo que o efeito hidrodinâmico também seja responsável pela dor de curta latência produzida pelo estímulo térmico de algumas pequenas restaurações de amálgamas. Se os túbulos dentinários estiverem abertos e houver a formação de pequenas fendas sob a restauração de amálgama, possivelmente devido à adaptação inadequada à parede cavitária, poderá ocorrer o movimento do fluido através dos túbulos, por causa da ação de abertura e de fechamento dessa fenda. Isto pode ocorrer como consequência da expansão ou contração do amálgama quando exposto a temperaturas extremas ou a aplicação

135

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

de cargas oclusais. Portanto, a colocação de um verniz ou de um fino forramento na cavidade é feito com o objetivo de impedir o movimento do fluido pela dentina, e não para atuar como um isolante térmico, como se pensava um tempo atrás.

Estímulo Químico A maioria dos materiais dentários que entra em contato com a dentina pode liberar componentes, que são considerados tóxicos à polpa, tanto pela sua estrutura química quanto pelo seu pH. As resinas acrílicas foram citadas como exemplos de materiais que causam reação pulpar quando colocadas sem um forramento. Contudo, testes de toxicidade sugerem que estes materiais são bem-tolerados pelos tecidos moles. As resinas acrílicas são extensivamente usadas como cimentos ósseos em próteses de quadril sem nenhuma reação inflamatória adversa. Isto sugeriria que outros fatores seriam responsáveis pela reação pulpar associada a esses materiais. Até recentemente, a maioria dos estudos da toxicidade pulpar dos materiais restauradores não considerava a influência da contaminação bacteriana, que agora é considerada como tendo um importante papel na produção da inflamação pulpar, como discutido a seguir. Isto não significa que não precisamos nos preocupar com a toxicidade química, como o baixo pH de alguns materiais, como os cimentos de fosfato de zinco e os de policarboxilato de zinco, que podem apresentar efeitos na polpa.

subjacente por um forramento adequado. No entanto, enquanto no passado pensava-se que o papel principal de um material restaurador intermediário fosse proteger a polpa da ação tóxica dos materiais restauradores, essa visão teve que ser modificada levando-se em consideração o papel das toxinas bacterianas. O uso dos materiais restauradores intermediários agora é proposto para: ■



A abordagem adesiva é agora tão importante que é tratada separadamente no Capítulo 2.5, de maneira que aqui consideraremos apenas os vernizes cavitários, as bases e os materiais para forramento. Primeiro, discutiremos a química desses materiais e, então, consideraremos qual poderá ser mais apropriado para as várias aplicações clínicas.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O papel principal de um material forrador é proteger a polpa, fornecendo uma barreira contra as bactérias e prevenindo o movimento do fluido pelos túbulos dentinários.

VERNIZES CAVITÁRIOS, BASES E MATERIAIS PARA FORRAMENTO

Bactérias e Endotoxinas Um assunto de considerável interesse e debate é o efeito da microinfiltração. Este termo descreve vagamente a penetração de fluidos orais e pequeno número de bactérias e seus subprodutos tóxicos entre o material restaurador e as paredes cavitárias. Esta percolação tem sido considerada uma fonte potencial de irritação pulpar. Em experimentos usando animais germ-free, foi demonstrado que a resposta pulpar a alguns materiais é consideravelmente diferente do que aquela observada em animais com uma flora microbiana normal. Por exemplo, os cimentos de fosfato de zinco não demonstram inflamação pulpar (e podem até apresentar alguma formação de ponte dentinária) quando colocados em polpas expostas na ausência de bactérias. Por sua vez, os animais do grupo controle mostraram inflamação pulpar grave e formação de abscesso. Outros materiais mostraram uma resposta inflamatória, mesmo nos animais germ-free, demonstrando que a toxicidade química ainda pode ser um fator importante em algumas circunstâncias. O aumento do entendimento do mecanismo da toxicidade pulpar não muda o fato de que alguns materiais danificam a polpa se não forem separados da dentina

eliminar o potencial da microinfiltração bacteriana pelo uso de técnicas adesivas de forma que nenhuma fenda exista entre o material restaurador e o dente; apresentar uma barreira antibacteriana para as bactérias que infiltram de forma a proteger a polpa de suas toxinas.

Os principais grupos de materiais que se enquadram na categoria de bases e materiais de forramento são os seguintes: ■ ■ ■ ■ ■ ■

vernizes; cimentos de hidróxido de cálcio; cimentos à base de óxido de zinco; cimentos de ionômero de vidro; cimentos de ionômero de vidro modificado por resina; resinas fotopolimerizadas.

Vernizes Cavitários Apresentação e Composição Os vernizes cavitários consistem em um líquido límpido ou amarelado que contém resinas naturais, tais como copal, colofônia e sandáraca, ou resinas sintéticas sandarac, tal como o poliestireno. As resinas são dissolvidas em um solvente, como álcool, éter ou acetona, e são aplicadas no soalho cavitário com um pincel ou bolinha de algodão. O solvente é evaporado, deixando para trás

MATERIAIS RESTAURADORES INTERMEDIÁRIOS

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uma fina camada de resina. Este processo pode ter que ser repetido até três vezes para assegurar uma camada uniforme de resina.

Nesses cimentos odontológicos, existe um excesso de pó, de forma que o material final consiste em partículas de pó não reagidas unidas por uma matriz salina.

Aplicações

Cimentos de Óxido de Zinco e Eugenol

Seus principais usos são:

Dentro do grupo dos cimentos de óxido de zinco e eugenol, existe uma ampla variedade de formulações para diferentes aplicações.

■ ■

apresentar uma barreira à penetração de substâncias químicas; agir como uma barreira temporária à perda dos componentes da superfície do material restaurador.

Cimentos de Hidróxido de Cálcio Apresentação e Composição Este material é fornecido em duas pastas, uma branca e outra amarelo-clara. Uma pasta consiste em uma mistura de hidróxido de cálcio (50%), óxido de zinco (10%) e sulfonamida (40%). A outra pasta consiste em dissalicilato de butileno glicol (40%) com quantidades variadas de dióxido de titânio e sulfato de cálcio.

Reação de Presa Volumes iguais das duas pastas são misturados entre si por cerca de 30 segundos; o cimento toma presa em cerca de dois minutos. O processo de presa para estes materiais não foi completamente elucidado, mas se acredita que envolve uma reação de quelação entre o óxido de zinco e o dissalicilato de butileno glicol.

Propriedades Esses materiais possuem uma baixa resistência à compressão, tipicamente 20 MPa, mas é suficiente para suportar as pressões de condensação do amálgama dentário. O cimento recém-misturado é altamente alcalino, com um pH de 11-12. Acredita-se que isso seja responsável por uma importante característica dos cimentos de hidróxido de cálcio: sua habilidade de estimular a formação de dentina secundária pela polpa dental. Quando a pasta é colocada em contato com a polpa, possivelmente na presença de uma microexposição, causará uma camada tripla de necrose em torno de 1,5 mm de espessura. Isto em geral dá origem a uma camada calcificada. Quando a ponte adquire o aspecto parecido com a dentina e a polpa é isolada de qualquer irritação, a formação de tecido duro cessa.

Cimentos à Base de Óxido de Zinco Os cimentos à base de óxido de zinco usados na odontologia são sistemas pó-líquido, com os pós sendo básicos, e os líquidos, ácidos. Quando são misturados, ocorre uma reação ácido-base com a fórmula geral: MO + H2A → MA + H2O base

ácido

sal

água

Óxido de Zinco e Eugenol Não Modificado É apresentado como um pó branco composto basicamente de óxido de zinco, mas contém até 10% de óxido de magnésio, que é misturado com um líquido límpido, composto de eugenol misturado com óleo de oliva ou com semente de algodão. Os óleos são adicionados para mascarar o gosto do eugenol e modificar a viscosidade.

Processo de Presa O cimento é misturado adicionando o pó ao líquido em pequenos incrementos até se obter uma consistência espessa; isto leva cerca de um minuto, e a proporção de pó:líquido é cerca de 3:1. O óxido de zinco, inicialmente, absorve algum eugenol, que fica confinado na camada superficial das partículas do pó e reage para formar uma matriz de eugenolato de zinco amorfo, como mostrado na Figura 2.4.1. Isso aglutina a porção não reagida do pó. Um traço de água é necessário para iniciar a reação de presa, mas, uma vez iniciada, ela é um subproduto da reação de presa. O material reagido contém também óxido de zinco e eugenol não reagidos. O material está disponível nos cimentos de reação de presa lenta e rápida. O cimento de presa lenta leva em torno de 24 horas para endurecer, e o cimento de presa rápida leva cerca de cinco minutos, embora isto dependa da natureza do pó, do tamanho da partícula e da adição de aceleradores, tais como acetato de zinco ou ácido acético.

Propriedades O cimento reagido possui um pH de 6,6 a 8 e possui praticamente nenhum efeito sobre a polpa quando colocado em cavidades profundas. A presença de eugenol livre possui um efeito sedativo sobre a polpa, e reduz a dor que pode ser associada às propriedades antibacterianas do cimento. Contudo, seu uso não é recomendado quando existe suspeita de exposição pulpar, pois ele é levemente irritante à polpa quando entra em contato direto com ela. Uma das principais desvantagens dos cimentos de óxido de zinco e eugenol é a sua alta solubilidade no ambiente da cavidade oral. O eugenol é constantemente liberado e, conforme vai se dissolvendo, o cimento gradualmente se desintegra. Os cimentos também possuem propriedades mecânicas baixas, com resistência compressiva de apenas 15 MPa. Isto, combinado com a alta solubilidade, torna-o inadequado como base ou material de forramento. O eugenol também é conhecido por inibir a polimerização das resinas, por isso os cimentos contendo eugenol não podem ser usados em conjunto com materiais restauradores resinosos.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Figura 2.4.1 Reação de quelação do óxido de zinco com eugenol para formar um eugenolato de zinco.

Aplicações A versão de presa lenta é mais usada como material de selamento do canal radicular, com suas variadas modificações sendo discutidas com mais detalhe no Capítulo 2.6. A versão de presa rápida é usada principalmente nos curativos periodontais.

Óxido de Zinco e Eugenol Modificado Com o objetivo de superar algumas das limitações do cimento já descritas, as versões modificadas foram introduzidas. O objetivo era aumentar a resistência compressiva e reduzir a solubilidade. Essas modificações são apresentadas na forma de resinas adicionadas ao pó e/ou ao líquido, tais como: ■ ■

rosina hidrogenada a 10%, que é adicionada ao pó; poliestireno ou metil metacrilato, que é dissolvido no líquido.

Propriedades e Aplicações A resina adicionada aumenta a resistência compressiva para 40 MPa. Isso é suficientemente grande para o material ser usado como base ou forramento cavitário. O material também pode ser utilizado como material restaurador temporário, já que é menos solúvel na cavidade oral que os cimentos não modificados. Cimento EBA O cimento EBA é outro cimento de óxido de zinco e eugenol modificado, apresentado como um pó branco e um líquido de cor rosado. O pó consiste em óxido de zinco (60%-75%), quartzo fundido ou alumina (20%-35%) e rosina hidrogenada (6%). O líquido é 37% de eugenol e 63% de ácido etoxibenzoico (EBA). O EBA estimula a formação de uma estrutura cristalina, que confere uma maior resistência ao material após o final da presa. Propriedades e Aplicações Com as adições e modificações já descritas, uma melhora considerável na resistência compressiva (60 MPa) e na redução da solubilidade são obtidas. Isto torna os cimentos EBA adequados para o uso como material para forramento ou para restauração temporária.

Cimentos Forradores de Ionômero de Vidro e de Ionômero de Vidro Modificado por Resina Recentemente, o conceito de se usar cimentos de ionômero de vidro como forramento sob os compósitos ganhou ampla aceitação. O forramento de ionômero de vidro é capaz de aderir à dentina, e o compósito pode ser aderido ao cimento de ionômero de vidro e ao esmalte condicionado. Acredita-se que a capacidade de liberar flúor fornece proteção adicional ao esmalte e à dentina adjacente à restauração. Uma ampla variedade de cimentos forradores de ionômero de vidro está atualmente disponível. Sua composição química foi discutida com detalhes no Capítulo 2.3. Esses materiais são todos radiopacos, o que é especialmente importante quando usados em regiões posteriores. Eles tendem a possuir tempo de trabalho e de presa mais curtos que as versões restauradoras, o que é adequado para a sua aplicação como material de forramento sob compósitos ou amálgamas, pois a presa rápida reduz o tempo de espera antes da colocação do material restaurador. Uma presa lenta seria desvantajosa, especialmente no caso da técnica com o compósito, que já consome muito tempo. É importante saber como a qualidade de adesão entre os cimentos de ionômero de vidro e os compósitos pode ser obtida. Para aqueles materiais de forramento que necessitam de condicionamento ácido da base de ionômero de vidro com ácido fosfórico para obter a adesão com a resina composta, o processo do condicionamento não deve levar mais de 20 segundos. O melhor método de condicionamento é usar um gel ácido viscoso em seringa. Ele pode ser cuidadosamente aplicado na superfície de esmalte por um período de 20 segundos; após, então, toda a superfície (incluindo o cimento de ionômero de vidro) é exposta ao condicionador por um tempo adicional de 20 segundos. Uma exposição excessiva do cimento de ionômero de vidro ao condicionador provoca rachaduras na superfície e penetração do ácido que é impos-

MATERIAIS RESTAURADORES INTERMEDIÁRIOS

sível de se remover com enxágue; isto pode desencadear dor pulpar ou sensibilidade. Isto também pode causar extensa fratura do material e é melhor ser evitado. É preferível usar uma resina de baixa viscosidade com o objetivo de se obter uma boa adesão entre o compósito e o cimento de ionômero de vidro. Os problemas práticos gerados pela necessidade do condicionamento diferencial podem ser completamente evitados usando-se forradores de cimento de ionômero de vidro modificados por resina, que não necessitam de condicionamento para aderirem à resina composta. Os exemplos típicos desses cimentos disponíveis comercialmente são apresentados a seguir. PRODUTO VITREBOND KETAS BOND VIRAGLASS LINER FUJIBOND LC

FABRICANTE (3M/ESPE, Loughborough, UK) (3M/ESPE, Loughborough, UK) (RULAR VIVADENT, Schaan, Liechtenstein) (GC UK Ltd, Newport Pagnell,UK)

Esses materiais de forramento possuem uma vantagem adicional de fornecer uma adesão mais forte entre o dente e a resina composta devido à sua maior resistência coesiva em relação aos forradores de cimento de ionômero de vidro. Os cimentos de ionômero de vidro modificados por resina estão se tornando populares, enquanto o uso dos cimentos de ionômero de vidro como forradores está em declínio.

Resinas Fotopolimerizadas Uma variedade de materiais para forramento e bases cavitárias à base de resina apareceu no mercado, entretanto o seu papel é ainda obscuro. O objetivo com esses materiais parece ser combinar as vantagens da fotoativação com alguns dos efeitos terapêuticos da liberação de cálcio ou flúor. Os materiais incluídos nesse grupo são as resinas Bis-GMA contendo hidróxido de cálcio, as resinas fosfonadas contendo vidros que liberam flúor e as resinas Bis-GMA contendo hidróxido de cálcio e vidros que liberam flúor. Como estes materiais diferem dos compósitos fotoativados (outras que não apenas a natureza da carga) não está claro. Como as cargas estão envolvidas na resina, seus efeitos nos tecidos circunjacentes são discutíveis, embora as resinas possam ser suficientemente permeáveis para permitir a liberação de parte do hidróxido de cálcio e de flúor. Ainda assim, esses materiais não mostraram nenhuma vantagem particular sobre as outras tantas bases e forradores disponíveis, e é improvável que os substituam, especialmente porque eles têm sido substituídos pelos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina e pelos agentes adesivos dentinários mais atuais.

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ESCOLHA DOS MATERIAIS RESTAURADORES INTERMEDIÁRIOS Amálgamas A escolha do material restaurador intermediário antes da colocação de uma restauração de amálgama depende se a profundidade da cavidade formada pela lesão de cárie é rasa, média ou profunda.

Cavidades de Profundidade Rasa Em cáries de profundidade rasa, a cavidade deve ser preparada apenas na profundidade suficiente para fornecer um corpo de amálgama adequado. A dentina não deve ser removida desnecessariamente (para criar espaço para um material de forramento), pois existe dentina suficiente para atuar como isolante térmico. O material de forramento também não deve ser colocado na cavidade em espessura tal que o amálgama fique em espessuras muito finas, tornando-o propenso a fraturas de corpo. Nessa situação, a polpa necessita de proteção apenas contra o movimento do fluido no interior dos túbulos dentinários originado pela pressão oclusal, pela expansão térmica do metal e pelo ingresso de bactérias pelos túbulos dentinários. O método mais comum é aplicar uma fina camada de verniz sobre toda a superfície dentinária. O verniz sela efetivamente os túbulos dentinários, prevenindo o movimento do fluido e reduzindo o potencial de microinfiltração. Embora o verniz possa por fim se dissolver (possuindo apenas poucos µm de espessura), a deposição gradual dos produtos de corrosão do amálgama ajuda a selar as margens e promover uma barreira antibacteriana. Todavia, a cinética deste processo nunca foi realmente confirmada e os vernizes cavitários foram criticados for oferecer um isolamento deficiente, não fornecendo nem mesmo um filme, falta de atividade biológica, adesão insuficiente e tendo alta solubilidade. Para uma restauração de amálgama bem adaptada com margens apertadas, foi sugerido que qualquer forma de base sob o amálgama é desnecessária.

Cárie Dentinária de Profundidade Média Quando a cárie se estende além do que pode ser considerada uma cavidade rasa, existe a possibilidade de estímulo térmico direto à polpa; isto é especialmente verdade, no caso de uma polpa inflamada quando os limiares de temperatura são reduzidos. Não há necessidade de estimular o crescimento de dentina reparadora, pois isso já deve ter ocorrido em resposta ao ataque carioso. Também, qualquer inflamação diminuirá, se os estímulos irritantes (isto é, bactérias e toxinas da cárie) forem removidos. Um cimento de óxido de zinco e eugenol modificado seria uma boa escolha em tais situações, pois o eugenol possui efeito sedativo sobre a polpa inflamada e elimina qualquer bactéria residual na

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

cavidade. As propriedades térmicas isolantes destes materiais são mais que adequadas. Finalmente, um verniz cavitário é aplicado porque nem toda a dentina exposta será necessariamente coberta pelo material forrador.

Cárie Profunda Em situações em que a exposição pulpar é eminente, geralmente se considerada desejável deixar algum tecido cariado cárie no soalho da cavidade em vez de arriscar uma exposição. No entanto, isto não é possível, se a lesão de cárie tiver progredido para o estágio onde não puder ser remineralizada. É possível distinguir entre a dentina cariosa que remineralizará e a dentina cariada irreversível, porque a primeira é de remoção mais difícil com os instrumentos manuais ou pode ser visualizada usando uma solução evidenciadora de cárie. O cimento de hidróxido de cálcio deve ser colocado primeiro nas partes mais profundas da cavidade. Isto encorajará a formação de dentina reparadora e ajudará a remineralizar a dentina cariosa. A base isolante térmica de óxido de zinco e eugenol pode, então, ser colocada por cima, seguida de um verniz cavitário. Contudo, um problema que existe é que, em dado momento, os fluidos orais podem penetrar através da interface e iniciar a dissolução do cimento de hidróxido de cálcio. A fenda que se forma aumentará o risco de sensibilidade e infiltração marginal. Apesar de tudo que foi dito, o uso de forradores sob amálgama tornou-se um tópico de controvérsia considerável. Nos anos 1980, Osborne sugeriu que as bases e os materiais de forramento sob as restaurações de amálgama são desnecessários. Todavia, muitos estudos demonstraram que a cárie recorrente é um dos principais contribuintes da falha das restaurações de amálgama. É possível que a etiologia da cárie dentária recorrente associada às restaurações de amálgama tenha mudado com o passar do tempo. A ocorrência de qualquer mudança no padrão da cárie dentária seria racionalmente esperada, como resultado da melhor orientação na higiene oral, uso extensivo de flúor tópico e acesso à água fluoretada de abastecimento nos últimos 20 anos. Também, foi relatado por Mahler e Marantz que quase nenhuma cárie recorrente foi observada em torno das restaurações de amálgama com alto teor de cobre. É possível que o padrão da cárie também tenha alterado por causa dos avanços dos amálgamas de alto teor de cobre comparados com os amálgamas tradicionais?

Compósitos Um compósito totalmente polimerizado possui pouca citotoxicidade, e a inflamação pulpar sob as restaurações destes materiais ocorre principalmente devido à infiltração de micro-organismos e endotoxinas. Para superar o problema da microinfiltração, uma variedade de técnicas adesivas foi desenvolvida, três das quais são utilizadas atualmente: ■

condicionamento ácido do esmalte;

■ ■

base adesiva de cimento de ionômero de vidro/cimento de ionômero de vidro modificado por resina; e agentes adesivos dentinários.

O condicionamento ácido do esmalte assegurará um bom selamento marginal e atualmente é uma rotina na colocação de material restaurador em resina composta. Com o intuito de evitar a sensibilidade pós-operatória, é importante obter não apenas o selamento marginal, mas também a adesão da restauração ao soalho e às paredes cavitárias, pois caso contrário poderá ocorrer à sensibilidade pós-operatória devido à presença da fenda que dará origem ao efeito hidrodinâmico. Isso pode ser superado com a adesão da resina composta à dentina, tanto pelo uso de um cimento de ionômero de vidro ou cimento de ionômero de vidro modificado por resina na chamada técnica do sanduíche ou pelo emprego de um agente adesivo dentinário.

Restaurações do Bordo Incisal e Selantes de Fissura Se o procedimento restaurador envolve somente o esmalte, assim como em pequenas restaurações de bordo incisal ou selantes de fissura, uma base cavitária ou material de forramento não é necessária. O preparo cavitário envolve apenas o uso da técnica do condicionamento ácido que quase elimina qualquer microinfiltração e é descrita com mais detalhes no Capítulo 2.4.

Restauração Preventiva de Resina É uma restauração mínima onde pode haver uma pequena quantidade de dentina exposta. Como as margens dessa restauração estão totalmente em esmalte, o uso da técnica do condicionamento ácido assegura um bom selamento marginal. Portanto, parece não haver necessidade de proteger a superfície dentinária dos efeitos da microinfiltração. Além disso, o compósito é um excelente isolante térmico, de forma que não há necessidade de se preocupar com o estímulo térmico da polpa. Contudo, o uso do condicionador de ácido fosfórico na dentina exposta não é recomendado, pois a camada protetora de lama dentinária que é formada na dentina cortada (bloqueando muitos dos túbulos dentinários) é removida pela solução ácida, reabrindo os túbulos. A consequência disso é um grande aumento da permeabilidade dentinária. Portanto, é importante proteger a superfície dentinária do ácido. Uma variedade de opções está disponível para essa finalidade. Os vernizes de resina natural e os cimentos de óxido de zinco e eugenol não devem ser usados, pois interferem com a polimerização da resina composta. Em contrapartida, vernizes sintéticos (tais como o poliestireno) podem ser usados. Se uma cavidade condicionada e biselada é preparada, toda a cavidade e a superfície dentária devem ser cobertas por uma fina camada de verniz. O bisel será, então, realizado deixando somente a superfície desgastada do esmalte para ser exposta ao ácido. Todavia, esse processo deixa uma boa

MATERIAIS RESTAURADORES INTERMEDIÁRIOS

parte da restauração não unida. Como observado, outra opção é o uso de um forrador de cimento de ionômero de vidro ou de cimento de ionômero de vidro modificado por resina, com o último em geral sendo a escolha mais popular por causa da sua presa controlada. Com os aperfeiçoamentos dos agentes adesivos dentinários, mais e mais dentistas empregam este procedimento como o método preferido. Isso atua de maneira similar aos vernizes (pois protege a dentina do ácido), mas a adesão à dentina também é obtida. A combinação da adesão ao esmalte pela técnica do condicionamento ácido e a adesão dentinária com um agente adesivo dentinário deve eliminar qualquer possibilidade de ocorrência de microinfiltração nestas restaurações rasas. Os diferentes tipos de agentes adesivos dentinários e os seus mecanismos de ação são tratados com mais detalhe no próximo capítulo.

Lesões Cariosas Proximais e Oclusais Devido ao tamanho dessas restaurações e ao fato de que nem todas as margens podem estar confinadas ao esmalte, existe uma probabilidade maior de microinfiltração levando a uma inflamação pulpar. A provisão de um selamento marginal se torna muito mais difícil quando a margem esta subgengival e envolve a dentina radicular. Enquanto que a técnica do condicionamento ácido para a adesão em esmalte dos compósitos é muito eficaz, o mesmo não pode ser dito para os procedimentos adesivos dentinários. Portanto, não é indicado confiar apenas na união dos agentes adesivos dentinários para fornecer um selamento hermético em torno de todas as margens da restauração. De fato, tem-se que assumir que a microinfiltração ocorrerá e é inevitável. O hidróxido de cálcio é o melhor material de forramento para se usar em tais situações. No entanto, ele deve ser usado economicamente de forma que apenas uma pequena quantidade de dentina seja coberta, deixando a maior quantidade de dentina disponível para adesão. Os materiais de forramento de ionômero de vidro apresentam um problema, pois podem produzir uma leve inflamação pulpar em cavidades recém-preparadas. Atualmente, uma opção mais popular tem sido o uso de um cimento forrador de ionômero de vidro modificado por resina.

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Embora a união adesiva à dentina limite a microinfiltração, as bactérias foram encontradas em fendas sob o material. Essas bactérias não foram afetadas pelo material, já que ele possui pouca ou nenhuma ação antibacteriana. Portanto, é prudente proteger quaisquer áreas próximas da polpa com um cimento de hidróxido de cálcio antes da colocação do material de forramento de ionômero de vidro e a restauração de resina composta.

Lesões de Abrasão/Erosão Visto que este tipo de lesão envolve uma grande extensão da dentina, a resina composta necessita ser aderida à dentina via um agente adesivo dentinário ou um forrador de cimento de ionômero de vidro. Quando um material de forramento de ionômero de vidro é aplicado à dentina que estava exposta há algum tempo (como nas lesões de abrasão), a dentina secundária que se deposita parece proteger a polpa. Nessa situação, o cimento de ionômero de vidro pode ser aplicado diretamente sobre a dentina e então coberto com resina composta pela técnica do sanduíche. Até recentemente, isso parecia ser o método mais eficaz para aderir a resina composta à dentina do que o uso de um agente adesivo dentinário. Contudo, deve ser observado que tem havido rápidas melhorias nos agentes adesivos dentinários e a qualidade da adesão como indicada pelas taxas de retenção dos agentes dentinários adesivos de 3 passos está começando a atingir aquelas dos cimentos de ionômero de vidro.

Cimentos de Ionômero de Vidro e Cimentos de Ionômero de Vidro Modificados por Resina Os mesmos argumentos já destacados para os materiais forradores de cimento de ionômero de vidro e de ionômero de vidro modificado por resina aplicam-se aos materiais de restauração. Como o material de forramento geralmente não é indicado, exceto nos casos em que a cavidade é muito profunda e pode haver a possibilidade de microexposições da polpa, nesse caso um cimento de hidróxido de cálcio pode ser necessário (Cap. 2.6).

LEITURA COMPLEMENTAR Baratieri LN et al (2002) Effect of pulp protection technique on the clinical performance of amalgam restorations: threeyear results. Oper Dent 27: 319 Fisher FJ, McCabe JF (1978) Calcium hydroxide base materials: an investigation into the relationship between chemical structure and antibacterial properties. Brit Dent J 144: 341 Gordan VV, Mjor IA, Hucke RD, Smith GE (1999) Effect of different liner treatments on postoperative sensitivity of amalgam restorations. Quintessence Int 30: 55 Hilton TJ (1996) Cavity sealers, liners and bases: Current philosophies and indications for use. Oper Dent 21: 4

Mahler DB, Marantz RL (1980) Clinical assessments of dental amalgam restorations. Int Dent J 30: 327 Øilo G (1984) Early erosion of dental cements. Scand J Dent Res 92: 539 Osborne JW (1980) Dental amalgam: Clinical behaviour up to eight years. Oper Dent 5: 9 Peumans M et al (2005) Clinical effectiveness of contempory adhesives: A systematic review of current clinical trials. Dent Mater 21: 864 Smith DC (1971) Dental cements. Dent Clin N Am 15: 3 Wilson AD (1978) The chemistry of dental cements. Chem Soc Revs 7: 265

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Capítulo 2.5

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

INTRODUÇÃO O desenvolvimento da abordagem adesiva na odontologia restauradora trouxe muitas vantagens, tais como: ■ ■ ■ ■ ■ ■

melhoria da estética; conservação do tecido dentário; reforço da estrutura dental enfraquecida; redução da infiltração marginal; redução do potencial para sensibilidade pulpar; e uma grande variedade de técnicas.

Uma grande variedade dos sistemas adesivos foi introduzida nos últimos anos, muitos dos quais não sobreviveram ao teste do tempo. Tais adesivos foram incapazes de satisfazer as exigências estritas que são necessárias para um adesivo dental. O adesivo dental deve: ■ ■ ■ ■ ■

promover alta resistência de união com o esmalte e a dentina; promover uma união imediata e durável; prevenir o ingresso de bactérias; ser de uso seguro; e ser simples de usar.

Os sistemas adesivos que sobreviveram ao teste do tempo incluem: ■



a técnica do condicionamento ácido para adesão das resinas ao esmalte que, agora é extensivamente usada na colocação de resinas compostas e compômeros em dentes anteriores e posteriores e compômeros, próteses adesivas, facetas e bráquetes ortodônticos; os cimentos de ionômero de vidro e os cimentos de ionômero de vidro modificado por resina, com sua capacidade de aderir tanto ao esmalte quanto à dentina em restaurações adesivas diretas, atuando como bases adesivas sob compósitos restauradores e como agentes cimentantes de restaurações indiretas.

Por comparação, os agentes adesivos dentinários possuem uma história turbulenta. Muitos vieram e se

foram, mas em cada estágio do desenvolvimento houve melhoras significativas. Provavelmente, alguns dos sistemas adesivos dentinários hoje comercializados sobreviverão ao teste do tempo. O porquê de alguns materiais e técnicas terem sobrevivido e outros desaparecido é devido à necessidade de requisitos que o adesivo precisa ter para ser capaz de aderir a uma variedade de materiais (p. ex., compósitos, metais, cerâmicas) e a dois substratos muito diferentes, denominados esmalte e dentina. Os princípios da adesão já foram discutidos no Capítulo 1.10 e os aspectos da adesão dos cimentos de ionômero de vidro já foram tratados no Capítulo 2.3. Portanto, neste capítulo, apenas serão considerados os métodos de aderir os compósitos e as resinas ao esmalte e à dentina com os sistemas adesivos dentinários.

ADESÃO AO ESMALTE Estrutura do Esmalte O esmalte é o tecido calcificado mais denso do corpo humano e é único, pois é formado extracelularmente. É uma estrutura heterogênea, na qual o esmalte humano maduro consiste de 96% de mineral, 1% de material orgânico e 3% de água por peso (Tabela 2.5.1). A fase mineral é constituída de milhões de pequenos cristais de hidroxiapatita, Ca10(PO4)6(OH)2, que estão intimamente compactados na forma de prismas, mantidos unidos por uma matriz orgânica. Devido à substituição iônica (p. ex., fluoretos), a apatita do esmalte não possui a mesma porcentagem de cálcio: flúor da hidroxiapatita teoricamente pura (1,6:1), sendo em geral na média de 2:1 por peso. Os prismas possuem a forma de bastões alongados de aproximadamente 5 µm de diâmetro, possuindo uma seção transversal típica em forma de buraco de fechadura, com uma cabeça e cauda. Os prismas são alinhados perpendicularmente à superfície dentária, como mostra a Figura 2.5.1.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Tabela 2.5.1 Composição típica do esmalte e da dentina Esmalte Peso % Orgânico

1

Vol. % 2

Dentina Peso % 2

Vol. % 30

Inorgânico

95

86

70

45

Água

4

12

10

25

Figura 2.5.1 Estrutura prismática do esmalte.

Os cristais de hidroxiapatita são hexágonos achatados, como mostra a Figura 2.5.2, e, por causa da sua estrutura, não é possível obter uma compactação perfeita. Os espaços deixados entre os cristais são ocupados por água e material orgânico. A maior parte da água está intimamente ligada à estrutura do esmalte e não é facilmente removida com a secagem. A camada superficial do esmalte tende a possuir um conteúdo orgânico maior do que as camadas profundas, e é protegida por uma camada de película, que possui cerca de 1 µm de espessura.

Técnica do Condicionamento Ácido Devido à sua estrutura complexa, a superfície do esmalte pode ser modificada pela aplicação de condicionadores ácidos. A importância e o aproveitamento potencial disto foram propostos primeiramente por Buonocore, em 1995, quando descobriu que poderia tornar a superfície do esmalte mais suscetível às técnicas adesivas modificando-a com a aplicação de uma solução de ácido fosfórico. A partir daí, a técnica do condicionamento ácido para adesão dos compósitos restauradores ao esmalte foi desenvolvida. Seu efeito principal é o aumento da rugosidade superficial do esmalte a nível microscópico (Fig. 2.5.3), aumentando a energia da superfície, que melhora o molhamento (veja a seguir). Um grande defeito dos compósitos é que eles não possuem qualidades adesivas intrínsecas com os tecidos dentários, pois as resinas são essencialmente não polares.

Figura 2.5.2 Estrutura e compactação dos cristais de apatita do esmalte.

A modificação da superfície do esmalte pelo condicionamento ácido permite a formação de uma íntima união micromecânica entre o esmalte e o componente resinoso do compósito, desde que haja uma próxima adaptação no nível molecular. Essa descoberta permitiu a introdução de uma grande variedade de técnicas restauradoras que não eram possíveis anteriormente, tais como selamento de fissuras, adesão direta de bráquetes ortodônticos, próteses adesivas de resina e facetas laminadas. Muitos estudos contribuíram para a compreensão da relação entre o esmalte condicionado e as resinas, de forma que atualmente a técnica do condicionamento ácido é parte integrante dos procedimentos restauradores com os compósitos. Como mencionado, a aplicação de uma solução muito ácida (como o ácido fosfórico) ao esmalte possui o efeito de modificar as características da superfície, por meio de duas formas importantes. 1. O processo do condicionamento aumenta a rugosidade da superfície do esmalte. Quando o ácido fosfórico é aplicado na superfície do esmalte, uma reação ácido-base é iniciada, que causa da dissolução da hidro-

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

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Figura 2.5.3 Micrografia eletrônica de varredura da superfície do esmalte após o condicionamento por 40 segundos com solução de ácido fosfórico a 35%.

Periferia condicionada

é na faixa de 34-38 mJ.m–2. O esmalte não tratado possui energia de superfície menor que esse valor e, portanto, não possuindo as condições ideais para promover um adequado molhamento. Normalmente, a superfície do esmalte é coberta por uma camada de película que possui uma energia de superfície muito baixa (28 mJ.m–2). Essa camada é removida pelo ácido e expõe a superfície subjacente do esmalte com sua alta energia de superfície e, portanto, alta reatividade (42 mJ.m–2). A resina se adaptará bem a essa superfície com alta energia superficial, desde que ela esteja completamente seca. O embricamento micromecânico assegurará que a resina não se separará do esmalte. Desta forma, a adesão ao esmalte com a técnica do condicionamento ácido é de natureza essencialmente mecânica.

Núcleo condicionado

Figura 2.5.4 O efeito do ácido fosfórico no esmalte na remoção da periferia ou núcleo dos prismas.

xiapatita e diferentes fenômenos tópicos podem surgir. Eles incluem a perda predominante da periferia dos prismas de esmalte, como mostra a Figura 2.5.3; a perda predominante do núcleo dos prismas; e um padrão no qual não existe evidência específica de estrutura prismática. Estes padrões de condicionamento são mostrados esquematicamente na Figura 2.5.4. O efeito geral é o aumento da rugosidade superficial e, portanto, da área de união, tornando possível aderir a essa superfície por um processo de embricamento micromecânico. A rugosidade superficial aumentada oferece como vantagem adicional a melhoria da adesão por meios químicos por causa do aumento da área da superfície, embora sejam ligações secundárias. 2. O ácido possui o efeito de aumentar a energia da superfície do esmalte pela remoção dos contaminantes superficiais. Isso promove um melhor molhamento do adesivo na superfície do esmalte (Cap. 1.10). Tipicamente, a tensão superficial de uma resina adesiva

Procedimento Clínico As características do aumento da rugosidade superficial e a aumentada molhabilidade da resina usando a técnica do condicionamento ácido do esmalte superficial combinam a oportunidade de oferecer uma excelente união entre o compósito e o esmalte. Todavia, assim como em qualquer técnica aparentemente simples, enganos são facilmente cometidos, a menos que o operador siga estritamente as regras para se obter a adesão. As várias etapas da técnica do condicionamento ácido podem ser identificadas como as seguintes: ■ ■ ■

seleção do paciente; profilaxia do esmalte; e aplicação do condicionador.

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Seleção do Paciente A primeira regra para se obter uma boa união é que as superfícies a ser aderidas devem estar livres de contaminantes. Se a superfície estiver contaminada por água ou saliva, uma boa adesão entre o compósito e o esmalte não será obtida. A natureza altamente polar dos contaminantes superficiais evitará que a resina não polar se adapte intimamente à superfície do esmalte. A melhor abordagem para a prevenção da contaminação da superfície do esmalte é usar o isolamento absoluto. Isto nem sempre será possível e, naqueles casos em que o isolamento absoluto não puder ser usado, não é aconselhável adotar uma abordagem adesiva. A seleção adequada do paciente pode evitar esses problemas. Em particular, a técnica do condicionamento ácido do esmalte não deve ser usada em pacientes mentalmente deficientes, crianças de difícil controle e pacientes muito idosos.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A técnica do condicionamento ácido não deve ser utilizada em pacientes que não suportam procedimentos muito demorados.

Profilaxia do Esmalte Assim como em qualquer junta adesiva, é importante que a superfície do substrato esteja completamente limpa. A superfície do esmalte é coberta com uma camada de película e, possivelmente, também por uma camada de placa. Tais camadas precisam ser removidas antes do processo do condicionamento. Enquanto que a fina camada de película pode ser removida pelo ácido, não é possível remover os depósitos espessos de placa dessa maneira. Se esta limpeza não for realizada, a resina aderirá efetivamente aos contaminantes superficiais e não ao esmalte. A limpeza do esmalte superficial é mais bem-realizada com uma pasta de pedrapomes e água, aplicada com escova rotatória por uns 30 segundos. É bom evitar o uso de pastas profiláticas comerciais, pois elas podem conter alguns componentes, tais como óleos, que podem permanecer na superfície do esmalte. Isto reduzirá o molhamento da resina na superfície do esmalte. Uma vez que a superfície esteja limpa, ela deve ser completamente lavada e seca para remover todos os resíduos.

Aplicação do Condicionador Diversas pesquisas foram realizadas para avaliar o melhor método de condicionar a superfície do esmalte. Com o dente seco e apropriadamente isolado da saliva, a solução aquosa do condicionador de ácido fosfórico pode ser aplicada no esmalte com uma bolinha de algodão. Uma observação interessante e importante é

que existe uma relação inversa entre a eficiência do condicionamento e a concentração do ácido fosfórico. Altas concentrações de ácido fosfórico não são tão efetivas em produzir o padrão ideal de condicionamento como as baixas concentrações. A concentração ótima parece estar na faixa de 30%-50%. Concentrações excessivamente altas de ácido fosfórico tendem a apresentar uma mínima alteração na superfície do esmalte, possivelmente porque a baixa concentração de água causa a rápida saturação da solução pelos subprodutos da reação, diminuindo a taxa de dissolução. Logo, as soluções de ácido fosfórico fornecidas com os cimentos de fosfato de zinco não devem ser utilizadas, pois a concentração é muito alta (concentração aproximada do ácido é de 65%). É importante que a superfície do esmalte não seja esfregada durante o processo do condicionamento, pois os prismas de esmalte que se apoiam na superfície são muito friáveis ou frágeis e se quebram sob a menor carga. A ação de esfregar leva a fratura de todos esses prismas, inviabilizando a formação dos sulcos e das fissuras para compor os prolongamentos de resina. Também é importante que todo o ácido fosfórico e os subprodutos gerados da reação durante o processo do condicionamento sejam removidos. Frequentemente, isto é realizado de forma negligente ou apressada. O procedimento a ser adotado é lavar a superfície do esmalte com quantidade abundante de água, seguida de spray de água-ar por pelo menos 20 segundos. Se forem usados roletes de algodão para isolar os dentes, estes deverão ser substituídos para assegurar um campo seco. O processo de secagem é igualmente crítico, já que o objetivo é atingir uma superfície de esmalte perfeitamente seca.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Como a água é altamente polar, a resina não polar não se adaptará a uma superfície de esmalte umedecida.

A remoção dos grupamentos de hidroxila da superfície no procedimento de secagem melhora o molhamento da resina no esmalte e permite que ela escoe facilmente pela superfície e por dentro de todas as fissuras e sulcos produzidas pelo processo do condicionamento. É importante assegurar-se de que a mangueira de ar que é usada para secagem esteja livre de qualquer contaminante como óleo e égua. O esmalte condicionado e seco deve ter uma aparência opaca, esbranquiçada e levemente áspera.

Aplicação de Resinas Sem Carga Quando a resina é aplicada a uma superfície de esmalte seca e bem-condicionada, ela facilmente penetrará por

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

todas as irregularidades superficiais e formar prolongamentos de resina que penetram o esmalte numa profundidade de até 30 µm. Isto produz uma união muito efetiva, pelo mecanismo de embricamento micromecânico. Embora as opiniões sejam divididas, é recomendável, no consenso, que seja aplicada uma resina de baixa viscosidade (isto é, uma resina Bis-GMA sem carga ou algum dos muitos sistemas adesivos dentinários disponíveis) à superfície do esmalte antes da colocação do compósito. A razão para o uso de tal resina adesiva intermediária é que a baixa viscosidade do agente adesivo facilita a melhor penetração nos espaços microscópicos do esmalte condicionado comparativamente à alcançada com a inserção direta do compósito. A molhabilidade da resina composta é tão boa quanto a da resina de baixa viscosidade, porém a alta viscosidade do compósito impede o seu fácil espalhamento pela superfície do esmalte. Além disso, a viscosidade do compósito é suficientemente alta de modo que pode causar uma ponte entre os picos condicionados do esmalte, causando o enclausuramento de ar. Isso possui o duplo efeito de criar uma zona de inibição da polimerização da resina e um defeito interfacial, que pode ser uma subsequente fonte de uma falha adesiva.

Resistência de União Se o procedimento anterior for realizado com diligência, uma adesão eficiente entre o esmalte e o compósito será criada. Naquelas situações em que ocorre a falha da união, ela pode ser geralmente atribuída a uma técnica clínica deficiente. Clinicamente, a adesão ao esmalte não representa um problema. O íntimo embricamento micromecânico entre o esmalte condicionado e a resina é tal que se torna impossível separar a resina do esmalte sem causar fratura de um ou outro. Contudo, isso não significa que o fracasso das restaurações aderidas em esmalte não ocorrerá, visto que a falha coesiva do adesivo ou da restauração pode ainda ocorrer. Igualmente, as restaurações metálicas ou cerâmicas podem falhar na adesão devido à falta de união entre a resina e tais materiais restauradores. Quando ocorre uma falha adesiva, é muito importante estabelecer onde a fratura teve origem, já que isso indica qual componente foi o mais frágil neste sistema de união.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Se ocorrer uma falha de união na interface adesiva entre o esmalte e a resina, então, é mais que provável que tenha havido contaminação da superfície do esmalte antes da colocação da resina.

147

ADESÃO À DENTINA Estrutura da Dentina A dentina é composta de aproximadamente 70% de matéria inorgânica, 20% de material orgânico e 10% de água por peso (Tabela 2.5.1). O material inorgânico é principalmente a hidroxiapatita, e o material orgânico é predominantemente colágeno. Um aspecto característico da dentina é o arranjo dos túbulos dentinários que atravessam toda a espessura. A presença desses túbulos torna a dentina permeável às drogas, substâncias químicas e toxinas, que podem se difundir pela dentina e lesionar a polpa. A composição heterogênea da dentina torna-a um substrato particularmente difícil para união com um adesivo. Um segundo problema é que a pressão diferencial entre a polpa e o soalho dentinário causa o bombeamento do fluido para fora dos túbulos dentinários, de forma que não é possível criar uma superfície dentinária seca. A secagem vigorosa da dentina pode provavelmente resultar em dano irreversível da polpa vital e, portanto, não é uma opção. No caso de uma lesão de abrasão/erosão, a superfície dentinária em geral consiste em dentina esclerótica coberta por uma camada de película, placa e possivelmente cálculo. É importante que esses contaminantes superficiais sejam removidos antes do procedimento adesivo. Tal remoção é facilmente conseguida com a aplicação de pedra-pomes e água. Verifica-se então se a superfície está livre de qualquer contaminante e pronta para o procedimento adesivo. No entanto, a superfície dentinária ainda está coberta por uma camada de dentina desorganizada conhecida como camada de lama dentinária (Fig. 2.5.5). A lama dentinária consiste essencialmente em uma camada gelatinosa superficial de proteína coagulada, de espessura em torno de 0,5 a 5 µm. Ela é, via de regra, altamente contaminada por bactérias do processo carioso e contém resíduos dos instrumentos cortantes. Portanto, os problemas com a adesão dentinária podem ser resumidos da seguinte maneira: ■ ■ ■ ■

a dentina é hidrofílica, enquanto que a maioria dos adesivos é hidrofóbica; a dentina é um tecido vital; a dentina consiste tanto em material inorgânico como em orgânico; e a dentina é coberta por uma camada de lama dentinária.

Componentes dos Sistemas Adesivos Dentinários Com base nos conceitos dos primers e agentes de união, como discutido no Capítulo 1.10, pode-se considerar que os sistemas adesivos dentinários possuem três componentes essenciais:

148

■ ■ ■

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

um primer; um agente de união; um selante.

Na literatura odontológica, os primers normalmente são chamados de condicionadores dentinários e consistem em uma variedade de ácidos que alteram a aparência superficial e as características da dentina. Os agentes de união são na realidade os componentes que realizam a união, mas são geralmente descritos na literatura odontológica e pelos fabricantes como primers. A função do selante é escoar pelos túbulos dentinários e selar a dentina por meio da produção de uma camada superficial rica em metacrilatos, que promoverá a união com a resina do compósito. Esse componente é muitas vezes denominado resina ou adesivo. Este último termo é especialmente confuso já que é o agente de união que promove a união. Essa mistura de terminologia dos vários componentes dos agentes adesivos dentinários contribui para a confusão geral em torno deles. Nas discussões seguintes sobre os sistemas adesivos dentinários, usaremos a terminologia que é comumente usada na literatura odontológica, condicionadores dentinários, primers e selantes, com a intenção de não aumentar a confusão. Posteriormente, discutiremos como estes vários componentes podem ser misturados com o objetivo de produzir formulações mais fáceis de usar.

Papel do Condicionador Dentinário, Primer e Selante Condicionadores Dentinários O papel do condicionador dentinário é modificar a camada de lama dentiná-

ria que é formada na dentina pela ação de corte da broca durante o preparo cavitário ou por exposição aos abrasivos, tais como creme dental, em lesão de cárie de superfície lisa e lesões de abrasão/erosão. Uma das principais características diferenciais dos sistemas adesivos dentinários é a variedade dos condicionadores dentinários que tem sido usada no decorrer do tempo. Nela estão incluídos o ácido maleico, EDTA, ácido oxálico, ácido fosfórico e ácido nítrico. O que eles têm em comum é que todos são ácidos e modificam a camada da lama dentinária em graus variados. A aplicação de um ácido na superfície dentinária produz uma reação ácido-base com a hidroxiapatita. Isto causa a dissolução da hidroxiapatita e resulta na abertura dos túbulos dentinários e na criação de uma camada superficial desmineralizada de dentina, em geral de até 4 µm de profundidade (Fig. 2.5.6). Quanto mais forte o ácido, mais pronunciados são estes efeitos. Desta forma, para o EDTA, que é um ácido leve, ocorre apenas uma abertura parcial dos túbulos (Fig. 2.5.7), enquanto que para o ácido nítrico, que é um ácido forte, ocorre uma extensiva abertura dos túbulos dentinários (Fig. 2.5.8). O efeito disto é mostrado esquematicamente numa vista transversal da dentina na Figura 2.5.9. Alguns condicionadores dentinários podem conter glutaraldeído. A incorporação do glutaraldeído também é almejada para a modificação da dentina. O glutaraldeído é um conhecido agente de ligação cruzada do colágeno e é amplamente usado no curtimento de peles para produção de couro. Ao processo de reação cruzada é atribuída à produção de um substrato dentinário mais forte pela melhoria da resistência e estabilidade da estrutura do colágeno. Uma ressalva sobre o uso do glutaraldeído é

Figura 2.5.5 Micrografia eletrônica de varredura da camada de lama dentinária sobre a dentina.

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

que tem sido observada a necrose tecidual em outras áreas onde ele foi utilizado.

Primers O papel do primer é atuar como adesivo nos sistemas adesivos dentinários, já que ele promove um meio

Dentina desmineralizada

149

de aderir os compósitos hidrofóbicos e os compômeros à dentina hidrofílica. Assim, os primers atuam como um agente intermediário e consistem em monômeros bifuncionais dissolvidos num solvente adequado. O monômero bifuncional é de fato um agente de união que é

Dentina mineralizada

Figura 2.5.6 Micrografia eletrônica de transmissão da dentina após a aplicação de primer de ácido nítrico na superfície.

µm Figura 2.5.7 Micrografia eletrônica de varredura da superfície dentinária após aplicação do primer de EDTA.

150

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Figura 2.5.8 Micrografia eletrônica de varredura da superfície dentinária após aplicação do primer de ácido nítrico.

Dentina desmineralizada Dentina não desmineralizada

Figura 2.5.9 Vista da seção transversal da dentina após a aplicação de um primer ácido.

capaz de se combinar com dois materiais distintamente diferentes. A situação é análoga àquela da união da resina ao vidro nos compósitos, onde é usado o agente de união silano (Cap. 1.10). A fórmula geral para o agente de união dos primers dentinários é a seguinte: Grupo metacrilato – grupo espaçador – grupo reativo M–S–R O grupo metacrilato (M) possui a habilidade de se ligar à resina composta e fornecer uma forte ligação covalente. O grupo metacrilato deve ser capaz de promover um meio satisfatório para a polimerização com a resina do compósito.

O grupo espaçador (S) deve ser capaz de fornecer flexibilidade necessária ao agente de união para melhorar o potencial de adesão dos grupos reativos. Se a molécula for excessivamente rígida (devido à hidrância estérea), a capacidade do grupo reativo em encontrar um arranjo conformacional satisfatório pode ser prejudicada, levando, na melhor das hipóteses, a um arranjo deformado da união e, na pior, à disponibilidade limitada de locais para união. Os grupos reativos (R) são grupos polares pendentes ou terminais. Uma variedade de grupos polares funcionais é mostrada na Tabela 2.5.2. A polaridade da união é uma consequência da distribuição eletrônica assimétrica na ligação. As reações polares ocorrem como resultado das forças atrativas entre as cargas positivas e negativas nas moléculas (Cap. 1.3). Portanto, os grupos polares pendentes e terminais do agente de união podem se combinar com as moléculas polares similares da dentina, tais como os grupamentos hidroxila na apatita e os grupamentos amino no colágeno. A atração pode ser puramente física, mas em alguns casos pode resultar na formação de uma ligação química. A natureza desse grupo reativo determinará se a adesão será na apatita da dentina ou no colágeno. Em alguns casos ambos podem ser envolvidos. Embora todos os agentes de união usados nos primers dentinários possuam grupos polares reativos, eles variam de um sistema adesivo dentinário para outro. Todos possuem o objetivo de produzir uma forte união à dentina, mas os fabricantes e os pesquisadores não concordam em qual é o melhor agente de união. Uma

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

151

Tabela 2.5.2 Padrões de polaridade de alguns grupos funcionais usuais Tipo de componente

Estrutura do grupo funcional δ+

Álcool

C

OH δ –

δ+

Amina

C

NH2δ–

Dentina desmineralizada Penetração do agente de união dentinário Dentina não desmineralizada

Oδ– Ácido carboxílico

Cδ+

Figura 2.5.10 A penetração do agente de união na dentina desmineralizada.

OHδ– O δ– Aldeído

facial fraca. Com o objetivo de obter uma boa profundidade de penetração, o agente de união é, portanto, dissolvido num solvente, como o etanol ou a acetona. Os solventes são muito eficazes na busca por água e no seu deslocamento (“captura da água”), levando junto o agente de união conforme o solvente penetra na dentina desmineralizada. No entanto, é importante que a dentina não seja excessivamente desmineralizada, pois a profundidade da desmineralização pode se tornar excessiva para que ocorra a completa penetração do primer. Com o objetivo de saturar a dentina desmineralizada, é importante que seja aplicada quantidade suficiente de agente adesivo dentinário na superfície dentinária. Isso pode exigir a aplicação de algumas camadas, e também deve ser permitido que o material fique por tempo suficiente para o primer penetre e seja absorvido. A redução da espessura do adesivo com jato de ar excessivo também deve ser evitada, pois o que se quer é a evaporação suave do solvente.

C δ+ H

pequena seleção desses agentes de união é mostrada na Tabela 2.5.3, com o hidroxietil metacrilato (HEMA), sendo particularmente uma escolha muito popular. O HEMA é capaz de penetrar na dentina desmineralizada e unir-se ao colágeno via hidroxila e grupos amino do colágeno. A ação do agente de união na solução do primer é, portanto, criar uma rede de entrelaçamento molecular de poli (HEMA) e colágeno (Fig. 2.5.10). É muito importante que o primer seja capaz de penetrar totalmente e saturar a camada de colágeno desmineralizado. Se isso não ocorrer, então uma fina camada de colágeno permanecerá desmineralizada. Essa camada não será reforçada pela resina e formará uma região inter-

Tabela 2.5.3 Agentes de união utilizados na adesão dentinária

Hidroxietil metacrilato (HEMA)

H

CH3

C

C

H

Dimetacriloxietil fenol fosfato (MEP-P)

H

CH 3

C

C

CH2

CH2

OH

O C

O

CH2

CH2

O

CH3

C

C

C O

P

C

OH

O

H

H

O

O

H

NPG-GMA

C

O

CH2

CH OH

CH2

N

CH2

C

OH

152

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

A técnica de aplicação do primer é determinante no desenvolvimento ou não da microinfiltração.

Embora ocorra alguma penetração do selante para dentro dos túbulos dentinários, fornecendo adesão micromecânica adicional, é o primer que determina a qualidade da adesão final.

Selante Os primeiros selantes dentinários eram simplesmente resinas Bis-GMA ou UDMA sem carga, ativadas por luz ou de dupla ativação. Embora a aplicação de uma resina sem carga, tal como a Bis-GMA, diretamente em uma superfície dentinária condicionada por ácido resulte na formação de prolongamentos de resina, foi mostrado que este procedimento não resultava numa união adequada entre a resina e a dentina. A diferença principal é que sem o uso do primer, a resina hidrofóbica se adapta fracamente à dentina hidrofóbica. Quando um primer é empregado, sua ação torna a superfície dentinária mais hidrofílica, impedindo então a resina de se retrair das paredes dos túbulos dentinários e assegurando a formação de uma trama de prolongamentos resinosos altamente adaptados. Por exemplo, os terminais metacrilato do agente de união HEMA ficam disponíveis para aderir ao selante quando esse for aplicado depois na superfície dentinária preparada. A superfície dentinária é então intimamente selada com a resina, que é aderida à dentina à custa do agente de união contido no primer. Esse selante se unirá facilmente à resina composta. A camada resultante da interpenetração de dentina e resina é normalmente chamada de camada híbrida, como mostra esquematicamente a Figura 2.5.11. A maioria dos selantes dentinários mais recentes é uma mistura de Bis-GMA e HEMA. Isto ajuda a melhorar a adaptação do selante à superfície dentinária.

Técnica de Adesão Úmida à Dentina O agente de ligação dos agentes adesivos dentinários é transportado num solvente volátil, tal como o etanol ou a acetona. Tais solventes são muito eficazes no deslocamento da água na dentina, e no processo levam com eles o adesivo para dentro da dentina. Portanto, não é necessário, e pode até ser prejudicial a desidratação excessiva da superfície dentinária. Se a dentina for excessivamente seca, a consequência disto é que a camada de colágeno desmineralizado colapsará na superfície de dentina mineralizada, produzindo uma estrutura densa e de difícil penetração pelo primer (Fig. 2.5.12). Se a dentina estiver excessivamente desidratada, o colágeno colapsado pode ser reidratado com água. Por sua vez, se a camada de colágeno desmineralizado for mantida úmida, a estrutura porosa será mantida, e o primer poderá infiltrar essa camada facilmente, formando uma união de entrelaçamento molecular (Fig. 2.5.13). Por isso, é necessário remover apenas a umidade superficial excessiva. Todavia, as instruções do fabricante variam dependendo da composição do primer. Alguns primers contêm água como veículo e, para eles, é possível que o colágeno desmineralizado se reidrate suficientemente após secagem, permitindo a penetração do primer pela estrutura colágena.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

Zona híbrida

A eficácia do primer dos sistemas adesivos dentinários em produzir uma camada híbrida depende não apenas dos monômeros bifuncionais usados e dos solventes incorporados, mas também do conteúdo de água na dentina.

Selante/adesivo Dentina desmineralizada Penetração do agente de união dentinário Dentina não desmineralizada Figura 2.5.11 A camada híbrida criada pelo sistema adesivo dentinário.

Técnica do Condicionamento Ácido Total Quando os sistemas adesivos dentinários foram inicialmente introduzidos houve uma preocupação sobre o condicionamento da superfície dentinária. Antes do advento dos sistemas adesivos dentinários, a experiência clínica mostrava que quando o ácido fosfórico usado no processo de condicionamento do esmalte escorria para a dentina, os pacientes voltavam queixando-se de

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

153

1 µm Figura 2.5.12 Superfície desmineralizada da dentina após secagem com ar.

sensibilidade pós-operatória. Acreditava-se que isso era devido à permeabilidade aumentada da dentina após o condicionamento, resultando no efeito hidrodinâmico e possível penetração do ácido na polpa. Então havia relutância em se condicionar a dentina. O desenvolvimento dos sistemas adesivos dentinários significou que a superfície dentinária podia ser selada, e a sensibilidade pós-operatória devido ao efeito hidrodinâmico poderia ser evitada, desde que fosse alcançada uma união entre a dentina e a restauração. Gradualmente, também se observou que o uso de uma solução de ácido fosfórico a 35% resultava numa mínima penetração dentinária (4 a 5 µm) e era improvável que o ácido entrasse em contato com a polpa. Foi introduzida uma técnica diferenciada de condicionamento que envolvia o condicionamento dentinário em separado com uma concentração menor de ácido fosfórico ou o uso de um ácido leve como o EDTA. Contudo, o processo era muito complicado e demorado. Finalmente, surgiu o conceito da técnica do condicionamento ácido total, que consiste no condicionamento ácido simultâneo do esmalte e da dentina, por 20 segundos, com uma solução de ácido fosfórico a 35%. Esse procedimento é aplicável apenas em esmalte recém-cortado e o esmalte intacto necessita ser condicionado de forma convencional.

APRESENTAÇÃO DOS SISTEMAS ADESIVOS DENTINÁRIOS Três Passos Os adesivos dentinários antigos tentaram aderir diretamente à camada de lama dentinária. Contudo, a lama dentinária é uma camada rompida de dentina, que não é um substrato ideal para a adesão direta do adesivo. Os primeiros sistemas adesivos dentinários que mostraram efetividade razoável foram aqueles que formaram uma camada híbrida na adesão e foram criados na metade da década de 1980. Eles foram apresentados como sistemas de três passos, compostos de um condicionador dentinário, um primer e um selante dentinário, e funcionava como descrito. Alguns exemplos dos sistemas disponíveis comercialmente estão apresentados na Tabela 2.5.4. O condicionador dentinário é geralmente uma solução de ácido fosfórico a 35%; o primer pode ter de ser composto de um monômero único, bifuncional fotoativado em um solvente ou pode exigir a mistura de dois componentes para a ativação química. O selante dentinário pode ter também um componente, composto por uma resina com ativação química ou por luz, geralmente de dupla polimerização. Portanto, o número de seringas/frascos pode chegar a cinco.

154

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

1 µm Figura 2.5.13 Superfície desmineralizada da dentina que foi mantida úmida para impedir o colapso da estrutura colágena.

Tabela 2.5.4 Componentes de alguns sistemas adesivos dentinários de três passos disponíveis comercialmente Produto

Fase 1 Condicionador dentinário

Fase 2 Primer

Fase 3 Selante

No de etapas

Scotchbond multipurpose (3M/ESPE)

35% H3PO4

PCA Copolímero

Bis-GMA

7

HEMA

HEMA

Optibond FL (Kerr Corp)

35% H3PO4

Água GPDM

Bis-GMA

HEMA

HEMA

8

Etanol All-Bond 2 (Bisco)

32% H3PO4

Frasco 1: NTG-GMA

Bis-GMA

Acetona, etanol, água

UDMA

Frasco 2: BPDM

HEMA

12

CQ, acetona PCA, ácido policarboxílico; HEMA, hidroxietilmetacrilato; GPDM, ácido glicerofosfórico dimetacrilato; NTG-GMA, n-toliglicina-glicidil metacrilato; CQ, canforquinona; BPDM, bifenil dimetacrilato.

O problema com tais sistemas adesivos de três passos é que além de envolver um grande número de frascos, que pode gerar confusão, também requer muitas etapas para o procedimento adesivo, tipicamente de 8 a 10. Tanto os clínicos como os fabricantes almejavam a redução do número de etapas envolvidas no procedimento adesivo.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA É uma premissa razoável esperar que a simplificação do processo adesivo produzirá resultados mais consistentes e, portanto, mais confiáveis.

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

O desenvolvimento dos novos sistemas adesivos dentinários produziu uma ampla variedade de sistemas que visava simplificar o procedimento enquanto mantinha uma boa adesão entre a dentina e os materiais restauradores. Isto resultou na profusão de sistemas adesivos dentinários de dois passos.

Dois Passos Já que os sistemas adesivos de três passos consistiam em um condicionador dentinário, um primer e um selante, um meio de reduzir o número de componentes e possivel-

155

mente o número de etapas era combinar a ação de alguns desses componentes. Com o objetivo de simplificar a apresentação e o uso dos sistemas adesivos dentinários, essencialmente duas abordagens diferentes foram adotadas. Novos sistemas adesivos dentinários de dois passos foram desenvolvidos; em alguns casos combinando o primer e o selante (Tabela 2.5.5), e em outros combinando o condicionador dentinário e o primer (Tabela 2.5.6). O primeiro caso é normalmente chamado de sistemas adesivos de frasco único, enquanto que o último é denominado primer autocondicionante.

Tabela 2.5.5 Componentes de alguns sistemas adesivos dentinários de dois passos disponíveis comercialmente, da variedade de frasco único Produto

Fase 1 Condicionador dentinário

Fase 2 Primer/selante

No de etapas

Scotchbond One (3M/ESPE)

35% H3PO4

PCA copolímero

7

HEMA Bis-GMA Etanol & Água

Optibond Solo Plus (Kerr Corp)

35% H3PO4

GPDM

5

HEMA Bis-GMA Etanol

One-Step (Bisco)

32% H3PO4

BPDM

8

HEMA Bis-GMA Acetona Abreviações: consulte Tabela 2.5.4.

Tabela 2.5.6 Componentes de dois sistemas adesivos dentinários de dois passos disponíveis comercialmente, contendo primer autocondicionante Produto

Fase 1 Condicionador dentinário/ primer dentinário

Fase 2 primer/selante

Clearfil Liner Bond II (Kuraray Dental)

LB-Primer A:

Fenil-P 5-NMSA CQ

LB-Bond:

LB-Primer B:

HEMA água

SE-Primer:

MDP HEMA Dimetacrilato hidrofílico CQ N,N-dietanol p-toluidina Água

Clearfil SE Bond (Kuraray Dental)

No de etapas

MDP HEMA Bis-GMA

7

Sílica coloidal silanizada Fotoiniciadores SE-Bond:

6 MDP Bis-GMA HEMA Dimetacrilato hidrofílico CQ N,N-dietanol p-toluidina Sílica coloidal silanizada Fotoiniciadores

Fenil-P, 2-metacriloxietil-fenil hidrogênio fosfato; MDP, 10-metacriloxil metacrilato; 5-NMSA, ácido N-metacriloxil 5-aminosalicílico (consulte também a Tabela 2.5.4).

156

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Os sistemas adesivos de frasco único continuam a usar separadamente a etapa do condicionamento ácido antes da infiltração com primer/adesivo. Neste caso, o objetivo é que o processo da hibridização da dentina desmineralizada e o selamento dos túbulos dentinários ocorram simultaneamente. Para essa finalidade, muitos sistemas adesivos de frasco único requerem múltiplas aplicações do primer/adesivo. Isto assegurará a completa saturação da dentina desmineralizada com a mistura de resinas fornecidas no primer/adesivo.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A redução no número de etapas dos sistemas adesivos de dois passos, comparando com os sistemas adesivos dentinários de três passos, pode não ter sido tão drástica como se esperava.

Os benefícios dos sistemas de frasco único são: o clínico apenas precisa considerar um componente, comparado com a miríade de frascos geralmente associada aos sistemas adesivos de três passos; ■ não existe confusão na ordem de aplicação dos componentes; ■ o controle do estoque é feito de forma simples. Uma limitação dos sistemas adesivos de frasco único é que eles não podem ser usados em situações onde o acesso da luz do fotopolimerizador seja comprometido, tais como no caso dos pinos cimentados por resina ou dos amálgamas adesivos. Alguns fabricantes propuseram que estes materiais fossem empregados sem a etapa de condicionamento ácido quando usado em conjunto com os compômeros em áreas de baixas tensões, usando então o sistema de frasco único diretamente no esmalte e na dentina. Embora tal abordagem possa não ser prejudicial para a adesão à dentina, ela comprometerá a adesão ao esmalte. Pelo menos um fabricante (Dentsply) produziu um condicionador dentinário para ser usado com os compômeros. O condicionador consiste em uma solução aquosa de ácido itacônico e maleico e não precisa ser lavada. Esse sistema de dois passos possui a vantagem de reduzir as etapas envolvidas, mas tem a desvantagem de ainda ter que competir com outros adesivos dentinários de fase ■

única usados com os compômeros (veja a seguir). Além disso, não está claro quando o adesivo pode ser usado sozinho, quando poderá ser usado com um condicionador sem enxágue e quando o condicionador ácido deve ser usado. Os primers autocondicionantes trabalham sob a premissa de promover o processo da desmineralização e o da infiltração simultaneamente, formando então a camada híbrida. Isso possui a vantagem de se evitar a etapa ambígua da secagem da dentina. A segunda etapa, aplicação da(s) resina(s) sem carga, assegurará que os túbulos dentinários sejam selados e uma camada superficial rica em metacrilato seja formada.

Etapa Única O adesivo mais simples seria aquele aplicado num procedimento de etapa única. Os fabricantes ainda não chegaram a esse ponto de simplificação de colocar todos os componentes num frasco único. Embora isso possa parecer o próximo passo lógico, a falta de compatibilidade entre os componentes não o permite. O mais próximo que eles conseguiram no desenvolvimento de um sistema adesivo dentinário de um passo foi apresentar o adesivo em dois componentes que precisam ser misturados antes da aplicação na superfície do esmalte e da dentina sem a necessidade de nenhum tratamento prévio do esmalte ou da dentina (Tabela 2.5.7). O procedimento adesivo envolve quatro passos, consistindo em (1) dispensa e/ou mistura dos dois componentes, (2) aplicação na superfície do esmalte e da dentina, (3) secagem e (4) fotopolimerização. A vantagem dessa abordagem não é apenas a sua simplicidade, mas também evita a etapa ambígua da secagem da dentina. Os agentes adesivos dentinários de um passo geralmente são indicados para uso apenas com compômeros e em áreas de baixas tensões, porque a resistência de união ao esmalte, em particular, e em menor grau à dentina, provavelmente não é tão boa quanto a obtida com os sistemas adesivos dentinários de dois ou três passos. Os sistemas adesivos dentinários de um passo também podem ser usados para superar a sensibilidade simplesmente com a sua aplicação na superfície afetada.

Leia as Instruções do Fabricante Uma classificação completa dos agentes adesivos dentinários é fornecida na Tabela 2.5.8. Deve ser enfatizado

Tabela 2.5.7 Componentes dos sistemas adesivos dentinários de um passo disponíveis comercialmente Produto

Fase 1 Condicionador dentinário, primer e selante

No de etapas

Prompt-L-Pop (3M/ESPE)

Parte um: fosfatos metacrilados, fotoiniciadores e estabilizadores

4

Parte dois: complexo de fluoretos, água e estabilizadores i-Bond (Heraeus Kulzer)

UDMA, 4-META, glutaraldeído, acetona, água, fotoiniciadores, estabilizadores

3

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

157

Tabela 2.5.8 Classificação dos sistemas adesivos dentinários Passos/tipo Três passos

Dois passos

Tipo 1

Tipo 2

Descrição

Marca

1. Aplicação do ácido e lavagem para criar uma camada de dentina desmineralizada

All-Bond 2 (Bisco)

2. Aplicação do primer

Optibond FL (Kerr)

3. Aplicação do selante

Scotchbond Multipurpose (3M/ESPE)

1. Aplicação do ácido e lavagem para criar uma camada de dentina desmineralizada

Excite (Ivoclar/Vivadent)

2. Aplicação do primer e selante numa única solução

Gluma Comfort Bond (Heraeus Kulzer) One-Step (Bisco) Optibond Solo Plus (Kerr) Prime & Bond NT (Dentsply) Scotchbond One (3M/ESPE)

Tipo 3

1. Aplicação do primer autocondicionante 2. Selante aplicado separadamente

Clearfil Liner Bond 2V (Kuraray Dental) Clearfil SE Bond (Kuraray Dental) AdheSe (Ivoclar-Vivadent)

Etapa única

Tipo 4

1. Primer autocondicionante e selante aplicados em uma única solução

One-Bond F (J.Morita) Prompt-L-Pop (3M/ESPE) G-Bond (GC) Xeno III (Dentsply) I-Bond (Heraeus Kulzer)

que os diferentes agentes possuem diferentes instruções detalhadas de uso para se obter o melhor resultado. Não é possível contemplar cada uma das sutilezas e todas as nuances do procedimento de aplicação de cada um deles. Não obstante, deve ficar claro, pela descrição anterior dos agentes adesivos dentinários, que não existe uma técnica universal para a produção da adesão dentinária e que cada sistema possui seu próprio procedimento.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA É de extrema importância que as instruções de uso dos agentes adesivos dentinários sejam observadas cuidadosamente, já que elas diferem muito, dependendo dos componentes usados e das apresentações disponíveis para o consumidor.

Seleção de um Agente Adesivo Dentinário Biocompatibilidade Uma consideração importante é como a polpa poderá reagir ao procedimento adotado (particularmente à aplicação de ácido na dentina). É evidente a confiança que os adesivos dentinários depositam nos vários graus de formação dos prolongamentos de resina como forma de garantir a adesão dentinária. Um problema potencial é que a abertura dos túbulos dentinários pode causar extra-

vasamento dos fluidos para a superfície, devido à pressão pulpar. Isto impedirá uma boa adesão, já que previne que o adesivo penetre nos túbulos dentinários e se adapte à superfície dentinária. Embora isso possa ser superado por uma vigorosa secagem da superfície dentinária, o ressecamento excessivo da dentina provavelmente resultará em sensibilidade pulpar pós-operatória e em uma adesão deficiente. Ressalvas consideráveis entre os dentistas sobre o uso dos sistemas adesivos têm sido feitas, já que a abertura dos túbulos dentinários e o consequente aumento da permeabilidade dentinária podem representar um problema, como observado. Preocupações têm sido expressas sobre a possível resposta pulpar à aplicação dos ácidos na superfície dentinária. Algumas considerações a esse respeito são feitas no Capítulo 2.6 sobre o capeamento pulpar direto. No caso da dentina esclerótica, como a encontrada em lesões cervicais de abrasão em pacientes idosos, a aplicação de ácidos na dentina parece ser aceitável, já que a dentina é altamente mineralizada e não é criado um trajeto aberto até a polpa. Isto não ocorre no caso da dentina cariada, embora vários estudos tenham indicado que os sistemas adesivos dentinários e seus ácidos condicionadores associados não possuem efeito adverso na polpa. Portanto, a inflamação pulpar apenas ocorrerá se houver uma falha adesiva, resultando em infiltração bacteriana. Se isso pode acontecer ou não, depende da resistência e durabilidade da união à dentina, da facili-

158

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

dade em se obter essa adesão clinicamente e do material restaurador usado. Os sistemas adesivos dentinários não possuem nenhuma atividade antibacteriana intrínseca para conter a invasão bacteriana, embora algumas tentativas tenham sido feitas para incorporar agentes antibacterianos nestes materiais.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Um ponto muito importante a apreciar é que, se a união adesiva falhar, haverá um acesso fácil para a invasão bacteriana através da dentina permeável.

Para todos os sistemas adesivos dentinários é importante evitar o contato direto da pele com os líquidos do primer/adesivo, já que o contato regular pode resultar numa sensibilização do tipo IV (reação alérgica tardia) ou dermatite de contato.

Resistência e Durabilidade A fratura da junta adesiva pode ter sérias consequências já que ela permite a nova introdução de bactérias e resíduos nas margens cavitárias. Isto causará a descoloração marginal e pode resultar no desenvolvimento de sensibilidade pulpar. De maneira alternativa, a restauração pode simplesmente ser perdida devido à falta de adesão, a menos que tenha sido utilizada alguma forma de retenção. Existe um grande número de causas potenciais responsáveis pela falha da união entre a restauração e a dentina: ■ ■ ■ ■

contração de polimerização; expansão e contração térmica diferencial; tensões internas pela carga oclusal; ataque químico, tal como a hidrólise.

As possíveis consequências da contração de polimerização dos compósitos já foram discutidas (Cap. 2.2). Como pode levar até 24 horas para se obter a resistência de união total dos sistemas adesivos dentinários, a contração de polimerização pode causar a ruptura antes mesmo de a adesão ter tido chance de se estabelecer.

tário. Isso é definido pelo tão chamado fator-C, que é a proporção da área de superfície aderida em relação à área de superfície livre. Se a superfície livre para contração for muito pequena quando comparada com a área da interface entre o dente e a restauração, então a falha da união compósito/dentina tende a ocorrer por causa da contração em direção à superfície. Isso significa que uma adesão somente poderá ser obtida numa superfície plana ou em cavidades muito rasas, a menos que a adesão seja suficientemente forte para resistir as tensões geradas pela contração de polimerização da resina. Se esse for o caso, então as cúspides do dente deverão se deformar para compensar o efeito da contração. Em situações de cúspides seriamente comprometidas, como pode ser o caso de cavidades MODs amplas, isso pode resultar na fratura na base da cúspide. Mesmo que não ocorra, a tensão gerada na coroa dental pode dar origem à sensibilidade pulpar. Em situações de lesões induzidas por tensões, como lesões de abfração cervical, a aplicação de forças excêntricas ou forças oclusas em excesso pode causar a ruptura da adesão da restauração e finalmente ocasionar o seu deslocamento. Foi sugerido que esse problema pode ser superado em algum grau pelo emprego de um material restaurador com um baixo módulo de elasticidade (p. ex., resinas com micropartículas), pois isso impede a transferência de tensões para a interface dente-restauração. Esse conceito é essencialmente a mesma ideia de aplicar uma camada espessa de uma resina com módulo de elasticidade relativamente baixo (tal com um selante dentinário) na superfície dentinária antes da aplicação da resina composta. Se essa camada tiver espessura suficiente, então ela atuará como um “coxim elástico”, absorvendo a tensão de contração de polimerização com a deformação elástica por alongamento. Todavia, isso significa que as tensões deverão ser suportadas em outro lugar da estrutura dental e isto pode não ser a situação mais benéfica.

Número de Etapas Adesivas Se a escolha do sistema adesivo dentinário for baseada simplesmente na complexidade da sua aplicação, então os sistemas de um passo são a opção preferida. No entanto, menos etapas não significam necessariamente um melhor desempenho.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

É prudente recomendar aos pacientes que tentem colocar o mínimo de tensões sobre as restaurações adesivas recentemente confeccionadas pelo menos nas primeiras 24 horas.

A eficácia clínica dos sistemas adesivos dentinários com um número reduzido de etapas ainda necessita ser estabelecida.

A falha da união à dentina devido à contração de polimerização é também dependente do preparo cavi-

Existem também situações em que alguns agentes adesivos dentinários seriam inapropriados. Por exemplo, quando forem usados em conjunto com uma restauração

ADESÃO AO ESMALTE E À DENTINA

indireta, aqueles que precisam ser fotoativados imediatamente podem dar origem a problemas no assentamento da restauração, já que existe uma tendência da resina em se concentrar nos ângulos internos. Nessas situações um sistema adesivo de dois componentes com primer de ativação química seria indicado. Como mencionado, em situações em que o acesso da luz é problemático, como nos pinos metálicos cimentados com resina e nos amálgamas adesivos, um primer de ativação química também é indicado.

Desempenho Clínico Para restaurações pequenas com margens totalmente em esmalte, os compósitos diretos com sistemas adesivos dentinários são aceitáveis, desde que sejam adotadas técnicas adequadas para minimizar os efeitos da contração de polimerização. Para restaurações maiores envolvendo áreas extensivas de dentina exposta, e especialmente onde a cavidade se estende subgengivalmente, o uso de compósitos diretos em conjunto com os sistemas adesivos dentinários é contraindicado. O problema da contração de polimerização pode ser contornado, de alguma forma, pelo uso de inlays de compósito. No entanto, a divergência do coeficiente de expansão ainda representa um problema, e as restaurações cerâmicas unidas com resina podem ser as preferidas, pois elas concentram menos tensões na adesão realizada na região de dentina. É na durabilidade a longo prazo da adesão, em particular, que os novos sistemas adesivos dentinários de dois e um passo ainda precisam provar a sua eficácia clínica. Infelizmente, a mensuração da resistência à tração ou ao cisalhamento em testes in vitro mostrou ser um fraco indicador do desempenho clínico. Apenas poucos adesivos dentinários anunciados foram adequadamente avaliados clinicamente e nem todos os sistemas adesivos dentinários podem ser recomendados para uso clínico geral. Uma

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ampla revisão do desempenho dos sistemas adesivos dentinários em relação a suas taxas de retenção foi realizada por Peumans e colaboradores (2005), que mostraram que os sistemas adesivos dentinários de três passos possuem uma taxa média de falha de 4,8 ± 4,2%, quando comparados com os sistemas de dois passos (6,2 ± 5,5%), os sistemas autocondicionantes de dois passos (4,7 ± 5,0%) e os agentes adesivos dentinários um passo (8,1 ± 11,3%). Ainda, o resultado mais notável foi aquele dos cimentos de ionômero de vidro e dos cimentos de ionômero de vidro modificados por resina com taxas de 1,9 ± 1,8%. Portanto, o uso dos cimentos de ionômero de vidro e os cimentos de ionômero de vidro modificados por resina como base (aderida à dentina) sob os compósitos parece ainda ser uma abordagem alternativa altamente aceitável ao uso dos sistemas adesivos dentinários.

CONCLUSÕES Existem vários adesivos dentinários diferentes e cada um exibe características peculiares em relação a suas propriedades. A última geração de sistemas adesivos dentinários é muito promissora, de tal forma que a falta de retenção não é mais um fator importante no insucesso do material. No entanto, ainda não é possível garantir um selamento marginal com os sistemas adesivos dentinários em todas as situações clínicas.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O desempenho clínico dos sistemas adesivos dentinários melhorou significativamente, de forma que o sucesso clínico com restaurações adesivas tem se tornado muito mais previsível.

LEITURA COMPLEMENTAR Armstrong SR, Keller JC, Boyer DB (2001) The influence of water storage and C-factor on the dentine-resin composite microtensile bond strength and debond pathway utilizing a filled and unfilled adhesive resin. Dent Mater 17: 268–276 Bouillaguet S et al (2001) Bond strength of composite to dentine using conventional, one-step, and self-etching adhesive systems. J Dent 29: 55–61 Choi KK, Condon JR, Ferracane JL (2000) The effect of adhesive thickness on polymerization contraction stress of composite. J Dent Res 79: 812–817 Davidson CL et al (1984) The competition between the composite-dentine bond strength and the polymerisation contraction stress. J Dent Res 63: 1396–1399 Erickson RL (1992) Surface interactions of dentine adhesive materials. Oper Dent 5: 81–94

Finger WJ, Balkenhol M (1999) Rewetting strategies for bonding to dry dentine with an acetone-based adhesive. J Adhes Dent 2: 51 McLean JW (1996) Dentinal bonding agents versus glass– ionomer cements. Quintessence Int 27: 659 Moll K, Haller B (2000) Effect of intrinsic and extrinsic moisture on bond strength to dentine. J Oral Rehabil 27: 150–165 Nakabayashi N, Kojima K, Masuhara E (1982) The promotion of adhesion by the infiltration of monomers into tooth substrates. J Biomed Mater Res 16: 265–273 Nakabayashi N, Watanabe A, Arao T (1998) A tensile test to facilitate identification of defects in dentine bonded specimens. J Dent 26: 379–385 Pashley DH, Carvalho RM (1997) Dentine permeability and dentine adhesion. J Dent 25: 355–372

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Perdigão J et al (2000) New trends in dentine/enamel adhesion. Am J Dent 13: 25D–30D (special issue) Peumans M et al (2005) Clinical effectiveness of contempory adhesives: A systematic review of current clinical trials. Dent Mater 21: 864 Tay FR et al (2000) An ultrastructural study of the influence of acidity of self-etching primers and smear layer

thickness on bonding to intact dentine. J Adhesive Dent 2: 83–98 Van Meerbeek B et al (1998) The clinical performance of adhesives. J Dent 26: 1–20 van Noort R et al (1989) A critique of bond strength measurements. J Dent 17: 61–67

Capítulo 2.6

MATERIAIS ENDODÔNTICOS

INTRODUÇÃO A Endodontia ocupa-se da morfologia, fisiologia e patogênese dos tecidos pulpares e perirradiculares dos dentes humanos. O tratamento endodôntico objetiva salvar o dente quando ocorreu dano na polpa e nos tecidos perirradiculares associados. Os tratamentos envolvendo o uso de materiais dentários incluem o capeamento de uma polpa vital exposta, o selamento do espaço do canal radicular quando a polpa teve que ser removida e, no caso de dentes muito deteriorados, a reconstrução com sistemas de pinos e núcleos endodônticos (Fig. 2.6.1).

CAPEAMENTO PULPAR VITAL As duas principais causas de exposição pulpar são: ■ ■

lesões de cáries e desgaste dentário; exposição acidental durante procedimentos operatórios ou devido a traumatismo.

Em cada um dos casos mencionados, o tratamento restaurador é necessário para salvar o dente. A natureza deste tratamento depende da causa da lesão pulpar mencionada.

Capeamento Pulpar Indireto Sir John Tomes estabeleceu em 1859 que “é melhor permitir que uma camada de dentina pigmentada permaneça para a proteção da polpa do que correr o risco de sacrificar o dente”. Ele observou que a dentina pigmentada e desmineralizada poderia ser deixada nas cavidades profundas do dente antes da restauração, sempre com resultados altamente satisfatórios. Isto se aplica especialmente se há suspeita da existência de microexposições da polpa. A remoção desta dentina pode levar à exposição da polpa, prejudicando assim seu prognóstico. Já foi demonstrado que a dentina desmineralizada, se estiver livre de bactérias,

se remineralizará uma vez que a fonte de infecção tiver sido eliminada. O diagnóstico da presença de dentina desmineralizada livre de cárie pode ser auxiliado pelo uso de uma solução evidenciadora de cárie. A colocação de um material adequado diretamente sobre a dentina desmineralizada é chamada de capeamento pulpar indireto (CPI) e deve-se comentar que não há até o momento nenhum claro consenso para a aceitação deste procedimento clínico. O CPI foi definido como as etapas realizadas para proteger um dente vital no qual a remoção de todos os tecidos afetados resultaria em exposição pulpar. Neste contexto uma polpa não exposta é aquela que não exibe nenhum sinal de hemorragia na câmara pulpar ou próxima dela. Quando se realiza tal procedimento é muito importante que a infecção seja removida e que não encontre condições para recomeçar. Isto pode ser obtido com a colocação de um material de forramento com propriedades antibacterianas como o hidróxido de cálcio ou o cimento de óxido de zinco eugenol, os quais têm por objetivo estimular a formação de dentina secundária. Obviamente, as resinas compostas não devem ser colocadas diretamente sobre os forradores que contêm eugenol já que interferem na polimerização da resina. Com o surgimento de materiais dentários adesivos, outra possível opção restauradora foi a colocação de cimento de hidróxido de cálcio e depois a aplicação de um material de forramento adesivo, como o cimento de ionômero de vidro ou um cimento de ionômero de vidro modificado por resina. Ainda, outra opção é o uso das resinas compostas em associação de um adesivo dentinário. O objetivo é fornecer uma combinação de uma barreira antibacteriana e um selamento adesivo contra a entrada adicional de bactérias, removendo assim os adversários da polpa e permitindo que ela alcance a cura. Quando o hidróxido de cálcio é usado desta maneira, deve ser aplicado com moderação a fim de garantir a maior quantidade possível de dentina para a futura adesão com o cimento de ionômero de vidro/cimento de ionômero de vidro modificado por resina ou resina composta unida à dentina.

161

162

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

µm

Figura 2.6.1 Esquema de dente cuja raiz foi preenchida. Figura 2.6.2 MET mostrando a extensão da penetração do ácido dentro da dentina.

Mais recentemente foi proposta uma abordagem adesiva envolvendo a aplicação direta de um adesivo dentinário. O objetivo é selar a dentina remanescente pela criação da zona híbrida, evitando a sensibilidade pós-operatória imediata e protegendo o dente da entrada de bactérias. Há profissionais com sérias considerações no que diz respeito ao condicionamento ácido dentinário tão próximo à polpa, mas como a Figura 2.6.2 mostra, a desmineralização da dentina pela penetração do ácido é de apenas poucos micrometros. Existem evidências adicionais que dão suporte à posição de que o condicionamento ácido da dentina não matará a polpa adjacente. Com relação à estimulação de dentina secundária, mais evidências foram observadas e sugerem que isto não é uma característica especial do cimento de hidróxido de cálcio.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Pontos importantes a serem observados com relação a muitos materiais dentários: ■ são biologicamente compatíveis com a polpa para capeamento pulpar indireto desde que não estejam presentes bactérias e que a microinfiltração coronária seja impedida; e ■ estimularão a formação de dentina reparadora.

Capeamento Pulpar Direto O capeamento pulpar direto pode ser descrito como o curativo de uma polpa exposta com o objetivo de manter a vitalidade pulpar. Caso ocorra uma exposição pulpar como consequência do preparo do dente ou de traumatismo, é importante que sejam realizadas etapas para evitar a contaminação bacteriana. Se o profissional pode ter certeza de que isto está ocorrendo, então o procedimento de capeamento pulpar direto apresenta um bom prognóstico para que a polpa seja salva; embora as visões

variem, o consenso geral é de que o cimento de hidróxido de cálcio é o material de escolha para capeamento pulpar em tais situações. Porém, muitos clínicos acreditam que a taxa de sucesso em longo prazo com o tratamento endodôntico não justifica o tratamento das exposições pulpares traumáticas com procedimentos de capeamento pulpar que são mais imprevisíveis, especialmente porque o capeamento pulpar malsucedido pode levar à reabsorção, calcificação, pulpite, necrose pulpar ou envolvimento periapical. Entretanto, as vantagens de um procedimento de capeamento pulpar bem-sucedido são que dentes jovens vitais podem ter uma oportunidade de continuar a se desenvolver e que os efeitos de enfraquecimento dentário causados pelo tratamento endodôntico são evitados. Se o capeamento pulpar direto como procedimento clínico é controverso, da mesma maneira é controversa a escolha de materiais para o capeamento pulpar. Um material para capeamento pulpar pode ser considerado como um curativo de uma ferida da polpa exposta. Tal material tanto pode isolar passivamente a polpa do ambiente externo de maneira a impedir a invasão bacteriana e/ou pode induzir alguma mudança na polpa. Há evidências que sugerem que a polpa possui a capacidade de se autoisolar pela formação de uma barreira de tecido conectivo que por fim se transforma em tecido duro. A indução da formação de tecido duro precisa ser precedida por uma irritação de baixo grau que resulta em necrose por coagulação superficial. Com base nisso, um material para capeamento pulpar deve: ■

■ ■

ter um efeito superficial sobre o tecido pulpar, induzindo, portanto, um processo de encapsulamento biológico que resulta na formação de tecido duro; não causar efeitos adversos, sistêmica ou localmente, de maneira que a polpa seja mantida viva; proteger a polpa da entrada de bactérias pela coroa.

MATERIAIS ENDODÔNTICOS

Em outras palavras, um material para capeamento pulpar precisa ser capaz de interagir com a polpa para iniciar a formação de tecido duro e, uma vez que este processo tenha sido desencadeado, deve adotar um papel passivo. Se a polpa for exposta devido à presença de lesões de cáries, o procedimento para capeamento pulpar é contraindicado; a infiltração de bactérias que terá ocorrido para dentro da polpa não pode ser revertida e a única solução é uma pulpectomia total.

Materiais para Capeamento Pulpar Até recentemente, o único material que parecia satisfazer aos requisitos para o capeamento pulpar era o cimento de hidróxido de cálcio que foi usado pela primeira vez com esta finalidade nos anos 1930. Entretanto, sua posição de domínio como material para capeamento pulpar preferido está agora sendo desafiada pelos adesivos dentinários.

Cimentos de Hidróxido de Cálcio A primeira aplicação do Ca(OH)2 foi sob a forma de uma pasta semilíquida, consistindo em nada mais que uma mistura de hidróxido de cálcio em água. Esta foi modificada para uma pasta com metilcelulose, tornando-se mais fácil para manipular. Nos primórdios dos anos 1960, foram introduzidos os cimentos de hidróxido de cálcio que tomam presa nos quais o hidróxido de cálcio reage com um agente quelante éster salicilato na presença de um plastificante tolueno sulfonamida (Cap. 2.4). Os cimentos que tomam presa apresentam-se tanto como sistemas de duas pastas quanto como de uma pasta, consistindo em dimetacrilatos preenchidos por hidróxido de cálcio, polimerizados por luz. O problema com as versões que não tomam presa é que se dissolverão gradualmente e desaparecerão sob a restauração, o que pode diminuir as funções restauradoras. As versões que tomam presa são, portanto, em geral preferidas já que são menos solúveis. A dificuldade para o fabricante é obter um equilíbrio entre um material que seja suficientemente solúvel para ser terapêutico e não tão solúvel que se dissolva continuamente, embora seja discutível se o material para capeamento pulpar precise liberar algo para estimular a formação da ponte de dentina. Quando a pasta é colocada em contato com a polpa, causa a formação de uma camada de tecido necrótico de cerca de 1,0-1,5 mm de espessura que por fim desenvolve uma camada calcificada. Experimentos usando cálcio radioativo na pasta demonstraram que os sais de cálcio necessários para a mineralização da ponte não são derivados do cimento, mas fornecidos pelos fluidos teciduais da polpa. Uma vez que a ponte tenha obtido uma aparência semelhante à da dentina e que a polpa tenha se isolado da fonte de irritação, a formação de tecido duro cessa. Acredita-se que o alto pH do cimento de hidróxido de

163

cálcio é responsável por este tipo de resposta pulpar e que isto também está fortemente associado a suas propriedades antibacterianas.

Adesivos Dentinários O uso de adesivos dentinários é ainda mais controverso que o uso de hidróxido de cálcio como agente de capeamento pulpar direto, mas esta é uma área que vem sendo extensamente pesquisada. Como determinado por Stanley (1998), os dados de pesquisas sobre capeamento pulpar são, às vezes, inadequados, confusos, enganosos ou mesmo incorretos e diminuem a confiança dos clínicos na realização do capeamento pulpar. Na melhor das hipóteses, a situação é confusa e mais pesquisas são necessárias para estabelecer qualquer declaração definitiva. A hemostasia parece ser essencial e, para isso, foi recomendada a limpeza com uma solução diluída de hipoclorito de sódio (1,0% ou menos). Se o sangramento não pode ser controlado dentro de um minuto, indica-se o tratamento endodôntico. O que permanece controverso é a prática do condicionamento ácido total direto com adesivos dentinários e mais pesquisas precisam ser direcionadas para esta área. Alguns casos de sucesso com capeamento pulpar direto usando adesivos dentinários foram demonstrados, quando a etapa do condicionamento ácido é omitida ou então com o uso de sistemas adesivos que não requerem uma etapa separada do passo de condicionamento ácido, como os primers autocondicionantes, apesar da observação que o ácido fosfórico pode atuar como um agente hemostático eficaz. Desta maneira, os resultados obtidos com um adesivo dentinário podem ser diferentes daqueles obtidos com outro adesivo dentinário de forma que a experiência clínica não pode ser extrapolada de um para outro. Por isso, não surpreende que a maioria dos cirurgiões-dentistas continue a usar uma quantidade mínima de hidróxido de cálcio antes da colocação de um adesivo dentinário.

Fracassos após o Capeamento Pulpar Direto Os fracassos após capeamento pulpar direto podem ocorrer devido a três razões: 1. Polpa cronicamente inflamada. Não ocorre nenhum efeito cicatrizante sobre a polpa inflamada e, em tais situações, indica-se uma pulpectomia total. 2. Coágulo extrapulpar. Tal coágulo impede o contato entre o tecido pulpar saudável e o cimento e interfere com o processo de cicatrização da ferida. 3. Falha na restauração. Se a restauração não consegue proporcionar selamento bacteriano, então, a entrada de bactérias pela coroa pode ocasionar o fracasso. É importante distinguir esta última falha das demais, pois ela não está relacionada estritamente a uma falha do capeamento pulpar.

164

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

IMPORTÂNCIA CLÍNICA O sucesso em longo prazo do capeamento pulpar direto não depende apenas das reações induzidas localmente na polpa pelo material de capeamento pulpar, mas é também crucial a dependência da habilidade do clínico em ter certeza de que uma microinfiltração não ocorrerá e que o selamento das margens está mantido.

CH3 C

Isopreno CH2

CH

CH 3 C

Isopreno cis-isômero

MATERIAIS PARA OBTURAÇÃO DO CANAL RADICULAR Os objetivos do tratamento endodôntico não cirúrgico moderno são: ■ ■



Proporcionar limpeza do canal. O objetivo é produzir uma redução das bactérias até um nível não patogênico. Proporcionar “selamento apical”. Isto impede a entrada de fluidos que fornecerão nutrientes para bactérias no canal e também impede que agentes irritantes saiam do canal e entrem nos tecidos periapicais. Proporcionar “selamento coronário”. Isto impede recontaminação pela entrada de micro-organismos bucais.

Uma ampla variedade de materiais tem sido usada na tentativa de produzir um selamento impermeável do ápice dentário radicular. Os materiais de selamento do canal radicular mais amplamente usados são uma combinação de cones obturadores e cimentos seladores do canal.

Cones Obturadores Guta Percha A guta percha é uma borracha retirada da árvore taban. Foi introduzida no Reino Unido em 1843 e tem sido usada em Endodontia por mais de 100 anos. As borrachas são polímeros de isopreno (2-metil-1,3-butadieno) que é um isômero geométrico; isto significa que ele pode ter diferentes arranjos estruturais embora tenha a mesma composição, como retratado na Figura 2.6.3. Quando o grupo CH3 e o átomo H estão posicionados do mesmo lado do isômero isopreno, a estrutura é chamada de cis e o polímero resultante, cis-isopreno, é conhecido como borracha natural. Quando o grupo CH3 e o átomo H situam-se no lado oposto do isômero do isopreno, esta estrutura é chamada de trans e o polímero trans-isopreno é comumente chamado de guta percha (Fig. 2.6.4). Os efeitos das propriedades destas diferentes configurações do polímero são bastante profundos. Na forma cis, o átomo de hidrogênio e o grupo metil impedem o encaixe preciso de maneira que a borracha natural é amorfa e, portanto, macia e altamente flexível, enquanto a guta percha se cristaliza, em geral cerca de 60% cristalina, formando um polímero duro e rígido.

CH2

H C

CH 2

CH 2

CH 3

CH2

Isopreno trans-isômero

C

CH 2

C H

Figura 2.6.3 A estrutura do isopreno e o isopreno cis-isômero e trans-isômero nos quais estão baseadas a borracha natural e a guta percha.

As borrachas naturais são macias e pegajosas a não ser que seja endurecida por vulcanização, um processo descoberto por Charles Goodyear em 1839 (Cap. 1.1). A vulcanização envolve o aquecimento do polímero com uma pequena porcentagem por peso de enxofre. O endurecimento ocorre devido à formação de pontes de enxofre ou formação de ligações cruzadas entre as cadeias de polímeros, impedindo que as moléculas do polímero passem umas sobre as outras. Esta borracha com ligações cruzadas é usada para produzir lençóis e luvas de borracha. A guta percha é um material termoplástico que amolece a 60-65°C e derrete ao redor de 100°C de maneira que não pode ser esterilizada com calor. Se necessário, a desinfecção pode ser realizada com uma solução de hipoclorito de sódio (5%). O uso de solventes como a acetona ou o álcool deve ser evitado, já que estes são absorvidos pela guta percha, causando sua dilatação. Por fim, a guta percha retornará a seu estado não dilatado, comprometendo assim o selamento apical. Quando exposta à luz, a guta percha oxida e torna-se friável. Portanto, é importante verificar que os cones mantêm sua flexibilidade antes de usá-los. A guta percha pode assumir duas conformações diferentes. Em altas temperaturas, as cadeias de guta percha assumem uma forma estendida que pode ser preservada se resfriada rapidamente de maneira a formar a fase β cristalina, enquanto sob resfriamento mais lento, uma fase α mais densa é formada (Fig. 2.6.4). A guta percha em fase α apresenta melhores características termoplásticas e é, portanto, preferida para uso em sistemas de

MATERIAIS ENDODÔNTICOS

165

cis-isopreno CH3 C

H

CH3

C

C CH2

CH2

H

CH3

C

CH2

C CH2

H C

CH3 C

CH 2

CH 2

CH3

CH 2

CH2

n

trans-isopreno CH2

CH3 fase α

C

CH2 C

C

CH2

H

H

C

CH3

C

C

CH 2

CH2

H

n

H fase β

CH2

H

C C

CH2 CH2

CH3

H

C

CH2 CH2

C CH3

C

C n

CH 3

Figura 2.6.4 A estrutura do cis-isopreno (borracha natural) e a fase α e fase β do trans-isopreno da guta percha.

aplicação de guta percha quente nos quais a guta percha amolecida pelo calor é injetada dentro do canal radicular. Esta técnica foi inicialmente desenvolvida por Johnson em 1978 e progressos adicionais da técnica original incluem o uso de carregadores plásticos (Thermofil) e pistolas injetoras (Obtura) para a colocação da guta percha amolecida. Entretanto, na presença de um forame apical aberto, pode haver uma predisposição para extrusão do material de obturação através do ápice. Uma abordagem alternativa é dissolver a guta percha em um solvente químico como o clorofórmio ou xileno. Isto amolece a guta percha e permite que ela seja adaptada intimamente à parede do canal e copie a intricada morfologia do canal. Entretanto, à medida que o solvente é liberado, a estabilidade dimensional pode ficar comprometida e já foram relatadas preocupações com relação aos possíveis efeitos citotóxicos do uso destes solventes. Um dos principais usos é através dos cones de guta percha que são amolecidos e compactados pela condensação vertical e lateral a quente. A composição dos cones obturadores de guta percha comercialmente disponíveis variará de produto para produto, mas os valores comuns são mostrados na Tabela 2.6.1. Os ingredientes adicio-

Tabela 2.6.1 Composição dos cones de guta percha Componente

Quantidade (%)

Função

Guta percha

19-22

Borracha

Óxido de zinco

59-75

Partículas de carga

Sais metálicos pesados

1-17

Radiopacificador

Cera ou resina

1-4

Plastificante

nais são acrescidos para superar a característica friável inerente à borracha e para torná-la radiopaca.

Cones Metálicos Os metais, incluindo o ouro, o estanho, o chumbo, o amálgama de cobre e a prata, têm sido usados por muito tempo como materiais para obturação dos canais radiculares. Os cones de prata foram durante certo tempo extensivamente usado devido ao seu efeito bactericida. A prata é um material mais rígido e inflexível que a guta percha e era usada quando o acesso e instrumentação eram difíceis devido a uma pequena secção transversa ou

166

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

à anatomia difícil. Infelizmente, a rigidez da prata tornou impossível sua adaptação com exatidão às paredes do canal e criava-se maior dependência dos cimentos usados para fornecer o selamento. Outras desvantagens dos cones de prata eram que apresentavam tendência à corrosão, fato que poderia dar lugar à descoloração apical dos tecidos moles, e que eles são difíceis de remover. A corrosão pode ser limitada pelo selamento completo do cone dentro do canal radicular, de forma que ele esteja completamente circundado pelo cimento selador. Entretanto, agora estão disponíveis os cones de acrílico e titânio, como alternativa aos cones de prata, a fim de evitar os problemas de corrosão e talvez agora exista apenas um interesse histórico pelos cones de prata.

CIMENTOS SELADORES DO CANAL RADICULAR As propriedades ideais de um selador de canal radicular são que ele deve: ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■

ser fácil de usar; ficar livre de bolhas de ar e homogêneo quando misturado; escoar para formar uma película de espessura fina; ser insolúvel; se adaptar bem à parede do canal e ao cone obturador; ser radiopaco; ser biocompatível; ser bactericida ou, pelo menos, bacteriostático; e ser fácil de remover em caso de fracasso.

É bem-aceito que as propriedades de selamento de uma guta percha aplicada convencionalmente ou condensada lateralmente são tais que se torna essencial que ela seja usada em associação de um cimento selador do canal radicular. A função do cimento é preencher os espaços entre o cone obturador e a parede do canal radicular, produzindo um selamento antibacteriano. Ele também lubrifica os cones de guta percha durante a compactação e preencherá irregularidades do canal principal lateral. Ao contrário, o uso de cimentos para canais radiculares sem cones obturadores também é contraindicado. Quando usado em uma única porção, os cimentos são muito solúveis ou contraem excessivamente durante a presa. Além disso, é difícil mensurar quando, ou se, o canal está adequadamente preenchido e há risco de que o cimento possa extravasar para além do ápice radicular, para dentro dos tecidos circundantes. É interessante observar que um enfoque similar com os seladores de canais radiculares foi adotado tal como com os forradores cavitários. Agora se aceita que o cimento selador do canal radicular não pode proporcionar um selamento impermeável e a maior parte da atenção foi direcionada à incorporação de propriedades

antibacterianas, com ênfase na obtenção de um selamento antibacteriano. Uma ampla variedade de materiais é usada como seladores dos canais radiculares e estes incluem: ■ ■ ■ ■ ■ ■

cimentos de óxido de zinco eugenol (p. ex., Tubliseal, Kerr); resinas (p. ex., AH Plus, Dentsply; Diaket, 3M/ESPE); cimentos contendo hidróxido de cálcio (p. ex., Apexit, Ivoclar; Sealapex, Kerr); cimentos de ionômero de vidro (p. ex., Ketac Endo, 3M/ESPE; Endion, Voco); polidimetil siloxanos (p. ex., RSA RoekoSeal, Roeko); e agregado trióxido mineral (p. ex., Pro-Root MTA, Dentsply).

Em primeiro lugar, será descrita a composição do selador mais usado, os cimentos de óxido de zinco e eugenol. Depois, as características que os tornam adequados como seladores serão discutidas e, finalmente, os dados clínicos sobre seu desempenho serão avaliados.

Cimentos de Óxido de Zinco Eugenol Há muitos cimentos contendo óxido de zinco, usados com eugenol, aos quais é adicionada uma variedade de outras substâncias para modificar estes cimentos para uso como seladores de canais radiculares (Cap. 2.4). Há três razões principais para o uso de aditivos nos seladores de canais radiculares: ■ ■ ■

fornecer propriedades bactericidas; aumentar sua radiopacidade; e melhorar a adesão à parede do canal radicular.

À semelhança dos cimentos de óxido de zinco eugenol usados para forramento de cavidades e restaurações temporárias, alguns dos seladores consistem em um pó que é misturado com um líquido. A lista completa de ingredientes de um material amplamente usado (baseado em uma formulação originalmente proposta por Rickert em 1931) é apresentada na Tabela 2.6.2. O pó é predominantemente óxido de zinco ao qual é adicionada prata a fim de aumentar a radiopacidade. A resina atua como um plastificante e o iodeto como um agente antisséptico. O problema com esta formulação é que a prata tende a causar descoloração da dentina. Isto é particularmente problemático no acesso cavitário da coroa e afeta a aparência do dente. Formulações como o cimento de Grossman (Tabela 2.6.3) substituíram a prata por compostos de bário ou bismuto. O tamanho das partículas das preparações já mencionadas é bem-maior e tende a produzir uma textura arenosa à mistura resultante a não ser que seja completamente espatulada. Para superar isto, sistemas pasta-pasta foram desenvolvidos e se tornaram muito populares. Os constituintes típicos de tal selador de canais radiculares são apresentados na Tabela 2.6.4.

MATERIAIS ENDODÔNTICOS

Tabela 2.6.2 Composição de um cimento de óxido de zinco e eugenol baseado na formulação de Rickert

Tabela 2.6.5 Composição do AH Plus (Dentsply De Trey GmbH, Alemanha)



Pasta A

Pasta B

34-41

Óleo de cravos

78-80

Resina epóxica

1-amino adamantano

Prata

25-30

Bálsamo do Canadá

20-22

Oleoresina

16-30

Tungstato de cálcio Óxido de zircônio

N,N - dibenzil-5oxanonandiamina-1,9

Iodeto de ditimol

11-13

Aerosil

TCD-Diamina

Óxido de ferro

Tungstato de cálcio

Óxido de Zinco

%

Líquido

%

167

Óxido de zircônio Tabela 2.6.3 Composição de um Cimento de Grossman (Grossman) Pó

%

Líquido

%

Óxido de Zinco

42

Eugenol

100

Resina hidrogenada

27

Subcarbonato de bismuto

15

Sulfato de bário

15

Borato de sódio

1

Tabela 2.6.4 Composição do Tubliseal (Kerr Mf. Co., EUA) Base

%

Catalisador

Óxido de zinco

57-59

Eugenol

Oleoresina

18-21

Resina polimerizada

Trióxido de bismuto

7,5

Anidalina

Iodeto de timol

3-5

Óleos e ceras

10

Resinas A atração dos sistemas de resinas é que estes materiais podem ser facilmente formulados de tal forma que tenham tempo de presa rápido e ainda mantenham um tempo de trabalho suficientemente longo. Também, estes produtos não contêm nenhum pó espesso de maneira que apresentam textura muito lisa. Há dois sistemas de resina que estão no mercado por um tempo suficiente longo para que alguns dados clínicos tenham sido coletados sobre eles. Estes são uma resina epóxica de amina (AH Plus, De Trey, Alemanha) e uma resina de polivinil (DIAKET, 3M/ESPE, Seefeld, Alemanha). Ambas possuem formulações muito complexas e a composição do AH Plus é mostrada na Tabela 2.6.5. A resina toma presa por uma reação de polimerização por adição após a mistura de duas pastas. O diepóxido, um éter diglicidil de bisfenol A, e uma amina, ou o 1-amino adamantano ou a N,N-5-dibenzil-oxanonandiamina-1,9, reagem para formar oligômeros com grupos finais epóxica e amina, que podem reagir com outros monômeros ou oligômeros, como demonstrado de forma simplificada na Figura 2.6.5. Isto produz um polímero

Aerosil Óleo de silicone

termoplástico altamente flexível e de alta estabilidade dimensional embora ainda esteja sujeito à contração de polimerização. A reação de polimerização por adição leva várias horas, proporcionando assim um tempo de trabalho longo. As cargas radiopacas asseguram que o material tenha alta radiopacidade, mesmo quando aplicado em finas camadas. A viscosidade é controlada pela quantidade (>76% por peso) e tipo de carga. O tamanho das partículas de carga alcança, em média, menos que 10 µm para garantir uma película de espessura fina e fornecer uma consistência lisa. O problema principal com estas resinas é a quantidade de contração que ocorre durante a presa a qual pode comprometer o selamento apical.

Cimentos Contendo Hidróxido de Cálcio Os cimentos contendo hidróxido de cálcio apresentam-se sob a forma de uma pasta base e uma pasta catalisadora as quais são misturadas em porções iguais. Eles contêm uma resina semelhante a que é usada nas resinas compostas de duas pastas às quais é adicionado hidróxido de cálcio como carga em substituição ao vidro, carga mais utilizada. A composição de um destes materiais é apresentada na Tabela 2.6.6. Até o momento, pouco se sabe sobre o desempenho clínico destes materiais. Estes materiais apresentam tempos de trabalho longos e pH alto, o que cria um ambiente altamente alcalino no qual a maioria das bactérias morrerá. A biocompatibilidade é excelente com a formação de cemento sobre o forame apical. Um inconveniente é sua alta solubilidade o que gerou preocupações sobre possíveis microinfiltrações coronárias ou apicais após algum tempo.

Cimentos de Ionômero de Vidro Os cimentos de ionômero de vidro consistem em um vidro de flúor-alumínio-silicato, o qual reage com um ácido policarboxílico. Uma vez que os cimentos de ionômero de vidro apresentam baixa contração durante a presa e possuem a capacidade praticamente única para aderir diretamente à dentina e ao esmalte, estes materiais

168

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

OH

OH n

R

O

O

+n

R'

NH2

R

R' N n

A reação de presa do AH Plus é baseada em uma reação de adição térmica da epóxica-amina

Figura 2.6.5 A reação de presa do AH Plus, que é baseada em uma reação de adição epóxica-amina.

Tabela 2.6.6 Composição do Sealapex (Kerr Mf.Co., EUA) Pasta base

%

Pasta catalisadora

%

Hidróxido de cálcio

46

Sulfato de bário

39

Sulfonamida

38

Resina

33

Óxido de zinco

12

Salicilato de isobutil

17

Estearato de zinco

2

Sílica coloidal

2

Sílica coloidal Dióxido de titânio Óxido de ferro

6 4 SC > SA sendo os polissulfetos mais propensos à deformação permanente, e as siliconas de adição, os menos propensos.

Resistência ao Rasgamento A resistência ao rasgamento do material de moldagem é também uma propriedade importante, quando uma moldagem de um paciente dentado é realizada. Os polissulfetos possuem a maior resistência ao rasgamento, seguidos de longe pelos poliéteres e finalmente pelas siliconas. No entanto, uma alta resistência ao rasgamento não é necessariamente uma boa propriedade, já que uma altíssima resistência ao rasgamento pode dificultar na remoção da moldagem da boca, quando o material de moldagem escoa nos espaços interdentais. Além disso, uma quantidade considerável de deformação pode ocorrer nos materiais com uma alta resistência ao rasgamento antes do material sofrer o rasgamento, e esta deformação pode não ser totalmente recuperada.

Dessa forma a resistência ao rasgamento deve ser suficiente para prevenir falhas catastróficas, mas não tão alta para resultar em deformação excessiva ou dificultar a remoção da moldagem.

Reprodução dos Detalhes Superficiais Todos os materiais de moldagem elastoméricos, quando empregados em baixa viscosidade, são capazes de reproduzir os detalhes da superfície de maneira muito precisa. A habilidade de reproduzir o detalhamento superficial está diretamente relacionada com a viscosidade do material de moldagem: quanto menor a viscosidade, melhor a reprodução. Na verdade, a reprodução de detalhes é em geral tão boa que os modelos de gesso são incapazes de reproduzi-la. Os fatores que causam imperfeições na reprodução dos detalhes superficiais são geralmente relacionados à técnica deficiente. Por exemplo, deve-se tomar muito cuidado durante a mistura das duas pastas para minimizar a presença de bolhas de ar. As bolhas de ar não são problema quando estão presentes no interior do corpo do material, mas podem ser um problema quando se localizam na superfície ou próximo dela, pois o detalhe será perdido. Outro problema que pode se manifestar é a ocorrência de áreas onde o material de moldagem não reagiu adequadamente, mantendo um aspecto pegajoso. Isso é geralmente devido à manipulação inadequada, resultando numa mistura não homogênea. Todos os materiais de moldagem elastoméricos são hidrofóbicos, e se a superfície dentária se contaminar com saliva, o material de moldagem é incapaz de cobri-la adequadamente  isso pode causar perda de cópia dos detalhes superficiais. A capacidade de um material de moldagem de escoar sobre uma superfície pode ser determinada pelas medições do ângulo de contato. Os ângulos de contato da água com os materiais de moldagem foram medidos, e os valores são 49,3o, 82,1o e 98,2o para o poliéter, polissulfeto e silicona de adição, respectivamente. Isto demonstra que as siliconas são particularmente problemáticas, e os poliéteres são os mais fáceis de se trabalhar sob esse ponto de vista. Uma variedade de siliconas de adição, chamados hidrofílicas, está disponível no mercado. Adicionou-se nestes materiais um surfactante para alterar a hidrofobicidade da superfície, reduzindo o ângulo de contato para valores próximos daquele dos poliéteres.

Estabilidade Dimensional e Fidelidade É importante que o modelo da cavidade oral seja uma réplica tridimensional precisa, pois todo o trabalho laboratorial será baseado nesse modelo. Além do problema da distorção, existe também o perigo da expansão e da contração da moldagem. Com o advento das siliconas de adição e dos poliéteres, os materiais de moldagem estão provavelmente tão

MATERIAIS DE MOLDAGEM

precisos quanto necessitam ser. Recentemente, tem-se dado atenção à melhoria das suas características de manipulação; a estabilidade dimensional das siliconas de adição pode algumas vezes se tornar um problema, como discutido a seguir.

Outros Fatores Os fatores que contribuem para a produção de um modelo impreciso já foram discutidos, mas alguns fatores merecem mais comentários específicos em relação aos materiais de moldagem.

Contração de Presa e Contração Térmica Em geral, a contração de presa dos materiais de moldagem elastoméricos é muito baixa. A formação de ligações cruzadas resulta numa contração consideravelmente menor em geral que a associada à polimerização, já que envolve apenas um processo de ligação das cadeias poliméricas preexistentes umas às outras. O poliéter e as siliconas de adição possuem a menor contração de presa, seguidos dos polissulfetos. As siliconas de condensação possuem o maior grau de contração devido à contração de presa. Portanto, os materiais de moldagem podem ser ordenados da seguinte forma, em relação à contração de presa: PE = SA < PS < SC A contração térmica é importante já que a moldagem se resfria da temperatura da boca para a temperatura ambiente. Os poliéteres possuem a maior contração térmica (320 ppm/°C), seguidos pelos polissulfetos (270 ppm/°C) e depois pelas siliconas (200 ppm/°C). Eles podem ser ordenados da seguinte forma: SC = SA < PS < PE É claro que tanto a contração de presa como a contração térmica são afetadas pela quantidade de carga presente de forma que quanto maior a quantidade de carga, menor a contração.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A quantidade de pasta-base leve utilizada deve ser sempre a menor possível.

Estabilidade Dimensional Os polissulfetos tendem a se contrair na armazenagem, especialmente se forem mantidos em ambiente com baixa umidade, já que o subproduto da reação de presa é a água. Assim o modelo será sempre levemente maior que o dente, deixando espaço adequado para o agente cimentante. Os modelos devem ser vazados logo após a realização da moldagem.

189

Os poliéteres são muito estáveis na armazenagem, a menos que sejam colocados em ambiente altamente úmido, onde absorverão água e sofrerão expansão. Se isso ocorrer, o modelo resultante será menor que o dente original, e a coroa produzida sobre tal modelo não se adaptará sob nenhuma circunstância. Como esse material de moldagem absorve prontamente água dos alginatos, os dois nunca devem ser colocados em contato direto.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA As siliconas de condensação apresentam uma contração considerável com o passar do tempo. Isso é atribuído à perda do subproduto álcool. Portanto, assim como os polissulfetos, os modelos devem ser preparados o mais breve possível, após se permitir a recuperação elástica, isto é, entre 30 minutos e uma hora após a realização da moldagem.

As siliconas de adição são muito estáveis após a presa e mostram quase nenhuma alteração dimensional na armazenagem. Portanto, estes materiais são particularmente úteis em situações em que é necessária a duplicação de troquéis de gesso.

Técnica de Moldagem O polissulfeto e as siliconas de condensação apresentam uma pequena contração, de modo que o modelo vazado da moldagem é invariavelmente um pouco maior que o dente. Portanto, a quantidade de espaço criada para o agente cimentante dependerá do tempo que transcorreu entre a tomada da moldagem e a confecção do modelo. Para o poliéter e as siliconas de adição, a contração é tão pequena que existe pouco espaço para o agente cimentante. A alta estabilidade dimensional das siliconas de adição pode causar problemas se for utilizada a técnica de moldagem errada. A grande variedade de apresentações das siliconas para moldagem fornece a oportunidade de se utilizar várias técnicas de moldagem. A mais popular é a que emprega massa densa/massa de baixa viscosidade (pasta leve), que permitem o uso de uma moldeira de estoque. As consequências no tamanho dos modelos produzidos das três técnicas de moldagem são mostradas graficamente na Figura 2.7.14.

Técnica da Moldagem Simultânea Nessa técnica, a camada do material de baixa viscosidade é misturada e colocada numa seringa e, enquanto o material de moldagem é colocado em torno dos dentes que necessitam de uma moldagem precisa, a massa densa é misturada e colocada na moldeira de estoque. A moldeira

190

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Polimerização por condensação

Polimerização por adição

Mistura simultânea

Modelo maior

Modelo menor

Duas etapas com espaçador

Modelo maior

Modelo menor

Duas etapas sem espaçador

Modelo maior

Modelo menor

Modelo vazado imediatamente

Modelo vazado após 24 horas

Modelo vazado após uma semana

Figura 2.7.14 Alterações dimensionais das siliconas de adição e de condensação, de acordo com diferentes técnicas de moldagem.

carregada é, então, inserida, na boca do paciente, e os dois materiais de moldagem tomam presa simultaneamente. Haverá alguma deformação do material de moldagem com a remoção, maior parte da qual é recuperada imediatamente pelo efeito de mola.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A deformação permanente é a medida da capacidade de recuperação elástica, e, quanto maior a deformação permanente, maior é o potencial de distorção pela remoção da moldagem da boca. Se o modelo for vazado quase de imediato, pouca ou nenhuma contração (devido ao resfriamento e à contra-

ção de armazenagem) ocorrerá, e o modelo resultante apenas será levemente maior que o dente. Devido à contração de armazenagem (no caso da silicona de condensação), quanto maior a demora em vazar o gesso, maior será o modelo. Como as siliconas de adição são muito estáveis na armazenagem, o modelo será do mesmo tamanho, não importando quando for vazado. Os problemas potenciais com esta técnica estão relacionados com a remoção das siliconas de adição. Embora existam atualmente massas densas mais macias, a remoção pode ser difícil se a massa escoar para dentro dos espaços interdentais; quanto maior forem, mais difícil será de remover a moldagem. Outro problema que pode surgir é que a massa densa pode deslocar a camada fluida de onde se deseja maior precisão de detalhes da superfície.

MATERIAIS DE MOLDAGEM

191

Técnica de Moldagem de Duas Etapas com Espaçador

Compatibilidade com os Materiais do Modelo

Esta técnica efetivamente envolve a produção de uma moldeira especial usando primeiro a massa densa. Uma moldagem inicial é realizada diretamente nas superfícies bucais ou, algumas vezes, após a colocação de uma folha fina de celofane sobre a massa densa. Na primeira situação, a moldagem de baixa qualidade dos dentes é, então, cortada, criando um canal para a camada fluida. Após isto, uma segunda moldagem é produzida usando uma massa de baixa viscosidade, que fornecerá o detalhamento superficial necessário. Geralmente, é necessária uma quantidade maior de camada fluida nessa técnica que na técnica de moldagem simultânea, e isto significa que existe maior contração de presa, pois a massa fluida possui um conteúdo de carga muito menor. Isso é especialmente importante no caso das siliconas de condensação, que também mostram maior contração durante a armazenagem. As siliconas de adição não são em geral afetadas por tais problemas. A contração de presa é compensada em certo grau, pois a massa densa já terá tomado presa. Quando esse método é usado com as siliconas de adição, elimina-se a necessidade de remover o material rígido das áreas retentivas.

A compatibilidade com os materiais do modelo não representa um problema para nenhum dos elastômeros. Contudo, para as siliconas de moldagem, a hidrofobicidade pode torná-los suscetíveis à reduzida molhabilidade da pasta aquosa dos produtos à base de gesso usados para vazar os modelos ou troquéis, que consequentemente pode levar ao aprisionamento de bolhas de ar e espaços vazios. Apesar de este problema ter sido abordado de certa forma pela inclusão de surfactantes nos materiais de moldagem, este problema não desapareceu completamente. Uma maneira de minimizar a ocorrência de bolhas de ar e os espaços vazios pode ser pela aplicação de surfactante na superfície da moldagem após desinfecção e antes de vazar o modelo. Uma limitação do polissulfeto é que ele não pode ser metalizado com cobre para produzir troquéis reforçados, pois o polissulfeto reage com o eletrólito. O processo alternativo de metalização com prata não está facilmente disponível devido aos perigos associados ao cianeto de prata usado no processo de metalização. A suscetibilidade dos poliéteres em absorver água pode ocasionar alguma distorção durante o processo de metalização. As siliconas de condensação e de adição podem ser metalizadas tanto com cobre como com prata. O único problema aqui é que a superfície deve se tornar condutiva, e é difícil aplicar uma camada de grafite devido à baixa tensão superficial das siliconas.

Técnica de Moldagem de Duas Etapas sem Espaçamento Nesta técnica, a primeira moldagem é realizada com a massa densa. Depois, a camada fluida é colocada em volta dos dentes e na moldeira sobre a massa densa e, então, recolocada na boca. O processo de reposicionamento pode ser um tanto problemático. Como é necessária certa quantidade de espaço para a camada fluida, haverá alguma compressão da massa densa para acomodá-la. A excelente recuperação das siliconas de moldagem significa que, imediatamente após o material ter tomado presa e ser removido da boca, haverá um efeito de mola tão logo a pressão sobre a massa densa seja aliviada. Se o modelo for vazado quase que de imediato, é provável que para ambos os tipos de materiais de moldagem, o modelo seja levemente menor que o dente. Para as siliconas de condensação, a contração na armazenagem assegurará que, após uma demora de 24 horas, essa situação será revertida. No entanto, as siliconas de adição são tão estáveis dimensionalmente que o modelo será sempre menor.

Aceitabilidade Os polissulfetos possuem odor desagradável devido aos grupamentos de mercaptana. (Pequenas quantidades de tiol são adicionadas ao gás natural para torná-lo facilmente detectável, e os tióis são excretados pelos gambás para se proteger dos predadores.) Os polissulfetos também são difíceis de ser removidos dos tecidos, se derramados. Os poliéteres e as siliconas são materiais altamente aceitáveis e ocasionam menos sujeira durante manipulação.

Custo Os elastômeros são consideravelmente mais caros que os hidrocoloides e os materiais rígidos de moldagem, sendo as siliconas de adição ainda mais caros. Os méritos relativos dos materiais de moldagem elastoméricos são resumidos na Tabela 2.7.8.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A técnica de moldagem de duas etapas sem espaçamento é inapropriada para as siliconas de adição, pois a moldagem inicial é de difícil remoção das áreas retentivas após a presa devido à alta rigidez da massa densa.

DESINFECÇÃO DOS MATERIAIS DE MOLDAGEM A equipe odontológica está constantemente exposta aos micro-organismos, que podem causar infecções, tais como: resfriado comum; pneumonia; tuberculose; herpes

192

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

Tabela 2.7.8 Vantagens e desvantagens dos materiais de moldagem elastoméricos POLISSULFETOS Vantagens

Desvantagens

Boa molhabilidade

Alta deformação permanente

Boa cópia dos detalhes de superfície

Gosto e sabor desagradável

Fácil remoção

Deve ser vazado dentro de uma hora

Alta resistência ao rasgamento

Tempo de presa longo Tomar cuidado na desinfecção SILICONAS DE CONDENSAÇÃO

Vantagens

Desvantagens

Boa cópia dos detalhes de superfície (superfícies secas)

Hidrofóbico

Boa fidelidade dimensional

Contração na armazenagem

Baixa deformação permanente

Deve ser vazado dentro de uma hora

Grande variedade de viscosidades

Baixa resistência ao rasgamento

Fácil desinfecção Ótima aceitação pelo paciente POLIÉTERES Vantagens

Desvantagens

Hidrofílico

Alta deformação permanente

Boa cópia dos detalhes de superfície

Expande quando em contato com os desinfetantes ou em ambientes úmidos

Boa fidelidade dimensional

Remoção difícil

Boa resistência à deformação

Baixa resistência ao rasgamento

Ótima aceitação pelo paciente

Tomar cuidado na desinfecção SILICONAS DE ADIÇÃO

Vantagens

Desvantagens

Boa cópia dos detalhes de superfície (superfícies secas)

Hidrofóbico (a menos que seja adicionado um surfactante)

Boa fidelidade dimensional

Baixa resistência ao rasgamento

Boa estabilidade de armazenamento Baixa deformação permanente Grande variedade de viscosidades Fácil desinfecção Ótima aceitação pelo paciente

e; hepatite. Particularmente, desde o advento da AIDS, tem havido um crescente alerta dos potenciais da infecção cruzada no manuseio dos materiais de moldagem. A infecção cruzada pode ocorrer do paciente para o dentista, e auxiliar de consultório dentário e finalmente para o técnico de laboratório. Portanto, toda a equipe odontológica está em risco. A maioria dos laboratórios dentários não aceita moldagens, a menos que haja uma garantia do profissional de que elas foram desinfetadas. Isso representa um sério problema para o dentista, pois a realização de moldagens precisas é um procedimento difícil na melhor das hipóteses. Toda atenção e cuidados prestados ao se realizar uma moldagem de boa qualidade podem ser totalmente

destruídos, se a moldagem distorcer durante o procedimento de desinfecção. Cabe ao dentista escolher o material de moldagem mais apropriado e o procedimento de desinfecção associado.

Desinfetantes Já que a esterilização das moldagens não é possível, por causa da alta temperatura e do tempo necessário, a desinfecção é o método de escolha. O meio mais efetivo na desinfecção das moldagens é imergi-las numa solução desinfetante por até 30 minutos. Quando a desinfecção das moldagens não puder ser realizada pela imersão em um meio desinfetante, um spray desinfetante pode ser

MATERIAIS DE MOLDAGEM

usado. Existe uma variedade de soluções, que podem ser usadas como desinfetantes em sprays ou para imersão dos materiais de moldagem. Elas se dividem nos seguintes grupos principais: ■



■ ■

Soluções cloradas. Elas tendem a ser prejudiciais para pele, olhos etc., mancham os tecidos, possuem odor desagradável e são altamente corrosivas aos metais. Soluções de aldeídos. Elas liberam um odor sufocante e são irritantes à pele e aos olhos. Os produtos comerciais tendem a empregar soluções à base de glutaraldeído, em vez de formaldeído. As soluções de glutaraldeído a 2% são os desinfetantes preferidos. Soluções de iodo (Iodóforos a 1%). Fenóis.

Efeitos dos Desinfetantes na Fidelidade dos Materiais de Moldagem Os efeitos dos desinfetantes na precisão e na estabilidade dimensional dos materiais de moldagem têm sido exaustivamente estudados e um resumo sobre o conhecimento atual em relação às várias classes de materiais de moldagem é fornecido a seguir.

Hidrocoloides Reversíveis Os materiais de moldagem à base de ágar podem ser imersos em soluções de hipoclorito de sódio, iodóforos ou glutaraldeído com tampão fenólico. É importante que as instruções do fabricante sejam cuidadosamente seguidas em relação à diluição e o tempo de imersão. O tempo de imersão não deve de forma alguma exceder 30 minutos. Outro perigo potencial com o ágar está associado à contaminação cruzada pelo banho-maria.

Hidrocoloides Irreversíveis Uma alteração dimensional altamente significante ocorre nos alginatos para moldagem, quando imersos por mais de 15 minutos no glutaraldeído, formaldeído ou solução de hipoclorito de sódio, embora quando borrifados e deixados em contato com derivados fenólicos por 30 minutos também resultem em modelos com alterações dimensionais clinicamente significativas. O hipoclorito de sódio também causa dissolução parcial dos alginatos. A imersão por até 15 minutos no glutaraldeído neutro ou no iodóforo parece resultar em alterações dimensionais aceitáveis. Contudo, as moldagens de alginato embebidas em agentes aldeídos por tempos inferiores a dois minutos produziram modelos de qualidade superficial inferior. Portanto, as moldagens de hidrocoloide irreversível (alginato) distorcem quando imersas e devem ser desinfetadas por borrifamento e seladas num saco plástico pelo tempo recomendado pelo fabricante. A desinfecção interna (substituindo a água por um desinfetante antes da tomada da moldagem) é outra

193

possibilidade para os alginatos, pois ela permite o vazamento imediato da moldagem logo após a retirada da cavidade oral. Embora pareça altamente eficaz, ela ainda não supera o problema de como desinfetar a moldeira de moldagem.

Polissulfetos Estudos usando uma ampla variedade de desinfetantes e períodos de imersão variando de 10 a 30 minutos indicam que nenhum efeito adverso foi observado com os polissulfetos e que os sprays desinfetantes também são aceitáveis.

Poliéteres Os poliéteres são conhecidos por expandir quando expostos à umidade. Então, não é de surpreender que a imersão numa variedade de desinfetantes cause expansão excessiva após 10 minutos. As alterações dimensionais tornam-se altamente significativas após quatro horas de imersão em aldeído succínico aquoso a 10%, mas são aceitáveis após 10 minutos de imersão. Os sprays desinfetantes também são aceitáveis. Logo, a recomendação para os poliéteres é utilizar um spray desinfetante ou imersão em produtos com curto tempo de ação (< 10 minutos), como os compostos clorados.

Siliconas de Condensação Embora as siliconas de condensação não sejam quimicamente afetadas pela imersão prolongada em uma grande variedade de desinfetantes, o fator limitante com esse material de moldagem é sua inerente instabilidade dimensional.

Siliconas de Adição Muitos estudos têm pesquisado os efeitos dos desinfetantes na estabilidade dimensional das siliconas de adição. Eles concluem que nenhum efeito adverso resulta mesmo após uma exposição prolongada (até 18 horas) das siliconas de adição a todas as variedades de desinfetantes. A única desvantagem parece ser a reduzida molhabilidade do material do modelo nas moldagem realizada pelas siliconas hidrofílicas.

Procedimento de Desinfecção As impressões devem ser lavadas em água imediatamente após a remoção da boca do paciente, para retirar quaisquer sinais óbvios de saliva, sangue e resíduos. A desinfecção da moldagem deve ser realizada antes da confecção do modelo, ou antes de ser enviada ao laboratório. É de responsabilidade do dentista certificar que as moldagens foram recebidas pelo laboratório dentário sem contaminantes. Como pode ser visto pelo que foi descrito, o procedimento de desinfecção a ser adotado depende do tipo de material de moldagem e do desinfetante usado. Deve-se considerar que o objetivo do procedimento é

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO CLÍNICO

desinfetar e não esterilizar, este último exigindo imersão prolongada por períodos inaceitáveis e, em nenhum caso, isso é permitido. O Serviço de Aconselhamento da Associação Dentária Britânica (British Dental Association Advisory Service) (Advice Sheet A12) comenta que certos tipos de materiais de moldagem podem ser desinfetados com glutaraldeído, mas também observam que ainda não existe nenhum método universalmente aplicável para a desinfecção de todos os tipos de materiais de moldagem. Eles seguem recomendando que moldeiras descartáveis devem ser utilizadas e que os protéticos devem usar luvas ao manusear os materiais de moldagem e ao vazar os modelos. A Associação Dentária Americana (American Dental Association) sugere a imersão por 30 minutos num desinfetante à base de glutaraldeído para os polissulfetos e siliconas de condensação e de adição e o uso de um spray desinfetante de compostos clorados para os hidrocoloides irreversíveis e poliéter. No entanto, é importante que em cada caso as recomendações do fabricante sejam seguidas e que os procedimentos de desinfecção apropriados sejam usados para cada tipo de material de moldagem. Das informações disponíveis até o momento, os únicos materiais de moldagem que podem ser desinfetados sem nenhum efeito quase adverso são as siliconas de adição.

pais insucessos estão associados à reprodução deficiente dos detalhes de superfície e a adaptação deficiente da prótese.

PROCEDIMENTOS DE DESINFECÇÃO Alginato Borrife com desinfetante e coloque num plástico selado pelo tempo recomendado pelo fabricante. Polissulfetos Use imersão em um desinfetante e siliconas pelo tempo recomendado pelo fabricante (preferivelmente < 30 minutos). Poliéteres Use um spray desinfetante ou imersão em produtos com um tempo de desinfecção curto (< 10 minutos).



Reprodução Deficiente dos Detalhes de Superfície Os fatores que podem causar a reprodução deficiente dos detalhes superficiais são: ■





Adaptação Deficiente da Prótese Os fatores que originam uma adaptação deficiente são:

FRACASSOS NA REALIZAÇÃO DA MOLDAGEM ■

Como a qualidade da prótese é diretamente dependente da qualidade da moldagem, é importante que uma moldagem de qualidade ruim seja rapidamente identificada e não seja encaminhada ao laboratório dentário. Em muitos casos, a necessidade de repetições pode ser evitada estando-se atento para os tipos de problemas que podem surgir e como podem ser evitados. Os princi-

Aspereza ou rugosidade na superfície da moldagem. Isso pode ser devido à presa incompleta (usualmente associada à remoção prematura), manipulação inadequada ou presença de contaminantes superficiais. Uma reação muito rápida de presa também causará uma reprodução superficial deficiente e pode ser devido à temperatura, umidade ou mistura errônea. Bolhas. Elas usualmente surgem se o material toma presa muito rápido ou se as bolhas forem introduzidas durante o processo de manipulação. Lacunas irregulares. Elas aparecerão devido à umidade ou aos resíduos na superfície.

Distorção. O uso de moldeiras excessivamente flexíveis resultará na distorção da moldagem na medida em que a moldeira é distorcida durante o posicionamento. Se o tempo de trabalho do material de moldagem for excedido, o material não escoará adequadamente, existindo a tentação de utilizar maior pressão durante a realização da moldagem, causando distorção da moldeira e deformação permanente do material de moldagem. O movimento da moldeira enquanto o material está tomando presa também causará distorção. A falha de adesão entre a moldeira e o material de moldagem pode ocorrer, se houver adesivo insuficiente, se for usado adesivo errado ou se não houver tempo suficiente para o adesivo tornar-se efetivo. Um procedimento de desinfecção inadequado também originará distorção. Modelos muito grandes ou muito pequenos. Embora seja difícil distinguir entre próteses mal adaptadas devido ao tamanho inadequado ou à distorção, as causas mais comuns de modelos com tamanho errado são: o uso inapropriado das técnicas de moldagem, o vazamento do modelo no tempo incorreto, ou a armazenagem da moldagem em condições inadequadas de temperatura e umidade.

MATERIAIS DE MOLDAGEM

195

LEITURA COMPLEMENTAR CDMIE (1996) Infection control recommendations for the dental office and the dental laboratory. ADA Council on Scientific Affairs and ADA Council on Dental Practice. J Am Dent Assoc 127: 672–680 Jagger DC et al (2004) The effect of a range of disinfectants on the dimensional accuracy of some impression materials. Eur J Prosthodont Rest Dent 12: 154 Jamani KD, Harrington E, Wilson HJ (1989) Rigidity of impression materials. J Oral Rehab 16: 241–248 Johnson GH et al (1998) Dimensional stability and detail reproduction of irreversible hydrocolloid and elastomeric impressions disinfected by immersion. J Prosthet Dent 79: 446–453 Kess RS, Combe EC, Sparks BS (2000) Effect of surface treatments on the wettability of vinyl polysiloxane impression materials. J Prosthet Dent 83: 98

McCabe JF, Storer R (1980) Elastomeric impression materials. The measurement of some properties relevant to clinical practice. Brit Dent J 149: 73–79 Millstein P, Maya A, Segura C (1998) Determining the accuracy of stock and custom tray impression/casts. J Oral Rehab 25: 645–648 Pamenius M, Ohlsen NG (1987) The clinical relevance of mechanical properties of elastomers. Dent Mater 3: 270 Pratten DH, Craig RG (1989) Wettability of a hydrophilic addition silicone impression material. J Prosthet Dent 61: 197–201 Rosen M, Touyz LZG, Becker PJ (1989) The effect of latex gloves on setting time of vinyl polysiloxane putty impression materials. Brit Dent J 166: 374–375 Watkinson AC (1988) Disinfection of impressions in UK dental schools. Brit Dent J 164: 22 Wilson HJ (1988) Impression materials. Brit Dent J 164: 221

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SEÇÃO TRÊS MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS Os materiais descritos nesta seção são usados principalmente pelo protético na elaboração de próteses, embora haja considerável sobreposição, como no capítulo de cimentação. Informações detalhadas sobre a construção de próteses foram evitadas, já que esta é uma prerrogativa do protético. Entretanto, a responsabilidade pela escolha de materiais a serem colocados

na boca do paciente permanece sendo do cirurgião-dentista, o que requer um conhecimento do que está disponível. Embora o clínico não esteja envolvido nos vários estágios de confecção de uma prótese, o conhecimento profundo das características dos materiais utilizados e a compreensão dos processos envolvidos são de suma importância para fazer a escolha correta dos materiais para cada situação clínica. Além disso, o clínico notará que os conhecimentos sobre vários materiais e procedimentos envolvidos na construção de uma prótese contribuem bastante para a comunicação com o protético e evita possíveis equívocos.

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Capítulo 3.1

PRODUTOS À BASE DE GESSO

INTRODUÇÃO Os materiais derivados do gesso possuem várias aplicações odontológicas que incluem: ■ ■ ■ ■

modelos e troquéis; materiais de moldagem; moldes; revestimentos refratários.

Um modelo é uma réplica das superfícies de interesse da cavidade bucal; é vazado de uma impressão da anatomia bucal e é então usado para confeccionar um aparelho, como uma prótese parcial ou total. Um molde é usado para a confecção de uma dentadura. Troquéis são réplicas de dentes individuais e são geralmente usados na construção de coroas e pontes. Um revestimento refratário é um material resistente a altas temperaturas que usa o gesso como material ligante e é usado como material de moldagem para algumas ligas de ouro para fundição. Neste capítulo destacaremos a química e as propriedades destes materiais.

A produção de sulfato de cálcio hemi-hidratado pode ser realizada de três maneiras, produzindo versões de gesso com diferentes propriedades e, portanto, com diversas aplicações. Estas versões são o gesso comum Paris, o gesso-pedra odontológico e o gesso-pedra melhorado (densite). Deve-se observar que as três versões são quimicamente idênticas, distinguindo-se apenas na forma e nos detalhes estruturais.

Gesso Comum Paris O sulfato de cálcio di-hidratado é aquecido em um recipiente aberto. A água é liberada e o di-hidrato é convertido em hemi-hidrato, conhecido como sulfato de cálcio calcinado ou β-hemi-hidrato. O material resultante consiste em partículas grandes, porosas e irregulares que não se compactam muito bem. O pó precisa ser misturado com uma grande quantidade de água para obter uma mistura satisfatória para uso odontológico, já que grande parte desta água é absorvida pelos poros entre as partículas. A mistura usual é de 50 ml de água para 100 mg de pó.

Gesso-Pedra

QUÍMICA DO GESSO Composição O gesso (gipsita) é o sulfato de cálcio di-hidratado, CaSO4.2H2O. Quando esta substância é calcinada, isto é, aquecida até uma temperatura suficientemente alta para liberar parte da água, converte-se em sulfato de cálcio hemi-hidratado, (CaSO4)2•H2O e, sob temperaturas mais altas, forma-se a anidrita, como mostrado abaixo: Gesso (gipsita)

CaSO4•2H2O ↓ Até 130°C

Hemi-hidrato

(CaSO4)2•H2O ↓ Até 200°C

Anidrita

CaSO4

Se o di-hidrato for aquecido em uma autoclave, o hemihidrato que é produzido consiste em partículas pequenas, regulares e relativamente não porosas. Este sulfato de cálcio autoclavado é conhecido como α-hemi-hidrato. Devido à estrutura não porosa e regular das partículas, elas podem ser compactadas mais intimamente usando menos água. A mistura é de 20 ml de água para 100 g de pó.

Gesso-pedra Melhorado (Densite) Na produção desta forma de sulfato de cálcio hemi-hidratado, o di-hidrato é fervido na presença de cloreto de cálcio e cloreto de magnésio. Estes dois cloretos atuam como desaglutinantes, ajudando a separar as partículas individuais que, de outra forma, tendem a se aglomerar. As partículas de hemi-hidrato que são produzidas são

199

200

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

ainda mais compactas e regulares que as do gesso-pedra. O densite é misturado na proporção de 100 g de pó para 20 ml de água.

Aplicações O gesso comum é um material de uso geral, principalmente para bases e modelos, já que é barato, fácil de usar e modelar. A expansão de presa (veja a seguir) não é de grande importância para estas aplicações. Uma composição similar é usada para materiais de moldagem à base de gesso (Cap. 2.7) e para revestimentos refratários à base de gesso, embora para estas aplicações os tempos de trabalho, de presa e a expansão de presa sejam cuidadosamente controlados pela incorporação de vários aditivos (ver a seguir). O gesso-pedra é usado para modelos da boca, enquanto o gesso-pedra melhorado mais denso é usado para modelos dentários individuais, chamados de troquéis. Estes últimos são usados para confecção dos padrões de cera dos quais são produzidas peças de fundição.

Processo de Presa O aquecimento do hidrato para retirar parte da água produz uma substância que está efetivamente desidratada. Como consequência disto, o hemi-hidrato é capaz de se reagir com água e retornar ao sulfato de cálcio dihidratado, como se segue: (CaSO4)2•H2O + 3 H2O → 2CaSO4•2H2O Acredita-se que o processo de presa dos produtos à base de gesso ocorra na seguinte sequência: 1. Parte do sulfato de cálcio hemi-hidratado dissolve-se na água. 2. O sulfato de cálcio hemi-hidratado dissolvido reage com a água e forma sulfato de cálcio di-hidratado. 3. A solubilidade do sulfato de cálcio di-hidratado é muito baixa e uma solução supersaturada é formada. 4. Esta solução supersaturada é instável e o sulfato de cálcio di-hidratado se precipita na forma de cristais estáveis. 5. Como os cristais estáveis de sulfato de cálcio di-hidratado se precipitam na solução, mais sulfato de cálcio hemi-hidratado é dissolvido e isto continua até todo o hemi-hidrato ter dissolvido.

Tempos de Trabalho e de Presa O material deve ser misturado e vazado antes de alcançar o fim do tempo de trabalho. Os tempos de trabalho variam de produto para produto e devem ser escolhidos de acordo com a aplicação em particular. No gesso para moldagem, o tempo de trabalho é de apenas 2-3 minutos, enquanto para um revestimento refratário à base de gesso, o tempo se aproxima de 8

minutos. Tempos de trabalho curtos dão origem a tempos de presa curtos, já que ambos são controlados pela velocidade da reação. Portanto, para um gesso de moldagem, o tempo de presa é tipicamente de 2-3 minutos, enquanto o tempo de presa pode variar entre 20-45 minutos nos revestimentos refratários à base de gesso. Os materiais para modelos apresentam tempos de trabalho parecidos aos do gesso de moldagem, mas seus tempos de presa são um pouco mais longos. Para o gesso comum, o tempo de presa é de 5-10 minutos, enquanto para o gesso-pedra pode ser de até 20 minutos. As características de manipulação são controladas pela inclusão de vários aditivos. Aditivos que aceleram o processo de presa são a gipsita (20%), o cloreto de sódio se depositará na superfície do cristal impedindo um crescimento adicional. Isto provoca redução da velocidade de reação, ao invés de aumentá-la. Figura 3.1.1 Estrutura esferulítica do sulfato de cálcio di-hidratado.

Essa capacidade de expandir na presa é uma característica muito importante deste material e este é o fator que o torna tão útil em um grande número de aplicações odontológicas. Em particular, modelos e troquéis devem ser levemente maiores que a anatomia bucal. Isto assegura que as coroas, pontes e dentaduras não fiquem muito apertadas quando colocadas na boca. A expansão também é utilizada no caso dos revestimentos, já que ajuda a compensar a contração de resfriamento das peças metálicas fundidas da temperatura de fusão. Embora seja em geral desejável que os modelos produzidos com gesso comum ou pedra sejam levemente maiores, a expansão não controlada deste material é um inconveniente.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Existem vários aditivos nos produtos de gesso que são utilizados para controlar o nível de expansão, que no caso do gesso comum é 0,2-0,3% vol. e para os gesso-pedra e gesso-pedra melhorado para troquéis está na faixa de 0,05-0,10% vol.

Cloreto de Sódio O cloreto de sódio atua como núcleos de cristalização adicionais para a formação de cristais. A densidade mais

Sulfato de Potássio O sulfato de potássio (K2SO4) reage com a água e o hemihidrato e produz a “singenita” [K2(CaSO4)2•H2O]. Este composto cristaliza-se muito rapidamente e estimula o crescimento de mais cristais. Isto apresenta o efeito de reduzir a expansão e acelerar a reação de presa. Quando presente em solução aquosa a 2% reduz o tempo de presa de aproximadamente 10 minutos para 4 minutos.

Sulfato de Cálcio Di-hidratado A adição de uma pequena quantidade de sulfato de cálcio di-hidratado fornecerá núcleos de cristalização adicionais e atuará como um acelerador; reduzindo tanto o tempo de trabalho como o de presa.

Bórax A adição de bórax (Na2B4O7•10H2O) é importante porque ele se contrapõe ao aumento da velocidade de presa devido à inclusão dos aditivos mencionados. Ele é um retardador da reação de presa. A adição de bórax leva à formação de tetraborato de cálcio, que se deposita nos cristais de di-hidrato e impede um crescimento adicional.

Citrato de Potássio O citrato de potássio atua como um retardador e, às vezes, é adicionado em conjunto ao bórax. Desse modo, a regulação cuidadosa da quantidade dos aditivos mencionados permite que diferentes produtos de gesso possam ser produzidos com um correto grau de expansão e com os tempos de trabalho e de presa adequados para várias aplicações. As expansões de presa típicas para os produtos de gesso são mostrados na Tabela 3.1.2.

Tabela 3.1.1 Alteração do volume molar que ocorre em função da rehidratação do sulfato de cálcio hemi-hidratado (CaSO4)2•H2O + 3H2O → 2CaSO4•2H2O Peso molecular Densidade Volume molar

290 2,75 105

54

344

1,0 54

2,32 148

Alteração no volume = (148–159) / 159 = –7,1%

Tabela 3.1.2 Expansões de presa de alguns produtos de gesso Comum

0,20-0,30%

Pedra

0,08-0,10%

Pedra melhorado

0,05-0,07%

202

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A baixa expansão de presa do gesso-pedra e do gesso-pedra melhorado (densite) torna estes materiais ideais para a produção de troquéis e modelos tanto para trabalhos metálicos como cerâmicos.

Expansão Higroscópica A expansão de presa pode ser aumentada substancialmente pela imersão do material em água enquanto ele estiver tomando presa. Quando toma presa em contato com o ar ambiente, a tensão superficial da água livre tende a manter os cristais unidos e isto limita a capacidade dos cristais de crescerem. Entretanto, quando os cristais são imersos em água, eles podem crescer mais livremente, resultando em um maior nível de expansão. Este processo é chamado expansão higroscópica e, às vezes, é utilizado em revestimentos refratários de gesso para a fundição de ligas que apresentam alto coeficiente de expansão térmica ou alta contração durante a solidificação.

PROPRIEDADES Estabilidade Dimensional Uma vez que o material tenha tomado presa, ocorre pouca ou nenhuma alteração dimensional. A estabilidade durante armazenamento é excelente embora o material seja levemente solúvel em água. Por esta razão, deve-se evitar a lavagem com água quente.

Resistência à Compressão A resistência à compressão é a propriedade mecânica mais usada para calcular a resistência dos produtos à base de gesso. Os valores típicos estão mostrados na Tabela 3.1.3. A resistência à compressão é consideravelmente afetada pela relação pó:líquido usada. Está claro dos dados mencionados que a redução na quantidade de água requerida para produzir uma mistura aceitável fornece uma melhora significativa na resistência à compressão. Assim, a resistência à compressão do produto final é afetada pela alteração da proporção pó:líquido recomendada. O uso de uma quantidade excedente de água apresenta a

Tabela 3.1.3 Resistência à compressão de alguns produtos de gesso Comum

12 MPa

Pedra

30 MPa

Pedra melhorado

38 MPa

vantagem de produzir uma mistura fluida que pode ser facilmente vazada. O ar que é incorporado durante o processo de mistura pode ser removido facilmente de tal mistura de gesso-pedra ou gesso-pedra melhorado, usando vibração; entretanto, a resistência à compressão após a presa será inferior. Por sua vez, usar menos água que o recomendado resulta em uma mistura espessa que é mais difícil de remover o ar, levando a maior porosidade e a uma resistência significativamente menor. Há também o risco de que haja pouca água para que a reação ocorra em sua totalidade. Assim, o uso de menos água tem o potencial para aumentar a resistência à compressão, mas propriedades inferiores são obtidas se muito pouca água for usada. Há uma notável diferença entre a resistência úmida e seca dos produtos à base de gesso comum. Em geral, a resistência seca é cerca de duas vezes maior que a resistência úmida.

Resistência à Tração A resistência à tração úmida do gesso comum é muito baixa (quase 2 MPa). Isto se deve à porosidade e à natureza frágil, trazendo como desvantagem a fácil ocorrência de possíveis danos aos dentes e margens do modelo, se manuseado descuidadamente. O gesso-pedra apresenta uma resistência à tração cerca de duas vezes maior que a do gesso comum e é, portanto, preferido para a produção de modelos para coroas, pontes e troquéis.

Dureza e Resistência à Abrasão A dureza superficial dos produtos à base de gesso é muito baixa, então o material é altamente suscetível a riscos e desgaste por abrasão. As resinas epóxicas são exploradas como materiais alternativos para troquéis já que exibem uma melhor reprodução de detalhes, maior resistência à abrasão e maior resistência transversal do que os materiais à base de gesso, mas estão sujeitas à contração de polimerização.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A contração das resinas epóxicas durante a presa pode comprometer o encaixe das peças fundidas a não ser que isto seja levado em consideração durante o processamento.

Reprodução de Detalhes da Superfície Na especificação no 19 do American National Standards Institute/American Dental Association, a compatibilidade dos materiais de moldagem com os gessos-pedra é verificada pela reprodução de uma linha de 20 µm de largura em um molde de sulfato de cálcio di-hidratado não modi-

PRODUTOS À BASE DE GESSO

ficado. Como as superfícies dos produtos de gesso são ligeiramente porosas, detalhes diminutos da superfície, menores que 20 µm, não são produzidos de maneira eficaz. Entretanto, detalhes macroscópicos da superfície são reproduzidos de maneira muito precisa, embora bolhas de ar (enclausuradas entre o gesso comum e o material de moldagem, por exemplo) podem contribuir para a perda da reprodução dos detalhes da superfície. Durante o enceramento de um modelo para fundição, o troquel deve ser mantido úmido. Uma vez que o gesso apresenta certo nível de solubilidade em água, ocorrerá alguma perda de material da superfície e, portanto, a secagem e molhamento repetitivos devem ser evitados.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Caso um troquel precise ser umedecido mais uma vez, isto deve ser feito com uma solução aquosa saturada de di-hidrato.

203

Tabela 3.1.4 Vantagens e desvantagens do gesso comum na confecção de modelos Vantagens

Desvantagens

Dimensionalmente estável e fiel

Baixa resistência à tração, frágil

Barato

Detalhamento de superfície deficiente

Bom contraste de cor

Fraco molhamento da superfície de materiais de moldagem borrachoides

Resistência à abrasão deficiente

RESUMO As vantagens e desvantagens do uso do gesso comum na confecção de modelos podem ser resumidas como demonstrado na Tabela 3.1.4.

LEITURA COMPLEMENTAR Chan TK, Darvell BW (2001) Effect of storage conditions on calcium sulphate hemihydrate-containing products. Dent Mater 17: 134 Combe EC, Smith DC (1964) Some properties of gypsum plasters. Brit Dent J 117: 237 Derrien G, Le Menn G (1995) Evaluation of detail reproduction for three die materials by using scanning electron microscopy and two-dimensional profilometry. J Prosthet Dent 74: 1 Duke P et al (2000) Study of the physical properties of type IV gypsum, resin-containing, and epoxy die materials. J Prosthet Dent 83: 466

Eames WB, Edwares CR, Buck WH (1978) Scraping resistance of dental die materials: a comparison of brands. Oper Dent 3: 66 Fan PL, Powers JM, Reid BC (1981) Surface mechanical properties of stone, resin and metal dies. J Am Dent Assoc 103: 408 Paquette JM, Taniguchi T, White SN (2000) Dimensional accuracy of an epoxy resin die material using two setting methods. J Prosthet Dent 83: 301 Whyte MP, Brockhurst PJ (1996) The effect of steam sterilization on the properties of set dental gypsum models. Aust Dent J 41: 128

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Capítulo 3.2

RESINAS PARA BASE DE PRÓTESE

INTRODUÇÃO Existe um envelhecimento populacional no mundo ocidental e a projeção é que até 2025, mais de 50% da população terá mais de 50 anos. Apesar do desenvolvimento da higiene oral, é provável que muitas dessas pessoas necessitem de próteses totais ou parciais para substituir os dentes perdidos. No momento 32 milhões de norteamericanos usam próteses totais ou parciais, e o número de próteses prescritas anualmente fica em torno de 9 milhões de próteses totais e 4,5 milhões de parciais. Para esses pacientes é importante que a prótese seja esteticamente atraente e altamente funcional, pois ela terá uma influência muito positiva na sua qualidade de vida. A confecção de uma prótese envolve muitas etapas. A primeira etapa é a moldagem, que é seguida por várias etapas laboratoriais. Essas incluem a confecção do modelo, a montagem dos dentes, o enceramento, a inserção na mufla e o derretimento da cera, deixando espaço para ser preenchido pelo material para a base da prótese. Muitos materiais têm sido utilizados para confeccionar próteses, incluindo produtos de celulose, fenol formaldeído, resinas vinílicas e vulcanite. Entretanto, eles apresentaram uma série de problemas: ■

■ ■



os produtos de celulose sofriam distorções na boca e possuíam um gosto de cânfora, usada como plastificador. A cânfora desprendia-se da prótese causando bolhas, pigmentação e perda de cor em poucos meses; o fenol formaldeído (baquelite) era muito difícil de processar e também perdia a sua cor na boca; as resinas vinílicas possuíam baixa resistência à fratura, e as falhas eram comuns, possivelmente devido à fadiga; o vulcanite foi o primeiro material a ser usado na produção em massa de próteses, mas as suas qualidades estéticas não eram muito boas e atualmente foi substituído pelas resinas acrílicas.

A resina acrílica (polimetil metacrilato) é atualmente o material de escolha: esse material possui a qualidade estética necessária, é de baixo custo e de fácil processamento. Mesmo assim, não é ideal em todos os aspectos. Os requisitos ideais de um material para base de prótese são mostrados na Tabela 3.2.1. As resinas acrílicas são populares porque atendem muitos dos requisitos apontados na Tabela 3.2.1. Em particular, as próteses feitas de resina acrílica são de fácil processamento, utilizam técnicas de baixo custo e são esteticamente agradáveis. Além do seu uso na confecção de próteses totais, o material também é usado em uma grande variedade de aplicações, tais como: a confecção de moldeiras personalizadas; confecção de gengiva artificial em armações metálicas; reparo em próteses; reembasamento e; dentes artificiais.

COMPOSIÇÃO E ESTRUTURA DA RESINA ACRÍLICA A resina acrílica para prótese é obtida pelo processo de polimerização por adição de radicais livres para formar o polimetil metacrilato (PMMA). O monômero é o metil metacrilato (MMA):

H Me C

C

H

C

O

O Me em que o Me substitui o CH3. A conversão do monômero em um polímero envolve a sequência normal de ativação, iniciação, propagação e terminação, como descrito no Capítulo 1.6. As resinas estão disponíveis na forma química ou termicamente ativadas.

205

206

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

Tabela 3.2.1 Requisitos ideais de um material para base de prótese

Tabela 3.2.2 Componentes de uma resina ativada termicamente

Aspecto natural

Fácil manipulação



Alta resistência, rigidez, dureza e tenacidade

Baixa densidade

Pérolas ou grânulos de polimetil metacrilato

Estabilidade dimensional

Reprodução exata dos detalhes superficiais

Ausência de odor, gosto ou produtos tóxicos

Resistência ao crescimento bacteriano

Opacificadores – titânio/óxidos de zinco

Resistente à absorção de fluidos orais

Boa condutividade térmica

Fibras sintéticas – nylon/acrílico

Boa retenção com polímeros, porcelana e metais

Radiopaco

Reparo fácil

Limpeza fácil

Boa vida útil

Preço acessível

Resinas Termicamente Ativadas Esses materiais consistem em um pó e um líquido, que, depois de misturados e aquecidos, formam um sólido rígido. Os componentes do pó e do líquido estão mostrados na Tabela 3.2.2. Os motivos para a formulação de um sistema de pó/ líquido em particular são três: ■ ■ ■

é possível o processamento pela técnica de compressão da massa plástica; a contração de polimerização é minimizada; o calor da reação é reduzido.

A técnica da compressão da massa plástica de resina torna a confecção das próteses um processo relativamente direto. Uma mufla contendo os dentes num molde de gesso é preenchida com a massa de resina em fase plástica e então fechada sob pressão, de forma que o excesso de resina seja espremido para fora. Da mesma forma, pode-se produzir uma moldeira individual adaptando diferentes variedades de resina acrílica quimicamente ativada sobre um modelo e removendo os excessos. Os grânulos se dissolvem mais facilmente no monômero do que as pérolas, reduzindo então o tempo que leva para alcançar o estágio de massa plástica. A contração de polimerização é menor quando comparada com aquela que usa um monômero, porque a maior parte do material que está sendo usado (isto é, as pérolas ou grânulos) já está polimerizada. A reação de polimerização é altamente exotérmica, já que uma quantidade considerável de calor (80 kJ/µol) é liberada na redução das ligações de C = C para –C–C–. Como uma grande proporção da mistura já está na forma de um polímero, o potencial para superaquecimento é reduzido. Uma vez que a temperatura máxima alcançada será menor, então a quantidade de contração térmica também será reduzida. O monômero é muito volátil e altamente inflamável; desta forma, o recipiente deve ser muito bem-vedado o

Iniciador – peróxido de benzoíla Pigmentos/corantes Plastificador – dibutil ftalato Líquido Monômero de metil metacrilato Inibidor – hidroquinona Agente de ligação cruzada – etileno glicol dimetacrilato

tempo todo e mantido longe de chamas. O recipiente é um frasco de vidro escuro para aumentar o prazo de validade do monômero, evitando a polimerização espontânea pela ação da luz. A hidroquimona também prolonga o tempo de validade do monômero por meio da rápida reação com qualquer radical livre que possa se formar espontaneamente dentro do líquido, produzindo assim formas estabilizadas de radicais livres que não serão capazes de iniciar o processo de polimerização. Deve-se evitar a contaminação com os grânulos ou pérolas de polímero, pois eles carregam o peróxido de benzoíla em sua superfície, e apenas uma pequena quantidade de polímero é suficiente para iniciar a reação de polimerização. O pó do polímero é muito estável e tem um prazo de validade quase indeterminado. Um agente de ligação cruzada, tal como o dietileno glicol dimetacrilato, é adicionado com o objetivo de melhorar as propriedades mecânicas (Fig. 3.2.1a). Ele é incorporado em vários pontos ao longo da cadeia do polímero de metil metacrilato, formando ligações cruzadas com as cadeias adjacentes graças aos seus dois sítios de duplas ligações (Fig. 3.2.1b). Portanto, embora o polimetil metacrilato (PMMA) seja uma resina termoplástica, a inclusão de um agente de ligação cruzada impede a reação precipitada.

Resinas Quimicamente Ativadas A química dessas resinas é idêntica à das resinas ativadas termicamente, exceto que a polimerização é iniciada por uma amina terciária (p. ex., dimetil p-toluidina ou ácido sulfínico), em vez de calor. Esse método de polimerização não é tão eficiente como o processo de polimerização por calor e tende a produzir um material com menor peso molecular. Isso provoca um efeito adverso nas propriedades de resis-

RESINAS PARA BASE DE PRÓTESE

207

ou

.

Figura 3.2.1 (a) Dietileno glicol dimetacrilato e (b) a sua formação de ligações cruzadas.

tência do material e também aumenta a quantidade de monômero residual não polimerizado na resina. A estabilidade de cor não é tão boa como a da resina ativada termicamente, sendo as resinas quimicamente ativadas mais propensas ao amarelamento. O tamanho das pérolas do polímero é um pouco menor que das resinas ativadas quimicamente (que possuem pérolas de 150 µm) para facilitar a dissolução no monômero e produzir uma massa plástica. O estágio de massa plástica deve ser alcançado antes que a reação de polimerização por adição comece a afetar a viscosidade da mistura, impedindo a adaptação da mistura nas paredes do molde. O menor peso molecular também resulta na diminuição da temperatura de transição vítrea, sendo a Tg tipicamente de 75ºC a 80ºC. Embora possa parecer que isso torna o material mais propenso ao empenamento, este não é o caso. Como nenhuma fonte externa de calor é usada para polimerizar a resina, existe menos geração de tensões internas. Contudo, o material é altamente suscetível ao escoamento, e isso pode contribuir significativamente para uma eventual distorção da prótese quando em uso.

Resinas Fluidas Quimicamente Ativadas São resinas quimicamente ativadas que são bastante líquidas após a mistura, a ponto de poderem ser vertidas num molde feito de hidrocoloide. Elas proporcionam excelente reprodução dos detalhes superficiais, mas são tão inferiores às resinas química e termicamente ativadas em muitos outros aspectos, que não são muito utilizadas.

Resinas Ativadas por Luz Visível Uma versão ativada por luz visível também foi lançada, mas a química desses materiais tem maior relação com um compósito restaurador do que com as resinas para base de próteses já discutidas (Cap. 2.2). O material é composto por uma matriz de uretano dimetacrilato que contém uma pequena quantidade de sílica coloidal para controlar a reologia. A carga consiste em pérolas acrílicas que se tornam parte da estrutura entrelaçada do polímero após a ativação. É amplamente usada como material de reembasamento de prótese, na confecção de moldeiras individuais e no reparo de próteses fraturadas.

ASPECTOS DA MANIPULAÇÃO Proporção Pó-Líquido É importante usar a correta proporção pó-líquido (2,0/1,0 % em peso; 1,6/1,0% em volume). Muito pó pode levar a um preenchimento inadequado, pelo monômero, dos espaços livres entre as partículas de pó, resultando em um material fraco com consequente porosidades no produto final. O uso de monômero em excesso produzirá excessiva contração de polimerização e perda da qualidade da adaptação da superfície interna da prótese. Os aditivos tendem a se precipitar no fundo do recipiente, e é importante que o frasco seja agitado antes do uso para assegurar uma distribuição homogênea de seus ingredientes.

Controle da Cor O pigmento de cor em geral é incorporado ao pó do polímero, mas em alguns casos pode estar simplesmente na superfície das pérolas do polímero e pode se desprender rapidamente, apenas pelo contato com o monômero. Nesse caso o polímero deve ser adicionado ao monômero lentamente. Pouco pó produz uma nuance de cor mais clara.

Isolamento do Molde Existe o perigo de a resina penetrar na superfície relativamente áspera do molde de gesso e se aderir. Para prevenir isso, um meio isolante deve ser utilizado. Hoje em dia, o meio isolante geralmente utilizado é uma solução de alginato de sódio, embora alguns profissionais ainda recomendem o uso de uma folha de estanho.

Processamento Existem dois problemas em particular a serem observados no processamento dos acrílicos para prótese: um é a sua porosidade, e o segundo é a presença de tensões do processamento.

Porosidade O problema que mais afeta as resinas acrílicas para próteses é a ocorrência de porosidade durante a etapa de

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

processamento. Existem dois tipos principais de porosidade: porosidade por contração associada à contração de polimerização, e a porosidade causada pela volatilização do monômero, sendo denominada porosidade gasosa.

Porosidade de Contração A porosidade de contração ocorre porque o monômero se contrai em torno de 20% em volume durante o processamento. Usando o sistema pó/líquido essa contração é minimizada permanecendo na faixa de 5% a 8%. Entretanto, isso não se traduz em uma alta contração linear, que, baseada nessa contração volumétrica, corresponderia a uma contração linear em torno de 1,5% a 2%, mas de fato ocorre algo na faixa de 0,2% a 0,5%. Acredita-se que isso acontece porque a contração observada é, em grande parte, devido à contração térmica resultante da mudança da temperatura do processamento para a temperatura ambiente, ao invés da contração de polimerização. Com o objetivo de ativar o processo de polimerização, a temperatura na mufla deve ser elevada acima de >60°C, para que o peróxido de benzoíla se rompa, e forme radicais livres (Cap.1.6). Uma vez iniciada a reação, ela continua a gerar calor por conta própria, como resultado da reação exotérmica. Isso pode elevar a temperatura do acrílico para bem acima de 100°C. Na temperatura do processamento, a resina é capaz de escoar para dentro dos espaços criados pela contração de polimerização. A força direcional desse escoamento é promovida pela pressão exercida durante o processamento; comprimir 1 ligeiro excesso de material para base de prótese dentro do molde garante que o material estará sob pressão quando o molde for fechado. Tal pressão é mantida por todo o ciclo de processamento. A resina só se torna rígida quando fica abaixo da sua temperatura de transição vítrea, momento em que toda a contração de polimerização terá se completado. A partir desse ponto é a contração térmica que contribui para as alterações observadas nas dimensões da base da prótese. As resinas quimicamente polimerizadas ou de cura fria proporcionariam uma melhor adaptação da prótese, já que a temperatura do processamento é consideravelmente menor (em tomo de 60ºC, comparada com a de 100°C para a resina ativada termicamente). Entretanto, a adaptação é normalmente comprometida devido à maior probabilidade de fluência (creep) na Tg menor. Portanto, é importante que uma quantidade suficiente de resina na fase plástica seja colocada no molde para garantir que o material esteja constantemente sob pressão, durante o processamento. Isso causará o rompimento de qualquer bolha presente na mistura, devendo também ajudar a compensar a contração de polimerização. Por isso, a compressão do molde deve ser realizada apenas quando a massa de resina tiver alcançado o estágio plástico, pois antes dessa etapa a alta fluidez causa uma rápida perda da pressão.

Se houver evidência de porosidade localizada, pode ser devido à mistura deficiente dos componentes ou à compressão do molde antes de ter alcançado o estágio plástico. O diferencial de contração pode levar à distorção da prótese.

Porosidade Gasosa Como observado, durante a polimerização ocorre uma reação exotérmica. Isso pode causar a elevação da temperatura da resina acima de 100°C, temperatura esta que é ligeiramente superior à temperatura de ebulição. Se essa temperatura for excedida antes do processo de polimerização ter sido completado, monômero gasoso será formado – o que constitui a causa da porosidade gasosa. A quantidade de calor gerado depende do volume de resina presente, da proporção de monômero e da rapidez com a qual o calor externo alcança a resina. A ocorrência de porosidade gasosa pode ser evitada aumentando a temperatura de forma lenta e controlada.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A polimerização deve ser realizada lentamente (para impedir a porosidade gasosa) e sob pressão (para evitar a porosidade de contração), de forma que a temperatura do acrílico para prótese nunca exceda 100°C.

Tensões de Processamento A restrição imposta sobre a alteração dimensional da resina inevitavelmente gera tensões internas. Se fosse permitido o relaxamento de tais tensões, o resultado seria o empenamento, aparecimento de fissuras ou a distorção da base da prótese. Embora muitas das tensões geradas durante a contração de polimerização possam ser atenuadas pelo escoamento que ocorre acima da temperatura de transição vítrea, alguma tensão devido à contração térmica permanecerá. O nível de tensões internas pode ser minimizado pelo uso de dentes de acrílico, em vez de dentes de porcelana (de forma que não haja nenhum diferencial de contração no resfriamento), e pelo resfriamento lento da mufla. O alívio das tensões internas pode produzir pequenos defeitos superficiais na resina. Esses são conhecidos como fissuras e podem ser identificados pelo aspecto turvo ou enevoado da superfície da base da prótese. Uma fissura é uma região localizada de alta deformação plástica do polímero, que pode conter pequenos espaços. Nesse estágio não é ainda uma trinca, uma vez que, diferente de uma trinca, a região fissurada pode ainda suportar cargas. Entretanto, a fissura pode levar à fratura do tipo frágil do polímero. Na medida em que os microespaços da região fissurada aumentam, eles ficam separados por apenas pequenas fibrilas de polímero até que finalmente possam se romper e formar uma fenda

RESINAS PARA BASE DE PRÓTESE

Fenda

Região fibrilar

Microespaços

Figura 3.2.2 Formação de uma fenda resultante de uma fissura.

(Fig. 3.2.2). Essa fenda crescerá sob aplicação de carga externa, até alcançar um tamanho no qual continuará a crescer espontaneamente e causar a fratura da prótese. As fissuras podem ser formadas em resposta ao calor (devido ao polimento, por exemplo), ao diferencial de contração em torno de dentes de porcelana ou ao ataque por solventes, tais como o álcool.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Tem sido demonstrado que a indução de formação de ligações cruzadas nas cadeias polímeros pela adição de dietil glicol dimetacrilato reduz o potencial de formação de fissuras.

PROPRIEDADES Estabilidade Dimensional e Fidelidade Visto que a prótese é colocada num leito adaptável de tecidos moles, pode-se imaginar por que é tão importante que a prótese não altere sua forma. De fato, isso é de grande importância para a retenção da prótese, que pode ser definida como a resistência às forças que tendem a deslocar a prótese em uma direção oclusal. Isso é diferente de estabilidade, que é a resistência ao movimento numa direção horizontal. Os fatores que determinam a retenção das próteses na boca são essencialmente de natureza física. Os fatores anatômicos, como áreas retentivas, são considerados mais um transtorno do que uma vantagem, pois a prótese é rígida e não pode englobá-las. Em alguns casos, pode ser necessária a cirurgia pré-protética para remover estas áreas retentivas. A explicação mais adequada dos fatores que regem a retenção de uma prótese é o módulo de escoamento viscoso (como discutido no Capítulo 1.10), baseado na relação F = 3πηR4/2h3 δh/δt para um disco com raio R e uma espessura de saliva h.

209

A adesão da prótese à mucosa é promovida pela saliva e, quanto maior a área da superfície, melhor a união adesiva (isto é, o R deve ser o maior possível). Ao mesmo tempo, é importante que a coesão da película de saliva não seja destruída; ela se preserva melhor mantendo uma película de saliva o mais delgada possível entre a mucosa e a prótese (isto é, o h deve ser pequeno), assim a prótese terá uma adaptação bem mais precisa. O estabelecimento de um selamento periférico em torno da borda da prótese é muito importante para a retenção. Quanto mais justo o selamento, mais difícil se torna a penetração de saliva adicional no espaço entre a prótese e a mucosa, o que significa que é necessária aplicação de uma força maior para separar a prótese da mucosa. Qualquer evento que perturbe o selamento periférico, tal como sobre-extensão, interferências (p. ex., alívio de um freio) e desequilíbrio oclusal, prejudicará a retenção da prótese. Conforme o paciente envelhece, a taxa de produção e a consistência da saliva podem mudar. A saliva se torna menos aderente à prótese devido ao molhamento deficiente da superfície pelo suprimento inadequado de saliva; ela também se torna menos viscosa. A retenção da prótese pode então se tornar um problema particular, necessitando eventualmente o uso de fixadores.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Para uma prótese possuir uma ótima retenção, ela deve (1) cobrir a área máxima de mucosa compatível com a atividade muscular funcional e (2) possuir uma íntima adaptação, de forma a minimizar a espessura da película de saliva e manter um bom selamento periférico.

Propriedades Mecânicas A resistência à tração típica das resinas acrílicas não é superior a 50 MPa. O módulo de elasticidade é baixo e o módulo à flexão está na faixa de 2.200 a 2.500 MPa. Não é surpresa que isto, combinado com falta de tenacidade a fratura, explica a propensão das próteses à fratura. Cerca de 30% dos reparos em próteses realizados pelos laboratórios envolvem a fratura de linha média, que é a fratura mais prevalente nas próteses superiores. A maioria das fraturas está associada a algum incidente traumático, embora ele pode não ser facilmente reconhecido. Uma prótese, ao cair no chão, pode não apresentar necessariamente uma fratura instantânea, mas as chances de que uma fenda tenha se formado e que continuará a crescer imperceptivelmente até a prótese se quebrar de repente e desastrosamente é bemprovável. Portanto, algumas falhas da prótese podem ocorrer devido à fadiga à flexão.

210

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

Algumas fraturas podem estar associadas à qualidade deficiente do processamento. A falta de adesão entre a resina e os dentes de acrílico é uma possibilidade que produz uma interface fraca da qual uma fratura pode se iniciar. A formação de fissuras devido às falhas do processamento ou à exposição a solventes é outra possibilidade. Para aqueles pacientes que fraturam suas próteses regularmente, é viável se considerar o uso de uma resina para base de prótese resistente a alto impacto. Essas resinas são formuladas com um agente à base de borracha tenacificante, tal como uma fina dispersão de estireno de butadieno. A inclusão da borracha paralisa o crescimento das fendas, aumentando a resistência à fratura. Entretanto, isso também causa uma diminuição do módulo à flexão e a longo prazo aumenta as chances de falha ao longo tempo por fadiga devido à flexão excessiva. Uma alternativa para o fortalecimento das próteses acrílicas é a incorporação de fibras para produzir um compósito reforçado por fibra. Elas incluem: ■ ■





Fibras carbono, que não se tornaram populares devido à dificuldade de manipulação e à estética deficiente. Fibras aramídeas (poliparafenileno tereftalamida), que não provaram ser efetivas devido à falta de adesão entre as fibras e a matriz resinosa. Fibras UHMPE (ultra-high molecular weight polyethylene, polietileno de peso molecular ultra-alto), que são de cor neutra, possuem baixa densidade e conhecida biocompatibilidade e cuja superfície pode ser tratada para melhorar a adesão com a resina. No entanto, sua fabricação é muito demorada. Fibras de vidro, que se mostraram as mais promissoras e podem ainda ser incorporadas na resina como fibras curtas, frouxas ou entrelaçadas.

Nenhum desses materiais se mostrou ainda como substituto eficiente das resinas acrílicas sem carga, por causa das características de processamento inaceitáveis; assim as resinas reforçadas com borracha são preferidas, pois possuem propriedades de manuseio similares às das resinas de PMMA convencionais. Pesquisas para desenvolver um método bem-sucedido de produzir uma base para prótese reforçada com fibra estão em andamento.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A falta de resistência e tenacidade das próteses de resina acrílica é um problema sério e pode resultar em fraturas de até 10% das próteses dentro de três anos de uso. A fluência ou creep é um problema com as resinas acrílicas (particularmente as resinas quimicamente ativadas), pois elas são materiais viscoelásticos. A adição de um agente de ligação cruzada reduz a quantidade de fluência ou creep, mas não consegue eliminá-la totalmente.

Propriedades Físicas Condutividade Térmica A condutividade térmica do PMMA é de aproximadamente 6 × 10–4 cal.g–1.cm–2. Isso é muito baixo, e pode ocasionar problemas durante o processamento da prótese, pois o calor produzido pode ficar retido e não escapar, provocando um aumento da temperatura. Do ponto de vista do paciente, o problema com o baixo coeficiente de condutividade térmica é que a prótese isola os tecidos moles orais de qualquer sensação de temperatura, podendo levar o paciente a consumir uma bebida muito quente sem perceber, o que pode queimar a garganta e possivelmente até o esôfago.

Coeficiente de Expansão Térmica O coeficiente de expansão térmica é de aproximadamente 80 ppm/ºC. Um valor alto, como se pode esperar de uma resina. Em geral, isso não representa um problema, exceto quando se usa de dentes de porcelana na base da prótese. Estes dentes podem se soltar gradativamente e ser perdidos, devido ao diferencial de expansão e de contração.

Sorção de Água e Solubilidade Devido à natureza polar das moléculas de resina, o PMMA absorve água. Tal absorção é tipicamente na ordem de 1,0% a 2,0% por peso. Na prática, isso ajuda a compensar um pouco a contração de processamento. Entretanto, considerando a baixa taxa de difusão da água na resina, algumas semanas de imersão contínua em água seriam necessárias para a prótese alcançar um peso estável. Embora o PMMA seja solúvel na maioria dos solventes (p. ex., clorofórmio), por causa das suas tênues ligações cruzadas, ele é praticamente insolúvel na maioria dos fluidos que podem entrar em contato com a boca. Entretanto, alguma perda de peso ocorrerá devido à liberação em particular de monômero e possivelmente de alguns pigmentos e corantes.

Biocompatibilidade Em geral, o PMMA é altamente compatível, e os pacientes manifestam poucos problemas. Contudo, alguns pacientes poderão apresentar reação alérgica. Isso é associado mais provavelmente a alguns componentes na prótese, como monômero residual ou ácido benzoico. A reação alérgica tende a ser praticamente imediata e ocorre mais provavelmente com as próteses de resina quimicamente ativadas por causa do conteúdo maior de monômero residual. Algumas vezes pode-se superar esse problema submetendo a prótese a um ciclo de polimerização adicional, mas existe o risco deste procedimento causar distorção da prótese na medida que as tensões internas do processamento são liberadas.

RESINAS PARA BASE DE PRÓTESE

Quando um paciente apresenta uma reação de hipersensibilidade tardia a próteses à base de metacrilato, deve-se considerar o uso de materiais alternativos para base de prótese, como o policarbonato ou o nylon. As próteses confeccionadas com esses materiais devem ser produzidas por meio do processo de injeção do material no molde e embora a precisão seja alta, seu custo também é comparativamente a uma prótese confeccionada com PMMA. O nylon, que é o nome genérico de um polímero termoplástico, pertence à classe dos poliamidos e foi o primeiro material utilizado para confeccionar próteses nos anos 1950. A deterioração da cor, excessiva absorção de água e a alta flexibilidade associada ao baixo módulo de elasticidade são alguns dos problemas que ocorreram com esse material. Contudo, durante os anos 1970, diferentes polímeros de base poliamida foram desenvolvidos com o intuito de resolver alguns desses problemas, embora existam poucas publicações sobre seu desempenho. Aparentemente, muito menos se sabe sobre o uso do policarbonato como material para base de prótese, embora seja um material amplamente utilizado na fabricação de capacetes de segurança, devido à sua excelente resistência a impactos.

RESUMO As vantagens do uso do polimetil metacrilato (PMMA) são: ■ ■ ■

■ ■ ■ ■

possui estética excelente; é de fácil processamento e de baixo custo; possui baixa densidade. As desvantagens são que esse material: possui características de resistência muito pouco adequadas; é suscetível à distorção; possui baixa condutividade térmica; e é radiolúcido.

211

fície interna de uma prótese precisar de substituição para melhorar a adaptação, pode-se usar um material rígido de reembasamento. O reembasamento de uma prótese total pode ser necessário por causa das alterações nos tecidos moles causadas pela reabsorção óssea, o que tende a ser mais problemático nas próteses inferiores do que nas superiores. Os critérios para o reembasamento são: ■ ■ ■ ■ ■

retenção ou estabilidade deficiente; colapso da dimensão vertical da oclusão; degradação da base da prótese; falta de extensão da prótese para dentro das áreas de pregas mucobucais; e para pacientes muito idosos, nos quais a adaptação a uma nova prótese seria difícil, quando não impossível.

O reembasamento pode ser feito tanto com uma resina acrílica quimicamente ativada no próprio consultório, como enviando a prótese para o laboratório de prótese para reembasamento com um acrílico ativado termicamente. Os acrílicos ativados termicamente usados pelos laboratórios são idênticos àqueles usados na confecção das próteses. Existem dois tipos de resinas quimicamente ativadas, cujos componentes estão listados na Tabela 3.2.3. A razão para o segundo tipo de material de reembasamento é que o metil metacrilato (MMA) pode ser muito irritante aos tecidos moles e pode também causar sensibilidade no paciente. O polietil metacrilato (PEMA) e o butil metacrilato são menos irritantes ao paciente, mas possuem a desvantagem de redução da Tg, o que aumenta a possibilidade de instabilidade dimensional. Uma das maiores desvantagens do reembasamento no consultório é o controle impreciso da quantidade de material removido da prótese e a espessura do material de reembasamento, que será utilizado. Outros problemas são as reações altamente exotérmicas, o gosto inaceitável e a pouca estabilidade de cor com o tempo.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

MATERIAIS EMBASADORES DE PRÓTESE Os materiais embasadores de prótese pertencem essencialmente a um dos três grupos: ■ ■ ■

reembasadores permanentes rígidos; embasadores macios semipermanentes, e embasadores macios temporários/condicionadores teciduais.

Reembasadores Rígidos Embora o tempo de vida médio esperado de uma prótese total seja de quatro a cinco anos, a vida útil real depende da velocidade da reabsorção do osso alveolar. Se a super-

No melhor das hipóteses o reembasamento deve ser considerado apenas um tratamento temporário de longo prazo, sendo preferível o reembasamento laboratorial.

Embasadores Macios Semipermanentes Ocasionalmente, um paciente se queixará de dor persistente e desconforto com o uso de uma prótese, mesmo quando ela parecer totalmente satisfatória em todos os outros aspectos. Tal problema é mais observado na mandíbula, onde existe uma área menor para distribuir a carga e onde os pacientes podem possuir um rebordo alveolar pontudo, fino ou muito reabsorvido. Em tais

212

MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

Tabela 3.2.3 Os dois tipos de resina autopolimerizável Pó

Líquido

Tipo I

Tipo II

Polimetil metacrilato

Polietil metacrilato

Peróxido de benzoíla

Peróxido de benzoíla

Pigmentos

Pigmentos

Metil metacrilato

Butil metacrilato

Di-n-butilftalato

Amina

Amina

A borracha de silicone não adere facilmente à resina acrílica da prótese, por isso deve ser empregado um adesivo. Tal adesão pode ser obtida usando um polímero de silicone dissolvido num solvente ou um agente de união alquil-silano. Em ambos os casos a adesão é muito fraca e geralmente fracassa dentro de um tempo relativamente curto. Outra limitação é que o material tende a favorecer o crescimento de Candida albicans, podendo causar a estomatite protética.

Embasadores Macios de Acrílico casos, o paciente tem dificuldade em tolerar uma prótese rígida. Se a dor persistir quando todas as medidas possíveis foram tomadas para minimizar a carga oclusal e redistribuir a carga pela maior área possível, a prótese pode se tornar mais confortável com o uso de uma base macia. Isso promove um meio de absorver uma parte da energia envolvida na mastigação pela interposição de um material altamente resiliente entre a dentadura e a mucosa. Os polímeros com temperatura de transição vítrea logo acima da temperatura na boca possuem um comportamento borrachoide e são altamente resilientes. Alguns polímeros possuem uma temperatura de transição vítrea naturalmente baixa (p. ex., polímeros de silicone), e outros (p. ex., polimetil metacrilato) podem ser modificados pela inclusão de plastificadores para diminuir a sua temperatura de transição vítrea (Tabela 3.2.4). O plastificador atua como um lubrificante das cadeias poliméricas, facilitando o deslizamento de umas pelas outras, permitindo que material se deforme mais facilmente e reduzindo o módulo de elasticidade. De fato, o embasamento geralmente é confeccionado com um desses dois materiais macios.

Borracha de Silicone A borracha de silicone consiste em um polímero de polidimetil siloxano, ao qual é adicionada uma carga para dar a consistência correta. O material se solidifica por um processo de ligação cruzada em vez de um processo de polimerização, pois o material já é um polímero. Essa ligação cruzada pode ser obtida tanto pelo calor, usando o peróxido de benzoíla, ou em temperatura ambiente, usando o tetraetilsilicato (Cap. 2.7).

Esses embasadores macios possuem a vantagem de aderir bem à prótese de PMMA. Eles podem ser subdivididos naqueles que contêm plastificadores lixiviáveis e nos que contêm plastificadores polimerizáveis.

Sistemas com Plastificadores Lixiviáveis O polietilmetacrilato (PEMA) possui uma temperatura de transição vítrea de apenas 66ºC comparada com a de 100ºC, do PMMA. Uma combinação desses dois polímeros, com uma pequena quantidade de plastificador (tal como o dibutilftalato) é altamente resiliente. Portanto, o pó é uma mistura de PEMA e PMMA, e o líquido é o MMA, contendo de 25% a 50% de plastiticador. Infelizmente, o plastificador se desprende gradualmente, e o embasamento se toma rígido conforme perde a sua resiliência. A velocidade dessa transição depende, de certo modo, do procedimento de limpeza da prótese pelo paciente. Em geral, altas temperaturas e agentes alvejantes fortes devem ser evitados.

Sistemas Plastificadores Polimerizáveis Foram desenvolvidos novos plastificadores polimerizáveis, que resistem à dissolução, mas mantêm o seu efeito lubrificante. As formulações exatas desse novo material não são conhecidas, mas alguns usam o alquil maleato ou alquil itaconato; sabe-se que a composição do líquido de um sistema experimental é uma mistura de tridecil metacrilato, 2-dietilexil maleato e etileno glicol dimetacrilato. O líquido é misturado tanto como PEMA como com os co-polímeros de n-butil e etil metacrilato. O material é bastante duro em temperatura ambiente, o que torna fácil o acabamento, e amacia quando levado à temperatura da boca.

Vantagens Relativas dos Embasadores Macios Tabela 3.2.4 Temperatura de transição vítrea dos ésteres de polimetacrilato Grupo

Temperatura de transição (ºC)

Metil

125

Etil

65

Propil

38

Butil

33

As vantagens relativas dos embasadores macios de silicone e de acrílico estão destacadas na Tabela 3.2.5. Embora os embasadores macios sejam considerados uma solução de longo prazo para a distribuição deficiente da carga, a sua vida clínica geralmente não é maior que seis meses por causa dos problemas descritos. Por isso, eles são denominados embasadores macios semipermanentes.

RESINAS PARA BASE DE PRÓTESE

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Os embasadores macios são contraindicados para pacientes com fluxo salivar deficiente, pois a fricção subsequente entre o mucoperiósteo e o embasamento macio pode causar fricção dolorosa.

Condicionadores Teciduais/Embasadores Macios Temporários Em algumas circunstâncias, a prótese pode causar inflamação ou ulceração dos tecidos moles suportantes das cargas. Uma simples solução é suspender o uso da prótese até que a inflamação tenha diminuído. Normalmente, isso não é aceitável para o paciente, e um condicionador tecidual pode ser empregado para superar o problema. Um condicionador tecidual é um material macio que é aplicado temporariamente na superfície interna da prótese com o objetivo de possibilitar uma distribuição melhor das cargas. Isso permite que a mucosa retome à sua forma normal e resolva qualquer inflamação dos tecidos suportantes da prótese. Uma vez que a inflamação tenha regredido e o tecido se recuperado, uma nova moldagem pode ser realizada para confecção de uma nova prótese. Tal material deve ser excepcionalmente macio, mas não tão macio a ponto de ser expulso para fora da prótese. Esses materiais consistem de um pó de PEMA que,

Tabela 3.2.5 Vantagens relativas dos embasadores macios Borracha de silicone

Acrílico

Altamente resiliente

Menos resiliente

Mantém a maciez

Enrijece com o tempo

Necessita de um agente adesivo

Autoadesivo

Suscetível ao crescimento de Candida albicans

Mais resistente às bactérias

Adesão fraca

Adesão permanente

Fraca resistência ao rasgamento

Resistência ao rasgamento aceitável

Sem deformação permanente

Suscetibilidade a creep

quando misturado com um solvente como o álcool etílico e um éster aromático como um plastificador (p. ex., butilftalil butilglicolato), produz uma substância com consistência de gel. Sua consistência dependerá da proporção inicial de pó/líquido e da quantidade relativa de ambos os componentes. Quando o pó e o líquido são misturados, o solvente rapidamente penetra nas partículas do polímero e isso promove a plasticidade tão rapidamente como cria a estrutura do gel. O álcool e o plastificador desprenderão rapidamente e, portanto, o condicionador tecidual necessita ser substituído dentro de poucos dias para que o tecido traumatizado reverta para um estado saudável o mais rápido possível. Para alguns pacientes, o condicionador tecidual pode ser mantido por até três semanas; por isso, o uso frequente do termo embasador macio temporário. Uma sugestão para melhorar o curto tempo de validade dos condicionadores teciduais é cobri-los com uma fina camada superficial de resina metil metacrilato (MMA) semipolimerizada para reduzir a taxa de liberação do solvente e do plastificador.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Os condicionadores teciduais/embasadores macios temporários não devem ser usados sem agendar o paciente para uma nova consulta.

Os condicionadores teciduais são suscetíveis à colonização de micro-organismos. A menos que o condicionador tecidual seja substituído regularmente, ele atuará como um reservatório de micro-organismos, podendo causar sérias complicações, tais como infecções respiratórias, especialmente em pacientes idosos. Embora a limpeza mecânica e química possa manter os micro-organismos sob controle, os métodos de limpeza podem causar danos consideráveis ao condicionador tecidual. Uma abordagem que está sendo explorada é a incorporação de agentes antimicrobianos, como zeolita de prata ou itraconazol, que parecem ser eficazes. Os condicionadores teciduais são sensíveis aos limpadores de prótese e devem ser higienizados com sabão neutro e água.

LEITURA COMPLEMENTAR Braden M, Wright PS, Parker S (1995) Soft lining materials – a review. Eur J Prosthodont Rest Dent 3: 163 Chow CK, Matear DW, Lawrence HP (1999) Efficacy of antifungal agents in tissue conditioners in treating candidiasis. Gerodontology 16: 110 Garcia LT, Jones JD (2004) Soft liners. Dent Clin N Amer 48: 709

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Capítulo 3.3

LIGAS FUNDIDAS PARA RESTAURAÇÕES METÁLICAS

INTRODUÇÃO A produção de restaurações metálicas, como coroas, pontes, inlays, núcleos e pinos e núcleos metálicos fundidos e próteses parciais removíveis nos laboratórios de prótese dentária, é conduzida pela técnica da cera perdida. Este método de fundição já está disponível há um tempo considerável sendo bastante utilizado por artesãos para fabricar joias e ornamentos delicados. A sua história pode ser traçada desde antes de 3000 a.C., porém não foi utilizada na Odontologia antes dos anos 1890. Os princípios básicos são simples. Um modelo de cera com a forma desejada é produzido, sendo revestido por um material resistente às altas temperaturas. A cera é então removida pelo derretimento ou queima, deixando uma cavidade com a forma desejada. Esta pode ser agora preenchida com metal em fusão, de modo que o metal assuma a forma da escultura de cera original. Os estágios na produção de uma restauração dentária fundida são, portanto, os seguintes: ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■

preparo do dente; moldagem; vazamento do modelo; enceramento da forma desejada; inclusão do padrão de cera no revestimento; queima e derretimento; derretimento e fusão da liga; acabamento e polimento; e tratamentos térmicos.

Desse modo, pode-se observar que muitos materiais diferentes são envolvidos na produção de uma fundição metálica. Estes incluem materiais de moldagem, ceras, revestimentos e ligas para fundição. Alguns destes materiais já foram discutidos em seções anteriores. Não será fornecida neste capítulo uma descrição detalhada dos vários estágios práticos envolvidos na produção de uma restauração metálica fundida uma vez que este processo é prerrogativa do técnico de laboratório.

Em vez disso, a atenção será focada nas ligas que são utilizadas e nos seus requisitos para as aplicações na Odontologia Restauradora. Quando a técnica da cera perdida foi desenvolvida por Taggart no começo dos anos 1900, as ligas de escolha eram as áuricas. Para a construção de próteses parciais removíveis as ligas de ouro foram gradativamente substituídas por ligas de cobalto-cromo (Co-Cr) durante os anos 1950 e em menor número por ligas de Co-Cr-Ni. No final do século XX o titânio apareceu como liga para fundição de próteses parciais fixas e removíveis. É de responsabilidade do cirurgião-dentista selecionar a liga mais indicada para cada aplicação particular quando se instrui o laboratório na produção de uma prótese. Esta escolha não deve ser delegada ao técnico de laboratório. Afinal, é o cirurgião-dentista que cimentará estes materiais na boca do paciente.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA É responsabilidade do cirurgião-dentista saber quais metais estão fornecendo a seus pacientes. Isto requer o conhecimento dos tipos de ligas disponíveis, sua composição e propriedades.

PROPRIEDADES DESEJADAS A escolha da liga é regida por vários fatores. O custo é um fator importante a se considerar devido ao alto preço do ouro nos dias atuais. Outras considerações são a biocompatibilidade da liga e sua resistência à corrosão e ao deslustre. São estes fatores que praticamente limitam a variedade de ligas disponíveis para aplicações odontológicas. A indicação para uma aplicação específica, seja ela uma inlay em que há menor concentração de tensão ou

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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

uma prótese parcial fixa posterior, é determinada primariamente pelas propriedades mecânicas da liga, tais como: sua rigidez; resistência; ductibilidade e dureza. A rigidez é consequência tanto do desenho como do módulo de elasticidade da liga. Quanto maior o módulo de elasticidade, mais rígida será a estrutura para uma mesma forma. Esta é uma consideração importante, especialmente para próteses parciais fixas longas, núcleos fundidos, próteses parciais removíveis e seus grampos. Estas restaurações são também propensas a ser submetidas a cargas bastante elevadas e, portanto, precisam ser resistentes à deformação permanente. Isto requer que a liga tenha um alto limite de proporcionalidade e limite convencional de escoamento. Entretanto, para estruturas tais como os grampos, a alta resistência deve ser equilibrada com a ductibilidade, uma vez que é importante que a liga não seja tão frágil que frature quando pequenos ajustes forem feitos. No caso das inlays, em que a adaptação marginal é sempre melhorada pela brunidura, a ductibilidade é ainda mais importante. As ligas para estas aplicações precisam ser muito dúcteis e macias para não sofrerem fratura durante este procedimento. A facilidade de fundição de uma liga é uma consideração importante para o técnico de laboratório dentário. O técnico necessitará saber qual é o intervalo de derretimento e a temperatura de fusão para a liga, pois, em geral, quanto maior elas forem, maior serão os problemas apresentados no seu manuseio. Outra consideração importante neste contexto é a qualidade da adaptação da restauração, que é dependente da contração de fundição e de resfriamento da liga. Estas características têm que ser levadas em consideradas para que a peça fundida não venha a ter um tamanho muito pequeno. Quanto maior a contração, mais isto se torna um problema. A densidade da liga também é importante. A maioria das fundições é executada em uma máquina de fundição com força centrífuga e quanto maior a densidade da liga, mais fácil se torna a expulsão do ar do espaço molde e o preenchimento completo com a liga. Deste modo, as ligas com uma grande variedade de propriedades são necessárias para satisfazer estes diversos requisitos. As principais ligas empregadas em Odontologia são as ligas nobres, de metais preciosos e várias ligas básicas como a liga de Co–Cr e o titânio.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA É importante para o cirurgião-dentista ter uma relação profissional próxima do protético e levar em consideração seus pontos de vista quando estiver selecionando uma liga.

LIGAS NOBRES E DE METAIS PRECIOSOS Os metais nobres e preciosos consistem em oito elementos que têm várias características em comum. Eles são muito resistentes à corrosão (nobres) e caros (preciosos). Consideram-se metais nobres aqueles feitos de ouro, platina, ródio, rutênio, irídio e ósmio, enquanto a prata e o paládio geralmente são referidos como metais preciosos.

Ligas com Alto Teor de Ouro Este é um grupo de ligas que esteve presente na Odontologia por um tempo considerável e que pode ser distinguido de outras ligas utilizadas pelo seu alto conteúdo de metais preciosos, que não pode ser inferior a 75% sendo o teor de ouro maior que 60%. Os metais preciosos constituintes são frequentemente o ouro, a prata, a platina e o paládio. Estas ligas podem ser classificadas em quatro grupos distintos como indicado na Tabela 3.3.1. A quantidade de ouro em uma liga é definida por uma das duas maneiras seguintes: ■



Quilate. O ouro puro possui um quilate de 24 e o quilate de uma liga é expresso pelo número de partes em 24 avos de ouro que a compõe. Então, uma liga com 50% de ouro seria designada como liga de 12 quilates de ouro. Muitas joias são de ouro 9 quilates (37,5%) ou ouro 18 quilates (75%). Pureza. O ouro puro tem uma classificação de pureza de 1.000, de maneira que o ouro 18 quilates tem pureza 750 e o ouro 9 quilates é 375 puro.

Desse modo, as ligas odontológicas de ouro na Tabela 3.3.1 variam de 21,6 a 14,4 quilates ou pureza de 900 a 600.

Elementos Constituintes das Ligas Odontológicas de Ouro A maior fração dessas ligas certamente é de ouro, com quantidades menores de prata e cobre. Algumas formulações também se apresentam com pequenos conteúdos de platina, paládio e zinco. A prata possui o efeito de reforçar levemente a liga e se contrapõe ao pigmento avermelhado do cobre. O cobre é um componente muito importante, uma vez que aumenta a resistência, particularmente para as ligas de ouro tipo III e IV e reduz a temperatura da zona de fusão. O limite para a quantidade de cobre que pode ser adicionada à liga é de 16%, o aumento desta quantidade tende a manchar a liga. A platina e o paládio aumentam tanto a resistência quanto a temperatura de fusão. O zinco atua como um purificador durante a fundição, evitando a oxidação e melhorando as características de fundição (fundibilidade).

LIGAS FUNDIDAS PARA RESTAURAÇÕES METÁLICAS

Uma variedade de outros elementos, como o irídio, rutênio e rênio ( αm

(a) Tensão

Compressão

(b)

αp = αm

Resfriamento

IMPORTÂNCIA CLÍNICA

(c)

αp < αm Compressão

É importantíssimo que seja usada a combinação correta de metal e cerâmica.

Tensão

Tensões Induzidas Termicamente As cerâmicas usadas na confecção de restaurações metalocerâmicas perdem a sua fluidez termoplástica uma vez

Metal

Cerâmica

Figura 3.5.3 Efeito da discrepância térmica nas tensões residuais no metal e na cerâmica.

RESTAURAÇÕES CERÂMICAS ADERIDAS AO METAL

Quando αp = αm, os dois materiais se contraem na mesma taxa e nenhuma tensão diferencial é gerada (Fig. 3.5.3b). Quando αp < αm, o metal tenderá a se contrair mais que a cerâmica, o que a coloca em um estado de compressão (Fig. 3.5.3c). Isto reduz substancialmente a formação de trincas da cerâmica, pois as tensões compressivas serão superadas antes de ela ser colocada sob tensão. O metal estará sob tensão, mas, como a resistência à tração das ligas usadas é bastante alta (500 a 1.000 MPa), não existe o perigo de falha do metal. Por isso, parece que a melhor situação é aquela na qual o coeficiente de expansão do metal é maior que o da cerâmica. Sobre a discussão realizada, poderia se pensar que quanto maior a discrepância, melhor (já que a cerâmica estaria sob uma tensão compressiva maior), mas, de fato, isso não é o caso. A discrepância não deve ser muito grande, pois as tensões geradas no sistema podem causar fissuras ou fratura da cerâmica, ou descolamento da superfície metálica. A razão para isto é mais bem explicada considerandose uma cerâmica que é fundida a uma estrutura metálica circular, especialmente porque isso é mais parecido com a situação real, que é mostrada na Figura 3.5.4. Quando o metal tenta se contrair mais que a cerâmica, surgem tensões de tração radiais e tensões de compressão circunferências. Este último é vantajoso, mas o primeiro pode ser suficiente para causar o descolamento entre a cerâmica e o metal. Se a discrepância for muito grande, tensões de tração radiais podem causar a fratura da própria cerâmica, com a fratura aparecendo circunferencialmente.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA A melhor combinação de metal e cerâmica é aquela em que o coeficiente de expansão da cerâmica é apenas levemente menor que o do metal.

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Efeito da Composição da Cerâmica A diferença no coeficiente de expansão entre as cerâmicas feldspáticas usadas na confecção de coroas de jaqueta de porcelana e os metais disponíveis para união à cerâmica normalmente é muito grande. Para superar esse problema, o conteúdo de álcalis das cerâmicas é aumentado, como indicado na Tabela 3.5.2. Tanto a soda (Na2O) como o óxido de potássio (K2O) são adicionados para elevar o coeficiente de expansão para níveis de 14-16 ppm/ºC. Muito mais importante é o fato de que a adição desses óxidos resulta na formação de uma fase cristalina na matriz vítrea. A fase cristalina é conhecida como leucita tetragonal, que possui um alto coeficiente de expansão térmica de 22 a 24 ppm/ºC. A quantidade de leucita precipitada pode ser cuidadosamente controlada para fornecer uma cerâmica com o coeficiente de expansão correto para o uso com uma determinada liga em particular e pode ser de 30% a 40% do volume do material (Figura 3.5.5). A diminuição da temperatura de queima possui o benefício de redução do potencial de distorção pelo creep da liga. Após a fritagem da cerâmica feita na fabricação, ela é mantida numa temperatura elevada por um determinado tempo para permitir a formação de cristais de leucita. Portanto é um processo idêntico à ceramização das cerâmicas vítreas descritas no Capítulo 3.8. Por isso, talvez a melhor denominação das cerâmicas usadas nas restaurações metalocerâmicas seja cerâmicas vítreas contendo leucita. Todavia, essas cerâmicas vítreas são diferentes daquelas cerâmicas vítreas reforçadas com leucita descritas no Capítulo 3.8 e, nesse caso, a preocupação principal é combinar o coeficiente de expansão térmica com o do metal e não obter a maior resistência possível. De fato, a resistência à flexão das cerâmicas usadas nas restaurações metalocerâmicas é apenas na ordem de 30 a 50 MPa. Portanto, a construção da cerâmica sobre a estrutura metálica não deve ser muito espessa, pois isso pode conduzir a uma fratura da cerâmica quando colocada na boca.

Tensões de tração radiais Tabela 3.5.2 Composição típica de duas cerâmicas para união a metais comparada com uma porcelana para coroa de jaqueta (PCJ) Porcelana PCJ

Tensões de compressão circunferências

Porcelana trincada

Figura 3.5.4 Trincamento da cerâmica unida ao metal devido às tensões de tração radiais quando αp temperatura de queima da cerâmica Alto módulo de elasticidade Baixo creep Baixo custo

rigidez resultante da ponte metálica impedirá a ocorrência de deformações excessivamente altas (que a cerâmica pode não suportar) decorrentes da carga oclusal. Além do mais, uma baixa rigidez da armação metálica pode resultar em distorção devido à tensão de contração diferencial gerada no resfriamento após a queima da porcelana. Durante um determinado período, apenas as ligas com alto teor de ouro estavam disponíveis, mas com o crescente custo do ouro, uma variedade de ligas alternativas foi desenvolvida, que podem ser classificadas: em ligas de alto teor de ouro; ouro-paládio; alto teor de paládio; prata-paládio; níquel-cromo ou titânio comercialmente puro. A composição de algumas ligas é mostrada na Tabela 3.5.4.

ESCOLHA DAS LIGAS METALOCERÂMICAS Os requisitos das ligas usadas no sistema de restauração metalocerâmica são de certa forma diferentes daqueles das ligas de metal puro usadas para construções de próteses (Tabela 3.5.3). Como é necessário queimar a cerâmica sobre a superfície metálica, sua temperatura de fusão deve ser maior que a temperatura de sinterização da cerâmica. Se a temperatura de fusão do metal for muito próxima à temperatura de queima da cerâmica pode ocorrer o derretimento parcial das porções mais delgadas do coping metálica, ou o coping pode se deformar. Especialmente na construção de pontes extensas, em particular, o metal deve possuir um alto módulo de elasticidade e um alto limite de proporcionalidade. A alta

Ligas de Alto Teor de Ouro Para as ligas de alto teor de ouro, a temperatura de fusão é aumentada pela adição de platina e paládio, ambos possuindo alta temperatura de fusão. Uma diferença imediatamente óbvia entre a liga comum de ouro e uma liga de ouro para cerâmica é a supressão do cobre nessa última. Isso é feito porque o cobre reduz a temperatura de fusão e também possui a tendência de reagir com a cerâmica, produzindo uma coloração verde. Essa é outra característica das ligas: elas não devem reagir com a cerâmica de forma a comprometer a estética da restauração.

Tabela 3.5.4 Composição típica das ligas para metalocerâmica Tipo

Au (%)

Ag (%)

Pd (%)

Pt (%)

Ni (%)

Cr (%)

Mo (%)

In, Cu, Zn, Ga (%)

Alto teor de ouro

88

1

6

4







Equilibrado

Au-Pd

50

10

38









Equilibrado

Alto teor de paládio





80









Equilibrado

Pd-Ag



30

60









Equilibrado

Ni-Cr









70

20

10



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MATERIAIS DENTÁRIOS DE USO LABORATORIAL E MATERIAIS CORRELACIONADOS

As ligas de alto teor de ouro possuem a vantagem de estar no mercado há um tempo considerável, e a experiência clínica tem mostrado que elas são muito eficazes. Particularmente, a união entre a cerâmica e o metal é muito forte e confiável. A principal desvantagem das ligas de alto teor de ouro é a sua temperatura de fusão relativamente baixa, sua suscetibilidade ao creep em altas temperaturas e seu baixo módulo de elasticidade. É necessária uma espessura mínima do coping metálico de 0,5 mm. Em situações de espessura biológica limitada, isso pode causar problemas estéticos e geralmente resulta no sobrecontorno para mascarar a cor do metal. Nesse caso, as ligas de Pd-Ag e de metais básicos são mais atraentes.

duzindo peças fundidas com baixa flexibilidade e uma tendência reduzida ao creep sobre altas temperaturas durante a queima da porcelana. As ligas são menos exigentes em termos de fundição e adaptação, mas desde que sejam adotados os procedimentos adequados, os resultados poderão ser tão bons como os das ligas de ouro. Devido à presença de grandes quantidades de prata, existe a preocupação de que pode ocorrer a descoloração da porcelana. Tal problema parece ser mais grave com certas combinações de liga/porcelana mais que outras e pode ser minimizado pela seleção cuidadosa da combinação metal/porcelana. As múltiplas queimas devem ser mantidas a um mínimo, e o superaquecimento deve ser evitado.

Ligas de Ouro-Paládio Um motivo para a introdução das ligas Au-Pd no início dos anos 1970 foi o aumento rápido do custo do ouro. O preço dos metais preciosos se mostrou muito instável nos últimos 10 anos, e o custo pode variar muito de um ano para outro. Talvez seja bom lembrar que o custo do material representa apenas uma pequena parte do custo do tratamento odontológico. O desempenho das ligas Au-Pd é comparável ao das ligas de alto teor de ouro em termos de capacidade de fundição, precisão da adaptação e resistência à corrosão. Entretanto, existem algumas combinações de cerâmica/ liga que devem ser evitadas devido à discrepância das características da expansão térmica.

Ligas de Alto Teor de Paládio Essas ligas são compostas basicamente por paládio, com pequenas adições de outros elementos, tais como: cobre; gálio; e; estanho; e se tomaram muito populares nos últimos 10 anos. O cobre, que pode estar presente em quantidades de até 15%, pode ter um acréscimo surpreendente, pois se pensava que ele causava descoloração da porcelana. Entretanto, diferentemente das ligas de ouro, a inclusão do cobre nas ligas de paládio não parece possuir tal efeito. A resistência ao creep sobre altas temperaturas dessas ligas poderá ser deficiente se houver escoamento excessivo durante a queima da cerâmica.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA Essas ligas são contraindicadas para pontes extensas, pois podem apresentar um problema específico.

Ligas de Prata-Paládio As ligas de Ag-Pd possuem o módulo de elasticidade mais favorável de todas as ligas de metais preciosos, pro-

Ligas de Níquel-Cromo-Molibdênio As ligas de Ni-Cr-Mo possuem uma composição que é tipicamente 77% de Ni, 12% de Cr e 3,5% de Mo, embora o conteúdo de Mo e o de Cr possa atingir 9% e 22% respectivamente, à custa do níquel. As ligas de Ni-Cr-Mo são muito rígidas, pois o módulo de elasticidade pode ser em torno de duas vezes e meia maior que o das ligas de alto teor de ouro. Isso possui a vantagem de que a espessura do coping metálico pode ser reduzida de 0,5 mm para 0,3 mm, o que diminui o problema de sobrecontorno. Isto também significa que elas são a melhor escolha para a construção de pontes unidas por resina, especialmente aquelas que possuem um desenho tipo cantilever, onde é necessário um alto módulo de elasticidade para reduzir as tensões na camada adesiva. Elas também são as mais indicadas na confecção de pontes extensas, pois proporcionam uma rigidez maior e, devido à alta temperatura de fusão, existe menos potencial de creep sobre altas temperaturas durante a queima. As desvantagens com essas ligas é que a fundição é mais difícil, e a alta contração de fundição pode causar problemas de má adaptação. Também, a experiência clínica pode indicar que a união da cerâmica ao metal não é tão confiável como para outras ligas. Entretanto, conforme se ganha mais experiência com essas ligas, seu desempenho pode melhorar. O baixo custo da liga é certamente muito atraente. A biocompatibilidade das ligas de Ni-Cr tem sido motivo de preocupação. O níquel é um alérgeno conhecido, embora relatos de alergia ao níquel causada por aparelhos intraorais sejam raros. O berílio (