História oral: como fazer, como pensar

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José Carlos Sebe B. M e ih y Fabíola H o la n d a

CO M O

FAZER CO M O

editoracontexto

PENSAR

José C a rlo s S e b e B. M e ih y F a b ío la H o la n d a

HISTO RIA ORAL como fazer, como pensar

e d ito r a c o n te x to

C o p y rig h t© 2 0 0 7 José C arlos Sebe Bom M cihy Todos os direitos desta edição reservados à E ditora C o n tex to (E ditora Pinsky Ltda.)

M o n ta g em d e capa

G ustavo S. Vilas Boas P rojeto gráfico e diagram ação

G ap p Design R evisão

Cássio D ias Pclin R uth Kluska

D ados Internacionais de C atalogação na Publicação (c ip ) (C âm ara Brasileira d o Livro, sp , Brasil) M eihy, José C arlos Sebe Bom H istória o r a l : co m o fazer, co m o pensar / José C arlos Sebe Bom M eihy, Fabíola H o lan d a. - 2. ed., 4 a reim pressão. São Paulo : C o n tex to , 2015. Bibliografia. ISB N 9 7 8 -8 5 -7 2 4 4 -3 7 6 -0 1. H istó ria oral

I. H o lan d a, Fabíola.

II. T ítu lo .

0 7 -7 0 2 9

C D D -9 0 7 .2 índices para catálogo sistem ático: 1. H istória oral 907.2

E d it o r a C o n t e x t o D ireto r editorial: J a im e P in sky Rua D r. José Elias, 520 - A lto da Lapa 05083-030 - São Paulo - sp pa bx : (11) 3832 5838 co n te x to ^ e d ito ra c o n te x to .c o m .b r w w w .editoracontexto.com .br

2015

Para Suzana Lopes Salgado Ribeiro, por tudo que o N eho quer ser.

Proibida a reprodução total o u parcial. O s infratores serão processados na form a da lei.

S U M A R IO

A p re s e n ta ç ã o .........................................................................................................9 PARTE I - C om o F a z e r ..........................................................................................11 U N ID A D E I - Pressupostos.............................................................................. 13 1 - C o n c e ito s e d e f in iç õ e s ............................................................................................................... 13 2 - H is tó ria o ra l, d o c u m e n to e r e p r e s e n t a t iv id a d e ......................................................... 2 4 3 - Passos d o processo d e h is tó ria o r a l ....................................................................................2 9

U N ID A D E II - G êneros em história o r a l.................................................. 33 4 - T ip o s d e h is tó ria o r a l.................................................................................................................. 33

U N ID A D E III - A prática em história o ra l................................................43 5 - P r o je to d e h is tó ria o r a l .............................................................................................................4 3 6 - C o n d iç õ e s p a ra as e n tre v is ta s ............................................................................................... 55 7 - P e rs o n a g e n s e é tic a e m h is tó ria o r a l ................................................................................. 58

U N ID A D E IV - Estatudo da história o r a l................................................. 63 8 - Em busca d e u m lu g a r ............................................................................................................... 63

A - Textos para d iá lo g o ................................................................................. 81 a - O u tro s c o n c e ito s e d e fin iç õ e s ............................................................................................... 81 b - T ip o s d e h is tó ria o r a l .................................................................................................................8 5 c - B alanços e p a r a le lo s ................................................................................................................... 8 6

PARTE II - C om o p e n s a r...................................................................................... 89 U N ID A D E V - U m a H istória p ara a história o r a l................................. 91 9 - T ra je tó ria s d o o ra l e d o e s c rito .............................................................................................91 1 0 - E n tre v is ta s c o m o a to d e fu n d a ç ã o d a h is tó ria o r a l................................................92 11

- H is tó ria , e sc rita, s u b v ers ão e p o d e r .............................................................................9 8

12 - A m o d e r n a h is tó ria o r a l....................................................................................................... 101 13 - A g e s ta ç ã o d a m o d e r n a h is tó ria o r a l............................................................................106 14 - H is tó ria o ra l c o m o d iv is ã o d e s a b e r .............................................................................. 107 15 - A h is tó ria o ra l n o B r a s il........................................................................................................109

APRESENTAÇÃO

U N ID A D E VI - O e m p írico e o t e ó r ic o .................................................. 117 16 - Faces d e u m a só m o e d a ......................................................................................................117 17 - C o la b o ra ç ã o e c o o p e r a ç ã o ................................................................................................. 120 18 - B an co d e h is tó ria s ................................................................................................................... 126 19 - H is tó ria o ra l p u ra o u h íb r id a ........................................................................................... 128 2 0 - A n á lis e e m h is tó ria o r a l ......................................................................................................130

U N ID A D E VII - D o oral para o escrito....................................................133

“Fiz este livro comigo mesmo, com minha vida e com meu coração. Ele é fruto de minha experiência”. Michelet

21 - T ra n s c ria ç ã o ................................................................................................................................ 133

U N ID A D E V III - D ocum en tos e e x e m p lo s .............................................. 139 2 2 - A p rá tic a d a tras criçã o ; t e x tu a liz a ç ã o e tr a n s c ria ç ã o ...........................................139 2 3 - Ficha d e a c o m p a n h a m e n to e c o n tro le d o p r o je to ................................................ 145 2 4 - C a rta d e a u to r iz a ç ã o e uso das e n tr e v is ta s ...............................................................148 2 5 - C a d e rn o d e c a m p o .................................................................................................................. 151

B - Textos p ara d iá lo g o s ............................................................................. 155 d - S o b re tra n s c ria ç ã o ...................................................................................................................... 155

A h istó ria oral no Brasil, b e m c o m o em p a rte do m u n d o , te m avançado

e - T ra n s criaç ão e m h is tó ria o r a l ................................................................................................157

em to d o s os níveis. Sem d ú v id as, as c o n q u ista s d a e le trô n ic a p ro p õ e m

f - C o la b o ra ç ã o / m e d ia ç ã o .......................................................................................................... 161 g - O c a rá te r p ú b lic o d a h is tó ria o r a l ..................................................................................... 163

pro b lem as q u e exigem a d ap tação e n tre os a n tig o s m o d elo s d e fo rm u lação

h - D e v o lu ç ã o ....................................................................................................................................... 163

d o sab er e as técnicas de p ro d u ç ã o e análise de textos. O s reflexos dessas

i - M e d ia ç ã o ..........................................................................................................................................165

m u d a n ç a s se fazem p resen tes nas fo rm as d e ver e refletir so b re a vida

Palavras f in a is ...................................................................................................167

social e os in d iv íd u o s n o m u n d o globalizado. E n tre o u tra s altern ativ as,

B ib lio g r a fia ........................................................................................................ 169

a h istó ria oral se a p re se n ta c o m o solução m o d e rn a d isp o sta a in flu ir n o c o m p o rta m e n to d a c u ltu ra e n a c o m p re e n sã o d e c o m p o rta m e n to s e sen sib ilid ad e h u m a n a . O fato d e ser a m p la m e n te aceita pelo p ú b lic o a faz d esafiad o ra d o exclusivism o acad ê m ic o , a in d a q u e as disciplinas univ ersitárias ta m b é m a d is p u te m . E ste liv ro é u m a in tro d u ç ã o a b ra n g e n te e exem plificada, d e stin a d o a to d o s, a fim de facilitar o a p re n d iz a d o e a m p lia r os d eb ates so b re c o m o a b o rd a r: m e m ó ria , id e n tid a d e e c o m u n id a d e , m a té ria s-p rim a s d a h is tó ­ ria oral. R esu lta d o de anos d e p esquisas teóricas e aplicação e m diversos

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H is tó ria o ra l

tem as, te m o s a q u i u m ro te iro em q u e a ex p eriên cia p rá tic a se a rtic u la às p o n d e ra ç õ e s teóricas de m a n e ira q u e u m a justifica a o u tra . D iv id id o e m d u as partes, o como fa z e r é u m guia a te n to a re sp o n d e r e m o s tra r os passos da elab o ração d e p ro je to s em h istó ria oral. O como pensar é u m ro te iro teó ric o q u e enlaça ta n to a o rig em , p e rtin ê n c ia da tra n sfo rm a ç ã o d o c o n c e ito de d o c u m e n to , e o desafio d e q u e m se vale d a h istó ria oral c o m o o p o rtu n id a d e de aliar avanços d a e le trô n ic a co m c a p a c id a d e d e p o n d e ra r sobre o m u n d o n o te m p o p resen te. T o m a ra q u e a le itu ra seja ú til e q u e os resu ltad o s a ju d e m a c o m p re ­ e n d e r u m m u n d o q u e c a m in h a e n tre palavras, discursos, n arrativas e esperanças d e co m p re en sã o .

PARTE I - C O M O FAZER

Mas, o q u e é m esm o história oral? E d o cu m e n ta ç ã o oral o qu e é? Q u al a relação e n tre história oral e entrevista? Quais as m elhores definições de história oral? Registro em história oral, com o se faz? Há gêneros d ife re n te s em história oral, quais são? Vam os fa z e r um p ro je to de história oral?

U N ID A D E I - P R E S S U P O S T O S

instruída e capaz de motivar; mais que suajustificação, mudanças nasformas

1 - Conceitos e definições 1.1 - Q u em é q u em em história oral 1.2 - Eletrônica com o condição para a história oral

de ver o mundo e nela o papel de seus agentes. Por se considerar moderna e

2 - História oral, d o c u m e n to e rep re s e n ta tiv id a d e

coerente com os avanços do mundo eletrônico e com as linhas da globalização,

3 - Passos do processo de história oral

Alguns pressupostos regem a ação de uma história oral que se pretende

àqueles que optam pela história oral como algo mais do que simples entrevistas é dado pensar a estruturação de procedimentos capazes de dignificá-la além do possível valor informativo que possa conter. A história oral para deixar de ser recurso complementar implica estabelecimento de linhas de atuação que

1 -

C O N C E IT O S E D E F IN IÇ Õ E S

a extraia da aventura diletante ou de voluntarismos espontâneos. As operações em história oral exigem reflexões sobre o estabelecimento de textos e de seus usos. Assim parte-se do princípio de que os discursos orais são

“Aprende-se melhor a história oral experimentando-a, praticando-a sistemática e criticamente.” Jorge Eduardo Aceves Lozano

passíveis de transformação em textos escritos que se tornam testemunhais. A pluralidade desses discursos depende de tipos de captações e, assim, há

E n tre m u ita s o u tra s questões, os c o n ceito s e as definições são algum as

variações de entrevistas que se organizam em gêneros. Sem a lógica da

das q u e p o v o a m a cabeça d e q u a n to s se p re o c u p a m em e n te n d e r o papel

captação, as entrevistas de história oral se perdem em indefinições. Mais: sem critérios definidores dos gêneros de história oral não é possível definir caminhos de elaboração, guarda!arquivamento, trato de estabelecimento de textos e análises eventuais. Assim, é importante detalhar cada etapa dos procedimentos, em particular os momentos da aquisição das entrevistas e suas possíveis projeções analíticas.

d a h istó ria oral c o m o fo rm a de p e n sa r a s o c ie d a d e c o n te m p o r â n e a . V a le n d o -se d e d iálo g o s gravados, as percep çõ es da vida social são registradas d e m a n e ira a se c o n s titu ir e m fo n tes o u d o c u m e n to s q u e , c o n tu d o , dev em ser c o n sid e ra d o s desde

Fonte oral é mais que história oral. Fonte oral é o registro de qualquer recurso que guarda vestígios de ma­ nifestações da oralidade humana. Entrevistas esporádicas feitas sem pro­ pósito explícito, gravações de músicas, absolutamente tudo que é gravado e preservado se constitui em documento oral. Entrevista, porém, é história oral em sentido estrito.

sua o rig em . O p o n to d e p a rtid a das e n ­ trevistas em h istó ria oral im p lica a ceitar q u e os p ro c e d im e n to s são feitos n o p resen te, c o m gravações, e en volvem expressões orais e m itid a s co m

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U n id a d e I - Pressupostos

H istória o ral

in te n ç ã o d e a rtic u la r idéias o rie n ta d a s a registrar o u explicar aspectos de

5 - O espaço e o tem po da história oral, portanto, são o “aqui ’ e o “agora”, e o produto é um documento;

interesses p la n e jad o s em p ro jeto s. E n tre v ista em h istó ria oral é a m a n ifestação d o q u e se c o n v e n c io n o u

6 - C o m o m anifestação contem porânea, a história oral se vale dos aparatos da modernidade para se constituir, então, além de pessoas vivas reunidas

c h a m a r de d o c u m e n ta ç ã o oral, o u seja, s u p o rte m a terial d e riv ad o de

para contar algo que lhes é com um , a eletrônica se torna meio essencial

lin g u a g e m verbal expressa p ara esse fim . A d o c u m e n ta ç ã o oral q u a n d o

para sua realização.

a p re e n d id a p o r m eio d e gravações ele trô n ic as feitas c o m o p ro p ó s ito de registro to rn a -se fo n te oral. A h istó ria oral é u m a p a rte d o c o n ju n to de fo n tes orais e sua m a n ifestação m ais c o n h e c id a é a entrevista. C o m o p ro c e d im e n to específico, a entrevista em história oral é u m a fó rm u la p ro g ram a d a e resp o n d e à existência de projetos q u e a justificam . C o n v é m le m b ra r q u e a palavra d ita e gravada não existe c o m o fe n ô m e n o o u ação isolada. M u ito d o q u e é verbalizado o u in teg rad o à oralidade, c o m o gesto, lág rim a, riso, silêncios, pausas, interjeições o u m e sm o as expressões faciais - q u e n a m a io ria das vezes não tê m registros verbais Alguns fatores circunstanciam a situação de entrevistas em história oral: proje­ tos provocados, feitos no tempo presente, com auxílio da eletrônica, resultando um produto elaborado por colaboradores vivos. Essas marcas da moderna história oral diferenciam a en­ trevista de história oral de outras.

g a ra n tid o s em gravações - , p o d e in te g ra r os discursos q u e dev em ser tra b a lh a d o s p a ra d a r d im e n sã o física ao q u e foi ex­ presso em u m a e n trev ista d e h istó ria oral. A co n sid e ra ç ão d a en tre v ista além d o q u e

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C o m isso e m m e n te , e leg e-se u m a d e fin iç ã o c o m o c a p a z d e s in te tiz a r os e le m en to s q u e c o n stitu e m a h istó ria oral: C abe verificar cada fator dessa definição: H is tó r ia oral é u m c o n ju n to d e p r o ­ c e d im e n to s ... N ã o se tr a ta a p e n a s d e u m a to o u p ro c e d im e n to ú n ic o . H is tó ria oral é a

História oral é um conjunto de procedi­ mentos que se inicia com a elaboração de um projeto e que continua com o estabelecimento de um grupo de pes­ soas a serem entrevistadas. O projeto prevê: planejamento da condução das gravações com definição de locais, tempo de duração e demais fatores ambientais; transcrição e estabeleci­ mento de textos; conferência do pro­ duto escrito; autorização para o uso; arquivamento e, sempre que possível, a publicação dos resultados que devem, em primeiro lugar, voltar ao grupo que gerou as entrevistas.

so m a a rtic u la d a , p lan ejad a, de algum as a titu d e s p e n sa d a s c o m o u m c o n ju n to . N ã o é ap en as a en tre v ista o u o u tra fo n te oral q u e m arca a h istó ria oral. Q u e se in ic ia c o m a ela b o ra çã o d e u m p r o je to

é reg istra d o e m palavras é u m dos desafios d a h istó ria oral. G a ran te-se

A existência de u m p ro je to é c o n d iç ã o essencial p a ra a o p eração em

a v alid ad e dessa in te g ra ç ão d e fin in d o -se a palavra gravada em e n trev ista

h istó ria oral. C o m o p ro c e d im e n to p la n e jad o , u m a p ro p o sta p re v ia m e n te

c o m o u m d o s e le m e n to s c o m p o n e n te s d e u m a sessão.

a rm a d a se to rn a fu n d a m e n ta l p a ra se re sp o n d e r às três situações q u e

Q u a lq u e r resp o sta ao desafio d a h istó ria oral o b rig a to ria m e n te p a rte d e alguns p o n to s: 1 - É um ato prem editado, realizado segundo a orientação expressa em um projeto;

o rie n ta m a realização da h istó ria oral: a - de quem? b - como?, e c —por quê?

2 - É um procedim ento que acontece no tempo real da apreensão e que para tanto necessita de personagens vivos colocados em situação de diálogo;

O

e sta b e le c im e n to d e u m g r u p o d e p esso a s a serem en trevistad as

3 - Ao assumir-se com o manifestação contem porânea, a história oral m antém

A existência d e u m g ru p o d e pessoas a serem en trev istad as é c o n d iç ão

vínculo inevitável com o imediato e isso obriga reconhecer o enlace da

p ara a realização d e u m a p esq u isa em h istó ria oral. O g ru p o q u e gera

memória com modos de narrar,;

a p rim e ira situ ação ju stific a d o ra d a h istó ria oral - de quem ? - deve ser

4 - A história oral ao valer-se da m em ória estabelece vínculos com a identidade do grupo entrevistado e assim rem ete à construção de comunidades afins;

ex plicado e m suas razões d e escolha.

16

H is tó ria o ra l

U nid a d e I - Pressupostos

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O p r o je to prevê: p la n eja m e n to da c o n d u ç ã o das gravações

A u to riza çã o para o u so

As gravações devem ser planejadas e os papéis - q u e m entrevista e qu e m

T o d o tex to a u to riz a d o deve ser a c o m p a n h a d o d e u m a carta d e cessão

é e n trev istad o - devem ser acertados previam ente, de m an eira a evitarem surpresas. A explicação do pro jeto , d o p o rq u ê a pessoa é c o n v id ad a para

c o m especificações so b re seu uso p le n o o u relativo. A r q u iv a m en to

c o m p o r o c o n ju n to de pessoas entrevistadas, b em c o m o os destinos das gravações, precisam ser ap resentados antes d o com eço da oçeração.

É b o m esclarecer aos e n tre v istad o s q u e as gravações deverão c o m p o r u m d e te rm in a d o acervo e q u e seu uso n ão se esgota n o a p ro v e ita m e n to

D e fin iç ã o d e lo c a is O local d a realização d a entrevista deve ser acertado antes, m as a prefe­ rência d a escolha é sem pre prerrogativa d o entrevistado. H á projetos em

de u m p ro je to . S em p re q u e p o ssív e l, p u b lic a r o s resu lta d o s, q u e d ev em , em p r i­ m eiro lugar, v oltar ao g r u p o q u e g e ro u as en trevistas

q u e espaços definidos - estúdios, salas especiais - são indicados e, nessas situações, os acordos m ú tu o s devem ser resolvidos co m antecedência.

O c o m p ro m is s o c o m a “d e v o lu ç ã o ” d o s re s u lta d o s d o p ro je to é c o n d iç ã o b á sic a p a ra se ju s tific a r u m p r o je to d e h is tó ria o ra l. A c o n ­

T em p o d e d u ração

d iç ã o “p a ra q u e m ” d e v e ficar e x p lic a d a , p o is os p ro je to s q u e se v a le m

É sem p re im p o rta n te prever o te m p o d e gravação a ser d e d ic a d o aos

d e e n tre v is ta s c u m p r e m s e m p re u m p a p e l so cia l. S eja p a ra in s tr u ir

e n c o n tro s. T o d o p ro je to deve p ro p o r u m te m p o de d u ra ç ã o c o m u m a

teses, d is se rta ç õ e s , c o m p o r a ce rv o s o u fu n c io n a r c o m o a le rta te m á ti­

to d o s os seg m e n to s en trev istad o s, a in d a q u e d ificilm en te isso seja o b e ­

co, os te x to s e sta b e le c id o s , e m p rim e ir o lu g a r, d e v e m ser d e v o lv id o s

d ecid o . A previsão d o te m p o d a en tre v ista visa ta n to à d isp o n ib ilid a d e

aos p ro ta g o n is ta s g e ra d o re s e, c o n fo rm e o caso , à c o m u n id a d e q u e

d o e n tre v ista d o c o m o d o en trev istad o r.

os p ro v o c o u .

D e m a is fatores a m b ien ta is

O u tra s d e fin iç õ e s d e h istó r ia oral

P re fere n c ia lm e n te , os locais dev em p e rm itir p riv acid ad e e boas so lu ­

C o n sid e ra n d o q u e h istó ria oral é u m processo em m o v im e n to e levan­

ções de gravação. T ran scrição e e sta b e le c im e n to d e te x to s O processo d e passagem d o oral p ara o escrito é b a sta n te co m p lex o e d e m a n d a te m p o . É necessário esclarecer q u e o re su lta d o d e m o ra rá e q u e h á etapas até ch eg ar a u m a so lu ção final. C o n fe r ê n c ia d o p r o d u to e scrito

do-se em c o n ta a carga p olêm ica q u e pesa sobre sua aceitação, é preciso p en sar nas fragilidades conceituais de suas características. Isso, c o n tu d o , História oral é um recurso moderno usado para a elaboração de registros, documentos, arquivamento e estudos referentes à experiência social de pes­ soas e de grupos. Ela é sempre uma história do tempo presente e também reconhecida como história viva.

n ão invalida o esforço de definições. Pelo c o n trá rio p o ten cializa as a ltern ativ as de pensá-las, pois convida a posicionam entos. A necessidade de te r claros os porquês d o uso da história oral, em particular q u a n ­

O s cu id a d o s éticos são fu n d a m e n ta is em h istó ria oral. C o m o g aran tia,

d o se pensa em entrevistas, d e m a n d a levar em c o n ta as escolhas q u e d iri­

é p ru d e n te d eix ar claro q u e n a d a será d iv u lg a d o sem a prévia au to riz a çã o

girão os passos q u e dizem respeito ta n to à aquisição das entrevistas, co m o

d o en tre v istad o .

de seu uso. Para u m a escolha m in im a m e n te ad eq u a d a de u m co nceito é

18

H istória o ra l

im p o rta n te levar em consideração alguns fatores q u e m arcam a existência deste recurso, a saber: 1 - Necessidade de um projeto que justifique a ação; 2 - V inculação com um a área de estudos ou com propósitos independentes, sem pre de interesses sociais;

U n id a d e I - Pressupostos

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3 - H is tó r ia oral é u m a altern ativa para estu d ar a so c ie d a d e p or m e io d e u m a d o c u m e n ta ç ã o fe ita c o m o u so d e en trevistas gravadas em ap a relh o s e le tr ô n ic o s e tran sform ad as em te x to s escrito s. A lém de prezar o valor d o c u m e n ta l d o re su lta d o das entrevistas, bem c o m o dos ap arelh o s e le trô n ic o s, a q u i é c o n sid e ra d a a passagem d o oral

3 - Presença dos meios eletrônicos (gravadoras, filmadoras);

p ara o escrito. Essa a lte rn a tiv a se restrin g e ao c aráte r d o c u m e n ta l das

4 - Reunião direta/pessoal com pessoas dispostas às entrevistas;

entrevistas. A palavra “e stu d o ” n o caso restrin g e as funções sociais ou

5 - Definição sobre o uso e destino (arquivam ento) das entrevistas.

pú b licas d a h istó ria oral. 4 - H is tó r ia oral é u m p r o c esso s istê m ic o d e u so d e en trevistas

E n tre o u tro s , os p rin c ip a is c o n ce ito s de h istó ria oral são os seguintes:

gravadas, vertid as d o oral para o e sc r ito , c o m o fim d e p ro m o v er o

1 - H is tó r ia oral é u m a p rática d e ap reen são d e narrativas feita

registro e o u so d e en trevistas.

através d o u so d e m e io s e le tr ô n ic o s e d e stin a d a a: reco lh er te s te m u ­

N esse caso, o q u e se te m de n o v o é a d efinição d o uso das entrevistas,

n h o s, p ro m o v er a n á lises d e p r o c esso s so c ia is d o p resen te, e facilitar

o q u e significa q u e elas devem re sp o n d e r às indicações dadas n o p ro je to ,

o c o n h e c im e n to d o m e io im e d ia to .

q u e , p o r sua vez, a p o n ta m p a ra usos an alítico s. A n o ç ão de “sistem a”

N esse c o n ce ito , o q u e pesa é a “ap reen são de n arrativ as”, o q u e g aran te

m arca esta defin ição , q u e exigiría uso in d u tiv o .

u m significado p rim o rd ia l às pessoas q u e vivem u m processo social em

A en trev ista de h istó ria oral é sem pre u m processo dialógico, isto é, que

curso. A conexão e n tre o en tre v istad o e os fatos q u e a co n tec e m é relevante

d e m a n d a a existência de pelo m e n o s d uas pessoas em d iálogo, p o ré m não

p ara ju stific a r o p ro je to . O s m eios e le trô n ic o s são destacad o s c o m o p a rte

se tra ta de u m a conversa e sim de relação p ro g ram a d a , a te n ta às gravações.

d o processo. V aloriza-se ta m b é m a q u e stã o d a recolha e d a análise c o m o

A ssim , os c o n ta to s h u m a n o s, p re m e d ita d o s, se c o lo cam c o m o im p resc in ­

fases in d e p e n d e n te s p ara o c o n h e c im e n to d o m eio im e d ia to . N o te -se

díveis à elab o ração d a h istó ria oral. N ã o

q u e a en tre v ista é in d ic a d a c o m o “facilitad o ra” d o e n te n d im e n to social.

se p ro d u z , c o n tu d o , h istó ria oral p o r vias

2 - A fo r m u la çã o d e d o c u m e n to s através d e registros e le tr ô n ic o s é u m d o s o b je tiv o s d a h istó r ia oral. C o n tu d o , esses registros p o d e m ta m b é m ser a n a lisa d o s a fim d e favorecer e stu d o s d e id e n tid a d e e m e m ó r ia co le tiv a s.

in d ireta s, c o m o p o r te lefo n e o u in te rn e t, p o r exem plo. O c o n ta to d ire to , d e pessoa a pessoa, in te rfere d e m a n e ira a b so lu ta nas fo rm as de exposição das narrações.

História oral é um processo de aquisição de entrevistas inscritas no "tempo pre­ sente" e deve responder a um sentido de utilidade prática, social, e imediata. Isso não quer dizer que ela se esgote no momento de sua apreensão, do esta­ belecimento de um texto e da eventual análise das entrevistas.

Por o u tro lado, a ausência de in terlo cu ção Essa d efin ição c e n tra força n o c aráte r d o c u m e n ta l das en trev istas, q u e esta riam a te n tas a a tin g ir dois p lan o s an alítico s fu n d a m e n ta is: os estu d o s de id e n tid a d e e m e m ó ria . O s a p arelh o s ele trô n ic o s ta m b é m c o m p õ e m as c o n d iç õ es d e realização d a h is tó ria oral. É im p o rta n te re c o n h ec e r q u e o “c o letiv o ” é essencial p a ra essa definição.

pessoal faz c o m q u e sejam m e n o s e sp o n tâ n e a s as declarações e, p io r do q u e isso, d e m a n d a m variações n arrativ as q u e seriam d iferen tes. A h is tó ria oral c o m o p rá tic a co m p le x a e q u e in te g ra d iferen tes etapas é sem p re u m sistem a a rtic u la d o o n d e cada p a rte o u lance in te rfere e d e te rm in a o u tro . É e rra d o p e n sa r q u e u m a das p artes o u m an ifestação d o processo desse c o n ta d o q u e se e n te n d e p o r h istó ria oral.

História oral

20

Unidade I - Pressupostos

1.1 - Q U E M É Q U E M EM HISTÓ RIA ORAL

21

e sp o n tâ n e a , as d u as p artes devem m a n te r u m a p o ssib ilid ad e c o n fo rtáv el p ara o e sta b e le c im e n to d a en trev ista.

“O autor precisa deixar claro ao leitor qual é o lugar de onde fala, porque seu texto é uma construção baseada nos referenciais sociopolítico-profissionais e empíricos de seus diferentes papéis sociais.” Alice Beatriz da Silva Gordo Lang e Maria de Lourdes Mônaco Janotti

As entrevistas p ro d u z e m sem pre pelo m enos u m d o c u m e n to m aterial: a gravação. G ra n d e p a rte dos p ro jeto s, c o n tu d o , im p lica o esta b e le cim en to de u m te x to escrito e a p ro v a d o , m a té ria d eriv a d a d a en tre v ista gravada. Isso gera u m p ro b le m a de co n sequências im p o rta n te s p ara a consideração o b je tiv a so b re q u a l é o d o c u m e n to e m h istó ria oral. A final, o q u e seria

A h istó ria oral se realiza na c o n ju n ç ã o d e d o is e le m e n to s q u e se c o m ­ p le ta m n a relação d e pesquisa:

tex to a p ro v a d o d ep o is d e revisado c o m as ...

1 - o entrevistador;

.

m odificações p e rtin e n te s? r

!•

-

I

r

j

E ssa d isc u ssã o b a s ta n te f e rm e n ta d a

2 - o entrevistado. O

o d o c u m e n to : a fita gravada, o te x to c o m a tra n scriçã o “fiel” o u a in d a o

e n tre v ista d o r é q uase sem p re o d ire to r d o p ro je to , p o d e n d o , p o ­

É primordial que se pense no destino das gravações, que devem ser mantidas e disponibilizadas ao consumo social.

tem d iferen tes defensores. M u ito s a c h a m q u e o d o c u m e n to em h istó ria

rém , d eleg ar essa fu n ç ã o q u a n d o p revista e p re v ia m e n te d e te rm in a d a no

oral é a fita gravada. A m a io ria , p o ré m , d isco rd a e su p õ e as transcrições

p ro je to . D e to d a m a n e ira , as pesquisas de

em d ife re n te s fases, o le g ítim o te x to d o c u m e n ta l. M ais im p o rta n te d o

h istó ria oral tê m q u e te r n o m ín im o u m

q u e d e fin ir u m a o u o u tra p osição cabe ver os a rg u m e n to s.

Écomum existirem projetos de grande alcance e que demandam mais de um entrevistador, além de transcritor, re­ visor, mas sempre deve ficar definida a responsabilidade de comando da pesquisa. Boa parte dos projetos é feita por uma só pessoa, que assume a res­ ponsabilidade de todas as tarefas, isto, contudo, reduz o alcance de projetos que acabam se inscrevendo nos limites da micro-história.

“d ire to r” o u “c o o rd e n a d o r”. E n trev istad a é a pessoa o u v id a em gra­

1.2 - ELETRÔNICA C O M O C O N D IÇ Ã O PARA A HISTÓ RIA ORAL

vação. N a m ed id a em q u e os entrevistados an u em com as gravações, é ju sto considerálos, além de apenas “atores sociais”, parte d o projeto. As escolhas, b em co m o todos

os p ro ced im en to s de c o n ta to e de c o n d u ção das entrevistas, devem ser feitas

“A possibilidade de organização de arquivos com os depoimentos concretizou-se a partir de uma combinação dos avanços tecnológicos com a necessidade de se propor formas de captação de experiências importantes[...].” Fernando Silveira e Cristofer de Mattos

de acordo co m preceitos previam ente estabelecidos e acertados pelas partes. O re su lta d o d o e n c o n tro grav ad o e n tre e n tre v ista d o r e e n tre v ista d o é a e n trev ista. Jam ais se deve u sar o te rm o “d e p o im e n to ”, q u e carrega u m a fo rte co n o ta çã o “policialesca”, ju ríd ica, o u , n o caso brasileiro, d ire ta m e n te ligado aos te rm o s usados d u ra n te a d ita d u ra m ilita r p ara fu n d a m e n ta r os in q u é rito s. P o rq u e se reafirm a o caráte r d e m o c rá tic o d a h istó ria oral, n ã o é ju sto c o n fu n d ir en tre v ista c o m d e p o im e n to . D a m e sm a fo rm a q u e e n tre v istad o r não é policial o u investigador, o e n trev istad o não é d e p o e n te o u investigado. O e n tre v ista d o r e o e n tre v ista d o , n a situ ação d e e n tre ­ vista, dev em se re c o n h e c e r c o m o colaboradores. P o rq u e a p a rtic ip a ç ã o é

A m o d e rn a h istó ria oral d e p e n d e de recursos eletrônicos n a m e d id a em q u e estes se colocam c o m o m eios m ecânicos p ara auxiliar n ão apenas a gravação em seu m o m e n to de realização, m as, s o b re tu d o depois, q u a n d o se presta à fase de transposição d o oral para o escrito. U m a das caracte­ rísticas m ais evidentes d a história oral rem ete à c o n sta n te atualização dos m eios eletrônicos usados. Aliás, sem os recursos d a aparelhagem eletrônica e m ecânica de nossos dias, as entrevistas d ificilm en te teriam alcance em projetos d a m o d e rn a h istó ria oral q ue, p o r sua vez, são pensados co m a presença o b rig ató ria desses artifícios. V in c u la d a ao uso dos m eios eletrô-

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Unidade I - Pressupostos

História oral

23

nicos, a ju n ção de entrevistadores e entrevistados d im e n sio n a nova form a

e sua cap taç ã o se d á ap en as pela presen ça física de pessoas. A m e d iação

de se p ro d u z ir textos resultantes de pesquisas realizadas n o te m p o real da

das m á q u in a s a ju d a m u ito , p rin c ip a lm e n te depois.

apreensão. Isso ta m b é m joga luzes nos processos de preservação, arq u iv a­

O s avanços d a e le trô n ic a são c o n sta n te s e acelerados. A tra n sfo rm a ç ão

m e n to e uso de d o c u m e n to s dispostos às

dos gravadores chega a ser a ssustadora e d e m a n d a atualizações frequentes.

análises d o social.

As “velhas m á q u in a s”, g ran d es, pesadas, ostensivas, d e ra m lu g ar a p e q u e ­

Talvez, em termos de produção de ma­ terial documental, uma das virtudes da história oral seja colocar em prática a possibilidade de aproveitamento de aparelhos que, comumente, são usa­ dos para entretenimento, informação de notícias, registros ou reprodução mecanográfica.

É inegável ta m b é m a p o te n c ia lid a d e

nos ap arelh o s, leves, discreto s, p o rtá te is. O m e sm o a c o n te c e c o m os

d o s a p a re lh o s te c n o ló g ic o s d is p o sto s à

p ro d u to s m ateriais resu ltan tes: a n te s as fitas, d ep o is os C D s . E m term o s

facilitação das co n d iç õ es gerais dos p ro ­

de v a n ta g en s, deve-se re c o n h e c e r q u e q u a n to m e n o r fo r o a p arelh o ,

cessos d e a p re n d iz a g e m . Se isso é u m a

m e lh o r será a a m b ie n ta ç ã o dos e n c o n tro s. O m e sm o se d iz de aparelhos

v erd ad e p ara q u a lq u e r área d o c o n h e c im e n to , p a ra a h istó ria oral passa

c o m p le m e n ta re s c o m o spots d e luz o u sin tetizad o res. C u id a d o s devem

a ser d efin itiv a, pois seu uso força a q u e m tra b a lh a co m esse recurso a

ser to m a d o s an tes das gravações:

se in serir n o espaço e x p e rim e n ta l d e seu te m p o , v alen d o -se ta m b é m dos

1 - os aparelhos devem ser testados antes;

m eios m ecân ico s p a ra a m e lh o ria das pesquisas. A o b rig a to rie d a d e da

2 - a gravação da m atrícula da entrevista deve ser feita no começo do en­

p a rtic ip a ç ã o d a e le trô n ic a n a h istó ria o ral d e te rm in a u m a alteração nos

contro, definindo:

a n tig o s p ro c e d im e n to s de cap taç ã o d e entrevistas, antes feitos na base

a —local e data;

de a n o ta çõ e s o u d a m em o rização . A m e d iação d a e le trô n ic a é, aliás, u m a

b - nom e do projeto;

das m arcas d a h istó ria oral c o m o u m p ro c e d im e n to n o v o e renovável. O q u e deve ficar firm a d o , p o ré m , é q u e a h istó ria oral n ão se faz sem a p a rtic ip a ç ã o h u m a n a d ireta, sem o c o n ­ ta to pessoal. M e sm o n ã o sen d o possível d isso ciar a e le trô n ic a dos c o n ta to s d ire to s p ara a p ro d u ç ã o d a h is tó ria o ra l, sabe-se q u e n a d a su b stitu i a percep ção d o en tre v is­

É fundamental garantir a atualização dos dispositivos eletrônicos, que estão cada vez menores, mais imperceptí­ veis, porém, que fique garantido que não se deve fazer entrevista sem ab­ soluta anuência do colaborador. Por mais importante que seja o caso, não é aceitável fazer entrevista sem prévia autorização.

ta d o n o a m b ie n te d a gravação. P o rta n to , u m a e n tre v ista n ão é ap en as u m a coleção d e frases re u n id a s e m u m a sessão dialógica. A perform ance, o u seja, o d e se m p e n h o é essencial para se e n te n d e r o se n tid o d o e n c o n tro gravado. O lh a r nos o lh o s, p erceb er as vacilações o u o te o r e m o tiv o das palavras, n o ta r o c o n ju n to d e fatores re u n id o s n a situ ação da en tre v ista é algo m ais d o q u e a cap a c id a d e de registro pelas m á q u in a s, q u e se lim ita m a g u a rd a r vozes, sons gerais, e im agens. A percepção das em oções é b e m m ais com plexa d o q u e ap aren ta,

c - nom e do colaborador entrevistado; d - presença eventual de outras pessoas com seus nomes. Pessoas m ais p ru d e n te s c u id a m d e finalizar as en trev istas c o m os m es­ m os p ro c e d im e n to s, isto é, re p e tin d o a m a tríc u la d o p ro je to . H á divergências sobre vantagens e desvantagens n o sistem a de uso dos gravadores. A té pouco te m p o resistia-se às m udanças d o sistem a analógico para o digital. A conquista de m ercado digital, porém , se im pôs de m aneira definitiva. A reprodutibilidade técnica e a facilidade de arm azen am en to e transporte fazem com que atu alm en te não haja dúvida da validade do uso de recursos digitais. A dem ais, os expedientes digitais facilitam o arquivam ento das entrevistas e seus m anejos em program as de com putadores.

História oral

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2 -

Unidade I - Pressupostos

H IS T Ó R IA O R A L , D O C U M E N T O

E R E P R E S E N T A T IV ID A D E

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entrevistas q u a n d o não existem d o c u m e n to s — ain d a q u e esse não seja o p ro c e d im e n to m ais aceito. É sem pre b o m lem b rar q u e m u ito s oralistas não acatam o fato d e se fazer entrevistas q u a n d o p o d e m ach ar as inform ações

“Nos dias de hoje, parece haver ampla concordância de que vivemos num mundo em que, contraditoriamente, se encoraja a amnésia e, ao mesmo tempo, se oferece à nossa fruição uma ilimitada gama de informações.” José Walter Nunes e Nancy Alessio Magalhães

buscadas em o u tras fontes já existentes. É válido ta m b é m —e gran d e parte dos usuários de h istó ria oral assum e essa p o stu ra —co n sid erar as entrevistas co m o discurso in d e p e n d e n te , c o m significado em si, su ste n ta d o p o r u m a série de gravações q u e n u n c a se repetem . D e m o d o geral é recom endável

N ã o resta d ú v id a : os p ro d u to s d e e n trev istas e m h is tó ria o ral devem se m p re re su lta r e m d o c u m e n to s d e base m a te ria l escrita, a in d a q u e , e m ta n to s casos, d e riv ad o s d e d iálo g o s verbais. M as isso n ã o os iguala aos d e m a is, p o is a ex istên cia d e “d o c u m e n to ” n ã o resolve tu d o . Se há d ú v id a d e q u a l é o d o c u m e n to em h is tó ria oral - se a gravação o u o p r o d u to final, se o o b je to d a gravação o u o te x to e scrito e a p ro v a d o pelo c o la b o ra d o r - , n ão cabe d e sc o n fia n ç a d e q u e de u m o u o u tro m o d o se m p re , d e u m e n c o n tro g rav ad o , se p o d e sair c o m p e lo m e n o s u m s u p o rte d o c u m e n ta l v e rtid o d o oral p a ra o escrito. In d e p e n d e n te m e n te d a ex istên cia de d o c u m e n to s , p a ra a h is tó ria oral ju stifica-se a c ap taç ã o de e n tre v istas e m três s itu a ç õ e s p o n tu a is, q u a n d o :

não p en sar q u e a h istó ria oral serve exclusivam ente para “ta p a r buracos d o c u m e n ta is”. Pelo co n trá rio , relevar o valor das narrações co m o form a Deve ficar claro que quando se vale da entrevista para obter informação objetiva ou dados exatos, não se pratica história oral e sim se faz uso convencional de entrevistas. É equívoco supor que o mero ato de entrevistar equivale a fazer história oral.

de vê-las “em si” é m o d o saudável de c o n ­ siderar a h istó ria oral. H á , c o n tu d o , casos especiais o n d e a p ro d u ç ã o d e d o c u m e n to s b a sead o s em te s te m u n h o se ju stific a , m as m e sm o as­ sim , h á d e se esclarecer q u e n ã o se tra ta

d e regra e sim d e exceção e, c o m o tal, o re s u lta d o m e re ce c o n sid e ra ç õ es específicas. M u ito s c re d ita m à h is tó ria o ral o p a p el d e p ro d u to r a d e d o ­ c u m e n to s e m e p isó d io s em q u e a c e n s u ra e as p o lític a s g o v e rn a m e n ta is n ã o p ro m o v e ra m “o u tr o s ” re g istro s. Ju stific a-se , sem d ú v id a , o u so de

1—

existem versões diferentes da história oficializada;

2—se elabora um a “outra história” com base em docum entos efetuados para circunstâncias em que a interdição não perm itiu registros ou apenas gerou um tipo de registro; 3—

estu d o s de m e m ó ria , c o n stru ç ã o de id e n tid a d e e fo rm u lação de

consciência com unitária. A in d a q u e m u itas vezes a p ro d u ç ã o de entrevistas seja usada co m o alter­ nativa para p re e n ch e r vazios de d o c u m e n to s convencionais o u de lacunas de inform ações e até para c o m p le m e n ta r o u tro s d o c u m e n to s, é im p o r­ ta n te ressaltar q u e se p ode, de m an eira positiva, assum i-la iso lad am en te e p ro p o r análises das narrativas para a verificação de aspectos não revelados, subjetivos, alternativos aos d o c u m e n to s escritos. Para u n s é possível usar

e n tre v ista s q u a n d o se b u sca s u p e ra r in fo rm a ç õ e s so b re: to rtu ra s , p e r­ seguições, in te rd iç õ e s. D e m o d o geral, vale-se desse a rtifíc io q u a n d o se d e s tro e m n o ta s d e a lg u n s pro cesso s h istó ric o s - c o m o a q u e im a de d o c u m e n to s so b re a “su b v ersã o ” p ro m o v id a p o r a u to rid a d e s in s titu íd a s n o p o d e r c o m o in tu ito d e “a p a g a r” a p re se n ç a d a o p o siç ã o . O m e sm o se d iz d e situ a ç õ e s e m q u e a rep ressão , q u a n d o su p e ra d a , te n ta n e g ar seu p a p el tirâ n ic o . N esses casos é im p o r ta n te a p ro m o ç ã o d e d o c u m e n ­ tos. O s p ro je to s d e v em p re v e r essa fo rm a d e e s ta b e le c im e n to d e tex to s d o c u m e n ta is e revelar a c irc u n s tâ n c ia d e sua p ro d u ç ã o e uso. A necessidade de se a tiv ar o u m ate ria liz ar o q u e existe e m estad o oral re tid o n a m e m ó ria , o u m e sm o o q u e foi a b afad o p o r processos de cer­ c e a m e n to , q u ase sem p re aco n tec e p o r desafios d a p ró p ria c o m u n id a d e , q u e n ã o q u e r d eix ar m o rre r d e te rm in a d a s ex periências e q u e , p a ra isso,

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Unidade I - Pressupostos

História oral

27

p ro d u z situações nas quais, n o te m p o p resen te, re in v e n ta m o passado

para validar suas experiências, d a n d o sentido social aos lances vividos sob d i­

n ão resolvido. N esse s e n tid o , a h istó ria oral se m o stra fa to r significativo,

ferentes circunstâncias. U m a questão bastante relevante para q u e m se propõe

m eio d e m a n te r a exp eriên cia passada em estad o de “presen tificação ”.

a e n te n d er o papel da história oral diz respeito ao seu im pacto nos narradores

M as deve-se le m b ra r sem p re q u e n ã o é ap en as q u a n d o n ã o existem d o ­

e em suas c o m u n id a d es im ediatas. Isso recobra significado q u a n d o se leva

c u m e n to s necessários q u e a h istó ria oral aco n tece. Ela é vital ta m b é m

em c o n ta q u e no m u n d o globalizado a fragm entação d a in d iv id u alid ad e é

p ara p ro d u z ir o u tra s versões p ro m o v id as à luz de d o c u m e n to s cartoriais

u m fenôm eno coerente com a incapacidade rotineira de “se narrar”. H á duas

co n sa g ra d o s e oficiais.

correntes q u e se m an ifestam d ire ta m e n te sobre o alcance d a história oral:

H á situações ta m b é m em q u e , in d e ­ p e n d e n te m e n te d o aspecto q u e s tio n a d o r q u e se estabelece e n tre a h istó ria feita p o r h isto ria d o re s e d e m a is cie n tistas sociais

Lembrando que os documentos compulsados rotineiramente também pro­ duzem memória, torna-se importante, sempre, manter acessa a curiosidade paralela que mantém dúvidas sobre certeza das conclusões feitas em cima de documentos escritos.

1 - aqueles que advogam um a “história m iúda”, que poderia ser enquadrada no conceito de “m icro-história”, e 2 - os que apenas a reconhecem no circuito da “grande história”, e nesse sentido apenas adotam a história oral com o “estudo de caso” ou exemplo.

profissionais e a tra d iç ã o so b re os fatos, busca-se fazer u m a “o u tra h istó ria ”, versão q u e te n h a sua gênese d ife ­

D a d as as d ificu ld ad es de tra b a lh o c o m n ú m e ro s m u ito gran d es de

re n c iad a d o c o n ju n to estab elecid o o ficialm en te. A o se m a te ria liz ar em

e n tre v istas, a h is tó ria o ra l, c o m u m e n te , te m sid o e x p lo ra d a e m seu

d o c u m e n to escrito, p o ré m , a h istó ria oral g an h a o b jetiv id ad e d e q u a lq u e r

aspecto m ais d im in u to . O resu ltad o c o n ju n to disso ao lo n g o dos ú ltim o s

o u tro d o c u m e n to g rafad o o u d e análise h isto rio g ráfica, p o ré m deve ser

anos, c o n tu d o , te m p ro p o s to u m a visão d ife re n c ia d a d a g ra n d e H istó ria ,

in te rp re ta d a sob o crivo d a su b jetiv id a d e q u e a p ro d u z iu .

na m e d id a em q u e sugere u m a in tim id a d e capaz de to rn a r relativa a

A o ra lid a d e q u a n d o v e rtid a p ara o escrito co n g ela a realidade n a rra d a

generalização.

m u d a n d o a d in â m ic a original. O estado especial, fluido, da o ralidade se es-

A in d a q u e existam pessoas q u e p ra ti-

tratifica, fazendo o m o m e n to d a ap reen são se to rn a r p risio n e iro das letras

q u e m historia oral com o estudo de casos,

escritas. As análises sobre esse tip o de d o c u m e n ta ç ã o devem , pois, levar em

co nsidera-se isso u m a a p ertad a m o ld u ra

c o n ta a especificidade d o s u p o rte cria d o e seus resultados. A ssim n ão se

r

a c re d ita e m q u a lq u e r p ro je to de h istó ria oral q u e n ão registre a c o n d iç ão

tratar de situações de vínculos co m m ú lti-

d a gravação b e m c o m o os m é to d o s usados p a ra a tra n sp o siç ã o d o oral

pios aspectos da vivência coletiva, as versões

p ara o escrito. V alendo m enos pelas inform ações e m ais pelo jeito de cons-

contem pladas e os tem as avaliados não p o d em ser reduzidos a exem plos de

É matéria essencial da história oral a humanização das percepções que até então têm sido, geralmente, vistas como expressões institucionais, de macroestruturas, partidos políticos e processos como a industrialização, o comporta­ mento da relação campo-cidade.

tÍtu ÍÇâ° d ° S d °CUmentOS, O q u e Se revela é a im p o rtâ n c ia d a c o n stru ç ã o dos fatos.

. .

.

j

j

para possibilidades m ais am plas. P o r se r

Sem dúvida, a história oral compromete as reflexões que se atêm de maneira determinista aos aspectos quantitativos. tificação quando esta se submete àquela. Garante-se, contudo, o possível convívio das partes.

situações específicas e que se explicam em relações internas. O

q u e se c h a m a d e “g ru p a i”, “c u ltu ra l”, “social” o u “coletiv o ” em

Por m eio da histó ria oral, p o r exem plo,

h istó ria oral é o re su lta d o d e experiências q u e v in c u la m u m as pessoas às

m o v im en to s de m inorias culturais e discri­

o u tra s, se g u n d o p ressu p o sto s a rtic u la d o re s de c o n stru ç ã o de id e n tid a d e s

m in ad as - p rin c ip a lm e n te de m ulheres,

d e c o rre n te s de suas m e m ó ria s expressadas e m te rm o s c o m u n itá rio s . O s

índios, hom ossexuais, negros, desem pregados, pessoas co m necessidades

in d iv íd u o s, nesse c o n te x to , tê m a u to n o m ia de p ro c e d im e n to n a m e d id a

especiais, além de m igrantes, im igrantes e exilados - têm en co n trad o espaço

em q u e suas v o n ta d e s d im e n s io n a m d e m a n e ira o rig in al a c o m b in a ç ã o

28

Unidade I - Pressupostos

História oral

29

d e fatores pessoais, biológicos e as influências d o m e io e m q u e vivem .

fato de m u ito s rep etirem q u e a volta é u m objetivo m aterializa a v o n ta d e

A ssim , as experiências de cad a u m são a u tê n tic a s e se re la cio n am às d e ­

coletiva, ain d a q u e isso n e m sem pre se realize. O m ito d o lugar ideal, do

m ais p o r m e io d a c o n stru ç ã o d e u m a id e n tid a d e c o m u m . E m h istó ria

“paraíso” deixado, é m arca sin g u lar d o q u e caracteriza a m e m ó ria coletiva.

oral, o “g ru p a i”, “so cial” o u “co letiv o ” n ão c o rre sp o n d e à so m a d o s p a r­

L o g ic a m e n te , as e n tre v ista s são re lev an tes, m as, m ais d o q u e elas

ticulares. O q u e g a ra n te u n id a d e e co erên c ia às en trev istas enfeixadas

in d iv id u a lm e n te , as c o m u n ic a ç õ e s c o m o geral, c o m o a m p lo e c o letiv o

em u m m e sm o c o n ju n to é a rep etição d e certos fatores q u e , p o r fim ,

são essenciais. É e x a ta m e n te p o r se e q u ip a ra r h istó ria s q u e te n h a m p o n -

caracteriza a m e m ó ria coletiva. A o b serv ân cia e m relação à pessoa em

Garante-se. portanto, que uma das atenções fundamentais da história oral é mostrar o grau de cuidado com o específico explicado no coletivo.

sua u n id a d e , c o n tu d o , é c o n d iç ã o básica p ara se fo rm u la r o resp eito à e x p eriên cia in d iv id u a l q u e ju stifica o tra b a lh o c o m en tre v ista, m as ela

to s c o m u n s q u e se vale p o s itiv a m e n te do re c u rso d a h is tó ria Oral COITIO fo rm a de re o rg a n iz a r os espaços p o lític o s d o s g ru ­

vale n o c o n ju n to . N esse se n tid o , a h istó ria oral é sem p re social. Social,

p o s q u e , so b n o v a in te rp re ta ç ã o , te ria m

s o b re tu d o p o rq u e o in d iv íd u o só se explica n a vida c o m u n itá ria . D a í a

fo rça social. A n ã o e x istên c ia d e re p re s e n ta tiv id a d e in d iv id u a liz a d a em

necessidade d e d e fin ição dos ajustes id e n titá rio s cu ltu rais.

h is tó ria o ra l, n o e n ta n to , a c a rre ta re s p o n sa b ilid a d e s:

D ú v id a s c o m u n s c o m o a “re p re se n ta tiv id a d e ” d o s te ste m u n h o s , o

1 - o criterioso processo de seleção dos entrevistados, e

“alcan ce h is tó ric o ” das im pressões e a “relativ id ad e” dos casos n a rra d o s

2 - o núm ero das entrevistas que devem instruir o projeto.

tê m p e rd id o a força n a m e d id a em q u e as v irtu d e s e a p o p u la rid a d e da h istó ria oral passam a in te g ra r preferências indiscutíveis e g a n h a r ad ep to s,

C a lib ra r o n ú m e ro d e e n tre v istad o s c o m o alcance d o p ro je to é quase

devido à p en etração em territórios p o u c o viáveis pelas disciplinas em geral.

u m a arte. O u tr a q u e stã o saliente p ara o e n te n d im e n to d a h istó ria oral é

Por, ta m b é m , d a r voz a setores desp rezad o s p o r o u tro s d o c u m e n to s , a

o tre in o p a ra a ev en tu al análise c o n ju n ta das entrevistas. P o rq u e n ão se

h istó ria oral g a n h a significado ao filtrar as experiências d o passado através

c re d ita exclusividade às en trev istas isoladas, elas ap en as g a n h a m sen tid o

d a existência de n a rra d o re s n o p resen te. Isso, além d e p ro p o r a ltern ativ as

n o â m b ito d a p ro p o sta .

de d iálogos c o m o u tra s versões historiográficas e d o c u m e n ta is. R e u n id o , o c o n ju n to das histórias colhidas, além de p ro p o r discussão sobre as m otivações individuais e coletivas q u e levaram ao p ro jeto , serve

3

-

P A S S O S D O P R O C E S S O D E H IS T Ó R IA O R A L

p a ra q u e , se e q u ip a rad a s, fo rn eç a m e le m en to s capazes de ilu m in a r o c o n ju n to das individualidades q u e apenas se su sten tam sob alguns traços c o m u n s. S u p o n h a m o s o exem plo de u m p ro je to p re o c u p a d o c o m os n o r­

“É preciso atingir a vontade de querer retrospectivamente tudo o que aconteceu.” Nietzsche

destin o s q u e foram para a cidade de São P aulo d u ra n te a seca de 1958. N essa situação, h á u m c o n ju n to de m otivos concretos q u e teriam a tu a d o

P ro jeto é sem p re u m a in iciativ a p la n e ja d a p ara u m a situ a çã o de pes­

c o m o im p u lsio n ad o res das m igrações; p o ré m , cada in d iv íd u o sen tiu ou

q uisa específica. C o m o e m p re e n d im e n to de trab alh o , q u e im plica busca,

p ercebeu as m u d an ças, fo rm u lo u a revisão d e seus valores, p ro c e d eu a u m a

o p ro je to é provisório. Para u m a b o a realização de p ro jeto , fazem -se n e­

síntese das coisas seg u n d o seus p ró p rio s critérios. A resposta c o n ju n ta é o

cessárias alg u m as c o m b in a ç õ e s d e c o n h e c im e n to , h ab ilid a d e s, m eios e

q u e interessa, sem , c o n tu d o , deixar de valorizar o q u e h á de singular. O

p e rtin ê n c ia d a pesquisa. U m b o m ro te iro e essencial p ara se p e n sa r no

30

História oral

Unidade I - Pressupostos

31

d e sd o b ra m e n to d o tra b a lh o . D e fin ir os passos d a h istó ria oral im p lica

O s c u id a d o s d a tra n s p o siç ã o d e u m e sta d o d a p alav ra - o ral - p ara

estabelecer os cin co m o m e n to s p rin c ip a is d e sua realização:

o u tr o — e sc rito — são necessários. S obre a q u a rta e ta p a - d a análise p ro p ria m e n te d ita - , é im p o rta n te

1 - elaboração do projeto; 2 - gravação;

le m b ra r q u e p o d e o u n ão existir e m relação ao p rim e iro m o m e n to . T u d o

3 - estabelecim ento do docum ento escrito e sua seriação;

d e p e n d e d o o b je tiv o d o p ro je to . H á g ru p o s q u e só ace ita m a h istó ria oral q u a n d o esta se m o stra , d ep o is d e escrita, analisada. Esse p o sic io n a ­

4 - sua eventual análise;

m e n to , c o n tu d o exige a realização das etapas a n te rio re s e re c o m en d a -se

5 - arquivam ento; e

q u e , q u a n d o p a rte d o p ro je to , n ã o seja feita a análise sem p ro c e d e r

6 - devolução social.

to d o processo d e tra n scriçã o o u e sta b e le c im e n to final d o texto. O u tro s ,

O p rim e iro - o m o m e n to d a e lab o ração d o p ro je to - é im p o rta n te p o r d e fin ir crité rio s de p ro c e d im e n to , inclusive se a p ro p o s ta for de c o n stitu iç ã o d e u m b a n co de d ad o s. N esse caso, se se tra ta r apenas de u m a re c o lh a p ro g ra m a d a , deve-se d e fin ir se h av erá d e s d o b ra m e n to s c o m o tran scriçõ es e, nessa e v en tu alid ad e , de q u e tip o seria: literais o u transcriações. C aso se tra te , ap enas, d e c o le tar entrevistas, lo g ic a m e n te o d o c u m e n to será a gravação. C aso haja tran scrição , seja q u a l fo r o tip o , o d o c u m e n to p o d e ser c o n sid e ra d o o tex to escrito p rin c ip a lm e n te valo­ rizado se fo r a u to riz a d o pelo co lab o rad o r. O segundo - o instante da gravação - é fu n d am en tal p o r ser o tem p o da prim eira a titu d e de m aterialização do processo inicial d o projeto. O s defensores da fita gravada com o d o c u m e n to devem precisar na p roposta de sua in tenção e, em decorrência disso, precisam estabelecer as futuras form as de a rq u iv a m e n to e acesso p ú b lic o para .



i

.

tanto. As gravações devem ser previstas em detalhes de lócus e participações: o n d e e q u e m participa das sessões é fundam ental.

É relevante lembrar que só faz sentido discutir o documento em his-

^ n T b iíd L Í p ú b lk a 06' 3^ * ^

D e igual m o n ta , os dem ais elem entos que vão desde o tipo de gravação até seu a rq u iv a m e n to . A inscrição das entrevistas n o p ro je to é a razão de ser delas. O te rc e iro m o m e n to - d a c o n fe c ç ã o d o d o c u m e n to e sc rito - deve p re c isa r o tip o d e tra n s c riç ã o e seus usos. D e p e n d e n d o d o p ro je to , ta n to p o d e ser a tra n sc riç ã o literal c o m o a tra n sc ria ç ã o d o c u m e n ta l.

c o n tra ria m e n te , e n te n d e m q u e a p ro d u ç ã o d o te x to escrito e o exam e da en tre v ista p o d e m o u n ão ocorrer, n ã o sen d o raros os q u e c o n sid e ra m q u e só a con fecção d o d o c u m e n to é tarefa su ficien te p ara c u m p rir os ideais d a h istó ria oral. A rquivistas, p o r ex em p lo , valorizam a elaboração d o c u m e n ta l p a ra uso p o ste rio r e m u ito s deles esg o tam nisso a fu n ç ã o da h istó ria oral. H á aqueles q u e a c h a m q u e a elab o ração d o d o c u m e n to , dadas as passagens d o có d ig o o ral p ara o escrito, im p lica análises em v irtu d e dos tra b a lh o s q u e se faz n a “e d iç ão ” d o texto. A lém disso, é b o m le m b ra r q u e existe u m a lin h a de pessoas q u e tra b a lh a c o m h istó ria oral e q u e c o n sid e ra o le ito r c o m o u m ag en te ativo, q u e , ao ler u m a en trev ista, n ão p recisa ser c o n d u z id o a co n clu sõ es q u e ele saberá elaborar. A q u in ta e ta p a - de a rq u iv a m e n to - re m e te aos c u id a d o s e resp o n sa­ b ilid a d e n a m a n u te n ç ã o d o m a te ria l c o n se g u id o . P o rq u e se c o n d e n a a d e sc a rta b ilid a d e das gravações, cabe aos d ire to res dos p ro je to s a g u ard a o u d e stin o d o s p ro d u to s . A sexta e tapa - d e devolução social - diz respeito aos co m p ro m isso s co­ m u n itá rio s requeridos pela história oral q ue, sem pre, deve prever o re to rn o ao g ru p o q u e a fez gerar. Seja em fo rm a de livro, exposição o u m esm o de doação dos d o c u m e n to s confeccionados, a devolução é capital.

U N ID A D E II - G Ê N E R O S E M H IS T Ó R IA O R A L

4

4

- Tipos de história oral 4.1 - H istória oral de vida 4.2 - H istória oral te m á tic a 4.3 - Tradição oral - T IP O S D E H IS T Ó R IA O R A L

“Sua afirmação não está ligada à iniciativa de descrever a realidade.” Harry G. Frankfurt

Se c o n sid e ra d a c o m o espécie, as entrevistas em h istó ria oral sugerem g ê n e ro s q u e se d is tin g u e m fu n d a m e n ta lm e n te . S em a c o n sid e ra ç ã o especificada d o m o d o d e c o n d u ç ã o das entrevistas, q u a lq u e r p ro je to d e h istó ria oral fica c o m p ro m e tid o . B asicam ente, há três gêneros d istin to s e m h istó ria oral: 1 - história oral de vida; 2 - história oral tem ática; e 3 - tradição oral.

Um dos pontos basilares da distin­ ção entre história oral e entrevistas convencionais reside exatamente na especificação dos critérios de captação das narrativas segundo os termos esta­ belecidos nos projetos. É aí que entra a primeira variação entre entrevistas convencionais e de história oral.

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H is tó ria o ra l

U n id a d e II - G êneros em h is tó ria o ra l

As d u as p rim eiras p o d e m servir a p ro je to s de b a n co s d e h istó ria ou im p lic a r análises q u e su p erem o se n tid o d a recolha, m as a tra d iç ã o oral

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d a v id a social. A fa n ta sia, a m e n tira , a d is to rç ã o , o s o n h o , o lap so , o silê n cio ta m b é m .

a lu d e exam es lo ngos e co m plexos, incapazes d e síntese. N esse caso, aliás,

P o rq u e as h istó ria s d e vidas são d e c o rre n te s d e n a rra tiv a s e estas

a o bservação deve ser c o n sta n te , c o n tin u a d a , im pessoal e sobre o coletivo.

d e p e n d e m d a m e m ó ria , dos ajeites, c o n to rn o s , derivações, im precisões

A questão da objetividade - o u subjetividade - é a m aio r m arca distintiva

e até das c o n tra d iç õ e s n a tu ra is d a fala. Isso ta lh a a essência subjetiva

e n tre a disciplina H istó ria e a p rática da história oral. M esm o no universo

d a h istó ria oral d e vida. N o caso d a h istó ria oral te m á tic a, c o n tu d o , a

da história oral, é im p o rta n te observar variações de gêneros e, em particular,

existência d e u m foco c en tral q u e justifica o ato d a en tre v ista em u m

e n tre h istó ria oral de vida e história oral tem ática. E m term o s de história

p ro je to , re c o rta e c o n d u z a possíveis m aiores o b jetiv id ad es. P or lógico

oral de vida, a questão subjetiva se m o stra essencial. F ran k K erm o d e é claro

reconhece-se q u e o b jetividade ab so lu ta não existe, m as há recursos capazes

ao afirm ar q u e é inviável às narrações d e histórias de vida o c o n ceito de

de lim ita r devaneios e variações. U m a das práticas decisivas n a d ife re n ­

“verdade honesta". C o n tu n d e n te ao lim ite, W illia m L abov d e te rm in a as

ciação e n tre h istó ria oral d e vida e h istó ria oral te m á tic a é a existência

narrativas orais co m o "nada mais do que um a grande mentira". A responsa­

de u m q u e stio n á rio . D iz e n d o de o u tra fo rm a, e m h istó ria oral de vida,

b ilid ad e p o r esses pressupostos d e falsidade equivale à negação “científica”

n a m e d id a d o possível, deve-se tra b a lh a r c o m o q u e se c o n v e n c io n o u

d a h istó ria oral, em se n tid o a m p lo , e, em stricto sensu, à H is tó ria o u a

c h a m a r d e “e n trev istas livres” ; e m h istó ria oral te m á tic a , o q u e deve

q u a lq u e r m a té ria q u e se classifique nos rigores dos m é to d o s p ro b a tó rio s

p re sid ir são os q u e stio n á rio s, q u e p recisam estabelecer c ritério s de a b o r­

a b so lu to s. E x a ta m e n te p o rq u e o q u e m ais vale em h istó ria oral de vida

d ag em d e tem as. As p e rg u n ta s e respostas, pois, são p artes d o a n d a m e n to

são as versões in d iv id u a is d o s fatos d a vida, e n te n d e -se o peso subjetivo

investigativo p ro p o sto .

q u e F rançois E tien n e coloca n o e sta tu to “meram ente subjetivo" da h istó ria

A h istó ria oral te m á tic a se ap ro x im a em certa m e d id a dos p ro c e d im e n ­

oral. A ssim , re p a rtin d o o c a m p o das evidências prováveis o u atestadas

tos c o m u n s às entrevistas trad icio n ais. Isso, aliás, é u m risco e tem sido

p o r d o c u m e n to s de o u tro q u e lhe o p õ e o das pressuposições falíveis da

lu g a r-c o m u m a q u e m n ão e n te n d e de h istó ria oral. P o rq u e se su p õ e que

m e m ó ria , situ a m -se as d isp u ta s e n tre a H istó ria e a h istó ria oral.

en trev ista é m e ra m e n te u m diálogo investigativo, n ão faltam confusões.

N o caso d a h istó ria oral de vida, o q u e a d istin g u e é e x a ta m e n te a in ­

A d iferen ça é q u e os p ro c e d im e n to s q u e d e te rm in a m a h istó ria oral não

d e p e n d ê n c ia dos su p o rte s p ro b a tó rio s. As incertezas, d e sc a rta b ilid a d e da

se re strin g em apenas ao a to de apreensão das entrevistas. T o d o o e n q u a ­

referenciação exata, g a ra n te m às n arrativas d e co rre n tes d a m e m ó ria u m

d ra m e n to em etapas previstas n o p ro je to caracteriza o tra b a lh o de h istó ria

c o rp o o rig in al e diverso dos d o c u m e n to s c o n v en c io n a is úteis à H istó ria .

oral tem ática.

E m p a rtic u la r, a h istó ria oral d e vida se espraia nas c o n stru ç õ e s n a rra ti­

T radição oral, p o r ter predicados únicos, p o r se assentar em bases de o b ­

vas q u e apenas se in sp ira m em fatos, m as

servação e se trabalhar com elem entos da m em ória coletiva, não se encaixa

Onde a História vê fragilidade a história oral encontra seu sentido maior e o lugar

vão além , a d m itin d o fantasias, delírios,

na discussão sobre entrevistas. A dem ais, a tradição oral dep en d e de e n te n ­

poTsibmdUaPdaedoriC gr a i.

silêncios, om issões e d istorções.

d im en to s e n tre os fun d am en to s m íticos, rituais e vida m aterial de grupos.

6

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■ •

1

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,

.

Seria, pois, c o n d iç ã o exclusiva d a d is­

A som a dessas balizas constitutivas d e m a n d a m trabalhos pro fu n d o s em que

c ip lin a H is tó ria ser pro v áv el e à h is tó ria oral ser im p ro v áv e l o u senso-

a observação dirige as entrevistas de m aneira a su b m eter a narrativa a um a

rial, p o ré m , le m b ra n d o q u e o im p ro v áv e l ta m b é m se situ a n o â m b ito

prática expressa.

36

História oral

Unidade II - Gêneros em história oral

4. 1 - H ISTÓ RIA ORAL DE V ID A

37

I n d e p e n d e n te m e n te d o g ê n e ro n a rra tiv o e n c e ta d o pela a u to c o n te m plação, vale assinalar q u e ap en as n o alvorecer d o século x x , p o r iniciativa

“Se alguém colhe um grande ramalhete de narrativas orais, tem pouca coisa nas mãos. Uma história de vida não é feita para ser arquivada ou guardada numa gaveta, com o coisa, mas existe para transformar a cidade onde ela floresceu” Ecléa Bosi

d o par W . O . T h o m a s e F. Z an an ieck i, na Escola de Sociologia de C hicago, a p rá tic a a cad êm ica in c o rp o ro u as histó rias d e vida c o m o d o c u m e n to de resp eitab ilid ad e acadêm ica. A justificação, p o ré m , era vazada nos pres­ su p o sto s d e q u e a p o p u la ç ã o im ig ra n te p o lo n e sa a ser e stu d a d a era c a re n te de

M u ito s se referem à história oral de vida c o m o “biografia”, “relato de

d o c u m e n to s.

Vigorosos impulsos foram dados no momento da contracultura, quando, em geral, ao se rebelarem contra a oficialidade das elites, pessoas do povo começavam a ser alçadas como exemplo de nova abordagem dos estu­ dos sociais, que, de forma agressiva, começavam a ser "trocados".

v id a”, “relato biográfico”, “m é to d o biográfico”, “n o tas biográficas” e até

N essa lin h a d e a tu a ç ã o e m e rg e m os

m e sm o , sem relevar o papel d e m ediações, d a d o o fato d o n a rra d o r se

tra b a lh o s c in tila n te s d e O sc a r Lew is, q u e

contar, “a u to b io g ra fia ”. M as h á u m a longa, secular, tra je tó ria até q u e se

se c o m p õ e m c o m o u tro s c o m o M a u ríc io

chegasse ao g ên ero história oral de vida. A se m e n te das h istó rias de vida

C a ta n i, D a n iel B ertaux e L ucien Sève. E stava a b e rto o c a m in h o p a ra se

re p o u sa d ista n te , m as c e rta m e n te h á u m co m e ço q u e p o d e ser assinalado

p e n sa r o q u e viria a ser d ep o is a h istó ria oral de vida.

pelas Confissões de san to A g o stin h o (3 5 4 - 4 3 0 ) q u e in te rn a em si o D eus

E m te rm o s so cio m o ra is, a h is tó ria oral te m v ocação a valo rizar o

d o c ristia n ism o e c o m ele estabelece u m diálo g o ín tim o , a p aix o n ad o , e

in d iv íd u o em d e trim e n to d o exclusivism o d a e stru tu ra social. A o rig em

revelador de dú v id as e convicções. T u d o baseado em u m a tra je tó ria q u e

dessa p re o c u p a ç ã o ta m b é m é a n tig a e re m o n ta à n o ç ã o d e c u id a d o

é h istó ric o /p e sso a l. O tex to d e san to A g o stin h o p ro je to u -se n a lite ra tu ra

d e sp e rta d a p o r H e id eg g e r e m relação “a ser no m undo". Essa n o ç ão leva

so b re o eu c o m o u m m o d e lo q u e, sem d ú v id a , d e c o rre u das percepções

a c o n sid e ra r o q u e P latão d e fin iu c o m o “e m si” e q u e m o d e rn a m e n te

socráticas q u e prezavam o cuidar de si, q u e , p o r sua vez, se m an ifestaria

F o u c a u lt re d e fin iu em sua “h e rm e n ê u tic a d o p re se n te ” c o m o “a arte de

p o r m eio d a interiorização reflexiva dos p ró p rio s atos. Séculos se passaram e n tre san to A g o stin h o e P edro A b erlad o (1 0 7 9 - 1 1 4 2 ), q u e escreveu u m tex to d e e n c o n tro pessoal in titu la d o A história de m inhas calam idades o u , e m la tim H istoria C ala m ita tu m , q u e ta m b é m exerceu e n o rm e im p a c to

se autogovernar", e assim o c o n h e c im e n to Em termos histórico-científicos, a cap­ tação dessas noções do eu narrador ganhou sentidos diversos, produzindo uma formidável crítica, que, contudo, não dispensa seu uso ou validade.

e c o n tro le d a n a rra tiv a so b re si m esm o te ria m pap el fu n d a m e n ta l. F azendo u m a resenha das form as c ríti­

na época. M ais séculos tra n sc o rre ra m até q u e o u tra fu n d a m e n ta l o b ra

cas de uso d o biográfico, G a s to n P in eau

se firm asse n o céu dos q u e co n sid e ra v a m fu n d a m e n ta l o Ueu narrador”,

diz q u e h á m ais d o q u e op in iõ es diferentes; p o sicio n am e n to s op o sto s, que

dessa feita a de Jean-Jacques R ousseau, n o século

em suas Confissões.

p o d e m ser sintetizados em p ro p o stas c o m o “ilusão biográfica” (B ourdieu)

O livro d e R ousseau é de to d as as o b ras g erm in ais o m ais p restig iad o , e

em o p o sição à ideia de “revolução ex isten cial” (Sève). A cap taç ã o acad ê­

sua re p u ta ç ã o c o m o sêm en d a m o d e rn a biografia é in co n testáv el, m as

m ica das h istó rias de v id a serve c o m o pesquisas sobre o fu n c io n a m e n to

é im p o rta n te le m b ra r q u e m u ito an tes, u m a m u lh e r, C h ris d n e de Pi-

das sociedades (P eneff) e, se g u n d o o u tro s , c o m o funções terap êu ticas

san, nos idos de 1365, a b ria c a m in h o p ara revelações pessoais d a vida

(L egrand). P or u m a o u o u tra via, c o n tu d o , tem -se u m leq u e de aceitação

fe m in in a . Esse registro é im p o rta n te p o rq u e desloca o o lh a r m a sc u lin o

e n o rm e , q u e ta n to p e rm ite aos leitores de lite ra tu ra c o m o aos estu d io so s

e m a sc u lin iz a n te q u e m a rc o u o su rg im e n to d o gênero.

d a área de h u m a n id a d e s e m e sm o ciências clínicas se a p ro x im a re m das

x v iii ,

38

História oral

Unidade II - Gêneros em história oral

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histó rias de vida. N essa d ireção , o acréscim o de “o ra l” às h istó rias de vida

de esclarecim en to s de situações c o n flita n te s, polêm icas, c o n tra d itó ria s.

é u m g a n h o p e rm itid o pela ju n ç ã o d a aparelhagem eletrô n ica co m os p ro ­

A exteriorização d o te m a , sem p re d a d o a priori, o rg a n iz a a en trev ista

c e d im e n to s q u e se enfeixam nos critério s da investigação em h istó ria oral.

q u e deve se re n d e r ao alvo p ro p o sto . E n tã o , o g rau de a tu a çã o d o e n ­ tre v ista d o r c o m o o c o n d u to r dos tra b a lh o s fica m u ito m ais ex p lícito e é o rie n ta d o pelos recursos d a d o s pela seq u ên cia de p e rg u n ta s q u e devem

4 .2 - HISTÓ RIA ORAL T E M Á TIC A

levar ao esclarecim en to d o tem a. A ssim , seria eq u iv o c ad o c o n sid e ra r o c o la b o ra d o r u m sim ples in fo rm a n te o u a to r social o u m e sm o o b je to de “Não quero ser notícia depois de morto, porque o tema deve ser a vida e não a morte.” Nelson Rodrigues

p esquisa n o se n tid o su p erad o dos te rm o s. C o m o os trab alh o s de h istó ria oral te m á tic a se d isp õ em à discussão em to rn o d e u m a ssu n to cen tral d e fin id o - m e sm o q u e o u tro s d e c o rra m ou

A h is tó ria oral te m á tic a é so lu çã o q u e m ais se a p ro x im a das ex p ec­

c o n c o rra m p ara seu e sclarecim en to —, os aspectos su b jetiv o s ficam lim i­

tativ as aca d ê m ic as q u e c o n fu n d e m h is tó ria o ral c o m d o c u m e n ta ç ã o

tados a in d a q u e n ão a n u la d o s. A p resen ça d o c o la b o ra d o r q u e e n trev ista

c o n v e n c io n a l. A liás, o c a rá te r d o c u m e n ta l d e c o rre n te das en tre v istas é o

deve ser a tu a n te n o se n tid o de favorecer a a p resen tação de a rg u m e n to s

c ern e desse ram o . T a m b é m é o m ais c o n sid e ra d o p o r jo rn a lista s e dem ais

d o c o la b o ra d o r q u e re sp o n d e a estím u lo s dados.

pessoas q u e se valem de e n trev istas c o m o fo rm a d ialó g ica d e p ro m o v e r

O e n tre v istad o r, n o caso d e h is tó ria .

, .

.

,

Sem dúvida, o teor testemunhai se torna a chave que abre os compartimentos escurecidos por versões que devem

discussões em to rn o de u m a ssu n to específico. M e sm o a b rig a n d o índices

oral te m a tic a , deve ser p re p a ra d o an tes

d e su b je tiv id a d e , a h istó ria o ral te m á tic a é m ais passível d e c o n fro n ­

c o m in stru ç õ e s so b re o a ssu n to a b o rd a -

tos q u e se reg u lam a p a rtir d e d a ta s, fatos, n o m e s e situ açõ es. Q u a se

do. Q u a n to m ais in fo rm a çõ e s se tê m p re v ia m e n te, m ais interessantes

sem p re, a h is tó ria oral te m á tic a equivale à fo rm u la ç ã o d e d o c u m e n to s

e p ro fu n d a s p o d e m ser suas q u estõ es. C o n h e c e r as versões op o stas, os

q u e se o p õ e m às situ açõ es estabelecidas. A c o n tu n d ê n c ia faz p a rte da

detalhes m e n o s revelados e até im a g in a r situações q u e m e re ça m ser q u e s­

h is tó ria oral te m á tic a q u e se explica n o c o n fro n to d e o p in iõ e s firm adas.

tio n a d a s é p a rte d a p re p a ra çã o de ro teiro s investigativos. A escolha dos

A ssim , p o r n a tu re z a , a h is tó ria oral te m á tic a é sem p re d e c a rá te r social

co la b o rad o res nesse ra m o de h istó ria oral é fu n d a m e n ta l, pois o c aráter

e nela as e n trev istas n ã o se s u s te n ta m so zin h as o u em versões únicas.

te ste m u n h a i exige a qualificação d e q u e m se en trev ista. O estabeleci­

D e c o rrê n c ia n a tu ra l d e sua existência, a h is tó ria oral te m á tic a p u ra deve

m e n to d e c o m u n id a d e s d e d e stin o , colônias e redes é fu n d a m e n ta l para

p ro m o v e r d e b a te s c o m redes capazes d e n u tr ir o p in iõ e s diversas o u , no

q u e se re s p o n d a m p e rg u n ta s p e rtin e n te s aos fatos eleitos c o m o tem as.

caso d e h is tó ria o ral h íb rid a , p recisa se

E n tã o , além d a caracterização d o c o la b o ra d o r - q u e m é, o n d e estava na

mesclar com outras fontes, que, enfim,

A hipótese de trabalho nesse ramo da história oral é testada com insistência e o recorte do tema deve ficar explícito de tal maneira que conste das perguntas a serem feitas ao colaborador.

Em termos de história oral pura, os projetos temáticos devem fazer as vozes se confrontarem de maneira a promover o esclarecimento das versões a f in a í j u lt it o m Ç oÕpSrodjetodÚVÍdaS ^

.

< •

rebaixam tanto Seu USO COmo

. C o d lg O

(° ra,) eSPeCÍfic° q Uant° Seu Valor d o c u m e n to o rig in al.

COmO

E m geral, a h istó ria oral te m ática é usada c o m o m e to d o lo g ia o u técnica e, d a d o o foco te m á tic o p recisad o n o p ro je to , to rn a -se u m m eio de busca

ser reso,vidas ?el0 narrador

c ircu n stân cia d o evento, O q u e viu, ou v iu , c o n to u —, é cru cial saber COITIO se p o rta e m face de

O U tr a S

versões. O p ro je to de

.

.

.

,

h isto ria oral te m a tic a deve estar a te n to a

existência d e u m a h ip ó te se fo rte e c o n siste n te n a m e d id a em q u e será c o n s ta n te m e n te te stad a d u ra n te a en trev ista.

40

História oral

Unidade II - Gêneros em história oral

P reten d e-se, m e sm o c o n sid e ra n d o q u e ela é n a rra tiv a d e u m fato, q u e a h istó ria oral te m á tic a b u sq u e a v a ria n te c o n sid e ra d a le g ítim a de q u e m

c erim ô n ia s - são p artes in e re n te s à c o m p re en sã o d e g ru p o s q u e sem p re são exóticos ao c o n h e c im e n to c o m u m .

p re sen c io u u m a c o n te c im e n to o u q u e p elo m e n o s dele te n h a a lg u m a v a ria n te q u e seja discutível o u c o n te sta tó ria . C o m o a “v e rd a d e ”, n o caso, é u m e le m e n to e x te rn o , o e n tre v ista d o r p o d e e deve a p re se n ta r o u tra s o p in iõ e s c o n trá ria s e d iscu ti-las c o m o n arrad o r. T u d o c o m a fin alid ad e d e e lu c id a r u m a versão q u e é c o n te sta d a .

Dado seu caráter específico, a história oral temática tem características bem diferentes da história oral de vida. De­ talhes da história pessoal do narrador apenas interessam na medida em que revelam aspectos úteis à informação temática central.

A h istó ria oral te m á tic a n ão só a d m ite

41

As sociedades ágrafas são ricos d e p ó si­ Porque trabalha com a permanência e significado dos mitos, com a visão de mundo de comunidades que têm valores filtrados por estruturas mentais asseguradas em referências do passado remoto, a tradição oral percebe o in­ divíduo e o grupo diferentemente da história oral de vida e da história oral temática. Nesses casos prevalece o imediato; na tradição oral, o remoto compromete a noção de tempo linear.

tos d e tradições orais. N ã o só elas, p o rém . E m m u ito s casos a exposição de u m g rupo à d o m in a ç ã o de o u tro s p e rm ite q u e as tradições dos d o m in a d o s se a d a p te m de m a n e ira a c ria r m e c a n ism o s d e s o b re ­ vivência. D e to d a m a n e ira , a lógica d o d iferen te, antes de suas explicações para

o uso d o q u e stio n á rio , m as, m ais d o q u e isso, este se to rn a peça fu n d a ­

cu ltu ra s exóticas a ela, exige d e ta lh a m e n to descritivo e explicações dele­

m e n ta l p ara a aq u isição d o s d etalh es p ro c u ra d o s.

gadas pelo p ró p rio seto r social q u e vivência os fatos. B usca-se, pois, em p rim eiro lugar, e n q u a d ra r a situação d a inexistência d e registros escritos em u m p ro p ó sito d e estu d o s q u e ju stifiq u e a h isto ria oral feita a p a rtir do

4 .3 - TR A D IÇ Ã O ORAL

le v a n ta m e n to dos m ito s fu n d a d o re s. E m seg u n d o lugar, devem -se aplicar p ro c e d im e n to s capazes de p e rm itir a re co n tag em d o passado a fim de se “Tradição oral é a celebração do remoto criador.” Jan Vansina

p ro d u z ir d o c u m e n to s capazes de possibilitar u m acervo ú til à in stru ção de análises devotadas ta n to às explicações in tern as d o g ru p o c o m o às relações

S e g u ra m e n te a m ais difícil, in tric a d a e b o n ita fo rm a de expressão da

externas. As investigações devem revelar, além das p o stu ras e c o m p o rta ­

h istó ria oral é a tra d iç ã o oral. N ã o se lim ita n d o ap en as a entrevistas, a

m e n to s d o g ru p o , a no ção de passado e p resente d a q u ela c u ltu ra . A ob ser­

tra d iç ã o oral tra b a lh a co m o p re ssu p o sto d o re c o n h e c im e n to d o o u tro

vação c o n sta n te e o registro d o c o tid ia n o são p ro c e d im e n to s fu n d am en tais

e m suas p o ssib ilid ad es m ais d ilatad as. V iver ju n to ao g ru p o , estabelecer

para a trad ição oral, q u e sem p re está a te n ta ao c o m p o rta m e n to d o g ru p o .

co n d iç õ es d e ap reen são dos fe n ô m e n o s d e m a n e ira a favorecer a m e lh o r

Essa a titu d e to rn a relativa a p rática das

tra d u ç ã o possível d o u n iverso m ític o d o se g m e n to é u m dos segredos da

entrevistas q u e p o d e m existir, m as para

tra d iç ã o oral. P aren te d a etn o g rafia, a b o a resolução d a p esq u isa em tra ­

e lu cid ar c o m p o rta m e n to s coletivos.

d ição oral im p lica m in u c io sa descrição d o c o tid ia n o e de suas inversões.

O calen d ário , as festividades, os rituais

A c o m p le x id a d e d a tra d iç ã o oral reside n o re c o n h e c im e n to d o o u tro nos

de passagens, as c e rim ô n ia s cíclicas, as

d e ta lh es au to -ex p licativ o s de sua c u ltu ra . N o çõ es d e te m p o , lógica da

m otivações a b stratas d e tragédias even-

e s tru tu ra d e p are n tesc o , soluções d e a lim e n ta ç ã o e o rd e n a m e n to social,

r ii - ii c «=>í l n p n r o c p n n ê m i r a s

Explicações sobre a origem dos povos; crenças referentes às razões vitais do grupo e ao sentido da existência huma­ na, enquanto experiência que imita a vida; e o comportamento, bem como o destino de deuses, semideuses, heróis e personagens malditos, fantásticos e "históricos" são aspectos caros aos estudos das tradições orais.

c ritério s d e tra ta m e n to d a saúde, visões d a vida e da m o rte , b e m c o m o a

são m a té ria d a tra d iç ã o oral. O su jeito nesse tip o d e p esq u isa é sem pre

organização d o calendário e dos processos de celebração - rituais e dem ais

m ais coletivo, m enos in dividual, e p o r isso a carga da trad ição c o m u n itá ria é m ais p rezad a e p resen te p o rq u e c o n tin u a d a .

42

História oral

A in d a q u e seja c o m u m o uso d a tra d iç ã o oral e m g ru p o s fechados, c o m o trib o s o u clãs q u e a fro n ta m à m o d e rn iz a çã o , é possível fazer tra ­ b a lh o s de tra d iç ã o oral em sociedades u rb a n a s, in d u stria is, em q u e a

U N ID A D E III - A P R Á T IC A E M H IS T Ó R IA O R A L

resistência aos p ad rõ es d o m in a n te s exige ritu alização de p ráticas an ces­ trais. O s resu ltad o s d e tra b a lh o s de tra d iç ã o oral, g e ra lm e n te , são a in d a m e n o s im e d ia to s q u e os dem ais. P o rq u e re q u e r p a rtic ip a ç ã o c o n sta n te e observações in ten sas, além de a c o m p a n h a m e n to a te n to q u e sem pre e x tra p o la o nível d a e n trev ista, a tra d iç ã o oral é de execução m ais le n ta e exige c o n h e c im e n to s p ro fu n d o s ta n to d a situ ação específica investigada co m o d o c o n ju n to m itológico n o qual a c o m u n id a d e organiza sua visão de

5 - P rojeto de história oral 5.1 - C o m u n id a d e de destino 5.2 - C olônia 5.3 - Rede 6 - Condições para as entrevistas

m u n d o . U m c o n ju n to de m ito s a ju d a o e sta b e le cim en to de pressupostos a b erto s à c o n stru ç ã o dos d o c u m e n to s e análise das trad içõ es orais. P rin ­

7 - Personagens e ética em história oral

cípios m ito ló g ico s o rie n ta m a percep ção p o p u la r so b re o fu n d a m e n to e o d e stin o d e c o m u n id a d e s.

5

-

P R O J E T O D E H IS T Ó R IA O R A L

H á alguns p rin c íp io s q u e o rg a n iz am a te o ria dos m ito s q u e devem estar em m e n te ao se e la b o rar u m p ro je to d e tra d iç ã o oral. A ssim se p o d e p e n sa r nos c h am ad o s m ito s d e origem (a p arecim en to d o m u n d o , d a vida, d o s seres h u m a n o s), nos referenciais sobre os in s tin to s básicos (re p ro ­

“A história oral é uma grade de procedimentos que privilegia o sujeito, o diálogo, a criação textual desse diálogo...” Alberto Lins Caldas

d u ç ã o e a lim e n ta ç ã o ), nas explicações sobre a h istó ria (guerras, pragas, m o rte s), nas in d icaçõ es d o d e stin o pessoal (sorte o u n ão n o casa m en to

O d e ta lh a m e n to d o p ro je to e m h istó ria oral é c o n d iç ã o p ara q u a lq u e r

e nos negócios) e nas explicações so b re o c o m p o rta m e n to e x tra o rd in á rio

boa pesquisa, p rin c ip a lm e n te co m entrevistas. N essa lin h a, apresentam -se

(possessões, acessos). Esses fatores devem sem p re ser e q u ip a ra d o s aos

as p artes c o n stitu in te s de u m p ro je to q u e te m características p ró p rias p o r

g ra n d e s sistem as d e m ito s explicativos da h istó ria . Isso faz c o m q u e o

se tra ta r de “d o c u m e n ta ç ã o viva” . A seriação d e entrevistas d e m a n d a tra ­

investigador, o b rig a to ria m e n te , te n h a c o n h e c im e n to s universalistas a fim

ta m e n to especial d a passagem d o oral p ara o escrito e isso é a p ro fu n d a d o

d e oferecer c o m p araçõ es q u e m o stre m a c o erên cia e n tre as lin h as in te r-

no te m a d a transcriação. O p ro je to em h istó ria o ral é o in s tru m e n to n o r-

pretativ as d a h u m a n id a d e . Sugestões m ito ló g icas servem de p rin c íp io s

te a d o r q u e a ju d a a p lan ejar o tra b a lh o de pesquisa, d e lin e a n d o a p ro p o sta

re c o rre n te s p ara diversos g ru p o s vistos sob a ó tic a d a tra d iç ã o oral: m ito

a ser desenvolvida, a ju stific a tiv a /fu n d a m e n ta ç ã o , os m eios o p eracio n ais,

d o e te rn o re to rn o ; a visão d o paraíso terreal; a ideia d e te rra p ro m e tid a ;

a q u e stã o d a fo rm a e a evid ên cia d o s o bjetivos p o r m eio d e h ip ó teses de

d e povo escolhido; a v itó ria d o b e m c o n tra o m al; a v o lta d o M essias.

tra b a lh o . T u d o , p o ré m , é tra ta d o nos lim ites d iferen ciad o res d o p ro je to em h istó ria oral em c o n tra ste c o m os dem ais. A p o n ta d a c o m o re su lta d o d e u m pro cesso q u e vai d a tra n sc riç ã o sim ples à textualização, as en trev istas são exem plificadas e m cada etapa.

Unidade III - A prática em história oral

História oral

44

45

A tra n scriaç ã o é valorizada c o m o solução q u e c u m p re fu n ç ã o d u p la : em

de aq u isição d e entrevistas d e m a n e ira a su g erir c o n sta n te s ajustes. A

si, c o m o te x to e d e p e rte n c im e n to ao corpus d o c u m e n ta l d o p ro je to . São

d in â m ic a d a aq u isição e o rg an ização de textos d e h istó ria oral, p o r ser

a p re se n ta d o s ta m b é m os co n ce ito s d e c o m u n id a d e d e d e stin o , c o lô n ia e

m a té ria viva, in d ic a m u d a n ç a s c o n sta n te s nos p lan o s iniciais. As n o v id a ­

rede q u e o rie n ta m m aneiras específicas de resolução de p roblem as teóricos

des n ão previstas a p rio ristic a m e n te forçam m u d a n ç a s de ru m o . E xem plo

e técn ico s q u e os oralistas tê m n a fase d e ap reen são das entrevistas e na

clássico disso é a aplicação d a “lei dos re n d im e n to s decrescentes”, o u seja,

c o n stitu iç ã o das narrações. Q u e stõ e s de “q u e m e n tre v ista r”, “q u a n d o ” e

se n u m a rede prevista d e en tre v istad o s h á a rep etição de aspectos, desde

“o n d e ” são algum as das p reo cu p açõ es so m adas nessa p a rte . In fo rm açõ es

q u e d e fin id a a m e m ó ria coletiva d a c o m u n id a d e , isso sugere a lg u m a

so b re o a c o m p a n h a m e n to e c o n tro le d o p ro je to de p esq u isa em h istó ria

lim itaç ã o n a c o n tin u id a d e de entrevistas c o m o m e sm o seg m e n to . A

oral, c a rta de cessão e c a d e rn o de c a m p o finalizam essa sessão.

força c u m u la tiv a das entrevistas deve ser prevista n o p ro je to , m as suas

O p ro je to é a essência d o s tra b a lh o s e m h istó ria oral. M ais d o q u e

variações ta m b é m . A ssim , a eficácia das h ipóteses d e tra b a lh o e a veri­

m a n d a m e n to s seguros para e n c a m in h a r u m estu d o , o p ro je to em h istó ria

ficação d a p ro b le m á tic a a ser so lu c io n a d a dev em se re n d e r à d in â m ic a

oral ju n ta a m o tiv ação d o tra b a lh o co m os p ro c e d im e n to s a serem e feti­

dos d o c u m e n to s em fo rm ação. É claro q u e n ão se faz p rim e iro a série

vados p ara a b o a realização d a pesquisa. A c o n ju g a çã o d e d u as partes, a

de en trev istas p ara d ep o is inscrevê-las n o a n d a m e n to d o p ro je to . O p ro ­

in te n ç ã o e a p rá tic a d e e sta b e le cim en to de textos e sua e v en tu al análise, é

gresso d o s e stu d o s evolui c u m u la tiv a m e n te em c o n ju n to , v in c u la n d o a

o q u e caracteriza a h istó ria oral e a d iferen cia d e o u tra s p ro p o stas, m esm o

série c o m a verificação das p ro p o sta s iniciais. P ode-se m e sm o dizer q u e

das q u e ta m b é m se valem das fo n tes orais. C o m o c o m p o n e n te a tiv a d o r

h ipóteses d e tra b a lh o e m h istó ria oral ch eg am a ser sugestões. O a p r io r i

d o processo, o p ro je to é o e le m e n to d istin tiv o q u e a rtic u la e o rie n ta os

em h istó ria oral é sem p re u m a te m e rid a d e .

p ro c e d im e n to s d e cada etap a, fazen d o -o d a r se n tid o aos fu n d a m e n to s d a investigação c o m fo n tes vivas. t

D ife re n te m e n te d e p ro je to s baseados ,



-

i

i

e m d o c u m e n ta ç ã o c o n v en c io n a l, os p ia-

O projeto é a justificação e o mapa do andamento da pesquisa com entrevistas. Sem ele não se pode falar em história oral.

Como rumo, o projeto em história oral sintetiza as decisões sobre como operar durante todo o processo de investigação, mas não é uma camisa de força.

T o d o s os aspectos abrangíveis devem

estar contem plados no projeto COITIO .

,

partes que se comunicam, harmonizam, crescem e m u d a m . T u d o , p o rém , d ep en d e

nos q u e in c lu e m entrevistas em h istó ria

de co n d içõ es p re v ia m e n te d e te rm in a d a s e esclarecedoras dos p rin c íp io s

oral p a rte m d a co n sid e ra ç ão de q u e a série d o c u m e n ta l em q u e stã o é

básicos d a h istó ria oral: de quem, como e p o r quê. O p ro je to c o n te m p la

e la b o rad a , e sp ecialm en te, p ara esse fim . C o m o d o c u m e n to s “fabricados

esses três vértices d a p ro p o sta , p o ré m ded ica-se c o m m ais d etalh es ao

a d o is”, em m ú tu a co la b o raç ã o , as entrevistas feitas p ara fins específicos

“como”. “D e quem ” é p a rte c o n stitu tiv a das in te n ç õ es sem p re expressas

n ã o fazem ju s ao m e sm o tra ta m e n to dos d a d o s m a n tid o s em cartó rio s,

nas justificativas, e, d a m e sm a fo rm a, o “p o r q u e ’ a m p a ra a in te n ç ã o

arq u iv o s, m u seu s o u b ibliotecas. A in d a q u e p o ssam c o m p o r p ro d u to s

m ilita n te , d e tra n sfo rm a ç ã o d o status quo d o g ru p o ab ra n g id o .

g u a rd a d o s em arquivos, d esd e q u e resp eitad o o tip o d e te x to , entrevistas

C o n sid e ra d a s as três prem issas básicas, faz-se im p o rta n te d e fin ir o

d e m a n d a m tra ta m e n to d ife re n c ia d o . E as en trev istas g a n h a m força em

espectro d o q u e se p ro p õ e estudar. O a ssu n to deve ser d e lin e ad o c o m c u i­

c o n ju n to c o m o corpus d o c u m e n ta l.

d a d o , pois envolve a in d icação d o pessoal d e fin id o c o m o co lab o rad o res.

A c o n stitu iç ã o d e u m novo tip o de série d o c u m e n ta l, e la b o rad o espe­

A p ro p o sta “de quem ” deve ser tra n ç a d a co m os fu n d a m e n to s u tilitário s

c ific a m en te p ara o fim p ro p o s to e m h istó ria oral, c o n fo rm a o processo

d o e stu d o . Isso é o q u e delega ao p ro je to seu se n tid o e d e stin o . O esta b e ­

46

U n id a d e III - A p rá tica em h is tó ria o ra l

História oral

le c im e n to d o p rin c íp io m oral d o e stu d o in fo rm a sobre os p ro c e d im e n to s,

6—bibliografia;

fazendo-OS ServOS da motivação social.

A noção de mutabilidade do projeto se deve ao conceito de "fonte viva", p0 jSj a o cont rário das fontes escritas,

7—cronogram a.

a dinâm,ca do Proce«° é ág'1e sutl1-

O

j

.

lendo em Vista

.

OS

. .

1, .

princípios básicos

d a h is tó ria oral: de quem , como e p o r que

o p ro je to deve se in iciar a p a rtir d e escolhas q u e levem em c o n sid eração

tem a - sem pre p ro p o sto de fo rm a c o m p o sta - além d e sua relevância

social deve a p o n ta r p ara a p o ssib ilid ad e d e políticas públicas. Por lógico n ão se p en sa em c o n q u ista s q u e resultem

alguns fatores: 1 - relevância social da pesquisa; 2 - exequibilidade em term os de abrangência de entrevistas, local e tem po;

Supõe-se que a indicação de medidas capazes de alimentar propostas de transformação seja meta adequada para explicar a razao dos projetos temáticos.

r .

.

r

-

l i

cm efeitos de transformações absolutas, £ m u m e s tu d o s o b re o s g a ris n a c i_ o

d a d e d e C u ritib a , e n v o lv e n d o as tra je tó ­

3 - diálogo com a com unidade que o gerou; 4 - responsabilidade na finalização e devolução ao grupo.

47

rias das pessoas, p o r e x em p lo , p o d e r-s e -ia p e n sa r q u e m ais d o q u e se c o n se g u ir u m perfil desses tra b a lh a d o re s p o d e m -s e s u p o r p o lític a s de

Essas características p recisam o rie n ta r u m a síntese q u e serve de títu lo / g u ia p a ra se in ic ia r a m a te ria liz a ç ã o d o pro cesso . Pelo m e n o s n o in íc io , o títu lo /g u ia deve ser c o m p o s to p o r p a rte s q u e se c o m p le m e n ta m a fim d e revelar n ú c le o s a serem a b ra n g id o s pela p e sq u isa . U m ex em p lo d e títu lo in icial é “H istória oral de v id a de nordestinos em São Paulo: a experiência m igratória da seca de 1958". N esse caso, p o d e -se d e c o m p o r e le m e n to s q u e o rie n ta m o tra b a lh o a ser feito. A p ro p o s ta em tela seria: 1) d e h is tó ria oral de vida; 2) o g ru p o a ser e n fo c a d o seria d o s n o rd e s ­ tin o s q u e fo ra m à c id a d e d e São P aulo; 3) em d e c o rrê n c ia d a seca de 1 9 3 8 . U m a p ro p o s ta c o m o essa ta n to m a rc a a relev ân cia social d o te m a c o m o d e te rm in a sua e x e q u ib ilid a d e n a m e d id a em q u e b aliza o g ru p o e m u m local e n u m te m p o precisos. A lém d isso , a ssu m e im p o rtâ n c ia d ia n te d e u m g ru p o q u e se in d a g a q u a n to à id e n tid a d e n o rd e s tin a e p a u lis ta n a , brasileiras. U m p ro je to em h istó ria oral é c o n s titu íd o das seg u in tes partes: 1 - tema; 2 - justificação; 3 - problem ática e hipóteses;

a te n d im e n to social - d e e d u c a ç ã o , a lim e n to s , tra ta m e n to d e sa ú d e e a te n ç ã o fa m ilia r - a u m se g m e n to . A ssim u m p ro je to q u e p o d e ria re­ c eb e r o n o m e d e “ H istória de v id a de trabalhadores da lim p eza urbana de C u ritiba: ação e transformação" a b ra n g e ria u m esp aço de in fo rm a ç ã o a p ta a in d ic a r tip o d e escolas p ro fissio n a liz a n te s, p o te n c ia l c ria tiv o d o g ru p o e a té m e sm o c o rre ç ão d e tra je to s u rb a n o s . B asta e n u n c ia r o te m a p a ra q u e se p en se, in clu siv e, n ã o a p en a s nas p o te n c ia lid a d e s in te rn a s ao g ru p o , à a d m in is tra ç ã o p ú b lic a , m as ta m b é m ao f u n c io n a m e n to d a p ró p r ia c id a d e . A n o ç ã o d e “ação e tra n s fo rm a ç ã o ” , n o caso, g a n h a foros d e su tile za e su g estã o n a m e d id a e m q u e a p o n ta p a ra p rá tic a s de m u d a n ç a s q u e ta n to p o d e m ser d o s garis e n q u a n to pessoas c o m o d o m a te ria l q u e re c o lh e m . O seg u n d o item d o p ro je to é a justificação. C o m o “ação" para “justiçar cabe nesse a to o b serv ar a te n ta m e n te o e n tro s a m e n to e n tre a p ro p o sta geral e o e stu d o em q u estão . O s m o tiv o s específicos q u e a m p a ra m a investida d a p esquisa dev em ser claros e se re p o rta r aos g ru p o s q u e se p restam às entrevistas. A tu a aí m ais o “de quem" e o “p o r que '. O s m otivos alegados c o m o m o to res d o tra b a lh o p o d e m ser d e o rd e m p e sso al/g ru p ai, a cad êm ica o u h istoriográfica. M as sem p re de fu n d o social e a te n ta ao

4 - corpus docum ental e objetivos;

e n te n d im e n to d o tem po presente. A explicação d e ta lh a d a desses m o tiv o s

5 - procedim entos;

deve refletir a relevância d o te m a em v ista d a fo rtu n a crític a a tin e n te

48

Unidade III - A prática em história oral

História oral

ao a ssu n to m o tiv a d o r da investida. S u b ja c e n te a isso, a. justificação deve m o stra r a p e rtin ê n c ia d o assu n to visto p o r ân g u lo s novos. O realce aos m ecanism os operacionais

Se em qua|quer projeto é relevante sua justificação, em história oral isso é vital, dado o comprometimento moral com o grupo destacado para revelar suas experiências e versões dos fatos.

49

É p re c iso te r c laro q u a is os p ro b le m a s q u e se q u e r b u sc a r e c o m o se p o d e p e n sa r e m c a m in h o s, p e rg u n ta s,

aptas a ajudar na verticalização dos ar.

/ •

j



gumentOS. A o contrario dos projetos

Incluindo as chamadas hipóteses de trabalho, a série de perguntas a serem respondidas deve ser arrolada em obediência ao sentido social do projeto.

propostos visa a instruir dois procedim entos

c o m d o c u m e n ta ç ã o “d a ta d a ”, c o n tu d o ,

que se com pletam : 1) a elaboração d o corpus d o c u m e n ta l; 2) a inscrição das

as p ossibilidades de respostas d e p e n d e m , m u ito , d a b o a m o n ta g e m de

en trev istas n o p ro je to , fazen d o c o m q u e ele g a n h e se n tid o em c o n ju n to .

redes d e en tre v istad o s. O fato d e se tra ta r d e “d o c u m e n ta ç ã o viva” é u m

T u d o p a ra se tra n s fo rm a r em a rg u m e n to capaz de in s tru ir processos de

alerta p re p a ra tó rio p ara a falib ilid ad e das p ro b le m á tic a s o u hipóteses.

m u d a n ç a s sociais.

P a ra d o x a lm e n te, ao m e sm o te m p o aí reside a fe rtilid a d e d o s pro jeto s

D e p o is d a justificação, é preciso explicitar os m ecan ism o s d e c o n s titu i­

em h istó ria oral.

ção e usos d o corpus d o c u m e n ta l p ro d u z id o . Essa a titu d e leva à escolha

O e sta b e le c im e n to das e n tre v ista s o u fo rm u la ç ã o d o corpus docu­

d o g ên ero o u ra m o de h istó ria oral p re te n d id a : d e vida; tem ática; tra d i­

m en ta l é o u tr a e ta p a d o p ro je to . T e r claro o g ru p o e sc o lh id o é essencial

ção oral. E m te rm o s d e o p e ra çã o o u p ro c e d im e n to é necessário d efin ir

p a ra a d e fin iç ã o d e c o m o h á d e se e la b o ra r u m c o n ju n to d e e n tre v istas

se se tra ta de: 1) h istó ria oral p u ra, feita c o m diálogos in te rn o s das falas

capazes ta n to d e d iá lo g o in te rn o c o m o p ró p r io g ru p o c o m o c o m o

a p re e n d id a s, o u 2) h istó ria oral híbrida, q u a n d o as n arrativ as c o n c o rre m

e n to rn o . O m e sm o se d iz a re sp eito d a e v e n tu a l in te ra ç ã o c o m o u ­

c o m o u tro s su p o rte s d o c u m e n ta is. Esse é u m m o m e n to im p o rta n te , pois

tro s s u p o rte s d o c u m e n ta is . A c o n s titu iç ã o d e u m a série d o c u m e n ta l

exige q u e se d ê a d im e n sã o - e defesa - das a ltern ativ as d e c ru z a m e n to s

re q u e r c u id a d o s. U m d o s p o n to s c ru c iais é a d e te rm in a ç ã o d e o n d e

e n tre as fo n tes escolhidas. D e u m a o u o u tra fo rm a é m iste r esclarecer q u e

o u p o r q u e m co m eçar. N esse s e n tid o v alo riza-se a e n tre v is ta in icial. A

n u m p ro je to de h istó ria oral as fo n tes p rin c ip a is e em to rn o das q uais a

e n tre v ista básica o u as e n tre v ista s in iciais são c h a m a d a s d e p o n to zero

p esq u isa gira são as n arrações d o s co lab o rad o res.

e são elas q u e a n im a m a se q u ê n c ia p re te n d id a . É d a fase d e p o n to zero

N a justificação deve-se ev id e n cia r o m o tiv o d o uso d e redes de co la­

q u e se e x tra e m as p e rg u n ta s específicas q u e fav o recem a c o n tin u id a d e

b o ra d o re s. As versões o p o stas, as o p in iõ e s variáveis e c o n trá ria s, são

das d e m a is. A fase d e p o n to zero deve fo rn e c e r e le m e n to s capazes d e se

b e m -v in d a s e su gerem a p o ssib ilid ad e d e diálo g o e n tre as falas. T a n to na

a p ro fu n d a r os p o n to s in d ic a d o s n a p ro b le m á tic a e q u e d ev em ser perse-

a lte rn a tiv a d o uso d a h istó ria oral c o m o m e to d o lo g ia o u técn ica deve

É importante realçar que os objetivos em história oral são derivados do núcleo documental.

v ig o ra r o p re ssu p o sto das diversas linhas q u e favorecem o d e b ate. A justificação te m q u e se a te r d e ta lh a d a m e n te ao c aráte r dialó g ico d a tra ­ m a. A liás, a d in â m ic a d o tra b a lh o está e x a ta m e n te n a p ro m o ç ã o dessas várias diferenças.

g uÍdoS n a in v estig ação . O s objetivos d o tra b a lh o d ev em d e c o rre r d a in te n ç ã o d o e sta b e le c im e n to d o corpus docum ental.

As n a rra tiv a s to rn a m -s e o n ú c le o c e n tra l das a te n ç õ e s, p o is delas d e c o rre m as razões e os d ile m a s e m b u tid o s nas justificações. Esse é o

Superada a fase de determ inação tem ática e de afirm ação dos m otivos do

espaço p ara se fo rm u la r pressu p o sto s q u e vão se a d e n s a n d o n a m e d id a

projeto, o u seja, da justificação, o u tra etap a, é a problem atização, q u e deve

em q u e o c ru z a m e n to de idéias e o p in iõ e s deixa d e ser in d iv id u a l e abraça

d e c o rre r das investidas iniciais q u e q u alificam o p ro je to .

o coletivo. A problem atização deve se e n c a m in h a r p ara os objetivos. E os

50

U n id a d e III - A p rá tic a em h is tó ria o ra l

H istória o ra l

51

objetivos elevem ser claros e d ire to s p ara fu n c io n a re m c o m o p a râ m e tro .

o n d e se realizarão, q u a n to te m p o dev em durar? Esses d e ta lh es im p lica m

E m h istó ria oral, p o r c o n ta d o seu c aráte r p ú b lic o , os o b jetiv o s são d i­

a explicitação d o s co n ce ito s a lu d id o s ( C om unidade de destino, colônia e

v id id o s em :

redes). P a rtin d o -se d o m a io r p ara o m en o r, tem -se q u e se p re te n d e com

1 - objetivo geral: que dá um a dim ensão mais am pla ao que se quer estudar, a com unidade com o um todo, sem especificações;

essa te rm in o lo g ia facilitar a o p eração e d a r co n sistên cia ao p ro je to q u e , em su m a, te m as seg u in tes etapas.

2 - objetivos específicos: que se relacionam de m aneira mais próxim a com as questões que envolvem subdivisões do grupo analisado; 3 - objetivos com plem entares: que dizem respeito à devolução pública do trabalho realizado.

E x p licitar a o p eração , o u seja, o “c o m o fazer”, é u m dos passos cruciais

5.1 - C O M U N ID A D E DE DESTINO “Esse é o a m o r f a c i que faz com que o destino não apenas se realize, mas seja aceito, até mesmo amado com o tal.” Michel Maffesoli

d o p ro je to . N esse estágio é preciso a d m itir c o n ce ito s a p ro p ria d o s para d a r c o m p le x id a d e o u d im e n sã o ao p ro je to de h istó ria oral. Três c o n ceito s

H á dois pressu p o sto s q u e in s tru e m a c o n c e itu a ç ã o de “com unidade

se h ie ra rq u iz a m de m a n e ira c o m b in a d a e sem eles m u ito b em d efin id o s

de destino". A p rim e ira é de base m a terial e a seg u n d a de fu n d a m e n to

n ã o se o p e ra a d e q u a d a m e n te e m h istó ria oral:

psicológico, d e gên ero o u o rie n ta ç ã o (p o lítica, c u ltu ra l o u sexual). N o p rim e iro caso, e le m en to s d e efeitos físicos d izem respeito a situações

1 - C om unidade de destino;

q u e v in c u la m pessoas, clãs e g ru p o s expostos a c irc u n stân c ia s q u e dão

2 - Colônia;

u n id a d e tra u m á tic a ao d e stin o das pessoas: calam id ad e s, te rre m o to s,

3 - Redes.

pestes, flagelos, m a rc a m a vivência coletiva d e u m g ru p o em u m lugar

A p artir das especificações de cada u m desses elem entos é q u e se estabe­ lece a con d u ção das entrevistas. Para se arm ar a d eq u ad am en te o q u a d ro dos colaboradores deve-se a d m itir co m clareza que não basta “fazer entrevista” aleatoriam ente e nem decidir sobre a form a de pro ced im en to dialógico sem obedecer às estratégias de cada situação. As grandes definições dos quadros Há um natural afunilamento da capa­ cidade de apreensão das diversas expe­ riências e versões dos fatos derivados das entrevistas. Assim, da ampla deter­ minação da comunidade de destino passa-se à definição da colônia e dela se chega á formulação das redes.

de colaboradores devem o rien tar o critério decrescente, p a rtin d o do mais am plo para o mais específico. Assim, apenas depois que se estabeleceu u m e n te n d im e n to d o q u e é co m u n id ad e de destino é q u e se pensa em colônia, para, p o r fim , chegar-se às redes.

D e p o is, é preciso d e ta lh a r as q u estõ es de o rd e m p rá tic a p ara a realiza­ ção das entrevistas, q u e serão: únicas o u m últiplas1,abertas o u direcionadas;

físico e c u ltu ra l. O u tr a a lte rn a tiv a , esta de base psicológica, diz respeito às experiências de c u n h o m oral: pessoas afetadas p o r d ra m a s subjetivos o u n ão n a tu ra is c o m o violência, ab usos, a rb itra rie d a d e s, d iscrim in ação . D e u m a o u d e o u tra fo rm a, a su ste n ta ç ão q u e m arca a u n iã o de pessoas são d ra m a s c o m u n s, c o etân eo s, vividos c o m in te n sid a d e e c o n seq u ên cias relevantes, ep isó d io s q u e a lte ra m n o p o rv ir o c o m p o rta m e n to p re té rito , ro tin e iro , e q u e im p õ e m m u d a n ç a s radicais d e v id a g ru p a i. L e m b ra n d o q u e , p a ra H a lb w ac h s, a m e m ó ria coletiva é m a rc ad a pela a fin id a d e re­ p e tid a d e vivência c o m u n itá ria d e alg u n s d ra m a s, é n a in c id ê n cia dos p ro b le m a s e na busca de soluções q u e se evidencia o efeito d a experiência c o m u n itá ria . N essa lin h a, le m b ra r é u m desafio fu n d a m e n ta l. A m e m ó ria se c o n stitu i assim em artifício p o lítico -so cial p ara m a rc ar os e le m en to s id e n titá rio s d e u m a c o m u n id a d e .

52

História o ra l

Unidade III - A p rá tic a em h is tó ria o ra l

53

O coletivo é sinal d a in sistên cia de aspectos tra u m á tic o s q u e d e te r­

lônia" é sua p rim e ira divisão, a in d a q u e em b lo c o g ra n d e . D eve existir

m in a m c o m p o rta m e n to s registrados na m e m ó ria . Sem a rep etição e a

u m c rité rio ex p lícito p ara se p ro c e d e r à divisão d o to d o , pois a fin alid ad e

to m a d a de con sciên cia d o d ra m a c o m u m

d a “colônia” é facilitar o e n te n d im e n to d o

n ã o há m e m ó ria coletiva. A p e rs p e c ti­ va d e H a lb w a c h s preza a fo rm a ç ã o da

A partir de uma postura comum de um passado filtrado pelo trauma coletivo se formaria uma comunidade de destino que seria matéria de registro e verificação da história oral.

coletivo q u e se p e rd e ría n a ab ra n g ên c ia . A “colônia" é p a rte d iv id id a para possi­

Menor que comunidade de destino, a colônia é fragmento substantivo, fração representativa, ainda que nu­ mericamente inferior à grande comu­ nidade de destino.

m e m ó ria c o m u n itá ria c o n s tr u íd a m ais

b ilita r o e n te n d im e n to d o to d o p re te n d i­

p o r afin id ad es afetivas, p o r trajetó rias re p a rtid a s em c u m p lic id a d e q u e

do. M as há sutilezas nesse frac io n a m e n to ,

envolve a to d o s d o q u e p ro p ria m e n te nas altercações o u parcelas não

pois é necessário guardar, ao m e sm o te m p o , características peculiares q u e

rep resen tativ as d o coletivo.

ju stifiq u e m a fração e m a n te r os elos c o m u n s ao g ra n d e g ru p o . A ssim

E m te rm o s de h istó ria oral, as afin id ad es q u e en la ça m c id ad ão s q u e passam a te r d e stin o s c o m u n s são sem p re d istin g u id a s pela repercussão dos fatos na vida c o m u n itá ria . Seja p o r A abrangência e a repetição são marcas da memória coletiva e só interessa à história oral o sentido comunitário da memória. Mas a memória coletiva não é monolítica.

te r so frid o prisões, te rre m o to s, abalos cli­ m ático s, p a d ec id o to rtu ra s, epidem ias, os g ru p o s são id en tificad o s na h istó ria oral c o m o p o rta d o re s d e u m a “com unidade de

destino". A ssim , m ais o u m e n o s n a tu ra lm e n te , a h istó ria oral privilegia g ru p o s sociais deslocados —m igrantes e im igrantes —, parcelas m in o ritárias excluídas, m arg in alizad as, e se vale de suas n arrativ as p ara p ro p o r u m “outra história", o u h istó ria “ vista de baixo", d e â n g u lo in c o m u m , sobre d e te rm in a d a realidade e m c o n tra p o siç ã o ao sile n c ia m e n to o u à visão

c o m o p o d e ria m o s s u p o r q u e , e n tre os n o rd e stin o s q u e v ieram p ara São P aulo n a seca d e 1958, os evadidos d e cada e stad o a p re se n ta m suas ca­ racterísticas d ife re n te s, tem -se q u e , n a g ra n d e “com u n idade de destino", as co lô n ias são variadas c u ltu ra lm e n te . A “colônia" visa a organizar a c o n d u ç ã o d o e stu d o fazendo-o viável. C o m o seria im possível p e n sa r a "comunidade de destino" c o m o u m bloco indivisível, o p a rc e la m e n to em “colônia" seria u m a so lu ção o p e ra cio n a l q u e to rn a ria viável o estu d o . A decisão sobre "colônia", c o n tu d o , é sem ­ pre a rb itrá ria , pois há várias fo rm as d e p ro c e d e r a esse p a rc e la m e n to . D e o u tra m a n e ira , p o r ex em p lo , p o d er-se-ia p e n sa r em estabelecer “colônia" se g u n d o o c rité rio d e gênero: a m ig ração das m u lh e re s e m paralelo à dos

“m a jo ritá ria ” e in stitu c io n a liz a d a , a ssu m id a c o m o aq u ela q u e devem os

h o m e n s; das crianças em c o m p a ra ç ã o c o m os velhos; a d o s q u e vieram

re c o n h ec e r c o m o “versão oficial”. Por lógico, a visão d o s g ru p o s de p o d e r

so zin h o s e m e q u ip a raç ã o aos q u e tro u x e ra m fam ília. N esse caso, a "co­

interessa, m as c o m o c o n tra p o n to p ara o d iálo g o c o m os desvalidos.

m un idade de destino" se m a n te ria a m e sm a - os n o rd e stin o s m ig rad o s p ara São P aulo n a seca d e 1958 e a "colônia" - em vez d e se a te r ao to d o in d is c rim in a d a m e n te , d iria resp eito o u à p ro c e d ê n c ia p o r e sta d o o u ao

5.2 - C O LÔ N IA

g ên ero fe m in in o em c o m p le m e n to ao m ascu lin o . N o caso d o s estados, prevalece a resistência cu ltu ra l —h ábitos alim entares, tradições dom ésticas, “Com o alcançar a unidade na (apesar da?) diferença e como preservar a diferença na (apesar da?) unidade?” Zigmunt Bauman

“Colônia" é d e fin id a pelos p a d rõ e s gerais d e parcela de pessoas d e u m a m e sm a “com unidade de destino". Se "comunidade de destino" é o to d o , "co-

m úsica - , e n o caso d o g ên ero as diferenças e n tre a experiência m ig rató ria p ara a m u lh e r e p ara os h o m e n s.

54

História oral

Unidade III - A prática em história oral

5 . 3 -R E D E

55

É possível tra b a lh a r c o m d u as o u m ais redes ao m e sm o te m p o , m as o c u id a d o q u e se c o b ra é q u e n ão h aja m istu ra d e a rg u m e n to s. As q u e s­ “Para mim , as histórias são com o uns joguinhos de peças e montá-los de um ou de outro jeito é como jogar.” Gabriel Garcia Márquez

tões a p re se n ta d as às m u lh e re s, p o r ex em p lo , são d iferen tes das feitas aos h o m e n s. A a te n çã o aos a rg u m e n to s de cada rede justifica a intensificação d o e n te n d im e n to das razões d e cad a seg m en to . E x em p lo ap lic ad o a u m p ro jeto :

A “rede”, p o r sua vez, é u m a subdivisão da “colônia”, p o rta n to a m e n o r parcela d e u m a “com unidade de destino". D e n tro d a “colônia” é possível

Tema: “H istória oral de vida de nordestinos em São Paulo: a experiência m i­

id e n tifica r seg m en to s a in d a m ais restrito s q u e p o ssu am feições sin g u ­ lares. A rede deve ser sem p re p lu ral - id e a lm e n te várias

gratória da seca de 1 9 5 8 ”.

p o rq u e nas

C o m u n id a d e de d estino: todos os nordestinos atingidos pela seca de 1 958.

d iferen ças in te rn a s aos diversos g ru p o s Um dos fundamentos do bom estabelecimento das redes preza o entendimento em profundidade das razões de segmentos organizados que compõem o todo.

. .

,.

,.

C olôn ia: os nordestinos atingidos pela seca de 1958 e que migraram para a

,.r

residem as d isp u ta s o u o lhares d iferen tes ju stificam c o m p o rta m e n to s variados

cidade de São Paulo.

d e n tro de u m m e sm o p lan o .

m ulheres que vieram com família; m ulheres que vieram sem família. Outras

*

'

Redes: 1) h om ens q ue vieram com famílias; 2) h om ens que vieram sem família;

*

divisões poderíam ser pensadas: pessoas - h om ens e m ulheres - com familiares

In teressam os a rg u m e n to s q u e ju s ti­

em São Paulo; pessoas que antes tiveram experiências em São Paulo.

ficam o fe n ô m e n o p ara cad a seg m e n to . A riq u eza das redes in d ic a a fertilidade d o s m o tiv o s q u e , sob u m m e sm o m o tiv o cen tral - n o caso a seca d o n o rd e ste e a v in d a a São P aulo em 1958

U m p ro je to desse tip o p o d e a b rir c a m in h o p a ra se p e n sa r nos papéis

te ria m p ro m o v id o os

d e slo c a m e n to s. A in d a s u p o n d o esse ex em p lo , cabe le m b ra r q u e as razões q u e tro u x e ra m os h o m e n s são diversas das q u e m o tiv a ra m as m u lh eres. A ssim , p o d er-se-ia p e n sa r u m a rede m a sc u lin a e o u tra fe m in in a . S u b d i­

sociais - m ascu lin o s, fe m in in o s, d e pais e filhos - , n u m processo de m igração c o m o esse. P or o u tro lad o , a m e m ó ria das e stru tu ra s sociais fica ex p o sta de m a n e ira a su g erir c rité rio s p ara a a d ap taç ã o e m u d a n ç as.

visões a in d a p o d e ría m ser co n sideradas: redes dos h o m e n s q u e vieram c o m fam ílias e dos q u e vieram sós. P rin c ip a lm e n te n o caso d o tra ta m e n to m e to d o ló g ic o - em q u e são c o n sid e ra d o s os a rg u m e n to s orais c o m o fo rm a d e análise - , a c o m p a ra ç ã o de redes d iferen tes fornece, em geral, excelente o p o rtu n id a d e para con sid eração . A o rig em d a rede é sem p re o pon to zero, e essa en tre v ista deve o rie n ­ ta r a fo rm aç ã o das d em ais redes. A in d icação d e c o n tin u id a d e das redes p re fe re n c ia lm e n te deve ser d eriv ad a d a e n trev ista a n te rio r. A ssim , em

6

- C O N D IÇ Õ E S P A R A A S E N T R E V IS T A S

“As entrevistas em casa aumentarão as pressões dos ideais ‘respeitáveis’ centrados no lar; uma entrevista num bar, mais provavelmente, enfatizará atrevimentos e brincadeiras; e uma entrevista no local de trabalho apresentará a influência das convenções e atitudes ligadas ao trabalho.” Paul Thompson

cad a e n tre v ista o c o la b o ra d o r deve in d ic a r alg u ém q u e c o m p o rá a rede. A v a n ta g em dessa estratégia é q u e p o r ela m o n ta -se a rede de a c o rd o com

S e g u n d o p re c e ito s firm a d o s n o p ro je to , h is tó ria o ra l im p lic a u m a

o a rg u m e n to dos e n tre v istad o s e n ão dos d ire to res d o p ro je to . C o m isso,

série d e d ecisões so b re c irc u n stâ n c ia s das e n tre v ista s; assim , deve-se

se fortalece a razão d o g ru p o .

especificar, alé m das d e fin iç õ e s d e esp aço e te m p o d e d u ra ç ã o , se elas

56

Unidade III - A prática em história oral

História oral

57

te rã o o u n ã o e stím u lo s e se as n a rra tiv a s d e c o rre n te s serão livres o u

re stau ran te s, cin em as, c o m b o n s resu ltad o s, m as, d e q u a lq u e r fo rm a,

e s tru tu ra d a s . V a n ta g e n s e d e sv a n ta g e n s d e c ad a s itu a ç ã o d e v e m fazer

o ideal é sem p re haver co n d içõ es ad eq u ad as para a p u reza d o so m , e v ita n ­

p a rte d o s p ro je to s.

d o -se in te rru p ç õ e s e o u tro s im p e d im e n to s q u e d istra ia m a co n ce n tra ç ã o .

A m e m ó ria in d iv id u a l, a p esa r d e se e x p lic ar n o c o n te x to social, é

Q u a n to ao te m p o d a d o p ara cad a en tre v ista ta m b é m vale s u p o r a d in â m ic a d o e n c o n tro . A in d a q u e haja

a fe rid a p o r m e io d e e n tre v ista s nas q u a is o c o la b o ra d o r te n h a a m p la lib e rd a d e p a ra n a rra r. C u id a d o s d ev em ser to m a d o s e m relação às in te r­ ferên cias o u e stím u lo s p re se n te s nas e n tre v istas. E s tím u lo é in c ita ç ã o ,

A flexibilidade, evidentemente, deve existir; mas, em geral, a entrevista não deve ser "quebrada" ou "recortada" sem fortes razões.

de cad a situ ação d e en tre v ista, deve ta m b é m prevalecer o c u id a d o co m

o b te r. E s tím u lo s p o d e m e x istir o u não; r

r

r

r

e sta b e le c id o s n o p ro je to . H á a u to re s q u e a p e n a s c o n s id e ra m

deve-se p la n e ja r o n ú m e ro d e h o ras para cada e n c o n tro . A lém d o a sp ecto p rá tic o

n ã o fo rm a d e c o lo c a r n a b o c a d o e n tre v is ta d o as resp o stas q u e se q u e r tu d o , p o ré m , d e p e n d e d o s p re ssu p o sto s

n a rra d o re s m ais o u m e n o s e lo q u e n te s ,

0 ocas'°nal uso de e s t í m u lo s deve ser apresentado ao colaborador antes de suas eventuais aplicações, pois eles alteram a naturalidade que, muitas vezes, é buscada.

o m aterial, pois é lam en táv el faltar fita, p o r exem plo. Q u e m en tre v ista q u e m é o u tro fa to r decisivo n a q u a lid a d e d o p ro je ­ to. E m m u ito s casos, c o n v ém p e n sa r q u e deve h av er especificações no

a m e m ó ria , e n q u a n to fa to r d e análise,

re la c io n a m e n to e n tre e n tre v istad o res e en tre v istad o s. O q u e é m e lh o r o u

d e p o is q u e elas são d e p u ra d a s p o r en trev istas m ú ltip la s. Para esses, m e ­

n ão, d e p e n d e sem p re d o tip o d e p ro je to . A lgum as p e rg u n ta s dev em ser

ras p o n ta s d e le m b ra n ç as, reações im ed iatas, eq u iv alem à fantasia o u à

re sp o n d id as a n te s d e se p a rtir p a ra a a v e n tu ra das gravações: é m e lh o r

su p erficialid ad e. O u tro s , c o n tra ria m e n te , p referem o p e ra r c o m a e sp o n ­

saber o m á x im o possível sobre as pessoas o u não? É m e lh o r h o m e m e n ­

ta n e id a d e , a c re d ita n d o q u e a n a tu ra lid a d e seja u m a te sta d o d e p u reza da

trev istar m u lh e r o u não? E as idades dev em se equivaler? E m se tra ta n d o

m e m ó ria e q u e , se tra b a lh a d as p o r estím u lo s o u exercícios, elas espelham

de situações étn icas, seria a m e sm a coisa, b ra n c o e n tre v ista r n eg ro sobre

o rg anizações p ro g ressiv am e n te m ais sofisticadas. O s q u e a d v o g am u m a

suas c irc u n stân c ia s raciais?

n a rra tiv a a rm a d a , o u seja, em q u e o c o la b o ra d o r te n h a tid o te m p o para

U m a característica in teressan te das narrativas de m e m ó ria in d iv id u a l é

se p re p a ra r e assim p ro m o v e r u m a visão m ais o rg a n iz ad a d a h istó ria ,

q u e ela acaba p o r ser id e n tifica d a c o m o relevo das pessoas na sociedade.

p referem b u sca r a d efin ição d a c o n sciên cia n o q u e foi d ito . O s o u tro s

Q u a se sem pre, é c o m u m e n c o n tra r pesso­

o p ta m pela n a tu ra lid a d e .

as q u e n ão se a ch a m im p o rta n te s o u q u e

A fim d e p ro d u z ir m elhores co n d iç õ es p ara as entrevistas, o local esco­

d elegam a o u tro s a c ap acid ad e de narrar.

lh id o é fu n d a m e n ta l. D eve-se, sem p re q u e possível, deix ar o c o la b o ra d o r

Isso se deve a u m a característica d a nossa

d e c id ir so b re o n d e g o staria d e gravar a e n tre v ista. E xistem situações

sociedade sem pre aberta a celebrizar pesso­

em q u e e stú d io s, cen trais de sons, são re q u erid o s. N esses casos, logica­

as e d im in u ir o papel das pessoas c o m u n s.

Ao mesmo tempo, a percepção de que uma narrativa centraliza o narrador, que passa a ser a origem dos aconteci­ mentos, gera sempre uma sensação de importância social com a qual muitas pessoas não estão habituadas.

m e n te , os p ro je to s desenvolvidos p o r m u seu s o u a rq u iv o s d e m a n d a m

D a d a essa característica defeituosa sobre q u e m é m otivo de gravação, os

espaços privilegiados, m as g e ra lm e n te a casa d a pessoa, q u a n d o n ão há

trabalhos de m em ó ria individual apenas têm g an hado publicidade q u a n d o

im p e d im e n to , passa a ser o espaço esco lh id o . E xistem situações em q u e

são transparências de personagens consideradas im portantes. Q u e r seja pelo

escritó rio s, locais d e tra b a lh o o u de e n c o n tro s sociais, c o m o clubes, são

papel o u pela circunstância que envolve algum a pessoa, a m em ória ganha u m

eleitos. Sabe-se d e a ltern ativ as de entrevistas gravadas em igrejas, h o téis,

caráter em blem ático que, c o n tu d o , deve ser visto sem pre pela ótica social.

História oral

58

Unidade III - A prática em história oral

59

S en d o a m e m ó ria sem p re d in â m ic a , e q u e m u d a e evolui de época para

em im e d ia tism o s n o tra to das entrevistas. A in d a q u e sem p re p resida a

ép o ca, é p ru d e n te q u e seu uso seja relativizado, p o sto q u e o o b je to de

in te n ç ã o de se p u b lic a r o u d isp o n ib iliz a r os resu ltad o s das entrevistas,

análise, no caso, n ão é a n a rra tiv a o b je tiv a m e n te falan d o n e m sua relação

recom enda-se q u e elas sejam tratadas em sua íntegra. A o c o n trá rio de in d i­

c o n te x tu a l, e, sim , a in te rp re ta ç ã o d o q u e ficou (o u não) reg istrad o nas

cações superadas p o r práticas c o m u n s na Sociologia, m esm o q u a n d o frag­

cabeças das pessoas e foi passado p ara a escrita.

m e n ta d o s os discursos n arrativ o s, anexa, sem p re q u e possível, deve vir a entrevista, tra b a lh a d a na íntegra. Q u a n d o isso não for viável - seja pelo ta ­

7

-

P E R S O N A G E N S E É T IC A E M

m a n h o o u pela característica d o p ro jeto - ,

H IS T Ó R IA O R A L

“O respeito pelo valor e pela importância de cada indivíduo é, portanto, uma das primeiras lições de ética sobre a experiência com o trabalho de campo na história oral.” Alessandro Portelli

Na realidade, a história oral demanda um complexo tratam ento entre as partes. Uma etiqueta rigorosa prescreve os procedimentos que devem ficar claros segundo o projeto e explicitados invariavelmente antes da realização das entrevistas.

ó e v e ser o b r ig a to r ia m e n te in d ic a d o o °

lu g ar de acesso a ela. C a b e ao d ire to r d o .

_

p ro je to fazer tal indicação, A

_

i



,

r

j

A q u e stã o d o c o m p ro m isso é ru n d a m e n ta l n a te ia d e re la c io n a m e n to s d a

N o p assad o , o u e m e n te n d im e n to s tra d ic io n a is q u e a in d a v ig o ra m , a

h istó ria oral. É relevante le m b ra r q u e c o m p ro m isso n ão q u e r dizer c u m ­

d e fin iç ã o d e q u e m era o e n tre v is ta d o r e o e n tre v is ta d o ficava c la ra m e n te

p licid ad e o u afin id a d e ab so lu ta. É im p o rta n te te r em m e n te q u e m u ito s

e sta b e le c id a nas “tra n sc riç õ e s e x a ta s”, q u e , p o r sua vez, d e te rm in a v a m

p ro jeto s, p ara serem m ais c o m p le to s, exigem q u e sejam in teg rad as no

q u e m era q u e m . Q u a s e se m p re se assinalava u m “E ” p a ra o e n tre v is ­

c o n ju n to das entrevistas pessoas q u e se c o lo cam em lin h as ideológicas,

ta d o r, o u tra s vezes usava-se a le tra “ P ” (de p e rg u n ta ) o u a in icial de

pessoais, posições d iferen tes d o s d ire to res d o s e n trev istad o res. Isso, em

q u e m reg istrav a a e n tre v ista . V alia-se ta m b é m d o “ R ” p a ra sig n ificar

vez d e significar m o tiv o de c o n tra ste , deve ser visto c o m o fa to r de e n ­

a re sp o sta o u as in iciais d o e n tre v is ta d o . E m m u ito s casos, ta m b é m

riq u e c im e n to d o p ro je to , p o sto ser u m a fo rm a de c o m p le ta r visões de

a p e n a s se usav am travessões n o s inícios das p e rg u n ta s e das respostas.

fe n ô m e n o s q u e ficariam c o m p ro m e tid o s sem o “o u tro lad o ”. P o rq u e tem

D a d o s os avanços da h istó ria o ral, essa relação se m o d ific o u p o rq u e ta m ­

sid o m u ito c o m u m se fazer h istó ria oral c o m setores c o m os q uais os pes­

b é m m u d a ra m os papéis referentes à a u to ria d o p ro je to e o significado

q u isad o res se c o m p ra z e m o u a fin am , é im p o rta n te le m b ra r a necessidade

d o uso das entrevistas. A lém disso, in c o rp o ra n d o aspectos d a m o ral e da

de ta m b é m se o u v ir o u tra s p artes e integrá-las n o p ro je to .

c id a d a n ia c o n te m p o râ n e a s , inclusive os d eb ates sobre as relações éticas,

E m m u ito s projetos de história oral, confrontam -se as opiniões e, mais do

de d ire ito à a u to ria e a fu n ção social d o p ro d u to in te le c tu al, tê m im p o sto

q u e elas, as orientações q u e m otivam as partes. N a suposição, p o r exem plo,

c u id a d o s e m relação ao uso d a en tre v ista e d e preservação d a im agem

de u m estudo que enfoque to rtu ra d o s e to rtu ra d o re s , v ítim as e p e rp e tra ­

d o e n tre v istad o .

d o re s, os e n tre v ista d o re s n ã o p re c isa m

Evidentementenãoseadvogaapossibiii.

o b rig ato riam en te ser solidários o u afinados

dade de uma aíáo neutra- distante e imparcial. Isso simplesmente não existe. O que se pede é uma postura profissional, de alguém que sabe ouvir e dialogar.

In d e p e n d e n te m e n te dos prazos —q u e são c u rto s p a ra os jo rn alistas - n a

h is­

Nada deve ser espontâneo num encontro de história oral. Apenas a liberdade de fala deve gozar de prerrogativas descontraídas.

°

com a parte contrária. R equer-se, isso sim , .

r

.

,

|

.

tó ria oral, as en trev istas dev em p ro d u z ir

u m a a titu d e profissional e dem ocrática que

resu ltad o s feitos c o m m o ro sid a d e e a te n ç ã o exageradas. Sem isso não

ad m ita c o n tem p lar argum entos de am bos os lados. N o m o m e n to da apreen­

se realiza a c o o p eraç ã o e n ã o se explica a m ed iação . N ã o se deve p en sar

são das narrativas, ta n to a lógica de u m a parte co m o da o u tra se faz válida.

60

U n id a d e III - A p rá tic a em h is tó ria o ra l

H istória o ra l

61

P o r o u tro ângulo, o pró p rio entrevistador deve deixar ser u m observador

à q u e stã o d o a u to r. B a sic a m en te a p e rg u n ta q u e se faz é se o a u to r é

da experiência alheia e se c o m p ro m e te r com o trabalho de m aneira m ais

q u e m c o n to u a h is tó ria o u q u e m a re d ig iu , d a n d o -lh e u m a so lu çã o

sensível e com partilhada. T u d o isso sem perder de vista a visão d o projeto

fo rm al d e fin itiv a? N a p rá tic a , esse p o n to te m c o m p lic a d o m u ito s p es­

c o m o u m todo. A m u d an ça d o significado dos papéis, de q u e m é q u em , não

q u isa d o re s q u e se p e rd e m ao c o n f u n d ir o tra b a lh o d e c o la b o ra ç ã o na

está apenas ligada à superação das form as tradicionais de se fazer entrevistas.

e n tre v ista c o m a d ire ç ã o c o m p a rtilh a d a d o p ro je to . São conhecidos casos em que os autores

A d ep endência d o colaborador passa a ser m u ito m aio r d o que era antes. N ã o apenas este tem que dar a autorização para a publicação de parte ou d o to d o da entrevista, m as ele pode e deve tam b ém participar das etapas de transcrição e revisão d o texto q u e lhe com pete. Indicações de c o n tin u id ad e das entrevistas tam b ém p o d em favorecer o .

.

papel ativo dos colaboradores. r-,

. ,

D eve-se ter em m e n te q u e a capacidad e d e n a rra r está na an u ên cia, no estado psicológico e físico d o en trev istad o , q u e

Um dos pontos mais prezados na consideração da história oral está exatamente no fato de ela abrigar possibilidades de enganos, mentiras'. distorções e variações dos fatos registrados e conferidos por outros documentos,

Não apenas os direitos autorais devem ser encaminhados para o autor, mas também os riscos da condução da pesguisa, dos usos das entrevistas e os even­ tuais erros não explicitados nas apre­ sentações ou comentários publicados.

dividem os proventos das obras publicadas e até sabe-se de situações em que os autores abrem m ão dos direitos autorais em favor dos entrevistados. Essa decisão, porém , deve

pertencer exclusivam ente ao autor. Apesar de o tratam en to d ad o ao entrevis­ tado ser o de colaborador, m ediante as responsabilidades do escrito, o a u to r deve ser sem pre q u em colheu a entrevista, dirigiu o projeto e assum iu publica­ m en te a responsabilidade sobre o q u e está d ito , gravado e usado. A m u d an ça

p o d e, sim , d e cid ir sobre os ru m o s finais

da consideração d o papel d o entrevistado tem ocasionado alguns problem as.

da entrevista. Isso q u e parece óbvio não é tão claro, pois se julga q u e o

A novidade da questão e a in tim id ad e qu e m uitas vezes se estabelece entre as

c o n tro le da relação se c o n ce n tra nas m ãos d o en trev istad o r, q u e d e té m o

partes têm provocado situações inusitadas e de risco. E m alguns casos, certos

g ravador e q u e po d eria a p ertar b otões d e c o m a n d o , a ssu m in d o os rum os

colaboradores se sentem tão d o nos d o projeto que querem d ete rm in a r o seu

da relação. Essa tensão p e rm a n e n te c o n tin u a , pois ao te rm in a r a entrevista

curso. É possível inclusive haver c irc u n stân c ia s em q u e os c o lab o rad o res

o u as sessões de gravação as decisões sobre detalhes d a transcrição passam

forcem situações in c o n v e n ie n te s e até usem de c h a n ta g e m para a tu a r no

a ser c o m a n d a d o s pelo a u to r das transcrições. A o voltar para a conferência

d e se n v o lv im e n to d a p esq u isa. O a u to r

das entrevistas, c o n tu d o , tu d o m u d a até q u e se estabeleça o texto final.

tem q u e te r clareza d e seu papel e saber

Há projetos de história oral em que se faz necessário o esforço de equipe. Nessas situações, deve-se proceder a repartição das tarefas, mas o trabalho deve ter um diretor que será, sempre, o responsável geral pelo andamento e controle das etapas do projeto.

U m te rm o significativo n a relação de p o d e r das partes é a palavra “ne­

d ip lo m a tic a m e n te co lo car lim ites na in ­

gociação”. M ais d o q u e p ô r o u tirar partes de u m a entrevista, tu d o deve ser

terferên cia de c o lab o rad o res m ais afoitos.

negociado. M u ita s vezes coisas ditas e m m o m e n to s inesperados o u co m o

A ssim , se alg u ém o u u m c o n ju n to de

p a rte d e u m a narrativa g a n h am relevo diferen te q u a n d o v e rtid o d o oral

pessoas se responsabiliza pelas entrevistas

para o escrito. C aso haja necessidade e seja defin id a a relevância d o q u e foi

de u m a rede, as tarefas dev em p e rm a n e c e r sem p re as m esm as. A m u d a n ­

falado, recom enda-se u m a m b ie n te de cam aradagem para a negociação.

ça de ativ id ad es p o d e p re ju d ic a r a “especialização” e em tro c a pro v o car

O u tr o te rm o re le v an te n a m o d e rn a h is tó ria o ral é o d a “a u to ria ” .

im provisações n o m a n e jo das tarefas. Q u a n d o o c o rre m tra b a lh o s com

S e g u n d o os c rité rio s das a n tig a s p rá tic a s d e tra b a lh o c o m e n tre v ista s, a

eq u ip es, sugere-se q u e haja u m c alen d á rio d e reu n iõ es e q u e to d o s os

q u e s tã o d a a u to ria n ã o re p re se n ta v a n e n h u m p ro b le m a . P ara a h is tó ria

m e m b ro s d a e q u ip e to m e m c o n h e c im e n to das funções e dos estágios dos

o ra l, c o n tu d o , u m d o s a sp e c to s m ais in te re ssa n te s e p o lê m ic o s re m e te

c o m p a n h e iro s e d o p ro je to .

/

62

História oral

H á u m a form a de história oral que exige cuidados especiais. E m deter­ m inados projetos trabalha-se com o pressuposto da história oral de pessoas anônim as. Isso ocorre q u an d o , para evitar a identificação pública de e n tre­

U N ID A D E IV - E S T A T U T O D A H IS T Ó R IA O R A L

vistados célebres ou para se evitar constrangim entos envolvendo terceiros, m uda-se o n o m e da pessoa e alteram -se as situações da história o u da versão de algum fato capaz de possibilitar a precisão Projetos que trabalham com situações de risco, de vexames, de impressões sobre outros, ou de denúncia, po­ dem valer-se da "invisibilidade". Con­ tudo, na apresentação do trabalho devem ficar claros o nível e as razões do "disfarce".

8 - Em busca de um lu gar

dos casos. O m esm o acontece em relação 8.1 8.2 8.3 8.4 8.5

à proteção de indivíduos q u e precisam do a n o n im a to para não expor a si o u a família. N esses casos, ta m b é m é im p o r ta n te q u e se te n h a a autorização d o c o la b o rad o r

-

História História História História História

oral oral oral oral oral

com o com o com o com o com o

" fe rra m e n ta " "técnica" " m é to d o " " fo rm a de saber" "disciplina"

p a ra se p u b lic a r a entrevista. D a m e sm a fo rm a, o le ito r deve ficar avisado. E xistem g ru p o s de leitores q u e c ritic a m n e g ativ am en te esse tip o de p ro te ­ ção d o c o la b o rad o r, m as em d e te rm in a d a s o co rrê n c ias ele é p le n a m e n te

8 -

EM

BU SC A DE U M

LUG AR

ju stific a d o e até re c o m e n d a d o . U m dos exem plos m ais expressivos da v alid a d e dos p ro je to s d e h istó ria oral d e p erso n ag en s a n ô n im o s rem ete aos casos d e e stu d o s q u e en volvem pessoas p ú b licas, artistas e políticos.

“Qual o sta tu s da história oral? Difícil orientar-se em campo configurado tão recentemente, em meio a diversas concepções que se entrecruzam...” Janaína Amado e Marieta de Moraes Ferreira

E m d iferen tes situações, n o m u n d o to d o , m u ito em p a rtic u la r pelos efeitos d a globalização, a h istó ria oral c h a m a a ate n çã o p o r ser u m recurso crescente, p rá tic o , persuasivo e, p ara m u ito s, respeitável. S ua u tilid a d e se ab re p a ra a a p reen são , registro e, e v e n tu a lm e n te , tra b a lh o a n a lític o sobre ex periências d e pessoas e g ru p o s q u e se d isp õ e m a deix ar te ste m u n h o s o u q u e são c o n v id a d as p ara, pela fala, tra n s fo rm a r sua exp eriên cia em d o c u m e n to s escritos. D e tal m a n e ira a p o p u la rid a d e d a h istó ria oral te m se este n d id o q u e alguns defensores desse tip o de m anifestação se a m p a ram n o te rm o oralista p ara d e sig n a r seus a d ep to s. M as, le m b re m o s, o te rm o o ralista abriga u m a subversão capaz d e p ro v o car iras d e q u a n to s são aca­ n h a d o s na reco n sid eração d o papel d a escrita e d o oral. A su b stitu iç ã o d o te rm o a n tes u sad o - “h isto ria d o re s o rais” p o r o ra lista - faz sen tid o

64

H istória o ra l

U n id a d e IV - E sta tu to da h is tó ria o ra l

65

àqueles q u e s u p õ e m a h istó ria o ral além de u m exercício d e h isto riad o res

de u m a d im e n sã o d e m o c rá tic a , p o r ser a b ra n g e n te e acessível, d e u m a

d e ofício o u m e sm o d e p rá tic a exclusiva d a u n iv ersid ad e. M esm o nos

investida q u e m ais d o q u e s u b m e te r form as e m an eiras de p ro d u z ir co ­

espaços das academ ias, o e n q u a d ra m e n to na c o n d iç ã o d e “h isto riad o res

n h e c im e n to ao crivo a cad êm ico p e rm ite m anifestações q u e p a v im e n ta m

o rais” te m p ro v o cad o e stra n h a m e n to s causados a ta n to s o u tro s in te le c ­

a estrad a d e ta n to s q u e g o stariam d e p ro m o v e r pesquisas m e sm o sem a

tu ais, c o m o sociólogos, a n tro p ó lo g o s, psicólogos, jo rn alistas, etn ó lo g o s,

g rad u ação c o rp o ra tiv a u n iv ersitária. Isso, p o ré m , n ão significa falta de

geógrafos, q u e , ao tra b a lh a r c o m pressu p o sto s d a h istó ria oral, sen tem -se

critério s rígidos p ara os p ro c e d im e n to s investigativos. O s exem plos de

c o n stra n g id o s d ia n te d a d e p e n d ê n c ia p o u c o ex p lic ita d a e m sua relação

b o n s tra b a lh o s feitos fora d o espaço aca d ê m ic o se m u ltip lic a m e c o m ­

c o m a d iscip lin a H istó ria . O a d jetiv o qu alificativ o “o ra l” à H istó ria , ao

p ro m e te m o exclusivism o u n iv ersitário . A o fim e ao cabo, q u e stio n a-se

m e sm o te m p o e m q u e in c o m o d a , p a ra d o x a lm e n te , n ão te m m o tiv a d o q u e stio n a m e n to s dilig en tes a q u a n to s se sen te m a fro n ta d o s pela d esig n a­ ção q u e é, n o m ín im o , im p ró p ria . A lém d a adjetivação in ju sta , p o r lhes ro u b a r as afiliações d iscip lin ares, m u ito s se veem p e rtu rb a d o s co m o exclusivism o d a d e ­ p e n d ê n c ia de u m a d iscip lin a , a H istó ria , q u e lhes é a lh e ia. A fin al, p e rg u n ta -s e : seria a h istó ria oral p a trim ô n io dos h isto ­ riadores e os dem ais u su ário s te ria m q u e se re n d e r a u m a “H istória sem adjetivos”? Se a a trib u iç ã o à H is tó ria in c o m o d a aos p ro fis s io n a is d a c u ltu r a n o a m b ie n te

Um dos erros mais comuns é a confusão entre o mero uso de entrevistas e his­ tória oral. Entrevistas são diálogos efe­ tuados para instruir temas ou argumen­ tos nebulosos ou informativos e seu alcance muitas vezes se esgota nisso. História oral é um processo de registro de experiências que se organizam em projetos que visam a formular um en­ tendimento de determinada situação destacada na vivência social. Enquanto a entrevista subsidia outros tipos de documentos, no caso da história oral o que se pretende é a centralização das narrativas que se constituem, desde sua concepção, em objeto central das atenções.

u n iv e rs itá rio , o q u e d iz e r d o e fe ito na c o m u n id a d e n ã o a cad êm ica? O n ã o e sc la re c im e n to d o s p a p éis te m levado m u ito s a m a n te r a c o n fu são e n tre h istó ria oral e d e p o im e n to s, en trev istas, gravações.

O que se quer como condição de bom trabalho em história oral é rigor nas formas de condução das pesquisas e clareza no uso das entrevistas ou outras manifestações da oralidade. Fala-se, pois, das possibilidades de se pensar em autonomia da história oral que não mais seria instrumento complementar, documentação subsidiária, suplemento ou mesmo mera fonte.

a existência de u m a h istó ria oral feita na e pela acad e m ia e o u tra fora das grades universitárias. O q u e se b u sca v alo rar é a fe itu ra d e u m a b o a h istó ria oral. U m a p rim e ira d e c o rrê n c ia d a p ro c u ra d e a u to n o m ia o u d a m e lh o r d efin ição da h istó ria oral diz respeito ao seu e sta tu to . C o n v é m logo q u e stio n a r q u al o lu g ar da

h istó ria oral n o c o n ju n to d o c o n h e c im e n to d o m u n d o m o d e rn o , d e n tro e fora d o m eio u n iv ersitário . U su a lm e n te , p ara q u alificar a h istó ria oral, são a p o n ta d a s cin co possibilidades. A saber, h istó ria oral co m o : 1 - ferramenta; 2 - técnica; 3 - m etodologia; 4 - form a de saber; 3 - disciplina.

N ã o faltam , a tu a lm e n te, os q u e passam a escrever h istó ria oral com letra m in ú scu la para diferenciá-la das form as disciplinares de p ro d u ç ã o de saber o u c o n h ec im e n to . M ais d o q u e u m ato de rebeldia, essa alternativa im plica exigência d e definição para u m c am p o q ue, em m u ito s casos, q u e r ser in d e p e n d e n te . A grafia c o m letras m in ú sc u las, c o n tu d o , não deve ser ín d ice de reb aix am en to o u exclusão da h istó ria oral d o p lan tei de m atérias prezadas pelos c u lto res d o e n te n d im e n to social. Pelo c o n trá rio , trata-se

É c o n v e n ie n te dizer q u e q u a lq u e r a lte rn a tiv a m erece co n sid e ra ç ão desde q u e a escolha seja fu n d a m e n ta d a e d is c u tid a em relação às dem ais possibilidades. O q u e n ão se releva é o uso in d is c rim in a d o d a h istó ria oral c o m o se ela n ão possuísse u m d e b a te c o n siste n te so b re seu lu g ar na co m p o sição das form as d e ap reen são dos fe n ô m e n o s sociais. H á ta m b é m u m fa to r d iv isó rio q u e a tin g e a c o m u n id a d e d o s q u e p ra tic a m a h is tó ­ ria oral: seu caráte r profissional o u am a d o r. E m geral, os tra b a lh o s de

66

H istória o ral

h istó ria oral são feitos p o r pessoas interessadas e m soluções d e registro

U n id a d e IV - E sta tu to da h is tó ria o ra l

67

8.1 - HISTÓ RIA ORAL C O M O "FERRAM ENTA"

e análise d e situações, p ro b le m a s e fe n ô m e n o s sociais. H á casos em q u e os pesq u isad o res são v in c u la d o s a e n tid a d e s q u e tra b a lh a m p ro fissio n al­ m e n te e são p e rfe ita m e n te a d e q u a d o s aos c ân o n es p rezados pela h istó ria

“Existir, humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo.” Paulo Freire

oral q u e d ialo g a c o m saberes acadêm icos. E m o u tra s situações, tip o s q u e n ão se v in c u la m às in stitu iç õ e s d e en sin o , m as q u e ta m b é m p ro m o v e m pesquisas exem plares, c ab e m n a c o letiv id ad e d o s oralistas. O q u e , de

Sem c o n stitu ir u m o b jeto específico de

fo rm a alg u m a, deve prevalecer é o c aráte r co m ercial, o u m e rc an til no

pesquisa, c o m o “fe rra m e n ta ”, a h istó ria

m a u se n tid o , d o fazer h istó ria oral. D esd e q u e c o m p ro m e ta m os critérios

oral seria u m recu rso ad ic io n al, in s tru ­

d a livre investigação, se h o u v e r c en su ra o u “re c o m en d a ç õ e s” p ara q u e se

m e n to a m a is, o u m e ro in s tr u m e n to .

deixe de lad o este o u aq u ele asp ecto d a pesquisa, c o n d e n a -se tal p rática.

E n q u a n to acessório de a rg u m e n to s fo r­

A lib e rd a d e d e expressão é c o n d iç ã o p re c íp u a d a h istó ria oral. T a m b é m

m ulados p o r o u tro s estím ulos con tíg u o s,

se o p õ e ao uso de entrevistas, im ag en s, o u c o m b in a ç ã o d e am b as, c o m o

a história oral sintetizada em entrevistas

fo rm a p u b lic itá ria c o m o se h istó ria oral servisse de a p o io à merchandising

não ultrapassaria o significado dos dem ais

o u p ro p a g a n d a .

m eios o u fontes auxiliares e, assim , teria

C o n v é m le m b ra r q u e até p o u c o te m p o era dispensável a discussão

Na aparência, a história oral é mani­ festação "multidisciplinar", um proce­ dimento disposto aos vários grupos de tradições disciplinares diferentes ou de pesquisadores interessados. Isso, aliás, explicaria a adesão diversificada de segmentos promotores de registros e análise dos fenômenos sociais. Contu­ do, os limites do conceito de "multidisciplinaridade" - que se perde na falta de objeto próprio - acabam por reforçar a hegemonia da História como campo que submete a oralidade e subjuga o trabalho em outras áreas que se valem da prática de entrevistas.

certa n e u tra lid a d e n a rep u tação . E n tã o ,

so b re o e sta tu to d a h istó ria oral. Ela ser u m a sim ples “fe rra m e n ta ”, “té c ­

c o m o “algo a m ais”, as en trev istas se e q u ip a ra ria m aos o u tro s su p o rte s,

nica”, “m é to d o ”, “discip lin a ” o u “fo rm a d e sab e r” era algo q u e se p erd ia

sejam : escritos, estatísticos o u iconográficos. Seria, e n fim , u m acessório,

n a p rá tic a d e seu uso até e n tã o p o u c o c u id a d o em te rm o s d e definição

sim p le sm e n te u m recurso q u e p o d e ria o u n ão c o n trib u ir p ara reforçar a r­

teórica. D a d o o alcance da h istó ria oral p ra tic a d a ta n to nas universidades

g u m en to s. E m o u tras palavras, equivalería a só m ais u m a d en d o . N ã o seria

c o m o fora dela, e p rin c ip a lm e n te p o r causa d a d istâ n c ia e n tre essa p ro ­

e rra d o d izer q u e , inclusive c o m o fe rra m e n ta , as en trev istas ap en as servi­

d u ç ã o e as dem ais, crio u -se u m a d is p u ta in te n sa sobre o d ire ito de fazer

ríam para exem plificar casos in d icad o s c o m o co n seq u ên cia de m otivações

h istó ria oral. A in d a q u e esse d e b a te esteja e m fase d e m e lh o r a p ro x im a ­

históricas q u e , essas sim , p recisariam d e explicações m ais c o n se q u e n tes.

ção, é fu n d a m e n ta l q u e se o rie n te sobre os c ritério s de e n q u a d ra m e n to .

O valor te ste m u n h a i exarado d e en trev istas a red u ziría à afirm ação ou negação de algo já estab elecid o o u sem base d o c u m e n ta l. Isso é p o u co . C o m o “fe rra m e n ta ”, p o ré m , m ais re c e n te m e n te , o uso d e entrevistas em h istó ria oral foi p o sto em q u e stã o . E q u iv ale n d o a p o n to de p a rtid a , ficava a b e rto o ata lh o p ara verificações m ais p ro fu n d a s q u a n to a sua razão de ser. A d ú v id a g e rm in a l d e riv o u d a sem e n te p ro p o sta pelo c ria d o r da expressão fam osa, L ouis Starr, q u e a p ro b le m a tiz o u d a seg u in te m aneira: “mais do que um a ferram enta, e menos do que um a disciplina . O sim ples e n u n c ia d o desse m o te , a tra e n te , a in d a q u e im p reciso , foi expresso logo

68

História oral

Unidade IV- Estatuto da história oral

69

n o in sta n te d a requalificação d o uso te stem u n h a i d a d o d epois d a S egunda

e ru d ito e seus im p a c to s na so ciedade em se n tid o coletivo. A experiência

G u e rra M u n d ial, delegava à história oral, ao m esm o te m p o , u m a co ndição

pessoal e de g ru p o s g anhava d im e n sã o explicativa d o papel d o in d iv íd u o

in certa, m as d e relevância. O in d e fin id o

no m eio existencial, na m e d id a em q u e colocava em xeque a exclusividade

“e m m e io ” a dois polos ex trem o s (“ferra­

d a c u ltu ra le tra d a q u e, p o r séculos d e a c ú m u lo , causava fru stração d ia n ­

m e n ta ” e "disciplin a”) su g eria o d e b a te

te das c o n tra d iç õ e s expressadas p o r g uerras, m isérias, d o res e im p a c to s

so b re o lu g a r d o v alor d o te ste m u n h a i

negativos nas realidades sentidas. O u v ir as versões de p ro ta g o n ista s, além

c o n fe rid o p o r en trev istas q u e g an h av am

d o apelo c a tá rtic o e p o p u la r d e id en tificação , fu n c io n a v a c o m o u m a

o g o sto p o p u la r d e sa fia n d o a v a lid a d e

p rática d ia g n o stica d ig n a de registro e de alcance n a fo rm ação d a o p in iã o

socioexplicativa das “ciências”.

pública. Pode-se, pois, dizer q u e a p o p u la riz a çã o d o uso d e entrevistas

Existem grupos que insistem em tratar a história oral como secularmente eram aceitas as entrevistas, sem preocupa­ ções expressivas sobre sua formulação ou inscrição em um projeto e seu uso posterior. Para esses, a história oral não precisa ser testada enquanto uma práti­ ca regular com critérios discutidos sobre as soluções de elaboração documental de seu uso e arquivamento. Nessas situações a história oral seria apenas um expediente que pouco diferia de outros meios de abordagem de uma temática. A consequência do uso de entrevistas nesses casos não chega sequer a preocupar os usuários, posto ser detalhe informativo, complementar, "presentificador" e até dispensável.

A o m e sm o te m p o e m q u e a o p in iã o p ú b lic a se c o m o v ia c o m h is tó ria s d e

foi há u m te m p o u m a a lte rn a tiv a re v o lu c io n á ria d e in clu são social e desafio acad êm ico .

pessoas c o m u n s o u d e notáveis, c o m a

A marca pública dada às histórias que muitas vezes eram transmitidas

prática de narrações q u e se m u ltiplicavam

por rádio fugia do dom ínio intelectual universitário, que, assustado a

g e o m e tric a m e n te pelos m eios de d iv u l­

partir dessa constatação, clamaria por definições epistemológicas para

gação, p rin c ip a lm e n te pelo rád io , o u tro seto r exercitava-se c o m o lócus

acolher como seu aquele procedimento. Ao mesmo tempo, dava-se o pa­

d e p o sitá rio d e tais registros: os arquivos. Irro m p ia -se e n tã o u m c a m in h o

radoxo da afinidade testemunhai e o distanciamento na qualificação da

desafiador, de re sp o n sab ilid ad es das in stitu iç õ e s an tes ap en as d estin ad as

operação. O que mecanicamente passava a ser forma de atuação popular,

a g u a rd a r d o c u m e n to s raros o u con sag rad o s. S om avam -se, assim , fatos

as entrevistas, eram vistas como recursos a serem caracterizados pelos

correlatos à o p in iã o pública, a d o c u m e n taç ã o de experiências e a dim en são

intelectuais. A chamada cultura de massa se impunha e como realidade

exigida d e e n tid a d e s g uardiãs desses registros. C o m isso explicava-se a

óbvia exigia consideração. Abriam-se, pois, abismos que polarizavam

a b e rtu ra d o v a n g u ard ista O ralH istory Research Office d a U n iv e rsid ad e de

extremos: em uma ponta ocorria o apelo da inexorável vinculação do

C o lu m b ia , e m N o v a York, q u e cruzava d uas experiências p rin cip ais: os

testemunho com a prática da vida e, na outra, a caracterização de uma

p ró p rio s p ro je to s, g ra v a n d o e x p e rim e n to s d a elite in te le c tu al, e a a tiv i­

racionalidade que buscava vínculos entre o saber acadêmico e a sociedade.

d a d e arq u iv ística, d e g u a rd a de d o c u m e n to s d erivados d e entrevistas q u e

Na medida em que a atenção sobre o uso exclusivo ou dominante de

se a b ria m , g ra d a tiv a m e n te , p ara g ru p o s

Aforça da definição dada por Starr deve ser entendida na historiografia norteamericana derivada de pressupostos do pragmatismo. O sentido utilitário da cultura acadêmica estadunidense sempre valorizou o presente e seu im­ pacto na sociedade, a aplicação prática dos resultados de pesquisa e, assim, o testemunho de pessoas vivas.

p o p u la re s o u d e interesse a m p lo . N a p rá tic a , in s c r ita n a e x p e riê n c ia d e cid a d ão s c o m u n s, fazia-se necessário c o n h e c e r a tra je tó ria d o outro e rep en sar

Sob o calibre social, apontava-se para peculiaridades que misturavam uma intenção de registro de experiências com a necessidade de divulgação de casos que talhariam novo perfil social para a sociedade norte-americana que então renovava os modos de convívio e de divulgação.

as c o n d iç õ es d a m o d e rn a v id a coletiva.

entrevistas se ColoCOU como fator deciSIVO d a o rg an ização dos critério s de in stru ç ã o d as v ersõ es so b re fa to s, tu d o m u d o u . Pode-se dizer q u e o alvo d e te rm in a n te das tran sfo rm açõ es se d e u a p a rtir d o in sta n te em q u e as pen d ên cias sobre os critérios de

A o m e sm o te m p o os in te le c tu ais desenvolviam c a m in h o s q u e ta m b é m

elaboração d o s documentos orais se fizeram tem as específicos de estu d o s

q u e stio n a v a m o significado existencial e nele o v alor d o c o n h e c im e n to

afinados c o m novas p o te n c ialid ad e s.

70

H istória o ral

U n id a d e IV - E sta tu to da h is tó ria o ra l

8 .2 - HISTÓ RIA ORAL C O M O "TÉCNICA"

71

q u e m ereça a te n çã o n a explicitação das fo n tes gerais. C o m o técn ica, o uso das fo n tes orais confere sen tid o a cad êm ico à aplicação das entrevistas,

“Mais do que definir técnica de pesquisa, é necessário saber aplicá-la bem.” Luiz Hanns

q u e passam a ser validadas c o m o recurso de separação d a h istó ria oral p ro d u z id a n a u n iv e rsid a d e em op o sição às soluções q u e se v aliam d o uso m ais “in o c e n te m e n te o u “livre” das entrevistas. M u ita s d iscip lin as, p o r

A ssu m in d o q u e técnica é u m c o n ju n to de regras dispostas a c o n d u zir

n ão d e v o ta rem a te n çã o aos m o tiv o s c o n stitu in te s d o s d iscursos, acab am p o r a ssu m ir a h istó ria oral c o m o técnica,

os p ro c e d im e n to s de buscas de alg u m a certeza, o q u e se objetiva q u a n d o se vale d a história oral seg u n d o essa p ro p o sta é o uso de entrevistas co m o m ecanism o de operação capaz de guiar a pesquisa no cam in h o de resultados p rem ed itad o s. Pela definição de técnica co m o form a de aferir c o n se q u ê n ­ cias explicativas de propostas iniciais deu-se a “cientifização” da prática

Academicamente, o diálogo promovido pelo uso de diferentes fontes quase sempre se vale da história oral como recurso complementar de afirmações conseguidas a partir de vários meios. Nesses casos o caráter dialógico das fontes orais é valorizado.

c o m o fo rm a d e realçá-las sem , c o n tu d o , g a ra n tir-lh e p o sto d ire to r d e c o n d u ta s. N ã o são p o u c o s os q u e in d is c rim in a ­ d a m e n te , n a academ ia, se valem de e n tre ­

dos oralistas. Irro m p ia-se assim a operação acadêm ica d o uso d a história

vistas s u p o n d o estar fazendo h istó ria oral,

oral. C o m o técnica, c o n tu d o , deve-se su p o r q u e exista u m a d o c u m e n taç ã o

e, nesses casos, o q u e se n o ta é o uso té c n ico das gravações, q u e passam a

paralela, escrita o u iconográfica, e q u e as entrevistas en tra ria m co m o m ais

ser c o n sid erad as c o m o fo n tes o u d o c u m e n to s orais. C o m o técn ica, pois

u m apên d ice form alizado, m an eira precisa de diálogo de fontes, recurso

as en trev istas p o d e m c o n fu n d ir os p ro c e d im e n to s d a ap licação d a “letra

adicional q u e extrapolaria o uso in d efin id o o u e x e m p lific a d o r- a in d a q u e

viva”, textos q u e h ip o te tic a m e n te a ssu m e m essa fu n ç ã o m e sm o n ão sen ­

destacado. Sob essa co n d ição , as entrevistas c o m p o ria m u m sen tid o m ais

d o h istó ria oral. M ais u m a co n clu sã o so b re o uso das en trev istas c o m o

resoluto e n tre as fontes e teriam suas aplicações d e te rm in a d as claram ente,

técnica: elas n ão são apenas exem plos, pois g a n h a m c o n d iç ão privilegiada

p o rta n to m ais q u e sim ples “fe rra m e n ta ” para c o m p ro v a r o a n d a m e n to

de fo rm u la ç ã o de d iálogos e n tre o u tra s fontes.

de algo desejado OU pressuposto. C o m o técnica pressupõe análise, as im plicações d e seu uso devem articu lar o processo de cap taç ã o das entrevistas e sua inscrição n o processo analítico. M as as entrevistas seriam algo a m ais. O o b je to central, nesse caso, seria a do c u m e n taç ã o cartorial, escri­

As entrevistas no caso do uso da história oral como técnica seriam dependentes da documentação central e com ela deveriam manter vínculos calibrados, medidos, direcionados para o auxílio probatório de uma hipótese indicada aprioristicamente. É importante reco­ nhecer que os pesos dados aos testemu­ nhos orais coletados ou usados seriam, nesse caso, relativos em função da docu­ mentação central seriada de maneira a sugerir a validade das entrevistas.

8.3 - HISTÓ RIA ORAL C O M O "M É T O D O " “A história oral é vista como um método particular, mas não exclusivamente isso, pois também é considerada um meio de estabelecer relações de maior qualidade e profundidade com as pessoas entrevistadas. Jorge Eduardo Aceves Lozano

ta, h istoriográfica, estatística o u m esm o im agética e não as entrevistas q u e integ rariam a seriação c o m o elem en to d istin to pela sua originalidade, m as não exclusivo o u gerador de diálogos previstos desde o projeto. O uso d a h istó ria oral c o m o técnica, n o e n ta n to , na m e d id a em q u e é d a d o alg u m d e sta q u e às entrevistas, retraça seu prestíg io fazendo co m

M u ito m ais d o q u e técn ica, m é to d o é u m recurso q u e in d ic a u m p ro c e d im e n to o rg a n iz ad o e rígido d e investigação, capaz d e g a ra n tir a o b te n ç ã o de resu ltad o s válidos p ara p ro p o sta s d e se n h a d as desde a fo r­ m u la ç ão de u m p ro je to . E n q u a n to m é to d o , os p ro c e d im e n to s devem in d ic a r c a m in h o s específicos, d e te rm in a n te s, p ara a o b te n ç ã o d e efeitos

72

U n id a d e IV - E sta tu to da h is tó ria o ra l

H istória o ra l

73

esperados e estabelecidos a p rio ristic a m e n te em fu n ç ã o das h ip ó teses de

m eio d a ex ploração das h ip ó teses de tra b a lh o . P or c o n sid e ra r a h istó ria

tra b a lh o . D esd e D escartes, a n o ção d e m é to d o tem im plicações m etafísi­

oral m e to d o lo g ic a m e n te usada c o m o a solução m ais a cab ad a d e p rá tic a

cas e é m u ito m ais au ste ra e d e te rm in a n te d a c o n d u ç ã o d o s tra b a lh o s d o

científica, esta m erece ser d e v id a m e n te fu n d a m e n ta d a e m seus d etalh es

q u e a técnica. U sadas m e to d o lo g ic a m e n te , as en trev istas im p õ e m u m a

c o n s titu in te s e finais.

h ie ra rq u ia n a q u al fig u ram c o m o o rg a n iz ad o ras d o s dem ais a n d a m e n to s d o s recursos usados. C o m o m é to d o , a h istó ria oral se erg u e se g u n d o a ltern ativ as q u e p ri­

8 .4 - HISTÓ RIA ORAL C O M O "F O R M A DE SABER"

vilegiam as entrevistas c o m o a te n çã o essencial d o s estu d o s. T rata-se de

“D o conhecimento científico ao popular, o saber é sempre manifestação da inteligência.” Christoph Wulf

centralizar os te stem u n h o s co m o p o n to fu n d a m e n ta l, privilegiado, básico, das análises. H is tó ria oral c o m o m e to d o lo g ia im p lica fo rm u la r as e n tre ­ Para serem garantidas enquanto méto­ do, as entrevistas precisam ser destaca­ das como o nervo da pesquisa e sobre elas os resultados são efetivados. Os eventuais diálogos documentais com­ plementares devem manter os olhos nos temas emanados das entrevistas.

c o n h e c im e n to d a e x p eriên cia alheia, q u e se o rg a n iz a c o m n ítid a vocação

d o lo g ic a m e n te , os oralistas c e n tra m sua

os e n q u a d r a m e n to s té c n ic o s, m e to d o ló g ic o s o u c ie n tífic o s em geral, a

a te n ç ã o , d esd e o e sta b e le cim en to d o p ro je to , nos c rité rio s d e recolha das

a q u isiç ã o d e e n tre v ista s c o m o m a n e ira d e reg istrar, c o n ta r o u n a rra r,

en trev istas, n o seu p ro c e ssam en to , n a passagem d o oral p ara o escrito e

e n te n d e r o u c o n sid e ra r casos se a p ro x im a m ais das estratég ias ficcionais

n o s resu ltad o s an alítico s. C o m u m corpus d o c u m e n ta l estab elecid o em

d o q u e p ro p r ia m e n te ao re g istro m e tó d ic o ex ig id o p elos d e m a is p ro ­

c im a das entrevistas, pensa-se nas análises q u e d e m a n d a m diálogos co m

c e d im e n to s a ca d ê m ic o s. Fala-se d e a p ro x im a ç ã o e n ã o d e fusão, p o is o

o u tro s d o c u m e n to s.

re fe re n te em h is tó ria oral n ã o se c o n fu n d e c o m a in v e n ç ão livre. Isso faz

vistas c o m o u m e p ic e n tro d a pesquisa. R ido giraria em to rn o delas, q u e atu ariam c o m o força c e n trífu g a das p reo cu p açõ es. Para a h istó ria oral ser valorizada m e to ­

C o m o fo rm a d e saber, a h is tó ria o ra l é u m re c u rso a te n to ao uso d o

p a ra a essência d e tra je tó ria s h u m a n a s . M u ito m e n o s p re o c u p a d a co m

O c a rá te r c ien tífico d o uso m e to d o ló g ic o das entrevistas, c o n tu d o ,

d a h istó ria oral u m recurso a c o lh id o p o r g ru p o s q u e in d e p e n d e n te m e n te

lim ita d esco b ertas e m u d a n ç a s d e ru m o q u e , e m geral, são d efinidas

d e p recisões c o n c e itu a is o u té c n ica s b u s c a m fazer d a h is tó ria o ra l u m a

desde a e lab o ração d o p ro je to , n o ite m relativo às h ip ó teses de tra b a lh o .

espécie d e c u lto d o q u e c h a m a m e q u iv o c a d a m e n te “p re serv a ç ã o ” o u

P rin c ip a lm e n te n a acad em ia, m u ito s d o s q u e p ra tic a m h istó ria oral a

“re sg a te d a m e m ó r ia ” . N a v e rd a d e , a

ju stificam c o m o m é to d o o u “m e to d o lo g ia ”. R eclam a-se, c o n tu d o , de

expressão “p re serv a ç ã o ” o u “resgate da

Alguns acham que usada metodoiogicamente a história oral é uma camisa de força capaz de limitar as surpresas que, afinal, decorrem do uso de "docu­ mentos vivos".

m elh o res especificações d e sua aplicação

m e m ó ria ” deve ser su p e ra d a pela p rá tic a

Deve ficar claro que a tipificação de trabalhos em história oral como forma de saber implica considerar, além da ra­ cionalidade e da lógica, a estética como guia. Não se fala, pois, em saber como manifestação de espontaneidades ou do conhecimento pelo conhecimento. Mas não se dispensa o prazer da captação das histórias.

e n q u a n to tal, p o is n ã o b a sta a p lic a r a

d a b u sc a d e c o m p re e n s ã o d e situ a çõ e s

p alav ra p a ra sig n ificar sua o p eração . A

q u e tê m m ais a ver c o m a fo rm u la ç ã o de

p rá tic a d a h istó ria oral c o m o “m e to d o ­

reg istro s d o q u e c o m a m a n u te n ç ã o das

logia” re q u e r fu n d a m e n ta ç ã o a p rim o ra d a das soluções, q u e devem c o n te r

re m in isc ê n c ia s, q u e seriam m a n e ira s d e

desde os passos iniciais da pesquisa —d a fo rm a de aquisição das entrevistas

c o n g e la r o u “co isific ar” o p a ssa d o a p e n a s s u g e rin d o le itu ra s nostálg icas

- a té seu uso na defesa d e u m a tese o u solução d e u m “p ro b le m a ” p o r

das ex p eriên c ia s.

74

H istória o ra l

U nid a d e IV - E sta tu to da h is tó ria o ra l

75

M e sm o in d e p e n d e n te d o s crivos d a técn ica o u d a m e to d o lo g ia , e n ­

E m história oral, o saber estabelece u m a afinidade de reconhecim ento

q u a n to fo rm a d e saber, a h istó ria oral deve s u p o r m an eiras planejadas

das trajetórias narradas co m o se elas dialogassem com o sentido do ser no

d e a q u isição e uso d e en trev istas so b re fe n ô m e n o s, situações, fatos e

m u n d o . C o m o saber, as tram as decorrem sem pre de histórias “inteiras” que

experiências c o n sid e ra d o s relevantes p o r alg u m m o tiv o . O m e lh o r jei­

brigam com os fracionam entos sem pre arbitrários. Esse tipo de procedim ento

to d e co n h ecer, e n tã o , re q u e r q u e se d istin g a o saber p u ro o u n a tu ra l,

tem acarretado à história oral paralelism os e até confusões com a Literatura.

e sp o n tâ n e o o u in stin tiv o d o q u e filosoficam ente se c h a m a “p ru d ê n c ia ”.

N ã o são poucos os que, ao se depararem com a história oral que se ancora no

P a rtin d o -se d o p rin c íp io de q u e c o n h e c e r é u m a m a n e ira de levar ao

pressuposto d o saber, reconhecem com o ficção ou, segundo Bérgson, com o

saber, pensa-se nos dois estágios de p ro c e d im e n to p a ra tra n s fo rm a r a

“fabulação”, o u seja, ato criador de p o n to s narrativos co m u n s q u e servem

h is tó ria oral de c o n h e c im e n to o u registro, e m saber, o u seja, n o relacio­

com o catarse o u filtro agregador de experiências com uns. L ogicam ente,

n a m e n to d a experiência pessoal c o m o coletivo. N o p rim e iro caso, m u ito s

isso não tem im plicações negativas. A té pelo contrário, há q u e m julgue a

se c o m p ra z e m em p ro c e d e r ao registro o u à gravação, e n o se g u n d o há

transposição de histórias pessoais confundidas com L iteratura u m elogio.

c o m p ro m e tim e n to co m reflexões o u aspectos co nclusivos a respeito d a vivência registrada.

U m dos p o n to s altos d o re c o n h e c im e n to d a h istó ria oral c o m o saber reside n a p o ssib ilid ad e d e c o n stitu í-la c o m o u m a categ o ria à p a rte d o

P e n s a n d o q u e sa b e r é u m a to ra c io n a l, p re m e d ita d o , e q u e ta m b é m

c o n h e c im e n to c ien tífico q u e , m e d ia n te ela, passa a ser sem p re d ia g n ó s­

d e m a n d a p ro c e d im e n to s e x p líc ito s, ele p o d e ser d e fin id o c o m o fo rm a

tico. Pelo fato d e ser u m p ro c e d im e n to q u e d e m a n d a c u id a d o s estéticos,

d e e x p re ssã o e m q u e se fu n d e m o d e se jo d e re g is tra r e a d im e n s ã o

há c o rre n te s q u e a d v o g am e prezam o c o n c e ito de “b o a h istó ria c o m o

p ú b lic a d e h is tó ria s q u e m e re c e m d iv u lg a ç ã o . J u n to s , esses a sp e c to s

c o n d iç ão p a ra a existência e justificativa d o registro. A ssim , u m a “boa

d im e n s io n a m u m a e x p e r iê n c ia t r a n s m i t i d a c o m o o b je tiv o fin a l.

histó ria” se ju stificaria p o r si só, pela sin g u la rid a d e, d iferen ça d o coletivo.

“S a b e d o ria ” c o m o fo rm a d e c o n h e c im e n to d iz re s p e ito à v a lo riz a ç ã o A memória como geradora de conhe­ cimento deve ser vista como uma usina capaz de propor relatos que sirvam menos para encantar ou anestesiar lem­ branças caras e mais pelo impacto social. Não se despreza, porém, a alegria e pertinência de histórias que mereçam registros. Assim, as entrevistas devem conter registros de temas capazes de sugerir reflexões atentas ao interesse público amplo. As expressões estéticas das histórias não são desprezíveis.

d a e x p e r iê n c ia h u m a n a , d e m a n e ir a a e le v a r o s e n tid o m o ra l d a v iv ê n c ia

8.5 - HISTÓRIA ORAL C O M O "DISCIPLINA"

in d iv id u a l o u c o le tiv a . C o m o m a n e ira s u p e r io r d e r e c o n h e c im e n to d e v iv ê n ­ cias h u m a n a s , s a b e r te m m e sm o m ais

“Para pertencer a uma disciplina, uma proposição deve inscrever-se em certo horizonte teórico.” Michel Foucault

s e n tid o d o q u e o sim p le s re g is tro , e as h is tó r ia s g a n h a m s e n ti d o so c ia l e x a ­

A c o n sid e ra ç ão d a h istó ria oral c o m o d iscip lin a aca d ê m ic a é u m a

ta m e n te p o r isso. T a lv e z o q u e faça a

te n d ên cia radical professada p o r tan to s q u e levam sua prática a extrem os

h is tó r ia o ra l c o m o c o n h e c im e n to ser

p o lítico -cu ltu ral. N esse caso, a academ ia se assum iria c o m o espaço para o

u m a v e rte n te tã o p o p u la r seja o fa scín io e x e rc id o p elo s casos em geral.

debate sobre a consagração d a história oral co m o u m c am p o novo, coerente

T o d o s g o s ta m d e h is tó ria s e q u a n d o elas tra n s p a r e c e m as e v id ê n c ia s

co m os avanços p ro p o sto s pelo e n c o n tro da tecnologia eletrô n ica co m os

d a v id a to rn a m -s e a p a ix o n a n te s . H á , c o n tu d o , o risco se m p re p re s e n te

fu n d a m e n to s acadêm icos. R eco n h ecen d o -a c o m o u m recurso atual po r

d e s u p o r a n o s ta lg ia c o m o p rá tic a lo u v áv el.

c o m u n g a r o uso de tecnologias m o d ern as, de ú ltim a geração, co m funda-

76

U n id a d e IV - E sta tu to da h is tó ria o ra l

H is tó ria o ra l

77

m e n to s epistem ológicos p ró p rio s de m ilitân cia cu ltu ra l e política, há os

O q u e se coloca em questão nessa possibilidade é a oposição entre o

q u e p ro p õ e m u m e sta tu to in d e p e n d e n te para a histó ria oral, q u e deixaria

sim plism o com que têm sido tratadas as entrevistas e suas potencialidades

de ser adjetiva para ser sujeito de ações de tran sfo rm ação social.

analíticas, consideradas com o a som a de procedim entos de pesquisa. É cal­

O te m a d a tra n s fo rm a ç ã o social, nessa a lte rn a tiv a , to rn a -s e v ita l, s u ­

cada na com binação de u m desconforto causado pela inadequação às dem ais

p e ra os lim ites im p o sto s pelos d e m a is p ro c e d im e n to s, q u e se re strin g e m

form as de uso d o oral em face dos prom etedores recursos derivados dos co n ­

e m seus espaços c o n c e itu a is . P e n sa r a h is tó ria o ra l c o m o m e c a n is m o

tatos com os “d o cu m en to s vivos” que se exploram novidades dos usos dessa

d e m u d a n ç a s sociais é m ais d o q u e vê-la c o m o m e ro re c u rso fo rm al de

prática. E aí se levantam perguntas q u e vão desde as form as de aquisição de

c o n h e c im e n to . A in d a q u e m u ito s d e sp re z e m essa d im e n s ã o , aos q u e

entrevistas e registros até seus fins. Seria a aplicação das m áquinas - grava­

lu ta m p ela h is tó ria o ra l c o m o d isc ip lin a , ela c arre g a a p ro m o ç ã o das

dores, film adoras, com putadores, in tern et - elem entos capazes de explicar

tra n s fo rm a ç õ e s e m p o lític a s p ú b lic a s. Esse c a rá te r m ilita n te exige q u e

algum a m udança? O u , pelo contrário, o aparato eletrônico nada representa,

a h is tó ria o ra l a ss u m id a c o m o d is c ip lin a seja d ife re n te d a “ H is tó ria

além de u m a adequação m odernizadora das m esm as práticas que, co n tu d o ,

sem a d je tiv o s ” . S ua a sp iraç ã o “ u tó p ic a ” v isaria à in c lu sã o social e assim

teriam im plicações políticas diferentes em cada m o m e n to , chegando agora

seria, c o m o q u e r T re b lic h , u m a contra-história. As entrevistas, p o rta n to ,

a u m p o n to crítico q u e adm ite questionar sua independência? E tam b ém se

seriam a ltern ativ as valiosas p ara g ru p o s e situações n ão p ro m o to ra s de

indaga d o porquê da expressão “história oral”, em que poderia ser em pregada

d o c u m e n to s c o n v en c io n a is o u silenciadas p o r sanções c o m o censura,

sim plesm ente a palavra “entrevista” o u “d e p o im e n to ”?

in te rd iç ã o , o u o u tra m a n e ira d e sile n cia m e n to . P or lógico, esse p ro c e ­ d im e n to d a h is tó ria o ra l n ã o é a p en as “c o n tra ” a H istó ria , m as ta m b é m c o n tra as d em ais disciplinas. Seu c aráte r lib e rtá ­ rio retiraria a c o n d iç ão d e recurso auxiliar p a ra a afirm ação das “velhas” disciplinas e m eras discussões de teses. O uso de entrevistas, c o n tu d o , a p o n ta

Em termos práticos, supondo que para muitos a história oral tem se restringido à aplicação de entrevistas dialógicas, o que se nota é o uso delas enquanto "meio" e não como "fim". A redução do uso das entrevistas à condição de fonte ou documento auxiliar rebaixa a potencialidade dos textos resultantes de gravações de maneira a neutralizálos como se fosse um aposto aos outros suportes documentais.

A liada à problem ática d o conh ecim en to na contem poraneidade, algum as questões exigem respostas capazes de prom over a dinâm ica de u m a discussão q u e deve ser c o n tin u a d a , a m p la e de m o c rática p o sto c o n te r a possibilidade de crítica aos co n h ecim en to s form alizados em m oldes antigos e seus efeitos em face das funções sociais da c u ltu ra c o n te m p o râ n ea . A inda na senda dos questionam entos, vale s u p o r q u e o e n o rm e espaço ab erto às teorizações m ais tem a ver com falta de

Porque se acredita que um dos sucessos da larga aceitação da história oral se dá exatamente na quebra de sentido prático e utilitário das ciências huma­ nas em geral, pretendem-se apurar seus novos alcances, sociais e políticos.

p a ra exam es d e sua a p ro p ria ç ã o h isto -

objetivos novos propostos hoje para essa

riográfica e m d iferen tes m o m e n to s , q u e esb arra e m b lo q u e io s q u e as

m atéria d o q ue com as respostas capazes de

s u b m e te m fa ta lm e n te à c o n d iç ã o de su p o rte . V endo d e m a n e ira diversa

p e rtu rb ar a rotina d o en q u ad ram e n to das entrevistas na tradição das “velhas”

d e seus d e m a is usos - fe rra m e n ta , técn ica, m e to d o lo g ia o u sab er - , p r in ­

disciplinas. O q u e se n o ta é que, q u a n to m ais p o p u lar a história oral se torna,

c ip a lm e n te n o m eio a ca d ê m ic o se ju stificam indagações q u e p e rm ite m

mais banalizadas o u descartáveis ficam as discussões teóricas, q u e acabam se

q u e s tio n a r se n ão h á a lte rn a tiv a nova p ara o e n q u a d ra m e n to d a h istó ria

p erdendo p o r falta de alvos analíticos objetivos, valentes e bem form ulados.

o ra l. Tal in q u ie ta ç ã o , g ra d a tiv a m e n te , v em c o n q u is ta n d o seto res de

A grande responsável p o r tal situação, certam ente, é a ausência de coragem

v a n g u a rd a d a h istó ria oral q u e n ão se a c o m o d a m e m vê-la ap en as c o m o

para se colocar o problem a crucial da história oral m oderna. Seria suficiente

solução p ara cam p o s disciplinares.

pensar a história oral com o m atéria subsidiária? A H istória em sentido am plo

78

U nid a d e IV - E s ta tu to da h is tó ria o ra l

H istória o ra l

79

seria o cenário obrigatório, único ou fragm entado, da história oral? O u bem

u m a alienação, p retende-se rever a discussão tra ç an d o para a h istó ria oral

além disso, a história oral poderia se valer das dem ais disciplinas para validar

o objetivo p rim o rd ial de ser fo rm u la d o ra de a rg u m e n to s políticos.

seus objetivos, que, obrigatoriam ente, têm o endereço d o interesse público?

C u rio sa m e n te , alguns autores, alheios aos freios disciplinares, às vezes

U m dos argum entos centrais para q u e m postula a independência disci­

m esm o desprezando as bitolas qu e seguram fronteiras bem dem arcadas, aca­

plinar da história oral diz respeito à função social e prática dessa experiência

bam p o r d em o n strar o sentido da versão proposta de u m a história oral politi­

intelectual q u e teria u m a dim ensão pública im p o rtan te. Fala-se d o conheci­

cam ente atu an te. Assim situam -se os trabalhos pioneiros de Jo n a th a n G ros-

m e n to com o m ilitância, com o ação de fom ento às ações políticas decorrentes

sm an na África d o Sul, M ats G re ff na Suécia, Yara Bandeira de A taíde, A ndréa

da determ inação de certos problem as sociais. O s defensores da estatura nova,

Paula dos S antos e Suzana Lopes Salgado R ibeiro, e n tre o u tro s brasileiros.

disciplinar, da história oral consideram de fundam ental im portância o fato de

U m a le itu ra c u id a d o sa dos fu n d a m e n to s d a h istó ria oral, pois deixa

tratar de casos pouco considerados pela oficialidade das dem ais disciplinas.

e n tre v er q u e desde o in ício é a p re o c u p a ç ã o d a h istó ria o ral co m o c o m ­

S en d o verdade q u e d e m an eira in d ireta as d e m a is discip lin as p o d e ría m ta m b é m c u id a r desses p re s s u p o s to s , a d v o g a -se q u e , d e fo rm a o b jetiv a e fu n d a m e n ta l, a h is tó ria oral seria o lócus ideal p ara esse

Em tempos de "políticas afirmativas" e de inclusão social, por certo, a história oral independente teria um papel im­ portante como formuladora de postu­ lados ágeis para gerar argumentos que instruem políticas públicas capazes de mudar o s ta tu s q u o histórico.

p ro m isso social m a rc ad o pela ‘V oz dos excluídos", revelação d e aspectos desconhecidos, ocultos e desviados, não expressos nos d o c u m e n to s oficiais e escritos e, s o b re tu d o , a d e n ú n c ia d o so frim e n to e x tre m o d e g ru p o s m a ltra ta d o s p o r situações variadas. T o d o s os itens in d ic a d o s n ão o c u lta m a in te n ç ã o d e gerar a titu d e s políticas in stru íd a s através d a experiência das

fó ru m e a tu ação . P o rta n to , a h istó ria oral se c o n fig u ra ria c o m o u m te r­

pessoas q u e viveram processos repressivos o u de exclusão social. E m face

ritó rio discursivo e p o lítico q u e d a ria se n tid o aos deb ates, reivindicações,

dessa c o n sta ta ç ão , é de se p e rg u n ta r d o s fu n d a m e n to s d a H is tó ria em se

e p rá tic a s a tin e n te s à tra n sfo rm a ç ã o social. P o rém , n ã o seria u m recurso

a p ro p ria r c o m exclusivism o a u to ritá rio d o processo geral d a o ralid ad e.

q u a lq u e r, pois as c o n sid eraçõ es m n e m ô n ic a s e a c o n stitu iç ã o de elos

A lguns im p o rta n te s au to re s já se m a n ife sta ra m , até d e m a n e ira exage-

id e n titá rio s p o d e ría m realçar a reclam ad a “co n sc iê n cia d e classe” d e q u e

ra d a m e n te e lo q u e n te , c o n tra a p re te n sã o d e so e rg u im e n to d a h istó ria

fala E. P. T h o m p s o n .

oral à c o n d iç ã o d e d iscip lin a. Josep F o n ta n a estabeleceu, aliás, q u e isso

O s pro jeto s de ação afirm ativa seriam os grandes beneficiários d a p ro ­ p o sta de e n c a m in h a m e n to d iscip lin ar para a h istó ria oral. C aren tes de

é “u m a ab erração q u e chega ao ex trem o A definição da história oral como disciplina, sem dúvidas, implicaria a radi-

reivindicação social são pesquisas im ediatas, p o r vezes superficiais e feitas ao arrepio d o acaso. O q u e se p ro p õ e co m a m odificação d o e sta tu to da

,

,.

.

in d e p e n d e n te , o q u e é sim ples técn ica d e

fu n d am en tação no exercício da vida, quase sem pre, o qu e preside os esforços de in fo rm ação das atitu d es políticas q u e a lim e n ta m os projetos sociais de

.

q u a n d o p re te n d e co n v erter em disciplinas

pós-moderna impõe como desafio. Ademais, o entrosamento da eletrônica como fórmula facilitadora de produção e divulgação do conhecimento seria a celebração da dinâmica acadêmica.

tra b a lh o ”, e c o n tin u a a d je tiv a n d o a histó ’

ria oral de “fe rra m e n ta q u e só te m sen tid o .

.

.

,

q u a n d o se coloca a serviço d e u m a in te r­

h istó ria oral é q u e ela se to rn e u m lócus p e rm a n e n te , eq u ilib rad o e bem

p re ta çã o h istó ric a g lo b a l”. C o m o se p e r­

c o n stitu íd o para a form ulação de propostas q u e se assentam n o presente

cebe, m e sm o h isto ria d o re s progressistas, d ia n te d a h istó ria oral, m a n tê m

c o m o resposta de u m passado q u e não levou em c o n ta a inclusão social

p o stu ras c o nservadoras, c o rro b o ra n d o p ara q u e a m a té ria seja m esm o u m

de g ru p o s e p o u r cause os fu n d a m e n to s da dem ocracia. Sem cair n o sim -

m ero pretexto para o uso com o ferram enta, técnica ou m etodologia em geral.

p lism o de identificar nas disciplinas tradicionais e na prática intelectual

A - T E X T O S P A R A D IÁ L O G O S

a - O u tro s conceitos e defin ições b - Tipos de história oral c - Balanços e paralelos

a -

O U T R O S C O N C E IT O S E D E F IN IÇ Õ E S

“A história oral é um procedim ento m etodológico que busca, pela construção de fontes e docu m entos, registrar, através de narrativas induzidas e estimuladas, testem unhos, versões e interpretações sobre a História em suas m últiplas dimensões: factuais, tem po­ rais, espaciais, conflituosas, consensuais. N ã o é, p o r t a n t o , u m c o m p a r t i m e n t o d a h is tó r i a v i v i d a , m a s , s i m , o r e g is tr o d e d e p o i m e n t o s s o b r e essa h i s t ó r i a v i v i d a . "

(grifo da autora)

(Lucilia de A lm eida N eves D elgad o, em H i s t ó r i a o r a l: m e m ó r i a , t e m p o , id e n t i d a d e s , Belo H orizon te, s/n , 2 0 0 6 , pp. 15—6)

“A história oral p ode ser concebida c o m o ‘um a corrente disciplinar’ cujo cam p o de influência e ação não se restringe a um só país ou a um con tin en te, já que atualm ente é um a prática de investigação internacional que construiu as próprias redes e cam pos de inter-relação. M esm o assim , não se identifica com um a disciplina particular; vale dizer com a H istória, já que dela participam diversidades de estilos e procedências profissionais; a interdisciplinaridade é um de seus elem en tos característicos.” (Jorge Eduardo Aceves Lozano, “La história oral contem porânea um a mirada plural”, em H i s t o r i a o r a l: e n s a y o s y a a p o r t e s d e i n v e s tig a c ió n , M éxico, Ciesas, 2 0 0 0 , p. 10)

“A história oral foi criada em 1948 co m o um a técnica m oderna de docum entação histórica, q uando Allan N evin s, historiador da U niversidade de C olú m b ia, co m eço u a gravar as m em órias de personalidades im portantes da história norte-am ericana.” (“Oral H istory A ssociation h i s t ó r i a o r a l,

eua”,

citado por Paul T h o m p so n , em A v o z d o p a s s a d o :

R io de Janeiro, Paz e Terra, 1 9 9 2 , p. 89.)

82

H istória o ra l

A - Textos para d iá lo g o s

83

“E n ten dem os a H istória Oral co m o abordagem m etodológica em que há um en vol­

prefere as visões subjetivas e os percursos individuais, num a perspectiva decididam ente

v im en to do pesquisador com o objeto de estudo, procurando desvendá-lo a partir

‘m icro-histórica’.”

dos relatos orais dos sujeitos en volvidos, em com plem entaridade co m o uso de outras fontes escritas, iconográficas, materiais etc.”

na A m ad o (orgs.), U so s e a b u s o s d a h i s t ó r i a o r a l , R io de Janeiro. Fundação G etú lio

(Zeila B. F. Dem artini; Alice Beatriz S. G . Lang; M . Christina S. S. C am pos, H i s t ó r i a o r a l e p e s q u i s a s o c io ló g ic a : a e x p e r iê n c ia d o

(E tien n e F rançois, “A fecun did ade da história oral” em M arieta M . Ferreira; JanaiVargas, 1 9 9 6 , p. 4.)

CERU, São Paulo, Humanitas/FFLCH-usp, 1998.) “A história oral é um a história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida para

“A o estabelecer um a nova relação entre pesquisadores e os sujeitos, a história oral

dentro da própria história e isso alarga seu cam po de ação. A dm ite heróis vindos não só

pressupõe a realização de relações sim étricas e de colaboração entre eles, favorecendo

dentre os líderes, mas dentre a maioria desconhecida d o povo. Estim ula a professores

um d ep oim en to mais espon tân eo e interativo, construído dentro de um a relação

e alunos a se tornarem com panheiros de trabalho. Leva a história para dentro da

em pática que estim ula a reflexão, a afetividade e a m em ória.”

com u nid ade e extrai a história de dentro da com u nid ade. Ela ajuda os m enos favore­

(Yara D u lce Bandeira de A taíde, “H istória oral e construção da história de vida” em

cidos, especialm ente os idosos, a conquistarem dignidade e autoconfiança. Propicia

T e m p o s, n a r r a t i v a s e f ic ç õ e s ,

Salvador,

eduneb,

2 0 0 6 , p. 3 1 3 .)

o con tato —e a com preensão - entre classes sociais e entre gerações. E para cada um dos historiadores e outros que partilhem das m esm as intenções, ela p ode dar um sen­

“M ais d o que um a ferramenta, e m enos que um a d isciplina.”

tim ento de pertencer a determ inado lugar e a determ inada época. Em sum a, contribui para form ar seres h um anos mais com p letos. Paralelamente, a história oral propõe um

(Louiss Starr, citado por Trebitsch em M arieta M . Ferreira, H i s t ó r i a o r a l e m u l t i d i s c i p lin a r id a d e ,

R io de Janeiro,

cpdoc

, 1 994, p. 19.)

desafio aos m itos consagrados da história, ao juízo autoritário inerente à sua tradição. E oferece os m eios para um a transform ação radical n o sentid o social da história.” (Paul T h o m p so n , A v o z d o p a s s a d o : h is tó r i a o r a l , R io de Janeiro, Paz e Terra, 1992, p. 44)

“Por história oral se en ten d e o trabalho de pesquisa q ue u tiliza fontes orais em diferentes m odalidad es, in d ep en d en tem en te da área de c o n h ecim e n to na qual essa m eto d o lo g ia é u tilizad a.” (Estatuto da A ssociação Brasileira de H istória Oral, fundada em 1 9 9 4 , A r t .l2, par. Ia; em R e v i s t a d e H i s t ó r i a O r a l , n .l , 1 998, p. 14.)

“D izer que a história oral se ocupa sobretudo da subjetividade é um a obviedade. O cup a-se tam bém das recordações, da assim ilação pessoal das experiências vividas, do com p ortam en to individual e das explicações na história da responsabilidade pessoal

“H istória oral tem co m o principal finalidade criar fontes históricas.” (Sônia Maria de Freitas, H i s t ó r i a o r a l: p o s s i b i l i d a d e s e p r o c e d i m e n t o s , São Paulo, H um anitas, 2 0 0 2 , p. 19.)

“Posto sim p lesm en te, história oral coleta m em órias contadas e com entários pessoais de significado histórico feito por m eio de entrevistas.” (D o n a ld A R itche, D o i n g o r a l h is to r y , N e w York, Twayne Publichers, 1 994, p. 1.)

nos processos históricos e de sua interpretação, e tam bém das construções biográficas e das biografias.” (Alexander V on Plat, “C rim enes de guerra y silêncios: la história oral en la h istorio­ grafia A lem anha” em H i s t o r i a A n t r o p o l o g i a y F u e n te s O r a le s , n. 2 0 , ano 1 9 8 8 , p. 7.)

“A m etod ologia de história oral é bastante adequada para o estudo da história de m em órias, isto é, de representações d o passado.” (Verena A lberti, O u v i r c o n ta r : te x to s e m h i s t ó r i a o r a l, R io de Janeiro, Fundação G etú lio Vargas, 2 0 0 4 , p. 2 7 .)

“A história oral [...] seria inovadora por suas abordagens, que dão preferência a um a ‘história vista de baixo’ ( G e s c h ic h te v o n u n te n , G e n s c h ic h te v o n in n e r i) , atenta mais às maneiras de ver e de sentir, e que às estruturas objetivas’ e às determ inações coletivas

84

A - Textos para d iá lo g o s

H is tó ria o ra l

85

“O trabalho com a história oral consiste na gravação de entrevistas de caráter histórico

incluir-se na história d o tem p o presente, e se ela serve para designar a parte pelo todo,

e d ocu m ental com atores e /o u testem unhas de acon tecim entos, conjunturas, m ovi­

a expressão deve ser abandonada em prol da história feita co m testem unhas.”

m en tos, instituições e m odos de vida da história con tem porânea.”

(D aniele V oldm an, “D efinições e usos” em M arieta M . Ferreira; Janaina A m ado (orgs.),

(Verena Alberti, O u v i r c o n ta r : te x to s e m h i s t ó r i a o r a l , R io d e Janeiro, Fundação G etúlio

U so s e a b u s o s d a h i s t ó r i a o r a l ,

R io de Janeiro, Fundação G etú lio Vargas, 1 9 9 6 , p. 3 4 .)

Vargas, 2 0 0 4 , p. 77 .) b - T IP O S D E H IS T Ó R IA O R A L

“A história oral que tem se desenrolado nas últim as duas décadas deste século (xx), tem nos oferecido orientação e proporcionado m eios para obter um conjunto de propósitos, com o buscar um m elhor con h ecim en to da história e sociedade contem porânea e poder contribuir para a m odificação de um a prática científica frequentem ente desligada de seu en torn o e dos sujeitos sociais com que interage.”

A primeira definição teórica requerida referiu-se à opção, mas tam bém à definição entre um a história oral tem ática o u pelo trabalho co m histórias de vida. N o entanto, há con ven iência de cada um a para o m eu trabalho. Fazer a op ção por história oral tem ática contem plaria o que estava p rop ond o inicialm ente em m eu projeto, isto é, utilizar as entrevistas co m o fontes voltadas para a descrição das atividades fem ininas nas

(Jorge Eduardo Aceves Lozano, H i s t o r i a o r a l: e n s a y o s y a p o r te s d e i n v e s t i g a c i ó n , M éxico,

escolas de sam ba paulistanas, bem co m o as dem ais atividades exercidas pelas mulheres.

C iesas, 1996, p. 9.)

Seria um cam in h o coerente, pois pensava com binar esses dados com d o cu m en to s de outra natureza.

“H á, segun do m e parece, um con sen so em que a história oral é um trabalho de

A história oral de vida, no en tanto, co lo co u -se co m o um a possibilidade de superar

pesquisa, que tem por base um projeto e que se baseia em fontes orais, coletadas em

a mera aquisição de dados em favor da possibilidade de um a visão mais subjetiva das

situação de entrevista.”

experiências dos depoentes. N o caso da m inha pesquisa, a utilização dessa m etodologia

(A lice Beatriz da Silva G ordo Lang, “H istória oral: m uitas dúvidas, poucas certezas e

contribuiu para am pliar o alcance dos objetivos iniciais de registrar as vozes fem ininas

um a proposta” em José Carlos Sebe B om M eih y (org.), ( R e ) I n t r o d u z i n d o h i s t ó r i a o r a l

através da con stituição de d o cu m en to s... (5 2 /5 3 )

n o B r a s il,

São Paulo, Xam ã, 1 996, p. 34 .)

A op ção pela história oral de vidas en ca m in h o u -m e para o passo seguinte que foi delim itar o seu uso na pesquisa. O trabalho con d u ziu -m e a reflexões sobre os lim ites

“D iria que é antes um espaço de con tato e influências interdisciplinares; sociais, em escalas e níveis locais e regionais; com ênfase nos fen ôm en os e eventos que perm itam , através da oralidade, oferecer interpretações qualitativas de processos histórico-sociais. Para isso, con ta com m étodos e técnicas precisas, em que a con stituição de fontes e arquivos orais desem penha um papel im portante. D essa form a, a história oral, ao se interessar pela oralidade, procura destacar e centrar sua análise na v i s ã o e v e r s ã o que em anam do interior e do mais profundo da experiência dos atores sociais.” (Jorge Eduardo Aceves Lozano, “Prática e estilos de pesquisa na história oral co n tem ­ porânea” em M arieta M . Ferreira; Janaina A m ado (orgs.), U so s e a b u s o s d a h i s t ó r i a o r a l,

R io de Janeiro, Fundação G etú lio Vargas, 1 9 9 6 , p. 16.)

entre as experiências individuais e coletivas, o que se revestiu em um dos m eus prin­ cipais desafios teóricos. Em bora não houvesse planejado trabalhar co m um grupo de pessoas previam ente d efinido, não foi difícil constatar após as primeiras entrevistas a existência de um a com u nid ade na experiência vivida: a etnia, as origens das famílias, a con d ição fem inina, o trabalho d om éstico, a rede de am izades, o parentesco, o com padrio etc. circunscreviam os lim ites de um a coletividade. A op çã o pela história oral d e vida en ca m in h o u -m e para o registro de relato integral e singular, organizado de acordo com o narrador, no qual em ergem fatos relativos à co lôn ia e à rede das quais fazem parte, mas tam bém situações pessoais. O recon hecim ento de p ontos com u n s que perpassam todas as experiências não garante que as percepções dos m esm os sejam idênticas. Para W alter B enjam in, o narrador m antém em si aspectos que, em bora desvalorizados nas sociedades capitalistas e in ­

“N ã o voltem os à expressão ‘história oral’. Ela se tornou inadequada e só deveria ser

dustriais, são fundam entais para a troca de experiências. Ele utiliza a sua capacidade

em pregada a títu lo histórico, para qualificar o período historiográfico dos anos 1950

de narrar e lembrar, capacidade ilim itada, que p ode se “materializar através da fala,

aos 1 980. [...] Portanto, se a história oral é entendida co m o um m éto d o , ela deve

diferencialm ente a cada m o m en to . Q u a n d o Benjam in situa a narrativa enquanto

86

A - Textos para d iá lo g o s

H istória o ra l

processo de troca de experiência, recoloca uma nova postura para os pesquisadores em história oral. (54/55) (Fragm ento da dissertação de mestrado de Eloiza Maria N eves Silva, H i s t ó r i a s d e v i d a s d e m u lh e r e s n e g ra s: e s tu d o e l a b o r a d o a p a r t i r d a s esco la s d e s a m b a p a u l i s t a n a s ,

n o Programa de Pós-G raduação em H istória Social da

usp,

apresentada

2 0 0 2 , pp. 5 2 -5 .)

87

procedim entos de trabalho, form ular as perguntas e suscitar questões, mas não pode resolvê-las - isso cabe ao cam p o teórico das disciplinas canônicas. O u tro im portante balanço é o realizado por A ndré Gattaz, no artigo “M eio século de história oral” (1 9 9 8 ). N esse artigo Gattaz apresenta as várias maneiras de se fazer história oral classificadas em seis “tendências” o u “escolas” que ele ch am ou de história das elites; história oral historicista, história dos vencidos; gente ordinária, história oral m etalinguística e outras tendências. Essa classificação não segue os critérios historio-

c -

B A LA N Ç O S E PARALELOS

gráficos, nem cronológicos, nem geográficos. M as baseia-se n o tipo de assu nto/tem a/

D urante a gestação dessa m oderna história oral alguns balanços im portantes foram

objeto a ser estudado, variando en orm em en te os usos da história oral e seu s ta t u s . Para

feitos. D en tre eles escolhem os três com critérios d istintos e que percebem a história

Gattaz, na história das elites estão os grupos com vocação ao registro de experiência de

oral de maneira diferente, em bora em alguns m om entos sejam com plem entares, dando

pessoas “significantes” da sociedade, da política, entrevistando h om ens representativos

um panoram a da diversidade encontrada n o “fazer” história oral no Brasil.

de um a época e um setor social. N a tendência historicista estão aqueles que acreditam

Em ‘H istória Oral: m uitas dúvidas, poucas certezas e um a proposta’ (1 9 9 6 ) a

que através das fontes orais p ode-se “recuperar” fatos históricos do passado de um bair­

professora A lice Beatriz da Silva G ordo Lang, discute basicam ente a diferença entre o

ro, de um a cidade, de um a instituição, de um personagem , de um processo histórico.

trabalho co m fontes orais e história oral, através de um a proposta de conceituação e a

O s grupos que veem na história oral a possibilidade de “resgatar” a história dos

apresentação de uso das entrevistas a partir da sociologia. N esse texto fica claro que o

m ovim en tos sociais ou p olíticos, que foram silenciados, que não possuem registro

sim ples uso da entrevista não configura história oral e que o projeto de pesquisa on d e

escrito, o u que tiveram suas histórias distorcidas pela visão da elite, foram alocados

se deve especificar o uso de entrevista é fundam ental, bem c o m o os objetivos da pes­

na tendência história dos ven cidos. Paralelo aos historiadores dos ven cidos, estão

quisa, que não devem ser pautados “no interesse em com provar fatos, em acrescentar

aqueles que se voltaram à gen te co m u m , aos m arginalizados e que m ilitam um a his­

inform ações à docum entação existente, nem m esm o atestar a veracidade dos relatos,

tória oral política que pretende transpor os m uros acadêm icos e chegar às “lamas da

mas conhecer sua vivência e sua versão” (Lang, 1996: 3 8 ). A ideia de que a história

favela e ao con tato com o lum pesinato” (1 9 9 8 : 3 4 ), fazendo a história oral da gente

oral pressupõe um projeto e que o uso da entrevista vai além d o registro docu m ental

ordinária. N a tendência história oral m etalinguística encontram -se os pesquisadores

é p o n to pacífico entre os pesquisadores que pensam a história oral co m o um co n h e­

que estão mais preocupados com o d ep o im en to oral em si, do que co m a inform ação

cim en to que vai além da técnica de captação de entrevistas.

neles con tidos. Para esse grupo, im porta a forma, a m aneira co m o foi dita e contada

N a apresentação do livro ‘U sos e abusos da história oral’ (1 9 9 6 ), as organizadoras:

a história, e consideram a narrativa co m o um a construção da m em ória. Em “outras

M arieta de M oraes Ferreira e Janaína A m ad o, apresentam um a im portante discussão

tendências” o autor co lo co u aqueles grupos preocupados co m a criação e m anutenção

sobre o s t a t u s da história oral, identificando e caracterizando três linhas de atuação em

dos arquivos orais e a vertente biográfica que busca através dos testem un hos a vida de

história oral: um a que vê a história oral co m o um a técnica, pois estaria m ais ligada ao

um personagem , geralm ente p úblico, mas não necessariam ente vinculado às elites.

trabalho com fontes orais e preocupada apenas com o registro através de entrevistas;

(Fragm ento da tese de doutorado de Fabíola H olanda, E x p e r i ê n c i a e M e m ó r i a : A p a ­

um a segunda, que pensa a história oral co m o um a disciplina au tôn om a, pois con si­

l a v r a c o n t a d a e a p a l a v r a c a n t a d a d e u m n o r d e s t in o n a A m a z ô n i a ,

dera que o fato do n úcleo da investigação gerar um a série de preocupações, co m o por

program a de Pós-G raduação em H istória Social da

exem plo, as relações entre escrita e oralidade, que traz para a cena as trajetórias in divi­ duais, reform ula a relação su jeito/objeto, elege o presente co m o perspectiva tem poral das narrativas, tem um apelo p úb lico q ue ultrapassa os m uros da academ ia que exige toda um a discussão sobre quem é quem na história oral. N esse caso, a valorização da narrativa pede, tam bém , cam inhos alternativos de interpretação. E um a terceira linha, que defende a história oral co m o um a m etodologia que pode estabelecer e ordenar

u sp,

2 0 0 6 .)

tese apresentada ao

PARTE II - C O M O P E N S A R

Existe História na história oral? Escrito é oposição ao oral? Entrevista é história oral? A história oral brasileira é d ife re n te ? Q u al o papel dos bancos de histórias em história oral? É preciso analisar as histórias?

U N ID A D E V - U M A H IS T Ó R IA P A R A A H IS T Ó R IA O R A L 9

- Trajetórias do oral e do escrito

10 - Entrevistas com o a to de fu n d a ç ã o da história oral 11 - H istória, escrita, subversão e p o d er

Depois de apresentar o fazer história oral, discutir sobre seu estatuto e suas

12 - A m o d e rn a história oral

possíveis definições, cabe retraçar um breve itinerário sobre o percurso da

13 - A gestação da m o d e rn a história oral

moderna história oral. Com a preocupação central de perceber a adequação

14 - História oral com o divisão de saber

da história oral no Brasil, buscou-se valorizar a relevância do contexto

15 - A história oral no Brasil

democrático como condição para o estabelecimento da história oral, pois afinal pergunta-se: podemos falar de uma história oral latino-americana ou brasileira, asiática ou africana? Ou a m atriz norte-americana e europeia

9

- T R A J E T Ó R IA S D O O R A L E D O

E S C R IT O

são hegemônicas? A passagem do oral para o escrito e o caráter documental da história oral são discutidos como meio de integração entre os colaboradores individualmente

“Meu interesse por história oral advém de uma esquizofrenia acadêmica que tardou muito a ser transcendida.” Michael Frisch

e o projeto como um todo. Assim, serão apresentados os fundamentos e as teorias que antecedem e norteiam a construção de um projeto de história oral.

Parte-se de três pontos complementares:

A primeira questão que se impõe d iz respeito ao “p roduto”da história oral ou

1- história oral não é meramente entrevistas;

seja, o que é considerado como documento em história oral; outra d iz respeito

2 - entrevistas não significam fenômeno novo, mas é procedimento renovado na medida de sua inscrição moderna; e

às possibilidades de sefazer história oral segundo alguns critérios operacionais. A discussão sobre a representatividade dos colaboradores é enfatizada como forma de valorização dos participantes do projeto. De igual maneira se discute o “alcance histórico ” das entrevistas de história oral.

3 - o que define entrevistas como história oral é a exigência de um projeto atento a estabelecer o uso do oral vertido para o escrito em textos que servirão para registro, arquivamento e/ou uso analítico.

Informações sobre o acompanhamento e controle do projeto de pesquisa em história oral, carta de cessão e caderno de campo finalizam esta seção.

A junção desses três pressupostos exige ponderação sobre a trajetória da matéria e do que se entende por m oderna história oral. Isso faz com que seja relevante a consideração de seus pressupostos originais. Dona

92

U n id a d e V - Uma H istória para a h is tó ria o ra l

H istória o ra l

93

d e u m passado re m o to , a p rá tic a d a e n trev ista c o n sid e ra d a h istó ria oral,

h a b ilita v a a a d m in is tra ç ã o p ú b lic a a c o le ta r h istó rias d o povo, e tais

c o m o é u sad a h oje, tem u m a a n te rio rid a d e q u e p o d e ser re c o n h ec id a

n arrativ as fo ram v ertid as d o oral p ara o escrito, se rv in d o de uso ta n to

c o m o pré-história da m oderna história oral. A h isto ric id a d e d o processo

p ara o go v ern o c o m o p ara h isto ria d o re s de te m p o s seg u in tes q u e se va­

g a ra n te força explicativa às tra n sfo rm a ç õ es, q u e , c o n tu d o , p ara m u ito s

leram desses textos c o m o d o c u m e n to s. A d in a stia dos Z h o u , se g u n d o a

n e m seq u e r são registradas. A ssim c o m o p ara a H is tó ria a escrita m arca

trad ição , possuía u m a série de sistem as e regim es sobre p ro p rie d a d e de

a fase d e tra n siç ão , d a p ré -h istó ria , n o caso d a h istó ria oral são os a p a ­

terras, leis religiosas e ju ríd ica s e até c ân o n e s m usicais regulados, e isso

relhos e le trô n ic o s q u e servem p ara d e fin ir os novos te m p o s, o u seja, da

im p lic o u tra n sfo rm a ç õ es q u e necessitavam d e c o n tro le . N esse sen tid o ,

c h a m a d a m o d e rn a h istó ria oral.

o c o n h e c im e n to de experiências d a p o p u la ç ã o fez c o m q u e fossem re­ gistradas tra je tó rias in d iv id u a is e d e g ru p o s q u e c o n v iv iam sob m esm a o rie n ta ç ã o p o lítica. N a g ra n d e m a io ria das investidas, as tais tradições

10

-

E N T R E V IS T A S C O M O A T O D E F U N D A Ç Ã O

DA

fo ram passadas o ra lm e n te e d e p o is de co m p ila d a s se c o n s titu íra m em p a trim ô n io f u n d a d o r d e várias fo rm a s h is to ric a m e n te c h a m a d a s de

H IS T Ó R IA O R A L

epopeias. D ava-se a im pressão de q u e o c o n ju n to de h istó rias so m ad o “Muito mais que encontro, entrevista é interação.” Charon J. M.

serviría p a ra explicar u m a co letiv id ad e q u e teria nos c o m p o rta m e n to s afinados u m d e stin o c o m u m . D elineava-se assim a perspectiva m ais tard e

É afirm ação corrente que a história oral é tão antiga co m o a p rópria H is­ tória, m as isso é vago. Fala-se m esm o que to d a H istó ria antes de ser escrita passou p o r etapas narrativas o u outras m anifestações da oralidade aferidas há séculos. O pilar dessa afirm ação é a certeza de q u e ta n to a B íblia c o m o o u tro s livros sagrados, b e m c o m o as m ito lo g ias fu n d a m e n ta is d a c u ltu ra o c id e n ta l e m e sm o os p o e m a s sem in ais d a a v e n tu ra h u m a n a - c o m o a Ilíada e Odisséia - tê m o rig e m na o ra lid a d e . A le n ta m e ta m o rfo se da H is tó ria n ã o nega os registros d e trad içõ es n arrativas q u e p re c ed e m a e scrita e a sistem atização d e seu có d ig o c o m o solução h e g em ô n ica . D e to d a m a n e ira , é a escrita q u e m a rc o u a ru p tu r a e n tre fases históricas. As p rim eiras investidas de registros d e relatos pessoais fo ram p ro p o stas n a C h in a h á m ais de três m il anos, q u a n d o os escribas d a d in a stia Z h o u (6 9 0 a 7 5 0 e.c.), ta m b é m c h a m a d a C h o u , C h o w , J o u o u m e sm o C h e u , p ro p u s e ra m registros escritos de n arrativ as p o p u la re s. C o m o se c o n ­ sideravam eleitos pelos céus, seus líderes te ria m po d eres d iv in o s, m as p rec isa ria m c o n h e c e r o povo q u e go v ern av am p a ra fazê-lo b e m . Isso

re in a n te de q u e as to talid ad es ex plicariam as p artes e as histórias coletadas serviam de s u p o rte p ara o e n te n d im e n to d o g ru p o e p ara seu governo. Por m eio dessas h istó rias, avaliava-se a m o ral c o m u m e so b re ela eram estabelecidas as regras d e convívio. N o m u n d o bu d ista, islâm ico, ju daico-cristão o u m esm o nas experiên­ cias d eco rren tes dos c o n ta to s c o m nativos, na Á frica o u n a A m érica, na O c ea n ia o u regiões asiáticas, fo ram narrativas orais q u e in stru íram visões dos q u e chegavam e ou v iam relatos depois o significado do prestigio dominante da

palavra escrita sobre a oral, portanto, sempre se fez como forma de se exercer poder e, desde o princípio, impôs um dilema entre os dois códigos.

vertidos p ara a escrita. A prática d o registro r

r

o

de histórias servia ta n to COITIO fo rm a de .



-

j

c o n h e c im e n to , n o rm a tiz a ç a o d o s c o m ­ p o rta m e n to s co letiv o s o u e stratég ia de

d o m in a ç ã o , n a m e d id a e m q u e revelava ta n to o alcance d o s lim ites pes­ soais e de g ru p o s além d e estabelecer p a râ m e tro s p o lítico s de convívio. O o u v ir e o registrar se aliaram c o m o m a n e ira p o lítica d e d o c u m e n ta r, e q u e m g u ard av a os relatos d e tin h a o poder. Já nos registros das socie­ dades an tig as, c o m e ç a n d o pelos egípcios, a palavra escrita era valorizada

94

H is tó ria o ra l

U n id a d e V - Uma H istória para a h is tó ria o ra l

95

em d e trim e n to d a oral, q u e se to rn a v a recurso v u lg ar e te rritó rio da

orais”, q u a n d o p e rd e m a c o n d iç ã o exclusiva d e rep etição verbal, em p a r­

c o m u n ic a ç ã o c o m u m , in fo rm a l, e d a tran sm issão d o s c o n h e c im e n to s

tic u la r q u a n d o se s u b m e te m a estu d o s, se su jeitam às d iferen tes m aneiras

ro tin e iro s e d a m e m ó ria . A lg u n s c id a d ã o s e ra m p re z ad o s so c ia lm e n te

de form alização. D e sd e q u e o oral passa

p ela c a p a c id a d e d e d e te r os “s e g re d o s” d o s có d ig o s escrito s e isso d e le ­

p ara o escrito, abala a d in â m ic a g e rm in a l

gava a eles u m a c o n d iç ã o so len e e resp eito sa. A e scrita, aliás, g a n h a v a

e se v o lta p ara o verbal n ã o se livra m ais

fo ro s e c o n d iç ã o sag rad a, n a m e d id a em q u e b a n c a v a m in stâ n c ia s de

dessa in terferên cia.

p o d e r. A tra n s m is sã o d e c o n h e c im e n to s e in fo rm a çõ e s de geração a geração força­ va o d e se n v o lv im e n to d a m e m ó ria e das p ráticas de n arrações q u e dav am sen tid o s a u m tip o d e p rá tic a de co n tar. A lo n g a viagem d a h istó ria d o s povos ágrafos, b e m c o m o a sutil, m as c o n sta n te

Ainda que na Antiguidade Platão houvesse pontificado que "o triunfo da escrita" significava "a morte da memória", foi a grafia que venceu e de­ terminou, gradativamente, um rebaixa­ mento do prestígio e do significado da palavra falada. Com a escrita formula­ va-se uma distinção entre a memória como atributo da'transmissão oral e de outra concepção de memória, dessa feita triada pela presença da escrita.

N o p rim eiro caso, em face da oralidade

Há uma oralidade primária ou primitiva e outra secundária ou derivada. Desde que tenha sido mudado o registro do oral para o escrito, mesmo em casos de retornos, a "pureza" oral não tem mais o mesmo sentido.

p rim á ria ou p r im itiv a , n o re m o to passado o u em espaços o n d e a escrita n ão exerce influências o u q u e elas sejam m ín im a s, o a p re n d iz a d o é tra n s m itid o p o r e n sin a m e n to s q u e passam de geração a geração; n o caso d a o ra lid a d e secundária ou derivada, o q u e se te m é a d e p e n d ê n c ia a b so lu ta d o s a p arelh o s m e d ia d o s p o r o u tra s form as de co m u n ic aç ã o c o m o a televisão, a m úsica gravada e o u tro s c o m p o n e n tes

in v e rsão d o s v alores d a o ra lid a d e pela

m ed iad o s pelos eletrô n ico s d o m u n d o m o d e rn o . D iscíp u lo de M cL u h an ,

escrita, teve n a Id a d e M é d ia o u tro m o m e n to de co rte. A h e g e m o n ia

O n g e stu d o u a o ra lid a d e c o m o m eio de c o m u n ic a ç ã o e seu im p a c to

d o sab er escrito pelos c h a m a d o s escribas o u copistas e sua reclusão em

na so cied ad e m o d e rn a , em p a rtic u la r n o O c id e n te . S e p a ra n d o m u ito

a m b ie n te s d ista n te s d o acesso p ú b lic o d e c re ta ra m u m a espécie d e p o la ­

c la ra m e n te a o ra lid a d e em “culturas não afetadas pela escrita” , m o s tro u

rização dos d o is códigos. R esu lta d o disso, a d ep reciação d o p restíg io d a

q u e a o ra lid a d e s e c u n d á ria é sem p re e fa ta lm e n te c o m p le m e n ta r à escrita

o ra lid a d e em d e trim e n to d a escrita, q u e g an h av a e s ta tu to d e poder. É

m o d e rn a . Isso te m a ver c o m o fu n c io n a m e n to d a m e m ó ria , q u e n o caso

sob essa égide q u e su rg ia m as p rim eiras un iv ersid ad es, te m p lo s d o saber

da o ra lid a d e p rim á ria tin h a /te m papel p re p o n d e ra n te q u e , n o se g u n d o

cod ificad o . O le tra m e n to foi se in sta la n d o nas sociedades de m a n e ira a

caso, é relativo. D e tal fo rm a está e n ra iza d o o processo d e le tra m e n to

d e te rm in a r form as privilegiadas d e ver a c u ltu ra .

nas sociedades c o n te m p o râ n e a s q u e isso explica a d ificu ld a d e q u e m u ito s

S e g u n d o W alter. J. O n g , a o ra lid a d e te m q u e ser e n te n d id a em suas variações d e cap tação n o espaço e n o te m p o . T a m b é m é im p o rta n te n o ta r

têm e m a ceitar a o ra lid a d e c o m o m an ife staç ã o respeitável, crível, e capaz de carregar lógicas diversas d a escrita.

as relações d o s dois códigos, o u seja, o q u e d o oral é v e rtid o p ara o escrito

Philippe Jo u tard é u m dos autores que reconhecem na prática de busca das

- c o m o e p o rq u e - e vice-versa. T a m b é m é relevante n o ta r a d in â m ic a

origens da m atéria história oral, fàtalm ente, um a gênese prestigiosa. A inda que

d o processo, o u seja, se algo se in icia o ra lm e n te , passa p a ra o escrito e

ele duvide d a validade disso, reconhece na G récia o esforço de en te n d im e n to

d e p o is é d ifu n d id o n o v a m e n te d e fo rm a oral p ara, e v e n tu a lm e n te , ser

dos desvios e n tre o oral e o escrito e a subm issão daquele p o r este. N u m a

o u tra vez v e rtid o p a ra o escrito. L endas, m ito s, casos folclóricos são, em

época em q u e a história oral não era bem aceita pela co m u n id a d e intelectual

geral, passíveis de situações q u e se su b m e te m a variações d e estu d o s q u e

de vários países ou culturas, autores que defendiam sua validade retraçaram o

se in ic ia m em recolhas orais, d e p o is passam p a ra o escrito e m u ita s vezes

trajeto da oralidade, para ressignificá-la, rem o n tan d o u m a genealogia firm ada

v o lta m p a ra o u tro s p ú b lic o s de m a n e ira oral. As c h am ad a s “trad içõ es

no pressuposto de q u e os prim eiros historiadores - com o H e ró d o to , o “pai

96

U n id a d e V - Uma H istória para a h is tó ria o ra l

H istória o ra l

97

da história” - estabeleceram a participação pessoal, o testem u n h o , co m o a

a te n d ê n c ia p re sen te em h istó ria oral te m á tic a, q u e b u sca m ais in fo r­

base para descrever a “verdade” ou a “realidade” d o que se via. O testem u n h o

m ação d o q u e percep ção , n o ta -se aí a se m e n te das buscas quase sem pre

passava a ser critério. D e sd o b ra m e n to d o “eu vi, ouvi, estava lá”, o relato

en cerrad as em p ro p o sta s sociologizantes q u e se valem de entrevistas. Por

oral deveria recobrar nova autoridade ao ser

valer-se ap en as d e en trev istas e observação, o caso h e ro d ia n o geraria o

escrito. Eternizava-se. Instituíam -se, assim,

q u e se c o n h ec e c o m o história oral pura.

Aristóteles contrapôs o "historiador" ao poeta, afirmando que estes poderíam pensar o mundo "como tudo podería acontecer, segundo a verossimilhança e a necessidade".

.

.

. .

os estados da narrativa: ver/ouvir/atestar; j





r

i

.

j

r

T u cíd id es p referia n ã o c o n fiar n a rne, .

.,

« r i/



depois: org an izar a rala e tra ta r d e escrever

m o n a , q u e co n sid erav a sem p re

p ara a p o sterid a d e.

p o rq u e , e m m u ito s casos, seria d e p e n -

A os “h isto ria d o re s” , p o rta n to , caberia

ralivel

Tucídides, na Antiguidade clássica, duvidava do "método" de Heródoto, achando impossível definir a "verda se m P re’ u m a re to m a d a c ro n o lo gjca m arcacla pela C onstrução h eró ica e

pu ra valoriza-se o d iscu rso c o m o fo n te peculiar; cabe c o n sid e rá -lo em

n o stálg ica d a vida.

estabelecido c o m c ritério s afins. O n e x o d a c o n s tru ç ã o d o d isc u rso oral

D

r

1

seu e q u ilíb rio c o m outra fo n te , o u d o c u m e n to c aracterístico , ig u a lm e n te lhe é típ ic o , e isso le g itim a q u e seja a p ro x im a d o , p riv ile g ia d a m e n te , de o u tr o d isc u rso q u e ta m b é m se e stab elece d a m e sm a fo rm a . É im p o r­

19

-

H IS T Ó R IA O R A L P U R A O U

ta n te re ssaltar q u e história oral p u ra n ão é análise de discurso oral, pois se

H ÍB R ID A

d istin g u e n a observação d e sua c o n stitu iç ã o e m p íric a - d e stin a d a a u m “U m a é a ‘palavra pura’,

p ro je to específico —e obedece ao c rité rio d e expressão de u m a experiência

outra a ‘palavra ob jeto’.” H e lio O itic ic a

vivencial, de u m a visão d e m u n d o . T a m b é m a e v en tu al análise d e falas vazadas so b c ritério s d a h istó ria oral n ão se c o n stitu i em com paração de

A história oral pode ser “p u ra ” o u “h íbrida" . D iz e n d o de o u tra fo rm a,

discursos. P o rq u e as possíveis análises sem p re te n d e m a a b o rd a r tem as

u m p ro je to ta n to p o d e ser sim p le sm e n te de c o n stitu iç ã o d e u m acervo -

afeitos a u m a discussão - u m a tese, p o r ex em p lo

elas n ão se p re o c u ­

b a n c o d e h istó ria o u p ro p o s ta em q u e as vozes dos n a rra d o re s se cru zam

p a m c o m a o rig in a lid a d e d a c o n stitu iç ã o das fo n tes e, assim , se lim ita m

e n tre si de m a n e ira a p ro m o v e r u m a discussão p o lifô n ica - o u , ta m b é m ,

à id en tificação d e ig u ald ad es o u diferenças.

p o d e fazer as entrevistas dialogarem co m o u tro s tipos de fontes ou d o c u ­

A h istó ria oral h íb rid a te m o u tro o b jetivo. A o relativizar a força ú n ica

m en to s. N a situação de história oralp u ra é im p o rta n te o b serv ar a variação

da expressão oral, d e m a n e ira q uase q u e n a tu ra l, exige-se a e q u ip a raç ã o

130

H is tó ria o ra l

U n id a d e VI - O e m p íric o e o te ó ric o

1 31

dos a rg u m e n to s derivados de entrevistas co m o u tro s e m an ad o s de diversas

c o n s titu íd o s os d o c u m e n to s d e riv a d o s d e e n tre v is ta s e e s ta b e le c id o s

fo n tes. N esses casos, o q u e vale m ais é a força te m á tic a q u e tira a força

os c rité rio s d e d iá lo g o s c o m o u tra s séries d o c u m e n ta is .

d a lógica d a c o n stru ç ã o d a n a rra tiv a oral.

Isoladas, as e n tre v istas n ã o falam p o r si, lo g ic a m e n te . A lin h á-las,

N o caso d a h istó ria oral p u ra , o q u e se valoriza c o m o essencial é a

c o n tu d o , é u m p ro c e d im e n to capaz d e sugerir, m ais d o q u e a c o n d u ç ã o

c o n stru ç ã o d o p e rc u rso n a rra tiv o ; n o caso d a h istó ria oral h íb rid a , vale

d o p ro je to , possíveis análises. S ozinhas, ta m b é m , as en trev istas n ã o se

m ais a o b je tiv id a d e tem á tic a. A p rim e ira se p resta a tra b a lh o s feitos na

s u ste n ta m e n q u a n to h istó ria oral; seriam ap en as textos estabelecidos. A

base de narrações d e h istó rias d e vida; n o se g u n d o caso, vale os e n fo ­

d im e n sã o social é feita n a m e d id a em q u e

ques c e n tra d o s e m assu n to s específicos. N o caso das h istó rias de vida, a revelação d a h istó ria to d a , c o m p le ta , é desejável; n o se g u n d o caso, cabe o re c o rte sem p re revelador das in te n ç õ es de q u e m vai usar a en trev ista p a ra fins elu cid ativ o s de e stu d o s q u e d isp en se m o e n fo q u e subjetivo.

A memória coletiva e a identidade social se fundem para dimensionar o social, e mais do que objetos isolados de estudos elas se constituem no fundamento da história oral.

são indicados os p o n to s de intercessão das diversas entrevistas. As entrevistas derivadas de projetos de história oral se prestam a cruzam entos in ­

ternos e externos a ela. N o prim eiro caso, p o r se tratar de história oral pu ra, 20

- A N Á L IS E E M

H IS T Ó R IA O R A L

a b o a d e te rm in a ç ã o das redes im p õ e p ro c e d im e n to s q u e esp ecifiq u em origens de a rg u m e n to s afinados. A ssim , os im ig ran tes la tin o -a m e ric a n o s

“As palavras têm significado: algumas delas, porém, guardam sensações.” Zygmunt Bauman

q u e foram u m dia barrados na fro n teira d o M éxico co m os E stados U nidos p o d e m se d is trib u ir e n tre si de form as diversas, q ue, id e a lm e n te, in d ic a m redes q u e os c o m p o rte m se g u n d o traços c o m u n s capazes de explicar

A d ecisão so b re o tip o d e e n tre v is ta a ser feita , p rin c ip a lm e n te a

a in tim id a d e d o fe n ô m e n o : locais de p ro ced ên cias, gêneros, c o n d iç ão

re s p e ito d o tr a ta m e n to a ser d a d o d e p o is d o e s ta b e le c im e n to d o te x to ,

e c o n ô m ic a , nível de escolaridade, relações d e p a re n tesc o nos E stados

su g ere p rim a z ia n a decisão d a e v e n tu a l an álise das e n tre v ista s. A tre la d a

U n id o s. As p o ssib ilid ad e s d e d e s d o b ra m e n to de situ açõ es específicas

ao p ro je to , a p a rte re fe re n te ao uso das e n tre v ista s d ev e ser d e sta c ad a .

c aracterizam a sofisticação d o p ro je to , q u e, q u a n to m ais d e ta lh a d o , m ais

A ssim , é b a s ta n te sig n ific a tiv o o d e b a te so b re a an álise - o u n ã o - d a

sin g u la r será. A ssim , u m p ro c e d im e n to a n alític o im p lic a c ru z a m e n to s

e n tre v ista. Isso te m m u ito a v e r c o m a p ro p o s ta d e ela b o raç ã o de história

capazes de diversificar lógicas in te rn a s a cada seg m en to . A análise, pois,

oral p u ra o u história oral h íbrida.

é re su lta d o dessas co n stataçõ es.

A n á lise e m h is tó r ia o ra l é u m p r o c e d im e n to p r e m e d ita d o ,

U m dos graves erros d e q u e m tra b a lh a c o m en trev istas é a co n fu são

e sp e c ific a d o n o p r o je to e d isso d e p e n d e n te ; a fin a lid a d e d o p ro je to ,

e n tre a n á lise e re s u m o o u fra g m e n to .

e m p a rtic u la r, d e te rm in a a fo rm a d e c o n d u ç ã o d a e n tre v is ta . D e s ta rte ,

M u ita s pessoas su p õ e m q u e , ao sin te tiz ar

te m -s e q u e se a p r o p o s ta a p e n a s c o n te m p lo u o e s ta b e le c im e n to d e

o u m e sm o frac io n a r, fazem o p ro c e d i­

te x to - p a ra b a n c o d e h is tó ria s , p o r e x e m p lo - a q u e s tã o d a a n á lise é

m e n to a n a lític o , o q u e n ã o é v erd ad e.

d is p e n s a d a . D e o u tr a fo rm a , d e sd e q u e p la n e ja d a e p re v ia m e n te d e ­

Isso im p lic a d ife re n c ia r p ro c e d im e n to

te r m in a d a , c o m o p a rte d e u m to d o , a a n á lise d e v e in te g ra r o p ro c e sso

“com positivo” d e “ resolu tivó'. N o p rim e iro caso, sin te tiz a r o u re c o rta r é

d e d e s e n v o lv im e n to d a p ro p o s ta , m as em su a fase fin al, d e p o is de

apenas resum ir, e, sob a seg u n d a altern a tiv a , analisar é resolver a p ro p o sta

É fundamental em história oral distin­ guir o juízo estético das entrevistas - o fascínio pelo texto e pelo conteúdo da his­ tória-do juizo prático, que, afinal, explica o indivíduo em sua intenção narrativa.

132

H is tó ria oral

in d ic a d a n o p ro je to . K a n t p ro p u n h a q u e a b o a análise im plicava o re­ gresso d o to d o às suas p artes c o n stitu tiv a s de m a n e ira q u e a análise n ão se to rn e a divisão racio n al das en trev istas e m c o n ju n to , m as a d efinição

U N ID A D E V II - D O O R A L P A R A O ES C R ITO

d e seus tem as relevantes. Q u a n d o se pensa na análise das entrevistas em si, em sen tid o de história o ral p u ra , o q u e deve ser passível de co n sid e ra ç ão é a análise d o s “fatos observáveis”, das n arrativas c o n cretas. Isso faz c o m q u e se c o n sid e re m os fatos n a rra d o s c o m o “v erdades ú ltim a s” . 21 - Transcrição

21

- T R A N S C R IA Ç Ã O

“Se algu ém quer gerar u m a rosa, n ão p o d e pegar a flor e sim p lesm en te colocá-la na terra... tem q u e sem eá-la n o so lo , p ois só assim nascerá u m a outra rosa.” E u gen e Vale

O c o n c e ito d e tra n s c ria ç ã o é u m a m u ta ç ã o , “ação tra n s fo rm a d a , ação recriad a” de u m a coisa em o u tra , de algo q u e , sen d o de u m estado d a n a tu re za , se to rn a o u tro . A beleza d a palavra c o m p o sta p o r “tra n s” e “criação” sugere u m a sab e d o ria q u e ativa o se n tid o ín tim o d o a to de transcriar. Fala-se d e geração, m as n ão de c ó p ia o u re p ro d u ç ã o . N e m de p a ró d ia o u im itação . O senso estético e n c o n tra aí colo q u e ab rig a a p ro ­ xim ações sem p re evocadas e n tre lite ra tu ra e h istó ria oral. N esse se n tid o , aplica-se à p rá tic a d a tra n sfo rm a ç ã o d o oral n o escrito; a m e tá fo ra d a ág u a q u e tra n s m u d a d o líq u id o p a ra o gasoso. A

A noção da duplicidade diferenciadora entre o que é falado e grafado tem idade, ainda que muitas vezes seja cobrada uma transferência idêntica, como se o tema jamais fosse discutido.

palavra ta m b é m varia n a fo rm a d o oral p ara o escrito. É assim q u e se ju stificam as varian tes de u m a m esm a fo n te , a palavra, q u e ao p e rd e r sua c o n d iç ão etérea g a n h a d im e n sõ es plásticas, v iram letras grafadas.

134

H is tó ria oral

U n id a d e VII - Do o ra l para o escrito

135

N a p rática estética tra n sp aren te nos processos de p ro d u ç ã o literária,

A transcriação nos a p ro x im a d o sen tid o e d a in te n ç ão original q u e o co­

essas estratégias de m odificação foram usadas em p rim eiro lugar n a poesia e

la b o rad o r q u e r co m u n ic ar. E tu d o vira ato de e n te n d im e n to d o sentido

depois n a trad u ção . A m ecânica q u e as justifica são exercícios em prestados

p re te n d id o pelo em issor, q u e p o d e ser expresso ta n to o ra lm e n te q u a n d o

pela h istó ria oral. Eis, c o n tu d o , a inspiração básica: Ezra P o u n d dizia que

p o r escrito. E m o u tra d im e n sã o , o p ro je to c o m o u m to d o ta m b é m re­ p ro d u z essa in te n ç ão . M as, diga-se, essas

seus versos seriam “recriações”, form as corporificadas de original - fato, sen tim e n to , im pressão - q u e g a n h ariam m atéria em letras. E reconhecia q u e n a palavra há duas vidas: a oral e a escrita, e, q u e de u m a para o u tra solução, seria preciso “traduzir”. T e n d o a inspiração co m o p o n to de partida,

Por lógico, há limites e não se pode, por exemplo, transcriar princípios ma­ temáticos, fórmulas médicas, mas a favor da melhor tradução de mensagens admitem-se critérios de modificação.

recriações se realizam d e n tro d e regras. E as variações de códigos, em p a rti­ c u la r d e u m a lín g u a p ara o u tra , m ais d o n iip rn rrec n n n rlp n r ia

v ertid a em palavra, o p ro d u to , o po em a, concretizaria n a beleza o sentido

Ae

n a la v ra a n a la t

d a m ensagem . H a ro ld o de C a m p o s, n o Brasil, em p re sto u essa ideia - de

im p lica ria co m p lex o c a m p o q u e tra n ç a n a co erên cia, beleza e e n te n d i­

recriação - e d in a m iz o u o processo, a p lican d o -o à tra d u ç ão de u m a língua

m e n to . É im possível d o etéreo, d o v erb o , se passar à m aterialização da

para o u tra . A isso c h a m o u “transcriação”.

escrita c o m fid elid ad e a b so lu ta c o m o se u m a coisa fosse o u tra . A d m itir

A “trad u ção ” do oral para o escrito, assim com o u m a tradução de idiom as diferentes, não se opera com u m a sim ples transcrição, especialm ente q u an d o

isso, aliás, seria te m e rid a d e , visto q u e sons, e n to n a ç ã o , cacoetes, m o d u ­ lações, n ão se reg istram sem alterações.

se trata de u m texto subjetivo com o a poesia e - no caso da história oral - a

S e g u n d o a tra d iç ã o firm ad a, a passagem d o oral p ara o e scrito c o m ­

narrativa do colaborador. A té que se verbalizasse tal procedim ento em um a

p re e n d e an tes de tu d o b o m e n te n d im e n to d o q u e foi falado; o u tra etapa,

teoria, dois autores, O távio Paz e H aroldo de C am pos, se valeram de u m exer­

a passagem p a ra o escrito sem p e rd e r de v ista o referencial g u a rd a d o , seja

cício com um . O term o 1blanco”, em espanhol, não se traduziría do espanhol

nas form as de c o n stru ç ã o d e frases o u n o un iv erso vocabular. P or lógico,

p ara o p o rtu g u ê s, sim p le sm e n te , p o r “branco”. Essa m era tran sp o sição de

a tu a m nesse processo m etáfo ras, trejeito s lin g u ístico s, erros, m as sem

id io m as g ero u u m texto c o n ju n to desses dois im p o rta n te s poetas, Trans-

p e rd e r d e vista q u e n a d a é igual o u a m e sm a coisa. A rte e e n g e n h o , pois,

blanco, q u e m arco u d efinitivam ente o debate sobre o tem a. E m o u tra etapa,

fazem p a rte das h a b ilid a d e s re q u e rid a s pelos oralistas; o ju íz o crític o e

já p e n sa n d o a h istó ria oral, pessoas d o N ú c le o de E stu d o s e m H istó ria

o c o m e d im e n to ta m b é m . S u p e ra n d o as expectativas in fa n tis d e q u e o

O ra l d a

( n e h o - u s p ) se valeram d o m e sm o processo e o ap licaram às

oral te m c o rre sp o n d ê n c ia exata c o m o escrito, F ran k K e rm o d e d e sm o n ta

entrevistas d e h isto ria oral. C o m u m ch ão firm a d o n o uso d a transcriação

os pressu p o sto s d e q u a lq u e r “ verdade honesta” q u e seria id en tifica d a na

em história oral, A lberto Lins C aldas sugeriu a radicalização de tal conceito,

tra n scriçã o fiel de u m a e n trev ista. K e rm o d e z o m b a d a p re te n sã o d a fide­

perceb en d o to d o o processo de elaboração d o p rojeto em história oral com o

lid ad e a b so lu ta e d iz te x tu a lm e n te “ no m in uto em que se começa a escrever,

u m a solução transcriativa. A ssim , desde a origem da transform ação de algo

tenta-se fa zê -lo bem e escrever bem é um a a tiv id a d e que não tem relação

q u e n ã o seria n a tu ra l - o p la n o de recolha e fo rm u lação de textos —até a

com a verdade absoluta”. Isso reforça a n o ç ão de in te rferê n c ia n o texto.

sua dev o lu ção p ú b lica, seria p a rte d a m esm a p rá tic a tra n scriad o ra. A cres­

A liás, esses p rin c íp io s já estavam d e lin e ad o s p o r M a rtin H e id eg g e r ao

cente-se a isso o sen tid o p o é tic o q u e m arca os trab alh o s de h istó ria oral.

a firm ar q u e “dou um a pequena p ista p a ra quem quiser escutar: não se trata

É nessa direção que se assum e o conceito de “transcriação”. H om ologias:

de o u vir um a série de frases que enunciam algo; o que im porta é acom panhar

u sp

o p o e m a é o u tro e o m esm o, a entrevista transcriada é o u tra e a m esm a.

a m archa de um m ostrar” .

136

U nid a d e VII - Do o ra l para o e scrito

H is tó ria o ra l

137

A transcriação é assim u m fu n d a m e n to -c h a v e p ara a h istó ria oral, pois,

Paul G rice, q u e d e fin iu as regras das “c irc u n stân c ia s de e n u n c ia ç ã o ” q u e

sen d o ela a p licad a aos e stu d o s de g ru p o s, c o m u n id a d e s e in d iv íd u o s,

d e n u n c ia m a b u sca d e in te n ç ã o d o e n tre v ista d o ao seu in te rlo c u to r. Vale

a b a n d o n a os estritos c a m in h o s d a rac io n alid ad e e se ab re às co n v en ien tes

c o ro a r essa reflexão c o m as palavras de D a n ilo M a rc o n d e s ao s u p o r o

d im e n sõ es subjetivas. A n o ção de transcriação g a n h a novos sen tid o s na

sen tid o d a p ra g m á tic a n a filosofia c o n te m p o râ n e a :

h istó ria oral, pois sugere a fa talid ad e d a tran scriação c o m o a to d e recria­

O p o n to d e partida é a con cepção d e q ue a linguagem é essencialm ente dialógica

ção p a ra c o m u n ic a r m e lh o r o se n tid o e a in te n ç ã o d o q u e foi registrado.

e a troca linguísúca, a interação entre falante e ou vinte, é regida por u m princípio

A in d a q u e m u ito s falem d e h istó ria oral c o m o se ela fosse ap en as m ais

d e cooperação, o u seja, falam os para serm os entendidos, caso con trán o,n em sequer

u m a m a n e ira d e fo rm u la r d o c u m e n to , d efen d e-se o u tra h istó ria oral,

nos engajaríamos nesse processo. Essa con cepção cooperativa d efine u m m o d elo de

q u e se e n q u a d ra ria m ais e m e lh o r n o q u e Jeru sa Pires F erreira e n u n c ia

c o m o deveria funcionar a interação linguística.

co m o comunicação em presença, a energia,

É relevante le m b ra r q u e estabelecido

o envolvim ento m ultissensorial, que inclui, entre outras, a categoria da fascinação”. P a ra m e lh o r v a lo riz a r o a to tra n s c ria tiv o é p re c iso re c o rre r às in d ic a çõ e s d e J o h n L a n g sh a w A u s tin , q u e e m O x fo rd c rio u a “te o ria d o s a to s d e fala”, e m q u e

A transcriação se aplica mais ao gênero "história oral de vida" do que a "histó­ ria oral temática". No primeiro caso, porque a história deve sempre aparecer por inteiro, torna-se automaticamente lógica a publicação do todo. No segun­ do caso, porque o fragmento pode ter sentido exato, o recorte é aceitável. Nesse caso, os limites da transcriação são maiores.

e x p lic ita os fe n ô m e n o s p ra g m á tic o s d o uso d a lin g u a g e m . A u stin a rg u m e n ta q u e expressões d a fala n ã o são a p e n a s frases q u e se re s u m e m nas c o n d iç õ e s d e seus c o n te ú d o s s e m â n ­ tico s. E s ta b e le c e n d o a p re c io sa sep a ra ç ão e n tre fato res constatativos e perform ativos, ficava a b e rta a larga avenida q u e c o n d u z iría a e n te n d im e n ­ tos m ais sofisticados d o q u e aquele ad v o g ad o p o r q u a n to s veem na tra n s­ criação d a fala “a q u ilo q u e foi d ito d o je itin h o q u e foi falado”. P a rtin d o d o fu n d a m e n to in te n c io n a l das e n u n ciaçõ es, A u stin co n sag ra a in te n ç ã o p e rfo rm ática dos narradores co m o fu n d a m e n ta l. A perform ance, p o rta n to , vai além d a in te n ç ã o descritiva o u d o c o n te ú d o in fo rm a tiv o m ín im o das sentenças en u n ciad as. L ogicam ente, as passagens constatativas c o n tin u a m e x istin d o - c o m o “m e u n o m e é..., nasci e m ... n o a n o ...”; m as “ach o q u e sem p re fui u m a cria n ça feliz p o rq u e vivia em u m a casa n o in terio r, c o m pai, m ãe e irm ão s é p e rfo rm á tic a . E m passagens c o m o a p rim e ira , n ão cabe tra n scriar; n o caso d a se g u n d a , sim . P o rq u e A u stin viu os ato s da fala c o m o form as d e agir, d eix o u in d ic a d o o ru m o seg u id o p o r H e n ry

o te x to d e c a d a e n tre v is ta , d e p o is de e x au stiv a m e n te tra b a lh a d o e m to d a s as suas etapas até ch eg ar à tra n scriaç ã o , a

Porque toda entrevista escrita materia­ liza os atos da fala, ela deve conter, no máximo possível, incorporações de situações das entrevistas. Por exemplo, se o colaborador chora, mas não diz, isso deve transparecer no texto como parte integrante da performance.

en tre v ista deve v o lta r ao n a rra d o r/e n tre ­ v istad o p ara q u e ele se rec o n h eç a nela, faça d u ra n te o a to de co n fe rê n cia a v alidação q u e lhe g a ra n ta re c o n h e c im e n to d e si m esm o.

U N ID A D E V III - D O C U M E N T O S E E X E M P L O S

22 - A prática da transcrição; te x tu a liz a ç ã o e transcriação 23 - Ficha de a c o m p a n h a m e n to e c o n tro le d o p ro je to 24 - C arta d e a u to riz a ç ã o e uso das entrevistas 25 - C ad ern o de cam p o

22

-

A P R Á T IC A D A T R A N S C R IÇ Ã O ; T E X T U A L IZ A Ç Ã O

E T R A N S C R IA Ç Ã O

“H á verbos perform ativos. É preciso en ten d ê -lo s para se co m p reen d er os ‘atos d e fala’.” A ustin

C o n sa g ra n d o o p rin c íp io e le m e n ta r d e q u e existem diferenças e n tre u m a situ a çã o (lín g u a falada) e o u tra (lín g u a escrita), n o ta -se q u e o m ais im p o rta n te n a tra n sp o siç ã o d e u m d iscu rso p ara o o u tro é o sen tid o q ue, p o r sua vez, im p lica in te rv e n ç ão e desvios capazes de s u ste n ta r os critério s decisivos. P or o u tro â n g u lo , a in c o rp o ra ç ã o d o indizível, d o gestu al, das e m o çõ es e d o silêncio, c o n v id a à in te rferê n c ia q u e te n h a c o m o fu n d a m e n to a clareza d o tex to e sua força expressiva. E m h is tó ria oral, o re c o n h e c im e n to d o te x to p ro c e d id o pela c o n fe rê n cia e pela au to riz a çã o d e te rm in a se o c o la b o ra d o r se id e n tific o u o u n ã o c o m o resu ltad o . É essa a g ra n d e p ro v a d a q u a lid a d e d o tex to final. À guisa de exem plificação, vejam os o caso d e u m a e n tre v ista de u m p ro je to so b re os “sem -te rra ”. T rata-se, p rim e iro , d a m e ra tra n scriçã o da gravação, d o oral p ara o escrito.

140

H is tó ria o ra l

U n id a d e VIII - D ocu m e n to s e exem plos

1 41

Fase 1: tra n scriçã o ab so lu ta. N essa eta p a, fo ram colocadas as palavras d ita s e m estad o b ru to . P erg u n tas e respostas fo ram m a n tid a s, b e m c o m o

que carpir, ia toda a criançada p a ra roça. Só não trabalh ava quem

repetições, erros e palavras sem peso sem ântico. Sons c o m o o m ia d o de um

fica va cuidando da casa. Escola pouco tivem o. Os m ais novos tiveram ,

g ato q u e estava na casa e o to q u e d o telefone ta m b é m fo ram registrados.*

mas, a irm ã m ais velha nem teve escola. Eu p a rei um ano na escola e a outra irm ã f e z a terceira série. A ssim , os m ais novos estudaram mais.

E n trevista d o ra : D . A na, m e conta onde a senhora nasceu? Q uando a senhora nasceu? Com o f o i sua in fân cia? A n a: Eu nasci em Itararé... E n trevista d o ra : A h! A q u i p ertin h o então... A n a : É ... em 1 2 de agosto........eu nasci... E n trevista d o ra : E como era a fa m ília da senhora? A n a: A fa m ília nossa era assim , trabalhava na roça... p la n ta va ... ar­ rendava ou um pou qu in h o de am eia tam bém . A vida nossa era essa... E n trevista d o ra : E era grande ou pequ en a? A n a: Era grande, nove irm ão. E n trevista d o ra : N ove irm ãos!... A n a: N ove irm ãos, seis irm ã e três irm ão... E todo pequeno assim, pequeno assim , tem que ir p a ra a roça. Eu f u i com 7 anos p a ra a roça. Com o m eu p a i não tin h a condição, tin h a que trabalh ar p a ra tratar dos irm ãos. Os m ais velhos iam p a ra roça. (gato m iando m u ito) E n trevista d o ra : E a senhora é das m ais velhas? A n a: São três irm ãs m ais velhas. Os irm ãos mesmo, que é hom em , eram novos. Tem o caçula da m inha mãe, que agora tem 3 0 anos, égêm eo. Foi depois deles nascerem ... E ntão tínham os que deixar um de nós na casa para cu idar deles. M in h a m ãeficou m uito doente... Então todo d ia a gen te trocava, fic a v a um a irm ã e a outra ia p a ra roça. A que fica va cu idava das crianças e da casa. E ntão não era um a vid a boa... Tinha que trabalh ar na casa e na roça. Todos os filh os tin h am que trabalhar. E n trevista d o ra : E o que vocês trabalhavam na roça? A n a: P lan tava feijão, m ilho, a rroz... Só isso que a gente p la n ta va . D e m iu deza, p la n ta va m elancia, m eu p a i gostava de p la n ta r m elancia... M ais era isso que agen te plan tava. D a í chegava na época de carpi, tinha

E a escola era p erto ... (gato m iando). N ão p o d ia ir na escola, porqu e não p o d ia fic a r sem trabalhar. Acho isso a í não era um a vida boa. Foi um a vida m uito dura. E o p io r de tudo é que eu gostava de estudar. Passei de ano, toda fe liz , e não p u d e ir na escola m ais. Só f o i os irm ãos m ais novo, porqu e não iam na roça. M as dos grandes sem estudar... N ão é fá c il, não!... E hoje, depois de casado voltaram a estudar. Eu não quis, j á vieram atrás de m im um as p a r de vez. M as não quis! J á não estudei quando era criança, estudar depois de m ais velha... Eu já , assim , já ... não tenho m u ita saúde... Vou fic a r lá sentada, a cabeça j á não é m u ito boa p a ra gu ardar as coisas. O que aprende hoje, am anhã não lem bra m ais! E ntão não vou, não! N unca m ais qu is estudar, mas meus irm ãos estudam , (telefone toca e ela não atende) E n trevista d o ra : E os seus irm ãos m oram a q u i p o r perto? A n a: N ão, só tenho... m oram em Tatuí. E em Itararé m oram três irm ãos meus e o resto tudo m ora em Tatuí. E n trevista d o ra : E tem algum que é assentado? A n a: D os meus irm ãos só tem um a irm ã que éassentada, entrou agora, naquela terra do banco... você j á ouviu fa la r naquela terra do banco? E n trevista d o ra : A h! do Banco da terra!? A n a : É do “Banco da Terra"... Ela conseguiu.

142

U n id a d e VIII - D ocu m e n to s e exem plos

H istória o ra i

143

Fase 2: textualização. N essa fase foram elim in ad as as p erg u n ta s, tirados

Por isso, escola pouco tivemos. Os mais novos tiveram, mas, por exemplo,

os erros g ram aticais e reparadas as palavras sem peso sem ân tico . O s sons e

a minha irm ã mais velha nem teve escola. Eu parei um ano na escola e a

ru íd o s ta m b é m fo ram e lim in a d o s e m favor de u m te x to m ais claro e liso.

outra irm ã fe z até a terceira série. Os mais novos estudaram mais. E a escola

U m a frase guia, c h am ad a “to m v ital”, foi escolhida e extraída d a entrevista

era perto... M as não podia ir na escola, porque não podia ficar sem trabalhar.

c o m o u m to d o . O “to m v ita l” é u m recurso usad o p ara req u alificar a e n ­

Por isso acho que minha infância não fo i muito boa. Foi uma vida muito

trev ista se g u n d o sua essência. P o rq u e se p a rte d o p rin c íp io q u e cada fala

dura. E o p ior de tudo é que eu gostava de estudar... Passei de ano, toda feliz,

tem u m sen tid o geral m ais im p o rta n te , é tarefa de q u e m estabelece o texto

e não pude ir mais na escola. Só os irmãos mais novos puderam, porque ainda

e n te n d e r o significado dessa m e n sa g e m e re o rd e n a r a en tre v ista se g u n d o

não iam na roça. M as os grandes ficaram sem estudar... Não fo i fácil, não!...

esse eixo. É o “to m v ita l” q u e diz o q u e p o d e e o q u e n ão p o d e ser e lim i­ n a d o d o tex to . N o caso, o “to m v ita l” d a en tre v ista é “ D a q u i eu gosto!”.

E hoje, depois de casados muitos voltaram a estudar. Eu não quis, já vieram atrás de mim um p a r de vezes... M as não quis! Já não estudei quando era criança, estudar depois de mais velha... Não tem sentido. E também não tenho m uita saúde... Vouficar lã sentada, a cabeça já não é muito boa para

D aqui eu gosto!

guardaras coisas. O que aprende hoje, amanhã não lembra mais! Então não vou, não! Nunca mais quis estudar, mas meus irmãos estudaram.

Nascí em Itararé, aqui pertinho... nasci no dia 12 de agosto... A nossa

Em Itararé moram três irmãos meus e o resto todos moram em Tatuí. Dos

fam ília trabalhava na roça, arrendava ou plantava de ameia... a vida nossa

meus irmãos só tem uma irm ã que é assentada, entrou agora, naquela terra

era essa. A vida era essa... Era uma fam ília grande, ao todo nove irmãos, seis

do banco... aquele Banco da Terra... Ela conseguiu.

irmãs e três irmãos. Todos, mesmo pequenos tinham que ir para a roça... eu mesmo fu i com 7 anos. Todos os filhos tinham que trabalhar. Como meu p a i não tinha condição, a gente tinha que trabalhar para tratar dos irmãos pequenos. Os mais velhos iam para roça. Eu e mais três irmãs, somos as mais

Fase 3: o texto é ap resen tad o em sua versão final e depois d e au to riz a d o pela c o la b o ra d o ra deve c o m p o r a série d e o u tra s en trev istas d o m e sm o

velhas. Os irmãos homens eram mais novos. Tem os caçulas da minha mãe,

p ro je to . E v e n tu a lm e n te , essa e n tre v ista p o d e ta m b é m se in te g ra r n u m

os gêmeos, que agora têm 3 0 anos. Foi depois deles nascerem que minha mãe

b a n c o d e h istó rias d o M o v im e n to d o s T rab alh ad o res S em -T erra.

ficou muito doente... Então tínhamos que deixar um de nós na casa para cuidar deles. M as todo dia a gente trocava, ficava uma irmã e a outra ia para roça.

D aqui eu gosto!

A que ficava cuidava das crianças e da casa. Não era uma vida boa... Tinha que trabalhar na casa e na roça. N a roça a gente plantava feijão, milho, arroz... Só isso que a gente plantava. D e miudeza, melancia. M eu p a i gostava de plantar melancia... Não tinha m uita variedade, no mais era isso que a gente plantava. Quando chegava na época de carpi, tinha que ir toda a criançada para roça. Só não trabalhava quem ficava cuidando da casa.

Nasci em Itararé, no dia 12 de agosto de 1958. A nossa fa m ília traba­ lhava na roça, arrendava ou plantava de am eia... a vida nossa era essa: roça eplantação.... A gente era umafam ília grande, ao todo nove irmãos, seis irmãs e três irmãos. Quando era criança gostava de brincar de casinha, com as coisas que a gente

144

U n id a d e VIII - D ocum entos e exem plos

H istória o ra l

145

mesmo fazia, coisas de barro e bonecas de sabugo de milho verde, porque tem

não estudei quando era criança, estudar depois de mais velha... Não tem

cabelo. Meu paificava bravo com agente de estragar o sabugo. A gente inventava

sentido. E também não tenho m uita saúde... Vouficar lá sentada, a cabeça

um monte de brinquedo, mas não tinha muita folga para brincar... Gostava

já não é muito boa para guardar as coisas. O que aprende hoje, amanhã

de brincar de boneca também, mas quase não tinha brinquedo. Enquanto era

não lembra mais! Então não vou, não! Nunca mais quis estudar, mas meus

bem pequena, sempre achava um jeito de brincar. Quando fu i crescendo um

irmãos estudaram e estão estudando até hoje.

pouco, é que não deu mais... Só trabalhava, e quando estava em casa cuidava

Em Itararé moram três irmãos meus e o resto, três irmãos e duas irmãs,

dos irmãos mais novos. Então agente não teve muito tempo...

todos moram em Tatuí. Dos meus irmãos, só tem uma irm ã que é assentada, entrou agora, naquela terra do "Banco da Terra”... Ela conseguiu.

Todos, mesmo pequenos tinham que ir para a roça... eu mesmo fu i com 7 anos!... Todos os filhos tinham que trabalhar. Como meu p a i não tinha condição a gente tinha que trabalhar para tratar dos irmãos pequenos. Os mais velhos iam para roça. Eu e mais três irmãs, somos as mais velhas. Os

* E ntrevista feita por Suzana L opes Salgado R ibeiro durante a realização d o seu mestrado: Processos d e m u d a n ça s n o mst : história d e u m a f a m ília co o p era d a . M estrado. São Paulo, fflch / usp ,

2002.

irmãos homens eram mais novos. Têm os caçulas da minha mãe, os gêmeos, que agora têm 3 0 anos. Foi depois deles nascerem que minha mãeficou muito doente, sofrendo do pulmão. Então tínhamos que deixar um de nós na casa para cuidar deles. Isso por um ano, depois minha mãefo i melhorando, agora

23

-

F IC H A D E A C O M P A N H A M E N T O

E CONTROLE

D O PR O JETO

sarou, hoje é mais sadia do que eu. M as todo dia a gente trocava, ficava uma irm ã e a outra ia para roça. A que ficava cuidava das crianças e da casa. Não era uma vida boa... Tinha que trabalhar na casa e na roça.

“C o m o em q ualquer projeto d e ciên cias sociais, em história oral o a co m p a n h a m en to d o projeto é parte d o co n tro le necessário ao b o m resultado.’

N a roça a gente plantava feijão, milho, arroz... Só isso que a gente

José C arlos Sebe B om M eih y

plantava. D e miudeza pepino, verdura, horta e melancia. M eu p a i gostava de plantar melancia... Não tinha m uita variedade, no mais era isso. Quando chegava na época de carpi, tinha que ir toda a criançada para roça. Só não trabalhava quem ficava cuidando da casa. Por isso, escola pouco tivemos. Os mais novos tiveram, mas, por exemplo, a

T o d o s os p ro je to s devem ser a c o m p a n h a d o s d e fichas de c o n tro le . D eve sem p re haver, pelo m e n o s, d u as m o d a lid a d e s de fichas: u m a da situ ação d e en tre v ista e d o p ro je to e o u tra d o e n tre v ista d o e d o processo d a en tre v ista até o e sta b e le cim en to e ap rovação d o tex to final.

minha irm ã mais velha nem teve escola. Eu parei um ano na escola e a outra

A ficha d e situ ação d a en tre v ista e d o p ro je to é m e ra m e n te técnica

irm ã fe z até a terceira série. Os mais novos estudaram mais. E a escola era

e deve c o n te r o n o m e d o p ro je to e a relação d o s en tre v istad o s, c o m os

perto... M as não podia ir na escola, porque não podia ficar sem trabalhar. Por isso acho que minha infância não fo i muito boa. Foi uma vida muito dura. E o p io r de tudo é que eu gostava de estudar... Passei de ano, toda fe liz com nota boa e não pude ir mais na escola. Só os irmãos mais novos puderam, porque ainda não iam para a roça. Mas os grandes ficaram sem estudar... N ão fo i fácil, não!... E hoje, depois de casados muitos voltaram a estudar. Eu não quis, já vieram atrás de mim um p a r de vezes... M as não quis! Já

seguintes itens: I) d a d o s d o p ro je to ; II) d a d o s d o e n tre v istad o ; III) d ados dos c o n ta to s; IV ) d a d o s d o a n d a m e n to das etapas de p re p a ro d o d o c u ­ m e n to final; e V ) envio de co rre sp o n d ê n c ia s.

146

H istória o ra l

U nid a d e VIII - D ocum entos e exem plos

147

d a s e ta p a s

do

I ) D a d o s d o p r o j e t o __________

IV )

N o m e d o p ro jeto :______________

d o c u m e n t o f i n a l ________________________________________________________

D ire to r d o p rojeto:_____________

P rim e ira tran scrição :_________________________________________________

In s titu iç ã o p a tro c in a d o ra :______

T extualização:________

E n tre v ista d o r(es):______________

T ranscriação:

Pipo d e en tre v ista (gênero):

C o n fe rê n cia :_________________________________________________________

Local e d u ra ç ã o d a entrevista:

C a rta de cessão de direitos:

D ados

do

a n d a m e n to

e de

p re p a ro

______________________________________________________ _____________

Ficha catalográfica d a entrevista:

M o d e lo d e a c o m p a n h a m e n to II)

D a d o s d o c o l a b o r a d o r __________________________

1

2

3

4

5

X

X

X

X

X

X

N o m e c o m p le to :_______________________________________

A n d ré Silva

X

X

X

Local e d a ta d o n a sc im e n to :____________________________

C aio L inhares

X

X

X

E n d e re ç o atual: R ua____________________________ n õ

G ab riel Soares

X

X

X

B airro_____________________ C id a d e ______________ E stad o

M a n u e la F ern an d es

X

X

X

D o c u m e n to de id e n tid a d e :_____________________ T ip o :

V alkiria M orais

X

X

L ocal e ó rg ão de em issão:_______________________________

W ilm a N ovaes

X

X

X

Profissão atual:_________________________________________ Profissões an terio res:___________________________________ O b serv açõ es:_______________________________ .___________

V)

E n v i o d e c o r r e s p o n ê n c i a _____________

D a ta da carta de a p re se n ta çã o d o p ro jeto :______ D a ta d o a g ra d ec im e n to (s) da(s) en trevista(s): III)

D a d o s d o s c o n ta to s e d a e n tr e v is ta

In d ic a çã o d o c o n ta to :____________________________ D a ta d o c o n ta to :________________________________ O u tro s c o n ta to s:_________________________________ F o rm a d o c o n ta to :_______________________________ D a ta(s) da(s) en trevista(s):_______________________ L ocal da(s) entrevista(s):_________________________

D a ta d a rem essa d a en tre v ista p ara conferência: D a ta d a c a rta de cessão:

148

24

H is tó ria o ra l

-

U nid a d e VIII - D ocum entos e exem plos

C A R T A D E A U T O R IZ A Ç Ã O

E USO

D A S E N T R E V IS T A S

“Esses con tratos - inevitáveis, até certo

149

Exem plo 1 (Local, data)

p o n to - são a chave para abrir e fechar arquivos, lim itar o u facilitar o trabalho interpretativo.” Sérgio V ilas Boas

A c a rta de cessão é u m d o c u m e n to fu n d a m e n ta l p a ra d e fin ir a legali­ d a d e d o uso d a en trev ista. Ela p o d e re m e te r ta n to à gravação q u a n to ao te x to final (se este fo r p ro d u z id o ). N o caso d e haver só a gravação, deve ficar claro quais as possibilidades e os lim ites p ara o eventual uso po sterio r, e cabe ao c o la b o ra d o r deixar especificados os c ritério s d e uso. N esse caso, sugere-se q u e a c a rta de cessão seja clara p ara d e fin ir exclu siv am en te a tra n scriçã o fiel. D a m esm a

D e stin a tá rio , E u, (nom e, estado civil, d o c u m e n to de identidade), declaro para os devidos fins q u e cedo os direitos de m in h a entrevista, gravada (data(s)) para (entidade e pessoas) usá-la integralm ente o u em partes, sem restrições de prazos e lim ites de citações, desde a presente data. D a m esm a form a, autorizo o uso de terceiros ouvi-la e usar citações, fican­ do vinculado o controle à (instituição), q u e tem a guarda da m esm a. A b d ic a n d o d ire ito s m eu s e d e m eus d e sc e n d en te s, subscrevo a p resen te, q u e terá m in h a firm a re c o n h e c id a em c artó rio .

fo rm a, é p ru d e n te v in c u la r o c o n tro le de seu uso (n o to d o o u em p arte)

(n o m e e a ssin a tu ra d o c o la b o rad o r)

à in s titu iç ã o q u e te m a g u a rd a d a gravação (exem plo 1). S u p o n d o q u e nas gravações q ueira-se p ro p o r lim ites ta n to p a ra q u e as fitas sejam o uvidas c o m o p a ra seu uso em citações, deve-se p ro c e d e r u m te x to c o n te n d o c la ra m e n te as lim itaçõ es (exem plo 2). H a v e n d o , além d a gravação, te x to escrito, deve ficar claro q u e o q u e

Exem plo 2 (Local, data)

prevalece, inclusive p ara o uso d a in stitu iç ã o o u d o p ro je to pessoal, é esse texto. N esse caso, a a u to riz a çã o p ara se o u v ir a e n trev ista deve te r apenas

D e stin a tá rio ,

a fin a lid a d e c o m p le m e n ta r, pois, desde q u e feita a co n fe rê n cia , é sobre

E u, (n o m e, estado civil, d o c u m e n to de id en tid ad e), d eclaro para

ela q u e in c id e a “oficialização” d a en trev ista. As m esm as características

os devidos fins q u e ced o os d ire ito s d e m in h a e n trev ista, gravada

d e uso das gravações se a p licam ao te x to escrito (exem plos 3 e 4).

(data(s)) para (entidade e pessoas) usá-la com as lim itações relaciona­

H á , fin a lm e n te , situações em q u e o nível de a u to riz a çã o é a m p lo e c e d id o sem lim ites (exem plo 1).

das a seguir. D a m esm a form a, este n d o os lim ites a terceiros, ficando v in c u la d o o c o n tro le à (in stitu iç ã o ), q u e te m a g u a rd a d a m esm a. A b d ic a n d o d ire ito s sob a p a rte n ã o relacio n ad a, o q u e faço ta m ­ b é m aos m eus d e sc e n d en te s, subscrevo a p re sen te , q u e terá m in h a firm a re c o n h e c id a em c artó rio .

150

U nid a d e VIII - D ocu m e n to s e exem plos

H istória o ra l

1 51

Exem plo 4

L im ites:

(L ocal, data)

1) de p a rte s (c ita r c la ra m e n te as p a rte s q u e n ã o p o d e m ser o u v id as, in d ic a n d o inclusive se elas devem ser apagadas d a có p ia

D e stin a tá rio ,

o rig in al o u ap en as das colocadas a p ú b lic o ). 2) de prazos (citando se há lim itação de te m p o para sua liberação

E u, (n o m e , estad o civil, d o c u m e n to de id e n tid a d e ), declaro para

- u m o u m ais anos d esd e a d a ta d a gravação - o u se ap en as deve

os d evidos fins q u e ced o os d ire ito s de m in h a e n trev ista, tra n sc rita

ser c o lo c ad o a p ú b lic o d ep o is d a m o rte d a pessoa).

e a u to riz a d a para le itu ra (data(s)) p a ra (e n tid a d e e pessoas) usá-la

3) d e pessoas o u g ru p o s q u e n ão devem te r acesso à fita.

c o m as lim itaçõ es relacionadas a seguir. D a m e sm a fo rm a, e ste n d o os lim ites a terceiros, fican d o v in c u ­

(n o m e e a ssin a tu ra d o c o la b o rad o r)

lado o c o n tro le à (in stitu iç ã o ), q u e te m a g u a rd a d a m esm a. A b d ic a n d o d ire ito s sob a p a rte n ã o relacio n ad a, o q u e faço ta m ­ b ém aos m eus d e sc e n d en te s, subscrevo a p resen te, q u e terá m in h a firm a re c o n h e c id a em cartó rio .

E xem plo 3

L im ites:

(L ocal, data)

1) d e p a rte s (c ita r c la ra m e n te as p a rte s q u e n ã o p o d e m ser ouvidas, in d ic a n d o inclusive se elas dev em ser apagadas d a có p ia

D e stin a tá rio ,

o riginal o u ap en as das colocadas a p ú b lic o ).

E u, (n o m e , estado civil, d o c u m e n to de id e n tid a d e ), declaro para

2) de prazos (citando se há lim itação de te m p o para sua liberação

os d ev id o s fins q u e ced o os d ire ito s de m in h a en tre v ista, tra n sc rita

— u m o u mais anos desde a data da gravação —o u se apenas deve ser

e a u to riz a d a p a ra le itu ra (data(s)) p ara (e n tid a d e e pessoas) usá-la

colocado a público depois da m o rte da pessoa).

in te g ra lm e n te o u em p a rte s, sem restrições d e prazos e citações,

3) de pessoas o u g ru p o s q u e não dev em te r acesso à fita.

d esd e a p re sen te d a ta . D a m e sm a fo rm a, a u to riz o o uso d e terceiros (n o m e e a ssin a tu ra d o c o la b o rad o r).

a ouvi-la e usar citações, ficando v in cu lad o o c o n tro le à (instituição), q u e te m a g u a rd a d a m esm a. A b d ic a n d o d ireito s m eus e d e m eus d e sc e n d en te s, subscrevo a p re sen te , q u e terá m in h a firm a re c o n h ec id a e m c artó rio .

(n o m e e a ssin a tu ra d o c o la b o ra d o r).

25 -

CADERNO

DE C A M P O

“D ep ositário da m em ória da pesquisa, o cad erno d e cam p o é in stru m en to essencial, é um in stru m en to d e reflexão.

Luiz Eduardo R ob in son A ch u tti e M aria d e N azareth Agra H assen

A conselha-se v iv a m e n te o uso d e c a d e rn o d e c a m p o n o a c o m p a n h a ­ m e n to das entrevistas e no registro d a evolução d o p ro je to . N o c ad e rn o

152

H is tó ria o ra l

U n id a d e VIII - D ocu m e n to s e exem plos

153

d e c a m p o co lo cam -se as observações ta n to d o a n d a m e n to d o p ro je to

contudo, a notar que o novo equilíbrio fam iliar deveria vir pelo caminho

c o m o das entrevistas específicas.

mais descomplicado do grupo.

É nesse c ad e rn o q u e devem ta m b é m c o n star as im pressões, b em co m o as ilações feitas a p a rtir dos vínculos co m entrevistas a n terio res e hipóteses levantadas para e n ­

Sugere-se que o caderno de campo funcione como um diário, em que o roteiro prático (quando foram feitos os contatos, quais os estágios para se chegar à pessoa entrevistada, como correu a gravação, eventuais incidentes de percurso) seja arrolado.

laçar as futuras. O c a d e rn o d e c a m p o deve fu n c io n a r c o m o u m d iá rio ín tim o , e m q u e são registrados até os p ro b le m a s de aceitação das idéias dos en trev istad o s, b e m c o m o to d a e q u a lq u e r reflexão

E vitei comparar um irm ão com o outro. Mesmo assim, entendia o segundo pelo prim eiro, pois as diferenças mostravam resultados bem diversos de educação. E isso me levava a im aginar o projeto fam iliar. Percebia como Lea e Augusto projetaram-se nos dois filhos e, sobretudo, como em Rafael alguns traumas silenciados na relação não estiveram presentes. A alegria era a prova dos nove. A infância contada com detalhes mais expressivos mostrava os efeitos em uma vida que havia sido mais fá c il e reconhecida por todos. Impressionou-me muito a relevância que Rafael deu à hora da noticia e

te ó ric a d e c o rre n te de d eb ates so b re aspectos d o assu n to ,

às consequências im ediatas dela. Sem dúvida, sua vida dividiu-se em dois

o caderno de campo deve ser íntimo

momentos e ele de maneira quase mística aprendera o que significava o

quem dirige as entrevistas.

U m a das funções d o c ad ern o de cam po e possibilitar u m dialogo freq u en te e cons­ ta n te em relação ao p ro je to inicial. C e rta ­

m e n te , o c a d e rn o de c a m p o se to rn a u m referencial o b rig a tó rio nas fin a­ lizações d o s trab alh o s. A validade dele c o m o e le m e n to de registro g aran te a tra je tó ria d a evolução d o tra b a lh o q u e varia em vista d o p ro je to inicial.

Exem plo * Fui para a entrevista com Rafael, esperando algo próxim o do que encontrara com Marcos. Errei mais uma vez e uma vez mais aprendi que o espaço das surpresas em história oral é enorme. Afável, desarmado, transparente em sua sim plicidade, Rafael mostrou por que é o queridinho de todos. Dois predicados marcaram a figura do moço: a sensibilidade e o bom-humor, mesmo em situações difíceis. Trançadas, essas características projetavam um rapaz de sentimentos profundos e que fo i h ábil para se reorganizar e assim retraçar os caminhos da fam ília. Virou líder, elo e alguém de trânsito entre todos. A aparência jovial, contudo, dificultava em uma coisa: como conciliar a profundidade dos sentimentos e a seriedade dos compromissos adquiridos com o ar tão despretensioso? Talvez o bom controle da língua e a capacidade de combinar a dor com a esperança de dias melhores para todos. Demorei,

sofrimento. As conversas conduzidas em tons baixos pareciam uma história contada a distância e o sentido pedagógico do sofrimento garantia um clima de fábula a tudo. * R elato d o cad erno d e ca m p o da entrevista co m Rafael, extraído d e J .C .B . M eihy, A u g u sto & L ea: u m caso d e (d e s)a m o r em tem p o s m o d ern o s, São Paulo, C o n te x to , 2 0 0 6 . p. 1 4 9 .

B - T E X T O S P A R A D IÁ L O G O S

d - Sobre transcrição e - Transcrição em história oral f - C o lab o ração / m ed iação g - O c a rá te r público de história oral h - D evolução i - M e d ia ç ã o

d - S O B R E T R A N S C R IA Ç Ã O

A ssu m in do que a história oral concretiza-se som en te quando chega ao texto, su­ perando a etapa da entrevista e da form ação de arquivos, deve haver um processo de “transcrição” das entrevistas que assegure a form ação de um corpo d ocu m ental a ser trabalhado p elo historiador. Entende-se ainda que as linguagens, falada e escrita, têm valores distintos. O oralista Pilippe Joutard cita a respeito M aurice Pons, para quem “entre a fala e a escrita [...] há uma diferença pela qual escapam sutilm ente a verdade e a vida [...]”. A nalisando uma entrevista que realizou com Sim one Signoret, Pons nota que em suas frases “existe o calor, a em oção, o riso, o ofício, o talento. A o serem lidas, as m esm as frases aparecem sumárias e secas, quase embrulhadas em suas vestes escritas. [...] Signoret não consegue escutar-se ao ler-se. N ã o se reconhece em si m esm a”. Para que o narrador se reconheça n o texto da entrevista, é preciso que a transcrição vá além da passagem rigorosa das palavras da fita para o papel. A transcrição literal, apesar de extrem am ente necessária, será apenas uma etapa na feitura d o texto final, que cham o de t e x t u a l i z a ç ã o , por ser ao fim e ao cabo um m o d o de se reproduzir honesta e corretam ente a entrevista em um te x t o e s c r ito . A textualização deve ser uma narrativa clara, on d e foram suprim idas as perguntas do entrevistador; o texto deve ser “lim p o”, “en xu to” e “coerente

(o que não quer

dizer que as i d é i a s apresentadas pelo entrevistado sejam coerentes); sua leitura deve ser fácil, ou com preensível, o que não ocorre com a transcrição literal, apresentada

156

H istória o ra l

B-

Textos para d iá lo g o s

1 57

por alguns historiadores co m o “fiel” ao d ep oim en to, porém difícil de ser analisada

culturais são registrados, das primeiras observações anotadas, ao livro co m p leto e às

co m o d ocu m en to histórico.

maneiras co m o essas configurações fazem sentido em determ inados atos da leitura.

A textualização final deve conter em si a atmosfera da entrevista, seu ritm o e prin­

O etnógrafo “inscreve” o discurso social: e le o a n o t a . A o fazê-lo, ele o transforma de

cipalm ente a c o m u n ic a ç ã o n ã o - v e r b a l nela inclusa: em oções d o d ep oen te co m o risos

acon tecim ento passado, que existe apenas em seu próprio m o m en to de ocorrência,

ou choro, entonação e inflexão vocal, gestos faciais, de m ãos, ou m esm o do corpo. O

em um relato, que existe em sua inscrição e que pode ser con su ltado novam ente. O s

texto, ainda, não p ode abandonar a característica de originalm ente falado, devendo

gêneros, acadêm ico e literário, portanto, interpenetram -se inegavelm ente no traba­

ser identificado co m o tal pelo leitor.

lho etnográfico em geral; além disso, a escrita de descrição cultural é propriam ente

Para conseguir chegar a esse resultado, valem o-nos de dois con ceitos da lingu ís­

experim ental e ética.

tica, que não p odem ser en ten did os separadamente: o de transcriação, proposto por

Para Geertz, a palavra “ficção” retoma seu sentido mais explícito: perdendo a conotação

H aroldo de C am p os, e o de t e a t r o d e l i n g u a g e m , form ulado por Roland Barthes, que

de falsidade, de algo m eramente op osto à verdade, e la su g e r e a p a r c i a l i d a d e d a s v e r d a d e s

são adequados à prática da história oral por José Carlos Sebe B om M eihy. A transcriação surge da necessidade de se reformular a transcrição literal para torna-la com preensível à leitura. N a transcrição literal há inúm eras frases repetidas,

c u lt u r a is e h is tó r ic a s ,

o m o d o co m o estas são sistem áticas e exclusivas. O s textos antro­

pológicos são eles m esm os interpretações e, na verdade, de segunda e terceira m ão. (Por definição, som en te um ‘nativo’ faz a interpretação em primeira mão: é a sua cultura.).

en q uan to outras são cortadas pelo entrevistando ou pela qualidade da gravação; há

Trata-se, portanto, de ficções; ficções no sentido de que são ‘algo co n str u íd o , algo

m uitas palavras e expressões utilizadas incorretam ente, d evid o à própria dinâm ica da

m odelado’ —o sentido original de f i c t i o —não que sejam falsas, não-factuais ou apenas

fala, da conversa inform al — que é o que tentam os fazer das entrevistas. H á estran-

experim entos de pensam ento.

geirism os, gírias, palavras chulas, ou seja: term os que são bastante d istintos quando

sim , serve para ilum inar a natureza artificial, construída, de qualquer contar cultural.

falados o u escritos. Tendo-se, portanto em m ente que o cód igo oral e o escrito têm valores diferentes,

Focar a atenção na feitura d o texto e em retórica, as­

A ssum e-se, portanto, que a textualização final da entrevista é d e a u t o r i a d o h is to ­ r ia d o r ,

send o o d ep oen te um c o l a b o r a d o r para a fabricação desse novo d ocu m ento.

procura-se corrigir essa desigualdade através da transcriação. Processa-se então uma

Pensando o texto final co m o um a obra que fazemos juntos, ficam validadas as reflexões

intensa atividade sobre o texto e a gravação, na qual palavras, frases e parágrafos serão

sobre o esforço de “m aquiagem co n tid o no p rocedim ento escolhido. D esd e o in ício

retirados, alterados ou acrescentados, perm itindo que o não literalm ente d ito seja dito.

da leitura da entrevista, esse esforço deve estar aparente, afinal, on d e estão as perguntas

Esse processo está ligado a criação d o t e a t r o d e li n g u a g e m , que é a passagem para o texto da com u nicação não-verbal: a em oção insinuada através de um a careta, de um sorriso ou de uma lagrima. Trabalho arduo, verdadeira lapidação da fala, que não poupa a con sciên cia d o historiador de dilem as éticos perante cada alteração, adição o u corte.

feitas aos entrevistados? C o m o se chegou a um texto corrido e limpo? N a textualização, a interferência do autor não deve ser negada, porem explicitada. (Fragmento do artigo de A. C. Gattaz, Lapidando a fala bruta: a textualização em história oral, em J. C. S. B. Meihy (org.), (R e )in tr o d u z in d o a h istó ria o r a l n o B ra sil, São Paulo, Xamã, 19 9 6 , p p . 1 3 5 -4 0 .)

O trabalho de textualização das entrevistas, uma “alteração” da transcrição literal, levanta problemas teóricos que devem ser considerados. O s oralistas que adotam essa postura, frequentemente são acusados de ficcionistas”, pois se considera ainda em m uitos

e - T R A N S C R IA Ç Ã O

EM

H IS T Ó R IA O R A L

espaços que a textualização pertence ao ramo da literatura, por ser um “em belezam ento”

U m dos conceitos-chave de certa H istória Oral (Viezzer, 1984; Burgos, 1987;

da transcrição literal que tira seu carater de verdade . Assim, cabe aqui retomar as ten­

Patai, 1989) e em particular da obra de José Carlos Sebe B om M eihy (1 9 9 0 , 1 991,

dências mais novas da antropologia, da crítica textual e d o fazer histórico, considerando

1 993, 1996a, 1996b , 1997) é o de transcriação. É ele que vai inspirar o trajeto de

que a poética —e a política —são inerentes a qualquer produção de análise cultural, e que

procedim entos e o espírito da transformação da fala do interlocutor, do m o m en to da

a ciência está d e n t r o , e não a c i m a , dos processos históricos e linguísticos.

entrevista passando pelos ú ltim os trabalhos com o texto até a interpretação.

A noção de que os procedim entos literários perm eiam qualquer trabalho de repre­

É o co n ceito de transcriação que, aplicado aos estudos de indivíduos, grupos ou

sentação cultural e um a ideia recente na antropologia. Para C lifford G eertz, processos

m esm o com unidades, dará outra d im ensão ao fazer das cham adas C iências H um anas,

c o m o m etáfora, figuração e narrativa afetam os m odos pelos quais os fen ôm enos

158

H is tó ria o ral

B - Textos para d iá lo g o s

levando-a ao lim ite da própria coerência; isto é, com o co n ceito de transcriação se abandona os estritos d om ín ios das Ciências, criando, além dos tradicionais paradigmas, outra dim ensão, no caso, de interpretação do presente.

e)

159

j u n t a r o s a s s u n to s q u e se s e p a r e m n o v a i v é m d a s p e r g u n t a s e d a s r e s p o s ta s ( 1 9 7 8 :

19-24). Esses “procedim entos” se aproxim am daqueles utilizados por alguns oralistas

Esse con ceito, em H aroldo de C am p os, está ligado ao de “Tradução co m o trans­

(Viezzer, 1984; Burgos, 1987; M eihy, 1 9 9 0 /1 9 9 1 ). O processo inteiro é de diálogo e

criação e transculturação, já que não só o texto, mas a série cultural (o “extratexto” de

de transcriação, sem usar esses term os. Sua perspectiva é jornalística. M as o resultado

Lotm an) se transtextualizam no im bricar-se subitâneo de tem pos e espaços literários

final garante a individualidade da voz, o poder de recriar um a vida, o sentid o ficcional

diversos” (1976a: 10), send o essa

tanto d o texto que lem os q uanto da vida, matéria desse texto. A ideia de “suprim ir as perguntas para proporcionar ao leitor um texto corrido e fácil de ser lid o” é a que

... tr a d u ç ã o c r i a t i v a [ . . . ] u m m o d o d e t r a d u z i r q u e se p r e o c u p a e m i n e n t e m e n t e c o m a r e c o n s tit u iç ã o d a in f o r m a ç ã o e s té tic a d o o r i g i n a l [ . . . ] n ã o lh e s e n d o p o r t a n t o p e r t i n e n t e o s i m p l e s e s co p o d i d á t i c o d e s e r v i r d e a u x i l i a r d e l e i t u r a d e s s e o r i g i n a l. S u a m i r a é p r o d u z i r u m te x to is o m ó r fic o e m r e la ç ã o à m a t r i z [ . . . ] , u m te x t o q u e , p o r se u tu r n o , a m b ic io n e a fir m a r -s e c o m o u m o r ig in a l a u tô n o m o .

vai ser o centro da criação textual e a que permitirá m aior com preensão não som en te do texto e da leitura, mas, fundam entalm ente, daquelas d im ensões interiores, que é preciso conhecer e criar de maneira a se respeitar aquele que fala e o vivido na sua d im ensão de sujeito, ou m elhor, na tradicional dim ensão de “sujeito da história”.

(1 9 9 8 : 6 7 ) Para M oem a Viezzer (1 9 8 4 ), com en tan d o seu trabalho com o d ep o im en to de

Enquanto em C am pos o conceito se “restringe” a ser uma tradução, se preocupando

D o m itila Barrios de Chungara, que trabalha com gravações que vão de 1975 a 1 977,

“em inentem ente com a reconstituição da informação estética do original” para servir de “leitura desse original”, e ainda por cima buscando uma isomorfia com o “original”, a nossa

O q u e a p r e s e n to a q u i n ã o é u m m o n ó lo g o d e D o m i t i l a c o n s ig o m e s m a . É o r e s u lta d o

questão é mais ampla, exigindo não só um conceito específico para a possível tradução,

d e n u m e r o s a s e n tr e v i s ta s q u e t i v e c o m e la n o M é x i c o e n a B o l í v i a ; d e s u a s in te r v e n ç õ e s

que teremos que fazer entre a fala e o processo geral de textualização, mas uma visão geral

n a t r i b u n a , a s s im c o m o e x p o s iç õ e s, p a l e s t r a s e d iá l o g o s q u e d e s e n v o lv e u c o m g r u p o s

das ficcionalidades enquanto memória, fala, transcrição, textualização e interpretação.

o p e r á r io s , e s t u d a n t e s e e m p r e g a d o s u n i v e r s i t á r i o s , h a b i t a n t e s d e b a i r r o s p o p u la r e s ,

A o m esm o tem po, toca de leve na questão de considerar o texto final o nosso referente ao am bicionar que o texto afirme-se “com o um original au tô n o m o ” (precisamos fugir das idéias de reflexo em seus mais ardilosos artifícios), além d o que, flexibiliza todo o

e x i la d o s la t i n o - a m e r i c a n o s [ . . . ] to d o esse m a t e r i a l g r a v a d o , c o m o t a m b é m a l g u m a c o r r e s p o n d ê n c ia e s c r ita , f o i o r d e n a d o e p o s t e r i o r m e n t e r e v is a d o c o m D o m i t i l a , d a n d o o r ig e m a o p r e s e n t e d e p o i m e n t o . ( 1 9 8 4 : 7 - 8 )

trajeto de criação textual, desrespeitando ao respeitar; m odificando ao compreender;

A qui se vislum bra n itidam en te um trabalho d e transcriação, de tornar um a m alha

criando ao entender a criação; fugindo ao texto co m o ícone; ao autor com o ídolo e ao

de perguntas e respostas num texto, num a m alha ficcional, se bem que essa instância

texto com o referência, que não é nada mais que o conceito de objeto em ação.

ficcional escape com pletam ente aos interesses reais, políticos e teóricos tanto de Viezzer

U m dos primeiros textos que conhecem os, em que há interferência na fala do cola­ borador é a introdução de C láu dio Lacerda Paiva (1 9 7 8 ) no “D ep o im en to ” de Carlos Lacerda, dentro, ainda, de um “d ep oim en to jornalístico”. Suas idéias se organizam e se con stitu em c o m o procedim entos preciosos, ainda hoje úteis para nosso trabalho:

quanto de D om itila. N o entanto, há um a força de m odificação atuando e reordenando, perm itindo, cortando, rem ontando, assum indo e deixando; e o resultado faz aparecer seu cuidado e seu m edo ao dizer que “o que apresento aqui não é um m o n o lo g o , nos garantindo que o m o n ó lo g o é aparente. “Propositadam ente, m antive essa linguagem que forma parte intrínseca de seu d ep o im en to ” (1 9 8 4 : 8). O resultado é a saída visível

a ) é p r e c is o d e i x a r o “d e p o e n t e ”f a l a r li v r e m e n t e d a v i d a e d a s u a v i d a , c o n t a r o q u e f e z , o q u e d e i x o u d e f a z e r e d e i x a r q u e e le d ê s u a in te r p r e t a ç ã o d e tu d o ;

do entrevistador, deixando falar e viver o outro. A qui aparece tam bém um p ro ced im en to que so m en te com M eih y tom ará corpo

b ) m a n t e r u m to m c o lo q u ia l, d e i x a n d o a im p r e s s ã o d e e s ta r o u v i n d o o d e p o e n te ,

m eto d o ló g ico . A figura d aq u ilo q ue ele cham ará de colaborador e d o trabalho com

c r ia n d o u m a p o n t u a ç ã o q u e m a n t e n h a a e x a t a e n to n a ç ã o d a c o n v e rsa ;

esse colaborador aparece n itid am en te q u an d o V iezzer diz que o texto transcriado

c ) d e i x a r , n o r e s u l ta d o f i n a l , o c o n s t a n t e v a i v é m c r o n o ló g ic o ;

foi “posteriorm en te revisado co m D o m itila ”, d eixan do bem claro que a resultante

d ) s u p r im ir a s p e r g u n ta s p a r a p r o p o r c io n a r a o le ito r u m te x to c o r r id o e f á c i l d e

textual é em colaboração, resulta de um processo in term iten te não so m en te de

se r lid o :

m últiplas entrevistas, mas de um a fusão de entrevistas, de m o m en to s e histórias n um texto “ú n ic o ”.

160

B-Textos para diálogos

História oral

1 61

C o m Elizabeth Burgos (1 9 8 7 ) tem os um a m aior elaboração textual e aprim ora­

C riam os, em con ju n to, o texto, que, no caso, deixa de ser tratado co m o um d o ­

m en to m etod ológico. A m eta a que se propõe é com plexa e é um passo fundam ental

cu m en to, c o m o um a referência, um “dado concreto” e juridicam ente certo, p odend o

na criação com p leta do texto em “d iálogo”, não som en te em d o cu m en to , mas num

servir co m o prova: o texto é feixe vivo de ficcionalidades: é interferência virtual de

trabalho nitidam ente “ficcional”, se bem que ela não se dê con ta inteiram ente disso. O

todos os participantes: o texto nasce de um d iálogo e não é m ais que um m o m en to

pesquisador aqui não é mais o especialista das cinzas, o técnico do m o fo nem o infeliz

narrativo: ele não representa um passado, um a sociedade, um in divídu o, um a classe,

am ante p latôn ico de um tipo m orto de passado: sua matéria é o presente e o passado

um a cultura o u m esm o um a fala: o texto representa-se en q uan to intransitividade

que o acom panha por dentro, d and o-lh e m últiplas dim ensões, profundidades, reen­

viva. C o m o é possibilidade m últipla de leitura, advinda de um m o m en to narrativo,

trâncias, vozes, formas, sutilezas, em oções e aquela viva identidade que o caracteriza

m últiplas escolhas das partes envolvidas, tanto n o d iálogo quan to na textualização,

num a m esm a e virtual ficcionalidade viva.

não tem nem exige as tradicionais m aneiras de ler e interpretar.

Para M eihy, criando a base na qual desenvolverem os nossa ideia, a transcriação é

(Fragm ento d o artigo de A lberto Lins C aldas, Transcriação em H istória O ral, em N eh o-H istória, R e vista d o N ú c le o d e E stu dos em H istó ria O ra l, São Paulo, n. 1, usp / fflch / d h , n ovem bro,

... a f a s e f i n a l d o t r a b a l h o d o s d isc u r so s. [ . . . ] T e a t r a liz a n d o - s e o q u e f o i d i t o , r e c r ia n d o - s e

1 9 9 9 , pp. 7 1 -9 .)

a a t m o s f e r a d a e n tr e v i s ta , p r o c u r a - s e t r a z e r a o l e i t o r o m u n d o d e s e n sa ç õ e s p r o v o c a d a s p e l o c o n ta t o , e c o m o é e v id e n te , isso n ã o o c o r r e r ía r e p r o d u z i n d o - s e o q u e f o i d i t o p a l a v r a p o r p a la v r a . [ . . . ] te m c o m o f i t o tr a z e r a o le ito r a a u r a d o m o m e n to d a g ra v a ç ã o . [ .. . ]

f -

C O L A B O R A Ç Ã O / M E D IA Ç Ã O

O f a z e r d o n o v o te x to p e r m i t e q u e se p e n s e a e n t r e v i s t a c o m o a lg o f i c c i o n a l e, s e m

Para o pesquisador de história oral, sem pre foi mais fácil fazer entrevistas com

c o n s tr a n g im e n to , se a c e i t a essa c o n d iç ã o n o l u g a r d e u m a c i e n t i f i c i d a d e q u e s e r ia m a i s

sujeitos com os quais sim patiza de antem ão. É certo que entre os funcionários a serem

p o s t i ç a . C o m isso, v a l o r i z a - s e a n a r r a t i v a e n q u a n t o u m e l e m e n t o c o m u n i c a t i v o p r e n h e

entrevistados existiam m ilitantes de esquerda, mas m uitos tinham um perfil mais

d e su g estõ es. [ . . . ] N e s s e p r o c e d i m e n t o , u m a a t i t u d e s e t o r n a v i t a l : a l e g i t i m a ç ã o d a s

am bíguo e outros defendiam abertam ente posições políticas de direita, levantando

e n t r e v i s t a s p o r p a r t e d o s d e p o e n te s . ( 1 9 9 1 : 3 0 - 1 )

objeções, por exem plo, aos direitos hum anos. Essas questões colocavam -se sobrem a­

T o d o o processo (do “projeto”, passando pelas entrevistas, com o trabalho de “criar o

neira em relação aos m onitores, que, co m o os funcionários diretam ente responsáveis

texto”, até o texto “final”) faz pane de uma transcriação hermenêutica, que não é apenas a

pela con ten ção do adolescente infrator e pela segurança nas unidades educacionais,

“m odificação” ou “fase final dos trabalhos dos discursos”, mas concepção e visão de m undo,

eram vistos co m o torturadores e violen tos pela im prensa e pelos internos.

não som ente de com o se produz um texto, mas sobre o fundam ento da própria realidade, sendo, portanto, parte inextirpável da própria estrutura interpretativa.

D e que forma o historiador oral podería estabelecer uma relação de colaboração com eles? As situações de entrevistas devido a esse perfil dos entrevistados envolveram circuns­

A transcriação não p ode ser som en te um a “textualização” o u o fim de um a “tex-

tâncias delicadas, nas quais procuram os m anter um a postura que garantisse o registro

tualização”, não p ode ser texto, mas processo que exige, n o caso, um a postura geral

das experiências e das reflexões dos entrevistados, m esm o que estes defendessem idéias

e um a textualização radical.

e práticas às quais nos opuséssem os veem en tem ente. Essa postura significou cuidados

A o m esm o tem po, o co n ceito de transcriação instaura um desequilíbrio e um es­

com a con d ução da entrevista oral, baseados no co n h ecim en to sobre os efeitos das

tranham ento radical ao desm antelar o tradicional respeito e distância entre o sujeito e

perguntas, dos cód igos não-verbais e da relação entre entrevistado e entrevistador no

o ob jeto (tod o ob jeto é criação do ser social, não p od en d o ser pensado separado desse

resultado das narrativas.

fun dam en to). O con ceito de transcriação traduz um a ação criativa e um a relação viva

N o sso objetivo durante as entrevistas era mediar e estimular a construção da narra­

entre as clássicas d icotom ias (sujeito-objeto, eu -tu , oral-escrito, docu m ento-p esq u isa-

tiva pelos narradores, perm itindo que desenvolvessem seus argum entos e expusessem

dor) superando-as sem fazer-lhes concessões. N o processo transcriativo, as d icotom ias

suas idéias, sem serem im pedidos o u se sentirem diretam ente contestados. Procuramos

lógicas, necessárias a qualquer instauração científica, cedem lugar a um a ficcionalidade

respeitar o direito de eles pensarem diferente, sabendo que a narrativa deveria refletir

viva, a um sujeito e a um m u n d o sem os lim ites que lhe são norm alm ente im postos,

a visão de m un do do narrador, ainda que essa interagisse necessariamente com a nossa

bem lon ge dos lim ites científicos d e um a m etafísica caduca e perigosa, vivend o o

durante o processo de rememoração. Evidentem ente, esses e outros cuidados não retiram

in definid o co m o con d ição de existência.

162

B-

História oral

Textos para d iá lo g o s

163

das narrações os toldos da autocensura e das preocupações referentes à construção de

que podia incluir seus familiares, am igos, pares, adversários, superiores hierárquicos,

uma determ inada im agem que o entrevistado pretendesse transmitir de acordo com um

a im prensa, a sociedade co m o um todo.

con jun to de fatores subjetivos e conjunturais[...](pp. 4 1 -2 )

Evitam os gravar, na maioria dos casos, a entrevista logo n o prim eiro encontro.

[...] O s narradores n orm alm ente im aginavam a ação de entrevista co m o se des­

Preocupava-nos inicialm ente com a apresentação e explicação do projeto, exp on do

dobrando exclusivam ente no esquem a de pergunta e resposta. H ou ve estranham ento

seus objetivos e a m etodologia de coleta e transcrição das entrevistas. O narrador aderia

diante da proposta de entrevistas não-diretivas e precisam os convencer m uitos en ­

ou não ao projeto e marcava a data e o lugar do encontro, p od en d o optar por dar a

trevistados da pertinência de um a entrevista sem o uso de questionário e que corria

entrevista em sua residência ou na instituição.

com poucas intervenções.

Pedimos apenas que o local escolhido preservasse a intim idade do processo, se possível

A op ção por entrevistas não diretivas visou criar as con d ições para construção de

fosse. D e nossa parte, procuramos sempre criar as condições para que o entrevistado se sen­

narrativas mais livres, de forma a revelar temas, soluções discursivas e encam inham entos

tisse à vontade para construir sua narrativa com um m ínim o de interrupções, procurando

priorizados pelos narradores e não aqueles previam ente im aginados pelo entrevistador.

não nos aterm os a horários e nos colocan do à inteira disposição do narrador, (p p .54-6)

N esse sentid o, segun do Passerini:

(Fragmento da dissertação de mestrado de Fábio Bezerra de Brito, E cos d a

febem :

v id a d e fu n c io n á rio s d a F u n dação E s ta d u a l d e B e m -E sta r d o M e n o r d e S ão P a u lo , A o p o r t u n i d a d e d a s h is t ó r i a s p e s s o a is , q u a n d o in s c r ita s n a v i d a c o t i d i a n a , e s t i m u l a r e f e r ê n c ia s s o b r e s u a e x c e p c i o n a l i d a d e

Programa de Pós-Graduação em História Social da

usp ,

h istó ria o ra l d e

apresentada no

1992, pp. 41-2/ 54-6.)

- o u s e ja , a s c a r a c te r ís t ic a s q u e f a z e m u m

i n d i v í d u o d i f e r e n t e d o o u tr o . U m q u e s t i o n á r i o i m p l í c i t o , n o e n t a n t o , s u g e r e q u e a u n i f o r m i d a d e é o q u e s e c o n ta .

C am bridge

up,

(L. Passerini, F a s c is m in p o p u l a r m e m o r y [Cambridge:

1988, p. 8.])

g - O C A R Á T E R P Ú B L IC O D A H IS T Ó R IA O R A L

O que se pretende em estu dos de história oral, e nesse em particular, é p ossib i­

As entrevistas de história oral se desdobram nos limites do cam po formado pela relação

litar ao entrevistado registrar a sua história de vida, c o m o os fatos foram sentid os,

dialógica e historicamente determinada que se estabeleceu entre entrevistador e entrevis­

co m p reen d id o s e m esm o reinterpretados por aquele q ue os viveu. P retende-se não

tado. Elas carregaram, portanto, as marcas de ações mais ou m enos conscientes de ambas

só reviver a experiência cotid ian a, mas tam b ém analisar c o m o essa foi sentida em

as partes que tinham objetivos particulares em relação ao produto final da entrevista.

relação aos a co n tecim en to s ec o n ô m ic o s, sociais, p o lítico s, culturais e religiosos em

A construção narrativa não foi um exercício m ecânico e neutro de encadeam ento de fatos pelos entrevistados. Eles realizaram operações de seleção e recorte dos fatos,

que estiveram inseridos. N ã o p odem os desconsiderar ainda a im portância da história oral sob outro as­

hierarquizaram acon tecim entos e os apresentaram acom panhados de juízos de valor,

pecto. Em C a n t o d e M o r t e K a i o w á , José Carlos Sebe cham a-nos a atenção acerca do

assim co m o estruturaram seus argum entos sem pre com algum grau de reflexão sobre

caráter p úb lico da história oral e sua capacidade de interessados e leitores com u n s da

as atitudes e ações pretéritas. Em últim a instância, eles construíram um a narrativa

história, pois os textos produzidos, acessíveis e agradáveis, mas nem por isso m enos

ten do em vista um a determ inada im agem que pretendiam passar de si m esm os.

“científicos”, tornam -se leitura pública, am pliando o acesso ao saber.

Essa construção de um a im agem podia ser um m o v im en to m ais introspectivo,

(Fragmento da dissertação de S. A. Osman, C a m in h o s d a im ig ra çã o á ra b e em S ão P au lo: h istó ria apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social da

algo c o m o um acerto de contas com o passado, que, entre outros objetivos, podia

o ra l d e v id a f a m ilia r ,

servir para justificar p osições presentes ou para mostrar o quan to se foi injustiçado.

São Paulo, 1998, pp. 17-8.)

usp ,

A intenção d om in an te tam bém podia ser a de se defender de críticas o u atacar idéias ou grupos específicos dos quais se discordava. A entrevista tornava-se um m eio privilegiado para o entrevistado defender suas idéias, um a vez que ele podia desenvolver livrem ente seus argum entos sem objeções. A ação d o entrevistado co m o narrador transcorria em relação a um a audiência visível e aparente —o pesquisador —, mas tam bém em relação a um a audiência mais ampla,

h -

DEVOLUÇÃO

O que falar sobre o processo de devolução? A cho que para falar de devolução é preciso com eçar explicar um p ouco sobre o processo de pesquisa, tom an d o co m o exem plo m inha pesquisa de m estrado. N o m o m en to em que a história oral pensa no entrevistado, não apenas co m o um d ep oen te e sim co m o um colaborador agente ativo

164

História oral

B-

Textos para diálogos

165

de sua história, ten ho q ue adm itir que fui colocada em xeque pelos procedim entos que

m inha vida tão urbana acabou regida por eles. Porém, o tem p o cíclico e aparentem ente

resolvi seguir, desde o in ício dessa pesquisa. N ã o posso dizer que selecionei a família

m o n ó to n o dessa com u nid ade é rom pido pelas discussões que envolvem o processo

a ser entrevistada; foi ela quem m e escolheu, desde o prim eiro m o m en to . A casa de

produtivo e o fu n cion am en to da cooperativa.

D o n a A na e de seu T on in h o sem pre esteve de portas abertas. E foi na com panhia de

A finalização de m inha pesquisa de cam po d eu-se de forma bastante forte. N o dia 8

Márcia que tive os prim eiros con tatos com a com u nid ade. D essa form a, selecionei

de dezem bro de 2 0 0 1 , M árcia celebrou seu casam ento com José Luiz. Fui convidada,

as três entrevistas da fam ília de seu T on in h o, para com p or o corpo dessa dissertação.

não apenas para a festa, mas para pensar com ela sobre co m o seria a cerim ônia e

Foi tam bém nessa casa que nasceu outro projeto. Seu T on in h o co m p õ e m odas de

organizar tudo. Foi um prazer estar ali “n um m o m en to de tanta m ística”. Senti que

viola, em várias ocasiões ouvi tocar e cantar suas m úsicas. A lgum as vezes, to co u para

tinha realizado m uitas coisas jun to àquela fam ília ao lo n g o desses três anos. N aquele

m im ; em outras, ensaiava sozinh o no quarto, durante horas, sem pre depois de voltar

dia, m inha “coleta de dados” acabou. A ssim , Márcia e eu, que n o prim eiro dia de

d o serviço da roça. Em alguns dias, seu irm ão caçula, Z ezin h o, vinha ensaiar tam bém ,

pesquisa son ham os juntas, term inávam os essa etapa de nossas vidas, tam bém juntas.

era q uan do aconteciam verdadeiros saraus na pequena varanda da casa.

D eixan d o espaço para as m uitas experiências que ainda virão.

Em um desses eventos, o am igo R odrigo Garcez estava presente. Foi então que

(Fragm ento da d issertação de m estrado d e Suzana Lopes Salgado R ibeiro, Processos d e m u d a n ç a

perguntam os para seu T on in h o se ele gostaria de ter gravadas suas com p osições. “T odo

n o MST: h istó ria d e u m a f a m ília co o p era d a , apresentada n o Program a d e P ós-G raduação em

com p ositor sonha em ter suas m úsicas gravadas, nem que seja em fita”. Gravamos

H istória Social da usp , São Paulo, 2 0 0 2 .)

a fita. N aqu ele m om en to, surgiu a ideia de que, co m o seu T on in h o, poderia haver m u itos outros cantadores na fazenda. Surgia um n ovo projeto, paralelo, pois Rodrigo,

i -

M E D IA Ç Ã O

por ser estudante de com unicação, interessou-se em gravar um C D com essas músicas. A m inh a pesquisa de história oral se con centrou no estu do h istórico de um a C D M o v i m e n t o n o a r foi parte d o trabalho de conclusão de curso d o D eparta­ m en to de C in em a, Rádio e Televisão da

ec a - u s p

de R odrigo Garcez. Ele foi gravado

n o estúdio da Rádio C am ponesa e lançado durante a Sem ana O lím p ica, em m aio de 2 0 0 1 . N ele há com p osições de sete cantadores d o assentam ento, dentre eles a dupla

família em que quatro gerações coexistiam e podiam ser entrevistadas, e um a delas que já havia desaparecido era profundam ente con h ecida por várias pessoas de forma que p ud e reconstruir sua história tam bém . Tratava-se de um a fam ília judia alem ã, da região da Silésia, que imigra para o Brasil devid o à perseguição nazista.

“T on in h o e Z ezin h o”, que canta e toca 14 m úsicas de autoria de T on in ho. C o n v iv i in ten sa m en te d urante algu ns anos co m os vários ram os dessa fam ília, E xponho aqui a realização desse outro projeto, pois considero que o C D seja retorno de parte d e m eu trabalho ju n to à com u nid ade. À m edida que sua existência é tam bém

e até h oje n os c o m u n ic a m o s regularm en te. Participava das festas fam iliares, dos p rob lem as, d os co n flito s.

fruto da pesquisa que já tinha sido iniciada. N o m o m en to de seu lançam ento, cheguei a pensar que foi a m elhor parte da pesquisa, pois d ificilm ente um texto co m o esse será apropriado, co m o foi o C D . C ertam ente dará outras respostas, mas foi m u ito bom

Q uando levei a transcriação para m eus entrevistados, houve reações m uito diferentes. Havia algumas pessoas que exerciam um a liderança familiar; essas ficaram absolutam ente encantadas e pediram que eu elim inasse alguns trechos que lhes pareciam com prom ete­

som ar à m inha experiência de cam p o a em oção daquela noite.

dores e com pusesse um livro isolado para eles deixarem para seus antepassados. Assim C o m isso p osso dizer que m inha participação nessa com u n id ad e se deu das formas mais inusitadas possíveis. Fui pesquisadora a m aior parte d o tem po. M as m e envolvi na gravação de um C D . N a realização de um d ocu m entário, que acabou por não se concretizar. A judei na organização de festas. Fui jurada de gincana e juíza de jogos. A lém de ser consultada em reuniões dos coletivos de discussão do

m st

regional e ainda

fiz. A pessoa que ‘se sentia mais próxim a de m im , e que m e guiou para os diversos en ­ trevistados possíveis, recebeu com tanto entusiasm o, que precisou com pletar com alguns sentim entos certas passagens e escreveu várias cartas de próprio punho, m ostrando o quanto, após a leitura da entrevista, suas perspectivas haviam m udado: m udou seu tipo de trabalho, se separou, candidatou-se a cargo público.

participar de reuniões e assembléias. M as talvez o m ais interessante tenha sid o o que acon teceu q u an d o cada um D essa form a, fiz m uitas viagens para Itapeva. O plantio e a colheita do feijão pas­ saram a ser um a constante, eles aparecem com frequência nas entrevistas. E até m esm o

leu algum as passagens da entrevista dos outros m em bros da fam ília. Eram ramos que se tinham afastado m u ito uns dos ou tros, pois cu lturalm en te, so cia lm en te e

166

H is tó ria o ra l

e c o n o m ic a m e n te , e m esm o geograficam en te, se separaram d em ais. C ito apenas duas consequências: a . os ra m o s f a m ilia r e s se to r n a r a m m u ito m a is p r ó x im o s , p a s s a r a m a se f r e q u e n ta r d e n o v o , a p r o m o v e r e n c o n tr o s p a r a tr o c a r , se p r e s e n te a r , se o u v ir , t i r a r f o to s , e s ta r

P A L A V R A S F IN A IS

j u n t o s . O s d o R io p a s s a r a m a v i r a S ã o P a u l o e v ic e -v e r s a . b. N u m d o s r a m o s f a m i l i a r e s , h a v i a u m caso e x tr e m o d e a b u s o i n f a n til ; o p a i h a v i a a b u s a d o s e x u a lm e n te d a f i l h a , e t u d o e r a m a n t i d o s o b e n o r m e s ilê n c io . P o r o c a s iã o d a l e i t u r a d a s e n tr e v is ta s d esse r a m o f a m i l i a r , o a b u s o v e io à to n a , p r o v o c a n d o u m g r a n d e tu r b ilh ã o n u m p r i m e i r o m o m e n to ; m a s h o u v e d e p o is u m a c e r im ô n ia d e p e r d ã o : o p a i p e d i u p e r d ã o , se a r r e p e n d e u , co n fesso u e s ta r c o m p le t a m e n te tr a n s to r n a d o e m f u n ç ã o d e t e r s id o p r e s o n o c a m p o d e c o n c e n tr a ç ã o n a z i s t a e d a im ig r a ç ã o , e a f i l h a p ô d e p e r d o a r , e, lo g o e m s e g u id a , esse p a i v e io a f a le c e r .

Para m im a experiência de d evolução foi intensa, pois ela m e m ostrou com clareza que aquele que lia a entrevista já havia se transform ado pelo fato de tê-la dado e ter refletido sobre certos tem as, e ao lerm os juntos isso ficava m u ito patente: nem eu,

“É in qu estion ável q ue, ao fazer a afirm ação,

nem o entrevistado não éram os os m esm os d epois da entrevista. O texto registrava

forn eço um a boa base para se fazer certos julgam en tos

um d o cu m en to familiar, mas que ao m esm o tem po precisaria ser reiniciado, pois a

sobre o q u e acred ito.”

perspectiva d o passado mudara e o sentid o d o futuro tam bém . O que m e faz sempre

H arry G . Frankfurt

pensar que o d o cu m en to de história oral é um d o cu m en to transitório, que tem o valor do m o m en to em que é textualizado e transcriado —o que não é negativo - , pois m ostra seu valor interventivo e transform ador de realidades, que estavam , de certa form a, estagnadas em padrões repetitivos de pensar, sentir e agir. (R elato d e S ôn ia N o v in sk y sobre sua experiência em história oral. A autora d efen d eu a tese

A ju n ç ã o de m o d e lo s p rá tic o s c o m u m a d e m o n stra ç ã o reflexiva - de c o m o fazer u m tip o de h istó ria o ral - p o r certo p ro v o cará e n te n d im e n to s e co n trastes. O q u e se b u sco u foi a p o n ta r u m a o rie n ta ç ão fu n d a m e n ta d a ,

d e d ou torad o: A s m o ed a s erra n tes - n a rra tiv a s d e u m clã g e rm a n o -ju d a ic o ce n ten á rio , Programa

in s tru íd a e p ro v ad a e m vários tra b a lh o s. P or certo , valoriza-se o esforço

d e P ós-G rad uação em H istória S ocial da usp , São Paulo, 2 0 0 1 .)

de o u tra s linhas, m as, além d a p ro v ocação, p re te n d e u -se ex ib ir u m a al­ te rn a tiv a n a q u al se acred ita. O s fu n d a m e n to s básicos são:

1 - h istó ria oral n ã o é só en tre v ista , a in d a q u e en tre v ista s fa ça m p arte d e u m a a b o rd a g em da h istó r ia oral; 2 - o atraso b rasileiro na c o m p a tib iliz a ç ã o c o m o u tra s ex p er iê n c ia s p r o v o c o u d u a s m a n ife s ta ç õ e s estra n h a s a o n o s s o m eio : a — a in sp ira ç ã o teó r ica feita alh u res e c o m p a tív e l c o m o u tra s realidades; b — a lim ita ç ã o d e tra b a lh o s d e c a m p o q u e d isc u ta m a situ a ç ã o local in d e p e n d e n t e m e n t e d e e v o c a ç õ e s a b u siv a s v o lta d a s q u a se se m p r e à d isc u ssã o a lh eia ao ca so a b o rd a d o ;

168

H is tó ria o ra l

3 - a c o n sta n te p rática d e usar en trevista c o m o so lu çã o c o m p le m e n ta r faz c o m q u e sejam b lo q u e a d o s o s m e c a n is m o s ca p a zes d e lh es g a ra n tir c o n d iç ã o a u tô n o m a , c o m o é d esejável;

B IB L IO G R A F IA

4 - o m a l-e sta r r e su lta n te d a d o m in a ç ã o d o s h isto r ia d o r e s faz c o m q u e o u tr o s s e g m e n to s d iscip lin a r es n ã o r e c o n h e ç a m a a u to n o m ia d a h istó ria oral, a in d a q u e m u ito s d esses p e sq u isa d o r es n ã o se sin ta m b e m c o m o “h isto r ia d o r e s orais”; 5 - a d e sc r iç ã o d e p r o c e d im e n to s visa a m ostra r c o n d u ta s cap azes d e in stru ir p r o c e d im e n to s e favorecer e v e n tu a is an á lises.

In stitu c io n a liz a d o sob o n o m e N ú c leo de E studos em H istó ria O ra l neho

— sed ia d o n o D e p a rta m e n to d e H is tó ria d a U n iv e rsid ad e de São

Paulo, a ex p eriên cia re o rie n ta d a n o p resen te v o lu m e a testa investidas q u e têm sido b e m aceitas. N ã o apenas no Brasil, m as ta m b é m em países co m o

Abreu, Alzira Alves de.

A n g o la, C o lô m b ia , M éx ico , E stados U n id o s, e n tre o u tro s , a p rá tic a do

Alberti, Verena.

neho

se coloca c o m o a lte rn a tiv a significativa. Pelo v o lu m e de trab alh o s

pub licad o s pelo g ru p o , não resta d ú v id a d a eficácia dessa experiência. M as, c o m o se ate sta q u e h istó ria oral é s in ô n im o d e d e m o c rac ia , as ev en tu ais c o n te sta ç õ es m o stra m -se b e m -v in d a s.

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M estrado,

“H i s t ó r i a o r a l : c o m o f a z e r , c o m o p e n s a r

é um guia obrigatório para a prod ução d e

projetos em história oral. N o co n tex to nacional, certa m ente haverá um antes e um d ep o is d este livro. D e form a criativa e didática, o s procedim entos d em on strad os am param -se em precisa fun dam en tação teórica. T u do enq uad rad o n o d eb a te so b re pertinência da história oral n o Brasil. Trata-se d e uma d iscu ssão atual e instruída sob re o significado da pesq uisa e da con stru ção d o co n h ecim e n to n o m u n d o g lo b a liza d o , dentro e fora das universidades. A presentado sob re vários ân gu los, o d eb a te e x p õ e alternativas d o u so da história oral c o m o ferramenta, técnica, m etod ologia, co n h ecim e n to o u m esm o c o m o nova disciplina. Rigor e exp eriên cia na área fazem d este tex to um e lo g io a o s n o v o s rum os d o co n h ecim e n to e sua utilidade social. A lém d o grande valor c o m o prod ução intelectual, o livro é d e leitura agradável e fluente, a o m esm o tem p o em q u e estim ula a reflexão e co n vid a à prática d o leitor." - V ara D u lc e B a n d e ir a d e A ta íd e ,

ineu -

Salvador

J o s é C a r l o s S e b e B . M e i h y é um d o s introdutores da m oderna história oral no Brasil.

C oord en ador d o N ú cleo d e Estudos e m História Oral da U niversidade d e São P aulo ( xeiio / i si>), é p rofessor titular ap osen ta d o d o D epartam ento d e História da i si>. pn ifesst >ra adjunta d i»1 )epartam ento d e 1íistória tia I Jniversidade Federal d e Rondônia, doutora em História Social pela i si> e pesquisadora associada d o neho/ i si>.

F a b ío la H o la n d a

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editora

c o n te x to

Promovendo a Circulação do Saber

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9 78-8Í>-7244-376-0