Hermenêutica e aplicação do direito [20 ed.]
 9788530934477

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Carlos Maximiliano 20a edição r

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O AUTOR Carlos Maximiliano Pereira dos Santos, que costumava assinar apenas Carlos Maxi­

miliano, nascido em 24 de abril de 1873, na Vila de São Jerônimo, na então Província do Rio Grande do Sul. Iniciou seu curso de Direito na Faculda­ de de São Paulo, mas, ao fim de um ano, transferiu-se para a Faculdade de Minas Ge­ rais, então em Ouro Preto. Bacharelou-se em 1898. Eleito Deputado Federal em 1911, teve mandato renovado em 1912. Começou aí sua projeção nacional. Convidado pelo Presidente Wenceslau Braz, assumiu, em 1914, as funções de Minis­ tro da Justiça e Negócios Interiores. A Pasta abrangia também Educação e Saúde Pública. No campo do ensino secundário, estabe­ leceu o exame vestibular. No tocante à Saú­ de, instituiu o combate às endemias rurais. No setor da Justiça, restabeleceu o respeito às decisões do Poder Judiciário. Pela Ordem Pública, para evitar excessos ou fraqueza da Polícia, comparecia sempre em pessoa onde havia perturbações de ordem. Contribuiu, também, para a conclusão do Código Civil.

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p re ço s ju s lo s , g e ra n d o b e n e fíc io s e s e rv in d o a a u to re s, d o c e n te s , liv re iro s , lu n c io n á r io s , co la b o ra

d o re s e a c io n is ta s . N o sso c o m p o rta m e n to é tic o in c o n d ic io n a l e n o ssa re s|)o u sa b ilid a < lc so c ia l c a m b ie n ta l sao iv lo i ç a ilo s pela n a tu re za e d u c a i lo im l de n o ssa a t iv id a d e , se m t o m p ro m e te i o .

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Hermenêutica e Aplicação do Dlrolto | Carlos Maxlmillano

lhes o significado e descobrir-lhes o conteúdo constituem para ele o objetivo prin­ cipal, porém não - exclusivo. Já se expõe ao risco de forçar um pouco o sentido dos vocábulos aquele que inclui na denom inação de leis o D ireito Consuetudinário; decretos do Poder Executivo; regulam entos em geral; avisos e portarias m i­ nisteriais; instruções e circulares de autoridades adm inistrativas19 (1). Entretanto, ainda assim a epígrafe adotada varreria, im plicitam ente, do cam po da Interpreta-

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2 - (1) Francesco Degni faz a inclusão mencionada; embora no mesmo livro, distinga da in­ terpretação das leis a do Direito Consuetudinário (l'lnterpretazione delia Legge, 1909, p. 2 e 50-56). (2) Paul Vander Eycken - M éthode Positive de l'lnterprétation Juridique, 1907, p. 18. Parecem elucidativas algumas definições formuladas por afamados jurisconsultos: "Interpretação é a pesquisa e a explicação do sentido da lei" (Coviello - M anuale di Diritto Civile Italiano, 2- ed., 1915, vol. I, n8 62). Semelhante é o dizer de Ahrens - Encyclopédie Juridique, trad. Chauffard, vol. I, p. 104. "Chama-se Interpretação a determinação do verdadeiro significado da norma jurídica" (Bierling, Professor da Universidade de Greifswald, vol. IV, p. 197). Pensam do mesmo modo Pacifici-Mazzoni (Instituzioni di Diritto Civile Italiano, 3§ ed., vol. I, p. 30, n8 16) e Caldara (op. cit., p. 5). "Interpretação é a atividade científica dirigida para descobrir o conteúdo de uma norma ju rí­ dica" (C rom e- S y ste m des Deutschen Bürgerlichen Rechts, 1900-1912, vol. I, p. 96). Pronun­ ciaram-se de maneira quase igual Windscheid (Lehrbuch des Pandektenrechts, 8 ã ed., vol. I, p. 81), Dernburg (Pandette, trad. Cicala, vol. I, p. 85), Gludice (Enciclopédia Giuridica, 2§ ed., p. 30), Ferrini {Diritto Romano, 1898, p. 7) e Savigny (op. e trad. cit., vol. I, p. 202). "A Interpretação descobre o conteúdo de um texto legal e o exprime por outras palavras" (Gmür, op. cit. p. 35). "Chama-se Interpretação a operação lógica efetuada para se compreender o que a lei pres­ creve, o m ens ou sententia legis ou legislatoris" (Bonfante - Instituzioni di Diritto Romano, 2a ed., p. 23). "Interpretar a lei é revelar o pensamento que anima as suas palavras" (Clóvis Beviláqua - Te­ oria Geral do Direito Civil, p. 47). "Prescreve-se a Interpretação, em geral, - para fixar a regra de determinada relação jurídica mediante a percepção clara e exata da norma sancionada pelo legislador" (Pasquale F io re Delle Disposizioni Generali sulla Pubblicazione, Applicazione ed Interpretazione delle Leggi, 1890, vol. II, p. 517). "Interpretação é a declaração precisa do conteúdo e do verdadeiro sentido das normas ju rídi­ cas" (Espínola - Sistem a do Direito Civil Brasileiro, 1908, vol. I, p. 125). Opinaram em termos mais ou menos idênticos Henri Capitant (Introduction à l'Étude du Droit Civil, 3 ã ed., 72) e Degni (op. cit., p. 1). "Explicar o sentido e o alcance da norma jurídica - eis a tarefa da Interpretação" (Korkounov, Prof. da Universidade de Petrogrado, op. e trad. cit., p. 525). Doutrinaram de acordo com o mestre russo: Baudry-Lacantinerie & Houques-Fourcade ( Traité théorique e t pratique de Droit Civil, Des Personnes, 2? ed., vol., I, n8 240), Planiol (Traité Élém entaire de Droit Civil, 7§ ed., vol. I, n8 215) e Kohler, Prof. da Universidade de Berlim (vol. I, p. 122). Do confronto e da crítica das várias definições transcritas resultará talvez justificada a prefe­ rência pelo conceito seguinte, que é o transunto de todas elas, a Interpretação tem po r objeto determ inar o sentido e o alcance das expressões do Direito.

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ção, m ateriais que ali deveriam ser colocados: usos, decisões judiciárias; contratos, testam entos e outros atos jurídicos; ajustes e tratados internacionais; convenções interestaduais ou interm unicipais. D iscrim inam -se as m encionadas ordens diferen­ tes de prescrições conform e o agente de que em anam ; conservam , todavia, uma essência com um ; são fenôm enos jurídicos; enquadram -se em um a denom inação geral —expressões do D ireito (2). V O N T A D E DO LEG ISLADOR

23 —Prcceituava a Escola da Exegese em D ireito Positivo, a corrente tradici nalista p o r excelência, que o objetivo do intérprete seria descobrir, através da iioi ma jurídica, e revelar - a vontade, a intenção, o pensam ento do legislador" ( I ). N a verdade os sofistas ensinavam , outrora, que a norm a jurídica nascia de um acordo entre os cidadãos acerca do que se devia fazer ou deixar de fazer. () legislador criava o Direito; este surgia com o produto de opiniões ou convicções individuais (2). A vetusta Escola Teológica repeliu esse conceito; porque fez o Direito provir do céu, com o ideia inata, inscrita nas alm as pelo próprio Deus. Nenhum jurista a altura da sua época ousará hoje sustentar a doutrina dos sofistas atenienses, f in todo caso, predom inou até o século XVIII a crença de que o Direito, a Moral e dem ais instituições hum anas eram descobertas de sábios, dádivas dos fundadores de civilizações, ou verdades reveladas pelos profetas, videntes, magos. Vico atribuiu tudo à coletividade; lançou as bases da psicologia social. Secim dou-o a Escola Histórica. Hoje não m ais se acredita na onipotência do legisladoi não se interpreta o D ireito com o obra artificial do arbítrio de um hom em , ou de um grupo reduzido, e, sim, elaboração espontânea da consciência jurídica nacional, fenômeno de psicologia coletiva, um dos produtos espirituais da com unidade ( ') N a verdade, em pleno século dezoito, a Escola de Vico proclam ara vitoriosa “não ser o D ireito o produto de um a vontade que se itnponha e opere exteriorm ente sobre a vida dos povos, m as a realização e a expressão do espírito da coletividade" (4). E spelha o pensam ento generalizado; não é criação original de poucos, à maio ria, à própria demos, superiorm ente imposta.

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23 - (1) Domat - Teoria da Interpretação das Leis, trad. de J. H. Correia Teles, reprodu/nl.i integralmente no Código Filipino, de Cândido Mendes, vol. III, p. 425, n9 4. (2) Ferdinando Puglia, Prof. da Universidade de Messina - Saggi di Filosofia Giuridica, 2" ed., p. 25. (3) Icilio Vanni - Lezioni di I ih f.o liii del P iiilto , 4'1ed., 1920, p. 182-83; Sabino Jandoli 'tl< aç 3o do Direito | Carlos Maxlmlllttno

24 - A lei não brota do cérebro do seu elaborador, com pleta, perfeita, com o um ato de vontade independente, espontâneo. Em prim eiro lugar, a própria vonta­ de hum ana é condicionada, determ inada; livre na aparência apenas. O indivíduo inclina-se, num ou noutro sentido, de acordo com o seu tem peram ento, produto do m eio, da hereditariedade e da educação. Crê exprim ir o que pensa; m as esse próprio pensam ento é socializado, é condicionado pelas relações sociais e exprim e um a com unidade de propósitos. Por outro lado, as ideias em anam do am biente; não surgem desordenadam ente, segundo o capricho ou a fantasia do que lhes dá form a concreta. “São rítm icos os m ovim entos todos, inclusive os sociais e o das doutrinas que a estes acom panham ”21 (1). O pensamento não se m antém escravo da vontade; conserva a independência própria; não é apenas individual; eleva-se à altura de fenôm eno sociológico; não representa o trabalho de um a inteligência apenas, e, sim, algo de ilim itado, infinito, o produto do esforço cerebral de séculos; no âm ago encerra conceitos de que o pró­ prio autor aparente se não apercebe às vezes. Por isso, não m ais se apresenta, nem ensina a H istória com o sim ples repositório de façanhas dos reis. Heróis não fundam nações. Eles são m eros expoentes da bravura coletiva; órgãos da energia geral. A prova de que o indivíduo influi em escala reduzida no desenrolar dos fatos sociais ressalta de não se deter a m archa vitoriosa de um exército, nem retardar o progresso vertiginoso de um grande país, após o traspasse de um chefe aparentem ente in­ substituível. Por outro lado, o hom icídio de um déspota não faz raiar a liberdade; o revolucionário sincero de hoje será o descontente de am anhã, pelo contraste entre as prom essas de oposicionistas e as realizações de triunfadores. Também a ciência do Direito abrange um conjunto de fenôm enos sociais; com o a História, deve atender m enos ao esforço do hom em isolado do que à ação com plexa da coletividade (2).

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24 - (1) Herbert S p e n c e r- Ju stice, trad. de Castelot, 2^ ed., p. 44. No mesmo sentido dou­ trinaram W urzel, in O esterreichisches Zentralblatt cit., vol. 21, p. 766-767, e Roberto de Ruggiero, Prof. da Universidade de Roma - istituzioni di Diritto Civile, 7§ ed., vol. I, § 17, b, p. 129-30. (2) Kohler, Prof. da Universidade de Berlim, vol. I, p. 123. (3) Jethro Brown - The Underlying Principies o f M odem Legislation, 1915, p. 38. (4) Brown, Prof. da Universidade de Adelaide, na Austrália, op. cit., p. 137 e 140. No Império do Brasil havia dois partidos políticos: Liberal e Conservador. A Ideia mais sedutora e brilhante do primeiro, combatida pelo segundo em certa época, foi por este realizada parcial­ mente, a princípio; de modo definitivo, depois: Ministério e Câmara de conservadores elabora­ ram a lei de 28 de setembro de 1871, chamada — do Ventre Livre, porque declarava isentos da servidão os filhos de mulher escrava nascidos no Brasil; e concluíram a obra em 13 de maio de 1888, com a Lei da Abolição, assim denominada porque extinguia a escravidão no País. Na política Inglesa e na dos Estados Unidos, Ostrogorski aponta inúmeros exemplos de falta de apego aos programas, semelhança nas atitudes, plano de um partido observado ou com­ pletado pelo outro, malgrado o antagonismo aparente dos ideais orgânicos (Ostrogorski - La Démocratie e t l'Organisation des Partis Politiques, 1903, 2 vols.).

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lim regra, o uleal e nnli . ituon u i> ni> do que consciente. Surge e avulla de modo lento e quase im peiccpllvvl, iilim e loniti expressão na realidade antes de sei formulado em palavras ( l ) ( ) indivíduo que legisla é mais ator do que autor; traduz apenas o pensar e o senlii alheios, n llexiimentc às vezes, usando meios inadequa dos de expressão quase seni|>ie Impelem no lorças irresistíveis, subterrâneas, mais profundas do que os antagonism os dos partidos. De outro m odo se não explica o lato, verificado em todos os palses, de adotar um a facção no poder as ideias, os pro­ jetos e as reform as sustentadas pelo adversário, dom inador na véspera; um grupo realiza o program a dos contrários e, não raro, até as inovações que combatera (4).

25 - E ntretanto, não se deve exagerar a im portância do fator coletivo, socia sobre a legislação; ele predom ina, porém não de m odo exclusivo. Qualquer dou trina absoluta é falsa; tudo é relativo. De m enor valia do que se pensou oulrora, parece hoje o coeficiente individual, porém existe, atua, não pode ser desprezado' ’ (1). O ra consciente, ora inconsciente, opera com o encam inhador ou, pelo menos, propulsor da evolução legal. Descobre os meios para exprim ir, de modo clicienle, a vontade coletiva. N ão cria o Direito; porém revela-o, reduzindo-o a uma forma vi sível, apreciável, concreta. As contingências históricas e reais refletem -sc no senln individual; o hom em objetiva em um a norm a precisa o produto da consciência jurídica da coletividade. O Direito Positivo é o resultado de ação lenta e reação oportuna. () am biente age sobre a inteligência, m oderando-a, im prim indo-lhe caracteres determ inados, afinal o indivíduo reage sobre a natureza, dom inando-a, por sua vez, com a sua ai i vidade m odificadora, transform adora, indiscutivelm ente eficiente (2). A natureza hum ana am olda as instituições jurídicas; por sua vez estas reagem sobre aquela, dessa influência recíproca afinal resulta o equilíbrio alm ejado, um a situação rela li vãm ente estável (3). Enfim a ação do am biente é decisiva nas linhas gerais do D ireito; quanto mais este se especializa, m ais se faz sentir o fator individual: entra o progresso, em todos os seus aspectos, a depender da consciência Jurídica, habilidade, tato, previdência e decisão do legislador. A parece este com o órgão coordenador e transm issor do pensam ento da coletividade. As condições fundam entais da vida em com um constituem a justiça-, porém existe a possibilidade de não serem observadas espontaneam ente; ora, a sociedade

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25 - (1) Brown, op. cit., p. 129. (2) Francesco Cosentini Filosofia del Diritto, 1914, p. 52-53; Luigi Miraglia - H/oso/m ili-l Diritto, 2a ed., vol. I, p. 252 ?'> i (3) Flerbert Spencer, op. ( it., p I / 1 O dizer do professor da lJníveislil.id e i lr Kmn.i lol reproduzido quase literalm ente, qu.mlo .nr. dois últimos períodos. (4) O conceito ó de W arli, I In "'I e num eiir.o', m il iu s |urisconsultos.

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HermeníHitlc a e Apllt açUo do Direito | t.ii los Maximlllano

e a cooperação devem perdurar, a fim de atingir a hum anidade os seus objetivos superiores; logo, não pode ficar abandonado ao arbítrio dos indivíduos o que é essencial à sua coexistência ordeira e prom issora. Foram , pois, traçadas regras de conduta irrefragavelm ente obrigatórias e eventualm ente coercitivas, para forçar à obediência as vontades recalcitrantes. N o m eio-term o está a verdade: em bora não prevaleça o evolucionism o m e­ cânico em seu propósito de anular, de todo, o fator individual, nem por isso há de ser hoje restaurado o m étodo antigo de exegese. As contingências sociais criaram a necessidade, a norm a brotou quase espontânea, o fator subjetivo existiu, ativo, eficiente, porém , menos original, poderoso, autônomo do que o considerava a F i­ losofia antiga. O legislador não tira do nada, com o se fora um Deus; é apenas o órgão da consciência nacional. Fotografa, objetiva a ideia triunfante; não inventa, reproduz; não cria, espelha, concretiza, consigna. O presente, outrora considerado com o obra de um hom em - “ não é m ais do que um m om ento nesse rio perene da vida”, com o observa Savigny. Pode a lei ser mais sábia do que o legislador (4); porquanto abrange hipóteses que este não previu. 26 - Parece oportuno declarar, sem refolhos, não constituir privilégio dos adeptos da filosofia positiva contem porânea o com bate ao sistem a que se em penha na pesquisa da vontade do prolator de uma norm a jurídica. De fato, com tistas e spenceristas oferecem um fundam ento m ais, para repelir a concepção estreita da exegese; porém não ficam isolados no seu m odo de com preender a Hermenêutica. P or outras razões, adiante especificadas, racionalistas e teólogos tam bém se insur­ gem contra a teoria decrépita23 ( I ). N a verdade (seja qual for a orientação filosófica do jurista, não deixará ele de reconhecer ter sido m enos difícil outrora aprender a intenção do legislador, quando este era o m onarca absoluto. Contudo, já naquele tem po se contestava que simples trechos de um diário, notas pessoais, pudessem esclarecer o pensam ento objetiva­ do no texto. Em todo caso, em exposição de m otivos anteposta aos repositórios de norm as positivas, em leis posteriores ou sim ples soluções de consultas formuladas pelos juizes, o soberano explicava o seu próprio dizer.

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26 - (1) Com ser deísta, Bismarck se não distanciava, no fundo, da concepção spenceriana, ou comtista, do homem de governo. Dizia ele: "O estadista não pode inventar; nem criar coisa alguma; cabe-lhe apenas esperar e ficar à escuta até ouvir, através dos acontecimentos, o rum or dos passos do Eterno; e então saltar à frente deste e segurar-lhe as pontas do manto: isto é tudo" (Erwin Rose - Bism arck der grosse Deutsche, 63 ed., p. 164). A coexistência dos dois fatores, sociológico e individual, foi apreendida por Frederico, o G ran­ de, que a concretizou na seguinte máxima: "Apanhar a ocasião e em preender quando ela é favorável; porém não a forçar, abandonando tudo ao acaso" (Albert Sorel - L'Europe et Ia Révolution Française, 1905, vol. I, p. 23). (2) Kohler, vol. I, p. 129-141; Coviello, vol. I, p. 63-64.

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M udaram as circunstancias em que se eoiierelí/a o fenômeno jurídico. A ação do legislador é real, clii icnle, poi. in mio eltini. delinida, expressiva. I lá o impulso inicial e necessário de um. seftn se, entieliiiilo, a colaboração m ilímoda, variadís sima, de muitos, sensível, ventieável, no conjunto, porém inapreciável, às vezes até im perceptível, relativam ente ás minúcias. Quantos fatores aluam alé surgir o conceito definitivo! Em uma das forjas da lei, no parlam ento, com posto, em regra, de duas câm aras, fundem -se opiniões múltiplas, o conjunto resulta de frações de ideias, am algam adas; cada represenlan te do povo aceita por um m otivo pessoal a inclusão de palavra ou frase, visando a um objetivo particular a que a m esm a se presta; há o acordo aparente, resultado de profundas contradições. Bastas vezes a redação fin al resulta im precisa, ambígua revelando-se o produto da inelutável necessidade de transigir com exigências pe queninas a fim de conseguir a passagem da ideia principal. Se descerem a exum ar o pensamento do legislador, perder-se-ão em um báralro de dúvidas maiores ainda e mais inextricáveis do que as resultantes do contexto. s motivos, que induziram alguém a propor a lei, podem não ser os mesm os que levarau i outros a aceitá-la. Não parece decisivo o fato de haver um congressista expcndido um argumento e não ter sido este combatido; a urgência, a preocupação dc não irritai um orgulhoso cuja colaboração se deseja, ou cuja obstrução ao projeto se receia; um a indisposição individual, sobretudo um leader de câm ara ou relator de ( ’omissà< > Permanente; mil fatores ocasionais podem concorrer para um silêncio forçado; daí resultaria a falsa aparência de concretizar um a frase, em enda ou discurso as razões (l voto no plenário, a intenção predominante, a diretriz real da vontade da maioria. Quantas vezes um sim ples artigo de jornal influi m ais nas deliberações de um congresso do que orações parlam entares! O projeto peregrina pelos dois ram os do Poder Legislativo, em m archas c contram archas, recebendo retoques de toda ordem, a ponto de o renegar afinal, es pantado do aspecto definitivo da própria obra, o autor prim itivo da medida. ( omo descobrir, naquele labirinto de ideias contraditórias e todas parcialm ente venccdo ras, a vontade, o pensam ento, a intenção diretora e triunfante? Afinal o Executivo sanciona, sem dar as razões do seu ato: talvez entre eslas ligurem o cansaço de vetar proposições más (o que faz tolerar as m enos nocivas, a lim de não m elindrar com dem asiada frequência os representantes do povo); uma transação política, o receio de provocar desordens, a ânsia de fortalecer a receita ou dim inuir a despesa, e m il outras eventualidades, que não influíram no propósito dos deputados e senadores (2). 27 —A vontade do legislador não será a da m aioria dos que tom am parle votação da norm a positiva; porque liem poucos se inform am , com antecedência, dos term os do projeto cm dclialc; p o i tanto, não podem querer o que não conhecem Quando muito, desejam o piuu ipal poi exem plo, abaixar, ou elevar um imposto, eom inar, ou abolir uma pena A s \ e / e s , nem isso; no m om ento dos sufrágios, pei

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gunfam do que se trata, ou acom panham , indiferentes, os leaders, que por sua vez prestigiam apenas o voto de determ inados m em bros da Com issão Perm anente que em itiu parecer sobre o projeto. Logo, em últim a análise, a vontade, do legislador é a da minoria; talvez de um a elite intelectual, dos com petentes, que figuram nas assem bleias políticas em m enor núm ero sem pre, rari nantes in gurgite vasto. Por outro lado, não só é difícil determ inar aquela intenção volitiva, como, tam bém , distingui-la do sentido da lei, ou ao m enos m ostrar quanto influi no sig­ nificado de um a norm a jurídica e com o fora im pelida pelos m otivos geradores de um texto positivo24 (1). 28 - A base de todo o trabalho do exegeta seria um a ficção: buscaria um a vontade possível, agente, ativa no passado e as conclusões logicam ente decorren­ tes desse intento prim itivo25 (1). N ão se trata apenas dos tem pos im ediatam ente posteriores à lei, quando é m enos difícil estudar e com preender o meio, o am biente em que foi o texto elaborado, as ideias dom inantes, as divisões das assem bleias, as vitórias parciais de um grupo, as transigências da m aioria com este ou aquele pendor dos contrários. A tarefa, nesse caso, ainda seria pesada, porém em grande parte realizável. Entretanto, a letra perdura, e a vida continua; surgem novas ideias; aplicam -se os m esm os princípios a condições sociais diferentes; a lei enfrenta im­ previstas criações econôm icas, aspirações triunfantes, generalizadas no país, ou no m undo civilizado; há desejo mais veem ente de autonom ia por um lado, e m aior necessidade de garantia por outro, em conseqüência da extensão das relações e das necessidades do crédito. Força é adaptar o Direito a esse m undo novo aos fe­ nôm enos sociais e econôm icos em transform ação constante, sob pena de não ser efetivam ente justo, - das richtige Recht, na expressão feliz dos tudescos (2). Portanto a doutrina e a jurisprudência, ora consciente, ora inconscientem ente, avançam dia a dia, não se detêm nunca, acom panham o progresso, am param novas atividades, sustentam as m odernas conquistas, reprim em os inesperados abusos, dentro dos princípios antigos, evolutivam ente interpretados, num esforço dinâm i­ co inteligente, sem em bargo de aludirem ainda m uitos a um a vontade diretora, perdida nas trevas de passado rem oto. Eis aí a ficção: presum e-se o im possível;

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27 - (1) Prof. Wigmore - The Judicial Function, prefácio da Science o f Legal M ethod, de Bruncken & Register, p. XXXIII. 28 - (1) Fritz Berolzheimer - M e Gefrahren einer Gefühlsjurisprudenz, 1911, p. 7 e 19; R. Saleilles - Prefácio cit., p. XIV. (2) Francesco Ferrara - Trattato di Diritto Civile Italiano, vol. 1,1921, p. 210; Saleilles - Prefácio cit., p. XIV-XV. (3) Ferrara, Prof. da Universidade de Pisa, vol. I, p. 210 a 212; Saleilles - Prefácio cit., p. XVXVII; Theodor Rittler - Lehrbuch des Oesterreichischen Strafrechts, vol. 1,1933, p. 23-24. (4) Alfred Bozi - Die Weltanschauung derJu rispru denz, 2§ ed., 1911, p. 88-89; Berolzheimer, op. cit., p. 5-6.

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que o legislador de deceuitis ali as piev ism as |*,iandes transform ações até hoje ope radas, e deixasse, no texto eltíslit o a possibilidade para abrigar no futuro direitos periclifantes, oriundos de condições novíssimas. A sua visão profética atingiu não só os problem as jurídicos, mas o estado de coisas que os fez surgir; de sorte que, educado em velha escola I í I o n ó I I c i i ou econôm ica, ele atravessaria a História, espo sando hoje os postulados de uma corrente intelectual, am anhã os de outra, e assim sucessivam ente, sem pre renovado, variando sem pre, com o um fenomenal Prolcu. Se fôssem os, a rigor, buscar a intenção ocasional, precípua do legislador, o encontraríam os visando horizonte estreito, um conjunto de fatos concretos lias tante limitado. Quase sem pre a lei tem por fundam ento um abuso recente; os seus prolatores foram sugestionados por fatos isolados, nitidam ente determ inados, que im pressionaram a opinião, em bora a linguagem m antenha o tom de ideias gerais, preceito amplo. O legislador não suspeitou as múltiplas conseqüências lógicas que poderiam ser deduzidas de suas prescrições; não estiveram na sua vontade, nem se encontraram na sua intenção. Os tribunais apenas desenvolveram um prineí|>io sólido, um a ideia precisa, sem em bargo do pensam ento gerador, prim itivo, e as vezes até em possível, senão provável, divergência com este (3). O aplicador m oderno da lei antiga, se acaso se refere à intenção do legisladoi obedece a um pendor misoneísta, age sob o impulso do hábito inveterado, empresta as cores da realidade a um a figura que não vem ao caso, não cogitou do presente, n a o poderia prever tudo; em suma, o exegeta simula buscar a força ativa primordut I, po rém, de fato, recorre a um a entidade inexistente, fantástica; b racejano desconhecido, e volta com ares de ter descoberto a verdade, quando apenas se em bala e se perde no mundo da ficção. Transplanta-se, em espírito, ao lugar e à época em que o legislai li viveu, deliberou e agiu, e resolve hoje como se pensou ontem. Portanto, o D i r e i t o , segundo a doutrina, tradicionalista extremada, despreza as exigências mutáveis c sucessivas da vida prática e ergue barricadas contra a sua própria m odernização (• I). 29 - É um m al necessário a rigidez da forma; ao invés de o abrandarem com a interpretação evolutiva, agravam -no com a estreiteza da exegese presa à vontade criadora, prim itiva, im utável. Se há proveito por um lado, avulta o prejuízo maioi por outro: o que a lei ganha em segurança, perde em dutilidade; menos viável se torna o sofisma, porém fica excessivam ente restrito o cam po de aplicação 14 (3) W a c h - Handbuch des deutschen Civilprozessrechte, 1885, vol. I, p. 254 e segs.; Rouleiskln eld, op. cit., p. 23; Mario Rotondi, Prof. da Universidade Católica de M ilã o -Le g g e IJn le i|» e tazione delia, monografia in Nuovo Digesto Italiano, 1937-1940, vol. VII, n° I. (4) Crome, Prof. da Universidade de Bonn, vol. I, p. 197; Kohler, vol. V, p. 124. (5) Bierling, vol. IV, p. 200. 33 - (1) Caldara, op. cit., p. 5-(). (2) Vede os capítulos - Elemento Hi\tòtít o, 1‘io n ’sso Sistem ático e Elemento Tclcolóiin a. (3) Géza Kiss —G esetzesaiilciium i m ui u m if.t hriehcnes Recht, 1911, p. 19, nota K; I iloim r.l Guelíi - Enciclopédia Giillidii " eil , |> LI I

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I lerm eníkitlí a e A|>ll< aç.lo do Direito | . I 11 Até mesmo no campo do Direito Criminal é de observar a orientação acima aconselhada (III ppel - Deutsches Strafrecht, vol. I, 1925-1930, p. 38; Theodor Rittler - Lehrbuch des O f ,In reichschen Strafrechts, vol. 1,1933, p. 23 24). (3) Ferrara, vol. I, p. 210. Mostram-se contraditórios os coilteus da escola dogmática; porquanto, ao mesmo tempo que forçam o jurista a limitai se a husiat o aplicar apenas o pensamento, a vontade do le gislador, aceitam o que eles denominam Interpretação por analogia, isto é, a exlons.io cia regra jurídica aos casos sem ellianles, n.ln prevlslos pelos autores do texto, nem ini luídos verdadeiramente neste ((i.iie l'., op i II , p n i) Vede o capitulo Analtuila, n"' IM ,'\ De^ni, op i II , p. W . ((>) Digesto, liv. 1, tít. 3, frni*. 11 (1) W indsrheid, vol. I, p. 85 e nol.i 'I (H) l)ennl, op. i it , p. 51,

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Heimenôutli a e Apllc açülo do Direito | Carlos Maxlmlllano

a casuística intricada; apelava em dem asia para o argum ento de autoridade, para a communis opinio; os pareceres dos doutores substituíam os textos; as glosas tom avam o lugar da lei; assim , de excesso em excesso, se chegou à deplorável decadência jurídica, ao dom ínio dos retóricos e pedantes, - verbosi in refacili, in difficili muti, in angusta diffusi - “verbosos em se tratando de coisas fáceis, m udos quanto às difíceis, difusos acerca de assuntos de estreitas proporções” , - na frase cáustica do célebre Cujácio. Era força tocar atrás, levar a m agistratura a estudar as leis e guiar-se pelo próprio critério profissional de exegese, ao invés de com pulsar exclusivam ente as obras dos doutores e intérpretes, exagerados e infiéis. Sistem atizaram as norm as e lim itaram o campo da Herm enêutica. Foi sob a influência desta reação necessária que abrolharam os aforism os conservadores: in claris non fit interpretado. - Lex clara non indiget interpretatione. - In claris non adm ittitur voluntatis quoestio. Para os grandes m ales os rem édios enérgicos, violentos! 40 - Os escolásticos passaram , e, com o sem pre acontece, talvez em virtude da lei do m enor esforço, ou em conseqüência do hábito adquirido, desapareceu a causa da coerção retrógrada; porém esta ficou. Em pleno século dezoito Richeri fazia do brocardo célebre a base da sua doutrina de H erm enêutica jurídica; e assim definia Interpretação: Legis obscuraevel am biguoe explicatio - “explicação da lei obscura ou am bígua”35 (1).

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40 - (1) Degni, op. cit., p. 58; Virgílio de Sá Pereira - Dois Brocardos,separata da Rev. Geral de Direito, Legislação e Jurisprudência, 1920, p. 16-18. (2) Paula Batista, op. cit., § 3 e nota 1. Na mesma época o Conselheiro Ribas ensinava o contrário,precisamente a boa doutrina, em sua cátedra na Faculdade de Direito de São Paulo (Antônio Joaquim Ribas - Curso de Direito Civil Brasileiro, 2a ed., 1880, vol. I, p. 283). Foi aliás, um Professor da Faculdade do Recife, Tobias Barreto, que introduziu no Brasil a moderna cultura jurídico-filosófica alemã. (3) Chironi & Abello - Trattato di Diritto Civile italiano, vol. 1,1904, p. 56; Emmanuele Gianturco -S iste m a di Diritto Civile Italiano, 3- ed., I, p. 114; Sá Pereira, op. cit., p. 8: Ribas, vol. I, p. 283; Paulo de Lacerda, vol. I, nm 243 e 262; Espínola, Prof. da Faculdade de Direito da Bahia - Siste­ ma cit., vol. I, p. 1 2 6 ,1 2 9 e nota 10; Miraglia, Prof. da Universidade de Nápoles, vol. 1, p. 249; De Filippis, Prof. da Universidade de Milão, vol. I, p. 85; Saredo, op. cit., n25 536-537; Giudice, Prof. da Universidade de Pavia, op. cit., p. 30; Filomusi Guelfi, Prof. da Universidade de Roma, op. cit., p. 145; Caldara, op. cit., n25 6-10; Degni, op. cit., p. 61-67; Coviello, Prof. da Universida­ de de Catania, vol. I, p. 63; Laurent, Prof. da Universidade de Gand, vol. I, n9 269; Planiol, Prof. da Universidade de Paris, vol. I, n9 216 (menos decisivo); Savigny, vol. I, p. 201; Windscheid, vol. I, p. 85; Biermann, Prof. da Universidade de Giessen, vol. I, p. 29 e nota 6; Kiss, op. cit., p. 17; Bierling, vol. IV, p. 198; Gmür, op. cit., p. 35-36; Aubry & Rau, Falcimaigne e G a u lt- Cours de Droit Civil, 5a ed., vol. I, § 40, p. 193; Giovanni Lomonaco - Istituzioni di Diritto Civile, 2a ed., vol. I, p. 83; Pacificim azzoni- Istituzioni di Diritto Civile, vol. I, n9 16; Nicola StoIfi - Diritto Civile, vol. I, n25 806-807; Manresa y Navarro - Comentários al Codigo Civil Espahol, 2a ed., vol. I, p. 77; Valverde y Valverde - Tratado de Derecho Civil, 3a ed., vol. I, p. 89; J. Olegário Machado -

( em anos depois, ua I m uldiide ile I )lieito do Keeile, proleeionuva pela mes tua cartilha o Professoi Paula Mulisla Inscreveu os dogm as do seu credo num livro que, aliás, se tornou clássico e c excelente Nob outros aspectos. I )iseorria o catcdrá tico brasileiro: “ Interpretação c a exposição do verdadeiro sentido de uma lei ohs cura p o r defeitos de sua redação, ou duvidosa, com relação aos fatos ocorreu!es ou silenciosa. Por conseguinte, não tem lugar sem pre que a lei, em relação aos latos sujeitos ao seu dom ínio, é clara e precisa. Interpretado cessai in claris" (2). A nenhum ju rista ficaria bem repetir hoje as definições de Richeri e Paula Batista. Os dom ínios da I Ierm enêutica se não estendem só aos textos defeituosos; jamais se lim itam ao invólucro verbal: o objetivo daquela disciplina é deseolii ii o conteúdo da norm a, o sentido e o alcance das expressões do Direito. O bscuras ou claras, deficientes ou perfeitas, am bíguas ou isentas de controvérsia, todas as li ases jurídicas aparecem aos m odernos com o suscetíveis de interpretação (3).

41 - A palavra é um m au veículo do pensam ento; por isso, em bora de a|iarè cia translúcida a forma, não revela todo o conteúdo da lei, resta sem pre margem para conceitos e dúvidas; a própria letra nem sem pre indica se deve ser entendida à risca, ou aplicada extensivam ente; enfim, até m esm o a clareza exterior ilude; soli um só invólucro verbal se conchegam e escondem várias ideias, valores mais am pios e profundos do que os resultantes da simples apreciação literal do texto"' t I ) Não há fórm ula que abranja as inúm eras relações eternam ente variáveis da vida; cabe ao herm eneuta precisam ente adaptar o texto rígido aos fatos, que dia a dia surgem e se desenvolvem sob aspectos im previstos. N ítida ou obscura a norm a, o que lhe em presta elastério, alcance, dulilidade, é a interpretação. H á o desdobrar da fórm ula no espaço e no tem po: m ultiplicando as relações no presente, sofrendo, no futuro, as transform ações lentas, im pcrcc|tii veis, porém contínuas, da evolução (2).

Exposition y Comentário del Código Civil Argentino, vol. I, p. 49, nota ao art. 16; I ggei, ( >sn, Escher e Ftabb - Kommentar zum Schweizerischen Zivilgesetzbuch, vol. I, p. 48; StaudiiiKeis Kom m entar zum Bürgerlichen Gesetzbuch, 9 a ed., 1925, vol. I, p. 18; Mário Rotondi, in N i i o v h Digesto italiano, vol. VII, verbis - Legge (interpretazione delia), n9 1; Joaquim Dualde, 1’ml d.i Universidade de Barcelona - Una Revolución en Ia Lógica del Derecho, 1933, p. 49 (>i; (aiillo Battaglini, Prof. da Universidade de Bolonha - Diritto Penale, Teorie Generali, n" 14, p. Vede n® 13-17 e 116-A. 36

41 - (1) W alter Jellinek, op. cit., p. 161-162; Salomon, op. cit., p. 28; Dernburg, Prof. da Univ. m sidadede Berlim, vol. I, p. 89; Ferrai.i, vol. I, p. 206-207; Alves Moreira - Instituições do D n n ln Civil Português, vol. I, 1907, p. 31. Os apologistas do in claris... ........... . apóstolos da supremacia da exegese verbal, ns 1-5; John B o u v ie r- io w Dictionary, 1914, verb. Construction e Interpretation; Woodburn lhe Am erican Republic and its Governm ent, p. 339-340. É comum, na prática, e também nos compêndios; empregarem indiferentemente, como sino nimos, os dois vocábulos Interpretação e Construção, como sucede, entre nós, com In le ip ie tação e Exegese. Também na Alemanha se tem ideia da diferença de significado acima referida, embora .i do term o Construção (Konstruktion) não seja ali absolutamente o mesmo que se adota nos I sla dos Unidos (Rumpf, op. cit., p. 84 87). (2) Max Gmür, op. cit., p. 12; M axiinlliano Comentários, Prefácio. Os expositores do Direito noi le .irnei li dls|msll lv O ) Brütt, op. cit., p. 4'>.

SISTEMAS DE HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO

48 - Denom inam alguns - escolastica45 (1), outros - dogm ática (2), ao siste­ m a tradicional, prim itivo de Herm enêutica, ao que se obstina em ju n g ir o Direito aos textos rígidos e aplicá-lo hoje de acordo com a vontade, verificada ou presum i­ da, de um legislador há m uito sepultado. Em toda escola teórica há um fundo de verdade. Procurar o pensam ento do autor de um dispositivo constitui um meio de esclarecer o sentido deste; o erro consiste em generalizar o processo, fazer do que é sim plesm ente um dentre m uitos recursos da H erm enêutica - o objetivo único, o alvo geral; confundir o meio com o fim (3). Da vontade prim itiva, aparentem ente criadora da norm a, se deduziria, quando m uito o sentido desta, e não o respectivo alcance, jam ais preestabelecido e difícil de prever. 49 - Deve-se ao uso excessivo do Direito Rom ano entre os povos cultos, so­ bretudo no Foro civil, esse apego à form alística, a redução do aplicador dos Códigos a um a espécie de autôm ato, enquadrado em regras precisas e cheias de m inúcias, em um a geom etria pretensiosa, obcecado pela arte, enganadora, dos silogism os forçados, inteipretando hoje um texto com o se vivesse há cem anos, im obilizado, indiferente ao progresso, conform e os ditam es da escola tradicional. Copia, aliás, as práticas de R om a dos piores tem pos; não dos organizadores da incom parável na­ ção, e, sim, dos epígonos sem o talento criador, que brilhava nos antepassados ricos de aspirações, ciosos de onipotência. Com o im itá-los im perfeitam ente, agrava o m al, cristaliza preceitos outrora em pregados com inteligência e dutilidade46 (1).

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48 - (1) Gmelin - Q uosque?, 1910, p. 34 e 36. (2) Jandoli, op. cit., p. 45-52; Gmelin, op. cit., p. 77. (3) Caldara, op. cit., p. 5-6. 49 - (1) Gmelin, op. cit., p. 40, nota 3; Géza Kiss, op. cit., p. 33. (2) Düringer - Richet und Rechtsprechung, 1909, p. 76-77; Gmelin, op. cit., p. 2 e 82; Reuter­ skioeld, op. cit., p. 3-4; Roscoe Pound - Courts and Legislation, in Science o f Legal M ethod, de Bruncken & Register, p. 206. (3) Düringer, op. cit., p. 77. A preferência pelo Direito Romano, até ao exagero, proveio de Portugal. Apesar de ser aquele admirável repositório de normas jurídicas simples subsidiário do promulgado pelo legislador nacional, não havia em Coimbra, até a segunda metade do século dezoito, curso especial de

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Os doutos apelidaram 1‘iinih i lnluyjii n esse apego dem asiado aos métodos romanos, à preferência pelos i omenliidoteíi dns com pilações justinianas, em con traste com o abandono tios c\eeleitles teposilói ios de I)ireito m oderno estrangeiro (2). M erece o Digesto ser tmula aproveiliulo com o meio de educação e instrução dos futuros m agistrados, porém mio í m i i o , ou principal sequer (3). Mais valiosos do que ele parecem os tratados de I ilosolia Jurídica e os de Direito dos povos eul los. Bem -avisado proclam ou o insuspeito Jhering a seguinte divisa do juriseonsul lo: “Através do D ireito Rom ano, mas tam bém acim a e além do m esm o” (4). O mal vai sendo erradicado pouco a pouco. Em sua própria cidadela, no principal reduto seu na Europa, na Alemanha, a supremacia do Digesto sofreu golpe decisivo com a promulgação do Código Civil (5), em bora daquele país saíssem os corifeus da doutrina, que teve “em Savigny o seu sol, e em W indscheid, a estrela da tarde” () 5 0 - O sistem a tradicional, levado ao exagero, deu em resultado o predom ínio do método de exegese propriam ente dita, o qual consistia em expor a m atéria dos

Direito Civil pátrio; este era ensinado à margem do estudo do Direito Romano. Os Fst.ilulos da Universidade de Coimbra puseram em realce, em 1772, o erro em que laboravam os .in tepassados, e criaram a cadeira de Direito pátrio. Eis, textualm ente, o que se lê nos refetid•■ Estatutos, liv. II, tít. III, cap. IX, § 8®. Mostrará (o professor) o abuso, com que em Iodas elas (Faculdades) se ensinou sem pre, como principal, o Direito Civil Romano, que só era ai ev.i h ii > e subsidiário: Não tendo havido até agora cadeira, nem professor privativo, o próprio paia as lições das leis pátrias, que eram só as principais e dominantes no Foro. (4) "Durch das roemische Recht, aber über dasselbe hinaus" (apud Reuterskioeld, op. i II , p /ri /mm/, I ') I /, p.

Napoléon, vol. I, n" I 1 t.

Demologue

Com \ i)l so u m iscs"

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maxlmlllano

pela exegese, o rigor das leis57 (1). Valentiniano e M arciano foram um pouco além. Afinal Justiniano, o grande codificador, pretendeu cortar toda a autonom ia dos m agistrados e jurisconsultos em face do D ireito escrito: ao soberano, e só a ele, incum bia fazer e interpretar as leis (2). O im perador julgava com pleto o Corpus Juris, capaz de oferecer solução pronta para todos os litígios possíveis no presente e no futuro; por isso não adm itia os Comentários, nem outros quaisquer trabalhos elucidativos. Se acaso surgissem dúvidas na prática, deveriam os juizes dirigir-se ao soberano para que este ditasse a exegese com petente; as regras de H erm enêuti­ ca, espalhadas pelo D igesto, deveriam apenas guiar o intérprete oficial e legislador, e não o aplicador, ou expositor, do Direito (3). Justiniano logrou elim inar o Edictio do Pretor, porém não conseguiu, nem sequer durante o seu reinado, im pedir toda a interpretação doutrinai e substituí-la pela autêntica, isto é, pela única perm itida, em anada do próprio soberano (4). N apoleão revelou tam bém horror aos comentadores que ele julgava sim ples deform adores de códigos e estatutos fundam entais, com o ainda hoje pensam igna­ ros zom badores da ciência do Direito (5). 61 - A prática de recorrer ao poder im perial para obter a exegese fixa dos textos perpetuou-se m ais do que se deveria esperar do progresso da cultura políti­ ca. A Lei da Boa Razão ordenava aos m agistrados que, em surgindo controvérsia acerca da inteligência de um dispositivo, suspendessem o julgam ento e levassem o caso ao conhecim ento do Regedor, a fim de que este, observado um processo pelo m esm o propósito estabelecido, determ inasse, por um Assento com força obrigató­ ria, a interpretação definitiva58 (1). N o Brasil-Im pério, apesar de viger, segundo a letra do estatuto básico, a doutrina de M ontesquieu, ao G overno pedia o Judiciário

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60 - (1) “ Inter oequitatem ju squ e interpositam interpretationem nobis solis e t oportet e t licet inspicere" (Código liv., 1, tít. 14, frag. 1) - "somente a nós incumbe e é lícito apurar a interpre­ tação interposta entre a equidade e o Direito". No frag. 9 está o que determinaram Valentiniano e Marciano. (2) Carl Schmitt - Gesetz und Urteil, 1912, p. 25; Savigny, vol. I, p. 289-292. (3) “Si quid vero ut supradictum est ambiguum fu e rit visum: hoc ad im periale culmen p er judices referatur, et auctoritate Augusta m anifestetur, cui soli concessum, est leges, et condere et interpretari" (Justiniano, apud Código, liv. 1, tít. 17, frag., ou Const. 2, § 21 in fine) - "se, em verdade, conforme acima foi exposto, algo parecer ambíguo, seja submetido pelos juizes ao trono imperial e esclarecido pela Augusta autoridade, só à qual é permitido estabelecer e interpretar as leis". (4) Paul Oertmann - Gesetzeswang und Richterfreiheit, 1909, p. 32; Bernhard Windscheid Lehrbuch des PandeM enrechts, 8 a ed., vol. I, p. 95. (5) Edmond Picard - Le Droit Pur, 1910, p. 154. Quando Bonaparte soube do aparecimento da primeira glosa doutrinai, exclamou: "Vão es­

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tragar o meu Código!" 61 - (1) Lei de 18 de agosto de 1769, ou - da Boa Razão, §§ 3 a 6, in "Auxiliar Jurídico", de Cândido Mendes de Almeida, 1869, p. 448-450.

1 1 I n ) 1 1 67 - (1) Porta lis I >r.i mu ■ ■1'ieltniinnlie i II , Itaudry Lacantinerie & Houques I 01 in ade, vol I, n" 239.

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Hermenêutica e Aplicaç3o do Direito | Carlos Maxtmlllono

68 - Os próprios Códigos revelam ter sido reconhecida a im possibilidade de tudo especificar e prescrever; porquanto deixam ao alvedrio do julgador o apreciar inúm eros m otivos de dem anda, ou de escusa; por exem plo, quando se referem a boa ou má-fé; equidade; força m aior; m oral; bons costum es, ingratidão; im prudên­ cia, ou im perícia; objeto ilícito, ou im possível; fim ilícito, ou im oral; injúria grave; dolo, no civil e no crim e; bem com o ao usarem das expressões - quando exeqüível; sem pre que for possível; ou m andarem graduar a pena conform e as circunstâncias agravantes e atenuantes; e falarem de haver, sobre a pessoa do cônjuge, caído em erro que, descoberto, torne insuportável a vida em comum; ju sto motivo para não adm itir que outrem pague a sua dívida; indenizar, além do que o credor perdeu, o que razoavelm ente deixou de lucrar; tratar o im óvel alheio como se fosse seu; em pregar, no exercício do m andato, a diligência habitual; provar que guardava com o cuidado preciso o anim al danificador; restituir, na falta da própria coisa, o equivalente estim ado pelo seu preço ordinário e pelo de afeição; e assim por diante65 (1). Até m esm o o texto, sobretudo nas leis processuais, confia m uita coisa ao “prudente arbítrio do ju iz” . Os repositórios m odernos ainda se revelam m ais dadivosos de autonom ia que os antigos. Assim é que o Código Civil alem ão, com o o suíço, principalm ente no Livro sobre obrigações, abrange e especifica inúm eros casos de Treu ond Glaoben, de boa-fé e lealdade, e outros requisitos, cuja existência e extensão devem ser apreciadas segundo o critério pessoal do julgador. 69 - A liberdade de exegese, atribuída aos m agistrados, não surgiu recente­ m ente; sustentaram -na acatados rom anistas e a corte m ais adiantada dentre os que interpretavam a lei com inquirir qual a vontade, ou intenção, do respectivo prolator: uns e outros se não lim itavam a aplicar o que o legislador quis, m as tam bém o que ele quereria, se tivesse previsto o caso em apreço66 (1). D eixavam , assim , um cam po vastíssim o reservado ao alvedrio judiciário.

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68 - (1) Géza Kiss - Gesetzesauslegung cit., p. 50-52; Rudolf Stammler - Die Lehre von dem Richtigen Rechte, 1902, p. 316-434; Hermann Kantorowicz - Zur Lehre vom Dichtigen Recht, 1909, p. 9; Karl Gareis - Vom B egrif Gerechtigkeit, 1907, p. 31-32; Oertmann, op. cit., p. 1920; Código Civil, arts. 145, II; 219; I; 317, III; 932; 935; 958; 971; 1.002; 1.059; 1.060; 1.183, III; 1.192, I; 1.300; 1.527 e 1.543. 69 - (1) Mareei Planiol - Traité Éiém en taire de D roit Civil, 7§ ed., 1915-1918, vol. I, nss204 e 221. (2) Na Inglaterra, Alemanha e Áustria o mesmo fato se nos depara, e em escala muito mais larga do que na Bélgica e na França. Ehrlich, in "Sc. of Legal Method", p. 69-70, Geny, vol. II, p. 214. (3) Geny, vol. II, p. 246-248. Cita, em apoio do que aduziu, os livros, de êxito rápido e forte, publicados por Planiol, Colin & Capitant e Thaler, todos orientados pela corrente conservado­ ra adiantada.

Amplas AtilliuIçOns do lul/ M odeino

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A jurisprudência eoiileiiipoiiinvn 1 poi sim vez, e liem poderia deixai de ser. fortemente im pressionada pelo m ovim ento progressista e renovador quo se gene ra li/a entre os estudiosos do I )íivilo, sem distinção de escolas; o sopro de moder nismo saudável insinua-se pot toda parte, e da cátedra dim ana até o pretório. I srti h tu du I in itio ludicial perante a Lei Inglesa, in "S t. ol I e|;al Method", p. > ÍK V ril.' nu IMi

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Hermenêutica e ApllcaçSo do Direito | Carlos Maxlmiliano

lei. O bjeta-se que ele, nesse caso, form ula apenas um a regra a d hoc, e não perm a­ nente com o a que procede das assem bleias Entretanto há um a tendência para apli­ car aos processos novos a solução achada, o que form a a jurisprudência, guia dos estudiosos e m agistrados, fonte habitual de consulta. Logo hoje, de fato, arrastado pelo art. 4o da Lei de introdução ao Código Civil, o m agistrado preenche as lacunas dos repositórios de norm as, é, até certo ponto, legislador (2). Talvez se obtem pere que o ju iz atual não cria o Direito; inspirado pelos prin­ cípios gerais estabelecidos (art. 4o da Introdução do C ódigo Civil), deduz a regra em form a de sentença, para o caso concreto. O m esm o sucederia sob o im pério da Livre-Indagação, em bora autorizassem o m agistrado a agir com o se fora legisla­ dor; porque tam bém este, ou seja assem bleia, ou rei absoluto, não cria a ideia, não inventa coisa algum a; é apenas, segundo os espiritualistas, “o órgão dessa justiça universal que tem o seu princípio em Deus” (3); ou, no entender dos filósofos m odernos, apreende e formula em preceitos distintos as noções que irrompem, espontâneas, evolutivam ente, do am biente social. Câm aras e pretórios, livres na aparência, são instrum entos do meio; pensam e resolvem conform e os pendores da coletividade; não tiram do nada; concretizam , aplicam os princípios gerais, estratificados, estabelecidos pouco a pouco. Em verdade, o ju iz crê apenas aplicar, e o legislador produzir. A diferença entre os dois é som ente em grau e em método: um atende à espécie, o outro gene­ raliza; olha este para o futuro, aquele para o passado. A própria Equidade foi desde o tem po de A ristóteles com preendida com o no desem penho do papel de dilatar e m elhorar o Direito vigente (4). Não m enos criadora, em term os, é a escola tradicional de Herm enêutica ao fazer observar, não só o que o legislador quis, m as tam bém o que ele quereria se previsse o caso em apreço. Por outro lado, a própria dogm ática proíbe que se interprete um dispositivo com o se pretendesse o seu prolator um absurdo; ora o critério para aquilatar o que é ou não absurdo, varia, e muito; de sorte que de fato se autoriza o m agistrado a m elhorar o texto, com inutilizar neste o que lhe não pareça defensável na época atual (5). 75 - Portanto, a doutrina da Livre-lndagação, quando m oderada, quase se não distingue da preferida pela corrente histórico-evolutiva, em bora se não confunda com o processo da analogia, que apenas conclui de sem elhante a sem elhante72

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7 5 - ( 1 ) Kiss, op. cit., p. 55-56. (2) Em regra, os latinos desconhecem o meio-termo, vão logo aos extremos; por isso, entre nós, ou se exagera a competência e transpõem as raias legais, ou se atém cada um à letra fria dos dispositivos. (3) R. Saleilles - Prefácio a M éthode d'lnterprétation de Geny, p. XXV. (4) HompelI, op. cit. p. 106. (5) Brütt, op. cit., p. 199-200.

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( I >. Todavia, com o lotl.r. ,r, pnln\ ia . tem 'iijj.iiilieiição, não deixa de ser perigoso autorizar expressamente o jtll/ 11 liitnspoi ns i a ias da sua com petência de simples aplicador do Direito. Se o lii/eiu liimbém criador, em bora com restrições severas, ele pouco a pouco as irá solapando e suprim indo; já M ontesquieu observara que todos os poderes constitucionais tendem a exagerar as próprias atribuições e in validar o cam po da alheia jurisdição. No Brasil, sobretudo, em que o Judiciário é o ju iz suprem o da sua com petência, se fora autorizado a legislar em parle, não tardaria a fazê-lo em larga escala. H á inúm eros exem plos de tentativas desse podei para se sobrepor aos outros em todos os sentidos, até m esm o na esfera poli In a, e a ditadura ju diciária não é m enos nociva que a do Executivo, nem do que a onipo tência parlam entar (2). Basta que, acom panhando G m elin, se introduzam os fatores sociais na cxep.e se; a interpretação seja não som ente dogm ática e, sim, tam bém sociológica; porém sempre e só - interpretação. Geny, inspirado por um a frase célebre de Jhering, adotou a divisa, q u e é n da Livre-fndagação, m oderada, - Pelo có d ig o civil, mas além do có d ig o ( 'ivii, Saleilles com acerto indiscutível, prefere inverter a fórm ula, e proclam ar Alem dn có d ig o civil, mas pelo c ó d ig o c iv il (3)! A luz da A plicação do Direito deve Innçai os seus raios através da lei, e não acim a da mesm a; ressalva-se, deste modo, a In pótese de se tornar necessário preencher as lacunas do texto por meio da analojua e de outros recursos defensáveis em toda a linha (4). Os próprios corifeus da nova escola receiam o perigo e limitam o campo de aplicação dos seus ensinam entos. N ão adm item que se form ule regra espccíliea em qualquer hipótese e em todas as instâncias, acerca de m inúcias e perante jui/ de pouca im portância e não provada cultura geral; reservam a prerrogativa pnin os casos sérios, decididos por m agistrados de responsabilidade e longa experién cia da vida. N ão se recorre à Livre-Indagação nos litígios que nascem e morrem perante os ju izes de distrito ou paróquia, ou nos pretórios em regra destinados no desem penho das funções de preparadores e só decisores em um núm ero reslrilo de espécies forenses (5). N em m esm o com as restrições assinaladas, o sistem a novíssim o seria adnp tável ao estado atual da cultura jurídica dos povos sul-am ericanos. Alcançou, na I uropa Central, vitória esplêndida, verdadeira consagração, resultante, não só do art. Io do C ódigo Civil suíço, de 10 de dezem bro de 1907, com o tam bém de de. positivo sem elhante inserto na O rdenação Processual da Á ustria (6). Será lalve/ entre os povos cultos, a doutrina do futuro...

No Brasil a atribuição tiliiih u ti ii.lo estenderia aos Pretores na Capital da República, ac Juizes Municipais, sep.uudu n niudelu liupeilal; nem aos Juizes Distritais, ou de Pa/. (6) DürinRer, op. c ii , p UM

CONTRA LEG EM

76 - Lançada a escola da Livre-Indagação por François Geny, com algum tim idez, e Eugen Ehrlich, com desem baraço maior, eis que em 1906 reboa na E u­ ropa, estridente e sensacional com o um toque de clarim, a voz de A rm ínio Kantorowicz. Em vigorosa m onografia - A Luta p ela ciên cia do D ireito (Der K am pf um die Rechtswissenschaft), e disfarçado no pseudônim o de G naeus Flavius73 (1), o docente de Fri burgo, em Brisgóvia, atira a barra m uito longe. Ehrlich e Geny atribuem ao ju iz liberdade am pla, relativam ente criadora, em falta de disposição escrita ou costum eira; portanto, autorizam -no a agir proeter legem. Kantorowicz, em bora filiado à m esm a escola, induz o m agistrado a buscar o ideal jurídico, o Direito ju sto (richtiges Recht), onde quer que se encontre, dentro ou fora da lei, na ausência desta ou - a despeito da m esm a, isto é, a decidir p roeter e tam bém contra legem : não se preocupe com os textos; despreze qualquer interpretação, construção, ficção ou analogia; inspire-se, de preferência, nos dados sociológicos e siga o determ inism o dos fenôm enos, atenha-se à observação e à experiência, tom e com o guias os ditam es im ediatos do seu sentim ento, do seu tato profissional, da sua consciência jurídica. A doutrina revolucionária olha dem asiado para o foro íntim o, quando deveria, com o os m oderados e a escola histórico-evolutiva, tom ar

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76 - (1) Gnaeus Flavius foi o Callidus vir etfa cu n d u s ("varão eloqüente e hábil"), do IV século antes de Cristo; atingiu, em Roma, às mais altas honras, e revelou o ju s civile repositum in penetraiibus pontificum ut quom odo lege agi p o ssit sciretur ("o Direito Civil guardado nos recintos pontificiais, a fim de que se pudesse saber como agir em observância da lei"). (2) Gareis, op. cit., p. 28-30; Geny, vol. II, p. 252. (3) A jaça encontra-se na dogmática tradicional, a escola evolutiva interpreta até mesmo as disposições claras. (4) Theodor Sternberg - J. H. v. Kirchmann und seine Kritik der Rechtswissenschalt, 1908, p. 10. (5) A obra de Bülow - Lei e M agistratura (Gesetz und Richteram t) é de 1885, anterior à de Geny, cuja primeira edição surgiu em 1899, e também ao primeiro trabalho de Eh rlich - S o b re as Lacunas no Direito (Ü ber Lücken im Rechte), publicado em "Juristiche Blaetter", em 1888, e resumido no Prefácio da monografia - Livre-Pesquisa do Direito e Livre Ciência do Direito (Freie Rechtsfindung und fre ie Rechtsw issenschaft), de 1903. Geny confessa que os alemães o precederam (vol. II, notas a p. 349-351). Também aproveitaram a Kantorowicz as críticas do Unger; porém este se alistou na corrente moderada da Livre-Indagação (Deutsche Juristen-Zeitung, 1906, vol. XI, p. 748-787; Geny, vol. II, p. 376).

( antro Ir ^ r m

61

por ponto de partida a lei liileipielndii t com preendida não som ente á In/ dos preceitos lógicos, mas linuliem de iteoido eom as ideias, aspirações e interesses legítimos da coletividade (.’) A m onografia loi scgiiidu de onlm Leia Teoria do D ireito Justo (/n r Lehre vom, Richtigen Recht), em que o mestre apareceu com o seu próprio nome; produ /in , a prim eira, funda im pressão no mundo jurídico; porque pôs a nu, em lingua gem precisa e vibrante, as falhas e estreitezas da prática judiciária contem porânea, liem como do preparo profissional dos futuros m agistrados. Estes, no parecer do mestre panfletário, só se ocupam com as fórm ulas e deduções silogísticas das te gras aplicáveis aos fatos; não estudam a vida, nem as ciências que preparam pata a com preender bem. Por outro lado, os técnicos atuais, no pretório, revelam se apenas pelo conhecim ento das falhas e erros dos repositórios legislativos; asse m elham-se aos verm es que vivem nos paus podres e se afastam dos sãos; folgam, agitam -se, em pregam toda a sua atividade só nos troncos doentes, estragados, ava l iados. Os profissionais não exam inam , não dissecam , nem criticam o texlo claro, explícito (3), em bora em um caso concreto venha a ter eficácia antissocial, injusta, retrógrada. Portanto só excepcionalm ente a ciência oficia com o sacerdotisa da vei dade; é antes um a ancila do acaso, do erro, da paixão, da irreflexão, “ Do éter dos céus despenha-se até à lam a da terra” (4). A doutrina audaciosa que posterga a própria lei (contra legem) despertou lai go exam e e brilhante polêm ica. Difundiu-se logo o seu conhecim ento, graças à edição italiana e autorizada, do Juiz M ajetti, na qual, entretanto, houve alguns retoques, ligeiro recuo no sentido da escola de Ehrlich. A inda Stam pe c Sehmill palm ilharam a trilha de Kantorowicz, e tiraram largo proveito das apóstrofes de IKilow, aliás contrário apenas à jurisprudência m eram ente casuística e fornialisla. cultora exclusiva de preceitos e brocardos, pandectológica, indiferente ao exame dos fatores sociais dos fenôm enos jurídicos (5).

77 - A lgum a sem elhança com os ideais da Livre-Indagação tinham os liscola Crim inal Positiva, que propugnava tam bém m aior liberdade para o ju iz ao punir os réus, porém o sistem a era diverso: os próprios C ódigos deveriam sei me nos casuísticos, deixar m argens largas, sobretudo quanto às dirim entes, agravantes e atenuantes, e o m agistrado, im buído de profundos conhecim entos de psicologia e sociologia, teria um cam po vasto para fazer verdadeira justiça e graduar o alas lamento do convívio social conform e a tem ibilidade do delinqüente Não julgai ia contra legem : os próprios textos, pelos term os da sua redação, perm itiriam am plo alvedrio aos tribunais ao defender a coletividade contra o crime. Releva advertir que até os apologistas da Livre-Indagação moderada não a e s tendem à órbita da Crim inologia; enquadram -na somente no Direito Privado71 ( I )

l'!

77 - (1) Gmür, op.

cit,

p IM

6 2

Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

78 - Não foi possível aos corifeus da doutrina extrem ada preestabelecerem um critério para se saber quando é lícito abandonar os textos e form ular nova regra, e quais os litígios cuja valia não justifica a saída dos limites das disposições expressas. P or isso a escola pressupõe a existência de m agistratura bem -escolhida entre homens de valor intelectual. Para se justificar de semelhante necessidade, esm erou-se em pôr em realce os defeitos das organizações atuais, e dem onstrou, até à evidência, que tam bém a corrente histórico-evolutiva não atingirá o seu ideal sem a colaboração oportuna de um corpo de julgadores bem-preparados. N a personalidade do juiz está o único perigo no exercício do Direito, mas tam bém na m esm a se encerra a garantia real da verdadeira justiça - proclam a Ehrlich, o chefe tudesco do grupo moderado. O m agistrado m oderno, libertado das estreitezas da dogm ática, investido da prerrogativa de m elhorar a lei e supri-lhe as lacunas, guiado pela finalidade hum a­ na, atento aos fatores sociológicos dos fenôm enos jurídicos, não pode ter apenas a tradicional cultura rom anista e clássica; necessita de um preparo m enos especiali­ zado, mais am plo e com pleto. Hom ens de tanto valor se não encontram com um en­ te nos pretórios; porque o atual processo de seleção é antiquado e deficiente, e os vencim entos não atraem as capacidades excepcionais. Têm razão, neste particular, os apóstolos da ideia nova. A ju stiç a das decisões depende sempre do coeficiente pessoal: da cultura e perspicácia do m agistrado, suas preferências filosóficas, pendores jurídicos, orientação sociológica, bondade, retidão75 (1). Urge adaptar às novas exigências o ensino superior (2) e as leis de organização judiciária, bem com o dignificar, à m oda britânica, e estipendiar gene­ rosam ente os m em bros dos tribunais. “Quanto mais o G overno econom iza com a m agistratura, mais despende o povo com advogados” (3). 79 - A escola ultra-adiantada liberta de todo o limite ou critério objetivo o aplicador do Direito, o que parece perigosíssim o e destoante da concepção do Es­ tado m oderno, sobretudo inconciliável com o regim e de freios e contrapesos ado­ tado pelo Brasil, Estados Unidos e R epública A rgentina76 (1).

75

76

78 - (1) "Dai-nos homens! Dai-nos juizes de gênio! É o que precisam os!" (Gerland, Prof. da Universidade de Jena - O Exercício da Função Judicial, segundo a Lei Inglesa, in "Sc. of Legal Method", p. 231). (2) No Brasil é bastante insistir sobre a preferência pelos métodos modernos de expor as dis­ ciplinas, sobretudo no ensino do Direito Privado e do Judiciário; porque a distribuição das ma­ térias já é adiantada; não se prolonga em demasia o estudo do Direito Romano, como sucede na Europa Central, e voltou a ser obrigatório o curso da Filosofia do Direito, bem como o das Ciências Sociais, para o bacharelado que dá acesso aos primeiros cargos da magistratura. (3) Ehrlich - Freie Rechtsfindung und fre ie Rechtswissenschaft, in "Sc. of Legal Method", p. 65-66; Rumpf, op. cit., p. 78; Gmelin, op. cit., p. 20 e 81-82; Gmür, op. cit., p. 142-143 e 146. A frase literalmente transcrita é de Gmür, p. 146, nota 2. 79 - (1) Jandoli, op. cit., p. 63. (2) Geny, vol. II, pág. 322; Kiss, op. cit., p. 55.

Contra L e g e m

Defendem -se, m oderados e revolucionários, com alegar que, em observáneii da doutrina da Livre-Indagação, com o na vigência da H erm enêutica tradicional, < magistrado ju lg a em espécie; para esta ele descobre um a regra, sem aplicação In tnra; olha para o passado; ju s fa c it interpartes; e o que caracteriza o ato legislativo e o dispositivo costum eiro é a generalidade e o efeito perm anente, sobre os easoH vindouros (2). O conceito novo, pela m agistratura estabelecido, seria, na frase dii Kantorowicz, transitório e frágil com o as próprias estrelas. A lei é um a norma jm i • dica geral; a regra firm ada pelo juiz, um a norm a jurídica individual (3). As câmaras dispõem em abstrato; no pretório ordenam para o caso concreto ( I). Os argum entos procedem , em parte; m as não bastam para justificar as audin cias dos novos evangelizadores. A m aior parte dos trabalhos legislativos envolvo casos pessoais (5), e, não raro, decidem sobre o passado, com o na anistia, na el is • pensa de entrar com a quantia em que ficou alcançado com a Fazenda Nacional o funcionário, etc. A p ro p ria disposição geral é quase sem pre sugerida por um lato isolado (6). D em ais, tam bém às vezes o m agistrado ordena para o futuro, com o sucede nos interditos proibitórios (7).

80 - H á outros argum entos, que aproveitam em parte porém só aos mode dos: A) O ju iz apenas com pleta e m elhora a lei; portanto, entre o Legislativo e o Judiciário só se verifica uma verdadeira cooperação em funções públicas, e nao absorção, por um poder, das atribuições de outro. Dem ais, a doutrina de Monles quieu não to m a cada um dos três ram os da autoridade soberana absolutam ente independente; apenas conserva distintas as funções77 (1). B) N enhum poder tem uma função toda, com pleta; e cada um acum ula partes de diversas. O Lxeeulivo

(3) Unger, apud Kiss, p. 55. (4) Brütt, op cit., p. 180. (5) Durante uma legislatura, a 593, 0 Congresso Norte-Americano votou 6.940 leis sobie as suntos particulares, e apenas 692 sobre interesses gerais (Charles Beard - American (uivem m ent and Politics, 39 ed., 1920, p. 271). (6) Oertmann, op. cit., p. 16. (7) O Código Civil autoriza o juiz a prescrever para o futuro nos arts. 501, 529 e 587, última parte. 11

80 - (1) C. Alexandre Alvarez - Une nouvelle Conception des Études Juridiques ei dc Ia ( mli/t cation du Droit Civil, in "Sc of Legal Method", p. 474-475; Düringer, op. cit., p. 14. (2) Brütt, op. cit., p. 180; C. M axim iliano - Com entários à C onstituição B ra sileira, V irci to, porém com o que inconscientem ente, com o intuito de o com preender e liem aplicar. N ão cria, reconhece o que existe; não formula, descobre e revela o preceito em vigor e adaptável à espécie. Exam ina o Código, perquirindo das circunstâncias culturais e psicológicas em que ele surgiu e se desenvolveu o seu espírito; Ia/ a crítica dos dispositivos em lace da ética e das ciências sociais; interpreta a ref.ia com a preocupação de fazer prevalecer a justiça ideal (richtiges Recht)', porém tudo procura achar e resolver com a lei; jam ais com a intenção descoberta tle aj>11 por conta própria, proeter ou contra legem (3). Todo D ireito escrito encerra um a parcela de injustiça. Parece justa a rcp.iaj somente quando as diferenças entre ela e o fato são insignificantes, insensíveis. Pre

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8 1 - ( 1 ) Gareis, op. cit., p. 30. "Substituem a impessoalidade e a objetividade da norma pela ação da individualidade, pela obra pessoal e arbitrária do juiz: manifestação nova de irracionalismo e super-humanismol estético" (Bartolomei - Filosofia del Diritto, p. 160 e segs.). (2) M endelssohn-Bartholdy- Das Imperium des Richters, 1908, p. 153. (3) Berolzheimer - D ie Gefahren einer Gefühlsjurisprudenz, p. 12. 82 - (1) Géza Kiss, op. cit., p. 55-56; Brütt, op. cit., p. 83. (2) Geny, vol. I, p. 299-300. (3) Max Salomon - Dos Problem der Rechtsbegriffe, 1907, p. 63-64; Oertmann, op. c it., p /< vv ii.itli 1.1H vizinhos, com o os de M inas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, a palavra olt/in ■ii. oficialm ente em pregada, não designa a m esm a quantidade superficial de terra. f ) Presum e-se que a lei não contenha palavras supérfluas; devem todas ser entendidas com o escritas adrede para influir no sentido da frase respectiva ((>) g ) N a dúvida, prefere-se o significado que torna geral o princípio em a norma concretizado, ao invés do que im portaria num a distinção, ou exceção (7). h) A p o sição dos textos esclarece o herm eneuta: se o objeto é idêntico, parei o natural que as palavras, em bora diversas, tenham significado sem elhante ( X) /) Pode haver, não simples im propriedade de term os, ou obscuridade dc linguaJ gem, m as tam bém engano, lapso, na redação. Este não se presume: Precisa sei deJ tnonstrado claram ente. Cum pre patentear, não só a inexatidão, m as também a emis.ij da m esm a, a fim de ficar plenam ente provado o erro, ou simples descuido (9). j ) A prescrição obrigatória acha-se contida na fórm ula concreta. S e a lelia ii.hi é contraditada p or nenhum elem ento exterior, não há m otivo para hesitação: devii ser observada. A linguagem tem por objetivo despertar em terceiros pensam ento sem elhante ao daquele que fala; presum e-se que o legislador se esm erou em esJ colher expressões claras e precisas, com a preocupação m editada e lirme de sen bem -com preendido e fielm ente obedecido. Por isso, em não havendo elem entos do convicção em sentido diverso, atém -se o intérprete à letra do texto (10). E m bora seja verdadeira a m áxim a atribuída ao apóstolo São Paulo a lelia mata, o espírito v iv ific a -, nem por isso é m enos certo caber ao ju iz afastar se d.ej expressões claras da lei, som ente quando ficar evidenciado ser isso indispensável para atingir a verdade em sua plenitude. O abandono da fórm ula explícita consliluj um perigo para a certeza do Direito, a segurança jurídica; por isso é só juslilicá\e| em face de mal maior, com provado: o tle um a solução contrária ao espirito doij dispositivos, exam inados em conjunto. As audácias do herm eneuta não podem n ;| ponto de substituir, de ínlo. a noi ma poi outra (I I). A) Iintrelanlo, o iiimoi pei ipo. Imite perene de erros, acha se no exItem o opos. Io, no apego às p a la u ir. Alendii no ií letra do dispositivo; porém com a maio|

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

cautela e ju sto receio de “sacrificar as realidades m orais, econôm icas, sociais, que constituem o fundo m aterial e com o o conteúdo efetivo da vida jurídica, a sinais, puram ente lógicos, que da m esm a não revelam senão um aspecto, de todo form al” (12). Cum pre tirar da fórm ula tudo o que na m esm a se contém , im plícita e ex­ plicitam ente, o que, em regra, só é possível alcançar com experim entar os vários recursos da Herm enêutica (13). Verbum ex legibus, sic accipiendum est: tam ex legum sententia, quam ex ver­ bis - “O sentido das leis se deduz, tanto do espírito com o da letra respectiva” (14). São inevitáveis os extravasam entos e as com pressões; resultam da pobreza da palavra, que torna esta inapta para corresponder à m ultiplicidade das ideias e à com plexidade da vida. Por isto, há interpretação extensiva e estrita, posto que outrora se considerasse ideal a só declarativa (15). 1) A interpretação verbal fica ao alcance de todos, seduz e convence os indoutos, im pressiona favoravelm ente os hom ens de letras, m aravilhados com a riqueza de conhecim entos filológicos e prim ores de linguagem ostentados por quem é, apenas, um profissional do Direito. Com o toda m eia ciência, deslum bra, encanta, e atrai; porém fica longe da verdade as mais das vezes, por envolver um só elem ento de certeza, e precisam ente o m enos seguro. N ão se desdenhe, em absoluto, um tal processo; cum pre em pregá-lo, porém, com a m ais discreta cautela, para evitar o que os alem ães denom inam Silbenstecherei - logomaquia, esm erilhação pedantesca, disputa palavrosa e oca (16). Quem só atende à letra da lei, não m erece o nom e de jurisconsulto; é simples pragm ático (dizia Vico) (17). A exegese filológica atinge, apenas, o caso típico, principal; o núcleo, explí­ cito, lúcido, é cercado por um a zona de transição; cabe ao intérprete ultrapassar esse lim ite para chegar ao cam po circunvizinho, mais vasto, e rico de aplicações práticas (18). m) G uia-se bem o herm eneuta por m eio do processo verbal quando claros e apropriados os term os da norm a positiva, ou do ato jurídico (19). Entretanto, não é absoluto o preceito; porque a linguagem , em bora perfeita na aparência, pode ser inexata; não raro, aplicados a um texto, lúcido à prim eira vista, outros elem entos de interpretação, conduzem a resultado diverso do obtido com o só em prego do processo filológico (20). Sobretudo em se tratando de atos jurídicos, a justiça e o dever precípuo de fazer prevalecer a vontade real conduzem a decidir contra a letra explícita, fruto, às vezes, de um engano ao redigirem (21).

116 - A - N o s tratados de Direito e nos repositórios de Jurisprudência pululam conclusões em flagrante desacordo com a im pressão resultante da exegese pura­ m ente gram atical dos textos. a) O art. 32 da Lei Cam bial (D ecreto n° 2.044, dc 21 de dezem bro de 1908 determ ina: “O portador que não tira em tem po útil, e forma regulai o iiislnim enlo

Processos de Interpretação

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do protesto da letra perde o direito de regresso contra o sacador, endossadores e avalistas .” A exegese filológica leva a concluir que, não feito o protesto no prazo legal, cessa a faculdade de agir contra qualquer avalista; pois o texto não distingue entre o do aceitante da letra de câm bio, ou do em itente da nota prom issória, e os demais. Com esta orientação decidiu até um pretório que form a na prim eira linha entre os m ais esclarecidos do Brasil —o Tribunal de Justiça de São Paulo (A córdão de 30 de m arço de 1916). Reform ou, enfim, a jurisprudência, afeiçoando-a, de vez, à boa doutrina (A córdão de 8 de julho de 1919). O avalista do aceitante da letra, ou do em itente da nota promissória, é equipa­ rado ao avalizado. A responsabilidade deste não cessa pelo sim ples fato de se não protestar o título; portanto, o m esm o se dá com a daquele. A lei, em bora não distinga explicitam ente, refere-se a avalistas dos sacadores e aos de endossadores. O em itente, ou aceitante, e os respectivos avalistas são obrigados diretos; o sacador, o endossador e os seus avalistas são os que a doutri­ na considera obrigados regressivos, únicos que se libertam quando se não laz em tem po o indispensável protesto"'1 (1).

113

1 1 6 - A - (1) S a ra iv a - A

C a m b ia l, 2 - e d ., § § 9 6 , 1 7 1 e 2 8 6 ; C a r v a lh o d e M e n d o n ç a - T ratado

d e D ireito C o m ercia l, v o l. V, p a r te 2 -, n°- 7 6 6 e 9 5 7 ; P a u lo d e L a c e r d a —A C a m b ia l n o D ireito B rasileiro, 3^ e d ., n 9 3 1 6 ; J o s é M a r ia W h it a k e r - L etra d e C â m b io , 23 e d ., n 9 1 4 7 e n o ta 3 3 9 . (2) J o s é T a v a r e s , P ro f e s s o r d a U n iv e r s id a d e d e C o im b ra - S u c e s sõ e s , 2a e d ., v o l. I, p. 2 9 ; D ias F e r r e ir a , P ro fe s s o r d a U n iv e r s id a d e d e C o im b ra -

C ódigo Civil P o r tu g u ê s A n o ta d o , v o l. III,

c o m e n t á r io a o a rt. 1 .1 7 4 . (3) J o ã o V ie ira d e A r a ú jo -

O C ódigo P en a l In te r p r e ta d o - P a rte E special, v o l. I, n 9 1 1 1 , - P a rte E special n s 2 9 9 (e m d e s a c o r d o

2 4 7 ; G a ld in o S iq u e ir a - D ireito P enal B rasileiro

p. 2 4 6 q u a n to

a o r a p to e m p le n a ru a ); A c ó r d ã o d o T rib u n a l d e J u s t iç a d e S ã o P a u lo , d e 2 6 d e m a r ç o d e 1 8 9 8 ; A c . d a T e r c e ira C â m a r a d a C o r t e d e A p e la ç ã o d o D is t r it o F e d e ra l, d e 1 0 d e a b ril d e 1 9 1 5 ; G a­

z e ta Jurídica, v o l. 17 , p. 1 7 0 ; R evista d e D ireito, v o l. 4 0 , p. 2 1 2 - 2 1 6 ; E d g a rd C o s ta - R e p e rtó rio d e J u risp ru d ê n cia C rim inal, n 9 3 0 4 . (4) C h a v e a u e H e lie - T h éo rie d u C ode P énal, 3a e d ., v o l. IV, p. 3 8 9 - 3 9 9 ; G a r r a u d - T raité Théo r iq u e e t P ra tiq u e d u D roit P én a l F rançais, 2§ e d ., v o l. V, n 9 1 .9 8 2 e n o ta 11. (5) C a r lo s M a x im ilia n o - D ireito d a s S u c e s sõ e s , n 9 7 3 1 ; A u b r y & R au e B a rtin i - C ours d e D roit

Civil, 52 e d ., v o l. X I, § 6 9 2 e n o t a s 5 t e r a 6 te r ; T h é o p h ile H u c - C o m m e n ta ir e d u C ode Civil, v o l. V I, n o s 4 4 - 4 7 . (6) P la n io l & R ip e r t, e T r a s b o t - Traité P ra tiq u e d e D roit Civil, v o l. V, 1 9 3 3 , n 9 7 3 1 ; B a u d ry L a c a n t in e r ie e C o lin - D es D o n a tio n s e n tr e Vifs e t d e s T e s ta m e n ts , 3§ e d ., v o l. II, nas 2 .9 0 8 - 1 1 ; M a r c e lo P la n io l - Traité É lé m e n ta ir e d e D roit Civil, 7a e d ., vo l. III, n 9 2 .8 6 2 ; C . M a x im ilia n o -

D ireito d a s S u c e s s õ e s , n 9 1 .0 9 9 . (7) Ju lie n B o n n e c a s e -

L'École de L'Exégèse en Droit Civil,

1 9 1 9 , p. 2 1 7 ; P la n io l & R ip e r t e N a st,

v. IX, n u51 .1 1 8 1 .1 2 0 ; D u a ld e , o p . c it., p. 1 6 1 - 1 6 2 . (8) M e lo F r e i r e - In s titu tio n u m J u r is Civilis L usitani, Liber III, tít., 6 9, § 1 1 ; C o r r e ia T e le s , D ig esto

P o rtu g u ê s , vol. II, n 9 1 .1 6 4 , c o m a p o io e m V a la s c o ; P e re ir a d e C a r v a lh o - P rim eira s U n h a s

sobre o Prui rs\o Otfanalágico, e d iç ã o D íd im o d a V e ig a , v o l. I, n o ta 6 5 ; T e ix e ira d e F r e it a s n o ta 2 7 3 íi D o u trin a ihi\ A 0 r \ , d e ( o r r e ia T e le s ; C â n d id o M e n d e s - C ódigo Filipino, 1 4 s e d ., n o ta 5

9 4

Hermenêutica e Apllcaç3o do Direito | Carlos Maximiliano

b) Preceitua o Código Civil português: “Art. 1.457. As doações, t/in’ tiverem de produzir os seus efeitos p o r m orte do doador, têm a natureza de disposição de últim a vontade, e ficam sujeitas às regras estabelecidas no título dos testam entos.” A letra parece adm itir as doações causa mortis; porém a doutrina e a ju ris­ prudência concluem de m odo diam etralm ente oposto - contra a legalidade de tais atos benéficos (2). c) Prescrevia o C ódigo Penal de 1890, sob a epígrafe D o Rapto: “Art. 270. Tirar do lar doméstico, para fim libidinoso, qualquer m ulher honesta...” A exegese filológica excluiu do alcance do texto a tirada de um recolhim ento, ou colégio, e o rapto em plena rua, num teatro, agência de C orreios, ou loja de m o­ dista. A boa doutrina, baseada na interpretação lógica e estrita, não restritiva nem gramatical, engloba na m esm a figura delituosa todas as hipóteses referidas; porque “ a essência do crim e de rapto está no apossar-se da pessoa de alguém levando-a de um para outro lugar (abductio de loco a d locum, dos rom anos), ou retendo-a onde se ache à discrição de outra pessoa” (3). A fon te do dispositivo brasileiro é o art. 354 do Código Penal francês, um pouco mais explícito, aliás, porque alude à tirada “dos lugares onde os m enores tinham sido postos por aqueles a cuja autoridade ou direção estavam subm etidos ou confiado” . O repositório gaulês com preende, pois, claram ente, a casa paterna e o pensionato; porém não a rua, o cinem a, a loja, lugares onde o rapto se dá e é punido como tal (4). d) Preceitua o C ódigo Civil francês: “Art. 900. Em toda disposição entre vivos ou testamentária, as condições im possíveis e as que forem contrárias às leis ou aos costum es serão reputadas não escritas.” A exegese verbal induz a inferir que da condição ilícita não advém prejuízo para a validade da cláusula a que esteja adstrita; devem, pois, decidir com o se a condição não existisse. Pois bem ; a jurisprudência, vitoriosa até na Corte de Cassação, com referên­ cia aos atos de últim a vontade, afeiçoou à m elhor doutrina o preceito im perativo e claro; transportou para o cam po do dispositivo citado a teoria da causa determ i­ nante ilícita, e tem , com este fundam ento, anulado a própria liberalidade, a cláusu-

à O rdenação do liv. I, tít. 88, § 99, com ap o io em Gama, Valasco, Barbosa, Paiva e Pona; Carlos M axim ilian o , - D ireito d a s S u c e ssõ e s, n®5 1.544-1.545. (9) Pontes de M ira n d a - A çã o R e scisó ria , p. 11 e 238; Cândido M endes de A lm eida - Código Filipino, 14a ed., vol. I, nota 1 à Ordenação do livro 3a, títu lo 75, princíp io , com apoio de M o ­ rais e Silva Pereira; Teixeira de Freitas - D o u tr in a d a s A ç õ e s, nota 162, e P rim eira s Lin has so b re o P ro cesso Civil, vol. II, nota 696; M anuel Inácio Carvalho de M endonça - Da A çã o R escisória , n2 1, p. 8; Jorge A m e rican o - Da A ç ã o R e scisó ria , 2a ed., ns 29, p. 64; Pedro Lessa - Do P o d er Ju d iciá rio , § 45. (10) Raoul de Ia Grasserie - De La Ju stice en Fra n ce e t à I' É tra n g e r au XXe S iècle, vol. I, p. 123124; Egger, Oser, Escher e Haab - K o m m en ta r zum S ch w e izerisch en Z ivilg e sctz h iich , 2 a ed., 1930, vol. I, p. 48.

Mid i ev.os de lnler|>ielii(,8o

Li teslam cnlária inteira, nflo tte llmlln n considerar inócua, inexistente, min escrita, a condição apenas, com o a letrii do texto indicit (5). e) O art. 1.045 do ( 'ódigo ( iv il líancôs especifica: “O legado será ainda re putado feito conjuntam ente, quando uma coisa c]ue não é suscetível de ser dividida sem deterioração, tiver sido dada pelo mesmo ato a m uitas pessoas, até mesmo separadam ente.” A plicada esta norm a, desde que faltasse um dos legatários, a sua parte cabei ia aos restantes. Entretanto, nunca se cum priu aquele dispositivo; os tribunais limi lam-se a interpretar a vontade do testador, os term os do ato de últim a vontade; se não ressalta de tais elem entos o desejo de fazer subdividir entre uns o que ouliem deixou de receber, não se dá o acrescimento, em bora o bem -transm ilido causa mortis não possa ser dividido sem se deteriorar. D ecidem , pois, os juizes com o se o art. 1.045 não existisse (6). f ) O C ódigo N apoleão, no art. 1.554, estabeleceu a inalienabilidade dos bens dotais, imóveis; entretanto, ajurisprudência, atendendo ao enorm e desenvolvim cn to que, nos tem pos m odernos, teve a classe dos móveis, estendeu a estes o preceito, ou melhor, fez da exceção regra (7). g) As Ordenações Filipinas, livro Io, título 88, § 9o, preceituavam : “ li o pai, ou mãe, ou qualquer outra pessoa, que por m andado da Justiça fizer inventário, c nele sonegar e encobrir algum a coisa, assim m óvel, com o de raiz, que fosse do defunto ao tem po do seu falecim ento, perderá p a ra os menores tudo aquilo que sonegar.” O texto só se refere ao inventário em que houvesse interessados m e n o res; porém triunfou, na prática, o parecer generalizador e contrário, liaseado na razão da lei, colim ando evitar as fraudes tendentes a ilidir a regra concernente a igualdade nas partilhas; antes m esm o de revogadas as Ordenações, no Brasil c em Portugal se entendia ser tam bém im posta a pena de sonegados quando fossem Iodos os sucessores maiores e capazes (8). h) As Ordenações deparam -nos a seguinte regra, no livro III, título 75, |>i mei p i o , - “a sentença que é por Direito nenhuma, nunca em tempo algum passa em coisa | Itilgada” ; e a epígrafe d e c la r a - “em todo tempo pode ser revogada” . Permitem, por tanto, a ação rescisória em qualquer tempo. Entretanto, adquiriu força tle lei a opini.n » de Silva, que fixou o prazo em trinta anos (seis vezes mais, ainda, do que o cstabclc eido pelo Código brasileiro); logo não mais se rescinde “em qualquer tempo” ((>). /) A C orte de Cassação, de França, e o Suprem o Tribunal Federal, da Sim, a , aliistaram -se, com frequência, da letra das norm as positivas, até m esm o em casos de aparerde clareza (10).

117 - “ Soa com o um paradoxo a questão de saber se, em geral, a palavra c em condições de transmitir o pensamento, li, todavia, séria a dúvida, e até coni|>oila unia solução negai iva, apego ns pnlavras é 11111 tlesses fenômenos que, no 1)ireito como em tudo o mais, t uiaeleri/nm a liilta d e maturidade do d e s e n v o lv im e n t o intelectual. No começo da história do Direito poder-se-ia gravar esta epígrafe In principio erat verbum. A palavra, quer escrita, quer solenemente expressa (a fórmula), aparece aos povos crianças como algum a coisa de misterioso, e a fé ingênua atribui lhe força sobrenatural” 120 (1). Em R om a empregavam-na para deslocar, por 11111a espe cie de sortilégio, as messes de um a seara para a outra, e tam bém para fazer os deuses abandonarem um a cidade sitiada. Precisamente os povos mais atrasados, d e l i n g u a g e m menos culta, apegam-se aos vocábulos; o emprego obrigatório das fórmulas consagra ilas corresponde a um grau primitivo de civilização. Prevalece a crença no fenômeno exterior; ora a palavra é aquilo que aparece como suscetível de apreensão, imediato; 11 los. Cumpre estudar a fundo a linguagem, e só por esse meio interpretar o texto. () pn mitivo hermeneuta fica adstrito aos dom ínios dos lexicógrafos e dos gramáticos ( í ) A inda hoje, aliás, varrida, em bora das em inências da teoria, a m ística da sa bcdoria divina do legislador perdura na planície, filtrada no espírito do povo, c na técnica m isoneísta de aplicadores do Direito. No foro e nos parlam entos, “o y.ra maticalismo não é um fantasm a; é deplorável realidade” (4). A vitalidade espantosa do Direito rom ano, e, até m esm o, da Lei das I )o/e Tábuas antes de advir o Corpus Juris, deve atribuir-se à interpreta lio, que dcsen volvia e am pliava o Direito escrito, em bora deixando intata a letra respectiva (>) R elativam ente a um a civilização em brionária não parece insolúvel o proble­ ma; porque é pouco variado o conjunto das relações sociais, reduzida a mtilliplici ilade dos interesses; portanto m enor o cam po da linguagem ; m ais fácil sc anlolha 1 » abranger com as frases o pensam ento integral. Hoje sucede o contrário: mais com plexa a vida; cada palavra significa ideias diversas; insuficiente e precária se revela a exegese verbal (6).

120

123 - (1) Jhering, Prof. da Universidade de G ottingen, vol. III, p. 134. in p rin cip io e ra t verb u m frase do Gênesis, que, no caso presente, assim se e n te n d a : "em é|>" cas prim evas a palavra era tu d o". (2) D ernburg - P a ru lrk trn , ■’ ed., vol I, (3) Paul V ander I ycken

(4; R. Von Jhering, vol. III, p. 134 135 e 14 1

M r llu u lr 1 'ir.iliv r i l r I'In te rp re ta tio n Ju rid iq u e , 1907, p. 1 1 -V; I Mial

de, op. cit., p. 7 /H e 101 (4) Dualde - op. i ii , p ' I I -in e V i

(5) Sohm

Ilista i Ii i e /mlKm (ene-, ilrl i i r in lln 1'rlvtldo Romano, Itad. espanhola, | > HJ.

(6) llie rlin i;, vol IV, p ! M .• imiI.i I •• ao 'i

t

1 0 0

Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

124 - Em conclusão: nunca será dem ais insistir sobre a crescente desvalia do processo filológico, incom paravelm ente inferior ao sistem ático e ao que invoca os fatores sociais, ou o D ireito Com parado. Sobre o pórtico dos tribunais conviria inscrever o aforism o de Celso - Scire leges non est verba earum tenere, s e d vim ac potestatem '2' (1): “ Saber as leis é conhecer-lhes, não as palavras, m as a força e o poder”, isto é, o sentido e o alcance respectivos. Só ignaros poderiam , ainda, orientar-se pelo suspeito brocardo - verbis legis tenaciter inhaerendum - “apeguem o-nos firm em ente às palavras da lei” . N inguém ousa invocá-lo; nem m esm o quem de fato o pratica. N ão devem ter im itadores os form osos espíritos que, ao ventilar teses ju ríd i­ cas, ainda hoje tim bram em servir-se apenas de erudição filológica; ostentam com o docum entação, adversa ao Direito Com parado, trechos de gram áticas e dicioná­ rios, unicam ente. N inguém contesta o subsídio que pode prestar o conhecim ento das leis e usos da linguagem ; estude-se, todavia, o Direito, de preferência, nos livrds de Direito, nacionais e estrangeiros. Retrógrada e indefensável é a suprem acia da interpretação judaica. PROCESSO LÓ G IC O

125 - O Processo Lógico propriamente dito consiste em procurar descobrir o sen­ tido e o alcance de expressões do Direito sem o auxílio de nenhum elemento exterior, com aplicar ao dispositivo em apreço um conjunto de regras tradicionais e precisas, tomadas de empréstimo à Lógica geral. Pretende do simples estudo das normas em si, ou em conjunto, por meio do raciocínio dedutivo, obter a interpretação correta. O Processo Lógico tem m ais valor do que o sim plesm ente verbal122 (1). Já se encontrava em textos positivos antigos e em livros de civilistas, brasileiros ou reinícolas, este conselho sábio: “ Deve-se evitar a supersticiosa observância da lei que, olhando só a letra dela, destrói a sua intenção” (2). Por outras palavras o Direito rom ano chegara a conclusão idêntica: declarara - “age em fraude da lei aquele que, ressalvadas as palavras da m esm a, desatende

121 122

124 - (1) D ig esto , liv. 1, tít. 3, frag. 17. 125 - (1) Trigo de Loureiro - In stitu içõ e s de D ireito Civil B ra sileiro , 1861, vol. I, § 51; Crome, vol. I, p. 97. (2) Assento 345, de 17 de agosto de 1811; Ass. 358, de 10 de ju n h o de 1817; Borges Carneiro - D ireito Civil de P o rtu g a l, 1826, vol. I, p. 48, n9 18; Carlos de Carvalho - D ireito Civil B ra sileiro R eco p ila d o , art. 62, § 32. (3) Paulo, no D ig esto , liv. 1, tít. 3, frag. 29. (4) Gmür, op. cit., p. 26. (5) Nicola Coviello - M a n u a ie d i D iritto Ita lia n o , 2a ed., vol. I, p. 69; Paula Batista, op. cit., § 14; Ferrara, vol. I, p. 220; G ianturco, vol. I, p. 120; Fiore, vol. II, p. 528, ns 945. (6) Celso, no Digesto, liv. 33, tít. 10, frag. 7, 2°.

l'io i ev.os de Interpretação

|

no seu espírito” ( 'outra h \-eni /i e v .o s d e In te l p i et.n,,1o

103

Assim o jurista: eniiiu lodo i tillm de ciência relacionada eom a vida do lio tnem em com unidade, mio poderá leeluti os olhos â realidade; acima das frases, dos conceitos, impõem se. iiicootelveís, ns necessidades dia a dia renovadas pela coexistência hum ana, proleiíoi me, com plexa.

129 - Os extrem os do apreço pelo processo dogm ático, rígido, silogíslie tornaram -no fonte de erros (despautérios e injustiças; desacreditaram -no deve ras. C ertos autores até relegam a H erm enêutica exclusivam ente para o cam po da Lógica; afastam -na da esfera dos estudos jurídicos. E ntretanto, a experiência diuturna e universal leva a concluir que, entre indivíduos igualm ente fainilian zados com a ciên cia de Papiniano, irá m ais longe aquele que aos conhecim entos gerais do D ireito aliar o dos preceitos reguladores da interpretação, sem cxcluii os trad icio n ais126 (1). O m al está no abuso, que leva a desprezar o coeficiente pessoal e os valores jurídico-sociológicos; e não em sim ples uso, consistente em aplicar os processos da Lógica, sem deixar de contar com outros elem entos, inclusive a cultura, o ci i tério profissional, a isenção de ânim o, o tato e outros predicados individuais do verdadeiro exegeta e aplicador do Direito. A ssim com o os tradicionalistas caíram no deplorável exagero de transformai simples princípios dirigentes da pesquisa no sentido e alcance dos textos em foi mulas m atem áticas, incoercíveis, de efeito direto, fatal, único; os contem porâneos, arrastados pelo entusiasm o pelos elem entos sociológicos, erraram , tam bém , cm liizer tábua rasa do passado e, em conseqüência, perdida a brida, sem ponto de apoio, resvalaram até à Livre-indagação, ao julgam ento independente dos códigos, aos arestos p ro eter e tam bém contra legem. N o m eio-term o está a virtude: os vários processos com pletam -se rcci|>roca mente, todos os elem entos contribuem para a descoberta da verdade e maior apio ximação do ideal da verdadeira justiça. A os fatores verbais aliem -se os lógicos, c com os dois colaborem , pelo objetivo com um , os sociais, bem -m odernos, porém |a pressentidos pelos jurisconsultos clarividentes da R om a antiga. Todos os exageros

I /(>

129 - (1) Brocher, op. cit., p. 16-17. (2) Abel A ndrade - C o m entário ao Código Civil P a rtu g u ês, vol. 1,1895, Introdução, p. I XX; i X Carvalho de M endonça - Tratado d e D ireito C om ercial B ra sile iro , vol. I, n2 143; Desi .iite s 11 iieilo Civil B ra sileiro , 1880, vol. I, p. 292; Enneccerus - Leh rb uch d es B ü rg erlich en R echt',, I ‘ 17 I , vi >1 I, p. 117; Sabino Jandoli

Sulla leo ria delia In terp reta zio n e d elle L eg g i con S p e cia le IMu i |i i i il iH da mesma lei; e no exame de todos os fatos e sucessos hlstói li ns, ............... . ihmiaf para ela" (3).

N as palavras transcritas já está caracterizada a Occasio legis: com plexo d circunstâncias específicas atinentes ao objeto da norm a, que conslituíiam o iinpul so exterior à em anação do texto; causas m ediatas e im ediatas, razão política e pn í dica, fundam ento dos dispositivos, necessidades que levaram a prom ulgá los; lii.sj tos contem porâneos da elaboração; m om ento histórico, am biente social, condiçOo culturais e psicológicas sob as quais a lei surgiu e que diretam ente conlribuiiaij

153

1 5 7 - (1 ) Até a forma dos Estatutos de Coimbra é considerada modelo de linguagem vem.'» H Ia, de português clássico. (2) Estatutos, liv. 2, tít. 6, cap. 6, § 19. (3) Estatutos, liv. 2, tít. 6, cap. 6, § 23. (4) Almeida e Sousa, de lobão, Natns n M elo, vol. I, p. 18-19; Coelho da Rocha, vol I, 11 4 ‘! regra 1-; Trigo de Loureiro, vel I, U 4(>; Pacifici-Mazzoni, vol. I, p. 43-44; Ferrara, vol I, p ! I '] Enneccerus, vol. I, p. 11 Reuiee.ldorld, op. cit., p. 6; Salomon, op. cit., p. 63; lllai k, op i li p. 285-286; Suthcrland, vol II, 0 4/1,1 mny, vol. I, p. 288.

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

para a prom ulgação; conjunto de m otivos ocasionais que serviram de justificação ou pretexto para regular a hipótese; enfim o m al que se pretendeu corrigir e o m odo pelo qual se projetou rem ediá-lo, ou, melhor, as relações de fato que o legislador quis organizar juridicam ente (4). 158 - N enhum acontecim ento surge isolado; com explicar a sua origem , ra­ zão de ser, ligação com os outros, resulta o com preender m elhor a ele próprio. Precisa, pois, o aplicador do Direito transportar-se, em espírito, ao momento e ao meio em que surgiu a lei, e aprender a relação entre as circunstâncias am bientes, entre outros fatos sociais e a norma; a localização desta na série dos fenôm enos sociológicos, todos em evolução constante154 (1). A fim de descobrir o alcance em inentem ente prático do texto, coloca-se o intérprete na posição do legislador: procura saber por que despontou a necessidade e qual foi prim itivam ente o objeto provável da regra, escrita ou consuetudinária; põe a m esm a em relação com todas as circunstâncias determ inantes do seu apare­ cim ento, as quais, por isso m esm o, fazem ressaltar as exigências m orais, políticas e sociais, econôm icas e até m esm o técnicas, a que os novos dispositivos deveriam satisfazer; estuda, em sum a, o am biente social e jurídico em que a lei surgiu; os m otivos da mesma, a sua razão de ser; as condições históricas apreciáveis como causa imediata da prom ulgação (2). Enquadram -se entre as últim as os preceden­ tes, em geral; as concepções reinantes, além de outras influências m enos diretas e não m enos eficazes, com o certos fatos ocorridos no estrangeiro e as legislações de povos cultos (3). D eve-se supor que os elaboradores do Direito novo conheciam o meio em que viviam , e o espírito da época, e se esm eraram em corresponder, por meio de providências concretizadas em textos, às necessidades e aspirações populares, próprias do m om ento, bem com o às circunstâncias jurídicas e sociais contem porâneas (4). O herm eneuta precisa conhecer e tom ar no devido apreço os costum es an­ tigos e em voga na ocasião em que se preparou o dispositivo, ou repositório de regras, agora sujeito a exam e; deve ainda fam iliarizar-se com o Direito Positivo em vigor naquela época (5). 159 - Nem todos os fatores da Occasio legis têm a m esm a im portância: por exem plo, as considerações de pessoas e o fato histórico, apontados com o devendo

154

158 - (1) Reuterskioeld, Prof. da Universidade Sueca de Upsala op. cit., p. 59. (2) Geny, vol. I, p. 288; Degni, op. cit., p. 245; Black, op cit., p. 286. (3) Geny, vol. I, p. 288. (4) W alter Jellinek, op. cit., p. 164; Bierling- Juristische Prinzipienlehre, 1911, vol IV, p. 275. (5) Trigo de Loureiro, vol. I, § 46; Enneccerus, vol. I, p. 115; Black, op. cit., p. ,’ H(. ,'H l; Sutherland, vol. II, § 471.

Occasio Legis

123

ter sido o m otivo passageiro que determ inou a prom ulgar a norm a, m erecem do herm eneuta apreço dim inuto, às vezes até nenhum

(1).

1 6 0 _ A própria Occasio legis, além de constituir um dos elem entos m ais fracos da H erm enêutica hodierna, antolha-se-nos m enos aplicavel a disposiçoes vetustas; seu valo,- decresce à m edula que o tem po Irauscorre após o su rg u da re2ra

e s c r it a o u c o n s u e t u d in á r ia 156 ( 1 ) .

’ Às vezes intervém causas diversas, ou o sentido planejado se dilata duiante a elaboração do texto, de sorte que, prom ulgado este, causa e conteúdo nao se conci­ liam de todo (2). Com o tem po aum enta o contraste. As circunstancias am bientes, os m otivos conhecidos, as relações várias que deram origem as disposiçoes novas apenas constituem o im pulso inicial; pela cooperação de outros fatores, talvez nao expressos a norm a adquire alcance m aior do que o pelos seus prolatores colimado. Progride sem se a l t e J o texto; adapta-se, pela exegese inteligente, às necessidades econôm icas e sociais da vida. Esta não para, c a jurisprudência deve ^ o m p a n h a ^ em virtude da sua m issão dc aplicar o Direito aos fa to s da atualidade Os fenomenos novos exigem novas providências. Eis porque não rece acatam ento quem se obstina em valorizar antiquadas m edidas e constra g os contem porâneos com as fórm ulas ressuscitadas do po do sepulcro ( ).

155 156

159 _ ( i) Savigny, vol. 1, p. 213; C oviello, vol. I, p. 70, n® IV. 160 - (1) Windscheld, vol I, p 8 4 , 5 . (3) De0rX ú rg 0 w | Pl , T « H ° ' ' «'•!

" I ' - 111 ■>’ l0 0 ' V cd c 0 d e se nvo lvim e n to da idéia acim a

exposta, c m os nos 162 !«.; Vander Eycken, op. cit., p, 107.

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Muxlinlll.ino

am pla, de m odo que abranja, não só o bem econôm ico e m aterializado, m as tam ­ bém outros valores, de ordem psíquica. Protege-se o patrim ônio físico e m oral, do indivíduo a princípio; da coletividade, acim a de tudo (3). Inspira-se a H erm enêutica em os m esm os princípios da ciência de que é au­ xiliar; atende, sobretudo, ao fim social, “elem ento especificam ente jurídico; subs­ tância, realidade do D ireito” ; grande fator, portanto; um dos m ais eficientes da exegese m oderna. O dogm a tradicional da vontade foi substituído pelo dogm a histórico-evolutivo do escopo, o arbítrio indom ável do indivíduo, pelo fim em i­ nentem ente hum ano do instituto (4). 163 - Deve o intérprete sentir com o o próprio autor do trabalho que estuda; im buir-se das ideias inspiradoras da obra concebida e realizada por outrem . Anatole France diz, no Jardim de Epicuro: “C om preender um a obra-prim a é, em suma, criá-la em si m esm o, de novo.” Este pensam ento é aplicável a qualquer produto do intelecto do hom em , isolado este, ou em coletividade; abrange a linguagem em geral; as expressões do Direito, em particular159 ( I ). Entretanto, o trabalho ficaria em m eio, se apenas se lim itassem a perquirir acerca do fator subjetivo, da intenção dos prolatores. O objetivo da norm a, positiva ou consuetudinária, é servir a vida, regular a vida; destina-se a lei a estabelecer a ordem jurídica, a segurança do Direito. Se novos interesses despontam e se enqua­ dram na letra expressa, cum pre adaptar o sentido do texto antigo ao fim atual (2). A pesquisa não fica adstrita ao objetivo primordial da regra obrigatória; des­ cobre tam bém o fundam ento hodierno da mesma. A ratio ju ris é um a força viva e móvel que anim a os dispositivos e os acom panha no seu desenvolvim ento. “E com o um a linfa que conserva sem pre verde a planta da lei e faz de ano em ano de­ sabrocharem novas flores e surgirem novos frutos.” Não só o sentido evolve, mas tam bém o alcance das expressões de Direito (3). 164 - A doutrina que adm ite o escopo alterável com o tem po, e se preocu­ pa, de preferência, com o objetivo atual das disposições, é hoje aceita por quase todas as correntes doutrinárias: satisfaz à velha escola histórica, e até ao ramo tradicionalista adiantado; bem com o à falange histórico-evolutiva, universalm ente vitoriosa; m erece tam bém os aplausos incondicionais dos dois grupos em que se bifurca a Livre-indagação científica'60 (1).

159

160

163 - (1) Vander Eycken, op. cit., p. 88. (2) Gmür, op. cit., p. 45-46. (3) Ferrara, vol. I, p. 215-216. 164 - (1) Rudolf Stam m ler - Theoríe der Rechtswissenschaft, 1911, p. 618-619; Rumpf, op. cit., p. 56; Jandoli, op. cit., p. 69. Vede n - 28-32; 69 e segs. (2) Hellwig - Lehrbuch des Deutschen Zivilprozessrechts, 1907, vol. I, p. 170.

I lemento leleológk o

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O Direito progride « in r ulteiiiieiu os textos; desenvolve-se por meio di interpretação, e do pieem liimeiilo du:. Iik iiiiíis autorizado pelo art. 3" da Introduçãi do Código Civil brasileiro, sem elhante ao 4" do C ódigo francês (2). Aceitam o mestres da I lerm enéuliea, inclusive os próprios tradicionalistas adiantados, liulo ( que é possível enctisur na letra do dispositivo, sob o fundam ento de que o legisla dor assim determ inaria se lhe ocorresse a hipótese hodierna, ou ele redigisse noi' mas no m om ento atual; fornecem espírito novo à lei velha; atribuem às expressõe antigas um sentido com patível com as ideias contem porâneas (3). 165 - Em todo caso, o herm eneuta usa, m as não abusa da sua liberdade ani|d de interpretar os textos; adapta os m esm os aos fin s não previstos outrora, poréil com patíveis com os term os das regras positivas; som ente quando dc outro modi age, quando se excede, incorre na censura de B acon - a de “torturar as leis a lim d causar torturas aos hom ens” - torquere leges ut homines torqueal"'' ( I ). O fim prim itivo e especial da norm a é condicionado pelo objetivo geral di Direito, m utável com a vida, que ele deve regular; m as em um e outro caso o en copo deve ser com patível com a letra das disposições; com pleta-sc o preceito |in meio da exegese inteligente; preenchem -se as lacunas, porém não contra legem 166 - Os que não adaptam o sentido do texto ao fim atual, além de alaslai eii o D ireito da sua m issão de am parar os interesses patrim oniais e o bem-eslai psl quico do indivíduo consociado, revertem ao quarto século antes de Crislo, qiiandi Teodósio II prom ulgou a sua célebre C onstituição. Prescreveu esta aos magisli.ij dos a observância exclusiva e textual dos escritos de Papiniano, Paulo, ( íaio, 11|] piano e M odestino; quando houvesse discordância entre os grandes jurisconsiilloi dever-se-ia optar pelo prim eiro. O Im perador Teodósio instituiu, dc fato, uma autoridade científica, em bora coletiva, “um tribunal de m ortos, sob a presidem i de Papiniano” 162 (1). N ão se contesta o valor atribuído à técnica tradicional, com base de exegesd é causa de estabilidade relativa; digna de uso; porém não se justifica o abuso. | apego ao passado, o form alism o silogístico (2). “O Direito não é uma eseolástie;|

(3) Biagio B ru g i-P refá cio do livro de Francesco Degni, cit., p. VI-VII; Ehrlich, apud "sur.ii| Prof. da Universidade de Bordéus - Les Tra n sfo rm a tion s G é n éra les du D roil P rivé, I •• I 7, 158; Pietro Cogliolo - S c r i t t i Varii d i D iritto P riv a to , 3a ed., vol. I, p. 14-15; Edmond Pii ard I D ro it P ur, 1910, p. 154-155; Sabino Jandoli —Sulla Teoria delia In terp reta zio n e d elle le i/g i elo progredir da sociedade (2). Em conseqüência de prevalecer o processo que tom a em apreço os dados m o­ rais, econôm icos e políticos (3), “o D ireito perdeu enfim o seu caráter de ciência verbal, para se to m ar o que ele é, e deve ser, um a ciência puram ente social, tirando os seus elem entos das leis da Sociologia dom inadas pela adaptação aos princípios de ju stiça” (4). 171 - As m udanças econôm icas e sociais constituem o fundo e a razão de ser de toda a evolução jurídica; e o D ireito é feito para traduzir em disposições po­ sitivas e im perativas toda a evolução social. Como, pois, recusar interpretá-lo no sentido das concepções sociais que tendem a generalizar-se e a impor-se? " N ã o q u e r e m o s o a rb ítrio d o ju iz . N ão o a d m itim o s p o r p re ç o n e n h u m . P re te n d e m o s , e n tre ta n to , q u a n d o a lei n ã o o r d e n e c o m u m a c e rte z a im p e ra tiv a , q u e o m a g istra d o p o ssa m a r c h a r c o m o s e u te m p o , p o ssa le v a r e m c o n ta o s c o s tu m e s e u so s q u e s e c ria m , id e ia s q u e e v o lv e m , n e c e s s id a d e s q u e r e c la m a m u m a s o lu ç ã o d e , ju s t iç a " 167 (1).

Do exposto já se depreende dever-se apelar para os fatores sociais com reserva e circunspeção, a fim de evitar o risco de fazer prevalecerem as tendências intelectu­ ais do ju iz sobre as decorrentes dos textos, e até m esm o sobre as dominantes no meio em que ele tem jurisdição, como sucedeu em França, com o magistrado Magnaud. Rejeita-se o sentido achado pelos processos tradicionais, quando o texto se preste a interpretação consentânea com a época, ou a exegese, correta à prim eira vista, conduza, praticam ente, quer a iniqüidade m anifesta, quer a um a conclusão incom patível com o sentir presum ível de um legislador ponderado e conseqüente M aior será, entretanto, a liberdade do herm eneuta, quando se tratar de um instituto novo, ou de problem a só agora exam inado nos pretórios, e não previsto diretam ente pelas disposições positivas que na aparência lhe são aplicáveis (2). MORAL

172 - A órbita do Direito e a da M oral são concêntricas; e o raio da últim a é o m ais longo: m uita coisa fulm inada pela ética é tolerada pelas leis168 (1); por outro

167

1 7 1 - (1) A lo c u ç ã o d e R. S a le ille s , in " L e s M é t h o d e s Ju r id iq u e s " , Leçon sfa ites au Collège Libre des Sciences Sociales en 1 9 1 0 , 1 9 1 1 , p. X X I-X X II. (2) A u b r y & R a u - C o u rs d e Droit Civil Français, 5^ e d ., v o l. I, p. 1 9 4 ; H e n ri C a p it a n t - / / it r o d u c tion ò l'Étude du Droit Civil, 3® e d ., p. 8 4 - 8 5 .

168

1 7 2 - (1)

Non omne, quod licet, honestum est: n e m t u d o o q u e a Digesto, liv. 5 0 , tít. 1 7 , fra g .

M o ra l to le r a o u s a n c io n a (P a u lo , no

pode,

e, s llll, o q u o s e

deve.

lei s e a b s té m d e p ro ib ir, a 1 1 4 ). N ã o s e faz o q u e s e

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Flermenêutlca e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

lado, tudo o que os textos exigem ou protegem está de acordo com o senso m oral m édio da coletividade. E m resum o: não pode haver D ireito contra a M oral, em bora nem todos os ditam es desta encontrem sanção nos códigos (2). Por isso, leis positi­ vas, usos, costum es e atos jurídicos interpretam -se de acordo com a ética; exegese contrária a esta jam ais prevalecerá. Cum pre dilatar ou restringir o sentido do texto, a fim de que este não contravenha os princípios da M oral (3). 173 - A respeito desta regra de H erm enêutica, de aplicação generalizada pelo universo, alguns esclarecim entos parecem oportunos. Se é certo que o Direito não im põe a M oral, não é m enos verdadeiro que se opõe ao imoral; não estabelece a virtude com o um preceito; porém reprime os atos contrários ao senso ético de um povo em determ inada época; fulm ina-os com a nulidade, inflige outras penas ainda mais severas. Por esse processo negativo, indireto, cim enta a solidariedade, prestigia os bons costum es e concorre para a extinção de hábitos reprováveis. C ondena a m á-fé, os expedientes cavilosos para iludir a lei, ou os hom ens169 (1). Entretanto não abroquela um a ideia superior, virtuosa, de m oralidade, e sim, o senso ético m édio do povo em geral, na época em que foi feito o ato ajuizado; com o bem observou Vadalá Papale, o D ireito corporifica e defende não a moral abstrata dos m oralistas, e, sim, a m oral da vida (2). 174 - Com essa orientação, não só regulariza a atividade hum ana do pre­ sente, com o tam bém auxilia o progresso e prepara o futuro. N a verdade, a ética exerce papel preponderante na evolução jurídica: por m eio da exegese, chega a alterar o sentido prim itivo dos textos de m odo que os deixe de acordo com as ideias m odernas de m oralidade e solidariedade hum ana. O direito de propriedade e a liberdade de contratar serviços, por exem plo, são condicionados pela neces­ sidade superior de fazer prevalecer o bem de todos sobre o do indivíduo, e o dos fracos perante os fortes. Incum be ao herm eneuta seguir o curso da consciência moral, que se modifica dia a dia, no seio de um m esm o povo170 (1).

(2) Karl Gareis - Rechtsenzyktopaedie und M ethodologie, 52 ed., 1920, p. 24-26. (3) H. Campbell Black - Handbook on the Construction and Interpretation o f the Laws, 2S ed., §48. 169

170

173 - (1) Já os antigos civilistas proclamavam que a lei nunca autoriza o dolo, nem permite a cavilação (Coelho da Rocha Direito Civil, vol. I, § 45, regra 1§; Trigo de Loureiro - Instituições de Direito Civil Brasileiro, 3a ed., vol. I, Introdução, § LVII, regra 22). (2) Degni - op. cit., n25138-139; Jandoli, op. cit., p. 74. 174 - (1) Emílio Caldara - Interpretazione delle Leggi, 1908, n9 147; Degni, op. cit., n® 140144; Jandoli, op. cit., p. 74. (2) Adelbert Düringer - Richter und Rechtsprechung, 1909, p. 25 26.

l-etores Sociais

I

Os hábitos e pendores m orais constituem um a fonte m utável, progressiva inesgotável, de boa doutrina jurídica; por isso, am param, ajudam , guiam o liei mu neuta. Fazem brotar da letra m orta ideias novas, adiantadas, dignas de aplieiiçtli entre um povo culto, cheio de bondade, previdente, patriota, hum anitário (2), 175 - Para os incom paráveis rom anos já constituía principal regra de inlei pretação a que se fundava no honesto e no útil. Referia-se o honesto ao DiieiK N atural; o útil, ao interesse geral da R epública e àquilo que trazia o soberano lieij para todos. Cícero elogiou o jurisconsulto Caio A quílio G alo porque “sempre m terpretava as leis de m odo que as m anobras repreensíveis e os vícios nunea a|>m veitavam aos seus autores” 171 (1). A inda hoje, quando a lei proíbe a prática de certos atos entendem se vedado tanto estes, com o outros diversos, porém conducentes ao m esm o lim. São anu láveis não só as convenções e outros atos jurídicos proibidos, mas tamliém o realizados com o intuito de fraudar a disposição im peditiva (2). “ A lei sempre si entenderá de m odo que o dolo fique repelido e não vitorioso” ( \ ) ÍN D O LE DO R EG IM E

176 - A H erm enêutica é ancila do Direito, servidora inteligente qm o n im | aform oseia, hum aniza, m elhora, sem lhe alterar a essência ia as Ut . devem *iJ concebidas e decretadas de acordo com as instituições vigentes, logo a cm ge>,( m ero auxiliar da aplicação das norm as escritas, nada procura, m m i mu líii >r desacordo com a índole do regime. Em bora diversos o fenôm eno jurídico e o político, jamais será possível m.| pará-los de todo, quer nas relações externas, quer nas internas: entre dois |iovo( e entre indivíduos de nacionalidade e residência diferentes; ou entre a lgie|n c J Estado, entre o G overno e o povo, e entre os vários poderes constitucionais1 th ! É até certo que a ciência m oderna se propõe a integrar os estudos jm ídicos | os políticos; por isso a H erm enêutica e a A plicação do D ireito precisam iiiqnn í1 qual a norm a que m elhor corresponde não só às exigências da justiça, como Iam

171

172

175 - (1) Paula Batista - Herm enêutica Jurídica, ed., § 18, nota 2. (2) Trigo de Loureiro, vol. I, Introdução, § LVII, regra 22, nota 11; Coelho da Rocha, vol. I, 'i 'Pj 10- alínea. (3) Borges Carneiro - Direito Civil, vol. 1, § 12, n9 20. 1 7 6 - (1 ) Giulio Battaglini, Prof. da Universidade de Bolonha -D iritto Penalc Tcoric (n-nciul 1937, n9 17; Degni, op. cit., p. 332-134. (2) Degni, op. cit., p. 333-334. (3) Jandoli, op. cit. p. 35-36; Degni, op. cit., p. 2. (4) J. G. Sulliei t.iml S/díi/les and Statutory Construction, 2- ed., 1904, vol. II, li 4H1, (5) Degni, op i II , 11 l. (6) Geny M rllio ilr i II , vol II, |> 11, 114 e 775.

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Hermenêutica e Apllcaçiío do Direito | Carlos Maximiliano

bém às da utilidade social; jam ais prescindem , portanto, do elem ento político, ín­ dice das novas necessidades, novas condições e novas relações (2). Inspiram -se na teoria das fontes jurídicas, atendem às atribuições e interdependência dos poderes constitucionais, às faculdades do m agistrado, aqui am plas, ali restritas, à distribui­ ção das com petências, ao modo de se m anifestar a norm a positiva, à natureza da m esm a, à índole sua e à de todo o sistem a em vigor (3). Exam ina-se um a lei em conjunção com outras e com referência às institui­ ções vigentes e à política geral do país (4); porque um dispositivo, expresso com as m esm as palavras, pode ser aplicado de m odo diverso em dois Estados sujeitos a regim es diferentes (5). Por isso, o herm eneuta, ao com pulsar os repositórios de D ireito estrangeiro, ou tentar um a exegese dificultosa, terá o cuidado de verificar se esta, ou aqueles, no caso em apreço, contrariam , ou não, o sistem a jurídico em vigor em nosso País. M erece preferência a ideia adotada pelas coletividades colo­ cadas no m esm o nível de civilização, em iguais condições de cultura, e cujas legis­ lações espelhem tendências análogas às que se verificam no Direito nacional (6).

177 - Prova da influência das instituições sobre a Herm enêutica ressalta d fato de ser m ais am pla a faculdade de interpretar quando o ju iz pode até exam inar a legalidade dos atos do Executivo e a constitucionalidade das resoluções das câm a­ ras, com o sucede no Brasil, Estados Unidos e R epública Argentina, do que nos lu­ gares onde im pera a onipotência parlam entar, e com ela o bill de indenidade, para sanar e revigorar os atos irregulares do C hefe de Estado, ou dos M inistros173 (1). N ão atente o herm eneuta apenas ao regim e jurídico geral, mas tam bém ao especial: a exegese de um preceito de Direito Civil fica subordinado ao sistem a adotado pelo C ódigo a respeito de cada instituto, com o seja o casam ento, a suces­ são. E, pois, com a m aior am plitude que a índole do regim e influi na interpretação do D ireito, com o um dos fatores sociais.

173

1 7 7 - (1 ) Degni, op. cit., p. 8. O poder do juiz, como intérprete e aplicador do Direito, é maior na Inglaterra, como fora o do pretor em Roma por ser nesses países menos acentuada a divisão dos p o d e ic. ( onslltiu ionais.

APRECIAÇÃO DO RESULTADO

178 - Preocupa-se a H erm enêutica, sobretudo depois que entraram em fun­ ção de exegese os dados da Sociologia, com o resultado provável de cada in­ terpretação. Tom a-o em alto apreço; orienta-se por ele; varia tendo-o em mira, quando o texto adm ite m ais de um m odo de o entender e aplicar. Q uanto possível, evita um a conseqüência incom patível com o bem geral; adapta o dispositivo às ideias vitoriosas entre o povo em cujo seio vigem as expressões de Direito sujeitas a exam e174 (1). Prefere-se o sentido conducente ao resultado mais razoável (2), que melhor corresponda às necessidades da prática (3), e seja mais humano, benigno, suave (4). E antes de crer que o legislador haja querido exprim ir o conseqüente e ade­ quado à espécie do que o evidentem ente injusto, descabido, inaplicável, sem efei­ to. Portanto, dentro da letra expressa, procure-se a interpretação que conduza a m elhor conseqüência para a coletividade (5).

174

1 / 8 - (1) B o zi, o p . c it. p. 2 3 2 ; A u b r y & R a u , v o l. I, p. 1 9 4 . (2)

In ambigua voce legis ea potíus accipienda est significai quoe vitio caret

- "n o c a s o d e

lin g u a g e m a m b íg u a d a le i, o p t e - s e p ela e x e g e s e d e c o n s e q ü ê n c ia p r á tic a , e x e q ü ív e l, a c o rd e c o m a r e a lid a d e e o D ire ito " ( Digesto , liv. 1®, tít. 12, 32 -

longa consuetudine,

De legibus, senatusque consultis et

frag . 19 , d e C e ls o ).

(3) Quotiens idem serm o duas sententias exprimi, ea potissim um excipiatur, quoe rei gerendae aptior est - " q u a n d o o m e s m o p r e c e it o e x p r im e d u a s p r o p o s iç õ e s , a c o lh a - s e , d e p r e f e ­ r ê n c ia , a q u e s e ja m a is a d e q u a d a p a ra r e g e r a m a t é r ia r e s p e c t iv a " (Digesto, liv. 5 0 , tít. 1 7 - De regulis ju ris antiqui, fra g . 6 7 , d e Ju lia n o ). (4) S a v ig n y - Traité de Droit Romain, t ra d . G u e n o u x , v o l. I, p. 2 2 1 . In re dubia benigniorem interpretationem sequi non minus Justius est quam, tutius-, "n o s c a s o s d u v id o s o s s e g u ir a in ­ t e r p r e t a ç ã o m a is b e n ig n a é n ã o s ó m a is ju s t o c o m o t a m b é m m a is s e g u ro " (Dig., liv. 5 0 , tít. 17, frag . 1 9 2 ).

-T ra ta d o de Derecho Civil Argentino, Parte General, 1 9 1 7 , Lehrbuch des Pandektenrechts, 8 S e d ., v o l. I, p. 8 4 (d á , e m n o ta , 6 , o s

(5) R a y m o n d S a lv a t

n^ 1 0 7 ; W in d s-

chend -

f r a g m e n t o s 19

e 6 7 , já t r a n s c r it o s ) ; S u t h e r la n d , v o l. II, § § 4 8 7 - 4 9 0 . B o zi (o p . c it., p. 2 9 3 ) v is lu m b r a n o fr a g m e n t o 6 7 , r e p r o d u z id o a c im a , e e m o u t r o s d o D ig e sto e d o C ó d ig o d e J u s t in ia n o , a p r e o c u p a ç ã o c o m a s c o n s e q ü ê n c ia s p o s s ív e is d e c a d a e x e g e s e o r ie n t a n d o o in t é r p r e t e e m R o m a ; e a c h a q u e h o je s e a t e n d e m u ito m a is a o

resultado

vel d e u m m o d o d e e n t e n d e r u m le x t o d o q u e s e a d m it ia n o t e m p o d e Sa v ig n y.

p ro vá­

1 3 6

Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

179 - D eve o Direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou im possíveis. Também se prefere a exegese de que resulte eficien­ te a providência legal ou válido o ato, à que tom e aquela sem efeito, inócua, ou este, juridicam ente nu lo 175 (1). R eleva acrescentar o seguinte: “É tão defectivo o sentido que deixa ficar sem efeito (a lei), com o o que não faz produzir efeito senão em hipóteses tão gratuitas que o legislador evidentem ente não teria feito um a lei para preveni-las” (2). Por­ tanto a exegese há de ser de tal modo conduzida que explique o texto com o não contendo superfluidades, e não resulte um sentido contraditório com o fim colim ado ou o caráter do autor, nem conducente a conclusão Física ou moralmente im possível (3). D esde que a interpretação pelos processos tradicionais conduz a injustiça fla­ grante, incoerências do legislador, contradição consigo m esm o, im possibilidades ou absurdos, deve-se presum ir que foram usadas expressões im próprias, inadequa­ das, e buscar um sentido equitativo, lógico e acorde com o sentir geral e o bem presente e futuro da com unidade (4). O intérprete não traduz em clara linguagem só o que o autor disse explícita e conscientem ente; esforça-se por entender m ais e m elhor do que aquilo que se acha expresso, o que o autor inconscientem ente estabeleceu, ou é de presum ir ter querido instituir ou regular, e não haver feito nos devidos term os, por inadvertência, lapso, excessivo am or à concisão, im propriedade de vocábulos, conhecim ento im perfeito de um instituto recente, ou por outro m otivo sem elhante (5).

175

179 - (1) Berriat Saint-Prix - M anuel de Logique Juridique, 2s ed., nm73-74; Fabreguettes, op. cit., p. 386; Caldara, op. cit., n® 184; Black, op. cit., p. 118-134. (2) Paula Batista, op. cit., § 12. Interpretatio illa sum enda quoe absurdum evitetur (Jason: "adote-se aquela interpretação que evite o absurdo". O que se diz da lei em geral, também se aplica aos costumes, usos e atos jurídicos. (3) Bernardino Carneiro - Primeiras Linhas de Hermenêutica Jurídica e Diplomática, 24§ ed., § 31. (4) Max Rümelin, apud Gmelin - Quousque?, p. 19-20; Pasquale Fliore - Delle Disposizioni Generali sulla Publicazione, Applicazione ed Interpretazione delle Leggi, 1890, vol. II, p. 528. Quotiens in actionibus, aut exceptionibus, ambíigua oratio est: commodissimum est, e o accipi, quo res, de qua agitur, m agis valeat quam, ph ereat: "quer nas ações, quer nas exceções, em sendo ambígua a frase, é muito aconselhável preferir o sentido de que resulte válido, eficiente o objeto de que se trata, em vez do que o anule, inutilize, faça-o perecer" (Dig., liv. 34, tít. 5, frag. 12, de Juliano). (5) E. R. Bierling-Ju ristíc h e Prinzipienlehre, 1911, vol. IV, p. 200. Vede n° 32.

FIAT JUSTITIA, PEREAT MUNDUS

180 - O D ireito suscita de m odo indireto e diretam ente ampara a atividade produtiva, tutela a vida, facilita e assegura o progresso; não embaraça o csíoiçi honesto, o labor benéfico, a evolução geral. N asce n a sociedade e para a soeieda de; não pode deixar de ser um fator do desenvolvim ento da mesma. Para ele nái é indiferente a ruína ou a prosperidade, a saúde ou a m oléstia, o bem-estar ou i desgraça. Para isso, até m esm o no cam po do Direito Privado, encontra hoje dillei acolhida, tolerada apenas em sentido restrito, nos casos excepcionais de dispo sições claríssim as, a antiga parêm ia, varrida há m uito do Direito Público e lillit prim ogênita da exegese tradicional, rígida, geom étrica, silogística l 'ial jusliliti pereat mundus: “Faça-se justiça, ainda que o m undo pereça.” A interpretação sociológica atende cada vez m ais às conseqüências provávei de um m odo de entender e aplicar determ inado texto; quanto possível liusea nm conclusão benéfica e com patível com o bem geral e as ideias modernas tle pude ção aos fracos, de solidariedade hum ana. Faça-se justiça, porém de tal sorle que < mundo prossiga a rum o dos seus altos destinos. A frase vetusta e terrível passou a ser olhada com antipatia por muitos, eonj desconfiança, pelo m aior núm ero; alguns a repetem com ironia, outros em lon patético; raros a invocam ainda com o um m otivo de decisão, e nem com o eseu:.; m erece apreço; decididam ente perdeu a antiga popularidade176 ( I ). 181 - Os m estres contem porâneos, de m aior prestígio nos auditórios e nas cátedras da Europa nos últim os vinte anos, introduzem “com binações de maneirnij de encarar os assuntos e um a com o derrocada, inversão ou substituição de valores que levam a m odificar a inclinação geral, em favor de um Direito, ignahnenid seguro, porém m enos abstrato e m ais verdadeiram ente hum ano” . Entre os lineoi característicos da corrente que vai predom inando, ressaltam “ a restrição das disj cussões de palavras ou dos argum entos lógicos em proveito das considerai, t.OI, Ruin|>l - Gesetz und Richter, 1906, p. 12; Carl Schmitl o e.eij

und Urlril, P >I ' | ■ 11., M il* i i i i i i I i I lie Anwcndung des Rechts nach Art. I des S c I i w c I / p i n h, dn i lid e m P iililii .1 Im perativas ou P io lliltlv .i'.

177

tucíonais, as adm inistrativas, as penais, as processuais, as de policia e segurança c as de organização judiciária (2). N ão parece ocioso especificar que tam bém pertencem à classe referida as L i­ de im postos (3); as que regulam o serviço, a polícia e a segurança das estradas dn ferro (4); atribuem com petência aos tribunais ou estabelecem as diversas ordens ) organizam a proteção aos incapazes (7); ou cercam de garantias o trabalho con providências sobre horários, higiene, acidentes, pensões obrigatórias, cte. (X) 253 - R ecrudesce a dificuldade na fixação das espécies quando se Iniln d< disposições de ordem pública incluídas nos dom ínios do Direito Privado: aquela) em que visivelm ente predom ina o objetivo de tutelar o interesse geral, e sulioidi. nado a ele se deixa o do indivíduo249 (1). Tais são as norm as que têm poi olijeli fixar o estado das pessoas, a capacidade ou incapacidade, os direitos e deveres qmj do m esm o procedem ; regular os bens na sua divisão e qualidade, ou a forma e i validade dos atos, e salvaguardar o interesse de terceiros (2). C onsideram -se de ordem pública as disposições sobre a organização dn Inmi lia: por exem plo, as que dizem respeito ao exercício do pátrio poder, aos ducilo e deveres dos cônjuges, assim com o as que proíbem a poligam ia, ou o oij ganizarem e funcionarem sociedades, civis ou com erciais ( I), as que icstiuigi m faculdade de instituir herdeiros ou deixar legados (5); bem com o e n i.is pn m í'ii,oi i relativas à organização da propriedade, determ inadoras dos dueilo'. iear. min. > coisas e do m odo de adquiri-las (6). 254 - Legis virtus hoec est: imperare, vetare, permillcrc, piinne " e lu iu , i< da lei: ordenar, proibir, perm itir,punir. D esta frase de M odestino ' " ( I ) abi olhou i

(6) Fiore, vol. II, n® 1.000. (7) Fabreguettes, op. cit., p. 282. (8) Fabreguettes, op. cit., p. 280, nota 1, e p. 282. 249

250

253 - (1) Beudant, vol. I, n9 120. (2) Francesco de Filip p is- Corso Completo di Diritto Civile Italiano Comparato, vol. I, P10H, p 1h I Fiore, vol. II, n9 1.000; Huc, vol. I, ne 186; Beudant, vol. I, ns 120; Alves Moreira, vol I, p I.I., (3) Alves Moreira, vol. I, p. 65; Fiore, vol. II, n9 1.000; de Filippis, vol. I, p. 90. (4) Fabreguettes, op. cit., p. 283. (5) Fabreguettes, op. cit., p. 282. (6) Alves Moreira, vol. I, p. 65; Beudant, vol. I, n9 120. 254 —(1) I ) I k«". I 509 513; Sutherland, vol. II, § 539. (.’ ) Ill.it Is u|i t ii , |i '.1 3 , V e d e " ' .1 111111111

/ e h 11\< ais, n u> 4 0 2 4 0 3 .

1 9 0

Hermenêutica eA p licaçíio d o Direito | Carlos Maximiliano

282 - O poder de tributar é soberano, em bora seja o respectivo exercício con­ dicionado pela Constituição. As delegações ou transferências desse direito, feitas pela União aos Estados e por estes a M unicípios, quer em caráter perm anente, quer envoltas em leis ordinárias, concessões e convênios, interpretam -se estritam ente. O m esm o se entenderá a respeito do poder de taxar outorgado a particulares, em ­ bora m ediante contrato276 (1). 283 - Enumeração. Q uando se depara um a enum eração de hipóteses, cum pre distinguir: se os m otivos e os fins do dispositivo se restringem aos casos expressos, ou se o próprio texto deixa perceber claram ente que a linguagem é taxativa, dá-se exegese estrita; o contrário se pratica em verificando fortes presunções de ser a es­ pecificação feita com o intuito de esclarecer, isto é, exemplificativa apenas277 ( 1). O próprio contexto auxilia o intérprete; indica se o intuito é especificar, ou explicar, com pletar o ensinam ento com o auxílio de exemplos. Não se presum e o caráter excepcional de um a regra; por isto os term os da m esm a indicam precisa­ m ente se a enum eração de casos é taxativa. Q uando a linguagem deixa m argem a dúvidas, orienta-se o herm eneuta pelos m otivos e os fins do preceito; se ainda assim a incerteza persiste, conclui pela regra geral, prefere considerar m eros exemplos as hipóteses figuradas no dispositivo. Esm era-se quase sem pre o legislador em tornar evidente o propósito de res­ tringir o alcance da norma; até usa, não raro, das palavras só, apenas, unicamente e outras de significado sem elhante, ou do vocábulo seguinte, precedendo a enum e­ ração de casos (2). 284 - Prescrição. Subm etem -se a exegese estrita as norm as que introduzem casos especiais de prescrição, porque esta limita o gozo de direitos278 ( I); rigor igual se exige para as disposições que declaram certos bens im prescritíveis, por im portar isto em privilégio (2). 285 - D ispensa. Q uando um ato dispensa de praticar o estabelecido em lei, reg u lam en to, ou ordem geral, assum e o caráter de exceção, interpreta-se

276

277

278

282 - (1) C. Maximiliano - Com entários à Constituição Brasileira, 391 ed., n® 167 e segs.; Kimbal - The National Governm ent o f the United States, 1920, p. 39 e 357; Black - Handbook o f American Constitutional Law, 32 ed., p. 452-453, e On Interpretation, cit., p. 501-502; Judson, op. cit., §§ 5-6. 283 - (1) Chironi & Abello - Trattato di Diritto Civile Italiano, vol. 1,1904, p. 66-67; Gianturco, vol. I, p. 123, nota 2; Laurent, vol. I, ne 277. (2) Alves Moreira, vol. I, p. 49-50. 284 - (1) Coelho da Rocha - Instituições de Direito Civil Português, 4 a ed., vol. I, § 45, nota à regra 12. (2) Degni, op. cit., p. 38, n® 20. Diga-se o mesmo sobre a Decadência.

Brocardos e Outr.is Henias do I tormcnêuttca e Aplli ação do Direito

2 0 7

povos latinos, o Tratado de Pothier (3), o qual serviu de fonte do livro do Código Civil francês referente às O brigações. Infelizm ente o C ódigo Civil português (an­ tigo) ainda consolidou o preceito rígido, nos seguintes term os: “Art. 2.512. O de­ poim ento de um a única testem unha, destituído de qualquer outra prova, não fará fé em juízo, exceto nos casos em que a lei expressam ente ordenar o contrário” (3a). Tam bém em França a jurisprudência palm ilhou outrora a trilha esconsa (4). 311 - B em -distanciadas desse critério estreito, tendente a agrilhoar a inteli­ gência e a consciência do m agistrado, a m oderna doutrina e a prática judiciária dos países cultos orientam -se em sentido diam etralm ente oposto ao brocardo oriundo do B aixo Im pério Romano. “Facilitar a prova, na mais larga m edida possível, é um dos pontos m ais im ­ portantes que, na form ação dos direitos, merece fixar a atenção do legislador e atrair os olhares da ciência”307 ( 1).

307

3 1 1 - (1) R. V o n lh e rin g -

L'Esprit du Droit Romain,

t ra d . M e u le n a e r e , 3 S e d ., v o l. IV, p. 2 0 0 .

(2 ) N e v e s e C a s t r o , o p . c it., p. 3 0 8 ; G a r s o n n e t , v o l. III, p. 7 6 , § 8 5 5 ; A c c a r ia s , v o l. II, n® 7 7 6 , n 2

Processo Civil, v o l. II, 1 9 0 0 , § 1 6 8 , n o ta 4 . Prinzipienlehre, 1 9 1 1 , v o l. IV, p. 1 0 1 ; L o d o v ic o M o r t a r a - M a nuale delia Procedura Civile, 6 § e d ., v o l. I, n 2 4 1 9 , p. 3 9 7 ; Luigi M a t t ir o lo - Trattato di Diritto Giudiziario Civile Italiano, 5§ e d ., v o l. II, n 2 7 0 2 ; C e s a r e B a ld i - Le Prove Civili, 2? e d ., 1 9 1 5 , p. 7 5 2 ; J o ã o M o n t e iro -

(3) E r n s t R. B i e r l i n g - J w / s t ó c h e

6 1 9 , § 2 1 , n 2 2. " P o r t a n t o o n ú m e r o n a d a t e m q u e v e r n e s t e p o n to d a a p r e c ia ç ã o ló g ica . O e s s e n c ia l é s e r a t e s t e m u n h a a d o r n a d a d a q u e la s q u a lid a d e s o u d o t e s m o r a is , in te le c t u a is e fís ic o s e x ig id o s p a ra o c a s o , e d e p o r c o m u m a n a t u r a lid a d e tal q u e a c o n v ic ç ã o s u r ja ; é p r e c is o q u e h a ja p o ­ d id o e q u e r id o o b s e r v a r d ilig e n t e m e n t e e m a n ife s t e d e m o d o v e r a z t u d o q u a n t o o b s e r v o u . D e s d e o m o m e n t o e m q u e s e a p r e s e n t e o u s e c o n sig a u m a t e s t e m u n h a d e s t a c la s s e e c o m e s t a s c o n d iç õ e s , q u e r h a ja u m a , q u e r s u r ja m a t é m il, n ã o s e t e m p o r is s o u m a p ro v a m a io r, n e m m e n o r : t e m - s e a p ro v a . C o m e fe ito , a s m il n ã o fa z e m m a is d o q u e r e p e t ir o q u e u m a s ó p o d e d e p o r, e , s e e s t a é fid e d ig n a , v a le t a n t o c o m o a s m il" (E lle r o , o p . e e d . c it., p. 1 9 4 ). (4) M a r io P a g a n o -

Teoria delle Prove, c a p . 8. La Prova p er Testimoni nei Processi Penali,

(5) E u g ê n io P in c h e r li (6 )

Digesto,

1 8 9 5 , p. 19.

liv. 2 2 , tít. 5 , fra g . 1 3 .

System der Rechts und W irtschafisphilosophie, 1 9 0 6 , v o l. III, p. 9 3 Trattato, delia Prova p er Testimoni, 2§ e d ., n 2 3 4 2 , p. 5 8 3 ; M o r t a r a , A u b r y & R a u - Cours de Droit Civil Français, 52 e d ., v o l. XII, 1 9 2 2 , § 7 6 1 ,

(7 ) Dr. F ritz B e r o l z h e i m e r e 2 5 1 ; C e s á r io C o n s o lo vo l. I, n 2 4 1 9 , p. 3 9 7 ;

p. 3 0 2 ; B o n n ie r, v o l. I, n - 1 3 1 e 2 9 2 . (8) M a ttiro lo , v o l. II, § 7 0 0 e n o ta 3 d a p. 6 1 0 ; M o r t a r a , C o n s o lo e A u b r y (9) F r a n c e s c o R ic c i -

Delle Prove,

s o n n e t , v o l. III, § 8 5 5 , p. 7 6 -7 7 e n o t a s 5 e 6 ; J o ã o M o n t e ir o

Civil,

&

R a u , lo c. c it.,

retro.

1 8 9 1 , n 2 1 5 6 , p. 2 5 8 ; C o n s o lo , o p . c it., n 2 3 4 3 , p. 5 8 4 ; G a r ­

-P ro g ra m a do Curso de Processo

v o l. II, § 1 6 8 e n o ta 4; M o r t a r a , v o l. I, n 2 4 1 9 , p. 3 9 7 ; A c c a r ia s , v o l. II, p. 7 5 2 , n 2 7 7 6 ;

B o n n ie r, v o l. I, p. 1 4 5 - 1 4 9 , n 2 1 3 1 , e p. 3 7 0 - 3 7 2 , n 2 2 9 2 ; M a ttiro lo , v o l. II, n25 7 0 0 - 7 0 2 , A u b r y

&

R a u , v o l. X II, p. 3 0 2 , § 7 6 1 e n o ta 8 ; P e r r e a u , Prof. d a F a c u ld a d e d e D ire ito d e T o lo s a -

chnique de Ia Jurisprudence en Droit Privé, ju r is p r u d ê n c iíi c o p io s a .

Te-

v o l. I, p. 1 5 5 - 1 5 6 . O s a u t o r e s c ita d o s in v o c a m

r IJlrolto I xi e|x lnh.il

191

em tom lim ilnlivo, ap lica-se ás pessoas e aos casos e tem pos expressos, exeln s iv a m e n k r1"' ( I ). 286 - Parece oportuna a generalização da regra exposta acerca de determinadas espécies de preceitos, esclarecer como se entende e aplica um a norma excepcional. E de Direito estrito; reduz-se à hipótese expressa: na dúvida, segue-se a regra geral Eis porque se diz que a exceção confirma a regra nos casos não excetuados ’K" ( I ) 287 - O processo de exegese das leis de tal natureza é sintetizado na paièima célebre, que seria im prudência elim inar sem m aior exam e - interpretam-se restri tamente as disposições derrogatórias do D ireito comum. N ão há efeito sem causa: a predileção tradicional pelos brocardos provém da m anifesta utilidade dos mes. mos. C onstituem sínteses esclarecedoras, adm iráveis súm ulas de doutrinas r o n s o . lidadas. Os m ales que lhes atribuem são os de todas as regras concisas: decorrem não do uso, e sim do abuso dos dizeres lacônicos. O exagero encontra se antes ii.i deficiência de cultura ou no tem peram ento do aplicador do quo no âm ago do apoj tegm a. B em -com preendido este, conciliados os seus term os e a evolução do I >i reito, a letra antiga e as ideias m odernas, ressaltará ainda a vantagem alua! d e s s e com prim idos de ideias jurídicas, auxiliares da m em ória, am paros do licimencuLt fanais do julgador vacilante em um labirinto de regras positivas Q uanta dúvida resolve, num relâm pago, aquela síntese expressiva mleipnl tam -se restritivamente as disposições derrogatórias do I >ireito conuun ' i I i1

279 280 281

285 - (1) Coelho da Rocha, vol. I, § 45, nota à regra 12. 2 8 6 - (1 ) Laurent, vol. I, n9 277. 287 - (1) Vede o capítulo - Brocardos, n - 292-295. (2) Chironi, vol. I, p. 31; Gianturco, vol. I, p. 123. Vede o capítulo - Analogia, n25 245-247. (3) Reuterskioeld, op. cit., p. 87; Pacifici-Mazzoni, vol. I, n9 21; Alves Moreira, vol I, |i 4| Brütt, op. cit., p. 183-184. (4) Virgílio Sá Pereira - Dous Brocardos, separata da Revista Geral de Direito, I eiev,ile< ei .i i oisa de que se trata, em vez de resultar a sua invalidade",

300

3 0 4 — (1 ) S lllh e i l.ind, v o l II, 'i 4'IK ; lll.ick, o p cit., p. 4 5 0 .

204

Hermenêutica e Apllcaçiio do Direito | Carlos Maximiliano

305 - Quem suporta ônus, deve gozar as vantagens respectivas - “pertence o côm odo a quem sofre o i n c ô m o d o O adágio conclui - et contra'. “E inversam en­ te” , isto é os que têm direito ao cômodo, devem sofrer os incômodos que lhe estão anexos, ou do m esm o decorrem 301 (1). 306 - Acessorium sequitur principale: O texto referente ao principal, rege tam bém o acessório, O acessório acom panha o principal302 (1). 307 - Verba cum effectu, sunt accipienda: “Não se presumem, na lei, palavras inú­ teis.” Literalmente: “Devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia.” A s expressões do Direito interpretam -se de m odo que não resultem frases sem significação real, vocábulos supérfluos, ociosos, inúteis303 (1 ). Pode um a palavra ter m ais de um sentido e ser apurado o adaptável à espécie, por m eio do exam e do contexto ou por outro processo; porém a verdade é que sem pre se deve atribuir a cada um a a sua razão de ser, o seu papel, o seu significa­ do, a sua contribuição para precisar o alcance da regra positiva (2). Este conceito tanto se aplica ao Direito escrito, com o aos atos jurídicos em geral, sobretudo aos contratos, que são leis entre as partes. D á-se valor a todos os vocábulos e, principalm ente, a todas as frases, para achar o verdadeiro sentido de um texto (3); porque este deve ser entendido de m odo que tenham efeito todas as suas provisões, nenhum a parte resulte inoperativa ou supérflua, nula ou sem significação algum a (4). 308 - Entretanto o preceito não é absoluto, Se de um trecho se não colige sentido apreciável para o caso, ou transparece a evidência de que as palavras fo­ ram insertas por inadvertência ou engano, não se apega o julgador à letra morta, inclina-se para o que decorre do em prego de outros recursos aptos a dar o verda­ deiro alcance da norm a304 (1 ). Bem -avisados, os norte-am ericanos form ulam a regra de H erm enêutica nes­ tes term os: “Deve-se atribuir, quando fo r possível, algum efeito a toda palavra, cláusula, ou sentença” (2). Não se presum e a existência de expressões supérfluas;

301 302 303

304

305 - (1) Paula Batista, op. cit., § 40. 306 - (1) Paula Batista, op. cit., § 40. 307 - (1) Assentos 282, de 20 de março de 1770, e 305, de 22 de outubro de 1778; Carlos de Carvalho -D ireito Civil Brasileiro Recopilado, 1899, art. 62, § l 8; Paula Batista, op. cit., § 12, nota 4; Ribas, vol. I, p. 296; Borges Carneiro, vol. I, § 12, n® 15; Coelho da Rocha, vol. I, § 45, regra 6a. (2) Max Salomon - Dos Problem der Rechtsbegriffe, 1907, p. 49. (3) Trigo de Loureiro, vol. I, Introd., § LVI, regra 18§. (4) Sutherland, vol. II, § 380. 308 - (1) Black, op. cit., p. 165-166. (2) Sutherland, vol. II, § 380; Black, op.cit., p.165. (3) Black, op. cit., p. 167.

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em regra, supõe se c|iie leis e contratos foram redigidos com atenção e esmero; de sorte que traduzam o objetivo dos seus autores. Todavia é possível, c não muito raro, suceder o contrário; e na dúvida entre a letra e o espírito, prevalece o último. Quando, porém , o texto é preciso, claro o sentido e o inverso se não deduz, indiseu tivelm ente, de outros elem entos de H erm enêutica, seria um erro postergar expres­ sões, anular palavras ou frases, a fim de tom ar um dispositivo aplicável a delermi nada espécie jurídica (3): interpretado in quacumque dispositione ne sic Jcicicnda, ut verba non sint supérflua, et sine virtute operandi: “Interpretem -se as disposições de m odo que não pareça haver palavras supérfluas e sem força operativa.” Testis unus, testis nullus: “U m a testem unha não faz prova. Testem unha única, testem unha nenhum a.” 309 - Pertence o brocardo à A plicação do Direito, exclusivam ente. Parec entretanto, oportuno realizar aqui o estudo e a refutação daquela parêm ia célebre, não só pela im portância que isso teria para a prática judiciária, com o tam bém pela sua afinidade de origem com a H erm enêutica tradicional. Laboram em erro os que atribuem a U lpiano, ou a contem porâneo seu, a exigência de duas testem unhas para constituir prova plena. O que dos dizei es da quele jurisconsulto, apreciados em conjunto, se deduz é que nos casos cm que n lei impõe a audiência de testemunhas (no plural), duas são suficientes"1, 11 ) I >c fato, no Digesto se nos depara a lição de A rcádio, no sentido de merecei t icdilo a afirmativa de um a só testem unha proba e digna de apreço e consideiaçao ( ' i < • brocardo - Testis unus, testis nullus - “ um a testem unha não faz prova" doi m u de um a Constituição do Im perador Constantino, data da época do Maixo Impei io Rom ano, e não do período áureo das letras jurídicas do Lácio (3).

305

309 - (1) Accarias - Précis de Droit Romain, 4^ ed., vol. II, ne 776, p. 752, nota 4; I doii.nd B o n n ie r- Traité Théorique et Pratique des Preuves en Droit Civil et en Droit Criminei, 4'1 ed , vol. I, p. 369, n9 292. (2) Si vero est his quidam (eorum ) aiiud dixerint, iicet im parí numero, credendum esl; mm enim ad muititudinem respici oportet sed ad sinceram testim oniorum fidem , et tesiiinoiiui qu ibu spotiu s iux veritatis adsistit (Arcadius, apud Digesto, liv. 22, tít. 5 - D e testibus, liar.. I , § 3e) - "se em verdade, sobre o assunto em debate, algumas (delas) algo disserem, ( iim pie dar crédito, ainda que deponham em núm ero singular porquanto não convém consideun ii multiplicidade, porém a f é sincera dos depoim entos, bem como os testemunhos em que pie cipuamente está presente a luz da verdade". "Não se deve ter em vista a multidão, porém a fidelidade sincera dos testemunhos" mm enim ad m uttitudinem respici oportet, sea ad sinceram , testim oniorum fidem . (3) Código, de Justiniano, liv. 4, tít. 20, frag. 9, § 12; Neves e Castro - Teoria das Provir.. IHJit), p. 306, ns 272; Accarias, vol. II, 762, nota 4; Bonnier, vol. I, p. 369, n® 292. (4) Bonnier, vol. I, p. 370, n® 292. (5) E. Garsonnet - Traité théorique e t pratique de procédure, 2a ed., vol. III, HV>, nnl.i , Bonniei, vol, I, p. 372, ne 292. (ii) I o y s e l hwlitutes Coutumières, liv. V, tít. V - Des Preuves, § 10.

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

Prestigiaram -no o D ireito C anônico (4) e o M uçulm ano (5). N asceu da parêm ia rom ana a de Loysel, fam iliar aos juristas italianos: Voix d ’un voix de nun (6).

310 - C oadunar-se-ia o brocardo com as ideias da época em que se porfiav em enfeixar toda a doutrina jurídica em preceitos rígidos de um a precisão m atem á­ tica e aplicabilidade m ecânica; a H erm enêutica e a Prova deixavam a m enor m ar­ gem possível ao coeficiente pessoal, exercitavam -se m ediante processos geom étri­ cos, silogísticos, sem elastério nenhum . O ju iz não decidia pela sua convicção; não se lhe reservava a possibilidade de form ar opinião pelo conjunto do processo; tudo era preestabelecido. A sentença basear-se-ia no alegado e provado; e assim seria considerado o que obedecesse a requisitos m inuciosos e fatais306 (1 ). Já foi apreciada oportunam ente a inanidade desse sistem a pretensioso, no tocante à Interpretação (2). Não menos ilusória é a sua base, relativam ente à evi­ dência legal. O bediente ao critério vetusto, a dogm ática estabelecia, a princípio: “ Um a tes­ tem unha não faz prova - testis unus, testis nullus; duas constituem prova plena.” C om preendeu depois o exagero da recusa do depoim ento singular, e em endou des­ te m odo a regra: “U m a testem unha faz meia prova; duas constituem prova integral, decisiva.” R equintou em precisão m atem ática; pretendeu reduzir a algarism os o que é, por sua própria natureza, contingente, com plexo, dependente do critério, integridade e com petência técnica do aplicador do Direito. Em Portugal e no Brasil prevaleceu aquele conceito, inserto nas O rdenações do Reino, livro I II, título 52, e acolhido em obra que se tornou clássica entre os

306

310 - (1) "Realmente, a exigência de contar as testemunhas de modo que mil possam fazer crer aquilo que uma só não pode, implica uma estimação demasiado material da certeza, além de ser esse critério uma sobrevivência ou vestígio daquele preconceito dos antigos doutores, em virtude do qual somavam metades, quartos ou oitavos de prova, e recordar também o costum e germânico acerca dos conjurados, costume que exigia um número deter­ minado deles, para provar a inocência" (Ellero - De Ia Certitumbre en los Juicios Criminales, trad. espanhola de Adolfo Posada, 3§ ed., 1913, p. 194, correspondente à p. 187 do original italiano, publicado sob o título de Crítica Criminal. (2) Vede o capítulo - Processo Lógico, n9 126. (3) Pothier - Tratado das Obrigações Pessoais e Recíprocas, trad. e adições de Correia Teles, vol. II, n9 779. João Monteiro, catedrático da Faculdade de Direito de São Paulo -P ro ce sso CivH, vol. II, § 172, nota 2, p. 294, externa este conceito: "uma só testemunha faz meia prova." Em nota o, exara a corrigenda seguinte: "Isto foi escrito em 1883. Hoje não diríamos assim, mas que, dadas as outras circunstâncias da causa, esta única testem unha faria prova bastante." (3a) O novo Código Civil Português, de 1966, não mantém a regra do art. 2.512 do antigo. O art. 396 estabelece: "A força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livre­ mente pelo tribunal." (4) Bonnier, vol. I, n9 292, p. 371.

Rim .irdif. i' Outras Ri'«ras dc1 HeimonêutU n c Aplli aç,"lo do Direito

2 0 7

povos latinos, o Tniluilo Jc 1’othier (3), o qual serviu de fonte do livro do C ódigo C ivil francês referente às Obrigações. Infelizm ente o C ódigo C ivil português (an­ tigo) ainda consolidou o preceito rígido, nos seguintes term os: “Art. 2.512. O de­ poim ento de um a única testem unha, destituído de qualquer outra prova, não fará fé em juízo, exceto nos casos em que a lei expressam ente ordenar o contrário” (3 a). Também em F rança a jurisprudência palm ilhou outrora a trilha esconsa (4). 311 - B em -distanciadas desse critério estreito, tendente a agrilhoar a inteli­ gência e a consciência do m agistrado, a m oderna doutrina e a prática judiciária dos países cultos orientam -se em sentido diam etralm ente oposto ao brocardo oriundo do Baixo Im pério Rom ano. “Facilitar a prova, na m ais larga m edida possível, é um dos pontos m ais im­ portantes que, na form ação dos direitos, m erece fixar a atenção do legislador e atrair os olhares da ciência”307 (1).

307

3 1 1 - (1) R. V o n lh e r in g -

L'Esprit du Droit Romain,

t r a d . M e u le n a e r e , 3 § e d ., v o l. IV, p. 2 0 0 .

(2 ) N e v e s e C a s t r o , o p . c it., p. 3 0 8 ; G a r s o n n e t , v o l. III, p. 7 6 , § 8 5 5 ; A c c a r ia s , v o l. II, n 9 7 7 6 , n 9

Processo Civil, v o l. II, 1 9 0 0 , § 1 6 8 , n o ta 4. Prinzipienlehre, 1 9 1 1 , v o l. IV, p. 1 0 1 ; L o d o v ic o M o r t a r a - Manuale delia Procedura Civile, 6 a e d ., vo l. I, n 9 4 1 9 , p. 3 9 7 ; Luigi M a t t ir o lo - Trattato di Diritto Giudiziario Civile Italiano, 5 9 e d ., v o l. II, n 9 7 0 2 ; C e s a r e B a ld i - Le Prove Civili, 2 a e d ., 1 9 1 5 , p. 7 5 2 ; J o ã o M o n t e ir o -

(3 ) E r n s t R. B ie r lin g -Ju ristisch e

6 1 9 , § 2 1 , n 9 2. " P o r t a n t o o n ú m e r o n a d a t e m q u e v e r n e s t e p o n to da a p r e c ia ç ã o ló g ica . O e s s e n c ia l é s e r a t e s t e m u n h a a d o r n a d a d a q u e la s q u a lid a d e s o u d o t e s m o r a is , in te le c t u a is e fís ic o s e x ig id o s p a ra o c a s o , e d e p o r c o m u m a n a t u r a lid a d e ta l q u e a c o n v ic ç ã o s u r ja ; é p r e c is o q u e h a ja p o ­ d id o e q u e r id o o b s e r v a r d ilig e n t e m e n t e e m a n if e s t e d e m o d o v e r a z t u d o q u a n t o o b s e r v o u . D e s d e o m o m e n t o e m q u e s e a p r e s e n t e o u s e c o n sig a u m a t e s t e m u n h a d e s t a c la s s e e c o m e s t a s c o n d iç õ e s , q u e r h a ja u m a , q u e r s u r ja m a té m il, n ã o s e t e m p o r is s o u m a p ro v a m aio r, n e m m e n o r : t e m - s e a p ro v a . C o m e fe ito , a s m il n ã o fa z e m m a is d o q u e r e p e t ir o q u e u m a s ó p o d e d e p o r, e, s e e s t a é fid e d ig n a , v a le t a n t o c o m o a s m il" (E lle r o , o p . e e d . c it., p. 1 9 4 ). (4) M a r io P a g a n o -

Teoria delle Prove, c a p . 8 . La Prova per Testimoni nei Processi Penali,

(5) E u g ê n io P in c h e r li (6)

Digesto,

1 8 9 5 , p. 1 9 .

liv. 2 2 , tít. 5, frag . 13 .

(7) Dr. F ritz B e r o l z h e i m e r - System

der Rechts und W irtschafisphilosophie, 1 9 0 6 , v o l. III, p. 9 3 Trattato, delia Prova p e r Testimoni, 2§ e d ., n 9 3 4 2 , p. 5 8 3 ; M o r t a r a , A u b r y & R au - Cours de Droit Civil Français, 5 a e d ., v o l. X II, 1 9 2 2 , § 7 6 1 ,

e 2 5 1 ; C e s á r io C o n s o lo v o l. I, n 9 4 1 9 , p. 3 9 7 ;

p. 3 0 2 ; B o n n ie r, v o l. I, n251 3 1 e 2 9 2 . (8) M a ttiro lo , v o l. II, § 7 0 0 e n o ta 3 da p. 6 1 0 ; M o r t a r a , C o n s o lo e A u b r y & R a u , lo c. c it., (9) F r a n c e s c o R icci -

Delle Prove,

s o n n e t , v o l. III, § 8 5 5 , p. 7 6 - 7 7 e n o t a s 5 e 6; J o ã o M o n t e iro

Civil,

retro.

1 8 9 1 , n 9 1 5 6 , p. 2 5 8 ; C o n s o lo , o p . c it., n 9 3 4 3 , p. 5 8 4 ; G a r ­

-P ro g ra m a do Curso de Processo

v o l. II, § 1 6 8 e n o ta 4 ; M o r t a r a , v o l. I, n 9 4 1 9 , p. 3 9 7 ; A c c a r ia s , v o l. II, p. 7 5 2 , n 9 7 7 6 ;

B o n n ie r, v o l. I, p. 1 4 5 - 1 4 9 , n 9 1 3 1 , e p. 3 7 0 - 3 7 2 , n 9 2 9 2 ; M a ttiro lo , v o l. II, n “ 7 0 0 - 7 0 2 , A u b r y

&

R a u , v o l. XII, p. 3 0 2 , § 7 6 1 e n o ta 8; P e r r e a u , Prof. d a F a c u ld a d e d e D ire ito d e T o lo sa -

chnique de Ia Jurisprudcnce en Droit Privé, ju r is p r u d ê n c ia c o p lo s a .

Te­

v o l. I, p. 1 5 5 - 1 5 6 . O s a u t o r e s c it a d o s in v o c a m

208

I ler menôutit a e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

( )s ju izes pesam os depoim entos; não os contam (2). A credibilidade de um a prova testem unhai não depende do núm ero dos que são cham ados a esclarecer a liistiça; avalia-se pelos seguintes elem entos: verossim ilhança dos dizeres; probida­ de científica do depoente; seu conhecido amor, ou desamor, à verdade; latitude e segurança de conhecim ento, que m anifesta; razões de convicção que declara e se lhe devem perguntar; confiança que inspira, pelo seu passado, pela sua profissão e pelo grau de cultura do seu espírito (3). Mário Pagano, aliás favorável à observância do brocardo no juízo criminal, pondera que do confronto entre dizer ressalta a verdade: “esta é corno a luz, que brota e ciulila quando dois corpos se chocam e se percutem reciprocamente. A confrontação e a pedra de loque da verdade” (4). Objeta Eugênio Pincherli que a verdadeira razão iliis ei m s judiciários não está em ouvir um a testemunha; devemos antes buscá-la “na eslieiliva da mente humana que não pôde, ou não quis perserutar no ânimo daquela testemunha, nem medir pelas qualidades pessoais da mesma a fé que mereciam as '.uns palavras: que não pôde, ou não quis realizar com justo critério aquele trabalho su111d. cm 11roí ilo (|iie Mário Pagano declarou ser a pedra de toque da verdade (j)ietra di /•.//. /ei >ii63; Giorgio Giorgi - Teoria delle Obbligazioni, 7a ed., vol. II, ns 40. 111 1P) (1) Trigo de Loureiro, vol. I, § LIV, regra 12; Carlos de Carvalho, op. cit., art. 63; Ribas, vol. I, 297; Borges Carneiro, vol. I, § 12, ns 24. (?) W alter Jellinek - Gesetz, Gesetzesanwendung undZweckmaessigkeitserwagung, 1913, p. 171. (3) Domat, trad. Correia Teles, in Código Filipino, vol. III, p. 436, XVIII. (4) Carlos de ( arvalho, op. cit., art. 62, § 2°. ('») Siitherlmid, vol II, >i 40r>,

Ilrocardos e Outras Regras de Hermenêutica e Aplicação do Direito

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do preceito vetusto procura elem entos para dem onstrar a razão de ser do mais m oderno (2). “Q uando as leis novas se reportam às antigas, ou as antigas às novas, inter­ pretam -se umas pelas outras, segundo a sua intenção com um , naquela parte que as derradeiras não têm ab-rogado” (3); atingem todas o m esm o objetivo: as recentes não conferem m ais regalias, vantagens, direitos do que as norm as a que explicita­ m ente se referem (4), salvo disposição iniludível em contrário. Q uando um a regra positiva, ou sim ples frase, alude a outra, de m odo espe­ cífico; as duas proposições, referentes e referidas, devem ter o m esm o efeito. Se a referência se lim ita a um a parte de outro dispositivo, só essa parte se interpreta com o a que a ela se reporta (5). Proposições incidentes ou enunciativas valem menos que as principais. 3 2 0 - Em um texto há uma parte culm inante, decisiva, e outras m eram ente ex­ plicativas ou expositivas; a prim eira tem m aior valor, prepondera sobre as demais: a ela se presta m aior atenção, particular acatam ento. “As proposições enunciativas ou incidentes da lei, e as suas razões de decidir, não têm a m esm a força que as suas decisões”318 (1). Entretanto, um as e outras m utuam ente se auxiliam na exegese: as proposições principais entendem -se conform e as explicações ou restrições que as incidentes lhes trazem (2). Quando duas disposições dim anam de um princípio com um , interpretam-se no m esm o sentido. As conseqüências explicitam ente previstas servem para m elhor entender os antecedentes, a regra geral, o princípio enunciado, de que derivam (3). N a verdade, a proposição principal vale mais do que as incidentes, que lhe ficam subordinadas; na dúvida, é ela que prevalece, a regra geral; nunca a restrição. Será, todavia, de bom aviso procurar sem pre conciliá-las e com binar todas, de modo que, ao invés de um a se sobrepor a outras, reciprocam ente se com pletem (4). 3 2 1 - 0 P oder Executivo não tem com petência p a ra interpretar, p o r meio de aviso ou regulamento, disposições de lei cuja execução esteja exclusivamente a cargo do P oder Judiciáriow (1).

318

3 2 0 - (1) Assento 237, de 14 dejunho de 1740; Carlos de Carvalho, op. cit., art. 62, § 72; Ribas, vol. I, p. 297; Borges Carneiro, vol. I, § 12, ne 25. (2) Bernardino Carneiro, op. cit., § 38. (3) Charles Brocher - Étude sur les Príncipes Généraux de L'lnterprétatíon des Lois, 1870, p. 93-94.

319

(4) Bernardino Carneiro, op. cit., § 39. Outros brocardos ainda valiosos para a Hermenêutica e a Aplicação do Direito foram lembra­ dos e comentados, especial ou incidentemente, em várias seções desta obra; por isso, dos mesmos se não faz menção neste capítulo. 321 - (1) Carlos M axim iliano - Com entários à Constituição Brasileira, 5^ ed., n2 359; A. J. Ribas - Curso de Direito Civil Brasileiro, 1880, vol. I, p. 289; Lei n9 23, de 30 de outubro de 1891, art. 99, § 29. Vede o capítulo - Interpretação Aiim nlii a.

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Herm enêutica e AplicaçSo do Direito | Carlos Maximiliano

322 - A uniform e interpretação legislativa de um a norm a constitui objeto de particular acatam ento por parte do aplicador do Direito. N ão há propriam ente jurisprudência parlam entar; m as os precedentes m an­ tidos inalterados pelo C ongresso podem ser invocados com o contribuição para a H erm enêutica320 (1 ). Se durante lapso apreciável de tem po o parlam ento m ostrou entender do m es­ mo m odo um texto, ordinário ou básico, essa exegese uniform e e relativam ente diuturna m erece o respeito dos outros poderes constitucionais. Milita, a favor da m esm a, forte presunção de certeza; logo não a devem postergar senão depois de m aduro exam e e em face de argum entos sólidos em contrário. O apoio das C âm a­ ras constitui ju sto m otivo de acatam ento a determ inada interpretação (2). C O M P E T Ê N C IA

323 - C om petência não se presum e; entretanto, um a vez assegurada, entendese conferida com a am plitude necessária para o exercício do poder ou desem penho da função a que se refere a lei321 (1). D esde que se outorgou a um tribunal certa com petência, não se supõe revoga­ da por haver sido investido outro juízo de atribuições sem elhantes (2). Procure-se conciliar os dois dispositivos; visto se dever atender tam bém à circunstância de se presum irem exclusivas as funções conferidas, a um a autoridade, se o legislador não prescreveu, a respeito, evidentem ente o contrário: a divisão dos poderes é a regra; a sua confusão, fato excepcional (3). Q uando a norm a atribui com petência excepcional ou especialíssim a, interpreta-se estritam ente; opta-se, na dúvida, pela com petência ordinária (4). Titulo, epígrafe. Preâmbulo, ementa. 324 - Os títulos, as epígrafes e as rubricas da lei em conjunto, ou de capítulo ou parágrafo, não fazem parte, propriam ente, da nom ia escrita, não foram discu­ tidos nem votados, não contêm um a regra explícita. Entretanto, foram presentes aos legisladores e aceitos com o acessórios da lei, destinados a indicar a ordem e a correlação entre as suas partes.

320 321

322 - (1) Sutherland, vol. II, § 476. (2) Vede n25 99 e 204. 323 - (1) Fabreguettes, op. cit., p. 384. (2) Black, op. cit., p. 138; Sutherland, vol. II, § 569. (3) Sutherland, vol. II, § 568; Caldara, op. cit., n9 205. (4) Caldara, op. cit., n° 205; Fabreguettes, op. cit., p. 384. N.io se confunda excepcional com especial. Vede n9 274 e o capítulo - Leis Penais, n9 389.

Brocardos e Outras Regras de Herm enêutica e Aplicação do Direito

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Deve-se presum ir ser a epígrafe oportuna, expressiva, regular; na falta de argum ento sólido em contrário, adm ite-se que apenas com preende o objeto exato da norm a, e, portanto, serve para deduzir o sentido e o alcance desta. Entretanto, a lei não se equipara a um m anual teórico; a disposição das suas m atérias não é feita com o rigor escolar. M uitas vezes o título figurou no Projeto e é m antido apesar de haver o C ongresso dilatado, ou restringido os term os das dis­ posições prim itivas; daí resulta a necessidade de atribuir ao texto um alcance m ais am plo, ou m ais estreito, do que a epígrafe parece indicar322 (1). Pelas razões expostas, o título ajuda a deduzir os motivos e o objeto da norma; presta, em alguns casos, relevante serviço à exegese; auxilia m uito a m em ória, é fácil de reter, e por ele se chega à lem brança das regras a que se refere; porém oferece um critério inseguro; o argum ento a rubrica é de ordem subsidiária; vale m enos do que os outros elem entos de H erm enêutica, os quais se aplicam direta­ m ente ao texto em sua íntegra (2). 325 - O preâmbulo dá ideia do “estado de coisas que se resolveu mudar, dos males destinados a serem rem ediados, das vantagens am paradas ou prom ovidas pela lei nova, ou das dúvidas referentes a dispositivos anteriorm ente em vigor e rem ovidas pelo texto recente”323 ( I ). Põe em evidência as causas da iniciativa parlamentar e o fim da norma; por isso, conquanto não seja parte integrante desta, merece apreço como elemento de exegese. Quase sempre traduz o motivo, a orientação, o objetivo da lei, em termos concisos, mas explícitos. Todavia não restringe nem am plia o sentido decorrente das próprias regras positivas; por isso o seu valor, embora m aior do que o dos simples títulos ou ru­ bricas, é inferior ao dos processos aplicados diretamente às disposições escritas (2). Influi, para a interpretação e aplicabilidade, o lugar em que um trecho está colocado. 326 - Q ualquer um poderia ser condenado à forca, desde que o julgassem por um trecho isolado de discurso, ou escrito, da sua autoria: vetusto e certo é este

322

323

324 - (1) Brocher, op. cit., p. 67-71; Fabreguettes, op. cit. p. 391-392; Caldara, op. cit., n9 138; Black, op. cit., p. 244-252; Sutherland, vol. II, § § 399-340; Barriat Saint-Prix, op. cit., n® 78-79; Paula Batista, op. cit., § 33. Distanciaram-se da verdade os dois mestres que se colocaram em extremos opostos: Metlln negava qualquer valor às epígrafes relativamente à interpretação; Cujácio chamava-lhes i Ia ves legum "chaves das leis" (Caldara, op. cit., n9 138; Berriat Saint-Prix, op cit., n9 80). (2) Paula Batista, Berriat Saint-Prix, Fabreguettes, Brocher, Sutherland, Black e Caldara, loc. ( II 3 2 5 - (1 ) Black, op. cit., p. 253. "A em enta da lei facilita a sua inteligência" (Assento 282 de 29 de março de 1770; Carlos de Carvalho, op. cit., art. 62). (2) C. Maximiliano, op. i II,, 1" ed., n® 90; Sutherland, vol. II, 341-342; Black, op. cit,, p, ?'i 1 258; Caldara, op. cit , n« 1 1/

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

conceito, O valor de cada regra, ou frase, varia conform e o lugar em que se acha, “U m a lei deve aplicar-se à ordem de coisas para a qual foi estabelecida. Os objetos que são de ordem diversa, não podem ser decididos pelas m esm as leis”324 (1). D enom ina-se argum ento pro subjecta matéria o que se deduz do lugar em que se acha um texto. Tem vários pontos de contato com o argumento a rubrica (2). “ M uitas disposições, observa Dupin, se as generalizassem , conduziriam ao erro os que se deixassem surpreender, visto deverem ser restringidas à rubrica sob a qual estão colocadas; legis mens, et verba a d titulum sub quo sita sunt, accommodanda, et pro subjecta m atéria vel am plianda vel restringenda” (3) —“o sentido e as pala­ vras da lei devem afeiçoar-se ao título sob o qual se acham colocados; am pliem -se ou restrinjam -se conform e o assunto a que estão Subordinados” . 327 - É com um no foro tom arem expressões genéricas, escritas com um obje­ tivo, e adaptá-las a outro, violentam ente, apesar de haver, no m esm o livro ou repo­ sitório de normas, preceito especial para a hipótese vertente325 ( 1). “ Em regra, é pre­ ciso em cada gênero de negócios consultar as leis que lhe são próprias” (2). Deve-se buscar em capítulo especial sobre um assunto a doutrina relativa a este (3). Cai em erro quem se serve, para resolver um caso jurídico, ou docum entar um parecer, de disposições relativas a objeto diferente e fim distinto. A isto se denom i­ na, em França, usar d ’arguments de raccroc, “argum entos de bam búrrio” (4). “Não se aplica um a proposição alhures verdadeira a uma decisão que lhe é estranha” (5). Indague-se bem se se trata de um caso geral ou de especial, de regra ou da exceção; e, assim esclarecido, procure-se, no lugar próprio, o dispositivo logicam ente indicado. “A necessidade e evidência deste postulado são intuitivas.” Todo objeto particular ou especial de um a regra apresenta aspectos próprios carac­ terísticos; do que resulta ordenar aquela em um sentido ao invés de outro. Refere-

324

325

326 - (1) Livro Prelim inar do Projeto de Código Civil francês, tít. 5, art. 4 9; Caldara, op. cit., ne 175; Saredo, op. cit., n9 14, art. IV. Vede n9 141, o. (2) Fabreguettes, op. cit., p. 384; Berriat Saint-Prix, op. cit., ns 81. (3) Paula Pessoa - Código Criminal do Im pério do Brasil, 2^ed., comentário ao art. 29. 327 - (1) "M uitas disposições há que, generalizadas,induziriam a erro osincautos, e devem ser restringidas à matéria própria do título (ou capítulo) de que foram extraídas" - M ulta generaliter accepta incautos fa lleren t et restringi debent ad argumentum tituli unde desum pta sunt. "Os títulos e as divisões das leis são como que bandeiras, que indicam a que corpo cada um pertence" (Conselheiro Paula Pessoa, op. cit., comentário ao art. 22). (2) Paula Batista, op. cit., § 21. (3) Giovanni Lomonaco - Instituzioni di Diritto Civile, 2? ed., vol. IV, p. 330; Código Civil do Chile, art. 22, alínea (transcrito em o n9 44-A). (4) Berriat Saint-Prix, op. cit., n9 149 e nota 2. (5) Berriat Saint-Prix, op. cit., n9 143. (6) Caldara, op. cit., n® 175.

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dos e Outras Regras de Hermenôutlca e ApllcaçSo do Direito

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se, pois, a relação determ inada; é provável que o m esm o preceito se não adapte a outras relações, de ordem diferente. Pode até encontrar-se, para a hipótese particu­ lar, disposição especial, clara, iniludível; porém noutro lugar (6). 328 - Cum pre verificar se se trata de um princípio am plo ou preceito ex­ cepcional; do gênero ou da espécie; de um ou de outro ram o do Direito; pois, conform e a hipótese, varia a norm a, e a m aneira de interpretar326 ( 1). Entre duas disposições à prim eira vista aplicáveis ao caso em apreço, prefere-se a que mais direta e especificam ente se refere ao assunto de que se trata: illud potissim um habetur quod a d speciem directum est. “ Prefira-se aquilo que concerne diretam ente à espécie em apreço” (2). N em m esm o quando se aplica um texto por sem elhança, extensão, analogia, ou se recorre aos princípios gerais de Direito, é lícito deixar de atender à natureza das coisas, aos elem entos objetivos, a todos os fatores que determ inam a espécie jurídica à qual pertence um caso concreto (3). 329 - Tom ada a interpretação sob o aspecto form al ou técnico-sistem ático, deve-se ter em vista, acim a de tudo, o lugar em que um dispositivo se encontra327 (1). Especialm ente das relações com os parágrafos vizinhos, o instituto a que per­ tence e o conjunto da legislação se deduzem conclusões de alcance prático, ele­ m entos para fixar as raias de dom ínio da regra positiva (2). Até m esm o em se aplicando o processo sistem ático de exegese, deve-se ter o cuidado de confrontar e procurar conciliar disposições que se refiram ao mesmo assunto ou à m atéria semelhante, em bora insertas em leis diversas (3). O que caracteriza o verdadeiro jurisconsulto, é exatam ente a segurança com que descobre a norm a apropriada para cada hipótese rara, enquanto os indoutos aplicam a regra geral a sim ples exceções, ou fazem pior: generalizam preceitos destinados só a estas, forçam analogias, transplantam disposições para terreno que as repele, enquadram os casos de certa categoria em artigos de lei feitos para rela­ ções dessem elhantes na essência.

326 328 - (1) Max Gmür - Die Anwendung des Rechts

nach Art. I des Schweizeríschen Ziviigesetz-

buches, 1908, p. 52; Caldara, op. cit., n2 230. (2) Papiniano, apud Digesto, liv. 50, tít. 17, frag. 80; Black, op. cit., p. 328; Brocher, op. cit., p. 91-92. (3) J. X. Carvalho de Mendonça - Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. 1,1910, ne 148; Alves Moreira - Instituições do Direito Civil Português, vol. 1, 1907, p. 47; Enneccerus, vol. I, p. 115. 327 329 - (1) Gmür, op. cit., p. 52; Caldara, op. cit., n8 220. (2) Gmür, op. cit., p. 52. (3) Courtenay llbert - The M tt luinh •• nf Law M aking, 1914, p. 120, n° 2.

2 2 0

Herm enêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

DISPOSIÇÕES T R A N S IT Ó R IA S

330 - As D isposições Transitórias, com servirem - para regular a passagem das relações jurídicas pendentes, do dom ínio de um a lei para o de outra, quase sem pre indicam direta ou indiretam ente m otivos e escopo da norm a prom ulgada por últim o328 (1 ). As vezes até, na vigência das novas regras positivas surgem de m odo im previsto, no texto, circunstâncias e fatos que as D isposições Transitórias resolveriam , e é força recorrer a elas, com o elem ento subsidiário (2). P ode e Deve. 331 - Propende o Direito m oderno para atender m ais ao conjunto do que às m inúcias, interpretar as norm as com com plexo ao invés de as exam inar isoladas, preferir o sistem a à particularidade. Se isto se diz da regra escrita em relação ao todo, por m ais forte razão se repetirá acerca da palavra em relação à regra. Aterse aos vocábulos é processo casuístico, retrógrado. Por isso m esm o se não opõe, sem m aior exam e, po de a deve, não po d e a não deve (soll e muss, kann nicht e d a rf nicht, dos alem ães; may e shall, dos ingleses e norte-am ericanos)329 ( 1). 332 - Em geral o vocábulo pode (may, de anglo-am ericanos; s o ll koenne, dos teutos) dá ideia de ser o preceito em que se encontra, m eram ente, perm issivo, ou diretório, com o se diz nos Estados U nidos; e deve {shall, must, de anglo-saxônios; muss, diirfe, de alem ães) indica um a regra im perativa330 (1 ). Entretanto, estas palavras, sobretudo as prim eiras, nem sem pre se entendem na acepção ordinária. Se, ao invés do processo filológico de exegese, alguém re­

328

330 - (1) Caldara, op. cit., ns 137. (2) Exemplo: De três em três anos se elegia, em cada Estado, um senador, que term inaria o mandato daí a nove. Quando, por motivo ocasional, havia duas vagas, cqmo saber qual o que term inaria o tempo do antecessor e qual o que exerceria um mandato, completou? - Resolvia-se o caso pelo art. l e § § 52 a 7 9 das Disposições Transitórias da Constituição de 1891; não havia outro meio.

329 331 - (1) Carl Crome - System des Deutschen Bürgerlichen Rechts, vol. 1,1900, p. 99. 330 332 - (1) Ludwig Enneccerus-Leh rb u ch des Bügerlichen Rechts, 15a ed., 1921, vol. I, p. 113, § 51 (a obra toda é de Enneccerus, Kipp e Wolff; mas o vol. I é feito por Enneccerus); Black, op. cit., p. 129-130. (2) Crome, vol. I, p. 69, notas 8 e 9; Enneccerus, vol. I, § 51, notas 1 e 2; Black, op. cit., p. 529-532; Sutherland, vol. II, § 840; Bouvier-Law Dictionary, 8a ed., 1914, verbo "M ay"; James Ballentine - A Law Dictionary, 1916, verbo "May". (3) Sutherland, vol. II, § 640; Black, op. cit., p. 528-532; Bouvier, loc. cit.; Ballentine, op. cit., verbo "M ay"; C. Maximiliano - Com entários à Constituição, 5 a ed., n2 133. "É lícito interpretar como um dever imposto a determinada autoridade pública o p o der à mesma conferido: m ay = shall (em português: pode = deve, é obrigado)" llbert - The M echanics o f Law M akinq, 1914, p. 121, n5 9).

Brocardos e Outr.i\ Ragi.is de Hermenêutica e Aplicação do Direito

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corre ao sistem ático e ao teleológico, atinge, - às vezes, resultado diferente: desa­ parece a antinom ia verbal, p o d e assum e as proporções e o efeito de deve (2). Assim acontece quando um dispositivo, em bora redigido de m odo que traduz na aparên­ cia, o intuito de p erm itir, autorizar, possibilitar, envolve a defesa contra m ales irreparáveis, a prevenção relativa a violações de direitos adquiridos, ou a outorga de atribuições im portantes para proteger o interesse público ou franquia individu­ al (3). Pouco im porta que a com petência ou autoridade seja conferida, direta, ou indiretam ente; em form a positiva, ou negativa: o efeito é o m esm o (4); os valores jurídico-sociais conduzem a fazer o po d er redundar em dever, sem em bargo do elem ento gram atical em contrário (5). Um chefe de escola filosófica do Direito, grande professor de Goettingen, ge­ neraliza a regra: para ele o intuito perm issivo se não presum e; em geral, quaisquer que sejam as palavras da lei, sem pre se deve preferir entendê-la com o imperativa. Eis o ensinam ento textual de Rodolfo von Jhering: "A forma im perativa, isto é, a forma prática imediata de uma proibição ou de uma ordem, é a forma regular sob a qual o Direito aparece nas leis. Pouco importa, aliás, que a expressão seja imperativa ou não; o caráter imperativo jaz na coisa, na ideia Na boca do legislador, é tem o sentido de deve se r (por exemplo, a ação é prescrita em dois anos, significa: deve ser prescrita). A forma do Direito em que a expressão e a ideia correspondem em toda a linha, é historicamente a primeira, e quando a comparo à que lhe sucede, eu a denomino forma inferior" (6).

333 - Em regra, pa ra a autoridade, que tem a prerrogativa de ajuizar, por alvedrio próprio, da oportunidade e dos m eios apropriados para exercer as suas atribuições, o p oder se resolve em dever. Generaliza-se a acepção perem ptória, n a esfera do D ireito Público: onde a linguagem da C onstituição outorga poder, este é com preendido com o dever; não se interpreta a lei suprem a com o descendo a fixar preceitos não necessários, re­ gular m atérias não essenciais, form ular norm as que se observariam à vontade. Presum em -se imperativas, ou perem ptórias, as suas disposições; e só cm casos de evidência plena, quando do sentido lógico, da exegese am pla não resulte dúvida sobre serem perm issivas ou diretorias, será lícito entendê-las neste c a rá te r" 1 ( I ). Há, pois, exceções, com o o da Constituição de 1891, art. 3o, com binado com o 34, § 13; porém só prevalecem quando, não só a letra, mas tam bém o espirito,

(4) Epitácio Pessoa - M ensagem Presidencial, de 1920, trecho relativo .i lnteiveiit,aii I • d rial no Estado da Bahia; C. Maximiliano -C om entários, ne 131; Constituição de IH41, m i', i." r / § § i s , 8 2 ,1 1 ,1 3 e 30. (5) Enneccerus, vol. I, § 51, notas 1 e 2; Crome, vol. I, p. 99, notas 8 e 9; Sutlieilrtiid, vol II, h M tl (6) R. Von Jhering - L'Esprit du Droit Romain, trad. M eulenaere, ed., vol III, |i '•(), »i -If. 331

3 3 3 - (1 ) Black, op. cit., p 11 1H, Sutherland, vol. II, § 640.

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Hermenêutica e AplicaçSo do Direito | Carlos Maximiliano

concordantes o elem ento filológico e o sistem ático, levem a concluir por sim ples autorização, possibilidade, com petência facultativa. 334 - O bserva-se, às vezes, o inverso, principalm ente nos dom ínios do D i­ reito Privado: a linguagem é imperativa, porém do exam e do contexto resulta um a norma facultativa ou perm issiva; deve resolve em pode. Das sim ples palavras não se deduz a força obrigatória absoluta, a pena im plícita de nulidade para a inobser­ vância da regra332 ( 1). Também se autoriza em term os que envolvem proibição (2). A R G U M E N T O DE A U T O R ID A D E

335 - Sem pre se usou nas lides judiciárias, com excessiva frequência, bom ­ bardear o adversário com as letras de arestos e nom es de autores, com o se foram argumentos333 ( 1). O Direito é ciência de raciocínio; curvando-nos ante a razão, não perante o prestígio profissional de quem quer que seja. O dever do jurisconsulto é subm eter a exam e os conceitos de qualquer autoridade, tanto a dos grandes nom es que ilus­ tram a ciência, com o a das altas corporações judiciárias. Estas e aqueles m udam frequentem ente de parecer, e alguns têm a nobre coragem de o confessar; logo seria insânia acom panhá-los sem inquirir dos fundam entos dos seus assertos, com o se eles foram infalíveis (2). Nullius addictus ju ra re in verba m agistri: “N inguém está obrigado a ju rar nas palavras de m estre algum .” 336 - O argum ento ab auctoritate gozou até de prestígio oficial; no caso de contraste de opiniões, era de rigor; outrora, a preferência, não pelos fundam entos lógicos, e, sim, pelos autores. Justiniano explicitam ente ordenara que seguissem Papiniano, Ulpiano e Pau­ lo, desprezassem M arciano, e acim a de todos colocassem o prim eiro, optassem pelo seu parecer propter honorem splendidissim i Papinianis “em virtude da con­ sideração devida ao brilhantíssim o Papiniano”334 ( 1). A lista exarada na constitui­

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3 3 4 - (1) M artinho G a rc e z - Nulidades dos A tos Jurídicos, 2a ed., vol. I, n“ 83-97; Aubry & Rau - Cours de Droit Civil Français, 5 a ed., vol. I, § 37. Vede n“ 256-265. (2) Enneccerus, vol. I, § 51, notas 1 e 2; Sutherland, vol. II, § 640; Bouvier, op. cit., verbo "Shall". 335 - (1) Cogliolo - Filosofia del Diritto Privato, 1888, p. 133; Fabreguettes, op. cit., p. 386. (2) Laurent, vol. I, ns 280. Aristóteles assim justificava o proceder em desacordo com o seu grande mestre: Am icus Plato, se d magis amica veritas: "Platão é meu amigo; porém maior amiga minha é a verdade." 336 - (1) Código Justinianeu, liv. I, tít. 17, frag. 1, § 62. (2) Cogliolo - S c ritti Varii, vol. I, P- 16-17. (3) Fulgosio verberava o fanatismo pelos postglosadores, nestes term os: "assim como os an­ tigos adoravam ídolos em vez dos deuses, assim também os advogados adoram glosadores

Un» ,ndos e Outras Regia1, de I lerm enêutica e Aplicação do Direito

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ção de Teodósio II era maior, com preendia tam bém M odestino e Gaio; mas asse­ gurava a preem inência a Papiniano (2). N a Idade M édia aureolaram de prestígio avassalador os glosadores (3); o m aior de todos foi A cursio (1182-1260), o ídolo dos jurisconsultos, autor da Gran­ de Glosa, observada com o se fora um código. Bartolo destronou-o em o século im ediato, e foi a figura central entre os juristas de m ais de duzentos anos, que pre­ feriam o Direito rom ano às Glosas dos doutores. Até hoje, em cada país, prevalece, num ou noutro ramo do Direito, um a auto­ ridade sem par. N a Alem anha foram os favoritos Windscheid, para o Direito Civil, e Staubs para o Comercial (4); substituíram-nos Planck e Endemann. Predominaram, na Suíça, Windscheid e Jaegers (5); em França, A ubry & Rau, para o Civil; Garsonnet, em Processo; LyonCaen & Renault, em Direito Comercial (6); no Brasil-Império Teixeira de Freitas foi o prim us inter pares; na R epública prevaleceram Rui Barbosa, no Direito Constitucional; Clóvis Beviláqua, no Civil, e J. X. Carvalho de Mendon­ ça, no Comercial, em bora nenhum dos três haja desfrutado predomínio igual ao de Teixeira de Freitas, entre nós; W indscheid, entre os povos de raça germânica, e Papi­ niano, em Roma (7). Em todo o caso os seus pareceres foram ouvidos com particular acatamento; inclinaram-se perante eles, de preferência, os juizes e os estudiosos. 337 - V ários sentim entos levam o m agistrado a apoiar-se no argum ento de autoridade: o m edo de errar se acaso se fia em suas próprias luzes; o receio de constituir opinião isolada; a aversão às novidades, com um nos velhos e nos que publicaram o seu m odo de pensar; o desejo de obter assentim ento de outros, vitó­ rias, aplausos335 ( 1). Da parte dos advogados aquele processo é aproveitado com o objetivo de especular com o instinto de im itação, a preguiça intelectual, a tim idez, a ignorância d o j u i z e o horror da responsabilidade', insinuam um a solução já feita, para não correr, o julgador, os azares de um a nova, em que se arriscaria a errar e ver o seu veredictum repelido pelos colegas, dissecado pelos causídicos ou reform ado pelo tribunal superior (2).

como se foram evangelistas" - sicu t antíqui adorabant idola pro diis ita advocati adorant glossatores pro evangelistis (Cogliolo - Filosofia, p. 133). (4) Gmür, op. cit., p. 121 e nota 3. (5) Gmür, loc. cit. (6) Fabreguettes, op. cit., p. 250, nota 3, e p. 387, nota 1. (7) Séculos depois do reinado de Justiniano ainda o grande Cujácio opinava que, a não ser por irrisão, ninguém poderia ser comparado a Papiniano: nemo unquam Papiniano oequari potest, n isip e r deridiculum (Fabreguettes, op. cit., p. 196, nota 1). 335

337 - (1) Berriat Saint-Prix, op. cit., ns 115. (2) Berriat Saint-Prix, op. cit., n® 113. (3) Berriat Saint-Prix, op. cit., nos 113 e 114. (4) Geny - M éthode d'lnterpró\ation, vol. II, p. 54-55.

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I lerm enêutlca e Apllcaç3o do Direito | Carlos Maximiliano

A facilidade em achar autoridades p ró e contra, sobre todas as questões sé­ rias, dem onstra a fraqueza de sem elhante modo de persuadir e vencer. R epitam -se as razões, não os nom es apenas; afirmações, sem justificação expressa, podem ser o fruto de inadvertência. Q uando os argum entos são fracos, insuficientes, ou nem existem sequer, dim inuída há de ser a confiança na doutrina, em bora de alto tribunal, ou grande jurisconsulto (3). Excetuam -se os assertos relativos a questões pacíficas, os quais os escritores repetem sem justificar. H á um caso em que o argum ento de autoridade se torna muito forte; é se ele se reveste dos característicos da boa jurisprudência, isto é, se traduz um parecer unifor­ me e constante. “Quando a doutrina dos escritores aparece com o um feixe com pac­ to, um bloco, m elhor ainda quando é unânime, constitui um a autoridade m uito posi­ tiva, que, sem excluir absolutam ente o critério profissional do intérprete, lhe impõe grande prudência para romper, de frente, contra o que a m esm a lhe sugere” (4). 338 - A pesar da fraqueza do argum ento de autoridade, não deve abandoná-lo, em absoluto, o profissional. Faz efeito na m ultidão; e o advogado, ou polem ista, não pode desprezar esse fator de prestígio e êxito. Convém invocá-lo, para contrabalan­ çar o triunfo resultante de citações de autores e arestos pelo contraditor336 ( 1). Serve principalm ente para evitar prolixidade e com o rem ate a um a argum en­ tação m ais sólida: depois de acum ular elem entos lógicos, as m elhores razões; com ­ pletaria o efeito de trabalho o declarar afinal, por exem plo, o seguinte: sufragam a m esm a doutrina os escritores F, G, e H e os tribunais A, B e C. Bastaria, nesse caso, citar os livros e páginas ou parágrafos respectivos, e as datas dos julgados. No foro, sobretudo, nada se deve desdenhar que possa concorrer para o êxito da causa; nas lides judiciárias, provas, argum entos, enfim elem entos de convicção e fatores de vitória nunca são dem ais (2). 339 - Não é delicado e produz mau efeito o invocar a autoridade daquele perante o qual ou contra quem se pleiteia ou discute; especula-se, deste m odo, com a vaidade, que interdiz o abandono e a retratação do erro. Cham a-se argum ento a d hominem, a d judicem ou a d curiam, conform e se refere o anterior parecer do contraditor, de um ju iz, ou de tribunal coletivo. Tal processo fere ao m esm o tempo as conveniências e a lógica337 (1). 340 - Q uase nenhum apreço m erece o argum ento, aliás freqüente, e form ula­ do m ais ou m enos nestes term os: assim pensam todos os hom ens, a unanimidade dos m estres, a torrente dos jurisconsultos, a m aioria dos escritores e tribunais. E

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338 - (1) Berriat Saint-Prix, op. cit., n® 116 e 119. (2) Berriat Saint-Prix, op. cit., ns 119. 339 - (1) Berriat Saint-Prix, op. cit., n“ 113 e 120.

liroc,irdos e Outras Regras de Hermenêutica e Aplicação do Direito

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difícil verificar e, sobretudo, docum entar a veracidade de tal afirm ativa338 ( 1). Se valem pouco os sim ples nom es, o fato de serem m uitos não eleva bastante a im por­ tância do processo; ao contrário, im pressiona m elhor, e com justiça, o m encionar as autoridades com indicações honestas dos seus trabalhos e do lugar em que se encontra o parecer favorável: página de livro, ou data de sentença. A ludir a auto­ ridades em globo só parece aceitável, em bora de m edíocre efeito, ao encerrar um a dissertação, apoiada em argum entos sólidos e copiosas citações eruditas. 341 - N ão se confunda o argum ento de autoridade com o de fonte. M erece este muito m aior apreço, e verifica-se quando se invoca um livro, ou texto legis­ lativo, que indiscutivelm ente serviu de base para o trabalho de legislador. Assim aconteceu em França a respeito da obra de Pothier, elevada ao prestígio de Direito Subsidiário, porque inspirou, na íntegra, a parte do Código Civil relativa às Obrigações339 (1 ); o m esm o se deu no Brasil, com o livro do D esem bargador Saraiva, de que proveio o Direito Cam bial em vigor no país (2). Com o argum ento ab auctoritate o processo é diferente: um preopinante cita autores e julgados, sem lhes reproduzir os dizeres, nem trasladar sequer a súmu­ la dos conceitos; o contraditor invoca outros escritores e arestos; refere-se este à prim eira edição de um livro; replica o outro com a segunda; e assim prossegue o bom bardeio a distância, de nomes de m estres e datas de acórdãos, sem descer à essência da matéria, às razões científicas de decidir (3). Q uando a fo n te de um a disposição é o texto de lei estrangeira, a exegese adotada para este, no país onde o m esm o vigora, orienta, m elhor do que outra qualquer, o intérprete brasileiro. A P A IX O N A R -S E N Ã O É A R G U M E N T A R

342 - É com um no foro, na im prensa e nas câm aras substituírem as razões, os fatos e os algarism os pelos adjetivos retum bantes em louvor de um a causa, ou em

338 340 - (1) Berriat Saint-Prix, op. cit., ne 167. 339 341 - (1) Julien Bonnecase - L'École de l'Exégèse en Droit Civil, 1919, n25 25-28; Berriat SaintPrix, op. cit., n25 95-112. Vede o capítulo - Elem ento Histórico. Nem o próprio argumento de fonte é decisivo: vede a dissertação sobre - Testis unus..., ne 313. (2) José A. Saraiva - A Cambial, 2a ed., 1918. Vede J. X. Carvalho de Mendonça - Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. V, Parte II, 1922, na 534, nota*; Paulo de Lacerda - A Cambial no Direito Brasileiro, 3 a ed., Prefácio. (3) Racine, em sua comédia Les Piaideurs, ato III, cenas III e IV, satiriza o abuso do argumento de autoridade: descreve um ju iz (Dandin) impaciente, enquanto o advogado se alonga a in­ vocar "a autoridade do Peripatético", e a citar "Pausânias, Rebuffe, o grande Cujácio, Hermenopolus", até que o magistrado adormece profundamente, para despertar ainda atordoado, esboçar, a princípio, condenação desarrazoada e iníquia, e propender, enfim, para o senti mentalismo e a absolvlçilo

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Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

vitupério da oposta. Lim itam -se alguns a elevar às nuvens os autores ou as justifi­ cativas que invocam , e a deprim ir os do adversário; outros cham am irretorquíveis, decisivas, esm agadoras às próprias alegações, e absurdas, sofísticas, insustentá­ veis, às do contraditor. Exaltar, enaltecer com entusiasm o, ou m aldizer detratar com veem ência não é argum entar; será um a ilusão de apaixonado, ou indício de inópia de verdadeiras razões340 (1 ). A ironia leva a palm a ao vitupério. O que im pressiona bem (saibam os novos, mais ardorosos e m enos experientes) é a abundância e solidez dos argum entos aliados à perfeita cortesia, linguagem ponderada e m odéstia habitual (2). R E F O R M A D A LEI SEM ALTERAR O TEXTO

343 - N ão pode o intérprete alim entar a pretensão de m elhorar a lei com desobedecer às suas prescrições explícitas. Deve ter o intuito de cum prir a regra positiva, e, tanto quanto a letra o perm ita, fazê-la consentânea com as exigências da atualidade. A ssim , pondo em função todos os valores jurídico-sociais, em bora levado pelo cuidado em tornar exeqüível e eficiente o texto, sutilm ente o faz m e­ lhor, p o r lhe atribuir espírito, ou alcance, mais lógico, adiantado, hum ano, do que à prim eira vista a letra crua pareceria indicar341 (1). O herm eneuta de hoje não procura, nem deduz, o que o legislador de anos anteriores quis estabelecer, e, sim , o que é de presum ir que ordenaria, se vivesse no am biente social hodierno. Sem esbarrar de frente com os textos, ante a m e­ nor dúvida possível o intérprete concilia os dizeres da norm a com as exigências sociais; m ostrando sem pre o puro interesse de cum prir as disposições escritas, m uda-lhes insensivelm ente a essência, às vezes até m algrado seu, isto é, sem o desejar; e assim exerce, em certa m edida, função criadora', com unica espírito novo à lei velha (2). 344 - A té m esm o no cam po do Direito C onstitucional a H erm enêutica e o C ostum e exercem o seu papel sutilm ente m odificador, apesar de ser ali m aior o rigor, m ais profundo o respeito pela letra dos preceitos suprem os, tanto que os

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342 - (1) Berriat Saint-Prix, op. cit., n9 164. (2) "A ironia, que eu aconselho, não é cruel. É doce e benévola. O seu riso desarma a cólera, e é ela que nos ensina a zombar dos maus e dos tolos, que, se não fora esse derivativo, poderí­ amos ter a fraqueza de odiar" (Anatole France - LeJa rdin d'Épicure, 1923, p. 94-95). 343 - (1) E. R. Bierling - Juristische Prinzipienlehre, 1911, vol., IV, p. 262, nota 54; Cogliolo Scritti Varii, vol. I, p. 39 e 42. Doutrina Jerem ias Bentham: "Nunca é a própria lei que está em desacordo com a razão; é sempre algum malvado intérprete da lei que a corrompeu e dela abusou - It is never the law its e lfth a t is in the wrong; it is always som e wicked interpreter o f the law that has corrupted and abused it (apud Brunken & Register - Science o f Legal M ethod, 1917, p. 223). (2) Bierling, vol. IV, p. 228-230.

I

Brocardos e Outras Regras de Herm enêutica e Aplicação do Direito

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próprios corifeus da livre-indagação, da Freie Rechtsfindung, não ousam aplicá-la ao estatuto básico342 (1). “ Seria erro capital de análise jurídica o construir apoiado na letra dos docu­ m entos ordinários ou constitucionais sem atender à evolução lenta e contínua, à qual se devem ter adaptado os poderes e os institutos da república” (2). “H á outra espécie de revisão, invisível e poderosa, é a que resulta da ação contínua dos costum es políticos: um a C onstituição revê-se cada dia pela sua pró­ pria aplicação; porque as instituições que ela estabeleceu têm por elem entos, sem cessar renovados, hom ens que pensam e que atuam em face de um a realidade m utável” (3). “A sim etria das form as constitucionais dissim ula m uitas vezes, m ais do que revela, o equilíbrio real das forças políticas; e para conhecer o regim e cons­ titucional de um país, não basta ler a sua C onstituição. Os textos, com efeito, nunca form am um a rede bastante cerrada, nem bastante firm e para im pedir os costum es parlam entares e governam entais de fazerem prevalecer tacitam ente contra a C ons­ tituição regular um a constituição oculta que a excede e pode desnaturá-la: quer dizer que todos os países têm um a C onstituição costum ária, m esm o aqueles que parecem viver sob o regim e de uma C onstituição escrita” (4). N a A lem anha im perial Laband e Jorge Jellinek registraram várias alterações constitucionais sem se m odificar a letra do estatuto básico. Frisch observou na Su­ íça fenôm eno idêntico (5), e Cruet, em França e nos Estados Unidos (6). Todo o regim e parlam entar é mais o fruto de costumes político-jurídicos do que de disposições escritas. Nos Estados U nidos ao Presidente não incum bia a livre-escolha dos M inis­ tros: dependia de aprovação do Senado a investidura. Passou esta câm ara a hom o­ logar sistem aticam ente as nom eações; e assim prevaleceu, de fato, a com petência exclusiva do Chefe de Estado, atributo intrínseco do regim e presidencial (7). 345 - C aso típico de m elhoria na lei por m eio de interpretação e do costum e verifica-se a respeito da reeleição do prim eiro m agistrado da República. Existe a tendência dem ocrática universal, contrária à longa continuidade no governo343

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3 4 4 - (1) Gmür, op. cit., p. 134. Vede o capítulo - Livre-indagação, ns 77. (2) Carmelo Caristia - II Diritto Costituzionale Italiano nella Dottrina Recentissima, 1915, p. 153. (3) Jean Cruet - A Vida do Direito e a Inutilidade das Leis, trad. portuguesa, 1908, p. 93. (4) Cruet, op. cit., p. 88-89. (5) W alter Jellinek, op. cit., p. 186-187 e nota 35; Frisch - W idersprüche In der Literatur und Praxis des Schweizerischen Staatsrecht, 1912, p. 30 e segs. (6) Cruet, op. cit., p. 94-102. (7) Houve uma exceção em 1925: o Senado desaprovou a nomeação de Warren para Attorney General, que nos Estados Unidos acumula funções exercidas no Brasil pelo Procurador-Geral da República e pelo Ministro da Justiça. 3 4 5 - (1 ) A. Esmein - Elément', de Drnit ConstitutionnelFrançais et Comparé, 7 a ed., 1921, vol. II, p. 38.

( I ). Daí resulta insinuar-se, a despeito da lei escrita, o princípio vedador das reeleições. Perm ite-as o estatuto norte-am ericano, indefinidamente. W ashington recusou a segunda; prevaleceu a sua conduta com o futura regra im preterível. O General Grant, havendo sido reeleito, tentou, depois de intervalo de quatro anos, voltar ao poder: foi repelido, Firm ou-se c, preceito consuetudinário; nem com o interregno de um ou m ais períodos presidenciais se adm ite segunda reeleição (2). Pelo texto fundam ental francês o Presidente é reelegível indefinidam ente. Teve o m andato renovado, uma só vez, Júlio Grevy, forçado a renunciar no de­ curso do novo septênio. Houve segunda tentativa de renovação de investidura, a favor de Em ílio Loubet, que a recusou, em 1906, e o fato constituiu precedente costumeiro, firm ou doutrina, e definitiva, contra as reeleições, prestigiada pelo su­ cessor de Loubet, A rm ando Fallières (3). Entretanto, o texto da Lei Constitucional de 25 de fevereiro de 1875, que em França rege a espécie, prescreve: “Art.. 2o: O Presidente da República é eleito, por m aioria absoluta dos sufrágios, pelo Senado e pela C âm ara dos Deputados reunidos em A ssem bleia Nacional. É nom eado por sete anos; é reelegívelV A ninguém é lícito fazer tudo o que p o d e: o dever opõe barreiras ao poder. Non omne qu od licet honestum est: “Nem tudo o que o Direito perm ite, a Moral sanciona” (4). 346 - O bservam -se tam bém no Brasil interpretações e práticas m odificadoras do espírito de dispositivos do código supremo: a) R eduziram -se a letra m orta as palavras “diversificando as leis destes” , do art. 60, letra d, do estatuto de 1891. b) A sem elhança do que se deu nos Estados Unidos quanto à investidura dos Secretários de Estado verifica-se no Brasil, relativam ente aos M inistros diplom áticos e aos do Suprem o Tribunal Federal, a invariável hom ologação do ato presidencial pelo Senado, até m esm o nos casos em que o novo ju iz nunca tenha revelado o notável sahcr exigido pelo art. 56344 (1). Portanto, na prática, o Presidente goza da prerrol?,ativa de escolher livremente aqueles funcionários.

(2) James Bryce - The American Com m onwealth, 3 a ed., vol. I, p. 45-46; Esmein, vol. II, p. 40. O princípio costumeiro norte-americano forma o art. 58 da Constituição da Tcheco-Eslováquia, de 1920 (Esmein, vol. II, p. 40). Em 1940, Roosevelt quebrou a tradição, obteve terceiro mandato. (3) Léon Duguit - Traité de Droit Constitutionnei, 1911, vol. II, p. 418-419. Sob o pretexto de manter a continuidade governamental às portas da guerra, em 1939 o Par­ lamento abriu exceção à excelente norma consuetudinária, em favor de um Presidente que foi, meses depois, forçado a renunciar. (4) Paulo, no Digesto, liv. 50, tít. 17, frag. 144. 144

346 - (1) No primeiro quadriênio da República o Senado recusou aprovar três nomeações, aliás escandalosas: de um médico e dois generais, amigos do vice-presidente em exercício, Floriano

347 - N a esfera do Direito Privado a liberdade do herm eneuta é m aior ain­ da do que em D ireito Público; e por isso ali avulta a tolerância em relação aos costumes form ados paralelam ente ao texto rígido. N ão é, pois, de adm irar que o professor Coglioli registre, na Itália, m aneiras de considerar o dote e a locação de serviços de operários, m ais adiantadas e louváveis do que a decorrente da letra crua das leis civis345 (1). O m oderno herm eneuta é, sem o pretender, até o aperfeiçoador sutil, o soci­ ólogo do Direito. IM P R E S C R IT IB IL ID A D E D A DEFESA

347-A —Merece relevo especial e com entário esclarecedor o brocardo vetus­ to —quoe tem porada sunt a d agendum, perpetu a sunt a d excipiendum: “O que é tem porário, em se tratando de ações, é perpétuo no tocante às exceções” ; ou, m ais sinteticam ente, “o direito de acionar é tem porário; o de defesa, perpétuo” . Ao apotegm a rom ano correspondem o francês - tant dure la demande, tant dure L ’exception: “Tanto quanto dura a dem anda, perdura a exceção;” e o alem ão —A ns pruchvergeth, Einrede besteht: “A ação passa, a exceção fica.” Nenhum fundam ento de defesa perde a eficácia enquanto persiste, para o ad­ versário, a faculdade de acionar. Se um term o é preestabelecido em lei para se fazer valer determ inado direito por m eio de ação, o decurso do prazo referido não im pede o titular, do m esm o direito, de o alegar com o base de contestação, em sendo dem andado346 (1 ). Exemplo: Para se livrar de credores, Caio vende imóvel

Peixoto, para magistrado da mais alta corte judiciária do País! Prevaleceu a regra de só escolher para a suprema judicatura os bacharéis em Direito, e passou a ser sistemática a homologação. 345 347 - (1) Pietro Cogliolo - S crítti Varíi, vol. I, p. 39-40. 346 347-A - (1) Ricci, Batista, Caire & Piola - Corso d i D iritto . Vede n9 347-E, letras a e b. (2) Giorgio Giorgi - Teoria delle O bbligazioni, 7§ ed., vol. VIII, n9 236. (3) D ig esto , liv. 44, tít. 4 9 - De do li m a li e t m etu s e xcep tio n e, fragmento 59, § 6®: Non s ic u t de d o lo a ctio ce rto tem p o re fin itu r, ita etiam excep tio eod em te m p o re danda e s t; nam h a e c p e r­ p e tu o c o m p e tit: cum a c to r quidem in su a p o te s ta te h a b ea t, q u a n do u ta tu r su o ju r e ; is a u tem cum quo agitur, non h a b e a t p o te sta te m , q u a n do co n ve n ia tu r : "Embora a a çã o motivada por

dolo term ine dentro de certo tempo, não precisa ser oferecida no mesmo prazo a exceçã o de igual natureza; porquanto esta é cabível perpetuam ente: ao passo que o autor tem em seu poder fixar o momento de usar o próprio direito; à pessoa, porém, contra a qual ele age, não assiste o arbítrio de fazer prevalecer o seu quando lhe pareça conveniente." (4) Théophile Huc - C o m m enta ire d u Code Civil, vol. VIII, n9 189. (5) Petroncelli, monografia in N uovo D igesto Italia n o , 1937-1940, vol.V, verb o "Eccezione", n9 6; João Monteiro - P ro ce sso Civil, vol. II, § § 1 0 2 ,1 0 8 e 110; A. J. Ribas - C o n solid ação d a s Leis do P ro cesso Civil, arts. 558 e 581. O brocardo não se refere às exceções d ila tó ria s : à de incompetência ra tio n e p e rso n a e , por exemplo.

nerm eneutlc.i e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

sim uladam enfe a Tício. Este faz citar o herdeiro universal daquele, para cum prir o contrato com a entrega do bem de raiz. O dem andado alega o vício da venda; o suposto adquirente objeta que decorreram m ais de quatro anos e, por isto, a eiva da sim ulação prescreveu. O sucessor de Caio triunfará, pelo m enos neste ponto; pois ele e o de cnjus conservaram o seu direito, visto que m antiveram a posse e não trataram da execução do contrato, a exceção não prescreveu; em quatro anos prescreveu a ação (2). A m áxim a latina se não refere só aos casos de nulidade e rescisão, com o, in­ terpretado literalm ente, parece indicar o conhecido preceito do jurisconsulto Paulo (3), origem clássica do brocardo genérico; tem um alcance am plo (4). C om preende todos os meios diretos de ilidir a ação, as exceções perem ptórias, dos doutores (5), com o sejam: a de nan adim pleti contractus (não cum prim ento das cláusulas a que se obrigara o autor); de coisa julgada; novação ou transação; pagam ento; prescrição; erro; dolo, medo, sim ulação, direito de retenção, falta de prestação de garantia, ou de capacidade do obrigado, e sem elhantes arguições de defesa (6). 347-B - Com as razões seguintes é justificada tradicionalm ente a prevalência do preceito rom ano: a) A. ação exercita-se à vontade do titular do direito; o m esmo não se dá com a exceção, a qual ninguém pode opor quando queira; o seu titular precisa aguardar o ataque por parte do adversário; por isto, não seria cabível alegar inércia do defendente, e, consequentem ente, prescrição347 (1 ). b) A negligência, que m otiva a prescrição, está em abster-se o titular de exercer um a ação que lhe daria o gozo de um direito do qual está privado; o que se defende acha-se no gozo da parte essencial do direito próprio, c) Um dos fins da prescrição é dim inuir o núm ero de processos; certo da im prescritibilidade das exceções, o indivíduo não tom a a iniciativa processual; só se ergue, para repelir o ataque e inutilizar o litígio por outrem intentado, d) Com a dem ora, aum entam as dificuldades do réu, por isto, sc estabelece para o autor o dever jurídico de agir logo; ao passo que, se é o réu que invoca o direito cuja ação prescreveu, a tardança em fazer sem elhante alegação só a ele prejudica (2).

(6) Código Civil italiano, de 1885, arts. 1.300 e 1.302; S tau d in g er- K o m m en ta r zum Bürgerlich en G esetzb u c h , 9 a ed., vol. I, coment. 8® ao art. 194; Enneccerus, Kipp & W olff - Leh rb u ch d es B ü rg elisch en R e ch ts, 8a ed., vol. I, parte 13, § 218, V; Eh re n zw e ig - S ystem d e s O esterreich isch en A llg em ein en P riv a tre ch ts, vol. I, § 134; Biermann - B ü rg erlich es R e ch t, vol. I, § 37;

PacificLMazzoni - Istitu zio n i d i D iritto Civile, vol. II, ne 198; Fadda & Bensa, notas ao vol. I, § 112, das P a n d ette, de Windscheid. 141

347-B - (1) Windscheid & Kipp - Leh rb uch d es P a n d e k te n re ch ts, 8a ed., vol. I, § 112; Nicola Coviello - M a n u a le d i D iritto Civile, 2- ed., vol. I, § 143, p. 462. Este argumento inspira-se, à evidência, no preceito, transcrito, de Paulo. (2) Savigny - Traité d e D roit R om ain, tradução Guenoux, vol. V, § 254.

Brocardo*

e O u l i . e . I l e n i . 1-, d e

Herm enêutica e Aplicação do Direito

2 3 1

347-C Com o o primeiro fundamento (o da letra a ) ê o geralmente invocado, em o destruir porfiam os adversos à aplicabilidade do brocardo. N o seu conceito, não tem mais cabimento, hoje, a imprescritibilidade, das exceções; porque desapareceu a sua própria razão de ser: a quem contratou por erro, ou dolo, por exemplo, é facul­ tado não esperar a exigência do adversário relativa ao cum primento da obrigação; pode acioná-lo imediatamente, para anular o ato que, ludibriado, subscreveu348 (1 ). Aos defensores do aforism o “pareceu ju sto que a exceção, arm a defensiva, conservada fosse tanto tem po quanto a ação nascida do contrato pode ser utilizada com o arm a ofensiva” ; portanto as exceções adequadas a repelir determ inada ação duram tanto com o esta; podem ser utilm ente levantadas em qualquer tem po em que a dem anda surja no pretório (2). A cresce um argumento: os Códigos só aludem à prescrição das ações; silenciam quanto às exceções, e a m atéria em apreço é de direito estrito, não com porta am pliação por analogia (3). 347-D - Alguns escritores restringem a aplicabilidade do axiom a às exce­ ções verdadeiras e exclusivas, isto é, quando visam proteger um direito que não pode ser garantido ou alegado por meio de ação, e, sim, em contradita oposta a um a dem anda349 (1). O utros m estres julgam m ister que o obrigado tenha ficado na posse de todos os seus direitos, com o se o ato m erecedor da sua repulsa judiciária

348

349

347-C - (1) Mareei Planiol - Traité É lém e n ta ire d e D roit CivH, 7 a ed., vol. II, n9 1.291. (2) Chironi - Istituzioni di Diritto Civile, 2- ed., vol. I, § 109; Lomonaco - Istituzioni d i Diritto Civile, 2a ed., vol. V, p. 359; De Filippis - Corso di Diritto Italiano Com parato, vol. IV, n9 133; Chironi & Abello - Trattato di D iritto Civile, vol. I, p. 688; Pacifici-Mazzoni, vol. II, ns 198; Aubry & Rau e Bartin - Cours de D roit Civil, 5a ed., vol. XII, § 771; p. 529; Bufnoir - Propriété e t Contrat, p. 739. (3) Manifestam-se contrários à aplicação do brocardo: Colmet de Santerre, Marcadé e Duranton, citados por Luigi Borsari - C om m entario d el Codice Civile, vol. III, parte 2a, § 3.262; Laurent - P rín cip es d e D ro it Civil, vol. 19, n - 57-80, e vol. 32, n9 372; Baudry-Lacantinerie & T is s ie r - De Ia P rescrip tio n , n - 609-612; Mareei Planiol, vol. II, n9 1.291; Unterholzer, citado por Savigny, vol. V, p. 451, nota d; Brinz, citado por Puchta - P an d ek ten , § 95, nota b; Coviello, vol. I, p. 461-463; Ricci & Battista, vol. V, n9 147; Clóvis Beviláqua - Teoria G era l do D ireito Civil, I a ed., § 86; João Monteiro, vol. II, § 109, nota 4; Aureliano de Gusmão - P ro cesso Civil e C o m ercia l, vol. I, n9 125. Vede n9 284. 347-D - (1) Lomonaco, vol. V, p. 360; Pacifici-Mazzoni, vol. II, n9 198; Acórdãos das Cortes de Apelação de Florença, Nápoles e Messina, a p u d Ricci & Battista, vol. V, n9 147. (2) Larombière - T h éo ríe e t P ra tiq u e d es O blig a tion s, vol. V, coment. 34, ao art. 1.304; Toullier & Duvergier - Le D ro it Civil F ra n ça is, 7a ed., vol. IV, n9 602. (3) Savigny, vol. V, § 255, nota p ; Ehrenzeig, vol. I, § 134; Planiol & Ripert e Esmein - Traité P ra tiqu e de D roit Civil Fra n ça is, vol. VI, n9 460; Giorgi, vol. VIII, n9 237.

(4) Mostram-se acordes com a parêmia clássica: Charles Maynz - Cou/v de D roit R om ain, V ed., vol. I, 5 64; Fndemann - Leh rb u ch d es B ü rg erlich en R e ch ts, vol. I, parte I § 88, nota 12, e § 92, nola 10; c.nl Crome - S y s t e m des D eu tsch en Bü rg erlich en Rech ts, vol, I, ') I 14, n" l, Leonh.iid /ie/ AH qetneine Theil d es B ü rg erlich en G ese t/b u ch s, 'l, V; Wlndsc lielcl H Kipp, vol. I, 111 e mii.i l. apoiados em Demburg e ReRelsberK; Ptic lila, op, i It , 9‘>e nota h,

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Hermenêutica e ApllcaçSo do Direito | Carlos Maximiliano

não existisse; pois, neste caso, a ele não incum bia provocar a ação; estava, e devia continuar, na expectativa (2). Entretanto, a jurisprudência do Tribunal Suprem o da A lem anha, da Á ustria e do Brasil; bem com o das Cortes de C assação de França e da Itália prestigia o brocardo na plenitude do respectivo alcance (3); bastante num erosa ainda, entre os expositores da ciência jurídica, se nos antolha a falange propugnadora da perpetuidade das exceções perem ptórias (4). O C ódigo Civil italiano de 1865, art. 1.302, e o português, art. 693, explicita­ m ente asseguram a im prescritibilidade da defesa que pleiteie nulidade ou rescisão. 347-E - O brocardo m erece acolhida, com as restrições seguintes, não recu­ sadas nem pelos seus m ais extrem os apologistas: a) Só não prescrevem as exceções propriam ente ditas, meios jurídicos de repelir ações. Não prevalece a parêm ia quando, sob a aparência de exceção, colim am fazer vingar o objeto próprio de um a verdadeira ação, isto é, quando, de fato, apenas se contrapõe um pedido a outro, de sorte que a m atéria da defesa e a da dem anda têm existência autônom a, nenhum a relação de dependência há entre um a e outra, não se baseiam am bas sobre o mesmo título jurídico. E preciso, portanto, que a contradita não envolva um a exigência nova, não se funde sobre um a preten­ são, porém sobre determ inados fatos adequados a ilidir o litígio (sobre o dolo, por exem plo)350 (1). N ão se perpetua, por conseguinte, o direito de alegar com pensação (2), nem o de reconvenção (3): Elio é acionado por N óvio e teve contra este um

Staudinger, vol. I, coment. 8® ao art. 194; Ehrenzeig, vol. I, § 134; Bierm ann, vol. I, § 99; Savigny, vol. V, § § 253-255; Accarias - P ré cis de D ro it R o m a in , vol. II, n9 891; Henri Capitant, In tro d u ctio n à L 'É tu d e du D ro it Civil, 3® ed., p. 308-309; Zachariae Von Lingenthal & Crome - M a n u a ie d e l D iritto Civile F ra n c e se , trad. italiana de Ludovico Barassi, anotada, vol. I, § 149; H uc, vol. VIII, n9 190; Aubry & Rau e Bartini, vol. XII, § 771; Mario Petroncelli, in N uovo D ig esto Ita lia n o , 1937-1940, vol. V, verbo "Eccezione", n9 6; Emmanuele G ianturco - S is t e m a ili D iritto Civile, vol. I, 3- ed., § 75, p. 390-391; Nicola Stolfi - D iritto Civile, 1919-1934, vol. III, n” 1.165; Chironi, vol. I, § 109; Lomonaco, vol. V, p. 359; De Filippis, vol. VI, n9 133; Chironi Ki Abello, vol. I, p. 688; Pacifici-Mazzoni, vol. II, n8 198; Borsari, vol. III, parte 2a, § 3.262 (não integralmente); Giorgi, vol. VIII, ns 235; J. O. Machado - E x p o s itio n y C o m en tário d e l Código Civil A rg e n tin o , vol. XI, p. 32; - Dias Ferreira - C ód igo Civil P o rtu g u ê s A n o ta d o , vol.

II, coment. ao art. 693; Cunha Gonçalves - T ra ta d o d e D ireito Civil, em curso de publicação, vol. III, n9 415; Alves Moreira - In stitu içõ e s d e D ireito Civil P o rtu g u ê s, vol. I, nB 285; M. I. Car­ valho de Mendonça - D o u trin a e P rá tica d a s O b rig a çõ es, 2a ed., vol. I, n9 438; João Mendes Júnior - D ireito Ju d iciá rio B ra sile iro , 2§ ed., tít. 3S, cap. 6 9, n9 V, p. 193-194; Barão de RamaIho - P ra xe B ra sile ira , 2S ed., § 234: Carpenter - Da P re sc riç ã o , n9 61; Almeida Oliveira - A P re scriçã o , p. 234-239. ISO

347-E - (1) Zachariae Von Lingenthal & Crome, trad. cit., vol. I, § 149 e nota 1; Kipp, nota 3 ao § 112 do vol. I de W indscheid; Staudinger, vol. I, coment. 8 ao art. 194; Stolfi, vol. III, n9 1.165; Cunha Gonçalves, vol. III, n9 415; Mirabelli - D elia P rescrizio n e, n9 114-118.

Brocardos e (Juli.e, Uegia'. de Hermenêutica o Apllcaç3o do Direito

23 3

crédito, que deixou prescrever; não o pode trazer a com pensar o débito posterior ao lapso prescricional referido; nem , tam pouco, o aduzir em simples reconvenção. b) O campo de ação do brocardo não se estende à réplica oposta à contestação apresentada pelo réu; não pode o autor, em revide aos argum entos da defesa, alegar direito seu cuja ação esteja prescrita; pois quem replica a um a exceção, não está de posse do direito reclam ado (4). c) O apotegm a não abroquela defesa fundada em direito extinto pela decadên­ cia', esta não se confunde com a prescrição; atinge a ação e a execução (5). Exem ­ plo: se uma jovem oriunda de justas núpcias propõe contra o presumido pai ação de alim entos e este lhe argui a ilegitim idade, depois de transcorrido o termo fixado pelo Código Civil, art. 178, § 3o, e § 4o, n° I; sucum be o contestante; porque o prazo de dois meses para o progenitor im pugnar a filiação é de decadência', constitui lap­ so preclusivo, não prescricional', o seu decurso fere de morte o direito do chefe de fam ília, que o não pode m ais alegar nem sequer com o fundam ento de defesa. D E C A D Ê N C IA

347-F - Ocorre a decadência (Dêchéance, dos franceses; decadenza, dos ita­ lianos; Ausschlussfrist, Gesetzliche Befristung ou Praeklusivbefristung, dos ale­ m ães), quando a lei criadora de um direito subordina a existência do m esm o a determ inado prazo. A norm a positiva concede ação especial, sob a condição de ser, esta, proposta dentro de certo lapso de tem po. Por outras palavras: dá-se a decadência quando um preceito de lei assegura a faculdade de agir judicialm ente e ao m esm o tem po a subordina à condição de a exercer dentro de prazo predeterm i­ nado. Exemplo: o C ódigo Civil brasileiro outorga ao doador a faculdade de punir o ingrato com o lhe retirar o benefício; porém tal prerrogativa é lim itada no tem po;

(2) Windscheid, vol. I, 112, nota 8, além da nota 3, de Kipp; Keller, a p u d Puchita, op. cit., 95, nota b; Staudinger, vol. I, coment 8 ao art. 194; Stolfi, vol. III, n9 1.165; Bartolo, a p u d Ricci & Battista, loc. cit. (3) Coviello, vol. I, p. 463; Baudry-Lacantinerie & Tissier, op. cit., n9 611; Crome, vol. I, § 114, nota 11; Giorgi, vol. VIII, n9 235; João Mendes, op. cit., tít. 32, cap. 6®, n9 V. (4) Aubry & Rau e Bartini, vol. XII, § 711, p. 530; Baudry-Lacantinerie & Tissier, op. cit., n" 6 1 1, João Mendes, op. cit., tít. 39, cap. 69, n9 V, p. 193-194. (5) Josserand - Cours d e D roit Civil, vol. II, n9 1.005; vol. III, n9 1.636; Enrico Gropallo, in Nuovo D igesto Italia no , 1937-1940, vol. X, in verbis "Prescrizione Civile", n9 18; Coviello, vol. I, p. 4H'>; Planiol & Ripert, Esmein, Radouant e Gabolde - Traité P ratiqu e de D roit Civil, vol. VII, n" 1.'I0?, com o apoio de 3 arestos; Fluc, vol. XIV, n9 318; Aubry & Rau e Bartin, vol. XII, § 711; ( unli.i Gonçalves, vol. III, na 420; Keller, a p u d Puchta, op. cit., § 95, nota b, Venzi, nota a ; P.ii llli I Mazzoni, vol. II, p. 595 e segs.; Crome, vol. I, § 114, n9 1; Gianturco, vol. I, p. 393, com o .ipolu de Arndts, Unterholzner e Windscheid; Seve Navarro, a p u d Clóvis Beviláqua, op. cit., *i H(>. Vede: Carlos M axim iliano - D e c a d ê n c ia , na revista "Direito", vol. I, janeiro efevereiro de PMO, p. 41 50.

há dc ser exercida dentro dc um ano, a contar do dia em que o autor da liberalidade teve conhecim ento do fato que o levou a desestim ar o outrora am ado e favorecido (arts. 1.181-1.184). A ssem elham -se a decadência e a prescrição extintiva, tanto que os elaboradores do C ódigo Civil brasileiro, por evidente engano, intercalaram casos con­ cretos daquela entre os consagrados geralm ente com o pertencentes a esta. N ão se confundem os dois institutos jurídicos; há entre eles diferenças irrefragáveis, não assinaladas, aliás, pelos incom paráveis jurisconsultos rom anos, porém hoje reconhecidos universalm ente nos dom ínios da doutrina e nas conclusões da prá­ tica351 (1). Se um m oderno professor fulgurante, com o C hironi (2), ainda resiste à corrente, isto acontece apenas em aparência; porquanto ele próprio classifica as hipóteses de decadência com o de um a prescrição especial, oferecendo requisitos e conseqüências que a prescrição com um não depara; foi precisam ente por causa desta diversidade que a técnica preferiu criar m ais um instituto jurídico (3). Com o elem entos esclarecedores de um a tese difícil, transladam -se conceitos de expositores prestigiosos, no tocante ao assunto ora versado. M odica, autor de livro notável sobre a m atéria, proclam ou: “D ecadência é o fim da ação por não haver o interessado exercido o direito dentro do term o perem p­ tório fixo, estabelecido por lei, sentença, convenção ou testam ento” (4). É a perda de um a faculdade, de um direito ou de ação, resultante da só ex­ piração de um term o extintivo predeterm inado. O que a caracteriza é, pois, o não repousar sobre um a presunção de aquisição, nem de liberação qualquer; m uito se assem elha aos prazos processuais (5). Q uando a lei concede ação sob a condição do seu exercício em um tem po determ inado e de um m odo prefixo, a expiração deste term o traz a decadência (6). E sta resulta, quando norm a positiva impõe um prazo prefixado para a realização de um ato, em geral para a utilização de um a faculdade (7). “ Incorre-se em decadência, quando a lei ou a vontade do hom em estabelece um term o perem ptório para o exercício de um direito ou a propositura de um a ação judiciária” (8).

351

347-F - (1) São expressões sinônimas de decadência: caducidade e prazo preclusivo. (2) Istu tu zio n i d i D iritto Civile, vol. I, § 105. (3) Laurent - P rín cip es d e D ro it Civil, vol. 32, n9 10; Aubry & Rau e Bartin - Cours d e D ro it Civil, 5 a ed., vol. XII, § 7 7 1 . (4) Modica - Teoria delia D ecadenza nel D iritto Civile Ita lia n o , vol. I, n9 220, p. 206, apud Giorgi - Teoria d e lle O bbligazioni, 7 a ed., vol. VIII, p. 367, nota 1. (5) Théophile Fluc - C o m m enta ire d u Code Civil, vol. XIV, n9 316. (6) Aubry & Rau e Bartin, vol. XII, § 771. (7) Planiol & Ripert, Esmein, Radouant e Gabolde, vol. VII, n9 1.403. (8) Nicola Stolfi - D iritto Civile, vol. III, n9 1.197. (9) Pacifici-Mazzoni - Istitu zio n i, vol. II, n9 196. (10) Garsonnet - Traité d e P ro cé d u re , 2§ ed., vol. II, § 512.

IIIIII

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235

“ Para haver decadência ê necessário que a existência do direito, que dá lugar a ação, e, por isto, tam bém a existência desta, seja lim itada por lei a um certo tem ­ po” (9). O corre, portanto, quando um texto explícito concede ação, porém condi­ cionada ao requisito de se efetuar a propositura dentro de um lapso exato. “Os prazos, isto é, o tem po durante o qual é determ inado, perm itido ou veda­ do realizar certos atos, constituem a principal fonte das decadências’’’ (10). 347-G - Sob vários aspectos divergem decadência e prescrição extintiva. a) As duas pessoas que figuram em caso de decadência são, am bas, titula­ res de direito: o de um a, perm anente; o da outra, contingente, efêm ero, sujeito a desaparecer quando não exercido dentro de curto prazo. N as hipóteses de prescri­ ção, ao contrário, só se nos depara um portador de direito; a outra parte nenhum direito tem, na espécie; sobre ela pesa, antes, um dever, um a obrigação, a qual se extingue em conseqüência da negligência ou bondosa inércia do credor. Exem plo do prim eiro caso: o filho oriundo de justas núpcias tem os direitos decorrentes da legitim idade; ao pai assiste o direito de cassar sem elhante regalia; o direito do des­ cendente é limitado no tem po; dura dois m eses o do ascendente, isto é, extinguese, desde que não seja exercido dentro de sessenta dias contados do nascim ento do filho (C ódigo Civil, arts. 344 e 178, § 3o). Exem plo do segundo caso: o tom ador de nota prom issória tem o direito de haver a im portância da m esm a, em qualquer tem po; ao emitente nenhum direito assiste; ao contrário, ele suporta a obrigação de pagar; decorridos cinco anos do vencim ento do título, p o d e livrar-se da cobran­ ça alegando prescrição, b) A prescrição é a definitiva consolidação de um estado de fato de que um a pessoa está gozando, oposta ao direito de outra; a decadência conserva e corrobora um estado jurídico preexistente, c) A prim eira extingue um direito; a segunda respeita um direito em via de form ação, d) A.prescrição favore­ ce a quem tinha um estado de fato, convertido, depois, pela inação de outrem , em estado de direito; com a decadência aproveita quem estava já fruindo um direito e tinha com o o adversário o igualm ente titular de direito, de um a ação que se extinguiu e era destinada a aniquilar o outro estado de direito352 ( I), e) A prim eira só vem da lei; a segunda pode tam bém advir de determ inação de ju iz ou de ato

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347-G - (1) Cunha Gonçalves, vol. III, n9 420. (2) Giorgi, vol. VIII, n9 225. (3) Nicola Coviello, vol. I, § 150, p. 484. (4) Biermann - B u e rg e rlich e s R e ch t, vol. I, § 98, n9 4; Staudinger, vol. I, p. 763; Enneccerus, Kipp & Wolff, vol. I, parte 49, § 211, III; Planiol & Ripert, Esmein, Radouant e Gabolde, vol., VII, ns 1.403. (5) Giorgio Giorgi - Teoria d elle O bbligazioni, 7 ã ed., vol. VIII, n9 225. (6) Laurent, vol. 32, n9 10; Huc, vol. XIV, n9 317. (7) Armin Ehrenzweig - System d es O esterreich isch en , A llg em ein en P riv a tre ch ts, vol. I, parte ia , § 125; VI; Biermann, vol. I, § 98, n9 4. (8) Giorgi, vol. VIII, n9 225.

Hermenêutica e Aplicação do Direito | Carlos Maximiliano

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jurídico (unilateral ou bilateral, gratuito ou oneroso) (2), f) O escopo da prescrição é pôr fim a um direito que, por não ter sido utilizado, deve supor-se abandonado; o da decadência é preestabelecer o tem po em que um direito possa ser utilm ente exercido (3). g) A prescrição visa apenas ações; a decadência nem sem pre: com ­ preende ações e direitos: refere-se tam bém a prazos que se não relacionam com ações, com o, por exem plo, o relativo à celebração de casam ento (C ódigo Civil, art. 181,8 1°) (4). h) A prescrição só é alegada em exceção, isto é, com o m atéria de defesa', a decadência pode dar lugar a ação (5). i) Aquela, em regra, abrange obrigação ou direito real, som ente; com preende, pois, os elem entos do patrim ônio, apenas; cam po m ais vasto, com o, por exem plo, o das relações de fam ília, a decadência atinge (6). j) () direito sujeito a decadência já surge com o um a faculdade lim itada no tem ­ po; o subordinado a prescrição abrolha em caráter ilimitado, quanto ao tem po (7). I) Lm regra, os prazos estipulados em artigos de código não colocados no capítulo referente à prescrição e nos quais se não declara explicitam ente versarem sobre tal instituto, dizem respeito a decadência (8). A recíproca, entretanto, não é verdadeira: no art. 178 do repositório brasileiro de norm as civis, há num erosos casos de decadência m isturados com os de prescrição e postulados com o se per­ tencessem a esta espécie jurídica. 347-H - M ais esclarecedora do que quaisquer regras será um a lista, em bora incom pleta sem pre, m eram ente exemplificativa, jam ais taxativa, de hipóteses con­ sagradas de decadência353 (1). Eis a que se nos depara no C ódigo Civil: a) A nulação de casam ento prom ovida pelo cônjuge (art. 178, § I o, § 5°, I,

§ r , 1); b) A nulação de casam ento prom ovida pelo m enor ou pelo pai (art. 178, § 4o, II, § 5°, II); c) A nulação de casam ento de m enor de dezesseis ou dezoito anos (arts. 178, § 5o, III; 183 e 213-216); d) Anulação de casamento efetuado perante autoridade incompetente (art. 208); e) Prazo para o casamento, depois de publicados os editais respectivos (art. 181); f Prazo para as testem unhas de casam ento in extremis confirm arem em juízo o que ouviram do enferm o (art. 200);

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347-H - (1) Os casos, enunciados em seguida, encontram-se mencionados nas obras citadas de Clóvis Beviláqua - Código Civil Comentado, vol. I, comentário ao art. 178; Carpenter, Modi­ ca - Teoria delia Decadenza, Giorgi, Gropallo, Stolfi, M irabelli, Staudinger, Crome, Josserand, I luc, Aubry & Rau, Planiol & Ripert e Cunha Gonçalves. (?) I nrico Gropallo, in Nuovo Digesto Italiano, 1937-940, vol. X, in verbis "Prescri/ione Civile", n« 18. (1) Glorsl, vol. VIII, nu 225.

Brocardos e Outras Regras de Hermenêutica e Aplicação do Direito

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g) Im pugnação de legitim idade de filho nascido na constância do m atrim ônio (arts. 178, § § 3 ° e 4o, I, e 344); h) Perda de terreno pela avulsão (arts. 178, § 6°, XI, e 541-542); i) A ceitação form al da herança (art. 1.584); j ) Separação dos patrim ônios, do defunto e dos herdeiros (art. 1.769, § 2o); l) Exclusão de herdeiro indigno (art. 178, § 9o, IV); m) Revogação de doação por ingratidão (arts. 178, § 6o, 1, e 1.184); n) Prazo para desobrigar ou reivindicar bens onerados ou vendidos ilegal­ m ente pelo pai e pertencentes a filho m enor (art. 178, § 6o, III e IV); o) Pacto de m elhor com prador, no contrato de com pra e venda (art. 1.158, parágrafo único); p) Preferência atribuída ao condôm ino, em caso de alienação de parte da coi­ sa com um (art. 1.139); q) Vício redibitório em m óvel, suprim ento de preço, etc. (art. 178, § 5o, IV); r) Vício redibitório em coisa m óvel (art. 178, § 2o); s) C láusula de resgate, em com pra e venda (arts. 178, § 8°, e 1.141); t) Rem issão de im óvel hipotecado (art. 815); u) Responsabilidade do em preiteiro pela solidez e segurança da construção (art. 1.245); v) Interdito possessório (art. 523); x) Prazo para o inventário (art. 1.770); y ) Prazo para aceitar proposta de contrato (art. 1.081, III); z) Direito de preem pção (art. 1.153); aa) Escusa de tutela (art. 416); bb) Prazo para propor ação rescisória (art. 178, § 10°, VIII); cc) Prazo para exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio (art. 576). Encontram -se no Direito Com ercial os seguintes casos de decadência: a) Responsabilidade do transportador por dim inuição ou avaria em gêneros a ele confiados (Código, art. 109); b) Vício redibitório (Código, art. 211); c) Prazos concernentes ao pagam ento de cam bial ou nota prom issória, e no protesto dos referidos títulos de crédito (Lei Cam bial, D ecreto n° 2.044, de ' de dezem bro de 1908, arts. 20, 21, 22, 26, 28, 30 e 32); d) Prazos de pagam ento, etc., concernentes ao cheque (Lei sobre i el;iç:io e as regras aplicáveis em geral, conforme a espécie jurídica de que se trata364 ( I ) A teoria orientadora do exegeta não pode ser única e universal, a m esm a para iodas as leis, imutáveis no tempo; além dos princípios gerais, observáveis a respeito de quaisquer normas, há outros especiais, exigidos pela natureza das regras jurídicas, \ .11 lável conform e a fonte de que derivam, o sistema político a que se acham ligadas e as categorias diversas de relações que disciplinam. O que não partir desse pressu­ post o, 1’s scncial à boa Hermenêutica, incidirá em erros graves e freqüentes (2). As disposições de Direito Público se não interpretam do m esm o m odo que as do Direito Privado; e em um e outro ainda os preceitos variam conform e o ramo particular a que pertencem as norm as: os utilizáveis no C onstitucional diferem dos em pregados no Crim inal; no C om ercial não se procede exatam ente com o no Civil, e, no seio deste, ainda a exegese dos contratos e das leis excepcionais se exercita m ediante regras especiais (3).

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357 - (1) Emílio Caldara - Interpretazione delle Leggi, 1908, n2 166; Francesco Degni L'interpretazione delia Legge, 2- ed., 1909, p. 8, n2 6. (2) Degni op. cit., p. 44. (3) Sabino Jandoli - Sulla Teoria delia Interpretazione delle Leggi con Specialc Riguardo alie Correnti M etodologische, 1921, p. 36-38; Paula Batista - Compêndio de Hem irnêutica Jurídi­ ca, S8 ed., 79; Degni, op. cit., p. 9 20.

DIREITO CONSTITUCIONAL

358 - O grau menos adiantado de elaboração científica do Direito Público, a am plitude do seu conteúdo, que menos se presta a ser enfeixado num texto, a grande instabilidade dos elementos de que se cerca, determ inam um a técnica especial na fei­ tura das leis que compreende. Por isso, necessita o hermeneuta de m aior habilidade, competência e cuidado do que no Direito Privado, de mais antiga gênese, uso mais freqüente, modificações e retoques m ais fáceis, aplicabilidade m enos variável de país a país, do que resulta evolução mais completa, opulência m aior de materiais científi­ cos, de elemento de certeza, caracteres fundamentais m elhor definidos, relativamente precisos. Basta lembrar como variam no Direito Público até m esm o as concepções básicas: relativas à ideia de Estado, Soberania, Divisão de Poderes, etc.365 (1 ). A técnica da interpretação m uda, desde que se passa das disposições ordiná rias para as constitucionais, de alcance m ais am plo, por sua própria natureza e em virtude do objetivo colim ado redigidas, de modo sintético, em term os gerais (2). Deve o estatuto supremo condensar princípios e norm as asseguradoras do pro gresso, da liberdade e da ordem, e precisa evitar casuística m inuciosidade, a lim de se não tornar dem asiado rígido, de perm anecer dúctil, flexível, adaptável a épocas e circunstâncias diversas, destinado, com o é, a longevidade excepcional. Quanto m ais resum ida é um a lei, m ais geral deve ser a sua linguagem e maior, portanto, a necessidade, e tam bém a dificuldade, de interpretação do respectivo texto (3). 359 - A força do costu m e avulta no Direito Público; ali ele se form a com frequência m aior e exerce em larga escala o seu papel de tornar m ais hum ana, m elhorar sutilm ente e com pletar as disposições escritas. M erece, por esse m otivo, atenção particular; pois chega a reduzir a sim ples form alidades, sem alcance práli co, até alguns trechos perem tórios366 ( 1).

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3 5 8 - (1 ) Degni, op. cit., p. 9. (2) Filomusi G u elfi-E n ciclo p éd ia Giuridica, 5 a ed., p. 150-151; Campbell B lack-H an dbook on the Construction and Interpretation o f the Laws, 2a ed., p. 18. (3) C. Maximiliano - Comentários à Constituição Brasileira, 5a ed., nos 69 e segs.; Bryce The American Commonwealth, 3a ed., vol. I, p. 372. 359 - (1) Degni, op. cit., p. 9. Vede a dissertaçfio Reforma da lei, nui 344-346. O Costume não tem a influência acima dcsc ilt.i, n iii.iin iii timinal do Direito Público,

.>**. i v i . i A i i i i i i i n i i o

360 Por outro lado, as leis fundamentais devem ser mais rigorosam ente olirigatórias do que as ordinárias, visto pertencerem , em geral, à classe das im­ perativas e dc ordem pública; ao passo que as com erciais e as civis se alinham , em regra, entre as perm issivas e de ordem privada; aquela circunstância obriga o hermeneuta a precauções especiais e à observância de reservas peculiares à espécie jurídica. A própria Freie Rechtsfindung m oderada, a escola da Livre-indagação proeter legem , escrupuliza em transpor as raias do D ireito Privado367 (1). W>I O I )ireito C onstitucional apoia-se no elem ento político, essencialm ente mstável, a esta particularidade atende, com especial e constante cuidado, o exegela. Naquele departam ento da ciência de Papiniano preponderam os valores ju ríd i­ co sociais. I )ovem as instituições ser entendidas e postas em função de m odo que coiicspoiidam às necessidades políticas, às tendências gerais da nacionalidade, à ( ooidcnaçáo dos anelos elevados e justas aspirações do povo368 (1). W) ’ A diferença entre os dois grandes ram os do Direito estende-se até os dados lilológicos. lim geral, no D ireito Público se em prega, de preferência, a linf',na)',cm técnica o dizer jurídico, de sorte que, se houver diversidade de significado di* m esm o vocábulo, entre a expressão científica e a vulgar, inclinar-se-á o herm eneula no sentido da primeira. A o contrário, o Direito Privado origina-se de costu­ mes formados por indoutos, visa disciplinar as relações entre os cidadãos, fatos ocorridos no seio do povo; é de presum ir haja sido elaborado de modo se adapte integralm ente ao meio para o qual foi estabelecido, posto ao alcance do vulgo, vazado em linguagem com um 369 (1). 363 Por ser a C onstituição tam bém um a lei, que tem apenas m ais força do que as outras às quais sobreleva em caso de conflito, contribuem para a inteligên­ c i a da m esm a os processos e regras de H erm enêutica expostos com um ente para o I )ireito Privado: o elem ento filológico, o histórico, o teleológico, os fatores so­ ciais, etc.370 (1). Entretanto, por causa do objetivo colim ado e do fato de abranger matéria vastíssim a em um com plexo restrito, nem sem pre se resolvem as dúvidas

t(. 1 360 - (1) Max Gmür - D/e Anwendung des Rechts nach Art. I des Schwelzerischen Zivilgesetzbuches, 1908, p. 134. Vede a dissertação - p o d e - d e v e , e o capítulo - Leis de ordem pú blica..., nul 251-256. ItiH 361 - (1) Degni, op. cit., p. 9. Robert de Ruggiero, Prof. da Universidade de Roma - Istituzione di Diritto Civile, 7a ed., vol. I, § 17, p. 124, expende este ensinamento: "Inspira-se a interpretação em critério menos rígido, no Direito Constitucional e no Administrativo, nos quais predomina o elemento político, do que resulta maior mutabilidade nas relações e nos conceitos." I(>9 362 - (1) E. R. Bierling, Juristische Prinzipienlehre, 1911, vol. IV, p. 214-215. 110 363 - (1) Bierling, vol. IV, p. 256-257. (2) Endlich - A Commentary o f the Interpretation o fSta tu tes, 888, § 506.

Direito Constitucional

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ou se atinge o alcance preciso das disposições escritas com aplicar os preceitos da vulgar exegese jurídica, adequados a leis m inuciosas, relativam ente m ais per­ feitas e destinadas a fins particulares m ais ou m enos efêm eros. D entre as próprias regras clássicas, algum as se em pregam especialm ente e de m odo peculiar, à inter­ pretação constitucional. Existem preceitos que só servem para o D ireito Público. H á m ister fixá-los e com preendê-los bem (2). São eles, em seguida, expostos e explicados; aclara-se, tam bém , o uso particular que algum as regras interpretativas das leis ordinárias têm na exegese do estatuto básico. 364 - I. O C ódigo fundam ental tanto prevê no presente com o prepara o fu­ turo. Por isso ao invés de se ater a um a técnica interpretativa exigente e estreita, procura-se atingir um sentido que torna efetivos e eficientes os grandes princípios de governo, e não o que os contrarie ou reduza a inocuidade371 (1). Bem observa Story: “O governo é um a coisa prática, feita para a felicidade do governo hum ano, e não destinada a propiciar um espetáculo de uniform idade que satisfaça os planos de políticos visionários. A tarefa dos que são cham ados a exercê-lo é dispor, providenciar, decidir; e não debater; seria pobre com pensação haver alguém triunfado num a disputa, enquanto perdíam os um império; termos reduzido a m igalhas um poder e ao m esm o tem po destruído a R epública” (2). 365 - II. Forte é a presunção da constitucionalidade de um ato ou de um a interpretação, quando datam de grande núm ero de anos, sobretudo se foram con­ tem porâneos da época em que a lei fundam ental foi votada. Minime sunt mutanda, quoe interpretationem certam sem per habuerunt372 (1). Todavia o princípio não é absoluto. O estatuto ordinário, em bora contem po­ râneo do Código suprem o, não lhe pode revogar o texto, destruir o sentido óbvio, estreitar os limites verdadeiros, nem alargar as fronteiras naturais (2). Recorda Story várias interpretações e plausíveis conjeturas triunfantes nos prim eiros anos de prática constitucional e totalm ente abandonadas depois (3). O bservou-se no B rasil o m esm o fato: exempli gratia - por quantos estádios passou, entre nós, até a vitória da doutrina sã e definitiva, a inteligência do dispositivo que assegura as im unidades parlam entares!

371 372

364 - (1) Endlich, op. cit., § 458; Black, op. cit., p. 17-18. (2) Joseph Story - Commentaries on the Constitution o f the United States, 5a ed., vol. I, § 456. 365 - (1) Paulo, no Digesto, liv. I, tít. III, frag. 23; J. G. Sutherland - Statutes and Statutory Construction, 2a ed., vol. II, 476. Vede ns 303. (2) Willoughby - On the Constitution, 1910, §§ 11 e 12; Cooley - Constitutional Limitations, 1903, p. 103. (3) Story, vol. I, § 407, nota 1.

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366 - III. Todas as presunções m ilitam a favor da validade de um ato, legisla­ tivo ou executivo; portanto, se a incom petência, a falta de jurisdição ou a incons­ titucionalidade, em geral, não estão acima de toda dúvida razoável, interpreta-se e resolve-se pela m anutenção do deliberado por qualquer dos três ram os em que se divide o Poder Público. Entre duas exegeses possíveis, prefere-se a que não infirm a o ato de autoridade373 (1). O portet ut res plus valeat quam pereat. Os tribunais só declaram a inconstitucionalidade de leis quando esta é evi­ dente, não deixa m argem a séria objeção em contrário. Portanto, se, entre duas interpretações m ais ou m enos defensáveis, entre duas correntes de ideias apoiadas por jurisconsultos de valor, o Congresso adotou um a, o seu ato prevalece. A bem da harm onia e do m útuo respeito que devem reinar entre os poderes federais (ou estaduais), o Judiciário só faz uso da sua prerrogativa quando o C ongresso viola claram ente ou deixa de aplicar o estatuto básico, e não quando opta apenas por determ inada interpretação não de todo desarrazoada (2). 367 - IV. Sem pre que for possível sem fazer dem asiada violência às palavras, interprete-se a linguagem da lei com reservas tais que se torne constitucional a m edida que ela institui, ou disciplina374 ( 1).

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366 - (1) Bryce, vol. I, p. 397; Black, op. cit., p. 105-118 e 334-335. Vede n2 304. (2) "É um dever de justo respeito à sabedoria, à integridade e ao patriotismo do corpo le­ gislativo pelo qual passou uma lei, presumir a favor da sua validade, até que a violação do Código fundamental seja provada de maneira que não reste a m enor dúvida razoável (Cooley, op. cit., p. 254: as palavras acima de toda dúvida razoável - beyorid ali reasonable doubt encontram-se em todos os comentadores do estatuto norte-americano). Até 1911, isto é, durante 124 anos, a Corte Suprema dos Estados Unidos julgou inconstitucio­ nais 33 atos do Congresso Federal e 248 leis estaduais ou municipais (Everett Kimball - The

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National Governm ent o f the United States, 1920, p. 410). A inconstitucionalidade foi alegada em 1.138 litígios, dos quais apenas 218 versava sobre deliberações do Poder Legislativo Na­ cional. Percebe-se que o povo, temeroso dos escrúpulos da magistratura em relação ao julga­ mento das resoluções dos outros poderes fed erais, raramente se afoita a negar a validade das mesmas; e, ainda assim, os casos de vitória para os argüidores de inconstitucionalidades não passam de 15%. Não se observa, nem parece lógico igual rigor em se tratando de atos de au­ toridades regionais; por isso avultam os pleitos contra estes; e os triunfos dos impugnadores elevam-se a 25 l!2 % das ações propostas com o intuito referido. A Corte Suprema, por alvedrio seu, espontâneo, só admite o pronunciamento da inconstitu­ cionalidade, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros; e, ainda assim, mostra a maior repugnância e discreta reserva ao ter de declarar irritas quaisquer deliberações do Congresso Nacional. Apesar disso, e talvez porque houvesse, depois de 1904, pequeno aumento anual de casos vitoriosos contra a Legislatura da Federação, e maior contra as estaduais, bastante se avolumou a corrente limitadora da prerrogativa do Judiciário, e multiplicaram-se as sugestões para restringir a possibilidade de anulação de atos das Câmaras (William Meiga - The Relation o f the Judiciary to the Constitution, 1919, p. 240; Haines - The Am erican Doctrine o f Judicial Suprem acy, 1914, p. 320-353; Kimball, op. cit., p. 410). 161 ( I ) Wllloughby, professor da Universidade de John Hopkins, vol. I, p. I Y

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368 - V. A constitucionalidade não pode decorrer só dos motivos da lei. Se o parlam ento agiu por m otivos reprovados ou incom patíveis com o espírito do Có­ digo supremo, porém a lei não é, no texto, contrária ao estatuto básico, o tribunal abstém -se de a condenar375 (1). 369 - V I . Existe a inconstitucionalidade/ór/na/ alegável em todos os países e decorrente do fato de não ter o projeto de lei percorrido os trâm ites regulares até a publicação respectiva; e a intrínseca ou substan cial relativa à incom patibilidade entre o estatuto ordinário e o suprem o, da qual os tribunais brasileiros, argentinos, m exicanos e norte-am ericanos tom am conhecim ento, porém não pode ser ventila­ da nos pretórios europeus, em geral376 ( 1). 370 - VII. Em bora as expressões nas leis suprem as sejam, mais do que nas ordinárias, vazadas em linguagem técnica, nem por isso entenderão aquelas como escritas em estilo arrevesado e difícil, inacessível à maioria, e, sim, em termos claros, precisos. N ão se resolve contra a letra expressa da Constituição, baseado no elem ento histórico ou no cham ado Direito natural. Cum pre-se o que ressalta dos term os da norm a suprema, salvo o caso de forte presunção em contrário: às vezes o próprio contexto oferece fundam ento para o restringir, distender ou, sim plesm ente, determ inar377 ( 1). Não podem os tribunais declarar inexistente um decreto, legislativo ou exe­ cutivo, apenas por ser contrário aos princípios da justiça, às noções fundamentais do Direito: é de rigor que viole a C onstituição, im plícita ou explicitam ente (2). Lm todo caso, do exposto se não conclui que o só elem ento filológico baste para dar o verdadeiro sentido e alcance das disposições escritas (3).

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3 6 8 - (1 ) Cooley, Professor da Universidade de Michigan, op. cit., p. 257; Willoughby, vol. I, |> IH. 369 - (1) A. Esmein. Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Paris l lr m r n l•• de Droit Constitutionnel Français et Comparé, 7ã ed., 1921, vol. I, p. 538, 586-660 e not.i 94; Racioppi & Brunelli - Commento alio Statuto dei Regno, 1909, vol. III, §§ 754-757. Também adotaram, neste particular, o modelo dos Estados Unidos: o Canadá, Austrália, Repú blica da África do Sul, Nova Zelândia, Bolívia, Colômbia, Venezuela, Cuba e Rumânia (Meigs,

op. cit., p. 12). Houve quem sustentasse no Congresso este despautério: pode-se, no Brasil, argüir de incons titucional uma lei, por haver antinomia entre os seus dizeres e os do Código supremo; mas ,i ninguém é licito deixar de cumprir e aplicar a norma promulgada, unicamente porque a mes ma não é o fruto de um processo parlamentar acorde com o texto fundamental. Quem pode o mais, pode o menos; àquele a quem compete pronunciar a inconstitucionalidade substanciai, logicamente incumbe decretar a formal, que, aliás, decorre da inobservância dos arts. 67 a 72 do estatuto básico de 1946. Vede o capítulo - Exegese e critica, n2 46-47. 377 370 - (1) Willoughby, vol. I, § 17, Cooley, op. cit., p. 89. (2) Willoughby, vol. 1, § 25 e nota 47. (3) Vede o capítulo l lem ento filológico.

Mermíinêutlc.i e Aplle.içflo do Direito | Carlos Maximiliano

3 7 1 VIII. O elem ento histórico auxilia a exegese do C ódigo básico, m antida a cautela de só atribuir aos debates no seio da Constituinte o valor relativo que se deve dar, em geral, aos trabalhos parlam entares378 (1). A história da Constituição e a de cada um dos seus dispositivos contribuem para se interpretar o texto respectivo. Estudem -se as origens do Código fundam en­ tal, as fontes de cada artigo, as causas da inserção das diversas providências na lei, os fins que se tiveram em m ira ao criar determ inado instituto, ou vedar certos atos. Tente-se com preender o estatuto brasileiro à luz da História e da evolução dos princípios republicanos; exam ine-se quais as ideias dom inantes na época do advento do novo regim e, o que se pretendeu m anter, o que se preferiu derrocar. C om pare-se o texto vigente com a C onstituição Im perial e a dos Estados U nidos, não olvidando que o espírito destas duas, bem com o os casos da com m on Law e Equity, colhidos em clássicos e brilhantes com entários, guiam o escrupuloso intér­ prete da lei básica de 24 de fevereiro de 1891 (2). E de rig o r o recurso aos Anais e a outros docum entos contem porâneos, a fim de apurar qual era, na época da C onstituinte, a significação verdadeira e geralm en­ te aceita dos term os técnicos encontrados no texto (3). 372 - IX. Q uando a nova C onstituição m antém , em alguns dos seus artigos, a m esm a linguagem da antiga, presum e-se que se pretendeu não m udar a lei nes­ se particular, e a outra continua em vigor, isto é, aplica-se à atual a interpretação aceita para a anterior. O texto do C ódigo fundam ental do Im pério e os respectivos com entários facilitam a exegese do estatuto republicano, assim com o o Direito inglês é invocado pelos publicistas dos Estados U nidos. A inda mais: os direitos assegurados pela Constituição antiga prevalecem , na vigência da nova, nos pontos em que esta não revogou aquela379 (1). 373 X. A C onstituição aplica-se aos casos m odernos, não previstos pelos qm' a elaboraram . Faz-se m ister supor que os hom ens incum bidos da nobre tarefa “de distribuir os poderes em anados da soberania popular e de estabelecer preceitos pai a a perpétua segurança dos direitos da pessoa e da propriedade tiveram a sabe­ doria de adaptar a sua linguagem às em ergências futuras, tanto com o às presentes; de sorte que as palavras apropriadas ao estado então existente da com unidade e

UH

371 - (1) Vede o capítulo - Elem ento histórico, n9 148 e segs.

119

(2) "Os estatutos dos povos cultos e especialmente os que regem as relações jurídicas da República dos Estados Unidos da América do Norte, os casos de Common Law e Equity serão também subsidiários da jurisprudência e processo federais" (Decreto n9 848, de 11 de outu­ bro de 1890, art. 387). (1) Willoughby, vol. I, § 14, exemplifica: "Leis retroativas, habeas corpus, forma republicana de governo, impostos, comércio, etc." 3 7 2 - (1 ) Cooley, op. cit., p. 96-97.

D ire ito C o n s titu c io n a l

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ao m esm o tem po capazes de ser am pliadas de m odo que abranjam outras relações m ais extensas não devem ser afinal restringidas ao seu m ais óbvio e im ediato sen­ tido, se, de acordo com o objetivo geral dos autores e os verdadeiros princípios do contexto, podem elas ser estendidas a diferentes relações e circunstâncias criadas p or um estado aperfeiçoado da sociedade”380 (1). Cum pre ao legislador e ao juiz, ao invés da ânsia de revelar inconstitucionalidades, m ostrar solicitude no sentido de enquadrar na letra do texto antigo o institu­ to moderno. Só assim é possível perdurar cento e quarenta anos um a Constituição, com o a norte-am ericana, e um terço de século outra, que foi a brasileira de 1891. D ependem a felicidade, a paz e o progresso do país de que tais leis se não alte­ rem, nem substituam com frequência Enquanto a França foi dom inada pelo prurido de reform as constitucionais, não houve ali governo estável, poder pacificam ente transm itido, tranqüilidade, riqueza (2). A Constituição é a égide da paz, a garantia da ordem , sem a qual não há progresso nem liberdade. Forçoso se lhe tom a acom panhar a evolução, adaptar-se às circunstâncias im previstas, vitoriosa em todas as vicissitudes, porém , quanto possível, inalterada na forma. 374 - XI. Q uando a C onstituição confere poder geral ou prescreve dever franqueia tam bém , im plicitam ente, todos os poderes particulares, necessários para o exercício de um , ou cum prim ento do outro381 (1).

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373 - (1) Story, vol. I, § 456, nota a. Até mesmo aqueles que ainda reduzem a exegese a uma pesquisa de vontade, não m.ils procuram saber só o que o legislador quis; acham dever cumprir-lhe também saber o que ele quereria, se vivesse na atualidade e se lhe deparasse a hipótese em apreço (Wach, Bindlnu e Kohler, apud Ludwig Enneccerus - Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts, 15a ed., 192 I , vol l, |i 110). Vede o capítulo - Vontade do legislador, n25 25, 28, 32 e 34. O Direito romano, cujo prestígio só há pouco entrou em declínio, tem suprido as dellí l('ni l.r. da legislação moderna em litígios sobre estradas de ferro e outros assuntos de que se n:io poderia ter cogitado diretamente na Cidade Eterna. (2) Com atribuir sempre os seus males ao estatuto básico, a França reformava-o com (requI•Ie11 v«i do interesse público (fim social do im posto) e a decretação pelos represen­ t ai d e s do povo. Ressalvados estes requisitos precípuos, nenhum a outra restrição ao ji o d e i de tributar se presume: só prevalece quando se dem onstra existir, explícita o u im plicitam ente, no âm ago de um a regra positiva (4). 400 Explicado o m odo de entender a faculdade de distribuir pelo povo os encargos pecuniários do erário, cum pre fazer saber agora com o se interpretam os textos em que o legislador usa daquela prerrogativa soberana. I. 1’ressupõe-se ter havido o m aior cuidado ao redigir as disposições em que se estabelecem im postos ou taxas, designadas, em linguagem clara e precisa, as pessoas e coisas alvejadas pelo tributo, bem -determ inados o modo, lugar e tempo do lançam ento e da arrecadação, assim com o quaisquer outras circunstâncias refei enles à incidência e à cobrança. Tratam -se as norm as de tal espécie com o se foram

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399 - (1) Charles Beard - Am erican Governm ent and Politics, 3 S ed., 1920, p. 358; Thomas Cooley - A Treatise on the Law o f Taxation, 3- ed., p. 178 e 180. (2) Willoughby - The Constitutional Law o f the United States, 1910, vol. I, §§ 23 e 33; Judson, op. cit., § 59; Kimball, op. cit., p. 39 e 357. (3) J. G. Sutherland - Statutes an dStatutory Construction, 2® ed., vol. II, § 541; Campbell Black Handbook on the Construction and Interpretation o f the Laws, 2a ed., p. 501-503; Cooley, vol. I p. 455, 466-468, e notas respectivas. Prevalece a regra de exegese estrita, quer as transferências do poder de tributar se deem em caráter permanente, quer decorram de leis ordinárias, concessões, ou convênios: nunca se presum e o intento de abrir mão de direitos inerentes à autoridade suprema. Vede C. Maximiliano - Comentários, etc., n® 168 e segs. (4) Blai k Constitutional l aw, nul452-453; Willoughby, vol. I, 23 e 33; Cooley, vol. I, |>. 177 178. Iodas as presunçOes se Im llnam a lavor do exercício Ilimitado da l.n uldttde de lilbutar.

Leis Fiscais

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rigorosam ente taxativas; deve, por isso, abster-se o aplicador de lhes restringir ou dilatar o sentido. M uito se aproxim am das penais, quanto à exegese; porque en­ cerram prescrições de ordem pública, im perativas ou proibitivas, e afetam o livreexercício dos direitos patrim oniais. Não suportam o recurso à analogia, nem a in­ terpretação extensiva; as suas disposições aplicam -se no sentido rigoroso, estrito. Também no cam po do Direito Fiscal se observa, com as reservas j á enuncia­ das, o brocardo célebre - In dubio pro reo, ou o seu sem elhante - In dubio contra fiscum : “N a dúvida, contra o fisco”407 (1). O contraste m erece especial registro: quando se trata de com petência para decretar ônus fiscais, decide-se, na dúvida, pelo poder de tributar; quando se inter­ preta lei de im postos, observa-se o inverso - opina-se, de preferência, a favor do contribuinte e contra o erário. Presum e-se o direito de lançar taxas; não se presu­ m e o lançamento. 401 - II. Entretanto não se interpreta a lei tendo em vista só a defesa do con­ tribuinte, nem tam pouco a do Tesouro apenas. O cuidado do exegeta não pode ser unilateral: deve m ostrar-se equânim e o herm eneuta e conciliar os interesses em m om entâneo, ocasional, contraste408 ( 1). N ão atende som ente à letra, nem se deixa dom inar pela preocupação de res­ tringir, resolve de modo que o sentido prevaleça e o fim óbvio, o transparente objetivo seja atingido. O escopo, a razão da lei, a causa, os valores jurídico-sociais

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4 0 0 - (1) Karl Wurzel - Das Juristische Denken, in "Oesterreichisches Zentralblatt für die Juristische Praxis", vol. 2 1 , p. 6 7 4 , nota 4 ; Bernardino Carneiro - Primeiras Linhas de Hermenêutica Jurídica e Diplomática, 2§ ed., § 5 3 ; Sutherland, vol. II, §§ 5 3 6 - 5 3 7 ; Cooley, vol. I, p. 4 5 3 - 4 5 6 ; Degni, op. cit., p. 2 3 , nota 2; Pacifici-Mazzoni, vol. I, ns 2 1 ; Caldara, op. cit., n“ 1 9 9 - 2 0 1 ; Vander Eycken, op. cit., p. 3 2 1 ; Paula Batista, op. cit., §§ 4 6 - 4 7 . Vede o capítulo Leis Penais, n9 3 9 3 . Aplica-se o brocardo - In dubio contra fiscum - som ente às disposições taxativas que decre­ tam impostos, e assim mesmo quanto a regras gerais, não quanto às exceções, que se resol­ vem, na dúvida, a favor do fisco. Exemplo do último caso: as isenções de impostos previstas na própria lei que os institui (ns 4 0 2 ). Opostas ao in dubio contra fiscum , até hoje universalmente vitorioso na jurisprudência, des­ pontam objeções no campo da doutrina, fundadas em não ser, hoje, o tributo uma imposição arbitrária e talvez caprichosa de potentado, como outrora; porém a conseqüência do reco­ nhecimento espontâneo de um dever para com a pátria e a sociedade feito pelos próprios contribuintes: estes, representados pelos seus eleitos, decretam o ônus para si próprios, con­ sentem no lançamento, apoiam-no de antemão. Tal parecer não granjeou maioria entre os teóricos do Direito; o brocardo prevalece ainda, atenuado, embora, como o in dubio pro reo (Mantellini - Lo Stato e il Codice Civile, vol. I, p. 2 3 3 e segs.; Benvenuto Griziotti - Principii di Politica, Diritto e Scienza delle Finanze, 1 9 2 9 , p. 2 0 0 - 2 0 6 ; Ezio Vanoni - Natura ed Interpretazione delle Leggi Tributarie, 1 9 3 2 , p. 3 -3 5 ). 401 - (1) Black - On Interpretation, p. 517-518; Cooley, vol. I, p. 460-461. (2) Black - On Interpretation, p. 520-521; Sutherland, vol. II, § 537; Cooley, vol. I, |>, 449, 452, 462-463.

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I ler menôutica e ApllcaçSo do Direito | Carlos Maximiliano

(nilio legis, dos rom anos; Wertuteil, dos tudescos) influem mais do que a lingua­ gem, inliel transm issora de ideias. Experimenta, em suma, o intérprete os vários processos de Hermenêutica; abslém-se de exigir mais do que a norm a reclama; porém extrai, para ser cumprido, tudo, absolutamente tudo o que na m esm a se contém. Se depois desse esforço ainda persiste a dúvida, aplica afinal a parêmia, resolve contra o fisco e a favor do contribuinte (2). 102 111. O rigor é m aior em se tratando de disposição excepcional, de isenç o e s ou abrandam entos de ônus em proveito de indivíduos ou corporações. Não se presume o intuito de abrir m ão de direitos inerentes à autoridade suprema. A outor)’,a deve ser feita em term os claros, irretorquíveis; ficar provada até à evidência, e s e nào estender além das hipóteses figuradas no texto; jam ais será inferida de fatos s termos verdadeiramente técnicos entendem-se na acepção técnica. Se, apesar de todas estas precauções, a luz se não faz, completa, satisfatória, sobre a verdadeira in­ teligência do ato, ou cláusula, empregam-se outros recursos da Herm enêutica428 (1). LI VI Toma em apreço o exegeta os costum es e usos do País, Estado ou M unicípio; l i em com o os recebidos, quer na profissão dos contraentes, quer no |m‘iicio dc negócios dc que se trata; atende igualm ente aos hábitos, afeições e prefeo in i.is do estipulante; às relações dos interessados, às suas condições financeiras e i lasse social; ao estado, situação e natureza da coisa que é objeto do ato jurídico; a s i ii. unslàncias em que se propôs, celebrou e com eçou a executar o pacto, ou icsolvcu la /e r o testam ento429 (1). ■122 V11. Iúnpregue-se o processo sistem ático, experim entado já na H erm enenlica geral: considera o ato com o um todo, sem incoerências nem contradições; com para com as dem ais a frase duvidosa, e do conjunto das disposições deduz o sentido de cada uma. As cláusulas sobre cuja significação os interessados não chegaram a acordo, interpretam -se pelas que não despertaram divergência; com harm onizar as antecedentes com as subsequentes, explicam -se as am bíguas430 (1).

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410 (1) Ribas, vol. II, p. 422-423; Lacerda de Almeida, op. cit., p. 274; Coelho da Rocha, vol. I, § 110; Trigo de Loureiro, vol. II, § 413; Código Comercial, art. 130; Puchta, op. cit., § 66; Clarck, op. cit., p. 502-503; Biermann, vol. I, p. 166-167; Bierling, vol. IV, p. 247-248; Gmür, op. cit., p. 19 e nota 2; Endemann, vol. III, parte I, p. 252; Enneccerus, vol. I, p. 530 e 533; Krasnopolski, vol. V, p. 120; Heinrich Dernburg - Das Bürgerliche Recht des Deutschen Reichs und Preussens, V ed., vol. V, § 42, VI, e nota 6; Koehne & Feist, vol. I, § 78, p. 150; Crome, vol. V, p. 90, § 652 e nota 18, Leonhard - Erbrecht, p. 236, II, 6. a? I (1) Espinola, vol. II, p. 675; Ribas, vol. II, p. 422; Coelho da Rocha, vol. I, § 110; Mackeldey, op. cit:., § 188; Correia Teles, vol. I, n9 384; Código Comercial, arts. 130 e 131, IV; Miraglia, vol. I, p. 460; Dias Ferreira, vol. II, nota ao art. 684; Giorgi, vol. IV, p. 199-200; Chironi, vol. I, p. 114; Schneider & Fick, vol. I, p. 26-27; Parsons, vol. II, p. 655; Bierling, vol. IV, p. 248; Biermann, vol. I, p. 167; R u m p f- Gezetz und Richter, 1906, p. 177; Kipp, Prof. da Universidade de llei llm, vol. V, § 42, nota 6; Koehne & Feist, vol. I, p. 150, § 78; Alves Moreira - Instituições do D irrlto Civil Português, vol. II, Das Obrigações, 1911, p. 598-599. 417 ( I ) Lacerda de Almeida, op. cit., p. 273; Carlos de Carvalho, op. cit., art 785; Código Comeu lal, art. I 11, II, I splnota, vol. II, p. 676; Correia Teles, vol. I, nu I l l l ; lrÍKde I ourciro.

Interpretação de Atos Jurídicos

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423 - VIII. A Moral deve presidir à feitura de todos os atos jurídicos, e é, por isso, um guia do herm eneuta. Interpretam -se os contratos de acordo com os ditam es da lealdade e boa-fé; nem aqueles, nem os testam entos podem conter disposições contrárias à ordem pública nem aos bons costum es. N a hipótese de alguém 111:1111 festar um a vontade que efetivam ente não tinha, absolvem -no se agiu com intenção honesta e sincera; condenam , pelo m enos, a ressarcir perdas e danos, se procurou iludir ou causou prejuízo a terceiros. É possível e justo, porém m uito dillcil, vc rificar, por m eio das circunstâncias que rodearam o caso, hábitos do eslipulanle e outros m eios de prova, se houve engano reparável, bem com o se foi tom ado n sei h i um sim ples gracejo sem conseqüências prejudiciais a outrem 431 (1). 424 - IX. Entre duas exegeses verossím eis, prefere-se a que se aproxima dn regra geral fixada em norm a positiva. Na dúvida, presum e-se que as partes quiseram conform ar-se com a lei Assim pois, em contratos antenupciais opina-se pela com unhão de bens; no caso de ullimn vontade, pela sucessão legítima, em bora não especificado o direito á evu yfln o vendedor é obrigado a garanti-la ao com prador; as disposições expressai. implli nm a aceitação de uma conseqüência tácita quando necessária para a validade ou i li ciência das prim eiras; declarado o fim , em pregam -se os meios estabelecidos em li i ou costume para atingir àquele; se o objeto do ato é um a universalidade de >oLa com preende todas as coisas particulares que a universalidade abrange q u e i m i a i m ais, subentende-se tam bém querer o m enos; o acessório segue o |)t incipul" t I i 4 2 5 - X . Presum e-se que o estipulante, ou as partes, não ptclendeinm mu absurdo, nem convieram tam pouco em um ato, ou cláusula, sem eleito pintli ortcl ul h \ i.

Interpretação de Atos Jurídicos

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427 - XII. O riente-se o intérprete pelo fim econôm ico, prático ou afetivo que o estipulante, ou as partes, pretenderam atingir por m eio do ato jurídico ou da sim ples cláusula; ressalve o modo particular de utilidade que determ inou os interessados a convirem na obrigação; procure realizar, em conjunto e plenam en­ te, os objetivos colim ados pelo testador, ou por todos os contraentes. N ão é só na H erm enêutica legal que o processo teleológico m erece ficar no prim eiro plano e se lhe não conhece superior em eficácia435 ( 1). 428 - XIII. A conduta posterior e concorde dos estipulantes, que tiver relação com o objeto principal, será ótimo elemento para explicar o intuito dos interessados ao celebrarem o ato jurídico. Todavia a explicação resultante de palavras, ações ou omissões de uma das partes, no contrato, não pode ser invocada contra a outra431' (1). A lguns escritores cham am interpretação autêntica a esse processo (2); outros opõem restrições a sem elhante ideia, sobretudo por causa da força obrigatória, que lhes não parece existir com o na exegese autêntica das leis (3). O que é vedado relativam ente aos contratos, adm ite-se com o elem ento va­ lioso a respeito de testam entos: atos ou expansões posteriores de uma das partes m erecem registro, para esclarecer as disposições pela m esm a estabelecidas em b e­ nefício de herdeiro ou legatário seu (4). 429 - XIV. Se designaram a m oeda, peso ou m edida em term os im precisos que se aplicam a quantidades ou valores diversos, prefira-se o que seja de uso em atos de natureza igual ou sem elhante437 ( 1). 430 - XV. Para prevalecerem devem ser expressas as disposições de que re­ sulte fiança ou garantia, renúncia, cessão, transação, e interpretam -se estritam ente com o os contratos benéficos438 ( 1).

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427 - (1) Parsons, vol. II, p. 655; Maynz, vol. I, p. 475; Giorgi, vol. IV, p. 198; Miraglia, vol. I, p. 460; Biermann, vol. I, p. 167. 428 - (1) Carlos de Carvalho, op. cit., art. 286; Espínola, vol. II, p. 672, nota 352; Código Co­ mercial, art. 131, II; Clark, op. cit., p. 510; Puchta, op. cit., § 66; Pacifici-Mazzoni, vol. IV, n2 64; M. I. Carvalho de Mendonça - Contratos, vol. I, n5 31. (2) Coelho da Rocha, vol. I, § 110; Ribas, vol. II, p. 420-421; Lacerda de Almeida, op. cit., p. 272-273; Giorgi, vol. IV, p. 196-197. (3) Espínola, vol, II, p. 672; Windscheid, vol. I, p. 381 e nota 12; Clark, op. cit., 510; M. I. C. Mendonça - Contratos, vol. I, p. 31. (4) Kipp - Erbrecht, p. 60-61; Dernburg, vol. V, § 42, IX e nota 6; Koehne & Feist, vol. I, p. 150, §78. 429 - (1) Carlos de Carvalho, op. cit., art. 289; Código Comercial, art. 132. 430 - (1) M. I. Carvalho de Mendonça - Obrigações, vol. I, p. 668, e vol. II, p. 281; Lacerda de Almeida, op. cit., p. >!; Coelho da Rocha, vol. I, § 110; Mainz, vol. I, p. 476; Código Civil, art. 1.090; Clark, op. cit., p 'i()9

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Hermenêutica e ApllcaçSo do Direito | Carlos Maximiliano

431 X V I. Pode-se recorrer a um ato estranho, sobretudo quando a ele se fez referência no contrato ou no instrum ento revelador da últim a vontade; é tam bém eoiivinluivel buscar esclarecim entos no esboço, rascunho ou projeto de testam ento. I iitrelanlo, serve som ente este processo para explicar, jam ais para suprir ou com ­ pletai a declaração439 (1). I L2 XVII. Quando em um ato jurídico houver conflito entre a parte impressa e a i vi rilt /. prevalecerá a última, por dever traduzir melhor a vontade dos interessados, vislo i|iie foi leita adrede para exprimir a intenção do testador, ou dos contraentes440 (1). •I U X V111. A causa e os motivos m erecem o apreço do intérprete som ente quando mlluíram na vontade declarada, do estipulante, ou das partes441 (1). Ml

XIX Aplicam-se aos testam entos as regras seguintes: a) tem valor o

t e s t e m u n h o d e quem redigiu ou escreveu o ato jurídico442 (1); b) declarações feitas

p e lo ,/,', 7////.V propositada ou ocasionalm ente, não com pletam , m as explicam o ins........ eiilo (.’); ( I ) Beudant, Conselheiro da Corte de Cassação de França - Les Donatlons entre Vifs et le . lestam cnts, vol. II, 2° ed., 1934, n® 362; 1odovico Barassi, Prof. da Universidade i .iirtllc a de Mll.lo In Si/oess/one Icstnm m tarla, 1936, |>. 502; Perrenu U'i /ift/fllie ilr In lin h in n ilrn c r

Interpretação de Atos Jurídicos

287

b) toda obrigação restringe a liberdade; por esse m otivo, só prevalece quando provada cum pridam ente. In dubio pro libertate. Libertas omnibus rebus favorabilior est (Gaio, no Digesto, liv. 50, tít. 17, frag. 122). Se não estipularam com a n e­ cessária clareza o preço, opina-se pela m enor quantia; nos contratos de em préstim o resolve-se contra o m utuante ou prestam ista, em caso de dúvida razoável; nos de venda, em prol do com prador (2); c) todas as presunções m ilitam a favor do que recebeu, para assinar, um do­ cum ento já feito. Às vezes pouco entende do assunto e com um ente age com a m áxim a boa-fé: lê às pressas, desatento, confiante. E justo, portanto, que o elabo­ rador do instrum ento ou título sofra as conseqüências das próprias am bigüidades e im precisões de linguagem , talvez propositadas, que levaram o outro a aceitar o pacto por o ter entendido em sentido inverso do que convinha ao coobrigado. C asos freqüentes desta espécie de litígio verificam -se a propósito de apólices de seguros, e notas prom issórias. Palavras de uma proposta interpretam -se contra o proponente; de um a aceitação, contra o aceitante (3). Assim , pois, as dúvidas resultantes de obscuridade e im precisões em apólices de seguro interpretam -se contra o segurador. Presum e-se que ele conheça m elhor o assunto e haja tido inúm eras oportunidades práticas de verificar o mal rcsullanle di­ urna redação, talvez propositadam ente feita em term os equívocos, a lim tle alran a clientela, a princípio, e dim inuir, depois, as responsabilidades da em presa na ocasião de pagar o sinistro (4). 436 - XXL A lém das regras tradicionais, destinadas a esclarecer a intenção, expressa ou presumida, do estipulante, ou o sentido em que se efetuou o acordo das

en D roit P rivé, vol. II, p. 16-17; Laurent, Prof. da Universidade de Gand - P rincipes d c D roil

em 50 decisões judiciárias. O enunciado afinal, acima, desfaz a contradição aparente entre a regra exposta sob a letra a, do n9 435, e a exarada em o n9 424: na dúvida sobre se houve ou não liberalidade, é de opi nar pela prevalência desta. Entretanto há disposições dúbias, como, por exemplo, a seguinte: 'Deixo aos descendentes de B e aos colaterais de C." Observa-se em semelhante caso a grada Civil, 4-ã ed., vol. XIV, n9 163; William Borland - The Law o f W iils, p. 326-327, apoiado

ção estabelecida para a herança legítima. (2) Vede n9 313-L. (3) Lacerda de Almeida, op. cit., p. 275-276; Trigo de Loureiro, vol. II, § 647; Clóvis Beviláqua D ireito d a s O b rig a çõ es, 1896, § 76; Espínola, vol. II, p. 676; Ribas, vol. II, p. 423; M. I. Carvalho de Mendonça - O brig a ções, vol. II, ne 604; Correia Teles, vol. I, n9 388; Carlos de Carvalho, op. cit., art. 288; Código Comercial, art. 131, V; Pacifici-Mazzoni, vol. IV, n9 64; Chironi, vol. I, p. 174; Mackeldey, Prof. da Universidade de Bonn, op. cit., § 188; Maynz, vol. I, p. 475; Savigny - O b íig a tio n en rech t, vol. II, p. 193; Clark, op. cit., p. 508; Parsons, vol. II, p. 662-663; Rossel, vol. I, p. 52, n9 58; Schneider & Fick, vol. I, p. 27, ns 54; Krasnopolski, vol. II, p. 87. (4) Cesare Vivante - Trattato di D iritto C om m ercia le, 3- ed., vol. IV, n9 1.875; Clark - H andbook o f th e La w o f C o n tra cts, 3S ed., p. 508, n9 6; Aubry & Rau - C ours de D roit Civil Fra n ça is, 58 ed., vol. IV, li 141, nota 4.

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HermenèutU a e Apllcaç.lo do Direito | Carlos Maximiliano

vontades, guiam o hermeneuta o interesse geral, a lei, os princípios fundamentais da I t i s l i ç a , os ditames da equidade Não pode haver conflito entre as aspirações econô­ m i c a s do cidadão e a ordem jurídica estabelecida. O egoísm o é condicionado pela linalidade lutmana; o bem do indivíduo prevalece em função do conquistado evoluti­ vamente pela espécie. Respeita-se a vontade declarada; porém há de pairar bem -alta .1 ideia dc justiça. Assim se resolvem todas as dúvidas. Onde a intenção se não desco­ bre, nítida, precisa, em um ato revestido dos requisitos legais, orienta-se o magistrado pela equidade e pelo interesse social. Embora difíceis de apreender, nem por isso valem menos os dois elementos modernos de exegese dos atos jurídicos444 (1). 437 XXII. O contrato importa em uma restrição voluntária da liberdade; o testamento, em uma liberalidade espontânea; por isso não aproveitam nem obrigam além dos seus termos; na aplicação das cláusulas respectivas não há lugar para a ana/inriul, de m odo que afete apenas a perpetuidade de um a fração do dispositivo anlei i o i , contrariada, de frente, pelo posterior. lím resumo: sem pre se com eçará pelo Processo Sistem ático; e só depois de venlicai a inaplícabi 1idade ocasional deste, se proclam ará ab-rogada, ou derrogada, a norm a, o ato, ou a cláusula. 440 Q uando cessa em pa rte a autoridade da lei, ou d o ,costume, dá-se a derrogação; quando se extingue totalmente, é o caso de ab-rogação. Um term o C.eiiérico revogação abrange um a e outra hipótese448 (1). Derogatur legi, aut

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A l') (1) Sobre o assunto ainda existe outro capítulo, com a epígrafe - D isp o siçõ es c o n tra d i­ tórias. AAO (1) Eduardo Espínola - B re ve s A n o ta çõ e s ao Código Civil B ra sileiro , vol. I, 1918, p. 19; llorp.es Carneiro - D ireito Civil d e P ortu gal, 1826, vol. I, p. 51; Carlos de Carvalho - D ireito ( ivil Brasileiro Reco pila d o , art. 22; Clóvis Beviláqua - Teoria G era l do D ireito Civil, 1908, p. 59; leixeira de Freitas - V ocabulário Ju ríd ico , verbo A b -rog a çã o e D erro g a çã o ; Ferreira Borges - D ii ionárío Ju ríd ico -C o m ercia l 2- ed., verbo A b -rog a çã o e D erro g a çã o ; James Ballentine, Prof. da San Francisco Law School - A L a w D iction ary, 1916, verbo A b ro g a te e D eroga tu r, etc.; Bouvier La w D iction ary, 8 a ed., verbo A b ro g a tio n e D erog a tio n; Alves Moreira, vol. I, p. 20-21, ns 15. (1) Modestino, em o D igesto, liv. 50, tít. 16, frag. 102. (1) Espínola, vol. I, p. 20. I Is o texto do art. 4 2: "A lei só se re v o g a , ou derroga, por outra lei; mas a disposição especial n3o revoga a geral, nem a geral revoga a especial, senão quando a ela, ou ao seu assunto, se reterlr alterando-a explicita ou implicitamente." Seria desejável que assim começasse: "A lei só se a b -roga, ou derroga..."; ou, simplesmente: "A lei só si* revoga por outra lei, etc."

Revogação do Direito

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abrogatur. Derogatur legi, cum p a rs detrahitur; abrogatur legi, cum prorsus tollitur: “ Derroga-se ou ab-roga-se a lei: derroga-se quando um a parte da m esm a deixa de subsistir; ab-roga-se quando a norm a inteira perde o vigor” (2). O Código Civil Brasileiro, em um m esm o artigo (4o da antiga Introdução), de com eço em prega im propriam ente o verbo revogar com o oposto a derrogar; do prim eiro se utiliza depois com acerto, a fim de indicar, tanto os casos em que parte do disposto em lei cessa de obrigar em geral, com o aqueles em que a regra jurídica em sua totalidade perde a eficácia (3). 441 - A revogação é expressa, quando declarada na lei nova; tácita, quando resulta, im plicitam ente, da incom patibilidade entre o texto anterior e o posterior. O prim eiro caso é raro e de pouca im portância449 (1); dele se encontra exem plo no Código Civil, cujo artigo últim o, 1.807, reza: “Ficam revogadas as Ordenações, A lvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costum es concernentes às matérias de Direito Civil reguladas neste C ódigo.” Dá-se revogação expressa em declarando a norm a especificadam ente quais as prescrições que inutiliza; e não pelo sim ples fato de se achar no últim o artigo a fra­ se tradicional - revogam -se as disposições em contrário: uso inútil; superfetação, desperdício de palavras, desnecessário acréscim o! Do simples fato de se prom ulgar lei nova em contrário, resulta ficar a antiga revogada (2). Para que perderem tempo as Câm aras em votar m ais um artigo, se o objetivo do m esm o se acha assegurado pelos anteriores? N os textos oficiais se não inserem palavras supérfluas. 442 - Pode ser prom ulgada nova lei, sobre o m esm o assunto, sem ficar tacitam ente ab-rogada a anterior: ou a últim a restringe apenas o cam po de aplicação da antiga; ou, ao contrário, dilata-o, estende-o a casos novos; é possível até transfor­ m ar a determ inação especial em regra geral450 (1). Em suma: a incom patibilidade im plícita entre duas expressões de direito não se presume; na dúvida, se conside­ rará um a norm a conciliável com a outra. O jurisconsulto Paulo ensinara que - as leis posteriores se ligam às anteriores, se lhes não são contrárias; e esta últim a circunstância precisa ser provada com argum entos sólidos: Sed et posteriores leges a d priores pertinent, nisi contrarioe sint idque multis argumentis probatur (2).

449

450

441 - (1) Coviello - M a n u a te d i D iritto Civile ita lia n o , 2$ ed., vol. I, P- 94. (2) Alves M oreira, vol, I, p. 21: Espínola, vol. I, p. 22; Planiol - Traité E lé m e n ta ire d e D ro it Civil, 7 ã ed., vol. I, ns 228; Saredo - Trattato d e lle L eg g i, ns 810; Dalloz - R é p e rto ire , verbo Lo is ne 555; Raymundo Salvat - Tratado de D erecho Civil A rg e n tin o , P arte g e n e r a l ns 89. 442 - (1) Puchta - P an d ekten , 12§ ed., § 18. (2) D ig esto , liv. I, tít. 3, frag. 28. (3) Espínola vol. I, p. 22; Saredo, op. cit., n - 815-816. Vede o capítulo - Disposições contradi­ tórias, n25140-141. (4) Demolombe, vol. I, ns 126; Coviello, vol. I, p. 94; Planiol, vol. I, n® 228; Black - Handbook on the Construction and Interpretation o f the Laws, 2a ed., p. 355.

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H e rm enêutica e A plicação do D ire ito | Carlos M a xim ilia n o

Para a ab-rogação a incom patibilidade deve ser absoluta e formal, de modo ara sc não executarem certas disposições, com o, p. ex., a que autoriza a punir a m ulher adúltera, ou o m arido que tiver concubina teúda e m anteúda (3); porém, nem por isso é lícito considerar revogado o artigo de código, regulam ento ou norma especial (4). •152 X. C onsidera-se expressa ou tacitam ente ab-rogada a regra anterior, nao em dala da publicação da lei nova, e sim no dia em que esta se torna obrigatói ia (( Ynligo ( ivil, art. 2o, da antiga Introdução)460 (1). ■153 XI. Q uando o fim da lei é único e foi atingido, ela desaparece461 (1); assim acontece em se autorizando despesas ou diversas providências excepcionais, I ii o oeasião de guerra, peste, revolta, ou qualquer outra calam idade pública. Em riy.ru, entretanto, não se extinguem as norm as por haverem cessado os motivos ilas m esm as ou a ordem de coisas para a qual se legislou (2). M uitas vezes se torna difícil, senão impossível, descobrir a causa a razão da lei, e até o fim colim ado |iclos seus prolatores; raram ente figuram explicitam ente no título, no preâm bulo, ou em qualquer outro lugar. D em ais, pode a expressão de D ireito sobreviver ao seu m otivo principal, por perdurarem os secundários; talvez, ainda, novos m otivos supervenientes deem m argem à aplicação ju sta do texto e não incom patível com a letra respectiva (3).

Título Preliminar: "Art. 55 - Las ieyes sólo se derogan po r otras leyes posteriores, y no prevalecerá contra su observancia el desuso, ni Ia costum bre o Ia prática en contrário." D o P e ru - "Art. VI - Las leyes no se derogan p o r Ia costum bre ni por el desuso." D o U r u g u a i - “Art. 95 - Las leyes no puedem se r derogadas, sino p o r otras leyes; y no valdrá alegar contra su observancia el desuso ni Ia costum bre o prática en contrario." (3 ) l h e o d o r R ittle r, Prof. d a U n iv e r s id a d e d e I n n s b r u c k - Lehrbuch des Oesterreichischen Strafrcch ts, v o l. I, 1 9 3 3 , p. 2 0 - 2 1 . P r e c e it u a m t r ê s C ó d ig o s C iv is e s tr a n g e ir o s , n o r e s p e c t iv o Da E s p a n h a -

V e d e n o ta 3 9 2 - ( 2 ) . (4) D e m o lo m b e , vo l. I, n® 1 3 0 .

41)0

4 ')2 - (1) P a c ific i-M a z z o n i, vo l. I, n 9 1 2 6 ; C o v ie llo , v o l. I, p. 9 3 .

'161

4 5 3 - (1 ) C o v ie llo , v o l. I, p. 9 5 . (? ) E n n e c c e r u s , v o l. I, § 4 1 e n o ta 8 ; C o v ie llo , v o l. I, p. 9 5 ; A lv e s M o r e ir a , v o l. I, p. 2 2 ; E s p ín o la , v o l. I, p. 22 2 3 ; e o a rt. 5 9 d o

Título Preliminar d o s

P r o je t o s d e C ó d ig o C iv il d e N a b u c o e F e líc io

d o s S a n to s. (1) S a r e d o , o p . c it., n ° 8 0 3 ; D e m o lo m b e , vo l. I, n 9 1 2 9 . (4) l)e I lllp p ls, v o l. I, p. 9 1 ; P a c ific ! M a z z o n l, v o l. I, n fi 1 2 8 ; F n n e i i e i n s, v o l I,

(5) Vede o i .ipltlllo

IV irlto exi e/n loiiiil, nu>? ! 1 ?7 ?, ?HHe 191)

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4 I , n o ta 8.

Revogação do D ire ito

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As regras jurídicas, um a vez prom ulgadas, adquirem existência autônom a; independente do fim respectivo e da sua inicial razão de ser. As leis de guerra, |>. ex., sobrevivem ao flagelo, desde que sejam expressas em term os gerais; podem regular fatos sem elhantes, no futuro. É do contexto, sobretudo, que o hermeneuta infere se as norm as positivas têm caráter transitório ou perm anente. Laboram em erro os que julgam sem efeito um a disposição escrita, pelo lato de desaparecerem as causas da m esm a, apoiados no prolóquio - cessan te ratione legis cessat lex ipsa (“com o desaparecer a razão da lei, perde a eficácia a lei m es­ m a”). Refere-se a m áxim a aos preceitos derrogatórios do D ireito com um , os quais se não baseiam nos m esm os princípios que a regra geral; por esse m otivo se enten­ dem de m odo estrito; não adm item extensões, nem analogias; vigoram nos limites rigorosos e visíveis que o seu espírito, ou razão, claram ente atinge. O aforism o ro­ mano pertence à Herm enêutica, e não à A plicação do Direito; não recorda um meio indireto para ab-rogar os textos, e sim um a base para os interpretar estritamente quando envolvem disposições excepcionais (4). Enfim: aplica-se ao art. 6o da anti ga Introdução do C ódigo Civil; jam ais será possível estendê-lo ao art. 4o (5). 454 - XII. O Poder Judiciário, com declarar inconstitucional uma lei. nào a revoga nem sequer im plicitam ente: apenas provoca a sua revogação expressa; descobre e revela a antinomia entre aquele estatuto e o fundam ental; indica, enlie leis existentes e incom patíveis, a qual das duas se deve obediência em rirtud!)

Revogação do D ireito

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o presente as suas raízes no passado; estuda-se este, para com preender aquele. Prom ulgaram nova lex; m as o ju s ficou firm e, ininterrupto, em bora rejuvenescido, arejado, loução464 (1). 457 - A revogação distingue-se da anulação, nos seus efeitos: esta age sobre o passado; aquela, sobre o futuro, obediente ao princípio da irretroatividade. ( )s fatos novos não são regidos pela norm a revogada; m as os anteriores continuam a sê-lo. Os efeitos da ab-rogação são instantâneos, isto é, a lei fica elim inada para o futuro465 (1). Isto prevalece quer a propósito de sim ples regra revocatória de oulra, quer no tocante à hipótese de preceito que ab-rogue outro por sua vez ab-rogadoi de um anterior: os fatos ocorridos no intervalo entre os dois últim os atos, legislati­ vos ou executivos, ficam de pé e regidos pela lei ou regulam ento em vigor na época respectiva (2). P or exemplo: elim ina-se im posto ou taxa; a cobrança cessa em rela­ ção ao exercício financeiro atual; porém é exigível o tributo referente ao exercício anterior. Ao contrário: se o ônus é declarado inconstitucional, expungem -se todos os lançam entos que ao m esm o se reportem .

464

- D e lle I eç/gl Trattato delle I erigi,

4 5 6 - (1) G io v a n n i P a c c h io n i, P ro f. d e D ire ito C ivil na R e a l U n iv e r s id a d e d e M ilã o

in Generaie,

1 9 3 3 , p. 1 5 0 - 1 5 2 ; G iu s e p p e S a r e d o , C o n s e lh e ir o d e E s ta d o -

n• m fatos concretos, e orientada toda essa atividade, que o intérprete . /< ni //i h/i