Endocrinologia feminina e andrologia: manual prático para endocrinologistas, ginecologistas, urologistas e médicos com interesse na área [1ª ed.]

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Endocrinologia feminina e andrologia: manual prático para endocrinologistas, ginecologistas, urologistas e médicos com interesse na área [1ª ed.]

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Ruth Clapauch

Manual prático para endocrinologistas, ginecologistas, urologistas e médicos com interesse na área

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Ruth Clapauch

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Os autores deste livro e a AC FARM ACÊUTICA LTDA., um a editora integrante do G EN |G rupo Editorial N acional, em penharam seus m elhores esforços para assegurar que as inform ações e os procedim entos apresentados no texto estejam em acordo com os padrões aceitos à época da publicação, e todos os dados foram atualizados pelos autores até a data da entrega dos originais à editora. Entretanto, tendo em con ta a evolução das ciências da saúde, as m udanças regulamentares governamentais e o constante fluxo de novas inform ações sobre terapêutica m edicam entosa e reações adversas a fárm acos, recom endam os enfatica­ m ente que os leitores consultem sempre outras fontes fidedignas (p. ex. site da Anvisa, do Bularium ou dos laboratórios farm acêuticos), de m odo a se certificarem de que as inform ações contidas neste livro estão corretas e de que não houve alterações nas dosagens recom endadas ou n a legislação regulamentadora. O s autores e a editora se em penharam para citar adequadam ente e dar o devido crédito a todos os de­ tentores de direitos autorais de qualquer m aterial utilizado neste livro, dispondo-se a possíveis acertos posteriores caso, inadvertida e involuntariam ente, a identificação de algum deles tenha sido om itida. E nd ocrinologia Fem in in a e A ndrologia C opyright © 2 0 1 2 by

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C IP-BRA SIL. C A TA LO G A Ç Ã O -N A -FO N TE SIN D IC A T O N A CIO N A L D O S E D IT O R E S D E LIV R O S, RJ E 46 E n d o c r in o lo g ia fe m in in a e a n d ro lo g ia : m a n u a l p rá tic o p a ra e n d o c r in o lo g is ta s , g in e c o lo ­ g ista s, u ro lo g is ta s e m é d ico s c o m in te re ss e n a á r e a / R u th C la p a u ch [o rg a n iz a çã o ]. - S ã o P a u lo : A. C. F arm acêu tica, 2 0 1 2 . 2 3 cm 1. E n d o crin o lo g ia. 2. E n d o crin o lo g ia ginecológica. 3. A ndrologia. I. C lapauch, R u th . 1 2 -5 1 8 8 .

C D D : 6 1 6 .4 CD U : 6 1 6 .4 037287

ORGANIZADORA Ruth Clapauch Médica endocrinologista, PhD. Professora visitante da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Consultora do Setor de Endocrinologia Feminina do Hospital da Lagoa, Ministério da Saúde, RJ. Diretora do Departamento de Endocrinologia Femi­ nina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - SBEM. COLABORADORES Adriana Lofrano Porto Professora-adjunta do Laboratório de Farm acologia M olecular da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília - FS/UnB. M édica coordenadora do Ambulatório de Endocrinologia das Gônadas e Adrenais do Hospital Universitário de Brasília - HUB.

Alexandre Hohl Médico Endocrinologista titulado pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - SBEM. Mestre em Neurociências pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. D outorando em Ciências Médicas pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Professor de Endocrinologia da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Presidente do Departam ento de Endocrinologia Fem inina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - SBEM - Gestão 2011/2012.

Amanda Athayde Professora-adjunta da P ontifícia Universidade C atólica do Rio de Janeiro - PUC-Rio e da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. D iretora do D epartam ento de Endocrinologia Fem inina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - DEFA-SBEM . M édica do In stitu to Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione - IED E-RJ.

Ana Carolina Marchesini de Camargo Professora-adjunta da D isciplina de Ginecologia do Departam ento de Tocoginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí - FMJ. D outora em Ginecologia e Obstetrícia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - FMRP/USP.

Ana Rosa P. Quidute Residência e Mestrado em Endocrinologia no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto - HCRP/FMRP/USP. D outoranda em Farm acologia pela Universidade Federal do Ceará - UFC. M édica Assistente do Serviço de Endocrinologia e Diabetes do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará HUWC/UFC.

vi Colaboradores

Andréa Glezer Pós-doutoranda pela Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMUSP. D outora pela Facul­ dade de M edicina da Universidade de São Paulo - FM USP. M édica assistente da Unidade de Neuroendocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMUSP.

Andréa Ferreira Form ada na Faculdade de M edicina da Fundação Universidade de Passo Fundo - FM/UFP/RS. Residência em Clínica M édica no Hospital São Vicente de Paulo em Passo Fundo - HSVP/RS. Residência M édica em Endocrinologia e M etabologia no Hospital da Lagoa - M inistério da Saúde - Rio de Janeiro. M édica do Serviço de Endocrinologia do Hospital da Lagoa - M inistério da Saúde - Rio de Janeiro.

Angela Maggio da Fonseca Livre-docente em Ginecologia. Professora-associada do D epartam ento de O bstetrícia e G inecologia da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMUSP.

Carlos A. Bruguera Ex-presidente da Sociedade Argentina de Radiologia - SAR. Professor do curso de Ultrassonografia do Centro de Ensino de Buenos Aires (Argentina). S ta ff do Departam ento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital Italiano de Buenos Aires.

Carmen Regina Leal de Assumpção M édica com Especialização em Endocrinologia e M etabologia titulada pela Associação M édica Brasileira AMB - e pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - SBEM/RJ. M édica estatutária do Ins­ titu to Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione - IEDE. Presidente do Centro de Estudos do Jayme Rodrigues - CEA. Coordenadora do am bulatório de Obesidade Infantil do mesmo Instituto - IEDE, de janeiro de 1983 - até o m om ento. M em bro do Laboratório de Transporte de M embranas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. M em bro do Departam ento de Endocrinologia Fem inina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - SBEM/RJ. D ou tora em Ciências pela Univer­ sidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ, Estudo do Oxido N ítrico em plaquetas de adolescentes com Obesidade e Síndrome metabólica. Presidente do Comitê Científico da Sociedade Brasileira de Endocrino­ logia e M etabologia SBEM -RJ, Projeto Escola Saudável.

Carolina Aguiar Moreira Kulak Professora-adjunta do Departam ento de Clínica Médica da Universidade Federal do Paraná - UFPR. Médica da Unidade de M etabolism o Ósseo do Serviço de Endocrinologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná - UFPR/SEM PR D outora em M edicina Interna pela Universidade Federal do Paraná U FPR - e pela Universidade Colum bia - USA.

Carolina Leão Oderich M édica Ginecologista e Obstetra. Mestre em Ciências Médicas.

Carolina Sales Graduação médica pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU. Residência médica em GO com subespecialização em Reprodução H um ana pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina de Ribeirão Preto - HCRP/FMRP/USP. M estrado e D ou torad o em G inecologia e O bstetrícia pela Faculdade de M edicina de Ribeirão Preto - FMRP/USP - na área de Reprodução Humana. D ocente do departam ento de Ginecologia e O bstetrícia da Faculdade de M edicina de Ribeirão Preto - FMRP/USP.

Cássio Slompo Ramos M édico V oluntário do Serviço de Endocrinologia do H ospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná - UFPR/SEMPR. Mestre em M edicina Interna pela Universidade Federal do Paraná - U FP R

César Eduardo Fernandes Professor Titular da Disciplina de Ginecologia e O bstetrícia da Faculdade de M edicina do ABC - FMABC. Presidente da Associação de O bstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo - SOGESP.

ClaudioTeloken Professor Livre-docente de Urologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde - UFCSPA. D outor pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. Responsável pelo Programa de Residência em Urologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde - UFCSPA. Chefe da Disciplina de Urologia da Universidade

Colaboradores vii

Federal de Ciências da Saúde - UFCSPA. M embro Titular da Academia Sul Riograndense de Medicina. Special Fellow pela Cleveland Clinic Foundation - Cleveland, OH - USA. Ex Pesquisador da Wayne State University, D etroit, M I - USA.

Dalisbor Marcelo Weber Silva Graduação em M edicina pela Universidade Federal do Parana - U FP R Residência de Medicina Interna pela Universidade Federal do Paraná - U FPR Especialização em Endocrinologia e Metabologia pela Universidade de São Paulo - USP. Fellow em Endocrinologia e Metabologia pelo CHU de Bordeaux - F R Presidente da Comissão de Educação Médica Continuada da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - SBEM. Professor Convidado da Faculdade de Medicina da UNIVILLE - Joinville/SC. Diretor Científico da ABrASSO.

Daniel Alexandre Bottino M.D., PhD. Professor-adjunto em Fisiologia Cardiovascular. Laboratório de Pesquisas Clínicas e Experi­ mentais em Biologia Vascular - BIOVASC. Departam ento de Ciências Fisiológicas - DCF. Instituto de B io­ logia Roberto Alcântara Gomes - IBRAG. Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.

Débora Vieira Soares Professora-adjunta da Universidade Federal Fluminense - UFF. D outora em Endocrinologia pela Univer­ sidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. M embro Titular da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M e­ tabologia - SBEM .

Diogo Guarnieri Panazzolo Médico Endocrinologista formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. D outorando do Programa de Pós-Graduação em Fisiopatologia Clínica e Experimental da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - FisClinex/UERJ.

Dolores P. Pardini Mestre e D ou tor em Endocrinologia e M etabologia pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. Responsável pelo am bulatório de Climáterio da D isciplina de Endocrinologia da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. Diretora do Depto de Endocrinologia Feminina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - SBEM.

Domingos Bica Mestre e D outor em Cirurgia pela Faculdade de M edicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ. Chefe do Serviço de Urologia Pediátrica do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira - IPPMG/UFRJ. Especialização em Andrologia Pediátrica no Basler Kinderspital - Suíça. Especialização em Urologia Pediátrica no Children’s Hospital o f Philadelphia - USA. M embro das Sociedades Brasileiras de Cirurgia Pediátrica e Urologia. M em bro da American Academy o f Pediatrics (Urology Section). M embro da International Children’s Continence Society - ICCS. M embro da Society o f Pediatric Urology.

Elaine Maria Frade Costa Professora Livre-docente da Disciplina de Endocrinologia da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMUSP. M édica Supervisora de Equipe Técnica do Serviço de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FM USP. Chefe da Unidade de Endo­ crinologia do Desenvolvimento do Serviço de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMUSP.

Eliete Bouskela M.D., PhD. Professora Titular em Fisiologia Cardiovascular. Laboratório de Pesquisas Clínicas e Experi­ m entais em Biologia Vascular - BIOVASC. D epartam ento de Ciências Fisiológicas - DCF. In stitu to de Biologia Roberto Alcântara Gomes - IBRAG. Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.

Ely Montarroyos Cortes Graduada pela Faculdade de M edicina pela Universidade Gam a Filho - UGF. M estre em M edicina In ter­ na pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. M édica do H ospital Federal da Lagoa. Chefe do Setor de Infectologia do H ospital da Lagoa. Possui experiência na área de M edicina, com ênfase em C líni­ ca M édica e Infectologia, atuando principalm ente nos seguintes temas: HIV/AIDS, terapia antiretroviral, tuberculose outras doenças oportunistas em pacientes com HIV. M em bro da Câm ara T écnica de AIDS do CREM ERJ M édica de Referência em Genotipagem do HIV do M inistério da Saúde.

viii Colaboradores

Erika Mendonça das Neves Pós-graduanda da Ginecologia do Departam ento de O bstetrícia e Ginecologia da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo.

Euderson KangTourinho Professor-adjunto e Doutor do Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Chefe da seção de Diagnóstico por imagem do Instituto de Ginecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Membro titular da Academia de Medicina do Rio de Janeiro - AMRJ. Coorde­ nador da Câmara Técnica de Radiologia do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro - CRM/RJ.

Eveline G. P. Fontenele Residência em Endocrinologia no Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FM USP. M estre em Endocrinologia pelo H ospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMUSP. D outoranda em Biotecnologia pela Rede Nordeste de Biotecnologia - RENORBIO/UFC. M édica assistente do Serviço de Endocrinologia e Diabetes do Hospital Universitário W alter Cantídio - HUWC/UFC.

Gerson Carakushansky Professor-titular e Livre-docente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Fellowship na Divisão de Endocrinologia e Genética da State University o f New York (SUNY), Syracuse, NY.

Gláucia M. F. S. Mazeto Responsável pela D isciplina de Endocrinologia M etabologiada Faculdade de M edicina de B otu catu Universidade Estadual Paulista “Jú lio de M esquita Filho” - UNESP. Responsável pelos Ambulatórios de Tireopatias, Neoplasias da Tireoide e Medular - Hospital das Clínicas de Botucatu.

Isaac Moise Yadid Diretor Médico da Primórdia Medicina Reprodutiva - Rio de Janeiro. Diretor Médico do Centro de Reprodução H um ana Perinatal Barra - Rio de Janeiro.

Isabela Bussade M estre em Endocrinologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Professor da Pós-graduação em Endocrinologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio/IEDE. M edica Pesqui­ sadora Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares - GOTA/IEDE-RJ.

Jaime Kulak Júnior Professor-adjunto do Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Paraná - U FP R D outor em Ginecologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - FMRP/USP - e Universidade de Yale - USA.

José Antonio Miguel Marcondes Livre-docente em Endocrinologia pela Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FM/USP. Médico do Serviço de Endocrinologia e Coordenador do am bulatório de Síndromes Hiperandrogênicas do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Juliana Elmor Mainczyk M edica do serviço de Endocrinologia do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione - IEDE.

Laura S. Ward M estre em M edicina e D ou tor em Endocrinologia Clínica pela Escola Paulista de M edicina da Universi­ dade Federal de São Paulo - U N IFESP. Pós-D outor em G enética M olecular na University o f C incinatti, USA tendo defendido Tese de Livre-Docência em C línica M édica pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. Professora Associada nível M S-5.III da Universidade Estadual de Cam pinas - UNICAMP. Presidente do D epartam ento de Tireoide da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e M etabologia - SBEM . Representa o Brasil na W orld Thyroid Federation. Chefe do Laboratório de G enética M olecular do Câncer da FMC. Publicou 111 artigos em periódicos com seletiva política editorial. Escreveu 40 capítulos de livros. Orientou 51 projetos de Iniciação Científica, 21 de Mestrado e 10 de D outorado, tendo supervisionado 3 pesquisadores em projetos de Pós-Doc.

Colaboradores ix

Lenora Maria Camarate Silveira Martins Leão Professora-adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Coordenadora da Disciplina de Endocrinologia do Hospital Universitário Pedro Ernesto - HUPE/UERJ. Coordenadora do Ambulatório de Gônadas e Adrenal do Hospital Universitário Pedro Ernesto - HUPE/UERJ.

Lucia Henriques Alves da Silva Médica Endocrinologista, Especialista em Endocrinologia e Metabologia pela Sociedade Brasileira de Endocrino­ logia e Metabologia - SBEM. Residência Médica em Endocrinologia e Metabologia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Mestranda em Fisiopatologia Clínica e Experimental do Programa de Pós-graduação em Fisiopatologia Clínica e Experimental da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - FisClinex/UERJ

Luciano de Melo Pompei Professor-afiliado da disciplina de Ginecologia da Faculdade de M edicina do ABC. D outor em M edicina pela Faculdade de M edicina do ABC.

Luiz Augusto Casulari D outor em Endocrinologia pela Università degli Studi di M ilano - Itália. Médico da Área de Endocrinologia do Hospital Universitário de Brasília - HUB. Orientador dos cursos de Pós-graduação em Ciências Médicas e em Ciências da Saúde da Universidade de Brasília - UnB.

Luiz Augusto Giordano M édico da D iscip lin a de G inecologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Jan eiro - U N IRIO . Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. E sp ecialista em E n d o sco p ia G in eco lóg ica pela Federação B rasileira de G in eco log ia e O b ste trícia FEBRA SG O . D iretor da Sociedade de Ginecologia e O bstetrícia do Estado do Rio de Janeiro - SGORJ.

Luiz Guilherme Kraemer de Aguiar Professor-adjunto de Endocrinologia do D epartam ento de M edicina Interna da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - FCM/UERJ.

Manoel R. A. Martins Professor-adjunto da Disciplina de Endocrinologia do Departam ento de M edicina Clínica, Faculdade de M edicina da Universidade Federal do Ceará - UFC. Serviço de Endocrinologia e Diabetes do H ospital Universitário W alter Cantídio - HUWC/UFC.

Marcelo Fernando Ronsoni Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Médico Endocrinologista pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. M estre em Cuidados intensivos e paliativos pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC.

Marcelo Luis Steiner Professor-afiliado da Disciplina de Ginecologia da Faculdade M edicina do ABC, Santo André/SP. D outor em Ginecologia pela Universidade Estadual Paulista - UNESP. Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de M edicina do ABC - FMABC. Responsável pelo am bulatório de Osteoporose do Centro de Atenção In te­ gral a Saúde da M ulher de São Bernardo de Campo - CAISM.

Marcelo Vieira Andrologista do Centro de Referência da Saúde da Mulher, Hospital Pérola Byington, dos Projetos ALFA e BETA, CEERH São Paulo, Célula M ater São Paulo, Reproferty São José dos Campos, M ater São José dos Campos. Mestre em Cirurgia pela Santa Casa de São Paulo. Chefe do Departam ento de Andorlogia-Infertilidade M asculina da Sociedade Brasileira de Urologia biênio 2012 - 2013.

Marcello D. Bronstein Professor Livre-docente, Faculdade de M edicina da USP. Chefe da Unidade de N euroendocrinologia. Disciplina de Endocrinologia e Metabologia. Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FM/USP.

Mareio Rutowitsch Professor e D outor em M edicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Chefe do Serviço de D erm atologia do Hospital Federal dos Servidores do Estado.

x

Colaboradores

Maria Celeste Osório Wender Mestre e Doutor em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Professora-associada de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS. Coordenadora do Am­ bulatório de Climatério e Anticoncepção do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - HCPA. Professora da Pósgraduação em Medicina - Ciências Médicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS.

Mariana Costa Silva Graduada em M edicina pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. M édica Residente do Progra­ m a de Residência M édica em Endocrinologia da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Aluna do curso de Mestrado Profissionalizante em Residência M édica do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina - HU/UFSC.

Maria do Carmo Borges de Souza Diretora da Fertpraxis Reprodução Humana - RJ. Presidente da Rede Latinoamericana de Reprodução Assistida.

Mario Gáspare Giordano Professor Titular Emérito da Disciplina de Ginecologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO. M em bro Em érito da American Society for Reproductive Medicine. M embro Titular da Federa­ ção Brasileira de Ginecologia e O bstetrícia - Febrasgo. M embro da Comissão de Ginecologia Endócrina da Federação Brasileira de Ginecologia e O bstetrícia - Febrasgo. M embro Titular da Sociedade Brasileira de M astologia - SBM . M em bro Titular da Federação Latino Americana de Ginecologia e Obstetrícia. M em bro Em érito da New York Academy o f Sciences.

Mario Vicente Giordano Professor da Disciplina de Ginecologia da Universidade Estácio de Sá - UNES A Médico da Disciplina de Gineco­ logia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO. Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Especialista em Endoscopia Ginecológica pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Diretor da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro - SGORJ.

Marise Lazaretti-Castro Livre-docente, professora-adjunta da disciplina de Endocrinologia e Chefe do A m bulatório de D oenças O steom etabólicas da Escola Paulista de M edicina - EPM.

Marise Tinoco de Souza Residência em Endocrinologia pelo Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione - IEDE. Mestre em Endocrinologia e M etabologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Especialista Titulado em Patologia Clínica pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC.

Mauri Carakushansky M .D . Chefe da Divisão de Endocrinologia Pediátrica da Nemours Children’s Clinic, Orlando, Flórida. Professor-assistente de Pediatria da University o f Central Florida, Orlando, Flórida. Professor-assistente de Pediatria da Florida State University, Tallahassee, Flórida. Ex-Fellow da Divisão de Endocrinologia Pediátrica do Joh n s Hopkins Hospital., Baltim ore, Maryland.

Oswaldo Martins Rodrigues Junior Diretor e Psicoterapeuta do Instituto Paulista de Sexualidade. Co-coordenador do Curso de Especialização em Psicoterapia com Enfoque na Sexualidade - CEPES - Instituto Paulista de Sexualidade desde 1999. Membro do Conselho Consultivo da WAS - World Association for Sexual Health - 2001-2009. Secretário Geral/Tesoureiro (2001-2005). Membro do Comitê Científico Internacional (2009-2013). Editor Chefe da revista “Terapia Sexual” (desde 1998), revista técnica de publicação semestral. Coordenador de Pesquisas do Grupo de Estudos e Pesquisas do InPaSex - GEPIPS. Autor do livro “O sexo que se vê” (Ed. Livro Pronto, 2012).

Patricia Muszkat Pós-graduanda da Divisão de Endocrinologia, Unidade de Metabolismo Ósseo e Mineral da Escola Paulista de M edicina da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP/EPM.

Paulo Antônio Oldani Felix M estrando em Ciências Médicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Médico Assistente. Responsável pelo Ambulatório de Psoríase do Serviço de Derm atologia do Hospital Federal dos Servidores do Estado - HSE/RJ.

Colaboradores xi

Paulo Ferrez Collet-Solberg Professor-adjunto de Endocrinologia Pediátrica da D isciplina de Endocrinologia do Departam ento de M e­ dicina Interna da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - FCM/UERJ. Presidente do Com itê de Endocrinologia Pediátrica da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro - SOPERJ. M em bro do Com itê de Endocrinologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Pediatria - SBP.

Paulo Maurício Soares-Pereira Mestre em Ginecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Chefe do setor de M astologiado Hospital Federal dos Servidores do Estado - H SE - M inistério da Saúde. Coordenador de ensino e pesquisa do Centro de Estudos e Pesquisa da M ulher -CEPEM . Título de especialista em Ginecologia e O bstetrícia pela Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e O bstetrícia - FEBRASGO. Título de especialista em M astologia pela Sociedade Brasileira de M astologia - SBM . Título de habilitação em M am ografia pela Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Membro da Câmara Técnica Especializada de M astologia do Conselho Regional de M edicina do Rio de Janeiro - CRM/RJ.

Ricardo M. R. Meirelles N otório Saber pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Professor-associado de Endocrinologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Diretor do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione - IED E.

Ricardo Mendes Alves Pereira Médico do Hospital Israelita Albert Einstein-SP e do Hospital Maternidade Santa Joana-SP.

Ricardo Vasconcellos Bruno Mestre e Doutor em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Chefe do Serviço de Reprodução Humana e Ginecologia Endócrina do Instituto de Ginecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Diretor do Capítulo de Ginecologia e Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões Delegado para o RJ da Sociedade Brasileira de Climatério - SOBRAC - e da Sociedade Brasileira de Ginecologia Endócrina - SOBRAGE.

Rita Vasconcellos Weiss Graduação em M edicina UCISAL. Mestre em Endocrinologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. D ou tor em Endocrinologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Pesquisadora-visitante em Endocrinologia/Biologia Molecular da Universidade de Zurique, Suíça, 2006-2009. Professora da Escola M édica de Pós-graduação em Endocrinologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Chefe do am bulatório de Endocrinologia Fem inina do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglioni - IEDE.

Roberto de Azevedo Antunes Hospital Federal dos Servidores do Estado. Diretor da Fertpraxis Reprodução Humana/RJ.

Rodolfo Strufaldi Professor-afiliado da Disciplina de Ginecologia da Faculdade Medicina do ABC - FMABC, Santo André/SP. D outor em Ciências da Saúde na Área de Ginecologia pela Faculdade de Medicina do ABC - FMABC. Mestre em Ciências da Saúde na Área de Ginecologia pela Faculdade de M edicina do ABC - FMABC. Coordenador Médico do Centro de Atenção Integral à Saúde da M ulher de São Bernardo do Campo - CAISM.

Rogério Bonassi Machado Professor-adjunto da Disciplina de Ginecologia e Chefe do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí - FMJ. D outor em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP.

Rosalina Jorge Koifman M edica pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado da Guanabara - UEG (atual UERJ). Mestre em Medicina Social, Universidad Autonoma M etropolitana Xochimilco, Cidade do México, México. Coordenadora do D epartam ento de V igilância Epidem iológica, Secretaria M unicipal de Saúde do Rio de Ja n eiro (1 9 8 0 -1 9 9 0 ). D o u to ra em Saúde P ú blica pela E scola N acion al de Saúde Pública/FIO CRU Z. Coordenadora da Área de Concentração de Epidemiologia Ambiental do Programa de pós-graduação em Saúde Pública e Meio Ambiente, Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz - FIOCRUZ (2006-2012). Pesquisadora T itu lar da Escola N acional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz FIOCRUZ. Bolsista de Produtividade do CNPq, Nível 2.

xii Colaboradores

Sérgio Koifman Médico pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado da Guanabara - UEG (atual UERJ). M estre em M edicina Social, Universidad A utonom a M etropolitana Xochim ilco, Cidade do México, México. D outor em M edicina Preventiva, Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - USP. Pós-doutor pela School o f O ccupational Health, M cGill University, M ontreal, Canadá. Coordenador do Programa de Pós-graduação em Saúde Pública e Meio Ambiente da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz - FIO CRU Z (2006-2012). Pesquisador T itu lar da Escola N acional de Saúde Publica da Fundação Oswaldo Cruz - FIOCRUZ. Bolsista de Produtividade do CNPq, Nível 1 A.

Sidney Glina Professor Livre-docente da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC. Chefe da Clínica Urológica do Hospital Ipiranga. D iretor do Projeto ALFA e Instituto H. Ellis.

Tânia A. Sanches Sartori Bachega Professora-associada da Disciplina de Endocrinologia da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FM/USP. M édica Assistente do Serviço de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade de São Paulo - FMU/SP.

Valéria Saraceni Graduada em M edicina pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. D outora em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz - FIOCRUZ. Gerente Técnica do Sistem a Nacional de Agravos de Notificação - SINAN - da Secretaria M unicipal de Saúde e Defesa Civil do Rio de Janeiro - SM SDC-RJ. Colaboradora do M inistério da Saúde no Programa Nacional de D ST e AIDS. Possui experiência na área de Saúde Cole­ tiva, com ênfase em Epidemiologia e avaliação de serviços de saúde, atuando principalmente nos seguintes temas: HIV/AIDS, coinfecção TB/HIV, transmissão vertical do HIV, sífilis congênita e risco ocupacional aos patógenos sanguíneos. Coordenadora do Estudo TH Rio- TB/HIV no Rio de Janeiro, iniciado em 2005 em 29 unidades municipais de saúde com programa de AIDS, parte da iniciativa CREATE - Consortium to Respond Effectively to the the AIDS TB epidemic.

Vânia Ravizzini Manoel Sondermann Especialista em G inecologia e O bstetrícia pela Federação Brasileira das Sociedades de G inecologia e O bs­ tetrícia - FEBRA SG O . T ítu lo de habilitação em m am ografia pela Federação Brasileira das Sociedades de G inecologia e O bstetrícia - FEBRA SG O . M em bro da Com issão Especializada de H abilitação em M am o­ grafia da Federação Brasileira das Sociedades de G inecologia e O bstetrícia - FEBRA SG O . Coordenadora m édica do setor de Im aginologia M am ária do Centro de Estudos e Pesquisa da M ulher - CEPEM.

Vicente Renato Bagnoli Livre-docente em G inecologia. Professor-associad o do D ep artam en to de O b ste trícia e G in eco logia da Faculdade de M ed icin a da U niversidade de São Paulo - FM/USP.

Victoria Zeghbi Cochenski Borba Professora-adjunta de Clínica Medica do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná - HC/UFPR. Médica do Serviço de Endocrinologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná - HC/UFPR. Vice-presidente do Departamento de Metabolismo Ósseo da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - SBEM. D outora em Endocrinologia pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP.

Walmir Coutinho Professor titular de Endocrinologia da Pontifícia Universidades Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Pre­ sidente Eleito da Associação Internacional para o Estudo da Obesidade. Chefe do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia do Rio de Janeiro - IEDE. D ou tor em Endocrinologia pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP.

Wellington Santana da Silva Júnior Graduado pela Universidade Federal do M aranhão - UFMA. Residência em Clínica M édica pelo Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás - HC/UFG. Residente de Endocrinologia e M etabologia do Institu to Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione - IED E.

Apresentação

Ao longo de meu envolvimento com a Endocrinologia Feminina, desde 1992, e depois com a Andrologia, desde 2005, sempre recebi dos alunos pedidos de indicação de livros abordassem esses temas de maneira completa e atualizada, para acompanhar melhor os ambulatórios. De fato, há excelentes livros estrangeiros e nacionais que abordam esse campo do conheci­ mento, escritos por renomados ginecologistas e urologistas. Há também excelentes livros de Endocrinologia geral que dedicam parte de seu índice aos problemas das gônadas. Mas faltava uma obra que harmonizasse saberes sobre patologias específicas de gênero, femini­ no e masculino, com os olhares de todos os especialistas envolvidos nesses temas, em uma aborda­ gem prática que pudesse ajudar ao médico que efetivamente lida com esses casos. Que abrangesse peculiaridades de outras patologias endócrinas, como obesidade, anorexia, distúrbios de tireoi­ de, na esfera reprodutiva. Que, ao mesmo tempo, trouxesse temas mais afeitos à Ginecologia, como a doença fibrocística da mama e a endometriose, para o conhecimento do endocrinologista. Que falasse da disfunção erétil com a experiência do urologista. Que zelasse pelo futuro dos pacientes, ensinando a prevenir e a avaliar doença cardiovascular e o câncer. E que também abrisse novas janelas de interesse para quem aprecia a área, conscientizando-se do efeito da in­ fecção pelo HIV e da influência dos desreguladores endócrinos no aparelho reprodutivo. Portanto, misturar saberes da Endocrinologia, da Ginecologia, da Urologia e de outras es­ pecialidades, com o objetivo de proporcionar uma visão completa e objetiva da Endocrinologia Feminina e Andrologia, é o motivo principal deste livro. Pedi e contei com a ajuda inestimável de experts em cada um dos assuntos abordados, que usaram seu conhecimento e sua dedicação para escrever seu melhor texto, voltado para a com­ preensão da patologia em foco e seu bom atendimento. Espero que esta obra seja útil aos médicos em geral, e que sirva para otimizar e propagar o interesse no tratamento dos problemas de Endocrinologia Feminina e Andrologia!

Agradecimentos

Às forças que fizeram este livro se concretizar: À Editora GEN que me fez a proposta e o desafio de escrevê-lo; a toda a equipe editorial que, e-mctil por e-mail, encaminhou convites, acompanhou e cobrou prazos, recebeu versões e revisões e, finalmente, diagramou e organizou os capítulos finais. Aos autores que assumiram comigo este desafio e cuja qualidade de trabalhos tom aram esta obra primorosa. Aos pacientes que forneceram a motivação para que esse projeto acontecesse. Ao meu marido Edward e à minha filha Bruna, que sempre me deram todo apoio e compre­ ensão, sem cobranças. À disciplina que aprendi desde muito pequena. Aos exemplos de integridade e realização que recebi de meu pai. À herança equilibrada de carinho e de impulso/força de vontade para realizar de meus avós paternos. À força divina, que nos direciona a agir visando o melhor para todos.

Sumário

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33

Desordens da diferenciação sexual, 1 Hiperplasia adrenal congênita, 27 Puberdade normal, 57 Puberdade precoce, 68 Puberdade atrasada, 82 Ginecomastia, 98 Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo, 109 Obesidade e seus efeitos no sistema reprodutivo, 121 Hipogonadismo feminino, 132 Hipogonadismo masculino no jovem, 151 Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério, 164 Síndrome pré-menstrual, 177 Doença fibrocística/alterações funcionais benignas da mama, 186 Hiperprolactinemias, 200 Contracepção hormonal, 210 Acne e alopecia androgenética feminina, 226 Hirsutismo, 243 Síndrome dos ovários policísticos, 255 Endometriose, 269 Infertilidade do casal, 292 Endocrinologia da gravidez, 303 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos, 318 Redução da libido, 337 Uso de andrógenos em mulheres, 347 Falência ovariana precoce, 360 Riscos e benefícios da terapia hormonal da menopausa, 375 Menopausa: a escolha da reposição hormonal, 392 Esteroides sexuais usados na terapia hormonal da menopausa, 401 Andropausa ou hipogonadismo masculino tardio, 417 Disfunção erétil, 429 Prevenção da osteoporose, 439 Osteoporose pós-menopausa, 448 Osteoporose em homens, 463

xvi Sumário

34 35 36 37 38 39

Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher, 477 Esteroides sexuais e câncer ginecológico, 497 Esteroides sexuais e câncer no homem, 508 HIV e sistema endócrino, 514 D es reguladores endócrinos e eixo gonadal, 524 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia, 538

Caderno colorido

Desordens da diferenciação sexual G erso n C a r a k u s h a n s k y D o m in g o s B ic a M auri C araku sh an sky

INTRODUÇÃO Ao longo do tempo, os indivíduos portadores de uma diferenciação sexual atípica tornaram-se alvo de tabus, preconceitos, dúvidas, debates e estudos. No entanto, não se pode negar que, nas últimas décadas, houve significativa mudança na abordagem daquelas que, hoje, são conhecidas como Desordens do Desenvolvimento Sexual (DDS). Segundo um recente depoimento de Hughes,1 ocorreu o que ele denominou uma verdadeira “revolução silenciosa”, tendo como fenômeno catalisador diversos fa­ tores, como a revisão da nomenclatura usada, a nova classificação das causas das DDS e a motivação dos profissionais da saúde para trabalhar de forma multidisciplinar no atendimento dispensado a esses pacientes. Por outro lado, também ocorreram importantes revisões e modificações no planeja­ mento das cirurgias corretivas praticadas, em comparação com as que estavam em uso até a penúltima década do século passado. Alvo de intensa polêmica, aquelas cirurgias mutiladoras precoces geraram, inclusive, a insatisfação dos próprios pacientes que fo­ ram submetidos a elas durante a infância. Deu-se também maior ênfase às implicações éticas, sociais, psicológicas e legais que o diagnóstico de uma DDS costuma acarretar. A excelente monografia editada por Alice Dreger,2 com o título “A history ofintersex: from the age ofgonads to the age ofconsent”, retrata todas as importantes mudanças, não só de conceitos, mas também de atitudes. Aliás, foi a própria Dreger, pesquisadora da Northwestern University, em Chicago, que lançou, em 2005, a proposta para que fosse adotada uma nova nomenclatura.3 Sob a denominação genérica de DDS encontra-se embutida uma grande diversidade de apresentações clínicas e um vasto leque de possibilidades diagnósticas, além de implicações prognósticas. Algumas DDS já se manifestam no nascimento, princi­ palmente por meio de uma genitália ambígua, enquanto outras são diagnosticadas apenas na puberdade, devido ao atraso no aparecimento das características sexuais secundárias. O grande desafio em relação aos pacientes nascidos com DDS é o de se conseguir chegar a um diagnóstico etiológico preciso no menor intervalo de tempo possível. A caracterização precoce desses pacientes possibilita, inclusive, a descoberta de situações emergenciais que colocam a criança em risco de morte, caso não tenha um atendimen­ to imediato. Do mesmo modo, a eventual presença de um tumor gonadal associado a

2 Endocrinologia Feminina e Andrologia

algumas DDS merece atenção preventiva especial dos profissionais que acompanham esse tipo de paciente. Finalmente, é bom lembrar que o aconselhamento genético familiar é de funda­ mental importância, sobretudo nos casos de DDS que, sabidamente, podem acometer vários membros de uma mesma família: a hiperplasia adrenal congênita (HAC), a de­ ficiência de 5-a-redutase e a síndrome de insensibilidade aos androgênios, completa e incompleta (CAIS e PAIS).

FISIOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO SEXUAL Para que o leitor possa entender a fisiopatologia das principais DDS é necessário ter, pelo menos, um conhecimento básico sobre a fisiologia do desenvolvimento sexual. O nosso propósito é o de fazer apenas um relato muito sucinto sobre esse tópico, assim, aqueles que desejarem obter informações mais detalhadas devem procurar as boas fontes de consulta4'12 que existem na literatura. O processo do desenvolvimento sexual nos mamíferos se inicia no momento da fertilização, com o estabelecimento do sexo cromossômico do zigoto, e ele resulta da interação de vários genes, fatores transcricionais, hormônios e receptores hormo­ nais. Alterações podem ocorrer em qualquer um desses componentes e vão ocasionar o aparecimento de diversos tipos de DDS. O sexo do indivíduo é determinado pelo sexo da gônada. Por esse motivo, o eventochave primário do desenvolvimento sexual consiste na determinação do sexo gonadal, que, por sua vez, irá definir o desenvolvimento da gônada embrionária indiferencia­ da ou bipotencial em uma direção masculina ou feminina. O evento secundário do desenvolvimento sexual embrionário consiste na diferenciação das genitálias interna e externa pela ação de hormônios. Essa segunda etapa é denominada diferenciação sexual. Existem, portanto, 2 etapas distintas e sequenciais. Entender todos os mean­ dros que envolvem a determinação e a diferenciação sexual representa um verdadeiro desafio tanto para os clínicos quanto para os pesquisadores. A gônada bipotencial se origina na crista urogenital primitiva. Durante o está­ gio bipotencial, vários genes como WT1, SF1, LHX9, LIM1, PAX2, GATA4, EMX2 e WNT4 se expressam nas cristas gonadais (Figuras 1.1 e 1.2). Todos eles são necessários para o desenvolvimento gonadal normal em ambos os sexos, sendo a dosagem gênica e o nível de expressividade relativa que eles exercem um importante diferencial para estabelecer o caminho da determinação sexual que as gônadas irão seguir.

Q

Diferenciação masculina

Os fatores que desempenham um papel importante na diferenciação testicular es­ tão delineados na Figura 1.1. O primeiro passo envolve a interação de vários fatores de transcrição e células sinalizadoras. O gene DAX1, localizado no cromossomo X (Xp21), é necessário para o desenvolvimento das gônadas em ambos os sexos. Para a formação do cordão testicular, a presença de uma única cópia deste gene é o desejá­ vel, pois, ao contrário do que ocorre na formação do ovário, o excesso de expressão dele (dose dupla) em um feto XY agiria como um fator antagônico para a formação testicular. O mesmo fato acontece quando existe uma expressão exagerada do gene autossômico WNT4 em fetos masculinos, podendo até provocar uma reversão do sexo no sentido feminino.

Capítulo 1 Desordens da diferenciação sexual 3

CBX2

IZ

lo

E ^

S Q

x

X Q

x


10 ng/mL após estí­ mulo agudo com ACTH sintético,19 entretanto, esse valor foi definido antes dos estudos moleculares do gene da 21-hidroxilase. Com o advento dos estudos gené­ ticos, confirma-se o diagnóstico molecular de forma NC em todos os indivíduos com valores da 170H P pós-ACTH>17 ng/mL,20 e observa-se que valores pós-estímulo entre 10 e 17 ng/mL são encontrados tanto em indivíduos heterozigotos como naqueles afetados pela forma NC.21 Para esses casos, ou seja, indivíduos com manifestações hiperandrogências e valores da 170HP pós-ACTH entre 10 e 17 ng/mL, tem sido indicado o estudo molecular para a confirmação do diagnóstico de forma NC. Outros hormônios que também estão elevados são androstenediona, testosterona e 21-desoxicortisol. O amplo espectro fenotípico e hormonal da HAC-210H deve-se a diferentes graus de atividade enzimática causados por várias mutações no gene que codifica esta enzima.22 De acordo com o Consenso de 2010 da Endocrine Society, o diagnóstico molecular é recomendado apenas quando existe dúvida diagnóstica após as avaliações clínica e hormonal ou com o propósito de aconselhamento genético.16

O

Diagnóstico neonatal

A forma clássica da HAC-210H é caracterizada por níveis séricos de 17-hidroxiprogesterona acentuadamente elevados. Os valores basais medidos por radioimunoensaio, geralmente, são superiores a 10.000 ng/dL em lactentes afetadas, enquanto os níveis normais de recém-nascidos são inferiores a 100 ng/dL. Isso torna possível o rastreamento de recém-nascidos para esta doença em sangue seco de papel filtro (“teste do pezinho”), o qual já é obrigatório em todos os 50 estados americanos.

IMPORTANTE No Brasil, a inclusão do diagnóstico da H AC-210H no “teste do pezinho” já foi aprovada e está em processo de implantação no Programa Nacional de Triagem Neonatal.

A triagem minimiza atrasos no diagnóstico, especialmente nos meninos, e reduz a morbidade e a mortalidade por crises de insuficiência adrenal.23 E importante ressaltar que crianças enfermas ou prematuras podem ter níveis ele­ vados de 17-hidroxiprogesterona, sem erros inatos na biossíntese de esteroides, espe­ cialmente com idade gestacional inferior a 31 semanas. Nosso grupo analisou 67.640 recém-nascidos com amostras coletadas entre 2 a 7 dias de vida e concluiu que quando os níveis de referência para a 17-hidroxiprogesterona em recém-nascidos são ajusta­ dos para o peso ao nascimento, há uma importante melhora na precisão do método.24 O padrão-ouro para diferenciar a 21-hidroxilase de outras deficiências enzimáticas da esteroidogênese é o teste de estímulo com ACTH. No entanto, o tratamento de urgên­ cia não deve ser adiado para realizar este teste em um recém-nascido que apresenta hipotensão com anormalidades eletrolíticas ou com risco de vida. As alterações hormonais dependem da gravidade da deficiência enzimática. Os pacientes portadores da forma PS têm os mais elevados níveis de 17-hidroxipro­ gesterona (até 100.000 ng/dL), após estímulo com ACTH. Os pacientes com a for­

Capítulo 2 Hiperplasia adrenal congênita 33

ma VS geralmente possuem níveis ligeiramente mais baixos (10 a 30.000 ng/dL) e os pacientes com a forma NC apresentam os menores níveis (1.500 a 10.000 ng/dL). Medidas aleatórias basais de 17-hidroxiprogesterona são frequentemente normais em pacientes com a forma NC, a menos que o teste seja realizado no início da manhã. A análise de mutação pode confirmar o diagnóstico e é usada em alguns programas de triagem neonatal.25,26 Encontra-se disponível comercialmente nos Estados Unidos, mas é dispendiosa e muitas vezes não completamente coberta por seguradoras.

GENÉTICA MOLECULAR O gene que codifica a enzima 21-hidroxilase (CYP21A2) está localizado no braço curto do cromossomo 6, na região do genes HLA classe III (6p21.3), bem como o pseudogene (CYP21A1P/, o qual não codifica uma enzima devido à presença de várias muta­ ções. Ambos os genes são compostos por 10 exons e apresentam alta homologia entre si, 98% na região exônica e 96% na região intrônica.27 Os genes CYP21 alternam-se com os genes C4 e TNX duplicados e, devido à alta homologia das regiões de repetições dos

210

300

HLA-B

A

i

/

TNF

/

400

C4/CYP21

/

HLA-DR

\

/ Classe I

\

Classe

L

\

Classe II

\

/ /

\

/

\

/ /

\

/ RP1

\ C4A

RP2

C4B

◄ TNX A

TNXB

FIGURA 2.3 Os genes da 21-hidroxilase (CYP21A1P e CYP21A2) estendem-se sobre uma região de aproximadamente 30 kB, no braço curto do cromossomo 6 (6p21.3), dentro do complexo HLA, especificamente dentro da região que codifica o HLA classe III. Os números indicam as distâncias entre os genes em kilobase. Adaptado de White & Spiser, 2000.11 CYP21A1P: pseudogene; CYP21A2: gene ativo; C4 e C4B: genes do quarto componente do com­ plemento sérico (fator 4); RP1: gene de uma proteína quinase nuclear; RP2: cópia truncada do gene RP1;TNXB: gene da tenascina-X;TNXA: cópia truncada do gene TNXB. Os genes TNX estão em fitas cromossômicas opostas e as setas indicam o sentido da transcrição.

34 Endocrinologia Feminina e Andrologia

genes C4/CYP21/TNX, essa região é alvo de grandes rearranjos e conversões gênicas que são as principais fontes de mutações causadoras da deficiência da 21-hidroxilase (Figura 2.3). Essas mutações basicamente consistem em deleções, grandes conver­ sões ou mutações de ponto no gene CYP21A2. A frequência das mutações no gene CYP21A2 varia de acordo com a etnia; deleções e grandes conversões são encontradas principalmente em pacientes com a forma clássica e são identificadas em 20% a 33% dos alelos afetados em populações caucasianas,28 apresentando baixa frequência na população latino-americana.29,30 Até o momento, mais de 100 mutações de ponto já foram descritas (ex.: www. hgmd.cf.ac.uk) e 9 delas são as mais prevalentes em vários estudos populacionais. Estas mutações são, normalmente, identificadas no pseudogene, sugerindo que elas são transferidas do pseudogene para o gene ativo por eventos de microconversões. Alelos mutados podem levar microconversões duplas, que envolvam 2 ou mais mu­ tações de ponto em exons consecutivos.28,31,32 Esses eventos exemplificam a impor­ tância de uma análise de segregação de mutações e da necessidade de rastreio de todas as mutações que podem ser derivados de pseudogene no gene ativo, para o diagnóstico molecular preciso. As mutações não provenientes do pseudogene, representando eventos mutagênicos casuais, geralmente são encontradas em casos isolados. No entanto, para alguns deles tem sido descrito um efeito fundador, como as mutações G424S, R408C, 1003 A 1004 InsA, IVS2 -2 A > G.33,34 As mutações que criam códigos prematuros de parada de leitura ou alteram as re­ giões de splice ou a estrutura de leitura da proteína estão associadas à forma clássica perdedora de sal, enquanto as mutações missense, dependendo do aminoácido altera­ do, podem estar associadas a qualquer forma clínica. A mutação mais frequente na forma perdedora de sal é a mutação splice 12; na forma virilizante simples, a mutação de ponto I172N, e na forma não clássica, a V281L.11 De acordo com o comprometimento da atividade enzimática causado pelas muta­ ções, estas são divididas em grupos conforme a sua atividade residual e, em seguida, correlacionados com formas clínicas.22,35 (Tabela 2.1). O grupo A incluiu mutações que determinam menos que 2% de atividade enzimática e estão relacionados com a forma perdedora de sal. O grupo B incluiu mutações que codificam uma enzima com atividade enzimática residual de 3% a 7% e estão relacionadas com a forma viri­ lizante simples. O grupo C incluiu mutações que determinam uma atividade residu­ al enzimática de 20% a 60% e estão relacionadas com a forma não clássica. A maioria dos pacientes portadores de HAC-210H é heterozigota composta, e a forma clínica está associada com o alelo que apresenta maior atividade residual enzimática.28,31,36,37 (Tabela 2.2). Na maioria dos casos de HAC-210H há uma boa correlação entre o genótipo, a forma clínica, os níveis de 17-hidroxiprogesterona e os níveis de testosterona,31,32,36,37 porém, em alguns pacientes as formas clínicas não correspondem às previstas pelos genótipos. Esta ausência de correlação, geralmente, ocorre devido à presença de mu­ tações adicionais que não foram detectadas nos estudos genéticos ou que estão em regiões reguladoras do CYP21A2, que não são frequentemente rastreadas em estudos genéticos,38,39 ou, ainda, por conta da presença de uma atividade de 21-hidroxilação extra-adrenal. No entanto, as enzimas e/ou os tecidos envolvidos nesta atividade não são conhecidos.11,40

Capítulo 2 Hiperplasia adrenal congênita 35

TABELA 2.1 Classificação das mutações no gene CYP21A2, respectivas localizações e atividades enzimáticas Mutação

Sitio

Atividade enzimática (%)

Grupo A Deleção/Conversão Del 8nt Cluster Inserção T G291S Q318X R356W A ou C -» G (12 splice)

EXONS 1-8 EXON 3 EXON 6 EXON 7 EXON 7 EXON 8 EXON 8 INTRON 2

Grupo B I172N

EXON 4

3 -7

Grupo C P30L V281L P453S

EXON 1 EXON 7 EXON 10

3 0 -6 0

0 0 0 0 0 0 -2 Mínima

18 ± 9 2 0 -6 6

Adaptado de Speiser PW et al., 1992.36 Os estudos de mutagênese in vitro permitiram quantificar a redução da atividade enzimática conferida por cada mutação e correlacioná-las com as diferentes forma clínicas da doença. As mutações que conferem total perda ou severo comprometimento da atividade enzimática estão relacionadas às formas perdedora de sal e virilizante simples, respectivamente, enquanto que as mutações que conferem moderado comprometimento da atividade enzimática estão relacionadas à forma não clássica. Como a HAC-210H pode ser causada por várias mutações, a maioria dos pacientes são heterozigotos compostos, isto é, apresentam mutações diferentes em cada um dos alelos, e a forma clínica será conferida pelo alelo que tiver a mutação com maior atividade enzimática

TABELA 2.2 Diferentes genótipos e fenótipos de pacientes portadoras de HAC-210H Mutações

Grupo genotípico

Possíveis combinações A l/ A l A1/A2 A2/A2

Form a clinica

CONV/DEL Cluster Ins T Q 318X R356W G291S 12 splice

Al

PS

I172N

B

A /B B/B

VS NC

P30L V281L P453S

C

A /C B/C

NC

vs VS ou PS

A2

Adaptado de Speiser PW et al., 1992.36

c/c

36 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Apesar das divergências entre genótipo e fenótipo, a determinação de mutações na HAC-210H é amplamente utilizada na prática clínica, por exemplo, para o diag­ nóstico diferencial entre a forma virilizante simples e a não clássica nos meninos, na triagem neonatal, para diferenciar resultados positivos de falso-positivos, e no diag­ nóstico pré-natal nas gestações de risco. O diagnóstico pré-natal vem sendo utilizado há mais de 2 décadas em gestações de risco, isto é, em mães que já possuem uma criança portadora da forma clássica.41 O aprimoramento das técnicas para a identificação das mutações da deficiência da 21-hidroxilase e a possibilidade de extração de DNA de vilo coriônico possibilitam o diagnóstico genético a partir da 10a semana de gestação.

TRATAMENTO O tratamento baseia-se na reposição de glicocorticoide e mineralocorticoide em do­ ses fisiológicas, com o objetivo de bloquear o hiperandrogenismo adrenal, sem causar efeitos adversos advindos do hipercortisolismo. Vale notar que as prioridades do tra­ tamento mudam de acordo com a faixa etária. Na infância, o foco é evitar a desidra­ tação, identificação correta do gênero, otimização do crescimento e desenvolvimento e realização da genitoplastia feminilizante precoce. No adulto, os objetivos são asse­ gurar a fertilidade e prevenir efeitos adversos associados ao hipercortisolismo, como obesidade, síndrome metabólica (SM) e osteoporose.



Tratamento pré-natal

O tratamento pré-natal (Figura 2.4) continua sendo considerado uma terapia experi­ mental e somente deverá ser realizado em instituições acadêmicas capazes de fazer se­ guimento a longo prazo dos indivíduos submetidos ao tratamento (afetados ou não), a fim de que os riscos e os benefícios possam ser bem-definidos.16 O objetivo principal é evitar a virilização intra-útero da genitália externa de feto feminino portador da for­ ma clássica, reduzindo a necessidade de realização da genitoplastia e o impacto psico­ lógico gerado por essa virilização. Como a diferenciação da genitália externa inicia-se precocemente, o tratamento deve ser instituído entre a 6a e 7a semanas de gestação a todas as gestantes de risco,42 não se justificando a sua instituição após a 10asemana de gestação. Vale advertir que a HAC é uma doença autossômica recessiva, e apenas 1 a cada 4 fetos serão comprome­ tidos. Adicionalmente, metade dos fetos será do sexo masculino, logo, apenas 1 a cada 8 fetos tratados se beneficiará com o tratamento pré-natal. Após a confirmação da gestação pelo phCG positivo, o protocolo mais utilizado para o tratamento pré-natal consiste em iniciar a terapia com dexametasona na dose de 20 mg/kg/dia dividida em 3 tomadas.42 Entre a 10a e a 12a semanas de gestação, realiza-se a biópsia de vilo coriônico para a extração de DNA e a determinação do sexo fetal por meio da pesquisa do gene SRY, pela reação de polimerização em cadeia (PCR). No caso de o feto ser do sexo masculino, não há riscos de malformações geni­ tais e a terapia é suspensa. Por outro lado, se o sexo fetal for feminino, mantém-se a terapia com dexametasona e realiza-se o estudo do DNA do vilo corial das mutações que forem identificadas no DNA do caso índex. Apenas se o feto apresentar mutações em ambos os alelos deve-se continuar a te­ rapêutica até o nascimento. Caso contrário, o tratamento é interrompido. Todo diag-

Capítulo 2 Hiperplasia adrenal congênita 37

Dosar |3hCG

Atraso menstruai 4a- 5asem

DEXA 20 pg/kg/dia 4- 3 doses Biópsia VC

10a- 12a sem

!

46, XX (SRY-)

!

46, XY (SRY+)

! Suspender DEXA

Estudo do CYP21A2

Não afetada

Afetada

I

I

Suspender DEXA

Manter DEXA até o fim da gestação

Nascimento

Confirmação do Diagnóstico Pré-natal

FIGURA 2.4 Fluxograma do diagnóstico e tratamento pré-natal de gestações de risco para feto afetado com a forma clássica da HAC-210H.

nóstico pré-natal (normal ou afetado) deve ser confirmado na I a semana de vida. A terapia pré-natal é aparentemente eficaz na redução ou na eliminação da virilização da genitália externa fetal, com taxa de sucesso entre 80% e 85%.43 Em uma das maiores séries da literatura, em que foram avaliadas 532 gestações de risco para a deficiência da 21-hidroxilase, foram diagnosticados 61 fetos femininos portadores da forma clássica. Vinte e cinco fetos foram submetidos à terapia com dexametasona antes da 9asemana de gestação: metade das meninas nasceu com genitália externa normal e, as demais, apenas com pequena virilização (sempre menor do que a do caso índex), sem necessi­ dade da realização da genitoplastia na maioria dos casos.42,44 Os dados referentes à segurança do tratamento de longo prazo ainda são limitados. Com relação à segurança das mães, estudos demonstraram apenas um pequeno aumento de peso, cerca de 3 kg, e edema nas mulheres tratadas.42 Com relação à segurança dos fetos, aparentemente a incidência de abortos espontâneos é igual à da população geral, e não são encontradas alterações nos parâmetros antropométricos ao nascimento e no desenvolvimento subsequente.44 Em uma metanálise de estudos envolvendo a segurança de longo prazo para as crianças que foram submetidas à dexametasona na vida fetal, não foram detectadas diferenças no comportamento e no humor.45 Outro ponto muito debatido na literatura é com relação à indicação de tratamento pré-natal com o objetivo de evitar a virilização cerebral do feto, uma vez que se observa

38 Endocrinologia Feminina e Andrologia

que meninas com HAC-210H apresentam maior frequência de comportamento tipica­ mente masculino.11 Esse fato levanta a hipótese de que altos níveis de testosterona na vida pré-natal pode influenciar o comportamento sexual de meninas com HAC-210H.



Tratamento pós-natal

O tratamento pós-natal visa a repor as necessidades fisiológicas de glicocorticoide e/ou mineralocorticoide, com o objetivo de reduzir o hiperandrogenismo e prevenir a desidratação por perda de sal, sem afetar o crescimento e o desenvolvimento. Nos pacientes em fase de crescimento, a medicação escolhida é o acetato de hidrocortisona na dose de 10 a 15 mg/m2/dia ou o acetato de cortisona 18 a 20 mg/m2/dia, ambos divididos em 3 tomadas.16 A meia-vida curta desses glicocorticoides minimiza a su­ pressão do crescimento e outros efeitos colaterais que são frequentemente observados com glicocorticoides mais potentes, como a prednisona e a dexametasona.46,47 Para fins didáticos, o tratamento será dividido entre períodos neonatal, infância e pós-puberal.

Q Tratamento na fase neonatal O tratamento da crise de perda de sal consiste na hidratação com reposição de sódio e na administração endovenosa de hidrocortisona na dose inicial de 50 mg/m2, seguida de manutenção com 25 a 50 mg/m2 a cada 8 horas até o recomeço da alimentação. Compensada a fase aguda, inicia-se o uso do acetato de hidrocortisona ou acetato de cortisona nas doses descritas acima. Os dados ainda são controversos na determina­ ção se a maior dose deve ser diurna ou noturna.48 Porém, na nossa experiência, ocorre melhor controle do hiperandrogenismo com a utilização da dose noturna 20% maior do que as demais. Vale ressaltar que o acetato de hidrocortisona/cortisona em comprimido e em sus­ pensão não são bioequivalentes. A suspensão é inadequada para controle da HAC, pois não há uma distribuição uniforme da medicação na solução.49 O recomendável é diluir um comprimido macerado em pequena quantidade de líquido imediatamente antes da administração. Na forma PS associa-se o uso de 9a-flúor-hidrocortisona 150 a 250 mcg via oral (VO) em dose única pela manhã. Existe uma ampla variação da necessidade de dose de reposi­ ção entre os RN, mas dados da casuística do Serviço de Endocrinologia do HC-FMUSP mostram que a dose média inicial até o 6o mês de vida é de aproximadamente 200 mcg/dia. A necessidade de mineralocorticoide tende a diminuir rapidamente nos primeiros meses de vida devido ao aumento da maturidade renal com a idade50 (Figura 2.5). Nas crianças portadoras da forma PS e em aleitamento materno exclusivo, é fundamental a associa­ ção de cloreto de sódio 1 a 2 g/dia diluídos em água, pois a quantidade de sódio no leite materno é insuficiente para suprir a demanda desses pacientes.51,52 O seguimento das crianças portadoras da forma PS deve ser semanal no I o mês de vida e, a seguir, a cada 2 ou 3 semanas para adequação das doses do glico e mine­ ralocorticoide. O exame clínico deve avaliar peso, altura, velocidade de crescimento e pressão arterial (PA). Os exames bioquímicos de sódio e potássio são realizados se­ manalmente nas primeiras semanas para ajuste da dose do mineralocorticoide e, uma vez atingida a estabilização hidroeletrolítica, as dosagens passam a ser quinzenais e, posteriormente, mensais.

Capítulo 2 Hiperplasia adrenal congênita 39

FIGURA 2.5 Gráfico representando a dose média diária de 9a-fluorhidrocortisona de 23 pacientes portadores da forma PS durante os primeiros 2 anos de vida acompanhados no Ambulatório de Endocrinologia do Desenvolvimento do HCFMUSP. A dose média utilizada entre 0 e 6 meses foi de 200 mcg/dia (100-350), entre 7 e 18 meses foi de 150 mcg/dia, e entre 19 e 24 meses foi de 125 mcg/dia. Fonte: Dados dos pacientes acompanhados no Ambulatório de HAC da Unida­ de de Endocrinologia do Desenvolvimento do HC-FMUSR



Tratamento na infância

A dose inicial de reposição de acetato de hidrocortisona ou de cortisona é a mesma do neonato, 10 a 15 mg/m2 e 18 a 20 mg/m2, respectivamente. Na nossa experiência não houve diferença na dose de acetato de cortisona ao longo da infância nos pacientes com a forma clássica (Figura 2.6). No entanto, outros autores demonstraram aumento da necessidade da dose de hidrocortisona na puberdade e sugerem que isso seja devido ao aumento do clearcince de cortisol.53,54 Por outro lado, com o crescimento, observa-se uma diminuição da necessidade de 9-a-flúor-hidrocortisona. Por isso, a dose varia geral­ mente de 150 a 200 mcg/dia no I o ano de vida, de 100 a 150 mcg/dia após os 2 anos, e se estabiliza em 50 mcg/dia após os 4 anos, até o final do período de crescimento. As crianças devem ser acompanhadas a cada 3 meses. E considerado bom controle clínico quando ocorrer ausência de sinais de virilização ou de Cushing, PA normal, velocidade de crescimento entre os percentis 25 e 90 de Tanner, controle do avanço da idade óssea, normalização dos valores de androstenediona e testosterona para sexo e idade. As dosagens hormonais são obtidas trimestralmente pela manhã, antes do recebi­ mento das medicações. E importante observar que as concentrações de 170H P podem permanecer elevadas nos casos de forma clássica, mesmo entre os pacientes com bom controle hormonal.

40 Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 2.6 O gráfico mostra que a dose média de acetato de cortisona utilizada ao longo da infância de 30 pacientes com forma clássica, acompanhados no Am­ bulatório de Endocrinologia do Desenvolvimento do HC-FMUSP, foi semelhante, variando de 18 a 20 mg/m2/dia. Fonte: Dados dos pacientes acompanhados no Ambulatório de HAC da Unidade de Endocrinologia do Desenvolvimento do HC-FMUSP.

Em nossa experiência, a semelhança das recomendações da Endocrine Society, a tentativa de normalização da 170HP e/ou sua redução para valores abaixo de 10 ng/mL geralmente associa-se com o aparecimento dos efeitos metabólicos adversos do glicocorticoide, além da redução da velocidade do crescimento.16 A análise de 30 pacientes do sexo feminino com a forma clássica acompanhadas em nosso ambulatório, que foram tratadas com acetato de cortisona desde o diagnóstico, demonstrou que aquelas com bom controle hormonal alcançaram estatura final (EF) semelhante à estatura-alvo (EA), ao passo que as pacientes com controle inadequado estavam em média -1,2 desvio-padrão (DP) abaixo da EA (Figura 2.7). Nas crianças que fazem uso de mineralocorticoide, os valores de sódio, potássio e APR devem ser monitorados. A grande maioria dos casos, apesar de possuir va­ lores normais de sódio, potássio e PA, mantém valores discretamente elevados da APR (4 a 7 ng/mL/h).55 As crianças com a forma NC sintomática, evoluindo com pubarca precoce, com ou sem avanço de idade óssea, devem ser tratadas com acetato de hidrocortisona ou cortisona.16 Nas pacientes acompanhadas em nosso laboratório, a dose de acetato de cortisona necessária para o controle do hiperandrogenismo foi menor do que a necessária na forma clássica (15 mg/m2/dia, entre 7 e 10 anos, e 16 mg/m2/dia, entre 11 e 14 anos). Nas adolescentes com queixa de irregularidade menstrual e acne, as manifestações geralmente se revertem após 3 meses do uso de glicocorticoide. No entanto, a melhora

Capítulo 2 Hiperplasia adrenal congênita 41

EF DP

EA DP

EFDPEADP

*

C n= 30 pacientes sexo feminino Bom controle Mau controle

* p 4 m l de v o lu m e. 2

B o ls a e s c ro ta l c o m te x tu ra

P elo s lo n g o s , esp a rso s, liso s e p o u c o

m o d ific a d a e c o lo ra ç ã o m a is

p ig m e n ta d o s n a b ase do p ê n is

e scu ra P ê n is a u m e n ta d o de ta m a n h o , 3

te s tíc u lo s em to r n o de 10 m l c o m b o ls a s m a io re s

4

5

P elo s e scu ro s e e n c a ra c o la d o s , e ste n d e n d o -se até a ju n ç ã o p u b ia n a

P ê n is a u m e n ta d o c o m g la n d e já

P elo s d o tip o a d u lto , c o b rin d o u m a

d esen volvid a. V o lu m e te s tic u la r

área m e n o r, n ã o se e ste n d e n d o a té a

m a io r q u e 11 m l

face m e d ia l d a co x a

P ê n is e b o ls a e s c ro ta l de a d u lto

P elo s tip o a d u lto

As alterações físicas na puberdade são definidas pelos estágios de Tanner. A forma­ ção mamária é primariamente controlada pelos estrógenos secretados pelos ovários. O desenvolvimento mamário pode ser unilateral por vários meses. Embora o crescimento de pelos pubianos e axilares estejam sob o controle dos andrógenos adrenais, o estágio de desenvolvimento mamário se correlaciona bem com o estágio de desenvolvimento de pelos pubianos em meninas normais. Entretanto, como 2 diferentes glândulas endócrinas controlam o processo, devem ser estadiados separadamente. Em geral, o pico de velocidade de crescimento é atingido cerca de 6-9 meses após aparecimento do estágio 2 mamário. Cerca de 18% a 20% da estatura adulta deve-se ao crescimento na puberdade.9 A menarca ocorre tipicamente durante a fase de desaceleração do crescimento linear, isto é, 6-12 meses após o pico máximo de crescimento e, em média, 2,5 anos após o início da puberdade, geralmente entre os estádios 3 e 4 do desenvolvimento dos pelos pubianos e 4 e 5 do desenvolvimento mamário.8,10

D e fin e -se p u b e rd a d e p re co ce (PP) q u a n d o o in íc io d os ca ra cte re s sex u ais se cu n d á rio s o co rre a n te s d os 8 a n o s n a s m e n in a s e d os 9 a n o s n o s m e n in o s 10 (F ig u ra 4 .2 ).

PUBERDADE PRECOCE GONADOTROFINA DEPENDENTE (PPGD) Ocorre quando a liberação pulsátil de LH tem um padrão puberal, e o pico do LH após administração de GnRH é indistinguível de um padrão puberal normal.11 A etiologia na maioria das meninas é idiopática e, nos meninos, uma causa é iden­ tificada. Existe maior prevalência de puberdade precoce no sexo feminino e, ao contrá­ rio, no sexo masculino, maior prevalência de atraso constitucional do crescimento e da puberdade. A razão para a diferença entre os sexos é desconhecida.11

Capítulo 4 Puberdade precoce 71

Classificação da Puberdade Precoce

Variantes Incompletas • Telarca Precoce • Adrenarca Precoce • Menarca Precoe

Puberdade Precoce Completa

PPGI

PGD

Hiperplasia Adrenal Congênita

Idiopática

Cisto Ovariano

Tumor Cerebral (Glioma hamartoma)

Tumor Ovariano

Anomalias Congênitas

Tumor Adrenal

Outras doenças do SNC como infecções, trauma, cirurgias, radiação, cistos

Tumor Virilizanre Testicular Testotoxicose

1

Genética (KISS 1 - GRP 54 gene)

Síndrome de MC Albright (SMA) Hipotireoidismo primário severo latrogênico Síndrome de Peutz Jeghers

PPGI: puberdade precoce gonadotrofina independente, PPGD: puberdade precoce gonadotrofina dependente.10

FIGURA 4.2 Classificação da puberdade precoce. Fonte: Rodriguez H and Pescovitz. Precocious Puberty.10

Das anormalidades do SNC, o hamartoma é a causa mais frequente. A maioria não apresenta crescimento, não causa efeito de massa ou aumento da pressão intracra­ niana. O tumor tem a característica de possuir células neurossecretórias semelhantes àquelas encontradas no hipotálamo médio basal e que exercem seu efeito por meio da síntese e da liberação de GnRH de forma pulsátil.12 Outras causas são aquelas secundária à exposição prévia a esteroides sexuais (p. ex.: após queda dos andrógenos pós-corticoterapia na hiperplasia adrenal). Foi descrita

72 Endocrinologia Feminina e Andrologia

mutação no receptor do gene KISS associada à PPGD anteriormente diagnosticada como idiopática.13,14 Algumas características clínicas da puberdade precoce central na menina estão des­ critas na Tabela 4.3. T A B E L A 4.3

Progressão da puberdade precoce central na m enina25

Clínica E stá g io p u b e ra l V elo cid a d e de c re s c im e n to Id ad e ó ssea

Progressão da puberdade precoce P ro g re ssã o de u m está g io p a ra o u tr o em m e n o s de 6 m eses A celerad a, > 6 c m /ano V ariável, g e ra lm e n te a v a n ça d a em m a is q u e 1 a n o em re la çã o à id ad e c r o n o ló g ic a

A ltu ra fin a l - p r o g n ó s tic o

A b aix o d a esta tu ra -a lv o

C o m p rim e n to u te rin o

> 3,5 cm

V o lu m e u te rin o

> 1,8 cm

O v ário s P ico d o L H a p ó s te ste de G n R H

P o u c o im p a c to n a d ecisã o M ú ltip lo s cisto s >5 UI/L

Fonte: J-C.Carel et al 2007.25

■ PUBERDADE PRECOCE GONADOTROFINA INDEPENDENTE (PPGI) Ocorre quando a produção de esteroides sexuais ocorre independentemente da ativa­ ção do eixo gonadotrófico. A origem pode ser gonadal (SMA, testotoxicose), adrenal (tumores, hiperplasia congênita de suprarrenal - HCA) ou externa (exposição indevi­ da a andrógenos/estrógenos). A HCA é uma doença autossômica recessiva, na qual ocorrem mutações no gene que codifica as enzimas necessárias à síntese do cortisol. A forma mais frequente é a deficiência da 21-hidroxilase. As deficiências clássicas levam à função enzimática ausente ou muito comprometida, causando elevada secreção de andrógenos durante o desenvolvimento fetal com consequente genitália ambígua. A forma não clássica e as deficiências enzimáticas parciais podem levar ao hiperandrogenismo no período puberal ou depois da puberdade.11,13,15 Antes do advento da ultrassonografia, acreditava-se que o ovário pré-puberal era quiescente, e a frequência de cistos na pré-puberdade era baixa. A associação de cisto ovariano e telarca precoce começa a ser descrita na década de 1980.21 Sabe-se que o cisto ovariano pode tornar-se transitoriamente funcional,21 elevar a secreção de estrógenos e levar ao desenvolvimento mamário transitório.13 Uma forma de puberdade precoce masculina familiar, causada por mutação heterozigótica no receptor do LH, leva à ativação das células de Leydig que, então, produzem testosterona, apesar da supressão das gonadotrofinas. E a chamada testotoxicose.11 A SMA é também causada por mutação ativadora no gene da subunidade alfa da proteína ligadora do nucleotídeo guanina (proteína G). Essa ativação da subunidade

Capítulo 4 Puberdade precoce 73

alfa estimula a adenilciclase, aumentando a produção de adenosina monofosfato (AMP) cíclico. As manifestações endócrinas são decorrentes da secreção au­ tônoma de vários hormônios, entre eles hormônio de crescimento, cortisol e testosterona.14,15 Os hepatomas são tumores raros que secretam p-hCG, com início de aparecimen­ to, em geral, aos 2 anos de idade. Todos os tumores hipofisários são extremamente raros em crianças. A testotoxicose seria o equivalente na menina da SMA e pode levar secundariamente à PPGD por ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. Os tu­ mores de células de Leydig são raramente malignos. Um algoritmo para o diagnóstico da puberdade precoce está exposto na Figura 4.3.

Sinais de desenvolvimento Puberal Precoce

!

FSH: hormônio folículo-estimulante, LH: Hormônio luteinizante, PPGD: Puberdade precoce gonadotrofina dependente, PPGI: Puberdade precoce gonadotrofina independente, SMA: Síndrome Mc Cune Albright, HCA: Hiperplasia congênita da adrenal, PRA: persistência de restos adrenais.

FIGURA 4.3 Algorítimo para avaliação da puberdade precoce.8

74 Endocrinologia Feminina e Andrologia

VARIANTES DO DESENVOLVIMENTO PUBERAL OU PUBERDADE PRECOCE INCOMPLETA □

Telarca precoce isolada

Aparecimento bilateral ou unilateral de tecido mamário na ausência de outros sinais de maturação puberal. Doença benigna, autolimitada, compatível com desenvolvi­ mento normal na idade apropriada e, em mais de 80% dos casos, ocorre após os 2 anos de idade e antes dos 4 anos. Deve ser diferenciado da hiperplasia mamária neonatal, que se encontra presente ao nascimento, é consequência dos hormônios gestacionais e regride espontaneamente.8 O diagnóstico diferencial entre puberdade precoce em estágio inicial e telarca pre­ coce é, muitas vezes, difícil. Com o aumento significativo da prevalência da obesidade, a distinção entre PPC e obesidade com ou sem telarca, põe outro desafio diagnóstico. A idade óssea pode estar avançada em meninas obesas, que se apresentam como pseudotelarca, devido ao aumento de tecido adiposo.9,13,14

D

Pubarca precoce isolada

É definida como aparecimento de pelos pubianos antes dos 8 anos nas meninas e dos 9 nos meninos. A menina com pubarca precoce tipicamente se apresenta com pelos pubianos e axilares. IM P O R T A N TE A c lito r o m e g a lia é s in a l de v iriliz a çã o e a lta m e n te su g e stiv a de p a to lo g ia grave, n ã o sen d o o b se rv a d a n a p u b a rc a p re co ce b e n ig n a , q u e n ã o a lte ra a p ro g re ssã o p u b e ra l n o r m a l e é a u to lim ita d a .13

Alguns estudos indicam que, na menina, a pubarca pode ser o sinal de uma futura síndrome dos ovários policísticos (SOP).15,16

D

Menarca precoce isolada

Ocorre quando o sangramento vaginal é pré-puberal, não acompanhado de qual­ quer evidência de desenvolvimento sexual. A etiologia é desconhecida com várias hipóteses descartadas. O diagnóstico diferencial com corpo estranho e infecções do trato genitourinário e traumas é de extrema importância, pois trata-se de um diag­ nóstico raro de exclusão.5,8

D

Ginecomastia do adolescente

Aumento do desenvolvimento mamário pode acontecer em 39% a 75% dos meni­ nos, geralmente nos estágios iniciais da puberdade. Isso ocorre pelo aumento do estradiol decorrente da aromatização da testosterona, antes que a concentração de testosterona se oponha à ação estrogênica. Pode estar presente em condições pato­ lógicas, como na Síndrome de Klinefelter ou Síndrome de Resistência Parcial aos andrógenos. Atenção deve ser dada quanto à questão do aumento da prevalência em decorrência da obesidade.10,13

Capítulo 4 Puberdade precoce 75

DIAGNÓSTICO D

Clínico

A história clínica pode revelar sintomas sugerindo anormalidades ou traumas perinatais, infecções prévias, ingesta ou exposição a esteroides sexuais ou a presença da mes­ ma condição em outros membros da família. Deve-se avaliar início do quadro, tempo e velocidade de progressão, associando a outros sintomas. O exame físico deve incluir descrição dos caracteres sexuais secundários de acordo com estágios de Tanner, com medida da mama. E necessário avaliar a presença de oleosidade de couro cabeludo, acne facial, pelos corporais e faciais, odor de glândulas apócrinas, galactorreia. Um exame cuidadoso da genitália deve ser realizado. Um menino com menos de 9 anos com pênis aumentado e com um testículo < 2,5 cm no maior eixo deve chamar atenção para PPGI (p. ex.: causas adrenais).8,10,13,17 O aumento do testículo deve indicar provável PPGD. IM PO R TA N TE A p re se n ça de a ssim e tria te s tic u la r e n o d u la rid a d e à p a lp a çã o a p o n ta p a ra u m provável tu m o r te stic u la r.

A presença de pelos pubianos sem aumento do pênis pode nos levar ao diagnóstico de pubarca precoce. Deve-se procurar hipertrofia muscular e desenvolvimento puberal acelerado no menino, em busca de testotoxicose. E preciso examinar a pele em busca de manchas que possam indicar SMA ou neurofibromatose. Deve-se afastar a presença de massas abdominais (hepatomas ou massas adrenais) ou pélvicas, bem como solicitar RX de mão e punho esquerdo para avaliar o grau de maturação do esqueleto (idade óssea).9,13

D

Laboratorial

Em alguns casos de PP, as dosagens podem vir em níveis pré-puberais. O padrão ouro no diagnóstico da puberdade precoce na menina é a prova de estímulo com GnRH endovenoso, com dosagem de FSH e LH no basal e após 30 min e 60 min. A dosagem basal de LH não discrimina o tipo de puberdade precoce na menina, embora o de­ senvolvimento dos ensaios ultrassensíveis possa, muito em breve, tornar dispensável esse teste de estímulo.10 Atualmente, a maioria dos autores aceita como positiva uma resposta superior a 5 UI/L. No nosso meio, utilizamos 6,9 UI/L na menina e 9,6 UI/L no menino.17,18 Caso a prova seja negativa, deve-se reavaliar em 4-6 meses.10,11,14 Na im­ possibilidade de se fazer o teste do GnRH e, em caso de forte suspeita de puberdade precoce central, sugere-se colher amostra de sangue 2 h após injeção intramuscular (IM) de Leuprolide depot, considerando o valor acima de 10 UI/L como positivo.18 Na presença de virilização na menina, deve-se solicitar dosagem de 17-OH-Progesterona, sulfato de diidroepiandrosterona (SDHEA) e andrógenos, para afastar HCA.10 Solicitar hormônio tireoestimulante (TSH) e tiroxina livre (T4L), para afastar suspeita de hipotireoidismo. Na presença de SMA, dosar outros hormônios, como

76 Endocrinologia Feminina e Andrologia

cortisol, hormônio do crescimento (GH), prolactina e testosterona, para afastar hipersecreção desses hormônios, o que pode acontecer na síndrome. Podemos en­ contrar o fator do crescimento do tipo insulina 1 (IGF-1) elevado nos casos de PP, e ele pode ser um parâmetro de avaliação do tratamento, quando seus valores retornam aos níveis normais para idade em uso de análogo do GnRH na PPGD, por exemplo.10,11’13 No sexo masculino (Figura 4.4), a dosagem do LH é discriminatória quando utiliza­ do método imunofhiorimétrico, e uma concentração > 0,6 UL é diagnóstica de puber­ dade precoce central, além da dosagem de testosterona que também é discriminatória. Se a testosterona estiver aumentada e o LH for inferior a 0,6 UL, deve-se realizar a prova do GnRH e, a partir de 9,6 UL, consideramos PPGD.11

D

Imagem

RX de mão e punho esquerdo A avaliação da idade óssea pela método de Greulich and Pyle19 tem permanecido o melhor método de aferição da maturação óssea desde 1959.

Ultrassonografia mamária Pode ajudar no diagnóstico diferencial entre telarca e lipomastia.20

Ultrassonografia pélvica transabdominal Conforme mencionada, a prova do GnRH é o padrão ouro no diagnóstico da PP. Em vários estudos, considerando PP com base na progressão do quadro clínico, aceleração da velocidade de crescimento, avanço de idade óssea, o tamanho uterino e/ou volume uterino é o melhor preditor de puberdade, o que já nos ajuda no diagnóstico diferen­ cial entre a telarca precoce e a puberdade precoce.

PARÂMETROS IMPORTANTES DA ULTRASSONOGRAFIA PÉLVICA NA PUBERDADE PRECOCE •

L im ite su p e rio r d o c o m p r im e n to d o ú te ro > 3 5 m m



V o lu m e u te rin o > 2 m L



V o lu m e o v a ria n o > 1 c m 3

Esses pacientes deverão ser acompanhados e reavaliados após 6 meses, porque a chance de tratar-se de uma PP inicial é bastante provável. Existem valores padroni­ zados para limite superior do tamanho uterino, volume uterino e volume ovariano. O tamanho e/ou volume do útero são mais específicos que o volume ovariano. Os aumentos refletem ação estrogênica.11,20’21,22’23

Ultrassonografia dos testículos Na investigação de uma assimetria ou massa palpável.

Capítulo 4 Puberdade precoce 77

Aumento do pênis antes dos 9 anos

Sim

Não

I

I

SDHEA: Sulfato de deidroepiandrosterona, 170HP: 17-hidroxiprogesterona, HCA: hiperplasia congênita adrenal, ACTH: Hormônio adrenocorticotrófico, PPGD: Puberdade precoce gonadotrofina dependente, HCG: Hormônio gonadotrófico coriônico, LH: Hormônio luteinizante, GnRH: Hormônio liberador das gonadotrofinas.

FIGURA 4.4 Algoritmo para investigação de puberdade precoce em meninos.11

78 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Ressonância nuclear magnética (RNM) Se a suspeita é de PPGD, RNM de crânio e sela com contraste é solicitada para deter­ minar a anatomia da área hipotálamo-hipofisária e afastar patologia. O melhor corte para visualização de hamartomas é em T2, e o uso de contraste é indispensável para afastar e/ou definir tumoração. Na presença de virilização, quando existe suspeita de tumor adrenal, a tomografia de abdômen ou RNM é o melhor exame.11

■ TRATAMENTO O análogo do GnRH de longa ação (GnRHa) é a mais eficaz terapêutica para a PPGD. Os mais utilizados são triptorrelina e leuprorrelina, na dose inicial de 3,75 mg IM profunda a cada 28 dias.10,24 Na monitoração do tratamento com GnRHa, alguns estudos sugerem dosar o LH 2 h após injeção, considerando suprimido um valor de LH < 6,6 UI/L18 ou < 3UI/L após a prova do GnRH,25 durante o uso do GnRHa. Não existe um critério absoluto para identificar aquelas meninas que se beneficia­ rão do uso do GnRHa. Utilizado o padrão ouro do diagnóstico de PPGD (pico de LH >5 U/L após prova do GnRH,10,26,27 sugere-se fazer a predição da estatura final de acor­ do com o método de Bayley-Pinneau modificado, de forma a corrigir a superestimação sistemática da altura final quando se calcula pela “idade óssea avançada” - que está avançada na PP - mas o que ocorre normalmente é que os resultados obtidos após tra­ tamento em termos de estatura final se correlacionam melhor com o cálculo feito para idade óssea “compatível” no pré-tratamento. Sugere-se, então, utilizar as tabelas com “idade compatível” em vez de “idade avançada” e iniciar o tratamento se a predição de estatura final for menor que 155 cm.25,29,30 O tempo de tratamento varia de 2,1 a 7,5 anos. A média das séries varia de 3 mais ou menos 5 anos. Os melhores resultados com GnRHa são descritos quando a parada de tratamento encontra-se em torno de 12 a 12,5 anos de idade óssea, na menina, e 13 a 13,5 anos, nos meninos.25,27,30 Vários fatores estão envolvidos no tratamento. Por exemplo, idade óssea avançada, menor velocidade de crescimento e menor previsão da estatura final antes do tratamento pioram o prognóstico.25 A histrelina é um GnRHa 150 vezes mais potente que o GnRH endógeno. Foi de­ senvolvido como um implante subcutâneo flexível, não biodegradável, que é coloca­ do na região subcutânea sob anestesia local ou sedação com duração de 1 ano, e foi aprovado pela Food and Drugs Administration (FDA). Atualmente, já existem estudos com 2 anos, e os resultados mostram excelente supressão de LH e esteroides.33,34 No tratamento da PPGI, a escolha terapêutica pode ser cirúrgica seguida de qui­ mioterapia ou radioterapia na dependência do diagnóstico. Os inibidores da aromatase (anastrozol e letrozol) têm indicação potencial na SMA e testotoxicose, com vários estudos em andamento, assim como também na PPGD em meninos.31,32 Especialistas em SMA têm apontado melhores resultados com o uso do modulador seletivo da ação estrogênica, o tamoxifeno, em meninas, do que com anastrozol e letrozol.11 No tratamento da PPGI, as drogas são utilizadas para bloquear a síntese e a ação dos andrógenos, podendo-se utilizar os glicocorticoides na hiperplasia adrenal, antiandrógenos, como acetato de ciproterona e espironolactona, e ácidos imidazólicos, como o cetoconazol.35,36

Capítulo 4 Puberdade precoce 79

ALVO TERAPÊUTICO NA PUBERDADE PRECOCE •

D e te c ç ã o e tr a ta m e n to de lesõ e s exp an siv as.



B lo q u e io d a m a tu r a ç ã o sex u a l p re co ce até a id ad e n o r m a l de in íc io d a p u b erd a d e.



R e g re ssã o d os ca ra cte re s sex u ais se cu n d á rio s.



A tin g ir e s ta tu r a fin a l n o rm a l; d e sa celera çã o do ritm o de m a tu r a ç ã o esq u elética .



P rev en ção de d istú rb io s e m o c io n a is n a c ria n ç a e em su a fa m ília .



In te g ra ç ã o esco la r.



R e d u ç ã o de a b u so sex u a l e in íc io p re co ce d a ativ id ad e sexu al.



P rev en ção de gravidez.



P reserv ação de fe rtilid a d e fu tu ra .

CONCLUSÃO A causa mais comum de PP na menina é a PPGD idiopática, e o tratamento com GnRHa apresenta boa resposta terapêutica. Existe aumento na incidência da telarca precoce, e o diagnóstico diferencial entre a PPGD e a telarca precoce é importante, pois sabemos que a primeira leva à perda de estatura final, além de outros problemas já abordados. Com o aumento prevalente da obesidade, é importante fazer o diagnóstico diferen­ cial entre tecido glandular e lipomas tia. Saber identificar o paciente com PP, oferecer o tratamento correto, monitorar e sus­ pender no momento adequado é o ideal para que esse indivíduo não perca altura final.

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C a r m e n R e g in a L ea l W

e l l in g t o n

de

Sa n t a n a

A ssu m pção

da

S il v a J ú n io r

INTRODUÇÃO O termo puberdade define uma série complexa de transições biológicas previsíveis relacionadas com a maturação sexual em ambos os sexos.1 Faz parte de um pro­ cesso contínuo do desenvolvimento da função gonadal e da ontogenia do sistema hipotálamo-hipófise-gonadal desde a fase fetal até o amadurecimento sexual com­ pleto e a fertilidade.1,2 Portanto, abrange o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários, o crescimento esquelético e as mudanças na composição corporal. Es­ sas manifestações dependem de fatores genéticos, hormonais, ambientais além de fatores psicossociais.1,3,4 A puberdade tem início em função da gonadarca, ou seja, da ativação das gônadas pelos hormônios hipofisários folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH),3 que são secretados em resposta à reativação da liberação pulsátil do hormônio liberador de gonadotropinas (GnRH) pelo hipotálamo.1,3,4 O início da puberdade é controlado por muitos fatores ainda não completamente elucidados. O estímulo hipotalâmico para a puberdade é inibido a partir dos 6 meses de vida pós-natal, permanecendo quiescente até a idade usual de início da puberdade. A obtenção de um peso corporal (ou de uma composição corporal) crítico parece desempenhar um importante papel no desenca­ deamento e na manutenção da puberdade, especialmente nas meninas,5 o que pode estar relacionado com a secreção de leptina.3,5 Tipicamente, o início da puberdade é precedido pela adrenarca, termo que defi­ ne a ativação do córtex adrenal para a síntese de andrógenos adrenais.3 Essa ativação é resultante de uma mudança no desenvolvimento do padrão de resposta secretória adrenal ao hormônio adrenocorticotrófico (ACTH)6 e torna-se bioquimicamente apa­ rente em torno de 6 anos de idade em meninos e meninas. A adrenarca parece não estar relacionada com a maturação puberal do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal e, embora usualmente acompanhe de perto a puberdade, os dois fenômenos podem ser dissociados, como se observa na presença de hipogonadismo. A maturação sexual durante a puberdade consiste em uma série previsível de eventos. O desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários pode ser utilizado para o estadiamento clínico da puberdade com base nos critérios estabelecidos por James Tanner.8

Capítulo 5

Puberdade atrasada 83

IMPORTANTE D efin e-se p o r p u b a rc a o su rg im e n to de p elos n a região p ú b ica em a m b o s os sexos e, p o r telarca, o a p a re cim e n to de tecid o m a m á rio em m en in a s. O u tra s d efin içõ es im p o rta n te s são a m en arca, o u seja, a id ad e de in íc io d a p rim e ira m e n s tru a ç ã o , e a e sp e rm a rca , q u e co rre sp o n d e à id ad e de s u rg im e n to d a p rim e ira e ja cu la ç ã o (ev id en ciad a p elas em issõ es n o tu rn a s de esp e rm a e p ela p re se n ç a de e sp e rm a n a u rin a ). P a ra a lg u n s a u to re s, a e sp e rm a rca seria o e q u iv a le n te m a s c u ­ lin o d a m e n a rc a .3

O termo amenorreia primária pode ser utilizado para descrever meninas com mais de 15 anos com menarca atrasada, que podem apresentar telarca e pubarca normais, por presença de anormalidades anatômicas, como hímen imperfurado.4 O desenvolvimento puberal normal tem início geralmente entre os 9 e 12 anos, em meninas, e entre os 10 e 13 anos, em meninos.4 O intervalo de tempo entre o início da puberdade e o estágio adulto varia bastante em ambos os sexos. Estima-se em 3 anos o período médio de desenvolvimento do estágio 2 ao 5 (estadiamento de Tanner) de genitais e de pelos pubianos no sexo masculino.9,10 No sexo feminino, a estimativa é de 3 a 4 anos entre os estágios 2 ao 5 de mamas e de pelos pubianos.9,11 Em média, cada estágio puberal tem a duração de cerca de 6 a 9 meses. Variações na idade de início ou na progressão do desenvolvimento puberal compre­ endem a puberdade precoce e a puberdade atrasada.

■ CONCEITO DE PUBERDADE ATRASADA A puberdade atrasada é definida clinicamente como a ausência de sinais de maturação sexual em idade superior a 2,5 desvios-padrão (DP) acima da idade média para o início da puberdade em uma determinada população. Em termos práticos, corresponde a um volume testicular inferior a 4 ml em meninos com mais de 14 anos ou à ausência de desenvolvimento mamário em meninas com mais de 13 anos.1,4,12 Caracteriza-se ainda a puberdade atrasada nos casos de ausência de menarca em meninas a partir de 16 anos1,4 ou dentro de 5 anos após o início da puberdade.1

ETIOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO A etiologia da puberdade atrasada em ambos os sexos é variada. As causas podem ser transitórias ou permanentes, assim como podem afetar o desenvolvimento puberal desde o seu início ou interrompê-lo durante a sua progressão (Tabela 5.1). Assim se definem, de acordo com a fase de desenvolvimento puberal relacionada com puberdade atrasada: • Puberdade ausente ou infantilismo sexual: ocorre quando não se observam, de forma permanente, sinais de maturação sexual espontânea. • Puberdade incom pleta ou interrom pida: caracterizada quando os sinais de maturação sexual têm início, mas não progridem adequadamente (intervalo maior que 2 anos entre 2 estágios puberais consecutivos ou ausência de volume testicular adulto no sexo masculino ou de menarca no sexo feminino após 5 anos de início da puberdade).

84 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 5.1

Lista de causas de puberdade atrasada

Atraso puberal primário

Hipogonadismo hipogonadotrópico

Hipogonadismo hipergonado trópico

A tra so c o n s titu c io n a l

T u m o re s n o siste m a n ervoso

S ín d ro m e s g en éticas

d o c re s c im e n to e d a

cen tra l/ D o en ças in filtrativ as



S ín d ro m e de T u r n e r

p u b erd a d e



As tro e i to m a



S ín d ro m e de N o o n a n e



G e r m in o m a



G lio m a

P ré -m u ta çã o do X frág il



C ra n io fa rin g io m a

C rip to rq u id ism o

D o e n ç a s/ C o n d içõ e s



P r o la c tin o m a

D isg e n e sia g o n a d a l

sistê m ic a s



H is tio c ito s e de célu la s de

S ín d ro m e dos te stícu lo s

L a n g e rh a n s

ev an escen tes

Atraso puberal secundário

tr a n s to r n o s re la c io n a d o s



F ib ro s e c ís tic a



A sm a

C isto d a b o ls a de R a th k e

T ra u m a / T o rçã o te sticu la r



D o e n ç a in fla m a tó r ia

D e fe ito s g e n é tico s

Q u im io te ra p ia / R a d io te ra p ia

in te s tin a l



S ín d ro m e de K a llm a n

In fe c ç ã o g o n a d a l



D o e n ç a c e lía c a

(K A L I, F G F R 1 , P R O K 2 ,





A rtrite re u m a to id e

PR O K R 2, FG F8, H S6ST 1 e

G a la cto se m ia

ju v e n il

C H D 7)

O o fo rite a u to im u n e

H ip o g o n a d is m o h ip o g o n a ­

O rq u ite a u to im u n e

b u lim ia

d o tr ó p ic o iso la d o (K A L I,

D e fe ito s n a estero id o g ên ese

D o e n ç a fa lc ifo rm e

G N R H R , G N R H 1, G PR 54,



H e m o ssid e ro se

FG FR 1, FG F8, PR O K 2,



T a la s s e m ia

PR O K R 2, TA C 3, TA C R 3,



D e fic iê n c ia de 1 7 ,2 0 liase



D o e n ç a re n a l c r ô n ic a

H S 6 S T 1 , N ELF e C H D 7)



H ip e rp la sia A d ren al



S ID A

• •

A n o re x ia nervosa/





lip o id ic a c o n g ê n ita

Diabetes mellitus

n a d a l (D A X 1 , S F -1 ,

S ín d ro m e das célu las de

H ip o tir e o id is m o

H E S X -1 , L H X 3 e P R O P -1 )

S e rto li iso lad as (S ín d ro m e de

O b e sid a d e e h ip o g o n a ­

D e l C astillo )



D e fic iê n c ia de

d ism o h ip o g o n a d o tr ó p ic o

h o r m ô n io do

(L E P , L E P R e P C I )

c re s c im e n to

S ín d ro m e s

S ín d ro m e de C u s h in g



P ra d er-W illi

E x e rc íc io s fís ic o s



B a rd e t-B ie d l

excessiv os



CHARGE

D e s n u triç ã o

D o e n ç a de G a u ch e r



tase

In se n sib ilid a d e a n d ro g ê n ica

H ip e rp ro la c tin e m ia •

D eficiência de 5-alfa-redu-

h ip o tá la m o -h ip ó fls e -g o -

E n d o c r in o p a tia s •

D e se n v o lv im e n to do eixo

C a x u m b a , C o x sa ck ie

P ó s-in fe cçã o do siste m a n erv o so ce n tra l D e fe ito s d a lin h a m éd ia •

D is p la s ia s e p to -ó p tic a



H ip o p itu ita ris m o c o n g ê n ito

Q u im io te ra p ia / R a d io te ra p ia T ra u m a

Adaptado de Palmert MR, Dunkel L 13

Capítulo 5 Puberdade atrasada 85

Com relação ao caráter transitório ou permanente de sua causa, a puberdade atra­ sada pode ser classificada em: • Atraso puberal: é oriundo de uma causa transitória de puberdade atrasada. Subdi­ vide-se em: ■ Atraso puberal simples ou primário: também conhecido como atraso constitu­ cional do crescimento e da puberdade (ACCP), acomete indivíduos saudáveis com estatura reduzida para a idade cronológica, mas geralmente apropriada para a idade óssea e para o estado de desenvolvimento puberal, uma vez que ambos estão frequentemente atrasados. Constitui a principal causa de puber­ dade atrasada (80% a 90%) em ambos os sexos, porém é mais prevalente no sexo masculino.14 E considerada uma variante normal do desenvolvimento humano, uma vez que o desenvolvimento sexual se completa geralmente 2 a 4 anos mais tarde que a média populacional.4 A maioria dos casos (70% a 80%) é familiar, e história de atraso puberal em um dos genitores é comum.14 ■ Atraso puberal secundário (hipogonadismo hipogonadotrópico funcional): origi­ na-se em indivíduos acometidos por doenças crônicas descompensadas, em desnu­ tridos, em usuários crônicos de glicocorticoides ou naqueles que apresentam outros fatores que podem transitoriamente comprometer o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários.1,4,15 Na anorexia nervosa, ocorre amenorreia hipotalâmica que pode preceder ou ser concomitante à perda de peso.16 Sabe-se que o percentual de gordura corporal (acima de 17%) é determinante da menarca, sendo a leptina o elo entre o tecido adiposo e o eixo gonadal.17 Regressão dos ovários para estágios pré-puberais, regressão do tama­ nho das mamas e perda parcial dos pelos pubianos também podem ocorrer. Nos me­ ninos, observa-se a diminuição do LH, do FSH e da testosterona, associada à redução do volume testicular, oligo ou azoospermia.16 • Insuficiência do desenvolvimento puberal: é decorrente de uma causa permanente congênita ou adquirida de puberdade atrasada, em virtude do acometimento direto do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal, e pode ser subdividida em: ■ Hipogonadismo hipogonadotrópico: ocorre em virtude de falência hipotálamohipofísária permanente e, consequentemente, cursa com gonadotropinas baixas.4 A deficiência congênita de GnRH é essencialmente uma doença de meninos, com re­ lação entre os sexos de aproximadamente 5:1. A deficiência de GnRH pode manifes­ tar-se em qualquer idade.18 Quanto ao padrão de herança, essas formas congênitas, com ou sem anosmia, podem ser autossômicas recessivas, autossômicas dominantes ou ligadas ao X. No entanto, a herança oligogênica tem sido cada vez mais reconhe­ cida e manifesta-se por penetrância incompleta e expressividade variável dentro da mesma família, partilhando, pelo menos, uma mutação em um gene reconhecido como essencial para a secreção de GnRH.19 O diagnóstico definitivo da deficiência congênita de GnRH geralmente não é feito antes dos 18 anos de idade, a menos que outras características sugestivas estejam presentes (hipospádias anteriores e/ou criptorquidia, anosmia, agenesia renal, defeitos esqueléticos etc.).18 Um exemplo clássico de hipogonadismo hipogonadotrópico congênito é a Síndrome de Kallman, condição incomum com padrão de herança geralmente li­ gado ao X (Xp22.3). É 4 vezes mais frequente no sexo masculino.1 Decorre de mutações no gene KAL, o qual codifica uma molécula de adesão denominada

86 Endocrinologia Feminina e Andrologia

anosmina, responsável pela migração dos neurônios secretores de GnRH da pla­ ca olfatória para o hipotálamo durante a vida fetal.4 Classicamente, cursa com hipogonadismo hipogonadotrópico e anosmia ou hiposmia. A anosmia é secun­ dária à disgenesia dos lobos olfatórios e pode ser a única manifestação da síndrome. Os indivíduos com a Síndrome de Kallman geralmente apresentam esta­ tura normal na infância, mas falham em progredir com o estirão de crescimento puberal.1Hoje, acredita-se que a Síndrome de Kallman não seja necessariamente um transtorno que requeira terapia permanente. A reversão do hipogonadismo hipogonadotrópico já foi relatada em cerca de 10% dos pacientes do sexo mascu­ lino após a descontinuação da terapia hormonal.20,24 Outras doenças genéticas com padrões de herança variados também represen­ tam formas congênitas de puberdade atrasada decorrentes de hipogonadismo hipogonadotrópico. São exemplos algumas formas sindrômicas de obesidade associadas a retardo mental, como as Síndromes de Prader-Willi e de BardetBiedl.1,4 Dentre as formas adquiridas, destacam-se os tumores da região hipo­ tálamo-hipofisária, em especial o crâniofaringioma.1 As doenças infiltrativas da região hipotálamo-hipofisária (p. ex., linfoma, histiocitose de células de Langerhans, sarcoidose) podem resultar em diminuição da secreção de GnRH, concentrações séricas baixas ou normais de gonadotropinas e amenorreia. Essas lesões são raras e podem estar acompanhadas de sintomas neurológicos, como cefaleia intensa, alterações da personalidade ou transtornos do humor.21 ■ Hipogonadismo hipergonadotrópico: cursa com falência gonadal primária perma­ nente, o que resulta em secreção aumentada de gonadotropinas. As causas mais comuns são as genéticas, como as Síndromes de Turner e a de Klinefelter. A Síndrome de Turner (45, X) e suas variantes são a causa mais comum de hipogo­ nadismo hipergonadotrópico no sexo feminino,1,4 com incidência de 1:3.000 nascidas vivas.4 Alguns casos são diagnosticados na infância, decorrentes dos dismorfismos e das anomalias cardíacas ou renais.1 Em virtude da atenuação das características dismórficas nos casos de mosaicismos 45X/46XX ou outras aberrações do cromossomo X, presentes em cerca de 40% dos casos, o diagnóstico pode ocorrer apenas na puber­ dade, em função da baixa estatura e da puberdade atrasada.4 A Síndrome de Klinefelter, ou disgenesia dos túbulos seminíferos, é a causa mais frequente de hipogonadismo hipergonadotrópico no sexo masculino,1,4 ocorrendo em aproximadamente 1:1.000 nascidos vivos.4 Poucos casos são diagnosticados antes da puberdade e não é infrequente a ausência de diagnóstico até a vida adulta. O genótipo é tipicamente 47XXY, embora variações e mosaicismos possam ocorrer. O início da puberdade nem sempre está atrasado, mas a virilização inadequada resulta da dimi­ nuição da síntese de testosterona pelas células de Leydig. A disgenesia dos túbulos seminíferos resulta em infertilidade por comprometimento da espermatogênese. O volume testicular destes pacientes raramente ultrapassa 5 mL.4

■ AVALIAÇÃO CLÍNICA O objetivo da avaliação clínica inicial é excluir transtornos subjacentes causando pu­ berdade atrasada.12 Anamnese detalhada e exame físico minucioso devem preceder qualquer investigação laboratorial ou exames de imagem.15

Capítulo 5

Puberdade atrasada 87

A anamnese deve incluir informações sobre crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor da criança, surgimento de algum evento puberal e sua evolução cronológi­ ca, bem como etnia, hábitos nutricionais, exercícios físicos, história psicossocial, esta­ do de saúde atual, antecedentes mórbidos pessoais e uso de medicações, antecedente de criptorquidia, orquidopexia e irradiação gonadal ou central, exposição ambiental a disruptores endócrinos, alterações olfativas, sintomas neurológicos e história familiar de consanguinidade ou de atraso puberal, incluindo a menarca materna. O exame físico deve incluir aferições antrop o métricas cuidadosas, incluindo altura, peso, envergadura e relação entre os segmentos superior e inferior. Outro aspecto fun­ damental é a avaliação dos caracteres sexuais secundários e o estadiamento do grau de desenvolvimento sexual pela escala de Tanner.4

IMPORTANTE A lo ca liz a çã o , o ta m a n h o e a c o n s is tê n c ia d os te stíc u lo s , b e m co m o a p re se n ça de p ig m e n ta çã o e de e n ru g a m e n to d a p ele d a b o ls a e sc ro ta l, sem p re devem ser v e r ific a d a s .4 P a r tic u la r a te n ç ã o deve ser d a d a à s im e tr ia d o s te s tíc u lo s , u m a vez q u e tu m o r e s g o n a d a is p o d e m o c o rre r em v á rio s d is tú rb io s in te rse x u a is.

Aferições seriadas da altura e do volume testicular durante 1 ou 2 anos frequente­ mente ajudam a esclarecer o diagnóstico.15 Micropênis, associado ou não a criptorquidia, pode ser resultante de deficiência de GnRH.15 Em alguns casos de hipogonadismo hipergonadotrópico, a genitália ambí­ gua pode ser resultado de virilização parcial.1 A pesquisa de dismorfismos e de síndromes relacionadas com doenças ou condi­ ções sistêmicas deve ser realizada,4,15 e a antropometria dos pais e irmãos também deve ser obtida.4 A altura é um parâmetro importante a ser considerado para elucidação diagnóstica dos casos de insuficiência do desenvolvimento puberal. Em pacientes com falência gonadal primária, excetuando-se algumas síndromes dismórficas, a altura é usualmente normal.1 Nos casos de falência hipotálamo-hipofisária, quando o envolvimento hipofisário for somente do setor gonadotrópico, o paciente poderá apresentar estatura normal ou acima da média e proporções eunucoides em virtude do atraso na fusão epifisária. 15 Nesses pacientes, deve-se avaliar também a presença de defeitos da linha média (lábio leporino, fenda palatina), sindactilia, agenesia renal unilateral e criptorquidia uni ou bilateral, o que pode sugerir a presença de alterações genéticas específicas, como as mutações do receptor do fator de crescimento do fibroblasto tipo 1 (FGFR1).22

NOTA PRÁTICA •

In v e stig a r m e n in o s q u e p o ss u e m v o lu m e te s tic u la r in fe r io r a 4 m l c o m m a is de 14 a n o s;



H a b itu s e u n u c o id e s e n v o lv e o s e t o r g o n a d o t r ó f ic o d a h ip ó f is e . O p a c ie n t e a p r e s e n t a e s t a t u r a n o r m a l c o m o s m e m b r o s s u p e r io r e s e in fe r io r e s lo n g o s e m r e la ç ã o ao tó r a x . A re la ç ã o d o s e g m e n to s u p e r io r c o m o in f e r io r é m e n o r q u e 0 ,9 , e a e n v e rg a d u ra , m a io r q u e a e s ta tu r a e m p e lo m e n o s 1 c m , s u g e r in d o a tr a s o n o f e c h a m e n t o e p ifis á r io s e c u n ­ d á rio a h ip o g o n a d is m o ;2,3

88 Endocrinologia Feminina e Andrologia



O c o m p r im e n to p e n ia n o m e n o r do q u e 2 c m o u 2 D P d a m é d ia p a ra a id ad e c r o n o ló g ic a c a ra c te riz a o m ic ro p ê n is . A o b esid a d e em m e n in o s p o d e in ic ia lm e n te levar ao fa lso d ia g ­ n ó s tic o de m ic ro p ê n is , p o is h á a u m e n to do c o x im g o rd u ro s o su p ra p ú b ic o , sen d o m a n d a ­ to rio rea liz a r a m e d id a e o ex am e do p ê n is c o r re ta m e n te ;



N e n h u m te ste d istin g u e p a c ie n te s c o m A C C P (q u e te rã o ev o lu çã o e s p o n tâ n e a d a p u b e r­ dade) de p a c ie n te s c o m o u tra s ca u sa s de p u b e rd a d e a tra sa d a , p a r tic u la r m e n te h ip o g o n a d ism o h ip o g o n a d o tr ó p ic o . L o g o , a h is tó r ia c o m p le ta e o ex am e fís ic o d e ta lh a d o d evem p reced er q u a lq u e r ex a m e c o m p le m e n ta r.

QUESTIONAMENTOS DO MÉDICO AO PACIENTE •

H á s in to m a s n e u ro ló g ic o s , c o m o cefa leia , d is tú rb io s v isu ais, a n o s m ia , d iscin e sia , c o n v u l­ sões e d e fic iê n c ia m e n ta l, fa d ig a , p o liú ria e/ou p o lid ip sia ?



H á u so de d ro g a s c o m o h e r o ín a e m e ta d o n a , q u e p o d e m a lte ra r a se cre çã o de G n R H ?



E x iste h is tó r ia fa m ilia r de p u b erd a d e a tra sa d a o u a u sen te ?



F o i n e o n a ta l n o r m a l e teve b o a sa ú d e n a in fâ n cia ?



U ltim a m e n te , te m havido m u d a n ça n o s h á b ito s, estresse, peso, d ieta o u exercício , o u d o e n ça q u e p o d e re su lta r em a m e n o rre ia h ip o ta lâ m ic a ?

INVESTIGAÇÃO LABORATORIAL A partir da avaliação clínica do paciente com puberdade atrasada, alguns exames labo­ ratoriais poderão ser úteis para elucidação diagnóstica: • • • •

Dosagens de FSH e de LH basais e sob estímulo com 100 pg de GnRH. Dosagem randômica de prolactina. Dosagem de estradiol nas meninas. Dosagem de testosterona basal e sob estímulo com gonadotropina coriônica humana (hCG) nos meninos (a dosagem sob estímulo deverá ser realizada na presença de níveis gonadotrópicos baixos, criptorquidia ou outros distúrbios testiculares). • Cario tipo (avaliado a partir do DNA de linfó eitos do sangue periférico). • Avaliação de outras deficiências hormonais (na suspeita de deficiência hipofisária múltipla): TSH e T4 livre, cortisol, GH sob estímulo farmacológico, IGF-1 e proteína carreadora do IGF (IGFBP3).4 • Exames gerais (solicitados de acordo com a suspeita clínica de uma determinada doença ou condição sistêmica que esteja atuando como causa secundária de atraso puberal): hemograma, glicemia, ferritina, ureia, creatinina, eletrólitos, função hepática, fosfatase alcalina, urina tipo I, urinocultura, níveis séricos de IgA, anticorpos antiendomísio, antigliadina e antitransglutaminase IgA e IgG, teste do suor etc. A distinção entre ACCP e hipogonadismo hipogonadotrópico não é simples, uma vez que os níveis gonadotrópicos basais e sob estímulo com GnRH encontram-se bai­ xos em ambas as condições.4,12 O diagnóstico diferencial pode ser obtido de forma pouco específica com a dosagem de sulfato de deidroepiandrosterona (S-DHEA), um marcador de adrenarca. Pacientes com hipogonadismo hipogonadotrópico tendem a

Capítulo 5

Puberdade atrasada 89

apresentar maturação adrenal normal e, portanto, níveis normais de S-DHEA, o que é infrequente nos pacientes com ACCP.4,15 Em meninos, os níveis basais de inibina B também parecem apresentar alguma utilidade para distinguir as 2 condições, embora mais estudos ainda sejam necessários.23 O hipogonadismo hipergonadotrópico é sempre patológico e impõe a realização de cariótipo para investigação das disgenesias gonadais, mesmo na ausência de outros estigmas clínicos com elas relacionados.4,15

EXAMES DE IMAGEM A radiografia de mão e punho esquerdos (para avaliação da idade óssea) deve ser soli­ citada em todos os pacientes sob investigação de puberdade atrasada.15 Outros exames de imagem que se podem fazer necessários são: • Radiografia simples de crânio (calcificações supra e intrasselares sugerem a presença de um crâniofaringioma). • Ultrassonografia pélvica ou da bolsa escrotal (avaliação das gônadas, da presença ou ausência de útero e da sua integridade e investigação das massas ovarianas ou testiculares identificadas ao exame físico). • Laparoscopia (pode ser necessária quando as gônadas não são localizadas pelos métodos de imagem não invasivos ou nos casos de disgenesia gonadal com cromossomo Y total ou parcialmente presente, quando se deve proceder com a extirpação gonadal, em virtude do risco de degeneração maligna para gonadoblastoma). • Ressonância nuclear magnética (RNM) de crânio ou de sela turca (na presença de sintomas neurológicos, de sinais sugestivos de processos expansivos no sistema nervoso central ou se os testes laboratoriais forem compatíveis com transtornos hipotalâmicos ou hipofisários). Um algoritmo para avaliação de pacientes com puberdade atrasada é proposto na Figura 5.1.

TRATAMENTO Após avaliação clínica e investigação com exames complementares, deve-se estabele­ cer o tratamento da puberdade atrasada com base em sua etiologia. Se uma determi­ nada doença ou condição sistêmica responsável pelo atraso puberal for identificada, o tratamento específico deverá ser direcionado visando à correção do transtorno (reposição de hormônio tireoidiano no hipotireoidismo, utilização de agonista dopaminérgico no tratamento de prolactinoma, excisão de craniofaringioma etc.).1,15 Excetuando-se alguns poucos casos, o tratamento deve ser restrito a meninos com idade cronológica acima de 14 anos4,15 e meninas acima de 13 anos4 que exibam pouco ou nenhum sinal de puberdade e que expressem ansiedade considerável em virtude do atraso. As metas de curto prazo do tratamento da puberdade atrasada incluem: • Obtenção de caracteres sexuais secundários apropriados para a idade, a fim de melhorar a ansiedade do paciente sobre a própria aparência em relação aos seus

90 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Algoritmo para avaliação de pacientes com puberdade atrasada. ACCP: atraso constitucional do crescimento e da puberdade; IMC: índice de massa corporal; RNM: ressonância nuclear magnética. Adaptado de Palmert MR, Dunkel L.13 FIGURA 5.1

Capítulo 5

Puberdade atrasada 91

pares, um problema particular para meninos que necessitam se despir em ambientes públicos, como chuveiros comunitários ou aulas de ginástica, mas que ocorrem em algum grau em ambos os sexos. • Indução de um pico de crescimento sem que se promova o fechamento prematuro das epífises ósseas. Essa meta requer um seguimento frequente (p. ex., a cada 6 meses) da idade óssea durante o tratamento. As metas terapêuticas de longo prazo, nos casos de puberdade atrasada secundária à deficiência isolada de GnRH, são: • Manutenção das concentrações séricas de esteroides sexuais dentro dos valores de referência para adultos. • Eventualmente, indução da fertilidade, se e quando o paciente desejar.15 Em pacientes com ACCP, as opções de tratamento incluem conduta expectante ou terapia de baixa dose com testosterona (em meninos) ou estrogeno (em meninas). A família deve ser orientada sobre o diagnóstico e a evolução, para evitar ansiedade. A reposição de esteroides sexuais em baixas doses mostrou-se benéfica em meni­ nos e meninas, promovendo o aumento da velocidade de crescimento e da maturação sexual, o que afetou positivamente os aspectos psicossociais, como a autoestima e o bem-estar.12 Em meninos, a terapia com testosterona pode ser realizada por diversas vias, e a es­ colha deve considerar a preferência do paciente. Apesar de conveniente, o uso de gel de testosterona ainda não se encontra largamente aprovado para utilização em menores de 18 anos.4’15 A ausência de resposta (ou seja, a indução puberal) após 3 ciclos de testosterona em meninos com suposto ACCP pode sugerir hipogonadismo hipogonadotrópico per­ manente.12 As doses iniciais para tratamento do hipogonadismo hipogonadotrópico, em geral, são as mesmas das utilizadas no tratamento do ACCP, mas são aumentadas gradativamente, ao longo de aproximadamente 3 anos, até que as doses de reposição no adulto sejam atingidas.12,13 Outra potencial estratégia terapêutica para meninos com ACCP e baixa estatura são os inibidores da aromatase. Esses medicamentos bloqueiam a conversão de andrógenos em estrógenos, os principais hormônios responsáveis pelo fechamento das epífises ósseas. Por isso, já se mostraram capazes de prolongar o crescimento linear e de aumentar a estatura final em meninos. Ainda há carência de informações sobre o melhor momento para iniciar o tratamento, a dose apropriada e a duração da terapia. Além disso, alguns potenciais efeitos colaterais devem ser considerados, como alte­ rações no desenvolvimento do osso trabecular e deformidades nos corpos vertebrais. Mais estudos ainda são necessários antes que os inibidores da aromatase sejam incor­ porados na prática rotineira.12 Alguns esquemas terapêuticos para indução de puberdade no ACCP e no hipogo­ nadismo em meninos encontram-se disponível na Tabela 5.2.

92 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 5.2 Medicamentos utilizados para o tratamento do ACCP e do hipogonadismo permanente em meninos Medicamento e formulação

Tratamento dos meninos doses recomendadas ACCP

Efeitos colaterais e cuidados

Hipogonadismo E ritro c ito se , g a n h o de p eso, h ip erp la sia p ro stá tica . A ltas doses p o d em

TESTO STER O N A

p ro m o v er o fe c h a m e n to p re m a tu ro das epífises. N ão deve ser u tiliz a d a em m e n in o s co m id ad e ó ssea in fe rio r a 10 an o s.

E n a n ta to , c ip io n a to

N ão

P o d e-se in ic ia r

T o d a s as p rep araçõ es

e p r o p io n a to de

re co m e n d a d a s

ap ó s os 12 a n o s

IM : efeito s lo ca is

te s to s te r o n a IM

a n te s d os 14

de id ad e c o m

(dor, eritem a, reação

Enantato de testosterona apresenta uma duração de ação mais prolongada do que o propionato de testosterona.

a n o s.

5 0 m g a ca d a 4

in fla m a tó ria e ab scesso

D o s e s in ic ia is de

se m a n a s.

estéril).

5 0 m g alOO m g

A u m e n ta r a d ose

P ria p ism o p o d e o co rre r

a ca d a 4 se m a n a s

em 5 0 m g a ca d a

em p a cien te s co m d o e n ça

p o r 3 a 6 m eses.

6 -1 2 m eses.

fa lcifo rm e.

T r a ta m e n to

A p ó s a tin g ir

re p e tid o c o m

100 m g a 150 m g

in c r e m e n to s de

m e n s a lm e n te ,

25 mg a 50 mg

d im in u ir o

n a d o se (n ã o

in te rv a lo p a ra

ex ced er 1 0 0 m g ).

2/2 sem a n a s. D o s e de a d u lto : 2 0 0 m g a cad a 2 se m a n a s.

U n d e c a n o a to de

S e m in fo rm a ç õ e s

D o s e de a d u lto :

te s to s te r o n a IM

d isp o n ív eis.

1 .0 0 0 m g a cad a 1 0 -1 4 sem a n a s.

G e l de te s to s te r o n a

S e m in fo rm a ç õ e s

P o d e-se in ic ia r

Irrita çã o lo cal.

Preparações

d isp o n ív eis.

q u a n d o fo re m

A pós o u so , evitar o

transdérmicas para uso

a tin g id a s a p ro ­

c o n ta to de pele co m

tópico à noite.

x im a d a m e n te

o u tra s p essoas.

50% d as d o ses de a d u lto c o m te s to s te r o n a IM . D o s e s de ad u lto : 50 m g a 80 m g d ia ria m e n te . C o n tin u a

Capítulo 5

Puberdade atrasada 93

C o n tin u a ç ã o d a Tabela 5 .2 A in d a n ã o ap rovad os

IN IB ID O R E S DA ARO M ATASE

p ara esta in d ica çã o . A pós o in ício d a p u b erd ad e, p o d em a u m e n ta r a secreção de g o n a d o tro p in a s e os níveis circu la n te s de te sto ste ro n a .

L e tro z o l V O

2 ,5 m g d iá rio s.

N ão

D im in u iç ã o d os níveis

re co m e n d a d o .

de H D L co le stero l, e ritro cito se e d efo rm id ad es v ertebrais fo ra m relatad as.

A n a stro z o l V O

BOMBA D E IN FUSÃ O SC P U L S Á TIL D E G nRH

lm g d iá rio .

N ão

M e n o s p o te n te

re co m e n d a d o .

q u e o le tro z o l.

N ão

In ic ia r c o m 5 -

R e q u e r m a io r

re c o m e n d a d a

2 5 ng/kg/pulso

ex p eriên cia.

ro tin e ira m e n te .

a c a d a 9 0 m in a

E a fo r m a m a is

1 2 0 m in .

fis io ló g ic a de re p o siçã o .

A u m e n ta r p a ra 2 5 - 6 0 0 ng/kg/ p u lso .

hCG SC ou IM + F S H recombinante SC

N ão

h C G : d o ses de

h C G : in fla m a ç ã o

re co m e n d a d o s

5 0 0 U I a 3 .0 0 0

te s tic u la r, p o d e n d o

ro tin e ira m e n te .

U I d u as vezes p o r

in d u z ir a p o p to s e das

se m a n a , a u m e n ­

célu la s g e rm in a tiv a s.

ta d a s a c a d a 2

N o in íc io p ré -p u b e ra l

dias.

em p a c ie n te s c o m

D o se s a ju s ta d a s

h ip o g o n a d is m o

de a co rd o c o m os

h ip o g o n a d o tr ó p ic o é

n íveis sérico s de

n e ce ssá rio a d ic io n a r

te s to s te r o n a

o F S H p a ra in d u z ir o c re s c im e n to te s tic u la r e

F S H r e c o m b in a n ­

a e sp e rm a to g ê n e se . N ã o

te: d o ses de 75

h á d ad o s so b re e fe ito s

U I a 2 2 5 U I, 2 -3

fu tu r o s n a fe rtilid a d e .

vezes p o r sem a n a .

VO:via oral,SC: via subcutânea, IM:via intramuscular. Adaptado de Palmert MR, Dunkel L.13

Os esteroides sintéticos de administração oral se constituem em opções terapêuticas para meninos, como a oxandrolona que, tem como efeito colateral a hepatotoxicidade. As doses diárias devem ser de 0,1 mg/kg (cerca de 1,25-2,5 mg/dia) em pacientes com idade óssea superior a 9 anos.3

94 Endocrinologia Feminina e Andrologia

A indução da puberdade com estrógeno em meninas pode ser realizada pelas vias oral ou transdérmica, inicialmente em doses menores do que as utilizadas em adultos. A princípio, não se deve adicionar um progestógeno até que se observe um desenvol­ vimento mamário substancial e não apenas limitado à aréola, uma vez que o início precoce do progestógeno pode comprometer o crescimento mamário.15 O tratamento com estrógeno deve ser combinado com um progestógeno nas me­ ninas com hipogonadismo hipogonadotrópico permanente e naquelas em uso isola­ do de estrógeno há mais de 2 anos, visando promover a ciclicidade endometrial.15 O mesmo deve ocorrer nos casos em que se observa sangramento espontâneo com o uso isolado do estrógeno.1,4,15 Alguns esquemas terapêuticos para indução de puberdade no ACCP e no hipogo­ nadismo em meninas encontram-se disponíveis na Tabela 5.3.

IMPORTANTE É im p o r ta n te re ss a lta r q u e, n o s ca so s de h ip o g o n a d is m o h ip o g o n a d o tr ó p ic o em a m b o s o s sex o s, a re p o siçã o de este ro id e s sex u ais n ã o é ca p a z de re sta b e le ce r a fe rtilid a d e .

A testosterona exógena não induz o crescimento testicular ou a espermatogênese, e o estrógeno exógeno não induz a ovulação. A indução da fertilidade nesses casos requer tratamento com GnRH pulsátil ou gonadotropinas exógenas.1,4,12

TABELA 5.3 Medicamentos utilizados para o tratamento do ACCP e do hipogonadismo permanente em meninas Medicamento e formulação

Tratamento das meninas doses recomendadas ACCP

Efeitos colaterais e cuidados

Hipogonadismo

E s tr ó g e n o s E tin ile s tr a d io l

D o s e in ic ia l de

D o s e in ic ia l de 2 pg

T oxicid ad e hepática,

Componente das pílulas contraceptivas. Preparações de baixa dose estão disponíveis na Europa.

2 p g d ia ria m e n te .

d ia ria m e n te .

níveis au m en tad os de

A u m e n ta r ap ó s

A u m e n ta r a cad a

algum as p roteín as de

6 -1 2 m eses p a ra

6 a 12 m eses p a ra

ligação plasm áticas.

5 p g d ia ria m e n te .

5 P & 10 p g e 2 0 p g d ia ria m e n te (d o se de

P otencialm ente,

a d u lto ).

tro m b o em b o lism o e

m aio r risco de hip ertensão arterial do que os estrógenos naturais.

1 7 P -e s tra d io l

D o s e in ic ia l

D o s e in ic ia l de 5 pg/

E stró g en o s n atu rais

Comprimidos orais.

de 5 pg/kg V O

k g V O d ia ria m e n te .

p o d em ser preferíveis

d ia ria m e n te .

A u m e n ta r a cad a

aos estrógen o s

A u m e n ta r ap ó s

6 a 12 m eses p a ra

sin tético s.

6 -1 2 m eses

10 p g, 15 p g e 2 0 pg

A v ia tr a n s d é rm ic a

p a ra 10 pg/kg

d ia ria m e n te .

p o d e a p re s e n ta r

d ia ria m e n te .

D o s e de a d u lto :

v a n ta g e n s

1-2 m g d ia ria m e n te .

em re la çã o à a d m in is tra ç ã o o ral. C o n tin u o

Capítulo 5 Puberdade atrasada 95

C o n tin u a ç ã o d a Tabela 5 .3 1 7 p -e stra d io l

Adesivo: in ic ia r

Adesivo: in ic ia r c o m

N ã o h á d ad os

Adesivo ou gel transdérmicos de uso didrio.

c o m 3 ,1 -6 ,2 pg/

3 ,1 -6 ,2 p g / 24 h (1/8-

d isp on ív eis em

2 4 h (1/8-1/4 de

1/4 de u m ad esivo de

p a cien te s m ais

u m ad esivo de

2 5 p g / 24 h ).

jo v e n s so b re

2 5 p g / 24 h ).

A u m en tar em 3,1-

eq u iv alên cia de

A u m e n ta r em

6,2 pg/24 h a cad a 6

doses en tre o adesivo

3 ,1 -6 ,2 p g / 24 h a

m eses.

e o gel

c a d a 6 m eses.

D o s e de a d u lto : 5 0 1 0 0 p g / 24 h.

E s tró g e n o s e q u in o s

D o s e in ic ia l

D o s e in ic ia l de

E stró g e n o s e q u in o s

c o n ju g a d o s

de 0 ,1 6 2 5 m g

0 ,1 6 2 5 m g p o r 6 -1 2

co n ju g a d o s n ão

Comprimidos orais.

d ia ria m e n te

m eses.

são p recu rso res

p o r 6 -1 2 m eses

A u m e n ta r a ca d a 6 -1 2

do estrad io l. S eu

e d ep o is titu la r

m eses p a ra 0 ,3 2 5 m g,

u so é q u e stio n a d o

p a ra 0 ,3 2 5 m g

0 ,4 5 m g e 0 ,6 2 5 m g

c o m o u m a fo rm a

d ia ria m e n te .

d ia ria m e n te .

n ã o fisio ló g ica de

D o s a g e m d ep en d e

D o s e h a b itu a l de

rep o sição .

d a fo rm u la ç ã o .

a d u lto : 0 ,6 2 5 m g.

G e ra lm e n te

5 m g a 10 m g

Progesterona

n e c e ssá rio s ap en as

de a c e ta to de

adicionada para

se o tr a ta m e n to

m e d ro x ip ro g e s te ro n a

induzir ciclicidade

fo r d u ra r m a is do

d ia ria m e n te d u ra n te

endom etrial após

q u e 12 m eses.

o s ú ltim o s 7 dias do

12-18 meses de terapia

c iclo m e n stru a l.

estrogênica (m ais

A ltern a tiv a :

tardiam ente se a dose

p ro g e s te ro n a

de estrógeno tiver sido

m ic r o n iz a d a n a d ose

au m en tad a de fo rm a

de 1 0 0 p g a 2 0 0 p g

len ta e gradativa;

d ia ria m e n te .

m ais precocem ente se

P r o g e s tó g e n o s

Várias opções disponí­ veis, geralmente por via oral

ocorrer sangram ento espontâneo).

GnRH pulsátil

N ã o re co m e n d a d o ro tin e ira m e n te .

U sa d o p a ra fe rtilid a d e .

R eq u er m a io r expe­ riência. É a fo rm a m ais fisio ló g ica de reposição.

VO: via oral. Adaptado de Palmert MR, Dunkel L 13

CONCLUSÃO • Investigar todos os meninos de 14 anos e meninas de 13 anos sem sinais de puberdade. • Hipogonadismo primário ou hipergonadotrópico é caracterizado por altos níveis de LH e FSH. E uma condição sempre patológica e impõe a realização de cariótipo para investigação das disgenesias gonadais.

96 Endocrinologia Feminina e Andrologia

• O hipogonadismo secundário ou hipogonadotrópico e o ACCP são caracterizados por baixas concentrações de LH e FSH e a distinção entre ambos não é simples. Os componentes mais valiosos para diferençar as 2 condições são a história detalhada, o exame físico minucioso e o seguimento clínico frequente. • O exame físico deve incluir o estadiamento puberal pela escala de Tanner, aferições seriadas de peso, altura e volume testicular nos meninos. A velocidade de crescimento deve ser calculada a partir de avaliações consecutivas ao longo de, no mínimo, 6 meses. • Devem estar presentes na avaliação laboratorial inicial: LH e FSH, prolactina, função tireoidiana, estradiol nas meninas e testosterona total e fração livre nos meninos. Exames adicionais devem ser solicitados de acordo com a suspeita clínica e com os resultados dos exames iniciais. Em pacientes selecionados, a dosagem de andrógenos adrenais e o cariótipo são apropriados. • A radiografia de mão e punho esquerdos para determinação da idade óssea, já na avaliação inicial, fornece informações valiosas sobre a relação entre a idade cronológica e a maturação esquelética. Crianças com ACCP geralmente apresentam idades ósseas de 12 para 13,5 anos, embora possam evoluir para além dessa idade sem evidência de maturação puberal. Outros estudos de imagem que são úteis em pacientes selecio­ nados incluem a ultrassonografia pélvica ou testicular e a RNM de sela turca. • Se um transtorno específico (doença ou condição sistêmica) pode ser identificado como a causa do atraso puberal, a terapia deve ser direcionada para o respectivo transtorno. • A reposição de esteroides sexuais por um curto período em pacientes com ACCP pode ser apropriada quando o atraso puberal é grave ou quando as implicações na esfera psicossocial do paciente são proeminentes, não podendo ser solucionadas eficazmente com medidas educativas isoladas. A orientação dos familiares também é importante para evitar angústias. Apesar de as alterações no início ou na progressão do desenvolvimento puberal se­ rem prevalentes, ainda há uma lacuna de informações a respeito dos eventos deflagra­ dores da puberdade, da existência de métodos de boa acurácia para diferençar os casos de ACCP daqueles com hipogonadismo hipogonadotrópico e dos melhores esquemas terapêuticos para indução puberal. Dessa forma, ainda são necessários avanços que permitam melhor abordagem da puberdade atrasada, tema tão impactante sobre os aspectos biológicos e psicossociais.

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M a r c e l o F e r n a n d o Ro n s o n i M a r ia n a C o s t a S il v a

INTRODUÇÃO A ginecomastia é o excessivo desenvolvimento da glândula mamária masculina, uni­ lateral ou bilateral. Geralmente, apresenta-se como uma massa móvel subareolar, po­ dendo ser dolorosa ou apresentar-se de forma assintomática. É uma condição benigna e comumente autolimitada, porém costuma ocasionar prejuízo psicossocial e dimi­ nuição da qualidade de vida dos pacientes afetados.1'5 O critério para diagnóstico de ginecomastia varia de acordo com cada autor: alguns consideram patologia um disco glandular maior que 0,5 cm, e outros, maior que 2 cm de diâmetro. Estudos mostram tecido mamário palpável em 60% a 80% dos recémnascidos de ambos os sexos. Já entre os meninos, durante a puberdade, a prevalência de ginecomastia encontra-se entre 50% e 70%. Nos idosos acima de 70 anos, o aumento de mama pode ser encontrado em torno de 50% dos homens.5

■ FISIOPATOLOGIA

IMPORTANTE O m e c a n ism o p a to g ê n ic o b á sico d a g in e c o m a s tia é o d eseq u ilíb rio n a relação en tre e stró g e n o s e a n d ró g e n o s.

Os estrógenos promovem estímulo do crescimento glandular, enquanto os andró­ genos exercem ação inibitória sobre a glândula. Esse desequilíbrio hormonal decorre de uma maior produção ou atividade estrogênica ou de uma diminuição da produção ou da atividade androgênica.2,5 Nos homens, a maior parte dos andrógenos é produzida pelos testículos, enquanto o estradiol é derivado da aromatização da testosterona e androstenediona, principal­ mente nas células de Sertoli. Uma pequena porção dos estrógenos é convertida a par­ tir da testosterona, pela ação da enzima aromatase a nível periférico, sendo o tecido adiposo3 o maior sítio.

Capítulo 6 Ginecomastia 99

Podemos classificar a ginecomastia, quanto à etiologia, em fisiológica ou associada a outras condições. As causas dessa enfermidade estão listadas na Tabela 6.1.

G in e c o m a s tia fis io ló g ic a ■

G in e c o m a s tia n e o n a ta l



G in e c o m a s tia p u b e ra l



G in e c o m a s tia sen il

G in e c o m a s tia p a to ló g ic a ■

A u m e n to de e s tró g e n o s sérico s

o

E s tró g e n o s e x ó g e n o s

o

A u m e n to d a p ro d u ç ã o de e s tró g e n o s □

G ô n a d a s: tu m o re s d e cé lu la s de Leydig, tu m o re s de célu la s de S e r to li, tu m o re s de célu las g erm in ativ as, h e rm a fro d itism o verd ad eiro, in sen sib ilid a d e a n d ro g ê n ica c o n g ê n ita



A d ren ais: tu m o re s a d re n o c o rtic a is , h ip e rp la sia a d re n a l c o n g ê n ita



T e c id o s p e rifé rico s: o b esid a d e , cirro se h e p á tic a , c a r c in o m a h e p a to c e lu la r, realim e n ta ç ã o a p ó s d e s n u triç ã o , h ip e rtiro id is m o , s ín d ro m e do ex cesso de a ro m a ta s e fa m ilia r

o



P ro d u ç ã o a n o r m a l de h o r m ô n io g o n a d o tr ó flc o c o r iô n ic o (h C G ) □

E u tó p ic o : tu m o re s de cé lu la s g e rm in a tiv a s



E c tó p ic o : tu m o re s de p u lm ã o , fíg a d o , e s tô m a g o e rim

D im in u iç ã o d a p ro d u ç ã o de te s to s te r o n a

o

F a lê n c ia te s tic u la r p rim á ria □

C o n g ê n ita / g e n é tic a : a n o r q u ia c o n g ê n ita , s ín d r o m e de K lin e fe lte r, d e fe ito s n a b io s s ín te s e de te s to s te r o n a



A d q u irid a: o rq u ite v irai, tra u m a , c a s tra ç ã o , d o e n ça s n e u ro ló g ic a s e g ra n u lo m a to sa s (c o m o h a n s e n ía s e ), in s u fic iê n c ia re n a l

o

F a lê n c ia te s tic u la r s e c u n d á ria (d o e n ça h ip o ta lâ m ic a e/ou h ip o fisá ria )

M e d ic a m e n to s Id io p á tic a

D Ginecomastia fisiológica Neonatal Nos primeiros meses de vida, encontramos uma elevação dos estrógenos circulantes no neonato. Esses estrógenos foram produzidos pela unidade materno-feto-placentária e agem sobre a mama do recém-nascido, promovendo o crescimento da mesma. Na maioria dos casos, esse aumento é bilateral. Além da ampliação mamária, também pode ocorrer uma secreção opaca fisiológica, conhecida popularmente como “leite de bruxa”. O desaparecimento da ginecomastia acontece em poucas semanas, mas a mes­ ma pode persistir por períodos mais longos.6

Puberal Durante a puberdade, há uma elevação dos níveis de estradiol sérico nos meninos, en­ quanto os níveis de testosterona sérica não se modificam. Nesse caso, notamos que há

100 Endocrinologia Feminina e Andrologia

uma diminuição na relação entre testosterona e estradiol, sendo essa a patologia básica do crescimento mamário nessa fase. Normalmente, a ginecomastia puberal começa 1 ano após o início da puberdade, se apresentando de forma assimétrica e bilateralmente. Em alguns casos, está associada a uma dor mamária importante, o que estimula a procura por atendimento médico. O curso natural dessa forma também é a regressão espontânea entre 1 e 2 anos. Alguns adolescentes podem apresentar um aumento volumoso da mama (tecido mamário maior que 4 cm) e persistente, chamado de macromastia persistente puberal. Estudos endócrinos nesses pacientes têm falhado em revelar alguma anormalidade hormonal. Uma vez atingido o estágio de fibrose do tecido mamário, seja na macromastia ou na forma fisiológica, a regressão do volume mamário é muito pequena. Muitas vezes, nesses casos, é necessário fazer uso de terapia medicamentosa ou cirurgia para corrigir a displasia glandular.7

Senil Alguns idosos apresentam um declínio da testosterona sérica total e dos níveis de tes­ tosterona livre, associado a uma elevação da globulina ligadora dos hormônios sexuais (SHBG). O avanço da idade também está associado a um aumento da massa gorda e da atividade da aromatase no tecido adiposo. A ginecomastia senil também se apre­ senta bilateralmente, é indolor e normalmente não há regressão espontânea. Nessa faixa etária, deve-se atentar para a sobreposição de vários medicamentos que possam vir a ser causadores de ginecomastia (Tabela 6.2).8

TABELA 6.2

Principais medicamentos associados à ginecomastia

Hormônios A n d ró g e n o s, e ste ro id e s a n a b ó lic o s , e s tró g e n o s, g o n a d o tr o fin a c o r iô n ic a , h o r m ô n io de cre s­ c im e n to (G H )

Antibióticos C e to c o n a z o l, c ip ro flo x a c in o , e tio n a m id a , iso n ia z id a , m e tro n id a z o l

Medicamentos cardiovasculares A m io d a ro n a , a n lo d ip in o , a n ta g o n is ta s do c a n a l de c á lc io (v erap am il, d iltia z e m , n ife d ip in o ), b e ta b lo q u e a d o re s , d ig itá lic o s, d ig ito x in a , e s p ir o n o la c to n a , fu ro se m id a , in ib id o re s d a E C A (c a p to p ril, e n a la p ril), m e tild o p a , n itr a to s , re se rp in a , tia z íd ico s

Inibidores da síntese de andrógenos (medicamentos antiandrogênicos) A c e ta to de c ip ro te ro n a , c e to c o n a z o l, e s p iro n o la c to n a , flu ta m id a , fin a ste rid a , ó le o s d eriv ad o s de p la n ta s c o m a çã o a n tia n d ro g ê n ic a

Medicamentos antiulcerosos C im e tid in a , la n s o p ra z o l, o m e p ra z o l, r a n itid in a

Quimiot erápico s A g en tes a lq u ila n te s , a lca lo id e s v in ca , m e to tr e x a to , c o m b in a ç ã o de q u im io te r á p ic o s C o n tin u a

Capítulo 6 Ginecomastia

101

C ontinuação d a Tabela 6.2

Medicamentos psicoativos

Antidepressivos tricíclicos, inibidores da recaptação da serotonina (fluoxetina, venlafaxina, paroxetina), diazepam, fenotiazinas, haloperidol, neurolépticos, olanzapina, pregabalina, risperidona Medicamentos de abuso

Álcool, anfetaminas, heroína, maconha, metadona Outros medicamentos

Alopurinol, antirretrovirais, auranofina, clomifeno, domperidona, etretinato, fenitoína, fenofibrato, hipolipemiantes orais (atorvastatina, rosuvastatina), melatonina, metoclopramida, penicilamina, sulindac, teofilina

D Ginecomastia patológica Diversas alterações podem promover um desequilíbrio hormonal, levando à forma­ ção da ginecomastia. Esses estados patológicos são classificados conforme mostra a Figura 6.1.

1. Formação deficiente de testosterona

< Ç = jl 7 ß -H S d |= [ >

Testosterona

3. Aumento da formação de estrogênio extra-glandular (Aumento de substrato) Androstenediona

< Ç = jl 7 ß - H S P |= t>

Testosterona Aromatase

Aromatase

Secreção

Secreção < Ç = jl 7 ß -HSD

Testosterona

F o rm a çã o E xtra g la n d u la r

Estrona

Estradiol

Exemplos: tumores adrenais, hiperplasia adrenal congênita, deficiência de 17 p-HSD

4. Aumento da formação de estrogênio extra-glandular (Aumento da aromatase) Androstenediona

< d l7 ß - H S D |= ^ >

Testosterona

IAromatase I

Aromatase Secreção

Aromatase

Secreção

17 ß-HSD

< Ç = jl 7 ß -H S d | = ^

Estrona

Fo rm a çã o E x tra g la n d u la r

Estradiol Exemplos: tumores de células de Leydig e de Sertoli, hermafroditismo verdadeiro, tumores secretores de hCG

F o rm a çã o E xtra g la n d u la r

Estrona

Estradiol

Exemplos: aumento hereditário, carcinoma hepático, obesidade

*0 componente alterado de cada padrão encontra-se grifado em roxo. **17-p-HSD (hidroxiesteroide desidrogenase); hCG: hormônio gonadotrófico coriônico.

FIGURA 6.1 Padrões anormais da relação entre andrógeno e estrógeno.

102 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Fatores locais também desempenham importante função na fisiopatologia. Sabese que alterações nos receptores de androgênios ou de estrogênios, aumento da ati­ vidade local da aromatase ou diminuição de sua degradação podem levar ao desen­ volvimento de ginecomastia, sem que ocorram alterações nos níveis séricos desses hormônios.9,10 Alterações da ação ou da secreção de outros hormônios também podem oca­ sionar ginecomastia, p. ex.: prolactina, tiroxina, cortisol, gonadotrofína coriônica humana, leptina, GH, fator de crescimento semelhante à insulina (IGF) e horm ô­ nio luteinizante (LH). A hiperprolactinemia já foi considerada causa primária de ginecomastia, contudo, níveis elevados de prolactina podem ocasionar essa pa­ tologia devido a uma inibição da secreção de gonadotrofinas e hipogonadismo secundário, mas não, como se pensava, em virtude da ação direta da prolactina no tecido mamário.1113



Ginecomastia secundária ao uso de medicamentos

Nos últimos anos, vários estudos têm demonstrado o efeito trófico sobre a glândula ma­ mária, decorrente do desequilíbrio hormonal induzido por medicamentos. Os princi­ pais medicamentos associados à ginecomastia estão na Tabela 6.2, e seus mecanismos de ação principais estão descritos na Tabela 6.3.14-15

TABELA 6.3 Mecanismos de ação farmacológica implicados na indução da ginecomastia Medicamentos

Mecanismos de ação

D ia z e p a m , d ig o x in a , fe n ito ín a , h C G , c lo m i-

S ã o m e ta b o liz a d o s em e s tró g e n o s, p o ssu e m

fe n o , e ste ro id e s a n a b ó lic o s , e s tró g e n o s c o n ­

ativ id ad e e s tro g ê n ic a in tr ín s e c a o u e s tim u ­

ju g a d o s e s in té tic o s

la m a sín te s e de e s tró g e n o s

C im e tid in a , flu ta m id a , iso n ia z id a , c e to c o n a -

E x ib e m ativ id ad e a n tia n d ro g ê n ic a o u in i­

z o l, s u b s tâ n c ia s c ito tó x ic a s (b u s u lfa n , v in -

b e m a sín te se de a n d ró g e n o s

c ris tin a , v im b la s tin a ), m a c o n h a , m e to tre x a to , m e tro n id a z o l, o m e p ra z o l, p e n ic ila m in a , r a n itid in a , e s p ir o n o la c to n a D o m p e rid o n a , h a lo p e rid o l, m e to c lo p ra m i-

In d u z e m h ip e rp ro la c tin e m ia

d a, fe n o tia z in a D ia z e p a m , fe n ito ín a

A u m e n ta m a c o n c e n tr a ç ã o de S H B G

hCG: hormônio gonadotrófico coriônico,SHBG:globulina ligadora dos hormônios sexuais.

D

Ginecomastia idiopática

Na maioria das séries publicadas, 50% ou mais das ginecomastias avaliadas não têm alteração endócrina, doença associada ou uso de medicamento identificável, sendo assim classificadas como ginecomastias idiopáticas.16 Disruptores endócrinos ainda não identificados podem estar envolvidos na fi­ siopatologia dessas. Recentemente, os efeitos deletérios da exposição aos ésteres de ácidos ftálicos (ftalatos) despertaram a atenção da comunidade médica e de agências

Capítulo 6 Ginecomastia

103

reguladoras de todo o mundo. Eles são aditivos plastificantes de resinas de cloreto de polivinila (PVC), poliuretano e resinas celulósicas empregados em produção de fibras sintéticas de roupas ou estofados, brinquedos, cosméticos, aditivos alimentares, em­ balagens. Os ftalatos de alta massa molecular são considerados teratogênicos, hepatotóxicos, nefrotóxicos e, ainda, apresentam efeitos antiandrogênicos e associação com feminilização de fetos masculinos, telarca precoce e, possivelmente, ginecomastia.17'19

CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS A ginecomastia é comum em homens saudáveis e pode ser identificada, com fre­ quência, em um exame físico de rotina. Homens com ginecomastia estável de longa data não necessitam de novas investigações.

IMPORTANTE A p r e s e n ç a d e d o r m a m á r ia o u a u m e n t o d a m e s m a , de i n í c i o r e c e n t e , f o r a d a s fa ix a s e t á r ia s c o n s id e r a d a s f is io ló g ic a s , d e v e m c o n d u z ir a u m a in v e s tig a ç ã o e t i o l ó g ic a m a is d e ta lh a d a .

A principal queixa é o aumento concêntrico uni ou bilateral do componente glan­ dular mamário. A ginecomastia pode apresentar-se de forma dolorosa ou indolor. A dor mamária (mastodinia) ocorre em 25% dos casos, e aumento da sensibilidade local é descrita por 40% dos pacientes. A ginecomastia crônica é geralmente assintomática.5 Secreção mamilar, massa fixa ou massa excêntrica à palpação não são comuns na ginecomastia fisiológica e requerem uma investigação mais apurada.12



Investigação clínica

O roteiro clínico de avaliação do paciente com ginecomastia deve incluir anamnese e exame físico completos. Algumas características importantes a serem abordadas estão listadas abaixo:20 • Anamnese ■ Idade de início ■ Velocidade de progressão ■ Presença de dor ■ História de uso de medicamentos ■ Profissão ■ História familiar ■ Sintomas de disfunção sexual ■ Prejuízo psicossocial • Exame físico ■ Peso, altura, índice de massa corporal (IMC), circunferência abdominal, enverga­ dura e medidas dos segmentos corpóreos ■ Estádio puberal ■ Habitus (marfanoide, eunucoide) ■ Estigmas de doença hepática crônica

104 Endocrinologia Feminina e Andrologia

■ Sinais de hipertireoidismo ■ Avaliação das mamas: tamanho da glândula mamária, assimetria, contorno, presença de massas, existência de descarga papilar (espontânea e à expressão) deve-se diferenciar de lipomas tia ■ Avaliação gonádica: tamanho testicular, assimetria, consistência, presença de massas palpáveis

D

Investigação laboratorial

A avaliação laboratorial deve incluir a dosagem dos níveis hormonais séricos de testosterona total, estradiol, LH, hormônio estimulador da tireoide (TSH) e tiroxina livre (T4L), hCG e prolactina.1,20

D

Exames de imagem

Exames de imagem devem ser ponderados conforme cada caso. Ultrassonografia de mamas e mamografia são utilizadas para mensurar o componente glandular e realizar diagnóstico diferencial com outros aumentos na região de mamas (p. ex.: lipomastia). Podem ser úteis as avaliações com ultrassonografia testicular, tomografia computado­ rizada de adrenal e tomografia computadorizada de hipófise. O fluxograma da investi­ gação diagnóstica da ginecomastia está ilustrado na Figura 6.2.3,20

Avaliação Laboratorial da Ginecomastia Dosar hCG, LH, Te E2

r

T ■ n im i

i

1 Normal B d CG ■mu i * i 1r i Dosar PRL Dosar TSHeT4 L US testicular |HiP °9 °nadismo US testicular |Gi"ecomastia * i i i Primário idiopatica T4LÎ Normal Elevada ■ Normal i TShU I Massa | Normal | Cariótipo Normal Massa Resis­ 1 i HipertiroProlactinoma I tência tumor de célsJTumor de céls. idismo TC adrenal germinativas | germinativas (p ro v á v el)^ ^ ^ jjJ| J| jjy Andro_ HipogonadismoB gênica I 1 extragonadais Normal ■ Massa Secundário ou TC/RNM Neoplasia nãosela turca trofoblástica secretora de hCG

1 Exposição estrogênica

I

Elevada atividade Neoplasia extraglandular adrenal das aromatases

Rx tórax TCabdome hCG: gonadotrofina coriônica humana; LH: hormônio luteinizante;T:testosterona; E2: estradiol; PRL: prolactina;T4 L: T4 livre; TSH: hormônio tireoestimulante; TC: tomografia computadorizada; RNM: ressonância nuclear magnética;US: ultrasonografia; Rx: radiografia

FIGURA 6.2 Investigação diagnostica da ginecomastia.

Capítulo 6 Ginecomastia



105

Outras investigações

Outras investigações endocrinológicas e/ou exames de imagens são necessários nas seguintes situações:3 • Ginecomastia em meninos pré-púberes. • Macroginecomastia puberal. • Ginecomastia progressiva em qualquer idade. • Ginecomastia assimétrica (exceto para ginecomastia neonatal e puberal). • Suspeita de malignidade em mama, testículos ou outro sítio.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL O diagnóstico diferencial deve ser feito em caso de lipomas, neurofibromas, carci­ noma de mama e obesidade (lipomastia). Lipomas, neurofibromas e carcinoma de mama geralmente são unilaterais, pouco dolorosos e excêntricos, enquanto a gine­ comastia caracteristicamente começa em área subareolar e aumenta concentricamente. Em muitos casos, é difícil estabelecer uma diferenciação entre ginecomas­ tia e lipomastia. A palpação deve ser feita com o paciente em posição supina, e caso o tecido mamário seja sentido com a ponta dos dedos, trata-se de ginecomastia, mas se não for palpável, refere-se à lipomastia. A verdadeira ginecomastia também pode ser diferenciada da lipomastia por meio de mamografia ou ultrassonografia das mamas.1,3,20

TRATAMENTO Pelo seu caráter benigno e autolimitado, a maioria dos casos de ginecomastia não requer tratamento, apenas observação clínica.

IMPORTANTE D o r im p o rta n te e c o n s tra n g im e n to so cia l in d ica m a n ecessid ad e de te ra p ia esp ecífica, devendo o tr a ta m e n to ser d ire c io n a d o c o n fo rm e os o b je tiv o s do p a c ie n te .21,22

O tratamento da causa de base ou, se possível, a suspensão do medicamento causa­ dor de ginecomastia irão proporcionar regressão do tecido mamário e do desconfor­ to, ao menos, parcialmente. Há melhor resposta quando o tratamento é aplicado nos casos de início recente, dentro dos primeiros 6 meses de surgimento. Se o tempo de evolução for maior que 1 ano, dificilmente haverá regressão completa, devido à pro­ gressão para tecido fibroso.22,23 Como opções de tratamento medicamentoso, existem disponíveis substâncias androgênicas e antiestrogênicas, representadas pelos bloqueadores do receptor de estrógeno e pelos inibidores da aromatase (Tabela 6.4).

106 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 6.4

Tratamento clínico da ginecomastia

• Substâncias antiestrogênicas ■ Bloqueadores dos receptores de estrógeno o Tamoxifeno: 1 0 -2 0 m g , 2 vezes/dia, V O (to ta l de 2 0 - 4 0 m g/dia) o Raloxifeno: 6 0 m g , 1 vez/dia, V O o Clomifeno: 5 0 - 1 0 0 m g, 1 vez/dia, V O (to ta l de 5 0 - 1 0 0 m g/dia) ■ Inibidores da aromatase o Anastrazole: 1 m g , 1 vez/dia, V O o Letrozol: 2 ,5 m g, 1 vez/dia, V O o Exemestano: 2 5 m g , 1 vez/dia, V O • Substâncias androgênicas ■ Di-hidrotestosterona: 1 2 5 -3 7 5 m g, 1 vez/dia, tó p ico em gel (co m ercializad o p o r im p o r­ ta çã o )

• Substâncias antiandrogênicas ■ Danazol: 1 0 0 -3 0 0 m g , 2 vezes/dia, V O (to ta l de 1 0 0 -6 0 0 m g/dia) VO: via oral.

O uso de testosterona pode apresentar resultados benéficos em casos de hipogonadismo de curta duração, anorquia e orquite virai. Contudo, em muitos casos, como na síndrome de Klinefelter, ela apresenta efeitos inconsistentes e pode até piorar a ginecomastia, por ser aromatizada em estradiol. A di-hidrotestosterona apresenta me­ lhores resultados por não ser aromatizada.24 Os bloqueadores do receptor de estrógeno (tamoxifeno e raloxifeno) têm seu uso crescente, principalmente na ginecomastia puberal grave e dolorosa, com bons resul­ tados demonstrados em diversos trabalhos. Os inibidores da aromatase (anastrozol) têm se mostrado eficientes, porém com menos estudos de avaliação.22,25 Nos casos de ginecomastia decorrentes de terapia antiandrogênica para câncer de próstata, o tratamento mais efetivo parece ser a prevenção do seu desenvolvi­ mento pela irradiação das mamas (efetividade acima de 90%). Nesses pacientes, caso opte-se pelo tratamento medicamentoso, o tamoxifeno parece ser melhor que o anastrozol, e a administração diária de tamoxifeno parece ser mais adequada que a semanal.25,26

IMPORTANTE O t r a t a m e n t o c ir ú r g ic o ( m a m o p la s t ia ) d eve s e r c o n s id e r a d o p o r m o tiv o s e s t é t ic o s e m p a c ie n t e s c o m g i n e c o m a s t i a c r ô n ic a ( p r e d o m ín io d e te c id o f i b r ó t i c o ) e n a q u e le s q u e n ã o r e s p o n d e r a m à te r a p ia m e d ic a m e n to s a . A m a m o p la s tia é b a s t a n t e e m p r e g a d a a t u a l­ m e n te , e n t r e t a n t o , n e c e s s it a d e u m c ir u r g iã o e x p e r ie n te p a r a se o b t e r r e s u lt a d o s e s t é ­ tic o s s a tis fa tó r io s .

Capítulo 6 Ginecomastia

107

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108 Endocrinologia Feminina e Andrologia

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Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo Is a b e l a B u s s a d e W

a l m ir

C o u t in h o

INTRODUÇÃO Os transtornos alimentares são condições clínicas caracterizadas por alterações pato­ lógicas do comportamento alimentar. Na seção dedicada aos transtornos alimentares da DSM- IV (Diagnostic and Statistical Manual o f Mental Disorders - 4thEdition) estão lista­ das 2 categorias diagnósticas principais: a Anorexia Nervosa (AN) e a Bulimia Nervosa (BN). Além da AN e da BN, um terceiro tipo de transtorno alimentar tem sido pro­ posto, sob a denominação de Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP), tradução da nomenclatura de língua inglesa de Binge EatingDisorder. • Critérios diagnósticos da DSM-IV para Anorexia Nervosa: ■ Recusa em manter o peso corporal acima do peso mínimo considerado normal para a idade e altura (perda de peso conduzindo a manutenção de peso corporal menor que 85% do esperado, ou falha em atingir um ganho de peso durante o período de crescimento, conduzindo a um peso corporal menor que 85% do esperado). ■ Medo intenso de ganhar peso o tornar-se gordo mesmo estando abaixo do peso. ■ Distúrbio na forma com a qual o indivíduo vivência o seu peso ou forma corporal, não dando importância ao peso e a forma em uma autoavaliação ou negando a seriedade do baixo peso atual. ■ Nas mulheres após a menarca, amenorreia, isto é, ausência de, no mínimo, 3 ciclos menstruais consecutivos quando deveriam ocorrer Deve-se especificar os tipos: o Restritivo: durante o episódio de AN, o indivíduo não se envolve em episódios recorrentes de compulsão alimentar ou comportamento purgativo (isto é: vômitos autoinduzidos ou uso inapropriado de laxativos, diuréticos ou enemas). o Purgativo: durante o episódio de AN, o indivíduo envolve-se em episódios recorrentes de compulsão alimentar ou comportamento purgativo (isto é: vômitos autoinduzidos ou uso abusivo de laxativos, diuréticos ou enemas).

110

Endocrinologia Feminina e Andrologia

• Critérios diagnósticos da DSM-IV para Bulimia Nervosa: ■ Episódios recorrentes de compulsão alimentar, caracterizados por: o Comer em um período restrito de tempo (p. ex.: 2 horas) uma quantidade de comida considerada definitivamente maior do que a maioria das pessoas comeria em intervalo de tempo semelhante e nas mesmas circunstâncias, o Uma sensação de perda de controle sobre a ingestão alimentar durante o episódio. ■ Comportamentos compensatórios inadequados e recorrentes com a intenção de evitar o ganho de peso, tais como: vômitos autoinduzidos, uso inadequado de laxantes, diuréticos, enemas ou outras medicações, jejuns ou exercícios físicos. ■ Os episódios de comer compulsivo e os com portam entos compensatórios inadequados ocorreram, ao menos 2 vezes, em média, por semana, nos últimos 3 meses. ■ A autoavaliação está exageradamente associada à forma ou peso corporal. ■ O quadro não ocorre exclusivamente durante episódios de anorexia nervosa. Ocorre nos tipos: o Purgativo: durante o episódio corrente de BN, a pessoa envolve-se em episó­ dios recorrentes de vômitos autoinduzidos ou uso abusivo de laxativos, diuré­ ticos ou enemas. o Não purgativo: durante o episódio corrente de BN, a pessoa utiliza outros comportamentos compensatórios inapropriados tais como: jejuns ou exercí­ cios abusivos, mas não utilizou regularmente vômitos autoinduzidos ou uso abusivo de laxativos, diuréticos ou enemas. Considerando-se mulheres na idade reprodutiva, os transtornos alimentares são mais prevalentes do que se supõe, sendo a AN prevalente na ordem de 0,3%, mais fre­ quente em adolescentes, enquanto a BN tem prevalência de 0,5% a 1,5%, mais concen­ trada em adultos jovens, no auge da idade reprodutiva.1 Considerando-se transtornos alimentares subclínicos ou não especificados, sua ocorrência é provavelmente maior, mas sua prevalência não é particularmente definida.2

ANOREXIA NERVOSA □

Aspectos históricos

Muito embora existam relatos desde a antiguidade, somente no século 19 o conceito de inanição autoimposta foi diretamente associado, na literatura médica, a alguma perturbação mental subjacente. Os médicos William Gull, de Londres (1868) e Charles Lasègue, de Paris (1873), apresentaram quase que simultaneamente relatos de mulhe­ res jovens cujo quadro clínico era caracterizado por emagrecimento progressivo, amenorreia, constipação, perda do apetite, redução dos sinais vitais e graves perturbações psicológicas. Podemos ressaltar 3 conjuntos de critérios fundamentais para o diagnóstico de AN presentes nas diversas classificações atuais: (1) preocupação intensa com a forma e o peso; (2) comportamentos dirigidos à inexorável busca da magreza e (3) as conse­ quências físicas decorrentes desse comportamento, como emagrecimento progressivo, alterações na função endócrina e outras anormalidades nutricionais.

Capítulo 7 Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo

D

111

Epidemiologia

A AN ocorre predominantemente em mulheres jovens, somente 5% a 10% dos pacien­ tes são do sexo masculino. A incidência de AN é atualmente da ordem de 8 indivíduos por 100 mil/ano, e a taxa de prevalência, na ordem de 0,3% em mulheres jovens.1 Evidên­ cias sugerem que fatores psicossociais desempenham importante papel na distribui­ ção dos transtornos alimentares, tendo em vista a maior ocorrência desses distúrbios em países ocidentais industrializados. A influência da “cultura do corpo” e da pressão para a magreza que as mulheres sofrem nas sociedades ocidentais parece estar associa­ da ao desencadeamento de comportamentos anoréticos; dessa forma, determinadas profissões se encontram em risco aumentado para o desenvolvimento do transtorno, como modelos e bailarinas.3



Etiologia

O modelo etiológico mais aceito atualmente para explicar a gênese e a manutenção dos transtornos alimentares é o modelo multifatorial. Ele se baseia na hipótese de que vários fatores - biológicos, psicológicos e sociais - estejam associados ao desenvolvi­ mento e à manutenção dos transtornos alimentares. A neurotransmissão tem sido investigada pela sua relação com a determinação do comportamento alimentar, mas o estado de inanição, presente na maioria dos casos de AN, pode ser o responsável por várias alterações no metabolismo dos neurotrans­ missores, o que dificulta a pesquisa na área.4 Uma alteração no metabolismo da serotonina cerebral (hiperatividade) é uma das hipóteses para a etiologia da AN, podendo funcionar como marcador biológico das alterações psiquiátricas observadas em associação. Da mesma forma, o envolvi­ mento do sistema serotoninérgico poderia explicar outras manifestações característi­ cas da patologia, como as alterações do apetite apresentadas pelas pacientes. A suscetibilidade genética para AN e BN tem sido investigada em vários estudos de associação que avaliam gens candidatos, como fator neurotrófico derivado cerebral, re­ ceptor neurotrófico de tirosino quinase tipo 2 e 3, serotonina, leptina e hipocretinas.5

D

Quadro clínico

O desenvolvimento desta condição clínica se inicia de forma típica em mulheres jovens, geralmente na infância ou na adolescência. O início é marcado por uma restrição dietética progressiva com a eliminação de alimentos considerados “engordantes” como os carboi­ dratos. O medo de engordar é uma característica central da síndrome anorética, servindo, muitas vezes, como um diferencial para outros tipos de anorexia secundários às doenças clínicas ou psiquiátricas. De forma gradativa, as pacientes passam a viver exclusivamente em função da dieta, da comida, do peso e da forma corporal. O curso da doença é caracteri­ zado por perda de peso progressiva e continuada. A alteração da imagem corporal faz com que a pessoa se sinta acima do peso, apesar de sua magreza evidente.6 Existem 2 tipos de apresentação clínica da doença. O primeiro é constituído pelo grupo de pacientes que somente empregam comportamentos restritivos associa­ dos à dieta, sendo chamado de anorexia nervosa do tipo restritivo. Outro grupo de pacientes anoréticas compõe a categoria denominada de anorexia nervosa do tipo purgativo. Nesta forma da doença, ocorrem episódios de compulsão alimentar e comportamentos purgativos, como os vômitos autoinduzidos, além do abuso de laxativos e diuréticos.7

112

Endocrinologia Feminina e Andrologia

O comprometimento físico progressivo secundário ao estado de desnutrição crô­ nica ocasiona várias manifestações clínicas que complicam a evolução da AN. A gravi­ dade da desnutrição pode ser avaliada pelo índice de massa corporal (IMC = peso em quilogramas dividido pela altura ao quadrado; cuja faixa normal para adultos é de 20 a 25). Segundo os critérios diagnósticos atuais (DSM-IV, ou a Classificação Internacio­ nal de Doenças 10a Edição), podemos considerar que um IMC igual ou abaixo de 17,5 é um dos critérios para o diagnóstico de AN. No início, alguns sinais mais leves de desnutrição são observáveis: crescimento de lanugo, queda de cabelos, alopécia e ceratose folicular. A perda de peso, quando se ini­ cia, deve-se à perda de gordura. Entretanto, logo a seguir, o organismo dá início à gliconeogênese e ao catabolismo proteico. Esses processos conduzem a depleção proteica, perda de água do espaço intracelular, alterações no balanço eletrolítico e complicações metabólicas. Alcalose metabólica, hipocloremia, hiponatremia e hipocalemia são as alterações eletrolíticas mais frequentemente observáveis na AN e estão associadas às queixas de cansaço e à fraqueza muscular. A desidratação e a hipocalemia, comuns nas pacientes anoréxicas particularmente no tipo purgativo, podem conduzir à lesão tubular renal. Hipotensão arterial, bradicardia e arritmias cardíacas podem complicar as alterações hidroeletrolíticas existentes. A anemia, quando presente, é geralmente do tipo normocítica normocrômica, associada ou não à leucopenia.8 Várias alterações endócrinas estão presentes, a começar pelas alterações no eixo gonadal responsável pela amenorreia, manifestação típica desse quadro. As alterações nos hormônios tireoidianos podem conduzir ao hipotireoidismo clínico. A osteoporose e a infertilidade encontram-se entre as mais sérias consequências da AN. Os bai­ xos níveis de gonadotrofinas, estrógeno e a elevação do cortisol estão implicados na sua patogênese.8

Q

Diagnóstico diferencial

Várias condições clínicas podem cursar com anorexia e emagrecimento, como doenças do trato gastrointestinal, endocrinopatias, neoplasias ocultas e síndrome da imuno­ deficiência adquirida (AIDS). No entanto, quando a causa da anorexia e do emagreci­ mento é uma doença clínica, não existem as alterações da imagem corporal e o medo mórbido em relação ao ganho ponderai.

D Tratamento Devido a sua complexa etiologia multifatorial, a AN é considerada (assim como to­ dos os transtornos alimentares) uma condição de difícil tratamento. A integração das abordagens médica, psicológica e nutricional é a base da terapêutica. O psiquiatra, o clínico geral ou o endocrinologista, o psicólogo e o nutricionista devem trabalhar de forma integrada no tratamento da AN. Algumas metas devem nortear tanto o tratamento ambulatorial quanto o hospitalar.

IMPORTANTE O s p ro g ra m a s de tr a ta m e n to devem e sta b e le ce r u m p eso m ín im o p r o p o s to e u m a v elo cid a d e c o n tr o la d a de g a n h o de p eso p a ra q u e as p a c ie n te s p o ss a m d esen v o lv er o c o n tr o le so b re os seu s p ró p rio s h á b ito s a lim e n ta re s.

Capítulo 7 Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo

113

O “contrato” sobre o peso saudável mínimo é, talvez, uma das partes mais delicadas do tratamento, mas deve ser estabelecido de início entre a paciente e a equipe terapêutica. O uso de medicamentos não é o objetivo principal do tratamento, mas, na maioria das vezes, é essencial. Os medicamentos de suporte clínico, como reposição hidroeletrolítica oral, sulfato ferroso, cálcio e vitamina D, devem ser avaliados individual­ mente. Apesar de não existir um agente farmacológico específico para a AN, vários medicamentos têm-se mostrado úteis no tratamento dessa condição. O uso de antidepressivos é recomendável em pacientes que desenvolvem um quadro depressivo associado. A utilização dessas substâncias em pacientes com AN deve ser cautelosa, tendo em vista as frequentes anormalidades clínicas associadas. As pacientes com o tipo purgativo do transtorno podem se favorecer com a utilização de agentes antidepressivos do tipo inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), como fluoxetina 20 mg a 80 mg, paroxetina 10 mg a 40 mg e sertralina 50 mg a 150 mg, em um período de 6 a 12 meses. No caso de um transtorno de ansiedade associado, o uso de agentes ansiolíticos do tipo benzodiazepínicos, como alprazolam, clonazepam e bromazepam, pode ser recomendável.9

BULIMIA NERVOSA D Aspectos históricos Russel, em 1979, fez a descrição conceituai da síndrome bulímica como a conhecemos atualmente. Na descrição do quadro, destacavam-se 3 aspectos básicos: (1) impulso forte e intratável para a comida, (2) medo de se sentir empanzinado com os alimen­ tos expresso por meio dos vômitos, abuso de agentes purgativos ou ambos, (3) medo mórbido de ficar gordo (a). Nas classificações psiquiátricas, a bulimia emergiu como uma entidade diagnóstica distinta em 1980, com a publicação da 3aEdição do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-III).



Epidemiologia

O transtorno é tipicamente encontrado em mulheres jovens, sendo a prevalência da BN na ordem de 0,5% a 1,5%. A BN é rara em homens, e a sua ocorrência é de apro­ ximadamente 1/10 daquela observada nas mulheres. A sua incidência em serviços de atenção primária é em torno de 11,4 por 100 mil habitantes por ano. Determinadas populações, como manequins, dançarinos, atletas e outras profissões, evidenciam ris­ co aumentado para o desenvolvimento de BN.1

D

Etiologia

Anormalidades em vários sistemas neurotransmissores foram descritas na BN. A ocor­ rência de níveis diminuídos do neuropeptídeo Y (NYY) e da colecistoquinina (CCK) em pacientes bulímicas pode estar relacionada com a capacidade dos bulímicos em comerem uma grande quantidade de alimentos em um curto intervalo de tempo, em consequência de um baixo limiar de saciedade. A diminuição da atividade serotoninérgica central poderia ser um fator predisponente para o desenvolvimento da BN e também para os episódios de compulsão alimentar. Assim, a redução da atividade serotoninérgica central contribuiria para uma resposta diminuída aos estímulos de saciedade. A deficiência de serotonina seria a responsável pelo comportamento denominado carbohydrate cravingou ânsia por carboidratos, já que

114

Endocrinologia Feminina e Andrologia

esses compostos facilitam a entrada no cérebro de precursores da síntese de serotonina. Os estudos utilizando compostos que agem no sistema serotoninérgico, como os antidepressivos ISRS no tratamento da BN, corroboram a hipótese de que a redução na frequência de episódios bulímicos observada com os ISRS funciona como mais uma evidência indireta da ação que o sistema serotoninérgico desempenha na fisiopatologia da BN.10

D

Quadro clínico

O quadro clínico e/ou exame físico podem não ser suficientes para o diagnóstico de BN, sendo a característica principal do transtorno o episódio de compulsão alimentar, seguido de métodos purgativos. Seu diagnóstico não leva em conta o IMC e inclui um aspecto comportamental que se baseia em comer uma quantidade de comida conside­ rada exagerada se comparada ao que uma pessoa comeria nas mesmas condições.

IMPORTANTE A c o m p u ls ã o a lim e n ta r ta m b é m te m u m c o m p o n e n te su b je tiv o , q u e é a se n sa çã o in c ô m o d a q u e o p a c ie n te te m d u ra n te o e p isó d io de to ta l fa lta de c o n tr o le so b re o seu p ró p rio c o m p o r ­ ta m e n to . E sses e p isó d io s te n d e m a o c o rre r em is o la m e n to , n a m a io ria das vezes, e são a c o m ­ p a n h a d o s de s e n tim e n to s de a rre p e n d im e n to , c u lp a e d esejo s de a u to p u n iç ã o .

A quantidade de calorias ingerida por episódio pode variar enormemente, muito embora, em média, oscilem entre 2 mil a 5 mil calorias. O vômito auto induzido ocorre em cerca de 90% dos casos. O efeito imediato provo­ cado pelo vômito é o alívio do deconforto físico secundário à hiperalimentação, além da redução do medo de ganhar peso. A sua frequência é variável, podendo ser de 1 até 10 ou mais episódios por dia, nos casos mais graves. Outros mecanismos utilizados pelas bulímicas para controle do peso após uma ingestão exagerada são: uso inadequado (sem prescrição médica) de medicamentos do tipo laxativos, diuréticos, hormônios tireoidianos, agentes anorexígenos e enemas. Manobras como jejuns prolongados, exercícios físicos exagerados são também formas de controle do peso, mas geralmente geram menos complicações clínicas do que as técnicas purgativas já descritas. Na BN a paciente mantém preocupação excessiva com a forma e o peso corporal.11

Complicações clínicas Diferente da AN, as pacientes com BN podem apresentar IMC baixo, normal ou elevado. As consequências metabólicas podem ser secundárias a IMC fora das faixas recomendadas, episódios de compulsão alimentar ou das práticas compensatórias utilizadas. Algumas vezes, é por meio das complicações médicas do quadro que se faz o diag­ nóstico de BN. O alargamento bilateral das glândulas parótidas, a erosão no dorso das mãos (associados à indução do vômito), as cáries ou abrasões do esmalte dentário aparecem em pacientes com alta frequência de vômitos e auxiliam o reconhecimento de um caso de BN. A maioria dos comportamentos bulímicos, como os vômitos e o abuso de diuréticos e laxativos, conduz à desidratação e à alcalose metabólica subsequente. Aproximadamente

Capítulo 7 Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo

115

50% das pacientes apresentam anormalidades hidroeletrolíticas, sendo a alcalose meta­ bólica, a hipocloremia e a hipopotassemia as mais observadas. Hiponatremia, hipocalcemia, hipofosfatemia e hipomagnesemia encontram-se também descritas. Eventualmente, a acidose metabólica pode ocorrer em pacientes que fazem uso abusivo de laxativos. E comum a presença de sintomas gastrointestinais, como esofagite, gastrite e úlcera gástrica, além da ruptura do estômago, nos casos mais graves. As pacientes podem queixar-se de sintomas associados a episódios de hipoglicemia ocasionais.12 Assim como na AN, parece haver ocorrência aumentada de transtornos do humor e transtornos de ansiedade em pacientes com BN. Muitos estudos têm sugerido asso­ ciação positiva entre a presença de sintomas bulímicos e o surgimento de sintomas depressivos. O abuso de álcool e psicoestimulantes são descritos, mas também pode­ mos encontrar o abuso múltiplo de substâncias que, por via indireta, pode impactar na fertilidade das pacientes. O diagnóstico diferencial com AN do tipo purgativo é estabelecido, pois na BN a paciente não apresenta um emagrecimento tão intenso nem as alterações graves da imagem corporal evidenciadas na AN.

D Tratamento O tratamento da BN deve ser conduzido por uma equipe multiprofissional. A neces­ sidade de internação hospitalar nos casos de BN está relacionada com a presença de complicações médico-psiquiátricas. O abuso de laxativos, o abuso de álcool e outras drogas, o risco de suicídio e a gravidade de certos comportamentos decorrentes dos transtornos de personalidade podem necessitar de intervenção hospitalar. Na maio­ ria das vezes, entretanto, o tratamento da BN é extra-hospitalar, devendo-se tentar um período inicial de abordagens como a psicoterapia cognitivo-comportamental, o aconselhamento nutricional e o uso de psicofármacos, que podem conduzir à melhora das pacientes. Os ISRS são as drogas de primeira linha do tratamento dos sintomas bulímicos, notadamente o cloridrato de fluoxetina na dose de 20 mg a 80 mg durante 6 a 12 meses. No entanto, observações mais recentes sugerem que o efeito da fluoxetina em controlar os episódios de comer compulsivo pode ser tempo-limitado, ou seja, tende a diminuir com o tempo, sendo frequentes as recaídas, apesar da manutenção das doses.13 Como na AN, devemos levar em consideração algumas características clínicas da paciente bulímica quando prescrevermos um antidepressivo. Se a paciente apresentar baixo peso, o uso de psicofármacos deve ser acompanhado de perto, em função de uma possível resposta aumentada. Em pacientes com vômitos muito frequentes, pode haver desequilíbrio hidroeletrolítico (p. ex., hipocalemia), o que aumentaria a cardiotoxicidade de certas drogas. O efeito de perda de peso e diarreia eventualmente experimentados por alguns pacientes que usam ISRS podem atuar como agentes complicadores nesses casos. A ocorrência de toxicidade serotoninérgica deve ser também considerada, uma vez que leva à amplificação dos efeitos serotinérgicos centrais e à bradicardia.

TRANSTORNOS ALIMENTARES E INFERTILIDADE Ao assumirmos que as alterações endocrinometabólicas presentes nos transtornos ali­ mentares, notadamente na AN, têm primordialmente a função protetora durante os períodos prolongados de baixa oferta de macro e micronutrientes, compreendemos

116

Endocrinologia Feminina e Andrologia

que a amenorreia secundária, usada como critério diagnóstico da AN, reflete a adapta­ ção do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal ao período de restrição calórica sustentada. Mulheres com AN apresentam hipoestrogenismo secundário a disfunção hipotalâmica. O distúrbio de secreção de hormônio liberador das gonadotrofinas (GnRH) leva a alteração na pulsatilidade das gonodotrofinas e consequente estímulo ovariano in­ suficiente para ovulação, que se acompanha de diminuição na produção de estradiol. Também ocorre perda do feedback positivo em que baixos níveis de estrógeno estimu­ lariam a secreção de gonadotrofinas. Associada ao quadro existe, em menores propor­ ções, diminuição da aromatização de andrógenos em estrógenos no tecido adiposo (secundária à diminuição deste). A diminuição da ingesta calórica altera a pulsatilidade do GnRH, o que leva a uma resposta secretória subnormal de hormônio luteinizante (LH) e hormônio folículo estimulante (FSH). Especificamente existem aumento na relação FSH/LH e diminui­ ção da amplitude dos pulsos de LH.14 Também são descritas diferenças qualitativas no padrão de glicosilação das gonadotrofinas na AN, o que pode ter impacto em sua atividade biológica. Essas alterações hormonais resultam em uma fase folicular pro­ longada associada a uma fase lútea insuficiente, estando a restrição calórica associada à diminuição na pulsatilidade do LH e ao comprometimento da ovulação.15 A infer­ tilidade resulta tanto do distúrbio anovulatório quanto da restrição autoimposta à atividade sexual, comum nestas pacientes. A amenorreia presente na fase ativa da doença pode ser interpretada como um me­ canismo adaptativo no sentido de prevenção quanto a uma possível gestação em um período de comprometimento nutricional grave. A deficiência de fase lútea (descrita anteriormente) tem sido observada historicamente em épocas de racionamento de ali­ mentos, como nos períodos da primeira e da segunda guerra mundial. De especial interesse é a observação da presença de transtornos alimentares não diagnosticados em mulheres que procuram tratamento para infertilidade. Em um estudo longitu­ dinal, foi observada presença de transtornos alimentares em 58% das mulheres com amenorreia ou oligomenorreia.16



Tratamento

O objetivo primário do tratamento deve ser a recuperação do peso. Uma vez que este é reestabelecido (90% do peso previsto para a altura) e mantido, os ciclos menstruais tendem a se reestabelecer em até 1 ano. O retorno dos ciclos menstruais é usado como critério de recuperação das pacientes com transtorno alimentar. Um dos critérios hor­ monais utilizados para avaliação da melhora da função reprodutiva é a dosagem do estradiol sérico. Um adequado estado nutricional é um determinante crítico para a manutenção e a recuperação da atividade gonadal normal. Nesse contexto, tanto o conteúdo de gordu­ ra corporal per se quanto o consumo de macronutrientes exerce um importante papel na função reprodutiva, o que impacta na necessidade de um plano alimentar calcula­ do e balanceado para as necessidades de cada paciente, e não apenas a recomendação de ganho ponderai.17 Estudos mais recentes têm sugerido o papel de outros hormônios. Nesse contexto, os níveis médios de leptina seriam possíveis preditores do retorno dos ciclos mens­ truais, uma vez que existe relação direta desta com o conteúdo de tecido adiposo e o metabolismo energético. Em mulheres com AN, a elevação do cortisol basal também

Capítulo 7 Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo

117

se mostrou correlacionada com o conteúdo de gordura corporal, tendo sido conside­ rada um bom indicador de recuperação dos ciclos menstruais em mulheres com AN.18 No entanto, em mulheres com BN, que utilizam como padrão compensatório a práti­ ca de atividade física suprafisiológica, os níveis elevados de cortisol se correlacionam negativamente com a presença de ciclos menstruais. Níveis séricos de FSH, inibina B e hormônio antimülleriano tendem a estar suprimidos nas pacientes com transtorno alimentar ativo, associados ao grau de supressão ovariana. A dosagem sérica desses hormônios tem sido estudada, considerando que sua elevação tende a ser proporcio­ nal ao grau de recuperação ponderai. A elevação da leptina se associa ao incremento nos níveis de gonadotrofinas, in­ dicando que os níveis de leptina podem ser responsáveis pela ativação do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal. Estudos observacionais mostram ser necessários valores de leptina superiores a 1,85 ng/ml para elevação do FSH e do LH, assim como o restabe­ lecimento dos ciclos reprodutivos.19 Estudos iniciais em modelos animais validaram o uso da leptina recombinante como tratamento para amenorreia hipotalâmica secundária a déficit energético, com ou sem mudança no peso ponderai. Em humanos, foi administrada leptina recombinante subcutânea (metreleptina) por 3 meses, com o objetivo de normalizar os níveis séricos de leptina em mulheres com amenorreia hipotalâmica. As pacientes tratadas evoluíram com ciclos ovulatórios e aumento significativo nos níveis de LH, estradiol, fator do crescimento do tipo insulina 1 (IGF-1), hormônios tireoideanos e marcadores de formação óssea.20 Recentemente, em estudo randomizado, duplocego, controlado, 20 mulheres com amenorreia hipotalâmica foram tratadas com metreleptina ou placebo. No grupo tratado, os níveis de leptina aumentaram signi­ ficativamente após a quarta semana de tratamento e se mantiveram elevados nas 36 semanas subsequentes. Houve ajuste de dose nas pacientes com mudança ponderai, com o objetivo de não permitir ganho ou perda de peso. Os ciclos menstruais foram restabelecidos em 70% das pacientes, após 4 a 32 semanas do início do tratamento (sendo 50% destes ovulatórios), e houve também elevação nos níveis de estradiol e progesterona nessas pacientes.21 No grupo placebo, 2 entre 9 pacientes menstrua­ ram. Os resultados sugerem que a hipoleptinemia contribui significativamente para a função reprodutiva e neuroendócrina, sendo um elo entre peso corporal, metabo­ lismo e função gonadal. O uso de contraceptivos hormonais como mecanismo de retorno dos ciclos mens­ truais nas pacientes com transtorno alimentar ativo deve ser avaliado com cautela, pois, principalmente, em pacientes com AN pode-se perder um importante parâ­ metro de recuperação da doença, que é o retorno fisiológico dos ciclos menstruais. A administração de GnRH também foi estudada nesse grupo de pacientes, uma vez que tem a capacidade de induzir ciclos menstruais em mulheres com amenorreia hipogonadotrófica, em que as atividades ovariana e hipofisária encontram-se pre­ servadas.22

TRANSTORNOS ALIMENTARES E GESTAÇÃO O diagnóstico de gestação pode complicar o curso de um transtorno alimentar, e as mudanças na composição corporal podem aumentar a ansiedade em relação ao ganho de peso.

118

Endocrinologia Feminina e Andrologia

IMPORTANTE M u lh e re s q u e in ic ia m a g e sta çã o c o m h is tó r ia p reg re ssa de tr a n s to r n o a lim e n ta r devem ser m o n ito ra d a s de fo r m a m a is c o n s ta n te n o p e río d o g e s ta c io n a l e n o p ó s-p a rto , p rin c ip a lm e n te d u ra n te a a m a m e n ta ç ã o .

Em estudo retrospectivo, avaliando 454 mulheres no período de 3 a 7 meses pósparto, foi reportada prevalência de 11,5% de algum tipo de transtorno alimentar, com predominância em mulheres mais jovens.23 Ao considerarmos a possibilidade de a ges­ tação contribuir na recidiva ou no agravamento de um transtorno alimentar atual ou preexistente, os dados de literatura são controversos e sugerem um curso variável em diferentes amostras. Em 2 estudos prospectivos, foi demonstrado que os sintomas de transtorno alimentar podem melhorar em mulheres com BN, enquanto as pacientes com AN são mais propensas à recorrência de sintomas clínicos.24,25 Em recente estudo de coorte com 12.254 mulheres com graus variáveis de dis­ função do comportamento alimentar, foi observado que os sintomas de transtorno alimentar melhoraram durante o curso da gestação. No entanto, essas mulheres re­ portaram a manutenção da preocupação com seu peso, mais sintomas ansiosos re­ lacionados com o peso, maior prática de exercícios e dietas hipocalóricas e indução de vômitos e laxativos quando comparadas a mulheres sem transtorno alimentar pregresso.26 Ao considerarmos as evidências sobre a possibilidade de o transtorno alimentar afetar a gestação e o desenvolvimento fetal, os dados também são limitados. Em uma coorte com mulheres com AN, BN e controles, foi observado que mulheres com BN tiveram maior taxa de perda fetal enquanto as ocorrências de recém-natos com baixo peso foi maior em pacientes com AN, quando comparadas a mulheres sem trans­ torno alimentar.27 Em outro estudo retrospectivo, mulheres com AN e BN apresen­ taram maior prevalência de perda fetal, retardo de crescimento intrauterino, baixo peso ao nascer, fetos com microcefalia e trabalho de parto prematuro (principal­ mente em mulheres com IMC < 20 kg/m2).28 No entanto, a história pregressa de AN por si só não parece estar asssociada a desfechos negativos no trabalho de parto e/ou nascimento. A prevalência de transtornos de humor nas pacientes com transtorno alimentar no período pós-parto está aumentada. Em estudo retrospectivo caso-controle, foi obser­ vado que um terço das mulheres com transtorno alimentar evoluíram com sintomas depressivos no pós-parto, o que equivale a 3 vezes o valor encontrado na população geral, que está na ordem de 3% a 12%.29 O fato tende a se associar à interrupção do aleitamento materno mais precocemente. Considerando o curso da gestação distinto nas pacientes com transtorno alimen­ tar, as pacientes com histórico pregresso ou atual devem ser referenciadas precoce­ mente para acompanhameno obstétrico de alto risco e idealmente para um serviço especializado em transtornos alimentares.

Capítulo 7 Anorexia nervosa, bulimia e seus efeitos no sistema reprodutivo

119

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Obesidade e seus efeitos no sistema reprodutivo L u cia H en riq ues A lves da S ilva D io g o G uarnieri Pa n a zzo lo L u iz G uilherm e K raemer de A g u ia r

INTRODUÇÃO Obesidade, definida como o excesso de gordura corporal resultante de um desequi­ líbrio energético secundário a elementos comportamentais, ambientais e genéticos, classifica-se, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), pelo cálculo do índice de massa corporal (IMC) (Tabela 8.1).

TABELA 8.1

Classificação dos indivíduos quanto ao seu IMC IMC = peso/ (Altura x Altura) - dado em kg/m 2

IM C e n tre 18 a 2 4 ,9

Peso normal

IM C e n tre 2 5 a 2 9 ,9

Sobrepeso

IM C m a io r q u e 3 0 3 0 a 3 4 ,9 3 5 a 3 9 ,9 >40

Obesidade Obesidade leve Obesidade moderada Obesidade grave

Grau I Grau II Grau III

Cabe mencionar que, apesar de útil e facilmente reprodutível, o IMC não deve ser utilizado de forma isolada na avaliação clínica, já que não distingue massa gorda de massa magra. Por exemplo, um indivíduo com grande quantidade de massa muscular ou se estiver edemaciado pode apresentar elevado IMC sem estar obeso; da mesma for­ ma, um paciente com IMC normal pode apresentar significativo acúmulo de gordura abdominal (avaliado pela medida da circunferência abdominal), o que se constitui fator de risco cardiovascular. Estudos promissores vêm sendo feitos no sentido de se validar novos índices para essa diferenciação como o recentemente proposto índice de adiposidade corporal (BAI - da sigla, em inglês, Body Adiposity Index) } Diversos pontos de corte para definição de anormalidade da circunferência abdo­ minal foram definidos; de consenso, sabe-se que ela se correlaciona positivamente com a gordura visceral. Uma das propostas mais utilizadas atualmente, por contemplar

122 Endocrinologia Feminina e Andrologia

indivíduos de etnias distintas, é a da International Diabetes Federation (IDF) (Tabela 8.2),2 que recomenda pontos de corte de 80 cm e 90 cm, respectivamente, para mulheres e homens em nossa população.

TABELA 8.2

Valores étnico-específicos de circunferência abdominal (CA)

País\etnia Europeus (n o s EU A , as m ed id a s p a ra

H om ens

>94

M u lh e re s

>80

H om ens

>90

M u lh e re s

>80

H om ens

>90

M u lh e re s

>80

H om ens

>90

M u lh e re s

>80

h o m e n s > 1 0 2 c m e m u lh e re s > 8 8 cm p o ssiv e lm e n te c o n tin u a r ã o a serem u sa d a s p a ra fin s c lín ic o s).

Sul-asiáticos

Chineses

Japoneses

Americanos do Sul e Centro

U tiliz a r v alo res d os s u l-a s iá tic o s *

Africanos Subsaarianos

U tiliz a r v alo res d os eu ro p eu s

Mediterrâneos orientais e Árabes

U tiliz a r v alo res d os eu ro p eu s

* Até que medidas específicas estejam disponíveis.

FISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR O sistema reprodutor feminino é responsável pela produção de óvulos, pela prepa­ ração de um ambiente com adequadas condições para implantação daqueles fertili­ zados pelos espermatozóides e ainda pelo desenvolvimento do embrião até o nasci­ mento. As principais funções do aparelho reprodutor masculino são a produção de espermatozóides e a síntese de testoterona, que asseguram ao homem a fertilidade, a virilidade e a manutenção dos caracteres sexuais masculinos. Para tal, é necessária a ação coordenada de diversas estruturas - hipotálamo, hipófise, ovários e útero que, por meio da síntese e da secreção de hormônios e peptídeos, regulam o processo fisiológico. O hipotálamo, por meio de neurônios cujos axônios se projetam na circulação por­ to-hip o fisária, produz e secreta, de forma pulsátil, dentro de frequência e amplitude específicas, o hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH). Este, por sua vez, esti­ mula os gonadotrofos da hipófise anterior a sintetizarem e secretarem os hormônios folículo estimulante (FSH) e o luteinizante (LH). Diversos sinais centrais e periféricos modulam a atividade neuronal e permitem ou não a liberação do GnRH pelo hipotálamo.

Capítulo 8 Obesidade e seus efeitos no sistema reprodutivo

123

Alguns desses sinais são estimuladores, como a norepinefrina (NE), o neuropeptídeo Y (NPY) e a leptina, enquanto outros são inibitórios, como a p-endorfina, o ácido gamaminobutírico (GABA) e a interleucina-1. Há ainda a ocorrência de determinados sinais com ação tanto estimulatória quanto inibitória, como o 17-p-estradiol. A am­ plitude e a frequência dos pulsos de secreção do GnRH pelo hipotálamo regulam na adeno-hipófise a síntese de gonadotrofos. Nesse contexto, a síntese do FSH é maior em resposta a pulsos de baixa frequência, enquanto pulsos com maior frequência e amplitude aumentam a síntese do LH. Na mulher, o FSH tem o papel de recrutar os folículos primordiais e estimular seu crescimento e sua maturação. Além disso, induz a expressão de receptores de LH, a atividade da enzima aromatase capaz de converter a androstenediona, produzida nas células da teca, em 17-p-estradiol nas células da granulosa e ainda a síntese de inibina B. Já o LH induz a ovulação, a manutenção da produção do estradiol pelas células da granulosa e da progesterona pelo corpo lúteo, a produção de andrógenos pelas células da teca e ainda o estímulo à secreção de inibina A. Os peptídeos ativina e folistatina, juntamente com os subtipos de inibina, além dos hormônios ovarianos, contribuem para a regulação da secreção das gonadotrofinas (Figura 8.1) por meio de mecanismos contrarregulatórios.

Hipotálamo GnRH+ Hipófise

' 30 kg/m2).27 Os medicamentos listados na Tabela 8.4 são os mais uti­ lizados na prática clínica para perda de peso. Entretanto, somente os 2 primeiros têm a indicação em bula. A fluoxetina, a bupropiona e o topiramato, usados com outras indicações, agem na redução de episódios compulsivos em alguns casos específicos e podem também proporcionar redução ponderai.

TABELA 8.4 Medicação S ib u tr a m in a

Principais medicações utilizadas para o tratamento da obesidade Mecanismo de ação

Dose habitual

In ib e a re c a p ta ç ã o

1 0 -1 5 m g/dia

Efeitos colaterais B o c a seca, a u m e n to

de s e r o to n in a e d a

d a p ressã o a rte ria l e

n o ra d re n a lin a

fre q u ê n c ia ca rd ía ca , c o n s tip a ç ã o

O r lis ta t

R e d u z a a b s o rç ã o de

1 2 0 -3 6 0 m g/dia

g o rd u ra n o in te s tin o

D ia rre ia , fla tu lê n c ia , d isp ep sia

(em to r n o de 30% ) F lu o x e tin a *

In ib e a re c a p ta ç ã o de

1 0 -6 0 m g/dia

s e r o to n in a T o p ir a m a to *

B u p r o p io n a *

A tu a n a m o d u la ç ã o

N e rv o sism o , n á u se a s, re d u çã o d a lib id o

7 5 - 2 0 0 m g/dia

P ro b le m a s de c o o rd e ­

de re ce p to re s d o

n a ç ã o , d ificu ld a d e de

á cid o g a m a -a m in o -

c o n c e n tra ç ã o , to n tu r a ,

b u tír ic o

p a restesia s

In ib e re c a p ta ç ã o de

1 5 0 -3 0 0 m g/dia

C o n v u lsõ es, in s ô n ia ,

d o p a m in a e n o ra d re ­

tre m o r, d is tú rb io s de

n a lin a

c o n c e n tra ç ã o

*Não é considerado agente antiobesidade.

EFEITOS DA PERDA DE PESO NO SISTEMA REPRODUTIVO A perda ponderai constitui-se medida fundamental para o restabelecimento da fun­ ção reprodutiva em ambos os sexos. A intensidade dos efeitos depende do grau de obesidade e do montante de peso perdido. Isso ocorre em virtude da melhora do perfil hormonal, da amplificação da sensibilidade à ação da insulina e ainda da redução dos níveis de leptina e citocinas inflamatórias. No sexo feminino, diversos estudos mostraram efeitos positivos da redução ponde­ rai sobre o ciclo menstrual e a fertilidade, mesmo com perdas da ordem de 5% a 10% do peso inicial. Esses trabalhos contemplaram diferentes modalidades de tratamento para obesidade, como dieta hipocalórica, atividade física regular, uso de medicamen­ tos específicos e cirurgia bariátrica.28'30

Capítulo 8 Obesidade e seus efeitos no sistema reprodutivo

129

O perfil hormonal dos homens obesos que perdem peso também melhora, pois há aumento dos níveis de LH, SHBG, testosterona total e livre com diminuição dos níveis de estradiol, tanto após perda por dieta hipocalórica31 quanto por cirurgia bariátrica.32 Evidências indicam que também pode ocorrer aumento nos níveis de inibina B,25 sugerindo possível melhora da espermatogênese. Outro efeito importante da perda de peso é sobre a disfunção erétil, pois homens que perdem 10% ou mais do seu peso apresentaram melhora a disfunção.33 Com base nas considerações, o tratamento da obesidade, independentemente da opção terapêutica empregada, com consequente redução ponderai e manutenção da perda, traz benefícios diretos sobre o sistema reprodutor. Entretanto, alguns pon­ tos merecem atenção em relação à população feminina. A recomendação ideal é a orientação para o emprego de métodos de contracepção, preferencialmente métodos de barreira, a qual deve ser feita previamente ao início do uso de qualquer agentes antiobesidade. Devemos, no entanto, ressaltar que os contraceptivos hormonais orais em baixas doses nas pacientes obesas podem ter sua eficácia reduzida. Contudo, caso as mulheres tratadas engravidem, a ingestão de qualquer um desses agentes deve ser prontamente interrompida. Outra recomendação importante é que, se a perda de peso foi obtida por meio de cirurgia bariátrica, a prevenção e/ou o tratamento de possíveis deficiências nutricionais associadas são necessários e funda­ mentais, a fim de evitar eventos adversos materno-fetais.

CONCLUSÃO O sistema reprodutor da mulher e do homem obesos sofre impactos importantes em sua regulação. Independentemente do gênero, há consequências clínicas que estão di­ retamente relacionadas com o grau de adiposidade corporal. A recomendação ideal para a reversão da comorbidade é o estímulo à redução ponderai. Em obesos, perdas de 5% a 10% do peso inicial já resultam em melhora na função reprodutiva e devem ser estimuladas como primeira medida terapêutica, a fim de restabelecer a homeostase do sistema reprodutivo.

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Capítulo 8 Obesidade e seus efeitos no sistema reprodutivo

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INTRODUÇÃO O funcionamento normal do sistema reprodutor feminino envolve uma estreita inte­ gração do eixo hipotálamo-hipófise-ovariano (HHO) e o funcionamento adequado de órgãos como tireoide e adrenais. No presente capítulo, nos propomos a apresentar uma breve revisão da fisiologia do eixo e abordar aspectos específicos do diagnóstico e do tra­ tamento das principais causas de hipogonadismo feminino hiper e hipogonadotrófico.

D

Fisiologia do eixo hipotálamo-hipófise-ovariano

Ao nascimento, as meninas têm um número fixo de folículos primordiais (cerca de 100 mil), que diminui progressivamente ao longo da vida até cerca de lm il aos 50 anos de idade. Antes da primeira ovulação, os oócitos se encontram na fase de repouso da primeira divisão meiótica, e o crescimento folicular é mediado pela ação do hormô­ nio folículo-estimulante (FSH) sobre os folículos ovarianos. A produção de estrógeno pelos folículos é resultante do estímulo combinado de FSH e hormônio luteinizante (LH) sobre as células da granulosa e da teca. Portanto, o eixo HHO desempenha um papel central no desenvolvimento do sistema reprodutor feminino por estimular a gametogênese, a esteroidogênese ovariana, o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários e permitir a reprodução sexual.

IMPORTANTE A o lo n g o d o d esen v o lv im en to até a vida a d u lta , o eixo H H O a p re se n ta g ran d es flu tu a çõ e s n a su a atividade, sendo in flu en ciad o pelo estresse am b ien tal e pelo estado n u tricio n al. E m h u m an o s, exibe u m p ad rão de ativid ad e ca ra cte rística , sen d o ativo n a vida in tra u te rin a e n o in ício d a vida p ó s-n a ta l, a seg u ir re p rim id o p o r m e ca n ism o s cen tra is a in d a in d e te rm in a d o s n o p erío d o prép u b era l e n o v a m e n te ativad o n a p u b erd ad e.

A ativação puberal da secreção de hormônio liberador das gonadotrofinas (GnRH) é regulada por estímulos transinápticos e gliais facilitadores e inibidores sobre a rede de neurônios GnRH. Estudos recentes apontam que a secreção de GnRH é controlada

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

133

por 2 subgrupos de genes - subordinados e governantes - que operam em diferentes contextos para coordenar a atividade secretória do GnRH na puberdade. Em mamífe­ ros, demonstrou-se que a via excitatória envolve aminoácidos (glutamato) e o neuropeptídeo kisspeptina, e a via inibitória, opioides e o ácido aminobutírico (GABA). As células gliais produzem fatores de crescimento (FGF, IGF-I e TGF ) e prostaglandinas que, por sinalização célula a célula, estimulam a liberação de GnRH e se mostram fun­ damentais para o início da puberdade (Figura 9.1).1 Em resposta ao GnRH, a adeno-hipófise secreta o FSH e o LH. O LH estimula a produção de androstenediona nas células da teca do ovário, enquanto o FSH promove o crescimento dos folículos ovarianos e regula a produção de estradiol (E2) e de inibina B

FIGURA 9.1 Representação esquemática do controle transináptico e glial dos neurônios GnRH por ocasião da puberdade feminina. 0 domínio I exibe os componentes inibitórios transinápticos do sis­ tema, representados pelos neurônios GABA e produtores de opioides; o domínio II, as vias neuronais excitatórias, representadas pelos neurônios glutamatérgicos e produtores de kisspeptina (KISS); e o domínio III é composto de células astrogliais e ependimogliais. GABA R, receptor y-aminobutírico (GABA); OPR, receptor opioide; GLU, glutamato; GLU R, receptor de glutamato; GPR54: receptor de kisspeptina;TGF pR, receptor do fator de crescimento tumoral P; FGF R, receptor do fator de cresci­ mento do fibroblasto (FGF); IGFR, receptor de fator de crescimento insulina-símile - I (IGF-I); PGER, receptor de prostag landi na (PG); setas com linhas cheias: estimulação; setas com linhas tracejadas: inibição. Adaptado de Ojeda SR e t o l J

134 Endocrinologia Feminina e Andrologia

nas células da granulosa. Os esteroides (estradiol e progesterona) e a inibina secretados pelos ovários, bem como os peptídeos de origem ovariana e hipofisária (activina e foliculostatina) modificam a secreção de FSH e LH por mecanismo de retroalimentação positiva e negativa. A activina estimula a produção de FSH, enquanto a foliculostatina suprime a ação da activina. A ovulação é dependente de um pico de LH no meio do ciclo. Após a ovulação, o folículo se transforma em corpo lúteo, tornando-se capaz de secretar E2 e progesterona (P) sob o controle de FSH e LH. O LH também estimula a secreção de inibina A pelas células da granulosa do corpo lúteo. O endométrio possui elevadas concentrações de receptores nucleares para E2 e P e é extremamente sensível a esses hormônios. O E2 induz a proliferação endometrial, en­ quanto a progesterona limita seu crescimento e aumenta sua diferenciação. A queda nos níveis de E2 e P leva à descamação da camada funcional do endométrio, e a camada basal remanescente é capaz de se regenerar completamente em resposta ao estrógeno. Portanto, o funcionamento normal do sistema reprodutor feminino depende da ação coordenada do hipotálamo, da hipófise, dos ovários e do endométrio e resulta em menstruações regulares a cada 24 a 35 dias. A capacidade reprodutiva e a maioria das funções ovarianas cessam após a menopausa, fase em que os ovários perdem os oócitos e células esteroidogênicas, e caracterizam-se pelo hipoestrogenismo e pela ausên­ cia de ciclo menstrual. Algumas desordens específicas no eixo HHO ou nos sistemas relacionados podem resultar em hipogonadismo.2

DEFINIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO O hipogonadismo feminino é uma condição caracterizada por falência na produção de esteroides sexuais ovarianos, sendo classificado quanto à etiologia como primá­ rio (hipogonadismo hipergonadotrófico) ou secundário (hipogonadismo hipogonadotrófico). No hipogonadismo hipergonadotrófico, níveis baixos de estrógeno estão associados a concentrações elevadas de LH e FSH, enquanto no hipogonadismo hipogonadotrófico, os níveis de LH e FSH são baixos ou inapropriadamente normais. A Tabela 9.1 apresenta as principais causas congênitas e adquiridas de hipogonadismo feminino hiper e hipogonadotrófico.

TABELA 9.1

Congênito

Causas de hipogonadismo feminino Hipergonadotrófico

Hipogonadotrófico

S ín d ro m e de T u r n e r

S ín d ro m e de K a llm a n

S ín d ro m e de N o o n a n

H ip o g o n a d is m o h ip o g o n a d o tr ó fic o iso la d o

D is g e n e sia g o n a d a l X X

H ip o p itu ita ris m o c o n g ê n ito

M u ta ç õ e s n o g en e d o re c e p to r

H e m o c ro m a to se e h e m o g lo b in o p a tia s

de F S H M u ta ç õ e s n a su b u n id a d e P do LH

Adquirido

F a lê n c ia o v a ria n a p r e m a tu r a (ver

H ip e rp ro la c tin e m ia

C a p ítu lo 2 5 ): in s u fic iê n c ia o v a ria n a

T u m o re s h ip o fisá rio s

a u to im u n e , s e c u n d á ria ao câ n ce r,

S ín d ro m e de S h e e h a n

a g en tes q u ím ic o s o u irra d ia çã o , o u

H ip o fisite p ó s-p a rto

devido a o u tra s ca u sa s

T r a u m a c ra n io e n c e fá lic o

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

135

DIAGNÓSTICO A apresentação clínica do hipogonadismo feminino é variável conforme a época em que ocorre. Na infância e na adolescência, pode manifestar-se como atraso do crescimento e do desenvolvimento puberal, infantilismo sexual e amenorreia primária. Amenorreia secundária, infertilidade e menopausa precoce são as manifestações principais quando ele se instala na vida adulta. Outros sinais e sintomas podem compor o quadro clínico que, aliados aos exames complementares, auxiliam no diagnóstico etiológico.

O

Diagnóstico diferencial

Hipogonadismo hipergonadotrófico

Síndrome deTurner Afetando aproximadamente 50:100.000 nascidos vivos do sexo feminino, a síndrome de Turner (ST) caracteriza-se por ausência parcial ou completa do cromossomo X.3 Es­ sas pacientes apresentam vários estigmas próprios da síndrome, tais como edema de mãos e pés ao nascimento, higroma cístico, pescoço alado, cúbito valgo, malformações cardíacas de câmaras esquerdas e malformações renais, deformidade de Madelung, baixa implantação de orelhas e cabelos (em tridente) e metacarpo curto. Apresentam maior risco de otites e perda auditiva, osteoporose e fraturas. Além do hipogonadis­ mo, elas apresentam maior probabilidade de desenvolver baixa estatura, relacionada com a haploinsuficiência do gene short stature homeobox (SHOX), doenças autoimunes, dislipidemia, diabetes mellitus, hipertensão arterial, insuficiência coronariana e cerebrovascular. O diagnóstico é realizado pela análise do cariótipo, que requer, no mínimo, 30 cé­ lulas. Os achados citogenéticos são, portanto, bem variáveis: aproximadamente 50% das pacientes apresentam monossomia do cromossomo X, em torno de 30% exibem mosaicismo, e o remanescente tem alterações estruturais no X, tais como X em anel (46,X,r(X)), perda do braço curto (46,XXp2) ou longo (46,XXq2). A relação entre genótipo e fenótipo tem sido avaliada por muitos autores, e mais de 9 cariótipos consisten­ tes com a ST têm sido detectados (Tabela 9.2). Quanto à idade ao diagnóstico, ainda não se tem dados epidemiológicos que refli­ tam a situação em todo o país, mas um estudo retrospectivo realizado em Campinas, SP, mostra que o diagnóstico de ST ainda é tardio, sendo feito no primeiro ano de vida em apenas 10% dos casos.4 A função gonadal pode ser variável. As apresentações mais comuns são amenorreia pri­ mária (85%) e infertilidade (98%), mas menarca espontânea pode ser observada em torno de 20% das pacientes. Na maioria das crianças com idade inferior a 5 ou superior a 10 anos, a insuficiência ovariana determina elevações significativas nos níveis de LH e FSH quando comparadas a meninas não portadoras da síndrome. A inibina B é secretada pelos folículos ovarianos em desenvolvimento e, da mesma forma que o FSH, é considerado um bom marcador de função ovariana. Embora sua análise não seja feita de rotina nas pacientes com ST, a dosagem de inibina B pode estar indicada para avaliar fertilidade.5

Síndrome de Noonan O hipogonadismo na síndrome de Noonan (SN) é mais comumente observado em meninos. Em meninas, um estudo britânico revelou menarca mais tardia, em média

136 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 9.2

Achados citogenéticos associados à síndrome de Turner

Genótipo

Classificação

4 5 ,X

M o n o s s o m ia

4 6 ,X ,i(X q )

A lte ra çã o e s tr u tu ra l n o X

Variantes

4 5 ,X / 4 6 ,X ,i(X q ) 4 5 ,X / 4 6 ,X ,i(X q )/ 4 6 ,X X p 2

4 5 ,X / 4 6 rX X

M o s a ic o

4 5 ,X / 4 6 ,X X lm a r 4 5 ,X / 4 5 ,X lm a r

4 6 ,X ,r (X )

A lte ra çã o e s tr u tu ra l n o X

4 5 ,X / 4 6 ,X ,r (X )r

4 5 ,X / 4 6 rX Y

M o s a ic o

4 6 ,X X q 2

A lte ra çã o e s tr u tu ra l n o X

4 5 ,X / 4 6 ,X X q 2

4 6 ,X X p 2

A lte ra çã o e s tr u tu ra l n o X

4 5 ,X / 4 6 ,X X p 2 4 5 ,X / 4 6 ,X X p 2 / 4 6 ,X X 1 m a r

4 5 ,X / 4 7 rX X X

M o s a ic o

4 6 ,X ,t(X ;1 5 )

A lte ra çã o e s tr u tu ra l n o X

(q 2 2 .1 ;q 2 4 )

aos 14,6 anos, mas não existem muitas evidências de um comprometimento maior da puberdade como na ST.6

Disgenesia gonadal XX e mutações no gene do receptor de FSH e da subunidade-p do LH Na disgenesia gonadal com cariótipo normal, as pacientes se apresentam com fenótipo feminino associado à falha em iniciar a puberdade e desenvolver os caracteres sexuais secundários. Como as portadoras de ST, elas apresentam elevados níveis de gonadotrofinas e gônadas em fita, contudo, não apresentam baixa estatura ou outros estigmas da síndrome. É uma desordem heterogênea, com várias etiologias distintas. Em muitos casos, exibe um padrão de herança autossômica recessiva, sendo esporádi­ ca nos demais. O defeito pode estar restrito às gônadas em algumas pacientes, mas, em outras, pode estar associada à perda auditiva neurossensorial (síndrome de Perrault). Em alguns casos, foram detectadas mutações no gene do receptor de FSH; em outros, anormalidades maiores no cromossomo X, no locus Xq e no locus Xpll.2-p.22.1, cuja função está relacionada com o desenvolvimento ovariano. Outras anormalidades cromossômicas, como o cariótipo 47,XXX e as deleções no Xq, levam geralmente à parada do desenvolvimento puberal por falência ovariana prematura. Nesses casos, a presença de falência ovariana prematura isolada na ausência de baixa estatura ou outros estigmas não permite considerar os achados citogenéticos isolados variantes da ST.7 Mutações no gene do receptor de LH ou da subunidade do LH estão relacionadas geralmente com oligomenorreia e infertilidade, porém o desenvolvimento de amenorreia secundária, embora raro, tem sido relatado.8 Nessas pacientes, o desenvolvimento genital e puberal, bem como as concentrações de FSH são normais, mas os níveis de LH podem ser baixos (deficiência de subunidade do LH) ou elevados (deficiência do receptor de LH).9

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

137

Insuficiência ovariana secundária ao câncer, quimioterapia ou irradiação A disfunção gonadal e a infertilidade são alguns efeitos adversos da quimio ou da radioterapia e podem contribuir para o desenvolvimento de depressão e possíveis prejuízos cognitivos em pacientes portadoras de câncer. Qualquer dano que leve à diminuição do número de folículos aumenta o risco de falência ovariana prematura. A redução da reserva de oócitos pode também resultar em menor chance de gravidez, mesmo na presença de ciclos menstruais. Embora os ovários sejam menos sensíveis que os testículos à radioterapia, quando eles estão próximos ou dentro do campo da radiação, pode haver dano ovariano pro­ porcional à dose da radiação, à idade da paciente ou, mais precisamente, ao número de folículos funcionantes.10A idade de ocorrência da falência ovariana pode ser pre­ vista partindo da dose e da idade na ocasião do tratamento com o auxílio de tabelas.11 O dano actínico ao útero tem sido demonstrado após tratamento de câncer infantil, observando-se maior risco de aborto, parto prematuro e baixo peso ao nascer.12 Irra­ diação corporal total pré-transplante de medula óssea está também associada à inci­ dência elevada de infertilidade e à falência ovariana prematura. Irradiação craniana tem sido relacionada tanto com puberdade precoce quanto atrasada. Na maioria dos pacientes portadores de câncer de tireoide e submetidos à iodoterapia, não há prejuízo significante na fertilidade. Os efeitos tóxicos da quimioterapia sobre os ovários dependem do tipo de droga, da dose cumulativa e da combinação de idade e estado gonadal pré-tratamento. O risco de amenorreia permanente frequentemente é considerado medida de gonadotoxicidade. Agentes alquilantes e procarbazina são os principais citostáticos gonadotóxicos. Em estudo recente com portadoras de Linforma de Hodkin, o risco de amenor­ reia foi relatado como inferior a 20% nas pacientes submetidas aos esquemas de quimioterapia Adriamicina ou Doxorubicina, Bleomicina, Vimblastina e Dacarbazina (ABVD) ou 4-6 ciclos de Ciclofosfamida, Hidroxidoxorubicina ou Doxorubicina, Vincristina ou Oncovin e Prednisona (CHOP), sendo encontradas taxas semelhantes de gravidez em sobreviventes e controles no período de 1 ano.13 Em outro estudo de seguimento em longo prazo, pacientes tratadas com radioterapia (não infradiafragmática) e acompanhadas por, no mínimo, 10 anos apresentavam risco acumulado de desenvolver falência ovariana prematura de 37%, independentemente da idade ao tratamento.14 Os efeitos gonadais do tratamento do câncer de mama com 5-fluorouracil, epirubicina e ciclofosfamida (FEC) são dependentes da idade, com elevado risco de ame­ norreia permanente (acima de 80%) em mulheres com mais de 40 anos, intermediário, para mulheres de 30 anos, e baixo (inferior a 20%), para mulheres aos 20 anos.15

Insuficiência ovariana autoimune A ooforite autoimune ocorre em cerca de 5% dos casos de insuficiência ovariana pre­ matura espontânea. Pode estar associada a outras falências hormonais nos quadros de síndromes poli glandulares autoimunes (SPA). A SPA 1 inclui mais frequentemente o hipoparatireoidismo e a insuficiência adrenal, enquanto a SPA 2 geralmente associa insuficiência adrenal, tireoidopatia autoimune e diabetes mellitus tipo 1. Outras pato­ logias autoimunes que podem estar associadas à ooforite autoimune incluem o lúpus eritematoso sistêmico e a miasteniagravis.

138 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Hipogonadismo hipogonadotrófico

Hipogonadismo hipogonadotrófico isolado e síndrome de Kallman Os neurônios secretores de GnRH originam-se na placa olfatória e migram para o hipotálamo médio basal. Uma migração deficiente desses neurônios leva ao desenvol­ vimento de hipogonadismo hipogonadotrófico, associado ou não a distúrbios olfatórios, caracterizando, assim, a síndrome de Kallman (SK) ou o hipogonadismo hipogo­ nadotrófico isolado normósmico (HHIn), respectivamente. Trata-se de uma desordem genética cuja prevalência, em torno de 1:8.000, é maior em pacientes do sexo mascu­ lino. Existem 3 padrões de herança: autossômica recessiva, autossômica dominante e recessiva ligada ao X; no entanto, muitos casos são esporádicos. As pacientes geralmente apresentam atraso puberal ou amenorreia primária e esta­ tura normal ou elevada com proporções eunucoides. A presença de história familiar e distúrbios olfato rios são a chave para o diagnóstico. Um defeito genético subjacente pode ser identificado em alguns pacientes. O gene KALl é o sítio de mutação mais comum na síndrome de Kallman ligada ao X e codifica uma glicoproteína denomina anosmina. Geralmente, apresenta o fenótipo mais severo, estando associado a contra­ ções musculares involuntárias simétricas (sincinesia) em 75% e agenesia renal unila­ teral em 30% dos pacientes. A Tabela 9.3 lista os principais genes relacionados com o hipogonadismo hipogonadotrófico isolado.16

Defeitos genéticos relacionados com o hipogonadismo hipogonadotrófico isolado

TABELA 9.3

Gene

Fenótipo

Herança

KA Ll

SK

R ecessiva lig a d a ao X

FG FR 1

S K ;H H In

A D , A R, o lig o g ê n ic a

FG F8

S K ;H H In

A D , A R, o lig o g ê n ic a

PRO K2

S K ;H H In

A R , A D , o lig o g ê n ic a

PRO KR2

S K ;H H In

A R , A D , o lig o g ê n ic a

N ELF

SK

A D o lig o g ê n ic a

CHD7

S K ;C H A R G E

AD

GNRHR

H H In

A R , o lig o g ê n ic a

GNRH1

H H In

AR, AD

K IS S 1 R

H H In

AR

TA C 3

H H In

AR

TA C R 3

H H In

AR

Outras manifestações clinicas 70% sin cin e sia 30% ag en esia ren al u n ila te ra l 30% fe n d a p a la tin a , lá b io le p o rin o fe n d a p a la tin a , lá b io le p o rin o fre q u e n te ep ilep sia, d istú rb io s do s o n o , s in ­ cin e sia , d isp la sia fib ro s a e o b esid a d e

su rd ez e h ip o p la s ia de ca n a is se m i­ circu la re s

P o u c o s ca so s d e scrito s. Leve d ific u l­ dade de a p ren d iz a d o

SK: Síndrome de Kallman, HHIn: hipogonadismo hipogonadotrófico isolado normósmico, CHARGE:síndrome definida pela presença de colobomas, anormalidades cardíacas, atresia de coana, retardo mental, anormalias auriculares e genitais, AD:autossômica dominante, AR: autossômica recessiva. Adaptado de Semple RK et al.16

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

139

Hipopituitarismo congênito A deficiência combinada de hormônios hipofisários (hipopituitarismo) é definida quando a produção de 2 ou mais desses hormônios está ausente ou é deficiente. A etiologia é multifatorial e pode ser secundária a um dano neurológico. Contudo, um subgrupo de pacientes desenvolve hipopituitarismo na infância e é classificado como idiopático. A etiologia genética para essas deficiências é então provável e envolve mu­ tações em vários genes responsáveis pelo desenvolvimento hipofisário. Os fatores de transcrição HESX1, LHX3, LHX4, POU1F1, PROP1, SIX6, OTX2, PTX2, GLI2 e SOX3 desempenham um papel importante no desenvolvimento e na maturação da hipófise. Mutações nesses genes estão relacionadas com o desenvolvimento de hipopituitaris­ mo e defeitos na linha média, como fenda palatina e displasia septo-óptica. Embora a incidência de mutações nesses genes ainda seja baixa, as linhas de pesquisas atuais buscam definir a base molecular da deficiência hormonal nessa condição clínica.17 O quadro clínico é composto por sinais e sintomas de deficiência hormonal múltipla, sendo mais frequente a deficiência de GH, de TSH e de gonadotrofinas, o que acarreta bai­ xa estatura, atraso do desenvolvimento psicomotor, infantilismo sexual ou atraso puberal e déficit cognitivo. Além dos defeitos na linha média, algumas anormalidades oculares, tais como entropia, coloboma e distrofia pigmentar da retina, podem estar presentes. A análise por ressonância magnética (RM) da região hipotálamo-hipofisária em pa­ cientes portadores de hipopituitarismo congênito é uma ferramenta importante no diagnóstico, pois diversos achados, tais como hipoplasia do nervo óptico, hipoplasia hipofisária, ausência de haste, ausência de septo pelúcido e ausência ou hipoplasia do corpo caloso, têm sido demonstrados.18

Hemocromatose e hemoglobinopatias A hemocromatose primária ou secundária se caracteriza pelo depósito de ferro em vários tecidos corporais e está associada ao desenvolvimento de vários distúrbios endócrinos, como hipotireoidismo, diabetes mellitus, hipogonadismo hipo ou hipergonadotrófico. A talassemia é uma hemoglobinopatia hereditária que cursa com anemia crônica e necessidade de múltiplas hemotransfusões. Em consequência, o acúmulo de ferro em tecidos vitais leva ao desenvolvimento de hemocromatose e às suas compli­ cações cardíacas, hepáticas e endócrinas. O hipogonadismo pode ser hiper ou hipogonadotrófico por acometimento de ovários ou da região hipotálamo-hipofisária.19 Em pacientes com hipogonadismo hipergonadotrófico por falência ovariana primária não relacionada a autoimunidade, bem como nas portadoras de hipogonadismo hipogonadotrófico idiopático, nas quais não se observam lesões na região hipotálamohipofisária, uma avaliação hematologia com dosagens de ferro sérico e ferritina pode apontar para causas relacionadas com o depósito de ferro.20

Hiperprolactinemia A hiperprolactinemia pode ocorrer por causas fisiológicas ou patológicas. As fisiológi­ cas incluem a gestação, a estimulação do mamilo e o estresse. As principais causas de hiperprolactinemia patológica são os tumores da região selar e suprasselar, especial­ mente o prolactinoma, o uso de medicações como antidepressivos e antipsicóticos e o hipotireoidismo primário. Níveis de prolactina superiores a 150-200 ng/mL em mu­ lheres não gestantes quase sempre ocorrem apenas em pacientes com prolactinomas.

140 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Associados ao quadro de hipogonadismo, os prolactinomas >10 mm podem indu­ zir hipopituitarismo e sintomas neurológicos, principalmente cefaleia e diminuição do campo visual, por compressão dos tecidos adjacentes. O aumento da prolactina sérica tipicamente induz encurtamento da fase lútea, re­ dução dos níveis de FSH e LH, diminuição de função das células da granulosa, hipoestrogenemia e, eventualmente, amenorreia. Em homens, ocorre redução dos níveis de testosterona, redução na contagem e na motilidade dos espermatozóides. A galactorreia pode ocorrer tanto em homens como em mulheres, porém é muito mais comum no sexo feminino. A redução da libido é frequente.

Tumores hipofisários A presença de lesões hipofisárias ou hipotalâmicas pode ocasionar hipopituitarismo por compressão do tecido hipofisário normal. Os adenomas clinicamente não funcionantes podem ter evolução lenta, manifestando-se por sintomas de hipopituita­ rismo, alterações visuais e cefaleia. Assim, torna-se necessária a avaliação da região hipotálamo-hipofisária com ressonância nuclear magnética (RNM) das pacientes com quadro clínico de hipogonadismo hipogonadotrófico para afastar causas tumorais. Lesões extensas da hipófise podem sofrer apoplexia.

Síndrome de Sheehan ou apoplexia pituitária pós-parto Caracteriza-se pela presença de hemorragia pós-parto, que leva a isquemia e necrose hipofisária. A hiperplasia fisiológica da hipófise ao final da gestação favorece a hipoperfusão tecidual em situação de vasoconstrição severa, como a que ocorre durante uma importante hemorragia no peri e no pós-parto, mesmo em situações de partos hospitalares.21 Em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, a síndrome de Sheehan (SS) é ainda considerada uma importante causa de hipopituitarismo adqui­ rido. O hipopituitarismo agudo pode ser suspeitado nos primeiros dias ou semanas após o parto pela falta de lactação (agalactia) e pela amenorreia persistente. No en­ tanto, devido ao estado crônico de hipopituitarismo menos intenso apresentado por muitas pacientes, o diagnóstico é tardio, fazendo com que as manifestações das deprivações hormonais sejam tratadas de forma inadequada, não apenas em nosso meio, como em outras regiões do mundo. Assim, muitas pacientes são portadoras de anemia crônica, osteoporose e dislipidemia por ocasião do diagnóstico.22 As manifestações clínicas do hipocortisolismo por deficiência de ACTH são insi­ diosas e menos intensas do que na insuficiência adrenal primária. Fadiga, letargia, anorexia, redução de libido, artralgia, mialgia e perda de peso são queixas frequentes. Entre os achados laboratoriais, são comuns eosinofilia, hipoglicemia e hiponatremia.23 E fundamental estabelecer o diagnóstico de deficiência de ACTH, pois situações de estresse podem precipitar uma crise de insuficiência adrenal, que, uma vez não diag­ nosticada, pode ser letal. A deficiência de GH, parcial ou total, pode levar a um número considerável de efei­ tos adversos, incluindo diminuição da massa muscular e aumento da massa gorda, elevação dos níveis séricos de LDL colesterol, diminuição da densidade mineral óssea, diminuição do bem-estar, aumento do risco de doença cardiovascular devido ao au­ mento dos marcadores inflamatórios de risco cardiovascular (proteína C-reativa), do fibrinogênio e do fator inibidor do ativador plasminogênico (PAI-1). Estudo realizado

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

141

com indivíduos portadores de hipopituitarismo demonstrou que a presença de defi­ ciência de GH (DGH) seria um fator determinante para o aumento da mortalidade por todas as causas e por doença cardiovascular quando comparados a uma popula­ ção de mesma idade e mesmo sexo.24,25 Os sinais de deficiência de gonadotrofinas são marcantes na SS: amenorreia se­ cundária de instalação precoce na história clínica das pacientes, queda de pelos cor­ porais, ausência de libido, infertilidade, atrofia mamária, secura vaginal, dispaurenia e desenvolvimento precoce de osteoporose acentuada. Na mulher pós-menopausa com osteoporose severa e baixos níveis séricos de gonadotrofinas e IGF-I, deve-se suspeitar de hipogonadismo hipogonadotrófico, e o diagnóstico de SS deve ser pen­ sado na presença de história prévia de partos laboriosos e agalactia.24 A avaliação por imagem da região hipotálamo-hipofisária por RM revela parênquima hipofisário re­ duzido ou sela vazia.26 As manifestações da deficiência de hormônio tireoestimulante (TSH) são mais leves e tardias que no hipotireoidismo primário e incluem bradicardia, fraqueza, dificuldade para perder peso, pele seca e infiltrada, cabelo ressecado, fala lenta, constipação intestinal, intolerância ao frio, mialgia, artralgia, parestesias e refle­ xos tendinosos lentos. Anemia crônica normocítica e normocrômica é um achado laboratorial comum. Com a diminuição do clearance de água livre devido ao hipoti­ reoidismo e a associação com a deficiência de ACTH, encontra-se frequentemente hiponatremia crônica. A deficiência de prolactina compromete a lactação, poden­ do levar a agalactia ou hipogalactia.

Hipofisite Pós-Parto É uma causa rara de hipopituitarismo, caracterizada pela infiltração linfocítica e pelo consequente processo inflamatório crônico associado à fibrose e ao aumento do vo­ lume hipofisário. Acomete, principalmente, o sexo feminino, sendo mais comum no final da gestação ou no período pós-parto. A presença de auto anticorpos tem sido demonstrada nesta condição, e outras endocrinopatias autoimunes podem estar asso­ ciadas, principalmente à tireoidite autoimune. As pacientes acometidas tipicamente apresentam cefaleia e alterações visuais em mais de 50% dos casos. Na RM da região hipotálamo-hipofisária, podem ser observados sinais de espessamento da haste hipofisária ou massa hipofisária homogênea, mimetizando um adenoma. Raramente, pode ocorrer diabetes insípido. Alguns autores preconizam pulsos com altas doses de glicocorticoides para reduzir o efeito de massa.27

Trauma cranioencefálico Traumas cranianos que resultem em hemorragia ou não. Podem estar associados ao hipopituitarismo, sendo o déficit de GH o mais comumente observado. Geralmente, a evolução é crônica, e o diagnóstico, tardio. Os fatores de risco para o desenvolvimento de hipopituitarismo pós-trauma incluem gravidade da lesão, edema axonal difuso e choque.28

Obesidade A obesidade está associada à infertilidade e ao risco elevado de irregularidade mens­ trual e amenorreia, que não podem ser atribuídas tão somente à Síndrome de Ovários

142 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Policísticos (SOP). Em face da epidemia atual de obesidade e da baixa prevalência de SOP na população, os efeitos da adiposidade sobre o eixo HHO vêm ganhando foco. Embora crianças obesas tenham um início mais precoce de pubarca, a pro­ gressão do desenvolvimento mamário é lenta e está relacionada com redução da secreção de LH.29 Algumas hipóteses têm atribuído esse papel às adipocinas (leptina, adiponectina, peptídeo glucagon símile -1 e grelina) que, por ação central ou periférica, interferem com a secreção hipotalâmica ou hipofisária. Uma molécula candidata é a 170H-esteroide desidrogenase tipo V, produzida no tecido adiposo subcutâneo. A hipótese explicaria o desenvolvimento de disfunção gonadal tanto em mulheres obesas metabolicamente saudáveis quanto nas não saudáveis. As primeiras, pelo hipogonadismo induzido pelo tecido adiposo subcutâneo, e as últimas, pelo desenvolvimento de SOP relacionado com adiposidade visceral, nas quais a resistência insulínica serve como marcador clínico de irregularidade menstrual.

Amenorreia hipotalâmica funcional Nessa patologia, o estado hipogonadotrófico ocorre na ausência de doença orgânica ou anatômica.30 As causas mais comuns estão associadas a 3 mecanismos principais: estresse, perda de peso e atividade física excessiva. Esses fatores, isolada ou frequente­ mente em conjunto, levam à supressão da pulsatilidade do GnRH. E comum a ocor­ rência de outros distúrbios endócrinos associados, como a hiperatividade do eixo corticotrófico e a hipoatividade do eixo tireotrófico. A leptina parece ser um mediador importante na amenorreia hipotalâmica funcional,31 tendo sido descrita melhora clínica nesses pacientes com a administração de leptina.32 Nesse último estudo, 3 das 6 pacientes tratadas recuperaram ciclos mens­ truais ovulatórios com o uso de leptina recombinante. E importante notar que a amenorreia hipotalâmica funcional é um diagnóstico de exclusão. Dessa forma, a propedêutica clínica e laboratorial deve pesquisar outras causas de amenorreia por hipogonadismo hipogonatrófico.

Síndrome de Prader-Willi Desordem neurogenética de apresentação clínica variável que resulta da ausên­ cia de expressão paterna de genes localizados no braço longo do cromossomo 15 (1 5 q ll-q l3 ). Afeta igualmente homens e mulheres, e sua incidência varia entre 1:10.000 a 1:20.000 nascidos vivos. O quadro clínico consiste em achados dismórfícos, retardo mental, transtornos alimentares, baixa estatura, ingesta calórica elevada com obesidade severa e hipogonadismo. Muitas adolescentes e mulheres adultas portadoras de síndrome de Prader-Willi (SPW) têm puberdade e menarca espontâneas, mas evoluem para amenorreia ou oligomenorreia. No entanto, há relatos de gestação em pacientes com SPW geneticamente confirmadas, indicando que o grau de hipogonadismo é variável. Um defeito primário no ovário, especifícamente na fase folicular, leva à parada de maturação dos folículos. Além disso, a disfunção hipotalâmica presente na SPW é também leve e variável (LH normalbaixo e FSH normal-alto.33 A Figura 9.2 apresenta um algoritmo de investigação diagnóstica para o hipogona­ dismo feminino.

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

143

l

FIGURA 9.2 Algoritmo de investigação do hipogonadismo

F





INDICAÇÃO E CONTRAINDICAÇÕES RELATIVAS E ABSOLUTAS DO TRATAMENTO D Critérios de elegibilidade A reposição de esteroides está indicada para todas as pacientes em idade correspondente a menacme, e o tratamento da infertilidade pode ser oferecido para pacientes com ová­ rios funcionantes que não apresentem contraindicações ou riscos elevados inerentes a gravidez e parto, ou seja, para mulheres com idade entre 18 e 39 anos, não obesas, sem anormalidades uterinas, tumores ou cistos ovarianos e que desejem engravidar.

144 Endocrinologia Feminina e Andrologia



Contraindicações absolutas

Câncer de ovário, endométrio e a maioria dos cânceres ginecológicos, câncer de intes­ tino, melanoma, história familiar de câncer de mama, doença benigna da mama, por­ tadores de mutações BRCA, história prévia de tromboembolismo, varicosidade severa e endometriose.

D

Contraindicações relativas

Doenças cardiovasculares e cerebrovasculares preexistentes e câncer de mama tra­ tado. Em tais circunstâncias, é recomendável que a decisão do tratamento envolva a consulta de outros profissionais e que se obtenha o consentimento por escrito do paciente.34

ABORDAGEM TERAPÊUTICA Em condições ideais, o tratamento do hipogonadismo deve proporcionar níveis fisio­ lógicos de estrógeno e progesterona adequados para a faixa etária da paciente, favo­ recendo o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários, a libido e a atividade sexual satisfatória e, em casos específicos, promover a fertilidade. Deve ser seguro, favorecer o crescimento longitudinal e o desenvolvimento psicossocial das crianças, prevenir o desenvolvimento de osteoporose e não aumentar a mortalidade por outras causas. Embora não existam esquemas terapêuticos que atendam plenamente às especi­ ficações supracitadas, na prática, o manejo terapêutico das pacientes portadoras de hipogonadismo envolve 2 aspectos: reposição de esteroides sexuais e, quando possível, tratamento da infertilidade. Para ilustrar a abordagem terapêutica do hipogonadismo hiper e hipogonadotrófico, selecionamos 2 desordens específicas por apresentarem dados mais consolidados na literatura: a ST e o hipogonadismo hipogonadotrófico na mulher adulta.

O Tratamento do hipogonadismo hipergonadotrófico em portadoras de síndrome de Turner Reposição hormonal Quando os sinais de puberdade estão ausentes e FSH e LH estão bastante elevados, deve-se induzir a puberdade com estrógeno nas portadoras de ST para assegurar um desenvolvimento físico e psicológico normal, de modo que o pico de massa óssea seja alcançado no início da vida adulta. Infelizmente, em virtude do diagnóstico tardio, a maioria das pacientes é tratada com estrógeno em época bem posterior ao desejável para não provocar a parada do crescimento. Estudos recentes apontam que o tratamento com estrógenos iniciado aos 12 anos, em pacientes tratadas com GH permite a evolução da puberdade sem interferir com a altura final.35 Deve ser dada preferência às preparações transdérmicas, por serem mais fisiológicas e favorecerem melhor resposta ao GH, quando comparada às formulações orais.36'38 Inicia-se o tratamento com baixas doses, aumentando gradualmente em 2-3 anos até a feminilização completa, sendo mantida a dose final até idade compatível com menopausa (Tabela 9.4).

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

TABELA 9.4

145

Esquema de reposição hormonal em pacientes

com síndrom e deTurner

Idade (anos) 10-11

Comentários específicos M o n ito r a r d e se n v o lv im e n to p u b e ra l e s p o n tâ n e o c o m F S H sérico e e stá d io de T a n n e r. S e n ã o h á p u b e rd a d e e F S H se eleva, in ic ia r E 2 em b a ix a s d oses.

12-13

D o se in ic ia l: E 2 tra n s d é rm ic o 6 ,2 5 pg/dia (ad esivo o u gel); E 2 m ic ro n iz a d o 0 ,2 5 m g o ra l A u m e n to tr im e s tra l d a d o se em 2 a n o s até a lc a n ç a r a d o se a d u lta .

12,5 - 15

P o r ex em p lo : 14, 2 5 , 3 7 ,5 0 , 7 5 , 1 0 0 , 2 0 0 p g d iá rio via adesivo D o se a d u lta : E 2 T ra n sd é rm ico lO O p g a 2 0 0 p g ; E 2 O ral: 2 -4 m g ; E E 2 2 0 p g ; E E C 1 ,2 5 m g a 2 ,5 m g. In ic ia r P m ic r o n iz a d a o ra l c íc lic a ap ó s 2 a n o s de te ra p ia c o m E 2 o u q u a n d o

14-16

o c o rre r S T V . D o se a d u lta : 2 0 0 m g/ d ia p o r 10 d ias (e n tre os dias 2 0 - 3 0 ) n o c iclo m e n sa l o u p o r 2 0 d ias (e n tre os d ias 1 0 0 - 1 2 0 ) n o c iclo trim e stra l.

14-30

M a n te r d o ses p le n a s a té a id ad e de 3 0 a n o s. M o n ito r a r e s p e ss a m e n to en d o m e tria l. U sa r a m e n o r d o se c o m m a io r p ro te ç ã o ó sse a (eq u iv a len te a 0 ,6 2 5 m g E E C ).

30-50

M o n ito r a r d ieta , e x e rcício e fa to re s de risco p a ra o ste o p o ro s e . D M O e m a m o g ra fia re g u la r a p a r tir d o s 4 5 a n o s

>50

A d ecisã o so b re o u so de e s tró g e n o b a seia -se n o s m e s m o s c rité rio s d a p ó sm e n o p a u s a n o rm a l

EEC: estrógenos equinos conjugados, E2 estradiol, EE2: etinil estradiol, P: progesterona micronizada, DMO:densitometria mineral óssea,STV:sangramento transvaginal. Adaptado de Bondy CA.39

Tratamento da infertilidade Embora poucas pacientes apresentem gravidez espontânea, a maioria é infértil. Vá­ rias técnicas de reprodução assistida estão disponíveis hoje em dia. As mulheres com ovários funcionantes, que tenham ciclos espontâneos, podem ser orientadas a criopreservar oócitos ou a não adiar a gravidez, pelo risco de falência ovariana prematura. O implante de oócitos criopreservados da própria paciente ou embriões doados pode ser uma alternativa para as mulheres com ovários não funcionantes que desejam en­ gravidar. Nesse caso, atenção especial deve ser dada à preparação apropriada do útero. A paciente deve estar sob terapia de reposição hormonal adequada há pelo menos 1 a 2 anos antes da transferência de oócitos ou embriões, para garantir tamanho (endométrio > 7 mm) e fluxo sanguíneo adequados ao útero. Nas condições ideais, apenas 1 embrião deve ser transferido para evitar o risco adicional de gestação múltipla. A taxa de sucesso entre as pacientes com ST é semelhante ao observado nos demais casos de infertilidade, sem aumento na taxa de aborto. No entanto, elas apresentam maior risco de complicações maternas, atribuídas a parto cesariano (baixa estatura), maior frequência de hipertensão arterial e diabetes, maiores riscos de dilatação e dissecção da aorta. Assim, antes de programar uma gravidez, as pacientes devem ser submetidas a

146 Endocrinologia Feminina e Andrologia

uma avaliação cardiometabólica completa, incluindo ecocardiograma (ECG) e RNM do coração. Portadoras de bloqueio atrioventricular, dilatação aórtica ou antecedente de coarctação devem ser desaconselhadas a tentar engravidar. A glicemia e a função tireoidiana também devem ser monitoradas. Portanto, todas as gestantes devem ser acompa­ nhadas em um serviço terciário, por uma equipe multidisciplinar que envolva obstetras, endocrinologistas e cardiologistas especialistas em gestação de alto risco. Em muitos países, a adoção é uma opção para muitas mulheres com ST.39

O Tratamento do hipogonadismo hipogonadotrófico na mulher adulta Reposição hormonal A deficiência de gonadotrofinas é tratada com combinação de estrógeno e progesterona (ou só estrógeno em caso de pacientes histerectomizadas). A decisão de realizar esse tipo de terapia deve ser individualizada, levando-se em consideração os riscos e os benefícios para cada paciente, bem como as queixas clínicas. As pacientes mais jovens terão maior benefício com a reposição por diminuir os riscos de osteoporose e eventos cardiovasculares. A via transdérmica é preferível para mulheres tabagistas ou que apre­ sentam cefaleia, hipertrigliceridemia, distúrbios hepatobiliares, antecedentes de tromboembolismo. As pacientes com SS frequentemente apresentam hipertrigliceridemia e HDL baixos, que podem ser agravados com as apresentações orais.24,40

Tratamento da infertilidade A reposição de FSH e também de LH é necessária para promover estimulação folicular, ovulação e fertilidade em mulheres com hipogonadismo hipogonadotrófico elegíveis para o tratamento. Foi demonstrado que pacientes com níveis muito baixos de LH (< 1,2 UI/L) apresentam uma resposta melhor quando recebem a suplementação de am­ bos. Deficiências leves de LH podem apresentar resposta ao tratamento isolado com FSH. O esquema consiste na administração diária por via subcutânea, de a-lutropina 75 UI em associação ao a-folitropina 75-150 UI. A dose dea-folitropina pode ser aumentada até 225 UI de acordo com os níveis de estrógeno e grau de maturação folicular monito­ rada por ultrassom. Os ajustes são semanais, mas a duração do tratamento não pode ser superior a 3 semanas. Quando a resposta folicular for satisfatória (pelo menos 1 folículo > 1 7 mm e sem hiperresposta ao tratamento, a ovulação pode ser induzida com dose única de hCG IM na dose de 10.000 UI e inseminação subsequente. Caso não ocorra gravidez, o ciclo de tratamento pode ser repetido até o total de 3 ciclos, desde que não ocorram efeitos adversos sérios, síndrome da hiperestímulo ovariano ou reação de hipersensibilidade as drogas.41

Tratamento da hiperprolactinemia O tratamento de escolha na maioria dos pacientes com amenorreia secundária a prolacti­ nomas é o uso de agonistas dopaminérgicos.42A cabergolina geralmente é o agonista pre­ ferido, devido a sua melhor tolerabilidade, comodidade posológica (uso 1 ou 2 vezes por semana) e resposta terapêutica em um subgrupo de pacientes resistentes a bromocriptina. Em pacientes que não desejam engravidar, ou que tenham tumores resistentes ou sejam intolerantes aos agonistas dopaminérgicos, a reposição hormonal, conforme descrita ante­ riormente, é uma opção adequada, especialmente nos microadenomas. Alternativas como a cirurgia transesfenoidal ou a radioterapia ficam reservadas para casos excepcionais.

Capítulo 9 Hipogonadismo feminino

147

Pacientes com hiperprolactinemia de outras causas devem ser tratadas geralmente com a retirada do agente causador quando possível, como a suspensão ou a substitui­ ção do antidepressivo ou antipsicótico, por exemplo. Não sendo clinicamente possí­ vel, a alternativa seguinte é a reposição hormonal conforme descrita acima. Em último caso, pode-se tentar o uso de agonista dopaminérgico, o qual está associado a risco de piora do quadro psiquiátrico (psicose).42

Tratamento da amenorreia hipotalâmica funcional O foco do tratamento dessa patologia é a redução das suas causas, ou seja, a norma­ lização da carga de atividade física, da ingesta calórica e o tratamento de eventuais distúrbios psicológicos associados.30 O tratamento hormonal para reposição e/ou indução da fertilidade pode ser realizado no caso de insucesso do tratamento espe­ cífico. O uso de leptina32 e/ou antagonistas opioides43 ainda é experimental.

EFEITOS ADVERSOS E MANEJO D

Uso de esteroides sexuais

A maioria dos estudos sobre os efeitos da reposição hormonal avaliou pacientes na pós-menopausa ou pacientes durante a menacme em uso de contraceptivos orais. Nes­ se último grupo, o risco de eventos coronarianos parece estar aumentado,44 porém o aumento pode não ser clinicamente significativo devido ao baixo risco basal nessas pacientes. No entanto, em pacientes com risco adicionais como idade crescente, taba­ gismo, história familiar, o risco pode ser mais significativo. Embora o risco de desen­ volvimento de hipertensão arterial sistêmica seja baixo, é importante a monitorização da pressão arterial. Há leve aumento no risco de eventos cerebrais isquêmicos e de tromboembolismo venoso. O risco de surgimento de câncer parece estar aumentado ou reduzido conforme o sítio da neoplasia, porém os estudos são conflitantes. Em geral, o risco geral de surgimento de câncer parece não estar aumentado.45

D

Uso de gonadotrofinas

A síndrome de hiperestímulo ovariano é uma complicação potencialmente fatal da terapia de indução da ovolução com gonadotrofinas. Na sua forma mais grave, po­ dem ocorrer aumento ovariano maciço, hemoconcentração e acúmulo de líquidos no terceiro espaço (ascite, hidrotórax). Esse quadro pode evoluir para insuficiência renal, choque hipovolêmico, tromboembolismo, síndrome do desconforto respiratório do adulto e eventualmente óbito. O manejo da complicação é, principalmente, de supor­ te, incluindo a correção dos distúrbios hidroeletrolíticos e das complicações agudas. Anticoagulação geralmente não é necessária, porém é importante monitorizar a coa­ gulação devido ao risco de coagulação intravascular disseminada.

CONCLUSÃO O hipogonadismo feminino é uma condição endócrina facilmente detectada, que acomete pacientes de todas as idades. Seu diagnóstico diferencial amplo é desafiante para pediatras, endocrinologistas, clínicos e ginecologistas. Uma vez definida a etiologia, o tratamento apropriado promove bem-estar e alívio dos sintomas na maioria das pacientes.

148 Endocrinologia Feminina e Andrologia

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C a su la ri

A d r ia n a L o f r a n o P o r t o

INTRODUÇÃO O hipogonadismo masculino caracteriza-se pelo comprometimento de ao menos uma das duas funções testiculares fundamentais: a produção de testosterona e a espermatogênese. As manifestações clínicas variam conforme o tipo e o grau de disfunção tes­ ticular, bem como o momento de instalação da doença ao longo da vida. Este capítulo abrange os aspectos mais relevantes sobre apresentação clínica, diag­ nóstico, diagnóstico diferencial e abordagem terapêutica do hipogonadismo quando este se apresenta desde a idade puberal até a meia-idade, isto é, do adolescente ao adul­ to jovem. Exclui-se aqui o hipogonadismo tardio, associado à síndrome metabólica, bem como as desordens da diferenciação sexual, condições que serão abordadas em outros capítulos.

CAUSAS O hipogonadismo masculino é classificado conforme a causa subjacente. O hi­ pogonadismo primário, também chamado hipogonadismo hipergonadotrófico, resulta de diferentes distúrbios que acometem diretamente os testículos, levando à baixa produção de testosterona e/ou à infertilidade. Caracteriza-se pela concen­ tração elevada de gonadotrofinas devido à deficiência primária na capacidade de produção de espermatozóides e dos esteroides sexuais gonadais. No sexo mascu­ lino, a causa mais comum é a síndrome de Klinefelter, com prevalência estimada de 1:600 homens.1 O hipogonadismo secundário ou hipogonadotrófico ocorre quando há distúrbios funcionais ou anatômicos na região hipotálamo-hipofisária que comprometem a se­ creção das gonadotrofinas e, consequentemente, a função testicular. Na Tabela 10.1, estão resumidas as causas de hipogonadismo primário e secundário.

152 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 10.1

Principais cau sas de h ip o g o n ad ism o em h o m en s jo v e n s

Hipogonadismo primário ou hipergonadotrófico Causas Congênitas

Causas adquiridas

S ín d ro m e de K lin e fe lte r

O rq u ite in fe c c io s a

M u ta ç õ e s n o re c e p to r d o L H o u d o F S H

R a d ia çã o

C rip to rq u id is m o

U so de a g e n te s a lq u ila n te s e a n tin e o p lá s ic o s

A n o rq u ia

G lic o c o rtic o id e s

D is tr o fia m io tô n ic a

T rau m a T o r s ã o te s tic u la r O r q u ie c to m ia D o e n ç a s c rô n ic a s (cirro se , in s u fic iê n c ia re n a l c r ô n ic a [IR C ]) A u to im u n e S ín d ro m e d a im u n o d e fic ê n c ia a d q u irid a (H IV/Aids)

Hipogonadismo secundário ou hipogonadotrófico Causas congênitas

Causas adquiridas

H ip o g o n a d is m o h ip o g o n a d o tr ó fic o iso la d o

H ip e rp ro la c tin e m ia

n o r m ó s m ic o

A n á lo g o s do G n R H

S ín d ro m e de K a llm a n n

G lic o c o rtic o id e s

H ip o g o n a d is m o a sso cia d o a o u tra s d e fic iê n ­

O p iá ce o s

cia s h ip o fisá ria s

D o e n ç a s c rô n ic a s (H IV , cirro se , IR C , d o e n ç a

S ín d ro m e de P ra d er-W illi

p u lm o n a r o b s tru tiv a c rô n ic a [D P O C ]) D ia b etes m ellitus C isto s e tu m o re s h ip o tá la m o -h ip o fis á rio s H e m o c ro m a to s e S a rc o id o s e T u b e r c u lo s e h ip o fis á r ia T ra u m a Id io p á tic o

A P R E S E N T A Ç Ã O C L ÍN IC A

IMPORTANTE O h ip o g o n a d is m o m a s c u lin o e m g e ra l é fa c ilm e n te r e c o n h e c id o , a p a r tir de a n a m n e s e e e x a m e fís ic o c u id a d o s o s , e p o d e ser c o n fir m a d o p o r m e io de ex a m es la b o r a to r ia is a p r o ­ p ria d o s.

Os principais sinais clínicos decorrentes do comprometimento da espermatogênese são infertilidade e volume testicular diminuído. A produção deficiente de testosterona associa-se a manifestações clínicas diversas, que variam conforme o

Capítulo 10 Hipogonadismo masculino no jovem

153

momento de instalação do hipogonadismo ao longo do desenvolvimento do sistema reprodutivo. Assim, diante de um adolescente ou adulto com sinais e sintomas suges­ tivos de hipogonadismo, o clínico deverá, inicialmente, realizar anamnese e exame físico detalhados e direcionados à aquisição de informações a respeito das etapas do desenvolvimento sexual e dos sintomas presentes. Na maioria das vezes, o hipogonadismo é suspeitado na adolescência, quando ocorre deficiência completa ou parcial do desenvolvimento puberal. Nessa situação, evidencia-se infantilismo sexual com maturação ausente ou incompleta da genitália externa, pelos corporais e faciais escassos, timbre de voz fino, proporções eunucoides, baixa massa óssea e reduzido desenvolvimento muscular. Por outro lado, quando o hipogonadismo se inicia após a puberdade ter sido com­ pletada, predominam sinais e sintomas relacionados com a deficiência adquirida de testosterona, como a diminuição da libido e da energia, além do humor deprimido que ocorrem precocemente, já nas primeiras semanas de instalação, mas são inespecíficos. A longo prazo, em indivíduos não tratados, verifica-se redução dos pelos sexuais e dos pelos corporais andrógeno-dependentes, redução do hematócrito, da força e da massa muscular, bem como da densidade mineral óssea. Infertilidade também consti­ tui um sinal clínico frequente. A ginecomastia pode estar presente, mas é mais comum no hipogonadismo primário.2,3 Ao exame físico, devem-se observar detalhadamente os caracteres sexuais primá­ rios (desenvolvimento genital) e secundários, tais como pelos pubianos, corporais e faciais. No adolescente, é essencial analisar o grau de desenvolvimento puberal segundo os estágios de Tanner, a fim de caracterizar o atraso do desenvolvimento sexual em relação à idade cronológica. Além disso, observam-se a proporção dos segmentos corporais superior e inferior e a presença de ginecomastia. O aspecto eunucoide caracteriza-se por envergadura 5 cm maior do que altura e segmento in­ ferior (medida-púbis) maior 2 cm em relação ao segmento superior (medida púbis até o alto da cabeça). Está relacionado com a deficiência de testosterona e estradiol durante o desenvolvimento puberal, o que resulta em atraso no fechamento epifisário com crescimento prolongado dos ossos longos, sob efeito do hormônio de crescimento.3 Em homens adultos que desenvolvem hipogonadismo após a puberdade, os acha­ dos ao exame físico podem ser discretos ou mesmo ausentes. A diminuição pro­ gressiva dos pelos sexuais e corporais e da massa muscular ocorre tardiamente, às vezes vários anos após o início do hipogonadismo, e não há alteração da proporção corporal.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL Frente à suspeita clínica de hipogonadismo em adolescentes ou homens jovens, recomenda-se inicialmente a determinação das concentrações plasmáticas de testosterona total e gonadotrofinas hipofisárias (hormônio luteinizante [LH] e hormônio folículo estimulante [FSH]), além da avaliação da espermatogênese, por meio de espermograma. A redução do número de espermatozóides no sêmen e/ou da concentração de testosterona total confirma o diagnóstico.

154 Endocrinologia Feminina e Andrologia

A medida da testosterona plasmática total é considerada o teste mais importan­ te para o diagnóstico de hipogonadismo. Geralmente, reflete com acurácia satisfatória a secreção total de testosterona pelo testículo e representa o conteúdo total de tes­ tosterona circulante, isto é, a fração livre mais a fração ligada a proteínas plasmáticas. Pode ser determinada por radioimunoensaio, ensaios imunométricos ou por cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massas, sendo esse o método mais acurado, porém de elevado custo. Diversos ensaios automatizados estão dis­ poníveis comercialmente e apresentam acurácia satisfatória para distinção entre os estado de hipogonadismo e eugonadismo.4"6 Para a maioria dos ensaios labora­ toriais disponíveis na prática clínica, a faixa de normalidade situa-se em torno de 300 a 800 ng/dL.2 A interpretação das medidas de testosterona total em homens jovens deve levar em conta variações circadianas, com pico no início da manhã e nadir no início da noite. Além disso, algum grau de flutuação também é observado em homens nor­ mais, em um mesmo período do dia. Atualmente, está bem definido que a determi­ nação da testosterona total deve ser realizada a partir de amostra sanguínea colhida no início da manhã. Além disso, recomenda-se repetir a dosagem quando a con­ centração inicial encontra-se reduzida, isto é, abaixo de 300 ng/dL na maioria dos ensaios disponíveis. Assim, pelo menos duas medidas de testosterona total abaixo do limite inferior da normalidade são necessárias para o diagnóstico definitivo do hipogonadismo. A determinação direta da concentração plasmática de testosterona livre não é necessária na maioria das vezes e, quando indicada, deve ser feita por método de diálise de equilíbrio, o qual constitui padrão-ouro, porém ainda se apresenta pouco disponível em laboratórios comerciais. Alternativamente, há a possibilidade de se dispor de uma medida indireta da concentração de testosterona livre, calcu­ lada a partir das concentrações de testosterona total, globulina transportadora dos hormônios sexuais (SHBG: Sex Hormone Biding Globulin) e albumina plasmática. Para sua interpretação, é necessário conhecer a equação empregada nessa estimati­ va, bem como padronizar e comparar os resultados com os valores de normalidade definidos pelo laboratório responsável pelo ensaio. Outros métodos análogos não foram validados e não se correlacionam com os resultados obtidos por diálise de equilíbrio.2,5 Sendo assim, na prática, na maioria das vezes, a determinação da testosterona livre de maneira indireta, por meio da testosterona livre calculada, apenas se justifica na suspeita de alterações nos níveis da SHBG. Dentre as mais comuns, inclui-se a dife­ renciação entre hipogonadismo associado à obesidade e hipogonadismo associado ao envelhecimento, quando essa proteína encontra-se diminuída ou levemente aumenta­ da, respectivamente.7 Além disso, encontra-se cada vez mais difundido o uso da concentração plasmá­ tica de testosterona biodisponível, que consiste das frações livre e ligada fracamente à albumina (excluindo a fração ligada à SHBG). A testosterona biodisponível pode ser determinada diretamente, pelo método de precipitação por sulfato de amónio, ou também pode ser calculada a partir das concentrações de testosterona total e SHBG. Esse parâmetro também parece refletir de maneira acurada o estado androgênico em um indivíduo.8

Capítulo 10 Hipogonadismo masculino no jovem

155

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL A determinação das concentrações plasmáticas de LH e de FSH possibilita a diferen­ ciação entre hipogonadismo primário e secundário. No hipogonadismo primário, a concentracão plasmática de testosterona é baixa na presença de concentrações eleva­ das de LH e FSH, caracterizando a disfunção testicular primária. Ao contrário, no hi­ pogonadismo associado à disfunção hipotálamo-hipofisária (secundário), as concen­ trações de LH e FSH estão reduzidas ou inapropriadamente normais frente às baixas concentrações plasmáticas de testosterona. Para o diagnóstico diferencial entre as diversas causas de hipogonadismo, é es­ sencial que, durante a anamnese, o clínico exclua a presença de doenças sistêmicas, distúrbios alimentares, atividade física excessiva, uso de medicamentos, tais como glicocorticoides e opiáceos, e uso de drogas de abuso, que potencialmente alteram o metabolismo ou a produção da testosterona.2 No hipogonadismo hipergonadotrófico, costuma ocorrer comprometimento mais significativo da espermatogênese em relação à produção de testosterona. Embora vá­ rias doenças testicular es comprometam tanto a função dos túbulos seminíferos quan­ to a função das células de Leydig, o dano à espermatogênese parece ser mais intenso e precoce. Assim, a contagem de espermatozóides pode ser baixa ou ausente em conjun­ to com a concentração normal ou elevada de FSH, enquanto a concentração plasmá­ tica de testosterona pode permanecer normal. Essa situação ocorre com frequência na síndrome de Klinefelter, caracterizada por disgenesia de túbulos seminíferos, e pode perdurar por vários anos até a deficiência androgênica tornar-se clinicamente aparen­ te, a despeito da presença de testículos de volume muito reduzido.1 De maneira semelhante, no hipogonadismo hipergonadotrófico, a probabilidade de ocorrência de ginecomastia é maior. Isso ocorre possivelmente devido ao efeito estimulatório das altas concentrações de gonadotrofinas sobre a aromatase testicular, na pre­ sença de capacidade limitada de produção de testosterona pelas células de Leydig. As­ sim, há um aumento da conversão intratesticular de testosterona em estradiol, induzida pela aromatase, com secreção aumentada de estradiol em detrimento à de testosterona. Ao diagnosticar um paciente com hipogonadismo hipergonadotrófico, a realização do cariótipo é importante para excluir ou não a síndrome de Klinefelter, principal­ mente em homens pós-púberes com volume testicular menor do que 6 mL. Indivíduos portadores dessa condição beneficiam-se de aconselhamento genético e seguimento clínico de condições metabólicas e cardiovasculares concomitantes. Ocasionalmente, pacientes com mosaicismo (cariótipo 46,XY/47,XXY) podem apresentar volumes testiculares superiores.9 Já nos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico, mais comumente ocorre re­ dução proporcional, tanto na produção de testosterona quanto na espermatogênese. Quando a condição é identificada em homens jovens, é necessária avaliação direcio­ nada à identificação da etiologia, com o objetivo de afastar a existência de tumores hipofisários, hiperprolactinemia, hemocromatose e outras doenças infiltrativas, apneia obstrutiva do sono, dentre outros. Ocasionalmente, o hipogonadismo hipogonado­ trófico pode estar associado a condições genéticas, tais como a síndrome de Kallmann e o hipogonadismo hipogonadotrófico congênito normósmico, nos quais há hipofunção isolada do eixo gonadotrófico, com ou sem manifestações fenotípicas sistêmicas,

156 Endocrinologia Feminina e Andrologia

porém sem comprometimento dos demais eixos hormonais do sistema hipotálamohipófisário (Tabela 10.2). T A B E L A 10.2

I

Características fenotípicas sugestivas de algum as causas

de hipogonadism o em hom ens jovens

Apresentação

Características fenotípicas In fa n tilis m o sex u al, m ic ro p ê n is , c rip to rq u id is m o variável,

S ín d ro m e de K lin e fe lte r

In fâ n c ia , a d o le sc ê n c ia o u

te s tíc u lo s p e q u e n o s e de

id ad e a d u lta

c o n s is tê n c ia firm e, d isfu n ç ã o n e u ro co g n itiv a , g in e c o m a s tia , varizes m e m b ro s in fe rio re s In fa n tilis m o sex u al, m ic ro p ê n is ,

A d o le sc ê n c ia o u id ad e S ín d ro m e de K a llm a n n

a d u lta ; ra ra m e n to n o p e río d o n e o n a ta l

c rip to rq u id is m o variável (u n i o u b ila te ra l), a n o s m ia o u h ip o s m ia , fe n d a p a la tin a , m a lfo rm a ç õ e s re n a is, h ip o a c u s ia , s in c in e s ia b im a n u a l

H ip o g o n a d is m o

A d o le sc ê n c ia o u id ad e

In fa n tilis m o sex u al, m ic ro p ê n is ,

h ip o g o n a d o tr ó fic o

a d u lta ; ra ra m e n te n o

c rip to rq u id is m o variável, o lfa to

iso la d o n o r m ó s m ic o

p e río d o n e o n a ta l

n o rm a l D e se n v o lv im e n to g e n ita l n o r ­

H ip o g o n a d is m o a d q u irid o (h ip o o u h ip e rg o n a d o tr ó fic o )

Id a d e a d u lta

m a l, re d u çã o de p e lo s co rp o ra is, g in e c o m a s tia variável, in fe r tili­ d ad e

Na presença de hipogonadismo hipogonadotrófico, devem-se solicitar medidas de prolactina e saturação de transferrina, que avaliam a presença de hiperprolactinemia e hemocromatose respectivamente. Avaliação da função hipofisária anterior, por meio das dosagens basais de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), cortisol, hormônio tireoestimulante (TSH) e fator de crescimento semelhante à insulina 1 (IGF-1), deve ser realizada sempre que as concentrações de testosterona total estiverem abaixo de 150 ng/dL, o que sugere hipogonadismo hipogonadotrófico severo. Nessa situação e na presença de pan-hipopituitarismo, hiperprolactinemia persistente ou sintomas relacionados com a possível expansão tumoral, como cefaleia e alterações visuais, ava­ liação por imagem da região hipotálamo-hipofisária também está indicada, por meio de ressonância magnética nuclear (RMN).10

TRATAMENTO DO HIPOGONADISMO DE INÍCIO NA INFÂNCIA OU NA ADOLESCÊNCIA OU NO PERÍODO PÓS-PUBERAL EM HOMENS JOVENS A modalidade de tratamento do hipogonadismo varia de acordo com a função que necessita ser restabelecida. Caso haja comprometimento irreversível das funções

Capítulo 10 Hipogonadismo masculino no jovem

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testiculares, a reposição com testosterona é imperativa. Quando a fertilidade é desejada, o uso de outras modalidades terapêuticas, como a administração de gonadotroflnas, pode ser necessário.

■ REPOSIÇÃO DE TESTOSTERONA Recomenda-se a reposição com formulações farmacêuticas de testosterona em ho­ mens com sinais e sintomas inequívocos de hipogonadismo. Os objetivos da reposição em jovens com hipogonadismo incluem a indução e a manutenção das características sexuais secundárias, a melhora da função sexual, o restabelecimento da sensação de bem-estar geral e, em longo prazo, a prevenção da osteoporose.2,11,12 A finalidade é possibilitar oferta suficiente de testosterona aos tecidos em que ela exerce suas funções biológicas, o mais próximo possível do que é encontrado em indi­ víduos normais. Com a reposição adequada, pleiteiam-se atividade e comportamento sexual normais, com resposta sexual adequada aos estímulos eróticos e manutenção da frequência e da duração das ereções noturnas.13'16 A reposição proporciona aumento de pelos nos locais sensíveis à ação dos andrógenos, como barba, axila e púbis, os quais são importantes para a identificação sexual do homem. Aumento da massa e do metabolismo muscular, com redução da gordura corporal e modificação em sua distribuição, com restauração da aparência corporal masculina são observados.14,17

D Contraindicações As contraindicações ao tratamento com testosterona são semelhantes àquelas para homens mais idosos, com ênfase na presença de câncer de mama e próstata. Sintomas sugestivos de obstrução urinária moderada a grave (escore IPSS - International Prostate Symptoms Score >19), presença de nódulo prostático palpável e/ou PSA (Prostate-Specific Antigen) maior que 4 ng/mL ou maior que 3 ng/mL em homens com alto risco de câncer de próstata (negros ou homens com história familiar de câncer de próstata em parentes de primeiro grau) também constituem contraindicações à reposição androgênica. Além disso, o tratamento com testosterona também não está recomendado na presença de policitemia, definida por hematócrito acima de 50%, apneia obstrutiva do sono severa não tratada e insuficiência cardíaca congestiva mal controlada.2,11

IMPORTANTE E m p a c ie n te s se le c io n a d o s q u e d e se ja m fe rtilid a d e , o tr a ta m e n to c o m te s to s te r o n a iso la d a ­ m e n te n ã o é in d ic a d o , p o is in te rfe re n e g a tiv a m e n te n a esp e rm a to g ê n e se .

D

Formulações de testosterona

A escolha deve ser feita em comum acordo com o paciente, levando em consideração aspectos farmacocinéticos, comodidade no tratamento e custo. A seguir, apresentamse as formulações farmacêuticas de testosterona (T) disponíveis no Brasil e de maior utilização. Aos interessados em obter mais informações sobre outras formulações, sugere-se consultar as revisões de Snyder eta l.n e Bhasin et al.2

158 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Ésteres de testosterona Devido à esterificação no grupo 17-beta-hidroxil da testosterona, esses produtos são mais lipofílicos do que o hormônio natural. A injeção intramuscular produz a sua estocagem e liberação gradual do veículo à base de óleo, o que prolonga a presença da testosterona no sangue.11,18,19 Constituem o enantato de testosterona e o cipionato de testosterona, sendo que apenas o cipionato encontra-se comercialmente disponível no Brasil. C ip ion ato de testosterona

A apresentação comercial inclui embalagem com 3 ampolas (de 2 mL) de 200 mg cada. Pode ser administrada meia ampola (100 mg) a cada 7 dias ou 1 ampola, a cada 14 dias. Após a aplicação intramuscular da dose de 200 mg, a testosterona atinge con­ centrações no sangue acima do limite superior do normal entre o segundo e quarto dias e diminui gradualmente para os limites de normalidade até o final do intervalo entre as doses (14 dias), quando se situa próximo ao limite inferior da normalidade. As concentrações de dehidrotestosterona (DHT) e estradiol (E2) aumentam em pro­ porção ao aumento das concentrações de testosterona, mas as relações T:DHT e T:E2 não se alteram.2,11,19 As vantagens dessa formulação são o custo baixo, a correção dos sintomas de deficiência androgênicas e a possibilidade de se flexibilizar a dosagem, sem a necessidade de aplicações diárias. As desvantagens são a necessidade da admi­ nistração intramuscular e flutuações nas concentrações plasmáticas de testosterona, gerando uma situação não fisiológica.2,18,19 A monitorização do tratamento é feita por meio da dosagem de testosterona plasmática no sétimo dia após a aplicação, a qual deve estar em valor próximo à média da normalidade para homens jovens saudáveis, preferencialmente entre 350 e 750 ng/dL. E necessário procurar flutuações da libido e do humor para adequar a dose.2,11,18,19 M istura de ésteres de testosterona

A apresentação comercial, para uso intramuscular, inclui embalagem de 1 ampola com 250 mg de testosterona divididos entre os seguintes ésteres: propionato (30 mg), fenilpropionato (60 mg), isocaproato (60 mg) e decanoato (100 mg). Geralmente é administrado a cada 3 semanas. U n d ecan o ato de testosterona

Ampola de 1.000 mg em solução oleosa injetável de 4 mL (250 mg/1 mL). E comercia­ lizado no Brasil e na Europa, mas não nos Estados Unidos, sendo indicado para repo­ sição em homens com idade superior a 18 anos. Deve ser aplicado sempre intramus­ cular e muito lentamente, porque pode desencadear necessidade de tossir, aumento de tosse e dificuldade respiratória logo após a injeção. As primeiras 2 aplicações devem ter um intervalo de 6 semanas, e as seguintes, a cada 10 a 14 semanas. A monitorização e a individualização da dose serão de acordo com a concentração da testosterona ao final de cada intervalo de tratamento (10 a 14 semanas pós-dose). Caso a testosterona plasmática esteja acima ou abaixo dos limites de normalidade, deve-se aumentar ou di­ minuir o intervalo de tempo entre as aplicações. As concentrações de testosterona são mantidas normais na maioria dos homens. A DHT e o E2 aumentam em proporção ao aumento das concentrações de testosterona. Contudo, as relações DHT:T e T:E2 não se alteram. A principal vantagem é o maior intervalo de tempo sem necessidade

Capítulo 10 Hipogonadismo masculino no jovem

159

de aplicação. As desvantagens são a necessidade de volume grande de líquido aplicado (4 mL) e o sintoma de tosse em alguns homens, além da dificuldade de flexibilizar as doses devido à sua longa ação.2

Gel de testosterona Não há apresentação comercial disponível atualmente no Brasil. Nos Estados Unidos e na Europa, está disponível nas formas de sachês, tubos e bisnagas, com 5 g a 10 g de gel a 1%, o que permite a dose de 50 mg a 100 mg de testosterona por dia. Fornece concentra­ ções mais fisiológicas de testosterona e E2. As concentrações de DHT são maiores, mas a relação T:DHT é menor do que em homens normais. Corrige os sintomas de deficiência de andrógenos, possibilitando flexibilização da dose, fácil aplicação e boa tolerabilidade da pele. As desvantagens são a potencial possibilidade de transferência para a mulher e a criança pelo contato da pele; portanto, deve-se cobrir o local da aplicação quando estiver em contato com elas. Pequena irritação da pele pode ocorrer, assim como moderadamente altas concentrações de DHT. As concentrações de testosterona plasmáticas são mantidas quando o local da aplicação é lavado somente após 4 a 6 horas da aplicação. A monitoriza­ ção deverá ser feita por meio de dosagem de testosterona 1 semana após ter sido iniciada a reposição, com o objetivo de mantê-la próxima à média normal.2,11,18

■ MONITORIZAÇÃO E SEGUIMENTO CLÍNICO DO PACIENTE EM TRATAMENTO DE REPOSIÇÃO ANDROGÊNICA O objetivo do tratamento androgênico é manter as concentrações plasmáticas de tes­ tosterona o mais próximo possível da média da normalidade, idealmente entre 400 e 700 ng/dL.2,11 Após iniciada a reposição hormonal, todo indivíduo deverá ser acompanhado a cada 3 a 6 meses, para avaliação da melhora dos sintomas e possíveis efeitos adversos. Além disso, em adolescentes e adultos jovens com hipogonadismo iniciado no perío­ do puberal ou pré-puberal, deve-se monitorar o processo de crescimento e desenvol­ vimento. A concentração de testosterona também deve ser avaliada após 3 meses do início do tratamento, e o esquema terapêutico, ajustado, conforme a necessidade. Em homens jovens, a prevalência de câncer de próstata e demais alterações que contraindiquem ou limitem o tratamento é baixa, porém eventualmente devem ser reconhecidas de imediato. Recomenda-se a dosagem inicial do PSA aos 40 anos e, a partir do valor obtido nesse momento, é definida a frequência da monitorização. Ho­ mens com 40 anos ou mais que apresentam PSA basal maior que 0,6 ng/mL devem ser submetidos a exame digital da próstata e determinação seriada do PSA aos 3 e 6 meses após o início da reposição. O risco de câncer de próstata pode ser estimado utilizando ferramentas para cálculo disponíveis na internet (http://deb.uthscsa.edu/URORiskCalc/Pages/calcs.jsp) e leva em conta idade, raça, história familiar, dentre outros fato­ res de risco. Apesar da baixa incidência de complicações graves em pacientes jovens, a monitorização do risco de câncer de próstata deve ser prioritária, particularmente em homens com mais de 40 anos.2 Para mais informações a respeito da monitorização em homens acima de 40 anos ou com alto risco, recomenda-se consultar Bhasin et dl.2 disponível em http://www.endo-society.org/ guidelines/final/upload/FINAL-Androgens-in-Men-Standalone.pdf.

160 Endocrinologia Feminina e Andrologia

É recomendado avaliar hematócrito e hemoglobina antes e após 3 e 6 meses de tratamento, em seguida, uma vez ao ano. Se o hematócrito for maior que 54%, recomenda-se interromper a reposição e avaliar a presença de hipóxia e apneia do sono, reiniciando-se a reposição com dose menor do que a anterior.11,18,19 Efeitos adversos incluem aumento de peso, acne, seborreia, calvície, maior frequên­ cia de ereções, priapismo, apneia do sono, nervosismo, depressão, hostilidade, câim­ bras, icterícia e alterações das provas de função hepática, em graus variáveis, porém, raramente, comprometem o tratamento. Nos casos de formulações injetáveis, pode ocorrer dor, equimose, edema e infecção no local de aplicação.2,11,18 A testosterona pode aumentar o efeito hipoglicemiante da insulina, as concentra­ ções plasmáticas de anti-inflamatórios, como a oxifenilbutazona, e os efeitos de anticoagulantes.18

TRATAMENTO DA INFERTILIDADE EM PACIENTES COM HIPOGONADISMO HIPOGONADOTRÓFICO As gonadotrofinas, FSH e LH, são necessárias para a iniciação e a manutenção da espermatogênese. Em pacientes com secreção deficiente de gonadotrofinas, a utilização de reposição androgênica isolada é efetiva na melhoria dos sintomas do hipogonadismo, além de ser fácil e com preço acessível. Contudo, o uso continuado da testosterona ocasiona diminuição ainda maior do volume testicular, comprometendo a produção de espermatozóides e a fertilidade. Alternativas estudadas para manutenção da produção de testosterona, aumen­ to ou manutenção do volume testicular e iniciação e manutenção da espermatogênese incluem: a) gonadotrofma coriônica humana (hCG);20'22 b) gonadotroflna menopáusica humana (hMG, que inclui frações variáveis de FSH e LH);20,21 c) FSH recombinante humano20,22'24 e d) hormônio liberador das gonadotrofinas (GnRH).20 Outras alternativas que vêm ganhando importância crescente são o uso dos antagonistas fracos do receptor estrogênico, clomifeno e enclomifeno e inibi­ dores da aromatase.25,26 Fatores que influenciam um melhor prognóstico para o tratam ento com go­ nadotrofinas incluem o hipogonadismo parcial, isto é, com volume testicular > 6-8 mL e concentração detectável de FSH e inibina B, e ausência de criptorquidia. No hi­ pogonadismo hipogonadotrófico iniciado antes da puberdade ou no período peripuberal, um estudo mostrou que o tratamento prévio com testosterona parece resultar em resposta espermatogênica mais lenta ao tratamento com gonadotro­ finas, enquanto o tratamento inicial com gonadotrofinas levou a resposta mais rápida.27

D

Gonadotrofinas

Em homens com infertilidade secundária à deficiência de gonadotrofinas, o uso tera­ pêutico de hCG, por seu efeito semelhante ao do LH e meia-vida mais longa, estimula as células de Leydig e aumenta a produção intratesticular de testosterona de maneira dose-dependente. O aumento da testosterona intratesticular exerce estímulo parácrino às células de Sertoli e células germinativas.28 Em alguns pacientes com secreção endógena residual de FSH, hCG isoladamente pode ser suficiente para estimular a espermatogênese. Por outro lado, FSH isoladamente não é efetivo.

Capítulo 10 Hipogonadismo masculino no jovem

161

Nesse sentido, efeitos mais consistentes têm sido obtidos por meio da associação de hCG com FSH recombinante humano. Vários esquemas têm sido propostos para estimulação da espermatogênese. O mais aceito atualmente emprega doses iniciais de 2.000 UI de hCG urinário, por via intramuscular, ou hCG recombinante, por via sub­ cutânea, 3 vezes por semana. Essa dose é ajustada a cada 1 a 2 meses, conforme a con­ centração de testosterona plasmática e, quando esta estabiliza entre 400 e 800 ng/dL, o espermograma passa a ser avaliado a cada 1 a 3 meses. A maioria dos pacientes atinge contagem de espermatozóides normal (> 40 milhões/volume ejaculado ou > 15 milhões/mL) entre 6 e 24 meses de tratamento. Quando a contagem de espermatozóides não atinge pelo menos 7,5 milhões/mL entre 12 e 24 meses, adiciona-se ao esquema terapêutico FSH recombinante, em doses entre 150 e 300 unidades, via subcutânea, em dias alternados, por cerca de 18 meses. Observou-se resposta espermatogênica ade­ quada em 46,2% a 88,9% dos homens tratados.11,22'24 Alternativamente, pode-se adicionar hMG ao hCG, em vez do FSH recombinante, com custo bem mais acessível. A dose inicial é de 75 unidades, 3 vezes por semana, e pode ser aumentada para 150 U/semana. Se a gestação não ocorre em 6-12 meses após adequação do espermograma, o pa­ ciente é encaminhado para reprodução assistida.



Antagonistas do receptor estrogênico

Com base nos efeitos de retroalimentação dos estrógenos no sistema hipotálamo e hipófise, tem sido de grande interesse a ação dos antagonistas do estrógeno na promo­ ção da espermatogênese e na capacidade reprodutiva masculina.25,26 É bem estabelecido o uso de antagonistas fracos dos receptores estrógenos na indu­ ção da ovulação em mulheres com anovulação crônica. Embora seu efeito no estímulo à produção de FSH, LH e testosterona ainda não tenha sido demonstrado de maneira inequívoca em estudos iniciais, várias observações recentes mostram que o clomifeno e seus derivados podem restaurar a função gonadal em um grupo de homens com hi­ pogonadismo. O clomifeno é um fármaco não esteroide, ativo por via oral e relaciona­ do com o diestilbestrol. Ele estimula a liberação das gonadotrofinas por competir com o estradiol nos receptores hipotalâmicos, neutralizando a retroalimentação negativa sobre o GnRH. Esse aumento nas gonadotrofinas e da testosterona poderia melhorar a contagem, a motilidade e a morfologia dos espermatozóides.25

O

Inibidores da aromatase

A presença de aromatase e receptores de estrógenos nas células de Leydig e de Sertoli, nos espermatócitos, espermátides e espermatozóides, sugere que os estrógenos tenham ação importante no sistema reprodutor masculino.25 O estrógeno exerce potente efeito negativo na liberação das gonadotrofinas. A testos­ terona, por outro lado, é transformada em estrógeno pela ação da aromatase. Assim, o bloqueio da aromatase ocasiona aumento do LH, do FSH e da testosterona.29,30 Os inibidores da aromatase não esteroides são o anastrazol, o letrozol e a testolactona. Sua utilização no tratamento do hipogonadismo masculino ainda necessita de maiores estudos, principalmente em relação aos efeitos em longo prazo. São bem tolerados e di­ minuem a relação estradiol/testosterona em 77% dos homens.29,30 Isso porque a inibição da aromatase é dose-dependente, e a supressão da aromatase é menor no testículo em comparação aos tecidos muscular e adiposo, o que explica a ação parcial no homem.

162 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Devido ao seu modo de ação, os inibidores da aromatase estão limitados para au­ mentar a testosterona em homens com baixas concentrações desse hormônio e com alguma função residual do eixo hipotálamo-hipófise-gônada, preferencialmente na­ queles com disfunção combinada hipotalâmica e testicular.26 Em homens com obesidade grave, a inibição da aromatase ocasionou normalização da testosterona, aumento da espermatogênese, restauração da fertilidade e melhora da sensibilidade à insulina e da perda de peso.31,32 O tratamento prévio com inibidor da aromatase em paciente com síndrome de Klinefelter resultou em recuperação de espermatozóides por extração intratesticular.33 Apesar de promissor, o uso de inibidores da aromatase no tratamento da infer­ tilidade em homens jovens com hipogonadismo ainda não está definido na rotina clínica.

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Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério E r ik a M e n d o n ç a A n g e l a M a g g io

das da

N ev es

Fo n sec a

V ic e n t e R e n a t o B a g n o l i

■ INTRODUÇÃO A ocorrência de intervalos menstruais regulares aponta para a existência de um com­ petente sistema neuroendócrino ovariano e canalicular, capaz de favorecer o desenvol­ vimento puberal, a periodicidade dos ciclos e o sucesso reprodutivo. Espera-se que até os 14 anos de idade ocorra a menarca (primeiro evento menstrual), independentemente do desenvolvimento puberal, ou até os 16 anos de idade, quando houver atingido estágio ideal de caracterização sexual secundária. A partir desse marco, inicia-se a menacme - período reprodutivo da mulher - que irá até a menopausa.1

IMPORTANTE A m e n stru a ç ã o é d e fin id a c o m o sa n g ra m e n to g e n ita l p erió d ico , c u jo in terv alo v aria de 2 5 a 3 5 dias. A d u ra çã o h a b itu a l d a m e n stru a çã o é de 4 a 6 dias, p o d e n d o variar de 2 o u até 8 dias de d u ra ç ã o em a lg u m a s m u lh e re s. O v o lu m e m e n s tru a l n o r m a l é de 3 0 m L a 8 0 m L , sen d o q u e m a io r q u e 8 0 m L é co n sid e ra d o a n o rm a l.2'5

Sangramento genital em pré-puberes pode apresentar variadas causas, mas, em ge­ ral, é pequeno o volume de perda, sem repercussão sistêmica. Ocorre, por exemplo, por ocasião do uso local de estrógenos para tratamento de sinéquias de pequenos lábios, lesões vulvares pruriginosas (líquen escleroso, vulvovaginite por leveduras, trichomo­ nas e enteróbios vermiculares), hemangioma de vulva que sofre atrito, traumatismos genitais acidentais (hematomas, lacerações até mesmo lesão em empalamento de con­ sequências graves), abuso sexual (hematomas e lacerações). A principal causa de san­ gramento genital em meninas é o prolapso de uretra por eversão da mucosa uretral, que responde ao tratamento com estrógenos locais por 1 semana ou cirurgicamente, no insucesso da conduta clínica. Da mesma forma, no prolapso, o sangramento de carúncula uretral tem boa resposta com estrógeno tópico.6

TIPOS DE IRREGULARIDADES MENSTRUAIS Devido à falha na maturidade do sistema hipotálamo-hipófise-ovários em adolescen­ tes, não é rara a ocorrência de sangramento uterino anormal (por insuficiência da fase

Capítulo 11

Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério

165

lútea ou ciclos anovulatórios) até 2 anos após a menarca, quando, então, o eixo atinge estabilidade funcional, na ausência de outras entidades nosológicas.2 O ciclo menstrual pode apresentar diferentes tipos de alterações: quanto à duração (hipermenorreico, quando o período menstrual dura mais de 5 dias e hipomenorreico, quando dura menos de 5 dias), quantidade (menorragia quando há perda grande de sangue e coágulos durante o período menstrual, sem modificar a duração, e oligomenorreia no sangramento escasso) e intervalo (proiomenorreia quando a menstruação ocorre a cada 20 a 25 dias, polimenorreia na presença de ciclos menstruais a cada 15 dias, opsomenorreia em intervalos de 35 a 40 dias e espaniomenorreia quando ocor­ rem falhas menstruais de 2-3-6 meses).4,5 Dentre as causas de sangramento aumentado, podem-se encontrar os distúrbios da coagulação, que produzem hemorragia genital desde a menarca, sendo os mais co­ muns a púrpura trombocitopênica idiopática e a doença de Von Willebrand, geral­ mente associada a história de sangramento gengival e hematomas diversos.6 Infecções por clamídia, gonococo ou micoplasmas também podem induzir sangra­ mento irregular e sinusiorragia (sangramento no ato sexual), associada a corrimentos e dores referidas em hipogástrio.6 Entende-se por metrorragia perda sanguínea genital atípica em qualquer período de tempo entre um ciclo menstrual e outro, podendo se prolongar por dias, cessar ou reaparecer sem as características que mantêm a menstruação normal.4,5 Dentre as várias causas uterinas de metrorragia, ocorrem os leiomiomas uterinos (mais frequentes a partir de 35 anos), pólipos endometriais, lesões cervicais, hiperplasia do endométrio, hiperplasia com atipia e câncer de endométrio.7 O uso de anticoncepcionais hormonais está associado à hemorragia de escape, que ocorre em até 30% das mulheres durante o primeiro ciclo de uso de pílulas combina­ das, mais comumente naquelas de baixa dose.8 No climatério, as mais relevantes causas de hemorragia genital são a endometrite, associada à vaginite atrófica e o uso de terapia hormonal (TH).8

IMPORTANTE O d ia g n ó s tic o de S a n g ra m e n to (o u H e m o rra g ia ) U te rin o D is fu n c io n a l - (S U D ) é fe ito ap ó s te re m sid o exclu íd as to d a s as cau sas o rg â n ica s de sa n g ra m e n to g e n ita l e g esta çã o , p o is, m u ita s vezes, o p ro b le m a e stá re la c io n a d o c o m a lte ra çõ e s fu n c io n a is n o eix o h ip o tá la m o -h ip ó flse g o n a d a l. E s ta c o n d iç ã o é u m a im p o r ta n te ca u sa de a n e m ia fe rro p riv a .5

O SUD é responsável por cerca de um terço dos sangramentos genitais em mulhe­ res e ocorre em qualquer período da menacme, principalmente, na puberdade e no climatério (período de vida entre os 40 e 65 anos de idade), quando o fluxo é irregular quanto ao intervalo, à duração e à intensidade, decorrente da deprivação estrogênica pura e anovulatória, devido à desregulação do eixo neuro-hipófise-ovário, o que pode ser fator de risco para a hiperplasia endometrial.9 Ocorre, ainda, a variedade ovulatória do SUD, causada pela elevação e pela que­ da brusca dos níveis de estrógenos na ruptura do folículo, além do sangramento pós-ovulatório causado por alterações na ovulação ou na formação anômala do corpo lúteo, com insuficiência da progesterona e subsequente descamação endo­ metrial.9

166 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Entende-se por amenorreia a ausência da menstruação em período fisiologicamente esperado para a ocorrência dos ciclos menstruais. E dita como primária na ausência de menstruações após 15 anos e, secundária, na ausência de menstruação por 3 ciclos - ou mais - consecutivos em pacientes na menacme. ,n A falsa amenorreia, também chamada criptomenorreia, deve ser excluída desse con­ ceito, causada pela não exteriorização do fluxo menstrual após a menarca e o con­ sequente acúmulo desse sangramento retrógrado no aparelho genital interno. Essa condição clínica gera amenorreia, dor pélvica recorrente e eventual retenção urinária, além de risco sobre o futuro reprodutivo da adolescente. A criptomenorreia é doença congênita do sistema canalicular em nulíparas e ocorre em hímen imperfurado, septo vaginal transverso imperfurado, septo vaginal oblíquo imperfurado, agenesia parcial da vagina, agenesia total da vagina ou agenesia cervical. Porém, a patologia também pode ser adquirida em mulheres que apresentaram partos por via vaginal e posterior estenose do trajeto de parto.12 O fluxo menstrual pode se acumular na vagina (hematocolpo), no útero (hematometra), nas tubas (hematossalpinge) e no interior da cavidade abdominal (hematoperitônio).1,13

AMENORREIA PRIMÁRIA A amenorreia não é um diagnóstico, mas um sintoma causado por múltiplos fatores etiológicos. A investigação de rotina na amenorreia primária inicia com a busca de manifes­ tações clínicas, dados cronológicos do desenvolvimento puberal e pôndero-estatural, com atenção à pesquisa de nódulos em regiões inguinocrurais ou estigmas turnerianos, antecedentes prévios de traumas, cirurgias, quimioterapia ou radioterapia e exa­ mes de imagem pélvica, como sistematizado na Figura 11.1.4)10,11

D

Ginatresias

A síndrome de Mayer-Rokitanshy-Kuster-Hauser compreende distúrbio do desen­ volvimento isossexual decorrente de anomalias congênitas da fusão dos duetos de Muller, que cursa com amenorreia primária e diferenciação morfológica feminina normal. Constitui séria limitação fisiológica à fertilidade e ao intercurso sexual com penetração vaginal. Apresenta possível herança poligênica multifatorial e associação com malformações urinárias e de corpos vertebrais.1,12,13 Ao ultrassom, ovários se apresentam normais, vagina e útero, ausentes, dosagens hormonais normais, estudo genético: 46, XX. Radiografia de coluna, bem como ultras­ som das vias urinárias, é obrigatório, pois malformações do trato urinário são bastan­ te frequentes.16 A amenorreia nas ginatresias não obstrutivas é irreversível, mas a vivência sexual é possível pelo desenvolvimento da neovagina. Na presença de completa diferenciação do 1/3 distai da vagina, está recomendada a técnica não cruenta de Frank, ideal para o desenvolvimento da neovagina, que em semanas ou meses poderá obter as dimen­ sões adequadas para o coito sem riscos de complicações, como estenose e bridas, apresentando revestimento com características biológicas semelhantes às da vagi­ na normal. Para pacientes com ambiguidade genital ou agenesia vaginal completa, a alternativa é a vaginoplastia cirúrgica pela técnica de Mclndoe, com resultados satisfatórios.1,12,13

Capítulo 11

Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério

167

Anamnese, Exame Físico (Diferenciação +, com caracteres sexuais presentes) Ultrassom pélvico

FIGURA 11.1 Diagnóstico da amenorreia primária com diferenciação dos caracteres sexuais.41415

O diagnóstico da amenorreia primária sem diferenciação dos caracteres sexuais deve ser abordado pela Figura 11.2 que, além de considerar os aspectos clínicos, separa os grupos pelos níveis de gonadotrofinas.4,10,11

D

Hipogonadismo hipogonadotrófico

Na amenorreia de causa hipotalâmica, ocorre inibição da secreção pulsátil do hormô­ nio liberador das gonadotrofinas (GnRH), queda da estimulação cíclica normal de gonadotrofinas hipofisárias e consequente disfunção ovariana, o que pode cursar com retardo puberal. Isso ocorre na síndrome de Kallmann, em que há deficiência genéti­ ca do GnRH, falha na migração de axônios olfatórios para o hipotálamo, puberdade tardia e amenorreia primária, com baixos níveis de gonadotrofinas, cariótipo normal (XX) e dificuldade de perceber odores (anosmia ou hiposmia).17 Outras causas comuns de amenorreia em mulheres jovens e adolescentes são es­ tresse emocional, perda de peso e desnutrição (que reduz o percentual de gordura necessária à atividade da enzima aromatase), exercícios vigorosos (aumentando a se­ creção de endorfinas e diminuindo a liberação de GnRH), além de outras causas mais raras, como lesões hipotalâmicas, incluindo linfoma, histiocitose, sarcoidose e cistos ou tumores hipotalâmicos.17 Aspectos moleculares também podem atuar sobre genes de receptores das gonado­ trofinas, gerando implicações fenotipicas e disfunções reprodutivas.12,18

168 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Anamnese

Amenorreia primária

\

Exame físico: Infantilismo sexual e genital

\

\Causa Ovariana Disgenesia Gonadal

FIGURA 11.2 Diagnóstico da amenorreia primária sem diferenciação dos caracteres sexuais.511

Diagnóstico O diagnóstico é sugerido pela amenorreia primária isolada ou associada a outras falências glandulares. As dosagens hormonais - hormônio folículo estimulante (FSH), hormônio luteinizante (LH), hormônio tireoestimulante (TSH), hormônio do crescimento (GH), T3 e T4 livre - concluem o diagnóstico.17

Tratamento O tratamento consiste na reposição de estrógeno e progestógeno que promovem a di­ ferenciação dos caracteres sexuais e iniciam os fluxos menstruais. Havendo deficiência de outros hormônios, devem-se individualizar e indicar as reposições necessárias.2’4,11



Disgenesia gonadal

A disgenesia gonadal caracteriza-se por indivíduos portadores de amenorreia primá­ ria e infantilismo sexual causados pela presença de gônadas em fita indiferenciadas desprovidas de elementos germinativos e não secretoras de esteroides sexuais. A etio­ logia pode ser: alterações genéticas diversas, constituição cromossômica anormal e outras. Clinicamente, existe a forma pura, que apresenta estatura normal e ausência de malformações somáticas, e a síndrome de Turner e variantes, quando houver baixa estatura e presença de malformações.19,20

Diagnóstico Durante a anamnese e o exame físico, podem ser percebidas limitações psicomotoras, so­ ciais e até verbais. As manifestações físicas podem ser sutis, incluindo orelhas deformadas e de baixa implantação, pescoço alado, implantação baixa dos cabelos, tórax em escudo,

Capítulo 11

Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério

169

hipertelorismo dos mamilos, baixa estatura, cúbito e geno valgo, micrognatia e enverga­ dura maior que altura (habitus eunucoide). Os exames complementares mostram dosagens hormonais (FSH, LH) elevados, ultrassonografia pélvica com útero presente, ovários ausentes ou atróficos, Raios X (RX) de mãos e punhos com idade óssea menor que a crono­ lógica, pela ausência de estímulo hormonal, e estudo genético variável: 46 XX; 46 XY nas forma puras e 45 X ou mosaicos 45X/46XY na síndrome de Turner e variantes).19’20 Pacientes com síndrome de Turner podem apresentar malformações cardíacas con­ gênitas (coarctação da aorta, valva aórtica bicúspide e dilatação progressiva da raiz da aorta ou dissecção), linfedema congênito, malformações renais, perda auditiva neurossensorial, osteoporose, obesidade, diabetes e perfil lipídico aterogênico.19,20

Tratamento A baixa estatura pode ser corrigida com hormônio de crescimento já na infância e estrógeno em baixas doses, iniciando antes de 9 anos e aumentando a dose na adoles­ cência para acelerar o desenvolvimento puberal dos caracteres sexuais, induzir perio­ dicidade menstrual, possibilitar a vivência sexual e a manutenção da massa óssea.19,20 O tratamento hormonal é a reposição com estrógenos e progestógenos até a idade esperada da menopausa.8 Na síndrome de Turner raramente ocorre gestação espontânea e menos ainda que alcance a maturidade fetal. Com a possibilidade de gestação pela técnica de repro­ dução assistida, foi percebido aumento de 2% na ocorrência de mortes maternas por acidentes cardiovasculares, devido à incidência maior de malformações aórticas.16,21 O tratamento cirúrgico consiste de correções das malformações e gonadectomia quando houver a presença do cromossomo Y, devido a risco mais elevado para transfor­ mação neoplásica da gônada disgenética.20Jonson et al.,20 2010 descreveram 3 casos, com síndrome de Swyer (disgenesia gonadal pura completa) com 3 tipos histológicos distin­ tos de tumores (disgerminoma, seminoma e gonadoblastoma). Concluem os autores que, frente ao diagnóstico de disgenesia gonadal com presença de Y no cariótipo, deve-se indicar gonadectomia profilática, devido ao risco de transformação neoplásica.20 A M E N O R R E IA S E C U N D Á R IA

Amenorreia secundária é queixa de elevada frequência e complexos fatores etiopatogênicos, tanto pelo eixo neuroendócrino da reprodução, quanto por causas extragenitais. O roteiro propedêutico complementar para diagnóstico etiológico segue a Figura 11.3.2,8,11



Fatores extragenitais

Tireoide As doenças da tireoide são mais frequentes em mulheres, trazendo prejuízo à fisiologia da reprodução. No hipotireoidismo primário, o aumento do hormônio liberador da tireotrofina (TRH) estimula a liberação da prolactina, o que pode causar amenorreia. No hipotireoidismo secundário de causa central, a amenorreia ocorre por ação direta na regulação do retrocontrole de FSH, LH e estradiol. No hipertireoidismo, os níveis plasmáticos de estradiol estão aumentados, bem como os níveis da globulina trans­ portadora dos hormônios sexuais (SHBG) e do LH, que determina anovulação crônica e consequente amenorreia.3,8,14

170

Endocrinologia Feminina e Andrologia

ß-HCG FSH/LH Prolactina Ultrassom pélvico

Prolactina aumentada

TSHt

1 1

TSH normal

r

Hipotireoidismo Hiperprolactinemia funcional Prolactinoma

Alterações da cavidade endometrial

Prolactina normal FSH / LH

Aumentado Histeroscopia ou Histerossalpingografia

Ovários policísticos Acne - Hirsutismo

Baixo

Perfil androgênico

Falência ova ria na Alterado

Síndrome de Asherman

Teste clomifeno Teste GnRH

Teste cortrosina

T Ressonância Magnética ou Tomografia Computadorizada de crânio Estudo neurooftalmólogico

T

T

Hiperplasia ■ Síndrome dos adrenal ovários policísticos

I

FIGURA 11.3 Roteiro diagnóstico da amenorreia secundária.5

Diagnóstico O diagnóstico clínico é confirmado pela dosagem dos hormônios tireodianos (T3, T4 total e livre); informações adicionais eventualmente são obtidas por ultrassonografia com Doppler da tireoide e dosagem dos anticorpos (antitireoglobulina e antiperoxidase tireoidiana).14

Tratamento O hipotireoidismo é tratado pela reposição dos hormônios tireoidianos, em doses ajus­ tadas a cada caso pelos níveis de TSH e T4 livre. O hipertireoidismo deverá ser orientado e tratado pelo endocrinologista por meio de drogas , iodo radioativo ou cirurgia.14

Adrenal A hiperplasia adrenal congênita é um erro inato do metabolismo do cortisol causado em mais de 90% dos casos pela deficiência da enzima 21-hidroxilase que pode ser diag­ nosticada no recém-nascido ou na infância, na forma clássica virilizante ou perdedora

Capítulo 11

Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério

171

de sal. Contudo, a forma tardia é responsável por irregularidades menstruais como a amenorreia associada a manifestações androgênicas.8

Diagnóstico Na presença de manifestações clínicas de hiperandrogenismo e amenorreia, deve-se avaliar o perfil androgênico (androstenediona, testosterona,17 OH-progesterona e sulfato de deidroepiandrosterona) e fazer diagnóstico diferencial entre síndrome dos ovários policísticos (SOP) e hiperplasia adrenal congênita (HAC) forma tardia (ver capítulos específicos).8,14

Tratamento O tratamento da HAC forma tardia deve ser feito com corticoides, principalmente, para preservar a fertilidade e reduzir a virilidade, tendo como parâmetro os níveis de androgênios.8,22

Q

Fator canalicular

Síndrome de Asherman Amenorreia secundária decorrente de trauma endometrial após parto, abortamento ou outra manipulação uterina, ou infecção - esquistossomose, tuberculose e outras secundárias ao uso de dispositivo intrauterino (DIU) - capazes de formar aderências endometriais e obliterar a cavidade uterina.15

Diagnóstico E sugestivo pela história de amenorreia pós-gestação, associada a complicação no par­ to, aborto com curetagem ou grande infecção pélvica. A histerossalpingografia, com padrão de falha de enchimento, ou histeroscopia confirma a presença de aderências endometriais.15

Tratamento O debridamento das sinéquias pela histeroscopia tem resultados satisfatórios e pode ser seguido pela inserção de DIU, com administração de estrógenos nos primeiros meses do pós-operatório.14

Metrose de receptividade Amenorreia que cursa com integridade da cavidade uterina e canal cervical, além de função ovariana cíclica, mas a função menstrual inexiste. Por esse motivo, também é chamada de ovulação silenciosa, e o endométrio, apesar de responder à sequência estradiol-progesterona, não sofre a descamação hemorrágica. Aparentemente, o endo­ métrio secretor é reabsorvido.15

D

Fatores ovarianos

Insuficiência ovariana prematura Cerca de 1% das mulheres tem insuficiência ovariana prematura como causa de amenorreia secundária e até primária. Ocorrem hipoestrogenismo e níveis eleva­ dos de gonadotrofinas antes dos 40 anos. Fatores etiológicos possíveis incluem tóxicos, drogas, radiação, infecções, bem como defeitos genéticos, mas a etiologia

172 Endocrinologia Feminina e Andrologia

da grande parte dos casos não é definida. Possivelmente se trata de anomalia gené­ tica que determina número reduzido de folículos primordiais ou atresia folicular acelerada. Eventualmente, identificam-se anomalias cromossômicas, como mosai­ cos 46XX/45X0. Também pode haver associação com outras doenças autoimunes, como a doença de Addison, diabetes tipo I e tireoidites autoimunes. Outras causas são a destruição de folículos por infecção, como ooforite por caxumba, ou agressao risica.9 ~

C *'

*

%

Diagnóstico Baseia-se no quadro clínico sugestivo de amenorreia secundária antes dos 40 anos, em geral seguida de sintomas vasomotores e ressecamento da pele e da vagina. A pesquisa dos antecedentes mórbidos ajuda no diagnóstico etiológico. Os exames complemen­ tares mais relevantes são: gonadotrofinas elevadas, estradiol baixo e ultrassonografia transvaginal mostrando ovários reduzidos ou não visíveis. Para o diagnóstico etiológico, recomenda-se solicitar de forma individualizada estudo genético e fatores autoimunes, entre outros (ver capítulo específico).14

Tratamento O tratamento hormonal é recomendado para alívio dos sintomas vasomotores, cutâ­ neos e geniturinários, bem como para prevenção da osteoporose, dislipidemia, entre outras, com rastreamento para neoplasias ginecológicas de rotina.8’14,24

Síndrome dos ovários policísticos É o distúrbio endócrino mais comum em mulheres na idade reprodutiva, com preva­ lência de 7% a 10%.9,25,26 De acordo com o Consenso de Rotterdam (2003), considera-se SOP na presença de 2 dos 3 critérios seguintes: disfunção menstrual, hiperandrogenismo com ou sem hiperandrogenemia e alteração morfológica ovariana ao exame de imagem, excluindose as causas secundárias de hiperandrogenismo. O padrão ultrassonográfico descrito nesse consenso é a presença de 12 ou mais folículos entre 2 mm a 9 mm em um ou ambos os ovários ou volume ovariano a partir de 10 cm3.9,25,26 Na atualidade, a forte associação entre SOP e distúrbios metabólicos tem sido o cen­ tro da preocupação clínica, pois a resistência à insulina torna real as chances de obesi­ dade futuramente. Tais condições são fatores de risco para desenvolvimento do diabetes mellitus (DM) e da doença cardiovascular (DCV), além da hiperplasia e do carcinoma de endométrio.9,25,26

Diagnóstico O quadro clínico, em geral, mostra períodos de amenorreia; oligo ou anovulação, in­ fertilidade e sinais clínicos de hiperandrogenismo, como aumento de peso, acne, acantose nigricans e hirsutismo, além de progressivas complicações metabólicas. Devem ser solicitados ultrassonografia pélvica; dosagens hormonais (FSH, LH, prolactina, dosagens dos androgênios: testosterona, sulfato deidroepiandrosterona, androstenediona, 17-alfa-hidroxiprogesterona). Na presença de níveis séricos elevados de 17-alfahidroxiprogesterona, deve-se fazer o diagnóstico diferencial com HAC forma tardia (ver Capítulo 2).

Capítulo 11

Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério

173

Tratamento Consiste de orientações gerais, apoio psicológico; dieta para atingir o peso ideal; exer­ cícios físicos; contraceptivos hormonais orais, drogas antiandrogênicas e, nos casos com resistência persistente à insulina, deve-se indicar a metformina.9,25,26

D

Fatores centrais

Insuficiência hipofisaria Na síndrome de Sheehan, ocorre infarto hipofisário e pan-hipopituitarismo após cho­ que por hemorragia obstétrica. Possivelmente, o vasoespasmo das artérias hipofisárias que se segue à hipotensão possa comprometer a perfusão arterial da adeno-hipófise. Quanto maior o dano hipofisário, mais rápido se instala o quadro de falha na ama­ mentação, amenorreia, hipotireoidismo, hipofunção adrenal e, nos casos mais graves, até o óbito.8,14

Diagnóstico O quadro clínico, em geral, apresenta referência de sangramento intenso no parto ou na curetagem e, logo após, amenorreia, falta de produção de leite e comprometimento do estado geral das dosagens hormonais - FSH, LH, estradiol, TSH e hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) diminuídos -, na maioria das vezes, concluem o diagnóstico sem maiores dificuldades.8,14

Tratamento O tratamento deve ser feito com estrógenos associados aos progestógenos para con­ trole da amenorreia, mas, inicialmente, deve-se compensar a deficiência adrenal com corticoides, posteriormente, com hormônio da tireoide, e, depois, deve ser feita a repo­ sição de estrógeno e progestógeno.8,14

Tumores hipofisários As neoplasias da hipófise constituem uma das neoplasias intracranianas mais fre­ quentes e, entre as neoplasias hipofisárias, o prolactinoma é o responsável por 40% a 75% dos casos. As neoplasias com menos de 10 mm são denominadas de microprolactinoma e estão restritas a sela túrcica. Quando maiores, podem ou não ultrapassar os limites da sela e são chamadas macroprolactinomas. As manifestações mais relevantes são amenorreia secundária, frequentemente associada à galactorreia, e, em se tratando de macroadenomas, é comum ocorrer alterações neurológicas com cefaleia e visuais (escotomas e redução de campo visual).3

Diagnóstico O diagnóstico é feito quando o quadro clínico apresenta amenorreia e, particular­ mente, se o tumor for secretor de prolactina, aparecerá clinicamente a galactorreia. A dosagem de prolactina no sangue, a ressonância magnética da sela turca e o estudo neuro-oftalmólogico concluem o diagnóstico, devendo-se ter o cuidado de afastar hi­ potireoidismo primário pela dosagem do TSH.3,8,14

174 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Tratamento O tratamento é preferencialmente realizado com agonista dopaminérgico, como a bromoergocriptina e a cabergolina, em doses ajustadas a cada caso. O tratamento ci­ rúrgico ou por radioterapia apenas estão indicados quando o tratamento clínico não oferecer resultados satisfatórios ou por intolerância.3’8’14

Amenorreia hipotalâmica funcional A amenorreia hipotalâmica funcional (AHF) é definida como um transtorno não orgâ­ nico e reversível, no qual ocorre comprometimento do hormônio liberador de GnRH. Existem vários tipos de AHF: amenorreia relacionada ao estresse, à perda de peso, ao exercício, a iatrogênica e a psicogênica. O espectro das repercussões de alterações de GnRH na hipófise na AHF é muito amplo e inclui desde menor frequência de pulsos até ausência completa de pulsatilidade de LH. A fisiopatologia da AHF é complexa e envolve neurotransmissores, neuroesteroides e neuropeptídeos, que participam da regulação fisiológica da secreção pulsátil do GnRH, como alopregnanolona, neuropetideo Y, hormônio liberador de corticotropina, leptina, beta-endorfina e outras.14 Na amenorreia hipotalâmica por estresse, não há evidências de fatores causais endócrinos ou sistêmicos, porém está relacionada, principalmente, com diversos fatores de estres­ se que afetam o controle neuroendócrino do eixo reprodutor, estresse metabólico, físico e psicológico.14 O diagnóstico está baseado no histórico clínico da paciente, incluindo iden­ tificação de qualquer situação de estresse induzido por perdas, problemas familiares ou de trabalho, perda de peso, transtornos alimentares ou treinamento físico excessivo. Não há parâmetro para investigação endócrina dessa causa de amenorreia, uma vez que é alta­ mente dependente da resposta individual adaptativa ao estresse.14 O tratamento consiste em identificar os fatores de estresse, procurar eliminá-los e, eventualmente, indicar psicoterapia, estimular o ciclo com estrógenos e progesterona ou com clomifeno.14 Na etiologia da insuficiência hipotalâmica iatrogênica, estão implicadas drogas como esteroides sexuais, fenotiazídicos, reserpina, imipramina, sulpirida, antidepressivos e outros psicotrópicos, que, por bloqueio dopaminérgico e estímulo do sistema serotoninérgico, liberam prolactina, causando amenorreia e galactorreia.27 Para a ava­ liação complementar, são úteis as dosagens hormonais - FSH, LH, estradiol, que estão em níveis diminuídos,14’27 - e prolactina, que pode estar aumentada. O tratamento deve ser iniciado com a suspensão dos medicamentos causadores da iatrogenia, que geralmente conduzem ao reinicio dos fluxos menstruais em período de até 6 meses. Se houver muita ansiedade, pode-se indicar estímulo com clomifeno.14,27 C O N C LU SÃ O

As irregularidades menstruais nos diferentes períodos etários (puberdade, menacme e climatério) devem ser consideradas de forma individualizada, pois apresentam ma­ nifestações clínicas relevantes, determinadas por diferentes fatores etiopatogênicos. Como norma geral, torna-se indispensável o diagnóstico correto que apresenta ca­ racterísticas peculiares a cada faixa etária, por meio das quais serão indicados exames complementares mais pertinentes a cada grupo de pacientes que permitirão, assim, tratamento mais efetivo e melhor prognóstico.

Capítulo 11

Irregularidade menstrual: da menarca ao climatério

175

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d e r ic h

IN T R O D U Ç Ã O

A síndrome pré-menstrual (SPM) é um distúrbio crônico que ocorre na fase lútea do ciclo menstrual e desaparece logo após o início da menstruação. A SPM se caracteriza por uma combinação de sintomas físicos, psicológicos e comportamentais que interfe­ rem de forma negativa nas relações interpessoais da mulher. Quando os sintomas são leves a moderados, tendem a iniciar poucos dias antes do fluxo e apresentam menor interferência na vida cotidiana. Porém, quando os sintomas são intensos, costumam ocorrer com frequência a partir da ovulação, durando mais ou menos 14 dias.1 Acredita-se que até 90% das mulheres apresentam sintomas pré-menstruais. Porém, alguns estudos demonstraram que 20% a 40% das mulheres sofrem de SPM e que 3% a 8% apresentam sintomas intensos — provocando interferência nas suas atividades diárias, levando ao comprometimento da sua produtividade e da sua qualidade de vida, o que constitui o Transtorno Disfórico Pré-Menstrual (TDPM). Em janeiro de 2007, médicos latino-americanos participaram de uma reunião para elaborar um do­ cumento sobre SPM e TDPM, com foco em epidemiologia, diagnóstico e tratamento na América Latina. A revisão dos dados mostrou que a prevalência de SPM e TDPM é mais alta nos países da América Latina (Brasil e México) do que nos países europeus, assim como a conscientização sobre a expressão SPM.2 Percebe-se também que os sintomas mais prevalentes são físicos,3 mas, dos sinto­ mas psíquicos, a irritabilidade tem sido descrita como o sintoma mais proeminente em mulheres com SPM ou TDPM.4 A severidade dos sintomas nos leva a prestar mais atenção e a utilizar os meios pos­ síveis para minimizar o sofrimento dessas mulheres. E T IO L O G IA

A etiologia da SPM permanece desconhecida e, por isso, muitas hipóteses têm sido propostas, porém nenhuma delas pode ser comprovada. Há consenso de que seja se­ cundária à atividade cíclica ovariana. A menstruação em si não é fundamental, visto que os sintomas se mantêm após histerectomia. Parece ser consequência de uma in­ teração complexa e pouco compreendida entre hormônios esteroides ovarianos, peptídeos opioides endógenos, neurotransmissores centrais, prostaglandinas, sistemas autonômicos periféricos e endócrinos. A ciclicidade ovariana parece criar uma vulne-

178

Endocrinologia Feminina e Andrologia

rabilidade inicial para a SPM ao modular vários fatores endócrinos. Seria o resultado final da influência das várias modificações fisiológicas que normalmente acompanham a atividade cíclica ovariana em mulheres suscetíveis.5 Estudos mostram que o uso dos inibidores da recaptação da serotonina (ISRS) são efetivos no alívio dos sintomas se­ veros de SPM, quando comparado com placebo. Isso sugere que a via serotoninérgica esteja envolvida na patogênese da SPM.6 E importante ressaltarmos as mudanças sociais que diferenciam a mulher de anti­ gamente, que tinha gestações e lactações sucessivas, apresentando longos períodos de amenorreia, da mulher contemporânea, de reduzida paridade. O resultado é um pe­ ríodo maior de flutuações cíclicas de estradiol e progesterona, associados a sintomas pré-menstruais. D IA G N Ó S T IC O E D IA G N Ó S T IC O D IF E R E N C IA L

Os sintomas do TDPM podem ser muito semelhantes a outras doenças, por isso uma avaliação prospectiva acurada dos sintomas é necessária para se realizar o diagnóstico. A American College Obstetricians and Gynecologists (ACOG) preconiza a realização de diá­ rios anotando os sintomas por 2 a 3 meses consecutivos, e não apenas por um ciclo.7 Infelizmente ainda não existem diários validados em português. A SPM e o TDPM devem sempre ser diferenciadas de outros sintomas psiquiátri­ cos, que eventualmente apenas se exacerbam no período pré-menstrual, e de algumas condições médicas como hipotireoidismo ou hipertireoidismo. Uma variedade de sintomas clínicos, como cefaleia, fadiga crônica e síndrome do intestino irritável, é exacerbado frequentemente próximo à menstruação, contudo, os sintomas não são típicos de SPM, e o período, frequentemente, não coincide com a fase lútea. Exames laboratoriais poderão ser realizados, excepcionalmente quando for necessário afastar outras patologias.8 Existem algumas escalas na língua inglesa validadas para serem utilizadas, princi­ palmente, em pesquisas, com o objetivo de avaliar eficácia de tratamentos da SPM. The Premenstmal Tension Syndrome (PMTS) Rating Scales; Daily Record ofSeverity ofProblems (DRSP); The Scott & White Daily Diary o f Symptoms (usa escala visual analógica entre 0-10 sobre dor pélvica, cefaleia e humor - ansiedade, depressão e irritabilidade); Penn State Daily Symptom Report (DSR) - questionário com 17 itens: 10 de comportamento e 7 de queixas físicas, com escala entre 0-4, sendo 1 item especificamente relacionado com oscilações de humor.9,10 Alguns autores postulam que os quadros disfóricos pré-menstruais constituem um espectro de anormalidades. Em um extremo, está a maior parte das mulheres no menacme, que apresenta algum desconforto, principalmente físico, durante o perío­ do pré-menstrual. Essas mulheres podem ser classificadas de acordo com os critérios diagnósticos da ACOG para SPM (Tabela 12.1). No outro extremo, está o TDPM, que representa a forma mais grave da SPM e é classificada segundo os critérios do DSM-IV (Tabela 12.2). Os critérios do DSM-IV são bastante rigorosos, incluindo neles apenas 5% da população com sintomas, valorizando, principalmente, os sintomas emocionais em detrimento dos físicos.11

Capítulo 12 Síndrome pré-menstrual

179

Presença de 1 ou mais sintomas afetivos ou somáticos durante os 5 dias antes da menstruação em cada 1 de 3 ciclos menstruais prévios. Sintomas afetivos: depressão, raiva, irritabilidade, ansiedade, confusão, introversão Sintomas somáticos: mastalgia, distensão abdominal, cefaleia, edema das extremidades Sintomas aliviados pelo início da menstruação (sintomas aliviados em 4 dias do início da menstruação sem recorrências até pelo menos o dia 13 do ciclo) Sintomas presentes na ausência de qualquer terapia farmacológica, consumo de hormônios ou abuso de drogas ou álcool Sintomas ocorrem reprodutivamente durante 2 ciclos de registros prospectivos A paciente apresenta disfunção identificável do desempenho social ou econômico

T A B E L A 12.2

Critérios para o diagnóstico de Transtorno Disfórico Pré-Menstrual

(TDPM) - A m erican Psychiatric A sso cia tio n (2002)*• •

Pelo m e n o s 5 d os seg u in tes sin to m a s p resen tes n a m a io r p a rte do te m p o d u ra n te a fase lú te a e qu e c o m e ça m a d esap arecer ap ó s a m e n stru a çã o ; p elo m e n o s 1 s in to m a dos 4 in iciais: ■

H u m o r m a rc a d a m e n te d ep rim id o , s e n tim e n to s de d esesp era n ça e p e n sa m e n to s de b a ix a a u to e s tim a .



A n sied ad e, te n s ã o , n erv o sism o .



L a b ilid a d e e m o c io n a l e x tr e m a (fic a r s u b ita m e n te tr is te , c h o r o s a o u s u s c e tív e l à re je içã o ).



R aiv a o u irrita b ilid a d e p e rs is te n te s , o u a u m e n to d o s c o n flito s in te rp e sso a is.



D im in u iç ã o d o in te re sse n a s ativ id ad es u su a is (esco la, tr a b a lh o , a m ig o s, h o b b ies etc.).



S e n s a ç ã o s u b je tiv a de d ificu ld a d e de c o n c e n tra ç ã o .



L eta rg ia , c a n s a ç o fá c il o u fa lta de en erg ia.



M u d a n ç a n o a p e tite , c o m e r em ex cesso o u craving.



H ip e rs o n ia o u in s ô n ia .



S e n s a ç ã o s u b je tiv a de e s ta r “fo r a de c o n tr o le ”.



O u tro s s in to m a s fís ic o s c o m o ed em a, m a sta lg ia , cefa leia , m ia lg ia s, a rtra lg ia s, g a n h o de peso.



O s s in to m a s são graves o s u fic ie n te p a ra in te rfe rir n o tr a b a lh o , n a e s c o la o u n a s ativ id ad es so cia is e n o r e la c io n a m e n to c o m o u tra s p e sso a s (ev itar ativ id ad es so cia is, d im in u iç ã o d a p ro d u tiv id a d e e e fic iê n c ia n o tr a b a lh o e n a esco la).



O d istú rb io n ão é u m a ex acerb ação de s in to m a s e x isten te s de o u tr a d o en ça, co m o d ep ressão m a io r, tr a n s to r n o d o p â n ic o , d is tú rb io d is tím ic o o u tr a n s to r n o de p e rso n a lid a d e (e m b o ra p o ssa e s ta r s u p e ra ju n ta d o a q u a lq u e r u m deles).



O s três p rim eiro s crité rio s p recisa m ser co n firm a d o s p ro sp e ctiv a m en te co m reg istro s d iários p o r, p elo m e n o s , 2 c iclo s (o d ia g n ó s tic o p o d e ser fe ito p ro v is o ria m e n te a té q u e se ja c o n fir ­ m a d o ).

Adaptada de Miner e t a l., 2002.11

180

Endocrinologia Feminina e Andrologia

IN D IC A Ç Ã O ( S E L E Ç Ã O D O P A C IE N T E )

Os sintomas da síndrome pré-menstrual são muitos e variados, sendo citados mais de 100 sintomas físicos, psicológicos e comportamentais associados, contudo algum grau de desconforto durante a fase lútea deve ser considerado normal.12 Os sintomas psicológicos mais frequentes são a labilidade de humor e a irritabilida­ de, ocorrendo em até 80% das pacientes, outros são: ansiedade, depressão, sentimento de desvalia, insônia ou aumento de sonolência, diminuição da memória, confusão, concentração diminuída e distração.13 As queixas físicas comuns incluem aumento do volume abdominal e sensação de fadiga, cefaleia tensional, enxaqueca, mastalgia, dores generalizadas, aumento de peso, fogachos, tonturas, náuseas e palpitação.13 Entre as mudanças de comportamento, são comuns mudanças nos hábitos ali­ mentares, aumento de apetite, avidez por alimentos específicos (particularmente doces ou comidas salgadas), não participação em atividades sociais ou profissionais, maior permanência em casa, aumento de consumo de álcool e aumento ou diminui­ ção da libido.12 A B O R D A G E M T E R A P Ê U T IC A

O manejo inicial consiste em educação e orientação.

IMPORTANTE As p a c ie n te s e seu s fa m ilia re s devem c o n h e c e r as c a ra c te rís tic a s d a sín d ro m e p ré -m e n stru a l, p o is ela é u m a p a to lo g ia e n d o c rin o g in e c o ló g ic a de ca u sa in c e rta , e n ã o p ro v e n ie n te d a im a g i­ n a ç ã o d a m u lh e r.

Apoio médico, empatia, discussão e paciência parecem ser bastante úteis. As modificações dietéticas são amplamente indicadas, apesar de não terem sido avaliadas em grandes trabalhos controlados. Recomenda-se que as pacientes devam alimentar-se de forma equilibrada — proteínas, fibras e carboidratos adequados e bai­ xa ingestão de gorduras saturadas; alimentos muito salgados ou muito doces devem ser evitados por poderem produzir retenção hídrica e consequente desconforto. Be­ bidas como café, chá e à base de cola devem ser evitadas, pois são estimulantes, po­ dendo agravar a irritabilidade, a tensão e a insônia. Também o álcool e outras drogas podem piorar os sintomas psicológicos. Muitas mulheres obtêm alguma melhora com modificações dietéticas, por isso o aconselhamento nutricional é um componente da terapia. O exercício aeróbico pode elevar os níveis de endorfina e, com isso, melhorar o humor. Várias evidências reforçam que a atividade física tem seu lugar no tratamen­ to dos sintomas pré-menstruais. Ainda que essas medidas careçam de estudos para determinar seu real papel no tratamento da SPM, são extremamente válidas como orientação global de saúde e devem ser recomendadas aos pacientes.14 Há uma infinidade de tratamentos descritos para a SPM, a maioria deles sem um grupo-controle. As abordagens em terapia complementar são extremamente popu­ lares, e existem estudos indicando que mulheres portadoras de SPM fazem uso de

Capítulo 12 Síndrome pré-menstrual

181

medicina complementar para alívio dos seus sintomas, mesmo quando estão rece­ bendo alguma medicação e estão satisfeitas com ela. Alguns estudos sugerem que a utilização de vitamina B6 (piridoxina) é melhor que placebo para SPM. Suple­ mentos com cálcio podem ser benéficos, assim como cápsulas de castanha-da-índia (Vitex agnus castus) que parecem ter efeito antagonista à prolactina. O uso de óleo de prímula também está popularizado, mas parece ser inefetivo. Uma metanálise loca­ lizou 27 estudos controlados em medicina complementar. A maioria deles apresen­ tava problemas metodológicos, e a conclusão dos autores foi de que atualmente não existe evidência corroborando o uso de medicina complementar/alternativa para o tratamento da SPM.15 A utilização de progesterona foi avaliada por vários estudos duplo-cegos controla­ dos com placebo. Nenhum mostrou melhora significativamente superior à causada pelo placebo, ou seja, muitas pacientes que utilizam progestógeno e referem melhora da sintomatologia da SPM podem estar se beneficiando somente do efeito placebo. Uma revisão do Cochrane de 2012 afirma que a progesterona não ajuda a tratar SPM e tampouco é efetiva, não havendo nenhum ensaio que apresente um subgrupo de mulheres que tenham se beneficiado.16 Um estudo recente avaliou a eficácia do danazol durante a fase lútea no manejo da SPM e da mastalgia cíclica. Esse estudo foi o que teve o maior número de mulheres incluídas e, embora o danazol tenha se mostrado eficaz no alívio da mastalgia, não houve melhora estatisticamente significativa nos sintomas da SPM no grupo tratado com danazol com relação ao grupo placebo.17 Os diuréticos têm sido muito usados para tratar as pacientes com SPM, particular­ mente aquelas com queixas de retenção líquida, ganho de peso e aumento de volume abdominal. Na fase lútea do ciclo, a progesterona inibe o efeito da aldosterona no túbulo distai, porém o fenômeno ocorre indistintamente nas pacientes com e sem SPM. Dos ensaios clínicos controlados com placebo, somente 2 demonstraram bene­ fício com o uso do diurético. Portanto, eles têm um papel limitado como tratamento, sendo mais indicados para mulheres com queixas de aumento do volume abdominal e edema periférico pré-menstrual. A espironolactona 50 mg a 100 mg/dia é o diurético mais utilizado.14 Os anti-inflamatórios não esteroides, como o ácido mefenâmico e o naproxeno, po­ dem auxiliar no tratamento de pacientes com dismenorreia, contudo não têm efeito sobre a SPM.14 Os anticoncepcionais orais eliminam a ciclicidade ovariana e poderiam ter eficácia terapêutica, principalmente para aquelas mulheres com dismenorreia e mastalgia prémenstrual, embora os resultados na literatura sejam controversos e não haja evidência de que possam aliviar os sintomas pré-menstruais. Uma possibilidade seria a tomada de contraceptivo oral contínuo.18 A formulação contendo 30 mcg de etinilestradiol/3 mg de drospirenona tem sido preconizada como eficaz no tratamento dos sintomas prémenstruais. A drospirenona é um progestógeno derivado da espironolactona com propriedades progestogênicas, mineralocorticoides e antiandrogênicas e sem ativida­ de estrogênica e androgênica. A atividade antimineralocorticoide contrabalançaria o efeito de retenção hídrica presente nos anticoncepcionais combinados de baixa dose e poderia combater os sintomas de edema, ganho de peso e mastalgia associados ao período pré-menstrual. Atualmente a formulação de 20 mcg de etinilestradiol/3 mg de drospirenona no regime de 24/4 foi aprovada para tratamento de sintomas emocio-

182

Endocrinologia Feminina e Andrologia

nais e físicos de SDPM.19)20 Estudos demonstram melhora importante da produtividade, das atividades sociais e das relações sociais das mulheres com sintomas de TDPM. Contudo, é desconhecida a efetividade após 3 ciclos de uso e não se tem evidências para saber se é melhor que outros anticoncepcionais. Os contraceptivos orais (CO) devem ser considerados, se os sintomas forem primariamente físicos, mas podem não ser eficazes se os sintomas de humor forem predominantes.21 A formulação de CO de primeira escolha para o tratamento de sintomas emocio­ nais e físicos da SDPM contém 20 mcg de etinilestradiol/3 mg de drosperinona no regime 24/4.22 Muitos estudos avaliaram a eficácia dos ISRS no manejo da SPM/TDPM apre­ sentando taxas de 60% a 90% de melhora, comparada a 30% a 40% do placebo.23 Os medicamentos mais usados são citalopram, fluoxetina, paroxetina, sertralina e um inibidor da recaptação de noradrenalina (antidepressivo de outra classe), a venlafaxina (Tabela 12.3). Os ISRS podem ser usados de forma contínua ou intermitente, a partir do 15° dia do ciclo. Uma metanálise 23 mostrou que os ISRS (citalopram, fluoxetina, paroxetina e sertralina) são efetivos para a redução de SPM/TDPM, sendo melho­ res no regime contínuo (ORO,28, 95% Cl 0,18-0,42) do que no regime intermitente (OR 0,55, 95% Cl 0,45-0,68). O uso contínuo da medicação tem um efeito muito mais amplo. Esse achado é contrário ao que se pensava e se praticava há pouco tempo e deve ser considerado na hora de prescrever a medicação.

TABELA 12.3 •

Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS)

M e d ic a ç ã o e D o se : ■

C ita lo p ra m 2 0 m g a 4 0 m g/ d ia o u p o r m e ta d e d o ciclo .



F lu o x e tin a 2 0 m g a 6 0 m g/dia o u p o r m e ta d e do ciclo .



P a r o x e tin a 2 0 m g a 3 0 m g/ d ia o u p o r m e ta d e do ciclo .



S e r tr a lin a 5 0 m g a 1 5 0 m g/ d ia o u p o r m e ta d e do ciclo .



V e n la fa x in a * 5 0 m g a 2 0 0 m g/ d ia o u p o r m e ta d e do ciclo .

*A venlafaxina,além de ISRS,também é inibidora da noradrenalina.

Estudo recente mostra que a sertralina é eficaz em tratar apenas os sintomas psí­ quicos da SPM/TDPM, não havendo modificação quanto aos sintomas físicos, o que indica que o início do uso dos ISRS deve ser criterioso e bem-definido.24 Os ISRS apresentam perfil bastante seguro, sem efeitos residuais após a interrup­ ção da medicação. Existe um estudo demonstrando que a fluoxetina está associada a uma alteração de mais ou menos 4 dias na duração dos ciclos menstruais.25 Contudo, as alterações na função sexual dificultam a aderência ao tratamento. O citalopram apresenta perfil de para-efeitos menor, pode ser usado de forma intermitente, e seu maior inconveniente é o custo.26 Sabe-se que no tratamento dos quadros depressivos os ISRS apresentam demora na apresentação dos seus efeitos, mas, nos quadros disfóricos pré-menstruais, a melhora dos sintomas pode ocorrer mesmo na semana seguinte

Capítulo 12 Síndrome pré-menstrual

183

à do início da medicação. Aparentemente parece não haver diferença na efetividade dos ISRS para o TDPM em usuárias e não usuárias de CO.27 Sedativos como os benzodiazepínicos (alprazolam 0,25 mg, 2 vezes ao dia na fase lútea) fazem parte dos recursos terapêuticos da SPM e são comprovadamente eficazes, mas é preciso levar em conta os riscos de dependência e a rápida tolerância induzida por essas medicações. Esses estariam indicados em situações de extrema ansiedade, sempre com muito critério.14 Outra opção terapêutica eficaz — ainda que extrema — são os análogos do GnRH. Por provocar castração médica, os sintomas da SPM melhoram significativamente. Como o medicamento necessita ser usado por tempo prolongado, pode-se provocar aumento do risco de osteoporose à paciente. Além disso, em geral, há queixa de foga­ cho e atrofia urogenital. E importante salientar que a SPM tem melhora conhecida com placebo. Um es­ tudo se propôs a avaliar esse fenômeno e detectou melhora sustentada (3 a 4 meses) em 20% das pacientes e melhora em pelo menos 1 ciclo entre 30% e 49%.15 Este dado deve ser levado em conta na avaliação da resposta das pacientes. Além disso, estudo recente vem demonstrando os benefícios da acupuntura quando comparada com o uso de progesterona e ansiolíticos com P < 0.00001, o que mostra um novo potencial terapêutico não farmacológico.28 M A N EJO E C O N C LU SÃ O

No manejo da paciente que possui critérios para SPM e TDPM, deve-se inicialmente realizar completa anamnese, exame físico e avaliação laboratorial. Havendo suspeita de qualquer patologia psiquiátrica associada, a paciente deve ser encaminhada ao pro­ fissional de saúde mental para receber tratamento concomitante. O objetivo maior do tratamento é o alívio do sintomas. Existem poucas evidências que suportem uso de vitamina D, cálcio e suplementação de vitamina B6, assim como evidências insuficientes do sucesso de terapias cogni­ tivas na melhora dos sintomas.

IMPORTANTE Como os sintomas pré-menstruais são crônicos e recorrentes, o tratamento deve considerar os custos e as reações adversas, iniciando-se primeiramente com a abor­ dagem das mudanças de hábitos e dieta.

Os ISRS devem ser considerados a primeira linha de tratamento.29 O CO contendo drospirenona parece ser efetivo para tratar os sintomas somáticos e físicos da SPM, podendo ser indicado como primeira escolha. Os ISRS são comprovadamente eficazes para tratar SPM/TDPM, devendo sua utilização ser avaliada pelo médico após deta­ lhada análise clínica.

184

Endocrinologia Feminina e Andrologia

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oença fibrocística/ alterações funcionais benignas da mama P a u l o M a u r íc io S o a r e s -P e r e ir a V â n ia R a v iz z in i M a n o e l S o n d e r m a n n



IN T R O D U Ç Ã O

Doença fibrocística é um quadro clínico que se inicia no menacme e se estende até a menopausa. Cursa com mastalgia e/ou nódulo com exacerbação da sintomatologia na fase pré-menstrual e apresenta alterações histológicas próprias, que caracterizam a entidade.1,2 A sinonímia encontrada na literatura médica ao longo do tempo, embora muito vasta, não retrata com exatidão o seu significado. Vários termos foram empregados, entre eles: doença cística da mama (Cooper - 1829); mastite crônica cística (Schimmelbusch - 1892); doença microcística (Reclus - 1893); fibroadenomatose cística (Semb - 1928); mastite crônica (Geschickter - 1945); displasia mamária (Gallager 1969); displasias seletivas e não seletivas (Uriburu - 1950); aberrations o f normal develop­ ment and involution (ANDI) (Huhers & Mansel - 1987). Após os trabalhos de Dupont & Page, em 1985,3 sobre biopsias mamárias de lesões benignas, o College o f American Pathology recomendou nominar a entidade de “alte­ rações fibrocísticas da mama”.4 Todos os termos caíram em desuso, inclusive doença fibrocística, visto que são ter­ mos genéricos que sinalizam para uma patologia, ou seja, uma doença, muitas vezes evocando a ideia de malignidade ou lesão pré-maligna. Hoje se reconhece que as ma­ nifestações clínicas e as alterações histológicas são funcionais e benignas5'7 e traduzem uma manifestação exacerbada do tecido mamário a estímulos hormonais e a fatores intrínsecos, associados a ações do meio ambiente. Face às evidências, em 1994, a Sociedade Brasileira de Mastologia, por meio de uma reunião nacional de consenso, sugeriu o termo “alterações funcionais benignas da mama” (AFBM), que tem sido utilizado com grande aceitação em nosso meio. A frequência, apesar de incerta, é muito elevada e atinge mais de 70% das mulheres no menacme,8 com maior incidência nas mulheres de alto poder econômico, nulíparas e primíparas idosas.5,6,9 Em pacientes submetidas a autópsia e portadoras de mamas clini­ camente normais, verificou-se 55% de alterações histológicas próprias das AFBM.8 A mastalgia, principal sintoma das AFBM, é a responsável pelo principal motivo de consulta nos ambulatórios especializados.10 Além dos sintomas que algumas vezes interferem de forma significativa na vida da mulher, seja física ou emocionalmente, afetando as atividades profissionais, a vida sexual e a familiar, a imagem criada entre a

Capítulo 13 Doença fibrocística/aIterações funcionais benignas da mama

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sintomatologia e a possibilidade de estar com câncer ou de ser uma candidata à doen­ ça são preocupações presentes e constantes nas mulheres com AFBM.211 E T IO L O G IA

Ainda não é bem-compreendida a etiologia das AFBM;7 no entanto, a participação dos esteroides ovarianos e as suas variações durante o ciclo menstrual são inquestionáveis, vista a inexistência das alterações na infância, na pós-menopausa e no sexo masculino. As alterações genéticas adquiridas ou herdadas também estão associadas às lesões be­ nignas da mama, bem como facilitam o desenvolvimento das AFBM.2 A ação estrogênica persistente sobre o tecido fibroglandular promove a proliferação do epitélio ductal e do tecido conjuntivo, bem como a dilatação dos duetos, formando os microcistos, identificados frequentemente nos exames ultrassonográficos. Soma-se às alterações a retenção hídrica que, no conjunto, facilitam o aparecimento de edema, contribuindo como fator adjuvante para o desenvolvimento da mastalgia.9’12 Por outro lado, sabe-se que a concentração de estradiol plasmático nas mulheres com AFBM não difere daquela da população feminina geral, sem AFBM. A relação estrógeno e AFBM não depende de taxas elevadas de estrógeno, mas parece que o tempo de exposição mais prolongado e repetitivo é o que importa. Isso é defensável se compararmos as mulheres de gerações passadas com as atuais, de modo que as primeiras tinham vários filhos, amamentavam por longos períodos e, em função das múltiplas gestações, tinham apenas de 50 a 60 ciclos menstruais durante a vida, enquanto as segundas menstruam de 350 a 400 vezes, em função de terem poucas gestações, optarem pela primeira gestação em idade mais avançada e por pouco tem­ po de amamentação.12 Outra via da participação do estrógeno, ainda que controvertida, parece ser uma resposta anômala do tecido mamário à ação local do hormônio que, associada à expo­ sição persistente dos estrógenos, facilitaria o desenvolvimento das AFBM. As alterações clínicas e histológicas refletem a resposta funcional da mama à ação hormonal cíclica do menacme e não estão associadas a risco aumentado para câncer de mama.8 Os conhecimentos atuais sinalizam para um outro hormônio, a prolactina, que teria um papel des encadeado r, embora a relação estrógeno, prolactina e AFBM não seja bem-compreendida. À semelhança do estrógeno, parece existir ação local da pro­ lactina, visto que não foram detectados níveis elevados do hormônio na maioria das mulheres com mastalgia. Embora o nível sérico médio da prolactina esteja dentro da variação normal, é mais elevada nas pacientes com AFBM. Evidências mais atuais apontam para possíveis alterações no mecanismo pulsátil da prolactina e/ou das gonadotrofinas. A liberação de opioides endógenos e fatores neuroendócrinos, como a serotonina, reduzem a liberação de dopamina e, consequentemente, promovem aumento da pro­ lactina. Esta é uma situação verificada em situações de estresse e tensão emocional. Outro aspecto importante quanto à participação da prolactina é a resposta ao uso de drogas com ação antiprolactinêmica que promovem alívio significativo da mastal­ gia, quando comparado com placebo. Têm sido observadas nas mulheres com mastalgia cíclica a elevação das concentra­ ções plasmáticas de ácidos graxos saturados e a redução de ácidos graxos essenciais

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

(poli-insaturados).8 O desequilíbrio acarreta diminuição na síntese da prostaglandina E l, que é um modulador da ação hormonal, possuindo ação reguladora na síntese de prolactina, além de interferir também no metabolismo dos estrógenos, da progesterona, da dopamina e da serotonina.9 A multiplicidade de fatores e mecanismos de ação possivelmente responsáveis pelo desenvolvimento das AFBM demonstram que muito ainda se tem que conhecer para um melhor entendimento da etiologia desta entidade. Q U A D R O C LÍN IC O

As AFBM cursam com mastalgia, turgência mamária, área(s) de espessamento, nódulo(s) e derrame papilar. Os sintomas e sinais podem estar presentes isoladamente ou em conjunto, sendo que a mastalgia é o quadro predominante.

D

Mastalgia

Geralmente é bilateral, espontânea, difusa e cíclica (se repete a intervalos regulares, e o marco deste evento é o ciclo menstrual). Quando focal, geralmente é referida nos quadrantes superiores externos, acompanhada de hipersensibilidade local. A intensidade da sensação dolorosa quase sempre é leve e raramente grave e incapacitante.9’12 Pode ser contínua quando não há período de acalmia ou intermi­ tente quando há períodos em que ela desaparece. A percepção dolorosa é variada, po­ dendo referir como desconforto, sensação de peso, fisgadas, ardência, queimação etc., com irradiação ou não para os braços ou região dorsal. Essa sintomatologia pode ser progressiva e cada vez mais intensa até a menopausa, bem como pode regredir esponta­ neamente ou por conta de tratamento. Verifica-se seu início por volta dos 20 anos e, nesse período, não costuma apresentar alterações importantes à palpação; no entanto, a turgência mamária é frequentemente observada e citada pela própria paciente.

D

Nódulo

Com a evolução do quadro clínico, por volta da terceira ou quarta décadas, surgem os nódulos que, na maioria das vezes, traduzem a formação de cistos. Estes podem ser unilaterais ou bilaterais, únicos ou múltiplos, e de tamanhos variados, coalescentes ou isolados (Figura 13.1). A palpação, percebe-se massa regular, bem-definida, com bordas lisas, geralmente móveis, que variam da consistência cística, depressível à endurecida, na dependência da tensão do líquido no interior do cisto e da formação de fibrose adjacente. Algumas vezes, não se tem a percepção tão clara como descrito, e pode apresentar-se como uma área endurecida, sensível, mal-delimitada, eventualmente difusa, mobili­ dade reduzida, que habitualmente é denominada de espessamento ou adensamento, sendo também citada como nódulo dominante. Quando as alterações se mesclam e a percepção é da existência de múltiplas formações nodulares pequenas e mal definidas, o termo nodularidade também é usado. As alterações à palpação nem sempre traduzem apenas a presença de cistos, mas podem ser a expressão clínica de algum processo hiperplásico, constituindo uma lesão sólida, que pode ser benigna ou maligna, daí a necessidade de rigorosa inves­ tigação.13

Capítulo 13 Doença fibrocística/aIterações funcionais benignas da mama

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FIGURA 13.1 (A) Imagem anecoica com reforço acústico posterior, parede lisa e regular, corres­ pondendo a cisto simples. (B) Imagens anecoicas, paredes lisas e regulares correspondendo a cistos simples agrupados (cortesia do Centro de Estudos e Pesquisa da Mulher - CEPEM).

D Derrame papilar Geralmente é provocado, bilateral, com eliminação por vários poros ductais e mais frequente no pré-mênstruo. Geralmente tem características colostro símile, amarelada ou esverdeada. ■

D IA G N Ó S T IC O

A anamnese deve detalhar as queixas da paciente. A mastalgia é o principal sintoma e, sendo uma queixa subjetiva, deve-se aferir sua intensidade (leve, moderada e intensa), bem como sua forma de ocorrência (cíclica, acíclica e extramamária). A investigação do uso de alguma medicação hormonal ou que atue no eixo hipotálamo hipofisário é necessária. A associação com outras queixas, como a regularidade ou não do ciclo menstrual, conduzirá a anamnese e exame clínico mais direcionados. Todas as etapas do exame físico devem ser cumpridas com absoluto rigor. Uma vez estabelecida a hipótese diagnóstica, será solicitado algum exame comple­ mentar, se necessário. O exame a ser solicitado vai depender dos achados clínicos e, principalmente, da idade da paciente. A mamografia deve contemplar todas as mu­ lheres acima de 40 anos, enquanto a ultrassonografia será solicitada para as mulheres mais jovens ou como exame complementar à mamografia14 (Figura 13.2). A ressonân­ cia magnética (RM) e a tomossíntese são métodos que também podem ser utilizados na dependência de cada caso. O uso dos exames complementares não se prende ao diagnóstico das AFBM, mas à pesquisa de alguma alteração de maior gravidade, como o câncer. Por meio da identi­ ficação de alguma imagem de suspeição, pode-se chegar ao diagnóstico de uma neo­ plasia maligna oculta ao exame físico. Os exames deverão ser realizados na rotina para o diagnóstico precoce do câncer de mama, independentemente da queixa da paciente.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 13.2 (A) Mamografia evidenciando mama densa, com 2 formações nodulares parcial­ mente regulares e com limites definidos. Neces­ sária realização de ultrassonografia. Imagem com características benignas (cortesia do CEPEM). (B) Formações nodulares anecoicas com característi­ cas benignas que correspondem às imagens visibilizadas na mamografia da Figura 13.2 (A) (cortesia do CEPEM).

Atualmente, a utilização das biopsias per cutâneas (core biopsia ou biopsia direcio­ nada a vácuo - mamotomia), orientadas por ultrassonografia ou mamografia apresen­ tam, excelente acuidade diagnóstica. O quadro histológico se caracteriza por algumas alterações, como fibrose do estroma, formação de cistos, ectasia ductal, metaplasia apócrina, proliferação epitelial leve (até 4 camadas de células epiteliais revestindo os duetos) e adenose. A proliferação epitelial, bem como as alterações lobulares próprias da adenose, frequentemente estão associadas às áreas de atrofia, sendo estes fenômenos identificados em um mesmo campo microscópico, o que demonstra a possibilidade da concomitância de alterações evolutivas e involutivas. ■

D IA G N Ó S T IC O D IF E R E N C IA L

A mastalgia cíclica dificilmente terá outra alteração que se confunda com ela, embo­ ra possa haver outra causa de mastalgia enxertada. No entanto, a mastalgia acíclica, quando unilateral, tem como diagnóstico diferencial, principalmente, as causas extramamárias, quase todas de origem musculoesquelética, caracterizando a síndrome da dor em parede torácica. Entre as principais causas, podem-se citar: nevralgia intercostal, processo inflamatório costocondral (Síndrome de Tietze - osteocondrite), trauma da parede torácica, neuromas pós-cirurgia torácica, radiculite cervical, ma­ mas volumosas e pêndulas, fibromialgia, herpes zóster, doença de Mondor, distúr­ bios psicossomáticos, doença coronariana e pericardite. Os processos inflamatórios

Capítulo 13 Doença fibrocística/aIterações funcionais benignas da mama

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crônicos ou crônicos agudizados também são diagnóstico diferencial para a mastalgia acíclica. A anamnese e o exame físico permitirão, na maioria das vezes, estabelecer o diag­ nóstico correto. Os processos inflamatórios têm evolução própria, com alterações fa­ cilmente identificadas à inspecção. A palpação, quando identifica alguma alteração, nem sempre é bastante para estabelecer o diagnóstico, casos em que se impõe o uso do método complementar. A investigação invasiva por meio da biopsia per cutânea, ou mesmo da biopsia cirúrgica a céu aberto, estabelece o diagnóstico definitivo. O principal diagnósti­ co diferencial é com o câncer, que deve ser diagnosticado com a maior brevidade possível. C O N D U T A E O R IE N T A Ç Ã O

Uma vez afastado o diagnóstico de neoplasia maligna e estabelecido o de AFBM, a primeira conduta é a orientação, que consiste no esclarecimento à paciente de que o processo responsável pela sua sintomatologia é benigno, não tendo qualquer relação com doença maligna e que se trata de uma alteração funcional que não lhe coloca em risco no que se refere ao câncer de mama.9,12,15 Sabe-se que essa atitude é efetiva e pode resolver ou minimizar aproximadamente 80% dos casos.12,16,17 Sabe-se também que o sucesso dessa orientação está na dependência da boa relação médico-paciente, con­ quistada ao longo das consultas iniciais. Nem sempre se consegue o convencimento da primeira vez, mas seguir a linha é vantajoso, visto que o tratamento medicamentoso das AFBM nem sempre é eficaz, e a maioria apresenta efeitos colaterais significativos,11 reservando-os para os casos que não responderam à orientação e que apresentaram sintomatologia que interfere nas atividades diárias da paciente. Nesta oportunidade, devem-se valorizar algumas ações gerais de saúde, como prá­ tica de atividade física e mudanças de hábitos alimentares, se necessário. Essas ações não têm efeitos diretos na mastalgia ou nas suas manifestações, mas farão com que a mulher se sinta melhor e, dentro de um contexto mais amplo, é possível oferecer me­ lhor qualidade de vida, o que, de certa forma, influenciará favoravelmente. O tempo de espera para a avaliação do sucesso ou não da orientação deverá ser de até 6 meses. Caso persista a sintomatologia, deve-se avaliar a relação custo/benefício e se decidir pela terapia medicamentosa. O uso criterioso das diversas terapias dispo­ níveis permite remissão ou alívio da sintomatologia em 92% das mastalgias cíclicas e 64% das mastalgias acíclicas.17 TR A TA M EN TO

O tratamento clínico é direcionado para a mastalgia, visto que as alterações encontra­ das na palpação serão observadas ou investigadas pela propedêutica mais adequada. A falta de um melhor conhecimento da etiologia das AFBM acarreta algumas difi­ culdades no manuseio terapêutico.15 A grande diversidade de drogas sugeridas para o seu tratamento, bem como a falta de estudos bem-desenhados com maior número de participantes e maior tempo de se­ guimento, evidenciando informações mais precisas, fazem com que o tratamento das

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

AFBM seja, até certo ponto, sem embasamento. Outra questão importante é a escolha da melhor droga para se começar o tratamento,10 visto que a falta de resposta a uma droga não impede responder favoravelmente a outra substância.18 Até o momento, nenhuma metanálise foi realizada para avaliar os resultados e efei­ tos de todos os agentes envolvidos no tratamento da mastalgia.10 O uso de placebo apresenta resposta satisfatória em 20% dos casos de mastalgia.8 As drogas utilizadas para o tratamento da mastalgia podem ser divididas, para fins didáticos, em substâncias hormonais e não hormonais.



Tratamentos hormonais

Antiprolactinêmicos

Bromoergocriptina10'1618 • Eficaz na mastalgia cíclica. • Efeitos colaterais importantes: náuseas, vômitos, diarreia, cefaleia, hipotensão, tonteira etc. • Posologia: dose máxima diária: 5 mg (2,5 mg 2 vezes/dia) durante 6 meses. Iniciar com dose menor: 1,25 mg ao deitar, aumentar 1,25 mg por semana até atingir a dose máxima.

Lisurida • Eficácia semelhante à bromoergocriptina. • Efeitos colaterais menos intensos. • Posologia: 0,1 mg a 0,2 mg/dia, aumentando para até 0,4 mg, se necessário.

Cabergolina • Eficácia semelhante à da bromoergocriptina. • Efeitos colaterais menos intensos e menos frequentes. • Posologia: 0,5 mg/semana administrado em 1 ou 2 doses. Aumentar semanalmente até atingir 1 mg/semana.

Antiestrogênicos (SERMs)

Tamoxifeno2'8'10'14'16'19 • Eficaz para mastalgia cíclica ou acíclica. • índice de resposta em mais de 70% dos casos. • Efeitos colaterais presentes em torno de 20% na dose de 10 mg/dia. Os principais são: hiperplasia endometrial, tromboembolismo venoso, alterações menstruais, foga­ chos, ganho de peso, alopécia, irritabilidade. • Posologia: 10 mg/dia durante 3 a 6 meses.

Raloxifeno • Eficaz para mastalgia cíclica ou acíclica. • Poucos efeitos colaterais. • Posologia: 60 mg/dia durante 6 meses.

Capítulo 13 Doença fíbrocística/alterações funcionais benignas da mama

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Afimoxifeno • Antiestrogênico em apresentação gel para uso local. • Ainda não está no mercado.

Antigonadodróficos

Danazol8'1016'18 • É um derivado da testosterona e apresenta efeitos androgênicos em 20% das usuárias. • E considerada eficaz para a melhoria da dor mamária, com índice de resposta de 50% a 75% das mastalgias cíclicas e acíclicas. • Posologia: 200 mg/dia na fase lútea, podendo chegar até 400 mg/dia durante 3 a 6 meses. • O danazol é teratogênico. Usar somente na mastalgia cíclica.

Gestrinona9 • Mecanismo de ação semelhante ao do danazol. • Efeitos colaterais do tipo androgênico (acne, seborreia, aumento da pilificação etc.). • Posologia: 2,5 mg VO, 2 vezes por semana durante 3 meses.

Análogo do hormônio liberador de gonadotrofina8'16 • índice de resposta varia de 70% a 90%. • Efeitos colaterais importantes. • Deve ser utilizado somente em mastalgia grave e em pacientes refratárias a outros medicamentos. • Posologia: Goserelina: 3,6 mg subcutâneo a cada 28 dias; Leuprolide: 3,75 mg a 7,5 mg uma aplicação IM/mês.

Tratamentos não hormonais Ácidos graxos essenciais (poli-insaturados)

Ácido gama-linolêico (óleo de prímula)8'10,16'18'20 • Não há evidências atuais que demonstrem o benefício do ácido gama-linolêico (AGL) para o tratamento da mastalgia. • Os estudos multicêntricos, duplos-cegos, controlados com placebo não demonstram diferença significativa entre os grupos, mostrando que a eficácia do AGL não difere do placebo. • Os efeitos colaterais são pouco frequentes (2%) • Posologia: 1 g 3 vezes/dia durante 3 a 6 meses.

Vitex a g n u s casft/s10,16 • Eficaz para o controle da mastalgia cíclica. • Segurança e poucos efeitos colaterais. • Posologia: 40 mg a 80 mg/dia durante 3 a 6 meses.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

Anti-inflamatórios8'16 • As evidências atuais são controversas quanto ao uso dos anti-inflamatórios (AINE) nas mastalgias. • A tendência é utilizar o AINE tópico, o qual apresenta boa eficácia com mínimos efeitos colaterais. • Posologia: diclofenaco gel: 3 vezes/dia durante 6 meses.

Diuréticos8,9 • Indicados quando a sintom atologia mais exuberante for a congestão mamária ou o edema pré-menstrual, sendo prescritos nos dias que antecedem a mens­ truação. • Espironolactona: 25 mg, 50 mg e 100 mg. • Hidroclorotiazida: 25 mg e 50 mg.

Ansiolíticos e antidepressivos • Usar nos dias que antecedem a menstruação, principalmente quando fazendo parte do quadro de tensão pré-menstrual e nos quadros disfóricos, a fim de minimizar a tensão emocional.

Vitaminas8 • As mais empregadas são: A l, B l, B6, C e E, isoladas ou combinadas. • Os resultados são comparáveis aos do uso de placebo.

CONDUTA NOS CISTOS O diagnóstico do cisto mamário será confirmado pela ultrassonografia, apesar dos achados clínicos ou radiológicos. A prevalência estimada de mulheres entre 30 e 50 anos portadoras de cisto mamá­ rio é de 50% a 90%.21 Os cistos podem ser simples, quando apresentam conteúdo líquido fluido, pa­ rede delgada, regular e lisa. (Figura 13.3) Ocasionalmente o conteúdo líquido pode tornar-se espesso, dificultando a diferenciação entre nódulo sólido de baixa den­ sidade ou cisto com conteúdo espesso e, nestes casos, chama-se cisto complicado. (Figura 13.4) O espessamento da parede do cisto também é um achado do cisto complicado. Outro tipo de cisto é o cisto complexo, que se caracteriza pela presença de septações espessas ou pela presença de conteúdo misto, isto é, há um componente sólido que se adentra no interior da cavidade cística que contém líquido. (Figura 13.5) Este tipo de lesão denota uma patologia que pode ser benigna ou maligna. (Figura 13.6) Os cistos complexos de conteúdo misto não se enquadram dentro das AFBM, mas no capítulo das patologias.12 Outra forma de classificar os cistos é quanto ao volume e, nesse aspecto, não há consen­ so. A tendência sob o ponto de vista clínico é considerar macrocistos aqueles com volume igual ou superior a 10 mm, quando já há possibilidade de identificá-lo clinicamente,9 em­ bora ultrassonograficamente seja possível com diâmetro superior a 3 mm.8

Capítulo 13 Doença fibrocística/aIterações funcionais benignas da mama

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FIGURA 13.3 (A) Mamografia evidenciando mama densa, com formação nodular isodensa no quadrante superior. Necessária realização da ultrassonografia. Imagem com características be­ nignas. (B) Imagem anecoica com reforço acústico, parede lisa e regular, correspondendo a cisto simples (cortesia do CEPEM).

FIGURA 13.4 Imagem hipoecoica com debris em seu interior correspondendo a cisto compli­ cado com secreção espessa (cortesia do CEPEM).

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 13.5 (A) Mama com predomínio de tecido adiposo, com imagem nodular regular, limi­ tes definidos, localizada no quadrante inferior. Necessário realizar ultrassonografia. (B) Imagem anecoica com formação sólida em sua parede, sugestiva de processo proliferativo, correspon­ dendo a cisto complexo (cortesia do CEPEM).

FIGURA 13.6 Imagem anecoica com pequena formação ecogênica em seu interior, sugestiva de vegetação, correspondendo a cisto complexo (cortesia do CEPEM).

Capítulo 13 Doença fibrocística/aIterações funcionais benignas da mama

197

Quanto aos revestimentos, podem ser classificados em: • Apócrinos: quando revestidos por epitélio colunar alto. Geralmente são bilaterais e múltiplos e apresentam taxas elevadas de recidiva.21 • Atenuados4 ou transudativos:21 quando revestidos por epitélio plano. Ambos apre­ sentam características próprias metabólicas e bioquímicas.21 No cisto simples ou complicado, a conduta inicial é o controle periódico. Se a pa­ ciente tem 40 anos ou mais, o controle será realizado por ocasião dos exames de rotina para a “prevenção” do câncer de mama. Abaixo dessa idade, dependerá do caso, porque as lesões não apresentam qualquer relação com o câncer de mama. Portanto, não há nenhuma conduta especial. Quando o cisto adquire volume maior, produzindo dor ou desconforto, ou mesmo certo grau de ansiedade ou medo por parte da paciente, pode-se proceder ao seu esva­ ziamento por meio da punção por agulha fina (PAAF).21 Quando o líquido aspirado apresentar aspecto sanguinolento ou citologia com células atípicas, haverá necessida­ de da excisão do mesmo. Outras situações que levam à indicação da excisão são: massa residual pós-punção, recidiva do cisto por mais de 3 vezes no período de 1 ano, cistos gigantes e achados suspeitos na mamografia após a punção. Quanto ao cisto complexo com conteúdo misto, embora controvertida, entende­ mos que a PAAF não é a melhor opção, sendo a excisão completa a melhor conduta, preservando-se a integridade do material, o que facilitará o trabalho do patologista. Nas séries de Berg,22'24 18% a 23% dessas lesões eram representadas por neoplasia maligna.

ESSA INDICAÇÃO É BASEADA NOS ARGUMENTOS •

U m a v ez id e n t if ic a d a v e g e ta ç ã o n o in t e r io r d o c is t o , p o s s iv e lm e n te tr a ta - s e d e u m p r o c e s s o p r o life r a tiv o , d o tip o p a p ilífe r o , e q u e, p o r ta n to , re q u e r e s tu d o a n a to m o p a t o ­ ló g ic o .



E ste m a te ria l v e g eta n te é m u ito friável e, p o rta n to , deve ser p reservad o ju n t o c o m a cá p su la d o c isto e ser m a n u se a d o p elo p a to lo g is ta so b p e n a de d a n ific a r o m a te ria l e p re ju d ic a r a c o n c lu s ã o d o d ia g n ó s tic o . P r o c e d e n d o -s e a PA A F, o c is to se rá esv a z ia d o , e o c o n te ú d o só lid o (p ro ce sso p ro life ra tiv o ) p o d e n ã o ser m a is v isib iliz a d o em fu n ç ã o das d en sid ad es d o c o n te ú d o só lid o e d o te c id o fíb r o g la n d u la r a d ja c e n te (iso d en sid a d es). Isso , n o e n ta n to , p o d e n ã o o c o rre r n a s m a m a s p r e d o m in a n te m e n te ad ip o sas.



A re la ç ã o a n a tô m ic a , c o n te ú d o s ó lid o e p ared e d o c is to te m de ser av aliad a, o q u e só é p o ssív el p elo ex am e a n a to m o p a to ló g ic o , b e m c o m o a d e fin iç ã o de b e n ig n id a d e o u m a lig ­ n id a d e, e e s ta ú ltim a , se in situ o u in v aso ra.

Essas razões são suficientes para se entender a indicação da exérese do cisto complexo e a contraindicação da PAAF.

198 Endocrinologia Feminina e Andrologia

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Capítulo 13 Doença fíbrocística/alterações funcionais benignas da mama

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Hiperprolactinemias A n d r ea G lezer M a r c e l l o D . B r o n s t e in

INTRODUÇÃO A prolactina (PRL) é um hormônio polipeptídico com mais de 300 ações em diferentes espécies, porém, sua principal função nos seres humanos se refere aos cuidados com o recém-nato, por meio da promoção do crescimento adicional e do desenvolvimento das glândulas mamárias na gestação e na lactação, garantindo a galactopoiese, bem como a indução fisiológica do hipogonadismo no puerpério. O papel fisiológico da PRL, no que se refere à reprodução no sexo masculino, não é bem-estabelecido.1

■ FISIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA A PRL é secretada por células especializadas da adeno-hipófise, os lactotrófos, e, dife­ rentemente dos outros hormônios hipofisários, sua principal regulação é inibitória pela dopamina. Este neurotransmissor é secretado pelo hipotálamo, e sua ação sobre os lactotrófos depende da integridade da haste hipofisária, que une o hipotálamo à hipófise. Tumores da região selar e suprasselar que comprimam a haste hipofisária impedem o aporte de dopamina aos lactotrófos e, portanto, a secreção de PRL se en­ contrará elevada. Esta situação é denominada desconexão de haste. Por outro lado, há diversos fatores liberadores da secreção de PRL, como a serotonina, o hormônio estimulador da tireotrofina (TRH) e o peptídeo vasoativo intestinal (VIP).1 A hiperprolactinemia é secundária a diversas causas, como condições fisiológicas (gestação, amamentação, estresse); farmacológicas e patológicas, como insuficiência renal e hepática, hipotireoidismo, adenomas hipofisários, outros tumores ou proces­ sos inflamatórios da região hipotálamo-hipofisária; e macroprolactinemia. Os prolac­ tinomas, adenomas com secreção autônoma de PRL, são os tumores hipofisários mais comuns, com prevalência de 100 casos por milhão, que atingem mais frequentemente mulheres jovens, sendo 10 vezes mais frequentes no sexo feminino, na faixa etária dos 20 aos 50 anos. Em adultos com mais de 60 anos, a prevalência entre os gêneros é similar.1A identificação da etiologia da hiperprolactinemia é importante para que seja instituído o tratamento adequado. A hiperprolactinemia, definida pela elevação dos níveis da PRL sérica acima dos limites normais, é a disfunção hipotálamo-hipofisária mais comum e causa importante de hipogonadismo e infertilidade. Souter et dl.2 avaliaram 1.705 mulheres com queixa de in­ fertilidade, sendo hiperprolactinemia diagnosticada em 12,1% dos casos e confirmada, após

Capítulo 14 Hiperprolactinemias 201

segunda dosagem de PRL, em 5,2% do total. A irregularidade menstrual foi relatada em 22% das pacientes, e 4% dessas mulheres eram portadoras de hiperprolactinemia. Porém, a elevação dos níveis de PRL também foi diagnosticada em 5,6% daquelas com ciclos regulares, sem diferença nos níveis de PRL entre os grupos. No entanto, a pre­ sença de macroprolactinemia não foi avaliada no estudo, o que pode ser a causa de hiperprolactinemia nas pacientes com ciclos regulares. M A N IF E S T A Ç Õ E S C L ÍN IC A S

Na hiperprolactinemia, a pulsatilidade da secreção do hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH), das gonadotrofinas e a resposta gonadal ao estímulo gonadotrófico estão alterados, levando ao hipogonadismo e às suas manifestações clássicas, em ambos os sexos: disfunção sexual, infertilidade, irregularidades menstruais e perda de massa óssea.1 A galactorreia, considerada um marco no quadro clínico da hiperpro­ lactinemia, não é um sinal obrigatório tampouco específico. Outros distúrbios, como obesidade e síndrome metabólica,3 especialmente em homens; e alterações na qualidade de vida, têm sido atribuídos à hiperprolactinemia.4 Finalmente, nos casos relacionados com macroprolactinomas e outros tumores da região hipotálamo-hipofisária, efeitos de massa como cefaleia e distúrbios visuais são frequentemente encontrados.1

D Diagnóstico e diagnóstico diferencial O diagnóstico de hiperprolactinemia é realizado quando a dosagem de PRL sérica encontra-se acima do valor normal de referência (20 a 25 ng/mL em mulheres; 15 a 20 ng/mL em homens).5 O estresse da punção venosa pode aumentar a secreção de PRL, em geral, em níveis pouco acima do valor normal. Há 2 estudos6,7 que avaliaram se nova coleta de PRL após repouso de 30 min seria útil na identificação de pacientes com hiperprolactinemia leve relacionadas com o estresse, e em ambos 25% a 30% dos casos de hiperprolactinemia leve foram ligados ao estresse.

IMPORTANTE Isso sig n ifica qu e p a cien te s c o m h ip e rp ro la c tin e m ia d iscreta, a s sin to m á tic o s, co m p esq u isa de m a c r o p r o la c tin a n eg ativ a, d ev em ser reav aliad o s ap ó s n o v a c o le ta e m re p o u so . N o e n ta n to , c o m o ro tin a , o rep o u so p a ra d o sag em de P R L n ã o é in d icad o .

A dosagem de PRL deve ser realizada apenas quando indicada, ou seja, em indivíduos com sintomas possivelmente relacionados com hiperprolactinemia, uma vez que a macro­ prolactinemia é frequente na prática clínica. As indicações para dosagem de PRL sérica são presença de tumor hipofisário; ginecomastia; galactorreia e hipogonadismo hipogonadotrófico, que, no sexo feminino, caracteriza-se clinicamente por irregularidade menstrual ou amenorreia e, nos homens, disfunção sexual e infertilidade.1 Após confirmação do diagnóstico de hiperprolactinemia, as seguintes possibilida­ des etiológicas devem ser investigadas: • Fisiológicas: gestação e lactação, estimulação mamária. • Farmacológicas: medicações antipsicóticas, antidepressivos, opiáceos, cocaína, medi­ cações anti-hipertensivas (verapamil, metildopa), medicações que atuem no trato

202

Endocrinologia Feminina e Andrologia

gastrointestinal (metoclopramida, domperidona), inibidores de protease usados no tratamento da síndrome da imunodeficiência adquirida no adulto (SIDA) e uso de estrógenos. Associadas às doenças sistêmicas: insuficiência renal, insuficiência hepática. Associadas às doenças endocrinológicas: hipotireoidismo primário, síndrome de ovários policísticos (SOP), doença de Addison e doença de Cushing. Secundária a secreção autônoma de PRL por adenomas hipofisários: prolactinomas, tumores de secreção mista de PRL e de hormônio de crescimento (GH). Secundária a outros tumores da região hipotálamo-hipofisária ou a doenças infec­ ciosas ou infiltrativas que acometam a haste hipofisária, levando à desconexão de haste, como, macroadenomas hipofisários não funcionantes, craniofaringeomas, metástases, hipofisite linfocítica, sarcoidose, tuberculose, pós-cirurgia ou radiote­ rapia, entre outros. • Estimulação dos nervos intercostais por cirurgia mamária ou torácica, trauma da parede torácica. • Macroprolactinemia. • Idiopática. Para identificar a causa da hiperprolactinemia, pode-se seguir o fluxograma da Figura 14.1. Entre as medicações que mais frequentemente causam hiperprolactinemia, por ação antagonista dopaminérgica, estão os antipsicóticos e neurolépticos, como a risperidona, o haloperidol e a sulpirida; e drogas de efeito no trato gastrointestinal, como o metoclopramida e a domperidona. Se for possível a suspensão da droga, nova dosa­ gem de PRL sérica poderá ser realizada a partir de 3 dias. Do contrário, deve-se realizar ressonância magnética (RM) de hipófise para afastar causa patológica associada.8

IMPORTANTE N o h ip o tir e o id is m o p rim á rio , o p r in c ip a l m e c a n is m o d o a u m e n to d a se cre çã o de P R L é a elev ação d os n íveis d o T R H . O s n ív eis sérico s de P R L n o rm a liz a m ap ó s re p o siçã o a d e q u a d a c o m le v o tiro x in a .9

Com relação à SOP, em contradição a dados prévios que demonstraram hiper­ prolactinemia em até 30% dos pacientes, estudos mais recentes não confirmaram qualquer relação fisiopatológica entre as 2 condições, podendo ser apenas uma as­ sociação ao acaso.10’11 Por isso, em pacientes que permanecem com sintomas de irre­ gularidade menstrual após normalização da PRL, se o tratamento específico estiver indicado, será necessária a investigação de outras causas que justifiquem os sinto­ mas, como SOP. A estimulação mamária em mulheres não gestantes pode levar ao aumento dos níveis de PRL devido ao reflexo neurogênico. Por esse mecanismo, afecções na parede torácica, como herpes zóster, traumas mecânicos ou químicos, podem estar relaciona­ das com a hiperprolactinemia.12A estimulação mamária no exame clínico, na ultrassonografia e na mamografia tem um efeito mínimo sobre os níveis de PRL.13

Capítulo 14 Hiperprolactinemias 203

RM: ressonância magnética.

FIGURA 14.1 Fluxograma para diagnóstico diferencial em hiperprolactinemia (hiperPRL).

A PRL pode ser classificada de acordo com seu peso molecular em forma monomérica, dimérica e macroprolactina. Esta última apresenta alto peso molecular e baixa atividade biológica.14 Em pacientes normo e hiperprolactinêmicos, a principal isoforma circulante é a monomérica, porém, em cerca de 25% dos indivíduos com hiperprolactinemia,15 a principal isoforma é a macroprolactina, situação denominada por macroprolactinemia. A macroprolactina causa hiperprolactinemia por redução do clareamento renal e por redução do estímulo do tônus dopaminérgico. Em um indivíduo com macroprolactinemia verdadeira, ou seja, cujas concentrações séricas

204 Endocrinologia Feminina e Andrologia

de PRL monomérica estão dentro do limite da normalidade, não se esperam sintomas relacionados com a hiperprolactinemia. Portanto, esta é uma situação de dissociação entre o quadro clínico e o laboratorial, e sua pesquisa deve ser realizada em indivíduos hiperprolactinêmicos assintomáticos, nos quais a solicitação da dosagem de PRL ini­ cial é discutível. A macroprolactinemia é uma situação benigna quanto à fertilidade. Vallette-Kasic etal.16 avaliaram 106 indivíduos com macroprolactinemia, e 7 mulheres engravidaram durante o acompanhamento, com partos sem complicações. Nos casos de macroprolactinemia com níveis elevados de PRL monomérica, sintomas relaciona­ dos com a hiperprolactinemia podem estar presentes, e a investigação etiológica deve realizada. Por outro lado, em pacientes com macroprolactinemia verdadeira e inferti­ lidade, outras causas de infertilidade podem coexistir e devem ser pesquisadas.17 Frente a um paciente com hiperprolactinemia sintomática, após exclusão de gesta­ ção, uso de medicações que possam causar hiperprolactinemia, insuficiência renal, in­ suficiência hepática e hipotireoidismo, deve-se proceder à realização de RM da região selar, a fim de identificar se a causa é um tumor hipofisário com secreção autônoma de PRL (prolactinoma), ou se outros tumores hipofisários ou da região, bem como doen­ ças infiltrativas ou infecciosas, são a causa da hiperprolactinemia por desconexão de haste. Nos prolactinomas, em geral, o nível de PRL sérico é proporcional ao tamanho tumoral. Portanto, em microprolactinomas, esperam-se níveis de PRL séricos de até 200 ng/mL e, em geral, macroprolactinomas acima desses níveis.18 Karavitaki et al.19 avaliaram os níveis de PRL em pacientes com tumores hipofisários não funcionantes com desconexão de haste e, em 98,7%, os níveis foram menores que 95 ng/mL. Dessa forma, embora haja exceções, nos adenomas hipofisários não secretores, o nível de PRL não ultrapassa 100 ng/mL. A diferenciação entre um prolactinoma e a hiperprolacti­ nemia por desconexão de haste é fundamental, pois a terapêutica, em especial quando há compressão das vias ópticas e deficiência visual, é completamente diferente.

IMPORTANTE Q u a n d o to d a s as e tio lo g ia s m e n c io n a d a s fo r a m e x c lu íd a s e a R M s e la r é n o r m a l, fa z -se o d ia g n ó s tic o de h ip e r p r o la c tin e m ia id io p á tic a , e m b o r a a p r e s e n ç a d e m ic r o a d e n o m a s n ã o d etectá v eis n a im a g e m n ã o p o ssa ser ig n o ra d a .

A B O R D A G E M T E R A P Ê U T IC A

O tratamento da hiperprolactinemia tem por objetivos cessar a galactorreia e restau­ rar o estado de eugonadismo e, portanto, a disfunção sexual e a fertilidade. Se a causa for tumoral, o tratamento também buscará controlar o seu crescimento e restaurar a função hipofisária quando esta é prejudicada. As modalidades terapêuticas disponí­ veis para os prolactinomas são tratamento clínico, cirúrgico e por irradiação.

D Tratamento clínico Os agonistas dopaminérgicos (AD) são padrão-ouro para o tratamento dos prolacti­ nomas e, em nosso meio, estão disponíveis os derivados de ergotamina: bromocriptina (BRC) e cabergolina(CAB). Essa classe de drogas promove redução da secreção hormo­ nal, inibição da transcrição do gene da PRL, bem como a redução do prolactinoma.

Capítulo 14 Hiperprolactinemias 205

A CAB é a droga de escolha, uma vez que apresenta melhor tolerabilidade e maior eficácia que a BRC. A dose inicial da CAB é, em geral, de um comprimido de 0,5 mg 2 vezes por semana, e a titulação é realizada em função da resposta.20 O uso da CAB promove normalização dos níveis séricos de PRL em mais de 85% dos casos e redução tumoral em mais de 80% dos casos, enquanto a BRC promove normalização dos níveis de PRL em 80% dos microprolactinomas e em 70% dos macroprolactinomas.21 Os principais efeitos colaterais dos AD são náuseas, vômitos e hipotensão postural, enquanto congestão nasal, câimbras e distúrbios psiquiátricos estão entre efeitos mais raros. A CAB foi relacionada com a valvopatia em pacientes portadores de doença de Parkinson, utilizando doses muito elevadas de CAB e nos quais há maior prevalência de outros fatores de risco para valvopatia. A CAB, e não a BRC, tem ação agonista no receptor de serotonina 5HT2B, fato que pode promover proliferação de fibroblastos e insuficiência valvar, em especial nas valvas tricúspide e pulmonar. Nos pacientes em uso de CAB para o tratamento de hiperprolactinemia, a valvopatia pela medicação ainda é assunto controverso. De 11 estudos publicados a esse repeito, totalizando 795 usuários de CAB, em apenas 1 deles houve associação entre o uso da CAB e a presença de insuficiência tricúspide moderada.22,23 De qualquer forma, até a obtenção de dados mais consistentes, a monitorização individualizada com ecocardiograma é desejável. Apesar de crônico, o tratamento com AD pode se associar à remissão da hiperpro­ lactinemia, havendo pacientes que permanecem normoprolactinêmicos mesmo após suspensão da droga. Passos etal.24 obtiveram em 20,6% dos pacientes tratados com BRC (25,8% em microprolactinomas e 15,9% em macroprolactinomas), normoprolactinemia após suspensão da droga em tempo mediano de 44 meses. Taxas ainda maiores de re­ missão foram verificadas com CAB por Colao etal:25 69% em microprolactinomas e 64% em macroprolactinomas, em um tempo mediano de uso, em tomo de 40 meses. No entanto, para Dekkers eta l.26 em metanálise recente, que inclui 19 estudos sobre suspen­ são de AD, sendo apenas 4 com CAB, a média de pacientes em remissão foi de 21%, com tendência a maior média entre os que usaram CAB (35%) quando comparados àqueles que usaram BRC (20%). Embora, as guidelines da Endocrine Society20 sugiram que a suspen­ são dos AD deva ser realizada de forma gradual, em pacientes tratados por pelo menos 2 anos, consideramos que a retirada de AD deva ser individualizada.

D Tratamento cirúrgico As indicações para o tratamento cirúrgico dos prolactinomas incluem: inadequada re­ dução nos níveis de PRL e/ou não redução/crescimento tumoral em vigência de altas doses de AD; prolactinomas com compressão de vias ópticas promovendo deficiência visual que não reverta com o uso de AD a curto prazo; apoplexia tumoral sintomática; e fistula liquórica pela redução tumoral com uso de AD. A evolução cirúrgica depende da experiência e da habilidade do neurocirurgião, bem como dos níveis de PRL, e das dimensões e do grau de invasão do tumor. Gillam e ta l.26 avaliando 50 séries cirúrgicas, mostraram remissão em 74,7% dos microprolactinomas e em 33,9% dos macroprolactinomas. A taxa de recorrência na mesma análise foi de 18,2%, em micros, e de 22,8%, em macroprolactinomas, o que reduz a eficácia do tratamento a longo prazo.

D Radioterapia Entre os tumores hipofisários, os prolactinomas são os mais radioresistentes e, por­ tanto, a indicação da radioterapia se restringe aos tumores resistentes às terapêuticas

206

Endocrinologia Feminina e Andrologia

habituais com crescimento tumoral apesar do uso de AD e da cirurgia. A normaliza­ ção média dos níveis de PRL com a radioterapia foi de 31,4% nos estudos compilados por Gillam etal.,26 número que não difere ao analisar-se o tipo de radioterapia e uso de AD ou de cirurgia como tratamentos combinados. Os efeitos colaterais incluem lesão do trato óptico; 50% de risco de hipopituitarismo em 10 a 20 anos, alterações neuropsicológicas; bem como o aparecimento de tumores secundários e acidentes vasculares cerebrais (AVC).

O Fertilidade e gravidez Em pacientes do sexo feminino, o tratamento com AD restaura a fertilidade na maio­ ria dos casos. Na falta de resposta ao tratamento medicamentoso, e nos casos de microprolactinomas, a indução da ovulação com citrato de clomifeno ou gonadotrofinas recombinantes pode ser indicada.28 Em pacientes portadoras de microadenomas, o risco de crescimento tumoral com repercussão clínica na gestação é de até 5% e, portanto, logo após a confirmação da gestação, o uso de AD é suspenso. A paciente deve ser acompanhada clinicamente a cada trimestre da gestação, e a dosagem sistemática de PRL não é indicada. Na vigên­ cia de cefaleia importante ou queixa visual com alteração em exame neuroftalmológico, a realização de RM sem contraste está indicada, preferencialmente após o primeiro trimestre. Se houver crescimento tumoral importante, o uso de AD deverá ser reintroduzido. Já para pacientes com macroadenomas, o risco de crescimento tumoral com repercussão clínica é de 15% a 35%. Assim, em paciente com macroprolactinoma ex­ pansivo, devemos aguardar a redução tumoral para dentro dos limites da sela túrcica por, pelo menos, 1 ano de tratamento com AD antes de autorizar a gestação. Quando a redução tumoral não ocorre, o tratamento cirúrgico está indicado. A manutenção ou não dos AD durante toda a gestação fica a critério do especialista. A avaliação neuroftalmológica deve ser realizada periodicamente. Nos casos em que a suspensão do AD resultou em crescimento tumoral, a conduta inicial é reintrodução do medicamento. Se este não for eficaz, o tratamento cirúrgico está indicado, preferencialmente no se­ gundo trimestre.29 Em homens, além da disfunção sexual, o hipogonadismo por hiperprolactinemia pode promover alterações no espermograma, principalmente no que se refere à mo­ tilidade. Colao et al.30 demonstraram que a qualidade do esperma aproximou-se do encontrado em controles apenas após 24 meses de tratamento com CAB. Portanto, deve-se reavaliar o paciente com queixa de infertilidade por um período mais prolon­ gado que o necessário para restaurar os níveis normais de testosterona. Em pacientes portadores de prolactinoma que permaneçam hipogonádicos apesar do tratamento clínico, o uso do citrato de clomifeno tem se mostrado útil na elevação dos níveis de testosterona, mesmo na ausência de normalização dos níveis de PRL. Esta abordagem apresenta vantagens sobre a reposição de testosterona por restaurar a fertilidade.31

D Prolactimomas agressivos Tumores hipofisários agressivos são definidos pela presença de expansão ou invasão ex­ tensa de estrutura vizinhas, pelo rápido crescimento tumoral e/ou pela presença de tu­ mores gigantes, com mais de 4 cm em seu maior diâmetro. O diagnóstico de carcinoma hipofisário é realizado na presença de metástases. Carcinomas hipofisários são extrema-

Capítulo 14 Hiperprolactinemias 207

mente raros, porém o tipo mais frequente entre eles é o prolactinoma. Os prolactinomas agressivos são mais comuns em pacientes jovens do sexo masculino. A prevalência de resistência aos AD em prolactinomas ocorre em cerca de 10% dos microprolactinomas e em 18% dos macroprolactinomas.1 O principal mecanismo da resistência é relacionado com a redução dos receptores dopaminérgicos dos prolactinomas.32 A estratégia inicial para tratar os pacientes resistentes parcialmente aos AD é o au­ mento escalonado da dose da medicação. Ono etal.33 obtiveram normalização dos ní­ veis de PRL em 96,2% dos pacientes com dose de até 12 mg por semana de CAB. Vale lembrar que a dose máxima de CAB em bula é de 2 mg semanais. Outras estratégias ainda em fase de estudos clínicos são o uso de análogos de somatostatina, de molé­ culas quiméricas na ligação entre receptores D2 e de somatostatina, o uso de moduladores do receptor de estrógenos, de antagonistas do receptor de PRL e de drogas antiblásticas, como temozolamida e inibidores de mTor ou de tirosina quinase. C O N C LU SÃ O

A hiperprolactinemia é uma importante causa de hipogonadismo e infertilidade, espe­ cialmente entre mulheres jovens. Diagnosticar a causa dessa condição é fundamental para a indicação do tratamento adequado. Nas hiperprolactinemias idiopáticas e nos prolactinomas, o tratamento de escolha é o uso de AD. O tratamento cirúrgico e por irradiação são opções para os casos de resistência e intolerância aos AD. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

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Capitulo14

Hiperprolactinemias 209

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Contracepção hormonal

C aro lin a Sales J

IN T R O D U Ç Ã O

A introdução da contracepção significou um grande avanço para a saúde e a liberdade feminina, proporcionando à mulher fazer seu planejamento reprodutivo e, assim, es­ colher se deseja ou não ter filhos e, em caso positivo, no momento em que considera propício. O planejamento reprodutivo também tem impacto no aumento do intervalo intergestacional, uma vez que curtos intervalos intergestacionais são considerados um fator de aumento de morbimortalidade materna e neonatal em qualquer mulher.1'3 Curtos intervalos intergestacionais (intervalo entre o último parto e a gestação seguin­ te inferior a 18 meses) estão associados a maior risco de agravos perinatais (prematuri­ dade, baixo peso e restrição de crescimento) e maternos.1'3 As tentativas de planejamento reprodutivo datam de épocas remotas da civilização, com o uso de métodos com eficácia e segurança bem aquém do desejável. Dos métodos com eficácia comprovada, os não hormonais foram os primeiros a serem desenvolvi­ dos, com o primeiro preservativo criado em 1709. Somente em 1950, o contraceptivo hormonal oral foi desenvolvido em laboratório, sendo liberado para uso na população geral a partir de 1960.4 Assim, o primeiro método hormonal a ser utilizado foi a pílula contraceptiva combinada contendo noretinodrel e mestranol (Enovid®). A presença do estrógeno (no caso, o mestranol) associada ao progestógeno (noretinodrel) ocorreu ao acaso inicialmente, uma vez que já se sabia que o responsável por inibir a ovulação era o progestógeno. Isso aconteceu porque as primeiras pílulas contendo “supostamente” apenas noretinodrel foram purificadas em uma segunda fase de pesquisa, ocorrendo mais sangramentos inesperados e irregulares com o noretinodrel purificado do que com a primeira versão. Com exame mais detalhado das 2 versões de noretinodrel, observouse que a primeira versão do progestógeno estava contaminada com mestranol, o que garantiu maior controle de sangramento.5 Dessa forma, a presença do estrógeno na con­ tracepção hormonal foi conveniente para garantir melhor controle de ciclo. Durante os últimos 50 anos, várias modificações foram feitas nos contraceptivos hormonais (CHs) para aumentar efetividade, tolerabilidade, segurança e aceitabilida­ de.6 Essas mudanças compreenderam redução de dose do estrógeno e progestógeno, criação de progestógenos menos androgênicos, contraceptivos de progestógeno isola­ do, novas vias de prescrição hormonal e, recentemente, a inclusão de estrógeno natu­ ral (valerato de estradiol e 17-betaestradiol) na contracepção combinada oral. Atual­ mente há várias opções de CHs, apesar de o CH oral ainda ser a modalidade hormonal mais utilizada e conhecida no Brasil.7

Capítulo 15 Contracepção hormonal 211

C L A S S IF IC A Ç Ã O D O S C O N T R A C E P T IV O S H O R M O N A IS

Os contraceptivos são divididos em não hormonais e hormonais. Os CHs podem ser classificados conforme sua composição (Tabela 15.1) e via de administração (Tabela 15.2). A composição refere-se à presença do progestógeno isolado ou associado ao estrógeno (combinado). Já a via de administração significa administração do CH pela via oral ou não oral (transdérmica, vaginal, intramuscular, intrauterina e subdérmica).

TABELA 15.1 Classificação dos contraceptivos hormonais quanto à sua composição Progestógeno isolado

Estrógeno associado ao progestógeno (métodos combinados)

O ra l

O ra l

In je tá v e l tr im e s tra l (A M P D )

In je tá v e l m e n sa l

S IU -L N G

A n el v a g in a l

Im p la n te lib e ra d o r d e E N G

A desivo

AMPD: acetato de medroxiprogesterona de depósito,SIU-LNG: sistema intrauterino liberador de levonorgestrel, ENG: etonogestrel.

TABELA 15.2 Classificação dos contraceptivos hormonais quanto à via de administração Métodos orais

Métodos não orais

O ra l c o m b in a d o

In je tá v e l tr im e s tra l (A M P D )

O ra l de p ro g e stó g e n o iso la d o

In je tá v e l m e n sa l A n el v a g in a l S IU -L N G Im p la n te lib e ra d o r de E N G

AMPD: acetato de medroxiprogesterona de depósito,SIU-LNG: sistema intrauterino liberador de levonorgestrel, ENG: etonogestrel.

Os contraceptivos orais combinados (COCs) podem ser classificados quanto à dosa­ gem de etinilestradiol (EE). São considerados de alta dosagem aqueles COCs com do­ sagem de EE > 50 mcg, enquanto os COCs com dosagem de EE < 50 mcg são conside­ rados de baixa dosagem. Há ainda os COCs com dose ultrabaixa de EE, que são aqueles contendo 15 mcg ou 20 mcg de EE. Os COCs podem ainda ser classificados quanto à composição e à dose dos hormônios utilizados nos comprimidos de uma carteia: mo­ nofásicos (a maioria dos COCs existentes, a mesma dose de estrógeno e progestógeno em todos os comprimidos de uma carteia, representada por uma única cor dos com­ primidos), bifásicos (pílulas de 2 cores diferentes na carteia do COC, o que significa 2 doses diferentes de estrógeno e progestógeno), trifásicos (pílulas de 3 cores diferentes na carteia do COC, o que indica 3 doses diferentes de estrógeno e progestógeno) e, mais recentemente, quadrifásicos (pílulas de 4 cores diferentes na carteia do COC, signifi­ cando 4 diferentes doses de estrógeno e progestógeno). A separação em fases tem como

212

Endocrinologia Feminina e Andrologia

principal objetivo o controle do ciclo em mulheres que sangram durante o uso de COCs monofásicos. Por último, existe a classificação dos COCs em gerações, que depende de sua introdução no mercado norte-americano,8 as quais estão descritas na Tabela 15.3.

TABELA 15.3

Classificação dos contraceptivos em gerações

Geração

Composição

Primeira

C O C c o m d o se de E E > 5 0 m c g a sso cia d o a u m d os p ro g e stó g e n o s: n o r e tin d r o n a , n o r e tis te r o n a , lin e s tr o l o u n o r e tin o d r e l

Segunda

C O C c o m d o se de E E < 5 0 m cg a sso cia d o a u m d os p ro g e stó g e n o s: le v o n o rg e stre l o u n o rg e s tre l

Terceira

C O C co m dose de E E < 5 0 m cg associad o a u m dos p ro ­ gestógenos: g estod en o , desogestrel o u n o rg estim a to

Sem classificação

C O C co m dose de E E < 5 0 m cg associad o a u m dos p rog estóg en o s: d ro sp ire n o n a *, clo rm a d in o n a * e ciproteron a. O s C O C s co m estró g en o n a tu ra l en trariam n o gru p o sem classificação.

*há autores que classificam os COCs contendo estes progestógenos como de quarta geração.

Os COCs podem ser usados de maneira cíclica (com pausa de 4 a 7 dias, a depender da composição de cada contraceptivo oral) ou estendida/contínua (sem pausa). Ape­ sar de a eficácia teórica ser a mesma entre as formas de uso do COC, a pausa mais curta (4 dias) parece estar associada a maior eficácia contraceptiva do que a observada nos contraceptivos orais com pausa tradicional de 7 dias. Isso porque a chance de esque­ cimento é menor com pausa curta do que com intervalo tradicional.9 Considerando que a pausa curta ou ausência de pausa seria mais associada a menor chance de falha, alguns COCs usam placebo na pausa, que são identificados por comprimidos de cor diferente na carteia de um COC. Entre os métodos não orais, existem os chamados contraceptivos reversíveis de lon­ ga duração (LARC - long-acting reversible contraception), que são aqueles em que o inter­ valo de administração é superior a um mês.10 Dessa forma, dos CHs disponíveis no Brasil, constituem LARCs o implante liberador de etonogestrel, o sistema intrauterino liberador de levonorgestrel (SIU-LNG) e o injetável trimestral. A vantagem dos LARCs é a alta eficácia, na medida em que não dependem de ação diária da usuária, sendo, por isso, fortemente recomendados para grupos de baixa adesão, como adolescentes e usuárias de álcool e outras drogas.11 M E C A N IS M O S D E A Ç Ã O

Os CHs são métodos que agem primariamente por mecanismos pré-fertilização, sen­ do que o progestógeno é o principal responsável pelos efeitos anticonceptivos obser­ vados. O principal efeito do progestógeno é a inibição do pico pré-ovulatório de hor­ mônio luteinizante (LH). Além disso, exerce efeitos locais no útero, como alteração

Capítulo 15 Contracepção hormonal 213

do muco cervical, tornando-o hostil ao espermatozóide (interferindo na motilidade do espermatozóide); bem como exerce efeito antiproliferativo no endométrio e altera a motilidade tubária. O estrógeno age inibindo o pico de hormônio folículo-estimulante (FSH) e, com isso, interfere negativamente no crescimento folicular.5 Dos CHs disponíveis, apenas o SIU-LNG e as minipílulas (pílulas contendo apenas progestógeno, porém a dose só inibe a ovulação em a 50 mcg têm o dobro de risco de TEV do que aqueles com menos de 50 mcg. Entre doses menores que 50 mcg (35, 30, 25 e 20 mcg), não há diferença significativa no risco de TEV. Não se sabe ainda se contraceptivos conten­ do estrógenos naturais terão menor risco de TEV do que aqueles com EE. O tipo de progestógeno associado ao estrógeno também influencia o risco de TEV, sendo o levonorgestrel (mais androgênico) o mais seguro, aumentando em 2 vezes o risco comparado ao das não usuárias de métodos hormonais. Os demais progestógenos aumentam em 4 vezes o risco, sem diferenças significativas entre eles. Porém, como o risco absoluto é baixo com qualquer progestógeno associado ao estrógeno, se a paciente tiver benefício adicional de uso de outro progestógeno, que não o levonor­ gestrel, não haverá nenhum problema em se optar por outras associações estroprogestogênicas. Vale lembrar que os progestógenos isolados não alteram o risco de TEV, sendo indicados para mulheres de risco para TEV ou com passado de eventos tromboembólicos.19'21 Já a trombose arterial, representada pelo infarto agudo do miocárdio (IAM) e pelo acidente vascular cerebral (AVC), é ainda mais rara do que a TEV, o que dificulta o estudo da influência dos CH no risco de trombose arterial. Porém, é descrito maior risco de IAM e AVC entre usuárias de CH combinados, especialmente se associado a algum fator de risco, como tabagismo e hipertensão arterial. Os dados mais consistentes apontam que a dose de EE > 5 0 mcg é associa­ da a maior risco de ocorrência destas enfermidades, porém doses mais baixas não abolem o risco. Diferentemente da TEV, na qual está bem-estabelecido qual proges­ tógeno mais seguro, não se sabe qual progestógeno tem menor risco de trombose arterial.20 Assim como para o risco de TEV, os progestógenos isolados também não estão associados a aumento de risco de IAM e AVC, sendo indicados para mulheres de risco ou que já tiveram um desses eventos.21

218

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Efeitos no metabolismo lipídico Os CH podem afetar as lipoproteínas, sendo mais frequente aumento de lipoproteína de alta densidade (HDL) e de triglicérides (TG). O aumento de TG é da ordem de 30% a 80% dos valores iniciais. O aumento é provocado pela síntese hepática de TG pelo EE. A via não oral do EE, ao contrário do que ocorre na terapia de reposição hormonal, provoca o mesmo aumento dos TG (da ordem de 50%) que a via não oral.22 Assim, em mulheres com hipertrigliceridemia importante, o indicado seria não usar EE por via alguma, pre­ ferindo os métodos não hormonais ou os que contêm apenas progestógeno.21

Efeitos no metabolismo de carboidrato Sabe-se que o EE reduz a sensibilidade à insulina. No entanto, uma metanálise mos­ trou que o uso de CH não tem impacto significativo no metabolismo glicídico de mu­ lheres não diabéticas.23’24

Efeitos na pressão arterial O etinilestradiol tem um efeito pró-hipertensivo, na medida em que provoca aumento da síntese hepática de angiotensinogênio.25 Mesmo as vias não orais (anel e adesivo) que contêm etinilestradiol provocam esse efeito.19,24,26 O efeito é mais relevante quando a mulher é hipertensa, pois o uso de contraceptivos combinados (independentemente da dose) pode descontrolar a pressão de hipertensas, sendo a descontinuação dos métodos combinados uma importante medida de controle da pressão arterial nesses casos.21,27 Em normotensas, o efeito é pouco relevante nas doses habituais, podendo aumentar o risco de hipertensão especialmente em uso de COC de alta dosagem de etinilestradiol.19

Efeitos no risco de câncer de mama A associação entre câncer de mama e uso de contraceptivos combinados é controversa, mostrando desde um pequeno aumento de risco até ausência de associação.28'29 Os estudos de maior casuística normalmente não encontram associação relevante en­ tre uso de COC e risco de câncer de mama.29

Massa óssea Com exceção do injetável trimestral (AMPD), os demais métodos, sejam combina­ dos ou apenas de progestógeno, não afetam a densidade mineral óssea (DMO) de maneira negativa. Já o AMPD pode levar à redução da DMO (menor que 1 desviopadrão),30 no entanto, a redução é transitória, assim como a redução provocada pela amamentação.30'31 Mulheres que usaram até 13 anos de AMPD (e descontinuaram o método) não apresentaram diferença na DMO quando comparadas com mulheres que não usaram métodos hormonais.32 Mesmo em mulheres pós-menopausadas, a medida de DMO em ex-usuárias de AMPD por 9 anos não foi diferente daquela das que não usaram métodos hormonais.31 IN D IC A Ç Õ E S E C O N T R A IN D IC A Ç Õ E S

Atualmente a prescrição de qualquer contraceptivo deve ser baseada nos critérios médicos de elegibilidade da Organização Mundial de Saúde (OMS). Isso porque os

Capítulo 15 Contracepção hormonal 219

critérios avaliam o uso de contraceptivos em diversas situações clínicas, mostrando quando são indicados e quando são contraindicados. Essas orientações são revistas periodicamente, sendo que há previsão de nova revisão em 2012. As orientações estão disponíveis gratuitamente no site da OMS: http://www.who.int/reproductivehealth/ publications/family_planning/en/index.html.21 Essas diretrizes são partilhadas pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO)33 e pelo Centerfor Disease Control andPrevention (CDC).34 E importante estar atento às orientações, uma vez que a prescrição de um CH pode afetar negativamente uma eventual doença da paciente. As Tabelas 15.6 e 15.7 mos­ tram determinações e exemplos de situações comuns na prática da Endocrinologia.

TABELA 15.6 Critérios de elegibilidade médica para os métodos contraceptivos segundo a Organização Mundial de Saúde Categoria

Classificação

Julgamento Clínico

1

N ã o h á re striç ã o ao u so do m é to d o

U tiliz a r o m é to d o em q u a isq u e r

c o n tra c e p tiv o .

c irc u n s tâ n c ia s .

A s v a n ta g e n s em u tiliz a r-se o m é ­

U tiliz a r de m o d o g eral o m é to d o .

2

to d o g e ra lm e n te su p e ra m os risco s, te ó r ic o s o u p ro v ad o s. 3

O s risco s, c o m p ro v a d o s o u te ó ric o s ,

N ã o é re co m e n d a d o u so do m é to d o ,

su p e ra m as v a n ta g e n s do u so do

a m e n o s q u e m é to d o s m a is a d e q u a ­

m é to d o .

d os n ã o e s te ja m d isp o n ív e is o u n ã o s e ja m aceitáv eis.

R is c o de saú d e in a ce itá v e l ca so o

4

N ã o u tiliz a r o m é to d o (p ro scrito ).

m é to d o a n tic o n c e p c io n a l se ja u t i­ liz a d o .

Adaptada de WHO, 2009.21

TABELA 15.7

Situações clínicas comuns do uso de contraceptivos hormonais

Condição

Progestógeno Isolado

Contraceptivo combinado O ra l

In je tá v e l S IU -L N G

V a g in a l

In je tá v e l

T ra n s d é rm ic o

Doença cardíaca isquêmica (a tu a l o u p reg ressa) ou AVC Obesidade (IM C > 3 0 kg/m 2)

1

1

2

2

a) Id ad e < 3 5 a n o s

1

1

2

2

b) Id a d e > 3 5 a n o s

1

1

3/4*

3

Tabagismo

C o n tin u o

220

Endocrinologia Feminina e Andrologia

C o n tin u a çã o da Tabela 15.7

Múltiplos fatores de risco para DCV

2

3

3/ 4**

3/ 4**

2

2

2

2

2

3

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2

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4

4

D ia b e te s m e llitu s a) D o e n ç a n ã o v a scu la r (in d e p e n d e n te d o u so o u n ã o de in su lin a ) b ) C o m lesão de ó rg ã o alvo (v a scu lo p a tia , n e u ro p a tia , n e fr o p a tia o u re tin o p a tia ) c) M a is d e 2 0 a n o s de d o e n ç a

Dislipidemia HAS a) H istó ria de H A S, q u an d o PA n ã o p o d e ser a ferid a b) H A S co n tro la d a , q u an d o PA pod e ser aferid a c) N íveis elevad os de PA (m m H g ): I. PA S: 1 4 0 -1 5 9 o u P A D :9 0 -9 9 II. PA S > 1 6 0 o u PA D >100 d) D o e n ç a v a scu la r

Adaptada de WHO (2009).21 SIU-LNG: sistema intrauterino liberador de levonorgestrel,AVC: acidente vascular cerebral, HAS: hipertensão arterial sistêmica, PA: pressão arterial. * Muda para categoria 4 se fumar > 15 cigarros/dia. ** A depender da severidade de cada caso (o prescritor tem de avaliar quais fatores estão presentes, ver a classificação de cada fator e decidir caso a caso). # Quando é aumento de LDL,é categoria 2; porém se é aumento de triglicérides, torna-se categoria 3.

Assim, uma portadora de síndrome dos ovários policísticos (SOP) com hipertrigliceridemia e hipertensa não poderá iniciar tratamento com contraceptivos combina­ dos, pelo aumento dos triglicérides e descontrole da PA promovidos pelo EE. Dessa forma, deverá ser prescrito para contracepção um método não hormonal ou apenas de progestógeno. O controle do hiperandrogenismo deverá ser feito com outras medica­ ções antiandrogênicas, como, p. ex., a espironolactona. E importante observar que a mudança da via de administração do estrógeno em contracepção não se traduz em benefício metabólico diferentemente do que ocorre com a terapia de reposição hormonal no climatério. Isso porque, em geral, usa-se o etinilestradiol, um estrógeno sintético potente que consegue induzir as mesmas alterações hepáticas independentemente da via de administração. Assim, a síntese de

Capítulo 15 Contracepção hormonal 221

angiotensinogênio (e, por consequência, efeito na PA), o aumento de cerca de 50% nos triglicérides e o aumento de risco de trombose são semelhantes entre a via oral e não oral dos métodos combinados.22,23,27 E importante lembrar que, após a orientação sobre quais métodos a mulher pode ou não usar por parte do médico, a escolha final de qual método deverá ser prescrito cabe à mulher (Lei n° 9263 de 12 de janeiro de 1996).36 B E N E F ÍC IO S N Ã O C O N T R A C E P T IV O S D O S C O N T R A C E P T IV O S H O R M O N A IS

É importante o conhecimento dos benefícios não contraceptivos dos CHs, pois estes efeitos garantem mais adesão das usuárias ao método. Além disso, há mulheres que vão iniciar os CHs por seus benefícios não contraceptivos, e não propriamente pelo efeito anticonceptivo. São provados os seguintes benefícios não contraceptivos dos CH:18 • • • • • • • •

Redução da mortalidade. Redução do volume menstrual e de anemia. Redução da dismenorreia. Regularização do ciclo menstrual (com os métodos combinados, sendo o anel vaginal o método com menor risco de spotting). Redução da dor pélvica provocada pela endometriose. Redução dos sinais de hiperandrogenismo (acne e hirsutismo). Redução dos sintomas de tensão pré-menstrual. Redução do risco de câncer de ovário (cerca de 40%), endométrio (50%) e colorretal (cerca de 20%).

Alguns benefícios associados aos contraceptivos reportados no passado, como efei­ to positivo na massa óssea e nos leiomiomas, não foram provados em estudos mais recentes. Atualmente, um possível efeito na massa óssea é considerado não clinica­ mente relevante e, nos miomas, já foram reportados efeitos negativos e positivos, po­ rém sabe-se que não há nenhuma relação entre CH e leiomiomas, apenas redução do sangramento provocado por estes.18 ■

C O N T R A C E P Ç Ã O D E E M E R G Ê N C IA

A contracepção de emergência é representada pelo uso do dispositivo intrauterino, pela pílula combinada e pela pílula apenas de progestógeno após relação sexual des­ protegida para evitar uma gestação não planejada. Como este capítulo trata de CHs, abordaremos apenas os 2 últimos métodos. Os contraceptivos de emergência reduzem em 57% a 93% o risco de gravidez após uma relação desprotegida.36 A pílula combinada é usada como esquema de Yuzpe: 100 mcg de EE + 500 mcg de LNG de 12 h em 12 h por 24 h, com eficácia até 72 h após a relação sexual desprotegi­ da. As demais pílulas combinadas, com outros progestógenos, não são recomendadas para contracepção de emergência. Posteriormente, com o conhecimento de que bastava o progestógeno para a con­ tracepção de emergência, foi lançada a pílula de progestógeno isolado com objetivo de

222

Endocrinologia Feminina e Andrologia

uso pós-coital. Assim, temos o levonorgestrel isolado, 0,75 mg de 12 h em 12 h por 24 h ou 1,5 mg em dose única (preferível), com eficácia até 120 h após a relação sexual. A pílula de emergência contendo apenas progestógeno é mais eficaz e apresenta me­ nos efeitos adversos que a pílula combinada.36 Os 2 métodos, disponíveis no Brasil, previnem a gestação por interferir no processo de ovulação, abolindo-o ou postergando-o. No passado, acreditava-se que apresenta­ vam os mesmos mecanismos que os contraceptivos hormonais de progestógeno, ou seja, alteravam a motilidade tubária, o muco cervical e o endométrio. IM P O R T A N TE N o e n ta n to , e s tu d o s re c e n te s m o s tr a r a m q u e a d o se a lta e a g u d a de p r o g e s tó g e n o só in t e r ­ fe re n a o v u la ç ã o . P a r a c o r r o b o r a r o f a t o , o s c o n tr a c e p tiv o s h o r m o n a is de e m e r g ê n c ia só fu n c io n a m se o fe r ta d o s p ré -o v u la ç ã o , ap ó s a o v u la ç ã o n ã o são ca p a z e s de re d u z ir n e n h u m a g ra v id e z .36

Recentemente, um modulador seletivo do receptor de progesterona com mecanis­ mo pré- e pós-fertilização foi aprovado fora do nosso país para uso como contracep­ tive de emergência, o ulipristal. Esse medicamento já é usado em outros países como contraceptivo de emergência, tendo maior eficácia que o contraceptivo de emergência que contém apenas levonorgestrel. ■

C O N C LU SÃ O

O Seleção do método a ser prescrito De forma geral, para indicar as opções contraceptivas disponíveis, primeiramente o médico deve avaliar se a mulher tem alguma restrição a algum método contraceptivo. Caso a mulher tenha alguma limitação, deverão ser oferecidas apenas as opções segu­ ras para a paciente (categorias 1 e 2 da OMS). IM PO R TA N TE O u tr o p o n to im p o r ta n te a ser c o n sid e ra d o é o b e n e fíc io n ã o c o n tra c e p tiv o de u m C H , o q u e d ev erá s e r le v a d o e m c o n t a t a n t o p a r a g a r a n tir u m a c o n tr a c e p ç ã o m a is a d e q u a d a p a r a a p a c ie n te c o m o ta m b é m p a ra a u m e n ta r a ad esão ao m é to d o .

Em qualquer caso, a escolha final do método cabe à mulher, uma vez que, quando a escolha é feita pelo médico, cerca de 72% das mulheres descontinuam após 1 ano de uso do método. Já quando a escolha é feita pela própria mulher, o percentual cai para cerca de 9%.37 Assim, o papel do médico é orientar a paciente sobre os métodos contra­ ceptivos disponíveis, cabendo a ela a escolha final do método. Antes de iniciar o uso de um contraceptivo, é imperativa uma boa história clínica para avaliar se existem situações que afetam a prescrição. Além disso, deve ser feito exame físico para avaliar a PA e a presença de doença inflamatória pélvica (caso a mu­ lher deseje DIU). Normalmente, exames complementares são desnecessários, a não ser em situações clínicas específicas.

Capítulo 15 Contracepção hormonal

T

223

T

1. Escolher pelos ■ 1.Discutir as opções critérios da OMS H com a paciente 2. Via convenien- H 2. Via conveniente te após discutir com

FIGURA 15.1 Organograma de prescrição de contracepção. Gratuito no site descrito da OMS.

D

Uso contínuo de contraceptivos orais combinados

Não só os COCs, como também outros métodos combinados (anel e adesivo) podem ser usados de maneira estendida ou contínua. O regime contínuo é considerado aquele que o uso de contraceptivo dura mais de 28 dias; em geral, são 63 ou 84 dias de uso contínuo de contraceptivo combinado, seguido de pausa de 7 dias. Porém, há mulheres que usam sem pausa por longos períodos. Em relação aos regimes cíclicos, há menor taxa de sinto­ mas pré-menstruais (dismenorreia, cefaleia, edema, cansaço, entre outros) associados ao regime contínuo, sem diferença em termos de impacto metabólico.22,38'41 No entanto, é importante ressaltar que ainda faltam estudos de longo prazo para comprovar a mesma segurança em termos de risco/benefício do regime contínuo em relação ao cíclico, uma vez que os estudos disponíveis têm duração máxima de 12 a 24 meses. Este capítulo pretendeu fazer uma revisão do estado da arte da contracepção hor­ monal feminina. Com relação à contracepção hormonal masculina, ainda não se tem nenhum método hormonal disponível para os homens, os quais ainda se encontram em fase de pesquisa, independentemente da formulação ou da via de administração.42 R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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M a rcio R u to w itsch Pa u lo A n tô n io O ldani F elix

ACNE

A acne é uma afecção das glândulas pilossebáceas muito frequente, totalizando cerca de 14% das consultas dermatológicas no Brasil,1 apresentando-se desde quadros leves a formas com comprometimento sistêmico.2 Devido a sua alta frequência e por, na maioria das vezes, ser autolimitada, já foi considerada fisiológica. Entretanto, devido ao grave impacto psicossocial que ela causa, comparável a doenças sistêmicas como a asma, o diabetes, a artrite e a epilepsia, esse conceito foi abandonado.3,4 Atualmente, é considerada uma doença crônica, podendo estar associada a doenças endocrinológicas e com autoimunidade.2 Estudos recentes associam a acne ao risco aumentado de doenças tireoidianas nas mulheres, doença inflamatória intestinal, diabetes mellitus e à presença de autoanticorpos.3 A acne parece ter caráter familial, porém devido a sua alta incidência, é difícil a comprovação.5 Acomete todas as faixas etárias, com pico de incidência entre os 12 e 24 anos, sendo a dermatose mais frequente entre os adolescentes, chegando, no Ociden­ te, a atingir 95% dos meninos e 83% das meninas com 16 anos de idade.3,5,6 Acomete ambos os sexos, porém, devido ao estímulo androgênico, sua frequência e gravidade são maiores nos sexo masculino. Acomete todas as etnias, sendo menos frequente nos orientais e negros.6 Homens brancos são mais propensos a desenvolver quadros mais graves, como a acne nodulocística, do que os homens negros.5 Graus leves de acne já podem ser vistos em recém-natos, provavelmente devido ao estímulo de andrógenos maternos, podendo durar por todo o período neonatal quan­ do, em geral, remite voltando a surgir na puberdade. Nesta fase, devido à maturação adrenal e ao desenvolvimento gonadal, com o consequente aumento na produção de andrógenos, ocorre um aumento das glândulas sebáceas, com incremento da produ­ ção de sebo e consequente surgimento da acne.1,7 A acne pode ser o primeiro sinal da puberdade; nas meninas, pode preceder a menarca em até mais de 1 ano.4 Na maioria dos homens, espera-se regressão do quadro entre 20 a 25 anos, já as mulheres podem continuar com o problema durante toda a vida adulta, reduzindo sua prevalência so­ mente após os 45 anos de idade.1,5 Cunliffe e Gould analisaram mais de 2 mil homens e mulheres e viram que a maior prevalência de acne entre os homens foi antes dos 16 anos, já, entre as mulheres, foi após os 23 anos. Estudos mostram que até 50,9% das mulheres e 42,5% dos homens apresentaram acne na 3a década de vida, e o percentual

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 227

foi de 26,3% e 12%, respectivamente na 5 a década. Piora da acne após a adolescência foi percebida por 3,6% dos homens e 13,3% das mulheres.4,8

D

Etiopatogênese

A patogênese da acne é complexa e multifatorial, mas 4 fatores são fundamentais para o seu surgimento, são eles: • Alteração da queratinização do epitélio da porção infundibular do folículo: causando obstrução do óstio folicular e impedindo a drenagem normal do sebo. • Hiperprodução sebácea: leva ao acúmulo de sebo, que aumenta a pressão interna do folículo, acarretando sua ruptura. • P ro liferação b acterian a: em especial o Propionibacterium acnes (P. acnes) que hidrolisa os triglicerídeos presentes no sebo, produzindo ácidos graxos livres, que são irritantes para a parede folicular, favorecendo a sua ruptura. Além disso, essas bactérias ativam a imunidade inata, levando ao processo inflamatório perifolicular. • Inflam ação: com a ruptura do folículo, o sebo e a queratina, que são substâncias imunogênicas, entram em contato com a derme, desencadeando o processo inflamatório.2,5,9,10,11,12 Além desses fatores, sabe-se que outros também são indispensáveis para o desen­ volvimento da acne. Um deles é a presença de andrógenos circulantes. Hamilton, em 1941, demonstrou que homens castrados não desenvolvem acne e, em 1962, Pochi et al. observaram que a reposição de testosterona nesses pacientes levava ao aumen­ to da produção de sebo e ao surgimento da acne.7,13,14 Os andrógenos estimulam a hiperproliferação do epitélio folicular, além de aumentar a produção do sebo. A dihidrotestosterona (DHT) é o andrógeno mais potente e é produzido, em grande parte, pela conversão periférica da testosterona, principalmente, pela enzima 5-a-redutase presente em grandes quantidades nos folículos pilosossebáceos.7,15 O desenvolvimento da glândula sebácea também é influenciado por outros fatores, como fator estimulador de linfócitos 1 (Lef-1), hormônio do crescimento (GH), fator de crescimento insulina-símile (IGF) e receptor proliferador-ativado de peroxisoma, que estimulam a diferenciação das células-tronco em sebócitos, enquanto o ácido retinoico, o fator de crescimento epidérmico, o fator transformador do crescimento, o fator de crescimento do fibroblasto e as moléculas de adesão estimulam a diferencia­ ção normal do folículo pilossebáceo.7 Outro fator muito controverso é a influência da dieta na acne. Antes da década de 1960, o tratamento da acne incluía dieta restritiva de carboidratos e lipídeos, como chocolate, refrigerantes, doces e gorduras. No final da década de 1960, Fulton et a l, e, em 1971, Anderson publicaram estudos que não mostravam relação da dieta com a acne, o que levou a uma mudança de conceitos, porém esses estudos apresentam sérios problemas em seu desenho.6,16,17 Atualmente, sabe-se que os estados hiperinsulinêmicos aumentam a produção de IGF-1 e causam diminuição da proteína ligadora do IGF-3 que agem diretamente na proliferação e na apoptose dos queratinócitos, além de estimular a síntese de andró­ genos por vários tecidos, levando ao aumento da glândula sebácea com consequente incremento da produção de sebo.6,16 Hoje, em estudos mais bem desenhados, viu-se que a ingestão de alimentos contendo chocolate levou ao aumento dos níveis de insu-

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

lina quando comparados aos mesmos alimentos sem chocolate, o que talvez explique a relação entre chocolate e acne que muitos pacientes relatam.16)20,21 A acne é uma característica da síndrome do ovário policístico (SOP) que cursa com obesidade, hiperinsulinemia, resistência à insulina e hiperandrogenismo. As pacien­ tes apresentam altos índices de IGF-1, andrógenos e baixa concentração de globulinas ligadoras de hormônios sexuais (SHBG). A melhora da resistência à insulina, seja pela perda de peso ou pelo uso de medicações, como a metformina e a pioglitazona, nor­ malizam os níveis desses hormônios nas mulheres com SOP. O uso dessas medicações deve ser levado em conta no tratamento de pacientes com acne que apresentem resis­ tência à insulina.18)19)20)22,23)24 Sabe-se que uma restrição calórica intensa reduz a produção do sebo, e que esta volta ao normal com o retorno à dieta de rotina. Isso talvez seja explicado já que, para a glândula sebácea produzir sebo, necessita de energia. O glicogênio é a principal fonte de nicotinamida adenina dinucleótido fosfato (NADPH), necessário para gerar essa energia, logo uma baixa ingestão calórica reduziria os níveis de glicogênio nas glân­ dulas sebáceas, sendo um fator limitante na lipogênese sebácea. Dietas com alto teor de ácidos graxos monoinsaturados parecem estar relacionadas com a piora da acne, já que estes, quando aplicados topicamente na pele levam à queratinização anormal e à hiperplasia epidérmica.16 O zinco e a vitamina A também têm papel importante na acne, e estudos mostram que pacientes com acne, principalmente com acne grave, apresentam níveis séricos baixos dessas substâncias.6,16 Em 2002, Cordain et al. estudaram 2 populações não ocidentalizadas, os ilhéus de Kitavan da Papua Guine e os povos Ache do Paraguai, que não apresentam acne, e atribuise o fato a uma dieta pobre em carboidratos. O fato também foi confirmado na popula­ ção de esquimós Inuit, que só passaram a apresentar acne após a introdução de hábitos alimentares ocidentalizados. Além disso, sabe-se que a dieta com baixos índices glicêmicos atrasa o início da puberdade e, consequentemente, o surgimento da acne.6,16,25



Quadro Clínico

Em geral, seu início é gradual, com surgimento de lesões na puberdade, acometendo mais a face, e, em menor grau, dorso, peito e ombros. Quando o surgimento é abrup­ to, devem-se pesquisar outras causas subjacentes.5 Clinicamente, a acne pode ser classificada de acordo com o tipo de lesão que apre­ senta: lesões não inflamatórias, como os comedões abertos e fechados; e inflamató­ rias, como pápulas, nódulos, cistos e até cicatrizes. Os comedões abertos são pápulas achatadas com um ponto negro central, já os comedões fechados, muitas vezes, são difíceis de observar, ou são pequenas pápulas cor da pele, sem orifício visível. As le­ sões inflamatórias variam desde pequenas pápulas eritematosas e pústulas a grandes nódulos flutuantes e dolorosos. A presença de pápulas, pústulas ou nódulos depende da extensão e da localização do infiltrado inflamatório.4,5 Não existe consenso quanto à classificação da acne, existindo vários sistemas. O mais utilizado é o que a classifica pelo tipo de lesão e por sua gravidade. Quando exa­ minamos com cuidado, encontramos lesões em vários estágios, porém sempre existe predominância de um tipo de lesão, e sua classificação pode ser feita em comedoniana (Figura 16.1), papulopustulosa (Figura 16.2) e nodular; seguida da severidade: leve, moderada e grave.5,26

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 229

FIGURA 16.1 Acne da mulher adulta forma comedoniana.

FIGURA 16.2 Acne da mulher adulta forma papulo pustulosa.

As cicatrizes podem ser consequência tanto da acne inflamatória quanto da não inflamatória. Tanto as cicatrizes quanto as lesões ativas causam graves distúrbios psi­ cológicos independentes, sem correlação com a gravidade.4 Na maioria dos homens, o quadro regride espontaneamente entre os 20 e 25 anos, porém, em alguns casos e especialmente nas mulheres, o quadro pode se estender pela vida adulta.1)27

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

Estudos mostram que existe diferença entre a acne da adolescente e da mulher adul­ ta, indicando ser 2 entidades diferentes, com mecanismos fisiopatológicos distintos. A acne na mulher adulta pode ser dividida em persistente, quando o quadro inicia-se na adolescência e persiste na vida adulta; e de início tardio, que se inicia após os 25 anos de idade. Sugere-se que a acne com início tardio possa estar relacionada com distúrbios hormonais.1 Nota-se que não só a idade de início é um fator diferenciador das formas de acne, mas também a topografia. Enquanto nas adolescentes as lesões se localizam na porção superior da face e do dorso, a acne da mulher adulta se concentra no mento, ao redor da boca e linha da mandíbula e, em geral, são mais inflamatórias quando comparadas com a acne da adolescência. Outro fato interessante é a piora prémenstrual relatada pelas pacientes.1,8,24 E questionável se a presença de acne isolada persistente seja um sinal de hiperandrogenismo, e os estudos mostram resultados controversos. Logo, devem-se, sempre, buscar informações sobre ciclos menstruais, sinais de hirsutismo, alterações de voz e aumento da libido. O surgimento súbito de acne grave e alterações menstruais deve levantar a suspeita de alterações hormonais. O uso de cosméticos e de certas drogas, em especial andrógenos, corticosteroides, lítio, isoniazida, complexo B, podem levar ao surgimento de acne, devendo sempre ser questionado na história o uso dessas substâncias.1,7 Muitas vezes, a acne pode ser um componente essencial de várias doenças sistêmi­ cas ou síndromes.24,27

Síndrome SAHA Síndrome caracterizada pela associada de seborreia, acne, hirsutismo e/ou alopecia androgenética. Pode ser indicativo de excesso de andrógenos circulantes na mulher, tanto por níveis séricos elevados (hiperandrogenemia) como por uma sensibilidade aumentada do folículo pilossebáceo em responder aos estímulos dos níveis normais de andrógenos circulantes. Pode ser classificada em idiopática, ovariana e hiperprolactinêmica. O excesso de andrógenos é o distúrbio endocrinológico mais frequente nas mulheres com acne, atingindo cerca de 5% a 10% de todas as mulheres na idade fértil, podendo ser causado tanto pelo excesso de produção, como por distúrbios do meta­ bolismo periférico de andrógenos ou pela indução do metabolismo e da ativação dos andrógenos na pele. A glândula sebácea possui todas as enzimas para biossíntese da testosterona, sendo os tecidos periféricos responsáveis por 50% da testosterona circu­ lante na mulher. Os andrógenos causam várias alterações na pele, entre elas aumento do tamanho e número dos lóbulos das glândulas sebáceas, bem como o aumento da secreção sebácea. Os níveis de andrógenos circulantes não se relacionam com a gravi­ dade da acne, indicando que pode haver superprodução na pele.27

Síndrome SAPHO Acrômio de Sinovite, Acne, Pustulose, Hiperostosis e Osteite, a SAPHO é uma síndro­ me rara, subdiagnosticada, com prevalência estimada em menos de 1:10.000, sendo caracterizada pela presença de osteoartropatia com fator reumatoide negativo e ma­ nifestações cutâneas em vários graus como acne/hidroadenite supurativa/foliculite dissecante, psoríase vulgar/psoríase pustular/pustulose palmoplantar, síndrome de Sweet, doença de Sneddon-Wilkinson e pioderma gangrenoso. A severidade da acne

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 231

pode variar de leve a quadros de acne fulminans. As manifestações cutâneas podem pre­ ceder, serem concomitante ou seguirem manifestações osteoarticulares.

TRÊS CRITÉRIOS MAIORES PROPOSTOS PARA A SÍNDROME • Osteomielite multifocal recorrente com ou sem lesões cutâneas • Artrite estéril aguda ou crônica com psoríase pustulosa ou palmoplantar ou acne severa • Osteite estéril na presença de uma das manifestações cutâneas

Não se conhece a etiopatogenia da síndrome, mas o P. acnes parece ter papel importan­ te, e o seu tratamento é pautado na pouca experiência e se baseia em corticosteroides, antiinflamatórios não hormonais, sulfassalazina, metotrexate, ciclosporina A, leflunomida e, mais recentemente, no uso de antifator de necrose tumoral alfa (anti-TNF-a).27

Síndrome PAPA Tríade de artrite piogênica estéril, pioderma gangrenoso, e acne conglobata descrita em várias famílias em 1997. Em 2002, identificou-se o gene CD2-bindingprotein 1 como causador da síndrome. A artrite soronegativa, não axial, pauciarticular, em geral, é o primeiro sintoma em torno de 1 a 16 anos de idade. Na puberdade, surge acne nodular grave, e o pioderma gangrenoso se desenvolve também na adolescência ou na vida adulta. Existe maior prevalência de proteinúria, diabetes insulinodependente, hipogamaglobulinemia, hepatite idiopática e uveíte nestes pacientes. Os corticosteroides podem induzir melhora da acne e do pioderma gangrenoso, já os antibióticos são ineficazes. Sulfassalazina, leflunomida podem melhorar os sintomas articulares e prevenir sua evolução. Dapsona, por seu efeito antineutrofílico, pode ser útil e os anti-TNF-a e o anakinra (receptor recombinante humano de interleucina tipo 1[IL-1]) são promissores.27

D Laboratório Testes microbiológicos são desnecessários na maioria dos casos, já que a bactéria en­ volvida na patogênese da acne é o P. acnes, um anaeróbio gram-negativo que habita normalmente a pele. A foliculite por gram-negativo pode surgir no curso da acne, muitas vezes, causada pelo uso indiscriminado de antibióticos tópicos e sistêmicos, caracterizado por pús­ tulas e nódulos, em geral perioral e perinasal. Como pode ser causada por bactérias resistentes a vários antibióticos, a cultura pode ser útil nestes casos. Avaliação endocrinológica de rotina não é recomendada na acne isolada, e sim nos casos de acne associada a outros sinais de hiperandrogenismo. Nas crianças, este pode manifestar-se como bromidrose (suor com cheiro desagradável), pelos pubianos e axila­ res e clitoromegalia. Nas mulheres, acne de início tardio, irregularidade menstrual, hir­ sutismo, alopecia androgenética, infertilidade, acantose nigricans e obesidade central.26

D Tratamento O tratamento da acne pode ser tópico, sistêmico e, em alguns casos, cirúrgico, podendo associá-los ou não, dependendo da gravidade, adesão do paciente e outros fatores.12

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

Tratamento tópico O tratamento tópico é o de escolha da acne leve a moderada. O uso dos retinoides tópicos, peróxido de benzoíla e combinações destes com antibióticos (eritromicina e clindamicina) são efetivos. A administração de antibióticos, tanto tópicos como sis­ têmicos, isolados deve ser evitada por estar relacionada com resistência bacteriana. O uso de vários agentes agindo em diferentes pontos da patogênese da acne pode ser útil, porém deve-se ter atenção para incompatibilidades químicas que levem à neutraliza­ ção das substâncias.26

Retinoides Sua principal ação é a normalização da descamação do epitélio folicular, impedindo a formação de novos microcomedões e reduzindo os comedões preexistentes. São anti-inflamatórios que agem como imunomoduladores diretos, mas não possuem atividade antibacteriana. Todos os retinoides podem causar eritema, descamação e sensibilidade na pele. A tretinoína foi, durante muito tempo, o único retinoide tó­ pico disponível, mas, por causar irritação, levou ao desenvolvimento de novas molé­ culas, como o adapaleno e a isotretinoína, com efeitos irritantes menores e eficácia semelhante.9’11’12,28

Antibióticos Reduzem o processo inflamatório por diminuir a população de P. acnes, diminuindo, assim, a produção de ácidos graxos livres e a ativação do sistema imune. Podem ser usados por via oral (tetraciclinas e macrolídeos) ou tópica (eritromicina e clindamicina). O uso de antibióticos tópicos isolado ou por períodos prolongados ou associados a antibióticos sistêmicos deve ser evitado pelo risco do surgimento de cepas bacterianas resistentes.9’12’29,30,31’32

Peróxido de Benzoíla E um agente antibacteriano potente e possui pequena ação anti-inflamatória. Por pos­ suir ação antibacteriana, é utilizado em associação com antibioticoterapia tópica ou oral para evitar a resistência bacteriana. A combinação com antibióticos tópicos ou retinoides tópicos potencializa sua ação. Os efeitos adversos mais frequentes são o eritema e a descamação da pele.9’12

Combinações A combinação de antibióticos tópicos (eritromicina e clindamicina) com retinoides ou com peróxido de benzoíla é mais efetiva que as drogas isoladas e reduz o risco de resistência bacteriana.26,33

Outros Acido salicílico é moderadamente eficaz na acne, já o ácido azelaico, apesar de os estudos mostrarem bons resultados, na prática, é bem menos eficaz que os outros agentes. Enxofre, resorcinol, sulfacetamida, cloreto de alumínio e zinco têm pouca evidência científica para o seu uso.26

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 233

Tratamento Sistêmico

Antibióticos Sistêmicos Os antibióticos sistêmicos vêm sendo usados há vários anos no tratamento da acne, sendo o tratamento de escolha na acne moderada a severa e nas formas inflamatórias resistentes a tratamento tópico. Doxiciclina, minociclina, tetraciclina, eritromicina, sulfametoxazol-trimetoprim e azitromicina são eficazes. A doxiciclina e a minociclina são mais eficazes que a tetraciclina. A eritromicina é eficaz, mas seu uso deve ser reser­ vado para casos em que não se possa utilizar tetraciclina (gestantes, crianças menores de 8 anos), por ser comum a resistência bacteriana com seu uso.26 A maior preocupação com o uso de antibioterapia sistêmica é a resistência bacte­ riana, que vem aumentando nos últimos anos, sendo que seu uso deve ser criterioso e por curtos períodos.7,26

Isotretinoína O uso de isotretinoína oral é aprovado para os casos de acne nodular grave resistente ao tratamento. Na prática, ela é utilizada para o tratamento de formas de acne menos gra­ ves, resistentes ao tratamento, que causam cicatrizes tanto físicas quanto psíquicas.26 A isotretinoína oral é o agente inibidor mais potente da produção do sebo em monoterapia e age nos 4 principais fatores patogênicos, sendo o tratamento mais eficaz. O maior problema do seu uso é a teratogenicidade, logo sua prescrição deve ser feita apenas por médicos com experiência no seu manejo, sendo necessário que a paciente assine um termo de consentimento.9,11,12,26,28 Casos de depressão, alterações do humor, ideias suicidas e suicídios foram relatados por pacientes em uso da droga, porém sem relação causal estabelecida. A isotretinoína é um derivado da vitamina A, e os efeitos colaterais são semelhantes aos da hipervitaminose A, como ressecamento de mucosas, hiperostose, fechamento prematuro das epífises, desmineralização óssea. Além disso, aumento do colesterol, triglicerídeos, enzimas hepáticas são frequentes, sendo necessário o acompanhamen­ to laboratorial durante o tratamento.26

Terapia Hormonal A hormonioterapia em casos selecionados é muito útil. A acne na mulher pode persis­ tir por toda a vida adulta, e falhas nos tratamentos tradicionais são frequentes. Falhas terapêuticas são vistas em 79% a 81% das mulheres com o uso de antibióticos e 15% a 30% como uso de isotretinoína oral.7,26 A falha terapêutica, a resistência bacteriana e as limitações do uso da isotretinoína apoiam o uso dos agentes hormonais. Esses agentes podem agir de várias formas: supressão da produção ovariana de andrógenos (contraceptivos orais); bloqueio dos receptores androgênicos (espironolactona, flutamida, acetato de ciproterona); supressão adrenal da produção de andrógenos (corticosteroides) ou inibição da 5-a-redutase (finasterida).7

Contraceptivos Orais Agem inibindo a produção do hormônio folículo-estimulante (FSH) e do hormô­ nio luteinizante (LH), reduzindo, assim, a produção de andrógenos. Os que contêm estrógenos na fórmula possuem ainda um efeito antiandrogênico secundário por

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

aumentar os níveis de SHBG. Os contraceptivos transdérmicos ou anéis vaginais não possuem estudos controlados no tratamento da acne.7)26)34

Espironolactona Seu efeito antiandrogênico se deve ao bloqueio competitivo de receptores quando uti­ lizado em altas doses. A dose recomendada é de 50 mg a 200 mg/dia.Os efeitos adver­ sos mais frequentes são: hipercalemia, hipotensão arterial, alterações menstruais, dor e aumento mamário, cefaleia e letargia. Não é uma terapia de primeira escolha, sendo mais utilizada nos casos de falha à terapêutica tradicional ou de acne associada à hiperandrogenismo com alterações menstruais, piora pré-menstrual, aumento recente do hirsutismo ou seborreia, níveis séricos elevados de andrógenos ou à distribuição da acne na porção inferior da face, linha da mandíbula e pescoço.1)7)24)26

Flutamida Seu uso em mulheres levando à ocorrência de hepatite fulminante motivou alerta da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVIS A), ratificando a única indicação te­ rapêutica aprovada no Brasil e em outros países: o tratamento de câncer de próstata em estágio avançado.35

Ciproterona Primeiro bloqueador de andrógeno bem-estudado no tratamento da acne. Sua asso­ ciação com etinilestradiol (sob a forma de um contraceptivo oral) teve eficácia com­ provada no tratamento de mulheres com acne. Seu uso em doses maiores (50 mg a 100 mg/dia) é eficaz no tratamento da acne e do hirsutismo.7,24)26

Finasterida Os estudos não mostram efeito no tratamento da acne.7,26

ALOPECIA ANDROGENÉTICA FEMININA □

Introdução

A queda dos cabelos é preocupante, porque a primeira palavra lembrada quando se fala no assunto é desespero,36 por isso ela deve ser interpretada sempre como uma entidade clínica, devido à interação entre saúde e estética. Alopecia (gr. Alopekia pelada, de alópex raposa) androgenética (gr. Andro homem, gr. Gênica transmissão por genes) (AAG) é uma condição genética comum de queda dos cabelos, tanto nas mulheres quanto nos homens, provocada pela ação dos andró­ genos circulantes.37 Esclarecemos que há outros tipos de alopecias sem qualquer cono­ tação com fatores hormonais como areata ou cicatriciais. No caso da AAG, há um afinamento progressivo levando à perda dos cabelos e, por volta dos 50 anos, ela ocorre em ambos os sexos, de 20% a 53% nas mulheres e de 50% nos homens.38,39 Ela é sempre determinada geneticamente, mas, na mulher, além do fator genético, associa-se tam­ bém à presença de endocrinopatias androgênicas.40 A AAG é a forma mais comum de queda dos cabelos e, pela elevada frequência, é considerada, algumas vezes, um sinal

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 235

fisiológico de envelhecimento; mas, apesar disso, causa forte impacto psicossocial nos pacientes.41,42



Patogênese

A AAG é andrógeno-dependente, devida a um gene único autossômico e dominante com penetrancia variável e reduzida no sexo feminino,42 para alguns autores, ela ocor­ re em 50% dos homens e das mulheres.43,44 Mas a herança mendeliana não surge de forma tão simples. Em 1984, Kuster & Happle45 estudaram o traço autossômico domi­ nante e consideraram-na um exemplo clássico de origem poligênica. O fator genético irá determinar tanto a densidade quanto a distribuição dos folículos pilosos no couro cabeludo com sensibilidade específica aos andrógenos e seus próprios receptores fi­ nais sensibilizados.46 A calvície feminina pode ter início na puberdade e, nas mulheres mais precoce­ mente afetadas, pode progredir por décadas. Os mecanismos etiológicos fundamen­ tais na AAG são, em princípio, os mesmos no homem e na mulher, outros diferem47 assim como a expressão fenotípica. Na puberdade, surge uma modificação hormo­ nal em que os andrógenos atuam no interior dos folículos pilossebáceos, genetica­ mente programados e, no homem, em geral, surge uma recessão bitemporal com predomínio no vértex, podendo evoluir para uma absoluta calvície na área afetada. Nas mulheres, a linha de implante dos cabelos fica preservada e ocorre um afinamento progressivo no topo do couro cabeludo. Essa modificação biológica do pelo leva à progressiva diminuição do tempo da sua fase de crescimento, ciclo após ciclo. O cabelo terminal entra em processo de repouso e cai a cada 4 anos, em média, retor­ nando com menor espessura para durar mais 4 anos ou menos. O pelo possui 3 ciclos de desenvolvimento; a fase anágena ou de crescimento que dura em média 4 a 6 anos no sexo feminino, seguida de uma fase de transição ou catágena, quando o pelo para de crescer, durando de 15 a 20 dias, e, finalmente, a terceira fase telógena, na qual, em geral, o pelo se desprende por um período de 2 a 3 meses. Cerca de 90% dos folículos estão na fase anágena; 1% na fase catágena e 8% a 10% na fase telógena. Na AAG há progressiva miniaturização, e não destruição do folículo piloso envol­ vido. Os folículos afetados apresentam-se com número maior na fase telógena e dura­ ção menor na fase anágena. Quanto à embriogênese dos cabelos, Ziller48 encontrou diferenças na origem entre os situados na região frontoparietal e os da região occiptotemporal. A derme da região frontoparietal é derivada da crista neural, e a da região occiptotemporal, do mesoderma. A diferença embriológica poderá influenciar as respostas dos folículos pilosos no que se refere à terapêutica da AAG. Os diversos andrógenos e suas diferentes concentrações irão determinar a perda ou o crescimento dos pelos em áreas específicas da superfície corporal em ambos os sexos. O crescimento de pelo axilar e pubiano é testosterona-dependente, enquanto o crescimento do pelo da barba e a perda dos cabelos que ocorre na AAG são DHTdependentes.44 A transformação da testosterona em DHT requer a presença de uma enzima, a 5-a-redutase. Pelo fato de as enzimas esteroides estarem presentes no órgão-alvo folicular, a interconversão de andrógenos pode ocorrer no folículo piloso. Esta enzima apresenta 2 subtipos, e os órgãos-alvo onde cada um é encontrado em

236 Endocrinologia Feminina e Andrologia

maior concentração são controversos. A 5-a-redutase tipo 2 está presente na bainha radicular externa do folículo piloso e na papila dérmica. A expressão dessa enzima no couro cabeludo calvo, em contraste com sua ausência no couro cabeludo não calvo ou occipital, explica a sua participação na patogenia da AAG.49,50

D Aspectos clínicos O padrão mais comum na AAG feminina é o de afinamento difuso ou rarefação dos cabelos da região frontoparietal, com preservação da linha de implante frontal do cou­ ro cabeludo. Com a rarefação dos pelos, ocorre alargamento da divisão central dos cabelos, con­ figurando um padrão em “arvore de Natal”.51 A medida da largura da divisão central pode ser utilizada para classificação da gravidade da AAG (Figura 16.3). O padrão Ludwig52 (Figura 16.4) tem 3 estágios, o primeiro apresenta alargamento discreto da

FIGURA 16.3 Paciente com AAG padrão em árvore de natal. À esquerda em 2002, com 22 anos; e à direita em 2012, com 31 anos.

FIGURA 16.4 Padrão Ludwig de alopecia feminina.52

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 237

linha de divisão frontoparietal do couro cabeludo; no segundo, há rarefação mais in­ tensa e, no terceiro estágio, a rarefação é marcante.53,54 Ocasionalmente, as mulheres podem apresentar um quadro de AAG similar à que acontece nos homens, que vem a ser a forma de padrão masculino, em que há reces­ são da linha de implante dos cabelos na região temporal e pode ser caracterizada de acordo com a classificação de Hamilton, como AAG do padrão masculino.55,56 Este tipo é mais frequente nas mulheres no período pós-menopausa, apesar de que, ao con­ trário dos homens, elas não irão ficar completamente calvas.57 Muitas vezes, além da rarefação nas áreas afetadas, elas percebem que os seus cabelos estão mais finos e não crescem tanto quanto antes.54 A AAG feminina pode surgir em qualquer momento após a puberdade. Em geral, ela se inicia entre a segunda e quarta décadas de vida, no período pré-menopausa, ou a qualquer momento por uma disfunção hormonal. Deve-se estar atento porque, apesar de os andrógenos serem necessários para provocar a miniaturização folicular, muitas mulheres com AAG apresentam níveis séricos normais dos mesmos.58,59 Mas não podemos afastar um quadro de hiperandrogenismo se há história de alterações menstruais, hirsutismo, acne grave e/ou outros sinais e sintomas. A AAG feminina e masculina é considerada fator de risco cardiovascular, já que os pacientes apresentam maior risco de síndrome metabólica e possuem placa de ateroma de carótidas. Alguns autores recomendam a investigação da parte metabólica e a ultrassonografia de carótida nesses pacientes como medida preventiva, já que essas alterações podem ser encontradas em 60% dos homens e quase 50% das mulheres com AAG de início precoce.60

Diagnóstico diferencial Nas mulheres, algumas vezes, o diagnóstico não é tão simples, porque temos de ex­ cluir outros tipos de alopecia, como areata e eflúvio telogeno. Caso a AAG tenha um início precoce, devemos pensar na possibilidade de hiperandrogenismo. A maior dificuldade é observar pacientes com real AAG, já que, muitas vezes, a ava­ liação clínica isolada não permite o diagnóstico das formas clínicas iniciais, havendo necessidade de biopsia confirmatória.61

Q Terapêutica O tratamento tanto poderá ser clínico quanto cirúrgico.

Tratamento clínico O principal objetivo consiste em diminuir a atividade androgênica nos folículos: blo­ queando a transformação da testosterona em DHT, como os inibidores da 5-a-redutase (finasterida), bloqueando o receptor androgênico (espironolactona, acetato de ciproterona, flutamida), ou equilibrando a relação entre andrógenos e estrógenos (17 alfaestradiol). Entre os modificadores biológicos, encontramos o minoxidil.

Finasterida Inibidor seletivo da enzima 5-a-redutase tipo 2 que faz a conversão periférica da tes­ tosterona em DHT.62 Ela é um potente e competitivo inibidor sem afinidade pelos

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

receptores androgênicos, não tendo ação androgênica, antiandrogênica, estrogênica, progestacional ou de outros esteroides.63 O seu emprego no sexo masculino teve início em 1986.64 As evidências revelaram que os pacientes que apresentavam grande quantidade da enzima 5-a-redutase tipo 2 possuíam próstata hiperplásica com altas taxas de DHT; por outro lado, os indivíduos com deficiência genética dessa enzima nasciam com genitália ambígua, apresentavam baixos níveis de DHT circulante, não tinham cresci­ mento da próstata nem AAG. A finasterida foi inicialmente desenvolvida para tratar os indivíduos com hiperplasia prostática benigna (HPB). Diversos ensaios clínicos com finasterida confirmam o efeito benéfico na AAG mas­ culina, mas não na feminina. O emprego da finasterida para as mulheres, na posolo­ gia de 2,5 mg por dia, foi aventado em um estudo clínico que mostrou uma resposta satisfatória.65

Bloqueadores do receptor androgênico Nas mulheres com excesso de andrógenos, o uso de drogas que bloqueiam a produção ou a utilização celular desse hormônio poderá ser útil. Elas compreendem pílulas contraceptivas orais combinadas que irão diminuir a produção androgênica ovariana e suprarrenal;66,67 para os casos em que haja alterações andrógeno-dependentes, empre­ gamos um anovulatório que possua um progestógeno não androgênico. Temos ainda antiandrogênios sistêmicos, como a espironolactona em doses iguais ou superiores a 100 mg/dia e o acetato de ciproterona, que mostram alguma eficácia. São modificado­ res da transformação de andrógenos em estrogenos.

Alfaestradiol Age in vitro, reduzindo a formação de DHT e aumentando a conversão de testosterona em androstenediona e estrona. Utilizado de forma tópica há mais de 10 anos, contu­ do ainda se questiona sua absorção folicular in vivo> e a demonstração de sua eficácia ainda carece de estudos controlados.

Minoxidil E um modificador biológico, cujo mecanismo de ação no crescimento do cabelo é incerto. Não apresenta efeito hormonal ou imunossupressor, possui ação mitogênica observada em células epidérmicas cultivadas e prolonga o tempo de vida dos queratinócitos. O sulfato de minoxidil (SM) tem sido identificado como o metabólico ativo respon­ sável pela estimulação do folículo.35 A conversão do SM é muito maior no folículo do que na epiderme e/ou derme. Ele é derivado da piperidinopirimidina, que atua como vasodilatador na musculatura lisa arteriolar no tratamento da hipertensão arterial. O minoxidil reverte o processo de miniaturização do pelo na AAG ao normalizar o ciclo do folículo.36 O aumento no tempo da fase anágena resultaria em hipertrofia folicular.71 A ação somente se produz nos folículos em fase de miniaturização, mas não completamente miniaturizados, ou seja, folículos que têm um diâmetro pequeno, curto (0,5 cm a 2 cm) e hipopigmentado; ele não estimula os folículos normais.72 O minoxidil sincroniza os ciclos foliculares, especialmente nos dois primeiros anos de tratamento.

Capítulo 16 Acne e alopecia androgenética feminina 239

A solução de minoxidil é encontrada na concentração de 2% e 5%, podendo ser usada tanto no homem quanto na mulher portadora de AAG. Evita-se o uso de maior concentração no sexo feminino pelo risco de hipertricose facial, apesar de a resposta ser melhor e mais rápida que a 2%.73

Tratamento cirúrgico O tratamento cirúrgico vem evoluindo muito nos últimos anos.74 A cobertura cosmé­ tica fica limitada pela quantidade e pela densidade do cabelo doador occipital dispo­ nível. Atualmente realiza-se a técnica dos microenxertos (1 a 2 fios de cabelo por cada enxerto) do cabelo doador para preencher a área calva.



Miscelânea

Existem no mercado diversos medicamentos e nutracêuticos indicados para queda de cabelos sem estudos clínicos que comprovem eficácia. A simples reposição vitamínica é um mito, embora a prescrição com pouco embasamento em avaliações clínicas ou a pedido do paciente seja comum na prática diária. Poucos estudos clínicos criteriosos foram realizados, entre os quais alguns avaliam doenças diversas, muitas vezes agru­ padas como “queda dos cabelos”, englobando eflúvio/AAG de forma indistinta.75 • T erap ia co m luz: o uso de laser erbium ou laser diodo de baixa frequência e até mesmo

o uso de diodo emissor de luz (LED) vermelha vêm sendo descritos76 como eficazes e seguros em alguns relatos de casos. Essas opções não devem ser as de primeira escolha, pois carecem ainda de mais estu­ dos clínicos que confirmem ou não sua eficácia para o tratamento da AAG feminina. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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1 5 5 0 n m fra c tio n a l erb iu m -g lass laser in

M e etin g o f th e H a ir R esearch S o cie tie s (in

fem ale p a tte rn h a ir loss. JE A V D . 2 0 1 1 ; 2 5 :

press); apud Fied ler VC; C am ara C R T o p ical

1450-4.

17

Hirsutismo

J o s é A n t o n io M ig u e l M a r c o n d e s

IN T R O D U Ç Ã O

O pelo se origina do folículo piloso, que juntamente com a glândula sebácea e o mús­ culo arrectorpili constituem a unidade pilossebácea. Há aproximadamente 5 milhões de folículos pilosos cobrindo toda a superfície corporal, exceto as regiões palmares e plantares e os lábios, sendo que aproximadamente 100 mil a 150 mil estão localiza­ dos no couro cabeludo.1 Após o nascimento, o número de folículos é constante, não havendo a formação de novos até cerca de 40 anos de idade, quando começa a ocorrer um decréscimo de seu número.2 Estruturalmente, há 3 tipos de pelos: lanugo, viloso e terminal. Lanugo é um pelo delgado e não pigmentado, que cobre toda a superfície do feto e que, em geral, regri­ de em 1 a 3 meses pós-parto. O viloso é também delgado e pouco ou sem pigmento, porém com um comprimento maior que o lanugo. O pelo terminal é longo, espesso e pigmentado, sendo encontrado comumente em ambos os sexos, nas sobrancelhas, cílios, regiões axilares e pubianas e couro cabeludo. No homem, constitui a maior parte dos pelos corporal e facial. A diferença visual da pilosidade corporal entre ho­ mens e mulheres não se relaciona com o número de folículos pilosos, mas sim com o tipo e a qualidade do pelo em cada folículo. De fato, a concentração de folículos pilosos varia de acordo com a raça, mas para uma mesma raça, ela é constante, inde­ pendentemente do sexo. O crescimento do pelo se faz por meio de um ciclo constituído por 3 fases: anagen (fase de crescimento), catagen (fase de involução) e telogen (fase de repouso).2 Nos seres humanos, há uma assincronia entre essas fases, dando a impressão de um cres­ cimento contínuo dos pelos. A duração da anagen varia de acordo com a localização da unidade pilossebácea. No couro cabeludo, pode variar de 2 a 6 anos, enquanto no restante do corpo, varia de 3 a 6 meses. Já a duração das fases de catagen e telogen independentemente da localização da unidade folicular, variam de 2 a 3 semanas a 3 a 4 meses respectivamente. Alterações importantes da dinâmica de crescimen­ to de pelos decorrem de modificações na duração da anagen: um prolongamento é observado quando o pelo viloso se transforma em terminal, como no hirsutismo, enquanto uma diminuição resulta em queda do pelo, como acontece na alopecia androgenética. Em resposta a diferentes estímulos, como citocinas, fatores de crescimento e hor­ mônios, p. ex., hormônio estimulador da tireoide (TSH) e hormônio de crescimento (HC), mas principalmente dos andrógenos, as unidades pilossebáceas diferenciam-se

244 Endocrinologia Feminina e Andrologia

em folículos pilosos ou folículos sebáceos, sendo que, no folículo piloso, o pelo pode transformar-se de viloso em terminal.3 O grau de sensibilidade androgênica e a morfo­ logia de cada unidade pilossebácea (folículo piloso ou sebáceo) são determinados pela sua localização. Por outro lado, além de determinar o crescimento do pelo terminal, os andrógenos tem um efeito diverso sobre a fase de anagen: enquanto no couro ca­ beludo a diminuem, no restante do corpo, são responsáveis por um prolongamento dessa fase. Na mulher, os principais andrógenos na circulação são o sulfato de deidroepianrosterona (DHEAS), a deidroepianrosterona (DHEA), a androstenediona, a testosterona e a di-hidrotestosterona (DHT), em ordem decrescente de concentração. Entretanto, somente a testosterona e a DHT se ligam ao receptor androgênico, sendo o DHEAS, a DHEA e a androstenediona considerados como pró-hormônios. As adrenais e as gônadas são as glândulas que dispõem de todas as enzimas necessárias para a síntese dos hormônios esteroides, do qual fazem parte os andrógenos, a partir do colesterol, denominando-se esse processo esteroidogênese. Uma vez sintetizados, os andrógenos são secretados, circulando sob uma forma livre e uma forma ligada a proteínas trans­ portadoras, representadas pela albumina e principalmente pela sex hormone-binding glo­ bulin (SHBG), e sendo metabolizados a produtos inativos ou a esteroides com maior ou menor atividade androgênica. Na mulher, 50% da testosterona circulante tem origem na conversão periférica, principalmente no tecido adiposo, e o restante origina-se igualmente das adrenais e dos ovários.4 Tanto a glândula sebácea quanto o folículo piloso são equipados com todas as enzimas necessárias para a síntese e o metabolismo dos andrógenos,5 moti­ vo pelo qual os andrógenos circulantes não refletem necessariamente a concentração local de andrógenos na unidade pilossebácea. O principal andrógeno ativo na uni­ dade pilossebácea é a DHT, originada localmente pela ação da enzima 5-a-redutase, tendo como principal substrato a testosterona no homem e a androstenediona na mulher.6 Essa conversão é importante, uma vez que a DHT é 3 vezes mais potente que a testosterona, por se ligar com maior afinidade ao receptor androgênico.7A ativi­ dade 5-a-redutase decorre da atividade de 2 isoenzimas, tipo 1 e tipo 2, codificadas por genes distintos e com diferentes características bioquímicas. Essas isoenzimas estão distribuídas por vários tecidos corporais, como testículo, próstata, pele da região genital,8 mas existem controvérsias sob sua concentração exata na unidade pilossebácea.9,10 H I R S U T I S M O : ID E N T IF IC A Ç Ã O E D IA G N Ó S T IC O D IF E R E N C IA L

O hirsutismo se caracteriza pela presença, na mulher, de uma quantidade excessiva de pelos terminais em locais onde normalmente não são encontrados, obedecendo a uma distribuição tipicamente masculina. Decorre da interação entre a concentração dos andrógenos circulantes, a concentração de andrógenos no folículo piloso e a sen­ sibilidade deste aos andrógenos. A presença do hirsutismo tem sido identificada pelo emprego da escala de Ferriman e Gallwey.12 De acordo com a publicação original, a presença e a quantidade de pelos foram avaliadas em uma escala de 0 a 4, em 11 áreas corporais. Os autores obser­ varam que, em mulheres jovens, uma quantidade significativa de pelos foi encontrada em braços e pernas, enquanto nas demais áreas, a quantidade foi quase nula. A partir

Capítulo 17 Hirsutismo 245

IMPORTANTE É im p o rta n te sa lie n ta r q u e o h irsu tis m o é u m sin al, sen d o u m a das m a n ife sta çõ e s d a sín d ro m e h ip e ra n d ro g ê n ic a . E ssa sín d ro m e e n g lo b a p a to lo g ia s q u e a p re se n ta m , em c o m u m , a p re se n ça de sin a is e s in to m a s de ex cesso a n d r o g ê n ic o .11 N a m u lh e r, as m a n ife s ta ç õ e s in c lu e m , a lém do h ir s u tis m o , a a cn e e a a lo p e c ia a n d ro g e n é tic a , a d is fu n ç ã o m e n s tru a l, a in fe rtilid a d e , o a b o r ­ ta m e n to p reco ce e os sin a is de v iriliz a çã o (a tr o fia do p a rê n q u im a m a m á rio , a lte ra çã o d a to n a ­ lid a d e d a voz, re d is trib u iç ã o de m a ssa s m u sc u la re s e c lito ro m e g a lia ).

dessa observação, propuseram que um escore hormonal poderia ser obtido por meio da quantificação dos pelos em 9 das 11 áreas avaliadas (com exclusão da perna e do braço). Essa escala que considera apenas 9 áreas tem sido referida como sendo de Ferriman e Gallwey modificada13 (Figura 17.1), adotando-se como limite da normalidade um escore menor que 8, o que representa o percentil 95 dos dados originariamente publicados por Ferriman e Gallwey.12 Para mulheres asiáticas, devido à menor preva­ lência de hirsutismo em pacientes com hiperandrogenemia, sugere-se, como limite de corte, um escore menor ou igual a 6.14 O hirsutismo deve ser diferenciado da hipertricose, condição decorrente de um crescimento excessivo de pelo tipo viloso, localizada ou generalizada, de natureza genética ou adquirida, decorrente do uso de drogas como fentoína, glicocorticoide,

FIGURA 17.1 Graduação do hirsutismo de acordo com a escala de Ferriman e Gallwey. A presença de pelos em 9 áreas do corpo consideradas andrógeno-sensíveis são graduadas de 0 (ausência de pelo terminal) a 4 (presença abundante de pelo terminal).

246 Endocrinologia Feminina e Andrologia

minoxidil ou ciclosporina.15 Eventualmente, pode ocorrer presença de pelo terminal, mas obedecendo à distribuição feminina de pelos. Embora a hipertricose independa da presença de andrógenos, a hiperandrogenemia pode agravar a hipertricose. ■

S ÍN D R O M E S H IP E R A N D R O G Ê N IC A S : D IA G N Ó S T IC O E T IO L Ó G IC O

Uma vez identificada a presença do hirsutismo, torna-se necessário o seu diagnóstico etiológico. Uma abordagem prática consistir em dividir as síndromes hiperandrogênicas em 2 grupos, virilizantes e não virilizantes, de acordo com a presença ou ausência dos sinais e sintomas de virilização (Figura 17.2). Essa divisão é importante, pois identifi­ ca um grupo de risco para a presença de tumores secretores de andrógenos utilizan­ do apenas dados clínicos, uma vez que as síndromes hiperandrogênicas virilizantes compreendem patologias de etiologia neoplásica (os tumores adrenais e ovarianos viri­ lizantes) e funcional (a forma clássica de hiperplasia adrenal congênita e a hipertecose de ovário ou hiperplasia do estroma cortical). Já as síndromes hiperandrogênicas não virilizantes compreendem patologias de etiologia apenas funcional, como a forma não clássica de hiperplasia adrenal congênita, o hiperandrogenismo (hirsutismo) idiopático e

+ Tumor adrenal SÍNDROMES VIRILIZANTES

Imagem adrenal

- Tumor de ovário Hipertecose de ovário

Á Sim

SÍNDROMES HIPERANDROGÊNICAS

Virilização?

> 17 ng/mL

Não

SÍNDROMES . NÃO VIRILIZANTES

17-OHP pós estímulo

10 a 17 ng/mL

Forma não clássica 21-OHase

Sequenciamento gênico Hirsutismo idiopático

pós-estímulo < 10 ng/mL Síndrome dos ovários policísticos

;

Avaliação metabólica

17-OHP: 17-hidroxiprogesterona. 21-OHase: 21 -hidroxilase.

FIGURA 17.2 Fluxograma diagnóstico das síndromes hiperandrogênicas.

Capítulo 17 Hirsutismo 247

a síndrome dos ovários policísticos (SOP). Em geral, pacientes com síndrome virilizante apresentam uma concentração de testosterona total maior que 200 ng/dL, enquanto aquelas com síndrome hiperandrogênica não virilizante apresentam uma concentração de testosterona normal ou pouco elevada, geralmente menor que 200 ng/dL.16

D Tumores virilizantes Os tumores virilizantes são raros,17 representados principalmente pelos tumores ovarianos derivados dos cordões das células sexuais e pelos adenomas e carcino­ mas adrenais. Os tumores adrenais, em geral, não são palpáveis, mas são facil­ mente identificados por métodos de imagem, como a tomografia computadori­ zada. Já os tumores virilizantes ovarianos apresentam uma variação significativa de tamanho, sendo, muitas vezes, de difícil visualização. O método de escolha é a ultrassonografia pélvica, de preferência pela via endovaginal. Um recurso também promissor é o PET-CT.

Q

Hipertecose do ovário

O termo hipertecose do ovário, ou hiperplasia do estroma ovariano, refere-se a um achado histopatológico caracterizado por ilhas de células da teca luteinizadas localizadas no estroma ovariano, entre coleções de pequenos folículos atrésicos. É um sinal e não uma categoria específica de doença. Pode ser encontrada tanto em adolescentes ou mulheres adultas jovens, associada à resistência à insulina grave ou por meio de uma forma leve na pós-menopausa, representando diferentes me­ canismos etiopatogênicos. Quando presente na mulher adulta jovem, em geral, associa-se à resistência à insulina, que tem como marcador clínico importante a acantose nigricans.

D

Hiperplasia adrenal congênita

A hiperplasia adrenal congênita compreende um grupo de doenças hereditárias com herança autossômica recessiva, decorrente de mutações em genes codificado­ res de enzimas envolvidas na síntese do cortisol. Pode se manifestar desde a época do nascimento, pela genitália ambígua na menina ou por macrogenitossomia no menino, ou mais tardiamente, na infância, adolescência ou idade adulta, recebendo a denominação de forma não clássica.18 Nessa forma, pode ter uma apresentação variável, como pubarca precoce, hiperandrogenismo, principalmente o hirsutismo e a acne e raramente a alopecia, simulando o hiperandrogenismo idiopático, ou ainda por meio de uma associação de sinais e sintomas semelhantes à encontrada na SOP.

D

Hiperandrogenismo idiopático

O conceito de hiperandrogenismo idiopático tem-se modificado ao longo do tempo.3 Inicialmente, foi caracterizado como hirsutismo, acne ou alopecia de causa desconhe­ cida, após a exclusão de outras causas de síndromes hiperandrogênicas. Um conceito atual e estrito é aquele que caracteriza o hiperandrogenismo idiopático pela presença de hiperandrogenismo associado a ciclos menstruais regulares e ovulatórios na pre­ sença de normoandrogenemia e ultrassonografia de ovários normal, com exclusão de outras causas de hirsutismo.

248

D

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Síndrome dos ovários policísticos

A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é uma das endocrinopatias mais comuns, afetando aproximadamente de 5% a 7% das mulheres na idade reprodutiva.18 Consi­ derada, até o fim do século passado, uma desordem da esfera reprodutiva (pela pre­ sença do distúrbio menstrual e consequente infertilidade) e estética (pela presença das manifestações hiperandrogênicas), hoje é entendida também como um impor­ tante fator de risco cardiovascular.19 Possivelmente, o elo entre as condições associa­ das e a síndrome seja a resistência à insulina, presente independentemente do índice de massa corporal, mas com um efeito aditivo importante da obesidade. Entretanto, não está indicada a sua pesquisa por meio de índices que avaliam a sensibilidade à insulina nem com finalidade diagnóstica e, muito menos, com finalidade terapêuti­ ca. Por outro lado, devido à alta prevalência de distúrbios metabólicos e da própria síndrome metabólica,20'22 todas as pacientes devem ser rastreadas para dislipidemia, representada principalmente por uma redução da concentração do HDL-colesterol e menos frequentemente pela hipertrigliceridemia, e para anormalidades do meta­ bolismo dos hidratos de carbono, por meio de teste de tolerância oral à glicose, mais sensível que a glicemia de jejum para essa finalidade, principalmente em pacientes com índice de massa corporal normal20 (Figura 17.3). Uma variedade de combinação de sinais e sintomas é a regra em pacientes porta­ doras da síndrome, principalmente aqueles relacionados com a esfera reprodutiva.11 Com a finalidade de uniformizar o diagnóstico da SOP, vários documentos foram elaborados nesses últimos anos. Pela frequência com que são citados na literatura, ressaltam-se 3, resultantes da combinação das características fundamentais da sín­ drome: hiperandrogenemia, hiperandrogenismo, disfunção menstrual e morfologia ovariana policística identificada por ultrassonografia23'25 (Tabela 17.1). Um ponto concordante desses consensos sobre a SOP é que se trata de uma síndrome e não uma doença específica. Consequentemente, nenhum critério isolado é suficiente para o seu diagnóstico clínico, sendo, portanto, um diagnóstico de exclusão.

■ Glicemia de jejum ■ Glicemia após sobrecarga

Normal

Sobrepeso

Obesidade

FIGURA 17.3 Prevalência dos distúrbios do metabolismo dos carboidratos de acordo com a glice­ mia de jejum ou glicemia após sobrecarga com glicose, em função do índice de massa corporal em pacientes brasileiras portadoras da SOP.20

Capítulo 17 Hirsutismo 249

TABELA 17.1

Consensos sobre o diagnóstico da síndrome dos ovários policísticos

NIH, 1 9 9 0 23

Rotterdam, 200324

AES, 200625

Os 2 c rité rio s:

2 d os 3 c rité rio s:

O s 2 crité rio s:



D is fu n ç ã o m e n s tru a l





H ip e ra n d ro g e n is m o o u



D is fu n ç ã o m e n s tru a l



H ip e ra n d ro g e n is m o o u h ip e ra n d ro g e n e m ia

h ip e ra n d ro g e n e m ia •

O v ário s p o lic ís tic o s *

D is fu n ç ã o m e n s tru a l o u o v ário s p o lic ís tic o s *



H ip e ra n d ro g e n is m o o u h ip e ra n d ro g e n e m ia *

+ E x clu s ã o o u tra s ca u sa s

* Identificado por ultrassonografia pélvica com presença de 12 ou maisfolículos com menos de 10 mm de diâmetro e/ou aumento do volume ovariano (> 10 cm3). NIH: National Institutes of Health, AES:Androgen Excess Society

IN V E S T IG A Ç Ã O D O H I R S U T I S M O

A investigação deve ser realizada em pacientes sem uso, há pelo menos 3 meses, de contraceptivos hormonais ou outros medicamentos que possam interferir no quadro clínico, laboratorial ou de imagem. Devem-se excluir doenças que possam evoluir com sinais e sintomas de síndrome hiperandrogênicas, como síndrome de Cushing, hiperprolactinemias e, com menos frenquência, hipotireoidismo e acromegalia, bem como a iatrogenia. A identificação dos sintomas e sinais de virilização é fundamental, por ser um dado clínico que permite a subdivisão das síndromes hiperandrogênicas em virilizantes e não virilizantes. A apresentação isolada de um desses sinais ou sintomas ou a presença dos mesmos associada a ciclos menstruais regulares é um marcador pouco sensível para o diagnóstico das síndromes virilizantes. Já a presença desses sinais e sintomas, especialmente com instalação rápida e progressiva, associados ou não, em uma pa­ ciente com amenorreia, deve alertar para a existência de síndrome virilizante, sobretu­ do de etiologia tumoral, até que se prove o contrário. Uma causa frequente de hiperandrogenismo (principalmente a acne e, menos comum, hirsutismo e alopecia) é a iatrogenia, que pode desencadear quadros va­ riáveis, inclusive de virilização com aumento de testosterona total. Os principais deles, na prática clínica, são as medicações com substâncias esteroides, sejam glicocorticoides, contraceptivos hormonais ou anabolizantes com efeito androgênico. E importante investigar se a paciente está utilizando medicamentos inalatórios, cremes dermatológicos ou ginecológicos e outras formulações tópicas que contenham esteroides. A idade do início do quadro clínico e o perfil menstrual podem orientar o diagnós­ tico. Quando se inicia antes da menarca, é possível que seja decorrente de hiperplasia adrenal congênita ou tumores virilizantes, enquanto o início na perimenarca sugere a SOP. A apresentação de distúrbio menstrual afasta a etiologia idiopática. Entretanto, no caso de ciclos regulares, deve-se investigar a presença de ovulação, por meio da do­ sagem de progesterona no 21Qdia do ciclo. No exame físico, a obesidade, principalmente do padrão androide, deve ser valo­ rizada. Pode ser identificada pela medida da circunferência abdominal (> 88 cm) ou

250

Endocrinologia Feminina e Andrologia

pela relação entre a circunferência da cintura e a do quadril (> 0,85). Sua presença é um importante fator de piora de distúrbi o metabólico na SOP (Figura 17.3). A presença de acanto se nigricans deve ser valorizada, por ser um marcador impor­ tante de resistência à insulina. Todavia, é mais facilmente identificável em mulheres pardas, situação que pode não necessariamente estar relacionada com a diminuição significativa da sensibilidade à insulina. A galactorreia e a hiperprolactinemia verda­ deira (hiperprolactinemia com pesquisa de macroprolactina negativa) devem alertar para o aparecimento de tumores hipofisários secretores de prolactina. Um aspecto importante em uma paciente com síndrome hiperandrogênica é a de­ monstração de concentração aumentada de andrógenos no sangue, sendo a testosterona total e a testosterona livre os principais andrógenos considerados úteis para identificação da hiperandrogenemia, seguidos pela DHEAS e pela androstenediona. Embora o padrão-ouro para a dosagem de testosterona livre seja o método de diálise de equilíbrio, na prática clínica, utiliza-se a fórmula de Vermeulen,26 pela qual se ob­ tém a testosterona livre a partir das concentrações da testosterona total e da SHBG. O cálculo pode ser realizado pelo site: . Vários métodos encontram-se disponíveis para a dosagem de testosterona total, sendo os mais utilizados o radioimunoensaio e o enzimaimunoensaio. Entretanto, o coeficiente de variação é significativo (entre 10% e 20%), sendo tanto maior quanto me­ nor a concentração de testosterona, especialmente para valores inferiores a 250 ng/dL,26 e não há um padrão de referência universal. Para uma mesma amostra, dosadas em laboratórios diferentes, pode haver uma variação, de 2 a 6 vezes, da concentração.27 Levando-se em consideração essas observações, é preciso ter cautela para se valori­ zar um aumento da concentração de testosterona, sobretudo em pacientes sem sinais clínicos de excesso androgênico. Uma dificuldade adicional com relação à dosagem dos andrógenos decorre da ausência de valores de referência estabelecidos para cada população e faixa etária. O rastreamento da forma não clássica de hiperplasia adrenal congênita por deficiência da 21-hidroxilase (21-OHDase) se faz pelo diagnóstico da 17-hidroxiprogesterona (17-OHP), substrato dessa enzima. Embora alguns autores preconizem o uso da dosagem basal, utilizamos a de 17-OHP, 1 hora após a administração do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) sintético EV, em bolus, por permitir uma maior discriminação entre portadores e não portadores da doença. Uma concentra­ ção maior que 17 ng/mL é compatível com esse diagnóstico, enquanto valores entre 10 e 17 ng/mL necessitam da confirmação do diagnóstico pelo sequenciamento do gene da 21-OHDase.28 Considerando a frequência da SOP na etiologia das síndromes hiperandrogênicas, sobretudo quando da presença de hirsutismo, é obrigatória a realização de ultrassonografia pélvica ou transvaginal. Em mulheres com ciclos menstruais regulares, a ultrassonografia deve ser realizada na fase folicular precoce, enquanto em mulheres com distúrbio menstrual, pode ser realizada aleatoriamente ou após 3 a 5 dias de fluxo menstrual induzido pela administração de progesterona. Se houver evidência de um folículo dominante (> 10 mm), o exame deve ser repetido. A identificação do ovário policístico deve obedecer a critérios diagnósticos es­ tritos e não somente se apoiar na aparência multicística ou policística do ovário29 (Tabela 17.1). Entretanto, mesmo quando se utilizam critérios estritos, ovários policísticos podem ser encontrados em aproximadamente 75% das pacientes com SOP26 e

Capítulo 17 Hirsutismo 251

em até 20% de mulheres normais.24 O seguimento de 24 mulheres normais com ová­ rios policísticos por um período de 8 anos demonstrou que somente 1 evoluiu para a síndrome. Das restantes, metade manteve a morfologia e a outra parte apresentou regressão da mesma.30 Dentre as dificuldades para o diagnóstico da SOP,31 uma é representada pela paciente na adolescência, período no qual algumas das características fundamen­ tais da síndrome podem estar presentes ou ser um achado transitório. Assim, é prudente que esse diagnóstico seja feito somente em adolescentes com a máxima probabilidade de apresentar SOP. De acordo com uma proposta de Carmina et a l .31 nessa fase, seria necessária a presença dos 3 critérios do Consenso de Rotter­ dam.23 Adicionalmente, somente o hirsutismo seria aceito como sinal de excesso androgênico e o distúrbio menstrual (oligomenorreia) seria valorizado se presente por, pelo menos, 2 anos. A B O R D A G E M T E R A P Ê U T IC A

Para tratar hirsutismo, deve-se compreender o tratamento específico da doença de base, quando for possível identificá-la, e o tratamento inespecífico. Este último pode, com frequência, ser associado ao tratamento da doença de base, com o objetivo de acelerar a regressão do hiperandrogenismo. De acordo com o Clinical Practice Guideline, da Endocrine Society 32 a droga de esco­ lha para se iniciar o tratamento do hirsutismo são os contraceptivos hormonais orais (CHO), compostos por uma associação de estrógeno e progesterona, embora não exis­ tam evidências de que sejam úteis a longo prazo. No entanto, considerando que é frequente a associação de hirsutismo com distúrbio menstrual, o CHO promove a regularização do ciclo menstrual, cumprindo um papel importante na profilaxia da hiperplasia e do carcinoma de endométrio. Por outro lado, constituem um meio segu­ ro de contracepção, fundamental quando são usadas drogas potencialmente teratogênicas, como os antiandrógenos e a finasterida. Dentre as várias opções disponíveis, deve-se dar preferência àquelas com baixa dosagem de etinilestradiol (< 30 pg). Com relação ao componente progestógeno, em geral, são escolhidos os chamados de terceira geração, por apresentarem atividade antiandrogênica (acetato de ciproterona, acetato de clormadinona), baixa atividade androgênica (desogestrel ou gestodeno) ou, mais recentemente, um derivado da espironolactona, a drosperinona. Não se obtendo uma resposta adequada na regressão do hirsutismo após 6 meses, está indicada a associação de uma droga de ação antiandrogênica (ace­ tato de ciproterona ou espironolactona) ou inibidora da enzima 5-a-redutase (finasteride)14,32 (Tabela 17.2). O uso dessas drogas deve obedecer a algumas nor­ mas gerais (Tabela 17.3) e à relação custo-risco-benefício. Considerando-se que não existe diferença na eficácia dessas drogas no tratamento do hirsutismo, devese evitar o uso da flutamida, devido ao seu potencial efeito hepatotóxico. Paralelamente ao tratamento farmacológico do hirsutismo, podem ser empregadas medidas auxiliares, como a depilação, epilação e utilização de laser. O uso tópico de creme de eflortina a 13,9% pode ser útil no caso de hirsutismo facial, principalmente associado à laserterapia.33 Essa droga inibe a enzima que catalisa a síntese de poliamina folicular, responsável por crescimento do pelo.

252

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Antiandrógenos e inibidor da 5-a-redutase utilizados no tratamento do hiperandrogenismo

TABELA 17.2 ■

Esquemas terapêuticos 1 0 0 m g/ d ia d u ra n te 10 dias A c e ta to de

(in ic ia r n o I o d ia de C H O )

c ip r o te r o n a

5 0 m g/dia d u ra n te 2 0 d ias (in ic ia r n o I o d ia de C H O ) 1 0 0 m g 2 vezes/dia, c o n tín u o

E s p ir o n o la c to n a

1 0 0 m g , 2 vezes/dia, c íc lic o (2 1 d ias, ju n ta m e n te c o m CHO)

F lu ta m id a *

6 2 ,5 m g a 1 2 5 m g , 1-2 vezes/dia

Efeitos colaterais F a d ig a , m a sta lg ia , a u m e n to de a p e tite c o m c o n c o m ita n te a c ré s c im o de p eso , n á u se a s, cefa leia , d ep ressão e d is tú rb io s do s o n o H ip o te n s ã o a rte ria l, h ip e rp o ta s s e m ia , e p ig a stra lg ia , fad ig a, m a s ta lg ia e m e tro r ra g ia

M a s ta lg ia , h e p a tite , in s u fic iê n c ia h e p á tic a fu lm in a n te M a s ta lg ia , d ep ressão ,

F in a ste rid e

1-5 m g/dia, c o n tín u o

d im in u iç ã o de lib id o ,

2 ,5 m g em dias a lte rn a d o s

d is tú rb io s g a s trin te s tin a is , ic te r íc ia

*Apesar de casos de hepatite aguda fulminante terem sido descritos apenas com doses superiores a 125 mg/dia, desaconselha-se seu uso, pois seu efeito não é superior ao das demais drogas. CHO: contraceptivo hormonal oral.

Normas gerais para o uso dos antiandrógenos e de inibidor da 5-a-redutase na paciente com hiperandrogenismo

TABELA 17.3 I

O s m e d ic a m e n to s d evem ser u tiliz a d o s s o m e n te ap ó s a in v e stig a çã o d a c a u sa b á s ic a do h ir s u tis m o , p r in c ip a lm e n te c o m e x clu sã o de tu m o re s a d re n a is o u o v a ria n o s p ro d u to re s de a n d ró g e n o s. C o n s titu i c o n tr a in d ic a ç ã o a b s o lu ta a p re se n ça o u p o ssib ilid a d e de gravidez, c o m o o b je tiv o de se ev itar m a lfo rm a ç õ e s in te rse x u a is em fe to s m a s c u lin o s . E m ca so de dúvid a, deve-se p ro c e d e r à p ro p e d ê u tic a a d e q u a d a p a ra se d e te c ta r g e sta çã o . N o caso de p a c ie n te s c o m v id a sex u a l ativ a, deve-se fo r n e c e r o rie n ta ç ã o q u a n to ao u so de m ed id a s c o n tra ce p tiv a s. A p ó s a su sp e n sã o d a d ro g a , d evem ser a g u a rd a d o s 6 m eses a n te s de se p la n e ja r gravidez. O e fe ito d o m e d ic a m e n to é, em g eral, ta rd io , d ev en d o -se o rie n ta r a p a c ie n te q u e a m e lh o ra d o h ir s u tis m o deverá se m a n ife s ta r e n tre 6 e 9 m eses d o in íc io do tr a ta m e n to . O te m p o de d u ra çã o d o tr a ta m e n to d everá ser o m a is lo n g o p o ssív el, em g eral, 2 a n o s. Q u a n to m a io r o te m p o de tr a ta m e n to , m a io r a p o ssib ilid a d e de re m issã o do q u a d ro ap ó s a su sp e n sã o d o m e d ic a m e n to . A d o se de m e d ic a m e n to u tiliz a d a d everá ser d im in u íd a ao lo n g o do te m p o , m a n te n d o -s e a p a c ie n te em u so d a m e n o r d o se p ossív el.

Capítulo 17 Hirsutismo 253

C O N C LU SÃ O

O hirsutismo, caracterizado pela presença, na mulher, de uma quantidade excessiva de pelos terminais em locais onde normalmente não são encontrados, obedecendo a uma distribuição tipicamente masculina, é uma das desordens mais frequentemente encontradas em mulheres na idade reprodutiva. Decorre de uma alteração do ciclo de crescimento do pelo induzido pelos andrógenos, com um prolongamento de sua fase de crescimento (anagen). Apesar de ser geralmente decorrente de alterações funcionais e benignas, pode ser indicativo da presença de uma neoplasia (tumores ovarianos e adrenais virilizantes) ou de uma doença genética (hiperplasia adrenal congênita, nas suas formas clássica e não clássica). E, portanto, um sinal, e quando se evidenciar a apresentação do mesmo, deve-se investigar a doença de base. Na investigação, devem-se considerar dados clínicos (iatrogenia, idade de início, pre­ sença de sinais, sintomas de virilização e histórico menstrual), laboratoriais (determina­ ção da concentração dos andrógenos e da 17-OHP e cálculo da testosterona livre) e de imagem (ultrassonografia pélvica). Na presença de síndrome virilizante, deve-se empre­ gar propedêutica adequada para identificação ou exclusão de tumores virilizantes. A terapêutica compreende o tratamento inespecífico do hirsutismo (métodos me­ cânicos de redução dos pelos ou farmacológicos, por meio do uso isolado de CHO ou associado a antiandrógeno ou finasterida) e o tratamento da doença de base e de comorbidades associadas, bem como avaliação do distúrbio metabólico e redução do risco cardiovascular na SOP, além de aconselhamento genético para as pacientes com hiperplasia adrenal congênita. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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Síndrome dos ovários policísticos R ic a r d o V a s c o n c e l l o s B r u n o R u th C la pa u c h

IN T R O D U Ç Ã O

Com prevalência entre 5% e 10% da população feminina, a síndrome dos ovários po­ licísticos (SOP) passou e passa por várias indefinições, o que faz o número de publi­ cações aumentarem significativamente ao longo dos anos e das décadas. O PubMed publicou, entre os anos de 1985 e 1989, 91 artigos sobre SOP, e entre 2005 e 2008, mais de 5 mil trabalhos foram escritos sobre o tema. Se analisarmos a resistência à insulina, os números são mais alarmantes: entre 1995 e 1999, foram publicados 8517 artigos e, entre 2005 e 2008, mais de 50 mil. Esta pequena introdução é para chamar a atenção de uma doença antiga, como poderá ser visto pelo histórico a seguir, mas que cada vez mais é atualizada e muito identificada com a evolução da mulher e, princi­ palmente, dos hábitos de vida adotados pelos seres humanos nas últimas décadas. As ditas influências externas, fatores ambientais ou estilo de vida, que são extrínsecas aos genótipos da mulher para desenvolvimento da doença, vêm agravando enormemente a prevalência da síndrome, o que explica o número de publicações sobre a SOP. ■

H IS T Ó R IC O

Nosso histórico começa com o relato de Emile Charles Archard e Joseph Thiers, em 19 de julho de 1921, a respeito da associação de hiperandrogenemia com diabetes, publi­ cado no boletim do evento denominado Séance de La SociétéMedicale des Hôpitaux de Paris. A publicação tornou-se referência para os pesquisadores que investigavam e investigam a SOP. O artigo foi intitulado Le virilisme pilaire et son association à Pinsuffisance glycolytique (Diabète desfemmes à barbe).1Archard e Thiers compararam outros 7 relatos de mulheres com hirsutismo e glicosúria que faleceram. Os autores não encontraram policistose ovariana em nenhum caso, o que era dificultado na época pela ausência de ultrassonografia, enquanto nas adrenais foram observadas alterações como tumores uni e bilaterais, hiperplasia cortical e Síndrome de Cushing em diferentes pacientes. Convém mencionar que Launois, Pinard e Gallais, em 1911,2 a partir de semelhantes observações, chamaram a atenção para a origem embriológica do epitélio celômico, comum entre as adrenais e as gônadas, prevendo a integração entre as adrenais e o ovário. Este artigo foi conside­ rado notável por Jeffcoate e Kong,3 que observaram a perspicácia clínica em antecipar o complexo entendimento entre as glândulas endócrinas. A Síndrome de Cushing teve sua associação descrita com a glândula pituitária em 1932 e com a SOP, em 1935, por

256

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Stein e Leventhal.4 A SOP originalmente foi chamada de Síndrome de Stein-Leventhal, que consideraram a anovulação e a infertilidade em 7 pacientes observadas por pneumopelvigrafia. Na época, eles recomendavam a ressecção em cunha dos ovários como o melhor tratamento. A biópsia dos ovários perdurou como método diagnóstico até os anos 1970, com o desenvolvimento das técnicas de radioimunoensaio e a introdução do citrato de clomifene. Em 1970, Yen etal.6 consideraram a dosagem do hormônio luteinizante (LH) e da testosterona (T) como pré-requisitos fundamentais no diagnóstico da SOP. Com a facilidade dos exames de dosagens hormonais, o início dos anos 1980 foi marcado pela tentativa de se definir a síndrome por meio de um parâmetro laboratorial, como a relação entre o LH e o hormônio folículo estimulante (FSH) que, maior que 3, foi por muito tempo considerado patognomônico no diagnóstico laboratorial da SOP. Essa relação posteriormente foi diminuída para maior que 2 e, na dificuldade de definir a SOP por uma relação, alguns autores passaram a considerar o valor do LH maior que 10 mg/dL. Hoje, definimos a síndrome por critérios clínicos e de imagem, como vere­ mos mais adiante, isto é, voltamos às origens ao valorizar a clínica, sem obviamente deixarmos de nos valer dos recursos tecnológicos da ultras sono grafia, que tanto evo­ luiu nos anos 1980. Neste ponto, o trabalho de Adams de 19857 estabeleceu-se como clássico, servindo de base até hoje para a definição da imagem de policistose ovariana, mesmo que com pequenas mudanças das considerações definitivas estabelecidas atual­ mente pelos critérios de Rotterdam ESHRE/ASRM de 2004,8 o que será considerado no item de diagnóstico. A resistência insulínica e a SOP começaram a ter associação a partir dos trabalhos de Burghen et al.,9em 1980, que fizeram a primeira sugestão de uma relação entre o hiperandrogenismo da SOP e a hiperinsulinemia. Os autores notaram que os níveis de insulina plasmática durante teste oral de tolerância à glicose (TOTG) em pacientes obesas portadoras de SOP estavam elevados em 8 mulheres quando as compararam com o grupo controle. Em seguida, Chang et al.10 demonstraram a presença de hipe­ rinsulinemia em pacientes não obesas com diagnóstico de SOP, de forma a evidenciar que este era um fator específico da SOP, em vez de secundário à obesidade. Em 1989, Conway etal.11 revelaram que 30% das mulheres não obesas com SOP tinham um grau mais leve de resistência à insulina, enquanto Falcone et al.12 informaram que 63% de suas pacientes com SOP e não obesas eram resistentes à insulina. Robinson etal.,13 em 1993, demonstraram que a sensibilidade à insulina variava de acordo com o padrão menstrual. As diferenças de opinião na literatura sobre a inter-relação de resistência à insulina e hiperandrogenismo perpetuaram até hoje. Conway et al.11 creditavam a hiperinsulinemia ao aumento da produção androgênica ovariana; outros pesquisadores,14,15 no entanto, não conseguiram demonstrar essa relação direta. Além da obesidade, a história familiar de diabetes e a etnia podem afetar a prevalência da resistência à insu­ lina. Quando esses fatores ocorrem em não caucasianas com SOP, estas pacientes ten­ dem a ser mais insulinorresistentes do que as caucasianas, como observaram Dunaif etal., em 1993.16 Devemos entender que a quantificação clínica de resistência à insulina continua a ser uma ciência imprecisa, como reconheceram Gennarelli etal., em 2000.17 Legro et al., em 2004,18 chegaram a definir “propostas e armadilhas” na detecção da resistência insulínica na SOP. Em resumo, entre 50% e 70% das pacientes com SOP têm resistência à insulina e, portanto, esta é uma característica prevalente, porém não universal do transtorno.19

Capítulo 18 Síndrome dos ovários policísticos

257

F IS IO P A T O L O G IA

De todas as incertezas, uma certeza persiste: a SOP compreende um grupo hetero­ gêneo de pacientes e apresentações clínicas, com diferentes tentativas de explicação fisiopatológica, associadas ou não entre si. Novos estudos apontam que a SOP seja consequência de uma herança poligênica, associada a fatores ambientais.

D

Base genética

Evidências de agregação familiar tanto para hiperandrogenemia quanto para os aspectos metabólicos foram descritas em pacientes com SOP. Mães de mulheres com SOP mos­ traram maior risco de doença cardiovascular (DCV) e hipertensão arterial, enquanto os pais apresentaram maior risco de doença cardíaca e acidente vascular cerebral (AVC). Da mesma forma, DCV em pai e mãe foi associada a maior risco de SOP na prole feminina.20 Uma das regiões candidatas bem-estabelecidas é a D19S884, localizada em 19pl3.2 a cerca de 800 kb do gen do receptor da insulina, conferindo resistência insulínica.21 Poli­ morfismos nos genes FTO e MC4R também foram associados a alterações de índice de massa corporal (IMC) em mulheres com SOP; parecem não estar ligados diretamente a alterações reprodutivas, mas podem interagir com outros genes, como o POMC, predis­ pondo certas mulheres com IMC aumentado a desenvolver SOP. Outros polimorfismos, como rsl0986105 e rsl0818854, localizados em 9q33, parecem estar ligados ao hiperandrogenismo e, possivelmente, à irregularidade menstrual na SOP.22

D

Círculo vicioso

Na SOP, uma vez deflagrada qualquer uma das alterações implicadas em sua gênese, um círculo vicioso de eventos descrito por Yen23 ocorre sucessivamente, perpetuando as alterações da síndrome. Assim, independentemente da porta de entrada no círculo fisiopatológico, a relação LH/FSH aumentada provoca hipersecreção de andrógenos ovarianos e ausência de desenvolvimento folicular, com aumento da relação estrona/ estradiol, que age em nível hipofisário, perpetuando as alterações de gonadotrofinas, que vão aumentar a secreção de andrógenos, e assim sucessivamente (Figura 18.1).



Alterações neuroendócrinas

Está bem-descrito um aumento tônico de LH, secundário ao aumento de frequência e amplitude de pulsos de hormônio liberador de gonadotro finas (GnRH). Este padrão pode ocorrer por exposição pré-natal a níveis altos de andrógenos ou pela diminuição da inibição central de dopamina e opioides endógenos em relação ao GnRH. Da mes­ ma forma, acredita-se que a baixa concentração de FSH ocorra por inibição endógena, causada possivelmente pela concentração aumentada de hormônio antimulleriano, característica de pacientes com SOP.24 Modelos animais expostos a excesso de T na vida fetal revelaram defeitos metabóli­ cos, como resistência insulínica e hiperinsulinemia quando fêmeas adultas.25 A hipó­ tese de programação fetal está bem-definida em modelos animais, mas ainda precisa ser confirmada em humanos.

D Ativação do sistema nervoso simpático Foi descrita maior densidade de fibras catecolaminérgicas, o que pode contribuir na fisiopatologia da SOP, estimulando a produção androgênica.26 Um marcador

258

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Á GnRH Amplitude e frequência de pulsos

FIGURA 18.1 Fisiopatologia da síndrome dos ovários policísticos. Conforme descrito por Yen S.23

importante de atividade simpática é o Nerve Growth Factor (NGF) e, recentemente, foi demonstrado que mulheres com SOP têm níveis aumentados de NGF.27 Em modelo animal hiperexpressando NGF nos ovários, houve elevação persistente de LH e altera­ ções morfológicas típicas nos ovários.

O

Hiperandrogenismo primário adrenal e/ou ovariano

Foi observada, em mulheres com SOP, alteração de uma base na região CYP17 do gen que codifica a enzima citocromo P450 17-alfa, provocando aumento de sua ati­ vidade. Ocorre, então, hipersecreção discreta de androstenediona e T livre, a partir de células da teca e de sulfato de de-hidroepiandrosterona (S-DHEA) e 17-hidroxiprogesterona a partir do córtex adrenal, bem como hiper-resposta dos 17 cetoesteroides ao hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). Os altos níveis de andrógenos locais provocam atresia folicular, perpetuam a relação LH/FSH aumentada e au­ mentam a resistência insulínica.

O Síntese extraglandular de andrógenos Alterações de atividade da 1 lb-hidroxiesteroide desidrogenase28 e das 5-alfa e betaredutases29’30 podem aumentar a síntese de andrógenos no tecido adiposo. Essas enzimas

Capítulo 18 Síndrome dos ovários policísticos

259

Resistência Insulínica

Hiperinsulinemia

Recrutramento e tamanho de adipócitos abdominais

Andrógenos

FIGURA 18.2 Círculo vicioso hiperinsulinemia/hiperandrogenismo. Adaptado de Naber S.31

estão envolvidas no metabolismo periférico do cortisol, o que pode levar à ativação da esteroidogênese adrenal. Por outro lado, o aumento de tecido adiposo, pelo sobrepeso e pela obesidade, re­ presentaria uma causa exógena, ambiental, de síntese extraglandular de hormônios.

O Resistência insulínica Foram descritos polimorfismos genéticos determinando resistência à insulina, mesmo em mulheres magras com SOP. Aqui se formaria um novo círculo vicioso, conforme descrito por Nader,31 com hiperinsulinismo provocando hiperandrogenismo ovariano (Figura 18.2) e vice-versa. Estudos in vitro mostraram que a insulina atua sinergicamente no LH nas células da teca, estimulando a produção de andrógenos, que, por sua vez, estimulam o recruta­ mento e o tamanho de adipócitos abdominoviscerais, aumentando a relação cinturaquadril. Com o aumento do efluxo de ácidos graxos livres abdominais, a extração he­ pática, bem como a sensibilidade periférica e hepática à insulina seriam prejudicadas, perpetuando o hiperinsulinismo e o aumento de andrógenos.

Fatores intrafoliculares Na SOP, há distribuição anômala de inibina intraovariana: diminuição nas células da granulosa e aumento nas células da teca, causando atresia folicular e hiperandroge­ nismo. Também ocorre diminuição de folistatina nas células da granulosa, causando hiperestrogenismo. Embora dosagens séricas de inibina sejam normais em pacientes com SOP, após a fase folicular precoce os níveis de inibina intraovarianos nas células da teca são muito maiores que os de mulheres normais, podendo contribuir para a atresia folicular na época da seleção do folículo dominante. A inibina aumenta a produção de andrógenos

260

Endocrinologia Feminina e Andrologia

mediada por LH em células da teca em cultura. A redução da folistatina nas células da granulosa pode resultar em aumento da produção de estrógenos. Kit ligande (KL) é uma citocina intraovariana que promove ativação de folículos primordiais, crescimento e sobrevida folicular, diferenciação de células do estroma, proliferação de células da teca e síntese de andrógenos.32 Desregulação da KL em pa­ cientes anovulatórias hiperandrogênicas com SOP é uma etiopagenia promissora que vem sendo investigada. O E S P E C T R O D A S O P ( M A N IF E S T A Ç Õ E S C L ÍN IC A S )

O diagnóstico da SOP é definido pelos critérios de Rotterdam, com a presença de 2 destes 3 sinais e sintomas: oligoamenorreia ou amenorreia, hirsutismo e imagem de policistose ovariana (segundo critérios). Devemos estar atentos para excluir desordens similares à SOP, como detalhado na Tabela 18.1. Hoje reconhecemos que existe um amplo espectro clínico de apresentações para SOP, desde mulheres que até ovulam esporadicamente com leve hirsutismo e sem imagem de SOP, até pacientes com amenorreia há 1 ano, hirsutismo severo, acne intenso, calvície e acantose nigricans (sinal de resistência insulínica). O ponto exato em que a síndrome é desencadeada ainda é desconhecido, mas parece de comum senso que o IMC está envolvido neste processo.33 O espectro da síndrome segue um tipo de curso diante do aumento do IMC e outro na ausência de sobrepeso ou obesidade, como aferiu Homburg.34 Diversos trabalhos confirmaram que a redução de peso claramente melhora a expressão clínica, como visto por Clark etal.35 As incertezas são tantas, que torna difícil explicar como mulheres completamen­ te androgenizadas permanecem ovulando e outras sem características androgênicas mostram-se anovulatórias.

TABELA 18.1

Doenças a serem excluídas na diferenciação da SOP

H ip e rp la sia a d re n a l c o n g ê n ita S ín d ro m e de C u s h in g T u m o r e s se c re to re s de a n d ró g e n o s D o e n ç a s d a T ir e o id e H ip o g o n a d is m o h ip o g o n a d o tr ó fic o



Distúrbios menstruais

Oligomenorreia, amenorreia e ausência de padrão menstrual são características co­ muns à SOP. Perto de 90% das mulheres com oligomenorreia possuem imagem de SOP ao ultrassom, enquanto 30% das amenorreicas têm esse resultado.36 Setenta e cinco por cento das pacientes com infertilidade por anovulação são diagnosticadas com SOP. E importante lembrar que síndrome hiperprolactinêmica é outra patologia que constantemente leva a essas manifestações de padrão menstrual.

Capítulo 18 Síndrome dos ovários policísticos

D

261

Hirsutismo, acne e alopécia

Aumento dos pelos corporais e faciais é um dos mais comuns sintomas presentes; dependendo da etnia, até 92% das mulheres com imagem de ovário policístico ao ultrassom possuem essas características. O hirsutismo sempre esteve ligado à SOP e permanece como manifestação clássica do androgenismo da síndrome, mas a acne, que mais recentemente foi reconhecida como desordem endócrina androgênica, pode estar presente em até 75% de mulheres com imagem de SOP. A alopécia, principalmente a de características virilizantes, aparece como manifestação menos comum. Todas essas manifestações refletem a estimulação androgênica da unidade pilosebácea. Salienta-se que a chamada seborreia de couro cabeludo, na maioria das vezes, manifesta-se antes da acne e, se tratada, poderia evitá-la, protegendo grande parte das pacientes de sequelas. Sinais mais severos de virilização, como clitoromegalia ou engrossamento da voz, são manifestações mais raras e, nestes casos, tumo­ res virilizantes devem ser excluídos.



Aborto recorrente

Também denominado abortamento habitual, é uma consequência vista, muitas ve­ zes, em pacientes que procuram nossos consultórios e que normalmente não apre­ sentam muitas manifestações clínicas. Essas mulheres são ovulatórias e conseguem engravidar, mas infelizmente não conseguem chegar ao parto. A hipersecreção de LH foi proposta como a causa da perda reprodutiva, como descreveram Homburg et al. em 1988,37 mas muita discussão surgiu e ainda surge devido ao fato de ou­ tros autores não confirmarem em trabalhos envolvendo mulheres que passaram por fertilização in vitro (FIV) que vieram a abortar de forma habitual38 e não possu­ íam aumento expressivo do LH. Na tentativa de suprimir o aumento do LH, surgiu como proposta a supressão ovariana prévia, com o uso de análogos de GnRH para posterior indução da ovulação,33 o que foi discordado por outros autores também com pesquisas observacionais.39 Ainda podemos destacar o aumento de um agente trombofílico denominado inibidor do ativador do plasminogênio (PAI 1), que pare­ ce estar ligado a microtromboses no leito endometrial. Outro fator a se considerar é que o uso de metformina nestas pacientes deve ser prolongado até, pelo menos, a 12 a semana, lembrando que a metformina não mostrou ser teratogênica e está incluída na categoria B do Food and Drug Administration (FDA) de uso de drogas na gravidez (estudos em animais não mostraram risco fetal; dados observacionais em humanos também não).



Aspectos metabólicos

Obesidade está presente em 30% a 50% das portadoras de SOP e ainda destacamos que 25% possuem sobrepeso, portanto um IMC acima dos parâmetros normais pode ser encontrado em até 75% das pacientes. A hiperinsulinemia pode ser observada em mais ou menos 80% das mulheres obesas e em 30% a 40% das mulheres não obesas.40 A distribuição de gordura em pacientes com SOP resulta em aumento da circunferência abdominal, que é um marcador da resistência à insulina. A acantose nigricans deve ser considerada um marcador cutâneo da resistência, com ressalva de que não é específica da SOP e pode estar ligada à etnia.

262

Endocrinologia Feminina e Andrologia

IM A G E M



Ultrassonografia

A ultrassonografia sempre teve um papel destacado no diagnóstico da SOP, que pas­ sou a ser definitivo com o consenso de Rotterdam. Entre vários conceitos definidos no consenso, vamos destacar apenas os seguintes: 12 folículos ou mais, medindo entre 2 mm e 9 mm de diâmetro e/ou aumento do volume ovariano >10 cm3 em, pelo me­ nos, 1 dos ovários.8Quando encontramos um folículo maior que 10 mm ou um cisto único, devemos repetir a ultrassonografia no próximo ciclo para afastarmos qualquer possibilidade de policistose ovariana.

Q Dopplervelocimetria Além de outros exames que podem servir para elucidar a SOP, como ultrassom 3D e ressonância magnética (RM), gostaríamos de destacar a dopplerfluxometria, confir­ mada por Battaglia41 e Zaidi42 como método complementar ao diagnóstico da SOP. Em nosso trabalho, demonstramos que o Doppler mostrou Vmáx significativamente maior (p < 0,0004) no estroma ovariano das pacientes com SOP (12,2 cm/s) em relação ao grupo controle (8,05 cm/s); o índice de pulsatilidade da artéria uterina também se revelou muito superior no grupo com SOP em detrimento do controle.43 Diante dos dados, concluímos que a velocimetria-Doppler pode constituir subsídio a ser incorpo­ rado à investigação clínica e à ultrassonográfica no tocante ao diagnóstico da SOP.



Exame clínico

A SOP, pelos próprios critérios de Rotterdam na definição da síndrome, estimula ao exame clínico e à anamnese, mesmo necessitando da imagem para compor os parâme­ tros. Os parâmetros a serem avaliados estão citados a seguir e se encontram detalha­ dos em capítulos específicos deste livro: • Couro cabeludo: procura de calvície, no formato masculino com entradas; procura de seborreia na cabeça e até caspas. • Acne facial, em colo e dorso. • Pelos espessos e escuros em locais diferentes do padrão feminino, como facial (buço excessivo, barba), no meio do peito, excessivo no abdômen, formato losangular na pube (diferente do triangular feminino) e espesso em membros e raiz de coxas. • Raros: alteração da voz (rouca e engrossada); clitóris aumentado. • Acantose nigricans: procurar em região de dobras com base de pescoço, axilas, sulcos inframamários, virilha. • Peso e cálculo do IMC. • Circunferência abdominal, que deve ser aferida em ponto equidistante da última costela e a crista ilíaca anterosuperior; o padrão feminino para mulheres da América do Sul, segundo a International Diabetes Federation (IDF), não deve ultrapassar 80 cm. • Pressão arterial: aferir, principalmente, em pacientes com comorbidades já associadas à SOP. ■

TR A TA M EN TO

O tratamento da SOP pode se dividir em 3 condutas: (i) a que visa melhorar os sinto­ mas da SOP; (ii) a que visa à gravidez e (iii) a que visa à prevenção ou ao tratamento

Capítulo 18 Síndrome dos ovários policísticos

263

da síndrome metabólica. Não podemos esquecer que a paciente pode necessitar dos 3 tratamentos ao mesmo tempo, o que não é incomum, considerada a prevalência da obesidade e da resistência à insulina, como já citamos.

O

Hirsutismo

O grau de hirsutismo vai determinar as medidas que devem ser adotadas. Algumas drogas estão disponíveis para o uso, como espironolactona, ciproterona e flutamida. Lembramos que pelos já desenvolvidos virilizados devem ser extirpados com pinças, depilação ou laser. O uso de anticoncepcionais combinados a ciproterona, drospirenona, clormadinona ou dienogest é uma boa opção em quem é portadora de hirsu­ tismo leve ou moderado associado à oligoamenorreia ou amenorreia. E importante ressaltar, contudo, que esse tratamento é paliativo, não corrige a resistência insulínica e não impede a progressão da síndrome. A antibioticoterapia, para os casos de acne, presta-se bem, principalmente os antibióticos que agem em estafilo cocos.



Anovulação e infertilidade

O citrato de clomifene é a droga mais usada quando se fala em indução da ovulação. O clomifene é um estrógeno que atua competindo com o próprio estrógeno natural no receptor hipotalâmico, estimulando a liberação do GnRH e, assim, a liberação de LH e FSH. E importante destacar que o citrato de clomifene é usado em doses de 50 mg a 150 mg/dia, que não devem ser aumentadas quando não se consegue uma indução da ovulação com 150 mg. Também devemos salientar que muitas pacientes portadoras de SOP são más respondedoras ao clomifene; em outras, pode levar à gestação gemelar, bem como complicar com síndrome de hiperestimulação ovariana. Os protocolos de indução de ovulação com o FSH, seja urinário ou recombinante, são mais efica­ zes que clom ifene na indução da ovulação em pacientes com SOP. Não cabe aqui detalhar esquemas de indução para inseminação intrauterina ou para FIV, pois este capítulo não é voltado para esterileutas. Mas devemos lembrar que o risco de hiperestimulação sempre assombrou os médicos que trabalham com reprodução humana assistida. O uso da metformina melhora as taxas de ovulação, gravidezes e nascimentos em portadoras de SOP, conforme se comprovou em uma grande revisão de trabalhos Lord et al.44 A sensibilização da insulina com sua respectiva diminuição leva à diminuição dos andrógenos livres circulantes e, com isso, estabiliza-se a relação células da granulosa/células da teca, permanecendo o oócito em sua fase própria para li­ beração na ovulação, não amadurecendo antes do tempo. A ressecção em cunha sempre foi admitida como opção na melhora da fertilidade, pela diminuição dos andrógenos ovarianos e, consequentemente, melhora da ovulação. Com o avanço da videolaparoscopia, a técnica da cunha evoluiu ao que hoje denominamos de drilling ovariano, que consegue queimar os ovários em micropontos com destruição mínima do parênquima. 0 laser de C 0 2 também pode ser utilizado com os mesmos resultados do drilling. Porém, a destruição de parte dos ovários e a observação de recidiva do quadro clínico em até 1 ano, associadas à fibrose decorrente do procedimento, levam a uma corrente contrária a sua execução, admitindo que esta seja a última opção a ser tentada.

D

Perda de peso

A perda de peso é o melhor tratamento para portadoras de SOP com obesidade ou sobrepeso. A melhora da resistência insulínica ajuda a reverter ou minorar o quadro

264

Endocrinologia Feminina e Andrologia

desde que se associe a um controle alimentar e um bom programa de exercícios físicos. Vale lembrar que a perda de peso também melhora a fertilidade.

SOP e a metformina Metformina (cloridrato de 1,1-dimetil biguanida) é umabiguanida atualmente utilizada como sensibilizador da insulina e antidiabetogênico oral. A droga atua como sensibilizadora da insulina na membrana celular, conduzindo a glicose para o meio intracelular. Além da função para que foi desenvolvida, podemos ainda relatar como fundamental sua participação na inibição do mecanismo hepático de gliconeogênese, evitando a dissolvência dos ácidos graxos.45 Em 1994, Velazquez et a i,46 pela primeira vez, avaliaram os efeitos da administração da metformina em 26 pacientes obesas com SOP, com a intenção de investigar o papel da resistência à insulina na patogênese da síndrome. Após 6 meses de metformina com doses de 1500 mg/dia, os autores relataram redução signi­ ficativa nos níveis de andrógenos circulantes e no peso corporal. Além disso, demons­ traram a eficácia da metformina na regularização dos ciclos menstruais, que passaram a ser ovulatórios em pacientes com SOP. Em grupos comparativos usando metformina em dosagens de 1,5 g e 2,5 g/dia, observamos que as doses maiores possuem maior efeito nas pacientes mais obesas, na redução do IMC e da circunferência abdominal.47 Atualmente, ginecologistas e endocrinologistas prescrevem a metformina para tratar pacientes com SOP. The Androgen Excess and PCOS Society sugere que a metformina seja usada para tratar e prevenir a progressão da tolerância alterada à glicose em pacientes portadoras de SOP.48 A American Association o f Clinicai Endocrinologists recomenda a me­ tformina como intervenção inicial em pacientes com sobrepeso ou obesas com SOP.49 Em 2007, ocorreu o InternationalESHRE/ASRM-sponsored PCOS Consensus Workshop Group50 para discutir desafios terapêuticos nas mulheres com infertilidade e SOP. O grupo de estudo concluiu que os sensibilizadores de insulina não deveriam ser uti­ lizados como agentes de primeira escolha na indução da ovulação de mulheres com SOP, e que o uso deveria ser restrito às pacientes com tolerância alterada à glicose. Nestler, em 2008,51 em um editorial interessante, criticou as conclusões do consenso de 2007, mantendo aberto o debate sobre a questão. S O P E R IS C O C A R D IO V A S C U L A R

Mulheres com SOP têm aumento da prevalência de vários fatores de risco cardiovas­ cular, incluindo hipertensão52 e dislipidemia.53 A SOP também tem sido associada ao aumento da doença arteriosclerótica e da disfunção endotelial.54 A prevalência da SOP faz da doença um dos grandes riscos para a morte por DCV em mulheres. A comorbidade mais comum em portadoras de SOP é a dislipidemia, com prevalência de 70%, principalmente do aumento da lipoproteína de baixa densidade (LDL), segundo o National Cholesterol Education Program Guidelines.55 Alterações da lipoproteína de alta densidade (HDL) e dos triglicerídeos são vistas em mulheres obesas e magras. A idade ainda é um fator agravante, principalmente pelo acúmulo de placas de ateroma e pela diminuição da luz das grandes artérias, como as carótidas.

Capítulo 18 Síndrome dos ovários policísticos

265

IM PO R TA N TE A S O P é u m a d o e n ç a p ro g ressiv a q u e p io ra e n o rm e m e n te c o m a a s so cia ç ã o d a o b esid a d e o u d o so b re p e so . A re s is tê n c ia à in s u lin a ev o lu i p a ra h ip e rin s u lin e m ia , n a se q u ê n cia , to le r â n c ia a lte ra d a à g lic o se e, fin a lm e n te , d ia b e te s tip o II.

A dislipidemia, o aumento da resistência vascular periférica levando à hipertensão e uma circunferência abdominal típica de resistência insulínica perfazem critérios que enquadram essas pacientes como portadoras de síndrome metabólica. PR EV EN Ç Ã O - SO P EM A D O L E S C E N TE S

A prevenção passa, em primeiro lugar, por um diagnóstico precoce, como já exempli­ ficado. Quando se atende uma adolescente com queixas de distúrbios menstruais, já acima do peso, com circunferência acima de 80 cm, IMC de 28, sinais de hirsutismo e acne, não podemos apenas prescrever um anticoncepcional oral com um progestógeno antiandrogênico e acharmos que estamos tratando a SOP. Essa menina já deve ser avaliada metabolicamente e orientada para controle alimentar e exercícios físicos, pois a progressão da doença é severa. IM P O R TA N TE A p rev en çã o , e n tã o , p a ssa p o r b o m c o n tr o le a lim e n ta r, fu n d a m e n ta lm e n te d ie ta a d e q u a d a e p rá tic a de e x e rcício s a e ró b ic o s. A m a n u te n ç ã o do p eso é fu n d a m e n ta l n o tr a ta m e n to d a S O P e de su as c o n se q u ê n c ia s .

É importante acrescentar as recomendações do último consenso da ESHRE/ASMR publicado em 2 0 1256 para adolescentes com SOP: • Os critérios para o diagnóstico da SOP em adolescentes diferem dos critérios para o diagnóstico de mulheres mais velhas em idade reprodutiva. • Os grupos de risco que devem ser identificados são as portadoras de obesidade, hirsutas, com irregularidade menstrual e outras alterações que chamem atenção de SOP, mas é recomendada cautela no diagnóstico. • As manifestações individuais devem ser tratadas por prevenção, principalmente a obesidade, a acne, o hirsutismo, entre outras. O consenso ainda chama a atenção para o desenvolvimento de mais pesquisas no campo da SOP, principalmente em adolescentes, fase que acreditamos ser fun­ damental para prevenir os casos mais graves contra a evolução para a síndrome me­ tabólica.

266 Endocrinologia Feminina e Andrologia

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R ica rd o M endes A lves P ereira L u iz A u g u sto G io rd a n o M a rio V icente G io rd a n o Isaac M oise Y a d id

IN T R O D U Ç Ã O

Descrita inicialmente por Cari Von Rokitansky, em 1860/ a endometriose perma­ nece até hoje como doença de fisiopatologia não totalmente esclarecida. E frequen­ temente encontrada na prática ginecológica, pois determina múltiplos sintomas, com destaque para a dor pélvica e a infertilidade. A ressecção cirúrgica das lesões endometrióticas proporciona o diagnóstico definitivo, com base na confirmação histológica de glândulas e estroma endometriais com variável quantidade de infla­ mação e fibrose, às vezes circundado por tecido metaplásico muscular. O diagnós­ tico presuntivo da endometriose profunda pode ser baseado no quadro clínico, na imagem de ultrassonografia transvaginal (USTV) com preparo intestinal ou resso­ nância magnética (RM).2 A endometriose é definida como a presença de tecido semelhante ao endométrio eutópico (estroma e glândulas) fora da cavidade uterina, ocasionando importante rea­ ção inflamatória crônica.3 Segundo a Associação Americana de Medicina Reprodutiva (ASMR), a endometriose deve ser vista como doença crônica que necessita de longo planejamento terapêutico, em que o objetivo principal é otimizar o tratamento clíni­ co, evitando-se abordagens cirúrgicas repetidas. Ocorre em mulheres em idade fértil, da menarca à menopausa, sendo pouco frequente fora desse período. Em virtude desse achado, é dita doença hormônio-dependente, principalmente dos estrógenos. Não há maior prevalência em determinado grupo étnico ou classe social. E a principal causa de dor pélvica crônica (superior a 6 meses) nas mulheres, e o im ­ pacto negativo dos sintomas na qualidade de vida é bem-reconhecido. O tratamen­ to uniforme da doença é difícil, em virtude das múltiplas formas de apresentação. A presença de infertilidade resulta em tratamento que pode ser diferente daquele de pacientes que possuem dor e não desejam mais filhos. Em algumas mulheres, pode ser necessária cirurgia com exérese da maior quantidade possível de lesões, muitas vezes, necessitando de abordagem do intestino, da bexiga, do assoalho pél­ vico (músculo coccígeo) e dos nervos e plexos nervosos pélvicos. Devido à m ulti­ plicidade de órgãos que podem ser acometidos e dos diferentes objetivos de vida da paciente, pode ser necessária a participação de equipe multidisciplinar ou equipe

270

Endocrinologia Feminina e Andrologia

formada por cirurgiões ginecológicos treinados e capacitados como verdadeiros cirurgiões pélvicos.2,4 A doença acomete mais frequentemente pelve feminina, prin­ cipalmente a região retrocervical, ligamento uterossacro, fundo de saco de Douglas, folheto posterior do ligamento largo, ovários e suas respectivas fossas, retossigmoide, face anterior e posterior do útero, peritônio vesicouterino e bexiga. Lesões extrapélvicas são menos frequentes, mas podem ser encontradas em apêndice, ileoterminal, cécum, cicatriz umbilical, diafragma e tórax. Implantes em cicatrizes cirúrgicas po­ dem estar relacionados com cesárea ou, mais raramente, com miomectomias prévias. A presença de tecido endometrial na parede uterina, justaposta à zona juncional do endométrio, é denominada como adenomiose. Adenomioma compreende a presença de tecido endometrial no interior de um leiomioma. ■

E T IO L O G IA

Desde a descrição inicial da endometriose, no século XIX, ainda não foi possível iden­ tificar sua exata etiologia. Múltiplas teorias são utilizadas para a descrição dos eventos fisiopatológicos, mas nenhuma delas consegue explicar, por completo, todos os mo­ dos de manifestação da doença.

O Metaplasia celômica Desde 1898, quando foi descrita, vem sendo complementada por outros autores. Nos últimos 25 anos, Redwine tem defendido à exaustão a relação da “mulleriose” na etiologia da endometriose.5 A teoria pressupõe que algum segmento do peritônio pélvico, na medida em que é derivado do mesotélio celômico, é capaz, sobre certas circunstâncias, de sofrer metaplasia ou reversão para o tecido mulleriano primitivo. Mulleriose refere-se a defeito de desenvolvimento na diferenciação ou na migração de qualquer componente celular no sistema de duetos paramesonéfricos (duetos de Muller), podendo ser endometrial, miometrial, tubário, cervical ou vaginal (fórnice posterior). Portanto, mulleriose é um braço da teoria da metaplasia celômica. Isso é resultado de uma forma embrionária de depósito ectópico de tecido, podendo ser endometriose, desde o nascimento, ou substrato de tecido indiferenciado (outros componentes mullerianos), o qual, mais tarde, sofre metaplasia em endometriose ou outro tecido mulleriano. A metaplasia fibromuscular caracteriza endometriose pro­ funda.5,6 Estudo demonstrou presença de endometriose em 11% de fetos humanos com 16 semanas,6 resultado comparável ao de Redwine há 20 anos em natimortos,5 e muito próximo ao estimado para a população feminina em idade reprodutiva.7 Esta aparente complexa teoria tem sido deixada para um papel secundário em rela­ ção à superficial teoria do refluxo. Isso tem sido um grande equívoco com influência negativa no adequado entendimento da fisiopatologia da endometriose e no manejo das pacientes. Esse tipo de entendimento pode contribuir para as altas taxas de insu­ cesso verificadas no tratamento.

O Menstruação retrógrada Teoria descrita por Sampson, em 1927,8 foi a primeira e permanece como a mais popularmente aceita, mesmo sem nunca ter havido evidência científica de que as células endometriais originadas da cavidade uterina possam aderir e infiltrar o peritônio pélvico. Seus defensores alegam que o refluxo do sangue menstrual pelas

Capítulo 19 Endometriose 271

tubas uterinas seria fator determinante para o implante de células endometriais na cavidade abdominal. As obstruções ao fluxo menstrual, e o aumento do mesmo, podem ser fatores de risco para o desenvolvimento da endometriose, pois oca­ sionam maior refluxo menstrual. E possível que contrações uterinas irregulares facilitem o refluxo sanguíneo.9 A menstruação retrógrada ocorre em 60% a 80% das mulheres, mas nem todas desenvolvem a doença sintomática. Células endome­ triais já foram descritas no líquido peritoneal de mulheres em diálise peritoneal no período menstrual.10 Assim, a presença do refluxo menstrual, isoladamente, não seria capaz de resultar em endometriose. São necessários fatores adicionais, como a quantidade de sangue que alcança a cavidade pélvica e a capacidade do sistema imunológico de eliminar as células endometriais da pelve. Esta teoria não conse­ gue explicar o desenvolvimento de endometriose extra-abdominal (torácica) ou na ausência de menstruação (agenesia uterina).



Teoria da indução

Semelhante à metaplasia celômica, propõe que alguns fatores biológicos e/ou hormo­ nais induzem a diferenciação de células indiferenciadas em tecido endometrial.11

D Disseminação linfática ou vascular Algumas localidades incomuns de endometriose podem ser explicadas por esta teoria, como lesões extra-abdominais (tórax).

D Alterações imunológicas Como descrito anteriormente, após a presença de células endometriais no peritônio , é necessária “permissibilidade” imunológica para adesão, infiltração e proli­ feração celular. Já foi descrita menor atividade das células natural-killer, com citotoxidade reduzida nas células endometriais ectópicas.12 Há maior presença de leucócitos e macrófagos no líquido peritoneal, os quais determinam grande secreção de citocinas e fatores de crescimento. A secreção de citocinas (Tabela 19.1) advém das células infla­ matórias e também do tecido endometrial ectópico, ocasionando proliferação dos im­ plantes. Fatores de crescimento (fator de crescimento do endotélio vascular - VEGF) são responsáveis pelo desenvolvimento de capilares. A maior presença de leucócitos nos focos resulta em verdadeira reação inflamatória local.13 Os linfócitos também es­ tão aumentados no fluido peritoneal, e suas funções de cito toxicidade contra células endometriais estão comprometidas.14 T A B ELA 19.1

Algumas citocinas implicadas na fisiopatologia da endometriose

In te r le u c in a -ip In te rle u c in a -6 In te rle u c in a -8 F a to r de N e cro se T u m o r a l (T N F ) P r o te ín a q u im io tá c tic a de m o n ó c ito s (M C P -1 ) R A N T E S (q u im io c in a s reg u la d a s so b a tiv a çã o n o r m a lm e n te ex p ressad a e se cre ta d a p o r célu la s T )

272

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Provavelmente, as alterações imunológicas identificadas nas pacientes com endometriose contribuem para o entendimento da fisiopatologia da inflamação desencadeada por essas lesões e sua consequente manifestação clínica, que inclui dor, fibrose e aderência. E possível que pacientes portadoras de endometriose estejam mais susceptíveis às doenças autoimunes. Pesquisa com pacientes da Associação Americana de Endome­ triose identificou maior frequência de doenças inflamatórias autoimunes, hipotireoidismo, fibromialgia, asma, entre outras.15 Contudo, mais estudos são necessários para confirmar os achados.

EPIDEMIOLOGIA A real prevalência da endometriose é de difícil precisão, pois algumas pacientes não apresentam queixas. Em pacientes que são submetidas à laqueadura tubária, a en­ dometriose pode ser encontrada em cerca de 5% dos casos.16Nas pacientes com dor pélvica crônica, a endometriose pode ser responsável pelo sintoma em até 70% das vezes.17Em pacientes inférteis, encontramos endometriose em 25% a 50% dos casos.18 Nas adolescentes que sofrem de dor pélvica crônica ou dismenorreia, a endometriose pode ser encontrada em até 50% das videolaparoscopias realizadas.19 Alguns fatores de risco são reconhecidos para endometriose. Há indícios de aco­ metimento familiar. Estudo observacional encontrou risco relativo de 5,2 para irmãs e 1,56 para primas de portadoras de endometriose.20 Alguns autores relatam acometi­ mento familiar em 4% a 6% dos casos.21 Em gêmeas monozigóticas, já foi descrita inci­ dência de 75%.22 O acometimento familiar pode ocorrer não só pelo caráter genético, mas também pelo mesmo estilo de vida.23 Estudo de irmãs acometidas por endome­ triose identificou alteração de região do cromossomo 10q26 e menor participação do cromossomo 20p l3.24 Estudos genéticos têm demonstrado diferenças entre o endométrio eutópico e o pre­ sente nos implantes de endometriose. Pesquisa comparando implantes ovarianos com o endométrio das mesmas pacientes identificou hiperexpressão de múltiplos genes, in­ cluindo o PROK1 (endocrine-gland-derived vascular endotelial growthfactor), CAV-1 (caveolin-1), NGF (nervegrowfactor) e H SD17p-ll (hydroxysteroid 17-beta deydrogenase 11) no tecido endometriótico. Dentre outros, o gen BOK (BCL-2 related ovarian killer) encontrava-se pouco expressado. O sistema matriz metaloproteinases (MMPs) também encontra-se alterado no endométrio e no tecido endometriótico. Esse sistema é importante para a adesão, a invasão e o desenvolvimento de implantes da doença.25 Recentemente, muitos estudos têm procurado entender a relação dos genes HOX com a endometriose. Esses genes, denominados ‘Homeobox* (Hox/HOX), são fato­ res de transcrição e desempenham papel essencial no desenvolvimento do esqueleto axial, incluindo a espécie humana. Nos mamíferos, os genes Hoxa 9, HoxalO, H oxall e Hoxa 13 regulam a diferenciação dos duetos mullerianos (paramesonéfricos) na es­ trutura genital do adulto. A expressão do Hoxa9 é limitada a tuba de falópio; HoxalO é expresso no epitélio, estroma e músculo uterino; Hoxal 1 é expresso nas glândulas cervicais e corpo uterino; e o H oxal3 é fortemente expresso no epitélio vaginal. Prin­ cipalmente, o HoxalO/HOXA10 está diretamente envolvido na embriogênese uterina (epitélio, estroma e músculo) e na implantação do embrião. A expressão desse gen ocorre ciclicamente no endométrio em resposta aos hormônios esteroides, regulando a receptividade endometrial durante a janela da implantação. Considerando que a

Capítulo 19 Endometriose 273

maioria das lesões endometrióticas está localizada no trajeto correspondente às es­ truturas mullerianas durante a embriogênese, pode ser plausível relacionar desenvol­ vimento dos duetos mullerianos, endometriose e HOXAIO. A expressão do HOXAIO tem sido demonstrada no peritônio humano, no ovário, na endometriose pulmonar26 e na endometriose do retossigmoide.27 O estudo do endométrio de mulheres com e sem endometriose tem identificado múltiplas expressões gênicas. Há diferenciação na codificação da interleucina-15, glicodelina, aromatase, receptor de progesterona e fatores angiogênicos.28Muitos outros genes têm sido identificados e vinculados à doença. Ainda não há indicação prática para estudos genéticos em famílias com endometriose. As obstruções ao fluxo menstrual constituem importante fator de risco para o de­ senvolvimento da endometriose. Elas podem ser congênitas ou adquiridas. Há maior refluxo sanguíneo para a cavidade pélvica, provável fator facilitador para o desenvol­ vimento da doença. Septos vaginais transversos, agenesias do colo uterino, hímen imperfiirado, cornos uterinos rudimentares e não comunicantes são exemplos de causas congênitas. As estenoses do colo uterino após procedimentos cirúrgicos, como conizações e cauterizações, são causas adquiridas que podem obstruir o fluxo menstrual.

IMPORTANTE T o d o s o s fa to re s q u e a u m e n ta m o v o lu m e o u a fre q u ê n c ia m e n s tru a l são im p u ta d o s c o m o de risco p a ra e n d o m e trio se . A n u lip a rid a d e , c iclo s m e n s tru a is e n c u rta d o s , m e n a rc a p re co ce , m e n o p a u s a ta rd ia e m e n s tru a ç õ e s excessivas são e x e m p lo s c ita d o s .29

Algumas pesquisas têm identificado fatores ambientais como possíveis colabora­ dores no desenvolvimento da condição patológica. Os compostos semelhantes à dioxina, subproduto de processos industriais incluindo reações com cloro e proveniente da incineração de lixo, são frequentemente relacionados. Os compostos possuem ca­ pacidade de ativação de receptores pertencentes à Superfamília de Receptores, que englobam os receptores hormonais, ocasionando a transcrição de múltiplos genes. Assim, os compostos semelhantes à dioxina poderiam estimular a endometriose devi­ do à maior produção de interleucinas, de enzimas do citocromo P-450 (aromatase) e gerando maior remodelação tecidual. É possível uma ação conjunta com estrógenos na estimulação tecidual e no bloqueio do receptor da progesterona.30As bifenilas policloradas (PCBs) também são apontadas como produtos tóxicos de relevância. Apesar de ainda não estar definido seu real papel no desenvolvimento da endometriose, algu­ mas hipóteses podem ser consideradas. Além da ação via receptor, já descrita para as dioxinas, é possível efeito ativador da MMP, mesmo na presença de progesterona, sa­ bidamente um potente agente anti-inflamatório. As PCBs são encontradas em fluidos dielétricos de transformadores, capacitores e coolers.31 F IS IO P A T O L O G IA



Lesão endometriótica

Desde a menarca, a cada ciclo menstrual, o endométrio eutópico, sobre influência estrogênica, cresce e descama (camada funcional), sendo eliminado ao meio exterior

274

Endocrinologia Feminina e Andrologia

pelas vias genitais inferiores, o que caracteriza a menstruação. O canal endocervical, a cavidade vaginal e a genitália externa são revestidos por tecido epitelial glandular, pavimentoso e queratinizado respectivamente, conferindo hipotética proteção ao conta­ to com as inúmeras substâncias de caráter inflamatório contidas no fluido menstrual. Os estrógenos também estimulam o endométrio ectópico (endometriose), que cresce e descama a cada ciclo, porém a característica tecidual do peritônio parietal ou visce­ ral não confere proteção. Sendo assim, há início de um processo de agressão tecidual inflamatória com imediata e progressiva resposta à inflamação caracterizada na forma de lise tecidual, produção de mediadores inflamatórios que promovem aumento da permeabilidade capilar e quimiotaxia, produzindo mais mediadores químicos, além dos contidos no fluido descamado pelo endométrio ectópico. A resposta é caracteriza­ da por exsudação, neovascularização, fibrose e retração (nódulo, aderência, distorções anatômicas) e, talvez, em situações próprias, o surgimento de fenômenos metaplásicos (metaplasia muscular). Essas alterações, localizadas no endométrio ectópico, originam as mais diferentes formas de apresentações das lesões endometrióticas, seja na forma superficial ou infiltrativa (profunda). O conceito de endometriose microscó­ pica (“invisível”) não encontra qualquer evidência científica e, portanto, não deve ser usada como base para qualquer tipo de terapêutica.32

O

Dor e disfunção de órgão afetado

As dores somáticas ou viscerais, juntamente com a infertilidade, constituem as princi­ pais indicações para o tratamento da endometriose. A dor é causada pela estimulação nas terminações nervosas por algumas das substâncias liberadas durante o processo inflamatório e pode ser exacerbada por um estímulo não doloroso. Diferente da dor, a hiperalgesia (aumento da sensibilidade dolorosa), que é bem conhecida mas raramente descrita pelos clínicos que lidam com endometriose, é fenômeno de intensa dor quando um estímulo, normalmente não doloroso, é apli­ cado. Alguns exemplos são clássicos: dispareunia de profundidade, dor à defecação, dor intensa durante o toque vaginal, quando comprimimos a lesão de endometriose profunda. Os sintomas dolorosos têm forte correlação com a localização da lesão.27 Quanto maior a quantidade de terminações nervosas na região, maior será a probabilidade de sintomas dolorosos. A porção posterior do anel pericervical (região retrocervical, liga­ mento uterossacro e fundo de saco de Douglas) está em íntimo contato com o plexo hipogástrico inferior, por onde transita a maioria dos estímulos aferentes nervosos (esteroceptivos e proprioceptivos) do sistema nervoso somático.

D Infertilidade Embora haja correlação entre quantidade, tipo e localização da lesão endométriotica com os sintomas dolorosos encontrados27, na infertilidade não está bem clara a associação das formas clínicas da doença. O conceito atual é que a infertilidade na endometriose é multifatorial, com muitas formas possíveis de interferência na reprodução.33 Na cavidade pélvica, há mudanças inflamatórias no fluido peritoneal, decorrentes da proliferação de macrófagos e disfunção dos fagócitos, bem como da liberação de fatores proinflamatórios e angiogênicos que podem afetar a interação do espermato­ zóide com o oócito.

Capítulo 19 Endometriose 275

No útero, ocorre ativação no fator 1 da esteroidogênese e na aromatase, aumentan­ do a resistência à progesterona e promovendo mudanças diretas sobre o endométrio, interferindo na nidação. Os ovários podem ter a reserva tecidual reduzida pelo endometrioma ou por cirur­ gias, além da função ovulatória alterada. A tuba pode sofrer distorções anatômicas, obstrução, dilatação com acúmulo de se­ creção (hidro ou hematossalpinge), interferindo negativamente não somente nas taxas de gestação espontânea, mas também nos procedimentos de reprodução assistida. T IP O S D E E N D O M E T R IO S E

Podemos dividir em 3 tipos a doença endometriótica: • Endometriose superficial: tem um papel duvidoso na infertilidade, restando apenas uma influência nos sintomas dolorosos. • Endom etriose profunda: é arbitrariamente definida como a infiltração do peritônio maior do que 5 mm. Didaticam ente esta definição põe em evidência a infiltração do espaço retroperitoneal, que pode variar desde a camada subperitoneal até os planos mais profundos da pelve feminina (assoalho pélvico, raízes sacrais). Essas lesões estão frequentemente associadas a infertilidade, maior inten­ sidade da dor, distorções anatômicas e disfunção do órgão ou estrutura acome­ tida. • Endom etriose ovariana: pode acometer a superfície da gônada ou, na sua forma profunda, formar pseudocistos a partir da invaginação do epitélio celômico ovariano, denominados de endometriomas ou popularmente conhecidos como cistos “chocolate”. C L A S S IF IC A Ç Ã O

Várias classificações foram propostas até hoje, porém nenhuma preenche necessida­ des vinculadas ao prognóstico de melhora da dor ou de resolução da infertilidade. A forma de avaliação mais utilizada considera a classificação da ASMR (Figura 19.1) que permite avaliação tridimensional das lesões e diferenciação entre lesões superficiais e profundas. A classificação é feita mediante estádios da doença: estádio I (mínima), estádio II (leve), estádio III (moderada) e estádio IV (grave). As lesões também devem ser descritas como brancas, vermelhas ou pretas.34 Outra forma utilizada para a classificação da doença subdivide os achados morfo­ lógicos em endometriose peritoneal superficial (Figura 19.2), endometriose ovariana (endometrioma) e endometriose infiltrativa profunda.35 (Figuras 19.3 e 19.4).

IMPORTANTE E n d o m e trio s e p r o fu n d a é d e fin id a c o m o a in filtr a ç ã o d o s im p la n te s de e n d o m e trio s e além de 5 m m d a su p e rfíc ie p e rito n e a l, c o m fib ro s e e h ip e rp la s ia m u s c u la r.36

Capítulo 19 Endometriose 277

FIGURA 19.3 Endometriose ligamento uterossacro.

FIGURA 19.4 Pelve congelada por endometriose.

D IA G N Ó S T IC O

Deve-se manter alto grau de suspeição da doença, pois há um longo intervalo entre o início dos sintomas e o diagnóstico. Um estudo nacional identificou tempo médio de 7 anos para o diagnóstico. Quanto mais jovem a paciente no início dos sintomas, maior o tempo para o diagnóstico.37 São características da endometriose manifestações cíclicas dolorosas ou disfunção do órgão acometido no período pré e menstrual e, em menor intensidade e duração, no período ovulatório (em decorrência do hiperestrogenismo do pico ovulatório). A dor, em diferentes formas e intensidade, mas principalmente no hipogástrio, é o sin­ toma preponderante na endometriose. Dor no hipogástrio, repentina, tipo pontada, de caráter paralisante, de curta duração e que cede espontaneamente, é extremamente

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

comum. As pacientes podem queixar-se de dismenorreia progressiva ou não, dor pél­ vica crônica que se intensifica nos períodos pré- e menstrual, lombalgia cíclica, cons­ tipação crônica, aumento do número de evacuações e não diarreia (fezes líquidas), distensão abdominal, sangramento uterino anormal (escape pré e pós-menstrual), dispareunia de profundidade, movimento peristálticos dolorosos, disquezia (cólica que alivia com a evacuação ou eliminação de gases, proctalgia, tenesmo com ou sem muco, reflexo gastrocólico doloroso) e alterações cíclicas da micção (disúria, polaciúria, dor ao final da micção, dor vesical com a bexiga cheia, nictúria). Frequentemente citada, mas extremamente rara, é a hematúria cíclica manifestada em alguns casos de invasão da mucosa vesical. Já o sangramento retal cíclico (menstrual) aparece em menos de 5% das lesões infiltrativas do retossigmoide, mas, quando presente, é praticamente sinal de certeza de infiltração da camada mucosa. Dependendo do local acometido, podemos ter sintomatologia rara, manifestada geralmente no período menstrual, como por exemplos: endometriose na pleura pode apresentar-se como pneumotórax catamenial, derrame pleural hemorrágico, dor torácica tipo pleurítica, atrito pleural; endometriose brônquica como hemoptise; na cicatriz umbilical como sangramento, dor, intumescimento, secreção; no diafragma como dor torácica e em ombro, algumas vezes com irradiação para o braço direito e pescoço, dificuldade para respirar devido à dor, muitas vezes só conseguindo dormir na posição sentada; no assoalho pélvico como dor na nádega, dor e pressão no períneo, dificultando permanecer sentada por longos períodos; no plexo lombossacro como ciatalgia cíclica. Apesar da enorme gama de manifestações, algumas pacientes podem ter sintomatologia discreta. Muitas mu­ lheres com endometriose podem adaptar-se a uma determinada situação dolorosa ou incômoda que elas comumente interpretam como normal. As classificações existentes não conseguem proporcionar vínculo entre o grau da doença e a intensidade da dor. Assim, é possível uma paciente com endometriose leve apresentar sintomatologia álgica exuberante. Acometimento extrínseco ou intrínseco do ureter pode levar a hidrouereteronefrose com perda da função renal. Estes casos são diferentes da obstrução aguda do ureter por cálculo que se manifesta com dor. Na obstrução por endometriose, a falência renal é silenciosa e, muitas vezes, diagnosticada como achado de exame e tardiamente. Quadros agudos podem ocorrer em virtude de endometriose. Os casos mais rela­ tados ocorrem devido a rotura de endometrioma, apendicite, obstrução intestinal e dor crônica agudizada. Na análise de casos de endometriose aguda, em atendimentos emergenciais realizados por cirurgiões gerais, as condições mais encontradas foram: nodulações em incisões cirúrgicas à Pfannestiel, nodulações no canal inguinal e cica­ triz umbilical, hematoquezia, dor abdominal recorrente, tumorações anexiais e peritonite.38 A infertilidade é outro quadro frequente na endometriose. Como já mencionado, o mecanismo exato de causa e efeito ainda é controverso. Hipóteses como as distorções anatômicas do trato genital, alterações no fluido peritoneal, na receptividade endometrial, na implantação embrionária e alterações endócrinas e ovulatórias são frequen­ temente citadas.39 Repercussões psíquicas podem ser encontradas nestas pacientes. Um estudo brasi­ leiro comparou a frequência de depressão em pacientes com diagnóstico cirúrgico de endometriose. Comparando 2 grupos, um com pacientes portadoras de dor pélvica e

Capítulo 19 Endometriose 279

outro sem o sintoma, no grupo com dor a depressão apresentou frequência de 86% contra 36% no grupo sem dor.40 Na dependência da localização e do grau de acometimento dos órgãos pélvicos, pode-se encontrar grande variabilidade no exame físico. Durante o exame especular, é importante a minuciosa inspeção da mucosa do fórnice vaginal posterior. Se houver lesão no espaço retovaginal, a parede do reto extraperitoneal e a vaginal poderão ser infiltradas, causando retrações, distorções, lesões avermelhadas ou mesmo azuladas quando a mucosa estiver infiltrada (cisto endometriótico). Ao toque vaginal, pode-se encontrar dor à palpação das regiões anexiais e à mobilização uterina. O útero pode es­ tar fixo, tanto na posição retrovertida como em anteversoflexão. Nodulações extrema­ mente dolorosas podem ser palpáveis na região retro cervical, ligamento uterossacro e espaço retovaginal. Ainda no exame digital, através do fórnice vaginal posterior, ao acessar a parede pélvica lateral, podem-se identificar traves fibróticas ou nodulações extremamente dolororosas na região do assoalho pélvico (músculo coccígeo) ou do plexo lombossacral. Tumorações anexiais fixas podem ser palpáveis na presença de endometriomas ovarianos.

IMPORTANTE P a ra m u ito s p ro fis s io n a is o to q u e re ta l é im p o r ta n te , p o is p e rm ite b o a a v a lia çã o d a reg iã o re to v a g in a l, p ared e d o re to b a ix o , reg ião re tro ce rv ica l e d os lig a m e n to s u te ro ss a c ro s .



Exames complementares

O diagnóstico por imagem tem apresentado grande evolução na última década. Mesmo assim, a endometriose superficial permanece como um grande desafio para os exames de imagem, que não conseguem uma avaliação eficiente desta modalidade da doença. Já com relação à endometriose profunda, a USTV, principalmente com preparo intes­ tinal e complementada com a transabdominal, a RM da pelve e a ecocolonoscopia têm promovido verdadeira revolução no diagnóstico, no mapeamento das lesões e no plane­ jamento terapêutico, principalmente o cirúrgico. No acometimento do retossigmoide, os exames complementares, idealmente, deveriam avaliar o tamanho da lesão, as cama­ das e a circunferência intestinal comprometidas, bem como a distância da borda anal.

IMPORTANTE ■ USTV: é u m b o m exam e p ara a d etecção de en d o m etrio m as ovarianos, co m excelente especi­ ficidade e sensibilidade.41 Possui lim itações n a avaliação da end om etriose superficial e de aderên­ cias pélvicas. N a avaliação d a en d o m etrio se p ro fu n d a, q u an d o realizada p o r p ro fissio n al cap a­ citad o, vem sen d o in d icad a co m o p rim eiro exam e.42 É possível o estu d o de lesões de retossig­ m o id e c o m esta técn ica, m esm o sem preparo in testin al. P ara avaliação da d istân cia da b o rd a anal, dado p ré-op eratório relevante, o preparo in te stin a l parece ser de ajuda. N a en d o m etrio se u rin ária, con segu e avaliar o a c o m e tim e n to vesical e as d ilatações ureterais.

• Ultrassonografia abdominal: em c o n ju n to c o m a U S T V , p e rm ite av aliação d a fo s s a ilía c a d ire ita (ile o te r m in a l e a p ê n d ice ). T a m b é m c o n se g u e av aliar a p r e s e n ç a de d ila ta ç ã o das vias u rin á ria s su p erio res.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

• Ecoendoscopia retal: p o d e ser u tiliz a d o c o m o c o m p le m e n to n a d e te c ç ã o de le sõ e s de re to ss ig m o id e , c o m d e ta lh a m e n to d as ca m a d a s a c o m e tid a s e a d is tâ n c ia d a b o r d a an al. N ã o é su p e rio r à U S T V .43

• RM: e x c e le n te e x a m e p a r a a v a lia r e n d o m e tr io s e o v a r ia n a e, c o m m é d ic o s e x p e rie n te s, p e r m ite a d e q u a d a a v a lia ç ã o d a e n d o m e tr io s e p r o fu n d a , m u ito p r ó x im a a o u ltr a s s o m , d e te r m in a n d o ó t im a c o r r e la ç ã o c o m o s a c h a d o s la p a r o s c ó p ic o s .2 P r o p o r c io n a m e lh o r av aliação d a e n d o m e trio s e p ro fu n d a , a tin g in d o a sso a lh o p élv ico e p le x o lo m b o s s a c ro .

• Enema baritado e colonoscopia: a m b o s p o d e m a v a lia r a m u c o s a in te s tin a l, p o ré m o a c o m e tim e n to d e sta c a m a d a é in c o m u m . S in a is in d ire to s p o d e m ser id e n tific a d o s , c o m o a e ste n o se . D ev id o às su as lim ita ç õ e s , devem ser s u b s titu íd o s p e la U S o u R M .

• Videolaparoscopia: h is to r ic a m e n te é c o n sid e ra d a a té c n ic a p re fe re n cia l p a ra o d ia g n ó s ­ tic o , a sso c ia d a ao e stu d o h is to ló g ic o das lesõ e s retirad as. H á g ra n d e v a ria b ilid a d e de ap re­ s e n ta ç ã o d as lesõ es, q u e p o d e m ser v e rm elh a s, a m a rro n z a d a s, p re ta s, e sb ra n q u iç a d a s, em fo rm a de vesícu las, fa lh a s p e rito n ia is, d en tre o u tras. O s e n d o m e trio m a s, ta m b é m ch am ad o s de c is to s de c h o c o la te , c o n tê m líq u id o m a rro m e, em g eral, p o d e m e sta r ad erid o s ao lig a ­ m e n to la rg o . A m u ltip lic id a d e d e le sõ e s fa z c o m q u e a e x p e riê n c ia d o e x a m in a d o r s e ja fu n d a m e n ta l ao d ia g n ó s tic o . A lg u m a s p e sq u isa s d e m o n s tr a m q u e o e s tu d o h is to ló g ic o d as le s õ e s deve ser re a liz a d o q u a n d o h á d ú v id a s n o d ia g n ó s tic o m e d ia n te a a v a lia ç ã o v isu a l.44 P o ré m , c e rc a d e 3 0% d as le sõ e s re tira d a s n ã o p o s s u e m d ia g n ó s tic o h is to ló g ic o co n firm a d o . As lesões retro v ag in ais p o d e m n ã o ser visu alizad as, p o is, em alg u m as situ a çõ e s, e x iste m a d erên cia s n o fu n d o de sa co o u a lesã o p o d e ser in fra p e rito n e a l. C o m a m e lh o ria da avaliação p ré-o p era tó ria , o p ap el d a la p a ro sco p ia d ia g n ó s tica fico u red u zid o. T e m m a io r a p lic a çã o n o s ca so s de s u sp e ita de lesõ e s su p e rficia is em p a c ie n te s c o m in fe rtilid a d e .

• Marcadores séricos: o C a - 125 é o ú n ic o m a rc a d o r b io q u ím ic o u tiliz a d o n a p rá tic a p a ra a u x ilia r n o d ia g n ó s tic o e a c o m p a n h a m e n to de p a c ie n te s a p ó s a re s s e c ç ã o c ir ú r g ic a d a e n d o m e trio s e . C o n s id e ra -s e elev ad o u m v a lo r s u p e r io r a

35 U I/m L. A ele v a çã o de seu s

n íveis é m a is e n c o n tr a d a n a e n d o m e trio s e m o d e ra d a e grave. A p re se n ta lim ita ç õ e s n o seu u so c lín ic o , p o is o u tra s lesõ es g in e c o ló g ica s p o d e m o c a s io n a r seu a u m e n to , c o m o m io m a s u terin o s, d o e n ça in fla m a tó ria pélvica, c a rc in o m a ov arian o , en tre o u tras. A lém d isso, m esm o em caso s graves de e n d o m e trio se , p od e te r seu v alo r n o rm a l. P od e ser u tiliz a d o em p acien tes n o p ré -o p e ra tó rio , em q u e v alo res elevados (>

65 U I/m L) p o d e m e s ta r c o rre la c io n a d o s c o m

m a io r fre q u ê n c ia de a d erên cia s graves e m a io r risco de lesõ es in te s tin a is .45

D IA G N Ó S T IC O D IF E R E N C IA L

Como a endometriose apresenta múltiplas formas de apresentação, a lista de doenças englobadas no diagnóstico diferencial é extensa, incluindo, entre outros: • • • • • • • •

Doença inflamatória pélvica. Cisto ovariano hemorrágico. Torção ovariana. Dismenorreia primária. Mioma degenerado. Síndrome da bexiga dolorosa. Infecção urinária. Doença inflamatória intestinal.

Capítulo 19 Endometriose 281

• • • • • •

Síndrome do cólon irritável. Diverticulite. Carcinoma vesical. Carcinoma intestinal. Carcinoma ovariano. Tumores apendiculares. TR A TA M EN TO

A endometriose é doença benigna, de alta prevalência, que não põe em risco a vida da paciente, salvo raríssimas exceções, como obstrução bilateral do ureter ou obstrução e perfurações intestinais. Entretanto, ela frequentemente limita a qualidade de vida, devido aos mais variados tipos de distúrbios dolorosos, além de ser uma das mais fre­ quentes causas de infertilidade.

IMPORTANTE Costumamos tratar essas pacientes nas seguintes situações: • Dor ou a disfunção do órgão acometido. • Causando infertilidade. • Prevenindo complicações futuras em casos selecionados. O tratamento definitivo para a endometriose é simples: erradicação cirúrgica das lesões. O sucesso do tratamento cirúrgico é mais bem avaliado pela determinação da quantidade de doença, se alguma permanece após a intervenção operatória.46 O tratamento com medicamentos possibilita tratar apenas os sintomas. Não há medicamento que atue na eliminação da lesão endometriótica. Eles agem promoven­ do atrofia endometrial, p. ex.: análogo do GnRH, ou progestógenos, ou levando a uma decidualização endometrial e atrofia (contraceptivos hormonais). A ação destes me­ dicamentos ocorre tanto no endométrio tópico (cavidade uterina), como no ectópico (lesão endometriótica), apresentando praticamente as mesmas reações ou resposta. Após interromper a medicação, ambos os endométrios voltam a sofrer a ação do estrógeno endógeno (ovariano) e tendem a ter as mesmas respostas da fase pré-medicação (sintomas “de novo”).

Q Conduta expectante Pode ser considerado nas pacientes assintomáticas, com sintomas mínimos sem impac­ to na qualidade de vida, e na perimenopausa. Após a menopausa, a instalação do hipoestrogenismo ocasiona regressão expressiva dos focos da doença. Estas pacientes devem ser frequentemente avaliadas, pois é possível em 10% das vezes uma atividade da aromatase, estimulando assim o endométrio ectópico e podendo manter os sintomas dolorosos. Felizmente na prática clínica, menos de 10% das pacientes que adentram ao climatério terão dor ou sintomatologia da endometriose relacionada à atividade da aromatase. No entanto, qualquer mulher, em qualquer fase do climatério, que apresente endométrio ectópico (endometriose), particularmente as que apresentavam sintomas no menacme, podem tornar-se novamente sintomáticas durante a reposição hormonal.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

Tratamento clínico

Pacientes com dor ou disfunção de órgãos decorrentes da endometriose, podem re­ ceber medicação que poderá aliviá-la dos sintomas, mas jamais tratará a doença de­ finitivamente, pois as medicações impedem, na maioria das vezes a descamação do endométrio ectópico, evitando, assim, a agudização do processo inflamatório desen­ cadeado durante o período menstrual. Quanto mais infiltrativa a lesão e mais extensa a doença, menor será a probabilidade de resposta positiva ao controle dos sintomas. Este tipo de tratamento não deve ser realizado em pacientes com estenose intestinal significativa (raro) ou ureteral, tumor anexial suspeito ou que apresente aumento pro­ gressivo das lesões na vigência da medicação. Nas pacientes inférteis, o tratamento clinico não demonstra benefício em relação às taxas de gravidez e atrasa o surgimento da mesma.47Várias são as opções medicamentosas na tentativa de reduzir ou controlar a dor e em raras situações suprimir o crescimento endometrial ectópico: • Contraceptivos orais: constituem a melhor opção de tratamento a longo prazo, pois podem ser utilizados, se forem ausentes as contraindicações, até a menopausa e com custo reduzido. Em geral, são utilizados os contraceptivos combinados, com estrógeno e progestógeno. Apresentam a capacidade de provocar a decidualização e posterior atrofia dos focos endometriais ectópicos, além do bloqueio das gonadotrofinas. Ainda não há consenso sobre o melhor regime de administração dos contra­ ceptivos combinados, se cíclico ou contínuo. Na opção do esquema cíclico e com a ausência de melhora sintomática da paciente, pode-se alterar a terapia para o esquema estendido (contínuo). Outras vias de administração dos contraceptivos podem ser utilizadas (vaginal, transdérmica), mas ainda não há número suficiente de pesquisas com estes preparados. Recentemente, um novo progestógeno utilizado em pílula combinada, o Dienogeste, foi introduzido no Brasil. Em outros países, seu uso isolado vem apresentando boa eficácia no tratamento da endometriose, com controle sinto­ mático semelhante aos análogos do GnRH.48Em breve, é possível esta apresentação em nosso país. • Progestógenos: possuem capacidade de decidualização dos focos endometrióticos. Outro mecanismo de ação seria a supressão das MMP, com bloqueio do crescimento dos focos.49Os progestógenos, de modo geral, conseguem alívio sinto­ mático na maioria das pacientes. Os contraceptivos progestacionais também podem ser utilizados para este fim. O acetato de medroxiprogesterona 150 mg injetável é opção interessante pela fácil posologia trimestral. O implante subdérmico pode ser utilizado por até 3 anos. Os progestógenos orais como gestrinona, megestrol, noretisterona e medroxiprogesterona podem ser utilizados para o controle da dor. Os principais efeitos colaterais são sangramento uterino irregular, ganho ponderai e alterações do humor. O endoceptivo liberador de um progestó­ geno, o levonorgestrel (SIU-LNG) é uma opção interessante nas pacientes sinto­ máticas, pois é permitido seu uso por até cinco anos. Alguns estudos demonstram que o SIU-LNG é capaz de reduzir a dismenorreia e a dor pélvica crônica. A recor­ rência dos sintomas também é reduzida com o uso do SIU-LNG após cirurgia para endometriose.50,51 Os estudos com progestógenos orais são realizados por 6 a 12 meses, mas seu uso a longo prazo é possível. Há discreta redução da massa óssea com doses altas de medroxiprogesterona injetável e redução do HDL com uso da noretisterona. A monitorização óssea é controversa. O perfil lipídico deve ser controlado com uso de noretisterona a longo prazo.

Capítulo 19 Endometriose 283

• Análogos do GnRH: os análogos agonistas do GnRH bloqueiam as gonadotrofinas hipofisárias, impedindo a síntese de estrógenos ovarianos. Esta classe de medica­ mentos se mostra eficaz no controle da endometriose, como os progestógenos. Em geral, são utilizados por 3 a 6 meses. Seu uso prolongado pode ocasionar redução da massa óssea. Outros efeitos colaterais são os fogachos, ressecamento genital, alterações de humor, diminuição da libido, todos vinculados ao hipoestrogenismo. A adição de medicamento para controle destes sintomas (add-back therapy) pode ser empregada. Os mais comumente utilizados são os preparados estroprogestínicos utilizados para tratamento da menopausa, a tibolona, noretisterona e os contraceptivos orais. Os análogos são utilizados pelas vias intramuscular, subcutânea e nasal. O spray nasal é utilizado diariamente e as outras vias são utilizadas mensalmente ou a cada três meses. • Inibidores da arom atase: a aromatase é a enzima capaz de converter os andrógenos em estrógenos. Nos focos de endometriose, há maior expressão e atividade desta enzima. Esta classe de medicamentos pode bloquear a produção estrogênica no endométrio ectópico, no ovário e no tecido adiposo periférico.52Ainda não são aprovados para o tratamento da dor em pacientes com endometriose. Os mais utilizados são o Anastrozol e o Letrozol. Uma revisão sistemática demonstrou que os inibidores da aromatase utilizados em conjunto com outras medicações reduzem significativamente a dor das pacientes.53 Em pacientes na pré-menopausa, o uso prolongado destes medicamentos pode ocasionar elevação do hormônio folículoestimulante e desenvolvimento de múltiplos cistos ovarianos. E interessante a prescrição de medicamento para controle destes eventos, como os contraceptivos ou análogos do GnRH. • D anazol: esteroide sintético derivado da 17-alfa-etiniltestosterona capaz de ocasionar ambiente androgênico e hipoestrogênico. Possui ação antigonadotrópica. E usado na dose de 200 a 800 mg/dia por 3 a 6 meses. Permite melhora sinto­ mática efetiva quando comparado a placebo.54 Impõe-se o controle dos paraefeitos androgênicos, como a atrofia mamária, acne, mudança no perfil lipídico, dentre outros. • Anti-inflam atórios não horm onais: devido ao papel das prostaglandinas na fisiopatologia da endometriose, o uso dos anti-inflamatórios parece racional. Não há estudos demonstrando efetividade no controle da dor causada por endometriose. Devido aos achados positivos na dismenorreia, é possível seu uso nestas pacientes. O tratamento clínico no pós-operatório é frequentemente utilizado, seja na cirur­ gia conservadora ou radical. Apesar de haver melhora nas taxas de recorrência, não se provou benefício na recidiva da dor ou nas taxas de gestação.55 Terapia hormonal do climatério pode ser necessária nas pacientes submetidas à ooforectomia bilate­ ral, mormente naquelas na pré-menopausa. Normalmente, pacientes submetidas à histerectomia devem realizar terapia apenas com estrógeno. Há relatos de pacientes com endometriose severa, submetidas à exérese uterina e dos seus anexos, que apre­ sentaram recidivas após terapia estrogênica. A possibilidade de malignização de fo­ cos, apesar de rara, é possível com o uso isolado do estrógeno. Assim, alguns autores consideram que nas pacientes submetidas a tratamento radical por doença grave, a melhor conduta seria terapia de reposição hormonal combinada, ou seja, estrógeno associado a progestógeno.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

D Tratamento cirúrgico A cirurgia laparoscópica tornou-se o padrão ouro no tratamento cirúrgico da endometriose em praticamente todos os grandes centros de referência nacional e mundial, devido as suas conhecidas e consagradas vantagens sobre a laparotomia. Os princípios da cirurgia da endometriose são: 1- Excisão de todas as lesões visí­ veis; 2- Cirurgia mediante técnica sítio específico, ou seja: a técnica será especí­ fica para cada região ou órgão atingido, por exemplo: endometrioma de ovário, endometriose de retossigmoide ou endometriose de bexiga, etc.; 3- Restauração da anatomia pélvica; 4- Preservação e reestabelecimento da fertilidade, se houver desejo reprodutivo; 5- Profilaxia de aderências; 6- Preservação e reestabelecimento da função dos órgão pélvicos; 7- Utilização de técnicas cirúrgicas minimamente invasivas. A cirurgia conservadora engloba a manutenção uterina e a maior quan­ tidade de tecido ovariano possível. A endometriose profunda deve ser excisada e não cauterizada (Figuras 19.5 a 19.12). A cauterização constitui uma das causas de maior fracasso neste tipo de intervenção, levando à persistência da lesão, frequente e erroneamente con­ fundida como recidiva. A cauterização age na superfície da lesão e não na parte infiltrativa, como em um “iceberg”, estando a maior parte da lesão localizada ou “submersa”, infiltrando o retroperitônio. Talvez, na lesão isolada e superficial a fulguração, vaporização ou cauterização possa eliminar o tecido endometrial ectópico. Frequentemente, a doença endom etriótica leva a formação de extensas e firmes aderências, principalmente dos órgãos pélvicos. São aderências inflam a­ tórias e, portanto, a simples lise não traz nenhum benefício, já que as aderências serão refeitas, pois a lesão continua e com um agravante, a formação de fibrose, criando assim um novo fator de dor e dificuldade cirúrgica em um novo proce­ dimento. Mesmo em ressecções radicais envolvendo intestino, bexiga ou obliteração no fun­ do de saco, a fertilidade pode ser restabelecida em 40% a 60% das pacientes, se uma das tubas estiver preservada, bem como a função ovariana.56

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FIGURA 19.5 Endometriose no peritônio vesicouterino.

Capítulo 19 Endometriose 285

Vejam as figuras em cores no Caderno Colorido

FIGURA 19.6 Endometriose no peritônio vesicouterino: ressecção.

FIGURA 19.7 Endometriose de bexiga e parede uterina anterior. *-i ..•• '.** «

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FIGURA 19.10 Endometriose de plexo sacral: ressecção.

FIGURA 19.11 Retossigmoidectomia vaginal assisistida por laparoscopia.

Vejam as figuras em cores no Caderno Colorido

286

Capítulo 19 Endometriose 287

FIGURA 19.12 Ressecção Intestinal com grampeador linear.

É consenso entre os principais centros de referência no tratamento da endometriose que quanto mais completa e radical for a exérese das lesões, maior a possibilidade de cura, com taxas de 50% a 90%.56,57,58 Histerectomia com ooforectomia bilateral foi conside­ rado no passado um exemplo de cirurgia radical. Hoje sabemos que estas pacientes podem persistir com lesões infiltrativas profundas no retroperitônio e continuarem sintomáticas pela ação periférica das aromatases, convertendo andrógenos em estrógenos. Histerectomia deve ser reservada às pacientes com prole constituída ou grave­ mente afetada por adenomiose focal ou infiltração endométriotica da serosa uterina comprometendo extensamente a parede miometrial, impossibilitando, assim, sua exérese. Ooforectomia deve ser realizada se houver extenso comprometimento do estroma ovariano (comum após tentativas inadequadas de extração de endometriomas) bilateralmente e em pacientes que já tenha prole constituída. Tanto a histerectomia como a ooforectomia somente podem beneficiar estas pacientes se todas as lesões pro­ fundas, especialmente na pelve, forem extirpadas. Os princípios da cirurgia da endometriose requerem consumo de tempo considerá­ vel em treinamento e experiência, superando os da cirurgia oncológica. Estas pacien­ tes devem ser encaminhadas para centros especializados com apropriado treinamento e experiência para submeter-se a um procedimento seguro. Se estas cirurgias, mesmos as mais radicais, forem realizadas em centros especializados por cirurgiões experientes, as complicações graves são raras.4,56,59

D Tratamento da infertilidade O tratamento clínico da endometriose em pacientes inférteis não deve ser realizado. As pacientes inférteis com suspeita de endometriose mínima ou leve podem beneficiar-se da realização de videolaparoscopia para exérese das lesões (Figura 19.13), porém esta conduta ainda não está totalmente definida na literatura médica.60,61 Na endometriose profunda, o tratamento cirúrgico radical pode melhorar as taxas cumulativas de gra­ videz espontânea, e se realizada antes de fertilização in vitro (FIV), pode melhorar as taxas de gravidez.32,57

288

Endocrinologia Feminina e Andrologia

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FIGURA 19.13 Exérese de lesão superficial.

As pacientes portadoras de endometriomas pequenos (< 4 - 5cm) podem ser sub­ metidas à FIV sem a exérese da lesão. Estudos de metanálise não demonstram piores resultados de gravidez em ciclos de FIV na presença destas lesões.62,63 A cirurgia ovariana pode ocasionar comprometimento da reserva folicular. As condutas na infertilidade podem ser assim definidas:64 • Diagnóstico e tratamento cirúrgico de endometriose mínima ou leve —> conduta expectante ou indução ovulatória com ou sem inseminação intrauterina (IIU) nas pacientes com menos de 35 anos. Pacientes com mais de 35 anos devem ser subme­ tidas a IIU ou FIV. • Pacientes com endometriose moderada ou grave devem ser submetidas a tratamento cirúrgico • Pacientes com endometriose moderada ou grave que não engravidaram após a cirurgia ou que tenham idade superior a 35 anos devem ser submetidas à FIV. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

1. V on R o k itan sk y C. U eber u teru sd ru sen-neu buildung in uterus and ovarilsarcom en. Z Ges Aerzte W ein 1 8 6 0 ;3 7 :5 7 7 -9 3 .

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IN T R O D U Ç Ã O

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu cuidados a se buscar para a Saú­ de Reprodutiva, como controle da fertilidade (ou seja, como ter ou não ter filhos e quando), atendimento adequado às gestantes, assistência ao parto e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Em uma visão mais ampla, deve-se considerar as pessoas individualmente e em conjunto, pensar e orientar também sobre os cuidados com o meio ambiente, com nossos hábitos e condições de vida. Pensa-se que, na hora de se ter filhos, as coisas acontecerão naturalmente, como respirar ou piscar os olhos. Questões como idade da mulher, dificuldades de engra­ vidar, problemas de infertilidade parecem distantes, coisas que que só acontecem com os outros. Poucos param para pensar e decidir que também devem planejar a parada da pílula ou dos métodos que evitam a gravidez e que, de preferência, isso deve ocorrer antes dos 35 anos da mulher (ou dos 40 anos do homem). As questões relacionadas com a dificuldade de engravidar podem se constituir em um problema sério a afetar a vida de mulheres, homens e casais, gerando muita ansiedade, tensão e frustração.1 Mesmo hoje, com a evolução das técnicas e com o conhecimento e a tecnologia mé­ dica, as diversas possibilidades da reprodução chamada assistida, como a fertilização in vitro, a microinjecção intracitoplasmática do espermatozóide (ICSI), os diagnósti­ cos genéticos pré-implanrtação dos embriões, a criopreservação de espermatozóides, óvulos ou embriões podem não ser a garantia de sucesso. E necessário que haja, então, plena informação para as pessoas quanto à sua saúde em geral, como e quando planejar sua família, suas ideias sobre filhos, o cuidado bio­ lógico com o tempo que passa e a necessidade de ter seu médico como um aliado nas ações de saúde. As escolhas que definem a pesquisa e o tratamento da infertilidade fazem parte, portanto, do desenvolvimento sistemático de procedimentos,2a fim de reduzir tempo e custos na avaliação, como também minimizar os desgastes emocionais.2As melhores condutas provêm das publicações clássicas, são baseadas em dados robustos ou, mais simples e frequentemente, são os melhores dados disponíveis, em um universo contí­ nuo, de educação continuada.3

Capítulo 20 Infertilidade do casal 293

D E F IN IÇ Õ E S

F ertilid ad e diz respeito ao número de filhos vivos de um casal. Fecu n d ab ilid ad e é a probabilidade de ocorrer uma gravidez por ciclo de exposição, enquanto a fecu n d id a­ de se define pela probabilidade de se chegar a nascido vivo a cada ciclo de exposição.

Em um casal normal, a taxa de fecundidade varia entre 15% e 20%.4A média de relações de 2 a 3 vezes por semana parece otimizar a possibilidade. A padronização e a comparação dos procedimentos em reprodução levados a cabo em diferentes países e regiões visa, principalmente, padronizar e harmonizar dados de coletas internacionais, ajudando a monitorização da viabilidade, da eficácia e da segurança da tecnologia reprodutiva assistida praticada em todo o mundo. Assim, 72 clínicos, cientistas de áreas básicas, epidemiologistas e cientistas sociais se reuniram na sede da OMS, em Genebra, em dezembro de 2008, para criar um novo glossário da terminologia reprodutiva.5 Entre os termos avaliados, especial ênfase devemos atri­ buir à definição da In fertilid ad e.

IMPORTANTE Infertilidade (definição clínica) é a doença do sistema reprodutivo definida pela falha de se obter gravidez clínica após 12 meses ou mais de coito regular desprotegido. Esta dificuldade afeta aproximadamente 10% dos casais em idade reprodutiva. Pode ser primária, quando o casal já conseguiu gravidez mesmo que não tenha chegado ao termo, ou secundária, quando não houve gravidez. Há possibilidades em se aguardar por 2 anos, pois metade das mulheres que não estão grávidas ao final do primeiro ano atingirá esse objetivo em até 24 meses (taxa cumulativa de 92%). Em 3 anos de espera, a taxa cumulativa se resume a 93%. Da mesma forma, quando a mulher tem idade > 35 anos, o tempo pode ser redu­ zido para 6 meses. A pesquisa deve ser imediata quando na presença de antecedentes sugestivos de problemas ou em mulheres > 40 anos. Uma observação cabe quanto ao conceito de infertilidade social e novas constitui­ ções familiares.6 A Resolução n° 1.957/2010 do Conselho Federal de Medicina7 passou a permitir o acesso às técnicas de Reprodução Assistida, antes restritas a “toda mulher capaz”, a “todas as pessoas capazes”, o que abre espaço para famílias homoafetivas, que, na realidade, já são relativamente numerosas. ■

P R IN C ÍP IO S B Á S IC O S D O A T E N D IM E N T O

A investigação da infertilidade visa identificar situações causais, levando à adequada prescrição de tratamento. A avaliação começa com a anamnese detalhada8 e o exame físico completo. A OMS preconiza a consulta conjunta, posto que ambos os interessa­ dos são afetados pelas decisões e pelos tratamentos. A primeira consulta deve incluir avaliação de como a mulher/casal entende a sua própria fertilidade. História sexual, contracepção, gravidezes, filhos vivos, história ocupacional, hábitos (inclui fumo, ál­ cool, drogas lícitas e ilícitas) e cirurgias (principalmente sobre o aparelho reprodutor) devem ser investigados, bem como tratamentos anteriores, hormonais e em geral e datas.

294

Endocrinologia Feminina e Andrologia

O rastreio do colo do útero deve ser preconizado, assim como a prevenção da rubéola. Deve-se iniciar investigação precocemente se estiverem presentes na história pregressa fa­ tores como doença inflamatória pélvica e criptorquidia e em mulheres acima de 35 anos. A suplementação com ácido fólico deve ser sugerida quando a mulher deseja gestar, na dose de 0,4 mg/dia, para a prevenção de defeitos do tubo neural, mantida até a 12 a semana de gravidez. Quando na presença de história prévia de criança portadora de defeito neural, a dose é de 5 mg/dia (nível de evidência A). Doenças crônicas, como infecções virais, hepatite B ou C, soropositividade para HIV, demandam encaminhamento direto a um especialista para redução nos riscos da investigação e do tratamento. Algumas vezes, estes casais não são inférteis, mas neces­ sitam de aconselhamento e condução do processo reprodutivo. Casais com história an­ terior de tratamento para câncer ou com diagnóstico recente, em preparo para tratamento oncológico, devem ser referidos diretamente a um especialista. E T IO L O G IA

A OMS reconhece na infertilidade um problema de saúde pública.9 Embora principal­ mente nos países em desenvolvimento a mulher seja o foco maior da propedêutica e da “culpa” social, o homem contribui igualmente nas causas relacionadas. Estima-se que cerca de 35% das causas estão associadas a fatores femininos, 30% a fatores mas­ culinos, 15% são de causa desconhecida e que 20% dos casais inférteis apresentam uma associação de fatores. A prevalência das alterações etiológicas pode diferir de acordo com a região geográfica estudada ou com os grupos sociais.

D Dados a considerar Idade O declínio da fertilidade começa muitos anos antes da menopausa apesar da persistên­ cia de ciclos ovulatórios, mais pronunciado a partir dos 35 anos. Níveis de hormônio folículo-estimulante (FSH) >15 no terceiro dia do ciclo menstrual significam níveis de gestação declinando significativamente. São raras as gestações quando FSH > 25 UI. Ainda, mulheres com má-resposta à indução de ovulação e com FSH basal aumentado tendem à menopausa antes de 45 anos, comparadas a outras normorrespondedoras. O risco de aborto espontâneo também aumenta com a idade materna: 14% nas pa­ cientes com menos de 35 anos, 19% nas pacientes de 35 a 37 anos, 25% nas de 38 a 40 anos e 40% após 40 anos. Tanto a diminuição da fertilidade quanto o aumento das ta­ xas de abortos estão associados a maior frequência de aneuploidias (alterações do nú­ mero ou formas cromossomiais), na maior parte das vezes relacionadas com os óvulos. São descritos efeitos da idade do homem > 40 anos na qualidade do sêmen, o que pode acentuar o dano à fertilidade de um casal quando associa-se o risco de ambos.

Obesidade Pode causar impacto na função reprodutiva, resultando em disfunção ovulatória. A perda de peso, incluindo exercício e dieta, melhora as taxas de gravidez (nível de evi­ dência A). Persiste a discussão sobre um índice de massa corporal (IMC) mínimo para se conduzir um tratamento, estimado em 30, para outros 35 ou, ao menos, a perda de 10% do peso inicial. Nos homens,10há forte evidência de que IMC aumentado cursa com

Capítulo 20 Infertilidade do casal 295

redução nos níveis de testosterona, globulina ligadora de esteroides sexuais (SHBG) e testosterona livre, porém não se observou evidência significativa de associação entre alterações espermáticas e IMC elevado até o presente momento.10

Álcool Não existe evidência consistente entre o uso de álcool e a infertilidade feminina. No entan­ to, o consumo excessivo de álcool pode afetar, de forma reversível, a qualidade seminal.

Tabagismo Tabagismo tem sido associado a efeitos adversos sobre a fertilidade. Nos homens, afeta negativamente vários parâmetros seminais: concentração, motilidade e morfologia. Essas alterações parecem associadas ao aumento do risco de dano ao DNA do espermatozóide. Nas mulheres, os componentes do tabaco podem afetar o microambiente folicular, acelerando a depleção folicular e a perda da função reprodutiva, além de alterar os níveis hormonais na fase lútea. O nível basal de FSH é significantemente maior em mulheres jovens fumantes quando comparado ao das não fumantes. Estudos têm de­ monstrado que o número de ciclos de fertilização in vitro necessários para conseguir gravidez em fumantes é o dobro quando comparado às não fumantes.

IMPORTANTE Mulheres com problemas de fertilidade devem ser informadas de que o tabaco diminui a fertilidade e devem ser orientadas a suspender seu uso.

Cafeína Cafeína (presente no café, chá, chocolate e refrigerantes cola) é inconsistente com a infertilidade feminina. O mesmo ocorre quanto às bebidas descafeinadas. Entretanto, em homens, a associação cafeína-fumo diminui a motilidade dos espermatozóides, assim como aumenta a proporção de gametas mortos.

O Investigação da causa de infertilidade Fator cervical É atribuído a pequena parcela da infertilidade feminina (cerca de 5%). Estão incluídas malformações, alterações anatômicas decorrentes de procedimentos cirúrgicos, neo­ plasias malignas ou benignas, pólipos, infecções e fatores imunológicos. Contudo, o teste pós-coito hoje é desconsiderado devido a seu baixo valor preditivo nas taxas de gravidez (nível de evidência A).

Fator ovariano Cerca de 20 % das pacientes inférteis apresentam disfunções ovulatórias, classificadas pela OMS em 3 grupos: • Grupo 1: Falência hipotalâmica-hipofisária (hipogonadismo hipogonadotrófico) - 10%. • Grupo 2: Disfunção hipotalâmica - 80% a 90 %, com níveis de estrógeno normal. Resulta em anovulação (expressa por oligomenorreia/amenorreia), predominando o achado de ovários do tipo micropolicísticos (associados a distúrbios menstruais,

296

Endocrinologia Feminina e Andrologia

obesidade, hiperandrogenismo). Tais mulheres são definidas como portadoras da Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), embora 30% apresentem peso normal. • G rupo 3: Falência ovariana (hipogonadismo hipergonadotrófico) - 4% a 5%.

Exames utilizados para avaliar o perfil das pacientes Avaliação da reserva ovariana: dosagem sérica de FSH e estradiol na fase folicular precoce, entre 3 o e 5 ° dia do ciclo, a contagem dos folículos antrais (CFA) e a avaliação do hormônio antimulleriano (AMH). Os 2 últimos são considerados atualmente o padrão-ouro para a pesquisa de reser­ va ovariana. O AMH é produzido pelos folículos pré-antrais e antrais até 6 mm, de modo que não sofre influência do ciclo menstrual,11 podendo ser dosado no sangue periférico em qualquer momento (Loh et a i, 2011). Já a CFA deve ser realizada por meio de ultrassonografia transvaginal entre os dias 2 e 4 do ciclo menstrual, quando são contados todos os folículos entre 2 mm e 10 mm.12 Apesar de não predizerem o sucesso de um determinado tratamento de infertili­ dade, conseguem estimar a resposta ovariana em ciclos de FIV/ICSI. Tal fato ajuda no aconselhamento pré-tratamento, permitindo a programação de protocolos me­ dicamentosos mais ou menos agressivos de acordo com os valores encontrados. Além disso, ambos conseguem inferir os riscos de uma hiper-resposta ovariana e as chances de desenvolvimento de uma síndrome de hiperestímulo ovariano com sensi­ bilidade e especificidade de 82% a 90,5% e 76% a 81,3% para o AMH e sensibilidade de 80% e 82% para a CFA. Por fim, o AMH ainda está sendo avaliado na determinação de reserva ovariana após quimioterapia ou cirurgias ovarianas e na determinação da idade da menopausa, bem como no diagnóstico da SOP. Valores de AMH menores que 1 a 1,5 ng/mL estão relacionados com uma baixa reserva, assim como com um CFA total abaixo de 3 a 5 folículos.

PACIENTES COM CICLOS MENSTRUAIS REGULARES NÃO DEVEM SER SUBMETIDAS ATESTE DE AVALIAÇÃO DA OVULAÇÃO S e o ciclo é irregular, d osar p ro g estero n an o 2 I o dia o u m ais tarde (quando ciclos de m ais de 2 8 dias, te n ta r p rogram ar cerca de 7 dias antes da provável m en stru ação), p ara co n firm ar ovulação. Q u an d o d osad a adequadam ente, níveis séricos de p rogesteron a abaixo de 3 ng/m L sugerem anovulação. O su p orte de fase lú tea é fu n d am en tal nas pacientes que realizam ciclos de FIV/ICSI, a p rincip al p o so ­ log ia nesses casos é a u tilização de p rogesteron a n atu ral m icron izad a 2 0 0 m g 8/8h via vaginal que deve ser m an tid o ao m en o s até o dia do b eta-g o n ad o tro fin a co riô n ica h u m a n a (beta-H C G ). N os casos em que realizam os tratam en to s de baixa com plexidade, co m o q u an d o u tilizam os citrato de clo m ifen o p ara ind u ção de ovulação, o suporte de fase lú tea é controverso, en tretan to , co m o existe a possibilidade da o co rrên cia de u m quadro de insu ficiência lú tea nessas situações, pode ser reali­ zado o su porte de fase lú tea co m doses m ais baixas, p. ex., co m p ro to co lo s de progesterona n atu ral m icron izad a n a dose de 2 0 0 m g a 4 0 0 m g p o r dia, via vaginal, por, pelo m en o s 14 a 2 1 dias, até o H C G prod uzid o pelo em brião con segu ir su sten tar o corp o lú teo.

D o sa g e m sé rica d e p ro la c tin a

Deve ser reservada a pacientes com irregularidade menstrual e galactorreia.

Capítulo 20 Infertilidade do casal 297

D o sa g e n s sé ric a s d e h o rm ô n io s tire o id e a n o s

Devem ser realizadas apenas em pacientes com suspeita de tireoidopatia. Teste d o C lo m ife n o (CC)

Tem como objetivo avaliar a reserva ovariana. E realizado por meio da administração de 100 mg/dia de CC do 5 o ao 9o dia do ciclo e dosagem de FSH no 3 o e no 9 o dia do ciclo. Dosagem de FSH no 3 o dia inferior a 10 mU/mL pressupõe boa reserva ovariana. O valor normal do teste corresponde a valor inferior a 26 mU/mL no somatório das dosagens do ciclo.13 A v a lia ç ã o d e g lic o se e in su lin a

A resistência insulínica já pode ser sugerida clinicamente quando da presença da acantose nigricans. No caso de SOP, principalmente quando IMC > 26, deve-se avaliar o índice de HOMA IR (glicose basal x insulina/405), alterado quando > 2,17 ou fazer diretamente um teste de tolerância oral à glicose. U ltra sso n o g ra fia se ria d a

Permite a documentação de todo desenvolvimento folicular, a avaliação endometrial (aspecto e espessura) e possibilita a contagem de CFA. Um exame único avalia a pos­ sibilidade de cistos ovarianos ou endometriomas, assim como das patologias anexiais em geral. Faz parte dos critérios diagnósticos da SOP. B ió p sia e n d o m e tria l

É um método de alta acurácia, porém invasivo. Não deve ser realizada rotineiramente, pois não existem evidências de que o tratamento medicamentoso para insuficiência lútea aumenta as taxas de gravidez. T e m p era tu ra b a sa l

Baseia-se na ação termogênica da progesterona na segunda fase do ciclo. No entanto, cerca de 20% dos ciclos ovulatórios podem ocorrer sem a curva bifásica da temperatu­ ra corporal basal. Não é um bom preditor de ovulação. A n á lise d o m u c o ce rv ic a l

O muco cervical apresenta alterações durante o ciclo menstrual. Na fase estrogênica, é abundante, de aspecto cristalino e filante. Cristaliza-se sob aspecto arboriforme à visualização microscópica. Na segunda fase, é espesso, sem filância, opaco e perde a capacidade de cristalizar.

Fator tuboperitoneal De incidência aumentada nas últimas décadas devido à alta prevalência de infecções causada por germes de transmissão sexual como Chlamydia e gonococo, é a principal causa de infertilidade feminina em nosso meio, correspondendo a cerca de 30% a 40% do total. A presença prévia de salpingite dobra o risco relativo de infertilidade.

298

Endocrinologia Feminina e Andrologia

O diagnóstico deve ser realizado por meio de histerossalpingografia (HSG), que possibilita a avaliação da permeabilidade tubária. Como infecções assintomáticas por clamídia podem ser reativadas ou introduzidas no sistema genital superior a partir da manipulação uterina, a utilização de doxiciclina 100 mg 12/ 12h por 5 dias,14iniciada 1 a 2 dias antes do exame ou azitromicina 1 g no dia do exame são métodos profiláticos efetivos ou terapêuticos previamente à HSG. Na presença de alterações tubárias à HSG, deve-se realizar a videolaparoscopia para confirmação diagnóstica e, quando necessário, salpingoplastia. A presença de hidrossalpinge está associada à diminuição estatisticamente significativa das taxas de implantação. Essa redução pode estar associada a um efeito tóxico direto no endométrio e/ou a um flu­ xo contínuo de “lavagem” do embrião da cavidade uterina. Pacientes com hidrossalpinge devem ser submetidas à salpingectomia prévia ao tratamento de reprodução assistida.

Fator uterino São leiomiomas (associação controversa), malformações, pólipos e sinéquias.15A HSG pode mostrar falhas de enchimento da cavidade uterina, bem como levantar a suspeita de malformações uterinas. A ultrassonografia permite identificação mais acurada das anormalidades uterinas. A histeroscopia é o exame padrão-ouro no diagnóstico de pólipos e sinéquias, entretanto seu emprego inicial na paciente infértil não deve ser rotina, já que não aumenta as taxas de gravidez. Endometriose ocorre em 20% a 40% das mulheres inférteis, e 30% a 50% das mulhe­ res com endometriose são inférteis, com vários mecanismos implicados nessa associa­ ção, como distorção da anatomia pélvica, alteração peritoneal com aumento da con­ centração de macrófagos ativados, prostaglandinas, interleucinas, proteases e fator de necrose tumoral (TNF), alterações da resposta imunológica e alterações na implanta­ ção, síndrome do folículo luteinizado não roto, disfunção de fase lútea, crescimento folicular anormal e secreção anormal de hormônio luteinizante (LH). O diagnóstico da endometriose pode ser realizado por ultrassonografia, ressonân­ cia nuclear magnética (RNM) e laparoscopia. A ultrassonografia não tem valor diag­ nóstico da endometriose peritoneal, mas é útil no diagnóstico de endometrioma (nível de evidência A). Comparada à laparoscopia, a RNM tem valor limitado no diagnóstico, sendo, por­ tanto, a laparoscopia o exame padrão-ouro no diagnóstico de endometriose. Nos estádios I/II, a ablação dos focos de endometriose e a realização de lise de ade­ rências têm sido associadas ao aumento das taxas de gravidez quando comparados à laparoscopia apenas. O tratamento hormonal após o tratamento cirúrgico não au­ menta as taxas de gravidez, mas o tratamento com inseminação intrauterina (IIU) associada à estimulação ovariana, sim (nível de evidência A). Nos estádios III/IV, a realização de tratamento cirúrgico parece apresentar correlação negativa com as taxas de gravidez. Estas pacientes devem ser submetidas a FIV/ICSI. I N F E R T I L I D A D E M A S C U L IN A

Qualquer condição que altere a qualidade e/ou a quantidade do esperma pode levar à infertilidade. A causa mais comum de infertilidade masculina é a idiopática. A avaliação da infertilidade masculina deve incluir anamnese, exame físico e exa­ mes complementares.

Capítulo 20 Infertilidade do casal 299

A anamnese deve incluir idade, profissão, gestações anteriores com a parceira atual ou anterior, tratamentos prévios, avaliação da fertilidade da parceira, história sexual (frequência do coito, ereção e ejaculação), história de infecções e doenças sexualmen­ te transmissíveis, criptoquidia, trauma ou torção testicular, diabetes, antecedentes cirúrgicos, uso de drogas com efeito sobre a espermatogênese e história de doenças familiares. O exame físico deve incluir o exame físico geral e dos genitais e deve ser realizado por profissional treinado e capaz de identificar alterações associadas à infertilidade. A avaliação seminal é a base da avaliação da infertilidade masculina. O esp ermo gra­ ma é um teste sensível (89,6%), mas pouco específico. Os parâmetros seminais podem variar entre diferentes amostras do mesmo indivíduo, sendo necessária a realização de, pelo menos, 2 exames. A repetição do exame aumenta a especificidade, reduzindo os falsos-positivos de 10% para 2%. Em caso de análise seminal normal, não há neces­ sidade de repetição.



Exames complementares

Espermograma O sêmen é colhido por masturbação, com abstinência de 2 a 5 dias, em local próximo ou no próprio laboratório, com intervalo de tempo mínimo para o início da avaliação. Os principais valores de referência encontram-se na Tabela 20.1.

TABELA 20.1

Valores de referência para avaliação seminal16 Critério

Valores

V o lu m e

> 1,5 m L

L iq u e fa çã o

6 0 m in u to s

pH

> 7 ,2

C o n c e n tr a ç ã o e s p e rm á tic a

> 15 m ilh õ e s/ m L

N ú m e ro to ta l de e sp e rm a to z ó id e s

> 3 9 m ilh õ e s

M o tilid a d e

> 40% A + B o u > 32% de A

V ita lid a d e

> 58 %

L e u c ó c ito s

< 1 m ilh ã o / m L

M o r fo lo g ia

> 3 0 % (P a p a n ic o la u m o d ifica d o ) > 4 % (m o rfo lo g ia e strita , K ru ger)

Denomina-se normozoospermia aos valores de um ejaculado normal, enquanto azospermia é a ausência de espermatozóides no ejaculado. A concentração diminuída é a oligozoospermia. A falência testicular primária é a causa mais comum da infertilidade masculina por oligozoospermia e é causa da azospermia não obstrutiva. Pode ser devida a criptorquidismo, torção ou trauma, orquite, alterações cromossomiais, doenças sistêmi­ cas, radioterapia ou quimioterapia. Há redução do volume testicular e níveis de FSH elevados.

300

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Na azospermia obstrutiva, que compreende menos que 2% dos casos, os testícu­ los são normais, FSH, idem. Nessas condições, há associação a mutações do gene da fibrose cística e alterações renais. Inclui condições como a ausência bilateral dos de­ ferentes.

Bioquímica seminal Dosagem de ácido cítrico e zinco avaliam a secreção pros tática e a dosagem de fruto se a secreção das vesículas seminais. A diminuição ou a ausência da dosagem de frutose pode ser causada pela ausência das vesículas seminais ou dos duetos deferentes.

Espermocultura Avalia a presença de doenças sexualmente transmissíveis.

Testes imunológicos Determinam a presença de anticorpos na superfície do espermatozóide (MAR test e Immunobead test). Não há evidências para serem incluídos como rotina.

Teste de penetração espermática Teste de migração espermática, avaliação da capacitação espermática, avaliação da rea­ ção acrossômica e avaliação da ligação do espermatozóide.

Ultrassonografia de bolsa escrotal Permite avaliar o volume dos testículos, a presença de varicocele e de tumores. A vari­ cocele está presente em 11,7% dos homens com sêmen normal e em 25% daqueles com sêmen alterado. A cirurgia da varicocele, como tratamento da infertilidade, não aumenta os índices de gestação segundo Baazeem et al., 2011.17 Essa cirurgia deve ser considerada apenas em casos selecionados, principalmente se o paciente em questão apresentar vasos varicosos palpáveis e um tempo pequeno de infertilidade.

Biópsia testicular Indicada apenas em paciente azoospérmicos. Permite a diferenciação entre azoosper­ mia secretória e obstrutiva.

Análises genéticas e cromossômicas Cariótipo, microdeleção de cromossomo Y, teste de mutação para o gene da fibrose cística. E S T E R IL ID A D E S E M C A U SA A P A R E N TE

Em aproximadamente 15% dos casais inférteis, não encontramos causa para infer­ tilidade. É possível que existam causas não detectadas pelos exames atualmente disponíveis. Esperar ou agir? A idade e o tempo da infertilidade serão os maiores determinantes.

Capítulo 20 Infertilidade do casal 301

F A T O R P S IC O LÓ G IC O

Tema complexo, desde que a resposta ao estresse é variável. Há associação entre es­ tresse, trabalho e menor probabilidade de concepção em mulheres. O estresse pode afetar o relacionamento do casal, diminuindo também a libido e, assim, interferindo na concepção. Em homens, maior frequência de relatos de perda da libido e diminui­ ção na frequência do coito tem sido observada durante procedimentos diagnósticos e terapêuticos. Pelo menos 2 estudos randomizados demonstraram que intervenções psicológicas melhoraram índices de gravidez em mulheres com menos de 2 anos de in­ fertilidade. Relatos têm evidenciado que um número razoável de pacientes deixa trata­ mento de reprodução assistida por decisão própria,18 mesmo quando ele é totalmente assegurado pelo sistema de saúde, independentemente de motivação financeira,18 por questões emocionais. C O N C LU SÃ O

Ainda que ocorram causas orgânicas bastante bem-definidas, pode ocorrer desacerto entre o que é esperado e o resultado,19 com reações de grande intensidade emocional, no sucesso ou no fracasso do tratamento. Contribuir no atendimento à infertilidade deve significar estar disposto a estabelecer uma diferença. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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15. A SR M . P ratice

21

Endocrinologia da gravidez M ario V icente G io rd a n o L u iz A u g u sto G io rd a n o M ario G áspare G io rd a n o

IN T R O D U Ç Ã O

O organismo materno, no curso da gravidez, é sede de alterações hormonais e imunológicas imprescindíveis à evolução fisiológica da mesma. Há algumas particularidades endocrinológicas nessa época da vida da mulher, nos 3 compartimentos responsáveis pelo equilíbrio hormonal: materno, placentário e fetal.

IMPORTANTE É importante o estudo das modificações endócrinas, próprias da gravidez, assim como as particularidades na esteroidogênese, pois abortamentos, malformações, macrossomia fetal, crescimento fetal restrito, entre outros, poderão ocorrer caso estejam presentes alterações enzimáticas ou defeitos na síntese hormonal.1

E S T E R O ID O G Ê N E S E

Quando há implantação do blastocisto no tecido endometrial (nidação), inicia-se uma série de reações imunológicas e hormonais, visando à evolução do ovo. O corpo lúteo é o responsável pela síntese de progesterona (P) do início da gravidez até as cercanias da 8-/9â semana. O hormônio gonadotrófico coriônico (hCG), sintetizado pelo próprio ovo e pelo sinciciotrofoblasto, mantém o corpo lúteo ativo. Após esse período, a pla­ centa assume a função de síntese da progesterona.1 A placenta necessita do colesterol materno (LDL-colesterol) para iniciar a esteroi­ dogênese. O estrógeno, presente em altas concentrações na mulher grávida, aumenta a atividade da enzima P450scc na placenta, importante na conversão do colesterol em pregnenolona.1 O LDL-colesterol sofre hidrólise no sinciciotrofoblasto (mitocôndria), fenômeno denominado endocitose, e libera o colesterol para iniciar a esteroidogênese. O coleste­ rol livre é transformado em pregnenolona por ação da 20-22 desmolase (mitocôndrias no sinciciotrofoblasto). A pregnenolona sofrerá reações mediadas pelas enzimas 3-phidroxiesteroide desidrogenase e 4-5-isomerase, transformando-se em progesterona.2

304

Endocrinologia Feminina e Andrologia

A pregnenolona sintetizada pela unidade placentária alcança o compartimento fetal e sofre influência enzimática (fenômeno conhecido como sulfólise), transformando-se em sulfato de pregnenolona. Este, na córtex adrenal fetal, mediante ação das enzimas 17-hidroxilase e 17-20 desmolase, é convertido em sulfato de deidroepiandrosterona (SDHEA). O SDHEA retorna à placenta onde é convertido em deidroepiandrosterona livre (DHEA), sem o radical sulfato. A DHEA, sob ação da 3-p-hidroxiesteroide desidrogenase e 4-5-isomerase, converte-se em androstenediona, que posteriormente será convertida em testosterona (dessa vez, sob influência da 17-desidrogenase). Uma vez que a placenta sintetizou testosterona e androstenediona, esses andrógenos, mediante ação da enzima aromatase, são convertidos em estradiol e estrona. As concentrações de estradiol e estrona, na grávida, são 100 vezes superiores às encontradas nas mulhe­ res não grávidas.3,4 Na córtex adrenal, parte do SDHEA sintetizado não retorna à placenta, culminan­ do na síntese de estradiol e estrona. Parte significativa do SDHEA, no fígado fetal, será convertido em sulfato de 16-a-hidroxideidroepiandrosterona. Este será transportado à placenta, onde sofrerá reações enzimáticas até a conversão em estriol. A concentra­ ção plasmática de estriol na gravidez está mil vezes acima do encontrado em mulheres não grávidas.3,4 Outrora, a dosagem do estriol era método de valia para saber-se do bem-estar fetal. Essa particularidade na síntese de estrógenos pelo sinciciotrofoblasto é necessária, pois a placenta não dispõe das enzimas 17-a-hidroxilase e 17-20-desmolase, impres­ cindíveis na conversão de progestógenos (21 átomos de carbono) em andrógenos (19 átomos de carbono). A placenta também não é capaz de sintetizar corticosteroides, pois não possui a enzima 11-hidroxilase.1,3 A enzima P450arom é um produto do gene CYP19. A aromatização dos andróge­ nos é imprescindível à síntese de estrógenos. Quando há mutações no gene da enzima P450arom, haverá acúmulo de andrógenos durante a gravidez, podendo ocorrer virilização em fetos femininos e na própria gestante (incapacidade placentária em aroma­ tizar os andrógenos em estrógenos).1’3 A placenta também é capaz de sintetizar fator hipotalâmico de liberação de gonadotrofinas (GnRH), fator de liberação de corticotrofinas (CRH), fator de liberação de tireotrofinas (TRF), entre outros (Figura 21.1). H O R M Ô N IO S E F U N Ç Õ E S N A G R A V ID E Z

O Hormônio gonadotrófico coriônico A produção de hCG ocorre precocemente, pelo próprio ovo, e é considerado o mar­ cador mais fidedigno para o diagnóstico inicial da gravidez. O hormônio possui 2 unidades em sua cadeia polipeptídica: alfa e beta. A fração alfa é idêntica a algumas trofinas hipofisárias, como o hormônio estimulador da tireoide (TSH), hormônio foliculoestimulante (FSH) e, principalmente, o hormônio luteinizante (LH). Ao solici­ tarmos a dosagem sérica do hCG, devemos especificar a mensuração da fração beta (p-hCG). Com isso, evitamos resultados falsos positivos (reações cruzadas com outras gonadotrofinas). Já a cadeia beta é específica do hCG. No dia seguinte à nidação, já é possível a identificação do P-hCG no plasma, podendo-se confirmar a gravidez mesmo antes do atraso menstrual.1

Capítulo 21

Endocrinologia da gravidez 305

FIGURA 21.1 Esquema simplificado da esteroidogênese placentária, materna e fetal. A pla­ centa necessita do córtex adrenal fetal para completar a síntese estrogênica, uma vez que não possui enzimas necessárias para a conversão de progestógenos em andrógenos.

Quando há atraso menstrual de um dia, a concentração sérica de p-hCG é de, apro­ ximadamente, 100 mUI/mL. Habitualmente, a concentração sérica de hCG duplica a cada 48/72 horas, podendo ser útil no acompanhamento após abortos, co rio carcinoma, mola hidatiforme, gravidez ectópica ou gravidez após fertilização assistida. No fim do

306

Endocrinologia Feminina e Andrologia

hCG (mlll/mL)

FIGURA 21.2 Os níveis de hCG elevam-se no I otrimestre da gravidez. Após a 18a/20a semana, suas concentrações permanecem estáveis até o parto.

I o trimestre (10a/11a semana), há abrupta elevação de hCG (pico): 100.000 mUI/mL, declinando após esse período. Por volta da 18â/20â semana, os níveis de p-hCG decli­ nam para 10.000 a 20.000 mUI/mL e permanecem assim até o parto (Figura 21.2).5 A principal função do hCG é dar suporte hormonal à prenhez. E ele que estimula o corpo lúteo a manter a síntese hormonal no início da gravidez, superando o estímulo do LH hipofisário materno. Quando há adequada síntese de hCG, o corpo lúteo não sofre atresia e consegue manter a boa evolução da gravidez até a 8â/10â semana. Após esse período, mesmo se houver remoção do corpo lúteo, não haverá abortamento por deficiência hormonal. As células luteinizadas do corpo lúteo contêm receptores com alta afinidade para o hCG. Não se sabe o motivo da involução do corpo lúteo justa­ mente quando há maiores concentrações séricas de hCG.1 O hCG tem atividade tireotrófica intrínseca, no entanto, bem inferior ao TSH hi­ pofisário. Quando há condições clínicas que propiciam intensa síntese de hCG (p. ex., doença trofoblástica gestacional), poderá surgir hipertireoidismo clínico. Há indícios da ação do hCG no testículo fetal, sendo o hormônio responsável pelo início da esteroidogênese e, consequentemente, desenvolvimento do fenótipo masculi­ no. Porém existem outros hormônios capazes de exercer a mesma função, como o hor­ mônio adrenocorticotrófico (ACTH), com ação nas células de Leydig fetais. A progesterona parece ser o hormônio com maior capacidade inibitória sobre a síntese de hCG. Quando a placenta assume a atividade de esteroidogênese (ao redor da 10â semana), as concentrações de progesterona elevam-se até o termo. As con­ centrações de hCG declinam após a 10â/12â semana (pico), mantendo-se estáveis até o termo.5

Capítulo 21

Endocrinologia da gravidez 307

IMPORTANTE A d o sa g e m d o h C G é ú til n a s se g u in te s s itu a ç õ e s :5

• Diagnóstico de gravidez: principal exame no diagnóstico precoce de gravidez (atraso menstrual de 1 a 2 dias). Solicitar a subunidade beta. • Abortam ento: quando há decesso fetal, há diminuição nos níveis séricos do hor­ mônio. Portanto, quando ocorre abortamento espontâneo, pode-se avaliar a elimi­ nação completa dos tecidos ovulares mensurando o p-hCG no plasma (acompanha-se o declínio até a negativação). • Gravidez ectópica: avaliação da evolução de uma possível gravidez ectópica ou abortamento tubário, quando aparecem níveis positivos do hormônio e a ultrassonografia transvaginal não identifica gestação intrauterina, após 5 ou 6 semanas da data da última menstruação. • Neoplasia trofoblástica gestacional: os níveis de p-hCG são 10 a 100 vezes supe­ riores aos detectados na gravidez normal. Podem ser usados no acompanhamento após esvaziamento uterino. Os níveis decrescem e devem negativar-se após algumas semanas. Novo aumento nas concentrações séricas de hCG sugerem doença resi­ dual ou recrudescimento da condição patológica.

Q Hormônio lactogênico placentário O hormônio lactogênico placentário (hPL), também denominado hormônio somatotrófico coriônico, é produzido no sinciciotrofoblasto (placenta) não dependendo de substratos maternos ou fetais. A maior parte do hPL produzido (90%) é transferida ao compartimento materno. A concentração eleva-se até a 36- semana de gravidez, com estabilização posterior. Na 2 a metade da gravidez, os níveis de hPL aumentam até 10 vezes. Após o parto, o hormônio não é mais detectado no plasma materno, pois tem meia-vida curta (15 a 30 minutos). Os níveis de hPL materno estão diretamente rela­ cionados tanto ao peso fetal quanto ao da placenta. Os níveis estão elevados nos casos de gestação múltipla. O hPL estimula a produção de insulina e do fator de crescimento semelhante à insuli­ na (IGF-1) no organismo materno, facultando a melhor utilização da glicose pelos orga­ nismos materno e fetal. Na 2 a metade da gravidez, com a maior síntese desse hormônio, poderá haver efeito diabetogênico com aumento nos níveis circulantes de insulina (hiperinsulinemia) e diminuição da resposta celular à insulina (resistência insulínica). O hPL tem o efeito metabólico importante de assegurar a oferta nutricional ao concepto. Para isso, promove lipólise com elevação dos níveis de ácidos graxos livres. A medida que a glicose diminui (após jejum materno), o hPL acelera a lipólise, com con­ sequente elevação dos ácidos graxos livres, que serão utilizados como substrato ener­ gético materno. Com isso, há manutenção da oferta constante de glicose ao feto. Caso o jejum seja prolongado ou a ingesta alimentar materna restrita, haverá formação de corpos cetônicos, que serão utilizados pelo feto como fonte energética. Se isso for uma condição crônica, e não eventual, poderá ocorrer dano cerebral fetal (Figura 21.3).5 Quando há diabetes gestacional, a hiperglicemia materna acarretará hiperinsulinemia fetal, com consequente macrossomia. Alguns estudos sugerem que o hPL seja o verdadeiro hormônio do crescimento (HC) fetal, já que a estrutura do hPL é bastante semelhante à desse hormônio.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 21.3 Ação do hPL frente à oferta normal de substrato energético materno e à restrição de glicose materna ao feto. O status de jejum prolongado e ingesta alimentar restrita poderá levar à formação de corpos cetônicos, que serão utilizados como substrato energético pelo feto, podendo ocasionar dano cerebral.

Capítulo 21

A

INIBEM A SÍNTESE DO GnRH PLACENTÁRIO Progesterona Inibida Folistatina Opioides endógenos

Endocrinologia da gravidez 309

ESTIMULAM A SÍNTESE DO GnRH PLACENTÁRIO • • • •

Estrógeno Ativina Insulina Prostaglandinas

O GnRH placentário tem função importante na regulação da esteroidogênese placentária. Ele sofre influência de diversos fatores que estimulam ou inibem a sua secreção. FIGURA 21.4

Alguns estudos correlacionaram os níveis de hPL com a função placentária. Baixos níveis estariam associados a risco de sofrimento fetal por insuficiência placentária. No entanto, métodos mais modernos de avaliação biofísica fetal suplantaram a dosagem do hPL. Não há indicação na dosagem de hPL na gravidez.

Q Hormônios placentários semelhantes aos de liberação hipotalâmicos A placenta humana é capaz de sintetizar hormônios produzidos pelo hipotálamo fe­ minino. E o caso dos hormônios GnRH, CRH, TRH, entre outros. O GnRH parece ter função reguladora na esteroidogênese placentária e nas prosta­ glandinas. Na Figura 21.4, foram resumidas as inter-relações do GnRH com os demais hormônios. As curvas de produção de GnRH e hCG são coincidentes. O CRH é sintetizado pelo trofoblasto, membranas fetais e decídua. Há uma par­ ticularidade no mecanismo de feedback quando comparado ao CRH hipotalâmico e ao CRH placentário. O segundo não é inibido pelos glicocorticoides, ao contrário, esses tem função estimuladora sobre a síntese de CRH placentário. Próximo ao parto, ocorre eleva­ ção do cortisol e do ACTH, e é o período no qual as concentrações de CRH são maiores. O CRH placentário é regulado por inúmeras substâncias, entre elas, a vasopressina, norepinefrina, angiotensina II, prostaglandinas, neuropeptídios Y e ocitocina. As principais funções do CRH são: estimulação da adrenal fetal e regulação do fluxo sanguíneo. Não se sabe como o CRH placentário contribui para o estímulo adrenal materno. Outro peptídio sintetizado pela placenta é a urocortina. Similar ao CRH placentá­ rio, a urocortina liga-se a receptores do CRH e à proteína carreadora. Portanto, mesmo em menor proporção, a urocortina tem função similar ao CRH, sobretudo induzindo a síntese de prostaglandinas e de metaloproteinases na matriz extracelular das células placentárias e fetais. A urocortina também estimula a esteroidogênese adrenal fetal e tem função reguladora do tônus vascular (endotélio). Ao contrário do CRH, a urocor­ tina não possui ação estimuladora sobre o ACTH.6

D Hormônio tireotrófico coriônico O hormônio tireotrófico coriônico (hCT) é o placentário com atividade tireotrófica e semelhante estrutural e biologicamente ao hormônio estimulador da tireoide (TSH).

310

Endocrinologia Feminina e Andrologia

O hCT difere das outras glicoproteínas por não compartilhar a subunidade alfa co­ mum. A concentração plasmática é baixa, e a potência biológica, bem inferior ao TSH. Embora incomum, mulheres com doença trofoblástica gestacional podem desenvol­ ver hipertireoidismo e, mais raro ainda, exibir sinais de crise tireotóxica.1

D Adrenocorticotrofina coriônica humana Os níveis de ACTH hipofisário não se alteram durante a gravidez. O ACTH placentário, porém, eleva-se gradativamente durante a prenhez, promovendo elevação conco­ mitante do cortisol livre. O ACTH placentário é regulado pelo CRH, também sinteti­ zado pela placenta. Lembramos que o ACTH produzido na gravidez não é suprimido quando administramos cortisol exógeno. Durante o parto, ocorre aumento significativo do ACTH e do cortisol. A ocitocina (determinante da contratilidade uterina) parece exercer efeito estimulador sobre o CRH e ACTH placentários, importantes no ato da parturição.

D Prolactina A prolactina (PRL) é um hormônio sintetizado pelo endométrio, no fim do ciclo menstrual (endométrio decidualizado), e por hipófises materna e fetal. A placenta e as membranas fetais não sintetizam PRL. Os níveis pré-gravídicos, de 15 a 25 ng/dL, variam até 400 ng/dL nas proximidades do parto. A PRL eleva-se a partir da 8a semana de gravidez, sintetizada na adeno-hipófise materna, respondendo aos elevados níveis estrogênicos observados na gravidez. Na hipófise materna, encontram-se hiperplasia e hipertrofia das células acidófilas produtoras de PRL. A PRL é o único hormônio hipofisário que se eleva durante a gravidez e tem importante função no preparo do organismo materno à lactação.1,5

Q Outros hormônios placentários A kisspeptina é um neuropeptídio sintetizado pelo gene supressor Kiss-1. A kisspeptina tem função conhecida na puberdade, permitindo um controle central do eixo hipotálamo-hipofisário (gonadotrófico). Quando há deficiência de leptina, poderá ocorrer diminuição da Kiss-1 e alterar o processo puberal fisiológico. A placenta (sinciciotrofoblasto) produz kisspeptina com função conhecida na invasão trofoblástica (placentação). Os níveis se elevam no decorrer da gravidez.7

D Relaxina Refere-se ao hormônio peptídico sintetizado no corpo lúteo gravídico. As concen­ trações plasmáticas maternas elevam-se no I o trimestre da gravidez (quando o cor­ po lúteo é o responsável pela manutenção da gestação) e declinam no 2 o trimestre. Parece que a relaxina tem função na manutenção inicial da prenhez, mas estudos futuros são necessários para elucidar completamente a função biológica. A relaxina tem função vaso dilatadora e de estímulo nos fatores de crescimento do endotélio vascular (VEGF).8

D Fatores de crescimento e citoquinas A placenta sintetiza muitas proteínas com importante função no crescimento embrio­ nário e no sistema imune materno, essenciais à evolução da gravidez. Inúmeras substân­ cias são produzidas, entre elas: fator estimulador de colônias 1 (CSF-1), interleucina-l-p,

Capítulo 21

Endocrinologia da gravidez 311

interleucina-6, fator de necrose tumoral alfa (TNF-a), fatores de crescimento semelhan­ tes à insulina (IGFs), entre outros. Elas têm funções não compreendidas por completo, mas há atividade no desenvolvimento celular e na síntese hormonal (p. ex., hCG).1

O Alf afeto proteína A a-fetoproteína (AFP) é uma glicoproteína derivada do fígado fetal. Os níveis plasmáticos atingem pico no fim do I o trimestre. A AFP é encontrada predominantemente na circulação fetal. Parece que a AFP atuaria como proteína carreadora de esteroides fetais e teria ação teci dual semelhante a alguns fatores de crescimento.1 O Sistema Nervoso Central (SNC) fetal apresenta altas concentrações de AFP. Quan­ do há defeitos de fechamento do tubo neural fetal (contato direto do SNC fetal com o líquido amniótico), encontramos altas concentrações de AFP no líquido amniótico e, consequentemente, no plasma materno. AFP elevada pode sugerir malformações neurais congênitas.9



Progesterona

Nas primeiras 8 semanas de gravidez, a síntese dos progestógenos advém, fundamen­ talmente, do corpo lúteo. Após esse período, a placenta assume essa função. Para isso, o tro fobias to necessita do colesterol materno (LDL-colesterol). Durante a gravidez, a produção de P é crescente. A progesterona tem meia-vida curta. A metabolização é hepática (materna), na qual 30% dos metabólitos são excretados pelas vias biliares e intestino delgado e 70% são reaproveitados pelo fígado e encaminhados à circulação sanguínea. No início da gra­ videz, concentrações acima de 20 ng/mL são compatíveis com boa vitalidade embrio­ nária. As concentrações plasmáticas durante a gestação não trazem informações rele­ vantes devido à grande variação individual e por a produção não revelar a viabilidade fetal. Portanto, não há indicação na dosagem de P durante a prenhez. A principal função da progesterona é a manutenção e progressão da gravidez. No início da gestação, a P determina alterações nos microvilos das células endometriais, permitindo o contato destas com o embrião. Ainda no tecido endometrial, a P induz a síntese de catepsina ácida, importante na decomposição do colágeno, facilitando a nidação.10 O hormônio também promove relaxamento das fibras musculares, possibilitando o estiramento uterino com o evoluir da gravidez, sem que haja contração miometrial (efeito Csapo). Em alguns casos, a administração de progesterona pode inibir um traba­ lho de parto prematuro. Como há relaxamento muscular dos sistemas renal, digestivo e biliar maternos, eleva-se o risco de infecção urinária, constipação intestinal e colelitíase. A P compete com a aldosterona e aumenta a excreção renal de sódio. Assim, há estímu­ lo do sistema renina-angiotensina-aldosterona, promovendo a elevação da aldosterona. No tecido mamário, a P estimula os alvéolos acarretando no aumento volumétrico das mamas e inibe os receptores de PRL nas mamas, motivo pelo qual não ocorre lactogênese durante a gestação, mesmo com níveis elevados de PRL. A P ativa os centros respiratórios presentes no SNC materno, ocasionando aumen­ to da ventilação pulmonar e mantendo as demandas crescentes de oxigênio pelos or­ ganismos materno e fetal. Há relatos da ação imunossupressora da P. Admite-se que as concentrações eleva­ das de P na gravidez sejam importantes para que a mãe não desenvolva anticorpos contra os tecidos fetais.

312

Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 21.1

Funções da progesterona na gravidez



F a c ilita a n id a ç ã o (c a te p sin a , m icro v ilo s célu la s e n d o m e tria is , e d e m a e stro m a l).



P o ssu i ativ id ad e m io rre la x a n te (in ib in d o a c o n tra tilid a d e u te rin a ).



E s tim u la o d e se n v o lv im e n to m a m á rio (alv éo los).



In ib e a la c to g ê n e s e a n te s d o p a rto .



P ro m o v e h ip e rv e n tila ç ã o p u lm o n a r (m a io r a p o rte de o x ig ê n io p a ra m ã e e fe to ).



P e rm ite su p re ssã o d a re s p o s ta im u n o ló g ic a .



A u m e n ta a ex cre çã o re n a l de só d io .

D Estrógenos Os estrógenos têm 18 átomos de carbono. Os principais estrógenos naturais são: estradiol, estrona e estriol. O estriol é o estrógeno mais abundante no ciclo gravídico, porém o de menor potência biológica. A partir da 9â semana, o estriol começa a ser sintetizado, momento em que a glândula adrenal fetal inicia a síntese androgênica (substrato para a síntese estrogênica). Os 3 estrógenos elevam-se gradativamente durante toda a gravidez. As concentrações de estrógenos são bastante variáveis entre as gestantes e, até mes­ mo, entre 2 gestações distintas da mesma mãe. Não há indicação em se dosar estróge­ nos durante a gravidez e não existe correlação eficaz entre as concentrações hormonais e o bem-estar fetal. Antigamente dosavam-se as concentrações de estriol materno com o intuito de se avaliar a viabilidade e bem-estar fetais. Hoje dispomos de métodos bio­ físicos mais simples e mais eficazes na detecção do sofrimento fetal. Podem-se dosar a AFP, o hCG e o estriol para o rastreio de aneuploidias fetais. Gestações com baixas concentrações plasmáticas de estriol podem associar-se a óbito fetal, hipofunção adre­ nal fetal, deficiência enzimática placentária (sulfatase e aromatase), entre outros.1 Lembramos que a placenta não tem capacidade de sintetizar estrógenos sem a uti­ lização de precursores androgênicos (sulfato de deidroepiandrosterona) oriundos da adrenal fetal. Durante a gravidez, a síntese de estrógenos ocorre de forma crescente. Os estróge­ nos maternos são metabolizados no fígado e eliminados no sistema renal sob forma de vários metabólitos. As principais funções dos estrógenos na gravidez estão descritos na Tabela 21.2.

TABELA 21.2

Funções dos estrógenos na gravidez



A u m e n ta m o v o lu m e s a n g u ín e o (flu x o s a n g u ín e o u te ro p la c e n tá rio ).



E s tim u la m a sín te se de P R L p e la h ip ó fis e m a te r n a e b lo q u e ia m a m e s m a n o s re ce p to re s m a m á rio s , in ib in d o a la c to g ê n e s e d u ra n te a gravidez.



E fe ito in o tr ó p ic o p o sitiv o n a s célu la s m io c á rd ic a s c o m c o n s e q u e n te a u m e n to do d é b ito c a rd ía co .



E fe ito h e p á tic o p o sitiv o n a sín te se de p ro te ín a s ca rre a d o ra s de h o rm ô n io s .



E s tim u la m o s is te m a re n in a -a n g io te n s in a -a ld o s te ro n a .

PRLprolactina.

Capítulo 21

Endocrinologia da gravidez 313

— Progesterona — Estrógenos ___ Cortisol

i

i

10 sem

i

15 sem

i

20 sem

i

25 sem

i------------------- 1

30 sem

35 sem

i

40 sem

FIGURA 21.5 Notar as concentrações de progesterona e estrógenos na gravidez. Próximo ao parto, ocorre diminuição do bloqueio progestogênico miometrial e elevação dos estrógenos e cortisol, importantes hormônios relacionados com a parturição.

H O R M Ô N IO S F E T A IS

O feto é capaz de sintetizar cortisol, corticosterona e aldosterona independentemente do compartimento materno. Para isso, ele emprega o LDL-colesterol oriundo do fígado. Os hormônios transportados ao feto são rapidamente sulfatados. E um mecanis­ mo de defesa fetal, impedindo a atividade biológica de potentes esteroides porventura presentes na circulação fetal (exógenos ou endógenos). As sulfatases são comumente encontradas no tecido placentário e são eficientemente utilizadas quando esse órgão necessita de precursores hormonais fetais para a esteroidogênese. Quando há deficiên­ cia nas sulfatases placentárias, existirá também deficiência na síntese estrogênica com graves repercussões para o feto e na parturição.1,5 S I S T E M A E N D Ó C R IN O M A T E R N O

O organismo materno é sede de inúmeras modificações, desde o início da concepção até o parto. Após, há o retorno gradual endócrino e metabólico ao estado pré-gestacional. Os sistemas hipotalâmico, hipofisário, tireoidiano, paratireoidiano e adrenal maternos sofrem alterações no sentido de se adaptarem à unidade materno-fetal-placentária.

D Hipotálamo materno O hipotálamo sintetiza diversos hormônios com função estimuladora, entre eles, o GnRH, CRH, hormônio liberador de hormônio de crescimento (GHRH) e TRH. Eles estão presentes na circulação portal em altas concentrações, onde exercem efeito bio­ lógico (sistema porta-hipofisário). Contudo, eles não são mensurados no plasma (cir­ culação sistêmica) de mulheres não grávidas.

314

Endocrinologia Feminina e Andrologia

O GnRH (hipotalâmico) eleva-se durante a gravidez, mas o significado biológico ainda não foi elucidado. Não ocorre alterações significativas na síntese de TRH hipo­ talâmico materno, porém há síntese de TRH placentário, mas em níveis baixos.11



Hipófise materna

Há hipertrofia e hiperplasia dos lactotrofos, situados no lobo anterior da hipófise, o que determina aumento do volume (3 vezes maior) da glândula quando comparado ao de mulheres não grávidas. Seis meses após o parto, a glândula retorna ao tamanho pré-gravídico. Ocorre diminuição na liberação e síntese de gonadotrofinas, em respos­ ta ao menor estímulo pelo GnRH. Há retrocontrole negativo, pois, na gravidez, têm-se altas concentrações de estrógenos, progesterona, inibina A e inibina B, promovendo inibição das gonado tro finas hipofisárias (FSH e LH). Após a nidação, a hipófise mater­ na não exerce função relevante para a evolução da gestação. Ocorre elevação do HC hipofisário. Os valores iniciais de 0,5 a 7,5 ng/mL atingem um pico na 28-/30- semana de gravidez, oscilando entre 12 e 14 ng/mL.5,12 O ACTH e o TSH hipofisários praticamente não se alteram durante a gestação. Verifica-se elevação do ACTH placentário, provavelmente secundária ao aumento do CRH placentário. Consequentemente, podemos dizer que a gravidez é um estado de hipercortisolismo.5,13 Como vimos, os níveis de PRL elevam-se gradativamente até um pico durante o par­ to, com função de preparo das mamas para a lactação. A causa provável do aumento da PRL durante o ciclo gravídico é a elevação observada no estradiol. Após o parto, o estímulo fetal sobre a papila mamária seria o responsável pela manutenção da hiperprolactinemia fisiológica. O hormônio estimulador de melanócitos (MSH) está presente na gravidez em ní­ veis elevados. Esse aumento do MSH explica as alterações dermatológicas observadas em algumas gestantes, como a linha nigra e o cloasma gravídico.14 Os níveis de hormônio antidiurético (ADH) permanecem inalterados. Os níveis de ocitocina elevam-se progressivamente e auxiliam no processo de contratilidade uteri­ na durante o parto. No pós-parto, coadjuvam na ejeção do leite.

D Tireoide materna As concentrações séricas de TSH alteram-se de forma discreta durante a gravidez. No iní­ cio, devido ao estímulo do hCG, verificam-se níveis discretamente mais baixos de TSH, que logo retornam aos patamares habituais. O volume da glândula tireoide aumenta durante a gravidez. Os ácinos glandulares sofrem hipertrofia e hiperplasia. Ocorre, ainda, hipervascularização da glândula. Podemos encontrar aumento na síntese dos hormônios tireoidianos matemos (T4 e T3), secundário aos fatores estimuladores sintetizados na placenta, como o hCG e hCT. Com isso, o TSH hipofisário declina suavemente no I o trimestre, em decorrência desses hormônios placentários. Na maioria das vezes, essa queda (e posterior normalização) do TSH não determina alterações clínicas.5 Como, na gravidez, há elevação considerável dos estrógenos, esses estimulam a sín­ tese de proteínas hepáticas transportadoras de hormônios, principalmente a globulina ligadora de tiroxina (TBG). Com isso, o aumento dos hormônios tireoidianos identificado na gravidez não traz repercussões clínicas, uma vez que eles encontram-se ligados às proteínas transportadoras, mantendo as concentrações de T4 livre dentro dos limites da normalidade.

Capítulo 21

Endocrinologia da gravidez 315

D Paratireoide materna O paratormônio (PTH) exerce efeito relevante na regulação da hipocalcemia. Na gravi­ dez, percebe-se aumento na depuração do cálcio, determinando estímulo da glândula para corrigir a depleção do íon. Com isso, ocorre hiperplasia das paratireoides mater­ nas, com elevação do PTH. O estabelecimento da hipocalcemia materna decorre da hemodiluição gravídica, do aumento da taxa de filtração glomerular e da transferência do íon para a osteogênese do feto (por mecanismo ativo).5

Q Pâncreas materno Na gravidez normal, há hipertrofia e hiperplasia das ilhotas pancreáticas, aumento da insulina plasmática e alguma resistência à ação da insulina. A partir do 2 ° trimestre, os níveis de insulina elevam-se. Contrariamente, os estrógenos, progestógenos, hPL e corticosteroides atuam limitando a ação da insulina (“resis­ tência insulínica?”), provavelmente com efeito sobre os receptores celulares de insulina. A elevação da insulina ocorre pelo aumento na sua produção, e o hormônio não atra­ vessa a barreira placentária, pois é degradado por insulinases. Essas particularidades determinam hipoglicemia, dita fisiológica, em gestantes, após jejum prolongado. Na gestação, ocorre redução dos níveis de glucagon. Em grávidas, o transporte de glicose ao feto ocorre por difusão facilitada, o que pode determinar hipoglicemia ma­ terna, que será compensada com o aumento dos ácidos graxos como fonte energética, produzindo corpos cetônicos, prejudiciais ao feto. Isso explica a importância de uma dieta adequada durante a gravidez, com a ingestão de menores quantidades e interva­ los igualmente menos esparsos.

D Suprarrenal materna Não verificam-se alterações volumétricas significativas nas glândulas adrenais da mãe, mas ocorre elevação sérica do cortisol materno. No 3 o trimestre, esse aumento é tri­ plicado quando comparado às não grávidas. Há crescimento no nível do ACTH e con­ sequentemente, do cortisol. No entanto, também observa-se elevação da Globulina Carreadora de Cortisol (CBG), o que determinará aumento no cortisol total e efeito menos intenso no cortisol livre. Este último atravessa facilmente a placenta, ao con­ trário da fração conjugada às proteínas carreadoras. Possivelmente, o crescimento do nível do cortisol no organismo está associado às estrias observadas na gravidez. Já o sistema renina-angiotensina-aldosterona está estimulado na gestação. Sabe-se que, na prenhez, há redução da reatividade vascular (vasodilatação e hipotensão) e di­ minuição da sensibilidade vascular à angiotensina II. Não existe, no entanto, nenhum sinal de hipopotassemia ou hipernatriemia, e a pressão arterial, no 2 o trimestre da gra­ videz, tende a ser menor quando comparada às pressões fora do ciclo gravídico. Parece haver redução da sensibilidade do sistema vascular materno à angiotensina.15 A síntese de andrógenos adrenais está discretamente aumentada em grávidas, e es­ ses podem ser consumidos pela placenta para ocasionar a síntese de estrógenos. A D A P T A Ç Õ E S E N D O C R IN O M E T A B Ó L IC A S D O O R G A N IS M O M A T E R N O

D Metabolismo glicídico O metabolismo glicídico, na gravidez, está direcionado à manutenção de níveis fisiológi­ cos de glicose e aminoácidos necessários para o desenvolvimento fetal. Na gestação, há

316

Endocrinologia Feminina e Andrologia

hiperplasia das células beta do pâncreas, responsáveis pela síntese de insulina. Conse­ quentemente, ocorre aumento da insulina. Tanto a insulina quanto os fatores de cresci­ mento semelhantes à insulina (IGF) são importantes na regulação do metabolismo, na proliferação celular e no desenvolvimento dos tecidos.16 A PRL e o hPL aumentam o número de células beta pancreáticas na gravidez, ele­ vando a síntese de insulina. Na gestação, tanto no jejum quanto no pós-prandial, os níveis de insulina são superiores quando comparados às mulheres não grávidas. Como consequência direta, verifica-se níveis mais baixos de glicose (10% a 20%) nesses mesmos momentos, secundários a maior armazenamento de glicogênio nos tecidos, maior utilização de glicose periférica, diminuição da síntese hepática de glicose e con­ sumo constante de glicose pelo concepto.17 A “resistência insulínica (?)” materna resulta da maior síntese de hormônios placentários, como o hPL, a progesterona e o CRH (maior aporte de cortisol). Eles alteram a sensibilidade à insulina, por mecanismo ainda não totalmente compreendido.17

O Metabolismo lipídico O tecido adiposo era, recentemente, considerado um reservatório de energia e calorias. Hoje sabe-se que esse tecido é um importante órgão endócrino, que sintetiza diversas substâncias com funções autócrinas e parácrinas, denominadas adipocinas.18 Na gravidez, ocorre elevação dos triglicerídios, principalmente devido ao aumento da atividade da lipase hepática (elevação da síntese hepática de triglicerídios) e redução da atividade da lipoproteína lipase, resultando em diminuição do catabolismo do tecido adiposo. Também verifica-se crescimento no nível das apolipoproteínas A-I, AII e B.19,20 Essas alterações são importantes para a manutenção energética do binômio mater­ no-fetal.

IMPORTANTE A lta s c o n c e n tra ç õ e s de trig lic e ríd io s são u tiliz a d a s c o m o fo n te de e n e rg ia m a te rn a , e n q u a n to a g lico se é c o n s u m id a c o n tin u a m e n te p elo fe to .

No 2 o trimestre da gravidez, observa-se acúmulo de gordura (energia), enquanto no 3 o, haverá o consumo dessa energia armazenada.21 Leptina e adiponectina, pertencentes à família das adipocinas, são proteínas secretadas pelo tecido adiposo com ações no metabolismo, em processos inflamatórios, sis­ tema cardiovascular e endócrino. A leptina é hormônio sintetizado pelo tecido adipo­ so e placenta e tem função no metabolismo da gordura. Verifica-se elevação da leptina na gravidez, principalmente no 2 o trimestre (momento em que há acúmulo de energia pela mãe). Ainda não se conhece a verdadeira função da leptina na gestação. A adipo­ nectina é produzida pelos tecidos adiposos materno e fetal. Tem função conhecida na regulação do metabolismo dos lipídios e da glicose. No curso da gravidez, os níveis de adiponectina decrescem com a evolução da mesma.22'24

O Metabolismo hidreletrolítico A retenção hídrica é fenômeno fisiológico na gravidez, tornando-se evidente nos ede­ mas de membros inferiores, comuns em gestantes no 3 o trimestre. A diminuição da

Capítulo 21

Endocrinologia da gravidez 317

osmolaridade plasmática é uma das principais razões para a retenção de água. Esse edema está relacionado, também, com a ação do ADH.21 R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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r

í

- i H

I

Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos

22

G lá u c ia M. F. S. M a zeto La u ra S. W ard



IN T R O D U Ç Ã O

A ligação entre a glândula tireóidea e o sistema reprodutivo vem, há muito tempo, sen­ do relatada.1Na verdade, desde a primeira descrição de um caso de puberdade precoce relacionada com hipotireoidismo grave,2 o interesse pela interação entre as disfunções da tireoide e as alterações reprodutivas tem sido crescente. Evidências derivadas de estudos experimentais e clínicos sugerem que os eixos hipotálamo-hipófise-tireoide (HHT) e hipotálamo-hipófise-gônadas (HHG) são fisiologicamente relacionados e agem em conjunto, como um sistema unificado, em várias condições patológicas. A constatação da presença de receptores específicos para o hormônio tireoidiano (HT) no ovário, os quais poderiam regular a função reprodutiva, bem como da influência dos estrógenos no eixo HHT, conduzem à ideia de uma relação recíproca entre as duas grandes vias endócrinas.3 Por muito tempo, foi considerado que apenas o sistema re­ produtor feminino (SRF) se relacionava com o HHT. Contudo, mais recentemente, inter-relações entre este e o sistema reprodutor masculino (SRM) têm sido evidencia­ das.4 Assim, alterações estruturais ou funcionais, em qualquer nível de um eixo, pode­ riam implicar manifestações clínicas atribuíveis ao outro, em ambos os sexos. Devido à elevada frequência e às repercussões que causam, neste capítulo serão abordadas, principalmente, as associações entre as disfunções tireoidianas, hiper e hipotireoidis­ mo e as alterações da função reprodutiva. ■

F IS IO L O G IA D A IN T E R A Ç Ã O E N T R E A S F U N Ç Õ E S T I R E Ó I D E A E R E P R O D U T IV A

Os HTs exercem efeito sobre praticamente todos os níveis do eixo HHG, influencian­ do na síntese e na secreção de praticamente todos os hormônios relacionados e no funcionamento de vários órgãos. Podem ainda agir sobre as concentrações séricas de globulina ligadora de hormônios sexuais (SHBG),5 impactando nas concentrações dos hormônios livres. Em homens, os HTs podem influenciar nas concentrações séricas de gonadotrofi­ nas, p. ex., agindo sobre a secreção de hormônio luteinizante (LH), nas de esteroides sexuais, alterando a testosterona biodisponível5 e nas de prolactina. Quanto às gônadas propriamente ditas, as 2 principais funções testiculares, a pro­ dução de espermatozóides, pelas células de Sertoli, e a síntese de androgênios, pelas células de Leydig, sofrem a ação dos HTs. Embora muitos fatores influenciem na

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 319

proliferação e na maturação das células de Sertoli, o HT parece representar um sinal hormonal importante para a sua proliferação durante o desenvolvimento testicular, afetando a população celular final e, consequentemente, o volume testicular e a pro­ dução de espermatozóides na vida adulta.6Os HTs podem estimular as células de Sertoli de forma clássica, por meio de receptores específicos localizados no núcleo,7 ou de forma mais rápida, sugerindo ação não genômica.8 Os HTs também influenciam na diferenciação, na proliferação e na função das células de Leydig, com ação direta sobre a síntese de esteroides por estas células, apresentando, assim, papel na produção androgênica.6 Além de receptores para HTs, os testículos também apresentam recep­ tores para hormônio estimulador da tireoide (TSH), cujo exato papel fisiológico ainda carece de definição mais clara.9 Os receptores para HT são ainda expressos em células penianas e de músculo liso do corpo cavernoso, o que sugere ação direta desses hormônios também sobre o pênis.10 Em mulheres, a exemplo do que ocorre nos homens, os HT influenciam nas concen­ trações séricas dos hormônios gonadotróficos, dos esteroides sexuais11 e da prolactina. As células ovarianas expressam receptores para HTs,12 com indícios de que esses hormônios sejam importantes para a manutenção do ciclo ovariano,13 e para TSH, sugerindo que o envolvimento entre os eixos tireoidiano e reprodutivo possa ser ainda maior.9 O endométrio também apresenta receptores para HT e para TSH, os quais parecem funcionais,14 sendo que os HTs apresentam efeitos relevantes sobre o desen­ volvimento endometrial e do corno uterino,15 indicando que o eixo HHT encontra-se diretamente envolvido com a fisiologia do útero.14 Mas é particularmente durante a gravidez, que a interação entre a tireoide e o SRF se torna mais evidente, com diversas mudanças ocorrendo na função tireoidiana, re­ sumidas na Tabela 22.1.

TABELA 22.1 Alterações fisiológicas consecutivas características da gravidez e sua influência sobre as dosagens hormonais e a função tireoidiana Alteração fisiológica î

TB G e proteínas carregadoras

Î hCG no primeiro trimestre Î

volume plasmático

Î

deiodase (da placenta- tipo III)

Î

volume glandular

Î depuração de iodo

Alteração de teste de função tiroidiana T T 4 to ta l e T T 3 to ta l t T 4 livre e

i

TSH

T p o o l o rg â n ic o de T 4 e T 3

T

d eg ra d a çã o de T 4 e T 3 re q u e re n d o > p ro d u ç ã o

h o rm o n al tT g i p ro d u ç ã o h o r m o n a l em áreas c o m d é fic it de io d o

hCG: gonadotrofina coriônica,TBG: globulina carreadora de hormônio tireoidiano,Tg: tireoglobulina, T3: triiodotironina,T4: tiroxina,TSH: tireotrofina.

A T4 circula no sangue ligado a proteínas séricas. Porém, é a sua forma livre, T4 livre (T4L), que apresenta ação hormonal. O hiperestrogenismo, tanto endógeno (gra­ videz) quanto exógeno (hiperestimulação ovariana), é acompanhado por um aumento

320

Endocrinologia Feminina e Andrologia

da globulina transportadora de tiroxina (TBG), que é a principal proteina carreadora da T4. Durante a gravidez, a concentração de TBG dobra, com aumento no número de sítios de ligação para a T4.16 O processo resulta em elevação das concentrações séricas de T4 total (T4T), com as de T4L se mantendo normais. Ocorre ainda aumento no flu­ xo sanguíneo renal e na filtração glomerular, levando à depuração aumentada de iodo, e o metabolismo periférico dos hormônios da tireoide é modificado, essencialmente sob a influência da iodotironina deiodinase “tipo 3” placentária.16Finalmente, os HTs também podem ser transitoriamente aumentados durante o l e trimestre de gestação por causa dos efeitos tireotróficos das elevadas concentrações séricas de hCG. No caso de uma tireoide com função ameaçada (quer seja por baixa ingestão de iodo na dieta e/ou doença autoimune e/ou tireoidectomia), os requisitos aumentados de HT não podem ser satisfeitos, e essa condição resulta, por sua vez, na diminuição das concen­ trações de T4L e no aumento compensatório nas de TSH.16 D O EN Ç A S D A T IR E O ID E E D IS T Ú R B IO S D O S I S T E M A R E P R O D U T IV O F E M IN IN O

Hiper e hipotireoidismo são os principais distúrbios da tireoide que podem exercer efei­ tos adversos sobre a reprodução feminina,11 com todo o eixo HHG podendo ser afeta­ do. No hipertireoidismo, podem ser observadas elevações das concentrações séricas de LH e FSH (os quais podem, todavia, não sofrer alteração), estradiol total (com o estradiol livre se mantendo inalterado), estrona, SHBG, testosterona, A4-androstenediona e di-hidroepiandrosterona (DHEA); bem como redução das concentrações de progesterona.11 No hipotireoidismo, podem ser observadas reduções das concentrações de estradiol total (com o estradiol livre se mantendo normal), estrona, SHBG, testostero­ na (com a testosterona livre se mantendo normal), A4-androstenediona e progesterona, com LH e FSH se mantendo normais.11 Além disso, hiperprolactinemia, com galactorreia, pode ocorrer em pacientes com hipotireoidismo primário,17 provavelmente pela estimulação da prolactina provocada pelas elevadas concentrações de hormônio liberador do TSH (TRH). A maturação sexual pode ser comprometida pela disfunção tireoidiana, com o hipotireoidismo podendo causar alterações no processo puberal, geralmente atraso, mas, ocasionalmente, resultando em pseudopuberdade precoce.2,3 Em mulheres adultas, as disfunções tireoidianas podem ser associadas a distúrbios menstruais. No hipertireoidismo, as manifestações mais comuns são a hipo e a oligomenorreia, embora aumento de sangramento também possa ocorrer.3,11 O padrão menstrual pode ser alterado por ação direta dos hormônios da tireoide sobre os ová­ rios, ou por ação indireta sobre a secreção de prolactina (PRL) e hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) e sobre a produção de SHBG e de fatores de coagulação.16 O hipotireoidismo, geralmente, está associado a ciclos menstruais anormais, com polimenorreia3 e hipermenorreia. Uma das alterações mais dramáticas do eixo HHG, provocada pelos distúrbios tireoidianos, em mulheres, é a infertilidade. Tanto a tireotoxicose como o hipotireoi­ dismo, manifesto ou subclínico, têm sido associados à redução da fertilidade,11 com ciclos anovulatórios ocorrendo frequentemente nas disfunções tireoidianas.3 Além das disfunções, também as doenças autoimunes da tireoide (DAIT) têm sido associadas à infertilidade feminina.11 De fato, em mulheres inférteis, a prevalência de

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 321

DAIT é significativamente maior, especialmente na presença de endometriose ou síndrome dos ovários policísticos (SOP). Porém, as DAIT não parecem interferir com a implantação fetal normal.16 Além das alterações do SRF, anteriormente citadas, várias outras são associadas às doenças tireoidianas, como os tumores uterinos. A associação entre tumores fibroides e nódulos de tireoide foi relatada, sugerindo um papel do estrógeno em ambas as alterações.18 Além disso, maior risco para alguns tumores malignos, particularmente sarcomas uterinos, na presença de doenças tireoidianas, principalmente bócio e hipertireoidismo de longa evolução, foi relatado em mulheres dinamarquesas, resultados que necessitariam ser confirmados por outros estudos.19 Lesões císticas ovarianas volumosas, consequentes à hiperestimulação gonadal, podem ocorrer em casos de hipotireoidismo grave, podendo levar a hemorragia intra-abdominal e sinal de Cullen. Nesses casos, a sequência de eventos que resulta em hiperestimulação ovariana não é clara. Ela poderia ser o resultado da interação das elevadas concentrações de TSH com o receptor de FSH. Poderia ainda ser devido ao estímulo das go nado tr o finas por concentrações elevadas de TRH,20 apesar de, aparen­ temente, as concentrações de FSH não se encontrarem particularmente elevadas no hipotireoidismo primário de longa evolução, mesmo com a intensidade de estimula­ ção gonadal.21

D Doenças da tireoide e reprodução assistida O resultado final da técnica de reprodução assistida (TRA) pode ser influenciado por uma série de fatores. Nesse contexto, tanto a presença de disfunções quanto de autoimunidade tireoidianas inspiram preocupação. O hipotireoidismo, pela sua elevada frequência em mulheres na faixa etária repro­ dutiva e pela associação com resultados gestacionais adversos,22 é a disfunção mais preocupante, inspirando ainda algumas controvérsias. Um dos pontos a ser esclareci­ do seria qual a concentração sérica pré-concepcional ideal de TSH neste grupo espe­ cífico de pacientes. Recentemente, foi definido que o limite superior do TSH, no pri­ meiro trimestre da gestação, seria de 2,5 pIU/mL.22 Michalakis etal. (2011), avaliando uma coorte de 1.231 mulheres submetidas àTRA, observaram que 23% apresentavam concentrações de TSH entre 2,5 e 4,0 pIU/mL. Nessas pacientes, os autores observa­ ram que as concentrações pré-concepcionais mais elevadas de TSH foram associadas com reserva ovariana diminuída, mas não com resultados adversos da TRA ou da gra­ videz.23 Por sua vez, Reh et dl. (2010), avaliando pacientes submetidas à fetilização in vitro, não encontraram diferenças nas taxas de gestações clínicas, partos ou abortos, comparando-se os cutoffs de TSH de 2,5 e 4,5 mUI/L.24 Assim, o mérito de reduzir-se o TSH-alvo, previamente a TRA, permanece controverso. A autoimunidade tireoidiana per se também parece representar um problema real para a reprodução assistida. Comparando-se mulheres com e sem DAIT, submetidas à TRA, taxas de gravidez semelhantes são obtidas, com as primeiras apresentando maior taxa de abortamento espontâneo no primeiro trimestre, mesmo quando o eutireoidismo estava presente antes da gravidez.16 Por outro lado, a hiperestimulação ovariana controlada (HOC), e a consequente e significativa elevação das concentrações séricas de estrógeno,11 que ocorre no preparo para a TRA, tem impacto significativo sobre a função da tireoide, particularmente em mulheres com DAIT.16 O aumento estrogênico é dependente do processo de HOC

322

Endocrinologia Feminina e Andrologia

utilizado,, tornando-se particularmente significativo na sua maior complicação, a síndrome da hiperestimulação ovariana (SHO). Quando D ATT está presente inicialmen­ te, o impacto da HOC sobre a função tireoidea é evidente, com aumento do TSH e di­ minuição da T4L, e sua magnitude depende das concentrações de TSH e T4L prévios à HOC. Nesses casos, pode ocorrer hipotireoidismo subclínico, o que poderia alterar o resultado da gravidez. Mulheres com suficiência de iodo e sem doença tireoidiana, geralmente, são capazes de aumentar a produção de HTs, em resposta ao estímulo adicional induzido pela HOC.11 Quanto ao hipertireoidismo, os estudos que avaliam a influência dessa disfun­ ção sobre a TRA são escassos. Porém, considerando-se as repercussões do hiperti­ reoidismo franco sobre a gestação e que o eutireoidismo deve ser atingido antes da concepção,22 parece prudente proceder-se à resolução do mesmo antes da realização da TRA. D O E N Ç A S D A T I R E O I D E E G E S TA Ç Ã O

As doenças tireoidianas acometem, principalmente, as mulheres, e as disfunções e a autoimunidade da glândula ocorrem particularmente naquelas em idade reprodutiva. De modo geral, tanto o hipo quanto o hipertireoidismo podem complicar a gestação, sendo o primeiro a disfunção mais frequententemente observada.11 Na gestação, assim como fora dela, as principais causas de hipotireoidismo, na presença de suficiência de iodo, são as DAIT, as quais podem, contudo, manifestar-se na forma de tireoidite crônica assintomática em 5% a 20% das grávidas.11 Apesar da elevada prevalência das DAIT, um problema que não pode ser esquecido é a insuficiência de iodo nas gestantes. Gestantes com deficiência de iodo leve a moderada têm risco aumentado para o desenvolvimento de bócio, efeitos adversos sobre a função cognitiva da prole, com déficit de atenção e distúrbios de hiperatividade.22 Os guidelines da American Thyroid Association, publicados em 2011, recomendam que grávidas e lactantes deveriam ingerir um mínimo de 250 mcg de iodo. Para tal, nos Estados Unidos, elas deveriam complementar sua dieta com suplementos diários, por via oral, contendo 150 mcg de iodo, na forma de iodeto de potássio.22

IMPORTANTE É importante ressaltar que, no Brasil, nem todos os polivitamínicos, normalmente indicados para as gestantes, contêm iodo em sua composição.

As consequências da hipofunção tireoidea materna sobre o resultado da gra­ videz podem ser diversos. O hipotireoidismo se associa a aumento da incidência de perda fetal3 e outras morbidades, tanto gestacionais quanto para o concepto. Além do aborto espontâneo, o hipotireodismo manifesto tem sido associado a au­ mento das taxas de parto prematuro e/ou baixo peso ao nascer, sofrimento fetal durante o parto e, talvez, também hipertensão induzida por gestação, descolamen­ to placentário e morte fetal.22 Apesar dos relatos das complicações, ainda existem algumas controvérsias na literatura, as quais poderão ser esclarecidas por estudos

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 323

bem-desenhados, prospectivos e com grande número amostrai que se encontram em andamento.11 Além do hipotireodismo clássico, existe a possibilidade de hipotiroxinemia isola­ da, cujas causas ainda não estão completamente elucidadas, a qual poderia acometer aproximadamente 2% das gestantes. Seu papel não deve ser negligenciado, uma vez que existem relatos de associação com resultados gestacionais insatisfatórios.11 Quanto à tireotoxicose, as 2 principais causas, na gravidez, são a doença de Graves (DG), a qual é relativamente rara, mas potencialmente prejudicial, e a tireotoxicose gestacional transitória (TGT), relativamente mais comum, mas geralmente mais bran­ da. A história natural da DG é alterada na gravidez, com tendência de exacerbação no primeiro trimestre, melhora espontânea no segundo e terceiro trimestres e risco de rebote no período pós-parto.11 Caso a tiretoxicose se mantenha descontrolada, particularmente durante o segundo e terceiro trimestres, várias complicações maternas e fetais podem ocorrer. Entre as com­ plicações maternas, são relatadas maiores incidências de eclâmpsia, insuficiência cardíaca congestiva, edema agudo de pulmão, arritmias cardíacas e crise tireotóxica.25 Como com­ plicações para o concepto, são referidas maiores taxas de abortamento, natimortalidade, prematuridade, baixo peso ao nascer, malformações fetais,25 restrição de crescimento intrauterino e oligoâmnio.26 Hipertireoidismo fetal/neonatal pode ocorrer como conse­ quência da passagem transplacentária de TR-Ab estimulante materno. Pode tanto ocorrer em recém-nascidos de mulheres com DG em atividade quanto naquelas que obtiveram cura definitiva da doença - por cirurgia ou iodo radioativo (131I) -, mas que mantiveram elevados títulos de TR-Ab. Seu diagnóstico é, geralmente, baseado na presença de taquicardia fetal, idade óssea acelerada e retardo do crescimento intrauterino.11 D O EN Ç A S D A T IR E O ID E E D IS T Ú R B IO S D O S I S T E M A R E P R O D U T IV O M A S C U L IN O

Como nas mulheres, hiper e hipotireoidismo também podem afetar a função repro­ dutiva masculina, provocando alterações tanto nas concentrações hormonais, quan­ to nos vários componentes e processos do SRM. A tireotoxicose pode estar associa­ da a elevações das concentrações séricas de LH e FSH (os quais podem, porém, estar inalterados), testosterona (total e biodisponível, com a livre se mantendo inalterada), DHEA, SHBG e estradiol (total e livre).11 Pode ainda ser observada redução da resposta da PRL ao TRH e da variação da testosterona após estímulo com hCG.5 No hipoti­ reoidismo, são relatadas diminuições nas concentrações séricas de testosterona (total e livre), SHBG (a qual pode, porém, encontrar-se inalterada), À4-androstenediona e DHEA, com as de LH e FSH mantendo-se dentro da faixa de normalidade.11 A fertilidade também pode ser comprometida em homens com disfunção tireoidiana. Pacientes com hipertireoidismo podem apresentar anormalidades nos parâmetros seminais, como astenospermia,5,11 hipospermia, oligospermia, necrospermia5 e teratospermia (anormalidades na morfologia espermática).5,11 Além da redução na fertilidade, pacientes com hipertireoidismo podem apresentar outras manifestações clínicas de hipogonadismo, como ginecomastia e redução do volume testicular.5

324

Endocrinologia Feminina e Andrologia

A alteração nas concentrações de HT pode ainda repercutir, direta ou indiretamen­ te, sobre a função sexual masculina. Tanto o hipo quanto o hipertireoidismo têm sido associados à disfunção erétil.11 ■

D IA G N Ó S T IC O D A S D I S F U N Ç Õ E S T IR E O ID IA N A S

O diagnóstico das disfunções tireoidianas é baseado na presença de suspeita clínica, a qual é confirmada pelos resultados de exames laboratoriais, ou pela realização de rastreamento em grupos específicos de pacientes. O quadro clínico clássico do hipotireoidismo é de cansaço, sonolência, perda de concentração, diminuição da memória, intolerância ao frio, constipação, depressão, ganho de peso, aumento de volume da tireoide, menstruações irregulares, síndrome do túnel do carpo, déficit de audição, pele seca, unhas quebradiças, tendência ao edema, particularmente ao palpebral e pretibial não compressivo, bradicardia, pres­ são alta e alteração do reflexo de Aquiles. Embora o quadro clínico possa sugerir o diagnóstico, como grande parte das manifestações citadas se constituem em queixas comuns na prática clínica, este deveria ser confirmado pela detecção de concentra­ ções séricas reduzidas de T4L e elevadas de TSH. Caso as concentrações de T4L este­ jam normais e as de TSH elevadas, configura-se o quadro de hipotireoidismo subclínico.27Quando a dosagem do TSH é realizada pelo método de ensaio imunométrico não isotópico (IMA), a faixa de normalidade fica em torno de 0,2 a 4,5 mlU/L.28 A investigação da etiologia do hipotireoidismo pode ser realizada pela dosagem sérica de anticorpo anti-TPO, uma vez que a causa mais frequente do distúrbio é a tireoidite de Hashimoto. Como, mesmo na ausência de sinais e sintomas típicos da disfunção tireóidea, o hipotireoidismo pode ser associado a distúrbios do sistema reprodutivo, conforme já relatado anteriormente, justifica-se, em algumas situações, a realização de rastreamento laboratorial. Enquanto o diagnóstico propriamente dito pode ser realizado, de forma custo-efetiva, pela dosagem de T4L e TSH, o rastreamento poderia ser feito, inicial­ mente, apenas pela dosagem do TSH.27 Em mulheres, o diagnóstico precoce da disfunção tireoidiana e, consequen­ temente, seu tratam ento, reduzem a incidência de alterações do SRF, como as m enstruais.11 Assim, mulheres em idade fértil, que apresentem distúrbios mens­ truais, infertilidade e/ou galactorreia,27 bem como meninas com puberdade pre­ coce2 ou atrasada deveriam ser investigadas bioquimicamente para hipotireoidis­ mo. Além disso, é aconselhável avaliar a função e a presença de autoimunidade tireoidiana em mulheres inférteis que serão submetidas à TRA, previamente ao procedimento e, nos casos em que for detectada DAIT, o acompanhamento da função tireoideana após a HOC e durante a gravidez.16 Uma vez que o diagnós­ tico de tireoidite de Hashimoto tenha sido instituído, não haveria a necessidade do acompanhamento laboratorial das concentrações séricas de anticorpos antitireoidianos. Quanto à detecção de hipotireoidismo na gestação, é fundamental que sejam utili­ zados intervalos de referência do TSH específicos para a gravidez devido às alterações hormonais fisiológicas representadas nas Figuras 22.1 e 22.2.

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 325

4.5

3.5

2.5

TSH mUI/L 1.5

0,5 0,03

10

20

30

40

Idade gestational (semanas)

FIGURA 22.1 Evolução das concentrações séricas de TSH durante a gestação.29

São consideradas portadoras de hipotireoidismo manifesto as gestantes com concen­ trações elevadas de TSH (maiores que 2,5 mIU/L) e reduzidas de T4L e aquelas com TSH de 10 mIU/L ou mais, independentemente das concentrações de T4L. O hipotireodismo subclínico é definido como TSH entre 2,5 e 10 mIU/L com concentração de T4L nor­ mal.22 Caso as concentrações de T4L estejam reduzidas e as de TSH inapropriadamente normais, as possibilidades de hipotireoidismo central ou hipotiroxenemia isolada de­ vem ser lembradas. Grande parte das mulheres com hipotireoidismo manifesto sabe de seu problema e se encontra em tratamento com levotiroxina. Por outro lado, no caso do hipotireoidismo subclínico, o qual é mais frequente que o manifesto, a maioria das pacientes não tem o diagnóstico e não será facilmente diagnosticada, a menos que um procedimento de rastreamento seja realizado.11Apesar disso, a Associação Americana de Tireoide, em seus últimos guidelines, concluiu que não há evidências suficientes para recomendar contra ou a favor do rastreamento universal por meio do TSH no início da gestação. A sociedade recomenda que todas as gestantes sejam inqueridas, na primeira consulta de pré-natal, sobre histórico de doença tireoidiana e/ou uso de levotiroxina ou drogas antitireoidianas, indicando a investigação laboratorial apenas para mulheres com elevado risco de hipotireoidismo manifesto. Esse grupo inclui aquelas com: histó­ ria de disfunção ou de cirurgia de tireoide prévia, idade maior que 30 anos, sintomas de disfunção da tireoide ou a presença de bócio, positividade para anti-TPO, diabetes do tipo 1 ou outras desordens autoimunes, história de parto prematuro ou aborto espontâ­ neo, história de radiação de cabeça ou pescoço, história familiar de disfunção tireoidia­ na, obesidade mórbida, uso de amiodarona ou lítio, história de administração recente de contraste radiológico iodado, infertilidade ou residência em uma área de conhecida insuficiência, de moderada a grave, de iodo.22 Porém, o rastreamento de alterações tireoidianas apenas em gestantes de risco ainda é controverso, com dúvidas, inclusive, sobre qual seria o exame de escolha para a avaliação.

326

Endocrinologia Feminina e Andrologia

T4 livre (ng/dL) 1,55 1,40

97,5% 1,24 1,09

média

0,93 0,78 0,62 0,47

2,5 %

0,31 0,16

0 &

°> < ò -r " -7' '

/V' & \J -7 -7

-7

^

-iv

^

-nv

V

'%?

-r

ï

Jtí

Idade gestacional (semanas)

T4 total (ng/dL)

97,5% 17,16 15,60 14,04

média

12,48 10,92 9,36 7,80 6,24 4,68

2,5 %

3,12 1,56

0 t?

fcr*

n

jy ^ jfy

J> &

n>

&

jp jf> 7? 7? ^ -7° ’

Idade gestacional (semanas)

FIGURA 22.2 Evolução das concentrações séricas deT4TeT4L durante a gestação (modificado de Stricker e t a l., 2007).30

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 327

O quadro clínico clássico do hipertireoidismo é de ansiedade, nervosismo, irritabili­ dade, fadiga, fraqueza muscular, bócio, emagrecimento, insônia, sudorese excessiva, pal­ pitação, taquicardia, taquiarritmias atriais, intolerância ao calor, pele quente e sedosa, tremores, pressão arterial divergente, hiper-reflexia, retração palpebral, alterações mens­ truais, hiperfagia, hiperdefecação, exoftalmia,31 mixedema pré-tibial e acropaquia. Os últimos 3 sinais clínicos são indicativos de que o hipertireoidismo é causado pela DG. O diagnóstico da tireotoxicose é confirmado pelas concentrações séricas reduzidas de TSH e elevadas de T4L. O hipertireoidismo subclínico se caracteriza por concentrações suprimidas de TSH e normais de HTs. Caso não haja evidências clínicas de DG, a cap­ tação elevada de 131I confirmará que a tireotoxicose é devida à hiperfiinção tireoidiana, cuja principal causa é a DG. Uma forma alternativa para diagnosticar a DG é a dosagem de TRAb, a qual poderia ser realizada em situações nas quais a captação de 131I não seja disponível ou não possa ser utilizada, como na gestação e durante o aleitamento.32 Apesar de o quadro clínico do hipertireoidismo parecer dramático, algumas vezes ele se mostra frustro. Além disso, as manifestações clínicas podem ser confundidas com outras morbidades, não tireoidianas. Assim, ao investigar-se a função tireoidiana em situações de alterações da maturação sexual, menstruais e infertilidade, previa­ mente ou não à TRA, pode-se chegar à conclusão de que existe hipertireoidismo asso­ ciado ao distúrbio do SRF. Na gestação, a história e/ou o quadro clínico de tireotoxicose, a presença de hiperemese gravídica ou ainda as indicações para o rastreamento de disfunção tireoidia­ na citadas anteriormente, devem resultar em investigação da função da glândula. No primeiro trimestre, a presença de concentrações suprimidas de TSH podem indicar tanto a presença de TGT, quadro normalmente brando e auto limitado, quanto de outras causas mais graves de hipertireoidismo, como a DG. A realização de exame físico e anamnese cuidadosos, com dosagens de T4L e, eventualmente, de T3 e TRAb, podem auxiliar no diagnóstico diferencial. Exames com 131I não devem ser solicitados na gestação.22 Os casos de gestantes com DG, mesmo que já tratadas de forma defini­ tiva e em eutireoidismo atual, devem ser submetidos a dosagem de TRAb com 20 a 24 semanas de gestação, pois a presença de títulos elevados desse anticorpo é relacionada com a ocorrência de DG fetal e neonatal.22 Em homens, considerando-se as alterações do SRM associadas às disfunções tireoi­ dianas, relatadas anteriormente, a função tireoidiana deveria ser avaliada nos casos com infertilidade, disfunção erétil e ginecomastia. IN D IC A Ç Ã O D E T R A T A M E N T O D A S D IS F U N Ç Õ E S T IR E O ID IA N A S

O hipotireoidismo franco, clínico e/ou laboratorial, em homens e mulheres, em geral, deve ser tratado. Se a disfunção tireoidiana for associada a distúrbios reprodutivos, os mesmos poderiam apresentar regressão. Em mulheres com hipotireoidismo e alte­ rações menstruais e/ou dificuldade para conceber, p. ex., o tratamento da disfunção tireoidiana pode reverter as alterações menstruais e melhorar a fertilidade.16 Em mulheres inférteis que serão submetidas à TRA, o hipotireoidismo franco deve ser tratado antes da realização do procedimento. Além disso, pacientes com hipotireoi­ dismo subclínico, que recebem tratamento com levotiroxina previamente à TRA, podem apresentar maior viabilidade dos embriões,33 menor taxa de aborto, com maiores taxas de gravidez e parto, do que as não tratadas, sugerindo que a suplementação com levo-

328

Endocrinologia Feminina e Andrologia

tiroxina deveria ser recomendada também nestes casos.34 Na reprodução assistida, na presença de DAIT (em pacientes que já se encontram ou não em tratamento com levo­ tiroxina), antes de iniciar o procedimento de HOC, é aconselhável manter as concentra­ ções séricas de TSH abaixo de 2,5 mIU/L e monitorar rigorosamente os testes de função da tireoide. Em mulheres com concentrações séricas de TSH entre 2,5 e 4,0 mIU/L, sem tireoidectomia ou DAIT prévias, propõe-se a monitorização da função tireóidea após a HOC. A administração de levotiroxina deve ser iniciada em caso de TSH acima de 2,5 mIU/L, na presença de DAIT. Além disso, aumento na dose de levotiroxina deve ser con­ siderado nas mulheres que já estão em terapia de substituição, com o objetivo de obter concentração de TSH abaixo de 2,5 mIU/L, antes da HOC, pois esse procedimento aumenta as exigências de HT.11 Na gestação, deverão ser tratadas as mulheres com TSH acima dos limites de referên­ cia trimestre-específicos, com T4L diminuído, aquelas com TSH acima de 10 mIU/L, independentemente da concentração de T4L e as com hipotireoidismo subclínico e positividade para anticorpo anti-TPO.22 A Tabela 22.2 resume os principais efeitos do hipotireoidismo sobre a gestação.

TABELA 22.2 Complicações maternas associadas ao hipotireoidismo35 Complicações maternas

Referência

A b o rto

R ô ti et a l , 1 9 9 6 ;36 G lin o e r, 1 9 9 7 ;37 M o n to r o , 1 9 9 7 38

D o e n ç a h ip e rte n siv a d a g e sta çã o

Roei et a l , 19 9 6 36

P a rto p re m a tu ro

M o n to r o , 19 9 7 38

A n e m ia

Roei et a l , 19 9 6 36

D e s c o la m e n to p re m a tu ro de p la c e n ta

M e s tm a n , 2 0 0 4 35

H e m o rra g ia n o p ó s-p a rto

Roei et a l , 19 9 6 36

C o m p lic a ç õ e s fe ta is

R ô ti et a l , 1 9 9 6 36

É importante lembrar que o hipotireoidismo materno está associado a profundas alterações de desenvolvimento de sistema nervoso central (SNC) e rebaixamento de nível de inteligência do concepto, o qual depende fundamentalmente dos níveis hor­ monais maternos para seu desenvolvimento durante as críticas primeiras semanas de gestação, como resume a Figura 22.3. Permanece controverso se a medicação deveria ser introduzida, durante a gestação, em mulheres eutireoidianas com DAIT. Até o momento, há falta de ensaios clínicos con­ cluídos, adequadamente desenhados, randomizados, para elucidar a controvérsia.16 Homens com distúrbios reprodutivos e hipotireoidismo, quando tratados com le­ votiroxina, também apresentam melhora das queixas relativas ao SRM. As anormali­ dades na morfologia espermática e a disfunção erétil melhoram ou normalizam quan­ do o eutireoidismo é restaurado.11 O tratamento do hipotireoidismo não costuma apresentar contraindicações na faixa etária reprodutiva. Porém, recomendam-se cuidados específicos na instituição do tratamento em casos associados a insuficiência adrenal, coronariopatia e em pa­ cientes idosos.

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 329

Da criança

Milenização

Cóclea Cortex cerebral Estriado

Eventos importantes no SNC

Vias subaracnóideas Corpo caloso

T

0

Olhos Face — I— 1

Cerebelo

Denteado de hipocampo 1------ 1-------1-------1------- r 2

3

4

5

6

Idade gestational em meses

T 7

T

T

8

t

T

T 2

T 3

Nascimento (termo)

Prematuridade

FIGURA 22.3 Influência dos hormônios tireoidianos na maturação das estruturas cerebrais fetais.39

O hipertireoidismo franco, clínico e/ou laboratorial, devido às morbidades que acarreta, também deve ser tratado. Com relação ao hipertireoidismo subclínico, o tratamento ainda é controverso. Os guidelines da American Thyroid Association e da American Association of Clinical Endocrinologists Taskforce, publicados em 2011, recomendam que, na presença de TSH 0,1 mU / L, o tratamento deveria ser considerado em indivíduos com 65 anos de idade ou mais e em pacientes com doença cardíaca ou sintomas de hipertiroidismo.32 A abordagem terapêutica de mulheres com hipertireoidismo gestacional depende da gravidade dos sintomas. A TGT não demandaria tratamento específico. Já a DG, quando com hipertireoidismo franco, deveria ser tratada. Por outro lado, o tratamen­ to não é indicado no hipertireoidismo subclínico, uma vez que esta condição não tem sido associada à evolução gestacional desfavorável.22 Em homens com hipertireoidismo e alterações do SRM, a correção do hipertireoi­ dismo, com o tratamento, pode restabelecer vários aspectos da função reprodutiva, como a função erétil.11 Quanto às contraindicações para o tratamento do hipertireoidismo, estas podem existir em relação a determinada modalidade terapêutica em particular. Assim, a utilização do 13T é contraindicada na gravidez, na lactação, no câncer de tireoide co­ existente ou na suspeita de câncer de tireoide, em indivíduos incapazes de cumprir as diretrizes de segurança de radiação e em mulheres que planejam gestação dentro de 4 a 6 meses.32 As drogas antitireoidianas são contraindicadas em pacientes que já apresentaram reações adversas graves com as mesmas e, no I o trimestre da gravidez,

330

Endocrinologia Feminina e Andrologia

o uso de metimazol é contraindicado, devemdo-se dar preferência ao propiltiouracil.32 Quanto à tireoidectomia, a contraindicação é a associação com comorbidades graves, como doença cardiopulmonar, fase terminal de câncer ou outras doenças de­ bilitantes. A gravidez é uma contraindicação relativa. Nessa situação, a tireoidectomia só deve ser realizada quando o controle rápido do hipertireoidismo é necessário e as medicações antitireoidianas não podem ser usadas. Deve ser evitada, particular­ mente, no primeiro e terceiro trimestres, devido aos efeitos teratogênicos associados aos agentes anestésicos e ao aumento do risco de perda fetal, no primeiro, e do risco de parto prematuro, no terceiro trimestre.32

D Abordagem terapêutica do paciente com disfunção tireoidiana O tratamento do hipotireoidismo deve ser realizado com levotiroxina sódica por via oral, em doses que variam, no adulto jovem, entre 1,2 a 1,7 mcg/kg de peso/dia. No caso do hipotireoidismo subclínico, doses diárias totais em torno de 25 mcg a 50 mcg poderiam ser suficientes. A tomada da medicação deve ser pela manhã, em jejum, pelo menos 30 min antes do café da manhã, com água. Vitaminas, suplementos e outros medicamentos não devem ser ingeridos conjuntamente ou próximos da tomada da levotiroxina. Nos pacientes com antecedentes cardiovasculares, o tratamento deve ser instituído com cautela, iniciando-se com doses entre 12,5 pg a 25 pg por dia, aumen­ tando 25 pg a cada 4 semanas, até a dose suficiente para normalização do TSH.40 A avaliação laboratorial deve ser realizada em 6 a 8 semanas após atingir-se a dose plena da levotiroxina. O objetivo do tratamento é normalizar as concentrações séricas de TSH. Na gestação, a normalização deve levar em consideração os intervalos de re­ ferência trimestre-específicas (primeiro trimestre: 0,1-2,5 mUI/L: segundo trimestre: 0,2-3,0 mUI /L; terceiro trimestre: 0,3-3,0 mUI /L).22 A Tabela 22.3 sugere doses para início de tratamento e para ajuste de dose.

TABELA 22.3 Sugestão de parâmetros para a dose plena inicial e para posteriores reajustes de levotiroxina para a gestante. Note que o reajuste é feito pelo peso medido no momento desse reajuste

I

TSH

Dose plena inicial

Dose de reajuste

< 10 pU/mL

1 pg/kg de p eso atu al/ d ia o u 5 0 p g / d ia

2 5 - 5 0 p g/ d ia

Entre 10 e 20 pU/mL

l,5 p g / k g de peso atu al/dia o u 1 0 0 pg/dia

5 0 - 7 5 pg/ d ia

> 20 |xU/mL

2 pg/kg de p eso atu al/ d ia o u 1 5 0 pg/dia

7 5 - 1 0 0 pg/dia

Pacientes com hipertireoidismo manifesto por DG podem ser tratados com 13T, tireoidectomia ou drogas antitireoidianas (DAT), de preferência em um serviço especia­ lizado nesse tipo de distúrbio. A opção por uma ou outra modalidade de tratamento vai depender do paciente, da presença de comorbidades, da disponibilidade e da resposta ao método terapêutico. O 131I é o tratamento inicial preferido nos Estados Unidos, apre­ sentando boa resposta com relação ao controle do hipertireoidismo, com elevada taxa de evolução para hipotireoidismo, mas, como já referido, exige um periodo posterior à aplicação em que se evite gravidez por 6 meses A tireoidectomia é preferencialmente indicada nos casos de bócios volumosos e na suspeita de neoplasia associada.

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 331

No Brasil, em geral, as DAT são indicadas para o tratamento inicial da DG, prin­ cipalmente nos casos de bócios pequenos, na gestação e em crianças e adolescentes.31 Existem 2 DAT disponíveis no Brasil, o metimazol (Mz) e o propiltiouracil (PTU). Se as DAT são escolhidas para a terapia, o Mz deve ser a droga de escolha, exceto no primeiro trimestre da gestação, na crise tireotóxica e nas reações menores ao Mz (em pacientes que recusam o 131I e a cirurgia), uma vez que o PTU tem sido associado à grave hepatotoxicidade.32 As doses iniciais para o tratamento podem variar de 10 a 40 mg/dia de Mz (em uma única tomada) ou 100 mg a 400 mg/dia de PTU (dividos em 3 tomadas), dependendo da gravidade do caso. Com o controle da tireotoxicose, estas podem ser regredidas para uma dose de manutenção de 5 mg a 10 mg/dia de Mz ou 50 mg a 100 mg/dia de PTU. A DAT deve ser mantida por 12 a 18 meses e, então, ser regredida ou retirada.32 Quando as manifestações clínicas da tireotoxicose apresentam-se muito intensas, o tratamento sintomático com betabloqueadores poderia minimizá-las. Assim, drogas como o propranolol, em doses de 10 mg a 40 mg cada 6 h , 8 h32 ou 12 h, ou atenolol 25 mg a 100 mg 1 a 2 vezes ao dia,32 poderiam ser utilizadas. Em grávidas, a abordagem mais adequada do hipertireoidismo gestacional asso­ ciado à hiperemese gravídica inclui terapia de suporte com controle dos vômitos, manejo da desidratação e, se necessário, hospitalização. As DAT não são recomendadadas em casos de TGT.22 Quanto às outras causas de tireotoxicose, o ideal é que as mulheres com hipertireoidismo estejam em eutireoidismo antes de tentar a gra­ videz. Durante a gestação, o PTU é a DAT preferida no primeiro trimestre, de modo que, se a paciente estiver em uso de Mz, a medicação deverá ser mudada para PTU nessa fase. Após o primeiro trimestre, considerando-se os efeitos colaterais relacio­ nados com o PTU, a mudança para o Mz deve ser considerada.22 As doses da medica­ ção dependem da gravidade dos sintomas e da intensidade da hipertiroxinemia. Em geral, as doses iniciais de Mz ficam em torno de 5 mg a 15 mg/dia e as de PTU, de 50 mg a 300 mg/dia, em doses divididas.22 O propranolol, em doses de 20 mg a 40 mg cada 6 h a 8 h22 ou 40 mg cada 12 h, poderia ser utilizado para o controle das ma­ nifestações adrenérgicas. Porém, esta droga deveria ser utilizada pelo menor tempo possível, devido às possíveis consequências fetais e neonatais, particularmente a res­ trição de crescimento intrauterino, a bradicardia fetal e a hipoglicemia neonatal.41 Durante o seguimento, a T4L e o TSH devem ser monitorados a cada 2 a 6 semanas, com a T4L sendo mantida no limite superior ou moderadamente acima da faixa de normalidade,22 com a utilização da menor dose possível de DAT. Mais estudos são necessários para avaliar a validade das recomendações feitas pelas várias sociedades médicas americanas, para minimizar potenciais efeitos teratogênicos e colaterais do uso de tais drogas.11 A tireoidectomia, para tratamento do hipertireoidismo por DG, é raramente indicada na gestação. Porém, a cirurgia poderia ser necessária em casos de alergias graves ao Mz e ao PTU, em pacientes necessitando de doses extrema­ mente elevadas de DAT e naquelas que não aderem à terapia medicamentosa. Caso necessária, o período mais adequado para sua realização seria o segundo trimestre,22 mais especificamente no fim deste. Embora seja o momento mais adequado, ainda existe risco de parto prematuro.32 O tratamento do hipertireoidismo com 131I é contraindicado na gestação.22 Devido à potencial gravidade do quadro, o hipertireoi­ dismo em gestantes deve ser acompanhado por profissionais com experiência nessa condição.

332

Endocrinologia Feminina e Andrologia

E F E IT O S A D V E R S O S D O T R A T A M E N T O

O tratamento do hipotireodismo com levotiroxina por via oral, em homens e mu­ lheres adultos, não costuma ser acompanhado por efeitos adversos, desde que se­ jam respeitadas as indicações e doses preconizadas. As doses de levotiroxina devem ser cuidadosamente tituladas, evitando-se a indução de tireotoxicose iatrogênica que, mesmo que subclínica, pode estar associada a alterações cardiovasculares, particularmente arritmias, em idosos, e aumento da perda óssea em mulheres menopausadas.42 A terapia do hipertireoidismo, por outro lado, pode ser acompanhada de alguns efeitos bastante deletérios. As DAT podem ser associadas a efeitos colaterais, como erupção cutânea, anemia, artralgia, intolerância gástrica, neutropenia, febre, queda de cabelos e diminuição do paladar. Reações mais graves como agranulocitose, trombocitopenia, aplasia de medula, necrose hepatocelular, hepatite colestática, hipoglicemia, vasculite, poliartrite e glomerulonefrite também podem ocorrer.43 As reações mais le­ ves são mais frequentes, enquanto as mais graves são mais raras. A erupção cutânea, p. ex., pode ocorrer em cerca de 5% dos pacientes, enquanto a agranulocitose ocorre em 0,2% a 0,5% dos casos.32 Antes de se iniciar a terapia com DAT para DG, deveriam ser solicitados hemograma completo, incluindo contagem de glóbulos brancos, com diferencial, e um perfil de enzimas hepáticas, incluindo bilirrubinas e transaminases.32 Os pacientes deveriam ser informados dos possíveis efeitos colaterais das DAT e da necessidade de informar o médico imediatamente caso ocorram erupção cutânea pruriginosa, icterícia, fezes acólicas ou urina escura, artralgias, dor abdominal, fadiga, náusea, febre ou faringite. Antes de iniciar as DAT e em cada visita posterior, o paciente deve ser alertado para interrom per a m edicação imediatamente e chamar o médico quando houver sintomas sugestivos de agranulocitose ou lesão hepática. Além disso, um hemograma deve ser solicitado em todo paciente em uso de DAT que apresente episódio febril e faringite.32 Em nosso serviço, um cartão identificado com os dados pessoais e com a DAT em uso, informando sobre a possibilidade de agranulocitose ou hepatotoxicidade e sobre as condutas imediatas necessárias, é fornecido a todos os pacientes em uso de DAT. Eles são orientados a procurar o serviço médico, caso surjam as alterações descritas, e a apresentar o cartão, para auxiliar na primeira abor­ dagem do caso. No caso de agranulocitose, a internação em esquema de isolamento reverso e a avaliação por hematologista são necessários. Nesses casos, dependendo de indicações específicas, poderiam ser prescritos antibióticos de largo espectro e fa­ tor estimulador de colônias de granulócitos humanos recombinante. Na suspeita de toxicidade hepática, uma criteriosa avaliação da função do fígado deve ser realizada. Os efeitos adversos graves devem receber tratamento médico especializado na área e os pacientes devem ser direcionados para outra modalidade terapêutica da tireo­ toxicose. Efeitos adversos menores, como as reações alérgicas cutâneas, poderiam ser controlados com o uso de anti-histamínicos, enquanto a intolerância gástrica poderia ser tratada com antieméticos e/ou protetores gástricos. Caso persistam, a interrupção da DAT é indicada, e a escolha por tratamento definitivo, com 131I ou cirurgia, seria a melhor opção. Na impossibilidade destas, a troca por outra DAT poderia ser tentada.32 No caso de manifestações mais graves, a utilização de outra DAT não é indicada,32 e o tratamento definitivo deve ser realizado.

Capítulo 22 Associações entre doenças da tireoide e distúrbios reprodutivos 333

Em mulheres, o tratamento da tireotoxicose com 131I poderia suscitar preocupações quanto à possibilidade de concepção futura e eventual teratogenia. Porém, nesses ca­ sos, o 131I não parece apresentar efeitos prejudiciais,11 quando respeitado o intervalo de 6 meses após sua administração. Quando o 131I é utilizado em doses maiores, para tratar o câncer de tireoide, podem ocorrer alterações transitórias da função ovariana, com amenorreia e elevações das concentrações séricas de FSH, mesmo em pacientes mais jovens e naquelas tratadas com doses não muito elevadas.44 Assim, de qualquer forma, por razões profiláticas, é habitualmente recomendado evitar-se a concepção por pelo menos 6 meses após a administração da terapia com 131I para a DG.11 Em gestantes, o 131I está contraindicado, e o tratamento com DAT deve ser acom­ panhado de forma particularmente cautelosa, devido aos seus efeitos adversos e ao fato de que todas as DAT atravessam a placenta e podem afetar a função tireoidiana fetal.11 Dessa forma, a menor dose possível de DAT deveria ser utilizada. Os efeitos adversos ocorrem em 3% a 5% das gestantes que tomam esses medicamentos. Fe­ lizmente, em sua maioria, tratam-se de reações alérgicas, como erupção cutânea.45 Porém, quadros graves, com agranulocitose e óbito podem ocorrer. Uma grande preo­ cupação com o uso de DAT na gravidez está relacionada com os possíveis efeitos teratogênicos. O Mz foi associado a malformações congênitas, principalmente aplasia cútis e síndrome de “Embriopatia pelo Mz”, que inclui atresia coanal ou esofágica e fácies dismórfica.22 Recentemente, um relatório da Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos, chamou a atenção para o risco de hepatotoxicidade em pacientes expostos a PTU, com a possibilidade de danos fatais ao fígado.46 A hepa­ totoxicidade pode ocorrer a qualquer momento durante o tratamento com PTU, e a monitorização das enzimas hepáticas durante o uso da droga deve ser considerada, embora não existam dados que indiquem que esta seja eficaz em prevenir hepatoto­ xicidade fulminante.22 Em homens, o tratamento do hipertireoidismo com 131I não parece causar lesões graves ou irreversíveis ao SRM.11Porém, a utilização de doses maiores, como aquelas direcionadas à terapia do carcinoma diferenciado da tireoide, têm sido relacionadas com alterações significativas no SRM. Efeitos deletérios do 131I sobre os testículos, os quais estão diretamente relacionados com o fracionamento da dose do radioisótopo e a dose acumulada absorvida pelas gônadas, têm sido relatados.11,47 Diminuição tran­ sitória da função testicular e, mais especificamente, supressão transitória da espermatogênese, com oligospermia48ou mesmo completa azoospermia, têm sido observadas por até 3 anos após o 131I, em pacientes que receberam doses mais elevadas.11 Nesses casos, uma elevação transitória do FSH é comum e geralmente regride dentro de 18 meses.48 A criopreservação de esperma, antes da terapia com 131I para o câncer da ti­ reoide, poderia ser considerada em homens jovens, especialmente aqueles propensos a receber doses maiores e/ou mais numerosas de radioiodo.11 C O N C LU SÃ O

A função tireoidiana influencia no sistema reprodutor de várias maneiras, sendo a sua normalidade fundamental para a reprodução. Tanto o hiper quanto o hipotireoidismo podem afetar adversamente o SRF e o SRM. Essas disfunções podem provocar distúr­ bios nos esteroides sexuais e em sua proteína carreadora. Em homens, podem, ainda, acarretar alterações na morfologia e na motilidade espermática e na função erétil, com

334

Endocrinologia Feminina e Andrologia

diminuição da fertilidade. Em mulheres, podem provocar distúrbios menstruais e infer­ tilidade, a qual também tem sido associada à própria autoimunidade tireoidiana. Na gestação, o hipotireodismo é a disfunção tireoidiana mais comum e é frequen­ temente causado por DAIT. Tem sido reconhecido como uma causa de aborto espon­ tâneo, parto prematuro e/ou baixo peso ao nascer, sofrimento fetal durante o parto e, talvez, também de hipertensão induzida por gestação e descolamento placentário. Embora os programas de rastreamento para detecção do hipotireoidismo na gestação sejam extremamente necessários, não existe consenso sobre quais seriam os melhores critérios e os exames mais adequados para a investigação. O hipertireoidismo clínico, durante a gravidez, é muito menos comum do que o hipotireoidismo, e é causado, principalmente pela DG. Esta pode acarretar compli­ cações maternas, como eclâmpsia, insuficiência cardíaca congestiva, edema agudo de pulmão, arritmias cardíacas e crise tireotóxica, além de complicações para o concepto, como abortamento, natimortalidade, prematuridade, baixo peso ao nascer, malfor­ mações fetais, restrição de crescimento intrauterino e oligoâmnio, bem como hiperti­ reoidismo fetal/neonatal. Assim, o conhecimento das disfunções tireoidianas e de seu potencial risco para o sistema reprodutor deve alertar os profissionais de saúde sobre a necessidade de inves­ tigação das mesmas na presença de distúrbios reprodutivos. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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O s w a l d o M a r t in s R o d r ig u e s J u n io r

IN T R O D U Ç Ã O

O termo “libido” tem sido usado, em especial no meio médico, como referência ao desejo sexual. Embora essa associação tenha ocorrido a partir dos escritos de Sigmund Freud, no começo do século XX, o termo se referia à energia vital respon­ sável por todas as expressões humanas, não apenas às sexuais. Outro fator impor­ tante na conceituação do desejo sexual é a restrição epistemológica e ontológica à qual se refere o termo “libido”, que encontra compreensão dentro das teorias psicanalíticas. Assim vamos preferir adotar a expressão “desejo sexual” em vez de “libido”, por ser mais aceita na atual literatura científica que se refere à sexualidade, já implicando outros preceitos epistemológicos e ontológicos, necessários para a construção de um contexto de tratamento das queixas relacionadas com o desejo sexual. Para discutir a inibição do desejo sexual, devemos utilizar alguns fundamentos e conceitos sobre as questões do desejo em si e da atração sexual. D E S E J O E A TR A Ç Ã O S E X U A L

A discussão sobre o desejo e como somos ou nos sentimos atraídos por outra pes­ soa (ou objeto) tem várias vertentes, tornando-se uma questão epistemológica. Temos duas vertentes antagônicas: a visão biológica e a visão sociológica. A visão biológica aponta que o desejo sexual é inato, não se cria, mas inibe-se muito, pouco ou não se inibe nada. A teoria biológica compreende o ser humano como uma espécie da família dos mamíferos, e por comparação, as funções da cavidade nasal, denominada órgão vomeronasal (OVN), aparecem como importantes, ao menos, para os machos de cada espécie reconhecerem quando a fêmea se encontra receptiva à ati­ vidade sexual. A finalidade do OVN seria exclusivamente detectar sinais químicos dos ferormônios envolvidos no comportamento sexual e marcar território.1 Essa crença é muito comum tanto entre profissionais de saúde quanto entre leigos, mas têm apare­ cido estudos que contradizem esse esquema biológico.2,3,4 Ainda assim, existe a compreensão de que os genes diferentes estimulam atração sexual: “A medida que os genes compartilhados no casal aumentam, a resposta sexual das mulheres aos parceiros diminui, o número de parceiros sexuais fora do par au­ menta e a atração por outros homens além do parceiro principal aumenta, particular­ mente durante a fase fértil do ciclo”.5

338

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Mesmo sem descartar que o desejo/atração sexual seja somente biológico, ainda se compreende que pode ser modificado pelos contextos histórico, social, relacional e psicológico. Uma compreensão pode ser feita pela Teoria das Estratégias Sexuais,6 na qual a escolha de parceiros pode ser feita de 2 formas diferentes ou, até mesmo, associadas. Descrevem a estratégia a curto e a longo prazos. Os homens buscam mulheres jovens e atraentes, pois detectam, na juventude, a possibilidade de ainda gerar muitos filhos e, na atratividade, a saúde do corpo para enfrentar a gravidez e suas repercussões. A mulher buscaria um parceiro com dispositivos internos de força, poder e capacidade de proteção para ela e sua prole. Ainda no contexto sociológico, baseado em princípios biológicos, temos estudos que apontam que o interesse sexual e a excitação associam-se a motivos para formar e manter um relacionamento próximo.7 Outra compreensão sociológica é a Abordagem dos Campos Sociais, uma forma de organização social baseada nas estruturas da vida sexual coletiva que produziria os relacionamentos sexuais, estruturas e processos tan­ to psicológicos quanto sociais.8 Questões relacionadas com atração sexual sempre se referem à beleza, mesmo que exista o reconhecimento de que os padrões de beleza mudam ao longo da história e são diferentes em cada cultura ou grupo social. Assim alguns teóricos apontam que o segredo da atração sexual não está no corpo perfeito, mas na postura. Um exemplo disso é mulheres que andam de forma mais feminina serem vistas como mais bonitas, mesmo que não tenham o desejado “corpão de violão”. O mesmo vale para os homens: um andar “masculino” é mais atraente do que um belo corpo que exagera no rebolado. A compreensão é que a beleza é baseada em uma fundação formada a partir de uma série de percepções sociais.9 Uma função sempre considerada importante é o amor como fonte do desejo sexual. A esse respeito, têm sido postuladas considerações, em especial dentro da Psicologia.10 E importante perceber que o significado de amor, entre duas pessoas, para conduzir a um relacionamento de casal e sexual, é um criação histórica que se inicia nos séculos VI e VII, demonstrada por tradições orais e, posteriormente, escritas, como nos contos do rei Arthur, em Tristão e Isolda, Romeu e Julieta, Abelardo, Wether etc. Somente no fim do século XIX, com a criação das atuações da psiquiatria e da ciência da Psicologia, é que passam a receber consideração diferenciada do amor religioso, mas propagado na literatura, o que ocorre ainda no século XXL

DESEJO E ATRAÇÃO SÃO MOTIVAÇÕES PARA A ATIVIDADE SEXUAL E IMPLICAM • Energia inata - condições orgânicas e fisiológicas. • Condições históricas, sociais e relacionais de contexto sociocultural. • Delimitações pelo histórico de vida único, aprendizado de comportamento por imitação e por associação de uma ação a uma emoção.

C O M O D E F IN IR D E S E J O

O desejo sexual tem sido definido como uma motivação biológica inerente ao organis­ mo humano. Assim sendo, se uma pessoa é saudável e nenhuma doença ou nível de

Capítulo 23 Redução da libido 339

hormônios está fora do padrão esperado, ela tem condições físicas, orgânicas e bioló­ gicas de sentir desejo. Sentir desejo pelo que se escolhe é, e sempre será, o problema de cada ser humano na interação com os demais indivíduos. A construção do objeto do desejo sexual rece­ be influências de limitação orgânica, modulações do mundo externo e distorções do mundo subjetivo e psicológico. Compreender como o desejo de uma pessoa se forma implica compreender como se deu a interação das influências didaticamente divididas em orgânicas, sociais e psicológicas. O objeto do desejo é diferenciado para cada pessoa e foi aprendido de modo tão so­ fisticado e por meio de mecanismos tão complexos que cada indivíduo sempre acredi­ tará que o desejo sentido é intrínseco e deve ter uma causa outra que não a vontade de eleição. A pessoa não se sente capaz de responsabilizar-se pelo desejo que sente desti­ nado a determinado objeto. Paradoxalmente, ela acredita que todos os humanos, por serem constituídos de modo parecido, devem sentir o mesmo desejo, mas ao mesmo tempo, percebe-se solitária, pois ninguém parece entender, de fato, o que ela sente. Sempre que buscarmos entender o desejo de uma pessoa, será preciso considerar alguns argumentos: geográfico, histórico, familiar pré-nascimento, estabelecimentos de identidade de gênero, de papel social de gênero, existência de padrões de aceitação ou de negação de desejos sexuais diversos no ambiente cultural e social. ■

D IA G N Ó S T IC O E D IA G N Ó S T IC O D IF E R E N C IA L

D

Para definir inibição do desejo

As queixas de não ocorrer o desejo em uma quantidade suposta recebem as classifica­ ções indicadas na Tabela 23.1.

TABELA 23.1 C ID -1 0 (O M S)

Manual Estatís­ tico de Doenças Mentais

Definições de inibição de desejo sexual F 52.0 Ausência ou perda do desejo sexual Frigidez Transtorno hipoativo de desejo sexual

A perda do desejo sexual é o problema prin­ cipal e não secundário a outras dificuldades sexuais, como uma falha da ereção ou uma dispareunia.

F 52.1 Aversão sexual e ausência de prazer Anedonia (sexual)

A perspectiva da relação sexual produz medo e/ou ansiedade suficientes para que a atividade sexual seja evitada (aversão sexual), mesmo que as respostas sexuais ocorram normalmente e o orgasmo seja sentido, mas existirá, ainda, uma falta do prazer apropriado (ausência do prazer sexual).

Transtorno de desejo sexual hipoativo

Deficiência ou ausência de fantasias sexuais e desejo de ter atividade sexual, considerando que a perturbação deve causar acentuado sofri­ mento ou dificuldade interpessoal.

Fontes: CID-1011 (Organização Mundial de Saúde) e Manual Estatístico de Doenças Mentais.12

340

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Na última década, surgiram pessoas que se consideram normais, mas do ponto de vista psicológico, parecem ser normóticas, sem psicopatologias, mas que não sentem necessidades de expressões sexuais interpessoais, estão adequadas socialmente, são produtivas e, ainda, se constituem um problema teórico e prático, sem classificações enquanto patologias. Essas considerações de definição implicam distinguir possíveis causas do tran s­ torn o de desejo sexual hipoativo de ordem física, mormente hormônios que são considerados como fatores de importância na produção do desejo sexual, os esteroides sexuais. Nesses casos, o diagnóstico correto é disfunção sexual devido a um a condição m édica geral, quando se presume que a disfunção se deve exclusi­ vamente aos efeitos fisiológicos de uma condição médica geral específica. Medicamentos utilizados em Psiquiatria e Neurologia estão incluídos na lista dos que produzem a inibição do desejo sexual em mulheres e homens.13 Então, temos a disfunção sexual induzida por substância. As drogas que apresentam mecanismo de ação serotoninérgica possuem maior potencial para causar disfunções sexuais. Os antidepressivos tricíclicos (ADT), os inibidores da monoaminoxidase (IMAO) e, prin­ cipalmente, os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS) têm sido os mais implicados em interferências no desejo sexual e no orgasmo ou na anorgasmia. A venlafaxina, a mirtazapina e a milnaciprana, drogas de ação dual (serotoninérgica e noradrenérgica), ocupam aparentemente uma posição intermediária.13,14 Entre os an­ tidepressivos, produzindo de 30% a 70% das disfunções sexuais,14 temos os descritos na Tabela 23.2.

TABELA 23.2 T r ic íc lic o s

Antidepressivos implicados em inibição do desejo sexual D e s ip ra m in a , N o r tr ip tilin a , A m itr ip tilin a e Im ip r a m in a

IS R S

C ita lo p ra m , E s c ita lo p ra m , F lu o x e tin a , F lu v o x a m in a , P a r o x e tin a e S e r tr a lin a

O u tro s

V e n la fa x in a

Diferenciando as mulheres dos homens, uma discussão recente propõe que a defini­ ção relativa a questões de desejo hipoativo seja associada a questões de excitação sexual, pressupondo uma superposição das fases de desejo e excitação sexual nas mulheres.15 Quando a compreensão da queixa elimina as questões físicas, pensa-se em causas psicológicas. Um problema nessa pressuposição é que não se fizeram, concomitante­ mente, avaliações de ordem psicológica que possam fundamentar esse diagnóstico. A distinção causal necessita de estudos psicológicos anteriores para que se designe corre­ tamente o diagnóstico.16 Também é importante compreender que as causas de ordem psicológica não são meras associações populacionais estatísticas, como se referem em muitos textos, denominando de causas as situações de abuso sexual na infância, trau­ mas emocionais, educação sexual repressora ou religião. Os mecanismos psicológicos,

Capítulo 23 Redução da libido 341

esquemas cognitivos e mentais são as causas psicológicas, e essas é que necessitam ser estudadas e compreendidas em cada paciente que se queixe.17,18 A inibição do desejo sexual pode ocorrer em associação com outras disfunções sexuais: disfunção erétil masculina ou anorgasmia feminina. A expressão de desejo diminuído ou ausente pode ocorrer por condições psicopatológicas que exigem psicodiagnóstico: transtorno depressivo maior, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático. Uma condição de difícil diagnóstico médico são as parafilias,19 devido a desinfor­ mação do profissional de saúde, questões morais pessoais envolvidas e falta de treino para esse diagnóstico específico. As parafilias podem ser compreendidas como formas diferentes das usuais para destinar a satisfação do desejo sexual ou obter excitação sexual. Lembrando que já foram denominadas de desvios, pode-se compreender, p. ex., que uma pessoa que sinta desejo por pés de determinados formatos e não se mobilize para o coito terá um desejo “desviado”. O desenvolvimento de um instrumento que permita compreender a expressão do desejo sexual tem facilitado o trabalho clínico:20um questionário autopreenchido que permite reconhecer se existe, e em que proporção, desejo pelo autoerotismo, pela par­ ceria sexual ou por outrem, auxilia no diagnóstico inicial, permitindo descartar a falta do desejo em geral, apontando para o funcionamento fisiológico adequado, além de possíveis expressões de desejo distinto do óbvio da queixa, que geralmente será pela parceria conjugal. A seguir, é apresentado o questionário já validado em português. Sua análise apon­ ta para a existência de 2 fatores que auxiliam na compreensão das queixas dos pacien­ tes: desejo sexual diádico e desejo sexual solitário, evidenciando como se diferenciam em homens e mulheres. O desejo solitário, nos homens, associa-se ao desejo pela parceria sexual, o que deve ser compreendido de modo positivo quando as pontuações forem altas. O item 14 não avalia o desejo sexual, mas a percepção do indivíduo frente ao período em que aguen­ taria confortavelmente a ausência de atividades sexuais. Observou-se, nos resultados, uma moderada associação desse item com os relacionados com desejo sexual diádico e nenhuma com desejo sexual solitário. Essa analogia é suposta pela compreensão do significado de “atividades sexuais”, em que a maior parte das pessoas as compreende especificamente com outro. Embora a prática solitária masculina se relacione com o desejo pela parceira, a di­ minuição do desejo solitário não precisa ocorrer, reforçando que, se houver redução do mesmo apenas no relacionamento a dois, não existem bases fisiológicas compro­ metidas. O questionário tem o intuito de proporcionar parâmetros para cada paciente na evolução do tratamento, na medida em que se repete o questionário comparando-o numericamente a si mesmo ao longo do tempo, e não o equiparando ao restante da população, o que teria menor significado para as questões do desejo sexual. Contudo, mesmo considerando as somatórias dos números de um questionário, deve-se com­ preender que o fator “subjetividade” é imperioso.

342

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Inventário de Desejo Sexual (SDI-2) Este questionário busca conhecer seu desejo sexual. Por desejo sexual, entenda-se dizer"interesse"ou "vontade"de atividades sexuais. Para cada item, por favor, circule o número que melhor mostre seus pensamentos e sentimentos. Suas respostas serão mantidas em sigilo. 1 - No último mês, quantas vezes você gostaria de ter tido contatos sexuais com alguém (p. ex.: tocar os genitais um do outro, dar e receber estimulação oral, coito etc.)? (0 ) nenhuma (4 ) 2 vezes por semana (1) 1 vez ( 5) 3 ou 4 vezes por semana ( 2 ) 1 vez a cada 2 semanas ( 6 ) diariamente (3) 1 vez por semana (7) mais de 1 vez por dia 2 - No último mês, quantas vezes você teve pensamentos sexuais envolvendo outra pessoa? (0 ) nenhuma (4 ) 3 a 4 vezes por semana ( 1) 1 ou 2 vezes no mês ( 5) diariamente ( 2 ) semanalmente ( 6 ) 2 vezes por dia (3) 2 vezes por semana (7) muitas vezes por dia 3 - Quando você tem pensamentos sexuais, quão forte é o seu desejo em buscar um contato sexual com seu(sua) parceiro(a)? 0

1

2

3

4

5

6

7

8

sem desejo

desejo forte

4 - Quando você olha para uma pessoa atraente, quão forte é seu desejo? 0 1

2

3

4

5

6

7

8

sem desejo

desejo forte

5 - Quando você passa algum tempo com uma pessoa atraente (p. ex., no trabalho ou na escola), quão forte é seu desejo sexual? 0 1

2

3

4

5

6

7

8

sem desejo

desejo forte

6 - Quando você está em uma situação romântica (p. ex., um jantar a luz de velas, um passeio na praia etc.) quão forte é seu desejo sexual? 0 1

2

3

4

5

6

7

8

sem desejo

desejo forte

7 - Quão forte é seu desejo sexual para se envolver em uma atividade sexual com seu(sua) parceiro(a)? 0

1

2

3

4

5

6

7

8

sem desejo

desejo forte

8 - Quão importante é, para você, satisfazer seu desejo sexual por meio de atividades com seu(sua) parceiro(a)? 0

1

2

3

4

5

6

7

8

não é importante

extremamente importante

9 - Comparado a outras pessoas de mesma idade e sexo, como você avalia seu desejo de ter atividades sexuais com alguém? 0

1

2

3

4

5

6

7

8

menos desejo que outros

muito mais desejo que outros

10 - No último mês, quão frequentemente você gostaria de ter buscado prazer sexual sozinho (masturbação, tocar os genitais etc.)? (0 ) nenhuma vez (4 ) 2 vezes por semana (1) 1 vez no mês ( 5) 3 a 4 vezes por semana ( 2 ) 1 vez a cada 15 dias ( 6 ) diariamente (3) 1 vez por semana (7) mais de 1 vez por dia 11 - Quão forte é seu desejo de obter prazer sexual sozinho? 0 1

2

3

4

5

6

7

8

sem desejo

desejo forte

12 - Quão importante é, para você, satisfazer seus desejos de obter prazer sexual sozinho? 0

1

2

3

4

5

6

7

não é importante

8

extremamente importante

13 - Comparado a outras pessoas de mesma idade e sexo, como você avalia seu desejo de obter prazer sexual sozinho? 0 1

menos desejo

2

3

4

5

6

7

8

muito mais desejo

14 - Quanto tempo você aguentaria, confortavelmente, sem alguma atividade sexual? (0 ) para sempre (4 ) algumas semanas ( 1) 1 ou 2 anos ( 5) 1 semana ( 2 ) vários meses ( 6 ) um dia ( 3) 1 mês ( 7) menos de um dia Qualquer pontuação abaixo da metade das escalas de Likert de cada questão associa-se a diminuições de desejo sexual (nessas questões, a escala varia de 0 a 8 pontos, implicando que números abaixo de 4 inclusive marcam a associação com desejo sexual inibido).

Capítulo 23 Redução da libido 343

A B O R D A G E M T E R A P Ê U T IC A

Quando as queixas são de ordem subjetiva, com ou sem concomitante psicopatológico, a psicoterapia será a forma de tratamento adequada. Preferencialmente, deve-se ter o casal nas consultas semanais ou bissemanais, pois a adequação a ser buscada implica a preexistência desse casal. O tratamento psicoterápico focalizado na sexualidade incorpora os seguintes quesitos técnicos. •

• • • • • •

• • • • • •

• • • • • •

• • • • • •



/



1 Q

Proibição de coito. Focalização sensorial. Correção de processos cognitivos errôneos.17 Tratamento concomitante de problemas sexuais femininos: disfunções de desejo, vaginismo, anorgasmia, dispareunia. Treino em expressividade emocional/assertividade. Treino em comunicação de casal: conversar, desenvolver comunicação afetiva e efetiva (compartilhar é fortalecer). Formas alternativas de comunicação ajudam a vencer e não ter outros problemas, sexuais ou não. Realização de exercícios de relaxamento, meditação ou outras formas de diminuir estresse e administrar trabalho e cansaço físico e emocional. Prática de biblioterapia. Realização de banho terapia (individual e de casal). Busca por qualidade de vida. Suspensão do uso do tabaco: a nicotina produz vasoconstrição sanguínea, difi­ cultando a excitação sexual e facilitando a ejaculação. Interrupção do uso do álcool: pelo menos, antes das atividades sexuais. Em espe­ cial, durante uma terapia onde se necessita aprender novos comportamentos, pois o álcool inibe os reflexos e diminui as sensações táteis. Prática de exercícios regulares: melhorar condições físicas para o sexo e melhorar sensações de bem-estar. Ingestão de comidas saudáveis: sentir-se melhor. Descanso: fadiga e estresse competem com sexo. Dormir horas o suficiente Estímulo de fantasias sexuais e não sexuais com a parceria. Planejamento do bom do sexo: pensar no sexo positivo e, necessitando de preser­ vativo ou pílula, cuidar para ter sempre por perto. Eleição dos melhores horários para o sexo: de manhã, no fim de semana etc., sendo aproveitado de forma descansada e sem preocupações com a hora ou com a necessidade de dormir. Vida social: alguns necessitam desenvolver; outros, diminuir a quantidade despen­ dida com os relacionamentos sociais em prol da atividade sexual. Recreação ou hobby: desenvolver atividades que auxiliem a busca do bem-estar. Planejamento de futuro: ter um plano que promova uma vida sexual saudável e mantenha os ganhos desenvolvidos na psicoterapia. Técnica da fantasia sexual seriada.21 Técnica da busca obrigatória.21 Tratamento em grupo.22

344

Endocrinologia Feminina e Andrologia

É necessário compreender que a aplicação das técnicas acima referidas se insere em um processo de psicoterapia, compreendendo o (a) paciente em foco e a parceria sexual, os objetivos do(a) paciente, além de considerar a possibilidade de associação de outras disfunções sexuais presentes em ambos os componentes do casal.

IMPORTANTE M e s m o q u a n d o existe a lg u m c o n te x to fis io ló g ic o o u m e d ic a m e n to s o a sso cia d o à d im in u iç ã o d o d esejo sex u al, a a b o rd a g e m p s ic o te rá p ic a te m su ce sso s e fa c ilita a a d e q u a çã o d os casais, d im in u in d o a re sta s de c o m u n ic a ç ã o e de fru s tra ç õ e s c o m o c o n te x to sex u al e x iste n te .

Os tratamentos medicamentosos implicam a substituição de medicamentos que possam estar associados à inibição do desejo e o uso de medicamentos hormonais ou que atuem sobre a produção hormonal do corpo. A discussão sobre o desejo sexual feminino ganhou novos aspectos na primei­ ra década do século XXI, apontando maior importância da subjetividade femini­ na e produzindo menor diferença entre desejo e excitação sexuais, além de incluir o temor das áreas de estudos sociais (Sociologia, Antropologia e Psicologia) pela medicalização da disfunção sexual com objetivos de aumentar o desempenho nas mulheres.23 Um dos norteadores do tratamento medicamentoso das disfunções sexuais é a pres­ suposição de que existe a falta ou diminuição de hormônios historicamente associados à expressão sexual. Assim, estudos que buscam demonstrar essa necessidade apontam para o uso de adesivos dérmicos hormonais em mulheres,24 embora outras publicações apontem que pessoas com mais idade tenham níveis de testosterona mais baixos e, mes­ mo sob reposição, não apresentem melhora do desejo sexual.25 Os riscos do tratamento com testosterona em mulheres são, a curto prazo, o hirsutismo e a acne, sendo que, a longo prazo, não existem estudos. Na última década, a reposição hormonal de testoste­ rona em homens deixou de trazer a preocupação com o desenvolvimento de câncer, mas ainda não trouxe a recuperação do desejo sexual, como tem sido procurado desde a dé­ cada de 1950. Em homens com hipogonadismo, o tratamento hormonal correlacionouse com o aumento do desejo sexual,26 razão pela qual, nesses homens, o tratamento da inibição do desejo sexual será o tratamento do hipogonadismo. Descobertas ao acaso conduziram ao uso de alguns medicamentos por seus efeitos cola­ terais, a exemplo da bupropiona27 ou da tibolona,28 que melhoram a expressão do desejo se­ xual feminino. Novas tentativas de medicamentos apareceram, a exemplo da flibanserina.29 Discussões da primeira década do século XXI apontam a necessidade de maiores estudos de eficácia de tratamentos e a possibilidade de que os tratamentos medica­ mentosos associados à psicoterapia permitam melhores efeitos.30 C O N C LU SÃ O

As questões referentes a como o desejo sexual se desenvolve para além da reprodução, um determinante certamente biológico, exigem que atentemos ao contexto histórico e social de uma determinada pessoa. Somente assim, podemos compreender como esse

Capítulo 23 Redução da libido 345

indivíduo, em especial, precisa da expressão da sexualidade, ou não, e como aprendeu, ao longo da vida, expressar esse desejo. Um ser humano saudável fisicamente tem as bases para a expressão da sexualidade de acordo com as regras sociais aprendidas e de acordo com o que pode desenvolver em sua vida, o que poderá diferenciá-lo das demais pessoas em uma mesma cultura. A inibição do desejo sexual ou as formas di­ ferentes da expressão do desejo podem depender de uma estrutura psicológica, seja patológica ou adequada à vida de um indivíduo. Compreender como se desenvolve e como a pessoa satisfaz suas necessidades permite, então, ajudá-la a superar a inibição do desejo sexual. Devemos lembrar que, das disfunções e problemas sexuais, a inibição do desejo sexual pode ser das mais difíceis de tratar, uma vez que não existe uma necessidade percebida pela pessoa. As razões que trazem um paciente a um consultório para o tra­ tamento dessa inibição podem ser patológicas em si, trazer sofrimentos e incômodos, mas tratar-se por querer manter um casamento não será a motivação mais adequada para superar-se a inibição do seu desejo sexual. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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Uso de andrógenos em mulheres

24

C esar E d u a r d o F ernandes Ro d o lfo Stru fa ld i M a rcelo L uis Stein er L u cia n o de M elo Pompei

INTRODUÇÃO Nas mulheres, os andrógenos declinam lenta e progressivamente ao longo do período reprodutivo, e esse decréscimo é maior no período pós-menopausa. A síndrome da insuficiência androgênica na mulher (SIA) tem despertado inúmeras discussões e con­ trovérsias. O estado de deficiência androgênica se manifesta insidiosamente por diminui­ ção da função sexual, do bem-estar e de energia, por fadiga, emagrecimento, instabilidade vasomotora, alterações na composição corporal e perda de massa óssea. Entretanto, esses sintomas são potencialmente atribuíveis a diferentes etiologias, dificultando um diagnósti­ co adequado. O diagnóstico da SIA parece ser essencialmente clínico, não havendo evidên­ cias atuais da necessidade de realização de exames laboratoriais para sua comprovação. Os hormônios sexuais, especialmente os estrógenos e andrógenos, possuem efeitos bem estabelecidos na modulação estrutural e funcional de tecidos genitais, incluindo o útero, a vagina, as glândulas periuretrais, os vestíbulo vaginal, o clitóris e os peque­ nos e grandes lábios. Os andrógenos são esteroides sexuais com 19 átomos de carbono, precursores obri­ gatórios para a síntese dos estrógenos, estando associados às características sexuais masculinas. Os principais andrógenos produzidos pelas mulheres incluem a testosterona (T), a androstenediona (A4A), o sulfato de desidroepiandrosterona (SDHEA) e a di-hidrotestosterona (DHT). Nas mulheres, o SDHEA é o andrógeno quantitati­ vamente mais abundante, e a T, por sua potência biológica, é o de maior importân­ cia.1 Em mulheres jovens, 25% da T circulante é originário da glândula adrenal, 25% é sintetizado nas células da teca e no estroma ovariano, sob controle do hormônio luteinizante (LH). A partir da conversão periférica de outros andrógenos, ocorre a pro­ dução de aproximadamente 50% dos andrógenos, com posterior metabolização pela 5-oc-redutase à DHT ou por aromatases a estrógenos.2 A testosterona tem sido referida habitualmente como a principal representante da androgenicidade plasmática em mulheres. Considera-se biologicamente ativa a T biodisponível que circula livre ou ligada à albumina e indisponível para ação metabó­ lica a fração aderida à globulina ligadora dos hormônios sexuais (SHBG). Contudo, a afinidade da SHBG pelos andrógenos é maior do que pelos estrógenos, fazendo as variações nas concentrações de SHBG influenciem, de forma significativa, nas ações

348

Endocrinologia Feminina e Andrologia

androgênicas. A forte correlação entre T e SHBG possibilita a utilização da SHBG como marcador indireto de androginismo feminino.2 Decréscimos nos níveis de SHBG são observados em algumas situações, como hipotireoidismo, obesidade, estados de hiperinsulinemia e em uso de glicocorticoides. Por outro lado, elevações na SHBG são relatadas ao longo da vida, com o envelheci­ mento natural, em resposta às altas concentrações de tiroxina e estradiol, na cirrose hepática e com a terapia hormonal da pós-menopausa.3 Os andrógenos, nas mulheres, exercem uma função essencial sobre a sexualidade, in­ fluenciando o desejo, o humor, a energia e o bem-estar.4 Além dos efeitos genitais e sobre a sexualidade, os andrógenos atuam também no Sistema Nervoso Central (SNC), no córtex e em estruturas hipotalâmicas e límbicas, influenciando a liberação de neurotransmissores e modulando importantes funções relacionadas com a sensibilidade, a percepção e o prazer.5 Evidencia-se, então, a importante participação dos andrógenos sobre a função de estruturas centrais e periféricas envolvidas na saúde, no comportamento e no bem-estar das mulheres. ■

A N D RÓ G EN O S NA M U L H E R

O declínio dos níveis plasmáticos de andrógenos precedem o estrogênico, resultado esse da redução linear da produção de SDHEA e DHT pelas adrenais a partir da 4 a década de vida e do número crescente de ciclos anovulatórios observados nos últimos anos da menacme.6 Estudos avaliando as concentrações plasmáticas de T total em mulheres com função menstrual normal demonstram que ocorre uma queda significativa com a idade. Os níveis observados em mulheres, aos 40 anos de idade, representam a metade daqueles vistos aos 20 anos.7 Não há completa compreensão a respeito do impacto da menopausa sobre a pro­ dução androgênica. Algumas pesquisas comparando os níveis hormonais de T e de Á4A em veias ovarianas e sangue periférico, associadas a investigações em ooforectomizadas, indicam claramente que, nos primeiros 5 anos após a menopausa, os ovários podem produzir aproximadamente 40% a 50% da T circulante, com variabilidade in­ dividual dependente da atividade enzimática das células do estroma ovariano, em par­ ticular, da expressão da 3-p-hidroxiesteroide desidrogenase.8 De outra parte, ocorrem alterações morfológicas e na função esteróidica ovariana com o advento da menopausa. O ovário pós-menopáusico, em decorrência de sua exaustão folicular, é menor que seu equivalente na menacme. A diminuição mais evi­ dente, de aproximadamente 30% do volume do córtex ovariano, é consequência da acentuada redução de folículos em crescimento e maturação, além da esclerose arte­ riolar obliterativa e da fibrose cortical decorrente do envelhecimento.9 A diversidade de resposta ovariana provavelmente contribui para a controvérsia sobre os níveis plasmáticos de andrógenos após a menopausa. A queda na produção androgênica é um processo fisiológico e contínuo, sugerindo que a elevação na atividade das células estromais ovarianas, em resposta ao LH, serviria como mecanismo compensatório temporário, fornecedor de substrato para a gênese de estrógenos em alguns sítios extragonadais.2 ■

D E F IC IÊ N C IA A N D R O G Ê N IC A F E M IN IN A

Não existe, na atualidade, um consenso claro sobre a definição clínica da SIA em mu­ lheres e tampouco se conhece a respeito da sua real prevalência. Além disso, a maioria

Capítulo 24 Uso de andrógenos em mulheres 349

dos ensaios laboratoriais utilizados para a dosagem das concentrações plasmáticas de T em mulheres não atende adequadamente à aferição de seus níveis, principalmente quando se encontram abaixo da faixa de normalidade ou em seus limites inferiores. O Consenso de Princeton, em 2001, baseado em ampla revisão da literatura, definiu o conceito de SIA como sendo o conjunto de sintomas clínicos na presença de biodisponibilidade diminuída de T e níveis normais de estrógenos.10 Os sintomas atribuíveis à insuficiência androgênica podem ser observados no Tabela 24.1.

TABELA 24.1

Principais sintomas da deficiência androgênica feminina

D im in u iç ã o d a se n sa ç ã o de b e m -e sta r H u m o r d isfó ric o F a d ig a p e rs is te n te sem c a u sa e sta b e le cid a A lteração d a fu n çã o sexual, in clu in d o d im in u ição da libid o , do prazer e da receptividade sexual Perda de m a ssa óssea e m assa m u scu la r P ersistên cia de sin to m a s v aso m o to res, d im in u ição da lu b rificação vagin al p ó s-m en o p áu sica sob ad equ ad a terap êu tica estro g ên ica R a re fa ç ã o o u a fin a m e n to d os p elo s p u b ia n o s A lte ra çõ e s n a m e m ó ria e n a c o g n iç ã o

Esses sintomas, em muitos casos, são escamoteados ou, até mesmo, não referidos, sendo potencialmente atribuíveis a diferentes etiologias, dificultando o correto diag­ nóstico por parte dos clínicos. No entanto, o diagnóstico de SIA é frequentemente lembrado em pacientes que se submetem à ooforectomia bilateral. Os andrógenos parecem ter influência significativa no comportamento, na sensação de bem-estar e no humor de mulheres após a menopausa, com melhora nas queixas de depressão, conforme observado em pesquisas com grupos de mulheres submetidas à reposição hormonal androgênica.11 As principais causas de redução dos níveis plasmáticos de T estão listados na Tabela 24.2.

TABELA 24.2 Causas de redução dos níveis de andrógenos em mulheres Normal com o avanço da idade Condições que alteram a produção de testosterona •

O o fo r e c to m ia



In s u fic iê n c ia o v a ria n a



In s u fic iê n c ia a d re n a l



D o e n ç a s c rô n ic a s



H ip o p itu ita ris m o *•

Tratamento com fármacos •

T e r a p ia e s tro g ê n ic a



C o rtic o s te ro id e s

350

Endocrinologia Feminina e Andrologia

D IA G N Ó S T IC O D A IN S U F IC IÊ N C IA A N D R O G Ê N IC A

Os principais sintomas da SIA, em mulheres, são diminuição da sensação de bem-estar, humor disfórico, fadiga persistente de causa desconhecida, redução da libido e da re­ ceptividade sexual e do prazer, sintomas vaso motores e diminuição da lubrificação vaginal, na menopausa, sob estrogenioterapia adequada, perda de massa óssea e com­ prometimento da força muscular, rarefação e afinamento dos pelos pubianos. E im­ portante lembrar que o avanço da idade é a causa mais comum de redução dos níveis plasmáticos de T nas mulheres. Outras situações, como a ooforectomia, insuficiência adrenal e ovariana, hipopituitarismo, corticoterapia e a terapia estrogênica, apesar de menos frequentes, são também causas de insuficiência androgênica.12 Em 2005, a Sociedade Norte-Americana de Menopausa (NAMS)13fez algumas reco­ mendações a respeito da terapêutica androgênica (TA):

IMPORTANTE •

M u lh eres p ó s-m e n o p á u sica s c o m sin to m a s de in s u fic iê n c ia an d ro g ên ica, exclu íd as o u tra s ca u sa s, são c a n d id a ta s à T A .



N ã o se re c o m e n d a T A d e s a c o m p a n h a d a de te ra p ê u tic a e s tro g ê n ic a (T E ).



N ã o d evem ser u tiliz a d o s te ste s la b o r a to ria is p a ra o d ia g n ó s tic o d a SIA .



A n te c e d e n d o a T A , é o b r ig a tó r ia a av aliação in ic ia l de lip íd io s e d a fu n ç ã o h e p á tica .



A T A deve ser a d m in is tra d a em b a ix a s d oses e p o r c u rto p e río d o de te m p o .



A v ia tr a n s d é rm ic a (ad esivos, cre m e e gel) p arece ser p referív el à v ia o ra l (V O ).



Im p la n te s e fo rm u la ç õ e s in tra m u s c u la re s a p re s e n ta m risco de d o sa g e n s excessivas.



N ã o e x iste m d a d o s de s e g u ra n ç a so b re a T A em u su á ria s a lo n g o p razo .



D eve h aver m o n ito r a m e n to d os re su lta d o s c o m b ase n a m e lh o ra da sexu alid ad e, do b em e s ta r e n o a p a re c im e n to de ev en to s ad versos.



D ev em -se in d iv id u a liz a r a te ra p ê u tic a e re sp e ita r in ic ia lm e n te as m e sm a s c o n tra in d ic a çõ e s d a te ra p ê u tic a e stro g ê n ic a .



A T A n ã o deve ser in d ic a d a em p a c ie n te s c o m c â n c e r de m a m a o u e n d o m é trio , d o e n ç a c a rd io v a scu la r e d o e n ç a h e p á tica .

A definição e o diagnóstico da SIA não são exclusivos à insuficiência androgênica, sendo o diagnóstico eminentemente clínico e independente de comprovação labo­ ratorial. Na tentativa de racionalizar a abordagem diagnóstica na suspeita de SIA, o Consenso de Princeton,10 propôs o roteiro semiótico observado na Figura 24.1. C O N S E Q U Ê N C IA S D A S ÍN D R O M E D A IN S U F IC IÊ N C IA A N D R O G Ê N IC A NA M U L H E R

D Efeitos sobre a densidade mineral óssea Mulheres na menacme com quadro clínico de hirsutismo ou anovulação crônica hiperandrogênica mostram correlação positiva entre os andrógenos endógenos e a den­ sidade mineral óssea (DMO).14 Na pós-menopausa, em contrapartida, os baixos níveis de andrógenos séricos associam-se à redução massa óssea e ao risco aumentado de fra­ turas, assim como há evidências de que mulheres submetidas à terapia convencional

Capítulo 24 Uso de andrógenos em mulheres 351

FIGURA 24.1 Fluxograma para o diagnóstico da síndrome da insuficiência androgênica na mulher.10

da menopausa associada aos andrógenos promove ganho de massa óssea e aumento dos marcadores bioquímicos de formação óssea.15 O ganho de massa óssea observado à exposição androgênica se faz tanto em função do estímulo à diferenciação osteoblástica, síntese da matriz proteica e da mineraliza­ ção, assim como pela supressão da interleucina-6, promovendo a inibição da gênese osteoclástica. No geral, a redução de massa muscular precede à perda óssea notada nas mulheres após a menopausa.16 Baixa DMO e osteoporose são situações clínicas frequentemente notadas em mu­ lheres com insuficiência androgênica, e é reconhecido claramente o efeito anabólico do andrógeno nos ossos, em função da existência de receptores androgênicos nos osteoblastos.16 Os andrógenos estimulam a proliferação óssea de células ósseas in vitro, assim como estimulam os marcadores de formação óssea in vivo.15 Estudos contro­ lados têm demonstrado aumento na DMO com uso de andrógenos isolados, sendo significativamente maior quando associados à TE, se comparado quando esta é em­ pregada isoladamente.17 Andrógenos sintéticos, como o undecanoato de testosterona (UT) por VO exibe efeito positivo no osso, e acredita-se que seu efeito hepático possa ser menor que o da metiltestosterona, visto que, após absorção intestinal, sofre um desvio do sistema por­ ta e se dirige ao dueto torácico, chegando ao sangue pelo sistema linfático.2 A revisão de 3 estudos placebo controlados em mulheres pós-menopáusicas que utilizaram por 3,12 e 24 meses estrogênio conjugado associado à T oral ou implantes, evidenciou au­ mento da DMO densitométrica (lombar e trocantérica), assim como nos marcadores de formação óssea (osteocalcina e fosfatase óssea alcalina).18 Os andrógenos têm ação reconhecida sobre o metabolismo ósseo, com efeito sinérgico quando associado ao estrogênio, porém não há indicação regulatória para o uso de androgênio na prevenção e no tratamento da baixa DMO.

352

Endocrinologia Feminina e Andrologia

O Efeitos sobre a composição corporal O efeito anabólico da T promove a síntese proteica por ativação do sistema IGF-1 intramuscular. Com isso, a administração de andrógenos determina aumento na quantidade de tecido muscular. Ao longo da vida e com o avanço da idade, os níveis reduzidos de T e de seus precursores podem contribuir, de maneira significativa, para a diminuição da massa magra.19 O metabolismo basal e o gasto energético têm suas taxas diminuídas progressiva­ mente no período pós-menopáusico, e isso também está relacionado com a redução da massa magra. Isso se faz, provavelmente, porque a diminuição de tecido magro reduz as necessidades energéticas em repouso, e isso, associado à diminuição da ativi­ dade física sem uma proporcional redução na ingestão calórica, propicia o acúmulo de gordura corporal.20 Parece haver uma correlação positiva entre os anos de menopausa, índice de massa corpórea (IMC) e porcentagem total de gordura corporal, assim como a localização da gordura visceral, que se associa à hipercolesterolemia, aterosclerose, hipertensão arterial sistêmica e resistência insulínica com influência clara sobre a elevação do risco cardiovascular.11

D Efeitos sobre a função sexual feminina Na atualidade, a deficiência androgênica tem sido considerada um dos componentes etiopatogênicos mais significativos entre todos os demais que interferem na sexualidade feminina. No universo que representa a função sexual, não se deve desconsiderar os diferentes fatores envolvidos, a exemplo das influências socioculturais, relações inter­ pessoais, condições biológicas e principalmente psicológicas. Existem evidências de que baixos níveis circulantes de T determinam alterações das mais variadas na função sexual feminina. Não obrigatoriamente o nível androgênico baixo é o fator determinante da reduzida função sexual feminina, como se pode observar em um estudo realizado com 1.021 mulheres que laboratorialmente apre­ sentavam baixos níveis de SDHEA, T livre e Á4A e, em contrapartida, não relatavam nenhum tipo de alteração em suas funções sexuais, medidas por meio de questionário sobre sexualidade.21 Além dos efeitos nos genitais, os andrógenos exercem papel neuroestrutural no hipotálamo e no sistema límbico, influenciando a liberação de alguns neurotransmissores envolvidos na sensação de prazer e na percepção. Com base nas evidências atualmente disponíveis, parece haver uma coparticipação de estrógenos e andrógenos na estruturação da resposta sexual feminina, envolvendo os efeitos con­ juntos nos genitais e no cérebro.2 É reconhecido, de longa data, o papel dos esteroides sexuais, em particular dos es­ trógenos e dos andrógenos, na modulação da função sexual feminina. Existem recep­ tores para os hormônios sexuais em praticamente todos os tecidos do organismo, com evidente expressão nos tecidos genitais e no cérebro, sugerindo, dessa maneira, que há influência dos hormônios sobre a sexualidade e o comportamento, tanto em nível central, com a excitação e desejo, quanto em nível periférico, na produção de muco e lubrificação genital.2 Estudos demonstraram que as usuárias de TA tiveram melhora de desejo sexual, excitação, fantasias, frequência, satisfação, orgasmo e do prazer sexual.22,23 Shifren, em um estudo randomizado, duplo-cego e placebo controlado mostrou uma larga

Capítulo 24 Uso de andrógenos em mulheres 353

diferença entre o efeito da T transdérmica na função sexual de mulheres ooforectomizadas, quando comparado ao grupo placebo.22 Em uma revisão de 8 estudos randomizados controlados contra placebo em grupos de mulheres pós-menopáusicas, por um período de 9 a 24 semanas de uso de estrógenos isolados ou associados à diferentes apresentações de T (oral, implantes, adesivos) com diversas doses, mostrou, na sua totalidade, aumento dos domínios dos questionários de sexualidade.18 Estu­ do recente prospectivo que avaliou o efeito de desidroepiandrosterona (DHEA) a 1% em aplicações intravaginais diariamente, durante 12 semanas, em 216 mulheres pósmenopáusicas mostrou melhora quando comparado ao placebo em vários domínios da sexualidade: 68% excitação, 39% lubrificação, 75% orgasmo e 57% da dispareunia por secura vaginal, sendo considerado uma excelente alternativa terapêutica sem ris­ cos sistêmicos.23 O uso de T na dose de 300 mcg/dia, associado a estrógeno em forma de adesivos, por 24 semanas, melhorou a função sexual, principalmente o desejo em mulheres ooforectomizadas, entre 20 e 70 anos de idade, que apresentavam desordem do desejo sexual hipoativo.24 A ação do creme de T também foi evidente em mulheres, ainda na menacme, que apresentavam queda da libido e diminuição laboratorial dos níveis séricos de T.25 Há evidências claras, na atualidade, de que a TA interfere significativamente nos domínios da função sexual feminina, havendo indicação precisa nas mulheres portadoras de SIA.

D Efeitos sobre a qualidade de vida IMPORTANTE H á c o rre la ç ã o c la ra e n tre os s in to m a s d a in s u fic iê n c ia a n d ro g ê n ic a e as d e so rd e n s do h u m o r, a d im in u içã o d a lib id o , a fa d ig a g en eralizad a, assim co m o co m p ro v ad o efeito d a T A n o h u m o r, n o b e m -e s ta r g eral, n a e n e rg ia e n a d im in u iç ã o d os g rau s de d ep ressão .

Estudo randomizado, cruzado, placebo controlado, com 31 mulheres na me­ nacme que fizeram uso de 10 mg/dia de creme de T a 1%, por um período de 12 semanas, apresentou resultados estatisticamente significantes, com aumento dos escores de bem-estar geral, nos resultados da escala sexual de Sabbatsberg e na diminuição dos níveis de depressão no inventário de Beck, quando comparados com placebo.26 Inúmeros estudos randomizados, duplo-cego e placebo controlados, realizados em grupos de mulheres com insuficiência adrenal ou no período pós-menopáusico natural que fizeram uso de DHEA contra placebo em doses que variaram entre 25 e 100 mg/dia, durante um período de tempo de 3 a 12 meses, demonstraram melhora significativa no bem-estar, no humor e na fadiga, com diminuição da ansiedade e da depressão.18 Existem fortes evidências clínicas que recomendam o uso de andrógenos nas mulheres que apresentam alterações no bem-estar geral, na energia, no humor, fadiga e nos quadros de depressão que sejam decorrentes da SIA feminina.

354

Endocrinologia Feminina e Andrologia

TR A TA M E N TO COM A N D R Ó G EN O S

O tratamento androgênico, nomeadamente com a T, tem sua indicação sempre que se considera o diagnóstico de SIA. Ainda que o tratamento da dispareunia secundária à secura vaginal após a menopausa deva ser realizado com o emprego de estrogenos que restauram o pH e o epitélio vaginal, a TE isolada tem-se mostrado ineficaz quando o problema envolve a esfera sexual, como o desejo e a libido.27 Como regra geral, a TA não deve ser oferecida para mulheres na pós-menopausa sem o emprego concomitante da TE. E imperioso ainda lembrar que, em mulheres no período menopáusico sob TE, a adição de andrógenos não garante a proteção endometrial, havendo a necessidade também do uso de progestógenos. Existem evidências, na literatura, de que o uso de TA na menopausa associado à terapêutica estroprogestativa mostra benefícios da T sobre o desejo, a responsividade e a frequência da atividade sexual.22,28,29 A T administrada por VO tem absorção intestinal e passa por metabolização e inativação hepática antes de atingir os órgãos-alvo. A forma micronizada oral não é bem absorvida e resulta em níveis plasmáticos insuficientes para manifestar efei­ to terapêutico. A forma alquilada, a saber, a metiltestosterona, nas doses de 1,25 a 2,5 mg/dia é a que acumula maior experiência clínica. Ainda de forma oral, o UT, aprovado para redução da libido em homens e com efeito hepático menor do que a metiltestosterona, empiricamente na dose de 40 mg/dia, tem recebido indicação em mulheres, ainda que suas doses eficazes e seguras não sejam completamente co­ nhecidas. O fato de as formulações orais de andrógenos normalmente sofrerem a pri­ meira passagem e metabolização hepática pode repercutir em efeitos colaterais, particularmente no perfil lipídico e lipoproteico, com redução dos níveis de HDLcolesterol. Nas doses atualmente recomendadas, a utilização de andrógenos parece determinar claros benefícios no bem-estar geral, na massa óssea e principalmente na sexualidade, sem efeitos colaterais evidentes. Entretanto, os conhecimentos atuais não permitem o uso de andrógenos a longo prazo, porque o seu papel na aterosclerose e na doença cardiovascular ainda é incerto e não está estabelecido. A influência do uso da TA foi estudada prospectivamente em 37 mulheres pósmenopáusicas e histerectomizadas, com idade entre 42 e 62 anos, que por um período de 12 semanas, receberam 1 mg/dia de estradiol percutâneo associado à metiltestoterona 1,25 mg/dia ou placebo por VO. Os resultados mostraram que os níveis de colesterol total, LDL-colesterol, triglicerídios não mudaram, bem como houve dimi­ nuição significativa do SHBG em ambos os grupos. Aumento do índice de androgênio livre foi observado apenas no grupo de metiltestoterona. Com relação aos fatores de risco cardiovascular, não ocorreram alterações estatisticamente significativas sobre os níveis plasmáticos de fibrinogênio, as pressões sistólica e diastólica, o peso corporal, o IMC e a relação cintura-quadril. Esse estudo sugeriu que a combinação de baixa dose de metiltestosterona e estradiol percutâneo, por 1 ano, não determina aumento signi­ ficativo nos fatores de risco cardiovascular.19 O uso de DHEA intravaginal diário foi avaliado recentemente, por um período de 12 semanas, em 218 mulheres pós-menopáusicas, na faixa entre 42 e 74 anos. As me­ didas de DHEA e de todos os seus metabólitos no plasma, após 2, 4 e 8 semanas, e ao

Capítulo 24 Uso de andrógenos em mulheres 355

fim do estudo, não demonstraram variações significativas durante todo o período de observação.30 Observações como essa, desencorajam o emprego da DHEA por essa via, com finalidade de TA. A via de administração parenteral de T mais estudada tem sido a transdérmica, uma vez que a pele absorve rapidamente esse hormônio. A administração por adesivos ou em gel transdérmico, nas doses diárias de 150 mcg a 300 mcg, tem de­ monstrado bons resultados sobre a sexualidade feminina na pós-menopausa.29 E preconizada a aplicação dessas formulações na face interna dos braços, das coxas e do abdome inferior. A via parenteral de administração de T tem se mostrado vantajosa quando compa­ rada à VO.2 O Tabela 24.3 mostra os fármacos, as vias de administração, as doses e as características das preparações mais frequentemente empregadas em TA.

TABELA 24.3 Fármaco

Preparações utilizadas na terapêutica androgênica feminina Via de administração

Dose

Características M e ia -v id a c u rta ; 3 doses/dia; p r e ju ­

Undecanoato de testo sterona

O ra l

40 m g

d ica p a râ m e tro s lip íd ic o s ; p ro m o v e n íveis p la s m á tic o s variáveis de te s to s te r o n a M e ia -v id a c u rta ; 3 -5 doses/

Metiltestosterona

O ra l

1 ,2 5 -2 ,5 m g

dia; h e p a to tó x ic a ; n íveis su p ra fisio ló g ic o s de te s to s te r o n a ap ó s a b so rç ã o A d m in istração diária; an álo g o

Oxandrolona

O ra l

2 ,5 m g

sin té tico d a te sto stero n a ; n ã o sofre aro m atização F a r m a c o c in é tic a favorável;

DHEA

O ra l

2 5 -5 0 m g

p re c u rs o r de a n d ró g e n o s; n ã o ap ro v ad o p e la F D A

Cipionato/ enantato de testo sterona

In je tá v e l

200 mg

In tr a m u s c u la r ; in d u z n íveis de te s to s te r o n a s u p ra fisio ló g ic o L o n g a d u ra çã o ; in se rçã o a c a d a 6

Implante de testo sterona

S u b c u tâ n e a

5 0 -1 0 0 m g

m eses; n ã o ap ro v ad o p o r ó rg ã o s re g u la tó rio s ; d o sa g e n s excessiv as; n íveis s u p ra fisio ló g ic o s

1 ,2 5 -2 ,5 mg/

Gel/adesivo de testo sterona

T ra n s d é rm ic a

d o se; 1 5 0 3 0 0 m cg/ d o se

P re p a ra çã o p re fe re n cia l; fa r m a c o ­ c in é tic a m a is fav o ráv el; m eia-v id a variável c o m o tip o de p re p a ra çã o ; u so d iá rio ; m e lh o r p e rfil m e ta b ó li­ co ; a ju s te de d o se

DHEA: desidroepiandrosterona, FDA: U.S. Food and Drug Administration.

356

Endocrinologia Feminina e Andrologia

S E G U R A N Ç A , E F E I T O S C O L A T E R A IS E C O N T R A IN D IC A Ç Õ E S D A T E R A P Ê U T I C A A N D R O G Ê N IC A

Sempre que pensamos em indicar a TA, nos deparamos com a inexistência ou a paucidade, em praticamente todo mundo, em preparações ou opções destinadas ao uso em mulheres. Obviamente, essa dificuldade espelha as questões de segu­ rança, ainda não muito claras, em particular, para uso a longo prazo, fazendo com que os órgãos regulatórios tenham dificuldade para aprovar as distintas modali­ dades de TA. O objetivo principal que se deve ter com a TA é prover uma quantidade de hormô­ nios que propicie concentrações plasmáticas normais ou próximas ao limite superior da normalidade, sendo, assim, improvável o aparecimento de manifestações androgênicas. Estas compreendem o crescimento piloso, o hirsutismo, a acne, a calvície tem­ poral, a hipertrofia do clitóris e o aprofundamento da voz. A presença de eventos adversos ao tratamento com T está relacionada com a via de administração, dose empregada e sensibilidade individual. As manifestações des­ favoráveis sobre o perfil lipídico e lipoproteico estão restritas à VO, praticamente não ocorrendo com a via parenteral de administração de T. Com relação à sexualidade, a exacerbação de pensamentos e fantasias sexuais pode considerar a necessidade de redução das doses ou interrupção completa do tratamento. Os potenciais efeitos cola­ terais da TA estão listados na Tabela 24.4.

TABELA 24.4

Efeitos colaterais da terapia androgênica feminina

H irs u tis m o *• •

A lo p e cia



V iriliz a ç ã o (c lito re m e g a lia , v oz g ro ssa)



A cn e e a u m e n to d a o le o sid a d e d a p ele e do ca b e lo



A g ressivid ad e



R e d u ç ã o n ív eis de H D L -c o le s te ro l



R e s is tê n c ia à in s u lin a e a u m e n to d a g o rd u ra a b d o m in a l



H e p a to to x ic id a d e



C â n c e r de m a m a C â n c e r de e n d o m é trio

A possível relação da TA com o câncer de mama tem sido lembrada com frequência, ainda que não esteja demonstrada de maneira clara. Receptores androgênicos são en­ contrados em cerca de 50% dos tumores de mama, estando associados à sobrevida maior em pacientes operadas de câncer de mama e com respostas mais favoráveis à hormonioterapia em doença avançada.31 A influência da suplementação de estradiol esterificado associado à metiltestosterona foi estudado em 31.842 mulheres pós-menopáusicas participantes do Women’s Health Initiative - Observational Study (WHI-OS), por um período de 4,6 anos, evi-

Capítulo 24 Uso de andrógenos em mulheres 357

denciou que as usuárias de E + T não tiveram impacto significativo no risco do câncer de mama [RR= 1,42 (IC 95%; 0,95 a 2,11)].32 Os estudos clínicos com terapia exógena de T possuem limitações significativas e ainda são inconclusivos para relacionar ao risco ou não de câncer de mama. A depleção estrogênica e a atividade da aromatase observada na menopausa deter­ minam aumento nos níveis de T livre, e isso pode elevar o risco de câncer de mama.33 Estudo de coorte prospectivo com mulheres pós-menopáusicas usando diferentes for­ mulações contendo T, no Nurses* Health Study, após seguimento de 2 anos, mostrou consistente elevação no risco de câncer de mama invasivo em usuárias de estrógeno combinado à T.34 Frente às evidência atuais, não se recomenda o uso de andrógenos em mulheres que possuam fatores de risco pessoais ou familiares associados ao câncer de mama. As contraindicações da reposição androgênica na mulher podem ser divididas em absolutas (gravidez, lactação, policitemia, acne grave, hiperplasia ou câncer endometrial, câncer de mama, cardiopatias, hepatopatias e insuficiência renal) e relativas (hirsutismo e acne moderada, alopecia androgênica, hiperlipidemia e síndrome metabólica). C O N C LU SÃ O

Os efeitos adversos da administração de andrógenos são reversíveis na sua quase tota­ lidade, com a suspensão do tratamento. No entanto, é aconselhável que, aproximada­ mente 2 meses após o início da TA, se realizem dosagens sanguíneas de hemoglobina, de enzimas hepáticas e dos níveis séricos dos lipídios. O controle ultrassonográfico en­ dometrial e a mamografia devem ser realizados com periodicidade anual, assim como se faz na terapêutica estrogênica.18 Vale ressaltar que não se deve indicar a TA em pacientes que não estejam adequa­ damente estrogenizadas e que atualmente não existem dados de segurança sobre a TA em usuárias a longo prazo. As mesmas considerações e contraindicações para a TE são válidas e aplicáveis para a TA. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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Capitulo 24 Uso de andrôgenos em mulheres 359

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j f ' :

;

ovariana precoce D o lo res P. Pard in i ■



IN T R O D U Ç Ã O

A falência ovariana precoce (FOP), também conhecida como menopausa prematura, é caracterizada por amenorreia, elevação das gonadotrofinas hipofisárias e deficiência dos esteroides sexuais, ocorrendo antes dos 40 anos de idade. Afeta 1% a 2% das mu­ lheres antes dos 40 anos e 0,1% das mulheres antes dos 30 anos de idade.1 Quanto à sua instalação, a FOP pode ser primária ou secundária. ■

E T IO L O G IA

Na grande maioria dos casos de falência primária, a causa é desconhecida. As anorma­ lidades cromossômicas (especialmente no cromossomo X), polimorfismos no gene do receptor do hormônio folículo estimulante (FSH), mutação na inibina B, deficiências enzimáticas e doenças autoimunes podem estar envolvidas. A FOP secundária é ob­ servada em sobreviventes pós-tratamento cirúrgico, quimioterápico ou radioterápico de doenças malignas.2 Podemos dividir as causas em 2 categorias: as que ocorrem por depleção folicular e as decorrentes de disfunção folicular (Tabela 25.1).

TABELA 25.1

Etiologia e classificação da FOP8

Depleção folicular

Disfunção folicular

Diminuição do número inicial de folículos

Deficiências enzimáticas

D is g e n e sia g o n a d a l p u ra A p la sia o u h ip o p la s ia tím ic a Id io p á tic a

1 7 -a -h id r o x ila s e 1 7 , 2 0 -lia s e C o le s te r o l d e sm o la se G a la c to s e -l-fo s fa to -u r id il-tr a n s fe r a s e

Atresia folicular acelerada R e la c io n a d a ao c ro m o s s o m o X S ín d ro m e de T u r n e r M o s a ic o s de X D e le ç õ e s de X G a la c to s e m ia Ia tr o g ê n ic a A g en tes v irais A u to im u n id a d e D e fe ito d a re g u la çã o d o c ic lo c e lu la r o ó c ito -e s p e c ífic o Id io p á tic a

Autoimunidade O o fo r ite lin fo c ític a Im u n o g lo b u lin a s b lo q u e a d o ra s do re c e p to r d as g o n a d o tro fin a s A n tic o rp o s a n tig o n a d o tr o fin a s

Defeitos de sinalização G o n a d o tr o fin a a n o rm a l R e c e p to r de g o n a d o tr o fin a a lte ra d o P r o te ín a G a n o rm a l

Iatrogênica Idiopática

Capítulo 25

Falência ovariana precoce

361

D Depleçãofolicular Número inicial de folículos deficientes Resulta de alterações no mecanismo que regula a migração das células germinativas, a proliferação mitótica das oogônias e o início da meiose para formar os folículos primordiais. Exemplos: 1- disgenesia gonadal pura familial 46,XX, 2- inativação da proteína óssea morfogenética 4 (BMP4), a qual leva à ausência de células germinativas e 3- aplasia ou hipoplasia tímica.1 Os pacientes com a forma afolicular da FOP não apresentam, necessariamente, amenorreia primária e ausência de caracteres sexuais secundários. Anormalidades le­ ves na formação das células germinativas podem, inicialmente, suportar desenvolvi­ mento puberal normal e, até mesmo fertilidade, mas eventualmente resultam em FOP devido à depleção prematura de folículos.1

Atresia folicular acelerada Alterações do cromossomo X Os 2 cromossomos X ativos e intactos são necessários para impedir a atresia folicular acelerada durante a vida pré-natal tardia (após a vigésima semana de gestação). Na Síndrome de Turner (45,XO e nos mosaicismos 45,XO, 45,XO/46,XX, 45,XO/47,XXX), as células germinativas migram para a prega gonadal, mas os oócitos primários sofrem atresia acelerada, provavelmente devido à perda da dosagem diploide de 1 ou mais genes vitais para o desenvolvimento gonadal.1’3 Os segmentos cromossômicos FOP 1 (Xq21.3-q27) e FOP 2 (Xql3.3-q21.1) são im­ portantes para definir a função ovariana. Existe aumento da incidência familial de FOP nas mulheres com pré-mutações da síndrome do X frágil, decorrente de altera­ ções no gene FMR1, o qual se localiza no segmento cromossômico FOP 1. De interesse clínico, o início mais precoce (entre 16 e 21 anos) da disfunção ovariana ocorre em pacientes com deleções na região FOP 2, quando comparadas àquelas com deleções na região FOP 1 (entre 24 e 29 anos).1,3 O risco de ter um cariótipo anormal é tanto maior quanto menor a idade de ins­ talação da falência ovariana. Análise cromossômica é sempre recomendada devido ao maior risco de desenvolvimento de tumor gonadal, associado à presença de fragmen­ tos do cromossomo Y nessas pacientes.

Galactosemia E uma doença autossômica recessiva rara causada pela deficiência da enzima galacto­ se-1-fosfato uridil-transferase (GALT), com consequente acúmulo de galactose e seus metabólitos. Oitenta e um por cento das mulheres afetadas desenvolvem FOP, a maio­ ria logo após a puberdade.1

Quimioterapia, irradiação e toxinas ambientais Inicialmente a quimioterapia (QT) destrói as células da granulosa e teca em prolifera­ ção, as quais são os componentes primários dos folículos em desenvolvimento. Poste­ riormente, e em especial com os agentes alquilantes, há alteração do DNA das células dos folículos primordiais não proliferativos. A idade da paciente, a dose e o tipo de droga são os principais fatores preditivos do desenvolvimento da disfunção ovariana

362

Endocrinologia Feminina e Andrologia

após a QT (Tabela 25.2). Pacientes na pré-puberdade são relativamente resistentes aos efeitos ovarianos dos agentes alquilantes.1

TABELA 25.2

Risco estimado de disfunção gonadal com drogas citotóxicas2

Risco alto

Risco médio

Risco baixo

C ic lo fo s fa m id a

C is p la tin a

V in c r is tin a

C lo rm e tid in a

C a rb o p la tin a

M e tr o tr e x a to

B u s u lfa n

D o x o r u b ic in

B le o m ic in a

M e fa la n

M e r c a p to p u r in a

P ro c a rb a z in a

V in b las tin a

C lo ra m b u c il

Falência ovariana induzida por radiação é dependente da idade da paciente e da dose recebida. Uma dose de radiação ovariana maior ou igual a 600 cGy produz fa­ lência ovariana em virtualmente todas as pacientes com mais de 40 anos, mas há di­ ferenças significantes na sensibilidade entre os indivíduos.1,4 Com relação às toxinas ambientais, sabe-se que mulheres fumantes apresentam menopausa mais precoce que as não fumantes.1

Agentes infecciosos Caxumba, infecção por Shigella, malária e varicela têm sido implicadas como causas raras de FOP.4

D Disfunção folicular Algumas pacientes com FOP têm oócitos e folículos de aparência normal, embora eles não funcionem adequadamente, mesmo na presença de níveis adequados de gonadotrofinas.1Nessas formas foliculares, há possibilidade de retorno da função ovariana de forma espontânea ou induzida.4

Deficiências enzimáticas Deficiências da colesterol desmolase (SCC), 17-a-hidroxilase (170H ), 17, 20-liase e aromatase podem impedir a síntese de estrógeno, resultando em retardo puberal, amenorreia primária e aumento dos níveis de gonadotrofinas, apesar da existência de folículos primordiais aparentemente normais. Pacientes com a forma clássica de deficiência de SCC são incapazes de produzir qualquer esteroide biologicamente ativo e raramente sobrevivem até a vida adulta.1,4 Pacientes com deficiência da 170H desen­ volvem hipertensão, hipocalemia, amenorreia primária e ausência do desenvolvimen­ to dos caracteres sexuais secundários. A deficiência da aromatase se manifesta com retardo puberal, amenorreia hipergonadotrófica e múltiplos cistos ovarianos.1 A falta de retroalimentação negativa do estrógeno sobre as gonadotrofinas pode re­ sultar em crescimento folicular excessivo e desregulado, sendo que as pacientes podem apresentar ovários palpáveis ao exame físico, com risco de torção e infarto ovarianos.1

Capítulo 25

Falência ovariana precoce

363

Defeitos de sinalização Defeitos nas gonadotrofmas, em seus receptores ou na proteína G (sinalização pós-receptor) podem resultar em falência ovariana.1 Mutação dos genes da subunidade p do FSH, do gene KAL e do gene DAX-1 alteram a síntese e a secreção das gonadotrofmas. Mutação do gene da subunidade p do FSH foi descrita em uma paciente com amenorreia primária, desenvolvimento precário dos caracte­ res sexuais secundários e infertilidade. A síndrome de resistência ovariana (ou de Savage) é decorrente de alteração em nível de receptor ou pós-receptor das gonadotrofmas. Mutação do receptor de LH pode se manifestar com amenor­ reia primária ou secundária, sendo que as pacientes descritas atingiram os está­ dios puberais IV ou V de Tanner. As pacientes com mutação do receptor de FSH apresentam amenorreia primária hipergonadotrófica e desenvolvimento variável de características sexuais secundárias.1,4 Resistência ovariana, devido a defeito no sistema de geração de AMP cíclico, foi demonstrada em paciente com pseudo-hipoparatiroidismo, a qual apresentava amenorreia secundária e hipoestrogenismo hipergonadotrófico.1

FOP de causa autoimune Corresponde a cerca de 20% dos casos de FOP. Seu diagnóstico é relativamente difícil e baseado na exclusão de outras causas conhecidas de FOP, além da presença de 1 ou mais critérios para doenças autoimunes.6,7 As evidências que suportam um papel da autoimunidade na patogênese da FOP são:

Associação com outras doenças autoimunes Em 2% a 10% dos casos, a FOP está associada à doença de Addison (DA), caracterizan­ do as síndromes poli glandulares autoimunes (SPAs).1,7 FOP está presente em 17% a 50% dos casos de SPA do tipo 1 e em 4% a 7% dos casos de SPA do tipo 2.6 No entanto, a maioria das pacientes com FOP não apresenta DA associada. Nestas, a FOP pode se apresentar de forma isolada (1%) ou estar associada a outras doenças autoimunes diferentes da DA (em até 57% dos casos).6,7 A autoimunidade tiroidiana é a alteração autoimune mais prevalente (14% a 27%) associada à FOP na ausência de envolvimento adrenal, seguida pela presença de anticorpos anticélulas parietais (4%), diabetes mellitus do tipo 1 (2%) e miastenia gravis ou positividade para anticorpos antirreceptor de acetilcolina (2%).7

Autoanticorpos circulantes A n tic o rp o s a n tio v á rio

São encontrados em até 67% das pacientes com FOP isolada, em 75% daquelas com FOP associada a outras doenças autoimunes e em 78% daquelas com antecedente de cirurgia pélvica.1 Dessa forma, esses anticorpos são comuns na FOP, mas sua especifi­ cidade e importância patogênica são questionáveis. Ainda não está estabelecido se eles são simplesmente um epifenômeno secundário à liberação de antígenos após o dano celular.6 Além disso, sua existência é transitória: eles estão presentes na fase inicial da destruição folicular, mas desaparecem nos estágios mais tardios da doença.1

364

Endocrinologia Feminina e Andrologia

A n tic o rp o s a n tirre c e p to rd e g o n a d o tro fin a s

Anticorpos bloqueadores do receptor de FSH foram primeiramente identificados em 3 pacientes com miastenia gravis e hipogonadismo hipergonadotrófico, sugerindo mecanismo imunológico comum.1,6’7 Imunoglobulinas (IgGs) capazes de bloquear a síntese de DNA induzida por FSH nas células da granulosa foram demonstradas em 81% das pacientes com FOP, indicando interferência com a função pós-receptor. En­ tretanto, esses estudos utilizaram receptores de gonadotrofinas não humanos.1,6,7 A n tic o rp o s a n tiz o n a p e lú c id a

Interferem com a interação espermatozoide-oócito e com o desenvolvimento folicu­ lar, podendo ocasionar depleção folicular e amenorreia. Estão presentes em 5,6% das mulheres com infertilidade, 9% daquelas com FOP e em 50% das pacientes menopausadas, sugerindo que a reatividade contra proteínas ovarianas possa ser secundária ao dano folicular, mais que uma resposta autoimune primária.7 A n tic o rp o s a n tic é lu la s p ro d u to ra s d e e ste ro id e s

São IgGs que se ligam às células produtoras de esteroides (ACPE) dos ovários (células da teca, hilares, da granulosa e corpo lúteo), testículos (células de Leydig), placenta (sinciciotrofoblastos) e córtex adrenal.1,7 Estão presentes em 87% das mulheres com FOP associada à DA, mas são raramente encontrados (2% a 7%) no soro de pacientes com FOP na ausência de DA.6,7 Uma vez que 40% das pacientes com DA e função ovariana normal, positivas para ACPE, desenvolvem falência gonadal após um período de 10 a 15 anos da detecção desses anticorpos, eles são considerados marcadores de falência ovariana.1 Os ACPE podem ser citotóxicos para as células da granulosa humanas em cultu­ ra. Esses anticorpos são reativos predominantemente contra a SCC e a 170H , mas também contra uma proteína de 51 KDa das células da granulosa e placenta e a 3p-hidroxiesteroide desidrogenase do tipo II (3p-HSD)10. Autoanticorpos anti-3p-HSD, detectados por “immunoblof”, foram encontrados em 21% das pacientes com FOP.18 Diferentemente, quando dosados por meio de imunoprecipitação, foram observados em apenas 2% a 12% dos casos de FOP, sugerindo que esses anticorpos tenham baixo significado como marcador diagnóstico de FOP.7

Evidência histológica de ooforite Está presente em 11% das pacientes com FOP. Todas as pacientes positivas para ACPE têm ooforite linfocítica, mas esta é um achado excepcional (menos de 3%) nas pacien­ tes com FOP isolada ou não associada à DA. Mais da metade das pacientes com FOP, ooforite e ACPE têm cistos ovarianos. O aumento ovariano e a formação de cistos podem ser resultado da produção local de linfocinas e da alteração da esteroidogênese folicular, com consequente aumento dos níveis de gonadotrofinas. Geralmente, há de­ pleção folicular e, algumas vezes, no estágio final do processo autoimune, as glândulas podem parecer fibróticas (ovários em fita) ou atrofiadas. Em 40% dos casos, alguns ou numerosos folículos ovarianos podem ser detectados. Em cerca de 10% dos casos, há grande número de folículos imaturos; esses casos provavelmente representam ocor­ rências de síndrome de resistência ovariana.1,7

Capítulo 25 Falência ovariana precoce

365

Histologicamente, infiltrado mononuclear é concentrado ao redor dos folículos em desenvolvimento, poupando os folículos primordiais e o córtex ovariano. O infiltra­ do é intenso nas células da teca interna e externa; no início, preservando as células da granulosa, até que ocorra a luteinização do folículo. Folículos atrésicos e, quando presentes, corpo lúteo ou albicans, também apresentam infiltrado. Este também pode ser observado nas regiões medular e hilar dos ovários, assim como nas regiões perivascular e perineural do hilo ovariano. Análise imuno-his to química da ooforite revela que as células inflamatórias se constituem, principalmente, de linfócitos T (CD4+ e CD8+), poucas células B, macrófagos, células natural killer (NK) e um grande número de plasmócitos, que secretam IgG, imunoglobulina M (IgM) e imunoglobulina A (IgA) in situ. O significado da expressão inapropriada das moléculas do complexo maior de histocompatibilidade (MHC) de classe II nas células da teca e da granulosa luteinizada ainda permanece obscuro, devido ao fato de poder ser induzida in vitro na presença de interferon-y.1,7 Cabe ressaltar que a ausência de ooforite linfocítica não pode ser consi­ derada evidência conclusiva contra uma etiologia autoimune.6

Infecções Três e meio por cento das pacientes com FOP de causa autoimune têm antecedentes de varicela, malária ou infecções por Shigella ou citomegalovírus, e 3% a 7% das pacien­ tes que contraíram caxumba apresentaram ooforite.1

Resposta imune mediada por células Há aumento das células B produtoras de anticorpos (CD5+19+) e baixo número de cé­ lulas T efetoras supressoras (CD8+57+), além da diminuição do número e/ou da ativi­ dade das células NK.6,7 O número de linfócitos T ativados circulantes está aumentado em cerca de 35% das pacientes com FOP.1,7 No entanto, mulheres na pós-menopausa também podem apresentar a alteração. Possivelmente, o hipoestrogenismo hipergonadotrófico presente nas mulheres com FOP e também naquelas pós-menopausa seja o responsável pelo aumento do número de linfócitos T ativados circulantes.1,6,7

Recuperação da função ovariana após terapia imunossupressiva Os agentes mais empregados são os corticosteroides,6 embora plasmaferese, timectomia ou terapia com IgG iv também possa ser utilizada.1

Marcadores imunogenéticos Na FOP associada à DA, como parte da SPA do tipo 2, o haplotipo predominante é HLA-B8/DR3, mas o HLA-A9 também é comumente encontrado. Na FOP como par­ te da SPA do tipo 1, foi observada associação com o HLA-A3.1,7 Na FOP isolada, foi demonstrada a presença do HLA-B35 em 37% dos casos (risco relativo de 2.99) e do HLA-DR3 em 53% dos casos (risco relativo de 4.3).6

Modelos animais Im u n iz a ç ã o co m a n tíg e n o s o v a ria n o s

Ooforite autoimune experimental pode ser induzida em camundongos BALB/c, utilizando-se extratos ovarianos bovinos associados ao adjuvante de Freund. A imunização

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

produz ooforite alérgica após 14 dias, com infiltração ovariana por linfócitos, macrófagos e plasmócitos. Diferentemente do observado na ooforite autoimune humana, os principais alvos do ataque imune são o espaço interfolicular e os folículos primordiais e secundários. Essa ooforite também pode ser induzida pela transferência passiva de linfócitos do sangue periférico de ratos imunizados com antígenos ovarianos para animais normais, indicando que as células T e B são importantes na patogênese da doença. Anticorpos antiovarianos não são detectados no soro dos animais antes do 28° dia e podem interferir com antígenos da zona pelúcida (ZP), inibindo a fertilização e/ou alterando a ovulação.7 Im u n iz a ç ã o co m z o n a p e lú c id a

Coelhos imunizados com antígeno da ZP não ovulam em resposta à administração de hCG, e os folículos em desenvolvimento desaparecem. O aspecto histológico de gru­ pamentos de células de suporte sem um oócito localizado centralmente indica que an­ ticorpos anti-ZP interromperam a diferenciação normal do desenvolvimento folicular precoce (tempo de produção da ZP). Ooforite clássica não aparece, como no caso da imunização com proteína ovariana. A diferença na morfologia ultraestrutural sugere que este seja um mecanismo improvável de FOP em humanos.1,7 Em certas espécies de ratos, imunização com o antígeno 3 da ZP (ZP3) induziu ooforite semelhante à doença humana. As lesões foram atribuídas às células T espe­ cíficas para o ZP3, as quais, quando transferidas para camundongos, causaram oofori­ te. O antígeno, nesse processo, poderia ser criado pela liberação de ZP3 por meio da atresia folicular.1 A ZP3 de camundongo e a humana apresentam 67% de identidade. As células T CD4+ reativas contra a ZP3 produzem interleucina-2, interferon-S e fator de necrose tumoral (TNF), mas não interleucina-4, indicando uma resposta do tipo T h l. Células B autorreativas contra antígenos ovarianos podem ser geradas após a transferência das células T e podem ser ativadas a produzir anticorpos anti-ZP3 in vivo pelas células T específicas anti-ZP3.7 Um outro mecanismo pelo qual auto anticorpos anti-ZP3 podem ser induzidos é por meio de mímica molecular. Existe homologia entre o ZP3 e a cadeia 8 do receptor de acetilcolina do camundongo, o qual também pode causar ooforite severa e estimular a proliferação de clones de células T específicos anti-ZP3. Entretanto, o receptor de acetilcolina humano não compartilha nenhuma sequência com a proteína ZP3 humana, tornando este mecanismo improvável para a patogênese da FOP humana. A associação entre FOP e miastenia gravis, na qual os anticorpos antirreceptor de acetilcolina estão presentes, permanece uma coincidência notável e não esclarecida.1,7 T im e cto m ia n e o n a ta l

Foi descrita a ocorrência de disgenesia ovariana e alterações inflamatórias na tiroide, na hipófise, nos testículos, na mucosa gástrica e nas glândulas salivares em certas linhagens de camundongos submetidos à timectomia no terceiro dia de vida. A timectomia em uma idade precoce ocasiona a perda de células reguladoras e/ou células T supressoras CD4+, as quais são geradas no timo apenas após a primeira semana de vida e controlam o repertório de células CD4+ autorreativas. Consequentemente, as células autorreativas permanecem na circulação e levam ao dano tecidual autoimune.1,7 Histopatologicamente, observa-se infiltrado linfocitário difuso e acometimento dos folículos em desenvolvimento por monócitos, macrófagos, neutrófilos e plasmócitos.

Capítulo 25

Falência ovariana precoce

367

A ooforite pós-timectomia e o aparecimento de anticorpos antiovarianos ocorrem em uma progressão ordenada, que é potencializada pela puberdade, implicando a presença de um antígeno estimulado por gonadotrofinas.1,7A ooforite linfocítica é mais intensa entre 4 a 14 semanas após a timectomia, com a reação inicial direcionada contra os folículos em desenvolvimento; há colapso dos folículos ovarianos e perda de oócitos. Anticorpos antiovarianos, contra a ZP, o oócito, as células da granulosa, teca e células produtoras de esteroides são detectados na quarta semana e desaparecem na décima quarta semana, quando o ovário se toma atrófico. A doença parece ser mediada pelas células T. Este qua­ dro histológico e sorológico é comparável à condição humana da FOP por ooforite.7 T ra n sferê n cia d e cé lu la s T n o rm a is p a ra c a m u n d o n g o s a tím ic o s sin g ê n ic o s (n u /n u )

Os camundongos atímicos nu/nu apresentam função deficiente das células T. Quan­ do timócitos CD4+CD8+de camundongos normais, no período neonatal, são transfe­ ridos para esses camundongos atímicos, cerca de 50% a 75% deles desenvolvem oofori­ te autoimune e/ou gastrite. As células causadoras de doença são do tipo T h l.7

Patogênese da FOP de causa autoimune Ooforite autoimune resulta da perda de tolerância imunológica contra antígenos ova­ rianos e é mediada tanto pela imunidade celular quanto pela humoral. E multifatorial, necessitando de fatores genéticos (entre eles, o sistema antígenos leucocitários huma­ nos - HLA) e ambientais (infecções virais) para o seu desenvolvimento. Autoantígenos glandulares podem se combinar mais facilmente com certas moléculas do sistema HLA que com outras ou, ainda, os genes desse sistema podem controlar o repertório de células T.7 Em uma fase inicial, há acúmulo de células apresentadoras de antígeno (células dendríticas e macrófagos) no tecido ovariano, possivelmente devido à presen­ ça de neoantígenos (vírus, drogas etc.), à alta taxa de metabolismo ou ao crescimento das células endócrinas ou ainda devido a alterações vasculares que permitem a migra­ ção das células dendríticas. Em uma fase tardia, ocorre produção aparentemente des­ controlada de células T CD4+e CD8+autorreativas e de autoanticorpos da classe IgG nos linfonodos de drenagem. Finalmente, o ataque imunológico gerado por células T autorreativas, citocinas e autoanticorpos ocasiona destruição do tecido glandular, que é extremamente suscetível.7A Figura 25.1 sumariza as causas de FOP.8

Condições autoimunes

Causas genéticas familiares L ...7

10%

5% .

.......

f

Anormalidades do cromossomo X FIGURA 25.1 Causas de FOP.9

/

20%

65%

Idiopática

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

D IA G N Ó S T IC O

A FOP pode apresentar-se de diferentes formas, porém manifesta-se mais frequente­ mente como amenorreia secundária ou irregularidade menstrual antes de 40 anos de idade, acompanhado ou não de sintomas decorrentes do hipoestrogenismo, como fo­ gachos, sudorese noturna e secura vaginal. Casos diagnosticados antes dos 20 anos, em geral, são menos sintomáticos.1 Uma pequena porcentagem de 10% de mulheres pode apresentar-se com amenorreia primária, nas quais uma causa genética é o mais prová­ vel. O diagnóstico é confirmado ao se demonstrar hipogonadismo hipergonadotrófico com pelo menos 2 dosagens de FSH > 40 mUI/L , em ocasiões separadas por, pelo menos, 1 mês de intervalo. As amostras de gonadotrofina devem ser coletadas após 3 a 4 meses de amenorreia ou irregularidade menstrual. Caso estejam na faixa menopausal, devem ser repetidas após 4 semanas juntamente com a dosagem sética de estradiol, confirmando o hipogonadismo. Avaliar a função tiroidiana e os níveis de prolactina é recomendável no diagnóstico diferencial de amenorreia. Um retardo no diagnóstico da falência ovariana prematura pode acarretar perda óssea secundária à deficiência estrogênica. Mulheres com menopausa precoce têm 50% mais fraturas quando comparadas com mulheres em menopausa aos 50 anos, portanto, deve-se sempre associar uma ava­ liação da massa óssea por ocasião do diagnóstico.8’10



História clínica

Na maioria das mulheres, não existem sinais e sintomas óbvios que precedem a irre­ gularidade menstrual. A maior parte delas tem história menstrual normal, idade da menarca e possível fertilidade antes dos sintomas iniciais de falência ovariana. Algu­ mas pacientes desenvolvem amenorreia abruptamente após ciclos regulares, ou mais comumente após interrupção do uso de contraceptivos orais ou após gravidez. Outras apresentam padrão menstrual irregular anos antes da amenorreia. Há ainda as que nunca chegaram a menstruar. Nas mulheres com amenorreia secundária, um dado mais precoce até que a irre­ gularidade menstrual pode ser história pregressa de infertilidade e abortamento de repetição. Alguns autores denominaram de falência ovariana oculta ou baixa reserva ovariana as mulheres com ciclos regulares porém FSH alto, infertilidade e má resposta à indução de ovulação ou abortos. Farhi eta l.n descreveram 12 mulheres inicialmente diagnosticadas como portadoras de infertilidade sem causa aparente ou anovulação, que apresentavam perfil hormonal, inclusive FSH normal. Todas eram classificadas como “más respondedoras” por não terem respondido adequadamente à dose alta de HMG (gonadotrofinas menopausais humanas, 5 amps/dia durante 5-8 dias), tanto por não ter havido desenvolvimento folicular quanto pelos baixos níveis de estradiol alcançados. Todas essas pacientes desenvolveram FOP em um período curto: o FSH na fase folicular precoce subiu de uma média de 5,4 para 53,5 mUI/L cerca de 9 meses após as tentativas de gravidez.8 Nos casos de amenorreia secundária, após exclusão de gravidez, a paciente deve ser arguida sobre infecções previa por caxumba, varicela, tuberculose, malária, shiguelose.2 A irregularidade menstrual também pode ser secundária a disfunção tiroidiana e estados hiperandrogênicos como a síndrome dos ovários policísticos (SOP). A história pregressa deve excluir causas iatrogênicas, como cirurgia pélvica prévia, quimio ou radioterapia, e doenças autoimunes. Embora na maioria dos casos a FOP ocorra esporadicamente,

Capítulo 25

Falência ovariana precoce

369

existe história familiar positiva em 10% a 15% dos casos. Assim sendo, essas pacientes devem ser arguidas sobre a família, bem como a ocorrência de outras doenças autoimunes, como hipotiroidismo, insuficiência adrenal, hipoparatiroidismo, vitiligo e diabetes mellitus.12 Deve-se pesquisar história familiar de menopausa precoce (antes dos 40 anos) ou cedo (entre 40 e 45 anos). Nas com amenorreia secundária, deve-se questionar tam­ bém se há casos na família de debilidade mental em homens, que apontam para a possi­ bilidade de que esses pacientes sejam portadores da Síndrome do X frágil. A paciente pode referir sintomas decorrentes da deficiência estrogênica, como sin­ tomas vasomotores, suores noturnos, distúrbio no sono, secura vaginal e dispaurenia. Entretanto, nem todas as pacientes têm níveis de estrógeno muito baixos e, na grande maioria, a citologia vaginal encontra-se normal quanto aos níveis de estrógeno.12

D

Exame físico

O exame físico pode revelar a associação com outras doenças autoimunes, como hiperpigmentação ou vitiligo (as quais estão associadas com insuficiência adrenal autoimune). Baixa estatura, pescoço alado e hipertelorismo podem ser indicativos de Síndrome de Turner. Nos casos da Síndrome do X frágil, podemos encontrar retardo mental, demência, tremor ou ataxia.12

O Laboratório Em mulheres abaixo dos 40 anos, amenorreia de pelo menos 4 meses, acompanhada de 2 dosagens de FSH igual ou acima de 40 mUI/mL, com, no mínimo, 1 mês de inter­ valo tem sido considerada o selo diagnóstico de FOP.1 No entanto, em termos evolutivos, dosagens seriadas de FSH apresentam pouca sensibilidade e especificidade na predição de fertilidade e função ovariana futura.13 Rebar 14 descreveu flutuações de estradiol plasmático > 50 pg/mL em mulheres com FOP e, confirmando seus achados, em 65 mulheres com FOP estabelecida e cariótipo normal seguidas por Nelson 6 com dosagem hormonal semanal durante 4 meses, 50% demonstraram algum grau de desenvolvimento folicular (estradiol >50 pg/mL) e 16% apresentaram níveis de proges ter ona compatíveis com ovulação (> 3 ng/mL). Uma prática comum tem sido o “teste da progesterona”, com o intuito de avaliar os níveis de estrógeno endógeno. Usualmente a dose diária de 10 mg de acetato de medróxiprogesterona por 10 dias não promove sangramento nas mulheres com FOP, diferentemente das mulheres com reserva estrogênica normal, que sangram após a parada da progesterona. Por outro lado, o teste pode ser erroneamente interpretado na presença de função ovariana intermitente, retardando o diagnóstico. O teste da progesterona não substitui a dosagem de FSH no diagnóstico de FOP.6 Recentemente tem-se preconizado a dosagem de inibina, especialmente a B, para o diagnóstico de FOP. Em 73 pacientes, a manutenção de níveis baixos de inibinas A e B após QT correlacionou-se positivamente com o desenvolvimento de falência ovariana.1S Para avaliação da reserva ovariana pré-estímulo à ovulação em mulheres selecionadas, testes de estímulo com clomifene ou hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) têm sido mais informativos que valores isolados no terceiro dia do ciclo de FSH >10 mUI/mL ou que a inibina B < 45 pg/mL. A dosagem da inibina isolada não se correlacionou com pior prognóstico reprodutivo em 106 mulheres estudadas pré-indução de ovulação. O teste de estímulo com clomifene é realizado pela administração de 3 mg de citrato de clomifene/kg/dia até, no máximo, 150 mg/dia durante 5 dias (usualmente do quinto ao

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

nono dia do ciclo). Dosam-se estradiol (E2), hormônio luteinizante (LH), FSH basais e pós-clomifene. O normal é o LH dobrar o valor basal e o FSH aumentar menos que o LH. Na baixa reserva ovariana, ocorre maior liberação de FSH e pequeno aumento do E2. A soma do FSH basal e do final superior a 26 correlacionou-se com mau prognóstico para fertilidade. Este tipo de teste dinâmico pode, contudo, apresentar variabilidade interciclos considerável, devido às flutuações do FSH.8 O EFORT é outro teste que visa avaliar reserva ovariana, com base no incremento do E2 e da inibina B, 24 h após a administração de FSH. Em 85 mulheres menstru­ ando regularmente, de 18 a 39 anos, correlacionou-se melhor com a resposta à indu­ ção de ovulação e foi mais reprodutível que valores basais de FSH ou que o teste da clomifene realizados em 1 a 4 ciclos seguidos.16 Outra arma diagnóstica com utilização e interesse crescente é a dosagem do hor­ mônio antimuleriano (AMH), produzido pelo desenvolvimento dos folículos antrais. Acredita-se ser um excelente medidor da reserva ovariana e poderia predizer a idade da menopausa, entretanto, mais estudos ainda são necessários. Sua vantagem é poder ser dosado em qualquer fase do ciclo mentrual.1

D

Cariótipo

Quando a falência ovariana se apresenta com amenorreia primária, em 50% dos casos está associada a alterações no cariótipo. Por outro lado, naquelas com amenorreia secundária, a maioria apresenta cariótipo normal. Anormalidades no cromossomo X frequentemente estão associadas a formas familiares de FOP. A região X q l3 a Xq26, com exceção do Xq22, do braço longo do cromossomo X é fundamental para o desen­ volvimento e a função dos ovários. Translocação, deleção, inversão e duplicação nessa região têm sido associadas à FOP.6

D

Estudo genético

O estudo é obrigatório naquelas pacientes com história familiar de FOP, a fim de afas­ tar a síndrome do X frágil, principalmente se houver associação com retardo mental. Cerca de 14% das mulheres com história familiar de FOP têm pré-mutação no gene FMR1, comparado com 2% das mulheres portadoras da forma esporádica de FOP. O gene FMR1 é o responsável pela síndrome do X frágil, uma repetição tripla ligada ao X. Mulheres com pré-mutação no gene FMR1 têm risco aumentado de darem à luz crianças com retardo mental, 5% a 10% delas engravidam após remissão espontânea da função ovariana. Nessas pacientes, é fundamental o aconselhamento genético.

O

Imagem

O ultrassom pélvico ou transvaginal é um método não invasivo que pode trazer sub­ sídios ao diagnóstico. Os ovários podem apresentar-se pequenos e em fita, com dimi­ nuição do volume uterino na amenorreia primária. Na amenorreia secundária com cariótipo normal, o ultrassom pélvico ou transvaginal demonstra, em 50% dos casos, folículos ovarianos que funcionam intermitentemente. Da mesma forma do que se observa em relação à variação do FSH, seguindo 65 mulheres com FOP por meio de ultrassom transvaginal semanal por 4 meses, Nelson observou que 40% desenvolveram folículos antrais ao ultrassom.17 Após amenorreia estabelecida, foram descritos folículos ao ultrassom até 6 anos depois, e gravidez ocor­ reu até 16 anos após o diagnóstico de FOP.

Capítulo 25

Falência ovariana precoce

371

Nas mulheres com a chamada baixa reserva ovariana, apesar de 40% demonstrarem atividade folicular espontânea, há uma correlação pobre entre diâmetro folicular visua­ lizado ao ultrassom e níveis de E2 plasmático,17 mostrando que os folículos não devem estar “saudáveis”. Com o advento das técnicas de fertilização in vitro, pôde-se constatar que muitos dos folículos induzidos nessas pacientes apresentavam-se “vazios”, isto é, ausência de oócitos ou oócitos de má qualidade, não se obtendo fertilização. Recentemente foi descrito que o volume ovariano ao ultrassom transvaginal pode, por si só, ao longo das décadas, refletir o número de folículos ovarianos remanescentes e determinar a reserva ovariana.8

Biópsia de ovário A biópsia de ovário para diagnóstico de ooforite ou para determinação das formas foliculares ou não foliculares de FOP não tem sido prática habitual. Gravidez tem ocorrido apesar de a biópsia constatar falta de folículos. Entretanto, gonadectomia está indicada para prevenção de gonadoblatoma naqueles pacientes que o cariótipo demonstrar fragmentos ou o cromossomo Y.18 Foram observadas alterações como infiltrado linfocítico na ooforite autoimune, folículos escassos na amenorreia secundária e praticamente ausência de folículos na amenorreia primária. Estudos mostrando ampla variação no número e na distribuição de folículos ovaria­ nos no mesmo ovário e na mesma paciente demonstraram que a avaliação da reserva ovariana por meio da biópsia de ovário é difícil e inacurada. Lambalk19 utilizou ovários de pacientes em idade reprodutiva, removidos em cirurgias por patologias não ovarianas, para contar o número e o tipo de folículos em biópsias múltiplas e no ovário total. Os resultados mostraram que valores de folículos estimados por biópsias foram extre­ mamente variáveis devido à ampla variação na distribuição de folículos na superfície ovariana. Esse procedimento, portanto, não é recomendado atualmente para avaliar po­ tencial reprodutivo. Além disso, a biópsia ovariana, mesmo que por meio do ultrassom transvaginal, é um método invasivo que pode levar à formação de aderências. C O N S E Q U Ê N C IA S D A D E F IC IÊ N C IA E S T R O G Ê N IC A

A expectativa média de vida nas mulheres com FOP tem sido 2 anos menos quando comparadas com aquelas que atingem a menopausa ao redor dos 55 anos de idade, e vários estudos têm mostrado aumento da mortalidade em portadoras de FOP. As mulheres não tratadas têm risco aumentado de desenvolver osteoporose, doenças cardiovasculares (DCVs), demência, declínio da cognição e doença de Parkinson.1,20 TR A TA M EN TO

Apesar da heterogeneidade de causas que acarretam a falência ovariana prematura, os objetivos fundamentais do tratamento são os mesmos: a terapia de reposição hormo­ nal (TRH) e a gravidez na mulher jovem. Os conceitos de tratamento envolvem restauração, preservação e substituição da fun­ ção ovariana. Até o momento, não existe tratamento efetivo que normalize a função ovariana. A preservação da função usando criopreservação e auto ou xenotransplante

372

Endocrinologia Feminina e Andrologia

podem vir a ser possíveis em um futuro próximo. Também o desenvolvimento das pes­ quisas referentes aos receptores estrogênicos pode mudar os antigos conceitos da TRH.

Q Terapia de reposição hormonal O principal objetivo da reposição hormonal nas pacientes portadoras de FOP referese ao alívio dos sintomas provenientes da deficiência estrogênica, à manutenção da massa óssea e à minimização do risco de eventos cardiovasculares. Nas adolescentes, a TRH pode ser útil na indução dos caracteres sexuais secundários. Até o presente, são poucas as evidências conclusivas quanto ao melhor método de reposição, que inclui os anticoncepcionais orais (ACO) ou a TRH pós-menopausa clássica.1 Mulheres com FOP, a princípio, requerem doses maiores de estrógeno do que as menopausadas fisiológicas ao redor dos 50 anos de idade, entretanto, naquelas em idade puberal, as quais ainda não completaram a maturação óssea, as doses devem ser menores e progressivas. Os esquemas incluem estrógeno equino conjugado (EEC), nas doses de 0,15 mg a 0,3 mg, ou etinilestradiol, na dose de 100 ng/kg de peso/dia inicialmente. Adesivos de estradiol com 25 pg cortados pela metade também podem ser utilizados na terapia inicial com baixas doses. As doses podem ser aumentadas com auxílio da monitorização da idade óssea, bem como da progressão puberal. Caso ocorra perda sanguínea, deve-se associar progesterona para proteção endometrial, como acetato de medroxiprogesterona 12 dias por mês, na dose de 5 mg/dia, noretisterona, na dose de 0,7 mg/dia, por 12 dias, gestodene, 75 pg/dia ou progesterona natural, na dose de 50 mg/dia, 12 dias por mês.21 Durante a fase reprodutiva, o objetivo é que a mulher atinja níveis de estradiol séricos compatíveis com a fase folicular do ciclo menstrual (300 a 400pg/mL), podendo ser usado 100 pg de estradiol transdérmico/dia ou doses equivalentes por via oral na ausência de hepatopatia severa.1,12Nas mulheres não histerectomizadas, deve-se asso­ ciar a progesterona, de preferência a progesterona micronizada, na dose de 200 mg/dia durante 12 dias por mês. Existem várias apresentações que contemplam essa associa­ ção usadas na pós-menopausa que podem ser utilizadas. Deve-se, porém, ajustar a dose de acordo com a faixa etária. Gravidez pode ocorrer na mulher com FOP que faz uso da TRH e deve ser descon­ tinuada, uma vez confirmada a gestação. A FOP não tem consequências quando a mulher já completou sua vida reprodu­ tiva, comparada àquelas que desejam engravidar. Se elevados níveis de FSH indicam depleção de folículos primordiais, mulheres com FOP deveriam ser estéreis. Entre­ tanto, existem relatos de gestações em mulheres afetadas que ocorreram durante a estrogenoterapia, levando à hipótese de que o estrógeno pode ter efeito saudável na foliculogênese e na concepção. Aumento da ligação dos receptores de FSH após admi­ nistração exógena de estrógeno também tem sido demonstrado em ratas. Outros estudos têm associado corticosteroides ao estrógeno para promover ovu­ lação induzida por hMG. Em estudo recente, o corticoide não influenciou a resposta ovariana a go nado tro finas.22 Diversos são os esquemas possíveis para TRH, e seus prós e contras devem ser ab­ solutamente individualizados, quanto a dose, tipo de estrógeno, via de administração e associação com progestógenos. A reposição androgênica também deve ser considerada naquelas mulheres que referem fadiga persistente, perda ou diminuição da libido, além da reposição de estrógenos.

Capítulo 25



Falência ovariana precoce

373

Terapia não hormonal

A utilização de bisfosfonados orais também tem sido proposta na prevenção da osteoporose, sem, entretanto, atuar na sintomatologia decorrente do hipoestrogenismo. Ingesta diária de 1.200 mg de cálcio elementar e manutenção de níveis séricos de vitamina D3 de, no mínimo, 30 ng/mL (75 nmol/L) estão igualmente indicados na preservação da massa óssea.22

D Restauração da função ovariana O tratamento para restaurar a função ovariana na FOP envolve 3 hipóteses. A pri­ meira seria a supressão dos elevados níveis de gonadotrofinas, melhorando a res­ posta ovariana às gonadotrofinas endógenas ou exógenas; a segunda seria um efeito rebote, após a supressão das gonadotrofinas, aumentando a possibilidade de ovu­ lação expontânea ou induzida; e a terceira seria a imunossupressão, aumentando a responsividade às gonadotrofinas endógenas ou exógenas. Esse conceito terapêutico baseia-se na etiologia autoimune da FOP. Uma das mais importantes questões é se os poucos oócitos remanescentes nos ovários da mulher com FOP são de qualidade e, uma vez atingido o crescimento folicular in vivo ou in vitro, manteriam sua capa­ cidade reprodutiva.23

D Preservação da função ovariana A preservação do potencial reprodutivo começa a ser oferecida para as pacientes com elevado risco de desenvolver FOP, como as que vão receber QT ou radioterapia e as com história familiar de FOP, por meio da criopreservação, da maturação ovarina in vitro, do auto ou do xenotransplante.



Doação de oócitos

A doação de oócitos é uma opção viável para engravidar usando transferência intratubária de gametas (GIFT), intrauterina ou transferência tubaria, que tem sido descrita como melhor que fertilização in vitro. A taxa de gravidez na transferência tubária tem sido de 40% a 50% enquanto a intrauterina, de 20% a 30%. Novos métodos de concep­ ção assistida, como canulação tubária com histeroscópio ou ultrasonografia, podem evitar a necessidade de laparoscopia e anestesia.23 A chance de concepção espontânea na mulher cariotipicamente normal com FOP é aproximadamente 5% a 15%, portanto, naquelas que não desejam conceber, deve ser utilizada anticoncepção oral em baixas doses.1,2



Apoio psicológico

A paciente jovem, portadora de FOP, necessita ser muito bem-orientada quanto à na­ tureza e ao prognóstico da patologia. A grande maioria delas deverá receber TRH por longo período, fato que dificulta a aderência, além da fertilidade que, muitas vezes, está comprometida de forma irreversível. Em resumo, a mulher jovem portadora de FOP necessita identificar a causa básica da patologia, receber reposição adequada de estrógeno e progesterona e ser introduzida em um programa de fertilização assistida.1

374

Endocrinologia Feminina e Andrologia

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Riscos e benefícios da terapia hormonal da menopausa L e n o r a M a r ia C a m a r a t e S il v e ir a M a r t in s L e ã o D é b o r a V ie ir a S o a r e s

IN T R O D U Ç Ã O

Embora a menopausa seja um evento conhecido desde a antiguidade, somente no século XX, com o aumento da expectativa de vida da mulher, o isolamento dos esteroides ovarianos e a aprovação da comercialização de estrógenos equinos conjugados (EEC) pelo Food and Drug Administration (FDA), em 1942, a terapia de reposição do estrógeno tornou-se justificável e possível.1 Ao controlar os sintomas climatéricos, o tratamento trouxe significativo benefício para a qualidade de vida da mulher, tornando-se popular na década de 1960 devido aos investimentos maciços em propaganda e pesquisa e, particularmente, após a publicação do livro Feminine Forever, no qual a menopausa foi abordada como uma doença tratável pela reposição estrogênica. Na segunda metade dos anos 1970,2 publicações relevantes associaram o uso de es­ trógenos isolados ao aumento da incidência de câncer de endométrio, alertando para os riscos desse tratamento.2,3 Esse risco foi, porém, rapidamente abolido pela adição de progestógenos à terapia estrogênica nas mulheres com útero.4 Na mesma época outro grande benefício do tratamento foi reconhecido em conferência de consenso do National Institutes o f Health (NIH), realizada em 1984, ao estabelecer-se que a repo­ sição de estrógenos era o tratamento mais efetivo para prevenir a perda óssea após a menopausa.5 Além dos benefícios sobre sintomas vasomotores, urogenitais e densidade mineral óssea (DMO), nos anos 90, muitos estudos observacionais e epidemiológicos começa­ ram a demonstrar risco cardiovascular relativo significativamente mais baixo em usuá­ rias de terapia hormonal da menopausa (TH) quando comparadas às não usuárias.6,7 Estudos clínicos comprovaram alterações favoráveis no perfil metabólico de mulheres submetidas à estrogenioterapia,8 sugerindo-se que a TH poderia ser utilizada para a prevenção de doenças crônicas, como a aterosclerose, doença coronariana e acidente vascular cerebral (AVC). Essas evidências, associadas à observação de baixo risco abso­ luto para câncer de mama em usuárias da terapia, incentivaram muito o uso da TH. Entretanto, a publicação de grandes estudos multicêntricos, randomizados, placebocontrolados, particularmente o Women's Health Initiative Investigators (WHI),9 di­ vulgado a partir de 2002, desencadeou grande controvérsia sobre a TH, reduzindo drasticamente sua utilização. Em conjunto, a análise inicial destes estudos não de­ monstrou qualquer benefício significativo da terapia estrogênica ou estro-progestagênica na prevenção primária ou secundária de eventos cardiovasculares.9,10 Ao contrário

376

Endocrinologia Feminina e Andrologia

do esperado, com base nos grandes estudos observacionais, no WHI verificou-se um aumento do risco para fenômenos tromboembólicos, AVC e câncer de mama nas mu­ lheres que utilizaram estrógeno associado ao progestógeno e aumento de trombo­ se e AVC naquelas que utilizaram o estrógeno isoladamente. Algumas características metodológicas deste estudo, como a idade avançada da amostra estudada e a avaliação de um esquema terapêutico fixo, impediram a generalização das conclusões, motivando reanálises mais detalhadas daqueles resultados e outros estudos controlados. A luz de novos conhecimentos, diversas sociedades têm emitido frequentes posicionamentos com o objetivo de atualizar a compreensão dos riscos e benefícios da TH no tratamen­ to de sintomas relacionados à menopausa e na prevenção de doenças, considerando as especificidades relacionadas aos fatores genéticos, à idade, ao tempo decorrido desde a menopausa, às diferentes formulações, doses e esquemas terapêuticos hoje disponíveis. R IS C O S E B E N E F ÍC IO S D A T E R A P I A H O R M O N A L D A M E N O P A U S A

D

Sintomas vasomotores

O controle dos sintomas vasomotores permanece como o principal benefício e indica­ ção para a TH. Durante a transição menopáusica, a instabilidade vasomotora afeta de 60% a 80% das mulheres, potencialmente aumentando a irritabilidade, dificultando a concentração e o sono, com prejuízos significativos na qualidade de vida.11 Em uma revisão publicada pelo Instituto Cochrane, calcula-se que a estrogenioterapia isola­ da ou associada ao progestógeno reduz em 75% a frequência e em 87% a intensidade dos sintomas vasomotores.12Estudos mais recentes indicam que a utilização de doses baixas pode ser efetiva.13 Até o momento, a reposição de estrógeno, em todas as suas apresentações sistêmicas, é a única opção terapêutica aprovada pelo FDA para ate­ nuação de sintomas vasomotores.14 O uso de progestógeno isolado reduz sintomas vasomotores de forma menos efetiva.12’15



Sintomas urinários

Meta-análises de estudos controlados com placebo e as revisões do Instituto Cochrane indicam que a terapia sistêmica com doses-padrão de estrógeno, melhora significati­ vamente os sintomas decorrentes da bexiga hiperativa (polaciúria, nictúria, disúria, urgência urinária) e que este benefício é ainda maior com o uso de estrógenos por via vaginal.16,17Adicionalmente, segundo análise de 9 estudos apropriados envolvendo 3.345 mulheres após a menopausa, a via de administração vaginal apresenta também importante benefício no controle das infecções recorrentes do trato urinário, defini­ das pela confirmação de 3 infecções/ano ou 2 infecções/6 meses.18 Uma recente revisão do WHI sugeriu que a terapia com estrógenos por via oral, independentemente da coadministração de progestógeno, eleva o risco para litíase renal.19

O Sintomas genitais O estrógeno é o tratamento mais efetivo para a reversão dos sintomas moderados e severos de atrofia vulvar e vaginal, que incluem a secura vaginal, prurido vulvar, leucorreia e dispareunia. Algumas formulações sistêmicas com baixas doses podem não controlar adequadamente os sintomas da vaginite atrófica, sendo necessária a adição de estrógenos tópicos os quais, como consenso, apresentam maior benefício sobre crescimento e maturação celular, pH e vascularização da parede vaginal.20 Doses tão

Capítulo 26 Riscos e benefícios da terapia hormonal da menopausa 377

baixas quanto 10 pg/dia de creme ou 10 a 25 pg/dia na forma de tabletes têm sido consideradas efetivas21'23 para o tratamento dos sintomas locais, com absorção sistê­ mica pequena, observada principalmente no início do tratamento e em vaginas muito atróficas.24Tomando-se por base as atuais evidências, a opção por estrogenioterapia vaginal isolada em doses baixas dispensaria o uso de progestógenos e a monitorização do endométrio. Contudo, faltam estudos de longa duração que suportem esta condu­ ta a longo prazo.25 Dessa forma, qualquer episódio de sangramento genital durante o tratamento com estrógeno tópico deve ser imediatamente investigado.

Q Função sexual Mesmo que em doses muito baixas, tanto a estrogenioterapia sistêmica quanto a tópica melhoram significativamente a dispareunia, apresentando efeito benéfi­ co na função sexual de mulheres com atrofia urogenital relacionada à deficiência estrogênica.26,27 Existem, entretanto, poucas evidências de que a TH tenha influência na função sexual de mulheres sem sintomas urogenitais ou naquelas com desordem hipoativa do desejo sexual, a qual parece ser influenciada por fatores psicológicos, emocionais e pelos androgênios. Contudo, em respeito ao estabelecido em consenso, a adequada estrogenização deve sempre preceder a indicação da administração de testosterona em mulheres com suspeita clínica e laboratorial de insuficiência androgênica.28

D Sistema cardiovascular Doença coronariana Observações de que a doença cardiovascular (DCV) aumentava exponencialmente com a idade após a menopausa e de que usuárias da terapêutica de reposição estrogênica apresentavam redução de 35% nos eventos cardiovasculares,29 associadas às evidências científicas de que o estrógeno endógeno apresentava efeitos protetores tanto em fato­ res circulatórios quanto diretamente na parede de vasos30,31 sugeriram fortemente que o risco cardiovascular poderia ser reduzido com a TH, mas, conforme mencionado an­ teriormente, os resultados do WHI não favoreceram essa hipótese. Ainda não está cla­ ro, entretanto, se os resultados deste grande estudo controlado que avaliou os efeitos cardiovasculares dos EEC (0,625 mg/dia) associados ou não à medroxiprogesterona (MP) na dose de 2,5 mg/dia podem ser extrapolados para outras doses, formulações e esquemas terapêuticos e, principalmente, se os benefícios cardiovasculares poderiam ter sido observados se as componentes da amostra estudada, ao início do tratamento, fossem mais jovens ou tivessem menor tempo decorrido desde a menopausa. Essa hipótese do “tempo” ou “janela de oportunidade” tem sido sugerida por gran­ des estudos observacionais, experimentais e muitos outros clínicos controlados. Em um exame recente do Nurses* Health Study, que acompanhou 29.380 mulheres du­ rante 28 anos, os autores concluíram que mulheres jovens submetidas à ooforectomia bilateral apresentavam, durante sua vida, aumento significativo do risco para DCV e AVC quando comparadas às não ooforectomizadas, mas que este risco era atenuado naquelas tratadas precocemente com estrógeno.32 Estes achados clínicos corroboram os estudos experimentais de Clarkson eta l.33 nos quais, repetidamente observa-se que, somente quando iniciada precocemente, a TH retarda a progressão do processo aterosclerótico em macacas submetidas à castração cirúrgica.

378

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Em uma meta-análise de 19 estudos randomizados envolvendo 16 mil mulheres na menopausa com idade média de 55 anos, também foi observada correlação en­ tre o benefício cardiovascular e a instituição precoce da terapia.34 Paralelamente, o exame de subgrupos do WHI compostos por mulheres com faixa etária mais baixa/ menor tempo de hipoestrogenismo tem indicado que os efeitos da TH na DCV va­ riam em função da época da instituição do tratamento, observando-se redução do risco de eventos cardíacos nas mulheres que iniciam a TH antes de completados 10 anos em menopausa.35 Nestas reanálises do WHI foram observados menores escores de cálcio em artérias coronarianas de mulheres que iniciaram EEC por via oral em torno dos 50 anos de idade e, em concordância, menor número de revascularizações, eventos cardiovasculares e morte por infarto agudo do miocárdio antes dos 60 anos neste subgrupo.36 Considerando-se estas evidências e a importância de investimentos na prevenção primária da DCV, que é responsável por aproximadamente 40% das mortes após a menopausa, representando mortalidade quase 10 vezes maior do que a observada em decorrência do câncer de mama37 2 grandes estudos prospectivos e randomizados, o Kronos Early Estrogen Prevention Study (KEEPS) e o Early VS Late Intervention Trial with Estradiol (ELITE) estão sendo desenvolvidos. Estes estudos testam a hipótese de que, se iniciada logo após a menopausa, a TH reduz a progressão da aterosclerose minimi­ zando o risco de DCV. Ambos estão avaliando (através do espessamento da íntima/ média de carótidas e acúmulo de cálcio em artérias coronarianas) os efeitos da TH oral e transdérmica na progressão da aterosclerose em mulheres recrutadas na perimenopausa. Além da influência do tempo, foi também sugerido a partir do WHI que o risco car­ diovascular basal da paciente pode modular sua resposta à TH.38 Assim, um subgru­ po de mulheres daquele estudo com PCR reduzida e perfil lipídico favorável (relação LDL/HDL colesterol 110 mg/dL

FIGURA 34.2 Distribuição das prevalências de fatores de risco para DCV, por faixa etária,

2oinquérito. Iniciativa CARMENT. Distrito Leste, Goiânia (GO), 2004.

Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 483

O tabagismo é a principal causa de morte evitável e de doenças em países em de­ senvolvimento. A nicotina é considerada o componente primário do tabaco que esta­ belece e mantém a dependência, apesar das consequências prejudiciais.27 Apesar de os efeitos do tabaco em relação à saúde e de a capacidade viciante da nicotina serem bem conhecidos, somente nos Estados Unidos, mais de 4.500 adolescentes iniciam o hábito de fumar todos os dias.28 Aproximadamente um terço da população mundial é consti­ tuído por fumantes, e a maioria iniciou o hábito de fumar durante a adolescência.29,30 E importante lembrar que o tabagismo passivo também aumenta o risco CV. A Síndrome Metabólica (SM), que atinge atualmente um terço da população america­ na e cuja incidência aumenta com a idade, é a associação de diversos fatores de risco para aterosclerose (DM, intolerância à glicose ou hiperglicemia de jejum, obesidade central, dislipidemia e hipertensão arterial), que ocorre cada vez mais cedo na vida e persiste na idade adulta. Diversos estudos têm apontado para um risco aumentado de SM quando há níveis baixos de globulina ligadora de hormônios sexuais (SHBG), tanto no homem quanto na mulher,31 especialmente em situações onde a SHBG se eleva fisiologicamente, como na idade avançada. A SHBG baixa favorece níveis mais elevados de andrógenos nas mulheres e níveis totais de testosterona menores nos homens. Os valores de SHBG sofrem influências ambientais, porém, também são geneticamente determinados. Foi demonstrado recentemente que a presença do polimorfismo rs6257 do gen da SHBG determina menores níveis plasmáticos desta proteína e que homens e mulheres por­ tadores deste polimorfismo tiveram maior percentual e chance de desenvolver DM2, mesmo após ajuste para o índice de massa corporal (IMC) e a cintura.32 Embora possa haver influência genética, o aumento da prevalência mundial de obesi­ dade é o fator ambiental determinante do incremento atual na incidência de SM, sendo a RI o denominador fisiopatogênico comum que antecede as alterações citadas. Cada meia-unidade a mais no IMC aumenta significativamente o risco de SM em indivídu­ os com sobrepeso/obesidade. A hiperglicemia e a HA agravam a disfunção endotelial, mas considerando-se a SM como entidade única, podemos supor que mecanismos re­ lacionados intrinsecamente à pato gênese da RI estejam envolvidos no dano endotelial e microvascular nesses indivíduos. O desenvolvimento da aterosclerose é regulado por mecanismos inflamatórios, e a RI interfere nesta cascata. Portadores de SM têm maior risco para desenvolver DM2 e DCV e maior probabilidade de ter taxas de mortalidade CV e global aumentadas, independentemente de alterações na tolerância à glicose. O estudo multicêntrico Interheart,33 que incluiu a população brasileira, demonstrou que dislipidemia, tabagismo, HA, diabetes, obesidade abdominal, fatores psicossociais, bai­ xo consumo de frutas e vegetais, álcool e sedentarismo são responsáveis por mais de 90% dos casos de IAM em ambos os sexos, em todas as regiões estudadas. Todos esses fatores de risco são modificáveis, e os autores sugerem medidas de prevenção baseadas em inter­ venções factíveis e semelhantes para todas as populações estudadas. O DM2, um dos componentes da SM, é uma síndrome de etiologia múltipla, carac­ terizada por hiperglicemia crônica com distúrbios no metabolismo de glicídios, lipí­ deos e proteínas decorrentes da incapacidade de a insulina de exercer adequadamente seus efeitos adiante da RI. Em longo prazo, há danos, disfunção e falência de vários órgãos, especialmente rins, olhos, nervos, coração e vasos. A causa mais frequente de mortalidade desses pacientes é a DCV. Como diagnóstico primário, é a 6 a causa mais frequente de internação, contribui significativamente (30% a 50%) para cardiopatia isquêmica, insuficiência cardíaca, AVC e HA. A DM2 representa 30% dos pacientes

484

Endocrinologia Feminina e Andrologia

internados em Unidades Coronarianas Intensivas, com dor precordial, 26% dos que ingressam em programas de diálise e é a principal causa de amputação de membros inferiores. A maioria dos pacientes diabéticos tem sobrepeso/obesidade e a perda de peso é parte essencial do tratamento. Um em cada 3 americanos adultos tem HA, definida como PA sistólica > 140 mmHg e/ou PA diastólica > 90 mmHg. Dentre os hipertensos americanos, 20% desconhecem essa condição, 71% usam medicação e apenas 48% têm seus níveis tensionais controla­ dos. Nos Estados Unidos, mais homens do que mulheres têm HA até os 45 anos; dos 45 aos 64 anos o percentual é equivalente e, após os 64 anos, as mulheres superam os homens. A hipertensão é 2 a 3 vezes mais comum em mulheres que usam contraceptivos orais, especialmente nas obesas e com mais idade.34 Na SM, na HA, na DM2 e na obesidade há um aumento de marcadores inflamató­ rios que caracteriza um estado de inflamação crônica subclínica. Há elevação plasmática da proteína C reativa (PCR), marcador de atividade inflamatória sistêmica - pa­ cientes com PCR elevado apresentam maior incidência de DCV. A ação inflamatória de moléculas envolvidas no rolamento (selectinas) e na adesão (ICAM-1 e VCAM-1) de leucócitos ao endotélio promove a entrada destes na parede do vaso, iniciando o processo aterogênico. O processo inflamatório responsável pelo surgimento e a ma­ nutenção da aterosclerose pode também causar a ruptura da placa aterosclerótica e precipitar complicações trombóticas agudas. Adipocinas, TNF-a, interleucina 6 (IL-6) e resistina são secretadas pelo tecido adiposo e têm grande potencial inflamatório. O TNF-a contribui para a RI e a disfunção endotelial, reduz a biodisponibilidade do NO e impede a vasodilatação endotélio-dependente em animais e humanos. A adiponectina tem efeito anti-inflamatório, protege a parede vascular, aumenta a produção de NO e inibe a ação do TNF-a. A hipoadiponectinemia está relacionada com a disfunção endotelial em indivíduos com intolerância à glicose, diabéticos, obesos e hipertensos. O estresse oxidativo está associado à RI em modelos experimentais e em humanos e pode influenciar na sua patogênese. As principais fontes formadoras de espécies re­ ativas de 0 2 no endotélio são as vias enzimáticas da NADPH oxidase e da NO sintase (eNOS) desacoplada. Nos vasos, o íon superóxido reage com o NO formando peroxinitrito, espécie reativa de nitrogênio altamente deletéria ao endotélio, relacionada à disfunção endotelial e ao desacoplamento da eNOS, que determina a produção adi­ cional de superóxido e a perpetuação da disfunção endotelial. A doença arterial obstrutiva periférica (DAOP), cuja prevalência ajustada à idade é de 12%, é a expressão dos efeitos da aterosclerose nas artérias dos membros inferiores, reconhecida também como marcador de aterosclerose em artérias coronárias e caró­ tidas. O sintoma mais frequente é a claudicação intermitente, avaliada pela distância de marcha. Nos portadores de DAOP, 5% a 10% desenvolvem isquemia crítica e neces­ sitam de amputação ou revascularização do membro acometido. A classificação de Fontaine estabelece 4 classes funcionais, em que as classes III e IV representam quadro clínico de isquemia crítica do membro. A fluxometria com Doppler pode ser feita à beira do leito, em regime ambulatorial, com equipamento portátil. O índice tornoze­ lo-braço (ITB) é calculado pelo quociente pressão sistólica maleolar e maior pressão braquial, e um resultado < 0,95 caracteriza a presença de DAOP. Três grandes regiões anatômicas são acometidas por aterosclerose nos membros inferiores: aorto-ilíaca, femoro-poplítea e troncos infrapatelares. O eco-Doppler identifica o grau de obstrução, avalia a parede e identifica a presença de calcificação e de circulação colateral.

Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 485

Quanto ao sedentarismo, vários estudos demonstraram que a atividade física vi­ gorosa, frequente e recente reduziu o risco de AVC em 14% a 18% em homens,35,36 enquanto em mulheres, os resultados foram discordantes, sendo descritas reduções de 20% a 40% ou redução alguma.37 A presença ou não de fatores de risco CV modificáveis aos 50 anos tem sido uti­ lizada para quantificar o risco futuro de doença e a expectativa de vida. Quando se comparou a ausência de qualquer fator de risco CV clássico aos 50 anos (HA, tabagis­ mo, colesterol maior que 240 mg/dl ou diabetes) com a presença de 2 destes fatores, verificou-se o risco de eventos CV por toda a vida (lifetime risk) de apenas 5,2% versus 68,9% em homens e 8,2% versus 50,2% em mulheres. Além disso, as pessoas saudáveis aos 50 anos tiveram expectativa de vida mais elevada - de 10 ou mais anos.38 RISC O C A R D IO V A S C U L A R : E S C A L A D E F R A M IN G H A M E D I R E T R I Z E S S H A P E

Diversos pesquisadores pelo mundo têm criado modelos de cálculos de risco de desen­ volvimento de doença isquêmica coronariana (DIC) nos últimos 20 anos. Nenhum deles ainda contempla toda a complexidade de interações entre os fatores de risco CV envolvi­ dos. Embora esses sejam conhecidos, também devem ser consideradas mudanças de ca­ racterísticas populacionais no decorrer dos anos. Atualmente, há maior envelhecimento da população e crescimento da prevalência de obesidade em caráter epidêmico nos Esta­ dos Unidos, sendo acompanhado pelo mundo, fato que não existia há 30 ou 40 anos.39



Escala de Framingham

A Escala de Risco de Framingham foi desenvolvida nos Estados Unidos, a partir de um estudo populacional na cidade de Framingham, Massachusetts, com recursos da National Heart Institute há mais de 50 anos.40 Foram recrutados cerca de 5 mil habi­ tantes de ambos os sexos, sem doença cardíaca conhecida, que foram acompanhados ao longo de vários anos com exames clínicos e laboratoriais, sendo gerada uma escala com uso de variáveis simples, frequentemente usadas na prática clínica diária. Este estudo prospectivo permitiu a estratificação do risco CV, bem como o cálculo da pro­ babilidade de ocorrer um evento coronariano após 10 anos. Esta escala ainda é muito utilizada apesar de apresentar limitações, como ausência de análise de outros fatores como fibrinogênio, efeito do exercício físico, obesidade ou proteína C reativa. Quanto ao sexo, até a menopausa, a Escala de Framingham superestima o risco CV para mulheres, uma vez que não considera o fator protetor CV exercido pelo estrógeno. As Tabelas 34.2 a 34.7 mostram os parâmetros para o cálculo de risco para 10 anos pela Escala de Framingham para homens e mulheres, respectivamente, baseado no artigo de Wilson et al. de 1998, publicado pela revista Circulation,41 em que várias tabelas são con­ sultadas com pontuações sobre idade, LDL-C, colesterol livre (COL) total, HDL-C, PA e presença de diabetes ou tabagismo. Seis passos deverão ser preenchidos. Deve-se optar por pontos do colesterol total ou LDL-C, não se podendo usar critérios diferentes nos 6 passos avaliados. Após o preenchimento dos passos, realiza-se o somatório de todos os campos preenchidos. O total encontrado é comparado com a tabela seguinte, que mostra diversas pontuações com LDL-C ou colesterol como referência e seus riscos individuais de desen­ volvimento de doença coronariana após 10 anos. A última tabela de cada grupo revela a média de risco de acordo com a faixa etária. Assim, ao dividirmos o percentual encontrado na Tabela 34.3 pelo da Tabela 34.4, calculamos a estimativa de risco relativo.

Cálculo da Escala de Framingham para estimativa de risco de doença coronariana após 10 anos em homens Valor

PASSO 1 Idade

3 0 -3 4

3 5 -3 9

4 0 -4 4

4 5 -4 9

5 0 -5 4

5 5 -5 9

6 0 -6 4

6 5 -6 9

7 0 -7 4

LDL pontos ou COL pontos

-1

0

1

2

3

4

5

6

7

PASSO 2 LDL-C (mg/dL)

190

LDL-C (mmol/L)

< 2 ,5 9

2 ,6 0 - 3 ,3 6

3,37-4,14

4 ,1 5 - 4 ,9 2

> 4 ,9 2

Pontos

-3

0

0

1

2

Colesterol (mg/dL)

< 160

1 6 0 -1 9 9

2 0 0 -2 3 9

2 4 0 -2 7 9

>280

Colesterol (mmol/L)

< 4 ,1 4

4 ,1 5 - 5 ,1 7

5,18-6,21

6 ,2 2 - 7 ,2 4

> 7 ,2 5

Pontos

-3

0

1

2

ou

3

'

PASSO 3 HDL-C (mg/dL)

< 35

3 5 -4 4

4 5 -4 9

5 0 -5 9

>60

HDL-C (mmol/L)

< 0 ,9 0

0 ,9 1 -1 ,1 6

1 ,1 7 -1 ,2 9

1 ,3 0 -1 ,5 5

> 1 ,5 6

LDL pontos

2

1

0

0

-1

ou ou Colesterol pontos C o n tin u a

486 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 34.2

Continuação da Tabela 34.2

PASSO 4 Pressão sistólica (mmHg)

Pressão diastólica -> < 80

120-129 130-139 140-159 > 160

PASSO 5 Diabetes mellitus

Sim

LDL-C ou colesterol pontos PASSO 6 Tabagismo

Sim

Não

LDL-C ou colesterol pontos

2

0

Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 487

< 120

488

Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 34.3 Determinação de risco de doença coronariana após 10 anos, de acordo com a pontuação da Escala de Framingham Risco de DIC LDL-C pontos

10 anos risco de DIC

COL pontos

10 anos risco DIC

< -3

1%

-2

2%

-1

2%

< -1

2%

0

3%

0

3%

1

4%

1

3%

2

4%

2

4%

3

6%

3

5%

4

7%

4

7%

5

9%

5

8%

6

11%

6

10%

7

14%

7

13%

8

18%

8

16%

9

22%

9

20%

10

27%

10

25%

11

33%

11

31%

12

40%

12

37%

13

47%

13

45%

>14

>56%

>14

>53%

COL = colesterol total; DIC= doença isquêmica coronariana.

Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 489

TABELA 34.4

Distribuição de risco médio por faixa etária em homens Risco comparativo

Idade (anos)

Média 10 anos risco de DIC

Média 10 anos risco de DIC rígido*

Média 10 anos baixo risco de DIC **

30-34

3%

1%

2%

35-39

5%

4%

3%

40-44

7%

4%

4%

45-49

11%

8%

4%

50-54

14%

10%

6%

55-59

16%

13%

7%

60-64

21%

20%

9%

65-69

25%

22%

11%

70-74

30%

25%

14%

COL= colesterol total; DIC= doença isquêmica coronariana. * Risco de DIC rígido exclui angina pectoris. ** Baixo risco é considerado para pessoa da mesma idade quando pressão arterial é ótima (PA 120x80mmHg), LDL-c = 100-129 mg/dl ou colesterol = 160-199 mg/dl, HDL-C = 45 mg/dl para homens, não fumante e não diabético.

Valor

PASSO 1 Idade

30-34

35-39

40-44

45-49

50-54

55-59

60-64

65-69

70-74

LDL pontos ou COL pontos

-9

-4

0

3

6

7

8

8

8

PASSO 2 LDL-C (mg/dL)

190

LDL-C (mmol/L)

,92

Pontos

-2

0

0

2

2

Colesterol (mg/dL)

< 160

160-199

200-239

240-279

>280

Colesterol (mmol/L)

7,25

Pontos

-2

0

1

1

3

ou

PASSO 3 HDL-C (mg/dL)

60

HDL-C (m m ol/L)

1,56

LDL pontos

5

1

0

ou Colesterol pontos

ou 0 C o n tin u o

490 Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 34.5 Cálculo da Escala de Framingham para estimativa de risco de doença coronariana após 10 anos para mulheres

Continuação da Tabela 34.5 PASSO 4

Diabetes mellitus LDL-C ou colesterol pontos

Tabagismo

Sim

LDL-C ou colesterol pontos

2

Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 491

PASSO 5

492

Endocrinologia Feminina e Andrologia

TABELA 34.6 Determinação de risco de doença coronariana após 10 anos, de acordo com a pontuação da Escala de Framingham nas mulheres RISCO DE DIC LDL-C pontos

10 anos risco de DIC

COL pontos

10 anos risco DIC

< -2

1%

< -2

1%

-1

2%

-1

2%

0

2%

0

2%

1

2%

1

2%

2

3%

2

3%

3

3%

3

3%

4

4%

4

4%

5

5%

5

4%

6

6%

6

5%

7

7%

7

6%

8

8%

8

7%

9

9%

9

8%

10

11%

10

10%

11

13%

11

11%

12

15%

12

13%

13

17%

13

15%

14

20%

14

18%

15

24%

15

20%

16

27%

16

24%

>17

>32%

>17

>27%

COL = colesterol to tal; DIC = doença isquêmica coronariana.

Iremos utilizar um exemplo prático: Paciente, sexo masculino, 60 anos, é diabéti­ co, tabagista há menos de 1 ano, com PA 140x85 mmhg, colesterol total 240 mg/dL, LDL-C 130 mg/dL e HDL-C 34 mg/dL. Como o paciente é do sexo masculino, usare­ mos a Tabela 34.2: • • • •

P asso P asso P asso Passo

1: idade 60 = 5 pontos 2: colesterol total 240 = 2 pontos 3: HDL-C 34 = 2 pontos 4: PA 140x85 = 2 pontos (deve-se considerar a pontuação mais elevada quando

os pontos das pressões sistólicas e diastólicas não coincidirem)

Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 493

TABELA 34.7

Distribuição de risco médio por faixa etária nas mulheres Risco comparativo

Idade (anos)

Média 10 anos risco de DIC

Média 10 anos risco de DIC rígido *

Média 10 anos baixo risco de DIC **

30-34

< 1%

< 1%

< 1%

35-39

< 1%

< 1%

1%

40-44

2%

1%

2%

45-49

5%

2%

3%

50-54

8%

3%

5%

55-59

12%

7%

7%

60-64

12%

8%

8%

65-69

13%

8%

8%

70-74

14%

11%

8%

*Risco de DIC rígido exclui angina pectoris. ** Baixo risco é considerado para pessoa da mesm a idade quando a pressão arterial é ótim a (PA = 120x80 mmHg), LDL-C = 100-129 mg/dL ou colesterol = 160-199 mg/dl, HDL-C = 55 mg/dL para m ulheres, não fum antes e não diabéticas. COL = colesterol total; DIC = doença isquêm ica coronariana.

• Passo 5: diabetes sim = 2 pontos • Passo 7: tabagismo sim = 2 pontos.

A pontuação total será 5 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2 = 15. Ao olhar a Tabela 34.3, encon­ tramos como risco individual (observe a coluna do colesterol, pois, foi este critério usado neste exemplo) > 53%. Para obter risco relativo, dividimos 53% por 21% (risco médio por idade, Tabela 34.4), dando o total de 2,52. Ao observarmos a Tabela 34.4, podemos notar que há presença de 2 colunas, em que é desconsiderada a presença de angina pectoris ou paciente apresenta baixo risco por possuir parâmetros clínicos e laboratoriais ótimos.

O Diretrizes SHAPE Screening for Heart Attack Prevention and Education (SHAPE) é uma força-tarefa composta por profissionais da área de saúde, voluntários, para criar métodos que ten­ tem diminuir o IAM no mundo.42 Em 2006, o grupo SHAPE publicou novas diretrizes para triagem de pessoas assintomáticas quanto ao risco de desenvolver DIC. Em resumo, este guia é preconizado para homens entre 45 e 75 anos e mulheres de 55 a 75 anos, assintomáticos do ponto de vista CV, para detectar e tratar aterosclerose subclínica. Medidas do escore de calcificação da artéria coronária (CACS), com visualização por tomografia computadorizada e aferição de espessura médio-intimal (EMI) ou placa de ateroma em carótida, detectada por ultras­ som, são capazes de mostrar evidências da presença e da extensão da aterosclerose. Assim,

494

Endocrinologia Feminina e Andrologia

a partir desses 2 exames podemos estratificar o risco CV em vários níveis, desde baixo até altíssimo risco. Quanto maior o risco, maior a vulnerabilidade da placa de ateroma, com possibilidade de fragmentação e consequente trombose e infarto. Atualmente, a Ame­ rican Heart Association e a The American College o f Cardiology incorporaram alguns métodos descritos no projeto SHAPE, elevando os níveis de recomendação para o uso de métodos de imagem não invasivos para estudo da aterosclerose subclínica.43’44 Dessa forma, reforça-se a importância das diretrizes SHAPE para estratificação de risco CV. A Figura 34.3 (na página 514) mostra o fluxograma para a triagem de pacientes assintomáticos para a classificação em diferentes categorias de risco CV. Espera-se ajudar os profissionais de saúde, a partir do uso da Escala de Framin­ gham e das diretrizes SHAPE, na prevenção primária da DCV na nossa população. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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Capítulo 34 Avaliação do risco cardiovascular no homem e na mulher 495

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Rep. 2 0 1 1 ; 1 3 :3 4 5 -5 2 .

DIRETRIZES SHAPE

EXCLUSÕES

Baixíssimo risco Homem > 45 Mulher > 55 anos Apresentando: COLESTEROL < 200mg/dL PA < 120x80 mmHg Sem d ia b e te s m e llitu s Sem história familiar DCV Sem Síndrome Metabólica Não tabagista

PASSO 2

PASSO 3

Alvo LDL

Teste Aterosclerose Score de cálcio (CACS) (TC de coronárias) ou EMI / placa em carótida (ultrassom)

Teste Negativo CACS = 0 EMI < 50 percentil

Sem fatores de risco

Baixo Risco

+ Fatores de risco _ k Colesterol alto, HAS, DM, — ^ Risco Moderado ~ tabagismo, história familiar e síndrome metabólica CACS < 100 e < 75 percentil EMI < 1mm e < 75 percentil e sem placa em carótida

< 130 mg/dL = 1mm ou 75 percentil -► ou < 50% placa estenótica -► Alto Risco em carótida

, individual

CACS > 100 e > 90 percentil ou CACS > =400 Altíssimo Risco -► -► >= 50% placa estenótica em carótida FIGURA 34.3 Fluxograma baseado e modificado a partir das diretrizes do First Screening for Heart Attack Prevention and Education - SHAPE. Devem

ser seguidos os passos de 1 a 3 para tomada de decisão. O passo 1 exclui pacientes que não precisem fazer os exames por serem considerados de bai­ xíssimo risco ou por idade avançada, que já pressupõe aterosclerose subclínica, sem necessidade de realizar exames de imagem confirmatórios*. Para os pacientes classificados em altíssimo risco, deve ser realizado o teste de isquemia miocárdica (ergometria). Com o resultado do teste positivo, será realizada angiografia seguida de acompanhamento de diretrizes preexistentes. Com teste negativo, mantém-se como alvo LDL de 70 mg/dL e novo teste individualizado. CACS: score de cálcio da artéria coronária; EMI: espessamento médio-intimal de artéria carótida; ITB: índice tornozelo braquial; PCR: proteína C reativa.

496 Endocrinologia Feminina e Andrologia

PASSO 1

Novo teste

Esteroides sexuais e câncer ginecológico A na

35

R o g ér io B onassi M a c h a d o C a ro lin a M archesin i de C am arg o

IN T R O D U Ç Ã O

Em 2008, mais de 6 milhões de casos de câncer na mulher foram diagnosticados em todo o mundo, sendo que 56% ocorreram em países em desenvolvimento.1 O câncer de mama, com 1,3 milhão, é a primeira neoplasia diagnosticada na mulher, seguida do carcinoma do colo uterino, do carcinoma endometrial e do câncer ovariano, com cifras atingindo 529, 287 e 225 mil novos casos ao ano, respectivamente.1 Embora a incidência e mortalidade do câncer do colo uterino, do endométrio e do ovário sejam elevadas, outros tumores genitais são raros. Os efeitos biológicos dos estrógenos, progestógenos e andrógenos podem ser identificados na neoplasia mamária e também em praticamente todos os tumores genitais. No entanto, a associação entre o ambiente hormonal e a neoplasia nem sempre é estabelecida: entre os tumores genitais, o carcinoma endometrial é o único com evidências comprovadas da participação hormonal. O tumor ovariano, por sua vez, tem relação intrigante com os esteroides sexuais, uma vez que a utilização de contraceptivos orais reduz sua incidência, o mesmo não ocorrendo com a terapia de reposição hormonal (TH) na pós-menopausa. O câncer do colo uterino, cujo apa­ recimento é intrinsecamente relacionado com o vírus do papiloma humano (HPV), tem pouca relação com os hormônios sexuais, embora se descrevam alterações no ciclo celular do vírus em resposta a estrógenos e progestógenos. Do mesmo modo, parece haver discreta relação entre os tumores da vagina, da vulva e os esteroides sexuais. A participação dos hormônios sexuais na gênese dos tumores ginecológicos é dis­ cutida há tempos. Hoje se reconhecem interações entre estrógenos, progesterona, progestógenos e andrógenos entre as diversas neoplasias genitais, em maior ou me­ nor grau, por meio de estudos que focalizam mecanismos moleculares de atuação, incluindo a expressão de oncogenes, que apontam para possíveis inter-relações, nem sempre confirmadas por estudos epidemiológicos. A maior parte dos estudos que aborda o assunto sob a ótica clínica provém de dados da utilização de contraceptivos orais combinados (COC) e da TH no climatério. Neste capítulo, serão abordados os principais aspectos referentes à interação entre os esteroides sexuais e os tumores malignos do trato genital e da mama feminina.

498

Endocrinologia Feminina e Andrologia

C Â N C E R D E C O LO U T E R I N O

O câncer do colo uterino tem incidência cerca de 2 vezes maior em países em desenvol­ vimento, quando comparado aos mais desenvolvidos.

IMPORTANTE C o m a p ro x im a d a m e n te 5 0 0 m il ca so s n o v o s p o r a n o n o m u n d o , o c â n c e r do c o lo do ú te ro é o 2 o tip o de c â n c e r g in e c o ló g ic o m a is c o m u m e n tre as m u lh e res, sen d o resp o n sáv el p elo ó b ito de, a p ro x im a d a m e n te , 2 3 0 m il m u lh e re s p o r a n o .

No Brasil, o risco estimado é de 19 casos para cada 100 mil mulheres, com pico de sua incidência entre 45 e 49 anos.2 O câncer de colo uterino é uma neoplasia cuja etiologia está intimamente ligada à infecção pelo HPV.3 Entretanto, nem todas as mulheres infectadas pelo HPV oncogênico desenvolvem o carcinoma cervical. Além disso, mesmo as pacientes que apresen­ tam a neoplasia, levam anos para desenvolvê-la, o que sugere a existência de cofatores associados à carcinogênese. Existem 2 mecanismos básicos que previnem a replicação de células geneticamente alteradas: a apoptose e a senescência celular. Em lesões intraepiteliais precursoras e no câncer do colo uterino, a expressão dos genes que contro­ lam esses mecanismos está aumentada e sofreu mutação.4 Não existem evidências de que o uso de contraceptivos orais aumente a taxa de infecção pelo vírus, porém seu uso aumenta o risco de desenvolver um câncer cervical proporcionalmente ao tempo de exposição ao uso de COC.57 O uso de contraceptivo oral parece seguro por menos de 5 anos; entre 5 e 9 anos, há aumento do risco relativo em 2,8 vezes, e o seu uso prolongado por 10 anos ou mais pode aumentar o risco de desenvolvimento do câncer cervical em até 4 vezes em pacientes portadoras do HPV.8,9 Estudos in vitro sugerem que tanto o estrógeno quanto a progesterona aumentam a expressão de alguns genes virais e estimulam a proliferação das células do epitélio cer­ vical, por meio de receptores hormonais, no próprio genoma virai integrado à célula humana.5 Estudos em ratos sugerem que o estrógeno induz o surgimento de carcino­ mas cervicais na presença de deleções do gene p53, que é responsável pelos mecanis­ mos de apoptose celular. Nesses ensaios, observa-se que, na presença dos oncogenes E6 e E7, encontrados nos HPV de alto risco, há diminuição do tempo de latência até o surgimento do carcinoma, e os tumores frequentemente têm tipos histológicos e comportamento mais agressivos.10 Desconsiderando os efeitos de iniciação e promoção da atividade carcinogênica, o uso do COC, oral ou não oral, pode induzir à prática sexual desprotegida, que consti­ tui um importante fator de risco para o desenvolvimento do câncer do colo do útero, por aumentar a exposição ao HPV e outras doenças sexualmente transmissíveis. Em uma população onde a maioria das mulheres referia atividade sexual sem uso de pre­ servativo, estudo comparando a presença das lesões precursoras do câncer do colo uterino e o uso de contraceptivos hormonais demonstra esse sinergismo. Mesmo na vigência da contracepção injetável à base de progestógeno (acetato de medroxiprogesterona - AMP), houve aumento do risco do surgimento do câncer de colo uterino.11 Estudos que ajustaram suas amostras para fatores que poderiam influenciar no sur­ gimento do câncer do colo uterino, como o tabagismo, número de parceiros sexuais

Capítulo 35 Esteroides sexuais e câncer ginecológico 499

e atividade sexual desprotegida, também evidenciaram risco relativo crescente com o tempo de exposição ao contraceptivo hormonal.12 Apesar das evidências, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que o número de casos de câncer de colo uterino associado ao uso do contraceptivo hor­ monal é aparentemente pequeno e, por isso, não recomenda a suspensão dessa medi­ cação na vigência de infecção pelo HPV. Considera também que a maioria dos casos de câncer cervical pode ser evitada por meio de exames de screening, como a citologia cervicovaginal.9 Quanto à TH no climatério, não existem evidências da interação entre os hormô­ nios utilizados e o câncer do colo uterino. C Â N C E R D E E N D O M É T R IO

O câncer de endométrio, também conhecido como câncer do corpo uterino, tem inci­ dência e taxas de mortalidade muito variáveis em todo o mundo. Considerando ape­ nas os tumores do trato genital feminino, o câncer de endométrio é o mais frequente em países desenvolvidos e o 2 o mais comum em países em desenvolvimento. Estima-se que seja a 7 a neoplasia maligna atuante no mundo, com aproximadamente 190 mil ca­ sos novos. Países desenvolvidos, como o Canadá, têm incidência média de 15 casos a cada 100 mil mulheres, acentuadamente aumentada após os 40 anos e com tendência a um declínio após os 75 anos. Existem 2 tipos distintos de câncer de endométrio. O tipo I é associado a ambiente predominantemente estrogênico e responde a tratamen­ to hormonal. Com tipo histológico favorável (endometrioide) e alta expressão dos re­ ceptores hormonais de estrógeno e progesterona, se desenvolve a partir de hiperplasia do endométrio. O tipo II não está associado à exposição estrogênica e origina-se de endométrio atrófico, habitualmente em mulheres mais idosas. Opostamente ao tipo I, tem pior prognóstico e não é influenciado pelo ambiente hormonal.13 O surgimento do câncer de endométrio tipo I é influenciado por fatores reprodu­ tivos e hormonais. Sendo evidência da influência hormonal nessa patologia, o adven­ to de certos medicamentos com ação sobre os moduladores seletivos do receptor do estrógeno (SERM), para tratamento do câncer de mama, tem aumentado o risco de desenvolver um carcinoma de endométrio. A obesidade também constitui fator que aumenta de 2 a 5 vezes o risco de neoplasia endometrial. Mulheres obesas tendem a au­ mentar seus níveis de estrógeno, fruto da conversão periférica no tecido adiposo. Além disso, essas pacientes habitualmente apresentam ciclos anovulatórios, diminuindo a produção endógena de progesterona e aumentando a secreção ovariana de andrógenos, os quais são perifericamente convertidos em estrógeno.13 Dessa forma, essas mu­ lheres são bombardeadas por estímulo estrogênico contínuo, sem a ação antagônica de progesterona em doses adequada. No passado, um aumento na prevalência do cân­ cer de endométrio foi observado com o uso de TH, sejam elas de reposição ou mesmo de contracepção, sem a ação antagonista da progesterona em doses adequadas. O estrógeno aumenta a atividade mitótica das células endometriais, enquanto a progesterona reduz essa atividade por meio da diminuição do número de receptores para estrógeno, da elevação da produção de metabólitos inativadores do estrógeno e de mecanismos de indução da diferenciação celular. Não existem evidências de que as doses usuais de estrogenos sejam carcinogênicas, mas sabe-se que o aumento da atividade mitótica induzida pelo estrógeno eleva a probabilidade de ocorrência de

500

Endocrinologia Feminina e Andrologia

mutações genéticas, provavelmente pela ativação de oncogenes e inativação de genes supressores de tumores.13 Mulheres usuárias de COC têm propensão a câncer de endométrio consistente­ mente diminuído.5'7 Esse risco é menor quanto mais longo for o período de uso do medicamento, e seu fator protetor pode durar até 15 anos após a interrupção do uso. Existem controvérsias se há diferença no grau de proteção com relação à dose do contraceptivo, mas aparentemente o resguardo é maior em mulheres que usam baixa dose de estrógeno e altas doses de progestógeno.5 Esse benefício provavelmente é resultado da ação antiproliferativa e atrófica sobre o endométrio. Com relação ao uso de tera­ pia de reposição ou TH no período climatérico ou pós-menopausa, o risco de câncer de endométrio é inversamente proporcional ao número de dias em que a mulher usa o progestógeno. Assim, pacientes em uso exclusivo de estrógeno ou utilização de es­ trógeno contínuo e progestógeno por menos de 10 dias durante o mês têm chance aumentada de desenvolver carcinoma de endométrio quando comparadas às que nun­ ca usaram TH. Estudos randomizados demonstram que a adição de progestógenos reduz o desenvolvimento de hiperplasia endometrial e a proliferação celular.5 C Â N C E R D E O V Á R IO

Nos países desenvolvidos, o câncer de ovário é a 6 a doença maligna mais frequente, correspondendo a 3% do total de casos de câncer. Sua incidência anual varia de 3 a 13 casos a cada 100 mil mulheres, dependendo do país em estudo: países desenvolvi­ dos têm quase o dobro da incidência dos países em desenvolvimento.1 Em pacientes acima de 45 anos, essa ocorrência aumenta para aproximadamente 40 casos a cada 100 mil mulheres. O câncer de ovário é a neoplasia ginecológica mais difícil de ser diagnosticada: cerca de 3/4 dos tumores malignos de ovário apresentam-se em estágio avançado (III ou IV) no momento do diagnóstico inicial.9 A maioria dos cânceres ovarianos acontece ao acaso, mas cerca de 10% possuem história familiar e mutação genética comprovada. Estudos biomoleculares têm de­ monstrado a presença de diversas alterações genéticas e epigenéticas de oncogenes e genes supressores de tumor, como o BRCA1 e o p53, em tecido neoplásico ovariano. Apesar disso, a história evolutiva desses tumores permanece incerta. Acredita-se que os tumores epiteliais do ovário sejam originários do epitélio superficial que o reco­ bre, mas não se sabe se um tumor benigno ou borderline poderia originar um tumor maligno.14 Enquanto a etiologia da maioria dos tumores ovarianos permanece incerta, a teo­ ria de uma possível correlação com estímulos estrogênicos é plausível. A maioria dos tumores de mama, endometriais e ovarianos expressa receptores do hormônio esti­ mulador das gonadotrofinas (GnRH) como parte de um mecanismo regulador e ini­ bidor da proliferação celular. Essa inibição acontece porque a ativação desse receptor diminui a transcrição de receptores de fator de crescimento e outros produtos de on­ cogenes, bem como a expressão de receptores de estrógeno. A ativação destes estimula a atividade mitótica do epitélio ovariano, da mesma maneira que ocorre na mama e no endométrio. Estudos utilizando agonistas do GnRH demonstram diminuição da expressão de receptores de estrógeno e consequentemente redução da atividade proliferativa celular. Opostamente, a exposição contínua das células tumorais ao estrógeno mostrou aumento na expressão de seus receptores.15

Capítulo 35 Esteroides sexuais e câncer ginecológico 501

Estudos preliminares eram controversos com relação à associação do uso de hor­ mônios e o surgimento do câncer de ovário. Porém os estudos que apontavam aumen­ to da incidência da neoplasia em mulheres usuárias de associações estrógeno-progestativas não apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre os grupos. Também não se conseguiu identificar diferenças entre os diversos progestógenos uti­ lizados. A comparação entre mulheres usuárias de terapia estrogênica pura, terapia hormonal sequencial e terapia combinada contínua mostrou elevação na incidência do carcinoma ovariano nas pacientes usuárias de estrógeno sem oposição progestogênica e com terapia sequencial.16 O uso de COC induz atividade apoptótica no tecido ovariano.5 Atualmente, é consenso que o risco de câncer de ovário é reduzido entre as usuárias de COC,5'7 e esse benefício é ampliado quanto maior for o tempo de uso da medicação, além de seus efeitos poderem persistir por até 20 anos após a interrupção do uso do medicamento. C Â N C ER D E V U LV A

O câncer de vulva é uma neoplasia rara. As taxas de incidência mais elevadas aproximam-se de 2 casos a cada 100 mil mulheres. No Brasil, esta incidência é em torno de 2,5 casos a cada 100 mil mulheres.2 O câncer de vulva apresenta 2 perfis muito distintos com relação aos seus fatores de risco. As neoplasias que ocorrem antes do 65 anos têm perfil semelhante aos tumores anogenitais, apresentando associação com comportamento sexual de risco, infecção pelo HPV e pelo HIV, baixo nível socioeconômico e tabagismo. Da mesma forma, o câncer de colo uterino apresenta lesões precursoras facilmente detectáveis e tratáveis, o que impediria a progressão para a doença invasiva. As mulheres que desenvolvem carcinoma de vulva após os 65 anos geralmente não têm história de tabagismo ou infecção pelo HPV. Na verda­ de, 15% ou menos dos tumores vulvares nessa faixa etária apresentam positividade para o DNA HPV.2 Um estudo caso-controle que vislumbrou pesquisar fatores etiológicos para esta neoplasia, independentemente da idade das pacientes, não encontrou associação com a idade de início da menopausa, paridade, antecedentes de abortamento ou uso de contraceptivos orais. Os únicos fatores que se destacaram na população com carcino­ ma escamoso de vulva foi a menarca antes dos 12 anos e o excesso de peso. Associando o fato de os tumores de vulva terem baixa expressão de receptores de estrógeno, considera-se que o câncer nessa região não está fortemente ligado ao uso de contraceptivos orais e TH.17 C Â N C E R D E V A G IN A

As neoplasias de vagina são extremamente raras. Sua incidência em todo o mundo raramente alcança 1 caso a cada 100 mil mulheres. Os maiores índices acontecem na Argentina e Colômbia com 1,5 e 1,2 caso a cada 100 mil mulheres, respectivamente. O câncer na vagina representa 1% a 2% de todos os tumores malignos e são mais fre­ quentes em pacientes idosas. A vagina também pode ser sede de metástases de outros tumores, por isso, acredita-se que esses dados possam estar superestimados.2 O câncer primário nesse local é raro, e o diagnóstico só pode ser admitido em pacientes com cérvice e vulva absolutamente sem lesões.

502

Endocrinologia Feminina e Andrologia

A maioria (90%) dos cânceres de vagina é composta por células escamosas e tem fatores de risco semelhantes aos dos demais cânceres anogenitais, como infecção pelo HPV, tabagismo, iniciação sexual precoce, elevado número de parceiros sexuais e baixo nível socioeconômico. O adenocarcinoma de células claras da vagina é ainda mais raro e acontece em mulheres mais jovens cuja mãe se expôs ao dietiletilbestrol (DES) antes da 12a semana de gestação.18 O DES é um derivado estrogênico sintético, que foi am­ plamente prescrito, nas décadas de 1950 e 1960, com a finalidade de diminuir as taxas de abortamento e toxemia gravídica. Esssa medicação não se mostrou efetiva para seus propósitos e ainda, 10 a 20 anos depois de seu uso, aumentou o risco de desenvolver o adenocarcinoma de vagina. Apesar de raramente ocorrer antes da puberdade, estimase o risco de 14 casos de neoplasia a cada 10 mil mulheres expostas ao DES.18 Outros fatores associados ao surgimento dessa neoplasia são inflamação crônica devido ao uso de pessários, antecedente de histerectomia prévia por patologia benig­ na, terapias de imunossupressão, radioterapia cervical, endometriose e infecções. Os agentes infecciosos considerados cofatores do câncer de vagina são o herpesvirus e, mais fortemente associado, o HPV. Não existem evidências importantes a respeito do uso de hormônios, como no caso de TH e contraceptivos, e o surgimento do carcino­ ma escamoso da vagina.19 ■

C Â N C ER D E M A M A

O carcinoma mamário é classicamente descrito como neoplasia estrógeno-dependente. Ao que parece, esse esteroide associa-se à promoção e progressão da neoplasia mamá­ ria, enquanto permanece controverso seu papel como iniciador do tumor.20 Do mesmo modo, o ambiente estrogênico endócrino parece ser importante apenas para mulheres com suscetibilidade genética, onde o metabolismo do estrógeno endógeno pode ser anormal e relacionado com expressão de múltiplos genes. Esse desbalanço parece ser o elemento que determina a excessiva formação de catecolestrógenos, que, reagindo com o DNA, iniciam uma série de eventos que levam ao câncer de mama.21,22 Os progestógenos, por sua vez, poderiam aumentar o efeito estrogênico sobre o teci­ do mamário. Estudos demonstram aumento da atividade mitótica mamária na presen­ ça da progesterona, bem como maior atividade dos marcadores de proliferação celular Ki-67 e antígeno nuclear de proliferação celular (PCNA), além de aumento da prolife­ ração na unidade dueto lobular terminal, na fase lútea.23 Além disso, os progestógenos determinam insulinorresistência e diminuição da globulina ligadora dos hormônios sexuais (SHBG), mecanismos indiretos relacionados. Considera-se também como efeito indireto o aumento na densidade mamária observado por diferentes progestógenos.23 O Women's Health Initiative (WHI) mostrou aumento no risco do câncer de mama para usuárias da associação estroprogestativa (RR = 1,26; IC 95% 1,10-1,59).24 Em con­ traste, a elevação do risco não foi observada com a estrogenioterapia isolada (RR =0,77; IC 95% 0,59-1,01).25 Surpreendentemente, a análise dos subgrupos desse estudo de­ monstrou diminuição significativa no risco do carcinoma ductal mamário (responsável por 70% dos cânceres de mama), com os estrogenos conjugados utilizados de forma iso­ lada (RR = 0,71; IC 95% 0,52-0,99).26 Embora não se possa excluir o risco observado em outros estudos com a própria estrogenioterapia isolada, o assunto permanece cercado de controvérsias. Contudo, os dados discrepantes apontam claramente para diferenças entre os compostos utilizados em TH quanto ao impacto sobre a neoplasia mamária.

Capítulo 35 Esteroides sexuais e câncer ginecológico 503

Seguindo essa linha de raciocínio, outros progestógenos necessitariam de in­ vestigação para se determinar o efeito individual de cada composto. Nesse senti­ do, os dados do estudo E3N, uma coorte francesa com início em 1990, apresen­ tou resultados referentes à avaliação de 80 mil mulheres.27 Durante o seguimento médio de 8,1 anos, foram diagnosticados 2.354 casos de câncer de mama. Das 80.377 mulheres estudadas, 70% usaram TH por tempo suficiente para avaliar o risco de câncer de mama à semelhança de outros estudos, como o WHI. Compara­ das às mulheres que nunca usaram TH, o risco relativo para o estrógeno isolado foi de 1,29 (IC 95% 1,02-1,65). As combinações estroprogestativas apresentaram resultados de risco bastante distintos, como mostrado na Tabela 35.1. Não hou­ ve aumento significativo no risco com estrógenos associados à didrogesterona e ao acetato de nomegestrol, utilizando-se estrogênios pela via oral. Em contraste, observou-se maior risco com os progestógenos sintéticos. A progesterona micronizada e a didrogesterona, ao se associarem aos estrógenos pela via transdérmica, também não apresentaram elevação do risco. Ressalte-se, no entanto, que não há diferenças significativas ao se compararem as vias de administração quanto ao risco de câncer de mama.

TABELA 35.1 estudo E3N27

Risco relativo de câncer de mama invasivo com TH -

Valor de p para diferenças entre as vias de administração

Estrógeno VO

Estrógeno via transdérm ica/ percutânea

Risco Relativo (intervalo de confiança 95%)

Risco Relativo (intervalo de confiança 95%)

1 ,3 2 (0 ,7 6 -2 ,2 9 )

1 ,2 8 (0 ,9 8 -1 ,6 9 )

0 ,9 3

P ro g e s te ro n a

C asos insuficientes

1 ,0 8 (0 ,8 9 -1 ,3 1 )



D id ro g e s te ro n a

0 ,7 7 (0 ,3 6 -1 ,6 2 )

1 ,1 8 (0 ,9 5 -1 ,4 8 )

0 ,2 7

M e d ro g e s to n a

2 ,7 4 ( 1 ,4 2 - 5 ,2 9 ) *

2 ,0 3 ( 1 ,3 9 - 2 ,9 7 ) *

0 ,4 3

A c e ta to de c lo r m a d in o n a

2 ,0 2 (1 ,0 0 -4 ,0 6 )

1 ,4 8 ( 1 ,0 5 - 2 ,0 9 ) *

0 ,4 3

A c e ta to de c ip r o te r o n a

2 ,5 7 ( 1 ,8 1 - 3 ,6 5 ) *

C asos insuficientes



P ro m e g e s to n a

1 ,6 2 (0 ,9 4 -2 ,8 2 )

1 ,5 2 ( 1 ,1 9 - 1 ,9 6 ) *

0 ,8 4

A c e ta to de n o m e g e s tro l

1 ,1 0 (0 ,5 5 -2 ,2 1 )

1 ,6 0 ( 1 ,2 8 - 2 ,0 1 ) *

0 ,3 0

A c e ta to de n o r e tis te r o n a

2 ,1 1 (1 ,5 6 - 2 ,8 6 ) *

C asos insuficientes



1 ,4 8 ( 1 ,0 2 - 2 ,1 6 ) *

C asos insuficientes



Tratamento

Estrógeno isolado Estrógeno combinado com:

A c e ta to de m e d ro x ip ro g e s te ro n a

VO: via oral. *Valores estatisticamente significativos.

504 Endocrinologia Feminina e Andrologia

A última avaliação do estudo E3N demonstrou que a estrogenioterapia combina­ da aos progestógenos, com exceção da didrogesterona e progesterona, promoveram aumento na incidência de tumores receptores de estrógeno positivos (ER+).28 Entre­ tanto, a análise dos subgrupos mostrou que, mesmo com as combinações contendo didrogesterona ou progesterona, houve aumento no risco do carcinoma lobular. Deve-se ressaltar que o estradiol associado à didrogesterona ou à progesterona não pro­ moveu elevação do risco de se ter carcinoma ductal mamário, cuja importância clínica é maior que o tumor lobular. Outros estudos corroboram os dados do E3N quanto ao menor risco observado com a didrogesterona em comparação a outros progestógenos.29,30 Dessa forma, a análise dos principais estudos aponta para o aumento da possibi­ lidade de se adquirir carcinoma mamário entre as mulheres que utilizam diferentes formas de TH no climatério. Contudo, deve-se considerar, do ponto de vista prático, a melhor forma de interpretação dos riscos e a exposição clara à mulher candidata a essa modalidade terapêutica. Nesse sentido, a análise do risco absoluto é fundamen­ tal. Além do fácil entendimento, o mesmo transporta-se ao mundo real. Pode-se exem­ plificar o risco absoluto da neoplasia mamária entre mulheres que utilizam a TH por meio da interpretação do risco relativo adequado à incidência real da doença. Nos Estados Unidos, a incidência do câncer de mama entre mulheres de 50 a 60 anos é de 2,8 novos casos a cada 100 mulheres ao ano (Figura 35.1). Caso o risco assumido for de 24% a mais, de acordo com o estudo WHI (RR = 1,24), o acréscimo seria de 0,7 novo caso, ou seja, o mesmo passaria para 3,5 a cada 100 mulheres (Figura 35.2). Assim, a abordagem precisa dos benefícios comprovados versus os riscos teóricos revela-se como elemento preponderante diante da prescrição racional da TH em pa­ cientes no climatério feminino.





Cada mulher de 50 anos tem aproximadamente 2,8% de chance de desenvolver câncer de mama aos 60 anos Risco absoluto de 2,8 por 100 mulheres

11K l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l

iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii 100 mulheres, 2,8 estão sob ríscõ”

*Fonte: American Câncer Society. Breast Câncer Facts and Figures 2001-2002. Disponível em: http://www.cancer.org/downloads/STT/BrCaFF2001 .pdf.

FIGURA 35.1 Risco absoluto de câncer de mama: população geral.

Capítulo 35 Esteroides sexuais e câncer ginecológico 505

• •

W H I: risco relativo de 1,24 (P < 0,001) após 5 anos de TH (24% de aumento no risco) Risco Absoluto (população geral): 3,5 por 100 usuárias

R isco d e C a d e m a m a a o s 6 0 a n o s a p ó s 5 a n o s d e u so d e TH (a ssu m in d o 2 4 % d e a u m e n to n o risco)

11] Llllllllllllllllllllll

iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii i í -í 'V \ iff

(< 1 mulher adicional sobre a incidência normal)

„; *

FIGURA 35.2 Risco absoluto de câncer de mama após uso da TH por 5 anos.

Resultados pouco conclusivos apontam para a relação entre os COC e o câncer de mama. Os benefícios e riscos de contraceptivos hormonais orais foram revistos pelo Working Group (WG), da International Agency for Research on Câncer (IARC), que concluiu haver um aumento do risco de carcinoma hep ato celular, de mama e do colo do útero em usuárias de COC.31 Por outro lado, um estudo prospectivo de base popu­ lacional, publicado mais recentemente, não encontrou uma correlação significativa entre o uso de qualquer contraceptivo e o risco para neoplasia (RR = 1,02; IC 95% 0,92-1,12), com exceção de associação positiva para câncer de reto (RR = 1,68; IC 95% 1,08-2,62) e de bexiga (RR = 1,74; IC 95% 0,86-3,51).32 Corroborando com esses resultados, publicou-se um estudo de base populacional com 1.587 mulheres que faleceram por câncer de mama nos Estados Unidos, para avaliar a interferência do COC no risco da mortalidade por essa neoplasia. Os autores não observaram relação entre uso de COC e taxa de sobrevida entre mulheres com cân­ cer mama invasivo. Eles observaram, pelo contrário, uma discreta redução das causas gerais de mortalidade entre as usuárias de mais de 10 anos de COC (RR = 0,67; IC 95% 0,47-0,96).33 Metanálise de estudos de caso-controle, publicada em 2006, encontrou relação entre o uso do COC e a elevação do risco para câncer de mama na pré-menopausa (RR = 1,19; IC 95% 1,09-1,29), especialmente quando o COC foi administrado antes de uma ges­ tação a termo (RR = 1,44; IC 95% 1,28-1,62), apesar de os autores ressaltarem diversos vieses dos estudos, como tempo de uso do COC e inadequado pareamento populacio­ nal.34 Para o caso de mulheres que possuíam história familiar para o câncer de mama, foi publicada metanálise em 2009. Resultados de 3 publicações35'37 sugerem aumento da associação entre contraceptivos orais e câncer de mama em mulheres com história

506

Endocrinologia Feminina e Andrologia

familiar positiva. Entretanto, essa relação era limitada àquelas que utilizaram COC an­ tes de 1975,36 época em que as formulações administradas eram totalmente diferentes das atuais, e às com história familiar positiva em parentes de segundo grau.35 Em contraste, há evidência de uma metanálise38 sugerindo que o uso de COC não modifica o risco de câncer de mama entre as pacientes com história familiar positiva. Da mesma forma, uma nova metanálise, conduzida em 2009, também não observou alteração da propensão para desenvolvimento desse tipo de câncer em usuárias de contraceptivos hormonais orais com história familiar positiva.39

IMPORTANTE P o d e-se c o n c lu ir q u e as ev id ên cias e p id e m io ló g ic a s d isp o n ív e is, b a sea d a s em e stu d o s o b s e r­ v a cio n a is, de c a s o -c o n tro le e c o o rte s, n ã o d e m o n s tro u a u m e n to do risco p a ra c â n c e r de m a m a em u su á ria s de c o n tra c e p ç ã o h o rm o n a l.

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Esteroides sexuais e câncer no homem C la u d io T eloken 1

IN T R O D U Ç Ã O

Os esteroides sexuais masculinos (ESM) são substâncias que determinam o perfil androgênico no ser humano, com impacto variável, de acordo com sua potência (Tabela 36.1).1Juntamente com a globulina ligadora dos hormônios sexuais (SHBG),2 exibem papel crítico no desenvolvimento masculino.3Entre eles, destacam-se: Androstenediona, Desidroepiandrosterona (DHEA), Di-hidrotestosterona (DHT) eTestosterona (T).4'6

TABELA 36.1 Distribuição dos principais esteroides masculinos, fontes produtoras e potência1 Identificação

Principal produtor

Produção diária mg

Potência relativa

D i-h id r o te s to s te r o n a (D H T )

T e s tíc u lo

0 ,3

1 6 0 -1 9 0

T e s to s te r o n a (T)

T e s tíc u lo

6 ,6

100

A n d ro s te n e d io n a

A d ren al

1,4

39

D eh id ro ep ian d ro stero n a (DH EA )

A d ren al

29

15

A DHT é considerada o mais potente andrógeno e deriva-se da T pela redução do anel “A” por meio da ação da enzima 5 alfa-redutase (SRD5A).7 Os ESM são produzidos principalmente pelas gônadas, mas também pelas glân­ dulas adrenais e pela conversão de outros esteroides no fígado, no tecido adiposo e outros.8 A complexidade das inter-relações dos ESM com neoplasias malignas no homem e eventual direto relacionamento entre ambos invoca um detalhamento de pelo menos 3 eventos que participam ativa e sinergicamente da ocorrência destas, quais sejam: envelhecimento, hereditariedade e susceptibilidade individual, esta última vinculada ao estilo de vida.

Capítulo 36 Esteroides sexuais e câncer no homem 509

E N V E L H E C IM E N T O M A S C U L IN O E C Â N C E R

O envelhecimento masculino é fator de risco para os tumores malignos, particular­ mente o câncer de próstata (CAP), que é o tumor mais comum no homem, exceção feita aos tumores de pele. Quanto mais idoso o indivíduo, maior a chance dessa mo­ léstia. E tão prevalente, que, acima de 90 anos de idade, todos os homens seriam por­ tadores de CAP, não necessariamente com cortejo clínico. Curiosamente, trata-se do momento em que os níveis androgênicos no homem são mais reduzidos9 e, quanto mais baixos os níveis séricos de T, mais agressivo seria o CAP.10 O homem idoso exibe vários sintomas e sinais juntamente com diminuição nos níveis androgênicos séricos, os quais comprometem a qualidade de vida de maneira significativa. Além disso, a média da sobrevida de um homem idoso com T baixa é menor do que aquela dos homens de mesma idade com níveis séricos normais.11 O impacto das alterações no homem e sua qualidade de vida podem ser mensurados, objetivamente, por meio de questionários validados, como os seguintes: • Aging Males* Symptoms Scale (AMS), 17 questões. O escore varia de 1 (sintoma ausente) a 5 (severo). Quanto mais elevado é o escore, mais significativo é o quadro clínico.12 • Androgen Deprivation Aging Male (ADAM), 10 questões. Se a pessoa responde SIM às questões “l ” ou “7” ou quaisquer 3 outras, é provável tratar-se de deficiência de ESM.13 A libertação dos indivíduos de sua sintomatologia hipogonádica demanda trata­ mento que, por vezes, gera preocupação, no que se refere ao surgimento de neoplasias malignas. Efetivamente, há sugestão na literatura do envolvimento dos ESM no desencadeamento e na progressão de tumores malignos, particular mente no que se refere à carcinogênese prostática.14 Entretanto, até o presente momento, não existe evidência conclusiva de que a administração de T aumenta o risco do CAP ou da hiperplasia benigna da próstata (HBP). Da mesma forma, não há evidência de que a T poderá transformar CAP subclínico em doença clinicamente detectável. Há evidência de que a administração de T, independentemente da via, pode estimular o crescimento e agravar os sintomas dos homens com CAP localmente avançado ou metastático. H E R E D I T A R I E D A D E E G E N É T IC A

Tanto fatores hereditários como genéticos estão envolvidos no controle dos ESM e nos tumores masculinos, especialmente CAP. Estudos em gêmeos sugerem um componente hereditário nos ESM, embora a ligação das variações genéticas destes sobre o CAP seja limitada. Essa comprovação subsidia-se em estudo multicêntrico, o qual demonstra que efetivamente há variação na linha germinativa, produzindo diferenças significativas nas concentrações de ESM, mas que não influenciam efetivamente no risco de CAP.15 Os estudos na área avançam céleres na descoberta de variações dos ESM e de seu impacto na gênese de tumores com ênfase particularmente no CAP, pois trata-se de um instrumento de extremo valor no tratamento e na prevenção de tais entidades nosológicas.16,17 Outra situação assaz relevante é que os receptores dos hormônios esteroides (SHR) exibem fatores de transcrição intracelulares, sabidamente influenciando no desenvolvi­ mento e no crescimento de sequências do DNA. Supõe-se que essas alterações possam

510

Endocrinologia Feminina e Andrologia

produzir modificações no relacionamento dos ESM e tumores. Conhecidas as modifica­ ções, certamente servirão como alternativa terapêutica para câncer masculino.18 A análise da associação eventual de genótipos com 2 variáveis, (a) níveis hormonais séricos e (b) CAP agessivo, demonstrou significativa associação entre T plasmática e single-nucleotide polymorphisms (SNPs). Nenhum SNP associou-se com ambas as variá­ veis. Observou-se também associação entre CAP agressivo e SNPs. As variações dos gens podem influenciar os níveis plasmáticos androgênicos ou a malignidade do CAP, entretanto as modificações que afetam os hormônios não são as mesmas que afetam o grau de diferenciação do CAP.19 O estudo do genoma humano associado a 5 estudos epidemiológicos independen­ tes localizou modificações genéticas com impacto na etiologia do câncer de mama e próstata, independentemente da idade.20 E N V E L H E C IM E N T O M A S C U L IN O E D E F IC IÊ N C IA A N D R O G Ê N IC A

Entre os sintomas mais comuns da deficiência androgênica no homem (DAEM), destacam-se diminuição de libido, disfunção erétil, depressão, fraqueza muscular, cansaço, alteração do humor e do sono, diminuição da memória. Os sinais mais frequentes são redução na massa muscular, aumento do tecido adiposo, infertilidade, osteoporose e anemia.21 O quadro clínico, para ser valorizado, deve apresentar, além dos sintomas e sinais, diminuição sérica nos níveis androgênicos. A redução dos níveis séricos de ESM pode decorrer de trauma testicular ou pélvico, remoção gonadal cirúrgica, uso de drogas recreativas, hipogonadismo hipogonadotrófico ou do processo natural de envelhecimento, em que exatamente prevalecem as neoplasias malignas masculinas.22 O diagnóstico é crucial, desde que muitos sintomas de hipogonadismo são comuns a outras entidades nosológicas, como depressão (perdas sociais e familiares, desempre­ go, aposentadoria, abandono pelos filhos etc.), hipotireoidismo, obesidade (aumenta a prevalência e mortalidade do CAP), hiperprolactinemia, acidente vascular cerebral e envelhecimento, de per si. Destarte, a utilização de questionários validados é determi­ nante para um diagnóstico preciso.23 Nenhum deles é sensível e específico o suficiente, mas auxiliam no diagnóstico di­ ferencial. O questionário ADAM é 83% sensível e 39% específico,13 enquanto o questio­ nário AMS exibe sensibilidade de 60% e especificidade de 59%.12 Os níveis séricos de T, para serem considerados baixos, oscilam entre 200 a 300 ng/dL. Abaixo de 200 ng/dL, certamente existe hipogonadismo e, acima de 600 ng/dL, com certeza, não há hipogonadismo. No homem, existe variabilidade inter e intraindividual de cerca de 20%. Por isso é de bom alvitre efetuar coletas matutinas da T, respeitando o ritmo circadiano, e, pelo menos, 2 exames com 1 ou 2 semanas de intervalo. As alte­ rações pelo ritmo circadiano não são tão expressivas em idosos, mas significativas em jovens. Faz-se mister averiguar também os níveis de prolactina, SHBG, além de sur­ preender doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, adicionando à investigação glicemia e hemoglobina glicosilada.24 Frente a um quadro clínico exuberante no que tange a sinais e sintomas, mas ainda pairando dúvidas, além da T total e livre e da albumina, o DHEA pode ser averiguado. Este, como a T total, diminui enquanto o SHBG aumenta no envelhecimento. Outras mensurações são raramente necessárias, como hormônio do crescimento, que diminui

Capítulo 36 Esteroides sexuais e câncer no homem 511

14% por década. Nos obesos, a dosagem da leptina, que é um peptídeo produzido pelos adipócitos, é conveniente, pois promove crescimento da próstata na puberdade e pode estimular o desenvolvimento do CAP,25 A leptina também possui uma condição típica, que é a indução da proliferação de células de CAP andrógeno-independente.26 E S T I L O D E V ID A

Pelas razões expostas, para todos os indivíduos sintomáticos, em investigação envol­ vendo ESM e/ou tumores malignos, é necessário abandonar fumo e álcool. E crucial a diminuição da obesidade visceral e a prática de exercícios físicos. O inadequado estilo de vida desenvolve um indivíduo mais suscetível e mais vulnerável a diversas doenças, compromete a autoestima, não estimula a adesão ao tratamento e impede melhor eficiência do resgate terapêutico implementado. E N V E L H E C IM E N T O M A S C U L IN O , D E F IC IÊ N C IA A N D R O G Ê N IC A E C O N S ID E R A Ç Õ E S T E R A P Ê U T I C A S

A reposição de ESM é formalmente contraindicada em homens sabidamente portado­ res de CAP e de câncer de mama. Antes da intervenção com andrógenos, deve ser afastada a presença de CAP, usando-se toque retal e dosagem sérica do antígeno prostático específico (PSA). Em casos dúbios ou nos indivíduos de alto risco para CAP (familiares portadores de CAP: pai, ir­ mãos), há indicação de ultrassonografia transretal com biópsia prostática, coletandose, no mínimo, 6 fragmentos de cada lado da próstata. O homem tratado com sucesso para CAP e portador de sintomas hipogonádicos é candidato potencial para reposição hormonal se não exibir evidência clínica e/ou laboratorial de CAP. Os riscos e benefícios devem ser claramente discutidos e muito bem entendidos pelo paciente. De outra parte, se o indivíduo exibir sintomatologia severa no trato urinário in­ ferior (LUTS), como disúria, noctúria, jato fino, urgência miccional, hesitação miccional, impõe-se avaliação com urodinâmica. Se o International Prostate Symptom Score (IPSS) for maior do que 21, haverá contraindicação momentânea para tratamento com substâncias androgênicas. Libertando-se dos sintomas, o indivíduo poderá ser candidato à reposição androgênica.27E adequado perscrutar presença ou não de insu­ ficiência renal ou cardíaca. A reposição androgênica é bem-tolerada na maioria dos pacientes e produz expres­ siva melhora na qualidade de vida.28 A faixa etária não é fator impeditivo para o tratamento, não obstante alguma con­ trovérsia ainda persista, especialmente em se tratando de homens idosos.29 A administração da T visando ao equilíbrio dos ESM pode ser efetuada por diversas vias (ver capitulo de Andropausa ou Hipogonadismo Masculino Tardio). Outra alter­ nativa para a compensação do indivíduo é o uso transdérmico da DHT, cuja principal vantagem é a sua não aromatização, evitando aumento prostático. Se ao cabo de 3 meses de tratamento não houver melhora clínica, excetuando-se disfunção erétil, o tratamento deverá ser cancelado. Normalmente, a reposição androgênica é bem-tolerada. Não obstante, cerca de um terço dos indivíduos interrompem o tratamento (18% no primeiro ano). A razão

512

Endocrinologia Feminina e Andrologia

principal é a não percepção de benefícios e a necessidade de revisões médicas muito frequentes.30 Nos portadores de CAP metastático, certamente ocorrerá progressão deletéria da doença.31 C O N C LU SÃ O

Há sugestões robustas na literatura do envolvimento dos ESM com tumores malignos. Entretanto, não existe evidência conclusiva de que a administração de andrógenos como a T aumente o risco de carcinogênese, particularmente do CAP. Da mesma forma, não há comprovação de que a T transforme CAP subclínico em doença clini­ camente detectável. Adicione-se às evidências o fato de que homem que desenvolve CAP não possui níveis séricos de T suprafisiológicos e homens com elevados índices de T não são de maior risco para o desenvolvimento de CAP daquele que exibe níveis mais baixos. Há evidência, sim, de que a T pode estimular o crescimento e agravar os sintomas dos homens com CAP localmente avançado ou metastático. Destarte, a presença de sintomas e sinais associados às alterações nos exames laboratoriais, a administração medicamentosa com o precípuo intuito de restaurar o equilíbrio nos níveis séricos dos ESM é adequada, visando ao resgate da qualidade de vida no homem. E crucial averi­ guar quem deve, bem como quem se qualifica para um tratamento seguro e adequado. Os pacientes devem ser orientados sobre benefícios e possíveis riscos do tratamento androgênico e o seguimento, a curto prazo, inicialmente, é obrigatório. R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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IN T R O D U Ç Ã O

A Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS) foi reconhecida em 1981 pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças Americanos (CDC),1 associada a uma grande variedade de doenças oportunistas, a maioria de origem infecciosa (IO). A des­ truição direta dos linfócitos T CD4+ pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) leva à queda progressiva da imunidade. Rapidamente a pandemia ganhou magnitude nunca imaginada, tornando-se logo uma das mais letais já enfrentadas pela humani­ dade, até o surgimento da terapia antirretroviral combinada de alta potência, conhe­ cida como TARV, reduzindo a mortalidade.2 Paralelamente foram sendo identifica­ das manifestações endócrinas ligadas à infecção pelo HIV. Essas alterações podem ser primárias, pela ação direta do vírus (p. ex., adrenalite pelo HIV), ou secundárias, por efeitos indiretos de citoquinas, IOs ou, mais raramente, neoplasias.3 Nos primórdios da epidemia, na ausência de antirretrovirais (ARV), o curso natural da doença era pon­ tuado por IOs graves acopladas à desnutrição (;wasting syndrome), levando à morte em curto espaço de tempo. Nessa ocasião, a insuficiência suprarrenal e o hipogonadismo eram diagnosticados com frequência.4 O panorama foi modificado após o advento da TARV, com aumento da sobrevida2 e uma inestimável melhora na qualidade de vida. Contudo, os efeitos adversos dos antirretrovirais e a evolução clínica da própria doen­ ça aumentaram muito o número de complicações metabólicas.5 O envelhecimento da população com HIV tem sido outro desafio no manejo desses indivíduos.6 No Brasil, os portadores de HIV têm garantido o acesso ao tratamento gratuito e à TARV. Apesar disso, índices elevados de diagnóstico tardio foram demonstrados por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), com 43,6% dos pacientes atendi­ dos no serviço público no Brasil, entre 2003 e 2006, com início tardio de tratamento.7 Por esse motivo, ainda é possível encontrar casos graves de AIDS como no início da epidemia, além dos casos que, apesar de controlados pelo uso da TARV, apresentam uma doença com características de doença crônica acoplada ao envelhecimento, todos susceptíveis aos distúrbios endócrinos e metabólicos relacionados com o HIV. No presente capítulo, abordaremos inicialmente as doenças relacionadas com a disfunção da suprarrenal, a disfunção gonadal e a doença tireoidiana. Em seguida, serão abordadas as alterações metabólicas associadas à infecção crônica pelo HIV e pelo uso da TARV, incluindo as alterações corporais antropométricas, a dislipidemia, o diabetes mellitus (DM), a resistência à insulina e as alterações ósseas.

Capítulo 37 HlVe sistema endócrino 515

IN S U F IC IÊ N C IA S U P R A R R E N A L

Em estudos de necropsia, as suprarrenais são as glândulas mais frequentemente aco­ metidas na AIDS, embora a exteriorização clínica da insuficiência suprarrenal (ISR) seja incomum. Talvez isso se deva ao fato de que as suprarrenais necessitem de um alto nível de destruição para que haja um quadro clínico típico. A ISR foi um dos pri­ meiros problemas endócrinos observados nos pacientes com HIV, com etiologia geral­ mente infecciosa.8 Os sintomas são geralmente inespecíficos e se confundem com os da própria AIDS avançada: tonteira, fadiga, perda de peso, náuseas, vômitos, diarreia inexplicável, hipotensão, hiperpigmentação, hipercalemia e hiponatremia. As causas nos portadores do HIV são as mesmas daquelas que acometem a população em geral, mas a prevalência de certas doenças e etiologias adicionais exigem conhecimento di­ ferenciado. Em pacientes com AIDS avançada, a ISR primária tem como causa prin­ cipal as infecções por Mycobacterium tuberculosis, citomegalovírus (CMV), Cryptococcus neoformanSj Nocardia spp., Mycobacterium Avium complex (MAC), Histoplasma capsulatum, Toxoplasma gondii e o próprio HIV.3,9 O acometimento neoplásico da suprarrenal já foi descrito no linfoma não Hodgkin e no Sarcoma de Kaposi.10Algumas medicações usa­ das no tratamento de IOs podem alterar a função adrenal, como fluconazol, cetoconazol, rifampicina e acetato de megestrol.9 Após a TARV, a ISR secundária ao uso de corticoide exógeno tem sido cada vez mais expressiva na população HIV-positiva, tanto pelo uso por via inalatória (fluticasona e budesonida utilizadas para problemas respiratórios), quanto pelo uso tópico (triancinolona para lesões dermatológicas). A etiologia dessa ISR parece estar ligada à interação entre glicocorticoides e ARV da classe inibidores de protease (IP), principal­ mente o ritonavir (RTV). A principal via metabólica do glicocorticoide é o citocromo P450, por meio da isoenzima CYP3A4, a qual é inibida pelos IPs usados no tratamen­ to do HIV. O RTV, mesmo em baixas doses, quando utilizado como potencializador (ibooster) de quase todos os outros IPs, é um potente inibidor do isoenzima CYP3A4. Não se conhece bem a interação de todos os corticoides com os IPs, mas sabe-se que baixas doses de RTV podem potencializar os esteroides, levando a efeitos sistêmicos, mesmo com vias de administração aparentemente pouco perigosas. Estudos mostram que a prednisolona atinge concentrações até 30% mais elevadas.11 A infecção pelo HIV não se configura como contraindicação para a corticoterapia em doses fisiológicas ou suprafisiológicas, que são eventualmente usadas em IOs, tais como neurotoxoplasmose e pneumonia pelo Pneumocystis jiroveci, antes P. carinii (PCP). A ISR pode ser também secundária à disfunção do eixo hipotálamo-hipofisário, associada a outras formas de hipopituitarismo, quando afetado por patógenos (C ryp­ tococcus neoformanSj CMV e Toxoplasma gondii), por imunomoduladores liberados pelos linfócitos infectados pelo HIV e, provavelmente, também pela ação direta do HIV, le­ vando à necrose idiopática da adeno-hipófise.12 D IS F U N Ç Ã O G O N A D A L M A S C U L IN A

A testosterona total e sua fração livre diminuem normalmente com o envelhecimento na população geral. Não se sabe se o fenômeno ocorre de forma mais acelerada no envelheci­ mento dos portadores do HIV, de forma que disfunção gonadal é comum no sexo mascu­ lino. Dos pacientes do sexo masculino com doença avançada, cerca de 67% se queixam de

516

Endocrinologia Feminina e Andrologia

falta de libido e 33%, de impotência.13 Em pacientes tratados com TARV, a proporção cai para aproximadamente 20%. A causa da disfunção é secundária aos baixos níveis de gona­ dotrofina, devido aos efeitos da desnutrição, inflamação, infecção ou como consequência do uso de várias drogas que podem inibir a produção de gonadotrofina. O hipogonadismo está associado a perda de peso, sarcopenia, impotência e redução de força.3 Nesta população, a dosagem de testosterona total pode não refletir com acurácia os níveis de testosterona, devido a variações nos níveis de globulina carreadora de hormônio sexual (SHBG) e albumina, as quais também devem ser dosadas. Para fazer o diagnóstico correto, deve-se dosar testosterona total, SHBG e albumina para cálculo de testosterona livre e biodisponível. E sempre importante determinar se o hipogonadismo é primário (falência testicular) ou secundário (disfunção do eixo hipotálamo-hipofisário). A disfunção secundária é a mais frequentemente encontrada nos portadores do HIV, cursando com baixos níveis de gonadotrofina. A reposição de testosterona resulta em aumento de massa magra, melhora da qualidade de vida e da depressão, podendo haver ganho de até 8% na massa magra após 1 ano de tratamen­ to.3 A testosterona pode ser utilizada por via intramuscular, transdérmica ou oral. O papel de esteroides anabolizantes, como nandrolona e oxandrolona (lembrar da hepatotoxicidade), associados aos exercícios de musculação ainda não está firmado. A ocorrência de ginecomastia e de elevação da prolactina foram descritas em por­ tadores do HIV. Entretanto, na maioria dos casos, a ginecomastia não é verdadeira, fazendo parte da síndrome de lipodistrofia, uma redistribuição de gordura pelo corpo em pacientes que usam TARV por longos períodos.9 D IS F U N Ç Ã O G O N A D A L F E M IN IN A

Bem menos estudada do que a masculina, a disfunção ovariana é pouco comum entre as mulheres com HIV/AIDS. A amenorreia acomete cerca de 25% das pacientes sem uso de TARV, e 50% não ovulam quando a contagem de células T CD4+ está baixa.4 S ÍN D R O M E D E S E C R E Ç Ã O IN A P R O P R IA D A D E H O R M Ô N IO A N T ID IU R É T IC O

A hiponatremia com hipercalemia são os distúrbios hidroeletrolíticos mais comuns em portadores do HIV hospitalizados. A síndrome de secreção inapropriada de hor­ mônio antidiurético (SIADH) responde por metade dos casos de hiponatremia asso­ ciados a HIV/AIDS por excreção elevada de sódio na urina. A SIADH pode ser causada por várias infecções e neoplasias, e o tratamento consiste em restrição hídrica e, em casos extremos, reposição com salina hipertônica.3 É importante lembrar que a trimetoprima, medicação muito utilizada na combina­ ção com sulfametoxazol, para tratamento de PCP pode ser causa frequente de hiper­ calemia, por ação direta sobre o túbulo renal.3 D IS F U N Ç Ã O D A G L Â N D U L A T I R E O I D E

Casos de hipotireodismo podem ser encontrados após tireoidite por Pneumocystisproved, CMV, MAC, Cryptococcus neoformans, Rhodococcus equi, Aspergillus fumigatus e Sarcoma de

Capítulo 37 HlVe sistema endócrino 517

Kaposi. Porém a maioria dos casos tem etiologia autoimune por tireoidite de Hashimoto, como na população em geral. Os clínicos devem ficar alertas para a possibilidade da ocorrência de hipotireoidismo em pacientes com Tireoidite de Hashimoto após o início da TARV, no contexto da restituição incompleta da imunidade (Síndrome de Imunorreconstituição ou IRIS).14 Observações recentes demonstraram um aumento na prevalên­ cia de hipotireoidismo primário. Um estudo francês mostrou que 2,6% de 350 pacientes infectados pelo HIV tinham hipotireoidismo clínico e 6,6% apresentavam doença subclínica. Fatores preditivos para o hipotireoidismo estavam ligados ao uso de estavudina (D4T), baixa contagem de células T CD4+ e sexo masculino.15 ■

C O M P L IC A Ç Õ E S M E T A B Ó L IC A S R E L A C IO N A D A S A O V ÍR U S D A IM U N O D E F IC IÊ N C IA H U M A N A E A O S A N T IR R E T R O V IR A IS : D I S L IP ID E M IA , R E S IS T Ê N C IA À IN S U L IN A , D O E N Ç A C A R D IO V A S C U L A R E D O E N Ç A S Ó S S E A S

O sucesso da TARV em controlar a replicação do HIV, permitindo a restauração do sis­ tema imune, foi acompanhado do reconhecimento de complicações metabólicas im­ portantes, que resultam em aumento do risco de doença cardiovascular (DCV). Assim, ocorre diminuição das complicações infecciosas, com exceção da tuberculose, que pode acometer indivíduos mesmo com contagens de células T CD4+ mais altas. Por razões ainda não definidas, pacientes infectados pelo HIV, mesmo com supressão virai máxi­ ma obtida pela TARV, apresentam risco aumentado de doenças prevalentes em pessoas de faixas etária mais elevadas, como neoplasias não definidoras de AIDS, DCV, doença renal, osteopenia e osteoporose, hepatopatias, “fragilidade” ou frailty (perda de massa muscular, exaustão, fraqueza e lentidão) e, em alguns casos, complicações neurológicas. Essas condições são observadas no processo de envelhecimento e são causadas, pelo me­ nos em parte, pelo processo inflamatório crônico relacionado com a infecção pelo HIV. Os pacientes que não conseguem elevação robusta da contagem de células T CD4+ têm risco maior de câncer, doença hepática e, provavelmente, de DCV.16



Lipodistrofia associada à infecção pelo vírus da imunodeficiência humana e a terapia antirretroviral combinada de alta potência

Alterações antropométricas em portadores do HIV têm sido agrupadas sob o termo lipodistrofia, o qual inclui a lipoatrofia e a lipo-hipertrofia. A avaliação do depósito de gordura pode ser feito por meio da auto avaliação, da percepção do profissional de saúde, das medidas antropométricas, da ressonância nuclear magnética (RNM), da tomografia computadorizada (TC) e da absorção de dupla emissão de raios X (DEXA) de corpo inteiro, estes mais utilizados nas pesquisas do que na clínica. Apesar de compartilharem dos mesmos fatores de risco, incluindo idade avançada, sexo masculino e AIDS mais avançado (baixo nadir de linfócitos T CD4+), a patogênese desses distúrbios é distinta. A ocorrência de ambas, lipoatrofia e lipo-hipertrofia, é mais bem denominada lipodistrofia mista.16

D Lipoatrofia A alteração antropométrica mais comum em indivíduos recebendo TARV é a perda de adipócitos subcutâneos, mais evidente na face, nas nádegas, nas pernas e nos braços,

518

Endocrinologia Feminina e Andrologia

afetando mais de 30% dos pacientes. A lipoatrofia de face inicia-se na região malar e se estende, deixando bem evidente o sulco nasogeniano, o que confere aos pacientes aparência envelhecida, como estigma da doença. As veias superficiais dos membros superiores e inferiores se tornam bastante aparentes, porém não tortuosas. Em muitas oportunidades, são confundidas com varizes nos membros inferiores. Todo o quadro pode diminuir a autoestima dos pacientes e comprometer a adesão à TARV. A exposição à primeira geração de inibidores da transcriptase reversa análogos de núcleosídeos (ITRN), a saber, estavudina (D4T) e zidovudina (AZT), é o fator de risco mais importante no desenvolvimento da lipoatrofia, por causar disfunção mitocondrial nos adipócitos, levando à apoptose dos mesmos, por meio da inibição da enzima gama-DNA-polimerase, com consequente depleção do DNA mitocondrial. Outros ARVs também podem piorar a lipoatrofia, incluindo alguns IPs, como nelfinavir e in­ dinavir, cujo uso foi praticamente abolido. O atazanavir, IP ainda bastante utilizado, parece ter pouco efeito na gênese da lipoatrofia. O papel dos inibidores da transcripta­ se reversa não análogos de núcleo sídeos (ITRNN), principalmente do efavirenz (EFV), como fator isolado ainda é controverso.17 Existe também predisposição genética para a lipoatrofia.18 O tratamento mais eficaz para a lipoatrofia é evitar o uso de AZT e de D4T e op­ tar pelos ITRNs de segunda geração, abacavir e tenofovir (TDF - este um inibidor de transcriptase reversa análogo de nucleotídio), que não alteram a composição de gor­ dura corporal porque não inibem a enzima gama-DNA-polimerase. A substituição dos ARVs leva à restauração de gordura lenta e provavelmente incompleta.17 Os demais tratamentos medicamentosos propostos foram decepcionantes: uridina, tiazidolonas e pravastatina não são recomendados.16 O único tratamento realmente eficaz é o preenchimento facial, que pode ser feito com gordura ou com outras substâncias sintéticas. No Brasil, o metacrilato é o preenchedor mais utilizado, pois, além de se obter excelentes resultados estéticos e duradouros, ele tem um custo menos elevado. A regulamentação desse procedimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ocorreu inicialmente pela Portaria GM n° 2582/2004.19



Lipo-hipertrofia

Um subgrupo de pacientes desenvolve acúmulo anormal de gordura localizada cha­ mada de lipo-hipertrofia, bastante típica dos que são bem-sucedidos na TARV. Ela se caracteriza pelo acúmulo de gordura na região intra-abdominai e/ou na região dorsocervical. O acúmulo de tecido adiposo intra-abdominal é a apresentação mais frequen­ te, levando ao aumento da circunferência abdominal com protrusão dos órgãos, o que causa, por vezes, desconforto abdominal e/ou flatulência. Estudos com TC e/ou RNM evidenciaram perda do tecido adiposo subcutâneo com acúmulo de gordura em mesentério e retroperitônio. A hipertrofia do tecido adiposo dorsocervical (giba de búfalo) é decorrente do acúmulo de gordura no tecido subcutâneo, similar ao obser­ vado na Síndrome de Cushing, sendo, porém, independente do cortisol sérico. As mu­ lheres podem apresentar também aumento do volume das mamas.16 Essa gordura ectópica pode levar a efeitos metabólicos adversos, como a resistência à insulina. A etiologia da lipo-hipertrofia ainda é desconhecida e parece ser muitifatorial. As al­ terações estão ligadas ao risco aumentado de DCV e DM tipo 2.20 Do mesmo modo, também aumentam o risco de esteatose hepática e decréscimo de densidade mineral óssea (BMD).16 Infelizmente a estratégia de troca de ARV não tem mostrado bons

Capítulo 37 HlVe sistema endócrino 519

resultados no tratamento e/ou na prevenção da complicação.21 O mais recomendável é a mudança de estilo de vida, incluindo exercícios de resistência e aeróbicos, bem como alimentação balanceada. Alguns ensaios com terapia medicamentosa foram, na sua maioria, pouco encorajadores. A metformina, com objetivo de reduzir a lipohipertrofia, foi utilizada em pacientes com intolerância a glicose e hiperinsulinemia, ocorrendo modesta perda de gordura abdominal, mas com acentuação da lipoatrofia. A testosterona reduziu os adipócitos subcutâneos, mas não os viscerais. O uso do hor­ mônio do crescimento recombinante (GHr) em doses suprafisiológicas reduziu em até 20% a adiposidade visceral em ensaio controlado com placebo.22 Contudo, seu uso não foi aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), pelo fato de a suspensão do tratamento reverter ao quadro anterior e o uso a longo prazo poder causar resistência à insulina, DM tipo 2, artralgias e/ou edema periférico. A droga tesamorelin (Egrifta®) é o primeiro e único tratamento indicado e liberado pelo FDA em novembro de 2010, para induzir e manter a redução do excesso de gordura visceral em pacientes HIV po­ sitivos com lipodistrofia. Trata-se de uma droga sintética que atua como análogo do fator de liberação do hormônio de crescimento endógeno, sendo bem-tolerada.23

D Alterações no metabolismo lipídico e DCV Os pacientes com AIDS sem TARV já apresentam caracteristicamente hipertrigliceridemia, redução do colesterol total, baixa concentração de colesterol contido na lipoproteína de alta densidade (HDL) e predominância de pequenas partículas de colesterol contido nas lipoproteínas de baixa densidade (LDL).9 As dislipidemias são extremamente frequentes entre os portadores do HIV e resultam em significante au­ mento no risco de DCV. O estudo Data Collection on Adverse Events ofAnti-HIV Drugs Study (DAD) investigou a incidência de acidentes cardiovasculares e cerebrovasculares nessa população e a associação dos fatores de risco para DCV com a TARV, com parti­ cipação de mais de 20 mil pacientes. Uma publicação realizada pelo grupo no ano de 2007 confirmou a existência de associação entre a duração da TARV e o aumento no risco de infarto agudo do miocárdio (IAM), com um RRa = 1,16 por ano de exposição à TARV (IC 95%: 1,09-1,23). A incidência de IAM foi de 1,5/1.000 pessoas/ano entre os que não eram expostos aos IPs e 6,0/1.000 pessoas/ano entre os expostos aos IPs.24 A DCV aterosclerótica tornou-se a principal causa de morte de portadores do HIV nos países desenvolvidos. Esses pacientes têm risco elevado de aproximadamente 2 vezes de apresentar IAM quando comparados a indivíduos da mesma faixa etária e de mesmo sexo. Ainda não se conhece exatamente a fisiopatologia do fenômeno, mas sabe-se que os fatores clássicos correlacionados com a DCV na população geral estão envolvidos, como alta prevalência de dislipidemia causada pela TARV, hipertensão arterial e DM. Existem fatores comportamentais, frequentemente observados na po­ pulação infectada, que também estão relacionados à elevação do risco de DCV, como alta prevalência de tabagismo, sempre superior a 50% em múltiplos estudos e maior relação cintura-quadril nos infectados com relação aos não infectados.25 A dislipidemia associada à TARV é caracterizada pelo aumento nos níveis de VLDL (maior transportador de triglicerídeos), LDL, Lipoproteína-a e redução do HDL, al­ terações diretamente relacionadas com o risco de aterosclerose e suas complicações, como IAM e DCV periférica, mesmo em indivíduos sem infecção pelo HIV.26 O tratamento da dislipidemia em portadores do HIV deve considerar as mesmas metas recomendadas para a população geral, após análise global dos demais fatores de

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

risco. É recomendado sempre iniciar com medidas não medicamentosas e na persistên­ cia da dislipidemia, iniciar o manejo farmacológico, com extrema cautela. A elevação dos níveis de triglicérides, fenômeno frequente nesse grupo populacional, deve ser tratada. Quando a alteração for acompanhada de DCV preexistente, histórico familiar precoce de DCV ou HDL-C < 40 mg/dL, o tratamento farmacológico deve ser considerado.27 As medidas não farmacológicas tais como suspensão do tabagismo (a interrupção do fumo eleva as taxas de HDL), controle nutricional e atividade física compõem um estilo de vida que contribui para equilíbrio metabólico, redução da distribuição inade­ quada de gordura corporal e formação de massa muscular. Os medicamentos utilizados no tratamento da dislipidemia desse grupo são fibratos e estatinas. No caso de hipertrigliceridemia isolada, além dos fibratos, ácidos graxos ômega-3 ou niacina podem ser prescritos. A primeira escolha para a dislipidemia mista é a classe de fibratos,27 com as seguin­ tes doses recomendadas: • • • • •

Bezafibrato: 400 mg a 600 mg/dia. Genfibrozila: 900 mg a 1.200 mg/dia. Etofibrato: 500 mg/dia. Fenofibrato: 250 mg/dia. Cipofibrato: 100 mg/dia.

Para o tratamento da hipercolesterolemia, as estatinas devem ser utilizadas, com exceção da sinvastatina e a lovastatina. Essa classe de drogas é metabolizada via citocromo P450, logo interage com os IPs, o que pode elevar o nível sérico das estati­ nas, com o aumento dos efeitos adversos, incluindo a rabdomiólise. Teoricamente, as estatinas mais seguras para uso em associação aos IPs são a pravastatina (cuidado com interação com o IP darunavir), a fluvastatina, a atorvastatina e a rosuvastatina. Quando for necessário associar fibrato com estatina, deve-se ficar atento ao maior risco de rabdomiólise.27 As estatinas devem ser iniciadas em baixa dosagem, e as doses recomendadas são: • • • •

Pravastatina: 20 mg a 40 mg/dia. Fluvastatina: 20 mg a 40 mg/dia. Atorvastatina: 10 mg a 80 mg/dia. Rosuvastatina: 10 mg a 40 mg/dia.

Singh et dl. demonstraram que a atorvastatina e a rosuvastatina são mais potentes para diminuir os níveis de colesterol total, colesterol-LDL e colesterol não HDL nesse grupo, com baixa toxidade.28 Outra estratégia terapêutica consiste na troca de medicamentos que compõem a TARV, substituindo classes de medicamentos ou drogas específicas que têm impacto negativo no metabolismo lipídico (ex: lopinavir/ritonavir) por drogas com menor im­ pacto (p. ex.: atazanavir). Muitas vezes, os clínicos ficam relutantes em seguir essa con­ duta porque pode ter impacto desfavorável no controle virai da infecção pelo HIV.16

O D ia b etes m ellitus e resistência à insulina A prevalência de resistência à insulina, intolerância à glicose e DM tem sido demonstra­ da em vários estudos. Em um deles, p. ex., a incidência de DM tipo 2 foi 4 vezes maior em homens HIV-positivos recebendo TARV do que em indivíduos não infectados.9

Capítulo 37 HIV e sistema endócrino 521

A elucidação dos fatores que estão envolvidos no processo de alterações na homeostase da glicose, especialmente resistência à insulina, ainda permanece como um grande desafio, atualmente explicado por 3 hipóteses não excludentes, que seriam a inibição da atividade dos transportadores de glicose na membrana plasmática (GLUT1 e GLUT4), inibição da diferenciação do pré-adipócito e indução da apoptose do adipócito maduro.26 Efeitos indesejados da TARV também estão envolvidos, pela alteração no tecido adiposo, pela desregulação de ácidos graxos livres, pelo processo inflamatório e pela adipocina.9

IMPORTANTE O tr a ta m e n to d o s p o rta d o re s d o H IV deve seg u ir o d a p o p u la ç ã o em g eral, sen d o e sse n cia l o e s tím u lo à ativ id a d e fís ic a e à a lim e n ta ç ã o b a la n c e a d a . A m e tfo r m in a deve ser c o n sid e ra d a c o m o p rim e ira lin h a , p rin c ip a lm e n te p a ra os in d iv íd u o s c o m lip o -h ip e r tr o fia c e n tra l, j á q u e a d ro g a p o d e te r a lg u m e fe ito n a re d u çã o d a g o rd u ra v isceral.

Para os indivíduos com manifestação de lipoatrofia, a pioglitazona tem preferência em relação à metformina, para que não ocorra maior perda de gordura. A saxagliptina, medicação antidiabética da classe de inibidores da dipeptidil peptidase (DDP-4), deve ser evitada em pacientes que usam TARV, porque interage com os ARVs. Os indivíduos HIVpositivos que apenas exibam intolerância à glicose devem ser considerados para o trata­ mento com metformina, além da mudança no estilo de vida, principalmente se tiverem idade inferior a 60 anos, IMC > 35 kg/m2 e apresentarem lipo-hipertrofia central.9

O Alterações ósseas Osteopenia e osteoporose Com o envelhecimento da população portadora de HIV, mais comorbidades vão se somando à infecção crônica controlada pela TARV e a seus efeitos indesejados. A os­ teopenia e a osteoporose vão aparecer em indivíduos mais jovens, podendo a osteopo­ rose ter prevalência até 3 vezes maior nesse grupo, mais evidentes entre os que estão em uso de TARV. A etiologia parece ser multifatorial e provavelmente representa complexa interação entre a infecção pelo HIV, fatores de risco tradicionais para osteoporose (má-nutrição, baixo peso, altas taxas de uso de tabaco e álcool, baixos níveis de vitamina D) e fato­ res ligados à TARV. Indivíduos infectados que nunca fizeram uso de TARV têm alta prevalência de osteopenia, provavelmente mediada pelos efeitos sistêmicos do processo inflamatório crônico na remodelagem óssea, por aumento da atividade osteoclástica e diminuição da formação óssea pela promoção de apoptose de osteoblastos. O hipogonadismo também pode ser fator adjuvante. Os componentes da TARV também pare­ cem influenciar a perda de massa óssea. O tenofovir, muito utilizado atualmente, apesar de ainda não estar bem-estabelecido, tem sido relacionado com perda aguda de massa óssea. Outros fatores secundários também devem ser afastados, como uso de glicocorticoides, síndrome disabsortiva, abuso de opiáceos, baixa contagem de células T CD4+, duração da infecção pelo HIV, lipodistrofia, resistência à insulina e hiperlactatemia. A Sociedade Americana de Doenças Infecciosas (IDSA) sugere densitometria óssea para portadores do HIV a partir dos 50 anos de idade que apresentem 1 ou mais fa­ tores de risco adicionais para osteopenia e/ou osteoporose. Uma vez que tais fatores

522

Endocrinologia Feminina e Andrologia

são extremamente prevalentes nesse grupo, a maioria dos pacientes se enquadra nessa rotina. Se o exame não indicar necessidade de tratamento, deverá ser repetido a cada 2 a 5 anos, dependendo do caso.29 As medidas gerais são as recomendadas para a população em geral, com alimen­ tação balanceada, ingestão de quantidades adequadas de cálcio e de vitamina D. Es­ pecificamente, é recomendado 1.000 mg a 1.500 mg de cálcio e 800 IU a 1.000 IU de vitamina D diariamente. Expor-se moderadamente ao sol, realizar exercícios aeróbicos diários, de fortalecimento muscular, de equilíbrio para prevenção de quedas, parar de fumar e limitar a ingestão de álcool também são práticas recomendadas. No caso de necessidade de terapia medicamentosa, os bifosfonatos estão indicados como potentes inibidores da reabsorção óssea mediada pelos osteoclastos. A recomen­ dação de um deles vai depender da experiência do médico e da possível adesão do paciente à prescrição semanal, mensal ou anual.

Osteonecrose A necrose avascular da cabeça do fêmur é uma complicação que parece ocorrer com mais frequência entre os portadores do HIV. Entre os fatores predisponentes, encontram-se uso de IPs, hiperlipidemia, uso de corticoides, uso de álcool e de drogas. Uma metanálise recente apontou ação indireta dos IPs, via indução de dislipidemia.30 R E F E R Ê N C IA S B IB L IO G R Á F IC A S

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Desreguladores endócrinos e eixo gonadal S érgio Koifm an Ro salin a Jo rg e Koifm an

IN T R O D U Ç Ã O

O ciclo reprodutivo constitui o mecanismo desenvolvido ao longo da evolução que possibilita a formação e o desenvolvimento de novos seres aptos à procriação, e ga­ rante, assim, a perpetuação da espécie. Consiste em uma série de etapas que se iniciam antes da concepção, perpassam o período da embriogênese, a infância, a puberdade, a adolescência e a vida adulta e viabilizando a formação de novos indivíduos que pos­ sam reiniciar com êxito o mesmo ciclo sucessivamente ao longo do tempo. Nesse processo, os hormônios esteroides desempenham um papel primordial, ga­ rantindo que as diferentes etapas do ciclo reprodutivo se desenrolem adequadamente. A partir das moléculas de colesterol, predecessor dos hormônios esteroides, realizase sua transformação sob ação enzimática levando à produção, p. ex., de cortisol e aldosterona na glândula suprarrenal e do estradiol no ovário. Sob a ação dos hor­ mônios esteroides distribuídos pela corrente sanguínea, irão ocorrer os mecanismos de homeostase endócrina entre o hipotálamo, a hipófise e os testículos ou ovários, constituindo-se, assim, o eixo gonadal. As etapas desse processo de transformações irão desenvolver-se tanto no organismo materno, como na placenta e no feto, ressal­ tando a importância do período intrauterino para as etapas cruciais do início do ciclo reprodutivo. Neste capítulo, será analisado o papel de algumas exposições exógenas que irão afetar os sensíveis mecanismos de homeostase de todo o sistema endócrino, acar­ retando modificações na fisiologia reprodutiva do indivíduo ao longo de todas as etapas da vida. ■

D E S R E G U L A D O R E S E N D Ó C R IN O S : C O N C E IT O E E F E I T O S B IO L Ó G IC O S

Denominam-se desreguladores ou interferentes endócrinos (endocrine disrupters, ou endocrine disruptors na língua inglesa) as substâncias químicas exógenas que apresen­ tam atividade hormonal e podem alterar a homeostase do sistema endócrino. Essas substâncias podem também afetar órgãos que respondem aos estímulos hormonais. Os efeitos dos interferentes endócrinos resultam de sua semelhança com hormônios endógenos, da capacidade de serem antagônicos aos efeitos dos hormônios, de al­ terar o padrão de síntese e o metabolismo dos mesmos, ou modificar a atuação dos receptores hormonais.1

Capítulo 38 Desreguladores endócrinos e eixo gonadal

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Como os hormônios esteroides possuem uma estrutura molecular com anéis aro­ máticos, outras substâncias químicas com estrutura similar podem apresentar ação de desregulador endócrino (Figura 38.1). Entre estas se incluem diferentes substân­ cias químicas que apresentam efeitos estrogênicos ou antiandrogênicos, entre as quais encontram-se descritas na literatura as seguintes: • Organoclorados, substâncias que contêm átomos de cloro em suas moléculas, como o dicloro-difenil-tricloro-etano (DDT) e seus m etabólitos, como DDE, indicador de exposição crônica a este pesticida. Foi empregado no controle de vetores a partir da década de 1940 e na agricultura, até o início de seu banimento em vários países a partir da década de 1970. Além do DDT, incluem-se nesta categoria Fíexaclorociclohexano (HCFI), Hexaclorobenzeno (HCB), Mirex, Endosulfan, Aldrin, Dieldrin, Clordano, e diversas outras substâncias utilizadas como plaguicidas. Embora a comercialização dos organoclorados esteja proibida, eles ainda são detectados porque depositam-se no tecido adiposo, persistindo por décadas no organismo. • Bifenilas policloradas (PCBs), utilizadas no passado como isolantes térmicos nos transformadores elétricos, plastifícantes em tintas e produtos de borracha. • Bisfenol-A, utilizado na fabricação de plásticos, diversos materiais dentários como resinas e selantes, retardante de chamas (tetrabromo-bisfenol A). É empregado na manufatura de diversos recipientes plásticos, incluindo mamadeiras, que, aquecidos, podem liberar suas moléculas. • Dibenzo-p-dioxinas policloradas (PCDDS ou dioxinas) e dibezofuranos policlorados (PCDFs ou furanos), substâncias produzidas pela combustão de plásticos e outros materiais, sendo carcinogênicas. A substância 2,3,7,8 tetraclorodibenzo-p-dioxina (TCDD) é uma das mais intensas substâncias tóxicas conhecidas, usada como desfolhante (agente laranja) na guerra do Vietnã. • Alquifenois, empregados na produção de detergentes industriais e espermicidas. • Ftalatos, utilizados desde a década de 1930 na fabricação de conservantes, recipientes de alimentos e plásticos, sendo empregados para dar consistência, incluindo chupetas, garrafas de plástico e outros. • Bifenilas bromadas, empregadas na fabricação de retardantes de chamas. • Parabenos, utilizados na fabricação de perfumes e fragrâncias. • Benzofenona e cânferos, empregados na fabricação de filtros solares. • Vinclozolin, fungicida empregado na agricultura, como na cultura da uva e de outras frutas. • Tributil-estanho, utilizado na pintura dos cascos de embarcações como substância antimoluscos e antialgas. O interesse nesse amplo conjunto de produtos decorre de seus efeitos endócri­ nos de importância crescente na literatura enquanto substâncias químicas capazes de interagir com o eixo gonadal. Por exemplo, a exposição de animais ao bisfenol-A é capaz de reduzir a contagem e a motilidade de espermatozóides e causar altera­ ções no tecido mamário,2 refletindo seu potencial de interferir nos mecanismos fisiológicos do sistema endócrino. Nesse sentido, um mesmo desregulador endó­ crino como o bisfenol-A pode apresentar ações diversas órgão-específicas, sendo antiandrogênico, com efeitos antagonistas no testículo, e agonista, com efeitos estrogênicos na mama.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

Chh OH

Dihidrotestosterona

Dietilstilbestrol

OCH2

H2 CO

rco

2

H Hidroxifeniltricloroetano

O

Clordecona (Kepone)

C1 H2

FIGURA 38.1 Estruturas químicas de alguns compostos naturais e sintéticos capazes de interagir com receptor de estrógeno. Fonte: Fontenele é ta l., 2010.6

Como o fenômeno da homeostase endócrina é específico para cada indivíduo, e os níveis hormonais variam segundo o sexo, a idade e o momento no qual se realiza sua aferição, a caracterização da ação de um interferente endócrino também o é. Assim, as nuances advindas dessa especificidade geram dificuldades no estabelecimento de

Capítulo 38 Desreguladores endócrinos e eixo gonadal

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padrões que tipifiquem a partir de qual nível de exposição a uma dessas substâncias passará a ocorrer um efeito modificador do equilíbrio endócrino.3 D E S R E G U L A D O R E S E N D Ó C R IN O S : D E S F E C H O S R E P R O D U T IV O S

A ação dos diferentes interferentes endócrinos na esfera reprodutiva é múltipla, atinge ambos os sexos e pode manifestar-se em diversas faixas etárias. Entre estas, pode-se citar modificações na qualidade do esperma humano e animal, mortalidade fetal, Apgar instisfatório, baixo peso ao nascer, prematuridade, alterações na proporção de nascimentos de sexo masculino, puberdade precoce, infertilidade, disfunção erétil, malformações congênitas, síndrome dos ovários policísticos, endometriose, doenças tireoidianas e câncer de testículo, existindo evidências sugestivas em relação a sua as­ sociação causal com o câncer de mama.4'6 Um das características demográficas marcantes da espécie humana é a maior frequên­ cia de nascimentos masculinos, a qual é da ordem de 56% a 57% do total de nascimen­ tos. Ao longo da vida, a mortalidade no sexo masculino é superior que no feminino em todas as faixas etárias, acreditando-se que a maior frequência de nascimentos de varões tenha sido uma alternativa evolutiva compensatória. Em episódios de elevada contaminação ambiental, como o acidente em uma fábrica de dioxinas em Seveso, Itália, no ano de 1976, foi verificado declínio na proporção de nascimentos masculi­ nos.7 Tendência similar vem sendo observada nos municípios agrícolas do estado do Paraná, com grande produção agrícola e uso de pesticidas, verificando-se queda na proporção de nascimentos masculinos, que variam entre 40% a 50%.8 O efeito de interferência endócrina das substâncias químicas não é exclusivo para a espécie humana. Nos Estados Unidos, foi observado que sapos que vivem em lagos próximos a áreas agrícolas com uso intensivo do herbicida atrazine passaram a apre­ sentar disgenesia gonadal com hermafroditismo e oogênese testicular, o que caracteri­ za um fenômeno de feminilização quimicamente induzido da espécie.9 Um fenômeno oposto vem sendo descrito em ostras, cracas, algas, mexilhões e outros organismos marinhos expostos à substância química tributil-estanho, observando-se a masculinização da genitália feminina em caramujos marinhos com a formação de pênis e vas deferens, fenômeno denominado como imposex.10 Os 2 exemplos retratam que os impactos da exposição aos desreguladores endócri­ nos na saúde humana e na vida animal refletem um fenômeno comum, alcançando o conjunto de seres vivos, e que a análise de exposições isoladas de cada uma das ex­ posições ou das espécies atingidas seria insuficiente para uma abordagem abrangente do problema. O projeto Endocrine Disruption Research, 2007 (EDEN)11 consistiu em uma iniciativa de cientistas da União Europeia para analisar, de forma integrada, os efeitos dos interferentes endócrinos na vida humana e animal, explorando seus meca­ nismos de ação em misturas de substâncias e baixas dosagens de exposição. Cerca de 150 diferentes interferentes endócrinos foram analisados, e os resultados do projeto apontam para as evidências de que a exposição simultânea a diferentes interferen­ tes endócrinos tenha um padrão acumulativo. Os estudos experimentais evidenciam que desreguladores endócrinos de baixa potência e em níveis reduzidos de exposição podem interagir produzindo efeitos combinados quando presentes em quantidade suficiente. Nesse sentido, o Relatório Final aponta para a necessidade premente no de­ senvolvimento de biomarcadores da exposição acumulada aos interferentes endócrinos.

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O conjunto de trabalhos analisados confirma o papel do eixo hipotálamo-hipofisário como extremamente sensível aos efeitos dos interferentes endócrinos, os quais afetam diretamente o desenvolvimento sexual precoce observado após a exposição àquelas substâncias. O impacto acarretado na síntese de hormônios esteroides in­ clui a diferenciação sexual, a reprodução e outros processos não reprodutivos, como a neurodiferenciação.11 PR O G R A M A Ç Ã O IN T R A U T E R IN A

A partir da década de 1980, começaram a ser publicadas investigações que relatavam maior ocorrência de desfechos crônicos, como a mortalidade por doença coronariana, em localidades na Inglaterra caracterizadas por baixas condições de vida no início do século XX.12 Os indicadores de saúde nessas regiões na década de 1920 revelavam percentual elevado de nascidos com baixo peso, ou que apresentavam importante dé­ ficit ponderai nos primeiros anos de vida. Os resultados foram considerados surpre­ endentes, pois, com a descoberta dos fatores de risco associados às doenças cardiovas­ culares (hipertensão arterial, dislipidemia, diabetes tipo 2, tabagismo, sedentarismo, entre outros), a partir da década de 1960, esperava-se que as doenças cardiovasculares impactassem, sobretudo nas áreas de alto nível socioeconômico, e não nos grupos populacionais que viviam os primeiros anos de vida em condições de privação econô­ mica. Com o passar do tempo, evidências do mesmo tipo de associação passaram a ser descritas em relação à intolerância a glicose, ao diabetes melittus, à obesidade, à insufici­ ência renal e a diversos outros desfechos crônicos. As observações contribuíram para o surgimento da hipótese de que o feto tenderia a moldar o padrão de desempenho funcional de seus órgãos em função do microambiente no qual se desenvolve. Dessa maneira, frente às condições de restrição no aporte calórico (p. ex., fome materna, diabetes, entre outros), os órgãos do feto enfrentariam as condições restritivas em um processo adaptativo para sobreviver em condições de desempenho acorde com o microambiente circundante. Nesse sentido, o pâncreas de­ senvolveria menor quantidade de células beta, o coração teria menor quantidade de miócitos, os rins desenvolveriam menor quantidade de néfrons, entre outras altera­ ções que privilegiem o desenvolvimento do cérebro. Esse conjunto de modificações recebeu a denominação de hipótese de Barker, pela qual existiria uma plasticidade do desenvolvimento fetal, no qual o desempenho funcional de todo o organismo seria programado durante o período intrauterino.13 A modulação no organismo do feto em condições de restrição seria mediada pelo eixo endócrino hipotálamo-hipófise-adrenal, o qual estabeleceria a alocação de nu­ trientes segundo 3 esferas prioritárias no desenvolvimento fetal: crescimento, ma­ nutenção e reprodução. Os efeitos se caracterizariam pela redução no crescimento, exemplificado por meio de baixo peso ao nascer, menor massa muscular, crescimento reduzido do esqueleto e dos órgãos (menor número de néfrons e células beta no pân­ creas) e aumento na deposição de tecido adiposo. As alterações nas funções de manu­ tenção ocorreriam com a supressão da imunidade, a redução da capacidade de reparo dos tecidos e na sobrevida. Finalmente, em termos de alterações na estratégia repro­ dutiva, o feto seria programado para apresentar menarca precoce - possibilitando a precocidade da vida reprodutiva - e menor investimento na futura prole, com redução do peso ao nascer e na idade gestacional.14

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Nesse sentido, o surgimento de um novo ambiente na vida pós-natal (maiores demandas endócrinas frente a um maior aporte calórico, condições de estresse me­ tabólico e psíquico etc.) poderia levar à incapacidade metabólica de um indivíduo modulado para viver em condições de restrição. A programação intrauterina consis­ te, assim, em um processo pelo qual um estímulo ou um dano ocorrido em período crítico venha a repercutir de forma irreversível, com efeitos de longa duração no desenvolvimento do indivíduo afetado.15 O conjunto dessas concepções é interpre­ tado como constituindo o campo científico relativo às origens desenvolvimentistas da saúde e do adoecimento humano - Developmental origins ofhealth and disease, (DOHaD).16 Um das contribuições mais importantes de apoio às concepções da programação intrauterina no processo de adoecimento humano foi possibilitada por um conjun­ to de estudos epidemiológicos desenvolvidos a partir do episódio conhecido como o “Inverno da Fome” (The Hunger Winter). No ano de 1944, a Resistência Holandesa à ocupação do país pelas tropas alemãs desenvolveu diversas atividades de sabotagem, às quais se sucedeu intensa represália, incluindo o corte na distribuição de alimentos naquele país. Assim, o inverno de 1944-45 caracterizou-se como um período de fome intensa, com cerca de 20 mil mortos, afetando particularmente a região sudoeste do país (http://www.verzetsmuseum.org/tweede-wereldoorlog/en/kingdomofthenetherlands/thenetherlands,june_1944_-_may_1945/the_hunger_winter). Após o término da guerra, iniciou-se um estudo epidemiológico, no qual se buscou reconstruir a co­ orte de nascidos vivos na Holanda naquele período para acompanhamento. Com base nos registros de nascimentos e arquivos paroquiais, foi possível identificar o exato período (trimestre da gravidez) no qual os indivíduos encontravam-se no período intrauterino em relação aos meses do inverno de 1944-45.14 (Lumey et a i, 2007) Essa coorte vem sendo desde então acompanhada e, graças ao monitoramento, observou-se que os indivíduos que se encontravam no primeiro trimestre da gravidez durante o inverno de 1944-45 apresentaram riscos mais elevados ao longo da vida de desenvol­ verem alterações na tolerância a glicose, perfil lipídico aterogênico, obesidade, doença coronariana, microalbuminúria, esquizofrenia, distúrbios afetivos, personalidade an­ tissocial e câncer de mama (Kyle e Pichard, 2006). Em conjunto, os resultados deram consistência à plausibilidade para a ocorrência dos efeitos descritos como associados à programação intrauterina. D E S R E G U L A D O R E S E N D Ó C R IN O S E P R O G R A M A Ç Ã O I N T R A U T E R I N A

A capacidade de os interferentes endócrinos provocarem alterações na programação intrauterina, com efeitos de longo prazo na prole de gestantes a eles expostas, vem igualmente sendo documentada. Um exemplo clássico de relevância dos interferen­ tes endócrinos na programação intrauterina foi a identificação de um agrupamento de 8 casos de câncer de vagina em mulheres com menos de 30 anos na região de Boston, Estados Unidos, em meados da década de 1980.17 Sendo uma neoplasia rara, e com distribuição característica nas mulheres idosas, a concentração no tempo (al­ guns poucos anos) e no espaço (mesma região geográfica) da doença em uma faixa etária atípica (adolescentes e adultas jovens) levantava a hipótese de alguma mudança ambiental relativamente recente como a possível explicação para o agrupamento da doença em mulheres jovens. Realizou-se um estudo epidemiológico caso-controle, no

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

qual foram entrevistadas aquelas 8 pacientes e suas mães, bem como 32 pacientes sem câncer de mesma faixa etária e suas respectivas mães. Os antecedentes de diversas exposições das pacientes ao longo da vida e de suas mães durante a gestação (ra­ diação ionizante, fumo, contato com animais domésticos, exposições ocupacionais, entre outros) foram analisados e, dessa maneira, foi possível observar que, durante a gestação relativa a 7 das 8 mulheres jovens com câncer de vagina, suas mães haviam feito uso do medicamento dietilstilbestrol (p < 0,0001). A investigação evidenciou que essa terapêutica, adotada nas décadas de 1950 a 1960 no tratamento de ameaça de abortamento espontâneo, era a responsável pelas alterações ocorridas durante o período intrauterino daquelas pacientes, ocorridas cerca de 2 décadas ou mais antes do início da doença. Desde então, é crescente na literatura a identificação de substâncias que atuam como interferentes endócrinos ao longo da vida, e inclusive durante o período prénatal, possibilitando, assim, sua ação na programação intrauterina. Uma dessas subs­ tâncias é o bisfenol-A, cuja semelhança estrutural com o dietilstibestrol é maior que a existente com o estradiol. O fato tem sido apontado como uma evidência de que substâncias químicas com estrutura variável podem ligar-se aos receptores de estrógeno, desencadeando efeitos semelhantes àqueles que ocorreriam sob a ação de hor­ mônios endógenos.18 No caso do bisfenol-A, a ação estrogênica tem sido associada, entre outros, a alterações precursoras na carcinogênese m am ária (hiperplasia ductal e carcionoma in situ) em animais,2 bem como em uma esfera ampla de efeitos associa­ dos à exposição.18 A modificação nos padrões de qualidade do esperma, incluindo redução em sua contagem e motilidade, vem igualmente sendo descrita em países industrializados.19 Já no início dos anos 1990 se observava declínio importante na contagem espermática ao longo das 5 décadas anteriores.20 Embora a natureza da tendência seja ainda considerada controversa,21 a infertilidade consiste em problema de saúde igualmente crescente e relacionado com a qualidade do esperma, cujos fatores causais incluem a exposição intrauterina aos interferentes endócrinos. Uma investigação que analisou a correlação entre vendas de pesticidas, em 1985, em diferentes estados do Brasil e a realização de espermograma pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em homens de 20 a 59 anos, durante o período de outubro de 1999 a setembro de 2000, observou corre­ lação positiva (r = 0,60) entre ambas distribuições.22 Em um estudo descritivo sobre a qualidade do esperma, realizado em 127 adolescentes não fumantes de 14 a 17 anos considerados saudáveis em uma escola técnica de São Paulo, observou-se que 17,7% apresentavam motilidade < 50%; oligospermia (concentração menor que 5 milhões/mL) estava presente em 7,3%, e azoospermia, em 1,8%.23 Outro impacto relevante relacionado com a ação antiandrogênica de alguns desreguladores endócrinos diz respeito à incidência de malformações congênitas em ho­ mens, sobretudo criptorquidia e hipospádia. A maturação sexual e a função repro­ dutiva são dependentes da homeostase de hormônios esteroides, e a exposição do feto a substâncias com ação estrogênica ou antiadrogênica pode modificar sutilmente a relação entre estrógenos (endógenos ou exógenos) e andrógenos, afetando a diferen­ ciação sexual dos fetos do sexo masculino. Durante a embriogênese, as gônadas se desenvolvem inicialmente a partir do tu­ bérculo genital, originado ao redor do 34° dia após a ovulação e localizado nas ad­ jacências dos rins embrionários a partir do mesmo tecido. Sob a ação hormonal, as

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gônadas embrionárias começam a migrar pelo abdômen, alojando-se nas fossas ilíacas para formar os ovários e, sob a ação da testosterona no homem, a migração persiste, prosseguindo até a bolsa escrotal. A ação antiandrogênica de interferentes endócrinos consiste em um dos fatores para a interrupção do processo, interrompendo o descen­ so dos testículos e conduzindo à anomalia congênita denominada criptorquidia. As hipospádias podem resultar de um fenômeno de fusão incompleta das pregas uretrais e serem também decorrentes da exposição a agentes antiandrogênicos. Em uma inves­ tigação realizada em uma coorte de 27.100 recém-nascidos ao longo de 2 anos em área de uso intensivo de pesticidas em Campina Grande, PB, foi observada prevalência ao nascimento de 2,1% de anomalias genitais, incluindo 0,85% de criptorquidia, 0,55% de hipospadia e 0,66% de micropênis.24 Os autores observaram que cerca de 80,4% dos pais e 58,6% das mães relataram uso de pesticidas e/ou outros interferentes endócri­ nos antes ou durante a respectiva gestação. O câncer de testículo apresenta taxas de incidência mais elevadas nos países desenvolvidos,25 sendo observado aumento de sua incidência em diversos países industrializados, embora as razões para essa tendência permaneçam em debate.26 A distribuição epidemiológica de sua incidência apresenta um padrão caracte­ rístico de elevação na faixa etária de 20 a 44 anos, com lento declínio em grupos etários de maior idade. Entretanto, em países como a Dinamarca, a magnitude da incidência de câncer de testículo vem aumentando sucessivamente nas coor­ tes mais jovens.27 Estes autores relataram que as taxas mais elevadas da doença nos homens nascidos em 1938 na Dinamarca (cerca de 16/100 mil), apresen­ tavam magnitude cerca de 50% menor que aquelas observadas nos nascidos 25 anos depois, em 1963. A observação da concomitância de homens apresentando riscos elevados de in­ fertilidade, malformações reprodutivas (criptorquidia e hipospadia) e câncer de tes­ tículo levou à definição de uma entidade nosológica denominada Síndrom e de Disgenesia Testicular (SDT),28 a qual está associada à ação de interferentes endócrinos em sua etiologia.29A existência da síndrome, posteriormente confirmada por outras investigações,19 contribuiu para que a observação de seus componentes (espermatogênese com prom etida, criptorquidia, hipospádia e/o u câncer de testículo) não fossem mais analisados como eventos independentes e isolados, mas sim enquanto diferentes etapas na história natural de adoecimento desencadeada pelos interferen­ tes endócrinos.30 Dessa maneira, a SDT foi classificada de acordo com sua apresen­ tação clínica, em que a presença de sintomas varia de acordo com a gravidade da sín­ drome: SDT leve, com predomínio das alterações espermáticas; SDT moderada, na qual a presença de criptorquidia pode acoplar-se à espermatogênese comprometida; e a SDT severa, na qual há maior frequência de sintomas, como espermatogênese alterada, criptorquidia ou hipospádia (Figura 38.2). Nas apresentações mais leves da síndrome, com predomínio do comprometimento da espermatogênese, a incidência de câncer de testículo é reduzida, elevando-se à medida que a gravidade da síndrome torna-se mais evidente.28 Segundo o Relatório Final do projeto EDEN, a exposição aos ftalatos na gravi­ dez pode alterar o desenvolvimento sexual masculino por retardar a diferenciação celular no embrião e outros efeitos moleculares decisivos na indução da SDT, in­ cluindo a supressão de células de Leydig ou a migração dos testículos para a bolsa escrotal.11

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

SDT leve

SDT moderada

SDT severa

FIGURA 38.2 Síndrome de Disgenesia Testicular (SDT). Fonte: Skakkebaek e t a i , 2001.28

D E S R E G U L A D O R E S E N D Ó C R IN O S N A P R Á T IC A C L ÍN IC A

□ Anamnese ambiental As exposições ambientais representam um acessório importante na atividade profis­ sional e a anamnese ambiental deve ser incorporada na prática clínica.

Marcadores de exposição Um marcador dos efeitos da ação antiandrogênica de desreguladores endócrinos porventura presentes no período intrauterino que vem atraindo recentemente a atenção de pesquisadores é a distância anogenital aferida nos recém-nascidos com o emprego de um paquímetro (Figura 38.3). Esse parâmetro antropométrico consis­ te na medida do comprimento entre o centro do ânus e a primeira dobra da bolsa escrotal, ou até a comissura posterior dos lábios na vulva. Uma medida alternativa desse parâmetro consiste no comprimento da distância entre o centro do ânus e a inserção cefálica do pênis ou do clitóris. A distância anogenital é maior nos homens, e o interesse científico decorre da observação em alguns estudos de que o parâmetro encontra-se diminuído em homens expostos no útero a agentes antiandrogênicos.29 A distância anogenital tem se revelado um indicador sensível dos efeitos da exposi­ ção a interferentes endócrinos na gestação, como os ftalatos, substâncias químicas antiandrogênicas. Foi observado que os meninos menores de 3 anos de gestantes com maior exposição a interferentes endócrinos mensurados na urina durante o pré-natal apresentaram diminuição da distância anogenital.31 A diminuição da distância anogenital foi também relatada em homens apresentando diminuição da fertilidade,32 bem como naqueles submetidos à cirurgia urológica para correção de hipospádia ou criptorquidia.9

Capítulo 38 Desreguladores endócrinos e eixo gonadal

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A mensuração da distância anogenital deve ser realizada em decúbito dorsal com as pernas flexionadas

Exame genital: mensuração da distância anogenital com paquímetro. Fonte: modificado de Salazar-Martinez e t a i , 2004.33 FIGURA 38.3

Janelas de exposição Os diferentes períodos do desenvolvimento humano são suscetíveis à ação de agen­ tes químicas, sendo denominados de janelas críticas de exposição a essas substâncias. Esses períodos caracterizam-se pela regulação hormonal da proliferação celular nos órgãos, da migração celular e do desenvolvimento de funções especializadas no orga­ nismo. Assim, p. ex., o período entre a 10a e a 16a semana da gravidez constitui uma janela crítica para o desenvolvimento do trato genital masculino enquanto, para o desenvolvimento da mama feminina, incluem-se os períodos entre o início da gravi­ dez até a 9a semana, aquele compreendido entre a 3 5 a e a 39a semana e também dos 9 aos 16 anos (www.emcom.ca/EM/windows.shtml). Dessa maneira, a identificação das janelas críticas de tempo sensíveis à ação das substâncias químicas é de grande importância na avaliação dos efeitos dos agentes químicos tóxicos, incluindo os inter­ ferentes endócrinos. Além dos efeitos das exposições químicas descritos no sexo masculino, outros efeitos das exposições ambientais têm sido também descritos na antecipação da pu­ berdade feminina. Em um estudo realizado na Dinamarca, foi relatado que a curva de distribuição do início da puberdade (estágio Tanner 2 do desenvolvimento ma­ mário) apresentou uma média de 9,86 anos com base em uma amostra de 995 ado­ lescentes no período de 2006 a 2008. Esses valores representam redução de cerca de 12 meses comparativamente aos resultados verificados em outra amostra de 1.100 adolescentes examinadas em de 1991 a 93, nas quais a média daquele parâmetro foi de 10,88 anos. A adoção de metodologia similar nos 2 estudos realizados em um intervalo de tempo reduzido, em uma população relativamente homogênea, revela a importância de modificações ambientais recentes como possível explicação para as diferenças observadas.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

Esse conjunto de evidências aponta para a necessidade de que os profissionais de saúde reflitam sobre o fato de que muitas enfermidades de seus pacientes talvez não constituam fenômenos puramente biológicos e isolados. Nessa perspectiva, muitas patologias são resultado de um amplo processo de diversas exposições ambientais ocorridas no passado, incluindo os primeiros anos de vida, o período intrauterino, ou mesmo prévias à sua concepção. Dessa maneira, a atividade clínica no âmbito da es­ fera reprodutiva deveria talvez passar igualmente a considerar a incorporação de uma exploração mais ampla das exposições ambientais e ocupacionais, incluindo aquelas de natureza química, tanto no paciente quanto em seus pais, e mesmo seus avós, de­ vido à persistência de modificações genéticas e epigenéticas, ao longo de gerações, de­ correntes de exposições ambientais.34 A exposição materna a diversas substâncias químicas ocorridas durante a gestação de um paciente adulto com transtornos reprodutivos - como aquelas veiculadas pelo fumo (inclusive o tabagismo passivo), pelas tinturas de cabelo, pelo uso de filtros so­ lares, pelos resíduos de pesticidas nos alimentos, pela inalação de poluentes do ar em moradias localizadas nas proximidades de áreas industriais ou áreas de queima de lixo, em decorrência da contaminação dos pais no exercício de suas atividades ocupa­ cionais ao longo da vida, entre outros exemplos -, são assim igualmente relevantes na prática clínica voltada para os pacientes com doenças reprodutivas, quanto as demais análises exploratórias de suas enfermidades. P E R S P E C T IV A S N O C O N T R O L E D O S D E S R E G U L A D O R E S E N D Ó C R IN O S

Embora existam alguns mecanismos de controle individual da exposição aos desreguladores endócrinos (p. ex., em relação ao tabagismo), tal controle só é possível de ser efetivo por meio de políticas públicas que possam abolir - ou limitar - a exposição das populações a essas substâncias nocivas à saúde. Nesse sentido, a participação dos profissionais de saúde, cientistas e da sociedade civil demandando a adoção de polí­ ticas de controle daquelas exposições tem desempenhado um papel historicamente importante, embora ainda incipiente, no avanço destas iniciativas. Foi graças às evidências científicas que o uso do DDT começou a ser banido a partir da década de 1970, embora, no Brasil, a plena proibição de sua fabricação, importação, exportação, estocagem e comercialização somente tenha se efetivado em 2009. A utilização do tributil-estanho foi proibida inicialmente pela marinha americana, em 1980, pela França, em 1982, pela Inglaterra, em 1986, e posteriormente pelos de­ mais países da Comunidade Europeia, na década de 1990. Já em relação ao bisfenol A, ainda produzido em fábricas na Espanha, na China e utilizado na manufatura de diversos materiais plásticos, o amplo conjunto de evidências sobre os efeitos estrogênicos decorrentes de sua exposição levaram o governo canadense a proibir a fabricação e a importação de mamadeiras contendo bisfenol-A, o que estimu­ lou sua substituição por similares de vidro, (http://query.nytimes.com/gst/fullpage.ht ml?res=9907E4DA103EF937A25753ClA9669D8B63&ref=bisphenola). Para o conjunto de interferentes endócrinos, os cientistas participantes do projeto EDEN lançaram, em 2005, um documento (The Trague Declaration on Endocrine Disrup­ tion) manifestando sua preocupação com a exposição da população aos interferentes endócrinos e, particularmente, com os efeitos a longo prazo na fertilidade masculina na Europa (http://old.env-health.Org/a/1821). Nesse sentido, o crescimento da reprodução

Capítulo 38 Desreguladores endócrinos e eixo gonadal

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assistida para casais jovens observado em diferentes países industrializados, incluindo o Brasil, tal como referido no Relatório Final do Projeto EDEN, poderia ser considerado um indicador da ampliação de um grave problema de saúde pública quanto à qualidade seminal, bem como de outros problemas na esfera reprodutiva existentes atualmente nas populações daqueles países. Esses passos representam, contudo, apenas o início de uma larga caminhada para as mudanças necessárias nos hábitos e estilos de vida das populações dos países in­ dustrializados. Neste percurso, será primordial o esclarecimento da população sobre a natureza destas exposições, muitas das quais são desconhecidas, assim como seus efeitos. Mesmo considerando-se as inconsistências e lacunas no conhecimento científico ainda presentes sobre a associação entre muitas substâncias químicas e seu potencial de atuarem como interferentes endócrinos, a postura preconizada por diversas entida­ des científicas é a da adoção do Princípio da Precaução. O princípio postula que, frente à incerteza sobre os efeitos da exposição a um agente desconhecido, deve-se buscar alternativas conhecidas e seguras. C O N C LU SÃ O

Para finalizar, podemos resumidamente afirmar que a exposição aos desreguladores endócrinos tem sido evidenciada como danosa à saúde humana e à saúde reprodutiva, em particular. Esta não se trata, entretanto, de apenas uma questão acadêmica. A mudança no padrão de exposição a essas substâncias pode ser alcançada, mas exi­ girá ampla atividade de esclarecimento das populações afetadas. Para que isso ocorra, será necessária a adoção de opções de mudança substanciais na forma de viver das sociedades contemporâneas, as quais sejam capazes de pressionar coletivamente pela implantação de políticas públicas capazes de controlar ou limitar a exposição aos des­ reguladores endócrinos. R E F E R Ê N C IA S B IL IO G R Á F IC A S

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

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Capitulo38

Desreguladores endöcrinos e eixo gonadal

537

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Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia E u d e r s o n K a n c T o u r in h o C a rlo s A . B r u g u er a

MAMA

As doenças da mama têm recebido especial atenção. O câncer mamário não é mais condição exclusiva de países ricos e atinge, de modo preocupante, países emergentes. No Brasil, o câncer de mama situa-se entre os 5 mais incidentes entre as mulheres, estimando-se em mais de 50 mil casos, atrás somente dos tumores de pele não melanoma.1 Considerando a alta mortalidade determinada pelo câncer mamário e consciente da importância do diagnóstico e tratamento precoces, progressos no âmbito da bioengenharia ampliaram a modalidade de instrumentos utilizados na investigação diag­ nóstica da doença. Naturalmente, as doenças benignas puderam ser criteriosamente mais bem avaliadas, reduzindo de maneira significativa o número de procedimentos cirúrgicos. O tema é visto sob vários aspectos, despertando interesse e preocupação, exigindo atenção e cuidados de vários especialistas e profissionais, de modo a preparar ações que visem à saúde mamária, ao diagnóstico e ao tratamento da doença, bem como à reabilitação da paciente. Mamografia é o exame rotineiramente solicitado no rastreio do câncer, de modo geral, a partir dos 40 anos em pacientes assintomáticos. A indicação do exame deve ser norteada pelo exame físico e pela história clínica câncer de mama em parentes próximos (p. ex). A ultrassonografia é modalidade de exame usualmente solicitado em complementação ao estudo mamográfico, visando caracterizar melhor determinados achados, e quando as mamas se revelam densas de modo a impossibilitar identificação de lesões. Outras indicações da ultrassonografia incluem crianças e mulheres jovens com alte­ rações à palpação ou na paciente de alto risco, assintomática; na mulher grávida, na vigência de processo inflamatório ou na orientação de procedimentos invasivos. A ressonância magnética vem sendo utilizada de modo crescente. Tomografia por emissão de pósitrons (PET) e outras modalidades de imagens, como tomossíntese e elastografia, são menos utilizadas no presente.

IMPORTANTE Q u a n d o o ex am e é in d ic a d o p a ra ra stre io , p ressu p õ e -se q u e d e te rm in a d o s a c h a d o s serão d e te c ta d o s e, e n tre eles, a lg u n s serão m a lig n o s. D ia g n ó s tic o é a h a b ilid a d e de ca ra c te riz a r c o m o b e n ig n o o u m a lig n o u m a lesã o d e te c ta d a .2

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 539

FIGURA 39.1 Mamografia mediolateral.

A mamografia é realizada, rotineiramente, em 2 incidências fundamentais: a craniocaudal e a mediolateral, esta inclui maior volume de tecido, sendo realizada em inclinação de 45° ou pouco mais (Figura 39.1). São as incidências de rastreio, utili­ zadas na detecção. Incidências ou técnicas especiais são úteis em complementação ao estudo de base com o objetivo diagnóstico, visando ao aprofundamento da análise de determinado achado. A relação entre tecido fibroglandular e adiposo varia em função da idade, da parida­ de, das características individuais, entre outros fatores. Além disso, quanto maior for a participação de parênquima fibroglandular, no caso das mamas densas, maior será a dificuldade diagnóstica em relação ao exame mamográfico. Na década de 1990, surgiu o Breast Imaging and Reporting Data System (BI-RADS®) elaborado com a contribuição de especialistas de diversas áreas, representando várias instituições (Colégio Americano de Radiologia, Instituto Nacional do Câncer, da Administração de Alimentos e Drogas, do Colégio Americano de Cirurgiões, de Patologistas, Centros de Controle e Prevenção de Patologia Mamária). Os objetivos do BI-RADS® são padronizar os laudos mamográficos e sistematizar a linguagem na descrição dos achados, comprometendo o radiologista mediante a impressão diag­ nóstica expressa sob a forma de categorias e recomendando conduta. Encontra-se o BI-RADS® na 4 a edição (dez/2003), mercê do aperfeiçoamento ocorrido no curso do tempo. Nessa ocasião, o BI-RADS foi estendido para ultrassonografia e ressonância magnética. Desse modo, a linguagem é uniforme, não sendo possível a utilização de palavras ou termos ambíguos que possam criar dificuldades quanto à interpretação. Não há, pois, espaço para terminologia pessoal, eliminando-se o conflito quanto à interpretação da imagem e à conduta médica.3'5

540

Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 39.2 Em A, mama densa. A maioria dos nódulos tem densidade similar sendo difícil

sua identificação. Em B, o predomínio de gordura favorece a identificação das lesões mamárias.

O sistema prevê a classificação das mamas consoante a quantidade relativa de parênquima fibroglandular/tecido adiposo. A composição mamária estabelece: • • • •

Mamas densas: 75% ou mais de componente fibroglandular. Mamas heterogeneamente densas: 51% a 75%, de componente fibroglandular. Mamas parcialmente gordurosas: 26% a 50%, de componente fibroglandular. Mamas predominantemente adiposas: 25% ou menos, do componente fibroglandular.

Dessa classificação, havemos de entender que quanto maior for o componente fi­ broglandular maiores serão as dificuldades em relação ao diagnóstico, porquanto re­ duz a sensibilidade da mamografia. No outro extremo, mamas predominantemente adiposas criam ambiente altamente favorável ao diagnóstico (Figura 39.2). Diferentes categorias foram criadas, obrigando o radiologista a assumir compro­ misso quanto à interpretação dos achados após a análise da mamografia. Laudos me­ ramente descritos deixam de existir mercê da obrigatoriedade de referir a categoria na qual se enquadra a lesão. E, para cada tipo de categoria, é norteada uma conduta. As categorias previstas na quarta edição variam de 0 a 6, conforme resumido na Tabela 39.1: • Categoria 0: o exame é inconclusivo e exige avaliação adicional. Para o esclareci­ mento, podem ser necessárias incidências especiais, compressão localizada, ampliação de imagem ou outro tipo de exame. A ultras sono grafia é frequentemente requisitada na complementação da categoria 0. • Categoria I: não se observam alterações (negativo). As mamas são radiologicamente normais. Recomenda-se novo exame mamo gráfico no intervalo de 1 ano (paciente com 40 anos ou mais).

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 541

• Categoria II: nesta categoria, os achados são interpretados como benignos. Incluem fibroadenomas calcificados, calcificações secretórias, calcificações com centro radiotransparente, calcificações vasculares e de fios de sutura, nódulos com componente adiposo (lipoma, hamartoma, cisto oleoso), implante mamário, distorção pós-cirúrgica etc. A conduta é a mesma para a categoria I (Figura 39.3). • Categoria III: provavelmente benigno. Nesta categoria, encontram-se as lesões com características que sugerem benignidade, mas nas quais não se pode excluir a possi­ bilidade de malignidade. A incidência de doença maligna nesta categoria é de 2% ou menos. Inclui nódulos circunscritos sem calcificação, grupamento de microcalcificações monomórficas e isodensas e assimetria focal. A proposta para esta categoria consiste no acompanhamento mamográfico da lesão em curto intervalo (6/6 meses) por tempo não inferior a 2 anos. Uma vez confirmada a estabilidade da lesão, a reclassificação será feita, incluindo-a na categoria II (Figura 39.4). O seguimento mamográfico não contempla as pacientes que desenvolvem ansiedade, que residem em lugar longínquo sem estrutura para o acompanhamento, que desejam gestar em curto prazo. • Categoria IV: suspeito. Nesta categoria, estão incluídos os achados que não possuem aspectos tipicamente malignos, mas sinalizam para a probabilidade superior à da categoria III. Está subdividida de IV A, B e C, traduzindo suspeita leve, intermedi­ ária e moderada, respectivamente. Para as lesões inclusas nesta categoria, está indicado prosseguir a investigação, habitualmente com biopsia, visando ao estudo histopatológico (Figura 39.5). • C ategoria V: altamente suspeito. Trata-se de lesões com elevada probabilidade de malignidade (> 95%). O aspecto mamográfico é tão fortem ente sugestivo, que o tratamento cirúrgico pode ser cogitado sem a biopsia prévia. No entanto, considerações oncológicas podem exigir a realização do estudo histopatológico (Figura 39.6). • Categoria VI: malignidade conhecida. A lesão inclusa nesta categoria já foi biopsiada, estudada histologicamente e classificada como maligna antes do início de qualquer terapia.

TABELA 39.1 Categoria

Resumo das impressões diagnósticas e condutas Interpretação

VPP

Conduta

0

In c o n c lu s iv o

I

N e g a tiv o (n o rm a l)

0%

E x a m e a n u a l (> 4 0 a n o s)

II

B e n ig n o

0%

E x a m e a n u a l (> 4 0 a n o s)

III

P ro v a v elm en te B e n ig n o

2% 95%

B io p s ia

VI

L esã o m a lig n a co m p ro v a d a

VPP:Valor preditivo positivo.

E x a m e a d ic io n a l

542

Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 39.3 Categoria II: Nódulo circunscrito, com calcificações grosseiras.

Fibroadenoma.

FIGURA 39.4 Categoria III: Nódulo circunscrito, homogêneo, contorno re­

gular. Indicado segmento semestral.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 543

FIGURA 39.5

Categoria IV: Densidade focal, suspeita, no QSE da mama direita. Necessária biopsia para esclarecimento.

FIGURA 39.6 Categoria V: Nódulo denso, irregular, espiculado, determinado

retenção dos tecidos circunvizinhos. Aspectos típicos de câncer.

544

Endocrinologia Feminina e Andrologia

□ Alterações funcionais Alterações fibrocísticas constituem condição comum nas mamas e traduzem um con­ junto de alterações dos dutos e do estroma. As alterações podem se apresentar de for­ ma isolada ou coexistir com outras. A formação de cisto é a alteração mais comum. O cálcio sob a forma de fosfato e de oxalato pode se depositar na mama, enriquecendo o quadro de alterações.6 Referidas como alterações funcionais benignas da mama, acometem grande número de mulheres,, e as manifestações clínicas são representadas por dor e espessamento mamário. Alterações císticas e fibrose são comuns na mama. Ainda não está definido se integram um conjunto de alterações que ocorrem espontaneamente em uma fase da vida ou sobre elas deva-se olhar sob o aspecto patológico. O termo “alterações funcionais benignas da mama”, difundido mais amiúde nas 2 últimas décadas, traduz o entendimento de mudanças naturalmente esperadas em dado período da vida da mulher. A palpação, é comum identificar aspecto heterogêneo, algo nodular, com zonas de espessamento. A análise da mamografia nem sempre é fácil mercê das alterações histológicas associadas ao maior acúmulo de líquido e da superposição de imagens, podendo, às vezes, simular outras condições patológicas.7 Ao exame ultrassonográfico, os aspectos são igualmente variáveis, identificandose parênquima fibroglandular heterogêneo com áreas de atenuação e/ou aspecto nodular associado a cistos de tamanho variado. Os cistos são desprovidos de impor­ tância, salvo quando presentes em mamas de mulheres que integram grupo de alto risco com história familiar. O risco é 3 vezes maior, embora não haja explicações no momento.8 Em face da variedade de apresentação, vezes há em que imagens de aspecto suspeito na mamografia ou no ultrassom conduzem a paciente a submeter-se a procedimento de biopsia, com vista ao esclarecimento diagnóstico.

D Mama x hormônio exógeno O uso de estrógeno e progestógeno de modo contínuo e por tempo prolongado aumenta o risco para câncer de mama.9 Admite-se que a ação hormonal na terapia de reposição atuaria como fator promocional de um processo já iniciado. A mama necessita de muitos anos para se desenvolver, e sua maturação é comple­ tada com a gravidez. Apresenta, ao longo da vida, processo involutivo caracterizado radiologicamente pela redução do parênquima fibro glandular e pelo aumento do componente adiposo. Em algumas mulheres, esse processo se inicia precocemente; em outras, são necessárias várias décadas para que o tecido adiposo substitua ampla­ mente as estruturas fibro glandulares. Mamas ricas em gordura apresentam condições propícias para que imagens suspei­ tas sejam identificadas precocemente no exame mamográfico de rastreio. Em contraste com a mama densa, cujas dificuldades diagnósticas são conhecidas, a mama gordurosa é radiotransparente, tornando fácil a demonstração das várias formas de apresentação do câncer.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 545

Uma pequena parcela de mulheres submetidas à terapia hormonal (TH) apresen­ ta aumento da densidade mamária, quer difusa ou focal (Figura 39.7). As alterações focais devem ser avaliadas com cuidado porquanto representam uma das formas de

Paciente em que houve aumento de densidade mamária após TH. Em A, mama antes da TH. Em B, dois anos após. FIGURA 39.7

FIGURA 39.8 Em A, nódulo identificado após 1 ano do inicio da TH. Em B, o exame ultrassono-

gráfico revela tratar-se de cisto.

546

Endocrinologia Feminina e Andrologia

apresentação do câncer. Considerando que a TH por tempo prolongado e contínuo aumenta o risco de câncer de mama, achados mamográficos no curso do tratamento devem merecer especial atenção. De modo geral,, nos casos duvidosos,, o exame ultrassonográfico ou a suspensão temporária por 2 a 3 meses tem permitido a correta interpretação (Figura 39.8). Ú T E R O E O V Á R IO S

Desde o descobrimento da ultrassonografia e sua difusão no mundo ginecológico e obstétrico,, a possibilidade de aplicá-la no controle da ovulação ocupou o mundo cien­ tífico, primeiro por via suprapúbica, com muitas limitações,, e depois por via transva­ ginal, que é utilizada na maioria dos departamentos especializados. E imprescindível a repleção vesical ao limite da tolerância, habitualmente obtida mediante a ingestão de 3 a 4 copos de água 1 hora antes do exame. O desconforto e as limitações técnicas reduzem o número de solicitações desse exame por essa via. O exame por via transvaginal é realizado com a bexiga vazia, podendo-se abordar útero e ovários ao posicionar o transdutor na vagina, protegido por um preservativo descartável, no qual se coloca pequena quantidade de gel ultrassónico. Isso evita que bolhas de ar constituam impedimento à transmissão do ultrassom, obtendo-se, por essa via, excelente representação anatômica. Os ovários se localizam seguindo os habituais reparos anatômicos, que são os gran­ des vasos pélvicos até o fundo de saco de Douglas. Os transdutores intracavitários operam com frequência habitual de 6,5 MHz e um alcance de imagem aproximada de 8 cm. Se com essa técnica não forem visíveis, é possível recorrer à via suprapúbica com prévio enchimento da bexiga.



Monitorização de ovulação

Para melhor visualização dos ovários utilizamos a ultrassonografia pélvica transvaginal e, nas pacientes virgens, a via suprapúbica ou transretal. Encontramos 2 ou 3 pequenos folículos menores que 9 mm. Em alguns casos, observa-se uma coroa de pequenos folículos sem aumento ovariano significativo que alguns denominam “micropolicístico”, mas, por tratar-se da etapa pré-menstrual, consideramos mais apropriado denominá-lo “micropolifolicular”, quando em adolescentes, posto que não se desenvolveram os siste­ mas hormonais de regulação da ovulação nem o sistema de alternância entre um ovário e outro. A situação é corrigida logo após alguns episódios menstruais sem tratamento. Por via transvaginal, é frequente encontrar vários folículos no ovário normal, como imagens de aspecto cístico, esféricas, de paredes internas lisas, com conteúdo líquido anecoico de tamanhos variáveis (Figura 39.9). E comum encontrar entre 2 e 3 folículos em cada corte. O folículo cresce progressivamente até o 14° dia, che­ gando a um tamanho aproximado de 20 mm a 24 mm, até que rompe, reduzindo de tamanho e, às vezes, com aparição de líquido no fundo de saco de Douglas ou periuterino (Figura 39.10). Durante o tempo de crescimento folicular, o Doppler mostra a presença de peque­ nas artérias espiraladas ao redor do folículo de baixa resistência periférica (elevada diástole), enquanto o ovário contralateral apresenta um fluxo de alta resistência, já que não requer oxigênio e nutrientes na mesma magnitude que o portador de folículo em maturação.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 547

FIGURA 39.9 Ovário normal com folículos em desenvolvimento visto por via transvaginal.

FIGURA 39.10 Em A, folículo maduro com 20 mm de diâmetro. Em B, aspecto após ocorrido a ovulação. Em C, fluxo vascular do corpo lúteo ao Doppler colorido. Em D, líquido em torno do útero após ter havido rotura folicular.

A maioria dos autores dedicados à reprodução assistida prefere realizar a punção do folículo antes do 14° dia, pois a essa altura já podem encontrar corpos lúteos no lugar folículos.

548 Endocrinologia Feminina e Andrologia

A estimulação hormonal do ovário deve-se controlar com os 3 maiores folículos. Pode suceder a hiperestimulação, com o desenvolvimento extraordinário dos folículos e risco para a paciente, o que exige controle mais frequente. Imediatamente após a rotura do folículo, que se evidencia pela diminuição do seu tamanho e pela alteração da forma, aparecem alguns finos ecos no seu interior re­ sultantes de pequeno sangramento e observa-se espessamento das paredes, além de retração, característica do corpo lúteo. O Doppler revela que o corpo lúteo tem abun­ dante vascularização, possivelmente em preparação para a produção de hormônios na primeira etapa da gravidez (Figura 39.10). Alguns folículos demoram a romper pela presença de uma enfermidade infla­ matória pélvica desconhecida até este momento, ou como característica particular do paciente. A regra de que a ovulação ocorre habitualmente entre os dias 9 o e 17° não é muito precisa. Temos visto gravidez com ovulação fora dessas datas, habitu­ almente em torno do 18° dia, excepcionalmente em dias próximos da menstruação. Contribui com essa questão o fato de que o óvulo pode sobreviver até 72 h no peritônio, e os espermatozóides, até 48 h nas mesmas condições. A ruptura folicular é habitualmente indolor, embora algumas pacientes tenham clara sensação dolorosa do lado que estão ovulando. Não existe um limite cientificamente comprovado a despeito do tamanho máximo a que chega um folículo antes de romper. Contudo, há consenso de que a partir dos 50 mm de diâmetro se chama “cisto” basicamente pelo risco que implica sua ruptura, sua torção ou seu sangramento agudo. De todo modo, àquelas pacientes que vão ser submetidas à intervenção cirúrgica de um cisto com essas características, se aconselha a realização de uma ultrassonografia nos instantes antes da transferência para o cen­ tro cirúrgico (Figura 39.11).

FIGURA 39.11 Formação cística de 50 mm de diâmetro no ovário esquerdo, visto

na ultrassonografia pélvica.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 549

Existem múltiplos protocolos protocolos para o controle preciso da ovulação. A via utilizada é uniformemente a transvaginal. Começa-se habitualmente com um exame no 9 o dia do ciclo, seguido de outro no 12° dia. Daí em diante, recomenda-se fazer outro no 14° dia e, se o folículo persistir, seguir fazendo a cada 48 h até sua ruptura. Geralmente este protocolo se estabelece em um comitê com os componentes da equi­ pe de reprodução assistida, modificadas pelas condições particulares de cada paciente e seu histórico de outros controles ou estimulações anteriores. Durante o ciclo menstrual, ocorrem modificações no endométrio, visíveis ao ultras­ som. A camada basal não se altera durante o ciclo e dela se origina a camada funcional e emergem os vasos que vão nutri-la. A espessura endometrial é avaliada tomando-se como ponto de reparo a interface do miométrio/endométrio. A camada funcional so­ fre mudanças de espessura e ecogenicidade ao longo do ciclo, tendo cerca de 2 mm a 3 mm após a menstruação, cerca de 4 mm a 5 mm, em torno do 8 o dia, e em fase folicular tardia, entre 8 mm a 12 mm. Alterações da ecogenicidade são visíveis e decorrem da proliferação e do arranjo glandular, do depósito de mucina e glicogênio na camada funcional e de alterações vasculares. Na fase periovulatória, é hipoecoico com aspecto trilaminar e, na fase pré-menstrual, é ecogênico e homogêneo (Figura 39.12).

D Monitorização na menopausa Na menopausa ocorre a involução do tecido ovariano que se manifesta ultrassonograficamente por uma diminuição de seu volume e de sua ecogenicidade. O volume do ovário na mulher adulta normal no menacme oscila entre 5 cm3 e 6 cm3, calculado pela equação que consiste em multiplicar os 3 diâmetros e o produto final por 0,52. A maioria das equipamentos proporciona diretamente o volume a partir das medidas dos 3 diâmetros. O aspecto ultrassonográfico se modifica substancialmente na menopausa. O ovário passa a ser um tecido homogeneamente ecogênico alterado só pela ausência de folículos, tendo centro ecogênico e periferia hipoecoica. Essa con­ dição provoca às vezes dificuldade por ser similar ao aspecto do intestino, que tem um centro hiperecogênico correspondente à mucosa e uma periferia hipoecoica similar à parede muscular.

FIGURA 39.12 Em A, imagem longitudinal do útero obtido por via transvaginal na fase pósmenstrual. Note que o endométrio é fino. Em B, imagem uterina obtida no mesmo plano por via transvaginal no período periovulatório. Observe que o endométrio tem maior espessura e é hipoecoico, com aparência trilaminar.Três pequenas imagens ecogênicas foram identificadas sugerindo pólipos. O estudo histeroscópico confirmou os achados do exame ultrassonográfico.

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Endocrinologia Feminina e Andrologia

O método convencional de explorar a pelve feminina por meio da bexiga cheia per­ de valor na menopausa, sendo frequente a não visualização dos ovários por seu tamanho pequeno, motivo pelo qual alguns especialistas finalizam o laudo com o texto “não se visualizam os ovários nem massas anexiais”. O método ultrassonográfico adequado é pela via transvaginal realizada com a be­ xiga vazia e com abundante lubrificação do preservativo, já que, com a menopausa, há perda da elasticidade e lubrificação na parede vaginal, o que pode resultar na introdução dolorosa do transdutor. Após colocar o transdutor e de identificar o útero e o endométrio, o examinador se dirige aos anexos, buscando os reparos anatômicos habituais para o ovário, que são os grandes vasos pélvicos. A presença de cirurgia vulvar, infecção ou virgindade é um impedimento para a via transvaginal. Nesses casos, pode-se optar pela via transretal que tem a mesma precisão que a via transvaginal. O exame dos ovários na pós-menopausa com Doppler color e espectral é uma ferra­ menta de grande valor, já que, em condições normais, encontramos um perfil de velocida­ des com alta resistência periférica e diástole escassa ou reversa, representando que o órgão está consumindo pouco oxigênio e nutrientes justamente por seu estado involutivo. A aparição de um fluxo diastólico elevado em um ovário menopáusico está ligado à presença de tumores malignos que requerem oxigênio e nutrientes para seu cresci­ mento. E frequente a visualização de pequenos cistos simples na pós-menopausa que devem cumprir certos requisitos para serem considerados como tal (Figura 39.11): • • • • •

Cisto menores de 50 mm. Paredes internas lisas. Conteúdo líquido anecoico. Ausência de septos ou de proliferação intracística Doppler negativo (o Doppler deve mostrar alta resistência).

Cumprindo esses requisitos, a possibilidade de que se trate de um cisto maligno é muito baixa. Na pós-menopausa o endométrio atrofia tornando-se fino e não ultrapassando 5 mm de espessura. O sangramento que acontece na pós-menopausa deve ser bem avaliado, sobretudo no sentido de afastar a possibilidade de câncer, em face de sua letalidade. Em cerca de 10% dos casos o sangramento vaginal, nessa fase da mulher, deve-se ao câncer de endométrio cuja prevalência é baixa. Na vigência de sangramento genital com endométrio fino ao exame ultrassonográfico transvaginal, outra causa deverá ser considerada. Adenocarcinoma de endométrio é o mais comum nessa fase e tende a aumentar com a idade. Há sugestão no sentido de usar 4 mm como medida de espessura endometrial máxima porquanto tornaria mais alta a sensibilidade no sentido de excluir câncer. Nas pacientes submetidas a terapia hormonal cíclica aceitase espessura máxima < 9 mm. Endométrio atrófico, no entanto, representa a causa mais comum de sangra­ mento. Pólipos, hiperplasia endometrial e mioma submucoso representam outras causas (Figura 39.13 A,B,C e D). Endométrio atrófico tem como causa o hipoestrogenismo. Alterações clinicas si­ milares são observadas na vagina. Não raramente observa-se pequena quantidade de líquido na cavidade endometrial.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 551

FIGURA 39.13 Em A endométrio espessado, irregular e heterogêno supeito de câncer em paciente com 10 anos de menopausa e sangramento genital. Exame histeroscópico com biópsia e estudo histopatológico confirmou a impressão inicial. Em B útero visto no plano medianosagital evidenciado imagem nodular hiperecóica, circunscrita, na cavidade endometrial, forma usual de apresentação do pólipo. Em C endométrio espessado. Observe microformações císticas representativas de glândulas endometrias dilatadas. Em D mioma submucoso determinando compressão e desvio do endométrio. Todas imagens obtidas por via transvaginal.

Pólipos são formações benignas que se desenvolvem no endométrio, de origem pouco conhecida, constituindo causa de sangramento, sobretudo na perimenopausa e pós-menopausa e seu crescimento é estimulado pelo estrógeno e tamoxifen. Repre­ sentam aglomerado de glândulas endometriais hiperplásicas mescladas com estroma, originando-se a partir da basal, podendo ser sésseis ou pediculados, únicos ou múltiplos originando-se em qualquer sítio da cavidade endometrial. Pólipo maligno é raro. Usualmente, o exame histeroscópio contemplará aprofundamento do estudo, momento no qual a biópsia será realizada, ou mesmo sua completa remoção, seguido de estudo histopatológico. A hiperplasia do endométrio resulta da proliferação glandular anormal. E causa comum de sangramento e se desenvolve a partir da estimulação estrogênica sem apo­ sição. Ao ultrassom vê-se endométrio difusamente espessado, algumas vezes o espessamento é focal. Pequenas formações císticas podem ser observadas em muitos casos e representam glândulas dilatadas. O mioma uterino é o tumor mais comum na pelve feminina, sua prevalência é maior na fase reprodutiva. E causa pouco comum de sangramento na pós-menopausa,

552

Endocrinologia Feminina e Andrologia

tendo importância na gênese do sangramento os miomas submucosos pelo contato que apresentam com o endométrio comprimindo e deslocando-o.

O Ovários policísticos A síndrome dos ovários policísticos (SOP) inclui alterações da função ovariana, conju­ gada a hiperandrogenismo e mudanças morfológicas que sinalizam ovários policísti­ cos. Por constituir uma síndrome, nenhum dado isolado deve ser considerado critério para estabelecer o diagnóstico. Tem outros envolvimentos porquanto aumenta o risco de síndrome metabólica, diabetes tipo 2, provável doença cardiovascular e câncer do endométrio. A SOP deve ser considerada em qualquer mulher adolescente com hirsu­ tismo, acne persistente, irregularidade menstrual ou obesidade.10 O consenso de Rotterdam (2003) estabelece como critérios para o diagnóstico da SOP:11 • Oligomenorreia e/ou anovulação. • Sinais de hiperandrogenismo clínico e/ou bioquímico. • Ovário policístico ao ultrassom. Embora haja variedade na caracterização do ovário policístico, o consenso estabe­ lece critérios mais rigorosos porquanto incluir valores relativamente a sensibilidade e especificidade para defini-los. A técnica do exame ultrassonográfico preferencial é por via transvaginal, especialmente em obesas, e estabelece: • Volume >10 mL. • 12 ou mais folículos com 2 mm a 9 mm de diâmetro. Para cálculo do volume ovariano, é utilizada a fórmula (A x B x C) x 0,52 (A= com­ primento; B= largura; C= espessura). Os folículos tendem a ocupar a periferia dos ová­ rios e, no centro, destaca-se estroma amplo e de maior ecogenicidade (Figura 39.14). Na ausência de oligomenorreia e/ou amenorreia ou hiperandrogenismo, uma mu­ lher que apresenta ao exame ultrassonográfico ovário com aparência policística não

FIGURA 39.14 Em A, espécime anatomopatológico do ovário policístico exibindo pequenos

folículos periféricos e estroma amplo (Gentileza Prof. José Maria Barcelos). Em B a imagem ultrassonográfica obtido por via transvaginal. B a imagem ultrassonográfica obtida por via trans­ vaginal. Pequenos folículos na periferia ovariana observando-se, ao centro, estroma amplo e ecogênico.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 553

deve ser considerada portadora de SOP. Se houver folículo dominante com diâmetro maior que 10 mm, ou corpo lúteo, deve-se repetir a avaliação no ciclo seguinte. Informações com mais detalhes implicam a utilização de equipamento de ultras­ som de boa qualidade,, por via transvaginal, nas mãos de um experiente e paciente ultrassonografista. PR Ó STA TA

Embora a ultrassonografia possa ser utilizada em diversas condições relacionadas com doença prostática, na rotina clínica, suas indicações são mais limitadas. A ultrassono­ grafia transretal tida no passado como a modalidade técnica ideal para o rastreio do câncer prostático foi substituída pela pesquisa do antígeno prostático específico (PSA) associada ao toque retal. Profundamente situada na pelve, a próstata é acessível ao ultrassom por via transabdominal e transretal. A maioria dos trabalhos é elaborada com base na técnica transretal. Antes de iniciar o exame, deve-se ter em mãos resultado do toque retal, PSA e história clínica. A próstata é dividida em 4 zonas: a periférica, a de transição, a central e a glandular periuretral. A periférica representa a zona maior, com cerca de 70% do tecido prostático no paciente jovem, antes que se desenvolva a hiperplasia benigna, e constitui sede da maioria dos cânceres. A zona de transição é a menor, representa cerca de 5% do tecido glandular, porém tem importância, posto que nela se origina a hiperplasia prostática benigna.12 O estudo por via abdominal utiliza transdutor com frequência de 3,5 a 5 MHz e por via transretal de 5 a 7,5 Mhz. O volume prostático é calculado tendo como ponto de re­ paro os 3 maiores diâmetros: o longitudinal, o transverso e o anteroposterior, aplicandose a fórmula (L x T x AP) x 1,57. Considerando que há similaridade entre volume e peso, uma vez que 1 mL de tecido prostático equivale a 1 g, a medida de volume pode ser con­ vertida com peso.13 O peso da próstata no jovem é em torno de 20 g. O tempo necessário para duplicação do peso prostático a partir dos 50 anos é de 10 anos. O aumento da porção interna da glândula é a manifestação mais comum na hiper­ plasia prostática benigna, tendo ecogenicidade mais baixa em relação à zona periférica. Em face da combinação estroma/glândula, o padrão ecogênico se apresenta variado.14 Nódulos de diferentes ecogenicidades, calcificações e cistos de retenção podem estar presentes na zona de transição. Distúrbios urinários podem ocorrer em pacientes com hiperplasia prostática. Todavia, nem sempre o tamanho da próstata é proporcional às manifestações clínicas. Algumas vezes glândulas muito aumentadas coexistem com pacientes assintomáticos ou oligossintomáticos, e pacientes com glândulas relativamente pequenas apresen­ tam distúrbios importantes da micção. Diante da manifestação de prostatismo, o exame realizado por via abdominal per­ mite avaliar de modo satisfatório o tamanho da próstata, demonstrando o aumento do lobo médio. No mesmo ato, é possível realizar o exame da bexiga com observação de espessamento parietal, divertículos e eventuais tumores (Figura 39.15). Se necessá­ rio, o exame pode ser estendido aos ureteres, sistemas pielocaliciais e rins, obtendo-se, dessa maneira, visão panorâmica do aparelho urinário. A avaliação do resíduo pósmiccional pode ser feita ao solicitar que o paciente esvazie a bexiga, ocasião em que se determina o volume vesical remanescente.15

554 Endocrinologia Feminina e Andrologia

Se não houver suspeita de câncer, a ultrassonografia transretal será desnecessária, uma vez que a técnica por via abdominal contempla com informações o que o médico precisa para orientar a conduta. Caso sejam necessárias medidas prostáticas mais pre­ cisas, como para monitorizar o tamanho da glândula no curso do tratamento, deve-se usar a via transretal. Há outras causas de distúrbios urinários que não estão relaciona­ das com a próstata.

IMPORTANTE N o s ca so s de in fe rtilid a d e , p o d e ser u tiliz a d a a u ltra s s o n o g r a fia tr a n s r e ta l c o m v is ta à d e te c ­ çã o de ca u sa o b s tru tiv a en v o lv en d o as v esícu la s se m in a is, d ila ta ç ã o d os d u to s e ja c u la tó rio s e d e te c ç ã o de c is to s d a lin h a m é d ia q u e p o d e m c o n s titu ir b a rre ira à p ro g re ssã o d os esp er­ m a to z ó id e s.



Câncer de próstata

Excluindo o câncer de pele não melanoma, o câncer de próstata é o que mais incide no homem. Estimativas oficiais sinalizam para pouco mais de 60 mil novos casos para o ano de 2012.16 O rastreamento do câncer prostático é recomendado a partir dos 50 anos, ou dos 40 quando há história familiar. Visa à detecção precoce, em pacientes sem sintomas, oportunidade em que se pode aplicar com sucesso os recursos terapêuticos. Inicia-se com o toque retal e a dosagem do PSA. Este, por permitir identificar o câncer em fase inicial, trouxe como consequência redução significativa da doença metastásica.17 São necessários cerca de 10 anos para o câncer causar morte. Por isso, aplicam-se formas mais amenas de controle da doença após 75 anos de idade, uma vez que não haveria mudanças apreciáveis quanto à longevidade.12 O tratamento varia do uso de hormônios com finalidade paliativa à prostatectomia radical.

FIGURA 39.15 Exame realizado por via transabdominal. Em A, observe a próstata aumentada comprimindo o colo e assoalho vesical em paciente com hiperplasia. Pequena área hipoecoica (+) é vista na região periférica. Em B, a identificação de tumor de bexiga, assintomático, por ocasião do estudo da próstata em paciente com distúrbio urinário.

Capítulo 39 Imagens em Endocrinologia Feminina e Andrologia 555

O rastreio do câncer é realizado rotineiramente por meio da dosagem do PSA e do toque prostático. Aquele é normalmente secretado por células epiteliais dos dutos, ajudando a fluidificar o produto da ejaculação. Níveis elevados podem ser encontra­ dos no câncer, no entanto outras condições benignas podem elevá-lo, como prostatite, biopsia, hiperplasia benigna, cistoscopia. A coleta de sangue para a dosagem de PSA deve ser feita antes de qualquer manipulação da glândula.18 Níveis séricos normais de PSA, inferiores a 4 ug/mL, podem ser observados em pacientes com câncer de próstata. Caso o toque retal ou o exame ultrassonográfico se revele suspeito, a investigação deve prosseguir. A velocidade de aumento do PSA, no curso de 2 anos, contribui para a distinção entre hiperplasia benigna e câncer de próstata, uma vez que é mais rápido neste.19 A ultrassonografia prostática transretal, embora no passado tenham sido superes­ timadas suas indicações, tem atualmente 2 aplicações fundamentais: monitorizar a biopsia e orientar o tratamento. A maioria dos cânceres ocorre na zona periférica da próstata (70%) e apresenta bai­ xa ecogenicidade ao exame ultrassonográfico, sendo hipoecoico. A taxa de detecção do câncer pelo ultrassom transretal é similar à do toque retal, do PSA e da ressonância magnética. Considerando que 60% a 70% dos casos de câncer de próstata são demons­ trados pela ultrassonografia transretal, achados suspeitos ao toque e ao PSA e negati­ vos ao ultrassom devem encorajar para a realização da biopsia.19 Cerca de 30% dos casos de câncer de próstata são isoecoicos e difíceis de demonstra­ ção ao ultrassom em face de semelhança com ecogenicidade do tecido normal. Nesses casos, o emprego do Power Doppler permite estabelecer melhor a dimensão da lesão. O câncer que se manifesta ao exame ultrassonográfico como hiperecoico é infrequente. As características relacionadas com a ecogenicidade de um nódulo devem-se aos com­ ponentes histopatológicos presentes.20 Quando se programa biopsia prostática, tem de se ter em mente que o procedi­ mento, em face de suspeita clínica, deve contribuir para mudança na orientação do tratamento. A seguir, estão descritas as indicações para biopsia: • • • • • •

Toque retal suspeito. PSA >10 ug/mL. Há sugestões para redução do valor. Nódulo visível ao ultrassom transretal Velocidade de aumento do PSA excessiva. Fragmentos positivos na prostatectomia transretal. Pacientes com adenocarcinoma metastático com câncer primário não evidente.

Antes da realização da biopsia, alguns cuidados devem ser observados, como a in­ terrupção de drogas anticoagulantes ou antiplaquetárias, anti-inflamatórios não esteroides e outras drogas que possam interferir na coagulação.

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Caderno colorido

r

FIGURA 1.6 A. Aspecto pré-operatório de

uma paciente com DDS 46,XX por HAC, mos­ trando a hipertrofia do clitóris e o seio urogenital. Estão delineadas as incisões cirúrgi­ cas para a realização de um retalho cutâneo perineal em forma de "U" invertido para a vaginoplastia. B. Utilizada mucosa uretral (ou seio urogenital) para a reconstrução das partes anterior e lateral do introito vaginal. C. Aspecto final da genitália com 3 meses de pós-operatório.

B

Caderno colorido

Endocrinologia Feminina e Andrologia

E

FIGURA 1.7 Correção de hipospádia peniana proximal pela técnica de retalho trans­ verso do prepúcio dorsal, técnica de "Onlay" proposta por Duckett54.

FIGURA 16.1 Acne da mulher adulta forma comedoniana.

FIGURA 16.2 Acne da mulher adulta forma papulo pustulosa.

Caderno colorido

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Caderno colorido - IV

Endocrinologia Feminina e Andrologia

FIGURA 16.3 Paciente com AAG padrão em árvore de natal. À esquerda em

2002, com 22 anos; e à direita em 2012, com 31 anos.

FIGURA 19.2 Lesão endometriose superficial.

Endocrinologia Feminina e Andrologia

Caderno colorido

FIGURA 19.3 Endometriose ligamento uterossacro.

FIGURA 19.4 Pelve congelada por endometriose.

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Caderno colorido - VI

FIGURA 19.5 Endometriose no peritônio vesico uterino.

FIGURA 19.6 Endometriose no peritônio vesico uterino: ressecção.

FIGURA 19.7 Endometriose de bexiga e parede uterina anterior.

Endocrinologia Feminina e Andrologia

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Caderno colorido - VII

FIGURA 19.8 Endometriose de bexiga e parede uterina anterior: resseccão.

FIGURA 19.9 Endometriose de bexiga e parede uterina anterior: resultado final.

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FIGURA 19.10 Endometriose de plexo sacral: ressecção.

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Caderno colorido

FIGURA 19.11 Retossigmoidectomia vaginal assisistida por laparoscopia.

FIGURA 19.12 Ressecção Intestinal com grampeador linear.

FIGURA 19.13 Exérese de lesão superficial.