Drogas: entre a histeria e a ciência

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Drogas: entre a histeria e a ciência

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Dr ogas: entr e a hist er ia e a ciência Uma visão atual da Moralidade e das evidências mundiais e brasileiras sobre os entorpecentes por Alessandro Loiola, MD Copyright © 2019 ManhoodBrasil

Sobre a obra:

Os dados que alcançam o grande público realmente mostram o mundo das drogas e suas consequências? É possível algum progresso Moral e Prático para resolver este problema? Mais que isso: será que temos um problema com as Drogas? Como identificar o que é histeria e pseudo-moralismo e o que é realidade e lucidez em um assunto tão controverso?

As respostas para estas e muitas outras questões estão no novo lançamento exclusivo de ManhoodBrasil Edições: “Drogas: entre a Histeria e a Ciência” , e-book escrito pelo médico e filósofo capixaba Alessandro Loiola.

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A presente obra é disponibilizada pela equipe ManhoodBrasil e seus diversos parceiros com o objetivo de disseminar o conhecimento para uso em pesquisas e estudos acadêmicos. Caso tenha interesse em conhecer outros conteúdos produzidos por ManhoodBrasil, teremos o maior prazer em receber sua visita em nosso site e redes sociais: Site: www.manhoodbrasil.com.br Facebook: https://web.facebook.com/manhoodbrasil/ Instagram: https://www.instagram.com/manhoodbrasil/

Para contato com o autor: Email: [email protected] Facebook: https://web.facebook.com/alessandro.loiola.9

Índice 1. Introdução

2. Usos e Abu so s 3. Um Pouco Sobre as Campeãs de Audiência

4. Qu atr o Ar gu men tos Contr a as Dr ogas 5. Contr a-ar gu m entando a Fa vor das Dr ogas 6. Como Outros Países Lidam com as Drogas? 7. O que a Islândia Tem Para Nos Ensinar? 8. O Brasil Vive uma Epidemia de Entorpecentes? 9. Uma Visão Moral Nua, Crua e Utilitária 10. Conclusão

INTRODUÇÃO A maioria dos países permite o uso recreacional de substâncias psicoativas como cafeína, nicotina e álcool, mas proíbe o uso de outras. Muitas pessoas acham legítimo que alguém tome uns drinques para relaxar nas horas de folga – o happy hour, inclusive, se tornou um hábito bastante difundido nas grandes cidades –, mas qual seria a razão pela qual achamos tolerável permitir o uso de álcool para recreação enquanto proibimos o uso de outros entorpecentes com o mesmo propósito? Em quase todos os casos, as normas que tornam algumas drogas ilegais não se baseiam em evidências objetivas, mas em uma percepção emocional de sua imoralidade: consideramos algumas drogas “erradas” e ponto final. Nenhuma discussão é aceita além deste limite. Como sempre ocorre, o argumento ético inspira um apelo que supera a lógica, teoricamente sustentando-se por si só. Apesar desta retórica, é surpreendentemente difícil defender o motivo pelo qual o consumo de algumas substâncias é permitido e de outras não, como veremos a seguir.

US OS E AB US OS O fascínio com substâncias psicoativas vem sendo registrado desde que aprendemos a escrever: há relatos de uso de álcool no Egito e de ópio na Grécia, centenas de anos antes da era Cristã, e é bastante provável que nossa relação com estas e outras “drogas” seja bem mais antiga que isto. Com o tempo, a humanidade aumentou em tamanho, e nosso contato com as drogas também: de acordo com dados da ONU, cerca de 275 milhões de pessoas – ou 5,6% da população mundial entre 15 e 64 anos de idade – utilizaram drogas consideradas ilícitas pelo menos uma vez nos últimos 12 meses. Destas, 11% sofreram danos devido ao consumo e 0,06% morreram de overdose1. O número de mortes decorrentes do uso de drogas lícitas e ilícitas vem aumentando nas últimas décadas: em 1996, elas vitimaram 216 mil pessoas no mundo todo. Em 2016, foram 317 mil. Considerandose este período, o aumento de 46% no número de mortes por substâncias psicoativas foi acompanhado de um aumento de apenas 27% da população mundial (de cerca de 5,8 bilhões de pessoas em 1996 para 7,4 bilhões em 2016). Não morrem mais pessoas apenas porque existem mais pessoas no mundo: morrem mais pessoas porque o quebra-cabeça dos entorpecentes vem sendo abordado de maneira sistematicamente improfícua8,9. O risco de uso e abuso de drogas depende de fatores externos como disponibilidade, custo, método de administração e grau de aceitação por parte da sociedade. Todavia, os mecanismos que levam à dependência são influenciados por predisposições genéticas: estudos com gêmeos mostram que existe um componente hereditário que predispõe ao uso e ao desenvolvimento de adicção2. Estima-se que a genética contribua com cerca de 40% da capacidade de alguém desenvolver algum tipo de dependência, mas esta influência varia segundo a substância, o sexo e a idade: a herança genética responde por 49% da dependência de álcool entre homens (h) e 64% em mulheres (m); para cocaína, 44% (h) e 65% (m); para maconha, 33% (h) e 79% (m); e para cigarro 53% (h) e 62% (m). Dependências que surgem na tenra idade em geral estão relacionadas a fatores

ambientais, ao passo que dependências que surgem durante ou além da idade adulta costumam estar mais associadas à influência dos genes6. E aqui temos o primeiro ponto interessante com relação às drogas: elas fornecem mais uma evidência contundente da obviedade de que gêneros não são uma “construção social”, mas um fato biológico inegociável. Por razões genéticas, biológicas e hormonais, as mulheres tendem a ter respostas biológicas e psicológicas mais prazerosas a drogas como maconha, opioides, cocaína, anfetaminas e tranquilizantes. Naquelas com risco de dependência, o vício surge e se instala mais rapidamente em comparação aos homens na mesma situação, porém as doses utilizadas e os efeitos colaterais tendem a ser maiores. Por exemplo: os sintomas de abstinência após cessação do tabagismo são mais intensos nas mulheres, e os índices de recidiva são maiores. Nos homens, isto ocorre com bebidas alcoólicas3-5.

UM POUCO SOBRE AS CAMPEÃS DE AUDIÊNCIA Dentre as drogas mais populares na Pós-Modernidade, temos álcool, cigarro, maconha, cocaína e crack, anfetaminas, ecstasy, alucinógenos, opioides e opiáceos, tranquilizantes e antidepressivos. Álcool Em países desenvolvidos como Bélgica, Alemanha, França, Reino Unido, Austrália, EUA e Itália, o consumo de álcool vem diminuindo desde 1920. Atualmente, entre pessoas com mais de 15 anos de idade, o consumo anual per capita de álcool puro tem sido estimado em torno de 12 litros na Inglaterra, na França e na Rússia; 10 litros na Austrália e na Argentina; 9,8 litros nos EUA e Canadá; 7 litros na Itália e na China; e cerca de 8 litros no Brasil7. Cigarro Aproximadamente 35% dos homens e 22% das mulheres nos EUA utilizam nicotina, mas as mulheres estão sujeitas a mais complicações associadas ao tabagismo que os homens, e apresentam mais dificuldade para interromper o hábito4. No Brasil, 13% dos

homens e 9% das mulheres são fumantes – o dobro da prevalência observada na década de 198010. Em termos de morbidade, o tabaco representa 4,1% dos problemas de saúde relacionados ao consumo de drogas no mundo todo; o álcool, 4%; e todas as drogas ilícitas combinadas, apenas 0,8%2. Maconha Evidências indicam que a maconha já era utilizada há mais de 5.000 anos na região que hoje conhecemos como Romênia11. No século XXI, a cannabis conquistou o título de droga ilícita mais cultivada, vendida e utilizada em todo o mundo: segundo a Organização Mundial de Saúde, 2,5% dos habitantes do planeta – ou 147 milhões de pessoas – consome maconha pelo menos uma vez ao ano11. No curto prazo, a maconha pode resultar em sedação, perda de memórias recentes, comprometimento da coordenação motora e da capacidade de julgamento, ansiedade, ideações de autoextermínio, paranoia e psicose. Durante a gestação, o uso de maconha parece prejudicar permanentemente o desenvolvimento cerebral e a capacidade cognitiva do bebê12. No longo prazo, a cannabis pode levar à dependência química, comprometimento intelectual duradouro, bronquite, doenças cardiovasculares, osteoporose, síndrome do estresse pós-traumático, depressão e esquizofrenia2,11. Cocaína No século XVI, a cocaína trazida do Peru era recomendada na Europa como um tratamento medicinal. No século XIX, Freud a indicava como auxílio terapêutico em casos de melancolia, caquexia e exaustão física e psicológica. Entre 1880 e 1930, a cocaína chegou a ser considerada a panaceia dos novos tempos, e a partir dela foram desenvolvidos os primeiros anestésicos eficazes15. Entretanto, antes que a primeira metade do século XX terminasse, os efeitos deletérios da cocaína se tornaram óbvios e seu emprego curativo entrou em declínio16. No Brasil, cerca de 2% dos estudantes de grandes centros urbanos já usaram cocaína pelo menos uma vez na vida64. Nos EUA, 40% dos

usuários habituais de cocaína são mulheres, sendo que elas representam a maioria (51%) na faixa etária entre 12 e 17 anos de idade3. Apesar de ser uma das drogas ilícitas de consumo mais comum, a maioria dos usuários de cocaína consome a droga de modo recreacional e não diariamente13. Crack O crack é produzido pela mistura da pasta base de cocaína com água e bicarbonato de sódio. Quando aquecida, esta mistura dá origem a cristais conhecidos como “pedras” de crack – em termos bem simples, o crack é a apresentação da cocaína que pode ser fumada. No Brasil, estima-se que o crack possua uma prevalência de 0,81% entre os usuários de drogas ilícitas, o que representaria cerca de 370 mil pessoas64,65. As discussões que o crack provoca derivam de dois problemas Morais que orbitam seu uso. Primeiro, o risco de dependência pode ser considerado “explosivo” quando comparado à maconha ou ao álcool: mais de 80% dos usuários que tentam abandonar o crack não conseguem – contra 65% para maconha e 20% para álcool65,93,94. Segundo, a possibilidade de violência: estatísticas de grupos terapêuticos mostram que mais de 30% dos usuários de crack se envolvem em práticas criminosas66.

Anfetaminas Dentre as anfetaminas, duas merecem destaque: a metanfetamina e o ecstasy. A metanfetamina, conhecida como meth ou cristal , é a droga ilegal mais comumente sintetizada nos EUA. Cerca de 6% dos adolescentes norte-americanos com idade igual ou superior a 12 anos já utilizaram Meth pelo menos uma vez2. Os efeitos da meth duram algumas horas e incluem euforia, hipersexualidade, diminuição da ansiedade e aumento da sensação dos níveis de energia com aumento da produtividade. O abuso pode causar danos cerebrais e prejuízo das faculdades intelectuais, hipertermia, insuficiência renal e hepática aguda, convulsões, arritmia cardíaca, infarto do miocárdio e derrame. O uso crônico costuma resultar em ansiedade, depressão,

agressividade, isolamento social, psicose, transtornos do humor e dificuldades de coordenação motora. O ecstasy , ou 3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA), é um derivado da anfetamina. Foi sintetizado e patenteado na Alemanha pela Merck, em 1914, como um moderador do apetite, mas nunca chegou a ser comercializado com este objetivo. Na década de 1980, começou a ganhar fama como uma droga de uso recreacional, com efeitos parecidos àqueles da cocaína2. Atualmente, as preparações “caseiras” de ecstasy contém cafeína, LSD, anfetamina, metanfetamina, anfetaminas, paracetamol, quetamina outras substâncias não identificadas. Mesmo com esta salada, a morte como consequência do uso e ecstasy é considerada rara – mas ocorrer. Entre os especialistas, o aspecto mais perturbador do abuso de MDMA é a possibilidade de efeitos psiquiátricos irreversíveis no longo prazo67.

Alucinógenos Os alucinógenos dividem-se em três grupos: as triptaminas (p.ex.: o DMT e a psilocibina, sendo esta encontrada em cogumelos do gênero Psilocybe, Panaeolus e Conocybe, entre outros); as liseramidas (p.ex.: LSD, derivado do fungo Claviceps purpurea ); e as fenetilaminas (p.ex.: a mescalina, derivada do cacto mexicano chamado pescal ou peiote)14. Em nosso meio, a mescalina não tem grande público. Mas os outros têm. O LSD foi sintetizado pela primeira vez pelo químico suíço Albert Hofmann em 1938, e seus efeitos psicoativos foram descobertos quanto Albert acidentalmente ingeriu a droga em 1943. Ele também foi o responsável pelo isolamento da psilocibina a partir do cogumelo mexicano Psilocybe mexicana em 195817. Mais de 100 espécies diferentes de cogumelos que ocorrem na natureza são ricas em psilocibina, com propriedades alucinógenas são bastante similares ao LSD. A N, N-dimetiltriptamina, ou DMT, é considerada o alucinógeno mais potente conhecido. Sintetizado pela primeira vez por Richard Manske, um bioquímico canadense, em 1931, o DMT foi extensamente pesquisado pelo químico brasileiro Oswaldo Gonçalves de Lima, que demonstrou a presença de DMT em várias

plantas. Desde então, pesquisas adicionais encontraram traços de DMT em praticamente todos os seres vivos. Nos humanos, a atividade do DMT concentra-se nas camadas subcorticais dos lobos frontoparietais e temporais e nas camadas corticais dos lobos parietais, mas ainda não sabemos em quais quantidades ele ocorre em nossa espécie18. As propriedades alucinógenas do DMT foram descobertas pela ciência apenas em 1956, quando o psiquiatra húngaro Stephen Szara extraiu DMT da planta Mimosa hostilis e injetou um pouco em si mesmo, por via intramuscular18. A molécula de DMT é surpreendentemente similar às moléculas de serotonina, triptofano e psilocibina18. Quando administrado por via oral, o DMT é inativado pelas enzimas Monoamino Oxidase (MAO) no fígado antes que qualquer efeito seja percebido pelo cérebro. Apenas quando a atividade da MAO é inibida, os efeitos do DMT oral são percebidos. Porém, quando administrado por via inalatória, endovenosa ou intramuscular, o DMT consegue evitar a inativação pela MAO no fígado e seus efeitos surgem em minutos ou mesmo segundos, durando entre 15 e 60 minutos, dependendo da dose e da via utilizada18. Curiosamente, populações indígenas no Brasil, Colômbia, Peru e Equador “descobriram” meios de ingerir DMT em misturas contendo inibidores da MAO encontrados na natureza: o DMT é o principal composto da ayahuasca, um psicotrópico utilizado em muitos rituais religiosos. A Ayahuasca costuma ser obtida fervendo-se folhas de Psychotria viridis (também conhecida como chacrona, uma planta arbórea rica em DMT) com caules de Banisteriopsis caapi (também conhecido como cipó mariri ou jagube, rico em inibidores da MAO)17. Nas últimas décadas, o uso de DMT vem se tornando cada vez mais comum. Seus efeitos incluem alucinações visuais, distorção da imagem corporal, distúrbios da fala, alterações do humor, euforia e ansiedade. Estes efeitos dependem da via, da quantidade e do contexto em que a droga é utilizada: os sintomas do DMT intramuscular, por exemplo, costumam ser menos intensos que aqueles do DMT inalado ou endovenoso. Quando utilizado por via oral, as manifestações do DMT se iniciam em 60 minutos, atingem um pico após 90 minutos e duram aproximadamente 4 horas. Por via endovenosa, doses menores que 0,2 mg/Kg não produzem efeitos

alucinógenos, e é possível que a administração por infusão contínua produza efeitos mais prolongados, mas isto ainda não foi testado18.

Opioides, Opiáceos, Tranquilizantes e Antidepressivos Opioides e opiáceos como morfina, heroína, meperidina, propoxifeno e metadona possuem uma prevalência muito baixa no Brasil. Apenas 0,1% da população brasileira entre 12 e 65 anos utilizará heroína pelo menos uma vez na vida95. Por outro lado, tranquilizantes e antidepressivos são bem mais frequentes: estima-se que cerca de 20% dos brasileiros apresentem sintomas depressivos96 e muitos se medicam de forma rotineira, mesmo quando não indicado. De cada 10 brasileiros em uso de tranquilizantes como diazepam, alprazolam e clonazepam, três consomem a substância sem qualquer recomendação médica expressa, sendo que as mulheres utilizam estas substâncias três vezes mais que os homens68. Especificamente com relação ao clonazepam (Rivotril®), somos o terceiro maior produtor e o maior consumidor do mundo: o clonazepam é o segundo remédio mais vendido no país, perdendo apenas para contraceptivos orais atrelados à distribuição pelo SUS. Sozinho, ele movimenta mais 220 milhões de reais no mercado farmacêutico brasileiro a cada ano69,70.

QUA TRO ARGUME NTOS CONTRA AS DROGAS Qualquer que seja a natureza do entorpecente e seu emprego – recreacional ou terapêutico –, a simples menção da palavra “entorpecente” desencadeia uma miríade de reações sociais, políticas, médicas, históricas e, acima de tudo, Morais: nossa ideologia inata nos diz que substâncias psicoativas são fundamentalmente erradas. Os principais argumentos que sustentam esta posição em geral caem em uma de quatro categorias: (1) as drogas provocam alterações do estado mental e eliminam o livre arbítrio; (2) as drogas causam violência; (3) as drogas custam dinheiro para a sociedade; e (4) existem políticas antidrogas que deram certo, então não existem justificativas para que elas continuem sendo usadas.

Drogas Provocam Alterações do Estado Mental e Eliminam o Livre Arbítrio Os usuários de substâncias psicoativas costumam associá-las a uma experiência positiva, a um estado de aventura, motivação, relaxamento, divertimento, fuga da realidade ou de revelação espiritual. Todavia, o efeito de qualquer substância psicoativa é imprevisível: um dia o álcool lhe deixa leve, no outro lhe deixa agressivo. Um dia a maconha lhe proporciona uma viagem reflexiva, no outro causa um surto de paranoia. Um dia a fluoxetina elimina o humor melancólico, no dia seguinte encoraja o suicídio. Um dia uma xícara de chá de ayahuasca dissolve seu ego e promove uma conexão espiritual com elfos cabalísticos, no dia seguinte você mergulha em uma crise de ansiedade com fortes traços de esquizofrenia. Em resumo: é impossível predizer as repercussões, e cada novo uso é um novo risco assumido. Podemos até achar que temos algum controle sobre as chances, mas esta impressão não passa de uma tênue ilusão de segurança.

Excetuando-se as prescrições médicas, quando alguém começa a utilizar uma substância psicoativa, quase sempre é por livre e espontânea escolha e a Moralidade de fato participa do processo decisional: o indivíduo faz conscientemente a opção entre usar ou não a droga – e, neste momento, seu julgamento tem alguma representatividade. Todavia, com ou sem a colaboração de fatores genéticos, e na presença ou não de uma receita formal, pessoas que lidam mal com a frustração e a ansiedade encontrarão na droga uma maneira de lidar com a realidade fugindo dela. Uma vez instalada a dependência química, o autopertencimento se esvai, levando com ele a capacidade de emitir arbítrios Morais lúcidos sobre o que é Bom e Correto. É nesta hora que a alteração do estado mental causada pela droga passa a representar o prenúncio de um desastre.

Drogas Causam Violência O Brasil está entre os 10 países mais violentos do mundo: 9% dos brasileiros em áreas urbanas já foram vítimas de pelo menos uma forma de violência física27. Quando somamos a isto a correlação entre abuso de drogas e condutas agressivas, temos um problema real em mãos: cocaína, crack, anfetaminas e metanfetaminas induzem comportamentos violentos. Ecstasy e Maconha podem causar paranoia, crises de pânico e surtos psicóticos que podem derivar para agressões13, assim como drogas consideradas lícitas, como desvenlaflaxina, fluvoxamia, paroxetina e fluoxetina (antidepressivos); venlaflaxina (ansiolítico); triazolam (benzodiazepínico); atomexetina (utilizada no tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade); e mefoquina (antimalárico) também podem resultar em atitudes hostis36. Entre os usuários de entorpecentes que procuram tratamento especializado, 72% dos homens e 50% das mulheres possuem antecedentes de comportamentos violentos, especialmente aqueles que fazem uso de álcool, maconha ou cocaína. De um modo geral, o consumo de drogas está associado ao risco de negligência, abuso físico e violência sexual contra crianças, dentro e fora da escola, além de aumentar em seis vezes a possibilidade de suicídio22-24,29-31. Com relação ao álcool – a droga mais comum no mundo –, vale dizer que seu consumo aumenta o risco de estupro, tanto pelo

incremento da vulnerabilidade da vítima quanto pelo comprometimento do juízo Moral, pelo aumento da impulsividade e pela diminuição da inibição e do medo por parte do atacante26. Dados multinacionais de unidades de Pronto Socorro mostram que o consumo de álcool está relacionado a 62% das ocorrências envolvendo violência e em 40% dos casos de violência doméstica32. Pesquisas realizadas no estado de São Paulo entre 2001 e 2004 estimaram que a adoção de políticas de tolerância zero para a associação entre consumo de bebidas alcoólicas e direção reduziu em 10% o número de homicídios intencionais21. Além da violência envolvendo o usuário e seus contactantes, o comércio de drogas causa sua própria violência colateral. Por exemplo: em julho de 2017, o Uruguai tornou-se o primeiro país do mundo a vender maconha com fins recreativos ao público. De acordo com o Instituto de Regulação e Controle da Cannabis, o consumo uruguaio não sofreu um acréscimo além do esperado, mas observouse um aumento da violência associada ao comércio da maconha: os traficantes disputam e defendem com unhas e dentes cada fatia dos territórios disponíveis. Algumas vezes, é mais fácil roubar o produto de outros cartéis que produzi-lo. E ambas as dinâmicas são conduzidas com emprego de meios brutais que podem afetar tanto usuários quanto não-usuários25, 28,33-35.

Drogas Custam Dinheiro para a Sociedade O Brasil é o terceiro maior fabricante de cerveja do mundo e a produção cresce a uma taxa média de 5% ao ano. O segmento cervejeiro responde por 80% do mercado de bebidas alcoólicas, faturando mais de R$ 70 bilhões por ano e recolhendo cerca de R$ 21 bilhões em impostos37. Não obstante, segundo a Organização PanAmericana de Saúde, o álcool é o maior fator de risco de morte entre adolescentes entre 15 e 19 anos, superando todas as demais drogas: 73,9 homens e 11,7 mulheres a cada 100 mil habitantes morrem anualmente no Brasil por causa do álcool38. Como resultado, enquanto os pequenos e os grandes produtores de bebidas alcoólicas movimentam o equivalente a 1,6% do PIB, o alcoolismo suga 7,3% do PIB37, e 30% de todas as mortes no trânsito estão relacionadas à

presença de um ou mais motoristas dirigindo sob o efeito de álcool19. Ainda assim, as bebidas alcoólicas não são consideradas fundamentalmente imorais ou ilegais. O cigarro representa um imbróglio quase tão grande quanto o álcool. De acordo com dados do Centers for Disease Control, o tabaco mata mais pessoas nos EUA que HIV, drogas ilegais, acidentes automobilísticos, suicídios e homicídios intencionais somados39. No Brasil, 15% das pessoas maiores de 18 anos – ou mais de 20 milhões de indivíduos – utilizam produtos derivados do tabaco, com aumento considerável do risco para doenças cardiovasculares, pulmonares e câncer40. O tabagismo é responsável por 12,6% de todas as mortes em brasileiros com mais de 35 anos de idade, causando aos cofres nacionais um prejuízo de R$ 56 bilhões a cada ano entre custos médicos diretos e custos decorrentes da perda de produtividade, morte prematura ou incapacitação. A arrecadação com impostos sobre produtos de tabaco retorna R$ 12 bilhões destes custos, restando ao Estado um prejuízo de R$ 44 bilhões41. Ou seja: para o bolso da sociedade, a legalidade da nicotina é um péssimo negócio. Ainda assim, a nicotina não é considerada imoral ou ilegal. Além de as drogas – lícitas ou não – representarem uma perda de produtividade, elas ainda oneram aqueles que produzem e pagam impostos com seu trabalho: nos EUA, 26% das mulheres e 12% dos homens dependentes químicos necessitam de assistência financeira do Estado para sobreviver4. Infelizmente, não existem dados equivalentes para o Brasil, mas não é irreal supor que também tenhamos um (enorme) problema neste sentido.

Drogas Podem ser Controladas por Políticas Adequadas O argumento derradeiro contra os entorpecentes reside no fato de que existem políticas antidrogas que deram certo, então não teríamos justificativas para outorgar seu uso. Na primeira metade do século XX, Mahatma Gandhi tentou instituir uma Lei Seca na Índia, mas não obteve sucesso. No início do século XXI, a Índia viu os índices de alcoolismo aumentar 55% e uma nova onda proibicionista surgiu: em 2016, alguns estados começaram a introduzir regras banindo o comércio de bebidas alcoólicas42. Os resultados desta política ainda estão para ser vistos.

Mas os clássicos resultados da Lei Seca norte-americana são bem conhecidos. Um pouco antes da cruzada anti-etílica de Gandhi, os proibicionistas dos EUA já acreditavam que a indústria de bebidas alcoólicas representava a maior de todas as ameaças à sociedade, e apenas a proibição irrestrita poderia evitar a iminente falência da família e do american way of life. Boa parte dos apoiadores da Lei Seca era composta de cidadãos que bebiam, mas achavam que outras pessoas não deveriam beber. A despeito da jacobice intrínseca, a Lei Seca – ou Ato Volstead ou Ato de Proibição Nacional – entrou em vigor em 16 de janeiro de 1920. Sua aprovação ganhou apoio por três motivos principais: primeiro, os altos índices de mortes causadas pelo alcoolismo no começo do século XX (10 a 15 mortes por 100 mil habitantes/ano). Segundo, a turbulência política do período, com os movimentos marxistas provocando convulsões sociais em toda parte. Terceiro, pela crença popular de que o consumo de álcool de alguns impedia o progresso Moral e material de todos44. A Lei Seca proibia a produção, o transporte e a venda de bebidas alcoólicas, mas era cheia de brechas: não havia proibição para posse e consumo. Muitos farmacêuticos tinham permissão para vender uísque sob prescrição como tratamento para várias moléstias, indo desde ansiedade até gripe. Com a Lei Seca, o número de farmacêuticos triplicou. O uso de bebidas alcoólicas também era permitido com fins religiosos, e muitas cidades testemunharam uma proliferação de congregações43. Mesmo com estes furos, a prevalência de alcoolismo, de internações hospitalares por psicose alcoólica e embriaguez, e de mortes por cirrose diminuiu durante os anos da Lei Seca em comparação aos anos pré-proibição45. O consumo de cigarro também diminuiu, mas o consumo de narcóticos aumentou45. Com relação à violência, a Lei Seca diminuiu em 40% o número de crimes contra pessoas e propriedades, mas aumentou em 20% o número de detenções por comércio ou consumo de bebidas alcoólicas45. Um dos efeitos inesperados da Lei Seca foi modificar o padrão de consumo de bebidas: os destilados, por serem mais fortes em um volume menor, substituíram os fermentados; e o consumo foi transferido dos bares para os lares, devido ao risco de flagrante. Isso teve um efeito social inesperado: os saloons não eram meramente

lugares para beber. Eles retinham o monopólio da vida social da maioria dos assalariados norte-americanos. Eram locais diversão, recreação e formação de laços de amizade. Com o fim dos bares, várias outras formas de confraternização, recreação e diversão ganharam a preferência do público45, e é de se teorizar que o rádio, das salas de cinema e até mesmo a cultura dos shoppings centers surgiram e ganharam popularidade aproveitando este hiato. CONTRA-ARGUMENTANDO A FAVOR DAS DROGAS Os principais argumentos em defesa da descriminalização e liberação geral drogas residem no Relativismo Moral do argumento das alterações dos estados mentais; na incongruência do conceito de livre arbítrio; na diferença fundamental entre associação e relação causal entre drogas e violência; na impostura discricionária dos custos sociais; na análise pragmática dos resultados da Lei Seca nos EUA; e na limitação das potencialidades terapêuticas de várias substâncias consideradas ilícitas.

O Relativismo Moral da Alteração dos Estados Mentais Condenamos as drogas, pois elas produzem “alterações dos estados mentais” que consideramos normais. Sem adentrar no mérito do que seria um “estado mental normal”, o que há de intrinsecamente errado com substâncias capazes de alterar os estados mentais humanos? O propranolol, um anti-hipertensivo comum, pode afetar a memória e produzir diferentes graus de amnésia no longo prazo. Pessoas que utilizam medicamentos contra doença de Parkinson apresentam alterações significativas de sua capacidade de emitir julgamentos Morais46. Cerca de 15% dos fármacos indicados no tratamento de depressão, ansiedade, insônia, tabagismo, psicose, epilepsia e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade podem precipitar comportamentos violentos36. Estas substâncias deveriam ser declaradas imorais? Abordando o universo químico de maneira Virtuosa, Consequencialista e Utilitarista, alguém poderia dizer que substâncias “lícitas” devem ser tratadas de maneira diferentes

porque são “terapêuticas”, ao passo que as ilícitas são apenas “recreacionais”. Mas o que dizer o álcool e do cigarro? Por acaso são terapêuticos? E são imorais ou ilegais? E exatamente como você diferencia uma substância ou atividade terapêutica de uma recreacional? Meditar, ler um livro ou ouvir uma música para relaxar depois de um dia estafante são recursos artificiais empregados para produzir estados mentais alterados e talvez até pegar no sono. São simultaneamente recreacionais e terapêuticos – assim como algumas drogas consideradas ilícitas. Após avaliar o risco cumulativo de 20 drogas, pesquisadores do Departamento de Neuropsicofarmacologia do Imperial College, de Londres, concluíram que o álcool era a substância mais perigosa de todas. A psilocibina foi considerada a mais segura, com um risco 12 vezes menor que aquele das bebidas alcoólicas. O LSD ficou em terceira lugar neste quesito. No cômputo geral, os alucinógenos causam menos danos físicos e mentais que muitos medicamentos de prescrição usual, como os benzodiazepínicos, e são menos tóxicos que a maioria das drogas consideradas líticas14,17,90. Na literatura médica, não existem relatos de mortes por overdose decorrentes do fumo de maconha ou ingestão de psilocibina53-55,97,98. O mesmo não pode ser afirmado com relação ao álcool ou a diversos sedativos, antidepressivos, tranquilizantes e analgésicos opiáceos encontrados no comércio. Em 2013, pesquisadores noruegueses avaliaram 21.967 participantes de uma pesquisa nacional sobre uso de drogas e descobriram que 13,4% dos respondentes relatava uso crônico de alucinógenos, mas nenhum reportava qualquer efeito negativo em termos de desempenho mental ou social. Pelo contrário: muitos referiam uma melhor percepção de saúde mental e menores índices de ansiedade e uso de medicamentos psiquiátricos47. Se você condena as drogas porque elas alteram o comportamento humano, o que fazer com substâncias capazes de gerar empatia, controlar temperamentos e tornar as pessoas mais pacientes, felizes, Boas e Corretas ? Muitas religiões e cultos utilizam alucinógenos como Ayahuasca e Psilocibina para promover aperfeiçoamento Moral há centenas – talvez milhares – de anos. Se a Moralidade é uma virtude, melhorá-la através da modulação farmacológica dos estados mentais seria imoral?

A Incongruência do Conceito de Livre Arbítrio Uma as faces da condenação da alteração do estado mental diz respeito à perda do livre arbítrio. De fato, existem evidências neurocientíficas mostrando que os mecanismos cerebrais envolvidos no arbítrio de pessoas com dependência química são diferentes daqueles acionados em pessoas não-dependentes48. Entretanto, existe aqui uma dubiedade: Presumimos que nossas escolhas são todas deliberadas, lógicas e racionais – o que não são nem de perto. Praticamente todas as escolhas que você faz, dia após dia, hora após hora, minuto a minuto, são irracionais, impulsivas ou emocionais. Com uma frequência incômoda, seu livre arbítrio – programatizado pelos seus genes, formatado por suas experiências e limitado pelas regras sociais aprendidas –, opera baseado em sensos abstratos de esperança, necessidade, prazer, medo ou incerteza. A pretensa liberdade de seus critérios de seleção é apenas isto: uma pretensão de liberdade, cujo maior e talvez único valor reside em mitigar a aflição causada pela absoluta falta de controle sobre quase tudo. Qual a diferença essencial entre os seus processos “conscientes e inadiáveis” de tomada de decisão e as compulsões mentais urgentes de um dependente químico? Se nos livrarmos da noção de que o consumo de drogas elimina o livre arbítrio, e considerarmos que o usuário de drogas, mesmo aquele com dependência, exerce algum controle sobre suas decisões, então ele pode ser Moralmente e legalmente imputado por elas e suas consequências. Encarar o usuário de entorpecentes como um agente Moral ciente de suas escolhas e não uma vítima de seu vício ou da “sociedade” significa abandonar de uma vez por todas o rótulo de doença que colamos sobre a dependência química. É óbvio que esta mudança de paradigma representa um retorno às acusações de fraqueza de caráter pelos setores mais Moralistas da sociedade: um usuário torna-se usuário por que quer, e um viciado é viciado pelo mesmo motivo. Ainda que esta seja uma declaração dura, ela é decente: trata-se de assumir a responsabilidade pelos efeitos de nossas vicissitudes. Um dependente químico pode solicitar ajuda para livrar-se da compulsão, mas isto não o torna menos autor do hábito adquirido ou lhe amputa o pouco livre arbítrio que cada um de nós usufrui.

Drogas Versus Violência: a diferença fundamental entre associação e causa Em 1971, Nixon declarou que os entorpecentes eram o inimigo público número um, dando início à Guerra às Drogas nos EUA. Como ocorrido na Lei Seca, a Guerra ostensiva causou uma epidemia de encarceramentos e incentivou o emprego atividades criminosas como um meio de proteger ou adquirir narcóticos. Isto vinculou etiologicamente o comércio de drogas à violência, pois atividades ilegais estão relacionadas ao uso da força. Todavia, em uma análise mais lúcida, é fácil perceber que as drogas são preditivas de violência, elas estão relacionadas à violência, mas não existem estudos mostrando relações causais concretas e inquestionáveis entre ambas28. Haja vista a imensa popularidade das bebidas alcoólicas e de outras drogas, o índice geral de abuso e dependência de entorpecentes é relativamente baixo, cravando 2,9% da população na Inglaterra; 2,7% na França; 5,9% na Rússia; 3,8% na Austrália; 3,1% na Argentina; 5,4% nos EUA; 3,7% no Canadá; 1,6% na Itália; 1,9% na China; e 3,7% no Brasil7. Se presumirmos que a Guerra às Drogas de fato evita alguém de se tornar um dependente químico, responda: quantos potenciais viciados precisam ser salvos pelas normas vigentes para compensar a morte de um único inocente pego por uma bala perdida no meio de uma briga de quadrilhas de traficantes rivais? No Brasil, a lei n. 11 343/2006 tem sido apontada como responsável por mais que duplicar a população carcerária do país condenada por delito ligado a drogas49, mas ela não diminuiu a violência nas ruas: em 2005, nossa população carcerária contava com 361 mil detentos. Em 2018, eram 605 mil – um aumento de 67% em um período onde a população nacional aumentou apenas 11%. Cerca de 30% dos presidiários estão encarcerados por tráfico de drogas. Ou seja: pelo menos 22% do aumento do número de encarceramentos foi resultado direto da Guerra às Drogas em si, não de outras consequências relacionadas a elas, como roubos, agressões ou homicídios. Enquanto combatíamos o comércio e o consumo de entorpecentes, a taxa anual de assassinatos por 100 mil habitantes

saltou de 26,1 em 2005 para 30,3 em 201850-52. Exatamente o quê a montanha de dinheiro investida na “Guerra” resolveu? A atividade no mundo do crime em geral precede o uso de drogas ilícitas: apesar de mais de 70% dos homens presos devido crimes contra a integridade física ou a propriedade de terceiros apresentarem testes positivos para o uso de substâncias ilícitas, e 75% dos presidiários serem usuários de drogas, 50% não faziam uso de entorpecentes quando foram presos pela primeira vez13. O crime leva ao uso de drogas – não o contrário. Policiar, investigar e punir com rapidez e rigor crimes de violência e contra a propriedade seria uma medida mais inteligente e eficaz para diminuir o problema das drogas que mobilizar recursos imensos para combater vendedores e usuários pela droga em si. Além de a maioria dos usuários não cometer crimes contra a integridade física ou a propriedade privada de terceiros, eu costumo observar com assombro e perguntar aos meus botões: de que maneira chegamos à incrível conclusão que as drogas são a principal causa de violência e assassinatos em nosso país quando menos de 10% dos homicídios no Brasil são elucidados?71

A Hipocrisia Discricionária dos Custos Sociais Você pode até apontar o dedo acusador para os custos sociais das pessoas que não estudam, não trabalham e não estão procurando emprego, e gastam seu tempo cometendo crimes para usar drogas e vice-versa. Todavia, a realidade é diferente desta preconcepção. A maioria dos usuários não financia seu vício por meio de crimes contra a integridade física ou a propriedade de terceiros: 70% deles utilizam os recursos provenientes de seus empregos fixos ou temporários para bancar o vício. Muitos complementam o financiamento a partir da ajuda de familiares ou recebem algum tipo de auxílio do governo13 – o que não é Moralmente aprovável, mas não constitui uma ilegalidade e menos ainda uma violência. Quando justificamos a condenação Moral das drogas denunciando os danos sociais colaterais que elas causam, quase sempre estamos nos referindo aos custos da criminalidade e da violência associadas ao tráfico. Mas boa parte destes custos só existe porque certos entorpecentes são considerados ilegais: procure por

donos de bares matando uns aos outros para assumir pontos de venda de cerveja, ou operadores de caixa de lojas de conveniência explodindo postos de gasolina para diminuir a concorrência da venda de cigarros. Dificilmente encontrará algum. Se a criminalização das drogas visa proteger a integridade física e a propriedade de terceiros, então o combate às drogas deveria reduzir estes indicadores de violência – e não é isto que vem ocorrendo. É provável que sem a Guerra às Drogas os preços da maconha, do crack, da cocaína, do LSD, do ecstasy e de muitos entorpecentes caíssem vertiginosamente, assim como o emprego de meios violentos para garantir o seu comércio. E existem evidências mostrando os efeitos de políticas assim: entre 2013 e 2014, a legalização da maconha no estado de Washington (EUA) levou a uma diminuição significativa da criminalidade no período: o consumo da droga aumentou, mas os estupros diminuíram 30% e os roubos e assaltos, 10%57. A adoção de políticas similares para a maconha também resultaram em uma diminuição de 13% nos crimes violentos nos estados dos EUA que fazem fronteira com o México56. Em Portugal, a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade é de 8% para maconha; 0,2% para cocaína, crack, anfetaminas e ecstasy; 12% para tranquilizantes e sedativos; e 0,5% para opioides e opiáceos1. Desde 2001, a legislação portuguesa descriminalizou a aquisição e a posse de várias drogas para consumo pessoal. Contudo, caso a quantidade de entorpecentes esteja além daquela estipulada pela lei, pode haver configuração e condenação por tráfico, com penas que variam de 1 a 12 anos de reclusão dependendo da natureza da substância. Todavia, a sentença pode ser reduzida caso o cidadão consiga provar que vendia drogas para sustentar seu próprio vício em drogas. Em 2013, prevendo as constantes inovações do mercado de entorpecentes, o Decreto Lei 54 proibiu a produção, exportação, propaganda, distribuição, venda ou dispensação de novas substâncias psicoativas não listadas no Decreto Lei 15, de 1993. Desde a descriminalização, Portugal tem registrado quedas dramáticas no número de mortes por overdose, infeções por HIV e crimes relacionados com o consumo de entorpecentes. Estudos indicam que o uso de drogas diminuiu no país. Entre a população com menos de 34 anos, o consumo de heroína caiu 70%. Apesar de

ainda apresentar índices preocupantes, 16 anos depois da reforma, a experiência portuguesa demonstra que o consumo de drogas não aumentou89, tampouco o país se tornou uma rota de turismo de droga ou o paraíso da violência indiscriminada: segundo a ONU91, Portugal apresenta uma taxa anual de homicídios por 100 mil habitantes de apenas 0,97 – ou trinta vezes menor que a aquela do Brasil. Atualmente, a Guerra às Drogas nos EUA custa aos cofres federais cerca de 26 bilhões de dólares ao ano, e calcula-se que outros 25 bilhões sejam gastos pelos estados a cada ano. Se considerarmos os danos causados à propriedade associados o tráfico, estes custos avançam mais 10 bilhões de dólares – isso para não falar nas vidas perdidas e nas lesões corporais incapacitantes. Em um cenário assim, estudos estimam que a legalização das drogas nos EUA reduziria os gastos governamentais em cerca de 41,3 bilhões de dólares por ano58. Uma vez que os recursos do Estado são limitados, as decisões devem ser tomadas de maneira Utilitária e Consequencialista: onde estes recursos podem ser empregados produzindo o maior e o melhor efeito possível? Quando optamos por uma “Guerra às Drogas”, o financiamento destes esforços significa que menos dinheiro será empregado em outros setores da sociedade. Não existe isso de um almoço grátis, advertiu Milton Friedman há muitos anos. O empenho do sistema policial e do aparato de justiça para combater no front da Guerra às Drogas reduz o efetivo disponível para combater a violência e crimes contra a propriedade – que nem sempre estão relacionados ao consumo ou ao uso de entorpecentes ilegais.

Uma Consideração Pragmática da Lei Seca nos EUA No começo do século XX, legiões de proibicionistas motivados por uma onda de Moralidade religiosa tentaram adotar restrições ou mesmo banir o comércio e o consumo de álcool em países como Índia, Islândia, Finlândia, Noruega, Rússia, Canadá e Nova Zelândia. Mas nenhum destes experimentos foi tão amplo e bem documentado quanto a Lei Seca nos EUA. A despeito dos efeitos positivos descritos, o período da Lei norte-americana não foi um sucesso absoluto. Como toda Guerra às Drogas, ela causou danos.

Economicamente, a Lei Seca aniquilou toda uma indústria: em 1916, havia 1.300 cervejarias nos EUA; dez anos depois, havia nenhuma. No mesmo período, o número de destilarias diminuiu 85% e o número de vinícolas caiu de 318 em 1914 para 27 em 192544. A falência de destilarias, cervejarias, vinícolas, restaurantes e bares e todo tipo de indústria e serviços que orbitavam o mercado de bebidas alcoólicas eliminou milhares de postos de trabalho e redundou em uma queda na qualidade das bebidas vendidas no mercado negro. Uma vez que a Lei era dúbia quanto à produção caseira de vinhos, houve uma explosão na venda de concentrados de uva que traziam no rótulo a observação: “não deixar armazenado sob o risco de fermentação alcoólica”. Mesmo com estes subterfúgios, a Lei Seca custou ao todo 300 milhões de dólares para ser instituída e ocasionou uma perda de 11 bilhões de dólares em impostos43. Socialmente, os benefícios também foram ambíguos: antes de 1917, os índices gerais de mortalidade estavam decrescendo tanto entre homens quanto entre mulheres. A partir de 1921, com a vigência da Lei, observou-se um pronunciado aumento dos índices de óbito entre homens e apenas um leve declínio entre as mulheres. Análises mais detalhadas mostraram que a mortalidade de homens negros, especialmente na faixa acima de 35 anos de idade, aumentou entre 1921 e 1926. Entre homens brancos, os índices de mortalidade permaneceram estacionados, mas as mulheres brancas apresentaram uma diminuição rápida e significativa. Em outras palavras: durante os primeiros anos da Lei Seca, a melhora dos indicadores de mortalidade limitou-se ao grupo das mulheres brancas, piorando em todos os outros estratos demográficos45. Quando foi revogada em dezembro de 1933, no auge da Grande Depressão, a Lei já havia pavimentado o caminho para o surgimento de inúmeras quadrilhas de crime organizado, e todo o empenho das autoridades e toda a montanha de dinheiro investida não foram capazes de formar uma geração de pessoas abstêmias: com a suspensão do decreto, o consumo per capita de bebidas alcoólicas voltou a crescer44. No final, a norma que deveria inspirar temperança produziu destemperança e excessos, tornando os problemas socioeconômicos relacionados ao álcool ainda piores que antes43.

As Possibilidades Terapêuticas A Moralidade discricionária que desaprova algumas drogas vai contra as evidências científicas que documentam suas prodigiosas possibilidades terapêuticas. Por exemplo: os tratamentos disponíveis para muitos transtornos mentais não são eficazes. Os efeitos colaterais são incômodos, a adesão é um problema e as recorrências são comuns. Contudo, existem relatos de excelentes resultados com o emprego de substâncias consideradas ilícitas em pessoas sofrendo de tabagismo, alcoolismo, síndrome do estresse pós-traumático, ansiedade e depressão 13,17. Exempli gratia , vejamos o caso de quatro substâncias “imorais e ilegais”: a maconha, a psilocibina, o LSD e o DMT. Em 2.900 a.C., a medicina tradicional chinesa já prescrevia o uso de maconha como tratamento para dores osteomusculares. Também existem registros de empregos terapêuticos da cannabis na medicina indiana datados de 1.000 a.C60. Atualmente, sobram dados confirmando a eficácia da maconha no tratamento de dores crônicas, enxaqueca, fibromialgia, náuseas por quimioterapia, síndrome do intestino irritável, glaucoma, ansiedade, epilepsia, anorexia, insônia e doença de Parkinson11,13. Por causa do volume dessas evidências, o Canadá introduziu a cannabis no arsenal terapêutico “tradicional” em 200159. Em 2017, 28 estados nos EUA já haviam feito o mesmo11. Em todos os casos, existe a advertência de não recomendar a abordagem em gestantes, mulheres em fase de amamentação, pessoas com menos de 25 anos de idade, indivíduos com histórico de abuso de drogas, psicose, ou doenças pulmonares, cardiovasculares ou renais crônicas59. Não obstante, nos pacientes tratados a partir de uma indicação clínica correta, os benefícios tornaram-se indiscutíveis. O LSD é eficaz no tratamento de depressão e ansiedade severa em pacientes refratários aos tratamentos convencionais, sem produzir efeitos colaterais significativos14,18,61. Não obstante, seu estereótipo de “substância perigosa da contracultura” vem impedindo que testes populacionais mais amplos sejam realizados. Em 2011, uma revisão da literatura médica sobre testes com psilocibina não mostrou qualquer aumento no índice de dependência química, psicose, transtornos mentais, efeitos colaterais graves ou sequelas cognitivas crônicas entre os usuários da substâncias97: 60%

das pessoas que utilizam psilocibina uma única vez relatam uma “viagem” mística transformadora, classificando a vivência como uma das cinco maiores experiências positivamente modificadoras de suas personalidades. Esta capacidade de persuasão tornou a psilocibina extremamente oportuna no tratamento de pacientes com transtorno obsessivo-compulsivo e de transtornos de ansiedade e depressão em pacientes com câncer e outras doenças terminais14,18,62. Em tabagistas que consomem mais de 15 cigarros por dia, a associação de psilocibina com terapia cognitivo-comportamental é capaz de produzir abstenção por mais de 6 meses em 80% dos casos63. Em 2012, pesquisadores espanhóis investigaram 127 usuários crônicos de ayahuasca (DMT), comparando-os a um grupo de 115 pessoas religiosas. Após 1 ano de acompanhamento, os cientistas observaram que os usuários do chá apresentavam índices menores de psicopatologia e egocentrismo, e índices melhores de percepção de bem-estar psicossocial, resiliência emocional e memória de trabalho que o grupo de religiosos72. Em 2015 e 2016, estudos de neuroimagem mostraram que o uso prolongado de ayahuasca (DMT) promove mudanças objetivas em várias estruturas cerebrais, interrompendo o padrão de pensamentos repetitivos e patológicos presentes em pessoas com ansiedade, depressão e dependência química (incluindo tabagismo e alcoolismo), mudando suas perspectivas, valores, personalidades e comportamentos17. Clinicamente, os usuários crônicos de ayahuasca exibem níveis menores de desesperança, e uma única dose da substância é capaz de diminuir sintomas depressivos graves por até 21 dias, sem provocar mania ou hipomania99. Devido aos efeitos neuroprotetores e neurorregenerativos, os cientistas teorizam que a administração contínua de DMT poderia ser útil no tratamento de lesões cerebrais graves e estados de hipóxia prolongada como parada cardiorrespiratória, doença arterial obstrutiva periférica e asfixia perinatal18. Apesar destas evidências, nosso preconceito Moral com relação às substâncias alucinógenas tem sido um obstáculo para seu estudo e emprego terapêutico. Para muitos pesquisadores, os alucinógenos são considerados o fruto proibido da árvore o conhecimento: sabemos que eles podem ter utilidade, mas sua investigação científica é coberta por várias camadas de tabus e censuras. A

despeito dos pontos de vista e percepções pessoais divergentes, descartar as implicações e a eficácia terapêutica documentada do uso de algumas substâncias entorpecentes não é apenas uma imoralidade, mas irresponsável, tirânico e – porque não dizer – cruel.

COMO OUTROS PAÍSES LIDAM COM AS DROGAS?

Sempre que o assunto “drogas” surge no Brasil, nos perguntamos como as nações mais desenvolvidas lidam com esse assunto. Muito bem: tomemos como exemplo os 10 países com a melhor colocação em termos de IDH entre 189 nações segundo a ONU (quais sejam: Noruega, Suíça, Austrália, Irlanda, Alemanha, Islândia, Suécia, Singapura e Holanda) e vejamos como isto ocorre: Na Noruega, a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade é de 8,6% para maconha; 1,3% para cocaína ou crack; 0,5% pra anfetaminas; 1,6% para ecstasy; 4,3% para tranquilizantes e sedativos; 0,2% para opioides e opiáceos1,73. A Noruega descriminalizou as drogas em 2017: os entorpecentes deixaram de ser um problema de polícia e passaram a ser tratados como problemas de saúde pública. Usuários não são mais presos, mas recebem tratamento. Contudo, a produção, aquisição, importação, exportação, armazenamento de entorpecentes, quando julgados atividade de tráfico, configuram crime com pena de 2 a 10 anos de reclusão mais multa73,74. Na Suíça, a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade é de 9% para maconha; 0,8% para cocaína ou crack; 0,3% pra anfetaminas; 0,1% para ecstasy; e 0,4% para opioides e opiáceos1. Em meados da década de 1980, assustada com o elevado número de mortes por overdose por heroína, a Suíça passou a oferecer tratamento ao invés de cadeia para os usuários. A descriminalização fez com que o mercado para heroína diminuísse 83%. Apesar de algumas experiências mal sucedidas – como a liberação para venda, compra e uso de heroína no parque Platzspitz, em Zurique entre 1987 e 1992 – as medidas do governo suíço reduziram em 90% a incidência de crimes contra

propriedade cometidos por participantes dos programas de desintoxicação75. Entre 1992 e 2014, o número de mortes anuais por overdose de entorpecentes despencou de 419 para 134. Em 2008, um plebiscito votou a favor da continuidade do programa estatal para regulação da heroína, mas contra a legalização da maconha76. A Austrália, o terceiro melhor IDH do mundo, lidera a lista mundial de países que mais utilizam drogas recreacionais: a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para australianos entre 15 e 64 anos de idade é de 10% para maconha; 2,5% para cocaína ou crack; 1,4% pra anfetaminas; 2,2% para ecstasy; 1,6% para tranquilizantes e sedativos; e 3% para opioides e opiáceos1. Apesar da progressão do número de mortes por overdose desde 2011, a política australiana pode ser considerada flexível, variando de acordo com o estado: alguns permitem o porte de maconha para uso pessoal, outros exigem tratamento compulsório e aplicam multas. Na Irlanda, a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade é de 13,8% para maconha; 2,9% para cocaína ou crack; 0,6% pra anfetaminas; 4,4% para ecstasy; 6% para tranquilizantes e sedativos, e 0,7% para opioides e opiáceos1,77. A legislação irlandesa encara todas as substâncias psicoativas – incluindo álcool, medicamentos e drogas ilícitas – mais ou menos da mesma maneira: apesar de a posse de drogas consideradas ilegais ser um crime independente da quantidade, a política do governo irlandês tem sido a de abordar a posse de pequenas quantidades de droga como sendo para uso pessoal, preferindo ações que visam a recuperação do usuário e não seu encarceramento. Todavia, o tráfico de entorpecentes configura crime passível de pena perpétua e reclusão de no mínimo 10 anos caso o cidadão esteja portando uma quantidade de substâncias com valor acima de 13 mil Euros78. Na Alemanha, a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade é de 13,3% para maconha; 1,2% para cocaína ou crack; 1,9% pra anfetaminas; 1,3% para ecstasy; 5,4% para tranquilizantes e sedativos; e 0,3% para opioides e opiáceos1. O uso de entorpecentes não é considerado um crime, mas a lei prevê punições para posse de narcóticos de acordo com a quantidade e o tipo de droga, o envolvimento de outras pessoas, o histórico pessoal e se existe ou não interesse público em

interditar o envolvido. Existem critérios diferentes para o que representa uma “pequena quantidade” de maconha, heroína, cocaína, anfetamina e ecstasy. Para metanfetamina, existe uma lei Federal estipulando um limite de 5 gramas de substância ativa para posse. Nos casos julgados e sentenciados, o princípio “tratamento ao invés de punição” permite – em certas circunstâncias – que o condenado opte pelo tratamento, com abrandamento da pena79. Na Suécia, a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade é de 7,3% para maconha; 0,6% para cocaína ou crack; 0,7% pra anfetaminas; 0,5% para ecstasy; 2,7% para tranquilizantes e sedativos; e 0,5% para opioides e opiáceos1. O uso e a posse de drogas ilícitas configura crime, sendo a posse passível de condenação dependendo da natureza e da quantidade da substância encontrada, entre outras circunstâncias, com penas variando entre 6 meses a 10 anos de reclusão80. Em Singapura, a legislação contra entorpecentes é extremamente rígida. Segundo o Misuse of Drugs Act81, a posse de qualquer quantidade de entorpecente é presumida como tráfico e, acima de um determinado patamar, a pena de morte deve ser considerada. Para aplicação da pena capital, a lei estipula o limite mínimo de 500 gramas para maconha; 30 gramas para cocaína; e 250 gramas para metanfetamina, por exemplo. Quantidades abaixo do limite para pena de morte podem ser punidas com castigos corporais, reclusão por vários anos ou prisão perpétua. Qualquer cidadão de Singapura que utilize drogas fora do país está sujeito a 10 anos de reclusão mais multa81. De acordo com Central Narcotis Bureau (CNB), as drogas mais comuns são metanfetamina (64% dos usuários presos), heroína (27%) e maconha (7%)82. Apesar da legislação rígida e de os dados oficiais basearem-se somente no número de pessoas detidas devido ao consumo de entorpecentes mostrarem que o número de usuários permaneceu estável desde 2012, mais de 40% dos usuários presos em 2017 eram usuários novos e 64% deles estavam abaixo dos 30 anos de idade, sugerindo que o problema das drogas em Singapura ou vem ocorrendo debaixo dos bigodes dos oficiais do CNB há muitos anos ou está apenas começando83. Desde a década de 1970, a Holanda tem sido citada como uma referência na tolerância ao uso de entorpecentes, especialmente maconha. A posse, o cultivo, a produção, a venda, a importação ou a

exportação de drogas pode configurar crime dependendo da quantidade e do tipo de substância envolvida, com pena máxima de 12 anos reclusão. Sem embargo, o simples uso de drogas não é considerado um crime nos termos da lei, desde que respeitadas algumas normas quanto ao local e idade dos usuários. Como regra, ser pego com até 5 gramas de maconha não constitui razão suficiente para que alguém seja preso. A prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para holandeses entre 15 e 64 anos de idade é de 15,7% para maconha; 3,7% para cocaína ou crack; 3,6% pra anfetaminas; 7,4% para ecstasy; 0,5% para tranquilizantes e sedativos; e 0,1% para opioides e opiáceos1,84. Estes dados, aliados às análises da experiência da Lei Seca norteamericana, sugerem que a descriminalização de entorpecentes é viável em muitos cenários e que nem sempre a condenação peremptória do uso produz os resultados esperados. Pelo contrário: a perseguição implacável pode mascarar as estatísticas e comprometer a confiabilidade dos diagnósticos sociais. Ainda assim, mesmo nos países mais indulgentes, a permissão para o uso aliada à repressão da produção e comércio de entorpecentes é uma amostra cômica do tamanho das contradições produzidas pela Moralidade pública.

O QUE A ISLÂNDIA TEM PARA NOS ENSINAR?

Apesar de a Islândia ostentar o 6º melhor IDH do mundo, deixei sua análise propositadamente por último. No final da década de 1997, seus adolescentes estavam entre os bebedores mais vorazes da Europa. Vinte anos depois, o país apresentava ao mundo uma geração de jovens com baixíssimos índices de alcoolismo, drogadição e tabagismo: a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para islandeses entre 15 e 64 anos de idade é de 3,4% para maconha; 1% para cocaína ou crack; 0,7% pra anfetaminas; 0,5% para ecstasy; e 0,7% para opioides e opiáceos1. Observando estes números, é possível perceber que este pequeno país insular tem um problema menor com as drogas quando comparado às outras nove nações abordadas anteriormente. Qual teria sido o pulo do gato da Islândia?

A história de sucesso da Islândia está associada aos trabalhos do psicólogo norte-americano Harvey Milkman. Durante a década de 1970, ao avaliar usuários de heroína e anfetaminas, Milkman observou que estes dois grupos possuíam estilos de personalidade bem diferentes: os usuários de heroína e outros opioides buscavam na droga uma maneira de amortecer a realidade, ao passo que os usuários de anfetamina buscavam uma maneira de vencê-la e conquistá-la85. Milkman ponderou que uma maneira de evitar o contato com as drogas seria detectar estes traços de personalidade ainda no início da adolescência, oferecendo aos jovens cérebros atividades que suplementassem aquele “hiato” que, se não fosse abordado do modo correto, fatalmente os conduziria para algum tipo de entorpecente. Em 1992, Harvey recebeu uma bolsa do governo norte-americano para trabalhar sua teoria junto a adolescentes com elevado risco social em Denver, capital e cidade mais populosa do estado do Colorado (EUA). Ele passou a oferecer aos jovens arte, música, dança, escultura, retórica, pintura e qualquer atividade recreacional saudável que quisessem aprender – uma abordagem quase Aristotélica de “boa orientação do ócio”. Associado a este roteiro, Milkman colocou seus alunos em sessões de meditação nos moldes de Atenção Plena (mindfulness), para que desenvolvessem as habilidades necessárias para gerenciar suas mentes, aprimorar seus raciocínios e melhorar seu padrão de relacionamento interpessoal. O ponto central no plano residia no fato de que palestras e oficinas de “combate às drogas” não funcionam porque são chatos e desinteressantes. O que falta aos jovens em situação de risco não são palestrantes, mas habilidades e capacidades para lidar com desejos, informações e objetivos. No final da década de 1990, Milkman foi convidado a levar seu programa para a Islândia86. Lá, incluiu os pais dos participantes no sistema, fazendo-os perceber que o tempo e qualidade do tempo que passavam com seus filhos fazia toda diferença. Simultaneamente, o governo da Islândia começou a mudar algumas leis: a venda de cigarros foi proibida para menores de 18 anos e a venda de álcool para pessoas com menos de 20 anos de idade se tornou ilegal. A legislação também baniu toda e qualquer forma de propaganda de tabaco e álcool, e passou a ser ilegal a presença de crianças entre 13 e 16 anos na rua após as 10 horas da noite. Medidas adicionais foram

implantadas para estreitar os vínculos entre os pais e as escolas: nas reuniões obrigatórias, os pais recebiam orientações sobre como conversar com seus filhos sobre projetos de vida, a questionar sobre suas companhias e ter controle sobre aonde iam. Em algumas cidades, famílias de baixa renda passaram a receber um Cartão de Lazer no valor de pouco mais de 700 reais por ano por criança, para pagar por atividades como esporte, dança, pintura, teatro e cinema87. Durante 15 anos, as capacitações para os educadores, as atividades e entrevistas periódicas com os adolescentes, e os reforços de orientação para os pais foram mantidos com grande método e disciplina. Os foram mais que palpáveis: o porcentual de crianças entre 15 e 16 anos de idade que passavam boa parte de seu tempo livre com seus pais nos finais de semana dobrou (de 23% para 46%), o porcentual daquelas que participavam de atividades esportivas pelo menos quatro vezes na semana aumentou de 24% para 42%, e a prevalência de adolescentes usuários de cigarro, maconha e bebidas alcoólicas despencou88. As ideias de Harvey Milkman e a experiência da Islândia oferecem um exemplo magnífico de como medidas simples e inteligentes, associadas à dedicação e perseverança, são capazes de produzir resultados extraordinários. Apesar de a Islândia ter pouco mais de 330 mil habitantes espalhados em uma área de 102 mil km2, isso não significa que os mesmos princípios não possam ser aplicados em um país de 208 milhões de habitantes e 8,5 milhões de km2 de extensão. Tudo que precisamos fazer é replicar o modelo fatiando-o para municípios ou cidades com até 300 mil habitantes, por exemplo, e então expandido para centros progressivamente maiores. Os dados da Islândia e as ideias de Milkman suscitam duas perguntas. Primeiro: será que temos juízo, competência e boa vontade para implantar algo parecido? Segundo e mais importante: será que é necessário?

O BRASIL VIVE UMA EPIDEMIA DE ENTORPECENTES?

Observando a população brasileira como um todo, constatamos que 21% dos jovens entre 16 e 24 anos já experimentaram pelo

menos uma droga ilícita49. Contudo, tornando estas estatísticas ao mesmo tempo mais generalizadas e específicas, temos a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para pessoas entre 15 e 64 anos de idade no Brasil é de 2,5% para maconha; 1% para cocaína ou crack; 0,3% pra anfetaminas; 0,2% para ecstasy; 2,1% para tranquilizantes e sedativos; e 0,1% para opioides e opiáceos1. Quando comparamos estes números aos da Islândia, por exemplo, é difícil crer que temos um uso descontrolado de drogas: exceto pelo uso de tranquilizantes e sedativos, os demais índices são iguais ou menores que aqueles do país nórdico – mesmo após quase duas décadas de ações focadas do governo islandês. Fazendo uma soma simples da prevalência das cinco drogas “ilícitas” mais comuns (a saber: maconha, cocaína crack, anfetaminas, ecstasy e opioides opiáceos), temos uma prevalência de uso de 12,2 na Noruega; 10,6 na Suíça; 17,7 na Austrália; 22,4 na Irlanda; 23,1 na Alemanha; 6,3 na Islândia/ 9,6 na Suécia; e 30,5 na Holanda – ou uma “prevalência média” de 16,55 (Singapura não oferece dados suficientes para este cálculo). No Brasil, esta soma equivale a 4,1 – 400% menor que a média dos nove países com melhor IDH do mundo. Ainda que os dados da ONU possam ser considerados suspeitos ou tendenciosos, é difícil afirmar que esta discrepância seja apenas um produto de conspirações geopolíticas ou pura engenharia social. Negar-se a enxergar a dimensão das estatísticas não é ser saudavelmente cético, mas apenas voluntariamente teimoso. Não obstante nossa menor prevalência no uso de entorpecentes, temos um índice de homicídios intencionais por 100 mil habitantes/ano 46 vezes maior que a média dos nove países com melhor IDH do mundo: segundo dados da ONU, em 2016, a Noruega apresentou um índice de homicídios intencionais de 0,5; a Suíça, 0,54; a Austrália, 0,94; a Irlanda, 0,8; a Alemanha, 1,18; a Islândia, 0,3; a Suécia, 1,08; e a Holanda, 0,55, perfazendo uma média de 0,65. No mesmo ano, os brasileiros experimentaram uma taxa de homicídios intencionais de 29,5391. Se o consumo de entorpecentes – e consequentemente o mercado que as fornece – é a principal causa de violência em uma sociedade, então os países listados, que apresentam um consumo de drogas ilícitas bem maior que aquele documentado no Brasil, não

deveriam ter índices de homicídios intencionais mais elevados que os nossos? Mas não é isso que ocorre. Na verdade, como visto, os dados oficiais apontam que consumimos bem menos drogas que eles, mas ainda assim matamos mais. Se procurarmos uma associação um pouco mais razoável, a encontraremos no PIB nominal per capita (PPC): os 10 países com melhor IDH do mundo possuem um PPC de 54,1 mil dólares – versus 13,6 mil do Brasil92. Em outras palavras: o brasileiro médio ganha cerca de 400% menos que um cidadão dos países mais ricos, e este dado – e não a prevalência de uso de drogas – alinha-se melhor ao elevado índice de homicídios intencionais em nosso país. Se pretendemos combater a violência nestas paragens, deveríamos tratar nossa miopia Moralista, esquecer as drogas e colocar todos os esforços na melhora da produtividade e da renda.

UMA VISÃO MORAL NUA, CRUA E UTILITÁRIA A Moralidade consiste na conversão de uma preferência em um valor cultural que passa a ser internalizado pela sociedade em um determinado momento. Por isso, em geral, a Moralidade é vista como algo positivo, mas ela também pode ser empregada como ferramenta de coação de um grupo sobre outro. A Homossexualidade já foi considerada imoral, e então uma doença, e então apenas uma orientação sexual trivial e digna. O tabagismo já foi considerado elegante, e então uma declaração de rebeldia, e então um hábito Moralmente condenável, mas permissível. Em ambos os casos, o processo social envolvido costuma ser quase sempre o mesmo: primeiro, observa-se o uso de uma substância ou comportamento em uma minoria demográfica em particular; por influência cultural, o hábito se espalha para outros grupos e comunidades adjacentes, todavia mantendo o rótulo de imoralidade e desconfiança. Logo em seguida, por pressões políticas, a ação é considerada “ilícita”. Com o tempo, caso o uso ou comportamento se torne disseminado o suficiente, inicia-se um movimento contrário para suspensão do rótulo de ilicitude. Se a droga ou comportamento tiver a capacidade de se tornar popular, deixará também de ser considerado imoral – e, em alguns casos, poderá ser até reclassificado como tolerável (tabaco) ou de uso

corriqueiro por pessoas refinadas (vinho, uísque), mesmo quando seus prejuízos são extensos e conhecidos. Alguns entorpecentes têm sido parte de rituais religiosos há milhares de anos, mas a modernidade os baniu do teatro das discussões sérias sem que houvesse qualquer raciocínio científico baseado em evidências que justificassem essa discriminação. Alegamos que algumas drogas são imorais, pois a vida é a sagrada e as drogas a destroem. Entretanto, considere o caso do açúcar refinado: o excesso de açúcar mata milhões de pessoas no mundo todo, todos os anos. Poucas pessoas consomem açúcar porque são forçadas a isso. Consumimos açúcar porque nos sentimos bem, porque o açúcar é uma fonte rápida de energia e – principalmente – porque alimentos doces são gostosos. Mas não precisamos consumir açúcar refinado para sobreviver: o organismo pode muito bem retirar o açúcar que necessita de alimentos naturais. Se vamos proibir as drogas pelas ameaças que elas trazem à vida (que é sagrada ), não deveríamos fazer o serviço completo e proibir o açúcar também? Atividades como boxe, MMA, base jumping, paraquedismo, alpinismo e voo livre são extremamente arriscados – ainda que este seja um perigo controlado e assumido de modo voluntário. Se vamos proibir o uso de drogas pelos danos e riscos que elas trazem ao usuário e à vida que é sagrada, não deveríamos aproveitar a chance e aprovar um pacote tornando estas atividades ilegais de uma vez por todas? E o que dizer sobre pessoas que se alimentam de maneira inadequada, se recusam a fazer exercícios e se tornam obesas? Elas estão colocando suas vidas em risco! Não deveriam ser proibidas e punidas pela força da Lei de fazerem isto? Dizemos que as drogas são imorais, pois limitam livre arbítrio e causam dependência. Bem, seu livre arbítrio é limitado pelo Estado (vide os limites de velocidade, o uso obrigatório de capacete ou cinto de segurança, sua “contribuição compulsória” para o Imposto de Renda e o serviço militar obrigatório), pelas convenções sociais, por seus genes, e por suas obrigações com a sua família, seu trabalho e suas contas. E somos dependentes de comida, água, afeto e relacionamentos: o jejum, a desidratação e o isolamento emocional, quando muito intensos e prolongados, podem produzir danos físicos e psicológicos terríveis. Finalmente, dizemos que as drogas são imorais, pois podem causar danos a outrem e à propriedade de terceiros, ainda que não

intencionalmente. Neste caso, deveríamos ser honestos com o método de raciocínio empregado e repensar a Moralidade de automóveis, bicicletas, motocicletas, skates, patins, aviões, helicópteros, pisos encerados, piscinas, varandas e janelas sem grades, tomadas elétricas, embalagens de vidro, utensílios de plástico, armas de fogo e incontáveis medicamentos. Argumentar assim não é aproveitar recursos sofistas para impor o império do Relativismo Moral permissivo e contraproducente, mas tentar fazer valer uma visão racional e congruente da Moralidade que nos dispomos a bancar. É isso ou assumir a perpétua hipocrisia coletiva de tudo. CONCLUSÃO As proibições costumam vir acompanhadas de modificações legislativas que mais tarde garantem ao Estado o monopólio quase total daquilo que foi proibido. No Brasil, este fenômeno pode ser visto com relação aos jogos de apostas e o porte de armas de fogo. Em outros casos, o banimento oficial representa apenas uma tentativa fracassada de impedir o consumo daquilo que continuará sendo consumido ilegalmente. A tolerância zero com as drogas é uma bandeira política sedutora, mas ela é uma intenção natimorta a inalcançável: humanos não irão parar de consumir drogas por força da Lei – eles irão apenas consumi-las com maior discrição. Nenhum dependente de crack ou usuário de ecstasy jamais aguardou autorização do governo para começar a servir-se de narcóticos. Sejam as drogas um problema ou não, não existe um passe de mágica para resolvê-las. O perfil dos entorpecentes e dos usuários irá mudar com o tempo, assim como os eventuais dilemas associados. Qualquer medida com intenção de eficácia real deverá passar não pelo combate violento às drogas, mas pela impunidade dos crimes contra a integridade física e a propriedade do cidadão, pela prevenção do contato dos jovens com a subcultura que permeia criminalidade, por medidas educacionais explícitas e permanentes nas escolas, pelo estabelecimento de regras meritocráticas no mercado de trabalho, pela melhora da renda oriunda do esforço próprio, e pela valorização da religião e da saúde emocional dos núcleos familiares. Em termos de Estado, é imperativo estabelecer

uma maior autonomia para que cada unidade da federação decida como irá dividir seus recursos para lidar com os entorpecentes. Após quase cinco séculos de disseminação do método científico, qualquer julgamento Moral deveria envolver evidências, não emoções. E delegar ao Estado a proibição ou autorização do uso de drogas consiste em manter a tutela governamental de decisões que deveriam caber unicamente ao indivíduo. O Estado deveria servir para proteção dos mais vulneráveis – bebês, crianças e pessoas mentalmente incapacitadas, por exemplo –, deixando aos adultos a responsabilidade pelas consequências de suas próprias escolhas. Sem embargo, uma consulta popular realizada nos EUA em 2016 mostrou que 60% da população apoiava a legalização da maconha, sendo que 54% acreditavam que esta legalização deveria ser plena e irrestrita11. No Brasil, como herança de décadas de políticas assistencialistas e paternalistas, 47% da população é favorável a que o Estado decida quais drogas podem ser consumidas legalmente e quais devem ser proibidas49. É triste constatar, mas, como nação, temos um longo caminho pela frente para apreender o que significa Autopertencimento.

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