Diego Velázquez (1599-1660): a face de Espanha [1 ed.]
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Norbert Wolf

DIEGO VELÁZQ!)EZ 1599 -166o

A face de Espanha

TASCHEN KOLN LONDON

MADRID N;w YORK

PAR IS TOKYO

CAPA:

RetraltJ dum umio sentado no chão (D. Sebasrián de Morra?), cerca de 1645 Óleo sobre tela, I 06,5 x 8 UI cm

Madrid, Museo dei Prado ll.USTRAÇAO DA PÁGINA 1:

Auto-retrato, cerca de 1640 Óleo sobre tela. 45.8 x 38 cm Valéncia . .\1useo te Bellas Artes de San Pío V llt:STRAC AO DA PÃrpo i11triro da miulrn Jsnbtl. 16.11/32 Óko sobre tela. 207 ~ 119 cm 1\ov:r Iorque. colecção pan icul3r Vcl:í.:yuc.~: pinrou cSic rcrrJto po r ci ma de um amigo retrJto da rainha. pintado por si no fim dos ano~ 20 do século xvn.

Parece que Velázquez, no plano técnico, só conseguiu esse efeito depois da sua viagem a Itália, embora sem uma influência ou um modelo directamente responsável. Nenhum dos seus alunos conseguirá igualá-lo na qualidade de representação desse género de fenómeno. Não há dLívida de que a presença de Peter Paul Rubens na corte e os retratos pintados por ele contribuíram largamente para privilegiar um estilo de representar,;ão mais moderno e mais rico. A construção do palácio do Buen Retiro na periferia de Madtid - o conde-duque de Olivares dá a maior in1portância à sua disposir,;ão complexa c luxuosa - deve ser considerada como a cxpn:ssão da nova necessidade de «esplendor», de luxo enobrecido pela arte e exibido de maneira cerimoniosa. Será no entanto fal so ver em Velázquez o retratista da corte e das suas futilidades, da abastança e do amor do fau sto. Ele conhece evidentemente a posição social dos seus modelos e as regras do protocolo que um pintor de corte deve respeitar; está igualmente consciente do facto de ser necessário contribuir para a glória da corte espanhola com os meios do seu génio artístico. Mas, para além

1-.M (.'IMA t-: I'(Jt.14/.15 Óleo sobre tela . .10.1.5 x .1 17.5 cm Madrid, Mus~o dei Pmdo

PÁGNA~:

Ponn~nor do Rrrrmo

16.>-1/.15

rqursrrr dr Filipe 11' .

dessas considerações, e com uma qualidade que resiste ao passar do tempo, fixa sobre a tela, no meio de todas essas coisas preciosas, a personalidade dos que pousam para ele. Constata, sem apreciação moral ou julgamento, e descreve os rostos tomados transparentes um tanto como o seu destino e as mãos tão delicadas dos aristocratas que parecem cansados pelos séculos. A beleza subtil e a nobreza desses retratos principescos são tão extraordinárias que nenhum artista depois dele conseguiria representá-las da mesma manc1ra. O herdeiro do trono, tanto tempo esperado, o príncipe Baltasar Carlos, na~cido no dia 17 de Outubro de 1629, era a alegria de seus pais. Em Koma, Velázquez participa numa das embriagantes festas dadas em numerosas aldeias europeias em honra do seu nascimento. Assim que voltou para Madrid, decide pintar o jovem príncipe, então com dezasseis meses. Numa outra obra, representa a criança loira com um insólito companheiro (ilust. p. 34). Envergando um fato de cerimónia sumptuosamente bordado (ilust. p. 35) que o transfonna num adulto em miniarura, o príncipe ergue-se 37

Retrato eque.ure tfe Filipe III. cerca ele 1634/35 Óko sobre tela. 305 x :120 cm /'.ladri d. Mu>CO dei Prado

Ticiano

Retrato equestre du imp~rotfur Carlu$ Quintu cm Miihlbcrg. 1548 Óleo sobre tela. 332 x 219 cm ~ladrid. r.luseo dei Prado !Xpois da sua nomcaçiio como pintor da cone. Velázque1. teve a oponunidacle de c~mclar no ,\ldccr o célcbn: retraio do impcrmlor real iLado por Ticiano. i\ l>bra rcpn:scnta C;orlos Quimo cm tntjc militar mas sem om;omentos a legóricos. r~nunciando me~mo 1t de~criç:\o de 1mpa~ ou cena< ele comhatc.

sobre um estrado coberto por um tapeie sob um cortinado drapeado; tem na mão direita um baslão de comando c descansa a mão esquerda sobre o punho·de uma e.~pada; o gorjal ck aço indica o seu fulllro papel de comandante dos exércitos. O seu ros1o. onde se divisam os 1raços da sua graciosa mãe francesa, está voltado para outra criança. em primeiro plano à esquerda, cuja cabeça o enfrenta. Trata-se de um anão ou, como se julga actualmente, de uma anã. um dos brinquedos humanos 1ão apreciados nas cortes da época. A garota tem na mão uma roca de praia e uma maçã, como se se tratasse do ceptro e do globo imperiais. c desempenha o papel de um absurdo mestre-de-cerin1ónias para o fulllrtl rei. A dei Pt3do

heróis. Velázquez conseguiu aqui uma composição barroca das ma is ousadas. Como marechal ostentando um chapéu com plumas, e nve rgando uma c ouraça incmstada de ouro e empun hando o bas tão de comandante na mão dire ita. Olivares . célebre pela sua mestria de cavale iro. faz a mo ntada empinar-se à beira de uma falésia em prime iro plano. O es pectador contempla o perfll esquerd o do conde-duque. que volta a cabeça para s i e o enfrenta com ar imperioso. A cabeça de Olivares constirui a mais v iva luz da composição. O sobe rbo cavalo c astanho olha c m frente. para uma cidade cm fogo na planície onde se elevam colunas de fumo c inzento e de poeira. Ao contrário de opiniões muitas ve zes expressadas . não devia tratar-se de qualquer batalha cm part icular, já que era preciso retratar de maneira geral a habilidade militar de um homem que condu zia os exércitos do rei de triunfo em triunfo. Assim que o Bu~::n Retiro ticou termi nado, Filipe IV me teu-se noutro projecto que manteve Velázqucz. ocupado durante vári os anos. O rei c açador apaixonado e temerário - cavalgava muitas vezes com uma pequena escolta nas profundas flor~::s t as d os vastos te rre nos de caça do Prado. Quis que o seu pintor de corte fixasse na tela. para as gerações futuras, os v~::ados que abatia (ilust. p. 41). No caminho que tomava, através da serra, erguia-se uma torre de observação. a To rre da Parada, construída por Carlos Quinto para parar c re pousar, como o seu nome indica. A torre agradava muito a Filipe IV, que a mando u aumentar e transformar em pavilhão de caça. O re i tinha pressa de ver a decoração te m1 inada. c Rubens recebeu uma enorme encomenda de novos quadros inspirados em temas mitológicos. Depois de 1638. quando os traba lhos tem1inaram. Velázquez teve de decid ir onde seriam pendurados c ele mesmo de realizar uma série ele retratos em trajes de caça. como complemento das obras já existentes e paralelamente aos quadros dos mestres holandeses. A decoração d o pavilhão de caça representava um acréscimo de trahalho e de esforços para Velázquez, mas o seu prestígio na con e via-se assim aumentado. Os três retratos conservados d e caçad ores pintados por Vclázquez são d e tamanho natural. O retrato. várias vezes modificado, do monarca (Retraro de Filipe T\1 em rrajes de caça; ilust. à esquerda) foi acabado cm 1632/33. O rei e rgue-se. com um ar natu ral absolutamente impressionante, diante de um c arvalho de Fo lhagem e sp3ÇO nào definido e vazio. s~m mesmo uma linha 3 marcar o >olo. O fundo des1a ohr.t-prima pintada cm 1ons luminosos de cin1emo- :tcluahnemc tr.m>· fom1ados em ocre-sujo- enc:mlar.imab 1ardc pi mores como O o} 3 ou :'>I anel.

ÀlllkmTA: Édoua rd Mum:l 0 P({arn. I X66 Óleo sobre te la. lól x 97 cm Paris . .Musé~ d'Orsay

.\fl·nipu. 1639- 1611 Óko >Oh• c 1cl~. 178.5 x 9.1.2 cm Madrid. Musrn dd Pr.ulo

selvagem e segura com força a bainha vazia da ~spada nt::gligtmtem entc agarrada na outra mão. Velázquez deixará o retrato inacabado no fim dos anos trinta e outro pintor o terminará, trabalhando sobretudo o casaco cinzento. Apesar das suas enfermidades, os anões e os bobos de Vclázquez são os observadores perfeitamente íntegros do poder temporal. O carácter insistente, fascinante, que o artista soube dar em particular ao seu olhar, aos seus olhos. revela que esses habitantes de um mundo imcrtnediário sabem pôr a descoberto - melhor que qualquer cortesão thi,turisches 1\Juscuon: 2. 66. 67. 92. 93. 95