Aves da Baía do Araçá e arredores
 9788592264307

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Livro Aves Araçá.Capa.Corrigida.Pallotti.OK

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Aves

da Baía do Araçá Aves da Baía do Araçá e arredores

e arredores

ISBN 978-85-922643-0-7

+10

9 788592 264307

Patricia Luciano Mancini Bianca Santos Matinata Luciano Gomes Fischer

Aves da Baía do Araçá e arredores

Patricia Luciano Mancini Bianca Santos Matinata Luciano Gomes Fischer

2017

Copyright © 2017 Patricia L Mancini, Bianca S Matinata e Luciano G Fischer Para uso das fotografias ou de trechos do livro consulte os autores por e-mail. O PDF pode ser acessado em ResearchGate.net ou solicitado aos autores.

Coordenação Geral do Projeto Biota/FAPESP-Araçá Antônia Cecília Zacagnini Amaral Alexander Turra Aurea Maria Ciotti Carmen L. D. B. Rossi-Wongtschowski Yara Schaeffer-Novelli Revisão Luís Fábio Silveira

Aos nossos pais, que acreditam nos nossos sonhos.

Fotografias Luciano Gomes Fischer Patrícia Luciano Mancini Bianca Santos Matinata Daniel Mello Gabriel Mello Capa, Projeto Gráfico e Diagramação Luciano Gomes Fischer Citação sugerida: Mancini, P.L.; Matinata, B.S.; Fischer, L.G. 2017. Aves da Baía do Araçá e arredores. 1ª Edição, Patricia Luciano Mancini, São Paulo, 108 p.

Às aves, que nos fazem sempre levantar os olhos e enxergar muito além do nosso próprio mundo.

Mancini, Patricia Luciano Aves da Baía do Araçá e arredores. / Patricia Luciano Mancini, Bianca Santos Matinata, Luciano Gomes Fischer. São Paulo: Patricia Luciano Mancini (Editora), 2017.

108p.; il. ; 21 cm



ISBN 978-85-922643-0-7

1. Avifauna - São Sebastião, Brasil 2. Aves, Baía do Araçá, São Sebastião 3. Aves - Fotografia 4. Aves - Manguezal. I. Matinata, Bianca Santos. II. Fischer, Luciano Gomes. III. Título.

CDD 598.298161 5

SUMÁRIO

Egretta thula - garça-branca-pequena

Prefácio

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Apresentação

8

Agradecimentos

11

Introdução

12

Ameaças às Aves

15

A Baía do Araçá

16

As Aves da Baía do Araçá

18

O Mangue da Balsa

20

As Aves do Mangue da Balsa

20

O Canal de São Sebastião

22

As Aves do Canal de São Sebastião

22

O Porto de São Sebastião

24

Dicas para Observação de Aves

26

Ciência Cidadã

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Como Usar o Guia

30

Morfologia Externa Básica das Aves

31

Fichas das Espécies

32

Pranchas das Espécies

90

Glossário

98

Bibliografia

100

Sites Consultados

102

Lista de Espécies

103

Créditos Fotográficos

106

Sobre os Autores

108 7

Coereba flaveola - cambacica

Prefácio Este guia é um produto do projeto temático "Biodiversidade e funcionamento de um ecossistema costeiro subtropical: subsídios para gestão integrada" (FAPESP 11/50317-5). Ele tem por objetivo fornecer informações práticas que permitam a identificação das aves comumente presentes na Baía do Araçá, como também na zona costeira de grande parte do Sudeste do Brasil. Ao longo de muitos anos, a comunidade acadêmica tem estudado a Baía do Araçá que, quando observada com detalhes, impressiona por sua beleza e elevada diversidade biológica. Neste projeto houve o envolvimento de mais de uma centena de pesquisadores e revela o conhecimento adquirido nestes quatro últimos anos, por meio de publicações em revistas científicas, folders, livros e guias como esse, sobre as aves da baía, o qual, como coordenadora do Projeto Biota/FAPESP-Araçá, tive o privilégio de ter sido convidada para ser a prefaciadora. Não sou ornitóloga, como os autores bem sabem, porém, minha curiosidade em conhecer as aves começou quando iniciei em 1973 minha pesquisa de mestrado, trabalhando com fauna de praias. A dificuldade em reconhecer aquelas aves que sobrevoavam a praia ou caminhavam pela areia era imensa. Onde obter este conhecimento de forma correta e simples? Por esta razão, tenho certeza que este guia tem várias destinações. Dentre elas disseminar o conhecimento adquirido pelos colaboradores envolvidos pelo entusiasmo e compromisso da Patrícia Mancini em preparar um material de fácil acesso, porém com rigor científico, proporcionando conhecimento à população, capacitando-a a participar das decisões que impactam a biodiversidade da região. Além disso, esse guia deve ficar disponível em bibliotecas, laboratórios de pesquisa, salas de aulas e com certeza, nas mãos de pessoas de diferentes formações e interesses. Ele também deve ser distribuído em pousadas à beira-mar e que com certeza sentirão orgulho em folhear um guia de aves ilustrado e de linguagem simples, acessível e identificar as aves que se encontram em seu entorno. Iniciativas como esta, compor um guia de altíssima qualidade sobre as aves que frequentam a Baía do Araçá, só podem enriquecer o interesse das pessoas em observar e preservar a avifauna e seus hábitats. A observação de aves é extremamente difundida em diversos países, porém no Brasil apesar da grande diversidade, essa atividade ainda é pouco praticada. A edição do guia "Aves da Baía do Araçá e arredores" é extremamente bem vinda, e reflete a excelência e maturidade do trabalho investigatório que tem sido desenvolvido pelo Projeto Biota/FAPESP-Araçá. Este guia revela a elevada diversidade de aves no local, até aqui desconhecida e que, sobretudo constitui um sólido argumento para a preservação da baía. A. Cecilia Z. Amaral Coordenadora do Projeto Biota/FAPESP - Araçá 9

Apresentação A elaboração do guia "Aves da Baía do Araçá e arredores" é fruto de inúmeras horas de persistente observação e esforço da Dra. Patricia Luciano Mancini, da colaboração de Bianca Santos Matinata e da magnífica fotografia do Dr. Luciano Gomes Fischer. Este guia de aves foi produzido dentro do contexto do Projeto Biota/FAPESP-Araçá "Biodiversidade e funcionamento de um ecossistema costeiro subtropical: subsídios para gestão integrada", subvencionada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado De São Paulo (FAPESP). O Projeto Biota/FAPESP-Araçá é um marco nos estudos sobre ecossistemas costeiros. Os resultados obtidos sobre sua importância ecológica, social, econômica e política viabilizarão o entendimento dessa região sob uma ótica integrada, de forma a gerar subsídios para o diálogo entre sociedade e tomadores de decisão, e definir políticas públicas voltadas a seu uso sustentável. Isso é especialmente importante considerando que a Baía do Araçá encontra-se dentro de duas unidades de conservação, a Área de Proteção Ambiental Marinha do Litoral Norte do Estado de São Paulo (APA do Litoral Norte) e da Área de Proteção Ambiental Municipal dos Alcatrazes (APA de Alcatrazes). No âmbito do Projeto Temático Biota-FAPESP/Baía do Araçá, e atendendo a demanda necessária dentro do Módulo Sistema Nectônico, (responsável pelo levantamento da diversidade de peixes, tartarugas marinhas, aves e mamíferos marinhos), os autores registraram mensalmente, ao longo de um ano, as aves da Baía do Araçá e áreas adjacentes, localizada ao lado do porto de São Sebastião e ao Canal de mesmo nome (veja mapa abaixo).

10

Esse guia de aves faz parte do projeto "Avifauna associada à Baía do Araçá (sudeste do Brasil): composição, abundância, uso de hábitat e relações tróficas", desenvolvido pela Dra. Patricia Mancini e colaboradores, sob a supervisão do Prof. Luís Fábio Silveira, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo. A pesquisa visou preencher a lacuna de conhecimento sobre a avifauna na região, e que se torna ainda mais relevante visto a eminência da expansão do Porto de São Sebastião, que ameaça diretamente a existência da Baía do Araçá. Quando convidamos a Dra. Patricia para participar do Módulo Sistema Nectônico, realizando o levantamento das aves da Baía do Araçá, não tínhamos ideia sobre a riqueza da avifauna ali presente, onde até hoje foram contabilizadas 78 espécies terrestres e aquáticas que fazem parte da teia trófica do local. A Patricia não se contentou em estudar apenas as aves da Baía do Araçá: se deslocou para o Canal de São Sebastião e para o Mangue da Balsa, ávida para entender o que acontecia no entorno. Esta curiosidade foi premiada, e outras espécies foram acrescentadas ao registro inicial, revelando a maravilhosa avifauna da região. Além disso, constatou-se a importância do Mangue da Balsa para a nidificação de algumas espécies de aves aquáticas, como o savacu-de-coroa (Nyctanassa violacea), ameaçado de extinção no estado de São Paulo, além de diferentes espécies de garças. O livro se propõe a estimular a prática de observação de aves na região, oferecendo dicas e sugestões de como iniciar as "passarinhadas". Um esquema da morfologia externa das aves foi inserido para facilitar a descrição das aves e a compreensão do leitor. São apresentadas fichas de 42 espécies contendo fotos, descrição das espécies, e informações sobre distribuição, hábitat, alimentação e curiosidades sobre cada uma delas. Procurando minimizar o volume de informações, sem deixar de registrar outras espécies que foram avistadas na área, pranchas com fotos de outras 42 aves constam no final do livro. Este livro apresenta de forma simples, didática e bem ilustrada muitas das aves que habitam a região e, acreditamos que constituirá importante ferramenta para disseminar o conhecimento adquirido, ao ser utilizado por toda a comunidade que mora nos entornos do Araçá, lideranças locais, escolas e formadores de opinião. Serve ainda para alertar as autoridades públicas e privadas sobre a necessidade de preservar essa belíssima fauna de aves para que, no futuro, outros dela desfrutem. É com muito orgulho que escrevo esta apresentação e quero elogiar e agradecer os autores pelo belíssimo resultado. Carmen L.D.B.R. Wongtschowski Coordenadora do Módulo Sistema Nectônico, Projeto Biota/FAPESP-Araçá 11

Egretta caerulea - garça-azul

Agradecimentos À coordenação do Projeto Biota/FAPESP-Araçá (2011/50317-5): Profa. Dra. Antônia Cecília Zacagnini Amaral, Prof. Dr. Alexander Turra, Profa. Dra. Aurea Maria Ciotti, Profa. Dra. Carmen Lúcia Del Bianco Rossi-Wongtschowski e Profa. Dra. Yara Schaeffer-Novelli pela elaboração do projeto temático "Biodiversidade e funcionamento de um ecossistema costeiro subtropical: subsídios para gestão integrada". À Profa. Dra. Carmen Lúcia Del Bianco Rossi-Wongtschowski, coordenadora do Módulo II: Sistema Nectônico, e à Profa. Dra. Lucy Satiko Hashimoto Soares, coordenadora do Módulo VII: Interações Tróficas, pelo convite para participar desse importante projeto, pelo incentivo, apoio, palavras de carinho e por serem profissionais inspiradoras! Ao Prof. Dr. Luís Fábio Silveira pela criteriosa revisão e valiosas sugestões que contribuíram para aperfeiçoar a qualidade deste livro. À Profa. Dra. Yara Schaeffer-Novelli, coordenadora do Módulo IV: Sistema Manguezal, pelos ensinamentos e informações sobre o manguezal. Aos pesquisadores Dr. Thiago Vernaschi Vieira Costa, Dr. Vítor de Queiroz Piacentini, Dr. Leandro Bugoni e Dr. Luís Fábio Silveira pelos esclarecimentos na identificação de algumas das espécies. Ao Gabriel Mello e Daniel Mello por colaborarem com as belas fotos de Eudocimus ruber, Aramides cajaneus, Herpsilochmus rufimarginatus e Cantorchilus longirostris. Aos colegas da Seção de Aves do Museu de Zoologia da USP, pelo auxílio em campo e pela troca de experiências, em especial à Ariane Campos Gouveia, Fernanda Bocalini, Jeremy Kenneth Dickens e Natália da Mata Luchetti. A todos os moradores da Baía do Araçá, especialmente aos prestativos Neemias Nobre Borges, Marcelo Alves (Latinha) e Moacir Nobre de Jesus (tio Moa) pelas dicas e informações sobre as aves. Ao querido Sr. Luís Paulo Dutra, motorista de taxi, por nos auxiliar na logística e transporte sempre com pontualidade, eficiência e bom humor. Ao Secretário do Meio Ambiente da Prefeitura de São Sebastião, Dr. Eduardo Hipólito do Rego pela autorização para desenvolver as atividades de pesquisa no Mangue da Balsa (Autorização 0003/2014 SEMAM). Ao Museu de Zoologia da USP, pela disponibilização da infraestrutura e por abrigar a Coleção de Aves, sob a curadoria do Prof. Dr. Luís Fábio Silveira. Ao Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (CEBIMar/ USP), pelo apoio logístico e infraestrutura durante as amostragens e a todos os seus funcionários, sempre muito prestativos e atenciosos. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelo auxílio para o desenvolvimento do projeto e pela bolsa concedida.

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Introdução As aves encantam os seres humanos graças à sua extraordinária beleza e diversidade de cores de suas penas, vocalizações e comportamentos, sem falar na invejável capacidade de voar. O voo só foi possível devido às várias adaptações morfológicas, tais como: • Penas recobrindo o corpo. As penas são estruturas muito leves, que auxiliam na manutenção da temperatura corporal, entre outras funções vitais; • Esqueleto formado por ossos pneumáticos (ocos e cheios de ar) resistentes e leves; • Membros anteriores modificados em asas, que geram o impulso necessário para o voo, além de possibilitar manobras; • Presença de uma quilha no osso esterno, onde localizam-se músculos peitorais muito desenvolvidos que movimentam as asas; • Ausência de bexiga urinária e dentes, que contribuem para a redução do peso corporal. Algumas aves, como as emas e os pinguins, apesar de possuírem muitas das características citadas acima, acabaram perdendo a capacidade de voar ao longo da sua evolução. A capacidade de voar foi importante para que as aves conseguissem se distribuir amplamente por vários ambientes em todo o planeta, ocupando os mais distintos hábitats como florestas, praias, campos, manguezais e ilhas, desde as regiões tropicais até os polos. Atualmente existem cerca de 12.000 espécies de aves no mundo e destas, 1.919 ocorrem no Brasil, que é o segundo país com a maior diversidade de aves no planeta. Apenas a Colômbia, com 1.921 espécies, supera o Brasil. Algumas características marcantes das aves são os variados formatos, tamanhos e cores de seus bicos e suas chamativas penas coloridas. Os bicos estão diretamente relacionados ao tipo de alimento que as aves consomem. Note, por exemplo, o longo e forte bico das garças que é utilizado para pescar, enquanto que os das andorinhas são diminutos e servem para capturar pequenos insetos em voo. Os beija-flores tem o bico fino e longo, próprio para alcançar o interior das flores e se alimentar do néctar, e os urubus e gaviões possuem bico forte e afiado adaptado para dilacerar carcaças. Os pés das aves, por sua vez, são um indicativo do tipo de ambiente em que elas vivem. As aves terrestres possuem variados arranjos na disposição dos dedos, permitindo agarrar as suas presas (como nos gaviões e corujas, por exempo), manipular o alimento (papagaios, araras e periquitos) ou mesmo escalar árvores (pica-paus e arapaçus). Aves aquáticas como os marrecos, atobás, gaivotas e trinta-réis têm membranas entre os dedos dos pés (conhecidas como membranas interdigitais) que facilitam seu deslocamento na água. Outras espécies como as garças e os colhereiros possuem pernas e dedos longos, adaptados para caminhar em ambientes alagados. 14

O formato e tamanho das asas diferem entre as espécies, possibilitando uma grande variedade de estilos de voo. Você já deve ter notado urubus planando durante muito tempo no ar com suas largas e compridas asas, ou mesmo o voo com muitos batimentos de asas, como observado nos biguás e nas marrecas. As andorinhas fazem rápidas manobras no ar devido às asas compridas, e os beija-flores podem bater suas pequeninas asas até 90 vezes por segundo, voando em diferentes sentidos ou mesmo pairando no ar. As penas da cauda das aves, conhecidas como retrizes, também são fundamentais pois auxiliam no direcionamento durante o voo. Muitas espécies de aves são migratórias, ou seja, se deslocam periodicamente entre os locais de reprodução e os locais de descanso reprodutivo ou de invernagem. Algumas espécies podem voar milhares de quilômetros entre essas duas áreas. Todos os anos alguns visitantes procedentes do Canadá e dos Estados Unidos, após a reprodução, vêm passar as "férias" no Brasil. Esse é o caso das batuíras-de-bando, dos maçaricos-de-sobre-branco e dos maçaricos-pintados, também encontrados na Baía do Araçá e no Mangue da Balsa (e que você conhecerá mais adiante). São animais que viajam mais de 10 mil quilômetros só para apreciar a "gastronomia local" composta pelos vermes poliquetas, larvas de insetos, pequenos camarões e outros invertebrados de pequeno porte que vivem nesses locais. As aves tem papel essencial na manutenção e no funcionamento dos hábitats onde vivem. Muitas espécies auxiliam na polinização das plantas (beija-flores e cambacicas), na dispersão de sementes e frutos (tiês, saíras e tucanos), fundamentais para a reprodução de muitas espécies vegetais, garantindo a manutenção de matas e florestas. Gaviões e corujas controlam populações de roedores. Andorinhas e outras aves se alimentam de mosquitos, cupins e outros insetos, incluindo alguns prejudiciais ao homem. Os urubus são extremamente importantes, pois se alimentam de carcaças e restos de animais mortos. As aves também servem de alimento para outros animais, incluindo outras aves que predam os ovos e os filhotes, como o tucano e o anu-branco. O acúmulo dos excrementos das aves marinhas, também conhecido como guano, é utilizado como fertilizante na agricultura. O guano é encontrado em grande quantidade em várias ilhas oceânicas, hábitat de colônias de aves marinhas. Nas ilhas oceânicas do Peru, o guano foi o principal produto exportado durante o século XIX e o início do século XX. Até hoje existe uma grande demanda por guano peruano, por ser um excelente fertilizante natural. Algumas espécies de aves são utilizadas como indicadoras da qualidade do seu ambiente, pois só são encontradas quando este se apresenta em bom estado de conservação. Entre muitos casos, destacamos aqui o savacu-de-coroa ou socó-caranguejeiro, que habita as áreas de mangue bem preservados. 15

Ameaças às Aves Embora o Brasil tenha a segunda maior diversidade de espécies de aves no mundo, infelizmente, não estamos preservando nossa rica fauna de aves nem os ambientes onde elas vivem. O Brasil é o país com o maior número de espécies ameaçadas de extinção. De acordo com a "Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção", existem seis espécies extintas e 234 espécies de aves ameaçadas no Brasil (MMA 2014), que representam 11% de todas as espécies de aves do Brasil, ou 13% de todas as aves ameaçadas no planeta (1.227 espécies) segundo a BirdLife International (2015). A principal ameaça para a maioria das espécies de aves é a destruição ou a descaracterização do ambiente natural onde elas vivem. Por isso é essencial conhecer o uso que elas fazem de cada área, visando conservar esses ambientes e garantir a manutenção dos hábitats essenciais para o seu ciclo de vida. Essa é uma ameaça muito grave que ocorre em todas as regiões do Brasil. No levantamento da avifauna realizado na Baía do Araçá e seu entorno (descrito em detalhes a seguir), das 84 espécies registradas, cinco estão ameaçadas devido à perda de hábitat, ou seja, 6% das espécies. O trinta-réis-real (Thalasseus maximus) e o trinta-réis-de-bico-vermelho (Sterna hirundinacea) constam na Lista Nacional da Fauna Ameaçada (MMA 2014), enquanto que o savacu-de-coroa (Nyctanassa violacea), o papagaio-moleiro (Amazona farinosa) e o guará (Eudocimus ruber) estão na Lista Estadual da Fauna Ameaçada de São Paulo (Silveira et al. 2009).

Caracara plancus - carcará Platalea ajaja - colhereiro

Sterna hirundinacea trinta-réis-de-bico-vermelho A captura e o comércio ilegal de aves silvestres também é uma ameaça para muitas espécies. Capturar, perseguir e manter aves em cativeiro, sem licença da autoridade competente, é crime (Lei 9.605/1998). É possível adquirir aves legalizadas, que devem sempre ser mantidas em condições que garantam o seu bem estar em cativeiro. Outra ameaça são as colisões das aves contra vidraças, muros e prédios das cidades, cada vez mais frequentes. Estima-se que milhões de aves ao redor do mundo sejam mortas a cada ano dessa forma. Aplicar adesivos e deixar crescer plantas trepadeiras são algumas soluções para evitar esses acidentes. 17

A Baía do Araçá A Baía do Araçá é uma pequena enseada com área de aproximadamente 0,5 km², localizada no município de São Sebastião, no litoral norte do Estado de São Paulo. No entanto, seu pequeno tamanho não é proporcional à sua importância. Dentro da Baía do Araçá existem diversos ambientes, como costões rochosos, quatro praias arenosas (Deodato, Pernambuco, Germano e Topo), duas ilhotas (Pernambuco e Pedroso), uma ampla planície lamosa, que fica exposta na maré baixa, o Córrego Mãe Izabel e seis remanescentes de mangue. Em todo o litoral norte do Estado de São Paulo existem apenas 3,4 km² de manguezais. Essa diversidade de ambientes da Baía do Araçá abriga mais de 1.400 espécies de organismos, incluindo 78 espécies de aves, 122 de peixes e centenas de espécies de invertebrados. Os invertebrados são muito abundantes servindo de alimento para centenas de espécies que vem se alimentar dentro da Baía do Araçá. Lá habitam muitas espécies de camarões, caranguejos, siris, ermitões, mexilhões, berbigões, ostras, estrelas-do-mar, ouriços-do-mar, esponjas, anêmonas, cracas, entre outros. As macroalgas também são importantes como alimento e para a manutenção da biodiversidade local, pois centenas de espécies de pequenos organismos vivem associadas a elas. As macroalgas também são o alimento preferido das tartarugas-verdes observadas na Baía do Araçá durante a maré alta. Graças a essa fartura de alimento é que a Baía do Araçá pode ser considerada um verdadeiro "restaurante" a céu aberto, 18

principalmente para as aves aquáticas que aproveitam esse cardápio diversificado. Segundo a legislação vigente, por abrigar núcleos de manguezal, a Baía do Araçá é uma Área de Preservação Permanente (APP), sendo considerada um Patrimônio Nacional pela Constituição Brasileira (05/10/1988). As APPs são áreas naturais, com rígidos limites de exploração que tem por objetivo proteger os solos. A Baía do Araçá também faz parte da Área de Proteção Ambiental Marinha do Litoral Norte do Estado de São Paulo (APAMLN) e a Área de Proteção Ambiental Municipal de Alcatrazes (APA de Alcatrazes). Mas você sabe o que é uma Área de Proteção Ambiental? A Área de Proteção Ambiental (APA) é uma categoria de unidade de conservação de uso sustentável, que tem como objetivos "proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais" (Lei 9.985 de 18 de julho de 2000, do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC). No entanto, mesmo inserida em duas Unidades de Conservação, esse pequeno refúgio que abriga tamanha biodiversidade vem sofrendo com ocupações irregulares, emissão de efluentes de esgoto doméstico e vazamentos de óleo constantes por estar localizado aos arredores do Porto de São Sebastião e do Terminal Aquaviário da Petrobrás. Além disso, existe a eminência da expansão do Porto de São Sebastião, que ameaça diretamente a existência da Baía do Araçá. 19

Butorides striata - socozinho

As Aves da Baía do Araçá Entre junho de 2014 e maio de 2015, realizamos um levantamento da avifauna na Baía do Araçá e no Mangue da Balsa. Contamos as aves na maré baixa durante três visitas mensais totalizando 120 horas de observação. Iniciamos as contagens uma hora antes do pico da maré baixa, entre as seis e doze horas da manhã. Realizamos registros visuais com binóculos e câmeras fotográficas. Na Baía do Araçá registramos 78 espécies de aves, pertencentes a 34 famílias e 15 ordens. Destas, 69% são aves terrestres e 31% são aves de ambientes aquáticos. A abundância e riqueza (número de espécies) das aves variou entre as estações do ano, sendo que no verão e no outono ocorreram os maiores valores (Tabela 1). Tabela 1. Variação da riqueza (número de espécies) e da abundância por estação do ano na Baía do Araçá. Estação do ano Verão Outono Inverno Primavera

Número de espécies 42 45 29 35

Durante as contagens também registramos o comportamento das aves (o que elas estavam fazendo) para saber como elas usavam a Baía do Araçá. Também as classificamos em dois grupos (terrestres e aquáticas) para verificar se havia diferenças no uso de hábitat (Figura 2).

Figura 1. Frequência das aves registradas na Baía do Araçá, em São Sebastião, durante as contagens realizadas entre junho de 2014 a maio de 2015.

Abundância 236 a 318 202 a 260 100 a 154 117 a 226

Consideramos como espécies Frequentes aquelas que foram observadas em >75% dos meses (ou entre 9 a 12 meses no ano), Comuns aquelas registradas entre 25%-67% dos meses (entre 4 e 8 meses) e Ocasionais aquelas observadas em