As razões de uma cidade - Conflito de hegemonias

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Sou imensamente grata a José Antônio Lemenhe, Luiz Fernando Raposo Fontenelle, Faria Guilherme, José da Rocha Furtado Filho, Rosemary Conti, Irlys Alencar Firmo Barreira, Gilmar de Carvalho, Maria Sulamita de Almeida Vieira e René Barreira. Eles e elas sabem porquê.

Catalogação na Fonte: Bibliotecária Ana Cristina Azevedo Ursulino

L551 r

Lemsnhe, Maria Auxiliadora As razões de uma cidade: conflito de hegemonias. - Fortaleza: Stylus Comu­ nicações, 1991. 131p. 1. Fortaleza - História política 2. For­ taleza — Oriqem e problemas sociais I. Título C.D.U. 981 (813.11)

B H /U F C

Para Marina, que muito em breve fará melhor.

detensa, que ao ódio e a inveja da Capital deve-se o estado presente daquella rica porção do nosso ter­ ritório. " Barão de Studart 1892

‘‘Depois do Golpe de Estado de 1840... a autoridade das^aesembléias sobre as câmaras somente se faz sentir pelo lado mau, pela excessiva dependência e concentração dos negócios nas capitais das pro­ víncias. " Tavares Bastos 1870

ÍNDICE INTRODUÇÃO

..........................................................................................

A ECONOMIA PASTORIL E AS VILAS COLONIAIS DO CEARÁ - O Marasmo Económico nos Séculos XVI e XVII

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-------

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21

- A Pecuária e as Vilas do Litoral: Fortaleza e Aquiraz

..........................

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- A Expansão da Pecuária e a Criação de Vilas no Sertão ..................

33

- A Pecuária e a Fragilidade dos Núcleos Urbanos . ............................

42

A ECONOMIA AGRÍCOLA E A EMERGÊNCIA DA VILA DE

Í FORTALEZA

..............................................................................................

I - Expansão da Agricultura Comercial e de Subsistência ...............

50 50

- Limites ao Crescimento das Vilas do Sertão e a Emergência da Vila de Fortaleza

.................................................................................................

| A HEGEMONIA EM PROCESSO

...........................................................

58 66

f | - A Economia Brasileira: 1820-1840

......................................................

67

§*- A Economia Cearense: 1820-1840

......................................................

69

,í - A Centralização Político-Administrativa no Primeiro Reinado .............

74

!*- Fortaleza intermediando o Controle de Ordem Política .......................

77

....................................

85

CONSOLIDAÇÃO DA HEGEMONIA ................................................

97

A Economia Brasileira: Segunda Metade do Século XIX

....................

97

A Economia Cearense: Segunda Metade do Século XIX .....................

100

A Centralização Político-Administrativa no Segundo Reinado .............

106

Fortaleza, Núcleo Hegemónico do Ceará

......................................... ..

110

...............................................................................................

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Fortaleza Nucieando o Excedente Económico

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Be. ografia

APRESENTAÇAO

O trabalho que temos a satisfação de apresentar detém vários motivos para a sua publicação. Elaborado inicialmente como dissertação de Mestrado, ele vai muito além de um mero exercício conceituai. Aqui a autora aborda uma temática já desenvolvida por outros especialistas em estudos urbanos, mas o tratamento que aplica aos seus dados é suficientemente amplo e original, para sugerir uma nova teoria do fenômeno urbano no Brasil, uma teoria mais consentânea com a realidade dos nossos processos históricos e metlSs dependente das contribuições irrelevantes e, com frequência equivocadas, inspiradas na análise de outros contextos. fE m seu recorte crítico, a autora acompanha o curso da construção da hegemonia de Fortaleza enquanto centro de gravidade de um sistema social e económico que transpõe os limites do espaço cearense. .! É um trajeto que, guardadas as proporções e a especificidade do Outro Nordeste, indica significados funcionais exten­ sivos a outras cidades brasileiras que se inscreveram no mesmo universo da exploração colonial. De fato, o fenômeno urbano no Brasil, qualquer que tenha sido a conjuntura determinante da sua eclosão, ins­ titucionaliza, com grande semelhança, padrões dominantes de integração e cristalização. Embora agreguem estruturas subsidiárias ou secundárias que lhes transmitem a feição de desvio adaptativo e um caráter de regionalidade, a sua sistematicidade operativa é praticamente a mesma. Ela provém das exigências realísticas da “cultura do colonialismo”, isto é, dos valores, dos meios organizacionais, dos ob­ jetivos da exploração, da natureza do povoamento, implantados com o projeto de colonização e urdidos ao longo dos séculos. Portanto, quer Fortaleza, quer São Paulo, quer ainda Santa Rita de Jacutinga ou Cuiabá, ou Imperatriz, ou qualquer outra cidade, não obstante a sua historicidade e momento de hegemonia derivam de

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kL.I«ÉÉSáfc

h

m Ê È ã m w ponto Mfuturo das riaria no ã binómio manufatura-comércio, como na-ões emergentes, as atividades económicas voltadas para a cnaça Se S nsT e vd am m no Reino de Portugal uma imensa fta fjta ta d e n * t»Ai~nal A falta de maturidade da economia dos núcleos urbanos Dortúqueses transparecia da mediocridade das manufaturas, quer na divnr Jdade e qualidade da produção, quer no voiume de bens errados. A verdade é que estas atividades não resultaram da livre compos.ç o âas cíegoriaqs profissionais urbanas com suficiente poder de gestão

eram apenasmente consentidas, quer dizer, lic e n c ia d a ^ P ^ ta d a s e nxadas Doliciadas, suspensas ou incentivadas, seja pela , . S S f C o S r n o s dks Vilas e cidades e até pelos titulares dos SeS o r to s - auecuirtnaram com penas de multa, sequestro de bens e S ê ° a t X eTualquer iniciativa económica cuja forma violasse a prerrogativa superior da outroga do exercício dos ofícios. A bem dize , râo S s tia m sequer corporações antes do século XV e a reoulamentação dos mesteres so se verificou nas duas centúrias seouintes A menção a artesãos na documentação coeva esta 3 de^indicar um movimento manufatureiro significativo, mas sim, precisam enfa,7e” tegotias de trabalhadores ao nível domestico das peqUenaSle m s S s te n íS o 1K f p o r onde evoluíam e se consolidavam os núcleos u r b a X de além Pirineus. as ações de teor economico da cidade portuguesa deixavam a sua intemalidade urbana para alcançar outras realidades produtoras; realidades exteriores, que serviam d ponfos de^apobpam transações de alta N a tiv id a d e . A caracterísbca que procuramos destacar como o pnme.ro regisuo por onde estruturou-se o arquétipo da cidade empono está, P0,3’ especialização dessa economia urbana de Portugal no desempe..ho de serviços de intermediação, de interposição entre eS2artiaos diferentes de corretagem, preferenciaimente monopolistica, de arí,y o provenientes de variadas fontes produtoras, quer agrícola, quer

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manufatureira ou melhor, na sua conversão em foco de drenaoem e reexportação de bens, transportados para dentro e para fora dos seus contornos economicos e sociais. Nestas circunstâncias a cidade cor tuguesa pode ser entendida, às vésperas do descobrimento e da colonizaçao do Brasil, como engajada na função de entreposto ou depósito, onde se estocavam e circulavam os excedentes da produção das áreas situadas nas vizinhanças e ao alcance do seu poder de atraçao., Em suma, este tipo de cidade é marcado pela hipertrofia da importância e do comando do comércio sobre todo o conjunto ou sistema sócio-económico. t evidente que o estilo difícil de instrumentação do primado das cidades portuguesas exigiu meios de coerção e conquista m uto ma.s agressivos do que as práticas do incipiente m e r c a n til™ empregadas pelos centros manufatureiros europeus nas d souTas para a constituição das hegemonias económicas Tecnicamente e\e residiu na apropriaçao dos excedentes da p r o d u ç ã o m a i L 7 ' ce influencia da cidade, naturalmente situadas em território português produção que servia de base para o intercâmbio com praças estran’ geiras ou para a redistribuição interna, entre áreas criadoras de bens .L'a,s especializados. Mas,, as fórmulas de funcionamento desta economia tiveram que recorrer, internamente, a casuísmoTcom m a S poder de constrangimento legal para promover a ado a l i :rçada dos partic.pantes produtores e também garantfr às ctíTdes as í-nçoes de entrepostos e de centrais de intermediarãn À apareihos para a dominação económica no jogo de interesses que privilegiavam sistemicamente a cidade recorria s p Jn tõ l qu®

bens agrícolas e artes^rais onp s 6 t° n?e brotavam os fluxos de comércio urbano Assim"' ' ! ! q,Ue sustentavam o movimento do aprot isionamento dos árt , „„-P hTr" erl no-- se,i jnçõ«s n^tnrai o n a ra p rt 9 • d Proveniência rural, além das dos d° V° !ume 6 3 d'versificação dependência em ^relacL?cana° ' ° U' em outras Palavras. a exclusivos de produtores íu e irbm í p ^ 00'1'h^ 0 d ® a9reSados virulentas discutas Z í ■ 9 desencadear e fomentar as nfluência e n tre g a s ^ 9 de áreas de expressão o.iqinal é ,,m' J l 3 0; 3 area de influência que, em c.idas as variáveis sistê'micas r tP s ? S indlcad° res do quadro urbano, sistémicas deste mercantilismo peculiar que então

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se esboçava, caracterizado pela ausência de importância da função manufatureira, contextualizou-se também como fator de conquista e defesa, indissoluvelmente encadeado ao metabolismo da expansão. Desde entãov no velho continente e nas futuras colónias da América Portuguesa, ó “açambarcamento legitimado", tão antigo já nos tempos formativos de Portugal, quanto atual, na hodierna realidade brasileira, anunciou-se como um “jacobinismo urbano”, extremamente agudo. Mesclando manobras financeiras com a superestrutura codificada para orientação das ações administrativas, a cidade portuguesa aparelhouse para agir, tão ofensivamente, quanto defensivamente, ou na apropriação das condições de criação de bens dos centros rivais, cu resguardando ciosamente os pontos de apoio de suas próprias áreas tributárias. Conflitos permanentes de jurisdição decorriam desta tendência simultaneamente “invasionista” e “protecionista” - tendência que só conhecia limites de comedimento na autoridade arbitrai do Poder centralizador da monarquia. Porém, os verdadeiros filões da riqueza para este gênero peculiar de economia urbana estavam, naturalmente, no comércio ex­ terior. Mas, as soluções usadas para o controle das fontes de criação de bens do mercado interno, dada a sua natureza “ invasionista”, não poderiam ser utilizadas .contra os parceiros europeus, cujas políticas protecionistas apoiavam-se em crescentes poderios económicos e militares e em tradições de belicosidade formada em séculos de lutas feudais e dinásticas. A subordinação hipotética destas praças teria que fazer-se através do controle monopolístico de mercadorias em grande demanda, produzidas muito além das fronteiras européias, no quimérico e imenso universo que se sabia existir desde as linhas de frente do Islamismo até os rincões mais remotos do Extremo Oriente. Conforme sabemos todos, a expansão portuguesa para este Oriente fez-se lentamente. Nem seria possível à acanhada economia aplicar in­ vestimentos maciços nas navegações e conquistas ou receber, quase ao mesmo tempo, os aportes vultosos da Ásia e da África. O des­ dobramento vagaroso do avanço português permitiu um aprofun­ damento da especialização da sua economia de intermediação, o reforço das linhas do comércio exterior, a maximização da lucratividade na colocação dos bens que trazia das “ navegações”, nas praças européais, sobretudo as cobiçadas especiarias, a ampliação dos órgãos da administração ultramarina, a preparação de quadros. Paralelamente a esta especialização intermediadora que suscitou o desenvolvimento de uma ideologia do atravessamento, promoveu-se uma reforma instituicional para viabilizar a criação de um império mer­ cantil sem o sustentáculo da produção manufatureira, um mercantilis­ mo precoce e deformado, onde a violência física e guerreira ligava-se à violência económica. Para tanto, o Reino transformava-se, ele mesmo, em um Estado mercantil e, pela primeira vez na história do

vasto Oriente, apresentava-se como “comprador", não a tradicional figura do mercador particular, mas sim, uma temível potência naval, agindo em nome de um Estado estrangeiro e em proveito dos seus comerciantes e dele mesmo... O preceito operativo deste Estado poderia ser aqui enunciado como o conjunto de ações ins­ titucionalizadas, conduzentes ao maior número de benefícios no menor prazo possível e env vendo o mínimo de investimento. Conforme dissemos alhures, o crescimento ultramarino das áreas de influência da cidade portuguesa, mormente da capital, redun­ daria em um enorme sistema de relações comerciais, estendendo-se por oceanos e continentes. Tal sistema estruturava-se segundo uma ordem bem reduzida e simples de componentes. De um lado, ali­ nhavam-se as constelações de alimentadores do sistema, as regiões geradoras dos bens constantes da pauta de comércio tutelado, definidas geralmente como “colónias de exploração". Do outro lado, a cidade portuguesa maior, transformada em foco metropolitano, com uma capacidade armazenadora ampliada em escalas antes imprevisíveis e sua organicidade definitiva de “empório", alojando os elementos administrativos encarregados da regência do conjunto das colónias de exploração e incluindo um corpo de funcionários exe­ cutivos que ia da Coroa às repartições especializadas. Entre os ter­ minais das zonas de exploração onde desenrolavam-se as atividades produtoras e a séde urbana européia absorvedora dos benefícios, o sistema abrangia ainda a existência de um terceiro elemento ins­ titucional, a feitoria, que atuava no ultramar como aparelho local de intermediação representando, de longe, os papéis de dominação delegados pela metrópole invasora. A feitoria foi, pois, o segundo registro significativo na articulação do arquétipo da cidade empório. Mas, note-se bem, a feitoria não se constituiu nenhuma modalidade de fenômeno urbano - ela foi, unicamente, um dispositivo organizacioal, correspondendo a um enclave introduzido nos contextos produtores, para desempenho da função dupla de tutoramento da circulação de bens e comercialização do volume de mercadorias geradas no contor­ no dos seus meios de controle - e como ponto da imensa rede de conexões que comunicavam entre si e prendiam a cidade às zonas ultramarinas de influência. Porisso, é lícito dizer que a feitoria foi responsável operacionalmente pela transformação da colónia de exploração em reserva económica da cidade metrópole. É bem verdade que com seu caráter de dispositivo or­ ganizacional a feitoria também possuía o cunho de um contingenciamento crónico, porque a sua implantação se fazia, incrementava e se desfazia em razão das particularidades dos bens gerados local­ mente e, portanto, das oscilações da demanda nos mercados de con­ sumo. A sua administração, dirigida para o ordenamento das condições de comercialização, acompanhava tanto quanto possível as

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é ccrivei que vicissitude da oferta e da procura. Destarte, e n v dizer-se e .™ m ^ u intermediaaas e o comércio coordenador dos fluxos de circularão feitoria era, ao menos em hipótese, m^uicoc, impermanente, ---------- - pois a, sua que se estruturou a cidade empório sobre a quai atuavam dois com­ iens criados no circuio dos fluxos de bens circulo aa da ssua ponentes antagónicos de forças na proporção que evoluíram as de mercado, segundo " ótica da condições do povoamento e da exploração económica Com o ire o seu primeiro agiam os impulsos expansionistas do núcleo urbano no sen­ “ Ç eao rnais | tido de ativar a produção e o consumo das suas zonas de influência s á S Mas foi através do seu indispensável posicionamento aumentando o volume do comércio de exportação e importação dos estratégico que Portugal, sem dispor de bases manufatureiras, P°s em colonos espalhados pela imensidão dos sertões, dos territórios aber­ ação em sua maior capacidade, a função de mediadora das tos à conquista. E verdade que o crescimento da intensidade do economias, trocando de uma praça para, outrai osr artigos que rada coménJo trazia, em consequência, a multiplicação dos atravesditando a todos, uma consumiria, assim auauuu „ sadores, a fundação de vilas subsidiárias, seu desenvolvimento e graus de rentabilidade. •A------feitoria foi, nestas iUUS yiauo procura, nos maisi elevados competição com o centro urbano matricial, a fragmentação da zona de • _____ —«I m nin ~y pgjQ q ual ('finfirfitÍZ 3V 3" circunstâncias, o meio operacional mais eficaz pelo c°^retizava^ influencia original, em outras tantas áreas menores, o acirramento da se o controle absoluto dos preços no amploD arco de bens que a concorrência e uma permanente atmosfera de antagonismos entre os economia do Ocidente intercambiava com a economia do O-iente. ç.upcs coion,ais. As medidas internas de proteção dos interesses es­ Através da ação da feitoria Portugal pode impor preços de compra, tabelecidos de comércio, sempre traduziu a defesa contra a quer extraindo as suas zonas de influência ultramarinas, quer afundan­ ■•.roduçáo, na sociedade negócios, das pessoas estranhas ao grupo do por condições privilegiadas o comércio com outras feitorias quer primitivo. Porisso o instrumento de seieção para os membros da ainda manobrando, como único interlocutor, o domíniodos livres mer­ c-jt-geria seriam as várias modalidades de concretização dos excados. No final do século XVI, graças à dupla função da teuoua Porc.usrvismos, entre os_ quais ó pagamento de taxas, licenças avenças tuqal desfrutou de um estatuto jamais alcançado, em termos de subsídios, contratações que constituíam, por efeito do seu valor na concepção e aplicação das regras do monopólio ao manipular os sociedade desmonetizada da colónia, um obstáculo que se formava preçosP máximos e mínimos de compra e venda, alternadamente nos -j entre as autoridades centrais e municipais com os comermercados vendedores e compradores, sem envolver-se com nenhum c.jí .es. 0 aparelho repressor integrava a própria engrenagem ad­ problema da manufatura. Poder-se-ia dizer, por conseguinte, que o f m ministrativa que se encarregava de localizar e punir os clandestinos... do século XVI marcou o ponto ótimo da especialização do sistema inu se9onao componente antagónico ficou sendo a externalidade da termediador português e que a feitoria teve função decisiva na r GaGS emP°np- A acumulação dos capitais promovida pela cidade concretização desta vantagem. . . , ; r o se iazia como primeira etapa da transferência para as reserO arquétipo da cidade empório reunindo no Brasil os do.s .as económicas da Metrópole. Esta inclinação, de um lado acentuava reqistros que mencionamos, varia em torno do mesmo tipo ideal, na a função isitorial da cidade enquanto centro exportador de bens e de medida em que predominam ou a dinâmica antiga das re.açoes entiea .ç ,^dis obtidos pela intermediação na interposição entre economias. zona de influência interna e a cidade - como nos tempos da formaçac p.nmoUr i° ad° ’ reduZ!a a sua face de centro atravessador, agindo em do espaço continental português - ou a formalizaçao das relaçoetuguesa SeUS mteresses !ocais- no molde da antiga cidade porprivilegiadas e dos monopólios de expansao ultramarina instrumentada na feitoria. De qualquer modo é lícito seguir as mesmas “ nhasde. i f aPrfe n ta m o s , sua autora analisa a reprodução reflexão conduzidas por Eulália Lahmeyer Lobo, quando eia analisa o., t da Cidade i S cidade emporio inserida no Outro Nordeste Ela seaup os contexto da cidade empório brasileira onde o cap^ahsmo com e.cid; da cora^ t o ç ã o do fenômeno a e v S t e das suas definia a sua função de domínio sob-e os espaços colonizadoa Na^ prática, o controle do sitema colonial se faz por quem dominava^ da ~ í n v é ^ ? 'd o SEMaSS 0h de |SI’ Ua56eS qUe se aPres8n,aram depois Ef t do brasileiro, a_ repetição do primitivo discurso os meios de circulação. Aí o comerciante estava sempre ^g ad o jj. , coionizador prcc,amaÇa? d£» independência política dos burocracia metropolitana no processo de acumulaçao de cap.tais brasileiros assim como aos proprietários rurais dos meios de produção. , 01, pof |, sua tradnrão P’i L CUra a írapsparencia do arquétipo no paradoxo da e* cêntrica- a . realidade trágica dos ?on tanto, na reunião dos 3 elementos representativos do sitema colonial Hr r^ ~?s ",e P°breza, funcionando basicamente como administração metropolitana através dos prepostos ultramarinos, P^? 'lerH enCia 9 man°bra de interesses externos - porém __j~ r*r\nr\r\rc\ Hnc honQ p r.nnsumidorci deis rn0rc3ocn< zona de influência ° em tud0 3 sua essência emporial de armazenamento, dé 14

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r

/ controle da produção e da circulação de mercadorias, de permanente Instrumento intermediador. Luiz Fernando Raposo Fontenelle ^

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(*)

Luis Fernando Raposo Fontenelle é professor titular no Departamento de Ciências Sociais e Filosofia da Universidade Federal do Ceará e foi orientador da tese que

j»gSi?m m

originou este trabalho.. A autora deixa consignado aqui os seus agradecimentos ao Prof. Fontenelle.

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-.t i.

INTRODUÇÃO

Se se pudesse generalizar a evolução histórica dos núcleos ur­ banos do Brasil, surgidos no litoral, como Fortaleza, o trabalho aqui apresentado seria uma inútil obviedade. Os estudos relativos à urbanização brasileira demonstram que as atuais grandes cidades, que tiveram origem no período colonial, j á nasceram hegemónicas. Salvador, Recife, Rio de Janeiro, Manaus, São Luís, Belém, dentre ou­ tras, instituídas “vilas” ou “cidades reais”, ao longo do primeiro e se­ gundo séculos da colonização, foram, nas diferentes regiões, pontos exdusivos de_auçleação_da^produção para o mercado externo e sede do aparato burocrático e militar. Na realização destas duas funções originárias, assentou-se a base da dominação daqueles núcleos sobre as áreas dispersas da produção e eventuais aglomerações interioranas. (Oliveira, 1982) Tal não foi o caso de Fortaleza. jO prolongado período em que a vila ficou deslocada em relação às regiões do Ceará produtoras de bens para o mercado do litoral de Pernambuco e do exterior, veri­ ficado ao longo do século XVIII, inviabilizou o desenvolvimento nela de atividades económicas de caráter urbano. fA essa circunstância _acresce-se o fato de que a vinculaçáo administrativa do Ceará a Per­ nambuco excluiu da via , até o final do século XVIII, como de qualquer outra da capitania, o desempenho de funções burocráticas. 0 atributo de “vila", conferido ao pequeno aglomerado que sediava uma guar­ nição militar, só teria significado à luz dos interesses da dominação coloniãrpoftiigup»sãr Assim, a inserção do Ceará à economia colonial, ao contrário das demais regiões do Brasil, não se deu através do núcleo que viria a ser a capital provincial no Brasil independente, tampouco de nenhum outro.

da produção e do mercado vetariam a possibilidade de sustentação dos dois núcleos e justificariam a disputa pela hegemonia entre Aracati e Fortaleza, disputa essa vencida pela segunda, por ser capital de província e, nesta condição, privilegiada na ordem poiíiico-adminístraíiva do império. A perspectiva teórica que fundamenta este estudo foge à concepção tipológica da cidade. Tai perspectiva tem orientado, com exceções a maioria das análises sobre o fenômeno urbano no Brasil. Na procura de identificação nas origens da vida urbana brasileira, o padrao clássico de cidade européia ou "cidade ocidental” como define Weber (1974), diversos estudiosos, ao se defrontarem com um universo empírico que escapa ao "tipo ideal” tomado como modelo, negaram a concretude do fenômeno urbano, ou, mais en­ faticamente a predominância da cidade sobre o campo. Sérgio Buarque de Holanda (1973:33) considera que, “ao passo que em todo o resto do Brasil as cidades continuavam simples e pobres depen­ dências dos domínios rurais, a metrópole pernambucana vivia por si ... Há quem afirme que “a fisionomia rústica da cidade traduz a predominância da vida rural sobre a urbana”. (Leal, 1963:45) ou ainda [a] “cidade colonial ... encontrava-se marginalizada na estrutura de re­ produção da vasta empresa comercial da colónia. Isto equivale a dizer que a cidade colonial não teve condições de desenvolver uma bur­ guesia". (Machado, 1974:265) Subjaz nessas afirmativas o pensamento dualista que, con­ traponto campo e cidade” como realidades autónomas não rela­ cionais, deixa escapar o significado e a extensão histórica do fenô" j urbano no Brasil. (Oliveira, 1982) e que justifica conhecê-las co­ mo cidades-empório, segundo faz Fontenelle. A perspectiva teórica aqui elegida conduz a conceber campo e Jade como formas de organização diferenciadas, cumprindo cada uma delas uma especialização funcional, uma divisão de trabalho, que é definida a partir de estruturas sócio-históricas globais. Devem-se, portanto, buscar na constituição do capitalismo mercantil e industrial, no qual o Brasil e^ consequentemente, o Ceara se inserem, as bases para a compreensão da emergência e hegemonia de Fortaleza. soma-se como pressuposto básico que a cidade brasileira ^ 9 ® Para a expansão do capitalismo mercantil. Reproduzindo o pac p o inicia! de acumulação capitalista no velho mundo, a apropriação uo excedente comercializável, no novo mundo, tem assento nas aqlomeraçoes urbanas. (Oiiveira, 1982) Nesse sentido, a colonização e a .ida urbana coincidem, historicamente, no Brasil. iTrechos das notas dominicais de Tollenare (1908:214) que se referem ao Ceará.

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de subsídios militar e a proibição de abrir roçados e corte de madeira. A solicitação feita para eievar a vila à" categoria de cidade se bem j resultaria em alterações na vida económica e administrativa do aglo­ merado, deveria corresponder ao desejo do estrato dominante em / igualar-se em prestígio aos da cidade de Salvador e Rio de Ja ne iro .__ / Restaria destacar que a posição de vila-capital da Capitania in. dependente conferia a Fortaleza vantagens sobre as outras vilas na captação de recursos excedentes do campo para a edificação de obras. Sabe-se que a construção do Forte que deu o nome à viia, uma das maiores obras da época, foi financiada por fazendeiros do sertão como informa Brígido (1979:3) - A Estas considerações mostram como estavam ionge os tempos em que a viia era um aglomerado sem sustentação económica. Tomando-se como referência o ano de 1811, ,para o qual temos informações que permitem comparar o voiume de algodão ex­ portado pelos portos da Capitania,'nota-se a importância relativamente destacada do Porto de Fortaleza. Além de apresentar maior percentual de venda (42,9%), é o único vinculado diretamente ao mercado inglês. Mas o de Aracati não está muito abaixo (35%) e persite a dominação da praça de Recife, que absorve 65.1% da produção, incluindo até mesmo o algodão cultivado em áreas próximas a Fortaleza (18,7%).

QUADRO 5 Algodão exportado pelos portos do Ceará

1811 (arrobas) Porto de Embarque Fortaleza Aracati Acaraú Camocim Total

Destino Pernambuco Inqlaterra 2.128 (18,7%) 9 226 (81,3 %) 9.249 (100%) 5.581 (100%) 0,278 (100%) 17.236 (65,1%) 9.226 (34,9%)

Totai 11.354 (42,9%) 9.249 (35,0%) 5.881 (21.1%) 0,278 (01,0%) 26.462 (100%)

FONTE;Brígido (Revista do Instituto do Ceará, 24:182-183) Mesmo centralizando um maior voiume da produção do algodao, Fortaleza ainda é uma vila inferior ao Aracati e ao Icó. Segundo a -escrição de 1816, feita por Pauiet (Revista do Instituto do Ceará, 12(13): 16),

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[Aracati] “é a mais opulenta da capitania com maior população e onde se acham casas de sobrado, o que é devido a ser o porto de embarque das produções de algodões e solas do ter­ mo das vilas das Russas, ou de São Bernardo, Campo Maior, Icó e todo o Jaguaribe e da villa de Monte-Mor o Novo em par­ te... Tem casa de câmara e cadeia, a melhor da capitania” ... [Fortaleza] “assento do governo com um batalhão de tropas regulares, um juiz de fóra que é auditor da tropa e juiz da alfân­ dega. Há uma casa de cadeia arruinada; não tem cadeia, e ser­ vem-se as autoridades civis de uma cadeia militar... A villa é pobre, seo commercio de pouco vulto, ainda que o porto é soffrivel, apezarde uma enseada, mas como só as immediações do termo, até a serra da Uruburetama, parte do termo de Aquiraz e parte do termo da villa de Monte-Mor o Novo se sur­ tem da Fortaleza, o commercio é muito menor do que o do Aracati. Não há uma só caza de sobrado, e as terras são muito inferiores. O solo é de areia solta, o tijolo, cal e madeira são ca­ ros, e tudo concorre para ser mui despendiosa a edifi­ cação” ...

canais gerados no período da pecuária, que faltavam à capital, e se mantinham com força suficiente para atenuar vantagens que poderiam advir das medidas adotadas pela administração com vistas a estimular as trocas em Fortaleza, como a isenção da cobrança de direitos du­ rante seis anos, a contar de 1803, sobre os produtos de exportação e importação nela comercializados. ^ A despeito da manutenção da hegemonia de Aracati ainda ao 'findar o período colonial, as modificações ocorridas entre fins do sé­ culo XVIII e começo do seguinte no Ceará - desenvolvimento da agricultura para exportação e a separação administrativa^ da capitania da de Pernambuco, associadas, - assinalaram a emergência de For­ taleza no contexto da economia do Ceará

Em 1814, ... “a casa de Inspecção do Algodão no Aracaty era superior a da capital, sendo os principais generos de exportação da di­ ta villa algodão e couros". (Pompeu Sobrinho, 1922 v.2:85) Tolenare, que visitou o Ceará entre 1816-1818, descreve Aracati: “ ... é uma cidade que dia a dia adquire maior importância devido ao plantio do algodão, que ali tem dado bom resultado. A população é de 600 almas, tem tres igrejas". (Revista do In­ stituto do Ceará, 21 (22):213) A descrição de Koster sobre as duas vilas igualmente chama a atenção para a proeminência de Aracati sobre Fortaleza (1942:160165) Havendo Aracati centralizado a produção da pecuária por mais de um século, parece óbvio que quinze anos de atividade comercial do porto da vila-capital não eram suficientes para impressionar melhor os visitantes de Fortaleza. Mas o desnível entre as duas não pode ser vis­ to apenas como resultado de uma acumulação no período anterior, pois Aracati passou a dispor com o cultivo do algodão de uma área de influência, ou de reserva de produção, mais extensa do que a de Fortaleza, como ainda continuou centralizando a produção do couro e era o centro abastecedor das áreas do interior, como revela a descri­ ção acima. Acrescente-se ainda um fator que favorecia a vila do Aracati, qual seja, a utilização para o comércio do algodão daqueles 64

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4 -

A H E G E M O N IA EM PRO CESSO

Ao longo do século XIX, o quadro urbano do Ceara se amplia, com a criação de vilas, elevação à categoria de cidade das vilas surqidas da pecuária, e se mofifica com o aparecimento da capital como núcleo urbano hegemónico da Província. A superaçao da incipiente função administrativa, mediante a centralização da produçao para exportação, não deve ser associada à mudanças estruturais de monta, pois as características fundamentais da sociedade colonial brasileira se mantiveram no período imperial e o Ceará não poderia ser umai ex­ ceção' Fortaleza desempenhará, do mesmo modo que Aracacti, o papel de principal praça de mercado da Província agora de maior vulto pois, além de ser o centro de captação da produçao agrícola alqodão, a partir do começo do século - tomará de Aracati a ex­ clusividade do comércio do couro; será como consequência o maior centro importador, f ~ . . . . Na literatura que trata das cidades brasileiras, no período pòsindependência, argumenta-se que o rompimento da subordinação a deputados e senadores da Província, o coliegio se sinja reli­ giosamente à letra da lei, lembrando-se que devem ter em vista o arredarem de si nomeações de homens inimigos declarados da sagrada causa do Brazil, os quaes são bem considerados por factos escadalosamente perpetrados à vista de nós todos,e que Sua magestade Imperial, uma vez que não recáiam as nomeações em homens probos e de reconhecida conducta, não só as terá por nullas, como também punirá severamente a todos aquelles que para ta! concordarem. Advirto mais a V. Sas. para que o participem ao collegio eleitoral, que Sua Magestade Imperial ficará contente si o co­ llegio n'esta parte obrar com dignidade, que lhe cumpre; sendo muita de minha especial obrigação levar à Augusta Presença de Sua Magestade Imperial todos os procedimentos que, fora d’este trilho, se houverem de praticar; o que cer­ tamente não é de esperar do collegio eleitoral; porque da boa eleição de deputados e senadores independentes depende muito não só o bem geral como o bom conceito do soberano, devendo a Província por esta maneira apagar a nódoa com que um bando de malvados a quiz manchar.’ In Nogueira (1889, v. 1:51) Restava punir os líderes. Aqueles que não morreram em com­ bate foram executados em praça pública, em Fortaleza. Uma punição

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exemplar, nos moldes da dominação metropolitana e que no império servia para reafirmar o poder de coesão do centro e da capital provin­ cial como símbolo mais perceptível, porque mais próximo daquele poder. Curiosamente, o patíbulo que servia nas execuções é mantido na praça pelas autoridades provinciais até ser destruído pelo povo logo após a notícia da abdicação do Imperador. A repressão à Confederação do Equador viria reforçar a po­ lítica centralista do Primeiro Reinado. Mas, para se manter, vale-se o Centro de ações complementares. São indicados para a administração das províncias presidentes conservadores, afinados com os interesses do governo sediado no Rio de Janeiro. No Ceará, o presidente que havia assumido posições vacilantes, pelo menos nos momentos ínTciais da Confederação, é substituído por outro, de confiança do Im­ perador. Em Pernambuco é nomeado juiz relator da Comissão Militar (Quintas, 1967:194). Outro recurso foi a ampliação do contingente das forças armaadas no centro e nas províncias. Sabe-se, pelo estudo de Uricoechea (19/8:93) que no Primeiro Reinado os gastos militares su­ peraram em .m uito as despesas com a4burocracia. Tão importante como as medidas anteriores para o controle nas províncias foi a atribuição aos Comandantes das Armas, sediados nas capitais, de poaer de mando poiítíco, revelado, por exempio, nas ações do Co­ mandante do Ceará.. Notabilizado na historiografia cearense por sua ar­ bitrariedade, deliberou sobre assuntos que formalmente exorbitavam as funções de um Comandante de Armas, tais como, anulando decisões da presidência, investindo pessoas de sua confiança em car­ gos. Escrevia ele ao seu subordinado no Crato:

Eu so quero que se faça o que mandar, por que eu só mando o que S.MJ. quer; e assim que chegarem minhas ordens, cum­ pram-se, dê por onde der!” In Nogueira (1889:64) O fortalecimento do centro estimulava a reorganização da facção absolutista", contrária ao regime constitucional, e a dos “liberais”, originando disputas que acabariam desembocando na Abdicação. , final do Primeiro Reinado e ao longo da Regência eclodem conflitos armados e dissenções menores, contra as quais o poder central reage, através da força das armas e de instrumentos legais, pa­ ra preservar a unidade e a paz social", necessárias à expansão eco­ nómica e à reafirmação política da classe dominante.

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No Ceará os conflitos reproduzem as disputas do centro, re­ cheadas com a rivalidades dos chefes locais. As antigas contendas entre chefes locais na região do Cariri í47) são revividas com a exclusão temporária’ das liberais do controle político da região. Os confrontos que ocorrem nos municípios de Crato, Jardim e Icó, se não tiveram a mesma significação política dos movimentos separatistas, traziam à luz a persistência daquele poder atomizado, a que já nos referimos, e contra o qual reagiria o Centro, através dos mecanismos intermediários de controle, estabelecidos na capital. Assim é que para conter as rebeldias dos chefes locais na região do Cariri são reforçadas as tropas provinciais que, em nome dos princípios constitucionais, deveriam restaurar a ordem, como re­ velam as exortações do Comandante às tropas enviadas à região dos conflitos: “ Eia, pois, Camaradas, marchemos intrépidos: seja a mais rigorosa disciplina militar a nossa primeira divisa;' desempe­ nhemos a confiança, que em nós tem depositado o Exmo. Go­ verno, que espera de nossos exforços o socego do interior da província, ameaçado por vias absolutistas que debalde tentão transformar o systema jurado”. In Nogueira (1889, v.1:88) De Fortaleza partem também as ordens centrais, às autori­ dades judiciárias municipais, proibindo reuniões secretas “ para qual­ quer fim que seja, sem a indispensável autorização do governo” In Nogueira, (1889, v.1:96), e recomendações aos chefes locais obe­ diência aos princípios constitucionais como faz o Presidente da Província a Pinto Madeira: (48) “Tenho a dizer-lhe que S.M. o Imperador jamais Quer nem tolera outro methodo de governo que não seja o de Imperador Constitucional, e como tal deve ser nossa cega obediência..." In Nogueria (1889,v.1:78) ^ A abdicação e a ascensão ao poder do liberais, no centro co­ mo nas províncias, iriam revestir as disputas entre os chefes locais no Ceará de cunho político e acentuar as divergências, manifestas em conflito armado, como o que ocorre no Cariri. A Confederação do Equador colocou em risco a unidade. Movimentos como o liderado (47)

Opunham-se, no Crato, os Alencar e Bezerra Monteiro, em Jardim, os Alencar e Souza. Montenegro (1953:19)

^ ^ Pinto Madeira era comandante das Armas no Crato, opositor de Alencar. Liderou no Primeiro Reinado a “reação absolutista" e na Regência o movimento armado.

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por Pinto Madeira ameaçam a hegemonia dos liberais moderados e a paz necessária à expansão económica que no Centro-Sul ia se recu­ perando com o início do desenvolvimento da agricultura cafeeira. Os procedimentos para a repressão seriam os mesmos: participação das tropas imperiais e provinciais, agora com o apoio da França, e pro­ messa de anistia. A condenação sumária de Pinto Madeira assinala o fim do movimento e revela o seu caráter de disputa local. Alencar ao assumir a presidência da Província, nove dias após a posse, impõe a con­ denação à morte do velho inimigo, a despeito da oferta de anistia, na sede do município onde ambos disputavam o mando O patíbulo que lá permaneceu por longos anos pode ser entendido como símbolo do domínio de uma oligarquia, mas não seria infundado percebê-lo como sinal de prevalência de um poder que começa a se consolidar a partir da capital.

4.5 -

Fortaleza N ucleando o Excedente Económico

O papel das capitais como intermediadoras na captação de ex­ cedentes, sob a forma de bens e tributos, do mesmo modo que sua função de controle da ordem política, como vimos, não é uma novi­ dade que surge no país independente. (Com raras exceções, dentre as quais se conta Fortaleza, as sedes das capitanias, via de regra, situadas no litoral, eram os núcleos aglutinadores da produção das áreas rurais para o mercado europeu e captadores dos impostos co­ brados sobre a produção e comercialização de bens para a Coroa portuguesa.? Mantida a participação do Brasil na divisão internacional do trabafho, como área de produção de matérias-primas e bens alimentícios para o mercado externo; não teria como ser alterada aquela função. Entendida a questão numa perspectiva estritamente econó­ mica, o rompimento das relações coloniais traria como elemento novo, e que viria favorecer a expansão das cidades-porto, a possibilidade de dinamização das trocas jielas realizadas, uma vez eliminada a intermediação metropolitana. [Êm princípio, para dar suporte às trocas am­ pliadas, seria necessário dotar as cidades-porto, cidades-capitais, de uma infra-estrutura para a comercialização, na qual se incluiriam me­ lhoria dos portos, construção de armazéns, agências financiadoras, etc.jO aumento da capacidade de acumulação dos proprietários e cdrherciantes poderia favorecer a expansão do mercado importador, e consequentemente do mercado inteno, resultando num crescimento do comércio varejista.

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1B“ 1 S d e s S o

QUADRO 7 Receita das Câmaras de Fortaleza e Aracati 1837-1838 (réis)

a liberdade de comércio não traria senão pos-

sSlidades virtuais de

brasileiras desse período.

NaS ^ M t d f e x S n i a de modo geral, e, em particular, ressalta-se a ?da t a t a ^ e x ^ assocla 0 limttado cresc-



— ——————— Fontes de Renda

1

meSnt?populacional do Rio de Janeiro à queda das exportações. O estudo sobre «" S & 1 Í S 3 Í dcos de que * s p = . n ndi^. c-lona| do açúcar e do algodao

não te n h a ^ d^mtnuWo o s ^ r e ç o s p ^ g ° e^so^retudo^pelo c S S d J produção verificado nas áreas concorrem t6S A concorrência externa. t u S

c i l dde° * ° c B S s iapraticamen,e, o único produtor de caie

(53) Vejam-se FURTADO (1966) e SINGER (1975).

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garantiu-lhe uma expansão rápida e contínua, assegurando altos níveis de acumulação, a despeito da utilização de mão-de-obra escrava, en­ carecida, desde a década de 40, pelas restrições ao tráfego de bran­ cos. Não é novidade afirmar-se que a cafeicultura foi o esteio eco­ nómico e político do 2o Reinado. Uma ressalva deve ser feita sobre a situação do açúcar e do algodão no conjunto das exportações, indicada pelas cifras do QUA­ DRO anterior. Note-se que os percentuais, referem-se à participação da­ queles produtos na receita e não o volume de bens exportados. Portanto, a queda da importância do açúcar e as oscilações dos ren­ dimentos com o algodão não significam, pelo menos nesse período, baixa de produção. No caso do açúcar a queda dos preços não desestimulou o aumento da produção. Constata-se, tomando como referência cifras relativas a Pernambuco, aumento das exportações: entre 1836-40 a exportação média era de 27.844 toneladas, entre 1851 -55,56.931 e, entre 1886-90, 119.227, (Eisenberge, 1977:421. O algodão também tem o cultivo ampliado, favorecido em re­ lação ao açúcar, na década de sessenta, pela retração do fornecimen­ to dos Estados Unidos. Ilustraremos a afirmativa, posteriormente, ao analisarmos a agricultura cearense. Incorporamos, para compreender o aumento da produção da­ queles dois produtos, a análise de Marson (1981:26-29), que, embora referida apenas ao açúcar, parece-nos acertado estendê-la para o caso do algodão. Segundo a autora, a queda de preços do açúcar no mercado internacional tornara o produto mais acessível ao consumo de componentes de outras classes sociais, que não a dominante, como foi regra durante muito tempo, assegurando desta forma uma ampliação da demanda. Idêntica relação pode ser feita para o caso do algodão. A baixa do preço do produto e dos custos de produção de fios e tecidos teriam permitido a extensão do consumo de têxteis a faixas mais amplas do mercado europeu, favorecendo desta forma a produção das áreas de cultivo da matéria-prima, e dentre elas o Brasil. De outra parte, “as exportações brasileiras [de modo geral] contavam com a proteção do câmbio que, desvalorizando providencialmente a moeda brasileira frente à libra, assegurava ganhos compensadores” (Marson, 1981:128) a produtores e comerciantes. Acrescentaríamos, como causa mais óbvia, que, com preços menos competitivos em relação aos do café, uma vez assegurada a demanda externa para o açúcar e o algodao, restava a seus produtores, para garantir uma maior acumulação, aumentar o seu cultivo. A prosperidade económica, assinalada no período, motivada pelo aumento das exportações , não beneficiou igualmente as diferen­ tes regiões brasileiras, já integradas ao mercado internacional. Contu­ do, a prevalência económica e política do Centro-Sul, que se inicia e

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1855-1860 Valor Quant. Valor Oficial _ Jss __ Oficial k9 25,0 13,6 12,9 20,4 _______ ; 53,8 59,1 31,7 40,3

1860-1865 Valor Oficial 36,0

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O Q U AD R 011 apresenta a participação dos principais produtos no conjunto das exportações entre os anos 1850-1885. Revelam os dados que o algodão se firma co o o principal produto da economia. Essa afirmação se inicia, no meio do século, apresentando um percentual alto, em relação aos outros produtos (53,8%). Tem sua participação diminuída entre 1855-65, recuperandose para apresentar índices mais altos de exportação entre 1870-1875. Conquanto nos anos de 1860-65 figure como o segundo produto mais exportado, nestes anos, como nos demais, no que respeita ao valor exportado, ocupará sempre o primeiro lugar. Os aumentos verificados, quer quanto ao volume, quer quanto ao valor,-a partir de 1865, 100

CD c a u ! alfândega daquela praça, do tributo de exportação. As perdas dej veriam ser grandes para justificar a comercialização, pelo p orta de Fortaleza, do algodão produzido ná área de Aracati. Ja nos anos 5759, parte do algodão lã produzido demandou o mercado externo, par­ tindo da capital (Brasil, 1964:355). . À exclusão de Aracati da comercialização externa seguiu-sc- a perda da sua posição de núcleo principal nas transações com as províncias do País, que é assumida por Fortaleza. Emre 1855-1 oC2 a arrecadação de impostos sobre produtos exportados p a r^ u tro s por­ tos do Império, na Mesa de Rendas de Aracati, passa de 2.800$000 para 4:872$855. Em Fortaleza, aumenta de 3:894$007 para 14:688$939, como se depreende dos dados que seguem. (QUADRO 19) Dificilmente poder-se-ia atribuir a baixa do movimento do porto do Aracati à queda da produçãp ern sua^área de influência. O cultivo do algodão é intensificado em toda a província, estimulado pela retração da Drodução dos Estados Unidos (Girão, 1947:224) e nehuma ocorrência interna como uma seca, responderia pela queda na pecuária. O acréscimo da taxa cobrada sobre a comercialização dos J r bens exportados para outras províncias (passa de 2,5% para 3 /o a par­ tir de 1855) deve ter contribuído para reforçar a transferencia, ja as­ sinalada, da produção da região de Aracati p a r a ^ informações através da consulta a Edições do • jornal O Comerciai aue em 1860, atracavam no porto dé Fortaleza navios procedentes de Aracati, carregados de algodão e co uro, Studart (1892:350)_afirma que, para fugir aos impostos, parte da produpapj^algodao_e_çouros era desviada para Mossoró. ^ Mas a prevalência de Fortaleza sobre Aracati no comércio r com asl)ufras provTnciis, iniciada nos anos sessêfvfãTesteve associ-_ 'v, ada a decisões tomadas pela administração provincial relativas a con-__ y tratos com companhias de navegação e à sucessão de investimentos^ em infra-estrutura rodo-ferroviárià áo longo dàs décadas seguinte^. Nos anos de 1858, 1860 e 1865, contratos jealizados pe.o qovemo provincial com três companhias de navegação costeira viriam privilegiar o porto da Capital. Segundo esses contratos, ficava autori­ zada a Companhia de Pernambuco a receber mercadorias nos portos

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Quadro 19 Arrecadação de impostos sobre exportação para outros portos do País (a) 1855-1862 Anos 1855 1856 1857 1858 1859 1860 1861 1862

Fortaleza 3:894$007 3:219$952 4:831$240 4:820$131 8:018$662 9:866$920 14:259$205 14:698$939

Aracati 2:800$000 6:811 $281 12:006$000 9:092$727 8:228$373 7:836$192 6:649$200 4:872$855

Acaraú 1:741 $802 4:500$000 4:666$948 6:924$473 6:006$157 4:685$512 5:278$674

200$000 151_$Q15 500$000 560$736 1’436$000 1:166$065 896$500 1:485$320

bonte: Brasil (1964, t.2:634-635) (a) Taxa de 3% de Aracati, Acaraú, Camocim e Fortaleza. A do Maranhão coube o comércio em Amarração, Camocim, Acaraú e Fortaleza. À Companhia Brasileira foi concedida a exclusividade do comércio da Capital. Nesta divisão de praças de comércio, beneficia-se Fortaleza com uma área de mercado mais extensa, pois abrange Pernanbuco, Maranhao e outras regiões do País, e com uma frequência maior d i embarcações no seu porto. Após o contrato com a Companhia Bra­ sileira (1865), o porto da capital passa a receber em média oito navios por mês. No de Aracati, não mais do que quatro. (Guabiraba, 1889:39). A inclusão de Aracaú e Camocim na rota das duas Companhias igualmente desfavoreceu Aracati. Desde o perioao colonial aqueles portos exerciam a função de nucleadores da produção de Camoc|m e Sobral para o comércio de Aracati. A ligação direta com as praças de Reci.e e ^ão Luis, numa época de produção crescente naque as duas áreas do Ceará, subtraía de Aracati significativa parcela das mercadorias. Como se vê no quadro anterior, foram crescentes as exportações em Acaraú e Camocim. ^ primazia de Aracati consistirá, por algum tempo, na comerSOja 6